244
CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO UNISAL CAMPUS MARIA AUXILIADORA Isabel Cristina das Chagas Oliveira Educação profissional: formação para o trabalho ou qualificação para o emprego? Reflexões a partir da Pedagogia Crítica e da Educação Sociocomunitária Americana 2016

CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO§ão_Isabel... · Você é uma pessoa muito especial que tem um ... desenvolver como cidadão crítico e consciente do mundo em que vive,

  • Upload
    doduong

  • View
    218

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO

UNISAL – CAMPUS MARIA AUXILIADORA

Isabel Cristina das Chagas Oliveira

Educação profissional: formação para o trabalho ou qualificação para o emprego? Reflexões a partir da Pedagogia Crítica e da

Educação Sociocomunitária

Americana

2016

Isabel Cristina das Chagas Oliveira

Educação profissional: formação para o trabalho ou qualificação

para o emprego? Reflexões a partir da Pedagogia Crítica e da

Educação Sociocomunitária

Dissertação apresentada como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação à comissão julgadora do Centro Universitário Salesiano de São Paulo, sob a orientação da Professora Doutora Maria Luísa Amorim Costa Bissoto.

Americana

2016

Oliveira, Isabel Cristina das Chagas.

O47i Educação profissional: formação para o trabalho ou qualificação para o emprego? Reflexões a partir da Pedagogia Crítica e da Educação Sociocomunitária/ Isabel Cristina das Chagas Oliveira. – Americana: Centro Universitário Salesiano de São Paulo, 2016.

244f.

Dissertação (Metrado em Educação). UNISAL – SP.

Orientadora: Maria Luisa Amorim Costa Bissoto.

Inclui Bibliografia.

1. Educação sociocomunitária. 2. Pedagogia crítica. 3. Autonomia. 4. Educação Profissional. 5. Trabalho 6. Emprego 7. Formação de Professores I. Título. II Autor

CDD 370.115

ISABEL CRISTINA DAS CHAGAS OLIVEIRA

“EDUCAÇÃO PROFISSIONAL: formação para o trabalho ou qualificação para o emprego? Reflexões a partir da Pedagogia Crítica e da Educação Sociocomunitária”.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu do Centro Universitário Salesiano de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação – área de concentração: Educação Sociocomunitária. Linha de pesquisa: A intervenção educativa sociocomunitária: linguagem, intersubjetividade e práxis. Orientadora: Profa. Dra. Maria Luisa Amorim Costa Bissoto

Dissertação defendida e aprovada em 12 de dezembro de 2016, pela comissão julgadora: __________________________________________ Profa. Dra. Maria Luisa Amorim Costa Bissoto – Orientadora Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL

__________________________________________

Prof. Dr. Antonio Carlos Miranda – Membro Interno Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL __________________________________________ Prof. Dr. Adelino Francisco de Oliveira – Membro Externo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo - IFSP

AGRADECIMENTOS

Me disseram que ao escrever os agradecimentos sentiria algo incrível, e é

verdade. Nesse momento, sinto uma mistura de euforia, saudosismo, de paz e

acima de tudo de gratidão.

Em primeiro lugar agradeço a Deus que me acompanhou até aqui me dando

fé e perseverança. Ele colocou em meu caminho pessoas que se tornaram

exemplos de vida e de profissionalismo durante toda essa caminhada.

Ao meu esposo Júnio, que viveu e sentiu comigo todos os momentos e

sensações de angústias, de alegrias, de inseguranças e de superação. Só tenho a

agradecer por sua compreensão e apoio pelos inúmeros fins de semana dedicados

exclusivamente a essa pesquisa dos quais esteve sempre do meu lado me ajudando

a buscar forças e a acreditar em mim mesma. Você é metade de mim, minha

conquista é sua conquista!

Aos meus familiares que me apoiaram e também se solidarizaram comigo nos

momentos mais difíceis e também compreenderam minhas ausências durante todo o

período dedicado ao mestrado.

Ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, do

Campus pesquisado, em especial à direção geral que não só autorizou a realização

da pesquisa como também apoiou em tudo que precisei; aos professores

participantes da pesquisa que, além de cederem parte do seu tempo para

participarem da pesquisa, trouxeram contribuições que foram muito além das minhas

expectativas iniciais para a dissertação, da qual considero que são coautores na

terceira parte. E as minhas colegas e amigas do Sociopedagógico que durante todo

meu período dedicado ao mestrado compreenderam meu cansaço e me deram

incentivos nos momentos de maior dificuldade.

Agradeço a cada um dos meus colegas do mestrado que dividiram comigo

experiências únicas durante as aulas, os congressos, os seminários, almoços... Em

especial ao Wellington Aires que compartilhou comigo sua generosidade e

conhecimento durante as tarefas nas disciplinas e nas apresentações em

congressos e seminários, você me inspirou a ser uma pessoa melhor.

Aos professores participantes da banca que aceitaram prontamente o convite

para participarem e que além de avaliar contribuíram para a melhoria da dissertação.

À minha orientadora Malu, pessoa eu comecei a admirar desde a primeira

aula. Muito obrigada por ver em mim um potencial que eu desconhecia, por me fazer

conhecer e viver, verdadeiramente, o mundo acadêmico! Obrigada por fazer cada

aula ser inesquecível! Repito sempre para os meus colegas que existe uma Isabel

antes da Malu e uma Isabel depois da Malu. Você, com certeza, faz a diferença na

vida de todos que passam por você. Você é uma pessoa muito especial que tem um

lugar só seu no meu coração.

Saibam que vocês só reforçaram o meu entendimento de que estamos aqui

para servir e sermos servidos, que não se faz nada sozinho e que todos são, direta

ou indiretamente, responsáveis uns pelos outros.

RESUMO

O objetivo central dessa pesquisa é investigar os contornos epistemológicos da

educação profissional, nos cursos técnicos integrados ao ensino médio,

discutindo sua natureza de formação para o trabalho ou de qualificação para o

emprego. Partimos do princípio de que a educação profissional deve contribuir

com a formação para o trabalho, de maneira que leve o educando a se

desenvolver como cidadão crítico e consciente do mundo em que vive, agindo

como sujeito capaz de transformar sua realidade, de forma autônoma. A

metodologia é a de investigação qualitativa, na modalidade pesquisa-ação, e a

coleta de dados se deu mediante a análise documental e encontros de grupo

focal, no ambiente escolar, com professores que atuam na Educação Profissional

Técnica de Nível Médio nos cursos Integrados de um Instituto Federal de

Educação Ciência e Tecnologia, sobre questões que envolvem esta modalidade

de educação. A primeira parte do trabalho trata do levantamento conceitual em

relação à educação profissional e os pressupostos da pedagogia crítica. Em

seguida, traça-se um panorama do histórico da Educação Profissional no Brasil,

para tentar compreender a que se deve a forma como essa é atualmente

concebida, em especial quanto às tensões entre a formação para o trabalho e/ou

a preparação para o emprego. Na segunda parte discorremos sobre a formação

de professores no Brasil, destacando a problemática que isso vem representando

na Educação Profissional, analisamos a legislação sobre a Educação Profissional

no Brasil, e, no esteio dessa a criação dos Institutos Federais de Educação,

Ciência e Tecnologia, os princípios que justificaram sua fundação, o perfil

esperado para a ação docente, para a formação do alunado e para a ação com/na

sociedade. E, ao final, levantamos uma reflexão sobre o perfil do professor para

atuar na Educação Profissional, que, em nosso entender, deve pautar-se na

pedagogia crítica e nos princípios de uma educação sociocomunitária. Na terceira

e última parte tratamos dos procedimentos da pesquisa propriamente dita, do

percurso metodológico, e da coleta e análise dos dados. A pesquisa colaborou

para a discussão da educação profissional recolocando alguma de suas tensões,

apresentando contribuições da pedagogia crítica e da educação sociocomunitária.

Como resultado, identificamos, com base na análise dos documentos e nas falas

dos participantes que a instituição investigada tem como objetivo proporcionar aos

alunos uma formação integral/ holística, portanto, voltada mais para o trabalho do

que para o emprego.

Palavras-chave: Educação Profissional. Pedagogia Crítica. Trabalho e Emprego.

Formação de Professores. Educação Sociocomunitária. Autonomia.

ABSTRACT

This research aims to investigate the epistemological milestones of professional

education, specifically in the technical courses integrated to high school, discussing

its characteristic of work formation or job qualification. This work has as one of its

principle the idea that professional education must contribute to work formation,

helping students to develop as critical citizens aware of the world where they live in,

acting as subjects able to transform their reality autonomously. Methodology

framework followed the path of qualitative action research and data collection

happened through document analysis and focus group meetings. Those took place in

the school with teachers who work with high school professional education in the

Federal Institutes of Education, Science and Technology, and covered issues related

to this specific kind of teaching. The first part of this work is a conceptual discussion

about professional education and the principles of critical pedagogy. Next, it is made

a historical panorama of professional education in Brazil in an attempt to

comprehend the roots of its current understanding, specially the tensions between

work formation and / or job qualification. The second part addresses teacher

formation in Brazil, highlighting its implications to professional education. Brazilian

legislation related to professional education is analyzed, specially the one which

creates the Federal Institutes of Education, Science and Technology, focusing on the

expected teaching profile, students formation and action within society. A discussion

about the teaching profile for professional education is also made, considering the

principles of critical pedagogy and socio-community education. The third part brings

the methodological procedures of the research, including data collection and

analysis. The research collaborated to the discussion of professional education,

replacing some of its tensions, presenting contributions of critical pedagogy and

socio-communitarian education. As a result, we identify, based on the analysis of the

documents and the participants' speeches, that the research institution aims to

provide the students with a holistic / holistic education, therefore, geared more

towards work than employment.

Keywords: Professional Education. Critical Pedagogy. Work and Job. Teacher’s

Formation. Socio-community Education. Autonomy.

LISTA DE QUADROS

Quadro 01: Expansão dos Institutos Federais ..........................................................49

Quadro 02. Mudanças nos sistemas produtivo........................................................115

Quadro 03. Mudanças nos sistemas de trabalho....................................................116

Quadro 04. Mudanças nos sistemas organizacionais e de gestão.........................116

Quadro 05. Mudanças nos sistemas educacionais e na formação profissional......117

Quadro 06. Caracterização dos sujeitos..................................................................135

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01. Evolução do número de ingressantes, matriculados concluídos e

evadidos em cursos ofertados pela Rede Federal de 2009 a

2013...........................................79

LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Eixos Estruturantes da Formação do Professor da Educação Profissional.

..................................................................................................................................156

Figura 2- As cinco competências para o professor da educação profissional.........157

Figura 3- Interrelação das cinco competências para a formação do professor da

educação profissional...............................................................................................158

Figura 4- Formação inicial e formação continuada .................................................160

LISTA DE ABREVIATURAS

CBO- Classificação Brasileira de Ocupações

CEB- Câmara de Educação Básica

CEFAM- Centro de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério

CEFET- Centro Federal de Educação Tecnológica

CEJUVENTE- Comissão Especial de Políticas Públicas de Juventude

CNE- Catálogo Nacional de Cursos

CEPAL- Comissão Econômica para a América Latina e Caribe

CNE- Conselho Nacional de Educação

CONIF- Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação

Profissional

CNJ- Conselho Nacional da Juventude

EPTNI- Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrado

ETECs- Escolas Técnicas do Estado de São Paulo

FATECs- Faculdades de Tecnologia do Estado de São Paulo

FNDE- Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

GF- Grupo focal

IF- Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia.

LDB- Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LOA- Lei Orçamentária Anual

MEC- Ministério da Educação

MP- Medida Provisória

MTE- Ministério do Trabalho e Emprego

PDI- Plano de Desenvolvimento Institucional

PEC- Proposta de Emenda Constituciona

PLANFOR- Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador

PPC- Projeto Pedagógico do Curso

PPI- Projeto Pedagógico Institucional

PPP- Projeto Político Pedagógico

PRE- Pró- Reitoria de Ensino

PROEJA- Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a

Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos

PROEP- Programa de Expansão da Educação Profissional

PROJOVEM- Programa Nacional de Inclusão de Jovens

PRONATEC- Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego

SENAI- Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

SENAC- Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

SENAT- Serviço Nacional de Aprendizagem em Transportes

SENAR- Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

SETEC- Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica

SPPE- Secretaria de Políticas Públicas e Emprego

UNESCO- Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura

UTFPR - Universidade Tecnológica Federal do Paraná

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 21

PARTE I. A educação/qualificação para o trabalho/emprego: (in) definições ................. 29

1.1. Trabalho e emprego: algumas definições ..................................................................... 40

1.2. Histórico da educação profissional no Brasil................................................................... 53

1.2.1. Algumas críticas ao decreto 5154/04 ............................................................................... 60

1.2.2. Planfor ..................................................................................................................................... 62

1.3. As políticas públicas para a educação profissional da juventude ............................ 65

1.3.1. Políticas públicas para a juventude: o que se entende por juventude? ............... 67

1.4. Principais instituições de educação profissional no Brasil na atualidade .............. 76

1.4.1. Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia ........................................... 77

1.4.2. Das possibilidades para uma educação profissional que seja emancipadora .... 83

PARTE II. A formação docente e as especificidades necessárias para atuar na

educação profissional técnica de nível médio ......................................................................... 91

2.1. Aspectos históricos da formação de professores no Brasil ........................................ 93

2.2. Legislação que trata da formação docente para atuar na educação profissional 101

2.3. Das diretrizes que orientam a educação profissional técnica integrada ao ensino

médio ................................................................................................................................................. 108

2.4. Entendendo a “nova” proposta de professores para atuar na educação

profissional ...................................................................................................................................... 112

PARTE III. Desenvolvimento da pesquisa ............................................................................... 123

3.1. Percurso metodológico ....................................................................................................... 123

3.1.1. Análise dos documentos que orientam os cursos técnicos integrados ao ensino

médio ................................................................................................................................................. 127

3.1.2. Organização e desenvolvimento do grupo focal ........................................................ 132

3.1.2.1. Da contextualização dos sujeitos ................................................................................ 134

3.1.2.2. Dos encontros dos grupos focais ............................................................................... 137

3.1.2.3. Da análise dos encontros do grupo focal ................................................................. 140

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................... 171

REFERÊNCIAS ................................................................................................................................ 175

APÊNDICE 1- Termo de consentimento livre e esclarecido para autorização da

pesquisa na instituição ................................................................................................................. 189

APÊNDICE 2- Formulário de consentimento livre e esclarecido para participação dos

professores no grupo focal ......................................................................................................... 191

APÊNDICE 3- Transcrição dos encontros ............................................................................... 193

MEMORIAL

Minha história com a educação, de uma forma geral, foi marcada inicialmente

pelo meu ingresso no curso de Pedagogia no ano de 2005, em uma cidade

localizada no estado de Minas Gerais, no qual pude ter um olhar diferente para as

questões envolvidas nos processos de ensino e aprendizagem. Até então, enquanto

aluna, questionava muito sobre a forma como aconteciam as aulas, e com o

processo de educação, que havia recebido até então, com pouca significação dos

conhecimentos trabalhados para a minha vida pessoal, ou para perspectivas de vida

profissional, ou, ainda, para uma compreensão mais crítica da sociedade.

No último ano da faculdade, ao fazer um dos estágios obrigatórios, recebi a

proposta de trabalhar em uma escola particular que oferecia desde a educação

infantil até o ensino médio. Onde acabei trabalhando por cinco anos como

professora da educação infantil. Embora considerasse à época uma experiência

fantástica atuar na educação infantil, por ter a oportunidade de colocar em prática o

que estava aprendendo e perceber o quanto a aprendizagem pode ser prazerosa

para os alunos e para o professor, ainda não me sentia como agente de mudança,

pois eu era considerada pelos colegas professores do ensino fundamental e médio,

como “babá de luxo”, o que me causava certa frustração. Embora eu

compreendesse o quanto o trabalho com a educação infantil fosse importante,

percebia que nem os próprios colegas, nem a direção, enxergavam a importância

dessa fase para o desenvolvimento das crianças.

No ano seguinte, em 2009, fui convidada como professora substituta para ser

professora no ensino fundamental I, em uma escola da rede pública, na minha

cidade natal, Bambuí. Nessa oportunidade, por ser professora iniciante, fui

direcionada pela coordenadora pedagógica para a “turma problemática”, pois as

“turmas boas” já tinham sido escolhidas pelas professoras efetivas da escola. Mas

como para mim não havia, como até hoje não há, esse tipo de separação entre

turmas “boas” ou “ruins”, esse foi um desafio ao qual me entreguei de corpo e alma.

Assim que começaram as aulas percebi alunos com pouca autoestima e baixo

autoconceito, pois, afinal de contas, eles sabiam que estavam na “turma

problemática”.

Percebi que poucos tinham apoio, ou mesmo estrutura familiar, para apoiá-

los, além de estarem, praticamente, todos em situação de alta vulnerabilidade

socioeconômica. Eu, com pouca experiência, me envolvi intensamente com aqueles

alunos, busquei diferentes alternativas, ao menos aquelas que estavam ao meu

alcance, para fazer com que o momento em que estivessem na escola fosse

significativo para as suas vidas. E, em pouco tempo, os resultados vieram, pois

vários deles passaram a ser destaques na escola, pelo seu desempenho acadêmico.

Considerei que esse resultado tinha tanto sido pelos investimentos didáticos e

pedagógicos que eu havia feito, como pelo reconhecimento de que precisavam da

confiança e da percepção positiva, por parte do professor.

Essa foi a primeira turma do ensino fundamental com a qual trabalhei, e que

me marcou profundamente, permitindo que eu compreendesse realmente o quanto a

educação pode transformar a vida das pessoas. Essa experiência me ensinou muito

mais do que aquilo que pude aprender nos quatro anos de faculdade. Tive a

oportunidade de fazer com que muito daquilo que me incomodava, enquanto aluna,

pudesse ser diferente para aqueles meus alunos. A partir de então, tenho me

dedicado à área da educação com muito empenho, profissionalismo e respeito ao

educando.

No ano de 2010 fiz uma especialização, também na área de educação, no

campo da Educação Infantil, onde ainda trabalhava que me despertou ainda mais a

vontade de aprofundar-me em outros estudos sobre a educação. O mestrado

passou a ser uma meta, a qual, por motivos pessoais, durante cinco anos teve que

ficar apenas como um sonho hibernado.

Durante quatro anos, entre aqueles de 2009 e 2012, minha rotina foi essa,

trabalhar no período da manhã com os alunos do ensino fundamental e no período

da tarde com turmas de educação infantil, da rede privada, na cidade de Bambuí.

Até que prestei um concurso em 2012, para ocupar o cargo de Pedagoga, no

Instituto Federal de São Paulo e fui aprovada.

No ano de 2013, fui nomeada e me mudei de Bambuí-MG, para o estado de

São Paulo. Ingressei como pedagoga no Instituto Federal de São Paulo, Campus

aqui pesquisado, onde tive a oportunidade de construir novos conhecimentos sobre

a educação, percebendo outras perspectivas que a educação poderia trazer, dessa

vez no campo da educação profissional. Com esse contato direto com a educação

profissional percebi o quanto ela é carregada de incertezas, tensões e indefinições.

O que me motivou a dedicar minha dissertação a essa modalidade de educação.

Passei a trabalhar com muitos profissionais que buscam, dentro das suas

condições, desempenhar um bom trabalho, com intuito de proporcionar uma

educação transformadora na vida dos alunos, no sentido de acompanhá-los tanto na

formação técnica como na sua emancipação cidadã. Em vários momentos do

cotidiano profissional surgiam discussões a respeito de qual é a proposta de

educação dos Institutos Federais, como tratar da educação profissional, e outras.

Dos ricos diálogos e discussões, inteirando-me das divergências sobre os possíveis

entendimentos em relação a questões fundamentais para a educação brasileira,

minha vontade de realizar o sonho do mestrado, que estava adormecida, veio à

tona.

No início de 2015 foi criado no campus pesquisado um grupo de estudos

sobre tópicos educacionais diversos, em que era livre a participação. Como

participante, pude perceber que havia, por parte dos professores e da

Coordenadoria Sociopedagógica (apoio discente e docente), muitas discussões

sobre qual a educação que se pretendia nos cursos profissionais integrados ao

ensino médio. Tornou-se patente que o que eu percebia como angústias

profissionais, no que se refere à identidade desses cursos, também angustiava a

maioria dos meus colegas. Com a entrada no mestrado, então, no ano de 2015,

após passar pelo processo seletivo, comecei a cursar as disciplinas do mestrado, e

outras concepções e construções teóricas foram emergindo. E com base nessas, e

com o apoio da minha orientadora, chegamos a esse trabalho, que, acredito,

contribuirá para nossa práxis educativa, no Instituto Federal em que atuo. Considero

também que debater, e abrir o diálogo sobre a educação profissional brasileira é

uma ação necessária, dada as fragilidades, mas, também, às potencialidades que

marcam essa modalidade de ensino.

Trouxe neste memorial apenas um pouco da minha história direta com a

educação. Porém, acredito que essa história se constrói desde o momento que

nascemos até aquele em que morremos. Tentei ser breve, não querendo aqui

desmerecer todos os outros fatos que me fizerem ser quem eu sou e que ainda

estão por vir, e me reinventar.

21

INTRODUÇÃO

A educação profissional, entendida como uma modalidade de educação pela

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- LDB de 1996 possui características

próprias, e tem passado por modificações constantes, ao menos desde meados do

século XX, e que ainda atualmente não está identitariamente definida, em sua

complexidade. Mostra-se alvo frequente de mudanças nas políticas públicas, que lhe

atribuem, muitas vezes, o papel de interferir nas taxas do desemprego; ou pela

própria volatilidade do trabalho e do emprego na contemporaneidade, com profissões

surgindo e desaparecendo velozmente; com novas formas de gestão do tempo

dedicado ao trabalho, pelo uso das tecnologias; ou pelo próprio movimento de

adaptação/renovação do capital, dentre outras. Consideramos que não há ainda,

portanto, uma clareza epistemológica e no cotidiano da prática dos profissionais que

trabalham nessa modalidade de educação, se a educação profissional pode ser

considerada uma qualificação para o emprego ou uma formação para o trabalho.

Diferenciação importante para se pensar sobre o modo como a prática pedagógica se

dará, para questionar a formação dos sujeitos, o ideal de ser humano socialmente

esperado, e as perspectivas de alienação ou de emancipação1 do estudante.

Debruçar-se sobre essa diferenciação é o que se propõe a realização dessa

pesquisa. Afinal de contas, se a educação profissional deve “preparar um bom

profissional”, o que se entende por isso? O que significa preparar um “bom

profissional” na contemporaneidade? Como as instituições de educação profissional,

em especial os Institutos Federais, e, sobretudo, o campus onde foi realizada a

pesquisa, respondem a isso? Essas são as questões que caracterizam o problema

dessa investigação.

Partimos do princípio de que a educação profissional deve contribuir com a

formação para o trabalho, de maneira que leve o educando a se desenvolver como

cidadão crítico e consciente do mundo em que vive, agindo como sujeito capaz de

1 Por emancipação entenderemos, acompanhando Martins (1993), a ampliação das possibilidades de

pré-disposições objetivas, das capacidades subjetivas orientadas à satisfação ou êxito das próprias necessidades, enfim, à capacidade de “disposição humana de “guiar” a sua vida pela razão, apoiado pelos juízos críticos de responsabilidade de decisões (= imperativos morais de comportamento) e atitudes, ao longo desse processo emancipador” (MARTINS, 1993, p. 54).

22

transformar sua realidade, de forma autônoma. E não para a qualificação para o

emprego, ao menos quando isso for considerado como alienação, ou quando se

transformam os sujeitos em “ferramentas” para a execução de determinadas tarefas,

reduzindo-se às capacidades humanas a uma instrumentalidade vazia (MERÇON,

2012).

Trata-se de conceitos distintos, aqueles de trabalho e de emprego, em que se

entende o trabalho como algo inerente à vida humana, pelo qual o ser humano se

realiza, para transformar seu contexto de vida e criar as condições para a sua

sobrevivência. Assim entendido, o trabalho pode ser concebido como princípio

educativo, inclusive pelas instituições de educação profissional. Já o conceito de

emprego, criado para atender às demandas do mundo capitalista, exige controle do

comportamento, subordinação pautada em uma relação de dependência econômica,

e, muitas vezes, de instrumentalização do ser.

Dentro do exposto, o objetivo dessa pesquisa é investigar os contornos

epistemológicos da educação profissional, nos cursos técnicos integrados ao ensino

médio, do Instituto Federal de São Paulo no Campus pesquisado, localizado no

interior do estado, na mesorregião de Piracicaba, discutindo sua natureza de

formação para o trabalho ou de qualificação para o emprego. Diferenciação, em

nosso entender, fundamental para que a educação, nessa modalidade de ensino, se

configure, de fato, como uma educação emancipatória. Como resultados esperados,

acreditamos que conhecendo e discutindo as concepções dos docentes a esse

respeito seja possível aprimorar as práticas educacionais, o currículo, a formação

continuada do docente e a produção do conhecimento na área.

Partimos do princípio de que a educação profissional deve oferecer uma

educação que contribua para a formação integral dos seus alunos, não se limitando

apenas ao preparo para exercer uma determinada profissão. Assim, preparando seus

alunos com uma formação para o trabalho, não para o emprego.

Uma proposta de educação integral dentro da formação humanista pode ser

compreendida como uma “pedagogia rizomática” “(...) na qual uma multiplicidade de

fatores e processos é colocada a disposição do estudante, de modo a que ele

aprenda a fazer suas escolhas, produzir suas conexões, construir seu processo de

aprendizagem em meio ao múltiplo e ao diverso” (GALLO, 2011, p 02).

23

Considerando ainda o Estatuto da Criança e do Adolescente, por educação integral

entendemos aquela que se baseia na proposta humanista de trabalhar o

desenvolvimento conjunto em termos dos seus aspectos físicos, moral, intelectual e

social em condições de liberdade e dignidade.

Para Gadotti (2009, p. 37) “Todas as escolas precisam ser de educação

integral, mesmo que não sejam de tempo integral. Trata-se de oferecer mais

oportunidades de aprendizagem para todos os alunos”. O autor compreende que a

educação integral é a integralidade, isto é, “um princípio pedagógico onde o ensino

da língua portuguesa e da matemática não está separado da educação emocional e

da formação para a cidadania. Na educação integral, a aprendizagem é vista sob

uma perspectiva holística”.

Compreendendo o histórico da educação profissional, que desde sua

existência veio para atender às necessidades de mão de obra, vinculadas às

características dos modos de produção de cada época, entende-se mais a ausência

de identidade que ainda existe em relação a essa modalidade de educação. Em

1909, foi criada a Escola de Aprendizes Artífices, primeiro nome dado ao Instituto

Federal, para “dar uma oportunidade” para os filhos dos trabalhadores, ou jovens,

que “desvalidos” da sorte de terem apoio financeiro e/ou familiar para continuarem os

estudos, encontrariam no ensino profissional uma forma de sustento. Essa

concepção “assistencialista” – que também pode ser entendida por um viés

disciplinador e controlador da juventude pobre, concebida historicamente como

potencial fonte de problemas sociais - ficou incorporada a essa modalidade de

ensino, que carrega até atualmente essas concepções de “favor”, “oportunidade” ou

“controle”, para atender aos social e economicamente marginalizados.

Os documentos que direcionam os cursos técnicos integrados ao ensino médio

como, será visto adiante, propõem uma educação diferente daquela tecnicista,

pregada há décadas atrás, e contemporaneamente criticada. Mas, na prática do

cotidiano escolar, o que se modificou? Quais os espaços e perspectivas de se

construir uma educação profissional que leve à autonomia e emancipação daqueles

que procuram a educação profissional? Em especial, os jovens, faixa etária tratada

nessa investigação. Os professores possuem uma formação que os preparem para

24

atender a essas especificidades? Ou reproduzem os modelos tecnicistas, mais clara

ou mais veladamente? Como eles se veem nesse processo?

Por educação tecnicista, Saviani (1999), entende o parcelamento do trabalho

pedagógico com a especialização de funções, trabalhando com um ser, embora

completo, de forma fragmentada. Para ele, o elemento principal da educação

tecnicista é a organização racional dos meios, em que professores e alunos

assumem uma posição secundária, de serem apenas executores de um processo

cuja concepção, planejamento, coordenação e controle ficam a cargo de

especialistas supostamente habilitados, neutros, objetivos, imparciais. Portanto, cabe

à educação tecnicista “(...) proporcionar um eficiente treinamento para a execução

das múltiplas tarefas demandadas continuamente pelo sistema social. A educação

será concebida, pois, como um subsistema, cujo funcionamento eficiente é essencial

ao equilíbrio do sistema social de que faz parte” (SAVIANI, 1999, p 25). Essa

proposta de educação tecnicista é oposta a concepção de educação que propomos

na pesquisa, pois trazemos como pressupostos para a educação profissional uma

educação emancipadora, transformadora, que segue os princípios da pedagogia

crítica e da educação sociocomunitária.

Metodologicamente, esta pesquisa é uma investigação qualitativa, na

modalidade de pesquisa-ação. Os sujeitos da pesquisa são professores, que atuam

nos cursos técnicos integrados ao ensino médio, de um campus do Instituto Federal

de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, com formações e experiências

diversas, uma vez que o critério para se trabalhar nos Institutos Federais é possuir

curso superior na área pretendida. O Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia de São Paulo existe desde 2008, e o Campus onde foi realizada a

pesquisa iniciou suas atividades em 26 de julho do ano de 2010, sendo que os cursos

aos quais dedicamos nossa pesquisa, Cursos Técnicos Integrados ao Ensino Médio,

tiveram início em sua oferta totalmente no campus no início de 2015. Ou seja, há a

participação desde o início dos cursos desses professores, sujeitos da pesquisa. E,

em assim sendo, essa investigação se torna, portanto, motivo de reflexões,

investigações, incertezas, e de angústias, presentes em suas práticas. Essa

característica de disparar a reflexão sobre a prática, visando a uma qualificação

dessa, é que faz com que essa pesquisa tenha sido planejada como pesquisa-ação.

25

A construção dos instrumentos para a coleta dos dados fez uso da análise

documental, tanto da legislação federal quanto dos documentos institucionais, que

normatizam as diretrizes para os cursos Técnicos de Nível Médio, e do grupo focal,

com professores do campus em foco. Os encontros do grupo focal foram

incorporados às discussões de temas tidos como relevantes pelos professores

participantes, estando esses conscientes de que os dados levantados estariam sendo

direcionados para a pesquisa. O grupo focal foi percebido por eles como um

elemento para discutir a prática.

A escolha em se trabalhar com o grupo focal se deu por acreditar que essa é

uma forma democrática de expressão, com a garantia de que toda e qualquer opinião

seria respeitada. O grupo focal tem por característica constituir-se numa discussão

em grupo, deixando os participantes à vontade para expressarem suas opiniões, sem

a preocupação com respostas prontas, ou corretas, uma vez que se gera um debate.

Para as pesquisadoras abaixo:

O GF é um método de investigação particularmente poderoso, uma vez que se assenta na dinâmica criada pelas interações entre os membros participantes. Encorajando o pensamento entre os membros do grupo e promovendo a reflexão em torno das contribuições verbais dos outros participantes. As discussões emergidas no seio destes pequenos grupos permitem ao investigador aceder quer às respostas cognitivas, quer as respostas emocionais dos participantes [...] (CAIRES; FERNÁNDEZ JANSSEN, 2016, p. 196).

A primeira parte do trabalho trata do levantamento de teorias, no campo da

educação e da sociologia, sobre a definição de alguns conceitos fundamentais para o

desenvolvimento da pesquisa, tais como educação e qualificação, trabalho e

emprego, o que se entende por juventude. Com base nos pressupostos da pedagogia

crítica traz um panorama de como a concepção que temos sobre educação

profissional se relaciona com esta pedagogia. Em seguida, traça-se um panorama do

histórico da Educação Profissional no Brasil, para tentar compreender a que se deve

a forma como é concebida hoje, em especial as tensões entre a formação para o

trabalho e/ou a preparação para o emprego.

Na segunda parte é feito, inicialmente, um resgate histórico sobre a formação

de professores no Brasil, mostrando que não há historicamente o cuidado com a

formação de professores para trabalharem na Educação Profissional. Em seguida,

26

analisamos a legislação sobre a Educação Profissional no Brasil, e, no esteio dessa a

criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, os princípios que

justificaram sua fundação, o perfil esperado para a ação docente, para a formação do

alunado e para a ação com/na sociedade. Destacamos as Diretrizes para a Educação

Profissional dos Cursos Técnicos de Nível Médio. E, ao final, levantamos uma

reflexão sobre o perfil do professor para atuar na Educação Profissional, de natureza

emancipatória.

Na terceira e última parte trataremos dos procedimentos da pesquisa

propriamente dita. Como resultados que podem ser apontados, consideramos que

os professores que participaram da pesquisa não tiveram uma formação para

trabalhar com a Educação Profissional técnica de Nível Médio. Essa falta de

preparação durante a formação docente fez com que eles aprendessem, na prática,

tentativa e no erro, na busca constante por aperfeiçoamento, como trabalhar com

esta modalidade de educação. Os professores da instituição pesquisada se colocam

na condição de aprendentes e afirmam que ainda estão se adaptando a todas as

necessidades que esta modalidade de educação exige. Acreditam que estejam

trabalhando para proporcionar aos alunos uma formação integral, prioritariamente

humanista, e por isso voltada mais para o trabalho do que para o emprego, mas

nem sempre suas ações estão alinhadas a essa proposta, pois esbarram em

problemas que limitam suas ações. Os professores reconhecem que as condições

de trabalho no Instituto Federal propiciam que o trabalho seja mais integrado, que

haja momentos para discussões e reflexões sobre a educação, o que tem sido

importante para o aprimoramento sobre a prática docente. É interessante notar que

a partir do terceiro encontro, que aconteceu no dia 16 de agosto, ficou evidente a

preocupação desses professores sobre a atual situação política e econômica vivida

pelo país, predominantemente de incerteza, e de que forma as decisões que serão

tomadas impactarão a continuidade dos trabalhos nos Institutos Federais (IF’s). A

todo o momento, os professores falavam sobre o medo de que se percam as

características, que próprias do IF, favorecem as condições para uma educação

diferenciada.

A pesquisa realizada teve impactos significativos na perspectiva profissional

docente da pesquisadora, que pode compreender melhor o porquê de tantas

27

indefinições sobre esta modalidade de educação, que parece, tantas vezes, estar à

deriva em meio a um sistema educacional já fragilizado. Foi possível também fazer

uma escuta mais reflexiva sobre a prática docente, o que pensam, o que sentem,

quais as perspectivas desses professores. Para a instituição e para os professores

que dela participaram foi uma oportunidade de poder discutir e refletir sobre a sua

ação docente, sobre a educação profissional e sobre a qualidade e as tensões, que

caracterizam a educação profissional, em especial na instituição-alvo dessa

investigação.

28

29

PARTE I. A educação/qualificação para o trabalho/emprego: (in) definições

Não se pode falar em educação/qualificação para o trabalho/emprego no

Brasil sem se referir à educação profissional. Na educação profissional de formação

técnica, como é o caso do curso aqui pesquisado, o tema trabalho é um dos

principais assuntos entre os jovens e os docentes. Contudo, percebemos que no

cotidiano escolar esse termo, trabalho, é usado como sinônimo de emprego, o que

consideramos se deva pela própria fragmentação do conceito de trabalho.

Banalizado como emprego, as tensões que seriam possíveis de serem levantadas,

ao se refletir sobre o significado do trabalho para os seres humanos e suas

sociedades, raramente o são. Reafirma-se, assim, a necessidade de separar esses

termos, o que será feito no decorrer desse trabalho.

Apple (2006, apud McCarthy 2011, p. 55) fala que o esforço neoliberal na

educação visa uma escolarização em que as necessidades das economias sejam

atendidas pela produção de capital humano que seja capacitado, adaptável e

flexível. E além de conceber as escolas como produtoras de “capital humano”, “(...) o

neoliberalismo possui uma agenda cultural igualmente preocupante: ela implica

mudar radicalmente o modo como pensamos nós mesmos e quais deveriam ser as

metas do ensino”. Assim, o neoliberalismo tem conferido às instituições de educação

a transformação da educação em mercadoria.

Esta modalidade de educação/qualificação tem como uma de suas propostas

a inserção do egresso no “mundo do trabalho”. No texto em tela, educação/formação

profissional está relacionada ao trabalho e qualificação profissional está relacionada

à preparação para o emprego. Pois, embora os documentos que orientam a

educação profissional, que serão discutidos na segunda e terceira parte, afirmem a

necessidade de uma formação integral, voltada para o desenvolvimento holístico dos

alunos, a preocupação das escolas muitas vezes está em qualificar o aluno para

atender às demandas do mercado, o que é entendido então como preparação para o

emprego, e que será discutido adiante. Utilizaremos o termo formação profissional

no decorrer do texto, por ser o termo utilizado nos documentos oficiais atuais, mas

discutiremos continuamente porque este não é o termo mais correto para a

abordagem de preparação para o emprego. Conforme entendemos, muitas vezes, o

que se pratica no cotidiano escolar da educação profissional, é a qualificação para o

30

emprego. Pretende-se, então, em conformidade com os objetivos dessa pesquisa,

analisar criticamente se a educação que se pratica no Instituto Federal de Educação,

Ciência e Tecnologia de São Paulo, no campus investigado, está voltada

prioritariamente para formação para o trabalho ou para a qualificação para o

emprego.

Mas qual seria a diferença entre educação e qualificação? Ao final, parecem

ser a mesma coisa, e muitas vezes, no cotidiano escolar, são utilizadas como

sinônimos. Pretende-se, inicialmente, apresentar tais conceitos, que trazem a

compreensão das diferentes concepções que se têm dessas, segundo alguns

autores.

A educação é compreendida, de acordo com Gadotti (2005), como um

requisito fundamental para o acesso ao conjunto de bens e serviços disponíveis na

sociedade. Como direito, ela é condição necessária para o indivíduo usufruir de

outros direitos constituídos em uma sociedade democrática. Para ele, a educação

se funda na apropriação do conhecimento, e este não está restrito à escola, pois

pode acontecer a todo o momento e em qualquer lugar. O autor compreende

também que a educação é um fenômeno social, e, portanto, produto e produtora de

múltiplas determinações sociais.

Rodrigues (2011) explica que na sociologia a educação é compreendida como

um componente da vida social responsável pela organização das experiências

diárias individuais e coletivas da humanidade, responsável pelo desenvolvimento da

personalidade e garantia da sobrevivência humana. Para ele, o ato de educar está

relacionado a três recursos da vida social, que estão interligados: as técnicas ou

pedagogias embutidas nas práticas educacionais; as normas, que podem ser

estabelecidas através de leis e regulamentos jurídicos, que normatizam os grupos

sociais; e os valores, que são julgados e com os quais se pode concordar ou

discordar, segundo os critérios dos diferentes grupos da sociedade, compartilhados

pelos indivíduos. Por causa desses três elementos, a educação não pode ser

considerada neutra: “Olhar a educação do ponto de vista da sociologia é

compreender que se a pedagogia é o fundamento das práticas educacionais, as

crenças, os valores e as normas sociais são os fundamentos da pedagogia”.

(RODRIGUES, 2011, p. 09).

31

Para definir educação, Durkheim (2014), afirma que é preciso considerar os

sistemas educacionais que já existiram e os que ainda existem para, por meio da

comparação, identificar os pontos em comum, que os perpassam. Após analisar

diferentes culturas, seria possível entender que cada sociedade tem um ideal sobre

a formação do indivíduo, tanto no aspecto moral quanto naqueles intelectual e físico.

E que, portanto, para uma sociedade, a educação seria o modo pelo qual se

preparam as crianças para dar sequência à sua própria existência. E, ainda reforça,

“a educação consiste em uma socialização metódica das novas gerações”

(DURKHEIM, 2014, p. 54). Rodrigues (2011) compreende que para Durkheim a

educação é essencialmente o processo pelo qual o indivíduo aprende a ser membro

da sociedade, e que, portanto, a educação é essencialmente socialização. Por isso,

não existiria uma educação única, já que a educação é considerada socialização, e

sabendo que existem diferentes sociedades, logo existem diferentes formas de

educação, mesmo havendo algumas crenças e valores comuns a todas elas. Desta

forma, a educação permite que a sociedade, que é considerada um processo,

continue viva, por “sermos iguais e diferentes ao mesmo tempo” (RODRIGUES,

2011, p. 29).

Paro (1997b, p. 108 apud Paro 1999, p. 08) entende a educação como

“apropriação do saber historicamente produzido. Disso decorre a centralidade da

educação enquanto condição imprescindível da própria realização histórica do

homem”.

Com base nos apontamentos dos autores anteriores, trazemos como

perspectiva que fundamenta a pedagogia crítica a concepção de educação segundo

Freire. O autor é referência na área da educação no Brasil e no mundo. Ele não

discute o termo educação somente como ação do conhecimento ou uma

metodologia, ele busca trazer para a reflexão dos leitores a ideia de algo que vai

além, como forma de intervenção no mundo e de que podem participar desse

processo todos os envolvidos em qualquer ato da vida cotidiana. Essa educação que

ele propõe é libertadora e requer respeito e valorização por todas as formas de

conhecimento, não somente aquele formal, obtido nos bancos escolares.

Para Freire (1996), a educação é uma forma de intervenção no mundo.

“Intervenção que além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/ou

32

aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante quanto o

seu desmascaramento” (FREIRE, 1996, p 96). No pensamento freiriano a educação

é a possibilidade de superação das relações verticais entre opressores e oprimidos.

Em que, por meio do diálogo e da reflexão crítica da realidade haja possibilidade de

transformação desta. O autor entende a educação como uma “ação especificamente

humana” e concebe que não existe educação neutra. Para ele, a qualidade de ser

política é inerente à sua natureza. “É impossível, na verdade, a neutralidade da

educação (...). A educação não vira política por causa da decisão deste ou daquele

educador. Ela é política” (FREIRE, 1996, p.107).

Freire (1986) propõe uma educação que seja libertadora, transformadora, e

defende que essa educação seja democrática, desveladora, desafiadora, que leve

ao ato crítico, à leitura da realidade e à compreensão de como funciona a sociedade.

Ele entende que a educação não acontece apenas dentro das escolas, ela acontece

em diversos lugares e cita os movimentos sociais como prática de uma educação

libertadora. O autor afirma que a luta pela transformação/mudança na sociedade não

acontece só dentro da escola, embora esta seja parte da luta pela mudança. “Assim,

em última análise, a educação libertadora deve ser compreendida como um

momento, ou um processo, ou uma prática onde estimulamos as pessoas a se

mobilizar ou a se organizar para adquirir poder” (FREIRE, 1986, p. 47). Ele entende

que a educação não é questão apenas de método, mas de uma relação de mão

dupla de respeito e valorização pelos conhecimentos dos indivíduos, em que quem

ensina aprende e quem aprende também ensina. Essa é uma relação de divisão de

poder, que se alinha a proposta da educação sociocomunitária que propõe

justamente o compartilhamento do poder.

Já a qualificação é entendida por Desaulniers (1997, p. 53), no âmbito dos

países capitalistas, “como um processo que, na maioria das vezes, insere-se num

sistema formal de escolarização, tendo como finalidade preparar os indivíduos para

o trabalho”. Ferretti (2004, p.413) acrescenta que a qualificação é como “um rol de

tarefas e uma lista de atributos pessoais”, o que torna o termo vinculado à

valorização de determinados comportamentos, em detrimento de outros. Tais

comportamentos são aqueles tidos como apropriados para o trabalho, como saber

33

seguir instruções, controlar os impulsos, adequar a forma de pensar à lógica da

produção, etc.

Segundo Teixeira (2010), para Dewey a educação pode ser definida como

“(...) o processo de reconstrução e reorganização da experiência, pelo qual lhe

percebemos mais agudamente o sentido, e com isso nos habilitamos a melhor dirigir

o curso de nossas experiências futuras” (DEWEY, 1978 apud TEIXEIRA, 2010, p.

37). Por essa definição, a educação é entendida como uma preparação inseparável

da vida. Teixeira (2010) discute ao trazer esse conceito de Dewey com uma

avaliação de que não há como dissociar a educação da vida, ela acontece em um

processo dinâmico em que enquanto se vive se educa. Segundo o autor:

Enquanto vivo, eu não estou, agora, preparando-me para viver e, daqui a pouco, vivendo. Do mesmo modo, eu não estou em um momento preparando para educar-me e, em outro, obtendo o resultado dessa educação. Eu me educo por intermédio de minhas experiências vividas inteligentemente. Existe, sem dúvida, certo decurso de tempo em cada experiência, mas assim as primeiras fases como as últimas do processo educativo têm todas igual importância e todas colaboram para que eu me instrua e me eduque– instrução e educação que não são os resultados externos da experiência, mas a própria experiência reconstruída e reorganizada mentalmente no curso de sua elaboração (TEIXEIRA, 2010, p. 38).

Segundo o Ferretti (2004), o conceito de qualificação teve início com a

racionalização do gerenciamento dos modos de produção, iniciado com o modelo

taylorista e seguido por aquele taylorista-fordista. Ambos os modelos são

reconhecidos por utilizarem formas racionalizadas de organização da produção

industrial, e revolucionaram a indústria durante o século XX, sendo que ainda hoje

vigoram, especialmente naqueles setores produtivos onde não há grande variação

nos processos produtivos. Esses dois sistemas visavam a maximização da produção

e do lucro por meio da exploração da força de trabalho dos operários, e impactaram,

pela força com que configuraram a organização social, a delimitação dos papeis de

cada indivíduo na sociedade, as relações interpessoais, a hierarquização social

baseada no tipo de cargo/função ocupada, etc.

O taylorismo propôs a ideia da gerência científica do trabalho para melhor

otimizar e garantir a eficiência produtiva, estabelecendo uma série de passos para

tanto: planejamento, treinamento dos profissionais, de acordo com suas aptidões,

34

aprimoradas pelas instruções recebidas; controle das operações executadas na

produção, verificando se estavam sendo corretamente executadas; execução

designada, ou seja, cada qual deve realizar apenas as tarefas que lhe são atribuídas

e a singularização das funções, isso é, as tarefas são subdivididas em partes,

decompostas em suas características essenciais, como movimentos, espaço,

material, etc., e cada funcionário faria apenas uma determinada parte da tarefa total.

Segundo Ribeiro (2015, p. 66) uma das características fundamentais sobre a

gerência científica proposta por Taylor está na separação entre quem pensa e quem

executa: “Está claro, então, na maioria dos casos, que um tipo de homem é

necessário para planejar e outro tipo diferente para executar o trabalho” (TAYLOR,

1987: 35, apud RIBEIRO, 2015, 66). Esta racionalização da atividade produtiva

exige que o trabalhador se mantenha constantemente focado na realização da parte

que lhe cabe na cadeia de produção, para executar a sua função no tempo

determinado, obtendo-se, assim, maior produtividade e de forma “adaptada” às

“qualificações” dos sujeitos. Dessa forma, reduzia a humanidade que havia no

trabalhador fazendo deste apenas um instrumento de execução para atender às

necessidades do capitalismo.

O fordismo, assim como o taylorismo se preocupava com a questão do

controle e da otimização da produção e do lucro. Inovou quando introduziu a esteira

rolante, o que acelerou ainda mais o processo de produção, moldando operários

ainda mais disciplinados e alienados nas suas funções mecânicas e repetitivas. Com

a esteira rolante, o fordismo intensificou, automatizou e mecanizou o controle da

força de trabalho já existente no taylorismo. Com a expressão “homem massa” o

fordismo não queria controlar apenas o processo de trabalho, mas a vida particular

dos operários. Assim, intensificou/ introduziu conceitos que interferiam de tal modo

na vida dos operários que, segundo Ribeiro (2015), mudou o estilo de vida dos

americanos. A autora afirma que o fordismo estabeleceu um padrão de organização

do trabalho de interferência na vida produtiva e pessoal dos operários que se

mantém, em alguns casos, até os dias de hoje. No final dos anos de 1960, por vários

motivos, como pelas manifestações de insatisfação dos estudantes e dos

trabalhadores contra o controle e exploração a que estavam sendo submetidos, a

saturação do mercado, a redução do consumo, dentre outros fatores, houve uma

35

crise no fordismo, levando a uma readequação nos processos produtivos. No

entender de Clarke (1991, p. 120), tal readequação levou a mudanças profundas,

que modelaram produtos, modos de produção, a relação dos trabalhadores com os

modos de produção e de toda a sociedade com o consumo:

A subseqüente crise do fordismo leva à fragmentação econômica, social e política da qual deve surgir um novo regime "pós-fordista". À medida que a produção fordista se aproxima de seus limites, surgem novos métodos de produção. A saturação dos mercados de massa leva a uma crescente diferenciação dos produtos, com uma nova ênfase no estilo e/ou na qualidade. Produtos mais diferenciados exigem turnos de trabalho mais curtos, e, portanto, unidades de produção menores e mais flexíveis. Novas tecnologias fornecem os meios pelos quais se pode realizar vantajosamente esta produção flexível. Entretanto, estas novas formas de produção têm implicações profundas. Uma produção mais flexível requer máquinas mais flexíveis e de finalidades genéricas, e mais operários "polivalentes", altamente qualificados, para operá-las. Uma maior qualificação e flexibilidade exige que os operários tenham um grau mais alto de responsabilidade e autonomia. Uma produção mais flexível também requer formas mais flexíveis de controle de produção, ao passo que relações de produção mais flexíveis requerem o desmantelamento das burocracias corporativas

Além desses dois modos de produção, por volta dos anos de 1950, após sair

de uma guerra, o Japão, incentivado para reerguer sua economia, constrói um novo

modelo de produção chamado de toyotismo. O toyotismo trouxe uma ideia diferente

do taylorismo e do fordismo, com a proposta da acumulação flexível, pela qual a

fabricação e a estocagem dos produtos aconteceriam conforme a demanda do

mercado, pelo sistema chamado just in time. Essa flexibilização também acontecia

na diversificação das atividades desempenhadas pelos operários, que deixaram de

operar apenas uma única máquina para operar cinco: era a ideia de um homem para

cada cinco máquinas. A flexibilização que isso exigia trouxe, fortemente, a

concepção de qualificação dos trabalhadores, do trabalho em equipe, a garantia do

“emprego vitalício”, em que somente nos períodos de maior produção se

subcontrataria, com salários mais baixos outros funcionários, dentre outras

características. O toyotismo espalhou-se não só pelo oriente, mas também pelo

ocidente.

O toyotismo tentou se diferenciar do taylorismo e do fordismo trazendo uma

proposta de fazer o convencimento dos trabalhadores de que era uma forma

produtiva capitalista mais participativa e justa. Mas Kuenzer (1999) crítica essa

36

proposta ao dizer que essa forma de organização flexível do trabalho, na verdade,

esconde, sob a ideia da valorização da “visão e participação” do trabalhador, uma

nova configuração do trabalho, que intensificou o uso da força de trabalho,

explorando-o ainda mais a serviço do capital. Assim como os demais sistemas, tinha

como objetivo o controle e o lucro. Nesse sentido, Gounet (1999, p. 52) traz a

reflexão sobre a exploração nas indústrias automobilísticas, como foi o caso da Ford

e da Toyota, que são modelos de exploração da força de trabalho, que aumenta

ainda mais a desigualdade:

O sistema de acumulação na indústria automobilística aparece com o um fantástico processo de marginalização, de exclusão, de estratificação social. Pode-se falar de dualização, pois não é apenas uma diferenciação entre classes sociais ou uma divisão de condições no interior da classe operária. (...) O sistema de acumulação provoca uma diferenciação social ainda mais pronunciada. E essa tendência à desigualdade é tudo, menos democracia.

Por força de trabalho Marx (1982, p. 187) compreende “(...) o conjunto das

faculdades físicas e mentais, existentes no corpo e na personalidade viva de um ser

humano, as quais ele põe em ação toda a vez que produz valores de uso de

qualquer espécie”. O autor entende que a força de trabalho é vendida como uma

mercadoria e a maneira de não precisar vender a força de trabalho é se o indivíduo

possuir os meios de produção. Mas ser ou não possuidor dos meios de produção

não é uma questão de escolha.

Para Marx (1982, p, 189) a natureza não produz os possuidores dos meios de

produção e os possuidores apenas das forças de trabalho. Segundo ele, essa

relação não tem sua origem na natureza: “Ela é evidentemente o resultado de um

desenvolvimento histórico anterior, o produto de muitas revoluções econômicas, do

desaparecimento de toda uma série de antigas formações da produção social”.

Para Kuezer:

[...] formas de divisão social e técnica do trabalho e da sociedade a partir do taylorismo/fordismo, tinha por finalidade atender às demandas de educação de trabalhadores e dirigentes, dada uma clara definição de fronteiras entre as ações intelectuais e instrumentais, em decorrência de relações de classe bem demarcadas que determinavam o lugar e as atribuições de cada um (KUENZER, 1999, p. 167).

Ferretti (2004, p. 403) aponta que pelas influências desse período “o olhar

lançado pela área educacional à qualificação profissional foi profundamente

37

marcado pela sua dimensão especificamente técnica”, uma visão em que

predominava a concepção de que a qualificação profissional apenas preparava o

indivíduo para exercer tecnicamente uma determinada função. Nessa perspectiva, o

seguimento da educação profissional recebia, e ainda recebe, fortes influências

desse período, que se dão no âmbito da educação e do trabalho, respondendo aos

interesses da sociedade capitalista.

Com base nessas primeiras reflexões sobre educação e qualificação

podemos entender que a educação pode acontecer em situações e locais diversos.

Ela pode acontecer tanto nas experiências individuais, como na interação social, nas

práticas escolares, ou fora delas. É um processo que busca contribuir para o

desenvolvimento da humanidade dos sujeitos, em suas dimensões social, cultural,

ética, entre outras, ou seja, na integralidade do indivíduo. É concebida como

essencial para o desenvolvimento humano e devendo partir do princípio da liberdade

para que seja transformadora. Pode ser capaz de empoderar os indivíduos para que

sejam agentes de mudança no mundo. Já a qualificação se dá em ambientes

destinados para uma determinada finalidade produtiva, tendo ligada à sua essência

a ideia de aprimoramento de determinadas funções, por meio de instrução

circunscrita para atingir objetivos, específicos para atender a uma determinada

demanda do capital.

Porém, mesmo após esta breve explanação sobre as diferenças entre

educação e qualificação, o que se pode perceber é que nas sociedades industriais

modernas todos os termos estão interligados, de uma maneira ou outra, à questão

do trabalho, o que deve ser considerado, segundo Frigotto (1998, apud OLIVEIRA;

ALMEIDA, 2009, p. 158) como:

Os processos educativos e formativos, que ao mesmo tempo são constituídos e constituintes das relações sociais [...] passam por uma ressignificação no campo das concepções e políticas. Estreita-se ainda mais a compreensão do educativo, do formativo e da qualificação, desvinculando-os da dimensão ontológica do trabalho e da produção, reduzindo-os ao economicismo do emprego [...].

Na concepção de Freire (1987) a educação, em contextos neoliberais, não é

pensada na perspectiva da emancipação, mas na perspectiva de atender ao

imediatismo do mercado, mantendo uma relação de subordinação entre opressores

e oprimidos. Nessa perspectiva de atender apenas às necessidades do mercado, o

38

desenvolvimento humano, necessário para a formação de pessoas autônomas, é

contabilizado simplesmente através de números, que são gerados a partir das forças

produtivas, sem ser considerado o contexto social, cultural, histórico e político de

cada indivíduo, que também compõe essas forças; contexto que faz ou deveria fazer

parte do processo da educação, por meio da qual o desenvolvimento humano

transcorre. Neste aspecto, Rodrigues (2011, p. 31) acrescenta a esta discussão o

questionamento sobre o ato de educar, e questiona se a educação “pode ser algo

mais do que um mecanismo de manutenção da ordem” estabelecendo a separação

entre a classe trabalhadora/ oprimida e a classe dominante/ opressora. Em relação a

isso, Apple assim se posiciona:

A fim de entender a educação e agir sobre ela nas suas complicadas conexões com a sociedade como um todo, devemos nos envolver no processo de reposicionamento, isto é, devemos ver o mundo pelos olhos dos despossuídos e agir contra os processos ideológicos e institucionais que reproduzem condições opressivas (APPLE, 1995, apud APPLE; AU; GANDIN, 2011, p. 14).

Há que se considerar também que a escola não consegue fugir dos

parâmetros ditados pelo sistema capitalista, passando, de forma consciente ou não,

a ser reprodutora de uma ideologia que preza pela manutenção da separação de

classes e que é ditada pelo consumo. Assim, cabe reconhecer que a posição que é

trazida pela pedagogia crítica, como aqui argumentado, pode ser uma forma de luta

e resistência a essa situação:

Apesar de reconocer que la escuela es un instrumento más de trasmisión ideológica a favor del poder, este enfoque sostiene que los sujetos involucrados en el proceso educativo no sólo gozan de la posibilidad de resistir, sino también de intervenir para modificar la realidad social. Con respecto a las relaciones que se establecen en el aula, se considera que el educador tiene corno misión ser un facilitador del diálogo, que el aprendizaje debe darse en un plano horizontal por medio de la interacción comunicativa entre maestro y alumno, y que la escuela no es únicamente una reproductora del orden y cultura dominante, sino que también puede convertirse en un lugar alternativo de creación cultural (BORQUEZ, 2006, p. 104).

A pedagogia crítica, que tem dentre alguns dos seus principais autores Freire,

Giroux e McLaren, é uma proposta de educação que, como aqui afirmado,

colaboraria para transformar a educação profissional atual, trazendo a possibilidade

da formação de indivíduos mais críticos, autônomos e, como consequência, mais

39

emancipados, mudando o status quo. Analisaremos, a seguir, alguns pontos da

pedagogia crítica que, nos parecem estar diretamente ligados à questão da

educação profissional, para refletir e mais bem compreender suas inter-relações.

Como defende Giroux (2013), essa pedagogia não é uma metodologia

didática, que possa ser aplicada independentemente do contexto. Pelo contrário,

representa o resultado de lutas sociais, inspiradas pela educação popular, e outras

perspectivas educacionais assemelhadas, em seus propósitos, tendo como

precursor Paulo Freire e que está relacionada com as especificidades dos contextos

dos sujeitos, ou das comunidades, constituindo-se em um projeto político e moral:

En este contexto, la enseñanza se convierte en sinónimo de un método, técnica o la práctica de un entrenamiento en habilidades artesanales como. Por otra parte, la pedagogía crítica debe ser visto como un proyecto político y moral y no una técnica. La pedagogía es siempre política, ya que está conectado a la adquisición de la agencia. Como proyecto político, la pedagogía crítica ilumina la relación s entre el conocimiento, la autoridad y el poder. Se llama la atención sobre las cuestiones relativas a quien tiene control sobre las condiciones para la producción de conocimientos, valores y habilidades, y se enciende como el conocimiento, las identidades y la autoridad se construyen dentro de conjuntos particulares de relaciones sociales. Asimismo, llama la atención sobre el hecho de que la pedagogía es un intento deliberado por parte de los educadores para influir en cómo y qué conocimientos y subjetividades se producen dentro de conjuntos particulares de relaciones sociales (...) Lo más importante, toma en serio lo que significa entender la relación entre la forma en que aprendemos y cómo actuamos como agentes individuales y sociales, es decir, que se ocupa de enseñar a los alumnos no sólo a pensar, sino a luchar a brazo partido con sentido de responsabilidad individual y social, y lo que significa ser responsable de las acciones propias como parte de un intento más amplio para ser un ciudadano activo que puede ampliar y profundizar las

posibilidades de la vida pública democrática (GIROUX, 2013,s/p).

Segundo Borquez (2006), McLaren(1998) tenta sintetizar as características e

metas mais importantes da pedagogia crítica, quando afirma que a pedagogia crítica

está associada ao símbolo hebreu tikkun, que significa "curar, reparar y transformar

el mundo ... ". E completa, trazendo a perspectiva de McLaren sobre a proposta

libertadora da pedagogia crítica:

[...] la pedagogía crítica proporciona dirección histórica, cultural, política y ética, para los involucrados en la educación que aún se atreven a tener esperanza. Irrevocablemente comprometida con el lado de los oprimidos [...] dado que la historia está fundamentalmente abierta al cambio, la liberación es una meta auténtica y puede alumbrar un mundo por completo diferente [...], los teóricos críticos generalmente analizan a las escuelas en una doble forma: como mecanismos de clasificación en el que grupos seleccionados

40

de estudiantes son favorecidos con base en la raza, la clase y el género, y como agencia para dar poder social e individual (MCLAREN, 1998, p. 196 apud BORQUEZ, 2006, p. 105).

Na perspectiva da pedagogia crítica, acreditamos que a educação profissional

pode ser um espaço de resistência e luta no que se refere à condição de uma

educação transformadora. Que possibilite a todos os envolvidos serem agentes

críticos, reflexivos, e que assumam uma postura ativa para transformar a escola e,

consequentemente, a sociedade contemporânea. Não pretendemos, contudo,

assumir uma postura ingênua, em relação a isso. Sabemos que a pedagogia crítica

tem já uma história de lutas em prol de uma educação emancipatória e

transformadora, das dificuldades enfrentadas, e que os esforços dessas lutas, várias

vezes enveredam para aquilo que parece “insucesso” (KINCHELOE, 2008). Afinal,

se fosse efetiva, estaríamos em um caminho que parece cada vez de maior

alienação? Essa é uma pergunta que pode ser feita. Mas também outra poderia ser

feita: Aonde estaríamos, enquanto sociedade, se esforços como aqueles da

pedagogia crítica não fossem feitos? Entendida a pedagogia crítica e a educação

profissional como processos, compreende-se aqui que a caminhada é perseverante,

contínua, não havendo espaço para desesperança. Nem, tampouco, para a

ingenuidade.

1.1. Trabalho e emprego: algumas definições

É fundamental para esta pesquisa investigar se a educação profissional

oferecida atualmente assume a preocupação com a formação integral do aluno, que

busque, além da qualificação para o mundo do trabalho, a formação para autonomia

e emancipação dos jovens, direcionando-se para o que vem sendo aqui entendido

como educação profissional voltada para o trabalho. É importante saber de que

forma as instituições que oferecem esta modalidade de ensino pensam e efetivam a

formação profissional, que pode e deve propiciar ao aluno também a continuidade

nos estudos ou ingresso/reingresso no mundo do trabalho. Assim, antes de tudo, se

faz necessário aprofundarmos aqui, para mais bem discutir a concepção da

educação profissional, entender os conceitos, e fazer a distinção, entre trabalho e

emprego.

41

Segundo Lazzareschi (2009 p.07), “trabalho e emprego não são palavras

sinônimas (...) trabalhar significa criar utilidades para a satisfação das necessidades

humanas relativas à sobrevivência, às necessidades sociais, culturais, artísticas,

espirituais e psíquicas”. O trabalho existe desde a antiguidade, imprescindível para

atender às necessidades humanas, e é por meio da transformação da natureza

(inclusive da própria natureza humana) efetivada pelos seres humanos para

viabilizar a vida, isso é, pelo trabalho, que o mundo vem sendo modificado, tanto na

criação e transformação de bens materiais quanto na prestação de serviços.

Segundo Fromm (1983, p. 34), toda concepção de auto-realização do homem

para Marx só pode ser plenamente compreendida se ligada à concepção de

trabalho. Para ele, o trabalho “(...) é ou deveria ser, quando livre, a expressão da

vida”. Para o autor:

O trabalho é a expressão própria do homem, uma expressão de suas faculdades físicas e mentais. Nesse processo de atividade genuína, o homem desenvolve-se a si mesmo, torna-se ele próprio; o trabalho não é só um meio para um fim- o produto- mas um fim em si mesmo, a expressão significativa da expressão humana (...) (FROMM, 1983, p. 48).

Marx (1982, p. 202) compreende que, “o trabalho é um processo de que

participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria

ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza”. E

aponta:

O trabalho como criador de valores de uso, como trabalho útil, é indispensável à existência do homem, quaisquer que sejam as formas de sociedade, é necessidade natural e eterna de efetivar o intercâmbio material entre o homem e a natureza, e, portanto, de manter a vida humana. (...) O homem, ao produzir, só pode atuar como a própria natureza, isto é, mudando as formas da matéria. E mais. Nesse trabalho de transformação, é constantemente ajudado pelas forças naturais (MARX, 1982, p. 50).

Ele atribui como “caráter da espécie” a essência do homem que se realiza

universalmente no decorrer da história pela atividade produtiva humana. Segundo

Fromm (1983) o trabalho para Marx deveria ser considerado uma atividade de

liberdade e não uma mercadoria.

Para Gadotti (2012), o trabalho constitui-se num valioso instrumento de

formação técnico-científica e cultural, desenvolvendo no jovem a responsabilidade

social ao mesmo tempo em que intervém na preparação para a vida social. Saviani

entendendo o trabalho como necessário à vida social e assim se expressa:

42

Ora, o ato de agir sobre a natureza transformando-a em função das necessidades humanas é o que conhecemos sob o nome de trabalho. Podemos, pois, dizer que a essência do homem é o trabalho. A essência humana não é, então, dada ao homem; não é uma dádiva divina ou natural; não é algo que precede a existência do homem. Ao contrário, a essência humana é produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. A essência do homem é um feito humano. E um trabalho que se desenvolve, se aprofunda e se complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico (SAVIANI, 2006, p. 04).

Rodrigues (2011, p. 34), corroborando com essa ideia, aponta a reflexão que

deve ser feita entre o trabalho e as relações sociais, pois, “Ao mesmo tempo em que

o trabalho é o intermediário da relação do homem com a natureza, ele é, também, o

intermediário da relação dos homens uns com os outros”.

Frigotto (2001) nos aponta duas dimensões do trabalho, sendo que a primeira

está subordinada a responder às necessidades do ser humano enquanto um ser

histórico-natural. Esta dimensão busca atender aos imperativos do ser humano para

manter-se vivo. A segunda dimensão está centrada no trabalho como princípio

educativo necessário a toda vida humana. Com base nessas duas dimensões, o

trabalho, então, pode ser entendido como algo propriamente humano, que emerge

como atividade criativa, livre e inalienável do ser humano, permitindo-lhe (re)criar e

renovar continuamente a existência humana. Mas, tendo em vista as situações de

opressão, que também podem ser geradas pelo trabalho, pois devido ao valor que

lhe é intrínseco como possibilidade de transformação da realidade, se torna

instrumento de poder, considera-se um dever que o respeito aos demais seres

humanos seja apreendido e socializado.

Moura (2004) compreende o trabalho como princípio educativo em sentido

ontológico, por mediação entre o homem e a natureza, sendo entendido, portanto,

como elemento central na produção da existência humana. Por essa mediação, o

homem gera conhecimentos que são histórica, social e culturalmente acumulados,

ampliados e transformados.

Gadotti (2012, p. 51), ao referir-se ao trabalho, enfatiza que “Admitindo-se que

o homem se realiza pelo trabalho, também temos de admitir que ele pode “perder-

se” nele. Sendo uma necessidade humana, o processo de trabalho que escapar ao

domínio do homem e alienar o próprio homem”. Mas, o ser humano pode tornar-se,

43

ao menos em alguma medida, consciente do processo de alienação, aprendendo a

dominar os instrumentos que utiliza, compreendendo as relações de exploração

próprias ao sistema capitalista, buscando escapar daquilo que parece inevitável: não

ser dominado por estes.

Fromm (1983, p. 50), ao tratar do tema da alienação, assim se coloca: “O

conceito do homem ativo e produtivo, que compreende e controla o mundo objetivo

com suas próprias faculdades, não pode ser plenamente entendido sem o conceito

de negação da produtividade: a alienação”. Segundo o autor, para Marx alienação

significa que ”o homem não se vivencia como agente ativo de seu controle sobre o

mundo (...). Alienar-se é vivenciar o mundo e a si mesmo passivamente,

receptivamente, como sujeito separado do objeto”.

Para Marx (1983, apud Peixoto, 2010, p. 33) “a alienação humana está no fato

de haver no processo de produção uma relação que impede e constrange a

realização do trabalho como “objetivação”, ou seja, como realização da natureza

humana”. Nesse sentido compreende-se que a alienação surge com a propriedade

privada que resulta na divisão social do trabalho:

Com esta divisão surge a separação entre os que dirigem e os que executam o processo de trabalho. Há, pois, nesta relação, a instauração da alienação. O trabalhador é constrangido a atender suas necessidades mais imediatas, tais como: comer, beber, vestir, etc., se não o fizer porá em risco sua própria existência. Ao fazer de sua capacidade de trabalho um meio para atingir determinados fins, a sua atividade deixa de ser uma atividade livre (auto-atividade) e torna-se trabalho alienado (MARX,1983, apud

PEIXOTO, 2010, p. 33).

Diferentemente do trabalho que requer criatividade e liberdade, o emprego é

limitado a exercer determinadas tarefas, sem que haja espaços para a reflexão. Ou

para a conscientização, como entendida por Freire: o processo de formação de uma

posição crítica, não ingênua, em relação aos fenômenos da realidade objetiva, como

aqueles envolvidos na opressão dos trabalhadores (DAMO, MOURA, CRUZ, 2011).

O emprego é um conceito típico da sociedade capitalista: “O emprego é uma

relação contratual de trabalho entre o proprietário e o não proprietário de trabalho,

isto é, da capacidade de trabalhar dos não proprietários dos meios de produção, em

troca de uma remuneração, um salário” (LAZZARESCHI, 2009, p.9). Pode, então,

ser entendido como a venda da força e do tempo do trabalhador, que os trocam por

44

um valor, uma “paga” pelos seus serviços. Além de manter uma situação de

subordinação e alienação no exercício das atividades, como aponta Oliveira (2012),

quanto mais se é moldado pela rotina e pela disciplina imposta pelas condições do

emprego, mais se reduz a capacidade de criticidade quanto às situações às quais os

trabalhadores são submetidos, afetando sua humanização. Para Gadotti (2012, p.

57) esta forma de trabalho “suga a força criadora de valor, em meios de subsistência

que compram pessoas” como se compra qualquer outro objeto:

Como mercadoria o homem não possui valor em si. Seu valor deriva da relação de troca, enquanto está na origem do lucro, da mais valia e da acumulação do capital. O trabalhador, diz Marx, sai sempre do processo como nele entrou, fonte pessoal de riqueza, mas desprovido de todos os meios para realiza-la em seu proveito. Uma vez que, antes de entrar no processo, aliena seu próprio trabalho, que se torna propriedade do capitalista e se incorpora ao capital, seu trabalho durante o processo se materializa sempre em produtos alheios (GADOTTI, 2012, p. 57).

Nesse sentido, Marx (1982, p. 209) traz a questão do que chamamos hoje

de emprego fazendo uma análise que nos ajuda a diferenciar melhor o trabalho de

emprego:

O processo de trabalho, quando ocorre como processo de consumo da força de trabalho pelo capitalista, apresenta dois fenômenos característicos. O trabalhador trabalha sob o controle do capitalista, a quem pertence seu trabalho. O capitalista cuida em que o trabalho se realize de maneira apropriada e em que se apliquem adequadamente os meios de produção [...]. Além disso, o produto é propriedade do capitalista, não do produtor imediato, o trabalhador. O capitalista paga, por exemplo, o valor diário da força de trabalho. Sua utilização, como a de qualquer outra mercadoria, por exemplo, a de um cavalo que alugou por um dia, pertence-lhe durante o dia.

Marx, segundo Fromm (1983, p. 49) tinha como discussão central “(...) a

transformação do trabalho alienado e desprovido de significado em trabalho

produtivo e livre (...)”.

Também Masson e Mainardes (2011, p. 82) defendem a formação para o

trabalho e não para o emprego: “Cabe esclarecer que a ampla formação humana

pressupõe a formação para o trabalho, mas esta não significa a formação para a

empregabilidade, concebida de forma restrita e fundamentada nas demandas

instáveis do mercado de trabalho”.

Frigotto (2001) denomina o emprego de trabalho/emprego ou trabalho

assalariado, que sob o capitalismo, deixa de ter centralidade como valor de uso em

resposta às necessidades vitais dos seres humanos, passando a ter sua

45

centralidade como valor de troca. Com o objetivo único de gerar lucro ao capital, que

tem em sua essência o acumular, o concentrar e o explorar.

Segundo Oliveira e Almeida (2009, p. 160), no período dos anos de 1990, o

conceito de empregabilidade ganha destaque, passando a ser entendido como uma

possibilidade de redução dos riscos sociais ocasionados pelo desemprego. Nesse

período, “havia uma forte tendência a caracterizar a empregabilidade como uma

possibilidade de visualizar o futuro, na perspectiva de “arranjar” um emprego e,

sobretudo, de se manter nele”. Nesta perspectiva, pode-se compreender que a

educação, em especial a chamada “educação profissional”, foi conivente com as

demandas do capitalismo. E, como tal, reduziria os processos educativos a

“treinamentos”, tornando as pessoas aptas para o desenvolvimento das funções que

seriam mais necessárias ao mercado.

Segundo Westbrook (2010), Dewey compreendia que o pensamento era uma

função mediadora e instrumental que havia evoluído para servir aos interesses da

sobrevivência e do bem-estar humanos. A pedagogia de Dewey se apoiava no

pragmatismo, que ele preferia chamar de instrumentalismo. Nessa proposta, as

ideias teriam importância se servissem de instrumento para a resolução de

problemas da vida real em que o foco era a ação, a experiência, por meio da qual

promovia- se ao educando o aprendizado útil e significativo. Segundo Lorieri (2000),

o conhecimento resultante da compreensão presente na experiência: “é um meio,

um instrumento da, na e para a ação (...) a verdade é que uma ideia,

intelectualmente, não pode ser definida por sua estrutura, mas só por sua função e

uso”. (DEWEY, 1933 (1979), apud LORIERI 2000, p. 53).

Em sua natureza, muitas das instituições que oferecem a educação

profissional tiveram, ou ainda têm, a concepção da educação ofertada apenas como

um meio para o aluno conseguir um emprego, o que reforça e reproduz uma

perspectiva mercadológica e instrumentalista da educação. Esse modelo ofertado

seria, em nosso entender, qualificação profissional, quando muito, e não educação

profissional. E estas instituições serão “abastecedoras” de um mercado que sequer

receberá todos os profissionais formados.

Com base nessas reflexões sobre trabalho e emprego, argumentamos que o

trabalho é transformador da sociedade e do próprio homem, enquanto o emprego

46

visa atender a uma demanda das forças produtivas, mantendo o status quo dos

proprietários dos meios de produção, e reduzindo a dimensão humana. Segundo

Silva e Cunha (2002, p. 77) há a necessidade de mudança na atualidade em que

vivemos:

O mundo globalizado da sociedade do conhecimento trouxe mudanças significativas ao mundo do trabalho. O conceito de emprego está sendo substituído pelo de trabalho. A atividade criativo, crítico e pensante, preparado para agir e se adaptar rapidamente às mudanças dessa nova sociedade produtiva passa a depender de conhecimentos, e o trabalhador deverá ser um sujeito.

Conforme Abramo (2004), a questão do trabalho está entre os assuntos que

mais mobilizam os jovens. Contudo, o que pode ser observado em documentos que

tratam das políticas públicas por meio de programas como o Programa Nacional de

Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e o Programa Nacional de

Inclusão de Jovens (Projovem), que se ocupam da relação educação e trabalho, é o

predomínio de um enfoque na formação tecnicista, reduzindo a “educação para o

trabalho” em qualificação para determinadas formas de emprego. Esse tipo de

opção traz grandes preocupações, pois a concepção da educação, seja ela

profissionalizante ou não, deve ser concebida como uma formação holística/integral,

por princípio, não reducionista. Ao pensar no trabalho como prática reflexiva da ação

humana, não apenas como a execução de determinada função, podemos constatar

que a formação oferecida a esses jovens é contraditória com a concepção de

educação que se prega nas legislações educacionais, como na Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional (LDB) vigente, decreto 5154/04, Plano Nacional de

Educação (PNE, 2014), Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

Profissional Técnica de Nível Médio (2012), dentre outras legislações, que tratam

desta modalidade de educação. Ainda, os referidos programas, estando voltados

prioritariamente a jovens e adultos de baixa renda, reforçam modelos históricos de

“educação assistencialista” da juventude e de adultos, fazendo uso de formas

precarizadas de “preparar para o trabalho”, “anunciadas” quase como sendo um

favor para esse público.

Müller (2009) afirma que há ainda, na contemporaneidade, preconceito em

relação às atividades laborais, de caráter manual/braçal, preconceito que parece ter

se iniciado no Brasil já no período colonial. De acordo com a autora:

47

A formação profissional no Brasil, desde a atuação dos jesuítas, foi sempre entendida como uma modalidade reservada às classes populares, aos caboclos, aos portugueses pobres, escravos e índios, que deveriam ocupar-se do “saber-fazer” e de quem dependeria o conforto da vida cotidiana (MÜLLER, 2009, p. 02).

No Brasil, desde os primeiros anos de colonização, a educação já era

privilégio de poucos, era destinada para uma minoria, a elite. Aos demais, restavam

as ocupações braçais. A primeira iniciativa formal de ensino de profissões desde a

colonização do país veio com as corporações de ofícios, que eram associações que

sobreviviam a partir de um patrimônio formado pelas cotas pagas pelos seus

membros. Os ofícios ensinados eram tarefas artesanais que exigiam dos

aprendentes força braçal e habilidade. Essas corporações de ofícios exerciam o

papel de formação profissional e de produção e tinham como objetivo principal a

“regulamentação do processo produtivo artesanal” (MÜLLER, 2009, 04).

Segundo a autora, nas corporações de ofícios havia uma hierarquia

estruturada entre os mestres, que estavam no topo da hierarquia como “detentores”

do poder, que ofereciam e contratavam trabalhos, ensinavam os ofícios, aplicavam

as provas, organizavam o ensino e monitoravam o trabalho com rígida disciplina.

Abaixo dos mestres estavam os oficiais, que eram aprendizes com alguma

graduação e que após passar pelo exame de proficiência também eram

considerados como mestres. E, por fim, havia os aprendizes que eram os

ingressantes nas corporações de ofícios que seriam “capacitados” para uma

determinada profissão.

Em 1809, foi criado o Colégio de Fábricas no Rio de Janeiro para oferecer

formação de aprendizes e artífices, que pode ser considerado a primeira intervenção

governamental sobre a formação profissional de jovens. Porém o Colégio de

Fábricas foi desativado em 1812 por não haver uma demanda industrial que o

justificasse.

Em 1827 o Estado passa a ser responsável pela organização escolar

brasileira com o propósito da diminuição do analfabetismo e que com a

profissionalização dos pobres, esses “resguardariam a sociedade dos riscos de

violência e revoltas” (MÜLLER, 2009, 09). Nesse sentido, as escolas

profissionalizantes se tornam referente à caridade e assistencialismo, como tentativa

48

de “velar” a desigualdade existente, que ainda perdura na visão de muitos na

contemporaneidade.

Em meados do século XIX surgem as Sociedades Propagadoras de Instrução

Popular, organizada pela sociedade civil e mantida por patronos ricos, que tinha por

objetivo ministrar cursos de artes e ofícios em Liceus. Os alunos eram operários que

estudavam no período noturno. Com a ebulição da industrialização no Brasil, em

1909 foram criadas as escolas técnicas de formação profissional em nível primário.

Foi somente em meados dos anos de 1940 que a educação profissional

passou a ser considerada uma função conjunta da sociedade e das entidades

empresariais, perdendo um pouco dos contornos de assistencialismo, embora

continuando a pautar-se por modelos instrucionista de preparação para o exercício

de uma determinada profissão, ainda acompanhando o modelo das corporações de

ofícios, embora atualizado para atender às novas formas do capital. Segundo a

autora, em 1942, por meio do decreto 4.048/42, foram criados cursos específicos

para a formação profissional para atender os anseios da indústria por meio da

criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) que se tornou um

elo preparador de mão de obra qualificada que tinha como proposta a aproximação

da profissionalização às reais necessidades das empresas no país. O SENAI tinha

como discurso o desenvolvimento do bem-estar social atrelado ao crescimento

econômico e ao aumento da produtividade, por meio da racionalização da formação

para o trabalho.

O decreto 2208 de 1997, do governo de Fernando Henrique Cardoso, que foi

substituído em 2004, no governo Lula, pelo decreto 5154, apontava para a educação

profissional como forma de qualificação para o emprego, ainda destinado aos

desfavorecidos, numa valorização da aprendizagem do “ofício” em detrimento de

uma formação humanística, que favorecesse a continuidade dos estudos, em níveis

mais avançados de ensino.

Diversos discursos governamentais têm afirmado, na última década, os

efeitos da expansão da educação profissional na inclusão social e na redução da

pobreza (EVANGELISTA, SHIROMA, 2006). Mas, segundo as próprias autoras, e

também para Oliveira (2012), a mera oferta ou a mera participação nos cursos de

educação profissional não garante a redução da pobreza e da exclusão social. Pois,

49

esta forma de “educação profissional” assume apenas um caráter de política

compensatória de Estado, para os “desfavorecidos”. Esse tipo de formação continua

pautado no treinamento ocupacional está focado em atender somente às demandas

do mercado. Não dando condições para que os seus egressos construam autonomia

e criticidade, continuando a se comportarem como agentes passivos do processo

educacional.

Embora tenha havido nos últimos oito anos um aumento significativo no

número de instituições que oferecem essa modalidade de educação, em especial

com a expansão dos Institutos Federais, não houve acompanhamento na mesma

proporção da preocupação com a qualidade da oferta desses cursos. Com base no

quadro 1 é possível ter ideia da expansão dos Institutos Federais em quantidade de

campi, número de matrículas nos cursos regulares e de investimentos aplicados nos

últimos anos com base na Lei Orçamentária Anual (LOA).

Quadro 01: Expansão dos Institutos Federais

Fonte: Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (CONIF, 2016).

Em que pese tal expansão, parece continuar também a haver uma “seleção”

de público, no que se refere à educação profissional. No campus aqui investigado, a

procura majoritária é por alunos em situação de vulnerabilidade social2. Para Gadotti

(2012, p. 65), “a formação cultural do proletariado só será completa numa sociedade

2 Janczura (2012, p. 304, citando CARNEIRO e VEIGA, 2004), assim define vulnerabilidade social:

“em sociedades baseadas em economia de mercado, a pobreza representa a primeira aproximação da maior exposição a riscos, principalmente em contextos em que famílias pobres não contam com uma rede pública de proteção social (acesso a bens e serviços básicos que viabilizem melhores oportunidades para enfrentar as adversidades). A ausência de recursos materiais alimentará outras fragilidades: baixa escolarização, condições precárias de saúde e de nutrição, moradias precárias em locais ambientalmente degradados e condições sanitárias inadequadas (necessidades insatisfeitas). Famílias e pessoas em tais condições de vida disporão de um repertório mais reduzido para enfrentar as adversidades, o que, nos termos de Sen (2000), é denominado privação de capacidades”.

50

em que for abolida a divisão social do trabalho, que divide os que “fazem” dos que

“pensam”, porque esta divisão o embrutece espiritualmente”, tornando-o alienado.

Na perspectiva freireana, podemos trazer a discussão de educação bancária para

complementar a questão da alienação como reproduzida nos cursos profissionais,

que reforça a condição do aluno como agente passivo do processo, “recebedor e

estocador” de informações. Nas palavras de Freire:

Na visão “bancária” da educação, o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão – a absolutização da ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da ignorância,

segundo a qual esta se encontra sempre no outro (FREIRE, 1987, p 38).

A questão do público da educação profissional, acima referida, pode ser lida

com um olhar para o histórico da educação profissional, que será abordado na

sequência da argumentação.

Sobre a tomada de consciência, Gadotti (2012) parte do pressuposto de que

essa não é espontânea, nem inata. A tomada de consciência exige esforço e

atuação de elementos externos e internos aos sujeitos. Neste caso, a educação é

um elemento que pode exercer forças tanto internas quanto externas, podendo ser a

chave para contribuir diretamente com uma mudança na concepção dos seres

humanos sobre seu lugar no mundo. Saviani (2006, p.01) aponta que “Trabalho e

educação são atividades especificamente humanas. Isto significa que,

rigorosamente falando, apenas o ser humano trabalha e educa”.

Em relação às concepções da educação profissional, Prestes e Véras (2009,

p.54) apontam que há várias concepções existentes, sendo possível considerar

todas como factíveis, mesmo defendendo posições distintas, a respeito da Educação

Profissional. Uma das concepções defende e vislumbra na Educação Profissional

uma oportunidade para aqueles que seriam “vítimas” do mundo capitalista. Para os

defensores e teóricos dessa perspectiva, “(...) o papel da política de qualificação do

trabalhador é o de possibilitar aos trabalhadores pobres, desempregados, jovens,

idosos, mulheres e negros”, a oportunidade que nunca tiveram de serem

qualificados ou requalificados, profissionalmente. A crítica que se faz a essa

concepção é a de que as políticas públicas são pensadas para os “desvalidos de

51

sorte”, termo utilizado pelas Escolas de Aprendizes Artífices no período de sua

criação, no ano de 1909, e que acabou se perpetuando ao longo dos tempos.

Mesmo que não seja evidenciado, como nos aponta Arruda (2010, p. 03), quando

trata da reforma da educação profissional com o Decreto nº 2.208 de 17 de abril do

ano de 1997, que ao efetuar a desvinculação entre o ensino médio e o ensino médio

técnico “a tendência seria que as vagas deste último fossem ocupadas por alunos

oriundos das camadas populares, estes sim interessados em uma formação estrita

para o mercado de trabalho”. Em pesquisa realizada pela autora, foi demonstrado,

em relação a essa legislação, que embora o foco tenha sido as camadas populares,

a reforma não propiciou a democratização desse público à educação profissional,

especificamente nos cursos Técnicos Integrados ao Ensino Médio. Nessa

colocação, a autora se posiciona também entendendo que a educação ofertada é

limitada à formação para o emprego e não para o trabalho. Questionamento que

também fazemos durante a pesquisa e que tentaremos compreender melhor durante

os encontros com os docentes do Instituto Federal de São Paulo do campus

investigado.

Numa outra concepção, se considera que a passagem dos jovens pela

educação profissional pode propiciar o domínio de saberes que os ajudem a

desenvolver mais autonomia, para intervenções sociais conscientes, para o

exercício da cidadania, enfim. Nesta perspectiva, Oliveria (2012), destaca que a

educação profissional deve ser valorizada não somente em virtude da habilitação

profissional, mas em especial, naquilo que lhe dá sentido, a formação humana. Para

ele, a educação profissional, assim como a educação básica e educação superior,

são espaços fundamentais para elaboração e agregação das dimensões políticas,

afetivas, intelectuais, dentre outras. Nessa dimensão, as práticas de formação

devem acontecer considerando a necessidade da indissociabilidade entre o pensar e

o fazer como processo fundamental para que a educação profissional seja

emancipadora.

Contudo, para se pensar na educação profissional para a juventude, que

propicie a autonomia e a emancipação, na qual acreditamos, é preciso compreender

alguns aspectos importantes nas discussões existentes sobre esta modalidade de

educação, em seus avanços e retrocessos conceituais. Até a década de 1980, era

52

aceitável ou recomendado que os cursos de Educação Profissional, especialmente

de Nível Médio, qualificassem seus alunos para exercer uma tarefa específica, que

era ditada pelo sistema industrial, de base mecânica. Mas, contemporaneamente,

esse perfil profissional rígido de atender a esse tipo de sistema industrial, reduziu-se,

em virtude das inovações tecnológicas, que trouxeram sofisticações ao processo

industrial, o que exigiu uma mudança na forma de oferta desses cursos. No entender

de Almeida:

A educação profissional que vinha sendo oferecida, os currículos de ensino e a própria estrutura do sistema de formação profissional existente foram concebidos para um padrão de produção assentado, sobretudo, no trabalho assalariado em ocupações tradicionais no setor industrial. As qualificações oferecidas eram voltadas para o exercício de tarefas em postos de trabalho específicos, adequadas à relativa rigidez funcional que caracterizava os processos produtivos. [...]. Assim, esse tipo de formação profissional, que foi bem-sucedido em qualificar trabalhadores no passado, rapidamente se revelou inadequado para enfrentar as mudanças no perfil de qualificação hoje (ALMEIDA, 2003, p.02).

Esse “novo” modelo de educação profissional, que prepara para o trabalho e

não para o emprego, deve se preocupar em formar o egresso para que saiba atuar

não só em sua área de formação profissional, de modo restrito como pregado pelos

modelos taylorista, fordista e toyotista. Propõe uma formação integral, que garanta

que o formando tenha condições de pensar e agir em diferentes situações e

ambientes, não somente naquele profissional, com postura ética e autônoma. O que

exige também uma mudança de paradigmas nas instituições e em todos os

envolvidos no processo de educação profissional, e requer um novo olhar sobre

esse. Resta questionar se esse “novo” modelo não estaria, por sua vez, também

reduzindo, por detrás de um discurso humanista, a formação do trabalhador para um

novo cenário profissional, em que a flexibilização das demandas trabalhistas seja a

tônica.

E, ainda numa outra concepção, há aqueles, que segundo Wermelinger;

Machado e Filho (2007) não valorizam a Educação Profissional, como modalidade

de ensino, por julgarem que as pessoas que a procuram não possuem as

competências básicas, quer culturais, quer cognitivas, quer econômicas, sociais, ou

outras, suficientes para dar continuidade aos seus estudos. Entendendo que a

educação profissional existe para manter certa estratificação social, em que os que

53

procuram por esta modalidade de educação seriam aqueles trabalhadores, ou filhos

de trabalhadores, que receberiam uma educação que os manteria sempre na

condição de mão de obra qualificada. Nessa visão haveria claramente a

desvinculação entre o pensar e o fazer nos cursos de Educação Profissional.

Prestes e Véras (2009) fazem críticas à abordagem da qualificação

profissional, pois apontam para a insuficiência dessa em garantir tanto a inserção

como a permanência dos trabalhadores no mundo do trabalho, além de indicar o

“descompasso entre a geração e transmissão de informações produzidas nos

treinamentos - restritos e localizados” (PRESTES; VÉRAS, 2009, p.53).

Segundo Wermelinger; Machado e Filho (2007, p. 208) um aspecto que

causaria a desvalorização da educação profissional seria “A baixa definição dos

objetivos, finalidades e proposições dessa modalidade de ensino, que certamente

podem ser tomados como fatores que contribuem para esse entendimento”. Embora

exista uma legislação própria para esse seguimento, há ainda, nos próprios

Institutos Federais, importantes responsáveis pela oferta da Educação Profissional

na contemporaneidade brasileira, dificuldade em definir qual proposta de educação

deve atender na prática, causando uma falta de identidade para essa modalidade

educacional. Essa falta de identidade causa fragilidade e dá espaço para que haja

diferentes práticas pedagógicas em uma mesma rede de educação:

A educação profissional é, antes de tudo, educação. Por isso mesmo, rege-se pelos princípios explicitados na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Assim, a igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola, a liberdade de aprender e ensinar, a valorização dos profissionais da educação e os demais princípios consagrados pelo artigo 3.º da LDB devem estar contemplados na formulação e no desenvolvimento dos projetos pedagógicos das escolas e demais instituições de educação profissional (BRASIL, PARECER CNE/CEB Nº 16/99, p.17).

1.2. Histórico da educação profissional no Brasil

Segundo Saviani (2006), nas comunidades primitivas esteve o ponto de

partida entre educação e trabalho. Esta relação se dava no compartilhamento dos

conhecimentos validados pela própria comunidade, que os transmitiam para as

novas gerações, dando continuidade à construção de um fundo de saberes,

54

essencial à continuidade da espécie. Não havia ainda a divisão de classes nem de

terras, tudo era feito em comum, ao mesmo tempo em que se educavam.

Mas, como consequência da complexidade dos modos de organização social,

começou a haver a divisão das terras e de outros bens necessários à produção e à

dominação, como as armas, e a divisão do trabalho, provocando uma ruptura na

relação de comunidade existente nas sociedades primitivas. Como implicação

dessas divisões, e da subsequente diferenciação social, houve também a distinção

da educação, que antes era identificada com o próprio processo de trabalho comum,

comunitário, realizado cotidianamente.

A educação passa a ter duas modalidades centrais, uma para a classe

daqueles que dominavam os instrumentos para a geração de riquezas, que

propunha a formação intelectual “na arte da palavra e nos exercícios físicos de

caráter lúdico ou militar”. E a outra modalidade foi “direcionada ao próprio processo

de trabalho” (SAVIANI, 2006, p. 06), assim, de caráter eminentemente prático,

laboral. A partir dessa divisão, se institucionaliza a educação.

Segundo Garcia (2000, p. 01) a então formação profissional, primeiro nome

dado ao que chamamos hoje de educação profissional, ficou marcada no Brasil

desde o “(...) início com o estigma da servidão, por terem sido os índios e os

escravos os primeiros aprendizes de ofício”:

[...] numa sociedade onde o trabalho manual era destinado aos escravos (índios e africanos), essa característica ‘contaminava’ todas as atividades que lhes eram destinadas, as que exigiam esforço físico ou a utilização das mãos [...]. Aí está a base do preconceito contra o trabalho manual, inclusive e principalmente daqueles que estavam socialmente mais próximos dos escravos: mestiços e brancos pobres (CUNHA, 2000, apud WERMELINGER, MACHADO e FILHO, 2007 p. 213).

Com as transformações dos modos de produção surgem outros modelos de

educação. Na Idade Média, há a crescente influência da religião nessa relação,

constituindo-se a Igreja católica, e depois aquelas de matriz protestante, fortes

fatores de impacto. Com a Revolução Industrial e o crescente avanço do modo de

produção capitalista, e a formação dos Estados-nação, inicia-se a concepção da

educação como função do Estado, amarrada a essa a ideia de escola como coisa

pública, e daí gratuita e obrigatória. Em todo esse processo evidenciou-se a

separação entre escola e aqueles detentores dos meios de produção de riquezas,

55

por um lado, e a formação para o trabalho e os outros membros da sociedade que

deveriam alimentar, com a força do seu trabalho e também, pelo consumo dos bens

produzidos- esses meios de produção; e, dessa forma, ainda, aprofundou-se a

distinção entre o trabalho intelectual e aquele manual. Em que com isso segundo

Saviani (2006, p. 10):

[...] o domínio de uma cultura intelectual, cujo componente mais elementar e o alfabeto, se impõe como exigência generalizada a todos os membros da sociedade. E a escola, sendo o instrumento por excelência para com viabilizar o acesso a esse tipo de cultura, e erigida na forma principal, dominante e generalizada de educação. Esse processo assume contornos mais nítidos a consolidação da nova ordem social propiciada pela industrial moderna no contexto da Revolução Industrial.

O sistema capitalista fomentou a centralização da vida nas cidades, e o êxodo

rural, pois a população volta-se para a produção industrial, processo que se

acentuou por volta do final do século XVIII e primeira metade do século XIX. As

crescentes e contínuas mudanças nos novos processos de trabalho, com a

operacionalização de máquinas cada vez mais complexas, aprofunda a ruptura entre

o trabalho intelectual e o trabalho manual, realimentando também mudanças nas

formas de se educar, do que se concebia como educação, quem teria direito a essa,

e de que maneira seria ofertada.

Com a necessidade de operacionalização e manutenção das máquinas

industriais criaram-se cursos profissionais, realizados nas próprias fábricas ou em

escolas próprias para atender às novas demandas. Reforçando o dualismo entre as

escolas de qualificação geral, ligada à intelectualidade para a elite e as escolas de

qualificações técnicas, voltadas para a profissionalização dos proletários,

marginalizados, desvalidos de sorte ou desfavorecidos de fortuna:

Considerando: que o augmento constante da população das cidades exige que se facilite às classes proletarias os meios de vencer as dificuldades sempre crescentes da lueta pela existencia: que para isso se torna necessario, não só habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com o indispensavel preparo technico e intelectual, como faze-los adquirir habitos de trabalho proficuo, que os afastara da ociosidade ignorante, escola do vício e do crime; que é um dos primeiros deveres do Governo da Republica formar cidadões uteis à Nação (BRASIL, DECRETO Nº 7.566, DE 23 DE SETEMBRO DE 1909).

56

A educação profissional, nesse discurso, seria vista como uma formação, que

exigiria do trabalhador a habilidade nos trabalhos manuais como meio de atender às

necessidades do mercado e “tirar-lhes da ociosidade ignorante”. Pensamento que

ainda parece vigorar, na contemporaneidade, por uma parte da população brasileira,

que entende a educação profissional como específica para um determinado grupo,

considerado o dos menos favorecidos economicamente. Isso demonstra que o

estigma construído durante anos ainda não se desfez, reflexo de uma sociedade

dividida em classes.

Segundo Garcia (2000, p.5), foi no governo “de Nilo Peçanha que o ensino

profissional no Brasil teve um grande impulso: em todas as capitais do Brasil foram

criadas escolas de profissionalização. Em 1910 estavam instaladas dezenove

escolas”, embora em situação precária tanto nas estruturas físicas como em

recursos humanos. Estas escolas de profissionalização eram chamadas de Escolas

de Aprendizes e Artífices, e eram ligadas ao Ministério da Agricultura, Indústria e

Comércio. Em 1918, é aprovado o decreto nº13064, que traz algumas alterações

para as Escolas de Aprendizes e Artífices. Dentre as mudanças estão: a

desvinculação dessas escolas ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio e a

vinculação diretamente ao Ministério da Educação e Saúde Pública; além da

mudança no nome dessas escolas que passam a se chamar Liceus. “Percebemos

nesse período total desvinculação entre formação profissional e educação; aos

trabalhadores era destinada uma formação voltada para o treinamento,

adestramento” (GARCIA 2000, p. 07).

Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005) elucidam que apenas na metade do século

XX o analfabetismo passa a ser motivo de preocupação da elite intelectual brasileira.

Neste momento, a educação torna-se objeto de políticas de Estado para o povo.

Contudo, mantinha-se a dualidade entre as formas de educação, contemplando

duas realidades díspares. Havia, de um lado, a formação geral/intelectual ofertada

para aqueles de maior poder econômico, e, em alguma parcela destinada também a

formar quadros de burocratas, necessários às funções de escrituração, e a formação

para a preparação de mão de obra para a execução de ofícios manuais, para

aqueles com menor poder econômico. Essa discriminação se arrasta até os dias de

hoje, gerando ainda preconceito quanto ao tipo de formação provida aos cidadãos.

57

Esses mesmos autores discorrem sobre esse dualismo, que se destaca na década

de 1940, com a organização das leis orgânicas que regulamentam a separação

entre o ensino tradicional/geral e o ensino profissional, oficializando esta divisão. A

equivalência entre as duas modalidades de ensino é estabelecida apenas na década

de 1950, por meio das leis de equivalência, e da primeira Lei de Diretrizes e Bases

da Educação (LDB) em 1961, em que os concluintes dos cursos técnicos poderiam

então, ter acesso a cursos superiores, assim como os concluintes da formação

geral.

No período de 1968 a 1973, a educação profissional assume uma atuação

importante para responder às necessidades da produção capitalista, como sendo

uma formação intermediária entre os operários que não tinham nenhum tipo de

formação e aqueles conhecidos como profissionais da elite. Esta necessidade de

capacitação profissional era necessária para atender um mercado em ebulição:

Acordos assinados pelo governo brasileiro com a USAID (United States Aid International Development) demonstravam a intenção de se ampliar ao máximo as matrículas nos cursos técnicos e de promover uma formação de mão-de-obra acelerada e nos moldes exigidos pela divisão internacional do trabalho. Com o aumento da procura de empregos, acarretada, inclusive, pela rápida urbanização, os empregadores passaram a exigir o nível de escolaridade cada vez maior como modo de seleção preliminar (FRIGOTTO; CIAVATTA e RAMOS, 2005. p.08).

Com o surgimento da primeira LDB de 1961, foi instituída a educação

profissional compulsória no então ensino secundário, com o propósito de atender a

demanda por profissionais de nível técnico. Utilizava-se do discurso de que aqueles

que não conseguiam um lugar no mercado de trabalho era porque não tinham a

formação profissional necessária. Vendendo a ilusão de que a certificação de um

curso técnico seria garantia de uma boa colocação no mercado de trabalho,

transferindo a responsabilidade da empregabilidade ou a falta dela para a própria

população. Como afirmam Oliveira e Almeida (2009, p. 157) “A disseminação de

cunho ideológico era de uma perspectiva de desenvolvimento dos países do

Terceiro Mundo e, para os indivíduos, a promessa de garantia de melhores

empregos e ascensão social, vinculado à tese do pleno emprego”. Mas esta

compulsoriedade não durou muito, visto o próprio esgotamento da ideia de pleno

58

emprego, pelas importantes crises econômicas que afetaram o mundo na década de

1970.

Retomou-se então o distanciamento entre a modalidade de ensino geral, que

volta a se preocupar com a educação para a preparação intelectual, própria para o

ensino superior, e a modalidade de ensino técnico, que preparava prioritariamente

para as profissões de base manual. Ficando as escolas técnicas federais da época

responsáveis pela oferta dos cursos técnicos, além daquelas pertencentes ao

Sistema S, como as do SENAI criado em 1942, e SENAC criado quatro anos depois

em 1946 pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo

(CNC). Em se tratando do plano de valores, mantinha-se o entendimento de que os

cursos de nível superior não eram destinados ao grupo dos proletários, oriundos da

classe trabalhadora, e vice-versa. Aos proletários e filhos de proletários cabiam os

cursos de nível técnico, que os prepararia, os treinaria, como mão de obra

qualificada, de acordo com as demandas do mercado de trabalho. Havia, inclusive,

uma diferença em relação à carga horária das aulas dos cursos técnicos, que por

serem direcionadas para uma determinada profissão, não proporcionavam o número

de horas curriculares para garantir a formação educacional geral mínima necessária,

de forma que os discentes dos cursos técnicos não poderiam dar continuidade em

seus estudos posteriores, e ingressarem no ensino superior.

Ao final da ditadura militar, em 1985, houve uma mobilização nacional pela

inclusão na constituição do direito à educação pública gratuita, democrática e laica.

Foi proposta também a formação da educação voltada para vinculação da formação

integral, tendo o trabalho como princípio educativo. Preocupados com a visão que a

educação profissional carregou durante muito tempo de que a formação exercida era

praticamente um “adestramento em técnicas produtivas” (FRIGOTTO, CIAVATTA e

RAMOS, 2005, p. 9), foi proposta então a formação integral e politécnica.

A concepção da politecnia tinha a intenção de romper com a dicotomia entre a

educação básica e a educação técnica. Nesta visão, a educação técnica não teria

como fim atender aos interesses do mercado e não seria um fim em si mesma,

podendo possibilitar aos egressos a possibilidade de continuidade nos estudos. A

politecnia é definida por Saviani como:

59

Politecnia diz respeito ao domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas que caracterizam o processo de trabalho produtivo moderno. Está relacionada aos fundamentos das diferentes modalidades de trabalho e tem como base determinados princípios, determinados fundamentos, que devem ser garantidos pela formação politécnica. (SAVIANI 2003, apud FRIGOTTO, CIAVATTA e RAMOS, 2005 p. 14).

Para Gadotti (2012), a politecnia tem por finalidade fazer compreender e viver

a estrutura econômica-social, a partir de sua inserção na atividade de produção para

intensificar sua capacidade de ação.

Para Wermelinger, Machado e Filho (2007, p. 211) “O conceito de politecnia

pressupõe ultrapassar o conhecimento meramente empírico e requer formas de

pensamentos mais abstratas”. O que significa ir além da formação exclusivamente

técnica, mas que enseja um trabalhador com perfil mais amplo, que seja consciente,

criativo e crítico, que busque sempre a autonomia.

Para Saviani a palavra politecnia significa literalmente “múltiplas técnicas”, o

que leva ao conceito da totalidade pela junção de técnicas fragmentadas. Enquanto

o termo tecnologia, pouco utilizado na época de Marx, traz o sentido da unidade

entre a teoria e a prática. Nas palavras do autor:

De fato, a palavra “politecnia”, como eu próprio também destaquei no livro mencionado, publicado em 1989, literalmente significa múltiplas técnicas, multiplicidade de técnicas; daí o risco de entender esse conceito como a totalidade das diferentes técnicas fragmentadas, autonomamente consideradas. Tecnologia, por sua vez, literalmente significa estudo da técnica, ciência da técnica ou técnica fundada cientificamente (SAVIANI, 2006, p. 163).

Manacorda (2007, p. 48) faz, com base na leitura de Marx, um comparativo

entre os termos politecnia e tecnologia, que se alinha ao já apontado por Saviani

(2006):

Mas, parece-nos, principalmente, que o politecnicismo sublinha o tema da disponibilidade para os vários trabalhos ou para as variações dos trabalhos, enquanto a tecnologia sublinha, com sua unidade de teoria e prática, o caráter de totalidade ou onilateralidade do homem, não mais dividido ou limita do apenas ao aspecto manual ou apenas ao aspecto intelectual (prático-teórico) da atividade produtiva.

Para o autor, o termo politecnia destaca a ideia de multiplicidade de

atividades enquanto o termo tecnologia propõe uma formação única de que seja

unificada a teoria e a prática. Na compreensão desse termo, há oposição entre a

divisão entre trabalho intelectual e trabalho manual, dando ao indivíduo a “(...) plena

manifestação de si mesmo (...)” (MANACORDA, 2007, p. 48).

60

A proposta da educação profissional e tecnológica visa, então, superar a

dualidade estabelecida entre as distintas classes sociais, sendo que com a

integração da educação geral à formação técnica se favoreceria a formação integral

do sujeito da educação.

Segundo Oliveira (2012), com a aprovação da última LDB, de 1996

(atualmente vigente), e com a reforma da educação profissional, no ano de 1990,

aconteceram algumas mudanças significativas na relação educação e trabalho.

Como exemplo, a instituição do decreto nº 2208/97, que regulamentou o § 2 º do art.

36, e os artigos 39 a 42 da LDB de 1996, que normatizam a educação profissional.

Este decreto, que propunha uma educação profissional tecnicista, foi revogado em

2004, com a mudança de governo do Brasil, que tinha como intensão reformular a

proposta da educação profissional. Surge então o Decreto nº 5154/04, que

estabelece as diretrizes da educação profissional e tecnológica do capítulo III da

LDB. Este capítulo define a educação profissional e tecnológica, que passa a

abranger os seguintes cursos: de qualificação profissional, inclusive formação inicial

e continuada de trabalhadores; de educação profissional técnica de nível médio e de

educação profissional tecnológica de graduação e pós-graduação.

Embora a educação profissional tenha passado e ainda passe por uma visão

reproducionista, a favor da elite, Dewey, em 1915, já trazia a concepção de uma

formação para o trabalho, transformadora. Ele criticava o modo de educação em que

os trabalhadores tinham que se adaptar às demandas do capital e defendia “um tipo

de educação profissional que, em primeiro lugar, modificasse o sistema laboral

existente e, finalmente, o transformasse” (DEWEY, 1915, p. 412 apud

WESTBROOK, 2010, p. 29).

1.2.1. Algumas críticas ao decreto 5154/04

Sem a intensão de defender ou refutar, mas de analisar as propostas dos

decretos nº 2208/97 e o decreto 5154/04, o que é necessário quando se trata da

regulamentação da educação profissional, fazemos, aqui, alguns apontamentos. O

decreto nº 2208/97, que regulamentava a educação profissional e tecnológica e que

em 2004 acabou sendo substituído, tinha uma proposta sobre educação profissional

61

diferente do que se propõe atualmente. Seu artigo 5º propunha que a educação

profissional de nível técnico “[...] terá organização curricular própria e independente

do ensino médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou sequencial a

este” (BRASIL, 1997). Reforçando o dualismo existente entre a educação geral e a

educação profissional, preocupava-se apenas com a preparação para a

empregabilidade. Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005), enquanto a LDB

9394/96, sinalizava para a formação profissional de forma integrada à formação

geral, esse decreto não só proibia a oferta de forma integrada como reforçava a

fragmentação entre elas.

Diferentemente do decreto 5154/04, em vigor, que não só menciona a

necessária articulação entre o ensino técnico com o ensino médio como prevê

também as formas em que serão ofertadas. Nesse, a Educação Profissional

Técnica poderá ocorrer de forma integrada ao Ensino Médio, podendo ser na

mesma instituição de ensino ou em instituições de ensino distintas; concomitante

para os alunos que já estão cursando o ensino médio, de forma subsequente para

aqueles que já concluíram o ensino médio ou, ainda, de forma integrada ao Ensino

Médio, do qual trataremos com mais profundidade, posteriormente.

Ainda, no artigo 9º, do decreto 2208/97, a concepção do currículo desta

modalidade de ensino é entendida como algo instrucionista: “As disciplinas do

currículo do ensino técnico serão ministradas por professores, instrutores e

monitores selecionados, principalmente, em função de sua experiência profissional

[...]” (BRASIL, 1997). É percebido que ao mencionar os profissionais para atuar nesta

modalidade de educação, neste caso para os cursos técnicos de nível médio,

confundem-se os papéis de funções diferenciadas, acentuando-se a ideia de que os

alunos serão instruídos a realizarem determinados procedimentos, que os tornarão

técnicos em alguma profissão, não havendo preocupação com a formação para os

professores desta modalidade de educação. Reforçando a ideia de que a educação

para essa modalidade não se preocupava com a formação integral do educando,

visando principalmente a qualificação para o emprego.

No Decreto 5154/ 04, em seu o artigo 3º, aponta-se para a oferta dos cursos

e programas de formação inicial e continuada segundo itinerários formativos. Que

são compreendidos, pelo próprio Decreto, como “[...] consideram-se itinerários

62

formativos ou trajetórias de formação as unidades curriculares de cursos e

programas da educação profissional, em uma determinada área, que possibilitem o

aproveitamento contínuo e articulado dos estudos”. (BRASIL, 2004, incluído pelo

Decreto nº 8.268, de 2014). O que pode ser entendido como o reconhecimento de

uma tentativa de romper com a oferta fragmentada e descontínua de formação

profissional anterior, não a percebendo como um fim em si mesma, mas, também,

como uma maneira de “fazer avançar” a formação profissional dos alunos,

“costurando” percursos curriculares, como modo de “criar atalhos” para abreviar a

duração dos cursos e, dessa forma, do próprio processo formativo.

O decreto acima trata sobre “a indissociabilidade entre teoria e prática”, que

nos leva a crer na mudança na concepção da Educação Profissional. Vista antes

como treinamento para determinada função, sem que houvesse o desenvolvimento

do pensamento crítico e reflexivo. Atualmente, propõe-se que para esta mesma

modalidade não basta apenas saber executar bem uma determinada tarefa, é

preciso também compreendê-la em seu contexto, e integralidade.

1.2.2. Planfor

No âmbito das políticas públicas de formação profissional do Ministério do

Trabalho e Emprego (MTE) é necessário abrir espaço para análise também do Plano

Nacional de Formação Profissional- PLANFOR. Criado em 1995, tinha como objetivo

qualificar 20% da população econômica ativa (OLIVEIRA, 2006). Atualmente,

denominado como Plano Nacional de Qualificação é entendido como uma política

pública de qualificação profissional, voltada para o atendimento a setores da

população considerados como “grupos vulneráveis e sob- risco social”, visando

potencializar a empregabilidade, como proposta segundo o Ministério do Trabalho e

Emprego (TEM) /Secretaria de Políticas Pública e Emprego (SPPE):

a) aumento da probabilidade de obtenção de trabalho e de geração ou elevação de renda, reduzindo os níveis de desemprego e subemprego; b) aumento da probabilidade de permanência no mercado de trabalho, reduzindo os riscos de demissão e as taxas de rotatividade; c) elevação da produtividade, da competitividade e renda (BRASIL, 1999 apud BATISTA, 2009, p. 3).

63

A política de qualificação profissional, segundo Oliveira (2006, p. 104) “(...)

voltada aos setores marginalizados ou em risco de exclusão social, implementada

pelo MTE, veio atender às exigências das agências multilaterais”. Em especial ao

Banco Mundial, que defendia que a educação profissional deveria desvincular-se do

Ministério da Educação. O governo brasileiro, atendendo ao Banco Mundial, alterou

a oferta da educação profissional para ser oferecida apenas após a conclusão do

ensino médio, fortalecendo novamente o dualismo existente entre educação básica

e educação profissional. O que favoreceu, por meio de uma sistemática dos cursos

em módulos, a visão fragmentada desses cursos, que seriam regidos pela lógica do

mercado. O PLANFOR teve os mesmos pressupostos estabelecidos nas

recomendações da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL): educação

para a competitividade, em que a educação profissional não seria uma alternativa

para quem quisesse uma educação básica de qualidade. Com esta proposta, a

certificação profissional ficou sob responsabilidade do empresariado, o que colocava

esta modalidade de educação dominada pelos interesses da produção. Segundo

Oliveira (2006, p. 106) as instituições que ofereciam educação profissional,

especialmente as escolas técnicas e agrotécnicas brasileiras, em especial da rede

federal, passaram a ser “meros agentes empresariais de formação de recursos

humanos”.

Neste período, o Programa de Expansão da Educação Profissional (PROEP),

que atualmente é de responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da

Educação (FNDE), era financiado principalmente pelo Banco Interamericano de

Desenvolvimento. Oliveira (2006) ressalta, que a primeira condição para que o

PLANFOR obtivesse resultado, seria a articulação deste com as políticas de criação

de empregos, em que a capacitação profissional fosse vinculada apenas ao

atendimento das demandas do mercado.

Com base crítica sobre uma educação voltada para a empregabilidade,

Batista (2009), após uma análise do PLANFOR, conclui que ao utilizarem o termo

empregabilidade e a oferta de cursos por competências, não possibilitavam a

formação para a autonomia. Assim, os jovens e adultos que buscavam na educação

uma melhor oportunidade no mercado de trabalho, eram considerados apenas como

“treinandos” pelo PLANFOR:

64

[...] a noção de competências e a ideologia da empregabilidade são formas de produção do consentimento, instrumentos ideológicos que visam capturar e manipular a subjetividade do trabalhador. Esses conceitos são expressões de uma sociabilidade perversa que anula, discrimina e exclui os sujeitos e, depois, torna-os culpados por esta situação (BATISTA, 2009, p. 22).

A utilização do termo “treinando” nos remete, novamente, à preparação para o

emprego e não para o trabalho, uma vez que, em se tratando de seres humanos,

que possuem habilidades próprias, o treinamento não trará transformações para

suas vidas nem de suas famílias: a mudança nas condições de existência fica

podada. Apenas continuarão reproduzindo e mantendo uma sociedade onde poucos

possuem o conhecimento e, consequentemente, o “poder”.

Ao pensar na questão da reprodução exercida na educação, Bourdieu (2014)

faz uma crítica às escolas, que muitas vezes reproduzem a divisão de classes

existente na sociedade e conservam as desigualdades, ao invés se serem agentes

de transformação desse modelo. Considerando que a classe burguesa se diferencia

da classe trabalhadora por inúmeras características como a cultura, o modo de falar,

as oportunidades, os valores, dentre outras, o autor avalia que essas diferenças não

são levadas em consideração pelas instituições de educação que ignoram e

desprezam estas diferenças socioculturais e continuam privilegiando os valores e

princípios das classes burguesas, das quais os que a ela não pertencem, precisam

conformar e adaptar, mesmo que não haja significado para eles. Nesse sentido,

Bourdieu (2014, p. 25) compreende que a ação pedagógica é uma violência

simbólica por usar de seu poder de maneira impositiva que reforça as relações de

subordinação:

Todo o poder de violência, isto é, todo poder que chega a impor significações e a impô-las como legítimas, dissimulando as relações de força que estão na base de sua força, acrescenta sua própria força, isto é, propriamente simbólica, a essas relações de força.

A educação, mesmo sendo política, como afirmou Freire (1996), tende a se

colocar como neutra nas instituições escolares como uma maneira de “mascarar”

suas reais intenções. Que intencionalmente querem reproduzir uma sociedade

desigual, que mantenha cada grupo em seu devido lugar. Como afirma “Assim, a

função mais dissimulada e mais específica do sistema de ensino consiste em

65

esconder sua função objetiva, isto é, dissimular a verdade objetiva de sua relação

com a estrutura das relações de classe” (BOURDIEU, 2014, p. 248):

(...) em razão da inércia particular que a caracteriza, sobretudo quando está investida da função tradicional de conservar e de transmitir uma cultura herdada do passado e dispõe de meios específicos de autoperpetuação, a Escola está em condições de impor às exigências externas uma retradução sistemática porque conforme aos princípios que a definem enquanto sistema (BOURDIEU, 2014, p. 174. grifos do autor).

Histórica e socialmente a dualidade na educação profissional não está apenas

entre educação técnica e ensino médio. Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005),

os cursos tecnólogos também enfrentam uma distinção no nível de ensino superior.

Com a lei n. 6.545/78, e a transformação das Escolas Técnicas Federais em Centros

Federais de Educação Tecnológica (CEFET), pode-se estender a discussão para

entender qual a proposta dos cursos tecnólogos, que se equiparam aos cursos

superiores, mas possuem suas especificidades.

Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005), compreendem o curso tecnólogo como de

nível intermediário entre os cursos técnicos e as engenharias, já que os tecnólogos

estão se formando para as atividades mais práticas de execução que propriamente

as atividades de planejamento:

Ter-se-iam, assim, atingidos os objetivos preconizados para países de economia dependente e consumidor de tecnologias importadas: política de capacitação de massa, barateamento dos custos profissionalizantes, adequação e atendimento às necessidades do mercado de trabalho, criação de caminhos alternativos às universidades, e, finalmente, o não aniquilamento da necessária camada de técnicos adequados ao processo de reestruturação produtiva (FRIGOTTO, CIAVATTA E RAMOS, 2005, p. 11).

Na continuidade dessas discussões trataremos das políticas públicas voltadas

para a educação profissional da juventude.

1.3. As políticas públicas para a educação profissional da juventude

Segundo Bucci (1997), a definição do conceito de políticas públicas é a de

que essas devem estabelecer uma relação intrínseca com a proteção e garantia de

direitos individuais, sociais, econômicos, culturais, entre outros. Para a autora, as

66

políticas públicas se definem para a realização de objetivos específicos pelo governo

e conta com a participação de agentes públicos e privados: “Políticas públicas são

os programas de ação do governo para a realização de objetivos determinados num

espaço de tempo certo” (BUCCI, 1997, p.95).

Consideramos, aqui, que esse cerne das políticas públicas encontra-se

fragilizado, em sua efetivação, no Brasil, ao menos naquilo que tange a áreas como

educação e saúde. Oliveira (2012) entende políticas públicas como a materialidade

da intervenção do Estado na sociedade civil, que, no uso do poder, utiliza-se dessa

intervenção para implantar ou reformular medidas que pretendem solucionar

problemas já conhecidos. Estas intervenções deveriam envolver todos ou um

determinado grupo específico no seu planejamento e/ou execução, já que resvalam,

mais direta ou indiretamente, na população como um todo. Mas, novamente, aqui,

esse é outro ponto de fragilidade, pois, na maioria das vezes as políticas públicas

são pensadas por um grupo reduzido de personagens, que nem sempre tem o

conhecimento – ou interesse- suficiente para problematizar e propor alternativas

efetivas de intervenção. As políticas públicas se materializam e adquirem força no

âmbito do Estado e, nesse sentido, Oliveira (2012, p.146) afirma como podem

ampliar as capacidades humanas:

[...] a qualificação profissional, compreendida como capacidade de ampliação das capacidades humanas, intelectivas e de base técnicas, assume a condição de direito dos trabalhadores brasileiros, devendo se realizar como forma de ampliar tais capacidades intelectivas e laborais, articuladas a um projeto de formação humana [...] possui dimensão e sentido públicos. Logo, deve ser assumida como de responsabilidade do Estado, na forma de promoção e execução.

Acompanhando Peter (2012), consideramos que para compreender as

políticas públicas se deve, inicialmente, levantar os seguintes questionamentos: a. o

que se está colocando como o problema a ser enfrentado/encaminhado pelas

políticas públicas?; b. quem delimitou tal problema, e em quais bases?; c. quais

setores sociais serão atingidos, e como? d. quais os recursos financeiros, materiais,

humanos, institucionais que serão empregados, quem arcará com os custos de tais

recursos e concordam com isso?

67

1.3.1. Políticas públicas para a juventude: o que se entende por juventude?

As políticas de educação profissional para a juventude entraram

decisivamente na agenda política como alternativa para “superação do quadro de

pobreza e de exposição às drogas e à violência que acomete a juventude brasileira”

(SILVA, 2012, p. 163). Cabe nesse momento, refletir sobre as políticas de educação

profissional para a juventude. Mas quando se fala em juventude, de que grupo de

pessoas está se falando? O que melhor define a juventude nos dias de hoje?

A juventude está definida, segundo o Estatuto da Juventude (2013), como:

“§1º Para os efeitos desta Lei, são consideradas jovens as pessoas com idade entre

15 (quinze) e 29 (vinte e nove) anos de idade”. León (2005, p. 13) também aponta

para a utilização cronológica para a definição de juventude no Brasil: “(...) tem-se

utilizado a faixa etária entre os 12 e 18 anos para designar a adolescência; e para a

juventude, aproximadamente entre os 15 e 29 anos de idade, dividindo- se por sua

vez em três subgrupos etários: de 15 a 19 anos, de 20 a 24 anos e de 25 a 29 anos”.

O autor nos traz um dado interessante sobre o entendimento de juventude no que se

refere ao recorte cronológico nos países ibero-americanos, em que se verifica uma

grande diferença entre eles:

[...] entre 7 e 18 anos em El Salvador; entre 12 e 26 na Colômbia; entre 12 e 35 na Costa Rica; entre 12 e 29 no México; entre 14 e 30 na Argentina; entre 15 e 24 na Bolívia, Equador, Peru, República Dominicana; entre 15 e 25 na Guatemala e Portugal; entre 15 e 29 no Chile, Cuba, Espanha, Panamá e Paraguai; entre os 18 e 30 na Nicarágua; e em Honduras, a população jovem corresponde aos menores de 25 anos (CEPAL e OIJ, 2004, apud. LEÓN, 2005, p. 13)

Porém, a definição do que é juventude vai muito além da limitação

cronológica do tempo:

[...] definir juventude implica muito mais do que cortes cronológicos, vivências e oportunidades em uma série de relações sociais, como trabalho, educação, comunicações, participação, consumo, gênero, raça etc. Na realidade, essa transversalidade traduz que não há apenas um grupo de indivíduos em um mesmo ciclo de vida, ou seja, uma só juventude (CASTRO; ABRAMOVAY 2002, p.17).

Silva (2012, p. 164), aponta que até pouco tempo a compreensão de

juventude estava predominantemente relacionada a uma cronologia determinada, ao

qual se encontra subjacente uma visão estável e bem delimitada do

68

“amadurecimento biológico”. Mas, com todas as mudanças sociais ocorridas nas

últimas décadas, esta definição cronológica/ biológica, não deve mais ser concebida.

Nesse sentido, segundo Silva (2012, p. 165), “[...] a juventude se prolonga até depois

dos 30 anos, o que significa um terço da vida”.

Segundo Castro e Abramovay (2009, p. 217), podem-se adotar duas formas

de se tentar caracterizar a juventude. Uma delas adota a perspectiva de que a ideia

de juventude está representada por um “contingente populacional com

características comuns”. A outra forma concebe a “juventude como um grupo dotado

de identidade própria, dentro de uma perspectiva social, histórica e cultural”. Porém,

as autoras apontam para a ótica que descarta parcialmente o marco teórico como o

que pode caracterizar a juventude valorizando a categoria sociológica do jovem.

Defendendo que a juventude vai adquirindo autonomia pessoal compatível com as

transformações sociais, “[...] o que assim significaria que ela representa uma fase

mais propícia à redefinição das bases de socialização geracional”.

Nesta mesma linha de pensamento, León (2005) entende que a juventude

corresponde a uma construção social, histórica, cultural e relacional em que vão se

transformando. Ele também concorda que o recorte na categoria etária não é

suficiente para compreender e definir a juventude de forma justa, mas vê nesse

recorte um valor necessário quando se trata de fazer algumas delimitações:

A definição da categoria juventude pode ser articulada em função de dois conceitos: o juvenil e o cotidiano. O juvenil nos remete ao processo psicossocial de construção da identidade e o cotidiano, ao contexto de relações e práticas sociais nas quais o mencionado processo se realiza, com fundamentos em fatores ecológicos, culturais e socioeconômicos. (LEÓN, 2005, p. 14).

Carrano (2003, apud Silva 2012, p. 166) entende que é “mais adequado

compreendê-la como uma complexidade variável, que se distingue por suas

diferentes maneiras de existir, nos diferentes tempos e espaços”. Para o autor, a

noção de juventude é resultado da experiência histórica social de um determinado

indivíduo e varia de acordo com a formação humana. Nesta perspectiva, a juventude

é uma definição cultural, que, dessa forma, está em constante transformação,

conforme as bases culturais de uma sociedade também se modificam. Na sociedade

brasileira o jovem é visto como um ser em transição entre a infância e a fase adulta.

69

Mas, mais que um momento de transição, é um período, relativamente extenso de

tempo, em que o indivíduo está se estabelecendo no mundo, traçando suas

escolhas profissionais, sua maneira de se portar em diferentes ambientes,

adequando ou reinventando-se neles. É uma fase que pode ser bastante intensa,

em que começam a tomar decisões por si próprios, a dimensionar o impacto dessas

em seu futuro, que agora passa a depender deles. Como em nossa cultura,

espelhando aquelas das culturas urbanas, as crianças são tuteladas até chegar

nessa fase da vida, os jovens sentem muitas dificuldades em decidir quais caminhos

escolher. Ou seja, a situar-se com autonomia no mundo. Ao mesmo tempo em que

são cobrados para fazerem escolhas “maduras”, muitos parecem não possuir a

experiência suficiente para fazê-las, o que não significa que não tenham potencial

para tanto. Também nesse período os jovens, numa maneira ampla, ainda não

possuem uma plena credibilidade social, o que faz com que sejam vistos como

quase-adultos potencialmente responsáveis, mas, ainda, fonte de instabilidade para

a sociedade.

Os dados sobre a população jovem devem ser levados em consideração para

se entender a importância em ter atenção especial com esse grupo, principalmente

em relação às políticas públicas:

Não é por acaso que existe atualmente um movimento político para a juventude, pois, pelas características demográficas, os países latino-americanos e caribenhos vivem uma “onda jovem”, formada por uma população majoritariamente juvenil. Compõe um setor que, por um lado, carece de estruturas dentro das políticas públicas e, por outro, é um nicho de mercado promissor e em potencial [...] Frente a estas características, o Brasil possui uma população jovem formada por 34.236.060 habitantes (IBGE, 2013), o que significa 18% da população do país com idade entre 14 e 24 anos (BARREIRO; MALFITANO, 2014, p. 135).

Para Silva (2012), esta compreensão da diversidade juvenil é importante para

a formulação de políticas específicas e adequadas para esse público. Pois, na

maioria das vezes, essas políticas são pensadas e definidas utilizando-se de

critérios apenas econômicos, ou etários, e sem a participação dos próprios jovens,

maiores interessados, em sua elaboração, execução ou avaliação. Ferindo o próprio

Estatuto da Juventude, em seu Art. 4o, que assim coloca: “O jovem tem direito à

participação social e política e na formulação, execução e avaliação das políticas

públicas de juventude” (BRASIL, 2014). Essa ausência de voz dos jovens na

70

formulação e implantação de políticas públicas, ou mesmo o recorte sobre o qual se

fundamentam (viés econômico, por exemplo, centralizando-se na juventude

vulnerável economicamente) geram políticas que redundam no controle social, mas

sem transformar a sociedade.

Segundo Malfitano (2011, apud BARREIRO; MALFITANO, 2014), há pouco

tempo é que se passou a ter um enfoque das políticas públicas sobre a juventude.

Em meados da década de 1980, houve a possibilidade de elaboração e

implementação de políticas públicas, em diversas questões sociais, com enfoque

inicialmente no público infanto-juvenil, mas com maior atenção para a infância e a

adolescência, deixando-se de lado, nesse momento, a juventude. As políticas

voltadas para a juventude começam a ter maior atenção a partir do ano de 1994,

porém, com propostas e ações que visavam especialmente à prevenção da violência

e o controle comportamental desse grupo, que era visto como ameaça para o

restante da população. Segundo Sposito e Carrano (2003, apud BARREIRO;

MALFITANO, 2014), tinham um efeito compensatório, relacionado nomeadamente

às questões socioeconômicas que atingiam a juventude. Originaram-se, dessa

forma, propostas simplistas de redução da violência, principalmente focadas na

juventude economicamente vulnerável, com medidas emergenciais, que não tinham

como preocupação a prevenção da violência e a oferta de novas possibilidades para

os jovens, em especial para aqueles em situação de conflito com a lei, pois viam

nesses, uma ameaça à sociedade.

A partir dos anos 2000, segundo Freitas (2012), a institucionalização de

políticas públicas no Brasil passou a ter o entendimento de que é preciso políticas

específicas para atender as questões que afetam a juventude. Entendendo que as

Políticas Públicas objetivam atender grupos específicos para resolver problemas

também específicos da população, o que nos preocupa é o que aponta Freitas

(2012, p. 185) de que para a juventude se mantêm “ainda nos dias de hoje a

categorização de que as políticas para juventude devem destinar-se aos jovens em

“situação de risco social””. Quem delimita quem é o jovem em situação de risco

social? A juventude brasileira, como um todo, não apresenta problemas específicos,

que deveriam ser contemplados, numa lógica de que a atenção a um determinado

problema não excluiria a preocupação com outros problemas? Ainda, se as políticas

71

públicas feitas até hoje, para a juventude em “situação de risco”, não estão sendo

suficientemente eficazes, haja vista a precariedade de perspectivas de vida da

nossa juventude3, e se o foco continua o mesmo, algo precisa ser repensado. Para

Castro e Abramovay (2002, p. 33): “Apreendidos como vítimas, ora como promotores

de um problema social específico (violência), os jovens são representados como

uma espécie de ameaça à estabilidade do sistema”. E continuam:

[...] apesar dos jovens inscritos para participarem como beneficiários de programas serem oriundos de estratos sociais baixos, não se dever frisar tais jovens com “grupo de risco”, sob pena de representar um retrocesso, visto que esse tipo de referência não contribui para a construção de cidadania, mas, ao contrário, estigmatiza e exclui (CASTRO; ABRAMOVAY, 2002, p. 33).

Outra crítica feita pelas autoras é que essas políticas são muitas vezes

desconhecida ou ignoradas pela sociedade. Segundo as autoras, há uma tendência

a inauguração ou lançamentos com eventos festivos, mas nem sempre houve uma

análise para saber as reais necessidades da comunidade. Além disso, muitas vezes

não há preocupação com o processo de implantação, implementação e avaliação

dos programas. E criticam, ainda, que muitas vezes se pensa apenas na questão

material como, por exemplo, na criação de quadras de esportes para ocupar os

jovens nos tempos livres por uma determinada região. Mas se limita somente a

construção da quadra “não se faz um acompanhamento crítico e nem uma prestação

de contas à população sobre gastos públicos. Não há propriamente preocupação

com políticas universalistas e específicas, orientadas para a diversidade de seus

beneficiários em termos geracionais, que resgatem as identidades” (CASTRO e

ABRAMOWAY, 2002, p. 37).

Sobre os apontamentos dessas autoras, pode-se observar que houve

avanços na agenda pública no que se refere às políticas públicas para a juventude,

mas também apontam para o recorte de classe social, que continua a priorizar a

população jovem pobre. Nesse sentido, fazemos um questionamento sobre como

favorecem para que se garanta o acesso aos direitos sociais de todos os jovens,

inclusive daqueles que não se encontram em situação de vulnerabilidade 3 Dados do IBGE (Indicadores Sociais, 2015) mostram sobre a população jovem brasileira entre 15-29 anos de idade que, 22,5% só estuda, 13,1 % estuda e trabalha, 44,5 % só trabalha e 20,0% não estuda e não trabalha.

72

econômica, mas podem enquadrar-se em outras vulnerabilidades? Entendemos que

deve, sim, haver uma preocupação com políticas públicas para grupos específicos,

porém, não devem ser reduzidas somente a ações que visam atender à juventude

negra ou àquelas econômica e socialmente marginalizadas, por exemplo. Precisam

ser mais abrangentes, para a juventude brasileira como um todo, sob pena de não

se efetivarem como públicas.

Acreditamos que devam trabalhar com propostas que possam ajudar na

construção e no desenvolvimento de habilidades importantes na defesa dos direitos,

permitindo que todos os jovens, pobres ou não, negros ou não, sejam cidadãos

conscientes, seres de direitos e agentes de transformação. Para isso é preciso que

essas políticas se preocupem em ajudar na construção do empoderamento e na

emancipação dos jovens, devendo, portanto, agirem equanimemente, contemplando

as especificidades da situação econômica e de estigmas sociais.

Segundo Barreiro e Malfitano (2014, p. 139), “o movimento de discussão de

uma agenda para a juventude iniciou-se por solicitação da Presidência da República,

com a criação da Comissão Especial de Políticas para a Juventude (CEJUVENTE),

em 2003, sediada na Câmara Federal de Deputados”. Embora seja importante

reconhecer que já havia movimentos trabalhando nas questões que envolvem

interesses da juventude de formas isoladas e que se fortaleceram a partir dessa

comissão. Segundo esses autores, em um mapeamento dos programas federais já

existentes voltados à juventude, promovido quando do estabelecimento dessa

Comissão, foram identificados 45 programas com 135 ações, das quais apenas 19

ações eram, de fato, destinadas para a juventude. Através desses dados, fica

evidente a fragmentação e a fragilidade das políticas brasileiras para a juventude.

Como resultado desse processo foi criado a lei Nº 11.129, de 30 de junho de 2005,

que institui o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem), a criação do

Conselho Nacional da Juventude (CNJ) e a Secretaria Nacional de Juventude.

O ProJovem foi lançado em 2005, como programa emergencial e

experimental, destinado a executar ações integradas que propiciassem aos jovens

brasileiros, na forma de curso previsto no Art. 81 da LDB elevação do grau de

escolaridade visando a conclusão do ensino fundamental e da qualificação

profissional, voltada a estimular a inserção produtiva cidadã dos jovens entre 18 e 24

73

anos. Reestruturado em 2008, e mantida a proposta inicial de elevação de

escolaridade, a qualificação profissional e a inclusão cidadã, passou a ser

denominado de Projovem Integrado, se dividindo em quatro modalidades, para

atender aos jovens com diferentes perfis com idades entre 18 e 29 anos. O

Projovem Urbano, que ficou sob responsabilidade da Secretaria Geral da

Presidência da República; o ProJovem Campo, coordenado pelo Ministério da

Educação; o ProJovem Trabalhador, de responsabilidade do Ministério do Trabalho

e Emprego; e o ProJovem Adolescente regulado pelo Ministério do Desenvolvimento

Social e Combate à Fome.

Já o Conselho Nacional da Juventude tem como desígnio formular e propor

diretrizes da ação governamental, voltadas especialmente para a promoção das

políticas públicas para a população jovem. A Secretaria Nacional de Juventude ficou

responsável pela função de articular intersetorialmente as ações em âmbito nacional

para a juventude.

Catro e Abramoway (2002, p. 21) sugerem como forma de obter melhores

resultados por meio das políticas públicas, que estas sejam propostas de maneira

participativa “de/para/com” a juventude: “Entende-se que esse deva orientar uma

política em que o elemento integrador, quer nas ações que fazem parte de políticas

universais, quer nas políticas específicas para jovens (...)”. As autoras compreendem

que existem alguns vieses em paradigmas conceituais sobre juventude que devem

ser analisados, pois, para elas, são decisivos para a ausência ou ineficácia de

políticas públicas para a juventude. Como exemplo citam três fatores que dificultam

a eficiência e eficácia dessas políticas: não conceber os jovens como atores com

identidades próprias; não considerar a diversidade existente entre as juventudes

abandonando a compreensão de que vêm de contextos diferentes e por isso são

heterogêneas e; pensar sempre no jovem como o futuro, abandonando a concepção

do jovem como agente histórico no presente.

Pensando na juventude em sua amplitude, não há como não refletir na

questão da formação profissional e do trabalho, que são uns dos pontos principais

de preocupação desse grupo. O artigo 14 do Estatuto da Juventude (2013) afirma

que “O jovem tem direito à profissionalização, ao trabalho e à renda, exercido em

74

condições de liberdade, equidade e segurança, adequadamente remunerado e com

proteção social”.

Contemporaneamente, alguns programas governamentais destinam-se à

formação educacional e profissional para os jovens, assim, além do ProJovem,

temos o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec),

instituído pela Lei n. 12.513, de 26 de outubro de 2011, ainda pouco estudado em

seus princípios e formas de efetivação. O Pronatec faz parte do programa Brasil sem

Miséria e tem como proposição oferecer a jovens e adultos, inclusive àqueles

trabalhadores, “maiores oportunidades”, por meio de cursos de formação inicial e

continuada. Há inúmeras críticas tanto quanto à fragilidade dessa proposta quanto à

superficialidade da formação oferecida. Não aprofundaremos, aqui, nessas críticas,

mas para uma verificação dessas ver Scavo e Bezerra (2014), Franzoi, Silva e Costa

(2013) e Saldanha (2012).

Muito tem se discutido nas instituições de educação, especialmente nas

instituições de educação profissional, sobre a formação que se deve proporcionar

aos jovens. Com base na elaboração de políticas públicas para a juventude, tem-se

discutido a efetividade das possibilidades de inserção da juventude no mercado de

trabalho, na educação, na política e na cultura. As legislações como a LDB 9394/96,

as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível

Médio, Parecer 5154/04, dentre outros, assinalam para uma educação para a

emancipação, que leve o jovem a ser protagonista, que tenha uma formação

holística, enfim, sempre um discurso da oferta para uma formação integral. Porém,

com poucas práticas efetivas para que essa proposta de educação se concretize.

Em uma análise crítica, diversos programas voltados para a juventude

brasileira, especialmente no que se refere à educação ou qualificação profissional,

apresentam em suas propostas falhas perceptíveis, embora reconheçam-se suas

contribuições. Como já mencionado anteriormente, um ponto em questão é que são

programas, na maioria das vezes, isolados uns dos outros, o que já seria prejudicial

à efetivação do proposto nessas legislações, por não haver uma sequência ou uma

complementação entre eles. Outro ponto que destacamos é que esses programas

tendem a demonstrar que são a solução definitiva dos problemas enfrentados por

determinado grupo social, dando a entender que são um fim em si mesmos, como

75

se bastassem para resolver os problemas que envolvem a juventude. As políticas

públicas para educação e trabalho são precárias no Brasil e muitos programas de

educação profissional possuem estratégias descontextualizadas e descontínuas,

que poucos valores agregam à formação dos jovens, que buscam nelas novas

oportunidades. Nesse sentido, a educação profissional ou qualificação profissional

aparecem como “soluções” para os problemas enfrentados pelos jovens, como

desemprego, pobreza, violência, drogas entre outros. Sobre o uso desse argumento

Segnini (2000, p. 75) observa:

O desemprego crescente de trabalhadores escolarizados, sobretudo nos setores mais modernos da sociedade, é tomado como um dos argumentos para tornar relativa essa perspectiva instrumental da educação que se expressa como se fosse capaz de garantir o emprego ou, até mesmo, o trabalho.

O problema está em entender que a educação/ qualificação profissional, por

si só, não consegue solucionar tudo isso. Segundo Arruda (2010, p. 02), na visão de

Mészáros (2002), ao transferir a responsabilidade do desemprego para a educação

ou qualificação profissional está se transferindo também para o próprio indivíduo

essa responsabilidade, além de promover “uma inversão na ideologia de

meritocracia da sociedade capitalista: a meritocracia pelo trabalho cede lugar à

meritocracia pela educação”. O argumento de que a formação profissional poderia

solucionar o problema do desemprego, embora pareça lógico em sua formulação, se

sustenta apenas quando a economia se encontra “aquecida”. O discurso de que é

preciso se profissionalizar para garantir uma vaga no mercado de trabalho, ou é

preciso se qualificar para manter-se no mercado de trabalho, precisa ser

reelaborado. Isso se a concepção de formação profissional estiver ligada somente à

qualificação profissional, que prepara o educando apenas para exercer uma

determinada profissão/função. Nessa perspectiva, Segnini (2000, p. 79), afirma que:

A qualificação assim compreendida expressa relações de poder no interior dos processos produtivos e na sociedade; implica também o reconhecimento que escolaridade e formação profissional são condições necessárias, mas insuficientes, para o desenvolvimento social. Isso porque se sabe que somente políticas e ações concretas, que possibilitem real desenvolvimento social e econômico (distribuição de renda, reforma agrária, reforma do sistema de saúde e educacional), podem estar superando desigualdades e construindo condições sociais que redundam em cidadania. E só encontram sentido social no interior de um projeto de

76

desenvolvimento econômico que possibilite direitos sociais, entre eles, o trabalho.

Na concepção da educação profissional, em que há a preocupação com a

educação holística que prepara também para o trabalho, não há necessidade em

mudar o discurso, uma vez que este já deve ser de que a educação profissional

pode contribuir para a transformação da sociedade. Entendendo-se que manter um

registro em carteira e a venda da força de trabalho por um valor no final do mês, não

é o suficiente para garantir a cidadania. A relação educação e trabalho deve

contribuir para uma formação ética, cidadã, crítica, reflexiva, que leve à autonomia e

à emancipação. A questão é investigar se e como se configura, na educação

profissional, a fundamentação legal, e o exercício dessa, para a formação integral do

jovem.

1.4. Principais instituições de educação profissional no Brasil na atualidade

A educação profissional é ofertada em todo o país e ganhou muita atenção

nos últimos oito anos. Dentre as instituições que oferecem educação profissional

destacam-se: O Centro Paula Souza, que é uma autarquia do Governo do Estado de

São Paulo, vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência,

Tecnologia e Inovação e conta com a oferta de cursos técnicos em 219 Escolas

Técnicas Estaduais (Etecs) e cursos de tecnologia com 66 Faculdades de

Tecnologia (Fatecs), reunindo aproximadamente 283 mil alunos em cursos técnicos

de nível médio e cursos tecnológicos, em mais de 300 municípios no estado de São

Paulo, segundo dados do site oficial, disponíveis em: http://www.cps.sp.gov.br/#.

Outra oferta de educação profissional no país é o Sistema S, conhecida assim

por integrar diversas organizações e instituições, cujos nomes se iniciam com essa

letra, já acima referida. Segundo o Portal Brasil (2015), o Sistema S conta hoje com

11 instituições, e dentre as organizações e instituições do Sistema “S” se destacam:

o Serviço Nacional de Aprendizagem na Indústria (SENAI), que oferece educação

profissional na prestação de serviços de assistência técnica e tecnológica para a

indústria; o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), que se dedica à

oferta de educação profissional para trabalhadores na área de comércio e serviços;

o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), que oferece educação

77

profissional para trabalhadores rurais; o Serviço Nacional de Aprendizagem em

Transportes (SENAT), que oferece educação profissional para trabalhadores na área

de transportes, dentre outros. Os cursos, em sua maioria, são oferecidos

gratuitamente, e em alguns casos, quando oferecidos por instituições particulares,

são cobrados valores considerados mais baixos do que de instituições particulares

normalmente cobram pelos seus cursos.

1.4.1. Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia

Em se tratando de instituições que oferecem educação profissional e

tecnológica, os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, possuem

destaque nessa investigação, tanto em termos de sua representatividade no Brasil

quanto para nosso interesse como objeto de pesquisa. Tais instituições se fazem

presentes em todo o território nacional e tem em sua proposta ofertar uma educação

profissional que visa à formação holística dos educandos, previstas em seus

documentos direcionadores. No intuito de dar maior espaço para a educação

profissional, o governo federal, investiu entre os anos de 2011 e 2014, mais de R$

3,3 bilhões nessa modalidade de ensino, ampliando a oferta de cursos e vagas por

meio do Plano de Expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e

Tecnológica. O que, consequentemente, teve um aumento significativo na oferta de

cursos não só para a juventude brasileira, mas também para aqueles que, já adultos,

pretendem retornar aos estudos e buscar novos horizontes pessoais e profissionais.

A Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica teve início

em 23 e setembro de 1909, por meio do Decreto 7566, com a criação de 19 escolas

chamadas de Escola de Aprendizes e Artífices. Essas que não tinham sido criadas

“para todos”, destinavam-se para os filhos do proletariado, para treinamento laboral,

como forma de garantir um lugar definido na estrutura social, afastando esses jovens

do crime e da ociosidade. Em um regime rigoroso disciplinar, condicionava seus

alunos a serem passivos, disciplinados e obedientes. Em 1937, por meio da Lei nº.

378 transformaram as Escolas de Aprendizes Artífices em Liceus Industriais, dada a

exigência da mecanização da produção industrial brasileira, mas sem mudanças na

forma com que pregavam a educação profissional.

78

No ano de 1942, segundo Cunha (2012), pelo Decreto nº 4127, de 25 de

fevereiro, os Liceus transformam-se em Escolas Industriais e Técnicas. As quais, por

sua vez, organizavam seus cursos para atender às demandas da indústria, com a

mesma forma de ensino disciplinado e restrito à qualificação profissional. Em 1959

estas escolas transformam-se em Escolas Técnicas Federais, ganhando autonomia

na gestão e na didática e ampliando a oferta de cursos técnicos. Após quase duas

décadas, três Escolas Técnicas Federais (Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro) se

transformam em Centros Federais de Educação e Tecnologia. Esse processo

continuou de forma gradativa para outras Escolas Técnicas Federais, até o ano de

2008. Em dezembro de 2008, por meio da Lei nº 11.892, a Rede Federal de

Educação Profissional e Tecnológica criou o Instituto Federal de Educação, Ciência

e Tecnologia, passando automaticamente todas as escolas técnicas vinculadas às

universidades federais à condição de campus do Instituto Federal. Esta lei inclui

também a Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, Centros Federais

de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca - CEFET-RJ e de Minas Gerais

- CEFET-MG; escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais e o Colégio

Pedro II no Rio de Janeiro.

Os Institutos Federais, que são equiparados às universidades federais, são

instituições de educação superior, básica e profissional, pluricurriculares

e multicampi, especializados na oferta de educação profissional e tecnológica nas

diferentes modalidades de ensino, com base na conjugação de conhecimentos

técnicos e tecnológicos com as suas práticas pedagógicas (BRASIL, 2008).

Segundo o portal do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de

Educação Profissional, Científica e Tecnológica (CONIF), os Institutos Federais

contam com 564 campi espalhados pelo Brasil, com 846.710 mil matrículas. Não

entraremos aqui na questão da permanência e evasão nos Institutos Federais,

considerando que cabe estudo dedicado especialmente a este tópico. Mas

levantamos aqui que esse tema deva ser alvo de preocupação, pois atinge números

altos, como exposto no gráfico a seguir:

79

Gráfico 01. Evolução do numero de ingressantes, matriculados concluídos e evadidos em cursos ofertados pela Rede Federal de 2009 a 2013:

No âmbito dos objetivos dessa investigação, o foco está no investimento que

se teve, especialmente nos últimos 8 anos, nesta modalidade de educação e na

efetividade da proposta de educação profissional e tecnológica, delineada em seus

documentos direcionadores.

Segundo Arcary (2015), a Rede Federal de Educação Profissional, que

completou no ano de 2014 seus 105 anos de existência, teve maiores e

significativas transformações no que se refere à educação pública, nos últimos

quinze anos. Desde o fim da ditadura militar, em 1985, nenhuma outra esfera da

educação pública no Brasil mudou tanto quanto essa modalidade de ensino. Em

especial, e que mais nos interessa, são as mudanças de ordem qualitativa, para as

quais são fundamentais mudanças de ordem conceitual e epistemológicas, da

educação profissional.

Por meio de um acordo firmado entre os Institutos Federais (IF’s) e o

Ministério da Educação (MEC), sobre a forma de distribuição dos cursos, foi

estabelecido que do total das vagas ofertadas, um mínimo de 50% devem ser

destinadas para cursos técnicos de nível médio, que englobam os cursos

concomitantes e subsequentes, integrados ao ensino médio e o Programa Nacional

de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de

80

Educação de Jovens e Adultos (Proeja), com obrigatoriedade de no mínimo 10% da

oferta. E, ainda, a oferta de 20% das vagas destinadas a cursos de licenciatura ou

formação pedagógica. Podendo os outros 30% serem divididos, de acordo com as

necessidades regionais, entre cursos Tecnólogos, bacharelados, engenharias, pós-

graduação lato sensu e stricto sensu. Além da oferta de cursos de formação inicial e

continuada, cursos de educação a Distância, dentre outros. Segundo Pacheco,

Essa organização pedagógica verticalizada, da educação básica a superior, é um dos fundamentos dos Institutos Federais. Ela permite que os docentes atuem em diferentes níveis de ensino e que os discentes compartilhem os espaços de aprendizagem, incluindo os laboratórios, possibilitando o delineamento de trajetórias de formação que podem ir do curso técnico ao doutorado (PACHECO, 2010, p. 09).

Um ponto importante, além do aumento significativo no número de oferta da

educação profissional e tecnológica, está no novo sentido que se dá, pelo menos

documentalmente, na concepção da educação profissional e tecnológica. Nesse

sentido, o MEC, em 2005, anunciou como compromisso:

Corrigir distorções de conceitos e de práticas decorrentes de medidas adotadas pelo governo anterior, que de maneira explícita dissociaram a educação profissional da educação básica, aligeiraram a formação técnica em módulos dissociados e estanques, dando um cunho de treinamento superficial à formação profissional e tecnológica de jovens e adultos trabalhadores (BRASIL, 2005, apud SILVA 2012 p. 174).

Na avaliação de Silva (2012), o decreto 5154/04 cumpriu parcialmente com

esta proposta, principalmente com a possibilidade da oferta dos cursos técnicos

integrados ao ensino médio e da obrigação de integração entre a formação técnica e

a formação geral. Mas, também avalia que mesmo com este avanço legal, ainda

existem muitos “entraves”, que dificultam esta interação como, por exemplo, o perfil

dos professores, as estruturas físicas, a estrutura curricular fragmentada, entre

outros pontos, que não permitem maior liberdade para a efetivação de uma

educação, de fato, transformadora. Nesse aspecto, Pacheco (2010, p. 09) afirma

que as propostas dos IF’s “devem ir além da compreensão da educação profissional

e tecnológica como mera instrumentalizadora de pessoas para ocupações

determinadas por um mercado”. O autor reforça que a emancipação dos jovens está

entre um dos principais objetivos dos IF’s. Para ele, a perspectiva da educação para

81

o trabalho nos IF’s é entendida como “potencializadora do ser humano, enquanto

integralidade, no desenvolvimento de sua capacidade de gerar conhecimentos a

partir de uma prática interativa com a realidade, na perspectiva de sua

emancipação” (PACHECO, 2010, p. 22).

Além da expansão na educação profissional e tecnológica, Frigotto, Ciavatta e

Ramos (2005, apud Silva 2012) ainda acrescentam que na política da educação

profissional, a partir da eleição do governo do Partido dos Trabalhadores, além do

plano de expansão dos IF’s, houve a realização de alguns programas, já

anteriormente citados, como a integração do Programa Nacional de Integração da

Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de

Jovens e Adultos (Proeja); o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem);

o Programa de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec); dentre outros

programas, que representam uma expansão significativa na oferta da educação

profissional para a juventude. Mas que, segundo esses autores, estão desintegrados

de outras políticas públicas, e, praticamente sem terem sido discutidos e

encampados pela comunidade, extremamente dependentes de dotação

orçamentária estatal.

O que os torna fragilizados em cenários de turbulências político-econômicas,

ou mesmo das figuras que ocupam posições decisórias na esfera estatal, ou seja,

são políticas públicas, mas não têm se configurado como políticas de Estado. Se

mostram, dessa forma, mais bem caracterizados mesmos como “programas”, a

nomenclatura como são adjetivados oficialmente, o que indica seu caráter de

provisoriedade. Para Marinho e Façanha (2001, p. 01), algumas características dos

programas sociais são: “a. elaborados para atender a objetivos genericos, multiplos,

e de dificil verificacao a priori”; “b. à sua descentralização operacional, envolvendo

entidades e instituições de administração complexa e burocráticas, dificultando a

coordenação das ações”; “c. às regras de financiamento e de repasses adotadas

que, em geral, não são integradas e estruturadas pelos objetivos que se pretende

estimular”; d. aos períodos de vigências dos programas, que nem sempre

claramente postos, e geralmente não alinhados aos fechamentos dos anos fiscais e

orçamentários, redundam numa instabilidade de recursos financeiros, que ameaça a

continuidade dos programas.

82

Sobre a falta de integração entre esses programas, Macedo (2012, p. 225)

identifica como um problema em relação a essa forma de fazer políticas públicas,

que “As propostas específicas para a juventude ainda são vistas como um conjunto

de caixinhas (...)”, colaborando para uma fragmentação das políticas públicas para a

juventude, faltando conjunto e integralidade nas propostas, que surgem de formas

isoladas e que não dialogam.

Segundo Silva (2012), é preciso refletir sobre o que foi e está sendo feito

tanto política quanto ideologicamente sobre os investimentos na educação

profissional, no sentido de entender se verdadeiramente estão trazendo a ação

transformadora para a juventude, no que diz respeito à autonomia e emancipação,

como está proposto em documentos e diretrizes dos IF’s; como será adiante tratado.

Segundo o autor, o crescimento da rede federal de educação profissional é uma

oportunidade histórica para “oxigenar” o debate sobre a educação profissional

transformadora, para além dos interesses do capital.

Dentre os objetivos dos IF’s, destacamos aqui o inciso V do artigo 7º da Lei nº

11.892, propõe o estímulo e apoio a processos educativos que levem à geração de

trabalho e renda e à emancipação do cidadão na perspectiva do desenvolvimento

socioeconômico local e regional. Pode-se entender que a expansão da rede federal

de educação profissional e tecnológica pode ser uma boa oportunidade para

incentivar o debate acadêmico e político, para mobilizar não só docentes, mas

discentes e gestores, como também toda a comunidade escolar para a construção

de alternativas verdadeiramente emancipatórias.

Os discursos da maioria das instituições de educação profissional, seguidos

das legislações que as regem, referem-se à educação para a emancipação, mas é

preciso investigar se na prática essas instituições, em especial o Instituto Federal de

São Paulo no campus aqui investigado, estão envolvidos com a formação integral do

alunado, que levaria à autonomia e à emancipação do jovem, e que possibilite

também uma formação para o trabalho e não para o emprego.

83

1.4.2. Das possibilidades para uma educação profissional que seja

emancipadora

Cada Instituição de educação possui suas diretrizes traçadas por legislações

próprias, de ordem externa, assim como documentos importantes, que normatizam

as práticas e os que são constituídos internamente, como, por exemplo, o Projeto

Político Pedagógico (PPP), os Projetos Pedagógicos dos Cursos (PPCs), dentre

outros. Esses documentos têm como propósito estabelecer a forma de trabalho que

cada instituição de educação adotará, baseadas em seus princípios ideológicos,

metodológicos, formas de avaliação, enfim, os pressupostos que as direcionam.

A questão está em entender se a proposta posta na legislação, em especial

no caso da educação profissional para os cursos Técnicos Integrados ao Ensino

Médio, vigora, ou se está ainda conduzida e amalgamada, na prática cotidiana, com

os princípios de uma educação acrítica e passiva, às quais se encontra subjacente a

concepção de que a função da educação profissional é preparar para o emprego,

oferecendo, dessa forma, condições de mobilidade social para jovens de baixa

renda, conforme posto por Prestes e Véras (2009). Ou, ainda, segundo a concepção

expressa por Wermelinger; Machado e Filho (2007), de que aqueles que estão na

educação profissional não teriam condições, de várias ordens, para dirigirem-se à

educação superior, valendo-se, assim, da educação profissional como

“terminalidade” dos estudos.

Ou, ainda, se no momento em que se cria o Projeto Político Pedagógico, os

Projetos Pedagógicos de Cursos e outros documentos direcionadores, se pensa em

uma atuação para que a educação profissional transforme a situação de

conformidade com a natureza das coisas, e que traga para os educandos a

possibilidade de refazerem suas histórias por meio de uma educação

transformadora, que possibilite que eles possam configurar novas realidades de

vida, pautadas na liberdade, na democracia e no empoderamento dos educandos.

Não pretendemos, novamente, adotar uma postura ingênua, de que a educação, por

si, será capaz de operar transformações radicais na sociedade, mas acreditando que

pode ser impulsionadora de outras formas de conceber a realidade, a partir daí,

gerando-se um movimento de transformação.

84

Empoderamento é um termo continuamente referido nos discursos ligados à

educação emancipatória. Pinto 1998 (apud Carmo, 2007) define empoderamento

como sendo um processo de reconhecimento, criação e utilização de recursos e de

instrumentos pelos indivíduos, grupos ou comunidades, que se traduzem em

acréscimo de poder. Seja esse poder de ordem psicológica, sociocultural, político

e/ou econômico, levando a aumentar a eficácia dos sujeitos no exercício da

cidadania. Para uma educação que empodere é necessário considerar que não se

“dá poder” ao outro, não se pode pressupor que esta ou aquela instituição ou

educador dará, oferecerá o empoderamento aos seus educandos. Isto deve fazer

parte do princípio da instituição, que em suas práticas cotidianas, trabalhará e

constituirá as condições para que a construção do empoderamento dos seus

educandos se efetive. Isso exige constituir espaços de diálogo, de tomadas de

decisão coletivas, do exercício de uma gestão participativa e democrática, o que se

traduz não só no empoderamento dos estudantes, mas também dos docentes,

funcionários e comunidade acadêmica. Assim, se impulsiona o compartilhamento do

empoderamento com famílias, comunidades e outros ambientes sociais, para

semear e cultivar a transformação social.

A proposta da pesquisa não visa pensar na revolução da educação

profissional, como salvadora do mundo. Mas tem em seu propósito entender, na

prática, como se dá a formação para a Educação Profissional Técnica de Nível

Médio nos cursos Integrados, sem ter a ideia inocente de que a instituição escolar é

a única responsável pela formação da consciência crítica dos indivíduos. Porém,

pensamos nesta como sendo um dos espaços que pode propiciar reflexões para a

formação voltada para a autonomia e emancipação. Oliveira (2012) ressalta que

para que a educação profissional não fortaleça a alienação dos jovens é preciso que

haja a indissociabilidade entre o pensar e o fazer na educação profissional, o que

poderá favorecer seu potencial criativo.

Azevedo (2009, p. 9) afirma que “a educação profissional tem um importante

lugar na educação”. Mas não pode ser entendida como um molde que apenas “[...]

hipervaloriza a aprendizagem da manipulação de objectos técnicos”. Para o autor, a

educação profissional deve valorizar “[...] a aprendizagem e a capacidade de diálogo

com os outros sobre os contextos, os objectos, o seu uso, as suas finalidades, as

85

influências recíprocas entre as partes e o todo, ou seja, sobre um quadro mais vasto

de uma aprendizagem tecnológica (tecnos+logos)”, de forma que favoreça a

manifestação da própria humanidade.

É preciso reflexão sobre os aspectos relevantes para o entendimento de

como os jovens podem desenvolver criticidade em suas práticas para não se

tornarem alienados por uma sociedade que busca manter o poder. Na proposta de

uma educação transformadora, os jovens devem colocar-se como agentes de

mudanças. Como destacou Oliveira (2012, p. 96):

Não entendo a escola como local de confecção de mentalidades revolucionárias ou anticapitalistas, mas considero que a passagem pelos bancos escolares ou pelos espaços educativos deve propiciar aos indivíduos o domínio de saberes qualificadores para uma intervenção social mais consciente e mais autônoma.

Rodrigues (2011), baseado no pensamento de Marx e Engels sobre a questão

da educação para a emancipação, nos faz refletir sobre qual o papel que a

educação exerce nas escolas. Entendida pelos autores como uma valiosa arma a

favor da emancipação do ser humano, a educação também mostra-se com poder

suficiente para alienar os sujeitos, e se será emancipatória ou alienante dependerá

ainda dos contextos dos demais grupos sociais com os quais o aluno estará em

contato. Pois a educação não é neutra, e pode revolucionar, da sua maneira, as

situações as quais alguns grupos sociais são expostos, ou apenas manter a relação

de desigualdade social, com base no poder aquisitivo e intelectual que os sujeitos

possuem, com lugares e condições distintas.

Assim, volta-se a questão sobre que proposta de educação profissional se

pratica no Instituto Federal de São Paulo no campus investigado? O que será

discutido na terceira parte desta pesquisa, por meio da análise dos dados

construídos ao longo dessa investigação, principalmente a partir dos encontros

presenciais com os professores do campus, que vivem este questionamento

diariamente, especialmente nos cursos Técnicos Integrados ao Ensino Médio. Há

diversos elementos envolvidos nessa questão, tanto quanto ao que os próprios

alunos esperam/buscam em sua formação profissional, até o que os professores

entendem por educação profissional. A educação praticada está valorizando apenas

a formação para o emprego que visa abastecer o mercado de trabalho mantendo

86

uma situação de poderes já estabelecida, considerando, com Frigotto (2001, p.80)

que:

Neste horizonte a educação em geral e, particularmente, a educação profissional se vincula a uma perspectiva de adestramento, acomodação, mesmo que se utilizem noções como as de educação polivalente e abstrata. Trata-se de conformar um cidadão mínimo, que pensa minimamente e que reaja minimamente. Trata-se de uma formação numa ótica individualista, fragmentária - sequer habilite o cidadão e lhe dê direito a um emprego, a uma profissão, tornando-o apenas um mero “empregável” disponível no mercado de trabalho sob os desígnios do capital em sua nova configuração.

Ou propõe e pratica uma formação para o trabalho, que vai muito além da

profissionalização, que visa à formação integral dos jovens?

Para uma educação profissional emancipadora, que objetiva proporcionar a

formação integral dos alunos, Frigotto (2001) aponta para cinco aspectos essenciais

a serem contemplados. São eles: que esteja pautada pela solidariedade e igualdade

entre os seres humanos; que a educação básica seja pública, laica, unitária, gratuita

e universal, centrada na ideia de direito subjetivo do ser humano; que seja uma

educação técnico-profissional sustentável e indissociável da educação básica; que

não se reduza a Educação Profissional como política focalizada apenas na geração

de emprego, ou preventiva ao desemprego e, por fim, que seja um processo que

articule organicamente as relações sociais de produção e as relações políticas,

culturais e educativas elaboradas com e para a sociedade, garantindo a participação

dos próprios interessados na elaboração, execução e avaliação dos processos.

Nesse sentido, Gadotti (2012) aponta para a necessidade de unir o ato

produtivo e o ato educativo, explicando que a unidade entre educação e o trabalho

deveria ser admitida como um meio decisivo para a emancipação do ser humano.

Assim, a interação entre o ensino e o trabalho seria a maneira dos homens e

mulheres saírem da condição de alienação. Segundo Gadotti (2012), Marx se

opunha à “profissionalização”, reservada unicamente para a classe trabalhadora,

pois defendia que a educação deveria ser pública, com acesso para todos; a

educação gratuita, de responsabilidade do Estado; e a educação pelo trabalho.

Frente a esta proposta de educação para a emancipação, Ribeiro (2003, apud

OLIVEIRA; ALMEIDA 2009, p. 163) compreendem que:

87

Hoje não se discute mais a educação somente para o trabalho, mas a educação integral do homem para o trabalho e para a cidade. À medida que o conhecimento passa a ser o elemento-chave do novo paradigma produtivo, a transformação educacional torna-se um fator fundamental no desenvolvimento dos seus requisitos básicos: capacidade inovadora, criatividade, integração e solidariedade. Uma nova abordagem para a educação traz implícita a necessidade de uma nova organização institucional, ou de uma reformulação de papéis dos atores envolvidos no processo da educação.

Mas até que ponto as instituições de educação profissional também se

envolvem com estas mudanças? De que forma isso se dá? Como se posiciona em

relação à dicotomia, apontada por Desaulniers, entre o “mundo da formação”,

especialmente aquela humanista, e o discurso da “qualidade total” da gestão

empresarial:

Em face dessa realidade, enquanto o mundo do trabalho defronta-se com as orientações que configuram a Qualidade Total (TCQ), que se efetiva através de um controle rigoroso da organização do processo de trabalho e da gestão, baseada numa metodologia que se apoia nos resultados das organizações junto ao mercado, o mundo da formação está impelido a produzir/formar o trabalhador que corresponda a tais exigências. A desarticulação que caracteriza esses dois mundos, mais ou menos acentuada dependendo da época, constitui-se hoje em um obstáculo a essa nova dinâmica imposta pelo avanço do capitalismo, tanto para o capital como também para o trabalho. E, nesse contexto, a produção de trabalhadores com uma nova “performance” exige estratégias de cunho pedagógico, que sejam devidamente planejadas, pois não há mais como esperar por aquela competência produzida naturalmente, de forma espontânea como, em geral, vinha acontecendo até bem pouco tempo (DESAULNIERS, 1997, p. 55).

Face à necessidade de mudança e de desmistificação da concepção da

educação profissional como aquela que assume, quase que automaticamente, o

sentido de “preparação para o trabalho”, para o que concorre, fortemente, seu

retrospecto histórico no Brasil, há a necessidade de compreender as novas

proposições da educação profissional. O decreto 5154/04, alterado pelo decreto nº

8.268, de 2014, reconhece a diferença entre trabalho e emprego quando, dentre as

premissas da educação profissional, em seu parágrafo II, aborda a articulação que

precisa ser feita dos esforços nas áreas da educação, do trabalho e do emprego, e

da ciência e tecnologia. Ainda, neste mesmo artigo, no parágrafo III, reconhece-se a

centralidade do trabalho como princípio educativo. O que, de certa forma, pode nos

mostrar que a concepção da educação profissional, que inicialmente se pautava

numa visão tecnicista, pode estar voltando seu olhar, contemporaneamente, para

88

uma educação profissional pensada na formação também para o mundo do trabalho,

mas não unicamente para o trabalho ou para o emprego. Sobre esta nova proposta

para a educação profissional, Oliveira (2012) enfatiza que a política da educação

profissional, que fundamenta o trabalho como princípio educativo, propõe uma

formação integradora e integrada, que pode contribuir para um projeto de formação

humana para além do trabalho. Preocupação compartilhada por Moura:

[...] é fundamental que o professor atente para o fato de que o trabalho como princípio educativo não se restringe ao “aprender trabalhando” ou ao “trabalhar aprendendo”. Está relacionado, principalmente, com a intencionalidade de que através da ação educativa os indivíduos/coletivos compreendam, enquanto vivenciam e constroem a própria formação, o fato de que é socialmente justo que todos trabalhem, porque é um direito subjetivo de todos os cidadãos, mas também é uma obrigação coletiva porque a partir da produção de todos se produz e se transforma a existência humana e, nesse sentido, não é justo que muitos trabalhem para que poucos enriqueçam cada vez mais, enquanto outros se tornam cada vez mais pobres e se marginalizam – no sentido de viver à margem da sociedade (MOURA, 2014, p. 99).

No contexto de grandes transformações capitalistas na atualidade, Oliveira

(2012) traz a discussão de que a educação profissional se revela também como um

fator de desenvolvimento, de competitividade, de qualidade e produtividade,

necessárias à nova cultura do trabalho. Essas mudanças trouxeram a necessidade

de mais investimentos na formação profissional, que busca agora não apenas um

profissional que saiba exercer mecanicamente uma determinada função. A demanda

hoje é por profissionais que tenham capacidade de pensar, agir, decidir, que tenha

responsabilidade. Observando que isso também pode se constituir numa “armadilha”

para as esperanças de uma educação emancipatória, pois ao se priorizar as

capacidades contemporâneas requeridas ao mercado, pode-se, mais uma vez,

constituir-se uma educação profissional alienante, daí a importância de uma

formação que vai além da preparação para a formação de um bom profissional, pois

este poderá se tornar apenas um executor de tarefas.

Assim, é necessária, para não cair nessa “armadilha”, que se pense em uma

educação para a vida. Silva (2012) aponta para a necessidade de o sistema

educacional dar ênfase à educação ao longo da vida e reforça que seja pública,

gratuita, de qualidade e participativa. Que esta nova concepção de educação

profissional assuma o compromisso de superar os processos de exclusão social,

89

que encontre políticas públicas de educação e trabalho que valorizem e pratiquem a

construção da autonomia e emancipação da juventude brasileira. Sobre a educação

ao longo da vida Gadotti (2009, p. 32) compreende que:

A educação ao longo de toda a vida implica ensinar a pensar, saber comunicar-se, saber pesquisar, ter raciocínio lógico, fazer sínteses e elaborações teóricas, saber organizar o seu próprio trabalho, ter disciplina para o trabalho, ser independente e autônomo, saber articular o conhecimento com a prática, ser aprendiz autônomo e a distância... enfim, adquirir os instrumentos necessários para continuar aprendendo sempre.

O estatuto da juventude, em seu artigo 2º, cita como primeiro princípio a

promoção da autonomia e emancipação dos jovens. E que a emancipação destes

“refere-se à trajetória de inclusão, liberdade e participação do jovem na vida em

sociedade” (BRASIL, 2013). Sobre a questão da autonomia, Freire (1996), em

“Pedagogia da Autonomia”, trata da necessidade de se respeitar a autonomia,

entendida como a consciência de quem decide os rumos do seu devir, e a dignidade

do educando, o que ele considera um “imperativo ético”. Uma educação para a

autonomia não é um favor que se concede, mas algo que respeita a identidade do

educando. Que a consciência do ser inacabado, constantemente ressaltada em seu

livro, traga reflexões sobre a necessidade de liberdade do educando para que possa

construir, aos poucos, a sua autonomia, o que pode levar à emancipação.

Pacheco (2010, p. 23), ao abordar a autonomia, afirma que o conceito

pressupõe “liberdade de agir ou, em outras palavras, a possibilidade de autogestão,

autogoverno, autonormação. Exprime também certo grau de relatividade, pois se é

autônomo sempre em relação a outrem”. Assim como também Gadotti (2004), ao

afirmar que o significado de educar, que ele acredita ser a habilidade de

potencializar ao educando a capacidade de buscar respostas para suas perguntas,

se confunde com o formar para a autonomia. E, neste sentido, a educação deve ser

“autoeducação”. Ele entende que autonomia está associada à liberdade e, dessa

forma, traz a seguinte definição: ‘’autonomia vem do grego e significa capacidade de

autodeterminar-se, de autorrealizar-se [...] autonomia significa autoconstrução,

autogoverno [...] e que, portanto, será sempre relativa e determinada historicamente”

(GADOTTI, 2004, p. 10).

90

A formação na educação profissional deve ser voltada para a emancipação e

para o enfrentamento da alienação a que muitos brasileiros são sujeitados. Dessa

forma, a educação deve desenvolver-se nas múltiplas dimensões do humano, e

nesta perspectiva “o sujeito juvenil passa a ser um ator político-chave da

transformação, como sujeito em emancipação e emancipador” (SILVA, 2012, p.

176). Azevedo (2009) reforça essa posição, ressaltando que as escolas, os Institutos

Federais de Educação Profissional e Tecnológicas e outras instituições de

educação, devem ser entendidos como lugares que oportunizem e assumam a

responsabilidade de construir com os educandos o ensino voltado para a

cooperação, a autonomia, a liberdade e a emancipação.

Por estes apontamentos iniciais, é possível se ter ideia da carga de

paradigmas que a educação profissional carrega no âmbito do espaço brasileiro,

repercutindo nas dimensões administrativa, política, histórica, cultural e pedagógica.

A partir dessas reflexões iniciais percebe-se a importância de discutir como se dá o

entendimento desta modalidade de ensino nos Institutos Federais e como ela

acontece na prática.

91

PARTE II. A formação docente e as especificidades necessárias

para atuar na educação profissional técnica de nível médio

Em um cenário de uma sociedade, entendida hoje pela Organização das

Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura - UNESCO como Sociedade do

Conhecimento, a informação está presente em tempo real a todo o momento e em

qualquer lugar. Tendo no conhecimento o seu princípio de poder, as instituições de

educação, incluindo aquelas de educação profissional, não se sustentam mais sobre

a ideia do “enciclopedismo”, como forma de garantir a boa formação de seus alunos.

Pois, se a informação está ao alcance de quase todos, não faria sentido frequentar

uma instituição de educação apenas para este fim. Por outro lado, também é uma

sociedade em que o conhecimento é a “moeda de troca”, ou seja, quem detém o

conhecimento, quem o valida como “correto”, quem tem os meios para produzi-lo e

divulgá-lo, detém mais poder. As instituições de educação, inclusive aquelas de

educação profissional, precisam assumir uma nova postura e uma nova perspectiva

no que se refere à educação, em nosso caso, a educação profissional.

Numa sociedade que se organiza em torno da volatilidade gerada pela

crescente velocidade de produzir e disseminar informações, Bauman (2009) em

entrevista a Porcheddu (2009), considera possível utilizar o temo modernidade

líquida. Nessa concepção, o autor faz uso da metáfora da fluidez dos líquidos para

explicar a impermanência, volatilidade e flexibilidade da modernidade (BAUMAN,

2013). Essa modernidade líquida requer novas posturas das instituições em todos os

aspectos, principalmente na mudança de concepção do que se entende por

educação e, consequentemente, na transformação das práticas docentes. Em se

tratando da educação profissional, a mudança deve acontecer também na

concepção do que se entende como educação profissional. Que deve ir muito além

do simples ato de o professor, “detentor de todo o saber”, “passar” seus

conhecimentos para tentar instruir seus alunos sobre uma determinada profissão. A

educação profissional, como está proposta em documentos direcionadores

contemporâneos, traz aquilo que acreditamos seja a melhor forma da educação sair

da condição de reproducionista da desigualdade social. Essa foi incorporada pela

escola, e para que a escola se transforme precisa propiciar a descristalização e a

92

mudança de paradigmas, em prol de uma sociedade mais justa. O que,

consideramos, está na proposta da pedagogia crítica, que, juntamente com a

educação sociocomunitária, sustenta a discussão teórica dessa investigação:

Muchos de los partidarios del modelo reproduccionista, consideran que existe una correspondencia entre la escuela y el universo económico (ya que la función primordial de los centros educativos es calificar la fuerza de trabajo para el mercado laboral, según las necesidades de la clase poseedora de los medios de producción), pero al mismo tiempo estiman que la fuerza laboral útil es sometida a los valores dominantes, por medio de la reproducción ideológica que ejercen los que poseen el poder y la riqueza (BORQUEZ, 2006, p. 104)

Quando se trata de mudança, não se pode conceber que a simples mudança

nas metodologias pedagógicas seja capaz de trazer transformação. Como nos fala

Freire (1986, p. 48):

O educador libertador tem que estar atento para o fato de que a transformação não é só uma questão de métodos e técnicas. Se a educação libertadora fosse somente uma questão de métodos, então o problema seria mudar algumas metodologias tradicionais por outras mais modernas. Mas não é esse o problema. A questão é o estabelecimento de uma relação diferente com o conhecimento e com a sociedade.

É necessária uma mudança de concepção, que passe por momentos de

debate e reflexão para que todos os envolvidos no processo, tanto a comunidade

interna quanto a comunidade externa às instituições escolares, destacando nessa

parte os professores que atuam na educação profissional, realmente compreendam

a necessidade da mudança de paradigmas. É preciso que, por meio do processo

reflexivo, haja a tomada de consciência dos professores de que a educação

profissional contribua para a formação holística de seus alunos, não se limitando à

construção de conhecimentos relacionados à área específica de profissionalização,

mas que contribua para a construção de uma educação para a emancipação,

entendendo e responsabilizando-se pelo processo de educação integral dos sujeitos.

Especialmente na educação profissional técnica integrada ao ensino médio, em que

além da formação geral da Base Nacional Comum Curricular, característica do

ensino médio, o professor deve se preocupar com a formação profissional, que

habilite o aluno a se tornar um profissional competente dentro da sua profissão

técnica e, ao mesmo tempo, empenhar-se na formação humanística, que busca

contribuir para a formação ética, humana, solidária, crítica e autônoma dos alunos,

93

ou seja, uma formação integral. De acordo com Kuenzer: “Enfim, ele deverá

promover situações para que seus alunos transitem do senso comum para o

comportamento científico” (KUENZER, 1999, p. 171), sem se esquecer dos

conhecimentos/conteúdos básicos que lhe serão cobrados.

Para melhor organização, essa parte da dissertação será dividida em três

subtemas: o primeiro aborda o histórico da formação de professores para melhor

entender o contexto atual. Existe um preparo docente para atender à modalidade da

educação profissional? Como acontece o processo de entendimento e adaptação

dos professores para se trabalhar com a educação profissional? Os professores têm

formação que se alinham às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

Profissional Técnica de Nível Médio? O que a legislação prevê sobre as exigências

para formar professores para atuarem nesta modalidade de educação?

Em seguida, é feita uma análise nas Diretrizes para os cursos de Educação

Profissional Técnica de Nível Médio. Por fim, com base em alguns autores como

Rehem (2009), Freire (1987), Kuenzer (2008), Gariglio (2012), Borquez (2006),

Mezirow (2013), dentre outros, trazemos algumas reflexões sobre o que se espera

do “novo” professor para trabalhar com esta modalidade de educação na

contemporaneidade. Estas são algumas das questões que se pretende discutir no

decorrer dessa segunda parte, entendendo que as transformações sociais ocorridas

nas últimas décadas configuram a necessidade de mudanças no que se refere ao

trabalho e nas formas de emprego, que requerem na contemporaneidade um perfil

profissional diferente, com novas competências.

A partir da reflexão desses subtemas, será dada abertura para a discussão da

terceira parte da dissertação, que trata do desenvolvimento da pesquisa, da coleta e

análise dos dados.

2.1. Aspectos históricos da formação de professores no Brasil

Rehem (2009), ao fazer uma pesquisa para tentar compreender o perfil e a

formação para os professores da educação técnica, constata que são raras as

formações específicas para os professores desta modalidade de educação. Ela

aponta que a maioria dos professores que nela atua utilizam-se ainda do “improviso”

pedagógico. Reconhecemos que na contemporaneidade há a exigência de uma

94

formação profissional docente diferente daquela de três décadas atrás, em que

bastava saber executar bem sua função como profissional de determinada área,

para ser entendido como competente para ensinar. Pouco se referia à reflexão, à

criatividade e à colaboração, pois com o surgimento das indústrias, um bom

executor de tarefas correspondia perfeitamente às necessidades do mercado. Como

exposto na primeira parte desta dissertação, atendia-se à qualificação para o

emprego e não à formação para o trabalho.

Segundo Saviani (2009), a necessidade de uma formação do docente foi

apontada por Comenius no século XVII. O primeiro estabelecimento dedicado à

formação de professores surgiu em 1684, em La Salle, em Reims, instituída por São

João Batista como Seminário dos Mestres. Mas somente após a Revolução

Francesa, no século XIX, é que se entendeu o problema da falta de “instrução

popular”. Havendo, então, a criação das escolas chamadas de Normais para a

formação de professores. Em Saviani encontramos que: “A primeira instituição com

o nome de Escola Normal foi instalada em Paris em 1795. Além de França e Itália,

países como Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos também foram instalando, ao

longo do século XIX, suas Escolas Normais” (SAVIANI, 2009, p. 143).

A partir da instalação de escolas “Normais” foi realizada uma separação em

que a Escola Normal Primária se destinava à formação de professores para o ensino

primário e a Escola Normal Superior se destinava à formação de professores em

nível secundário. Em 1802, a Escola Normal de Pisa, que se dedicava aos estudos

de nível secundário, seguindo os moldes de Paris organizava seus estudos sem o

cuidado com a formação didático-pedagógica, pois sua preocupação era com o alto

padrão dos estudos sobre conhecimentos específicos. No Brasil, a preocupação

com a formação para professores acontece após a independência (1822) e pode-se

tentar entender esse seu processo inicial de formação dos professores brasileiros a

partir de alguns marcos, como a Lei das Escolas de Primeiras Letras, promulgada

em 15 de outubro no ano de 1827. Antes dessa lei, tanto no período colonial, pelos

colégios jesuítas, pela reforma pombalina e até nos cursos criados por D. João VI,

não havia atenção com a formação específica para professores. A lei das Escolas

das Primeiras Letras (1827) determinava que os professores deveriam ser treinados

por meio do método mútuo e que aqueles que pretendiam ser professores deveriam

95

cursá-los nas capitais, com investimentos financeiros próprios (BORGES; AQUINO;

PUENTES, 2011).

Com a promulgação do Ato Adicional, em 1834, foi colocada sob

responsabilidade das províncias a instrução primária, que adotava a formação dos

professores, seguindo os moldes europeus, por meio das Escolas Normais. A

primeira Escola Normal do país é instituída um ano depois, no estado do Rio de

Janeiro. Passando nos anos seguintes a serem abertas em outros estados do país,

porém, “[...] tiveram existência intermitente, sendo fechadas e reabertas

periodicamente” (SAVIANI, 2009, p. 144). Essas escolas pregavam uma formação

específica, que deveria seguir os princípios didáticos e pedagógicos daquela época.

O foco estava em que os professores tivessem domínio dos conteúdos, que

deveriam ser transmitidos a seus alunos, sem maiores preocupações com a didática,

com as diferentes formas de aprendizagem, com os contextos que cada aluno vivia,

com o despertar da consciência crítica, com a responsabilidade social e outros

aspectos considerados importantes, contemporaneamente, pela pedagogia crítica.

A ideia da educação como construção do conhecimento, abordada na

primeira parte dessa dissertação, ainda não era considerada. Percebe-se, na

literatura referente a esse período inicial da educação brasileira, a utilização

constante de termos como “treinamento”, “transmissão de conhecimento”,

entendendo que o professor seria o detentor único do saber e os alunos “tábuas

rasas”. O professor se constituindo como o centro do processo pedagógico. A

educação tida como uma via de mão única, na qual o professor era o instrutor, e o

aluno, o aprendiz. Avanço conceitual para a época, mas que foi o precursor da

prática da educação bancária, no Brasil:

Quanto mais se exercitem os educandos no arquivamento dos depósitos que lhes são feitos, tanto menos desenvolverão em si a consciência crítica de que resultaria a sua inserção no mundo, como transformadores dele. Como sujeitos. Quanto mais se lhes imponha passividade, tanto mais ingenuamente, em lugar de transformar, tendem a adaptar-se ao mundo, à realidade parcializada nos depósitos recebidos (...). Na verdade, o que

pretendem os opressores “é transformar a mentalidade dos oprimidos e

não a situação que os oprime”, e isto para que, melhor adaptando-os a esta situação, melhor os domine (FREIRE 1987, p. 39).

Por se tornar alvo de muitas críticas sobre a ineficiência qualitativa e

quantitativa, as Escolas Normais, em especial aquela de Niterói, foi alvo de uma

96

experiência que não durou muito. A proposta de Couto Ferraz, presidente da

Província do Rio de Janeiro em 1849, fechou a Escola Normal de Niterói na tentativa

de substituir as Escolas Normais por professores adjuntos, que modificariam a forma

de atuação dessas escolas. Nesta proposta, futuros professores deveriam passar

um determinado período atuando como ajudantes dos regentes das classes mais

experientes, numa espécie de “estágio”, e após esse período esperava-se um

aperfeiçoamento de seus conhecimentos e práticas de ensino. Porém, não houve

muito êxito e adesão a essa proposta, que cinco anos depois foi retomada pelas

Escolas Normais.

No período entre os anos de 1890 e 1932 houve avanços das Escolas

Normais no Brasil, estabelecendo-se um padrão em sua organização e

funcionamento com a reforma da instrução pública do estado de São Paulo. Em

1890, houve uma tomada de consciência sobre a importância de uma boa formação

docente para melhoria da qualidade do ensino. Essa reforma trouxe dois pontos

importantes: o primeiro se referia ao enriquecimento dos conteúdos curriculares e a

ênfase nos exercícios práticos de ensino. O segundo ponto foi a criação da escola

modelo de São Paulo, que serviu de referência para que as escolas fossem

sistematizadas por uma organização padrão, tanto em seu currículo quanto na

preparação pedagógico-didática, e, assim, entendida como avanço na formação dos

professores em todo o país. Mas, após uma década seguindo a escola modelo e

seus padrões, houve um esmorecimento dessa ideia, por ser entendido que não

houve mudanças significativas no quadro de formação docente.

Inicia-se então uma nova fase na formação de professores, com a abertura

dos Institutos de Educação, que passam a ter preocupação não somente com o

ensino, mas também com a pesquisa. Segundo Saviani (2009, p. 145), os principais

institutos desse período com inspiração na ideia da Escola Nova foram o “Instituto

de Educação do Distrito Federal, concebido e implantado por Anísio Teixeira em

1932 e dirigido por Lourenço Filho; e o Instituto de Educação de São Paulo,

implantado em 1933 por Fernando de Azevedo”. Com o objetivo de transformar as

Escolas Normais em Escolas de Professores, para atender a uma pedagogia que

buscava a formação em seu caráter científico e não somente prático, como nas

propostas anteriores, propôs um currículo que incluía as seguintes disciplinas:

97

1) biologia educacional; 2) sociologia educacional; 3) psicologia educacional; 4) história da educação; 5) introdução ao ensino, contemplando três aspectos: a) princípios e técnicas; b) matérias de ensino abrangendo cálculo, leitura e linguagem, literatura infantil, estudos sociais e ciências naturais; c) prática de ensino, realizada mediante observação, experimentação e participação. Como suporte ao caráter prático do processo formativo, a escola de professores contava com uma estrutura de apoio que envolvia: a) jardim de infância, escola primária e escola secundária, que funcionavam como campo de experimentação, demonstração e prática de ensino; b) instituto de pesquisas educacionais; c) biblioteca central de educação; d) bibliotecas escolares; e) filmoteca; f) museus escolares; g) radiodifusão (SAVIANI, 2009, p. 146).

Os dois Institutos de Educação foram elevados a nível universitário entre os

anos de 1934 e 1935 e passaram a ser referências para a organização dos cursos

de formação dos professores para as escolas secundárias. Com o decreto Lei nº

1.190, de 4 de abril de 1939, organizou-se decisivamente a Faculdade Nacional de

Filosofia da Universidade do Brasil, que foi reconhecida por todo o país originando o

esquema chamado de 3+1 para os cursos de licenciatura e pedagogia, que vigora

até os dias de hoje. Nesse esquema 3+1, os três primeiros anos os estudos são

focados no conhecimento de disciplinas específicas da área de estudo e, no quarto

ano, havia uma preparação voltada para a formação pedagógica. Nesse período, o

modelo de formação dos professores em nível superior perdeu a referência de

origem, em que o suporte era as escolas experimentais, às quais competia fornecer

uma base de pesquisa, que pretendia dar caráter científico aos processos

formativos. Consequentemente, em finais da década de 1930, até meados da

década de 1940, os cursos normais centraram a oferta da formação profissional,

adotando-se “um tratamento de escola profissional para os cursos normais”

(SCHEIBE, 2008).

A partir do ano de 1964, com o golpe militar, foram realizadas algumas

mudanças na formação de professores, dentre essas estando a alteração na

nomenclatura do ensino primário e médio, que passaram a ser chamados de

primeiro e segundo graus. E a substituição das escolas Normais pela habilitação

específica do segundo grau, que habilitaria ao exercício no primeiro grau. Como

reflexos dessas mudanças, em 1972 houve uma divisão no magistério, sendo que

com o curso de duração de três anos o professor estaria habilitado para atuar até o

ensino fundamental I. Com a habilitação no curso de quatro anos, o professor estaria

98

habilitado para lecionar no ensino fundamental II e segundo grau. Devido a tantas

mudanças, que pouco contribuíram para a melhoria da formação docente, no ano de

1982 foi proposto e implantado os Centros de Formação e Aperfeiçoamento do

Magistério (CEFAMs), como proposta de revitalizar as Escolas Normais, mas que

também não tiveram êxito.

No ano de 1971, a lei nº 5692/71 previu que para atuar nas últimas séries do

primeiro grau e no segundo grau, haveria a necessidade de habilitação em nível

superior. No ano de 1980 houve um movimento em favor da reformulação dos

cursos de licenciatura e pedagogia, que lutavam pela “docência como a base da

identidade profissional de todos os profissionais da educação” (SILVA, 2003, apud

SAVIANI, 2009, p. 148). Com esse movimento, foi entendido que os cursos de

pedagogia, além de formarem para os cargos de direção, coordenação e orientação

pedagógica também seriam responsáveis por formar docentes para os primeiros

anos do ensino fundamental. Com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases atual,

em 20 de dezembro de 1996, estabelece-se a formação necessária mínima para

atuar na educação básica e educação superior.

Saviani (2009) reitera sua crítica sobre a falta de linearidade no que se diz

respeito à formação docente no Brasil, assim como tudo que envolve o sistema

brasileiro de educação em que “[...] a precariedade das políticas formativas, cujas

sucessivas mudanças não lograram estabelecer um padrão minimamente

consistente de preparação docente para fazer face aos problemas enfrentados pela

educação escolar em nosso país” (SAVIANI, 2009, p. 148).

Tentamos, até aqui, trazer um retrospecto sobre a formação docente no

Brasil, mas o que pode- se notar é que não é mencionado, durante o percurso da

formação docente, uma preparação ou habilitação para os profissionais que

atuariam na educação profissional. A mesma inconstância com que essa aparece

nos documentos oficiais, e que indica a fragilidade das suas definições e objetivos,

também é encontrada na legislação da formação docente para atuar na educação

profissional. Consideramos que a educação profissional não tinha destaque como

uma modalidade de educação. Compreendendo que ela está presente no Brasil já

há tempos, seria de se esperar que houvesse uma preparação/formação específica

para a atuação nesta modalidade, pois possui muitas especificidades.

99

Como aponta Gariglio (2012), mesmo com todo o crescimento da educação

profissional, em consequência à expansão das indústrias no Brasil, a formação para

os professores para atuarem na educação profissional não alcançou reconhecimento

suficiente para investimentos, reforçando o pouco valor dado a essa modalidade de

educação. Como bem lembra, fica evidente, por meio do Decreto 2208/97, que

permitiu que a presença do professor da educação profissional pudesse ser

substituída pela presença do instrutor ou monitor. Reforçando o valor reducionista do

treinamento como qualificação para o emprego, a que se prestava a educação

profissional proposta naquele período. Mas cujos ecos podem ser encontrados até a

atualidade.

Paulo Freire, com o pensamento de uma proposta diferenciada de educação,

na perspectiva da pedagogia crítica, aliás, como inspirador dela, influenciou bases

teóricas críticas da educação, que podem ser projetadas para a educação

profissional. Um entendimento pioneiro, com um profundo impacto no campo da

educação, com sua publicação em Pedagogia da Autonomia (1996), poderia ser o

disparador para se pensar numa atuação docente diferenciada, e, especialmente,

nos cursos de educação profissional. Destacamos alguns pontos que são

fundamentais em sua proposta: a atuação docente, em que não basta apenas o

saber rigoroso, é preciso que o professor tenha respeito pelos saberes dos

educandos. Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática, pois “A prática docente

crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o

fazer e o pensar sobre o fazer” (FREIRE, 1996, p. 39). Reconhecendo que por meio

da reflexão o professor pode melhorar sua prática. Freire aponta para a importância

de o professor ter respeito pela autonomia do educando, assim como entende que

ensinar exige a convicção de que a mudança é possível:

O mundo não é. O mundo está sendo. Como subjetividade curiosa, inteligente, interferidora na objetividade com que dialeticamente me relaciono, meu papel no mundo não é só o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não sou apenas objeto da história, mas seu sujeito igualmente. No mundo da história, da cultura, da política, constato não para me adaptar, mas para mudar (FREIRE, 1996, p. 74, grifos do autor).

É nessa perspectiva do educador, da educação, e da escola como agente de

transformação, que propomos que uma “nova” visão da atuação docente se estenda

100

para a educação profissional. Que transcenda para além da reprodução de uma

sociedade, em que predomina o capitalismo paralisante, que cria um mundo

desumanizado. Em que o valor está no ter e não no ser e cujo movimento a escola,

que, se não pode constituir-se, isoladamente, como salvadora, também pouco

reage, reforçando essa condição.

Por isso a nossa preocupação com a formação e com a prática do professor

da educação profissional, que pode ser um fator de mudança de paradigmas, ou o

mantenedor dessa cultura. É preciso que se trabalhe com um novo perfil de

professor, que vai muito além de ser bem qualificado no que se refere a sua área de

atuação. É preciso investir em sua formação humana e para atender às

especificidades que a Educação Profissional exige, frente ao cenário contemporâneo

do trabalho. Nas palavras de Kuenzer:

Na transição da hegemonia do paradigma taylorista/fordista de organização e gestão do trabalho para os novos paradigmas, tendo em vista as novas demandas de acumulação que deram origem a um novo regime fundado na flexibilização, configura-se uma nova concepção de educação profissional que, por consequência, traz novas demandas de formação de professores (KUENZER, 2008, p. 20).

Gariglio (2012) aponta para a pouca atenção dada à formação de professores

para atuar na educação profissional, especialmente nos cursos técnicos, pois

atende, de forma superficial, às necessidades específicas desta modalidade de

educação. Há pouco estudo sobre a formação dos professores para a educação

profissional e pouca organização das instituições ou dos próprios educadores em

torno de debates a respeito, que acontecem em momentos específicos para tratativa

do assunto, de forma descontínua e fragmentada. O que reforça a ideia da educação

profissional, que se tinha há décadas atrás, de uma educação especificamente

tecnicista e instrucionista. A desatenção dada à produção intelectual para a

formação de professores da Educação Profissional vem contribuindo para reforçar a

ideia de que esses profissionais não pertencem à área da educação, e que a estes

cabe, apenas, o domínio dos conhecimentos específicos da área de atuação de

forma mecânica e pouco reflexiva. Trazendo novamente a necessidade dessa

pesquisa, que pretende investigar como a educação que se pratica no campus aqui

101

pesquisado, nos cursos técnicos integrados ao Ensino Médio, se coloca em relação

às afirmações de Gariglio, acima referidas.

2.2. Legislação que trata da formação docente para atuar na educação

profissional

Rehem (2009) considera alguns elementos fundamentais para a formação do

professor da educação profissional técnica de nível médio, esses elementos se

dividem em três categorias. A primeira é ter conhecimento aprofundado, experiência

e visão crítica sobre o mundo do trabalho e tudo aquilo que se relaciona com a vida

profissional. A segunda é que o professor tenha domínio pedagógico para dar

significado ao aprendizado, e proporcione aos alunos, que vêm de contextos

diferentes, o interesse e a motivação em aprender e que traga, na proposta de uma

formação profissional, conhecimentos necessários não apenas para desempenhar

uma determinada profissão, mas que contribua para uma formação para a vida

cidadã. E, por fim, que tenha domínio dos conhecimentos específicos de sua área de

atuação.

Mas, para que o professor tenha todas as competências citadas

anteriormente, é necessária uma formação que contemple essas novas exigências.

A questão volta-se, então, para a formação dos professores para atuar na educação

profissional. Há um preparo específico para esses profissionais? O currículo em que

esses professores são formados contempla as especificidades da educação

profissional? Como se dá essa formação? Ao ingressar na educação profissional,

especialmente nos cursos técnicos integrados, os professores se sentem seguros

para atender às expectativas que a educação profissional contemporânea

necessita? Qual a formação inicial e continuada que esse profissional recebe para

trabalhar com educação profissional? Ela é suficiente?

Não questionamos se os professores que atuam nos cursos técnicos

integrados ao ensino médio possuem domínio sobre o conhecimento específico de

sua área de atuação. No caso dos Institutos Federais, o processo de seleção é

rigoroso quanto aos domínios dos conhecimentos específicos e à titulação, sendo

algo que não colocamos em discussão, aqui. Mas, o que nos interessa para essa

102

pesquisa é entender se aqueles outros conhecimentos, fundamentais para a

educação profissional contemporânea, também fazem parte do rol de

conhecimentos docentes e se são, de fato, colocados em prática. Esses

professores, ao ingressarem nos cursos Técnicos Integrados ao Ensino Médio,

compreendem e concordam com a proposta da educação profissional voltada para o

trabalho por meio de uma formação holística, como orientam os documentos

institucionais? Compreendem a importância da formação contínua para acompanhar

as mudanças no trabalho, ou mesmo para as transformações sociais da juventude?

Kuenzer (1999) faz uma observação interessante ao relatar que após tantas

mudanças no mundo do trabalho, e nas políticas educacionais, essas não são

completamente compreendidas, por muitos dos professores que atuam na educação

profissional. Como apontado na primeira parte dessa dissertação, não há ainda

clareza no que se refere às propostas para a educação profissional, o que é

entendido por Wermelinger; Machado e Filho (2007) como uma falta de identidade.

E se a própria instituição de educação profissional não tem claro o que se pretende

com a educação que oferece, é ainda mais difícil para os professores, ao iniciarem

na educação profissional, ter essa compreensão. Nessa perspectiva, é que

pretendemos refletir sobre a formação desses professores, para tentar compreender

as possíveis respostas que poderiam ser dadas às perguntas levantadas

anteriormente.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada em 20 de

dezembro de 1996, e alterada pela Lei nº 12.014, de 2009, estabelece que a

formação necessária para atuar na educação básica é:

Art. 61. Consideram-se profissionais da educação escolar básica os que, nela estando em efetivo exercício e tendo sido formados em cursos reconhecidos, são: (Redação dada pela Lei nº 12.014, de 2009) I – professores habilitados em nível médio ou superior para a docência na educação infantil e nos ensinos fundamental e médio; (Redação dada pela Lei nº 12.014, de 2009) II – trabalhadores em educação portadores de diploma de pedagogia, com habilitação em administração, planejamento, supervisão, inspeção e orientação educacional, bem como com títulos de mestrado ou doutorado nas mesmas áreas; (Redação dada pela Lei nº 12.014, de 2009) III – trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso técnico ou superior em área pedagógica ou afim. (Incluído pela Lei nº 12.014, de 2009) (BRASIL, 1996).

103

E o artigo 62 complementa a formação de professores para atuação na educação

básica, a qual também cabe para os cursos profissionais técnicos de nível médio:

Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade normal (BRASIL, 1996).

Rehem (2009) aponta que na formação docente, especialmente nos cursos

de licenciatura, que deveriam preocupar-se principalmente com a formação de

professores, está longe de ser um preparo como ela chama de “formação para os

formadores de profissionais”. A crítica se baseia na pouca importância que se dá às

disciplinas pedagógicas nos cursos de licenciatura, em que a preocupação está na

formação específica da área. E acrescenta que as universidades, ainda nos dias de

hoje, se preocupam em ensinar seus licenciandos a transmitir o que aprenderam de

forma mais dinâmica, o que não deixa de ser uma reprodução de modelos bancários

de ensino, que pouco favorecem a aprendizagem profissional para o trabalho. A

autora aponta para algumas falhas, que são decisivas para a permanência de uma

formação, que embora pretenda ser mais dinâmica, em seu discurso, ainda tenha

em sua raiz tal base conservadora. Ela considera a fragmentação dos currículos

desses cursos como um dos problemas mais impactantes na formação docente no

Brasil:

[...] a cisão entre a formação nas disciplinas específicas e a formação pedagógica; a dicotomia entre teoria e prática; a dificuldade de influenciar efetivamente os formandos na transformação das práticas escolares; a fragmentação do objeto da formação num currículo constituído por disciplinas estanques que não dialogam entre si (REHEM, 2009, p. 100).

Porém, o Brasil vive historicamente uma escassez de professores, uma vez

que esta não é uma profissão valorizada tanto financeiramente quanto na questão

de reconhecimento. Sendo, então, formados esses profissionais muitas vezes de

forma incompatível com as verdadeiras necessidades de uma formação docente

transformadora:

Esse fato pode ser compreendido, historicamente, pela negligência das políticas educacionais em relação à formação docente para os cursos de ensino profissionalizante, configurada pela dualidade do ensino no Brasil

104

que conduziu o ensino técnico a uma posição subalterna no sistema educacional, realidade que aos poucos tem se transformado em função dos investimentos federais junto à educação Profissional (MOURA, 2014, p. 07).

Segundo Moura (2014, p. 07), a partir de 2008, com a criação dos Institutos

Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, houve um grande aumento da

demanda por professores para atuar nos cursos de educação profissional,

principalmente nos cursos técnicos de nível médio, que correspondem a 50% das

vagas oferecidas em cada um dos 564 campi espalhados pelo país. A orientação na

lei de criação dos Institutos Federais, lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008, no

Art. 7º, parágrafo 1º, é de “ministrar educação profissional técnica de nível médio,

prioritariamente na forma de cursos integrados, para os concluintes do ensino

fundamental [...]”. Sendo que nem todos os professores possuem a formação

adequada para atuar nessa modalidade de educação, contando com professores

com diferentes formações como bacharéis, tecnólogos, engenheiros e licenciados,

uma vez que a exigência, na maioria dos editais, para ingresso do professor nos

Institutos Federais, é de possuir curso superior na área a qual está concorrendo,

variando de acordo com cada edital.

Trazendo, como consequência, a atuação de um grupo heterogêneo de

professores em um mesmo curso, surgindo muitas vezes conflitos no que se refere à

concepção e à prática da educação profissional. Pois, trazem em sua bagagem,

além da formação, suas histórias, culturas, ideologias entre outros aspectos que

compõem o perfil docente. Em alguns casos, acabam atuando de forma

fragmentada, distanciando-se uns dos outros, fazendo com que o curso integrado

não aconteça da forma interdisciplinar, como é proposto.

Com toda essa diversidade de formação dos profissionais, uma das

alternativas é a oferta de cursos de formação pedagógica e continuada, para tentar

proporcionar para esses profissionais maior compreensão sobre as especificidades

da modalidade de educação da qual fazem parte. Como tentativa de minimizar esse

distanciamento na formação dos professores, foi implementada a Resolução

CNE/CEB Nº 02/97, para tentar atender a ausência de formação pedagógica dos

professores que ingressaram nos Institutos Federais e que não possuíam

licenciaturas para cumprir em caráter especial a complementação/formação

pedagógica, que habilitará o professor a formação equivalente a de um licenciado.

105

Vale ressaltar que não se sabe muito sobre a eficiência dessa

complementação/formação pedagógica, pois há pouco estudo a respeito, havendo

espaço para uma pesquisa específica para esse assunto. E também não

entendemos como negativo o fato de haver professores com diferentes formações

lecionando em um único curso, pois compreendemos que a diversidade contribui

para expandir as possibilidades educativas, ampliar as concepções de mundo, e

enriquecer o curso com conhecimentos e experiências diversas, que podem se

complementar. Compreendemos que talvez o que se necessita nesses casos é da

promoção de momentos específicos, como grupos de estudos, encontros

pedagógicos, projetos de formação interdisciplinares ou transdisciplinares, cursos de

formação continuada, entre outros, que promovam a reflexão, o compartilhamento

de experiências, entre outras ações que propiciem o alinhamento da proposta de

educação da instituição, para que o curso realmente seja integrado e caminhe em

direção à oferta de cursos de qualidade, que propiciem tanto a formação profissional

como a formação humana e cidadã.

Moura (2014) usa a expressão “subalterna” ao se referir à forma como o

ensino técnico é considerado no sistema educacional. Conceito que a pedagogia

crítica propõe-se a discutir, como uma de suas principais lutas em favor da

transformação da desigualdade educacional e social existentes. Pois, na medida em

que a escola é reprodutora do mundo capitalista na qual está inserida, mantém ou

reforça a relação ideológica, que Freire (1987) chama de relação entre opressor e

oprimido. Quando se associam às problemáticas do ensino técnico e da preparação

para o trabalho à oferta desses cursos para aqueles com poucas “opções” de

mobilidade social, entramos num processo de recrudescimento dessa posição de

subalternidade. Nessa relação, os opressores desumanizam os oprimidos como

forma de dominação, e como decorrência desse processo desenvolve-se uma

“paralisia”, que “incapacita” a sair da condição de subalternidade em que foram

colocados. Nesse sentido, Freire (1987, p. 32) trata da condição de passividade, a

qual os oprimidos são colocados, de forma inconsciente: “Até o momento em que os

oprimidos não tornem consciência das razões de seu estado de Opressão “aceitam

fatalisticamente” a sua exploração”. E destaca que os diálogos e reflexões críticas e

libertadoras devem acontecer com os oprimidos, e pouco a pouco, ir construindo

106

uma rede de empoderamento que poderá levar à emancipação. Pois, para o autor,

“(...) a reflexão, se realmente reflexão, conduz à prática” (p. 33).

A Lei nº 11.892, 29/12/2008, que cria os Institutos Federais, traz como

atribuição para os Institutos Federais a oferta de Educação Profissional Técnica de

Nível Médio, Tecnológica de Nível Superior, Licenciaturas, cursos de Formação

Inicial, Continuada e de cursos para jovens e adultos (PROEJA), além de poderem

também oferecer cursos de bacharelado, engenharias, e cursos de pós-graduação

Lato Sensu e Stricto Sensu. O que implica e exige dos professores ter competências

para atuar nas diferentes áreas do conhecimento, podendo transitar desde os cursos

de Nível Médio até os cursos de Pós-Graduação, já que não há separação entre os

professores dentro do IF. E, segundo Carvalho e Souza (2014, p. 888): “Esta

complexidade na oferta de educação profissional e tecnológica, abrangendo níveis e

modalidades distintos, não veio acompanhada de políticas de formação docente”.

Segundo a Resolução Nº 6, do ano 2012, que define as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação Profissional, no que se refere à formação

docente para atuar nesta modalidade de educação, em seu Art. 40, trata: “A

formação inicial para a docência na Educação Profissional Técnica de Nível Médio

realizar-se-à em cursos de graduação e programas de licenciatura ou outras formas

(...)”. Ainda nesse artigo, o parágrafo 2º, aponta que para aqueles professores não

licenciados, “é assegurado o direito de participar ou ter reconhecido seus saberes

profissionais em processos destinados à formação pedagógica ou à cerificação da

experiência docente”, podendo ser equivalente às licenciaturas excepcionalmente

cursos de pós- graduação lato sensu, que abarque formação pedagógica;

excepcionalmente para os professores que tenham mais de 10 anos de experiência

docente como forma de reconhecimento dos seus saberes; e na obtenção de uma

segunda licenciatura, mesmo que esta não seja a que o professor foi aprovado em

concurso para lecionar. A preocupação com a qual nos deparamos, nesse artigo, é

que os prazos para que se cumpram essas excepcionalidades, ou seja, para que os

professores atendam a esta resolução, é até o ano de 2020. Para uma lei que foi

criada em 2008, como é o caso da criação dos IFs, verifica-se um déficit de 12 anos

da oferta desses cursos. Reforçando que não entendemos que, com isso, os

professores que ora atuam na educação profissional não sejam competentes para o

107

exercício de suas atividades, mas preocupamo-nos como a forma com que os

professores se preparam para a educação profissional, havendo muitas vezes,

dificuldades para atender às necessidades que esta modalidade de educação

necessita.

Entendendo que há professores que são engenheiros, licenciados,

graduados, tecnólogos entre outros, em suas formações iniciais, exercendo a

docência em um mesmo curso, há de se preocupar com o posicionamento e a

concepção que cada um carrega consigo sobre o que é educação e o que é

educação profissional, pois balizadores daquilo que ele leva para a sala de aula, e

marca sua prática pedagógica. Em se pensando na Educação Profissional Técnica

de Nível Médio como uma possibilidade de formação integral para a autonomia e

emancipação, de que formas pensam e propõem sua efetivação?

Na contemporaneidade, há a necessidade de uma concepção de educação,

por parte dos professores, para que haja mudanças no sistema de ensino-

aprendizagem, que vem mostrando-se uma face perversa na contribuição da

manutenção da desigualdade educacional e social. Espera-se deles que ajudem na

tomada de consciência dos seus alunos, para que enxerguem e construam

subsídios para sair da condição de alienação, em que muitas vezes se encontram.

Sobre o modelo reproducionista e as relações de poder estabelecidas no cotidiano

escolar, Bórquez (2006, p. 103) nos afirma:

En suma, los modelos reproduccionistas consideran a la escuela como um apéndice ideológico del Estado, que tiene corno función principal reproducir las relaciones de poder. También estiman que la escuela es un instrumento que desempeña un papel reproductor de las relaciones sociales y culturales

dominantes.

O que acreditamos seja uma forma de transformação, a qual a pedagogia

crítica se propõe a discutir, é a resistência contra o sistema capitalista, que

condiciona os sujeitos para uma situação de passividade, e na luta, por parte dos

educadores e de todos os envolvidos, para reverter a condição que a escola

assumiu. Principalmente nos cursos técnicos, que acabam sendo entendidos por

muitos como um favor para os mais pobres e “desvalidos de sorte”, como forma de

manter a ordem estabelecida pela elite. Para que haja uma mudança nesse cenário,

Kuenzer (2011 apud Moura 2014) esclarece que mesmo o professor estando

108

submetido ao capital, ele pode contribuir para a transformação da realidade. Como

formadores, podem contribuir para a formação de sujeitos autônomos, que sejam

capazes de compreender criticamente as relações estabelecidas pelo capitalismo e

que possam como seres emancipados, resistir e somar forças para também reverter

e superar essa situação. Como afirma Borquez (2006, p. 109) sobre a pedagogia

crítica contemporânea, que “(...) en su vertiente comunicativa, es que las clases

subalternas tienen la capacidad de resistir à la hegemonía dominante, más aún,

tienen la capacidad de proponer nuevas concepciones del mundo”.

Como crítica a uma não especificidade para a formação de professores e a

todos os pontos “fracos” na formação desses profissionais, é preciso conhecer

também o que a legislação atual normatiza sobre a Educação Profissional Técnica

Integrada ao Ensino Médio. E de que forma as bases legais contribuem para uma

educação profissional transformadora e emancipadora. Ou não...

2.3. Das diretrizes que orientam a educação profissional técnica integrada ao

ensino médio

Segundo a Resolução Nº 6, de 20 de setembro de 2012, que define as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Médio, a

Educação Profissional Técnica de Nível Médio pode acontecer de maneira articulada

ou concomitante ao Ensino Médio. Para nosso enfoque, optamos pela forma

articulada integrada. Esses cursos são planejados seguindo o Catálogo Nacional de

Cursos (CNC) mantidos pelos órgãos do MEC e Classificação Brasileira de

Ocupações (CBO), que tratam da parte profissionalizante. Indicando qual a carga

horária necessária para o curso, a infraestrutura mínima necessária, o campo de

atuação a que será habilitado o concluinte, quais as possibilidades de certificação

intermediária em cursos de qualificação profissional, se existem possibilidades de

formação continuada em cursos de especialização técnica no itinerário formativo e

possibilidades de verticalização para cursos de graduação nesse itinerário. Essas

diretrizes devem direcionar a construção do Projeto Pedagógico dos cursos técnicos.

Em se tratando dos cursos integrados ao Ensino Médio, estes são orientados

também pela Resolução Nº 2, de 30 de janeiro de 2012, que trata das Diretrizes

109

Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, que orientam aquilo que se refere à

Educação Básica. Sendo duas orientações/diretrizes diferentes, uma vez que os

cursos Técnicos Integrados ao Ensino Médio seguem uma orientação que se refere

à parte profissionalizante e outra que se refere à educação básica, a Resolução Nº 6

(2012) é uma tentativa de fazer a junção dessas duas diretrizes, a fim de que haja

integração entre as duas propostas e se faça um curso realmente integrado.

Em seu Art. 5º, a Resolução Nº 6 explicita a finalidade dos cursos de

Educação Profissional Técnica de Nível Médio, que “têm por finalidade proporcionar

ao estudante conhecimentos, saberes e competências profissionais necessários ao

exercício profissional e da cidadania, com base nos fundamentos científicos-

tecnológicos, sociohistóricos e culturais”. Ou seja, propõe uma formação integral,

que ao mesmo tempo em que forma para uma determinada profissão técnica, forme

também para a vida. Assim, trazemos novamente para nossa discussão a questão

de como se efetiva essa proposta nas instituições que oferecem esses cursos, em

especial nos Institutos Federais, sabendo que não há um preparo específico para os

professores, em relação à atuação na educação profissional.

A Resolução Nº 6 traz em seu Art. 6º, os princípios desses cursos, dos quais

destacamos:

I - relação e articulação entre a formação desenvolvida no Ensino Médio e a preparação para o exercício das profissões técnicas, visando à formação integral do estudante; II - respeito aos valores estéticos, políticos e éticos da educação nacional, na perspectiva do desenvolvimento para a vida social e profissional; III - trabalho assumido como princípio educativo, tendo sua integração com a ciência, a tecnologia e a cultura como base da proposta político-pedagógica e do desenvolvimento curricular; IV - articulação da Educação Básica com a Educação Profissional e Tecnológica, na perspectiva da integração entre saberes específicos para a produção do conhecimento e a intervenção social, assumindo a pesquisa como princípio pedagógico; V - indissociabilidade entre educação e prática social, considerando-se a historicidade dos conhecimentos e dos sujeitos da aprendizagem; XV - identidade dos perfis profissionais de conclusão de curso, que contemplem conhecimentos, competências e saberes profissionais requeridos pela natureza do trabalho, pelo desenvolvimento tecnológico e pelas demandas sociais, econômicas e ambientais (BRASIL, 2012).

Com base nesses princípios, que orientam os cursos Técnicos Integrados ao

Ensino Médio, pode-se dizer que a educação proposta vai ao encontro da educação

integral/holística, que vimos descrevendo desde o início. Essa formação propõe que

110

se contemplem aspectos ligados ao desenvolvimento profissional e humano. Mas a

questão que se discute aqui é se, na prática escolar cotidiana, é possível abarcar

toda essa proposta em um curso com duração, normalmente, de três anos, sendo

que os professores, que atuam diretamente nesses cursos, não foram preparados

para atender a todas essas demandas. Não se apresenta, dessa forma, algo simples

de se resolver ou efetivar.

O Instituto Federal tem no Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), um

documento direcionador, que discute e define as metas da instituição como um todo

e de cada campus particularmente, que são avaliados anualmente e rediscutidos a

cada cinco anos. Este documento tem, entre um de seus objetivos, verificar se cada

campus está cumprindo com o acordo da oferta de 50% de suas vagas a cursos

Técnicos de Nível Médio e 20 % para cursos de licenciaturas. Nele também é feito

um estudo sobre os cursos que se pretende ofertar para os próximos cinco anos.

Como missão o Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de São Paulo

tem: “Construir uma práxis educativa que contribua para a inserção social, para a

formação integradora e para a produção do conhecimento” (PDI, 2014, p. 27). Essa

formação integradora se refere a uma formação, que contemple não somente a

formação profissional, mas a formação que vise a cidadania, a autonomia, as

relações humanas, como é apontado de forma mais específica no Projeto Político

Pedagógico.

O Projeto Político Pedagógico do Campus aqui analisado, documento de

grande importância e recém-aprovado (2016), afirma que opta pela adoção de uma

pedagogia emancipatória. Com o propósito de favorecer a construção de estratégias

de inclusão, nos diversos níveis e modalidades de educação em que atua, para

possibilitar a formação e construção de sujeitos autônomos.

Tais diretrizes reafirmam o compromisso dos Institutos Federais com a

formação humanística de docentes e discentes, que precede a qualificação para o

trabalho e enxerga a educação profissional e tecnológica baseada na integração

entre ciência, tecnologia e cultura.

O Projeto Político Pedagógico (PPP) acima referido propõe como objetivo

central

[...] agregar à formação acadêmica a preparação para o mundo do trabalho, discutindo os princípios das tecnologias a ele relativas. Compreende-se,

111

para isso, que seja preciso derrubar as barreiras entre o ensino técnico e o científico, articulando trabalho, ciência e cultura, na perspectiva da emancipação humana (Projeto Político Pedagógico da instituição, 2016).

E, como orientado nos documentos-guia dos IF’s, propõe a indissociabilidade

entre o trabalho, a ciência, a tecnologia e a cultura. Sua organização e

desenvolvimento baseiam-se na concepção do trabalho como princípio educativo,

com o propósito não de formar somente para o exercício do trabalho, mas para a

vida. Tem, em sua proposta, o que é chamado de “tripé da educação”, pois toda sua

atuação é voltada para a indissociabilidade entre a pesquisa, a extensão e o ensino,

que devem propiciar um espaço educativo capaz de formar, qualificar e emancipar

os sujeitos. Está proposta no documento a ideia de uma educação transformadora,

concepção esta que está no centro da proposta da pedagogia crítica:

Deixa explícito, neste espaço, que a perspectiva de Educação Profissional a ser vivenciada pelos sujeitos em presença estabelece com o mundo do trabalho uma relação dialética, por se basear, de um lado, no reconhecimento dos saberes e práticas fundamentais para o exercício das atividades profissionais, mas também procurar desenvolver olhares críticos e transformadores dos problemas sociais que assolam a realidade social contemporânea (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, 2016, P. 80).

No PPP fica clara a diferenciação entre trabalho e emprego, reforçando-se o

entendimento do trabalho como princípio educativo, inerente ao ser humano, em que

“a concepção de trabalho não pode ser tomada como sinônimo de “emprego” ou

mera ocupação, mas sim como aspecto basilar e de caráter formador do indivíduo,

processo responsável pelo desenvolvimento das dimensões complexas da vida

humana” (PPP 2016, p. 85). Com base nesses apontamentos, é possível

compreender o posicionamento que o campus adota no que se refere à sua

concepção de educação. E complementamos que se preocupam com a relação

entre trabalho e educação “[...] tendo sempre como meta a colaboração na formação

de cidadãos preparados para a vida, e não apenas para o desempenho de

determinadas funções técnicas”. (2016, p. 85). Após pesquisar sobre a proposta de

educação prevista nos documentos que direcionam o Instituto Federal de Educação,

Ciência e Tecnologia de São Paulo, no Campus aqui analisado, precisamos

compreender melhor como se dá a efetivação dessas propostas, se e como os

professores as compreendem e de que forma as efetivam.

112

2.4. Entendendo a “nova” proposta de professores para atuar na educação

profissional

Segundo Kuenzer (1999), na atualidade há a necessidade de um novo perfil de

profissional, que desenvolva diferentes e novos papéis na vida profissional, ou seja,

que tenha uma formação para o trabalho, entendendo o trabalho como foi disposto

na primeira parte desta pesquisa. Que sua ação seja acompanhada de humanidade,

que contribua para a transformação de seus alunos em sujeitos críticos e

autônomos. Esse novo profissional precisa ter desenvolvida sua autonomia e

criticidade, para se posicionar diante dos dilemas e dificuldades que o trabalho

exige, e não ser apenas mais um “transmissor” daquilo que sabe, aceitando

acriticamente às condições que lhe são condicionadas. O professor, como

participante ativo direto do processo educacional, precisa acompanhar essas

mudanças: “O professor, como profissional, não escapa a essas exigências. E esses

requerimentos ficam mais evidentes quando se trata do professor que forma,

diretamente, profissionais para atuação na vida produtiva” (REHEM, 2009, p. 20).

Posição também defendida por Kuenzer:

A mudança da base eletromecânica para a base microeletrônica, ou seja, dos procedimentos rígidos para os flexíveis, que atinge todos os setores da vida social e produtiva nas últimas décadas, passa a exigir o desenvolvimento de habilidades cognitivas e comportamentais, tais como análise, síntese, estabelecimento de relações, rapidez de respostas e criatividade em face de situações desconhecidas, comunicação clara e precisa, interpretação e uso de diferentes formas de linguagem, capacidade para trabalhar em grupo, gerenciar processos, eleger prioridades, criticar respostas, avaliar procedimentos, resistir a pressões, enfrentar mudanças permanentes, aliar raciocínio lógico-formal à intuição criadora, estudar continuamente, e assim por diante (KUENZER, 1999, p. 169).

Há décadas atrás, em que tudo parecia sólido e cristalizado, em que havia um

padrão a ser seguido e não havia espaço para contestações ou inovações, os

trabalhadores precisavam memorizar e incorporar bem sua função de forma rápida,

pois, depois, bastava o aprendiz repetir automaticamente o que havia aprendido e

então estava apto ao exercício de sua profissão, até sua aposentadoria. No entender

de Rehem (2009, p. 38): “Os conhecimentos adquiridos tinham utilidade para

solucionar as situações pelo resto da vida, em razão dos contextos previsíveis e

duráveis em que se vivia”. Nesse contexto imutável e cristalizado, a educação

113

instrucional cabia perfeitamente, pois assegurava que o “conhecimento” adquirido

seria útil para toda a vida, garantindo o sustendo do trabalhador. Na ideia do

desenvolvimento humano como algo dinâmico, multidirecional e multifacetado, que

transcorre ao longo da vida, trazida por Bronfenbrenner (2005), sistematizada no

Modelo Bioecológico de Desenvolvimento Humano, a concepção de estabilidade do

processo de desenvolvimento, ou da sua linearidade, bem como da aprendizagem

em si, não faz sentido, pois, contrariamente, se argumenta que o desenvolvimento e

a aprendizagem humanos ocorrem numa ecologia, ou seja, na

progressiva acomodação mútua, ao longo do curso da vida, entre um ser humano ativo e em crescimento e as propriedades cambiantes dos contextos imediatos nos quais a pessoa desenvolvente vive, conforme esse processo é afetado pelas relações entre esses contextos e por aqueles mais amplos, nos quais tais contextos estão embebidos (BRONFENBRENNER, 2005, p. 107).

Essa mudança da modernidade na contemporaneidade, no que se refere à

liquidez e à flexibilidade, requer dos professores necessidades diferentes das

relatadas anteriormente, que se limitavam ao instrucionismo. O que inclui também

outras compreensões do que significa o desenvolvimento humano e a

aprendizagem, como exposto nas colocações de Bronfenbrenner. Necessita-se hoje

de uma pedagogia que seja crítica e favoreça a transformação na vida dos alunos, e

que traga em sua proposta um movimento e uma luta constante na tentativa de que

a educação possa ser transformadora e possa trazer mudanças também no mundo

que vivemos. Com base nos princípios da educação sociocomunitária e da

pedagogia crítica entende-se que a educação, deve lutar e impulsionar uma

mudança social, como nos aponta Borquez (2006, p. 105):

[...] a educación debe impulsar el cambio social, que favorezca la disminución de las desigualdades económicas, sociales, raciales, de género, etc., pero también se propone incidir en la formación de buenos ciudadanos, que sean capaces de luchar por mejores formas de vida pública, comprometiéndose con los valores de la libertad, igualdad y justicia social

A busca por essa educação, que traga mudanças na sociedade, passa pela

teoria de Mezirow (2013), que nos traz a discussão da aprendizagem

transformadora, termo que temos utilizado durante o discorrer de toda a dissertação.

Uma teoria que se alinha às propostas da pedagogia crítica, pois se baseia na

“profundidade da aprendizagem”, com o objetivo de que os alunos saiam da

114

condição de um conhecimento limitado, ingênuo, acomodado e acrítico para uma

situação que promova o conhecimento crítico e reflexivo. Para que sejam capazes

de avaliar e questionar com profundidade as situações ao seu redor e tenham

condições de serem agentes de transformação, capazes de trazer mudanças. Essas

mudanças devem começar pelas suas próprias estruturas de referência, que são

definidas por Mezirow (2013, p 112) como “[...] as estruturas culturais e linguísticas

por meio das quais interpretamos significados, atribuindo coerência e significância à

nossa experiência”. Essas estruturas moldam e delimitam a percepção, cognição e

sentimentos, preestabelecendo as perspectivas e propósitos, definindo então as

ações. De modo que aquilo que não se encaixar nessas estruturas pode ser

facilmente rejeitado. Havendo a aprendizagem transformadora, o sujeito é capaz de

modificar essas estruturas, muitas vezes fixadas, deixando-as mais abertas, flexíveis

e reflexivas, para uma nova forma de se conceber e se colocar no mundo, não mais

como agente passivo, mas como ser ativo e capaz de gerar transformações. Essa

nova forma de se colocar contribui para o empoderamento e para formação de

alunos mais autônomos e emancipados.

Mas, essa aprendizagem transformadora depende muito da concepção de

educação profissional que os professores têm e como eles a praticam. Para isso,

entende-se que é importante que o professor esteja preparado para trabalhar com

as especificidades da educação profissional, que em muitas ou na maioria das

vezes, recebe alunos que vivem em situações de alta vulnerabilidade social e

acríticos, acostumados com uma educação que lhes foi oferecida de maneia a levá-

los ao conformismo. Esses alunos deverão receber uma educação diferenciada

nesta modalidade de educação, que propicie a formação holística, segundo as

diretrizes. Essa educação deve contemplar a formação profissional técnica

escolhida, os conhecimentos próprios da Base Nacional Comum Curricular e a

formação para vida cidadã. Não é uma tarefa fácil, principalmente para aqueles que

não tiveram em sua base de formação elementos que abordassem esses aspectos.

Entendendo que não há, ou que há de forma reduzida, uma formação específica

para os professores trabalharem com a educação profissional, como propiciar tudo

isso?

115

Ramíres (1999, p. 19), ao falar da necessidade em se fazer as coisas de outra

maneira, traz algumas reflexões interessantes e pertinentes sobre essa discussão:

“Hoy día la sociedad está demandando una formación pertinente, de calidad y con

equidad social. En consecuencia, no se trata de “hacer más de lo mismo” sino hacer

las cosas de otra manera”. O autor faz um comparativo de maneira clara, em formato

de quadros, para discutir as mudanças de paradigmas no que se refere à educação

e ao trabalho, do que era considerado necessário na era industrial e do que é

necessário hoje, na era do conhecimento. Conforme exposto abaixo:

Quadro 02. Mudanças nos sistemas produtivos

Fonte: A. Ramírez, Galeano. Manual de capacitación para directivos de centros de formación (montevidéu, Cinterfor/OIT, 1999), p. 40.

116

Quadro 03. Mudanças nos sistemas de trabalho

Fonte: A. Ramírez, Galeano. Manual de capacitación para directivos de centros de formación (montevidéu, Cinterfor/OIT, 1999), p. 40.

Quadro 04. Mudanças nos sistemas organizacionais e de gestão

Fonte: A. Ramírez, Galeano. Manual de capacitación para directivos de centros de formación

(montevidéu, Cinterfor/OIT, 1999), p. 41.

117

Quadro 05. Mudanças nos sistemas educacionais e na formação profissional

Fonte: A. Ramírez, Galeano. Manual de capacitación para directivos de centros de formación (montevidéu, Cinterfor/OIT, 1999), p. 41.

Nessa nova conjuntura, denominada como a era do conhecimento, a riqueza

é medida pelo nível de conhecimento e tecnologia que se incorpora aos produtos e

serviços e, por isso, a grande valorização no desenvolvimento intelectual e criativo

da população. Conhecer é poder. Cabe pensar como e quem o controla...

Para Rehem (2009, p. 76), ao professor de educação profissional “cabe

fornecer os mapas e a bússola para que o educando possa navegar no complexo

mundo do trabalho, enfrentando as ondas do mercado sem se deixar sucumbir,

apesar das tempestades”. Nesse sentido, é importante no processo da educação

profissional trabalhar com os alunos a autonomia juntamente com os conhecimentos

necessários para cada profissão e que vão além da parte técnica, para que ao

118

ingressar no mundo do trabalho, o profissional tenha habilidades para lidar com

diferentes situações. Assim, reforça-se que a nova proposta de educação

profissional deve ser voltada para a formação para o trabalho e não para o emprego,

como já discutido anteriormente.

Trabalha-se aqui com a concepção de professor proposto pela pedagogia

crítica. Freire (1987, p. 12), entende que o professor deve-se colocar na condição de

ensinar e aprender ao mesmo tempo, pois “Quem ensina aprende ao ensinar e

quem aprende ensina ao aprender”. Nessa proposta da educação crítica, o professor

não é o único que pode ensinar. E reforça a ideia do ser inacabado e da

aprendizagem para ao longo da vida, em que os professores podem e devem ser

agentes transformadores e libertadores de uma condição a qual, muitas vezes, os

alunos são reféns. Nessa perspectiva, Au (2011) traz o pensamento de Freire, que

se sustenta sobre a afirmação de que “retirar o direito do sujeito à consciência e

remover seu “direito de transformar o mundo” é opressivo”. De acordo com a

pedagogia crítica, que prega que a educação deve ser libertadora, essa prática

docente precisa ser refletida. E por isso tamanha preocupação com os professores,

que atuam diretamente na educação profissional, que podem contribuir para essa

libertação e transformação na sociedade ou, simplesmente, reforçar as

desigualdades e as injustiças sociais. Freire (1986) relata bem essa questão de que

a educação pode transformar uma sociedade, como também pode ser reprodutora

dela:

[...] a educação, especificidade humana, como um ato de intervenção não está sendo usado com nenhuma restrição semântica. Quando falo em educação como intervenção me refiro tanto à que aspira a mudanças radicais na sociedade, no campo da economia, das relações humanas, da propriedade, do direito ao trabalho, à terra, à educação, à saúde, quanto à que, pelo contrário, reacionariamente pretende imobilizar a História e manter a ordem injusta (FREIRE,1986, p. 106).

Esse profissional deve se colocar na condição de mediador do conhecimento,

que trabalha juntamente com os conteúdos básicos necessários a cada disciplina

questões como ética, relacionamentos interpessoais, valores, cidadania, respeito,

entre outros valores importantes para que esses alunos se tornem críticos e

autônomos. Assim, entende-se que o professor da educação profissional, que fez a

119

escolha ao trabalhar com esta modalidade de educação, deve ter em seu trabalho

algumas competências:

[...] entendemos que o professor da educação técnica é um profissional que optou por ser professor, ou seja, além dos conhecimentos acerca do mundo do trabalho, e dos conhecimentos disciplinares que detém, prendeu, em bases científicas, a ensinar o que sebe fazer. Isso requer formação docente, que desenvolva, com competência, a educação para o trabalho, para conduzir pessoas no processo de aprender a trabalhar [...] educar para o trabalho deve implicar na formação integral do homem, mesmo tomando o trabalho como foco do processo formativo. Ainda que se considere a atividade econômica como a razão de ser da existência da educação profissional, sua entrega não deveria ser reduzida a esta. (REHEM, 2009, p. 77).

A mesma autora (2009) considera alguns eixos fundantes na formação

docente para atuar na educação profissional, para que ele possa, além das

capacidades exigidas para a formação de futuros profissionais, também atentarem-

se à formação pessoal para a autonomia e a emancipação, ou seja, para a formação

integral do discente:

Sendo o professor de educação técnica um profissional da aprendizagem para o trabalho, ele é, nessa condição, um profissional da gestão de condições de aprendizagem e da regulação interativa, em sala de aula e no mundo do trabalho. Para fazê-lo com autonomia, sua formação deve, portanto, contemplar a aquisição desse saber-ensinar, que vai apoiar-se no saber disciplinar de sua formação acadêmica e em sua experiência na respectiva área profissional no mercado de trabalho (REHEM, 2009, p. 109).

Em sua pesquisa, Rehem (2009) compreende que são necessários três eixos

de competências para o professor da educação profissional, que devem estar

articulados. O primeiro diz respeito aos saberes disciplinares adquiridos na formação

acadêmica específica de cada área, que permitem um conhecimento sólido, que

traga a reflexão crítica acerca de sua atuação. O segundo, diz respeito aos saberes

da experiência profissional relacionados com sua área de formação acadêmica.

Nesse eixo, o professor tem propriedade para entender as especificidades do

mercado de trabalho e pensar em como sua atuação pode contribuir para a inserção

dos futuros alunos neste. E a terceira diz respeito a saberes pedagógicos e

didáticos, para que o professor tenha condições de gerir as relações do processo de

formação que relacionem as diferentes possibilidades da educação profissional em

diferentes ambientes com a aplicação da prática reflexiva dos conhecimentos. Com

120

a articulação entre esses três eixos, o professor tem mais possibilidades de fazer

escolhas relevantes e de adequá-las às necessidades de seus alunos de forma

contextualizada com o mundo do trabalho e com seus contextos de vidas.

Contudo, não se pode dizer que com uma formação que se baseie nesses

três eixos teria-se já o suficiente para garantir uma boa formação para o docente da

educação profissional, pois um profissional não se faz somente com um bom curso,

que siga determinados padrões. Há de se tomar cuidado, porém, em não esperar

que a formação inicial do professor contemple todos os aspectos necessários para a

formação de um bom profissional. Ele deve ter uma boa base que o subsidie, mas

essa deve ser entendida apenas como formação inicial, sendo necessária a

formação continuada, essencial para sua atuação diferenciada:

Conceituamos a formação contínua como um processo que: se efetiva desde a formação inicial e se estende por toda a vida profissional do professor; enfatiza o desenvolvimento da competência pedagógica; propicia espaços e modos de reflexão sobre a prática desenvolvida; possibilita inovações e prevê possibilidades de ida e volta à ação; está fundado no conhecimento histórico e socialmente construído, questionado/criticado/aperfeiçoado pelos professores. Ao se efetivar no espaço institucional de trabalho, a formação contínua aprofunda o compromisso do professor com o aluno, o conhecimento e a construção coletiva. Além disso, torna possível o reconhecimento do professor como pessoa e profissional sensibilizado/estimulado para seu autodesenvolvimento (RIBAS, 2000, p.57 apud REHEM, 2009, p. 130).

Gadotti (2009, p. 54) afirma que: “Ao lado do direito do aluno aprender na

escola, está o direito do professor dispor de condições de ensino e do direito de

continuar estudando”.

Para que o docente da educação profissional atue de forma condizente com

uma nova proposta de educação emancipatória é preciso a interferência de outras

questões, diretas ou indiretamente relacionadas com a sua formação. Assim como

consideramos que a educação dos nossos jovens é uma construção, um processo

que depende de outras influências, como por exemplo, o seu contexto de vida,

precisamos considerar também essas especificidades, que interferem direta ou

indiretamente na formação dos professores. Contextos esses que, na maioria das

vezes, não são considerados pelos professores, formadores dos futuros professores

que atuarão na educação profissional. Com uma formação tecnicista e conteudista,

ao ingressar nesta modalidade de educação, esses professores precisarão de um

121

enorme esforço para efetivar práticas diferentes daquelas a que foram submetidos,

durante o processo de formação inicial. Ou, no caso de se conformar com a maneira

como ocorreu sua graduação, simplesmente irão reproduzir o modo como lhes foi

ensinado, dando continuidade a um processo de formação sem significação e que

se limita aos conteúdos específicos da área de atuação, dificultando a construção da

autonomia para seus alunos e para si próprios, uma vez que não entendem a

preocupação com temas para além dos conteúdos, como necessária em sua

atuação:

A los maestros ya no se les pide que sean innovadores, pensar críticamente, o que sean creativos. Por el contrario, se han reducido a la guarda de los métodos, los ejecutores de una cultura de la auditoría, y se les priva de asumir la autonomía en sus aulas. Según los conservadores, los grandes maestros han cometido el pecads en las últimas décadas de centrarse demasiado en la teoría y no lo suficiente en la práctica clínica, y por "teoría" entienden lo que la pedagogía crítica y otras teorías dicen: instrumentos que permiten a los futuros profesores situar el conocimiento escolar,las prácticas y los modos de gobernanza dentro de amplios contextos históricos, sociales, culturales, económicos y políticos. Reducción de la pedagogía para la enseñanza a métodos e instrumentos de evaluación basados en datos indicadores de desempeño que supuestamente miden la capacidad escolar y sirven para mejorar el rendimiento de los estudiantes. En lugar de proporcionar los mejores medios para hacer frente a las "verdades difíciles acerca de la desigualdad de la economía política de América". Tal pedagogía produce la estafa de "culpar a las desigualdades en los individuos y grupos con puntajes bajos." (GIROUX, 2013, s/p)

Na proposta de educação profissional aqui buscada é esperado do professor

uma postura diferenciada, não aquela de ensinar o que sabe por meio de instrução

acrítica:

Dele é esperada uma mediação capaz de fazer aprender pela interação, experimentação, vivência, testagem, pesquisa, acerto e erro, comprovação, provocação, intercâmbio, observação, criticidade, ação e reflexão. Cabe, ao professor, promover a aprendizagem assistida na direção da autonomia, e não apenas, uma aprendizagem ensinada (REHEM, 2009, p. 79).

Com essas atribuições do professor, acredita-se que os alunos se tornarão

sujeitos mais autônomos. Com esse formato de educação os alunos farão

diretamente parte do processo de ensino e aprendizagem, uma vez que também

consideramos que o professor não é mais o único detentor do saber e o único

122

responsável pela educação, ele também está em processo de aprendizagem e que

esta acontece ao longo de toda a vida, do seu processo de desenvolvimento.

Na próxima parte exporemos o processo de construção e análise dos dados,

refletiremos sobre os relatos dos professores que trabalham com a Educação

Profissional Técnico de Nível Médio nos cursos Integrados. Com base nesses

relatos, esperamos que seja possível compreender como os professores concebem

a proposta de uma educação profissional emancipatória. Tentaremos discutir se é

possível contemplar aquilo que está solicitado nos documentos, que direcionam esta

modalidade de educação, de que forma se efetivam, e os obstáculos que aí se

colocam.

123

PARTE III. Desenvolvimento da pesquisa

3.1. Percurso metodológico

Trataremos aqui da pesquisa propriamente dita, explicando a metodologia

utilizada, os processos para a construção dos dados e a análise dos documentos

direcionadores da educação profissional nos cursos técnicos integrados ao ensino

médio do campus investigado tentando compreender se a educação que se pratica é

formação para o trabalho ou qualificação para o emprego.

Acompanhando a hipótese dessa investigação, partimos do pressuposto de

que não há clareza de como a educação profissional deve acontecer, em especial

nos cursos técnicos integrados ao ensino médio. Buscamos tentar responder

algumas questões que estão no cotidiano dos professores, que trabalham com esta

modalidade de educação, fundamentando-nos nas ideias na pedagogia crítica e da

educação sociocomunitária, que se preocupam com uma educação para a

autonomia e para a emancipação dos jovens, e que se coadunam com nossas

perspectivas para essa pesquisa.

Esta pesquisa é uma investigação qualitativa, na modalidade de pesquisa-

ação, e foi realizada em uma instituição de educação profissional em um campus do

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, localizado no

interior do estado, na mesorregião de Piracicaba. Embora o campus exista desde

2010, somente no ano de 2015 foram implantados os cursos técnicos integrados ao

ensino médio oferecidos totalmente dentro da instituição. Antes disso, eram

oferecidos dois cursos “integrados”, que aconteciam em parceria com a Secretaria

de Estado da Educação, em que os alunos cumpriam no período da manhã a

formação básica na escola parceira e no período da tarde faziam a parte

profissionalizante no IF. Essa nova forma de oferta no campus, dos cursos técnicos

integrados ao ensino médio, de maneira integral e integrada, é algo que está ainda

em processo de adaptação, tanto para os alunos, quanto para os professores,

gestores e equipe pedagógica, que estão constantemente buscando aprimorar seus

conhecimentos sobre como e de que maneira deve-se trabalhar com esta

124

modalidade de educação, de modo a proporcionar uma educação que seja, de fato,

transformadora, como propõe a pedagogia crítica e a educação sociocomunitária.

Em termos de estrutura, o contexto onde foi desenvolvida a pesquisa está

assim organizado. A instituição conta hoje com mais de 500 alunos, com previsão de

que no ano de 2017 haverá aproximadamente 780 alunos. Atuam como servidores

68 professores e 41 servidores técnicos administrativos, que ingressam por meio de

concurso público, com exceção dos professores substitutos. Hoje o campus conta

com 5 professores substitutos, que ingressaram por meio de processo seletivo

simplificado, sendo que podem atuar no campus por no máximo 2 anos. Além

desses profissionais, atuam as empresas terceirizadas para manutenção predial,

limpeza, segurança e portaria contando hoje com 13 profissionais. O prédio utilizado

pela instituição não é próprio, ele foi cedido numa parceria público-privada pelo

período de 25 anos, dos quais 6 anos já foram utilizados. No ano de 2016 a

prefeitura municipal doou ao IFSP um terreno, no mesmo bairro onde está situada a

instituição para a construção de um campus que seja mais adequado para atender

às demandas dos cursos. Mas ainda não se iniciou a construção por falta de verbas.

A estrutura física do prédio utilizado conta hoje com 10 salas de aula, totalizando

509,55 m², 1 biblioteca com 273,62 m², 2 salas administrativas com 140,88 m², 3

laboratórios de química totalizando 556,71 m², 6 laboratórios de informática com

254,94 m², 1 laboratório de física com 32,94 m², 1 sala de apoio pedagógico com

52,60 m², além de áreas para serviços de apoio com 271,28 m², e outros espaços de

convivência com 947,48, 00 m², totalizando 3040 m² de área.

O campus oferece hoje dois cursos técnicos integrados ao ensino médio

podendo o aluno escolher a área técnica de Química ou Informática no ato da

inscrição. Esses cursos têm duração de três anos e o ingresso acontece por meio de

um “Vestibulinho” realizado no final do ano anterior ao ingresso. Esse curso oferece

40 vagas por ano em cada uma das áreas com ingresso anual. O campus também

oferece o curso Técnico em Química concomitante/ subsequente (4 semestres), que

é destinado para os alunos que já cursaram o ensino médio ou que estão cursando

o segundo ano do ensino médio. O ingresso nesse curso também se dá por meio de

um “Vestibulinho”, que acontece ao final do primeiro semestre de cada ano. O curso

é semestral e o ingresso se dá uma vez por ano. A instituição também oferece

125

cursos superiores em Tecnologia em Processos Químicos (7 semestres), Tecnologia

em Análise e Desenvolvimento de Sistemas (6 semestres) e Licenciatura em

Química (8 semestres). Esses cursos são semestrais, com ingresso por meio da lista

de classificação no SISU ao início de cada ano letivo. O campus também atua como

polo de dois cursos EaD, Técnico em Secretaria Escolar e Técnico em

Administração. Para esses cursos o ingresso é por meio de Vestibulinho com 40

vagas disponíveis.

A instituição também oferece cursos de extensão abertos para a comunidade.

Para participar dos cursos, os candidatos precisam apenas se inscreverem e

atenderem aos requisitos previstos no edital. Esses cursos são de curta duração e

oferecidos pelos próprios professores e servidores com carga horária que varia de

30 a 80 horas, com turmas entre 20 e 40 alunos. Esses cursos variam de acordo

com a demanda da região e com a disponibilidade dos professores. Dentre os

cursos oferecidos em 2016 temos: Conversação em Língua Inglesa – Nível Básico;

Conversação em Língua Inglesa – Nível Intermediário; Libras Básico; Conversação

em Língua Inglesa II; Damas e Xadrez em Ambientes Virtuais; Ensino de Algoritmos

e Programação WEB usando PHP; Excel Intermediário; Inglês Básico I; Introdução a

Programação Python; Língua Espanhola I; Língua Espanhola II; Matemática para o

ENEM; Português para Estrangeiros e Redação Científica

Além desses cursos já ofertados, iniciará em 2017 o curso de Técnico em

Administração, na educação de Jovens e Adultos (PROEJA). O curso será

semestral, com ingresso anualmente de 40 jovens e adultos. Está em fase de

finalização também dois cursos de Pós- graduação lato sensu em Gestão de

Tecnologia da Informação e Tecnologia da Informação e Comunicação na Educação

com previsão para iniciar no segundo semestre de 2017.

E, em assim sendo, essa pesquisa se torna motivo de reflexões,

investigações, incertezas, e de angústias, presentes nas práticas dos profissionais

desta instituição. Essa característica de trazer a reflexão sobre a prática, visando a

contribuição para a qualificação, é que faz com que essa pesquisa tenha sido

planejada como pesquisa-ação.

Segundo Franzolin, Minghini e Lourenço (2013), a pesquisa-ação é uma

forma de estudo qualitativo, que tem como característica o envolvimento tanto do

126

pesquisador quanto dos membros de uma organização, sobre a análise de um

assunto ou problema, que seja de interesse dos participantes, e que faça avançar a

qualidade do trabalho profissional ali desempenhado. É uma proposta

intervencionista de pesquisa, que se preocupa com as práticas e com os envolvidos

em um contexto especifico, e busca contribuir com reflexões e melhorias para um

determinado problema.

Para Greenwood e Levin (2007, apud Franzolin; Minghini e Lourenço 2013, p.

228), a pesquisa-ação tem entre os seus objetivos: “assessorar os participantes a

identificar seus problemas no ambiente de trabalho, encontrar e implantar possíveis

soluções”; possibilitar a verbalização de tensões e conflitos, de forma igualitária

entre os participantes, e propor a reflexão sobre a relação desses com os

problemas, para pensarem em possíveis intervenções.

A construção dos instrumentos para a coleta dos dados fez uso da análise

documental e de sessões de um grupo focal, como será explicitado posteriormente.

A análise documental foi feita por meio da legislação federal e dos documentos

institucionais, que normatizam as diretrizes para os cursos Técnicos de Nível Médio.

Dentre os documentos analisados estão: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional- LDB 9394/96; a Resolução nº 6, de 20 de setembro de 2012 que define as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível

Médio; o Projeto Político Pedagógico do campus; os Projetos Pedagógicos dos

Cursos, o documento Concepção e Diretrizes do Instituto Federal, o Plano de

Desenvolvimento Institucional, Resolução 94/2015 de 29 de setembro de 2015 que

aprova a Organização Didática do Instituto Federal de São Paulo, O Projeto

Pedagógico Institucional (PPI) aprovado pela resolução Resolução, 866, de 04 de

junho de 2013 e da lei 11.892 de 29 de dezembro de 2018, lei de criação dos IFs.

127

3.1.1. Análise dos documentos que orientam os cursos técnicos integrados ao

ensino médio

A leitura e análise dos documentos teve início no mês de abril de 2016. Com

base na leitura desses foi possível identificar a concepção de educação profissional

contida nos documentos direcionadores do IF para os cursos técnicos integrados ao

ensino médio. E foi possível a verificação dessa concepção na prática docente

cotidiana, por meio dos encontros do grupo focal, para entender se as propostas

contidas nos documentos estavam, de fato, sendo efetivadas. As categorias de

análise que foram usadas, e que emergiram das reflexões feitas a partir da revisão

de literatura foram: trabalho/emprego, contornos da educação profissional técnica

integrada ao ensino médio e autonomia/emancipação.

Em relação aos contornos da educação profissional técnica integrada ao

ensino médio. As Concepções e Diretrizes dos Institutos Federais trazem como

proposta para os IFs uma educação que seja diferente daquela proposta quando da

sua criação, e que perdurou por muitos anos, trazendo uma educação pauta e

apoiada na descristalização da visão reduzida que se tinha da educação profissional

à época. Segundo esse documento, entendendo os IFs como a efetivação de

políticas públicas, pretende-se trabalhar na “superação da representação existente

(de subordinação quase absoluta ao poder econômico) e estabelecer sintonia com

outras esferas do poder público e da sociedade, na construção de um projeto mais

amplo para a educação pública” (CONCPEÇÕES E DIRETRIZES DOS INSTITUTOS

FEDERAIS, 2010). Mostra-se, assim, preocupada com a formação integral, como

aqui já discutida anteriormente, e com a transformação social. Esse mesmo

documento traz como principal função:

[...] a intervenção na realidade, na perspectiva de um país soberano e inclusivo, tendo como núcleo para irradiação das ações o desenvolvimento local e regional. O papel que está previsto para os Institutos Federais é garantir a perenidade das ações que visem a incorporar, antes de tudo, setores sociais que historicamente foram alijados dos processos de desenvolvimento e modernização do Brasil, o que legitima e justifica a importância de sua natureza pública e afirma uma educação profissional e tecnológica como instrumento realmente vigoroso na construção e resgate da cidadania e da transformação social (CONCPEÇÕES E DIRETRIZES DOS INSTITUTOS FEDERAIS, 2010).

128

Considerando-se a distinção entre trabalho e emprego, nos documentos

analisados percebemos que há preocupação institucional em romper com o histórico

da educação profissional, que pregava uma educação tecnicista destinada aos

marginalizados pela sociedade. Dessa forma, prioritariamente inclinada ao emprego.

Buscando como compromisso a oferta de cursos que possam trazer a redução das

desigualdades sociais, como apontados no PPP (2016), em que, acompanhando os

processos de transformação no mundo, no ensino, no mundo do trabalho, se

trabalhe “com a perspectiva de diminuição das desigualdades sociais no Brasil”.

Essa ideia é reforçada por meio do Plano de Desenvolvimento Institucional (2014-

2018), que traz como missão dos IFs: “Construir uma práxis educativa que contribua

para a inserção social, para a formação integradora e para a produção do

conhecimento”. Entendemos que o PPP traduz uma preocupação com a formação

para o trabalho, no sentido que faz referência ao conceito de práxis educativa ou a

reflexão sobre a prática, que favorece a transformação, formação integradora,

produção do conhecimento. Contudo, no documento não há a explicitação das

bases ideológicas ou teóricas que fundamentaram esses conceitos, sendo assim, a

nossa afirmação é uma inferência. Mas que é referendada por outros pontos

semelhantes, conforme segue.

O PPP (2016) traz como proposta uma educação integral, por meio da qual se

desenvolva com os alunos, além das competências específicas para a atuação

profissional, os princípios da ética, da política, da cidadania, da inclusão social e da

sustentabilidade:

Desse modo, pautado pelos princípios da ética, da política, da cidadania, da inclusão social e da sustentabilidade vinculada à Educação Ambiental, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, Campus XXXX, busca formar cidadãos contextualizados e integrados ao meio em que vivem, e que poderão exercitar e concretizar posturas mais críticas sobre os sistemas produtivos atuais e sobre as condições econômicas e socioambientais em que se inserem (Projeto Político Pedagógico 2016).

Nos Projetos Pedagógicos dos cursos é possível verificar essa intenção na

identificação de expressões como: “formação humanística”, “relação entre teoria e

prática”, “trabalho como princípio educativo”, “compreensão da totalidade do

processo produtivo”, “formação integral”, “visão holística do mundo do trabalho”

dentre outras, que mostram uma concordância com os outros documentos que

129

regem a educação brasileira contemporânea, demonstrando a preocupação com a

formação integral dos alunos e não simplesmente com a preparação em formar um

técnico em alguma profissão. Os PPCs, por exemplo, justificam a oferta dos cursos

na área de Química e de Informática (duas áreas atualmente oferecidas nos cursos

técnicos integrados do campus) para atender às demandas locais e regionais e que

leve à emancipação e autonomia. Acompanhando um dos objetivos da lei de criação

dos IFs 11.892, que traz em seu artigo 7º, parágrafo “V - estimular e apoiar

processos educativos que levem à geração de trabalho e renda e à emancipação do

cidadão na perspectiva do desenvolvimento socioeconômico local e regional”. É

possível afirmar, dessa maneira, que há uma organicidade na filosofia institucional,

ao menos naquilo que tange aos seus documentos direcionadores. E que se dirige à

outra das nossas categorias de análise, a autonomia/emancipação.

A Organização Didática (2015) traz em seu Art. 6º, que trata dos currículos,

que esses cursos devem ter como princípio “práticas que se estabelecem com o

diálogo entre técnicos, professores, estudantes e comunidade vinculados a uma

visão histórica, ética e política”. Podemos observar, aqui, que há uma preocupação

com princípios que também identificamos na concepção da educação

sociocomunitária, naquilo que se associa à autonomia e emancipação: a

participação ativa, de todos os envolvidos no processo, a base sócio-histórica dos

processos educacionais e sociais. Mas esses são conceitos que também carecem,

contudo, de definições que favoreceriam a operacionalização dessas intenções: o

que se entende, por exemplo, como comunidade? E qual seria a “visão histórica,

ética e política” referida? Entendemos que se parte de uma proposição crítica de

currículo, mas a falta de explicitação facilita tanto com que os pressupostos da

Organização Didática não sejam bem compreendidos, como que sejam apropriados

por perspectivas contrárias à tal proposição.

A Organização Didática do IFSP também traz no Capítulo VII- sobre o

Registro e da Verificação do Processo Acadêmico, em seu artigo 30, parágrafo §3º

que as avaliações serão norteadas pela concepção formativa, processual e

contínua, pressupondo a contextualização dos conhecimentos e das atividades

desenvolvidas, a fim de propiciar um diagnóstico do processo de ensino e

aprendizagem, que possibilite ao professor analisar sua prática e ao estudante

130

comprometer-se com seu desenvolvimento intelectual e sua autonomia.

Demonstrando a preocupação com o desenvolvimento dos alunos e reconhecendo o

pressuposto processual que é a educação. Pensando-se na formação profissional

de nível médio, e na questão da autonomia/emancipação, o que essa proposição de

verificação do processo acadêmico significa, em termos dessa formação?

Consideramos que uma avaliação que deixe de ser “avaliativa” e se volte para ser

formativa, ainda está distante de se constituir em realidade, por várias razões,

algumas sendo: falta de modelos de práticas formativas de avaliação, de referenciais

teóricos, concepções de ensino-aprendizagem dos docentes e dos alunos, o caráter

instrucional, que ainda marca o ensino técnico. Por outro lado, onde fica a questão

da autonomia na prática escolar cotidiana? Qual o espaço que os alunos e os

docentes têm, no planejamento das aulas, na sua execução, no uso de recursos e

materiais, para se manifestarem? Pela vivência da pesquisadora na instituição e

pelas falas no grupo focal, entendemos que os professores têm certa liberdade eles

têm “certa liberdade” para definirem as formas de avaliação, de metodologias, mas

são limitadas pelo currículo e pelos documentos direcionadores. Em relação aos

alunos, observa-se que há pouco espaço para a participação deles.

A resolução nº 6, de 20 de setembro de 2012, que define diretrizes

curriculares nacionais para a educação profissional técnica de nível médio, em seu

Art. 14 traz a ideia de um currículo amplo, que proporcione aos alunos

oportunidades de formação que vão além da oferta de uma simples profissão, mas

de uma formação para a vida, como pode ser identificado:

Os currículos dos cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio devem proporcionar aos estudantes: I - diálogo com diversos campos do trabalho, da ciência, da tecnologia e da cultura como referências fundamentais de sua formação; II - elementos para compreender e discutir as relações sociais de produção e de trabalho, bem como as especificidades históricas nas sociedades contemporâneas; III - recursos para exercer sua profissão com competência, idoneidade intelectual e tecnológica, autonomia e responsabilidade, orientados por princípios éticos, estéticos e políticos, bem como compromissos com a construção de uma sociedade democrática; IV - domínio intelectual das tecnologias pertinentes ao eixo tecnológico do curso, de modo a permitir progressivo desenvolvimento profissional e capacidade de construir novos conhecimentos e desenvolver novas competências profissionais com autonomia intelectual; V - instrumentais de cada habilitação, por meio da vivência de diferentes situações práticas de estudo e de trabalho;

131

VI - fundamentos de empreendedorismo, cooperativismo, tecnologia da informação, legislação trabalhista, ética profissional, gestão ambiental, segurança do trabalho, gestão da inovação e iniciação científica, gestão de pessoas e gestão da qualidade social e ambiental do trabalho.

Essa é a proposta contida em um documento, mas como será visto na análise

do grupo focal, os currículos dos cursos técnicos integrados do campus não

conseguem, ainda, contemplar todos esses itens. Essa afirmação foi corroborada

pelos argumentos que poderão ser identificados nas falas dos professores

participantes da pesquisa, no encontro de número seis. Novamente colocamos, aqui,

a dicotomia trabalho/emprego: todos os pontos postos indicam uma concepção de

formação para o trabalho, mas com base no currículo, parecem se concretizar, na

prática, como um direcionamento para o emprego. Como entender isso?

O Projeto Pedagógico Institucional (PPI), aprovado pela resolução Resolução,

866, de 04 de junho de 2013 traz uma questão que é considerada muito importante

para os IFs, a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, que também

pode ser notada no PPP:

Considerar que o ensino e a extensão não podem ser analisados separadamente do mundo do trabalho, nem ser compreendidos sem a alimentação da pesquisa. Esta, por sua vez, não pode ser compreendida sem o campo da aplicação do ensino e da extensão. Todos se retroalimentam em função das necessidades sociais e econômicas e das demandas profissionais, em permanente atualização.

O PDI (2013) também aponta para a valorização da articulação entre teoria e

prática ao defender a “(...) articulação do conhecimento teórico com as atividades e

acontecimentos rotineiros, propiciando uma aprendizagem significativa, rompendo

assim com a dicotomia teoria/prática”. Trazendo a discussão que tivemos no início

dessa pesquisa ao estudar o histórico da educação profissional que propunha uma

ação dissociada da reflexão. Pensamos que a efetivação do tripé ensino-pesquisa e

extensão poderia romper com a formação para o emprego e direcionar a formação

para o trabalho. Porém, em um curso de 03 anos, com um currículo que se mostra

estruturalmente compartimentalizado, há espaço e condições para a efetivação

desse tripé?

Após análise dos documentos acima citados, compreendemos que houve

evolução no que se refere à concepção de educação profissional de nível técnico,

132

desde sua implantação nos IFs. E que esse avanço também se estendeu às

categorias de autonomia/emancipação e trabalho/emprego. Isso, contudo, não nos

dá garantias de que a educação profissional de nível médio, na instituição

pesquisada, venha sendo, de fato, transformadora, pois depende também de como a

comunidade acadêmica, que compõe essa instituição, bem como a comunidade em

que está inserida, compreendem esta modalidade de educação. E mesmo, como já

citado anteriormente, de clarificar-se para, e de discutir-se com, a comunidade

interna e externa, o que tais concepções, de trabalho/emprego,

autonomia/emancipação, e de educação profissional significam para elas. Mas o fato

de já constarem dos documentos direcionadores, se mostra um passo importante na

luta por uma educação que valorize e respeite as especificidades do ser humano e

reconheça nessas especificidades uma possibilidade de contribuir para sua

formação integral, para o trabalho como princípio educativo.

Como dito anteriormente, também foi utilizado como instrumento de coleta de

dados sessões de grupos focais, formados por professores do Instituto Federal de

São Paulo, do campus analisado, como será descrito abaixo. Nesses encontros do

grupo focal foram propostos pela pesquisadora, com base em discussões e

encontros de grupos de estudos, ocorridos antes e durante a pesquisa, como parte

das atividades dos docentes, temas tidos como relevantes para o desenvolvimento

da pesquisa. Tais temas foram aceitos pelos participantes, por serem considerados

como relevantes para as reflexões sobre a prática docente.

3.1.2. Organização e desenvolvimento do grupo focal

O grupo focal tem por característica constituir-se numa discussão em grupo,

deixando os participantes à vontade para expressarem suas opiniões, sem a

preocupação com respostas prontas, ou corretas, uma vez que se gera um debate

democrático. Por meio do grupo focal é possível propiciar momentos para se discutir

e compartilhar assuntos do interesse de todos e que pode, por meio do diálogo e

das reflexões, impactar na prática dos participantes.

Segundo Caires, Fernandes e Janssen (2016, p.195), os grupos focais são

metodologias de recolha de dados que ganharam destaque nos últimos 30 anos nas

133

pesquisas ligadas às Ciências Sociais “(...) como forma de recolher informações

acerca das percepções, atitudes, sentimentos e/ou opiniões em torno de um

determinado tema”. No grupo focal, a entrevista, que normalmente é regida por uma

situação mais formal e individualista, acaba por ser reconceituada como um espaço

para discussão entre os participantes, de maneira mais informal, favorecendo com

que o processo de coleta de dados se torne mais democrático, emergindo uma troca

de concepções e ideias, promovendo também a reflexão entre os participantes sobre

os temas tratados. É importante observar, ainda, que os dados levantados no grupo

focal não são somente aqueles expressos verbalmente, mas também aqueles que

transparecem nas expressões faciais, corporais, nos silêncios, nos comentários

feitos em voz baixa, dentre outras formas de comunicação não verbal. Nessa

proposta, os participantes da pesquisa não são apenas objetos de pesquisa, mas

colaboradores, e, de certa forma, coautores, pois ajudaram na avaliação sobre a

análise dos dados.

A preparação para o grupo focal se deu ainda no primeiro semestre de 2016 e

aconteceu concomitantemente à escrita da pesquisa, feita nas duas primeiras partes

dessa dissertação. Inicialmente, foi realizada uma reunião com o diretor geral da

instituição para expor a ideia da realização do grupo focal com os professores da

instituição e informado também qual era o objetivo da pesquisa. A direção recebeu

bem a proposta e disponibilizou que o grupo focal pudesse acontecer durante o

período das atividades dos docentes e da pesquisadora, desde que não fosse

interromper as aulas, por compreender que os temas discutidos poderiam contribuir

para a prática pedagógica do campus.

Após a autorização da direção geral por meio do termo de consentimento livre

e esclarecido, foi pensado com cuidado em quais professores, que atuam nos

cursos técnicos integrados ao ensino médio, seriam convidados para participarem

da pesquisa. Um dos pontos levantados pela pesquisadora é que não seria de tanta

contribuição se houvesse professores apenas de uma única área ou com uma

mesma formação, ou mesmo uma linha única de pensamento educacional. Pois,

uma das características dos IFs é essa diversificação de professores atuando junto,

daí o cuidado em convidar professores que espelhassem essa diversificação. A

partir da definição de se trabalhar com um grupo que pudesse representar a

134

heterogeneidade existente nos IFs, e no campus em questão, é que se chegou aos

participantes da pesquisa, como poderá ser visto no quadro 06, de caracterização

dos sujeitos.

3.1.2.1. Da contextualização dos sujeitos

Os sujeitos da pesquisa são professores dos cursos técnicos integrados ao

ensino médio das áreas de Química, Informática, Gestão e do Núcleo Básico

Comum. Inicialmente o grupo seria composto por 10 professores, porém a partir do

terceiro encontro, outro professor, sabendo dos temas que estavam sendo

discutidos manifestou interesse em participar também do grupo focal, passando

então a ter um grupo composto por 11 professores. No grupo dos 11 professores, 4

participantes são do sexo feminino e 7 participantes do sexo masculino com idades

que variam de 30 a 54 anos. Há nesse grupo professores de disciplinas teóricas e

de disciplinas práticas. Esses professores possuem formações e experiências

diversas como pode ser observado no quadro número 6. O intuito da escolha de

professores com formações, contextos e áreas diferentes se deu de forma

consciente com o propósito de poder ter uma mostra da diversidade que atua em

uma mesma instituição e em um mesmo curso. O que inicialmente poderia ser

entendido como algo complexo, mas segundo os próprios professores participantes,

essa diversidade é vista por eles como uma possibilidade enriquecedora de ampliar

os conhecimentos e diversificar as práticas docentes, pois eles compartilham, em

diferentes momentos, suas experiências.

Todos os professores vêm de experiências docentes anteriores e todos

concordam que trabalhar com esta modalidade de educação é algo novo e

desafiador. A maioria dos participantes trabalha com os cursos técnicos integrados

desde sua implantação no campus, perto de completar dois anos, com exceção de

um professor que tem experiência com a educação profissional, mas com os cursos

técnicos integrados ao ensino médio está há pouco tempo.

135

Quadro 06- Caracterização dos sujeitos

Participantes Sex

o

Idade Tempo de

experiênci

a docente

Tempo nos

cursos

técnicos

integrados

ao ensino

médio

Formação acadêmica

P14 F 33 anos 6 anos e

meio

2 anos Licenciada em química; Mestre

no Ensino Químico e Pós-

graduada Lato sensu em Gênero

e Diversidade na Escola.

P2 M 41 anos 9 anos 2 anos Técnico em Química; Bacharel e

Licenciado em química; Mestre

em Química Inorgânica, Doutor e

Pós-doutor em química; Pós-

graduado Lato sensu em Gestão

Pública e graduando em

Licenciatura em Filosofia.

P3 M 40 anos 13 anos 4 anos e

meio

Tecnólogo em processamento de

dados; Pós-graduação lato sensu

em análise de sistemas e em

gestão pública; Mestre em

Ciência da Computação,

Licenciado no Ensino da

Computação (complementação

pedagógica) e cursando Pós-

graduação lato sensu em EJA.

P4 M 33 anos 6 anos 1 ano Licenciado em Química; Mestre

em química; Doutorando em

educação.

P5 M 40 anos 12 anos 2 anos Graduado em Letras; Pós-

graduação lato sensu em

Educação; Mestrando em

Educação.

P6 F 53 anos 25 anos 2 anos Licenciada e bacharel em

Ciências Sociais; Mestre em

Trabalho e Sindicalismo; Doutora

em Ciências Sociais: As

transformações do perfil da

classe trabalhadora com a

inserção das novas tecnologias

4 Números atribuídos aleatoriamente.

136

nos processos de trabalho.

P7 M 30 anos 6 anos 5 anos Bacharel em Sistemas de

informação; Pós-graduação lato

sensu em Banco de Dados;

Licenciado em Computação

(programa R2- complementação

pedagógica) e Mestrando em

Educação.

P8 F 33 anos 4 anos 2 anos Licenciada em Química; Mestre

em Química Inorgânica.

P9 F 54 anos 12 anos 4 anos Graduada em Engenharia

Química; Mestre em Engenharia

Química; Doutora em Engenharia

de Alimentos.

,P10 M 32 anos 6 anos 1 ano e meio Bacharel em Administração;

Mestre em Administração; Doutor

em Administração e Pós-

doutorando em Administração.

P11 M 48 anos 20 anos 5 anos Bacharel em Química; licenciado

em Química, mestre em Química

e doutor em Química.

Fonte: Arquivo pessoal da autora

Os participantes foram convidados para participar do grupo focal após uma

breve explicação sobre a proposta da pesquisa. Foram convidados inicialmente 12

sujeitos, e aceitaram o convite os 11. A razão da recusa foi por incompatibilidade de

horário uma vez que, um dos convidados ministrava um curso de extensão no

horário em que iriam acontecer os encontros. Eles receberam e assinaram o termo

de consentimento livre e esclarecido que constava, além da proposta da pesquisa,

informações sobre a livre participação, a possibilidade de deixar de participar da

pesquisa a qualquer momento, quanto ao anonimato dos participantes, dentre outros

informes. O modelo do termo de consentimento livre e esclarecido consta anexo da

dissertação, para consulta.

Com os professores formalmente convidados, foi pensado em possíveis

temas para serem apresentados e validados, ou não, pelos participantes. Os temas

137

tratados estavam ligados às categorias de análise já citadas: trabalho/emprego,

educação profissional técnica integrada ao ensino médio e autonomia/emancipação.

Esses temas foram apresentados e discutidos no primeiro dos seis encontros do

grupo focal, sendo que ficou decidido que o tema do último encontro ficaria em

aberto, pois possivelmente poderia surgir alguma ideia de tema com base nos

encontros antecedentes. A ideia levada foi a de que, embora os temas fossem

pensados para atender às necessidades da pesquisa, que esses fossem decididos

com os participantes e não para os participantes. Os temas dos encontros ficaram

sendo, então: Encontro 1- Conhecendo melhor a formação e o contexto dos

professores participantes; 2- Compreender a questão do trabalho e emprego;

entender o que a legislação prevê sobre os cursos técnicos integrados ao ensino

médio e avaliar que tipo de educação se pratica no Campus XXX: formação para o

trabalho ou qualificação para o emprego; 3- Avaliar alguns documentos que orientam

a educação profissional nos cursos técnicos integrados ao ensino médio; 4- Discutir

sobre a formação continuada e sobre a heterogeneidade de professores que

trabalham nos cursos técnicos integrado ao ensino médio; 5- Discutir e refletir sobre

as competências necessárias para o professor da EPTNM e 6- Analisar os currículos

desses cursos e as concepções de educação que estão contidas nele.

Após avaliação dos temas propostos pela pesquisadora e aprovados pelo

grupo focal deu-se início à discussão. Os pontos levantados e os apontamentos dos

participantes serão descritos a seguir. Um acordo feito entre a pesquisadora e os

professores participantes foi que, ao finalizar os encontros e trabalhados os dados

dos encontros, esses seriam discutidos com os participantes antes de finalizada a

dissertação. Essa proposta se deu pelo fato de que não se pode falar de educação

sociocomunitária e pedagogia crítica e manter uma postura unilateral. É preciso que

aqueles envolvidos no processo sejam verdadeiramente participantes ativos nesse,

não só na coleta dos dados, mas na sua análise também.

3.1.2.2. Dos encontros dos grupos focais

O grupo focal foi organizado em seis encontros, realizados às terças-feiras,

com duração de uma hora e meia cada encontro. Os encontros aconteceram no

138

horário das 17h15mn até às 18h45 min, pois alguns dos participantes davam aulas

até às 17 horas e retornavam para sala de aula às 19 horas, sendo considerado pela

pesquisadora uma gentileza dos participantes cederem seus horários de intervalo e

de jantar para participarem da pesquisa. Ao início de cada encontro a pesquisadora

fazia uma contextualização teórico-reflexiva do tema, de modo que os participantes

pudessem relacioná-los com suas práticas diárias nos cursos técnicos integrados ao

ensino médio. Após a contextualização eram trazidas algumas questões

disparadoras, a partir das quais os participantes conversavam, até se formar uma

discussão sobre o tema. Todos os encontros foram filmados utilizando-se de duas

câmeras, posicionadas em ângulos diferentes, para que pudessem captar, além das

falas, as expressões não verbais, que também são importantes nos grupos focais.

No primeiro encontro, realizado no dia 02 de agosto de 2016, participaram 9

professores. Antes de iniciar a discussão do primeiro tema, a pesquisadora

reafirmou o compromisso de dar um retorno aos participantes e à direção geral da

instituição, dos resultados encontrados após a finalização da pesquisa. Após

explicar verbalmente a dinâmica do grupo focal e verificar se os participantes haviam

compreendido a proposta dos grupos focais, iniciou-se a discussão do primeiro

tema.

O objetivo do primeiro encontro foi de conhecer melhor o perfil dos

professores, discutir sobre a formação de cada um dos participantes e como se deu

ou está se dando o processo de “adaptação” desses nos cursos técnicos integrados

ao ensino médio.

No segundo encontro, que aconteceu no dia 09 de agosto, e contou com a

participação de 9 professores teve o objetivo de refletir sobre o que os participantes

entendem sobre os conceitos de trabalho e emprego, compreender melhor suas

definições e, com base nesses dois tópicos, refletir sobre como se dá a prática

desses professores e que propostas de educação estão/são assumidas por eles.

O terceiro encontro, realizado no dia 16 de agosto, contou com a participação

de 10 professores. Nesse encontro, retomou-se a discussão do encontro dois para

avaliar as práticas docentes e tentar identificar se elas se propõem à formação para

o trabalho ou para o emprego. Em seguida foi avaliado o que a legislação prevê

139

sobre o ensino para esta modalidade de educação e se, de fato, os docentes

concordam e cumprem com as propostas apontadas na legislação.

O quarto encontro realizado no dia 23 de agosto, contou com a participação

de 10 professores. Nesse encontro teve início um novo participante que não havia

sido convidado inicialmente, mas que, ao saber pelos outros colegas participantes

sobre os temas discutidos nos encontros, procurou a pesquisadora e manifestou

interesse em participar. O objetivo do encontro foi com base nos apontamentos

iniciais dos professores de que não tiveram formação para trabalhar com a

educação profissional, identificar se houve ou há capacitação oferecida pelo IF e

avaliar como é para os professores trabalharem em diferentes modalidades de

cursos, da diversidade que é trabalhar com professores com formações e

experiências diferentes.

No quinto encontro, realizado no dia 30 de agosto, participaram 10

professores. Esse encontro teve por objetivo avaliar quais as necessidades que a

educação profissional contemporânea traz e quais são as competências necessárias

para os professores que nela atuam, tendo como parâmetro os estudos de Rehem

(2009), que discute exatamente esses pontos em um livro dedicado especificamente

ao perfil e à formação necessários aos professores da educação profissional técnica.

O sexto e último encontro realizado no dia 06 de setembro teve a participação

de 10 professores e foi dividido em dois momentos. O primeiro momento teve como

objetivo avaliar e refletir sobre os currículos dos dois cursos técnicos integrados ao

ensino médio, oferecidos atualmente no campus. Avaliar se eles contemplam a

legislação e quais as propostas de educação estão contidas neles. Se essas

propostas atendem às expectativas desses professores e se o currículo facilita ou

dificulta o cumprimento de uma proposta de educação integral que leve á autonomia

e emancipação dos jovens que deles participam ou favorecem uma educação que

entendida como reproducionista que aliena os alunos. O segundo momento, como

solicitado anteriormente pelos participantes, não teve um tema definido, com o

objetivo que a conversa fluísse sem que houvesse um tema direcionador, tornando-

se um momento de integração mais descontraída dos saberes docentes.

Buscou-se em cada encontro proporcionar um ambiente acolhedor em que

cada participante se manifestasse quando se sentisse à vontade para falar do

140

assunto em discussão, dessa forma, será possível perceber durante a análise dos

dados que alguns professores se colocaram, verbalmente, mais que outros. O que

não significa que aqueles que falaram menos não tenham contribuído com a

pesquisa, apenas não se sentiram tão à vontade para falar sobre determinados

temas ou, como alguns mesmos disseram, foram contemplados, em alguns

momentos, nas falas dos colegas. Mas analisaremos os grupos focais a seguir.

3.1.2.3. Da análise dos encontros do grupo focal

O primeiro encontro do grupo focal aconteceu no dia 02 de agosto. A primeira

e a segunda questões levantadas no grupo focal foram sobre a formação e a

experiência docente de cada um dos participantes, a partir da qual se originou o

quadro número 06, sobre a caracterização dos sujeitos. Nele podemos compreender

a diversidade que caracteriza os professores que trabalham nos cursos técnicos

integrados ao ensino médio do campus pesquisado. Dentre os perfis de formação

temos engenheiros, licenciados, tecnólogos e bacharéis. Todos os professores

tiveram experiências como docentes antes de irem para o IF, que variaram de 4 a 25

anos.

Organizamos a análise dos dados de forma a contemplar, nas diferentes

falas, as três categorias por nós pensadas, e à luz dos referenciais teóricos.

Quando perguntados se os professores tiveram uma formação que contribuiu

para trabalharem com as especificidades dos cursos técnicos integrados ao ensino

médio, como eles se adaptaram a esta modalidade de educação e se esse foi um

“processo tranquilo”, foi unânime, nas respostas dos professores, que não tiveram

uma formação que possibilitasse a compreensão para trabalhar com estes cursos,

entendidos por eles com características diferentes dos cursos superiores e também

dos cursos de ensino médio somente. Nas falas dos participantes:

Na minha formação inicial eu não tive uma disciplina específica para trabalhar a EPT (Educação Profissional Técnica), eu compreendo também que naquela época não havia, embora já houvesse demanda desses cursos, não havia oferta deles de maneira tão expressiva como é hoje. O curso era construído e estruturado pelo viés bacharelesco. Dito isso, reflito sobre a aplicação de a maioria de nós não termos tido essa formação nos cursos de formação inicial. A gente tende a colocar na EPTNM (Educação Profissional Técnica de Nível Médio) metodologias e concepções de ensino

141

voltadas para nossa formação, pelo viés bacharelesco. Aí está o que alguns colegas apontaram sobre a distância entre o que a formação que a gente oferta e a necessidade do mundo do trabalho. Há uma desconexão entre o perfil que a gente forma e o profissional que o mundo do trabalho está solicitando e necessitando (P4, 02 agosto de 2016).

Me preparei para ser professor na preparação para dar minhas aulas, aprendi dando aula. Hoje há melhor preocupação na licenciatura para esta modalidade, mas mesmo assim a sala de aula é algo revelador em que se aprende na prática em que se aprende a trabalhar com essa diversidade. “eu que fiz licenciatura não me sinto tão preparado, penso na dificuldade de quem não fez (P5, 02 de agosto de 2016). Às vezes eu fico refletindo sobre um ponto, que eu não tenho ainda uma resposta, porque ficou claro aqui que não existe preparação para quem fez licenciatura trabalhar com os cursos Técnicos integrados e para nós, bacharéis, preparação nenhuma. Mas da mesma forma eu fico pensando assim, mesmo que tivesse essa formação para trabalhar com esses cursos eu acredito que por mais que tenha esse preparo, quando você entrar na sala de aula é totalmente diferente (P7, 02 de agosto de 2016). Não tive formação nenhuma, na verdade eu tive uma “antiformação” pelos meus professores” me formei e fui para a indústria. Hoje sinto que me formo com meus alunos e com as trocas de experiências com meus colegas (P9, 02 de agosto de 2016).

Essas falas mostram um pouco do que os professores participantes da

pesquisa trazem sobre a falta de formação acadêmica para trabalhar com esta

modalidade de ensino. E como isso impacta os contornos da educação profissional

de nível médio. Eles consideram que estão em constante processo de aprendizagem

e que está acontecendo de maneira contínua, por meio da reflexão sobre a prática.

Contudo, observa-se, também, que há poucas referências, nas falas dos docentes,

sobre a busca por bases teóricas que subsidiassem a prática didática. Os

professores se colocaram na condição de aprendentes:

Quando nós chegamos aqui no campus não sabíamos como formar um técnico, tínhamos experiência dos cursos superiores e a teoria dos cursos de Ensino Médio e fomos adaptando (...) fomos nos formando juntos e ainda estamos em formação (P2, 02 de agosto de 2016). Eu considero que a adaptação de início foi muita na prática, não houve uma reflexão crítica prévia e mesmo depois que iniciou o processo. A exemplo do que os colegas disseram, fazendo uma avaliação crítica, eu considero que eu reproduzi o que eu estava acostumado no ensino médio e fundamental em escolas particulares voltadas para o vestibular. Depois de um tempo essa adaptação passou de uma experiência prática para uma experiência mais teórica. Eu passei a me questionar a respeito de determinados assuntos, e na tentativa de responder a essas questões eu fui buscar grupos de estudo dentro e fora da instituição. Então eu tive uma

142

adaptação mais prática no início e agora uma adaptação mais teórica (P4, 02 de agosto de 2016). Essa adaptação não foi e não está sendo fácil para mim, antes de entrar aqui eu trabalhava em uma escola particular e lá eu já tinha a apostila, a aula pronta, e eu só tinha que estudar aquilo e ir lá aplicar. Então estávamos formando alunos apenas para o vestibular, era o foco deles. Aí quando entrei no IF eu vi uma coisa diferente, eu não só estou preocupada com os alunos que querem prestar um vestibular, mas formar ele para o mercado de trabalho e principalmente formar um cidadão. São três coisas juntas que a gente tenta fazer o possível para tentar contemplar (P8, 02 de agosto de 2016). A adaptação está sendo um processo de tentativa e erro, numa busca de autoconhecimento e autoaprendizagem, tentando entender o que se aplica do que eu aprendi e o que eu preciso melhorar e aperfeiçoar (P10, 02 de agosto de 2016).

Um ponto identificado nesse encontro foi que, embora os participantes

afirmem que não tiveram formação e que estão em processo de adaptação, eles

apontam que o campus pesquisado oferece oportunidade para que possam refletir e

aperfeiçoar suas práticas, inclusive em relação a poderem participar desse grupo

focal, como podemos verificar nas falas a seguir:

Essa questão da oportunidade que a gente tem aqui dentro do campus de ter essas discussões, inclusive de ter esse grupo focal está contribuindo bastante pra nossas reflexões. Nós tínhamos no grupo da Química esses tipos de discussões que contribuía muito nessas trocas de ideias e de experiências. Mas essa adaptação é realmente um desafio e a cada dia a gente reflete (P1, 02 de agosto de 2016). (...) nesses dois últimos anos aqui no IFSP acho que agora estou saindo da fase do encantamento em que nos últimos 20 e tantos anos de ensino superior privado em que eu só dava aula. Particularmente aqui no IFSP considero uma das experiências mais ricas em toda a história na educação, matéria que lecionei vários anos. Não tinha visto ainda um projeto de educação como este com uma riqueza de oportunidades que me deixou impactada. Pelas boas condições de carreira, trabalho, de ter dedicação exclusiva, com jornada de trabalho para sala de aula menor com tempo maior para preparação didática e com a integração entre ensino, pesquisa e extensão. Que permitem que a gente tenha feito nesse ano reflexões dessa experiência e pensarmos limites e possibilidades na EPTNMI (educação profissional Técnica de nível médio nos cursos integrados), limites e possibilidades de integração das disciplinas do Núcleo Básico Comum com as disciplinas técnicas não só da grade, mas de transcendência e transposição de uma matéria para outra. Tenho a sensação de estar recomeçando de novo, particularmente tem sido muito estimulante porque é uma equipe muito integrada, afinada, respeitosa nas diferenças. O que temos aqui não sei se outras instituições têm, de cruzarmos e conversarmos, experimentarmos, tem sido muito gratificante (P6, 02 de agosto de 2016).

143

Um privilégio que nós temos aqui no IF essa possibilidade de discutir, a outra é o privilégio de sermos selecionados para participar desses encontros que nós estamos tendo no grupo focal e trazer para esse ambiente de discussão que é muito rico não só para o seu trabalho, mas para nós também. Faz a gente pensar e repensar ver o ponto de cada um, ver o que nós temos de comum, o que nós temos incomum e aí é pensar em nossas práticas (P3, 16 de agosto de 2016).

Isso, por um lado, pode configurar uma ideia de autonomia do docente em

relação ao seu próprio processo formativo. Mas será que é assim mesmo? Os

docentes podem perceber essa autonomia, que, no contexto desse trabalho, está

referendado na conceituação de Gadotti (2004) como auto- realização humana, mas

se consideram emancipados para trabalharem na sua formação, pensando-se em

emancipação como conceituado por Martins (1993)? Quais as reflexões que podem

advir, a partir dessas ponderações, das diferenciações entre trabalho/emprego em

relação a como os docentes da educação profissional de nível técnico percebem sua

própria prática pedagógica?

Foi uma tônica, nas falas dos professores, a referência à falta de preparo.

Porém, acompanhando Moura (2008), o que caracterizaria a função do docente da

Educação Profissional, que tornasse possível tratar de uma formação específica

para exercê-la?

Isso nos leva a fazer a seguinte reflexão: existe um conjunto de saberes inerentes à profissão docente que a justifiquem como tal? Se a resposta for sim, temos que fazer outra pergunta: por que, então, existe uma grande liberalidade no mundo do trabalho e na sociedade em geral no sentido de que outros profissionais, que não têm a formação docente, atuem como tal? Nossa resposta é: apesar de existir um conjunto de saberes próprios da profissão docente (VEIGA, 2002), essa não tem reconhecimento social e do mundo do trabalho compatível com sua importância para a sociedade, por isso não há esse rigor (MOURA, 2008, p. 31).

Ou seja: a exigência de uma formação de qualidade para o docente que atua

na educação profissional de nível técnico, e, por conseguinte, a própria educação

profissional para essa modalidade, parece não contar com o respaldo da sociedade,

incluindo aí as instituições formadoras.

Pelas falas dos docentes podemos resgatar também uma das propostas da

educação sociocomunitária, pois, segundo Martin (1995, p. 7): “O objetivo último da

educação comunitária é desenvolver o processo pelo qual os membros de uma

144

comunidade aprendem a trabalhar juntos para identificar problemas e buscar

soluções para esses”. Nesse sentido, afirmamos que o campus em questão está em

busca desse sentido de comunidade, ao buscar identificar os seus problemas e

também em buscar, juntos, soluções para estes.

No segundo encontro, inicialmente, foi feita uma dinâmica em que os

participantes simularam duas situações distintas. Na primeira delas, simularam uma

linha de produção com prazos, incentivo à competitividade por meio de bônus,

pressão por parte do chefe, trabalho fragmentado, etc., no sentido daquilo que se

refere ao taylorismo/ fordismo, e que simularia o conceito de emprego. A segunda

etapa se referia à ideia do trabalho como princípio educativo, de liberdade e

criatividade em que o trabalhador conhecia todo o processo da construção de um

determinado objeto, não havia pressão quanto ao tempo para finalização, pois houve

respeito pelo tempo de cada um, além dos participantes poderem aprimorar suas

práticas aos poucos e podendo ousar da criatividade para dar características

diferentes a um mesmo tipo de objeto. Após a dinâmica foi feita uma reflexão para

compreender melhor o significado de trabalho e emprego.

A partir da reflexão sobre esses termos, trabalho e emprego, foi proposto que

os participantes pudessem, por meio das suas práticas diárias, identificar se a

educação que praticam pode ser considerada formação para o trabalho ou

qualificação para o emprego:

Eu fiquei pensando que as técnicas, os procedimentos vão sendo mudados e o que a gente faz aqui no IF nos laboratórios, nas aulas, na maioria das vezes vai ser diferente do que ele (o aluno) vai ter no trabalho. Então eu acho que uma formação integral, pensando na questão da autonomia, que ele consiga se desenvolver no trabalho com responsabilidade, com criticidade (P1, 09 de agosto de 2016). (...) a gente tenta trazer essa formação mais integral, mais para o trabalho e não necessariamente para uma empresa específica, nós buscamos uma qualificação mais ampla, pelo menos a gente tenta (P2, 09 de agosto de 2016). Pois assim como os colegas já mencionaram que o nosso objetivo é formar para a vida, e se é para a vida então a gente tem o objetivo de contribuir para formação do indivíduo por um viés mais antropológico, formar o cidadão por um viés mais sociológico e formar para o mundo do trabalho (P4, 09 de agosto de 2016). Então o que eu acho que nós temos que buscar é essa formação preocupada com o processo, com a formação completa na área de

145

conhecimento, mas também com todos os processos que envolvem essa prática. Nos nossos cursos nós temos que buscar isso. No Médio Integrado eu percebo que, até mesmo pelo nosso contexto hoje, a formação técnica e a formação básica conversa, dialoga bastante. Acho que a gente tem tudo para buscar essa formação (P5, 09 de agosto de 2016). Assim que assumi aqui comecei a entender essa dinâmica transformadora, rica, porque os nossos alunos de nível médio têm a oportunidade de formação que os alunos do ensino superior das instituições públicas têm no Brasil (P6, 09 de agosto de 2016). (...) a gente cobra tanto hoje a autonomia do aluno, mas o professor não deve formar o aluno, o aluno deve se formar e ele ter essa autonomia de seguir a carreira e a vida que ele achar melhor e interessante para ele. Essas possibilidades eu acredito que o IF tem dado para os alunos, a gente tem colocado várias possibilidades na frente deles, e eles com a autonomia deles vão decidir o caminho que querem seguir. E isso é o mais importante talvez numa escola (P7, 09 de agosto de 2016). Eu acredito que o ensino deve partir de uma forma que ele consiga conjugar a formação geral/ holística, mas também a formação de um especialista naquilo que ele buscou. Nós temos essas duas especialidades e nós devemos buscar essa integração entre as duas (P10, 09 de agosto de 2016).

Com base nas falas, os participantes consideram que devem proporcionar

aos alunos uma formação integral/ holística, que estaria voltada mais para o trabalho

do que para o emprego. Contudo, pelas falas também se nota uma indefinição

quanto as categorias trabalho e emprego: formar para o trabalho seria oferecer uma

“qualificação mais ampla”? Ou mais autônoma? É conjugar o aprendizado técnico

com aquele de conhecimentos gerais? É formar para a vida? Se pensarmos,

acompanhando a ideia, própria da pedagogia crítica, de que: “As estratégias de

formação dos trabalhadores não podem ser dissociadas de projetos de

desenvolvimento social. Portanto, é necessário reconhecer que qualquer leitura que

se faça sobre educação profissional pressupõe uma opção política acerca da

sociedade (...)” (ARAUJO, 2008, p. 56), de qual posição os professores partem, ao

pensar no que seria uma educação profissional para o trabalho?

Os docentes consideram também que ainda não conseguem que suas ações

se alinhem completamente a essa proposta, de formar para o trabalho, pois

encontram vários desafios, que limitam suas práticas.

Nesse mesmo encontro foi apresentada a lei de criação das Escolas de

Aprendizes e Artífices no ano de 1909, instituição que originou os IFs, e foi feita uma

breve comparação com a lei de criação dos IFs do ano de 2008. Ao ler em voz alta o

146

trecho que trata do objetivo que criação das Escolas de Aprendizes Artífices no ano

de 1909, houve por parte dos participantes uma reação de espanto. Ficou visível,

em suas expressões faciais, a “indignação” pela proposta que embasou os cursos

de educação profissional naquele tempo. Foi pedido para que os professores

avaliassem as possíveis mudanças, ou não, entre essas duas leis de criação de

cursos profissionalizantes. A lei de criação das Escolas de Aprendizes Artífices em

seu decreto nº 7.566, de 23 de setembro de 1909, propõe uma educação voltada

para atender a um público específico “às classes proletárias” como uma forma de

afastar “os pobres e desvalidos da fortuna da ociosidade ignorante, do vício e do

crime”. Enquanto a criação dos Institutos Federais, aprovada pela lei nº 11.892, de

29 de dezembro de 2008, propõe uma educação que não se limita a um

determinado grupo da sociedade e que traz em sua proposta não mais a ideia de

afastar os marginalizados da ociosidade, mas de promover uma educação que seja

voltada para a formação profissional e cidadã. Para os docentes:

Há uma grande diferença sim, parece que primeira, parece que a função da escola era tirar vagabundo da rua e colocar ele para trabalhar. Na criação do IF pode ver que a visão já é outra, da emancipação do cidadão. E acho que a principal relação aqui não é a formação para o emprego, para empresa, para a indústria e sim a emancipação do cidadão no desenvolvimento da região. Não que seja um desenvolvimento industrial ou algo parecido, mas o desenvolvimento com o conhecimento gerado (P2, 09 de agosto de 2016). O primeiro fala da questão dos desvalidos da sorte e aí o atual deixa bem claro a perspectiva do desenvolvimento socioeconômico local e regional, da geração do trabalho e renda que não restringe e fala da educação que é para todos, é aberta para todos (P3, 09 de agosto de 2016). É evidente a diferença no ano de 1909 em que a formação estava voltada para uma capacitação mais técnica como uma alternativa a violência e em 2008 a formação estava mais voltada para a construção de um cidadão como uma alternativa a atual realidade socioeconômica. Fica evidente atualmente, pelo menos na documentação, que a instituição tem como objetivo formar cidadãos (P4, 09 de agosto de 2016). O aluno precisa ser um agente transformador do mercado, não alguém que se adapta ao mercado (...). Acho que a gente precisa realmente pensar nessa formação para a transformação (P6, 09 de agosto de 2016).

Os professores parecem ver a proposta do IF pesquisado de fato como

“emancipação do cidadão”, vinculada ao desenvolvimento da comunidade onde o

aluno está inserido, e não como servindo a um propósito assistencialista. Contudo,

147

avançamos aqui algumas ideias: quais são as ações que vem sendo realizadas para

atingir as diretrizes colocadas na legislação de criação dos Institutos Federais?

Damos como exemplo a oferta de cursos de extensão quando da elaboração da

programação para a oferta dos cursos que serão oferecidos à comunidade, em que

nem sem sempre há a participação desta na definição de quais são suas reais

necessidades ou interesses. Poderia haver, conforme pensamos, ações para

impulsionar projetos de economia solidária, que favoreceriam, em nosso entender,

uma formação para o desenvolvimento da comunidade. Pelos documentos da

Aontas (2004), a ideia de empoderamento dos jovens, pela perspectiva de uma

educação (sócio) comunitária, emerge como vinculada ao desenvolvimento da

capacidade para a ação social, o que dá um senso de empoderamento individual e

coletivo, com habilidade para lidar com as questões de justiça social. No texto do

documento: “A Educação (sócio) comunitária tem como intenção o empoderamento

dos participantes com as habilidades, conhecimentos e análise coletiva para desafiar

a opressão e engajar-se em ações para trazer mudanças” (AONTAS, 2004, p.02).

No encontro de número três, realizado no dia 16 de agosto de 2016, foram

feitas análises de alguns documentos que orientam a educação profissional, em

especial os cursos de foco dessa pesquisa, alguns desses documentos foram

avaliados pela pesquisadora na coleta de dados da legislação. Nesse encontro

tivemos como ponto para discussão a análise e reflexões acerca do documento:

Concepção e Diretrizes do Instituto Federal, sugerido por uma das participantes, e

da resolução nº 06 de 2012, que trata da finalidade dos cursos de educação

profissional técnica de nível médio, da formação integral, em especial o artigo 5, que

se refere aos seus princípios norteadores. Sobre essa base foi discutido se, e de

que forma, os participantes efetivam as propostas contidas nesses documentos. Foi

identificado que nem todos os professores tinham conhecimento sobre esses

documentos. Por esse motivo, as principais propostas desses documentos foram

projetadas na parede para favorecer a discussão conjunta.

Analisando os princípios norteadores contidos no artigo 5, propostos pela

resolução 06 de 2012, que estão citados na segunda parte desta dissertação, os

professores dedicaram-se para debater como colocam em prática os objetivos do

decreto e fizeram os seguintes apontamentos:

148

O participante 2 cita uma mudança em sua prática com o uso do celular e faz

uma crítica ao uso de apostilas:

A mudança da prática também é muito importante. Há três anos estávamos reclamando dos alunos usando celular em sala de aula e hoje não incomoda mais, na verdade até ajuda, às vezes eles fazem a pesquisa durante a aula. Há uma descrença de que fora das apostilas não funcionam, mas nós podemos provar que funciona (P2, 16 de agosto de 2016). Eu tenho observado, fazendo uma reflexão sobre a minha atuação, que eu tenho tentado fazer exatamente isso (contemplar os princípios contidos no artigo avaliado) de maneira individual há mais tempo. Dentro das disciplinas que eu ministrava ou ministro, desenvolver a parte técnica, a parte cultural, a parte social. Por exemplo: na química trabalhando modelos atômicos, além de trabalhar o conceito de modelos atômicos, discutir um pouco a vivência desses cientistas, então fazendo uma abordagem histórica, relacionando com a nossa realidade (P4, 16 de agosto de 2016). Queria lembrar que nós temos a organização didática, e isso faz muita diferença, a gente tem o tempo para fazer essa pesquisa. Quando eu trabalhava nas escolas particulares e do estado eu tinha que seguir aquele caderninho achando que ele era o máximo. A nossa pedagogia hoje é focada no aluno e não mais no professor (P6, 16 de agosto de 2016). Tento trazer assuntos que são do interesse dos próprios alunos eles me ajudam a pesquisar. Para você despertar o interesse do aluno você tem que saber o que interessa ao aluno. Que seja o celular como ferramenta. Eu vejo os nossos alunos muito criativos. Eu tento sempre fazer um link da teoria com a prática e dos relacionamentos interpessoais e da postura como futuros profissionais. Trazendo sempre para a realidade (P9, 16 de agosto de 2016).

Sobre o documento Concepções e Diretrizes do Instituto Federal, apenas dois

dos participantes já tinham lido, não havendo, portanto, muitas manifestações a

respeito deste. A participante 6 aponta:

Esse documento tende a se tornar velho dentro do próprio IF, pois tem grupos de discussão e a gente vê que ele não é um documento muito apreciado por muita gente que está na parte mais política e administrativa. Ele fala em promoção de equidade, como é que você consegue equidade? Equidade é você partir do princípio de que as pessoas têm diferentes posições na sociedade e cabe ao Estado promover condições de equiparação mínima para que todos possam concorrer a partir de um certo patamar, que é a justiça social. Isso também já está velho, com corte de bolsas. A Assistência Estudantil teve um corte grande e essa reedição de que a educação é um privilégio... Por isso que eu gosto desse documento, acho que ele em si traz uma concepção de princípios para o professor em sala de aula que é muito importante também. Se a gente pensar que a educação é um privilégio, a gente precisa olhar para as diferenças econômicas dos nossos alunos como uma dimensão cognitiva (...). Não é só bolsa de assistência estudantil que vai garantir isso, é a “bolsa” da nossa dedicação, o nosso tempo com o aluno também. E nesse documento a

149

questão do vestibular não está colocada, o acesso às universidades é uma consequência e eu acho que os nossos alunos terão condições, até o mais pobrezinho aqui do São João (bairro marginalizado pela cidade), de entrar em uma boa universidade (P6, 16 de agosto de 2016).

Sobre a questão da educação para a justiça social, Pacheco (2010, p. 5)

aponta que a educação deve estar vinculada a um projeto que busque “não apenas

a inclusão nessa sociedade desigual, mas a construção de uma nova sociedade

fundada na igualdade política, econômica e social: uma escola vinculada ao mundo

do trabalho numa perspectiva radicalmente democrática e de justiça social”.

Por justiça social Hardiman e Jackson (2007) entendem a plena equidade de

participação de todos os grupos em uma sociedade modelada mutuamente para

contemplar as necessidades de todos. A justiça social, segundo esses autores,

envolve que todos tenham um sentido de agência e de responsabilidade social com

os outros, com a sociedade, e com o mundo como uma forma de romper com a

opressão:

O objetivo da educação para a justiça social é capacitar as pessoas para desenvolver a análise crítica, as ferramentas necessárias a compreensão da opressão e a socialização dessa em sistemas sociais, desenvolver o sentido de agência e de capacidade para interromper e mudar padrões e comportamentos opressivos, bem como a nós mesmos e as instituições e comunidades das quais somos parte (HARDIMAN; JACKSON, 2007, p.1).

Consideramos que a justiça social e a equidade, termos que foram apontados

por essa participante, bem como as falas dos demais docentes, em relação às

estratégias didáticas que visem engajar o aluno no processo de conhecer, quer

levando-o a pensar na construção histórica desse conhecimento, quer fazendo-o

refletir sobre como a tecnologia dos celulares pode ser usada para aprender os

conteúdos escolares e profissionais, se coadunam com os conceitos de autonomia,

empoderamento, pedagogia crítica e educação sociocomunitária, como aqui

expostos. E parece indicar uma guinada promissora nos contornos da educação

profissional de nível médio. Ainda, pensamos que os encontros dos grupos focais

tenham colaborado para que essas respostas surgissem, pois as reflexões sobre

esses temas foram constantes durante os encontros semanais.

No quarto encontro, realizado no dia 23 de agosto de 2016, foi feita uma

reflexão juntamente com os participantes com base na Lei nº 11.892, 29/12/2008,

que cria os Institutos Federais, e traz como atribuição para os IFs a oferta de

Educação Profissional Técnica de Nível Médio, Tecnológica de Nível Superior,

150

Licenciaturas, cursos de Formação Inicial, Continuada e de cursos para jovens e

adultos (PROEJA), além de poderem também oferecer cursos de bacharelado,

engenharias, e cursos de pós-graduação Lato Sensu e Stricto Sensu. Essa

diversidade na oferta de educação exige dos professores ter competências para

atuar nas diferentes áreas do conhecimento, podendo transitar desde os cursos de

Nível Médio até os cursos de Pós-Graduação, já que não há separação entre os

professores dentro do IF. Segundo Carvalho e Souza (2014, p. 888) “Esta

complexidade na oferta de educação profissional e tecnológica, abrangendo níveis e

modalidades distintos, não veio acompanhada de políticas de formação docente”.

No primeiro encontro todos concordaram que não tiveram formação inicial

para trabalhar com a educação profissional. Assim, foi perguntado aos participantes

se, após o ingresso no IF, houve cursos/encontros/capacitação oferecidos pela

instituição de formação continuada. De modo geral pode-se identificar que houve a

oferta de formação, mas pouco, se levado em consideração as demandas dos

docentes, como pode ser observado nas falas que seguem:

Agora nesse semestre teremos o início de um curso ofertado pelo IF, o IFSP para todos que é um curso com 200 horas a distância sobre educação inclusiva que já estava sendo preparado há algum tempo e só agora conseguiram colocar em prática (P1, 23 de agosto de 2016). Depois de muitas conversas a gente acaba chegando a alguns acordos, por tentativas e erros, mas não fomos orientados sobre como fazer (P2, 23 de agosto de 2016). Existia uma política de capacitação/complementação pedagógica na política do IF, mas quando eu entrei já não existia mais. Eu e o P7 tivemos que fazer essa complementação por conta própria. Hoje voltou a oferecer em uma parceria do IF com outras instituições. O IF cresceu de forma descontrolada, então a gente precisa de uma boa conversa para ajudar a resolver essa situação e equalizar o nosso trabalho, não necessariamente de uma capacitação (P3, 23 de agosto de 2016). Parece que há uma demanda para a capacitação na parte inclusiva ou na educação profissional. No caso do curso a distância do “IFSP para todos” o número de candidato excedeu 3 vezes o número de vagas mostrando uma demanda reprimida. Considerando que também deve haver uma demanda reprimida na capacitação para a formação para a educação profissional e tecnológica (P4, 23 de agosto de 2016) Percebo que há a ausência da formação e quando ela acontece é de modo precário. Que acaba fazendo com que o profissional passe por mais tempo desenvolvendo essas habilidades na prática, no dia a dia. Eu ressalto a importância da formação continuada para conseguir fazer transposição do

151

conhecimento científico, que é o perfil do professor polivalente para funcionar bem em todas as áreas (P5, 23 de agosto de 2016). Desde que entrei não tive nenhum tipo de curso de capacitação oferecido pelo IF. Somente aqui no câmpus, nós temos nos organizado para fazer grupos de discussões (...) (P9, 23 de agosto de 2016).

O participante P2 aproveita para informar que já existe nos IFs a preocupação

com a formação de professores para atender às necessidades próprias da formação

para a educação profissional. Desde 2015 se tornou obrigatório que se trate das

especificidades da educação profissional nas licenciaturas oferecidas pelo IF e

comenta: “Uma coisa interessante na reformulação da licenciatura é que foi incluída

a disciplina de educação profissional no curso de todas as licenciaturas do IFs” (P2,

23 de agosto de 2016).

É interessante destacar que durante esse encontro alguns participantes

ressaltam que embora quase não haja a oferta de cursos de formação continuada

oferecidos por parte da Reitoria, o campus em questão busca alternativas por

iniciativa própria para aprimorar suas práticas: “Aqui nós temos essas discussões,

mas eu fico pensando nos outros campi que não têm esses momentos” (P2, 23 de

agosto de 2016). E o participante 7 continua: “Como não tem essa política de

capacitação, felizmente temos um grupo que desafio imposto é desafio a ser

cumprido, que busca se esforçar e cumprir” (P7, 23 de agosto de 2016).

O P10 pontua o fato de embora não haver a oferta por parte do IF para

aperfeiçoamento ressalta a auto-capacitação como um momento de incentivo à

formação continuada. Foi observado, nesse momento, que os participantes P1, P4,

P7, P8 e P11 acenaram com a cabeça, indicando concordarem com a fala do

colega:

Para mim que venho da indústria e ensino privado, por mais que eu concorde com esse déficit do IF oferecer mais capacitação para os professores, gostaria de destacar que no IF em nosso plano de trabalho, há espaço para nossa auto-capacitação e formação contínua. Foi com grande satisfação que eu recebi essa notícia de ter essa possibilidade. O IF se preocupa com isso e fornece espaços, dentro da nossa carga horária de trabalho, para isso (P10, 23 de agosto de 2016).

Além dos grupos de estudos e outras atividades organizadas pelo próprio

campus, é interessante ressaltar que existe uma comissão chamada “formação

152

continuada”, da qual a própria pesquisadora faz parte, juntamente com outros

professes e outros servidores, que tem como atribuição a busca permanente para a

formação continuada dos servidores do campus pesquisado.

Após discutir as questões sobre a formação continuada, foi perguntado aos

participantes o que eles pensavam a respeito dessa diversidade de cursos que um

mesmo professor deve atender (médio, tecnólogo, licenciatura, cursos de pós-

graduação Lato e Stricto sensu, além dos cursos de Formação Inicial e Continuada,

PROEJA). O objetivo da questão era saber como era para eles transitar por todos

esses cursos:

É rico e a gente consegue explorar isso aí. Nós aprendemos muito com a experiência de vida com os outros. Sobre essa transitação, são professores muito diferentes em cursos muitos diferentes. É importante a gente verificar onde o professor melhor se encaixa, acho que deveria ter professor por curso, separando quem serão os professores do técnico, do superior, da licenciatura (P3, 23 de agosto de 2016).

Embora considere uma experiência rica, o P3 é partidário de uma divisão por

curso para que o professor trabalhe onde melhor se adapte. E a P8 ressalta que é

possível fazer uma realocação dependendo do perfil do docente:

Aqui a gente tem a opção de escolher, de acordo com o nosso perfil, em qual lugar a gente se encaixa. Como nós temos professores diversos, eles podem se encaixar onde dão mais certo. Mas é a nossa realidade por causa da nossa conversa, não sei se acontece nos outros campi.

Os P9 e P11 consideram que a questão do perfil é importante para direcionar

os cursos em que o docente irá trabalhar, mas consideram a possibilidade de atuar

em todos os cursos uma experiência positiva em que o P11 comenta: “Eu gosto da

ideia. Aqui a gente consegue realocar o professor de acordo com as modalidades

que ele tem um perfil melhor para trabalhar” (P11, 23 de agosto de 2016). E o P9

complementa:

É importante ver onde o professor se encaixa, mas eu já dei aula em praticamente todos os níveis de curso e eu vejo que são públicos diferentes e que devemos trabalhar de maneiras diferentes. É um desafio grande, mas é enriquecedor e prazerosa (P9, 23 de agosto de 2016).

153

O P4 também considera que essa diversidade pode ser considerada como

algo positivo, principalmente pelo fato de poder conviver e trocar experiências como

professores de formações diferentes da sua:

A diversidade dos cursos exige a diversidade de diferentes profissionais, eu sento ao lado de uma pedagoga e educadora física e de um engenheiro. Nessa mesma sala tem um colega formado em linguística, outro em computação. Essa peculiaridade do IF contribui para a formação de um professor com características que o IF precisa para atuar em diferentes áreas. Um fato que potencializa isso é a situação de que não há uma divisão institucional da localização de onde o professor vai ficar de acordo com a sua formação. Diferentemente das universidades que são divididas em departamentos (...) (P4, 23 de agosto de 2016).

E o P10 relembra que nos editais dos concursos públicos para ingressarem

como professores no IF não há essa distinção sobre os níveis de atuação dos

professores, pois todos são nomeados na Carreira de Magistério do Ensino Básico,

Técnico e Tecnológico (EBTT) com regime de dedicação exclusiva:

Eu vejo inicialmente que é a questão da seleção pelo concurso público, ele não está preocupado em fazer essa separação entre os professores e não se preocupa com as questões técnicas ou pedagógicas como melhor formação em nível de mestrado ou doutorado. Pois no concurso ter ou não esse além não é um limitador para ingressar ou não no IF é apenas atribuído pontuação a mais na prova de títulos. O que se preocupa é com a exigência mínima e o que você tem além é apenas para complementar. Vejo como positivo ter vários professores diferentes atuando em um mesmo curso, porque isso oferece aos alunos a oportunidade de ter uma visão de mundo diferente. Eu chego à conclusão de que professores precisam ser super-homens e as professoras precisam ser mulheres- maravilhas porque nós temos de ter a formação acadêmica, temos a complementação e formação pedagógica e da experiência profissional fora da área acadêmica, na indústria, nas empresas e nós não conseguimos fazer essa seleção. Esse professor não vai vir pronto e tem que se oferecer meios para esse profissional se desenvolver (P10, 23 de agosto de 2016).

Seguindo na mesma questão da diversidade que é o IF, foi perguntado aos

participantes, tendo em um mesmo curso (como é o caso do integrado) professores

com diferentes formações engenheiros, tecnólogos, licenciados, bacharéis entre

outros, como era para eles viver essa “mistura” de formações. Percebe-se pelas

respostas que, de maneira geral, eles consideram a experiência positiva: “Acredito

que para os alunos é bastante enriquecedora essa diversidade, de poder conhecer

154

diversos profissionais. É diferente, mas considero importante, bastante significativo”

(P1, 23 de agosto de 2016). E os demais:

Com essa diversidade, por mais que tenha diferenças nas ideias, de ideologias sobre a educação, talvez seja algo que enriquece também. Diferentes metodologias, flexibilidade, com o plano de ensino construído por nós, sem ter que trabalhar com as apostilas que tem dado certo (P2, 23 de agosto de 2016).

Essa diversidade múltipla exige uma competência para a atuação. Como a formação e a filosofia de vida é muito diferente no grupo, exige a necessidade de uma competência para administrar essa diversidade, administrar e respeitar os posicionamentos dos demais colegas seja eles políticos entre outros. Essa característica, além de contribuir para sermos profissionais melhores, contribui para sermos pessoas melhores. Eu percebo que a gente pode passar a ser menos preconceituoso. É bom! (P4, 23 de agosto de 2016).

O P5 também considera uma boa experiência e destaca que os alunos

precisam de um tempo para se adaptarem às diferentes maneiras de ensino dos

professores. Mas também considera essa diversidade rica:

É interessante e rico esse processo, eu tenho visto que os professores aqui são muito envolvidos e que aquele que tem mais habilidade de trabalhar com a prática, trabalha com ela, quem gosta mais da parte teórica vai trabalhar mais nessa parte. Essa riqueza de possiblidades é interessante, quanto mais diversidade melhor. Nós saímos de institutos que atuavam de maneiras isoladas e a nossa prática de sala de aula, muitas vezes é reprodução da nossa formação engessada e ter essa liberdade de experimentar essas maneiras diferentes é às vezes angustiante mesmo. Os alunos precisam de mais ou menos seis meses para se adaptar a nossa forma diferenciada de educação (P5, 23 de agosto de 2016). Eu vejo que é um ganho para o professor e para os alunos, essa além de diferente é enriquecedora. Na outra universidade que eu trabalhava, chamavam esses professores de Frankenstein, mas acho que aqui está mais para super- homem e mulher maravilha. E a formação do aluno vai ser pluridisciplinar mesmo até contribuindo para sua criticidade, para sua formação política (P9, 23 de agosto de 2016).

Tardif (2014) aponta que os diversos saberes dos professores e seu saber

didático têm origem social, para além da aprendizagem científica. Isso tem como

consequência reconhecer que são formados nos vários grupos, associações,

experiências de vida, dos quais os docentes participam. São, dessa maneira,

dinâmicos e também configurados pelos próprios alunos, colegas de trabalho,

contextos de práticas, etc. E as experiências de formação docente para a educação

155

profissional de nível médio devem contemplar essa diversidade e esse caráter social

dos saberes docentes, pois, de outra forma, as iniciativas de formação continuada

correm o risco de ser mais do mesmo. Ao pensar-se na concepção da educação

sociocomunitária, que como já dito, se preocupa com o empoderamento e a

autonomia dos sujeitos, o poder deve ser compartilhado da maneira a mais

equânime possível. Sendo que todos os envolvidos no processo educacional

participam ativamente da construção dos saberes, como protagonistas. Nessa visão

da participação de todos, inclusive dos alunos, estes passam a ser agentes de

mudança e de transformação social. Gadotti (2009, p. 55) também defende a

educação para a justiça social como forma de reduzir as desigualdades advindas

entre opressores e oprimidos: “Ela é a precondição do desenvolvimento e da justiça

social. Na era do conhecimento, socializá-lo é distribuir renda. Não há

desenvolvimento sem inovação tecnológica e não há inovação sem pesquisa, sem

educação, sem escola”. E, principalmente, sem trocas de saberes.

No quinto encontro, foi trabalhada uma apresentação power point, baseada

no livro de Rehem (2009), que trata do perfil e formação do professor de educação

profissional técnica, discutido na segunda parte desta dissertação, criada pela

própria autora e disponibilizada na internet, por meio do link:

http://docplayer.com.br/11654487-Cleunice-rehem-mestre-em-educacao-assessora-

mec-seres.html. Foi feita uma discussão, com os participantes do grupo focal, para

verificar a posição desses em relação aos pontos abordados pela autora.

Inicialmente, foram analisados os eixos estruturantes da formação dos professores

da educação profissional desenhado por Rehem em formato de pirâmide:

156

Figura 1- Eixos Estruturantes da Formação do Professor da Educação Profissional

Fonte:http://docplayer.com.br/11654487-Cleunice-rehem-mestre-em-educacao-assessora-mec-seres.html

O P2 julgou que não foi uma boa escolha esse formato para apresentar os

eixos estruturantes, pois, segundo ele, dá a ideia de agirem de forma isolada. E

acrescenta que na licenciatura oferecida pelo campus, eles tendem a trazer esses

eixos de manieta articulada:

Tradicionalmente estão muito separados esses três eixos, pelo menos dentro da nossa formação. Nós tentamos, na nossa licenciatura tentamos fazer essa integração. A partir do momento que você usa uma outra figura para fazer a junção desses temas, diminuiria a impressão de fragmentação entre os eixos (P2, 30 de agosto de 2016).

E o P11 destaca a ausência da parte humanística, que ele considera

importante ser um dos eixos estruturantes:

Eu gostaria de pensar em outro ponto que é a capacidade de se comunicar com o aluno, isso me parece muito técnico, falta a parte humanística que eu acho importantíssima na educação, é o amor a profissão e aos seres humanos mesmo, o respeito ao outro ser que está ali, naquele momento tentando aprender, empatia pelo outro. Os professores que eu me lembro,

157

são mestres que eu tinha muita empatia, seja em qualquer modalidade de educação (P11, 30 de agosto de 2016).

Dando sequência à apresentação de Rehem (2009), com base nos três eixos

estruturantes apresentados anteriormente, a autora apresenta um quadro com as

cinco competências que ela julga serem necessárias ao professor da educação

profissional. A imagem foi projetada e avaliada pelos participantes:

Figura 2: As cinco competências para o professor da educação profissional

Fonte:http://docplayer.com.br/11654487-Cleunice-rehem-mestre-em-educacao-assessora-mec-seres.html

Seguida da imagem da inter-relação entre elas:

158

Figura 3: Inter-relação das cinco competências para a formação do

professor da educação profissional

Fonte:http://docplayer.com.br/11654487-Cleunice-rehem-mestre-em-educacao-assessora-mec-seres.html.

Os participantes, em sua maioria, concordam com a necessidade das cinco

competências para uma boa atuação docente, mas, novamente, a disposição em

que estão colocadas foi algo incômodo para os participantes, como pode ser

observado nas falas que seguem: “Acho que elas contemplam, mas o que preocupa

é que elas estão fragmentadas. Nos cursos de hoje essas competências estão mais

integradas do que antes” (P1, 30 de agosto de 2016). E seguem:

Na questão do integrado isso é mais aflorado, tem todo aquele lado paternal, maternal, toda ação de medir muito o que e como você vai discutir com os alunos. É um momento propício para discutir as questões de valor, de ética e de profissionalismo e o bacana da autora é que ela fez uma ligação entre as competências, estão totalmente interligadas. Mas eu vejo que vai além. A educação tem que ter como propósito preparar a pessoa para o todo e não especificamente para o mercado (P3, 30 de agosto de 2016). De tão amplas, essas reflexões que estamos fazendo estão se encaixando nessas competências. O fato das setas interligando me faz pensar na inter-relação entre elas. Entendo que estamos propondo uma nova competência que estaria relacionada que seria o poder de ter uma visão holística de todas as competências apresentadas. Mas seria uma sexta competência. São muito amplas essas competências e toda vez que eu penso tudo está contemplado dentro delas (P4, 30 de agosto de 2016).

O que devemos levar em consideração é a constituição do sujeito professor, porque tem toda uma motivação, por que escolheu ser professor, etc. É

159

importante levar em consideração essa construção e essa atuação em sala vem muito antes dele ser professor (P5, 30 de agosto de 2016).

O que eu vejo na figura é uma tentativa da autora de criar um modelo conceitual teórico, que não é muito diferente de outras áreas como a administração e a educação. É um modelo teórico e genérico que vai com poucos pontos tentar resumir ou abranger uma quantidade grande de fatores. Em todo modelo não é possível acrescentar tudo aquilo que você precisa abordar, mas eu acredito que ela comtempla bastante. Eu faria o layout diferente, colocaria em forma de pentágono e essas setas interligando, acho que ficaria mais claro (P10, 30 de agosto de 2016).

É interessante não se preocupar em ensinar apenas o conhecimento técnico porque isso hoje é tudo muito descartável. O importante é ensinar a pensar a profissão, o trabalho, as relações. Eu acho que o problema está na figura, talvez um pentagrama expressasse melhor. Mas contempla bastante (P11, 30 de agosto de 2016).

Já o P2 reflete que cinco competências não são suficientes para dizer o que é

necessário para um professor. E se preocupa com o fato de alguém ou alguma

instituição usar o livro da autora como uma cartilha:

São muito mais do que cinco, e, enumerar e dizer que são apenas as cinco para ser um bom profissional(...) se fosse por exemplo uma interpretação de uma lei, ok, mas temos as nossas características e interpretações. Acho perigoso também alguém utilizar esse gráfico para falar que precisamos aprender apenas isso para formar o professor da educação profissional, pegando como cartilha como base para o professor porque é muito mais amplo (P2, 30 de agosto de 2016).

E a P8 faz uma reflexão sobre a abstração dessas competências, pois

entende que se desconsidera o contexto dos envolvidos nesse processo. E também

critica a forma como foi disposta a apresentação da autora:

A impressão que eu tenho é que essas competências são muito abstratas, da maneira como ela está pondo e é tecnicista também. Como se a gente tivesse em um papelzinho que dissesse de forma programada como formar o professor. E nessa abordagem, eu posso estar sendo injusta por não conhecer a autora, precisaria ler. A impressão que dá é que a competência é uma coisa que vem de fora e a subjetividade do professor? Mesmo com o último item, é um item mais técnico que não compreende a formação do professor ao longo do processo. A gente nunca termina de modo individual. A gente vai se constituindo de forma dialética (...). Minha impressão é que a autora traz isso de uma forma compartimentalizada, e é mais complexo do que isso. Se eu entendesse de gráficos, sugeriria outra representação. Acho muito genérico, precisamos aprender também os contextos dos alunos. Acho que isso deveria estar explicito na competência dos professores. Acho que é muito mais complexo do que ser portador de uma competência pedagógica que se encerra no domínio de uma sequência didática. Eu posso fazer uma sequência didática maravilhosa, mas a realidade é muito mais pulsante (P6, 30 de agosto de 2016).

160

A autora discute, em seu livro, a importância da formação continuada para ser

um bom professor, não só nesta modalidade de educação, mas, nesse caso, dando

foco para a educação profissional de nível médio. É preciso trabalhar/ investir de

forma igualitária na formação inicial e na formação continuada. Ainda utilizando a

apresentação da autora, foi analisada a seguinte imagem:

Figura 4: formação inicial e formação continuada

Fonte:http://docplayer.com.br/11654487-Cleunice-rehem-mestre-em-educacao-assessora-mec-seres.html.

Os professores que se manifestaram concordam que a formação continuada

tem o mesmo grau de importância que a formação inicial. Os participantes também

demonstram preocupação ao dizer que no IF há condições para que o professor

busque a formação continuada, mas reforçam que não é o retrato da maioria dos

professores no Brasil: “Eu compartilho da ideia da autora e faço uma ralação com o

IF, eu vejo que o projeto do IF está alinhado a essa proposta de ter a grande

possibilidade de fazer uma formação continuada, inclusive recebendo” (P4, 30 de

agosto de 2016). Para o P5:

161

O que a gente percebe é que nem sempre tem esse direito de ter a formação inicial e a continuada, acho que a gente faz parte de um grupo muito pequeno no universo da educação que tem condição de manter o equilíbrio para poder buscar a formação continuada e ter espaço para pesquisa. Porque se a gente for pensar, essa formação continuada dificilmente aparece nas outras instituições. Então eu concordo com essa divisão. Mas eu só acho que não é a realidade da educação brasileira (P5, 30 de agosto de 2016).

O P5 se sensibiliza com a ausência dessa possibilidade na realidade da

maioria dos professores brasileiros e se sente privilegiado por fazer parte de uma

pequena parcela desses profissionais que têm essa possibilidade. O que deveria ser

um direito garantido acaba sendo visto como um privilégio:

Acho que a formação continuada é inerente ao ofício, todas as profissões do mundo se caracterizam pela pesquisa contínua. A questão é que diferentemente da medicina, a carreira é precária, depende da estrutura da carreira, da remuneração do professor... e o pior que nessa falta de condição a culpa recai sobre o professor. É importante também que o professor que busca a formação continuada tenha liberdade na instituição que trabalha para aplicar os conhecimentos adquiridos, principalmente inovadores. Pois muitas vezes as instituições não dão espaço para isso (P6, 30 de agosto de 2016). Então a formação continuada dever existir sempre porque a teoria sempre muda, e ele precisa estar antenado a isso, sempre haverá práticas e metodologias inovadoras, principalmente em relação as TICs, e ele precisa estar antenado naquilo que está acontecendo também fora da academia seja nas indústrias ou nos comércios (P10, 30 de agosto de 2016). Poucos professores têm oportunidade da formação continuada nas outras instituições, porque além de não terem incentivos na carga horária, ainda precisam trabalhar em mais de uma instituição para conseguirem uma remuneração mínima e aí esse cara não tem nenhuma condição ou tempo para investir na formação continuada. E pior, ele acaba formando outros cidadãos com pouca base. É a questão de o país querer enfrentar efetivamente esse problema, por enquanto a gente vai sobrevivendo (P11, 30 de agosto de 2016).

Sobre a importância da formação continuada, Freire (1986, p. 62) nos faz

refletir sobre a importância em proporcionar ao professor o aperfeiçoamento para

melhorar a prática docente e ser agente de transformação:

Os professores deveriam ter nas mãos, através das próprias organizações, não só a defesa de seus salários, mas também o direito de ter melhores condições para o trabalho educacional. Em segundo lugar, os professores precisam conquistar o direito de prosseguir sua formação. Os professores cujo sonho é a transformação da sociedade, têm de ter nas mãos um processo permanente de formação (...).

162

O Plano Nacional de Educação 2014-2024 (Câmara dos Deputados, 2015)

destaca, em suas metas 15 e 16, a necessidade e as estratégias para a formação

continuada docente, em todos os níveis e modalidades de ensino. E, também

destaca, na meta 17, a necessidade de valorizar a profissão docente, pois, sem isso,

somente com a formação continuada, não será possível o empoderamento, a

autonomia e a emancipação do docente. Essencial para que aquela do aluno

aconteça.

Ainda no quinto encontro, a P6 traz uma reflexão importante sobre o papel

social da escola e alerta para o cuidado de não se tornarem reprodutores do sistema

de classes, em que estarão apenas a serviço do capital:

O papel social da escola é importante, pois se nós não prestarmos atenção, nós estaremos formando aqui um exército industrial de reserva de técnicos cuja função para o mercado é baratear a mão de obra por meio da concorrência para o emprego. Então eu acho que a competência da gente é fazer esse debate com a sociedade local e regional também, não só em sala de aula. Com o projeto de desenvolvimento local e aí nós enfrentamos dispositivo políticos poderosos porque talvez o interesse do mercado seja mesmo de formar uma mão de obra maior e mais barata. É uma competência que a gente tem que ter inclusive psicológica para lidar com esse ambiente hostil que é o mercado. Como é que eu formo um aluno dizendo seja o melhor, ultrapasse os demais? É uma violência para o professor e para o aluno.

Pensando na contribuição da P6, observamos que Gatti (2016), aponta 08

problemas atualmente enfrentados, na educação brasileira, para a formação

continuada do docente:

Resumindo, nos cursos de formação de professores, e em seu exercício de trabalho, interferindo em sua qualidade, oito pontos podem ser apontados: a) ausência de uma perspectiva de contexto social e cultural e do sentido social dos conhecimentos; b) a ausência nos cursos de licenciatura, e entre seus docentes formadores, de um perfil profissional claro de professor enquanto profissional (em muitos casos será preciso criar, nos que atuam nesses cursos de formação, a consciência de que se está formando um professor; c) a falta de integração das áreas de conteúdo e das disciplinas pedagógicas dentro de cada área e entre si; d) a escolha de conteúdos curriculares; e) a formação dos formadores; f) a falta de uma carreira suficientemente atrativa e de condições de trabalho; g) ausência de módulo escolar com certa durabilidade em termos de professores e funcionários; h) precariedade quanto a insumos para o trabalho docente.

Pelos relatos dos participantes, parece que a formação continuada, nos IF’s,

de forma geral, tem enfrentado menos problemas do que as instituições municipais,

163

particulares ou estaduais. Contudo, consideramos que vários dos pontos citados por

Gatti (2016) interferem na efetivação de uma formação docente para a autonomia e

a emancipação, como uma maior inter-relação dos cursos/propostas de formação

com a comunidade, e mesmo com a criação de comunidades de aprendizagem; a

indefinição quanto a quem é o docente da educação profissional; a falta da

interdisciplinaridade; a rigidez dos conteúdos curriculares, que ainda se mostram

instrucionais e compartimentalizados.

No sexto encontro, realizado no dia 06 de setembro, a primeira parte desse

último encontro teve como tema proposto e aceito pelos participantes a análise dos

currículos dos cursos técnicos em informática integrados ao ensino médio e técnico

em química integrado ao ensino médio. Foi perguntado aos participantes se o

currículo adotado hoje pelo campus contempla suas perspectivas de educação para

os cursos Técnicos Integrados ao Ensino Médio.

Segundo o Projeto Político Pedagógico (2016) do campus:

O foco central quando refletimos sobre currículo é buscar a orientação de

uma ação educativa de forma ampla e integrada, o que vai muito além de

listas de conteúdo, somatórias de cargas horárias e matrizes curriculares,

envolvendo acima de tudo e preponderantemente uma perspectiva social e

política [...].

.

Mas pode ser observado, pelas falas que seguem que, de maneira geral, os

participantes não estão satisfeitos com o currículo atual dos cursos e fazem críticas

em especial à Pró-reitora de Ensino na Diretoria de Educação Básica, responsável

pela avaliação dos Projetos Pedagógicos dos Cursos antes de serem enviados para

o Conselho Superior (órgão que aprova os cursos).

Os currículos dos cursos são construídos por uma comissão nomeada em

portaria, que se responsabiliza pela construção de um Projeto Pedagógico de Curso,

que deve seguir as normas vigentes. Os participantes falam de algumas limitações,

que em seu entender, impedem que a educação por eles praticada não se efetivem

completamente como formação para o trabalho. Eles fazem críticas quanto às

limitações impostas pela reitoria, que criam uma “falsa autonomia”. E criticam o

currículo engessado, que faz com que tenham que fazer uso de um “currículo oculto”

para que possam contemplar suas perspectivas de educação:

164

Desde que começamos a implantação do integrado a gente não tinha flexibilidade e, portanto, que foi mudando e cortando até chegar ao que temos hoje. Eu concordo que o que temos não é o ideal, mas toda vez que tentamos algo novo não é aceito pela PRE. É no currículo oculto que a gente consegue trabalhar de forma mais integrada. Se eu tivesse que entrar em uma sala só para dar aula eu não entraria (P1, 06 de setembro de 2016).

Nós até tentamos quando estávamos construindo os PPCs dos nossos cursos propor um currículo diferenciado, mas quando enviamos para a PRE eles cortaram tudo, então o que nós temos é o feijão com arroz. Eu acho que a nossa estrutura é feijão com arroz, é o que tem pra hoje. É muito complicado formar o aluno com essa estrutura e esperar, além disso, deles. (...) não é uma estrutura que eu acho ideal, embora eu tenha ajudado a elaborar. Porque temos a flexibilidade para fazer do nosso jeito, mas quando a gente manda para a PRE eles mandam cortar o que é diferente, uma falsa flexibilidade (P2, 06 de setembro de 2016).

A reitoria não dá liberdade para o campus inovar nos PPCs dos cursos, que acabam limitando as possibilidades de inovação e criando uma falsa autonomia. A nossa estrutura já vem engessada e a gente tenta reinventar, mas se a gente não atender, não é aprovado. Para mim esse currículo não é o que eu gostaria, essa proposta é de um curso integrado e integral, que não é integrado, que é extremamente massacrante, no entanto, atende a legislação. Com isso a gente volta lá no início da nossa discussão, a gente está formando para o mercado para o emprego ou para o trabalho? E aí nós chegamos à conclusão que estamos formando para a vida (P3, 06 de setembro de 2016).

(...) E aí eu fico pensando, que tamanho seria esse currículo para atender esses objetivos de formação? Então eu fico pensando que por mais que nos esforcemos, nós não vamos conseguir chegar a um currículo que consiga atender esse objetivo. Por outro lado, é claro que a gente pode ter um currículo que se aproxime mais da idealidade que esse, e nesse sentido nós temos muito a caminhar. Assim eu estou reconhecendo as minhas limitações e de todos nós. Um exemplo é que para gente a visão de mundo que a gente tem é a de que conhecimento só é conhecimento se ele for científico. Foi a pouco tempo que eu entendi que é só um dos óculos que nós temos para enxergar a realidade. Tem o conhecimento cientifico, a popular, o religioso, o místico. Temos limitações individuais que vem desde a nossa base de formação e a limitação de entender a visão que temos da escola, para que serve a escola? A gente muitas vezes entra na sala sem refletir muito sobre os objetivos das aulas, para que eu peço para o cara aprender e guardar isso sendo que nem eu mesmo saberia fazer aquilo se eu não tivesse estudado para a aula anteriormente. Embora eu veja que estamos longe do currículo ideal, eu avalio que a gente, no Campus XXX, está muito além dos currículos de escolas técnicas profissionalizantes que não são dos IFs isso não só para o que está escrito, mas pela visão de mundo (P4, 06 de setembro de 2016).

Eu acho que a gente não deve pensar em quantas disciplinas seriam necessárias para dar conta do currículo, porque não é uma questão quantitativa e sim qualitativa. Acho que a cada semestre, dialogando com os colegas das outras áreas, me permite dar um salto qualitativo na dimensão do cognitivo não só como a transmissão de um cérebro para o outro, mas de um corpo para o outro que faria a gente pensar não só em estratégias alternativas didáticas, mas nas relações interpessoais mais ricas e

165

qualitativamente diferentes. Muitas vezes nós trabalhamos de forma “oculta” com a interdisciplinaridade (P6, 06 de setembro de 2016)

Quando eu olho o nosso currículo, eu vejo tudo separado, não vejo a integração do curso. E nisso fica difícil os alunos perceberem a ligação de uma disciplina com outra. E dá para fazer a associação com qualquer disciplina, mas da forma como está sendo posta aqui fica difícil (P8, 06 de setembro de 2016).

Por essas falas é possível identificar que os participantes não estão satisfeitos

com o currículo atual e atribuem uma parte dessa insatisfação ao fato de serem

limitados pela PRE/ DEB, que não são abertas a propostas inovadoras. Tendo o

campus que trabalhar, como dito por um dos participantes, como o “arroz com

feijão”, ou seja, com uma proposta tradicionalista de educação.

No entender de Orlowski (2001, p. 168), as proposições curriculares no Brasil

dificilmente têm sido “puras” - mesclam o controle técnico dos conteúdos, da

organização institucional, das práticas didáticas e avaliativas com teorias de cunho

social:

O governo neoliberal se apropria de um discurso crítico e emancipatório não coerente com a sua prática e enfatiza a Educação Profissional como direito à educação e trabalho. Tal discurso, presente na legislação e pronunciamentos do gênero, coloca a qualificação para o trabalho como instrumento para a democracia, igualdade e liberdade, não deixando de estabelecer o vínculo deste com o mercado de trabalho. Respondendo às necessidades do capital, este é quem define as regras, e assim, o compro- misso da Educação Profissional passa a ser com a hegemonia dominante.

Reforçamos que o currículo não é neutro, e o fato do IF’s terem uma posição

ainda “tradicional”, em relação ao currículo, leva a tensões com o que é proposto

nos seus documentos direcionadores.

Por outro lado, consideramos que a tomada de consciência dessa limitação,

pelos professores, é um passo importante, no sentido de transformá-la. Segundo Au

(2011) a pedagogia crítica e libertadora de Freire trabalha para atingir duas metas: a

primeira é de capacitar os estudantes e os professores para a compreensão crítica

da sua relação com o mundo. A segunda meta está relacionada com a primeira, e

propõe que a pedagogia, ao ajudar a desenvolver a consciência, ajuda também a

capacitar os estudantes e os professores a tornarem-se pessoas mais conscientes

de seu contexto e da sua condição de sujeito, com poder de escolha. E ao tornarem-

se sujeitos críticos, com poder de escolha, tornam-se então agentes críticos capazes

de transformar suas realidades.

166

A Educação Sociocomunitária, em nosso entender, pode colaborar para isso

ao

favorecer a emersão das diferentes vozes que compõem as múltiplas educações, que vão nos configurando construindo a nossa subjetividade- enquanto vamos sendo inseridos nas malhas de relações sociais, que constituem o viver. A escuta atenta destas vozes, o colocá-las em diálogo, levantando a discussão de suas contradições e ideologias, é fundamental para que tenhamos uma tessitura da realidade mais crítica e emancipatória. É por meio desta discussão que a educação para a autonomia é possível (BISSOTO, 2012, p. 54).

É importante registrar nesta pesquisa que, embora não fosse um dos temas

proposto, porém de igual importância a estes, foi identificado que, a partir do terceiro

encontro, nas falas e nas expressões faciais e corporais dos participantes, a

manifestação de insegurança e preocupação sobre a atual situação política e

econômica vivida pelo país e a preocupação sobre de que maneira os IFs poderiam

ser afetados. Para o P4: “(...) nos preocupa bastante o fato de sermos

surpreendidos hoje pelo cancelamento do CONEPT por falta de verba que é

consequência do ajuste fiscal” (P4, 23 de agosto de 2016). E, ainda:

(...) a gente está assombrada com ameaças de mudanças nessa realidade. Eu acho que nesse final de ano a gente vai ter oportunidade de perceber se esse projeto vai permanecer ou se ele vai sofrer uma ruptura profunda porque vou deixar registrado e a instituição precisa ser analisada dentro do contexto em que há uma situação de impedimento do governo federal, da presidenta da república, assume em presidente interino que não é simpático a esse projeto. E as medidas que vem sendo tomadas indicam que a gente terá nivelamento com as políticas anteriores, seja no formato de maior número de aulas, seja nos cortes. A gente teve essa semana a notícia do corte nas bolsas de pesquisa do CNPQ para os IFs, e isso tudo gera impacto na nossa previsão. Como a gente vai atuar? Estamos chegando no momento de fazer um diagnóstico da realidade do município, de fazer pesquisas na região. Eu queria deixar registrado na pesquisa essa consciência de que o que está em sala de aula não está desconectado do mundo, do que acontece no contexto global (P6, 16 de agosto de 2016).

O participante (P4), no encontro realizado no dia 30 de agosto, pontua:

(...) existe uma preocupação que foi relatada na última reunião geral em que o diretor geral comentou que já se cogitou em uma reunião da SETEC em Brasília de praticamente transformar os professores dos IFs em “dadores” de aulas. E isso implica na inviabilização da formação continuada que hoje acontece dentro da nossa carga horária de trabalho.

Em diferentes momentos, durante os seis encontros com os professores

participantes da pesquisa, foi possível identificar falas que trazem a concepção de

educação profissional que eles carregam consigo. Essas falas retratam um desejo

167

de uma educação transformadora, mas que esbarra em alguns problemas como, por

exemplo, a questão estrutural. O fato de o campus não possuir prédio próprio. Ele

foi cedido por 25 anos, dos quais 6 anos já se foram. Assim, o prédio é pequeno e

com poucos espaços para os professores trabalharem fora da sala de aula. “(...)

Estamos tentando fazer, mas às vezes a gente esbarra em problemas estruturais”

(P5, 06 de setembro de 2016).

Outro fator limitante, como já mencionado pelos participantes, é o

engessamento do modo de se distribuir os componentes curriculares, de modo que

as disciplinas são postas de forma fragmentada, o que acaba dificultando os

trabalhos interdisciplinares ou transdisciplinares. E o projeto humanista

(emancipatório, de autonomia dos sujeitos) para uma educação profissional

transformadora.

O P5 aponta para a preocupação de existir um abismo entre a proposta de

educação dos IFs e o que os alunos trazem da formação anterior. Alguns outros

participantes manifestaram-se concordando com a fala do colega:

(...) quando a gente recebe os alunos vindos das outras escolas, há um abismo entre como o aluno vem e como nós esperamos esse aluno. Então a gente ao invés de fazer o trabalho proposto, precisa antes retomar e trabalhar os conhecimentos mínimos que ele já deveria vir sabendo e nós passamos praticamente o primeiro bimestre tentando fazer esse nivelamento (P3, 30 de agosto de 2016).

Freire (1986, p. 133) faz críticas aos currículos que tradicionalmente não

respeitam os contextos dos alunos. Ele afirma que não é contra um currículo ou um

programa, mas a forma autoritária com que esses são impostos é algo que precisa

ser repensado. Ele defende a participação crítica dos alunos e dos professores na

construção deste documento, que fará parte da vida deles, “eles têm o direito de

participar”, diz o autor. Que critica também a aceitação dos alunos em não fazerem

parte da tomada de decisão de questões referentes às suas rotinas acadêmicas por

estarem acostumados a terem sempre alguém decidindo por eles e não com eles. E,

acrescentamos, que se não houver a consciência de que a instituição escolar

precisa constituir-se numa comunidade, se pretende pautar-se por outras

perspectivas educacionais, isso nunca acontecerá.

168

Nesse sentido Santomé (2011, p. 87) critica e chama de Cavalo de Troia o

currículo que limita a construção da criticidade e da autonomia dos alunos. “(...) o

currículo baseado em disciplinas não ajuda os alunos a adquirir uma compreensão

minuciosa da realidade, ou, por extensão, de questões sociais, culturais, políticas e

religiosas”. Para ele, o modelo de currículo fragmentado, que usamos, transforma os

conteúdos em parcelas desconexas, que não se relacionam como se o

conhecimento fosse desconectado da realidade ou dos outros conteúdos,

possibilitando que os alunos não tenham a visão do todo. O autor afirma que o

currículo pode deixar de ter essa rigidez e de reforçar a segregação: “O currículo

pode tornar-se não um motivo de divisão, mas um espaço para nossa união- espaço

em que o direito de ser diferente e de respeitar mutuamente nossos direitos

legítimos torna-se possível” (SANTOMÉ, 2011, p. 97).

Uma observação importante, é que nos primeiros encontros, as falas estavam

mais positivas que nos últimos encontros. Não sabemos se pelo vínculo que foi se

fortalecendo no decorrer dos encontros, causando um ambiente de maior

segurança, ou se pelos problemas sobre a situação política e econômica que

também foram avançando, juntamente com o cronograma dos encontros, ou ainda

se as duas coisas juntas. O que pode ser notado, é que ao final, os participantes

acabaram desabafando algumas de suas angústias e expressando, seja nas falas

ou nas expressões faciais, preocupação com o rumo que a educação dos IFs e do

Brasil, de uma maneira geral, está tomando.

No dia 25 de outubro de 2016, aconteceu o sétimo encontro, em que a

pesquisadora apresentou aos participantes da pesquisa os dados trabalhados como

forma de poder haver a contribuição deles sobre o registro das falas. Participaram

do encontro 7 professores. Nesse encontro, a pesquisadora projetou na parede a

análise dos dados dos 6 encontros anteriores e fez a leitura para os participantes.

Esses foram contribuindo com suas análises, o que resultou nos dados

apresentados aqui.

A pedido do grupo gostaria de deixar registrado que estamos vivendo,

lamentavelmente, um momento importante na educação brasileira. Como exemplo a

criação e possibilidade de aprovação da PEC 241, que congela por 20 anos o gasto

púbico, que terá como limite a despesa do ano anterior corrigida pela inflação. Esse

169

fato preocupa muito os participantes, que temem pelo sucateamento da educação

no país. Outro ponto para ser registrado é a proposta da Medida Provisória (MP)

746/2016, que foi enviada ao congresso nacional para reforma do ensino médio, em

caráter de urgência. Os professores entendem que é necessária a reformulação do

ensino médio, porém, essa era uma discussão que já estava em andamento há

algum tempo, posição colocada por alguns dos participantes da pesquisa, que

integraram uma das comissões, que estudava uma nova proposta. Dessa forma,

entendem que não se pode mudar uma estrutura de ensino de uma hora para a

outra, sem ouvir os principais interessados nesse assunto, os professores, os

alunos, e a comunidade, de maneira geral, de forma democrática.

Sobre a questão da democracia, Dewey (1895, apud Westbrook, 2010, p. 20)

defendia a participação dos estudantes para que a escola fosse considerada

democrática:

[...] para a escola fomentar o espírito social das crianças e desenvolver seu espírito democrático, precisava organizar-se como comunidade cooperativa. A educação para a democracia requer que a escola se converta em “uma instituição que seja, provisoriamente, um lugar de vida para a criança, em que ela seja um membro da sociedade, tenha consciência de seu

pertencimento e para a qual contribua.

Infelizmente, na escrita, mesmo com um grande esforço para tentar

representar fidedignamente os encontros, não é possível captar todas as emoções,

entonações e expressões envolvidas durante os encontros. Mas, pelas falas

registradas nos seis encontros do grupo focal, nota-se que há envolvimento por

parte dos docentes em trabalhar com uma educação profissional que não seja

instrucionista e alienante. Identifica-se que há preocupação, por parte do grupo, em

proporcionar aos alunos, mesmo enfrentando dificuldades, uma educação que leve à

autonomia e emancipação.

O Projeto Político Pedagógico (PPP) do campus, que foi construído de forma

participativa, evidencia essa política de formação integral quando traz que:

Na busca por uma formação profissional, científica e tecnológica, os Institutos Federais, tal como prefigurado em sua Lei de criação (Lei n° 11.892/2008) objetiva “construir uma práxis educativa que contribua para a inserção social, a formação integradora e a produção do conhecimento”. (Art 2º). Assim, o IFSP, em consonância com seus objetivos e princípios assume compromisso em sua ação educativa com o desenvolvimento

170

integral do cidadão trabalhador (Projeto Político Pedagógico do campus

pesquisado, 2016).

Freire (1986, p. 204) propõe, e nós concordamos, dentro da pedagogia

libertadora, a aula libertadora e entende que esta pode ser uma maneira de

resistência às condições de opressão impostas: “A aula libertadora não aceita o

status quo e os mitos de liberdade. Ela estimula o aluno a desvendar a manipulação

real e os mitos da sociedade. Nesse desvendamento, mudamos nossa compreensão

da realidade, nossa percepção”. É essa também uma das propostas da educação

sociocomunitária, que propõe a discussão e o descortinamento das situações de

opressão, para todos possam agir com liberdade e criticidade para desenvolver-se

individualmente e em comunidade.

Trazendo como base teórica a pedagogia crítica e a educação

sociocomunitária, deixamos claro que a concepção de educação profissional que

acreditamos vai além de uma profissionalização. Propomos, desde o início dessa

pesquisa, uma educação integral, como defende Gallo (2011, p. 2): “(...)

proporcionar um processo educativo singularizante, no qual cada estudante possa

viver seus próprios encontros e produzir seus aprendizados, em relação solidária

com seus colegas e com os educadores”, tomando “o ser humano não mais como

unidade, mas como multiplicidade em constante transformação”.

Essa proposta, que se insere nos princípios de uma pedagogia crítica,

coaduna-se com os pressupostos de uma educação sociocomunitária, que também

pensa em uma educação em que todos os envolvidos no processo educacional

tenham representatividade, sejam ativos, autônomos e agentes de transformação.

171

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação profissional sofreu e ainda sofre interferências que a tornam,

ainda hoje, uma modalidade de educação da qual não se tem muita clareza de suas

reais propostas ou identidade. Por ter sido considerada por muito tempo restrita a

uma determinada classe da população, marginalizada pela sociedade, e por ter

como propósito inicial a qualificação de mão de obra de maneira tecnicista, carrega

um estigma difícil de desconstruir. Na contemporaneidade, a legislação da educação

profissional, ao menos naquelas aqui analisadas, além de não limitar a oferta para

uma parte específica da população, propõe uma formação integral, que seja não

somente para a profissionalização, mas para a vida.

O objetivo central dessa pesquisa foi investigar os contornos epistemológicos

da educação profissional, nos cursos técnicos integrados ao ensino médio,

discutindo sua natureza de formação para o trabalho ou de qualificação para o

emprego. Partimos do princípio de que a educação profissional deve contribuir com

a formação para o trabalho, de maneira que leve o educando a se desenvolver como

cidadão crítico e consciente do mundo em que vive, agindo como sujeito de

transformação. Como hipótese, trouxemos a ideia de que os professores ainda não

tinham clareza sobre a educação que devem praticar nesta modalidade de

educação, se voltada para o emprego ou para o trabalho.

A partir da compreensão de que a formação para o trabalho é diferente da

preparação para o emprego foi possível entender qual a proposta de educação está

se assumindo na instituição pesquisada.

A investigação buscou relacionar as concepções trazidas na pedagogia crítica

e na educação sociocomunitária com o trabalho desenvolvido no IFSP referente ao

campus pesquisado. E buscou fazer isso ao propiciar discussões e reflexões sobre

as análises das práticas docentes dos professores desse campus, de modo a

verificar se elas estão, ou não, contribuindo para a formação integral voltada para

autonomia e emancipação na educação profissional dos alunos dos cursos técnicos

integrados ao ensino médio. Ou se continuam reproduzindo a cultura da educação

profissional de anos atrás, que de maneira tecnicista e instrucionista, se preocupava

172

apenas em preparar mão de obra qualificada e acrítica para atender às demandas

do mercado.

A metodologia utilizada na pesquisa qualitativa foi a pesquisa-ação, como

uma tentativa de melhor compreender a questão das práticas docentes numa

possibilidade de aprimoramento da atuação profissional. Por meio de encontros de

grupo focal, buscamos trazer reflexões e possíveis soluções para os

problemas/desafios encontrados. Consideramos que a pesquisa colaborou para

trazer um aprofundamento sobre as categorias de análise trabalho e emprego,

autonomia e emancipação, nos cursos técnicos integrados ao ensino médio, em

relação à instituição, e a educação profissional de nível médio, de forma geral. Por

serem cursos considerados recentes, e pelos profissionais do campus parecerem ter

uma postura de aceitar desafios, acredita-se que a pesquisa poderá contribuir para a

reflexão que pode levar a uma prática transformadora.

Ao fazer análise dos documentos que orientam a educação profissional, é

possível identificar que exige- se atualmente, do professor desta modalidade de

educação, ações diferentes daquelas anteriores, em que o professor era apenas o

instrutor/ adestrador de comportamentos. Esse novo formato de educação requer

profissionais sensíveis à formação integral, que se preocupem com o

desenvolvimento cognitivo, com a formação para o trabalho dos alunos, mas que

também se preocupe com sua formação para a cidadania, para a vida. Essa

proposta de educação não centra- se no professor, pois esse, atua como mediador

do conhecimento, e este passa a ser construído em um processo participativo que

leve à autonomia e emancipação dos envolvidos. Mas, ao analisar o perfil dos

professores que trabalham com esses cursos, na instituição investigada, percebe-se

que há desafios a serem superados. Espera-se que esse profissional contribua para

essa formação integral, mas entendendo melhor a dinâmica dos IFs, com

profissionais com diferentes formações e diferentes perspectivas, identificamos que

é preciso investir mais em formação continuada para que eles possam atuar de

maneira mais segura e mais alinhada a essa ideia de formação para o trabalho e

não para o emprego.

Acompanhando as bases da educação sociocomunitária e da pedagogia

crítica, para que esta educação seja então voltada para o trabalho e não para o

173

emprego, para que ela se efetive como uma educação transformadora é preciso que

todos os envolvidos no processo educacional tenham clareza, consciência e

envolvimento dessa proposta para que, de fato, ela aconteça. Os professores não

podem ser os únicos responsáveis pela mudança desse paradigma. Os próprios

documentos orientadores do IF mostram que deve haver a participação de toda a

comunidade escolar. É preciso que tanto a comunidade escolar interna quanto a

externa se apropriem deste debate. Todos precisam desenvolver a consciência

crítica de que são agentes de transformação e que possuem poder para intervir

naquilo que lhes é necessário. Os professores são agentes de conscientização

dessas comunidades e entre si também, mas não podem assumir a

responsabilidade sozinhos. Pois como já mencionado em Aontas (2004), a educação

sociocomunitária, propõe o engajamento de todos os envolvidos em ações para

trazer transformações. Tendo na proposta da educação sociocomunitária o

compartilhamento equânime de poder, todos devem se sentir responsáveis para que

a proposta, em especial aqui, da mudança de qualificação para o emprego se volte

para formação para o trabalho. E quanto mais a gestão for participativa e

democrática, quanto mais a instituição assumir-se e fortalecer-se como comunidade,

mais haverá espaço para que a formação para o trabalho se afirme.

Ao discutir sobre os temas propostos no grupo focal, pudemos notar que os

professores têm buscado constantemente compreender qual a melhor forma de

trabalhar esses cursos para atenderem à legislação. Mas ainda há muito que ser

trabalhado, não só na questão da ação docente, mas com mais investimentos

estruturais, mais abertura para que os campi exerçam sua autonomia, investimento

na formação continuada, enfim, mais valorização para esse projeto que pode ser

transformador na vida dos alunos e da comunidade na qual está inserido. Ou pode

ser apenas mais uma forma de manter a desigualdade social.

Conclui-se que as concepções epistemológicas dos professores sobre a

educação profissional, do campus investigado, estão voltadas mais para o trabalho

que para o emprego. Eles compreendem a importância em trazer uma educação que

ajude a desenvolver a autonomia, criticidade, protagonismo e emancipação dos

jovens. Embora trabalhem visando atingir esses objetivos, encontram problemas que

impedem que essas práticas se efetivem totalmente.

174

É importante registrar que essa pesquisa não termina aqui com a conclusão

do mestrado. Como pedagoga da instituição em questão, entendo que a educação é

um processo que nunca se esgota. Assim, sinto-me responsável por continuar essas

discussões levando para um grupo maior durante as atividades de formação

continuada, semanas de planejamento e reuniões gerais, discussões que

contribuam para a práxis, para que ela se estenda para todos os professores

envolvidos na educação profissional. Acompanhando Freire,

Entre nós, mulheres e homens, a inconclusão se sabe como tal. Mais ainda, a inconclusão que se reconhece a si mesma, implica necessariamente a inserção do sujeito inacabado num permanente processo social de busca. Histórico-sócio-culturais, mulheres e homens nos tornam seres em quem a curiosidade, ultrapassando os limites que lhe são peculiares no domínio vital, se torna fundante da produção do conhecimento (FREIRE, 1996, p. 32).

Com base na fala de Freire (1996) pensamos na questão da inconclusão

como uma possibilidade de estar na busca constante pelo conhecimento, que não se

esgota em uma dissertação, mas que abre caminhos para continuar

permanentemente na busca dele.

175

REFERÊNCIAS

ABRAMO, Helena Wendel e Branco, PEDRO Paulo Martoni (orgs.). Retratos da Juventude Brasileira [título provisório], São Paulo, Instituto Cidadania e Editora da Fundação Perseu Abramo, a circular em novembro de 2004. ALMEIDA, Marilis Lemos de. Da formulação à implementação: análise das políticas governamentais de educação profissional no Brasil / Marilis Lemos de Almeida. Campinas, SP. [s.n.] 2003. AONTAS. Community Education. Ireland, 2004. Traduzido e adaptado por BISSOTO, M. L. apostilado. Mestrado em Educação, Unisal: Americana, agosto de 2016. ARAUJO, Ronaldo Marcos de Lima. Formação de docentes para a educação profissional e tecnológica: por uma pedagogia integradora da educação profissional. Trabalho & Educação – vol.17, nº 2 –p. 53-63. Maio / ago 2008. ARCARY, Valerio. Uma nota sobre os Institutos Federais em perspectiva histórica. 2015. Disponível em: <file:///C:/Users/Isabel/Downloads/Uma%20nota%20sobre%20os%20Institutos%20Federais%20em%20perspectiva%20hist%C3%B3rica%20-%20Valerio%20Arcary.pdf> Acesso em 25/02/2016. ARRUDA, Maria da Conceiçao Calmon. Trabalho e educação no cenário contemporâneo. In: VII Seminário do Trabalho, 2010, Marília. Anais do VII Seminário do Trabalho. Marília: RET, v. 1. p. 1-17. 2010 ARRUDA, Maria da Conceição Calmon. Políticas de educação profissional de nível médio: limites e possibilidades. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ/IE/DTPE. Trabalho apresentado no II SEPNET, Belo Horizonte, 2010. p. 1-15. AU, Wayne. Educando os professores para a educação crítica. _____In. APPLE, Michael W. Educação crítica: análise internacional/ Michael W. Aplle, Wayne Au, Luís Armando Gandin.- tradução: Vinícius Figueira; Porto Alegre: Artmed, 2011, p. 331-348. AZEVEDO, Joaquim. Repensar a dicotomia educação-trabalho na perspectiva antropológica e sociocomunitária do desenvolvimento humano. Congresso Mundial da Educação Profissional e Tecnológica Brasília, 24 de Novembro de 2009. BARREIRO, Rafael; MALFITANO, ANA. Retrato das politicas publicas governamentais brasileira para a juventude nos anos 2000 Última década n°40, Proyecto Juventudes, 2014. p. 133-157.

176

BATISTA, Roberto Leme. Estudos do Trabalho. Ano III – Número 4 - 2009 Revista da RET- Rede de Estudos do Trabalho <www.estudosdotrabalho.org Disponível em: http://www.estudosdotrabalho.org/Uma%20an%E1lise%20cr%EDtica.pdf> Acesso em 23/01/2016 BAUMAN, Zygmunt. Sobre educação e juventude: conversas com Riccardo Mazzeo/ Zygmunt Bauman; tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. BERNHEIM, Carlos Tünnermann. Desafios da universidade na sociedade do conhecimento: cinco anos depois da conferência mundial sobre educação superior / Carlos Tünnermann Bernheim e Marilena de Souza Chauí. – Brasília: UNESCO, 2008. 44 p. BISSOTO, Maria Luísa; MIRANDA, Antônio Carlos. Metodologia em Educação Sociocomunitária/ Maria Luísa Bissoto; Antonio Carlos Miranda (orgs.). Jundiaí, Paco Editorial: 2016. 268 p. BISSOTO, M. L. Um caminho para a autonomia: reflexões sobre a educação sociocomunitária do deficiente intelectual. In: ______, MIRANDA, A. Educação Sociocomunitária: tecendo saberes. Campinas: Átomo e Alínea, 2012. BRASIL. (Plano Nacional da Educação- PNE). Plano Nacional da Educação 2014-2024(recurso eletrônico): Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá outras providências. _2 ed. Brasília, Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2015 – (Série legislação, n. 194). BRASIL. Lei N° 12.852, de 5 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude - SINAJUVE. Diário Oficial da União, 6.8. 2013. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: n. 4.024/61. Brasília: 1961. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: n. 9394/96. Brasília: 1996. ______. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá outras providências. ______. Decreto nº 2.208, de 17 de abril de 1997. Regulamenta o §2º do art. 36 e os artigos 39 a 42 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2208.htm>. Acesso em 26/01/2016.

177

______. LEI Nº 11.892, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras providências. ______. MEC. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Institutos Federais. Um novo modelo de educação profissional e tecnológica: concepções e diretrizes, 2010.

______. Decreto nº 5.154 de 23 de julho de 2004.Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5154.htm> Acesso em 2401/2016. ______. Resolução Nº 6, de 20 de setembro de 2012. Define Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio. ______. Resolução Nº 2, de 30 de janeiro de 2012. Define Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. ______. Parecer CNE/CEB Nº 16/99. Trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf_legislacao/tecnico/legisla_tecnico_parecer1699.pdf> acesso em: 23/11/2016. ______. DECRETO Nº 7.566, DE 23 DE SETEMBRO DE 1909 Créa nas capitaes dos Estados das Escolas de Aprendizes Artífices, para o ensino profissional primario e gratuito. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf3/decreto_7566_1909.pdf> Acesso em: 13/07/2016. ______. LEI Nº 11.129, DE 30 DE JUNHO DE 2005. Institui o Programa Nacional de Inclusão de Jovens – ProJovem; cria o Conselho Nacional da Juventude – CNJ e a Secretaria Nacional de Juventude; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, e 10.429, de 24 de abril de 2002; e dá outras providências. ______. RESOLUÇÃO Nº 866, de 04 de junho de 2013. Aprova o Projeto Pedagógico Institucional. ______. Resolução CNE/CEB Nº 02/97 Dispõe sobre os programas especiais de formação pedagógica de docentes para as disciplinas do currículo do ensino fundamental, do ensino médio e da educação profissional em nível médio. BÓRQUEZ Bustos, Rodolfo. Pedagogía crítica. México: Trillas, 2006 (reimp. 2012). 200 p.

178

BORGES, Maria Célia; AQUINO, Orlando Fernández; PUENTES, Roberto Valdés. Formação de professores no Brasil: história, políticas e perspectivas. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n.42, 2011. p.94-112. Disponível em: http://ojs.fe.unicamp.br/ged/histedbr/article/view/3301/2926 BOURDIEU, Pierre, 1930-2002. A reprodução: elementos para uma teoria o sistema de ensino/ Pierre Bourdieu, Jean- Claude Passeron; tradução de Reynaldo Bairão; revisão de Pedro Benjamin Garcia e Ana Maria Baeta. 7 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. 275 p. BROFENBRENNER, U. Making Human Beings Human: bioecological perspectives on human development. Uk: Sage, 2005. Traduzido e adaptado por BISSOTO, M. L. apostilado. Mestrado em Educação, Unisal: Americana, março de 2016. BUCCI, Maria Paula Dallari. Políticas públicas e direito administrativo. Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 34 n. 133 jan./mar. 1997. CAIRES, Susana; FERNÁNDEZ, Maria Dolores Sánchez; JANSSEN, Natascha Van Hattum. O uso de grupos focais na análise de percepções dos alunos quanto à responsabilidade social universitária. In: BISSOTO, Maria Luísa; MIRANDA, Antonio Carlos. Metodologia em Educação Sociocomunitária/ Maria Luísa Bissoto; Antonio Carlos Miranda (orgs.) Jundiaí, Paco Editorial. 2016. p. 187-228. CARMO, H. Desenvolvimento comunitário. Sociologia de intervenção e o desenvolvimento comunitário. 2 ed. Universidade Aberta, Lisboa. 2007. Cap. 06. CARVALHO, Olgamir Francisco de; SOUZA Francisco Heitor de Magalhães. Formação do docente da educação profissional e tecnológica no Brasil: um diálogo com as faculdades de educação e o curso de pedagogia. Educ. Soc., Campinas, v. 35, nº. 128, p. 629-996, jul.-set. 2014 Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/es/v35n128/0101-7330-es-35-128-00883.pdf> Acesso em: 13/07/2016 CASTRO, Mary Garcia; ABRAMOVAY, Miriam. Por um novo paradigma do fazer políticas – políticas de/para/com juventudes Revista Brasileira de Estudos de População, v.19, n.2, jul./dez. 2002.

CASTRO, Mary Garcia. Quebrando mitos: juventude, participação e políticas. Perfil. Percepções e recomendações dos participantes da 1ª conferência Nacional de Políticas Públicas de Juventude/ Mary Garcia Castro e Miriam Abramovay. Brasísia: RITLA, 2009. CLARKE, Simon. Crise do fordismo ou crise da social-democracia? Revista de Cultura e Política. Nova Lua, n 24 São Paulo Setembro. 1991. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-64451991000200007>

179

Concepções e Diretrizes dos Institutos Federais, 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=6691-if-concepcaoediretrizes&category_slug=setembro-2010-pdf&Itemid=30192> CUNHA, Luiz Antônio. Fragmentos de uma história da Rede Federal de Educação Profissional Tecnológica. In. Um passado vestido de futuro: fragmentos da memória da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica. __Brasília: Editora IFB, 2012. p. 33-47. DAMO, Andreisa; MOURA, Danieli Veleda; Cruz, Ricardo Gauterio: Conscientização em Paulo Freire: consciência, transformação e liberdade, em Contribuciones a las Ciencias Sociales, enero 2011. Disponível em: http://www.eumed.net/rev/cccss/11/dmc.htm Acesso em: 11/05/2016. DESAULNIERS, Julieta Beatriz Ramos. Formação, competência e cidadania. Educação & Sociedade, ano XVIII, nº 60 1997. Disponível em: <http://www.unifra.br/professores/carin/TEXTO%20JULIETA%20DESAULNIERS.pdf>. Acesso em: 06/02/2016. Documento orientador para a superação da evasão e retenção na rede federal de educação profissional, científica e tecnológica. 2014. Disponível em: <http://www.ifto.edu.br/portal/docs/proen/doc_orientador_evasao_retencao_setec.pd> DURKHEIM, Émile. Educação e Sociologia. Tradução de Stephania Matousek. 5 ed. Petrópolis, RJ. Vozes, 2014. (Coleção textos fundantes da educação). EVANGELISTA, Olinda; SHIROMA, Eneida Oto. Educação para o alívio da pobreza: novo tópico da agenda global. Revista de Educação PUC- Campinas, Campinas, n 20, p.43-54, junho 2006. Disponível em: <file:///C:/Users/Isabel/Documents/DISSERTA%C3%87%C3%83O/Parte%20I/Texto%20parte%20I/Refer%C3%AAncias/EVANGELISTA%20E%20SHIROMA.pdf> FRANZOI, Naira Lisboa; SILVA, Carla Odete Balestro; COSTA, Rita de Cássia Dias. Proeja e Pronatec: ciclo de políticas, políticas recicladas. Políticas Educativas, Porto Alegre, v. 6, n.2, 2013. p. 84-100. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/index.php/Poled/article/viewFile/45658/28838> FRANZOLIN, Janaína Seguin; MINGHINI Luciano e LOURENÇO, Mariane Lemos. Pesquisa-ação. In. Takahashi, Adriana Roseli Wünsch. Pesquisa qualitativa em administração: Funda Pesquisa qualitativa em administração: fundamentos, métodos e usos no Brasil. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2013. v. 1. 392 p.

180

FERRETTI, C. J. Considerações sobre a apropriação das noções de qualificação profissional pelos estudos a respeito das relações entre trabalho e educação. Educação e Sociedade. Campinas, vol. 25, n. 87, 2004. p. 401-422. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 49 ed- Rio de Janeiro. Editora. Paz e Terra, 1996. 144 p. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Paz e Terra. 17ª ed. Rio de Janeiro. 1987. FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Trad.: Adriana Lopes. 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1986. 224 p. FREITAS, Alexandre S. Identidades juvenis, desemprego e processos de subjetivação nas políticas de juventude. In: Oliveira, Ramom (org.). Jovens, ensino médio e educação profissional: políticas públicas em debate. Campinas, SP: Papirus, 2012, p.181- 202. FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e Trabalho: bases para debater a Educação Profissional Emancipadora. PERSPECTIVA, Florianópolis, v.19, n.1, 2001. p.71-87. FRIGOTTO, Gaudêncio. A relação da educação profissional e tecnológica com a universalização da educação básica. Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100- Especial. out. 2007. p. 1129-1152. FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e Trabalho: bases para debater a Educação Profissional Emancipadora. Perspectiva, Florianópolis, v.19, n.1, 2001. p.71-87. FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria; RAMOS, Marise. A gênese do decreto n. 5.154/2004: um debate no contexto controverso da democracia restrita. 2005. <http://www.uff.br/trabalhonecessario/images/TN_03/TN3_CIAVATTA_M_FRIGOTTO_RAMOS.pdf>. Acesso em 27/01/1 FROMM, Erich. O Conceito Marxista do Homem. 8a edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1983. GADOTTI, Moacir. A questão da educação formal/não-formal. Institut international des droits de l’enfant (ide) Droit à l’éducation: solution à tous les problèmes ou problème sans solution? Sion (Suisse), 18 au 22 octobre 2005. Disponível em: <http://www.virtual.ufc.br/solar/aula_link/llpt/A_a_H/estrutura_politica_gestao_organizacional/aula_01/imagens/01/Educacao_Formal_Nao_Formal_2005.pdf>. Acesso em 06/02/2016.

GADOTTI, Moacir. Escola Cidadã. Ed. 10- São Paulo: Cortez. 2004 (Coleção da Nossa época; v. 24).

181

GADOTTI, Moacir. Educação Integral no Brasil: Inovações em Processo / Moacir Gadotti. - São Paulo: Editora e Livraria Instituto Paulo Freire, 2009. - (Educação Cidadã; 4) GADOTTI, Moacir. Concepção dialética da educação: um estudo introdutório. 16 ed. São Paulo. Cortez, 2012. GALLO, Sílvio. Educação Integral. Congresso de Educação Básica – Aprendizagem em Contexto. 2011. GARCIA, Sandra Regina de oliveira. O fio da história: a gênese da formação profissional no Brasil. Trabalho e Crítica, v.1, n.1, 2000. p. 1-18. GARIGLIO, José Ângelo; BURNIER, Suzana. Saberes da docência na educação profissional e tecnológica: um estudo sobre o olhar dos professores. Educ. rev. vol.28 nº. 1 Belo Horizonte Mar. 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-46982012000100010&lng=pt&nrm=iso&tlng=en Acesso em: 27/06/2016 GATTI, Bernardete Angelina. Formação de professores: condições e problemas atuais. Revista Internacional de Formação de Professores (RIFP), Itapetininga, v. 1, n.2, p. 161-171, 2016. GIROUX, Henry. Educación para la solidaridad: outra mirada hacia la educacion. 2013. Disponível em: http://educacionysolidaridad.blogspot.com.br/2013/02/una-entrevista-critica-con-henry-giroux.html Acesso em: 21/06/2016. GOUNET, Thomas. Fordismo e toyotismo na civilização do automóvel. 1ª ed. São Paulo, Boitempo, 1999. Guia para elaboração de trabalhos acadêmicos / Centro Universitário Salesiano de São Paulo. 4.ed. – São Paulo: UNISAL, 2015. HARDIMAN, R.; JACKSON, B. Conceptual Foundations for Social Justice Education. In: ADAMS, M.; BELL, L.; GRIFFIN, P. Teaching for Diversity and Social Justice. Routledge, 2007. Adaptado e traduzido do original por Maria Luisa Bissoto. Apostilado. Americana: Unisal, outubro 2016. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira : 2015 / IBGE, Coordenação de População e Indicadores Sociais. - Rio de Janeiro : IBGE, 2015. 137p. JANCZURA, Rosane. Risco ou vulnerabilidade social? Textos & Contextos (Porto Alegre), v. 11, n. 2, p. 301 - 308, ago./dez. 2012. Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fass/article/view/12173/8639>

182

JUNIOR, Justino de Sousa. Educação e reprodução social da ordem regressivo-destrutiva do capital: a formação dos trabalhadores em questão. _____In: Oliveira, Ramom (Org.). Jovens, ensino médio e educação profissional: políticas públicas em debate. Campinas, SP: Papirus, 2012, páginas 203-226. KINCHELOE, J. Critical Pedagogy Primer. New Yprk: Peter Lang Publishing, 2008. KUENZER, Acacia Zeneida. As políticas de formação: A constituição da identidade do professor sobrante. Educação & Sociedade, ano XX, nº 68, 1999. KUENZER, Acacia Zeneida. Formação de Professores para a Educação Profissional e Tecnológica: perspectivas históricas e desafios contemporâneos. In: MEC/INEP. (Org.). Formação de Professores para Educação Profissional e Tecnológica. 1ª ed. Brasília: MEC/INEP, 2008. p. 19-40. LAZZARESCHI, Noêmia. Sociologia do trabalho. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2009. 168 p. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=wmINYagk_zgC&pg=PA7&dq=trabalho+emprego&hl=pt-BR&sa=X&redir_esc=y#v=onepage&q=trabalho%20emprego&f=false>. Acesso em: 02/02/2016. LEÓN, Oscar Dávila. Adolescência e juventude: das noções às abordagens. In: FREITAS, Maria Virgínia de (org.). ABRAMO, Helena Wendel; LEÓN, Oscar Dávila. Juventude e adolescência no Brasil: referências conceituais. São Paulo, 2005. p. 9-18. LORIERI, Marcos Antônio. Aspectos do instrumentalismo pragmat1sta na teoria do conhecimento de John Dewey. Cognitio Revista de filosofia. ano 1 / n" i - 2o sem. 2000 - São Paulo / p. 46-57. Disponível em: http://revistas.pucsp.br/index.php/cognitiofilosofia/article/view/13398/9933 Acesso em: 02/11/2016. MACEDO, Severine Carmem. Juventude Brasileira em clima de novas perspectivas. In: PAPA, Fernanda de Carvalho; FREITAS, Mari Virgínia (Org.) Juventude em pauta: políticas públicas no Brasil– São Paulo: Peirópoles, 2012.p 221- 227. MANACORDA, Mario Alighiero. Marx e a pedagogia moderna / Mario Alighiero Manacorda; [tradução Newton Ramos de Oliveira]. Campinas, SP: Editora Alínea, 2007. 206 p. MARTIN, Ian. Community Education: Towards a theoretical analysis. A Educação comunitária: Por uma análise teórica. In: EDWARDS, R.; SIEMINSKI, S.; ZELDIN, D. Adult Learners, Education and Training. Routledge, 1995. Cap. 12. Adaptado e traduzido do original por Maria Luisa Bissoto. Apostilado. Americana: Unisal, agosto 2016.

183

MARTINS, Ernesto Candeias. O conceito de emancipação como uma nova meta educativa na formação humana. Revista Educação e Filosofia. Uberlândia, n 7 (14), p. 39-59, julho/dezembro 1993. MASSON, Gisele; MAINARDES, Jefferson. A ideologia da sociedade do conhecimento e suas implicações para a educação. Currículo sem Fronteiras, v.11, n.2, 2011. p.70-85. MARINHO, Alexandre; FAÇANHA, Luís Otávio. Programas sociais: efetividade, eficiência e eficácia como dimensões operacionais da avaliação. IPEA. 2001. Disponível em: http://www.ufjf.br/especializacaofisioto/files/2010/03/efetividade-efici%C3%AAncia-e-efic%C3%A1cia-em-programas-sociais.pdf MARX, Karl. O capital: crítica da economia política. Livro 1: O processo de produção do capital. 7ª ed. Tradução Reginaldo Sant’Anna. Difel. São Paulo. 1982. 579 p. MCCARTHY, Cameron; PITTON, Viviana; KIM, Soochul; Monje, David. Movimento e estase na reorientação neoliberal da escolarização. ____In: Apple, Michael. Educação Crítica: análise internacional. / Michael.W. Apple, Wayne Au, Luís Arnaldo Gandin; tradução: Vinícius Figueira- Porto Alegre: Aetmed, 2011. p. 49-65. Mercado de trabalho: conjuntura e análise / Instituto de PesquisaEconômica Aplicada; Ministério do Trabalho e Emprego.- v.1, n.0, (mar.1996) - Brasília: Ipea: MTE, 1996. MERÇON, Paulo. Relação de emprego: o mesmo e novo conceito. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.56, n.86, p.141-162, jul./dez. 2012. Disponível em: http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_86/paulo_mercon.pdf MEZIROW, Jack. Visão geral sobre a aprendizagem transformadora. In. KNUD Illeris (orgs.); Teorias contemporâneas da aprendizagem. tradução: Ronaldo Cataldo Costa; revisão técnica Francisco Silva Cavalcante Junior. –Porto Alegre: Penso.2013 p. 109-126. Ministério da Educação Centenário da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica. [2009?] data provável. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/centenario/historico_educacao_profissional.pdf>. Acesso em: 12/02/2016. Ministério da Educação. Portal Brasil. Programa capacita jovens para o mercado de trabalho. 2014. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/educacao/2012/04/programa-capacita-jovens-para-o-mercado-de-trabalho> Acesso em: 21/03/2016. Ministério da Educação. Portal Brasil. Sistema S é forte aliado do empresário na capacitação de trabalhadores. 2012. Disponível em:

184

http://www.brasil.gov.br/educacao/2012/02/sistema-s-e-estrutura-educacional-mantida-pela-industria. Acesso em: 30/03/2016. MOURA, Dante Henrique. Trabalho e formação docente na educação profissional [recurso eletrônico] / Dante Henrique Moura. – Dados eletrônicos (1 arquivo: 586 kilobytes). – Curitiba: Instituto Federal do Paraná, 2014. - (Coleção formação pedagógica; v. 3). MOURA, Dante Henrique. Revista Brasileira da Educação Profissional e Tecnológica / Ministério da Educação, Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. v. 1, n. 1, p. 23-38, jun. 2008 – Brasília: MEC, SETEC, 2008. MÜLLER, Meire Terezinha. Educação profissionalizante no Brasil – das corporações de ofícios à criação do SENAI. Revista da RET Rede de Estudos do Trabalho. Ano III – Número 5 – 2009. NÓVOA, António, coord. - Formação de professores e profissão docente. Lisboa: Dom Quixote, 1992. ISBN 972-20-1008-5. p. 13-33. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10451/4758> Acesso em: 08/05/2016. OLIVEIRA, Ramon. Por uma educação profissional democrática e emancipatória. In: ______. (org.) Jovens, ensino médio e educação profissional: Políticas públicas em debate - Campinas-SP: Papirus, 2012. p. 83-106.

OLIVEIRA, Ramon de. Agências multinacionais e a educação profissional brasileira. Campinas, SP: ed. Alínea, 2006.120 p. OLIVEIRA, Silvia Andreia Zanelato De Pieri; ALMEIDA, Maria de Lourdes Pinto. Educação para o mercado x educação para o mundo do trabalho: impasses e contradições. REP - Revista Espaço Pedagógico, v. 16, n. 2, Passo Fundojul./dez. 2009. , p. 155-167. OLIVEIRA, Waldemar Junior. A formação do professor para a educação profissional de nível médio: tensões (in) tensões. Santos (s.n.) 2008. 127p. Dissertação de mestrado- Universidade Católica de Santos, programa de mestrado em educação. Disponível em : <http://biblioteca.unisantos.br:8181/bitstream/tede/127/1/Waldemar%20de%20Oliveira%20Junior.pdf> Acesso em: 22/06/2016. ORLOWSKI BITTENCOURT, Rosely. O currículo sob o prisma da educação profissional. Olhar de Professor, vol. 5, núm. 1, Paraná, 2002, pp. 161-172. PARO, Vitor Henrique. Parem de preparar para o trabalho: Reflexões acerca dos efeitos do neoliberalismo sobre a gestão e o papel da escola básicaTrabalho apresentado no Seminário “Trabalho, Formação e Currículo”, realizado na PUC-SP

185

de 24 a 25/8/1998 e publicado em: FERRETTI, Celso João et alii; orgs. Trabalho, formação e currículo: para onde vai a escola. São Paulo, Xamã, 1999. p. 101-120. Disponível em <www.edilsonsantos.pro.br/textos/paremdeprepararparaotrabalho.doc> Acesso em: 11/02/2016 PACHECO, Eliezer. Os Institutos Federais: Uma Revolução na Educação Profissional e Tecnológica. [2010] data certa, não indicada no item Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=3787-cartilha-eliezer-final&category_slug=marco-2010-pdf&Itemid=30192>. Acesso em 25/02/2016. PEIXOTO, Patricia Ebani. Do PLANFOR ao PNQ: uma análise comparativa sobre os planos de qualificação no Brasil. Dissertação (mestrado em Política Social) Universidade Federal do Espírito Santo. Vitória. 2008. 137 p PEIXOTO, Maria Angélica. Para entender a alienação: Marx, Fromm e Marcuse. Revista Espaço Acadêmico- nº 110- Julho de 2010. PETER, J. Analyzing Public Policy. Taylor & Francis, 2012. PORCHEDDU, Alba. Zygmunt Bauman: entrevista sobre a educação. Desafios pedagógicos e modernidade líquida. Cad. Pesqui. vol.39 no.137 São Paulo May/Aug. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742009000200016> PRESTES, Emília; VÉRAS, Roberto. Educação, qualificação, trabalho e políticas públicas: campos em disputas. Revista Lusófona de Educação, 2009, p. 45-59. RAMÍREZ, Alberto Galeano. Manual de capacitación para directivos de centros de formación. Montevideo: Cinterfor, 1999. 189 p. il. Disponível em: <http://www.oitcinterfor.org/sites/default/files/file_publicacion/galeano.pdf> Acesso em: 23/05/2016. REHEM, Cleunice Matos. Perfil e formação do professor de educação profissional técnica. São Paulo: Editora Senac. São Paulo, 2009.

RIBEIRO, Eliane. Políticas Públicas de Educação e Juventude: avanços, desafios e perspectivas. ____In: PAPA, Fernanda de Carvalho; FREITAS, Mari Virgínia (Org.) Juventude em pauta: políticas públicas no Brasil– São Paulo: Peirópoles, 2012. p. 24-43. RIBEIRO, Andressa de Freitas. Taylorismo, fordismo e toyotismo. Lutas Sociais, São Paulo, vol.19 n.35, jul./dez. 2015. p.65-79. Disponível em: <http://revistas.pucsp.br/index.php/ls/article/view/26678/pdf> Acesso em: 31/10/2016.

186

RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da educação. Rio de Janeiro: Lamparina, 6 ed. 2011. SALDANHA, Letícia de Luca Wollmann. O Pronatec e a relação ensino médio e educação profissional. IX AMPED Sul. Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul. 2012. Disponível em: <http://www.ucs.br/etc/conferencias/index.php/anpedsul/9anpedsul/paper/viewFile/1713/141>. SALVADORI, Angela; DE BONI, Maria Ignês Mancini. A reforma da educação profissional nos anos 90: uma análise sobre as propostas e práticas no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. In: VII Congresso Nacional de Educação - Educere. Saberes Educacionais. Edição Internacional. 2007, Curitiba. VII Congresso Nacional de Educação - Educere. Saberes Docentes. Edição Internacional. Curitiba: PUC-PARANÁ, 2007. v. 1. p. 926-937. SANTOMÉ, Jurjo Torres. O cavalo de troia dos conteúdos curriculares. ____In: Apple, Michael W. Educação Crítica: análise internacional/ Michael W.Aplle, Wayne Au, Luís Armando Gandin; tradução: Vinícius Figueira; Porto Alegre: Artmed, 2011. p. 82-98. SAVIANI. Demerval. Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos. Trabalho encomendado pelo GT – Trabalho e Educação, apresentado na 29a Reunião da ANPEd no dia 17 de outubro de 2006. SAVIANI, Dermeval. Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do problema no contexto brasileiro. Trabalho apresentado na 31ª Reunião Anual da ANPEd realizada de 16 a 20 de outubro de 2008, em Caxambu (MG). Revista Brasileira de Educação v. 14 n. 40 jan./abr. 2009.

SAVIANI,Derrneva. Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobre educação e política!- 32. ed.- Campinas, SP: Autores Associados, 1999. - (Coleção polêmicas do nosso tempo; v.s).

SCAVO, Davide Giacobbo; Bezerra, Emanuelly Medeiros. Uma análise crítica do Pronatec FIC - Natal: um caminho para superação das desigualdades ou para subordinação? I seminário internacional de pesquisa em políticas públicas e desenvolvimento social Franca, 22 a 24 de setembro de 2014. Disponível em: <http://www.franca.unesp.br/Home/Pos-graduacao/-planejamentoeanalisedepoliticaspublicas/isippedes/emanuelly-medeiros-bezerra.pdf>

SCHEIBE, Leda. Formação de professores no Brasil A herança histórica. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 2, n. 2-3, jan./dez. 2008. p. 41-53. Disponível em: <http://www.esforce.org.br/index.php/semestral/article/viewFile/123/226> Acesso em: 28/07/2016.

187

SEGNINI, Liliana Rolfsen Petrilli. Educação e trabalho: uma relação tão necessária quanto insuficiente. São Paulo em Perspectiva, 14(2) 2000. SILVA, Jamerson Antônio de Almeida. As especificidades das políticas de qualificação profissional para a juventude. In: Oliveira, Ramom (org.). Jovens, ensino médio e educação profissional: políticas públicas em debate. Campinas, SP: Papirus, 2012. p. 163-180.

SILVA, Edna Lúcia; CUNHA, Miriam Vieira. A formação profissional no século XXI: desafios e dilemas. Ci. Inf., Brasília, v. 31, n. 3, set./dez. 2002. p. 77-82. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ci/v31n3/a08v31n3>. Acesso em: 24/04/2016. TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional/ Maurice Tardif.- Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. TEIXEIRA, Anísio. A pedagogia de Dewey. In: Westbrook, Robert Westbrook. John Dewey / Robert Westbrook; Anísio Teixeira, José Eustáquio Romão, Verone Lane Rodrigues (org.). – Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2010. 136 p.: il. – (Coleção Educadores) p. 33- 66. Um passado vestido de futuro: fragmentos da memória da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica. Brasília:editoroa IFB, 2012. (livro comemorativo do centenário da Rede Profissional e Tecnológica) WERMELINGER, Mônica; MACHADO, Maria Helena; FILHO, Antenor Amâncio. Políticas de educação profissional: referências e perspectivas. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.15, n.55, abr./jun. 2007. p. 207-222.

188

189

APÊNDICE 1- Termo de consentimento livre e esclarecido para autorização da

pesquisa na instituição

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado (a) responsável ____________________________________

Eu, Isabel Cristina das Chagas Oliveira, aluna regularmente matriculada no curso de Mestrado em

Educação do Centro Universitário Salesiano- unidade universitária de Americana gostaria de convidar o Instituto

Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, Campus XXX, a participar do trabalho investigativo a

ser por mim desenvolvido como parte da minha pesquisa de mestrado, sob a orientação da profa. Dra. Maria

Luísa Amorim Costa Bissoto e cujo objetivo é pesquisar os contornos epistemológicos da educação profissional

no Brasil, discutindo sua natureza de preparação para o trabalho ou de qualificação para o emprego, e

investigando as concepções de professores do Instituto Federal acima citado sobre essa diferenciação, em nosso

entender, fundamental para que a educação, nesse nível de ensino, se configure, de fato, como uma educação

emancipatória. Como resultados esperados, acreditamos que conhecendo e discutindo as concepções dos

docentes a esse respeito seja possível aprimorar as práticas educacionais, a formação continuada do docente e a

produção do conhecimento na área. Esses são os principais benefícios antevistos para essa investigação.

A investigação seguirá os pressupostos da metodologia da pesquisa qualitativa, na modalidade de

pesquisa-ação, envolve pesquisa bibliográfica, análise de documentos institucionais e grupos focais com

professores que atuam na educação profissional do Instituto referido. Recebi os esclarecimentos de que a

participação nessa pesquisa não traz complicações médicas ou legais de nenhuma ordem, propondo-se 06

reuniões de discussão profissional, com participação voluntária, na forma de grupos focais, que não

comprometerão os horários de trabalho dos docentes, sendo uma pesquisa de risco mínimo, obedecendo aos

critérios de ética na Pesquisa com Seres Humanos, conforme a Resolução de número 510/16, do Conselho

Nacional de Saúde. Nenhum dos procedimentos utilizados oferece risco à dignidade dos participantes.

Gostaria de deixar bem claro que a participação de cada sujeito nessa investigação é voluntária. Se

qualquer participante decidir não participar ou quiser desistir de participar, em qualquer momento, da referida

investigação, tem absoluta liberdade de fazê-lo. Nenhuma restrição lhe será imposta.

As atividades desenvolvidas nessa investigação, bem como os resultados alcançados com a mesma,

poderão ser eventualmente publicados, mas será mantido o mais rigoroso sigilo, através da omissão total de

quaisquer informações que permitam identificar os participantes; salvo expressa concordância, por parte de todos

os envolvidos, quanto ao contrário. Neste processo poderá haver também a gravação, em meio audiovisual, de

momentos de acompanhamento da investigação, mantendo-se a prerrogativa quanto ao anonimato dos sujeitos.

Informo também que os dados coletados serão destruídos após 05 anos do término da pesquisa.

Comprometo-me a apresentar uma devolutiva quanto à investigação desenvolvida, ao término dessa, à

Instituição e aos participantes; e a seguir rigorosa conduta ética, no curso da investigação.

A participação nessa investigação não envolve nenhum benefício material ou econômico para nenhuma

das partes: os prováveis benefícios advirão da contribuição para o desenvolvimento e da produção de

conhecimento, que favoreçam o avançar de questões relacionadas à esfera educacional.

190

Se você tiver qualquer pergunta em relação ao programa, por favor, entre em contato com a própria

pesquisadora, pelo telefone: (19) 9 9978 6053 ou pelo e-mail: [email protected]

Atenciosamente,

Mestranda: Isabel Cristina das Chagas Oliveira

Assinatura:_______________ Data _________________

Consinto na participação

Nome: __________________________________

Assinatura _____________________ Data ____________________

191

APÊNDICE 2- Formulário de consentimento livre e esclarecido para

participação dos professores no grupo focal

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado (a) professor (a) ________________________________________________________

Eu, Isabel Cristina das Chagas Oliveira, aluna regularmente matriculada no curso de Mestrado

em Educação do Centro Universitário Salesiano- unidade universitária de Americana gostaria de convidá-lo (a),

a participar do trabalho investigativo a ser por mim desenvolvido como parte da minha pesquisa de mestrado,

sob a orientação da profa. Dra. Maria Luísa Amorim Costa Bissoto e cujo objetivo é pesquisar os contornos

epistemológicos da educação profissional no Brasil, discutindo sua natureza de preparação para o trabalho ou de

qualificação para o emprego, e investigando as concepções de professores do Instituto Federal de Educação,

Ciência e Tecnologia de São Paulo Campus XXX sobre essa diferenciação, em nosso entender, fundamental para

que a educação, nesse nível de ensino, se configure, de fato, como uma educação emancipatória. Como

resultados esperados, acreditamos que conhecendo e discutindo as concepções dos docentes a esse respeito seja

possível aprimorar as práticas educacionais, a formação continuada do docente e a produção do conhecimento na

área. Esses são os principais benefícios antevistos para essa investigação.

A investigação seguirá os pressupostos da metodologia da pesquisa qualitativa, na modalidade de

pesquisa-ação, envolve pesquisa bibliográfica, análise de documentos institucionais e grupos focais com

professores que atuam na educação profissional do Instituto referido. Recebi os esclarecimentos de que a

participação nessa pesquisa não traz complicações médicas ou legais de nenhuma ordem, propondo-se 06

reuniões de discussão profissional, com participação voluntária, na forma de grupos focais, que não

comprometerão os horários de trabalho dos docentes, sendo uma pesquisa de risco mínimo, obedecendo aos

critérios de ética na Pesquisa com Seres Humanos, conforme a Resolução de número 510/16, do Conselho

Nacional de Saúde. Nenhum dos procedimentos utilizados oferece risco à dignidade dos participantes.

Gostaria de deixar bem claro que a sua participação nessa investigação é voluntária. Se você decidir não

participar ou quiser desistir de participar, em qualquer momento, da referida investigação, tem absoluta liberdade

de fazê-lo. Nenhuma restrição lhe será imposta.

As atividades desenvolvidas nessa investigação, bem como os resultados alcançados com a mesma,

poderão ser eventualmente publicados, mas será mantido o mais rigoroso sigilo, através da omissão total de

quaisquer informações que permitam identificar os participantes; salvo expressa concordância, por parte de todos

os envolvidos, quanto ao contrário. Neste processo poderá haver também a gravação, em meio audiovisual, de

momentos de acompanhamento da investigação, mantendo-se a prerrogativa quanto ao anonimato dos sujeitos.

Informo também que os dados coletados serão destruídos após 05 anos do término da pesquisa.

Comprometo-me a apresentar uma devolutiva quanto à investigação desenvolvida, ao término dessa, à

Instituição e aos participantes; e a seguir rigorosa conduta ética, no curso da investigação.

A participação nessa investigação não envolve nenhum benefício material ou econômico para nenhuma

das partes: os prováveis benefícios advirão da contribuição para o desenvolvimento e da produção de

conhecimento, que favoreçam o avançar de questões relacionadas à esfera educacional.

192

Se você tiver qualquer pergunta em relação ao programa, por favor, entre em contato com a própria

pesquisadora, pelo telefone: (19) 9 9978 6053 ou pelo e-mail: [email protected]

Atenciosamente,

Mestranda: Isabel Cristina das Chagas Oliveira

Assinatura:____________________________ Data _________________

Consinto na participação

Nome: __________________________________

Assinatura _______________________________ Data ____________________

193

APÊNDICE 3- Transcrição dos encontros

ENCONTRO DIA 02 DE AGOSTO DE 2016

OBJETIVO 1: Explicar a proposta do grupo focal e propor os temas para os

encontros;

OBJETIVO 2: Conhecer melhor a formação e o contexto que constitui cada um

dos professores participantes.

QUESTÕES DISPARADORAS

1- Experiência docente de cada participante e a quanto tempo trabalham na

EPTNM Integrado:

2- Qual a formação de cada um dos participantes?

3- Vocês consideram que tiveram um preparo/ formação para trabalhar na

EPTNM?

4- Como foi o processo de “adaptação” na EPTNM? Foi ou está sendo

difícil?

P1-

1- 6 anos e meio e 2 anos EPTNM Integrado

2- Licenciatura em química, mestrado no Ensino Químico e especialização em

gênero e diversidade na escola.

3- “Não aproveitei as disciplinas pedagógicas” motivos: na família tinha pressão

para fazer exatas, juntando a imaturidade de não entender ainda a

importância dessa formação pedagógica e na universidade tinha aquela

separação entre a área norte eram as disciplinas de exatas que eram

consideradas as difíceis e a área sul das disciplinas humanas, que tinham

certo preconceito de que não precisava estudar, esse preconceito se perdeu

quando passei a ser docente. Não teve estímulo nas disciplinas pedagógicas

na graduação.

194

4- Essa questão da oportunidade que a gente tem aqui dentro do câmpus de ter

essas discussões, inclusive de ter esse grupo focal está contribuindo bastante

pra nossas reflexões. Nós tínhamos no grupo da Química esses tipos de

discussões que contribuía muito nessas trocas de ideias e de experiências.

Mas essa adaptação é realmente um desafio e a cada dia a gente reflete.

P2-

1- 9 anos como docente e 2 anos nos cursos técnicos integrados ao ensino

médio;

2- Técnico em química, Bacharel e Licenciado em química, Mestre em Química

Inorgânica, Doutor e Pós-doutor em Química, Pós-graduado Lato sensu em

gestão pública e graduando em Licenciatura em filosofia.

3- A experiência que temos no IFSP é diferente das outras instituições que

oferecem licenciatura. Nessas outras universidades as disciplinas

pedagógicas são totalmente desvinculadas das outras disciplinas. Acontecem

até em prédios separados, os professores da educação e os professores das

áreas específicas divergiam em suas ideias. Aqui, no IFSP, temos uma

experiência diferente em que os cursos são realmente integrados e os

professores de todas as disciplinas (física, pedagogia) estão sempre se

reunindo para pensarem sobre o curso como um todo, diferente da formação

que eu tive. Quando nós chegamos aqui no campus não sabíamos como

formar um técnico, tínhamos experiência dos cursos superiores e a teoria dos

cursos de Ensino Médio e fomos adaptando (...) fomos nos formando juntos e

ainda estamos em formação.

4- A experiência que eu tive quando eu comecei no curso técnico, eu comecei a

dar aula como eu dava no bacharel e depois de um tempo que eu fui perceber

que era o ensino técnico, mas também era EM e foi um processo dialético

porque precisa de uma formação cidadã, você tem a formação técnica ou a

formação da racionalidade técnica específica e depois a formação para o

mercado de trabalho, da responsabilidade de formar um profissional que vai

atuar em um laboratório e pode ser que seja algo perigoso. Toda essa

195

formação parte para o mercado de trabalho, do cidadão e da acadêmica, São

três processos que foram dinamizando até chegar ao que temos hoje, não sei

se a gente chegou, mas estamos trabalhando para a formação desse

profissional técnico. Estamos no caminho.

P3-

1- 13 anos como docente e 4 anos e meio nos cursos técnicos integrados ao

ensino médio;

2- Tecnólogo em processamento de dados; Pós-graduação lato sensu em

Análise de Sistemas e em Gestão Pública, Mestre em ciência da computação,

Licenciado no ensino da computação (complementação pedagógica) e

cursando Pós-graduação lato sensu em EJA.

3- Comecei a carreira docente como um “bico” para juntar dinheiro para o

casamento. Mas deu tão certo, foi tão bom que eu aprendi com meus colegas

e com meus professores o que devo ou não fazer e me rendeu bons frutos. Aí

fiquei longos anos na graduação e antes do IF me aventurei no Centro Paula

Souza em num curso técnico e fiquei desesperado, porque senti que não era

“pra” mim. Porém levei isso como desafio e percebi que eu precisava

entender os alunos e foi um trabalho fascinante que eu mais aprendi do que

ensinei. No final do ano fui eleito o melhor professor e eu fiquei muito feliz

porque significou que a minha prática docente funcionou. Mas funcionou pelo

fato de entender as necessidades dos alunos e trabalhar encima disso aí.

Quando vim para o IF já tinha uma “pequena bagagenzinha nas costas”, mas

uma visão totalmente diferente das outras instituições e aqui eu senti

necessidade de buscar a qualificação e fui fazer licenciatura. Interessante que

quando pegava os documentos que falavam das práticas pedagógicas

percebi que muito do que estava escrito era feito na prática. Vi que o mesmo

conteúdo pode ser trabalhado de formas diferentes dependendo de cada

turma. Por isso o professor deve se reinventar sempre e ser o artista dentro

da sala de aula.

4- Eu vejo que na nossa equipe, mesmo estando em seguimentos diferentes,

estamos num viés que trilha para um mesmo caminho. Sabemos que temos

196

dificuldades, mas sabemos que não precisa ser sistemático que a gente tem

que se reinventar, estudar, que cada aula é um desafio e uma experiência. E

isso parte desde a nossa direção, gerência e coordenadores que nos dá essa

liberdade para podermos buscar, junto com nossos alunos qual a melhor

forma de buscar essa técnica, de passar o conteúdo, e a melhor metodologia.

Pegando na questão da formação minha e do P7 que somos da área de

informática, é muito complicado muitas vezes explicar para um aluno a teoria,

como por exemplo, na disciplina de lógica, é muito difícil ensinar o cara a

pensar, é muito difícil. É diferente de você pegar uma linguagem de

programação que já tem suas estruturas que basta seguir o roteiro e pegar

sua ideia e sua lógica, para nós da área técnica agente tira de letra. O difícil é

ensinar a pensar, mas se vc não ensinar a pensar, ensinar a lógica, o cara

não chega mais para frente.

P4-

1- 6 anos docente 1 ano EPTNM Integrado

2- Licenciado em Química; Mestre em química; Doutorando em educação.

3- Na minha formação inicial eu não tive uma disciplina específica para trabalhar

a EPT, eu compreendo também que naquela época não havia embora já

houvesse demanda desses cursos não havia oferta deles de maneira tão

expressiva como é hoje. O curso era construído e estruturada pelo viés

bacharelesco. Outro ponto é que as formações dos nossos professores eram

“bacharelescas” porque todos os professores que não ministrassem aulas nas

disciplinas pedagógicas eram bacharéis. Dito isso, reflito sobre a aplicação de

a maioria de nós não termos tido essa formação nos cursos de formação

inicial. Agente tende a colocar na EPTNM metodologias e concepções de

ensino voltados para nossa formação, pelo viés bacharelesco. Aí está o que

alguns colegas apontaram sobre a distância entre o que a formação que a

gente oferta e a necessidade do mundo do trabalho. Há uma desconexão

entre o perfil que a gente forma e o profissional que o mundo do trabalho está

solicitando e necessitando.

197

4- Eu considero que a adaptação de início foi muito na prática, não houve uma

reflexão crítica prévia e mesmo depois que iniciou o processo. A exemplo do

que os colegas disseram, fazendo uma avaliação crítica, eu considero que eu

reproduzi o que eu estava acostumado no EM e fundamental em escolas

particulares voltadas para o vestibular. Depois de um tempo essa adaptação

passou de uma experiência prática para uma experiência mais teórica. Eu

passei a me questionar a respeito de determinados assuntos, e na tentativa

de responder a essas questões eu fui buscar grupos de estudo dentro e fora

da instituição. Então eu tive uma adaptação mais prática no início e agora

uma adaptação mais teórica.

P5-

1- 12 anos de experiência docente e 2 anos nos cursos técnicos integrados ao

ensino médio.

2- Graduado em Letas; Pós-graduação lato sensu em Educação; Mestrando em

Educação.

3- Me preparei para ser professor na preparação para dar minhas aulas, aprendi

dando aula. Hoje há melhor preocupação na licenciatura para esta

modalidade, mas mesmo assim a sala de aula é algo revelador em que se

aprende na prática em que se aprende a trabalhar com essa diversidade. “eu

que fiz licenciatura não me sinto tão preparado, penso na dificuldade de quem

não fez...”. Sobre a questão do mercado de trabalho, há algo que me deixa

intrigado há muitos anos, desde a graduação. Sobre o papel e a função da

escola na mudança de papéis, pois quando a escola deixou de ser um

instrumento de transformação externo e o externo passou a transformar a

escola, aí entramos nesse conflito e principalmente nesse desafio da

formação do aluno da EPTNM que será formado para a atuação técnica e

também e para do núcleo básico crítica e humana. Penso como esses alunos

são privilegiados por receberem uma formação em que eles transformem o

externo. Porque todos aqui têm a preocupação com a formação integral, para

o trabalho, mas com uma visão crítica para o trabalho.

4- Talvez o que esteja acontecendo de diferente é que aqui não temos o setor

norte e o setor sul relatado pelos colegas. No IFSP percebo que há uma

198

aproximação e essa aproximação contribui para uma educação diferente

principalmente nos nossos cursos de licenciatura. Não há esse

distanciamento que favorece uma boa formação. Quando eu cheguei aqui eu

fiquei encantado com essa possibilidade de trabalho que a gente não

encontra em outro lugar. Essa adaptação por eu já ter certa experiência com

Ensino Médio, diante dessa formação técnica surge um novo desafio. Com a

minha disciplina, minha formação vai contribuir para esse curso técnico para

que ele não seja simplesmente um curso técnico, não ensine somente a

executar uma tarefa sem pensar. Fazer com que os alunos do técnico siam

com uma formação cidadã.

P6-

1- Licenciada e bacharel em Ciências Sociais; Mestre em Trabalho e

Sindicalismo; Doutora em Ciências Sociais: As transformações do perfil da

classe trabalhadora com a inserção das novas tecnologias nos processos de

trabalho.

Gostaria de salientar que ter licenciatura não é garantia de boa atuação, pois

dependerá da instituição em que se trabalha, pois algumas limitam a atuação

docente de acordo com sua perspectiva engessada de educação.

2- A EPTNM era posta de uma perspectiva do tecnicismo, não foi colocado na

minha formação. Embora minha área discuta a questão do trabalho. Não tive

a formação, mas trabalhei no curso de pedagogia por muitos anos, inclusive

na supervisão de estágio. E no superior, nos cursos de pedagogia a gente

tem uma vantagem porque quando os estágios acontecem e são vários

semestres, o aluno é aluno durante toda sua vida e agora vai atuar nos vários

estágios e as memórias são retomadas. O que caracteriza a docência é essa

constante situação de aluna enquanto professora, pois não há docência sem

deiscência. Não é que a licenciatura não se prepare, é que há situações que

são irresolvíveis no mundo do trabalho. Se a gente não se adequa ao ritmo

institucional, a cultura empresarial, a cultura do trabalho, agente se desloca.

Na escola não, agente se reinventa, a gente está sempre à frente do mercado

de trabalho. Tanto do ponto de vista de planejamento, quanto nas questões

199

que podemos trazer para o debate. Diferentemente das empresas que têm

uma cultura estanque e inflexível às mudanças. E o trabalhador na situação

de trabalhador é uma situação de vida ou morte, mas enquanto aluno ele

pode experimentar. Agente prepara tanto e tão bem para o mercado de

trabalho que não necessariamente o mercado vai aceitá-lo. Sobre escola e

trabalho, não existe o trabalho deslocado da vida humana, no trabalho as

questões de hierarquia, de poder de socialização, todas estão ali no trabalho.

Talvez o externo queira censurar algumas questões que estão discutidas no

trabalho e estão sendo discutidas aqui dentro.

3- Faço dois anos aqui no IF o mês que vem e nesses dois últimos anos aqui no

IFSP acho que agora estou saindo da fase do encantamento em que nos

últimos 20 e tantos ano de ensino superior privado em que eu só dava aula.

Particularmente aqui no IFSP considero uma das experiências mais ricas em

toda a história na educação, matéria que lecionei vários anos. Não tinha visto

ainda um projeto de educação como este com uma riqueza de oportunidades

que me deixou impactada. Pelas boas condições de carreira, trabalho, de ter

dedicação exclusiva, com jornada de trabalho para sala de aula menor, com

tempo maior para preparação didática e com a integração entre ensino,

pesquisa e extensão. Que permitem que a gente tenha feito nesse ano

reflexões dessa experiência e pensarmos limites e possibilidades na EPTNMI,

limites e possibilidades de integração das disciplinas do NBC com as

disciplinas técnicas não só da grade, mas de transcendência e transposição

de uma matéria para outra. Tenho a sensação de estar recomeçando de

novo, particularmente tem sido muito estimulante porque é uma equipe muito

integrada, afinada, respeitosa nas diferenças. O que temos aqui, não sei se

outras instituições têm, de cruzarmos e conversarmos, experimentarmos, tem

sido muito gratificante.

P7-

1- 6 anos docente e 5 anos nos cursos técnicos integrados ao ensino médio.

2- Bacharel em Sistemas de informação; Pós-graduação lato sensu em Banco

de Dados; Licenciado em Computação (programa R2- complementação

pedagógica) e Mestrando em Educação.

200

3- Considero que em momento algum na minha formação houve o preparo para

lecionar em qualquer nível de educação, não somos preparados para ser

professor e caímos de paraquedas dentro de uma sala de aula com 40 alunos

cada um com particularidades com uma formação cultural, social e econômica

e é a hora que a gente vê que precisa correr atrás por conta própria”. Final do

século 19 e 20, com a globalização quando se ensinava o profissional técnico

era ensinar o cara a apertar parafuso com um trabalho quase irracional.

Estamos vivendo numa hoje na era do conhecimento /da informação que não

basta ensinar apenas a “apertar o parafuso” e está pronto. Hoje em dia essa

parte técnica robotizada e a formação técnica parte muito da formação crítica,

cultural e humana. Não adianta formar o melhor programador se ao chegar no

mercado de trabalho ele não souber trabalhar em grupo, não souber tomar

decisões. O mundo muda muito rápido e precisa saber se reinventar a todo

momento.

4- Às vezes eu fico refletindo sobre um ponto, que eu não tenho ainda uma

resposta, porque ficou claro aqui que não existe preparação para quem fez

licenciatura trabalhar com os cursos Técnicos integrados e para nós,

bacharéis, preparação nenhuma. Mas da mesma forma eu fico pensando

assim, mesmo que tivesse essa formação para trabalhar com esses cursos eu

acredito que por mais que tenha esse preparo, quando você entrar na sala de

aula é totalmente diferente. Por exemplo, você vai num curso de seis meses

para aprender a andar de bicicleta, aí o cara te explica tudo, você faz prova e

fica tudo certo. Mas quando você terminar o curso e for subir na bicicleta,

você vai cair, vai patinar, vai demorar um tempo até você começar a pedalar,

andar uma pequena distância, depois de algum tempo vai pedalar mais e ir

mais longe até começar a conseguir fazer algumas manobras. Eu acho que é

a mesma questão, é obvio que ter uma formação é muito importante, mas

quando a gente vai para sala de aula a gente cai os primeiros tombos e aos

poucos vai se adaptando. Eu estou me adaptando e acho que essa

adaptação não vai acabar nunca. A gente vai se reinventando, em fim,

quando você cai nesse curso, além da parte técnica tem outras séries de

questões que você tem que se preocupar. Eles estão entrando na

201

adolescência então, às vezes, você tem que ser um pai e um professor ao

mesmo tempo, aconselhar, puxar a orelha de vez enquanto e dize que não é

por aí. Mas é obvio que a preparação, a formação anterior ajudaria muito,

mas depois também é importante continuar buscando melhorar.

P8-

1- 4 anos como docente e 2 anos nos cursos técnicos integrados ao ensino

médio.

2- Licenciada em Química; Mestre em Química Inorgânica.

3- Embora tenha feito licenciatura “só senti mesmo como ensinar, na prática.

Depois que a gente entra na sala de aula é que a gente aprende a ensinar.

4- Essa adaptação não foi e não está sendo fácil para mim, antes de entrar aqui

eu trabalhava em uma escola particular e lá eu já tinha a apostila, a aula

pronta e eu só tinha que estudar aquilo e ir lá aplicar. Então estávamos

formando alunos apenas para o vestibular, era o foco deles. Aí quando entrei

no IF eu vi uma coisa diferente, eu não só estou preocupada com os alunos

que querem prestar um vestibular, mas em formar ele para o mercado de

trabalho e principalmente formar um cidadão. São três coisas juntas que a

gente tenta fazer o possível para tentar contemplar esses três. Nem sempre é

possível, tem dias que a gente foca mais em um, no outro dia foca mais em

outro, mas estou tentando trabalhar dessa forma. Então para mim está sendo

um desafio muito grande, mas ao mesmo tempo é muito bom porque estou

aprendendo muito com isso. Estou tentando também ser cada vez mais uma

boa professora para eles. Tentando fugir da forma como eu trabalhava e

também da minha formação desde quando eu era criança até eu me formar.

Fugindo um pouco disso para tentar passar um pouco disso parar eles, que

não temos que nos preocupar só com o vestibular, tem que aprender um

determinado conteúdo, mas que ele vai servir para a vida e para o mercado

de trabalho.

P9-

202

1- 12 anos docente e 4 anos nos cursos técnicos integrados ao ensino médio.

2- Graduada em Engenharia Química; Mestre em Engenharia Química; Doutora

em Engenharia de Alimentos. Não fiz licenciatura, mas me considero um

pouco intuitiva.

3- Não tive formação nenhuma, na verdade eu tive uma “antiformação” pelos

meus professores me formei e fui para a indústria, hoje sinto que me formo

com meus alunos e com as trocas de experiências com meus colegas.

4- Eu acho que a minha adaptação foi suada, trabalhosa, eu sentia uma agonia

muito grande. Até porque dou muitas aulas na linha de OPU (Operações

Unitárias) que é uma disciplina que tem muitos livros para engenharia, mas

para cursos técnicos não tinha. Então como direcionar para um curso técnico

quando não se tinha livros? Hoje já tem um pouco. Buscava com meus

colegas algumas experiências que eles faziam de iniciação científica,

buscando nos livros de Química como fazer iniciação em laboratórios, mas

ela não foi fácil. Vi muito tutorial, já levei meus alunos para ferro velho para

verem equipamentos porque para ir fazer visita técnica na indústria era

complicado a questão do transporte. Então, tentando buscar maneiras de

trazê-los para a parte da realidade da indústria mesmo.

P10- ausência justificada (entrevista realizada no segundo encontro).

1- 6 anos de docência e 1 ano e meio na EPTNM.

2- Bacharel em Administração; Mestre em Administração; Doutor em

Administração.

3- Nos cursos que eu realizei não havia preocupação com a preparação para a

EPTNM.

4- A adaptação está sendo um processo de tentativa e erro, numa busca de

autoconhecimento e autoaprendizagem, tentando entender o que se aplica do

que eu aprendi e o que eu preciso melhorar e aperfeiçoar. Eu tento minimizar

essa distância trazendo exemplos práticos e vivências profissionais nas

indústrias e nas empresas para que essa distância diminua um pouco.

203

TRANSCRIÇÃO ENCONTRO 2 DIA 09 DE AGOSTO DE 2016

OBJETIVOS: Compreender a questão do trabalho e emprego; entender o que a

legislação prevê sobre os cursos técnicos integrados ao ensino médio e

avaliar que tipo de educação se pratica no Campus XXX: formação para o

trabalho ou qualificação para o emprego.

O encontro iniciou- se com o agradecimento da presença de todos e com a

chamada oral. Para iniciar a discussão do tema trabalho e emprego, foi feito uma

dinâmica “dobradura do chapéu”. A dinâmica tinha como propósito simular

primeiramente uma cadeia de produção (emprego) em que cada indivíduo realizava

uma parte do processo da construção do chapéu. Nesse momento eles eram

estimulados a produzirem em maior quantidade possível e como recompensa

receberia um “bônus” pela produção, não havia conhecimento do que se estava

produzindo, não havia tempo para reflexão e nem espaço para criatividade. No

segundo momento, houve liberdade para fazerem o mesmo produto, mas agora

cada um poderia conhecer o processo de construção do início ao fim, não havia

pressão para uma produção em números porque estavam preocupados com a

qualidade do produto. Houve espaço para explorar a criatividade.

Questão 1: Após a finalização da dinâmica, os participantes voltaram para seus

lugares e foi feita uma reflexão para saber como se sentiram durante a atividade.

Como foi essa experiência?

Questão 2: Falar do segundo momento da dinâmica em que houve o tempo

necessário para cada um fazer o seu próprio chapéu. Como foi essa experiência?

Questão 3: Que tipo de educação nós praticamos nos cursos Educação Profissional

Técnica de Nível Médio Integrada, seria mais uma formação para o trabalho ou uma

qualificação para o emprego?

P1-

204

1- Eu me senti pressionada e não me saio bem com pressão, ter que fazer

rápido, competir...

2- XXX

3- Eu fiquei pensando que as técnicas, os procedimentos vão sendo mudados e

o que a gente faz aqui no IF nos laboratórios, nas aulas, na maioria das vezes

vai ser diferente do que ele (o aluno) vai ter no trabalho. Então eu acho que

uma formação integral, pensando na questão d autonomia, que ele consiga

se desenvolver no trabalho com responsabilidade, com criticidade. Então eu

não vejo que ele tem que sair excelente em alguma técnica ou em alguma.

P2-

1- Acho que a gente já tinha discutido isso em um dos encontros do grupo de

estudos sobre trabalho e emprego. Nesse momento o participante questiona

a P6 sobre a questão de que desde a antiguidade havia a separação entre os

que pensavam os filósofos e religiosos que tinham um alto poder aquisitivo

enquanto que o trabalho manual era realizado pelos escravos e pessoas de

baixo poder aquisitivo que apenas reproduziam as profissões de seus pais.

Nesse momento a P6 contextualiza e explica: estamos acostumados a pensar

na história de forma linear e apenas no ocidente, mas que se formos analisá-

la num todo, veremos que o que acontece é a questão do preconceito com os

trabalhos manuais e certa separação entre o pensar e o fazer por meio da

escolarização. Segundo ela, a grande questão para nós é a separação e o

preconceito com o trabalho manual. A criação pode estar presente em

espaços que a gente não valoriza a inovação tecnológica muitas vezes

acontece no chão de fábrica. Hegel fala que esse preconceito manual está

presente na dialética escravo/senhor em que os senhores vivem da

exploração do trabalho manual, mas acabam caindo numa vida de ostentação

e isso vai dando poder para o escravo. Um pouco é preconceito nosso do

escravo que tem seus saberes e domina suas práticas, o conhecimento tácito.

2- Acho que isso que é interessante, numa linha de produção você não tem

noção do que está fazendo e quando você produz é algo que você mesmo

205

pensou ou pelo menos você está trabalhando sabendo de onde que começou

e para onde é que vai. Na questão do emprego é sempre uma relação de

troca onde o empregado sempre sai perdendo porque ele está vendendo a

sua força de trabalho e produzindo para que alguém lucre porque ele não tem

capital para produzir da mesma maneira.

3- Eu não queria falar o nome de outras escolas, mas, por exemplo, o SENAI,

que você tem aquelas simulações de empresas, nas indústrias que os alunos

vão lá tentar fazer as mesmas coisas que se faz na indústria. Isso é uma

qualificação para o emprego acho que isso a gente não faz aqui. Não sei se

porque os cursos são direcionados para a indústria diretamente e aqui tanto

na informática quanto na química a gente tenta trazer essa formação mais

integral mais para o trabalho e não necessariamente para uma empresa

específica, nós buscamos uma qualificação mais ampla, pelo menos a gente

tenta.

Outra coisa que eu penso e que eu li é sobre a falência da formação

profissional. Porque você tem um especialista que trabalha na indústria que

trabalha totalmente com a racionalidade prática, ele sabe na prática como

apertar o botão, como apertar o parafuso, mas não tem a teoria. Já o

acadêmico tem a teoria só que ele não a prática. Mas o ideal é juntar os dois,

quando você tem uma reflexão sobre sua prática pedagógica, e é isso que

estamos tentando fazer, fica mais rico do que só a racionalidade prática e

racionalidade técnica. Você faz uma reflexão sobre o que acontece no curso,

sobre o que acontece no decorrer dele e como a gente pode modificar ele.

Acho que é muito mais rico. Quando eu estudei no curso técnico tinha essa

visão de que o cara que trabalha na indústria vai formar melhor o aluno do

que o cara que vem da academia. Se for extremamente acadêmico ou se for

extremamente prático tem deficiências nos dois. Agora a reflexão sobre a

prática pedagógica sobre como você faz, porque tem aquela titulação, como

vai ensinar aquela titulação é que é importante.

Na área da química, por ser muito acadêmica, acabamos sendo muito

tradicionais pela formação bacharelesca. Então essa visão inovadora só tem

206

na área mais pedagógica, na área específica da química a gente é muito

tradicional.

P3-

1- Uma questão que eu vejo interessante é a situação que cada um tem o seu

tempo de aprender e para fazer. Por exemplo, o P4 pensando na

engrenagem, talvez ele por ele estar na posição que ele estava (durante a

dinâmica) não era bom para ele, talvez ele precisasse ficar no fim porque ele

teria o tempo dele, as habilidades e as competências dele que ele já

desenvolveu. Eu vejo que na educação é a mesma coisa com os alunos, às

vezes a gente quer “serializar” a educação. Tem que ser o A, depois o B, só

que a gente pode ver todas as vogais e não precisa ser primeiro o A e depois

o B e a gente vai montando formas de buscar o conhecimento. E essa

questão do estímulo, eu acho meio errado é a questão de adestrar. Minha

crítica ao governo de São Paulo em relação à educação é que os nossos

professores são adestrados, motivados ao bônus. Anualmente são

carregados esses bônus para que o professor trabalhe durante o ano eu acho

isso aí um absurdo. Eu acho que esse bônus deveria ser a valorização do

professor no dia a dia na sala de aula. Mas vale a gente pensar nessa

situação em que eu vou incentivar para que você faça, no nosso caso a

balinha. Na questão do desempenho do professor ele é incentivado a ter o

bônus e aí ele pensa apenas no valor de remuneração e não está errado

porque ele tem bocas para sustentar, contas para pagar, mas muitas vezes

ele deixa a questão da educação, do aprendizado e o empenho na escola fica

em segundo plano, o foco dele é alcançar os números para atingir a meta.

2- Essa dinâmica tem muito a ver com algumas piadas que a gente conta “eu

não quero procurar trabalho não, eu quero um emprego”. Pois eu entendo

que a primeira etapa é o trabalho e a segunda é o emprego. Nesse momento

a pesquisadora apenas esclareceu um pouco sobre as definições que estão

presentes na dissertação entre trabalho e emprego.

207

3- Acho que a principal função nossa é estimular o aluno a pensar e aí a

consequência do aprendizado leva a prática. E a prática é a mesma situação,

são os mesmos procedimentos, a forma pedagógica que a gente ensina

aqueles procedimentos. Mas, muitas vezes no mercado, é diferente, o

mercado tem suas necessidades e suas exigências. Mas acho que o principal

propósito nosso é estimular e dar a condição para o aluno que está

“engatinhando” levantar e andar e isso vai depender de cada um deles.

Precisamos tomar cuidado em relação às nossas práticas para ver se nossas

aulas não estão sendo “roteirizadas” a gente tem um roteiro e é esse que eu

vou seguir e não conseguir trabalhar se por acaso precisar sair do roteiro. É

pensar nos porquês. Antigamente a gente tinha os especialistas que só eram

bons no que faziam como apertar a porca da roda, se fosse preciso mudar o

profissional não saberia fazer. É isso que a gente tem que tomar cuidado,

para não repetir o que era feito há anos atrás.

Temos que fazer um paralelo entre o conservador e o inovador, nós estamos

na questão da inovação. Nós pensamos muito em novas tecnologias, novas

formas de resolver problemas do cotidiano, na verdade a gente tá formando

profissionais para profissões que não existem ainda, para resolver problemas

que não foram criados ainda.

P4-

1- Foi uma experiência muito ruim, porque eu tenho aversão à competição, nem

em sala de aula, nem na natação...

2- Em relação a esse segundo momento, não teve a pressão, nesse momento a

competição entre a equipe A e a equipe B deixou de existir e não havendo

isso é possível ver que a originalidade surgiu e a decoração de cada um é

diferente. É interessante a gente refletir como a competição e a pressão pode

estar presente no dia a dia em nossas aulas. Se a gente não se atentar, de

maneira indireta, isso faz que os alunos incorporem isso no mundo do

trabalho. E quando tem competição não é prazeroso, deixa de ser

colaborativo.

208

3- Pois assim como os colegas já mencionaram que o nosso objetivo é formar

para a vida, e se é para a vida então a gente tem o objetivo de contribuir para

formação do indivíduo por um viés mais antropológico, formar o cidadão por

um viés mais sociológico e formar para o mundo do trabalho.

P5-

1- Só acho interessante ressaltar da minha parte que nesse processo de

alienação, todo conhecimento que tem, por exemplo, no notebook, pensar

que cada peça é produzida em um lugar diferente e depois na linha de

montagem cada funcionário vai colocar uma pecinha. Eu penso que será

também que não é uma forma de proteger todo esse conhecimento? Porque

quando você coloca um especialista somente naquilo e junta vários

especialistas eles não dominam o todo e isso é uma relação de poder, se

fosse dominado por uma pessoa acho que perderia o domínio de controle e

de poder para proteger essas informações. Nesse momento de produção do

chapéu, eu percebi que cada um, motivado por essa competição e pelo bônus

ficava pensando na mão de obra escrava e vejo que os operários passam por

isso sempre e isso faz com que eles de alguma maneira se afastem da

própria criticidade.

2- Na segunda parte, cada um com a sua liberdade e com o seu tempo pode

colocar o seu conhecimento e agregar algo que não foi imposto. Eu enxergo

isso porque você consegue colocar o seu conhecimento e a sua criatividade.

E eu reforço que não é que as pessoas não tenham criatividade, acho que as

pessoas estão numa competição imposta motivada pelos bônus. Nesse

momento ele lembra que quando trabalhava no estado de Minas Gerais,

trabalhava com o incentivo do bônus que chegava sempre atrasado. Que era

um processo de alienação que o fazia parar de pensar criticamente no

processo e ficava preocupado apenas com os números.

O homem não nasceu para esse trabalho forçado, se formos pensar,

trabalhamos a vida toda buscando parar de trabalhar, a aposentadoria. Não

nascemos para o emprego, nascemos para o trabalho.

Só reforçando essa questão do preconceito eu fiz uma disciplina sobre a

questão do trabalho no mundo em que o professor deu o seguinte exemplo:

209

Tinha um professor sentado na varanda da sua casa lendo um livro, aí o

vizinho chegou e perguntou: Descansando? E o professor respondeu: Não,

trabalhando. Num outro dia o professor estava de folga no jardim podando a

grama e o vizinho perguntou: trabalhando? Não, descansando. Porque ha

uma visão destorcida da questão do trabalho.

3- Acho que aqui nós temos a oportunidade de trabalhar com uma educação em

que uma não anula a outra. No momento que fala do generalista e do

especialista eu enxergo que a formação técnica pode acontecer, buscar a

perfeição até mesmo porque eu entendo a preocupação. Se um profissional

for formado para construir viadutos, vejam o exemplo de BH que caiu um, por

isso se não tiver conhecimento eu acho que vai gerar um problemão. Então

que nós temos que buscar a perfeição então é essa formação técnica com

uma preocupação com o processo e sem desconsiderar o humano. Eu não

consigo enxergar uma anulando a outra. Apesar de que a gente vê casos de

gente que sabe tudo e não sabe nada, e têm os especialistas que sabem só

daquilo e que se pedir para ela abrir uma porta em que a fechadura, ao invés

de puxar pra baixo ter que puxar pra cima não consegue abrir a porta. Então

o que eu acho que nós temos que buscar é essa formação preocupada com o

processo, com a formação completa na área de conhecimento, mas também

com todos os processos que envolvem essa prática. Nos nossos cursos nós

temos que buscar isso. No Médio Integrado eu percebo que, até mesmo pelo

nosso contexto hoje, a formação técnica e a formação básica conversa,

dialoga bastante. Acho que a gente tem tudo para buscar essa formação. Em

que uma não anule a outra.

P6-

1- A mim toca as hierarquias, além do processo fordista que foi lembrado fica

bastante explícita a questão da alienação do trabalho alheio. Eu estava

brincando, até para a gente simular as questões de conflitos nas relações de

trabalho em que aquele que se considera um bom trabalhador também está

relacionado com essa situação de pânico, de alienação. Não sei por que, mas

o estímulo de um bônus me coloca na situação de um animal que está sendo

adestrado, e não qualificado. O trabalho que é uma dimensão humana, para

210

mim que é uma dimensão estruturante da personalidade, da subjetividade e é

uma dimensão da qual a gente transforma a natureza, a gente entra em

contato com a natureza, descobre as mil facetas da natureza, se defende dela

e se apropria dela em determinados tipos de relação. Nas situações de

trabalho, historicamente a gente se coloca numa dimensão de animais

adestrados porque nos cabe, cabe a todo mundo e essa dimensão de criação

cabe a poucos. A gente vive numa situação que quem cria é quem tem os

meios de produção, é o dono da fábrica. Aos demais cabe cumprir ordens. É

obvio que a gente está numa era pós-fordista da flexibilização, mas a gente

passou a buscar o bônus não porque o patrão me oferece, a gente introgetou

essa condição de trabalhar para ter o bônus e essa sensação é muito ruim.

Você a trouxe para gente de uma forma bem bacana.

2- Eu senti muito quando entrei aqui no IF o significado daquela história do

passarinho que nasceu no cativeiro e quando você abre a gaiola ele não sabe

que ele pode sair. Se a gente é adestrado para uma linha de produção vai ser

muito difícil se tornar outro instantaneamente. Eu estou trazendo uma vida de

transição, uma vida toda corporativa, de ter horários regulados, a hora que eu

podia ir ao banheiro e as infecções urinárias que são doenças comuns a

quem é professor. E vim para uma realidade em que a gestão é participativa,

em que os horários são diferentes. É como se eu não tivesse sido formada

para essa nova realidade.

3- Há dimensões em que a gente precisa ter noção do que a gente considera

certo ou errado, acho que uma educação totalmente tecnicista que não

permita que a gente faça em qualidade, mas sim em quantidade, para quem?

Para qual público consumidor? Mesmo a roupa que você compra uma roupa

em um departamento da classe C ela vai ter que necessariamente se mal

cortada? Acho que a gente pode se permitir sim estabelecer critérios de

valores acho que na nossa profissão de educar nos permite. Acho que a

gente não precisa ter pudor em relação a isso, não quero dizer que a gente

confronte de uma maneira negativa, o que o outro considera certo ou errado,

mas o que nos guia é sempre uma noção de perseguir aquilo que a gente

acha certo ou errado. Quando o profissional vai trabalhar com a excelência na

211

na profissão técnica, o que é que a gente pensa? A gente pensa que o nosso

aluno é uma pessoa inserida em relações mais amplas então ele precisa

superar essa fronteira entre treinar e achar que não é o papel dele olhar para

o funcionário e perceber se ele está mais pálido ou menos pálido, perceber se

ele está sendo molestado de alguma maneira, perceber como vão as relações

de trabalho na empresa. Não só por causa da dimensão da produtividade,

mas pela relação humana. A pessoa já vai passar o dia inteiro na fábrica que

é um ambiente insalubre, de tensão, não se pode achar que todo esse

processo é desvinculado das relações humanas que estão ali, se vai perder

um dedo ou se não vai, se vai ficar surdo, o camarada não quer colocar a

proteção auricular, então a gente insiste muito nessa separação entre técnico

e humano e que na verdade ela não existe. Acho que nós, a escola, forçamos

muito a barra em discutir esse assunto que na verdade não existe. A menos

que nós vamos ser totalmente monstruosos com as pessoas que estão

trabalhando com a gente. Você vai ficar surdo sim, vai perder o pulmão sim e

é o que temos para hoje.

Essa discussão a gente tem muito no grupo de estudos, eu tenho

acompanhado o curso de formação de professores e é tão bom ouvir essa

preocupação com a teoria nos cursos técnicos, porque a tendência em cursos

atuais é diminuir nos cursos de pedagogia, licenciaturas, as matérias teóricas.

E as aulas de práticas são importantes, os estágios também são muito

importantes, porque no estágio não é simulação. Mas a gente precisa retomar

essa dimensão da teoria e da abstração porque parece que a gente está

priorizando a “historinha”, o contexto e não está trazendo isso dentro de uma

perspectiva teórica e as pessoas não sabem mais abstrair. Aí a questão da

autonomia é obtida quando a gente teoricamente tem essa percepção, as

teorias pedagógicas, as escolas pedagógicas, as políticas educacionais, tudo

isso ajuda a gente como professora para formar um aluno, futuro professor,

futuro técnico. Porque se não a gente fica inseguro achando que tem que

levar uma receita de bolo. A gente esquece que a escola é uma organização,

eu acho que aqui, por ter uma gestão muito democrática, acho que a gente

ainda precisa inserir mais os alunos nas instancias gestoras. A entrada dos

212

alunos nas comissões gestoras vai dar para eles essa dimensão da

organização. Nós próprios esquecemos que aqui é uma organização, é uma

escola, mas é uma empresa, uma autarquia, ela contrata, seleciona, paga

contas, ela pensa nos recursos, pensa no layout, no planejamento... Talvez a

gente esqueça que não estamos trabalhando fora do mercado de trabalho,

isso é uma grande empresa, uma grande organização, mas as nossas

relações hierárquicas com os alunos faz a gente esquecer isso. Esse

distanciamento de que eu sou doutora e o aluno irá apenas receber, acho que

é um problema muito sério da postura do professor, mas a gente não percebe

que somos uma empresa.

O aluno precisa ser um agente transformador do mercado, não alguém que

se adapta ao mercado. Coisa que eu tenho muita implicância é essa lógica

darwinista da adaptação. Acho que a gente precisa realmente pensar nessa

formação para a transformação.

P7-

Pegando não só no caso dos alunos que são do Médio Integrado, pensando

na área de informática, nós temos ex- alunos que são funcionários públicos,

inclusive alguns que trabalham aqui. Tem um ex- aluno que está ingressando

no mestrado, ou seja, vai seguir a carreira acadêmica; temos alunos e ex-

alunos que estão em grades empresas multinacionais e temos alunos e ex-

alunos que estão em pequenas empresas aqui da cidade. Então a gente vê

como é bastante grande, então se a gente está dando a possibilidade de um

cara seguir uma carreira acadêmica, seguir uma carreira profissional, seja

dando continuidade ao negócio que a família já tem, seguindo a carreira

pública, eu acho que a gente está de uma forma sim, dando todas as

ferramentas, não para a gente formar os alunos, mas para eles se formarem.

Porque a gente cobra tanto hoje a autonomia do aluno, mas o professor que o

professor não deve formar o aluno, o aluno deve se formar e ele ter essa

autonomia de seguir a carreira e a vida que ele achar que é interessante para

ele, buscar e alcançar os objetivos que ele achar que é interessante. Essas

213

possibilidades eu acredito que o IF tem dado para os alunos. A gente tem

colocado várias possibilidades na frente deles, e eles com a autonomia deles

vão decidir o caminho que querem seguir. E isso é o mais importante talvez

numa escola. E já abrindo um parêntese com relação ao que o P10 falou, eu

estava em um evento em Campinas em maio, o DevCamp que é a maior

Conferência de Desenvolvimento de Software do interior de São Paulo e eles

reservaram um auditório só para falar do ser humano nesse processo. E uma

dessas palestras foi de um cara que trabalha na LOCALWEB e ele falou

justamente isso aí, até pouco tempo atrás era todo mundo especialista, o cara

fazia uma parte, passava para o outro que fazia outra, que passava para o

cara que ia testar e se desse errado voltava de novo. E hoje ele está falando

do desenvolvedor que é flextek, que tem uma noção de tudo, mas ele

continua exercendo aquela função de especialista. Por exemplo, o P3 vai

fazer alguma coisa e vai me passar, eu não vou saber só mexer naquela

parte que é minha responsabilidade, eu vou saber o que ele fez e eu tenho

um poder crítico de ter essa troca de experiências entre um e outro. Isso é

uma tendência que está acontecendo, principalmente na nossa área.

P8-

1- Eu me senti literalmente dentro de numa linha de produção e percebi que o

negócio é que quanto mais produzir e quando eu analiso o que fizemos, não

foi um trabalho tão bem feito, cada um fez uma parte e quanto mais se produz

mais imperfeito vai saindo.

2- Xxx

3- Eu sempre lembro quando estava aprendendo titulação (na faculdade) e o

professor falava: vocês estão aqui fazendo titulação, então a gente faz e

ensina da maneira certa, mas se vocês forem para uma indústria, ao chegar

lá, as coisas são diferentes. Os procedimentos não serão idênticos ao que

estão aprendendo aqui. Pode ter equipamentos mais sofisticados que

mudarão um pouco o processo. Em outros lugares, é tudo automático, mas

mesmo a gente fazendo do método mais primitivo, a gente é capaz de pensar

214

o que a gente está fazendo, uma vez que a técnica lá, querendo ou não,

embora os aparelhos sejam diferentes, a técnica é a mesma e se alguma

coisa dá errado, a gente sabe pensar em como corrigir. Então acho que isso é

o principal, apesar de os métodos aplicados serem diferentes, a teoria

aplicada é a mesma. A gente dá a faca e o queijo e eles têm que aprender a

cortar.

P9-

1- Xxxxx

2- Xxxxxx

3- Hoje eu estava no médico e ele comentou sobre essas questões de

formação, e ele questionou se é melhor um engenheiro mecânico que é

instruído por engenheiros mecânicos que estão na indústria, ou um

engenheiro mecânico que é ensinado por doutores. Eu vejo o IF com um

corpo docente de doutores e mestres muitas vezes “despreparados” para

atuar nos cursos técnicos. Porque nós não estamos efetivamente diante de

um emprego na indústria ou dentro de um laboratório. Mas eu ainda acho que

essa questão de trabalhar na extensão, no estágio, essa questão do núcleo

básico comum, quando mistura tudo, que é uma coisa muito particular do IF,

ela é muito rica para a gente aprender a trabalhar, mesmo que, com muitos

doutores e mestres, a formar esse cidadão crítico e com autonomia. Porque

essas várias reuniões, essa vontade de entender o que é o IF hoje, faz com

que a gente fale muito, debata muito e a gente começa a perceber que o

cidadão é esse cara que às vezes implica, às vezes questiona, e que muitas

vezes ele aprende, nem que seja com um trabalho manual como um projeto

de extensão e ele aprende que na hora que não tiver dinheiro ele sabe que

pode fazer uma coisa assim, que é um trabalho, diferente do que ele se

formou, e assim eu ainda acho que ele forma um cidadão mais completo.

Essa mescla que virou o IF tem a capacidade de formar um cidadão ainda

mais completo do que, por exemplo, uma escola técnica faz.

215

Acho muito interessante a pedagogia por projetos, porque quando você joga

um projeto, você faz o aluno perceber a resolução de um problema. E ele se

envolve, vai atrás de uma teoria até onde ele precisar, para resolver aquele

problema específico. A gente já está fazendo alguma coisa assim e por isso

que eu acho que isso é muito interessante para juntar. Se ele tiver esse

treinamento ele tem muito mais chance de dar certo no mercado de trabalho.

Eu prefiro trabalhar com a realidade, eu falo para o meu aluno “manda quem

pode, obedece quem tem juízo” e você faz os teus planos. Se você quer ficar

dois anos em uma determinada situação, você faz o teu plano e as

dificuldades você tem que aguentar. Porque daqui a três anos você pode

estar em outro lugar. Então acho que essas dificuldades que a gene também

enfrenta, eles também precisam enfrentar, porque uma hora ele vai ter que

aprender a “engolir sapos”.

P10-

1- A dinâmica me fez refletir bastante no sentido da produção em massa, da

linha de montagem, me lembrou o modelo taylorista/fordista de se trabalhar

onde se valorizava a especialização do trabalhador em uma determinada área

em que ele se capacitava para “apertar a roda do interior direito do automóvel

e ele fazia isso a sua vida toda. E com isso foi criando a figura do

profissional especialista que você acabava tendo o produto final, no nosso

caso do chapéu. Uma política voltada para a produtividade e por questões

quantitativas apenas.

2- Xxxxxxx

3- Para mim é um pouco difícil falar sobre o Campus XXXX, porque estou aqui a

pouco tempo e ainda estou assimilando essa cultura e essa filosofia com

relação aplicada aqui. Mas vou comentar sobre o que eu vejo nesse sentido.

Questões técnicas, muito se vê sobre a preparação para formar um

especialista. Nós temos escolas preocupadas em formar esses especialistas

e inserí-lo no mercado de trabalho, alienado, que só vai saber fazer aquilo,

que não tem uma visão holística do que é uma organização, do que é uma

216

empresa, do que é uma sociedade, ou nós ficamos preocupados em formar

esse cidadão generalista que conhece um pouco de tudo, que domina muitas

das áreas do conhecimento e vai depender dele como ele vai interpretar lá

fora e como ele vai aplicar isso lá fora. Eu acho que as duas são perigosas,

no seguinte sentido: você vai formar um aluno generalista, mas ele vai sair

com uma titulação, um título em técnico (no nosso caso em química ou em

informática) aí ele vai chegar lá no mercado e não vai saber fazer uma

titulação ou ele não vai conseguir assimilar aquilo que o professor transmitiu

em sala de aula como conteúdo na prática efetiva de uma empresa. Então

acho que nós temos que tomar muito cuidado porque há uma linha muito

tênue para não formar só o especialista e não formar só o aluno generalista

que sabe um pouco de tudo, mas não faz nada bem feito, mais ou menos a

história do pato que faz um pouco de tudo, ele nada, ele canta, ele anda, mas

é totalmente desengonçado, ele é totalmente generalista, ele sabe um

pouquinho de tudo, mas na essência ele não é o melhor naquilo que ele faz.

Então acredito que o ensino deve partir de uma forma que ele consiga

conjugar essas duas situações, que tenha essa formação geral/ holística, mas

que eu forme também um especialista naquilo que ele buscou. Nós temos

duas especialidades assim como em outras instituições existem outras. E nós

devemos buscar essa integração entre as duas.

TRANSCRIÇÃO DO ENCONTRO 3 DIA 16 DE AGOSTO DE 2016

OBJETIVOS: Avaliar alguns documentos que orientam a educação profissional

nos cursos técnicos integrados ao ensino médio

O encontro iniciou- se com o agradecimento da presença de todos e com a chamada

oral. Em seguida foram apresentados alguns documentos que orientam e EPTNM e

discutido com os participantes.

Questão 1: Foi apresentado um comparativo do que o primeiro decreto que deu

origem do IFSP em 1909 com a lei de criação do IFSP em 2008. Houve mudanças?

O que mudou? Para quem era e para quem é essa educação? Qual era o propósito

antes e qual é hoje?

217

Questão 2: Análise e reflexões acerca do documento: Concepção e Diretrizes do

Instituto Federal.

Questão 3: Após leitura do artigo 5 da resolução nº06 de 2012, que trata da

finalidade dos cursos de EPTNM, da formação integral pergunta-se: Como

efetivamos essas propostas na prática? Citar exemplos.

P1-

1- Xxxx

2- Xxx

3- xxxx

P2-

1- Há uma grande diferença sim, parece que primeira via como função da escola

tirar vagabundos da rua e coloca-los para trabalhar. Na criação do IF pode ver

que a visão já é outra, da emancipação do cidadão. Não sei se é tão ruim ter

crianças com diferentes classes porque aí elas reconhecem outras situações

que não só aquela da escola de elite e conhece outras realidades. E acho que

a principal relação aqui não é a formação para o emprego, para empresa,

para a indústria e sim a emancipação do cidadão no desenvolvimento da

região. Não que seja um desenvolvimento industrial ou algo parecido, mas o

desenvolvimento com o conhecimento gerado.

2- Xxxx

3- A mudança da prática também é muito importante há três anos estávamos

reclamando dos alunos usando celular em sala de aula e hoje não incomoda

mais, na verdade até ajuda, às vezes eles fazem a pesquisa durante a aula.

Há uma descrença de que fora das apostilas não funcionam, mas nós

podemos provar que funciona.

P3-

218

1- O primeiro fala da questão dos desvalidos da sorte e aí o atual deixa bem

claro a perspectiva do desenvolvimento socioeconômico local e regional, da

geração do trabalho e renda que não restringe e fala da educação que é para

todos, é aberta para todos. No senário atual no nosso campus se formos

fazer uma análise socioeconômica dos nossos alunos, você vai ver que tem

aquele com necessidade dentro de casa, aqueles que os pais ganham para

sobreviver e aqueles afortunados que mandam na cidade. Ai que eu vejo uma

incoerência, dado ao propósito inicial dos desvalidos da sorte e também

daqueles que vem buscar uma educação de qualidade. No entanto eu vejo

que os pais não estão muito preocupados com a educação de qualidade, mas

sim para deixar de pagar uma escola particular para trocar de carro, para

viajar e outras situações. Muitas vezes, tirando a vaga de um desvalido de

sorte. Eu vejo que a gente tem a lei de cotas que auxilia muito em respeito a

essas questões, senão nós seriamos uma escola pública privada. Eu vejo que

devia analisar e pensar um pouco no que a gente pode fazer, porque muitas

vezes a gente fica com o pé no freio pensando se dentro das questões que a

gente está realizando a gente está procurando o desenvolvimento regional?

Será que muitas dessas ações que a gente quer realizar vem da visão do

aluno de querer mudar. Será que de certa forma a gente não deixa de fazer o

que é previsto na legislação?

2- xxxxx

3- A reitoria não dá liberdade para o campus inovar nos PPCs dos cursos, que

acabam limitando as possibilidades de inovação e criando uma falsa

autonomia. Estudando na especialização da EJA eu li a seguinte frase: Para

você ensinar mandarim para João, primeiro você tem que conhecer João e

também conhecer o mandarim. Então primeiro eu preciso conhecer quem é o

meu aluno, quais são suas necessidades, o que ele precisa, de onde ele vem,

quais são suas perspectivas, estimular ele em relação a busca, para depois

ensinar aquilo que eu sei um pouco. É esse estímulo que faz parte de nós

educadores.

A visão que muitas vezes a gente tinha na questão do integrado, é um filho

que nós trabalhamos e colocamos. Eu vejo que em algumas discussões,

219

alguns têm a visão de formar o aluno para passar nas melhores

universidades, sendo que muitas vezes, a nossa percepção é formar aquele

aluno para superar as dificuldades encontradas lá fora e que leve uma

bagagem profissional. Então agora é que está começando a encaixar, que é

fomento regional. Não é mandar grandes cérebros para a USP, a gente pode

reter esses grandes cérebros aqui na nossa escola. Estamos no segundo ano

do integrado (nosso) e parece que agora é que essa engrenagem começou a

girar e a gente tá num pensamento coletivo. Porque nas perspectivas

anteriores, nas reuniões anteriores a ideia era formar o melhor aluno para ele

ir para fora, isso é errado! Nós não somos instituição privada, não precisamos

vender o nosso produto. O nosso produto a gente tem vender por aqui e

trazer para atender o arranjo local e regional. Eu vejo que o propósito nosso

hoje está encaixando, a gente está formando o aluno para o mundo.

Independente se ele vai querer ir para a instituição A ou B, se ele vai quer

ficar aqui, se ele vai querer entrar no mercado de trabalho, devemos dar

autonomia para que ele possa fazer o que ele desejar. Mas eu vejo que a

gente tem racha, tem visões diferentes, e isso é saudável, agora o que eu

tenho é que respeitar. Como exemplo, se eu não concordo com a visão da

colega, eu devo respeitar.

É um privilégio que nós temos aqui no IF é essa possibilidade de discutir, a

outra é o privilégio de sermos selecionados para participar desses encontros

que nós estamos tendo no grupo focal e trazer para esse ambiente de

discussão que é muito rico não só para o seu trabalho, mas para nós

também. Faz a gente pensar e repensar ver o ponto de cada um, ver o que

nós temos de comum, o que nós temos e incomum e aí é pensar as nossas

práticas.

Nesse momento o professor faz uma indagação sobre a preocupação com a

educação que os alunos recebem antes de ingressar no IF e como

poderíamos ajuda-los. Faz uma crítica sobre o uso de apostilas que

engessam o trabalho docente e critica a política do município que vê nessa

questão das apostilas uma possibilidade de lucro. Além disso, faz a crítica ao

220

não incentivo à qualificação profissional/formação continuada dos professores

na rede municipal.

P4-

1- É evidente a diferença em que em 1909 a formação estava voltada para uma

capacitação mais técnica como uma alternativa a violência e em 2008 a

formação estava mais voltada para a construção de um cidadão como uma

alternativa a atual realidade socioeconômica. Fica evidente atualmente, pelo

menos na documentação, que a instituição tem como objetivo formar

cidadãos. Então é necessário que não haja privilégio, seja de uma formação

de outra. Se a parte técnica precisa ser sólida, ela precisa estar permeada de

uma reflexão humana. Para que e para quem a formação técnica vai ocorrer?

2- Xxx

3- Eu tenho observado, fazendo uma reflexão sobre a minha atuação que eu

tenho tentado fazer exatamente isso, de maneira individual há mais tempo.

Dentro das disciplinas que eu ministrava ou ministro, desenvolver a parte

técnica, a parte cultural, a parte social. Por exemplo: na química trabalhando

modelos atômicos, além de trabalhar o conceito de modelos atômicos, discutir

um pouco a vivência desses cientistas, então fazendo uma abordagem

histórica, relacionando com a nossa realidade. A partir de certo momento eu

percebi que existe a possibilidade de fazer essa discussão holística não só

individual, mas coletiva, aliás, preferencialmente coletiva envolvendo outros

colegas. O resultado é muito melhor porque se outros professores, com

conhecimentos diferentes trabalham em conjunto, vai fortalecer o que eu

tenho feito. Outra importância que eu vejo é que quando dois, três, quatro

professores trabalham em cima de um determinado tema, há uma sinergia, o

resultado é melhor que se os quatro professores estivessem trabalhando

individualmente. Mas confesso que isso é novo, por causa da minha origem,

da minha formação inicial e dos lugares onde eu iniciei minha carreira. Daí

surge a importância da formação continuada, de reflexões como desse grupo,

mesmo que voltado para o meio acadêmico, mas esse espaço possibilita

221

essa reflexão. E aí a gente vai tomando consciência de que trabalhar

coletivamente é melhor e mais gostoso, embora seja desafiador.

Eu penso que nós temos efetivado de forma reflexiva e crítica. É constante

nos debates entre os professores, trocas de ideias e embates de concepções

de escola e eu vejo esses embates, desde que sejam respeitosos, de forma

positiva porque significa que a atuação está sendo refletida.

P5- (ausência justificada)

P6-

1- Eu acho que fala muito para gente o que é o IF aquele documento de

concepções e diretrizes do IF. A gente precisaria lê-lo com bastante cuidado,

a gente leu numa situação da formação continuada e ele é muito interessante.

O IF que tem mais de um século assume essa posição de governo, ele é uma

política de governo. Acho que a própria dificuldade do P3 de pensar ela

também está relacionada com esse momento de crise. Assim que assumi

aqui comecei a entender essa dinâmica transformadora, rica, porque os

nossos alunos de nível médio tem a oportunidade de formação que os alunos

do ensino superior das instituições públicas têm no Brasil. Nós temos uma

carga horária exclusiva, jornada de aulas diminuta; uma possibilidade de fazer

ensino, pesquisa e extensão que impacta diretamente na formação geral

desse aluno. Só que a gente está assombrada com ameaças de mudanças

nessa realidade. Eu acho que nesse final de ano a gente vai ter oportunidade

de perceber se esse projeto vai permanecer ou se ele vai sofrer uma ruptura

profunda porque vou deixar registrado que a instituição precisa ser analisada

dentro do contexto em que há uma situação de impedimento do governo

federal, da presidenta da república, em que assume em presidente interino

que não é simpático a esse projeto. E as medidas que vem sendo tomadas

indicam que a gente terá nivelamento com as políticas anteriores, seja no

formato de maior número de aulas, seja nos cortes. A gente teve essa

semana a notícia do corte nas bolsas de pesquisa do CNPQ para os IFs, e

isso tudo gera impacto na nossa previsão. Como a gente vai atuar? Estamos

222

chegando no momento de fazer um diagnóstico da realidade do município, de

fazer pesquisas na região. Eu queria deixar registrado na pesquisa essa

consciência de que o que está em sala de aula não está desconectado do

mundo, do que acontece no contexto global. E esse documento que a gente

não sabe se vai permanecer como documento norteador das políticas

públicas para os IFs deixa claro que a finalidade dessas instituições é de fato

promover um fomento regional que venha das próprias necessidades locais.

Acho que ele tem um viés da escola como redentora das situações, dos

alunos e a escola sozinha não vai promover redenção nenhuma. Mas acho

que é mais interessante do que a gente ter os modelos como SESI e SENAI.

2- Esse documento tende a se tornar velho dentro do próprio IF tem grupos de

discussão e a gente vê que ele não é um documento muito apreciado por

muita gente que está na parte mais política e administrativa. Ele fala em

promoção de equidade, como é que você consegue equidade? Equidade é

você partir do princípio de que as pessoas têm diferentes posições na

sociedade e cabe ao Estado promover condições de equiparação mínima

para que todos possam concorrer a partir de certo patamar, que é a justiça

social. Isso também já está velho, com corte de bolsas, Assistência Estudantil

teve um corte grande e essa reedição de que a educação é um privilégio. Por

isso que eu gosto desse documento, acho que ele em si traz uma concepção

de princípios para o professor em sala de aula que é muito importante

também. Se a gente pensar que a educação é um privilégio, a gente precisa

olhar para as diferenças econômicas dos nossos alunos como uma dimensão

cognitiva. E a P9 faz muito isso, por estar na extensão, e vê a educação no

sentido profissionalizado, com o seu artesanato, com o seu cuidado, com

aquele aluno que tem uma história de vida de maior carência que entra

porque a concorrência aqui ainda é baixa. Ele entra com uma defasagem

intelectual muito grande que não é necessariamente cognitiva. E a gente tem

uma jornada de trabalho que permite a gente trabalhar o tempo todo no

corredor. Não é só bolsa de assistência estudantil que vai garantir isso, é a

“bolsa” da nossa dedicação, o nosso tempo com o aluno também. E nesse

documento a questão do vestibular não está colocada, o acesso às

223

universidades é uma consequência e eu acho que os nossos alunos terão

condições, até o mais pobrezinho aqui do São João (bairro marginalizado

pela cidade), de entrar em uma boa universidade.

3- Queria lembrar que nós temos a organização didática, e isso faz muita

diferença, a gente tem o tempo para fazer essa pesquisa. Quando eu

trabalhava nas escolas particulares e do estado eu tinha que seguir aquele

caderninho achando que ele era o máximo. A nossa pedagogia hoje é focada

no aluno e não mais no professor.

Sobre a crítica levantada pelo P3 sobre o uso das apostilas, a professora

pontua: eu vejo que com as nossas licenciaturas a gente forma professores

com uma formação mais crítica em que vão reivindicar que os conselhos

municipais da educação sejam de fato conselho, da gestão do FUNDEB.

Pensamos a ciência e arte como uma coisa sem fronteira, a técnica e a ética

como dimensões que não tem fronteira. “Manda quem pode e obedece quem

tem juízo” sim, mas qual é o limite? Essa ideia de compartilhar e de planejar a

gente tem feito aqui, com o pé no chão.

P7- (ausência justificada)

P8-

1- xxxx

2- xxxxx

3- xxxx

P9-

1- xxxx

2- xxxx

3- Essa questão de fomentar a economia local eu acho que é válida a gente

valorizar a cultura local, valorizar o interior, mas também se o aluno quiser ir

para Harvard ou para UNICAMP, ele possa ir. Que eles reconheçam e

tenham orgulho de suas raízes.

224

Acho que passa um pouco pelas reuniões mesmo, seja num grupo como

esse, ou seja, na questão das nossas reuniões de quarta. Porque o mais rico

nessa troca além de trabalhar com projetos em comum, é essa troca de

experiências e vivências que a gente tem tido tempo para discutir. Na maioria

das vezes, com base nessas conversas eu implementado coisas que eu faço

em sala de aula. Tento trazer assuntos que são do interesse dos próprios

alunos, eles me ajudam a pesquisar. Para você despertar o interesse do

aluno você tem que saber o que interessa ao aluno. Que seja o celular como

ferramenta. Eu vejo os nossos alunos muito criativos.

Eu tento sempre fazer um link da teoria com a prática e dos relacionamentos

interpessoais e da postura como futuros profissionais. Trazendo sempre para

a realidade.

P10-

1- Xxx

2- Xxxx

3- Xxxxx

TRANSCRIÇÃO DO 4º ENCONTRO DIA 23/08

Objetivo:

Discutir sobre a formação continuada e sobre a heterogeneidade de

professores que trabalham nos cursos técnicos integrados ao ensino médio

Trazer o que a lei de criação dos IFs determina para atendimento para

contextualizar o início da discussão:

A Lei nº 11.892, 29/12/2008, que cria os Institutos Federais, traz como

atribuição para os IFs a oferta de Educação Profissional Técnica de

Nível Médio, Tecnológica de Nível Superior, Licenciaturas, cursos de

Formação Inicial, Continuada e de cursos para jovens e adultos

(PROEJA) além de poderem também oferecer cursos de bacharelado,

engenharias, e cursos de pós-graduação Lato Sensu e Stricto Sensu.

225

Essa diversidade exige dos professores ter competências para atuar

nas diferentes áreas do conhecimento podendo transitar desde os

cursos de Nível Médio até os cursos de Pós-Graduação, já que não há

separação entre os professores dentro do IF. E segundo Carvalho e

Souza (2014, p. 888) “Esta complexidade na oferta de educação

profissional e tecnológica, abrangendo níveis e modalidades distintos,

não veio acompanhada de políticas de formação docente”.

Questão 1: No primeiro encontro todos concordaram que não tiveram formação

inicial para trabalhar com a educação profissional. Após o ingresso de vocês no IF,

houve cursos/encontros/capacitação no IF de formação continuada? Se houve,

quando e com qual propósito específico foi?

A título de informação para as duas perguntas seguintes:

Segundo a Resolução Nº 6 de 2012 que Define Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação Profissional, no que se refere à formação

docente para atuar nesta modalidade de educação, em seu Art. 40

trata: “A formação inicial para a docência na Educação Profissional

Técnica de Nível Médio realizar-se em cursos de graduação e

programas de licenciatura ou outras formas (...)”. Ainda nesse artigo o

parágrafo 2º, aponta que para aqueles professores não licenciados, “é

assegurado o direito de participar ou ter reconhecido seus saberes

profissionais em processos destinados à formação pedagógica ou à

cerificação da experiência docente”, podendo ser equivalente às

licenciaturas excepcionalmente cursos de pós- graduação lato sensu

que abarque formação pedagógica; excepcionalmente para os

professores que tenham mais de 10 anos de experiência docente como

forma de reconhecimento dos seus saberes; e na obtenção de uma

segunda licenciatura, mesmo que esta não seja a que o professor foi

aprovado em concurso para lecionar.

226

Questão 2: O que vocês pensam a respeito dessa diversidade de cursos que um

mesmo professor deve atender (médio, tecnólogo, licenciatura, cursos de pós-

graduação Lato e Stricto sensu, além dos cursos de Formação Inicial e Continuada e

PROEJA? Como é para vocês transitar por todas essas modalidades?

Questão 3: Tendo em um mesmo curso (como é o caso do integrado) professores

com diferentes formações engenheiros, tecnólogos, licenciados e bacharéis, como

vocês vêm essa mistura de formações?

P1-

1- Agora nesse semestre teremos o início de um curso ofertado pelo IF, o IFSP

para todos que é um curso com 200 horas a distância sobre educação

inclusiva que já estava sendo preparado há algum tempo e só agora

conseguiram colocar em prática.

2- Xxxx

3- Acredito que para os alunos é bastante enriquecedora essa diversidade, de

poder conhecer diversos profissionais. É diferente, mas considero importante,

bastante significativo.

P2-

1- Pra mim foi um pouco confuso, eu tenho a formação acadêmica e tenho a

formação pedagógica. Mas a formação pedagógica ou é muito teórica ou ela

está focada no E.M. A gente tem uma formação que é totalmente abstrata

para o E.M. Quando eu entrei aqui eu tive muita dificuldade no ensino técnico

de identificar o que era importante para o aluno do ensino médio profissional

aprender. Eu fiz a licenciatura, mas não foca no ensino profissional, foca só

no E.M. Depois de muitas conversas a gente acaba chegando a alguns

acordos, por tentativas e erros, mas não fomos orientados sobre como fazer.

São importantes competências além das específicas, de trabalhar em grupo e

outras que você não encontra na teoria.

Aqui nós temos essas discussões, mas eu fico pensando nos outros câmpus

que não têm esses momentos.

227

Uma coisa interessante na reformulação da licenciatura é que foi incluída a

disciplina de educação profissional no curso de todas as licenciaturas do IF.

2- O ensino médio é sempre um desafio diário que a gente aprende muito, dei

aula no PRONATEC e foi muito bom para mim, enquanto outro professor não

se deu bem nesse curso. Mas é sempre um desafio.

3- Com essa diversidade, por mais que tenha diferenças nas ideias, de

ideologias sobre a educação, talvez seja algo que enriquece também.

Diferentes metodologias, flexibilidade, com o plano de ensino construído por

nós, sem ter que trabalhar com as apostilas que tem dado certo.

P3-

1- Existia uma política de capacitação/complementação pedagógica na política

do IF, mas quando eu entrei já não existia mais. Eu e o P7l tivemos que fazer

essa complementação por conta própria. Hoje voltou a oferecer em uma

parceria do IF com outras instituições. O IF cresceu de forma descontrolada,

então a gente precisa de uma boa conversa para ajudar a resolver essa

situação e equalizar o nosso trabalho, não necessariamente de uma

capacitação.

2- É rico e a gente consegue explorar isso aí. Nós aprendemos muito com a

experiência de vida de com os outros. Sobre essa transitação, são

professores muito diferentes em cursos muitos diferentes. É importante a

gente verificar onde o professor melhor se encaixa, acho que deveria ter

professor por curso, separando quem serão os professores do técnico, do

superior, da licenciatura.

P4-

1- Mais recentemente, em alguns encontros realizados pela PRE tem discutido,

o objetivo central não é discutir especificamente a EPT, mas os assuntos

permeiam bastante esse tema. Um exemplo é o CONEPT que é discutido

bastante sobre isso. Nesse sentido, nos preocupa bastante o fato de sermos

surpreendidos hoje pelo cancelamento do CONEPT por falta de verba que é

consequência do ajuste fiscal. Seria a segunda edição e quase não tem esse

tipo de política, e a recente política está deixando de existir. Parece que há

228

uma demanda para essa capacitação na parte inclusiva ou na educação

profissional. No caso do curso a distância do IFSP PARA TODOS o número

de candidato excedeu 3 vezes o número de vagas mostrando uma demanda

reprimida. Considerando que também deve haver uma demanda reprimida na

capacitação para a formação para a educação profissional e tecnológica.

2- A diversidade dos cursos exige a diversidade de diferentes profissionais, eu

sento ao lado de uma pedagoga e educadora física e de um engenheiro,

nessa mesma sala tem um colega formado em linguística, outro da

computação. Essa peculiaridade do IF contribui para a formação de um

professor com características que o IF precisa para atuar nas diferentes

áreas. Um fato que potencializa isso é a situação de que não há uma divisão

institucional da localização de onde o professor vai ficar de acordo com a sua

formação. Diferentemente das universidades que são divididas em

departamentos. Mesmo o departamento de química é subdividido em outras

áreas como o departamento da química inorgânica, orgânica e assim por

diante. Essa diversidade se por um lado possibilita a formação dos

professores de modo que eles sejam melhores professores, por outro lado

apresenta um dificultador porque é preciso estar atendo para as

peculiaridades, para todas as modalidades de cursos. É uma instituição

diferente e quando se coloca tudo isso na balança é positivo porque se o

professor conseguir administrar essas características e conseguir ir

incorporando um pouco do que cada colega tem para oferecer isso vai

contribuir para a formação de profissionais diferenciados.

3- Essa diversidade múltipla exige uma competência para a atuação. Como a

formação e a filosofia de vida é muito diferente no grupo, existe a

necessidade de uma competência para administrar essa diversidade,

administrar e respeitar os posicionamentos dos demais colegas. Essa

característica, além de contribuir para sermos profissionais melhores,

contribui para sermos pessoas melhores. Eu percebo que a gente pode

passar a ser menos preconceituoso. É bom!

P5-

229

1- Percebo que há a ausência da formação e quando ela acontece é de modo

precário. Que acaba fazendo com que o profissional passe por mais tempo

desenvolvendo essas habilidades na prática, no dia a dia. Eu ressalto a

importância da formação continuada para conseguir fazer transposição do

conhecimento científico. Que é o perfil do professor polivalente para funcionar

bem em todas as áreas.

2- Completando o que o p10 falou sobre os editais do IF. O edital de 2014

valorizou a titulação, o de 2015 valorizou mais a experiência profissional. É

interessante definir o perfil e acho quando a gente trabalha com o que

realmente gosta o trabalho fica diferenciado.

3- É interessante e rico esse processo, eu tenho visto que os professores aqui

são muito envolvidos e que aquele que tem mais habilidade de trabalhar com

a prática, trabalha com ela, quem gosta mais da parte teórica vai trabalhar

mais nessa parte. Essa riqueza de possiblidades é interessante, quanto mais

diversidade melhor. Nós saímos de institutos que atuavam de maneiras

isoladas e a nossa prática de sala de aula, muitas vezes é reprodução da

nossa formação engessada. Ter essa liberdade de experimentar essas

maneiras diferentes é às vezes angustiante mesmo. Os alunos precisam de

mais ou menos seis meses para se adaptar a nossa forma diferenciada de

educação.

P6- (ausência justificada)

P7-

1- Como não tem essa política de capacitação, felizmente temos um grupo que

desafio imposto é desfio a ser cumprido, que busca se esforçar e cumprir.

Acho que quando a gente ensina para os alunos até aquilo que eles não

querem ser, acho que estamos fazendo o nosso trabalho.

P8-

1- XXX

230

2- Aqui a gente tem a opção de escolher, de acordo com o nosso perfil, em

qual lugar a gente se encaixa. Como nós temos professores diversos, eles

podem se encaixar onde dão mais certo. Mas é a nossa realidade por

causa da nossa conversa, não sei se isso acontece nos outros campi.

3- Acho que às vezes os alunos não percebem, por imaturidade mesmo e

com o tempo vão assimilando que são professores com formações

diferentes e cada um vai dando uma visão diferente.

P9-

1- Desde que entrei não tive nenhum tipo de curso de capacitação oferecido

pelo IF. Somente aqui no câmpus, nós temos nos organizado para fazer

grupos de discussões.

Em conversas que eu tive com as empresas eu percebi que além da

formação técnica, eles prezam pelo profissional que tem iniciativa,

proatividade.

2- É importante ver onde o professor se encaixa, mas eu já dei aula em

praticamente todos os níveis de curso e eu vejo que são públicos diferentes e

que devemos trabalhar de maneiras diferentes e é um desafio grande, mas é

enriquecedor e prazeroso.

3- Eu vejo que é um ganho para o professor e para os alunos, essa abertura é

uma riqueza que além de diferente é enriquecedora. Na outra universidade

que eu trabalhava, chamavam esses professores de Frankenstein, mas acho

que aqui está mais para super- homem e mulher maravilha. E a formação do

aluno vai ser pluridisciplinar mesmo até contribuindo para sua criticidade, para

sua formação política.

P10-

1- Para mim que venho da indústria e ensino privado, por mais que eu concorde

com esse déficit e doe que IF precisa oferecer mais capacitação para os

professores, gostaria de destacar que no IF em nosso plano de trabalho, há

espaço para nossa auto- capacitação e formação contínua. Foi com grande

satisfação que eu recebi essa notícia de ter essa possibilidade. O IF se

231

preocupa com isso e fornece espaços, dentro da nossa carga horária de

trabalho para isso.

2- Eu vejo inicialmente que é a questão da seleção pelo concurso público, ele

não está preocupado em fazer essa separação entre os professores e não se

preocupa com as questões técnicas ou pedagógicas como melhor formação

em nível de mestrado ou doutorado. Pois no concurso ter ou não esse além

da formação mínima não é um limitador para ingressar ou não no IF é apenas

atribuído pontuação a mais na prova de títulos. O que se preocupa é com a

exigência mínima e o que você tem além é apenas para complementar. Vejo

como positivo ter vários professores diferentes atuando em um mesmo curso,

porque isso oferece aos alunos a oportunidade de ter uma visão de mundo

diferente. Eu chego à conclusão de que professores precisam ser super-

homens e professoras precisam ser mulheres- maravilhas porque nós temos

que ter a formação acadêmica, a complementação e formação pedagógica e

da experiência profissional fora da área acadêmica, na indústria, nas

empresas e nós não conseguimos fazer essa seleção. Esse professor não vai

vir pronto e tem que se oferecer meios para esse profissional se desenvolver.

Eu me arrisco a dizer, se você encontrar um profissional desse com todas

essas competências ele não vai estar disponível. Então a formação

continuada deve existir sempre, porque a teoria sempre muda e ele precisa

estar antenado a isso, sempre haverá práticas e metodologias inovadoras,

principalmente em relação as TICs, e ele precisa estar antenado naquilo que

está acontecendo também fora da academia seja nas indústrias ou nos

comércios.

P11- (primeira participação)

1- Acho que o IF tem uma memória fantástica e uma memória totalmente técnica

e essa memória tem passado com o tempo. E quem já entra nos novos campi

não resgata essa memória. Nós estamos construindo uma memória nova da

nossa escola e vai depender muito do que a gente está fazendo ou vai fazer

para as outras gerações entendenderem que a gente está se aprimorando,

está tentando.

232

2- Eu gosto da ideia. Aqui a gente consegue realocar o professor de acordo com

as modalidades que ele tem um perfil melhor para trabalhar.

3- Xxxx

4.1. Eu gostaria de pensar em outro ponto que é a capacidade de se

comunicar com o aluno, isso me parece muito técnico, falta a parte

humanística que eu acho importantíssima na educação, é o amor a profissão

e aos seres humanos mesmo, o respeito ao outro ser que está ali, naquele

momento tentando aprender, empatia pelo outro. Os professores que eu me

lembro, são mestres que eu tinha muita empatia, seja em qualquer

modalidade de educação.

TRANSCRIÇÃO DO 5º ENCONTRO DIA 30/08

Objetivo:

Discutir e refletir sobre as competências necessárias para o professor da

EPTNM

Apresentar as figuras de Hehem para ser avaliado e discutido pelos professores

disponível em ppt ou http://docplayer.com.br/11654487-Cleunice-rehem-mestre-em-

educacao-assessora-mec-seres.html

Como vocês avaliam as figuras abaixo? Concordam com essas propostas?

Mudariam alguma coisa?

Avaliação 1: Eixos de competências para o professor da EPTNM (pirâmide)

Avaliação 2: As cinco competências que Rehem atribui ao professor da EPTNM e a

interrelação entre elas.

Avaliação 3: Para ser um bom professor da EPTNM é preciso trabalhar/ investir de

forma igualitária na formação inicial e na formação continuada.

P1-

233

1- xxxx

2.- Acho que elas contemplam, mas o que preocupa é que elas estão

fragmentadas. Nos cursos de hoje essas competências estão mais integradas do

que antes.

3- xxxx

P2-

1. Tradicionalmente estão muito separados esses três eixos, pelo menos dentro

da nossa formação. Nós tentamos, na nossa licenciatura fazer essa integração. A

partir do momento que você usa outra figura para fazer a junção desses temas,

diminuiria a impressão de fragmentação entre os eixos.

2. Eu acho que é muito pouco, acho que o professor é formado de forma

globalmente. Acredito que essas entrariam. Se você pegar cada ponto

desses seria um livro, e tem várias teorias sobre cada um deles. São muito mais

do que cinco, e, enumerar e dizer que são apenas as cinco para ser um bom

profissional... se fosse por exemplo uma interpretação de uma lei, ok, mas temos

as nossas características e interpretações. Acho perigoso também alguém utilizar

esse gráfico para falar que precisamos aprender apenas isso para formar o

professor da educação profissional, pegando como cartilha como base para o

professor porque é muito mais amplo.

3- xxxx

P3-

1- xxxx

2. Na questão do integrado isso é mais aflorado, tem todo aquele lado paternal,

maternal, toda ação de medir muito o que e como você vai discutir com os

alunos. É um momento propício para discutir as questões de valor, de ética e de

profissionalismo e o bacana da autora é que ele fez uma ligação entre as

competências que estão totalmente interligadas. Mas eu vejo que vai além. A

234

educação tem que ter como propósito preparar a pessoa para o todo e não

especificamente para o mercado.

Nosso objetivo, no caso da informática é ensinar o aluno a lógica, ensinar a

pensar, ele construir o pensamento e aplicar as técnicas de programação. Não a

aprender uma linguagem de programação, até porque muda muito. Se você

trabalhar a base do conhecimento para programação, ele vai conseguir

desenvolver.

3.- A realidade da maioria dos professores no Brasil, o ganha pão dele é a aula,

então ele vai correr somente atrás de aula porque é o ganha pão da família. O

piso nacional no Brasil é uma vergonha e tendo que correr atrás de mais aula e

mais aula, que dinheiro vai sobrar para ele investir na formação continuada? A

qualificação vai ficando para depois. Isso interfere até no nosso trabalho porque

quando a gente recebe os alunos vindos das outras escolas, há um abismo entre

como o aluno vem e como nós esperamos esse aluno. Então a gente ao invés de

fazer o trabalho proposto, precisa antes retomar e trabalhar os conhecimentos

mínimos que ele já deveriam vir sabendo e nós passamos praticamente o

primeiro bimestre tentando fazer esse nivelamento.

P4-

1- xxxx

2.- Essas afirmações que têm sido feitas eu entendo que estão se encaixando

em uma das cinco competências apresentadas pela autora. De tão amplas,

esses reflexões que estamos fazendo estão se encaixando nessas

competências. O fato das setas interligando me faz pensar na interrelação entre

elas. Entendo que estamos propondo uma nova competência que estaria

relacionada que seria o poder de ter uma visão holística de todas as

competências apresentadas. Mas seria uma sexta competência. São muito

amplas essas competências e toda vez que eu penso tudo está contemplado

dentro delas.

235

3.- Eu compartilho da ideia da autora e faço uma ralação com o IF, eu vejo que o

projeto do IF está alinhado a essa proposta de ter a grande possibilidade de fazer

uma formação continuada, inclusive recebendo. E aliado a isso, existe uma

preocupação que foi relatada na ultima reunião geral em que o Waldo comentou

que já se cogitou em uma reunião da SETEC em Brasília de praticamente

transformar os professores dos IFs em dadores de aulas. E isso implica na

inviabilização da formação continuada que hoje acontece dentro da nossa carga

horária de trabalho.

P5-

1- xxxx

2.- O que devemos levar em consideração é a constituição do sujeito professor,

porque tem toda uma motivação, por que escolheu ser professor, etc. É

importante levar em consideração essa construção e essa atuação em sala vem

muito antes dele ser professor.

3.- O que a gente percebe é que nem sempre tem esse direito de ter a formação

inicial e a continuada, acho que a gente faz parte de um grupo muito pequeno no

universo da educação que tem condição de manter o equilíbrio para poder

buscar a formação continuada e ter espaço para pesquisa. Porque se a gente for

pensar, essa formação continuada dificilmente aparece em outras instituições.

Então eu concordo com essa divisão, mas eu só acho que não é a realidade da

educação brasileira.

P6-

1- xxxx

2. A impressão que eu tenho é que essas competências são muito abstratas, da

maneira como ela está pondo é tecnicista também. Como se a gente tivesse em um

papelzinho que dissesse de forma programada como formar o professor. E nessa

abordagem, eu posso estar sendo injusta por não conhecer a autora, precisaria ler.

A impressão que dá é que a competência é uma coisa que vem de fora e a

subjetividade do professor, mesmo com o último item, é um item mais técnico que

236

não compreende a formação do professor ao longo do processo. A gente nunca

termina de modo individual. A gente vai se constituindo de forma dialética. O papel

social da escola é importante, pois se nós não prestarmos atenção, nós estaremos

formando aqui um exercito industrial de reserva de técnicos cuja função para o

mercado é baratear a mão de obra por meio da concorrência para o emprego. Então

eu acho que a competência da gente é fazer esse debate com a sociedade local e

regional também, não só em sala de aula. Com o projeto de desenvolvimento local e

aí nós enfrentamos dispositivo políticos poderosos, porque talvez o interesse do

mercado seja mesmo de formar uma mão de obra maior e mais barata. É uma

competência que a gente tem que ter inclusive psicológica para lidar com esse

ambiente hostil que é o mercado. Como é que eu formo um aluno dizendo seja o

melhor, ultrapasse os demais? É uma violência para o professor e para o aluno.

Minha impressão é que a autora traz isso de uma forma compartimentalizada, e é

mais complexo do que isso. Se eu entendesse de gráficos, sugeriria outra

representação. Acho muito genérico, precisamos aprender também os contextos dos

alunos. Acho que isso deveria estar explicito na competência dos professores. Acho

que é muito mais complexo do que ser portador de uma competência pedagógica

que se encerra no domínio de uma sequencia didática. Eu posso fazer uma

sequencia didática maravilhosa, mas a realidade é muito mais pulsante. O momento

que você permite que o aluno fale você dirige o debate em sala de aula, o momento

de você estancar uma sangria, são questões pesadas. No livro Pedagogia da

autonomia de Paulo Freire, ele apresenta todas essas dimensões, mas acho que ele

coloca de uma dimensão mais completa. Na sociologia nós falamos que o todo é

diferente da soma das partes. Eu tenho todas essas partes, mas se eu somá-las,

não vai dar o todo, que no dia a dia eu mobilizo essas competências. Nessa

proposta parece que desconsidera o que falava Paulo Freire sobre considerar os

saberes do aluno.

3.- Acho que a formação continuada é inerente ao ofício, todas as profissões do

mundo que se caracterizam pela pesquisa contínua. A questão é que diferentemente

da medicina, a carreira é precária, depende da estrutura da carreira, da

remuneração do professor... e o pior que nessa falta de condição a culpa recai sobre

237

o professor. É importante também que o professor busque a formação continuada e

que tenha liberdade na instituição que trabalha para aplicar os conhecimentos

adquiridos, principalmente inovadores. Pois muitas vezes as instituições não dão

espaço para isso.

P7-

1- xxxx

2- xxxxx

3- xxxxx

P8- (ausência justificada)

P9- (ausência justificada)

P10-

1- xxxx

2.- O que eu vejo na figura é uma tentativa da autora de criar um modelo

conceitual teórico, que não é muito diferente de outras áreas como a

administração e a educação. É um modelo teórico e genérico que vai com

poucos pontos tentar resumir ou abranger uma quantidade grande de fatores. Em

todo modelo não é possível acrescentar tudo aquilo que você precisa abordar,

mas eu acredito que ela comtempla bastante. Eu faria o layout diferente,

colocaria em forma de pentágono e essas setas interligando, acho que ficaria

mais claro.

P11-

1- xxxx

2. É interessante não se preocupar em ensinar apenas o conhecimento técnico

porque isso hoje é tudo muito descartável. O importante é ensinar a pensar a

profissão, o trabalho, as relações. Eu acho que o problema está na figura, talvez um

pentagrama expressasse melhor. Mas contempla bastante.

238

Se fosse em uma escola técnica privada teria que ter a sexta competência que seria

a do professor saber jogar o jogo. Porque se você não se adequa ao jogo você está

fora. Aqui é mais leve.

3- Poucos professores têm oportunidade da formação continuada nas outras

instituições, porque além de não terem incentivos na carga horária, ainda precisam

trabalhar em mais de uma instituição para conseguirem uma remuneração mínima e

aí esse cara não tem nenhuma condição ou tempo para investir na formação

continuada. E pior, ele acaba formando outros cidadãos com pouca base. É a

questão de o país querer enfrentar efetivamente esse problema, por enquanto a

gente vai sobrevivendo.

TRANSCRIÇÃO 6º ENCONTRO 06/09/2016- último

Objetivo:

Analisar nosso currículo e as concepções de educação que estão contidas

nele.

O encontro teve início com uma breve explicação sobre o que é o currículo oficial,

currículo oculto e currículo real.

Após uma breve conversa sobre o que é cada um, foi feita uma reflexão com base

na análise dos currículos dos cursos técnicos integrados ao ensino médio oferecidos

pelo campus.

Observação: O nosso Projeto Pedagógico de Curso, antes de ser aprovado passa

por uma rigorosa avaliação da PRE/DEB e de pareceristas externos antes de ser

encaminhado para o Conselho Superior que aprova ou não os cursos. Com base

nessa informação podemos dizer que o nosso currículo atende a legislação e os

documentos institucionais. Certo? Alguém discorda?

239

Questão 1: O que entendemos por currículo?

Questão 2: Esse currículo contempla suas perspectivas de educação para os

cursos Técnicos Integrados ao Nível Médio?

Questão 3: Se vocês pudessem alterar esse currículo agora, o que vocês

mudariam? (não foi possível trabalhar com esta questão)

P1-

1- Xxxx

2- Desde que começamos a implantação do integrado a gente não tinha

flexibilidade e, portanto que foi mudando e cortando até chegar ao que temos

hoje. Eu concordo que o que temos não é o ideal, mas toda vez que tentamos

algo novo não é aceito pela PRE. É no currículo oculto que a gente consegue

trabalhar de forma mais integrada. Se eu tivesse que entrar em uma sala só

para dar aula eu não entraria.

P2-

1- Nós até tentamos quando estávamos construindo os PPCs dos nossos cursos

propor um currículo diferenciado, mas quando enviamos para a PRE eles

cortaram tudo, então o que nós temos é o feijão com arroz.

2- Eu acho que a nossa estrutura é feijão com arroz, é o que tem pra hoje. É

muito complicado formar o aluno com essa estrutura e esperar além disso

deles. Talvez um projeto por temas, por eixos temáticos, de modo a ele

(aluno) resolver os problemas e a buscar ferramentas. Agora se você colocar

tudo isso aqui para ele (aluno), não é garantia de que ele vai aprender. É uma

estrutura que você coloca que dependendo de como vai ser ensinado, não é

uma estrutura ideal. A partir do aluno que a gente quer formar, quais as

disciplinas ou conteúdos que eu deveria trabalhar para desenvolver o meu

aluno. Geralmente os professores pegam o plano de ensino e trabalha o que

está lá muitas vezes sem saber que aluno se quer formar. Quer dar a

disciplina dele, quer ensinar, mas isso não quer dizer que o aluno aprendeu.

Não é uma estrutura que eu acho ideal, embora eu tenha ajudado a elaborar.

Porque temos a flexibilidade para fazer do nosso jeito, mas quando a gente

240

manda para a PRE eles mandam cortar o que é diferente, uma falsa

flexibilidade.

P3-

1- A reitoria não dá liberdade para o câmpus inovar nos PPCs dos cursos, que

acabam limitando as possibilidades de inovação e criando uma falsa

autonomia. A nossa estrutura já vem engessada e a gente tenta reinventar,

mas se a gente não atender, não é aprovado.

2- Para mim esse currículo não é o que eu gostaria, essa proposta é de um

curso integrado e integral, que não é integral que é extremamente

massacrante, no entanto, atende a legislação. Com isso a gente volta lá no

início da nossa discussão, a gente está formando para o mercado para o

emprego ou para o trabalho? E aí nós chegamos a conclusão que estamos

formando para a vida. A gente vem amadurecendo, vem aprimorando. E

inicialmente, quando eu comecei a carreira eu apenas ensinava, sem

preocupar com o que eu estava trabalhando. Hoje eu mudei muito minha

forma de pensar, de avaliar, de ensinar e hoje eu reavaliei que eu preciso

ajudar o aluno a buscar o conhecimento, a pensar. É o aprender a aprender.

Eu lanço os desafios e vou junto com ele buscar. Acho que essa reflexão

passa por muitos de nós e isso significa que estamos amadurecendo e agindo

diferente.

P4-

1- Xxxx

2- Tenho pensado se o que eu tenho feito em sala de aula é o ideal. Estou

tentando. O nosso currículo é ideal? Eu acredito que não, pois acredito que

nunca vamos chegar ao ideal. E aí eu fico pensando, que tamanho seria

esse currículo para tender esses objetivos de formação? Então eu fico

pensando que por mais que nos esforcemos, nós não vamos conseguir

chegar em um currículo que consiga atender esse objetivo. Por outro lado, é

claro que a gente pode ter um currículo que se aproxime mais da idealidade

241

que esse, e nesse sentido nós temos muito a caminhar. Assim eu estou

reconhecendo as minhas limitações e de todos nós. Um exemplo é a visão de

mundo que a gente tem, a visão de mundo que a gente tem é a de que

conhecimento só é conhecimento se ele for científico. Foi a pouco tempo que

eu entendi que é só um dos óculos que nós temos para enxergar a realidade.

Tem o conhecimento cientifico, o popular, o religioso, o místico... Temos

limitações individuais que vem desde a nossa base de formação e a limitação

de entender a visão que temos da escola, para que serve a escola? A gente

muitas vezes entra na sala sem refletir muito sobre os objetivos das aulas,

para que eu peço para o cara aprender e guardar isso sendo que nem eu

mesmo saberia fazer aquilo se eu não tivesse estudado para a aula

anteriormente.

Embora eu veja que estamos longe do currículo ideal, eu avalio que a gente

está muito além dos currículos de escolas técnicas profissionalizantes que

não são dos IFs isso não só para o que está escrito, mas pela visão de

mundo. E isso está muito relacionado com a oportunidade que a gente tem de

refletir, de debater, de estudar que amadurece o grupo. Quando eu trabalhava

na iniciativa privada, eu ia lá só pra dar aula, não havia reflexão.

Estou começando a pensar que a escola não está com essa bola toda, de

conseguir formar. Estou começando a achar que o negócio é lá fora, é na

sociedade e, por mais que a gente faça a interdisciplinaridade, por mais que a

gente consiga enxergar as coisas que a gente ainda não enxergou a gente

não vai conseguir contribuir muito para a formação, é lá dentro de casa, é na

sociedade e não só dentro da escola, extrapolar os muros.

P5-

1- O currículo é muito complexo, porque é decidido, sabe-se lá por quem, uma

estrutura básica com possibilidades de alguma alteração, mas com uma

estrutura pré-definida e ao executar esse currículo... ainda não sabemos

definir o que é o currículo. Mudou-se o nome de grade curricular para

estrutura curricular, mas a ideia continua a mesma. Às vezes não vemos

quais são as reais necessidades da região para pensar no currículo.

242

2- Talvez esse trabalho de interdisciplinaridade entre várias disciplinas pudesse

melhorar essa integração. Será que a gente está sabendo como fazer?

Estamos tentando fazer, mas às vezes a gente esbarra em problemas

estruturais. A gente ainda esbarra em medos se estamos fazendo certo.

P6-

1- A gente chama a ciência de conhecimento, mas ela é uma das formas das

formas de conhecimento. É uma forma de poder.

2- Eu acho que a escola ainda está trabalhando o aluno do pescoço para cima,

a gente se preocupa com o intelecto, com a questão cognitiva, só que a gente

separa, a gente pensa o indivíduo como psicofísico como entidades

separadas. Quando tem um problema em sala de aula a gente encaminha,

terceiriza para o Sociopedagógico como se a gente não visse o aluno como

um ser integral e muitas vezes não reconhece que quando está transmitindo

uma aula técnica de sociologia, segundo o autor tal que fala do conceito tal,

eu esqueço que eu estou falando para um corpo, que incide sobre o

psicológico do aluno porque você está mexendo com valores muito profundos

do aluno. Então eu acho que a gente não percebe a dimensão integral do

aluno, trabalhando só do pescoço para cima. Isso eu falo das escolas de uma

forma geral. Nós próprios temos uma formação cartesiana, formados para

transmitir para o cérebro do outro, não para o corpo do outro.

Eu acho que a gente não deve pensar em quantas disciplinas seriam

necessárias para dar conta do currículo, porque não é uma questão

quantitativa e sim qualitativa. Acho que a cada semestre, dialogando com os

colegas das outras áreas, me permite dar um salto qualitativo na dimensão do

cognitivo não só como a transmissão de um cérebro para o outro, mas de um

corpo para o outro que faria a gente pensar não só em estratégias

alternativas didáticas, mas nas relações interpessoais mais ricas e

qualitativamente diferentes.

Muitas vezes nós trabalhamos de forma “oculta” com a interdisciplinaridade.

P7- (ausente)

243

P8-

1- Xxxx

2- Quando eu olho o nosso currículo, eu vejo tudo separado, não vejo a

integração do curso. E nisso fica difícil os alunos perceberem a ligação de

uma disciplina com outra. E dá para fazer a associação com qualquer

disciplina, mas da forma como está sendo posta aqui fica difícil.

P9- (ausente)

P10-

1- Xxxx

2- Eu vejo com bons olhos a ideia do Projeto Integrado como componente

curricular, mas no curso de Química aparece apenas no primeiro ano. Acho

que deveria acontecer em todos os anos.

A questão das disciplinas optativas deveriam ser melhor exploradas. Elas

poderiam ser uma tentativa de trabalhar com as demandas, dependendo do

interesse e da necessidade dos alunos. Acho que seria uma forma de quebrar

o gesso da proposta por meio das disciplinas optativas.

P11-

1- xxxxxxx

2- Os alunos do integrado têm muita energia e a gente não dissipa essa energia

e essa energia não dissipada é que leva à evasão, à desmotivação. Acho

que a gente pode ser um norte, mas não tem como sermos ideal porque

somos seres diferentes e em constante mudança. O que precisamos é de

romper com esse sistema.

Quando eu entrei aqui e me chamou muito a atenção porque eu sempre

trabalhei em escolas particulares e me chamou atenção o nível

socioeconômico que era bem diferente do que eu estava acostumado. A

244

gente ouvia fazer que não estava bom, mas eu tive a confirmação quando vim

parar aqui. Quando comecei, a impressão que eu tive é que aqui seria um

lugar de inserção social e nós vamos tentar fazer das tripas coração para

fazer com que alguns aqui consigam uma inserção no mercado de trabalho,

sair da clandestinidade e de melhorar a condição de vida de algumas

pessoas. Ainda não mudou muito, eu acho que a gente está com um grupo

com bastante dificuldade e o público do integrado está dividido em dois

grupos, daqueles de classe média e daqueles que realmente passam

necessidade. Trabalhar com esse pessoal que passa necessidade é

efetivamente gratificante saber que você pode estar de verdade fazendo

diferença na vida deles.