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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS Departamento de Ciências dos Alimentos Bacharelado em Química de Alimentos Disciplina de Seminários Cerveja: Sabor e Aroma Luiza Siede Kuck Pelotas, 2008

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTASDepartamento de Ciências dos AlimentosBacharelado em Química de Alimentos

Disciplina de Seminários

Cerveja: Sabor e Aroma

Luiza Siede Kuck

Pelotas, 2008

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LUIZA SIEDE KUCK

CERVEJA: SABOR E AROMA

Trabalho acadêmico

apresentado ao Curso de

Bacharelado em Química de

Alimentos da Universidade

Federal de Pelotas como

requisito parcial da Disciplina

de Seminários

Orientadora: Drª. Carla Mendonça

Pelotas, 2008

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Dedicatória e Agradecimentos

Dedico este trabalho àquelas pessoas que de uma ou de outra forma

contribuíram com o desenvolvimento deste.

De forma especial ao meu pai, grande cervejeiro, que me incentivou em todos os

momentos.

Agradeço à todos aqueles que estão sempre a minha volta, auxiliando e

incentivando: pai, mãe, meu irmão, ao meu namorado Jardel, que não mede

esforços para me ajudar. Aos amigos, colegas e professores.

Em especial, à professora Msc. Angelita Leitão, pela ajuda prestada durante

todo este período.

As orientadoras Dra. Carla Mendonça e Dra. Josiane Chim.

A WE Consultoria, Assesoria e Representação pelo material enviado para a

pesquisa, e a cervejaria Chopp Ijuhy.

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KUCK, Luiza Siede. Cerveja: sabor e aroma. 2008. 46f. Trabalho acadêmico –

Graduação em Química de Alimentos. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas.

Resumo

Quando o consumidor adquire um alimento qualquer, existem três fatores que

são preponderantes na escolha do produto: a aparência (cor, textura, etc), o sabor e

o aroma. Algumas vezes, dependendo da embalagem do alimento, o consumidor

não pode julgar o sabor e o aroma, mas se a pessoa que comprou o produto não se

agradou do mesmo, dificilmente ela repetirá a compra. Assim, o sabor e o aroma são

qualidades de extrema importância para diversos alimentos, dentre estes, a cerveja.

A cerveja é um alimento consumido em grande escala no Brasil, e o consumo per

capita em 2007 no país, foi de 47,6L/ano por habitante, totalizando um consumo de

10,34 bilhões de litros no ano. No Brasil, a cerveja mais produzida e consumida é a

cerveja do tipo Pilsen, que tem sabor e aroma suaves. Todas as matérias-primas

utilizadas na indústria cervejeira têm influência no flavor da cerveja após o término

do fabrico. No entanto, a matéria-prima que mais vai proporcionar sabor e aroma é o

lúpulo. Durante todas as etapas do processamento, o flavor da cerveja sofre

alterações, no entanto, são três as etapas em que estas alterações são maiores e

mais importantes: fervura do mosto, fermentação e maturação. Assim, para que se

tenha um produto com sabor e aroma agradáveis ao paladar do consumidor, e

necessário empregar matérias-primas de boa qualidade durante a fabricação, e

variar o tipo da matéria-prima conforme a cerveja que se quer produzir. Além disso,

deve-se ter cuidado durante o processamento e envase, e principalmente durante o

armazenamento, onde ainda podem ocorrer reações químicas prejudiciais ao flavor

da cerveja.

Palavras-chave: Cerveja. Sabor e aroma. Lúpulo. Fermentação.

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Lista de figuras

Figura 1. Cevada........................................................................................................13

Figura 2. Malte...........................................................................................................14

Figura 3. Flor do lúpulo..............................................................................................17

Figura 4. Saccharomyces cerevisiae.........................................................................22

Figura 5. Reação da Fermentação alcoólica..............................................................32

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Lista de tabelas

Tabela 1. Composição química do lúpulo..................................................................17

Tabela 2. Composição química do lúpulo quanto a quantidade de resinas

amargas.....................................................................................................................18

Tabela 3. Composição de açúcares do mosto..........................................................25

Tabela 4. Principais ácidos orgânicos formados durante a fermentação..................34

Tabela 5. Alcoóis superiores formados durante a fermentação e suas

concentrações...........................................................................................................35

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Sumário

1 Introdução.................................................................................................................8

2 Histórico..................................................................................................................10

3 Matéria-prima e sua influência no sabor e no aroma da cerveja............................11

3.1 Água.....................................................................................................................11

3.2 Malte....................................................................................................................12

3.2.1 Malteação..........................................................................................................14

3.3 Adjuntos...............................................................................................................15

3.4 Lúpulo..................................................................................................................16

3.5 Levedura..............................................................................................................21

4 Processamento da cerveja e as mudanças sofridas pelo sabor e aroma...............23

4.1 Moagem do malte.................................................................................................23

4.2 Mosturação...........................................................................................................24

4.2.1 Degradação do amido.......................................................................................24

4.2.2 Fosfatases.........................................................................................................26

4.2.3 Degradação das proteínas................................................................................26

4.2.4 Degradação dos glucanos.................................................................................27

4.2.5 Degradação de lipídios......................................................................................28

4.2.6 Decomposição de fenóis e polifenóis................................................................28

4.3 Filtração do mosto................................................................................................28

4.4 Fervura (Cozimento) do mosto.............................................................................29

4.4.1 Principais alterações de sabor e aroma durante a fervura................................30

4.5 Resfriamento do mosto........................................................................................31

4.6 Fermentação........................................................................................................32

4.6.1 Principais compostos de sabor e aroma produzidos durante a

fermentação...............................................................................................................34

4.6.1.1 Ácidos orgânicos............................................................................................34

4.6.1.2 Álcoois alifáticos superiores...........................................................................35

4.6.1.3 Ésteres...........................................................................................................36

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4.6.1.4 Diacetil e 2,3 pentanodiona...........................................................................37

4.6.1.5 Aldeídos........................................................................................................37

4.7 Maturação............................................................................................................38

4.8 Filtração e envase..............................................................................................39

5 Outras alterações no sabor....................................................................................40

6 Bactérias Contaminantes........................................................................................41

7 Conclusão..............................................................................................................43

8 Referências ...........................................................................................................44

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1 Introdução

Quando o consumidor adquire um alimento qualquer, existem três fatores que

são preponderantes na escolha do produto: a aparência (cor, textura, etc), o sabor e

o aroma. Algumas vezes, dependendo da embalagem do alimento, o consumidor

não pode julgar o sabor e o aroma, mas se a pessoa que comprou o produto não se

agradou do mesmo, dificilmente ela repetirá a compra. Dessa forma, nota-se que é

de grande importância na qualidade do alimento o sabor e o aroma. Para um maior

entendimento do assunto, é necessário conhecermos alguns conceitos:

Aroma: conjunto de sensações olfativas determinadas pelos

compostos voláteis dos alimentos, na boca, e percebidos pelo nariz,

por via retronasal. É uma espécie de mistura das sensações gustativas

e olfativas associadas ao consumo do alimento.

Sabor: sensações mais complexas, que associam a estimulação

dos gomos gustativos e células receptoras olfativas, e dos elementos

táteis e térmicos da língua e da cavidade oral. As substâncias que

conferem sabor a um alimento são em geral polares, solúveis em água

e não voláteis.

Assim, o sabor e o aroma são qualidades de extrema importância para diversos

alimentos, dentre estes, a cerveja. A cerveja é um alimento consumido em grande

escala no Brasil, sendo a bebida preferida de milhares de brasileiros. Segundo o

Sindicerv, Sindicato Nacional da Indústria Cervejeira (2008), o consumo “per capita”

no Brasil em 2007 foi de 47,6L/ano por habitante, totalizando um consumo de 10,34

bilhões de litros no ano.

É importante salientar, que quando se fala em características e processamento

da cerveja, devemos incluir o chope, isto porque, conforme o Decreto nº 2.314, de

04 de setembro de 1997, “Cerveja é a bebida obtida pela fermentação alcoólica do

mosto cervejeiro oriundo do malte de cevada e água potável, por ação da levedura

com adição de lúpulo”, e chope é denominada a cerveja que não sofreu o processo

de pasteurização no seu envase. Assim, o procedimento para fabricação de ambos

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é idêntico, sendo que a fabricação do chope tem fim antes do que a da cerveja

(BRASIL, 1997).

A cerveja predominante no mercado brasileiro, e conseqüentemente a mais

consumida, é a Pilsen, que é produzida em larga escala em indústrias de grande

porte. Entretanto, uma nova tendência vem se mostrando cada vez mais forte no

mercado brasileiro: as microcervejarias. As cervejas produzidas em microcervejarias

são produtos mais encorpados, de sabor e aroma mais pronunciados, e são a

preferência de consumidores mais exigentes em termos de qualidade sensorial

(ARAUJO, SILVA e MINIM, 2003).

A partir então, do aumento da implantação de microcervejarias no Brasil, ficou

mais fácil o acesso a cervejas diferentes da do tipo Pilsen. Cervejas conhecidas no

mundo inteiro como as “light”, “Export” ou “Dortmunder”, “München”, “Bock”,

“Malzbier”, “Weissbier”, “Ice”, “Viena”, “Weizen”, “Draft”, “Pale Ale”, “Brown Ale”,

“Mild”, “Bitter”, “Stout”, “Porter” dentre outras já estão sendo produzidas no país em

pequena escala (REINOLD, 1997).

Outros tipos de cervejas, que são conhecidas em alguns países como

cervejas festivas ou de festividades, também estão sendo elaboradas aqui. São

cervejas ou chopes com adição de espumante, erva-mate, chocolate, mel, frutas,

flores, plantas aromáticas, etc (WE CONSULTORIA, ACESSORIA e

REPRESENTAÇÃO 200?).

Assim, o sabor e o aroma, juntamente com outros fatores sensoriais, estão

tornando-se cada vez mais importantes e decisivos na escolha do consumidor.

Portanto, o objetivo deste trabalho foi estudar as mudanças que sofrem o sabor e o

aroma da cerveja durante o processamento, bem como a influência que cada um

dos ingredientes tem sobre os mesmos.

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2 Histórico

A palavra beer, que significa cerveja, é proveniente do latim e significa beber. A

cerveja já era conhecida por várias civilizações antigas e era muito popular em

regiões onde o clima não era propício ao cultivo de uvas. Muitos tipos de bebidas

foram elaboradas com cereais nos últimos 8000 anos, e hoje todas são

consideradas cerveja (REINOLD, 1997).

Não se conhece as matérias primas que eram utilizadas nas primeiras cervejas,

mas provavelmente tenham sido feitas de cevada, tâmaras, uvas ou mel, sendo a

cerveja uma das bebidas alcoólicas mais antigas do mundo. Mas, foram os gauleses

os primeiros a fabricá-la com malte, isto é, cevada germinada (VENTURINI, 2005).

Há evidências de que a prática da cervejaria originou-se na região da

Mesopotâmia onde, como no Egito, a cevada cresce em estado selvagem. No Egito,

a cerveja ganhou status de bebida nacional, o que ocasionou grande consumo e

geração de muitas crenças a seu respeito (VENTURINI, 2005).

Tem-se que a cerveja feita de cevada maltada já era fabricada na Mesopotâmia

em 6000 a.C. e que, há 4000 anos a.C. os babilônios já produziam dezesseis tipos

diferentes de cerveja, que eram feitas de cevada, trigo e mel (REINOLD, 1997).

O mais antigo código referente a produção de alimentos, é a Lei da Pureza

(“Reinheitsgebot”), que institui que a cerveja deve ser produzida somente com água,

malte, lúpulo e levedura. Esta lei foi instituída pelo Duque Guilherme IV da Baviera,

no ano de 1516. Atualmente já são permitidos o uso de outros ingredientes e

também alguns aditivos alimentares.

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3 Matérias-primas e sua influência no sabor e no aroma da cerveja

Os quatro ingredientes básicos na produção de cerveja são a água, o malte, o

lúpulo e a levedura, que possuem características que podem proporcionar sabor e

aroma ou então, interferir na formação de compostos de sabor e aroma durante o

fabrico. Neste capítulo estão destacadas as características peculiares de cada um

dos ingredientes.

3.1 Água

Mais de 90% da cerveja pronta é constituída de água, cuja qualidade e

características são de significado decisivo para a qualidade final da cerveja

(BRODERICK et al., 1977).

A água possui diversos tipos de sais dissolvidos e também matéria orgânica, no

entanto, a quantidade e a variedade destes elementos variam conforme o local de

onde a água é proveniente e a região onde a cervejaria se encontra. A quantidade e

qualidade destes sais dissolvidos e dos compostos orgânicos que estão contidos na

água influenciam os processos químicos e enzimáticos que ocorrem durante a

fermentação, o que altera a qualidade do produto final (BRODERICK et al., 1977;

REINOLD, 1997).

A água cervejeira não deve satisfazer somente os requisitos gerais de água

potável, mas deve ter também os requisitos básicos para assegurar o devido pH da

massa, a devida extração do lúpulo, uma boa coagulação na cocção e na

fermentação e também, o devido desenvolvimento da cor, do aroma e do sabor

(BRODERICK et al., 1977).

O cálcio é um dos componentes presentes na água mais importante na indústria

cervejeira, pois este protege a α-amilase da destruição térmica, ajuda a controlar o

pH, melhora o rendimento e a floculação da levedura, a eliminação de oxalato e a

reduzir a cor do mosto (BRODERICK et al., 1977).

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O magnésio que também está presente na água serve como uma coenzima

importante no processo de fermentação. O malte possui quantidades suficientes de

magnésio, no entanto, se forem utilizados adjuntos é necessário a adição de

pequenas quantidades de magnésio, o que pode ser feito através da água

(BRODERICK et al., 1977).

O excesso de alcalinidade da água contraria os efeitos benéficos do cálcio (Ca)

e do Magnésio (Mg). Deve-se evitar a utilização de água alcalina para lavar o

bagaço, pois além de prejudicar os benefícios que o Ca e o Mg trazem, há perigo de

extrair do grão polifenóis indesejáveis ao produto. Dessa forma, é importante que a

água seja um pouco ácida, pois a reação ácida é necessária para obter uma elevada

atividade das enzimas amilolíticas e proteolíticas. Se houver elevação de pH, a

atividade enzimática irá reduzir, o que aumenta a extração de cor e substâncias

amargas (BRODERICK et al., 1977).

Quanto a sulfatos, acredita-se que quando estes estão presentes na água,

obtêm-se uma cerveja de sabor mais “seco” ou mais amargo (BRODERICK et al.,

1977).

A matéria orgânica dissolvida pode causar sabores desagradáveis, tais como

sabores a pescado e a mofo. Quando cloro (Cl) combina-se com a matéria orgânica

também ocorrem mudanças indesejáveis no sabor da cerveja (BRODERICK et al.,

1977; REINOLD, 1999).

3.2 Malte

O malte consiste na germinação e posterior dessecação, principalmente, do grão

da cevada (Hordeum sativum) ou de qualquer outro cereal, como milho, trigo ou

aveia. Quando o malte não for obtido da cevada, ele deve levar o cereal de que

provém no seu nome, por exemplo, malte de trigo, quando for feito do grão do trigo

(BRASIL, 1978).

Na indústria cervejeira utiliza-se, principalmente, o malte obtido da cevada (fig.

1). A cevada é uma gramínea do gênero Hordeum, que se parece com o trigo, e

seus grãos na espiga podem ser alinhados em duas ou seis fileiras, sendo

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mais utilizada a cevada de duas fileiras, por ter grãos mais desenvolvidos e densos,

proporcionando assim um rendimento maior. A cevada é utilizada por ter um alto

teor de amido e um teor moderado de proteínas, por conter uma casca que serve de

meio filtrante, e importantes enzimas, que podem estar presentes no grão, ou se

formar durante o processo de malteação. O tipo de cevada ideal para maltear é

aquela que possui um alto poder germinativo e um baixo teor de proteínas, pois

quanto menor a quantidade de proteínas mais solúvel será o malte (BRODERICK et

al., 1977).

Figura 1. Cevada

Fonte: Portal São Francisco, 2008.

O grão da cevada é constituído de três partes principais:

Endosperma, que é constituído basicamente de amido de reserva,

além de outros carboidratos, como a sacarose;

Casca, que protege o grão contra influências atmosféricas danosas e

possibilita a formação de uma camada filtrante durante a clarificação

do mosto;

Embrião, que sob condições adequadas germina e forma folículo e raiz,

iniciando o processo de transformação no endosperma e ativando

enzimas, que são de grande importância na elaboração do mosto

(BRODERICK et al., 1977; REINOLD, 1997; VENTURINI, 2005).

Além disso, é interessante saber que as principais proteínas da cevada, que

posteriormente estarão presentes no malte são a albumina, a globulina, a prolamina

e a glutelina (REINOLD, 1997).

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3.2.1 Malteação

A malteação é divida em três partes: maceração, germinação e secagem. A

maceração consiste na imersão do grão de cevada em água, criando assim

condições para que o grão germine. O grão que possui 12% de umidade passará a

ter aproximadamente 42% de umidade. Esta etapa dura de 3 a 5 dias. A germinação

ocorre após a absorção da água, onde o grão irá germinar ocorrendo então a

formação de enzimas dentro do grão e a desagregação do mesmo. Esta etapa pode

durar até 8 dias. Depois de atingida a modificação fisiológica do grão, é bloqueada a

germinação através da secagem. Este processo consiste em aquecer o malte (Fig.

2) a aproximadamente 70°C por alguns minutos, reduzindo a umidade do grão para

2 a 5% (LIMA, AQUARONE e BORZANI, 1983; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e

SPOTO, 2006; VENTURINI, 2005).

Figura 2. Malte.

Fonte: Cervezaregia, 2008.

Durante a malteação, ocorre a formação de S-metil metionina (SMM), que é um

importante composto do aroma em cervejas do tipo lager. Este é o principal

precursor do dimetilsulfuro (DMS), que confere à cerveja aroma à verduras (WE

CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Assim, malteação da cevada tem como objetivo principal a obtenção de

enzimas, que provocarão as modificações necessárias nas substâncias

armazenadas no grão, de maneira que possam ser hidrolisadas durante a

maceração. Outra mudança que ocorre no grão é a redução das cadeias de amido,

o que torna o grão menos duro e mais solúvel. Vale ressaltar que a qualidade do

malte é de extrema importância para a qualidade final da cerveja,

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já que este contribui com as características físico-químicas e organolépticas da

mesma (REINOLD, 2008).

No grão da cevada, o amido é constituído, em média, de 24% de amilose e 76%

de amilopectina (REINOLD, 1997).

O malte é rico em hidratos de carbono (amido), proteínas, vitaminas do

complexo B e enzimas. As enzimas do malte são a α-amilase, a β-amilase, a

maltase a protease. Estas irão agir sobre o amido, convertendo-o em açúcares

fermentáveis durante a mosturação. Estes açúcares servirão de base para a

produção de etanol e gás carbônico pelas leveduras durante a fermentação (LIMA,

AQUARONE e BORZANI, 1983).

Os maltes podem ser classificados em duas classes: os maltes de base e os

maltes especiais. Os maltes de base constituem a grande percentagem de cereal

utilizado na produção da cerveja, sendo que os maltes especiais nunca representam

mais do que 10 a 25% do total. Os maltes de base providenciam quase toda a

capacidade enzimática necessária para converter os amidos em açúcares, sendo

que os maltes de especialidade, têm como principal função dar cor, contribuir com a

estabilidade da cerveja e, se possível, enriquecer o sabor. Dependendo do estilo de

cerveja que se queira produzir, pode-se apenas utilizar um ou dois tipos de malte de

cevada, havendo, no entanto, casos em que se chegam a utilizar seis a sete

variedades (WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Alguns exemplos de maltes especiais, que podem ser empregados na

elaboração de cervejas são: malte defumado, malte acidificado, malte melanoidina,

malte orgânico, malte torrado, malte caramelo, malte de chocolate, dentre outros

(MALTE WEYERMANN, 2008).

O malte pode ser substituído ou complementado com extrato de malte na

fabricação da cerveja, no entanto, esta prática não é muito comum.

3.3 Adjuntos

Em 1516, Guilherme IV, Duque da Baviera, instituiu como únicos ingredientes

da cerveja água, malte, lúpulo e levedura. Esta foi denominada a Lei da Pureza.

Sabemos que hoje é autorizada a adição de outros componentes diferentes desses,

como cereais não maltados e conservantes. Entretanto, muitas cervejarias seguem

esta lei até hoje, valorizando assim o seu produto.

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Os adjuntos são produtos que contém carboidratos, não são malteados e são

utilizados com intenção de diminuir o custo de produção, e em algumas vezes,

proporcionar uma característica peculiar ao produto final. Os principais adjuntos

utilizados são os açúcares, xaropes e cereais não maltados (REINOLD, 1997).

Os xaropes e açúcares têm a finalidade de atenuarem características específicas

da cerveja. Dentre adjuntos desta classificação, o mais utilizado é o açúcar

caramelizado, ou caramelo, que é empregado na fabricação de cervejas escuras, e

proporciona cor, sabor e aroma característicos a estas cervejas (VARNAM e

SUTHERLAND, 1997).

Os cereais não maltados mais utilizados como adjuntos são a própria cevada, o

trigo, o arroz, a aveia e o milho. O uso de adjuntos não deve exceder 20% do peso

total da matéria-prima (WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO,

200?).

O trigo não malteado pode ser empregado no fabrico de cervejas do tipo

Weizenbier e Berliner Weisse. O milho é utilizado sob a forma de gritz e se mal

estocado este pode tornar-se rançoso, prejudicando a estabilidade da espuma e o

sabor da cerveja (WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Segundo Reinold (1997), pesquisas indicam que o uso excessivo de adjuntos na

fabricação da cerveja aumenta os níveis de diacetil no produto final. O diacetil é uma

substância que causa sabor e aroma desagradável de manteiga na cerveja, e será

abordado com mais ênfase posteriormente.

3.4 Lúpulo

A Humulus lupulus é uma planta trepadeira pertencente à família da moráceas e

originária de zonas temperadas, sendo de difícil cultivo. É uma planta dióica, ou seja,

produz flores femininas e masculinas em plantas diferentes. As flores femininas são

agrupadas em cachos ou umbelas, que possuem uma vértebra que apresenta várias

dobras, sobre as quais se fixam pares de brácteas e bractéolas. As brácteas e as

bractéolas formam uma bolsa onde são armazenados grânulos de lupulina. Estes

grânulos são formados das substâncias de interesse na indústria cervejeira,

responsáveis principalmente pelo amargor característico da cerveja, como os

compostos amargos e os óleos essenciais do lúpulo. Portanto, somente as flores

femininas (Fig. 3) são utilizadas na indústria cervejeira (VENTURINI, 2005;

OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006).

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Figura 3. Flor do lúpulo.

Fonte: Cervejas do mundo, 2008.

A tabela 1 indica a composição química do lúpulo, numa relação entre seus

principais componentes e as respectivas quantidades.

Tabela 1. Composição química do lúpulo

Fonte: REINOLD, 1997.

Dentre todos estes componentes, os de maior importância na fabricação da

cerveja são os compostos amargos (resinas), os óleos essenciais, os minerais e os

taninos (REINOLD, 1997).

Componente Quantidade

Água 8-14%

Proteínas 12-24%

Resinas totais 12-21%

Ácidos-alfa 4-10%

Ácidos-beta 3-6%

Taninos 2-6%

Celulose 10-17%

Cinzas 7-10%

Óleos essenciais 0,5-2,0%

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Os compostos amargos do lúpulo são chamados de resinas do lúpulo,

encontram-se na lupulina e são os α-ácidos e os β-ácidos. Os α-ácidos são a

humulona, a cohumulona, a adhumulona, a prehumulona e a posthumulona. Os β-

ácidos são a lupulona, a colupulona, a adlupulona, a prelupulona e a postlupulona. A

tabela abaixo, expressa a porcentagem de cada um dos compostos amargos no

lúpulo.

Tabela 2. Composição química do lúpulo quanto a quantidade de resinas amargas.

Fonte: VARNAN e SUTHERLAND, 1997.

As resinas do lúpulo são dividas em resinas moles ou brandas e resinas duras.

As resinas moles representam aproximadamente 16% do peso do lúpulo, e são a

fração total de resinas que são solúveis em hexano. Incluem os ácidos alfa e beta e

as resinas moles não caracterizadas. Já as resinas duras, representam apenas 1%

do peso do lúpulo, e são a fração de resinas insolúveis em hexano. Esta fração

aumenta a medida que o lúpulo envelhece ou deteriora, servindo então, como um

índice de deterioração do lúpulo (BRODERICK et al., 1977).

Os α-ácidos são os compostos mais importantes para o amargor da cerveja, no

entanto a cohumulona produz efeitos negativos no amargor do produto final. Por

este motivo, muitas trabalhos de pesquisa estão sendo feitos, com intuito de

aumentar a quantidade de α-ácidos e diminuir a quantidade de cohumulona

(VARNAN e SUTHERLAND, 1997; WE CONSULTORIA, ACESSORIA e

REPRESENTAÇÃO, 200?).

Os α-ácidos possuem 100% de amargor, no entanto, estes são insolúveis.

Durante a cocção do mosto, estes são isomerizados e convertidos em iso α- ácidos,

tornando-se assim solúveis. Estes compostos formados, vão sofrer pequenas

α-ácidos Quantidade β-ácidos Quantidade

humulona 35-70% lupulona 30-55%

cohumulona 20-55% colupulona 20-55%

adhumulona 10-15% adlupulona 5-10%

prehumulona 1-10% prelupulona 1-3%

posthumulona 1-5% postlupulona valor não identificado

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precipitações durante o resfriamento e a fermentação, mas, mesmo assim, quase a

sua totalidade vai estar presente no produto acabado provocando o amargor da

cerveja (REINOLD, 1997; WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO,

200?).

Os compostos amargos podem ser degradados com a influência do oxigênio,

temperaturas altas e umidade do ar. Por isso, o lúpulo deve ser armazenado em

lugar frio, seco e sem a presença do oxigênio, até ser utilizado na fabricação da

cerveja (WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Na presença do oxigênio, os ácidos-α e os ácidos-β são oxidados para suas

respectivas resinas moles, que possuem de 36% e 29% de amargor,

respectivamente. Se estas continuarem em presença do O2 elas poderão oxidar-se

até resinas duras, que possuem menor valor amargo (cerca de 12%) e causam uma

influência negativa na qualidade do amargor. Assim, as resinas duras possuem

pouco valor para a elaboração da cerveja. Quando as resinas duras são formadas,

um processo paralelo ocorre. As cadeias laterais do ácido valérico, que é produzido

no mosto, se dissociam, formando um odor “caseoso” a lúpulo velho (REINOLD,

1997, WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Portanto, os compostos amargos são as substâncias mais valiosas do lúpulo,

pois proporcionam o sabor amargo da cerveja. Além disso, elas beneficiam a

estabilidade da espuma e aumentam a estabilidade biológica da cerveja, pois evitam

o desenvolvimento de alguns microrganismos por meio de suas propriedades anti-

sépticas (WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Depois dos compostos amargos, as substâncias de maior importância contidas

no lúpulo são os óleos essenciais. O óleo de lúpulo, ou azeite de lúpulo, ainda vem

sendo estudado. Pesquisas indicam que o óleo de lúpulo é constituído de mais de

200 compostos diferentes, quase todos voláteis. Estes compostos contribuem

positivamente no aroma da cerveja. Eles podem ser identificados somente através

de métodos espectofotométricos (REINOLD, 1997; WE CONSULTORIA,

ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

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20

A composição do óleo de lúpulo é específica para cada uma das variedades da

planta. Deste modo, a escolha do lúpulo a ser utilizado na produção da cerveja deve

ser de acordo com o sabor e o aroma desejado (WE CONSULTORIA, ACESSORIA

e REPRESENTAÇÃO, 200?).

O mirceno, o humuleno, o cariofileno e o farneseno são os quatro componentes

principais dos óleos essenciais, sendo que os mesmos constituem cerca de 60-80%

do óleo essencial da maioria das variedades. Esses compostos são todos

hidrocarbonetos altamente voláteis, e durante a fervura do mosto, a maior parte, (96-

98) é evaporado, contribuindo, portanto, pouco para o sabor e aroma de lúpulo na

cerveja (REINOLD, 1997; WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO,

200?).

O mirceno produz na cerveja uma determinada acidez no aroma do lúpulo,

proporcionando a cerveja um sabor áspero e desagradável se presente em

quantidades excessivas. Os sesquiterpenos, os cariofilenos, os farnesenos e os

humulenos e seus respectivos epóxidos, proporcionam sabores mais agradáveis à

cerveja. O humelonol II, os diepóxidos de humuleno, os monoepóxidos de humuleno

e de α-terpienol, são os compostos que conferem sabor e aroma a ervas e

especiarias a cerveja. Os alcoóis terpenos linalol, geraniol e citronelol, são os

responsáveis pelo aroma cítrico e floral que a cerveja pode apresentar. Alguns

compostos que fazem parte do óleo do lúpulo, podem conferir à cerveja sabor a

pomelo (VARNAM e SUTHERLAND, 1997; WE CONSULTORIA, ACESSORIA e

REPRESENTAÇÃO, 200?).

Acredita-se que alguns produtos da oxidação desses compostos, tais como as

epoxidos humulenos, são contribuidores positivos para o sabor da cerveja e,

portanto, um envelhecimento suficiente das variedades aromáticas de lúpulo é

necessário para permitir a formação desses produtos. Essa oxidação dos compostos

do óleo do lúpulo pode continuar durante a cocção do mosto (WE CONSULTORIA,

ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Assim, a maturação do lúpulo é acompanhada por um aumento nos níveis de

epóxidos de humuleno. O epóxido de humuleno II serve como precursor de

humulenol II, de humuladienona e humulol, que vão se acumular em menor

quantidade que os outros isômeros dos epóxidos de humuleno. Dessa forma, ocorre

também a formação dos epóxidos de outros compostos, presentes no óleo de lúpulo

(VARNAM e SUTHERLAND, 1997).

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O lúpulo pode ser adquirido na forma natural, em pellet ou extrato, e eles são

divididos em duas categorias: lúpulos aromáticos e lúpulos amargor. Os lúpulos

aromáticos são caracterizados por terem teores ácidos alfa baixos, níveis mais altos

de ácidos beta e um perfil de óleo associado a bom aroma. Esses lúpulos

geralmente são usados como lúpulos de acabamento ou condicionadores e são

adicionados ao mosto normalmente nos minutos finais da fervura. Dois exemplos de

lúpulos aromáticos muito utilizados são o “Hallertau” e o “Tettnang”. Lúpulos

amargos possuem um nível bem mais elevado de ácidos alfa do que de ácidos beta.

Esses geralmente são utilizados no processo de fervura para extração do amargor.

Um exemplo é o tipo “Nugget”. Existem algumas variedades que são consideradas

“duais” como, por exemplo, o “Northern Brewer”, “Cluster” entre outras (WE

CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

3.5 Levedura

Conforme Venturini (2005), “As características de sabor e aroma de qualquer

cerveja estão determinadas, de forma preponderante, pelo tipo de levedura

utilizada.”. O principal produto da fermentação das leveduras é o álcool e o CO2, no

entanto, inúmeros compostos são produzidos em menor proporção, e estes, são de

grande importância no sabor da cerveja. A cepa da levedura, a temperatura e o pH

da fermentação, o tipo e a proporção do adjunto (quando utilizado), e até mesmo o

modelo do fermentador e a concentração do mosto são fatores que influenciam o

sabor da cerveja na etapa de fermentação.

As leveduras assim como os bolores, são fungos, no entanto, estas se

apresentam sob a forma unicelular, desta forma, conseguem se reproduzir mais

rapidamente que os bolores. São facilmente diferenciadas das bactérias em virtude

de suas dimensões maiores e de suas propriedades morfológicas (CARVALHO,

BENTO e SILVA, 2006).

As leveduras mais utilizadas na indústria cervejeira são as do gênero

Saccharomyces. A S.cerevisiae (Fig. 4), é a mais utilizada na produção de cervejas

de fermentação alta, por ser uma levedura de alta atividade fermentativa. Já a

S.uvarum é mais utilizada na fabricação de cervejas de fermentação baixa, pois são

capazes de flocular ao final da fermentação, se depositando no fundo do tanque

(REINOLD, 1997; VENTURINI, 2005).

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Figura 4. Saccharomyces cerevisiae.

Fonte: Chateauneuf, 2008.

Para uma levedura ser considerada adequada à fermentação de cerveja, são

considerados o potencial de produção de etanol e dióxido de carbono, estes, são

diretamente relacionados com a capacidade de flocular da levedura e também o

sabor. Outros dois importantes fatores são a resistência ao etanol, que deve ser

grande, e a resistência a toxinas que podem ser liberadas por algumas cepas de

Saccharomyces (VARNAN e SUTHERLAND, 1997).

A Saccharomyces é capaz de fermentar um grande número de açúcares

diferentes, tais como sacarose, glicose, frutose, galactose, manose, maltose e

maltotriose (VARNAN e SUTHERLAND, 1997).

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4 Processamento da cerveja e as mudanças sofridas pelo sabor e aroma

Durante todas as etapas do processamento para obtenção de cerveja, ocorrem

fenômenos de maior ou menor importância, mas que vão acabar influenciando nas

características sensoriais da mesma. Assim, neste capítulo cada uma das etapas

será abordada brevemente, dando enfoque às mudanças que ocorrem no sabor e no

aroma.

4.1 Moagem do malte

A moagem consiste em moer o malte em moinhos de rolos em número de dois,

quatro ou seis. A moagem pode ser a seco ou então a úmida (OETTERER,

REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006; VENTURINI, 2005).

A moagem do malte tem os seguintes objetivos:

Rompimento da casca do malte no sentido longitudinal, expondo desta

forma o endosperma, porção interna do grão;

Desintegração total do endosperma, promovendo uma melhor atuação

enzimática sobre os componentes insolúveis do malte;

Produção mínima de farinha com granulometria muito fina, evitando a

formação de substâncias que produzam uma quantidade excessiva de

pasta dentro da solução (REINOLD, 1997).

As cascas do malte rompidas constituirão o elemento filtrante do mosto no

processo que será realizado posteriormente. Assim, é importante que a moagem

não seja muito severa, para que não se tenha um malte muito fino, já que isto irá

reduzir a velocidade da filtragem. Entretanto, é importante que a moagem não seja

muito grosseira, para que a hidrólise do amido realmente seja facilitada através do

aumento da superfície de contato do substrato amiláceo (OETTERER, REGITANO-

D’ARCE e SPOTO, 2006; REINOLD, 1997).

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4.2 Mosturação

Na mosturação ocorre a mistura do malte moído com água em temperaturas

controladas (em torno de 65°C), e de seu complemento se necessário, em tinas de

mosturação, a fim de solubilizar as substâncias do malte diretamente solúveis em

água, e proporcionar temperaturas ótimas para a ação das enzimas do malte. Este

procedimento tem como objetivo, promover a gomificação e posterior hidrólise do

amido a açúcares. O pH e a temperatura interagem para controlar a degradação do

amido e das proteínas. O produto final da mosturação é denominado mosto (LIMA,

AQUARONE e BORZANI, 1983; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006;

REINOLD, 1997; VENTURINI, 2005).

O mosto deve ser uma solução completa e equilibrada de carboidratos

fermentáveis, aminoácidos e minerais, que serve como fonte de nutrientes para as

leveduras durante a produção de etanol, e como fonte de precursores do sabor e

aroma (VARNAN e SUTHERLAND, 1997).

Para que se obtenha um mosto com todas as substâncias essenciais de forma

equilibrada, é fundamental que as reações bioquímicas necessárias ocorram de

maneira correta. Estas reações ocorrem através da ação das enzimas. Os três

grupos de enzimas que agem durante a mosturação são: amilases, fosfatases e

proteases (BRODERICK et al., 1977).

4.2.1 Degradação do amido

A degradação do amido é a reação bioquímica de maior importância durante a

mosturação (LIMA, AQUARONE e BORZANI, 1983).

O amido do malte é constituído de amilose e amilopectina. A amilose, é a parte

insolúvel do amido, é constituída de moléculas de glicose em forma de longas

cadeias espiraladas não ramificadas, e ligadas entre si por ligações alfa 1-4. A

amilopectina é o amido solúvel, e também é composta por moléculas de glicose, no

entanto, além de ligações alfa 1-4 possui ligações alfa 1-6. Estas ligações alfa 1-6,

causam ramificações nas cadeias de glicose, o que ocorre aproximadamente a cada

15 moléculas, e não podem ser degradadas (REINOLD, 1997).

Para a produção de cerveja, é necessária a degradação deste amido em

açúcares, para que as leveduras possam produzir etanol. As responsáveis por esta

degradação são as enzimas alfa-amilase e beta-amilase. Estas enzimas são

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inativadas à temperaturas de 80°C para a alfa-amilase e de 70°C para a beta-

amilase (REINOLD, 1997).

Quando o malte é misturado a água quente, as ligações de hidrogênio mais

fracas entre a amilose e a amilopectina são rompidas e os grânulos de amido

começam a intumescer, formando soluções viscosas. Este fenômeno é donominado

gelatinização do amido, e ocorre em temperaturas próximas de 60°C (BRODERICK

et al., 1977).

Logo após a gelatinização do amido, ocorre o a segunda ação importante da

mosturação. Quando a temperatura atinge aproximadamente 85°C, os grânulos de

amido se dispersam através da massa, ocorrendo assim, a liquefação do amido

(BRODERICK et al., 1977).

Segundo Reinold (1997), a terceira e última etapa da degradação do amido é a

açucaração ou sacarificação. Esta etapa ocorre quando a massa atinge a

temperatura ótima para ação da alfa-amilase e a da beta-amilase, que é em torno de

70 e 76°C. Ocorre então a transformação do amido em açúcares fermentáveis,

principalmente maltose. Há também a formação de alguns açúcares não

fermentáveis. Quanto mais elevado o teor de alfa-amilase, mais rápida será a

sacarificação. Na tabela 3 está expressa a composição de açúcares do mosto:

Tabela 3. Composição de açúcares do mosto

Fonte: REINOLD, 1997.

Açúcar Quantidade Fermentável/não ferment.

Maltose 48-52% Totalmente Fermentável

Glicose 12-15% Totalmente Fermentável

Frutose 4-6% Totalmente Fermentável

Sacarose 4-6% Totalmente Fermentável

Maltotriose 10-12% Fermentável no final do processo de

fermentação

Maltotetraose 1-2% Não fermentável

Maltohexaose 2-6% Não fermentável

Dextrinas

superiores

15-20% Não fermentável

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Pelo processo de mosturação, obtém-se a extração de 65% dos sólidos totais do

malte. Quanto mais longo o tempo de mosturação, e quanto menor a concentração

da mostura, maior a quantidade final de extrato fermentável. Se o teor de beta-

amilase for alto, a quantidade de extrato fermentável também será (REINOLD,

1997).

4.2.2 Fosfatases

As enzimas fosfatases, agem como substâncias tampão no mosto e na cerveja,

promovendo a acidificação do meio a partir da transformação do fosfato dibásico em

fosfato monobásico, com a precipitação do fosfato de cálcio e conseqüente

clarificação do mosto (REINOLD, 1997).

Poucas informações são encontradas na literatura detalhando os processos que

envolvem o sabor e o aroma, o que nos indica que há muito campo de pesquisa

nesta área. Sobre as fosfatases são encontradas poucas informações, e há

contradição entre autores.

4.2.3 Degradação das proteínas

As proteases são enzimas proteolíticas, isto é, elas degradam as moléculas

grandes de proteínas em subunidades menores, como peptídios e aminoácidos. As

proteases do malte do mosto são uma série de enzimas, e cada uma delas atua

sobre um substrato protéico específico. As proteínas presentes no malte são a

albumina, globulina, prolanina e glutelina. É importante ressaltar, que somente 40%

do total das proteínas do malte são solubilizadas no mosto, e estão disponíveis para

reagir. Os aminoácidos e peptídeos do mosto podem ser chamados de compostos

de nitrogênio, ou compostos nitrogenados da cerveja (BRODERICK et al., 1977).

Os produtos resultantes da proteólise (degradação protéica) podem ser:

Albumosas, peptonas – são produtos de alto peso molecular, e podem

conter mais de 100 aminoácidos;

Polipeptídeos, peptídeos – são produtos de baixo peso molecular, e

podem conter de 2 a 100 aminoácidos;

Aminoácidos – elementos básicos da proteína (REINOLD, 1997).

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A degradação protéica vai depender de diversos fatores, tais como a

temperatura de mostura, o tempo de mosturação, o pH da mostura, a concentração

da mostura e o teor de enzimas proteolíticas. O pH ideal para a degradação protéica

é de 4,6 a 5,0 e a temperatura deve chegar no máximo aos 60°C, pois acima disso

ocorre a coagulação das proteínas. Para que se tenha uma proteólise mais intensa,

é necessário que se utilize a temperatura ideal de mosturação, por um longo período

de tempo, e que a mostura seja bem concentrada, pois assim as enzimas

proteolíticas permanecem ativas (REINOLD, 1997).

A proporção da degradação protéica, afeta tanto o sabor, quanto as

propriedades físicas e a estabilidade da cerveja. Os componentes nitrogenados de

alto peso molecular (peptídios) predominam em temperatura mais elevadas que a

temperatura ótima de mosturação, enquanto temperaturas mais baixas

proporcionam maior degradação, dando origem a aminoácidos. As proteínas neutras

de alto peso molecular não são degradadas, e são necessárias para proporcionar

boa qualidade e estabilidade à espuma da cerveja. Além disso, deve haver um

equilíbrio correto entre proteínas e aminoácidos no mosto, para que se consigam

nutrientes para a levedura e a estabilidade da cerveja (LIMA, AQUARONE e

BORZANI, 1983).

Os aminoácidos formados durante a proteólise vão servir de nutriente às

leveduras durante a fase de fermentação (OETTERER, REGITANO-D’ARCE e

SPOTO, 2006).

4.2.4 Degradação dos glucanos

Além do amido existem outros polissacarídeos que estão presentes no malte e

tem importância na fabricação da cerveja, são carboidratos não fermentáveis. O β-

glucano e o pentosano são os principais carboidratos de importância desta classe.

Eles são produzidos no malte através da decomposição das paredes celulares da

cevada. Ele é degradado à temperaturas de 40 a 45°C em um pH que varia de 4,5 a

4,7. As enzimas que realizam esta degradação são as endo-beta-glucanases e as

exo-beta-glucanases (BRODERICK et al., 1977; REINOLD, 1997).

Durante a mosturação a decomposição dos β-glucanos de alto peso molecular é

severamente limitada, pois os mesmos são liberados somente

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após a proteólise, em temperaturas acima de 65°C, e as glucanases

correspondentes são inativadas acima de 40°C. As substâncias glutinosas

influenciam a estabilidade da espuma e o paladar da cerveja, e, portanto, deve-se

evitar a decomposição total em maltes bem solubilizados. Entretanto, é importante

que parte dos glucanos seja solubilizada, pois se isso não ocorrer, a alta viscosidade

do mosto vai gerar problemas durante a filtração (BRODERICK et al., 1977; LIMA,

AQUARONE e BORZANI, 1983; REINOLD, 1997).

4.2.5 Degradação de lipídios

Os lipídios contidos no mosto provém principalmente do malte e de adjuntos. Se

os teores de lipídios forem excessivos, pode haver alteração no sabor e no aroma da

cerveja envasada. Além disso, outro problema que o excesso de lipídios pode

causar é a supressão da espuma (REINOLD, 1997).

Os ácidos graxos predominantes no malte são o palmítico, o oléico e o linoléico,

na forma de glicerídeos e fosfolipídeos, enquanto no mosto predominam os ácidos

graxos livres (REINOLD, 1997).

As lipases do malte possuem atividade máxima aos 50°C e aos 65°C e são

rapidamente inativadas. No entanto, os lipídeos são, em grande parte, eliminados

durante a filtração e o cozimento do mosto (REINOLD, 1997).

4.2.6 Decomposição de fenóis e polifenóis

É a redução de polifenóis através da ação das peroxidases e das

polifenoloxidases, sendo que as temperaturas ótimas para ação destas são 40-45°C

e 60-65°C, respectivamente. Ocorre paralelamente à decomposição protéica

(BRODERICK et al., 1977; REINOLD, 1997).

O tanino é o principal representante do grupo dos polifenóis na cerveja. Ele é

oxidado, causando o escurecimento da cor da mostura (REINOLD, 1997).

4.3 Filtração do mosto

A filtração do mosto é realizada em um recipiente denominado tina de filtração.

Esta etapa da fabricação tem como objetivo a separação da fase sólida da fase

líquida do mosto, e divide-se em duas fases: filtração do mosto

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primário e a lavagem do bagaço, ou obtenção do mosto secundário (REINOLD,

1997; VENTURINI, 2005).

Na primeira filtragem o líquido passa através da camada de cascas do malte

depositadas no fundo da tina, constituindo o mosto primário. A camada de cascas

que encontra-se na tina de mosturação, é então lavada com água por uma ou mais

vezes, para recuperar a maior parte do extrato líquido que fica retido no bagaço

após a filtração, e aumentar o rendimento da fabricação. Este último procedimento é

conhecido como obtenção do mosto secundário (REINOLD, 1997; LIMA,

AQUARONE e BORZANI, 1983; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006)

O bagaço que ficou na tina, denominado torta, deve ter menos de 1% de

extratos solúveis, e pode ser utilizado na fabricação de rações para animais. (LIMA,

AQUARONE e BORZANI, 1983; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO,

2006).

Para que se tenha uma filtração rápida e com mosto limpo é necessário que o

malte esteja bem solubilizado, uma moagem não muito fina e boa degradação

protéica durante a mosturação. Também é importante que os glucanos sejam

degradados para que o mosto seja pouco viscoso, aumentando assim a velocidade

da filtração (REINOLD, 1997).

4.4 Fervura (Cozimento) do mosto

O mosto obtido na filtração é submetido a fervura, com objetivo de inativar

enzimas, esterilizar o mosto, precipitar proteínas, resinas e taninos, extrair os

compostos amargos do lúpulo, formar substâncias que irão contribuir para o sabor e

o aroma da cerveja, concentrar o mosto evaporando a água excedente, formar

substâncias redutoras e corantes, formar ácidos para a redução do pH, eliminar

compostos voláteis indesejáveis, como os sulfurosos e por fim, solubilizar e modificar

substâncias amargas do lúpulo (OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006;

REINOLD, 1997).

Nesta etapa é ajustada a concentração de açúcares do mosto e também é feita

adição do lúpulo. Tradicionalmente, o lúpulo é adicionado no início da fervura, no

entanto, muitas vezes o lúpulo é acrescentado quando a fervura está na metade ou

até mesmo no final. Isto porque os óleos essenciais, responsáveis por parte do

sabor e aroma da cerveja, são muito voláteis, podendo assim ocorrer perdas destes

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compostos durante a cocção (LIMA, AQUARONE e BORZANI, 1983; OETTERER,

REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006).

O mosto é mantido em fervura até atingir a concentração desejada de açúcar

para o início da fermentação. A fervura é feita em temperaturas de

aproximadamente 100°C e dura cerca de duas horas, permitindo uma evaporação

máxima de até 10% do volume inicial. É importante salientar, que se o tempo de

fervura ultrapassar 2,5 horas, a qualidade do amargor diminui em valores

consideráveis (REINOLD, 1997; VENTURINI, 2005).

A concentração de sólidos solúveis do mosto pela evaporação de parte da água,

é responsável pela característica sensorial de “corpo” da cerveja. As reações de

Maillard e a caramelização de alguns açúcares, que ocorrem devido ao efeito da

temperatura, conferem aromatização agradável à cerveja (REINOLD, 1997).

O escurecimento do mosto ocorre, portanto, devido a formação de melanoidinas,

concentração do mosto, oxidação de polifenóis e caramelização dos açúcares

(BRODERICK et al., 1977; REINOLD, 1997).

A inativação enzimática não é prejudicial ao mosto, pois a composição deste não

vai mais se modificar por causa disto. Quanto a coagulação protéica, para que se

tenha uma grande quantidade de proteínas coaguladas mais rapidamente, é

necessário que o tempo e a temperatura da fervura sejam altos. É importante

ressaltar que a caogulação protéica ocorre por causa da presença dos taninos

provenientes do lúpulo, estes que também são responsáveis pela turvação a frio

(REINOLD, 1997).

4.4.1 Principais alterações de sabor e aroma durante a fervura

As alterações no sabor, que não são aquelas produzidas pelo lúpulo, se devem

principalmente a formação de melanoidinas e na eliminação de compostos voláteis

de sabor, derivados da cevada e do processo de malteação. Durante a fervura do

mosto, alguns aminoácidos são destruídos, como a cistina e a cisteína. Caso estes

compostos não sejam destruídos, eles serão uma fonte de enxofre para a produção

de ácido sulfídrico para a levedura. O enxofre liberado pela destruição do

aminoácido é eliminado do mosto como ácido sulfídrico (REINOLD, 1997; WE

CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Durante a ebulição do mosto são eliminadas substâncias voláteis indesejáveis, e

por isso a fervura deve ser feito em tinas abertas. Se os compostos não forem

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eliminados, eles podem combinar-se com produtos de condensação de

melanoidinas e formar compostos não voláteis de sabor desagradável. Portanto, é

necessário que se faça uma ebulição vigorosa e uma boa evaporação para garantir

a qualidade do sabor no produto final (REINOLD, 1997; WE CONSULTORIA,

ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

No caso de haver adição de xaropes e corantes caramelos, pode ocorrer uma

redução nos compostos nitrogenados, e de acordo com a sua natureza, podem

produzir sabores (REINOLD, 1997).

A mais importante das alterações no sabor durante a fervura, e mesmo para o

produto final, é a adição de lúpulo ao mosto. Dos compostos responsáveis pelo

sabor e aroma fornecidos pelo lúpulo, os mais importantes são os α-ácidos. Estes

ácidos, sofrem isomerização durante a fervura, tornando-se assim ácidos iso-alfa,

que são mais solúveis que os α-ácidos e conferem maior sabor ao produto

(REINOLD, 1997; WE CONSULTORIA, ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Os iso-alfa ácidos, produzem um efeito bacteriostático a níveis baixos no mosto,

e também, são capazes de inibir fortemente uma ampla gama de bactérias, e não

agem sobre a levedura cervejeira. Além disso, estes ácidos são fortemente

tensoativos, agindo assim sobre estabilidade da espuma (WE CONSULTORIA,

ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

Os β-ácidos, não podem contribuir para o sabor da cerveja, pois estes são

solúveis somente em meios alcalinos, sendo insolúveis em água (REINOLD, 1997).

Ocorre também, formação de dimetilsulfuro a partir do S-metil metionina, em

menor quantidade quando comparado a malteação (WE CONSULTORIA,

ACESSORIA e REPRESENTAÇÃO, 200?).

4.5 Resfriamento do mosto

O mosto lupulado e fervido é centrifugado, geralmente em um tanque Whirpool,

onde as partículas sólidas do lúpulo e as proteínas coaguladas, denominadas trub,

sedimentam e são separadas do mosto. Cerca de 40% das substâncias amargas,

são eliminadas juntamente com o trub. O trub também pode ser retirado frio do

mosto, através de outros tipos de processo, no entanto é mais recomendável que se

retire quente, pois isto melhora a estabilidade físico-química e sensorial da cerveja

(OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006; REINOLD, 1997).

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Logo após o mosto é resfriado em trocadores de calor de placas até atingir a

temperatura desejada para a fermentação, que vai depender do tipo: fermentação

alta ou fermentação baixa. Mostos de cerveja tipo Lager são usualmente resfriados

entre 7 e 15°C e os do tipo Ale são resfriados em média entre 18 e 22°C. Por ultimo,

o mosto recebe uma aeração, feita com ar estéril ou oxigênio, que estimula o

crescimento das leveduras no início da fermentação (REINOLD, 1997; VENTURINI,

2005).

4.6 Fermentação

A fermentação é um dos processos mais importantes para o sabor e o aroma na

fabricação da cerveja. Nesta fase, diversos compostos são adicionados e serão de

grande impacto para o sabor do produto final. O princípio básico da fermentação, o

seu principal objetivo, é transformar açúcares fermentáveis em álcool e gás

carbônico. Entretanto, outros compostos são produzidos durante a fermentação, e

são denominados produtos secundários da fermentação.

A fermentação é um processo anaeróbico, realizado pelas leveduras, onde há a

conversão de carboidratos em etanol e gás carbônico. A reação química que

representa a fermentação alcoólica é a Fig. 5:

C6H12O6 2C2H5OH + 2CO2 + Energia

Figura 5. Reação da Fermentação alcóolica

Fonte: REINOLD, 1997.

Não só a glicose participa da fermentação, mas também todos os açúcares

fermentáveis que estão presentes no mosto. Além do etanol e do dióxido de

carbono, são formados alguns subprodutos do metabolismo das leveduras, como

ácidos, alcoóis alifáticos superiores, ésteres, diacetil, acetoína, ligações de enxofre,

etc. Muitos componentes do mosto podem ser assimilados pela levedura durante a

fermentação. Todos os compostos envolvidos na assimilação, a formação de

produtos e subprodutos, são influentes no sabor e no aroma da cerveja, sendo

alguns desejáveis, e outros indesejáveis. Entretanto, estes subprodutos da

fermentação só vão estar totalmente formados quando a maturação acabar, pois na

maturação ocorre uma segunda fermentação, que será comentada posteriormente

(VENTURINI, 2005; REINOLD, 1997).

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Estes subprodutos que as leveduras produzem através da síntese de

substâncias necessárias para o seu metabolismo e crescimento, vão ser

extremamente influentes no sabor e no aroma da cerveja. Os teores destes

compostos, vão variar de acordo com os padrões de crescimento celular, que vão

ser influenciados pelas condições do processo, tais como: concentração e

composição do mosto, temperatura e duração do processo de fermentação

(VENTURINI, 2005).

A fermentação alcoólica para a produção de cerveja inicia-se com a inoculação

do fermento preparado no mosto já resfriado. Esta quantidade de fermento

adicionada é, geralmente, na proporção de 1% (v/v), mas depende principalmente

do peso do mosto e do tipo de fermentação (BRODERICK et al., 1977; OETTERER,

REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006).

A fermentação, na maioria dos casos ocorre em tanques de aço inox fechado

para evitar contaminação e perda de CO2. Estes tanques possuem um sistema de

serpentinas ou camisas de refrigeração para o controle rígido de temperatura. A

fermentação alta pode ser feita em tanques abertos, no entanto, essa prática não é

tão comum (OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006).

Existem dois grandes grupos de classificação das cervejas quanto a

fermentação: fermentação alta, que resultam em cervejas do tipo “Ale”, e

fermentação baixa, que produzem cervejas do tipo “Lager”. As cervejas de

fermentação alta são feitas em altas temperaturas, e em curtos períodos de tempo, e

a levedura utilizada é a Saccharomyces cerevisiae. Na fase de alta fermentação a

levedura sobe à superfície arrastada pelo CO2. Já as cervejas de fermentação baixa,

são fermentadas em temperaturas menores, por longos períodos de tempo,

utilizando a levedura Saccharomyces uvarum, que se sedimenta e se deposita no

fundo do tanque. A principal diferença do sabor e aroma destes dois tipos de cerveja

é o aroma frutado, devido a maior quantidade de ésteres nas cervejas de

fermentação alta (CARVALHO, 2005; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO,

2006; REINOLD, 1997).

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4.6.1 Principais compostos de sabor e aroma produzidos durante a

fermentação

Além do álcool e do gás carbônico, muitos outros compostos são formados

através do metabolismo das leveduras. Estes são conhecidos como compostos

secundários da fermentação.

4.6.1.1 Ácidos orgânicos

A síntese dos ácidos orgânicos está associada com a assimilação de compostos

nitrogenados pelas leveduras, principalmente pelo consumo de aminoácidos

(ARAUJO, SILVA e MINIM, 2003).

Os principais ácidos orgânicos produzidos durante a fermentação estão

expressos na tabela abaixo:

Tabela 4. Principais ácidos orgânicos formados durante a fermentação

Ácido Quantidade

Ácido acético 20-150mg/L

Ácido fórmico 20-40mg/L

Piruvato 40-75mg/L

Malato 60-100mg/L

D-lactato 10-100mg/L

L-lactato 40-80mg/L

Citrato 110-200mg/L

Fonte: REINOLD, 1997.

Além destes ácidos também são formados o ácido succínico, piroglutâmico e

málico. Esses ácidos conferem a cerveja sabor frutado, amanteigado ou de queijo e

proporcionam, também, um aroma alcoólico típico de bebida fermentada. Além de

contribuírem com estes sabores para a cerveja, eles são responsáveis pela redução

do pH, e conseqüente melhora na estabilidade microbiológica, amargor mais

agradável e cor mais clara (ARAUJO, SILVA e MINIM, 2003; CARVALHO, 2005;

REINOLD, 1997).

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4.6.1.2 Álcoois alifáticos superiores

Os alcoóis alifáticos superiores, também são subprodutos do metabolismo da

levedura, e são formados durante a fermentação pelas vias anabólicas e

catabólicas, e a sua produção está associada à assimilação de nitrogênio pelas

leveduras e ao consumo e produção de aminoácidos. Eles se formam através da

desaminação ou por descaboxilação dos aminoácidos do mosto, ou também,

através de sínteses a partir de carboidratos. Cerca de 85% destes alcoóis

superiores, são formados a partir de três aminoácidos: L-Leucina, L-Isoleucina e L-

Valina (CARVALHO, 2005; REINOLD, 1997; VARNAN e SUTHERLAND, 1997).

Os principais alcoóis superiores formados durante a fermentação estão

expressos na tabela 5:

Tabela 5. Alcoóis superiores formados durante a fermentação e suas concentrações

Álcoois superiores Concentração na cerveja (mg/L)

n-propanol 2-10

n-butanol 0,4-0,6

Isobutanol 5-10

Álcool amílico 10-15

Álcool isoamílico 30-50

Álcool fenil-etílico 10-20

Fonte: REINOLD, 1997.

A formação dos alcoóis alifáticos superiores, depende de diversos fatores, tais

como a temperatura da fermentação, o teor de oxigênio, a raça da levedura, a

quantidade de levedura dosada, multiplicação da levedura e grau de fermentação.

Outro importante fator é a aeração das leveduras, pois assim, a multiplicação celular

é forçada e ocorre maior produção dos alcoóis. Cervejas que possuem mais

adjuntos podem possuir maior teor de alcoóis superiores (REINOLD, 1997).

Estes compostos conferem a cerveja um aroma alcoólico ou de solvente,

enquanto o álcool fenil etílico, que está presente em quantidades consideráveis na

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cerveja, pode contribuir positivamente para o flavor da cerveja, através de um aroma

de fragância (CARVALHO, 2005).

4.6.1.3 Ésteres

Os ésteres são compostos voláteis resultantes da junção de um ácido orgânico

com um álcool, e estes são os principais portadores do aroma da cerveja formados

durante a fermentação. O teor de ésteres na cerveja varia, em média, de 20 a 25 mg

L-1 (REINOLD, 1997).

Muitos são os fatores que influenciam na formação de ésteres, no entanto, os

principais são:

Mosto básico: quanto maior, mais ésteres;

Aeração: quanto menos aeração sofrer o mosto, maior a formação de

ésteres;

Tipo de levedura;

Temperatura de fermentação: se for mais elevada, ocorrerá maior

produção de ésteres;

Quantidade de nitrogênio no mosto: quanto mais elevada, maior o teor de

ésteres (BRODERICK et al., 1977; REINOLD, 1997).

Os ésteres são de grande importância para o sabor e principalmente para o

aroma da cerveja, pois eles conferem a cerveja um aroma frutado ou floral, porém

em excesso, podem se tornar desagradáveis e proporcionar a cerveja um aroma

muito forte de frutas ou característico de cervejas tipo ale (ARAUJO, SILVA e MINIM,

2003; CARVALHO, 2005).

Dentre os ésteres existentes, os tipos etílicos de ácidos graxos e acetatos são

considerados os mais importantes em bebidas alcoólicas em geral, onde se

encaixam as cervejas. Isto por que eles se apresentam em elevadas concentrações,

e as suas características de aroma são agradáveis. Os ésteres são encontrados em

maior quantidade em cervejas do tipo ale, pois além de outros fatores, ela é

fermentada em temperaturas mais elevadas. Os ésteres mais importantes da cerveja

são o acetato de etila, acetato de isoamila, acetato de isobutila, caproato de etila e

acetato 2-feniletila (NÓBREGA, 2003; VARNAN e SUTHERLAND, 1997).

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4.6.1.4 Diacetil e 2,3 pentanodiona

Tanto o diacetil quando a 2,3 pentanodiona, são substâncias que se formam

extracelularmente pela descarboxilação oxidativa espontânea dos ácidos α-

acetohidroxi. O α-acetolactato produz o diacetil e o α-acetohidroxibutirato a 2,3

pentanodiona. Estes ácidos saem da célula durante a fermentação, e são produtos

intermediários da síntese da valina e da isoluecina. Os dois compostos tem o poder

de conferir odor de manteiga rançosa, mel ou caramelo a bebida, em concentrações

de aproximadamente 1 ppm. O limite de percepção do diacetil, vai depender do tipo

de cerveja, mas em geral este limite é próximo de 0,15 mg L-1 (CARVALHO, ROSSI

E SILVA, 2007; REINOLD, 1997; VARNAM e SUTHERLAND, 1997).

Durante a fermentação, o diacetil é reduzido para acetoína e posteriormente

para 2,3-butanodiol, que proporciona um sabor desagradável mais forte que o

diacetil. O valor limite para o teor de acetoína na cerveja é de 0,5 a 5 mg L-1. Já a 2,3

pentanodiona, pode ser reduzida a 2,3 pentanodiol (REINOLD, 1997).

A temperatura alta favorece o processo de redução de diacetil, e este é um dos

motivos pelo qual as cervejas de fermentação alta são menos suscetíveis a este

efeito no sabor (BRODERICK et al., 1977).

O diacetil, não apenas surge durante a fermentação da cerveja, mas, se a

cerveja possui má qualidade microbiológica, e nela estão presentes bactérias

contaminantes como as lácticas, os teores de diacetil podem ser acima dos teores

desejáveis (BRODERICK et al., 1977; CARVALHO, ROSSI e SILVA, 2007).

4.6.1.5 Aldeídos

Os aldeídos são compostos que podem ser originados de diversas formas na

cerveja: através do metabolismo da levedura, pela degradação dos aminoácidos

durante a cocção do mosto ou então como resultado da descarboxilação dos ácidos

orgânicos (CARVALHO, 2005).

O aldeído mais importante na constituição da cerveja é o acetaldeído. Este é um

ponto de ramificação metabólica na fermentação alcoólica das leveduras, já que ele

pode ser reduzido a etanol ou oxidado a acetato. O acetaldeído está presente,

geralmente, em níveis de 2 a 20 mg L-1, e seu limite de percepção é de 5 a 50 mg

L-1. A produção de aldeídos constitui-se em um fator importante na perda de sabor

da cerveja (CARVALHO, 2005; VARNAM e SUTHERLAND, 1997).

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Os aldeídos apresentam aroma característico de maçã verde, e podem também

proporcionar odores a cerveja como odor a vegetal verde, verniz velho, batata frita,

repolho ou papelão. Além disso pode gerar na cerveja um flavor de amônia

(CARVALHO, 2005; CARVALHO, ROSSI e SILVA, 2007).

4.7 Maturação

O produto resultante da fermentação principal, descrita anteriormente, é a

cerveja “verde”, onde ainda existem leveduras em suspensão e certa quantidade de

material fermentescível. Esta cerveja passa por uma fermentação secundária, que é

conhecida como maturação. Assim, a maturação é um repouso prolongado da

cerveja, onde os seguintes processos ocorrem: fermentação secundária, saturação

com CO2, clarificação e amadurecimento dos componentes de sabor e aroma

(OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006, REINOLD, 1997).

Durante este período que pode durar meses, ocorrem mudanças positivas no

sabor e no aroma e clarificação da cerveja. Durante o período de maturação, são

formados mais ésteres e alcoóis alifáticos superiores, como aqueles formados

durante a fermentação principal. Cerca de 10% do total de ésteres da cerveja são

formados durante a maturação. Ocorre também a redução dos teores de compostos

sulfídricos, como o diacetil, acetaldeído e ácido sulfídrico. Ocorre uma atenuação no

amargor do lúpulo e é estabelecido o sabor final da cerveja (LIMA, AQUARONE e

BORZANI, 1983; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006; REINOLD,

1997)

A clarificação da cerveja ocorre através da sedimentação da levedura, e

separação substâncias como os complexos taninos-protéicos, que provocam

turvação em baixas temperaturas. É importante observar, que quanto maiores e

mais pesadas as substâncias e menor a viscosidade da cerveja, mais rápida e

eficiente será a clarificação. Os outros fatores que influenciam a clarificação da

cerveja são a altura do tanque, a superfície específica, a temperatura e o tempo

(REINOLD, 1997).

As cervejas do tipo ale, são acondicionadas tradicionalmente por um período de

1 a 2 semanas em uma temperatura de 12-20°C, para sofrer o processo de

maturação. Este acondicionamento pode ser em grandes depósitos ou até mesmo

na garrafa, quando se trata de cervejas de alta qualidade (BRODERICK et al., 1977).

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As cervejas do tipo lager, são acondicionadas em tanques a temperaturas de

4°C, durante várias semanas ou até meses. O período de maturação pode ser

reduzido sensivelmente quando se tem uma cerveja “verde” com níveis mínimos de

compostos desejáveis para o sabor e o aroma. Isto pode ser feito através do

controle da fermentação e modificação genética das leveduras, reduzindo assim os

níveis de diacetil (BRODERICK et al., 1977).

4.8 Filtração e envase

A filtração da cerveja tem como objetivo eliminar o a turvação que persistiu após

o processo de maturação. A cerveja apresenta essa turvação devido a presença de

materiais sólidos como células de levedura e complexos tanino-proteína (LIMA,

AQUARONE e BORZANI, 1983; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO,

2006).

São utilizados filtros de terra diatomácea e de placas de celulose. Esta etapa

não altera a composição e o sabor da cerveja, no entanto, é fundamental para

garantir seu aspecto cristalino (OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006;

VENTURINI, 2005).

A cerveja pode ser armazenada em garrafas ou latas de alumínio e deve passar

pelo processo de pasteurização. A pasteurização é feita com objetivo de

proporcionar estabilidade biológica à cerveja, através da destruição de

microrganismos pelo calor. Já o chope, e armazenado em barris de inox, e como

não sofre pasteurização deve ser conservado em temperaturas baixas

(CARVALHO, 2005; OETTERER, REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006).

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5 Outras alterações no sabor

Após o processamento, a cerveja ainda pode sofrer algumas alterações nas

suas caraterísticas sensoriais. A principal alteração, é o aparecimento de um flavor à

velho ou oxidado. O tempo, as temperaturas elevadas e a luz, podem acelerar as

reações de oxidação, envelhecendo a bebida rapidamente (OETTERER,

REGITANO-D’ARCE e SPOTO, 2006).

Outro sabor desagradável que se forma após o envase, é o sabor a luz, que

ocorre na cerveja quando esta é exposta a luz solar. A sua formação é atribuída ao

2-metil-2-buteno-1-tiol, decorrente da fotólise dos ácidos iso-α em presença de

tioamino-ácidos (WONG, 1995).

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6 Bactérias Contaminantes

A cerveja, assim como qualquer outro alimento, pode apresentar contaminação

microbiológica. Entretanto, esta contaminação é um pouco dificultada devido às

condições que a cerveja proporciona aos microrganismos: presença de etanol,

elevada concentração de CO2, baixo valor de pH (3,8 a 4,7) e reduzida concentração

de O2. Entretanto, alguns microrganismos ainda conseguem multiplicar-se nestas

condições, podendo comprometer as características da cerveja, dentre estas, as

sensoriais (DRAGONE. et al., 2007).

As contaminações na indústria cervejeira podem ocorrer de duas formas:

Contaminação Primária – provocada por microrganismos existentes nos

processos de produção, através de matérias-primas e equipamentos.

Contaminação Secundária – provocada por correntes de ar, embalagens

contaminadas, insetos, roedores e operadores (AEB GROUP, 2007).

Os micorganismos que podem proporcinar este comprometimento podem ser

separados em três grupos distintos: bactérias gram-positivas, bactérias gram-

negativas e leveduras selvagens (DRAGONE. et al., 2007).

As principais representantes das bactérias gram-positivas são as bactérias ácido

lácticas, que pertencem aos gêneros Lactobacillus e Pediococcus. As bactérias

ácido lácticas podem aumentar a viscosidade, causar turbidez, acidez e odores

desagradáveis, devido a formação de produtos como o diacetil, e dicetona, que vão

conferir um odor desagradável doce, de manteiga, ou de mel. Os principais

Lactobacillus relacionados com a alteração da cerveja são: L. brevis, L. buchneri L.

fermentum, L. casei, L. plantarum e L. delbrueckii. Quanto as Pediococcus, P.

damnosus é certamente a espécie deteriorante da cerveja mais comum e perigosa,

sendo responsável por cerca de 90% dos casos de contaminação de cervejas por

Pediococcus (VARNAM e SUTHERLAND, 1997).

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Dentre as bactérias Gram-negativas encontram-se as dos gêneros Pectinatus,

Megasphaera, Zymomonas e certos membros da família Enterobacteriaceae. Estas

bactérias estão presentes geralmente nas cervejas do tipo Lager. As principais

mudanças que ocorrem com a presença destas bactérias são o aparecimento de

turbidez, acidez, sabores e odores desagradáveis, como de ovos podres

(BRODERICK et al., 1977; DRAGONE. et al., 2007).

As leveduras selvagens podem ser definidas como qualquer levedura que está

presente na cerveja de forma não intencional. Destacam-se as do gênero

Saccharomyces como as responsáveis pelos maiores problemas de deterioração

das cervejas por leveduras, sendo ainda de difícil detecção pelas similaridades que

apresentam com as leveduras cervejeiras. As principais alterações produzidas na

cerveja, por estas leveduras, são o aparecimento de turbidez, excesso de gás,

excesso de acidez e odores desagradáveis (BRODERICK et al., 1977; VARNAM e

SUTHERLAND, 1997).

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7 Conclusão

O sabor e o aroma são duas características de extrema importância na cerveja,

entretanto, a preferência do consumidor nestes dois quesitos variam em cada região

ou país. No Brasil, a cerveja mais produzida e consumida é a cerveja do tipo Pilsen,

que tem sabor e aroma suaves.

Todas as matérias-primas utilizadas na indústria cervejeira, têm influência no

flavor da cerveja após o término do fabrico. No entanto, a matéria-prima que mais

vai proporcionar sabor e aroma é o lúpulo. Durante todas as etapas do

processamento, o flavor da cerveja sofre alterações, no entanto, são três as etapas

em que estas alterações são maiores e mais importantes: fervura do mosto,

fermentação e maturação.

Assim, para que se tenha um produto com sabor e aroma agradáveis ao paladar

do consumidor, é necessário empregar matérias-primas de boa qualidade durante a

fabricação, e variar o tipo da matéria-prima conforme a cerveja que se quer produzir.

Além disso, deve-se ter cuidado durante o processamento e envase, e

principalmente durante o armazenamento, onde ainda podem ocorrer reações

químicas prejudiciais ao flavor da cerveja.

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