Ciência e Cultura - As Greves Antes Da _grève__ as Paralisações Do Trabalho Feitas Por Escravos No Século XIX

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    Cincia e CulturaOn-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.65 no.2 So Paulo Apr./June 2013

    As greves antes da "grve": asparalisaes do trabalho feitas porescravos no sculo XIX

    Antonio Luigi Negro

    Flvio dos Santos Gomes

    Dia ensolarado. O italiano Pascoal se aproxima do brasileiro Justino. Apelidado de"missionrio", o italiano usava um desses chapeletes de militante socialista. Com uma p namo, o operrio um negro fez uma pausa no batente para olhar Pascoal nos olhos,ouvindo-o atento. Gesticulando com as mos, compensando o sotaque carregado, o italianoviera atear fogo: criticou salrios, incitou todos a largarem o servio e a fazer a revoluo."Voc, seu Pascoal" argumentou Justino (tambm com seu sotaque prprio) "estperdendo seu tempo. Eu no compreendo a lngua estrangeira".

    Tal como na charge de J. Carlos (publicada na revista Careta em 1917), imprensa, novelas etextos didticos divulgaram para o grande pblico essa fictcia figura do italianoanarquista. Celebravam o mito do imigrante radical, uma fantasia em parte utpica epreconceituosa. Utpica porque os trabalhadores europeus no eram em sua maioria rebeldnem se sentiam italianos. Ou seja, nem sempre eram anarquistas e tampouco se declaravaitalianos. Na verdade, uma grande parte era de origem rural, no era composta de artesosradicais ou trabalhadores de fbrica. Esses imigrantes no traziam consigo, em segundolugar, uma macia experincia de envolvimentos com partidos, greves e sindicatos. Havia, eacrscimo, divises tnicas entre os imigrantes. Consequentemente, a desconcertanteconcluso de Michael Hall a de o nascente operariado industrial de So Paulo de origemimigrante ter contribudo para manter a classe operria em situao relativamente fraca edesorganizada. Muitos abraavam identidades tnicas antes de mais nada, pois lhesassegurava um senso imediato de comunidade. Outros eram catlicos e conservadores.Tambm aceitaram servios cuja remunerao os brasileiros recusavam (1).

    O mito do imigrante radical tambm um preconceito porque, entre silncios eesquecimentos, impede que o trabalhador local (a comear pelo escravo) aparea comoprotagonista das lutas operrias. Figuras como a de Justino, que aparece trabalhando mas

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    pintado como alheio pregao inflamada do italiano radical, personificaram o anti-hericonformista. Enquanto que Pascoal desembarca pronto para lutar, o operariado formado emsolo brasileiro deve, nessa tica, ou aceitar a liderana do imigrante ou ficar de fora quaseum fura-greve. Deste modo, as imagens do trabalhador estrangeiro, branco, anarquista erebelde, assim como a do trabalhador brasileiro longe das lutas, no passam de umarepresentao caricata do operariado do incio do sculo XX.

    Alm disso, de acordo com esse mito do imigrante radical, a paralisao coletiva do trabalhoseria algo to indito no Brasil que sequer haveria um termo disponvel na lngua portugues

    para nomear o fenmeno. Na falta dessa palavra, ramos obrigados a tomar de emprstimoaos franceses a palavra grve! No entanto, a paralisao do trabalho como forma de proteste barganha foi sempre uma consequncia to espontnea e lgica da experincia dostrabalhadores que boa parte das lnguas europeias possui uma palavra prpria para designaro fenmeno. Assim, ingleses fazem strike. J os espanhis entram em huelga, enquanto queitalianos, quando param o servio, esto em sciopero. No Brasil do sculo XIX, as primeirasformas de suspenso coletiva das atividades ficaram conhecidas comoparedes. Sem essa,portanto, de um Pascoal rebelde e um Justino que no fala o idioma da luta operria. Parans, a emergncia da classe trabalhadora no pode estar vinculada apenas imigrao.

    QUANDO AFINAL SURGIRAM AS GREVES NO BRASIL? H quem tenha indicado que agreve dos tipgrafos de 1858 foi a primeira greve do Rio de Janeiro. Ser? Sabemos hojeque, um ano antes, os trabalhadores escravizados pertencentes ao Visconde de Maupararam o servio da fbrica da Ponta d'Areia. Esta era um dos maiores estabelecimentos dacidade, com cerca de 10 oficinas e 600 operrios, sendo 150 deles escravos. Contudo, apesade noticiada na imprensa, no existem maiores informaes sobre as reivindicaes dosescravos.

    Era comum haver cativos e livres no mesmo espao de trabalho. Dos operrios registradosnas manufaturas do Rio de Janeiro entre os anos de 1840 a 1850 em particular nasfbricas de vidro, papel, sabo, couros, chapus e txteis , 45% eram escravos. Almdisso, o recenseamento de 1872 apontou que, no Rio de Janeiro, havia mais de 2 mil cativosempregados como trabalhadores em pequenas fbricas.

    So vrias as evidncias de paralisaes feitas por escravos. No final da dcada de 1820,cativos, africanos livres e outros trabalhadores pararam a Fbrica de Plvora Ipanema,controlada pela monarquia. Reivindicavam melhorias nas condies de trabalho, incluindodirias e dieta alimentar. No Rio de Janeiro, em abril de 1833, um levante numa caldeirariatrouxe apreenso quando os escravos enfrentaram a fora policial, sucedendo tiros e mortes

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    Em 1854, Joaquim da Rocha Paiva foi testemunha e vtima da ao coletiva dos seusescravos. Tudo aconteceu na tera-feira, 5 de setembro. Foi na Fbrica de Velas e Sabo, supropriedade na Gamboa. Um grupo de escravos "armados de achas de lenhas e facas"paralisou as atividades e reivindicou sua imediata venda para outro senhor. A deciso delesao que parece no tinha motivo declarado. H informaes de que Rocha Paiva tentounegociar, propondo discutir o assunto no dia seguinte, enquanto alegava ser tarde da noite.Crioulos e africanos, na sua resposta, dirigiram-se ao proprietrio "em tom alto".Esclareceram "que no queriam esperar por que aquilo era negcio de ser decidido logo". Adeciso final do proprietrio apareceu no num acordo, mas sim na rpida represso policial

    de quase cem homens, que assustou os moradores da Corte, e chamou a ateno daimprensa. Chegando a fora policial fbrica, os escravos se entregaram s autoridades seopor resistncia. Talvez julgassem que, sendo presos, ficariam todos juntos, afastadosdaquela fbrica por algum tempo e depois poderiam ser vendidos, como desejavam.

    Em 1858, na rua da Sade, um outro grupo de escravos que trabalhava num armazm decaf se insurgiu contra seu proprietrio, Manuel Ferreira Guimares. Igualmente, paralisarao trabalho e se fizeram ouvir: neste caso, no queriam ser vendidos. Sabedores dasdificuldades financeiras de seu senhor com o armazm, os escravos no concordavam em sevendidos, talvez prevendo que seu destino poderia ser as fazendas de caf no interior daprovncia. Experientes no trabalho urbano, rejeitavam a venda para as reas rurais.Permanecer na cidade poderia significar no simplesmente ficar longe dos cafezais, mas

    manter arranjos familiares e laos de amizade. Queriam permanecer juntos. Por causa dissoo armazm parou. Como resultado, os escravos sofreram represlia imediata: foram levadospara a Casa de Deteno.

    Quando deixamos de lado a grve e mito do imigrante radical e nos dedicamos, em seguida, pesquisa, encontramos paredes feitas por trabalhadores escravos ou trabalhadores livresnascidos e crescido em solo nativo. Desse modo alargamos nossa viso e percebemos outraformas de protesto dos trabalhadores. Antes da grve,aparede dos escravos conseguiapressionar por melhores condies enquanto suspendia, temporariamente, os serviosnegociando tambm o retorno ao trabalho. Por isso mesmo, algumas fugas inclusive asescapulidas curtas e individuais eram eficazes como forma de negociao entre senhoresescravos. Aqui e ali, sumindo pelas falhas do sistema, mas deixando suas pistas em annciode jornal pagos por senhores que reclamavam o seu retorno, os cativos fugiam. Em taisanncios, havia informaes, que eram fornecidas pelos senhores, sobre a identidade e oscostumes dos escravos em fuga (sinais e marcas especficas, os seus hbitos, possveisparadeiros). Revela-se, assim, a mtua percepo de poderes, deveres e estratgias,senhoriais e escravas, de controle e protesto. Quando calculavam que era hora de parar detrabalhar, os escravos fugiam. Eram, s vezes, escapadas que duravam dias, ou um final desemana. Mesmo provisrias, eram cheias de tenses, castigos, concesses e riscos (parasenhores e escravos). Era comum proprietrios esperarem alguns dias para anunciar fugidosou contratar capites do mato. Tempo suficiente para que alguns fujes voltassemapadrinhados por senhores influentes e vizinhos de seus sinhs. A um padrinho cabiainterceder invocando generosidade e tolerncia. Se possvel, o escravo ganhava o quedesejava: uma melhoria nas condies do cativeiro. No mnimo, o escravo que regressavaqueria evitar castigos ou vinganas. Polticas dos senhores e polticas dos escravos acabamassim redefinidas: uma relao at pouco tempo atrs bem pouco conhecida.

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    Episdios aparentemente sem maior expresso como fugas temporrias, bebedeiras,desordens, ofensas fsicas talvez escondam aspectos decisivos da cultura escrava, guardandexpectativas relacionadas ao ritmo do trabalho, ao controle senhorial, disciplina e ao lazer.Em pocas que antecediam as festas religiosas, aumentava a incidncia das fugas. Noemaranhado da polmica definio sobre a criminalidade escrava, podemos ver a gestao duma identidade grupal coletiva. Numa amostra de cativos recolhidos na Casa de Deteno e1863, podemos verificar, entre suas motivaes, a priso tanto "a pedido" quanto por"insubordinar-se", ou mesmo "queixar-se". Estamos, talvez, diante da formao de umacultura de classe urbana entre os escravos, haja vista o alto nmero de cativos domsticos,cozinheiros, lavadeiras etc. Podiam ser cativos que se insurgiam, no mbito domstico, contr

    seus senhores (e assim eram remetidos Deteno). Mas tambm podiam ser cativos queprocuravam as autoridades policiais para defender o costume de alguma relao de trabalho,que consideravam desrespeitado. A lavadeira crioula Ludovina, por exemplo, procurou asautoridades policiais trs vezes no mesmo ano. No registro prisional feito, est marcado seucrime: "queixar-se". Reclamar, no caso de Ludovina, poderia ser a tentativa de protestarcontra o seu senhor ou seus clientes. Isto era crucial, em particular no caso de escravosurbanos, muitos dos quais "ao ganho", isto , aqueles que, por si mesmos, alocavam os seuservios no mercado. E recebiam por isso, transferindo uma parte de seu ganho ao senhor,que nada fazia. Eram os carregadores, as quitandeiras e os vendedores ambulantes. Depoisde trabalhar, tinham de dar ao seu senhor uma parte de seus ganhos. Entre aqueles presospor "queixar-se" (certamente acusados de insolentes), temos um grande nmero demulheres lavadeiras.

    Incluindo africanos, ndios, brasileiros e imigrantes, juntar as experincias de trabalhadoreslivres e escravos o melhor caminho para contornar preconceitos. Podemos cham-las deinveno da liberdade, num mundo marcado pela escravido.

    GREVE NEGRA Com certeza, os motivos das queixas, protesto e negociao dos escravosiam alm do ambiente e da lida domsticos. Estudando revoltas e movimentos sociais emSalvador, Joo Reis revelou uma greve de carregadores em 1857. Em resposta a mudanaslegais que interferiram nas relaes entre senhor e escravo e na forma de organizao dotrabalho, o que estava em jogo era uma intensa disputa com o poder pblico: o controle dasprticas e costumes do trabalho urbano de escravos e libertos ao longo do sculo XIX pelaadministrao municipal. No por acaso, Joo Reis a chamou de "greve negra". Centenas de

    africanos "ao ganho" a maior parte africanos ocidentais: os "nags" paralisaram porduas semanas o porto e o setor de abastecimento e transporte. Lutavam no por salriosnem pelo fim de castigos. Opunham-se a uma legislao que visava controlar sua lida, comdispositivos que interferiam na organizao de seus espaos de trabalho os cantos. Osgrevistas se opunham determinao da Cmara Municipal que exigia o uso de chapas deidentificao individual. Estas, com certeza, foram vistas como mais uma estratgia de

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    controle sobre seus costumes, seus valores, suas vidas, seu trabalho. Foram duas semanasde tenses e expectativas, com os senhores inclusive divididos. Amplamente acompanhadapela imprensa, aparede foi marcada pelo recuo das autoridades (2).

    PROTAGONISTAS NA LUTA DE TRABALHADORES Se havia greves antes da chegada dosimigrantes, tambm no foram um fenmeno urbano apenas. Na verdade, no s houveparalisaes na rea rural como tambm podiam dar continuidade a lutas anteriores, queprosseguiam sob novas formas e em novas condies sem para isso depender damilitncia de imigrantes europeus. Em Pernambuco (em 1919), mesmo submetidos mais

    aguda explorao, os trabalhadores da zona aucareira sustentaram uma greve macia.Ainda que no existam referncias s suas identidades, eram descendentes de escravos elibertos, mestios e negros. Sobre essa corajosa iniciativa, o jornal Clart publicou a notcia"O trabalhador agrcola em Pernambuco". Nesta, afirmou que, embora detratado comoindolente e estpido, o trabalhador rural era "o primeiro fator das fortunas dos usineiros". Agreve mostrou a fora desses trabalhadores sofridos e humilhados. Trabalhavam em farrapotinham dvidas com o armazm dos engenhos, sua dieta alimentar era pobre e praticamenteno recebiam assistncia dos poderes pblicos. Queriam jornada de oito horas de trabalho,aumento salarial, reconhecimento sindical e fim de punies. Os usineiros fecharam suasassociaes mo armada (3).

    Fica claro assim que nem s de italianos viveram as primeiras lutas operrias do Brasil. Osnegros vieram, antes de mais nada, para trabalhar e podiam possuir ou adquirir ofcio. Eramvitais em seu local de trabalho, no campo ou na cidade. Sua rebeldia, igualmente, era cruciapara mobilizaes e protestos da classe trabalhadora. Alm das manifestaes culturais pelaquais so conhecidos (como a arte e a religiosidade), os trabalhadores negros e seusdescendentes protagonizaram experincias de greve que, felizmente, so cada vez maisreveladas pela pesquisa histrica.

    Antonio Luigi Negro historiador, professor associado do programa de ps-graduao emhistria da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

    Flvio dos Santos Gomes historiador, professor do Departamento de Histria daUniversidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    1. Hall, M. "Immigration and the early So Paulo working class". In:Jahrbuch fr geschichtevon staat, wirtschaft und gesellschaft Lateinamerikas, 12, 1975.

    2. Reis, J. "A greve negra de 1857 na Bahia". In: Revista USP, 18, 1993.

    3. Arquivo Edgard Leuenroth. "O trabalhador agrcola em Pernambuco". In: Clart, 1, 1921,p. 21-23. Esta matria encontra-se transcrita no livro de Michael Hall e Paulo Srgio Pinheiro

    A classe operria no Brasil. Vol. 2. So Paulo, Brasiliense, 1981.

    BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

    Castellucci, A. Industriais e operrios baianos numa conjuntura de crise (1914-1921).Salvador, Fieb, 2004.

    Gomes, F. dos S. Histrias de quilombolas. Mocambos e comunidades de senzalas no Rio deJaneiro, sculo XIX. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1995.

    Mattos, M. B. Escravizados e livres: experincias comuns na formao da classe trabalhadorcarioca. Rio de Janeiro, Bom Texto, 2008.

    Negro, A. L. Gomes, F. dos S. "Alm de senzalas e fbricas: uma histria social do trabalho"In: Tempo Social. Revista de Sociologia da USP, 18, 1, 2006.

    Negro, A. L. "Rodando a baiana e interrogando um princpio bsico do comunismo e dahistria social: o sentido marxista tradicional de classe operria". In: Revista Crtica Histric5, 2012.

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    Hall, M. "Entre a etnicidade e a classe em So Paulo". In: Carneiro, M. L. T. Croci, F. (Org.).Histria do trabalho e histrias da imigrao. Trabalhadores italianos e sindicatos no Brasil(sculos XIX e XX). So Paulo, Edusp, 2010.

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