40
“JORNAL EUROPEU DO ANO” www.mantovani.pt Integram esta edição semanal, além deste corpo principal, os seguintes cadernos: ECONO- MIA, REVISTA E e EMPREGO Fundador: Francisco Pinto Balsemão 10 de dezembro de 2016 2302 €3,20 Diretor: Pedro Santos Guerreiro Diretor-Executivo: Martim Silva Diretores-Adjuntos: Nicolau Santos, João Vieira Pereira e Miguel Cadete Diretor de Arte: Marco Grieco www.expresso.pt Expresso 24h FOTO MARCOS BORGA FOTO TIAGO MIRANDA Ban Ki-moon elogia Guterres Em declarações exclusivas ao Expresso, o ainda secre- tário-geral das Nações Uni- das, Ban Ki-moon, elogiou a “visão apaixonada” e a “liderança ativa” do seu su- cessor, considerando-o “uma escolha soberba”. O antigo primeiro-ministro português entra em funções a 1 de janei- ro de 2017. P29 Costa e Rajoy oferecem almoço O almoço do Conselho Euro- peu da próxima quinta-feira tem ementa ibérica, assinada por José Avillez e Pepe Solla. Foi esta a forma que Costa e Rajoy encontraram para fechar as comemorações dos 30 anos da adesão de Portu- gal e Espanha à UE. P15 Alojamento local abranda em 2016 E26 João Soares: “Geringonça vai durar mais que 4 anos” P20 Macedo já tem nomes para gerir a Caixa ÚLTIMA JAMIE OLIVER AS RECEITAS DE NATAL E O PERIGO DO AÇÚCAR R52 REPORTAGEM NUMA CUBA POUCO LIVRE P32 Frederico Lourenço: “Estou surpreendido, feliz e reconhecido” PRÉMIO PESSOA 2016 O homem que leva os clássicos ao grande público P3 MP quer demolir casa de férias de Ricardo Salgado Casa da Comporta do ex- dono do BES foi licenciada “ilegalmente” numa duna a menos de 500 metros da praia, acusa procurador Como é que uma casa de luxo, avaliada em mais de um milhão de euros em 2013, foi licenciada tão perto do mar, junto à praia do Pego? Esta é a pergunta fei- ta pelo Ministério Público, que acusa a Câmara de Grândola de ilegalidades administrativas e omissões e quer anular as licen- ças e alvarás passados pelo mu- nicípio e condená-lo a demolir 10 edificações. O despacho feito pelo procurador Orlando Ma- chado ainda aguarda julgamen- to no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja. Sobre a existência de ilegalidades no licenciamen- to, o autarca envolvido, António Figueiredo Mendes, responde: “Não me pronuncio”. A empresa dona das casas garante por seu lado que a ação instaurada será contestada. As casas em questão foram arrestadas em 2015 pelo Ministério Público, na sequência do colapso do império Espírito Santo, mas continuam a ser utili- zadas pela família de Salgado. P23 CGTP “apaga” papel de Carvalho da Silva Contribuição do líder sindical durante 25 anos é claramente desvalorizada no livro sobre a história da central R38 Rangel não exclui candidatura ao PSD Eurodeputado confirma que segue “com toda a atenção” o que se passa no PSD e pode voltar a disputar a liderança P14 Médicos sem culpa na morte no São José Peritos concluem que tudo foi feito para salvar jovem David Duarte. Família quer responsabilizar governantes P22 HOJE AS MELHORES RECEITAS DO ANO POR JOSÉ AVILLEZ LIVRO GRÁTIS Comissões irregulares de Alexandre Pinto da Costa no FCP Agente fez negócios com jogadores que violam lei desportiva. FCP não tem responsabilidade legal P4 FOOTBALL LEAKS POR DENTRO DO CURSO FATAL Durante três meses o Expresso acompanhou um grupo de homens que sonham ser comandos. Dos 67 que começaram o curso, dois morreram. E apenas 23 resistiram R26 © Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

  • Upload
    phungtu

  • View
    231

  • Download
    3

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

“JORNAL EUROPEU DO ANO”

www.mantovani.pt

47x47mm

Integram esta edição semanal, além deste corpo principal, os seguintes cadernos: ECONO-MIA, REVISTA E e EMPREGO

Fundador: Francisco Pinto Balsemão 10 de dezembro de 20162302 €3,20

Diretor: Pedro Santos Guerreiro

Diretor-Executivo: Martim SilvaDiretores-Adjuntos: Nicolau Santos,João Vieira Pereira e Miguel Cadete

Diretor de Arte: Marco Grieco

www.expresso.ptExpresso

24h

FOT

O M

AR

CO

S BO

RG

A

FOT

O T

IAG

O M

IRA

ND

A

Ban Ki-moon elogia GuterresEm declarações exclusivas ao Expresso, o ainda secre-tário-geral das Nações Uni-das, Ban Ki-moon, elogiou a “visão apaixonada” e a “liderança ativa” do seu su-cessor, considerando-o “uma escolha soberba”. O antigo primeiro-ministro português entra em funções a 1 de janei-ro de 2017. P29

Costa e Rajoy oferecem almoçoO almoço do Conselho Euro-peu da próxima quinta-feira tem ementa ibérica, assinada por José Avillez e Pepe Solla. Foi esta a forma que Costa e Rajoy encontraram para fechar as comemorações dos 30 anos da adesão de Portu-gal e Espanha à UE. P15

Alojamento local abranda em 2016 E26

João Soares: “Geringonça vai durar mais que 4 anos” P20

Macedo já tem nomes para gerir a Caixa ÚLTIMA

JAMIE OLIVER AS RECEITAS DE NATAL E O PERIGO DO AÇÚCAR R52

REPORTAGEM NUMA CUBA POUCO LIVRE P32

Frederico Lourenço: “Estou surpreendido, feliz e reconhecido”

PRÉMIO PESSOA 2016

O homem que leva os clássicos ao grande público P3

MP quer demolir casa de férias de Ricardo Salgado

Casa da Comporta do ex-dono do BES foi licenciada “ilegalmente” numa duna a menos de 500 metros da praia, acusa procurador

Como é que uma casa de luxo, avaliada em mais de um milhão de euros em 2013, foi licenciada tão perto do mar, junto à praia do Pego? Esta é a pergunta fei-ta pelo Ministério Público, que acusa a Câmara de Grândola de ilegalidades administrativas e omissões e quer anular as licen-ças e alvarás passados pelo mu-nicípio e condená-lo a demolir

10 edificações. O despacho feito pelo procurador Orlando Ma-chado ainda aguarda julgamen-to no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja. Sobre a existência de ilegalidades no licenciamen-to, o autarca envolvido, António Figueiredo Mendes, responde: “Não me pronuncio”. A empresa dona das casas garante por seu lado que a ação instaurada será contestada. As casas em questão foram arrestadas em 2015 pelo Ministério Público, na sequência do colapso do império Espírito Santo, mas continuam a ser utili-zadas pela família de Salgado. P23

CGTP “apaga” papel de Carvalho da Silva

Contribuição do líder sindical durante 25 anos é claramente desvalorizada no livro sobre a história da central R38

Rangel não exclui candidatura ao PSD

Eurodeputado confirma que segue “com toda a atenção” o que se passa no PSD e pode voltar a disputar a liderança P14

Médicos sem culpa na morte no São José

Peritos concluem que tudo foi feito para salvar jovem David Duarte. Família quer responsabilizar governantes P22

HOJEAS MELHORES RECEITAS DO ANO POR JOSÉ AVILLEZ

LIVRO GRÁTIS

Comissões irregulares de Alexandre Pinto da Costa no FCP

Agente fez negócios com jogadores que violam lei desportiva. FCP não tem responsabilidade legal P4

FO OTBALL LEAKS

POR DENTRO DO CURSO FATALDurante três meses o Expresso acompanhou um grupo de homens que sonham ser comandos. Dos 67 que começaram o curso, dois morreram. E apenas 23 resistiram R26

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 2: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201602 PRIMEIRO CADERNO

Ricardo [email protected]

Descodificador por Pedro Cordeiro

Destituição na Coreia do SulO Parlamento sul-coreano aprovou ontem, por 234 votos em 300, a destituição de Park Geun-hye. A Presidente é acusada de extorsão, abuso de poder e suborno

1 Porque foi destituída Park Geun-hye?

A líder conservadora, no poder desde 2013, é acusada de ter deixado a sua amiga e confidente Choi Soon-sil interferir na governação e enriquecer de forma ilegítima. Choi, que aconselhava a Presidente tanto na nomeação de cargos públicos como no guarda-roupa, é filha do falecido líder da Igreja da Vida Eterna (seita xamanística), que foi guia espiritual de Park. Terá usado essa proximidade para extorquir dezenas de milhões de euros a empresas sul-coreanas. Os empresários que lhe pagaram afirmam que as instruções vinham do gabinete da chefe de Estado. O escândalo rebentou em outubro e levou multidões às ruas para exigir o afastamento da governante. Houve membros do partido da Presidente a votar a favor da destituição.

2 O que acontece a seguir?

Park fica suspensa enquanto o Tribunal Constitucional decide, num prazo de seis meses, se confirma a decisão parlamentar (é preciso o voto de seis dos seus nove juízes). O primeiro-ministro, Hwang Hyo-ahn, substitui-a interinamente. A chefe de Estado deve contestar a destituição: disse aos seus ministros que se iria preparar “calmamente” para o julgamento e, embora reconhecendo “falta de discrição e descuido”, não deu sinais de pretender demitir-se. “Espero que esta confusão tenha um desenlace satisfatório”, afirmou. Se o Constitucional confirmar a demissão, haverá eleições passados 60 dias. Nesse cenário, há quem preveja a vitória de um adversário mais à esquerda, que defenda uma aproximação à China e se mostre mais conciliador com a Coreia do Norte.

3 Como tem sido o mandato da Presidente?

Park, de 64 anos, está no poder desde 2013. Filha do ditador militar Park Chung-hee (que tomou o poder num golpe militar em 1963 e governou até ao seu assassínio, em 1979), foi a primeira mulher chefe de Estado do país e prometia ser uma versão contemporânea e democrática do pai, visto como um modernizador da Coreia do Sul. Park, que não tem marido nem filhos, prometeu dedicar-se inteiramente ao país. Dura em relação à Coreia do Norte, cultivou boas relações com Washington, com quem acordou a instalação de um sistema de mísseis de defesa que irritou a China. A nível interno, foi dura com adversários e chegou a dissolver um partido da oposição. Não resolveu problemas como a desigualdade, o desemprego e a corrupção.

4 Que consequências terá este caso?

O escândalo pôs a nu o segredo de Polichinelo das ligações obscuras entre governantes e os chaebol (grandes grupos empresariais). A crise política pode prejudicar a economia, que não está brilhante. O eleitorado sente-se desconfiado, já que todos os chefes de Estado do período democrático (desde 1987) foram acusados de burlas. Na primeira linha para suceder a Park estão o primeiro-ministro Hwang, o opositor liberal Moon Jae-in (preso político durante a ditadura do pai Park), o secretário-geral cessante da ONU, Ban Ki-moon, os autarcas de Seongnam, Lee Jae-myung (que se diz o Bernie Sanders sul-coreano e twitta tanto como Donald Trump) e de Seul, Park Won-soon, e o médico e milionário Ahn Cheol-soo, chefe de um partido reformista.

O Cartoon de António Buraco após Buraco...

ALTOSPaulo MacedoPresidente indigitado da CGD

Com a trapalhada na Caixa Ge-ral de Depósitos ao rubro e após a demissão em peso da equipa de António Domingues, o primeiro--ministro, António Costa, tinha de conseguir um trunfo forte para vi-rar a mesa. E com a escolha, ainda por cima rápida, de Paulo Macedo, conseguiu não só esvaziar a polé-mica, como deixar a oposição sem boa parte dos argumentos de ata-que ao Executivo.

Jerónimo de Sousa Secretário-geral do PCP

Já lidera os comunistas portu-gueses há 12 anos (o mesmo tem-po que Carvalhas) e foi eleito pa-ra outros quatro num congresso em que o PCP conseguiu resol-ver de forma hábil a quadratura do círculo que representa apoi-ar um Governo socialista (algo que nunca tinha feito) dizendo ao mesmo tempo que não apoia governo algum e não faz parte da solução de poder.

E BAIXOSMarcelo Rebelo de SousaPresidente da República

Os primeiros meses de manda-to de Marcelo em Belém têm sido claramente populares e com su-cessos assinaláveis. Mas os riscos de termos um Presidente que fa-la sobre tudo e a todo o tempo co-meçam agora a sentir-se com mais força. Como foi o caso dos salári-os da Caixa, matéria em que entra claramente em competências exe-cutivas, ou no bate-boca com o lí-der do PSD, inteiramente escusa-do para um Chefe de Estado.

Fernando MedinaPresidente da Câmara Municipal de Lisboa

Com a falta de um candidato forte por parte do PSD e a avalanche de obras que tem em curso, Medina prepara-se para conseguir em 2017 a eleição (apesar de ser presidente da Câmara nunca foi eleito). Mas isso não apaga factos negativos, co-mo o desta semana, por exemplo, em que se soube que várias obras que derraparam no tempo viram o seu prazo de conclusão revisto de forma discreta. Para que ninguém pudesse dizer que os prazos não se-riam cumpridos.

Jorge MendesEmpresário de futebol

As revelações do Football Leaks, que o Expresso e um conjunto de jornais internacionais têm feito na última semana, mostram um comportamento altamente discu-tível por futebolistas milionários que são ídolos de milhões e repre-sentam (ou deviam representar) um modelo para muitos jovens. Mas mostram também como o funcionamento do homem que é um dos maiores agentes de jo-gadores e treinadores do planeta deixa muito a desejar.

Martim [email protected]

RICARDO COSTA ESCREVE NO EXPRESSO DIÁRIO ÀS TERÇAS E QUINTAS-FEIRAS

Os testes do PISA destroem quase todas as ideias feitas sobre Educação em Portugal

Lurdes Rodrigues não tinham qual-quer sentido. É natural que o atual ministro tenha os mesmos objetivos dos antecessores. Mas a forma rápida como desmantelou exames e criou provas de aferição fora do fim dos ciclos é de um risco imenso para os resultados que fomos conseguindo.

Fui contra a reintrodução dos exa-mes de 4º ano, decididos por Nuno Crato, por não seguirem nenhum exemplo internacional, apesar de uma cultura precoce de avaliação poder ter efeitos positivos a longo prazo. O que não consigo perceber é como é que a atual implosão do sistema de avaliação pode beneficiar a Educação, a não ser numa diminuição das retenções, que é desejável se não for artificial.

A oposição preocupa-se com Mário Nogueira, eu dou mais atenção aos testes do PISA. Destroem ideias feitas, têm resultados e deixam alertas. Pen-so que estamos a correr riscos desne-cessários com este experimentalismo. Espero que os próximos teste do PISA destruam a minha ideia feita.

verizadas pela aferição internacional.Uma das raras vantagens de se es-

crever em jornais durante vários anos é a de se poder analisar assuntos ao longo do tempo. E a passagem do tem-po, com os novos dados agora divul-gados (explicados na pág. 24), mostra que o nosso progresso nos resultados educativos continuou, sendo Portugal um exemplo na OCDE. Para quem acompanha estes temas do lado da política, e para todos os que seguem os assuntos da Educação — como fazem milhares de professores, pais, educan-dos e familiares —, a constância da me-lhoria dos resultados é surpreendente.

Como é que políticas aparentemente contraditórias podem ter resultados tão bons e transformar Portugal num exemplo na área da Educação? A ex-plicação não será simples nem única, mas parece óbvio que debaixo do dis-curso político e de uma agressividade tonta há constantes que perduram. Entre a calma de David Justino, um discurso mais afirmativo de Maria de Lurdes Rodrigues e uma certa radi-calidade de Nuno Crato a Educação melhorou sempre.

Quem acha que Crato quis destruir a escola pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de

do num interessante combate contra o ‘eduquês’ — entre os quais Crato ou os meus amigos Medina Carreira ou Guilherme Valente —, o alegado facilitismo do nosso ensino tinha pro-vocado uma constante melhoria nos resultados, com especial incidência na matemática. Ou seja, as ideias de que ninguém aprendia nada e de que “an-tigamente é que era bom” foram pul-

Há exatamente três anos, escre-vi nestas páginas uma crónica que se intitulava “Quando a realidade atropelou Nuno

Crato”. O texto surgiu na sequência da divulgação dos testes do PISA (que aferem a evolução da qualidade da nossa Educação) e criticava Nuno Crato. Não em relação às políticas que o então ministro desenhou mas às ideias que as suportavam e que foram contrariadas por esses resulta-dos, sobretudo na matemática.

Goste-se ou não do modelo, os tes-tes do PISA são a referência mundial neste campo e em 2012 revelaram um dado indesmentível. Contra a ideia de muitos dos que se tinham empenha-

A realidade atropela os ministros da Educação (II)

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 3: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 PRIMEIRO CADERNO 03

Pedro Santos [email protected]

PEDRO SANTOS GUERREIRO ESCREVE NO EXPRESSO DIÁRIO ÀS SEGUNDAS E QUARTAS-FEIRAS

Quem quer sangue quer vingança. Quem quer sanção quer justiça. Mas quem quer tratamento igual pede pouco para o muito

que é sermos uma sociedade melhor. As autoridades judiciais decidirão com a espada numa mão e a balança na outra.

A ética não é o que sobra quando falha a lei porque não lhe sucede, precede-a. Ela própria forma atitudes sociais e como aceitamos que a lei seja cumprida ou não. Se um gestor de empresa falida não entregar o IVA ao Estado para pagar os salários desse mês, estará a violar a lei — mas está a ter comportamento ético errado? A sua decisão não pode ser comparada com uma evasão fiscal para aumentar lucros.

Os casos de futebol que o Expresso tem revelado em parceria internacional também não têm comparação com, por exemplo, casos de corrupção. São investigações jornalísticas já com consequências nas investigações fiscais em Espanha sobre rendimentos não declarados. Não é fácil pôr em causa ídolos de todos nós. Mas toda esta investigação mostra sobretudo o papel obscuro que alguns agentes e empresários têm no mundo do futebol. E mostra que há autoridades fiscais para as quais o respeito é bom mas também que não enfileiram no respeitinho medroso do silêncio, essa discreta expressão de cobardia.

Lei é definir “não se pode roubar”, moral é defender “não roubarás”, ética é questionar “porque não roubarei?”. Desde Aristóteles que se sabe que não se nasce com ética, ela é aprendida pela educação ou ensinada pela coerção — e que os exemplos são determinantes. A ética é o compromisso connosco próprios e com os comportamentos de outros na sociedade, que se revela nas decisões que cada um toma independentemente da lei: farei o quê mesmo se souber que ninguém me verá a fazê-lo? Isto é: se não for apanhado, sou diferente?

Exigirmos que os nossos ídolos, desportivos ou não, tenham comportamentos exemplares nas suas vidas e nos impostos que pagam não é desejarmos o seu mal individual mas o nosso bem coletivo. Admiração de corações abertos não é idolatria de olhos fechados. Coerção sobre quem falha é coação sobre quem não quererá falhar. E o comportamento dos que são amados é uma candeia e uma cadeia para o comportamento do que os amam.

Os desportistas serão condenados ou absolvidos nas suas falhas, mas serão investigados. Eles estão acima das maravilhas dos deuses, mas não estão acima das leis dos homens e não devem estar abaixo da ética de alguns dos agentes, empresários e advogados que os representam. Como escreveu Étienne de La Boétie há quase quase 500 anos, pessoas assim não são amigas, são cúmplices. O esforço e trabalho extraordinário de uns nos campos de futebol não justifica o aproveitamento ordinário de outros.

Os cúmplices pela calada

Frederico Lourenço A Bíblia, traduzida do grego, é a mais recente obra dada à língua portuguesa

O erudito que leva as obras clássicas ao grande público

Paulo Paixão

De um lado, o trabalho árduo, disciplinado, longe das luzes da ri-balta, que é a rotina diária do académico quando lança mãos à obra. Em trabalhos que não se realizam nem se consomem

no tempo instantâneo da comunica-ção global e que por vezes demoram largos anos. Professor associado com agregação da Universidade de Coim-bra, Frederico Lourenço é especialista em Estudos Clássicos, tendo dedica-do muito da sua vida a aprofundar o conhecimento da civilização grega e a divulgar esse acervo. Depois de ter traduzido a “Ilíada” e a “Odisseia”, as obras fundamentais de Homero, Lou-renço tem agora em mãos a empreitada da passagem, na íntegra, da Bíblia para a língua portuguesa, pela primeira vez, a partir das fontes gregas. O primeiro volume saiu em setembro deste ano; a tarefa tem fim anunciado para 2020.

Do outro lado, está a capacidade de tornar esse trabalho legível e atrativo para o grande público, sem cedências. O que nem sempre é fácil ou sequer possível no mundo científico, é normal para Frederico Lourenço, 53 anos, a quem foi ontem atribuído o Prémio Pessoa 2016. Trata-se do mais antigo e prestigiado galardão que distingue anualmente uma personalidade da vida cultural e científica, agora che-gado à 30ª edição. O prémio, uma ini-ciativa do Expresso com o patrocínio da Caixa Geral de Depósitos, tem um valor de €60 mil.

Num primeiro comentário ao Ex-presso, na manhã de ontem, Lourenço afirmou-se “surpreendido, feliz e reco-nhecido” pelo prémio. Confessa que se aventurou na tradução da Bíblia por já ter “ganho experiência e quilome-tragem com outras obras” (“Ilíada” e “Odisseia”), “trabalhos longos e que exigem muita disciplina”. Nos “dias bons”, são 12 horas sentado à secretá-ria. O regime só é aligeirado quando vai dar aulas à faculdade.

O académico sabia bem os riscos da empreitada da Bíblia. “A minha tradu-ção é feita de uma perspetiva históri-co-objetiva, não teológica. É a de um professor universitário, que não é padre nem teólogo, e por isso não tem uma dama a defender”, diz ao Expresso. De “leitores normais”, por assim dizer, mas “também de padres que falam a título pessoal”, Frederico Lourenço relata “receber diariamente incentivos (por e-mail ou no Facebook, por exemplo). As pessoas estão curiosas”.

Já entre o universo de especialistas, laicos ou não, a opinião deixa de ser consensual. O tradutor tem as ideias bem arrumadas: “No final do projeto leio as recensões, não me quero descon-centrar”, afirma Lourenço, com ironia.

Da germanística à história da dança

Francisco Pinto Balsemão, o presi-dente do júri, disse ontem em Seteais (Sintra), que “o traço mais singular“ da atividade de Lourenço “reside no modo como, ao longo de quase duas décadas, tem vindo a oferecer à língua portuguesa as grandes obras da litera-tura clássica. Através de um trabalho metódico, revelador de uma ambição servida por rara erudição”.

Erudito, pois, mas muito longe de estar fechado numa torre de marfim. Frederico Lourenço é uma espécie de homem de sete instrumentos. Balse-mão fez um elenco dessa “variedade de interesses e realizações” do Prémio Pes-

soa 2016, que “incluem, além da centra-lidade dos estudos clássicos, a música, o romance, a poesia, o teatro, o ensaio, os estudos bizantinos, a germanística e a história da dança”. Poderia acrescen-tar-se que Lourenço é também ensaísta e cronista; e, na música, é um pianista e cravista que estudou no Conservatório antes de ingressar na Faculdade de Letras de Lisboa.

Para Lourenço, a tradução de obras

Como salientou António Barreto, ou-tro dos membros do júri, “Frederico Lourenço é responsável por um fenó-meno raro: a ‘Odisseia’ e a ‘Ilíada’ fo-ram best-sellers”. E o primeiro volume da Bíblia, lançado a 22 de setembro, “esteve no top de vendas durante al-gumas semanas”, lembrou o sociólo-go. O segundo volume da Bíblia será lançado em março de 2017. O terceiro, que Lourenço está a finalizar por estes dias, irá para as livrarias em outubro do próximo ano.

Tributo a Miguel Veiga e João Lobo Antunes

No ano em que atinge a 30ª edição, o júri do Prémio Pessoa prestou “públi-ca homenagem a dois dos seus mem-bros, recentemente falecidos, Miguel Veiga e João Lobo Antunes” (este úl-timo vencedor do Pessoa, em 1996).

Balsemão falou do “sulco duradouro que ambos deixaram na sociedade por-tuguesa contemporânea”, para depois fazer uma evocação do advogado e do neurocirurgião, na qual perpassam episódios vividos nas reuniões do júri, realizadas desde sempre no Palácio de Seteais, em Sintra: “Não queremos deixar de assinalar o sentimento de perda e a saudade que as ausências da sua inteligência, humor e brilho em to-dos nós profundamente provocaram”.

[email protected]

Para Lourenço, a sua tradução não é a de um teólogo: “Não tenho uma dama a defender” FOTO MARCOS BORGA

PRÉMIO PESSOA

como a “Ilíada” ou a “Odisseia” está muito longe de ser um fim em si mes-mo. O helenista quer que elas sejam lidas e para isso sabe o que tem de fazer: “O desejo de disseminar a gran-de cultura clássica junto do público manifestou-se também na adaptação para jovens” das duas referidas obras de Homero, lembrou Balsemão.

O resultado de todo esse trabalho para os leitores é a retribuição destes.

Júri do Prémio Pessoa, ontem, em Seteais, pouco antes de ser revelado o vencedor da edição deste ano: Viriato Soromenho-Marques, Pedro Norton, António Barreto, Maria Manuel Mota, António Domingues (vice-presidente), Francisco Balsemão (presidente), Rui Magalhães Baião, Maria de Sousa, José Luís Porfírio e Diogo Lucena FOTO ALBERTO FRIAS

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 4: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201604 PRIMEIRO CADERNO

FO OTBALL LEAKS

ALEXANDRE PINTO DA COSTA: NEGÓCIOS COM O PORTO, COMISSÕES À MARGEM DA LEI

Texto Miguel Prado, Pedro Candeias

e EIC*

E quase Natal. Estamos no dia 23 de dezem-bro de 2014, uma ter-ça-feira. No Porto, a empresa Investiantas vende 2.090 ações do Futebol Clube do Porto (FCP) à Energy Soccer. É um peque-

níssimo negócio, de apenas 1.254 euros. Fica quase em família: a In-vestiantas é liderada pelo presidente do FCP, Jorge Nuno Pinto da Costa; a Energy Soccer é detida pelo seu filho, Alexandre, aí representado pelo seu sócio e amigo Pedro Pinho.

Nada de anormal num negócio entre pai e filho. Acontece, todavia, que a Energy Soccer é uma agência de representação de futebolistas e intermediação de transferências. E uma grande fatia da sua faturação

já vem de negócios com jogadores do FCP. A verdade é que Alexandre Pinto da Costa não esconde o orgulho de ser acionista da SAD (sociedade anónima desportiva) do Porto. A 1 de Abril de 2016 deu uma entrevista ao “Jornal de Notícias” assegurando ter influência zero nos dragões. As-sume-se azul e branco da cabeça aos pés: sócio do FCP desde que nasceu, acionista desde que a SAD foi criada e fundador da primeira claque do clube. “Tenho muita honra e prazer em ser filho do maior presidente da história do futebol mundial”, afirmou Alexandre nessa entrevista.

O facto de a Energy Soccer ter com-prado ações do FCP num contrato firmado com o presidente do clube é apenas um detalhe. Mas mostra a proximidade de Alexandre à insti-tuição. No passado mês de outubro, o antigo vice-presidente do FCP An-gelino Ferreira criticou essa rela-ção. “Mesmo que não haja conflitos de interesse legais, há questões de transparência”, disse em entrevista ao Expresso.

Muita informação sobre os negó-cios de Alexandre Pinto da Costa com o Porto já veio a público na pri-meira vaga de publicações do Foo-tball Leaks, quando um site de ori-gem desconhecida divulgou, entre setembro de 2015 e abril de 2016, diversos contratos da milionária in-

dústria do futebol. Soube-se então das comissões que o FCP pagou à empresa do filho do presidente.

A investigação Football Leaks, ago-ra a cargo da rede EIC – European Investigative Collaborations, a partir dos documentos a que a revista “Der Spiegel” teve acesso, mostra que não só a Energy Soccer fez negócios com o FCP, como também violou a lei nacional no que se refere aos empresários desportivos. “A pessoa que exerça a atividade de empresário desportivo só pode agir em nome e por conta de uma das partes da rela-ção contratual”, estipula a Lei 28/98, sobre o regime jurídico aplicável aos intermediários e aos contratos de tra-balho dos desportistas. Uma disposi-ção que está plasmada também nas regras da Federação Portuguesa de Futebol para a atividade dos interme-diários. Em pelo menos dois negócios a Energy Soccer jogou dos dois lados do tabuleiro, faturando ao clube de origem e à equipa de destino.

Os dois episódios aconteceram em 2013. Na transferência do futebolista Carlos Eduardo do Estoril Praia para o FCP a Energy Soccer recebeu, em junho desse ano, €100 mil do Porto pela intermediação. Mas uma outra fatura, que consta dos documentos a que o Expresso teve acesso a partir da investigação da rede EIC, mostra que em outubro de 2013 a Energy

Soccer também recebeu €68.400 do Estoril Praia como comissão pela mesma transferência. Em 16 de agos-to de 2013 um caso semelhante: a Energy Soccer fatura €60 mil (mais IVA) ao FCP como comissão pelo empréstimo de Rolando ao Inter de Milão. No mesmo dia a Energy Soc-cer emite uma fatura de €75 mil ao Inter… pela intermediação no em-préstimo de Rolando.

A Energy Soccer foi criada em ju-lho de 2012. Um dos seus primeiros negócios veio três meses depois. Em setembro de 2012 a empresa ganhou com a transferência de Álvaro Perei-ra do FCP para o Inter. Só que o paga-mento à empresa de Alexandre Pinto da Costa não foi feito diretamente pelo clube liderado pelo seu pai, mas sim pela IG Teams & Players, que entregou à Energy Soccer €25 mil.

Em 2014 a Energy Soccer também fez um negócio com a DNN, uma em-presa de intermediação desportiva que entregou à firma de Alexandre Pinto da Costa metade dos €500 mil que a DNN tinha recebido do FCP como comissão pelo contrato de Ri-cardo Quaresma. Questionado pelo Expresso sobre o porquê desta repar-tição do ganho, o presidente da DNN, Pedro Serpa Pinto, não quis explicar. “Confirmo que a companhia Energy Soccer faz parte da nossa relação de parceiros comerciais mas não me

parece adequado comentar relações comerciais concretas com este ou qualquer outro nosso parceiro de negócios”, respondeu o empresário. Mais tarde, quando o Porto trans-feriu Quaresma para o Besiktas, a Energy Soccer voltou a ganhar €156 mil, mas desta vez pagos diretamente pelos dragões.

E depois há o negócio de Casemiro. De uma penada, a Energy Soccer fa-tura €700 mil pela transferência do jogador do FCP para o Real Madrid. Na verdade Casemiro era jogador do Real, mas estava emprestado ao Porto. Mas os dois clubes tinham acordado uma opção de compra pelo FCP e outra cláusula que o Real po-dia exercer para suspender essa op-ção do Porto. Em junho de 2015 o Real ativa essa cláusula, pagando aos dragões €7,5 milhões para ter o seu Casemiro de volta. Mas os €700 mil que Alexandre Pinto da Costa faturou nesse confuso negócio não foram pagos pelo FCP, antes pela Vela Management, uma empresa com sede em Malta, liderada por Nélio Lucas, o presidente do fundo Doyen Sports.

Em março deste ano, quando os termos dessa comissão foram reve-lados na Internet, o presidente da Doyen veio afirmar que o FCP tem saído a ganhar. “Orgulhamo-nos da cooperação com a Energy Soccer e

Agentes Começou a carreira de agente desportivo nos anos 90 com José Veiga, hoje acusado de corrupção. Mas se Veiga caiu, o filho do presidente do FCP é hoje influente. Nem sempre os negócios da sua Energy Soccer cumprem as regras

INTERMEDIÁRIOS

“A MINHA INFLUÊNCIA NO FC PORTO É ZERO”Alexandre Pinto da CostaAdministrador da Energy Soccer, em entrevista ao “Jornal de Notícias”, 1 de abril de 2016

ENERGY SOCCER TEVE EM 2015 O SEU MELHOR ANOINTERMEDIAÇÃO A Energy Soccer, controlada por Alexandre Pinto da Costa e pelo seu sócio Pedro Pinho, teve em 2015 uma faturação recorde de €1,2 milhões. Desde a sua criação, em 2012, a agência acumulou receitas de €2,6 milhões e lucros acima de €300 mil. Nestes números não estão incluídos os €250 mil que Alexandre faturou em 2015 através de outra empresa sua, a Serials-port, que tem a mesma morada da Energy Soccer.

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 5: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 05 PRIMEIRO CADERNO

AS COMISSÕES COM JOGADORES DO FCP

CASEMIRO €700.000

RICARDO QUARESMA €406.000

ROLANDO €235.000

CARLOS EDUARDO €168.400

CHRISTIAN ATSU €150.000

FEDERICO VARELA €70.000

ÁLVARO PEREIRA €25.000

Alexandre Pinto da Costa, nossos parceiros em Portugal. Juntos con-tribuímos para alguns dos melhores negócios do FCP. O FCP teve sempre lucros com os negócios por nós in-termediados”, declarou então Nélio Lucas em comunicado.

A parceria entre Alexandre e Nélio já tinha começado antes. Em 2014 a Energy Soccer faturou €140 mil à Vela Management por serviços de prospeção de talentos. E em 2015 faturou outros €140 mil com um con-trato idêntico. Somemos os €700 mil do negócio com Casemiro e em dois anos a ligação entre Alexandre Pinto da Costa e a Doyen rendeu ao filho do presidente do Porto receitas de quase €1 milhão.

Mas se a Doyen já era um dos mais ativos intermediários e investidores no futebol europeu, porque precisava de entregar €700 mil à Energy Soc-cer na transferência de Casemiro? “A atividade e as decisões da Doyen e da Vela são confidenciais”, respondeu a empresa ao Expresso. Questionada sobre se este pagamento foi sujeito a IVA em Portugal (onde está a Energy Soccer) ou em Malta (sede da Vela), a Doyen respondeu que “ambas as em-presas cumprem com as respetivas obrigações fiscais”.

Já o FCP recusou responder quan-do questionado sobre um possível conflito de interesse nos negócios

com a empresa do filho do presidente do clube.

Dados recolhidos pelo Expresso mostram que desde a sua criação e até 2015 a Energy Soccer tem recei-tas totais de €2,6 milhões, tendo ge-rado um lucro acumulado superior a €300 mil. O ano passado foi recorde, com mais de €1,2 milhões em receitas na empresa de Alexandre.

Alexandre, formado em Gestão Empresarial, é também o admi-nistrador da empresa Serialsport, criada em 2006. Classificada como consultora, a Serialsport obteve em 2015 receitas de exatamente €250 mil (que geraram um lucro de €203 mil). A empresa funciona nas mes-mas instalações da Energy Soccer, na Rua António Nicolau de Almeida, no Porto. O Expresso enviou várias per-guntas tanto à Energy Soccer como a Alexandre Pinto da Costa, mas não obteve respostas.

A vida profissional de Alexandre Pinto da Costa é futebol. Mas a sua carreira não começou com a Energy Soccer, em 2012. Longe vão os anos 90, quando Alexandre se lançou na Superfute, com José Veiga, que foi de-tido em fevereiro no âmbito de uma investigação sobre crimes de corrup-ção e branqueamento de capitais.

*European Investigative Collaborations

[email protected]

Quem é Alexandre Pinto da Costa, o filho do mítico presidente do FC Porto que tem cada vez mais influência no clube?

“QUINHENTINHOS”, O MAL- -AMADO DELFIM DO DRAGÃO

A família portista nunca lhe perdoou a traição ao pai e mui-to menos ao clube, no que viu como uma conspiração contra o FC Porto a favor do arquirri-val encarnado: Alexandre Pin-to da Costa desonrara o nome do pai e a venerada insígnia do ‘dragão’ durante mais de uma década. O pecado do fi-lho primogénito do poderoso presidente do FC Porto foi ter--se aliado ao empresário José Veiga, por causa da partilha de comissões de jogadores.

Alexandre Pinto da Costa tinha 27 anos (hoje tem 49) quando, em 1994, fundou com José Veiga a agência Su-perfute. Ambos eram adep-tos do FCP. Veiga, que abriu o primeiro núcleo do clube no Luxemburgo, fez gran-des negócios com o Benfica, Sporting e clubes italianos. Chegou a ter na sua carteira de representações 24 joga-dores do Benfica e ligações fortes ao atual presidente dos ‘encarnados’, Luís Fili-pe Vieira. Em fevereiro deste ano, foi detido em Portugal por indícios de corrupção e branqueamento de capitais em negócios com uma em-presa do Congo.

O sócio 2658 do FC Porto já não trabalha com Veiga, mas foi quando trabalhou com ele que Alexandre arrefeceu a sua relação com o pai: quando o presidente do FCP mandatou o agente Luciano D’Onofrio e não José Veiga para interme-diar a transferência de Sérgio Conceição. O ato foi uma res-posta de Jorge Nuno Pinto da Costa à proximidade de Veiga ao Benfica.

Pai e filho reaproximaram-se em 2011, quando Alexandre Pinto da Costa descobriu que tinha um cancro num pulmão. Alexandre passou por uma cirurgia bem-sucedida e no ano seguinte lançou a Energy Soccer com Pedro Pinho, um amigo dos tempos em que es-tudavam juntos no Colégio Lu-so-Francês. Daí para a frente, os negócios de Alexandre com o FCP assentam em três veto-res: a associação com Pedro Pinho e Nélio Lucas; a relação com o pai e o que isso implica na gestão profissional das en-tidades que representam; e a rejeição das ideias de Antero Henrique, que se demitiu em setembro depois de 26 anos dedicados aos ‘dragões’, sa-ída para a qual contribuiu o desconforto com a influência crescente do filho do presiden-te. Os dois detestam-se.

Mais tolerado do que ama-do, Alexandre dividiu de vez há quatro anos a administra-ção da SAD do FC Porto ao voltar aos braços paternos, colocando os talheres à mesa das transferências do futebol. Já tinha andado pelo FCP na vitoriosa década de 90, sem mossa na direção que o fez diretor do clube aos 23 anos. Nem veio mal ao mundo quan-do debutou como agente nos anos do ‘penta’. Pelo meio, teve uma empresa que colo-cou cadeiras de plástico nas bancadas das Antas, foi sócio maioritário da Rádio Placard e, antes de exibir os galões de agente FIFA em 1996, fez uma curta incursão na política au-tárquica. Foi vereador sem pelouro no segundo manda-to de Fernando Gomes, hoje responsável pela pasta finan-ceira da SAD do FC Porto. Dessa época, ficou a censura do Tribunal Constitucional à Câmara Municipal do Porto, que comprou 20 mil contos de ações da SAD do FC Porto sem autorização prévia da As-sembleia Municipal.

A revolta da corte

Antero Henrique, fiel escudei-ro de Pinto da Costa, perdeu o braço de ferro com o recon-vertido Alexandre na escolha entre Marco Silva e Nuno Es-pírito Santo. Alexandre não tem cargo no clube, mas tem cada vez mais influência nos negócios; não participa em reuniões da SAD, mas foi a sua fação que levou a melhor na batalha pela venda dos di-reitos televisivos do clube para os próximos dez anos à MEO, enquanto Antero negociava com a NOS.

A questão de um confli-to moral é recorrente: deve o filho fazer negócios com a sociedade liderada pelo pai? Hoje, Alexandre tem opiniões fortes que não esconde, o que lhe vale a fama de autoritário.

Tal como o pai, interno no jesuíta Colégio das Caldinhas, em Santo Tirso, Alexandre es-tudou num colégio de inspira-ção religiosa: o Luso-Francês, instituição das Franciscanas Missionárias de Nossa Se-nhora. Foi um aluno media-no, não fez ensino superior, tal como o progenitor, para desgosto da mãe, Manuela Carmona Graça, licenciada em História em Coimbra, de quem o pai se divorciou em 1985 para viver com Filomena Morais, sua secretária.

Dois anos depois nascia a sua única irmã, Joana. Uma colega de escola conta que nunca foram próximos, “até porque Alexandre sempre re-jeitou Filomena”, a mulher

A proximidade a Veiga foi a causa para o seu afastamento há 18 anos

que Pinto da Costa desposou duas vezes — uma em 1998, outra em 2008, após a rotura com a polémica companheira Carolina Salgado. Das mulhe-res do pai, Alexandre apenas privou com a jovem Fernanda Miranda, tendo assistido ao casamento no Brasil, ao lado da mulher, a venezuelana Ma-riestela, mãe dos seus filhos Nuno, de 20 anos, e Maria, de 14. Pouco depois, separou-se.

A 1 de abril, ao “JN”, não re-negou a hipótese de suceder ao pai no cadeirão presiden-cial, mas Pinto da Costa garan-tiu em entrevista ao Porto Ca-nal que nunca indicará quem gostaria de ter como sucessor, afirmando que “só não gosta-ria de ver no seu lugar os filhos ou a mulher”.

20 anos de polémica

No primeiro round como em-presário, nos anos 90, Alexan-dre envolveu-se, entre outras, na operação da venda de Do-riva, que rendeu aos cofres portistas 8 milhões de dóla-res e a ele uma comissão de 5%, qualquer coisa como 70 mil contos na altura. Já então

se discutia se a transferência para a Sampdoria fora feita a solo ou em parceria com José Veiga, à semelhança do que sucedeu nas transferências de Domingos para o Tenerife e de Edmilson para o PSG. Ao Expresso, em março de 1999, um e outro negaram a existên-cia de um pacto secreto entre os dois. “Autêntico dispara-te”, disse Alexandre. Pouco depois, um e outro fizeram-se sócios da Superfute.

Volvidos 18 anos, a polémica reacende-se, atiçada pela seca de três anos de títulos e pela anunciada eventual guerra de sucessão. A aquisição foi Im-bula, que custou 20 milhões de euros ao FC Porto, negócio feito em parceria com a Doyen Sports de Nélio Lucas, CEO da empresa com sede em Malta. Nos meandros da bola, Alexan-dre é alcunhado de “Quinhen-tinhos”, por amiúde pagar con-tas com notas de 500 euros. Um amigo dos tempos do Co-légio Luso-Francês gaba-lhe “a boa memória, as respostas prontas e afiadas e a audácia em momentos difíceis”. Talvez seja herança genética do pai.Isabel Paulo com M.P. e P.S.G.

[email protected]

3Pelo menos três vezes a Energy Soccer faturou com Rolando: em fevereiro de 2013 cobrou €100 mil (mais IVA) ao FC Porto pelo empréstimo do jogador ao Nápoles; em agosto de 2013, um novo empréstimo ao Inter de Milão rende mais €60 mil pagos pelo FC Porto e €75 mil faturados ao Inter

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 6: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201606 PRIMEIRO CADERNO

As regras da FIFA para os menores

Como princípio, a FIFA não permite a transferência internacional de jogadores menores de 18 anos. Mas… há três exceções que na prática tornam esse princípio quase irrelevante. Primeiro, a transferência pode ser feita se os pais do jogador viajarem para o país onde o menor vai atuar por outros motivos para lá do futebol. Ou seja: a família do menor deverá ter a sua forma de subsistência no país de destino. Em segundo lugar, a transferência internacional de menores é aceite se ocorrer dentro da União Europeia, desde que o jogador tenha mais de 16 anos e o novo clube assegure tanto a formação desportiva como a escolar, para que o jovem possa seguir outra carreira caso desista do futebol profissional. A terceira exceção: a transferência internacional de menores é permitida se o jogador viver a menos de 50 quilómetros da fronteira e o clube de destino ficar também a menos de 50 quilómetros do seu país. Para os clubes que têm academias, a FIFA estipula a obrigação de reporte regular à federação nacional de todos os menores que por lá passam. M.P.

FO OTBALL LEAKS INTERMEDIÁRIOS

COMO OS AGENTES LUCRAM COM MENORES

Textos Pedro Candeias, Miguel Prado e EIC*

Estamos em 2014. Esta não será uma época de glória para o Futebol Clube do Porto (FCP). A equipa terminará o campeonato em ter-ceiro lugar, 13 pontos abaixo do primeiro, o rival Benfica. Nas

competições europeias o clube des-pede-se da Liga Europa nos quartos de final com uma derrota por 4-1 em Sevilha. Mas os responsáveis do Dragão já procuram soluções para o futuro. A academia de futebol River Lane, na Nigéria, será uma impor-tante fonte de novos talentos. É lá que o FCP vai buscar Chidera Ezeh, um jovem nigeriano com apenas 16 anos.

Há muito que as regras da FIFA não permitem transferências inter-nacionais de jogadores menores de idade, salvo algumas exceções. Essas regras foram violadas pelo Barcelo-na, sancionado pela FIFA com uma proibição temporária de transferên-cias e uma multa de €417 mil. Mas o Porto não só compra os direitos económicos de Chidera como logo de seguida vende à empresa britâ-nica For Gool 65% desses direitos. O acordo: a For Gool paga uma pri-meira prestação de €125 mil ao Porto e uma segunda prestação de €375 mil depois da emissão do certifica-do de transferência internacional. Desde logo o FCP fica com o direito

de recomprar 30% dos direitos eco-nómicos de Chidera por €600 mil até junho de 2017 e posteriormente mais 25% por €1 milhão. Dados que constam da documentação que a re-vista alemã “Der Spiegel” obteve e partilhou com a rede EIC-European Investigative Collaborations para o projeto Football Leaks, de que o Expresso faz parte.

O negócio de Chidera Ezeh é um exemplo de como o investimento de fundos se tornou prática corrente no futebol (“third party ownership”, ou TPO, proibido pela FIFA em abril de 2015). Mas mostra também a von-tade de clubes e agentes de ganhar negociando com menores. Embora o FCP efetivamente tenha adquiri-do o controlo dos direitos de Chide-ra quando o jovem tinha apenas 16 anos, só em janeiro de 2016, quan-do o jogador já tem 18 anos, é que o clube português instrui o processo formal de registo da transferência na FIFA. Nesse documento o Porto garante não ter havido intervenção de terceiros no negócio, mas o acor-do com a For Gool feito quase dois anos antes mostra o contrário. Os dragões foram representados pelo agente canadiano Edmund Chu. O preço a pagar pelo FCP à academia River Lane seria de meio milhão de euros, com uma prestação inicial de €125 mil e outra de €375 mil. Ora, exatamente o mesmo preço que o FCP cobrara dois anos antes à For Gool por 65% do passe. Conclusão: o clube acabou por ficar com 35% dos direitos de Chidera a custo zero, devido à liquidez providenciada pela

For Gool. Nesta transação o inter-mediário Edmund Chu ganhou uma comissão de €78 mil, mais de dez vezes o salário mensal de Chidera Ezeh, que até era, no início deste ano, um dos jovens futebolistas mais bem pagos do clube, segundo foi possível apurar.

A história de Chidera Ezeh, que hoje está emprestado ao Portimo-nense, está longe de ser uma exce-ção. O agente Edmund Chu, de 45 anos, tem uma relação próxima com o FCP. Além de ter trabalhado para a aquisição de Chidera, Chu teve um papel importante nas transferências para o Porto, em 2014, dos jovens Junior Pius e Christopher Fidelis (na altura já com 18 anos). Em ambos os casos, o Porto vendeu 70% dos direi-tos dos jogadores à empresa SECA (detida pela China Media Capital, proprietária de 13% do Manchester City). A SECA, uma agência despor-tiva chinesa, é chefiada por Edmund Chu, que também lidera a empresa Ramp Management Group, e que em 2015 levou para o porto o também nigeriano Chidozie Collins. Chidozie estreou-se pela equipa principal do Porto em fevereiro deste ano, contra o Benfica, na Luz.

O FC Porto recusou-se a respon-der às questões que o Expresso e o EIC enviaram sobre estes casos. Se-gundo o último relatório e contas do FCP, em junho último o clube tinha 50% dos direitos de Chidera Ezeh. Edmund Chu também foi questiona-do sobre estes negócios e possíveis conflitos de interesse por agir como intermediário pela Ramp e investir em passes de jogadores com a SECA, mas não obtivemos resposta.

As preocupações da FIFA

As regras da FIFA para proteger menores remontam a 2001. O prin-cipal argumento da instituição para ter regras específicas para menores é que “os jovens futebolistas são vul-neráveis a uma potencial exploração e abuso quando estão num país es-trangeiro sem o devido acompanha-mento”. “Se as transferências inter-nacionais podem, em alguns casos, ser favoráveis à carreira desportiva de um jovem jogador, elas podem, por outro lado, ser contrárias aos melhores interesses de uma vasta maioria de jogadores menores”, diz a FIFA. O organismo acrescenta que no passado “o tráfico de jovens joga-dores para clubes, principalmente na Europa, por pessoas sem escrú-pulos levou alguns menores [...] a ficar praticamente abandonados nas ruas”.

Voltamos a Portugal. A relação entre o FCP e a Ramp existe pelo menos desde 2010, quando a em-presa de Edmund Chu intermediou a transferência do jogador nige-riano Mikel Agu (então menor de idade) para o Porto. Esta ligação entre o FCP e África seria questi-onada em 2013, quando os agentes do jogador ganês Christian Atsu ameaçam expor publicamente os acordos com a Ramp. Isto acontece pouco depois de o Porto transferir Atsu para o Chelsea, um negócio de €3 milhões no qual a Ramp tinha uma percentagem, em virtude de um contrato assinado com o Porto no ano anterior. O agente Saif Rubie queria revelar o acordo que o Porto tinha com a Ramp para trazer me-nores africanos para o clube. Nem Saif Rubie nem o FCP quiseram fazer comentários.

Nesse mesmo ano de 2013, o FC Porto deu à austríaca Danubio 50%

de uma futura venda do jogador Ge-neroso Correia, como contrapartida pelos serviços que aquela empresa austríaca prestou na negociação do contrato de formação do jovem. Nes-sa altura, Generoso tinha apenas 14 anos. O FCP prometeu ainda recom-prar à Danubio 30% dos direitos do jogador por 2,5 milhões de euros, caso Generoso fizesse pelo menos cinco jogos pela equipa principal do Porto. O que ainda não aconteceu.

Negócios com menores duplicam

Segundo a FIFA, nos últimos cinco anos os registos de transferências internacionais de menores quase du-plicaram, passando de 1500 casos em 2011 para 2716 em 2015. A maior parte destas inscrições foram acei-tes. Mas no ano passado houve 393 registos recusados pela FIFA (14% do total).

As regras da FIFA proíbem os agentes de receber dinheiro de jo-gadores menores de idade, mas nada impede os intermediários de serem pagos pelos clubes e essa vem sen-do uma prática generalizada. E se o menor acordar pagar ao agente somente quando completar 18 anos? Foi o que aconteceu com um ado-lescente português que jogava no Benfica e se transferiu para o Ar-senal. O intermediário fixou a sua comissão de 5% sobre os salários que o jovem receberia, o jogador e a família concordaram, o contrato respeitou as regras da FIFA, todos ficaram contentes.

No início de 2015, João Virgínia, guarda-redes de 15 anos do Benfica, entrou na mira do Arsenal. Em junho desse ano João assinou um contra-to de representação com o agente Matthew Kay, da Doyen. Kay rece-beria 5% dos rendimentos futuros do jovem português. Mas somente depois de outubro de 2017, quando João Virgínia completará 18 anos. E até que João completasse 16 anos (outubro de 2015) o entendimento com o Arsenal também só poderia ser verbal. A verdade é que o jovem viajou para Londres logo no verão, ainda com 15 anos, para se integrar na academia do Arsenal. O contrato com os gunners só seria firmado após João fazer os 16 anos.

Nem a Doyen, nem o Benfica, nem o Arsenal responderam às questões que o Expresso e o consórcio EIC lhes endereçaram para obter mais es-clarecimentos sobre esta transação.

Dinheiro para todos

O agente não é a única figura que pode, a prazo, lucrar com as estre-las em ascensão. Ter um filho com talento para o futebol pode ser tam-bém uma forma de a família ter um rendimento extra. Mas será aceitável os agentes tentarem fechar negócios com menores oferecendo aos seus familiares elevados montantes de dinheiro?

Há seis anos, o Sporting teve um episódio delicado para resolver. Com 16 anos, Bruma começava a dar nas vistas. O Sporting foi informado do interesse do Chelsea e do Manchester City no avançado. Segundo um rela-tório interno do Sporting de outubro de 2010, a que a rede EIC teve acesso, o agente de Bruma, Catió Baldé, disse aos responsáveis do clube que outro agente convenceu a mãe do jogador a viajar a Manchester para se reunir com elementos do City. Este agente terá prometido oferecer €100 mil à mãe de Bruma, €50 mil ao irmão do jogador e €50 mil ao padrasto. Mas a

Investigação Em busca das pedras preciosas de amanhã, os agentes negoceiam o futuro de jogadores menores de idade driblando os limites da FIFA e convencendo as famílias dos jovens

FC PORTO GASTOU €25 MILHÕES COM AGENTES EM DOIS ANOSCOMISSÕES Os números constam dos relatórios e contas do Futebol Clube do Porto: nos últimos dois anos os dragões pagaram cerca de €25 mi-lhões em serviços de intermediação, dos quais €14,7 milhões na temporada 2014/2015 e €10,2 milhões na época 2015/2016. Os rivais Benfica e Sporting não apresentam nos seus relatórios números consolidados dos pagamentos a agentes nas operações com os seus futebolistas.

BRUMA O antigo avançado do Sporting foi em 2010 alvo do interesse do Manchester City e do Chelsea. Na altura com 16 anos, o jogador viu a sua família assediada por vá-rios agentes, mas continuou representado por Catió Bal-dé, a quem o Sporting concedeu 10% de uma futura trans-ferência de Bruma. Baldé chegou a acordar entregar os seus direitos ao agente Pini Zahavi, mas posteriormente desfez o negócio. Em 2013 o jogador foi vendido ao Gala-tasaray por €10 milhões. FOTO ABDULLAH COSKUN/GETTY IMAGES

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 7: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 07 PRIMEIRO CADERNO

Continua na página 8

reunião em Manchester não chegou a acontecer.

Segundo o mesmo relatório, ou-tro agente enviou a Bruma um SMS aliciante: “Bruma, diz à tua mãe que pagamos já €100 mil e no momento da assinatura mais €100 mil”. O Ex-presso enviou várias questões a Catió Baldé, mas não obteve resposta.

Pouco depois, o Sporting acabou por renovar o contrato de Bruma por três anos, concedendo à empre-sa de Catió, a Nafricatalents, uma comissão equivalente a 10% de uma futura venda do jogador. Confronta-do pelo Expresso sobre o que então sucedeu, o Sporting declarou não ter comentários a fazer, por se tratar de um período anterior à atual direção.

Em 2013, Bruma é transferido do Sporting para o Galatasaray, por €10 milhões, com uma cláusula que da-ria aos leões mais €30 milhões se os turcos revendessem o jogador ao Benfica, Porto ou Braga. O Sporting considera “normal” este tipo de cláu-sula. “Trata-se de um instrumento de gestão desportiva e económica que é utilizado por todos os grandes emblemas”, diz o clube.

Quando Bruma foi para o Gala-tasaray tinha já mais de 18 anos. E nessa altura terá compreendido que o futebol é mais do que marcar gran-des golos. É também saber rodear-se das pessoas certas. E estar preparado para saber que os agentes vão querer partilhar o sucesso dos jogadores. E o seu dinheiro também.

*European Investigative Collaborations

[email protected]

Este texto podia ter começa-do pelo olheiro ou pelo amigo do olheiro, mas a história de ambos tornar-se-á passado quando o agente de futebol entrar em cena. A advogada, por outro lado, daria sempre um bom início — um toque feminino num mundo mas-culino — só que o papel dela revelar-se-á fugaz. Os clubes, as cidades, os milhões e as comissões servem normal-mente para contexto e as of-fshores desta vez ficam para o fim. O melhor é arrancar com o protagonista. E no verão de 2016.

O jogador

Não será por acaso que Paul Pogba usa camisolas da NBA e faz kickboxing — ele tem a altura de um basquetebolista e o peso de um peso pesado

HÁ UM PREÇO PARA A INGENUIDADE?A carreira de Pogba já rendeu, pelo menos, €37 milhões ao agente. É o jogador mais caro da história

e isso é curioso. Porque não há muitos tipos de 1,91m e 84kg, com penteados e cor-tes de barba variáveis, que tenham a sua agilidade, ritmo e, sobretudo, habilidade para jogar à bola. Talvez haja um, Zlatan Ibrahimovic, que até é seu colega no Manchester United, e ambos são animais raros e exóticos do futebol: combinam talento e carisma e estas duas coisas juntas va-lem dinheiro. Muito dinhei-ro. Provavelmente não o su-ficiente para chegar aos 105 milhões de euros (podem ser 110 milhões de euros se forem cumpridos alguns objetivos) pagos pelo Manchester Uni-ted à Juventus para recupe-rar Paul Pogba, o médio fran-cês de apenas 23 anos, em julho de 2016, mas esta é uma indústria que desconhece os seus limites. E é feita por al-

gumas pessoas que também não percebem os seus.

O agente e a advogada

Paul Pogba e Zlatan Ibrahi-movic são representados por Mino Raiola, um agente com um fraquinho por enfants terribles — Mario Balotelli também é seu cliente — e se o United se chegou à frente foi porque este holandês nascido italiano esteve nas negocia-ções. Como seria de esperar, Raiola recebeu a sua parte, €27 milhões, um valor já no-ticiado no último verão. Raio-la planeara isto com quatro anos de antecedência. Em 2012, quando Pogba saíra do United para a Juventus — com poucos jogos disputados, de costas voltadas para o treina-dor Alex Ferguson e a custo zero —, o empresário garantiu

uma cláusula de €18 milhões para ele próprio se Pogba fos-se vendido por €90 milhões; e uma percentagem choruda se os valores ultrapassassem esse montante. Daí os €27 milhões.

Pogba transformou-se no homem mais caro do mundo a fazer o que ele faz; e Raiola no homem que mais recebeu de uma só vez para fazer o que ele fez — intermediar e outros afazeres não especificados, como poderemos ver a seguir.

O que consta nos documen-tos do Football Leaks que a “Der Spiegel” partilhou com o consórcio EIC ao qual o Ex-presso se associou, é que não terá sido apenas nesta transfe-rência que Raiola lucrou com Pogba — a Juventus, entre 2012 e 2016, pagou um total de €10 milhões por trabalhos de agenciamento ao jogador, sendo que o empresário não era um ele, mas uma ela, Ra-faela Pimenta, a advogada de Raiola. Porquê e para quê?

Confrontado pelo EIC com estas informações, Raiola res-pondeu que não responderia: “É uma campanha contra os agentes desportivos e altas figuras do futebol”. Recapitu-lemos: entre 2012 e 2016, Po-gba recebeu €12 milhões por salários e Raiola recebeu €10 milhões pelo agenciamento; a estes, somou ainda os €27 milhões da venda para o Man-chester United, totalizando €37 milhões. Todos ganharam o seu quinhão.

Nem sempre foi assim.

O olheiro

Paul Pogba é filho de Yeo Mori-ba e de Fassou Antoine Pogba, dois guineenses radicados nos subúrbios de Paris, na região de Seine-et-Marne, onde Clau-de Makelelé ou Lilian Thuram cresceram. O gosto pelo fute-bol veio do pai e Paul tem dois irmãos gémeos mais velhos, Florentim e Mathias, ambos futebolistas internacionais pela Guiné. É evidente que o mais novo sempre foi o mais talentoso e o mais determina-do dos três, e há uma história que um antigo treinador dele relatou ao Le Parisien. “Eu dizia-lhe: ‘Paul, tens de dar 80 toques com o pé direito, 80 com o pé esquerdo e 80 com a cabeça’. Numa segunda-feira, ele não conseguia fazer aquilo, à quarta-feira já conseguia”. Estava destinado a grandes coisas.

Um dia, a jogar pelo clube do bairro, o US Roissy-en--Brie, Pogba chamou a aten-ção de Oualid Tanazefti, filho de marroquinos que falhara como futebolista e se tornara entretanto olheiro do Le Ha-vre. Em 2006, Tanazefti tinha 21 anos e Pogba tinha 13 e foi fácil ao primeiro convencer o segundo a fazer testes no Le Havre: em 2008, com 15 anos, Paul foi chamado à se-leção francesa de sub-16 e aos 16 assinou contrato como jú-nior do Le Havre. Só que não o cumpriu. Tanazefti percebeu o valor de Pogba e persuadiu o futebolista e os pais com um

“ISTO É UMA CAMPANHA CONTRA OS AGENTES DESPORTIVOS E ALTAS FIGURAS DO FUTEBOL”Mino RaoilaEmpresário de Pogba em comentário às perguntas do EIC

2029Tanazefti foi o primeiro agente de Pogba e em 2014 propôs um negócio estranho: comprar-lhe os direitos de imagem, negociá-los em nome dele e receber 30% das receitas; o jogador, por sua vez, só veria a cor do dinheiro em 2029. Pogba assinou

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 8: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201608 PRIMEIRO CADERNO

O SISTEMA DE JORGE MENDESOS PATROCINADORES DOS JOGADORES PAGAM POR DIREITOS DE IMAGEM

4-6%MIM

DISTRIBUIÇÃODOS

DIREITOS DE IMAGEM

74%-76%Paraísos fiscais

ANDY QUINN100%Executivo da Gestifute Internacional

JORGE MENDES62,5%Agente de jogadores, fundador e proprietário da empresa Gestifute

LUÍS CORREIA32,5%Sobrinho e homem de confiança de Jorge Mendes

SCALONDA INVESTMENTS5%Sociedade instrumentallocalizada em Chipre

FONTE: EIC/EL MUNDO

CLIENTES CLUBE ATUALCEDÊNCIA DE DIREITOS*

TRANSFERÊNCIA PARA...

EMPRESA OFFSHORE SEDE

INSPEÇÃOFISCAL

JOSÉ MOURINHOManchester United

2004 Chelsea Koper ServicesIlhas Virgens Britânicas

Julho de 2014; encerrada

CRISTIANO RONALDO Real MadridDezembro de 2008

Real MadridTollin, Adifore e Arnel

Ilhas Virgens Britânicas

Dezembro de 2015; aberta

RADAMEL FALCAO MónacoAgosto de 2011

Atlético Fardey OverseasIlhas Virgens Britânicas

Dezembro de 2014; aberta

JAMES RODRÍGUEZ Real MadridOutubro de 2014

Real Madrid Kenalton AssetsIlhas Virgens Britânicas

-

FÁBIO COENTRÃO Real MadridFevereiro de 2011

Real Madrid Rodinn PanamáFevereiro de 2015

RICARDO CARVALHO Sem clubeSetembro de 2004

Real Madrid AldaIlhas Virgens Britânicas

Fevereiro de 2015

PEPE Real MadridJulho de 2007

Real Madrid WeltexIlhas Virgens Britânicas

Novembro de 2015

* CEDÊNCIA DE DIREITOS DE IMAGEM: DATA DE CEDÊNCIA DE DIREITOS DE IMAGEM A UMA SOCIEDADE OFFSHORE. MOTIVO: POSSÍVEL CAUSA DA ENTRADA NO SISTEMA OFFSHORE. INSPEÇÃO FISCAL: INÍCIO DA INSPEÇÃO FISCAL EM ESPANHA

20%Polaris Sports

FO OTBALL LEAKS

conto de fadas: Paul iria para Manchester para ser uma es-trela no United. Assinou um acordo de 12 meses e lá foi ele. Mas não foi sozinho.

Oualid Tanazefti, o jogador falhado, tinha outras ideias; deixou de ser olheiro do Le Havre, fez-se manager e ama-seca de Paul Pogba em terras inglesas. Depois, mon-tou uma empresa de agencia-mento chamada Sporteam com dois amigos (já iremos a um deles) e, à falta de licen-ça para exercer, contactou o agente Mino Raiola.

O Manchester United não era o Le Havre e era bom ter dicas e a coragem de alguém que Ibrahimovic dizia “não ter medo de nada” se as coi-sas corressem mal. Acaba-ram por correr.

Pogba jogou pouco e jogou mal nesse ano, e Raiola adiou e adiou negociações, pedindo mais pelo mesmo, esperou que o contrato terminasse e iludiu Ferguson até à últi-ma hora, para se apresentar com o médio, a ‘custo zero’, aos diretores da Juventus. Pogba percebeu agora que tinha agora um agente a sé-rio, Raiola, mas mantinha um assessor pessoal, Tanazefti. E não demoraria muito até que os dois chocassem e o futebo-lista francês tivesse de fazer a sua escolha.

O amigo do olheiro

Tanazefti era um tipo mete-diço e inseguro e isso tinha um custo: durante o anúncio na Juventus, quis aparecer na foto oficial junto de Pogba e de Raiola, e o jogador não gostou; em março de 2013, quando Pogba foi convocado

pela primeira vez à seleção A, Tanazefti entrou nas instala-ções do centro de estágio e foi escoltado até à rua. Ainda assim, Pogba deu-lhe o bene-fício da dúvida quando este lhe falou de direitos de ima-gem. De publicidade.

Na plataforma Football Leaks a que o Expresso teve acesso, há documentos onde se leem cláusulas obscuras assinadas entre jogado-res jovens e os seus repre-sentantes. A que consta no contrato entre Tanazefti e Pogba é uma delas e data de 5 de novembro de 2014. Ta-nazefti, com a ajuda de Ylli Kulashi, um dos sócios da empresa Sporteam e agen-te devidamente encartado para a prática, propuseram a Pogba o seguinte: negoci-arem os direitos de imagem em nome do futebolista que ficaria a receber 70% das re-ceitas geradas; para o efeito, Tanazefti e Kulashi compra-riam os direitos de imagem de Pogba por um valor en-tre os €1,8 milhões e os €5

milhões, sendo que o valor exato seria definido por um auditor independente; Tana-zefti e Kulashi seriam pagos logo que o dinheiro entrasse na conta mas Pogba não re-ceberia um cêntimo antes de 31 de outubro de 2029 — e quando o recebesse teria de ressarcir Tanazefti e Kula-shi pelos €1,8 milhões a €5 milhões gastos no início da operação; até 2029, Pogba teria direito a €33 mil euros/ano. Acresce que Tanazef-ti e Kulashi montaram uma empresa no Luxemburgo, a que chamaram Koyot Group, para gerir a exploração dos direitos de imagem do médio gaulês.

O mais estranho é que Paul Pogba assinou.

Mino Raiola procurou re-futar este acordo e, segun-do fonte da Mediapart, um dos parceiros do EIC, levou o assunto até ao Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia com o ar-gumento de que Pogba fora enganado. Falhou. Durante meses, Pogba esteve partido em dois enquanto Tanazefti se pôs no mercado a tentar revender os direitos de ima-gem do atleta. Primeiro, de acordo com o Mediapart, bateu à porta do fundo Doy-en Sports Investment que não quis nada com ele por saber que Pogba era agenci-ado por Mino Raiola; depois, Tanazefti tentou a empresa chinesa Fosun, igualmente sem sucesso, porque Jorge Mendes os avisou para a mes-ma questão. Tanazefti ficou encurralado e sem opções e resolveu o assunto direta-mente com Raiola a troco de €10 milhões, cinco milhões para ele, cinco milhões para o amigo dele. O problema terá sido resolvido antes de março de 2016, altura em que a Adidas anunciou o acordo de sponsorização entre 25 a 40 milhões de euros, vá-lido por 10 anos, que inclu-ía as chuteiras com o nome de Paul Pogba. Raiola, uma vez mais, conseguira o que queria.

A offshore

O rasto do dinheiro seguiu o guião de muitas outras histórias desta investigação: a empresa offshore. Após a análise aos documentos do Football Leaks, o consórcio EIC conclui que os direitos de imagem de Pogba não são dele mas da sociedade After-math Limited, que fica no pri-meiro andar do número 17 da rua Esplanade St. Helier, em Jersey, uma ilha no Canal da Mancha conhecida pelos seus benefícios fiscais. E que os verdadeiros donos da After-math estão num fundo cha-mado Whitmill Nominees. E ninguém sabe quem são.

Fim. Pedro Candeias

e Miguel Prado com [email protected]

Nem Pogba nem Raiola responderam às questões que lhes foram colocadas sobre este tema

As receitas de direitos de imagem de Pogba estão na Aftermath Limited, em Jersey

Recapitulemos: Cristiano Ro-naldo, José Mourinho, Pepe, Fábio Coentrão e Ricardo Carvalho foram ou estão ainda a ser investigados pelo fisco espanhol por não terem declarado a maior parte, ou até a totalidade, das receitas provenientes da exploração dos seus direitos de imagem — Ronaldo, por exemplo, apresentou €22,7 milhões de um bolo total de €150 milhões relativo aos períodos de 2009-2014 e de 2015-20, pelos quais recebeu adiantado mesmo a tempo de ainda poder ser be-neficiado pela “Lei Beckham”, que dava aos estrangeiros com

TODOS OS CAMINHOS VÃO DAR A JORGE MENDESO esquema de Ronaldo, Mourinho, Pepe, Coentrão ou Carvalho é semelhante. E todos eles são agenciados por Mendes

os melhores salários uma taxa de tributação sobre os rendi-mentos de 24% contra os qua-se 48% imposta aos residentes espanhóis.

Os esquemas fiscais de Ro-naldo, Mourinho, Pepe, Co-entrão e Carvalho são seme-lhantes: há sociedades, MIM e Polaris, encarregadas de ne-gociar os contratos de publi-cidade; o dinheiro pago pelos patrocinadores é pago a am-bas e, depois dos descontos das respetivas comissões, se-gue para uma empresa offsho-re. Só muda o nome; o agente é o mesmo. Os referidos joga-dores são representados por

Jorge Mendes, dono da Ges-tifute, e com ligações à MIM e à Polaris; os colombianos James Rodríguez e Radamel Falcão também estão entre os seus clientes. Em comum, e além do empresário, está o facto de todos estes futebolis-tas terem passado (e presen-te) em Portugal e Espanha, os países onde a análise aos 18,6 milhões de documentos da plataforma Football Leaks teriam mais impacto.

Do lado de lá da fronteira, o “El Mundo”, o jornal espa-nhol do consórcio EIC, sofreu a pressão de uma providência cautelar da sociedade Senn

Ferrero, que colabora com a Gestifute e advogados portu-gueses nos processos relati-vos aos jogadores. A Gestifu-te, por sua vez, emitiu vários comunicados em defesa de Mourinho ou Ronaldo, o últi-mo dos quais em que se anun-ciava todo o património no estrangeiro declarado pelo capitão da seleção nacional ao fisco espanhol. Acontece que não são esses valores que estão em causa, mas os mon-tantes ocultados à Agência Tributária espanhola durante anos relativos aos direitos de imagem do avançado.

P.C. e M.P. com EIC

OFFSHORES

Continuação da página 7

“ACHA QUE ESTOU PREOCUPADO? QUEM NÃO DEVE NÃO TEME”Cristiano RonaldoJogador do Real Madrid e capitão da seleção nacional em resposta à RTP após um jogo da Liga dos Campeões. Ronaldo não respondeu a uma pergunta do EIC, que o confrontou, na semana passada, sobre a ausência de muitos milhões na declaração de impostos de 2014

GANHOS DOS INTERMEDIÁRIOS ATINGIRAM RECORDE ESTE ANOESTATÍSTICA O mais recente relatório da FIFA sobre o papel dos intermediários nas transfe-rências internacionais de futebolistas revela que este ano, até 20 de novembro, os clubes já tinham gasto 368 milhões de dólares (€343 milhões) em comissões pagas a agentes, o mais alto valor de sempre. É um crescimento de 34% face a 2015. Um quarto da despesa foi paga pelos clubes de saída e três quartos pelos clubes de destino.

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 9: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 09 PRIMEIRO CADERNO

MiguelSousaTavares

menos, nada nas bandeiras indica nova nacionalidade. Mas logo depois, continuan-do a descer a 5ª Avenida, a concentração de turistas e po-lícias não deixa margem para engano: estamos em frente à Trump Tower, a nova sede do poder nos Estados Unidos. Donald vive lá em cima, na penthouse, e conta-se que a sua segurança está a custar um milhão de dólares por dia, que o mayor está farto de pa-gar e quer endossar ao gover-no federal. Todas as televisões têm ali o seu circo montado em permanência, e hordas de turistas — americanos, euro-peus e asiáticos — desfilam e fotografam, como se pudes-sem fazer parte da História. No caminho do bus do aero-porto para Manhattan, um casal do Dakota, acompanha-do por um filho que não lar-ga o inevitável iPad, anuncia que vem visitar Nova Iorque pela primeira vez. O pai jura orgulhosamente que nem se-quer vai deixar as malas no hotel, ansioso como está de ir directamente à Trump Tower. Donald vai fazer a América “great again”, e todos os idi-otas da nação querem estar presentes nesse momento re-fundador. No dia seguinte, 2 de Dezembro, já depois de as luzes da árvore de Natal do Rockefeller Center se terem acendido em Nova Iorque, Donald participa no primeiro daquilo a que chama os seus “comícios de agradecimento” pela eleição. Em Cincinnati, no Ohio, um dos estados do rust belt que lhe deu a vitória, ali roubada nas barbas dos democratas. Fala primeiro Mike Pence, o vice-presiden-te eleito: um curto discurso de fascismo puro e duro, pe-rante uma plateia que parece de puro e duro Ku Klux Klan. Depois vem Donald, que en-tra em cena como o Super--Homem, a capa substituída pela ridícula cabeleira, todo ele patético, boçal, penoso de ver. Por vezes, lê do teleponto o discurso que os assessores lhe prepararam, mas o que gosta mesmo é de sair do tex-to. E o que diz então o futuro Presidente dos Estados Uni-dos é que teve uma “landslide victory” (apesar de 2.300.000 votos a menos, quase 2% dos votos), contra uma “very di-shonest press”, que cometeu a heresia de prever a sua der-

rota. Aí não está sozinho: é de bom tom acusar a imprensa americana de não ter sabido ler os sinais do tempo. Mas isso significaria o quê? Que se deveria ter abstido de avisar os americanos sobre o que representava Donald Trump ou conformar-se porque os ventos do tempo, ali e por esse mundo fora, sopram no sentido do nacionalismo, do populismo, do salve-se quem puder?

Donald rebola-se de gozo no palco, ele próprio ainda não acreditando que venceu, e abre os braços proclaman-do: “Acusaram-me de ser bilionário, mas qual é o mal de saber ganhar dinheiro?” E de não pagar impostos durante dez anos, e de levar as suas empresas à falência, despedindo milhares de tra-balhadores, usando depois os prejuízos para não pagar impostos? Sim, qual é o mal? E que importa, se ele acaba de negociar um acordo com a Carrier prometendo pagar--lhes milhões de dólares de compensação para que a em-presa fabricante de aparelhos de ar condicionado desista de ir para o México e salve 1100 postos de trabalho nos Estados Unidos? E se os tra-balhadores da Carrier gra-vam vídeos a agradecer-lhe ser “um político diferente” e ninguém se pergunta se ele vai fazer o mesmo, e a que custo, com todas as outras empresas americanas der-rotadas pela globalização e pela concorrência de que os Estados Unidos sempre fo-ram os grandes arautos? Ali, entre os seus, enquanto lê os tradicionais apelos à unidade dos americanos que lhe escre-veram no teleponto, Trump foge do texto e engalfinha--se num discurso vingativo, primário, profundamente divisionista. Se dúvidas res-tassem de que não tem ca-tegoria para ser Presidente, bastaria escutá-lo nessa noi-te, em Cincinnati. “Vou-vos contar um segredo, mas não digam nada a ninguém”, di-zia ele, semicerrando os seus olhinhos de predador, com as pálpebras maquilhadas de branco. “Para a Defesa vem o general ‘Mad Dog’ Mattis, a coisa mais parecida com o general Patton que já tivemos e já era altura de termos.” Já sobre as suas escolhas na

Todos temos o s n o s s o s i t inerários particulares nas nossas c idades de referência. E m N o v a I o r q u e , o

meu há-de sempre passar por uma visita à Frick Collection, o meu museu preferido na ci-dade. Situado na 5ª Avenida, em frente ao Central Park, ocupa a que foi a casa par-ticular de Henry Clay Frick (1849-1919), um dos grandes industriais americanos do seu tempo e coleccionador de arte dedicado e conhece-dor. É uma casa sem nenhum interesse, no que os america-nos chamam de “estilo neo-clássico”, à roda de um pátio supostamente de influência mediterrânica, mas sem som-bra da leveza e da luz que tal implica. Abriga também uma muito elogiada colecção de móveis, bronzes e cristais, de que nada percebo e pouco me dizem. O que ali me fasci-na é a dimensão humana do museu — a dimensão de uma casa de um coleccionador de arte — e a sua fantástica ten-tativa de reunir, nesse espa-ço, toda a história da pintura ocidental até então, de Pie-ro Della Francesca a Manet. Frick não viveu o Modernis-mo nem o Impressionismo, e só podemos lamentá-lo. Mas, de resto, está lá representa-do quase tudo do essencial: um dos retratos de Filipe IV de Velázquez, uns fabulosos Goya, Rembrandt (incluindo o auto-retrato), dois deslum-brantes Ticianos, o mestre de todos os flamengos, Jacob van Ruisdael, o também paisagis-ta John Constable e dois dos meus três “pintores da luz”, Vermeer e Turner (só falta Caravaggio). Só pelos três Vermeer da Frick Collection vale a pena ir a Nova Iorque.

Saio da Frick e caminho ao longo do Central Park, que continua igual ao que é nos filmes e ainda, nestes dias ini-ciais de Dezembro, tem as ár-vores da cor mágica do Verão indiano. Dir- se-ia que nada mudou, afinal. Mas sim, mu-dou: à esquerda, The Pierre ostenta por baixo do nome o registo do novo proprietário, “A Taj Hotel” (como os nossos Seteais e Tivoli). O Plaza pa-rece igual a sempre ou, pelo

A cidade de Donald Trump

Trump tem os Estados Unidos. Mas nunca terá Nova Iorque. A vida continua

ILUSTRAÇÃO HUGO PINTOárea económica, apenas um silêncio embaraçado, pois elas são o total oposto das suas promessas eleitorais de ir combater Wall Street, por ele acusada de favorecer a candidatura de Hillary e de ser o centro de todos os ma-les económicos dos Estados Unidos. Para o Departamento de Comércio (o equivalente ao nosso Ministério da Eco-nomia), vai, como ministro, Wilbur Ross, um homem do Goldman Sachs, e, como vi-ce-ministro, o milionário de Chicago Ted Ricketts. Mas a mais contraditória escolha em relação a tudo o que foi dito e prometido por Trump é a do Tesouro, o equivalen-te ao nosso Ministério das Finanças. Steven Mnuchin é também um homem do Gold-man Sachs, especialista em gestão de activos de alto ris-co: uma criatura da especula-ção financeira, grande adepto da desregulamentação sobre as empresas, do tipo da que conduziu à crise financeira de 2008. Wall Street no seu pior. Segurem-se bem!

Trump pode viver na sua torre dourada da 5ª Avenida, ao estilo Versalhes de pato--bravo. Mas Nova Iorque, a cidade e o estado, rejeita-ram-no em força, e a força desta cidade é imensa, é indestrutível, venha quem vier do Dakota pregar-lhe as novas regras. No Ground Zero, contemplando a arre-piante simplicidade e beleza do Memorial às vítimas das Torres Gémeas (dois buracos na exacta medida das Torres e no espaço que elas ocupa-vam, por onde um fio de água, como um caudal de lágrimas, escorre permanentemente, desaparecendo no fundo), ou ali mesmo ao lado, olhan-do o deslumbrante PATH (o novo terminal de transpor-tes do World Trade Center), de Santiago Calatrava, per-cebe-se isso muito bem. Só uma cidade extraordinária, só uma gente extraordinária conseguiria transformar uma tragédia numa obra de arte ainda mais imortal. Trump tem os Estados Unidos. Mas nunca terá Nova Iorque. A vida continua.

Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 10: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201610 PRIMEIRO CADERNO

José Luís Carneiro Secretário de Estado das Comunidades

“Eu é que sou um bom auxiliar do Presidente Marcelo!”

Textos Cristina Figueiredo Fotos Alberto Frias

Nem onze nem dezasseis. Nin-guém sabe com rigor quantos somos (“porque há uma per-centagem muito elevada de portugueses pelo mundo que não está inscrita nos consula-dos”) mas as estimativas apon-tam para 11 milhões de residen-tes, 2,2 milhões de emigrantes, 2,5 milhões de lusodescenden-tes. Mas se há certeza que José Luís Carneiro tem é a de que teremos de nos habituar, “cada vez mais”, a níveis elevados de emigração, “por força da mo-bilidade social e económica”. Entrevista com o secretário de Estado das Comunidades numa época em que muitos portugue-ses voltam à pátria.

PP OPagudizarPdaPsituaçãoPpolí-ticaPePeconómicaPnaPVenezuela,PnoPBrasilPePemPAngolaPprovocouPoPregressoPantecipadoPdePemi-grantesPportugueses?

R Há indícios, pequenos ainda, que mostram que a estabiliza-ção da situação político-social em Portugal está a conduzir ao regresso de portugueses que saíram do país nos últimos cin-co anos. Mas é um facto que as circunstâncias que se vivem

ENTREVISTA

nalguns países também têm contribuído para isso.

PP TemPnúmeros?PJáPvoltámosPaoPnívelPdePemigraçãoPanteriorPaP2011?

R Por força da mobilidade social e económica, cada vez mais teremos de nos habituar a níveis altos de emigração. Os dados que temos (de 2015) di-zem-nos que dos 500 mil que saíram entre 2011 e o principio de 2015, 200 mil voltaram ao país ao fim de um ano. Mas a tendência cada vez mais con-solidada é para a mobilidade laboral por força da integração das economias e da própria glo-balização. Daí que faça cada vez mais sentido pensar em políti-cas integradas. E por isso criá-mos uma equipa transversal da alta administração — com re-presentantes da internacionali-zação, da indústria, do turismo, da segurança social, do ensino superior, dos assuntos fiscais e da justiça — que reúne men-salmente, sob a minha esfera, para dar celeridade processual a assuntos que nos são coloca-dos nos postos consulares e ga-binetes de apoio ao emigrante.

PP PodePfalar-sePdeP“fugaPdePcé-rebros”?PÉPumPmovimentoPquePimportaPestancar?

R A inserção dos portugue-ses altamente qualificados no mundo é um ativo essencial do Estado português! Foi, aliás, o que fez de Portugal, pequeno Estado de recurso exíguos, um país global, de cooperação e diálogo. Por alguma razão ti-vemos o apoio que tivemos na eleição de António Guterres como secretário-geral da ONU: tem muito que ver com essa imagem de Portugal.

PP ComoPvaiPserPaPrelaçãoPdaPcomunidadePportuguesaPnosPEUAP comP aP administraçãoPTrump?

R Temos portugueses com um elevado nível político de inser-ção nos mais variados patama-res de poder, quer nos demo-cratas quer nos republicanos, e essa é a melhor garantia da manutenção das boas relações entre Portugal e os EUA.

PP OsP portuguesesP noP ReinoPUnidoPpodemPficarPtranquilosPdepoisPdoP‘Brexit’?

R Temos ainda um tempo que nos vai permitir percecionar de forma mais clara como é que isso se vai processar. Para já estamos a reforçar os meios humanos nos serviços consu-lares de Londres e Manchester por forma a garantir informa-

ção e esclarecimento a quem os procure.

PP OPPresidentePtemPsidoPumPbomPauxiliarPnaPsuaPmissãoPjun-toPdasPcomunidades?

R Eu é que sou um bom auxi-liar do Presidente! Mas o PR tem tido uma função essencial na valorização dos portugueses no mundo. A decisão (conjunta com o PM) de comemorarem o 10 de Junho fora de Portugal tem um relevo imenso na auto-estima e na reconciliação dos portugueses com o seu país de origem.

PP HáPumPanoPeramPpúblicasPasPsuasPreservasPaPestaPsoluçãoPdePGoverno.PMudouPdePopinião?

R A forma como o PM desem-penhou suas funções e como todo o Governo procurou ga-rantir os compromissos com as instituições internacionais e, ao mesmo tempo, com o programa eleitoral, fizeram com que eu seja hoje um dos que dizem que esta fórmula foi acertada. Fui candidato a deputado pelo Por-to, vivi bem, enquanto líder dos autarcas socialistas, o combate local contra muitas das opções do Governo anterior e é com sentimento de dever cumprido que faço o balanço deste ano.

[email protected]

INVESTIDORES DA DIÁSPORA

Nos próximos dias 16 e 17, José Luís Carneiro é um dos anfitriões, em Sintra, do I Encontro dos Investidores da Diáspora, que a partir daqui se há de reunir anualmente. O objetivo número um da iniciativa — que já vinha do Governo anterior — é criar uma rede de contacto e cooperação entre as 6800 micro e pequenas empresas portuguesas que estão espalhadas pelo mundo, os autarcas em Portugal, as Câmaras de Comércio e as Academias do Bacalhau (um movimento que começou na África do Sul em 1968 e que já se espalhou por 54 locais).

PRÉMIO FARPA BEM AFIADA

“Ainda bem que ele não é o presidente do PSD”Pedro Passos CoelhoLíder do PSD, falando de Marcelo Rebelo de Sousa

PRÉMIO AMOR COM AMOR SE PAGA

“Se eu fosse presidente do PSD não podia ser Presidente de todos os portugueses”Marcelo Rebelo de SousaPresidente da República, não resistindo a responder a Passos

PRÉMIO HÉLAS, CONSENSO!

“Este é um momento embaraçoso para os dois: estamos de acordo um com o outro”António CostaPrimeiro-ministro, para Passos Coelho, sobre o facto de ambos estranharem a demissão de António Domingues da CGD

PRÉMIO ESCANÇÃO DE BELÉM

“O segundo vinho é o melhor”Marcelo Rebelo de SousaPresidente da República, sobre a substituição de Domingues por Paulo Macedo

PRÉMIO UMA QUESTÃO DE MILHÕES

“Quem não deve não teme”Cristiano RonaldoFutebolista, respondendo a pergunta sobre a alegada fuga aos impostos denunciada pelo caso Football Leaks

PRÉMIO GERINGONÇA 2.0

“Não há nada escrito nas estrelas que impeça um governo com ministros do BE e do PCP”João GalambaDeputado e porta-voz do PS

PRÉMIO GATO POUCO FEDORENTO

“Hoje não se poderia fazer um sketch sobre marrecos, coxos e mariconços”Ricardo Araújo PereiraHumorista, em entrevista ao “i”

Cristina Figueiredo e Martim Silva

[email protected]

NO FIM ERA O VERBO

3 DAYS AU TO M AT I C O R O R O SSO - Ø 4 2 m m / 4 5 m m

( R E F. 67 7 - R E F. 675 )

P A N E R A I . C O M

PORTO, AVENIDA DA BOAVISTA, 3511 - (EDIFICIO AVIZ) TEL. 22 610 12 83

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 11: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 11 PRIMEIRO CADERNO

Para mais informações visite www.bancobpi.pt

PROJECTOS VENCEDORESO Prémio BPI Capacitar distingue projectos que visam a inclusão social e a melhoria da qualidade de vida de pessoas comdeficiência ou incapacidade permanente. Na sua 7ª edição, o BPI Capacitar registou 305 candidaturas e o Júri distinguiu 19 projectos de instituições privadas sem fins lucrativos, atribuindo um donativo total de € 700.000, mais € 200.000 do que inicialmente previsto.

O BPI agradece o trabalho do Júri de selecção e a participação de todas as instituições que se candidataram, que são o testemunhodo interesse gerado por esta iniciativa, que irá repetir-se em 2017. A todos os premiados, as mais vivas felicitações e os votos de bom sucesso para os seus projectos.

BPI Solidariedade

2016

Associação Oncológica do Alentejo - AOAL

1º PrémioÉvora

ACAPO - Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal

APCV - Associação de Paralisia Cerebral de Viseu

APERCIM - Associação Para a Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados de Mafra

APPACDM de Lisboa

APPACDM do Porto

APPDA Coimbra

Associação de Paralisia Cerebral de Vila Real

Associação Portuguesa de Fibrose Quística - APFQ

Associação Recreativa Cultural e Social de Silveirinhos

Associação Salvador

AVAL - Associação Voleibol do Alentejo e Algarve

Cercipeniche - Cooperativa de Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados

Dançando com a Diferença

Focus

Liga dos Amigos do Centro de Saúde de Alfândega da Fé

Santa Casa da Misericórdia de Aveiro

VOARTE

Lisboa

Viseu

Mafra

Lisboa

Porto

Coimbra

Vila Real

Vila Nova de Gaia

Gondomar

Lisboa

Castro Verde

Peniche

Funchal

Porto

Alfândega da Fé

Aveiro

Lisboa

€ 27.938

€ 46.500

€ 13.500

€ 19.093

€ 44.930

€ 49.700

€ 30.098

€ 41.000

€ 38.900

€ 42.640

€ 24.350

€ 33.421

€ 40.000

€ 50.000

€ 50.000

€ 50.000

€ 20.800

€ 27.130

Fundação Afid Diferença Amadora € 50.000

Menções Honrosas

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 12: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201612 PRIMEIRO CADERNO

CGD

TC pode chumbar lei e Macedo manter o salário

PSD quer que o Constitucional avalie a lei que põe a CGD fora do estatuto dos gestores públicos. Um chumbo pode pôr em causa o salário de Paulo Macedo... ou não

É um caso confuso desde o iní-cio e não era agora que se ia tornar simples. A maioria PS/BE/PCP chumbou esta semana a proposta do PSD para repor limites aos salários da admi-nistração da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e, depois da votação, os sociais-democratas anunciaram aquilo que já ha-

viam ameaçado: o envio para o Tribunal Constitucional (TC) do decreto-lei do Governo que, em julho, isentou os gestores da CGD das obrigações impos-tas a todos os outros gestores de empresas públicas ou do se-tor empresarial do Estado.

O PSD entende que o decreto é inconstitucional, por ser um fato à medida para tratar de forma diferenciada a adminis-tração de uma única empresa em todo o universo empresa-rial do Estado. A decisão do TC pode demorar muitos meses, mas se for favorável aos argu-mentos do PSD, pode significar uma vitória política, mas sem consequências.

É que uma coisa é o TC dizer, eventualmente, que o decreto--lei 39/2016 é inconstitucional, mas coisa diferente é dizer que os atuais administradores da

CGD não podem manter os sa-lários que foram negociados com o Governo.

Vamos por partes. Se o TC considerar que o decreto go-vernamental é inconstitucio-nal, ele desaparece da ordem jurídica portuguesa — ou seja, voltam a valer as regras ante-riores, que impõem à admi-nistração da CGD o Estatuto do Gestor Público, com as mesmas obrigações de trans-parência e os mesmos limites salariais que valem para os restantes. Para o ponto essen-cial em disputa — o salário — voltam a valer a regras ante-riores: “Não pode ultrapassar o vencimento mensal do pri-meiro-ministro”, a não ser no caso de empresas “em regime de concorrência no mercado”, esse limite pode subir para a “remuneração média dos úl-

timos três anos” auferida pelo gestor em causa.

Quer isto dizer que, se o TC chumbar o decreto do Gover-no, o salário de Paulo Macedo e companhia terá de ser revisto? Se o Constitucional for explí-cito sobre isso, sim — os juízes podem ditar que os contratos celebrados entretanto, ao abri-go das novas regras, são inváli-dos; mas também podem dizer que a sua decisão só se aplica aos futuros contratos. E podem

nem referir essa questão. A lati-tude de decisão do TC é grande.

Se o TC declarar inválidos os contratos agora em vigor, o salário de Paulo Macedo ficará muito longe dos 423 mil euros por ano, mais prémios, que irá auferir. Mesmo que receba a mé-dia dos últimos três anos, o valor será muito inferior tendo em conta que em dois desses anos Macedo era ministro (vencimen-to-base de €4334 brutos), e só em agosto o ex-governante inici-ou funções como administrador da seguradora Ocidental. No caso de o TC chumbar o decreto de julho mas não se pronunci-ar sobre contratos celebrados entretanto, Macedo mantém o salário atual, mas abre-se uma nova frente de batalha jurídica. Como dizíamos, não era agora que isto ia ficar simples. F.S.C.

[email protected]

Se receber a média dos últimos três anos, Macedo terá um grande corte de vencimento, pois o salário-base como ministro era €4334

A TRADIÇÃO AINDA É O QUE ERA

Até o “Povo Livre” criticou Cavaco

Não é novo este tipo de mal-estar entre PSD e Presidentes da República da sua cor política. Em 2006, um editorial do “Povo Livre”, o jornal oficial do partido, acusou Cavaco Silva de ser “colaborante” com José Sócrates (“Cavaco e Sócrates pedalam para o mesmo lado” foi o título), depois de o então Presidente da República ter dado uma entrevista à RTP em que elogiou Sócrates, o “reformista”. Marques Mendes, que na altura

liderava o PSD na oposição, não queria crer, embora tenha resistido sempre a entrar na guerra direta com o PR. Este género de embate aconteceu com outros Presidentes e também com Governos do PS. Mário Soares começou por ser pacífico com o Executivo de Cavaco Silva, quando fez a vida negra a Vítor Constâncio (que então liderava o PS) e convocou as eleições antecipadas que deram a maioria absoluta ao PSD. No seu segundo mandato em Belém, Soares assumiu um tal protagonismo contra Cavaco que Guterres viu-se grego para se afirmar na liderança da oposição. Essa fase do consulado de Marcelo ainda não chegou. Â.S.

Texto Ângela Silva e Filipe Santos Costa

Marcelo Rebelo de Sousa não resistiu ao primeiro remoque público que esta semana re-cebeu do líder da oposição — “Ainda bem que ele não é o líder do PSD”, afirmou Pas-sos Coelho. E respondeu à le-tra: “Tem toda a razão. Se eu fosse líder do PSD não podia ser o Presidente de todos os portugueses.” Mas a estraté-gia do Presidente da Repúbli-ca é outra. Marcelo “não vai alimentar isto”, garantem no seu inner-circle. Porque “é proi-bido um PR dar troco a líderes partidários”. Além do mais, a convicção do Presidente é que se alguém tem a perder com este tipo de embate não é ele, que tem níveis de popularidade estratosféricos, mas quem o critica.

Do outro lado deste inespera-do pingue-pongue, também Pe-dro Passos Coelho quer baixar a temperatura. “Aquilo ganhou uma dimensão desproporcio-nada”, reconhece uma fonte próxima do líder laranja, ga-rantindo que a farpa a Marcelo não pretendia abrir uma guer-ra com o Presidente. O próprio Passos já arrumou o assunto, explicando que o contexto em que disse a frase polémica era muito diferente do que parece. Não era uma provocação ou um amuo (palavra usada por Mar-celo), mas, “pelo contrário, até houve um elogio da nossa parte à atuação do PR”, esclareceu o líder da oposição.

Na conferência promovida pelo jornal online Eco, Passos estava a discorrer sobre a re-lação do PR com o Governo, comparando com o que Cavaco Silva fez no início do mandato, quando o PM era José Sócra-tes. “No essencial”, concluiu Passos, a “cooperação e apoio institucional” que Marcelo tem dado a Costa não é “em termos muito diferentes” do que aconteceu com Cavaco e Sócrates, apesar das “notórias” diferenças de estilo. Mas a frase memorável foi a outra, que deu origem a um bate-boca entre o PR e o líder da oposição. Ao ponto de o social-democrata Paulo Rangel ter comentado: “Eu seria, quer no caso do Pre-sidente quer no caso do PSD, um bocadinho mais comedido.”

Marcelo “proibido” de dar troco a Passos

PRESIDENTE/GOVERNO

PSD acusa Marcelo de andar com Costa ao colo. Presidente acha que não perde com isso

A declaração do líder do PSD foi vista em Belém com estra-nheza. É sabido que Marce-lo e Passos não se gostam. É igualmente sabido que Marcelo nunca perdoará a Passos a for-ma como tentou que ele não se candidatasse nas presidenciais, vetando o seu perfil numa mo-ção ao Congresso do PSD. Mas depois da tensão inicial, as re-lações bilaterais até pareciam ter distendido. O encontro a sós de quase duas horas que recentemente tiveram no palá-cio cor de rosa, consta, ajudou a serenar o ambiente.

Feridas do 1º de Dezembro

A razão para este agravamen-to súbito está diagnosticada — Passos ficou furioso por Marce-lo ter criticado o seu Governo ao dizer nas comemorações do 1º de Dezembro que este feria-

do, que Costa repôs, “nunca devia ter sido suspenso”. Mas o PR (que foi fiel ao que disse na altura da suspensão dos fe-riados, quando era comentador na TVI) acha que o que faltou a Passos foi jogo de cintura para fazer o mesmo que Assunção Cristas: foi à cerimónia e feste-jou o feriado, apesar de o CDS ter feito parte do Governo que o suspendeu.

“O Presidente da Repúbli-ca não pode ter preferências nem amuos”, afirmou Marcelo, numa indireta ao líder da opo-sição. E, para prevenir ataques que, futuramente, repliquem as críticas de Pedro Santana Lo-pes (“o Presidente parece ver a realidade nacional com uns óculos cor de rosa”), Marcelo deixou teoria: “Estou a cumprir meticulosamente e rigorosa-mente a Constituição na rela-ção com o Governo.”

Nas últimas semanas, o clima entre Marcelo e Passos estava a desanuviar, crispou outra vez, mas ambos querem baixar a temperatura FOTO ANA BAIÃO

E o que é que isto quer dizer? Que “está previsto que o PR colabore com qualquer Gover-no, criando todas as condições para que ele possa realizar os objetivos nacionais. É esse o objetivo do mandato presiden-cial”, afirmou Marcelo, a pro-pósito das críticas que vêm da sua área política.

São estes os argumentos que o levaram a estar (quase) sem-pre ao lado do Governo. Seja na frente externa, onde tem tido uma ação exuberante e intensa a desfazer preconceitos para com o Executivo de esquerda e a dar garantias de que Portugal cumpre na Europa e convida ao investimento estrangeiro, seja na frente interna, onde teve um papel decisivo a ajudar a des-crispar o ambiente. A crispação com Passos, essa, surge quando menos se espera.

[email protected]

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 13: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 13 PRIMEIRO CADERNO

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 14: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201614 PRIMEIRO CADERNO

PSD

Rangel segue com “toda a atenção” a agitação no partidoEurodeputado não exclui voltar a ser candidato contra Passos. Rui Rio está no terrenoPaulo Rangel, o principal ad-versário de Pedro Passos Coe-lho na última vez que o PSD teve uma disputa de lideran-ça, em 2010, está atento ao ambiente de efervescência no partido e não põe de parte a possibilidade de se recandida-tar. Ao que o Expresso apurou, o nome do eurodeputado tem sido referido nos bastidores do PSD nas últimas semanas, so-bretudo desde que Rui Rio deu o tiro de partida para a discus-são do pós-Passos, ao admitir candidatar-se à liderança no congresso previsto para o início de 2018 — entre os que querem afastar Passos, há quem tenha dúvidas de que Rio avance mes-mo; e nesse cenário o nome de Rangel tem vindo à baila.

O eurodeputado, sabe o Ex-presso, não põe de parte, em conversas privadas, a hipótese de voltar a apresentar-se na cor-rida à chefia do partido, já no próximo congresso. O facto de ter ido a jogo uma vez, quando poucos lhe vaticinavam grandes hipóteses, tendo então alcança-do quase 35%, vale como cartão de visita; os espaços de opinião semanal que mantém no jornal “Público” e na TVI24 assegu-ram-lhe presença mediática — por vezes demarcando-se das opções de Passos Coelho, no-meadamente do discurso eco-nomicista do líder da oposição.

Ao Expresso, Rangel con-firma que, apesar de estar há sete anos entre Bruxelas e Es-trasburgo, tem estado “muito atento” ao que se passa no seu partido. “Sigo com atenção tudo o que se passa em Por-tugal e em particular no PSD, como sempre segui. Com toda a atenção”, diz Rangel.

E não não se trata só de aten-ção à distância: o eurodeputado é presença regular em eventos partidários um pouco por todo o país, a convite de diversas es-truturas partidárias, o que lhe permite ir tomando o pulso ao partido e olear o networking entre barões, dirigentes locais e bases. Rangel não é a única figura nacional a corresponder a convites deste tipo das estru-turas do partido, mas a sua pos-tura nas últimas semanas leva um influente social-democrata a “apostar” que “Rio vai acabar por desistir e será o Rangel a enfrentar o Passos”.

Porém, antes de dar qualquer passo, o eurodeputado quer fa-lar com algumas das figuras que o apoiaram em 2010, como Nuno Morais Sarmento, que ainda há pouco tempo se mos-trou disponível para trabalhar numa alternativa à liderança de Passos Coelho.

Rio com líderes distritais

Apesar de subsistirem dúvidas sobre a determinação de Rui Rio passar das palavras aos atos e disputar mesmo a pre-sidência do PSD no próximo congresso, o ex-autarca do Por-to vai fazendo o seu caminho. Não tem uma máquina a traba-lhar para ele dentro do partido, como Passos tinha com Miguel Relvas, Marco António Costa e uma mão-cheia de peões do aparelho, mas isso não impede que seja cada vez mais convi-dado para eventos partidários.Esta semana, o “Público” noti-

ciou um almoço “de Natal” em que Rio esteve com os presi-dentes das distritais de Aveiro, Salvador Malheiro, e de Leiria, Rui Rocha. E, no fim de se-mana, o ex-autarca do Porto esteve num jantar “de Natal” organizado pela concelhia de Castelo de Paiva, “com cente-nas de sociais-democratas”, segundo o mesmo jornal.

Rui Rio não só está a ser convidado para mais iniciati-vas, como tem dito mais vezes sim a esses convites. Isto, de-pois de manter contactos com quase uma dezena de presi-dentes de distritais e muitos responsáveis concelhios. O facto de ter sido autarca do Porto faz dele uma mais-valia a um ano de umas autárquicas que se afiguram muito difíceis para o PSD e às quais Passos parece dar pouca atenção (ver texto ao lado).

Filipe Santos [email protected]

Passos Coelho canta bem, mas o PSD não parece alegre. Paulo Rangel está atento FOTO ALBERTO FRIAS

Silêncio total sobre eleições locais

Mais uma vez, Passos ignorou as autárquicas num Conselho Nacional. E diz que não há razão para “lufa-lufa”

Começa a ser uma tradição: as intervenções de fundo de Pedro Passos Coelho ignoram siste-maticamente as eleições autár-quicas de 2017. Foi assim no Conselho Nacional (CN) desta terça-feira, já fora assim no CN anterior, e até quando encerrou a Academia do Poder Local, a 20 de novembro, Passos manteve o guião de ataque ao Governo e es-crutínio das contas públicas, sem dar um segundo às eleições que acontecem daqui a nove meses.

A atitude de Passos está a exas-perar dirigentes locais e candi-datos a autarcas. “É inacreditá-vel!”, desabafava esta semana o

presidente de uma distrital que pediu anonimato. “Como é que se faz um Conselho Nacional nesta altura e o presidente do partido não tem nada para dizer sobre autárquicas? Para ele é só números, só números. Ninguém percebe!”

Outros conselheiros nacionais ouvidos pelo Expresso confir-mam que a falta de empenho de Passos no processo autárquico é uma das razões da desilusão que cresce em relação à lideran-ça. O caso é ainda mais insólito quando há a convicção de que a sobrevivência do presidente do PSD pode depender dessas eleições.

Apesar desta atitude em pú-blico, o líder laranja tem-se des-multiplicado em deslocações ao terreno e, embora o discurso seja focado no Governo, as con-versas têm abordado as autár-quicas. Mas só nos bastidores. No sábado, dia 3, em Viseu, Pas-sos reafirmou os calendários do PSD — autárquicas só a partir do primeiro trimestre de 2017 — e defendeu que “não há nenhuma razão” para andar “numa lufa--lufa”. F.S.C.

Nas deslocações ao terreno, Passos Coelho tem falado de autárquicas — mas só nas conversas de bastidores

CONFERÊNCIAS

Críticosconvidam ex-líderes

O movimento Portugal Não Pode Esperar, um think tank lançado no PSD por Pedro Rodrigues, ex-líder da JSD e crítico de Pedro Passos Coelho, está a organizar um conjunto de conferências para as quais quer convidar todos os ex-líderes do partido. O tema é “o futuro da social-democracia e o papel do PSD na sociedade portuguesa”. O objetivo, diz Pedro Rodrigues, é “reconciliar o PSD com a sua história” e puxar pela intervenção desses antigos líderes partidários. “O PSD

tem extraordinários ex-líderes com condições de dar um grande contributo, e não pode deixar de aproveitar esse ativo na reflexão sobre o seu papel e as suas propostas para o país”, explica o antigo presidente da JSD, acrescentando que “não pode bastar que esses ex-líderes apareçam às vezes num congresso”. Já este sábado à tarde, o movimento Portugal Não Pode Esperar organiza em Lisboa o seu primeiro evento, com três grupos de trabalho, sobre Portugal no Mundo, reforma do sistema político e saúde. As conclusões dos debates serão comentadas por Pedro Reis, presidente do Instituto Sá Carneiro, e Carlos Encarnação, ex-presidente da Câmara de Coimbra. F.S.C.

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 15: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Proibido jogar a menores de 18 anos.

AF_IMPRENSA_NATAL16_SC_185X295_E.indd 1 11/28/16 3:08 PM

Expresso, 10 de dezembro de 2016 15 PRIMEIRO CADERNO

AICEP

António Costa e Augusto San-tos Silva queriam manter Mi-guel Frasquilho na presidência da AICEP-Agência para o In-vestimento e o Comércio Ex-terno de Portugal mas não con-seguiram demovê-lo de sair no fim do mandato, que termina no final deste ano. Tanto o pri-meiro-ministro como o minis-tro dos Negócios Estrangeiros tinham uma boa relação com Miguel Frasquilho e ainda não encontraram substituto. As di-fíceis relações com o secretário de Estado da Internacionaliza-ção tiveram, ao que o Expresso apurou, um peso decisivo neste desfecho.

Ao contrário do anterior Governo, que manteve a tute-la da AICEP sempre ao mais alto nível — primeiro era de Paulo Portas, quando este ti-nha a pasta dos Negócios Es-trangeiros, e depois continu-ou com Paulo Portas quando este ascendeu a vice-primei-ro-ministro — António Costa entregou a tutela da Agência a um secretário de Estado de Augusto Santos Silva. As re-lações de Jorge Costa Oliveira com Miguel Frasquilho nunca foram fáceis. E embora o pri-meiro-ministro tenha, segundo fontes oficiais confirmaram ao Expresso, admitido mexer na tutela da AICEP se isso aju-dasse a resolver o problema, Frasquilho preferiu sair.

Em recente entrevista ao “DN” e à TSF, o ainda presi-dente da Agência, que ocupa o cargo desde 2014, assumiu que não pretende continuar: “Foi uma iniciativa que partiu de mim e não tem rigorosamen-te nada que ver com o facto de ter havido uma mudança de Governo”. Contactado pelo Expresso, Frasquilho não quis fazer mais comentários sobre o assunto. Apenas reafirmou

Tutela pesou na saída de FrasquilhoAntónio Costa ainda não arranjou substituto para a AICEP e ponderou mexer na tutela. PM queria manter Frasquilho

que ainda não sabe o que vai fazer a seguir.

Apesar de o seu mandato terminar no fim de 2016, o presidente demissionário dis-se na mesma entrevista que é provável que continue na agên-cia “nos primeiros meses de 2017” por forma a fechar todos os dossiês relacionados com o plano estratégico que assumiu neste mandato e que fez ques-tão de cumprir.

O ministro dos Negócios Es-trangeiros já comentou a de-cisão de Frasquilho. Augusto Santos Silva disse respeitar a decisão e, num comunicado à Lusa, quis “agradecer publica-mente ao doutor Miguel Fras-quilho a dedicação e compe-tência com que desempenhou a sua função”. Quanto à futura administração, o ministro disse que ela será “comunicada opor-tunamente”.

Mudanças na calha?

Fontes próximas do processo referem a existência de uma short list e a definição de um perfil que passará por alguém da área do centro-direita com ligação aos meios empresariais. Mas também referem que não está a ser fácil. A perda de vi-sibilidade e de peso específi-co da AICEP, sobretudo em comparação com o papel que desempenhou no anterior Go-verno não ajudam. A dúvida é se António Costa aproveitará para mexer na tutela da Agên-cia, como admitiu fazer quando tentou segurar Frasquilho.

Certo é que, numa altura em que o chefe do Governo quer valorizar a agenda económi-ca e dar absoluta prioridade à captação de investimento por forma a pôr a economia a crescer, o papel da Agência, que tem por função, simulta-neamente, atrair investidores e abrir portas para os empre-sários portugueses lá fora, é absolutamente decisivo.

Ângela [email protected]

Cristina Figueiredo

As comemorações dos 30 anos da adesão de Portugal e Espa-nha à Comunidade Europeia começaram em janeiro, com uma cerimónia tradicional no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, mas terminam de for-ma bem menos ortodoxa, na próxima quinta-feira, em Bru-xelas. Ainda inspirado pelas estrelas Michelin recentemen-te atribuídas aos restaurantes portugueses — e empenhado que está em trazer uma pró-xima edição do evento para Portugal —, António Costa su-geriu a Mariano Rajoy que ofe-recessem o almoço de trabalho aos restantes 26 membros do

Costa e Rajoy oferecem almoço à UE

EUROPA

Na próxima quinta-feira, o almoço do Conselho Europeu tem ementa ibérica, assinada por Avillez e Pepe SollaConselho Europeu, na reuni-ão da próxima quinta-feira. O chefe do Governo espanhol agarrou a ideia e o resultado é uma ementa ibérica ideali-zada por dois chefes bem co-nhecidos: José Avillez assina a entrada (creme de castanhas) e a sobremesa (pastel de nata em massa folhada); Pepe Solla o prato principal (pescada do celeiro). A refeição será acom-panhada por vinhos portugue-ses e espanhóis.

A promoção da gastronomia dos dois países é o objetivo “económico” da iniciativa, mas também há uma inten-ção política, explica ao Ex-presso fonte do gabinete do primeiro-ministro: mostrar o bom relacionamento entre

os dois Estados vizinhos, re-centemente reforçado pela visita dos reis de Espanha a Portugal, sublinhar o clima de boa vizinhança (numa altura em que a central de Almaraz arrisca ser uma ‘espinha’ no prato) e, sobretudo, chamar a atenção dos restantes países da Europa como são possíveis boas relações bilaterais mes-mo entre governos de famílias políticas diferentes.

À mesa do almoço — que marca uma reunião convo-cada para discutir sobretudo as políticas de migração, mas também a agenda de seguran-ça e as políticas de emprego para a juventude — vão estar sentados os chefes de Governo dos (ainda) 28 Estados-mem-

bros, mas também o presi-dente do Conselho Europeu, Donald Tusk, e o presidente da Comissão Europeia Jean--Claude Juncker. Ao jantar serão apenas 27: o Reino Uni-do já não consta da lista dos convidados para discutir “o futuro da Europa”.

António Costa aterra em Bruxelas após dois dias em Nova Iorque, para onde parte amanhã, juntamente com o Presidente da República, para assistir ao juramento de Antó-nio Guterres como secretário--geral da ONU, na segunda-fei-ra de manhã. À tarde, Portugal oferece uma receção (no edifí-cio das Nações Unidas) a toda a comunidade diplomática.

[email protected]

Mariano Rajoy e António Costa: as boas relações entre Espanha e Portugal no prato dos 28 FOTO RUI DUARTE SILVA

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 16: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201616 PRIMEIRO CADERNO

Do Minho ao Algarve, passando pelas Beiras, Trás-os-Montes e Alto Douro, sem esquecer a Madeira e os Açores, e até nas grandes metrópo-les de Lisboa e Porto, o bacalhau é o grande pro-tagonista da ceia de Natal, normalmente cozido

com batatas, grelos e couve-portuguesa, tudo bem regado com o melhor azeite. Os mais conceituados chefs nacio-nais não hesitam e dizem com convicção que o bacalhau é obrigatório, não pode mesmo faltar no Natal. E, já agora, durante o resto do ano também não, tendo em conta que Portugal consome cerca de 70 mil toneladas de bacalhau seco anualmente. De nome científico Gadus, o bacalhau é o nome comum de várias espécies de peixes classificadas em vários géneros, sendo que o “verdadeiro” bacalhau encontrado no Atlântico é chamado Gadus morhua e pertence a uma das cerca de 60 espécies da mesma família de peixes migratórios. Entre os peixes comercializados como bacalhau existem dois mais comuns: o Gadus morhua, que vive nas águas frias do oceano Atlântico Norte, e o Gadus macrocephalus, do oceano Pacífico, no Alasca. O Gadus vive nos mares frios

Quase se pode arriscar dizer que não há mesa portuguesa onde este peixe não marque presença na noite de Consoada. Cozido, com todos, assado com crosta de broa, confitado, em tiborna ou caldeirada, e reinventado na tradicional “roupa velha”, o bacalhau brilha ao longo de todo o ano e ganha especial destaque em dezembro, como a principal estrela do Natal em Portugal.

do Norte, sendo geralmente de tamanho pequeno, embora alguns exemplares possam chegar a pesar 100 kg e medir pouco menos de dois metros. Alimenta-se de outros peixes menores, como o arenque. Na comercialização, o bacalhau é classificado de acordo com o seu peso, sendo o mais pequeno o miúdo, com me-nos de 500 g, e o maior o especial, com mais de 3 kg.

MIÚDO < 0,5 kg; CORRENTE – 0,5 kg até 1 kg; CRESCIDO – 1 kg até 2 kg; GRAÚDO – 2 kg até 3 kg; ESPECIAL – +3 kg.

Nas Lojas Continente pode encontrar uma oferta de baca-lhaus alargada, para todas as ocasiões. Da Noruega ou da Islândia, mais pequeno ou maior, de cura tradicional ou de cura amarela.

PESCA, SELEÇÃO E SALGASabia que a melhor altura para pescar bacalhau de quali-

NATAL É, DESDE SEMPRE, SINÓNIMO DE BACALHAU

PUB

Continente cabe aos consumidores a escolha final. Dizem os especialistas que quando adquirimos bacalhau salgado seco devemos ter em conta vários fatores que nos dão indicação sobre a qualidade do produto final, como a cor, manchas, defeitos, humidade, conformação, entre outros. Usualmente, a cor “palha” (mais amarelada) indicia um produto bem curado. A humidade pode ser aferida por apalpação do peixe, que se deve apresentar rijo e sem fissuras. Uma dica importante: segurando o peixe na horizontal, pelo lado onde estava a cabeça, o bacalhau não deverá dobrar em demasia. Em termos de conformação, deve ter atenção à qualidade e uniformidade da escala do produto, assegurando que, se for feito um corte ao longo da coluna vertebral, ficaremos com duas partes simétricas. Para facilitar a tarefa da escolha, nas peixarias das Lojas Continente pode pedir a ajuda de especialistas que diariamente manuseiam este peixe e tão bem o conhecem. Para que possa tirar o melhor partido do prato que pretende confecionar, peça ajuda para escolher qual o melhor exemplar e tipo de corte, pois a grande vantagem deste peixe é o seu aproveitamento. Saber cortar o bacalhau determina o aproveitamento de todas as partes, tornando-o um dos alimentos mais económicos. Pode pedir o corte tradicional, o de lombos ou outro que pretenda. Aconselhe--se com quem sabe.

BACALHAU AGORA FALA O ESPECIALISTA SIMÃO GONÇALVES – CNCB

de um cuidadoso processo, desde a escala até à salga. Todo este processo fica a cargo de especialistas, como a Companhia Nacional Comércio Bacalhau, S. A. (CNCB), uma empresa líder no mercado português que se dedica à produção, transformação e comercialização de bacalhau salgado seco. Poucas horas após a captura do bacalhau no oceano Atlântico Norte, os pequenos barcos regressam ao cais, onde a CNCB inicia junto dos pescadores islandeses a seleção da matéria-prima de primeira qualidade. Ainda em solo islandês, a CNCB assegura que o bacalhau selecionado é salgado no dia da descarga dos barcos, maximizando o seu período de maturação. A salga do bacalhau Selecção Continente Islândia é, assim, mais longa, proporcionando ao produto final uma cura melhor. Depois de pescado, escalado e salgado, o bacalhau é depois trazido para Portugal e transportado para as instalações da CNCB (na Gafanha da Nazaré), onde se procede à secagem e ao armazenamento em câmaras frigoríficas.

EM CASA: DA CONSERVAÇÃO À DEMOLHAApesar de o sal contribuir positivamente para a conservação, deverão ser tidos em conta vários cuidados. O bacalhau inteiro salgado seco pode ser guardado em local fresco e seco, desde que protegido da luz solar. Depois de cortado em postas, o bacalhau salgado seco deverá ser conservado no frigorífico. Em alternativa, pode ser congelado depois de demolhado, para utilizar em qualquer ocasião.Demolhar corretamente o bacalhau é também fundamental para que fique no ponto certo de sal, sabor e textura. O processo deve começar por uma lavagem em água fria corrente, para retirar o excesso de sal à superfície. Depois deve ser colocado num recipiente com água bem fria, com a pele virada para cima e totalmente coberto pela água. O segredo é reservar no frigorífico para manter a água bem fria, sendo que esta deverá ser renovada até três vezes por dia. As postas mais altas devem ser demolhadas durante mais tempo, pois têm uma maior concentração de sal no seu interior. depois da demolha, o bacalhau pode ganhar até 30% do seu peso em seco.

À MESA: BACALHAU É SAÚDEDepois de bem demolhado, aproveite o que o bacalhau tem de melhor. O consumo regular de peixe é universalmente recomendado pelos especialistas em alimentação, já que se trata de uma fonte privilegiada de diversos nutrientes, tais como: proteínas de alto valor biológico (com todos os aminoácidos essenciais ao organismo), minerais (como, por exemplo, selénio e iodo), vitaminas e gordura insaturada, da qual se destaca o ómega 3. O bacalhau é um peixe magro, com um baixo teor de gordura. No entanto, como é um dos peixes mais presentes nas mesas dos portugueses, é dos que mais contribui para atingir as necessidades diárias de ómega 3. É rico em vitamina D, ideal para manter o bom funcionamento muscular, e em vitamina B12, que ajuda na redução do cansaço e fadiga.Para privilegiar o valor nutricional do bacalhau, deve optar-se por métodos de confeção saudáveis, como é o caso dos cozidos, dos grelhados, dos estufados e dos assados com pouca gordura. A gordura de eleição usada na confeção e na preparação gastronómica deste peixe deve ser o azeite, e recomenda-se a combinação com ervas aromáticas e especiarias, como o colorau e o pimentão, em detrimento do sal, para condimentar os pratos de bacalhau. Sumo de lima ou limão também é uma excelente opção de tempero, mas apenas durante um curto período de tempo (cinco a dez minutos). Bom apetite!

TEMPOS DE DEMOLHA DO BACALHAUO tempo de demolha é meramente indicativo e depende do calibre/peso do bacalhau e gosto pessoal:

MIÚDO < 0,5 kg – 24 h;CORRENTE – 0,5 kg até 1 kg – 36 h; CRESCIDO – 1 kg até 2 kg – 48 h;GRAÚDO – 2 kg até 3 kg – 55 h;ESPECIAL – +3 kg – 72 h.

Como é que a CNCB nasce como produtora de bacalhau salgado seco? A CNCB – Companhia Nacional Comércio Bacalhau, S. A., é uma empresa líder no mercado português que se dedica à produção, transformação e comercialização de bacalhau salgado seco. Foi fundada no início de 2002, com a sua sede nas antigas instalações da CRCB – Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau. Até hoje transforma e comercializa os seus produtos com os mais rigorosos processos de controlo de qualidade. Apesar da sua curta existência, desenvolve já parcerias com importantes empresas do setor da distribuição de produtos alimentares.

Como define e caracteriza o bacalhau Selecção Continente Islândia?A CNCB assegura um produto final da mais elevada qualidade, representado na sua marca Norte, com um

único objetivo principal: a satisfação do consumidor. Apoiamo-nos em instalações amplas e bem equipadas para transformar e conservar o bacalhau, para que o consumidor possa escolher o que mais lhe agrada, sempre com a garantia de uma qualidade superior, um bacalhau fresco, saboroso e com todas as suas propriedades nutritivas.

O que torna este produto tão especial?Na Islândia, logo após a pesca, a CNCB assegura que o bacalhau selecionado seja salgado no dia da descarga dos barcos, maximizando o período de maturação do peixe, fator fundamental para que o produto final fique de acordo com o verdadeiro sabor dos portugueses. Tudo isto é realizado nos primeiros meses de cada ano, a época de pesca que apresenta a melhor qualidade no bacalhau pescado. A CNCB assegura, assim, um produto final distinto e da mais elevada qualidade – o bacalhau Selecção Continente Islândia.

DICAS PARA A COZINHA LÁ DE CASADiz-se que há 1001 formas de cozinhar bacalhau: cozido, no forno, assado na brasa, frito, em soufflés, caldeiradas e ensopados, com arroz, com natas ou béchamel, à Brás, à Gomes de Sá, à Zé do Pipo, confitado, gratinado, recheado, em açordas, empadões ou saladas, em pastéis e pataniscas. E para cada receita há sempre um corte ideal. O Corte Tradicional e o Corte Lombo são os dois tipos de cortes mais comuns, que dividem o bacalhau em lombos, postas médias ou finas, abas ou badanas, rabos e migas, de acordo com a preferência dos clientes. Nada se desperdiça. Aqui ficam algumas sugestões de preparação:

LombosEste é, normalmente, o corte mais suculento e que lasca mais facilmente. É ideal para assar, cozer ou grelhar e preparar pratos típicos, como bacalhau à lagareiro, bacalhau com broa ou bacalhau assado com batatas.

Postas médias ou finasAs postas mais finas são ideais para cozer, fritar ou desfiar, e confecionar, por exemplo, bacalhau de cebolada, caldeiradas ou bacalhau com natas.

Abas ou badanasSão ótimas para fritar em cebolada, cozer ou desfiar. Ideais para pataniscas ou bacalhau à Brás, por exemplo.

RabosSão excelentes para dar ainda mais sabor aos acompanhamentos. Deixe cozer lentamente e utilize a água de cozedura para fazer arroz, massas ou sopas.

MigasUtilize em lasanhas, empadões, empadas, massas, arroz de bacalhau.

dade é nos primeiros meses de cada ano? O bacalhau, um peixe migratório, dirige-se às águas frias do Norte para a procura de alimento e é até à Páscoa, altura da desova, a melhor altura para o pescar. Depois da captura e da seleção dos peixes, o bacalhau é aberto e escalado, remove-se a espinha central e inicia-se a salga, um processo milenar de envolvimento do bacalhau em sal (usa-se 1 kg de sal para 1 kg de bacalhau), que per-mite a conservação do peixe e a garantia da sua qualidade. Depois o bacalhau repousa durante um período mínimo de quatro meses e no final passa por um processo de secagem para desidratar. No processo de salga e seca tem lugar uma absorção de sal e uma considerável perda de água, originan-do um produto salgado com um teor proteico relativamente elevado. As características do bacalhau salgado seco são condicionadas não só pelos processos de salga (quanto mais tempo o bacalhau está no sal melhor a sua qualidade) e seca, mas também pela qualidade do peixe e do tipo de sal.

NAS LOJAS: A ARTE DE BEM ESCOLHERNo final de todo este processo, na peixaria das Lojas

SUGESTÃO PARA A SUA MESA DE NATALPara este Natal, o Continente recomenda o bacalhau Selecção Continente Islândia. Disponível nas Lojas Continente não só no Natal mas durante todo o ano, o bacalhau da Islândia é excecional. Pescado à linha (o que assegura melhor qualidade do produto, já que no processo de pesca com redes de arrasto é normal que o peixe ganhe hematomas), salgado a partir de peixe “salgado verde”, é resultado da escolha criteriosa de pescadores experientes e

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 17: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 17 PRIMEIRO CADERNO

Do Minho ao Algarve, passando pelas Beiras, Trás-os-Montes e Alto Douro, sem esquecer a Madeira e os Açores, e até nas grandes metrópo-les de Lisboa e Porto, o bacalhau é o grande pro-tagonista da ceia de Natal, normalmente cozido

com batatas, grelos e couve-portuguesa, tudo bem regado com o melhor azeite. Os mais conceituados chefs nacio-nais não hesitam e dizem com convicção que o bacalhau é obrigatório, não pode mesmo faltar no Natal. E, já agora, durante o resto do ano também não, tendo em conta que Portugal consome cerca de 70 mil toneladas de bacalhau seco anualmente. De nome científico Gadus, o bacalhau é o nome comum de várias espécies de peixes classificadas em vários géneros, sendo que o “verdadeiro” bacalhau encontrado no Atlântico é chamado Gadus morhua e pertence a uma das cerca de 60 espécies da mesma família de peixes migratórios. Entre os peixes comercializados como bacalhau existem dois mais comuns: o Gadus morhua, que vive nas águas frias do oceano Atlântico Norte, e o Gadus macrocephalus, do oceano Pacífico, no Alasca. O Gadus vive nos mares frios

Quase se pode arriscar dizer que não há mesa portuguesa onde este peixe não marque presença na noite de Consoada. Cozido, com todos, assado com crosta de broa, confitado, em tiborna ou caldeirada, e reinventado na tradicional “roupa velha”, o bacalhau brilha ao longo de todo o ano e ganha especial destaque em dezembro, como a principal estrela do Natal em Portugal.

do Norte, sendo geralmente de tamanho pequeno, embora alguns exemplares possam chegar a pesar 100 kg e medir pouco menos de dois metros. Alimenta-se de outros peixes menores, como o arenque. Na comercialização, o bacalhau é classificado de acordo com o seu peso, sendo o mais pequeno o miúdo, com me-nos de 500 g, e o maior o especial, com mais de 3 kg.

MIÚDO < 0,5 kg; CORRENTE – 0,5 kg até 1 kg; CRESCIDO – 1 kg até 2 kg; GRAÚDO – 2 kg até 3 kg; ESPECIAL – +3 kg.

Nas Lojas Continente pode encontrar uma oferta de baca-lhaus alargada, para todas as ocasiões. Da Noruega ou da Islândia, mais pequeno ou maior, de cura tradicional ou de cura amarela.

PESCA, SELEÇÃO E SALGASabia que a melhor altura para pescar bacalhau de quali-

NATAL É, DESDE SEMPRE, SINÓNIMO DE BACALHAU

PUB

Continente cabe aos consumidores a escolha final. Dizem os especialistas que quando adquirimos bacalhau salgado seco devemos ter em conta vários fatores que nos dão indicação sobre a qualidade do produto final, como a cor, manchas, defeitos, humidade, conformação, entre outros. Usualmente, a cor “palha” (mais amarelada) indicia um produto bem curado. A humidade pode ser aferida por apalpação do peixe, que se deve apresentar rijo e sem fissuras. Uma dica importante: segurando o peixe na horizontal, pelo lado onde estava a cabeça, o bacalhau não deverá dobrar em demasia. Em termos de conformação, deve ter atenção à qualidade e uniformidade da escala do produto, assegurando que, se for feito um corte ao longo da coluna vertebral, ficaremos com duas partes simétricas. Para facilitar a tarefa da escolha, nas peixarias das Lojas Continente pode pedir a ajuda de especialistas que diariamente manuseiam este peixe e tão bem o conhecem. Para que possa tirar o melhor partido do prato que pretende confecionar, peça ajuda para escolher qual o melhor exemplar e tipo de corte, pois a grande vantagem deste peixe é o seu aproveitamento. Saber cortar o bacalhau determina o aproveitamento de todas as partes, tornando-o um dos alimentos mais económicos. Pode pedir o corte tradicional, o de lombos ou outro que pretenda. Aconselhe--se com quem sabe.

BACALHAU AGORA FALA O ESPECIALISTA SIMÃO GONÇALVES – CNCB

de um cuidadoso processo, desde a escala até à salga. Todo este processo fica a cargo de especialistas, como a Companhia Nacional Comércio Bacalhau, S. A. (CNCB), uma empresa líder no mercado português que se dedica à produção, transformação e comercialização de bacalhau salgado seco. Poucas horas após a captura do bacalhau no oceano Atlântico Norte, os pequenos barcos regressam ao cais, onde a CNCB inicia junto dos pescadores islandeses a seleção da matéria-prima de primeira qualidade. Ainda em solo islandês, a CNCB assegura que o bacalhau selecionado é salgado no dia da descarga dos barcos, maximizando o seu período de maturação. A salga do bacalhau Selecção Continente Islândia é, assim, mais longa, proporcionando ao produto final uma cura melhor. Depois de pescado, escalado e salgado, o bacalhau é depois trazido para Portugal e transportado para as instalações da CNCB (na Gafanha da Nazaré), onde se procede à secagem e ao armazenamento em câmaras frigoríficas.

EM CASA: DA CONSERVAÇÃO À DEMOLHAApesar de o sal contribuir positivamente para a conservação, deverão ser tidos em conta vários cuidados. O bacalhau inteiro salgado seco pode ser guardado em local fresco e seco, desde que protegido da luz solar. Depois de cortado em postas, o bacalhau salgado seco deverá ser conservado no frigorífico. Em alternativa, pode ser congelado depois de demolhado, para utilizar em qualquer ocasião.Demolhar corretamente o bacalhau é também fundamental para que fique no ponto certo de sal, sabor e textura. O processo deve começar por uma lavagem em água fria corrente, para retirar o excesso de sal à superfície. Depois deve ser colocado num recipiente com água bem fria, com a pele virada para cima e totalmente coberto pela água. O segredo é reservar no frigorífico para manter a água bem fria, sendo que esta deverá ser renovada até três vezes por dia. As postas mais altas devem ser demolhadas durante mais tempo, pois têm uma maior concentração de sal no seu interior. depois da demolha, o bacalhau pode ganhar até 30% do seu peso em seco.

À MESA: BACALHAU É SAÚDEDepois de bem demolhado, aproveite o que o bacalhau tem de melhor. O consumo regular de peixe é universalmente recomendado pelos especialistas em alimentação, já que se trata de uma fonte privilegiada de diversos nutrientes, tais como: proteínas de alto valor biológico (com todos os aminoácidos essenciais ao organismo), minerais (como, por exemplo, selénio e iodo), vitaminas e gordura insaturada, da qual se destaca o ómega 3. O bacalhau é um peixe magro, com um baixo teor de gordura. No entanto, como é um dos peixes mais presentes nas mesas dos portugueses, é dos que mais contribui para atingir as necessidades diárias de ómega 3. É rico em vitamina D, ideal para manter o bom funcionamento muscular, e em vitamina B12, que ajuda na redução do cansaço e fadiga.Para privilegiar o valor nutricional do bacalhau, deve optar-se por métodos de confeção saudáveis, como é o caso dos cozidos, dos grelhados, dos estufados e dos assados com pouca gordura. A gordura de eleição usada na confeção e na preparação gastronómica deste peixe deve ser o azeite, e recomenda-se a combinação com ervas aromáticas e especiarias, como o colorau e o pimentão, em detrimento do sal, para condimentar os pratos de bacalhau. Sumo de lima ou limão também é uma excelente opção de tempero, mas apenas durante um curto período de tempo (cinco a dez minutos). Bom apetite!

TEMPOS DE DEMOLHA DO BACALHAUO tempo de demolha é meramente indicativo e depende do calibre/peso do bacalhau e gosto pessoal:

MIÚDO < 0,5 kg – 24 h;CORRENTE – 0,5 kg até 1 kg – 36 h; CRESCIDO – 1 kg até 2 kg – 48 h;GRAÚDO – 2 kg até 3 kg – 55 h;ESPECIAL – +3 kg – 72 h.

Como é que a CNCB nasce como produtora de bacalhau salgado seco? A CNCB – Companhia Nacional Comércio Bacalhau, S. A., é uma empresa líder no mercado português que se dedica à produção, transformação e comercialização de bacalhau salgado seco. Foi fundada no início de 2002, com a sua sede nas antigas instalações da CRCB – Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau. Até hoje transforma e comercializa os seus produtos com os mais rigorosos processos de controlo de qualidade. Apesar da sua curta existência, desenvolve já parcerias com importantes empresas do setor da distribuição de produtos alimentares.

Como define e caracteriza o bacalhau Selecção Continente Islândia?A CNCB assegura um produto final da mais elevada qualidade, representado na sua marca Norte, com um

único objetivo principal: a satisfação do consumidor. Apoiamo-nos em instalações amplas e bem equipadas para transformar e conservar o bacalhau, para que o consumidor possa escolher o que mais lhe agrada, sempre com a garantia de uma qualidade superior, um bacalhau fresco, saboroso e com todas as suas propriedades nutritivas.

O que torna este produto tão especial?Na Islândia, logo após a pesca, a CNCB assegura que o bacalhau selecionado seja salgado no dia da descarga dos barcos, maximizando o período de maturação do peixe, fator fundamental para que o produto final fique de acordo com o verdadeiro sabor dos portugueses. Tudo isto é realizado nos primeiros meses de cada ano, a época de pesca que apresenta a melhor qualidade no bacalhau pescado. A CNCB assegura, assim, um produto final distinto e da mais elevada qualidade – o bacalhau Selecção Continente Islândia.

DICAS PARA A COZINHA LÁ DE CASADiz-se que há 1001 formas de cozinhar bacalhau: cozido, no forno, assado na brasa, frito, em soufflés, caldeiradas e ensopados, com arroz, com natas ou béchamel, à Brás, à Gomes de Sá, à Zé do Pipo, confitado, gratinado, recheado, em açordas, empadões ou saladas, em pastéis e pataniscas. E para cada receita há sempre um corte ideal. O Corte Tradicional e o Corte Lombo são os dois tipos de cortes mais comuns, que dividem o bacalhau em lombos, postas médias ou finas, abas ou badanas, rabos e migas, de acordo com a preferência dos clientes. Nada se desperdiça. Aqui ficam algumas sugestões de preparação:

LombosEste é, normalmente, o corte mais suculento e que lasca mais facilmente. É ideal para assar, cozer ou grelhar e preparar pratos típicos, como bacalhau à lagareiro, bacalhau com broa ou bacalhau assado com batatas.

Postas médias ou finasAs postas mais finas são ideais para cozer, fritar ou desfiar, e confecionar, por exemplo, bacalhau de cebolada, caldeiradas ou bacalhau com natas.

Abas ou badanasSão ótimas para fritar em cebolada, cozer ou desfiar. Ideais para pataniscas ou bacalhau à Brás, por exemplo.

RabosSão excelentes para dar ainda mais sabor aos acompanhamentos. Deixe cozer lentamente e utilize a água de cozedura para fazer arroz, massas ou sopas.

MigasUtilize em lasanhas, empadões, empadas, massas, arroz de bacalhau.

dade é nos primeiros meses de cada ano? O bacalhau, um peixe migratório, dirige-se às águas frias do Norte para a procura de alimento e é até à Páscoa, altura da desova, a melhor altura para o pescar. Depois da captura e da seleção dos peixes, o bacalhau é aberto e escalado, remove-se a espinha central e inicia-se a salga, um processo milenar de envolvimento do bacalhau em sal (usa-se 1 kg de sal para 1 kg de bacalhau), que per-mite a conservação do peixe e a garantia da sua qualidade. Depois o bacalhau repousa durante um período mínimo de quatro meses e no final passa por um processo de secagem para desidratar. No processo de salga e seca tem lugar uma absorção de sal e uma considerável perda de água, originan-do um produto salgado com um teor proteico relativamente elevado. As características do bacalhau salgado seco são condicionadas não só pelos processos de salga (quanto mais tempo o bacalhau está no sal melhor a sua qualidade) e seca, mas também pela qualidade do peixe e do tipo de sal.

NAS LOJAS: A ARTE DE BEM ESCOLHERNo final de todo este processo, na peixaria das Lojas

SUGESTÃO PARA A SUA MESA DE NATALPara este Natal, o Continente recomenda o bacalhau Selecção Continente Islândia. Disponível nas Lojas Continente não só no Natal mas durante todo o ano, o bacalhau da Islândia é excecional. Pescado à linha (o que assegura melhor qualidade do produto, já que no processo de pesca com redes de arrasto é normal que o peixe ganhe hematomas), salgado a partir de peixe “salgado verde”, é resultado da escolha criteriosa de pescadores experientes e

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 18: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Boutiques MontblancLisboa: Av. da Liberdade, 111 · Centro Colombo, Loja 0.149 · El Corte Inglés, Piso 0Porto: Norteshopping, Loja 0.415/17 · Vila Nova de Gaia: El Corte Inglés, Piso 0

Pioneira desde 1906. Parao pioneiro que há em si.Concebido a pensar no viajante contem-porâneo e inspirado nos primórdios danavegação moderna, o Montblanc 4810Chronograph Automatic personificaa precisão e o requinte artesanal daalta relojoaria suíça.

Conheça toda a história emmontblanc.com/pioneering.Crafted for New Heights.*

* Manufaturado paraNovos Desafios

553627-04 | AD | Pioneering | PT | 4810 | Expresso | 139 x 220 mm | pt | t 5, b 5, r 5, l 5 mm

553627-04_AD_Pioneer_PT_4810_Expresso_139x220_pt_co.indd 1 01.11.16 11:43

Expresso, 10 de dezembro de 201618 PRIMEIRO CADERNO

INVESTIGAÇÃO

O processo dos submarinos foi arquivado há dois anos, mas Ana Gomes afirma que há dados novos, revelados nos “Panama Papers”, que jus-tificam que se volte a olhar para o caso. A eurodeputada defende que a Procuradoria--Geral da República deveria reabrir o processo e quer levar a investigação também para o Parlamento Europeu. A so-cialista propôs, esta semana, que a Comissão Parlamentar aos “Panama Papers” — de que é vice-presidente — estude o que considera ser “um caso de corrupção de alto nível” a en-volver dois Estados membros, Portugal e Alemanha.

Ana Gomes afirma que fal-ta ainda revelar quem foram os beneficiários de cerca de 10 milhões de euros, de “lu-vas pagas pelos fornecedores alemães”, no negócio dos sub-mergíveis adquiridos pelo Es-tado português. Defende que as revelações recentes podem ajudar a seguir o rasto do di-nheiro que foi transferido para um Fundo nas Bahamas — o FELLTREE Investment Fund. A transferência terá sido feita pela ESCOM, uma empresa de consultoria que pertencia ao Grupo Espírito Santo e que

Ana Gomes quer reabrir submarinosA eurodeputada defende uma nova investigação com base nas informações reveladas nos “Panama Papers”

representava o consórcio de fornecedores alemães.

Durante a investigação, o Ministério Público português nunca conseguiu a coopera-ção das autoridades das Baha-mas para esclarecer detalhes. “Graças aos ‘Panama Papers’, hoje sabe-se que o FELLTREE Fund nas Bahamas é detido por um FELLTREE Fund no Panamá”, explica a eurode-putada, acrescentando que os acionistas pertencem a “uma companhia de advogados na Suíça, que atuam como inter-mediários e que ofuscam os beneficiários últimos”.

Plano B

Na sequência do escândalo de evasão fiscal revelado por um Consórcio de Jornalistas — e que o Expresso publicou em Portugal —, o Parlamento Eu-ropeu decidiu criar uma comis-são parlamentar para inves-tigar alegadas contravenções relacionadas com o branquea-mento de capital e evasão fiscal. A chamada comissão “PANA” deverá avançar com recomen-dações políticas para combater este tipo de problemas, mas decidiu também debruçar-se sobre o estudo de um caso con-creto, que Ana Gomes propõe que seja o dos submarinos.

A proposta terá de ser avalia-da pelos eurodeputados, mas há mais iniciativas em cima da mesa e a comissão parlamentar

só poderá escolher um case stu-dy. A eurodeputada portugue-sa acredita que pode ter o apoio dos Verdes e dos colegas socia-listas, mas não tem tanta certe-za sobre uma posição favorável de eurodeputados alemães e do Partido Popular Europeu, onde têm assento PSD e CDS.

A proposta entregue à Comis-são parlamentar explica o caso a eurodeputados que nunca ouviram falar dele e inclui uma lista de nomes que, segundo Ana Gomes, deveriam ser ou-vidos, incluindo Durão Barroso e Paulo Portas, por estarem en-volvidos na decisão da compra dos submarinos.

“E se não houver uma in-vestigação feita pela comissão parlamentar, haverá uma in-vestigação feita por um con-junto de deputados”, promete Ana Gomes. Diz ter preparado um plano B, caso o Parlamen-to Europeu escolha analisar a fundo um outro tema e deixe de fora os submarinos. Prefere não revelar para já nomes mas adianta que terão “meios” para financiar a investigação. A eu-rodeputada, que foi assistente no processo dos submarinos, diz nunca se ter conformado com o arquivamento em 2014. A Comissão PANA poderá to-mar uma decisão sobre a es-colha do “estudo de caso” no início do próximo ano.

Susana Frexes Correspondente em Bruxelas

[email protected]

Adriano Nobre e Rosa Pedroso Lima

Será uma questão de tempo. Não se sabe ainda em concreto o quando ou o como, mas para Francisco Louçã não restam dú-vidas: a reestruturação da dívida pública portuguesa vai mesmo acontecer. “É inevitável”, diz o antigo coordenador do Bloco de Esquerda. E sendo inevitável, urge fazer o trabalho de casa. “Temos de estar preparados para isso, porque é assim que vai acontecer”.

A convicção foi avançada numa entrevista que o Expres-so publicará na edição de 23 de dezembro da Revista E, e onde o economista e professor univer-sitário abordou, entre outros te-mas, a sua participação no gru-po de trabalho formado entre o Governo, o PS e o Bloco para a avaliação da sustentabilidade da dívida externa portuguesa.

Embora sublinhe que o relató-rio final desse grupo de trabalho “não está concluído” e que é por isso “precoce falar sobre ele”, Louçã sublinha já os méritos da iniciativa. “Prova que é possível ter uma conversa muito útil so-

A dívida “é um monstro a deglutir a economia”

DÍVIDA PÚBLICA

Francisco Louçã insiste que Portugal “tem de estar preparado” para reestruturar a sua dívida pública “porque isso é inevitável”

bre a reestruturação da dívida. Veremos depois as conclusões políticas a que se chega, mas o trabalho feito foi muito interes-sante, sobre medidas de escalas diferentes: micro ou pequenas reestruturações, ajustamentos da dívida ou renegociações de maior gabarito”, sintetiza.

A reestruturação da dívida pú-blica tem sido sucessivamente colocada na agenda por BE e PCP. Na recente aprovação do Orçamento do Estado para 2017,

por exemplo, ambos os partidos invocaram a necessidade de Por-tugal dar início a esse processo, de forma a libertar os recursos financeiros que estão ao serviço da dívida — e que este ano deve-rão ascender a mais de €8 mil

milhões só em juros, um mon-tante que supera o excedente de €5 mil milhões nas contas públi-cas. Mas da parte do Governo, a resposta não muda: Portugal nunca avançará sozinho para uma reestruturação. O que para Louçã é um erro.

“Os juros aumentaram na semana passada porque havia a incerteza italiana; não tinha nada a ver com Portugal. Portu-gal pode ter os melhores índices económicos e os juros estão a disparar. Se este fim de sema-na houver uma intervenção no Monte dei Paschi provavelmen-te os juros vão voltar a subir”, exemplifica o antigo líder do Bloco. “E no dia em que os juros subirem 2 pontos percentuais em relação ao que são agora, a dívida portuguesa explode, por-que todas as emissões de dívida são insustentáveis”, completa.

Aliás, para Louçã, mesmo os recentes ‘êxitos’ de emissões de dívida portuguesa são analisa-dos por uma lente menos otimis-ta do que a que tem sido usada pelo Governo. “Uma emissão de dívida a 3%, para um país que festeja crescer a 1,2%, significa simplesmente que a dívida está a aumentar. Mas se o juro da

dívida for 5% não há forma de pagar, por muito que se aumen-tem impostos. Mesmo que se vendessem os hospitais, não há forma de pagar essa dívida”, diz o economista, antes de pegar numa imagem de estilo já antes usada por Cavaco Silva — num célebre artigo de opinião, em 2000, para ilustrar o peso da despesa pública do Estado na economia portuguesa —, para reforçar o seu ponto de vista: “A dívida cria dívida. É um efeito dominó. É um monstro sozinho a deglutir a economia.”

O eventual ataque direto a este ‘monstro’ foi, no entanto, de novo recalendarizado esta semana por António Costa, para o pós-eleições na Alemanha. Só depois disso, defendeu o pri-meiro-ministro em entrevista à RTP, será viável abrir um debate europeu sobre o problema das dívidas públicas. Para Louçã, as palavras de Costa serviram apenas para “registar uma coi-sa óbvia: que a Europa está to-talmente paralisada em função das eleições do próximo ano, sendo que a mais importante é na Alemanha, no final do ano”. Portanto, diz, mais uma vez “não acontece nada na Europa”.

Um sinal que acresce às “ci-meiras sucessivas de refunda-ção da Europa”, onde “depois não existe rigorosamente nada” e que, segundo o economista, indicam que “a zona euro está condenada”. “Ela não resiste à próxima recessão financeira. Não pode resistir. Porque dis-parando os níveis de dívida em países que são grandes devedo-

“Uma emissão de dívida a 3%, para um país que festeja crescer a 1,2%, significa que a dívida está a aumentar”, diz Louçã FOTO ANTÓNIO PEDRO FERREIRA

res, como a Itália ou Espanha, torna impossível a sustentação das regras orçamentais comuns e do pacto de estabilidade.” E, neste contexto, “num universo que perante qualquer crise vai punir as economias mais fracas com medidas que são insusten-táveis”, o final não será feliz. “A União vai desunir-se.”

[email protected]

O trabalho feito no grupo em que BE e Governo discutiram a dívida “foi muito interessante”. “Veremos depois as conclusões políticas a que se chega”

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 19: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

MBA*

> O MBA da Universidade de Lisboa; > Acreditado internacionalmente pela AMBA; > Uma semana de imersão em São Francisco;> 18 meses com horário pós-laboral;> + 700 MBAs formados em mais de 30 anos.

2017-18

EARLYBIRD*

15%(até 31 Dez)

C

M

Y

CM

MY

CY

CMY

K

Expresso_nov2016.pdf 1 02/12/2016 15:06Expresso, 10 de dezembro de 2016 19 PRIMEIRO CADERNO

Gente

MEA CULPA Gente também se engana. E, com a mesma facilidade com que não perdoa as falhas alheias, reconhece com humildade as suas próprias. Na semana passada, no que pretendia ser uma brincadeira em torno dos barretes vermelhos das crianças que receberam os reis de Espanha no Paço Ducal de Guimarães, Gen-te espalhou-se ao comprido: não reconheceu o gorro típico dos nicolinos, os per-sonagens das festas dos estudantes de Guimarães em honra de São Nicolau de Mira, uma tradição com mais de três séculos. Pelo lapso, involuntário mas nem por isso menos censurável, Gente apresenta as mais sinceras desculpas aos leito-res e, em particular, aos vimaranenses FOTO LUCILIA MONTEIRO

Os nicolinos e os reis de Espanha

Minutos portugueses Paulo Rangel organizou esta semana em Bruxelas, através do think tank que dirige, o Eu-ropean Ideas Network, um colóquio sobre a política externa americana de-pois da eleição de Donald Trump como Presidente dos EUA. O eurodeputado do PSD era o moderador de um painel com três especialistas internacionais, mas, a dado momento, teve de sair por causa de uma reunião que decorria em simultâneo. Rangel pediu então a Danu-ta Hübner, sua colega deputada do PPE, que estava na assistência, que o substi-tuísse por 20 minutos. “20 minutos ou 20 minutos portugueses?”, retorquiu a polaca, que foi comissária na equipa de Durão Barroso. “Verá que os 20 minu-tos portugueses são bastante curtos”, devolveu Rangel.

Arrivederci, dr. Costa? Cada pri-meiro-ministro tem um registo próprio para sair dos debates no Parlamento, mas António Costa escolheu normalizar a coisa. Cavaco saía sempre em modo austero e fazia sonantes declarações nos Passos Perdidos para marcar nas televi-sões. Sócrates adorava provocar os me-dia e lançava-se em autênticos comícios, atirando contra tudo e contra todos. E Costa joga na amena cavaqueira com os jornalistas. Quarta-feira, no fim de mais um debate quinzenal, foi assim — 10 minutos de descontraída conversa com os repórteres. E a descontração foi tal que, na despedida, o primeiro-ministro arriscou pronunciar a frase maldita da semana: “Arrivederci!” Matteo Renzi, o seu homólogo italiano, dissera o mesmo na véspera quando decidiu demitir-se, derrotado num referendo, provocando calafrios na zona euro. Mas Costa, é sabido, não dá importância ao Diabo...

Marcelo e o charuto Estão de pre-venção os repórteres que na segunda--feira acompanharão, em Nova Iorque, a cerimónia em que António Guterres vai prestar juramento sobre a Carta das Nações Unidas. António Costa e Marce-lo Rebelo de Sousa vão estar presentes, e o Presidente da República até já pro-meteu que fumará um charuto. Marcelo disse-o em Havana, quando Raúl Castro lhe ofereceu dois Cohiba e o Presidente admitiu guardá-los para ocasiões espe-ciais: “Talvez no dia da tomada de posse do engenheiro Guterres, que é no meu dia de anos, ainda por cima”, afirmou. Mantendo-se Marcelo como não fuma-dor, há fortes hipóteses de o ouvirmos, na segunda-feira, a replicar Bill Clinton: “Fumei. Mas não inalei.”

O novo aliado espanhol do BE Pablo Iglesias, o líder do Podemos, enfrenta séria concorrência de outro ‘espanhol’ como fiel amigo ibérico do Bloco de

Esquerda. Ainda se ouvem os ecos da polémica do protesto dos deputados blo-quistas no Parlamento após o discurso do rei Filipe VI: que a monarquia não vai a votos, que é uma coisa de castas, nada de-mocrática, etc... Fonte diplomática con-fidenciava esta semana que as reservas protocolares do BE por causa da realeza peninsular podem ter os dias contados, face à possibilidade (reduzida, é certo) de haver um Presidente da República es-panhol. Gente franziu o sobrolho e abriu a boca de espanto, mas a explicação foi rápida: trata-se de Manuel Valls, o até terça-feira primeiro-ministro francês, um socialista que quer suceder a Fran-çois Hollande no Palácio do Eliseu. Valls é hispano-gaulês, nascido em Barcelona e filho de pai espanhol.

A moda alastra Depois dos casos que atingiram o Governo nacional, agora é o grupo Aliança de Liberais e Democratas pela Europa (ALDE), no Parlamento Europeu, que tem em mãos uma su-posta falsa licenciatura de um dos seus assessores políticos, por acaso também português. Trata-se de um ex-aluno da Universidade Independente (onde tirou uma pós-graduação) e fundador de um recente movimento liberal em Portu-gal, que se apresentou ao ALDE como licenciado em Assuntos Europeus pela Universidade de Essex. O problema é que a instituição britânica só reconhece que ele fez lá um mestrado, mas não a licenciatura. Ai, os portugueses e o rigor (ou falta dele) dos curriculum vitae!

Três a um Depois de duas derrotas consecutivas (uma para a Liga e ou-tra para a Champions), os benfiquistas agarram-se ao que podem para se moti-varem em vésperas de mais um clássico na capital. Exultam com a liderança no campeonato (dois pontos de avanço sobre o Sporting) e com a qualifica-ção para os oitavos de final da Liga dos Campeões (mesmo depois da escorre-gadela frente ao Nápoles), lembrando que o seu rival falhou o acesso à Liga Europa. E gritam aos sete ventos que, mesmo antes do dérbi de domingo, a vantagem já vai em 3-1: três reportagens (em seis jornadas da Champions) a que o SLB já teve direito por parte da UEFA, no âmbito da promoção dos jogos nos canais televisivos com os direitos de transmissão, contra apenas uma para o SCP. O otimismo irritante de António Costa, está visto, faz escola!

Falta de chá Isabel Amaral é uma das mais credíveis especialistas portuguesas em protocolo. A ex-assessora para os assuntos culturais do primeiro-minis-tro Cavaco Silva conhece as regras de bem parecer e até dá formação sobre o tema. Num artigo publicado no dia 2 na sua página do LinkedIn, ensina os menos versados no cerimonial de Es-tado a não se estamparem num jantar oficial. Escrito num inglês impecável, o texto é profissional. Mas o mesmo não se pode dizer das fotos recortadas que o ilustram e que, remetendo para cenas ocorridas durante a recente visita dos reis de Espanha ao nosso país, são, no mínimo, deselegantes. E que, se não quebram nenhum protocolo, revelam alguma falta de chá.

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 20: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201620 PRIMEIRO CADERNO

REGRESSO AO CASAL VENTOSO Aceitou um copo de moscatel e não resistiu às entradas de presunto e pastéis de bacalhau. “Quem é que resiste a um pastel de bacalhau? É como pôr droga à frente de um dro-gado!”, comentou, a deixa para relembrar a sua grande marca como presidente de Câmara, que foi ter posto fim ao Casal Ventoso, o grande entreposto de tráfico a céu aberto na capital. No prato principal portou--se bem: robalo grelhado, que regou com azeite, mal tocando nas ba-tatas e nos brócolos. À sobremesa, uma tarte de maçã e um café. Tudo acompanhado de água, sempre fresca. Está de “dieta” há anos (mas nem por isso muito preocupado com o peso). Segue um princípio sim-ples que aprendeu com um amigo: nunca encher o prato nem repetir.

“José Eduardo dos Santos também tem qualidades”

Garante que a fama que tem de ser um homem da UNITA é um mito. Como o de que esteve envolvido no tráfico de marfim: “Eu, que gosto imenso de elefantes!”. É verdade que tem muitos amigos na UNITA e que respeita a memória de Savimbi, (“um grande combatente, com defeitos como toda a gente”). Mas ao mesmo tempo que ia à Jamba nunca deixou de falar com José Eduardo dos Santos, garante. Reconhece que o Presidente angolano “também tem qualidades” mas que, quarenta anos depois de permanência no poder, já devia “ir para a reforma” porque o país “precisa de um equilíbrio”. Vê o anúncio da sua não recandidatura como “um sinal de abertura”. Mas desconfia: “Alguém que teve o poder que ele teve tem condições para ter uma vida normal? Acho difícil. E não é só por ele”.

Texto Cristina Figueiredo e Luísa Meireles

Fotos Marcos Borga

As conversas, diz-se, são como as cerejas. Com João Soares é como se estivéssemos em junho em pleno vale do Fundão: o antigo presidente da Câmara de Lisboa, ex-ministro da Cultura (por uns breves quatro meses e meio) e atual deputado socialista é um conversador nato, franco e despre-tensioso (a palavra “gajo” é uma cons-tante). Para cada assunto tem uma experiência pessoal para recordar, um tema engancha no outro, non stop, e não raro, ao longo deste almoço no Pabe que durou duas horas, pergun-tas houve que só obtiveram resposta muitas histórias de permeio depois. Tal e qual o pai, diz quem conhece bem Mário Soares, que esta semana cumpriu 92 anos.

Passaram exatamente oito meses desde que deixou o Governo, e ga-rante que o episódio não lhe deixou “nenhum problema de ego”. “Estou muito bem na minha pele, que é a primeira condição para se estar bem com os outros e estou muito bem com os outros”, assegura. Mas as circuns-tâncias que o levaram a apresentar a demissão a António Costa estão bem vivas na sua memória e acabam por ser pano de fundo de toda a entrevista. Confessa-se ainda hoje perplexo com a reação, que considera excessiva e desmesurada, à “metáfora de duas linhas” que escreveu no Facebook (“o ‘Correio da Manhã’ dos pobres”, define) às sete da manhã de 7 de abril, onde prometia “um par de bofetadas” ao colunista do “Público” Augusto M. Seabra que, na véspera, escrevera um artigo onde o acusava de ter “um estilo de compadrio, prepotência e grosseria”.

Lembra-se de que saiu de casa pou-co antes das nove da manhã direto ao Conselho de Ministros, onde to-dos desligam os telemóveis, e que só quando a reunião acabou é que se deu conta da “polvorosa gigantesca” que ia pelos sites dos jornais, televisões e redes sociais. Rapidamente concluiu que “aquilo não tinha solução”, por-que “há uma certa nomenklatura que não pode comigo e com o meu estilo”. Ouviu Costa dizer que os ministros não se podem esquecer de que não estão à mesa do café e percebeu que estava a tornar-se “um empecilho”. Decidiu apresentar a demissão, não porque se tenha sentido atingido pelo comentário do primeiro-ministro —que compara ao gesto pouco polido, mas sem importância, de lhe trazerem o moscatel num copo sem lhe mos-trarem a garrafa —, mas porque “há coisas que são sagradas, que não se tocam, como a nossa liberdadezinha. Provavelmente é um sinal de velhice”. Recorre ao aforismo: “Galo do campo não dá em capoeira, não tem proble-ma nenhum”. Além de que “tem de se dar prova de desapego”.

Gostou mais de ser ministro ou pre-sidente de Câmara? “Procuro que as coisas me deem prazer”, diz, e até confessa que o trabalho que mais gos-tou de desempenhar, e que nem por isso teve grande visibilidade, foi o de representante de Portugal na OSCE. Mas reconhece que chefiar uma au-tarquia como Lisboa é “fascinante”. “Aí sonha-se, projeta-se, executa-se e pode-se medir se foi ou não útil para as pessoas”. Elogia Fernando Medi-

“Galo do campo não dá em capoeira”

ALMO ÇO NO PABE COM JOÃO SOARES

É com este aforismo bem-humorado que justifica a sua saída do Governo, em abril. “Prezo a minha liberdadezinha”, diz

na: “Tem grande qualidade, é muito inteligente e está a fazer um belíssimo trabalho”. Sobre as polémicas obras “todas ao mesmo tempo” acabara de dizer ao taxista que o transportara até ao Pabe: “Acho muito bem”. Mas não arrisca prever o resultado das próxi-mas autárquicas na capital: “Espero que ganhe, acho que merece. Mas as coisas, em política, às vezes são muito injustas. Vamos ver, ainda é cedo”.

“A CGD foi um momento infeliz”

Lembra, “não porque seja relevante” mas porque entende que é preciso dar textura a um tempo que vive preci-samente da “vertigem”, da “volatili-dade” e da “falta de memória”, que esteve com António José Seguro “até ao último segundo do último minuto da última hora”, mas que foi o primeiro, no dia seguinte às legislativas de 2015, a defender uma solução de esquerda. “Fui o primeiro a pedir a palavra na Comissão Política do PS para dizer que estávamos perante uma oportunidade histórica. Às vezes a história vem ter connosco e aquela era uma oportuni-dade única de construir uma solução à esquerda”. De novo a memória: “Se se fez uma primeira coligação [em Lisboa, em 1989] que uniu a esquerda toda — ainda não havia BE — foi em larga medida porque eu travei esse combate sozinho na direção do PS. Eu e o Acácio Barreiros”. Até Jorge Sampaio, inicial-mente, teve dúvidas, revela.

Um ano de ‘geringonça’ depois gosta do que vê: “Costa fez uma coisa pre-cursora. A solução é boa, o Governo é bom e o primeiro-ministro (sendo eu insuspeito para o dizer) gere aqui-lo muito bem”. Recusa a expressão ‘geringonça’, “até por ter sido inven-tada pelo Vasco Pulido Valente [o outro visado no post das bofetadas], que é um tipo que está de mal com o mundo e faz pagar aos outros os maus azeites que tem”. E apesar de reconhecer que o episódio da Caixa

Geral de Depósitos foi “um momen-to infeliz” continua a ver na atuação deste Governo “uma melhoria muito substancial em relação ao que lhe an-tecedeu”. Explica: “Não é pouca coisa ter um clima de tranquilidade social e económica como temos tido”. Para o que contribui também o Presidente da República, admite: “Marcelo tem excedido as minhas expectativas. Lá está, outro que percebeu que a histó-ria veio ter com ele e não quer perder a oportunidade, pelo contrário, está a agarrá-la bem”.

Reconhece que Fernando Medina tem feito “um

belíssimo trabalho”, mas admite que isso possa

não bastar para que vença as eleições

Volta à CGD: “Conheço mal o Do-mingues mas acho que não tinha o direito de ser tão ingénuo como foi”. Numa época de tamanho escrutínio por parte dos media, crivo “muito mais intenso” do que ter de entregar uma declaração no Tribunal Constitucio-nal, custa-lhe a crer que alguém ache que podia “escapar ao controlo”. Só se lhe deram essa garantia, contra-pomos. “Do que conheço do ministro das Finanças (de quem tenho a melhor das impressões e que é um tipo que cresceu do ponto de vista da maturi-

dade política) e do primeiro-ministro, duvido. Nem faz sentido. Ninguém vive na lua!”. Ainda acrescenta “e aqueles salários...” (mas não chega a qualificá--los, como faria nessa mesma tarde na AR, como “obscenos”)

Acha, portanto, que o Governo vai chegar ao fim da legislatura? “Não vejo razões para que não chegue. A grande questão é quantas legislaturas vai durar, porque vai durar mais do que uma”. Sublinha o papel do PCP — partido que, lembra, conhece bastante bem, aliás como Costa: “Temos isso em comum, os nossos pais foram am-bos do PC”. E o PC, diz, “é um partido profundamente responsável e ordeiro. O país não tem noção de quanto deve à cultura deixada pelo PCP de Álvaro Cunhal”.

De Portugal para a Europa: “Como não tenho fé em Deus, ainda tenho fé na ideia de Europa. Não sei como porque, racionalmente, não devia ter. Mas vou a países como a Sérvia e o Montenegro e eles ainda acham que a Europa é um espaço de esperança e de solidariedade”. E o mundo, com Trump, como vai ser? “Isso não sei”. Ele, que se confessa um entusiasta de Obama — “um grande avanço para a América” —, prefere ser cauteloso: “Disse de facto disparates inenarrá-veis mas prefiro dar-lhe um tempo para assentar. Como o vinho, tem de fazer cama”. Não resiste, porém, a comentar “aquela popa do gajo”. “É um horror!”.

A conversa termina, abrupta: “Tenho de me ir embora”. Já passam alguns minutos das 15h30, a hora que tinha combinado com o mecânico que lhe vai a entregar a lambreta (o melhor meio de deslocação em Lisboa, “desde que não esteja a chover”) a casa. Mas tem da pontualidade um conceito relativo: “Tive de explicar à minha mulher [An-nick Burhenne, belga] o conceito de cinco minutos em Portugal — é uma medida de tempo que está entre 30 segundos e a eternidade”.

[email protected]

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 21: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 21 PRIMEIRO CADERNO

Valdemar Cruz

Passados os primeiros momen-tos de euforia por uma vitória conquistada à segunda volta nu-mas eleições em que derrotou a lista presidida pela atual basto-nária, Elina Braga, Guilherme Figueiredo, natural e residente no Porto, está já a tratar de en-contrar casa em Lisboa, onde passará a maior parte do tempo. Vai largar os processos em que tem estado a trabalhar e coloca reservas quanto à possibilida-de de continuar a pleitear em tribunal enquanto se mantiver no cargo. A ideia de “ter o bas-tonário a litigar com os colegas em tribunal” não lhe parece “ra-zoável, até pelo dever de preser-vação da figura institucional”. É uma questão que terá ainda de ser mais refletida. Admite suspender o exercício profissio-nal, mas, acrescenta, “gostaria que essa suspensão não fosse completa”.

Para já, quer avançar com um conjunto de medidas internas e outras externas, suscetíveis de proporcionar à Ordem uma intervenção de maior qualidade na definição dos caminhos da justiça, que faz muita questão em sublinhar, “tem estado a ser encarada como um bem eco-nómico, quando deve ser vista como um bem essencial dos ci-dadãos”.

Primeiro quer arrumar a

Bastonário pede auditoria à Ordem

ADVO GAD OS

Guilherme Figueiredo, recém-eleito bastonário dos advogados, quer conhecer “o real estado” da instituiçãocasa. Assim, e no imediato, pretende a realização de uma auditoria externa à Ordem. O objetivo, frisa, “não é perseguir ninguém, mas criar condições para que possa haver uma es-pécie de ano zero assente no conhecimento do real estado financeiro da Ordem”. Esse será o caminho para “acabar com festas e atividades sem jus-tificação”, racionalizar meios e tornar “possível que se comece a trabalhar numa discrimina-ção positiva a favor dos jovens advogados e das advogadas em período de maternidade”.

Pagamentos dignos

Se o aprofundar do regime de incompatibilidades dos advo-gados pode ser um importante contributo para a discussão so-bre o que se entende hoje pela existência de um excessivo nú-mero de causídicos, Guilherme Figueiredo defende também que há todo um conjunto de responsabilidades do Estado que têm de ser equacionadas,

como “o pagamento digno aos advogados”.

Trata-se de um tema muito ligado à mais vasta questão do apoio judiciário e uma das pro-postas da nova direção da Or-dem passa pela criação de um Instituto Público, com a partici-pação do Ministério da Justiça, que “deverá receber verbas di-retamente do Orçamento Geral do Estado para pagar o apoio judiciário”. Na opinião do bas-tonário, “isso permitiria que o pagamento não ficasse depen-dente de quem é o ministro em cada momento ou da sua maior ou menor boa vontade”.

A área das custas judiciais constitui uma das grandes preocupações de Guilherme Figueiredo. Defensor da sua redução, aposta na criação de um teto, “que não existe, e isso é espantoso”, diz. Além disso sustenta a importância de cria-ção de isenções de custas para algumas pessoas singulares, “como é o caso dos trabalha-dores por conta de outrem nos conflitos laborais”.

Especialista em Direito do Trabalho, Figueiredo vai mais longe e propõe a obrigatorie-dade de constituição de advo-gado em circunstâncias em que não está contemplada, como na audiência de partes. Por nor-ma está sempre o trabalhador, isolado, frente a uma entidade patronal assistida por um ad-vogado, “o que gera grandes

desequilíbrios”, afirma. De-pois, acontecem situações ine-xplicáveis, como a que decorre da isenção de taxas de justiça quando o trabalhador se dirige diretamente ao Ministério Pú-blico, e a não isenção se optar por recorrer a um advogado.

Ética da discussão

No tocante ao acesso mais fa-cilitado à justiça, Guilherme tem apresentado uma proposta polémica. Tal como na Saúde, devia haver, diz, uma taxa mo-deradora. Quando confrontado com a possibilidade de abusos, responde que “os tribunais

Guilherme Figueiredo vai suspender a atividade para preservar o estatuto do bastonário FOTO D.R.

podem aplicar a litigância de má fé e multar quem abusa do sistema”.

Adepto da transformação da Ordem dos Advogados num espaço de “defesa da ética da discussão e de uma cultura de admissão do outro e da diferen-ça”, tem uma medida simbólica para apresentar. De três em três meses pretende reunir to-dos os anteriores bastonários que possam estar disponíveis para participar num debate de temas relevantes para a advo-cacia e para o Estado de direito democrático.

Esta insistência na qualifica-ção do Estado não é inocente.

Remete diretamente para os Estatutos da Ordem, que Fi-gueiredo quer rever, e onde se fala apenas de Estado de direi-to. Ora, explica, antes do 25 de Abril “também tínhamos um Estado de direito, só que não era democrático”.

Não por acaso, pretende alar-gar o âmbito da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Ordem, que passará a incluir uma CDU para as questões so-ciais e da natureza. “Em causa está o futuro da humanidade, e isso trabalha-se no presente”, diz o bastonário.

Por fim, um tema sempre mui-to caro em tudo o percurso pes-soal de Guilherme Figueiredo. Tão rápido quanto possível, quer retomar a publicação do “Foro das Letras”, agora alargado às artes. Tentará organizar um evento anual, com exposições ligadas às artes e à fotografia, e com várias iniciativas ao longo de um dia sobre poesia e lite-ratura. Não se trata apenas de uma valorização de gostos pes-soais. É, antes, refere, porque na advocacia sempre houve muita gente a revelar uma grande qua-lidade literária, como se percebe quando recorda nomes como os de António Osório, Manuel An-tónio Pina, Vasco Graça Moura ou Mário Cláudio. Se a poesia continuará a fazer parte do seu quotidiano, a cultura, conclui, “vai ter de entrar na Ordem".

[email protected]

Isenção de custas judiciais devia estender-se aos trabalhadores por conta de outrem nos conflitos laborais

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 22: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Quero falar das crian-ças de Alepo cercadas numa guerra horren-da que não sabemos

pensar. Enquanto compramos brinquedos de Natal, elas são mortas ou vivem atordoadas no meio de bombardeamen-tos, perdem os pais enquanto fogem do destino, agarradas ao último boneco ensanguentado,

na impossibilidade de viverem e serem felizes.

Num relatório da ONU de março de 2016, estima-se que cerca de 3,7 milhões de crian-ças, uma em cada três no país, só conhecem a guerra nos últi-mos cinco anos. Cinco anos, a idade de Omran, o menino da assombrosa imagem de cara en-sanguentada, sentado sozinho e

sem esperança numa ambulân-cia, símbolo de uma geração de crianças que não conhece o que é viver em paz e brincar. Este é o poder da fotografia, alcançar o coração das pessoas, disse o seu autor. A fotografia do cadá-ver de Aylan, o menino de três anos depositado pelo mar numa praia da Turquia. Os apelos de Bana, uma menina fortaleza de coragem. Nunca o poder da comunicação foi tão grande. Em contrapartida, o tsunami de alarme nas redes sociais tor-na-se inconsequente, desgasta a força das imagens. Por isso não conseguimos pressionar o suficiente para uma solução humanitária.

Alepo é um palco de dispu-ta sanguinária desde há vários anos, com a cidade no meio do fogo cruzado dos rebeldes e do

Governo Assad. O Irão inten-sificou os bombardeamentos com o apoio da Rússia. Os pa-íses do Golfo armam os rebel-des. O pior é que esta guerra não tem a lógica estratégica de Clausewitz, move-se segun-do células devoradoras que se autoalimentam do terror e do absurdo. Como afirma Umber-to Eco em “Pensar a Guerra”, os contendores funcionam ir-racionalmente, segundo um

“sistema em paralelo”, que não distingue entre regras nem da-dos. Aparentemente o sistema não pode ser controlado. As superpotências não parecem efetivamente interessadas em pôr termo à matança dos ino-centes. A ONU servirá para alguma coisa? Nem sequer é possível respeitar a existência de cordões humanitários.

Na Síria só há bombas, ca-nhões, napalm, cloro e ataques aéreos. Os governos sírio e russo conduzem bombardea-mentos criminosos em zonas populosas. Cerca de 100 mil cri-anças estão cercadas em Alepo. Voltamos ao poder das fotogra-fias que inundam as redes so-ciais seguidas de terabites de lágrimas inúteis, vertidas para sossego da nossa consciência.

O cinismo das superpotênci-

as, da Europa, o terrorismo e o tráfico de armas alimentam esta monstruosidade inqualifi-cável, aniquiladora de todos os direitos humanos. Os principais responsáveis deviam ser julga-dos por crimes contra a hu-manidade num tribunal penal internacional. Mas não vivemos num mundo normal.

Devíamos ser capazes de exigir zonas de exclusão aé-rea para impedir o bombar-deamento dos civis e garantir a ajuda humanitária. Há uma petição a correr na internet. Até agora, falharam todos os esforços para o cessar-fogo, é preciso pelo menos proteger a população civil, as crianças.

As crianças morrem cessar, em Alepo. Nós compramos brinquedos de Natal para as nossas crianças.

Às crianças de Alepo

O tsunami de alarme nas redes sociais torna-se inconsequente, desgasta a força das imagens

Expresso, 10 de dezembro de 2016PRIMEIRO CADERNO22

Justiçade PerdiçãoMaria José Morgado

TRÊS PERGUNTAS A

Cristina MalhãoAdvogada da família de David Duarte

P David Duarte morreu há quase um ano. Que balanço faz da investigação ao caso? R Tendo sido negado em dezem-

bro de 2015 o direito à saúde a David Duarte, temo que um ano depois esteja agora a ser negada à sua família o direito à Justiça. Porque a Justiça para ser justa tem de acontecer no tempo ade-quado, respeitando obviamente os prazos necessários da inves-tigação do Ministério Público (MP).

P O que pretende a família? R Queremos saber quem tem

responsabilidade na morte do nosso David. A questão da indem-nização a atribuir é um assunto secundário para nós. O nosso ob-jetivo principal é o da responsa-bilização criminal. Desde o início do processo, pretendemos que o MP apure a existência de res-ponsabilidades em toda a cadeia decisória na altura da sua morte no Hospital São José.

P Foi esse o sentido da queixa--crime que apresentaram? R Sim. De acordo com a lei, os

titulares de cargos públicos têm responsabilidade jurídica sobre os atos e omissões durante o exercício de funções.

NÚMEROS

113doentes com suspeita de aneurisma roto foram tratados na nova Urgência Metropolitana de Lisboa, assegurada rotativamente pelos centros hospitalares de Lisboa Norte, Lisboa Central e Lisboa Ocidental e Hospital Garcia de Orta

56horas foi o tempo que David Duarte esperou pela cirurgia no São José

Vera Lúcia Arreigoso e Hugo Franco

Três relatórios de pe-ritagens pedidas pelo Ministério Público e pelo Centro Hospita-lar de Lisboa Central (CHLC) à morte de David Duarte, há qua-se um ano, garantem que não houve negli-

gência na assistência prestada ao jovem de 29 anos no Hospital de São José. Os documentos a que o Expresso teve acesso atestam que foram cumpridas “as boas práticas clínicas”; que os administradores hospitalares tentaram resolver o pro-blema mas que a tutela não tomou uma decisão: pagar mais aos enfermeiros da equipa, que há dois anos não aceitavam estar de prevenção à noite, aos fins de semana e feriados.

O caso tornou-se polémico porque David Duarte não resistiu a um fim de semana de espera por uma equipa capaz de o operar. Morreu no dia 15 de dezem-bro de 2015, na madrugada de domingo para segunda-feira, três dias depois de ter entrado no São José, transferido do Hos-pital de Santarém, com um aneurisma que acabou por romper. Um ano depois, a família da vítima continua à espera que se faça justiça: a investigação do Minis-tério Público ainda não está concluída. “É legítimo que os familiares queiram apurar responsabilidades criminais na atuação dos titulares dos cargos com res-ponsabilidade na Saúde”, afirma Cristina Malhão, advogada dos queixosos. E já avançou com uma queixa-crime contra o ex-ministro Paulo Macedo, a Administra-ção Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e a anterior presidente do CHLC, do qual faz parte o São José.

Nos últimos meses, os peritos do Ins-tituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF), Hospital de Santa Maria e Ordem dos Médicos entregaram as suas conclusões às au-toridades. De acordo com a “consulta técnico-científica” do INMLCF, “a pato-logia do doente não impunha abordagem cirúrgica imediata; segundo as linhas de

Peritos ilibam médicos do São José

SO CIEDADE JUSTIÇA

Relatórios Medicina Legal, Santa Maria e Ordem dos Médicos concluem que tudo foi feito para evitar a morte de David Duarte

minado em junho, o extenso documento escreve preto no branco que “a indis-ponibilidade manifestada pelo corpo de enfermagem em continuar a assegurar a escala de cirurgia urgente/precoce da aneurismas cerebrais, que vigorava aos sábados e feriados em regime de prevenção” foi devida “a razões que se prenderam com aspetos essencialmente remuneratórios”. Além disso, a equipa de Paulo Macedo, incluindo a ARS de Lis-boa, “conhecia o problema pelo menos desde junho de 2013”.

Segundo o Expresso apurou, os dois enfermeiros especialistas necessários por equipa recebiam 2,5 euros líquidos por hora de prevenção — têm de estar a 30 minutos de distância de carro do hospital. A bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, explica que “não foi aberto qualquer inquérito porque não teve que ver com a má prática de enfer-magem”. Ainda assim, juntamente com a Ordem dos Médicos, visitaram o serviço de neurocríticos do São José e pediram o encerramento de quatro camas porque não estavam a ser cumpridos os requisi-tos técnicos relativo ao número de enfer-meiros presentes por doente. “O pedido foi aceite mas entretanto foram reabertas duas camas sem reunirem mais enfer-meiros. E vamos lá voltar”, assegura.

Na altura dos acontecimentos foi ques-tionado por que razão David Duarte não fora transferido para outro hospital, no-meadamente Santa Maria, São Francisco Xavier ou Garcia de Orta (em Almada). Nas peritagens a que o Expresso teve acesso, é unânime a opinião de que o esta-do de saúde do jovem requeria o máximo de estabilidade e que, na verdade, ne-nhum daqueles hospitais tinha condições de facto para realizar a cirurgia durante o fim de semana. Sabendo isto, a atual equipa ministerial (o próprio ministro foi presidente do Santa Maria) decidiu alte-rar o funcionamento da Urgência Metro-politana de Lisboa desde o início do ano para que casos como os de David Duarte não fiquem sem assistência. À noite, aos fins de semana e feriados, quatro centros hospitalares garantem cuidados 24 horas por dia a doentes com aneurisma roto ou AVC isquémico.

[email protected]

David Duarte morreu há um ano devido

a um aneurisma roto não operado por falta de equipa

clínica. Tinha 29 anos

RELATÓRIOS APONTAM CULPAS AO GOVERNO. FAMÍLIA DA VÍTIMA APRESENTOU QUEIXA CONTRA O EX-MINISTRO DA SAÚDE PAULO MACEDO

orientação em vigor, um aneurisma roto deve ser tratado nas primeiras 72 horas após o início dos sintomas, sendo que, nesta janela temporal, deve ser tratado o mais cedo possível, isto é, logo que es-tejam reunidas as condições adequadas do ponto de vista logístico e de recursos humanos especializados” — o que neste caso só seria possível às 8h de segunda--feira, quando estaria ao serviço a equipa de neurorradiologia. Em suma, “foram prestados os cuidados adequados”, con-clui o relatório entregue em julho.

Tutela foi culpada

Dois meses antes, um neurocirurgião sénior do Santa Maria, garantia, num documento de 18 páginas, “não ter sido indiciada a prática de qualquer infração disciplinar pelos profissionais de saúde do CHLC ou por qualquer titular dos seus órgãos”. No relatório é apontado o dedo à tutela: “A suspensão das referidas escalas foi oportuna e atempadamente identificada e comunicada ao conselho de administração do CHLC e, face à impos-sibilidade de, com os recursos existentes e os imperativos legais vigentes, esses problemas serem resolvidos no âmbito interno.” Assim sendo, “o conselho de administração deu atempadamente co-nhecimento das situações à tutela, tendo inclusivamente apresentado propostas de resolução, as quais, extravasando as suas competências, sempre teriam que obter acolhimento superior, o que, toda-via, não se veio a verificar.”

O perito escreve ainda que a falta de equipa nas ‘horas incómodas’, “pese embora se tenham mantido sempre condições assistenciais de acordo com as imposições decorrentes das boas prá-ticas clínicas”, fez com que “de uma situ-ação de excelência se passasse para uma situação aceitável”. E é taxativo: “Logo à partida, este caso apresentava-se como sendo de elevada morbilidade, não sen-do possível, em qualquer circunstância, garantir uma evolução positiva favo-rável, e ainda que atuando sempre na estrita observância das boas práticas clínicas e de acordo com os recursos disponíveis, como de facto sucedeu.”

Uma conclusão no mesmo sentido esta-

rá prestes a ser aprovada pela Ordem dos Médicos, apurou o Expresso. O colégio da especialidade defende também que a legis artis (o conhecimento médico atual) foi respeitada.

À mesa do atual ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, chegou também o relatório da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS). Ter-

FOT

O D

.R.

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 23: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 23 PRIMEIRO CADERNO

BREVES

Iraque tem de decidir em janeiro

IMUNIDADE O Ministério dos Negócios Estrangeiros anunciou quarta-feira ter entregado pessoalmente ao embaixador do Iraque um novo pedido do MP para le-vantamento de imunidade dos filhos Heider e Rhida Ali, indiciados por um cri-me de homicídio na forma tentada. Rúben Cavaco, 15 anos, foi agredido na ma-drugada de 17 de agosto, em Ponte de Sor. O MNE deu 20 dias úteis para obter uma resposta formal a esse pedido, que termina na pri-meira semana de 2017.

Portugal vai ter biblioteca braille

CEGUEIRA O Politécnico de Leiria vai criar a primei-ra biblioteca no país des-tinada exclusivamente à comunidade cega. Sob o mote “Mãos que Leem”, vai integrar obras de vários gé-neros (técnicas, romances e outras), ao contrário do que acontece na maioria das bibliotecas em Portu-gal, que se limitam a incluir obras mais técnicas. Todos os meses terá novos títulos.

154 acusações por corrupção no MPCRIME O Ministério Público instaurou 1741 inquéritos por crimes de corrupção e criminalidade conexa e deduziu 154 acusações no ano judicial de 2015/16, o que representa um aumen-to de 7% em relação ao ano anterior. De acordo com o último Relatório Síntese sobre Corrupção e Crimi-nalidade Conexa da PGR, divulgado sexta-feira, mais de metade dos inquéritos--crime instaurados são por crimes de corrupção (617) e peculato (457). Foram ain-da arquivados 942 inquéri-tos e 73 tiveram suspensão provisória do processo.

10doentes estão internados nos cuidados intensivos com complicações desencadeadas pela gripe. Na mesma altura, em 2015, não havia qualquer registo. Entre 1 e 6 de dezembro foram atendidos 2154 casos nas Urgências relacionados com o vírus AH3.

“SE ME PERGUNTAREM SE O DINHEIRO É DO SÓCRATES, EU ACHO QUE NÃO. MAS SE ELES PUDEREM PROVAR ISSO, EU TAMBÉM FUI ENGANADO”Michel CanalsGestor de fortunas da UBS e Akoya, indiciado no caso ‘Monte Branco’, em entrevista à revista “Sábado”

FACTOS DO MP

AS BARRACASEm 1982, António Filipe (proprietário) pede uma licença para arranjos numa barraca no lugar do Pego, para substituir paredes de madeira. Quatro anos depois, requer licença de habitação para fogo com duas ocupações com menos de 100 m2 cada

OS NÚCLEOSEm 2008, a Herdade da Comporta e a Santa Mónica (proprietários de terrenos e construções) iniciam processo para obras de reconstrução em dois núcleos, no lugar do Pego: um com uma área social e cinco quartos e outro destinado a integrar a suíte principal da casa, com quarto e sala (todos com quarto de banho). Formam quatro corpos de diversas dimensões ligados por estruturas de madeira, caniço e colmo que servem de ensombramento, assim como a pérgula central

AS ÁREASNo projeto, a área de construções ocupa no total 371 m2 e as de ensombramento 169,2 m2. Mas o MP encontrou incongruências, como um dos artigos urbanos inscrever um prédio de 142 m2 de um só piso numa área de terreno que apenas tem 116 m2

A VISTA AÉREAFotos aéreas revelam 10 volumes, quando a licença abarcava cinco prédios

NÚMERO

463mil euros (mais precisamente €463.750) foi o custo inicialmente estimado “por lapso” pela Herdade da Comporta para as “obras”. A conta final apresentada ficou em €165.837

Carla Tomás e Pedro Santos

Guerreiro

Um conjunto de barracas construídas em cima das du-nas, a menos de 500 metros da praia do Pego, no Carva-lhal, foi transformado num luxuoso complexo de 10 edi-ficações de traça rústica, nas quais a família de Ricardo Sal-gado, ex-presidente do Ban-co Espírito Santo, costuma passar férias. Foi o encanto pela obra arquitetónica final, com a casa-mãe na duna se-cundária e um passadiço pri-vado de ligação à praia, que o terão levado a esquecer-se do incómodo dos mosquitos e a trocar o Algarve pelo Carva-lhal/Comporta, onde reúne o clã no verão.

A transformação, feita em nome de empresas detidas pela família Espírito Santo foi, porém, “indevidamente licen-ciada” pela Câmara Municipal de Grândola, acusa o Ministé-rio Público num despacho que aguarda julgamento no Tribu-nal Administrativo e Fiscal de Beja. Na acusação, o procura-dor Orlando Machado pede ao tribunal para declarar nulos os atos administrativos prati-cados pela Câmara Municipal de Grândola, apreender os alvarás passados e condenar o município à demolição de to-das as edificações em causa e a pagar uma multa pelos atos praticados. Em causa estão vários despachos, assinados pela Câmara, entre 2008 e 2011, que levaram à aprovação das licenças de obras de re-construção e de utilização das casas, e dos respetivos alvarás.

Para o Ministério Público, estas autorizações não respei-taram as regras do Plano de Ordenamento da Orla Cos-teira Sado-Sines (que impede construções a menos de 500

MP quer demolir casa de férias de Ricardo Salgado

AMBIENTE

Como é que uma casa de luxo é construída na Comporta a menos de 500 metros da praia do Pego, com autorização da Câmara? É esta a pergunta que o MP quer ver respondida

metros da linha de preia-mar); o regime jurídico da Rede Na-tura 2000 (por não ter pedido parecer ao Instituto de Con-servação da Natureza sobre os valores naturais poten-cialmente afetados); nem as regras da Reserva Ecológica Nacional (REN), que interdita obras de construção e amplia-ção em sítios ecologicamente sensíveis, como dunas.

Lapsos e incoerências

A história começa em 2008, quando a Herdade da Com-porta, Atividades Agrossil-vícolas e Turísticas — que neste processo surge como a primeira “contrainteressa-da” entre quatro sociedades anónimas ligadas ao Grupo Espírito Santo envolvidas no caso — avança com um pe-dido de informação prévia para “realizar obras de re-construção” em dois núcleos habitacionais “em avançado estado de degradação” no lu-gar do Pego, Carvalhal. Fá-lo em nome da empresa Santa Mónica — Empreendimentos Turísticos, apresentada como dona do terreno, e posterior-mente em nome da sociedade administradora de bens Pedra da Nau, dona das casas.

Os promotores da obra ad-mitiram desde o início que o conjunto de barracas se en-contrava em “área de máxi-ma infiltração da lagoa para a duna”, em área de REN, mas argumentavam que a intervenção “praticamente não altera o perímetro de im-plantação das edificações” e que as construções existentes remontavam “aos anos 60”, não estando por isso sujeitas ao regime da REN. O argu-mento não é contrariado pela Câmara nem pela Comissão de Coordenação e Desenvol-vimento Regional do Alentejo e a licença é emitida em julho de 2009.

O Ministério Público tenta desmontar estas alegações, argumentando que no pro-cesso nada atesta que no local existiam construções erguidas na década de 60. O procura-dor questiona a não exigên-cia de tais provas por parte do município, assim como o facto de não constar do pro-cesso um anterior pedido de licença para “arranjos na barraca” no lugar do Pego. É que em 1982 e em 1986, duas estruturas de apoio agrícola obtiveram licença para serem transformadas em habitações e depois sofrerem arranjos a pedido do ex-proprietário, António Francisco, que não tem qualquer ligação aos Es-pírito Santo.

Eram então descritas como ocupações com menos de 100 metros quadrados. O que contrasta com a área bruta de construção atual, que mais do que triplica essa área.

“Estranha-se que o muni-cípio não compare o com-parável”, escreve Orlando Machado, constatando a “im-possibilidade de coincidência espacial entre as construções representadas”, assim como entre o que é declarado nas Finanças e na planta de edifi-

cações. Também lembra que há quatro prédios remanes-centes cuja descrição predial não foi exigida pela Câmara.

Réu pouco preocupado

“Não estou nada preocupa-do com a questão”, afirma o atual presidente da Câmara de Grândola, António Figuei-ra Mendes, que tinha ocupado o mesmo cargo em 1982. “Pas-sados 34 anos sou réu porque autorizei a reconstrução de uma barraca ao António Fran-cisco!” — ironiza. Mas quanto à hipótese de ilegalidades na condução do processo entre 2008 e 2011 fica-se por um “não me pronuncio”.

Da parte dos contrainte-ressados no processo fala a administração da Pedra da Nau (dona das casas). Con-firma ter sido “citada”, mas considera que “a ação não tem qualquer fundamento jurídico ou factual e parece ser fruto de um oportunismo lamentá-vel”. Argumentando que, “o licenciamento em causa cum-priu todos os trâmites legais aplicáveis, como também é reconhecido pelo Município de Grândola”, adianta que “a ação instaurada será oportu-namente contestada”.

As edificações em causa constam do pacote de bens arrestados pelo Ministério Pú-blico em 2015, mas que con-tinuam a ser usufruídos pela família de Ricardo Salgado. Porém, a administração da Pedra da Nau considera “bi-zarro que o Ministério Público de Lisboa tenha arrestado a propriedade em causa e venha agora o Ministério Público de Beja tentar afetar o valor dessa mesma propriedade”. Quanto a esse valor não escla-recem. Em 2013, a proprieda-de terá sido avaliada em €1,1 milhões.

[email protected]

Barracas agrícolas foram transformadas em casas confortáveis nas dunas, junto à praia do Pego, no Carvalhal FOTO LUÍS BARRA

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 24: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201624 PRIMEIRO CADERNO

RESULTADOS PORTUGUESES NO PISAEm pontos

500

475

450

2000 2003 2006 2009 2012 2015

Matemática492

Ciências501

Leitura498

FONTE: PROGRAMME FOR INTERNATIONAL STUDENT ASSESSMENT (PISA)

RESULTADOS PORTUGUESES NO TIMSSEm pontos

500

450

400

1995 2011 2015

Matemática541

Ciências508

FONTE: TRENDS IN INTERNATIONAL MATHEMATICS AND SCIENCE STUDY (TIMSS)

SUCESSOS

^^ Portugal^subiu^para^o^17º^lugar^entre^os^países^da^OCDE^na^literacia^científica,^tem^mais^top^performers,^menos^low^achievers^e^mais^alunos^desfavorecidos^a^superar^as^expectativas^

^^ Os^países^asiáticos^dominam^os^rankings^internacionais.^Singapura^lidera^todos,^seja^no^PISA^seja^no^TIMSS^^

^^ Finlândia,^Estónia,^Canadá^e^Irlanda^são^os^únicos^não-asiáticos^a^estar^no^top^5^nas^três^literacias^avaliadas^no^PISA

Isabel Leiria

É das poucas alturas em que, quando se aproxima a divul-gação dos resultados dos tes-tes, quem fica a roer as unhas não são os alunos — que, aliás, nunca chegam a saber como se saíram nas provas —, mas os governos. De três em três anos, o Programme for International Student Assessment (PISA), a maior e a mais importante avaliação na área da Educação conduzida pela OCDE desde 2000, tira o retrato ao nível de literacia dos jovens de 15 anos dos 35 países membros da organização e outros tantos participantes. E o mundo fica a saber quem são as superpotên-cias nesta área, quem parece ter encontrado a fórmula de sucesso e quem se terá engana-do nas reformas e nas opções que tomou.

Se até há uns anos Portugal ficava nas filas de trás da foto-grafia, nas últimas edições do PISA foi-se chegando à frente, até se colocar agora e pela pri-meira vez acima da média na OCDE. De forma estatistica-mente significativa no caso da literacia científica e na leitura. E na média da organização, no caso da matemática. É o único país europeu a conseguir me-lhorar sempre desde o início do programa e o feito foi assinala-do, por exemplo, num artigo no jornal El País, com o título “La Buena Escuela Portuguesa”.

Os resultados foram divulga-dos na terça-feira, mas já há uma semana, numa outra gran-de avaliação internacional com 49 países e regiões, os alunos portugueses do 4º ano tinham brilhado a Matemática. Tive-ram melhores desempenhos do que os finlandeses (referência incontornável em matéria edu-cativa) e, acima de tudo, regis-taram a maior progressão de to-dos os participantes no Trends in International Mathematics and Science Study (TIMSS) des-de a primeira edição, em 1995.

Do fim da tabela, o país saltou para a 13ª posição. E ‘saltaram’ também ex-ministros e respon-sáveis políticos a aplaudir e a reivindicar a quota-parte do mérito. Refira-se que os jovens de 15 anos que realizaram o PISA em 2015 realizaram me-tade do seu percurso no ensino básico sob o mandato de Maria de Lurdes Rodrigues (gover-no PS) e a outra sob a tutela de Nuno Crato (governo PSD/CDS). Isabel Alçada esteve me-nos de dois anos à frente da 5 de outubro. O Presidente da República deu os parabéns “às escolas, aos professores, alu-nos e pais” e voltou a sublinhar a importância das “linhas de continuidade e dos consensos nas políticas educativas”.

“Penso que todos os três úl-timos ministros que exerce-ram mais tempo o mandato tiveram mérito. David Justino, Maria de Lurdes Rodrigues, Nuno Crato. Os partidos nun-ca o assumirão, mas entendo que houve uma continuidade de políticas no sentido de uma maior exigência, rigor, compe-tência, que deu frutos”, avalia João Maroco, coordenador na-cional do PISA, do TIMSS e do PIRLS (Progress in Internati-onal Reading Literacy Study).

Entre as várias medidas, João Maroco destaca o papel

Nos testes que põem governos à prova Portugal passou com distinção

EDUCAÇÃO

Maior exigência, pais mais escolarizados e melhores professores explicam sucesso, diz coordenador do PISA

dos exames nacionais, primei-ro introduzidos por David Jus-tino no 9º e depois estendidos por Nuno Crato ao 4º e 6º anos.

O efeito exame nacional

“Não é pelo facto de haver exa-mes que se aprende melhor. Mas a verdade é que a existên-cia de uma prova que conta para a avaliação final com-promete os professores com o cumprimento do programa e também os alunos, que vão ter de trabalhar e esforçar-se mais e rever a matéria. Creio que esta é uma das razões que ajudam a explicar a melhoria dos resultados a Matemática dos alunos do 4º ano no último TIMSS, ao mesmo tempo que houve um retrocesso a Ciênci-as comparando com o estudo de há quatro anos”, aponta João Maroco. (Os exames a Português e Matemática do 4º e do 6 anos foram entretanto eliminados este ano.)

Na opinião do investigador do Instituto de Avaliação Edu-cativa (IAVE), há outro fator que não ajuda a que os alunos portugueses se saiam melhor a Ciências: o ensino “essenci-almente expositivo” que se faz no 1º ciclo e que contrasta com o tipo de exercícios que cons-tam do TIMSS.

“Se o método de ensino não mudou entre 2011 e 2015, o que sobra como explicação possível para o decréscimo dos resulta-dos é um menor investimento nas Ciências. Porque houve claramente uma aposta na Matemática e no Português”, defende João Maroco. Os re-sultados do último PIRLS, so-bre a literacia em leitura e que serão conhecidos no próximo em 2017, poderão reforçar ou

pôr em causa esta teoria sobre o “efeito exame nacional”. Que não se aplica a todos os outros países onde não há exames ao longo do ensino básico, como é o caso da Finlândia, e que nem por isso deixam de apresentar dos melhores resultados inter-nacionais.

A pergunta que se coloca en-tão é saber porque é que foi precisamente na literacia ci-entífica (o tema principal em avaliação no PISA de 2015) que os jovens portugueses mais progrediram, ultrapassando a média da OCDE de forma significativa e colocando-se em 17º lugar entre os 35 membros da organização.

O investigador lembra que a maior parte dos jovens que foram chamados a fazer o PISA (57%) e que contribuíram para a média está no 10º ano. E que também neste nível de esco-laridade existem provas na-

cionais a Física e Química e a Biologia e Geologia.

Melhorar, apesar da crise

O especialista admite, no en-tanto, que nem tudo reside na avaliação e que “as razões e as variáveis que levam ao sucesso são múltiplas”. Por vezes, nem sequer se encontram na esco-la, como é o caso do aumento das habilitações académicas dos pais. O avanço nas qualificações é inegável, mas o país continua em défice: apenas um quarto dos portugueses entre os 35 e os 44 anos — os que têm idade para ser pais de alunos participantes no PISA — é licenciado, quando a média da OCDE é de 37,5%.

Mais recursos disponíveis na escola, mais autonomia para os professores definirem progra-mas de apoio moldados à sua população escolar e aumento da frequência do pré-escolar — que possibilita que cada vez mais cri-anças, independentemente dos recursos das famílias, tenham um contacto precoce com os nú-meros e as letras — são outras das variáveis que o coordenador do PISA e do TIMSS coloca na equação que leva ao sucesso.

E que incluem, necessaria-mente, os professores. “Há 20 anos, muitas das escolas, sobre-tudo fora dos centros urbanos, não tinham professores de Ma-temática colocados no início do ano letivo. Muitos não eram licenciados em ensino da Ma-temática. Eram engenheiros que até podiam gostar de dar aulas, por exemplo, mas que não tinham formação pedagógica. Nada disto acontece hoje”, su-blinha João Maroco.

O próprio relatório (para já são dois volumes com mil pá-ginas e centenas de tabelas,

figuras e análises estatísticas) que acompanha a divulgação dos resultados do PISA enumera e contabiliza várias condições que ajudam a explicar a variação dos resultados entre os países. A questão é que nenhuma garante por si só o sucesso ou o falhanço. E mesmo as que puxam para baixo, podem ser contrariadas.

O caso da riqueza do país e dos gastos em educação por aluno é paradigmático. Ainda que haja uma relação comprovada entre resultados e despesa por aluno, há quem gaste muito e não con-siga grandes médias e há quem gaste pouco e chegue ao topo.

É o caso da Estónia, um peque-no país de 1,3 milhões de habi-tantes, que apresenta um gasto acumulado de 66 mil dólares por aluno dos 6 aos 15 anos (medida ajustada ao poder de compra de cada país para permitir compa-rações) e consegue um lugar no top 5 nas três literacias avaliadas pelo PISA. Portugal gasta mais 20 mil dólares, a Suécia quase o dobro, o Luxemburgo mais do triplo. E todos ficam atrás nos rankings da literacia.

Mas o caso português não deixa de merecer destaque. É que os resultados melhoraram numa altura de crise, contração do PIB e diminuição das verbas para a Educação. E apesar de o país ter também uma das maio-res percentagens de alunos com baixo índice social, cultural e económico, comprovadamente um dos mais fortes preditores do insucesso, grande parte (38%) consegue contrariar as dificul-dades e ter melhores resultados do que seria expectável.

Enquanto ninguém descobrir a fórmula exata de sucesso, to-dos poderão continuar a recla-mar o mérito e a atribuir a culpa.

[email protected]

O teste PISA foi realizado em Portugal em 2015 em 246 escolas públicas e privadas. Mais de 7 mil jovens de 15 anos fizeram o teste FOTO^NUNO^BOTELHO

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 25: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 25 PRIMEIRO CADERNO

Receber um diagnóstico de es-clerose múltipla (EM) já não é uma sentença de incapacidade permanente como aqui há uns anos. Não há cura, é crónica,

mas já se pode almejar à remissão da doença. A qualidade de vida dos doentes em Portugal está, porém, dependente do acesso à terapêutica, que ainda é desigual pelo país e está sujeita a um processo burocrático que leva a que os médicos se vejam confrontados com a impossibilida-de de travar os efeitos da doença degene-rativa por não poderem utilizar a medi-cação que consideram mais adequada em tempo oportuno. Um alerta que vem de médicos e associações no Dia Nacional da Esclerose Múltipla, que se assinalou a 4 de dezembro.

OITO MIL CASOS EM PORTUGAL Existem 5500 doentes em Portugal tratados em consulta hospitalar, mas as associações de doentes estimam que o número peque por defeito e falam em oito mil doentes. “Já se sabe muito sobre a doença, que é uma infeção viral, embora não se saiba o que faz disparar o gatilho“, explica Luís Cunha, diretor do Servi-ço de Neurologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, que faz o seguimento de 1200 casos. “Um doen-te bem tratado é capaz de não ter uma vida encurtada”, sublinha, mas para que isto aconteça é preciso um diagnóstico precoce da doença, que surge entre os 20 e os 40 anos, com maior incidência entre as mulheres, e que é antecipado através de ressonância magnética. “Ainda não é diagnosticada tão rapidamente como gostaríamos, mas já se evoluiu muito”, defende Susana Protásio, vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM), a mais antiga associação de doentes do país. “Quando alguém com 20 e poucos anos tem problemas de visão

Doentes de esclerose múltipla têm hoje melhores expectativas de vida, mas ‘a sua sorte’ depende muito de decisões burocráticas no acesso à medicação, o que não é irrelevante quando se trata da doença mais incapacitante entre jovens adultos em Portugal

Medicação inovadora tarda para a esclerose múltipla

“O apoio familiar é fundamental, muitas vezes o próprio tem de aceitar a doença e até fazer o luto”Paulo Pereira, PEM

“Isto é uma doença crónica e incapacitante com a qual temos de aprender a viver”Luís Loureiro, ANEM

“Para além da intervenção junto dos doentes, ajudamos nos problemas sociais no quadro da família, dos cuidadores, dos filhos”Susana Protásio, SPEM

PUB

turva, perda de força muscular nos braços e pernas, problemas ao nível cognitivo e da memória, sabe que alguma coisa está mal e procura ajuda”, garante Luís Cunha. Não é, todavia, um diagnóstico fácil de receber. “Primeiro, é o choque, depois vem a reação”, descreve. “São jovens informados que procuram saber quais as suas opções e exigem, e bem, a maior ajuda possível.”

EVITAR O QUE JÁ FOI INEVITÁVELE quais as opções? É preciso perceber que há diferentes tipos de EM. A mais frequente é a surtorremissão, em que há um surto e depois recuperação total ou parcial, a secundária progressiva, que se inicia com surtos e à medida que o tempo passa instala-se uma perda gradual de funções cognitivas, da força muscular, e a primária progressiva, em que se vai ins-talando uma perda gradual das funções do corpo. “Todos os casos acabam por ter uma deterioração progressiva”, assume Luís Cunha, explicando que há uma es-cala de 1 a 10 para a evolução da doença, em que o 6 é quando o doente passa para a cadeira de rodas. “Quando se chega a determinado patamar, pouco há a fazer, mas antes é possível travar a doença. Há uma janela de oportunidades que é pre-ciso aproveitar”, clarifica o neurologista. Mas é também aqui que surgem alguns conflitos. “A maior parte dos doentes é tratada com medicamentos chamados de primeira linha, que previnem os surtos e têm menos efeitos colaterais, depois temos 27% dos casos tratados com uma segunda linha, que são mais eficazes na redução da incapacidade mas também têm mais efeitos secundários e são mais caros”, descreve. Mas há ainda situações mais graves, em que é necessário uma terceira linha, e é aqui que encontram entraves. “Há um relativo bom acesso aos medicamentos, mas levam muito tempo a

ser disponibilizados em Portugal, às vezes com dois ou três anos de atraso”, acusa Susana Protásio.

“LEVA-NOS ÀS LÁGRIMAS”Luís Cunha corrobora e até dá um exem-plo. “Há um medicamento já aprovado nos Estados Unidos e na Europa. Con-seguimos tratar sete doentes com essa substância em regime off label, ou seja, usámos um medicamento aprovado para outras patologias, neste caso oncológicas, no tratamento da EM. Em cinco dos casos foi suficiente, mas há dois casos em que é preciso um reforço, e o Infarmed não autoriza”, lamenta. “É um drama tratar estes doentes, sabendo o que lhes vai acontecer se não receberem o tratamento adequado. São situações que nos levam às lágrimas”, confidencia. A SPEM não podia estar mais de acordo. “Uma pessoa com 20/30 anos deixa de ser ativa e fica pen-durada no sistema, com reformas de 200 euros porque não fez descontos”, termina Susana Protásio.

“Isto é uma doença que derrota muito as pessoas”“Costumo dizer que não caio pelas escadas abaixo, mas pelas escadas acima.” Luís Loureiro, presidente da Associação Nacional de Esclerose Múltipla (ANEM), serve-se do humor para descrever a doença com que vive há anos. Apertar botões, escrever “com a mão que não me obedece” são outras tarefas que se tornam difíceis. “É uma doença onde nos sentimos permanentemente derrotados”, descreve. Por isso não se trata apenas com fármacos, mas com uma abordagem multidisciplinar, onde a parte psicológica é fundamental, conjugada com a enfermagem, fisioterapia, terapia da fala, entre outros, passando também pela assistência social e cuidadores. “ Um dos problemas maiores e mais incompreendidos é a fadiga crónica”, descreve Paulo Pereira, presidente da Todos com a Esclerose Múltipla (TEM), que, entre outras coisas, aprendeu a lidar com a incontinência urinária, mesmo quando está a dar uma aula. “A lei portuguesa é dramática, quase não há part-times, o que seria uma boa solução para estes doentes”, acrescenta Susana Protásio, da SPEM, adiantando que muito do apoio pedido na associação é jurídico. É por isso que a TEM se tem empenhado na criação do Estatuto do Doente Crónico, tendo promovido uma petição, já discutida na Assembleia da República mas ainda sem resultados práticos.

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 26: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201626 PRIMEIRO CADERNO

BAIXA DENSIDADE

POPULACIONAL

NÍVEIS CRÍTICOS DE

INFRAESTRUTURAS E SERVIÇOS

FRACOEMPREENDEDORISMO

FRACA OFERTA DE EMPREGO

FORTE EMIGRAÇÃO E

ENVELHECIMENTO

Inversão de fluxos

migratórios e das dinâmicas demográficas

Atração do investimento

e produção de riqueza endógena

Ganho de escala e

aglomeração do tecido

urbano

Especificidadedo investimento

Insustentabilidade geracional

Perda de capital humano

Défice de investimento

A quebra do círculo vicioso

PROBLEMASSOLUÇÕES

FONTE: PROGRAMA NACIONAL PARA A COESÃO TERRITORIAL

TRÊS PERGUNTAS A

Eduardo Cabrita

P O Governo tem condições obje-tivas para concretizar no terreno o Programa Nacional para a Coesão Territorial? R Temos condições políticas para avan-

çar porque é um plano de ação com 164 medidas calendarizadas e tem uma visão global, transversal, que envolve compromissos de todos os ministérios em relação ao desenvolvimento do In-terior. Ou seja, resulta de um esforço de coordenação entre todos os instru-mentos de política pública concebidos pelo Governo, destinados aos cidadãos

e às empresas. Por outro lado, de seis em seis meses haverá um Conselho de Ministros dedicado à monitorização do programa, que avaliará o seu grau de execução e o cumprimento do calen-dário estabelecido.

P O programa pode incluir novas medidas ou alterar as que já foram calendarizadas? R Sim, é um programa dinâmico, aber-

to a novas contribuições. É por isso que estamos a organizar debates públi-cos por todo o país com a participação de autarquias, empresas, associações e instituições locais. De seis em seis meses, com a avaliação prevista do programa em Conselho de Ministros, poderemos reforçar ou corrigir as 164

medidas e introduzir novas. Aliás, va-mos criar um site de acompanhamento das medidas que permitirá aos agentes locais pronunciarem-se sobre elas.

P Há grandes potencialidades por explorar no Interior? R Sem dúvida. Miranda do Douro, por

exemplo, é a cidade portuguesa mais próxima da rede europeia de comboios de alta velocidade, porque está a 40 km da estação de Zamora. Os territórios do Interior são os que estão mais perto do mercado espanhol e dos grandes mercados europeus. E onde por vezes já encontramos exemplos de sucesso, como o polo aeronáutico de Évora, onde as fábricas da Embraer já criaram centenas de empregos qualificados.

Ministro-adjunto e coordenador do Programa Nacional para a Coesão Territorial

Para acabar com o fatalismo do Interior

Textos Virgílio Azevedo Fotos Rui Duarte Silva

Infografias Carlos Esteves

Não podia ser mais simbólico na histó-ria de uma cidade. A Universidade da Beira Interior (UBI) ocupa as antigas fá-bricas de lanifícios do centro histórico da Covilhã, como se

a atividade industrial tivesse dado lugar ao conhecimento. As sólidas paredes de granito construídas para a indústria acolhem hoje faculdades, centros de investigação e 7000 alunos, dos quais 900 são estrangeiros, a maioria do Bra-sil, Angola e Moçambique. E as antigas Real Fábrica de Panos e Real Fábrica Veiga albergam o Museu de Lanifícios, já considerado o melhor do país e por onde circulam alunos e professores pois está integrado num dos polos da universidade, junto às salas de aula e departamentos.

“A universidade é das ‘indústrias’ mais resilientes e competitivas da re-gião”, considera António Fidalgo. O reitor revela ao Expresso que a UBI “está a ser cada vez mais solicitada para projetos de desenvolvimento pelas au-tarquias, empresas e associações locais, porque os fundos da UE estão muito virados para a competitividade”. Mas os lanifícios não morreram. Apesar de terem fechado dezenas de fábricas nas últimas décadas, as quatro que restam “exportam mais do que todas as outras no passado”, constata o presidente da Câmara da Covilhã, Vítor Pereira. “E os lanifícios representam metade dos 77 milhões de euros das exportações anuais do concelho”.

Nos últimos 30 anos, a cidade outrora encaixada na encosta da Serra da Estre-la modernizou-se, estendeu-se para a Cova da Beira, e abriu-se em novas ave-nidas, bairros, jardins, escolas, centro hospitalar, campos desportivos, pisci-nas, hotéis, grandes superfícies. A UBI marca profundamente a identidade da Covilhã, sendo um polo decisivo para o desenvolvimento da cidade — a única do país que não é capital de distrito e tem uma universidade — e da região. E é a única universidade do interior do país com faculdade de medicina, cons-truída de raiz junto ao hospital.

Foi precisamente no auditório da Faculdade de Ciências da Saúde que se realizou na quarta-feira uma das sessões de discussão pública das 164 medidas calendarizadas para o Interior do Programa Nacional para a Coesão

Territorial. O PNCT pretende quebrar um círculo vicioso — que tem levado à desertificação de 2/3 do território nacional (ver infografia) —, de modo a atrair e fixar populações, estimular a atividade económica e a criação de em-prego, valorizar os recursos locais, pro-mover a cooperação transfronteiriça e o intercâmbio de conhecimento. Por isso inclui medidas como a redução do IRC para as empresas que se instalem no interior, a reabertura de tribunais encerrados nos anos da crise, a criação de uma rede de investigação em ecos-sistemas de montanha, a cobertura de banda larga móvel em mais 1000 fre-guesias ou a dotação de 100 aldeias com infraestruturas de energias renováveis e telecomunicações eficientes.

O programa é coordenado pelo mi-nistro adjunto, Eduardo Cabrita, e acompanhado pela Unidade de Missão para a Valorização do Interior (UMVI), liderada por Helena Freitas. Eduardo Cabrita iniciou na segunda-feira em Beja uma ronda de debates públicos do PNCT pelo país, onde participa sem-pre um ministro convidado, de modo a vincar as características transversais (interministeriais) do programa. Na Covilhã esteve o ministro da Ambiente, João Matos Fernandes.

Avaliação a cada seis meses

O debate na UBI, que reuniu mais de 200 pessoas, entre autarcas, empre-sários, académicos e dirigentes locais, aconteceu dois dias depois de Marcelo Rebelo de Sousa visitar a mesma facul-dade, no âmbito do programa “Portugal Próximo” da Presidência da República. “Têm sido feitos muitos estudos e diag-nósticos, mas é a primeira vez que há um programa de Governo com grande peso da valorização do território do Interior”, sublinha Eduardo Cabrita ao Expresso, “onde não olhamos os problemas com uma visão fatalista e assistencialista, mas de oportunidade” (ver entrevista).

“O programa não é a solução para to-dos os males, mas exigimos do Governo vontade política para o pôr em prática”, salientou Vítor Pereira no debate, lem-brando a posição estratégica da Beira Interior, “a meio caminho entre Lisboa e Madrid”. O autarca admite que as suas expectativas são elevadas, “porque é a primeira vez que um Governo pou-cos dias depois de ter tomado posse se abalançou a esta tarefa, que não é fácil”. E há um fator “que confere seriedade” à iniciativa: o Governo vai monitorizar semestralmente a aplicação das 164 medidas, expondo publicamente o que foi concretizado.

[email protected]

Desafio O debate público já começou e as 164 medidas do Programa Nacional para a Coesão Territorial avançam

TERRITÓRIO

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 27: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 27 PRIMEIRO CADERNO

POPULAÇÃO RESIDENTE

2001-2011

Cresceu Diminuiu

1960-2011

FONTE: UNIDADE DE MISSÃO PARA A VALORIZAÇÃO DO INTERIOR (UMVI)

Há problemas no interior “que se podem minimizar mas não têm solução, no sentido de podermos afirmar que ‘vai ser como era antes’”, avisa João Ferrão. O investigador do Ins-tituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e ex--secretário de Estado do Orde-namento do Território (governo Sócrates) recorda que, “tiran-do as cidades, o Alentejo está a perder população desde os anos 40”, quando terminaram os efeitos da Campanha do Tri-go lançada pelo Estado. E na Cordilheira Central, no centro do país, “concelhos como Pam-pilhosa da Serra estão a perder população desde 1920”.

No despovoamento do inte-rior, “há processos que se po-dem reverter e há tendências que, pelo menos nas próximas décadas, são irreversíveis”, argumenta João Ferrão. “Por isso temos de os gerir de for-ma inteligente e apostar nas cidades médias como alavan-cas do desenvolvimento”. Os diversos mapas inéditos fei-tos pela Unidade de Missão para a Valorização do Interior (UMVI), divulgados no Progra-ma Nacional para a Coesão Ter-ritorial (PNCT), podem ajudar a perceber melhor esta realidade.

A queda demográfica da mai-or parte dos concelhos do inte-rior do país é contínua desde 1960, mas esta tendência já está a mudar desde 2001, devido ao impacto das políticas públicas financiadas por fundos euro-peus, das universidades e ins-titutos politécnicos e do dina-mismo económico, com cidades médias como Bragança, Castelo Branco ou Beja, e respetivos concelhos, a aumentarem de

Os outros mapas de PortugalO Programa Nacional para a Coesão Territorial tem visões inéditas sobre o interior do país e os desequilíbrios regionais

população. E há outros conce-lhos que nunca deixaram de crescer apesar da sua interiori-dade, como Vila Real ou Évora (ver mapas).

Terras de baixa densidade

Portugal tem 3000 km de au-toestradas que aproximaram estas cidades do litoral. E, hoje, Vila Real ou Évora estão apenas a 1h30 de viagem de um gran-de porto (Leixões e Setúbal) e de um aeroporto internacional (Porto e Lisboa). Por isso, o con-ceito de interior está a ser subs-tituído pelo de “territórios de baixa densidade”, não apenas na população mas também nas infraestruturas de saúde, justi-ça ou ensino, no emprego e nas atividades económicas, sociais e culturais. Segundo o PNCT, são classificados nessa categoria 165 concelhos, incluindo todos os municípios do litoral do Alen-tejo — à exceção de Sines — e da Costa Vicentina, no Algarve.

“Estamos a usar a diferenci-ação positiva dos territórios de baixa densidade dos fundos eu-ropeus na aplicação do PNCT”, explica Helena Freitas, “mas não sou a favor de promover o interior à custa do litoral”. A coordenadora da Unidade de Missão constata que “há 10 a 20 concelhos que estão, na verdade, em vias de extinção e vão precisar de um programa de emergência nacional”. Mas para já “é preciso mais debate”. As 164 medidas do programa “são um choque de curto prazo, para esta legislatura” e a UMVI está a preparar a Agenda para o Interior, uma estratégia de longo prazo com programas virados para “o envelhecimento com qualidade, a inovação da base económica, a cooperação transfronteiriça, a acessibili-dade digital, a atratividade dos territórios ou a valorização do património cultural e natural”.

Jardim do Lago, na zona

moderna da Covilhã, e

Universidade da Beira

Interior, que tem 900 alunos

estrangeiros

TERRITÓRIO

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 28: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201628 PRIMEIRO CADERNO

Guerra e PazMiguel [email protected]

Alepo é o símbolo da ambição estratégica de Moscovo, da retirada de Washington do Médio Oriente e da fraqueza

das capitais europeias. É assim que alguns olham para a Síria.

A destruição sistemática da mais antiga capital comercial e financeira do mundo por onde passou Mar-co Polo, Ibn Battuta e a Estrada da Seda, garante a sobrevivência do regime de Bashar al-Assad em Da-masco, das bases russas na costa do Mediterrâneo e demonstra o poder de Moscovo a qualquer antagonista.

Muitos países e políticos europeus têm tido grande dificuldade em com-preender o essencial — Vladimir Pu-tin e o seu regime estão em guerra contra o eixo Berlim-Bruxelas-Wa-shington. Os instrumentos do Krem-lin têm sido sobretudo propaganda, espionagem, subversão e a guerra eletrónica. Os principais partidos políticos e instituições euro-atlânti-cas são vítimas de ataques informáti-cos sistemáticos. A Alemanha será o principal alvo no próximo ano.

2016 mostra a longa experiência e competência de Moscovo neste tipo de operações clandestinas. O objetivo é distorcer a realidade, mi-nar a coesão interna das sociedades euro-atlânticas e posicionar a Rússia para tirar partido de um novo ci-clo político. Isto é evidente no novo “Conceito de Política Externa” russo assinado por Vladimir Putin na se-mana passada.

Como o documento mostra, a Rús-sia comporta-se como se estivesse em ascensão. Neste contexto, a pro-jeção da imagem e do poder do país é vista como essencial em termos internos e externos. O Kremlin quer voltar a ser um dos novos “centros de poder” internacional. Para tal, está disposto a usar a força militar em determinadas circunstâncias. As armas nucleares desempenham um papel importante nesta estratégia de afirmação global. O seu uso pas-sou de “impensável” a “improvável.” A diferença semântica é importante e deve ser sublinhada. Mais tarde ou mais cedo, a NATO vai ter de repen-sar a sua doutrina nuclear.

Putin, um ex-operacional da con-traespionagem do KGB, é o campe-ão mundial na arte da manipulação. A sua grande proeza tem sido ca-muflar a fraqueza interna da Rús-sia e criar a ficção de que o futuro internacional será determinado por Moscovo.

Se olharmos para a destruição das instituições russas, a emigração de cerca de 600 mil pessoas nos últimos cinco anos para os países europeus, um salário médio mensal na casa dos 400 euros, o colapso da classe mé-dia, a educação e a saúde pública e a falta de competitividade industrial, vemos uma coisa muito diferente. Putin lidera uma Rússia que parou no tempo. De acordo com o Cré-dit Suisse “Global Wealth Report 2016,” Moscovo é a campeã mundial da desigualdade. Um por cento da população controla 74,5% da riqueza nacional. Ao pé disto, Washington é uma capital social-democrata.

A Rússia não está em ascensão. Está, sim, em declínio. O que Mos-covo tem é ambição política. Esse é o seu grande trunfo. É por isso que Putin constrói a imagem da força e pratica a imprevisibilidade.

Putin e as ruínas

Daesh líbio derrotado em Sirte

Forças fiéis ao Governo líbio apoiado pela ONU anunciaram segunda-feira ter tomado Sirte, bastião dos grupos locais identificados com o Daesh e que desde janeiro de 2015 tinham feito desta cidade costeira o seu feudo, dedicando-se aos habituais rituais macabros públicos: degolas, crucificações, torturas, etc., além de operarem contra os campos petrolíferos vizinhos. O cerco durava há seis meses e a resistência do grupo armado, apoiada em redes de túneis e

fortificações, atiradores ocultos, campos de minas, edifícios armadilhados e operações motorizadas com suicidas (tal como na cidade iraquiana de Mossul), obrigou à intervenção da aviação americana, que, desde agosto, fez meio milhar de missões, decisivas para desbloquear o avanço governamental. Resta tomar alguns prédios e saber o que farão os sobreviventes do Daesh, nomeadamente os chefes, que terão fugido para o deserto. R.C.

Anatomia de um genocídio em Alepo

Ricardo Silva

As f o r ç a s q u e a p o i a m A s s a d já conquistaram 8 0 % d a z o n a oriental de Ale-po nas mãos de grupos rebeldes há quatro anos. Q u a r t a - f e i r a

caiu a cidade velha. Estes sucessos só foram possíveis devido ao apoio da aviação russa e de infantaria es-trangeira, desde mercenários xiitas afegãos, paquistaneses e iraquianos à milícia libanesa Hezbollah, sem esquecer tropas especiais iranianas. Isto revela que o exército de Assad já não chega para as encomendas e que terá perdido metade dos seus efeti-vos, atualmente estimados pelo diá-rio francês “Le Monde” em 150 mil homens. Este excesso de visibilidade da coligação que apoia o ditador sírio levanta dois problemas: acirra ódios confessionais, pois os sunitas sírios (maioritários) veem aqui invasores estrangeiros, ainda por cima apósta-tas; por outro lado, estas tropas cuja vocação é o choque não são adequa-das (nem quererão fazê-lo) a missões de vigilância e contraguerrilha, sen-do que, se os rebeldes perderem as cidades mais importantes passarão à guerrilha, sabotagem e atentados.

Assad concluiu o cerco no início do verão, seguindo-se bombardea-mentos que desgastaram os grupos rebeldes da Fatah Halab e segundo a ONU fizeram 16 mil deslocados. Falhada a última tentativa do Jaysh al-Fatah de quebrar o cerco a partir do exterior, a 15 de novembro o Go-verno deu início à ofensiva terrestre, com as unidades de elite a avançarem a partir de norte.

As Forças Tigre, a Brigada “Fal-cões do Deserto” e diversos batalhões

da Guarda Republicana apoiados pelos palestinianos da Liwa al-Quds lideraram a ofensiva com o apoio dos curdos do enclave de Sheikh Maq-sood. No Sul foram posicionados os iraquianos da Harakat al-Nujaba, os libaneses do Hezbollah, os afegãos treinados e financiadas pelo Irão e os inúmeros “conselheiros” iranianos da Força Quds, além de árabes su-nitas das Brigadas Ba’ath e de várias unidades de milicianos.

Recuo rebelde generalizado

Dia 21, as Forças Tigre romperam a defesa da Fatah Halab em Hanano e avançaram para sul. Em menos de uma semana cortaram em dois o ter-ritório inimigo. Centenas de rebeldes morreram ou renderam-se e dez mil procuraram refúgio em território governamental.

A 1 de dezembro, o Ahrar al-Sham e outros 10 grupos anunciaram a for-mação do Jaysh Halab e relegaram o que resta da Fatah Halab para um papel secundário, mas nesse mesmo dia a coligação pró-Assad virou de leste para oeste. Nalgumas horas

conquistaram vários bairros. Segun-da-feira, o Jaysh Halab contra-atacou em Katarji e o Jaysh al-Fatah lançou dezenas de foguetes Grad sobre as posições do exército, mas a iniciativa continuou do lado governamental, que na madrugada de quarta-feira atravessou a zona de Sha’ar até à cidadela, conquistando pelo caminho os bairros antigos de Alepo e a mes-quita Umayyad.

Parte deste sucesso deve-se à aviação russa, que bombardeou a província de Idlib, evitando que o Jaysh al-Fatah pudesse mandar re-forços para Alepo. A fragata “Ad-miral Grigorovich” lançou mísseis de cruzeiro Kalibr e do porta-aviões “Kuznetsov” partiram vários caças MiG-29 e Su-33. Operando a partir da base de Khmeimim, caças Su-24 e Su-34 fizeram centenas de ataques a depósitos de armamento e viaturas nas estradas para Alepo.

Maior envolvimento russo significa mais baixas. Segunda-feira, um caça Su-33 despenhou-se ao aterrar no porta-aviões “Kuznetsov”. Um MiG-29 sofrera destino similar no mês passado, o que talvez diga algo sobre

a qualidade do material e o grau de preparação dos pilotos. Nesse dia um hospital de campanha em Alepo foi atingido por fogo de morteiro, que matou duas enfermeiras e o coronel Ruslan Galitsky, comandante da 5ª Brigada de Tanques da Guarda, ofi-cial de maior patente a perder a vida no conflito (28 mortos russos e oito aeronaves destruídas).

Rússia veta na ONU

Segunda-feira, Rússia e China opu-seram-se no Conselho de Segurança da ONU a uma resolução que previa sete dias de tréguas em Alepo. A Ve-nezuela votou no mesmo sentido. O texto, apresentado pela Espanha, Nova Zelândia e Egito teve os votos favoráveis dos restantes membros do Conselho e a abstenção de Angola. É a sexta vez que Moscovo veta uma resolução sobre a Síria desde 2011, sendo este o quinto veto chinês so-bre o mesmo assunto. A diplomacia russa parece preferir negociações diretas com os EUA, que decorrem em Genebra tendo como tema mo-dalidades de saída dos rebeldes de Alepo oriental, coisa que estes, mes-mo acossados, rejeitam. Um porta--voz do grupo salafita Nourredine Al-Zinki (cujo nome remete para o emir de Damasco no século XII, Nur ad-Din) explicou: “Se alguém tem de sair são os russos.”

Se a queda de Alepo se confirmar e for continuada por vários encla-ves rebeldes em redor de Damasco, Assad poderá libertar mais de 20 mil soldados para novas ofensivas talvez determinantes para o futuro do conflito. A futura posição da Casa Branca sob Trump e o maior ou me-nor empenho de potências sunitas como a Turquia ou a Arábia Saudita no apoio aos rebeldes sunitas ou lai-cos sê-lo-ão também.

[email protected]

Civis fugindo de Alepo leste a 29 de novembro, dia em que

os ataques governamentais mataram 53 pessoas

FOTO EPA

Drama Bombardeamento, frio e fome massacram civis nas zonas rebeldes

INTERNACIONAL MÉDIO ORIENTE

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 29: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Papel secreto, moedas transparentes

e menos bactérias?Falamos de inovação.

A entrega dos prémios contou com a presença da Professora Maria Manuel Leitão Marques, ministra da Presidência e da Modernização Administrativa.

Para incentivar a inovação relacionada com a emissão de moeda metálica e produção de documentos de segurança,cumprindo a sua missão e valores de instituição pública, a INCM criou os Prémios Inovação, ao qual concorreram os centros

de investigação e instituições universitárias portuguesas. Os três projetos vencedores da primeira edição darão um contributo efetivo para a excelência e modernização dos produtos da Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

PRIMEIRO PRÉMIOPaPel Secreto – Uma abordagem inovadora e de baixo cUStoProposta de Elvira Fortunato, Rodrigo Martins, Luís Pereira e Pedro Branquinha,do Centro de Investigação de Materiais (CENIMAT/CEMOP), João Goes e João Pedro Oliveira, do Centro de Tecnologia e Sistemas (CTS) do Instituto UNINOVA, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.

SEGUNDO PRÉMIOcUnhagem de moedaS total oU Parcialmente tranSParenteSProposta de Paulo Martins do Instituto de Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico.

MENçãO HONROSAdiminUição da colonização bacteriana em moeda metálicaProposta de Carla Carvalho, do Instituto de Bioengenharia e Biociências do Instituto Superior Técnico, Maria José Carvalho, do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais da Faculdade de Ciências, da Universidade de Lisboa, e Telmo Santos, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.

INCM PUB INOVAÇÃO 3.indd 1 09/12/16 11:34

Expresso, 10 de dezembro de 2016 29 PRIMEIRO CADERNO

Ricardo Lourenço Correspondente nos EUA

Ban Ki-moon é conhecido por ser parco em palavras e emo-ções, um comedimento que desaparece quando fala do su-cessor. Em declarações ao Ex-presso, o secretário-geral das Nações Unidas Unidas (ONU) garantiu que António Guterres é um líder “bastante bem pre-parado para construir sobre a base de progresso conquistado até hoje e lidar com os enormes desafios globais”.

“António Guterres é uma es-colha soberba para liderar a

“António Guterres é uma escolha soberba”

NAÇÕES UNIDAS

O secretário-geral da ONU elogia a “visão apaixonada” e “liderança ativa” do seu sucessor, mas lembra que o espera um mundo de “insegurança e incerteza”

organização. Ele é uma mistura única de visão apaixonada com liderança ativa”, disse-nos o lí-der da ONU, na quarta-feira à tarde, altura em que aproveitou também para fazer um retrato da política internacional.

“Ele entrará nas Nações Unidas numa altura em que o mundo atravessa uma fase de enorme insegurança e incerte-za, em que as divisões no seio da comunidade internacional feriram a capacidade da ONU para resolver diversos conflitos que até hoje geraram enorme sofrimento humano”.

Alarmado com o aumento do extremismo e da xenofobia,

Ban Ki-moon não se esqueceu das vagas migratórias, um fenómeno ao qual Guterres dedicou os seus esforços nos últimos dez anos, enquanto alto comissário da ONU para os Refugiados. “Nunca como agora vimos tantas pessoas em fuga, procurando segurança ou melhores oportunidades para a sua família”.

Apesar deste cenário som-brio, o diplomata sul-coreano considerou que há “esperança e potencial”. Lembrou a forma como os líderes globais se uni-ram em torno dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, “um mapa mundial para aca-

bar com a pobreza até 2030”, em paralelo com a promoção de “sociedades pacíficas e de um planeta saudável”.

Sobre este último ponto, Ban Ki-moon recordou ao Expresso que o acordo de Paris entrou em vigor há poucas semanas e que tal prova, mais uma vez, que “a comunidade interna-cional se pode unir em prol do bem comum global”

Por tudo isto, ele não tem dúvidas: “O momento gerado pelos governos internacionais, sector privado e sociedade civil é imparável. Não há volta a dar. Desejo as maiores felicidades a António Guterres”.

António Guterres presta juramento como secretário-

geral da ONU na segunda-feira

Esta segunda-feira, na ci-dade de Nova Iorque, o anti-go primeiro-ministro presta juramento sobre a Carta das Nações Unidas, numa cerimó-nia marcada para as 10h locais (15h em Lisboa), na sala da As-sembleia Geral. A entrada em funções ocorre no próximo dia 1 de janeiro.

Apesar de recém-chegado à “Big Apple”, Guterres é um ve-lho conhecido da elite política dos Estados Unidos, tal como constatou o Expresso numa série de entrevistas a antigos membros do Departamento de Estado e do Pentágono, todos eles fãs do perfil conhecedor

e simpático de “Tony” (nome pelo qual o ex-líder socialista é conhecido nas terras do Tio Sam).

Num trabalho publicado on-tem no Expresso Diário, repu-tados políticos como Joseph Nye e Brian Atwood, antigos vice-secretários de Estado das Administrações Carter e Clin-ton, respetivamente, revelaram que, em Washington, há o con-senso de que, embora as rela-ções internacionais atravessem uma crise sem paralelo, Guter-res é o homem mais bem pre-parado de sempre para liderar os destinos das Nações Unidas.

[email protected]

FOT

O B

REN

DA

N M

CD

ERM

ID/R

EUT

ERS

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 30: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 201630 PRIMEIRO CADERNO

O antigo primeiro-ministro e agora candidato às presiden-ciais, Manuel Valls, nem con-segue acalmar os órfãos da re-núncia do Presidente François Hollande nem alargar a base de apoio. Mesmo antes de passar a chefia do Governo ao dema-siado frio Bernard Cazeneuve, já fazia uma guinada à esquer-da, contraditória com o selo social-democrata que sempre imprimiu aos seus discursos, incluindo a transformação do PS em Partido Democrata ou Partido do Progresso.

As primárias socialistas (fim de janeiro) podem ser menos concorridas do que as da di-reita, que levaram às urnas mais de quatro milhões de eleitores. Às primárias da di-reita concorreram um antigo Presidente (Nicolas Sarkozy) e dois ex-primeiros-ministros (François Fillon e Alain Juppé) e os debates foram vivos. Ven-ceu Fillon, amigo de Vladimir Putin, católico praticante, “fi-losoficamente contra” o aborto e o casamento gay e com pro-postas sociais fraturantes. Ago-ra, Alliot-Marie, chiraquiana, anunciou que é candidata às presidenciais, podendo tirar votos a Fillon.

Este permanece como o maior adversário de Marine Le Pen, líder da Frente Naci-onal. Mas se não moderar o programa social dificilmente terá à segunda volta o voto dos eleitores da esquerda e do cen-tro, como Jacques Chirac teve em 2002 (mais de 80%) contra Jean-Marie Le Pen, fundador da FN e pai de Marine.

Fillon defende que apenas se-jam reembolsadas pelo sistema de saúde “as doenças graves”, abrindo campo à privatização do sector. Quer cortes progres-sivos no subsídio de desemprego e uma diminuição de 500 mil funcionários públicos. Mesmo os centristas dizem que isto des-truiria o “modelo social” francês.

Fillon, apesar de europeísta, defende uma aproximação à Rússia e ao regime de Assad, na Síria, invertendo a tradição pró--americana e de certo modo au-tónoma da França, dos manda-tos de Sarkozy e Hollande. No que respeita a contas públicas aproxima-se das políticas me-nos solidárias defendidas pela Alemanha para a zona euro.

As sondagens dão-no ven-cedor à segunda volta contra Marine Le Pen, a 7 de maio. Todos os estudos dão a elimi-nação da esquerda à primeira volta, 15 dias antes. Alguns can-didatos desta área, como o ex--ministro de Valls, Emmanuel Macron (centro-esquerda), e o dissidente socialista, Jean-Luc Mélenchon (apoiado pelos co-munistas), não concorrem às primárias e poderão apresen-tar-se diretamente à primeira volta das presidenciais. Cada um vale 10% nas sondagens, outro problema para Valls.

Itália sem lei eleitoral

A breve trecho não haverá elei-ções antecipadas em Itália, na sequência da derrota de Matteo Renzi, no domingo passado, no referendo para alterar 47

Futuro da UE joga-se e decide-se a Sul Caos na esquerda francesa, bloqueio institucional em Itália e medo do referendo em Espanha. O Sul agita-se

artigos da Constituição. O pri-meiro-ministro desejava levar a cabo a maior reforma alguma vez tentada no país.

A curto prazo, é possível que outro dirigente progressista substitua Renzi para assumir não só a administração quoti-diana do país como para apro-var uma lei eleitoral e resolver a grave crise de pelo menos oito bancos à beira da falência. Esta poderia, em teoria, provocar uma crise geral do euro: o Ban-co Central Europeu comprou, esta semana, títulos italianos em massa, para evitar uma ca-tástrofe pós-referendo.

Renzi demitiu-se mal foram revelados os resultados da vo-tação (58% contra e 41% a fa-vor). Os partidos da oposição pediram “eleições legislativas imediatas”, da antieuropeia Liga do Norte (LdN) aos indig-nados do Movimento 5 Estrelas (M5S), liderado pelo cómico Beppe Grillo. O resultado da consulta popular também res-suscitou politicamente Silvio Berlusconi, líder da Força Itá-lia, que ativou o travão para pedir calma. O processo condu-cente às novas eleições “tem de ser partilhado”, disse o antigo governante. Esta posição é, na prática, a mesma que defende a minoria esquerdista do Partido Democrático de Renzi, ou seja, a fação que contribuiu para a rejeição das reformas.

A crise não se resolverá, po-rém, num dia, nem numa se-mana nem num mês. Rompeu--se o encanto de uma geração de quarentões que conseguira chegar ao Governo expulsando os “velhos”, com um programa que visava criar a nova esquer-da nesta época de órfãos e ex-cluídos. As primeiras análises dos votos indicam que metade dos 58% de votantes que disse-ram “não” às reformas “não as

conhecia”, isto é, nem sequer as tinha lido. Votaram, maioritari-amente, contra a precariedade, a exclusão, o medo de empo-brecer de um dia para o outro. “Votaram contra o sistema das elites”, afirmou Matteo Salvini (LdN), o mais eurocético líder italiano, aliado a nível europeu com a francesa Marine Le Pen.

A demissão de Renzi resol-ver-se-á com a nomeação de um primeiro-ministro interino, que provavelmente será Pietro Grasso, hoje presidente do Se-nado. Seria a solução mais ins-titucional e neutra, para Renzi, para a oposição e na ótica das eleições antecipadas que pode-rão realizar-se na próxima pri-mavera. Outro candidato é Pier Carlo Padoan, atual ministro da Economia, que constituiria uma garantia para a Europa.

A UE quer que a Itália re-veja o orçamento para 2017, reduzindo em pelo menos 0,1% (15 mil milhões de euros) o excesso de défice autorizado. Isto seria através de cortes na despesa ou subidas de impos-tos. Um governante técnico (Grasso) ou económico (Pado-an) poderia tomar medidas im-populares sem prestar contas ao eleitorado.

É preciso resgatar oito ins-tituições de crédito, algumas das quais caixas de aforro (a

transformar em bancos) e há bancos à beira da falência. O mais urgente é o Monte dei Paschi de Siena (MPS), o banco mais antigo do mundo, que ne-cessita de uma recapitalização de 4000 a 5000 milhões de euros. Pelas normas europeias vigentes, o Estado não pode intervir. O segundo banco em perigo é o Unicredit, “demasia-do grande para falir”, dadas as consequências sistémicas que poderia ter no continente.

Por paradoxal que possa pa-recer, não há lei eleitoral para realizar eleições antecipadas. A antiga foi suspensa pelo Tribu-nal Constitucional. A segunda, que previa a supressão do Se-nado, foi rejeitada no referen-do. Ainda há vários recursos por apreciar mas o Constitucio-nal só decidirá a 24 de janeiro de 2017. A crise promete durar.

Espanha: como rever?

É consensual que a Constitui-ção espanhola precisa de uma revisão profunda e que este é o momento para iniciar um processo que será longo e tor-tuoso. Na semana que agora termina comemorou-se, com as solenidades da praxe e o fausto habitual, o 38º aniversário da Lei Fundamental, que se reve-lou de extrema utilidade para ordenar a convivência entre espanhóis.

Contudo, já não se verificam as circunstâncias políticas, so-ciais e económicas que gera-ram aquele texto legal. Mais de 60% dos espanhóis de hoje não puderam votar no referendo àquela Constituição (aprovada em 1978 por mais de 90% dos eleitores) nem tiveram ocasi-ão de assistir aos debates que suscitou. Pôs fim a 40 anos de ditadura franquista, venceu a tradicional tendência do país

Anúncio da candidatura presidencial de Manuel Valls, no dia 5 de dezembro em Évry, Paris FOTO CHRISTIAN HARTMANN/REUTERS

para a divisão e resultou de um extraordinário consenso, hoje impossível de repetir.

Até ao ano passado o Governo do Partido Popular (PP, centro--direita), liderado por Mariano Rajoy, negava-se a admitir a possibilidade de uma revisão constitucional por ter maioria absoluta. Dado que passou a minoritário no Congresso dos Deputados, não lhe resta se-não aceitar a abertura de um processo que requer o contri-buto da maioria das forças po-líticas. O Executivo admitirá nas próximas semanas, com toda a probabilidade, a cria-ção no Parlamento nacional de uma subcomissão que deverá dar os primeiros passos para organizar os trabalhos que se adivinham.

Há consenso sobre a neces-sidade de rever a organiza-ção territorial do Estado e a distribuição de competências entre a administração central e regional, e de introduzir re-gulamentações sobre a partici-pação cívica, a proteção do am-biente, os direitos garantidos pelo Estado-providência, os direitos digitais e a igualdade entre sexos.

A tese do PP e do próprio primeiro-ministro é que não se deve abrir a discussão sem acor-do entre os partidos sobre que mudanças devem ser introduzi-das, com que objetivo e através de que meios. Inegociáveis a unidade de Espanha, a forma de chefia do Estado, a soberania nacional, a igualdade entre to-dos os espanhóis, as liberdades e direitos cívicos e a pertença à União Europeia (UE).

O Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE, social-demo-crata), submerso numa grave crise de liderança, mantém a intenção de rever a Constitui-ção de 1978 para criar um Es-

tado federal. É o único grupo político que dispõe de um plano nesse sentido, elaborado em 2013 e conhecido como “De-claração de Granada”. Os soci-alistas também defendem um consenso prévio entre forças políticas, sublinhando que só o seu plano federal pode neutra-lizar a deriva independentista do governo regional da Cata-lunha e, em menor medida, do País Basco.

Os populistas do Podemos (P’s) e os seus aliados à es-querda, incluindo o Partido Comunista (PCE) questionam a organização do Estado (de-sejam uma república federal) e o “direito a decidir” de todos os povos que fazem parte de Espanha. Já o partido Cidadãos (C’s, centro-direita liberal) as-sume uma posição de rutura numa eventual discussão sobre a revisão constitucional. Os na-cionalistas catalães consideram ultrapassado o momento para reformar a Lei Fundamental. Caminham abertamente para o separatismo.

A Constituição prevê um re-ferendo e dissolução do Par-lamento se as alterações afe-tarem partes especialmente protegidas do texto jurídico. A consulta popular é possível, em todo o caso, se 10% dos depu-tados se unirem para exigi-la. Os 68 deputados do Podemos chegam e sobram para convo-car um referendo mas a pala-vra é tabu para Rajoy e seus próximos, depois das recentes experiências no Reino Unido (‘Brexit’) e Itália (reforma cons-titucional).

Angel Luis de La Calle Correspondente em Madrid,

Daniel Ribeiro Correspondente em Paris

e Rossend Domènech Correspondente em Roma

[email protected]

Nas suas previsões para 2017, a agência Bloomberg traça um cenário apocalíptico: sucessão de crises internacionais provocadas por Donald Trump, queda de Angela Merkel na Alemanha, partilha da Europa numa nova conferência de Ialta hegemonizada por Putin, vitória de Marine Le Pen em França... Da Áustria e da Itália vieram sinais contraditórios. Tal como as hordas otomanas em 1529 e 1683, o efeito

dominó populista parou (pelo menos para já) às portas de Viena. Em contrapartida, da combinação da demagogia populista e do imobilismo da classe política italiana resultou o insucesso da manobra kamikaze de Renzi para rever radicalmente a Constituição. O futuro não está escrito nos céus mas é fabricado dia a dia. A evolução política em França pode fazer com que Marine Le Pen seja apanhada em tenaz entre um

forte candidato conservador — François Fillon — e um eventual candidato de esquerda capaz de falar às classes populares. Já em Espanha discute-se como modernizar a Constituição sem causar um terramoto político à italiana. Na própria Itália tudo está em aberto, sem esquecer a Alemanha (ver entrevista na página seguinte). A realidade pode voltar a surpreender-nos e não necessariamente pela negativa.

EUROPA

As primárias socialistas (fim de janeiro) podem ser menos concorridas do que as da direita, que levaram às urnas mais de quatro milhões de franceses

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 31: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 31 PRIMEIRO CADERNO

Especular sobre um segundo resgate português “é inoportuno”

Cristina Peres

Na semana em que Angela Mer-kel foi reeleita líder dos demo-cratas-cristãos, e que de Itália e da Áustria surgem sinais con-traditórios quanto ao futuro da Europa, o Expresso falou com o nº 2 da diplomacia alemã. Mi-chael Roth, social-democrata, não está otimista quanto ao futuro do TTIP (acordo comer-cial com os EUA) e preocupa-se com o “retrocesso em termos de democracia, Estado de di-reito e liberdade dos media” na Turquia. Defende, porém, o diálogo com Ancara.

PP AsPdeclaraçõesPrecentesPdePresponsáveisPalemãesP[inclu-indoPoPministroPdasPFinanças,PWolfgangPSchäuble]P“afetamPaPcredibilidadePexternaPdePPor-tugalPePlançamPaPdúvidaPnosPmercadosPePnosPinvestidoresPquantoPàPcapacidadePdePoPpaísPsairP daP situaçãoP atualP semPterPdePrecorrerPaPumPsegundoPresgate.PAsPtaxasPdePjurosPna-cionaisPsobemPacimaPdasPdosPseusPcongéneresPePaumentamPasPdificuldadesPdaPRepúblicaPePdasPempresasPnacionais,PquePtêmPdePpagarPmaisPpelosPseusPempréstimos,PdificultandoPaPrecuperaçãoPeconómica”.PEstePtextoPdePNicolauPSantosPdoPfinalPdePoutubroPexprimePsentimen-tosPgeneralizadosPemPPortugal.PBerlimPtemPaPnoçãoPdasPconse-quênciasPdestasPdeclaraçõesPsobrePaPeventualidadePdePumPsegundoPresgate?P

R Ainda há duas semanas Portugal apresentou dados de crescimento económico anima-dores para o terceiro trimestre e, através do pagamento ante-cipado do empréstimo ao FMI, demonstrou que se encontra no bom caminho. Isso merece respeito e reconhecimento. Daí que quaisquer especulações sobre possíveis ajudas suple-mentares a Portugal sejam ino-portunas. Estou certo de que os mercados e os agentes da política financeira e económica partilham da minha satisfação e otimismo com a evolução po-sitiva da economia portuguesa.

PP APatualPsoluçãoPgovernati-vaPemPPortugalP—PsocialistasPapoiadosPporPbloquistasPePco-munistasP—PéPcontraPaPcorren-tePnaPEuropa.PÉPdiferentePparaPBerlimPlidarPcomPAntónioPCostaPouPPassosPCoelho?

R As relações entre a Alema-nha e Portugal — independen-temente da composição dos governos — pautam-se por uma profunda amizade e em termos bilaterais, internacio-nais e europeus há uma cola-boração estreita e confiança mútua. As relações pessoais são muito próximas, pense-se no elevado número de pessoas de origem portuguesa que vive na Alemanha. António Costa mostrou que é capaz de liderar o Governo português de for-ma hábil e responsável. Isso é apreciado tanto pelos seus parceiros europeus como pelo povo português, como sonda-gens recentes indicam.

PP NumaPentrevistaPdePbalan-çoPdoPseuPprimeiroPanoPdePGo-verno,PAntónioPCostaPdizPquePWolfgangPSchäublePéPumaPvozP

isolada,PcujasPtesesPsobrePoPdesempenhoPdePPortugalPnãoPencontramPeco,PnemPnasPins-tituiçõesP europeiasP nemP noPGovernoPalemão.PChama-lhePumaP“andorinhaPquePnãoPfazPaPprimavera”PdasPtesesPdaPauste-ridade.PQuerPcomentar?

R O Governo federal alemão vê-se na obrigação de fomentar a estabilidade, o crescimento e o emprego na UE. É essa a nossa dívida para com a Eu-ropa. No passado, o Governo português aplicou medidas im-portantes, embora dolorosas. Estou convicto de que Portugal contará com um crescimento a longo prazo se se mantiver de forma decidida no caminho que começou a trilhar. Man-tém-se a importância de uma consolidação equilibrada em termos sociais, de reformas estruturais e investimento em educação, inovação e infraes-truturas. É exatamente esta a

tríade que os sociais-democra-tas conseguiram aplicar na UE graças a um esforço conjunto. É necessário fomentar a coe-são social.

PP OPalívioPdaPdívidaPgregaPestáPprometidoPpelaPUEPháPmaisPdePumPano.PBarackPObamaPePoPFMIPdefenderamPaPreestruturaçãoPdaPdívida.PBruxelasPePBerlimPmantêm-sePcontra...

R A questão não é tão simples assim. Os países da zona euro emprestaram muito dinheiro à Grécia nos últimos anos. Quem agora nos exige que as dívidas sejam aliviadas deveria explicá--lo aos contribuintes, porque é do dinheiro deles que se trata. É possível melhorar o serviço da dívida e a sua sustentabi-lidade. O Eurogrupo chegou a um entendimento em maio para ter em conta essas medi-das até ao fim do Programa em 2018. Acreditamos que todos os parceiros europeus vão con-tinuar a apoiar a Grécia para que aumente o crescimento e o emprego. Contamos com o empenho do Governo grego para as reformas necessárias.

PP APEuropaPtemPcrisesPpremen-tesPentrePmãos,PcomoPaP“faltaPdePplano”PdePLondresPparaPoP‘Brexit’.PDePquePmodoPdossiêsPcomoPestePafetamPosPplanosPdePBruxelasPparaP2017?

R O ano de 2017 vai ser decisi-vo para a UE. Em março cele-bramos os 60 anos do Tratado de Roma, ocasião histórica para renovarmos o consenso de base na União e de nos con-

Michael Roth Ministro de Estado e Assuntos Europeus da Alemanha

centrarmos nos nossos valores e objetivos comuns. O voto no ‘Brexit’, os elevados níveis de desemprego jovem, as dificul-dades económicas ou os fluxos migratórios dramáticos colo-caram-nos grandes desafios e temos de nos empenhar ainda mais. A responsabilidade da saída dos britânicos da UE é do Reino Unido. O essencial é que os restantes 27 Estados-mem-bros se mantenham unidos e olhem em frente. O ‘Brexit’ não pode paralisar-nos.

PP NaPcimeiraPUE-UcrâniaP(24PdePnovembro)Pavaliou-sePaPapli-caçãoPdosPacordosPdePMinskPePfalou-sePdePmaisPseisPmesesPdePsançõesPàPRússia,PquePtermina-riamPaP31PdePjaneiro.PAPquestãoPfoiPultrapassadaPpelaPgravidadePdaPintervençãoPrussaPnaPSíria?

R A cimeira mostrou de novo que a UE assume de forma decidida e coesa os seus com-promissos perante a Ucrânia. O presidente do Conselho Eu-ropeu, Donald Tusk, salientou a necessidade de um apoio continuado à Ucrânia e de uma solução para o conflito no leste da Ucrânia, com base nos acordos de Minsk. Quanto ao prolongamento das sanções à Rússia, que foram decretadas devido ao envolvimento russo na desestabilização da Ucrânia, a UE pronunciar-se-á antes de 31 de janeiro. A questão fulcral é o cumprimento dos acor-dos de Minsk — desejaríamos avanços muito mais notórios. A situação na Síria é terrível e o apoio russo ao regime de Assad

ENTREVISTA

é responsável por atrocidades de guerra.

PP NaPsemanaPapósPoPreferendoPnoPReinoPUnido,PdissePaoPEx-presso:P“TemosPdePfazerPtudoPparaPmanterPcomoPessenciaisPasPrelaçõesPtransatlânticasPnes-tePmundoPdePcrisePePdesordem”.PComoPresponderiaPdepoisPdePeleitoPDonaldPTrump?

R Bem, a eleição de Donald Trump não altera o valor fun-damental das relações transa-tlânticas. Fora da Europa não há parceiro de que estejamos mais próximos. As nossas re-lações com os EUA pautam-se menos por questões de poder e mais por questões de valo-res, que são o fundamento da nossa parceria e implicam res-ponsabilidades para ambos os lados. Os nossos países estão estreitamente ligados em ter-mos económicos e culturais. Os numerosos desafios que

“ANTÓNIOPCOSTAPMOSTROUPPQUEPÉPPCAPAZPPDEPLIDERARPPOPGOVERNOPPORTUGUÊSPPDEPFORMAPHÁBILPEPRESPONSÁVEL”

“AINDAPNÃOPPSEPCONHECEPPAPPOLÍTICAPEXTERNAPPDEPTRUMP,PPÉPCEDOPPARAPESPECULARPSOBREPEVENTUAISPMUDANÇASPNASPRELAÇÕES”

enfrentamos mundialmente só podem ser resolvidos atra-vés de uma estreita coope-ração transatlântica. É claro que a eleição de Trump, à luz das suas declarações durante a campanha, levantou muitas questões, dúvidas e incertezas. É necessário que a UE fale a uma só voz perante os EUA. Não podemos permitir divisões entre nós.

PP OPConselhoPEuropeuPdeP15-16PdePdezembroPtemPnaPagendaPaPsegurançaPePdefesaPdaPUE,PasPmigraçõesPePaPavaliaçãoPdosPacordosPparaPaPdefesaPdaPfron-teiraPexterna.PNovosPdesafios,PnovosPparceiros?P

R Sem dúvida: as crises mundi-ais são mais numerosas e apro-ximam-se geograficamente da Europa, com consequências ainda mais diretas para a UE e a segurança dos seus cidadãos. Temos de dar passos concretos em direção a uma Agenda Eu-ropeia para a Segurança. Junta-mente com Portugal, saudamos que os MNE europeus tenham aprovado o plano proposto pela Alta Representante da UE para a Política Externa, Federica Mogherini, a 14 de novembro, plano que deverá ser adotado no próximo Conselho Europeu. Quanto às migrações, continu-ará no topo da nossa agenda a cooperação com os países de origem, de trânsito e de aco-lhimento. Como ainda não é possível perceber como vai ser o programa de política externa do futuro Presidente Trump é demasiado cedo para especular sobre eventuais mudanças nas relações transatlânticas.

PP DepoisPdePAngelaPMerkelPterPsidoPdeclaradaPoPgarantePdaPde-mocraciaPnaPEuropa,PcomoPvêPaPAlemanhaPdePnovoPchamadaP“aPliderarPoPmundoPlivre”?

R Seria descabido pensar que um único país europeu pode reclamar o papel de potência mundial. Porém, espero que nós, como europeus unidos, de-sempenhemos um papel impor-tante num mundo globalizado. Somos uma comunidade pauta-da pelos valores da democracia, liberdade, Estado de direito, segurança e solidariedade, um feito único no mundo! A Alema-nha vê-se como um elemento da equipa europeia, como media-dora séria, sobretudo entre os Estados-membros maiores e os mais pequenos. Beneficiámos muito da Europa unida, temos por isso uma responsabilidade acrescida no seu sucesso. A UE é e continuará a ser o nosso se-guro de vida.

PP BastaráP“nãoPdarPargumen-tosPaoPpopulismoPePaoPnaciona-lismo”PePdefenderP“bonsPargu-mentos”,PcomoPdiziaPemPjunho?

R Sem rodeios: o nacionalis-mo e o populismo germinam de forma perigosa na Europa, mesmo na Alemanha. A me-lhor resposta é uma argumen-tação séria que responda às expectativas dos europeus e melhore as suas condições de vida. Advirto contra a tentação de cedermos e enveredarmos também pelos chavões nacio-nalistas. As pessoas preferem sempre o original às cópias im-provisadas.

[email protected]

FOT

O M

ICH

AEL

GO

TTS

CH

ALK

/PH

OT

OT

HEK

VIA

GET

TY

IMA

GES

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 32: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016PRIMEIRO CADERNO32

Cuba (pouco) livre

Cristina Margato enviada

a Cuba

No domingo de ma-nhã, as cinzas de Fidel iriam a ‘enter-rar’ no cemitério de Santa Ifigénia, em cerimónia privada, reservada apenas a alguns convidados, incluindo alguns es-

trangeiros como Dilma Rousseff e Lula da Silva. Ficara, por isso, combinado entre os enviados do Expresso e da SIC uma saída às 4 e meia da manhã, para poderem registar o final da vigília que decorria na Praça da Revolução, em Santiago de Cuba, e o derradeiro cortejo em que o povo cubano poderia participar ao fim de nove dias de luto.

Nunca lá chegaríamos, porém. Minutos depois de sair da casa onde

estávamos hospedados encontrámo--nos na insólita situação de detidos pela polícia cubana e obrigados a re-correr à diplomacia portuguesa. Foi nesse momento que percebemos a importância do telefonema que o dono da casa recebera já depois da meia-noi-te, e ao qual apenas respondera: “Três jornalistas portugueses, dois homens e uma mulher. Vão sair muito cedo”. Ou a razão pela qual o mesmo homem nos aguardava com nervosismo nessa madrugada à saída dos quartos. O mo-torista que nos iria acompanhar tam-bém se atrasara. Ao telefone, explicava que estava impossibilitado de sair do sítio onde dormia, porque alguém se esquecera dele e o deixara trancado...

Resolvidas as questões com os dois homens, entrámos no carro. Não fo-ram precisos mais de dois ou três mi-nutos para tudo fazer sentido. Ainda

nem tínhamos avançado cinco metros já um carro da polícia se atravessava à nossa frente, fazendo-nos sinal para virarmos à esquerda e estacionarmos numa rua paralela. Com os passapor-tes e vistos na posse da polícia, um dos oficiais informava-nos de que tería-mos de seguir atrás do carro da polícia até às instalações locais da Imigração para sermos interrogados. Ainda per-guntámos a que tipo de questões te-ríamos de responder. Mas só ficámos a saber que “a seu tempo” seríamos informados. A razão, para já, expli-caram, tinha que ver com o facto de o carro em que seguíamos não estar autorizado a fazer serviço de aluguer. Facto que mais tarde não se viria a confirmar, ainda que o motorista e responsável pela viatura, como anun-ciara o oficial ainda no local, ficasse a salvo de multa ou penalização. Alheios ao assunto do carro, que nunca mais seria um assunto (por estar de facto autorizado a fazer esse serviço), terí-amos de seguir para as instalações da Imigração. Um edifício térreo que os próprios funcionários abriram, à nos-sa frente, ainda antes de o sol nascer, e no qual o dia começava ao som de música clássica alta.

Por volta das sete da manhã, e já de-pois de termos conseguido confirmar com Portugal que a situação havia sido comunicada ao Ministério dos Negóci-os Estrangeiros e que a Embaixada de Portugal em Havana iniciara diligên-cias junto das autoridades cubanas, “convidaram-nos” a apagar todos os registos de imagem que haviam sido feitos nos telemóveis desde o início da detenção, com a justificação de que se tratava de uma “situação militar”.

Um pouco mais tarde, uma mulher fardada, que até então não tínhamos visto, pedia-nos para nos sentarmos à frente da sua secretária. Calmamente, informava-nos que a nossa detenção

“se tratava de um procedimento de rotina”. O argumento, dizia, era de que não nos conseguiam localizar... ainda que nos tivessem encontrado, e esperado à porta de casa. Estávamos livres, sem mais justificação.

O assunto não teria grande impor-tância se, além de nos ter impedido de trabalhar naquele preciso momento, não fosse esta detenção a confirmação de que o Estado cubano reforçara, ao longo daquela semana, o seu habitual regime de vigilância e repressão. Se dúvidas houvesse, aquela detenção sem causas ou justificações, possibi-litar-nos-ia perceber o que é estar na pele dos cubanos, ainda que numa posição de superioridade, já que para eles não existe a possibilidade de pedir ajuda a uma embaixada estrangeira.

O que nos sucedera naquela madru-

gada provava também que as chama-das detenções arbitrárias e de curta de duração, que servem apenas para intimidar, não deixaram de se realizar apenas porque a ilha estava sob os holofotes da imprensa internacional ou porque à imprensa estrangeira as autoridades cubanas reservavam tratamento excecional. Pelo contrá-rio, o regime revigorou a máquina de vigilância e repressão, não perdoando a quem quis entrar em contacto com os opositores ao regime, na tentativa de contar o outro lado da história. O nosso caso não fora único. No dia 29 de novembro, por exemplo, havia sido detido o editor do jornal digital 14yme-dio, Reinaldo Escobar, e um jornalista da TVE durante a realização de uma entrevista na rua. Os dois profissio-nais acabaram por ser libertados ao fim de quatro horas por interferência da Embaixada de Espanha em Cuba. E na noite anterior à detenção dos en-viados do Expresso e da SIC, chegara a Santiago uma cubana que havia sido detida noutra cidade, apenas por ter ajudado a segurar um microfone a um jornalista estrangeiro. Já a salvo, em casa de familiares, a rapariga nem queria falar da hipótese de voltar a falar com jornalistas. O artista plástico Danilo Maldonado, conhecido por “El Sexto”, foi das primeiras detenções conhecidas, logo no dia 27, mas as denúncias continuam a aparecer, no-meadamente as que a Unión Patrióti-ca de Cuba está a fazer, por exemplo, no YouTube.

Lavagem cerebral

A operação de homenagem a Fidel foi cuidadosamente preparada. Não só na propaganda visual que pôde ser vista nas imagens que correram mundo ou na forma como aglomerou as pessoas e as convocou a participar naquele

que foi provavelmente o funeral mais longo e concorrido do século XXI. Nos primeiros dias, em Havana, o Expres-so ainda encontrou alguns cubanos capazes de se aventurarem por um discurso diferente ou de apontarem o medo como principal causa para au-sência de um pensamento discordan-te. “Fizeram uma lavagem cerebral aos cubanos”, dizia um dos homens que o Expresso encontrou na rua. Mas, à medida que a conversa evoluía, e o homem começava a falar do filho que atravessava a Colômbia na ânsia de chegar aos Estados Unidos, um estranho que estava por perto apro-ximava-se cada vez mais, obrigando-o a mudar de assunto. Nunca foi difícil notar a presença de informadores. Motivo suficiente para que as pessoas dissessem sempre as mesmas coisas aos jornalistas ou para rapidamente mudarem de assunto.

Mensagens censuradas

Durante a semana de homenagem a Fidel, a empresa que fornece internet em Cuba e que permite acesso à web através da compra de um cartão que é acionado apenas em alguns locais das cidades, como jardins, decidira desati-var alguns desses pontos sempre que a caravana fúnebre se aproximava de uma cidade. Mesmo antes da morte de Fidel, em setembro deste ano, o jornal digital 14ymedio, ao qual só se con-seguia aceder através de operadores de internet estrangeiros (o que, aliás, também acontecia para o Facebook ou para meios de comunicação social estrangeiros), já denunciava o facto de a mesma empresa não permitir o envio de mensagens nas quais apare-cessem palavras ditadura, democra-cia, ‘damas de blanco’, repressão, ou o próprio nome do jornal e dos seus colaboradores.

Ao longo dos nove dias de luto, não foi só a salsa e o álcool que ficaram interditos. A internet só foi facilitada e vertiginosamente rápida nos locais oficiais, como aquele que decorreu na Praça de Revolução em Havana, e que contou com a presença de líderes internacionais.

Os meios de comunicação social es-trangeiros estiveram quase sempre inacessíveis e os cubanos foram to-talmente controlados pelos órgãos do Estado. Na televisão, na rádio, na imprensa foi-se repetindo até à exaus-tão a canção “Cavalgando com Fidel”, e proporcionando os argumentos e as frases que os populares teriam de decorar e debitar, que ajudaram a construir uma espécie de barreira im-penetrável que não deu outra hipótese à imprensa internacional que não fosse a de servir de caixa de ressonância de um discurso único e de uma operação de reforço do regime milimetricamen-te encenada.

Trabalhar sem ouvir outros pon-tos de vista, com a certeza de que eles existem, tornou-se uma angústia para muitos profissionais. A jornalista da TVE, Almudena Ariza, enviada a Miami e a Cuba, confessava que se tinha sentido espiada, observada, perseguida, e que o seu sentimento era semelhante ao que teve na Coreia do Norte: “Fui à Coreia da Norte, duas vezes, e não encontrei grandes dife-renças entre o que vi lá e o que acon-teceu aqui nesta semana, na forma como se trata a informação pública, como são ensinadas as crianças desde pequenas, como as pessoas não têm liberdade para opinar ou como todos têm um discurso aprendido. Faz-me parecer que o que vi aqui nestes dias é o mesmo tipo de culto da personali-dade que vi na Coreia da Norte e que não vi em viagens anteriores.” Para Almudena Ariza é aliás curioso que questionemos “com muita satisfação e alegria” regimes como o da Coreia do Norte e que as conquistas na saú-de e na educação do regime cubano justifiquem a falta de liberdade de expressão, impedindo-nos de falar, sem receio, numa ditadura em Cuba, como aliás acontece em muitas partes no mundo, incluindo na Europa.

E se o culto de personalidade até domingo foi dedicado a Fidel, no re-gresso de carro de Santiago de Cuba a Havana era já possível verificar que novos outdoors ostentavam outra es-trela, o irmão Raúl. Para os cubanos, nada muda: tudo segue igual.

[email protected]

Depois de nove dias de luto, a caravana com as cinzas

de Fidel chegava a Santiago FOTO CHIP SOMODEVILLA/GETTY IMAGES

Jornalistas detidos Os enviados do Expresso e da SIC estiveram detidos na madrugada de domingo. O funeral de Fidel foi um momento crucial para o regime liderado por Raúl Castro consolidar a revolução, silenciar a oposição, reforçar a repressão e a vigilância

CUBA

AS DETENÇÕES ARBITRÁRIAS E DE CURTA DURAÇÃO, QUE SERVEM APENAS PARA INTIMIDAR, NÃO DEIXARAM DE SE REALIZAR APENAS PORQUE A ILHA ESTAVA SOB OS HOLOFOTES DA IMPRENSA INTERNACIONAL

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 33: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 33 PRIMEIRO CADERNO

BREVES

UE prolonga sanções à Rússia

BRUXELAS A União Eu-ropeia deverá prolongar por mais seis meses as sanções económicas im-postas à Rússia, segundo avançaram ontem fontes diplomáticas à Reuters. As sanções deveriam termi-nar a 31 de janeiro de 2017 e resultam da ação russa no conflito ucraniano. Até julho de 2017, os sectores abrangidos são o sistema financeiro, defesa e ener-gia. A extensão deverá ser confirmada pelos líderes europeus no Conselho Eu-ropeu da próxima semana.

A COMPRA DO AC MILAN POR UM FUNDO DE INVESTIMENTO CHINÊS É EXEMPLO DA ESTRATÉGIA DE SOFT POWER POR PARTE DE PEQUIM

ONU pede proteção para os rohingya

MYANMAR As Nações Uni-das pediram esta quinta--feira à líder de facto do Governo birmanês, a Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, que proteja a minoria mu-çulmana rohingya que vive no Noroeste de Myanmar (antiga Birmânia), na pro-víncia de Rakhine. Há mais de dois meses que está em curso uma operação militar que obrigou 21 mil rohingya a fugirem para o Bangla-desh e sucedem-se acusa-ções de abusos do exército. Os rohingya são considera-dos imigrantes clandestinos sem Estado pelas autorida-des birmanesas.

6polícias foram ontem mortos e três ficaram feridos num ataque à bomba junto a um posto de controlo no Cairo, Egito. Centenas de soldados e polícias foram mortos no país desde que um golpe militar afastou Mohamed Morsi da presidência, em 2013.

“CONDENARAM- -ME A MIM E A METADE DOS HOLANDESES. LOUCURA”Geert WildersO líder do eurocético e xenófobo Partido da Liberdade holandês reagiu assim à sua condenação por incitação à discriminação, por declarações proferidas contra marroquinos. O tribunal considerou o crime grave devido à posição de Wilders como líder de um partido. Contudo, os juízes optaram por não lhe aplicar qualquer pena

COLÔMBIA

Hoje, dois meses depois da rejeição do processo de paz em referendo e da atribuição do Nobel da Paz, o Presidente Juan Manuel Santos consegue um acordo aprovado pelo Par-lamento com a maior e mais antiga guerrilha do hemisfério ocidental. Enquanto Santos

Quem não caça com referendo caça com gato

Para evitar o arrastamento do processo de paz com as FARC recorreu-se à aprovação (unânime) no Parlamento

recebe formalmente o Nobel, seis mil membros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) fazem a sua última marcha como guerri-lheiros rumo às 27 zonas de transição para a vida civil.

Há 12 mil soldados e polícias vigiando os corredores por onde a guerrilha está autoriza-da a movimentar-se. Dentro de três meses, entregarão 30% das armas. Um mês depois, outros 30%. O restante, dentro de cin-co meses. Em maio, as FARC

terão desaparecido como guer-rilha depois de 52 anos.

“Dentro de 150 dias, o arma-mento das FARC estará nas mãos da ONU e as FARC terão deixado de existir”, apontou Santos, lembrando que começa o resto: desminagem dos cam-pos, culturas de substituição da coca, retorno dos deslocados e investimento nas regiões afeta-das pelo conflito.

A 30 de novembro, a Câma-ra de Representantes avalizou o novo acordo. Uma semana antes, tinha sido o Senado. Ao todo, 205 votos a favor e ne-nhum contra. Uma blindagem política sem precedentes na história recente. Os contrários ao acordo, liderados pelo ex--Presidente Uribe, preferiram deixar o recinto para que os seus nomes não ficassem regis-tados nos anais.

“No Congresso, estão repre-sentados todos os partidos e todas as regiões. Fazer outro

referendo dividiria mais o país, levaria mais tempo e implicaria riscos agravados”, justificou Santos.

Regressa assim o processo de paz posto em causa pelo referendo de 2 de outubro no qual uma apertada maioria de 50,23% rejeitara o compromis-so firmado a 26 de setembro, depois de quatro anos de nego-ciações em Cuba.

Governo e FARC decidiram reabrir as negociações com base em centenas de sugestões encaminhadas pelos defenso-res do “Não”. Foram incor-poradas 57 mudanças, das 60 propostas.

As FARC aceitam entregar bens e dinheiro adquiridos durante a guerra para indem-nizar as vítimas. Terão de dar informação pormenorizada à Justiça sobre o tráfico de droga e as plantações de coca serão destruídas.

Foi estabelecido um limite de

10 anos para a Justiça Especial de Paz agir e os juízes serão exclusivamente colombianos. As FARC rejeitaram limitações à possibilidade de participarem em eleições, incluindo mem-bros seus acusados de delitos graves.

Resta o Exército de Liberta-ção Nacional (ELN), segunda guerrilha do país com cinco mil membros. O Governo co-locou como condição para as negociações a entrega dos re-féns em poder da guerrilha. O entendimento com as FARC pressiona o ELN a um acordo, mas a pressão também é so-bre o Governo: dissidentes das FARC podem trocar de guerri-lha e o ELN pode apoderar-se das rotas do tráfico de droga. O diálogo entre o Governo e o ELN começa a 10 de janeiro em Quito, no Equador.

Márcio Resende Correspondente em Buenos Aires

[email protected]

Julio de La Guardia Correspondente em Jerusalém

As particularidades da realida-de política palestiniana levam a que a aplicação dos tempos seja sempre relativa. Segundo os estatutos do movimento Fa-tah — corrente maioritária na Organização de Libertação da Palestina (OLP), fundada por Yasser Arafat —, deve realizar os seus congressos de quatro em quatro anos. No entanto, passaram-se sete anos desde o 6º congresso, organizado em Belém em 2009. E este já ocorrera 13 anos depois do anterior. O mesmo acontece com as eleições presidenciais e legislativas, que deviam ter sido celebradas em 2009 e 2010, respetivamente, mas ainda es-tão por convocar.

Este estancamento da polí-tica palestiniana — motivado por uma liderança esclerosa-da, uma colonização israelita cada vez mais enquistada e a fragmentação territorial entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza está a ser habilmente aprovei-tado por Mahmoud Abbas para se perpetuar no poder, apesar da sua idade (quase 82 anos) e saúde precária (problemas cardíacos). Tudo indica que o triplo presidente (da Fatah, da OLP e da Autoridade Nacional Palestiniana, ANP) tem inten-ções de se agarrar aos três car-gos até ao fim da vida.

Liderança vitalícia?

O 7º congresso da Fatah reele-geu-o por aclamação. Entre os mais de 1300 delegados, não houve um que se atrevesse a votar contra. Quando muito, abstiveram-se. Um dos pesos pesados do movimento, Jibril Rayub, presente em todas as apostas quanto à sucessão, ad-mite ter excluído opositores e dissidentes. “É que a nossa prioridade era levar o congres-so avante”, justifica o ex-dire-tor do Serviço de Segurança Preventiva na Cisjordânia. “Agora, o que temos de fazer

Abbas agarra-se ao poder e sufoca dissidência na Fatah

PALESTINA

O 7º congresso nacional reforça a liderança do Presidente e exclui partidários de Dahlan

é rever e atualizar as estrutu-ras, porque os mecanismos de tomada de decisões que estabe-lecemos em 1960 já não estão válidos em 2016”, argumenta o atual presidente da Federação Palestiniana de Futebol.

“Noutros tempos, estávamos maioritariamente exilados e em fase revolucionária, ao pas-so que hoje estamos na nossa terra, a construir um Estado independente”, prossegue Rayub, que ficou em segundo nas votações para o Comité Central, superado apenas pelo carismático Marwan Barghou-ti. Visto por alguns como um Nelson Mandela palestiniano,

Barghouti cumpre pena numa prisão israelita.

Foi detido e julgado em 2002, mas a permanência atrás das grades só contribui para au-mentar a sua popularidade, que supera grandemente a do próprio Abbas (uma sondagem do Centro Palestiniano de In-vestigação Política, publicada em setembro, indicava que 61% dos cidadãos são partidários da saída de cena deste último).

Entre os 18 membros eleitos para o Comité Central, órgão máximo do movimento Fatah, há poucas caras novas e apenas uma mulher, a deputada Dala Salame, do círculo de Nablus.

Estava na 18ª e última posição da lista. Outros quatro mem-bros serão designados direta-mente por Abbas, que, com toda a probabilidade, nomeará dirigentes históricos herdados de Arafat, como Tayeb Abdel Rahim e Nabil Abu Rudeina, bem como o emergente Ma-jid Farah, diretor dos Serviços de Informações. O trabalho executivo do Comité Central é complementado pelo do Con-selho Revolucionário, formado por 132 membros, com funções legislativas.

O principal opositor da li-derança de Abbas é o ex-dire-tor do Serviço de Segurança

Preventiva na Faixa de Gaza, Mohammed Dahlan. Foi impe-dido de assistir ao congresso, como os seus seguidores no Conselho Legislativo (Parla-mento) e os quadros da própria Fatah, na maioria vindos da Faixa de Gaza, como o próprio Dahlan.

Abbas despojou-os da condi-ção de delegados e retirou-lhes os salários durante as semanas que antecederam o congresso.

O grande ausente

Desde que caiu em desgraça e foi expulso, em 2011, por ale-gadas ambições presidenciais, Dahlan vive exilado em Abu Dhabi, onde se dedica a lucra-tivos negócios e financia dissi-dentes e meios de comunicação críticos de Abbas.

Apoiado pelos países do cha-mado Quarteto Árabe — Egi-to, Jordânia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos — o antigo conselheiro de seguran-ça nacional de Arafat (embora efémero, pois o histórico di-rigente também desconfiava dele) ameaça, agora, criar uma cisão dentro do movimento para lançar um congresso al-ternativo a realizar no Cairo, sob os auspícios do seu prote-tor político, o Presidente egíp-cio Abdel Fatah Al Sisi.

Desde setembro, sucederam--se conflitos entre as forças de segurança da ANP e grupos armados vinculados a Dahlan e à Fatah, em diversos locais, como nos campos de refugia-dos de Balata, Jenin e Amari.

Por este motivo, o general Herzl Halevi, dirigente dos serviços secretos militares is-raelitas, advertia recentemente para uma potencial escalada da violência na Cisjordânia duran-te 2017, devido à previsível per-da de controlo no terreno por parte do octogenário Abbas.

Este, desde que foi eleito pre-sidente, em janeiro de 2005, foi claramente incapaz de des-frutar da popularidade e da le-gitimidade de que gozou o seu antecessor Arafat.

[email protected]

Por aclamação, Mahmoud Abbas perpetua-se no cargo FOTO MOHAMAD TOROKMAN/REUTERS

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 34: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016PRIMEIRO CADERNO34

Editorial&Opinião

Pedro Adão e [email protected]

Tiragem média de novembro: 92.825 exemplares

Associação Portuguesapara o Controlo de Tiragem

Associação Portuguesa de Imprensa

Direção Geral de Informação IMPRESA:Ricardo Costa (diretor geral),Alcides Vieira e Henrique Monteiro (diretores gerais adjuntos)

Publisher e Diretor:Pedro Santos Guerreiro

Diretor-Executivo:Martim Silva

Diretores-Adjuntos:Nicolau Santos, João Vieira Pereirae Miguel Cadete

Diretor de Arte:Marco Grieco

Redatores e Repórteres Principais:José Pedro Castanheira, Luísa Meireles e Virgílio Azevedo

Editor-executivo:Germano Oliveira

Editores:Helena Pereira (Política),Rui Gustavo (Sociedade),Rui Cardoso (Internacional),Pedro Lima (Economia), Jorge Araújo (Revista E) e José Cardoso (Editor-adjunto Expresso Diário)

Coordenadores Gerais de Arte:Jaime Figueiredo (Infografia), João Carlos Santos (Fotografia), e Mário Henriques (Desenho)

Coordenadores:Raquel Moleiro (Sociedade), Ana Sofia Santos (Economia), João Silvestre (Economia), Vítor Andrade (Economia),Pedro Candeias (Desporto), Ricardo Marques (Revista E), Rui Tentúgal (Revista E), Valdemar Cruz (Porto) e Paulo Luís de Castro (Multimédia) Documentação (Gesco):[email protected]

Redação, Administração e Serviços Comerciais:Rua Calvet de Magalhães, 242 2770-022 Paço de ArcosTel: 214 544 000 [email protected]

Delegação Norte:Rua Conselheiro Costa Braga, 502; 4450-102 Matosinhos Tel: 220 437 000

Publicidade:Pedro Fernandes (diretor), Miguel Simões (diretor comercial adjunto), João Paulo Luz (diretor comercial digital), Ângela Almeida (diretora da Delegação Norte); Hugo Rodrigues (diretor publicidade agências), Dinova Casanova, Gonçalo Troçolo e Nuno Martins (gestores de conta); Carlos Lopes (diretor publicidade diretos), José Paulo da Silva e Sérgio Alves (gestores de conta); Marta Teixeira e Helena Almeida (gestores de conta da Delegação Norte)Tel: 214 544 073/214 698 798 Fax: 214 698 516

Publicidade On Line [email protected]

Marketing, Comunicação e Criatividade:Mónica Balsemão (diretora),Ana Paula Baltazar (coordenadora de marcas de informação), Susana Freixo (gestora de marcas) e Carla Martins (coordenadora de comunicação para relações externas)

Produção: Raul das Neves (diretor),Manuel Parreira (assessor da Direção de Produção), Vasco Fernandez (diretor adjunto), João Paulo Batlle y Font e Carlos Morais (produtores)

Circulação a Assinaturas:Pedro M. Fernandes (diretor), José Pinheiro (coordenador de circulação), Helena Matoso (coordenadora de assinaturas)Serviço de Apoio ao Assinante:Tel: 214 698 801 (dias úteis, das 9h às 19h)Fax: 214 698 501; email: [email protected] a www.assineja.pt

Atendimento ao Ponto de Venda: [email protected]

Impressão: Lisgráfica,Casal de Stª Leopoldina, 2745 Queluz de Baixo

Distribuição: VASP-MLP, Media Logistics Park Quinta do Grajal, Venda Seca 2735-511 Agualva CacémTel: 214 337 000Pontos de Venda: [email protected] Tel: 808 206 545Fax: 808 206 133

“A Impresa Publishing não é responsável pelo conteúdo dos anúncios nem pela exatidão das características e propriedades dos produtos e/ou bens anunciados. A respetiva veracidade e conformidade com a realidade são da integral e exclusiva responsabilidade dos anunciantes e agências ou empresas publicitárias”.

Proprietária/Editora: IMPRESA PUBLISHING S.A.Sede: Rua Calvet de Magalhães, 242, 2770-022 Paço de Arcos. NIPC: 501984046. Administração da IMPRESA PUBLISHING: Francisco Pinto Balsemão, Francisco Maria Balsemão, Francisco Pedro Balsemão, Paulo de Saldanha, José Freire, Raul Carvalho das Neves e Rogério Canhoto.Composição do Capital da Entidade Proprietária: 100.000 euros, 100% propriedade da Impresa – SGPS, SA, NIPC 502437464 Registo da publicação na ERC: 101.101 ISSN-0870-1970

ESTATUTO EDITORIAL DISPONÍVEL EMwww.impresa.pt/Lei78/2015

José Miguel Bettencourt

A vitória inequívoca de António Guter-res como secretário-geral da ONU eleva a perceção de que poderemos estar perante uma “nova era” das

relações internacionais e das Nações Uni-das. A forma como foi eleito, merecendo a aprovação do Conselho de Segurança, a unanimidade da Assembleia-Geral da ONU e dos seus membros, num processo que pas-sou por apurados testes e repetidos êxitos, revelou que os mecanismos de escolha se revestiram de novidade, no sentido de que foram públicos e escrutinados pela opinião pública, constituindo um conjunto de sinais de mudança muito positivos para o novo mundo em que vivemos.

António Guterres é hoje uma figura muito acima da sua própria condição e naciona-lidade, respeitado e escutado, quer dentro da ONU quer na comunidade internacional. Ao ganhar em todas as votações, Guterres deu às Nações Unidas uma visão sólida de liderança, ultrapassando dificuldades que, à partida, pareciam quase impossíveis de superar, por estar em causa um dos lugares mais cobiçados do mundo. Surpreendeu, re-

velou ser uma personalidade internacional à altura das exigências, sabendo destacar-se no compromisso com uma das causas maiores do mundo contemporâneo — a da proteção dos refugiados e mais desfavorecidos.

O momento que atravessamos poderá for-çar a uma clarificação sobre a verdadeira razão de ser da ONU, recolocando a questão do seu papel no mundo. Uma das maiores di-ficuldades de Guterres poderá ser a de man-ter uma posição de equilíbrio, gerindo anta-gonismos entre potências mundiais ou entre países que, de alguma forma, podem ameaçar processos de paz ou o sucesso das negocia-ções fundamentais para a concretização da agenda mundial da ONU, não esquecendo as sensibilidades distintas do Conselho de Segu-rança, nem a relação que o próprio terá com os 193 países membros da ONU. Não foi por acaso que António Guterres fez um périplo, nas suas primeiras viagens depois de eleito, por entre os atuais líderes mundiais, como é o caso dos EUA, China e Rússia. Na verdade, poderemos estar a assistir a um percurso inovador de aproximação estratégica, tendo aí o secretário-geral de clarificar qual poderá ser a relação de cooperação da ONU com as diferentes organizações internacionais. Es-pera-se um novo impulso, capaz de enfrentar

questões tão diversas como a guerra na Síria ou o conflito na Ucrânia, conflitos híbridos no Báltico, os complexos problemas do mundo árabe ou o eterno conflito entre Israel e a Palestina. Deve igualmente assistir-se ao desenvolvimento de políticas promotoras da prossecução da luta contra a pobreza, da defesa sem tréguas dos direitos humanos, do desenvolvimento sustentável, da ajuda huma-nitária, assim como a reformas conducentes ao fortalecimento e modernização da ONU.

Para Portugal, a sua eleição representa um momento único em toda a história da diplomacia portuguesa e para os 42 anos de democracia. Tem para isso contribuído um notável desempenho dos seus líderes polí-ticos. Tivemos um presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, em dois mandatos, colocando-nos na história europeia. Temos um embaixador português a desempenhar com distinção o cargo de embaixador da Europa junto das Nações Unidas, João Vale de Almeida, e um secretário-geral-adjunto das Nações Unidas, Miguel Serpa Soares, a fazer um brilhante papel no lugar que ocupa.

São êxitos como estes que afirmam, ao mais alto nível, a imagem do país, reforçando a cidadania portuguesa e a presença de Por-tugal no mundo.

Jurista e investigador universitário fala numa nova era nas relações internacionais

António Guterres, Portugal e a ONU

Jorge Jordão

A concertação social está novamente na ordem do dia das nossas institu-ições políticas, acompanhando o processo de elaboração, discussão

e aprovação do Orçamento do Estado para 2017.

Compreende-se que tal aconteça numa sociedade democrática visando dar passos cada vez mais consistentes rumo ao desen-volvimento e reconhecendo, sensatamente, não existir alternativa ao diálogo social. Este será tanto mais produtivo quanto maior for a identificação com a economia real dos membros que integram o Conselho Económico e Social (CES), agora com novo presidente-eleito, o ex-ministro António Correia de Campos, a quem cumpre ende-reçar desde já os melhores votos de sucesso à frente desta instituição.

Chegou também o momento de reiterar que o CES deve alargar a sua representativi-dade, passando a abranger a Confederação dos Serviços de Portugal (CSP), nascida em finais de 2011 e ainda sem assento na con-certação social.

Urge colmatar esta lacuna, acompanhan-do a evolução dos tempos. Os associados

da CSP — como o Governo certamente não ignora — representam cerca de 20% do pro-duto interno bruto português, contribuem com mais de um terço do montante total de IVA e asseguram para cima de 180 mil postos de trabalho diretos.

Correia de Campos, empossado a 19 de outubro, transmitiu um excelente sinal ao assumir-se como um “facilitador de con-sensos” em busca de “resultados que façam mover o país”. É com o mesmo espírito que saliento aqui a necessidade de agregar à concertação social os serviços portugueses que irromperam na nossa economia, sobre-tudo a partir da década de 80, assumindo-se como os subsectores mais dinâmicos do ter-ciário e os precursores genuínos da moderna economia digital.

O dinamismo empresarial, a flexibilidade e a abertura à inovação avultam como atribu-tos essenciais destes componentes do nosso tecido económico que se estendem das tele-comunicações aos centros comerciais, pas-sando por áreas tão diversificadas como os cuidados de saúde, os transportes expresso, a segurança privada, o comércio digital, os estudos de mercado, a consultadoria em-presarial, as tecnologias de informação, o comércio por grosso e as modernas cadeias de distribuição.

Todos estes subsectores pautam-se por padrões internacionais de competitivida-de e apresentam um elevado potencial de crescimento no contexto do Mercado Único Digital que constitui, como sabemos, uma das linhas fundamentais de orientação es-tratégica da União Europeia.

Razões acrescidas, portanto, para alterar a presente configuração do CES, abrin-do-a ao protagonismo da CSP. Queremos, efetivamente, participar nos debates que vão seguir-se destinados à formulação de políticas públicas visando, entre outras, a promoção do investimento — imprescindível para assegurar o crescimento económico e emprego — e das alavancas essenciais que o determinam, tais como os impostos, os custos unitários do trabalho, as relações laborais ou o cumprimento dos contratos.

A concertação social, porém, só será ver-dadeiramente eficaz se todos os interveni-entes atuarem de forma independente, sem atitudes corporativistas ou submetidas a quaisquer pressões de natureza partidária.

Este é um compromisso que a Confedera-ção dos Serviços de Portugal pode assumir desde a primeira hora, sabendo de antemão que não existe outra forma de representar condignamente os seus associados nem de servir o interesse nacional.

Presidente da Confederação dos Serviços de Portugal quer sentar-se à mesa do CES

A nossa economia e a concertação social

É irónico que a perspetiva reacionária que tomou conta do sector da educação se tenha apressado a reclamar louros por estes resultados

Não é comum receber-mos boas notícias como as que chegaram esta semana com os dados

do PISA. Os jovens portugueses continuam a melhorar as suas competências em matemática, português e ciências e fazem-no em contratendência com muitos países. Mais: as melhorias são

Tão importante como o reco-nhecimento do impacto positi-vo das políticas educativas foi o ambiente de consenso com que foram recebidos os resultados. Por uma vez, não se ouviram críticas à metodologia utilizada pela OCDE, nem se vislumbrou nenhuma desconfiança face a este tipo de avaliação. Num país em que as mudanças excessivas nas políticas públicas, sem me-canismos de avaliação e de mo-nitorização do impacto, são um mal endémico, este consenso é fundamental para estabilizar so-luções. Até porque corresponde a uma alteração. Quantas vezes os resultados do PISA, quando começaram a mostrar melhorias nas competências dos estudantes portugueses, foram desvaloriza-dos por preconceito ideológico?

Se o país se puser de acordo sobre a importância de intro-duzir uma cultura de avaliação, procurando compreender quais são as políticas mais eficientes e eficazes para enfrentar de-

bilidades estruturais, isso será ainda mais relevante do que os ganhos sectoriais que possamos alcançar, mesmo em áreas fun-damentais como a educação.

É, contudo, irónico que a pers-petiva reacionária que tomou conta do sector da educação no espaço do centro-direita, e que nunca escondeu a sua desconfi-ança face às políticas desenvol-vidas em Portugal desde os anos noventa, se tenha apressado a re-clamar louros por estes resulta-dos. Para Crato e Passos Coelho, o que o PISA demonstrava é que a introdução de exames numa fase precoce do percurso escolar (4º ano!) e as novas metas curri-culares teriam tido um impacto positivo. Até podia ser, não fora dar-se o caso — como mostrou Nuno Serra num excelente texto nos ‘Ladrões de Bicicletas’ — dos alunos testados nesta amostra terem iniciado o seu percurso escolar em 2004, não tendo, por isso, sido atingidos pelas medi-das de Nuno Crato.

Que diferença faz?

acompanhadas de ganhos de equidade: enquanto o número de alunos muito bons aumenta, a média melhora e o estatuto so-cioeconómico das famílias afeta cada vez menos os resultados escolares. As crianças mais po-bres não estão condenadas a ter piores resultados escolares.

A leitura é clara: para um país que tem no défice estrutural de qualificações e nas desigualda-des duas debilidades estrutu-rais, estes dados mostram que investir na educação faz dife-rença e promove a mobilidade social. O PISA diz-nos, contudo, outra coisa: não é irrelevante o tipo de políticas escolhidas. O alargamento do pré-escolar; a garantia da escolaridade básica até aos 15 anos, em lugar de um encaminhamento precoce para a oferta vocacional; e a melhoria das próprias espaços de apren-dizagem (as escolas), bem como a inovação nas práticas pedagó-gicas são eficazes na promoção da igualdade de oportunidades.

Editorial A melhoria nos resultados educativos tem de ser atribuída a vários ministros e a diversos governos

Os avanços na Educação

Os portugueses foram surpreendidos esta semana com uma excelente notícia: segundo dois dos mais reputados estudos internacionais sobre o sector, o TIMSS e o PISA, os alunos portugueses do 4º ano de escolaridade ultrapassaram os alunos finlandeses; e os que têm mais de 15 anos conseguiram os melhores resultados de sempre, ficando acima da média da OCDE, o que se verifica pela primeira vez. Mais: Portugal foi um dos poucos países no mundo e o único na União Europeia que melhorou sempre os resultados desde a primeira edição do PISA. Ora sabendo que este indicador existe há 15 anos, o mérito tem de ser atribuído ao trabalho continuado desenvolvido por vários ministros, professores, alunos e famílias; e às políticas de governos de diversas orientações. Este, contudo, não é um resultado adquirido. As políticas de Educação devem aprender com os sucessos e os erros, mas também adaptar-se aos novos tempos. É que o mundo muda todos os dias.

CR7 tem de parecer sério

A Cristiano Ronaldo exige-se que seja sério. E que pareça sério. Como todos os cidadãos, deve ter os impostos em dia. O cumprimento das obrigações fiscais tanto é devido por José Sócrates, Ricardo Salgado ou qualquer um de nós. Usar expedientes de forma a otimizar a tributação até pode ser legal. Mas retira a CR7 a aura com que tem inspirado os portugueses e os seus milhões de seguidores em todo o mundo.

O frenesim de Marcelo em Belém

Discretamente, quase pé ante pé, começam a somar-se as vozes dos que alertam para um excesso de visibilidade e de participação do Presidente da República na atividade política nacional. Nesta altura, com a governação estabilizada e a popularidade em alta, o caso não é dramático. Mas casos desta semana, como os comentários sobre a Caixa ou o despique com o líder do PSD, são claramente excessivos e contraproducentes.

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 35: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 PRIMEIRO CADERNO 35

Editorial&Opinião

Daniel [email protected]

Henrique [email protected]

Oscar A. Moscariello

Completa-se hoje um ano des-de que Mauricio Macri tomou posse como Presidente da Ar-gentina, ato que principiou um

novo ciclo político no país depois de uma década dominada por adminis-trações de outro signo político. A data convida-nos a confrontar os prelúdios da campanha eleitoral com o caminho até agora percorrido pelo Governo, sem esquecer que o término do atual mandato de quatro anos ainda se avis-ta ao longe.

Quando se apresentou ao escrutínio das urnas, Mauricio Macri hasteou três prioridades cimeiras: reduzir a pobreza, combater o narcotráfico e unir os argentinos. Diferentes na sua natureza, o êxito de cada um dos ob-jetivos enunciados depende em larga medida da capacidade de gerar pros-peridade económica inclusiva, firme e sustentável. Algo que só poderá advir do dinamismo da economia aberta,

do funcionamento independente da justiça e do redirecionamento do Es-tado para a efetiva proteção dos mais carenciados.

Ao longo deste seu primeiro ano na Casa Rosada, Mauricio Macri retirou a dívida argentina de uma situação de incumprimento e reconquistou o acesso do país aos mercados interna-cionais de crédito. Simultaneamente, removeu com prontidão obsoletos obstáculos ao investimento estran-geiro, passando a permitir a flutua-ção plena da moeda e o livre repatria-mento de dividendos. Em paralelo, o instituto nacional de estatísticas foi reformado e a relação com o Fundo Monetário Internacional restabeleci-da para que seja regularmente publi-cada informação económica indepen-dente e credível. Neste novo contexto, foram lançados projetos de investi-mento nas áreas das infraestruturas, logística e energia no valor global de 175 mil milhões de dólares para os quais todos os investidores interna-cionais estão convidados a participar.

Num momento de crescente incer-teza global, a Argentina reabre-se ao mundo sem hesitações e com opor-tunidades talvez irrepetíveis. Opor-tunidades que se apresentam numa economia do G20 com 40 milhões de consumidores e abundante mão de obra qualificada, que proliferam num extenso território fértil em alimentos e abençoado em matérias-primas, que surgem num país com uma dívida pública líquida inferior a 20% do PIB e com um crescimento previsto supe-rior a 3% no próximo ano. Com a pres-ciência e o empreendedorismo que há tanto tempo as caracteriza pelo mundo fora, as companhias portu-guesas já demonstraram interesse em tomar parte na mudança em curso na Argentina, em particular através de duas missões empresariais a Buenos Aires realizadas em outubro passado.

Edificada passo a passo, a mudança duradoura não é alheia a sobressaltos e exige tempo e resiliência política para brotar e se consagrar pela popu-lação. Diante do atual Governo argen-tino persistem complexos e premen-tes desafios, tais como o de diminuir a inflação. Mas a rota seguida neste primeiro ano de mandato, que coinci-diu com a celebração do Bicentenário da nossa Independência, almeja in-dubitavelmente uma nova Argentina, um país em paz consigo mesmo, pre-visível e aberto aos demais.

Embaixador da Argentina faz balanço de 365 dias da presidência de Mauricio Macri

Argentina, um ano depois

Nuno Crato

O “El País”, o jornal de maior difusão do mundo hispânico, lamenta que a Espa-nha não tenha evoluído nos resultados do PISA, enquanto Portugal conseguiu ultrapassar a média da OCDE. Fala do “segredo português” e diz que “a melhoria se explica pela introdução de objetivos para os professores e de exames externos para os alunos”. “The

Economist”, na sequência do TIMSS e do PISA, considera Portugal um “impressive mover”, um país que tem avan-çado de forma notável, e cita-nos no fundamental: metas ambiciosas, avaliações e acompanhamento dos alunos com dificuldades.

Naturalmente, o nosso país também se regozija com os resultados. Não é para menos! No TIMSS, em Matemá-tica, os nossos jovens do 4º ano ultrapassaram a mítica Finlândia, e no PISA, que avalia os jovens de 15 anos em Ciências, Matemática e Leitura, passámos pela primeira vez para cima da média da OCDE. São os nossos melhores resultados de sempre.

Além das médias, há muita informação valiosa nos relatórios. E informação que também é positiva. Ficamos a saber, por exemplo, que o progresso de 2012 para 2015 no PISA foi feito tanto nos alunos mais avançados, como nos com mais dificuldades, que passaram a patamares superiores. Portugal é nisso citado como exemplo. E ficamos a saber que os alunos em vias profissionalizantes (vocacionais e profissionais) também foram testados, e até com maior representatividade do que no estudo anterior, de 2012, e que também eles acompanharam a nossa me-lhoria generalizada.

Ficou assim claro — ao contrário de interpretações in-ventadas — que todos podem progredir quando existe mais exigência, maior ambição e trabalho mais organizado. Eu avançaria mesmo: sem exigência generalizada, os mais penalizados são os mais desfavorecidos.

Os dados nacionais saídos a meio deste ano mostraram outros progressos: primeiramente, o abandono escolar baixou, reduzindo-se para metade de 2010/2011 para 2015. E as retenções, essa pecha persistente do nosso sistema de ensino, também se reduziram, atingindo no 4º, 9º e Secun-

dário os valores mais baixos de sempre. Parece que, com exigência, podemos também ser abrangentes no sistema de ensino.

Os nossos progressos devem-se, em primeiro lugar, aos nossos professores e alunos, assim como às escolas em ge-ral e à crescente atenção dos pais. Mas também se devem a algumas políticas educativas consistentes, nomeadamente a um esforço acumulado de atenção aos resultados e a qua-se duas décadas de progressiva generalização de avaliações nos finais de ciclo. E há fatores específicos nos anos entre 2011/2012 e 2015 que também devem ser estudados.

Os alunos avaliados no TIMSS de 2015 tiveram já novas metas curriculares obrigatórias nos seus últimos anos, metas mais exigentes e bem organizadas. Tiveram tam-bém um esforço de preparação para a prova final de 4º ano, que entretanto tinha sido introduzida e que todos eles vieram a fazer. Esses alunos beneficiaram de um sistema de apoio às primeiras dificuldades, com coadjuvações letivas de professores de outros ciclos, possibilidades de agrupamento transitório para estudos específicos e outros incentivos ao sucesso, auxiliados por um sistema de créditos horários às escolas.

Os alunos avaliados no PISA de 2015 beneficiaram desde 2011 de mais tempo letivo para matemática e português, e desde 2012 de mais tempo letivo para as ciências e mais tempo experimental em desdobramentos. Desses alunos de 15 anos, os que estavam no 7.º e 8.º tinham já benefi-ciado das novas metas obrigatórias. Os que estavam no 9.º ano tinham feito Provas Finais no 6.º e tinham tido as metas como orientação curricular complementar. Os que estavam no 10.º e 11.º tinham tido as metas também como orientação curricular e como referência supletiva nas provas do 9º que entretanto tinham realizado.

Somando uma evolução de mais de uma década, sem-pre em direção a maior ambição e mais avaliação, com o esforço recente de maior rigor curricular e de mais momentos de prova, conseguimos os melhores resultados de sempre. Não se deveria continuar esse caminho, para que em 2018 se possa ir ainda mais à frente?

Ex-ministro da Educação diz que mais exigência e trabalho mais organizado foram fundamentais na melhoria do setor entre 2011/15

Os nossos melhores resultados... à data!

ILU

STR

ÃO

CR

IST

INA

SA

MPA

IO

A cena repete-se: vou ao mé-dico, mas o médico não vem até mim. Olho para ele, digo--lhe o que tenho; ele não me

olha, não tira os olhos do ecrã, tecla a minha informação no sistema, no tal big data. Não conhece o big data, caro leitor? É uma medusa de algoritmos que gere biliões de dados pessoais. É pretensamente infalível na previsão do futuro. Sublinho o pretensamente: o big data deu como certa a vitória de Hillary Clinton. Ou seja, o big data é só a mais recente utopia positivista de uma longa lista de narcisos cien-tíficos. A razão que leva uma pessoa a esconder a sua intenção de voto é a mesma razão que conduz ao anseio por um médico empático: somos seres frágeis, temos medo, precisamos de uma estrutura moral para encaixar os factos. Não somos, caro leitor, um mero amontoado de tecidos orgâni-cos irrigados por fluidos, movidos por milhares de reações químicas e espezinhados por bactérias devida-mente espezinhadas por químicos recomendados pelo big data.

Não, não estou a defender o regres-so à intimidade do médico de aldeia, esse amigo que conhecia de memória todo o historial médico da família. O meu ponto é que não pode haver médicos sem juízo moral. O médico até pode pendurar o estetoscópio no pescoço do algoritmo, mas não pode fazer o mesmo com a consciência. A suspensão da intuição moral, que o leva a ser brilhante no tratamento das debilidades mecânicas do cora-ção enquanto órgão, transforma--o num cego quando o assunto é o coração humano enquanto metá-fora emocional. Um bom médico é alguém que faz a ponte entre o ór-gão e a metáfora, entre o mundo da possibilidade material da ciência e o mundo da consciência, entre o positi-vismo empirista ancorado à natureza e o juízo moral que olha para Deus. Se o caro leitor é daqueles que acham que Deus não existe, por favor não se amofine: troque “Deus” por “im-perativo categórico” e continue a ler.

Naquela tensão entre matéria e moral, o big data está a levar a me-dicina para a desumanidade positi-vista. Exemplos? Nos EUA alguns médicos exigem que colegas anti-eutanásia pratiquem a eutanásia, alegando que esta é uma prática reconhecida pelo Estado, logo to-dos têm de a cumprir. Repare, caro leitor, como a agenda fraturante acaba sempre na velha intolerân-cia autoritária. Se já é necessário nestas questões fraturantes, o juízo moral do médico será ainda mais decisivo no futuro próximo. A atual descoberta da unidade básica da vida (gene) é idêntica à descoberta da unidade básica da matéria (áto-mo): é uma bênção e uma maldição. Onde estão os limites éticos à en-genharia genética no homem? Esta questão não pode ser respondida pela ciência, o método científico é amoral e lida apenas com possibili-dades materiais. A ciência só nos diz se é possível encomendar um filho geneticamente melhorado, não nos diz se é legítimo fazer essa eugenia, não nos diz se é legítimo conceber um filho ex nihilo. A medicina, como ciência, tem de ser amoral. O médi-co, como pessoa, tem de ser um ente moral. É por isso que precisamos de médicos à moda antiga, daqueles que liam literatura e filosofia e não apenas os abstracts dos journals.

Medicina (a)moral

A tese era esta: o “facilitismo” estava a destruir a escola portu-guesa. Em 1974, Portugal tinha taxas de escolarização abaixo

de 30% no 2º e 3º ciclos e de 10% no ensino secundário e pré-escolar. Nas décadas seguintes chegou aos 80% nos 2º e 3º ciclos e no pré-escolar e aos 70% no secundário. Fora vencida a batalha da democratização do ensino. Mas des-de o início do século XXI que se estava a perder a batalha da qualidade e as principais vítimas da falta de exigência eram os mais pobres, que não podiam fugir para o privado. Foi com este dis-curso, nas televisões, nos jornais e até em livro, que Nuno Crato fez nome e chegou a ministro. Só que os núme-ros desmentem a tese. Mais uma vez, o último relatório do PISA confirma 15 anos de convergência com o res-to da Europa, em que passámos dos últimos lugares da OCDE, em 2000, para classificações acima da média, em 2015. O relatório avalia o conhecimento em matemática, ciência e leitura, que depende do trabalho que tenha sido feito com cada aluno do pré-escolar até aos 15 anos de idade. E olhando para o ciclo longo, o único que conta numa área onde tudo demora a ter efeitos, concluímos o mesmo que o comissário europeu da Educação: “Portugal é o único país da UE que tem melhorado de forma continuada o seu desempenho em PISA desde 2000.”

Apesar de nunca ter ligado pevide aos resultados do PISA, Nuno Crato atribuiu a evolução positiva mais re-cente a dois fatores que foram de sua responsabilidade: “Novos e ambicio-sos objetivos curriculares — as metas curriculares — e novas avaliações — as provas finais nos 4º e 6º anos de escola-ridade.” Só que as novas metas curricu-lares entraram em vigor entre os anos letivos de 2013/14 e 2014/15. Mesmo admitindo um efeito relâmpago, ape-nas teriam afetado menos de um terço da amostra do PISA 2015. Quanto aos exames, o delírio é um pouco mais preocupante. Num percurso normal, os alunos que integraram a amostra da OCDE completaram o 4º ano em 2008 e o 6º em 2010. Cinco e dois anos antes de serem criados os respetivos exames. Crato está a atribuir aos seus exames a capacidade de melhorar os conhecimentos de quem nunca os fez. Em toda a UE, apenas a Bélgica fran-cófona realiza, até ao 6º ano, exames com peso na avaliação. Nos últimos 15 anos, enquanto Portugal subia no PISA, a Bélgica caía. Talvez não seja o melhor modelo a seguir.

O discurso do “facilitismo” não é, no entanto, totalmente desprovido de razão. Tem é o sentido exatamente inverso ao que lhe costuma ser dado. Em Portugal, 23% dos alunos tinham chumbado pelo menos uma vez até ao 6º ano (números da OCDE de 2012). A média europeia é de 7%. Os nossos valores são ainda mais altos depois do 6º ano: cerca de um terço dos alunos repetiram pelo menos um ano. E, ape-sar do abandono escolar ter diminuído no tempo do anterior Governo (o que é bom), a retenção de alunos voltou a agravar-se. Não fossem tantas as reten-ções e estaríamos entre os primeiros da OCDE, diz quem fez as contas com os parâmetros do PISA. Porque falo de facilitismo? Porque apostar numa avaliação contínua que detete o aluno que está a ficar para trás e ter um plano de recuperação para ele é muitíssimo mais difícil e exigente do que chumbar quem não acompanhou a matéria. É esta exigência que nos falta.

A tal década perdida

HENRIQUE RAPOSO ESCREVE NO EXPRESSO DIÁRIO DE SEGUNDA A SEXTA-FEIRA

DANIEL OLIVEIRA ESCREVE NO EXPRESSO DIÁRIO DE SEGUNDA A SEXTA-FEIRA

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 36: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016PRIMEIRO CADERNO36

A CARTA DA SEMANA

In Memoriam Cartas

Os originais das cartas não devem ter mais de 150 palavras, reservando-se a Redação o direito de as condensar. Os autores devem identificar-se indicando o nº do B.I., a morada e o nº do telefone. Não devolvemos documentos que nos sejam remetidos. As cartas também podem ser publicadas na edição online.

Para contacto:fax nº (+351) 214 435 319ou [email protected]

OBITUÁRIO

1948-2016 Ministra principal do Estado de Tamil-Nadu somou triunfos políticos e acusações de apropriação indevida de recursos

JayalalithaaJosé Cutileiro

Jayalalithaa Jayaraman (o segundo a de Jayala-lithaa fora acrescentado em 2001 por razões nu-

merológicas), que morreu às 11h30 da noite do passado dia 5 de enfarto do miocárdio no hospital de Apollo em Chennai (cidade antes conhecida por Ma-drasta) poucas horas depois de os médicos — várias sumidades locais e um grande especialis-ta chamado de Londres — lhe terem dado alta e autorizado o regresso a casa, após interna-mento começado a 22 de Setem-bro devido a desidratação aguda e infecção pulmonar levando a septicemia que acabaria por ser debelada embora a sua fraqueza geral tivesse sido tanta que, a 12 de Outubro, havia passado a gestão das suas funções de mi-nistro principal do Estado de Tamil Nadu para o número dois do seu gabinete, aumentando a apreensão e a antecipação de tragédia por parte dos seus mui-tos (e muitas) fiéis seguidores, uma maioria dos 78 milhões de habitantes do Estado que sem-pre acreditaram nela, ao longo de várias décadas de triunfos po-líticos, governação atenta às ne-cessidades dos mais pobres e das mulheres e hábil a dar contenta-mento a eleitores, mas marcada também por várias condenações a prisão por apropriação indevi-da de recursos — o casamento do seu filho adoptivo aparece duas vezes no “Guinness Book of Records”: casamento com mais convidados; maior jantar sentado num casamento (12.800 pessoas) — condenações sempre anuladas por instâncias judiciais superiores e nunca afectando os seus apoios (“Como é que um homem pode julgar um Deus?”, rezara grande cartaz de protesto nas ruas da cidade), sendo eleita pela sexta vez ministro principal do Tamil Nadu em Maio deste ano, encontrando-se retratos seus na loiça das cantinas de es-colas e ministérios, na decoração de muitas instalações estatais, e nas últimas semanas, crescen-do a inquietação da sua gente muita da qual a venerava como uma deusa ou como “Adhipa-

rashakti” — título de filme em língua tâmil de 1971 de que fora a estrela — em português, “Poder Feminino Omnipotente”, haven-do centenas de pessoas a certa altura tentado forçar os portões do hospital.

Sendo infanticídio de recém--nascidas corrente em Tamil Nadu, Jayalalithaa criou rede de adopções que funciona bem. Convenceu mulheres a assen-tarem praça na polícia: há hoje várias esquadras só com mu-lheres; o apoio a crianças levou a melhores escolas e melhores cantinas: as estatísticas são con-vincentes. Não tinha sombra de dúvida sobre os seus próprios méritos. Depois da quarta vi-tória, disse: “Dez partidos coli-garam-se contra mim; não me coliguei com ninguém — tive fé em Deus e fiz uma aliança com o povo. O povo tem fé em mim e eu tenho fé no povo”.

Por muitos anos não lhe passa-ra pela cabeça ser política. Brâ-mane tâmil, tivera ilustres avós paterno e materno. O pai, advo-gado, perdera a fortuna e mor-rera tinha ela dois anos. Como outras mulheres novas do seu meio, a mãe aprendera dactilo-grafia e estenografia, mas fora

desafiada para actriz de cinema convencendo depois o produtor a dar um papel à filha de 15 anos — filmando só durante as férias por ser óptima estudante, tam-bém de dança indiana e música clássica ocidental, tencionando formar-se em Direito. Mas pas-sou a dedicar-se inteiramente ao cinema. Poliglota, fez filmes em tâmil, kannada, hindi e inglês, desde episódios de mitologias indianas a comédias seculares. Teve êxito ímpar, protagonista de 160 filmes, chamavam-lhe rainha do cinema tâmil. Actor célebre com quem muitas vezes contracenara e se metera depois em política desafiara-a para o partido que chefiava. Morreu precocemente, Jayalalitha dis-putou a sucessão à viúva, ga-nhou-a e, até à morte, não per-deu o mando do partido.

Esteve várias vezes perto de papel político importante naci-onal. Rahul Gandhi visitara-a no hospital; o primeiro-minis-tro Modi teceu-lhe agora ras-gado elogio.

José Cutileiro escreve de acordo com a antiga ortografia

Ferreira Gullar1930-2016 Poeta brasileiro, chamava-se, na verdade, José Ribamar Ferreira e era o quarto de uma prole de 11 irmãos. “É um nome inventado. Como a vida é inventada, eu inventei o meu nome”, explicou um dia. Foi Prémio Camões em 2010 e talvez o expoente máximo da poesia brasileira moderna e experimental. Deixou-se influenciar pela obra de Drummond de Andrade e Manuel Bandeira, começou a escrever muito cedo e ganhou vários prémios literários e juvenis. Ao princípio,

trabalhou na rádio, mas em 1950 foi despedido depois de se ter recusado a ler a versão oficial da morte de um operário num comício, que a polícia atribuíra a “baderneiros” e “comunistas”. Aderiu ao Partido Comunista, exilou-se na União Soviética, Chile e Peru, até regressar ao Brasil em 1977. No exílio escreveu ‘Poema Sujo’, poema de mais de cem páginas que será a sua obra-prima. Tornou-se depois um poeta concreto, e escrevia, por exemplo, em placas de madeira. Afastou-se desse movimento e aderiu ao neoconcretismo, que também viria a abandonar. Escreveu: “A arte existe porque a vida não basta.” A Academia Brasileira de Letras declarou-o “imortal” em 2014. Foi várias vezes indicado para o Prémio Nobel da Literatura, que nunca ganharia. Dia 3, de pneumonia, depois de ter recusado que o ligassem a suportes artificias de vida.

> John Glenn (1921-2016), as-tronauta, foi o primeiro norte--americano a completar uma órbita à volta da Terra, um ano depois de o soviético Iuri Ga-garin o ter feito. Mais tarde, aos 77 anos, tornou-se o mais velho astronauta a viajar no espaço. Foi senador do Parti-do Democrata até 1999. Dia 8, de causas não reveladas. > Greg Lake (1947-2016), mú-sico britânico, foi fundador e baixista dos King Crimson e dos Emerson, Lake and Pal-mer, duas bandas fundamen-tais do rock sinfónico. É autor do maior sucesso dos ELP, ‘Lucky Man’. Dia 7, de cancro. > Marcel Gotlib (1934-2016), desenhador e cartoonista fran-cês, publicou nas revistas “Pi-lote” e “Vaillant”. É autor da série “Rubric a Brac” e do cão “Gai Luron”. Tinha um estilo vivo e foi dos primeiros auto-res francófonos a fazer banda desenhada destinada exclusi-vamente a adultos. Dia 4, de cancro.

CGD em boas mãos

O Royal Bank of British (detido maioritariamente pelo Estado britânico), o Barclays e o Stan-dard Chartered Bank falharam os testes de stresse realizados pelo banco central de Inglater-ra às sete maiores instituições bancárias de terras de Sua Majestade. Por outro lado, o Lloyds Bank, liderado pelo português Horta Osório, apre-sentou uma robustez acima da média e dos mínimos exigidos, encontrando-se preparado para os cenários mais adversos. Re-lembre-se que este foi um dos bancos, a par do Royal Bank of British, resgatados pelo Es-tado inglês na ressaca da crise do subprime de 2008. Quando se privilegia a competência na escolha do Conselho de Admi-nistração, independentemente dos custos associados, obtêm--se resultados extremamente positivos. Em contrapartida, em Portugal, o aspeto que pa-rece interessar a BE, PCP e PSD é única e exclusivamente o vencimento do próximo líder da CGD, independentemente das suas capacidades e do seu potencial futuro. Felizmente, o Governo de António Costa manteve-se irredutível quanto às questões remuneratórias e assim conseguiu nomear Paulo Macedo, um excelente gestor, com competência, experiência e provas dadas suficientes para o exercício de semelhante tare-fa. Neste sentido, espera-se que as querelas à volta destas ques-tões cessem e agora os partidos da Assembleia da República e entidades reguladoras exerçam uma fiscalização rigorosa relati-vamente à gestão da CGD (...).João Ramos, Lisboa

“Força Aérea quer 400 milhões...”

(...) Para encerrar a Base Aé-rea do Montijo (que tem 20 aviões?), a Força Aérea quer ser indemnizada. Sim, indem-nizada! Porque esta quantia não pode corresponder aos custos de transferência que legitima-mente quererá ver cobertos. Em qualquer caso, não é a For-ça Aérea do Estado? Então, o Estado (Ministério das Finan-ças via Orçamento) indemni-za o Estado (Força Aérea via Ministério da Defesa), como se se tratasse de um negócio entre Estado e privados?! (...) A mudança do Montijo para outra base (Sintra, Beja, Ota, Tancos, Monte Real) à distância de 20 a 30 minutos de voo custa a transferência de pessoal, de alguns equipamentos por terra e voar com as aeronaves de um lado para o outro. Ao mesmo tempo que se consegue uma im-portante redução de despesas fixas, que deixam de ter lugar na base que encerra (...), uma vez que estes serviços já exis-tem na base de destino, tendo somente, alguns deles, de ser adaptados e/ou aumentados. O pessoal militar é, por princípio, mais fácil de transferir, porque a eventualidade de deslocação para novas frentes está na sua matriz (...). Estes são os cus-tos da transferência. O resto é planeamento e reafetação de meios, para o que já existe o pessoal e a respetiva despesa,

que é semelhante em qualquer base onde esteja colocado. Dito isto, falar de indemnização só pode ser... non sense.Manuel Teves Costa, Guia

O melhor do Norte não é o turismo

O melhor do Norte é a saúde pública, conforme resultado do trabalho “Top 5 — A Excelên-cia dos Hospitais”, apresentado recentemente em Lisboa. Re-sultados estes graças à vasta ex-periência, idoneidade e huma-nismo da grande maioria dos médicos e enfermeiros, que não trocaram o serviço de saúde pú-blica por salários milionários, menos horas de trabalho, redu-ção substancial de emergências médicas graves e complicadas e que se mantiveram fiéis às normas deontológicas a que se propuseram. São profissionais da nossa saúde pública sem presunção, sem ganância, sem vaidade, sem sintomas de in-solência ou superioridade, que tratam todo o tipo de doentes, indiferenciadamente, cidadãos nacionais ou estrangeiros, ricos e pobres, sem critérios de prio-ridade assentes nos diversos subsistemas de saúde. Indepen-dentemente da precariedade da maioria dos serviços de ur-gência, não somente por falta de meios humanos e operacio-nais mas também pelo exces-so e abuso de falsas urgências, que provocam listas de espera intermináveis, não podemos generalizar os demais serviços hospitalares (...). São estes pro-fissionais de saúde que fazem com que a nossa saúde públi-ca se distinga notoriamente da saúde privada. São estes pro-fissionais de saúde que lutam arduamente pelo SNS e que o Governo deveria condecorar.Cristina Machado, Lisboa

E se a União Europeia acabasse?

Pedro Araújo calculava, em maio, que a dívida portugue-sa (pública e privada) andava pelos 70 mil euros per capita. Miguel Sousa Tavares refere uma dívida do Estado de 230% do PIB. Pelos Acordos de Lon-dres de 1945, as dívidas alemã e francesa decorrentes da guerra, que eram de 200% do PIB, fo-

ram anuladas pelos credores, as potências vencedoras, como forma de reconstruir a Euro-pa, evitar os erros do Tratado de Paris de 1919 e relançar a indústria americana. O Plano Marshall enviou, entre 1947 e 1950, 132 mil milhões de dó-lares para a Europa (...). Com isso, a Europa reconstruiu-se, e os EUA consolidaram a sua hegemonia económica. Salazar, em 1962, para resistir às pres-sões de Kennedy para a saída de África, mandou devolver aos americanos a verba que recebe-mos, no valor de 3 mil milhões (50 mil milhões atuais) (...). Em clima de orfandade poderíamos ser tentados a uma solução tipo Benelux com a Espanha, que trouxesse uma política orça-mental, fiscal e social coorde-nadas (o Benelux dispõe de um Parlamento próprio em Bruxe-las) e mantendo as liberdades de circulação da UE (...).A. Carvalho, Lisboa

Os novos deuses

Escrever sobre uma estrela ou sobre um ídolo e criticá-los tor-na-se muito arriscado. A febre futebolística, que anima tantos adeptos, endeusa jogadores, solta amores e ódios e fomen-ta a movimentação de somas astronómicas, veda caminhos e acende semáforos vermelhos às críticas (...). A volúpia dos milhões recebidos, encaixados a cada minuto que passa, tanto de dia como de noite, coloca no Olimpo estes novos deuses, cobertos de ouro e que nos ce-gam de tanto brilho. Afinal, po-deriam repartir connosco uma ínfima parte do que recebem e continuarem podres de ricos. Porque a nós é retirado, por im-posição, uma parte importante dos nossos ganhos, para garan-tir a democracia e a vida em so-ciedade, onde temos a respon-sabilidade de contribuir para garantir a educação, a saúde, a segurança e a sobrevivência de todos. Já nem falo da dispa-ridade dos ganhos destes seres endeusados (receber num dia o que outros ganham numa vida!) nem da sua ‘preciosa’ contribui-ção para o avanço das socieda-des e o bem-estar dos povos, falo da desfaçatez de esconder com esquemas enganosos parte dos ganhos astronómicos, para fugir ou reduzir a sua participa-ção no bolo comum da socieda-de democrática (...).Elisabeth Oliveira, Faro

“Double standard”

Após a trapalhada do Governo de António Costa à volta da no-meação de António Domingues para a CGD, faz sentido fazer a seguinte pergunta: e se isto tivesse acontecido com Passos Coelho? Já teríamos visto e ou-vido partidos políticos, sindi-catos, imprensa e seus opinion makers agitar as águas e exigir a demissão do Governo. Isto com Passos Coelho seria imper-doável, mas com António Costa está tudo bem. Passos Coelho teria sido incompetente ao fa-lhar clamorosamente e ao ter deixado cair a sua escolha, mas Costa passa à vontade pelos pin-gos da chuva (...). Não há quem consiga ver falta de ética em Costa. A esquerda em Portugal vive à custa de um permanente benefício da dúvida: quando as coisas correm bem, tem o mé-rito reconhecido, quando há trapalhadas, dívidas, resgates, (...) a culpa é da oposição. Tor-na-se até difícil perceber por-que é que António Costa não nomeou a deputada Mortágua para a CGD.Manuel Brás, Lisboa

Envolvendo 72 países de todo o planeta na maior avaliação a nível mundial sobre educação, o relatório PISA 2015 compara o in-comparável. Pôr lado a lado o aproveitamento de alunos argelinos, peruanos, nor-te-americanos, kosovares, dinamarqueses e peruanos sem contextualizar as reali-dades sociais e económicas não faz sobressair a eficácia de cada sistema de ensino. Mas os bons resultados conseguidos pelos jovens portugueses a matemática fazem uma revelação: são os adultos que não sabem fazer contas. Após a Revo-lução dos Cravos, o FMI serviu-nos três planos de assistência financeira...Ademar Costa, Póvoa de Varzim

Afinal, quem sabe fazer contas?

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 37: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016 37 PRIMEIRO CADERNO

UMA INICIATIVA EXPRESSO/SIC NOTÍCIAS COM O APOIO

CITROËN C3MODELO 1.2Pure Tech 110 Shine

FORMA(portas/lugares) Hatchback, 5/5

PREÇOBASE(€) 13.377

PVP(€) 17.850

MOTORGASOLINA(cilindros/cm3) 2/1199

POTÊNCIA(cv/r.p.m.) 110/550

BINÁRIO(Nm/r.p.m.) 205/1500

CAIXAMANUAL(velocidades) 6

VELOCIDADEMÁXIMA(km/h) 164

ACELERAÇÃO0-100KM/H(s) 10,9

BAGAGEIRA(litros) 300

DEPÓSITODECOMBUSTÍVEL(litros) 45

COMP./LARG./ALT.(m) 3,99/1,74/1,47

CONSUMOS(litros/100km)

URBANO 5,5

EXTRAURBANO 4,6

MISTO 4,5

EMISSÕESCO2(g/km) 103

RENAULT MÉGANE SPORTMODELO Tourer Energy dci 130 GT Line

FORMA(portas/lugares) Carrinha, 5/5

PREÇOBASE(€) 22.402

PVP(€) 31.500

MOTORDIESEL(cilindros/cm3) 4/1598

POTÊNCIA(cv/r.p.m.) 130/4000

BINÁRIO(Nm/r.p.m.) 320-1750

CAIXAMANUAL(velocidades) 6

VELOCIDADEMÁXIMA(km/h) 198

ACELERAÇÃO0-100KM/H(s) 10,6

BAGAGEIRA(litros) 521

DEPÓSITODECOMBUSTÍVEL(litros) 47

COMP./LARG./ALT.(m) 4,62/1,81/1,45

CONSUMOS(litros/100km)

URBANO 4,7

EXTRAURBANO 3,6

MISTO 4,0

EMISSÕESCO2(g/km) 103

HYUNDAI TUCSONMODELO 1.7 CRDI Premiun

FORMA(portas/lugares) SUV, 5/5

PREÇOBASE(€) 25.225,47

PVP(€) 37.526

MOTORDIESEL(cilindros/cm3) 4/1685

POTÊNCIA(cv/r.p.m.) 115/4000

BINÁRIO(Nm/r.p.m.) 250 (1250/1750)

CAIXAMANUAL(velocidades) 6

VELOCIDADEMÁXIMA(km/h) 176

ACELERAÇÃO0-100KM/H(s) 13,7

BAGAGEIRA(litros) 488

DEPÓSITODECOMBUSTÍVEL(litros) 62

COMP./LARG./ALT.(m) 4,47/1,85/1,66

CONSUMOS(litros/100km)

URBANO 5,4

EXTRAURBANO 4,1

MISTO 4,8

EMISSÕESCO2(g/km) 119

O novo Hyundai Tucson é a prova das dificuldades que os projetistas têm para adaptar os automóveis às novas regras antipoluição, sobretudo quando se trata de motores a gasóleo. Para cumprir as normas Euro VI no que respeita a emis-sões de partículas, óxidos de azoto, etc., a marca teve de retrabalhar os motores existentes de 1700 centíme-tros cúbicos.

Como na fábula da manta do pobre, quando se puxa para um lado corre-se o ris-co de destapar do outro. Ou seja, os novos motores cum-prem a norma, do ponto de vista do andamento e da res-posta não há críticas a fazer mas o que sai penalizado é o consumo. Não que se vá para valores disparatados pelos padrões atuais mas é muito difícil obter de forma con-tinuada médias abaixo dos sete litros aos cem ou mes-mo um pouco mais. É claro

Hyundai Tucson Uma quadratura do círculo

que isto representa uma re-dução importante relativa-mente ao primeiro Tucson (o de 2004), que andava mais perto dos dez litros do que outra coisa. Em contraparti-da, a concorrência, a come-çar pelo Nissan Qashqai, faz reconhecidamente bastante melhor no que aos consumos diz respeito.

Seria, apesar de tudo, injusto, apreciar um carro só pelo gasóleo que gasta, até porque em tudo o resto, este SUV merece boa nota. Desde logo transmite aquela sensação subjetiva de estar-mos bem sentados, mal nos instalamos ao volante. Os interiores e o equipamento aproximam-se dos da con-corrência alemã mais cota-da, deixando para trás a ve-lha imagem do “forte e feio” e espaço a bordo não falta. Apesar de tudo fica alguma saudade do velho Tucson, mesmo bebendo mais ga-sóleo mas puxando às qua-tro e revelando-se capaz de chegar onde os jipes a sério chegavam. R.C.

Uma aventura em 2006

Muitas vezes a mesma designação agrega modelos muito diferentes. Basta pensar nas palavras Toyota e Land Cruiser. No caso do Tucson há um tremendo salto entre o modelo de 2004 e o atual. Conforto, comportamento em estrada, espaço, consumo, em todos estes domínios o salto foi tremendo. Mas o primeiro Tucson tinha tração integral inserível e aptidões TT. A única limitação era a altura ao solo, inferior à de um jipe e a ausência de redutoras. Em lama, pedra ou areia não deixava os créditos por mãos alheias como se comprovou na expedição Coast to Coast entre a Namíbia e Moçambique em 2006. R.C.

Por razões puramente alea-tórias, a carrinha Megane foi o primeiro concorrente ao Essilor Carro do Ano/Troféu Volante de Cristal deste ano que experimen-tei, salvo erro, por volta de 10 de outubro. Foi há algum tempo mas as impressões permaneceram, ao ponto de, se tivesse de resumir as minhas impressões deste carro num mínimo de pala-vras, dizer que custa a crer que um carro deste tamanho faça consumos tão baixos. Acrescentaria que a posição de condução é boa e fácil de acertar.

Numa apreciação mais geral, e tendo em conta os carros com que já andei (que neste momento deverão ser 70 ou 80% dos modelos a concurso), direi que só o Ma-zda 3 se revelou mais eco-nómico. Logo às primeiras impressões a Renault Me-gane Sport Tourer mostrou consumos médios da ordem

Renault Megane S. Tourer Espaçosa mas frugal

dos 5,6 litros aos cem, o que significa potencial para, com alguma adaptação ao carro, conseguir fazer ainda me-lhor. Registe-se o baixo nível sonoro do motor: em rota-ções intermédias até quase nos esquecemos de que lá está.

O motor diesel de 130 ca-valos chega e sobra para as encomendas com uma res-salva: padece, à evidência, da pecha de muitos outros motores modernos turbo-diesel, revelando-se anémi-co a muito baixa rotação. Ou seja, por exemplo para entrar numa rotunda, onde pode ser expectável ter de arrancar depressa, é melhor levar já a primeira metida e começar a embalar o motor porque se entrarmos em se-gunda, a baixa rotação, pode haver uma surpresa desa-gradável quando pisarmos o acelerador.

A versão ensaiada tinha alguns mimos que vale a pena referir e que descrevo em pormenor no texto de baixo. R.C.

Abre, fecha e ilumina...

A versão ensaiada tinha alguns mimos que vale a pena referir: projeção virtual de informações no para-brisas (o chamado “head-up display”), portas automáticas, isto é abrindo e fechando à mera aproximação do condutor (munido da chave no bolso, é claro) e faróis automáticos, dispensando a comutação médios/máximos. Pense o leitor que bom que é sair do carro e não ter que se preocupar em o trancar. Ou chegar ao pé da viatura e ser acolhido pela dita, acendendo luzes de cortesia e destrancando as portas. Quanto a guiar sempre em máximos mas sem encadear ninguém é o sonho de todos os preguiçosos como eu... R.C.

Citroën C3 Pure Tech A hora do apuro da raça

Qualquer semelhança entre o novo Citroën C3 e o an-tigo, de linhas arredondas, quase à 2 CV, é nula. Já no que respeita ao DS3 ou ao Citroën C4 Cactus não há coincidência: o novo carro é um exercício de engenharia genética. Se a forma geral lembra o DS3, as almofadas de proteção (air bumps) nas portas remetem para o Cac-tus. Lá dentro, os puxado-res das portas dianteiras, em forma de correia de mala de viagem remetem novamen-te para o Cactus.

Se fosse um concurso de design estava dito o essen-cial. Mas os carros — digo eu — não são para ser bo-nitos mas para andarem. Para isso lá está o motor o 1.2 a gasolina Pure Tech, de-bitando 110 cv. É uma das armas secretas da Citroën, já aplicada noutros modelos, com bem conseguido com-promisso entre andamento e consumo.

O painel de instrumentos é semelhante, mas menos intrusivo do que o do Cactus (uma espécie de ecrã uni-versal agregando todas as informações), caixa manual de cinco velocidades, Start e Stop que obriga a ligar e des-ligar num botão e pronto, aí vamos nós.

Do ponto de vista da res-posta, o motor cumpre com distinção. Tirando, é claro, o trabalhar irritante dos três cilindros que nos faz pen-sar se não estaremos a guiar uma moto. Já o consumo fica pelos mínimos olímpi-cos. Só tive oportunidade de fazer Lisboa-Paço de Arcos, ou seja, casa-jornal, faltando um bocadinho de estrada, nem que fosse até à Praia das Maçãs... Assim sendo, os 6,5 litros aos cem observa-dos não envergonham mas também não fazem levan-tar a plateia para aplaudir, sendo certo que para quem, como eu, está viciado em diesel, o regresso à gasolina pode implicar alguma neces-sidade de habituação. R.C.

Um modelo visto à lupa

Se o Cactus me fez bater o coração, o novo C3 agrada-me, embora de uma forma menos emocional. Traz pneu sobressalente, macaco e chave de rodas. Quem os achar dispensáveis não deve andar nas ruas de Lisboa. Para um carro desta dimensão, a câmara de marcha atrás não é crítica, mas já que o modelo ensaiado a traz, aplaudamo-la (ainda que seja um extra na versão a concurso). O volante não é espalmado mas tem bom toque. A versão a concurso inclui a ligação à internet (Citroën Connect Box) indispensável para a periódica e gratuita atualização da cartografia. R.C.

Carros candidatos

Audi Q2 1.6 TDI 116 Sport

Citroën C3 Pure Tech

Hyundai IONIQ Hybrid Tech

Hyundai Tucson 1.7 CRDi

Kia Sportage 1.7 CRDi

Kia Optima Sportwagon 1.7

Mazda3 CS Skyactiv-D 1.5

Mitsubishi Outlander PHEV

Peugeot 3008 Allure 1.6

Renault Mégane Berlina

Renault Mégane Sport Tourer

Volkswagen Passat Variant GTE

Volkswagen Tiguan 2.0 TDI Volvo V90 D4 SEAT Ateca

1.6 TDI Hyundai i20

1.0 TGDiHyundai i20

Active 1.0 TGDi

Visões do automóvel S

e sir Alec Issigonis voltasse a este mun-do ser-lhe ia difícil voltar a desenhar um carro tão revo-lucionário como o

Mini (1959). Do ponto de vista da carroçaria não poderia de-senhar o que lhe apetecesse porque teria pelo menos dois constrangimentos contraditó-rios: a aerodinâmica mandava--o desenhar um perfil frontal mergulhante, mas as normas de proteção dos peões em caso de atropelamento impunham--lhe uma frente arredondada e de linhas suaves. Idem para o espaço interior: o depósito

CARRO D O ANO ESSILOR

de combustível nunca poderia estar tão perto dos passageiros e teria de haver espaço junto a estes para airbags, barras de proteção, etc. Finalmente, o motor teria de obedecer a nor-mas antipoluição severas, gas-tar pouco e dar algum prazer

de condução. Uma verdadeira quadratura do círculo que tal-vez nem o génio de Issigonis chegasse para resolver.

Mas são de facto estes os constrangimentos da indús-tria. Além de fazer mais bara-to, equipado e bonito do que a

concorrência. A arma secreta chama-se eletrónica. A gestão eletrónica dos motores per-mite tirar as mesmas potên-cias de cilindradas cada vez menores. A contrapartida é a sofisticação das mecânicas e a dependência de peças de que há uns anos nem se ouvia falar: válvula EGR, medidor da massa de ar, etc. Pegou-se num bólide dos anos 50 (ima-ginemos um Ferrari das Mil Milhas), pôs-se a trabalhar e ligou-se o escape à admissão de um carro moderno (a gaso-lina). Trabalhou!

Rui [email protected] citadino ao SUV

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 38: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Expresso, 10 de dezembro de 2016PRIMEIRO CADERNO38

29/10/2010 O PRIMEIRO CONFRONTO

BENFICA 2-PAÇOS FERREIRA 0Depois de criar boa impressão no Fátima,

Rui Vitória estreia-se na 1ª Liga no Paços de Ferreira. No primeiro encontro com Jesus, triunfo

para o mais velho por 2-0, com golos de Pablo Aimar e Alan Kardec

23/4/2011 FINAL DA TAÇA DA LIGA PAÇOS FERREIRA 1-BENFICA 2Logo na primeira época, Rui Vitória consegue levar o Paços a uma final. Em Coimbra, o Benfica vence por 2-1 (golos de Jara e Javi García e Luisão na própria baliza), num jogo em que o Paços ainda falhou uma grande penalidade

26/5/2013 FINAL DA TAÇA DE PORTUGAL

BENFICA 1-V. GUIMARÃES 2O Benfica deixa fugir o campeonato para o FC Porto,

com o famoso golo de Kelvin aos 90+2, perde a Liga Europa com o Chelsea com um golo de Ivanovic nos descontos, e o annus horribilis de Jesus fica

ainda pior depois de perder a final da Taça de Portugal para o V. Guimarães de Rui Vitória

9/8/2015 SUPERTAÇA BENFICA 0-SPORTING 1Jesus sai para o Sporting, Vitória segue para o Benfica. Dias antes do primeiro duelo da época, Jesus lança a primeira de muitas farpas ao homem contratado para o substituir: “As ideias que estão lá são todas minhas. Pensei que o novo treinador mudasse alguma coisa, mas não vejo nada.” Os ‘leões’ vencem com um golo de Teo Gutiérrez

25/10/2015 PRIMEIRO DÉRBI NO CAMPEONATO

BENFICA 0-SPORTING 3Rui Vitória pica Jesus e diz que os seus jogadores,

“que são uma equipa”, vão jogar contra “11 jogadores do Sporting”. No campo, Jesus arrasa:

em plena Luz, vence por 3-0, com três golos marcados ainda na 1ª parte. No final, responde ao

adversário: “Era fácil pôr o Rui Vitória deste tamanhinho, mas não vou fazê-lo por respeito”

21/11/2015 REVIRAVOLTA NA TAÇA SPORTING 2-BENFICA 1Menos de um mês depois do jogo do campeonato, Jesus volta a bater Vitória, agora na 4ª eliminatória da Taça de Portugal, com Slimani a garantir a passagem do Sporting à fase seguinte no prolongamento. Vitória queixa-se da arbitragem e diz que não quer ser “comido de cebolada”. Jesus garante que o triunfo foi “limpinho, limpinho”

5/3/2016 O JOGO QUE DECIDE O CAMPEONATO

SPORTING 0-BENFICA 1Sporting e Benfica chegam ao dérbi separados

por um ponto, e em Alvalade um golo de Mitroglou aos 20 minutos é suficiente para o Benfica

de Vitória ultrapassar os ‘leões’ na liderança, lugar de onde nunca mais saiu. No final do campeonato,

Rui Vitória diz que, na sua lista de prioridades, Jesus está “atrás de um vendedor de pipocas”

de uma festa onde esteve

Duelos na red line

Lídia Paralta Gomes

Vai ser quentinho, quen-tinho, este dérbi onde ninguém vai querer ser “comido de cebolada” ou fazer “bola”. O léxi-co da guerra entre Rui Vitória e Jorge Jesus é rico e dá para fazer muitas brincadeiras,

mas primeiro vamos a coisas sérias: à 13ª jornada do campeonato, Benfica e Sporting entram em campo separados por dois singelos pontos. Ou seja, o jogo de amanhã (18h, SportTV1) não é qual-quer coisa, porque a liderança está em cima da mesa e as duas equipas vão jogar na red line, expressão trazida por Vitória para o dicionário do ‘futebolês’ na época passada, antes do jogo contra o Bayern de Munique para a Liga dos Campeões, e recordada na antevisão do Benfica-Ná-poles da última terça-feira.

A red line, basicamente, é aquela linha imaginária que separa o que é seguro do que não é, que define o que está dentro ou não dos limites e que tantas vezes já foi beijada (ou ultrapassada) nos confrontos entre os dois treinadores, protagonistas de belas trocas de palavras na última tem-porada e de duelos no campo capazes de afetar a frequência cardíaca de adeptos de Benfica e Sporting. Embora ainda falte muito campeonato, o encontro de amanhã será certamente mais um desses duelos, e o que está para trás ajuda. Os ‘encarnados’ vêm de duas derrotas segui-das: para a Liga dos Campeões, frente ao Nápoles, e, antes, em casa do Marítimo, desaire que somado à vitória do Sporting às custas do V. Setúbal deixou o Benfica, líder desde a 5ª jornada, ali à mão de se-mear. Vantagem psicológica para Jesus? Pois, estava lá até o Sporting cair espeta-cularmente em Varsóvia, na quarta-feira, ao perder frente ao Legia (1-0), deixando fugir um lugar (que parecia mais ou me-nos seguro) na Liga Europa.

Personalidades que chocam

Mais distintos não podiam ser: entre o calmo Rui Vitória e o explosivo Jorge Jesus há 16 anos de diferença (Vitória tem 46 e Jesus 62), e no confronto direto a balança pende claramente para o mais velho. Este será o 18º confronto entre os dois treinadores, e nos 17 últimos (12 no campeonato, 2 na Taça de Portugal, 2 na Taça da Liga e 1 na Supertaça) há 13 triun-fos para Jesus, 3 para Vitória e 1 empate.

Ainda assim, Jesus não poderá negar que foi Vitória a dar-lhe dois dos maiores desgostos da sua carreira. Em 2012/13, quando o agora técnico do Benfica ori-

entava o V. Guimarães e Jesus estava nos ‘encarnados’, os vimaranenses deram a volta à final da Taça de Portugal, vencen-do por 2-1 no Jamor. Isto num ano em que o Benfica quase ganhou o campeonato (mas depois houve o golo de Kelvin no Dragão aos 90+2), esteve perto de vencer a Liga Europa (mas depois houve o golo de Ivanovic do Chelsea aos 90+3) e, para terminar em beleza, ainda deixou escapar a Taça de Portugal. Do sonho ao inferno foi um piscar de olhos.

Na última temporada, com Jesus no Sporting e Vitória no Benfica, os ‘leões’ começaram por vencer os primeiros três duelos (Supertaça, 1ª volta do campeonato e 4ª eliminatória da Taça de Portugal), mas os ‘encarnados’ ganharam o jogo que, no fim de contas, resolveu o campeonato: um golo de Mitroglou permitiu ao Benfica de Rui Vitória ultrapassar o Sporting na ta-bela à 25ª jornada, e a partir daí ninguém mais tropeçou. O Benfica conquistou o tri e Jesus, na primeira época como treinador do Sporting, ficou-se pela Supertaça.

Na guerra de palavras, andou-se sem-pre na red line. Tudo começou ainda an-tes do primeiro jogo oficial da época, a Supertaça. “As ideias que estão lá são todas minhas. O modelo é o mesmo. Pen-sei que o novo treinador mudasse alguma coisa, mas não vejo nada”, atirou Jesus em entrevista à RTP. A troca de mimos foi uma constante durante toda a temporada e chegou ao clímax nas duas primeiras se-manas de janeiro, quando Vitória acusou Jesus de estar “obcecado pelo Benfica”. Na resposta, Jesus congratulou-se por ter feito Vitória “sair da toca”. “Era o que eu queria. Para treinar o Benfica, ele tem de se assumir. Vamos ver se aquele Ferrari continua a andar. Quando treinas um Ferrari, tens de ter mãos para ele.” O contra-ataque chegou três dias depois: “Com a idade que eu tenho, se calhar andava na luta pela subida de divisão ou pela manutenção”, atirou Vitória. Jesus não se deixou ficar: “Para chegar à 1ª divisão, tive de subir pelo meu trabalho. Há outros que também começaram no Vilafranquense mas ganhavam... bola.”

Luz é fortaleza (mesmo a perder...)

Historicamente, o Sporting tem tido di-ficuldades em vencer no novo Estádio da Luz, inaugurado em outubro de 2003: apenas 3 triunfos, contra 11 do Benfica (muitos deles com Jesus). Os restantes três jogos acabaram empatados. A última vitória dos ‘leões’ em casa do rival foi na temporada passada, por claros 3-0: o Sporting de Jesus dominou, marcou três golos na 1ª parte e deixou o Benfica de Vitória a sete pontos. Mas, no final da época, aquele dérbi valeu... “bola”.

[email protected]

Campeonato Benfica e Sporting, Rui Vitória e Jorge Jesus. O dérbi da 13ª jornada vai mais uma vez colocar frente a frente dois treinadores que gostam de jogar nos limites. Com as suas equipas e um com o outro

DESPORTO DÉRBI

FOT

O S

IMO

N H

OFM

AN

N/B

ON

GA

RTS/

GET

TY

IMA

GES

FOT

O C

AR

LOS

RO

DR

IGU

ES/G

ETT

Y IM

AG

ES

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

Page 39: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Que

Plano Juncker + Futuro da Europa

PALÁCIO DA BOLSA, PORTO16 DEZEMBRO SEXTA-FEIRA

UMA INICIATIVA DOS EURODEPUTADOS DO GRUPO PPEPAULO RANGEL E JOSÉ MANUEL FERNANDES

Entrada livre + Info e inscrições: www.psdeuropa.eu

CONFERÊNCIADEBATE

9h30 Sessão de abertura10h15 Plano Juncker (FEIE): Uma oportunidade11h45 Plano Juncker (FEIE): Os bons exemplos13h00 Almoço 14h15 Brexit, eleições americanas e impactos no futuro da Europa16h15 Sessão de encerramento

Museu de Arte Popular

Da fotografia ao azulejo

15 dez. 16 p 1 out. 17

Exposição

Reabertura15 dezembro 2016

Expresso, 10 de dezembro de 2016 39 PRIMEIRO CADERNO

BREVES

PALPITES

13ª jornada

11 dezembro18h

11 dezembro16h

11 dezembro16h

Benficax

Sporting

Feirensex

FC Porto

Nacionalx

Tondela1º

1-1 0-1 2-02º

2-1 0-2 1-03º

2-1 0-2 1-14º

1-1 0-1 2-05º

1-1 0-1 1-16º

1-1 0-1 2-07º

1-1 0-2 1-08º

2-2 0-2 1-19º

2-1 0-1 2-010º

0-2 1-3 1-011º

2-1 0-1 0-0

82 pontosRui Oliveira Costa

91 pontosNunes Liberato

121 pontosLuís Pedro Nunes

118 pontosMário Zambujal

121 pontosDaniel Oliveira

107 pontosManuel Serrão

132 pontosHenrique Raposo

114 pontosFrancisco J. Viegas

106 pontosManuela F. Leite

110 pontosJoana Amaral Dias

111 pontosRita Redshoes

Mais de mil atletas russos ‘sujos’DOPING Mais de mil atletas russos de 30 modalidades terão beneficiado de um programa de doping dirigi-do pelo Governo entre 2011 e 2015, concluiu Richard McLaren, mandatado pela Agência Mundial Antidoping para investigar as suspeitas de doping institucionalizado.

Olá Champions, adeus Liga EuropaFUTEBOL O Benfica perdeu com o Nápoles (1-2), o FC Porto goleou o Leicester (5-0) e ambos qualificaram-se para os oitavos de final da Liga dos Campeões. O Spor-ting perdeu com o Legia (0-1) e saiu da Europa, tal como o Braga, que perdeu com o Shakhtar Donetsk (2-4).Diogo Pombo

Ele já é grande em altura, mas tinha-se feito um dos grandes há pouco, dentro de água, num sítio tão à esquerda no mapa em relação a nós que não deixa os horários marcarem hora. Tendo o contacto dele, envia--se uma mensagem. “Parabéns pela qualificação para o CT.” Sendo Frederico Morais quem é, e quem acaba de se tornar, não se espera resposta. Ele acaba de garantir a entrada no circuito mundial de surf. O te-lemóvel deve ser a coisa mais chata nesse momento.

Mas ele, que acaba de che-gar onde apenas um português esteve antes, riposta com um “muito obrigado” e um “grande abraço”. A paciência de Fre-derico Morais faz deduzir que respondeu e agradeceu a toda a gente, dedução desnecessária quando se abre o Facebook e, com a arma do like, se vê como ele viu tudo o que lhe disseram por lá. Mas não é por isto que ele merece o que lhe tem acon-tecido.

Frederico Morais está há um mês no Havai. Nesse tempo, ele, que lá aterrou bem longe de se qualificar para o que fos-se, chegou a duas finais e con-seguiu dois segundos lugares em Haleiwa e Sunset, praias

No Havai é que ele está bem

SURF

Frederico Morais recebeu um convite para o Pipe Masters, última prova do ano do circuito mundial de surf

onde estão das ondas mais pesadas e difíceis de surfar do planeta. Amealhou pontos su-ficientes (foram 16 mil) para acabar em terceiro do circuito de qualificação, entrar no outro circuito em que tudo quanto é surfista quer estar e mais outra coisa — liderar o Triple Crown.

Este é o nome da competição que junta três provas havaianas à base do quem tiver mais pon-tos no fim ganha. Só que o surf não é justo e por um triz não foi

injusto com Frederico Morais, porque o Pipeline Masters (8-20 de dezembro), última das provas do Triple Crown, faz parte do CT, o circuito em que o português vai entrar, mas ainda não está. Das 36 vagas no even-to, 32 são cativas de quem surfa no circuito mundial, duas vão para wildcards e outro par é disputado por cento e tal surfis-tas que tentam entrar na prova através dos trials.

Até à madrugada de sexta-

-feira, o surfista de Cascais ti-nha de surfar contra nativos da costa norte da ilha de Oahu, habituados à onda de Pipeline, mais uns quantos outros sur-fistas. Mas a injustiça torna-se justa quando o azar de uns dá sorte a outros, como a lesão de Alejo Muniz ter dado um wildcard a Frederico Morais. É no meio dos melhores que lhe bastará avançar uma ronda para obrigar quem o persegue de perto na classificação a che-gar às meias-finais para não o deixar ganhar a Triple Crown. Um feito que será do mais pres-tigiante que o português po-derá alcançar. Porque são três provas, três ondas diferentes, todas difíceis, grandes, que me-tem medo e são para os corajo-sos. Que costumam ser muitos, entre quem vai na frente do QS e quem está no CT e tenha vontade de participar nas duas primeiras provas (os surfistas de elite têm direito a participar nos eventos de qualificação).

Quem vence o Triple Crown é muito bom, ganhou aos me-lhores e mostrou que é melhor em tipos de ondas diferentes do Havai, o sítio onde o surf nasceu para o mundo. É isto que Frederico Morais pode ser daqui a uns dias, além de mais rico, porque o prémio de 50 mil dólares também dá jeito.

[email protected]

Frederico Morais vai competir no circuito mundial a partir de março de 2017

FOT

O JO

E SC

AR

NIC

I/G

ETT

Y IM

AG

ES

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

2084636

Page 40: cld.pt pública não faz a mínima ideia do que está a dizer. Como metade das pedras que se atiraram a Maria de do num interessante combate contra o eduquês entre os quais Crato

Últimas

Henrique [email protected]

#2302expresso.sapo.pt

Sábado10 de dezembrode 2016

1012

TEMPO FIM DE SEMANA

Limpo “Passa/ Um vento frio na nossa nostalgia/ e a nostal-gia touca a desgraça”, escreveu Fernando Pessoa. Céu azul e neblina pela manhã.

Alunos portugueses bri-lham Portugal continua a galgar posições nos rankings internacionais da literacia, como o PISA e o TIMSS, colo-cando-se agora acima da média da OCDE. O progresso foi des-tacado pelo jornal espanhol “El País”, que escreveu sobre “La Buena Escuela Portuguesa”. P24

Marcelo e as exportações O Presidente da República dis-se ontem que tem “um feeling que as exportações portugue-sas em novembro vão crescer muito”.

Dívida: PR e Louçã discor-dam Marcelo Rebelo de Sousa disse ontem, em Palmela, que é “prematuro e extemporâneo” e “não faz sentido” lançar uma discussão sobre a renegociação da dívida portuguesa. Fran-cisco Louçã afirma que esse processo “será inevitável”. P18

Governo aprova benefí-cios fiscais O Governo vai aprovar, na próxima semana, um pacote de benefícios fiscais no valor de €24 milhões, rela-tivos a seis novos contratos de investimento.

Reunião sobre Almaraz Espanha já respondeu à carta portuguesa sobre a urgência de uma reunião para discutir o problema da central nuclear de Almaraz. Os ministros do Ambiente dos dois países estão agora a acertar agendas.

Pires de Lima premiado António Pires de Lima, ex-mi-nistro da Economia, recebeu o Prémio Padre João Carlos Belchior, atribuído desde 1987 pelo Colégio São João de Brito a antigos alunos que se distin-guem pela sua atividade.

Conservatório de Dança sem diretor O diretor da Es-cola de Dança do Conservató-rio Nacional, Pedro Carneiro, foi afastado na sequência de um processo disciplinar ins-taurado pelo diretor-geral dos Estabelecimentos Escolares.

Candidaturas ao Primus arrancam Já está a decorrer o período de candidaturas à 14ª edição do Prémio Primus Inter Pares (PPIP), uma inicia-tiva do Expresso e do Banco Santander Totta. As inscrições terminam a 24 de fevereiro de 2017. E19

Ataque suicida na Nigéria Duas bombistas suicidas fize-ram-se ontem explodir num mercado na cidade de Madaga-li, Nigéria, provocando a morte a pelo menos 30 pessoas.

EXPRESSO DIÁRIO

As Nossas Escolhas: seis apostas para ler este sábado

No Expresso Diário publicado hoje, em As Nossas Escolhas, apostamos em textos, entrevistas e reportagens — para os ler, basta inserir em leitor.expresso.pt ou através do nosso site o código que aparece na capa da Revista E. Falamos, entre outros, dos Football Leaks, com o texto em que se explica como Pepe e Coentrão ocultaram mais de sete milhões de euros. Falamos, no pós-Renzi, das mudanças que estão a acontecer na Europa e no mundo, num texto do Pedro Santos Guerreiro. Falamos ainda dos segredos por trás de 30 anos de Prémio Pessoa.

CARREIRA LENDÁRIA Fez ontem 100 anos um dos atores mais famosos do século XX, celebrizado pelo seu trabalho em filmes como “Spartacus” (1960) ou “20 Mil Léguas Submarinas” (1954). O único filho varão de judeus russos nascia em Nova Iorque, em 1916. Chamaram-lhe Issur Danielovitch, mas acabaria por mudar de nome já adulto. Douglas, que disse numa entrevista ao “Telegraph” em 2011 não pensar na morte, mas na vida, conta com um palmarés invejável: atuou em mais de 90 filmes e séries. FOTO GETTY IMAGES

Kirk Douglas, um “Spartacus” centenário

Sociais-democratas fazem colóquio sobre morte assistida, mas cada deputado votará por si

Deputados do PSD terão liberdade de voto na eutanásia

O grupo parlamentar do PSD vai organizar, em janeiro, um colóquio sobre a eutanásia, com especialistas de várias áreas, para que os deputados do partido possam fazer uma escolha informada quando a questão for a votos no Par-lamento. Mas já é garantido que, no momento em que hou-ver propostas legislativas para votar, os sociais-democratas

terão liberdade de voto (como sempre têm tido nas chama-das questões de consciência), ainda que o partido possa ter uma posição oficial.

Para já, o PSD não tem posi-ção definida sobre a questão da morte assistida, e foi o próprio Pedro Passos Coelho quem, no Conselho Nacional de terça--feira passada, propôs que o partido “tome a dianteira” e se prepare para um debate que está anunciado. O deputado Carlos Abreu Amorim vai coor-denar o colóquio, que depois dos deputados poderá ter ou-

tras sessões para militantes e simpatizantes do PSD.

Em janeiro, a Assembleia da República vai debater uma petição que propõe que Portu-gal legisle sobre a eutanásia — mas as petições dos cidadãos são apenas discutidas, e não votadas. Porém, o BE e o PAN já anunciara que até ao verão apresentam iniciativas legisla-tivas sobre o assunto. Ou seja, mais tarde ou mais cedo os deputados vão votar. “Que-remos que esse seja um voto informado e esclarecido”, diz Abreu Amorim.

Paulo Macedo já tem nomes para a CaixaTêm todos experiência de banca. Dois têm ou tiveram ligação à CGD, um passou pelo BCP, outro pelo BES e outro está nas Finanças

Paulo Macedo já tem a nova equipa de gestão da Caixa praticamente fechada. Serão cinco os administradores exe-cutivos que leva consigo. Têm todos experiência de banca. Dois têm ou tiveram ligação ao banco público, um passou pelo BCP, outro pelo BES e outro é académico, esteve na banca internacional e está nas Finanças. José João Guilher-me e Maria João Carioca são dados com certos. Nuno Mar-tins, José Brito e Francisco Cary são nomes que estão em cima da mesa. Há uma mulher na Comissão Executiva, o que não acontecia na equipa de António Domingues.

A recapitalização da Caixa está a avançar. Ao final da tar-de desta sexta-feira, a CGD in-formou ter recebido autoriza-ção do Banco Central Europeu (BCE) e do Banco de Portugal (BdP) para “prosseguir com as operações societárias que in-tegram a primeira fase do pro-cesso de recapitalização”. Está tudo encaminhado para que até fim do ano seja convertido em capital €960 milhões de obrigações (CoCos), para que seja integrada no balanço da Caixa parte da Parcaixa (€500 milhões) e para que aconteça a redução de capital no montan-te de €6 mil milhões, no âmbi-to de uma operação harmónio.

Os nomes de Macedo

O ex-ministro da Saúde irá buscar Maria João Carioca à presidência da Bolsa de Lis-boa, seis meses depois de esta

ter saído do banco público. A gestora esteve na SIBS e na Unicre e começou na McKin-sey. Macedo irá também levar consigo José João Guilherme, com quem trabalhou no BCP e que é ex-administrador do Novo Banco, estando agora na ECS, fundo de capital de risco e reestruturação de empresas.

Nuno Martins acompanhou o dossiê da CGD enquanto ad-junto do secretário de Estado do Tesouro Mourinho Félix. Licenciado em Engenharia Fí-sica e com carreira na banca internacional (Barclays e Ci-tigroup), também passou pelo BdP. José Brito é diretor de primeira linha da Caixa, res-ponsável pela área financeira e mercados. Trabalhou com Rui Vilar quando este presi-diu à Caixa. Francisco Cary foi administrador do BES In-vestimento e é administrador financeiro do Novo Banco.

HENRIQUE MONTEIRO ESCREVE NO EXPRESSO DIÁRIO DE SEGUNDA A SEXTA-FEIRA

Passam hoje 68 anos sobre a aprovação da Declaração Uni-versal dos Direitos Humanos, que a ONU adotou na sua

resolução de 10 de dezembro de 1948. Basta o artº 1º da Declaração para encontrar-mos todo um programa de vida em comum: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.

Na altura, o mundo pusera fim a uma guerra cruel e prolongada, com a rendição da Alemanha e do Japão, em 1945, três anos antes. O otimismo reinava sobre os escombros de cidades destruídas por bombas (atómicas em Hiroxima e Nagasáqui) e apesar das famílias amputados pela morte dos seus, fosse nas frentes da guerra fosse nos campos de concentração. Os seres humanos, vindos da barbárie, achavam improvável ou impossível voltar ao conflito como meio de resolução de problemas políticos. Ao contrário, a razão e a consciência levá-los-iam a agir em espírito de fraternidade.

A razão e a consciência, infelizmente, são incompatíveis com um velho sentimento — o medo. E tem sido o medo a levar os homens à barbárie. O medo das crises, isto é, de mudar, do desconhecido, da saída dos lugares de conforto, dos locais de tradição. Foi assim na I e II Guerras Mundiais, após o que o mundo mudou radicalmente, surgindo novos países, novos conceitos, novas maneiras de ser e de socializar. Hoje, 71 anos após a derrota do nazismo e dos seus aliados, novas e radicais mudanças se perspetivam. O mundo passou a ser multipolar; novos atores, como a China ou a Índia entre muitos outros, passaram a ter uma palavra a dizer; as crises demográfica e económica assolam a Europa; vagas de migrantes chegam aos polos mais desenvolvidos. Perante isto, o medo reinstala-se e torna-se, de novo, o maior inimigo do espírito humanista. Do seu ventre nascem nacionalismos, populismos, egoísmos, ideias de supremacia rácica, perseguições aos que pensam diferente. Talvez por isso a mensagem central seja aquela que João Paulo II formulou no início do seu pontificado, em 1978: “Não tenhais medo!” Pelo contrário, devemos reafirmar, com otimismo, o que os nossos pais e avós aprovaram: Somos livres e iguais em direitos e devemos agir como seres humanos. Não como animais medrosos refugiando-se na toca.

O medo e os Direitos Humanos

FONTES: IPMA E INSTITUTO HIDROGRÁFICO

Bragança

Porto

P. Douradas

Lisboa

Évora

Faro

P. Delgada

Funchal

Porto

Lisboa

Faro

05:19

05:22

04:50

Baixa

06:16

06:21

05:48

Baixa

11:32

11:56

11:14

Alta

12:29

12:54

12:10

Alta

11°

19°

11°

18°

19°

18°

22°

10°

18°

12°

18°

18°

19°

19°

22°

SÁBADO

SÁBADOMARÉS

DOMINGO

DOMINGO

11°

18°

15°

12°

17°

10°

11°

11°

15°

17°

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)

© Todos os direitos reservados. A cópia ou distribuição não autorizada é proibida. Ficheiro gerado para o utilizador 2084636 - [email protected] - 83.223.240.133 (13-12-16 09:13)