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Nota de Abertura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151 Jorge F. S. Gomes Obstáculos à gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público em Portugal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 153 Vasco Eiriz, Jorge Simões, Miguel Gonçalves Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 169 Mário José Batista Franco,Tânia Sofia da Costa Ferreira Gestão do conhecimento e competitividade organizacional: Um modelo estrutural . . . . . . . . . . . . . . 191 Leonor Cardoso Ambigüidades identitárias na “Feira Hippie”/Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213 Thiago Duarte Pimentel, Alexandre de Pádua Carrieri, Alfredo Rodrigues Leite-da-Silva Beyond human and intellectual capital: Profiling the value of knowledge, skills and experience . . . 237 Teresa Carla Oliveira, Stuart Holland Insatisfação com sistemas organizacionais e repercussão no atendimento a clientes . . . . . . . . . . . . . 261 Éder Paschoal Pinto ARTIGOS DE OPINIÃO COeG O plano de marketing: Um estudo discursivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 285 Luciano Augusto Toledo, Karen Perrotta Lopes de Almeida Prado, José Petraglia Revista semestral editada pelo ISPA Volume 13 - N.º 2 - Outubro 2007 Comportamento Organizacional e Gestão

COG -13-2

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Nota de Abertura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151 Jorge F. S. Gomes

Obstáculos à gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior públicoem Portugal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 153

Vasco Eiriz, Jorge Simões, Miguel Gonçalves

Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 169Mário José Batista Franco,Tânia Sofia da Costa Ferreira

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional: Um modelo estrutural . . . . . . . . . . . . . . 191Leonor Cardoso

Ambigüidades identitárias na “Feira Hippie”/Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213Thiago Duarte Pimentel, Alexandre de Pádua Carrieri, Alfredo Rodrigues Leite-da-Silva

Beyond human and intellectual capital: Profiling the value of knowledge, skills and experience . . . 237Teresa Carla Oliveira, Stuart Holland

Insatisfação com sistemas organizacionais e repercussão no atendimento a clientes . . . . . . . . . . . . . 261Éder Paschoal Pinto

ARTIGOS DE OPINIÃO COeG

O plano de marketing: Um estudo discursivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 285Luciano Augusto Toledo, Karen Perrotta Lopes de Almeida Prado, José Petraglia

Revista semestral editada pelo ISPA Volume 13 - N.º 2 - Outubro 2007

Comportamento Organizacional e Gestão

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Fruto de uma agradável coincidência, este número não temático de COeG reúne vários tra-

balhos realizados por autores unidos por uma mesma língua, a portuguesa, e oriundos do Brasil e

de Portugal. A variedade é, uma vez mais, uma das características principais das pesquisas agora

apresentadas ao escrutínio dos nossos leitores. Os temas são muito diversos, abrangendo a gestão do

conhecimento e a satisfação; as metodologias incluem estudos quantitativos e abordagens qualitativas;

as aplicações abarcam o marketing, as finanças, ou a gestão; os contextos vão do sector da electrónica

e da computação ao de uma feira hippie.

No primeiro trabalho, uma equipa composta por autores oriundos do meio académico e de um

organismo público (Vasco Eiriz, Universidade do Minho; Jorge Simões, Instituto Politécnico de Tomar;

Miguel Gonçalves, Instituto do Emprego e Formação Profissional) identifica os óbices à gestão do

conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público em Portugal. Estes autores

conduzem um inquérito com questionário aplicado a docentes das escolas de gestão e economia do ensino

público, e registam 142 respostas válidas. Os resultados apontam para os principais obstáculos à gestão

do conhecimento, como sejam a liderança e a organização, a comunicação, e os recursos organizacionais.

No segundo estudo, Mário Franco e Tânia Ferreira (Universidade da Beira Interior), exploram

um modelo da ‘organização que aprende’ (learning organisation) assente em quatro dimensões –

cultura organizacional, desenho organizacional, partilha da informação, e liderança –, tendo, para o

efeito, recorrido à Ydreams, uma empresa portuguesa com um elevadíssimo índice de patentes no

nosso país. Estes investigadores constatam um elevado grau de concordância dos atributos teóricos

com a realidade na Ydreams, apresentando, em conclusão, uma breve discussão de como se poderá

operar mudanças no sentido da aprendizagem.

No terceiro artigo, Leonor Cardoso (Universidade de Coimbra), analisa cinquenta organizações

industriais do distrito de Viseu, com o fim de testar a hipótese da influência da gestão do conhecimento

sobre a competitividade organizacional. A gestão de conhecimento foi definida operacionalmente através

de um questionário, com três dimensões: práticas de gestão do conhecimento, orientação cultural para

o conhecimento, e gestão social e discursiva do conhecimento. Como medidas de desempenho, foram

usados múltiplos indicadores económicos e financeiros (e.g. rendibilidade do activo, taxa de cres-

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Nota de Abertura

Page 3: COG -13-2

cimento real média). Os resultados alcançados sugerem a existência de um impacto positivo dagestão do conhecimento sobre a competividade da organização, facto que é discutido pela autora.

O quarto trabalho tem origem num estudo etnográfico e discursivo, realizado por uma equipa daUniversidade Federal de Minas Gerais, composta por Thiago Pimentel, Alexandre Carrieri, e AlfredoLeite-da-Silva. Estes autores aproveitam a existência de várias organizações familiares presentes naFeira Hippie de Belo Horizonte, em Minas Gerais, para discutir as ambiguidades identitárias vividaspelos múltiplos actores sociais. Os resultados apresentados ilustram os processos de construção e des-construção de identificações por parte dos gestores familiares, relativamente à Feira, em determinadoscontextos ao longo de sua história.

No quinto estudo, Teresa Oliveira e Stuart Holland (Universidade de Coimbra) produziram umtexto em língua inglesa, no qual redefinem o conceito de capital intelectual, remetendo para os conceitosde conhecimento, competências, e experiência. Realçam ainda os constructos de conhecimento tácitoe aprendizagem implícita, em concreto para a aquisição de vantagem competitiva. Apresentam o contributodesses dois constructos para a aquisição de competências formais e informais. Por fim, explicitama relação entre conhecimento tácito e explícito.

No sexto artigo, Éder Pinto (Fundação Getúlio Vargas) une dois quadros teóricos da moti-vação e da satisfação – a teoria bi-factorial de Herzberg e o modelo de Spitzer – com o fim deinvestigar a relação entre a insatisfação com os sistemas organizacionais e a dissonância cognitivano atendimento a clientes. Baseado em questionários desenvolvidos a partir dos quadros teóricos,analisou vendedores e respectivos clientes, em três unidades de uma rede de vendas de veículos no Suldo Brasil. Os resultados permitem-nos indagar sobre alguns refinamentos necessários às teorias, parti-cularmente à de Herzberg.

Por último, o artigo de opinião deste número de COeG é assinado por três autores – LucianoToledo, Karen Prado, e José Petraglia – da Universidade Mackenzie (São Paulo, Brasil). A reflexão--ensaio que nos apresentam aponta para a relevância do plano de marketing no contexto das activi-dades de marketing. O tema é tratado na perspectiva de um sistema hierárquico de decisões, colo-cando-se em destaque o marketing como uma função da troca e a importância do papel do marketingno direccionamento da gestão estratégica. É ainda estudado o lado determinante do plano de marketingbem como os seus principais equívocos. Este trabalho conclui com a afirmação de que o plano de marketingnão é uma solução para todos os problemas de uma empresa. Apesar de tudo, ele tem uma funçãode auxílio na antecipação dos estados futuros desejados, direccionando o caminho a ser percorrido.

JORGE F. S. GOMES(Instituto Superior de Psicologia Aplicada)

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Resumo. Este artigo identifica os obstáculos à gestão do conhecimento nas escolas de gestão eeconomia do ensino superior público em Portugal. Assume a gestão do conhecimento como um processocolectivo e interactivo que envolve a geração, codificação e transferência do conhecimento. No âmbitoduma pesquisa sobre gestão do conhecimento no ensino superior em Portugal, procedeu-se à aplicaçãode um questionário junto de docentes das escolas de gestão e economia do ensino público, tendo-seobtido 142 respostas válidas para tratamento de dados. Os dados foram submetidos a uma análisedescritiva e factorial tendo-se identificado os seguintes principais obstáculos à gestão do conhecimento:liderança e organização, comunicação, e recursos organizacionais.Palavras-chave: Gestão do conhecimento, obstáculos à gestão do conhecimento, ensino superior,Portugal.

1. Introdução

O conhecimento é informação cuja validez foi testada e reconhecida (Liebeskind, 1996). Oconceito distingue-se de opinião, especulação, convicção, ou outro tipo de informação cujo valor nãotenha sido sujeito a prova. O conhecimento tem, no entanto, vários significados que variam com ocontexto em que se utiliza o termo (Sveiby, 2000). Pode significar, entre outros, informação, consciência,

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COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL E GESTÃO, 2007, VOL. 13, N.º 2, 153-167

Obstáculos à gestão do conhecimento nas escolas degestão e economia do ensino superior público emPortugal

Vasco Eiriz

Universidade do Minho

Jorge Simões

Instituto Politécnico de Tomar

Miguel Gonçalves

Instituto do Emprego e Formação Profissional

Endereço: Universidade do Minho, Escola de Economia e Gestão, Gualtar, 4710-057 Braga, Portugal. E-mail: [email protected]

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saber, ciência, experiência, talento, perspicácia, competência, know-how, capacidade, aprendizagem,sabedoria, certeza. Além disso, pode incluir, por um lado, produtos codificados como documentos escritose, por outro lado, conhecimento tácito como, por exemplo, rotinas não codificadas (Nonaka & Takeuchi,1995).

Choo (2002, 2003) refere que os gestores não são apenas consumidores de informação; são tambémcriadores de informação e conhecimento. Através da gestão do conhecimento, os gestores desenvolvemum processo sistemático, articulado e intencional, suportado na geração, codificação, e transferênciade conhecimento. Neste processo existem naturalmente obstáculos que dificultam as actividadesenvolvidas na gestão do conhecimento. Neste artigo pretendemos identificar os obstáculos à gestãodo conhecimento. Só através da identificação destes obstáculos é possível desenvolver processos degestão do conhecimento que contornem esses obstáculos e, por via disso, tornem a gestão do conhe-cimento mais eficaz.

O contexto do nosso estudo foi o sector do ensino superior em Portugal. Pela sua natureza, oensino superior é um sector em que o conhecimento se assume como a componente mais importanteda sua actividade. Isto é, na investigação e desenvolvimento, e na formação, as instituições do ensinosuperior recorrem ao conhecimento para desenvolver as suas actividades e incorporam esse conheci-mento nos serviços por si prestados sob a forma, entre outros, de artigos de investigação, relatóriosde consultoria, e cursos de formação. Para melhor compreendermos de que forma as organizaçõesestudadas podem melhorar a sua gestão do conhecimento, importa identificar os obstáculos que estasorganizações encontram para gerir o conhecimento. Isto é, que barreiras existem à gestão do conhe-cimento? Serão essas barreiras percebidas como influentes? Qual a sua influência? De que naturezasão essas barreiras? Serão, por exemplo, de natureza tecnológica, organizacional ou outra? O estudodestas questões é necessário em qualquer tipo de organização mas mais necessário é quando o conhe-cimento integra explicitamente a própria oferta da organização. Neste sentido, a pesquisa destasquestões no contexto do ensino superior em Portugal oferece uma oportunidade única e original, namedida em que são desconhecidos estudos que se tenham debruçado em particular sobre este contextopara compreender os obstáculos à gestão do conhecimento.

Na seguinte secção revê-se a literatura sobre obstáculos à gestão do conhecimento e identificam--se as variáveis que foram utilizadas no estudo. De seguida, é descrito o contexto do nosso estudoempírico no sector do ensino superior em Portugal. Serão posteriormente descritos o método, popu-lação e amostra. Segue-se a apresentação dos resultados obtidos através da aplicação de um ques-tionário. O artigo finaliza com uma discussão das principais conclusões do estudo e sugestões parapesquisas futuras sobre o tema.

2. Obstáculos à gestão do conhecimento

Gerir o conhecimento envolve as seguintes actividades que afectam o nível do conhecimentoglobal da organização (Matusik, 2002): geração (através da criação ou aquisição) de conhecimento;codificação do conhecimento; e transferência do conhecimento.

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Eiriz, Simões, & Gonçalves

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A geração do conhecimento traduz-se na capacidade que uma organização tem em criar edisseminar conhecimento no seu seio e incorporá-lo em produtos, serviços e sistemas (Nonaka &Takeuchi, 1995). Por sua vez, o objectivo da codificação é colocar o conhecimento da organização numaforma que o torne acessível para todos aqueles que necessitam dele (Davenport & Prusak, 1998). Acodificação requer que o conhecimento seja transformado num código explícito, portátil e de fácilcompreensão. Por fim, a transferência do conhecimento dá-se de forma permanente e espontânea noseio das organizações. Esta transferência dá-se de forma localizada numa determinada parte daorganização, mas também ocorre de forma fragmentada, na medida em que essa transferência nãoé efectuada toda ao mesmo tempo.

Um dos papéis da gestão do conhecimento consiste em conferir um certo nível de formalizaçãoàs actividades de gestão de conhecimento e, simultaneamente, desenvolver estratégias específicas paraestimular a geração, codificação e transferência do conhecimento. Neste processo, muitos autores(e.g., Bhatt, 2001) acentuam a importância das tecnologias e sistemas de informação como auxiliaresnão só da transferência do conhecimento mas também da sua geração e codificação.

Além de variáveis de natureza tecnológica existem outros factores que podem influenciar asactividades de gestão do conhecimento. Por exemplo, Silva e Neves (2003) assumiram que a comu-nicação pessoal se torna mais eficaz do que qualquer tecnologia na comunicação de informação complexae no entendimento de sinais, enquanto Cross e Baird (2000) destacaram o papel da memória orga-nizacional. Por sua vez, Riege (2005) categorizou as barreiras à partilha do conhecimento em trêsgrandes grupos: barreiras de natureza individual associadas às pessoas; barreiras de natureza orga-nizacional; e barreiras de natureza tecnológica. Finalmente, De Long e Fahey (2000) e McDermotte O’Dell (2001) diagnosticaram barreiras de natureza cultural, enquanto Dyer e Hatch (2006) anali-saram barreiras à transferência inter-organizacional de conhecimento.

Birkinshaw (2001) reconheceu que a gestão do conhecimento nem sempre produz os resultadosdesejados e identifica quatro factores que justificam o insucesso de muitas iniciativas e programasde gestão do conhecimento. No primeiro desses factores, o autor salientou o facto de que muitas orga-nizações não reconhecem o facto de que gerir conhecimento é algo que ocorre naturalmente emqualquer entidade e não só naquelas que formalizam sistemas de gestão do conhecimento. Outrofactor que contribui para o insucesso é a atitude que muitas organizações têm ao encarar as tecno-logias de informação como substitutas da interacção social. Um terceiro factor advém do facto daorganização orientar em demasia a sua gestão do conhecimento para a reciclagem do conhecimentoexistente em detrimento de procurar criar novo conhecimento. Finalmente, muitas vezes, na aplicaçãode técnicas de gestão do conhecimento, a organização não ultrapassa abordagens tradicionais queacrescentam pouco valor.

Num outro contributo, Fahey e Prusak (1998) identificaram onze erros na gestão do conhecimento,salientando que são erros associados à forma como o conceito de conhecimento é compreendido emambientes organizacionais. Alguns desses erros são os seguintes: reconhecer o conhecimento comoexistindo predominantemente fora da mente dos indivíduos; não entender que um propósito fundamentalda gestão do conhecimento é criar um contexto de partilha; pouca importância dada ao papel do conhe-cimento tácito; focalizar no passado e no presente e não no futuro; e não reconhecer a importância

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Gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público

Page 7: COG -13-2

da experimentação. De acordo com estes autores, no sentido de minimizar os erros e maximizar oconhecimento, a organização pode seguir algumas orientações. A organização deve, por exemplo,possibilitar às pessoas oportunidades frequentes para reunir e debater. Deve ainda pedir aos indivíduosque identifiquem as repercussões do conhecimento gerado nos comportamentos de grupo e nos pro-cessos organizacionais. Ou seja, os gestores precisam de expor continuamente o conteúdo do conhe-cimento e sujeitá-lo a uma avaliação em todas as suas vertentes. Em suma, uma organização tem quedesenvolver auto-reflexão crítica, contínua, e honesta sobre os seus erros, procurando evitá-los e tentandoultrapassá-los da melhor forma possível.

Decorrente desta revisão da literatura sobre obstáculos à gestão do conhecimento, entendemossistematizar esses obstáculos nas seguintes 14 variáveis:

- falta liderança e direcção em termos de comunicar claramente os benefícios da gestão doconhecimento;

- a integração de iniciativas de gestão do conhecimento nas metas da organização é inexis-tente ou não esclarecedora;

- a cultura organizacional não incentiva práticas de gestão do conhecimento;- ausência de recompensas transparentes e reconhecimento que motivem as pessoas a partilhar

o seu conhecimento;- as pessoas são relutantes em partilhar o seu conhecimento com receio de perder poder e

influência;- o ambiente físico e a disposição das áreas de trabalho restringe a efectiva partilha do conhe-

cimento entre os membros da organização;- os canais de comunicação e transmissão do conhecimento são pouco eficientes;- a rivalidade entre departamentos ou outras unidades internas da organização não favorece

a partilha do conhecimento;- a estrutura da organização inibe as práticas de gestão do conhecimento;- as pessoas têm dificuldade em traduzir o seu conhecimento em acções concretas rentáveis

para a organização;- os sistemas de informação não dão um suporte adequado às práticas de gestão do conheci-

mento;- deficiência de recursos da organização que favoreçam a gestão do conhecimento;- a retenção do conhecimento, capacidades e experiência das pessoas não é uma prioridade;- faltam espaços formais ou informais para partilhar e gerar conhecimento.

Antes de apresentar e discutir os resultados do estudo destas barreiras, na secção seguinteprocede-se a uma breve caracterização do contexto em que decorreu o nosso estudo empírico.

3. Contexto do estudo

Há várias décadas que o ensino superior é alvo de múltiplas transformações, tendo vindo aadquirir uma importância crescente na qualificação e aprendizagem dos portugueses. Reconhecendo a

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Eiriz, Simões, & Gonçalves

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importância do sector em que decorreu o nosso estudo empírico, nesta secção efectua-se uma brevecaracterização do ensino superior em Portugal. Esta caracterização é sustentada com base na análise devários documentos (CIPES, 1999, 2000; DGESup, 1999; Instituto de Prospectiva, 1994; MCTES,2005; OCES, 2004, 2005a, 2005b; Santos, 1995).

O fenómeno mais relevante na evolução do ensino superior português é a sua expansão emassificação, tendo passado de cerca de 30 mil estudantes na década de 1960, para cerca de 400 milem 2001. De acordo com a DGESup (1999), para esta expansão contribuíram factores que foramcomuns a vários países, tais como o aumento da escolarização no ensino secundário, as profundastransformações políticas, económicas e sociais sentidas nas últimas décadas e, no caso de Portugal,o período posterior a 1974. Esta expansão concretiza-se de três formas: pela criação de novas uni-versidades públicas; pela criação do ensino superior politécnico; e pelo desenvolvimento de instituiçõesde ensino privado (Instituto de Prospectiva, 1994; Santos, 1995; DGESup, 1999).

Na estrutura do ensino superior em Portugal identificam-se, no que respeita à propriedade,instituições públicas, instituições particulares e cooperativas e, no caso particular da UniversidadeCatólica Portuguesa, uma instituição que resulta da Concordata entre o Estado português e o Vaticano.No que respeita ao tipo de ensino, o sector é constituído por instituições de ensino universitário einstituições de ensino politécnico. Em Portugal existem no sector público 15 instituições de ensinouniversitário e 15 de ensino politécnico a que se juntam seis instituições de ensino militar e policial.No ensino não público existem 14 universidades de ensino particular e cooperativo e a UniversidadeCatólica Portuguesa. O sector não público engloba ainda outros 108 estabelecimentos particularesou cooperativos de ensino universitário, politécnico ou misto.

No período compreendido entre 1975 e 2000, o número de alunos inscritos no ensino superiorcresceu significativamente. Enquanto na Europa esse número duplicou, em Portugal quase quintu-plicou, tendo sido o país que, no período referido, apresentou maior crescimento (OCES, 2004). Noano lectivo 2003/2004 existiam aproximadamente 390 mil alunos em cursos superiores, estando73% inscritos no ensino público e 27% inscritos no ensino não público.

O número total de docentes no ensino superior público era também claramente superior aonúmero de docentes do ensino superior particular e cooperativo. No total, dos 32527 docentes existentesem 2003/2004, o ensino público representava aproximadamente dois terços do número de docentes.

Em termos de repartição entre politécnico e universidade, verificava-se que o número totalde docentes que pertencem aos dois tipos de instituições é bastante próximo. Porém, em termos deuniversidades o número era muito superior quando comparamos o ensino público (12060/75%) como particular e cooperativo (4065/25%). No ensino politécnico este números eram mais próximos:9571 (58%) docentes no ensino público e 6831 (42%) docentes no ensino particular e cooperativo.

4. Método, população e amostra

O objecto da nossa investigação empírica foi as instituições de ensino superior público,excluindo-se as instituições de ensino militar e policial. Note-se, contudo, que não foram alvo de

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Gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público

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pesquisa todas as unidades orgânicas, mas apenas as que estão especializadas na formação nas áreasde gestão e economia.

A opção metodológica por reduzir a população de estudo ao ensino público da área científicade gestão e economia explica-se por razões de natureza diversa. Na medida em que seria utilizadoum questionário postal dirigido a docentes como instrumento de recolha de dados, por uma questãode custos e exequibilidade do estudo, entendemos, em primeiro lugar, reduzir substancialmente onúmero de inquiridos. Entre as diferentes opções que se nos colocavam começamos por reduzir oâmbito do estudo a docentes duma única área científica. Esta delimitação resultou da percepção quepossuíamos de que os processos de gestão do conhecimento no seio das instituições de ensino superiorsão bastante heterogéneos, variando consoante a área científica. Por exemplo, é natural que asquestões, problemas, desafios e processos empregues na gestão de conhecimento em faculdades deengenharia e ciências seja substancialmente distinto do das faculdades de letras e humanidades.Daí que a escolha tenha sido reduzida a uma única área científica com o objectivo de obter resultadosmais consistentes.

A escolha da área científica de gestão e economia resultou, por um lado, em virtude dosinteresses pessoais dos autores do estudo. Por outro lado, pela natureza do conhecimento desta área,pareceu-nos que é uma das áreas científicas que faz uma melhor ponte entre as ciências naturais eengenharia, e as artes, letras e humanidades e ciências jurídicas. Além disso, a gestão e economia édas áreas científicas que em Portugal possui uma representação mais equilibrada entre o sector públicoe não público.

Ainda que inicialmente o nosso objectivo fosse incluir os docentes do ensino público e nãopúblico na população a inquirir, decidimos reduzir a população às instituições de ensino públicoem virtude de não nos ter sido possível obter dados detalhados sobre os docentes do ensino não público.Desta forma, a população objecto de estudo era constituída por 2525 docentes, dos quais 1346 (53,3%)eram docentes universitários e os restantes 1179 (46,7%) eram docentes do ensino politécnico. Em2003/2004 estes docentes integravam 26 unidades orgânicas especializadas na formação em gestãoe economia (14 unidades de ensino universitário e as restantes 12 de ensino politécnico).

Dada a escassez de recursos disponíveis para o estudo, entendemos inquirir 40% da popu-lação em cada uma das 26 unidades identificadas. Em termos de procedimentos de recolha de dados,foram enviados os 1010 questionários em 26 envelopes, solicitando apoio à direcção de cada unidadeorgânica no sentido de distribuir os questionários pelos docentes da sua organização. Afim degarantir a confidencialidade das respostas, no questionário era pedido que cada docente nosdevolvesse o questionário individualmente. O primeiro contacto a solicitar apoio na recolha de dadosfoi efectuado em Setembro de 2005, tendo a recolha de dados decorrido durante o último quadri-mestre de 2005. O questionário enviado continha vinte questões que cobriam outros aspectos e visavammais objectivos de investigação para além do estudo dos obstáculos à gestão do conhecimento. Emparticular, para além de identificar o perfil dos respondentes e das suas organizações, o questionáriopretendia: i) identificar a atitude da organização sobre a gestão do conhecimento; ii) avaliar o uso deindicadores de medição do desempenho na gestão do conhecimento; iii) identificar os objectivosdo conhecimento na organização; e iv) identificar os obstáculos à gestão do conhecimento.

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Eiriz, Simões, & Gonçalves

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O questionário foi objecto de um pré-teste junto de quatro docentes que integravam a populaçãodo estudo. Através deste pré-teste foi possível introduzir ligeiras melhorias na redacção das questões.

Obtiveram-se 142 respostas válidas para tratamento de dados (taxa de resposta de 14%). Naanálise de dados recorreu-se ao software estatístico Statistical Package for the Social Sciences(SPSS), versão 13.

Exactamente metade dos 142 respondentes pertencem ao ensino universitário e a outra metadeintegra o ensino politécnico. Do total, 79 (55,6%) são do género masculino. Todos os respondentestinham mais de 25 anos e 75,9% tinha menos de 45 anos. Em termos de antiguidade na instituição,81,8% dos inquiridos tinha pelo menos cinco anos de experiência, sendo que mais de metade dosinquiridos tinha pelo menos nove anos de antiguidade. Entre os 142 respondentes havia 35 (24,6%)doutorados.

5. Resultados

No questionário administrado para estudar a gestão do conhecimento nas escolas públicasuniversitárias e politécnicas de gestão e economia incluía-se uma questão sobre os obstáculos à gestãodo conhecimento. Tratava-se duma questão composta pelas 14 variáveis identificadas na segundasecção deste artigo. Ao inquirido era pedido que avaliasse a influência de cada uma desses obstáculosna gestão do conhecimento na sua instituição recorrendo a uma escala Likert composta pelosseguintes pontos: 1) muito influente; 2) influente; 3) indiferente; 4) pouco influente; e 5) nada influente.Realizado o teste de fiabilidade Alpha de Cronbach, obteve-se um valor igual a 0,909 o que indicaa existência duma muito boa consistência interna das variáveis.

Nos resultados globais apurados, verificou-se que em todas as variáveis identificadas, maisde 50% dos inquiridos consideraram essas variáveis como muito influentes ou influentes, indiciando,deste modo, a relevância dos obstáculos identificados conceptualmente. Em todo o caso, as variá-veis que denotaram ser mais influentes são as seguintes, ordenadas pela média obtida (ver Tabela 1):i) ausência de recompensas transparentes e reconhecimento que motivem as pessoas a partilhar o seuconhecimento (esta variável foi identificada por 83,2% dos respondentes como sendo muito influenteou influente); ii) as pessoas têm dificuldade em traduzir o seu conhecimento em acções concretasrentáveis (82,3% consideram-na muito influente ou influente); e iii) faltam espaços formais ouinformais para partilhar e gerar conhecimento (76,8% dos respondentes avaliam-na como muitoinfluente ou influente).

Decompondo estes resultados em função do subsistema de ensino verificou-se que as duasprimeiras variáveis são as mesmas no ensino universitário e no ensino politécnico. Ou seja, tanto osdocentes do ensino universitário como do ensino politécnico referem, como obstáculos mais influentes, aausência de recompensas transparentes e reconhecimento que motivem as pessoas a partilhar o seuconhecimento, e a dificuldade que as pessoas têm em traduzir o seu conhecimento em acções concretasrentáveis. Estes resultados sugerem que os obstáculos à gestão do conhecimento são semelhantes nosdois subsistemas.

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Gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público

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Esta mesma questão foi sujeita a uma análise factorial. Com o objectivo de extrair factores das14 variáveis iniciais, podem ser utilizados diferentes métodos. No desenvolvimento do nosso estudoutilizou-se o método da análise das componentes principais. Afim de aferir a qualidade das correla-ções entre as variáveis de forma a se poder avaliar a viabilidade da análise de componentes principaisefectuaram-se o teste Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o teste de Bartlett. Os resultados obtidos (KMO =0,889 e teste de Bartlett = 887,74 para um nível de significância α = 0) enquadram-se dentro dos parâ-metros indicados como adequados para o prosseguimento da análise.

Com o objectivo de obter maior consistência nos resultados e facilitar a interpretação dos factores,

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Eiriz, Simões, & Gonçalves

Tabela 1Obstáculos à gestão do conhecimento

Obstáculos à gestão do conhecimento Média Desvio NúmeroPadrão de respostas

Ausência de recompensas transparentes e reconhecimento que motivem as 1,80 1,013 137pessoas a partilhar o seu conhecimento

As pessoas têm dificuldade em traduzir o seu conhecimento em acções 1,87 0,987 136concretas rentáveis

Faltam espaços formais ou informais para partilhar e gerar conhecimento 2,09 1,166 134

A cultura organizacional não incentiva práticas de gestão do conhecimento 2,10 1,135 136

Falta liderança e direcção na comunicação dos benefícios da gestão do 2,19 1,158 134conhecimento

Integração de iniciativas de gestão do conhecimento é inexistente ou não 2,26 1,103 132esclarecedora

As pessoas são relutantes em partilhar o seu conhecimento com receio de 2,29 1,199 136perder poder e influência

Os canais de comunicação e transmissão do conhecimento são pouco eficientes 2,38 1,198 136

Deficiência de recursos da organização que favoreçam a gestão do conhecimento 2,41 1,155 135

A retenção do conhecimento, capacidades e experiência das pessoas não é 2,43 1,162 135uma prioridade

A estrutura da organização inibe as práticas de gestão do conhecimento 2,44 1,211 134

O ambiente físico e a disposição das áreas de trabalho restringe a partilha 2,47 1,202 135efectiva do conhecimento dentro da organização

A rivalidade entre departamentos ou outras unidades internas da organização 2,53 1,351 137não favorece a partilha do conhecimento

Os sistemas de informação não dão um suporte adequado às práticas de 2,74 1,199 133gestão do conhecimento

Nota: Escala utilizada: 1 – muito influente; 2 – influente; 3 – indiferente; 4 – pouco influente; 5 – nada influente.

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no desenvolvimento do nosso trabalho, o procedimento de rotação varimax revelou-se suficiente parafazer a análise dos dados e interpretação dos resultados. Foram identificados três factores explicativosde 62,8% do total da variância, em que as variáveis se agruparam da forma descriminada na Tabela 3.

A interpretação dos resultados mostra que existem três factores principais na referência dosobstáculos que a organização possui na gestão do conhecimento.

161

Tabela 2Principais obstáculos à gestão do conhecimento

Variável Comunalidade Factor Valor % variância % variânciapróprio acumulada

A integração de iniciativas de gestão do conhecimento 0,610 1 6,509 46,492 46,492nas metas da organização é inexistente ou nãoesclarecedora

Falta liderança e direcção em termos de comunicar 0,709 2 1,266 9,043 55,535claramente os benefícios da gestão do conhecimento

Faltam espaços formais ou informais para partilhar e 0,454 3 1,015 7,251 62,786 gerar conhecimento

As pessoas têm dificuldade em traduzir o seu conhecimento 0,492em acções concretas rentáveis para a organização

Ausência de recompensas transparentes e reconhecimento 0,518que motivem as pessoas a partilhar o seu conhecimento

A cultura organizacional não incentiva práticas de gestão 0,715do conhecimento

A retenção do conhecimento, capacidades e experiência 0,596das pessoas não é uma prioridade

Os sistemas de informação não dão um suporte adequado 0,714às práticas de gestão do conhecimento

Deficiência de recursos da organização que favoreçam 0,693a gestão do conhecimento

A rivalidade entre departamentos ou outras unidades 0,649internas da organização não favorece a partilha do conhecimento

Os canais de comunicação e transmissão do conhecimento 0,609são pouco eficientes

O ambiente físico e a disposição das áreas de trabalho 0,542restringe a efectiva partilha do conhecimento entre os membros da organização

As pessoas são relutantes em partilhar o seu conhecimento 0,769com receio de perder poder e influência

A estrutura da organização inibe as práticas de gestão do 0,720conhecimento

Medida da adequabilidade da amostra Kaiser–Meyer–Olkin KMO = 0,889Teste da esferecidade de Bartlett = 887,740, nível de significância α = 0

Gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público

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Factor 1: Liderança e organização. As variáveis que compõem este factor são: falta de lide-

rança e direcção em termos de comunicar claramente os benefícios da gestão do conhecimento; a

integração de iniciativas de gestão do conhecimento nas metas da organização é inexistente ou não

esclarecedora; a cultura organizacional não incentiva práticas de gestão do conhecimento; e ausência

de recompensas transparentes e reconhecimento que motivem as pessoas a partilhar o seu conhecimento.

162

Eiriz, Simões, & Gonçalves

Tabela 3Principais obstáculos à gestão do conhecimento: Análise factorial das variáveis

Variável Factor 1 Factor 2 Factor 3

Falta liderança e direcção em termos de comunicar claramente os benefícios da 0,771gestão do conhecimento

A integração de iniciativas de gestão do conhecimento nas metas da organização 0,752é inexistente ou não esclarecedora

A cultura organizacional não incentiva práticas de gestão do conhecimento 0,751

Ausência de recompensas transparentes e reconhecimento que motivem as 0,661pessoas a partilhar o seu conhecimento

As pessoas são relutantes em partilhar o seu conhecimento com receio 0,725de perder poder e influência

O ambiente físico e a disposição das áreas de trabalho restringe a efectiva 0,662partilha do conhecimento entre os membros da organização

Os canais de comunicação e transmissão do conhecimento são pouco eficientes 0,648

A rivalidade entre departamentos ou outras unidades internas da organização 0,584não favorece a partilha do conhecimento

A estrutura da organização inibe as práticas de gestão do conhecimento 0,553

As pessoas têm dificuldade em traduzir o seu conhecimento em acções 0,549concretas rentáveis para a organização

Os sistemas de informação não dão um suporte adequado às práticas de gestão 0,804do conhecimento

Deficiência de recursos da organização que favoreçam a gestão do conhecimento 0,761

A retenção do conhecimento, capacidades e experiência das pessoas não é 0,636uma prioridade

Faltam espaços formais ou informais para partilhar e gerar conhecimento 0,492

Método de extracção: análise das componentes principaisMétodo de rotação: varimaxVariância explicada: 62,8%

Page 14: COG -13-2

Reflectindo sobre a essência destas variáveis, na nossa interpretação dos resultados alcançados, esteobstáculo resulta das opções da liderança, nomeadamente em termos da sua capacidade em reconhecer,organizar e implementar sistemas de gestão que confiram importância ao conhecimento. Este factorexplica 46,5% da variância.

Factor 2: Comunicação. Na interpretação deste factor, explicativo de 9% da variância, sobressaemclaramente as limitações de comunicação existentes nas organizações estudadas. Este factor é com-posto pelas seguintes seis variáveis: as pessoas são relutantes em partilhar o seu conhecimento comreceio de perder poder e influência; o ambiente físico e a disposição das áreas de trabalho restringe aefectiva partilha do conhecimento; os canais de comunicação e transmissão do conhecimento são poucoeficientes; a rivalidade entre departamentos ou outras unidades internas da organização não favorece apartilha do conhecimento; a estrutura da organização inibe as práticas de gestão do conhecimento; eas pessoas têm dificuldade em traduzir o seu conhecimento em acções concretas rentáveis para a orga-nização. Ou seja, apesar de uma efectiva gestão do conhecimento requerer canais de comunicação quefavoreçam a geração, codificação e transferência do conhecimento, os inquiridos reconhecem existiremobstáculos importantes em termos de comunicação que dificultam a gestão do conhecimento.

Factor 3: Recursos organizacionais. As variáveis que compõem este factor, explicativo de 7,3%da variância, são as seguintes: os sistemas de informação não dão um suporte adequado às práticas de gestãodo conhecimento; deficiência de recursos da organização que favoreçam a gestão do conhecimento; aretenção do conhecimento, capacidades e experiência das pessoas não é uma prioridade; e faltam espaçosformais ou informais para partilhar e gerar conhecimento. Analisando este factor pode concluir-se que aescassez de recursos organizacionais (sistemas de informação, capacidade e experiência das pessoas, espaçospara partilhar e gerar conhecimento, entre outros) se constitui como uma importante factor que dificultaa gestão do conhecimento.

A cada um destes factores corresponde o respectivo índice composto pelas variáveis que ointegram. Para cada índice foram calculadas as estatísticas descritivas apresentadas na Tabela 4.

As estatísticas apuradas para os três índices evidenciam que o índice “liderança e organização”é a barreira à gestão do conhecimento que mostra ser mais influente, seguida do índice “comunicação”e, finalmente, do índice respeitante aos “recursos organizacionais”.

163

Tabela 4Análise descritiva dos índices

Estatísticas Índice 1 Índice 2 Índice 3

Número de respostas 132 132 130 Não respostas 10 10 12 Média 2,0947 2,2601 2,4288 Mediana 2,0000 2,1667 2,2500Moda 2,00 2,00 2,25 Desvio Padrão 0,89663 0,87716 0,91193

Gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público

Page 15: COG -13-2

6. Discussão e conclusão

Este artigo pretendeu identificar os obstáculos à gestão do conhecimento no contexto das escolasde gestão e economia do ensino superior público em Portugal. Este contexto foi escolhido por razõesde natureza conceptual e pragmatismo metodológico. Ou seja, por um lado o ensino superior é umsector que, pela natureza da sua actividade, é adequado para estudar questões decorrentes da gestãodo conhecimento. Por outro lado, a restrição do estudo a uma área científica facilitou a sua exequibi-lidade.

Numa primeira análise descritiva dos dados recolhidos por questionário constatou-se que a ausênciade recompensas transparentes e reconhecimento que motivem as pessoas a partilhar o seu conheci-mento, por um lado, e o facto das pessoas terem dificuldade em traduzir o seu conhecimento em acçõesconcretas rentáveis para a organização, por outro lado, foram os obstáculos identificados como maisinfluentes, tanto por parte dos docentes universitários como por parte dos docentes do ensino poli-técnico. Na nossa leitura destes resultados, as duas variáveis revelam, em primeiro lugar, um obstáculode natureza organizacional e, em segundo lugar, um obstáculo de natureza individual ou pessoal.Este resultado vem ao encontro das propostas conceptuais identificadas na literatura que agregamos obstáculos em grandes categorias. Por outro lado, este resultado destaca factores organizacionais eindividuais em detrimento de barreiras de natureza tecnológica.

Efectuada uma análise factorial dos dados, constatou-se existirem três obstáculos principaisà gestão do conhecimento nas organizações estudadas: 1.º liderança e organização; 2.º comunicação;e 3.º recursos organizacionais.

O primeiro factor revela que a gestão do conhecimento necessita de ser incentivada pela lide-rança da organização, devendo esta implementar sistemas de gestão que comuniquem claramente osbenefícios de gerir o conhecimento, integrem iniciativas de gestão do conhecimento explicitamentenas metas da organização, e incentivem uma cultura organizacional que reconheça e recompense aspessoas a partilhar o seu conhecimento.

A comunicação revelou-se como o segundo grande obstáculo à gestão do conhecimento. A comu-nicação incentiva a transmissão e a absorção do conhecimento de forma permanente e eficaz. Ainteracção, o relacionamento, o contacto formal e informal entre os colaboradores da organização deveráser o mais fluido possível, para que a transferência do conhecimento tenha resultados profícuos. Paraisso, a disposição dos espaços físicos, e o desenho dos canais de comunicação e estrutura organizacionaldevem ser facilitadores da gestão do conhecimento, incentivando a tradução desse conhecimento emacções concretas e rentáveis para a organização.

O terceiro obstáculo mais importante à gestão do conhecimento são os recursos organizacionais.Desde logo, os recursos em termos de tecnologias e sistemas de informação devem dar um suporteadequado às práticas de gestão do conhecimento. Mas, as tecnologias de informação não substituem acapacidade e experiência das pessoas e, como tal, o aproveitamento destes recursos deve ser uma prioridadeda organização. Para gerir adequadamente o conhecimento, também ele um recurso organizacional, devehaver capacidade de conjugar diferentes recursos complementares. Por exemplo, a criação de espaçosfísicos e virtuais de partilha e geração do conhecimento é relevante para gerir o conhecimento.

164

Eiriz, Simões, & Gonçalves

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Da análise cuidada dos anteriores resultados é possível detectar algumas limitações do estudodesenvolvido e, simultaneamente, sugerir pistas para trabalhos futuros de investigação. Um aspectoque merece uma análise mais detalhada prende-se com a decomposição dos resultados obtidos. Apesardos nossos resultados evidenciarem alguma semelhança entre os subsistemas de ensino universitário epolitécnico, interessaria aprofundar estas semelhanças e diferenças. Além da análise por subsistema,outras variáveis que poderiam ser úteis considerar para estudar mais detalhadamente os obstáculosà gestão do conhecimento são a natureza jurídica das instituições (públicas e privadas) ou as áreas cien-tíficas prevalecentes em cada organização. Além disso, outras variáveis como, por exemplo, a faixaetária dos respondentes, género, antiguidade ou grau académico poderão também fornecer pistas impor-tantes para identificar e gerir as barreiras à gestão do conhecimento.

Poderá ainda fazer sentido estudar mais detalhada e aprofundadamente a forma como cada umdos obstáculos identificados se constitui como uma barreira à gestão do conhecimento e como essabarreira pode ser ultrapassada. Pense-se, por exemplo, no papel das tecnologias na comunicação, lide-rança e organização. Seria útil compreender as motivações da utilização dumas tecnologias em detrimentode outras e de que forma cada uma das tecnologias empregues influencia os modelos de comunicação,organização e liderança prevalecentes.

Julgamos ainda que a obtenção de evidência empírica no estudo dos obstáculos à gestão doconhecimento será também bem sucedida com o complemento de outras abordagens metodológicas.Por exemplo, a análise de casos, utilizando não só o questionário mas também entrevistas em pro-fundidade e observação poderão dar um contributo muito relevante para compreender a realidadeparticular de cada organização e sugerir iniciativas de gestão do conhecimento que se traduzam emresultados palpáveis para a organização.

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Abstract. This article identifies the barriers to knowledge management in schools of managementand economics of the Portuguese public higher education sector. It considers knowledge managementas a collective and interactive process that comprises the generation, codification, and transference of

166

Eiriz, Simões, & Gonçalves

Page 18: COG -13-2

knowledge. As part of a study on knowledge management activities in the Portuguese higher educa-tion sector, it was carried out a survey to the faculty of management and economics public schools.We collected 142 valid responses for data analysis. Descriptive and factorial analysis of data reveals thefollowing main barriers to knowledge management: leadership and organization; communication;organizational resources.Key words: Knowledge management, barriers to knowledge management, higher education, Portugal.

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Gestão do conhecimento nas escolas de gestão e economia do ensino superior público

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169

Resumo. Perante a actual envolvente, as organizações, para se tornarem competitivas, necessitam derecorrer a procedimentos, técnicas e instrumentos de gestão que assentem num processo de aprendi-zagem contínua. O objectivo deste artigo é, precisamente, conhecer e compreender melhor osprocedimentos e mecanismos que a uma organização deve adoptar para se direccionar para o novoparadigma de gestão – as organizações que aprendem. Neste estudo propõe-se um modelo conceptualda “organização que aprende”, que assenta em quatro dimensões: (1) Cultura Organizacional, (2)Desenho Organizacional, (3) Partilha de Informação e (4) Liderança. Para validar este modelo, foiadoptada uma abordagem de investigação qualitativa que se aproximou de uma investigação-acção.Para o estudo, foi seleccionado um único caso – empresa YDream – e como métodos de recolha dedados adoptou-se: entrevistas, observação participante e análise documental. Neste estudo concluiu-seque uma organização, para alcançar o novo paradigma – organização que aprende, necessita deintroduzir mudanças na sua política de gestão. A própria liderança deve entender e concordar colecti-vamente com a lógica de reestruturação organizacional proposta e que este novo desenho e culturaorganizacional, bem como todas as implicações que possam advir, sejam explicadas e partilhadasclaramente à totalidade dos colaboradores que fazem parte da organização. Para futuras investigações,nesta área do conhecimento sugere-se a realização de outros casos de estudo adoptando, em maiornível de profundidade, a metodologia investigação-acção. Trata-se de uma modalidade de investigaçãocujo objectivo é promover a mudança, invocada aqui, no campo organizacional.

Palavras-chave: Aprendizagem organizacional, modelo, competitividade, cultura, investigação-acção.

1. Introdução

As organizações são caracterizadas como sistemas abertos, desta forma, cada vez mais, sujeitas

às mudanças que ocorrem no meio envolvente onde operam. Estas mudanças ocorrem a um ritmo

COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL E GESTÃO, 2007, VOL. 13, N.º 2, 169-189

Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

Mário José Batista Franco

Universidade da Beira Interior

Tânia Sofia da Costa Ferreira

Mestre pela Universidade da Beira Interior

Endereço: Universidade da Beira Interior, Departamento de Gestão e Economia, Estrada do Sineiro, 6200 Covilhã,Portugal. E-mail: [email protected]

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acelerado. A contínua evolução da tecnologia, da informação e da comunicação, o que por sua vez, estáa reduzir as distâncias e a transformar o mundo numa aldeia global, são exemplos deste cenário actual.

Deste modo, as organizações sentem a necessidade de responder a estes desafios e, para isso,é necessário que as organizações sejam capazes de exercer a sua actividade adoptando novas confi-gurações organizacionais e novos paradigmas de gestão para assegurar a sua sobrevivência e desen-volvimento a longo prazo. Green (1999: 3) refere que “os avanços tecnológicos, a globalização e ainovação estão a fazer com que a vida no trabalho mude de uma forma muito rápida”.

De facto, a passagem de um meio envolvente estático para um meio turbulento, envolve mudançasestratégicas, que são traumáticas e dramáticas, porque alteram normas, estruturas, processos e metas,além de provocar profundas modificações na construção da realidade social (Mintzberg & Waters,1985). Para Chakravarthy (1982: 35), na actualidade, “a essência da administração é lidar com amudança” e, para Alperstedt (2000), as organizações, como sistemas adaptativos, necessitam de percebere de analisar continuamente os requisitos mutáveis do meio envolvente, para que a ele possam se adaptar.

Neste contexto, as organizações devem ser concebidas para criar, adquirir e transferir conhe-cimentos e para modificar os seus comportamentos a fim de reflectir esses novos conhecimentos.Aliás, vários investigadores (Nonaka, 1991; Spender, 1996; Lubit, 2001; López et al., 2003) consi-deram que a capacidade de criar e de aplicar novos conhecimentos é que vai constituir a verdadeirafonte de vantagem competitiva para as organizações.

Drucker (1993: 3) também partilha a ideia central dos anteriores investigadores, pois consideraque, “não é nem o capital, nem a terra, nem o trabalho, mas sim o conhecimento”, que vai ser amatéria-prima da sociedade actual e das suas transformações contínuas. Por isso, é normal haver gestoresinteressados em compreender e a fortalecer a capacidade de aprendizagem das suas organizações (Júnior& Vasconcelos, 2004).

Tiwana (2005) afirma que a habilidade das organizações em explorarem os seus activos intan-gíveis, torna-se cada vez mais decisivo do que o próprio investimento e gestão dos seus recursos//activos físicos. Com a volatilidade e incerteza dos mercados, o aparecimento de novas tecnologiase novos competidores, os produtos e serviços tornam-se obsoletos rapidamente. Assim, as organizaçõesque conseguem sobreviver, são aquelas que conseguem de uma forma consistente, criar novo conhe-cimento, disseminá-lo e incorporá-lo nos seus produtos e serviços.

Na era pós-industrial, as organizações que possuem sistemas internos de gestão de conhecimentoe capital intelectual conseguem rapidamente colocar no mercado novos produtos e serviços, criandouma forte vantagem competitiva.

Neste contexto, a aprendizagem organizacional1 é apresentada como uma nova e importanteabordagem para resolver os problemas de competitividade e inovação nas organizações. Aliás, estefenómeno começa a ser encarado como um elemento central no desempenho organizacional. Como

170

Franco & Ferreira

1 São vários os termos que procuram caracterizar a questão da aprendizagem na vida organizacional, tais como: aprendi-zagem organizacional, organização em aprendizagem, organização que aprende, organização aprendiz, empresa que aprende, empresainteligente, entre outros. Todavia, neste artigo será utilizado, com mais frequência, o termo organização que aprende.

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refere Senge (1996), o crescimento e desenvolvimento do mundo e a complexidade e dinamismo dosnegócios tende a vincular-se com a própria aprendizagem.

As organizações, hoje em dia, têm de ser organizações que aprendem, pois para que estastenham sucesso e consigam sobreviver no contexto actual, têm de comunicar com o meio onde estãoinseridas, assim como, com as pessoas que delas dependem e vice-versa.

Perante tais situações, para que a mudança se possa instalar num processo contínuo e não numprocesso pontual, é necessário criar organizações voltadas para processos permanentes de aprendizagem.Neste sentido, as organizações que aprendem adoptam configurações onde os seus membros expandemcontinuamente a sua capacidade de criar os resultados que realmente desejam, onde estimulam padrõesde pensamento novos e abrangentes, e onde as pessoas aprendem continuamente a aprender juntas.

Este artigo tem como objectivo principal conhecer e compreender melhor os procedimentose mecanismos que a uma organização deve adoptar para se direccionar para o novo paradigma degestão – as organizações que aprendem. A nível prático, este estudo contribui ainda para o desen-volvimento de práticas de gestão e de mudanças de comportamento que possam ajudar as organizaçõesa enveredar por processos de contínua aprendizagem. Para alcançar estes objectivos foi realizado umestudo de caso que se limitou à empresa YDreams.

2. Enquadramento teórico

2.1. Organização que Aprende

A literatura revela a falta de um corpo teórico convergente sobre as organizações que apren-dem. Este resultado surge possivelmente do carácter multidisciplinar nesta área do conhecimento.Contudo, pelo menos seis disciplinas têm contribuído, consistentemente, para o desenvolvimento destetópico: psicologia e desenvolvimento organizacional; ciência da administração; sociologia e teoriaorganizacional; estratégia; gestão da produção; e antropologia cultural. Essa interdisciplinaridade gerauma área que contém contribuições tanto complementares quanto competitivas (Easterby-Smith, 1997;Bontis et al., 2002).

Esta vasta fragmentação deu origem a diferentes teorias/escolas, mas nenhuma conseguiu resumira literatura importante sobre este fenómeno organizacional. Tal como Tsang (1997: 82) enfatiza,“não existe nenhum quadro conceptual que tenha conseguido reunir todos os avanços atingidos nodomínio da aprendizagem organizacional”.

A essência das organizações que aprendem é a habilidade da organização em utilizar a capa-cidade mental de todos os seus membros para criar processos que melhorem este processo de apren-dizagem. Uma organização que aprende é uma organização que facilita a aprendizagem de todos osseus membros e ao mesmo tempo transforma-os (Pedler et al., 1991).

Para Senge (1996: 3), organizações que aprendem são “organizações nas quais as pessoas expandemcontinuamente a sua capacidade de criar os resultados que realmente desejam, onde se estimulam

171

Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

Page 22: COG -13-2

padrões de pensamento novos e abrangentes, onde a aspiração colectiva ganha liberdade e ondeas pessoas aprendem continuamente a aprender juntas.”

De facto, o conceito de organização que aprende foi introduzido por Senge, no início da décadade 1990, fundamentando-se em cinco disciplinas, premissas com um corpo teórico e técnico que,quando colocadas em prática, podem transformar uma organização qualquer numa ”organização queaprende”: (1) domínio pessoal; (2) modelos mentais; (3) visão compartilhada; (4) aprendizagem emequipa e (5) pensamento sistémico.

O conceito de organizações que aprendem também foi apresentado por Garvin (1993). Esteinvestigador define este termo como organizações que são capacitadas a criar, a adquirir e a transferirnovos conhecimentos e, ainda, a modificar os seus comportamentos de modo a reflectir sobre os novosconhecimentos.

Garvin et al. (1998: 58) compreendem que “as empresas possuem conhecimento organizacional,e este é a capacidade de poder executar tarefas em conjunto que as pessoas não conseguem alcançarde forma isolada, visando essas tarefas criar valor às partes interessadas na organização”. Assim,esta definição apesar de atribuir ao colectivo humano o papel central na construção e aplicação do conhe-cimento, destaca-o como um potencial.

De referir que Edmondson (1999) descreveu a aprendizagem como um processo interactivo dedelineamento, desenvolvimento, reflexão e modificação de acções, diferentemente das visões baseadasem comportamento automático. Neste sentido, a aprendizagem nas organizações é um processo quese pode desenvolver a três níveis: (1) a nível do indivíduo; (2) a nível do grupo e (3) a nível da orga-nização.

Alguns autores (Crossan et al., 1999; Popper & Lipshitz, 2000) compreendem as organizaçõesque aprendem como a aprendizagem individual que ocorre no contexto organizacional, uma vez queé o indivíduo que possui a capacidade de agir nesse contexto. Uma abordagem ligeiramente diferentesugere que a aprendizagem individual é um pré-requisito para a aprendizagem organizacional (Hedgerg,1981; Kim, 1993; Dogson, 1993; Senge, 1996). Dogson (1993: 377), por exemplo, sugere que a apren-dizagem organizacional é o resultado da aprendizagem individual e que “os indivíduos são as entidadesprimárias de aprendizagem nas organizações e são os indivíduos que criam formas organizacio-nais que possibilitam a aprendizagem de tal forma que facilite a transformação organizacional”.

A aprendizagem individual depende da percepção, da inteligência, da experiência e das neces-sidades e motivações de cada um. Depende, ainda, do ambiente de aprendizagem. Caracteriza-se poruma racionalidade e por uma especificidade individuais e resulta em mudanças cognitivas e/ou com-portamento individual.

Por outro lado, a aprendizagem de grupo caracteriza-se por uma racionalidade e um quadro dereferência colectivos. Mas, como referem Probst et al. (1998), a criação e manutenção de construçõessociais comuns à realidade da organização, só pode acontecer, se os membros aceitarem modificar assuas representações e hipóteses individuais, comunicando-as e discutindo-as com os outros membros.

Após uma análise a essa questão, Popper e Lipshitz (2000) sugerem que, independentementeda definição de aprendizagem organizacional utilizada, esta será sempre mediatizada pela apren-dizagem dos membros da organização (nível de grupo), uma vez que uma organização só pode aprender

172

Franco & Ferreira

Page 23: COG -13-2

por intermédio dos indivíduos que a compreendem (Argyris & Schön, 1996; Kim, 1993). Estes inves-

tigadores consideram os grupos como elos fundamentais entre a aprendizagem individual e a apren-

dizagem organizacional. No entanto, o seu sucesso ou insucesso dependem do grau de liberdade que

lhes é permitido, da atribuição de tarefas de acordo com as capacidades demonstradas, da gestão e

circulação do conhecimento disponível e do incentivo e apoio prestados pela organização.

Snyder e Cummings (1998: 875) realizaram uma síntese da relação entre a aprendizagem

individual e a aprendizagem organizacional: os indivíduos aprendem em organizações, mas esta

aprendizagem pode ou não contribuir para a aprendizagem organizacional. A aprendizagem é organi-

zacional na medida em que: (1) é realizada para alcançar propósitos organizacionais; (2) é compar-

tilhada ou distribuída entre os membros da organização (grupos); e (3) os resultados da aprendizagem

são incorporados em sistemas, estrutura e cultura organizacionais. Pode-se, então, sublinhar que a

aprendizagem organizacional é um fenómeno colectivo, dado que a organização só pode aprender através

dos seus membros.

2.2. Modelo Conceptual de Análise

Com base numa revisão da literatura sobre as organizações que aprendem é possível caracte-

rizar estas últimas em várias dimensões/parâmetros:

Cultura organizacional. Uma organização com uma cultura de aprendizagem possui várias

características. Primeiro, possui processos de aprendizagem ao longo da vida, abrangendo a apren-

dizagem e a formação contínua, assim como incentiva e/ou facilita os membros que aprendem e expe-

rimentam (Barrett, 1995; Leitch et al., 1996). Segundo, é uma organização com um ambiente de apren-

dizagem, demonstrado pela liberdade que as pessoas têm em fazer algo e de não terem medo de falhar,

existe a aceitação dos erros e da falha sem punição (Barrett, 1995). Terceiro, é uma organização sem

limites, em que os membros desejam a aprendizagem e são forçados para compartilhar e, deste modo,

facilitam uma cultura de aprendizagem (Ulrich & Van Glinow, 1993).

Outras variáveis associadas à cultura organizacional prendem-se com a confiança e o envol-

vimento das pessoas, assim como a inovação e a criatividade, isto porque, segundo Campos (1999),

uma organização honesta sobrevive dentro de uma sociedade quando contribui para a satisfação das

pessoas. A organização deve preocupar-se em pagar bem aos seus empregados, respeitá-los, dar-lhes

oportunidade de crescimento e os accionistas devem ter lucros para o progresso e novas oportunidades.

Os aspectos mais visíveis e reconhecidos da cultura organizativa, pese embora que a sua inter-

pretação seja muito complicada (Chiva Gómez & Camisón Zorzona, 1999) são a confiança, os valores

e os objectivos, a comunicação, a implicação do indivíduo, a sua satisfação laboral, o compromisso

(Nevis et al., 1995), a superação no trabalho, a tendência da resistência à mudança, a pró-actividade e

a implementação das suas contribuições, o ambiente laboral e os mecanismos de avaliação.

Segundo Senge (1996), existem determinadas características que diferenciam as organizações

em aprendizagem das restantes, isto porque estas são adaptáveis ao seu meio envolvente externo;

apresentam um desempenho contínuo da sua capacidade de adaptação e mudança; desenvolvem o

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Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

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colectivo como a aprendizagem individual; e utilizam os resultados da aprendizagem para atingirmais facilmente os resultados propostos.

Neste sentido, está-se perante uma nova concepção de gestão que consiste no desenvolvi-mento de uma cultura que fomenta um levado grau de colaboração e de confiança entre os seusmembros e num processo contínuo de compreensão e assimilação das implicações da mudança (Oliveira,citado por Lisboa et al., 2004).

As organizações que aprendem necessitam de uma cultura, onde todos os indivíduos, sem excepção,compartilhem dos valores organizacionais (López Salazar, & Lopez Sánchez, 2001), confiem nos seuscolegas e superiores, estando satisfeitos com o seu trabalho, comprometidos com este e com os quaisque participam nele, dispostos a inovar, a permanecer na organização (Cameron & Freemann, 1991), aajudar-se, partilhando os conhecimentos e as experiências que conseguiram acumular ao longo da suavida laboral, e criando com ele importantes sinergias (Claver et al., 2001). Além disso, são maispró-activos do que reactivos, evoluindo desde a sua adaptabilidade à sua criatividade e implementamas suas contribuições, já que não se desmotivam nem se perdem nos recursos.

Numa organização com uma cultura de aprendizagem, todos (direcção, empregados, clientes,fornecedores) sentem que há oportunidades para aprender e crescer.

Estrutura organizacional. Todas as fronteiras numa organização que aprende são altamentepermeáveis para maximizar o fluxo de informação e abrir a organização às suas experimentações. Ainterligação em rede (proximidade e abertura entre a direcção, os empregados, os clientes, os concor-rentes e a comunidade) torna possível para a organização mais “inteligente” supervisionar constan-temente as necessidades e as pessoas em processo de mudança (McGill & Slocum, 1995).

Na configuração em rede, segundo os autores supracitados, ao contrário da estrutura mecanicista//tradicional, a tomada de decisão é frequentemente realizada com um cliente, fornecedor ou parceiro.De acordo com Salm e Amboni (1997), os projectos de redes capacitam as empresas a gerir projectosinter-unidades e a reduzir as decisões de tempo de lançamento. A vantagem principal dessas formasde organização é a habilidade de ser internamente flexível, e ao mesmo tempo, de se adaptar às mudançasno seu meio envolvente.

Argyris e Schön (1996) comentam que, hoje, o modelo de “redes” é o mais adequado à gestãodas organizações. McGill e Slocum (1995) indicam que a estrutura organizacional de hoje, deve seruma organização horizontal (orgânica), estruturada em torno de processos de gestão e não de funções.A organização horizontal significa que conjuntos de clientes definem as unidades de negócio. A orga-nização deve agrupar os seus recursos em unidades com as pessoas e processos necessários paraservi-las.

Actualmente, tem-se observado uma tendência cada vez maior de reestruturar as organizações,com o objectivo de as tornar orgânicas. Esta tendência é impulsionada pela complexidade e pelosdesafios do novo mundo que “requer organizações vívidas e inteligentes” (Pinchot & Pinchot, 1994:32). A globalização, o aumento da competitividade e o aumento do nível de exigência dos clientes sãoalguns factores com os quais uma organização tem de lidar.

É dentro deste cenário de incertezas que surge também a estrutura de equipas. Trata-se de umaestrutura caracterizada por romper as barreiras departamentais, por descentralizar as decisões para

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os níveis mais baixos das equipas de trabalho e por respeitar mais as pessoas inovadoras do que ahierarquia.

Tratando-se dessa nova era, as equipas são de fundamental importância neste ambiente demudanças. Como refere Kanter (2000), a individualidade não sobreviverá no futuro, mas poderá tero seu lugar. Contudo, as aptidões das equipas serão necessárias, a capacidade de trabalhar com outraspessoas em pé de igualdade, o respeito às contribuições e a capacidade de ouvir as suas ideias, entreoutros aspectos do trabalho em cooperação com outras pessoas, será essencial porque não se podecontar mais com o poder inerente ao cargo, mas sim forçados a contar com o poder das nossas ideiase como elas são transmitidas.

Partilha de informação. Na era da informação, o conhecimento tornou-se um produto principalde riqueza (Drucker, 1996). Tomando o conhecimento como fonte primária da corporação moderna,significa que o processo de desenvolvimento será a criação de conhecimento, e o processo de distri-buição será a partilha de conhecimento/informação (Koivula, citado por Pankakoski, 1998).

A reprodução de valor tem por objectivo a produção de conhecimento formatado como umproduto que pode ser vendido aos consumidores. Segundo Pankakoski (1998), a partilha de infor-mação/conhecimento consiste em formatar o conhecimento de tal forma que ele se torne acessívele compreensível para outras pessoas fora do grupo que desenvolveu a inovação. Requer a exteriori-zação, isto é, a conversão do conhecimento tácito em conhecimento explícito. A exteriorização e aprodução do conhecimento profissional apresenta as seguintes vantagens: (1) menor dependência deum ser humano em particular: à medida que o conhecimento tácito se torna explícito, pode ser ensinadofacilmente para outras pessoas e também para pessoas com menor conhecimento; (2) menor depen-dência no meio de comunicação intensivo em pessoa: seja a inovação verdadeiramente produzívelou não, há uma implicação para possíveis estratégias de partilha de conhecimento.

Segundo Nonaka e Takeuchi (1997: 65), a partilha de conhecimento e a reprodução de valor delarequerem conceitos da Gestão do Conhecimento, em que são definidos os tipos de conhecimento aserem estudados: o conhecimento codificado ou explícito “refere-se ao conhecimento transmissívelem linguagem formal e sistemática e o conhecimento tácito que é pessoal, específico ao contexto e,assim, difícil de ser formulado e comunicado”.

A partilha de conhecimento/informação faz-se através de canais de comunicação: esta comu-nicação dissemina um conteúdo inovador. Dependendo do grau de comunicabilidade verbal, o conhe-cimento pode ser transmitido ao vivo. A combinação do conhecimento explícito já existente com osnovos que estão a ser aprendidos faz-se através da implementação e, a interiorização que se segue aum aprendizado teórico aplicado à prática. Converteu-se, assim, o conhecimento explícito em conhecimentocompartilhado.

De acordo com Salm e Amboni (1997), na maioria das organizações que aprendem, os testes deinformações e dos sistemas de informações implicam a necessidade da organização estar receptivaa dados externos do seu ramo de actividade, dos seus mercados, da concorrência e a canalizar essasinformações para os colaboradores apropriados, sem reorientações de gestão. Isso também significaque os processos de informações internos não podem ser tão sobrecarregados, criando informações,apenas por criar (Salm & Amboni, 1997).

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Para estes autores, a eficácia de qualquer organização que aprende gira em torno da sua capa-cidade de recolher informações apuradas acerca dos efeitos do seu comportamento e de usar essasinformações para modificar o comportamento.

As organizações têm que desaprender os sistemas existentes que atrasam a aprendizagem, afim de implementar sistemas que a promovam. No cerne da desaprendizagem está a necessidade dese confrontar a questão da informação como forma de poder na organização nos dias de hoje (Salm& Amboni, 1997). Em conformidade com estes autores, uma das mais importantes fontes de poder éo controlo ou o excessivo acesso à informação, acerca das actividades da organização, das preferênciase julgamentos de outros, do que se passa, e acerca do que se está a fazer.

Quando os sistemas são projectados para promover a aprendizagem, fazendo com que a infor-mação apurada se torne acessível em tempo razoável, a posição de uma empresa muda sobre quemobtém qual informação e quando e o que ela pode fazer com isso (Salm & Amboni, 1997; McGill& Slocum, 1995).

Os projectos e a execução de sistemas de aprendizagem requerem que os gerentes e restantescolaboradores transponham várias crenças que atrasam a precisão, oportunidade e utilidade da infor-mação nas organizações. As organizações que aprendem reconhecem a importância do feedbackpleno que permita a avaliação da experiência. Os sistemas de aprendizagem não glorificam a racio-nalidade e tão pouco negligenciam o valor da intuição a favor de factos e análises (McGill & Slocum, 1995).

Liderança. Segundo Kotter (1990), numa época de revolução tecnológica e mudanças cres-centes, a liderança torna-se cada vez mais crucial, na medida em que representa o elemento propulsorde mudanças e é a força básica por detrás de uma mudança bem sucedida. Para este investigador, semliderança, a probabilidade de ocorrência de erros aumenta e as oportunidades de êxito reduzem-se.

Em conformidade com Vergara (2003), dentro do contexto apresentado, a liderança possibilita acooperação, diminui os conflitos e contribui para a criatividade, exercendo um papel integrador, muitonecessário numa época de organizações virtuais, pois mantém as pessoas unidas, mesmo sem estaremfisicamente próximas.

Assim sendo, a liderança associa-se a estímulos e incentivos que promovem a motivação daspessoas para alcançar os objectivos comuns, apresentando um papel relevante nos processos deformação, transmissão e mudança da cultura organizacional (Senge, 1996).

Segundo Barrett (1995), a cultura organizacional tem como base que a personalidade dos líderestenha impacto significativo na cultura das organizações e que o alinhamento das crenças e valoresocorra quando os valores da organização estão de acordo com os dos colaboradores.

Perante esta visão de Barrett (1995), os líderes eficazes são aqueles que complementam asdeficiências dos seus colaboradores e maximizam as suas potencialidades, de modo a conseguirema satisfação individual e colectiva no grupo de liderados, bem como, proporcionando o alinhamentoda cultura organizacional aos objectivos estratégicos da organização.

De acordo com Schein (1999), as certezas das lideranças formam a cultura que é confirmadapelos membros da organização, quando são postas em prática. Cada vez que as certezas são confirmadas,elas são reforçadas. Ao mesmo tempo, se as ideias iniciais dos líderes não funcionam, elas são aban-donadas ou substituídas por novas soluções que venham a resolver os problemas de forma a diminuir aansiedade do grupo.

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Para Queiroz (1996), é possível dizer que ao líder cabem dois papéis fundamentais: a) auxiliarno aumento da motivação dos liderados. Não se trata aqui de incentivar os trabalhadores ao alcance doobjectivo proposto, mas sim o papel do líder é, antes de tudo, desenvolver um ambiente de trabalhono qual o trabalhador possa accionar a sua motivação intrínseca, e b) manter a energia motivadorados liderados. Se, por um lado, é impossível motivar alguém, por outro lado, é muito fácil desmotivaruma pessoa. O líder, através fundamentalmente de uma comunicação correcta e de um adequado esforçode reconhecimento, precisa estar constantemente preocupado em manter a motivação do seu liderado.Quick (1996: 66) sublinha que: “quando os membros da equipa participam nos processos de decisãode uma organização, a motivação, a moral e o desempenho profissional do empregado aumenta.Quanto maior a participação do empregado, maior será o seu compromisso tanto com o trabalhocomo com a organização”.

Os sistemas de recompensas nas organizações que aprendem estão mais voltados para oreconhecimento e o reforço da aprendizagem. As organizações devem unir o pagamento e as práticasde promoção a tomada de riscos, à flexibilidade, à melhoria contínua e a outros comportamentos queuma organização que aprende requer. Mais que isso, significa remover as punições ao fracasso e à diver-gência (Pedler et al., 1991).

Assim, perante os novos paradigmas que se estão a impor às organizações e com base na revisãoda literatura realizada, desenvolveu-se um modelo conceptual (Figura 1) da “organização que aprende”,que assenta, fundamentalmente, nas quatro dimensões atrás expostas: (1) Cultura organizacional,(2) Desenho organizacional, (3) Partilha de informação e (4) Liderança.

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Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

Figura 1. Modelo conceptual para uma organização que aprende

CULTURA ORGANIZACIONAL- Confiança e Respeito- Diálogo, Comunicação e Poder- Mudança e Adaptação- Inovação e Criatividade- Satisfação/Participação e Proactividade

DESENHO ORGANIZACIONAL- Trabalho em equipa e Colaboração- Atribuição e divisão de poder- Flexibilidade e Adaptação- Gestão Participativa- Visão generalista

PARTILHA DE INFORMAÇÃO- Conhecimento tácito e explícito- Partilha de conhecimento- Comunicação- Aprendizagem- Recursos Humanos- Assimilação e adaptação

LIDERANÇA- Colaboração entre gestores- Organização auto-dirigida- Envolvimento de pessoas- Gestão heterogénea- Motivação e compromisso

“ORGANIZAÇÃO QUE APRENDE”( Novo Paradigma Organizacional )

Elaborado pelos autores

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De referir, no entanto, que um modelo é, por definição, uma simplificação de uma realidadecomplexa e existe sempre a possibilidade de incluir, ou não, certas variáveis e factores no mesmo.Todavia, a estrutura adoptada no modelo, com vista à análise das “organizações que aprendem”, sustentaquatro principais dimensões (cultura, estrutura, partilha de informação e liderança) e dentro destastoda uma diversidade de variáveis.

3. Metodologia de investigação

3.1. Objectivo e questões de investigação

O principal objectivo deste estudo é compreender melhor o fenómeno da aprendizagem orga-nizacional. Assim, deste objectivo de âmbito geral, decorrem algumas questões de investigação que aose obter resposta para elas, contribui para a compreensão e melhoramento das organizações que aprendem:

i) Como conseguir implementar uma cultura que permita a aprendizagem dos colaboradoresno seio da organização?

ii) Como desenhar uma estrutura organizacional para que exista um trabalho em equipa, flexi-bilidade e colaboração dentro da organização?

iii) Como facilitar a partilha de informação entre os colaboradores da organização para queocorra um processo de aprendizagem e de iniciativa?

iv) Como identificar se os líderes da organização motivam e envolvem os seus colaboradoresnos objectivos organizacionais e na delegação de tarefas?

v) Em que medida este fenómeno da aprendizagem organizacional permite o melhor desen-volvimento e competitividade das organizações?

3.2. Procedimentos Metodológicos

Para atingir os objectivos definidos, adoptou-se uma abordagem de investigação de naturezaqualitativa e também por ser a mais adequada para o entendimento das questões a serem investigadas.Segundo Godoy (1995: 63), não deve esquecer-se, no entanto, que durante o processo, neste tipo deinvestigação, “o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida deve ser a preocupaçãoessencial do investigador”. Trata-se, por conseguinte, de uma abordagem de carácter social. Uma inves-tigação social, para Gil (1999), pode ser entendida como um processo formal e sistemático com oobjectivo fundamental de descobrir respostas para problemas mediante o emprego de procedimentoscientíficos, permitindo a obtenção de novos conhecimentos no campo da realidade social. A partir dessereferencial, a investigação é predominantemente do tipo qualitativa que, para além de ser uma opçãodo investigador justifica-se, sobretudo, por ser uma forma adequada para entender a natureza deum fenómeno social.

Note-se no entanto que, após ter sido feita uma análise a posteriori, verifica-se que os proce-dimentos seguidos neste estudo se aproximam da investigação-acção. A investigação-acção, usada

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como uma modalidade de investigação qualitativa, é definida, segundo Cohen e Manion (2003: 223),como “um procedimento essencialmente in loco, com vista a lidar com um problema concreto local-izado numa situação imediata (...)”. De acordo com esta definição, uma característica deste tipo deestilo de investigação é que os participantes do estudo observam, indagam e focalizam determinadosaspectos através de reajustes constantes que melhoram a qualidade e a adequabilidade da sua prática.

Neste quadro da investigação qualitativa, optou-se ainda pelo método de investigação estudode caso. Este método, segundo Triviños (1995) e Godoy (1995), é o procedimento mais adequado parao estudo mais detalhado de uma determinada situação. O estudo de caso supõe que se pode adquirirconhecimento do fenómeno investigado a partir da exploração intensa de um caso.

Para validar o estudo de caso, usaram-se os testes lógicos e as estratégias de testagem propostaspor Yin (1994). Mais precisamente, apresenta-se um único caso – a empresa YDreams –, pelo que aunidade de análise é a organização/empresa como um todo. O caso em estudo foi seleccionado atravésde critérios, nomeadamente, (1) escolheu-se a empresa YDreams por ser um caso típico onde existiainformação prévia de existência de determinadas práticas de aprendizagem, (2) por se tratar de umaempresa pertencente ao sector de actividade das tecnologias e (3) a localização geográfica da mesma.

Os métodos e técnicas de recolha de dados foram as entrevistas pessoais e a observação par-ticipante, para triangulação de dados (Patton, 1990). Trata-se de fonte de informação típicas de umestudo de caso e de investigação-acção. O guião (protocolo) da entrevista foi desenvolvido baseadona extensa literatura consultada e nas dimensões do modelo proposto. A análise de documentos,formais e informais, cedidos pela empresa estudada, foi também outro método de recolha de dados.As entrevistas tiveram um tempo de duração cerca de 60 minutos e tiveram lugar em Janeiro de 2006.

A organização e interpretação dos dados obedeceram aos seguintes passos: (i) pré-análise, queconsistiu na organização e teve por objectivo operacionalizar e sintetizar as ideias iniciais; (ii)explorou-se o material, que consistiu em operações de codificação e enumeração, em face de regraspreviamente formuladas; (iii) tratou-se os dados obtidos e a sua interpretação, onde foram utilizadosfiguras para a condensação e destaque das informações obtidas para a análise. Mais precisamente, ainterpretação e a análise dos dados recolhidos foram tratadas com base no que os inquiridos disseram(interpretação de primeira ordem) e subsequente validação (interpretação de segunda ordem). Final-mente, foi aplicado o significado teórico para a obtenção de evidência empírica (Newman, 1994). Nesteúltimo procedimento, foi adoptada a análise de conteúdo como a técnica mais frequente (Bardin, 1995).Tal como refere Minayo et al. (1994), esta técnica é a expressão geralmente mais utilizada pararepresentar o tratamento dos dados de uma investigação qualitativa.

4. Estudo de caso

4.1. Caracterização da Empresa

A YDreams é uma empresa portuguesa fornecedora de soluções tecnológicas, fundada emJunho de 2000 por especialistas de renome internacional dentro das áreas de tecnologia de infor-

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Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

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mação, das telecomunicações, em processamento de imagens, em sistemas de informação geográ-ficos e na engenharia ambiental. A empresa encontra-se sedeada em Almada e assume o estatutojurídico de Sociedade Anónima. Atendendo ao critério do número de trabalhadores, esta empresa éconsiderada de média dimensão, já que emprega 60 trabalhadores.

Trata-se de uma empresa que desenvolve tecnologia pioneira e cria patentes tecnológicas nosdiversos campos, nomeadamente, na optimização de rotas, spatial data mining, augmented reality,assim como software de efeitos especiais para a indústria cinematográfica.

A YDreams desenvolve produtos, soluções para os clientes e serviços para quatro mercadosprincipais, através de quatro divisões independentes: publicidade, entretenimento, educação e culturae ambiente. Mesmo assim, a YDreams ajuda algumas das maiores corporações globais e cria novosmercados, baseando-se por padrões standard da qualidade, dedicação e por uma visão a longo prazo.Durante os últimos cinco anos, a YDreams construiu uma reputação no uso criativo da tecnologia, emPortugal e em todos os restantes mercados onde a empresa opera, que incluem os Países Baixos, França,Espanha, Reino Unido, Alemanha, China e Brasil.

A equipa da YDreams inclui peritos qualificados em diversas áreas, cuja experiência e criati-vidade garantem a execução eficaz de projectos de elevado perfil. Trata-se de uma empresa cujo graude habilitações predominante dos seus colaboradores é licenciado.

4.2. Análise e Interpretação da Informação Recolhida

O estudo de caso (YDreams) teve como principal fonte de informação uma entrevista a trêscolaboradores da empresa, que foram registadas com a sua autorização.

Tiago Fonseca, director de Produção, é detentor de uma licenciatura em Engenharia Informáticae está na empresa desde a sua fundação.

Nuno Ferreira possui uma licenciatura em Gestão de Recursos Humanos e é técnico de recursoshumanos (R.H.) da empresa, e encontra-se nesta desde 2005.

Por último, João Batalha é Gestor de Projecto da empresa, tem 26 anos e uma licenciatura emInformática e Gestão de Empresas, e está na YDreams desde 2002.

A apresentação e interpretação da informação recolhida foram organizadas tendo em contaas dimensões do modelo proposto.

Cultura organizacional. Na YDreams, a cultura é bastante informal, baseia-se no espírito deescritório open space, onde todos os colaboradores cooperam em conjunto caso tenham alguma dúvidaou ideia para expor. Desde cedo (no processo de recrutamento), a empresa tem a noção do que procurano candidato, ou seja, alguém que se adapte com facilidade a esse ambiente informal, mas ao mesmotempo responsável.

Segundo o director de Produção e o técnico de R.H. da YDreams, a cultura da empresa é “umacultura aberta, transversal e horizontal; no dia a dia, não se dá conta pelos níveis hierárquicos,todos falam com toda a gente... Gostamos de brincar, partilhar ideias, gostamos que as pessoasparticipem todas em tudo e aproveitem as capacidades uns dos outros”. O Gestor de Projecto (João

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Batalha) partilha esta ideia, ou seja, “a cultura da YDreams é aberta, muito informal e as pessoasadaptam-se facilmente.”

Como referem Chiva Goméz e Camisón Zorzona (1999) e López Salazar e López Sanchéz (2001),as organizações que aprendem necessitam de uma cultura, onde todos os indivíduos, sem excepção,compartilhem os valores culturais, confiem nos seus colegas e superiores, estando satisfeitos com oseu trabalho, comprometidos com este e com os quais que participam nele, dispostos a inovar e apermanecer na organização. Além disso, são mais pró-activos do que reactivos, evoluindo desde asua adaptabilidade à sua criatividade.

No que se refere à identificação por parte dos colaboradores da empresa com os objectivos evalores, tanto Tiago Fonseca como Nuno Ferreira comentam que a maior parte dos “colaboradorestem uma noção destes aspectos, isto porque, logo no processo de recrutamento e nas entrevistas,tentamos passar a mensagem e perceber se as pessoas entenderam bem o tipo de valores e cultura quequeremos continuar a perpetuar. Deste modo, as pessoas ao entrarem na empresa a sua adaptação érápida e fácil, porque as próprias pessoas identificam-se e gostam daquilo que nós mostramos. Acultura é bastante descontraída, porque a adaptação é muito rápida”.

“Também se identificam com os objectivos e valores, porque existe uma newsletter semanalem que se divulgam as novidades, os projectos que existem e que terminaram. Temos um mail geralque informa quando existe sucesso ou insucesso”. João Batalha confirma o anteriormente citadoembora ache que “antes, os colaboradores não tinham tanto a noção dos valores e objectivos comotêm agora.”

De facto, a comunicação como fonte e instrumento de poder tem claras correlações com a culturaorganizacional. Esta pode ser compreendida enquanto um conjunto de valores e pressupostos básicos,expressos em elementos simbólicos. A sua capacidade de ordenar, atribuir significações para construira identidade organizacional, age tanto como elemento de comunicação e consenso, como instrumen-taliza as relações de dominação (Fleury & Fleury, 1997).

Existe também um clima de confiança entre os superiores e entre os colaboradores na YDreams.Após a entrevista feita, em simultâneo, com Tiago Fonseca e Nuno Ferreira, estes referem: “tem dehaver total confiança; a diferença reside nas responsabilidades, e no poder de tomada de decisão.O trabalho no dia a dia é entre colegas, o que difere é o poder de decisão de cada um.” João Batalhaestá de pleno acordo com os colegas anteriores, pois “na empresa o clima de confiança predominaentre todos e a todos os níveis.”

De referir que a mudança/adaptação, inovação e criatividade são aspectos tidos em consideraçãona YDreams, isto porque os colaboradores conseguem lidar facilmente com a mudança, mesmo tendoa empresa sofrido várias reorganizações em cinco anos. “Começou com cinco pessoas e agora temsessenta colaboradores. Trata-se de uma empresa altamente flexível; todos os dias estamos em mudançae adaptação” (João Batalha).

Júnior e Vasconcelos (2004) constatam que, nas organizações de aprendizagem, as pessoas nãosão treinadas para exercerem as suas funções, mas sim educadas a desempenharem com maior satis-fação as suas actividades, desenvolvendo o espírito de equipa e criatividade, sendo respeitadas na suaindividualidade e autonomia, desenvolvendo assim um trabalho com excelência. O ambiente em si,

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nestas organizações, favorece a criação de objectivos em comum, ou seja, que sejam partilhados portodos os indivíduos, o que gera um sentimento de colectividade que contribui para a participação daspessoas de forma activa na resolução de problemas.

Tanto Nuno Ferreira como Tiago Fonseca realçam que “os trabalhadores estão sempre à procurade projectos interessantes. Quando fazemos o recrutamento desejamos que as pessoas tenham ambição,para trabalhar em projectos e procurarem coisas que ainda não tenham sido feitas; tentamos logoà partida encontrar pessoas com esse perfil. Também, dentro da empresa, existem reuniões com asdiversas áreas funcionais; fazemos vários brainstormings gerais, onde estão presentes os respon-sáveis das quatro áreas de negócio, isto porque podem gerar-se novas ideias.”

Em conformidade com o Gestor de Projecto, os colaboradores tem tendência a superarem-se,“porque a nossa área de negócio é muito competitiva. Embora esta iniciativa não esteja presenteem todos os colaboradores, existem muitos que, quando tem uma ideia, propõem-na e muitas vezesexecutam-na”. Ainda para João Batalha, “a maior parte das propostas de projectos que nos pedemtêm de passar pela parte criativa. Muitas vezes, o cliente tem esse objectivo, mas somos nós quetemos de criar os meios de o alcançar”.

Resumindo, para as empresas se tornarem em organizações que aprendem devem acima de tudo,segundo Chiva Goméz e Camisón Zorzona (1999), atribuir maior importância aos aspectos mais visíveise reconhecidos da cultura organizativa, embora a sua interpretação seja muito complicada. A confiança,os valores e os objectivos, a comunicação, a implicação do indivíduo, a sua satisfação laboral, o com-promisso (Nevis et al., 1995), a superação no trabalho, a tendência da resistência à mudança a proacti-vidade e a implementação das suas contribuições, o ambiente laboral e os mecanismos de avaliação,são aspectos a considerar para uma empresa caminhar para uma organização aprendiz.

Desenho/Estrutura Organizacional. A YDreams possui uma estrutura mecanicista (clássica),onde a formalidade não se nota no dia-a-dia, daí os próprios colaboradores afirmarem que se tratade uma estrutura completamente horizontal (orgânica), onde as pessoas têm contacto directo comos superiores.

Segundo Tiago Fonseca e Nuno Ferreira, a estrutura da empresa “é horizontal; possuímos umorganigrama como uma empresa mais formal, mas no dia-a-dia a estrutura e as relações interpes-soais são informais”.

Em relação ao trabalho em equipa e colaboração, existe a preocupação da empresa em apostarno trabalho em conjunto, o que proporciona na mesma uma maior criatividade e envolvimento porparte dos colaboradores. Esta empresa está a deixar de adoptar os modelos de trabalho individual, istoé, recusa que as pessoas permaneçam isoladas no seu local de trabalho. Como refere Kanter (2000), aindividualidade não sobreviverá no futuro, mas poderá ter o seu lugar. Contudo, as aptidões dasequipas serão necessárias, a capacidade de trabalhar com outras pessoas em pé de igualdade, o respeitopara com as suas contribuições e a capacidade de ouvir as suas ideias, entre outros aspectos, bemcomo o trabalho em cooperação com outras pessoas será essencial.

Na YDreams a maior parte do trabalho realizado é por equipas. De acordo com o Director deProdução e o técnico de R.H., “depende do tipo de projectos, alguns são individuais e outros sãoconstituídos por muitas pessoas e podem afectar diversas áreas, mas basicamente todas as áreas

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cruzam-se. No que respeita à autonomia das equipas em escolherem os seus membros, esta encontra-semuito centrada na selecção do Gestor de Projectos e decide-se qual a equipa. O Gestor de Projecto éque escolhe a equipa”.

João Batalha diz mesmo que: “costumamos trabalhar por equipa, mas depende sempre do tipode projecto que temos em mãos (…). A escolha dos membros da equipa é realizada pelo Gestor deProjectos e centra-se na capacidade das pessoas e também na disponibilidade das mesmas,porque, muitas vezes, estas estão em vários projectos ao mesmo tempo e não queremos subar-rendá-las de trabalho.”

Nesta perspectiva, Boyett e Boyett (2003) realçam que as equipas são o alicerce das organi-zações com alto desempenho e que é impossível atingi-lo sem elas, por mais que se tente.

Uma outra componente subjacente à estrutura/desenho organizacional é a gestão participativa,já que esta não pode existir sem o trabalho em equipas. Queiroz (1996: 95) complementa a seguinteteoria: “a formação de equipas deve ser precedida por um processo de base de amadurecimentoindividual, que consiste num grande passo para a motivação dos trabalhadores”.

Os objectivos das equipas/grupos na YDreams estão também relacionados com os projectosem si, mas são definidos em “conjunto, com o Gestor de Projectos e a pessoa que o defendeu e o cliente.Quem gere o tempo e as pessoas é o Gestor de Projecto, mas quem gere o projecto do cliente é oresponsável de vendas”, adiantam Tiago Fonseca e Nuno Ferreira. Para João Batalha, “existem reuniõesonde se estabelecem os prazos, são definidas as metas e depois há reuniões de acompanhamentopara ver se os objectivos estão ou não a ser atingidos”.

Ao questionar-se o director de produção e o técnico de R.H. sobre a liberdade dos colaboradoresem tomar decisões sem consultar o superior, estes realçam que “os trabalhadores têm determinadaliberdade para tomar decisões sem consultar o seu superior, isto porque há vários tipos de decisão.As decisões importantes são definidas no início do projecto e depois têm as linhas para seguirem;se têm dúvidas, consultam o Gestor de Projecto, mas a maior parte das vezes têm liberdade para tomaras suas decisões sem terem que estar sempre a recorrer ao superior. Têm uma certa autonomia.”

Para João Batalha, “muitas vezes, temos de ser nós a tomar as decisões que são importantespara o projecto e que têm de ser tomadas na hora, o que nos confere um certo grau de autonomiae de responsabilidade.”

Em suma, uma estrutura flexível, informal e, acima de tudo, descentralizada, são requisitos essenciaispara as organizações que aprendem.

Partilha de Informação. No que respeita à partilha de informação/conhecimento, na YDreamsa informação que não é utilizada, não é considerada “nula”. Tiago Fonseca e Nuno Ferreira declaram:“às vezes, pode acontecer recolher informação que não é importante para o projecto em causa,mas mais tarde pode ser relevante para outro, por isso não encaramos como tempo perdido essarecolha de informação, apenas não serve no momento”. João Batalha é da mesma opinião que oscolegas, “toda a informação é considerada útil, isto porque mais cedo ou mais tarde vamos acabarpor utilizá-la.”

Na YDreams existem regularmente reuniões com os diversos Departamentos para organizar etransmitir informação. Segundo o Director de Produção o Técnico de R.H. e o Gestor de Projecto, “quando

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Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

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é necessário, existem reuniões gerais e isto é mais normal ocorrer, quando existe alguma mudança.Depois, existem as transmissões de informação mais informais que ocorrem no dia a dia na empresa.”

No que respeita ao conhecimento útil para a tomada de decisão por parte dos colaboradores é-lhesfacultado facilmente, embora, muitas vezes, seja transmitida de uma forma informal. “Oralmente temosliberdade para discutir com a pessoa responsável. Assim, esse conhecimento/informação é trans-mitida pelo grau de participação e nível de responsabilidade que cada pessoa tem e, pelo trabalhono dia a dia, que compreende e identifica qual o tipo e nível de decisão que pode praticar. Resumindo,a informação todos nós temos e partilhamos em qualquer momento na empresa” (Tiago Fonseca eNuno Ferreira).

De acordo com João Batalha, existe uma pequena falha de comunicação ao “nível dos objec-tivos finais de cada projecto. Na empresa, existe o fórum, onde se coloca a informação que as pessoasrecolhem na Internet, desde assuntos relacionados com algum projecto, até aos cursos de formação,colóquios, conferências, entre outros.”

Cohen e Levintal (1990) afirmam que as empresas não devem atribuir valor apenas aos produtos,mas fundamentalmente no saber e conhecimentos dos seus colaboradores. A criação de um centro deaprendizagem, onde o colaborador pode desenvolver as suas habilidades é um passo importante, poisgera satisfação e motivação. A possibilidade do pensamento criativo surgir dentro das organizaçõesque valorizam o capital humano é sinal de prosperidade e de crescimento, porque o acumular de conhe-cimento nunca é demais.

Liderança. A selecção do líder para os projectos da empresa YDreams é, geralmente, feita pelosGestores de Projecto. Estes assumem o papel de líder, uma vez que vão ficar responsáveis pelo projectoem causa; estes são escolhidos, através de diversos parâmetros de selecção (a sua experiência, o tipode projecto e a sua disponibilidade).

No que diz respeito à selecção do líder na YDreams, Tiago Fonseca e Nuno Ferreira argu-mentam que estes são escolhidos baseado, “no tipo de projecto, pois tentamos afectar as pessoaspara projectos que se identifiquem. O líder, normalmente, é o Gestor de Projecto que é uma pessoaresponsável que controla diariamente o projecto”. O mesmo foi afirmado por João Batalha, “é ogestor de projecto que assume o papel do líder.”

O Director de Produção e o Técnico de R.H. sublinham que os líderes fornecem informaçãosuficiente e guiam os colaboradores para atingirem os seus objectivos. “Mais uma vez, os objectivossão fornecidos às pessoas e são controlados pelo Gestor de Projecto. É este que tem de definir osobjectivos da equipa, por esta razão, o líder tem de ser uma pessoa pró-activa, com cabeça, criativoe democrático, que esteja dentro da cultura da empresa, que saiba delegar tarefas e seja partici-pativo. Na YDreams não temos líderes autoritários.”

Tiago Fonseca e Nuno Ferreira, no que toca à motivação dos colaboradores, referiram que: “fazemosum acompanhamento diário; não há nada formal, mas as pessoas ao trabalharem em grupo, sabemperfeitamente como está a moral do grupo. As pessoas estão à vontade para dizer se estão bem oumal com alguma coisa, têm à-vontade para dizerem seja o que for. Faz parte da cultura e está enraizadonas pessoas. Também não existe absentismos na empresa visto que não temos horários fixos. Quandonão puderem vir trabalhar compensam noutro dia, isto é, sempre uma situação que é autorizada”.

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De acordo com João Batalha, as pessoas na empresa encontram-se motivadas, “todos sabemos quaisos nossos objectivos e tentamos a todo o custo alcançá-los. No que respeita ao absentismo, este nãose nota porque temos um horário flexível e como as chefias trabalham muito perto dos trabalhadoresestes notam a falta, quando ele existe.”

Resumindo, os membros de uma organização que aprende devem ser vistos como os princi-pais recursos, já que são eles os responsáveis máximos pela aprendizagem organizacional. Deste modo,a organização deve assumir como necessário pessoas com valores e uma cultura assente na aprendizageme evitar a sua fuga. Para que isso aconteça, é necessário a empresa ser encarada como um local ondeas pessoas criativas gostem de estar e colaborar.

No Quadro 1 faz-se uma síntese sobre o caso estudado, atendendo às dimensões e variáveis queconstam no modelo seguido.

4. Considerações finais

De acordo com o estudo realizado, conclui-se que uma organização para alcançar um processoaprendizagem contínuo necessita sofrer mudanças nas suas práticas ao nível de gestão, a saber:

1. As organizações que aprendem necessitam de uma cultura onde todos os indivíduos, semexcepção, compartilhem dos valores organizacionais. Um clima de confiança e de respeitoaceitável entre todos os intervenientes e aspectos como a mudança/adaptação, inovação ecriatividade são factores a ter em consideração.

2. A estrutura da organização que aprende deve ser flexível, adaptável e descentralizada. Trata-sede uma estrutura achatada, onde as equipas inter-funcionais estão presentes. Os colabora-dores, em geral, participam nas decisões e a flexibilidade desse tipo de estrutura permite arápida adaptação às mudanças.

3. A partilha de informação/conhecimento pode considerar-se como o principal capital das

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Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

Quadro 1Resumo dos Parâmetros do Modelo

Empresa YDreams

Cultura organizacional - Informal Partilha de informação - Utilização correcta da informação- Aberta e conhecimento - Informação facultada- Proactividade - Redes de relacionamento- Partilha de Valores - Criatividade e inovação

Estrutura organizacional - Horizontal/orgânica Liderança - Iniciativa à polivalência/delegação- Trabalho por equipas - Lideres informam quais os objectivos- Cooperação - Liderança compartilhada- Gestão Participativa

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organizações e encontra-se, efectivamente, no conhecimento individual dos colaboradores ena capacidade em aprender e inovar colectivamente.

4. Numa época de revolução tecnológica e mutações crescentes, a liderança torna-se cada vezmais crucial, na medida em que representa o elemento impulsionador de mudanças e é a forçabásica por detrás de uma mudança bem sucedida. O líder, através de uma comunicaçãocorrecta e de um adequado esforço de reconhecimento, precisa estar constantemente preo-cupado em manter a motivação do seu liderado. Quanto maior a participação do trabalhador,maior é o seu compromisso tanto com o trabalho como com a organização.

5. A aplicação de procedimentos e mecanismos de gestão que se aproximam do fenómeno daaprendizagem organizacional, bem como mudanças no comportamento dos responsáveispodem permitir um reforço da competitividade da sua organização.

Com base nesta investigação empírica, concluiu-se ainda que a empresa estudada (YDreams)já possui muitas das características das organizações que aprendem. Mais concretamente, paraalcançar esta mudança de paradigma organizacional, torna-se fundamental que a própria liderançadas organizações entenda e concorde colectivamente com a lógica de reestruturação organizacionalproposta e que este novo desenho e cultura organizacional, bem como todas as implicações que possamadvir, sejam explicadas e partilhadas claramente à totalidade dos colaboradores que fazem parte daorganização.

De sublinhar ainda que a principal limitação deste trabalho está associada com o facto de se abordarum fenómeno que está inserido num contexto de permanente mudança e instabilidade e que podeter afectado este estudo de caso. Contudo, o objectivo não foi desenvolver e propor um modelo idealde organização que aprende, mas abordar reflexões e as formas de comportamentos organizacionaisque podem levar a atitudes que estão próximas deste paradigma organizacional.

Uma outra limitação subjacente ao presente estudo foi a realização de um único caso, que emboraseja o mais apropriado para o estudo deste fenómeno (de natureza social), apresenta certas desvan-tagens, ou seja, não permite a generalização. Como refere Gil (1999), a impossibilidade de genera-lização dos resultados obtidos com o estudo de caso constitui uma limitação deste tipo de procedimentometodológico.

Como sugestões para futuras investigações podem ser apresentadas aquelas que possam aprofundarmelhor os resultados e as conclusões obtidas neste estudo. Assim, uma sugestão é a realização deoutros casos de estudo adoptando como metodologia a investigação-acção. Trata-se de uma modali-dade de investigação cujo objectivo é promover a mudança, invocada aqui, no campo organizacional.

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Abstract. Face to the actual organizational environment, firms are intended to achieve a climate inthe organization that makes possible the implementation of innovation behaviours, creativity andcontinuous learning. This paper aims at understanding procedures and mechanisms that an organi-zation should adopt to meet a new organizational paradigm – learning organizations. In this research,based on four dimensions (1) Organizational Culture, (2) Organizational Design, (3) Share ofInformation and (4) Leadership, a conceptual model of “learning organization” was proposed. Tovalidate this model, an approach of qualitative research close action-research was adopted. For thestudy, a single case was selected – YDream firm. In the empirical research the following sources wereadopted: interview, direct observation and documental analysis. The results support that an organi-zation, to achieve a new paradigm – learning organization, needs to apply changes in its policy. It’scrucial that leadership understands and agrees collectively with the logic of organizational restruc-turation proposed, and that this new organizational structure and culture, as well as all the implicationsthat can happen, must be explained and shared clearly with all collaborators who belong to the orga-nization. Future researches, in this field, should proceed to other case studies, at a deeper degree, usingan action-research methodology. This research method aims at foster changes in organizational field.Key words: Learning organization, model, competitiveness, culture, action-research.

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Um estudo de caso sobre as organizações que aprendem

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Resumo. A generalidade dos autores que se dedica ao estudo da gestão do conhecimento sustenta aexistência de uma relação entre esta e o desempenho organizacional, numa óptica de criação e manu-tenção de vantagens competitivas sustentáveis. Neste artigo apresentamos um modelo de equaçõesestruturais, através do qual se procura testar, na globalidade e para a mostra estudada (50 organizaçõesindustriais do Distrito de Viseu), a validade do pressuposto teórico enunciado, avaliando relaçõesde dependência ou interdependência simultâneas entre um conjunto de variáveis que evidencioupossuir relações de maior magnitude em estudos prévios e no âmbito dos quais utilizámos análisesde regressão múltipla. Os resultados obtidos sugerem a existência de um impacto positivo da gestãodo conhecimento na competitividade organizacional, reforçando as conclusões retiradas a partir dasanálises de regressão múltipla previamente realizadas, e sustentando empiricamente o modelo teóricode que partimos.

Palavras-chave: Gestão do conhecimento, competitividade organizacional, modelo de equações estru-turais, questionário de gestão do conhecimento, indicadores de desempenho organizacional.

Introdução

Até à década de 1980, pouca importância era atribuída ao conhecimento como um “activo”,um “capital” ou um “bem” organizacional. Actualmente, este constitui um recurso valioso e insubs-tituível enquanto força motriz das empresas que actuam, cada vez mais, em contextos marcadamenteincertos e imprevisíveis e onde a gestão estratégica da informação é recompensada, bem como aimprovisação, a inovação e a apropriação do conhecimento. De facto, num mundo onde os mercados,os produtos, a tecnologia e a própria sociedade se transformam a um ritmo vertiginosamente acelerado,

191

COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL E GESTÃO, 2007, VOL. 13, N.º 2, 191-211

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional:Um modelo estrutural

Leonor Cardoso

Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, Universidade de Coimbra

Endereço: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, NEFOG - Núcleo de Estudo e Formaçãoem Organização e Gestão, Rua do Colégio Novo, Apartado 6153, 3001-802 Coimbra, Portugal. E-mail: [email protected]

Page 41: COG -13-2

o conhecimento tem vindo a assumir o papel de principal fonte de vantagem competitiva sustentável

(e.g., Davenport & Prusak, 1998; Nonaka, 1990, 1991, 1994, 1997, 1998; Nonaka & Johansson, 1985;

Nonaka & Konno, 1999; Nonaka & Senoo, 1998; Nonaka & Takeuchi, 1994, 1995; Nonaka, Konno,

& Kosaka, 1993; Nonaka & Teece, 2001; Sveiby, 1997, 1999). É neste contexto que emerge o conceito

de gestão do conhecimento e a sua relevância actual tem que ver com a importância atribuída à capa-

cidade de identificar os atributos empresariais responsáveis pela criação e manutenção do conhecimento,

bem como com o reconhecimento do seu valor, raridade, inimitabilidade e insubstituibilidade.

Contudo, apesar do actual enfoque na gestão das empresas orientada para o conhecimento e

do reconhecimento da necessidade de uma nova teoria nele fundamentada que permita repensar as

organizações, não é ainda muito clara a forma como as empresas podem gerar e gerir o seu conheci-

mento, facto decorrente de um ainda existente défice de compreensão acerca da sua natureza e dos seus

processos. De facto, a “gestão do conhecimento”, de que actualmente muito se fala, corresponde a

maior parte das vezes a uma mera “gestão da informação”, situando-se no prolongamento de uma

longa tradição ocidental que tem encarado as empresas como “máquinas que processam infor-

mação”, oriunda da sua envolvente, e que têm em vista a resolução de problemas e a adaptação

organizacional. Esta perspectiva traduz uma visão estática ou um tanto passiva de organização, que

por isso fracassa no reconhecimento da dinâmica inerente ao processo de criação do conhecimento.

Ao operarem, as empresas deparam-se, inevitavelmente, com problemas que carecem de solução.

Ao longo deste processo de decisão, desenvolvem e aplicam progressivamente novo conhecimento,

não se limitando a processar informação, constituindo-se antes como entidades criadoras de conhe-

cimento, através das acções e interacções que empreendem e vão concretizando. Neste sentido, as

empresas sobrevivem e prosperam porque estão continuamente a gerar novo conhecimento. Ao longo

deste processo de criação, interagem com o seu ambiente, reformulando-o e reinventando-se (Nonaka,

1998). É neste contexto que uma mais eficaz abordagem à gestão do conhecimento concebe as organizações

como “entidades criadoras de conhecimento” (Nonaka, 1990, 1991, 1994, 1997, 1998; Nonaka et al.,

1985, 1993, 1994, 1995, 1998, 1999, 2001), realça a importância do papel que nelas desempenham as

pessoas, a sua acção individual e grupal, o conhecimento que geram e o contributo que tal conhecimento

representa para as empresas em que trabalham.

O reconhecimento do valor e da importância do conhecimento nos processos produtivos e na

formulação de estratégias de gestão, a sua inclusão nos processos de avaliação das empresas, assim

como a sua revalorização ou a sua crescente cotação na “economia do conhecimento”, tem igual-

mente suscitado iniciativas e originado controvérsias nas quais a gestão do conhecimento ocupa um

lugar central. O ambiente competitivo em que aos “trabalhadores do conhecimento” é prestada maior

atenção e em que lhes é atribuída maior relevância para o desempenho organizacional contribui para

reequacionar práticas de gestão de recursos humanos e repensar o papel que o conhecimento ocupa

nos modelos que enquadram essas práticas. De facto, dada a sua natureza intangível, é difícil iden-

tificar e medir o valor do conhecimento incorporado nos bens ou serviços que uma dada organização

produz, bem como nas competências e experiências dos colaboradores que viabilizam a sua compe-

titividade. Para além disso, o conhecimento em utilização não se deixa com facilidade codificar ou

quantificar e/ou não é tido em conta nos procedimentos contabilísticos habitualmente utilizados.

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Cardoso

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No entanto, porque constitui uma importante fonte de vantagem competitiva sustentável, torna-senecessário desenvolver formas de identificação, criação, avaliação e aplicação deste recurso, bem comoconceber sistemas adequados à sua gestão (e.g., Bontis, 1996; Brooking, 1997; Edvinsson & Malone,1997; Huseman & Goodman, 1999; Kaplan & Norton, 1996; Petty & Guthrie (2000); Stewart, 1997;Sveiby, 1997).

A gestão do conhecimento, enquanto atitude de gestão, constitui um processo que integra naestratégia organizacional a gestão das pessoas e das tecnologias de informação e comunicação (Davenport& Prusak, 1998; De Long, 1999; Soliman & Spooner, 2000; Zuboff, 1988), visando a promoção daaprendizagem organizacional integrada, recorrendo a informações colhidas junto de colegas,clientes, fornecedores, concorrentes, etc., de forma a utilizarem-se, no momento certo e mais rapi-damente do que a concorrência, os resultados do seu tratamento e síntese. Deste modo, cabe à gestãode topo das empresas o primeiro compromisso para com o conhecimento, que deve reflectir-se nodesenvolvimento de um conjunto de processos que vise e estimule a aquisição, partilha e utilizaçãodo conhecimento dentro da sua estrutura, de modo a acelerar e melhorar a resolução de problemase a tomada de decisão. Estes processos, mais culturais do que tecnológicos, deverão fomentar umambiente de trabalho que enfatize e premeie o compromisso global de todos os colaboradores paracom o conhecimento e a sua indispensável partilha.

Neste contexto, propusemo-nos realizar uma investigação com o objectivo de sustentarempiricamente a validade do pressuposto teórico anteriormente enunciado, segundo o qual a gestãodo conhecimento constitui uma fonte de vantagem competitiva sustentável ou, dito de outra forma,que a gestão do conhecimento promove a competitividade organizacional. Assim, afigurou-se-nospertinente avaliar em que medida a competitividade de uma dada organização poderá ser prevista apartir das percepções dos seus actores relativas à operância (ou à maior ou menor presença) de umconjunto de processos relacionado com o modo como o conhecimento organizacional é gerido.Tomámos portanto como objectivo avaliar a capacidade preditiva da gestão do conhecimento,medida através de um questionário de gestão do conhecimento por nós construído – o GC1 –, face aum conjunto de indicadores de competitividade2 –, designadamente indicadores de natureza económica(económico-financeiros, comerciais e produtivos), social e ambiental (Quijano, Aparicio, Bonavia, Masip,Navarro, & Ruiz, 1997).

Para o efeito, considerando como variáveis preditoras os quatro factores que constituem aestrutura tetradimensional do GC (que adiante explicitaremos) e como variável critério os resultadosobtidos nos indicadores de competitividade, procurámos sustentar empiricamente as relações teori-camente estabelecidas entre estas variáveis, aproveitando as potencialidades oferecidas pelas análisesde regressão múltipla.

Importa no entanto salientar que no respeitante aos resultados ambientais não recorremos a

193

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

1 GC é o acrónimo de Questionário de Gestão do Conhecimento. Para informações mais detalhadas acerca do processode construção e validação deste instrumento de medida pode consultar-se Cardoso, Gomes e Rebelo (2005).

2 Uma descrição exaustiva da operacionalização do conceito de competitividade encontra-se explicitada em Cardoso(2003, pp. 282-298).

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este tipo de análise, tendo antes procedido a uma análise da variância, no âmbito da qual procurámosaveriguar da existência de diferenças na percepção dos participantes, a propósito da aplicabilidadedos processos de gestão do conhecimento nestas organizações em função da variável em questão. Estadecisão decorreu dos dados a este respeito recolhidos que foram elucidativos quanto ao reduzidonúmero de organizações certificadas em termos ambientais, não obstante o reconhecimento de queo exercício da actividade implicava preocupações com o ambiente por parte de um número signifi-cativo de organizações.

As análises de regressão que realizámos permitiram-nos concluir que a gestão do conheci-mento evidenciou capacidades preditivas dos resultados organizacionais quer ao nível económico(económico-financeiro, comercial e produtivo), quer social. Acresce que se verificaram diferenças napercepção dos inquiridos quanto à incidência dos processos relacionados com a gestão do conhecimento,em função da variável respeitante às preocupações com o ambiente decorrentes do exercício de umaactividade organizacional com implicações ambientais (Cardoso, 2003).

Posteriormente, recorrendo a um modelo de equações estruturais, decidimos avaliar, na globa-lidade e para a mostra estudada, a existência de relações de dependência ou interdependência simultâneasentre o conjunto das variáveis que apresentou relações mais significativas aquando da realização dasanálises de regressão múltipla. A decisão de recorrer ao modelo de equações estruturais foi decorrentedo facto de se considerar esta metodologia particularmente indicada para auxiliar os investigadoresna formulação mais adequada e na validação da teoria subjacente aos processos de investigação,possibilitando igualmente uma compreensão exploratória dos dados em análise (Hughes, Price & Mars,1986). É dos resultados alcançados com este procedimento que, seguidamente, nos propomos darconta.

Método

Amostra

Para a realização deste estudo foram recolhidos dados em cinquenta organizações industriaisdo Distrito de Viseu3. Recolhemos e tratámos dados organizacionais documentados (relativos ao desem-penho organizacional e, por tal, disponibilizados pelo topo estratégico das organizações) e não docu-mentados (respeitantes à gestão do conhecimento e à qualidade de vida no trabalho, tendo estes sidorecolhidos mediante questionários administrados à generalidade dos colaboradores).

Assim sendo, nestas 50 organizações, para além das entrevistas estruturadas realizadas juntodos seus órgãos de direcção/gestão, foram distribuídos 1824 questionários, recolhidos 1547, tendosido analisadas as respostas de 1275 participantes.

194

Cardoso

3 Para uma caracterização pormenorizada da amostra pode consultar-se Cardoso (2003, pp. 230-247).

Page 44: COG -13-2

Medidas

A gestão do conhecimento foi medida através do GC, questionário composto por 32 itens (α=.93)e que evidencia uma estrutura tetradimensional, designadamente: Factor 1 – Práticas de gestão doconhecimento (congrega as acções organizacionais desenvolvidas em torno dos processos formalmenteinstituídos, centrados num conhecimento de natureza maioritariamente explícita – 10 itens; α=.88);Factor 2 – Orientação cultural para o conhecimento (reflecte um quadro que serve de orientaçãopara as práticas, regras, normas e procedimentos instituídos – 11 itens; α=.86); Factor 3 – Gestãosocial e discursiva do conhecimento (traduz as interacções, informais, que ocorrem na organizaçãoe que facilitam a construção social do conhecimento – 6 itens; α=.79); e Factor 4 – Gestão estraté-gica do conhecimento (reflecte uma orientação para o exterior por parte da organização – 5 itens;α=.76). As respostas foram dadas numa escala de tipo-Likert de 5 pontos, com uma amplitude de 1(Quase nunca se aplica) a 5 (Aplica-se quase totalmente).

Os resultados económicos concernentes à competitividade organizacional foram medidospela rendibilidade do activo4 (REAT – R2 = .37) no que respeita aos resultados económico-financeiros,pela taxa de crescimento real média5 (TCR_M – R2 = .27), relativamente ao desempenho ao nívelcomercial e pela produtividade por colaborador6 (PRDTV – R2 = .41), no que concerne aos resultadosprodutivos. Para a determinação dos resultados das organizações estudadas nestes indicadores,determinou-se o seu desempenho em cada um de três anos consecutivos (de forma a garantir umacerta “sustentabilidade” da performance em questão) tendo-se, posteriormente, obtido um resultado médioglobal. Os dados relativos a estas variáveis foram recolhidos através da aplicação do DO7, que cons-truímos e validámos.

Os resultados concernentes à competitividade organizacional, mas respeitantes à qualidade devida no trabalho foram avaliados através do Factor 1 (motivação e suporte) do QVT8 que adaptámose validámos (a versão definitiva é constituída por 9 itens e possui uma estrutura bi-dimensional –α=.81). O referido Factor 1 integra questões motivacionais relativas ao próprio trabalho desenvolvidopelos participantes e ao apoio ou suporte prestado por colegas e chefias (5 itens; α=.75). As respostasforam dadas numa escala de tipo-Likert de 5 pontos, com uma amplitude de 1 (Discordo muito) a 5(Concordo muito).

195

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

4 A rendibilidade do activo mede a rendibilidade dos capitais totais investidos na organização, independentemente darespectiva origem (próprios ou alheios), em função do resultado líquido gerado. Pode calcular-se através da seguinte fórmula:rendibilidade do activo = resultado líquido do exercício/activo*10.

5 A taxa de crescimento real das vendas avalia a evolução real do volume de negócios das organizações, depois de dedu-zido o desvio provocado pela inflação registada nos anos analisados. Para a sua determinação utilizou-se a fórmula de Fisher(Rodrigues & Nicolau, 1995, p. 267): (1+tn) = (1+tr) x (1+tp), em que tn = taxa nominal; tr = taxa real e tp = índice de preçosao consumidor.

6 Este indicador remete para o impacto do factor trabalho na evolução da produtividade ou, dito de outro modo, determi-na o contributo de cada colaborador para o nível de actividade da organização no espaço temporal em análise. Calculámo-laatravés da seguinte fórmula: Produtividade por colaborador = volume de negócios/número de colaboradores.

7 DO é o acrónimo de questionário de desempenho organizacional. Para informações mais detalhadas acerca do processode construção e validação deste instrumento de medida pode consultar-se Cardoso (2003).

8 QVT é o acrónimo de questionário sobre qualidade de vida no trabalho (Quijano et al., 1997). Para informações maisdetalhadas acerca do processo de adaptação e validação deste instrumento de medida pode consultar-se Cardoso (op. cit.).

Page 45: COG -13-2

Procedimentos prévios à análise dos dados

Tal como anteriormente referimos, o desenvolvimento desta investigação envolveu a conside-ração de dados organizacionais recolhidos a diferentes níveis (organizacional e individualmente). Assim,nas análises estatísticas realizadas considerámos cada organização como uma unidade de análise,fazendo-lhe corresponder a pontuação média das respostas recolhidas individualmente (Zammuto &Krakower, 1991). No entanto, para podermos utilizar com confiança as referidas pontuações, avaliámospreviamente a concordância intra-unidade nas medidas recolhidas ao nível individual (Kozlowski& Klein, 2000). Para o efeito, calculámos para cada organização o índice de desvio médio (ADM),considerando o intervalo de respostas nulas igual ou inferior a uma unidade (Burke, Finkelstein, &Dusig, 1999). O índice de desvio médio (Average Deviation Index) constitui uma medida de dispersãocalculada a partir da média aritmética dos desvios em valor absoluto dos resultados observados emrelação à média.

Avaliámos para cada item o valor do desvio médio da escala em cada organização, sendo apontuação média de 0.94 e o desvio-padrão de 0.11, tendo considerado que estávamos em condiçõesde agregar, com confiança, os dados individuais ao nível organizacional, utilizando a pontuação médiados inquiridos em cada organização enquanto resultado da gestão do conhecimento nessa mesmaorganização. Posteriormente, no sentido de averiguar a existência de variabilidade inter-organizacional,procedemos a uma análise da variância (ANOVA), tomando como variável independente (VI) ascinquenta organizações e como variável dependente (VD) as respectivas pontuações médias no GC.Obtivemos um F(49, 1225) = 5.20, p < .001, o que nos garante a existência de uma diferenciaçãointer-organizacional estatisticamente significativa. Os resultados obtidos nestes dois procedimentos,garantem-nos, por um lado, a existência de homogeneidade perceptiva intra-organizacional e, poroutro, a existência de heterogeneidade inter-organizacional. Repetimos o mesmo procedimento no queconcerne aos dados recolhidos com o QVT. Os resultados no desvio médio em cada organização, sendoinferiores à unidade (pontuação média dos desvios médios = 0.80 e desvio-padrão = 0.11), possibi-litam igualmente a sua agregação ao nível organizacional. Por outro lado, a realização da ANOVA,considerando como VD as pontuações médias em cada organização no QVT e como VI a variávelorganização, sendo de F(49, 1225) = 2.34, p < .001, garante-nos a necessária diferenciação inter-orga-nizacional.

No tratamento estatístico dos dados utilizámos os programas informáticos SPSS, versão 11.0, eAmos versão 4.01, para o sistema operativo Windows.

Etapas de estimação do modelo estrutural

Com o objectivo de construir um modelo passível de explicar as relações teoricamente esta-belecidas entre a gestão do conhecimento e a competitividade organizacional, seguimos as orientaçõesde diversos autores (e.g., Bagozzi, 1983; Bentler, 1980; Bentler & Weeks, 1980; Fassinger, 1987; Hughes,Price, & Mars, 1986) que consideram fundamental respeitar um conjunto de passos ou etapas, desi-

196

Cardoso

Page 46: COG -13-2

gnadamente: (a) especificação do modelo teórico de base; (b) construção de um diagrama de caminhos

(path diagram) que representa as relações teóricas a testar; (c) conversão do path diagram num conjunto

de equações estruturais (i.e., de regressão) e especificação do modelo de medida; (d) escolha da matriz

de dados e estimação do modelo proposto (estimam-se os parâmetros que compõem o sistema de equações

estruturais); (e) cálculo da identificação do modelo proposto; (f) avaliação da qualidade do ajusta-

mento (de forma a comprovar-se até que ponto este se ajusta à realidade que se pretende descrever), e

por fim, (g) re-especificação do modelo, se tal se justificar teoricamente.

Modelo exploratório das relações entre a gestão do conhecimento e a competitividade organi-zacional

A especificação do modelo teórico de base implica a descrição das estruturas relacionais que

se pretendem medir, tornando-se necessário seleccionar as variáveis que melhor operacionalizam o

problema a estudar. Tendo em consideração que havíamos previamente realizado um conjunto de

análises de regressão múltipla entre as variáveis referentes à gestão do conhecimento e aquelas que

respeitavam à competitividade organizacional, considerámos que fazia todo o sentido reter, aquando

da elaboração do modelo estrutural, as variáveis que evidenciaram possuir relações de maior magni-

tude nas análises de regressão anteriormente efectuadas. Deste modo, não só privilegiaríamos as referidas

relações, como reduziríamos a um número estritamente necessário as variáveis a integrar no modelo.

Esta redução tornava-se absolutamente necessária, na medida em que um dos pressupostos que importa

considerar na validação de um modelo de equações estruturais se prende com o tamanho da amostra

(que, tal como em qualquer outro método estatístico, influencia o erro amostral), sendo recomendável

um mínimo de cinco observações por cada parâmetro estimado (Bagozzi & Yi, 1988). Considerando

que no nosso caso apenas pudemos considerar um total de 42 observações (pois, do total das cinquenta

organizações da amostra, apenas 42 apresentavam todos os dados indispensáveis à realização do

modelo estrutural) havia que reduzir substancialmente o total de parâmetros a estimar. Neste sentido,

o nosso modelo assenta em dois constructos principais não observáveis, designadamente gestão do

conhecimento e competitividade, sendo este último um factor de segundo nível, avaliado em termos

de resultados económicos e de qualidade de vida no trabalho (único resultado social retido). Considerámos

que existe uma dimensão emergente dos resultados organizacionais obtidos ao nível da qualidade

de vida no trabalho e ao nível económico que se pode definir como competitividade. Tendo ainda em

consideração a conceptualização das relações entre a gestão do conhecimento e a competitividade

organizacional, as estruturas relacionais que pretendíamos medir implicavam a consideração de uma

relação causal entre a primeira (gestão do conhecimento) e a segunda (competitividade). Formu-

lámos assim as seguintes hipóteses de relação entre os constructos que integram o nosso modelo:

H1: A existência de uma percepção correspondente a uma maior aplicabilidade dos processos

de gestão do conhecimento às organizações tem um impacto positivo na sua competitividade.

H2: O desempenho ao nível económico manifesta-se na competitividade organizacional de um

modo positivo.

197

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

Page 47: COG -13-2

H3: A existência de uma percepção correspondente a uma maior qualidade de vida no trabalhoreflecte-se positivamente na competitividade organizacional.

A representação gráfica do modelo explicitado consta da Figura 1.

Modelo de medida proposto

O modelo estrutural exploratório que explicitámos e que implicou a construção de um pathdiagram, representativo das relações teóricas a testar, permite-nos agora evoluir no sentido daespecificação do nosso modelo de medida. Este pressupõe a conversão do diagrama num conjuntode relações estruturais entre as variáveis observáveis ou indicadores (passíveis de observação directa) eas variáveis latentes (não passíveis de observação). Se os constructos não observáveis foram já expli-citados (gestão do conhecimento e competitividade), importa agora seleccionar as variáveis observáveisou os indicadores, para posteriormente definir as relações estruturais entre ambos. Com base no critérioanteriormente referido (selecção das variáveis que evidenciaram relações mais significativas aquandoda realização das análises de regressão) e de acordo com o explicitado aquando da descrição das medidasutilizadas neste estudo, escolhemos como indicadores (observáveis) do constructo (de primeiro nível)relativo aos resultados económicos a rendibilidade do activo (REAT – coeficiente de determinaçãomúltiplo ou variabilidade partilhada R2 = .37), a taxa de crescimento real média (TCR_M – R2 = .27) e

198

Cardoso

Figura 1. Modelo exploratório de investigação

Resultados económicos

Qualidade de vida no trabalho

Gestão do conhecimento CompetitividadeH1(+)

H3(+)

H2(+)

Legenda: H1(+) – Hipótese 1; H2(+) – Hipótese 2; H3(+) – Hipótese 3. O sinal (+) indica o impacto positivo esperado.

Page 48: COG -13-2

a produtividade por colaborador (PRDTV – R2 = .41). Fazemos assim representar no modelo umindicador referente aos resultados económico-financeiros, um outro alusivo aos comerciais, e por fimum de natureza produtiva, respeitando o modelo teórico adoptado na determinação dos resultadoseconómicos. Seleccionámos como indicador único do constructo de primeiro nível referente à qualidadede vida no trabalho os resultados sociais obtidos ao nível do Factor 1 (motivação e apoio) do QVT(QVT_MF1 – R2 = .36), assumindo que esta variável é suficientemente representativa da dimensãoem questão9. A opção efectuada por um indicador único é objecto de controvérsia e consideradoquestionável, mas diversos investigadores optaram igualmente por este tipo de formalização em alter-nativa à utilização de uma variável observada com relações directas a outros constructos, como écomum a muitos modelos híbridos10 (Kline, 1998; Luque, 2000; Maruyama, 1998). No sentido dereforçar a ideia supra-citada, isto é, de que este indicador é suficientemente preciso para representar oconstructo relativo à qualidade de vida no trabalho, fixámos a variância do erro em zero, permitindoque o factor seja perfeitamente identificável pela variável correspondente (Iglesias, Fernández, del Río,& Trespalacios, 2002). Por fim, os quatro factores do GC (GC_MF1; GC_MF2; GC_MF3¸ GC_MF4)foram seleccionados como indicadores observáveis do constructo relativo à gestão do conhecimento.O conjunto de relações estruturais entre as variáveis observáveis ou os indicadores e as variáveis latentes(não passíveis de observação) encontra-se expresso na Figura 2.

Avaliação do modelo proposto

Iniciámos a etapa da estimação do modelo proposto com a realização de um estudo explo-ratório de forma a melhor compreender e justificar o modo como as variáveis consideradas no modeloestrutural se agrupam. Trata-se de um procedimento não obrigatório, mas recomendável, que é adoptadopor vários investigadores (e.g., Bei & Chiao, 2001; Cruz, 2003; Flávian & Lozano, 2001; Gutiérrez &Camarero, 2001; Iglésias, Férnandez, & Trespalacios, 2002; Zhu, Wymer, & Chen, 2002) e que permiteanalisar previamente a unidimensionalidade dos constructos, posteriormente complementada pelarealização de uma análise factorial confirmatória. Esta última foi realizada em separado, quer para osconstructos exploratórios relacionados com a gestão do conhecimento, quer para aqueles que respei-tavam aos resultados económicos, de forma a avaliar a fiabilidade das escalas de medição utilizadas.Através destes dois processos, procurámos depurar o modelo de eventuais variáveis que pudessemestar desajustadas ao modelo de equações estruturais a estimar.

No sentido de se proceder à análise factorial exploratória, optámos pelo método da análise emcomponentes principais com rotação varimax (utilizando, para o efeito o programa estatístico SPSS11.0), uma vez que pretendíamos ortogonalidade entre factores.

199

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

9 A variância total explicada por este factor é de 50%, valor que não sendo muito elevado é, no entanto, considerado adequado(Hair, Anderson, Tatham, & Black, 1999).

10 Um modelo híbrido, também denominado de “parcialmente latente”, contém pelo menos uma variável exógena comoindicador único de um constructo que não é representado (Kline, 1998).

Page 49: COG -13-2

200

Cardoso

Figura 2. Modelo de medida proposto

Qualidade de vida no trabalho

Resultados económicos

CompetitividadeGestão do conhecimento

H1(+)

H3(+)

H2(+)

REAT

TCR_M

PRDTV

QVT_MF1

CG_MF3

GC_MF2

GC_MF4

GC_MF1

Legenda: GC_MF1 – Média do Factor 1 (Práticas de gestão do conhecimento), GC_MF2 – Média do Factor 2 (Orientação cultural para o conhecimento);GC_MF3 – Média do Factor 3 (Gestão social e discursiva do conhecimento); GC_MF4 – Média do Factor 4 (Gestão estratégica do conhecimento); REAT– Rendibilidade do activo; TCR_M – Taxa de crescimento real média; PRDTV – Produtividade por trabalhador; QVT_MF1 – Média do Factor 1(Motivação e apoio); H1(+) – Hipótese 1; H2(+) – Hipótese 2; H3(+) – Hipótese 3. O sinal (+) indica o impacto positivo esperado.

Quadro 1Análise factorial exploratória

Factores

Factor 1 Factor 2

GC_MF2 0.854GC_MF4 0.796GC_MF3 0.789GC_MF1 0.692PRDTV 0.861REAT 0.841TCR_M 0.701

KMO = 0.735; Bartlett = 0.000

Legenda: Factor 1 – Gestão do conhecimento; Factor 2 – Resultados económicos; GC_MF1 – Média do Factor 1 (Práticas de gestão do conhecimento),GC_MF2 – Média do Factor 2 (Orientação cultural para o conhecimento); GC_MF3 – Média do Factor 3 (Gestão social e discursiva do conhecimento);GC_MF4 – Média do Factor 4 (Gestão estratégica do conhecimento); PRDTV – Produtividade por trabalhador; REAT – Rendibilidade do activo; TCR_M– Taxa de crescimento real média.

Page 50: COG -13-2

A análise dos resultados apresentados no Quadro 1 permite verificar que as variáveis se agrupam

em dois factores ou duas dimensões, tal como previamente havíamos formalizado, sendo o primeiro

relativo à gestão do conhecimento e o segundo aos resultados económicos. As saturações factoriais

encontradas são elevadas, superiores ao valor mínimo recomendável de 0.60 (Bagozzi & Yi, 1988), e

a variância extraída alcança os 68% da informação original.

Procedeu-se depois a uma análise factorial confirmatória para estes dois factores, tendo sido

averiguadas as validades convergente e discriminante das escalas utilizadas na medida destas duas

dimensões (cf. Quadro 2). Ao nível da primeira, da validade convergente, analisámos as saturações

factoriais e a fiabilidade de cada constructo (Luque, 2000), sendo esta última resultante da averi-

guação da consistência interna, da fiabilidade composta (que deve ser superior a 0.7, segundo Hair,

Anderson, Tatham, & Black, 1999) e da variância extraída (que deve ser superior a 0.5, de acordo com

Bagozzi & Yi, 1980). No nosso caso, as saturações factoriais são elevadas (M = 0.74) e significativas

(valores t > 1.96), os valores correspondes ao alpha de Cronbach são aceitáveis (porque são superiores

a 0.70) e os valores da fiabilidade composta e da variância extraída superam os mínimos recomendados,

sendo indicativos de uma consistência interna aceitável. Com base nestes resultados concluímos pela

existência de validade convergente ao nível dos constructos em análise. No que respeita à validade

discriminante, esta é garantida sempre que os valores médios da variância extraída superem os das

correlações para cada par de constructos (Fornell & Larcher, 1981), condição que garantimos, na medida

em que o valor médio da variância extraída entre os dois factores é igual a 0.575 e a correlação entre

ambos é igual a 0.39 (R2 = 0.152; p <.005).

No que respeita ao constructo de segundo nível referente à competitividade, realizámos uma

análise factorial confirmatória separada, obtendo um bom ajustamento para quase todas as medidas

(cf. Figura 3), comprovando que os resultados económicos e os resultados sociais referentes à

201

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

Quadro 2Análise factorial confirmatória

Dimensões Variáveis Saturações Teste t αα de Cronbach Variância Fiabilidadefactoriais (S) extraída composta

Gestão do conhecimento GC_MF2 0.828 4.068(Factor 1) GC_MF4 0.791 3.996 0.79 0.55 0.83

GC_MF3 0.667 3.543GC_MF1 0.653 *

Resultados económicos PRDTV 0.984 8.100(Factor 2) REAT 0.798 * 0.74 0.60 0.81

TCR_M 0.454 2.999

* parâmetro fixado em 1, sem valor t

Legenda: GC_MF1 – Média do Factor 1 (Práticas de gestão do conhecimento), GC_MF2 – Média do Factor 2 (Orientação cultural parao conhecimento); GC_MF3 – Média do Factor 3 (Gestão social e discursiva do conhecimento); GC_MF4 – Média do Factor 4 (Gestãoestratégica do conhecimento); PRDTV – Produtividade por trabalhador; REAT – Rendibilidade do activo; TCR_M – Taxa de cresci-mento real média.

Page 51: COG -13-2

qualidade de vida no trabalho partilham uma variância comum que é explicável pela dimensãocompetitividade. Com este tipo de formalização de factores de segundo nível pretende-se verificar seexiste uma causalidade comum que meça a relação entre os factores de primeiro nível (Kline, 1998).

Uma vez validadas as escalas e o factor de segundo nível, procedemos à estimação do modelode equações estruturais proposto anteriormente, recorrendo ao programa estatístico AMOS 4.01 (cf.Figura 4).

Na avaliação do ajustamento do modelo tivemos como referência os valores recomendados porArbuckle e Wothke (1999), Luque (2000) e Karjaluoto (2002), que sistematizamos no Quadro 3.

Utilizámos o estimador de máxima verosimilhança (MLE – Maximum Likelihood Estimator),na medida em que estamos perante um modelo não recursivo (que considera apenas relações numúnico sentido) e os dados cumprem o requisito da normalidade (cf. Quadro 4). Em regra, o cumpri-mento deste requisito permite retirar conclusões assintóticas, ou seja, garante que o modelo seja válidoem grandes amostras (Arbuckle & Wothke, 1999). Nas equações estruturais em concreto a não norma-lidade dos dados levanta problemas no que se refere ao valor estatístico do Qui-quadrado, inflaccio-nando-o (Bentler & Dudgeon, 1996), bem como ao uso do estimador de máxima verosimilhança, o únicoque nos garante um ajustamento aceitável e que pressupõe essa condição.

Do Quadro 4 consta a informação relativa a cada uma das variáveis observadas, designadamenteos seus valores mínimo, máximo, de assimetria e de curtose (ou achatamento), bem como o valor

202

Cardoso

Figura 3. Análise factorial confirmatória da competitividade (valores estandardizados)

Competitividade

Resultados económicos

Qualidade de vida no trabalho

REAT

TCR_M

PRDTV

QVT_MF1

.27

.33

1.00

e1

e2

e3

z3

z2

z1

e5

.45

.98

.79

Medidas de Ajustamento: Qui-quadrado = 5.131; p = 0.274; CFI = 0.977; RMSEA = 0.083; NFI = 0.907.

Page 52: COG -13-2

203

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

Figura 4. Modelo causal a estimar

REAT

TCR_M

PRDTV

e1

e2

e3

z1

z2

e5z3 QVT_MF

Resultados económicos

Qualidade de vida no trabalho

CompetitividadeGestão do conhecimento

GC_MF2

GC_MF1

GC_MF3

GC_MF4

e6

e7

e8

e9

1

1

1

1

1

1

1 11

1

1

1

1

1

1 1

0

Quadro 3Valores de referência para a avaliação do ajustamento dos modelos de equações estruturais

Índices absolutos de ajustamento Descrição Valores recomendados

Qui-quadrado Cálculo da diferença entre as matrizes P > 0.05 para ser aceitável; indicado parade covariância observadas e esperadas; amostras pequenas (com menos do quenão ajustado aos graus de liberdade. 200 observações).

RMSEA (Root mean square error Indica o ajustamento global do modelo < 0.05 ajustamento perfeito; of approximation) relativamente aos graus de liberdade. < 0.08 ajustamento aceitável

NFI (Normed of fit index) Compara o modelo proposto com o De 0 (sem ajustamento) a 1 (ajustamentomodelo nulo; não ajustado aos graus perfeito); > 0.80 ajustamento recomendado de liberdade.

CFI (Comparative fit index) Índice de adequação global do modelo De 0 (sem ajustamento) a 1 (ajustamento perfeito); > 0.90 ajustamento recomendado

Fontes: Arbuckle e Wothke, 1999; Luque, 2000; Karjaluoto, 2002.

Page 53: COG -13-2

de curtose ao nível multivariante (e respectivos rácios críticos). Constata-se que os valores referentesaos diversos rácios críticos se situam no intervalo entre +2.00 e -2.00, sendo indicativos da existênciade normalidade (Arbuckle & Wothke, 1999). Por outro lado, os valores de curtose são próximos dezero (com excepção do que se refere à variável TCR_M), pelo que as distribuições das variáveis nãoapresentam grandes desvios em relação à curva normal. Os rácios críticos de assimetria não excedem ovalor absoluto de dois, revelando que todas as variáveis apresentam uma distribuição simétrica.Importa, contudo, referir que o facto de todas as variáveis serem normais, não garante a existência denormalidade multivariante. No presente caso verifica-se a existência de normalidade multivarianteentre o conjunto de variáveis considerado, tal como se pode constatar pelo último indicador apre-sentado no Quadro 4, que apresenta um valor inferior a dois.

As medidas patentes no Quadro 5 indicam um bom ajustamento global do modelo proposto aosdados recolhidos (p > 0.05; CFI > 0.9; RMSEA < 0.08, NFI > 0.8).

Seguindo a recomendação de Hair, Anderson, Tatham, e Black (1999), fixámos a variância doerro de z2 em 0.05, uma vez que apresentava um valor negativo.

Resultados

Apresentam-se seguidamente os resultados obtidos na análise de equações estruturais, realizadacom o objectivo de avaliar as hipóteses previamente estabelecidas entre as dimensões ou constructosexplicativos da relação entre a gestão do conhecimento e a competitividade.

204

Cardoso

Quadro 4Análise da normalidade

Mínimo Máximo Assimetria Rácio crítico Curtose Rácio crítico

GC_MF4 2.940 3.930 -0.072 -0.189 -0.560 -0.740GC_MF3 2.520 3.920 -0.405 -1.072 0.637 0.842 QVT_MF1 3.338 4.400 0.650 1.720 0.482 0.637GC_MF2 3.190 4.150 0.029 0.076 -0.857 -1.133GC_MF1 2.060 3.900 0.194 0.514 -0.559 -0.740PRDTV 1.000 5.000 0.358 0.947 -0.918 -1.214 TCR_M 1.000 5.000 0.417 1.104 -1.334 -1.765REAT 1.000 5.000 0.722 1.910 -0.088 -0.116

Multivariante 4.094 1.049

Valores normais: Assimetria entre -3 e 3; Rácio crítico entre +2 e -2; Curtose em torno de 0; Rácio crítico entre +2 e -2; Normalidademultivariante: rácio crítico < 2.

Legenda: GC_MF1 – Média do Factor 1 (Práticas de gestão do conhecimento); GC_MF2 – Média do Factor 2 (Orientação cultural parao conhecimento); GC_MF3 – Média do Factor 3 (Gestão social e discursiva do conhecimento); GC_MF4 – Média do Factor 4 (Gestãoestratégica do conhecimento); QVT_F1 – Média do Factor 1 (Motivação e apoio); PRDTV – Produtividade por trabalhador; TCR_M –Taxa de crescimento real média; REAT – Rendibilidade do activo.

Page 54: COG -13-2

No Quadro 6 apresentamos os efeitos directos, indirectos e totais entre os constructos, origemdos elementos que suportam a análise dos resultados e nos permitem retirar conclusões quanto àshipóteses previamente delineadas.

As estimações apresentam-se em valores estandardizados, pelo que podem ser tratadas comoindicadores da importância relativa de cada dimensão relativamente a cada constructo endógeno oulatente (Goldberger, 1964).

Em conformidade com a primeira hipótese elaborada (cf. ponto 1.1.1.), constatámos que arelação entre a gestão do conhecimento e a competitividade, para além de positiva e significativa ébastante elevada, demonstrando a existência de uma forte relação directa. Efectivamente, a gestão doconhecimento evidencia um impacto positivo directo na competitividade organizacional (coeficientede “regressão” de 0.914), impacto esse que se aproxima da unidade. Trata-se de um resultado impor-tante, na medida em que confere suporte empírico à conceptualização que adoptámos e à orientaçãoteórica em que nos ancorámos para a realização da investigação.

205

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

Figura 5. Ajustamento do modelo estrutural final

REAT

TCR_M

PRDTV

Resultados económicos

QVT_MF

GC_MF1

GC_MF2

GC_MF3

GC_MF4

CompetitividadeGestão do conhecimento

Qualidade de vida no trabalho

e1

e2

e3

e5

e6

e7

e8

e9

z1

z2

z3

.82

.59

.85

.94

.47

1.00

.76

.71

.72

.79

.91

Quadro 5Ajustamento do modelo estrutural final

Qui-quadrado (χχ2) (Sig.) Graus de liberdade CFI RMSEA NFI Comentários

22.32 (0.269) 19 0.976 0.065 0.867 Variância do erro de z2 fixado em 0.05

Legenda: CFI – Comparative fit index; RMSEA – Root mean square error of approximation; NFI – Normed of fit index.

Page 55: COG -13-2

Os resultados obtidos permitiram igualmente confirmar, que tal como havíamos formalizado, adimensão relativa à competitividade constitui um factor de segundo nível formado pelos resultadoseconómicos e pelo resultado social referente à qualidade de vida no trabalho. Os elevados efeitosdirectos positivos verificados entre o factor de segundo nível e os factores de primeiro nível revelamque existe pouca variância não explicada entre os factores de primeiro nível (Kline, 1998), susten-tando empiricamente as hipóteses 2 e 3 que havíamos formulado. Parece no entanto existir uma maiorperda de variância explicada, no que respeita aos resultados económicos, uma vez que o efeito directoverificado é, neste caso, substancialmente menor do que aquele que se verifica ao nível dos resultadossociais relativos à qualidade de vida no trabalho (0.58 e 0.82, respectivamente), podendo concluir-seque a competitividade se manifesta mais nestes últimos do que nos primeiros.

Importa reiterar que estes resultados estão limitados pelo facto de os dados não preencheremum requisito normalmente necessário para validação de um modelo de equações estruturais: o númerode observações. Com efeito, no presente estudo apenas pudemos considerar na análise um total de42 casos, número manifestamente inferior aos 85 recomendados por Bagozzi e Yi (1988) se tivermosem conta a necessidade de deter cinco observações por cada parâmetro livre (apesar dos esforçosenvidados no sentido da redução do número de parâmetros, o nosso modelo causal integra um total de17 parâmetros livres). No sentido de minimizar estas limitações recorremos ao bootstrap, que consistena simulação de um determinado número de amostras diferenciadas, a partir da amostra original, sendocada uma delas um seu subconjunto de tamanho aleatório. Este procedimento (Hair et al., 1999) permiteverificar a robustez dos parâmetros em análise ao longo de várias amostras, num procedimento emtudo semelhante ao de uma validação cruzada. Realizámos um bootstrap para um conjunto de cemamostras aleatórias (cf. Quadro 7) e um outro para quinhentas (cf. Quadro 8) considerando um graude confiança de 95%. Realizámos ainda o teste de Bollen-Stine que é um método de simulação deamostras de tamanho aleatório adequado a amostras pequenas (Fouladi, 1998), no âmbito do qual seprocede ao cálculo de um novo Qui-quadrado, obtido entre todas as amostras aleatórias.

Os valores médios apresentados referem-se à média do coeficiente entre todas as amostrasaleatórias. O enviesamento corresponde ao cálculo da diferença entre o parâmetro estimado e a médiadas estimações entre todas as amostras aleatórias. O valor estatístico de p indica se o parâmetroestimado por bootstrap é significativo para um grau de confiança de 95%. A análise dos resultadosapresentados no Quadro 7 permite constatar que todos os parâmetros são significativos, com excepção

206

Cardoso

Quadro 6Matriz de efeitos directos, indirectos e totais (estimação por máxima verosimilhança, N=42)

Efeito de: Gestão do conhecimento Competitividade

em: Directos Indirectos Totais Directos Indirectos Totais

Competitividade 0.914 – 0.914 – – – Resultados sociais – 0.754 0.754 0.824 – 0.824Resultados económicos – 0.535 0.535 0.585 – 0.585

Page 56: COG -13-2

do coeficiente respeitante à relação entre a competitividade e os resultados económicos. Contudo,este coeficiente revela-se significativo quando repetimos a análise considerando quinhentas amostras(cf. Quadro 8).

Para averiguar a significação entre os parâmetros estimados no nosso modelo final e as esti-mações entre todas as amostras aleatórias (enviesamentos ou bias no output), realizámos testes denulidade para o valor do enviesamento (bias), tendo para o efeito recorrido ao programa estatísticoSPSS 11.0, confirmando que estes não são significativamente distintos de zero a 95% (ver testes denulidade nos Quadros 7 e 8).

A comparação dos resultados apresentados nos Quadros 7 e 8 permite verificar que o envie-samento é menor à medida que aumentamos o número de amostras consideradas na análise, peloque podemos concluir que os parâmetros se revelam robustos ao longo de um elevado número de amostrasde tamanho aleatório. De facto, a realização posterior de um bootstrap para um conjunto de 1000amostras, confirmou que o modelo continua a ser significativo com uma probabilidade de 0.413.

Quanto aos resultados do teste de Bollen Stine, obtivemos no que respeita à simulação relativaa cem amostras, um valor médio de Qui-quadrado de 21.28, que para 19 graus de liberdade repre-senta um valor de p igual a 0.386, enquanto que para a simulação referente a quinhentas amostras ovalor de 21.58 de Qui-quadrado equivale a uma probabilidade de 0.403. Uma vez que os parâmetrossão significativos, o teste de Bollen-Stine indica um bom ajustamento entre amostras, os enviesamentostendem a ser cada vez menores e em conjunto não são significativamente diferentes de zero, reunimosum conjunto de condições que nos permite concluir que os parâmetros são estáveis, apesar do reduzido

207

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

Quadro 7Resultados do bootstrap para 100 amostras

Coeficientes Erros p Enviesamento Rácio críticoestandardizados estandardizados

Competitividade ←← gestão do conhecimento 0.899 0.054 0.010 -0.016 16.648 Resultados económicos ←← competitividade 0.595 0.124 0.061 0.010 4.798Resultados sociais ←← competitividade 0.820 0.137 0.011 -0.005 5.985GC_MF1 ←← gestão do conhecimento 0.691 0.124 0.015 -0.017 5.573GC_MF2 ←← gestão do conhecimento 0.795 0.114 0.038 0.003 6.974REAT ←← resultados económicos 0.873 0.117 0.013 0.020 7.462TCRM ←← resultados económicos 0.442 0.157 0.016 -0.031 2.815PRDTV ←← resultados económicos 0.921 0.101 0.009 -0.016 9.119QVT_MF1 ←← resultados sociais 1 0 – 0 GC_MF3 ←← gestão do conhecimento 0.694 0.125 0.023 0.012 5.552GC_MF4 ←← gestão do conhecimento 0.752 0.141 0.011 0.014 5.333

Teste de nulidade 0.075Bollen-Stine Bootstrapped p 0.386

Legenda: GC_MF1 – Média do Factor 1 (Práticas de gestão do conhecimento); GC_MF2 – Média do Factor 2 (Orientação cultural parao conhecimento); GC_MF3 – Média do Factor 3 (Gestão social e discursiva do conhecimento); GC_MF4 – Média do Factor 4 (Gestãoestratégica do conhecimento); QVT_F1 – Média do factor 1 (Motivação e apoio); REAT – Rendibilidade do activo; TCR_M – Taxa decrescimento real média; PRDTV – Produtividade por trabalhador.

Page 57: COG -13-2

número de observações. Neste sentido, podemos afirmar que o modelo causal estimado é válido e repre-

sentativo da realidade que pretendemos descrever.

Conclusão

Neste artigo, aludimos a estudos prévios que realizámos com o objectivo de avaliar a capacidade

preditiva dos processos de gestão do conhecimento organizacional face aos resultados obtidos pelas

organizações estudadas num conjunto de indicadores de competitividade. Referimos, ainda, que as

análises de regressão nesse contexto realizadas nos permitiram concluir que a gestão do conhecimento

evidenciou capacidades preditivas dos resultados organizacionais, traduzidos em indicadores relativos

ao desempenho destas organizações, quer ao nível económico (económico-financeiro, comercial e pro-

dutivo), quer social. Foram estes resultados que nos conduziram à decisão de avaliar, na globalidade e

para a mostra estudada, a existência de relações de dependência ou interdependência simultâneas

entre as variáveis que evidenciaram possuir relações mais significativas. Utilizámos, para o efeito, um

modelo de equações estruturais que nos permitiu testar a validade do modelo teórico que orientou o

estudo que desenvolvemos, segundo o qual a gestão do conhecimento promove a competitividade

organizacional.

A constatação da elevada relação directa entre a gestão do conhecimento e a competitividade

organizacional, traduzida na existência de um impacto positivo da primeira na segunda, reforça as

208

Cardoso

Quadro 8Resultados do bootstrap para 500 amostras

Coeficientes Erros p Enviesamento Rácio críticoestandardizados estandardizados

Competitividade ←← gestão do conhecimento 0.900 0.053 0.003 -0.015 16.981Resultados económicos ←← competitividade 0.595 0.123 0.005 0.010 4.837Resultados sociais ←← competitividade 0.826 0.128 0.004 0.001 6.453GC_MF1 ←← gestão do conhecimento 0.700 0.119 0.004 -0.007 5.882GC_MF2 ←← gestão do conhecimento 0.793 0.101 0.012 0.001 7.851REAT ←← resultados económicos 0.870 0.126 0.006 0.017 6.905TCRM ←← resultados económicos 0.473 0.153 0.029 0 3.092PRDTV ←← resultados económicos 0.932 0.095 0.006 -0.005 9.811QVT_MF1 ←← resultados sociais 1 0 – 0 – GC_MF3 ←← gestão do conhecimento 0.701 0.129 0.006 -0.015 5.434GC_MF4 ←← gestão do conhecimento 0.756 0.127 0.006 -0.006 5.953

Teste de nulidade 0.549Bollen-Stine Bootstrapped p 0.403

Legenda: GC_MF1 – Média do Factor 1 (Práticas de gestão do conhecimento); GC_MF2 – Média do Factor 2 (Orientação cultural parao conhecimento); GC_MF3 – Média do Factor 3 (Gestão social e discursiva do conhecimento); GC_MF4 – Média do Factor 4 (Gestãoestratégica do conhecimento); QVT_F1 – Média do Factor 1 (Motivação e apoio); REAT – Rendibilidade do activo; TCR_M – Taxa decrescimento real média; PRDTV – Produtividade por trabalhador.

Page 58: COG -13-2

conclusões retiradas a partir das análises de regressão múltipla realizadas, e sustenta empiricamente omodelo teórico em que nos ancorámos para a realização da nossa investigação.

Estamos, contudo, conscientes de que, apesar de constituir um contributo relevante para o avançoda investigação relativa aos processos organizacionais relacionados com o conhecimento, o trabalhorealizado carece de continuidade e deve ser aprofundado.

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Abstract. Most authors who focus on the study of knowledge management claim the existence of arelationship between this and organizational performance, from a perspective of creating and main-taining sustainable competitive advantages. In this article we present a structural equation modelling,through which we aim to test, generally and for the sample under study (50 industrial organizationsin the District of Viseu), the validity of the theoretical assumption mentioned, assessing relation-ships of simultaneous dependence or interdependence between a set of variables that showed rela-tionships of greater magnitude in previous studies and to do so we used multiple regression analyses.The results obtained suggest the existence of a positive impact of knowledge management on orga-nizational competitiveness, reinforcing the conclusions drawn from multiple regression analyses pre-viously carried out, and holding up empirically the theoretical model we set out from.Key words: Knowledge management, organizational competitiveness, a structural equation modelling,knowledge management questionary, organizational performance indicators.

211

Gestão do conhecimento e competitividade organizacional

Page 61: COG -13-2

Resumo. Este trabalho tem por objetivo discutir as ambigüidades identitárias vivenciadas pelosatores sociais, representantes de organizações familiares que se agrupam na “Feira Hippie” de BeloHorizonte (Minas Gerais/Brasil). O embasamento teórico da discussão está ancorado na abordagemde identidade e nos processos de identificação social, enquanto que o material empírico provém deuma investigação em organizações familiares. O método de pesquisa adotado foi o qualitativo,baseado na Análise do Discurso e na história de vida dos gestores familiares ao longo dos seus 36anos de atuação na Feira. A análise evidenciou os processos de construção e desconstrução dedeterminadas identificações por parte dos gestores familiares em relação à Feira em determinadoscontextos ao longo de sua história. Além disso, foi possível perceber que tais processos de identifi-cação mantiveram uma estreita relação com a dinâmica dos grupos sociais na ocupação de um dadoespaço físico e simbólico – onde os dois elementos: os grupos e o espaço – desempenharam papelativo na construção dessas identificações sociais e organizacionais, no início como feira de arte-sanato e depois como feira de variedades.

Palavras-chave: Identidade, identificação, espaço físico e simbólico, análise do discurso.

1. Introdução

Este trabalho tem por objetivo discutir as ambigüidades identitárias vivenciadas pelos atoressociais e que são historicamente (re)construídas por meio de suas práticas sociais em organizações

213

COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL E GESTÃO, 2007, VOL. 13, N.º 2, 213-236

Ambigüidades identitárias na “Feira Hippie”/Brasil

Thiago Duarte Pimentel

Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Brasil

Alexandre de Pádua Carrieri

Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Brasil

Alfredo Rodrigues Leite-da-Silva

Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Brasil

Endereço: Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração, Faculdade de Ciências Econômicas, UniversidadeFederal de Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]

Page 62: COG -13-2

familiares que se agrupam em uma feira, denominada “Feira Hippie” de Belo Horizonte, do Estado

de Minas Gerais (Brasil).

Os estudos sobre a definição e construção de identidade apresentam-se em duas grandes vertentes

de análise, que se situam em pólos opostos de um continuum, de um lado a dimensão objetiva, caracte-

rizada pela estabilidade e por critérios estruturais de análise, a priori, permanentes ao longo do tempo.

De outro lado, pela dimensão subjetiva, marcada pela dinamicidade, pela não recorrência a variáveis

fixas de análise e sim pela interpretação relacional da noção de identidade dentro de um dado contexto

sócio-cultural.

Assim, partindo-se de Cuche (1996) e de sua distinção entre a concepção objetiva e subjetiva

nos estudos identitários (e culturais), este trabalho buscou o aprofundamento da abordagem subjetiva,

a partir de uma concepção na qual a identidade pode ser estudada como representações que os indi-

víduos fazem da realidade social, possibilitando observar um caráter variável da identidade, ou seja,

suas possíveis transformações ao longo de um dado percurso temporal.

Para tanto, esta investigação foi realizada a partir das narrativas elaboradas pelos atores familiares

que em seu conjunto possibilitaram a compreensão do discurso sobre as ambigüidades identitárias

dos atores sociais (Mumby & Clair, 1997; Czarniawska, 1998). Esse caminho permitiu apreender a história

de vida de cada expositor (família) entrevistado como um estudo de caso em si e, por extensão, a história

da Feira (ao longo de 36 anos) enquanto um conjunto de histórias de vida dos seus participantes.

As narrativas foram obtidas por meio de documentos e de entrevistas em profundidade focando a

história de vida de cada expositor. Para o tratamento e a análise dos dados foi utilizado o método

da Análise do Discurso.

Em seu início, a Feira foi considerada como o resultado da apropriação de um espaço (público)

por um grupo de atores sociais para mostrar (e vender) sua arte. Esse grupo era, inicialmente, iden-

tificado pela sua influência “hippie”, e comercializava o trabalho de subsistência. Posteriormente,

o espaço passou a ser ocupado pelos vendedores de variedades. Muitas vezes eles também atuavam

em conjunto com a família, mas suas atividades baseavam-se na comercialização de produtos indus-

trializados e manufaturados.

Assim, as narrativas sobre as histórias pessoais, organizacionais e sobre a própria história da

Feira, evidenciaram processos de construção e desconstrução de processos de identificação e das próprias

identidades sociais, pois a incorporação de novos membros e a mudança de local da Feira ao longo

do tempo foram processos que culminaram com a ambigüidade identitária da existência de uma feira

(e dos atores sociais que a compõem) que, a priori, era artesanal mas que hoje encontra-se dominada

por produtos tidos como “variedades” que ganham legitimidade pela sua institucionalização por parte

do poder público.

O presente artigo está organizado em cinco partes. A primeira é esta introdução do trabalho.

A segunda retrata as bases teóricas que orientaram a condução da pesquisa empírica. A terceira aborda

os caminhos de pesquisa percorridos neste trabalho. A quarta evidencia as análises dos dados. E

por fim, na quinta parte, esboçam-se algumas considerações as quais este estudo permitiu chegar.

214

Pimentel, Carrieri, & Leite-da-Silva

Page 63: COG -13-2

2. Identidade e Identificação: duas formas de se estudar as organizações

2.1. Uma retrospectiva sobre os estudos de Identidade

Caldas e Wood Júnior (1997) consideram que o conceito de identidade é oriundo da filosofia,da busca pelo descobrimento e conhecimento do próprio ser, no âmbito individual – do self, o queremete a três idéias básicas: à permanência – continuidade durante certo período de tempo; à singu-laridade – particularidades em relação aos seus semelhantes; e à unicidade – integridade do próprioser em si mesmo, na sua totalidade. Porém, pode-se considerar que os estudos atuais sobre identidadederivam, em grande parte, da psicologia social e da sociologia. Eles são influenciados por diversascorrentes e abordados em diferentes níveis de análise, desde o individual ao coletivo, enfocando sobre-maneira o indivíduo e o processo socialmente construído pelo qual ele se relaciona com os outros(Machado & Kopittke, 2002).

No campo da psicologia social, Kraus (2000) estuda o desenvolvimento da identidade como umacolcha de retalhos formada pelos variados mundos da vida social (lifeworlds) de cada indivíduo.Assim, o autor parte da concepção de que a rede social não mais garante o entendimento total da iden-tidade, tendo em vista o fenômeno crescente de individualização e seu papel importante na construçãodo si nos variados mundos vividos. Nesse sentido, os processos constituintes da identidade não maisseriam sociais, mas sim partiriam do próprio sujeito, ao experimentar situações diferenciadas e ambíguasao longo da vida. Isso levaria a um processo de investigação altamente individualizado, baseado naconstrução de biografias, que estariam em constante processo de reconstrução e modificação. O objetivonão mais seria fixar certo status de identidade, seria, na verdade, traçar as linhas do processo de iden-tidade, acompanhando sua realização e avaliação individual.

De maneira distinta, na concepção sociológica a identidade é entendida como fruto de umprocesso de interação em múltiplas realidades, que são apreendidas num contínuo de tipificações esignificações compartilhadas. As identidades sociais seriam formadas pela prática e posicionamentomútuo entre os atores. Elas seriam formadas, também, por direitos normativos, obrigações e sançõesque acabam por constituir papéis a serem assumidos. Assim, a identidade social é mais do que aconcepção individual de si mesmo, pois esta depende do reconhecimento e legitimação dos outrosque compõem a realidade social do sujeito (Berger & Luckman, 1985). Partindo dessa perspectiva,a identidade torna-se um conceito relacional e comparativo. As pessoas tenderiam a se classificar emvárias categorias sociais, desempenhando papéis, que permitem aos indivíduos se localizarem ou defi-nirem a si mesmos como partes do ambiente social. Estas seriam as bases da Teoria da IdentidadeSocial.

Já no campo dos estudos organizacionais, Caldas e Wood Júnior (1997) estabelecem um quadroanalógico entre identidade individual e organizacional, partindo da primeira em direção à segunda,onde se situam diversos níveis possíveis de definição de identidade e suas possíveis correspondênciastanto no âmbito do objeto focal, quanto das dimensões de análise. Para estes autores, o conceito variade acordo com o “objeto focal” analisado, ou seja, de acordo com o nível de análise – individual,

215

Ambigüidades identitárias na “Feira Hippie”/Brasil

Page 64: COG -13-2

grupal, organizacional, social, etc. – além de variar também, conforme sua dimensão de observação,isto é, como ele se apresenta, interna – como, por exemplo, um indivíduo se define, baseado no queele é – e externamente – como ele é definido pelos outros, ou o que os outros pensam daquele indivíduo.

Desse modo, esses autores colocam grande ênfase no conceito de identidade como autodefinição,embora não desconsiderem a importância do reconhecimento dos outros, que se daria via imagem– ou seja, aquilo que os outros pensam a respeito do indivíduo – na formação da identidade. Mas,em um estudo anterior Wood Júnior e Caldas (1995) já apontavam e defendiam o uso da metáfora-raizcomo estrutura auxiliar na apreensão das identidades nas organizações, uma vez que em sua concepção adefinição de Albert e Whetten (1985), se utilizada de maneira isolada, seria restrita no sentido de repre-sentar algo que a organização possui, não o que ela é.

Assim, Wood Júnior e Caldas (1995) enfatizam que a abordagem lingüística, mais especifica-mente através do conceito de metáfora-raiz, identificar-se-ia com a noção de visão de mundo dos atoresorganizacionais e traria à tona a geração de insights sobre o que é a organização e como ela é perce-bida. Entretanto, os autores reconhecem a limitação de seu uso, visto que esses modos de ver e não vera organização nunca seriam totalmente capazes de retratar a organização em toda a sua complexidade.

Alvesson (1998), Dutton e Durkerich (1991), Balmer e Wilson (1998) asseveram que o estudoda identidade holográfica e integradora parece ser o mais difundido na Teoria Organizacional. Paraesses autores, o estudo da identidade integradora traz também o conhecimento da imagem da organi-zação. A identidade, nesses estudos, iria ao encontro das proposições de Albert e Whetten (1985), erepresentaria o que os “membros” acreditam ser suas características, e a imagem descreveria o queos “atores” organizacionais “acham” que os de fora pensam sobre eles, sendo então a imagem umainterpretação do pensamento de outros e um esforço da organização em expor a sua identidade para oambiente.

Para Carrieri (2001), nessa abordagem generaliza-se o que a alta administração descreve comoidentidade e imagem, ocultando-se a existência dos outros atores organizacionais e conseqüentementea diferenciação e fragmentação da identidade e da imagem. Essa perspectiva se mostra predomi-nantemente na alta administração e assume a posição de que as organizações poderiam ser afetadas eaté mesmo transformadas por meio da comunicação. Esta, por sua vez, poderia influenciar a percepçãodos indivíduos membros daquela organização, para os levarem a mudar a imagem interna e externada organização.

Em síntese, ao se considerar as abordagens de Wood Júnior e Caldas (1995), de Albert e Whetten(1985), e de Nogueira (2000), entre outros, pode-se depreender que os principais conceitos e categoriasde análise se baseiam na visão da identidade organizacional como auto-conceito, ou seja, como aorganização se percebe, e na noção de imagem externa (ou identidade projetada) da organização,que focalizaria a percepção que os atores externos à organização possuem sobre esta.

Um ponto comum nessas abordagens propostas pelos estudos de identidade organizacional éque a identidade é vista como um atributo da organização, sendo quase que uma dimensão objetivacapaz de refletir atributos centrais, distintivos, e duradouros, passível de ser analisada externamentepor meio de valores da cultura organizacional. Entretanto, o que se pode questionar nessa abordagemé o caráter central do que é definido como identidade e como cultura da empresa, que por sua vez despreza

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as diferenças existentes dentro da organização tendendo a considerá-la como se esta possuísse umacultura ou identidade únicas (Carrieri, 2001).

2.2. A perspectiva de Identificação como um Processo de Construção da Identidade

Atualmente, as sociedades vêm sendo atravessadas por crises culturais e de identidade, e asorganizações têm buscado suprir essas carências, aparecendo “como grande[s], potente[s], nobre[s],perfeita[s], procurando captar os anseios narcisistas de seus membros e prometendo-lhes ser a fontede reconhecimento, de amor, de identidade, podendo preenchê-los e curá-los de suas imperfeições efragilidades” (Freitas, 2000, p. 9). Segundo Nogueira (2000), ao tratar dessas questões, a análise socialvoltada para as relações organizacionais tem elegido a organização como o locus de referência pre-ferido, em uma diversidade de relações de poder e manifestações inseridas nas dimensões simbólica ematerial-estrutural. Para Freitas (1999), as organizações têm servido de modelo às outras instituiçõesda sociedade, uma vez que estas passariam a se orientar pela lógica e racionalidade do trabalho, oque conseqüentemente conduziria a uma homogeneização das instituições na sociedade.

Corroborando com o entendimento de Freitas (1999), Carrieri (2001, p. 35) afirma que na buscapor sua identidade “[...] na interação com o ambiente, os indivíduos, grupos e organizações são indu-zidos a introjetarem símbolos, valores, signos, mitos e histórias que vão confirmando ou reforçandouma cultura e uma identidade que, muitas vezes, não lhes pertence”. Assim, a identidade coletiva, tantodos grupos, quanto das organizações, seria construída a partir da interação dos indivíduos. A cons-trução das identidades organizacionais estaria baseada num processo dialético de interpretação, reconhe-cimento e legitimação referenciados em outros agentes: os indivíduos, grupos, organizações ou gruposde organizações, dispersos no macro ambiente social e institucional.

Vasconcelos e Vasconcelos (2003) também ratificam essa proposição de que a identidade envolveum sentimento de pertencimento, de unicidade do indivíduo em relação ao grupo e de continuidadehistórica, ou seja, de duração ao longo de um determinado período de tempo. Esses autores asseveramque o indivíduo, ao mesmo tempo em que se reconhece por suas semelhanças consigo mesmo, o fazpor suas diferenças em relação aos outros, sendo a identidade, portanto, resultado de um processodialético de identificação e diferenciação manifestado, sobretudo, nas relações sociais.

Para Albert e Whetten (1985), a relação entre identidade organizacional e imagem externa poderiaser transferida aos participantes da organização, como se estes fossem ou possuíssem uma extensãoda organização. Contudo, se por um lado essa perspectiva ressalta aspecto de “posse” de uma dadaidentidade, por outro lado ela abre caminhos para o estudo dos processos de identificação, a partir dosquais autores como Chanlat (1992), Pratt e Foreman (2000), tendem a considerar que a identidadecoletiva emerge a partir das relações entre os indivíduos, quando da formação dos grupos sociais. Nessesgrupos, cada indivíduo seria responsável por representar um determinado papel, uma função socialdentro do grupo, o que implicaria na noção de pertencimento coletivo, num sentimento de filiação.

Assim, ao se considerar a identidade em sua relação com um conjunto de representações sociaiscompartilhadas, como um conjunto de significações culturais e, portanto, os significados simbólicosque ela exprime, autores como Nkomo e Cox Junior (1996) afirmam que a identidade pode ser vista

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como uma dimensão simbólico-cultural que é historicamente construída e, justamente por isso, estásempre sujeita a variações históricas, contradições e ambigüidades no decorrer da vida de um grupo,de uma organização.

Nesse sentido, tanto o contexto externo da organização quanto o interno (as culturas) devemser estudados para se compreender as mudanças ocorridas nas identidades, nos valores, normas e nasrelações sociais, pois, as contradições e as ambigüidades podem criar não uma, mas várias identidadesnas organizações. Dessa forma, é preciso que qualquer estudo a respeito de cultura e de identidadeconsiga destacar essa fluidez, essa dinâmica e crescente transformação histórica pela qual passa umaorganização, um grupo, um indivíduo (Carrieri, 2001).

Os estudos identitários (culturais) são agrupados por Cuche (1996) em duas concepções: aobjetiva e a subjetiva. Na concepção objetiva se considera a identidade como algo tratável por meiode uma descrição, baseada em certo número de critérios determinantes, objetivos e estruturais. Umexemplo são as categorias desenvolvidas por Albert e Whetten (1985): distintividade, centralidade econtinuidade temporal; que levam à instrumentalização de modelos de análise estáveis. Na concepçãosubjetiva, aqui defendida, a identidade é estudada como construções que os indivíduos fazem darealidade social, possibilitando observar seu caráter variável.

Deste modo, ela pode ser entendida como fruto de um processo de interação em múltiplas rea-lidades, que são apreendidas num contínuo de representações e significações compartilhadas (Machado,2005). Assim, defende-se aqui que as identidades sociais se formariam pela prática e posicionamentomútuo dos atores, e também, por direitos normativos, obrigações e sanções que acabam por instituirpapéis a serem assumidos; incorporando a concepção individual de si mesmo e também o reconheci-mento e legitimação dos outros que participam da realidade social do sujeito (Berger & Luckman,1985).

As pessoas tenderiam a se classificar em várias categorias sociais, desempenhando variadospapéis, que permitiriam aos indivíduos se localizarem ou definirem a si mesmos como partes doambiente social. Os estudos da identidade relacionados às organizações, segundo Hall e Du Gay(1996) deveriam incorporar essa noção relacional. O indivíduo, então, inserido na teia organizacionalpode construir sua identidade em relação à organização e a outras categorias subjacentes, como ogrupo de trabalho, de uma unidade, departamento, de um grupo da mesma idade, e até mesmo depequenos grupos com características próprias. Assim, cada membro da organização interagiria pessoale simbolicamente com outros, fazendo, formando e reconhecendo identidades. De fato, como cadaator organizacional realiza várias vinculações sociais, eles buscariam fabricar sua própria identidadefazendo uma síntese dessas vinculações.

Neste sentido, busca-se aqui transcender o enfoque mais tradicional dos estudos organizacionaisde identidade, baseados simplesmente nas categorias estruturais desenvolvidas por Albert e Whetten(1985): distintividade, centralidade e permanência. Em sentido oposto, desenvolve-se aqui a propostatanto de Cuche (1996) como de Hall (2005) da qual seria preferível adotar um conceito operatóriopara a análise da identidade: o de identificação, que é construída a partir das estratégias e táticas (Certeau,1990) dos atores sociais/organizacionais. A questão, então, não seria saber, por exemplo, qual é aidentidade organizacional, mas o que significa recorrer à identificação a determinada organização.

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Se admitirmos que a identidade é uma construção social, a única questão pertinente é: “Como, porque e por quem, em que momento e em que contexto é produzida, mantida ou questionada certaidentidade particular?” (Cuche, 1999, p. 202).

3. Caminhos de Pesquisa

Na investigação empírica adotou-se a abordagem qualitativa, por permitir um aprofundamentona questão da identidade e da identificação. O método de análise empírica foi o estudo multi-casos(Triviños, 1987), com foco nas narrativas (Mumby & Clair, 1997; Czarniawska, 1998) dos atoresfamiliares. Esse caminho permitiu apreender a história de vida de cada expositor (família) entrevis-tado como um estudo de caso em si e, por extensão, a história coletiva da Feira (ao longo de 36 anos)enquanto um conjunto de histórias de vida dos seus participantes.

Esse método se justifica, pois, permite apreender a história de vida de cada expositor comoum estudo de caso em si, e por extensão, a história da feira enquanto um evento social seria forne-cida pelo conjunto de histórias de vida dos expositores mais antigos desta instituição. Já pela utili-zação do método biográfico buscou-se uma discussão profunda do indivíduo em relação ao contextosocial no qual ele está inserido, o que possibilitou a reconstrução de experiências durante sua traje-tória profissional vinculada à própria história social da Feira (Marre, 1991).

Como técnica de coleta dos dados foi realizada a entrevista em profundidade com 56 sujeitosde pesquisa (ver Quadro 1), partindo da premissa de que esta estratégia metodológica é capaz deintroduzir o pesquisador no universo cultural dos indivíduos (Thiollent, 1987). Os sujeitos foramescolhidos por tipicidade, pelo critério de antiguidade (mais de 20 anos), assumindo-se que os maisantigos seriam capazes de expressar por meio de sua história, os processos de construção e recons-trução de identificações ao longo da história da Feira. A definição do número final de sujeitos depesquisa considerou os critérios de diversificação e saturação defendidos por Marre (1991), para acomposição da coleta de histórias de vida.

Para o tratamento dos dados utilizou-se a abordagem da Análise do Discurso, para a qual éessencial a relação da linguagem com a exterioridade, que pode ser compreendida como as condiçõesde produção do discurso (Fiorin, 1989). Nessas condições estão incluídos não apenas o falante e oouvinte, mas também o contexto histórico-social e ideológico da comunicação, elementos consideradosessenciais nos processos de identificação social. A análise dessas inserções contextuais se deu pormeio da observação dos percursos semânticos, compostos por temas e figuras e construídos a partir dequatro estratégias de persuasão relacionadas aos discursos (Faria & Linhares, 1993), descritas a seguir:

1. a construção das personagens no discurso e sua relação com as personagens efetivamenteexistentes permite transferir a responsabilidade do enunciador para o personagem ou oferecerao discurso a legitimidade deste último;

2. a seleção lexical é a escolha do vocabulário usado nos discursos, caracterizando-se pelo usode termos poucos comuns em substituição aos mais habituais, diferenciando o enunciador dasoutras pessoas;

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Quadro 1Características sócio-profissionais dos participantes da "Feira Hippie"

Nome Gênero sexual Idade (em anos) Tempo de trabalho (em anos) Produto Setor de atuação na Feira

1) R. Masculino 52 30 Puf´s e estofados em couro Couros2) D. Masculino 55 30 Brincos e anéis Bijuteria 3) G. Masculino 43 23 Bolsas e cintos Couros4) O. Masculino 54 29 Calçados Couros5) Z. Masculino 48 30 Brincos e anéis Bijuteria6) Z. Feminino 78 34 Brincos, anéis, colares e adereços Bijuteria7) P. Masculino 57 36 Calçados Couros8) W. Masculino 53 34 Trabalhos em prata Bijuteria9) S.N. Masculino 51 26 Montagem de adereços Bijuteria10) A. Masculino 58 25 Brinquedos de madeira Brinquedos11) C.A. Masculino 50 33 Roupas indianas Roupas12) C. Feminino 56 22 Roupas de Criança Roupas13) M.L. Feminino 54 20 Cestos e móveis de madeira Utensílios de casa14) N. Feminino 46 20 Peixe frito Comida15) P. Masculino 58 30 Roupas indianas Roupas16) S. Masculino 80 33 Móveis Movéis17) E. Masculino 49 30 Acrílicos Utensílios de casa18) J. Masculino 54 20 Cortinados de pano Utensílios de casa19) V.S. Masculino 53 32 Artes plásticas Utensílios de casa20) J. Masculino 49 25 Bijuteria Bijuteria21) Z.M. Masculino 52 28 Bijuterias Bijuteria22) A. Feminino 57 22 Acarajé Comida23) E. Masculino 62 35 Montador de barracas24) O.P. Masculino 79 33 Roupas femininas Roupas25) C. Feminino 63 28 Bijuteria Bijuteria26) L.T. Feminino 59 20 Quadros Artes27) L.L. Feminino 66 24 Artigos em Peles de Coelho Variedades28) A.P. Masculino 54 30 Artesanato em madeira Moveis29) R.M. Masculino 48 23 Roupas jeans Roupas30) I . Feminino 64 26 Bordados Utensílios de casa31) R. Masculino 55 20 Quadros Artes32) C. Feminino 54 24 Quadros Artes33) C. Masculino 52 25 Quadros Artes34) A. Masculino 53 28 Quadros Artes35) C. Masculino 64 31 Bolsas e cintos Couros36) C. Feminino 53 24 flores e arranjos Variedades37) M.S. Masculino 50 22 Brinquedos de madeira Brinquedos38) C. Masculino 56 34 Calçados Couros39) N. Masculino 52 25 Calçados, cintos e bolsas Couros40) R.S. Feminino 52 22 Enfeites e adornos Variedades41) L.C. Masculino 50 20 Flores e folhagens Variedades42) M.L. Feminino 73 24 Roupas de criança Infantil 43) L. Masculino 58 30 Roupas de bebês Infantil44) N. Feminino 48 23 Acarajé Comida45) N. Masculino 55 26 Espetinho Comida46) A.C. Masculino 50 24 Bijuteria Bijuteria47) L.D. Masculino 47 23 Calçados, carteiras e cintos Couros48) S.L. Masculino 52 28 Cintos e coletes em couro Couros49) M.Y. Masculino 53 26 Bolsas Finas Couros50) M. Masculino 46 20 Roupas Roupas51) A. Masculino 44 25 Cinto Couros52) C. Feminino 52 21 Arranjos e enfeites Variedades53) F. Masculino 48 30 Calçados Couros54) L. Masculino 52 31 Pulseiras e Relógios Bijuteria55) M.E. Feminino 65 26 Bijouterias finas Bijuteria56) W. Feminino 64 22 Feijão tropeiro e milho verde Comida

Nota: Para preservar a identidade dos sujeitos de pesquisa optamos por representá-los apenas pelas letras iniciais de seus nomes.

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3. as relações entre os conteúdos explícitos e os implícitos criam um efeito ideológico desentido ao se estabelecerem sintática e semanticamente, deixando que outros atores assumama interpretação de algo implícito no discurso;

4. o silêncio sobre determinados temas, ou seja, aquilo que não é dito, que teria a função depromover o esquecimento e excluir temas indesejáveis.

Assim, esta pesquisa buscou reconstruir as visões de mundo dos atores sociais através de umavisão dos sujeitos que presenciaram estes fatos, utilizando para isso a análise do discurso e as metá-foras presentes nos fragmentos discursivos como um todo, formada pelas diferentes interações sociaise dos atores organizacionais e seus desdobramentos no processo de construção de determinadas iden-tificações sociais com a Feira Hippie.

4. Um Breve Histórico da “Feira Hippie”

A Feira de Arte e Artesanato de Belo Horizonte, hoje denominada Feira de Arte, Artesanatoe Produtores de Variedades da Avenida Afonso Pena, surgiu em 1969 na Praça da Liberdade, quandoum grupo de intelectuais inspirados nas experiências de outros países, decidiu criar um espaço artísticoe cultural na cidade, com a finalidade de “levar a arte ao povo” e torná-la acessível a todas as camadasda população (Albano et al., 1984). Para Guerra (2002), as pressões políticas e sociais pelas quaiso país, e Belo Horizonte, passavam nos anos 1960 e 1970 eram fruto de todo um contexto históricode manifestação e contestação à repressão da Ditadura, o qual faz com que “[...] logo no início afeira passa a ‘ser identificada popularmente como FEIRA HIPPIE’, denunciando ‘simbolicamente’uma postura de contestação típica do Movimento HIPPIE americano” (Caldeira, 1998, p. 115).

A “Feira Hippie” pode ser melhor compreendida a partir de uma visão temporal, ondepercebe-se a existência de três momentos distintos1. Cronologicamente, ela pode ser dividida em quatroperíodos a fim de facilitar sua compreensão: a primeira fase se estende de 1969 até 1983, compreen-dendo o momento de criação da Feira, a sua aceitação pelo público e, conseqüentemente, o seu cresci-mento; a segunda fase que corresponde ao período de 1984 a 1988, onde houve um nítido desvirtua-mento das características originais da Feira; a terceira fase, que vai de 1989 a 1991, quando houvea mudança do local da Feira; e a quarta fase que compreende 1992 até os dias atuais. Essa divisãonão é estática, co-existindo assim diferentes características nos momentos de transição. No entanto,essa visão temporal serviu de referência contextual para se analisar os documentos selecionados.

Atualmente, estima-se que a Feira gere, aproximadamente, 15.000 empregos diretos e indiretos,entre os montadores de barracas, carregadores, pessoal de limpeza e fiscalização, além dos 3.000artesãos. A “Feira Hippie” também é tida como a maior atração turística de Belo Horizonte, sendoconsiderada “um verdadeiro shopping a céu aberto” que atrai um contingente maior do que a popu-

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1 Alguns autores consideram que a feira teve três momentos distintos. Entretanto, devido à distância temporal entre apublicação dos documentos exige-se o acréscimo de mais um período (de 1992 até os dias atuais).

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lação de muitos municípios mineiros, cerca de 80 mil pessoas, e movimenta uma parcela “signifi-cativa” do PIB de Belo Horizonte, cerca de 800 mil reais semanalmente (Belotur, 2004, p. 1).

5. Entre Artesão e Industrial: Descortinando Ambigüidades Identitárias

A análise dos percursos semânticos, que se delineiam a seguir, foi construída com base nocorte longitudinal de pesquisa dos trinta e seis anos da Feira Hippie, sendo possível evidenciar, apartir do seu conjunto, a formação de um discurso sobre as ambigüidades identitárias dos atores sociaise organizacionais da Feira Hippie ao longo de sua história. Cada percurso semântico, por sua vez éformado por um conjunto de temas e figuras e metáforas que conformam e evidenciaram a visãode mundo dominante sobre as formas de se perceber e interagir na Feira Hippie. As diferentesvisões representadas pelos percursos semânticos que conformam o discurso das ambigüidades identi-tárias da Feira expressam as respectivas mudanças vividas pelos expositores, tanto no contexto micro,de suas práticas sociais e organizacionais na Feira, quanto no macro-ambiente sócio, político e eco-nômico.

O discurso das ambigüidades identitárias da Feira Hippie de Belo Horizonte, captado por meiodas narrativas dos atores sociais e gestores familiares, foi construído com base em quatro percursossemânticos que se estruturaram a partir de determinados contextos e mantêm relações com eles. Essescontextos perpassam a história de vida dos participantes da Feira e estão presentes em seus discursos.

Os percursos semânticos analisados foram: a) Fundação da Feira: do período de 1969 a 1973,que remete às características que possibilitaram a identificação da Feira como sendo “hippie”, suametáfora principal de identificação foi “Woodstock Mineira”; b) Institucionalização da Feira: doperíodo de 1973 a 1983 e o início da organização por parte da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte(PBH), que tem como metáforas principais a “credencial/convite” e a “burocracia”; c) Descaracte-rização da Feira: referente ao período de 1983 a 1991, e que tem como metáforas principais o “cabidede emprego” e o “curral eleitoral”; e d) Mudança de espaço e de nome da Feira: que compreendeo período de 1991 a 2005, e refere-se ao novo lugar da “Feira de Variedades” na Avenida AfonsoPena e cuja metáfora principal é a do “Camelódromo”, pois, representa o “não-lugar” ou a ausênciade identificação em relação ao novo contexto.

5.1. O percurso semântico da fundação da Feira: o elo entre arte, artesanato e feira

O percurso semântico da fundação da Feira aparece descrito de duas formas diferentes: noprimeiro caso, a criação da feira é identificada com a personagem artistas, enquanto que no segundocaso ela seria identificada com a personagem artesãos. Os principais temas abordados foram: a) criaçãoplanejada; b) criação espontânea; c) produção artística; d) influência hippie.

O que se observou foram versões de seu começo, contudo, versões que a ligam às artes e aoartesanato, e em que, muitas das vezes, estes dois vocábulos são tidos como sinônimos, como algoinseparável. Como diz Frota (2005, p. 16) “a designação polissêmica de “popular” abrange desde a

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classe trabalhadora que mantém um rede de relações viva e compartilhada em seu território, nocampo e na cidade, bem como um universo heterogêneo de camadas.

Uma versão sobre o surgimento da Feira segue a perspectiva de que ela teria sido fruto deum movimento artístico planejado, onde se rejeita a participação do elemento “hippie” na criação daFeira. Utiliza-se da mobilização de duas personagens discursivas: “um grupo de intelectuais mineiros”,a quem é atribuída à responsabilidade pela criação da Feira e os “hippies”, que são tidos como membrosnão participantes do processo. As funções de ambas as personagens estão explicitas nos grifos2 dofragmento (01). A exclusão da influência do movimento “hippie” expressa nesse fragmento reforçao tema explícito de que a Feira teria sido criada por uma elite cultural e no implícito pressuposto deque essa elite não tinha relação com os “hippies” ou com o seu modo de vida. É interessante notarque o enunciador silencia sobre o fato de a Feira ter se tornado conhecida por Feira Hippie, o queseria inesperado se partir da premissa de que ela foi criada por uma elite cultural local.

(01) “Criada em 1969 por um grupo de intelectuais mineiros, [...] a Feira atual [...] tambémficou conhecida por Feira Hippie – embora os ¨hippies¨ não tivessem nada a ver comsua criação [...]” (Lopes, 1996).

Por outro lado, o trecho (02) evidencia a tese da casualidade, pois a Feira começa a se auto-organizar com algumas pessoas expondo no espaço da praça. Evidencia-se nesta versão que até1969 nada havia de “hippies”, mas outros grupos da sociedade mineira mostravam e vendiam seustrabalhos. Contudo, o grande número de “hippies” que apareceu na Feira fez “gerar o cunho” de FeiraHippie. O uso do vocábulo “cunho” mostra a forte influência “hippie”, a despeito de ser negada.Esta versão traça também uma distinção social entre os criadores da Feira (nível econômico maisalto) e os “hippies” (nível econômico mais baixo), como se observa no fragmento a seguir.

(02) “no final de 67 já tinha lá senhoras com bordados, algumas pessoas vendendo biju-terias [...] com um nível um pouco diferente da idéia do movimento hippie. [...] Em1969 os hippies começam a aparecer por volta de outubro de 69, quase no ano de 70. Eaí até gerar o cunho de Feira hippie” (Entrevistado n° 30)

A despeito da tentativa de se negar a influência “hippie” no surgimento da Feira, observa-se aseguir o uso do recurso polifônico, marcado pelo uso de aspas, indicando a fala de outra pessoa, ouseja, a veiculação, em tom de concordância, das idéias difundidas pela personagem “Maris’stellaTristão”, explícitas no fragmento (03), para se referir aos temas “liberdade”, “questionamento”, nota-damente marcados pelo movimento “hippie”, conhecido também como contracultura. No trecho,infere-se que a figura “Woodstoock” é colocada para situar o leitor sobre as características intrínsecasao surgimento da Feira, traçando um paralelo como movimento contracultura ocorrido nos EUA. Aseleção lexical “Woodstoock mineira” funciona como uma metáfora para se referir, de modoimplícito subentendido, ao significado de contestação, de liberdade que a “Feira Hippie” possuía e

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2 Todos os grifos nos trechos das entrevistas são dos autores e têm a função de clarear a argumentação.

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não possui mais, pois a conjugação do verbo “havia” no pretérito imperfeito do indicativo – implicano implícito pressuposto de que a Feira não mais possui essa característica.

(03) “havia ‘todo aquele clima de uma Woodstoock mineira’ [...] (Maris’stella Tristão)”(Acervo Belotur, 2004).

Contudo, o tema da produção artística é que define a identidade desses feirantes. Mais pre-cisamente, é a produção de artesanato que os definem como artistas. Artesanato enquanto forma deexpressão cultural. No artesanato há a técnica de se trabalhar certos materiais, mas existe “uma dosede carinho”, que faz cada produto único, uma peça de arte. O uso da expressão, “cultura de artesanato”,expõe uma visão de que o produto pronto é a expressão de uma cultura e essa confere ao produtoruma identidade, a de ser artesão.

(04) “O artesanato é uma coisa feita com [...] uma dose de carinho. A cultura do arte-sanato é diferente do que a de qualquer outro produto. [...] o artesanato não é feito emsérie [...] uma peça, ela sai diferente da outra” (Entrevistado n° 15).

Para os feirantes o artesanato é a vida deles, por que é através do artesanato que eles con-quistaram um espaço – físico e simbólico – na sociedade mineira. Muitos dos feirantes, se nãotodos, mas, são reconhecidos pela produção artesanal. O artesanato é o elemento de identificaçãocom a feira e que lhes deu uma identidade, através dele os feirantes imprimem as suas interpre-tações das expressões artísticas da cultura. A identidade de sua família também é baseada na pro-dução artesanal, assim todos devem participar desta criação, em todas as suas fases da criação atésua venda final. Já o trecho (05) evidencia explicitamente a combinação entre “arte” e “ofício” quedifere este dos demais tipos de trabalho.

(05) “É uma coisa que tem arte [...] que mistura arte com o ofício. Não é só fazer umproduto não. Tem que ter um pouco de arte nele” (Entrevistado n° 22).

5.2. Percurso semântico da institucionalização: a “burocracia entra na feira”

Neste percurso surgem dois temas essenciais: a) da versão oficial do surgimento e finalidade daFeira, b) e o da burocracia na feira, através da regulamentação, da seleção e controle dos feirantespela prefeitura.

Sobre o tema da identidade oficial da feira, segundo uma versão difundida e registrada pelaPrefeitura Municipal de Belo Horizonte, no primeiro Regulamento da Superintendência de Turismo daPrefeitura de Belo Horizonte da Feira de Arte e Artesanato, datado de 20 agosto de 1972, revela amobilização das seguintes personagens: os artistas e críticos de arte que compuseram um grupo eidealizaram a Feira e o prefeito que acatou a “sugestão” deles e resolveu instituí-la.

O tema da finalidade oficial da criação da Feira, o Regulamento da Feira de Arte e Artesanato,elaborado pela Superintendência de Turismo da Prefeitura de Belo Horizonte em 20 agosto de 1972,deixa explícito as suas funções culturais, sociais e econômicas.

(06) “Art. 4 - Instituída com a finalidade de promover, divulgar e popularizar as artes

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plásticas e o verdadeiro artesanato, a FEIRA se destina a dar oportunidade a artistase artesãos [...] para vender, em logradouro público aberto, o produto de seu trabalho [...].”(Superintendência, 1972, p. 1).

Funções culturais explícitas no trecho, as expressões “artes” e “verdadeiro artesanato” geram oimplícito pressuposto que a Feira deverá expor produtos relacionados à cultura, sendo possívelextrair, pelo menos mais dois implícitos, um relacionado à expressão “verdadeiro artesanato”, quegera um implícito pressuposto que existe o “artesanato ilegítimo”, e outro, um implícito subentendido,de que o verdadeiro artesanato estaria ligado à cultura e seria, portanto, melhor que o “artesanatoilegítimo”.

À principal função da Feira (a cultural) são acrescidas funções sociais veiculadas por meiodas expressões “dar oportunidade”, e “em logradouro público”, que implicam no implícito suben-tendido que a Feira deveria ter um caráter coletivo, voltada ao público de um modo geral; e tambémfunções econômicas que podem ser apreendidas pelas seleções lexicais: “vender”, o que pressupõe o envol-vimento de, pelo menos, dois agentes numa relação comercial, ratificada pelo aposto especificativo“em logradouro público aberto”, determinando o lugar de materialização dessa relação e “produto”,implicando no implícito pressuposto da fabricação deste produto e, portanto, das relações econômicasenvolvidas no processo. Além disso, outro aposto especificativo “o produto de seu trabalho”, deter-mina qual a característica dos produtos a serem vendidos, a que se chega por meio do implícito pres-suposto contido em “seu trabalho”, ou seja, exclui a possibilidade de venda de trabalhos de terceiros.

Se no discurso oficial os feirantes iniciais não foram mencionados como importantes para aorganização da Feira, o inverso não é totalmente verdadeiro. Há entrevistados que vêem a entradada Prefeitura como importante para a preservação da identidade, da qualidade dos produtos e dotamanho da Feira. Mas há também aqueles que a percebem como a vinda de uma “burocracia” –metáfora principal para compreender a identificação gerada nesse período – e um poder que decidequem é ou não artesão e, portanto, o feirante que poderia participar.

(07) “Foi em 1973 que eles [da Prefeitura] começaram a entrar. [...] Até então nãotinha organização da prefeitura. A Feira era feita dos artesãos pros artesãos. Assim,não tinha nenhuma credencial [...].” (Entrevistado n° 42).

(08) “A prefeitura entrou lá na Feira por volta dos anos 1973, por aí. Aí apareceu aMaris’stella Tristão com o marido dela [...] Aí ele começou a distribuir o cartãozinhodele como secretário [...] Então ele dava esse cartãozinho, que fazia tipo um ‘convite’pra você ir expor na Feira; assim, você estava convidado a expor na Feira aos domingose aquela coisa. Mas nos já távamos lá, entendeu? [...] Foi a primeira vez que chegarama por burocracia na Feira, foi isso. Aí começou a ter pessoas pra fazer avaliação praoutras pessoas entrar na Feira [...]” (Entrevistado n° 20).

O processo de avaliação (08) seleção descrito e instituído pela diretora era do suposto artesãofazer um trabalho em frente à comissão. O trabalho deveria ser considerado “artístico e artesanal”.Destaca-se o uso dos vocábulos artesanal e artístico, simultaneamente, para os produtos a serem apre-sentados para a comissão. Não bastava ser exclusivamente ou artístico ou artesanal, mas deveria

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ser os dois. Artesanal pelo fato de estar sendo feito pelo “sujeito” interessado em entrar na Feira; eartístico pelo fato de ser único, não “ser repetitivo”. Há o implícito pressuposto de que, então, o trabalhoartesanal não necessariamente é artístico, ou poderia não ser considerado pela comissão técnico-con-sultiva da Feira.

5.3. O percurso semântico da descaracterização: o “cabide de emprego” e o curral eleitoral

Neste percurso semântico observam-se os temas: a) do processo acentuado de descaracterizaçãoda Feira, principalmente devido ao seu crescimento desordenado; que foi causado pelo tema b) dasdisfunções burocráticas da administração realizada pela prefeitura, onde destaca-se o clientelismopolítico, e a emissão e concessão de pedidos para obtenção de vagas de maneira irregular, ou seja,não passando pelos critérios de seleção elaborados pela comissão técnica consultiva. Conseqüen-temente, chega-se ao tema c) da perda de qualidade dos produtos que ali eram comercializados.

Como se pode observar, no fragmento (09), aparecem mobilizadas as seguintes personagensdiscursivas explícitas: os “artistas” idealizadores que tinham o papel de avaliar e coordenar a Feira;a “Prefeitura”, que assume o papel de gestora e não consegue administrar; e os “artesãos desvincu-lados da arte” que conseguiram entrar na Feira. Em “artesãos orientados” por artistas, infere-se pormeio de implícito subentendido o domínio do saber, o caráter supremo destes sobre os primeiros e opoder de coordená-los no momento inicial.

Já em “a qualquer artesão desvinculado da arte garantiu-se carta de expositor”, entende-sepor meio de implícito pressuposto que os expositores não considerados como artistas nem artesãosobtinham outros meios de ingressarem na Feira. A relação entre as expressões “trabalho endossadopela Prefeitura” e “a Feira cresceu desordenada”, infere-se por meio de implícito subentendido que ocrescimento desordenado da Feira se deu a partir da administração da Prefeitura. O que é confirmadopelo termo “endossado”, utilizado pelo enunciador para asseverar a responsabilidade da Prefeitura.

(09) “No início, os artesãos eram orientados por esse grupo de artistas [comandados porMaris’stella Tristão]. Depois, o trabalho foi endossado pela Prefeitura que passou acredenciá-los. A Feira cresceu desordenada, a qualquer artesão desvinculado da arte garan-tiu-se carta de expositor.” (Moura, 1988).

Segundo o fragmento discursivo (10) o crescimento está associado fundamentalmente às licençasconcedidas do tipo “convite” para expor na Feira, isto é, tais licenças proporcionavam o direito ao seuportador de expor seus produtos sem passar por nenhum tipo de avaliação da comissão de especialistas,diferentemente do que ocorria no início da Feira quando as licenças eram quase que exclusivamente dotipo “credencial”, isto é, os seus portadores haviam sido selecionados pela comissão técnica-consultiva.Isso proporcionou, segundo a maioria dos entrevistados, dentre outras conseqüências, uma vertiginosa perdada qualidade dos produtos que eram expostos. É explícito que aumentou a interferência dos políticos naFeira e que estes conseguiram, ao final, tirar a diretora Maris’stella Tristão.

(10) “Por que era assim, tinha o grupo das credenciais que era dada pela Maris’stella,tinha “os caras” de convite, poucos ainda, coisa de políticos. Depois foi crescendo, e

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os políticos começaram a dar mais convites. No fim, eles [políticos] conseguiram tirara Maris’stella” (Entrevistado n° 16).

Percebe-se que a Feira, antes de arte e artesanato, passou a ser uma espécie de “curral eleitoral”,onde muitas vezes pessoas sem nenhum vínculo, aptidão ou relação com as artes ou com o artesanato,passaram a conseguir espaços, em troca de votos e apoio a determinados políticos. Isso pode ser veri-ficado nas correspondências interinstitucionais, em especial entre a Câmara de Vereadores e a Secretariade Turismo da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte.

Os fragmentos discursivos (11) e (12) também se referem ao tema da mudança da Feira peloseu uso na politicagem local como moeda de troca, mantendo uma clientela de favorecimentos emtroca de votos. Observa-se a seleção lexical do verbo “virar”, dando um sentido de transformaçãoruim, pois, representa uma perda para a feira da manutenção de suas características iniciais já que apersonagem Maristella era contra o uso político da Feira.

Para os feirantes a Feira transformara-se em um “cabide de emprego”, principal metáforausada para evidenciar o novo tipo de identificação estabelecido na Feira: o favorecimento político.Destaque se faz ao trecho do Fragmento (08), ou melhor no questionamento: “Quem não queria ter umabarraquinha ali?”, onde está explícito que muita gente de Belo Horizonte queria uma barraca naFeira, implícito subentendido que a Feira era um ótimo lugar para se ter um negócio, talvez o melhorde Belo Horizonte aos domingos.

(11) “A Feira virou um cabide de emprego. Quem não queria ter uma barraquinhaali?” (Entrevistado n° 29).

(12) “Foi substituir o artesão por interesseiro. Pessoas que só queriam ir lá para ganhardinheiro. Essa foi que a pior mudança que houve” (Entrevistado n° 31).

Destaca-se o fragmento (12), mais precisamente ao trecho onda há a referência aos personagensartesão e interesseiro – “substituir o artesão por interesseiro”, estando implícito subentendido aperda da identidade, pois era o conjunto de artesãos que dava a identidade institucional de Feirade arte e artesanato. Implícito subentendido também está perda da qualidade. A seleção lexical “interes-seiro” na denominação do personagem que se contrapõe ao artesão pelo enunciador reporta-se ao jogoda politicagem, é explícito que “o interesseiro” estava lá para ganhar dinheiro e não expor sua arte.Assim, infere-se que este personagem mercantilizava as relações na Feira fazendo com que ela deixede ser uma família de artesão.

5.4. A Feira de Arte, Artesanato e Produtores de Variedades: “Não-Lugar” da Avenida Afonso Penaou simplesmente o “Camelódromo”

Este percurso semântico é o dos temas da mudança espacial, de nome oficial, e suas implica-ções na identificação dos feirantes com o espaço físico e simbólico da Feira. Na mudança tudo setransforma: barracas, espaços, setores, feirantes, fregueses..., destaca-se contudo, que a alcunha de“Feira Hippie” continua. O trecho (13) evidencia a manobra política da Prefeitura para acabaracom a “feirização” da cidade ao reuní-las em um único espaço, sob o mesmo nome. Surge assim, a

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Feira de Artes, Artesanato e Produtores de Variedades da Avenida Afonso Pena, composta principal-mente pelos membros da “Feira Hippie” que foi retirada da Praça da Liberdade e por membros devárias outras pequenas feiras que aconteciam na cidade.

Mas para que isso ocorresse, a prefeitura precisava do apoio da maioria dos feirantes e comomuitos deles estavam em situação irregular (não possuíam licença), a prefeitura resolveu licenciartodos os membros das diferentes feiras desde que houvesse a mudança para um novo espaço. Nestesentido, aqueles que já tinham as credenciais (os feirantes “legítimos”, antigos, ou ainda aqueles quese dedicavam às artes e ao artesanato) tornaram-se “minoria” e passaram a não mais se identificarcom a lógica daqueles que entraram e visavam apenas o lucro.

(13) “Tinham mais de 4 mil pessoas inscritas querendo emprego na Feira. Mais espaçofísico. Então a Prefeitura mudou para dar mais espaço, para dar chances para aquelesque estavam de fora” (Entrevistado n° 34).

Assim, em 1991 a Feira de Artes e Artesanato de Belo Horizonte, mais conhecida pelo codinomeFeira Hippie, deixava a Praça da Liberdade e era transferida para a Avenida Afonso Pena, onde seriarebatizada de Feira de Arte, Artesanato e Produtores de Variedades. A mudança não era só física, mas,sobretudo, simbólica. Perdiam-se as raízes historicamente construídas pelas pessoas da cidade, tantofeirantes quanto fregueses. Nesse caso o novo espaço da feira apresentava-se como vazios de vínculossociais, identitários e, talvez o mais importante, sem vínculo de memória entre as pessoas e o lugar.Aparecendo, então, como um não-lugar. Nesse sentido é que Augè (1994, p. 73) afirma que define “seum lugar pode se definir como identitário, relacional e histórico, um espaço que não pode se definir nemcomo identitário, nem como relacional, nem como histórico definirá o não-lugar”.

O fragmento (14), evidencia mais claramente a alteração do nome da Feira devido à mudançade local e incorporação de novos tipos de produtos e participantes, implícito pressuposto a que sechega pela relação entre conteúdos da Feira de “Arte, Artesanato e Produtores de Variedades” emoposição à “antiga Feira de Arte e Artesanato”. Nesse trecho, o novo nome expressa a adequaçãoda Feira às novas características, e estabelece uma estreita relação com o percurso semântico da des-caracterização da feira. Nesse fragmento, o aposto especificativo “quando se transferiu para a AvenidaAfonso Pena” indica de modo explícito a mudança espacial ocorrida na Feira. Ainda como implícitopressuposto, o trecho traz as personagens “artesãos” de hoje, que não são nem “hippies” nem inte-lectuais “hoje tem pouco ou quase nada a ver com a antiga [...] Feira Hippie”. A seleção lexical “pom-posamente” denuncia uma ironia relacionando o nome ao conteúdo (aos produtos da Feira).

(14) “Batizada pomposamente de Feira de Arte, Artesanato e Produtores de Varie-dadesdesde janeiro de 1991, quando se transferiu para a avenida Afonso Pena, a Feira de hojetem pouco ou quase nada a ver com a antiga Feira de Arte e Artesanato (Feira Hippiecomo era conhecida, porque seus primeiros artesãos compunham-se de um grupo hippie/intelectual.” (Acervo Belotur, 2004).

O trecho (15) também evidencia a relação entre a mudança espacial, as injunções políticasocorridas com o processo de institucionalização da Feira, e a mudança identitária. Assim, o deslo-camento da Feira é usado para legitimar as mudanças da mesma, implícito subentendido a que se

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chega a partir dos apostos explicativos “inclusive o nome da Feira” e “porque tem determinadossetores que você não tem condição de ter um produto 100% artesanal, vai ter um maquinário” quejustificam o fato da mudança de nome. O enunciador mobiliza a personagem “Feira”, que recebeum novo nome, onde se percebe, através da seleção lexical “Produtores de Variedades”, a novacategoria criada para legitimar aqueles que não se enquadravam no tipo de produção antes exigidapela então Feira de Arte e Artesanato.

(15) “A Feira mudou muito de 1969 pra cá, quer dizer, cresceu muito, a Feira hoje não ésó “hippie”, é um ponto turístico da cidade, e [...] ela teve que se adaptar ao mundoné, à tecnologia, à moda, então, muita coisa foi mudando, inclusive o nome da Feira, queera Feira de Artes e Artesanato [que] passou a se chamar Feira de Artes, Artesanato eProdutores de Variedades, porque tem determinados setores que você não tem condiçãode ter um produto 100% artesanal, vai ter um maquinário, né [...]” (Entrevistado n° 01).

Ressalta-se no fragmento discursivo acima a seleção lexical do trecho: “um ponto turísticoda cidade”, agora a Feira pela sua extensão torna-se um ponto turístico, se na Praça havia dois pontosturísticos: a Feira e a Praça, na Avenida Afonso Pena o que atrai as pessoas é a Feira somente. Aindanesse fragmento está explicito que a Feira teve que se “adaptar ao mundo”, a “tecnologia”, a modapara continuar existindo, o que leva ao implícito subentendido de que os feirantes é que tiveram de seadaptar para continuarem feirantes, sobrevivendo enquanto empreendedores familiares. Mas se paraos fregueses os feirantes tiveram que se adaptar, o inverso também é verdadeiro. A maioria dos feirantesmais antigos declaram que a mudança espacial fez os públicos freqüentadores da Feira mudasse (16)e (17). O fragmento (17), através das personagens “elite” e “povão”, classes sociais opostas, mostra oque aconteceu na mudança. Assim, o modo artesanal e a criação artística dos tempos iniciais, ondecada produto era único, vai se perdendo, assim como a sua identidade.

(16) “Afetou sim a mudança, houve uma perda de volume de vendas muito grande. Amudança dela da Praça da Liberdade para a Afonso Pena mudou o tipo de público, quefoi alterado violentamente.” (Entrevistado n° 03).

(17) “Se antes na Praça era a elite que ia, agora na mudança a Feira ficou mais centrale aí quem vem é o povão, né.” (Entrevistado n° 19).

Assim, a partir dessas mudanças, a identificação do feirante passa a ser abalado e entra emcrise, uma vez que ele tem que escolher entre se adaptar às novas exigências que a Feira lhe impõe,e que muitas vezes, conduzem ao rompimento com o processo de criação artística e artesanal; oucontinuar a com este tipo de produção, o que muitas vezes significa a incapacidade de produzir em grandequantidade, a incapacidade de concorrer em termos de preços e possivelmente a perda de clientes,etc. Apesar disso, como é levantado no trecho (18) a profissão de artesão não existe ainda, não foireconhecida. Ela é legalizada enquanto ocupação dos expositores da Feira, ela foi legalizada pela Pre-feitura. Isso diminui o status social que a profissão deveria ter em relação ao status social do comer-ciante de variedades tido como “pequeno empresário”.

(18) “É legalizado, só não é reconhecido. Porque a profissão de artesão [...] nós entramos

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com um recurso em Brasília tem mais de dez anos, pedindo o reconhecimento da pro-fissão e até hoje não saiu” (Entrevistado n° 01).

(19) “Eu já cheguei uma fase de artesão para pequeno empreendedor. Pequeno empresárioporque o produto ainda continua sendo artesanato.” (Entrevistado n° 22).

(20) “Hoje eu brincando e brincando eu dou renda aqui para minha família e mais 300pessoas.” (Entrevistado n° 04).

A identificação de muitos dos feirantes com o conceito de arte e artesanato, visto no primeiropercurso semântico, começa a ser abalada e surge uma tensão entre a manutenção de uma dada iden-tidade e a mudança para outra, mais condizente com as “necessidades” do mercado. Mas existe, comomostrado no Fragmento (19), uma tendência dos feirantes caminharem para se tornar empresário,micros ou pequenos empresários, pois, a história da Feira de variedades – onde hoje freqüentammais sacoleiras que turistas, onde se vendem Barbies e Bobós de camarão –, dirigiu aos poucos atransformação dos antigos “hippies” e artesãos em produtores de um “industrianato”, um produto meioartesanato, meio industrializado como seus criadores explicitado no trecho “Pequeno empresárioporque o produto ainda continua sendo artesanato”. O tema do pequeno empreendedor tambémestá explícito no fragmento (20) evidenciado pela possibilidade na Feira de conseguir renda para osustento da família e para mais trezentas pessoas. Fica implícito subentendido da importância de serum pequeno empreendedor, da importância social dele e da Feira para uma sociedade com altas taxasde desemprego.

Observa-se que o pequeno empresário ou empreendedor emprega o “industrianato”, enquantoa construção de um processo misto entre produção industrial e artesanal, como uma estratégia social-mente elaborada a fim de tentar manter os ideais de criação e ao mesmo tempo aumentar a capacidadede produção em escala a fim de poder competir com os outros artesãos. Assim como diz o entrevis-tado no trecho: “a primeira peça sou sempre eu que faço”, fica implícito subentendido que a primeirapeça é o artesanato em si, é nela que está a arte da criação, que a diferencia das outras, e isto cabe aele fazer. Depois, começa a execução daquela peça em uma linha de montagem que ele “tercei-riza”. Além disso, há inúmeros profissionais que estão usando a Feira como forma de complemen-tar sua renda (familiar), metaforicamente denominados pelo enunciador do fragmento a seguircomo “engorda renda”, pois não são artesãos/artistas, mas expositores que têm outra profissão.

(21) “Eu faço o seguinte: a primeira peça sou sempre eu que faço. E aí eu procuro umapessoa e treino esta pessoa para ela ser o aprendiz do artesão e ela vira uma chefe deequipe. E aí ela começa a trabalhar em cima da peça piloto e então do ateliê ela vai pegaro produto estampado e tingido e ela vai só bordar. E ela vai formando as equipes. E asequipes só vão crescendo cada vez mais dependendo da minha demanda [...] Cada umjá controla a sua equipe e já me dá o trabalho revisado. Eu só tenho contato com oschefes das equipes.” (Entrevistado n° 15).

(22) Hoje dentro da Feira tem de tudo. Tem médico, tem engenheiro tem tudo, com umabarraquinha dele lá vendendo. São os engorda renda. Não são artesãos mesmo que fazemo seu próprio produto” (Entrevistado n° 17).

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A mudança de características da Feira que compunham sua função original, de um lugar paraum não-lugar e de um espaço cultural para espaço comercial, é metonimicamente explicitada pelas“peças em série” que passam a substituir o “artesanato mineiro, de qualidade”. No trecho a seguirsão mobilizadas as personagens, explícita, Yara Tupinambá, que crítica as atuais características dafigura discursiva “Feira” onde predomina a produção em série sem criatividade e, implícita, as pessoasque fabricam o artesanato em série para vender. Isso evidencia a transição da antiga identificaçãocom a arte e o artesanato para uma nova identificação baseada no lucro.

(23) “A Feira de Artesanato da Avenida Afonso Pena, acredita [Yará Tupinambá], virouum grande comércio. ‘Um enorme camelódromo’, [...] um cenário desolador, entregueas peças feitas em série, sem o menor cuidado criativo. O que falta é uma identidadecultural [...] Na situação econômica em que estamos, é muito mais cômodo repetir” (Stábile,2004).

Essa mudança é destacada pelos feirantes, para mostrar que a Feira mudou de público e estáse transformando num mercado, em um lugar de compras para sacoleiras. Há nesta transformaçãouma perda, ou melhor, uma mágoa (ou raiva) como está implícito subentendido na seleção lexicaldo vocábulo “mercado a céu aberto” no fragmento a seguir.

(24) “E essa Feira ali funciona como um mercado a céu aberto [...] Porque a Feira mudou.Não é mais igual o início da Praça da Liberdade. Hoje é Feira de sacoleiras. É um came-lódromo.” (Entrevistado n° 12).

Esse último fragmento completa este percurso semântico remetendo ao tema implícito pres-suposto da existência de empresários artesãos. Os demais percursos semânticos indicam a trajetóriaque permitiu a esses artesãos chegarem até aqui. Observa-se nessa trajetória que os artesãos, comsuas práticas antigas, continuam a existir na feira. Mas na medida em que dividem o espaço e o públicocom os outros atores, sejam eles simples vendedores, ou os novos pequenos empresários (empreen-dedores) essas identidades se cruzam, há espaço para a crítica, para o saudosismo e para a buscapor legitimidade. A ambigüidade identitária marca a transição das identidades, a ausência de umaclivagem na qual apenas uma permaneceria.

6. Considerações Finais

Este artigo analisou o discurso das ambigüidades identitárias vivenciadas pelos atores sociaisrepresentantes de organizações familiares da Feira Hippie de Belo Horizonte ao longo dos seus 36anos de existência. O primórdio da feira surge associado a produtos artesanais expostos em conjuntocom feirantes, muitos considerados “hippies”, o que criou no seu início a alcunha de Feira Hippie.

Contudo, o tema da identidade dos feirantes e da própria Feira não é estanque, muito pelocontrário, extremamente dinâmico. A Feira aos poucos acaba por servir de espaço de negociação,às vezes de forças desiguais, mas que a partir dela é que se constroem, modificam, consolidam-se emantem-se valores comuns entre os indivíduos. A partir das diferentes negociações entre os diversos

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atores sociais (políticos, eleitores, artesãos, feirantes, artistas, hippies, industriais, empresários, etc.) éque a Feira passa a ser mediadora de outros “valores” que não aqueles estritamente ligados à suaorigem, isto é, aqueles valores considerados artísticos e artesanais que orientaram os princípios deconfiguração e formação de sua identidade inicial.

Assim, a identidade da Feira fragmenta-se especialmente quando da mudança espacial, inúmerasidentificações surgem. Aos poucos a produção de “variedades” se torna o principal elemento identi-ficador da Feira com seus feirantes. O principal objetivo de muitos desses atores sociais passa a sero ganho econômico.

As narrativas elaboradas revelaram a tensão entre manutenção/mudança das identidades deartesão/industrial. Ao contrário do início da Feira quando os expositores buscavam nela uma formade manifestação da sua arte/artesanato. Aos feirantes iniciais, os sujeitos da pesquisa, couberam viveras ambigüidades, tais como: a) ser feirante ou pequeno industrial; b) manter sua marca pessoal mesmoquando a produção tem um padrão coletivo; c) ser produtor familiar ou empregador (precário) depessoas; d) produzir para sacoleiras (mercado interno) ou exportar. Ambigüidades que foram apreen-didas como o resultado de um processo histórico permeado por contradições advindas de significaçõesintersubjetivas por parte dos vários atores organizacionais que compõe a Feira.

A relevância deste estudo pauta-se na exploração de temas importantes para os estudos orga-nizacionais, como o de identidades e de organizações familiares dentro de uma perspectiva crítica(Davel & Alcadipani, 2003) histórica e contextual, mas que ainda se encontram marginalizados pelaacademia brasileira ainda muito preocupada em seguir a orientação dos estudos em âmbito interna-cional, mesmo que isso não se traduza em contribuições à produção nacional ou que não sejam com-patíveis com o contexto brasileiro (Rodrigues & Carrieri, 2001). Nesse sentido, o presente estudobuscou trazer à tona o estudo das práticas sociais nas organizações familiares e suas relações com aconstrução de identidades sociais como arcabouço teórico para entender a evolução histórica e contextualdas organizações em estudo. A proposição aqui defendida é que esse seria um caminho para a com-preensão de mudanças simbólicas nas organizações, uma argumentação sustentada tanto pelas evidênciasempíricas, quanto pelo entrecruzamento de bases teóricas.

Algumas contribuições podem ser evidenciadas deste estudo. Ao adotar a perspectiva da iden-tificação (Cuche, 1996; Hall & Du Gay, 1996; Hall, 2000) busca-se fazer emergir a noção dinâmica erelacional da identidade com o contexto sócio-histórico. A identificação é construída pela subjeti-vação das manifestações dos outros atores sociais (organizações, instituições) propiciando àquelesintrojetarem significações que trabalhariam em um espaço ambíguo entre a manutenção ou não deuma visão de mundo. Assim, busca-se aqui não rejeitar os critérios estruturais de distintividade, centra-lidade e permanência (Albert & Whetten, 1985) que servem de parâmetro para o estudo de identidades,mas pelo contrário aprofundá-los ao introduzir uma dimensão subjetiva, contextual e dinâmica da cons-trução do significado de uma dada identificação.

Como Caldas e Wood Júnior (1997) especularam conceitualmente e Pimentel et al. (2005) apontaramem seu estudo empírico, os critérios estruturais de distintividade, centralidade e permanência só podemser assim interpretados em um dado contexto sócio-histórico e cultural bem delineado, pois quando damudança desse contexto tais critérios passariam a incorporar uma nova lógica e, com isso, a refletir

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novos parâmetros. Nesse sentido, não haveria, a priori, algo permanente, já que essa definição não seriaatemporal, mas sim contextual. Como conseqüência, tampouco, poder-se-ia falar de uma centralidadeimutável e tautológica (como defendia Parmênides), mas sim de centralidades contextuais e mutáveis, jáque o princípio de tudo é o constante caráter de mudança (Heráclito, 1989). E por fim, a própria distin-tividade, nesse sentido, se daria também em conseqüência dessa mutabilidade contextual da centralidadee permanência. Portanto, a contribuição que se pretende deixar com este estudo é a de que os critériosestruturais de análise devem ser considerados de forma relativa, contextual e dialética, incorporando comopano de fundo a análise dos contextos de produção do discurso e suas formações sociais e ideológicas,que em última instância, auxiliariam a transcender os modelos demasiadamente objetivos e opacos de análisesocial, promovendo uma análise que superasse as dicotomias entre níveis micro e macro, objetivos esubjetivos, chegando assim a um modus operandi mais próximo do real.

Vale destacar que o próprio método de estudo – Análise do Discurso – contribuiu para oentendimento desses processos de identificação, da captação das ambigüidades e de construção deidentidades que são manifestadas por meio do e no discurso, e que, por esta razão, serviram de parâ-metro para os feirantes justificarem, legitimarem e adotarem determinadas visões de mundo queorientam as suas ações sociais. É igualmente importante frisar que os discursos veiculados pelos sujeitossociais referem-se a (re)construção dos fatos de acordo com suas memórias e, portanto, são marcadospela subjetividade. Mas, para a Análise do Discurso eles são tão importantes quanto qualquer docu-mento, uma vez que estão inseridos em um contexto de produção que, em última instância, serviriade parâmetro expressar o que é ou não dizível naquele contexto.

Por fim, as narrativas construídas pelos produtores de arte estudados possibilitaram mostrarestratégias de sobrevivência desses artesãos e suas famílias na maior feira do Brasil, estratégiasprincipalmente ligadas na manutenção da identificação de artista popular, família e organização.Identificação relacionada a uma produção considerada deslocada do centro, muitas vezes “anônima,anedótica, estática, e, sobretudo, considerada sem conceito” (Frota, 2005, p. 15), não uma arte consi-derada erudita, ou como diz Escobar (1996) desconsiderada uma arte da alta elite, qualificada comocontemporânea, do futuro, enfim, sempre central no cenário artístico urbano, mas uma arte que retratauma produção simbólica, “uma biografia, a fim de criar seu projeto artístico, a sua identidade social”(Frota, 2005, p. 16).

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235

Ambigüidades identitárias na “Feira Hippie”/Brasil

Page 84: COG -13-2

Abstract. This paper aims to discuss the identity ambiguities experienced by the social actors, whichrepresent a set of small family businesses in “Feira Hippie” of Belo Horizonte (Minas Gerais/Brazil).The theoretical support comes from the studies of identity and the process of social identification.The empirical data comes from a longitudinal study about family business. The research methodadopted was the qualitative method, based on Discourse Analysis and life history applied in thefamily managers about these lives and their 36 years of work in Belo Horizonte’s “Feira Hippie”.The analysis showed that the process of construction and reconstruction of specific identificationsin the Fair has a close relation with its family business. These ones looked for fill spaces (physicaland symbolic) as a way of demarking their territories. Besides, it has observed that the family business’dynamic as well the physical and symbolic spaces’ occupation, have an active role in the process ofconstruction and reconstruction of identifications and identities (social and organizational). In thebeginning it was conceived of as a cultural event, and nowadays as a commercial fair.Key words: Identity, identification, spaces physical and symbolic, discourse analysis.

236

Pimentel, Carrieri, & Leite-da-Silva

Page 85: COG -13-2

Abstract. The concept of human capital is associated mainly with the Nobel Laureate Gary Beckerand, in his usage, has a clear conceptual basis as investment in the costs of formal education. Bycontrast, this paper suggests that ‘intellectual capital’ is a re-branding of knowledge, skills andexperience rather than re-conceptualisation of resource based learning. Becker also chose not to includeinformal knowledge, skills or experience within his concept of human capital, which remains limitedby its constrained premises. This paper submits that both human capital and intellectual capitaladvocates fail to identify or measure the tacit knowledge and implicit learning which increasingly isrecognised as a key to the competitive advantage of organisations. It first focuses on the conceptualbasis of claims made for human capital and intellectual capital, outlines limits in their methodology,and contrasts these with insights from theories of tacit knowledge and implicit learning and the centralrole within them of informal or non-formal skill acquisition. It develops and illustrates instances ofinterfacing tacit and explicit knowledge before introducing a methodology for profiling the acquisitionof knowledge, ability and skills. It does so by introducing the concepts of non-formal learning-from-work (LfW) and informal learning-from-life (LfL), with evidence from a four country EU case studycommissioned within the lifelong learning remit of the Lisbon Agenda.Key words: Human capital, intellectual capital, tacit knowledge, implicit skills, latent abilities, learning-from-life, learning-from-work.

Introduction

The concept of ‘human capital’ has become a metaphor widely used in both management theoryand political debate on the need to invest in a knowledge economy. Economics Nobel laureate

237

COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL E GESTÃO, 2007, VOL. 13, N.º 2, 237-260

Beyond human and intellectual capital: Profiling thevalue of knowledge, skills and experience

Teresa Carla Oliveira

Faculty of Economics, University of Coimbra – FEUC

Stuart Holland

Faculty of Economics, University of Coimbra – FEUC

Address: Faculty of Economics, University of Coimbra, Coimbra, Portugal. E-mail: [email protected]

Page 86: COG -13-2

Gary Becker (2006) has claimed that: ‘For politicians, if they don’t mention the term human capital,

they don’t win’. Likewise, few managers lose out by claiming the need to invest in it, even if others

simply presume that this means more investment in training to upgrade skills. Youndt, Subrama-

niam and Snell (2004) claim that the human capital concept as introduced by Schultz (1961) and Becker

(1964, 1993) ‘refers to individual employees’ knowledge, abilities and skills’ (Youndt et al., 2004,

p. 338). Yet, as conceptualised by Schultz (1961) and made a paradigm case by Becker (1964), the concept

of human capital was not about knowledge, abilities and skills, but strictly about investment in and

financial returns to formal education. Becker (ibid.) took aggregate data for investment in secondary

and higher education and correlated it with the later earnings respectively of school leavers and university

graduates. He found that the lifetime earnings of graduates were higher than those of those who had

not graduated either from high school or from university.

This paper first briefly addresses the scope and limits of Becker’s (1963, 1994) concept and use

of the concept of human capital. Second, it addresses issues of implicit equity in the use of the term

intellectual capital by several of its advocates, their confusion of capital as a stock of investment in

education and flows of the knowledge, skills and experience of employees. Third, it questions whether

their main claims have been followed through in a conceptually clear manner by convincing research

methods. Fourth, it analyses the degree to which the main resource base of organisations and compe-

titive advantage of companies is tacit knowledge, latent abilities and implicit skills and the interfacing

of these between employees, and between companies. Fifth, it offers methodology for assessing

knowledge, abilities and skills derived from experience despite Becker’s (1963, 1994) assuming that

such experience if too difficult to measure. Sixth, it summarises case study findings demonstrating that

the formal education which is all that Becker (ibid.) measures as a stock of human capital, or the IT, R&D

and HRM that intellectual capital advocates claim as proxies for intellectual capital, do not capture more

than a minor part of the tacit knowledge, abilities and skills learned-from-work or learned-from-life.

It then draws conclusions in relation to the limits of both human capital and intellectual capital theory

and the scope of an alternative approach profiling and recognising the value of learning from experience.

1. On ‘Human Capital’

Becker’s (1964, 1993) conceptual framework is based on a range of limiting assumptions such

as that, before investment in their human capital, ‘all workers are identical’ (ibid., p. 301). He needs

this to be able to attribute differences in earning trajectories entirely to the different investment costs

of secondary and higher education. He disregards any education or training that neither is formally

structured, nor involves financial investment. He also presumes diminishing returns from investment

in human capital (Becker, ibid., p. 312) despite the degree to which learning from work and life expe-

rience may increase over time. Neither skills, nor experience nor on-the-job training figured in Becker’s

application of the concept of ‘human capital’ since he found them ‘too difficult to measure’, and therefore

did not try it. Again, one reason was his premise constrained methodology. For Becker (ibid.), human

capital is measured only in terms of investment costs and the higher lifetime income streams pre-

238

Oliveira & Holland

Page 87: COG -13-2

sumed to be derived from them. But while there may be a broad correlation at macro levels between

the income of graduates and the costs of their formal education, his presumption that people without

higher education have less economic value than those who do is deeply constrained. For instance, neither

Henry Ford nor those who initially worked with him had higher degrees in engineering or business,

nor anything other than on-the-job work experience, yet made the paradigmatic breakthrough to the

principles of mass production which dominated most of the 20th century (Lacey, 1987; Womack etal., 1990).

Becker (1964, 1993) also neglects the degree to which different methods of work organisation

may facilitate operational or organisational learning. He implicitly assumes non-learning organisations

typical of Fordism as his organisational paradigm, in which it is formal education, R&D, technology

and a high division of labour which determines output per worker. As he puts it: ‘[t]he growth in

capital depends on investments in new technologies, basic research and human capital’ (Becker, ibid.,p. 311).

Yet by excluding experience and informal on-the-job training, since he presumes its value

cannot be measured as human capital, he thereby makes no allowance for factors which may be

centrally important to informal skill acquisition, insight and innovation in a ‘knowledge economy’

or a ‘learning organisation’. This has been one of the most main features of the learning by kaizenor ‘continuous improvement’ in Japanese companies since WW2, led by Toyota, and which centrally

concerns the interfacing of tacit and explicit knowledge (Nonaka, 1994; Nonaka & Takeuchi, 1995).

Again, also, the breakthrough of Toyota and other companies which followed it was not the outcome

of investment in human capital in the sense of increasing formal education, but from high levels of

on-the-job learning by individuals and work groups from their own experience (Womack et al., 1990;

Womack & Jones, 1996, 2005).

In Becker’s (1964, 1993) own work, therefore, the concept of ‘human capital’ is a metaphor

for formal education, and in this sense limited. Nonetheless, his conceptual framework is clear and,

if within narrow limits, meaningful. Correlations on his principle can be run between how a national

economy performs and how many high school and higher education graduates it has. And some of

them are interesting, such as those trying to assess why growth rates differ of Edward Denison (1967),

for the Brookings Institution, which found that higher education counted. But such correlations

classically suffer also from the problem of over aggregation and premise dependency. For instance,

the US ranks high on a correlation of its investment in education and its economic growth, but such a

correlation may not account for other factors in such growth, including its long term deficit spending.

Germany ranked high on a correlation of formal education and both growth and export performance in

Denison’s (ibid.) findings, but now would not do so on growth while its export performance may

be due to other factors such as excellence in quality, reliability and delivery and, since the 1990’s

and since it overtook the US as the world’s leading exporter, in 2004, demand for machinery for

industry from China. Italy also ranked high in Denison’s (ibid.) correlations of investment in education,

growth and competitiveness for twenty years after WW2, but now would not do so on either of the latter.

The explanatory power of correlating investment in formal education with overall economic perfor-

mance is limited.

239

Beyond human and intellectual capital

Page 88: COG -13-2

2. On ‘Intellectual Capital’

As with Becker’s concept of ‘human capital’, the derivative concept of ‘intellectual capital’also is a metaphor, attributed to John Kenneth Galbraith by Feiwel in his volume The IntellectualCapital of Michael Kalecki (1975), with Galbraith asking in 1969 in a letter to Kalecki: ‘I wonder ifyou realize how much those of us in the world around have owed to the intellectual capital you haveprovided over these past decades’ (Galbraith, cit. Feiwel, ibid.). Certainly ‘intellectual capital’ is bothstriking and straightforward as a metaphor for an individual’s accumulation of knowledge. Thecrucial change comes when the term is metamorphosed from the attribute of an individual and hisor her cumulative knowledge and experience, to an organisation. Not least, it then raises equity issues.For instance, Edvinsson and Sullivan (1996) re-defined intellectual capital for Skandia as ‘knowledgethat can be converted into value’, adding that:

‘[i]t is clearly to the advantage of the knowledge firm to transform the innovationsproduced by its human resources into intellectual assets, to which the firm can assert rightsof ownership’ (Edvinsson & Sullivan, ibid., p. 358, our emphasis).

This assertion by Edvinsson and Sullivan (1996) that capital has the right to appropriate theintellect of labour, echoed by Stewart (1997) and Sullivan (2000), raises questions of procedural anddistributive justice in a manner that Becker’s (1964, 1993) use of ‘human capital’ does not. This notonly contrasts with the implicit equity and stakeholding of leading Japanese firms which ensurerecognition and reward for employee suggestions for translating ideas into product or process inno-vations (Womack et al., 1990; Womack & Jones, 1996; Colenso, 2000). It also directly confrontsthe principles of ‘psychological contract’ which now have generated a vast management literature(Conway & Briner, 2005). For explicit endorsement appropriated ‘intellectual capital’ for shareholdersamounts to a contradiction of such psychological contract for employees as stakeholders. It alsomay increasingly be important to how ‘creative people’ choose which companies they wish towork with, not least since intellectual creativity involves the generation of actual income streamsand who benefits from them, rather than only psychic income.

Sveiby (1998, 2001) contrasts the Edvinsson-Skandia use of the term ‘intellectual capital’with his own conceptual framework of ‘intangible knowledge assets’. His model is represented inFigure 1. It stresses that a key resource base for rather than of an organisation are people’s competence,skills and experience. By ‘internal structure’ he means the intangible knowledge assets within orga-

240

Oliveira & Holland

Figure 1. Knowledge as Assets: Sveiby

Intangible Knowledge Assets (Sveiby)

People’s Competence Internal Structure External Structure

Source: Derived from Sveiby (1998, 2001).

Page 89: COG -13-2

nisations, and by ‘external structure’ the manner in which the competence skills and experience ofsuch assets are deployed in relations between them.

The formalisation of intellectual capital in the Edvinsson-Skandia model, is summarised inFigure 2. In this they claim that intellectual capital = human capital in Becker’s sense + ‘structuralcapital’ as intellectual capital within organisations + ‘relational capital’, which is claimed to beintellectual capital in relations between them. Yet this not only does not add to Sveiby’s (1998,2001) concept of knowledge as an asset, or knowledge management as a process; it detracts fromthem in a manner that Sveiby (2001) himself well perceives in observing that the Edvinsson-Skandia formulation is inconsistent with his original knowledge management concept since knowledgeas learning concerns flows, whereas the concept of capital is a stock and static (Sveiby, ibid.).

Yet deconstructing the four alleged ‘capitals’ of the Edvinsson-Skandia model in terms ofhow their advocates such as Edvinsson (1997, 2000) Edvinsson and Sullivan (1996); Edvinssonand Malone (1997) actually describe their meaning in use, as indicated in Figure 3, demonstrates thatrather than ‘intellectual capital’ is used in the sense of the stock of the knowledge, abilities and skillsof employees; ‘human capital’ no longer is Becker’s (1963, 1994) concept of investment in formaleducation, but presumed to be individual competence in terms of acquired knowledge, abilities andskills derived from experience; ‘structural capital’ is the knowledge acquired by employees within anorganisation, to which it is explicitly asserted that they have no right when they leave it, while ‘rela-tional capital’ is the knowledge, abilities and skills of employees in relations between organisations.

In practice, therefore, the meaning in use and context (Wittgenstein, 1953) of the term ‘intel-lectual capital’ by its main advocates represents not the value of capital in the sense of its commonuse in economics as a stock of finance or physical assets, but cumulative knowledge, abilities andskills. Yet these are human attributes and attainments over time, and their characteristic feature is aflow of experience adding to a stock of knowledge, while those who deploy them in or between orga-nisations in economic terms are not capital but labour, whether management or other employees. Capitalhas no knowledge, skill or experience. People do. To describe the flow of their knowledge acquisitionand deployment as ‘capital’ both is to confuse the elementary economic distinction of stocks from flows,and re-branding rather than re-conceptualising. It is a classic simulacrum in the sense of: ‘A thing

241

Beyond human and intellectual capital

Figure 2. ‘Intellectual Capital’: Edvinsson-Skandia

Intellectual Capital =

Human Capital (HC) + Structural Capital (SC) + Relational Capital (RC)

Source: Edvinsson (1997, 2000); Edvinsson & Sullivan (1996); Edvinsson & Malone (1997).

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having the appearance but not the substance or proper qualities of something; a deceptive imitationor substance, a pretence’ (“Oxford Shorter Dictionary”).

3. ‘Measuring’ Intellectual Capital

Yet, as the fashion for IC has spread, its re-branding has widened to include next to anythinganyone does, including ‘social capital’ as claiming to mean ‘capital associated with internal rela-tionships, for example, between employees and supervisors, or among employees’ or ‘organisationalcapital’ in the sense of ‘whatever an organisation does when it draws on employees previous knowledge,abilities and skills’ (Reed, Lubattkin, & Srinivasan, 2006, p. 870; Leana & van Buren, 1999; Nahapiet& Ghoshal, 1998). This relates to the issue that while much intellectual capital or IC literature claimsto recognise the importance of all knowledge, abilities and skills within or between firms it as yethas not done so. Both the Edvinsson-Skandia model and later claims to measure IC identify only knowledgesuch as R&D expenditures, patents filed, HRM expenditures, and IT information technology such ascomputer programmes. To illustrate this we have taken two of the more ambitious and also recentlyavailable at the time of writing (Youndt et al., 2004; Reed et al., 2006). Kira Kristal Reed, with MichaelLubattkin and Narasimhan Srinivasan (ibid.), also claim that:

‘According to resource based theory, a firm’s resources – particularly intangible ones– are more likely to contribute to firms attaining and sustaining superior performancewhen they are combined or integrated’ (Reed et al., 2006, p. 867).

Reed et al. (ibid.) therefore address the issue that effective performance will depend on howfirms ‘combine or integrate’ intangible resources such as knowledge but not whether knowledge asinformation or something in an IT system actually is used rather than locked ‘deep in the minds ofmanagers who rarely read anything, as Mintzberg (1975) found decades ago. Organisational inertiamay mean that senior management fails to identify the non-formal learning-from-work and informallearning-from-life of employees, even on a representative sample basis of a kind which might enablethem to achieve ‘reflective practice’ (Schön, 1983, 1987, 1991) at work group level. Nor is this only

242

Oliveira & Holland

Figure 3. Deconstructing ‘Intellectual Capital’

Intellectual Capital = a stock of knowledge, abilities, skills and experience

Human Capital = individual competence in terms of acquired knowledge, abilities, skills and experience

Structural Capital = knowledge within an organization, to which former employees have no proprietaryrights when they leave

Relational Capital = knowledge, abilities, skills and experience in relations between organizations

Source: Own formulation.

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a matter of top-down rather than base or middle-up voice (Hirschman, 1970). Communication inorganisations tends to be vertical rather than horizontal (Womack & Jones, 2005) or diagonal andtherefore more genuinely multilateral. Nor do Youndt et al. (2004) or Reed et al. (2006) they addresswhether the organisation of the firm aids or abets knowledge generation and creativity ether by orbetween employees either explicitly by intent, such as IBM’s forbidding its computer scientists toinvestigate alternative architectures for its central processing chip (Dennett, 1995).

Reed et al. (2006), do recognise that claiming to demonstrate cause and effect in terms of ‘human,‘organisational’ or ‘social’ capital and its relationship to organisational performance ‘pose thornychallenges to researchers’ (Reed et al., 2006, p. 868) such as the criticism of some human resourcebased theory by Foss and Knudsen (2003) and Priem and Butler (2001) as ‘suffering from a tautologyproblem stemming from the fact that resources are defined in terms of the performance outcomeassociated with them’ (Reed et al., 2006, p. 868). Their response to this concern is ‘an intellectualcapital based view of the firm’, combining ‘social’ capital’ with ‘organisational’ capital. But they thenfall for the tautology problem by following Youndt et al. (2004) in assuming that questionnaires tofirms on their R&D, IT and HRM policies will capture human, social and organisational intellectualcapital (Youndt et al., ibid., p. 338). As Youndt et al. (2004) put it:

‘we selected these specific investments because the literature streams surrounding theseareas – namely, human resource management, information technology management, andR&D/innovation management – assert (our emphasis) that they are influential in thedevelopment of human, social and/ or organisational capital’ (Youndt et al., 2004, p. 337).

This assertion, again, parallels that of Edvinsson and Sullivan (1996), that a firm should assertrights of ownership (p. 358). Then, directly, Youndt et al. (2004) continue by claiming in the samevein that:

‘Prior research conceptualizes intellectual capital as the sum of all (our emphasis) knowledgeand knowing capabilities that can be utilised to give a company competitive advantage’(Youndt et al., 2004, p. 337).

There are limits in such assumptions. One is their tendency to post hoc ergo propter hoc inthe sense of claiming that since ‘literature streams’ and ‘prior research’ have asserted something ittherefore is the case. The second is that the presumption that intellectual capital includes ‘the sumof all knowledge and knowing capabilities’ (Youndt et al., 2004) is far wider than Becker’s (1964,1994) more limited but meaningful use of the concept of human capital as investment costs in formaleducation. The third is that whether IT, HRM and R&D represent ‘the sum of all knowledge andknowing capabilities’ is highly questionable. A fourth is that although advocates of intellectual capitalclaim to recognise the importance of tacit knowledge as among the intangibles ‘particularly… likelyto contribute to firms attaining and sustaining superior performance when they are combined or inte-grated’ (Reed et al., 2006, p. 867) neither they nor others as yet have demonstrated that they can doso (e.g. Edvinsson, 2003).

To take the three main variables on which Youndt et al. (2004) and Reed et al. (2006) focus,i.e. R&D, IT information technology and HRM, Archibugi and Pianta (1996) and Archibugi and

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Beyond human and intellectual capital

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Iammarino (2002) have evidenced that R&D captures only a fraction of the creativity and innovative

thinking within organisations, not only because many firms choose not to file patents but retain

their knowledge without doing so since its tacit nature thereby is a better protection of their possible

competitive advantage. The availability of IT information technology programmes is a poor indicator

of ‘company competitive advantage’ first because they offer only information rather than the knowledge

which may be vital to their effective use; second, because the general features of such system are

available to anyone rather than only to an individual company for its competitive advantage; thirdly,

because confirmation that employees may access them is not evidence that use them fully or creatively.

Taking HRM policies as a ‘given’ for all firms suffers from a similar presumption that all HRM policies

are effective in similar ways, while HRM managers in large organisations with thousands of employees

can recognise that they sometimes do not know what even middle managers in their organisation are

doing, far less what they may be thinking.

Besides which, unlike leading analysts of tacit knowledge who recognise precisely that it is not

explicit, and varies over different levels of consciousness and meaning, Youndt et al. (2004) and

Reed et al. (2006) simply take statements from company presidents, CEOs, and HRM managers

about their company’s use of IT, HRM and R&D as proxies for ‘intellectual capital’, and do so at their

face value. For example, Youndt et al. (2004) reported on performance differences across what they

call their ‘different intellectual capital profiles’ (IT, HRM and R&D) in over two hundred firms

across 134 industries in terms of standard industrial classifications. Each had over 4,000 employees.

Reed et al. (2006), followed the same IC profiles, and did the same for a range of large and established

companies in retail banking and commercial banking. But both studies did so by questionnaires which

in the case study of Youndt et al. (2004) were sent to the top two executives, whether presidents,

vice presidents or CEOs, and deputy HRM managers, sometimes gaining a reply from two of them.

Youndt et al. (ibid.) reviewed literature on intangible assets, but did not try to measure them. But what

were not open-ended questions but variants on a scale of multiple choice answers to claims such as:

‘Our employees are highly skilled’; ‘Our employees are widely considered the best in

the industry’; ‘Our employees are experts in their particular jobs and functions’; Our

employees develop new ideas and knowledge’; ‘Our employees are creative and bright’;

‘Our hiring process is thorough and comprehensive (uses tests, interviews, etc.)’; ‘Our

employees spend more hours a year in training than our competitors’; ‘Most of our

employees have desktop computing devices (PCs, workstations)’; ‘Our information

systems are integrated with each other’; and ‘Our information systems are accessible

to employees’ (Youndt et al., 2004, pp. 346-347).

What is striking about both such questions and those of Reed et al. (2006) who model their

own questionnaire on them, is in part their banality. For instance, which large corporation employing

thousands of employees does not have a data base, and both mainframe and worktop PCs, or routine

procedures, or annual IT budgets? But also, that while these authors go to pains to check whether there

was consistency or bias in their sample of firms, they do not check whether there could be bias in

individual responses from them. Some bias could not be checked without asking employees whether

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the claims of top management reflected their own realities. But others could. For instance, how

many of the respondents claimed that their employees were ‘widely considered the best in the

industry’, since if many or most of them did so this would be an implicit refutation of the findings.

This may not mean that the replies to the questionnaires are intentionally dishonest rather than ‘bluffing

a bit’ (Griseri, 1998). But relying on them without counterpart feedback from lower level employees

on whether they are rhetoric or reflect their own realities is unreliable.

4. Tacit Knowledge, Latent Abilities and Implicit Skills

A central claim of this paper is that, rather than R&D and IT information technology, or

HRM practices which may or may not be effective in organisational learning, it is tacit knowledge,

latent abilities and implicit skills learned non formally at work and informally from life which may

crucial to firms ‘attaining and sustaining superior performance’ (Reed et al., 2006, p. 867). Surpri-

singly, as author and populariser of the ‘competitive advantage’ concept, Michael Porter has not

referred to tacit knowledge in any of his three main original or edited volumes (Porter, 1980, 1990,

1998). Yet tacit knowledge and implicit skills increasingly are recognised to be crucial to how firms

can achieve or retain competitive advantage (e.g. Ambrosini & Bowman, 2001; Edmonson, Winslow,

Bohmer, & Pisano, 2003). For, the more tacit are the knowledge and skills acquired by implicit

learning within a company, the more protected it can be against imitation and copying, even if

competitors also infringe copyright. For neither tacit knowing nor implicit learning is a commodity

or technique which can readily be cloned independently of its own operational context, not least

since even those gaining such knowledge and learning may not be aware that they are doing so.

For example, building on the work of Michael Polanyi (1958, 1962), Hasher and Zacks (1984)

have analysed the process of encoding information without awareness. Reber (1967, 1993) pioneered

the concept of ‘implicit learning’ in the context of tacit knowledge, even if his claim that this process is

entirely unconscious rather than ranges over different levels of consciousness is controversial (Berry,

1997; Cleeremans, 1997). Spender (1993) has stressed the role and importance of both individual

and collective tacit knowledge. Nonaka (1994), Nonaka and Takeuchi (1995) and Baumard (1999)

have stylised individual and collective ‘knowledge modes’ which are either explicit or tacit. Indi-

viduals may gain explicit knowledge from others and feedback or extend it to them. But they also

assimilate and interiorise personal and collective knowledge at a tacit level. On the other hand, because

such knowledge is tacit and such learning implicit, top management itself may not recognise its

potential for operational learning and implications for overall learning within an organisation.

4.1. Implicit Logic in Tacit Knowing

Polanyi was a physicist who claimed that tacit knowledge was more vital, even to the so-called‘hard sciences’, than deductive reasoning, inference or calculation. Polanyi’s premise was that ‘thereare things that we know but cannot tell’ (1962, p. 601). He claimed that this is strikingly true of

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our knowledge of skills, of which his best known example is riding a bike or swimming, which one‘knows’ how to do but ‘may not have the slightest idea’ how one does it (Polanyi, ibid.). Similarly,Judge and Ferris (1992) claim an “amazing convergence across decision makers on a statement thatgoes something like this: ‘I can’t articulate it, but I’ll know it when I see it’ (Judge & Ferris, ibid., p. 3).For Polanyi, the basis of any knowing was tacit, and he argued for the ultimately tacit character of allour knowledge (Polanyi, 1958, 1962). He also submitted that in coming to understand something wedo not simply draw conclusions from the evidence we are examining but draw on a range of experienceand prior understanding, much of which is not consciously formulated (Polanyi, ibid.).

Polanyi (1962) also argued that how we relate tacit to explicit knowledge is logical like thelogic of a mathematical ‘coefficient’, claiming that: ‘A tacit coefficient… appears to be integral to allexplicit statement’ (Polanyi, ibid., p. 605). This is consistent with the mathematician and psycho-analyst Ignacio Matte Blanco’s concept of ‘unconscious logic’ (Matte Blanco, 1975, 1988), which hedrew from findings of ‘sets of meaning’ and interrelated ‘sets-within-sets’ of meaning in clinical analysis.It also is consistent with the evidence of Bartlett (1995) from his experimental work on recognitionand remembering, where he found that people tend to remember in terms of similar sets or ‘schema’ ofunderstanding and that these tend to ‘display an order of predominance among themselves. Moreover, thisorder remains relatively persistent’ (Bartlett, ibid., p. 308). Polanyi (1958, 1962) also claimed that‘subsidiary understanding’ or ‘tacit knowledge’ is organised in terms of ‘schema’ of understanding,and that this ‘may vary over all degrees of consciousness’ rather than just be unconscious (Polanyi,1958, pp. 91-92).

The work of Polanyi and the claims of Matte Blanco (1975, 1988) for ‘unconscious logic’suggest that there may be an implicit logic within tacit knowing (Oliveira, 2000, 2001, 2002, 2003) andthat, if so, it may be possible to identify it. Finding sets of meaning in discourse, and consistent impli-cations within them for people with similar work experience, therefore may mean that it is possibleto identify joint knowledge derived from similar implicit learning within work groups at lower levelsof an organisation rather than only asking senior or other managers to confirm the degree to which theiremployees ‘are highly skilled’, or ‘are widely considered the best in the industry’ or ‘are experts intheir particular jobs and functions’, or ‘develop new ideas and knowledge’ or ‘are creative and bright’(Youndt et al., 2004, pp. 346-347).

Polanyi (1962) also stressed that there are two kinds of knowing which invariably enter jointlyinto any act of understanding. There is (1) knowing a thing by attending to it, and (2) knowing athing by our awareness of it, while it is the latter knowledge that can be said to be tacit (Polanyi,ibid., his emphasis). He also suggested that attending too much to explicit correlation of phenomena,as in regression analysis, can misplace their causality, meaning and relevance. Thus a regressionanalysis can correlate variables, but these may not be explaining cause rather than only correlation.In a manner familiar enough to managers who neither have time for statistical analysis, nor confidencethat it explains ‘the whole picture’ (Mintzberg, 1975, 2004), he wrote that:

‘If the scientific virtue of exact observation and strict correlation of data are given absolutepreference for the treatment of a subject-matter (it) disintegrates when presented insuch terms (and) the result will be irrelevant to the subject-matter and probably of nointerest at all’ (Polanyi, 1958, p. 139).

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This, in turn, is consistent with the banality of the findings from Becker’s (1964, 1993) regressionanalysis that higher education graduates tend to have higher earnings than high school graduates,which readily enough could be claimed to be ‘known already’ or ‘common knowledge’. Or the banalityof the findings from similar regression analysis of Youndt et al. (2004) or Reed et al. (2006) thatlarge corporations employing thousands of employees have a data base, and both mainframe andworktop PCs, and routine procedures, and annual IT or other budgets.

4.2. Tacit Knowing and Creativity

Yet, according to Michael Cooley (1987), a mathematician and engineer strongly influencedby Polanyi, what is widely dismissed as ‘common knowledge’ itself tends to often relate to a wealth ofexperience whose value has not been recognized in professional or other formal qualifications of thekind stressed in Becker’s (1964, 1993) human capital theory, or expressed in semantic or propositionalform of a kind that readily would be recognized as ‘scientific’. Cooley (ibid.) also stresses the diffe-rence between ‘rule based’ and ‘experience based’ thinking. His case is that the rule based systemsof normative science or social science demand generalisation, repeatability and thus predictability.But while these may be features of some aspects of the physical world, and of machinery, insistingon predictability and generalisation in the modelling of human behaviour may exclude from it muchthat is characteristically human. While people may have habitual modes of thinking and acting,neither their behaviour nor thought, nor their speech is entirely predictable. Rather, it is variationrather than repeatability which make people interesting to others, rather than predictable and thereforeboring. It is what constitutes our individuality and personality, yet in the main part is neglected informalised information-based models of organisational learning or in human capital theory such asBecker’s (1964, 1993) which assumes that ‘people are identical’.

Cooley (1987) criticises the semantic basis of formal education and training programmes ofthe kind that Becker (1964, 1993) alone allows as an index of ‘human capital’ on the basis that theytell people how to do something rather than ask them how they already do it, what is good, bad orindifferent about how work is organised where they do it, and whether and how they know it mightbe improved. He laments the passing of the apprenticeship system and the manner in which it canenhance not only tacit knowledge but also tacit skills. He also distinguishes both between semanticlearning and between different categories of tacit learning, pointing out that skilled engineers wantingto propose a better way of making something often will want to draw it, or show it, or make a physicalmodel of it, rather than write it in a manner which cannot capture the concept which they wish toconvey. Their skill is in conceptualising how to do something rather than how to express it in semanticterms. They have it in their heads and in their hands when they can create it for themselves, ratherthan readily on their lips or in their finger tips on a keyboard, or entered into either a mainframe ofother computer of the kind that Youndt et al. (2004) assume to be a proxy for ‘intellectual capital’.

Cooley (1987) further claims that tacit knowing and intuition, rather than calculation, is thebasis of creativity. Baumard (1999) adds to this in terms of the degree to which tacit knowledgemay be the main competitive advantage of organisations, and by illustrates this not only by a range

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of case examples, as do Nonaka and Takeuchi (1995) that the vocabulary of knowing in Latinbased languages is less distinctive than that of classical Greek, and draws attention to four differentclassical Greek nouns for different types of knowledge. The first, episteme, is abstract generalisa-tion. The second, techne, is knowing how to do something. The third, phronesis, means knowingas the result of personal experience. The fourth, metis, means conjectural or creative intelligence.Neither techne nor phronesis lend themselves easily to explicit rationality. What they mean ishighly personal and tends to be implicit rather than explicit. They concern both how we come togaining knowing how to do something, and the ability or skill which we may have learned from lifeor from work experience. Besides which, as Baumard (1999), comments, the word ‘experience’which we take so for granted, in fact ‘papers over its own character, which is intuitive, tacit andunique’ (Baumard, ibid., p. 53).

4.3. Implicit Logic and Implicit Learning

Implicit learning as learning without being aware that we are doing so is most commonlyidentified with Reber (1967, 1969, 1976, 1989). The findings from discourse analysis (Oliveira, 2003) infour country case studies, and also earlier analysis of discourse in panel interviewing (Oliveira, 2000,2001, 2002) confirm the principle. But they do not confirm Reber’s (ibid.) presumption that implicitlearning is only unconscious. Rather, they suggest that it varies over a wide range of consciousnessand is influenced by preconscious assumptions, dispositions and beliefs confirming Bourdieu’s (1990,1997, 1998) case on habitus or the environment in which, since childhood, we have come to adoptthe values and beliefs learned implicitly from life experience long before we may have the chance tolearn from work.

Reber (1967, et al.) tested his concept of implicit learning in the context of the degree to whichpeople in a laboratory environment implicitly learned an artificial grammar. The experiments gavepeople a random string of letters to memorise. Those concerned were not initially told whether therewas an ‘implicit grammar’ in what they were given. Where they did find one, Reber (1967, et al.)claimed that they were learning ‘abstract rules’. He also claimed to demonstrate that this learning

remained intact to the same degree when the letters or symbols representing the same grammar were

changed. He later (Reber, 1976) also compared groups memorising strings of letters without being

informed that they had an artificial grammar and others who were not so informed. But he found that

explicit information that the strings contained an artificial grammar actually reduced the control groups’

success, which is much like Polanyi’s (1962) claim that consciously attending to something may

reduce our tacit understanding of it. Reber (1989) also is consistent with Polanyi (1958, 1962) in claiming

that ‘knowledge acquired from implicit learning processes is knowledge that is always ahead of the

capability of its possessor to explicate it’ (Reber, ibid., p. 229).

Reber’s (1967, et al.) claims also are similar to those of Bartlett (1995) and Matte Blanco (1975,1988) that we process the incoming current experience in schema or sets of stored experience. Theanalysis in all three cases is dynamic. New experience is related by the unconscious processor ofthe mind to previous experience, and informs or up-dates it without us being conscious of the process.

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For Bartlett (1995) the schema and schemata of new experience ‘cue’ reference by the subcons-cious or preconscious mind to schema of earlier experience. The concept ‘schema’ of stored experiencealso is consistent with Matte Blanco’s (1975, 1988) concept of the manner in which the unconsciousmind interrelates not only new and past experience, but also ‘sets’ and ‘sets-within-sets’ of such storedexperience. This is consistent with Reber’s (1967, 1976) concept of an unconscious ‘abstraction’process in learning. And, in turn, as with gaining tacit knowledge, such implicit learning may playa key role in operational or organisational learning and gaining and sustaining competitive advantage.

In claiming consistency between the approaches of Reber, Bartlett and Matte Blanco, it wouldbe misleading to suggest that Reber’s (1967, 1976) claims are uncontested. Shanks and St. John (1997)are not alone in challenging his presumption that implicit learning necessarily and always is uncons-cious, counter claiming that ‘human learning is almost invariably accompanied by conscious aware-ness’ (ibid., p. 394). The debate on implicit learning (e.g. Berry, 1997) has focussed for some timeon whether this necessarily is unconscious. Whether it is so also is important in a wider context. Forif implicit learning always is unconscious, there may be no ready means of identifying and enhancingit in the context of operational or organisational learning. But Cleeremans (1997) has challenged theassumptions of Shanks and St. John (1997), suggesting that their arguments ‘may be flawed becausethey require the assumption that a given piece of knowledge is either in the ‘unconscious’ box or the‘conscious’ box’ adding by contrast that ‘there be no such boxes’. As he puts it:

‘there appears to be a representational continuum that extends from raw storage of instancesto fully abstract representations, and the opposition that is often made between abstract(implicit) knowledge and fragmentary (explicit) knowledge that is at the heart of somany debates about implicit learning begins to fade away when one considers the wayin which connectionist models represent and use information. In short, abstraction is agraded, dynamic dimension’ (Cleeremans, ibid., p. 224).

Dianne Berry (1997, p. 239), in concluding her edited volume on ‘How Implicit is Implicit Learning’,and in considering what Reber (1993) himself had termed the ‘polarity fallacy’ between either whollyconscious or wholly unconscious learning, observed that: ‘Maybe future generations of researcherswill think of clever ways of getting past the current stalemate situation’. Yet the solution may be nearerto hand. Especially, Cleeremans (1997) has observed that:

‘Any theory of cognition has to make room for a concept such as ‘implicit’, and thatthe finding that some participants in case studies are in fact aware of some informationthat was previously assumed to be implicit does not necessary shatter the notion thatlearning can be implicit. They merely indicate that when implicit knowledge is assessed ina more sensitive way, it turns out that participants can express it’ (Cleeremans, ibid., pp.195-196).

This is precisely what Ambrosini and Bowman (2001) claim on the feasibility of identifyingtacit knowledge, submitting that either knowledge or abilities or skills may be tacit simply because“people never thought of what they were doing, they never asked themselves what they weredoing, and nobody else ever asked it either” (2001, p. 816). It also is what Nonaka and Takeuchi

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(Nonaka, 1994; Nonaka & Takeuchi, 1995) have claimed for the feasibility of interfacing tacit andexplicit knowing.

4.4. Interfacing the Tacit and the Explicit

Nonaka (1994) claims four stages for interfacing tacit and explicit knowledge including (1)socialisation (tacit knowledge amplification); (2) externalisation (transforming tacit knowledge intoexplicit knowledge); (3) combination (synthesizing and synergising both tacit and explicit knowledge),and (4) internalisation (retransforming explicit knowledge into tacit knowledge). But Nonaka alsostresses it is the process of explicating what is implicit and moving from the tacit to the explicit thatreally counts in innovative thinking and management. As he puts it:

‘When tacit and explicit knowledge interact…, something powerful happens. It is pre-cisely this exchange between tacit and explicit knowledge that Japanese companies aregood at developing. What’s more, as new explicit knowledge is shared throughout anorganisation, other employees begin to internalize it – that is, they use it to broaden,extend and reframe their own tacit knowledge’ (Nonaka, ibid., pp. 29-31).

Nonaka (1994) also is clear that tacit knowledge can be made explicit, and affirms that:

‘Understanding knowledge creation as a process of making tacit knowledge explicit…has direct implications for how a company designs its organisation and defines mana-gerial roles and responsibilities within it.’ (Nonaka, ibid., p. 36).

Giving examples from NEC, Sharp, Canon, Matsushita, Honda and other leading Japanese companies,Nonaka also claims that:

‘[i]n each of these cases, middle managers synthesized the tacit knowledge of bothfrontline employees and senior executives, made it explicit, and incorporated it into newtechnologies and products.’ (Nonaka, ibid., p. 45)

James Manyika (2006) also has made similar claims based on a McKinsey mega-analysis ofsome 8,000 companies and distinguishing communication that was formal in the sense of explicitand that which was not, as with the distinction between a written code of practice, and unwritten customand practice. He stresses that:

‘The conventional definition of knowledge workers as people who ‘think for a living’covers an extraordinary range of activities. Research scientists, foreign exchange traders,teachers, call centre operators and administrators – all are paid to think. Yet some of thesejobs are routine, easy to automate and lend themselves to rules. Others, such as the highlyinteractive work of salespeople, lawyers and managers, are subtle, complex and difficultto codify’ (Manyika, ibid., p. 13).

Consistent with Nonaka’s (1994) and Baumard’s (1999) claims, Manyika (2006) draws attentionto the McKinsey findings that, as tacit interaction within firms increases from a low of less than aseventh to a high of two thirds of more, performance differentials increase significantly (Manyika, ibid.).

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Akbar (2003) has claimed that the explicit-tacit distinction inadequately expresses the difference

in levels within what is tacit or explicit, tending to polarise between knowledge that is highly specific

or wholly tacit. This is valid enough for the disposition of intellectual capital studies to measure only

specifics concerning explicit knowledge such as patents and R&D and leave tacit knowledge simply

as an unknown, but is less warranted as a criticism of Nonaka or Takeuchi (Nonaka, 1991, 1994; Nonaka

& Takeuchi, 1995).

5. Profiling Learning-from-Work and Learning-from-Life

The methodology of our own international case studies allowed for social, economic and

educational context – and ambivalence – as with an unemployed single parent mother in her early

forties who had had done and passed several training courses, and was highly effective in gaining

results for single parents in her own situation than more highly qualified graduate social workers,

yet not been able to be a social worker because she lacked the requisite school certificates and university

degree. In terms of Gary Becker’s (1993) human capital theory, she therefore had no economic value.

Yet she was more effective in representing women in her own situation as an informal social worker

in a community project than formally qualified and social workers who had no life experience of a high

unemployment suburban housing estate where most women were heads of families. In terms of other

limits to the presumption that lifelong learning is serial retraining without integration into operational

reality, we also have found it not untypical for junior managers on MBA courses to comment ‘they

cannot promote me so they send me on a training course’. Therefore, too often, real learning-from

life is disregarded and under valued, while formal retraining is a placebo for non-promotion, and not

thereafter integrated into any coherent operational or organisational learning.

Such premises are reflected in Figure 4 which was used as a research premise and heuristic

model in training researcher and interviewers for the case study, and was premised on the assumption

that it could be found that informal learning-from-life and non-formal learning-from-work could greatly

exceed knowledge acquired from formal education or training. The four country case study also met Akbar’s

(2003) concern by distinguishing explicit from implicit learning at what Polanyi (1962) himself recognised

as different levels of counsciousness in tacit knowing. These are summarised in Figure 5. Formal education

and training is explicit and conscious. The same will be the case with Schön’s (1983, 1987, 1991) reflective

practice, whether this is self-directed reflection on what one is doing, or mutual and group based. By contrast

implicit learning as learning without being aware of doing so is semi-conscious or unconscious, and ranges

from childhood, through recreation and personal relationships, as well as non formal learning at work.

The four criteria for the informal one-to-one interviews therefore covered five ‘domains’: those

of implicit learning from childhood, recreation, relationships and work, on the right hand side Figure 5,

and also those of explicit formal education and learning. Within this there are a range of further distinctions

in use which are relevant to identifying learning-from-life and well as learning-from-work. One is to diffe-

rentiate informal and non-formal learning. The common use of informal learning is similar to that of

tacitly gaining knowledge without being aware that one has learned, and therefore less than conscious.

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The use in this sense is consistent with most learning-from-life. Non-formal learning is more conscious,i.e. being aware that one is learning something without this being part of formal instruction, and thereforeconsistent with learning-from-work, rather than formal learning-at-work in the sense of on-the-job training.Such learning is operational rather than organisational, and a main challenge for management, with tacit-explicit interfacing (Nonaka, 1994) is to interrelate and synergise both, rather than only to ‘combine andintegrate’ R&D, IT and HRM (Reed et al., 2006).

Identifying informal learning-from-life or LfL and non-formal learning-from-work or LfWaddress the issue of experience which Becker (1964, 1993) chose to neglect even in a work environmentbecause he found it ‘too difficult to measure’. We found in the international case study that appropriatediscourse analysis and a related coding system both could do this and rank the degree of such knowledgeand experience in terms of criteria such as knowledge, abilities and skills or KAS, individual values,beliefs and personality or VBP, in relation to the five main ‘criteria domains’ within Figure 6 of explicitlearning in formal education or training, and the implicit learning domains of childhood, recreation, rela-tionships, and work.

The domains of childhood, education, recreation, relationships and work were informed by ourresearch team drawing on their own life experience, while the criteria for the coding of discourse wasdrawn from the earlier discourse analysis in research interviews with and actual interviewing by managersin a broadcasting corporation case study (Oliveira, 2000, 2001, 2002). At the time, they were not directlyinfluenced by another parallel model or paradigm. But we were struck after finalising the project in

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Figure 4. Learning-from-Work and Learning-from-Life

Source: Own formulation.

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2004 by the degree to which the domains very much parallel those central to Mintzberg’s (2004)concept of a Reflection Module (Mintzberg, 2004, p. 300).

It was in such a context that the case study found that starting from ‘the self’, and especiallywith values and dispositions formed in childhood and adolescence (Bourdieu, 1990, 1997, 1998) hadthe virtue of beginning the interview discourse with what the individuals both knew well and betterthan the interviewer, i.e. themselves. The interview methodology also allowed for self-direction, withthem taking whatever issue or example they chose to explain what was important to them in terms

253

Beyond human and intellectual capital

Figure 5. Explicit and Implicit Learning

Explicit Learning

Formal EducationFormal Training

Reflective Practice- Self-Directed

- Mutual

Status: Conscious

Implicit Learning

ChildhoodRecreation

RelationshipsWork

Status: Semi-Conscious or

UnConscious

Source: Own formulation.

Figure 6. Identifying Learning-from-Work and Learning-from-Life

KASKnowledgeAbilitiesSkills

VBPValuesBeliefsPersonality

Context

CRITERIA

Relationships

Childhood Education

Recreation

Work

DOMAINS

Source: Own formulation.

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of the criteria set of values-beliefs-personality, typically opening with questions such as, ‘where wereyou born?’, ‘where did your parents come from?’, ‘what did they do?’, ‘who influenced you when youwere a child and what did you learn from them to value in life?’.

This approach is different from the presumption of intellectual capital advocates such as Youndtet al. (2004), or Reed et al. (2006) that such capital can be identified and measured by asking seniormanagement whether their employees made good use of IT programmes, how much they spent onR&D, and whether their HRM practices were considered ‘the best’ or ‘among the best’ in their sector.Unlike the questionnaire approach of Youndt et al. (2004), or Reed et al. (2006) which invitedmultiple choice answers to finite questions, the methodology of the one-to-one interviews was open-ended and aimed explicitly at not becoming a ‘spoken questionnaire’. In this regard it also differed fromthe recommendations of structured interviewing from its advocates such as Anderson (1997) or Dipboye(1997), where the last thing you should do is allow interview discourse to be led by the interviewee.The interviewer’s main responsibility was to steer the discourse from one domain to another to ensurea comparable degree of balance in the life and work experience covered by their discourse, but also tolook for fragments of discourse which could prove to be ‘fractals’ of a larger picture of their in depthtacit knowledge, latent abilities and implicit skills.

6. The Data Base and Data Analysis

The case study was undertaken for the European Commission with a remit to enhance the conceptof lifelong learning and to develop a methodology and architecture for a European Certificate of InformalLearning. The project was to follow through the Lisbon Agenda on lifelong learning and funded bythe European Union’s Socrates-Leonardo Programme (Oliveira, 2004).

- The sample included 30 interviewers and 238 persons (51.7% women) interviewed in afour countries (Portugal, Italy, Ireland and Hungary).

- The age composition was Young People (aged 18 to 22) 16.8%; Young Adults (aged 23-34)35.7%; Adults (aged 35-44) 15.5%; people in Mid Life (>45) 25.2%; and Others 6.7%.

- 45% of those interviewed were fully employed, 14.7% were employed part-time, and 29.8%were unemployed.

6.1. Data Base and Data Collection

The basis of the data collection was one-to-one audio taped semi-structured interviews aroundfive domains of life experience including childhood, education, recreation, relationships and work.Explicit learning through formal education and training were distinguished from implicit learningwhich either was informal and tacit, or non-formal in the sense of learned by example (Figure 5 above).

For data analysis, interview discourse was analysed by a customised coding system developedwithin a grounded theory approach. The criteria for coding were KAS (knowledge, ability, skills)and VBP (values, beliefs and personality) (Figure 6). Meaning of discourse within these criteria wascoded in relation to its use in Context (Wittgenstein, 1953, Mintzberg, 2004 and Figure 6), including

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Oliveira & Holland

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both the context of the interview and that of the learning-from-life (LFL) and learning-from-work(LFW) trajectories of the individual interviewees. Data processing was by SPSS for Windows andnon-parametric tests (Cramer’s V).

6.2. Findings

The main findings from the four country case studies are summarised in Table 1 below. Noneof the 240 interviewees found the interviews intrusive or asked to end it. Initial hesitation in somecases was countered by gained self confidence as interviewees realised that they were not a test buta chance to talk about themselves, their experience, their current situation, what they wanted from lifeor work (often related to work-life balance) and also, when in employment, what was inefficient orinadequate in their work environment and how it could be remedied.

In effect, the interviews succeeded because they concerned not only about what people did or

were performance assessed on, but about who they were and are, and what they could do in a different

job, or within the same job or work group. Some, grasping this early, plunged in straightaway with remar-

kable frankness. Many, on finding that time was up, said they regretted that it was so, commenting

typically that they could not remember a time when they had had such a chance to really talk about

themselves. All of which is consistent with Mintzberg’s (2004) finding that many managers later

found his Reflection Module to be a ‘life changing experience’ (Mintzberg, ibid., p. 301).

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Beyond human and intellectual capital

Table 1Attributions of Learning from Formal Education, from Life and from Work

Education LfL LfW Accredited

Specific Knowledge 32.4 25.6 17.6 31.5General Knowledge 26.1 40.4 5.5 19.3Abilities 14.3 39.4 20.6 12.2Skills 14.3 33.1 23.5 15.1Values 2.9 75.6 8.8 –Beliefs 2.1 20.2 6.1 –Personality 5.5 19.7 9.7 1.3

LfL: Learning-from-LifeLfL includes informal learning from childhood, recreation and relationships as well as direct attribution to life experience.

LfW: Learning-from-WorkLfW includes non-formal and informal learning.

Education includes both formal instruction and training.Percentage figures do not round due to other criteria in the sample.

Source: T. C. T. Oliveira (2004), A Methodology and Architecture for a European Certificate of Informal Learning. Brussels: Socrates-Leonardo.

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We also established in the case study that Matte Blanco’s (1975) ‘sets-within-sets’ of meaninggain significance in terms of making sense of implicit logic in both work and life experience. Forinstance what people have learned from the general set of life experience both tends to be greaterthan what they learn from the sub-sets of formal education. It also tends to influence both the set oftheir life skills, and the sub-set of their values, beliefs and personalities in a manner which work alonewill not, while in turn the dispositions which they acquire from life in the manner of Bourdieu (1977,1984, 1990), will influence the sub-sets of their attitude to work and the degree to which they aredisposed or otherwise to cooperate and contribute to a particular work group or work environment.We elaborate this also in the summary report below on the findings of case study findings.

Drawing on the concept of tacit and implicit learning at varying levels of consciousness(Polanyi, 1962; Cleeremans, 1997), and based on the twin concepts of ‘iterative’ interviewing andof ‘implicit logic’ in discourse (Oliveira, 2000, 2001, 2002, 2004, 2005), the findings demonstratethat while formal education and lifelong learning (LfL) by extended training is explicit and credited,implicit skills learned-from-life (LfL) and informal and non-formal skills learned-from-work (LfW) arenot, but may be identified and profiled in a manner facilitating three types of accreditation: general,vocational and professional.

7. Discussion of Findings and Conclusions

The findings demonstrate that most learning and acquisition of personal attributes relevantto employment are gained informally or non-formally from life or work, and that such learning istacit and implicit in nature. They confirm the claims of Bourdieu (1987, 1988, 1990) on the influenceof habitus or life experience on the acquisition of values, beliefs and personality. They disconfirm Becker’s(1964, 1993) claim that ‘experience is too difficult to measure’.

The findings indicate that learning-from-work and learning-from-life may be consistentlyunder-valued in the rationale, conceptual framework and methodology of the literature on humanor intellectual capital. There also is a similar under-valuation in much discourse on lifelong learningto the degree that this neglects tacit knowledge and implicit learning and focuses only on furtherformal education and training.

The findings support the case both for deconstructing the claims for ‘intellectual capital’, andalso deconstructing what otherwise tends to be rhetoric, however well meaning, on the need for ‘lifelonglearning’. They indicate that there are limits to presuming that such learning is simply readier access toformal training or retraining. The four country case study (Oliveira, 2004) followed the commitmentof the Lisbon Agenda to lifelong learning, and found that it was possible to identify and explicate tacitknowledge learned-from-life as well as knowledge non-formally learned-from-work in a mannerconsistent with both Nonaka’s (1994, 1998) stress on ‘explicating the tacit’, and recognising within itthe importance of learning from work and life experience both for innovative methods of work orga-nisation and individual self-fulfilment.

The presumption of the advocates and practitioners of ‘intellectual capital’ to capture all knowledge,abilities and skills relevant to increasing the competitiveness an organisation (Reed et al., 2006),

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clearly is not realised if this is no more than discourse with senior management about their employeesuse of IT, or R&D or HRM (Youndt et al., 2004; Reed et al., 2006), and fails to develop a methodologyto identify tacit knowledge or implicit skills. Organisational inertia also may mean that senior mana-gement fails to identify the non-formal learning-from-work and informal learning-from-life of employees,even on a representative sample basis of a kind which might enable them to achieve ‘reflective practice’Schön (1983, 1987, 1991) at work group level.

Organisations aiming to increase their competitive advantage by drawing on tacit knowledgeand implicit learning therefore would be well advised to adopt a methodology of one-to-one open-ended unstructured interviews with their personnel as the basis for group reflective practice. Such amethodology can identify both non-formal learning-from-work and also informal learning-from-life of a kind which may be relevant to enhancing learning-at-work. Although whether they may choseto do so with the explicit aim of asserting rights to their employee’s intellect in these regards, to enhanceshareholder value (Edvinsson & Sullivan, 1996), or recognising it on the premise of shared stakeholdervalue, and reinforced psychological contract, is a wider issue that only is raised rather than developedin this paper.

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Resumo. O conceito de capital humano está associado, de uma forma particular, ao Nobel atribuídoa Laureate Gary Becker e ao seu uso como base conceptual para explicar os custos de investimentoem educação formal. Este artigo, sugere que ‘capital intelectual’ é uma re-designação de conhecimento,

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competências e experiência mais do que uma re-conceptualização da aprendizagem baseada nos recursos.Mais ainda, Becker optou por não incluir conhecimento, competências e experiências informais noseu conceito de capital humano, o que reflecte constrangimentos nas suas premisas. Este artigo, aoargumentar que quer o conceito de capital humano quer o de capital intelectual não identificam e avaliamconhecimento tácito e aprendizagem implícita, evidencia o crescente reconhecimento deste tipo de conhe-cimento e aprendizagem como chave para a vantagem competitiva das organizações. Ao analisar o queestá subjacente aos conceitos de capital intelectual e humano, identificam-se os seus limites meto-dológicos e apresenta-se o contributo das teorias do conhecimento tácito e aprendizagem implícita paramelhor compreender a aquisição de competências informais e não formais. O artigo ainda desenvolve eexemplifica a interface entre conhecimento tácito e explícito, em particular no que se refere aos conceitosde aprendizagem não-formal no trabalho e informal da vida, com referência a um estudo realizado naperspectiva de abordagem ao longo da vida e que envolveu quatro países europeus.Palavras-chave: Capital humano, capital intelectual, conhecimento tácito, competências implícitase capacidades latentes, aprendizagem da vida, aprendizagem no trabalho.

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Resumo. O objetivo central deste trabalho interdisciplinar é verter um facho de luz sobre a relaçãoentre a insatisfação com sistemas organizacionais e a dissonância cognitiva no atendimento aclientes. Os vendedores e seus clientes, de três unidades de uma rede de vendas de veículos autorizadaa atuar no Sul do Brasil, foram selecionados para a pesquisa. Dois instrumentos de coleta de dadosforam construídos pelo autor, para investigar os selecionados. Eles foram aplicados em dois momentosdistintos. No primeiro, os vendedores e seus clientes responderam a questões sobre atendimento,nas diversas fases de vendas. No segundo, os vendedores responderam a questões sobre o sistemaorganizacional da rede, por meio de instrumento construído com base nas proposições de Spitzer(1997). A teoria bidimensional de Herzberg foi utilizada na construção da ponte entre os resultados-chave observados nas duas pesquisas. A constatação desse autor, sobre a influência da insatisfaçãocom fatores higiênicos na motivação, foi ratificada.Palavras-chave: Atendimento ao cliente, motivação do vendedor, teoria bidimensional de Herzberg,modelo de sistema organizacional de Spitzer.

1. Introdução

Em boa parte das organizações é notória a diferença entre o discurso e a prática de atendimentoa clientes, quer no âmbito do acolhimento de clientes externos, quer nos atendimentos a clientes internos.Diversas variáveis incrustadas na base do iceberg podem explicar essa dissonância, mormente asconcernentes à arquitetura da motivação embutidas nos sistemas organizacionais.

A análise dos fatores constantes nos eixos ‘insatisfação / ausência de insatisfação’ e ‘ausênciade satisfação / satisfação’ pode explicar os motivos de determinadas atitudes no trabalho e os reflexosdelas nos resultados da organização.

Boa parte da produção científica é centralizada em um único tema. Isso limita a compreensão

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COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL E GESTÃO, 2007, VOL. 13, N.º 2, 261-281

Insatisfação com sistemas organizacionais e repercussãono atendimento a clientes

Éder Paschoal Pinto

The Australian National University

Endereço: Moorhouse Street O’Connor, Apt. 6, Canberra, ACT 0200, Australia. E-mail: ederpinto@ uol.com.br

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da interconexão de elementos da vida real. Por isso, trabalhos interdisciplinares são cada vez maisbem-vindos ao universo do conhecimento científico.

A natureza deste trabalho é interdisciplinar, pois conecta pesquisas em duas áreas da Admi-nistração: Marketing (foco em atendimento a clientes); e Sistemas Organizacionais (foco em motivação).Ele segue a pista, indicada por Ulrich (1998), para as pesquisas contemporâneas. Esse autor orientouos pesquisadores a extrapolar o espaço interno da organização. Afirmou que “o redirecionamentodo foco das práticas de RH, mais sobre a cadeia de valor (fornecedores e consumidores) e menossobre as atividades no interior da empresa, tem profundas implicações” (p. 20).

Na seqüência desta parte introdutória, as seguintes secções serão apresentadas: inicialmenteo modelo de Spitzer, no qual ele propõe arquitetar a motivação e a satisfação no trabalho com basenos sistemas organizacionais; em seguida será apresentada a teoria cinqüentenária de Herzberg,que revolucionou o estudo da motivação em meados do século passado e continua provocando pes-quisadores; em seguida, a arquitetura e as bases conceituais da pesquisa demonstrarão o norte destetrabalho; depois os dados coletados serão apresentados e analisados; e na secção conclusiva serãoresgatados os termos-chave que permitirão o fecho do trabalho.

2. Sinopse do Modelo de Dean Spitzer

Spitzer (1997) propôs um modelo para a identificação e tratamento dos problemas de motivaçãoque repercute na satisfação e no desempenho do trabalhador.

O autor afirmou que o ser humano tem dois principais componentes básicos que definem seudesempenho: habilidade e motivação. Ele explicou que a habilidade sem a motivação é infrutífera;com a motivação, no entanto, “a habilidade ganha vida” (p. 17). E, disse o autor, todos podem obter oestado da ‘supermotivação’ (motivação elevada) e, conseqüentemente, desatar o nó que imobiliza ahabilidade e o desempenho.

À fórmula expressa por Spitzer para representar o desempenho (“Desempenho = Habilidadex Motivação”), pode-se acrescentar o fator ‘contexto’, visto que o desempenho não acontece emum vácuo, mas em um ambiente macro. Em outras palavras, o desempenho do indivíduo depende desi e dos fatores intra e extra-organizacionais relacionados à função por ele exercida. Assim, a seguintefórmula pretende substituir a de Spitzer:

Desempenho = Habilidade x Motivação x Fatores Organizacionais

Spitzer condenou seis concepções sobre motivação, dentre elas: algumas pessoas são motivadas,outras não; a ameaça é a única motivação que algumas pessoas entendem; e o bom senso é tudo oque se necessita para lidar com problemas de motivação (pp. 23-25).

O autor comentou que determinados programas de motivação, palestras e atividades de sensi-bilização elevam o ego do indivíduo, mas, quando a realidade do cotidiano do trabalho se impõe nova-mente, tudo volta a ser como antes, ou altera-se para pior seu estado de espírito. Em semelhante diapasão,disse que certos pacotes salariais e determinadas expectativas de privilégios são “algemas de ouro”que não estimulam a dedicação, a lealdade e a habilidade.

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Disse o autor que o primeiro passo a ser dado para elevar e sustentar a motivação é derrotaros desmotivadores e o segundo é gerar e sustentar os motivadores. Ele definiu o construto ‘motivador’como: “qualquer aspecto do trabalho que desperta emoções positivas/energizantes, mais especifica-mente, desejo”. E “desmotivador é qualquer aspecto do trabalho que desperta emoções negativas, comotédio, medo, raiva e ressentimento” (p. 57).

Spitzer recomendou combate aos fatores de insatisfação, dentre eles: configuração precáriade atividades, regra que engessa a criatividade e o fazer, competição interna irracional, ignorânciaou subutilização de talentos, expectativas obscuras, reuniões improdutivas, desonestidade, hipocrisia,sonegação de informações, respostas desalentadoras, invisibilidade da gerência (pp. 63-81).

Para que a motivação aconteça, segundo o autor, o gestor identifica os desejos e gera os moti-vadores correspondentes, respectivamente: atividade (acção, diversão, variedade), propriedade (inclusão,compartilhamento, escolha), influência (escolha, responsabilidade, oportunidade de liderar), afiliação(integração, trabalho em equipe), competência (uso dos pontos fortes, aprendizado, tolerância a errosnão intencionais), realização (tolerância a erros não intencionais, auxílio na obtenção de metas, melhoriados sistemas organizacionais, encorajamento diante de desafios), reconhecimento (encorajamento diantede desafios, valorização das obtenções), significado (importância do trabalho) (pp. 91-109).

Spitzer explicou que o ideal seria entender, pessoa a pessoa no trabalho, suas necessidades,desejos e expectativas, como recomenda a psicologia do indivíduo. Ou seja, ater-se a cada base decomprometimento de cada pessoa e satisfazê-la. No entanto, como esse ideal parece cada dia maisdifícil, em virtude da sobrecarga de trabalho operacional hoje imposta aos gestores, recomendou acçõessobre a tarefa e seu entorno, com ênfase neste. Em outras palavras, o trabalho tem dois aspectos: atarefa (conteúdo técnico) e o contexto (elementos do entorno da tarefa). Para a função se tornar maisatraente, muda-se o contexto.

Spitzer também recomendou ao gestor ir além das energias conduzidas para cada tarefa eseu entorno, ou seja, sugeriu desenvolver os sistemas organizacionais. Para ele, os sistemas são“constituídos de procedimentos, políticas, métodos e práticas” (p. 112) e “... quando corretamenteprojetados ou reprojetados, podem criar um ambiente capaz de liberar uma enorme energia emocionalque revitalizará a organização” (p. 113).

Para implantar esses sistemas, o autor sugeriu pontos de acção e alguns deles são exemplificadosno Quadro 1.

3. Aproximação da Teoria Cinqüentenária de Herzberg

Herzberg (1923-2000) realizou uma pesquisa na década de 1950, com engenheiros e contadoresem Pittsburgh. Passados aproximadamente 50 anos, sua teoria continua provocando pesquisadorespara, aqui e acolá, testarem suas afirmações e, assim, continua como referência central de estudo emmotivação ao trabalho. Ou seja, cotidianamente suas afirmações são pesquisadas e discutidas ao redordo planeta Terra, a saber: a validade dos fatores de satisfação e dos de insatisfação no trabalho.

Nessa pesquisa ele perguntou o que deixava os interrogados satisfeitos, bem como o que os

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Sistemas organizacionais e atendimento a clientes

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tornava insatisfeitos no ambiente de trabalho. Os dados permitiram elaborar uma lista de fatores queafetam as atitudes no trabalho. Segundo a ordem de importância (da maior para a menor), de umlado, os fatores que promoviam insatisfação: políticas da firma e suas aplicações, supervisão, condiçõesde trabalho, relacionamento com o supervisor, salário, relacionamento com pares, relacionamento comsubalternos, vida pessoal, status e estabilidade no emprego. De outro, os que promoviam satisfação:realização, reconhecimento, o trabalho em si, responsabilidade, progresso, crescimento pessoal.

Herzberg, Mausner e Snyderman (1959) verificaram que os fatores fazem parte de um mesmoeixo que vai desde a insatisfação até a satisfação, passando por ausências de ambas. Em outras palavras,eles distribuíram os fatores em duas dimensões: os da dimensão ‘insatisfação / ausência de insatisfação’foram denominados Fatores Higiênicos, e os da dimensão ‘ausência de satisfação / satisfação’ foramdenominados Fatores de Satisfação.

Herzberg (1997) comentou que muitas organizações investiram em fatores, como salário,benefício e comunicação e conseguiram pouca, ou nenhuma, motivação. Segundo o autor, o muitoque as organizações conseguiram foi reduzir a insatisfação ou obter a sua ausência. No entanto, asacções que foram orientadas para ajudar o funcionário a superar os desafios, bem como para sentir-sereconhecido e aprender demonstraram forte impacto na motivação.

Para o autor, os fatores higiênicos são provenientes do meio externo – não do trabalho em si.Os motivadores, no entanto, são intrínsecos ao trabalho que a pessoa realiza. Assim, os fatoreshigiênicos dependem de alimentação e realimentação constantes para manter a ausência de insatis-fação. Os motivadores, no entanto, têm impacto mais duradouro. Para Herzberg “a motivação é

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Pinto

Quadro 1Sistemas Organizacionais e Exemplos de Pontos de Acção

Sistemas Organizacionais Pontos de Acção, Visando Facilitar ao Liderado:

Planejamento Participar, compreender e se comprometer com o planejamento geral; definir as próprias metas e associá-las ao planejamento geral e realizar retroações.

Organização do trabalho Estar em ambiente descontraído de trabalho; realizar tarefas variadas; respeitar os prazos; e comemorar as vitórias.

Comunicação Compartilhar informações importantes; discutir fatos com os colegas; realizar sessões de perguntas e respostas; compartilhar a missão, os valores e a visão da organização; ser incentivado a dar e obter respostas às sugestões; e participarde reuniões importantes e produtivas.

Treinamento e desenvolvimento Cultivar atmosfera de aprendizagem; envolver-se na definição, na execução ena avaliação de treinamentos e desenvolvimentos; desenvolver os pontosfortes e gerir os fracos; aplicar os conhecimentos; e ter oportunidades como qualquer um.

Recompensas Obter salário adequado às suas competências; escolher os benefícios que interessam; ser reconhecido; e ser recompensado pelas contribuições espontâneas.

Fonte: Elaborado pelo autor a partir das recomendações de Spitzer (1997, pp. 111-254).

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baseada nas necessidades de crescimento. É um motor interno, e seus benefícios aparecem em umlongo período de tempo...” (1997, p. 79).

Como a motivação depende de um cargo enriquecido e o processo de enriquecimento é contínuo,Herzberg e Mausner (1993) recomendaram:

1. A função deve conter desafios para a aplicação de conhecimentos e habilidades.

2. Aos que aplicam seus conhecimentos e habilidades, incrementos contínuos de responsa-bilidades devem ser aplicados.

3. Se a função não pode apresentar desafios, ela deve ser automatizada, ou desempenhadapor pessoa com habilidades compatíveis, ou seja, que carece de habilidades para exercerfunções mais complexas.

Parafraseando os autores citados, um fator motivador tende a ser mais duradouro do que umhigiênico em virtude de que este é oferecido e mantido, ou não, pelo meio ambiente, e o motivador– estimulado pelo meio externo ou impulsionado pelo próprio intelecto – é sustentado pelo próprioindivíduo. Um exemplo no eixo ‘insatisfação / ausência de insatisfação’: a política salarial da organi-zação (fator higiênico) será mantida pelo tempo que ela desejar. Se for mantida em um nível aceitávelpelo indivíduo, ela não causará problemas a ele, mas, se combalida, ela poderá influenciar negativa-mente o seu “humor” financeiro em face de suas obrigações e desejos. Um exemplo de fator constantedo eixo ‘ausência de motivação / motivação’: o reconhecimento de determinado esforço do indivíduoencontrará eco se ele tiver a necessidade e permanecerá enquanto seu intelecto desejar. Ou seja, amanutenção de um fator de motivação (o reconhecimento, como exemplo dado) depende do indivíduo– se sentir e manter o sentimento de reconhecimento – e não do ambiente externo, enquanto a manu-tenção de um fator higiênico (a política de salários, como exemplo dado) é mantida, ou não, pela firma.Isto é, independe do sujeito em tela.

Alguém poderia argumentar que a firma pode não mais reconhecer o indivíduo e que isso seconfigura como um exemplo semelhante ao da política salarial, ou seja, de dependência do meio externo.Por outro lado, pode-se afirmar que isso não alteraria os reconhecimentos realizados. A argüiçãopoderia ser estendida: “mas um aumento de salário – fator higiênico – se combalido, também nãomodifica a situação anterior – a do período de aumento”. A diferença, entrementes, é que, se umaumento de salário é retirado, o afetado não mantém seu poder aquisitivo como no período em que oaumento vigeu; quanto ao reconhecimento, no entanto, se o indivíduo desejar e tiver convicção, oauto-reconhecimento perdurará por tempo superior à cessação dos reconhecimentos externos.

Aproximando-se o holofote da teoria de Herzberg e co-autores da polêmica intencionalmentegerada nos dois parágrafos anteriores, verifica-se que se o indivíduo for carente de constante reconhe-cimento e o reconhecimento do ambiente externo cessar, isso gera apenas ausência de satisfação, nãoinsatisfação. Por outro lado, a degradação da política salarial não gera ausência de insatisfação,mas insatisfação.

Críticas têm sido feitas à teoria de Herzberg, entre elas: quando o ser humano é bem-sucedidoele tende a atribuir os louros a si, no entanto, culpa o meio pelos fracassos. E a satisfação não resulta,necessariamente, em atitudes aplicadas ao aumento de produção.

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Sistemas organizacionais e atendimento a clientes

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Considerando-se essas críticas, pode-se argumentar que a tendência de atribuir o mérito a si– quando o indivíduo realiza um bom trabalho – caminha paralelamente, e não em sentido oposto,aos fatores mencionados na teoria bidimensional. Ou seja, o auto-elogio não se contrapõe aos senti-mentos de realização, progresso na firma, crescimento psicológico etc., obtidos por meio da funçãoem exercício – o trabalho tem, ao menos teoricamente, essa finalidade.

Culpar outros pelos fracassos é uma atitude que tanto pode advir de projeção das própriasfraquezas, como ser real. Sob a ótica da realidade, a culpa atribuída a outros estará denunciando osfatores que causam insatisfação, promovidos pela organização, ou seja, fatores como a falta de orien-tação, sonegação de informações, regras engessadoras etc., podem estar dificultando a realizaçãoda tarefa. No que concerne à projeção, o atribuir culpa a outros tende a ter o objetivo, consciente ouinconsciente, de ocultar fraqueza ou insatisfação. Assim, a projeção é “justificável”, pois competeao gestor compreender os fatores que impedem o gerido de realizar trabalhos excelentes, paradisponibilizar-lhe o que ele necessita.

Quanto à satisfação não resultar necessariamente em atitudes aplicadas ao aumento de pro-dução, há de se considerar que sua ausência implica uma situação pior. Adicionalmente, um traba-lhador que não tem os seus fatores higiênicos atendidos dificilmente se empenhará além do sufi-ciente para receber o contracheque no final do mês e manter o seu emprego. Portanto, se satisfaçãonão impulsiona necessariamente o indivíduo à produção, o que se dirá, então, da ausência de satis-fação e da insatisfação?

4. Interligando as Teorias Discutidas e Alguns Dilemas Atuais

A cinqüentenária teoria de Herzberg e a de Spitzer foram utilizadas para prover um facho deluz sobre a relação entre a insatisfação com fatores promovidos pela organização e a dissonânciacognitiva no atendimento a clientes. Em detalhe, o modelo de Spitzer (1997) foi utilizado para iden-tificar o grau de satisfação dos vendedores com os sistemas organizacionais e a teoria de Herzbergpara construir a ponte entre o resultado observado na pesquisa, que utilizou aquele modelo, com asdissonâncias verificadas no atendimento a clientes. Assim se justifica a comparação dos pensamentosdos dois autores.

As questões-chave de semelhança entre os autores:

1. Suas pesquisas e divulgações foram impulsionadas por observarem falta de motivação notrabalho ao longo de suas experiências profissionais e acadêmicas.

2. Argumentaram que muitos gestores, não compreendendo a hermenêutica da motivação,tentaram “motivar” o trabalhador por meio de pressões ou incentivos: “chute no traseiro”(Herzberg); “algemas de ouro” (Spitzer), mas poucos resultados, ou nenhum, eles conseguiram.

3. Constataram que a motivação é um fenômeno basicamente intrínseco – iluminada por‘gerador próprio’ (Herzberg) e ‘automotivação: força energizante’ (Spitzer).

4. Entenderam que a motivação é uma questão complexa que não é resolvida em curto prazo eque exige gestão contínua para elevá-la e sustentá-la.

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5. Recomendaram ao gestor lidar com a tarefa e com seu entorno para elevar e auto-sustentaras arquiteturas das motivações e os desempenhos individuais e organizacionais, pois otrabalho é a fonte da motivação humana.

Há diferentes conceituações entre os autores:

1. Para Herzberg, o ser humano tem duas necessidades: a pulsão interna para evitar a dor causadapelo ambiente e as de crescimento psicológico. Spitzer, no entanto, ao fator necessidadeacrescentou o construto desejo. Para ele, os desejos significam forte querer – coisas quequeremos ativamente – e as necessidades são essências da sobrevivência. Em outras palavras,enquanto Herzberg focalizou dois tipos de necessidades do ser humano, Spitzer disse quealém das necessidades há, ou não, o desejo de satisfazê-las. Assim, o indivíduo pode desejar,ou não, suprir necessidades, quer as de sobrevivência, quer as de crescimento psicológico.Em outros termos, há pessoas que convivem com determinadas necessidades em virtudede não as priorizarem, ou mesmo porque não podem satisfazê-las.

2. Herzberg (1997) explicou que os fatores que satisfazem (motivam) o indivíduo no trabalhosão distintos dos que causam insatisfação. No modelo de Spitzer, não há essa distinção.Comentando sobre o contexto do trabalho – colegas, supervisores, políticas da empresa,remuneração, disciplina etc. –, ele disse que “muitos desses aspectos contextuais do trabalhopodem ser classificados como motivadores ou desmotivadores” (1997, p. 57).

Clawson e Newburg (2005) também discorreram sobre a importância do fortalecimento doclima na organização, dizendo que o papel fundamental do líder é contribuir com a geração e susten-tação de energia no ambiente organizacional. Os autores definiram ‘energia’ como: “o percentual doengajamento da pessoa no trabalho, fisicamente, mentalmente, espiritualmente, emocionalmente e social-mente” (p. 15).

Clawson e Newburg manifestaram que o ambiente das organizações é carente de alta moti-vação, ou, como dizem, ‘energia’. Compararam a dedicação (baixa) do indivíduo ao trabalho coma que ele aplica em atividades voluntárias, como participação em esportes, nas quais ele dedica consi-derável volume de energia, sem qualquer remuneração, muitas vezes sem supervisão e com certocusto financeiro para realizá-las. Assim, as questões-chave são: por que a pessoa aplica menos energiano trabalho do que em atividades voluntárias, nas quais em vez de receber dinheiro ele paga pararealizá-las? Por que ele tem mais prazer em atividades fora do trabalho? Quais os atrativos que faltamao ambiente de trabalho?

Os autores sinalizaram duas questões no contexto dos dilemas das motivações: a relaçãoentre sentimentos e desempenho e a diferença entre imposição e escolha. Explicaram que o sentimentoafeta o desempenho, mas que os gestores pouca importância a ele têm dado. Quanto à escolha, ouobrigação, os autores disseram que a imposição de metas mina as energias motivadoras em virtudede que a exigência muda o foco da experiência para o desempenho, ou seja, da escolha para a obrigação.Entretanto, eles se manifestaram a favor de metas e recomendam ao líder a observação e negociaçãodelas quando o funcionário incorporar o gosto pela realização – nas palavras dos autores: “... logoapós os empregados terem desenvolvido energia para a coisa, as metas podem desenvolver muito o

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desempenho” (p. 20). Isso exige habilidade de verificar o momento oportuno para se evitar que aescolha não seja transformada em obrigação e passe a drenar as energias do envolvido.

Essa situação é desafiante porque atualmente a competição empurra a firma para acréscimosconstantes nas metas organizacionais e individuais e isso consome muita energia tanto do gestor quantode seus orientados. Daí o desafio de discutir as metas no momento oportuno ser muito maior, namedida em que as revisões são constantes e muitas vezes com parâmetros desconhecidos.

Em decorrência da alteração no cenário dos negócios, em diversos países e em indústrias detodos os tipos e tamanhos, os empregos estão sendo reduzidos drasticamente – e, com eles, a tradi-cional fase em que o empregado se comprometia com a firma em troca de emprego de longaduração. Assim, novas relações de trabalho estão sendo colocadas em prática, principalmente empaíses desenvolvidos, como nos Estados Unidos.

Para a compreensão desse novo relacionamento de trabalho, Tsui e Wu (2005) propuseramuma tipologia bidimensional de quatro células que demonstra, na vertical, os atrativos que a firmaoferece aos colaboradores e, na horizontal, as contribuições que deles espera. Os níveis de atrativose as contrapartidas serão altos e extensos, ou baixos e estreitos.

No modelo dos autores há – no canto superior esquerdo do gráfico de quatro células – um tipode contrato que tem como perfil um “limitado conjunto de atrativos, ou compensações, oferecidopelo empregador, e um estreito conjunto de contribuições esperado do empregado. Isso representaum relacionamento puramente econômico, de curto prazo e um conjunto de obrigações relativamentebem definido” (p. 46) e, por óbvio, não há comprometimentos adicionais. Esse tipo de relacionamentopode ser descrito da seguinte maneira: em vez de se ter um emprego, tem-se um trabalho.

Os autores comentaram que, em virtude das pressões dos custos, muitos empresários estãooptando por esse tipo de relacionamento, ou seja, por contratos de trabalho temporários, em tempoparcial, ou pela terceirização de tarefas.

No canto superior direito do gráfico, os autores classificaram um tipo de contrato caracterizadopor estreito conjunto de atrativos oferecidos pela firma e por contribuições elevadas e extensas exigidasdo contratado. Essa característica contratual tem sido empregada em face da acirrada competição edos limitados recursos disponíveis. Assim, as firmas tentam fazer mais com menos. A cada dia oscontratados são mais solicitados, e é comum observar pessoas acumulando funções de colegasdesligados da firma, além da exigência de comprometimento incondicional. Para os autores, essasituação não perdurará por muito tempo, pois se caracteriza como desequilíbrio na relação. Eles citamcomo exemplo a General Electric, que na década de 1980 adotou essa estratégia, mas já a abandonou.

Tsui et al. (1997) descobriram que as firmas que adotaram os dois tipos de relacionamentosacima descritos obtiveram maus resultados, quais sejam, baixo desempenho, nível insatisfatório decooperação, predisposição dos contratados à busca de novo emprego, ou contrato, e redução do compro-metimento com a organização.

No canto inferior esquerdo, os autores enquadraram um tipo de contrato em que a firma oferecesignificativo conjunto de atrativos e, como contrapartida, exige limitada contribuição. Ou seja, umaespécie de overdose de generosidade.

No canto inferior direito, encontra-se o que os autores definiram de ‘investimento mútuo’.

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Isto é, o contrato em que a firma oferece generosos atrativos e, em contrapartida, exige do contratadocontribuição elevada. Este tipo de relacionamento se caracteriza como de longo termo, em que há amplocomprometimento mútuo.

Os autores revelaram que a maioria das firmas mais bem classificadas na Revista Fortuneaplica a filosofia do investimento mútuo.

Levando-se em consideração que muitos dos contratos de trabalho que eram classificadosnas células inferiores foram transpostos para as superiores, pode-se supor que a nova dinâmica dorelacionamento é um dos fatores responsáveis pelo sacrifício da motivação, do comprometimentode longo termo e, possivelmente, pela redução de ganhos financeiros de trabalhadores e capitalistas.Pior, pela supressão do prazer no ambiente de trabalho.

5. Arquitetura e Bases Conceituais do trabalho

5.1. Processo Aplicado na Construção do Trabalho

O trabalho inicial teve como cerne a quantificação, o relacionamento e a análise de variáveis,ou seja, descrever, relacionar e analisar as atitudes de vendedores no atendimento a clientes com aspreferências destes – natureza teórico-empírica quantitativa. Com o resultado obtido nessapesquisa – dissonâncias cognitivas na maioria dos fatores pesquisados, entre o que o cliente esperado atendimento e como o vendedor o atende –, uma suposição foi estabelecida. Para afirmá-la, ounegá-la, foram descritos e analisados os níveis de satisfação dos vendedores com os sistemas organi-zacionais da rede de concessionárias. Motivado pelo resultado – constatação da suposição prece-dente –, o autor deste trabalho colocou as lentes da teoria bidimensional de Herzberg diante dasdescobertas e construiu a ponte entre os fatos verificados – insatisfação com um dos fatores organi-zacionais e dissonância cognitiva no atendimento a clientes.

5.2. População e Amostra

Três unidades de um grupo empresarial fundado em 1985 foram escolhidas para a pesquisa.O grupo era formado por dezesseis empresas localizadas em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul(Brasil). As unidades escolhidas administravam consórcios e comercializavam veículos novos dasmarcas Ford, Volkswagen e Fiat, e usados de todas as marcas.

A escolha do segmento foi intencional. Ou seja, deu-se em virtude da pujança do setor auto-mobilístico na economia internacional, das freqüentes inovações nos produtos e nas estratégias devendas, do grande contingente de trabalhadores e das freqüentes reciclagens.

Todos os profissionais de vendas de veículos novos da marca Fiat e usados de qualquer marcaque trabalhavam em Rio do Sul, Blumenau e Itajaí tiveram chance de ser sorteados. Pelo processo deamostragem aleatória simples, foram sorteados dez vendedores de cada localidade, aproximando-sedo censo da força de vendas de cada unidade.

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Conforme Aaker, Kumar e Day (2004, p. 392), o vendedor é que tem a competência de sele-cionar o cliente “conhecido”. Isto é, ele é o perito no processo desse tipo de amostragem.

Segundo McKenna (1992), um vendedor a cada dois anos, em média, deverá estar recebendo ocliente habitual para trocar seu veículo.

Com base na informação de McKenna e nas recomendações de Aaker et al., determinou-seque qualquer cliente que voltasse a comprar um veículo na concessionária em períodos de até quatroanos poderia ser escolhido. Os clientes que nesse período retornaram a uma das lojas foram identi-ficados no cadastro. De posse dos nomes, pediu-se a cada vendedor indicar três clientes que elesconheciam bem.

5.3. Instrumentos de Pesquisa

As proposições de vendas elaboradas por Friedman (1995) e as de negociação recomendadaspor Pinto (1994, 1999) foram utilizadas na formulação dos instrumentos – tanto no destinado a veri-ficar as preferências do cliente, como no que investigou as atitudes e comportamentos do vendedor diantedo cliente –, segundo os seguintes passos e conceitos:

1. Abertura: oferecer ajuda ao cliente. Os autores citados recomendaram desenvolver umrelacionamento pessoal mais do que comercial nesse momento.

2. Sondagem: identificar as necessidades e desejos por determinado produto. Quanto mais ovendedor souber de seus clientes, mais será capaz de ajudá-los a selecionar os produtos evendê-los.

3. Demonstração: nesta parte do processo de venda, o vendedor explica o valor do produto,através de suas características, vantagens, benefícios, e o torna atrativo.

4. Fechamento experimental: fazer uma pergunta para verificar a disposição do compradorpara adquirir o item principal – carro, por exemplo – e para a compra de um acessório.

5. Lidando com as objeções: se a venda não for concluída na etapa anterior, reforça-se aempatia. Isto é, o vendedor ouve o cliente e se coloca no lugar dele, visando descobrir oreal motivo da recusa da proposta. Destarte, outras opções podem ser oferecidas.

6. Fechamento: quando as objecções forem superadas, ou seja, o comprador mostrar-se plena-mente satisfeito, é o momento de fechar o negócio. Segundo os autores citados, a funçãode um vendedor é atender às necessidades, desejos e expectativas de seus clientes, verificandosua satisfação no processo e, em especial, na conclusão da venda.

Os formulários de pesquisa do processo de atendimento continham questões exclusivamentefechadas. Vários tipos de escalas foram formulados, visando, conforme orientações de Aaker et al.(2004, pp. 287-317), atender a cada natureza de fator investigado. Em cada questão, um estímulofoi feito e diversas respostas permitiram ao pesquisado identificar a sua atitude cotidiana nessa situação.

As questões feitas aos vendedores e aos clientes foram semelhantes em suas essências, massob a ótica de cada lado. Ou seja, ao vendedor foi perguntado como ele atendia ao cliente em cada

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variável do processo de atendimento. Ao cliente foi perguntado como ele gostava de ser atendido,nessas fases e nas respectivas variáveis.

As questões que compuseram o instrumento de pesquisa da satisfação do vendedor com ossistemas organizacionais da rede foram baseadas nas proposições de Spitzer (1997), cuja síntesepode ser vista no Quadro 1. Na construção do formulário utilizou-se uma escala Likert de cinco pontos,contendo os seguintes graus: ‘inexistente’, ‘insatisfatório’, ‘satisfatório’, ‘muito satisfatório’ e ‘excelente’.

5.4. Coleta de Dados

O formulário de preferências no atendimento foi enviado aos clientes pelos correios, com envelopesselados para respostas, facultando-lhes o anonimato.

A cada vendedor selecionado foram entregues dois formulários – o da primeira pesquisa, paraverificar como ele atendia ao seu cliente e o da segunda pesquisa, para expressar a sua satisfaçãocom os sistemas organizacionais. Em ambas as ocasiões o direito ao anonimato foi reservado.

Os participantes da amostra descreveram seus relacionamentos no ambiente interno e com oambiente externo.

O fenômeno intra-organizacional foi descrito em termos do grau de satisfação dos vendedorescom os sistemas organizacionais da rede de concessionárias. O relacionamento com o ambiente externofoi descrito em termos de como o vendedor atende ao seu cliente.

Os fenômenos podem-se influenciar mutuamente. Por exemplo, os sistemas construídos pelosgestores – questões intra-organizacionais – podem influenciar as atitudes dos vendedores diante dos clientes– questão interorganizacional. Estes, com suas demandas, podem influenciar vendedores e gestores.

5.5. Tratamento e Discussão dos Dados

No teste do instrumento de pesquisa da satisfação do vendedor com os fatores do sistema orga-nizacional, a maioria das variáveis do fator Planejamento e do fator Comunicação não permaneceuno grupamento teórico original após o teste fatorial e, por isso, esses fatores foram eliminados. Outrasquatro variáveis de grupamentos teóricos diversos foram excluídas por não permanecerem no grupa-mento teórico original.

O teste do instrumento revelou um indicador de coeficiente Alfa de Crombach de 0,92. Coma redução das variáveis, o instrumento explicou 77,8% da variância dos dados, com o indicador deKMO = 0,50.

Na classificação dos dados, dois grupos de tabelas com resultados consolidados foram cons-truídos: 1) o que evidencia as extensões da sintonia do vendedor com o cliente, em cada fase e variáveldo processo de vendas (Tabela 1) e; 2) o que demonstra as percepções dos vendedores sobre osfatores de satisfação embutidos nos sistemas organizacionais (Tabela 2).

Os dados foram tratados por meio de softwares estatísticos: SPSS, Sphinx 2000 e Excel. Ométodo estatístico mais utilizado foi o χ2, para verificar as dependências significativas entre as atitudesdo vendedor e as preferências de seus clientes.

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Na interpretação teórica dos dados privilegiou-se o modelo Insatisfação-Satisfação de Herzberge Mausner (1993) e, secundariamente, o modelo de motivação elevada e sustentada de Spitzer (1997).

Os resultados da pesquisa são expressos por meio de uma visão interpretativa e constru-tivista, conforme conceitos emitidos por Reich e Benbasat (1996). A interpretação da consonânciadeu-se com base nas informações dadas pelos sujeitos da pesquisa (vendedores e clientes). O cons-trutivismo caracterizou-se na ponte que o autor construiu para conectar as dissonâncias cognitivasdos vendedores no atendimento aos seus clientes com as insatisfações deles com os sistemas orga-nizacionais da rede pesquisada.

6. Apresentação e Análise dos Dados

Trinta vendedores e três clientes de cada vendedor responderam aos instrumentos de pesquisa. Os resultados das duas pesquisas serão apresentados separadamente na ordem cronológica das

investigações. Ou seja, inicialmente serão apresentados os resultados da investigação sobre o grau

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Tabela 1Resultados Consolidados da Investigação da Sintonia dos Vendedores com os Clientes

Fase Fator Investigado Resultado do χχ2

Recepção do cliente Campo de interação e confiança entre vendedor e cliente 0,23, gl = 1, 1-p = 36%

Sondagem Identificação do perfil do cliente 6, gl = 1, 1-p = 98% Identificação dos interesses de compras 1,80, gl = 1, 1-p = 82%

Uso de estratégias de vendas Tempo de acompanhamento do cliente na loja 15, gl = 2, 1-p = 99% Importância dos atributos do produto 51, gl = 3, 1-p = >99%

Contato pós-venda Verificando a satisfação do cliente com o produto 33, gl = 2, 1-p = >99%

Fonte: Resultados da pesquisa, com base no modelo de vendas de Friedman (1995) e Pinto (1994 e 1999).

Tabela 2Resultados Agrupados da Satisfação dos Vendedores com os Sistemas Organizacionais

Conglomerado de variáveis Graus: inexistente e insatisfatório Graus: satisfatório,muito satisfatório e excelente

Freqüência Proporção Freqüência Proporção

Organização do trabalho 12 40% 18 60% Treinamento e desenvolvimento 7 23% 23 77% Recompensas financeiras e não-financeiras 16 53% 14 47%

Fonte: Resultados da pesquisa.

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de sintonia dos vendedores com os clientes das unidades investigadas e, em seguida, a pesquisa queapurou o grau de satisfação dos vendedores com os sistemas organizacionais da rede de concessionárias.

Como o intuito central do trabalho é confrontar os resultados das duas pesquisas empíricascom a argumentação de Herzberg sobre o nefasto poder da insatisfação do indivíduo em seu desem-penho no trabalho, os resultados serão apresentados de maneira breve, restando o espaço necessário àanálise teórica dos resultados e para as conclusões. Isto é, não serão discutidos os detalhes das des-cobertas, mas o significado teórico delas.

6.1. Essência dos Resultados da Primeira Pesquisa

O objetivo da primeira pesquisa foi verificar o grau de consonância das atitudes dos vendedorescom as preferências de seus clientes habituais.

Como se observa na Tabela 1, em apêndice, dentre seis conglomerados de variáveis quatroapresentaram dependências significativas. Em outras palavras, apenas em dois conjuntos de variáveisa forma como o vendedor atende ao seu cliente é aproximada com a que este gosta.

Como exemplos de dissonâncias apresentados na Tabela 1.1., em apêndice, enquanto 57% dosvendedores afirmaram que consumo era o atributo que seus clientes indicavam como mais importantena decisão de compra de veículos, apenas 16% destes fizeram essa afirmação. Por outro lado, enquanto77% dos vendedores responderam que velocidade era o atributo mais indicado pelos clientes comode menor importância no veículo, apenas 45% dos clientes responderam que esse atributo era o demenor importância.

Eco semelhante – ao anteriormente emitido pelo diapasão da dissonância cognitiva – é ouvidona Tabela 1.2.: Atitudes Informais do Vendedor e Gosto do Cliente. Ela demonstra que 87% dosvendedores disseram que usavam a tática de comentar tempo e temperatura para descontrair clientese apenas 40% destes responderam que apreciam essa informalidade. Entretanto, há atitudes queeram bem-sucedidas: como exemplo, todos os vendedores afirmaram que ofereciam cafezinho, cháe outras iguarias e todos os clientes responderam que apreciavam esse tipo de cortesia.

Tendo-se em vista a prevalência das dissonâncias entre as percepções da força de vendas e aspreferências dos clientes, supôs-se que tal dissonância seria decorrente de insatisfação dos vendedorescom os sistemas organizacionais. Assim, decidiu-se verificar essa questão.

Tendo concluído este breve comentário dos resultados da primeira pesquisa, vamos analisar osobtidos na segunda.

6.2. Essência dos Resultados da Segunda Pesquisa

Para verificar a satisfação dos vendedores com os sistemas organizacionais da rede de conces-sionárias, o autor construiu um instrumento de pesquisa baseado na tipologia de Spitzer (1997), conformediscorrido na secção 5.

Spitzer definiu cinco conglomerados de fatores para se elevar e sustentar a motivação, conformedemonstrado no Quadro 1.

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Conforme se discorreu, a maioria das variáveis do fator Planejamento e do fator Comunicaçãonão permaneceu no grupamento teórico original após o teste fatorial e por isso esses fatores forameliminados.

No tratamento das respostas dos vendedores, as freqüências dos graus ‘inexistente’ e ‘insatis-fatório’ foram somadas, bem como as dos graus ‘satisfatório’, ‘muito satisfatório’ e ‘excelente’. Esteconjunto passa a ser denominado Fatores de Satisfação e aquele Fatores de Insatisfação.

Conforme a Tabela 2, a classificação dos Fatores de Satisfação ficou assim representada: treina-mento e desenvolvimento (77%); organização do trabalho (60%); recompensas (47%).

Como se observa, o conjunto de recompensas foi o único que apresentou maior quantidade devendedores insatisfeita em comparação com a dos satisfeitos.

Assim, esse conjunto de variável confirma a suposição estabelecida na primeira pesquisa –insatisfação dos vendedores com um ou mais sistemas organizacionais da rede. Os outros dois conjuntos– ‘organização do trabalho’, ‘treinamento e desenvolvimento’ –, no entanto, apresentaram mais ven-dedores satisfeitos que os insatisfeitos. Assim, dentre os três conjuntos validados na análise fatorial,esses dois negam a suposição de insatisfação, restando, apenas, as variáveis de recompensas.

6.3. Análise dos Dados de Ambas as Pesquisas e Interligação Teórica

A questão inicial (“O vendedor atende o cliente como este quer?”) inspirou o autor a definiro objetivo da primeira pesquisa: “Verificar a consonância das atitudes da força de vendas com o quea clientela aprecia, nas fases de venda e pós-venda”. E a indagação posterior (“Que causas podemestar inibindo as motivações de certos vendedores para um bom atendimento?”) oriunda das respostasà pesquisa inicial gerou a suposição de os fatores organizacionais serem os responsáveis e impul-sionou o pesquisador ao segundo desígnio: “Verificar o grau de satisfação da força de vendas com ossistemas organizacionais da firma pesquisada”.

Em resposta à primeira pergunta, verificou-se que 67% dos conjuntos de variáveis confron-tadas apresentaram dependências significativas, isto é, 67% de dissonância entre vendedores e clientessobre as preferências destes.

Para responder à segunda questão, investigou-se a satisfação dos vendedores com os sistemasorganizacionais. Os resultados revelaram que o conjunto das variáveis de recompensas é o únicoque possui mais vendedores insatisfeitos que os satisfeitos.

Diante dos resultados das duas pesquisas, recorreu-se à teoria dos fatores de satisfação e dos fatoreshigiênicos (Herzberg et al., 1959; Herzberg & Mausner, 1993; Herzberg, 1997), para verificar se odesempenho da força de vendas é explicável por esse ensinamento.

Observando-se a classificação dos fatores na Tabela 2, percebe-se a incidência de mais vende-dores insatisfeitos com o fator higiênico ‘recompensas’ e os motivadores (treinamento e desenvol-vimento; organização do trabalho) apresentaram maior número de vendedores satisfeitos. Ou seja, osfatores oriundos do “motor interno” (crescimento por meio de educação e pela riqueza da função),que são combustíveis e recompensas finais da motivação, foram os mais bem pontuados. Aparente-mente essa afirmação não se sustenta ante os dados obtidos na pesquisa de atendimento ao cliente.

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Isto é, uma vez que os dois conglomerados de motivação foram apontados pela maioria como satis-

fatórios, o atendimento deveria apresentar mais consonâncias do que dissonâncias.

Para aprofundar essa questão, vamos analisar a metáfora que Herzberg estabeleceu para explicar

o efeito da insatisfação na motivação do indivíduo. Ele comparou o atendimento das necessidades básicas

do indivíduo com a assepsia em um hospital. Disse o autor que um hospital limpo não acrescenta

saúde ao paciente, no entanto, se houvesse a presença de germes patológicos, sua saúde tenderia a

piorar. Com o esteio da essência dessa metáfora, pode-se dizer que a insatisfação com as recompensas

(germes) pode estar anulando o efeito da motivação ao atendimento (o trabalho em si) e dos treina-

mentos e desenvolvimentos realizados.

Tendo-se em vista que a arquitetura do cargo inclui o ocupante, as funções e as recompensas,

pode-se, com os pilares dessa afirmação, sustentar a ponte construída entre os germes intra-organiza-

cionais e as dissonâncias verificadas no atendimento aos clientes. Ou seja, as insatisfações dos vendedores

com as recompensas repercutem no frágil interesse em conhecer e melhor atender seus clientes, visto

que tanto as recompensas como o atendimento são elementos da arquitetura do cargo.

A discussão precedente gera mais uma questão crucial. Ou seja, tendo-se em vista que o aten-

dimento é a expressão-chave da qualidade da arquitetura do cargo, pergunta-se: qual é a razão de a

segunda pesquisa ter mostrado a satisfação da maior parte dos vendedores com a organização do

trabalho diante das dissonâncias entre as suas atitudes e as preferências de seus clientes?

Para responder a essa questão, vamos excluir, da Tabela 2.1., as respostas dadas ao nível inter-

mediário ‘satisfatório’. Desse modo, a escala passa a ter, na dimensão de insatisfação, as seguintes

variáveis: ‘inexistente’; ‘insatisfatório’. E, na dimensão de satisfação: ‘muito satisfatório’; ‘excelente’.

Destarte, a classificação dos fatores de satisfação – apontados como ‘muito satisfatório’ e ‘excelente’ –

passa a ser: treinamento e desenvolvimento (29%); organização do trabalho (24%); recompensas (19%).

Na outra dimensão da escala (vendedores insatisfeitos), nota-se: recompensas (53%); organização

do trabalho (40%); treinamento e desenvolvimento (23%).

Também sob este olhar mais rigoroso – de exclusão do grau ‘satisfatório’ –, o conjunto de

recompensas apresentou a maior diferença em comparação aos demais, sobre a quantidade de ven-

dedores insatisfeita em relação a dos satisfeitos. No entanto, o conjunto das variáveis de organização

do trabalho também apresentou quantidade superior de “insatisfeitos” em comparação com a dos satisfeitos.

Levando-se em consideração essa nova revelação, a classificação teórica do fator ‘organização

do trabalho’, como fator de satisfação, parece prejudicada. Entretanto, há esperanças de revitalizá-la.

Observa-se que a palavra ‘insatisfeitos’ foi grafada entre aspas no penúltimo parágrafo. A

intenção de grafá-la dessa forma significou que o fator ‘organização do trabalho’ assumiu o status

‘insatisfatório’ após a extinção das freqüências constantes no grau ‘satisfatório’; ou seja, o perfil do

conjunto resultou da ausência de parte da satisfação, não necessariamente da insatisfação.

Segundo Herzberg, o ‘trabalho em si’ pode ser fator de satisfação, ou de ausência de satisfação.

Os resultados desta pesquisa expressaram semelhante acorde. Isto é, a menor freqüência de vendedores

na dimensão ‘satisfação com a organização do trabalho’ em comparação com a demonstrada ante-

riormente só ocorreu após a exclusão de um grau dessa dimensão.

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Herzberg (1997) explicou que o enriquecimento do cargo, ou função, se concretiza “no rela-cionamento com o cliente...” (p. 80).

O facho de luz dessa assertiva esclarece que a satisfação dos vendedores com a organizaçãodo trabalho, apurada na Tabela 2, parece ser ilusória na rede pesquisada. Ou seja, se ela fosse real –mesmo com o rigor da exclusão do nível ‘satisfatório’ – a proporção dos satisfeitos seria superior ados que responderam não estar satisfeitos – a exemplo do resultado de Treinamento e Desenvolvi-mento (T&D) – e não haveria dissonância entre as atitudes dos vendedores e as preferências dos clientes.Parafraseando Herzberg, a satisfatória estruturação das atividades de vendas e os treinamentos edesenvolvimentos aplicados aos vendedores estariam se materializando no atendimento aos clientes.Assim, parece que ausência de satisfação é ratificada, com base nesse argumento.

Falando-se em T&D, suspeita-se que essa atividade não esteja refletindo no desempenho dosvendedores da rede de vendas de veículos, em virtude das dissonâncias observadas. Ou seja, aspalestras, os workshops e outras técnicas podem estar sendo aplicadas com muito entusiasmo, masdistantes da realidade da função de vendas. Semelhante argumentação foi proferida pelos autoresque foram citados como âncora neste trabalho. Isto é, eles afirmaram que muitas firmas têm investidofortunas em T&D e poucos resultados conseguiram (Herzberg, 1997, p. 59 – sobre treinamento emsensibilidade –, Spitzer, 1997, p. 16 – sobre diversos investimentos com funcionários).

A relação entre atendimento ao cliente e motivação pode também ser explicada por meio deteorias de comprometimento. Becker (1992) explicou que o comprometimento é composto pela naturezaintrínseca ou psicológica, isto é, as bases de comprometimento; e pela extrínseca, isto é, os focos docomprometimento (com o que ou com quem se compromete).

Considerando-se que as bases do comprometimento estão contaminadas com os germes dasrecompensas, elas podem estar repercutindo no foco (atendimento aos clientes). Assim, o comprome-timento, visto como composto por base e foco, também permite erigir a ponte entre as insatisfaçõesdos vendedores com as recompensas (bases de comprometimento) e a falta de sintonia com o cliente(focos de comprometimento).

Em síntese, os resultados observados neste trabalho estão em harmonia com depoimentos,afirmações e pesquisas realizadas por autores, como: Cespedes (1997), Spitzer (1997), Herzberg eMausner (1993), Becker (1992), Clawson e Newburg (2005), Tsui e Wu (2005).

Segundo Cespedes (1997): “Não obstante, embora o atendimento e os serviços tenham setornado um tema popular, as pesquisas constatam repetidas vezes que o bom atendimento ainda éuma exceção” (p. 267).

O modelo teórico de Spitzer permitiu conhecer o grau de satisfação dos vendedores com ossistemas organizacionais em diversos aspectos da dinâmica organizacional da rede pesquisada e osresultados confirmaram o depoimento do autor: “Pesquisas consecutivas identificaram falta demotivação [...] 69 por cento dos gerentes operacionais disseram que este é o problema mais prejudicialem sua organização” (p. 15).

A teoria de motivação proposta por Herzberg não é recente, mas os seus fundamentos continuamatuais, como se apurou neste trabalho. Ou seja, foi por meio do uso das afirmações do autor de quea saúde da motivação é afetada por germes existentes na dimensão ‘insatisfação / ausência de insa-

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tisfação’ e que o cargo enriquecido se materializa no atendimento ao cliente que permitiu a construçãoda ponte que ligou as insatisfações dos vendedores com as recompensas às dissonâncias no atendi-mento.

O construto ‘comprometimento’, segundo as suas bases e focos, foi desenhado por Becker umpouco mais recentemente do que a teoria de satisfação de Hersberg e seus colegas. Esse construtotambém foi de grande valia para a explicação das dissonâncias nos atendimentos.

O dilema da motivação apresentado por Clawson e Newburg (2005) representa um desafio amais na gestão dos fatores de satisfação implícitos nos sistemas organizacionais. Ou seja, os gestoresestão preparados para averiguar os sentimentos de seus liderados? E, como eles irão perceber o momentoexato de conjugar o sagrado direito de o trabalhador escolher com as metas organizacionais?

Ainda, as novas relações de trabalho estão mudando o perfil da motivação e do compromisso,conforme analisado a partir do modelo de Tsui e Wu (2005). Ou seja, as firmas passaram a exigirmais e oferecer menos, ou oferecer pouco e esperar pouco, agravando o quadro do compromisso delongo prazo, quiçá também do curto prazo. Haverá reversão desse quadro?

7. Conclusão

A natureza deste trabalho – extramuro (pesquisa com o cliente) e intramuro (pesquisa com ovendedor), com foco nesses dois elementos da cadeia de valor – permitiu analisar o nível de conso-nância do relacionamento dos vendedores com os clientes e o grau de satisfação daqueles com ossistemas organizacionais.

A suposição de que a possível causa da dissonância no atendimento a clientes poderia serresultante da insatisfação de parte dos vendedores com um ou mais sistemas organizacionais foiconfirmada por meio da segunda pesquisa e da ponte teórica que o autor erigiu na análise dos resultadosdo trabalho.

Os dados e as análises teóricas permitem concluir que a arquitetura das recompensas interfereno atendimento ao cliente. Em outras palavras, a constatação de Herzberg sobre a influência da insa-tisfação com fatores higiênicos na motivação e a relação que Becker construiu entre bases e focosde comprometimento foram ratificadas neste trabalho. A suspeição de que há ausência de satisfação naorganização do trabalho da rede de concessionárias e sua repercussão no atendimento ao cliente,também contribui com uma gota teórico-empírica no oceano do conhecimento da relação dos sistemasorganizacionais com o vendedor e com o cliente.

A contribuição para o universo das firmas advém do fato de este trabalho indicar a possibilidadede melhoria do desempenho da força de vendas em organizações com perfis parecidos de compro-misso. Para tanto, elas podem produzir enriquecimentos verticais. Ou seja, promover o crescimentopessoal real por meio de educação e pelo enriquecimento da arquitetura do trabalho e reduzir as insa-tisfações com recompensas.

Trabalhos com natureza semelhante a este abrem caminho para se elaborar e implementarestratégias internas, visando elevar o atendimento das necessidades e contribuir para ampliar os

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comprometimentos. E, ajustando-se a sintonia das atitudes da força de vendas com os clientes,contribui-se para melhorar o composto de promoção, principalmente nas organizações em que acompetição é mais centrada no atendimento e nos serviços do que no produto, como é o caso do setorautomobilístico.

Referências

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Ulrich, D. (1998). Os campeões de recursos humanos (Cid Knipel, tradução). São Paulo: Futura (obra originalpublicada em 1997).

Abstract. The main contribution of this interdisciplinary work is to shed some light upon the rela-tion between dissatisfaction with organizational systems and cognitive dissonance in the customerattendance. A group of salesmen and their costumers of three units of a certified car retailer establishedin the South of Brazil were selected for the research. The author built two research instruments forthe investigations. They were applied in two moments. Firstly, the salesmen and their customersanswered questions on attendance of each sale phase. And secondly, the salesmen answered ques-tions about organizational systems; these questions were based on Spitzer’s (1997) theory. On thebasis of Herzberg’s bi-factorial theory, it was possible to build a bridge between the key-results ofboth researches. The Herzberg’s findings, on the negative influence of dissatisfaction with hygienicfactors on the worker’ motivation, was confirmed.Key words: customer attendance, salesmen’ motivation, Herzberg’s bi-factorial theory, Spitzer’s orga-nizational systems model.

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APÊNDICE

Tabela 1.1.Classificação dos Atributos do Veículo, Segundo as Preferências dos Clientes e Segundo asPercepções que os Vendedores têm das Preferências de seus Clientes

Atributos Maior Importância Atribuída pelo Cliente Menor Importância Atribuída pelo Cliente

Segundo o Segundo o Segundo o Segundo oVendedor Próprio Cliente Vendedor Próprio Cliente

Consumo 57% 16% 10% 11% Cor 7% 2% 13% 42% Design 33% 55% 0% 2% Velocidade 0% 0% 77% 45% Segurança 3% 27% 0% 0% Total 100% 100% 100% 100%

Fonte: Resultados da pesquisa.

Observação: Excluindo-se o atributo velocidade, o conjunto dos atributos mais importantes obteve dependência muito significativa (χ2 = 51,gl=3,1-p=>99%). O conjunto de menos importância também obteve dependência muito significativa, com a exclusão do atributo segurança

(χ2 = 26, gl = 3, 1-p =>99%).

Tabela 1.2.Atitudes Informais do Vendedor e Gosto do Cliente

Questões Vendedores que Agem Clientes que Apreciam Dessa Maneira Essa Atitude

Oferecer cafezinho, chá e outras iguarias. 100% 100% Sorrir com descontração. 100% 100% Ser caloroso, amistoso e extrovertido. 93% 98% Cumprimentar com um aperto de mão. 100% 89% Achar graça de uma gafe cometida pelo vendedor. 27% 53% Falar sobre o tempo. 87% 40%

Fonte: Resultados da pesquisa.

Observações: a) Resultados classificados da maior para a menor consonância e; b) Estatística do χ2 = 0,23, gl = 1, 1-p = 36%.

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Sistemas organizacionais e atendimento a clientes

Tabela 2.1.Resultados Detalhados da Satisfação dos Vendedores com os Sistemas Organizacionais

Variáveis Inexistente Insatisfatório Satisfatório Muito satisfatório Excelente

Organização do Trabalho 12% 28% 36% 18% 6% Treinamento e Desenvolvimento 5% 18% 48% 20% 9% Recompensas 23% 30% 28% 12% 7%

Fonte: Resultados da pesquisa.

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Resumo. O artigo tem como propósito contribuir com a discussão sobre a relevância do plano demarketing no contexto das atividades de marketing. O trabalho foi estruturado sob a modalidade deensaio, e compõe-se de uma revisão do referencial teórico, mediante uma análise conceitual crítica dealguns aspectos pertinentes ao assunto. O tema é tratado sob uma perspectiva de um sistema hierárquicode decisões, pondo-se em destaque o marketing como uma função da troca e o papel do marketingno direcionamento da gestão estratégica. É estudada, ainda, a importância do plano de marketing eprincipais equívocos. O trabalho conclui com a afirmação de que o plano de marketing não é umasolução para todos os problemas de uma empresa. Entretanto, ele auxilia na antecipação dos estadosfuturos desejados, direcionando o caminho a ser trilhado. É sobre tudo, um instrumento facilitador,integrador e “potencializador” das estratégias empresariais, em cenários competitivos caracterizadospor crescente complexidade, volatilidade e incerteza.

Palavras-chave: Marketing, plano de marketing, troca.

1. Introdução

Lambin (2000) é enfático ao afirmar que é notória a revolução pela qual o mundo está passando.Por um lado, descortina-se o fenômeno da globalização, e, por outro, desenrola-se a revolução tecno-lógica capitaneada pelo uso da Internet e demais tecnologias emergentes. Neste ambiente, técnicas,como o Just in Time e a produção enxuta, são apresentadas como alternativas para a superação de

COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL E GESTÃO, 2007, VOL. 13, N.º 2, 285-300

O plano de marketing: Um estudo discursivo

Luciano Augusto Toledo

Universidade Mackenzie (NEPEI), Brasil

Karen Perrotta Lopes de Almeida Prado

Universidade Mackenzie (NEPEI), Brasil

José Petraglia

Mestre em Administração e doutorando em Marketing pela Fea-Usp, Brasil

Endereço: Universidade Mackenzie (NEPEI), Avenida Luciano Gualberto, 908, sala e106, Butantã, Brasil. E-mail:[email protected]

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obstáculos que atingem a cadeia de valor das organizações (Casarotto, 2002). Indiscutivelmente,

tais alternativas implicam em alterações nos processos de trabalho, diminuído estoque e produção

ao plano de demanda, melhorando a utilização de recursos, e, conseqüentemente promovendo a redução

de custos (Naisbitt, 1999). Estas alterações, digam-se transformações, pelas quais as organizações

estão sujeitas no atual ambiente de negócios contemporâneo, são necessárias para que o nível de

competitividade organizacional se mantenha crescente e constante. Entretanto, cada vez mais as

organizações estão sendo submetidas a adaptações e ajustes permanentes em produtos e processos

produtivos e gerenciais, e o que tudo indica, os agentes econômicos que não conseguirem adequar-se

às novas condições ambientais afrontaram dificuldades para desenvolverem-se e sobreviverem (Porter,

1989).

Naisbitt (1999) concatena que inseridas em um ambiente dinâmico e competitivo as organi-

zações para permanecerem competitivas, não podem depender exclusivamente da eficácia opera-

cional. É imperativo ser singular, ou melhor, apresentar diferenciação. Para o autor, ser singular

implica no desenvolvimento e implantação de mecanismos os quais melhorem os processos produ-

tivos organizacionais, e que, independentemente de resultados numéricos, devam promover um fluxo

contínuo de inovação, que se dissemine e que tenha total aceitação pelos diversos colaboradores de

uma estrutura hierárquica organizacional (Naisbitt, 1999). Nesse cenário de revolução tecnocultural,

destaca-se as figuras do marketing e do plano de marketing como instrumentos balizadores da melhoria

da competitividade empresarial e impulsionadores do crescimento da empresa.

2. Revisão da Literatura

2.1. O Estudo do Marketing

Kotler (2000) argumenta que um dos motivos primordiais para se estudar marketing é que

ele é responsável por grande parte do crescimento e do desenvolvimento econômico da empresa e

da sociedade. O marketing estimula a pesquisa e idéias inovadoras, tendo por resultado a oferta de

novos e melhores bens e serviços. Lambin (2000) assevera que o marketing é um conjunto de ativi-

dades operadas por organizações e também um processo social. Em outras palavras, o marketing

existe nos níveis micro e macro. Por esse motivo, pode-se conceber o marketing sob um duplo

enfoque. No primeiro examinam-se os consumidores e as organizações que os atendem; no segundo

adota-se uma visão ampla do sistema completo de produção-distribuição em que a empresa opera.

Para o mesmo autor, marketing quer compreende delinear, desenvolver e entregar bens e serviços que

os consumidores desejam e necessitam; consiste em proporcionar aos consumidores produtos, no

tempo certo, no local certo e no preço que estão dispostos e podem a pagar. No âmago do conceito,

sobressai em primeiro lugar o objeto ou razão de ser do marketing: a troca. Por outro lado, ao envolver-se

no processo de troca, o marketing propicia quatro tipos de estratégias: forma, tempo, lugar e posse.

Lambin (2000) lembra que as atividades correlatas ao marketing demandam estratégias que

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Toledo, Prado, & Petraglia

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necessitam da análise e ao delineamento do mercado. Isso envolve segmentação, escolha de mercado--alvo e posicionamento de mercado e por fim a operacionalização destas estratégias. Uma estratégiapode ser concebida como uma seqüência temporal de decisões, ou, alternativamente, como um processoque envolve um conjunto de ações voltadas para mover uma empresa em direção ao cumprimento desuas metas de curto prazo e seus objetivos de longo prazo (Harrison, 2005). As estratégias encon-tram-se presentes em todas as organizações, tanto as mais simples como as maiores e mais complexas,mas elas podem variar em relação ao grau de formalismo com que são formuladas e implantadas. Emalgumas empresas, em especial naquelas que operam em ambientes que mudam rapidamente, ouem organizações de pequeno porte, as estratégias não são definidas ou “planejadas” na concepçãoformal do termo (Harrison, 2005).

Além do grau de formalismo, as estratégias podem ser consideradas em relação ao fato de seremdeliberadas ou emergentes (Hax & Majluf, 1991). Na estratégia deliberada, os gerentes planejam seguirum determinado curso de ação predefinido e intencional. A estratégia emergente significa que ela nãoé necessariamente planejada ou intencional, mas o resultado de padrões e consistências observadasno passado, mediante um processo de tentativa e erro. Esses dois últimos conceitos constituem oslimites das diferentes combinações que formam a base de uma tipologia que caracteriza os processosde formulação de estratégias.

2.2. A Formulação da Estratégia

A formulação de estratégia, concebida como o processo de planejar as estratégias, ou, no sentidomais amplo, o processo de planejamento estratégico, pode ser desdobrado em três níveis (Kotler,2000): corporativo, empresarial ou da unidade estratégica de negócio (UEN) e funcional.

No nível corporativo, a formulação da estratégia (planejamento estratégico) refere-se à defi-nição, avaliação e seleção de áreas de negócio nas quais a organização irá concorrer e a ênfase quecada área deverá receber. Nesse nível, a questão fundamental é a alocação de recursos entre as áreasde negócio da organização, segundo os critérios de atratividade e posição competitiva de cada umadessas áreas, e as estratégias são predominantemente voltadas para o crescimento e a permanência(sobrevivência) da corporação.

A formulação estratégica no segundo nível – empresarial ou da área estratégica de negócios– está relacionada ao uso eficiente dos recursos e diz respeito ao direcionamento que a organizaçãoirá dar ao escopo dos negócios. Nesse nível, predominam as chamadas estratégias competitivas. Assim,a estratégia da unidade de negócio diz respeito à maneira como uma organização irá concorrer nosmercados escolhidos.

A formulação estratégica no nível funcional relaciona-se ao processo por intermédio do qualas várias áreas funcionais da empresa irão usar seus recursos para a implantação das estratégiasempresariais, de modo a conquistar vantagem competitiva e contribuir para o crescimento da corporação.Assim, por exemplo, em cada unidade de negócio, a área funcional de marketing irá desenvolver oprocesso de planejamento tendo em vista a formulação de estratégias competitivas e a consecuçãodos objetivos da unidade de negócio em mercados específicos (Kotler, 2000).

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O plano de marketing: Um estudo discursivo

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Em empresas de porte médio com uma única UEN, o planejamento estratégico de marketing

e o planejamento operacional de marketing podem ser desenvolvidos como um processo único

(Stevens et al., 2001), e, em organizações menores, o processo de planejamento incorpora os três

níveis simultaneamente. Harrison (2005) complementa, afirmando que, quando se trata de estratégicas

no âmbito corporativo, as decisões são tomadas nos escalões mais altos da organização, embora as

pessoas que se encontrem nesse nível possam receber informações de gestores de níveis mais baixos.

Se uma determinada organização contar apenas com uma única unidade de negócios, as decisões

do primeiro e segundo níveis são tomadas pelas mesmas pessoas. Em organizações com múltiplos

negócios, as decisões no nível da unidade de negócios são tomadas pelos executivos de maior nível

dentro da unidade; no nível da área funcional, as decisões são tomadas pelos respectivos gerentes.

Uma questão relevante, relacionada com os aspectos organizacionais do plano de marketing é

levantada por Ferrell e Hartline (2005). Trata-se de a quem atribuir a responsabilidade pela redação

do plano de marketing. Em algumas empresas, a responsabilidade pode caber ao gerente de marketing,

ao gerente de marca ou ao gerente de produto; em outras, os planos são elaborados por um comitê.

Existem ainda aquelas que contratam consultores de marketing para redigir o plano. Todavia, Ferrel e

Hartline (2005) são incisivos ao afirmarem que a responsabilidade pelo planejamento de marketing

repousa no nível do vice-presidente de marketing ou do diretor de marketing, na maior parte das

empresas.

Outra questão, levantada por Campomar (1983), refere-se ao fato de que, no plano de marketing,

devem ser identificadas as unidades operacionais e os gestores responsáveis pela realização das várias

atividades previstas no programa de ações. Os gestores deverão participar do processo por consti-

tuírem os agentes facilitadores do mecanismo de consecução das ações contidas no plano de marketing.

Como elementos comportamentais desejáveis nesses gestores, destacam-se:

- Habilidade de entender os outros e saber negociar;

- Força para ser justo, a fim de colocar as pessoas e alocar os recursos onde serão mais eficientes;

- Eficiência sobre os aspectos críticos do desempenho ao administrar as tarefas de marketing;

- Habilidade de criar uma ambiente informal propício para enfrentar cada problema com o

qual se defronte.

Ressalte-se, ainda, que a aprovação final do plano de marketing cabe ao CEO ou ao presidente,

embora muitas organizações recorram a comitês executivos, que avaliam e filtram os planos de marke-

ting antes de submetê-los ao dirigente que o aprovará (Ferrell & Hartline, 2005).

2.3. Papel do Marketing na Formulação e Implantação da Estratégia

Hooley et al. (2005) consideram central o papel do marketing na formulação e implantação

da estratégia. Isto porque a administração estratégica tem que lidar permanentemente como um ambiente

em constante mudança, no qual se sobressaem duas entidades e forças: o mercado e a concorrência.

Isso obriga as empresas, em ambiente de alta competitividade, caracterizado por demanda maior do

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Toledo, Prado, & Petraglia

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que a oferta, a pautarem suas ações em uma filosofia de orientação para o mercado (Kohli & Jaworski,1991; Narver & Slater, 1992).

A importância do marketing em organizações orientadas para o mercado, que mantêm umduplo foco – mercado e concorrência –, pode ser destacada mediante três elementos ou papéis queconstituem o ponto central de seu processo estratégico (Hooley et al., 2005). Nesse contexto, umprimeiro papel ou tarefa do marketing é a identificação das características, perfis, exigências e demandasdos clientes e a comunicação e disseminação eficaz das informações para a organização como um todo.O segundo papel do marketing é determinar o posicionamento competitivo, de modo a ajustar osrecursos, capacidades e objetivos da empresa às necessidades diversificadas dos clientes. Essa tarefaimplica reconhecer que os mercados são heterogêneos; cabe, portanto, à empresa identificar os seg-mentos que os compõem, avaliar o grau de atratividade de cada um deles e, simultaneamente, analisara condição competitiva para atendê-los. Essa análise determinará a estratégia de segmentação que aempresa irá adotar, em busca do atendimento de seus objetivos de crescimento e rentabilidade. Oterceiro papel revelador da importância do marketing no processo competitivo prende-se à tarefade implantação da estratégia, o que significa alinhar os recursos da organização para planejar e executara entrega de valor e conseqüente satisfação do cliente. O marketing contribui na coordenação dosesforços que visam a garantir a satisfação do cliente e a mantê-lo.

Lambin (2000) destaca a importância do marketing na atividade de planejamento e elaboraçãodo plano estratégico. O autor argumenta, preliminarmente, que um dirigente de empresa, ainda queavesso a qualquer idéia de planejamento terá sempre que lidar com três tipos de questões:

- Definição e avaliação dos investimentos na capacidade produtiva, necessários para responderà evolução da demanda ou para desenvolver novos produtos e/ou mercados, ou seja, paraatender os objetivos corporativos de crescimento e de rentabilidade;

- Estabelecimento do programa de produção necessário para atender às previsões de pedidos,tendo em conta que esses pedidos e encomendas são uma variável dependente da sazonali-dade e dos ciclos da demanda (variável externa incontrolável) e das ações decorrentes dosesforços de marketing da organização (variável controlável);

- Os recursos financeiros (tesouraria) necessários para fazer frente aos compromissos estimadosno processo de previsão de despesas e receitas.

Os problemas apontados são inerentes ao processo gerencial de qualquer organização, e sua soluçãotem por ponto de partida as previsões de vendas nos prazos curto médio e longo. Lambin (2000) realçaa importância e as vantagens do planejamento e dos planos estratégico e de marketing, e alinha comoargumentação, um conjunto de razões.

2.4. O Processo de Planejamento Estratégico de Marketing

Para Lambin (2000), o processo de planejamento estratégico de marketing tem por objetivoexprimir, de um modo claro e sistemático, as alternativas escolhidas pela empresa, tendo em vistaa assegurar seu crescimento no médio e longo prazo. Em seguida, as alternativas serão convertidas

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O plano de marketing: Um estudo discursivo

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em decisões e programas de ação. O autor considera que a abordagem de marketing, no contexto doplanejamento estratégico de marketing, articula-se em torno das seguintes questões fundamentais,cujas respostas constituirão a espinha dorsal do processo de planejamento e, eventualmente, de umplano estratégico de marketing:

- Definição do mercado de referência (mercado a ser considerado) e estabelecimento da missãoestratégica da empresa nesse mercado.

- Identificação da diversidade do binômio produto-mercado no mercado no mercado de referênciae definição dos posicionamentos suscetíveis de serem adotados.

- Avaliação da atratividade intrínseca dos binômios produto-mercado e identificação das situaçõesfavoráveis e desfavoráveis do ambiente.

- Para cada binômio produto-mercado levantar os trunfos da empresa, bem como suas forçase fraquezas e o tipo de vantagem competitiva que ela a empresa pode desenvolver.

- Estabelecimento de uma estratégia de cobertura e de desenvolvimento a ser adotada e donível de ambição (objetivos) estratégica, em termos de crescimento e lucratividade.

- Traduzir os objetivos estratégicos e convertê-los em um programa de ação que considere asvariáveis que compõem o processo de marketing no nível operacional: produto, preço, promoção,praça.

A proposição de Lambin (2000) põe em evidência três aspectos. O primeiro diz respeito a doiselementos que constituem o cerne do marketing estratégico: a segmentação de mercado e o posicio-namento competitivo. O segundo aspecto é convergente com o que afirmam Kotler (2000) e Harrison(2005). Nesse sentido, o processo de segmentação e posicionamento apóia-se nos princípios e técnicaspresentes no processo de desenvolvimento de estratégias competitivas. O terceiro aspecto reforça aidéia de integração entre as ações estratégicas, táticas e operacionais de marketing.

Por outro lado, na visão de Ferrell e Hartline (2005), o planejamento estratégico de marketingapresenta os seguintes aspectos peculiares:

- Pode ser interpretado como um funil ou filtro, por meio do qual, decisões amplas fluem emdireção a decisões mais específicas, à medida que o processo se desenrola nas várias etapasde planejamento subseqüentes.

- Envolve o estabelecimento de uma missão da organização, a formulação de uma estratégiacorporativa e uma estratégia da UEN, a fixação de metas e objetivos de marketing, adefinição das estratégias de marketing e, por fim, a elaboração de um plano de marketing.

- Deve ser consistente com a missão da organização e com as estratégias corporativas e da UEN.

- Deve ser integrado e articulado com os planos individuais das outras áreas funcionais daorganização.

- Estabelece metas e objetivos no âmbito das variáveis de decisão de marketing convergentescom a missão, os objetivos e as metas da organização como um todo.

- Estabelece uma estratégia de marketing que inclui a escolha e análise de mercados-alvos(segmentação de mercado) e a criação e manutenção de um composto de marketing apro-priado.

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- Dá origem a um plano estratégico de marketing que inclui as atividades e os recursos neces-sários para cumprir a missão da organização e da UEN e atingir seus objetivos e metas.

Devem-se ressaltar, ainda, as conexões estabelecidas entre o planejamento estratégico/planoestratégico de marketing e as demais áreas funcionais da empresa individual ou unidade estratégicade negócio. A Figura 1 proporciona uma visão da integração “plurifuncional” conectando o conjuntode atividades da cadeia de valor. Em uma organização orientada para o mercado, o marketingdesempenha um papel estratégico na orientação e reorientação contínua das atividades da empresa emdireção às oportunidades de crescimento e de rentabilidade, levando em consideração os recursos eo know-how disponíveis.

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O plano de marketing: Um estudo discursivo

Figura 1. Implicações do Planejamento de Marketing sobre as áreas funcionais

PESQUISAE

DESENVOLVIMENTO

PLANOESTRATÉGICO DE

MARKETINGFINANÇAS

RECURSOSHUMANOS

PRODUÇÃOOPERAÇÕES

Produtos novos,melhorados,ajustados.

Necessidades domercado,

Disponibilidade derecursos.

Previsões dedespesas emarketing

Capacidade de produção,prazos, qualidade.

Formação,qualificação.

Fonte: Adaptado de Lambin (2000).

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McDonald (2005) salienta que, apesar de o processo de planejamento estratégico de marketinge de elaboração de plano parecer uma tarefa simples, considerada a lógica que o sustenta, váriasquestões conceituais e práticas podem emergir, as quais convertem esse processo em um dos maisintrigantes aspectos do gerenciamento empresarial. McDonald (2005) sugere algumas dessas questões:

- Quando deve ser feito, com que freqüência, por quem e como?

- O processo é diferente para uma empresa de grande porte e para uma empresa de médioou pequeno porte?

- O processo difere entre empresas diversificadas e empresas com baixo ou nenhum grau dediversificação de produtos e mercados?

- Qual o papel do executivo principal (CEO) no processo?

- Qual o papel do departamento do planejamento da empresa ou unidade estratégica de negócio?

- Qual o papel do departamento de marketing?

- O planejamento de marketing deve ser feito de cima para baixo (top-down) ou de baixopara cima (botton-up)?

- Qual a relação e o grau de inter-relação entre o planejamento estratégico, que abrange períodosmais longos, e o planejamento operacional de marketing, que normalmente cobre um períodocorrespondente a um ano?

Assim, tão ou mais importante do que descrever o conteúdo de um plano estratégico de marketingé estabelecer um projeto de implantação de sistemas de planejamento de marketing. O processo deplanejamento estratégico de marketing deve ser interpretado como imprescindível para o sucessoda empresa. McCarthy (1996) define esse processo como a identificação de oportunidades atrativase desenvolvimento de estratégias de marketing rentáveis, convergindo para a visão do sistema demarketing. Essas estratégias devem ser específicas e direcionadas a um mercado-alvo, mediante umcomposto de marketing especializado. A concepção de Kotler (2000) a respeito do planejamento estratégicoorientado para o mercado tem um caráter mais abrangente sendo definido como uma atividade gerencialque envolve objetivos, habilidades e recursos de uma empresa para o aproveitamento das oportuni-dades em um mercado em contínua mudança.

2.5. Aspectos Diferenciais Entre Plano e Planejamento de Marketing e sua Formalização

Para melhor compreensão deste artigo, vale destacar a diferença entre plano e planejamentode marketing, uma vez que muitas pessoas confundem estes dois conceitos.

O planejamento pode ser considerado, segundo Campomar (1982, p. 2) “como um instrumentopoderoso para aumentar a velocidade e a capacidade de reação das organizações aos estímulosprovenientes do ambiente externo, quer sejam representados por ameaças ou por oportunidades”.Entretanto, o planejamento informal pode trazer um risco à sobrevivência da organização. Já a forma-lização do planejamento traz uma maior integração entre as partes envolvidas da empresa, aumentandoassim a sinergia do trabalho executado.

McDonald (2004, p. 486) coloca que “o planejamento de marketing é simplesmente uma

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seqüência lógica e uma série de atividades que levam à determinação de objetivos de marketing e àformulação de planos para alcançá-los”. Westwood (1996, p. 11) compartilha da mesma idéia aodefinir que o “termo planejamento de marketing é usado para descrever os métodos de aplicaçãodos recursos de marketing para se atingir os objetivos de marketing”.

Já segundo Boone e Kurtz (2002, p. 183) “o planejamento de marketing é o processo de antecipareventos e condições futuros a determinar cursos de ação necessários para alcançar objetivos de marketing”.Campomar (1982, p. 3) acrescenta que “a atividade de planejamento é complexa em decorrência desua própria natureza, qual seja, a de um processo contínuo de pensamento sobre o futuro, desenvolvidomediante a determinação de estados futuros desejados e a avaliação de cursos de ação alternativosa serem seguidos para que tais estados sejam alcançados”.

Por fim, o planejamento de marketing, segundo Bibb (2002), envolve todos os elementos dogerenciamento de marketing como a análise, o desenvolvimento de uma estratégia e a implantaçãodo marketing mix. O plano de marketing pode ser entendido como a consubstanciação do exercíciodo planejamento formal, sendo o planejamento um processo helicoidal e o plano linear (Campomar,1977). Ikeda (2005, p. 35) coloca que os conceitos de planejamento e plano estão conectados, masnão tem o mesmo significado. Já Campomar (1982), Semenik e Bamossy (1995), Westwood (1996),Churchill e Peter (2000), Kotler (2005a) asseveram que o plano de marketing é um documento quedireciona e orienta o esforço de marketing de uma empresa. Concatenando, Rocha e Christensen (1999,p. 263) complementam dizendo que o plano é o documento formal que descreve em maior ou menorgrau de detalhe, essas ações, seus tempos de realização e os recursos necessários. E, finalmente,para Westwood (1996), um plano de marketing é como um mapa – ele mostra à empresa onde elaestá indo e como vai chegar lá. Ele é tanto um plano de ação como um documento escrito. É umaferramenta de comunicação que combina todos os elementos do composto mercadológico em umplano de ação coordenado. Ele estabelece quem fará o quê, quando, onde e como, para atingir suasfinalidades.

Quanto à formalização do plano e marketing, é vasto o universo de formatos encontrados nasbibliografias disponíveis. Semenik e Bamossy (1995) chamam a atenção na hora da escolha de ummodelo de plano de marketing, pois, acreditam que, independente do formato adotado, é importanteque um plano focalize os esforços de marketing da empresa num mercado-alvo bem definido e queconsidere os efeitos do ambiente externo. É apresentado abaixo (Figura 2) um modelo que os autoresdeste trabalho crêem como sendo o modelo mais funcional por ser adotado em um grande númerode empresas. Este modelo se diferencia dos demais por apresentar também um caráter abrangente egenérico.

2.6. Aspectos Tangenciais plano de marketing e ao marketing

Segundo Bowen (2002), o plano de marketing traz alguns benefícios como:

- Ser um guia para todas as atividades de marketing da empresa para o próximo ano;

- Assegurar que as atividades de marketing estejam de acordo com o alinhamento estratégi-co da organização;

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- Forçar os gerentes de marketing a reverem e a pensarem objetivamente todos os passos doprocesso de marketing;

- Assessorar o planejamento financeiro para combinar os recursos com os objetivos do mar-keting; e,

- Criar uma maneira de monitorar os resultados atuais com os esperados.

Os benefícios citados acima estão relacionados às motivações internas que fazem com que asorganizações utilizem no seu cotidiano um plano de marketing. Entretanto, há também benfeitoriasexternas que a empresa pode obter com a adoção de um plano de marketing, como convencer inves-tidores a fornecer fundos para a empresa, podendo assim, alavancar novos negócios, como as parcerias.Para tal, o plano de marketing não deve ser visto como um documento que se limita a relatar fatos esim como algo que fornece razões sólidas, justificativas convincentes e projeções de resultados desa-fiadores (Jones, 2005).

Apesar dos benefícios expostos acima e de amplo referencial teórico que aborda o tema, o

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Figura 2. Modelo para Plano de Marketing

IANÁLISE

DASITUAÇÃO

IIOBJETIVOS

IIIPROGRAMA

DEAÇÃO

IVCONTROLE

ANÁLISE EXTERNA ANÁLISE INTERNA

DETERMINAÇÃO DEAMEAÇAS E

OPORTUNIDADES

DETERMINAÇÃO DESITUAÇÕES FAVORÁVEIS

E DESFAVORÁVEIS

DETERMINAÇÃO DEPONTOS FORTES EPONTOS FRACOS

ELABORAÇÂO DOPROGRAMA DE AÇÃO COM

PRAZOS, CUSTOS,RESPONSABILIDADE (4 P’s)

FIXAÇÃO DE OBJETIVOS

DETERMINAÇÃO DEFORMAS DE CONTROLE

CONFECÇÃO DO PLANO

Fonte: Campomar (1977, pp. 54-58).

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plano de marketing é alvo de críticas e problemas nas empresas. Vale notar que a falta de um planode marketing prévio torna complexo a identificação da origem de determinados erros e problemasna empresa. A investigação em busca da origem do problema irá demandar tempo deste profissionale de sua equipe, causando maiores transtornos do que se tivesse realizado anteriormente um bom planode marketing (Churchill & Peter, 2000).

McDonald (2004, p. 59) aponta quais são os problemas encontrados, quando não se tem umplanejamento de marketing:

- Oportunidades perdidas de lucro;

- Números sem sentido em planos de longo prazo;

- Objetivos irreais;

- Falta de informações acionáveis de mercado;

- Disputa interfuncional;

- Frustração da administração;

- Proliferação de produtos e mercados;

- Desperdício de verbas promocionais;

- Confusão na precificação;

- Crescente vulnerabilidade à mudança ambiental; e

- Perda de controle do negócio.

Vale ressaltar que muitos planejadores, ao definirem a demanda de um produto ou serviço noplano de marketing, se preocupam mais com os aspectos internos como a capacidade produtiva doque com as expectativas dos consumidores em relação aos produtos comercializados. Isto quer dizerque o plano deve ser definido em cima da capacidade que o mercado tem de compra e não em relaçãoa quanto o mercado estaria disposto a comprar (Polizei, 2005).

Kotler (2005b) analisou no decorrer da sua vida vários planos de marketing e argumenta queos profissionais que o confeccionam cometem muitos erros, uma vez que os objetivos e os orça-mentos são impraticáveis além dos planos estarem repletos de cifras do passado com controlesinadequados. Vale destacar também uma observação feita por Campomar (1977) que sugere que osobjetivos devem ser específicos, mensuráveis, realísticos, desafiadores, harmoniosos e estabelecidosde comum acordo entre a administração e os responsáveis por seus atingimentos.

Muitos profissionais acreditam que o plano de marketing só serve para empresas de grandeporte, porém a experiência mostra que toda organização independente do seu tamanho necessita terum plano de marketing. Dalhouse (1972, p. 40) apresenta os comentários clássicos dos porquês queas pessoas não fazem um plano de marketing na empresa: “Nós não somos grande o suficiente parater dados científicos do que vamos fazer por aqui”; “Nós nunca fizemos plano de marketing e aempresa sempre existiu”.

A proposta de um planejamento de marketing, segundo McDonald (1992), é identificar e criaruma vantagem competitiva sustentável. Spawton (1991) analisou pequenos produtores de vinho eidentificou que eles não faziam plano de marketing, mas começaram a perceber que por meio deum plano poderiam conseguir responder mais facilmente às mudanças ambientais. Desta forma,

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passariam a ter maior probabilidade de sucesso, analisando o mercado de vinho e dimensionando acapacidade produtiva dentro das expectativas do seu público-alvo.

Esta preocupação foi decorrente do avanço de novos entrantes neste mercado de vinho, umavez que hoje existem bons produtores na Austrália, na Nova Zelândia e na Califórnia (Spawton,1991). Outro exemplo é a venda de amendoim nos Estados Unidos, que se tornou mais complexa nodecorrer dos anos e forçou vendedores e produtores a darem maior atenção ao processo de marketing(Smith, 2003).

Cousins (1991) realizou uma pesquisa no Reino Unido e verificou que muitos executivos falamda importância de se fazer um plano de marketing, porém poucos de fato sabem utilizar e implantar oplano no seu dia-a-dia. Detectou que os executivos raramente seguem o modelo proposto e assim,preparam planos de marketing inconsistentes ficando insatisfeitos com a adoção deste documento.A pesquisa mostrou que um número pequeno de empresas inclui no plano os programas de açãopara o marketing mix ou faz a previsão das estratégias de seus competidores. Percebeu tambémque não há uma integração entre o conteúdo do plano e os seus benefícios.

É importante destacar que muitos profissionais de marketing acreditam que o plano de mar-keting seja algo muito formal e demorado, não dando a devida importância para a sua confecção.

Outra pesquisa realizada por Cousins (1990) buscou determinar que tipos de organizaçõesno Reino Unido produziam planos de marketing. A amostra foi definida por todas as organizaçõesde médio e grande porte, incluindo os setores privado, público e ONGs. Os dados foram coletados pormeio de questionários e entrevistas semi-estruturadas. A taxa de resposta foi de 385 dentre 412 empresas.

Os resultados indicaram que as companhias do setor público são mais propícias a produziremum plano anual de marketing do que as companhias do setor privado. O setor privado tende a produzirplanos de marketing na mesma quantidade que as ONGs. Entretanto, os planos de marketing dasONGs são radicalmente diferentes dos planos do setor privado e público.

Há também barreiras encontradas nas empresas quando o assunto é planejamento de marketing(Mcdonald, 2004, p. 57):

- Fraco apoio do conselho diretor

- Falta de um plano para o planejamento

- Confusão sobre os termos de planejamento

- Números no lugar de objetivos e estratégias de marketing por escrito

- Muito detalhe, muito à frente

- Ritual que acontece uma vez por ano

- Separação entre o planejamento operacional e o planejamento estratégico

- Não integração do planejamento estratégico de marketing ao planejamento corporativo

- Delegação do planejamento a um planejador.

Percebe-se, então, que muitas barreiras têm origem na própria organização. É pertinenteapresentar os resultados de uma pesquisa realizada no Brasil que confirma vários pontos levantadosaté aqui em relação ao assunto planejamento de marketing (Ikeda, 2005). Esta pesquisa teve o objetivode conhecer com maior profundidade o que as empresas fazem em relação às práticas de planejamento

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de marketing. O universo era os executivos de marketing e a amostra foi composta por alunos quefizeram cursos executivos em instituições de ensino em São Paulo nos últimos três anos. A atividadede planejamento de marketing recebeu uma média baixa dos respondentes da pesquisa no que serefere ao gerenciamento das atividades de marketing. Observou-se que a estrutura geral das atividadesde marketing está mais voltada para a gerência de produtos e assim, a maior responsabilidade demarketing recai para “promoção e comunicação”. A principal barreira detectada nesta pesquisa emrelação ao planejamento de marketing foi que os executivos administram crise ao invés de adminis-trarem o planejamento. Notou-se também que as empresas pequenas parecem realizar pouco ou nenhumplanejamento formal.

Em linhas gerais, a atividade de planejamento de marketing ainda é um campo que precisaser mais explorado pelas empresas. McDonald (1992), Lane e Clewes (2000) e Ikeda (2005) afirmamque estudos empíricos concluíram que poucas empresas praticam o que diz a teoria de plano de marketing,alvo de estudos.

2.7. Possíveis Limitações do Planejamento

Stevens et al. (2001) descrevem algumas situações que representam possíveis desvantagensobjeções associadas à atividade de planejamento. Uma delas é que o trabalho requerido pode exceder areal contribuição do planejamento. Outra questão é que o planejamento tende a retardar as ações efazer com que alguns administradores possam sentir-se tolhidos, sem que exercitem iniciativa própriae espírito empreendedor e inovador. Em algumas ocasiões, é possível, ainda que pouco provável, queum indivíduo, ao avaliar a situação e tratar de cada problema à medida que ela surja, possa obter melhoresresultados.

Lambin (2000) sugere outro conjunto de objeções normalmente apresentadas como inibidorasda aceitação do planejamento formal. Uma primeira objeção relaciona-se à falta de informação. Nessecaso, uma análise mais acurada de situações concretas revela que o problema advém do excesso de infor-mações ou da falta de análise profunda das informações disponíveis. Um sistema de informações demarketing, que permite acompanhar continuamente os movimentos da concorrência, do mercado edas demais forças e entidades do ambiente externo, figura como um requisito indispensável ao gestor,independentemente da presença ou não de um sistema de planejamento formal (Lambin, 2000).

Uma segunda objeção identificada por Lambin (2000) refere-se à precariedade, fragilidade,ou até mesmo futilidade das previsões. Os argumentos que dão sustentação a essa objeção dizemrespeito ao fato de que as decisões estratégicas são tomadas cada vez com maior freqüência em condi-ções de incerteza sobre o comportamento futuro das variáveis do ambiente externo incontrolável.Isto significa que o estrategista tende a basear-se fortemente na subjetividade e em grau menor naobjetividade que caracteriza o processo de previsão em ambientes estáveis. Lambin (2000) contrapõe aesses argumentos o fato de que a previsão não é um fim em si mesma; ela contribui apenas para odelineamento de um cenário, podendo ser considerada um meio facilitador da tarefa de pensar sobreo que poderia ocorrer em um ambiente dinâmico, incerto e incontrolável. A previsão deve serinterpretada como um instrumento que aumenta a sensibilidade, a vigilância e, principalmente, a

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capacidade de reação. Esse objetivo é alcançado ainda que as ações estabelecidas no plano não se

concretizem, e que certas suposições concernentes ao cenário não se verifiquem.

Uma terceira objeção prende-se à rigidez do plano e a uma concepção autoritária e formal do

plano e do planejamento. Assim, uma empresa, ao colocar o plano em ação, arrisca-se a consolidar

uma atitude e um comportamento burocrático, o qual, por sua natureza, é oposto à desejável flexi-

bilidade necessária para se lidar com ambientes instáveis. Como contra-argumento pode-se afirmar

que um plano é concebido exatamente para aumentar a flexibilidade de reação, graças a uma inter-

pretação rápida das alterações observadas. Isso significa que nenhum plano deve ser considerado um

produto final, e os dirigentes devem estar abertos à possibilidade e até à inevitabilidade de revisão

ao longo do período coberto pelo horizonte de planejamento determinado.

Em resumo, a despeito dos argumentos e objeções apontados, os benefícios do planejamento

superam suas possíveis desvantagens, as quais normalmente se circunscrevem as situações específicas.

3. Conclusão

O plano de marketing é um documento formal que direciona e agrega todas as informações

referentes às tomadas de decisões de marketing. Ele serve como um guia sendo um parâmetro do

previsto com o realizado. As organizações, ao fazerem um plano de marketing, tentam trazer resultado

para a empresa e agregar mais valor ao cliente.

O plano de marketing não é uma solução para todos os problemas de uma empresa. Entretanto,

ele auxilia na antecipação dos estados futuros desejados, direcionando o caminho a ser trilhado.

Um dos maiores benefícios da adoção de um plano em uma empresa é alinhar a estratégia da

empresa, favorecendo uma maior integração entre as áreas da organização e uma das principais

barreiras à implantação do plano é a visão de curto prazo que muitos executivos possuem, não dando a

devida importância à confecção do plano.

Apesar de muitos profissionais falarem que seguem um plano de marketing no seu dia-a-dia

dentro das empresas, poucos de fato beneficiam-se das vantagens de sua utilização. A imprevisibilidade

dos cenários abre espaço para que executivos não definam objetivos de marketing mensuráveis

nem previsões de desempenho de seus concorrentes. Esta falta de mensuração por sua vez torna o

plano de marketing com pouco valor, uma vez que torna difícil avaliar seu desempenho no decorrer

do ano.

Por mais voláteis que sejam os cenários, é fundamental o estabelecimento de objetivos quan-

titativos. Só assim será possível mensurar o desempenho da empresa e conseguir aperfeiçoar o plano

de marketing ano após ano.

Vale dizer, então, que há um grande campo de atuação para as pessoas que trabalham com

plano de marketing dentro das organizações, uma vez que os executivos hoje implementam de forma

incorreta o plano. Este artigo abordou a importância da confecção de um plano de marketing para

as empresas nos dias atuais, apresentando os benefícios e as barreiras de sua implantação.

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Abstract. The paper has as intention to contribute with the quarrel on the relevance of the marketingplanning in the context of the activities of marketing. The paper was structuralized under the assaymodality, and is composed in a revision of the theoretical referential, by means of a critical conceptualanalysis of some pertinent aspects to the subject. The subject is dealt by under a perspective to ahierarchic system decisions, setting in prominence the marketing as a function of the exchange andthe marketing function in the aiming of the strategically management. It is studied, still, the importanceof the marketing plan and main mistakes. The paper concludes that the marketing plan is not a solutionfor all the problems of a company. However, it assists in the anticipation of the desired future states,directing the way to be trod. He is on everything, an instrument, and integrator of the enterprise strate-gies, in competitive scenes characterized by increasing complexity, volatileness and uncertainty.Key words: Marketing, marketing planning, exchange.

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