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A evolução da aplicação da energia elétrica e suas consequências para a sociedade Volume 3

Coleção Energia Vol 3

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Terceiro volume

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Page 1: Coleção Energia Vol 3

A evolução da aplicação da energia elétrica e suas consequências para a sociedade

Cole

ção

Ener

gia

- Vo

lum

e 3

Volume 3

ApoioRealização

Promoção

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K

CAPA FINAL.pdf 1 16/11/09 13:12

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Caro leitor,

Dando continuidade à nossa Coleção Energia, o terceiro número da série traz um espectro amplo da evolução das

aplicações da eletricidade ao cotidiano social.

Com um foco especial para a trama histórica da sociedade brasileira, temos uma matéria que nos explica como

um esforço de planejamento governamental foi essencial para que o Estado de São Paulo pudesse aproveitar

seu grande potencial hídrico. Os rios paulistas contribuíram decisivamente para a expansão territorial brasileira

verificada na época colonial, servindo de suporte para o avanço dos bandeirantes. Foi a partir da década de 1950

que começou a se tornar realidade a promessa de transformar o potencial das águas (que no começo do século XX

era chamado de “hulha branca”) em efetiva geração de energia. O crescimento industrial e urbano vertiginoso que

se verificava necessitava de uma correspondente grande infraestrutura de produção de eletricidade. Os apagões,

que então eram comuns, apontavam para uma mudança de modelo no setor. Surgiram assim as empresas

que na década de 1960 foram unidas e consolidadas com a criação da Cesp. Nas demais regiões brasileiras,

empreendimentos similares se impuseram, como Furnas, Cemig, Chesf e muitas outras, formando a espinha dorsal

de um sistema que passou a ser interligado e muito mais eficiente.

O empreendimento mais sensacional que essa era nos legou é sem dúvida Itaipu. Seu gigantismo, seu papel

sensível em termos geopolíticos continentais, assim como o atestado de maioridade que representou para a

tecnologia de construção de barragens, com o pioneiro uso do cálculo numérico por elementos finitos são dados

que o leitor poderá conhecer nas próximas páginas. O impacto do apagão na noite de 10 de novembro de 2009,

que deixou boa parte dos estados mais populosos no escuro por várias horas, é um testemunho da importância

da geração de Itaipu e de como a transmissão dessa energia desempenha um papel vital no sistema elétrico

brasileiro.

O uso pacífico da energia nuclear foi o mote para a construção de usinas térmicas, que se tornaram essenciais

dentro do panorama internacional. O avanço das instalações nucleares trouxe requisitos especiais de segurança,

que nem sempre foram obedecidos, deixando um flanco aberto às críticas políticas e técnicas. Felizmente essa

etapa vem sendo vencida e hoje a energia nuclear volta a ser cogitada para um papel relevante na matriz

energética. O Brasil, que se empenhou tanto internacionalmente para garantir o acesso às tecnologias nucleares

a todos os países, e não apenas para uma minoria, logrou um tento notável ao dominar recentemente o ciclo de

enriquecimento do combustível nuclear – e um pouco dessa história é relatada neste volume.

Um efeito espetacular do progresso nas aplicações da eletricidade foi a entrada em campo da eletrônica,

especialmente a partir do início do século XX. Dispositivos como a válvula foram sucedidos pelo transistor e a

eletrônica de semicondutores possibilitou uma incrível e crescente miniaturização dos componentes. Além de usos

industriais, a eletrônica de consumo criou uma verdadeira revolução cultural em todas as camadas populares,

desde o popular radinho de pilha até o cada vez mais presente – e discute-se a sua imprescindibilidade e a

dependência assim criada – computador.

Finalmente, ainda no plano do consumidor, contamos uma história pouco conhecida: o sucesso inicial do carro

elétrico, até este ser vencido pelo motor a combustão interna. A pressão ambientalista ressuscitou o assunto, que

vem merecendo cada vez mais a atenção de governos, fabricantes e usuários.

Desejamos que esses temas ensejem uma leitura proveitosa e sirvam para suscitar novas reflexões sobre o mundo

energético em que vivemos.

Gildo Magalhães

Professor livre-docente em História da Ciência na Universidade de São Paulo

carta ao leitor por Gildo Magalhães

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Desenvolvimento e tecnologiaOs bastidores da construção da gigantesca Itaipu e as implicações sociais e

técnicas para três países. Seu projeto foi a forma encontrada para resistir ao

choque do petróleo e suprir as demandas energéticas da época.

Era da eletricidadeA história da iluminação artificial contada desde a descoberta do fogo e

a sua utilização para iluminar os caminhos do homem, passando pelas

luminárias a gás, a querosene, chegando à luz alimentada pela eletricidade.

Cidade em movimentoEm meados do século XIX, os carros elétricos eram dominantes em

detrimento dos veículos a combustão, empregados em competições e objetos

de pesquisas acadêmicas. O cenário mudou com o tempo, especialmente com

o desenvolvimento da indústria e alguns interesses privados.

EvoluçãoO desenvolvimento da eletrônica teve papel fundamental nas aplicações

da eletricidade. A substituição da válvula pelo transistor e a eletrônica de

semicondutores deram inicio a uma verdadeira revolução tecnológica, cada

vez mais presente no cotidiano das pessoas.

NuclearUm relato sobre a conquista da energia nuclear, os percalços desde sua

descoberta, sua aplicação em alguns lugares do mundo e uma reflexão sobre

como sua utilização é potencialmente mais segura do que outras formas de

geração amplamente empregadas.

Sob um olharA contribuição de uma companhia – formada pela fusão de 11 empresas

– para importantes projetos hidrelétricos, tendo como consequência a

profissionalização dos técnicos e peritos envolvidos nas obras.

DiretoresAdolfo VaiserJosé Guilherme Leibel Aranha Gerência operacionalSimone [email protected] Coordenação de circulaçãoEmerson [email protected]

Assistente de pesquisaMarina [email protected]

Administração Paulo Martins Oliveira [email protected]

Jornalista responsávelFlávia LimaMTB [email protected]

Projeto gráfico e direção de arte Leonardo [email protected]

Conselho editorialCyro Bernardes, Cyro Boccuzzi, Hilton Moreno, Isabel Félix, Gildo Magalhães dos Santos, Márcia Pazin e Sérgio Bogomoltz

ReportagemBruno D’Angelo e Lívia Cunha

RevisãoGisele Folha Mós

PublicidadeDiretor comercialAdolfo [email protected]

Contatos PublicitáriosAna Maria [email protected]ésar [email protected] [email protected]

Capa e ilustrações internasPoeira Estúdios

ImpressãoGráfica Ipsis

DistribuiçãoCorreios

Atitude Editorial Ltda.Rua Piracuama, 280 cj. 72 / PompéiaCEP 05017-040 / São Paulo - SPFone/Fax - (11) 3872-4404 [email protected]

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44

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expediente índice

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ENERGIA BINACIONAL

desenvolvimento e tecnologia Por Lívia Cunha

Com nome de origem tupi, a Usina de Itaipu gerou um acordo binacional que impactou diretamente três países do cone sul latino-americano, diversos Estados brasileiros e deu origem à maior hidrelétrica do mundo em plenas crises mundiais do petróleo

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1974.Anodecopadomundo,quandoa

AlemanhaOcidental–àépoca,divididadesdeo

finaldaSegundaGuerraMundial(1939-1945)em

socialista,noladoorientaldopaís,ecapitalista,no

ocidental–saiuvitoriosa,emcasa,conquistando

seubicampeonato.ParaoBrasil,restoupouco.

Poucoresultadoepoucaslembrançasdaseleçãode

70.Chegouàssemifinais,masperdeu.Disputouo

terceirolugarcomaPolônia;outrapartidaperdida,

oquelherendeuoquartolugarnocampeonato.

Enquantoperdiaemcampo,começavaaganharem

outrosterrenos.Nomesmoano,oterreirodeobrasdo

maiorprojetoenergéticodomundocomeçavaaser

preparado.AparceriabrasileiracomoParaguai–que

nãotinhaseclassificadoparaacopadaqueleano–

começavaaganhararesderealidade.Aobra,claro,era

aUsinaHidroelétricadeItaipuBinacional.

Oiníciodasobras,em1974,colocavafimaum

conflitodiplomáticoquejádurava224anos.Isso

fazcomqueahistóriadeItaipu,porvezes,pareça

maisumadisputapolítico-diplomáticadoqueuma

questãoeconômico-energética.Ahistoriadoraeautora

dolivroItaipu – As faces de um mega projeto de

desenvolvimento,IvoneCarlettoLima,explicaqueessa

impressãoficapelaformacomoahistóriadausinase

desenrolou.“Itaiputemtodaumahistóriaavercom

aquestãodaenergia,dodesenvolvimentoindustrial.

Mas,daformacomoaconteceu,elaacabouse

transformandoemumprojetoessencialmentepolítico

edecarácterinternacional”.Essaimpressãoresultados

diversosdesacordospolíticosentreosdoisprincipais

paísesenvolvidosatéchegaraoplanocomum.

AregiãoescolhidaparaainstalaçãodeItaipu,

chamadadeSaltodasSeteQuedasouSaltodeGuaíra,

eraumaáreadelitígiodisputada,desde1750,por

PortugaleEspanha–asmetrópolesdosfuturospaíses

latino-americanos–,quandofoiassinadooprimeiro

acordoquedescreviaaregião;oTratadodePermuta.

Abrigaeraparasaberquemtinhaosdireitossobre

aregiãodoSalto,noRioParaná–umconjuntode

cachoeirascomposto,naverdade,por21quedas,que

revelaria,anosmaistarde,umdosmaiorespotenciais

energéticosdomundoequedesapareceujustamente

porcontadaconstruçãodausinadeItaipu.Otexto

dotratadodoséculoXVIIInãodeterminavaquem

detinhaodomíniosobreasprópriasquedas.Osdois

paísesconsideravamqueoterritórioseriaseu,enão

dovizinho.Amaioriadosdocumentosseguintes

estabeleciaqueumamargemdoriopertenciaaum

paíseamargemopostaaooutro,masaquestãoera

orioemsi.Seeleeraomarcodivisor,oRioParaná

pertenciaaquem?

Eraapenasoiníciodeumadisputaextensa,

reacesa122anosdepois,em1872,comTratadode

Paz,quepôsfimàGuerradoParaguai(1864-1870).

Comavitóriabrasileira,quetevecomoaliadoso

UruguaieaArgentina,opaísguaranisofreuuma

retaliaçãodeguerra:seuterritóriofoireduzidopara

quase60%nopós-conflito–osaproximadamente

40%foramrepartidosentreoBrasileArgentina.

OdocumentoredefiniaterritórioseutilizavaoRio

Paraná,maisumavez,comopontodedivisão.Mas

nãohaviaprecisãosobrequemteriaopodersobreas

águaseesseimpasseseestendeuaté1966,anoem

quefoiassinadaaAtadeIguaçu,tambémconhecida

comoAtadasCataratas,quedeterminouqueo

aproveitamentodorioeseupotencialenergéticoseria

feitoemcondomíniodosdoispaíses.Esseéoinício

doestabelecimentodaatualregiãodeItaipucomo

binacional,ouseja,nãopertencenemaoBrasil,nem

aoParaguai:pertenceaosdois,juntos.Easemente

doque,nofuturo,viriaaserMercadoComumdoSul,

oMercosul.

Antesdechegaraesseacordo,oBrasilcogitou

elaborarumausinasozinhanaregião,masoParaguai

nãoaceitou,alegandoqueeletambémtinhadireito

sobreaárea.Ogovernoparaguaioameaçou,inclusive,

declararnovaguerraaoBrasilcasoinsistisseem

construirausinasozinha.Então,em1966,conta

Carletto,“emumareuniãoqueteveemFozdeIguaçu,

comosdoisrepresentantesdospaíses–osdois

chanceleres,brasileiroeparaguaio–,oBrasilacabou

cedendonoseguintesentido:dequesehouvesse

umaproveitamentodoRioParanánotrechoFozde

Iguaçu-Guaíra,esteseriaemcondomínio.Issopara

acabarcomesseproblematododequestionamento”.

Comoentendimentopolítico,atécnicacomeçouaser

postaemprática.Estudossobrearegião,opotencial

easformasdeimplantaçãodeumausinaforam

iniciados.

O tempO parecia ter Outra dimensãO àquela épOca. […] até entãO nãO se discutia a quem

pertencia O “saltO de Guairá”. O Brasil

cOnsiderava sua aquela estreita faixa de terra. O paraGuai tamBém.

Em Itaipu: integração em concreto ou

uma pedra no caminho, de Tão Gomes

Pinto. Ed. Amarilys.

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desenvolvimento e tecnologia

“Sete Quedas por nós passaram,

E não soubemos, ah, não

soubemos amá-las...

E todas sete foram mortas,

E todas sete somem no ar...

Sete fantasmas, sete crimes,

Dos vivos golpeando a vida,

Que nunca mais renascerá...”

(Carlos Drummond de Andrade)

Contexto

OBrasilviviaumaditaduramilitardesde1964.O

Paraguai,porsuavez,reviviaumregimeautoritário

comogeneralAlfredoStroessnerdesde1954–opaís

teveaindaoutraditaduracercadedezanosantes,

comotambémgeneralHiginoMorínigo,de1940a

1948.AsditadurasmilitaresnaAméricaLatinaforam

reflexosdiretosdaGuerraFria,instauradadesdeofim

daSegundaGuerraMundial,equedividiuomundo

entrecapitalistasesocialistas.Comoaguerranãotinha

confrontodiretoerachamadadefria,emoposição

àquentecomdisparosàqueima-roupaeataques

diretos.OsEstadosUnidos,quesempretiveramgrande

influênciasobreospaísesaosuldoseucontinente,

paraevitaraexpansãodaesquerdanaregião,

auxiliarameapoiaramasditadurasdegovernos

militares,cerceadorasdasliberdadesindividuais.

Nesseperíodo,apopulaçãodoBrasilaindaera

majoritariamenterural(aurbanasósuperouado

campo,nadécadade1970,deacordocomocenso

daépocadoInstitutoBrasileirodeGeografiae

Estatística,quandoopaíschegouapoucomaisde93

milhões,aotodo)eaindustrializaçãocomeçavaase

afirmar.Oprocesso,iniciadonoprimeirogovernode

GetúlioVargas,logoapósaRevoluçãode1930,foi

intensificadocomapolíticadesenvolvimentistade

JuscelinoKubitschek(1956-1961)eduranteaditadura

militar.Nesseperíodo,comoaumentodapopulação,

amudançaparaascidadeseocrescentenúmerode

equipamentos,aparelhosedispositivosexclusivamente

dependentesdaeletricidade,ademandaporenergia

elétricadopaíscomeçouacrescer.Parasuprir

àpopulaçãoeàsindústrias,eranecessáriotera

possibilidadedegerareoferecermaisenergiaaos

consumidores.Eissoperpassavapornovosprojetos,

principalmentehidrelétricos,aespecialidadedoBrasil.

Aadoçãodeprojetosdefontesenergéticas

renováveisganhouforçaem1973quandoomundo

viveuumadasgrandescrisesmundiaisdopetróleo.

Ospreçosforamelevadosemmaisde300%,como

formadeembargodospaísesárabesdaOrganização

dosPaísesExportadoresdePetróleo(OPEP)aosEstados

UnidoseàEuropaOcidentalporterdadoapoioe

subsídiosparaqueIsraelresistisseàsofensivasegípcia

esírianaGuerradoYomKipur–odiadoperdão,

umadasdatasmaisimportantesdocalendáriojudaico.

Omundosentiurapidamenteaaltadospreçoseos

paísesquetinhammaiordependênciadoóleonatural

sofreramosefeitosemsuaseconomias.OBrasil,que

játinhagrandeconhecimentonageraçãodeenergia

elétricaporfontehidráulica,intensificouaindamaisa

exploraçãodeenergiasrenováveis.

PoucosmesesantesdoconflitodoOrienteMédio,

tinhasidoassinadooTratadodeItaipuentreParaguai

eBrasil,quemarcavaadefiniçãolegaldoinícioda

exploraçãodoRioParanáemcondomíniodosdois

países,ouseja,oiníciodeItaipu.ComooParaguai

nãotinhaconhecimentotécnicoaprofundado–atéa

obradabinacional,opaíssótinhaumapequenausina

hidrelétrica–;tecnologiaprópriaecapitalfinanceiro

parainvestir,diz-sequeovizinhobrasileiroentrou

sócomaágua.Maseranecessárioconhecimentoe

recursosparaqueItaipudeixassedeserumprojeto

epassasseaserefetivamenteumausinageradorade

energia.Dessaforma,oBrasilsecomprometeuem

arcarcomtodososcustos.ParaqueoParaguaifosse

condôminonoempreendimento,ficouestabelecido

queadívidaseriapagaemenergia,nãoemdinheiro,

aolongode50anos.Porisso,ogovernoparaguaioé

obrigadoavendertodaaenergiageradaporItaipue

nãoconsumidaaoBrasilapreçosabaixodomercado.

Oprojetodamaiorhidrelétricadomundo,que

auxiliariaasuprirdemandasenergéticasdosdois

países,foiaformaencontradapararesistiraochoque

dopetróleoenãocortarosinvestimentosenem

congelaroprojeto.“Oobjetivodopresidenteda

República[doBrasil]erareforçaroabastecimentode

energiadetodaaregiãosudeste,vítimadeconstantes

‘apagões’”,contaojornalistaTãoGomesPinto,em

suaobraItaipu: integração em concreto ou uma pedra

no caminho.Porisso,depoisdeassinadooTratado

em1973,aobrasóparounoveanosdepois,em1982,

quandoausinafoifinalizada,resistindoamaisoutro

choquedopetróleo,ode1979.

Masnemtodosospaísesdoconesulestavam

satisfeitoscomoentendimentodoBrasileParaguai.

AArgentina,quetambémébanhadapeloRioParaná,

temiaqueausinaprejudicasseseuterritórioeinteresses

sobreaságuas.“AArgentinaquestionouaconstrução

daItaipujustamenteporcausadaaltitudedabarragem,

doníveldolagoqueseriaconstruído.Eladissequeseo

Brasilfizesseumausinadetalporteiriaimpossibilitar

aconstruçãodeumausinaqueelapretendiafazer

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Trabalhadores constroem uma das turbinas de Itaipu

Do tupi e guarani

Quando o grupo de técnicos paraguaios e brasileiros fizeram as pesquisas e

buscas da região mais apropriada para a instalação da hidrelétrica, eles chegaram

a um trecho do Rio Paraná chamado de Itaipu, que em tupi significa algo como “a

pedra que canta”. No local existia uma ilha, conhecida por esse nome, que quase

sempre ficava submersa devido à forte correnteza, acentuada por uma região de

curva do rio. Naquele local foi registrado um excepcional rendimento energético,

daí, foi definida a instalação da usina no local.

Assim como Itaipu tem influência das tribos indígenas existentes na região

anterior à chegada dos europeus, o Paraguai também tem. Ainda mais pela grande

presença de índios e seus descendentes na composição da população. Mostra disso

é que o país é bilíngue, falando espanhol e guarani. O próprio nome Paraguai,

em Guarani, tem um significado relativo a águas. Paraguay seria originado de

“águas do mar”, em Guarani. Sendo pará, o mesmo que “mar”; guá, que denota

“origem”; e ý, que significa “água”. Assim, seu significando seria algo como “água

que vem do mar”. O Rio Paraguai, um afluente do Rio Paraná, teria sido o primeiro

a receber o termo indígena. Depois, com a formação da nação, o país recebeu o

mesmo nome.

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desenvolvimento e tecnologia

tambémnoRioParaná,masmaisabaixo,em

condomíniocomoParaguai”,explicaahistoriadora

IvoneCarletto.Aquestãochegouaserlevadaparaa

AssembleiaGeraldasNaçõesUnidas,em1972,esó

foiresolvidaem1979,quandoostrêspaíses–Brasil,

ParaguaieArgentina–assinaramoAcordoTripartite.

Esseacordodefiniuasregrasparaoaproveitamento

dosrecursoshidráulicosnoRioParaná,notrechoqueia

desdeasSeteQuedasatéafozdoRiodaPrata.

Somadaàquestãodeaproveitamentohídricodo

rio,haviaumalendadequeseItaipufossemesmo

construídaeoBrasilabrisseascomportas,como

consequênciadeumeventualconflitoentreospaíses

aosuldaAméricaLatina,queeramgovernadospor

ditadurasmilitares,acidadedeBuenosAiresseria

inundadapelaságuas.Mascomotratadoentreos

países,aquestãodiplomáticafoisolucionada.O

acordodeutãocertoqueeleseriaagênesedistantedo

Mercosul,contandoaindacomaDeclaraçãodeFoz

deIguaçu–de1985,assinadapelospresidentesda

ArgentinaeBrasil,queselouasrelaçõesamistosasentre

osdoispaísesefoiabasedaintegraçãoeconômica

doconesul–ecomoTratadodeAssunção,que

oficialmentecriouoMercadoComumdoSul,de1991,

comaArgentina,oBrasil,oParaguaieoUruguai.

Construção

Depoisdosestudosdecampoedadefiniçãodo

localdausina,em1973,oterrenofoipreparado,em

1974,paraqueausinacomeçasseasererguidaem

1975.Aconstruçãoincluíaodesviode2quilômetros

doRioParaná,com150metrosdelargurae90metros

deprofundidadeparaaformaçãodoreservatório

dausina.ArecémcriadaEmpresaBrasileirade

Comunicação,aRadiobrás,em1978,noticiouque

“odesviodorioporumcanalartificialcorrespondeu

àprimeirafasedeconstruçãoparaasecagemde

seuleito.Ocanaldedesvio,escavadoemrocha,na

margemesquerda,temproporçõesincomuns”.Tudo

emItaipueragigantesco,porisso,foichamadopela

revistanorte-americanaPopular Mechanicsdeum

“trabalhodeHércules”–emreferênciaaosdoze

trabalhosqueosemi-deusgregotevequerealizare

quesópodiamserrealizadosporalguémcomforça

sobre-humana.

LocalizadanomunicípiodeFozdoIguaçu,

peloladobrasileiro,enaCiudaddelEste,pelo

paraguaio,ausinadeItaiputevequeconstruiruma

verdadeiracidadeparaalojarostrabalhadoresdo

empreendimento.AcidadedeFoz,antesdoiníciode

Itaipu,tinhacercade20milhabitantes.Nofinalda

obra,apopulaçãojáerademaisde100milpessoas.

Duranteaconstrução,entre1975e1978,foram

erguidasmaisdenovemilmoradiasaolongodasduas

margensdoRioParanáparaabrigarostrabalhadores

queparaaregiãosemudaram.Nopicodaobra,Itaipu

chegouater40miltrabalhadoresdiretos,odobrode

todapopulaçãoinicialdeFozdeIguaçu.Essenúmero

foialcançadoporque,entre1978e1981,foram

contratadasaté5milpessoaspormês.

Asobrasdabarragemforamconcluídasem

1982.Comoreservatórioformado,ospresidentes

doBrasil,JoãoFigueiredo,edoParaguai,Alfredo

Stroessner,inauguraramItaipu,em5denovembrode

1982,comoacionamentodomecanismoquelevanta

automaticamenteas14comportasdodeclive,que

liberaramaáguarepresadadoRioParaná.Depois

demaisde50milhorasdetrabalho,amaiorusina

hidrelétricadomundoestavafinalizada,masogiro

daprimeiraturbinasóacontecerianoanoseguinte,

emdezembrode1983,eageraçãoeatransmissãode

energiacomeçariadoisanosdepois,em1984.

Transmissão

TodaenergiaproduzidapelaUsinaBinacional

deItaipu,comofoidefinidopeloTratadodeItaipu,é

geradaemduastensõesefrequênciasdiferentes.Como

oParaguaiémovidoaumafrequênciade50Hzeo

Brasila60Hz,asoluçãoencontradapelostécnicos

doempreendimentofoiproduzirmetadedaenergia,

referenteàpartebrasileira,emcorrentealternada,

jáa60ciclosporsegundoe750kV,enquantoa

outrametade,doParaguai,seriageradaemcorrente

contínua,em50Hze600kV.

Oengenheiroeletricistaeprofessordoutorda

EscolaPolitécnicadaUniversidadedeSãoPaulo

(Poli/USP)JoséAntônioJardiniexplicaque“Itaipu

eraparasertodaemcorrentealternada,mascomo

oParaguaiempregafrequênciade50Hzeaquié60

Hz,nãodáparaligarumnooutro,então,erapreciso

retificaros50HzdausinadeItaipu:gerarem50Hz,

paraoParaguai,depoisretificareinverterparaoutra

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A construção da Usina custou US$ 1 mil/MW instalado. O equivalente a cerca de US$ 14 bilhões, à época.

A obra demorou 8 anos para ser concluída. Foi iniciada em 1974 e concluída em 1982. Mas só começou a gerar energia dois anos depois, em 1984.

Entre 1975 e 1978, mais de 9 mil moradias foram construídas às margens do rio para abrigar os homens que atuavam na obra.

A alteração do curso do Rio Paraná removeu 55 milhões de m³ de terra e rocha para escavar um desvio de 2 km de extensão, 150 m de largura e 90 m de profundidade. Para tanto, foram usadas 58 toneladas de dinamite.

Só no dia 14 de novembro de 1978, foram colocados na obra 7.207 m³ de concreto, o equivalente a 1 prédio de 10 andares/hora.

O total de concreto utilizado na barragem, 12,3 milhões de m³, seria suficiente para concretar 4 rodovias como a Transamazônica.

Itaipu alavancou o PIB do Paraguai, que em 1978 cresceu 10,8%.

Entre 1978 e 1981, eram contratadas até 5 mil pessoas/mês. No pico de construção, tinham cerca de 40 mil trabalhadores diretos.

O transporte de materiais para a Itaipu utilizou 20.113 caminhões e 6.648 vagões ferroviários em 1980.

26 dias foi o tempo recorde de transporte de rodas de turbinas entre a fábrica e a usina. Essas peças tinham cerca de 300 toneladas cada e percorriam um caminho de até 1.350 km.

O enchimento do Rio Paraná levou 14 dias. A lâmina de água tem 4 vezes o tamanho da Baía de Guanabara.

170 km foram submersos entre os municípios de Foz do Iguaçu e Guaíra.

8.519 propriedades foram desapropriadas e inundadas na margem brasileira do Rio Paraná.

Recorde de geração

Em 2004, quando a usina completou 20 anos de atividade, Itaipu já havia gerado energia suficiente para abastecer o mundo durante 36 dias.

Recorde de geração foi de 94.684.781 de MWh, em 2008.

Foi necessário mais do que conhecimento técnico, tecnologia e dinheiro para construir Itaipu. A obra foi feita pelas mãos de diversos homens que, durante muitos dias, tinham o trabalho como suas vidas. Devido ao grande porte da usina e à região inicialmente sem estrutura para uma construção dessa magnitude, foi necessário montar uma verdadeira cidade em torno do canteiro de obras. Casas, refeitórios, assistência. Tudo foi oferecido àqueles que lá trabalharam por anos. Mas a vida de uma pessoa não se resume à profissão. É composta pelas relações sociais, como relacionamentos afetivos e fraternos. Com os funcionários de Itaipu, claro, não foi diferente. Engenheiros, encarregados, topógrafos, geólogos, especialistas de cálculos de concreto, peritos em explosivos, ou seja, todo o tipo de “barrageiros” tradicionais, como são chamados os trabalhadores responsáveis pela construção de barragens de usinas hidrelétricas. Todos eles foram mandados para Foz do Iguaçu, pelo lado brasileiro, a fim de preparar o terreno de Itaipu. “No canteiro binacional, os paraguaios chegavam com sede de aprender e prestavam muita atenção no trabalho dos colegas brasileiros. Era uma relação carinhosa. No fim da história, casaram-se muitos brasileiros com paraguaios e vice-versa”, conta o jornalista Tão Gomes Pinto, no seu livro Itaipu:integraçãoemconcretoouapedranocaminho. Mas, durante as obras, o relacionamento entre empregados não era bem visto pela empresa. Era, inclusive, proibido. Tão Gomes relata em seu livro a história do namoro de um engenheiro com uma bibliotecária que foi coibido pela empresa. “A paixão do jovem engenheiro foi correspondida. Foram vistos pelo canteiro, algumas vezes, de mãos dadas. O assunto chegou à diretoria, que decidiu pela demissão do rapaz. Ele conta que chegou a chorar quando o encarregado de pessoal simplesmente pegou a tesoura e cortou a ponta do seu crachá. Era o ritual que o desligava de Itaipu”, conta.

númerOs de itaipu as mãOs de itaipu

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desenvolvimento e tecnologia

Pesquisa:• Itaipu: integração em concreto ou uma pedra no caminho. TãoGomesPinto,Amarilys.• Itaipu: as faces de um mega projeto de desenvolvimento.IvoneTeresinhaCarlettodeLima,EditoraGermânica.• A energia do Brasil. AntonioDiasLeite,NovaFronteira.

frequência,de60Hz,paraentãoligarnosistema

brasileiro.ÉporissoqueItaipugerouumaparteem

correntecontínua,ametadedoParaguai”.

EjáqueItaipu,paraoBrasil,foipensadapara

solucionarproblemasdeabastecimentoedemandade

energiaemgrandescentrosconsumidores,comoSão

PauloeRiodeJaneiro,essaenergiaprecisavachegar

aessasregiões.Dessaforma,foidefinido,desdeantes

daconclusãodaUsina,queaeletricidadegeradaseria

conectadaaoSistemaInterligadoNacional(SIN)e

enviadaparaabastecer,emespecial,SãoPaulo,pela

transmissãodeFurnasCentraisElétricas.Ogerenteda

SubestaçãodeIbiúna,SergioLuizIasbeck,explicaque

“oBrasilcompraaenergianãoutilizadapeloParaguai

eporumprocessodeconversãotransformaacorrente

alternadaemcorrentecontinua,transmiteemcorrente

continuae,naSubestaçãodeIbiúna,nacidadede

Ibiúna(SP),seconverteessaenergiaparaaforma

deenergiautilizadanosistemaelétricobrasileiro”.A

energiaparaguaia,porsuavez,étransmitidaparatodo

paíspelaAdministraciónNacionaldeEletricidad(Ande).

OsistemaemcorrentealternadadeItaipu,em750

KVe60Hz,compreendetrêslinhasdetransmissão

quesaemdaSubestaçãodeFozdeIguaçu,com18

das20unidadesgeradorasdahidrelétrica,echegam

àSubestaçãoTerminaldeTijucoPreto,emSão

Paulo.Essaenergiapassaaindapelassubestaçõesde

Ivaiporã,noParaná–umdosprincipaispontosde

conexãoeintercâmbiodeenergiaelétricadasregiões

SuleSudeste–,edeItabera,emSãoPaulo.Poresse

percurso,aenergiageradaporItaipu,referenteà

partebrasileira,chegaaosdemaisestadosdopaís.

JáaenergiacompradadoParaguaiéconvertida

naSubestaçãodeIbiúna,emSãoPaulo,deondeé

retransmitidaeconectadaaosistemainterligado.

Desde1984,quandoItaipucomeçouagerar

energia,atransmissãobrasileiraérealizadaporFurnas.

ComoéconectadaaoSIN,todososEstadosbrasileiros

interligadosaosistemacomandadopeloOperador

NacionaldoSistemaElétrico(ONS),acabamrecebendo

energiaelétricadeItaipu.Atualmente,trêsdos26

Estadosbrasileiros(maisoDistritoFederal)nãoestão

interligadosaosistema.SãoelesAmapá,Amazonase

Roraima.Masoabastecimentoprioritáriodausinaé

paraosestadosdoSuleSudeste.Abastecimento,este,

queficouprejudicadoemnovembrode2009.Porum

problemanatransmissãodaenergiageradaporItaipu,

18estadosbrasileirosconectadosaosistemasofreram

comafaltadeenergiaelétrica.Quatrodelestiveram

faltatotal,atingindotodososseusmunicípios–Riode

Janeiro,SãoPaulo,MatoGrossodoSuleEspíritoSanto

–,eosdemais14estadosregistraramblecautesparciais.

Impactos

ÉcertoqueItaipualterousignificativamentea

regiãodatríplicefronteira–Paraguai,Argentinae

Brasil.LevounãosóausinaparaomunicípiodeFoz

deIguaçu,levoumilharesdepessoasaseinstalaram

naregiãoepromoveudesenvolvimentoparaacidade

queseresumiaaduasruasasfaltadasnofinalda

décadade1960,iníciode1970.Mas,emcontrapartida,

retirouumaobradebelezanaturaldomundo,oSalto

deSeteQuedas,umaregiãode1,5km²deflorestase

terrasagriculturáveis,quefoiinundada.Maisde36mil

animaisforamdeslocadosdeseuhabitatnaturale8

milfamíliastiveramquesairdesuasterras.

AhistoriadoraIvoneCarletto,estudiosadahistória

deimplantaçãodeItaipuedosimpactossobrea

população,contacomosedeuoprocesso.“Houve

umagrandedesapropriação,forammaisdeoitomil

processossódoladobrasileiro.Emuitagentesesentiu

prejudicadaporqueachavaquenãofoijustoopreço

eelesfizeramummovimento,oMovimentodos

SemTerra(MST),quehojefazpartedahistóriados

movimentossociaisdoBrasil”.Foinesseperíodoqueo

MSTfoiformado,emcidadesnointeriordoParaná.“E

foiummovimento”,relataCarletto,“quefezcomque

Itaipucedessebastante,porqueelesconseguiramquase

tudoquepediramnaépoca”.

Aprincipalreivindicaçãodasfamíliasexpropriadas

eraaquestãoimobiliária.Issoporque,noiníciodos

anos1980,ainflaçãoeramuitoalta(ainflação

acumuladadoanode1979foide77,21%).“Por

exemplo,vocêrecebiadinheirodeItaipuhojee

amanhãjánãoconseguiacomprarquasenadaporque

ascoisasaumentavamdepreço,nãoacadadia,masa

cadahora”,acrescentaahistoriadora.

Page 11: Coleção Energia Vol 3

11

As obras da usina foram iniciadas em 1974 e concluídas em 1982

as hiDrelétricas

Rio Paraná

A Usina Hidrelétrica de Itaipu Binacional foi

o terceiro empreendimento hidrelétrico brasileiro

ao longo do Rio Paraná. A primeira obra foi a

Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira, iniciada em

1965 e concluída em 1978; seguida pela Usina

Hidrelétrica Engenheiro Sousa Dias, conhecida

como Usina de Jupiá, que foi iniciada na primeira

metade da década de 1960 e finalizada em 1974.

Após o início de operação da binacional, ainda

foi construída mais uma geradora no rio do lado

brasileiro: a Usina Hidrelétrica Engenheiro Sérgio

Motta, conhecida como Usina de Porto Primavera,

iniciada em 1980 e concluída no ano 2000. Foi o

primeiro projeto hidráulico em águas paraguaias.

Maiores do mundo

Itaipu foi durante muitos anos a maior usina

geradora de hidreletricidade do mundo. Com potência

instalada de 14 mil MW, proporcionada por 20

unidades geradoras de 700 MW cada, perdeu o

posto para a Usina Hidrelétrica de Três Gargantas,

na China, que, apesar de atualmente gerar menos

energia, tem maior potência instalada com previsão

de chegar a 22,4 mil MW quando estiver completa,

com todas as turbinas em funcionamento, o que deve

acontecer em 2011. A terceira maior usina do mundo

também é latino-americana. A Usina Hidrelétrica de

Guri, na Venezuela, tem potência instalada de 10.300

MW e abastece, além do próprio país, o Estado de

Roraima, no Brasil, que não está ligado ao Sistema

Interligado Nacional (SIN).

Usina

Turbinas

Potência nominal

Potência instalada

Recorde de produção anual

Concreto utilizado

Altura

Comprimento da barragem

Vertedouro (capacidade de vazão)

Escavações

Itaipu

20

700 MW

14 mil MW

94,7 bilhões kWh/ano (2008)

12,57 milhões m³

196 metros

7.744 metros

(concreto, enrocamento e terra)

175 metros (dique de Hernandárias)

62.200 m³/s

63,85 milhões m³

Comparativo entre itaipu e três GarGantas

Três Gargantas

32 (6 subterrâneas)

700 MW

22,4 mil MW (quando estiver completa,

prevista para 2011)

80,8 bilhões kWh/ano (2008)

27,94 milhões m³

181 metros

4.149 metros (concreto 2.309 m e dique

Maoping 1.840 m)

120.600 m³/s

134 milhões m³Fonte: Itaipu Binacional

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Page 12: Coleção Energia Vol 3

12

O ADVENTO DA ILUMINAÇÃO ARTIFICIAL

era da eletricidade Por Bruno D’Angelo

A história da luz através dos tempos, desde a revolucionária descoberta do fogo pelos homens

primitivos até o desenvolvimento da iluminação pública

Page 13: Coleção Energia Vol 3

13

Muitoantesdearchotes,lamparinasagás,

queroseneelâmpadaselétricas,eraaluzdosolque

guiavaoshomenspelomundo.Dediaeànoite

também,jáqueoluarnadamaisédoquealuzdo

solrefletidanalua.

Ocasoéquenemsempreoshomenspodem

contarcomobrilhodaluapararealizaremalguma

atividadenoturna.Muitasvezesocéuficaencoberto

pornuvens,impedindoqueapreciemosoluar,outras

tantas,osraiossolaresrefletememumafacedalua

quenãoseofereceparanós,aquidaTerra,fenômeno

chamadodeLuaNova.Nadamaiscerto,então,

queosprimeiroshomenstenhamconcentradosuas

tarefasnoperíododiurno,deixandoparaanoiteo

descanso.

Durantemuitotempo,pode-sedizer,atéa

invençãodalâmpadaincandescenteporThomas

Edison,asituaçãopermaneceubasicamentea

mesma.Nãoque,nesteínterim,algumasdescobertas

nãotenhampropiciadoaohomemummelhor

aproveitamentodanoite,fazendodelatambémum

palcoparaatividadesprivadas.Essasdescobertas,

porém,devidoàssuaspeculiaridades,nãopermitiram

oflorescimentodeumaculturanoturnanosmoldes

daqueocorreuapósoinventodeEdison.

Atrito, faísca e o homem se ilumina

Aprimeiragrandetransformaçãorealizada

peloengenhohumano,noquetangeàproduçãode

luz,surgiuaindanapré-história,comadescoberta

demeiosparaobterecontrolarofogo.Adatade

quandonossosancestraisrealizaramtalachadonão

podesermuitobemprecisada,porém,evidências

encontradasemcavernasatestamdequecercade

500milanosa.C..,naEradoPaleolíticoPosterior,o

chamadoHomemdePequimjáutilizavaofogonas

suaspráticasdiárias.

Ousodofogoapresentaduasfases:aquelana

qualohomemsomentesebeneficiavadaexistência,

masaindanãosabiacomoproduzi-loeoutra,na

qualohomemfinalmenteseapossavadosmeios

antespertencentessomenteanatureza,parapoder,

assim,provocarofogonahoraquebementendesse.

Naprimeirafase,eranecessárioesperarque

descargaselétricasatmosféricasatingissemárvores,

fagulhasseformassemeofogoiniciadoseespalhasse

pelaflorestacomaaçãodovento.Nessaetapa,o

homemficavatotalmentedependentedoacaso,oque

dificultavabastantequalquertipodeplanejamento.

Afinal,usufruía-seapenasmomentaneamentedoque

anaturezaoferecia.Assimqueachamaseextinguia

eraprecisovoltaràvidaanterior,comaesperançade

quenofuturoaflorestaseiluminassedenovo.

Noqueconcerneaodomíniodaprodução

defogoporpartedohomem,provavelmente,ele

começouassim:aobservaçãodequeofenômeno

sepropagavapeloaquecimentodegalhosoufolhas

secasindicouqueachamapoderiaseriniciadacom

temperaturaselevadas.Daíparaadescobertadeque

oatritoentredoispedaçosdemadeirasecapoderia

causartalefeitofoiumpulo.

Muitotempodepois,foidescobertoquequando

sebatiasílexcomferroouaçoasfagulhaserammais

fortesepersistentes.Esteprocedimento,detãoeficaz,

persistiuatéocomeçodoséculoXXemdiversos

cantosdomundo,inclusivenoBrasil.

Comodomíniodoprocessodecomoproduzir

emanteraschamas,começavaasegundafasedo

fogo.Assim,ohomemconseguiu,pelaprimeira

vez,iluminarsuasnoitescomsuasprópriasforças

semdependerdaboavontadedoSol.Enãosó.

Ofogotrouxeoutrosbenefíciosàraçahumana

quepôdefundirmetaisefabricarferramentas

paraatividadesdelaboredeguerra,aquecer-se

melhordofrioecozinharseusalimentose,dessa

forma,consequentemente,melhorarsuascondições

devida,aumentandosuaexpectativadevida.A

eletricidade,maistarde,trariabenefíciossemelhantes

eaprimorados.

Os primórdios da iluminação artificial

Descobertaamaneiradeseobterfogoefazê-

lodurar,ohomemtinhaagoraumnovodesafio:

fazeressadescobertanãoficarrestritaaespaços

determinados,eraprecisofazerandarachama.No

início,atritandomadeiraoupedraparaproduziro

fogo,ohomemfabricavapequenosarbustospara

queelecontinuassevivo.Empoucotempo,porém,

Page 14: Coleção Energia Vol 3

14

era da eletricidade

oprocessofoisetornandomaisbemelaborado.

Porexemplo,naBabilônia,naFeníciaenoAntigo

Egito,jáeramempregadasmadeirasmaisresinosas

desfiadasemtiras,amarradasemcipósdepichese

resinas.Estasforam,aliás,asprimeirastochas,que

possibilitaramaohomemmover-sejuntamentecom

ofogo,marcandooiníciodeumafasedailuminação

artificialdenominadadehomem-luz.

Provavelmente,oprimeiromaterialcombustível,

alémdamadeira,foiagraxaanimal.Maistarde,

descobriu-sequeoóleoextraídodeprodutosvegetais

comoolinho,amamonaeatéazeitonastambém

eramúteis.Algunsdesseselementos,aliás,seriam,

temposdepois,tambémempregadoscomobiomassa

parageraçãodeenergiaelétrica.Essesóleoseram

coletadosemchifresdeanimais,conchasmarinhasou

pedrascomcavidadesnaturais,que,posteriormente,

passaramdesimplesaparelhosrecolhedoresdeóleo

parareceptáculosondeseeragerado,mantidoe

transportadoofogo;surgiramassimasprimeiras

lucernas.Maistarde,aspesadaserústicaslucernas

depedraforamcedendoespaçosparautensíliosmais

sofisticadosfeitosdebarroedemetal

Nascivilizaçõesantigas,aslucernasoutochas

setornavamcadavezmaisfixas,comointuitode

iluminargrandesáreas,forospúblicoseanfiteatros.

EmRoma,porexemplo,ocircoMáximoeo

Coliseueramiluminadosdessaforma.Chamadasde

“fax”ou“taedas”,elasacompanhavam,também,

excepcionalmente,cerimôniascomobodasou

mesmocortejosfúnebres.NaGrécia,astochaseram

imobilizadastambémparailuminaçãopúblicae,

ocasionalmente,tornavam-seaparelhosmanuais

parailuminaremfestasemcompetiçãoondeeram

disputadascorridasapéouacavalo.

Énecessárionotarqueastécnicasdegeraçãode

luznãosemodificarammuitodesdesuadescoberta

atéaoséculoXIX;oprocessocontinuouasero

mesmo:aqueimadecombustíveislíquidospara

aproduçãodefogo.Aocontrário,osmateriais

empregadosparasuportedofogo,aslucernas,

sofreramtodootipodealteração.Passarama

contar,porexemplo,comumavariadaeartística

ornamentação;sendofabricadascommetaisecom

materiaispreciosos.

Pode-sedestacartambémnessatransformação

porqualpassaramosequipamentosdeiluminação,na

épocadofogo,osurgimentodoscastiçais,cujaideia

erasimples:aumentaraalturadafonteluminosa

paraqueoespaçoiluminadofossemaisamplo.Com

oaparecimentodavela,oscastiçaisetambémos

candelabrostornaram-seaindamaisimportantes.

Ovidrofoioutrarelevantedescobertaque

contribuiuparaamelhoriadailuminaçãoartificial.

Omaterialjáerafabricadopelosegípciosem2mil

a.C,masalcançougrandedifusãonaIdadeMédia.

Utilizadoaindahojenafabricaçãodelâmpadas

elétricas,ovidrosemprefoidegrandeajudaporque

funcionavacomoabrigoparaachama,evitandoque

estaseapagasseoumesmoseespalhassee,aomesmo

tempo,porsuatransparência,favoreciaailuminação

dosambientes.

Ofatoéqueindependentementedosmateriais

empregadosnafabricaçãodeartefatosdeiluminação,

estasinovaçõescontinuaramdurantemuitotempo

sendoaproveitadaspelascamadasmaisricasda

população.DeacordocomlivroA História da

Iluminação Artificial – das origens até o século XX,

deNataleBonali,aplebecontinuouiluminandoas

andançasnoturnas,comaprimitivaluzmanualfeita

derochasarcaicas.Muitasvezes,aoandarnasvielas

escuras,acamadamenosfavorecidaguiava-seapenas

porluzinhasdeminúsculosoratórioslocalizadosem

algumasesquinas.Jáosmaisricosquegostavam

davidanoturna,utilizavamservoslanterneirospara

guiaremocaminho.

Noquetangeàiluminaçãopública,atéoséculo

XV,elaeraconsideradadeverdoscidadãosenãodas

autoridades;provadissoeramasleisquevigoravam

naépoca,estabelecendopenaspecuniáriaspara

aquelesquedesrespeitassemasregras.Oscastelos

dossenhoresfeudaistambémnãoajudavamna

tarefadailuminaçãopública,jáqueeramtodos

muitosombrios,apresentando,geralmente,como

iluminaçãoexterna,umasolitáriatochapostadana

ponteelevadiça.

NoséculoXVI,numerososedifíciospúblicos

epaláciossenhoriaisforamprogressivamente

melhorandoavisibilidadeurbanaaoinstalarem

lanternasdeferroforjadonasesquinasdeonde

Page 15: Coleção Energia Vol 3

15

a luz trêmula e azulada emitida pelO Gás fOrmava em sua vOlta uma atmOsfera de vaGO

lirismO, uma aura rOmântica, que juntO cOm Os ‘Gasistas’, traBalhadOres respOnsáveis

pela OperaçãO dO aparelhO, tOrnOu-se parte dO fOlclOre pOpular da eurOpa e dOs demais

cOntinentes que vieram a utilizá-la

Rio de Janeiro, no final da década de 1920, com a inauguração da iluminação da Avenida Maracanã, na ponte do cruzamento com a rua Uruguai

Gasista acende luminária pública

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Page 16: Coleção Energia Vol 3

16

era da eletricidade

estavamsituados.Mesmoassim,passadoumséculo,

ailuminaçãopúblicaeuropéianãoapresentou

relevantesmodificações.Aspraçaseasruas

continuavamàsescurasealuzaindavinhaquaseem

suatotalidadedebraseirosetochaslocalizadasem

pátioseempassadiçosdegrandesmansões.

Notérminodosanos1600,porém,os

governantespassaramatomarailuminaçãodas

ruascomosuaresponsabilidadeecomeçaram

ainstalarlanternasemalgumasesquinas,nas

principaiscidades.Estesnovosequipamentoseram

abastecidosporequipeschamadasdefaroleirosque

contavamcomroldanasouescadasparasubirem

àslanternaseassimconseguiremrealizarafunção

paraqualforamdestinados.

Estasaçõesforam,certamente,ocomeçode

umanovafase,porquejánoiníciodoséculoXVIII,

umaprogramaçãomaisracionaldeiluminação

públicacomeçouaserefetuadanaEuropa,naqual

asprincipaiscidadesdocontinenteviramlanternas

semultiplicaremporsuasruas.Anovailuminação

funcionavaàbasedeóleosvegetais,cujoconsumo

eramaislento,masaluminosidadedachamaera

maisfraca.ConformeBonali,oprimeiroavanço

técnicoparamelhorarafruiçãodaluz,deu-seem

1760,comaadoçãodeumespelhocôncavode

metalpolidodentrodalanternaquepermitiumelhor

reflexãodachama.

SenaEuropa,ocenáriodailuminaçãoartificial

estavaprogredindo,naAmérica,poroutrolado,

osavançoserampraticamenteimperceptíveis.

Descobertahápouco,serviunoiníciodoseu

processodecolonização,parailuminarasandanças

dosdescobridores,comaparelhosmanuaistrazidos

dosveleiros,fogaréusimprovisadosearchotes

rudimentares.

Posteriormente,gruposreligiososdifundiram

asvelas,empregadasparailuminarasigrejinhas

quecomeçavamatomarcontadanovaterra.

Algumastentativasdedesenvolverequipamentos

deiluminaçãomaissofisticadostambémforam

colocadasemprática,masasoluçãoveioapenasa

partirdoséculoXVII,quandoaimigraçãotornou-se

maisnumerosaeocontatocomovelhomundoe

entreasigrejassetornoumaisfrequente,oquelevou

àsprimeirasimportaçõesdeaparelhosacabados.

Comachegadadenovosmateriais,foipossível

falardeiluminaçãonospaísescolonizados.NoBrasil,

destaqueparaacidadedoRiodeJaneiro,que,em

1763,poriniciativadeseusmoradores,começoua

iluminarseuslogradourospúblicos.Foraminstalados,

naépoca,20lampadáriosdemadeira,envidraçados,

àbasedeazeitedepeixe,esuspensosporvarõesde

ferro.Comoexplicaoengenheiroeletricistaeperito

emluminotécnica,MiltonMartinsFerreira,estes

lampadárioseramacesostodasasnoites,excetona

luacheia,quandoaluzrefletidaerasuficiente.

Novas tecnologias

Comacrescentepreocupaçãodosgovernantes

comailuminaçãopública,começa-seaprestarmais

atençãonodesenvolvimentodenovosmateriais

quepudessemfornecerumailuminaçãomais

eficiente,emtermoseconômicosedeluminosidade.

Obviamente,assoluçõesiniciaispermaneceram

noâmbitodofogo.Nãosepensoudeprontoem

outromeiodeiluminaçãoartificial.Modificou-sea

maneiracomoachamapassouaserproduzida.

Umadasgrandesiniciativaspioneirasfoia

lâmpadaArgand.InventadapelosuíçoPierreArgand,

em1783,oequipamentoerabaseadonofatodeque

oarcanalizadoemumcanudo,aquecidoporuma

chama,subiamaisrapidamenteaorecambiar-se,

nofundodessecanudo,comarfrio.Processoque

recebeuonomededuplacorrentedearequeporisso

conseguiamultiplicarseupoderiodeiluminação.

SegundoBonali,alâmpadaapresentava,contudo,

algunsinconvenientes,comoasombraprojetadapelo

reservatório,quedeviaestarsempreacimadonível

doqueimadoreocustoelevado.Essesproblemas

nãoforamefetivamenteresolvidos,mastambém

nãoimpediramainvençãodeterrelativosucessona

época.Provadissoéquequaseimediatamenteaoseu

surgimento,elafoiconvertidaemlustreseapliques,

ajustando-se,comotempo,aospreceitosestilísticos

vigorantesdoséculoXVIII.

Maserasóoinícioemuitasinvençõese

mudançasaindaestavamporvir.Aindanosanos

1700,maisespecificamente,em1792,oinglês

Page 17: Coleção Energia Vol 3

17

WillianMurdochencontrouumamaneirade

armazenarumprodutoquehaviasidodescoberto

umséculoantesquandosedestilouocarvão

fóssil:eraogásaeriforme,que,defato,tornou-se

aprimeiraalternativarelevantedescobertapela

humanidadeparaconseguirsuperarostradicionais

combustíveisquealimentavamailuminação

artificialgeradapelofogo.

OarmazenamentodogáspossibilitouaMurdoch

iluminarsuacasaesuafábrica.Paratanto,foi

necessáriaacriaçãodeumacomplexacanalização

feitadetubosdecobreouchumboquepossuíam

emcadaextremidade,torneirasreguladoraseuma

sériedepequenosorifíciosparaasaídadaschamas.

Apesardosucessoaparente,onovocombustível

apresentavaumgrandeobstáculorelacionadoà

segurança;elepodiaescaparfacilmente,aumentando

oriscodeexplosões.Alémdisso,aimplantaçãodo

sistemaeracara.

Estaspeculiaridades,segundoBonali,limitaram,

noinício,oaproveitamentodomésticodailuminação

agás,masnãoimpediramquefosseutilizadapara

iluminaçãopúblicaedegrandesestabelecimentos

comoteatros,cafésesalõesdefestas.Aprimeira

instalaçãopúblicapermanentebaseadaemgásquese

tevenotíciaaconteceu,porém,algumtempodepois

daideiadeMurdoch,em1807,naruaPallMall,em

Londres.Todavia,apósoempurrãoinicial,ascoisas

fluírammaisrapidamentee,empoucotempo,as

principaiscidadesdaEuropapassaramacontarcom

sistemasdeiluminaçãoagás.

Ossistemasconsistiamemlampiõescolocados

sobrepilastrassituadasnascalçadasepresospor

longosbraçosinstaladosnasesquinasoususpensosno

meiodarua.DeacordocomNataleBonali,osnovos

equipamentoseramsemmuitoluxo,apresentadosem

discretasformasquadradasoutrapezóides,feitascom

ferro-gusaousimplesmentechapasdeferrosoldadas.

Afinal,aintençãoeraapenasiluminarenãoadornar

acidade.Isso,entretanto,nãoimpediucertasruasda

cidade,habitadasporluxuosasmansões,exibirem

equipamentosdeiluminaçãoquemaispareciamobras

dearte.

NoBrasil,ailuminaçãoagáschegouem1854

porobradoBarãodeMauá,queimportouparaa

cidadedoRiodeJaneiroosistemainventadona

Inglaterra.Cácomolá,achou-seporbemnãousar

talinvençãoemambientesinternos,pelorisco

queofereciaavidadaspessoas,deintoxicaçãoe

incêndio.Outrofatorquefreouadifusãodonovo

sistemafoiocustoelevado.Conformeoengenheiro

eletricistaMiltonFerreira,esseobstáculoencontrou

umasaídacomadescobertadoquerosene.Menos

perigoso,elepodiaserusadoemambientesdoméstico

ànoite,semoperigodeespalhar-secomoogáse

causargrandestranstornos.

Antesdecederespaçoparaoutratecnologia,a

iluminaçãoagáspassouporumaprimoramento,

aumentandosuadifusão.Amelhoriaquelevou

aessecenárioveio,sobretudo,comainvenção

do“bicoAuer”,umretinodealgodãoembebido

deóxidosque,alémdepermitirregularasaída

dogás,tornava-seincandescentesemqueimar,

possibilitandoumgrandeaumentodeluminosidade.

Devidoàssuascaracterísticas,quandoodispositivo

começouaserutilizado,apartirde1886,operigo

deexplosõesdiminuiudrasticamente,alémdomais,

porcausadele,pôde-sevirar,pelaprimeiravez,a

chamailuminanteparabaixo,facilitandooprocesso

demanutenção.Outramodificaçãonoslampiõesa

gásqueotornaramequipamentosaindamelhores

paraépocafoioacoplamentodascamisinhascujo

desenvolvimentodematerialpermitiuquealuz

emitidapeloequipamentoapresentasseumbrilho

maisintenso.

Maisoumenosportentosos,comousem“bico

Auer”,ocertoéqueossistemasdeiluminaçãoagás

mudaramoscenáriosdascidades.Deacordocomo

especialistaemiluminação,MiltonFerreira,antesda

chegadadetalinvento,sobaprecáriailuminação

vindadofogo,asatividadesnoturnasdasociedade

emgeral,tantointernascomoexternas,erambem

limitadas.“Ogásfoiaprimeiramanifestaçãode

melhoramentonailuminaçãopublica,agilizandoas

atividadesnoturnas”,diz.

Depoisdele,avidadaspessoassetransformou

emdiversosaspectosemesmoqueseuusotenhasido

duranteumcurtoperíododetempo,suapassagem

foimarcante.ComoescreveBonali,“aluztrêmulae

azuladaemitidapelogásformavaemsuavoltauma

Page 18: Coleção Energia Vol 3

18

era da eletricidade

atmosferadevagolirismo,umaauraromântica,que

juntocomos‘gasistas’,trabalhadoresresponsáveis

pelaoperaçãodoaparelho,tornou-separtedo

folclorepopulardaEuropaedosdemaiscontinentes

quevieramautilizá-la”.

Concomitantementeaogásaeriforme,outros

combustíveisforamlargamenteutilizadosno

séculoXIXparaaproduçãodeluz.Ocarboneto

decálcio(acetileno),porexemplo,substância

orgânica,gasosa,incolor,foiempregadoem

carroças,bicicletas,vagõesferroviáriose,nofim

dos1800,emveículosmotorizados,parailuminar

oscaminhosdaspessoasqueosguiavam.Ao

recebergotasdeágua,oacetilenodáorigem

avivaschamas,oqueotornouumaopção

eficienteparaosveículosemgeral,apesardesua

instabilidadeedoriscodeexplosão.Segundo

Bonali,em1899,ocarroFiat,porexemplo,

jáexibiadoisgrandesfaróisalimentadospelo

carbonetodecálcio.

Opetróleotambémfoiutilizadoparaproduzir

iluminaçãoapartirdofogo.Aexistênciadomaterial

éconhecidadesdeaAntiguidadeemquetextosjáo

descreviamemformabetuminosaflutuandonaágua

doscharcos.Contudo,suadescobertaoficialédatada

de1859,quandoocoronelnorte-americanoEdwin

LaurentineDrake,aoperfurarosolododesertoda

Pensilvânia,nosEstadosUnidos,fezpelaprimeiravez

jorrardochãooóleonegroviscoso.

Aimagemdopetróleoémaisatreladaà

produçãodederivadosdecombustíveisparafazer

funcionaremveículosmotorizados.Nãosemmotivo,

afinaldecontas,ahistóriaprovouseressaasua

maisimportantefunção.Entretanto,nosprimeiros

anosdesuamaciçaextração,serviutambém

dealimentoparaosarcaicosequipamentosde

iluminação.Istoporque,destilado,eletemumalto

graudeabsorçãocapilar,alémdeserarmazenado

facilmenteede,naépoca,tercustobaixo.

SegundoBonali,naáreadeiluminação,

empregou-semaisopetróleonaslâmpadasdemesa,

jáquehaviadificuldadestécnicasemutilizá-lonos

aparelhospênseisporcausadafaltadereservatórios

paraocombustível.Aslâmpadasdemesa,pelo

contrário,jádispunham,naépoca,deumacervoque

contavacomessedepósitoqueeraanteriormente

ocupadocomóleosviçososecheirosos.

A iluminação elétrica

Experimentoscomproduçãodeluzpormeio

daeletricidadejávinhamsendofeitosdesdeo

séculoXVII.Maisespecificamente,comoinforma

oengenheirodeIluminaçãodaGEConsumer&

Industrial,JoséCervantes,desde1650,quando

ocientistaalemãoOttovonGuerikedescobriu

quealuzpoderiaserproduzidapelaexcitação

elétrica.Delápracá,muitosoutrosachados.No

iníciodadécadade1700,porexemplo,oinglês

FrancisHawskbee,realizouumaexperiênciana

qualcolocavaenxofredentrodeumglobode

vidrovazio;fazendoisso,percebeuaformaçãode

luzeesteexperimentofoiconsideradoaprimeira

lâmpadaelétricadesenvolvidanomundo.

Cercadeumséculoemeiomaistarde,em1840,

outroinglês,WilliamGrove,descobriuquetirasde

platinaeoutrosmetaisdevidamenteaquecidos,até

seincandescerem,produziamluzporumperíodo

detempo.UmanodepoisdaexperiênciadeGrove,

maisumavezumbritânico,FrederickdeMoleyns,

patenteouaprimeiralâmpadaincandescente

quesetemnotícia.Contudo,tantooaparelhode

Moleynsquantoosoutrosinventosdesenvolvidos

atéentãoapresentavamlimitaçõestécnicas,ouseja,

aluzproduzidanãopossuíaintensidadeeduração

suficientesparaseremutilizadosemlargaescala

parasubstituíremosequipamentosdeiluminação

existentesnaqueleperíodo.

Asprimeiraslâmpadaselétricasquetiveram

relativosucessocomercialforamasdearcovoltaico.

Inventadasnoiníciodosanos1800peloquímico

inglêsHumphryDavy,elasforambasicamente

utilizadasnailuminaçãopública.Conformeo

engenheiroeletricistaMiltonFerreira,aslâmpadas

aarcovoltaicooperavamemcircuitos-série,

exigindoparaseucontrole,oempregodevários

equipamentosauxiliares,oqueencareciaoprocesso,

alémdisso,elasapresentavamgrandeintensidade

luminosa,nãoprestandodessaforma,aouso

interno.Umaexperiênciarealizada,em1858,no

A Light and Power Company, assim como outras companhias de eletricidade, divulgava os benefícios da iluminação elétrica por meio de propagandas

Page 19: Coleção Energia Vol 3

19

faroldeSouthForeland,naInglaterra,comprovou

adificuldadeemseutilizaroequipamento;sua

queimaerainconstanteeavidaútilmuitocurta,

exigindoconstantemanutenção.

Asoluçãoveiocomonorte-americanoThomas

AlvaEdison.Aideiadalâmpadaincandescentejá

existia,masfoiEdisonqueencontrouofilamento

adequadoparaquealuzgeradafosseintensae

duradoura.Eletentoumaisdeseismilmateriaisde

filamentosalternativosdurantedoisanos,egastou

40mildólaresdaquelaépoca(cercadeUS$1milhão

dehoje)realizandomaisde1.200experiênciasaté

quedescobrisseofilamentodealgodão.Edison

acendeuseufilamentonodia19deoutubrode1879

edoisdiasdepoiseleaindaestavaincandescente.

Posteriormente,buscandomaiorduraçãodo

tempodeiluminaçãodalâmpada,Edisoneos

demaiscientistasdaépocapartiramatrásdeoutros

materiaisparafilamento.Edisonecnontrou,em

primeirolugar,comoopçãoeficiente,ofilamento

debambucarbonizadoqueapresentoumelhor

rendimentoedurabilidadequeofiodealgodão.

Depois,foiavezdofilamentodecelulosesuplantar

obambu.Masnadaquesecomparasseaometal

tungstênio,materialqueganhouadisputa,sendo

utilizadoaindahoje,por,entreoutrasrazões,

apresentarumpontodefusãomaiselevadodoque

3.000°C,ouseja,terumatemperaturadetrabalho

maisaltadoqueosoutrosmateriais.

Onovoinventomostrou-seeficiente,prático

e,sobretudo,seguroelimpo,secomparadoaos

equipamentosdeiluminaçãoquevinhamsendo

utilizadosatéaquelemomento.Porisso,foram

comercializadasemlargaescala,jáem1880,sendo

oprimeirosistemadeiluminaçãointroduzidoem

1882,noviadutoHolburn,emLondres.Nomesmo

ano,ailuminaçãoelétricachegouaNovaYorkpara

iluminaraPearlStreetStation.

Masadifusãodalâmpadanãosedeu

magicamente,paraqueelativesseapelocomercial,

ThomasEdisontevequetrabalharnoseu

aperfeiçoamento.Aorudimentarbulbocomfilamento

dealgodão,foiacrescentado,porexemplo,umabase

rosqueadaparausoemreceptáculos.Ocertoéque,

comainvençãodeEdison,aspessoasconseguiram

prolongarseudiaatéanoitedemaneirasustentável

eeconômica.“Apartirdestedescobrimento,a

rotinadomundocivilizadoeavidadaspessoas

mudaramradicalmente,nãosópermitindoomaior

desenvolvimentomaterialnomundo,mas,ao

longodotempo,umpadrãodevidamelhorparao

serhumano”,dizFerreira.Defato,ainvençãoda

lâmpadaelétricarevolucionoutodoocomportamento

dasociedade,aumentandoohoráriodasatividades

comerciaisouindustriaisepossibilitandoolazere

atividadesesportivasnoperíodonoturno.

Sealâmpadaincandescentelevoualuz

elétricaaosquatrocantosdomundo,alâmpada

fluorescente,quefuncionaàbasedevaporde

fósforo,difundiuaquestãodeeconomianoque

tangeàiluminaçãoviaeletricidade.Istoporque,

tendo,basicamente,amesmaqualidadedeluzquea

lâmpadaincandescente,utilizacercade70%menos

eletricidadequeelaecontacomumavidaútilaté20

vezesmaior.Porisso,setornoutãopopularquanto

alâmpadaincandescentenomundo,utilizadaem

residências,indústriaseestabelecimentoscomerciais.

No Brasil

Aprimeiracidadedopaísacontarcomum

sistemadeiluminaçãopúblicaaeletricidade,ainda

queembrionárioedemodestasproporções,foi

PortoAlegre,istoporque,acapitaldoRioGrande

doSul,jáservia-se,desde1887,daenergiagerada

pelaVelhaUsinaTérmicadaCompanhiaFiatLux.

Paraseterumaideiadecomoomunicípioestava

avançado,deacordocomolivroVidacotidiana

noBrasilModerno,aenergiaelétricaeasociedade

brasileira(1880-1930),asduasprincipaisregiões

doPaís,naépoca,SãoPauloeRiodeJaneiro,

sóforamcontarcomumsistemadeiluminação

elétricanoiníciodadécadade1900.

SãoPaulo,porexemplo,haviainaugurado

seusistemadeiluminaçãoagásem1872ejáse

interessavapelanovatécnicaquesurgia.Demorou,

então,algunsanosatéqueaportasseemterras

paulistanasoinventodeThomasEdison.Nãoque

duranteessaesperanadarelacionadoàeletricidade

tivessedadoascarasemsolopaulista.Pelocontrário,

Page 20: Coleção Energia Vol 3

20

era da eletricidade

diversosprojetosnaáreaforamrealizados,entre

eles,ainstalaçãodelâmpadasdearcovoltaicopela

EmpresaPaulistadeEletricidade,posteriormente

encampadapelaCompanhiaÁguaeLuzde

SãoPaulo,maistardeincorporadapelaLight;a

inauguraçãodosserviçosdaCompanhiaPaulista

deEletricidade,em1888;eailuminaçãodaRua

BarãodeItapetininga,em1905,pelaTheSãoPaulo

Tramway,LightandPowerCompanyLtd.

Noentanto,foisomenteem1911,queaLight,

responsávelpeladistribuiçãodeenergiaelétrica

paraSãoPaulo,fechouseuprimeirocontratocom

ogovernoestadualparailuminaçãopúblicaa

eletricidade.Nesteacordo,curiosamente,estava

incluídaadistribuiçãodeluzparaasavenidas

BrigadeiroLuísAntônioeHigienópolis,duasdas

atuaisprincipaisavenidasdacidade.

Nessesentido,sehouvecertademoraparaa

lâmpadaelétricachegaremSãoPaulo,empouco

tempo,porém,elaseespalhou.Em1914,omunicípio

jápossuía1637pontosdeiluminação,dosquais818

eramdelâmpadasincandescentese819delâmpadas

aarco.Mesmoassim,em1916,oslampiõesagás,

emnúmerode8.605,superavamainda,emmuito,a

iluminaçãoelétrica.

NoRiodeJaneiro,aintroduçãosistemática

daenergiaelétricacomeçouumpoucomaiscedo,

em1904,comasobrasdeconstruçãodaAvenida

Geral,cujofornecimentodeenergiaficouacargoda

empresaBranconnoteIrmãos,queforacontratada

pelacompanhiafrancesaSocietéAnonumeduGaz,

responsávelpeladistribuiçãodogásnacidade,

naépoca.Namesmaregião,fixouresidênciaa

companhiaTheRiodeJaneiroTramway,Light

naPowerCompanyLtd.,empresaquesetornaria

responsávelpelailuminaçãopúblicadacidade.

Independentementedaregiãodopaís,

asituaçãoaindaeraincipiente,mascom

investimentossólidosemunidadesprodutorase

distribuidorasdeenergialocalizadaspróximasàs

áreasaseremiluminadas,ascidadesbrasileiras

foramgradativamentedeixandodeladoos

lampiõesagáseinstaurandoaslâmpadaselétricas.

Sóparaseterumaideia,em1920,segundoo

Censo,umterçodasvilasemunicípiosdopaís

jápossuíailuminaçãoelétrica:noestadodeSão

Paulo,137dos158municípioscontavamcom

iluminaçãoexclusivamenteelétrica;emMinas

Gerais,98dos112;noParaná,26dos29;enoRio

GrandedoSul,39das60cidades.

AcidadedoRiodeJaneiro,porexemplo,entre

1910e1926,viuseunúmerogeraldepontosde

eletricidadequintuplicarnoslogradourospúblicosda

região,passandode3,5milparamaisde16mil,isso

tudopuxadoporumconsumoqueaumentaraoito

vezesnestemesmoperíodo.Aprogressãoacelerada

possibilitou,jáem1920,asubstituiçãototaldogás

pelaeletricidadenailuminaçãopúblicadomunicípio.

Comadesãosistemáticadailuminação

elétricaincandescentenoBrasil,nadamaiscerto

queocotidianodeseushabitantesmudasse

vertiginosamente.Asruasdasgrandescidades,por

exemplo,deixaramparatrás,pelomenosnaquele

momento,aimagemquemédicos,policiaise

autoridadespúblicas,constantemente,lheimpunham,

deumlugarinsalubre,violentoeinseguro.Coma

chegadadaluzelétrica,aruapassoudemeiopara

fim,delugardepassagemrápidaparapontode

encontro,reuniõesefestividades.Podia-se,agora,em

umacidadeemqueosíndicesdecriminalidadeainda

nãoeramelevados,desfrutardepasseiosnoturnosnas

novasgrandesavenidasemarcarencontroseeventos

naspraçasenosparquesurbanos.

Osteatrostambémsebeneficiarambastanteda

iluminaçãoelétrica.Tornaram-semaisclaros,mais

agradáveisemaissegurostambémporquediminuíram

oriscodeincêndiosqueexistiaquandoeram

iluminadosportochasouporlampiõesalimentadosa

gás.Nestecontexto,acidadedoRiodeJaneiroassistiu,

em1909,àinauguraçãodoTeatroMunicipal,em

umestadodegrandedesenvolvimentodolazereda

cultura.Jáem1911foiavezdeSãoPauloinauguraro

seuTeatroMunicipal.Aluzelétricatambémfezsurgir

umasériedenovasdiversõespúblicas,comoossalões,

clubesebilhares.Elescomeçaramaproliferargraças

aonovoinvento,oferecendoàpopulaçãovariadas

opçõesdelazeredivertimento.

Seasopçõesdelazeraumentavamdevidoao

Page 21: Coleção Energia Vol 3

21

Pesquisa• Vida cotidiana no Brasil Moderno, a energia elétrica e a sociedade brasileira (1880-1930), MemóriadaEletricidade• A História da Iluminação Artificial – das origens até o século XX, NataleBonali

adventodaluzelétrica,osproblemasrelacionados

aoprogressoeconômicotambém.Aoladodetodo

avançotecnológicopodia-severamisériageradana

esteiradeste.Aruaestavacadavezmaispovoada

pelasmultidõesqueproliferavamnoscortiçosecasas

decômodos.Cenárioque,deacordocomolivro

aVidacotidiananoBrasilModerno,eravisto,por

muitos,comoumaameaçaàordem,umretratoda

barbáriesedoatraso,resistênciaàcivilização.

Eraprecisotomarumaatitudeparaquea

situaçãonãosetornassemaiscalamitosaparaaqueles

quepodiamdesfrutardosnovosprogressos.Neste

momento,começaaseconsolidararelação,quase

automáticaquesefazhojeemdia,entresegurança

eruasiluminadasànoite.Diantedisso,asociedade,

preocupadacomseuprópriobem-estar,aumentoua

cobrançasobreoEstado,buscandoacontinuidadee

aexpansãodosbenefíciosdailuminaçãoelétricadas

viaspúblicas.

Umadasformasdeseminimizarasmazelassociais

éimpedirqueseusefeitossejamsentidosporqualquer

pontodacadeiasocial,iluminando-seoslogradouros

públicos,torcendoparaqueaviolênciatenhaosolhos

feridoscomaclaridadedaslâmpadaseseafaste.

Éprecisolembrarqueaeletricidadenãogera

apenasluz,elatambémproduzmovimentopara

asmáquinas,quetrazaumentodeprodução.O

empregadorvendemaismercadoriaetemmais

lucrodiantedeummercadoconsumidorcadavez

maior;oempregado,queétambémoconsumidor,

temmaishorasdetrabalhoe,consequentemente,

maisdinheiroparaconsumir.Dessaforma,para

aumentaraprodução,eraprecisotrabalharmais

tempo,eraprecisotrabalhartambémànoitee,

paraisso,aluzelétricasetornouimprescindível.

Semaistrabalhotrazmaisdinheiro,ailuminação

elétricanãodeixoudecontribuir,dessaforma,para

amelhoriadascondiçõeseconômicasdooperariado.

Foto de 1930 que mostra a iluminação pública da Rua Viana Drummond, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro

a iluminaçãO dOméstica fOi Beneficiada cOm a

descOBerta dO querOsene. menOs periGOsO, ele pOdia ser usadO em

amBientes dOmésticO à nOite, sem O periGO de espalhar-se cOmO O Gás e

causar Grandes transtOrnOs.

Luminária residencial para uso de gás, na parte superior, e eletricidade, na parte inferior.

Page 22: Coleção Energia Vol 3

22

cidade em movimento Por Flávia Lima

Entraves como carência de pesquisas e interesses políticos impediram o desenvolvimento dos veículos elétricos, nascidos em meados do século XIX, antes mesmo dos carros a combustão interna. Preocupação ambiental e crises da indústria do petróleo abriram caminho para um novo recomeço.

ELETRICIDADE SOBRE RODAS

Senador George P. Wetmore, em um veículo elétrico chamado “Krieger Electric Landaulet”, em Washington, nos Estados Unidos, no ano de 1906.

Page 23: Coleção Energia Vol 3

23

Emboraoscarrosdepropulsãoagasolina

tenhamdominadoasruasdetodoomundo,

elesnãoforampioneirosemsuaessência.Os

veículoselétricos–quevoltamagoraàcena

comoumasoluçãoecologicamenteviável–

passamlongedeserumanovidade.Háregistros

dequeoprimeiroindíciodeveículoelétricoseja

de1827naHungria,tendoganhadomercadoa

partirdofinaldoséculoXIXcomfabricação,

temporariamente,próspera.

Efetivamente,apartirdasegundametadedo

séculoXIX,deu-seinícioàeradaeletricidade

quesetornariapermanente.Orecurso

energéticoaplicado,especialmente,coma

invençãodomotorelétricoesuadifusãocom

aprimoramentos,revolucionoutodasasáreas

dasociedade.Tendoomotorelétricocomo

mecanismofundamentalaodesenvolvimento

daenergiaelétricaaplicada,aintrodução

dessaeletricidadenosprocessosprodutivos

enotransportedeu-sequasequeaomesmo

tempo.Nasmáquinasquecomeçamasurgir

nasdécadasfinaisdoséculoXIX,motores

maismodernoscolocavamempráticaos

conhecimentosdoeletromagnetismo.Omesmo

ocorreunotransportequandoaeletricidade

começaatracionarasprimeiraslocomotivas,

especialmenteasdecarga,sendotambém

aplicadasaoscarrosdepasseio.

Aeletricidadeéomaisantigométodode

propulsãodeautomóveisqueseconhece.A

tecnologiapodeseratribuídaaalgunscélebres

cientistas,acomeçarpelohúngaroinventor

domotorelétrico,ÁnyosJedlik,quemteria

primeirocriadooprincípiododínamoelétricode

autoexcitação,em1827.Comosuacriaçãonãofoi

noticiadaantesdonomedeSiemens,esteficou

comafamadoinventomaistarde,em1861.

Umpassomaisconsistentefoidado,porém,

pelofísicofrancêsGastónPlanté,aocriar,em

1859,abateriarecarregáveldechumbo-ácido,

amesma–comaprimoramentos–utilizadaaté

hojeemautomóveisconvencionais.Adescoberta

abriucaminhoparaoscarroselétricos,que

ganharamaEuropaeosEstadosUnidospor

trêsdécadas,tendosidoaFrançaeaInglaterra

osprimeirospaísesaapoiarodesenvolvimento

dessaindústria.

Osamericanos,naverdade,sóderamatenção

aoveículoelétricoapósA.L.Rykerintroduziro

primeirocarroaeletricidadenopaís,em1895.A

partirdeentão,ointeressecresceuedecidiu-se

investirfortementenanovidadeentreosanos

1890easduasprimeirasdécadasdoséculoXX.

Paraseterideia,em1897,osveículoselétricos

ganharamsuaprimeiraaplicaçãocomercialnos

EstadosUnidoscomumafrotadetáxisdeNova

York,constituídapelaElectricCarriageand

WagonCompanyofPhiladelphia.

Ofatoéque,antesdodesenvolvimentodos

automóveismovidosacombustíveis,oselétricos

foramumasoluçãobastanteaplicada.Odiretor

doInstitutoNacionaldeEficiênciaEnergética

(Inee),JaymeBuarquedeHollanda,conta

que,atéaviradadaqueleséculo,haviamuitos

veículoselétricosemcirculação.Estima-seque

40%doscarrosvendidosnesseperíodoeram

elétricos,sendoorestanterepartidoempartes

praticamenteiguaisentreveículosavaporede

combustãointerna.

Carros elétricos versus carros a combustão interna

OfimdoséculoXVIII,marcadopela

RevoluçãoIndustrial,tambémdeixouseu

Carro a vapor Bordino, de 1854

Page 24: Coleção Energia Vol 3

24

cidade em movimento

legadonotransporte.Símbolodestarevolução,

amáquinaavaporexerceugrandeinfluência

sobreosmeiosdetransporte.Em1769,ofrancês

Nicolas-JosephCugnotteriausadoummotora

vaporparamovimentarumveículopequeno,de

trêsrodas,mecanismoqueganhoumaisênfase

naslocomotivasdoiníciodoséculoXIX.Eassim

comoaslocomotivasconquistaramterritório,

osveículosavapor,tambémofizeramantes,

penetrandoomercadodeautomóveisdepasseio

edeserviço.Estesveículosmovidosavapor

concorreriammaistardecomoselétricosecom

osdecombustãointerna,tendoesteúltimosido

concebidonaAlemanha,porvoltade1885,

eobtidosucessodevido,principalmente,a

HenryFord,quepassouafabricá-losemsérie,

vendendocercade15milhõesdeunidadesde

umúnicomodelo,oconhecidoT,entre1908e

1927.

Desenvolvidosquasequesimultaneamente

emumperíodopropícioàmaterializaçãodas

pesquisascientíficasquebrotavamdasmentes

iluminadas,oscarroselétricoseàcombustão

internaandaramjuntosporalgumasdécadas

apartirdosanos1890,tendooprimeiro

sustentadoaposiçãodefavoritoporanos.Isso

porqueoselétricoschegaramaalcançaraltas

velocidadeseavencergrandesdistâncias.Um

dosmaisnotáveisrecordesfoiatingidopelo

conhecido“JamaisContente”,criadopelofrancês

CamilleJenatzy,que,em29deabrilde1899,

alcançouavelocidadede105,88km/h,sendo

oúnicoveículoaultrapassaramarcados100

km/hnaépoca.

Apesardofeito,demodogeral,osveículos

nãoapresentavamgrandepotencialde

velocidade–oquenãoeraumadesvantagem

propriamentedita,jáqueosautomóveisda

épocaeramempregadosemzonasurbanas,

relativamentepequenas.Elesapresentavamainda

algumasvantagensemrelaçãoaosconcorrentes:

nãoproduziamvibrações,cheirooubarulho.

Alémdisso,trocaraembreagememcarros

movidosagasolinaeraapartemaisdifícildesua

dirigibilidade,açãonãoexigidapeloselétricos.

Naviradadoséculo,eramoscarroselétricos

quepossuíammotorcommaiordesempenho.

Hollandacontaqueoveículoacombustãoainda

erapoucodesenvolvido,apresentavaalguns

problemas,alémdenãocontarcomcombustíveis

padronizados–atéoamadurecimento

daindústriadopetróleo,empregavam-se

principalmenteoqueroseneeoetanol,este,por

sermaishomogêneo.

Oscarroselétricostornaram-sepopulares

entreaspessoasmaisbem-sucedidasdaépoca,

queosempregavamnascidadespornãoexigir

grandesvelocidades.Eleseramospreferidos

tambémporquenãoseexigiaesforçomanual

paradarpartida,aocontráriodosveículos

agasolinaquedispunhamdeumamanivela

quedemandavagrandeesforçofísicoparaser

acionada,comointuitodedarpartidanocarro.

Oproblemaéqueessaalavancaexigiamuita

forçafísicadoscondutores,chegando,inclusive,

aprovocaracidentesnosusuários,comofraturas

nasmãosenosbraços.Porestemotivo,os

elétricoseramosfavoritosdasmulheres,que

tambémeramseduzidaspelaspropagandas,

asquais,frequentemente,exploravamessa

característicaaseufavor.Hollandacontaqueo

próprioHenryFordnãoadmitiaquesuaesposa

dirigisseumcarrocommotordecombustão

interna,apenasoelétrico,receosodequeelase

machucasseaomanejaramanivela.

Porsermaisconfortávelefácildemanusear,

Thomas Edison e um carro elétrico em 1913.

Page 25: Coleção Energia Vol 3

25

comparadoaosoutrosmeiosdetransporteda

época–avaporeacombustão–,oveículo

elétricotornou-seasoluçãofavoritado

transporteurbano,principalmenteporsua

simplicidade.“Suaconstruçãoeoperaçãoeram

maissimplesdoqueasdeveículosavaporou

acionadospormotoresdeexplosão.Entretanto,

suagrandelimitaçãoeraaautonomiade

percurso,devidaàpequenacapacidadedas

bateriasemrelaçãoaseupesoetamanho”,

explicaopresidentedaAssociaçãoBrasileirado

VeículoElétrico(ABVE),PietroErber.

FoinosEstadosUnidosqueoveículoelétrico

ganhoumaisaceitação,chegandoaregistrar,no

iníciodadécadade1900,33.842carroselétricos.

Paraseterideia,oconceitofoialémdoscarros

depasseio.Emmeadosde1920,haviamaisde

quatromilcaminhõesdeentregamovidosà

eletricidadeemNovaYork.AFrançatambém

investiunatecnologia,chegandoainstalar

cercade700pontosderecarga,noanode1901.

NoBrasiltambémtemosregistrosdeveículos

elétricos,porexemplo,oscaminhõeselétricos,

pesandoquatrotoneladas,querealizavam

amanutençãodaredeaérea,em1906,pela

TheRiodeJaneiroTramway,lightandPower

CompanyLimited.

Ocarroelétricoperdedefinitivamentea

corridacomocarroacombustãointernaa

partirde1912,quandoasvendascomeçarama

definhar.Umadasjustificativasquesedãoao

declíniodocarroelétricoéaescassezdeenergia

elétrica,porvoltade1912,quandoasresidências

foraminvadidasporequipamentoselétricos,

prejudicandoapopularidadedosautomóveis.

Erberacrescentaqueamelhoriadodesempenho,

areduçãodocustodosmotoresdecombustão

interna,amaiorautonomiaeainvençãoda

partidaelétricaparaessesmotoresdeterminaram

oabandonodatraçãoelétricaemautomóveis.

Soma-seaissoofatodeque,emcomparação

comumFordT,porexemplo,umcarroelétrico

chegavaacustaratétrêsvezesmais.Outros

fatosisoladostambémcontribuíram.Nadécada

de1920,aGeneralMotorsadquiriuosistema

debondeselétricosdaCalifórniaapenaspara

desativá-loeintroduzirousodeveículos

movidosacombustíveisfósseis.

Idas e vindas

Nadécadade1910,AlfredP.Sloan,o

maisduradouropresidentedaGeneralMotors,

inseriuummotorelétriconapartidadoveículo

acombustãointerna,desenvolvendoassimo

motordearranque.Anovatecnologiafacilitou

avidadoscondutoresemarcouoiníciodo

sucessodessemodelo.Adescoberta,associada

aofortalecimentodaindústriadepetróleofez

oscarrosacombustãodeslancharem,ganhando

mercado,emdetrimentodosveículoselétricos,

cujaprincipaldeficiência–abateria–não

haviasofridoaprimoramentossignificativos.

Númerosdaindústriadepetróleodadécada

de1920mostramqueaquedademercadodos

veículoselétricosestádiretamenterelacionadaà

estabilidadeeaoaumentodaproduçãomundial

depetróleo.

Éimportantelembrarque,mesmocoma

decadênciadoscarroselétricos,nuncasedeixou

defabricá-los,masparaaplicaçõesespecíficas.

PietroErberafirmaqueelespassaramaser

empregadosemcarrospequenosdeserviço,

principalmentenaEuropa,comocarrosde

carteirosedeleiteiros.“Oscarroselétricossão

ideaisparasetrabalharnoregimedoandae

Apreciador das novas tecnologias, Santos Dumont trouxe o primeiro carro elétrico para o Brasil, em 1891.

Page 26: Coleção Energia Vol 3

26

cidade em movimento

para,pois,parada,abaterianãodescarrega,

enquantoocarroacombustívelnãoéindicado

paraatuarnesseritmo”,compara.Emseguida,

foramtambémempregadoscomoempilhadeiras

ecomomeiodelocomoçãoemcamposdegolfe,

defuteboleemalgumasgrandescompanhias.

Dequalquermaneira,ointeressepor

pesquisassobrebateriastambémsedeixou

abaterenãoobtevegrandesevoluções.

Diferentementedabateriautilizadanos

automóveiscomoapoioaomotordearranque,

abateriadoveículoelétricodemanda

característicasespeciais,entreelas,devetera

propriedadedecargaededescargacontínua,

entretanto,comaspesquisasabandonadas,o

veículoelétricocontinuavaaapresentarpouca

autonomia,principalentraveaoseusucesso.

Orenascimentodosveículoselétricosse

dariaapartirdadécadade1970,comacrise

dopetróleo.DeacordocomoengenheiroElifas

GurgeldoAmaral,osproblemasambientais,

especialmenteoaquecimentoglobal,reforçaram

osinvestimentosempesquisas.Ainda,a

instabilidadedofornecimentodepetróleoe

aaltaoscilaçãodopreçocausadopelacrise

financeiramundialintensificaramanecessidade

denovosmeiosdetransporteefontesdeenergia

diferenciadas.Segundoele,todosessesfatores

favoreceramabuscadenovastecnologias,

fontesalternativasdeenergia,comoosveículos

flex,motoresmaiseficientes,veículoselétricose

híbrido,entreoutras.

Outropontoafavoréosurgimentodos

celularesedosnotebooks,nofinaldosanos

1980,queacabaporreacenderaspesquisas

sobrebaterias.“Osprimeiroscelulareseram

verdadeirostijoloseeracomumteruma

bateriareservanabolsaporcontadasuapouca

autonomia”,lembra.Nesseperíodo,aindústria

começaaapresentardemandaporbateriasmais

leveseentãoosestudosrecomeçam.Asbaterias

modernizaram-seeissoreavivouaspesquisas

tambémsobreasbateriasparaveículos(elétricos

ounão).

Éimportante,entretanto,relatardoisgrandes

saltoscomrelaçãoaorecomeçodocarroelétrico:

umestímulonorte-americanoeoutrofrancês.No

iníciodadécadade1990,foipromulgadauma

leinoEstadodaCalifórnia,nosEstadosUnidos,

quedeterminavaquecertopercentualdoscarros

nasruasdeveriateremissãozerodepoluição.

Alegislaçãonãofalavaemcarroelétrico,

masemboratenhahavidoalgumassoluções

propostas,naprática,foiadocarroelétricoque

maisseadequou.Ainiciativa,entretanto,nãofoi

muitobemrecebidaegeroupolêmica,indoparar

noSupremoTribunaldosEstadosUnidos.Aação

serviuparaqueosfabricantesseentusiasmassem

eprocurassemsaídasparaseobteratalemissão

zero.

AmaisfamosadelasfoiocarroEV1

(originalmente,electricvehiclenumber1,ou

veículoelétriconúmero1),produzidopela

GeneralMotors,masagora,diferentemente,

dosprimeirosmodelosdoiníciodoséculo,

esteprotótipopossuíaumasériedeelementos

modernosos.Ocarrofoilançado,masnão

obtevesucessonasvendas,poisopacotede

bateriasaindaeramuitocaro.Asoluçãoentão

encontradapelafabricantefoialugaroveículo,

istoé,nolugardevendê-lo,ocarroseria

emprestadoaoconsumidoremtrocadeumataxa

mensal.Aalegaçãoeradequeoaluguelseria

compensadopelaeconomiacomcombustível.

Oveículopossuíaautonomiademaisde

100quilômetroseotempoderecargaerade

aproximadamenteoitohoras.

Diversasempresastambémseenveredaram

Pela simplicidade de manuseio, propagandas incentivavam as mulheres a consumir carros elétricos. Este é um anúncio da Detroit Electric, em 1912.

Page 27: Coleção Energia Vol 3

27

Veículo elétrico puroSão aqueles que usam apenas a energia elétrica como

fonte de tração:

• Podem usar bateria ou células fotovoltaicas

• São recarregáveis

• Baixa autonomia

• Alto custo e baixo desempenho

• Não emitem nenhum tipo de poluente

híbriDoUtilizam a fonte elétrica e o combustível convencional.

• Principal solução em curto prazo em veículos elétricos

• Bom desempenho

• Boa autonomia

• É poluente

híbriDo plug-inUtilizam a fonte elétrica e o combustível convencional.

• Bateria pode ser alimentada por fonte externa (na

própria rede elétrica convencional)

• Atenua as limitações das baterias

um carrO elétricO que circule aprOximadamente 15 mil km pOr anO cOnsOme cerca de 300 kWh pOr mês, O que equivale aO cOnsumO de um aparelhO de ar-cOndiciOnadO. ele deverá ir aO encOntrO dO cOnceitO de smartGrid (redes inteliGentes), pOis pOderãO ter um efeitO de estaBilizadOr na rele elétrica distriBuída, incOrpOrandO funções, em uma residência, cOmO as de um nOBreak, pOr exemplO.

eficiência e emissões De Veículos elétricos

Veículo elétrico a bateria

• Eficiência: ~50% a 70%

• Não emite no local em que circula

Veículo elétrico híbrido

• Eficiência: pelo menos 30% a 50% mais km/l que o

convencional

• Emissões: menos 40% a 90% que o convencional, dependendo

do poluente

Henney Kilowatt, o primeiro carro elétrico regulado por transistores. Foi comercializado entre 1959 e 1962.

Prius: carro híbrido lançado pela Toyota em 1997. Conforme a fabricante, o próprio veículo recarrega a sua bateria, reunindo energia do calor dos gases de escape e energia cinética durante a travagem.

Page 28: Coleção Energia Vol 3

28

cidade em movimento

pelomesmocaminho,criandocarroscomesse

conceito.Apesardisso,em2003,aGeneral

Motorsdecidiuquenãovaliamaisapena

continuarcomessesistemaeresolveuretirar

osveículosdomercado.“AGMhaviadado

saltosespetaculares,comváriaspatentes,mas

resolveramjogartudofora,comummovimento

quefoilamentado,jáqueelespoderiamestar

hojemuitomaisàfrentedeondeestão;oVolt

éonovomodelocriadopelamontadora,mas

elestiveramquecomeçartudodenovo”,avalia

JaymeBuarquedeHollanda,doInee.

Osegundopontoimportantenahistória

doscarroselétricosveiodosfrancesesque,

preocupadoscomaquestãodapoluição

ambiental,lançaramumprogramaque

incentivavaalgumasempresas,comooserviço

decorreios,porexemplo,autilizarcarros

elétricosemsuasfrotasegrandesmontadoras,

comoRenaultePeugeot,sentiram-seencorajadas

eaderiramaocarroelétrico.Aquitambéma

ideianãovingoue,mesmotendoproduzido

cercadeseismilcarroseerguidoseletropostes

pelopaís,aexperiêncianãofoibemconduzidae

ficounamemória.

Maisumfatoisoladoequefuncionoucomo

umsolavancoparaatecnologiadaeletricidade

aplicadaaosveículoselétricosfoiincentivado

pelaatmosferadepreocupaçãocomoplaneta

transmitidapelaEco92,ocorridanoRiode

Janeiro.Poucotempodepois,oentãopresidente

dosEstadosUnidos,BillClinton,criouum

programaquedefiniaoseguinte:paracadadólar

investidoempesquisaedesenvolvimentodecarros

elétricos,ogovernoinvestiriamaisumdólar.

Aúnicacondição,estabelecidapelopróprio

governo,eradequeessecarrodofuturo

alcançasseamarcade80milhasporgalãode

gasolina–amédiadeconsumonaquelaépoca

erade23milhasporgalão.Praticamentetodos

osfabricantesentraramnojogoelevaram

variadosconceitosdeautomóveis,garantindo

que,emumfuturopróximo,trabalhariamcom

orendimentoproposto.Ocuriosoéquetodosos

modelosapresentadoseramdafamíliahíbrida,

istoé,incorporaosdoisconceitos:combustão

eeletricidade.Atecnologia,aliás,nãoeratão

original,jáque,em1917,oprimeiroveículo

híbrido(gasolina–eletricidade)foilançadopela

WoodsMotorVehicleCompany,emChicago.

Oshíbridosnãoderamcertocomercialmente,

poisofereciammuitopoucopeloseupreço:não

atingiamgrandesvelocidadeseapresentavam

dificuldadesdeuso.

Um novo conceito

Emboraaindústrianorte-americananão

tenhaprosseguidocomafabricaçãodosmodelos

desenvolvidos,oeventodesencadeoureações

dooutroladodomundo.NoJapão,aHonda

eaToyota,receosasdeficaremaquémdos

acontecimentosglobais,trataramdeselecionaros

melhoresengenheirosafimdeestudarosveículos

elétricos.Nasceu,então,nofinalde1997,oPrius,

oprimeirocarrohíbrido(movidoacombustão

eaeletricidade)produzidopelaToyota,tendoa

Hondanoseuencalço,comacriaçãodoInsight,

ummodelohíbridomaisesportivoecomsoluções

técnicasdiferenciadas.Começaentãoumanova

geraçãodecarros,oschamadosveículoshíbridos.

JaymeBuarquedeHollandalembraqueo

movimentoiniciadonaCalifórniateriasidoo

principalestímuloaosveículoselétricos,somado

àvoltadaspesquisassobrebaterias,reanimada

comoadventodoscelularesecomputadores

portáteis.“Atualmente,há2,5milhõesdePrius

[daToyota]emtodoomundo,alémdeoutros

Princípio de veículo elétrico idealizado por Ányos Jedlik em 1827.

Page 29: Coleção Energia Vol 3

29

Pesquisa•DocumentárioQuem matou o carro elétrico?DireçãodeChrisPaine.Produtora:ElectricEntertainment•Artigo“Umavisãogeraldosveículoselétricos,híbridosecélulaacombustívelnoBrasil”,deMaxMauroDiasSantoseGabrielGilvanderTomazGonçalvez(Disponívelemwww.simea.org.br)AssociaçãoBrasileiradeVeículosElétricos–www.abve.org.brInstitutoNacionaldeEficiênciaEnergética–www.inee.org.br

modelosdediversosfabricantes”,comemora.

Percebendoatendênciadepreocupaçãocom

omeioambiente,notandoatecnologiaque,

emboratenhanascidohámaisdeumséculo,

continuadevanguardaeacompanhandoas

recentespesquisas,osfabricantesdeautomóveis

passaramaseassociaraosprodutoresde

baterias,dandoinícioaumaverdadeiracorrida

nosentidodeaperfeiçoá-las–inserindomais

cargaereduzindoseupesoetamanho–eformar

osmelhoresconjuntosautomotivospossíveis.

Emtodoomundo,montadorasestão

desenvolvendoefabricandoseusveículos

elétricos;concessionáriasdeenergia,emparceria

comfabricantes,tambémestãocriandosuas

tecnologias.NocasodoBrasil,entretanto,

alémdaquestãodabateria–que,notocanteà

autonomia,aindaprecisaseraperfeiçoadapara

concorrercomosautosdecombustãointerna

–háoutroentravesignificativo:oImposto

sobreProdutoIndustrializado(IPI)paraesses

veículoséde25%,aopassoqueodeumcarro

convencionalédeaproximadamente7%.

ComoescreveramMaxMauroDiasSantose

GabrielGonçalves,emumartigosobreotema,

“noiníciodahistóriadoautomóvel,osveículos

elétricosocupavamlugardedestaque,enquanto

omotoracombustãointernaerausadoem

competiçõeseemtrabalhosacadêmicos”.Os

papéisforaminvertidos,entretanto,apesardas

barreiras,especialistasapostamnatecnologia

comoumfuturocerto.

Comparativo: automóveis a bateria e a Gasolina

Faixa de consumoConsumo médio

Consumo mensal (20 mil km/ano)Custo mensal de combustível

Gasolina

7 a 10 km/l8 km/l208 l

R$ 458

Elétrico

3 a 10 km/kWh5 km/kWh333 kWhR$ 153

Fonte: ABVE

motor elétrico

motor elétrico

bateria recarregável

gerador

FunCionamento de um veíCulo elétriCo

Page 30: Coleção Energia Vol 3

30

VIDA ELETRÔNICA

evolução Por Lívia Cunha

A eletrônica começou a ser aplicada em equipamentos elétricos

com maior intensidade depois da década de 1950, quando um

dos principais componentes eletrônicos foi desenvolvido: o

transistor. Graças a ele, os aparelhos eletroeletrônicos entraram

tão fortemente na vida cotidiana que hoje é difícil imaginar o dia

a dia sem eles.

Page 31: Coleção Energia Vol 3

31

Oscomputadoressempreinspirarammuitoa

criatividadehumana,sejanaáreatécnicaquantona

cultural.Duranteoperíodoáureodedesenvolvimento

dessasmáquinas,emmeadosdoséculoXX,quando

ocineastaStanleyKubricklançou2001: uma

odisseia no espaço,em1968,umdosfilmesmais

marcantesdahistóriadocinema–consideradosua

obraprima–,vislumbrava-sequalseriaoimpacto

dessescomputadoresnavidadaspessoas.Apesarde

Kubrickterapresentadoemsuaobraatemáticado

medodequeatécnicaganhassevidaprópria,que

acriaturadominasseocriador,oquereabriuuma

sériedequestionamentossobreéticaelimitesde

desenvolvimentodaciência,esteéumreceioantigo

nahistóriadahumanidade.

Fazendoumparalelocomocientificismo,que

ganhouforçanosséculosXVIIIeXIX,acreditava-

sequeaciênciapoderiacurartodososmales

domundo.Omesmosentimentoenvolveua

computação,entreasdécadasde1950e1970,ea

genéticaeaclonagem,nofinaldoséculoXX,temas

quetambémforamabordadosemdiversasobrasde

ficçãocientífica.

Odesenvolvimentotecnológicodainformáticaea

corridaespacialprovocadapelaGuerraFria(1945-

1991),emqueamericanosesoviéticostentavam

provaroseupoderesupremaciapelaconquistado

espaço,serviudepanodefundoparaqueKubrick

elaborasseseufilme,noqualcomputadorestomam

vidaedominamhumanos.Noperíodo,devidoao

desenvolvimentodenovoscomponenteseletrônicos,

oscomputadorescomeçavamareduzirdetamanho,

arealizarmaisoperaçõeserondavamoimaginário

popular.Estavamprestesasetornarelementos

pessoaisindispensáveisparaavidacontemporânea.

Masnãosóeleschegavamàscasaseàsvidas

modernas.Eletrodomésticoseeletroeletrônicosse

afirmavamcomopeças-chavenaformaçãodosbens

deconsumodasfamíliasdametadedoséculopassado.

Masparaqueeleschegassemaesseestágio,

deindispensabilidadenavidamoderna,inúmeros

pesquisadorescontribuíramcomprojetos.O

computador,noentanto,éconsideradoumainvenção

seminventor,tamanhaaquantidadedepessoasque

contribuíramaolongodeanos.

Mulheres operam um dos grandes computadores do meio do século XX, o Eniac

Page 32: Coleção Energia Vol 3

32

evolução

Origens

Oconceitodocomputadormoderno,paraseter

umaideia,nasceumuitosanosantesdeKubrick,mais

precisamenteem1822,quandoCharlesBabbage,

matemáticoeprofessordaUniversidadedeCambridge,

idealizouaMáquinadasDiferenças.Oprotótipo

imaginadoseriaumdispositivomecânicobaseado

emrodasdentadasquepoderiacomputareimprimir

extensastabelascientíficas.

AtéBabbage,osdispositivoscriadospara

computarecalculareramequipamentossimples.

Seuprojeto,de1822,queriamais.Maisdoqueser

umamáquinadecálculoequeresolvesseproblemas

matemáticos,aMáquinadasDiferençasseriacapaz

deexecutarumaamplagamadetarefas.Usandoum

sistemanuméricodecimal,funcionariapelogirode

umamanivela.Comoprotótipo,eledesejavalevara

comunidadecientíficaaumnívelmaisavançadode

desenvolvimentotécnico.

Oprojetodoequipamentoéconsideradoo

primeirocomputadormoderno,quecontariacom

memória,programas,unidadedecontroleeperiféricos

desaída.Masamodernidadefoiexatamenteoque

inviabilizouoaparelho.Comoamáquinaeraavançada

demaisparaosrecursosdaépoca,elacomeçouaser

construída,masnãofoiconcluídaporBabbage,devido

àslimitaçõestécnicasdoperíodo.

Odesenvolvimentodainformática–daqual

Babbageéconsideradoo“pai”pelaMáquinadas

Diferenças–edoscomputadoresmodernosestá

diretamenterelacionadoaosurgimentodaeletrônicaeà

aplicaçãodelatantoemequipamentosdonossodia-a-

dia,taiscomotelevisoreseaparelhosdesom,quantono

setorelétricodepotência,comaparelhosmaiscomplexos,

responsáveispelasupervisãoecontroledeindústriasdas

áreasdegeração,transmissãoedistribuição(GTD).

TalvezosinventoresdoséculoXIXnãoimaginassem

queemumfuturonãotãodistantetodosutilizariam

equipamentosrecheadosdecomponenteseletrônicosno

seudiaadia.Paralongedasprevisõesfuturistasdecarros

voadoresedefamíliasquepassariamfériasemoutros

planetas,oestágioalcançadonesseiníciodoséculoXXI

mostraumatecnologiainclusivaqueaparececadavez

maisparafacilitaravidahumana:computadorespessoais

eportáteis;telefonescelulares,que,entreasdiversas

funções,decâmera,gravadoreportaarquivos,também

servemparaconversar;aparelhoseletrodomésticos,que

vieramfacilitaretornaravidahumanamaispráticae

rápida;entretantasoutrascriações.

Masparachegarmosàsatuaismáquinas,dos

componentesedossistemasinteligentes,milhares

deanosdedesenvolvimentoforamtranscorridos.

Dosdispositivoscompletamenterudimentares,

passandopelosmanuais,eletromecânicos,eletrônicos

aosmicroprocessados,queincluemverdadeiros

microcomputadoresnosaparelhos,cadavezmais

compactos,passaram-semilênios,comintensificação

dodesenvolvimentonosúltimosséculos.Os

computadores,porexemplo,umdosprincipais

símbolosdamodernidadeeletrônicaatual,nadamais

sãodoqueaevoluçãodemáquinasdecalcular,que

remontamaosprimeirosdispositivosdecálculo.

Desdeaauroradohomem,comoapré-história

(próximoa4.000a.C.)échamadanaobradeKubrick,

oserhumanosentiunecessidadedeefetuarcálculos.

Inicialmente,eramutilizadaspequenaspedrase

gravetos,agrupadoseseparados,parafazercontas

comosomaesubtração.Osdedostambémeram

utilizadosnessatarefa.Masosprimeirosregistros

doquefuturamenteculminariamnainvençãodo

computadormodernosãodoorienteantigo.Nessa

épocaapareceuoprimeirodispositivomanualde

cálculo:oábaco.Nãoháprecisãoquantoàdata,mas

háregistrosqueeleteriasurgidonaMesopotâmia

(atualIraque),em5.000a.C.,noEgito,próximoa3.500

a.C.,ouaindanaChina,pertode2.600a.C.

Compostoporumamolduracombastões

ouaramesparalelos,dispostosnavertical–que

correspondiamàsunidades,dezenas,etc.,nosquais

eramcolocadoselementosmóveispararealizara

contagem,podendoserfichas,bolas,contaseassim

pordiante–,aequaçãoerafeitapelacombinação

doselementos.Oábacofoiométododecálculomais

rápidoatéoséculoXVII,quandosurgiuaRéguade

Cálculo,umdispositivomanualparacontasrápidas.

CriadapeloinglêsWilliamOughtred,entreas

décadasde1620e1630,elapermitiaqueassoluções

dosproblemasnuméricosfossemdadaspormeiode

duasguiasgraduadasdeslizantes.AcriaçãodaRégua

deOughtredfoipermitidagraçasàdescobertados

logaritmospelomatemáticoescocêsJohnNapier,na

décadade1610.Atabeladelogaritmos,elaboradapor

Napier,foicombinadacomodispositivodeWilliam,

dandoorigemàRéguadeCálculo.

Emseguida,surgiramascalculadorasautomáticas,

Os aparelhos eletroeletrônicos

criaram uma nova forma

de consumo e alteraram

significativamente a vida e

as relações de trabalho das

sociedades seguintes. A revolução

tecnológica é um dos fatores

que tende a alterar padrões

de consumo e hábitos de vida,

ajudando a explicar as alterações

que a sociedade sofreu

Page 33: Coleção Energia Vol 3

33

comoaPascalina,aprimeiramáquinaautomática

decálculo.Eraumequipamentocomrodasdentadas

quesimulavamofuncionamentodoábacoerealizava

contasdesomaesubtração.Anosmaistarde,na

décadade1670,comoevoluçãodaPascalina,surgiu

achamadaCalculadoraUniversal,capazderealizar,

alémdasfunçõesbásicas,amultiplicação,adivisãoea

raizquadradadasequações.

Essesequipamentoseosoutrossubsequentes

fizeramtécnicaseconhecimentosseremaprimorados

edifundidos.Essacadeia,formadaporfísicos,

matemáticoseoutroscuriososeinteressadospelo

mundotécnico,permitiuqueCharlesBabbage

projetasseoprimeirocomputadormoderno.Isso

porquenenhuminventoratuousozinho.Todosderam

continuidadeatrabalhosanterioresedeixaramabertos

oscamposparapesquisasedesenvolvimentosfuturos.

Oprimeirocomputadortotalmenteautomático

apareceusomentecemanosdepoisdoprojetoda

MáquinadasDiferenças.OAutomaticSequence

ControlledCalculator,conhecidocomoMarkI,foi

iniciadoem1939naUniversidadedeHarvard,por

HowardAiken,econstruídoemparceriacoma

Marinhaamericana.Com17metrosdecomprimento

por2,5metrosdealturaeumpesodecincotoneladas,

ocomputadorlevavadetrêsacincominutospara

fazerumacontademultiplicação.Maseratotalmente

automáticoenãonecessitavadaintervençãohumana

pararealizaçãodeseuscálculos.

Essesavançosrepresentamaeconomiadehoras

detrabalhoparaostrabalhadores.Issoporqueaté

quemáquinaseequipamentoscomoestesfossem

desenvolvidos,asatividadesqueenvolviamnúmeros

levavamhoras,àsvezes,diasparaseremrealizados.

Masnesseperíodo,entreosanos1930e1940,toda

afuncionalidadequeoscomponenteseletrônicos

poderiamagregaràvidahumanaeraaindapotencial.

Essesavançosedescobertasestavamconcentrados

nasmãosdepoucosenãohavia,ainda,ointeresse

depopularizar.Oconhecimento,porinfluênciadas

guerrasmundiais,estavarestritoanúcleosmilitarese

universidadesdeponta.

Provadissoéqueoprimeirocomputadordigital

eletrônicosurgiuseteanosdepoisdoprotótipode

Harvard,em1946,comodesenvolvimentodas

válvulaseletrônicas.EssamáquinaeraoEniac(do

inglêsElectronicNumeralIntegratorandCalculator),

criadopelaUniversidadedaPensilvâniaemparceria

O sistema naciOnal interliGadO (sin), que cOnectOu a rede elétrica Brasileira

a partir da década de 1970, fOi pOssível surGir cOm O desenvOlvimentO dOs

cOmpOnentes eletrônicOs

Page 34: Coleção Energia Vol 3

34

evolução

comogovernoamericano.Oprojetofoiiniciadoem

1943,duranteaSegundaGuerraMundial(1939-1945)

etinhacomoobjetivocomputaraçõestáticasde

guerra.Mascomosófoiconcluídodepoisdotérmino

doconflito,elepassouarealizaroperaçõespacíficas.

OfísicoCarlosBertulanirelataque,quandofoi

finalizadoecomeçouaoperar,oEniacocupavauma

salade140m².Logoapós,“noperíodode1945a

1951,irãosurgirosprimeiroscomputadores,nas

diferentesuniversidadesinglesaseamericanas,ao

mesmotempoemqueserãoconstruídasasúltimas

grandescalculadoras”,contaoengenheiroPhilippe

BretonnoseulivroHistória da informática.

Apartirde1951,essasmáquinascomeçaramaser

comercializadasedeixaramdeserexclusividadedas

universidadespesquisadoraseprogramasmilitares.

Inicialmenteutilizadoemgrandesempresas,foram

necessáriasalgumasdécadasatéqueocomputadorse

tornasseumprodutodeconsumodemassa,quetivesse

otamanhoeopreçoreduzidoseacapacidadeea

velocidadedeprocessamentoaumentada.

Oengenheiroeletricistaeprofessordoutorda

EscolaPolitécnicadaUniversidadedeSãoPaulo(Poli/

USP),JoséAntônioJardini,relataque,noBrasil,“para

usarumcomputadornadécadade1960,vocêtinha

quefazerumcontratocomaempresa,levarumasérie

decartõescomosdadosdoseucomputadoredeixar

láparaocomputadorlereprocessar;vocêlevavapara

acasaeolhavaosresultados,seerrasseumdado,

vocêperdiaoserviçoesósaberianodiaseguinte,pois

demoravahorasparaprocessarosdados”.

Diversosfatorescontribuíramparaqueaparelhos

eletrônicospassassemaintegrarnossasvidas

rotineiramente.Muitosdelesvãoalémdaquestãodo

desenvolvimentotecnológico.Sóatécnica,talvez,não

fossecapazsozinhadeprovocaraquiloquealguns,

inclusive,chamamderevoluçãotecnológicaouda

informação.ComoenfraquecimentodaGuerraFria

eosurgimentodadoutrinaeconômicaneoliberalista,

adotada,principalmente,pelosEstadosUnidosepela

Inglaterra,ospaísesestavamprontosparaexplorarem

odesenvolvimentodasindústriasdebensdeconsumo

edecapital,utilizandocomponentesdeeletrônica.Isso

alterou,significativamente,aformacomoaspessoas

serelacionavamcomosprodutosconsumidos.

Consumo

Oscomponenteseletrônicosforamresponsáveis

portornarequipamentoseaparelhosmenores,mais

baratosecommaiorprecisão.Dessaforma,acada

atualização,eramagregadasdiferentesfuncionalidades.

Comopassardosanosecomoaprimoramentoda

técnica,novastecnologiasforamsurgindo.AGuerra

Friacontribuiuparaodesenvolvimentotecnológico

dessasmáquinas,quandopaísesdoblococapitalistae

doblocosocialistainvestiamempesquisasmilitares.

Comaprimoramentodatecnologiadoscomponentes

eletrônicos,areduçãodocustodosprocessose

ogradualtérminodoconflitopermitiramquea

comercializaçãodoscomputadoresedeaparelhos

eletrônicoscomeçasse,especialmente,nosentão

chamadospaísesdeprimeiromundo.

Essesaparelhoseletroeletrônicoscriaramuma

novaformadeconsumoealteraramsignificativamente

avidaeasrelaçõesdetrabalhodassociedades

seguintes.Aantropólogadeconsumoeprofessorada

UniversidadeFederaldoEspíritoSanto(Ufes),Patrícia

Pavesi,explicaquearevoluçãotecnológicaéum

dosfatoresquetendeaalterarpadrõesdeconsumoe

hábitosdevida,ajudandoaexplicarasalteraçõesque

asociedadesofreu.

Provadissoforamosfenômenosprovocadosna

sociedadeocidentalpelorádioepelatelevisão,sua

sucessoracomoprincipalmeiodecomunicaçãode

massa.Orádio,criadonofinaldoséculodoséculo

XIX,eatelevisão,nadécadade1920,ganharam

grandepopularidadeapósasgrandesguerrase

alteraramaformacomoasfamíliasserelacionavam

comolar.Noperíodopós-guerras,possuirum

dessesdoisaparelhospassouarepresentarstatus

socialeelespassaramaserobjetosdacasaaserem

exibidosaosamigos,comosímbolosdemodernidade

esucessoprofissional.

AolongodasegundametadedoséculoXX,o

modelocapitalistaimperousobreosocialista,que

acentuouessasmudançasdehábitossociais.“Nosúltimos

anos,oconsumoaparececomoumsinalizadorsocial

dessasmudanças,inclusiveemseusexcessos.Dessa

forma,mudançasnospadrõesdeconsumoimplicam

mudançasnoestilodevida”,acrescentaPavesi.Foi

quandoosequipamentoseletroeletrônicossofreramum

substancialavançoemodernoscomponentespassarama

serconstruídoscomosaparelhos.

Assim,diversosfatorescontribuíramparao

sucessodaeletrônicanasociedadecontemporânea:

odesenvolvimentotecnológico,queculminouno

barateamentodosaparelhos,quefortaleceuoestímulo

aoconsumismoparagarantirstatussociale,assimpor

diante,todoselesalavancaramaprodução,oconsumo

O ábaco foi o primeiro equipamento manual de cálculo. Surgido na antiguidade, foi utilizado até o século XVII

Page 35: Coleção Energia Vol 3

35

esealimentavamciclicamente.

Quandoaeletricidadecomeçouaserinserida

nascidades,noBrasilentre1890e1920,ela

erarecorrentementeassociadaaoprogressoeà

modernidade.Quando,nasegundametadedoséculo

XX,aeletrônicacomeçouasefirmarcomotecnologia

dominante,pelamaioreficiênciaecontroledos

processos,possuirdispositivoseletroeletrônicosdeste

tipotambémpassouaserassociadoàatualidadeeà

modernização.

Componentes eletrônicos

Aeletrônicasempreestevepróximada

áreaelétrica,atépelosistemadealimentaçãoe

funcionamento.Massuaaplicaçãofoigradativa,a

partirdodesenvolvimentodatecnologia,utilizada

inclusiveemoutrasáreas.Antesdechegaresse

período,nofinaldoséculoXIXeiníciodoséculo

XX,quandoasusinasgeradorasdeenergiaelétrica

começavamaseinstalarnoBrasilparaabastecer

pequenasindústriasenúcleoshabitacionais,a

eletricidadeeraumprivilégiodepoucos.

Nessaépoca,asinstalaçõeserampontuais,as

usinasnãoseconectavamumasàsoutraseaenergia

produzidanãoerasuficienteparaabasteceratoda

população.Entretanto,maisdoqueumapolítica

excludente,onúmerorestritodebeneficiadosera

umalimitaçãotécnicaederecursosqueosprimeiros

empreendimentoselétricosbrasileirostinham.Eranesse

período,ainda,queaeletromecânicadominavaosetor.

Sóumpoucomaistardeéque“aeletrônica

começouaentrarnossistemaselétricos,antesda

eradaválvula,comoschamadosretificadores,

inicialmentedeselênioedepoisdegermânio”,conta

oescritortécnico,autordemaisde100livrosde

eletrônica,NewtonC.Braga.Aválvulafoiaprimeira

tecnologiaeletrônicautilizadaemlargaescala,

especialmentenaradiocomunicação,televisão,

computadoreseoutrosequipamentosdaprimeira

metadedoséculopassado.

Desenvolvidanadécadade1900peloamericano

LeedeForest,aválvulaeletrônicafoiutilizadacom

forçaatéadécadade1950,momentoemqueos

transistoresforamdesenvolvidos.Tambémconhecida

comoválvulatermiônicaouavácuo,elaéformada

poruminvólucrodevidrocomcomponentesmetálicos

noseuinterior,funcionandopeloaquecimentodeum

filamentometálico.Umadasprincipaisaplicações

daválvulaeletrônicafoinaradiocomunicação.

Comoelasfuncionavamapartirdoaquecimentode

seuscomponentes,eracomum,nesseperíodo,que,

paraseutilizarrádios,eraprecisoesperarqueestes

“esquentassem”atéestaremprontosparaseremusados.

DuranteaPrimeiraGuerraMundial(1914-1918),

acomunicaçãoviarádiofoiamplamenteempregada,

aproveitandoqueoconhecimentotécnicodos

aparelhoseletrônicosestavaconcentradonoscentros

depesquisasmilitares.Sóapósaguerraaindústria

eletrônicaefetivamentesurgiu,comoadventodas

emissõesradiofônicas,crescendorapidamente.“Entre

1922e1960,ototalanualdevendasdeequipamentos

eletrônicossubiudeUS$60milhõesparaUS$10,2

bilhões”,contaBertulani.

Masatécnicacomeçouamudartambém.

Nadécadade1950,asválvulascomeçaramaser

substituídaspelostransistores.Desenvolvidoem

1948pelosfísicosWalterBrattain,JohnBardeene

WilliamShockleynoslaboratóriosdaBellTelephone,

conhecidacomoBellLabs,nosEstadosUnidos,o

transistorrendeuumPrêmioNobeldaFísica,em

1956,aosinventores.Compostoporumpequenogrão

dematerialsemicondutor,noinício,erautilizadoo

germâniomas,posteriormente,foisubstituídopelo

silício,noqualeramligadostrêsoumaisterminais,em

geral,filamentosdeouro.

“Quandoostransistoressurgiramnaforma

comercialnadécadade1950,controlavamcorrentes

muitofracas.Dessaforma,aintroduçãodaeletrônica

nossistemaselétricosficoulimitadaatéqueos

semicondutoresevoluíramapontodepodercontrolar

O Eniac, primeiro computador digital eletrônico, surgiu em 1946 com o desenvolvimento das válvulas eletrônicas e ocupava um espaço de 140 m²

Page 36: Coleção Energia Vol 3

36

evolução

correntesintensas.Foiaépocaemqueaeletrônica

convencionalseseparoudaeletrônicadepotênciae

maiseletrônicapassouaserencontradanossistemas

elétricos”,esclareceNewton.

Masaimplantaçãodessasnovastecnologias

nãoerauniforme.OBrasil,porexemplo,estava

muitoatrasadoemtermosdeaplicaçãocomercial

dessesnovosdispositivos.Paraseterumaideia,

enquantoostransistoreseramcriadosecomeçavam

arevolucionaraeletrônicamundial,oBrasilainda

estavasedimentadonaeletrônicaanalógica,como

contaoengenheiroeletricistaeprofessordoutorda

EscolaPolitécnicadaUniversidadedeSãoPaulo(Poli/

USP)JoséAntônioJardini:“eramuitotrabalhoso

operarumausina,comsistemaelétricoantigamente,

porque,nadécadade1950e1960,vocêusavatelefone

erádioparaoperarosistema.Telefonavaparaausina

edizia‘desligaalinha’.Eraousodeeletrônica,de

comunicação,paraapoiarosetorelétrico”.

Essaatividadedecontrolemanualpormeiode

sistemasdecomunicaçãocomcomponenteseletrônicos

descritaporJardinierachamadadedespachodecarga.

MuitocomumemmeadosdoséculoXXnoBrasil,

começouasersubstituídoquandoasusinasforam

integradasaoSistemaNacionalInterligado(SIN),a

partirdadécadade1970,integrandoasusinasdo

setorelétricobrasileiro.Apesardenemtodaamalha

elétricadopaísestarinterligadaatualmente,autilização

deequipamentoselétricoseeletrônicosmelhorou

consideravelmenteocontroledeoperaçãoeos

processos,deixando-osmaisprecisos,seguroserápidos.

Apesardeteremdemoradoumtempomaior

paraseremintroduzidosnossistemaselétricos

depotência,ostransistoresforamrapidamente

incorporadosemequipamentoselétricosque

nãoexigiamgrandepotência,comonanascente

eletrônicadelazer,especialmentenospaísesmais

desenvolvidosdohemisférionorte.Comisso,

aválvulafoisubstituídaporessecomponente

eletrônicomaismoderno,rápido,baratoeeficiente.

Assim,osnovoscomputadoresconseguiramter

seustamanhosreduzidos,alémdocusto,que

foibarateado,edamelhoriadavelocidadedas

operações.Aindústriaeletrônicasepreparava

entãoparacresceremproduçãoelucratividadenos

anosseguintes.

Em1958,aGeneralElectriclançouumnovo

dispositivosemicondutormulticamadaschamado

tiristor.Comoadventodossemicondutores,asválvulas

foramsubstituídaspelostransistores,portiristores,

taiscomoosDiodosControladosdeSilício(SCRs),e

diversosoutrossemicondutoresdepotência,como

osTriacs,IGBTseMOSFETsdepotência.Odomínio

sobreaaplicaçãodosilício,utilizadonotransistor,foi

fundamentalparaosucessodaindústriaeletrônica,

paraaplicaçãonosistemaelétricodepotênciaepara

incorporaçãodessesaparelhoscomessescomponentes

navidacotidiana.

Odesenvolvimentodecomputadoresseaproveitou

tãofortementedessatécnicaque,emumaregiãoda

Califórnia,nasceuumconjuntodeempresasdosramos

deeletrônicaeinformática,apartirdadécadade1950,

queficouconhecidocomoValedoSilício,considerado

comoumaregiãodedesenvolvimento,devanguarda

edeinovaçãotecnológicanesseramo.ParaNewton

Braga,odesenvolvimentodatecnologiadosilício

foimuitoimportante,poispossibilitoujustamenteo

aparecimentodenovosdispositivossemicondutoresde

potênciae,aomesmotempo,microcontroladorescada

vezmenores,maisbaratosemaissofisticadosaponto

depossibilitaraimplantaçãodecontrolesdepotência,

comandos,inversoresemuitosoutrosdispositivosde

formasimpleseeficiente.

Odomíniodautilizaçãodesemicondutores

permitiuaindaacriaçãodoscircuitosintegrados,

entreofinaldadécadade1950einíciode1960.

Elessurgiramdanecessidadecadavezmaiorda

miniaturizaçãoedaeconomiadecustosdoscircuitos

eletrônicos.Admitiram,paraoscomputadores,

amultiprogramaçãoeaevoluçãodossistemas

operacionais.Tambémconhecidocomochip,um

circuitointegradoéumdispositivomicroeletrônico

quecontacommuitostransistores.Comdimensões

extremamentereduzidas,oscomponentessão

formadosempastilhasdematerialsemicondutor.

Jánadécadaseguinte,em1970,surgiramos

microprocessadores.TambémconhecidoscomoCPUs

ouunidadescentraisdeprocessamento,sãocircuitos

integradosquerealizamfunçõesdecomputaçãoem

umamáquina.AprimeiraCPUlançadafoioIntel

4004,em1971.Elamarcouépocaporque,atéentão,

diversostransistoresemchipstinhamqueserligados

umaumparafazerfuncionarocomputador.Com

omicroprocessador,todasasfunçõesecomandos

eramrealizadosapartirdeumúnicochip.Essas

novastecnologiaspermitiamavançosnãosónaárea

Quando os transistores surgiram

na forma comercial na década

de 1950, controlavam correntes

muito fracas. Dessa forma, a

introdução da eletrônica nos

sistemas elétricos ficou limitada

até que os semicondutores

evoluíram a ponto de poder

controlar correntes intensas

Page 37: Coleção Energia Vol 3

37

decomputação,mastambémnasindústriasquese

modernizavam,especialmentepelaautomaçãodeseus

processos;nostransportesurbanos;entreoutros.

Foinessadécadatambémqueaeletrônicade

potênciacomeçouaseraplicadaemmaiorescalaem

diversasaplicaçõesdosistemaelétricobrasileiro.A

eletrônicadepotênciapermitiuummelhorcontrole

demotoresparatraçãoelétrica,utilizadosemmetrôs

etrens;odesenvolvimentodedisjuntoresdeestado

sólido;assimcomoaaplicaçãodecomponentes

eletrônicosemdiversasoutrasaplicaçõesindustriais.

Foiem1974,porexemplo,queaprimeiralinhade

metrôdoBrasilfoiinaugurada,em14desetembro,na

capitalpaulista,ligandoJabaquaraàVilaMariana.

OdiretordeoperaçãodoMetrôdeSãoPaulo,

ConradoGravadeSouza,eoengenheiroeletricista

econsultormetroviário,PeterAlouche,relatamno

artigo“EvoluçãodatecnologianoMetrôdeSão

Paulo”algumasdasalteraçõesdoperíodo:“Erauma

épocadeimportantesinovaçõestecnológicasem

todosossetores–elétrico,eletrônicoemecânico,

comatelecomunicaçãoeainformáticasofrendo

umaverdadeirarevolução,emgrandeparte,fruto

daconquistaespacial.Ostécnicos,entãosouberam

aproveitaradequadamenteessesavanços,na

especificaçãodossistemasdesinalização,com

aadoçãopioneiraemlinhasnovasdemetrôda

conduçãoautomáticaedasupervisãoautomáticada

operaçãocomumacentralizaçãooperacionalpara

asupervisãoecontroleglobaldetodosossub-

sistemasapartirdeumcentrodecontroletotalmente

informatizado,inéditoparaosanos1970”.

Oaprimoramentodatécnicaeobarateamento

dosequipamentos,aliadosaodesenvolvimentoda

internet,permitiramqueumnúmeromuitomaior

depessoastivesseacessoaoconhecimentoeà

informação,oqueimplicaumapluralidadecadavez

maiordetecnologiaseferramentas.

Pesquisa: • Livro “História da Informática”, dePhilippeBreton.Unesp.• Livro “Memórias do computador: 25 anos de informática no Brasil”, deVeraDantaseSoniaAguiar.IDGComputerworlddoBrasil.• Artigo “Introdução à Informática – História da Informática – Um olhar pelo sistema”, deRaulSilvérioCoutinho.• Artigo “Do transistor ao microprocessador”, deEwaldoL.M.Mehl.• Artigo “História da Eletrônica”, deCarlosA.Bertulani.• www.newtoncbraga.com.br

Geração

Período

1940 – 1952

1952 – 1964

1964 – 1971

1971 – 1981

1981 – Hoje

Tecnologia eletrônica

Válvulas a vácuo

Transistores

Circuitos integrados

Microprocessadores

Circuitos com alta integração, VLSI (Very Large Scale Integration)

e ULSI (Utra Large Scale Integration)

Principais características

• Armazenamento de dados em cartões perfurados

• Surgem os primeiros tambores magnéticos

• Grandes computadores• Poucas horas de funcionamento

• Aplicação científica e militar• Tempo de operação:

milissegundos• Núcleos de ferrite, fitas e

tambores magnéticos são usados como memória

• Diminuição de tamanho• Mais rápidos

• Menor consumo de energia• Aplicação gerencial e

administrativa• Tempo de operação:

microssegundos• Evolução dos sistemas

operacionais• Miniaturização dos componentes

• Redução do tamanho• Menor custo

• Surgimento da multiprogramação

• Memória feita com semicondutores e discos

magnéticos• Surgimento do microprocessador

permitiu grande redução no tamanho

• Surgem muitas linguagens de programação

• Tempo de operação: nanossegundos

• Popularização do uso• Discos magnéticos de capacidade

muito grande• Inteligência artificial• Alta velocidade de

processamento• Alto grau de conectividade

• Tempo de operação: picossegundos

Gerações dos computadores

Fonte: Artigo Introdução à informática – História da informática – Um olhar pelo sistema, de Raul Silvério Coutinho e apresentação “Evolução dos Computadores”, de Alexandre Vitoreti de Oliveira, professor de Tecnologias para Sistemas de Informação da Unisul

Page 38: Coleção Energia Vol 3

38

nuclear Por Gildo Magalhães

ENERGIA ATÔMICAUma fonte para a “segunda onda” de eletrificação

Page 39: Coleção Energia Vol 3

39

Aampliaçãoexponencialdoconsumoenergético

aolongodostemposdeve-se,historicamente,a

avançostecnológicoscomoosquelevaramao

desenvolvimentodamáquinaavapor,domotor

elétrico,domotoraexplosão,daeletrônicaeda

micro-eletrônica,etc.Seéverdadequeahistória

dahumanidadepodesercontadacomoadascrises

energéticassucessivas,comoodesflorestamentoda

EuropanaIdadeMédiae,maiscontemporaneamente,

aescassezrelativadocarvão,dopetróleo,etc.,nãoé

menosverdadequeestaétambémahistóriadecomo

taiscrisesforamsuperadaspeloengenhocriativo

doserhumano.Abuscaporfontesenergéticas

abundantes,maiseficientesebaratasfazpartedo

padrãoculturalhumanodetodasasépocaselugares.

Aconquistadaenergianuclearé,nessesentido,

umdosrelatosmaisfascinantesdahistóriadaciência.

Seuusocontroladofoiconsideradopelocientista

LinusPauling(PrêmioNobeldequímicaem1954

eNobeldapazem1962)comoamaisimportante

contribuiçãocientíficadesdeaconquistadofogo

pelohomemprimitivo.Aradioatividadenaturalde

certassubstânciasdespertouaatençãodoscientistas

principalmentenasúltimasdécadasdoséculoXIX,

quandosesucederaminúmerasinvestigaçõese

descobertas:osraioscatódicosealuzfluorescente,os

raiosXevidenciadosporRöntgenem1895(equelogo

setransformaramemumusopioneiroepacíficoda

energianuclearnamedicina)earadiaçãodourânio.

Essesfenômenosapontavamparaaexistência

deumaestruturainternadoátomoeváriosmodelos

hipotéticosforamsucessivamentepropostose

debatidos,emespecialosdeThomson,Rutherforde

Bohr.NoiníciodoséculoXX,chegou-seaospoucos

aumconsenso,dequehaveriaumnúcleodecarga

elétricapositivaondeseconcentravaamassadecada

átomoeemvoltaelétrons,decarganegativa.

Emseguida,discutiu-seintensamenteporque

algunsnúcleoseramestáveis,aopassoqueoutros

sedesintegravamnaturalmente,emitindoradiação,

fenômenoespecialmenteestudadonaFrança

pelocasalCurie,MarieePierre,equeoslevouà

descobertadenovoselementosquímicos,comoo

rádio.Em1932,novasexperiênciasamadureceram

aideiadequeointeriordonúcleoatômicocontinha

doistiposdeconstituinte:opróton,comsuacarga

elétricapositiva,eonêutron,semcarga,mascom

propriedadesespeciais,poisalgunsconseguiam

atravessarparedesespessas.Começou-seausaros

recém-descobertosnêutronsparabombardearátomos

pesadoscomoourânio,atéqueumapesquisadora

alemã,LiseMeitner,dolaboratóriodeOttoHahn,

percebeuquenesseprocessoaconteciaaquebrado

núcleoatômico,oufissãonuclear,dandoorigema

átomosmaisleveseliberandoumaenergiaenorme,

quesepodiacalcularusandoafórmuladeEinsteinde

conversãodamatériaemenergia.

Seriapossívelmanterumareaçãoquímica

defissãoduranteumtempoemqueessaenergia

liberadapudesseseraproveitada?Comostrabalhos

deEnricoFermirealizadosjánosEstadosUnidos

duranteaSegundaGuerraMundial,estabeleceram-

seascondiçõesteóricasepráticaspararesponder

afirmativamente,pormeiodachamadareação

emcadeia,queaproveitavaoprodutodeuma

fissãoemitindonovosnêutronsque,porsuavez,

bombardeavamoutrosnúcleospesados,criandoum

efeitomultiplicadoremcascata.Estavaassimrealizado,

decertaforma,ovelhosonhodosalquimistasde

transmutaçãodamatéria.

NosecretoProjetoManhattan,osamericanos

coordenaramentãoummaciçoesforçodeequipes

Page 40: Coleção Energia Vol 3

40

nuclear

científicas,lideradasporRobertOppenheimerpara

produzirumformidávelartefatobélico,cujoprotótipo

foitestadocomêxitoemLosAlamosem1945.A

seguirprepararam-seasbombasatômicasqueseriam

desnecessáriasecruelmentelançadascontraoJapão

emHiroshimaeNagasaki,pondofimàSegunda

GuerraMundial.

Oqueémenosconhecidodessahistórianuclearé

quejáhátempostinha-sepensadoemusaragrande

liberaçãodecalorpromovidapelareaçãonuclearpara

esquentaráguaeassimpromoverageraçãotérmica

deeletricidade.Aampliaçãoemgrandeescalados

primeirosreatoresnuclearescomessafinalidadese

darianoiníciodadécadade1950,graçasaesforçosde

cientistas,comoocasalfrancêsFrédéricJolioteIrène

Curie,que,apartirde1948estabeleceramumplano

demetasdoEstadoparaimpulsionaraeconomia

debilitadapelaguerra,usandocomomolapropulsora

oconsumodeeletricidadegeradanuclearmente.A

comunidadeinternacionalpercebeuqueaenergia

nuclearpermitiriaumaindependênciadaimportação

dopetróleoárabe,como,aliás,evidenciou-secoma

criseegípcia-israelensedoCanaldeSuez,deflagrada

em1956.

OprogramaÁtomosparaaPazfoilançado

em1953pelopresidenteEisenhower,destinadoa

incentivarousopacíficoeapesquisadaenergia

nuclear,tornando-seumgrandeincentivopara

desenvolveracorrespondenteindústriaamericana.As

décadasde1960e1970viramumaexpansãonotável

daproduçãonucleardeeletricidade,atéqueaopinião

públicafoimobilizadacontra,emvirtudedosacidentes

dosreatoresdeThreeMileIsland(1979)nosEstados

UnidosedeTchernobyl(1986),naUcrânia.

Nesseentremeio,ousonuclearpacíficose

expandiu.Alémdageraçãoelétricaparausopúblico,

amarinhadosEUA,tendooalmiranteRickoverà

frente,equipousubmarinoscompropulsãonuclear–o

primeirosubmarinoNautilusfoiassimdenominado

emhomenagemaJúlioVerne,queemVinte Mil

Léguas Submarinashaviadescritoumaembarcação

dessetipo.Logo,aAlemanhaconstruiuoprimeiro

cargueironuclear,oOttoHahn.Conhecimentosnaárea

energéticaacabaramrevertendoparaoutrasaplicações

nucleares,comonamedicina(rádio-isótoposeoutros

elementosradioativosparatratamentoecurado

câncer)enaagricultura,parairradiaçãodealimentos

–ummétodoeconômicodeconservaçãosemalterar

suaaparênciaougosto,aplicávelamuitomaisclasses

dealimentosdoqueatradicionalpasteurização.Cabe

citaraquioavançobrasileironessasáreas,verificado

pelotrabalhodeinstituiçõescomo,respectivamente,

oInstitutodePesquisasdeEnergiaNuclear(Ipen)na

CidadeUniversitária,emSãoPaulo,eoCentrode

EnergiaNuclearnaAgricultura(Cena)daUniversidade

deSãoPauloemseucampusdePiracicaba.

Afissãonuclearnãoéaúnicaformadeproduzir

energiaapartirdonúcleoatômico.Existetambém

apossibilidadedesejuntarnúcleosdeátomosleves,

formandoumelementomaispesado–éafusão

nuclear.Oprocessoédetalmaneiramaiseficiente

quetodasasoutrasformasdeproduçãoenergética,

queelepôdefinalmenteexplicaralgoqueintrigava

oscientistashámuitotempo:deondeasestrelas

tiramocombustívelparamantersuastemperaturas

extraordinariamentealtas?Arespostaéqueelas

realizamreaçõesdefusãonuclearcomofonte

energética,comoonossoSol,quefundeátomos

dehidrogênio(trata-sedeisótoposdehidrogênio,

deutérioetrítio;isótopossãovariantesdeumátomo,

cujosnúcleostêmomesmonúmerodeprótons,mas

quantidadesdiferentesdenêutrons),transformando-os

emhélio.

Infelizmente,talcapacidadetambémfoiutilizada

paracriararmaseabombadefusãodohidrogênio

foiexperimentadapelosEstadosUnidosem1952,

Page 41: Coleção Energia Vol 3

41

a cOnquista da enerGia nuclear é um dOs relatOs mais fascinantes da história da ciência. seu usO cOntrOladO

fOi cOnsideradO pelO cientista linus paulinG cOmO a mais impOrtante cOntriBuiçãO científica desde a cOnquista dO

fOGO pelO hOmem primitivO.

Page 42: Coleção Energia Vol 3

42

nuclear

em tOdas as aplicações Bélicas, a enerGia nuclear

é liBerada de fOrma descOntrOlada, aO passO que nO usO

pacíficO se delimita e se cOnseGue desacelerar de fOrma cOntrOlada

a prOduçãO de nêutrOns na reaçãO em cadeia. as usinas nucleares mOdernas sãO pOtencialmente

mais seGuras dO que Outras fOrmas de

GeraçãO, inclusive a hidrOeletricidade.

intensificandoacorridaarmamentista,transformada

emguerra“fria”nasdécadassubsequentes.Apesar

disso,aenergiadefusãotambémseprestadeforma

notávelparaaproduçãodeusinaselétricastérmicas.

Oproblematemsidomanterareaçãodefusãoa

temperaturasaltasporumtemposuficienteparaque

oprocessosejaeconômico,ehouvegrandesavanços

napesquisatecnológicademateriaiseprocessosnesse

sentido,comonaimplosãoalaserenosgeradores

toroidais(“tokamak”).

Nãohádúvidadequeaenergianuclear

possibilitadapelafusãoseapresentanomomento

comoamaisinteressante,poisamatéria-primapara

afusãoéabundante,servindo,porexemplo,aágua

pesada(comosisótoposdehidrogênioeexistente

nosmares)eolítio(queseencontraportodapartena

crostaterrestre).Assim,virtualmente,qualquernação

teriaemprincípioacessoàmatéria-primaenergética,

ficandolivredecartéisdefornecedores.Enquanto

afusãopuranãosetornacomercial,umasolução

alternativaéoreatorhíbridodefissão-fusão,emquea

energianucleardafissãopodeservirparaaigniçãoda

reaçãodefusão.

Anecessidadedegerareletricidadecontinua

sendoumdosmaisfortesimpulsionadoresparao

usopacíficodaenergianucleare,comoreferido,a

Françafoipioneiranesseesforço.Issosedeveua

diversosfatores,entreelesarelativadificuldadede

aproveitarageraçãohídricanosriosfranceseseo

altonívelcientíficoetecnológicodopaís,quepôde

seraplicadoàindústrianuclearelevouaumcustodo

quilowatt-horamaisbaixodoquenasusinastérmicas

queusamcombustívelfóssil,bemcomomaisbaixo

doqueaenergianuclearemoutrospaíseseuropeus.

Oresultadoéque80%daeletricidadefrancesaé

deorigemnuclear.Há,porém,outrosmotivos,que

levaramàexpansãodaeletricidadedeorigemnuclear

poroutrospaísesdomundo,como:Bélgica(60%da

matrizelétrica),Hungria,SuéciaeCoreiadoSul(todos

acimade40%),Suíça,Espanha,Alemanha,Japão

(30%),EstadosUnidoseGrã-Bretanha(20%),Canadá

eArgentina(15%).Sãoaotodo44paísesemquea

energianucleardesempenhaalgumpapelrelevantena

matrizenergéticanacional.

Paraentenderoporquêdessaopção,énecessário

atentarparaváriosfatores,começandocoma

concentraçãodeenergiaimplícitanaeletricidade

deorigemnuclear.Umausinacompotênciade1

Gigawattnecessitade35toneladasdeurâniopara

suprirduranteumanoumacidadecomummilhão

dehabitantes;sefosseumatérmicaacarvãoseriam

necessárias2milhõesdetoneladasdehulha.

Outracomparação:onaviomercanteOttoHahn

operoudurantenoveanosconsumindoapenas55

quilosdecombustívelnuclear.Adensidadeenergética

(quantidadedeenergiageradaporunidadedemassa

docombustível)dourânionaturalemumgeradorde

últimageração(comregeneraçãodecombustívela

partirdochamado“lixo”atômico)émaisde500mil

vezesmaiordoqueadagasolina–permitindoque

ocustodaeletricidadegeradasejacompetitivocom

odaprópriahidroeletricidade.Casoseviabilizeo

reatordefusão,adensidadeenergéticaseriaaindano

mínimo14vezesmaiordoquenomelhorreatorde

fissãodeurânio.

Emtodasasaplicaçõesbélicas,aenergianuclear

éliberadadeformadescontrolada,aopassoqueno

usopacíficosedelimitaeseconseguedesacelerar

deformacontroladaaproduçãodenêutronsna

reaçãoemcadeia.Asusinasnuclearesmodernassão

potencialmentemaissegurasdoqueoutrasformas

degeração,inclusiveahidroeletricidade.Paraisso

contribuiuodesenvolvimentodoconceitodefailsafe,

oufalhasegura,istoé,emcasodequalquerfalhaque

possacomprometerasegurançadosistema,oprocesso

élevadoàinterrupção.

Page 43: Coleção Energia Vol 3

43

Esseprincípiojátinhasidointroduzidodesde

meadosdoséculoXIXnatecnologiaferroviária

paracontroledotráfego(achamadaengenhariade

“sinalizaçãoferroviária”),comousodecomponentes

ditos“vitais”–emcasodesituaçãodeinsegurança

oudefalhadoprópriodispositivodesegurança,o

sistemadecontroleinterrompiaacirculaçãodetrens,

gerandoumsinalvermelho–maismodernamente

essesistemaatuanosprópriostrenseleva-osà

paradaautomática.Essasnoçõesdesegurançaforam

generalizadaseestendidasàsregrasoperacionais,aos

programasdecomputadoreoutrositensdascentrais

nucleares–oquepodeseratestadocomparando-seo

projetoconceitualdeusinasmodernascomumaantiga

comoadeTchernobyl,concebidadentrodepremissas

maisadequadasaousomilitardoquecivildaenergia

nuclear.

Comessasmedidas,aenergianucleardefissão

efusãotorna-semaisseguradoqueviajardeavião

oudemetrô.Asegurançadecorredosaltosíndices

deconfiabilidadedasusinasnucleares,deseus

componenteseprocessos,quesãoresultadodo

investimentointensivoemtecnologia.Aprópriacarga

radioativaaquetodapessoaestáconstantementesujeita

noplaneta(devidoàradiaçãoterrestrenatural,aosraios

cósmicos,etc.)écercadedezvezesmaiordoqueaquela

recebidapelotrabalhadornasusinasnucleares.

Outrofatordeatratividadeparaaenergianuclear

temsidoaprogressivareciclagemdosresíduos

radioativos.Aexpressão“lixoatômico”é,aliás,

inteiramenteinadequada,poisosprodutosdafissão

nuclearsãoricosemprodutoscujaaplicaçãotem

despertadocadavezmaisaatençãodoscientistas.Os

produtosdasreaçõesnuclearescontêmumagrande

variedadedeisótoposúteisparaumasériedeprocessos

naturais,algunscompropriedadesinovadoras,que

sóagoracomeçamaserestudadas.Adotando-se

esseenfoquetecnológico,aenergianuclearpodeser

consideradaaomesmotempoumadasmaislimpas

queháeumaverdadeirafábricadenovosmateriais.

Finalmente,paraentenderaadoçãodaenergia

nuclearfeitaporváriospaísesdeve-selembrarque

nãoédesprezívelocustodetransmissãodaenergia

elétrica.Nocasodasbarragenshidrelétricas,seu

localédefinidoporcritériosdedesnível,vazão,área

dealagamento,etc.enormalmenteageraçãofica

acentenasoumilharesdequilômetrosdoscentros

consumidores,necessitando-sedeextensaslinhas

detransmissãodealtatensão,oquetemencarecido

consideravelmenteaeletricidade.

Comoocombustívelnuclearpodeserdeslocado

aumcustorelativamentebaixoatéausina,pois

graçasàjácitadaaltadensidadeenergéticasetrata

dequantidadescomparativamentepequenasde

combustível,ascentraispodemserlocalizadaspróximas

aosconsumidoreseatéseremlevadasparalocais

aindapoucopovoados,comoumvetorparainduzir

odesenvolvimentoeconômico(conceitodecidades

“nuplex”).Istopermiteplanejarcomplexosagro-

industriaisoudeextraçãoebeneficiamentodeminérios,

esuarespectivainfraestrutura,comumaflexibilidade

maiordoquecomoutrasfontesdeenergia.

NoBrasil,coubeaumcientistaemilitaraofinal

daSegundaGuerraMundialchamaraatençãoda

necessidadedesepesquisareproduziraenergia

nuclear.OalmiranteÁlvaroAlberto(1889–1976),que

eratambémquímicoeempresário,foieleitopresidente

daComissãodeEnergiaAtômicadarecém-criada

OrganizaçãodasNaçõesUnidas(ONU),cargoem

queseempenhouparagarantiroacessoàenergia

nuclearaospaísesemgeral,enãosomenteparaas

superpotências.Estasuaposiçãocausou-lhemuitos

problemaspolíticos,principalmente,porpartedos

EstadosUnidos.NoBrasil,ÁlvaroAlbertoconseguiu

criaroConselhoNacionaldePesquisas(CNPq)em

1951,importantesuporteparaodesenvolvimento

nãO há dúvida de que a enerGia nuclear pela fusãO se apresenta cOmO a mais interessante,

pOis a matéria-prima para a fusãO é aBundante, servindO, pOr exemplO, a áGua

pesada e O lítiO - recursOs aBundantes.

Page 44: Coleção Energia Vol 3

44

nuclear

científicoemgeral.

Apósumperíododeinstalaçõesexperimentais

depequenoporteeoestabelecimentodegrupos

depesquisa(emSãoPaulo,RiodeJaneiroeMinas

Gerais),jáduranteoperíododegovernomilitarpós-

1964,foicompradaausinanucleardeAngra1(depois

batizadacomonomedeÁlvaroAlberto),quecomeçou

aserconstruídaem1972massóentrouemoperação

comercialapartirde1985.Estausinasofreuatrasos

diversos,masaacusaçãomaiorquesepodefazeré

tersidocompradadosEstadosUnidosnaformade

“caixapreta”,sempermitiroacessopelosbrasileirosà

suatecnologia.Mesmocomtantosproblemas,deve-se

ressaltarqueAngra1éresponsávelporsupriruma

importantezonaindustrializadanosudestebrasileiro

eumsinaldesuaimportânciafoique,duranteo

dramáticoapagãoregistradoem2001,elacontribuiu

paraqueasituaçãonoEstadodoRiodeJaneironãose

tornasseaindapior.

DepoisdeAngra1foiassinado,aindaduranteo

períodomilitar,umacordodecooperaçãonuclearentre

oBrasileaAlemanhaOcidental,quetrouxealguns

novosesériosproblemas–sobrelevandoqueparte

datecnologiavendidapelosalemãesaindanãoera

testada.DesseacordoresultaramasusinasdeAngra

2e3(aindanãoterminada).HojeAngra1eAngra2

abastecemquasemetadedademandaenergéticado

EstadodoRiodeJaneiroerepresentamcercade2%

damatrizdegeraçãobrasileira.Umprogramamilitar

secretoenvolvendoaenergianuclearfoidenunciado

nogovernoCollor,tendosidodescontinuadoem

1991.Mesmoassim,permaneceuemvigênciaum

acordodepesquisanuclearenvolvendoaMarinha,a

UniversidadedeSãoPauloeoInstitutodePesquisas

EnergéticaseNucleares(IPEN)paradesenvolverum

protótipodegeradorelétricoparasubmarino.

Apesardoscortesdrásticosdeverbaseda

faltadeapoiooficial,aMarinhacontinuousuas

pesquisasemIperó,próximoaSorocaba,nointerior

deSãoPaulo.Ofrutodessapersistentebatalhafoi

alcançarem2006ocompletodomíniodociclode

enriquecimentodourânio,aonívelnecessárioparaa

produçãodeeletricidade–ourânionaturalprecisaser

“enriquecido”porisótoposquepossibilitemmantera

reaçãoemcadeia.TalfaçanhapermitiuaoBrasilentrar

noseletoclubedosquedominamessatecnologia,

podendo-seimaginarumfuturodeindependência

econômicacomrelaçãoaocarteleuropeude

enriquecimentodourânio–oquecausouverdadeira

celeumainternacional,tendoinclusivesidomotivo

paraaAgênciaInternacionaldeEnergiaAtômicafazer

vistoriaemIperócomopretextodecomprovarse

haviaintençãodefabricararmasnucleares.

SeoBrasilatualmentedominatodoociclodas

diversasetapasdefabricaçãodoelementocombustível,

poroutrolado,pode-seconsiderarumanação

favorecidaporpossuirenormesjazidasdeminério

(umadasmaioresreservasmundiais,naformade

uraninita),principalmenteasdeLagoaReal(Bahia)

eItatiaia(Ceará).Apenasumquartodoterritório

nacionaljáfoidevidamentemapeadoquantoaisso,

masnessaregiãojáseconstatouqueháimensas

reservasdeminério(300.000toneladas).

Namatrizenergéticaésaudávelhaverdiversidade

e,dependendodediversoscondicionantessócio-

econômicosegeo-climáticos,asdiversasfontes

energéticasserãorecomendáveis,tantoastradicionais

quantoasconsideradasalternativas,semexclusão.

Observa-se,noentanto,queainsistêncianasenergias

alternativasemdetrimentodasenergiastradicionais

representamuitasvezesumdesdobramentodo

pensamentomalthusiano,derivadodavisãodepolítica

econômicadoinglêsMalthusaofinaldoséculo

XVIII,segundoaqualosrecursossãofinitoseseu

esgotamentocomprometeopadrãodevidadosmais

desenvolvidos.

Essaideiatemsetraduzidonosúltimostempos

empalavrascujaboaintençãoénotável,masque

frequentementeaparecemenvoltasemummantode

obscuridade,taiscomo“crescimentosustentável”.É

precisoevitarquesobumaideiaútiledeapelopopular

seescondaumaintençãodediminuiropotencial

quenecessitaserliberadopelaindustrializaçãoe

plenoempregodaeconomia.Énestascondições

queotermo“sustentável”nemsempreébem

entendido,podendosetransformarapenasemuma

justificativadeadotarumcrescimentopaliativo,

abaixodonecessárioparaoplenoempregoprodutivo

Page 45: Coleção Energia Vol 3

45

a enerGia nuclear de fissãO e fusãO tOrna-se mais seGura dO que viajar de aviãO Ou de

metrô. issO pOrque Os altOs índices de cOnfiaBilidade das

usinas nucleares, de seus cOmpOnentes e prOcessOs, sãO

resultadO de investimentO intensivO

em tecnOlOGia.

queviriacomodesenvolvimentoeconômico

acelerado.Oconservacionismoquandoaliadoao

anti-industrialismodeixadeladoapotencialidade

pararealizarumcrescimentovirtualmenteilimitado,

principalmenteseforlevadoemcontaopotencialde

seresolverascrisespelousodacapacidadecriadorada

mentehumana.

Apolíticaenergéticafazpartedoplanejamento

estratégicodasnaçõesindependentesparacriar

eampliarsuainfraestrutura.Semenergiadealta

densidade,nãohámeioparaseatingirobem-estar

socialcomumaboaqualidadedevida,oqueestá

intimamenteligadoaosobjetivossociaismaisamplos

easeremdistribuídosdeformamaisjustaeequitativa,

comohabitação,saúde,educaçãoecultura.

Nestesentido,adistribuiçãodoconsumo

energéticoéaltamenteconcentradanomundoeno

Brasil,emparticular.Cercadeumterçodapopulação

mundialnãotemacessoàeletricidadeeoBrasil

consomeemmédiatrêsvezesmenoseletricidadedo

queaEspanhaouPortugaleseisvezesmenosdoque

osEUA.Háumademandareprimidadeeletricidade,

queseevidenciarácadavezmaisclaramenteàmedida

quehouverasubstituiçãodoscombustíveisfósseis,

comoporexemplo,nostransportes,semfalarnorisco

desériosecontinuadosapagões.Nãopareceremoto

falarnanecessidadedeumasegundaondamundialde

eletrificação,aexemplodaquelaqueocorreunoinício

doséculoXX.Aquestãonucleartemsidopalcode

grandescontrovérsias.

Paraestanovafasedeeletrificação,énecessário

saberalgodessahistóriadaenergianuclearpara

entendercomoasuacontribuiçãotenderáacrescer

comoesgotamentodasfontesconvencionaisepela

impossibilidadedasfontesalternativassupriremessa

demandareprimidadeformasignificativaeeconômica.

Algumas curiosidades envolvendo a energia nuclear

1) Hápoucosdomínioscientíficosetecnológicos

emqueapresençadasmulherestenhasidotão

significativaquantonapesquisanuclear.Elas

desempenharamnestesetorumpapelprotagonistade

primeironível,emumaproporçãomuitomaiordoque

aquecorrespondeàsuapresençanasprofissõesde

física,químicaouengenharia.Pode-sedizerquesem

aparticipaçãofeminina,desenvolvimentoscruciaisda

energianuclearnãoteriamsidopossíveisnaépocae

nascircunstânciasemqueocorreram.Umalistamais

completaserialonga,masapenasparacitaralgumas

dessasmulheres,lembramososnomesdeMarieCurie,

IrèneCurie,LiseMeitner,IdaNoddack,Marguerite

Perey,MariaGoeppert-Meyer,ElisabethRona,Mareitta

Blau,EllenGleditscheLeonaWood.

2) OalmiranteÁlvaroAlbertotentou,semconseguir,

umalicençadosamericanosparaimportarumacentral

nucleardosEUAem1953.Aalternativaentãopor

eleimaginadafoicomprarnaAlemanha,em1954,as

partescomponentesdeultracentrífugaspararealizar

umdosprocessosparaenriquecimentodeurânio.Com

esseestratagema,asautoridadesnorte-americanasnão

perceberamoqueseescondianocarregamentoque

partiriaemnaviodoportodeHamburgo.Noentanto,

partiudopróprioItamaratiumadenúnciadofatoàs

autoridadesnorte-americanas,queembargaramo

despacho,poisaAlemanhaeraentãoumpaísainda

militarmenteocupadopelosAliados.

3)Houvemuitofolcloreemtornodanecessidadede

aprofundarasescavaçõesparaosalicercesdeAngra

1.Dizia-sequeausinaestavasendoconstruídaem

terrenoinapropriado,algoqueseriasabidoatépelos

indígenas,quechamavamaquelelocaldeItaorna,ou

pedrapodre.OcorrequeapraiadeItaornaderivaseu

nomedeumpicodefrontenaSerradoMar,estesim

possivelmentechamadodeItaornaporalgummotivo

legítimo...Pesquisa: Guilherme Camargo. O fogo dos deuses. Rio de Janeiro: Contraponto.D. Hémery, J.-C. Debier, J.-P. Deléage. Uma história da energia. Brasília: Edunb.Bruno Latour. “Joliot: a história e a física misturadas”. Michel Serres (Ed.), Elementos para uma história das ciências, vol. 3. Lisboa: Terramar. Paulo Marques. Sofismas Nucleares. São Paulo: Hucitec.S. Motoyama, J.C.V. Garcia (Org.). O almirante e o novo Prometeu. São Paulo: Edunesp. Jonathan Tennenbaum. Energia nuclear. Rio de Janeiro: MSIa.Jonathan Tennenbaum. A economia dos isótopos. Rio de Janeiro: Capax Dei.

Gildo Magalhães dos Santos é professor livre-docente em História da Ciência na

Universidade de São Paulo (USP).

Page 46: Coleção Energia Vol 3

46

sob um olhar Por Renato de Oliveira Diniz

A CONSTITUIÇÃO DA CESP COMO FATOR DE DESENVOLVIMENTO DA ENGENHARIA

HIDRELÉTRICA BRASILEIRA

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Usina Euclides da Cunha em obras (rio Pardo, SP, 1956), uma das primeiras hidrelétricas construídas com investimentos do tesouro paulista. Sua construção foi iniciada em 1954 pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) e inaugurada em 1960 pela Companhia Hidrelétrica do Rio Pardo (Cherp), uma das estatais antecessoras da Cesp.

Page 47: Coleção Energia Vol 3

47

Nocomeçodemarçode1980,aEletronorte

construíaamaiorusinahidrelétricainteiramente

brasileira–Tucuruí,8.360MW–norio

Tocantins,noestadodoPará,quandoasobras

foramatingidaspelamaiorcheiaobservada,no

séculoXX,nesserio.Acheia,entreascidades

deMarabáeTucuruí,nãofoiprovocadapela

construçãodausina,poisocorreuforadaárea

dealagamentodoreservatórioeorioaindanão

estavarepresado;mastornou-sesériaameaçaà

continuidadedaconstruçãodausinaserápidas

eeficientesmedidasnãofossemtomadaspela

Eletronorteepelaempresaresponsávelpelas

obrascivis(CamargoCorrêa).Paraaltearem

poucosdiasaensecadeira(barragemprovisória

que‘seca’partedoleitodorioparaaconstrução

dasestruturasdefinitivasdeconcreto),a

Eletronortecontoucomacooperaçãoda

CompanhiaEnergéticadeSãoPaulo(Cesp),no

fornecimentodeinformaçõesarespeitodas

vazõesedaschuvas.Acontribuiçãofornecida

pelacompanhiapaulistafoiimportante,pois

forneceusubsídiosparaaequipeque,pordiase

noitesseguidos,transformouoquepoderiaserum

dosmaioresdesastresdaconstruçãohidrelétrica

noBrasil,emumaprovadacapacitaçãoda

engenhariabrasileiranessaárea.Aexperiência

desenvolvidanoestudo,noprojeto,naconstrução

enaoperaçãodeusinasgeradorasdemédioe

degrandeportepossibilitou,apartirdosanos

1950,principalmentenosestadosdeSãoPaulo,

MinasGeraiseRioGrandedoSul,acriaçãode

conhecimentotécnicoedetecnologianecessários

paraaexpansãodessesetornoBrasil.

Aassistênciatécnicafornecidapela

companhiapaulistafoiimportanteparanortearo

trabalhodaequipeque,pordiasenoitesseguidos,

heroicamentetransformouoquepoderiaserum

dosmaioresdesastresdaconstruçãohidrelétrica

noBrasil,emumaprovadacapacitaçãoda

engenhariabrasileiranessaárea;cujaexperiência

desenvolvidanoestudo,noprojeto,naconstrução

enaoperaçãodeusinasgeradorasdemédioe

degrandeportepossibilitou,apartirdosanos

1950,principalmentenosEstadosdeSãoPaulo,

MinasGeraiseRioGrandedoSul,acriaçãode

conhecimentotécnicoedetecnologianecessários

paraaexpansãodessesetornoBrasil.

ACesp,resultadodafusãodeonzeempresas,

foicriadaemdezembrode1966,tendocomo

principalacionistaotesourodoEstadode

SãoPauloesecaracterizava,jánoiníciodos

anos1980,comoempresaportadoradeparte

significativadoconhecimentoacumuladonopaís

datecnologiadeconstruçãodegrandesusinas

hidrelétricas.Acooperaçãotécnicafornecidaà

EletronortenaconstruçãodeTucuruídemonstraa

‘expertise’daempresageradorapaulista,quenão

setraduziaapenasnosconhecimentostécnicos

deprojeto,construçãoeoperaçãotécnicadessas

centraishidrelétricas.

Desdesuaconstituição,ao‘herdar’asobrase

projetosemexecuçãoporsuasantecessoras,seu

corpotécnicoprecisoudesenvolverapercepção

dequeconstruirumausinaqueaproveitaaforça

daságuasdeumrioparagerarenergiaelétrica

pressupõeumasériedenecessidadesque,em

umprimeiromomento,podeparecerapenaso

conhecimentosobrecomodesenvolveramaior

capacidadepossíveldeseproduzirquilowatts/

horaapartirdaconstruçãodeumabarragemede

umacasademáquinas.Foiprecisodesenvolver

métodosdetrabalhoquetambémdessemconta

dasdimensõessociais,culturais,econômicase

ambientaisdemodoabrangenteecomplexo.

Apesardeacontecercomdezanosdeatraso,

acriaçãodaCespfoiopassoinstitucionalque

marcouedefiniuaimplantaçãodegrande

partedasdiretrizesestabelecidasnoPlanode

EletrificaçãodoEstadodeSãoPaulo,estudo

encomendadopeloDepartamentodeÁguase

EnergiaElétricadaSecretariadeViaçãoeObras

Públicasdogovernopaulistaeapresentado,em

1956,pelaCompanhiaBrasileiradeEngenharia

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Durante a construção da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira (rio Paraná, SP/MS, anos 1960) foi necessário o desenvolvimento de vários estudos, muitos deles pioneiros no país, resultado da cooperação da Celusa/Cesp, do Instituto de Pesquisas Técnológicas (IPT) e das empresas envolvidas com sua construção.

Page 48: Coleção Energia Vol 3

48

sob um olhar

(CBE)que,em1950,entregaraplanosemelhante

aogovernodeMinasGerais.

OPlanodeEletrificação,apósumestudodas

perspectivasdedesenvolvimentodaeconomia

paulistaedeumaanálisehistóricoinstitucional

deseusetorelétrico,defineaformacomo

deveriasedaraintervençãoestatalnaprodução,

transmissãoedistribuiçãodaenergiaelétrica

emSãoPaulo.Alinhadiretrizeraacriação

imediatadeumaholdingcontroladapelo

tesouroestadual(CentraisElétricasPaulistas–

CELP)queseriaresponsávelpelaimplantaçãoe

operaçãodeumsistemadeusinasgeradorasde

potênciasuficienteparadarbaseeincentivar

ocrescimentoeconômicodoEstado;deum

sistemadetransmissão,interligadoecoordenado

pelaempresa;edaincorporaçãodosnegócios

dedistribuiçãoondenãohaviainteresseou

disponibilidadedeinvestimentosporparteda

iniciativaprivada.Ograndepodereconômico

eaforteinfluêncianavidapolíticanacionale

paulistadogrupoLightquedominavaomaior

mercadobrasileirodedistribuiçãodeenergia

elétrica(eixoSãoPaulo-Rio)dificultoua

constituiçãodaCelp,depoisCesp,imediatamente

apósaapresentaçãodoPlanopaulista.

Noentanto,aatuaçãodaCespedetrês

desuasantecessorasestatais(Uselpa,Cherp,e

Celusa),comoconsequênciadiretadaaplicação

deseusobjetivosinstitucionais,provocou

odesenvolvimentodoramodaconstrução

hidrelétricadaengenhariabrasileira:o

planejamentoeimplantaçãodasusinas,sistemas

detransmissãoeredesdedistribuiçãodemandou

umintensoesforçodasdiretoriasdeengenharia

eplanejamentodaempresa,dasempresas

projetistascontratadasedasconstrutoras

encarregadasdaexecuçãodosprojetos.Esse

esforçotraduziu-se,alémdaimplantaçãofísicado

parquegerador,constituídoporgrandescentrais

hidrelétricas,integradoentresieomercado

consumidor,porumconjuntodeextensaslinhas

detransmissão;produziutambémexperiências

econhecimentosqueaindahojedestacama

engenhariahidrelétricabrasileiranocenário

internacional.Possibilitouaimplantaçãoda

indústriadeequipamentoelétricopesado,ainda

quesobdomínioquasetotaldeempresasde

capitalinternacional;eofortecrescimento

daindústriadematerialelétricoleve,ao

mesmotempoemquecapitalizouecapacitou

tecnicamenteempresasprivadasdeconstrução

civilpesada,muitasdelasatualmenteconstituídas

comofortesgruposempresariasnacionaisem

processodeinternacionalização.

Paracitarmosumexemplodenatureza

técnicapodemosfazerreferênciaadepoimentos

querecolhemosrecentementedeengenheiros

envolvidoscomaconstruçãodasusinasdo

complexodeUrubupungá(JupiáeIlhaSolteira),

querelatamadificuldadeinicialmenteencontrada

paraaadoçãodedimensõesmaioresparaas

camadasdeconcretagemdosgrandesblocosde

concretoarmadodabarragem,dedimensões

inusitadasparaaépoca,afimdequesepudesse

aumentaraprodutividadeediminuirotempo

totaldeexecuçãodoempreendimento.Ointenso

calorproduzidopelareaçãoquímicaentreo

cimentoeaágua(“endurecimentodoconcreto”)

provocavarachaduras,inviabilizandoaexecução

deblocosmuitograndes,exigindoreparos

demoradosecaros,alémdecausardúvidasquanto

àsegurançaeàrealeficiênciadasestruturas.

Aconstruçãodasusinasdeconcretoaoladode

grandesinstalaçõesindustriaisprodutorasdegelo

resolveuumproblemacríticodaconstruçãode

grandesbarragens,pormeiodaadiçãodegelona

composiçãodoconcreto,aoinvésdeágua.Foi

aprimeiravezqueseadotounopaís,emlarga

escala,essasoluçãotecnológicajádesenvolvida

noexteriorequeéhojelargamenteutilizada.

Noentanto,oconhecimentoproduzidonão

seresumiuapenasàsquestõesdeengenharia

econstrução.SegundooadvogadoRubens

Naves,diretoradministrativodaCespem1986,a

empresadesenvolveu,emvinteanosdeexistência,

“umametodologiacadavezmaisabrangente

einterdisciplinar”noprocessodeimplantação

deumprojetohidrelétricodegrandeporte.A

partirdosestudosdeimpactosocioambiental

desenvolvidosparaoComplexodeUrubupungá,a

estatalsistematizou,em1978,no“ModeloPiloto

deProjetoIntegral”oknow-hownaconstrução

degrandesbarragens.Nosanos1980,esse

modeloserviudebaseparaaregulamentaçãoda

legislaçãoparalicenciamentodeaproveitamentos

hidrelétricosemtodoopaís,emumprocesso

natural,emqueasnovasquestõeslegais

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Usina de Ilha Solteira: grandes estruturas de concreto demandaram um amplo esforço de capacitação da engenharia nacional.

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49

Pesquisa• Águas de Março (filme, 16 min.). JeanRomainLésage,CicloFilmes,1980.• CESP: Pioneirismo e Excelência Técnica. JúlioCésarAssisKühleRenatodeOliveiraDiniz, FPHESP, 2002.• Panorama do Setor de Energia Elétrica no Brasil. RenatoFelicianoDias(coord.),CentrodaMemóriadaEletricidadenoBrasil,1988.• Plano de Eletrificação do Estado de São Paulo. DepartamentodeÁguaseEnergiaElétrica–DAEE;CompanhiaBrasileiradeEngenharia–CBE,1956.• Urubupungá – Jupiá – Ilha Solteira. EnzoSilveira,EdiçõesEnsil,1970.• Depoimento do eng. Raphael Antonio Nogueira de Freitas ao Centro de Documentação e Memória Camargo Corrêa – CDMCC, em 4 e 13/02/2004.

Renato de Oliveira Diniz é coordenador do Centro de Documentação e Memória

Camargo Corrêa (CDMCC), é doutorando em História das Ciências pela USP/ Projeto

Eletromemória e foi um dos fundadores e diretor técnico da Fundação Energia e

Saneamento entre 1998 e 2003.

demandadaspelosprojetosemexecuçãocriaram

anecessidadederenovaçãodalegislaçãoeda

consequenteregulamentação.

Avisãoabrangentedasrepercussõesda

construçãodeumahidrelétricadoportedeIlha

Solteirajáestavapresente,em1952,nosestudos

paraoaproveitamentohídricodoOestePaulista

desenvolvidospelaComissãoInterestadualda

BaciaParaná(SP,GO,MG,PR,SC,RS)enacriação

daCelusa,em1961.Construídodistantedos

centrosdeconsumo,ocomplexodeUrubupungá,

alémdefornecerenergiaparaocentroindustrial

paulistapróximoàcapital,deveriacriarumpolo

dedesenvolvimentonaregiãoemqueseinstalava,

possibilitaroestabelecimentodenovasviasde

comunicaçãoentreosuldoentãoestadodeMato

Grossoeooestepaulista,epreocupar-secomos

impactossobreanaturezadasáreasalagadase

navidadaspopulaçõesribeirinhasafetadas.Nos

anos1980,aCespjáhaviadesenvolvidouma

metodologiaqueconsideravaanecessidadede

levaremcontaosimpactossocioambientaisesuas

repercussõescomodeterminantesdoscaminhos

quesepoderiamadotaremdeterminadoprojeto;

anecessidadedeusomúltiplodasrepresascomo

abastecimentodeágua,turismoerecreação;e

atençãoaopatrimônioarqueológico,histórico,

religiosoouculturalsimplesmenteafetadoou

cobertopelaságuasdoreservatório.Issonos

permiteconcluirqueaimplantaçãodoatual

parqueenergéticopaulistafoieéumfatorde

desenvolvimentosocialemseumaisamplosentido.

AconstruçãodaUsinadoJirau,em

Rondônia,obrasímbolodoProgramade

AceleraçãodoCrescimento(PAC)éumexemplo

paradigmáticodacomplexidadedasações

queosempreendedores,hojeprivados,devem

desenvolvermesmoantesdoiníciodostrabalhos

deintervençãonoleitodorio.Osestudos

préviosdosimpactosdasobrasedaoperaçãoda

usinadevemprever,porexemplo,aformação

demão-de-obralocalparaaconstruçãoda

hidrelétrica;programasdeproteçãoàinfância

eàadolescência;deestudoedesenvolvimento

deprocedimentosrelativosàfaunadabacia

hidrográficadoMadeira;eregistroesalvamento

dopatrimônioarqueológicodaferroviaMadeira-

Mamoré.

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Usina Hidrelétrica de Jupiá ou Eng. Souza Dias (rio Paraná, SP/MS, anos 1980) é considerada ainda hoje uma hidrelétrica de grande porte e formou com a Usina de Ilha Solteira o Complexo Hidrelétrico de Urubupungá, marco de escala e de qualidade da tecnologia de construção hidrelétrica no país.

Page 50: Coleção Energia Vol 3

50

A evolução da aplicação da energia elétrica e suas consequências para a sociedade

Cole

ção

Ener

gia

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lum

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Volume 3

ApoioRealização

Promoção

C

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