Como o Feminismo Se Tornou Subalterno Ao Capitalismo – e Como Reivindicá-lo – LavraPalavra

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  • 7/25/2019 Como o Feminismo Se Tornou Subalterno Ao Capitalismo e Como Reivindic-lo LavraPalavra

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    19/05/2016 Como o feminismo se tornou subalterno ao capitalismo e como reivindic-lo LavraPalavra

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    LavraPalavra

    Como o feminismo se tornou subalterno ao

    capitalismo e como reivindic-lo

    Por Nancy Fraser, via The Guardian, traduzido por Felipe Kantor

    pensadora feminista Nancy Fraser vem ganhando destaque ao discutir temas da atualidade luz daTeoria Crtica da Sociedade. Seu projeto filosfico toma a justia enquanto tema central e suas derivaessegundo a mesma, so expostas nas possibilidades entre seu carter distributivo e de

    https://lavrapalavra.com/2016/04/06/como-o-feminismo-se-tornou-subalterno-ao-capitalismo-e-como-reivindica-lo/http://www.theguardian.com/commentisfree/2013/oct/14/feminism-capitalist-handmaiden-neoliberalhttps://lavrapalavra.com/2016/04/06/como-o-feminismo-se-tornou-subalterno-ao-capitalismo-e-como-reivindica-lo/https://lavrapalavra.com/
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    reconhecimento. No presente artigo a pensadora expe seu ponto de vista de maneira vigorosa,discutindo com o feminismo, o capitalismo e o neoliberalismo nesta constante tenso configurada emnossa realidade.

    Sendo uma feminista, sempre assumi que ao lutar pela emancipao das mulheres estavaconstruindo um mundo melhor mais igualitrio, justo e livre. Porm, ultimamente, tenhocomeado a me preocupar que os ideais pioneiros das feministas esto servindo finalidades

    bastante diferentes. Me preocupo, especificamente, que nossa crtica do sexismo est agorafornecendo a justificativa para novas formas de desigualdade e explorao.

    Em uma cruel reviravolta, temo que o movimento para a libertao das mulheres tenha seenredado em uma ligao perigosa com esforos neoliberais para a construo de umasociedade de livremercado. Isso explicaria como foi aceito que ideias feministas que j fizeramparte de uma viso de mundo radical so cada vez mais expressas em termos individualistas.

    Feministas que certa vez criticaram uma sociedade que promoveria o carreirismo agoraaconselham mulheres a aceitarem. Um movimento que uma vez priorizou solidariedadesocial agora celebra empresrias. A perspectiva que certa vez valorizou o carinho e ainterdependncia agora encoraja avanos individuais e meritocracia.

    O que est por trs desta alterao uma mudana de ares no carter do capitalismo. Ocapitalismo organizado pelo Estado do psguerra tem dado espao a um novo formato desorganizado, globalizante, neoliberal. As feministas da segunda onda emergiram comouma crtica ao anterior, mas se tornaram as subalternas do ltimo.

    Com o benefcio do olhar em retrospectiva, podemos agora ver que o movimento pelalibertao das mulheres apontou simultaneamente a dois futuros possveis. Em um primeirocenrio, se prefigurou um mundo onde cada emancipao de gnero andou de mos dadascom a democracia participativa e a solidariedade social; em um segundo, prometeu uma novaforma de liberalismo, capaz de garantir s mulheres tanto quanto aos homens os benefcios daautonomia individual, possibilidade aumentada de escolhas e avanos meritocrticos. Ofeminismo da segunda onda era, desta maneira, ambivalente. Compatvel com qualquer umadas duas vises de sociedade, ficou suscetvel a duas elaboraes histricas diferentes.

    Da maneira como enxergo, a ambivalncia do feminismo tem se decidido nos ltimos anos afavor do segundo, o cenrio liberalindividualista mas no porque ramos vtimas passivasdas sedues neoliberais. Ao contrrio, ns mesmas contribumos com trs ideias importantespara este desenvolvimento.

    Uma contribuio foi nossa crtica da renda familiar: o ideal de homem ganhapo/ mulherdonadecasa que era central ao capitalismo organizado pelo Estado. As crticas feministas aeste ideal agora servem para legitimar o capitalismo flexvel. Afinal de contas, esta formadepende fortemente do trabalho remunerado feminino, em especial o trabalho de baixarendaem servio e manufatura, realizado no apenas por jovens mulheres solteiras, mas tambm pormulheres casadas e com filhos; no apenas por somente mulheres de cor, mas por mulheres devirtualmente todas as nacionalidades e etnias. Na medida em que as mulheres se despejam nos

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    mercados de trabalho ao redor do globo, os ideais de renda familiar do capitalismo organizadopelo Estado esto sendo substitudos pelas novas e mais modernas normas aparentementesancionadas pelo feminismo da famlia de dois provedores.

    Ignore que a realidade que subjaz esse novo ideal de nveis depressivos de renda, seguranaempregatcia diminuta, padres de vida em decadncia, um abrupto aumento no nmero dehoras trabalhadas pela renda por residncia, exacerbao do turno duplicado agora

    comumente triplicado ou quadruplicado e um aumento da pobreza, cada vez maisconcentrado em residncias encabeadas por mulheres. O neoliberalismo transformou opatinho feio em cisne ao elaborar uma narrativa de empoderamento feminino. Invocando acrtica feminista da renda familiar para justificar a explorao, ele subordina o sonho deemancipao das mulheres ao motor de acumulao de capital.

    O feminismo tambm fez uma segunda contribuio ao ethosneoliberal. Na era do capitalismoorganizado pelo Estado, criticamos acertadamente uma constrita viso poltica tointensamente focada na desigualdade de classes que no conseguia enxergar tais injustiasnoeconmicas como a violncia domstica, o estupro e a opresso reprodutiva. Rejeitandoeconomicismo e politizando o pessoal, as feministas ampliaram a agenda poltica paradesafiar as hierarquias de status pressupostas nas construes culturais de diferena de gnero.O resultado deveria ter sido a expanso da luta por justia, de forma a conter tanto a culturaquanto a economia. Todavia o resultado real foi o foco unilateral em identidade de gnero scustas de assuntos po com manteiga. Ainda pior, a feminista recorreu poltica identitria

    bem encaixada com um liberalismo crescente, que quis nada mais do que reprimir toda amemria de igualdade social. Na realidade, absolutizamos a crtica do sexismo culturalprecisamente no momento em que as circunstncias requeriam ateno redobrada crtica daeconomia poltica.

    Por fim, o feminismo contribuiu com uma terceira ideia para o neoliberalismo: a crtica doestado de bemestar paternalista. Inegavelmente progressiva na era do capitalismo organizadopelo Estado, essa crtica tem desde ento convergido com a guerra do neoliberalismo contra oestado da bab e sua mais recente cnica aceitao das ONGs. Um exemplo patente omicrocrdito, o programa de pequenos emprstimos dos bancos mulheres pobres na partesul do globo. Lanada como uma alternativa de empoderamento e de baixo para cima ao invsda burocrtica e de cima para baixo fita vermelha dos projetos governamentais, o microcrdito apregoado como o antdoto feminista para a pobreza e sujeio das mulheres. O que se

    deixou passar, contudo, uma coincidncia perturbadora: o microcrdito brotou no momentoem que os governos abandonaram esforos macroestruturais de luta contra a pobreza, esforosque os emprstimos de pequena escala no conseguem substituir. Neste caso tambm, ento,uma ideia feminista foi recuperada pelo neoliberalismo. Uma perspectiva originalmentevoltada para a democratizao do poder governamental de forma a empoderar cidados usada agora para legitimar a mercantilizao e reduo do estado.

    Em todos estes casos, a ambivalncia do feminismo foi resolvida a favor do individualismo(neo)liberal. Mas o outro cenrio solidrio pode ainda estar vivo. A crise atual ganha a chancede pegar seu fio mais uma vez, reconectando o sonho de libertao das mulheres com a viso

    de uma sociedade solidria. Tendo em vista esta finalidade, as feministas precisam romper seuperigoso lao com o neoliberalismo e reivindicar nossas trs contribuies para nossosprprios fins.

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    Primeiro, podemos quebrar nosso elo esprio entre nossa crtica da renda familiar e ocapitalismo flexvel militando por uma forma de vida que descentralize o trabalho remuneradoe valorize atividades no remuneradas, incluindo e no somente a de cuidar. Em segundolugar, podemos romper a passagem de nossa crtica do economicismo para a poltica deidentidade ao integrar o esforo de transformao de uma ordem de status sedimentada emvalores culturais com a luta por justia econmica. Por ltimo, podemos cortar o adulteradovnculo entre nossa crtica da burocracia e do fundamentalismo de livremercado ao

    reivindicar o manto da democracia participativa como uma maneira de fortalecimento dospoderes pblicos necessrios para constranger o capital pelo bem da justia.

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    Crtica, Sem categoria

    feminismo, Filosofia, Marxismo, Mulher, Nancy Fraser, Neoliberalismo, PsModernidade

    One thought on Como o feminismo se tornou

    subalterno ao capitalismo e como reivindic-lo

    1. Marcus Valerio XR

    7 de abril de 2016 at 01:02

    Essa traduo, publicada ontem, tardia. O texto original

    (hp://www.theguardian.com/commentisfree/2013/oct/14/feminismcapitalisthandmaidenneoliberal) publicado em 14/10/2013 j havia sido traduzido e publicado praticamente nomesmo dia em hp://uninomade.net/tenda/comoofeminismosetornouaempregadadocapitalismoecomoresgatalo/ e outros mirrors por a.

    E mesmo este j uma constatao tardia, por sinal mais ou menos da mesma poca em queeu cheguei a concluso similar aps decidir me aprofundar no assunto at abandonar meurtulo de feminista.

    Mas o fato que as oligarquias norte americanas no teriam despejado bilhes de dlaresno financiamento do Feminismo de Segunda Onda se isso no fosse de seu interesse, e hojepodese notar que todos os pases tidos como mais feministas do mundo so tambm os

    Author archive Author website6 de abril de 2016

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    https://lavrapalavra.com/2016/04/06/como-o-feminismo-se-tornou-subalterno-ao-capitalismo-e-como-reivindica-lo/?replytocom=202#respondhttps://bloglavrapalavra.wordpress.com/https://lavrapalavra.com/author/bloglavrapalavra/http://uninomade.net/tenda/como-o-feminismo-se-tornou-a-empregada-do-capitalismo-e-como-resgata-lo/http://www.theguardian.com/commentisfree/2013/oct/14/feminism-capitalist-handmaiden-neoliberalhttp://mvxr.wordpress.com/https://lavrapalavra.com/tag/pos-modernidade/https://lavrapalavra.com/tag/neoliberalismo/https://lavrapalavra.com/tag/nancy-fraser/https://lavrapalavra.com/tag/mulher/https://lavrapalavra.com/tag/marxismo/https://lavrapalavra.com/tag/filosofia/https://lavrapalavra.com/tag/feminismo/https://lavrapalavra.com/category/sem-categoria/https://lavrapalavra.com/category/critica/
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    19/05/2016 Como o feminismo se tornou subalterno ao capitalismo e como reivindic-lo LavraPalavra

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    mais liberais, e que por outro lado China, Rssia, Cuba, Coria do Norte ou qualquer outropas contra hegemnico no tem sequer um trao desse Feminismo ocidental, quandomuito, tendo o legtimo feminismo de base.

    At mesmo a adeso ao Feminismo por parte dos partidos e instituies de esquerdacoincide com sua progressiva adeso a agenda liberal, isso pode ser visto com clareza noapenas no PT e no PSB, mas em praticamente todos os partidos exceo de alguns menores

    e mais exticos.

    No Brasil, o nico partido que mantm uma linha feminista verdadeiramente de basesocialista o PCO, que no por outro motivo tem denunciado largamente esse Feminismoque , em essncia, liberal, apesar do discurso fajuto em contrrio.

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