44

COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

  • Upload
    buithuy

  • View
    217

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de
Page 2: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERAL

Missão

Apoiar o Governo do Distrito Federal nas atividades de Planejamento Estratégico, Desenvolvimento Econômico, Social e Urbano, coletando, produzindo e disseminando informações para a tomada de decisões governamental e melhoria contínua da qualidade de vida da população do Distrito Federal e sua região de influência.

Brasília em Debate - Ano 2015 - nº 11 - Agosto1.Economia - Planejamento Territorial Distrito Federal (Brasil)ISSN - 2316-820X

Page 3: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 3

33Planejamento e Gestão

José Celso Cardoso Jr.

38A Codeplan, o Ipea e o desafio de retomar o planejamento estratégico

Ronaldo Coutinho Garcia

42Banco de Brasília apoia o 1º Fórum HSM sobre Gestão Pública

Assessoria de Imprensa

32Setores da economia em queda

Sandra Andrade

26Analise das Finanças Públicas do Distrito Federal

Roberto Piscitelli e Jusçanio Souza

21As quatro escalas do plano piloto no pla-nejamento urbano de Brasília

Sérgio Ulisses Jatobá

17O que é um bom governo para a nova governança pública?

Marcelo Gomes e Leonardo Albernaz

13Diagnóstico social, Avaliação de Políticas ou Impacto Midiático?

Paulo Jannuzzi

12Taxa de inflação cai em Brasília

Carlos Alberto Reis

7Entrevista - Lucio Rennó, presidente da Codeplan

5Carta ao leitor

Índice

Edição nº 11

Planejamento & Governança

Escalas gregária e monumental

Conceitos e teorias

Educação

Planejamento

Indicadores

PPB

CapaFoto: Fábio Rodrigues Pozzebom - ABr

Foto: Toninho Leite

Foto: Toninho Leite

Foto: Valter Campanato/ABr

Page 4: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate4

Apresentação

A 11ª edição da Brasília em Debate pauta a temática Planeja-mento e Governança, em uma tentativa de se aproximar de mode-los de gestão mais modernos e eficazes da administração pública e na avaliação dos indicadores sociais. O tema se desdobrou em suas múltiplas facetas, passando pelos conceitos teóricos, desa-fios e propostas.

Para inaugurar esta nova gestão, o presidente, Lucio Rennó, trata na entrevista dos desafios a serem enfrentados pela Com-panhia no sentido de transformá-la em um fórum de debate de questões relevantes tanto para o Governo de Brasília quanto para a sociedade em geral. Com o olhar em um projeto de desen-volvimento econômico e social para o Distrito Federal e a área metropolitana, destacam-se, entre outras propostas, a redução da desigualdade por meio da geração de empregos e os investi-mentos em educação.

Paulo Zannuzzi discute a elaboração e a utilização dos In-dicadores de Diagnóstico e de Avaliação. Justifica a excelência do indicador e sua utilidade como instrumento de diagnóstico ou advocacy de políticas para o Desenvolvimento, obtidas pela quantidade de informação e “neutralidade” da técnica usada na sua construção.

Para entender os conceitos de governança pública, o periódi-co contou com a colaboração dos especialistas Marcelo Gomes e Leonardo Albernaz que definiram a governança a partir de três pilares principais: a forma do regime político; os processos se-gundo os quais a autoridade é exercida na gestão dos recursos socioeconômicos e a capacidade governamental de formular e implementar políticas públicas.

O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de Brasília (PPB) no planejamento urbano da capital, de autoria do arquite-to urbanista Sérgio Ulisses Jatobá, apresenta uma visão geral e uma abordagem particularizada de cada uma delas. Cita as refe-rências teóricas, conceituais, funções, além de suas articulações e evolução, desde a concepção original por Lucio Costa.

Os economistas Roberto Piscitelli e Jusçanio Souza fazem uma análise das finanças públicas do Distrito Federal, ilustrando por exemplo, o descompasso que vem ocorrendo entre o crescimento da Despesa em relação ao crescimento da Receita a partir de 2012 e o que se acentuou nos últimos dois anos.

O texto, “Planejamento e Gestão: possibilidades atuais do Estado na promoção do desenvolvimento” de autoria de José Celso Cardoso Jr., alinha os conceitos de democracia, desen-volvimento e planejamento. Aborda ainda alguns elementos com destaque para o Plano Plurianual (PPA), aliado estratégico do processo de governar sociedades democráticas complexas, como é o caso do Brasil.

Ronaldo Coutinho Garcia discorre sobre as trajetórias da Codeplan e do Ipea ante o desafio de retomar o planejamento estratégico. Enfoca a crise que as instituições enfrentaram nos últimos anos, contextualizada do ponto de vista histórico. Desta-ca as atribuições de cada uma das instituições, passa pelos con-ceitos básicos do planejamento para o desenvolvimento nacional que requer projetos e planos.

A reportagem sobre a participação do BRB no 1º Fórum HSM de Gestão Pública destaca a presença do ex-prefeito de Nova Iorque, Rudolph Giuliani, que discorreu sobre algumas ações que coordenou, entre elas, o programa de segurança “Tolerân-cia Zero”, na redução dos assassinatos em NY em 70% e dos impostos em US$ 2,3 bilhões, além da adoção de um sistema de remuneração dos professores.

Brasília em DebateAgosto - Ano 2015 - Nº 11

GOVERNO DO DISTRITO FEDERALRodrigo Rollemberg - GovernadorRenato Santana - Vice-Governador

SECRETARIA DE ESTADO DE PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO DO DISTRITO FEDERAL -

SEPLAGLeany Barreiro de Sousa Lemos - Secretária

COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DFCODEPLAN

Lucio Remuzat Rennó Júnior - Presidente

DIRETORIA ADMINISTRATIVA E FINANCEIRAAntônio Fúcio de Mendonça Neto - Diretor

DIRETORIA DE ESTUDOS E PESQUISAS SOCIOECONÔMICAS

Bruno de Oliveira Cruz - Diretor

DIRETORIA DE ESTUDOS E POLÍTICAS SOCIAISFlávio de Oliveira Gonçalves - Diretor

DIRETORIA DE ESTUDOS URBANOS E AMBIENTAISAldo Paviani - Diretor

CONSELHO EDITORIALLeany LemosLucio RennóAldo Paviani

Antônio FúcioBruno Cruz

Flávio GonçalvesAlexandre Brandão

Jusçanio SouzaKeli AndradeSérgio Jatobá

Ana Maria NogalesMaurício BugarinRoberto Piscitelli

Assessoria de Comunicação Social

Jornalista responsávelValda Queiroz - Reg. prof. 426-DF

Arte finalMauro Moncaio

Foto capaFábio Rodrigues Pozzebom - ABr

ApoioNilva Rios, Eliane Menezes, Maurício Suda,Laerte Gouveia, Cleusa Rocha e Thiara Vilela

EstagiáriaAna Carolina Alves

AgradecimentosLeonardo Athias e Alexandre Brandão

Observação:* Os artigos assinados são de inteira responsabilidade dos autores* Permitida a reprodução total ou parcial desde que citada a fonte

Periodicidade: trimestralTiragem impressa: 1 mil exemplares; policromia: 44 páginas

Versão online: www.codeplan.df.gov.br

Companhia de Planejamento do Distrito FederalCodeplan

SAM - Bloco H - Setores ComplementaresCEP: 70.620-080 - Brasília-DFTel.: (0xx61) 3342-1021/1152

[email protected]

COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERAL

Page 5: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 5

para isso, precisam reduzir gastos com pessoal, algo muito difícil de se fazer pois salários são definidos também por Lei; reduzir custeio, o que é complexo dada a necessidade de manutenção de condições mínimas de trabalho; aumentar a receita, muito improvável em se dependendo de uma economia em crise e; aumentar impos-tos ou negociar patrimônios públicos, medidas amargas e impopulares.

Dada a possibilidade de caos e falência do Estado, a necessidade de planejamento, gover-nança e gestão mostram-se imprescindíveis no curto prazo. Se se gasta muito com pessoal, há que incentivar que essa força de trabalho preste serviços públicos de altíssima qualidade. Uti-lizar instrumentos de gestão que incentivem a produtividade, com avaliações objetivas de de-sempenho e condicionamento de promoções e progressões a critérios tangíveis e não apenas subjetivos, passa a ser fundamental para asse-gurar que o gasto com pessoal seja entendido como gasto público. Quantificação da apresen-tação de resultados e entrega de produtos, em tempo hábil, com dimensões de avaliação popu-lar dos serviços prestados, devem ser elementos centrais no monitoramento de resultados.

Se há poucos recursos, então o planejamen-to de gasto, dada a previsão de receita, tem que ser realista. Não se pode projetar mais gastos apostando em receitas futuras que dificilmente serão obtidas. Este foi, inclusive, um dos erros no passado que nos levou à situação atual. Nesse sentido, definir metas, estabelecer ações, criar indicadores e mensurá-los de forma sistemática e válida passam a ser ferramentas de governança que aprimoram a qualidade do gasto público.

Esta edição da revista Brasília em Debate traz à tona toda essa gama de assuntos referentes ao planejamento, governança e políticas públicas, que esperemos sejam relevantes para o enfren-tamento dos significativos desafios que se colo-cam à gestão pública nos anos vindouros.

Vivemos em um período único e preocupan-te na história política e econômica nacional e local. O Estado brasileiro, no nível federal, es-tadual, distrital e municipal parece ter se exau-rido do ponto de vista fiscal. As informações que emergem indicam aumentos relevantes de gastos fixos, com pessoal, ou de difícil corte: custeio, redução dramática na capacidade de investimento e extremas dificuldades de arcar com o pagamento de dívidas. Profundas revi-sões contratuais, com a diminuição de compras públicas complementam o cenário. Ou seja, so-mos testemunhas de um processo de irresponsa-bilidade fiscal generalizado ante o grande teste institucional da Lei Complementar 101/2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fis-cal. Neste momento, a maioria dos Estados da União e o Distrito Federal estão no limite pru-dencial ou já o ultrapassaram. Alguns casos já extrapolaram o teto previsto na lei de 49% para o Poder Executivo.

Uma alternativa que se coloca é o aumento de receitas. Contudo, vivemos profunda crise eco-nômica, com quedas constantes do Produto In-terno Bruto (PIB), aumento do desemprego, da inflação e das taxas de juros, redução do acesso ao crédito, encolhimento da indústria nacional e local e piora na qualidade de diversos serviços públicos. Há também uma séria crise de con-fiança e política instalada, com rebaixamento do país e suas instituições financeiras por agências de avaliação de risco, crise de governabilida-de no Congresso Nacional (e Assembleias Es-taduais) e embates duríssimos com sindicatos. Por último, resta o aumento de impostos e mo-vimentações patrimoniais, algo dificultado pela própria crise de governabilidade; medidas desse tipo exigem aprovação parlamentar.

Ou seja, os estados e os municípios que se defrontam com o problema, ao terem ultrapassa-do os limites fiscais impostos pela LRF, encon-tram-se em uma encruzilhada amarga. Precisam sair de sua situação de desrespeito à Lei mas,

Carta ao leitor

Lucio RennóPresidente

Page 6: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Entrevista - Lucio Rennó

Horário de funcionamento (exceto SAMU)Segunda a sexta-feira: 7h às 21hSábados, domingos e feriados: 8h às 18h(*) De segunda a sexta-feira: 7h às 19h

Atendimento ao CidadãoPela Central de Relacionamento do GDF, você obtém informações e orientações, dá sugestões e pode fazer reclamações sobre serviços prestados pelo GDF.

A ligação é gratuita

Combate à corrupção - Registro de denúncias de irregularidades em contratos e licitações (*)0800-644-9060

SAMU - Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - Atende às solicitações telefônicas de urgência da população (24 horas)192Denúncias - Ouvidoria do GDFOpção 2

Reclamações, elogios, sugestões e solicitações - Ouvidoria do GDFOpção 1162Doação de leite materno - Banco de Leite Humano, em parceria com o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito FederalOpção 4

Farmácia Ambulatorial Especializada - Agendamento para retirada de medicamentosOpção 3

Agendamento e solicitação de doação de sangue - Fundação Hemocentro de Brasília (*) Opção 2

Disque Saúde - Ouvidoria da Secretaria de Saúde Opção 1

160

Demais informações do GDFOpção 9

Disque Idoso - Casos discriminatórios contra idosos (*)Opção 8

Disque Racismo - Casos discriminatórios étnico-racial Opção 7

Combate à Violência Contra a MulherOpção 6

Programas habitacionais, análise de crédito, documentação para regularização de lote - CODHABOpção 5

Horários e itinerários de ônibus, Integração, Passe livre - DF TransOpção 4

IPTU, IPVA, Nota Legal - Secretaria de Fazenda (*)Opção 3

Telematrícula (*), Ensino de Jovens e Adultos, DF Alfabetizado - Secretaria de EducaçãoOpção 2

Violação de direitos, trabalho infantil, exploração sexual, Bolsa Família, população de rua - SedestOpção 1

156

Page 7: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 7

Criatividade e inovação são as metas da Codeplan

Entrevista - Lucio Rennó

Faz parte da linha editorial da Brasília em Debate, no início de cada gestão, entrevistar o presidente da Companhia para que ele possa apresentar as propostas e projetos da nova diretoria.

Com ampla experiência acadêmica e profissional no campo da Ciência Política, Lucio Rennó faz parte de uma geração, cuja maioria nasceu em Brasília e hoje assume cargos de direção no atual governo. Vem trabalhar de bicicleta e diz que não está interessado no poder pelo poder, muito menos pelos ganhos pessoais que o poder pode trazer. Ressalta que tem o compromisso com a melhoria do coletivo e da cidade que mora, entendida de forma extensiva, compreenden-do todo o DF e indo além, até área metropolitana. “Temos que ter coragem e responsabilidade de inovar na governança, em novas formas de mobilidade urbana, novas formas de promover o desenvolvimento e de torná-lo inclusivo. Ações individuais ajudam”, conclui.

Nessa entrevista concedida à Valda Queiroz, afirma que começou a se interessar pela Ciência Política influenciado pelo entusiasmo dos pais ante os movimentos de redemocratização do país no decorrer dos anos 1980. O fato de ter ingressado na Universidade de Brasília (UnB) no começo dos anos 1990, segundo ele levou-o a se apaixonar pelo estudo rigoroso e sistemático da política. “A produção de conhecimento sobre políticas públicas, por exemplo, é fundamental para apri-morarmos a intervenção estatal visando a melhoria da qualidade de vida da população” enfatiza.

Lucio Rennó com o foco na temática da Brasília em Debate, Planejamento & Governança, tem em mente a consolidação primordial da natureza da Codeplan, no sentido de que ela man-tenha sua tradição em pesquisa, mas também desenvolva análises e prognósticos, em sintonia com a visão moderna sobre o que se constitui o planejamento. Mantém as pesquisas distrital e metropolitana de domicílios nas regiões administrativas do DF e nos 12 municípios da Área Metropolitana de Brasília, e a Pesquisa de Emprego e Desemprego, além de novos estudos, pro-jetos e parcerias. Com isso, sob a gestão da nova diretoria, a Companhia está se tornando em um fórum privilegiado para debater questões relevantes tanto para o Governo do Distrito Federal quanto para a sociedade em geral.

A preocupação com a boa governança leva-o a traçar as linhas de um projeto de desenvolvi-mento voltado principalmente para a redução das desigualdades, mostrada nas pesquisas reali-zadas pela Companhia.

Em relação à Codeplan diz que, “estamos apenas retomando (as discussões), aparando arestas e estabelecendo um melhor ambiente de trabalho. Reivindicações antigas dos empregados como um Plano de Desligamento Voluntário e a mudança da natureza jurídica continuam em debate e estudo, mas tudo será feito de forma responsável, sem falsas promessas e com o máximo de transparência, ouvindo sempre as partes interessadas”.

Quem é

É professor adjunto (licenciado) do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasí-lia (UnB) e lecionou na Universidade do Arizona, Estados Unidos. Mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB e doutor em Ciência Política pela University of Pittsburgh. Tem duplo pós-doutorado no Latin American and Caribbean Studies Center da SUNY Stony Brook e no German Institute for Global and Area Studies, em Hamburgo, Alemanha. Acumula experiência na área de Ciência Política com ênfase em Política Comparada, Estudos Legisla-tivos e Comportamento Eleitoral. Exerceu cargos de direção no Programa de Pós-graduação do Instituto de Ciência Política e no Centro de Pesquisa e Pós-graduação sobre as Américas (CEPPAC) da Unb.

Page 8: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate8

gração entre cidades, com um bom planejamento de alternativas de mo-bilidade urbana, e que estejam locali-zados em áreas ambientalmente sus-tentáveis, com capacidade de suporte para o empreendimento almejado.

BD - As dificuldades são grandes?

Lucio Rennó - A despeito de suas possíveis limitações, investir em se-tores econômicos de ponta, embasa-dos na inovação e criatividade, que agreguem valor, dando início a ciclos virtuosos, nos quais pessoas de qual-quer localidade do Distrito Federal passam a se inspirar e almejar uma vida melhor, buscando assim aprimo-rar seus conhecimentos técnicos. Ou seja, mesmo que essa seja uma meta a médio e longo prazo, não podemos abrir mão de pensar nesses termos. Isso é principalmente interessante para os jovens, que sofrem bastante com o desemprego hoje, como de-monstram os dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego, em parceria com o DIEESE, SETRAB e Code-plan. Hoje em dia, a juventude está extremamente bem informada, co-nectada ao o mundo via internet. É fundamental estimular esses jovens para que invistam mais em aumentar seus conhecimentos. Em uma eco-nomia baseada em atividades que agregam valor a produtos, funda-mentada na criatividade e inovação, gera estímulos para que pessoas se qualifiquem cada vez mais. Há vários exemplos pelo mundo e pelo Brasil. Temos que pensar o desenvolvimento do DF como um projeto para o futu-ro. Certamente há pressa em solucio-nar o problema do desemprego, por exemplo, mas é nosso dever também imaginar e agir visando um futuro melhor para todos.

Vale lembrar que os instrumentos usados para fomentar o desenvolvi-mento precisam ser repensados. A concessão de incentivos creditícios, de terras, de exoneração tributária, amplamente utilizados, não podem ser vistos como os únicos disponí-veis. Certamente esses instrumentos continuarão a ser utilizados, mas em momentos de crise econômica, é im-portante ser criativo e inovador.

BD - De onde poderiam vir os inves-timentos?

Lucio Rennó - Poderiam vir de vá-rios fundos, com recursos federais e distritais, inclusive aqueles voltados para áreas específicas, como pesquisa e promoção artística e cultural. Dessa

para o desenvolvimento, acelerando a desburocratização para a abertura de negócios, associado ao investi-mento em indústrias voltadas para a tecnologia da informação, inovação, produção de conhecimento por meio da pesquisa e investimento na cultu-ra. Há ampla oferta de mão de obra qualificada e de consumidores ávi-dos por produtos com esse perfil no Distrito Federal. Contudo, o desafio é tornar essas atividades econômicas mais inclusivas. Embora haja capi-tal humano qualificado no DF para essas atividades econômicas, é no-tório também observar que parcelas significativas da população em idade economicamente ativa têm baixa es-colaridade, principalmente aquelas concentradas nas cidades periféricas do Distrito Federal e nos municípios adjacentes. Em outras palavras, des-tinar investimentos em capacitação técnica que se enquadrem nas cadeias

produtivas dos setores mencionados seria uma tarefa importantíssima do Estado. Também é necessário que se estimule a descentralização das ativi-dades econômicas pelo território, se possível articuladas com cadeias pro-dutivas locais. Se não for viável essa vinculação, e se necessário, que haja uma intervenção estatal mais pon-tual, na criação de polos de desenvol-vimento econômico, por exemplo. É essencial que estes prevejam a inte-

BD - Quais os principais desafios, à frente da Codeplan?

Lucio Rennó - São muitos os desa-fios. Assumimos essa gestão com a proposta de pensar a Codeplan como um fórum privilegiado para debater questões relevantes tanto para o Go-verno de Brasília quanto para a socie-dade em geral. Estamos consolidando a primordial natureza da Companhia, no sentido de que ela mantenha sua tradição em pesquisa, mas também desenvolva análises e prognósticos, em sintonia com a visão moderna so-bre o que se constitui planejamento. Com isso, pretendemos melhorar a qualidade da coleta de dados, usan-do tecnologias avançadas; fortalecer nossa capacidade analítica, investir na atualização teórica e metodológica de nosso quadro técnico; desenvolver sistemas que facilitem o acesso e vi-sualização de dados, democratizando o acesso à informação corrente sobre o Distrito Federal e sua área metro-politana; estruturar melhor o plane-jamento estratégico da Companhia e colaborar com o mapa estratégico do governo, principalmente na valida-ção de indicadores.

Em resumo, nossas indagações refe-rem-se à forma como se pensa o plane-jamento na atualidade e sua inserção de fato dentro da estrutura desse go-verno. Enfim, queremos tratar dessas questões... Mas, enfrentamos proble-mas bem tangíveis: a ocupação desor-denada do território, a concentração da oferta de vagas de trabalho no Plano Piloto e um desemprego com-parativamente alto em outras regiões, a baixa diversificação das nossas ati-vidades econômicas, os problemas de violência e mobilidade urbanas, a de-sigualdade profunda entre as regiões administrativas do Distrito Federal e entre o DF e os municípios adjacen-tes. Ou seja, precisamos ser criativos para pensar e implementar um novo projeto de desenvolvimento econômi-co e social do DF.

BD - Quais seriam as linhas desse projeto de desenvolvimento?

Lucio Rennó - Um projeto de desen-volvimento consistente deve reduzir desigualdades, principalmente por meio da geração de empregos e in-vestimentos em educação de qualida-de; estimular um ambiente de negó-cios favorável ao empreendedorismo e inovação; capitalizar as potenciali-dades locais; utilizar os recursos pú-blicos de forma consequente. Nesse sentido, é necessário gerar insumos

É necessário gerar insumos para o

desenvolvimento, acelerando a

desburocratização para a abertura de negócios, associado ao investimento em indústrias voltadas para a tecnologia da informação,

inovação, produção de conhecimento por

meio da pesquisa e investimento na

cultura.

Page 9: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 9

que as políticas públicas tem sobre a vida das pessoas. Estamos em diá-logo constante com as secretarias do Governo de Brasília para auxiliá-las no desenho e avaliação das políticas públicas. Estamos também criando um laboratório de avaliação do gas-to público, com parceiros de diversas instituições, como a UnB, o Ipea, o Instituto Mauro Borges de Goiás, e as instituições internacionais. A inter-nacionalização da Codeplan é parte importante desse projeto, que busca parâmetros comparativos para enten-dermos melhor nossa realidade local. Mas, sua essência é a atenção para a qualidade do gasto público visando avaliar o impacto da intervenção do Estado na vida do cidadão.

Exemplo disso é a parceria com a Secretaria de Segurança Pública para investigar questões sobre violência, crime e vulnerabilidade no DF, cuja vitimização é uma temática da nossa agenda, que está associada ao desen-volvimento social, problema que a so-ciedade enfrenta independentemente de classe social, renda etc. Esta pes-quisa não teria rebatimento somente à repressão mas pode apontar soluções para diminuir as oportunidades de cri-mes. Visa à prevenção, promovendo a inclusão social do jovem com inser-ção educacional, entre outros. Nisso, estão embutidas as discussões sobre cidadania que passam a ser centrais para entendermos o crime e a violên-cia urbanas de forma ampla.

BD - Então, as propostas dos projetos recém-implantados na Codeplan es-tão de acordo com a grande linha de pesquisa voltada para o planejamento e o desenvolvimento?

Lucio Rennó - Cabe ressaltar, ini-cialmente, que nosso esforço na Co-deplan é de valorizar e consolidar as pesquisas que os técnicos da casa já vinham realizando, algumas destas retomadas na administração anterior, e muito importantes para o DF e sua Área Metropolitana. São a Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD), a Pesquisa Metropolitana por Amostra de Domicílios (PMAD) e a Pesquisa de Emprego e Desem-prego (PED/DF). Além dessas ativi-dades, estamos ampliando o papel da Codeplan como um fórum de debates qualificados sobre temas correntes. Nossa série de palestras Quintas Co-deplan e Portas do Futuro volta-se para o debate com especialistas em temas diversos, de reconhecida ex-periência nacional e internacional. São palestras com um caráter mais

Diretoria de Estudos e Pesquisas So-cioeconômicas (DIEPES). Técnico de Pesquisa do Ipea, Bruno deu con-tinuidade aos importantes projetos de pesquisa da casa: a PDAD, a PMAD e a PED/DF e traz sua experiência em economia regional para pensar-mos as potencialidades e desafios do Distrito Federal. O renomado geó-grafo, Aldo Paviani, está à frente da Diretoria de Estudos Urbanos e Am-bientais (DEURA), com uma sólida agenda de pesquisas voltadas para as importantes questões territoriais, urbanas e rurais do DF e da Perife-ria Metropolitana. Flávio Gonçalves, professor da Universidade Federal do Paraná, diretor da Diretoria de Es-tudos e Políticas Sociais (DIPOS), pesquisador respeitado nacionalmen-te, já desenvolveu várias parcerias e pesquisas na Codeplan em diversas áreas sociais, como o mapeamento da pobreza e das oportunidades de vida na região. Além dos avanços nas áreas finalísticas da empresa, a Di-retoria Administrativa e Financeira (DIRAF), sob a liderança de Antônio Fúcio, experiente gestor público, tem trabalhado de forma próxima à Pre-sidência no enfrentamento de desa-fios diários e também estruturais da Companhia. Menciono, por exemplo, entre outras ações, nossa adesão ao sistema eletrônico Comprasnet que facilita os processos de licitações.

Queremos aprofundar nossa capacida-de analítica. Vamos avaliar o impacto

forma, instrumentos não usualmente vistos como fontes de insumo para o desenvolvimento deveriam ser consi-derados como tal. Destacam-se a Fun-dação de Apoio à Pesquisa, que me-rece cumprimentos pelo lançamento recente de edital voltado para o fo-mento à start-ups, acredito que o pri-meiro do gênero em sua história, mas também o Fundo de Apoio à Cultura, que é fundamental para estimular a economia criativa no DF. Além disso, a oferta de cursos técnicos voltados para o empreendedorismo e as par-cerias com a iniciativa privada, desde que tendo condicionalidades bem de-finidas e incentivos condizentes, são também importantes caminhos. Por último, cabe repensar as relações fe-derativas, nossa metrópole de caráter único, esparramada por, ao menos, o DF e Goiás, isso é uma necessidade imperativa. As parcerias entre Gover-no de Brasília, Governo de Goiás, As-sociação dos Municípios Adjacentes a Brasília (AMAB) e prefeituras são essenciais para capacitar funcionários das prefeituras, habilitando-os a cap-tar recursos, para elaborar projetos comuns de infraestrutura e para re-pensar a governança da área.

BD - Desse modo, o perfil técnico da atual Diretoria da Companhia está adequado para enfrentar esses desafios?

Lucio Rennó - Estamos afinados com a produção do conhecimento e isso se traduz em elaborar planos, projetos e realizar pesquisas voltados ao desenvolvimento para o Distrito Federal e sua periferia metropolita-na, capazes de diagnosticar cenários e condições de vida da população. E ainda, estamos empenhados em criar e aperfeiçoar indicadores socioeco-nômicos, culturais, ambientais, ma-pas georreferenciados, explorando o caráter multidisciplinar da insti-tuição. Somos pesquisadores, temos formação nas áreas de ciência polí-tica, economia, geografia e gestão. Creio que somos capazes, junto ao corpo técnico da Codeplan de pro-duzir informações, em múltiplos for-matos, referentes às áreas-chave da Companhia: economia, estatística, demografia, políticas sociais, plane-jamento urbano e ambiental. Além desses temas, podemos inovar repen-sando as questões de governança, de organização do Estado e cidadania.

Nesse sentido, vale destacar que a Codeplan agora conta com uma equi-pe de excelentes especialistas em suas diretorias. Bruno Cruz assumiu a

Queremos aprofundar nossa capacidade analítica. Vamos

avaliar o impacto que as políticas públicas tem sobre a vida das pessoas. Estamos em

diálogo constante com as secretarias do Governo de Brasília para auxiliá-las no desenho e avaliação

das políticas públicas.

Page 10: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

conceitual e que vão nos ajudar a en-tender problemáticas centrais para a nossa atuação e também para o Go-verno de Brasília.

Criamos também o Textos para dis-cussão (TD), seguindo o modelo de várias instituições com a mesma fi-nalidade nossa, como o Ipea. A série TD visa publicar trabalhos científicos e rigorosos, de fôlego, sobre o DF e a RIDE, visando ampliar nosso co-nhecimento sobre políticas públicas, planejamento e desenvolvimento na região. Vale lembrar que a remessa de trabalhos para a série TD é livre, aberta a todos os pesquisadores do Distrito Federal.

Também cabe mencionar o lança-mento do Prêmio Codeplan de Mo-nografias, uma iniciativa em parceria com a Fibra DF que visa estimular a produção de conhecimento, em sua primeira edição, sobre o desenvolvi-mento do DF e da RIDE. O Prêmio segue os moldes de iniciativas seme-lhantes da Secretaria do Tesouro Na-cional e da Secretaria de Orçamento Federal e visa, como a série TD, au-mentar o nosso estoque de conheci-mento sobre a região e estimular a produção de tal conhecimento para além da Codeplan.

Ou seja, estamos trabalhando para cumprir nossa missão ao gerar co-nhecimento e informações que au-xiliem o Governo de Brasília em seu planejamento e processo decisório sobre políticas públicas que visem a melhoria de vida da população atra-vés de um projeto de desenvolvimen-to baseado na inovação, criatividade, sustentabilidade e inclusão.

BD - As rodadas de discussão no âmbito da Quintas Codeplan sobre “Indicadores de Políticas Públicas e Serviços” trouxe contribuições para a reflexão dessa temática e há desdo-bramentos?

Lucio Rennó - Na verdade, a Code-plan teve atuação relevante na discus-são sobre os indicadores para o PPA e o Mapa Estratégico do Governo de Brasília, participando ativamente em sua crítica e construção. Foi nes-se sentido que decidimos debater no âmbito do projeto Quintas Codeplan tanto a questão da avaliação das po-líticas públicas quanto à formulação e avaliação de indicadores. As pales-tras foram desafiadoras no sentido de levar-nos a pensar de forma mais or-ganizada e sistemática como avaliar a qualidade dos indicadores. Vale re-

fletir ainda sobre a validade empírica dos indicadores, entendido como a relação entre a medida objetiva pro-posta e o conceito que se pretende medir. Devemos entender os indi-cadores como medidas sociais. As-sim, como todas as medidas sociais acredito que quanto mais objetivos e modestos formos na definição do que queremos medir, torna-se mais fácil atingir a validade de determinado indicador. Aliado ao conhecimento aprofundado das metas e objetivos do programa que se queira avaliar, é possível maximizar a validade das medidas propostas.

BD - A governança no mundo cor-porativo pode ser entendida como a capacidade em executar e tornar real o planejamento e suas estratégias. Como a Codeplan tem lidado com a questão da governança?

Lucio Rennó - A temática central desta edição da Brasília em Debate é Planejamento & Governança na tentativa de alinhar os dois termos que entraram para o vocabulário da administração pública na intenção de melhorar o modelo de gestão no país. Os leitores poderão se aprofundar, de

forma especifica, com o artigo dos especialistas Marcelo Gomes e Leo-nardo Albernaz que tratam da gover-nança pública relacionada à seu cará-ter polissêmico cujo significado varia conforme o campo de estudo ou no contexto da ciência política, da ges-tão governamental e das políticas pú-blicas. Por outro lado, os trabalhos de diversos autores neste número explo-ram conceitualmente a ideia de pla-nejamento e governança. Uma forma de fazer isso é pensar a governança, visando a construção de mecanismos eficientes de monitoramento, que só existem se houver um planejamento anterior, uma definição de metas e passos para atingi-las. Assim, a go-vernança pode ser entendida como etapa central ao colocar em prática as metas e ações definidas pelo pla-nejamento. A governança pode ser entendida como a capacidade em executar e tornar real o planejamento e as estratégias concebidas. Planejar envolve desenhar o mapa do cami-nho e definir aonde se quer chegar: governança é ter as ferramentas ade-quadas para assegurar que o caminho está sendo seguido ou corregido para se chegar aonde se almeja. Hoje em dia, o ato de planejar e monitorar são construídos coletivamente, de baixo para cima, e não impostos pelo centro do poder, como foi no passado. O pro-cesso de planejamento e governança precisa ser participativo, do contrário dificilmente será legitimado e possi-velmente falhará em atingir as me-tas propostas, já que potencialmente pode deixar de contar com o apoio de atores chaves nesse processo.

Antenados à essa questão temos pla-nos gerais de reestruturar a Compa-nhia, repensando seu planejamento estratégico, seu Plano de Cargos Sa-lários (PCS), seu Regimento Interno, mas sempre com a colaboração e par-ticipação dos técnicos da casa. Tam-pouco queremos reinventar a roda: muitas dessas discussões já estavam em curso na Codeplan. Estamos ape-nas retomando-as, aparando arestas e estabelecendo um melhor ambiente de trabalho. Reivindicações antigas dos empregados como um Plano de Desligamento Voluntário e a mudan-ça da natureza jurídica continuam em debate e estudo, mas tudo será fei-to de forma responsável, sem falsas promessas e com o máximo de trans-parência, ouvindo sempre as partes interessadas.

BD - Mudando um pouco de assun-to, como começou seu interesse pela Ciência Política?

Estamos trabalhando para cumprir nossa

missão ao gerar conhecimento e informações que

auxiliem o Governo de Brasília em seu

planejamento e processo decisório

sobre políticas públicas que visem a melhoria de vida da população através de um projeto de desenvolvimento

baseado na inovação, criatividade,

sustentabilidade e inclusão.

Brasília em Debate10

Page 11: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Lucio Rennó - Sempre tive curiosi-dade pela política, estimulado pelo ambiente familiar, as eleições sempre foram fatos emocionantes na minha casa, havia um olhar muito interes-sado sobre essa questão. Desse modo comecei a acompanhar a movimenta-da vida política e pública do país no decorrer dos anos 80, movido pelo entusiasmo que contaminou a todos nas eleições de 1986 e na Assembleia Constituinte. Foi um momento nacio-nal muito impressionante e eu viven-ciei tudo isso ainda muito jovem e achava surpreendente o engajamento cívico de amplos setores da sociedade brasileira e seu interesse por questões políticas. No começo dos anos 1990 ingressei na Universidade de Brasília e me apaixonei pelo estudo rigoroso e sistemático da política. A produção de conhecimento sobre políticas pú-blicas, por exemplo, é fundamental para aprimorarmos a intervenção es-tatal visando a melhoria do bem-estar da população. Uma preocupação da disciplina é justamente entender e ex-plicar a geração de bens públicos tan-gíveis e seus efeitos nos hábitos das pessoas. Nesse caso, é preciso ter uma noção muito clara de como se cons-titui esse rol de elementos que apon-taria para a melhoria da qualidade de vida. Há um aspecto normativo que inspira qualquer pesquisador empírico preocupado com questões desse tipo. A meu ver as pessoas podem viver de

forma honesta e generosa e baseados nesses valores tenham como foco uma vida confortável e rica de experiên-cias. Questões práticas e extremamen-te tangíveis como mobilidade urbana, pobreza, desigualdade, programas de políticas públicas são fundamentais para operacionalizarmos nossas ambi-ções normativas. Podemos mensurá--los. O papel importante da Codeplan é tentar analisar esses elementos em-piricamente; explorar formas de poder observar, qualificar e quantificar, se for o caso, indicar os elementos que atribuam qualidade de vida às pessoas e como ações do governo e sociedade podem contribuir para a melhoria da vida em nossa região. São informa-ções, dados, prognósticos que servem de insumos para que o governo possa entender melhor a sociedade do DF e seus desafios, seus problemas, e seus predicados.

BD - Você vem de bicicleta para o tra-balho. Isso é algo novo no Governo de Brasília. É uma nova geração as-sumindo posições de responsabilidade na sociedade?

Lucio Rennó - Gosto de pensar que sim. Esse governo é marcado por uma nova geração, quase toda ela nascida ou criada em Brasília, e que pensa e age de forma diferente. Não estamos interessados no poder pelo poder, muito menos pelos ganhos pessoais

que o poder pode trazer. Sinto que te-mos, de fato, um compromisso com a melhoria do coletivo, da cidade que moramos, entendida de forma exten-siva, compreendendo todo o DF e indo além, pensando em sua área me-tropolitana. Temos que ter coragem e responsabilidade de inovar na gover-nança, em novas formas de mobilida-de urbana, novas formas de promo-ver o desenvolvimento e de torná-lo inclusivo. Ações individuais ajudam. Andar de bicicleta polui menos, con-gestiona menos o tráfico, faz bem à saúde e tudo isso melhora a qualidade de vida. Para isso precisamos aproxi-mar o trabalho do emprego e melho-rar cada vez mais nossas ciclovias e o compartilhamento de vias entre veículos motorizados e não-moto-rizados. Temos que pensar em uma cidade onde o emprego esteja próxi-mo da moradia e que as pessoas pos-sam ir de bicicleta ou andando para o trabalho. Nossa Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios que está no campo agora, com perguntas so-bre modais de transporte, deixa isso claro: quem trabalha nas regiões ad-ministrativas onde mora se locomove com mais frequência para o emprego à pé ou de bicicleta. Todos ganham com um padrão de vida desse tipo.

Além disso, gosto muito de andar de bicicleta! Aumenta minha disposição para o trabalho. ■

I PRÊMIO CODEPLAN DE MONOGRAFIAS - 2015

Tema: “O Desenvolvimento do Distrito Federal e RIDE”

Inscrições: 10 de agosto a 9 de novembro de 2015

Informações:www.codeplan.df.gov.br

(61) 3342-1091 – (61) 3342-1036

Premiação: 1º colocado R$ 8 mil2º colocado R$ 6 mil3º colocado R$ 4 mil

G O V E R N O D E

BRASÍLIASecretaria de

Planejamento,Orçamento e gestãoCOMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERAL

Brasília em Debate 11

Page 12: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate12

IPCA

Taxa de inflação cai em Brasília(*) Carlos Alberto Reis

(*) Carlos Alberto Reis - Chefe do Núcleo de Análise de Preços

O acompanhamento e a análise da inflação em Bra-sília pela Codeplan, com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA/IBGE), mostram que em julho de 2015, a inflação local registrou alta de 0,38%, recuando 0.67 pontos percentuais em compara-ção ao mês de junho, que indicou variação de 1,05%. Com esse percentual mensal de inflação, Brasília ficou na quinta posição de menor índice, entre as 13 localida-des pesquisadas pelo IBGE (Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Vitória, Porto Alegre e os municípios de Goiâ-nia, Campo Grande, inclusive Brasília). No entanto, no acumulado do ano em curso, até julho, a inflação em Brasília de 5,18% foi a menor entre os locais pesquisa-das. Em 12 meses, acumulou alta de 8,96%.

Por grupos que integram a estrutura de cálculo do IPCA-Brasília, verificou-se que Artigos de Residência contabilizou a maior alta mensal, 1,49%, contribuindo com 0.07 p.p para o resultado da inflação geral no DF. Neste grupo os produtos com maior elevação de pre-ços foram consertos de refrigeradores (5,92%), tapetes (5,12%) e móveis para sala (3,55%).

O Grupo Habitação com segunda maior alta, com-putou aumento de 0,47%, resultando numa contribuição de 0.08 p.p ao índice geral de Brasília. As elevações ob-servadas nos preços dos revestimentos de piso e pare-de (3,16%), e das tarifas de energia elétrica residencial (2,03%), foram destaque neste grupo

Em ordem decrescente de alta, aparece o Grupo Ali-mentação e Bebidas com variação de 0,42%, contribuin-do com 0,09 p.p ao índice geral. As maiores altas ocor-reram em frutas como mamão,10,37% e pera, 7,06%. Destaque também para a alta do pão de queijo, com va-riação de 8,20%.

Com impacto de 0,08 p.p no resultado do índice ge-ral, o Grupo Transportes registrou alta mensal de 0,41%, impactado pelas passagens interestaduais, 7,62% e pe-los transportes escolares, 0,58%. No item Veículo Pró-prio, as altas mais significativas ocorreram nos preços de acessórios e peças, 2,35% e automóveis novos, ma-jorados em 1,52%.

Quanto ao Grupo Saúde e Cuidados Pessoais, o IPCA/Brasília registrou alta de 0,45%, impactando em 0.04 p.p o índice geral do mês. As despesas com den-tista aumentaram 0,88% e medicamentos, 0,21%, estes estão entre as altas mais representativas. O Grupo Edu-cação contabilizou alta mensal de 0,39% e o de Comu-nicação, 0,30%.

O Grupo Habitação acumulou maior alta em 12 me-ses em Brasília, 16,44%, a exemplo do resultado em ní-vel de média nacional. O Grupo Alimentação e Bebidas acumulou alta de 9,58% em 12 meses, e o de Educação, 8,58%. Somando-se aos resultados dos demais grupos, a inflação acumulada em 12 meses em Brasília alcançou o percentual de 8,96%.

De modo geral, os resultados do IPCA/Brasília neste mês de julho de 2015 apontam desaceleração no cresci-mento dos preços em nível de varejo, em relação ao mês anterior. Há uma leve tendência negativa da inflação ao longo dos primeiros sete meses do ano em Brasília, a qual pode ser revertida no segundo semestre, em fun-ção, especialmente, da previsão de novos aumentos de preços administrados, como tarifas de água e energia elétrica, decorrentes dos efeitos de estiagem e baixa nos reservatórios de água. ■

Quadro 1 - Inflação mensal e contribuições sobre o resultado geral, em pontos percentuais, por grupo do IPCA - Abril/2015

Grupos componentes do IPCA Brasília BrasilVariação (%) Contribuição p.p Variação (%) Contribuição p.p

Índice Geral 0,38 0,38 0,62 0,62Alimentação e Bebidas 0,42 0,09 0,65 0,16Habitação 0,47 0,08 1,52 0,24Artigos de Residência 1,49 0,07 0,86 0,04Vestuário -0,59 -0,04 -0,31 -0,02Transportes 0,41 0,08 0,15 0,03Saúde e Cuidados Pessoais 0,45 0,04 0,84 0,09Despesas Pessoais 0,57 0,07 0,61 0,07Educação 0,01 0,00 0,00 0,00Comunicação -0,2 -0,01 0,3 0,01Fonte: IBGE Dados elaborados pela Codeplan

Page 13: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

econométricas desenvolvidas na academia. Justifica-se a excelência do indicador e sua utilidade como instrumento de diagnóstico ou advocacy de políticas para o Desenvol-vimento pela quantidade de informação e “neutralidade” da técnica usada na sua construção. Para essa comunida-de epistêmica da “indicadologia”, quanto mais informa-ção, quanto mais impenetrável é a metodologia, quanto mais eclética é a base conceitual usada, mas válido e útil o indicador proposto. Quanto maior o número de casas decimais com que o indicador é apresentado, mas confiá-vel e preciso é a medida. Como se fosse apurado por um sistema de Contabilidade Nacional - como o Produto In-terno Bruto - o valor final do indicador, qualquer que seja, é a mais “isenta” e “precisa” do nível de desenvolvimento do país ou região. Nessa comunidade epistêmica, o méto-do precede o constructo, o conceito é a medida, a medi-da é o conceito. Em alguns casos, para essa comunidade epistêmica, a indistinção Conceito-Medida é até mesmo reconhecida como uma característica desejável. Medidas com forte base empírica justificariam, nessa perspectiva, pseudo-constructos.

Há um deslumbramento despropositado dos propo-nentes de tais indicadores quanto à utilidade dos mesmos como instrumentos de avaliação de políticas públicas. Em geral, para garantir a suposta “legitimidade acadêmica” e “purismo metodológico” na construção dos indicadores, seus proponentes valem-se quase que exclusivamente de referências filosóficas, conceituais e acadêmicas sobre Desenvolvimento, Bem-Estar ou Pobreza, deixando de incorporar o conhecimento aplicado sobre as experiências concretas de Políticas Públicas bem sucedidas tão larga-mente descritas por organismos multilaterais em diversos países e contextos. Tal escolha teórica e metodológica não seria problemática se essas medidas ficassem restri-tas ao meio acadêmico ou na produção de diagnósticos de condições de vida, mas torna-se problemática quando se advoga que os referenciais supostamente “iluminados” em que se baseiam, produzem indicadores igualmente “iluminadores” da boa razão técnica-política.

Bons indicadores de avaliação de políticas precisam na realidade, ser específicos e sensíveis aos vários com-ponentes programáticos das mesmas, para mostrar efei-tos - ausência de efeitos ou mesmo os defeitos - quanto existe razão de suspeitar que eles tenham sido produzi-dos. Para tornar mais clara essa assertiva, vale citar dois exemplos: se a escolaridade média é um bom indicador social para retratar diagnósticos de condições de vida no Brasil, frequência escolar de crianças de 4 a 5 anos, aban-dono no ensino médio, defasagem idade/série ou medidas de desempenho - todos disponíveis e atualizadas regular-

No esteio do sucesso midiático do Índice de Desenvol-vimento Humano dos últimos vinte anos, diversos centros de pesquisas, organizações internacionais e universidades disputam a atenção de jornalistas e, desejavelmente, to-madores de decisão no setor público para mostrarem a suposta originalidade conceitual e excelência técnica de suas propostas de indicadores de Progresso Social, Fe-licidade, Vulnerabilidade ou Pobreza Multidimensional. Relatórios sociais são produzidos com esses indicadores, seja em perspectiva comparativa entre países, seja em perspectiva temporal para ilustrar a potencialidade ana-lítica dos mesmos.

Como sugerido em alguns destes relatórios, o indica-dor proposto estaria assentado na base conceitual, filosó-fica e bibliográfica mais completa e abrangente disponí-vel sobre Desenvolvimento, estaria se valendo da maior variedade de dados sociais existentes entre os países e teria sido construído com as mais sofisticadas técnicas

Diagnóstico social, Avaliação de Políticas ou Impacto Midiático?(*) Paulo Jannuzzi

Artigo

Foto: Ana Nascimento

IPCA

Brasília em Debate 13

Page 14: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

devem refletir com mais sensibilidade e especificidade os efeitos - ou falta de efeitos - de ações e programas por elas desencadeados, medidos ao longo do tempo. Sincro-nia é atributo básico dos Indicadores de Diagnóstico; a diacronia é fundamental nos Indicadores de monitora-mento e avaliação de Políticas. Indicadores sociais se le-gitimam pela capacidade de diferenciação territorial em dado momento; Indicadores de Políticas, pela capacidade de diferenciação antes/depois das ações implementadas, em dois momentos, portanto.

Indicadores de monitoramento e avaliação de pro-gramas públicos deveriam, assim, refletir o desenho de políticas e programas específicos. Tome-se, por exem-plo, o caso das politicas de desenvolvimento social e superação da pobreza (Quadro 1)1. Se a natureza da in-tervenção envolve a formulação de programas de suple-mentação alimentar, com distribuição de leite a crianças ou de cestas básicas às famílias, requer-se idealmente medidas diretas de nível de desnutrição, como indica-dores antropométricos. Se o combate à fome envolve a implementação de programas de transferência de ren-da, ações de inclusão produtiva e políticas ativas de emprego (dinamização da economia, aumento real do salário mínimo etc.), indicadores de pobreza monetária são úteis para monitoramento das taxas de cobertura da população potencialmente retirada do risco de exposi-ção a esse flagelo. Se a estratégia envolve o provimento de alimentos por meio de merenda servida nas escolas ou de equipamentos de segurança alimentar - restauran-tes populares, banco de alimentos etc. - indicadores de acesso e frequência a itens alimentares específicos po-dem trazer subsídios relevantes para avaliação. Se, na estratégia de combate à pobreza, são acopladas inter-venções de natureza político-institucional para mitigar efeitos da estigmatização ou discriminação a que es-tão sujeitas as populações mais pobres, indicadores de percepção subjetiva de sua condição social podem ser importantes. Enfim, se o desenho do programa voltado à mitigação da pobreza é mais abrangente, envolvendo diferentes ações setoriais de políticas sociais, as medi-das de pobreza multidimensional ou um conjunto mais amplo de medidas de pobreza ou indicadores sociais po-dem ser mais úteis para acompanhamento da estratégia.

1 JANNUZZI, MARTIGNONI e SOUTO (2012).

mente no país - são indicadores muito mais específicos e sensíveis para captar a efetividade de políticas educa-cionais; indicadores de disponibilidade de bens, material de paredes e piso, acesso a serviços urbanos de água, luz, saneamento e transporte são certamente muito mais sen-síveis e específicos à existência ou não de programas de acesso a crédito, de valorização do salário mínimo ou de acesso à moradia popular que medidas de adensamento de moradores por cômodo. Por fim, se esperança de vida é um bom indicador de diagnóstico ou avaliação a longo prazo de mudança de estilos de vida e acesso a serviços de saúde de diferentes naturezas, mortalidade infantil ou bem estar físico reportado podem ser indicadores melho-res para monitoramento e avaliação regular de existência e oferta de programas de saúde pública.

Pode parecer contraditório, mas bons indicadores de diagnóstico social não são necessariamente bons indi-cadores de monitoramento e avaliação de políticas no curto e médio prazo. Diagnósticos apoiam-se, em geral, em indicadores de estoque; monitoramento e avaliação regular de políticas demandam medidas que reflitam flu-xos. No longo prazo, indicadores de diagnóstico podem ser úteis para avaliar o esforço do conjunto de estraté-gias desenhadas para colocar em ação a política social em questão. Afinal, políticas e programas efetivos são desenhados para mitigar a questão social originária va-lendo-se de estratégias com maiores chances de se via-bilizar no contexto de recursos, governabilidade política e competência técnica existente. Indicadores produzidos regularmente, que sejam sensíveis e específicos a essas estratégias, produzirão evidências certamente muito mais úteis para avaliar avanços, resiliências, retrocessos, inexequibilidade ou impropriedade da política que as medidas referidas a um constructo teórico distante, cer-tamente portador de visões desejáveis de sociedade, mas pouco instrumentalizador da ação pública mais efetiva e transformadora.

Enfim, Indicadores de Diagnóstico prezam pela ca-pacidade de explicação de alguma questão social ou de discriminação de situações típicas em que tal questão se manifesta em grupos populacionais ou territórios, em um momento específico do tempo. Indicadores de Políticas

Quadro 1: Indicadores de Avaliação de Políticas segundo natureza e desenho da Política de Combate à PobrezaNatureza da Política ou Programa Conceito Subjacente Indicadores de Avaliação

Provimento do acesso ao alimento por meio de meren-da escolar, distribuição de leite, cestas básicas, etc.

Fome, desnutriçãoIndicadores antropométricos, de insegurança alimentar, consumo de itens específicos

Transferência de renda, Inclusão Produtiva e Política ativas de Emprego

Pobreza monetária Taxa de pobreza medida pela linha de pobreza

Provimento de acesso a conjunto de programas, servi-ços e bens públicos

Pobreza multidimensionalIndicador multidimensional ou conjunto de indicadores sociais ou de pobreza

Redução da desigualdade de acesso à renda e a outros programas

Pobreza relativaProporção de pessoas com renda abaixo da renda me-diana, indicadores de desigualdade ou hiato de renda

Atuação nos efeitos simbólicos e de estigmatização da exclusão social

Pobreza percebida Indicadores subjetivos ou autodeclarados de pobreza

Desenho customizado de programas para público-alvos específicos

Pobreza multifacéticaIndicadores de pobreza específica para cada tipo de in-tervenção desenhada

Brasília em Debate14

Page 15: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 15

Pode-se até reconhecer a utilidade do IDH na elabo-ração de diagnósticos comparativos gerais de condições de vida, mas certamente é um equívoco empregá-lo como instrumento de avaliação de políticas públicas. Sua forte dependência de um indicador basicamente econômico - Produto Interno Bruto per capita - e de indicadores sociais de estoque - escolaridade média, anos esperados de esco-laridade e esperança de vida - o tornam pouco sensível e específico a políticas e programas sociais com impacto no curto e médio prazo como os programas de combate à fome e pobreza, operados pelo Ministério de Desenvolvi-mento Social e Combate à Fome (MDS) nos últimos doze anos. Fossem outros os indicadores primários do índice - de fluxo como taxas de atendimento escolar, acesso a programas de saúde, renda familiar ou taxas de pobreza - a medida seria certamente muito mais sensível e útil para o advocacy regular pretendido por seus proponentes, de subsidiar a avaliação de políticas sociais3. O IDH seria, pois, na melhor das hipóteses, um indicador para diagnós-ticos sincrônicos de “desenvolvimento humano”, mas não um indicador de avaliação diacrônico de políticas sociais.

Relatórios anuais com um indicador de tal natureza, pró-cíclico ao comportamento do PIB e insensível ao que se tem feito de relevante em políticas sociais no Brasil e outros países, contribuem, na realidade, para deslegiti-mar agendas progressistas e inovadoras na área social. É o que relevam os episódios que se repetem, todo ano, ao divulgar o Relatório de Desenvolvimento Humano no Brasil: ainda que o conteúdo do relatório possa reconhe-cer o mérito de políticas sociais no desenvolvimento hu-mano no país, a invariabilidade do índice é a contrapro-va usada - ingênua ou conscientemente - por segmentos da mídia e do meio político para apontar que nenhum avanço social foi alcançado. Para citar um dentre tantas situações dessa natureza, vale verificar a “esquizofrenia comunicacional” entre a citação selecionada do RDH 2013 - reconhecendo méritos da estratégia brasileira de políticas sociais - e manchete - de valência negativa - de portal Web de diário de circulação nacional, no dia de divulgação do relatório, como ilustrado no Quadro 2.

3 Vide JANNUZZI, BARRETO e SOUSA (2013). Vide ainda VAZ (2013) e VAZ (2014) para críticas semelhantes a outros indicadores “iluminados” propostos nos últimos anos.

As propostas de construção de indicadores de Desen-volvimento, Vulnerabilidade Social ou Pobreza Multi-dimensional não podem, pois, se valer apenas de cons-tructos teóricos e, muito menos, de experimentos de sociometria empiricista2. Precisam se inspirar mais nas experiências exitosas e boas práticas de políticas públicas em nível internacional e subnacional, documentadas em larga escala há mais de 30 anos. Sem negar, em absolu-to, a importância de referências conceituais, filosóficas e acadêmicas na motivação dessas propostas, advoga-se que, para sua operacionalização instrumental, é necessá-rio compilar, estudar e investigar o que diferentes países têm criado e colocado em prática em termos de políticas e programas sociais que atuam na mitigação da pobreza, da vulnerabilidade, da desigualdade. Indicadores usados no monitoramento e avaliação dessas políticas, referidos a programas ou públicos-alvo mais específicos, podem conferir maior utilidade técnica-política que os indicado-res sociais tradicionalmente recomendados em propostas de inspiração marcadamente acadêmica.

A experiência do Índice de Desenvolvimento Huma-no (IDH) é um bom exemplo a citar nesse sentido, e na-turalmente a evitar. Inspirado em concepções filosóficas supostamente “iluminadas” e “consensuais”, o indicador pouco refletiu, de fato, em suas medições anuais, os efei-tos das experiências de políticas sociais mais significa-tivas nos últimos vinte anos. De partida, isso se deve ao fato de que o indicador assenta-se em pressupostos clara-mente liberal-conservador acerca do papel do Estado no Desenvolvimento. Nesse ideário o desenvolvimento é o resultado da viabilização de oportunidades de emancipa-ção individual e não como processo ativo de promoção do acesso a direitos sociais coletivos, concepção essa que tem embasado a proposição de inovações importantes em termos de políticas sociais pelo mundo afora. Não seria surpreendente, pois, que um indicador construído sob a égide de um consenso de inspiração liberal-conservador sobre Desenvolvimento Humano não pudesse captar o que se propugna por Desenvolvimento Social por outras correntes e concepções políticas mais progressistas.

2 Sociometria empiricista soa propositalmente como um pleonasmo !!

Quadro 2: O que diz o Relatório de Desenvolvimento Humano sobre políticas sociais do Brasil e o que a imprensa noticia com base no IDH, presente no próprio relatório.

Relatório de Desenvolvimento Humano 2014, pg.104 Noticia repercutida no portal do jornal Estado de São Paulo no dia de lançamento do Relatório

The government implemented amix of policy interventions aimed at boosting the

job market, targeting government spending and cash transfers, expanding universal primary

schooling and redressing gender and racial disparities. Infant mortality was cut almost in half between 1996

and 2006, and the proportion of girls in primary school rose from 83 percent to 95 percent between 1991

and 2004. Brazil’s efforts to reduce its longstanding inequality by promoting income redistribution and

universal access to education, health care, water supply and sanitation services also improved child nutrition, resulting in a large reduction in child stunting for the

poorest 20 percent of the population.

Page 16: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate16

(*) Paulo JannuzziSecretário de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE e colaborador da Escola Nacional de Administração Pública.

Referências bibliográficas

• HELLIWELL, J.F. et al. World Happiness Report 2015. New York: Sustainable Development Solutions Network. 2015.

• JANNUZZI, P.M. ; MARTIGNONI, E. M. ; SOUTO, B. F. . O Programa Bolsa Família e sua contribuição para redução da pobreza no Brasil. Revista Brasileira de Monitoramento e Avaliação, v. 4, p. 40-61, 2012.

• JANNUZZI, P.M.; BARRETO,R.; SOUSA,M. Monitoramento e Avaliação do Desenvolvimento Humano: a insensibi-lidade do Índice de Desenvolvimento Humano às Politicas de Desenvolvimento Social. Revista Brasileira de Monitora-mento e Avaliação, v. 5, p. 60-79, 2013.

• VAZ, Alexander Cambraia N. Notas críticas conceituais e metodológicas referentes ao IPS - Índice de Progresso Social. Estudo Técnico SAGI nº 18/2013. Disponível em: www.mds.gov.br/sagi

• VAZ, Alexander Cambraia N. Pobreza Multidimensional . Estudo Técnico SAGI nº 08/2014. Disponível em: www.mds.gov.br/sagi

É curioso o fato de que tendo o Brasil sido classificado na 16ª posição dentre 159 países nesse Índice de Feli-cidade não tenha havido qualquer repercussão midiática interna no país, quando do lançamento da edição 2015 do Happiness World Report em abril de 2015. Será que seria diferente se o país tivesse regredido no ranking, ao invés de ter avançado oito posições em relação a 2005?

Felicidade, Bem-estar, Desenvolvimento Humano, Desenvolvimento Sustentável, Pobreza Multidimensio-nal são constructos muito caros à Economia Política e à agenda governamental. Não podem estar sujeitos a um sociometrismo empiricista que, supostamente bem inten-cionado, pode fazer apologia a políticas públicas equivo-cadas. Na realidade, esse sociometrismo empiricista é um mal que hoje acomete muitos centros de pesquisa, muitos deles bem intencionados, outros nem tanto. A disputa de recursos de financiamento de equipes parece legitimar uma certa lógica de quanto maior apelo midiático tem o relatório - em geral, quanto mais gravosa é a manchete que pode gerar - maior a garantia de que os recursos para o relatório do ano seguinte estarão garantidos.

Se não há qualquer dúvida de que os problemas so-ciais precisam continuar sendo investigados, também não deveria haver dúvida de que os instrumentos de monito-ramento e avaliação precisam ser cada vez mais consis-tentes, se o objetivo é, de fato, contribuir para mitigar as causas e consequências da questão social originária.

Não se pode avaliar resultados e impactos de políticas e programas sociais no presente com base em indicadores formulados sob a égide de uma política social de 50 anos atrás. Instituições de pesquisa como a Codeplan e suas parceiras na Associação Nacional de Instituições de Pla-nejamento Pesquisa e Estatística tem muito a contribuir para essa nova agenda de Indicadores! ■

O que diz o Relatório de Desenvolvimento Humano so-bre políticas sociais do Brasil e o que a imprensa noticia com base no IDH, presente no próprio relatório? Afinal, a análise sobre os avanços está correta ou é o indicador que não consegue expressar os avanços? Ou é o contrá-rio? O indicador está correto e a política social não está provocando nenhum desenvolvimento humano? Afinal, essa ambivalência do Relatório contribui para fortalecer ou para deslegitimar a Política Social?

As menções críticas ao IDH se aplicam a muitas ou-tras propostas, vale observar. Há muitos outros exem-plos de propostas de conceito-medidas a evitar, como o Índice de Felicidade do Earth Institute da Columbia University, patrocinado também pelas Nações Unidas (HELLIWELL 2015). Felicidade é definida, medida e confundida com seu indicador proposto, o Índice de Fe-licidade, calculado como uma síntese de seis indicado-res, dois deles indicadores objetivos - renda per capita ajustado ao poder de paridade de compra e esperança de vida ao nascer - e quatro indicadores de percepção sub-jetiva, construídos a partir de pesquisa realizada regu-larmente pelo Gallup em mais de 150 países, referidos a quatro aspectos - rede de apoio pessoal, confiança no governo/negócios, liberdade pessoal para tomar deci-sões sobre rumo da vida e generosidade. Estes aspectos são medidos a partir de respostas às perguntas “If you were in trouble, do you have relatives or friends you can count on to help you whenever you need them, or not?” (apoio pessoal), “Is corruption widespread throughout the government/business or not?” (confiança), “Are you satisfied or dissatisfied with your freedom to choose what you do with your life?” (liberdade para tomar de-cisões de vida), “Have you donated money to a charity in the past month?” (generosidade).

Page 17: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 17

O que é um bom governo para a nova governança pública?

Artigo

(*) Marcelo Barros Gomes(**) Leonardo Rodrigues Albernaz

Este artigo se propõe a discutir abordagens de go-vernança pública e condições para o seu fortalecimento, como meio essencial para tornar os governos mais aptos a lidar com as demandas sociais contemporâneas. Em ampla medida, esse esforço relaciona-se com a democra-tização do Estado e sua abertura para a sociedade civil, criando caminhos institucionais para a escolha de objeti-vos legítimos, para a atuação conjunta na implementação de políticas públicas e para uma interação constante entre organizações estatais e cidadãos, em que o aprendizado na ação governamental seja concomitante ao pleno exer-cício do controle social.

Além disso, acrescenta-se que o fortalecimento da go-vernança pública diz respeito à formulação estratégica do Estado, construída em torno de uma visão de desenvolvi-mento inclusivo e sustentável, demonstrável por indica-dores-chave. Essa formulação ampla deve ser articulada nas distintas esferas estatais por meio de centros de go-verno, dotados de capacidade para promover a concerta-ção intragovernamental e federativa, a priorização de me-tas e ações e a garantia das entregas efetivas aos cidadãos.

Por sua vez, essa formulação estratégica tem sua exe-cução e aprimoramento condicionados à constituição de uma administração pública profissional e qualificada, ca-paz de atuar conforme os pressupostos da democracia e da sustentabilidade econômica e fiscal - avanços institu-cionais brasileiros das últimas três décadas -, para reali-

zar as melhores escolhas na alocação de recursos e nas atividades regulatórias do Estado, com autonomia eleva-da em paralelo com a ampliação da transparência e das possibilidades reais de escrutínio da sociedade sobre os atos públicos.

Nova Governança Pública

Uma dificuldade inerente ao emprego da expressão governança relaciona-se ao seu caráter polissêmico, vez que seu significado varia conforme o campo de estudo e mesmo no âmbito específico da ciência política, da ges-tão governamental e das políticas públicas. Concentran-do-se no contexto de cada Estado-nação e, internamente, nas relações entre estado e sociedade, pode-se partir de uma concepção abrangente como a originalmente adota-da pelo Banco Mundial no início da década de 1990, se-gundo a qual governança é “a maneira pela qual o poder é exercido na administração dos recursos econômicos e sociais do país, com vistas ao desenvolvimento” (BAN-CO MUNDIAL, 1992).

Segundo essa perspectiva, a governança pode ser compreendida a partir de três pilares principais: a forma do regime político; os processos segundo os quais a au-toridade é exercida na gestão dos recursos econômicos e sociais com vistas ao desenvolvimento nacional; e a ca-pacidade governamental de formular e implementar po-líticas públicas, assim como, em sentido mais geral, de

Fotos: Toninho Leite

Page 18: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate18

exercer suas funções. Trata-se, pois, de um conceito que correlaciona os elementos estruturais do ambiente polí-tico, jurídico e social de um país com sua capacidade de produzir desenvolvimento em sentido socioeconômico.

Com significado semelhante, o relatório Governan-ce: the World Bank’s Experience (BANCO MUNDIAL, 1994) apresentou uma revisão do conceito, adotando os seguintes termos: “governança é sintetizada por formula-ção previsível, aberta e esclarecida de políticas (ou seja, processos transparentes); uma burocracia imbuída com ethos profissional; um braço executivo responsável por suas ações; uma forte participação da sociedade civil nos negócios públicos; e todos se comportando sob as regras da lei”. Nesse contexto, defende-se que a solidez das ins-tituições democráticas, a prevalência efetiva do Estado de Direito, a qualidade da burocracia governamental e a abertura para a sociedade são fatores determinantes do nível de desenvolvimento de um país e da sua evolução.

A partir dessa esfera mais abrangente, é possível des-crever e analisar o significado da governança pública em diversos contextos, conforme se percorra um caminho rumo à especificação dos componentes de observação, até alcançar as organizações governamentais e seus pro-cessos internos. Não é por outra razão que se pode, no limite dos órgãos e entidades públicas, considerar mode-los de governança corporativa aplicada ao setor público, conforme a expansão de estruturas e mecanismos a partir dos anos 1990, voltados à minimização dos problemas associados ao “conflito de agência”, atinente, por sua vez, à distinção entre propriedade e gestão empresarial.

Essa perspectiva mais específica tem sido construí-da por distintas organizações, a partir, em regra, da adaptação de modelos desenvolvidos originariamente em ambientes privados corporativos para a realidade das organizações estatais. Dois casos que ilustram essa abordagem são encontrados na proposição do IFAC (...) para os elementos constituidores da governança de en-tidades do setor público e no referencial elaborado pelo

Tribunal de Contas da União (TCU) (...) para orientar a adoção desses princípios e práticas nas organizações do estado brasileiro.

No espaço entre a esfera mais abrangente, como a proposta pelo Banco Mundial, e os modelos de gover-nança corporativa aplicados às instituições estatais, exis-te um campo ainda relativamente pouco explorado sob essa perspectiva, em que as unidades de observação se constituem de políticas públicas ou das estruturas estatais que as sustentam de forma conjunta. Esse campo permite, portanto, a consideração sobre a governança em políticas públicas setoriais, por exemplo, tomadas isoladamente ou em matrizes intersetoriais ou transversais, por um lado, ao mesmo tempo em que traz relevo ao papel dos órgãos centrais de governo, de cujo funcionamento dependem todos os programas e ações específicas a cargo das ins-tituições estatais.

Em comum, todas essas esferas de observação da governança pública guardam relação com a origem do termo, relacionada à ideia de “direção”, como nota Guy Peters (PETERS, 2013). Afinal, admitindo-se que a exis-tência do Estado e do seu aparato institucional se justi-ficam em função dos interesses últimos da sociedade, a governança pública tratará, em esferas e escalas distintas, da capacidade de um Estado, de um governo, das diver-sas políticas públicas e das organizações que as executam de seguir os rumos delineados pela cidadania, dentro dos limites facultados pela operacionalização das escolhas democráticas de um povo.

Peters desenvolve essa ideia ao desdobrar a governan-ça pública em quatro componentes gerais: a eleição de objetivos coletivos e legítimos pela sociedade; o estabe-lecimento de coerência e coordenação na concepção e na gestão de políticas públicas; a disponibilidade de condi-ções apropriadas para implementação das políticas públi-cas, em que se pode contemplar a capacidade interna da burocracia estatal e a articulação do Estado com atores não governamentais em geral; e a efetivação de proces-

sos de aprendizado con-tínuo e de accountability, englobando o acesso à in-formação de desempenho e formas de responsabili-dade dos gestores perante a sociedade.

Embora essas concep-ções estejam alinhadas ao escopo e aos objetivos deste artigo, explorare-mos ainda dois conceitos que o Tribunal de Contas da União tem utilizado no âmbito de políticas públi-cas específicas ou acerca do conjunto de governo. Dessa forma, o TCU pro-põe, em seu Referencial de Avaliação de Governan-ça em Políticas Públicas

Page 19: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 19

(BRASIL, 2014), que a governança em políticas públicas se refere aos “arranjos institucionais que condicionam a forma pela qual as políticas são formuladas, implementa-das e avaliadas, em benefício da sociedade”. E acrescenta o referencial, “nesse contexto, os arranjos institucionais dizem respeito, entre outros aspectos, a estruturas, pro-cessos, mecanismos, princípios, regras, normas que in-fluenciam a governança em políticas públicas”.

De forma semelhante, a Estrutura Analítica sobre Go-vernança Pública, proposta pela OCDE em estudo em conjunto com o TCU e outras entidades fiscalizadoras superiores de 11 países e da União Europeia, a boa go-vernança “é a otimização dos processos e arranjos institu-cionais pelos quais os governos formulam, implementam e oferecem políticas, programas e serviços em benefício dos cidadãos e da sociedade” (OCDE, 2014).

Em outras palavras, a boa governança “é a garantia de que os mecanismos que conduzem o ciclo de polí-ticas em formulação, implementação, monitoramento e avaliação estão funcionando com efetividade, eficiên-cia e economia, e são sustentados por princípios de governança mais amplos, tais como Estado de Direito, transparência, integridade e accountability”. No âmbito do referido estudo, compreende-se ainda que a boa go-vernança corresponde à construção de um Estado com agilidade estratégica, robustez institucional, abertura e processos eficientes e eficazes.

Para a OCDE, a capacidade de estratégia e agilidade refere-se a uma visão de longo prazo, em que objetivos são delineados e há um efetivo gerenciamento de riscos a eles associados, de forma a reunir todos os esforços sociais e recursos necessários para oferecer respostas às demandas dinâmicas da sociedade.

A robustez institucional relaciona-se a estruturas e re-des construídas em torno das políticas públicas, necessá-rias para que o Estado seja capaz de atuar com direção, coerência, articulação interna e externa, evitando lacunas e ineficiências associadas a sobreposições.

A abertura diz respeito à ação proativa do estado para apresentar suas decisões e ações aos cidadãos, eviden-ciando a relação entre suas medidas cotidianas e os ob-jetivos maiores eleitos pela sociedade, ao mesmo tempo em que se apresenta disponível para a articulação com atores sociais diversos, de natureza não-estatal, em busca de objetivos comuns relacionados ao interesse público.

Finalmente, são necessários sistemas e processos ca-pazes de atuar com eficiência e eficácia, gerando resulta-dos com o melhor aproveitamento dos recursos públicos, alinhados, necessariamente, a uma perspectiva integrada do conjunto de governo e à visão estratégica que norteia as intervenções estatais em um dado contexto social e econômico.

Em conjunto, essas perspectivas sobre a governan-ça pública permitem alinhavar os pontos de uma nova agenda para o aperfeiçoamento do aparelho do Estado, acoplando-se a uma terceira geração de reformas dentro do ciclo democrático, que permita com segurança a ma-nutenção de legados institucionais dos últimos 30 anos - notadamente, a estabilidade constitucional e a profis-sionalização pública (primeiro ciclo), maior eficiência e disciplina fiscal e monetária do Estado (segundo ciclo) -, elevando de forma significativa os resultados e a qualida-de do gasto público.

As reformas desse terceiro ciclo devem englobar as estruturas de governança como garantias fundamentais

A boa governança “é a garantia de que os mecanismos que conduzem o ciclo de políticas em formulação, implementação, monitoramento e avaliação estão funcionando com efetividade, eficiência e economia, e são sustentados por princípios de governança mais amplos, tais como Estado de Direito, transparência, integridade e accountability”.

Foto: Toninho Leite

Page 20: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate20

(*) Marcelo Barros Gomes, mestre em administração pública e políticas públicas pela London School of Economics and Political Science e especialista em auditoria de desempenho governamental pelo Government Accountability Office dos Estados Unidos. Auditor Federal Controle Externo e coordenador-geral da área social e da região Nordeste (TCU).

(**) Leonardo Rodrigues Albernaz, graduado em Engenharia Elétrica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e especialista em Análise e Avaliação de Políticas Públicas pelo Instituto Serzedello Corrêa do Tribunal de Contas da União. É auditor Federal de Contro-le Externo e secretário da Secretaria de Macro Avaliação Governamental do TCU (Semag/TCU).

para boa formulação, implementação e entrega de políticas públicas. Para tanto, ao longo dos ciclos de uma gestão, três perguntas devem ser res-pondidas de forma clara e objetiva por um governo: O que se almeja al-cançar com o gasto público e com as intervenções governamentais? O que se entregou de fato - e por quê? A que custo promove cada entrega? São três questões difíceis de serem respondi-das, tanto a priori quanto ao final de cada ciclo de gestão. A primeira diz respeito à possibilidade de fazer uma narrativa sobre o futuro, sobre os ce-nários normativos que se pretende concretizar. A segunda requer a defi-nição de uma cesta de indicadores de desenvolvimento e de resultados ade-quada para medir política pública e, a partir de certos critérios, subsidiar avaliações que permitam concluir cada ciclo das políticas, aferir seus resultados e garantir transparência e aprendizado para a sociedade e a ges-tão governamental. E, por fim, a ter-ceira requer um conhecimento mais preciso sobre os custos incorridos nas transformações da realidade social.

A constituição de um Estado apto a lidar com essas questões pressupõe a adoção de diretrizes e medidas que contemplem os principais desafios dessa agenda contemporânea:

1. Construir coletivamente uma estratégia nacional integrada, com indicadores de longo prazo e uma visão coerente de desenvolvimento inclusivo e sustentável;

2. Reformar a estrutura dos centros de governo na União e em todos os níveis da federação (unidades de coordenação e eficiência), com melhoria rele-vante da capacidade de articulação, priorização e acompanhamento de atividades, apoiando-se em indicadores-chave críveis e mensuráveis;

3. Aprimorar as decisões alocativas de recursos pú-blicos, dotar o sistema orçamentário de capacidade para contemplar o planejamento governamental de médio prazo com base em resultados e fortalecer a estrutura de governança fiscal, tendo em vista a sustentabilidade da dívida e do financiamento das políticas públicas em geral;

4. Consolidar a capacidade regulatória do Estado, com a criação de estruturas de análise de impac-

to regulatório, centrais de projetos robustas e manutenção de entes regu-ladores com autonomia decisória e fi-nanceira, independência e capacidade técnica efetiva;

5. Implantar sistemas e estruturas para análise de riscos sistêmicos e avaliação de controles internos, ca-pazes de garantir a eficácia dos resul-tados e a eficiência dos processos de entrega e regulação estatais;

6. Desenvolver a capacidade ava-liativa consistente das ações, dos pro-gramas e das políticas públicas, em todas as estruturas da administração pública, com o objetivo de aprimorar seu sistema decisório, sua transparên-cia, seu aprendizado e a responsabili-zação governamental;

7. Promover ações de transparên-cia e de abertura de dados, visando a participação cidadã efetiva com vistas à melhoria do controle social e da de-mocracia participativa.

Nesse cenário, para uma nova go-vernança pública, um bom governo vai além de uma ad-ministração pública eficiente e honesta. Um bom gover-no busca o desenvolvimento sustentável e inclusivo por meio de um Estado estratégico e ágil. Um bom governo possui instituições e políticas públicas abertas, transpa-rentes e íntegras, que fortaleçam o clima de confiança no país, tornando-o mais atrativo e favorável a investi-mentos produtivos.

Para a nova governança pública, um bom governo concebe, implementa, monitora, entrega, avalia e adota políticas, programas, serviços, regulações e atividades públicas de forma estratégica, responsável, republicana e democrática. Utiliza-se das melhores práticas interna-cionais, considerando as particularidades inerentes ao contexto nacional, e posiciona-se de forma estratégica em parcerias com a sociedade. Valoriza a inovação, a efi-ciência e a qualidade das instituições públicas. Busca a justa remuneração do capital privado em suas parcerias, a qualidade regulatória e a boa prestação dos serviços. Disponibiliza informações úteis, auditadas e corretas à sociedade. Possui agilidade para implementar suas ope-rações e capacidade para analisar contextos e alterar ru-mos rapidamente. Constrói um ambiente de percepção e valorização da ética. Acima de tudo, um bom governo, para a nova governança pública, busca realizar os obje-tivos legítimos da sociedade, ao tempo em que preserva os direitos e a qualidade de vida das futuras gerações. ■

Para a nova governança pública,

um bom governo concebe, implementa,

monitora, entrega, avalia e adota

políticas, programas, serviços, regulações e atividades públicas de forma estratégica,

responsável, republicana e democrática.

Page 21: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 21

As quatro escalas do plano piloto no planejamento urbano de Brasília

Artigo

(*) Sérgio Ulisses Jatobá

Foto: Toninho Leite

O plano-piloto de Brasília (PPB), concebido pelo ur-banista Lucio Costa, tem como um dos seus conceitos centrais a concepção de quatro escalas urbanas, elemen-tos definidores do seu tombamento patrimonial como conjunto urbanístico. São as escalas residencial, monu-mental, gregária e bucólica, predominantes em áreas es-pecíficas da cidade e articuladas a partir dos eixos rodo-viário e monumental (Fig.1).

As quatro escalas não estão explícitas no Relatório do PPB de 1957, mas foram citadas pela primeira vez por Lucio Costa em 1961 e ressaltadas no documento Brasília Revisitada de 1987. São definidas pela volume-tria construída, o sistema viário, a proporção de espaços livres e ocupados, as densidades e as práticas socioes-paciais. Embora tenham a sua aplicação restrita prati-camente ao Plano Piloto, muitos dos seus fundamentos estão presentes em outras áreas urbanas do Distrito Fe-deral. Contudo, constata-se que ao longo do tempo ocor-reram readaptações e mesmo desvirtuamentos do pro-jeto de Lucio Costa. As escalas, entretanto, não foram descaracterizadas nos seus princípios básicos, o que tem garantido, até o presente, a manutenção do tombamento.

A seguir se apresentará uma visão geral das escalas, bem como uma abordagem particularizada de cada uma delas. Serão explanadas as referências teóricas, concei-

tuais, funções e a articulação entre elas, procurando tra-çar sua evolução desde a concepção original até a efetiva implantação.

Uma visão geral

O conceito de escala urbana adotado por Lucio Costa no projeto do PPB não foi o cartográfico, pois transcen-de a mera representação física. Costa utiliza-se concei-tualmente das escalas no sentido morfológico urbano, mas sua abordagem, mesmo associada ao desenho do espaço, não está desvinculada das práticas socioespa-ciais e simbólicas.

Presume-se que Costa tenha procurado uma interpre-tação própria dos princípios racionalistas em função de sua vasta cultura arquitetônica e urbanística, que não se resumia ao urbanismo moderno. Neste sentido, a aplica-ção das escalas no seu projeto urbanístico foi a maneira por ele adotada para abordar a questão da setorização na cidade funcionalista do urbanismo moderno.

O funcionalismo vincula-se à corrente do urbanismo progressista, que propõe uma ruptura radical com o pas-sado histórico. Inspirados nos processos industriais e no cubismo, os princípios funcionalistas do urbanismo mo-derno foram postulados pelo arquiteto Charles-Édouard Jeanneret, mais conhecido como Le Corbusier, na Carta de Atenas, documento por ele escrito a partir das dis-cussões do Congresso Internacional de Arquitetura Mo-derna (IV CIAM), realizado em 1933. De acordo com Choay (2005) no funcionalismo, a indústria e a arte se uniram em torno da ideia do homem-tipo universal, con-ceituado pelos pré-urbanistas progressistas Owen, Fou-rirer, Richardson, Cabet e Proudhon, como o indivíduo, que independente das contingências de lugar e tempo, pode ser definido a partir de suas “necessidades-tipos

Figura 1 - As Quatro Escalas na Área Tombada. Fonte: GDF/Seduma (2009)

Page 22: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate22

cientificamente dedutíveis”. É essa imagem que sustenta o conceito lecorbusiano expresso nas quatro funções ur-banas: 1) habitar; 2) trabalhar; 3) locomover-se / circular e 4) cultivar o corpo e o espírito por meio da recreação.

As escalas do PPB guardam certa correspondência com a separação das funções urbanas, mas não se con-fundem com elas. Assim, é possível identificar o seu es-pelhamento em cada uma das funções da cidade moder-nista, embora não exista uma correlação direta entre as duas coisas. No projeto de Brasília as quatro escalas ar-ticulam as quatro funções urbanas, tornando-as em certa medida menos rígidas (Fig. 2).

Versalhes, no século XVII, passando pela Construção das Cidades segundo seus princípios artísticos, de Ca-mile Sitte, as Cidades-Jardins do Amanhã de Ebenezer Howard, o movimento City Beautiful e os planos de re-formulação urbana de inspiração haussmaniana, a mo-numentalidade é um requisito urbano das áreas centrais. Mesmo o urbanismo moderno de Le Corbusier, que se contrapôs a ideia de monumentalidade clássica, baseada no formalismo e na ornamentação excessiva dos edifí-cios, a incorpora como elemento essencial de projeto das áreas core e administrativas das cidades.

No Relatório do PPB, Costa esclarece o sentido de monumentalidade que desejou imprimir ao seu projeto: “Monumental não no sentido de ostentação, mas no sen-tido da expressão palpável, por assim dizer, consciente, daquilo que vale e significa”. A preocupação do urbanis-ta era se distanciar de uma monumentalidade por demais austera, que poderia resultar opressiva, o que o levou a declarar que a cidade “sendo monumental é também cô-moda, eficiente, acolhedora e íntima. É ao mesmo tempo derramada e concisa, bucólica e urbana, lírica e functio-nal” (COSTA, 1991, p.32).

Ao imaginar a Praça dos Três Poderes como “um Versalhes do povo, não um Versalhes do rei”, Costa ex-pressou a visão modernista de monumentalidade, que pretendeu romper com àquela considerada centralizadora e antidemocrática do urbanismo clássico, colocando em seu lugar novos monumentos que representassem a “força coletiva popular” (RODRIGUES, 2001). A monumentali-dade, contudo, sempre esteve historicamente vinculada ao poder e a aspectos simbólicos como rememoração, ideo-logia, exaltação e autoridade, como atestam diversos au-tores (MUMFORT, 1982; BENÉVOLO, 1983; HARVEY, 1989 e 1992, FOUCAULT, 1990; LEFEBVRE, 1963, 1999 APUD. RODRIGUES, 2001). E sua tradução es-pacial geralmente está vinculada a edificações de grande porte, arquitetura simbólica e a espaços abertos e panóp-ticos, que transmitem sentimentos de admiração e beleza, mas também de afirmação de poder e autoridade.

Talvez buscando recriar as condições dos espaços públicos de livre discussão e manifestação, percebe-se elementos tanto da Ágora grega quanto das praças das cidades coloniais espanholas e portuguesas na morfolo-gia da Praça dos Três Poderes e da Esplanada dos Mi-nistérios. Mas a intenção utopista do urbanista de des-vincular a monumentalidade da sua expressão espacial de poder é questionável, pois não é o espaço que condi-ciona as práticas sociais, mas são as práticas sociais que dão sentido ao espaço.

Escala Residencial

O segundo eixo estruturador do Plano Piloto, o rodo-viário, é o que conforma a escala residencial. Seu mó-dulo básico é a superquadra (SQ), conjunto residencial configurado dentro de um quadrado de 280 metros de lado, contendo até 11 projeções1 de edifícios residen-ciais, seis pavimentos sobre pilotis e densidade média esperada de 400 a 500 habitantes por hectare, o que re-sultaria em aproximadamente 3 mil a 4 mil pesos. Cada SQ abriga em seu interior uma escola e um jardim de infância (FERREIRA E GOROVITZ, 2009).

1 Projeção é um lote que permite ocupação de 100% da sua área com construção. Portanto, não exige afastamentos das divisas.

1. Escala residencial2. Escala monumental3. Escala gregaria4. Escala bucólica

Escala residencial - eixo residencial - intimistaEscala monumental - eixo monumental - coletiva/simbólicaEscala gregaria - concentrada/agregadora - cruzamento dos eixosEscala bucólica - áreas verdes, faixa arborizadora das SQ, cerrado circundante

1. Habitar - Escala residencial2. Circular - articulação entre as escalas3. Recrear - escalas bucólica e gregaria4. Trabalhar - escalas monumental e gregaria

Costa definiu para cada escala urbana do PPB uma feição morfológica associada a uma função socioes-pacial que a caracteriza, definida por jogo de volumes edificados e proporções (Fig. 3). Assim, a escala monu-mental tem caráter coletivo e simbólico, ressaltado por grandes espaços vazios e edifícios isolados. Na escala residencial, por sua vez, prevalece o tom intimista e co-loquial, conferido pelo conceito de unidade de vizinhan-ça e superquadras. Essas duas escalas estão conformadas ao longo dos dois grandes eixos que definem a estrutura urbana básica da cidade.

Na confluência dos dois eixos, monumental e rodo-viário/residencial, foi disposta a grande plataforma ro-doviária e no seu entorno imediato os setores comercial, bancário e de diversões, que conformam a área central e definem a terceira escala: a gregária.

A quarta escala, a bucólica, só foi mencionada no tex-to do Brasília Revisitada de 1987, enquanto as outras três já haviam sido citadas no Registro de uma Vivência de 1967. A função manifesta dessa escala, além de defi-nir o conceito de cidade-parque, articula, pela paisagem, a transição entre as outras três escalas.

Escala Monumental

Apesar de não estar explícita no edital do concurso do plano-piloto de Brasília (PPB), a exigência de confe-rir monumentalidade ao conjunto urbano da nova capi-tal estava naturalmente implícita à concepção da cidade. Além de ser um requisito obrigatório de uma cidade--capital, a monumentalidade foi um traço marcante de capitais brasileiras projetadas antes de Brasília, como Belo Horizonte e Goiânia, que esteve presente em todos os estudos urbanísticos elaborados para a nova capital antes do concurso.

A monumentalidade das áreas administrativas e dos espaços, onde se situam os edifícios que abrigam os po-deres governamentais, sempre predominou na história das cidades. No urbanismo clássico, desde o Plano de

Figura 2 - Correlação entre as escalas urbanas do PPB e as funções da cidade modernista / Elaboração do autor

Figura 3 - Características principais das escalas urbanas do PPB / Elaboração do autor

Page 23: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 23

Figura 6 - Unidade de Vizinhança implantada no Plano PilotoFonte: www.gamalivre.com.br/

Figura 5 - Conjunto Residencial do Parque Guinle, Rio de Janeiro - 1940 /Lucio CostaFonte: http://www.archdaily.com.br/

Figura 4 - Unidade de Vizinhança, desenho de Lucio Costa no Relatório do PPB. - Fonte: COSTA, 1991

O conjunto de quatro SQ estrutura uma Unidade de Vizinhança (UV), que congrega também equipamentos de maior porte, como cinema, posto de saúde, escola--parque, igreja e clube de vizinhança (Fig.4). A Unida-de de Vizinhança não é uma invenção de Lucio Costa e nem tampouco do urbanismo moderno. O conceito de neighborhood units foi proposto por Clarence Perry em 1929 quando elaborou um plano regional urbano para a cidade de Nova York nos EUA. O princípio era resgatar a convivência social e as relações de vizinhança perdidas com a expansão das cidades. Para tanto, propunha que as UVs fossem áreas residenciais auto-contidas com uma população limitada, dotada de equipamentos e serviços públicos localizados dentro de seus limites, geralmente no centro da unidade e acessíveis a pé. A escola é o equi-pamento principal, pois uma das funções básicas da UV era a proteção da infância.

mércio local se abriria para o interior da superquadra, sendo a rua somente uma via de serviço para carga e descarga de mercadorias. Essa rua de serviços, no en-tanto, transformou-se em rua comercial de fato, com as lojas abrindo-se para o lado do tráfego dos carros, em uma conformação mais parecida com a da rua tradicio-nal. O único comércio local, conforme estabelecido por Lucio Costa localiza-se na CLN 205/206 e revelou-se um fracasso comercial e de solução estética. Outra con-sequência da disposição periférica do comércio foi sua progressiva especialização e descaraterização como es-tritamente local.

A Unidade de Vizinhança na versão de Lucio Cos-ta concentra-se em um espaço alcançável pelo pedestre com moradia, comércio de primeira necessidade e equi-pamentos públicos básicos. Isso coincide em muitos pontos com o que se propugna atualmente como o ideal de cidade de alta qualidade urbana. Contudo, a preten-dida feição humanizante do urbanismo racionalista nem sempre se cumpriu e as vantagens da tipologia urbana da UV com uma densidade habitacional adequada, associa-da a áreas verdes e espaços públicos gregários, também não foram totalmente exploradas em Brasília. Mas é pre-ciso admitir que o projeto conceitual da superquadra é um dos melhores resultados urbanísticos produzidos a partir de conceitos modernistas.

Alguns princípios urbanísticos presentes no concei-to de UV de Perry, como a segregação da circulação de veículos e pedestres; a presença de grande quantidade de áreas verdes nas zonas residenciais e a setorização e separação das funções urbanas, foram assimilados pelo urbanismo moderno. A Carta de Atenas, contudo, acres-centou às unidades de vizinhança os edifícios em altura e os blocos de apartamentos sob pilotis com livre circu-lação no nível do solo. Esses postulados foram aplica-dos por Le Corbusier nas suas Unité d’Habitation em Marselha, 1945. O próprio Lucio Costa, em 1940, ado-tou os princípios das UV, na sua versão modernista, no conjunto residencial do Parque Guinle no Rio de Janeiro, considerado precursor das superquadras (Fig. 5).

Na proposta de UV de Lucio Costa, demonstrada na Fig. 6, os equipamentos, em sua maior parte, ser-vem a toda comunidade da UV. São restritos a cada SQ somente os equipamentos de educação fundamental (escola-classe e jardim de infância). Essa disposição, inclusive, propiciou a implantação da proposta de edu-cação integral do educador Anísio Teixeira, nos primei-ros anos de Brasília.

Já o comércio localiza-se na periferia das superqua-dras, contrariando o princípio de interiorização dos equi-pamentos na UV, até então predominante nas experiên-cias implantadas. O resultado, contudo, mostrou-se mais interessante, pois deu ao comércio uma abrangência não restrita ao local. Por outro lado, isso motivou uma das primeiras adaptações do projeto original, no qual o co-

Page 24: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate24

Escala Bucólica

Uma das características mais ressaltadas no PPB é a faixa densamente arborizada que emolduraria cada superquadra. Além de resguardar a sua intimidade, as faixas arborizadas são elementos de transição entre as escalas monumental e residencial e assumem uma importância fundamental, que é o de conformar o conceito de cidade-parque. A escala bu-cólica inclui também a orla do Lago Paranoá, os parques e as demais áreas verdes do Plano Piloto.

A concepção de cidade-parque tem origem tanto no conceito de cidade-jardim de Ebenezer Howard (1850-1929) quanto na idealização modernista de incorporar as áreas verdes no tecido urbano. A formulação híbrida “campo-cidade” um dos três imãs propostos por Howard, reunindo simultaneamente as vantagens dos ambientes urbano e rural, está no âmago da concepção urbana de Brasília, segundo Carpintero (1998, apud. TELES, 2005).

Da proposta modernista, Brasília reflete a ideia le-corbusiana de que “o sol, a vegetação e o espaço são as três matérias primas do urbanismo” (LE CORBUSIER, 1995). Edifícios isolados entremeados por amplas áreas verdes, plena insolação, iluminação natural e a elimina-ção da rua tradicional foram a receita preconizada pelo urbanismo moderno para combater a insalubridade da cidade industrial. Mas o que, a princípio, sugeria a ideia de uma cidade ambientalmente adequada, na verdade reforçou a fragmentação e a dispersão urbana, padrões atualmente considerados insustentáveis. Por outro lado, a manutenção das extensas áreas verdes torna-se bastante dispendiosa para o Poder Público e sua efetividade como espaço de uso comunitário é baixa.

Apesar disso, deve-se reconhecer as vantagens biocli-máticas e ecológicas de uma cidade-parque, especialmen-te quando a arborização adquire maturidade. Com mais de 50 anos de idade, as árvores do entorno das superqua-dras e das áreas verdes do Plano Piloto, destacando-se as faixas arborizadas dos eixos rodoviário e monumental,

verdadeiros parques lineares, fizeram materializar-se ple-namente a imagem de uma cidade incrustada no interior de um bosque.

Escala Gregária

Resolvidas as escalas monumental, residencial e a transição bucólica entre elas, restava a Lucio Costa defi-nir a área core do Plano Piloto. Para uma cidade moder-nista, sem as ruas e a agitação comuns ao centro de uma cidade tradicional, que o urbanismo lecorbusiano delibe-radamente queria evitar, isso era um grande desafio. Prin-cipalmente porque no cruzamento dos eixos monumental e residencial o urbanista projetou uma plataforma rodo-viária e não um centro nos moldes tradicionais.

Contudo, o que Costa imaginou para a área central de Brasília evocava os clássicos centros urbanos de Paris, Londres, Nova York e Rio de Janeiro, que bem conhecia e admirava. No Relatório do PPB descreveu o centro de diversões, que seria implantado ao lado do plano superior da plataforma, uma “mistura em termos adequados de Piccadilly Circus, Times Square e Champs Elysées” onde se previu cinemas, teatros,

“...galeria, amplas calçadas, terraços e cafés”; [...] “casas de espetáculos ligadas entre si por travessas no gênero tradicional da Rua do Ouvi-dor, das vielas venezianas ou de galerias cobertas (arcades) e articuladas a pequenos páteos com bares e cafés, e loggias na parte dos fundos com vista para o parque, tudo no propósito de propi-ciar ambiente adequado ao convívio e à expan-são” (Costa, 1991, p.24-25).

No lado oposto ao da área de diversões localizou-se o setor cultural, com a implantação “de uma eventual casa de chá e de Ópera”, onde veio a se instalar o Teatro Nacional. No entorno da plataforma rodoviária, ao sul e ao norte do eixo rodoviário, Costa dispôs os setores comercial, bancário, de radio e televisão e médico-hos-

SQS 308 - Plano Piloto, quadra integrante da Unidade de Vizinhança.Foto: Sérgio Jatobá

Page 25: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 25

(*) Sérgio Ulisses Jatobá - doutor e mestre em Desenvolvimento Sustentável (Universidade de Brasília - UnB) e especialista em Gestão Am-biental o Ordenamento Territorial e Planejamento Habitacional. Pesquisador do NEUR/UnB e Gerente de Estudos Urbanos da Codeplan.

pitalar. Esse conjunto de setores constitui, então, a cha-mada escala gregária.

Apesar da intenção projetual, a área central do Pla-no Piloto não se conformou com a animação urbana e no estilo dos centros tradicionais. Nos setores de diver-sões se instalaram um shopping center na parte norte e um centro comercial na parte sul, sem produzir os efeitos desejados por Lucio Costa. O shopping center, que teve sua primeira etapa inaugurada em 1971, foi um dos pri-meiros do país. Essa modalidade de centro comercial e de entretenimento, importada dos EUA, estabeleceu-se, se-gundo Bienenstein (2001) como mais do que uma junção de comercio e recreação, transformando o próprio ato de consumir em lazer.

Já o centro comercial, instalado no Setor de Diversões Sul, conhecido como “Conic”, procurou traduzir as dire-trizes propostas no Relatório do PPB, mas o resultado em quase nada se pareceu ao ali descrito. No entanto, o fato de não ter sido implantado como um shopping center pro-piciou a instalação de lojas populares, igrejas, cinemas, boates, teatros, sedes de sindicatos, livrarias e bares. Uma mistura que gera a frequência eclética e democrática no mesmo local de prostitutas, religiosos, intelectuais, artis-tas e trabalhadores. Isso deu ao “Conic” uma característi-ca menos elitista, cultuado como um espaço urbano mais autêntico e livre, em contraponto ao local controlado e praticamente privatizado do shopping center do Setor de Diversões Norte. Os dois espaços, contudo, mesmo sem atender ao originalmente proposto cumprem sua função gregária, cada um a seu modo.

Os espaços gregários do Plano Piloto não se limita-ram à setorização proposta para eles. Parte dos bares e restaurantes se instalaram nos comércios locais, muitos deles nas pontas dos conjuntos, criando as reclamadas

“esquinas de Brasília”. Junto com eles surgiram con-flitos envolvendo a legislação de controle sonoro e os chamados “puxadinhos”, ocupações não previstas de áreas públicas, que também envolvem outros tipos de comércio. Outros bares, restaurantes, teatros, cinemas e demais espaços de lazer, além de se instalaram nos shopping centers, também ocuparam áreas de clubes, hotéis e outros locais não previstos, distribuindo-se no ambiente urbano de forma similar ao de uma cidade tra-dicional. Pode-se dizer, assim, que os espaços gregários foram os que menos se submeteram à rigidez setorial modernista em Brasília.

Conclusão

As quatro escalas urbanas explicam a concepção do projeto de Brasília. Como menciona Francisconi (2011), elas são a teoria que foi apresentada pelo autor do projeto após o plano, ou seja, após a prática já estar realizada. Contudo, essa aparente inversão de ordem não reduziu a importância das escalas como o fundamento do tom-bamento da cidade e da sua inscrição como Patrimônio Cultural da Humanidade.

Ao longo da sua breve história, o PPB sofreu altera-ções. Algumas foram adaptações do projeto que respon-deram às necessidades executivas ou às demandas não previstas. Outras foram decorrentes de desvirtuamentos que ameaçam o tombamento como os “puxadinhos”, o impedimento físico da livre circulação nos pilotis, as ten-tativas de se criar um sétimo pavimento nos blocos resi-denciais das superquadras e a ocupação irregular da orla do Lago Paranoá. Contudo, a permanência do princípio das escalas atesta a força conceitual do projeto de Lucio Costa, que independente das críticas, muitas vezes injus-tas, que exacerbam seus defeitos, ou dos louvores que re-conhecem suas qualidades, mantém seu plano de voo. ■

Referências bibliográficas• BICCA, Paulo R. S. Brasília: mitos e realidades in PAVIANI. Aldo. Brasília, ideologia e realidade, espaço urbano em ques-

tão. Editora Universidade de Brasília. 2ª edição. 2010.

• BIENENSTEIN, Glauco. Shopping Center: o fenômeno e sua essência capitalista. Geographia, Niterói, Ano III, n. 6, jul/dez, 2001.

• CHOAY, Françoise. O urbanismo: utopias e realidades; uma antologia. São Paulo: Perspectiva, 2005.

• COSTA, Lucio. Brasília Revisitada 1985-1985, Anexo I do Decreto nº 10.829/1987 - GDF e da Portaria nº 314/1992 - Iphan. Governo do Distrito Federal.1987

• ______. Relatório do Plano Piloto de Brasília. ArPDF, Codeplan, Depha. Brasília. 1991

• _______. Registro de uma Vivência. Empresa das Artes. São Paulo. 1995

• FERREIRA, Marcílio Mendes e GOROVITZ, Matheus. A Invenção da Superquadra. Superintendência do Iphan no Distrito Federal. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Iphan. Brasília-DF. 2009

• FRANCISCONI. Jorge Guilherme. Da insustentabilidade do Plano Piloto. MDC Revista de Arquitetura e Urbanismo. Feve-reiro de 2011. Disponível em http://mdc.arq.br/2011/02/17/da-insustentabilidade-do-plano-piloto/#more-4662.

• LE CORBUSIER. A Carta de Atenas. Tradução de Rebecca Scherer. São Paulo: USP/FAU/LAP. 1995

• RODRIGUES, Cristiane Moreira. Cidade, Monumentalidade e Poder. Revista GEOgraphia. Vol. 3 Numero 6. 2001 Disponí-vel em http://www.uff.br/geographia/ojs/index.php/geographia/article/download/65/63 Acessado em 11/05/15.

• TELES, Delayse Maria. Tratamento paisagístico de espaços livres públicos de superquadras do Setor Sudoeste: o abandono da concepção modernista. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília. 2005.

Page 26: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate26

(*) Roberto Piscitelli(**) Jusçanio Souza

Artigo

Análise das Finanças Públicas do Distrito Federal

Fotos: Toninho Leite

A condição híbrida do Distrito Federal, com função de Estado e Município, e, somado a isso, sua condição de sede do Governo Federal, lhe confere situação peculiar na origem e na composição de sua receita orçamentária. Passados 55 anos desde sua fundação, o Distrito Federal mantém sua característica econômica terciária de servi-ços, especialmente públicos, mas já se ressente de um maior dinamismo e participação dos demais setores pro-dutivos, capazes de ampliar e diversificar a geração de receitas ao Tesouro local.

A decomposição da receita total do Distrito Federal, nos moldes definidos a partir da atual lei orçamentária, revela forte concentração das receitas com características genuinamente do Tesouro. Verifica-se, também, que as receitas correntes respondiam, até 2014, por algo nunca menor que 94%. Com base na execução orçamentária até junho de 2015, ficaram perto de 98% do total da receita (Quadros I e II).

Vale destacar que a partir de 2015, quando as transfe-

Quadro I - Evolução da Receita Total do DF (Tesouro e outras fontes)(Valores constantes, em R$ 1.000,00 a preços de 2015)

Especificação2011

(realizada)2012

(realizada)2013

(realizada)2014

(realizada)

Variação (%)

2014/2011

2015 (Previsão LOA/15)

Variação (%)

2015/2011

2015 (*) Realizada até junho

Receitas Correntes (I) 17.461.115 18.276.228 19.100.065 19.375.201 11,0 26.065.836 49,3 13.022.136Receita Tributária 12.043.198 12.548.138 13.142.727 13.680.405 13,6 14.255.603 18,4 6.679.269Receita de Contribuições 1.589.257 1.665.814 1.588.547 1.655.457 4,2 1.682.839 5,9 853.036Receita Patrimonial 492.993 528.097 402.675 684.056 38,8 403.152 -18,2 391.445Receita Agropecuária 13 16 15 23 82,3 4 -68,9 7Receita Industrial 4.561 5.243 6.505 2.250 -50,7 7 -99,8 937Receita de Serviços 422.276 463.563 553.603 470.044 11,3 475.783 12,7 214.674Transferências Correntes 1.796.265 1.892.477 1.844.870 1.892.942 5,4 7.944.711 342,3 4.340.211Outras Receitas Correntes 862.887 879.093 1.151.839 972.735 12,7 986.814 14,4 542.735Rec. Intraorçamentárias Correntes 255.122 299.020 411.997 18.134 -92,9 316.923 24,2 -Deduções/Restituições -5.456 -5.233 -2.713 -847 -84,5 - - -177

Receitas de Capital (II) 604.371 1.164.463 693.875 1.055.846 74,7 3.399.268 462,4 379.204Operações de Crédito 197.017 260.221 218.731 526.972 167,5 1.921.375 875,2 342.694Alienação de Bens 36.518 16.444 10.329 7.860 -78,5 56.663 55,2 14.099Amortizações 6.962 22.994 70.053 95.853 1.276,7 78.167 1022,7 4.143Transferências de Capital 363.874 864.804 394.762 425.161 16,8 1.336.063 267,2 12.330Rec. Intraorçamentárias de Capital - - - - - 7000 - 5.938

Total da Receita (III) = (I + II) 18.065.486 19.440.691 19.793.940 20.431.047 13,1 29.465.104 63,1 13.401.340Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional. (*) Portal da Transparência do GDF.Dados elaborados pelos autores. Valores inflacionados para 2015 pela média do IPCA.

Page 27: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 27

Artigo

rências da União destinadas a financiar a saúde e a edu-cação passaram a integrar o orçamento do Distrito Fede-ral (até então o pagamento era efetuado diretamente pela União e contabilizado no Sistema Integrado de Adminis-tração Financeira do Governo Federal - SIAFI), a partici-pação das transferências correntes em relação ao total da

receita do DF, até então em torno de 9%, aumentou para algo próximo de 32% por mero procedimento contábil.

Importante notar que a receita corrente líquida repre-sentou no período de 2011 a 2014 perto de 97% do total da Receita Corrente, reduziu sua participação para pouco

Quadro II - Evolução da Receita Total do DF (Tesouro e outras fontes)(Participação %)

Especificação 2011 (realizada)

2012 (realizada)

2013 (realizada)

2014 (realizada)

2015 (Previsão LOA/15)

2015 Realizada até

junhoReceitas Correntes (I) 96,7 94,0 96,5 94,8 88,5 97,2Receita Tributária 66,7 64,5 66,4 67,0 48,4 49,8Receita de Contribuições 8,8 8,6 8,0 8,1 5,7 6,4Receita Patrimonial 2,7 2,7 2,0 3,3 1,4 2,9Receita Agropecuária 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0Receita Industrial 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0Receita de Serviços 2,3 2,4 2,8 2,3 1,6 1,6Transferências Correntes 9,9 9,7 9,3 9,3 27,0 32,4Outras Receitas Correntes 4,8 4,5 5,8 4,8 3,3 4,0Rec. Intraorçamentárias Correntes 1,4 1,5 2,1 0,1 1,1 -Deduções/Restituições 0,0 0,0 0,0 0,0 - 0,0

Receitas de Capital (II) 3,3 6,0 3,5 5,2 11,5 2,8Operações de Crédito 1,1 1,3 1,1 2,6 6,5 2,6Alienação de Bens 0,2 0,1 0,1 0,0 0,2 0,1Amortizações 0,0 0,1 0,4 0,5 0,3 0,0Transferências de Capital 2,0 4,4 2,0 2,1 4,5 0,1Rec. Intraorçamentárias de Capital - - - - 0,0 0,0

Total da Receita (III) = (I + II) 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0Dados elaborados pelos autores.

Quadro III - Distrito Federal - Receita Corrente Líquida (*) - 2011 a 2015(Participação %)

Descrição 2011 2012 2013 20142015

(jan/jun)Receita Corrente (I) 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00Receita Tributária 69,95 69,76 70,31 70,67 51,29IPTU 3,33 3,22 3,23 3,07 2,26IRRF 13,02 13,28 13,30 14,57 10,51IPVA 4,65 3,76 3,68 3,89 4,95ITCD 0,29 0,36 0,94 0,50 0,36ITBI 1,56 1,88 2,03 1,77 1,18ICMS 37,41 37,26 36,78 36,49 24,62ISS 7,03 7,35 7,61 7,67 5,38Imposto Simples 1,65 1,65 1,70 1,75 1,29Taxas 1,01 1,01 1,04 0,96 0,74

Receita de Contribuição 9,23 9,26 8,50 8,55 6,55Receita Patrimonial 2,86 2,94 2,15 3,53 3,01Receita Agropecuária 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00Receita Industrial 0,03 0,03 0,03 0,01 0,01Receita de Serviços 2,45 2,58 2,96 2,43 1,65Transferências Correntes (-Transf. para o FUNDEB) 10,43 10,52 9,87 9,78 33,33Outras Receitas Correntes 5,01 4,89 6,16 5,02 4,17Deduções da Receita Corrente -0,03 -0,03 -0,01 0,00 0,00

Deduções (II) 9,44 9,23 8,99 9,02 38,95(-) Contrib. prev. de servidor ativo, inativo e pension. civil 7,18 7,07 6,79 6,88 4,96(-) Contrib. prev. de servidor ativo, inativo e pension. militar 1,20 1,18 1,17 1,18 0,93(-) Compensação financeira entre regimes de previdência 1,06 0,97 1,02 0,96 0,63(-) Dedução de receita para formação do FUNDEB 0,00 0,00 0,00 0,00 6,40(-) Transferências da união para educação e saúde 0,00 0,00 0,00 0,00 26,02

Recursos do FCDF não destinados ao pagamento de pessoal (III) 5,54 6,34 6,16 6,69 2,96(+) Total de recursos do Fundo Constitucional do DF (no SIAFI) 65,31 67,48 65,71 65,08 26,06(-) Recursos que custeiam despesas com pessoal no FCDF (no SIAFI) 59,78 61,14 59,54 58,39 23,10

Recursos do FCDF não utiliz. no pagamento de pessoal (IV) 0,00 0,00 0,00 0,00 0,40(+) Total dos recursos do FCDF transferidos da União para o DF e utilizados 0,00 0,00 0,00 0,00 25,34(-) Total dos recursos do FCDF utilizados em despesas com pessoal 0,00 0,00 0,00 0,00 24,93

Receita Corrente Líquida (I) - (II) + (III) + (IV) 96,10 97,11 97,17 97,67 70,82Fonte: Portal da Transparência do Distrito Federal(*) A receita corrente liquida é definida pela Lei de Responsabilidade fiscal (art. 2º, inc. IV)Dados elaborados pelos autores.

Page 28: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate28

mais de 70% nos primeiros seis meses de 2015, refletindo a redução da participação da receita tributária, em que a queda do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e sobre a Prestações de Serviços de Transporte Interesta-dual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) foi mais significativa, resultante dos impactos da crise econômica e consequente redução da atividade terciária no DF.

O simples olhar nas estatísticas da receita corrente lí-quida relativa aos anos de 2013 e 2014 já evidenciava a necessidade de contenção no aumento de gastos com pes-soal no Distrito Federal, situação que passou a ser crítica em 2015, em função da significativa redução da receita corrente líquida.

Em nível de maior discriminação, entre as receitas cor-rentes, destaca-se a tributária, com pouco mais de 48% da receita total pela LOA de 2015 e 49,8% da receita realiza-da no primeiro semestre de 2015. Essa não foi, entretanto, a proporção observada em anos anteriores, quando a rela-ção se estabeleceu em torno de dois terços, fato associado ao extraordinário incremento verificado nas transferên-cias correntes estimadas para 2015, elevando substan-cialmente sua participação relativa e, consequentemente, alterando a estrutura de participação relativa das demais componentes. Em 2015, no entanto, observa-se queda da atividade econômica local, com importantes impactos na arrecadação do ICMS e outros tributos, encolhendo, por-tanto, a receita tributária do DF.

As receitas tributárias se compõem quase inteiramente de impostos, com pequena parcela proveniente de taxas.

O ICMS é de longe a mais importante fonte de recur-sos tributários com mais da metade dos impostos (52%), quase um quarto do total da arrecadação. Rivaliza, por-tanto com as transferências, constituindo-se no segundo principal item da arrecadação, reforçando a importância do esforço na obtenção e ampliação de recursos que de-pendem essencialmente do nível da atividade econômica, isto é, do volume e do valor das mercadorias transacio-nadas e dos insumos utilizados pelas empresas, além do consumo de determinados serviços pela população, como é o caso da energia elétrica. No mesmo sentido se sobres-sai o outro tributo incidente sobre transações - serviços -, o ISS. Somados, ambos representam 64% dos impostos e 31% da arrecadação (R$ 9.067.434 mil). É desnecessário salientar a importância do agregado renda das famílias na arrecadação desse tipo de tributo.

Surpreende, até certo ponto, a participação do Impos-to de Renda na composição das receitas do DF. Como se sabe, é um tributo de competência da União, mas dele se apropriam Estados, o Distrito Federal e municípios quan-do efetuam descontos na fonte sobre rendimentos pagos a qualquer título, inclusive por suas autarquias e fundações (não incluídas, empresas públicas e sociedades de eco-nomia mista) que instituírem e mantiverem (CF, artigos 157, I, e 158, I). Seu montante é mais de 50% superior ao do próprio ISS. Incide sobre os pagamentos a servidores do DF e prestadores de serviços de um modo geral, aqui compreendidas tanto pessoas físicas como jurídicas. Ob-viamente, tem uma forte associação com a renda gerada pelo Setor Público, inclusive sua capacidade de prestação de serviços através dos contratos com o setor privado, aí incluídos autônomos e profissionais liberais.

O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automo-tores (IPVA) é o mais importante imposto sobre a pro-

priedade que, não obstante os elevados índices de ina-dimplência (amplamente noticiado), reflete o vigor do mercado de veículos da capital.

Um pouco abaixo, tem-se o Imposto Sobre a Proprie-dade Territorial Urbana (IPTU), cuja arrecadação parece estar flagrantemente abaixo de seu potencial, o que pode ser explicado por diferentes razões. São numerosos os ca-sos de imunidade amparados pela constituição: próprios públicos, representações estrangeiras e internacionais, templos, partidos políticos. Mas há outros importantes fa-tores: desatualização das pautas de valores (como alega-do por todos os governos), recorrência de inadimplência e sonegação, além da falta de regularização de imóveis e ocupações irregulares.

O Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) vem a seguir com sua arrecadação associada ao volume das transações dos imóveis, que, como se sabe, flutuam em função da dinâmica do mercado imobiliário.

Segue-se o imposto Simples, também surpreendente-mente reduzido quando se considera o perfil das empre-sas do DF.

O Imposto sobre Heranças e Doações teve reforço por meio do convênio assinado com a Secretaria da Recei-ta Federal do Brasil, que transfere para o DF os dados declarados pelos contribuintes do Imposto de Renda de suas declarações anuais, relativamente às transferências patrimoniais que realizam. Esse imposto tem sido men-cionado com frequência, como uma via a ser explorada na promoção do ajuste fiscal empreendido pela União e como uma das possíveis opções em um processo mais amplo de Reforma Tributária.

Entre as taxas, de pouca expressão relativa, a de lim-peza pública, no entanto, supera apenas ligeiramente o Imposto sobre Heranças e Doações. Destaca-se tam-bém a Contribuição para o Custeio do Serviço de Ilu-minação Pública.

As transferências correntes correspondem ao segundo conjunto de maior relevância, com mais de ¼ do total (quase 27%), e respondendo por cerca de 30% das recei-tas correntes, já deduzidas as transferências para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUN-DEB). O maior peso é representado pelas transferências intergovernamentais (99% do total), ou seja, aquelas efe-tuadas entre entes diversos ou múltiplos da Administra-ção. Nas transferências da União (mais de 80% das trans-ferências intergovernamentais), preponderam os recursos destinados à educação (R$ 2.854.433 mil) e à saúde (R$ 3.139.161 mil), mas são também relevantes as transfe-rências pelo SUS (R$ 666.800 mil) e via Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) (R$ 457.536 mil). A contribuição dos fundos constitucionais de par-ticipação monta a R$ 528.987 mil originários do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e R$ 140.806 mil do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Além das transferências da União, há as multigovernamentais, em que o FUNDEB se insere (R$ 1.821.455 mil).

Antes da dedução para o FUNDEB, as transferências intergovernamentais - da União - correspondem a ⅓ do total das receitas. Quando se consideram conjuntamente as transferências de capital - representadas por convênios, algo como 4,5% -, a dependência da União perfaz 37,5%

Page 29: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Quadro IV - Evolução da Despesa Total do DF (Tesouro e outras fontes)(Valores constantes, em R$ 1.000,00 a preços de 2015)

Especificação 2011 (realizada) 2012 (realizada) 2013 (realizada) 2014 (realizada)Variação (%)

2014/2011

2015 (Previsão

LOA/15)

Variação (%)

2015/2011

2015 (*) Realiz.

até junhoDesp. Correntes (I) 16.067.102 16.821.968 17.814.263 17.668.945 10,0 22.715.929 41,4 11.525.485

Pessoal e Encargos Sociais 10.002.214 10.570.732 11.005.924 11.828.245 18,3 16.896.099 68,9 8.845.325Juros e Encargos da Dívida 188.832 178.662 184.415 197.713 4,7 202.088 7,0 109.989Outras Despesas Correntes 5.876.057 6.072.574 6.623.925 5.642.988 -4,0 5.617.742 -4,4 2.570.170

Desp. de Capital (II) 1.686.867 2.472.369 3.011.564 2.021.687 19,8 5.854.108 247,0 280.846Investimentos 1.253.445 1.905.222 2.504.340 1.516.475 21,0 5.315.144 324,0 137.060Inversões Financeiras 248.416 369.215 316.970 302.646 21,8 347.039 39,7 30.306Amortização da Dívida 185.007 197.932 190.254 202.566 9,5 191.925 3,7 113.480

Res. Orç. do RRPS (III) - - - - - 639.843 - -Res. de Conting. (IV) - - - - - 255.224 - -Total da Despesa (I + II + III + IV) 17.753.969 19.294.337 20.825.827 19.690.633 10,9 29.465.104 66,0 11.806.331Superávit/Déficit 311.517 146.354 -1.031.888 740.415 0 1.595.010

Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional. (*) Portal da Transparência do GDF.Dados elaborados pelos autores. Valores inflacionados para 2015 pela média do IPCA.

Quadro V - Evolução da Despesa Total do DF (Tesouro e outras fontes)(Participação %)

Especificação 2011 (realizada)

2012 (realizada)

2013 (realizada)

2014 (realizada)

2015 Previsão LOA /15

2015 (Realiz. até junho)

Desp. Correntes (I) 90,5 87,2 85,5 89,7 77,1 97,6Pessoal e Encargos Sociais 56,3 54,8 52,8 60,1 57,3 74,9Juros e Encargos da Dívida 1,1 0,9 0,9 1,0 0,7 0,9Outras Despesas Correntes 33,1 31,5 31,8 28,7 19,1 21,8

Desp. de Capital (II) 9,5 12,8 14,5 10,3 19,9 2,4Investimentos 7,1 9,9 12,0 7,7 18,0 1,2Inversões Financeiras 1,4 1,9 1,5 1,5 1,2 0,3Amortização da Dívida 1,0 1,0 0,9 1,0 0,7 1,0

Res. Orç. do RRPS (III) - - - - 2,2 -Res. de Conting.(IV) - - - - 0,9 -Total da Despesa (I + II + III + IV) 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0Dados elaborados pelos autores.

do total das receitas do DF. (A estimativa para 2015 cor-responde a R$ 9.280.774 mil).

Ressalte-se que o DF não é particularmente bem aqui-nhoado no rateio dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios. Em relação ao FPE, a parcela apropria-da pelo DF permaneceu congelada até 2015, como resul-tado de um acordo político subsequente à Constituição de 1988. A participação do DF é a menor da Federação: 0,656117 (rateio sobre 100,0). A partir de 2016, ocorrerá variação (de reduzido impacto), em razão de se pondera-rem dois fatores (como na origem): população e o inver-so da renda per capita. O segundo fator é, como se sabe, desfavorável para o DF. De toda a maneira, a participação de todas as unidades da Federação depende do comporta-mento da arrecadação do Imposto de Renda e do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) do âmbito da União -, que é a base de cálculo do FPE. As oscilações nessa arrecadação variam não só em função do ciclo econômi-co, mas também sob o efeito da política de desonerações do Governo Federal, cujos ônus a União repartiu com as demais esferas da Administração.

Com relação ao FPM, Brasília reparte com as demais capitais a parcela de 10% de seus recursos totais (cuja base de cálculo também é constituída pelo Imposto de Renda e o IPI). Os parâmetros para a determinação dos coeficientes de participação são, mais uma vez, a popu-lação e a (o inverso da) renda per capita, repetindo-se os argumentos já expendidos com os comentários ao FPE. A participação da Capital Federal corresponde ao per-centual de 1,689189 na repartição desses recursos, o que a iguala a Campo Grande, e é superior apenas a Cuiabá

(1,520270) e Vitória e Florianópolis (1,351351). Para se ter uma ideia da participação relativa de Brasília, salien-te-se que Salvador e Fortaleza têm uma participação de 8,445946%. Brasília se beneficia com o fator populacio-nal 5,0 (o maior de todos, o menor é de 2,0), mas é desfa-vorecida pelo fator atribuído (ao inverso da) à renda per capita, de 0,4 (o menor de todos, o maior é de 2,5).

As transferências mais importantes são, de longe, as que compõem o Fundo Constitucional do DF, implemen-tado por meio da Lei nº 10.633, de 27 de dezembro de 2002, regulamentando o Art. 21, inc. XIV, da Constitui-ção Federal, que determina ser de competência da União organizar e manter a Polícia Civil do DF, a Polícia Militar do DF e o Corpo de Bombeiros Militar do DF, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo pró-prio. É relevante notar que, no caso das polícias e do cor-po de bombeiros, o custeio é inteiramente bancado pelo Governo Federal; os pagamentos devidos são suportados pelo Orçamento da União, diretamente, e o controle é efe-tuado via SIAPE, que é o mesmo sistema de pessoal da Administração Pública Federal. A assistência financeira, em valores que integram o orçamento do DF, é destinada à saúde e à educação, o que pode resultar, para o Tesouro do DF, superávit ou déficit, dependendo do montante das despesas realizadas nessas duas áreas.

O valor do Fundo Constitucional do DF, como já foi definido, trouxe como notável consequência a garan-tia de que o Governo de Brasília não precisaria nego-ciar anualmente os montantes transferidos pela União e, assim, estabilizar a sua programação. Por outro lado, a

Brasília em Debate 29

Page 30: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate30

União não assume a responsabilidade por uma expansão dos gastos com saúde e educação que exceda o valor pre-determinado, após a dedução dos gastos com segurança pública. O valor do Fundo, definido na própria Lei, foi de R$ 2,9 bilhões, corrigido a partir de 2003, pelo coefi-ciente resultante do quociente da variação da receita cor-rente líquida da União, em períodos sucessivos de doze meses. Esses períodos compreendem os meses de julho de um ano a junho do ano subsequente. Deste modo, a transferência calculada para o orçamento de 2015 corres-pondeu ao seguinte cálculo:

Coeficiente de variação do FCDF de 2014 para o cálculo do FCDF de 2015 = (Receita Corrente Lí-quida da União de julho de 2013 a junho de 2014) / (Receita Corrente Líquida da União de julho de 2012 a junho de 2013).

Os valores são entregues em duodécimos, até o dia 5 de cada mês.

Vale ressaltar, que a receita corrente líquida da União está fortemente associada ao nível de atividade econô-mica do país e que, no Brasil, a elasticidade da arreca-dação tributária em relação ao PIB é maior do que 1. Em outros termos, a variação da arrecadação é mais do que proporcional à variação do PIB (tanto para mais como para menos). Teoricamente falando, aumentos mais que proporcionais nas despesas com segurança obrigariam o Tesouro do DF a compensar com as despesas com saúde e educação, salvo na hipótese de estar disposto a bancar um extravasamento dos limites do Fundo, utilizando recursos próprios ou de outras fontes.

Os outros dois grupos de maior relevância entre todas as receitas são os de contribuições (corrente), com 5,7%, e as de operações de crédito (de capital), com 6,5%. As receitas de contribuições integram o orçamento da Segu-ridade Social (que corresponde a 10% dos dois orçamen-tos, fiscal e da Seguridade Social). A parcela mais im-portante é representada pela contribuição previdenciária (50%); a contribuição dos servidores ativos responde por 67%. As operações de crédito são essencialmente inter-nas e preponderantemente contratuais. Os maiores cre-dores são a Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

A performance das receitas de capital, especificamen-te quanto à sua participação na receita total do Distrito Federal, permite inferir ser o Distrito Federal uma uni-dade federativa pouco endividada, com reduzido serviço da dívida, onde a sua rolagem e respectivos encargos têm pouca expressão. Nesse aspecto, portanto, é um ente “que vive mais o presente”, onde os fluxos preponderam sobre os estoques de recursos.

No que diz respeito às despesas do Distrito Federal, elas estão distribuídas entre os orçamentos fiscal e da Segurida-de Social à razão de 62,3% e de 37,7%, respectivamente.

As despesas com recursos do Tesouro respondem por 88,36% do total e com recursos de outras fontes, por 11,64%. Receitas de outras fontes não financiam Inver-sões Financeiras, mas financiam a totalidade da Reserva Orçamentária do Regime Próprio da Previdência Social - RPPS (orçamento da Seguridade Social), enquanto os recursos do Tesouro financiam a totalidade da Reserva de Contingência (orçamento fiscal).

As despesas correntes, com base na execução reali-zada de janeiro a junho de 2015, estão respondendo por 97,6% e as de capital, 2,4% do total da despesa, as rela-tivas a juros, encargos e amortizações da dívida repre-sentam 1,9% do total. Não se contabilizou a execução de reserva de contingência até junho de 2015, devendo-se salientar que a LOA previa realizar algo próximo a R$ 900 milhões. Um aspecto a destacar no período analisado é a evolução na participação das despesas correntes e das de capital. Em 2011, a participação das despesas corren-tes no total das despesas era de 90,5%, caiu em 2013 para 85,5% e, em 2015, até junho, alcança 97,6%, com movi-mento inverso no tocante às despesas de capital, que nes-te ano representam 2,4%, deve-se destacar a significativa redução na participação das despesas com investimentos, apenas 1,2%, quando em períodos anteriores chegavam entre 7% e 12%.

As rubricas mais expressivas da despesa correspondem a pessoal e encargos com 76,7% das despesas correntes de 2015, e 74,9% do total; outras despesas correntes, 22,3% das despesas correntes e 21,8% do total; os investimentos respondem por 48,8% das despesas de capital e 1,2% do total, perfazendo 97,9% do total das despesas.

Nesse contexto, as estatísticas relativas à execução orçamentária do Distrito Federal indicam que as dívidas não se constituem em problema orçamentário para o Te-souro local, bastando observar que, em 2015, a participa-ção dos juros e das amortizações não ultrapassa 2% do total do orçamento. As inversões financeiras, por sua vez, contabilizam participação, até junho, de tão somente de 0,3% do total da despesa.

Em termos de evolução temporal, e tomando-se por base a despesa realizada no ano de 2011, início da última gestão, a comparação com os valores estabelecidos pela LOA/15 - início da gestão atual de Governo de Brasília - revela que as rubricas de despesas com maior crescimen-to no período analisado são Investimentos, com variação de 324%, alcançando R$ 5.313,1 bilhões. No entanto, os valores realizados até 2014 indicam crescimento de 21% relativamente ao realizado em 2011 e, ainda, ob-servando as despesas realizadas no primeiro semestre de 2015, verifica-se que estas não ultrapassaram R$ 137 mi-lhões, contra R$ 1.516,5 bilhões realizados em 2014 e R$ 2.504,3 bilhões em 2013, ou seja, numa nítida tendência de redução das despesas nessa rubrica.

Em contrapartida, as despesas com Pessoal e Encar-gos Sociais indicam sistemático crescimento, de 18,3% de 2011 a 2014 e, com base na previsão da LOA/2015, de 68,9%, lembrando que a partir desse ano os gastos com pessoal da saúde e educação passaram a fazer parte do orçamento local, explicando grande parte do aumento ocorrido nesse ano. Por oportuno, vale observar que as despesas realizadas nos primeiros seis meses de 2015 já alcançam cerca de 50% do previsto pela LOA.

Inversões Financeiras aumentaram 21,8% de 2011 a 2014 e, pela previsão da LOA/2015, um aumento de 39,7%. As despesas realizadas no primeiro semestre de 2015 ficaram em R$ 30,3 milhões, sinalizando que esta rubrica também executará despesas bem aquém das reali-zadas no ano anterior.

De modo geral, as estatísticas da execução da despesa de capital no Distrito Federal sinalizam que muito pos-sivelmente não se poderá alcançar os valores estabele-

Page 31: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 31

(*) Roberto Piscitelli - Mestre em Administração Pública. Economista e contador. Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados, atua na Coordenação da Área de Finanças Públicas e professor da UnB

(**) Jusçanio Umbelino de Souza - Economista - CORECON DF

cidos na LOA/2015, haja vista que, até o mês de junho do corrente ano, a execução orçamentária dessa rubrica representa apenas 4,8% do previsto, comprometido, prin-cipalmente, pela reduzida execução da despesa com in-vestimentos, impondo restrições, especialmente, para a realização de obras públicas.

Ressalte-se a situação-limite em que se encontram as despesas com pessoal, que, embora ainda não tenham atingido o limite máximo admitido pela Lei de Respon-sabilidade Fiscal, já ultrapassaram o chamado limite pru-dencial, correspondente a 46,55% da receita corrente lí-quida do DF, 95% do limite de 49,00%.

Como se sabe, excedido o percentual de 95% do limi-te, não poderá haver:

• Concessão de vantagem, aumento, reajuste ou ade-quação de remuneração a qualquer título salvo os de-rivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão - geral - prevista no inciso X do Art. 37 da Constituição;

• Criação de cargo, emprego ou função;

• Alteração de estrutura de carreira que implique au-mento de despesa;

• Provimento de cargo público, admissão ou contrata-ção de pessoal a qualquer título, ressalvada a reposi-ção decorrente de aposentadoria ou falecimento de servidores das áreas de educação, saúde e segurança;

• Contratação de hora extra, salvo situações previstas na LDO.

Ultrapassado o limite final, além das medidas antes elencadas, o percentual excedente terá de ser elimina-do nos dois quadrimestres seguintes ao de apuração do excesso, com a eliminação de pelo menos um terço no primeiro quadrimestre. A Constituição Federal prevê a adoção de medidas para regularização da situação, pre-vendo-se redução em pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e funções de confiança, exoneração dos servidores não estáveis e até de servidores estáveis (disposição até hoje não regulamentada). Alternativa-mente, poderá ser reduzido o valor atribuído aos cargos em comissão e funções de confiança, bem como a redu-ção temporária da jornada de trabalho, com redução para-lela de vencimentos.

Não alcançada a redução no prazo estabelecido, e enquanto perdurar o excesso, o ente não poderá receber transferências voluntárias, obter garantia, direta ou indire-ta, de outro ente e contratar operações de crédito, ressalva-das as destinadas ao refinanciamento da dívida mobiliária e as que visem à redução das despesas com pessoal.

O Gráfico a seguir ilustra bem o descompasso que vem ocorrendo entre o crescimento da despesa em rela-ção ao crescimento da receita a partir de 2012, e que se acentuou nos dois últimos anos. ■

Page 32: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate32

Setores da economia em queda(*) Sandra Andrade

Idecon

A atividade econômica no DF retraiu 1,7% no 1º trimestre de 2015, ante igual trimestre de 2014. Os três grandes setores da economia apresentaram que-das: Agropecuária (-9,3%); Indústria (-2,6%) e Ser-viços (-1,6%). O resultado apurado pelo Idecon para o DF ficou próximo ao PIB trimestral para o Brasil calculado pelo IBGE, que contraiu 1,6%. A economia local se ressentiu de medidas fiscais mais restritivas, tanto em nível nacional como local.

Serviços

O setor representa 94,0% da economia do DF e recuou 1,6%. No país, retraiu 1,2%. Apesar da con-tração média no setor de serviços local, a atividade de Serviços de Informação cresceu 4,4% no 1º tri-mestre de 2015.

A atividade Administração, Saúde e Educação Pú-blicas responde por 55,2% da estrutura econômica do DF e caiu 1,9%. No Brasil, o IBGE registrou queda de 1,4%. O desaquecimento do ritmo da atividade pública local deve-se, em parte, à redução do pessoal ocupado. O novo governo assumiu o Governo de Bra-sília em crise econômica e com restrições para novas admissões. O fraco desempenho da atividade pública influenciou o comportamento de outras atividades.

O comércio local retrocedeu 5,8% e o nacional caiu 6,0%, segundo o IBGE. Diante do cenário eco-nômico no início do ano, os consumidores e os em-presários permaneceram com a confiança em baixa. De janeiro a março de 2015, vários estabelecimentos comerciais no DF encerraram suas atividades e os tra-balhadores perderam 2.482 vagas formais, de acordo com o Caged/MTE.

A atividade Intermediação Financeira contraiu 7,9% no DF e 0,4% no Brasil. O encarecimento do crédito pode explicar parte do resultado desfavorável obtido para o DF, visto que a taxa anual da Selic foi

elevada duas vezes ao longo do 1º trimestre de 2015, em janeiro, 12,25%, e em março, 12,75%. Como a Selic é uma taxa de referência para o mercado, sua elevação impacta as diversas linhas de financiamento ao consumidor, reduzindo o volume de crédito.

Indústria

A Indústria, com peso de 5,7% na economia do DF, contraiu 2,6% no 1º trimestre de 2015, ante ao mesmo período de 2014. No Brasil, o IBGE compu-tou recuo de 3,0%.

O cenário tem-se mostrado desfavorável para a in-dústria local. A redução no consumo das famílias e a crise financeira enfrentada pelo Governo de Brasília, tem afetado negativamente o caixa das empresas.

A Indústria de Transformação representa 1,5% na estrutura econômica do DF e a Construção Civil, 3,4%, e retraíram, respectivamente, 2,2% e 2,3%. Em âmbito nacional a primeira atividade recuou 7,0% e a segunda 2,9%.

Agropecuária

O setor Agropecuário no DF responde por apenas 0,3% da atividade econômica local e no 1º trimestre de 2015, retraiu 9,3% em relação ao mesmo período do ano anterior. No Brasil, o setor cresceu 4,0%.

O índice negativo no DF deve-se à redução na pro-dução anual esperada para algumas das principais cul-turas temporárias. De acordo com os dados do LSPA/IBGE, as produções de milho, feijão e soja apresen-taram previsões de safra anual menores que a produ-ção de 2014. A estiagem que atingiu o DF, em janeiro e fevereiro em 2015, foi a responsável pelos baixos resultados. As produções para o milho, feijão e soja em 2015, foram 36,0%, 33,5% e 33,0%, inferiores ao volume colhido em 2014. ■

Tabela 1 - Idecon-DF: Série de variações trimestrais dos setores e das atividades econômicas em relação ao mesmo período do ano anterior - 1º Trimestre de 2013 ao 1º Trimestre de 2015

Atividades Econômicas 2013 2014 20151º Trim 2º Trim 3º Trim 4º Trim 1º Trim 2º Trim 3º Trim 4º Trim 1º Trim

Agropecuária 2,5 -0,1 -4,6 4,7 14,8 24,6 5,1 2,7 -9,3Indústria 1,6 1,8 1,6 -1,1 1,6 -1,8 -4,4 -2,2 -2,6

Indústria de transformação 4,6 6,4 7,9 6,1 6,5 5,2 -1,9 -3,3 -2,2Construção civil -0,1 0,2 -0,9 -4,2 -1,3 -5,3 -6,0 -2,0 -2,3Outros da indústria 1 5,3 1,0 1,9 0,1 4,7 0,0 -1,5 -0,3 -5,1

Serviços 1,0 1,7 1,0 1,4 3,2 1,3 2,3 1,2 -1,6Comércio 1,5 3,0 0,8 4,6 3,5 -2,0 -4,6 -4,2 -5,8Serviços de informação 9,5 7,0 5,8 4,7 4,9 5,4 5,5 5,3 4,4Intermediação financeira, seguros e previdência complementar

0,3 2,9 -1,2 1,3 3,2 -5,0 -3,6 -4,1 -7,9

Administração, saúde e educação públicas -0,3 0,4 0,5 0,2 2,7 1,8 3,3 1,4 -1,9Outros serviços 2 3,6 3,4 2,8 3,2 4,5 3,6 4,2 4,7 3,3

Idecon-DF 1,0 1,7 1,0 1,3 3,2 1,2 1,8 1,0 -1,7Fonte: Codeplan, Diretoria de Estudos e Pesquisas Socioeconômicas, Gerência de Contas e Estudos Setoriais, Núcleo de Contas Regionais1 - Extrativa mineral e Eletricidade, gás, água, esgoto e limpeza urbana.2 - Transporte, armazenagem e correio; Serviços imobiliários e aluguéis; Alojamento e alimentação; Serviços prestados às famílias; Serviços prestados às empresas;

Educação e saúde mercantis; e Serviços domésticos.

(*) Sandra Andrade - Coordenadora do Núcleo de Contas Regionais

Page 33: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 33

Planejamento e Gestão: possibilidades atuais do Estado na promoção do desenvolvimento

Artigo

(*) José Celso Cardoso Jr.1

Nesta segunda década do século XXI, pode-se afir-mar que desenvolvimento e democracia - como conceitos histórico-teóricos e categorias sociopolíticas - nunca es-tiveram tão presentes nos debates e embates públicos da academia ou da sociedade, como no Brasil da atualidade. Além do debate teórico, que por si só é desafiador, há bar-reiras estruturais para se pensar e aplicar o planejamen-to como função precípua e indelegável do Estado, isso mesmo dentro do governo, em ministérios, secretarias e órgãos que, supostamente, existem para esse fim. O pla-nejamento é um instrumento essencial para o desenvolvi-mento e convém lembrar Matus:

“O planejamento é uma das maiores conquistas libertá-rias que o homem pode almejar. Porque o plano é a ten-tativa do homem para criar seu futuro; é lutar contra as tendências e correntes que nos arrastam; é ganhar es-paço para escolher; é mandar sobre os fatos e as coisas para impor a vontade humana; é recusar-se a aceitar o resultado social que a realidade atomizada de infinitas ações contrapostas oferece-nos anarquicamente; é re-jeitar o imediatismo; é somar a inteligência individual para multiplicá-la como inteligência coletiva e criado-ra. (...) O planejamento é, portanto, uma ferramenta das lutas permanentes do homem desde o alvorecer da humanidade, para conquistar graus de liberdade cada vez maiores.” Carlos Matus (1996: 182 a 184)

Democracia, desenvolvimento e planejamento devem, então, andar juntos. Com vistas a contribuir para esse fim, o presente texto traz, primeiramente, uma discus-são de tendências observadas na atualidade que tocam à conceituação de desenvolvimento, vocalização de temas e decisões políticas, assim como as estruturas e formas de atuação do Estado. Em seguida, abordam-se alguns elementos de discussão do papel do planejamento, com destaque para o Plano Plurianual (PPA), como aliado es-tratégico para o processo de governar sociedades demo-cráticas complexas, como é o caso do Brasil.

Desenvolvimento, Estado e Sociedade

Observam-se três fenômenos em curso na atualidade: i) redefinições do conceito e do sentido de desenvolvimento; ii) multiplicação das formas e procedimentos de expres-são e vocalização de temas de relevância pública e tomada de decisões políticas; e iii) transformações na estrutura e formas de atuação do Estado e em suas interações com a sociedade (atores econômicos, políticos e sociais) na pro-dução de políticas públicas. Estas estão a exigir não só um

1 Colaboram para este texto os seguintes colegas: Ronaldo Coutinho Garcia, Roberto Rocha Pires e Paulo Barea Coutinho. O resultado final, no entanto, é de minha inteira responsabilidade, razão pela qual isento os mencionados colegas por qualquer uso abusivo ou equivocado de suas ideias.

aprofundamento das reflexões histórico-teóricas acerca dos significados e alcances de cada um dos três fenômenos citados, como a demandar novos arranjos sociopolíticos ou soluções institucionais para cada um deles, sob pena de o Estado e a Sociedade não conseguirem, ao menos no Brasil, realizar seus ideais de desenvolvimento e de demo-cracia no decorrer deste século XXI.

Em primeiro plano, quanto à reconceituação e ressig-nificação do desenvolvimento no século XXI, talvez já seja possível dizer que o desenvolvimento, hoje, já não é mais como era antigamente. Em outras palavras: ao lon-go do século XX, depois de ter nascido e crescido for-temente associado à dinâmica industrial do crescimento econômico, o conceito de desenvolvimento foi criticado e revisitado por diversos autores, escolas de pensamento e abordagens científicas, de modo a romper-se tanto o re-ducionismo como o “economicismo” a ele originalmen-te correlacionados. Para tanto, muito ajudou o próprio fracasso dos projetos e trajetórias nacionais de “desen-volvimento” centrados predominantemente na dimensão econômica do crescimento pela via industrial, pois na maioria dos casos - e a experiência concreta dos países latino-americanos é sintomática a esse respeito. Isso vêm acompanhado de longos anos de autoritarismo e supres-são de direitos humanos, civis e políticos, e/ou produzi-ram resultados deletérios em termos de sustentabilidade ambiental e humana, materializados em indicadores cres-centes ou elevados de degradação do uso do solo, da água e do ar, bem como de pobreza, indigência e desigualdades sociais e laborais de múltiplas dimensões.

Desta feita, é preciso reconhecer que, nos dias que correm, a ideia e a práxis do desenvolvimento vêm adquirindo, ainda que de forma gradual, conotações e

Razões e vantagens do PPA, aliado estratégico para o processo de governar em sociedades democráticas complexas

Foto: Toninho Leite

Page 34: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate34

significados mais amplos, complexos e dinâmicos. Fa-la-se aqui de um sentido de desenvolvimento que com-preende, entre outras, as seguintes dimensões ou qua-lificativos intrínsecos: inserção internacional soberana; sustentabilidade ambiental e humana; macroeconomia do crescimento, estabilidade e emprego; infraestrutura econômica, social e urbana; estrutura tecnoprodutiva avançada e regionalmente integrada; proteção social, garantia de direitos e geração de oportunidades; forta-lecimento do Estado, das instituições e da democracia (CARDOSO Jr., 2014).

Embora não esgotem o conjunto de atributos dese-jáveis de um ideal amplo de desenvolvimento para o país, estas dimensões certamente cobrem parte bastante extensa do que seria necessário para garantir níveis si-multâneos e satisfatórios de soberania externa, inclusão social pelo trabalho qualificado e qualificante, produtivi-dade sistêmica elevada e regionalmente bem distribuída, sustentabilidade ambiental e humana, equidade social e democracia civil e política ampla e qualificada. Com isso, recupera-se nas agendas nacionais a visão de que o Estado é parte constituinte em outras palavras - não exó-geno - do sistema social e econômico das nações, sen-do em contextos históricos de grande heterogeneidade e desigualdade como o brasileiro, particularmente decisivo na formulação e na condução de estratégias virtuosas de desenvolvimento.

Em segundo lugar, com respeito à multiplicação das formas e procedimentos de expressão e vocalização de temas de relevância pública, talvez também já seja pos-

sível afirmar que a democracia, hoje, já não é mais como era antigamente. Dito de outra forma: ao longo do século XX, depois de ter nascido e crescido fortemente associa-da a formas de representação classista. Vale dizer, sindi-catos e partidos políticos de filiação e vinculação tanto patronal como laboral, a democracia representativa clás-sica - e as diversas variantes institucionais parlamentares, congressuais e legislativas dela derivadas - foi perdendo capacidade política de explicitar e organizar os interesses crescentemente heterogêneos e muitas vezes antagônicos da sociedade, bem como de processar os respectivos con-flitos pelas vias formais. Com isso dificultou ou mesmo impediu, em vários casos, a construção de consensos e soluções negociadas - intrinsecamente - nos complexos e intrincados processos decisórios das políticas públicas.

Para tanto, é certo que muito ajudou o próprio proces-so de fragmentação e complexificação da vida social, em que a multiplicidade de atores, interesses, novas arenas e agendas políticas em permanente interação não encon-tram, nas instâncias tradicionais dos sindicatos, partidos políticos e mesmo em algumas organizações não gover-namentais já cristalizadas da sociedade civil, canais de expressão, vocalização e representação de suas pautas.

Essas novas agendas, sejam de natureza cotidiana ou estrutural, são fragmentadas e têm dificuldade de se apre-sentarem e transitarem de maneira crível nas instituições parlamentares, congressuais e legislativas clássicas da democracia representativa. Por isso, e considerando ain-da o vertiginoso desenvolvimento das novas tecnologias de informação, comunicação e interação social virtual em

Foto: Toninho Leite

Page 35: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 35

O Estado não é um ente externo e coercitivo

aos movimentos da sociedade e da economia, dotado de racionalidade

única, instrumentos suficientes e

capacidade plena de operação. É sim

parte integrante e constituinte da

própria sociedade e da economia, que precisa se

relacionar com outros agentes nacionais e internacionais para construir

ambientes favoráveis à implementação de suas

ações.

curso na modernidade líquida na qual vivemos (Bauman, 2001), outros canais e procedimentos legítimos de expres-são e vocalização têm surgido e proliferado em nossa so-ciedade. Por um lado, essa nova realidade agudiza a crise da democracia representativa tradicional e o anacronismo de suas instituições e procedimentos formais. Por outro lado, ela força e tensiona o aparecimento de novas formas de convivência política em regimes democráticos frágeis, algo que tem sido chamado de democracia participativa - ou mesmo deliberativa - para a árdua tarefa de organi-zar interesses, explicitar conflitos e produzir consensos coletivos (Pires, 2013). As novas tecnologias e as formas de interação social, ainda não totalmente incorporadas na esfera política stricto senso, também agem na complexi-ficação do processo político e agudizam tensões.

Isto posto, também aqui neste caso, é preciso reconhe-cer que a ideia e a práxis da democracia vêm ganhando conotações e significados muito mais amplos, complexos e dinâmicos. Democracia esta que convive atualmente com polarizações (talvez exageradas e que trazem riscos para a própria democracia) e crescente intolerância. Em contraponto, cabe fortalecer e mesmo talvez reinventar instâncias representativas tradicionais, em que fóruns tais como o Conselho de Desenvolvimento Econômico e So-cial (CDES) e outros correlatos serviriam para facilitar a comunicação e a consulta, bem como a negociação e a coordenação, entre interesses sociais heterogêneos e inte-resses públicos convergentes (CARDOSO Jr., SANTOS & ALENCAR, 2010). Nesse contexto, reforça-se o papel estratégico a ser cumprido por instituições como estas no assessoramento à Presidência da Re-pública. Isso complementa a função do Parlamento, no sentido de promo-ver consultas, concertação e delibera-ção sobre temas críticos ao desenvol-vimento nacional, com o potencial de qualificar as decisões governamentais (por meio do aporte de informações, perspectivas e experiências variadas dos conselheiros), explicitar interes-ses, processar conflitos e ampliar sua legitimidade (por meio da inserção social, liderança política dos mesmos e da criação de coalizões de apoio em torno de projetos), produzindo políti-cas públicas inovadoras e mais efeti-vas. Em síntese: as discussões contem-porâneas sobre o assunto reconhecem a existência - e defendem o uso - de modelos neocorporativistas, tais como seria o próprio espaço de convivência do CDES, como um encaixe à demo-cracia representativa, sem obviamente substituí-la ou com ela conflitar.

Em terceiro lugar, no que se refere às transformações na estrutura e for-mas de atuação do Estado em suas in-terações com a sociedade na produção de políticas públicas, é preciso partir do reconhecimento de que o Estado pode muito, mas não pode tudo. Essa talvez seja uma forma rápida de dizer que o Estado moderno, num ambien-te capitalista, ainda que possua algum raio de manobra para impor seus pró-

prios objetivos - supostamente refletindo um interesse racional, coletivo ou nacional -, não pode se movimentar para fora de alguns parâmetros definidores da sua própria existência.

O Estado não é um ente externo e coercitivo aos mo-vimentos da sociedade e da economia, dotado de racio-nalidade única, instrumentos suficientes e capacidade plena de operação. É sim parte integrante e constituinte da própria sociedade e da economia, que precisa se re-lacionar com outros agentes nacionais e internacionais para construir ambientes favoráveis à implementação de suas ações. Com isso, entende-se que a fragmentação dos interesses articulados em torno do Estado e a frouxidão das instituições burocráticas e processuais em termos da canalização e resolução dos conflitos limitam a autono-mia efetiva das decisões estatais cruciais e fazem com que o Estado brasileiro seja, simultânea e paradoxalmen-te, o locus de condensação e processamento das disputas por recursos estratégicos (financeiros, logísticos, huma-nos etc.), e o agente decisório último por meio do qual se materializam ou se viabilizam os projetos políticos dos grupos vencedores.

Desta maneira, explicitar, multiplicar e institucionali-zar outros canais de interação entre Estado e Sociedade no Brasil é tarefa das mais importantes para, simultanea-mente, fortalecer a democracia e aprimorar o modelo de desenvolvimento nacional (PIRES, 2013). Neste diapa-são, expressamos, por um lado, a convicção da necessi-dade e da oportunidade do enraizamento da democracia,

mediante o aperfeiçoamento de seus instrumentos e práticas cotidianas, e de outro, a necessidade de ampliar as bases de sustentação sociopolítica do governo, tendo em vista certo proje-to nacional de desenvolvimento com as características acima apontadas. Incorporar à cena política brasileira segmentos sociais diferenciados, dan-do-lhes possibilidade de influência política um pouco mais equilibrada, de tal sorte que empresários, lideran-ças sindicais, ativistas da cidadania e de grupos étnicos, organizações da sociedade civil, personalidades dos mundos acadêmico, jurídico, artísti-co e esportivo sejam chamados a se manifestar, em iguais condições, so-bre políticas e ações de governo, em curso ou a serem adotadas. Inicia-se, assim, o rompimento da tradicional postura de confronto e de eliminação do outro, estabelecendo-se, gradual-mente, uma posição de colaboração com vistas ao ganho mútuo e ao inte-resse coletivo (GARCIA, 2010).

A consolidação deste novo tipo de relação constitui, sem dúvida, uma ta-refa grandiosa e difícil, que se torna ainda mais complexa quando testada em um tempo histórico conturbado como o atual e em um país com as ca-racterísticas do Brasil. Além de fortes desigualdades que persistem, há um sentimento de esgotamento da repre-

Page 36: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate36

sentação tradicional por parte dos ci-dadãos e mesmo lideranças, num con-texto em que impera o consumo ante a informação fragmentada e filtrada por mídias e redes sociais.

O diálogo social é uma força por demais poderosa para não ser culti-vada e aplicada de forma sistemática para viabilizar os grandes processos transformadores exigidos para um Brasil verdadeiramente de todos. Se esse Brasil é possível, a sua constru-ção terá por base consensos resul-tantes de sincero diálogo social, da negociação firme e inteligente, da forte cooperação entre diferentes, da vontade coletiva de produzir o novo. Como esperado, exigirá governantes determinados e aparato público dota-do de enorme capacidade planejadora (Garcia, 2010).

É preciso, por isso, destacar que a construção de novos espaços de con-certação não é tarefa simples. Entre as dificuldades de implementação e de consolidação dessas novidades ins-titucionais, destacam-se aqui quatro elementos: i) a dificuldade de legiti-mação de inovações institucionais por parte dos vários agentes envolvidos, bem como pelo próprio governo e so-ciedade; ii) a linha muito tênue entre a capacidade do Es-tado de desencadear um novo espaço de concertação sem ser, ao mesmo tempo, colonizado por interesses particu-lares e sem se tornar um agente autoritário ou impositivo; iii) a capacidade real de que as deliberações construídas nesses espaços possam influenciar as decisões estratégi-cas dos governos; e iv) o risco de sobre representação dos atores estratégicos - vinculados a determinados interesses - indicados à posição de conselheiros.

Em definitivo, se a experiência concreta recente ain-da é por demais incipiente e desafiadora, para fins de se demonstrar a viabilidade tecnopolítica de congraçamen-to entre democracia substantiva e planejamento para o desenvolvimento nacional, é certo que dos esforços go-vernamentais e societais nesta direção dependerão as chances de sucesso e durabilidade da recente empreitada desenvolvimentista em nosso continente.

Planejamento como aliado do desenvolvimento

Na atualidade, a importância renovada do plane-jamento governamental em ambientes democráticos (estes que são, por excelência, complexos, incertos e dinâmicos), reforça a crença nesta atividade do Estado, como a única realmente capaz de transformar informa-ção em conhecimento aplicado, e este em ação concreta e objetivada de governos. É a única capaz de reduzir o mundo de incertezas radicais de nossas sociedades a riscos minimamente calculáveis do ponto de vista pro-babilístico. Com isso, fazendo os governos migrarem da improvisação absoluta na condução da administra-ção pública para o mínimo de racionalização, tornando possível a busca pela tríade eficiência, eficácia e efeti-vidade das ações governamentais.

Um sistema de planejamento, em suma, é a única coisa capaz de supe-rar a situação fragmentada e com-petitiva que hoje se observa dentro dos governos, permitindo uma con-vivência organicamente articulada e cooperativa, seja entre ministérios, órgãos e instâncias federativas, seja entre dirigentes políticos, burocracia pública e a própria sociedade civil organizada. O planejamento, por fim, quando estruturado de modo sistêmi-co e estratégico, é a única função de Estado capaz de conferir dinamicida-de a governos inertes ou paralisados, fazendo as economias converterem especulação financeira e rentismo em investimentos produtivos socialmen-te úteis, assim permitindo às socie-dades transitarem do passado e pre-sente a futuros menos incertos e mais condizentes com as aspirações da civilização e da coletividade na mo-dernidade. Nesse sentido, podem-se sistematizar alguns elementos para pensar e agir, com vistas ao planeja-mento efetivo e promotor do desen-volvimento2.

• Planejamento não é plano, é política

Planejamento é processo cotidiano e dinâmico de condução do governo. Não se confunde com documentos, livros e planos, ainda que estes, se bem elaborados, ajudem como parte necessária ao registro do-cumental, bem como na gestão e comunicação interna e externa ao governo etc. Mas que fique claro: planejamen-to é antes de tudo a arte da boa política. Logo, plane-jamento é processo tecnopolítico - contínuo, coletivo e cumulativo - por meio do qual se dá concretude a projetos oriundos da própria sociedade, canalizados por grupos que disputam de forma legítima e democrática a condu-ção das ações de governo. Por isso, tanto melhor, quanto mais republicanos e democráticos forem os critérios de organização institucional do Estado e os valores e normas de funcionamento das instituições e das próprias políticas públicas. Neste sentido, os planos - como documentos formais do planejamento - podem e devem ser elaborados para explicitar, ratificar e aperfeiçoar o processo geral de planificação, nos termos acima propostos.

• Mecanismos tecnopolíticos reais são muitas vezes diferentes dos formais

Até mesmo em função da cultura política brasileira, mecanismos tecnopolíticos reais são muitas vezes dife-rentes dos formais. Isso quer dizer que talvez haja exces-so de burocratismo e formalismo, tanto no desenho como na operacionalização das ações governamentais, expres-sas por um conjunto amplo de políticas públicas em si mesmas heterogêneas e complexas. E a distância entre o real e o formal talvez seja ainda maior em contextos históricos marcados por postura de ativação das funções

2 Vide CARDOSO Jr., J. C. (org.). Planejamento Brasil Século XXI: inova-ção institucional e refundação administrativa - elementos para o pensar e o agir. Brasília: Ipea, 2015 (no prelo).

Um sistema de planejamento, em

suma, é a única coisa capaz de superar a

situação fragmentada e competitiva que hoje se observa dentro dos governos, permitindo

uma convivência organicamente

articulada e cooperativa, seja entre ministérios,

órgãos e instâncias federativas, seja entre dirigentes políticos,

burocracia pública e a própria sociedade civil

organizada.

Page 37: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 37

governamentais, como as que recentemente vêm carac-terizando e remodelando o Estado brasileiro rumo a um perfil algo mais (neo ou social) desenvolvimentista. De fato, o ideal é que tal distância fosse menor do que con-cretamente é, ou que fosse diminuindo ao longo do tem-po, mas para tanto, faz-se necessário reformar estruturas arcaicas de nossa ossatura estatal e da própria legislação que (des)conecta o direito administrativo das funções tí-picas da administração pública brasileira.

• Planejamento não é panaceia, mas pode ser parte da solução

Para tanto, o Plano Plurianual (PPA) precisa ser visto e tido pelo governo como aliado estratégico, e não como obstáculo constitucional, mal necessário da burocracia ou inimigo público a ser ignorado ou derrotado no campo de batalha da política pública. Em outras palavras: nós não falamos de planejamento como algo utópico (se bem que planejamento se refira também, necessariamente, a uto-pias...), mas sim como função precípua e indelegável do Estado, função governamental cada vez mais necessária no mundo contemporâneo. Não como panaceia, mas sim como parte de soluções condizentes com a complexidade e heterogeneidade das questões sociais e econômicas em nossas sociedades. Recusar a alternativa planejadora, seja em nome do mercado, seja em nome das dificuldades in-trínsecas de estruturação e institucionalização desta ativi-dade, seria tremenda falta de compreensão de governan-tes sempre premidos por soluções aparentemente rápidas e fáceis no curto prazo. Situação esta que raramente será capaz de ir às raízes dos problemas, nem tampouco de aventar soluções estruturantes e perenes para eles.

• Vantagens do PPA, aliado estratégico de governo

Dadas as razões apontadas acima, decorreriam vanta-gens consideráveis ao Governo Federal - mas também às unidades subnacionais da federação - caso trabalhassem efetivamente para transformar o PPA em instrumento tecnopolítico de alinhamento institucional dos objetivos estratégicos, prioridades, metas e prazos do país.

Na relação “executivo X executivo”, o PPA:

• Serviria como instrumento de articulação, pactua-ção e coordenação intragovernamental.

• Poderia ajudar como instrumento de negociação e pactuação horizontal, talvez facilitando a monta-gem de coalizões programáticas suprapartidárias.

• Poderia servir como instrumento de negociação e pactuação vertical, talvez cumprindo o papel de complementação programática regional. Por fim, mas não menos importante.

• Trabalharia como instrumento de comunicação social e monitoramento público em torno de prio-ridades de governo, objetivos estratégicos, metas e prazos anuais do plano.

Desta feita, não só o planejamento governamental recuperaria sua função estratégica dentro do processo tecnopolítico de governo, como o PPA, especificamente, passaria a ser, de fato, a referência principal de negocia-ção e pactuação de governo, tanto na sua relação intra-governamental, como na relação entre poderes (Execu-tivo, Legislativo e Judiciário) e interfederativa (União, estados e municípios). ■

(*) José Celso Cardoso Jr.Doutor em Economia Social e do Trabalho, ambos pelo Instituto de Economia (IE) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Desde 1997 é técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea. Foi diretor de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia (Diest) e diretor de Planejamento, Monitoramento e Avaliação do Plano Plurianual (PPA 2012-2015), na Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos (SPI) do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG). Atualmente, coordena no Ipea o projeto Pensamento Estratégico, Planejamento Governamental e Desenvolvimento no Brasil Contemporâneo.

Referências bibliográficas

• BAUMAN, Z. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2001.

• CARDOSO JR., J. C.; SANTOS, J. C.; ALENCAR, J. Diálogos para o Desenvolvimento: a experiência do CDES sob o governo Lula. Brasília: Ipea, 2010.

• CARDOSO JR., J. C. Planejamento, democracia e desenvolvimento no Brasil: perspectivas à luz das capacidades estatais e instrumentos governamentais. In: CALIXTRE, A.; BIANCARELLI, A. CINTRA, M. Presente e Futuro do Desenvolvimento Brasileiro. Brasília: Ipea, 2014.

• CARDOSO JR., J. C. (org.). Planejamento Brasil Século XXI: inovação institucional e refundação administrativa - elemen-tos para o pensar e o agir. Brasília: Ipea, 2015 (no prelo).

• GARCIA, R. C. O CDES e a construção da agenda nacional de desenvolvimento: um relato particular. In: CARDOSO JR., J. C.; SANTOS, J. C.; ALENCAR, J. Diálogos para o Desenvolvimento: a experiência do CDES sob o governo Lula. Brasília: Ipea, 2010.

• MATUS, C. Adeus Senhor Presidente: governantes governados. São Paulo: Ed. Fundap, 1996.

• PIRES, R. R. A participação social no nível nacional: desafios a um projeto inacabado. In: AVRITZER, L. (org.). Experiência Democrática, Sistema Político e Participação Popular. São Paulo: Fundação Perseu Abramo (FPA), Projetos para o Brasil, 2013.

Page 38: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate38

A Codeplan, o Ipea e o desafio de retomar o planejamento estratégico

Artigo

(*) Ronaldo Coutinho Garcia1

O presente texto reproduz, com algumas adaptações, a apresentação oral do autor em evento integrante do Proje-to “Quintas Codeplan - Espaço de Discussão”, em março último. Sua participação objetivou auxiliar a discussão sobre as possibilidades do planejamento governamental na atualidade, a partir das trajetórias percorridas pela Co-deplan e pelo Ipea. São órgãos que integram uma rede de instituições responsáveis pela realização de estudos, pesquisas socioeconômicas, agropecuárias e demográ-ficas, incluindo a construção de indicadores estatísticos sintéticos, sobre a realidade brasileira, com abrangência estadual, municipal e federal. A atuação desses órgãos re-veste-se de fundamental importância para o planejamen-to governamental, especialmente no acompanhamento e avaliação de programas e políticas públicas. No entanto, a história registra vários momentos de dificuldades, para não dizer quase extinção dessas instituições, notadamente no período de governos neoliberais.

Nesse contexto, entendeu-se oportuno traçar um his-tórico das dessas instituições; atualizar alguns conceitos básicos do planejamento como instrumento crucial para a condução - pelo governo - de um processo de desen-volvimento; ressaltar a importância de se dispor de um adequado arranjo institucional para operar o sistema de planejamento estratégico e, por fim, apresentar algumas sugestões para o debate sobre o lugar da Codeplan na construção de um outro DF.

1 As opiniões aqui emitidas são de responsabilidade exclusiva do autor.

Breve Histórico da Codeplan e Ipea

A Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplica-da (Ipea) completaram 50 anos em 2014. É fundamental reconhecer que trata-se de entidades com reconhecido histórico de atuação em prol da administração pública brasileira, a despeito dos percalços quanto ao processo de estabilidade, perenidade e estrutura organizacional. Nesse meio século, por várias ocasiões, cruzamos mares intranquilos, atravessamos muitas tormentas e, apesar dos danos não desprezíveis, ainda estamos a navegar. E navegar é preciso, dizia o poeta.

Com a denominação de “Companhia do Desenvolvi-mento do Planalto Central” surgiu a Codeplan, cujo ob-jetivo era mostrar de que maneira as potencialidades do grande entorno da Capital Federal deveria com ela intera-gir, criando as condições para se transformar em um polo irradiador de progresso para a vasta porção interiorana do nosso território nacional. As mudanças em suas atri-buições e inserção institucional, tal como aconteceria no Ipea, permitiram acompanhar as transformações por que passaram os governos e os projetos nacionais e distritais implementados.

Ao final dos anos 1970, no início do mandato do úl-timo governo militar, a Codeplan implantou o Centro de Processamento de Dados (CPD). Isso possibilitou, no auge da onda neoliberal e da afirmação da ideologia gerencialista na administração pública, à Companhia “atuar mais especificamente na área da tecnologia da in-formação, ocasião em que abandonou e/ou secundarizou suas atividades típicas de pesquisa e estudos socioeco-nômicos, passando por um longo processo de esvazia-mento, com supressão de diversos projetos e cessão da grande maioria de seus técnicos para outros órgãos do Governo de Brasília” 2. Todavia, o término da segunda metade da primeira década do século XXI iria trazer uma tempestade quase perfeita para a instituição, com seu principal dirigente ocupando as páginas policiais dos jornais e mídias.

Em 2007, foi transformada em Companhia de Pla-nejamento do Distrito Federal, reavendo sua missão de “apoiar o Governo do Distrito Federal nas atividades de Planejamento Estratégico, Desenvolvimento Econômico,

2 Em www.codeplan.df.gov.br/a-companhia/a-secretaria.html, acesso em 01.06.2015.

Foto: Toninho Leite

Page 39: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 39

Social e Urbano, coletando, produzindo e disseminando informações para a tomada de decisão governamental e melhoria contínua da qualidade de vida da população do Distrito Federal e de sua região de influência”.3 Seria a tentativa de recuperar e atualizar a identidade original.

A partir de 2011, a Codeplan começou a se recompor tecnicamente e retomar importantes projetos de pesquisa e estudos socioeconômicos, fundamentais para interpre-tar a dinâmica e realidade do Distrito Federal, como a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED/DF), em par-ceria com o DIEESE/Secretaria de Trabalho, as pesqui-sas Distrital e Metropolitana por Amostra de Domicílios (PDAD/DF e PMAD) realizadas, respectivamente nas 31 regiões administrativas do DF e em nove municípios goianos do Entorno , o Índice de Desempenho Econô-mico do DF (Idecom), o SIGA e o GeoServiço, além de produzir estudos especiais. Em pesquisas como essas são produzidos conhecimentos e informações que permitem orientar socioespacialmente a atuação governamental. É retomada, assim, a nobre tarefa de a Companhia auxiliar o planejamento do desenvolvimento distrital e regional.

Quanto ao Instituto de Pes-quisa Econômica Aplicada (Ipea), faço um ligeiro apanhado da sua trajetória desde 1964, ano de sua criação. Inicialmente de-nominado Escritório de Pesqui-sa Econômica Aplicada (EPEA), ocupou lugar proeminente no arranjo institucional no auge do planejamento governamental no Brasil. Era, então, o presti-gioso Instituto de Planejamen-to Econômico e Social, braço técnico-político e operacional da Secretaria de Planejamento e Coordenação da Presidência da República (SEPLAN-PR), órgão central do sistema nacio-nal de planejamento, a qual se vinculavam o Ipea, o IBGE, o BNDE (o S foi incorporado em 1985), o CNPq (todos os insti-tutos e centros de pesquisa) e a FINEP/MCTI.

Ao Ipea cabia a realização de estudos e pesquisas sobre as-pectos nebulosos da realidade merecedora da interven-ção governamental; a elaboração de planos e programas nacionais, regionais e setoriais; a avaliação ex-ante de qualquer política, programa, projeto. Era responsável por conferir a consistência global aos planos nacionais (Projeto Nacional de Desenvolvimento-PND, inclusive); subsidiar decisões sobre financiamento a estados e muni-cípios, e empréstimos internacionais; providenciar proje-tos de lei de iniciativa do Executivo ou do Legislativo e preparar vetos e mensagens presidenciais; fazer a progra-mação financeira de todos os fundos de desenvolvimento

3 Idem

subordinados à SEPLAN. O Ipea/INOR elaborava e exe-cutava o Orçamento da União e o Ipea/CENDEC (Centro de Treinamento para o Desenvolvimento Econômico e Social), treinava os planejadores dos governos federal e estaduais de grandes municípios, além de formar planeja-dores para diversos países da América Latina e da África.

Em 1990, sob o governo Collor, o Ipea inicia um lon-go processo regressivo. Passa a ser denominado Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, ao mesmo tempo em que o planejamento governamental começa a ser enten-dido como algo ultrapassado e desnecessário. O Instituto passa a assumir atribuições consideradas pouco claras e amarga um longo processo de esvaziamento de pessoal, motivação, redução das demandas estruturadas e impre-cisão no seu papel institucional.

Ainda que em 1995 tenha se iniciado um processo de recomposição de seu quadro técnico, isso aconteceu sob uma perspectiva economicista e ortodoxa. Por quase 10 anos afirmou-se com uma prática academicista, por um lado, e oficialista-ideológica, por outro, com o intento de legitimar as políticas neoliberais em curso. Esse quadro

perdurou até a segunda metade da década seguinte, quando se somam esforços para reorien-tar a atenção em um programa de trabalho mais ambicioso e diversificado e o engajamento político-institucional (menos produção acadêmica e mais pro-posições de políticas, avaliações da ação governamental, estudos e análises de problemas comple-xos e assessoramento a alta dire-ção do governo).

Nesse contexto, tanto a Co-deplan quanto o Ipea sofreram as consequências de um mesmo fe-nômeno: os nossos governos não atribuem elevada importância ao planejamento estratégico do de-senvolvimento nacional.

Conceitos básicos

O desenvolvimento nacional requer projeto, plano e plane-jamento estratégico. O projeto (uma ideia de país, uma ideia de

Distrito Federal) identifica o que está bem no presente e o que não está, aponta como deve ser o futuro, isso tudo compartilhado pela cidadania, impregnando corações e mentes dos atores pertinentes a essa construção. O plano mostra como transitar de uma situação à outra, mediante um programa de ação. O planejamento mantém o plano atualizado para imprimir eficácia, sinergia e direcionali-dade às ações cotidianas, pois só se age no presente.

O Projeto Nacional pode ser respaldado em compe-tências ou não, ser sincero ou não, possuir viabilidade ini-cial ou não (são vários sim, vários não). O voluntarismo e a demagogia estarão sempre disponíveis ao não estadista.

O Boletim de Análise Político-Institucional faz parte das inúmeras publicações do Ipea

Page 40: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate40

O plano é a parte mais fácil do planejamento, pode até nem existir se não se pretende levá-lo à prática. Mas é um direito da sociedade saber para aonde se está caminhando e é um instrumento de aglutinação de interesses, recursos e competências. Organiza a cidadania e dá sentido à ação dos atores sociais. O planejamento é um sistema que ope-ra incessantemente, requer organização apropriada e exi-ge equipes dotadas de capacidade específicas, de modo a permitir a produção de conhecimentos e informações não triviais, úteis ao complexo processo de governar.

Governar é conduzir processos de transformação so-cial, enfrentando problemas, aproveitando oportunidades e mantendo conquistas sociais. E isso requer um pode-roso sistema de planejamento, caso não se queira viver no reino da improvisação, ser governado pelas circuns-tâncias e ser conduzido para aonde a sociedade não quer.

Entidades como a Codeplan e o Ipea, com a história e o potencial que têm, deveriam ocupar um lugar preciso no arranjo institucional responsável por operar o planejamen-to distrital e regional e o planejamento nacional. O arran-jo institucional é entendido como um conjunto de regras, mecanismos e processos que definem a forma particular de como se coordenam atores e interesses na implementação de uma política específica. São os arranjos institucionais, portanto, que dotam (sim ou não, mais ou menos) os es-tados e os seus governos de capacidade técnica e política para alcançar os objetivos a que se propõem.

Arranjos institucionais para o Planejamento

Os arranjos institucionais construídos ao longo da nossa história para operar o planejamento governamental no Brasil, responderam a alguns fatores básicos, entre os quais destacam-se:

1. A ambição e a amplitude do Projeto Nacional de Desenvolvimento (PND) pretendido pelo gover-nante que o constrói;

2. A compreensão detida pelos dirigentes políticos so-bre o processo de governar e sobre o lugar do Esta-do no PND;

3. O ambiente sócio-político-ideológico vigente em cada período histórico;

4. O estágio em que se encontravam as teorias, os mé-todos e as técnicas de planejamento governamental.

Assim, se pensarmos nos governos de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e no regime militar (que tinham pro-jetos nacionais de desenvolvimento), veremos que Vargas e os militares, por não serem constrangidos pelo tempo, construíram progressivamente arranjos institucionais for-mais avançados em suas respectivas épocas. Juscelino Ku-bitschek teve que inventar um modus operandi que lhe per-mitisse condensar o tempo histórico (alta velocidade nas transformações sociais), fazendo-o caber no tempo físico (tamanho do mandato), mediante ações eficazes e oportu-nas, sob organização e coordenação adequadas.

Os governos neoliberais desprezaram o protagonismo estatal, desacreditaram na possibilidade de um projeto na-

cional de desenvolvimento e condenaram o planejamento a uma caricatura: Fernando Collor inventou uma quime-ra, o Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, com as consequências conhecidas; (o interregno Itamar Franco explicitou a importância do planejamento, recriou a SEPLAN-PR, mas sem os instrumentos comparáveis à original, não teve tempo para reorganizar um arranjo efe-tivo e estava acicatado pela inflação galopante); Fernando Henrique Cardoso rebaixou a inserção do Planejamento, fazendo-o um ministério de linha e, em algum momento chegou a retirar o planejamento do seu nome. Em 1999 existiu o Ministério do Orçamento e Gestão (MOG).

Collor e FHC aproveitaram-se, é claro, da perda pro-gressiva de eficácia do planejamento normativo, iniciada ao final da ditadura, da crise multidimensional que havia se instalado no país (de regime, político-partidária, eco-nômica, ideológico-cultural etc.) e da avassaladora onda ideológica neoliberal. O fato é que o sistema nacional de planejamento foi desmontado no período.

A SEPLAN-PR, assim como Sistema Nacional de Pla-nejamento não mais existem. A coordenação do conjunto do governo não apresenta uma formalidade reconhecida. É comum ouvir-se na Esplanada do Ministérios pergun-tas sobre se existe e qual é o arranjo institucional vigente para a coordenação governamental. Algo não muito dife-rente caracteriza a realidade do Governo de Brasília.

Os governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidenta Dilma Rousseff tiveram como bandeira por em marcha um novo projeto de desenvolvimento nacio-nal, marcado pela inclusão social, pelo aprofundamento da democracia, por uma dinâmica econômica assentada na expansão do mercado interno com aumento da pro-dutividade sistêmica, pela sustentabilidade ambiental e pela afirmação soberana do país. Tarefa demandante de refinado planejamento estratégico, como atestam todos os casos exitosos de desenvolvimento nacional.

A experiência histórica nacional, europeia e japonesa do pós 2ª Guerra e a do sudeste asiático, a partir dos anos 1960, mostra que os arranjos institucionais para o plane-jamento governamental são construções que se fazem e se refazem ao ritmo do desenvolvimento nacional. São os fracassos e os sucessos colhidos no processo que indicam a necessidade de criar, destruir, reformar as peças do ar-ranjo, sempre com o propósito de se chegar aos objetivos pretendidos pela sociedade.

No entanto, desde 2003 vigora, com alguns acrés-cimos inorgânicos, o aparato nominal de planejamento herdado do governo FHC. Nominal porque foi reduzido a cumprir os rituais definidos pela Constituição Fede-ral (PPA, LDO, OGU), gerir a execução orçamentária e acompanhar a implementação do PPA. Parte maior do Ministério do Planejamento (MP) cuida de aspectos re-lacionados à gestão pública (gestão de projetos de inves-timento, do Patrimônio da União, do pessoal civil, dos procedimentos administrativos, da tecnologia da infor-mação). Isso faz com que a alta direção do ministério estivesse distraída, tendo seu foco de atenção desviado de sua atribuição precípua.

Page 41: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate 41

No âmbito distrital, como visto, a trajetória não foi muito diferente. Até alguns anos atrás o planejamento era um apêndice da Secretaria da Fazenda. E se hoje está em linha com as outras, não há um arranjo insti-tucional que permita uma articulação virtuosa entre os diversos instrumentos de condução das transformações que recoloquem o Distrito Federal e o seu Entorno em posição exemplar. Ademais, além de atribuir uma mis-são à Codeplan, é necessário estabelecer os mecanismos de interação sistêmica que possibilitem a utilização dos produtos da empresa como recursos estratégicos para o processo de governar.

A Codeplan e o seu lugar na construção de um outro DF

Primeiramente destaco o respeito e valorização pelo histórico da Codeplan. Oferecer avaliação ou comen-tários sobre o “projeto” da Companhia decorre de uma sincera torcida pelo alcance de um futuro grandioso e de lugar de alto relevo para a empresa no desenvolvimento distrital e regional.

O grande carinho pela Codeplan é consequência do muito que aprendi convivendo com vários codeplanea-nos, estudando o que produziam sobre o DF e o Entorno. A situação do Ipea, em larga medida semelhante à da Co-deplan, também inspira as proposições. Elas se dirigem à crise do sistema nacional de planejamento e aos que não sabem o que fazer com nossas duas instituições.

Considero que a Codeplan pode produzir o que ne-nhum órgão do Governo de Brasília seria capaz, tornan-do-se, imprescindível por:

• Realizar estudos que enfatizem criativa e complexa-mente a especificidade do DF. Enfrentar a ameaça do autonomismo fragmentador (eleições para Adminis-trações Regionais, como primeiro passo);

• Pensar interfederativamente e fazer sugestões de po-lítica de natureza multissetorial para construção de um DF sem as “ameaças” do Entorno, concretizando virtuosamente a RIDE;

• Fazer estudos e pesquisas que revelem o passado, permitam olhar o presente e prospectar o futuro. Ou seja, gerar conhecimentos cruciais para um projeto de desenvolvimento de longo prazo;

• Mostrar-se capacitada para dar explicações para pro-blemas complexos que frequentam a agenda gover-namental e para os quais não há competência setorial que lhes seja suficiente.

• Desenhar linhas de ação que superem o reducionis-mo setorialista e a especialização empobrecedora.

Essas não são tarefas triviais. Por isso, tão necessá-rias, salientando-se que não há quem esteja pleiteando realizá-las. A Codeplan possui posição privilegiada para postular proeminência em sua consecução. Está ancorada na tradição, experiência, informação, quadro técnico (que precisa ser estrategicamente ampliado) e mandato. Mas, por se tratar de algo novo, demanda preparação, capacita-ção, organização apropriada, entre outros requerimentos.

Há que se planejar para tanto, respondendo (ou obten-do respostas de quem pode dá-las) a algumas questões decisivas:

1. Em qual arranjo institucional irá se inserir?

2. Quais competências a desenvolver?

3. Como organizar o processo de trabalho?

4. A quais atores endereçar o produto do trabalho?

5. Como comunicar o resultado do trabalho?

6. Com quem dialogar permanentemente?

7. Quem pode se opor a tais propósitos?

As respostas não existem. Não há quem possa oferecê--las de imediato, pela simples razão de não estarem nelas pensando. Cada resposta será objeto de um processo de construção específico, envolvendo o corpo de emprega-dos e a direção da casa, as autoridades e os atores sociais pertinentes a cada uma delas. A construção será baseada em um grande esforço interno, do qual se dá partida para o esclarecimento e o diálogo intragovernamental e, pos-teriormente, com atores externos.

Em tal empreendimento o processo joga papel delica-díssimo. Deve ser cuidado com muita dedicação e sensi-bilidade. Mas a determinação em levá-lo a cabo é um dos principais vetores para a obtenção de resultados favoráveis.

Vale lembrar um provérbio persa: “Quem quer fazer alguma coisa encontra um meio, quem não quer encontra uma desculpa”. ■

(*) Ronaldo Coutinho Garcia Técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea

Foto: Toninho Leite

Page 42: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

Brasília em Debate42

Banco de Brasília apoia o 1º Fórum HSM sobre Gestão Pública

(*) Assessoria de Imprensa

BRB

No dia 3 de setembro último, foi realizado em Brasília, o 1º Fórum HSM sobre Gestão Pública. O evento teve apoio do Banco de Brasília (BRB) e contou com a participação de renomados palestrantes, como Rudolph Giuliani, ex-prefeito de Nova York; Vicente Falconi, consultor de gestão no Brasil; Rivadávia Drummond, presidente da HSM Educação Executiva e professor especializado em gestão da inovação; e Clóvis de Barros, acadêmico e pesquisador da Unesco. Estiveram presentes ao encontro os diretores e alguns superintendentes de áreas estratégicas do Banco.

O presidente do BRB, Vasco Gonçalves, participou da abertura do encontro, fazendo a apresentação de Rudolph Giuliani, primeiro palestrante do dia.

Rudolph Giuliani abriu sua palestra falando sobre dificuldades e superação, e sobre como uma adversidade pode se transformar em uma oportunidade, dependendo de como se olha a situação. O ex-prefeito discorreu sobre algumas ações de sucesso que coordenou, entre elas: o programa de segurança “Tolerância Zero”, que reduziu os assassinatos em NY em 70%; a diminuição dos impostos em US$ 2,3 bilhões; e o desenvolvimento de um sistema de remuneração dos professores baseado em desempenho.

Segundo Marco Aurélio Monteiro, diretor de Risco e Controladoria: “Esse fórum serviu para ressaltar que as ações planejadas e coordenadas de forma criteriosa, como por exemplo, na gestão pública, podem ter o resultado voltado para o bem-estar da população. Isso nos faz querer buscar o sucesso desse resultado e trazer para o BRB as ações adaptadas ao cenário do Banco”.

O superintendente de Governo, Márcio Hipólito, destacou que o encontro foi importante porque trouxe à tona um assunto cada vez determinante no futuro das organizações: a inovação. “Percebemos a importância não apenas da inovação relacionada ao desenvolvimento

tecnológico, mas principalmente à capacidade de se estar constantemente atento às mudanças do mercado, com foco em um jargão bastante em voga: surpreender o cliente. É um grande desafio aplicar esse conhecimento ao BRB, mas certamente alcançável, desde que feito com planejamento, determinação, organização, foco nos propósitos e muito engajamento. A partir de tudo isso os resultados são possíveis”.

Para o presidente do BRB, Vasco Gonçalves, o objetivo foi adquirir o maior número de informações e de conhecimento em gestão pública: “Esse evento foi extremamente produtivo, uma vez que proporcionou o debate de diversas questões ligadas à gestão pública, por meio da exposição das melhores práticas de mercado. Além disso, tivemos a oportunidade de conhecer projetos e ações implantadas, inclusive em outros países; adaptá-las para a realidade do BRB; e com isso, contribuir ainda mais com o crescimento e o aperfeiçoamento da instituição”.

A HSM Educação Executiva é uma escola de negócios que existe há quase 30 anos. Reconhecida nacionalmente, a empresa busca promover a atualização e o desenvolvimento de executivos e de gestores em todo o Brasil. ■

Foto: Arquivo BRB

“Esse evento foi extremamente produtivo, uma vez que proporcionou o debate de diversas questões ligadas à gestão pública, por meio da exposição das melhores práticas de mercado” afirma o presidente do BRB.

Vasco Gonçalves presidente do BRB

Page 43: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

A revista Brasília em Debate conta com a colaboração de economistas, professores, pesquisadores, cientistas políticos e sociais, entre outros especialistas. Os textos (artigos, opiniões, resenhas literárias) trazem prioritariamente abordagens da conjuntura econômica e social do DF, aspectos populacionais, sustentabilidade ambiental, planejamento urbano e territorial.

ISSN - 2316-820X

As normas para publicação e remessa de textos são:• Todos os artigos devem ser originais e escritos em português;• Apenas serão aceitos artigos previamente solicitados pelo Conselho Editorial e/ou Chefia de Edição;• Fonte no editor de texto: Times New Roman, tamanho 11, espaço simples;• Número de caracteres (incluindo tabelas e ilustrações):

- Artigos: 15 mil e 20 mil - Pontos de vista e Opiniões: 3 a 5 mil - Resenhas: 3 mil;

• É permitida a coautoria para Artigos;• As informações do autor devem estar expressas em nota de rodapé - nome e sobrenome, formação acadêmica,

instituição a que pertence (e-mail, telefone e endereço para contatos);• Tabelas, quadros, ilustrações, fotos, desenhos, esquemas, figuras, fluxogramas, mapas e gráficos, devem estar

numerados com algarismos arábicos na ordem em que foram citados, com legendas e fontes;• As ilustrações devem ser originais e tabelas, quadros, gráficos apresentados em software que permita edição;• Fotos devem ser enviadas em alta resolução (300 dpi), cor real, inclusive a foto do autor;• As notas explicativas de rodapé devem ser curtas, numeradas em ordem sequencial e citadas na mesma página;• As citações de até três linhas devem conter aspas na sequência do texto. Se ultrapassarem esse limite, devem

constar em parágrafo próprio, recuo da margem de 4 cm, fonte 10, espaço simples, sem aspas e identificadas pelo sistema autor-data (NBR 10520 da ABNT); e

• As referências bibliográficas devem seguir também as normas da ABNT (NBR 6023);• Os autores terão direito a 5 (cinco) exemplares da Revista, quando a tiragem for impressa.• O arquivo eletrônico com a formatação final deve ser encaminhado à ASCOM.• Casos omissos serão analisados e decididos pelo Conselho Editorial

Brasília em Debate

www.codeplan.df.gov.brAcesse. Informe-se

Page 44: COMPANHIA DE PLANEJAMENTO DO DISTRITO FEDERALlia-em... · O artigo sobre as quatro escalas do plano-piloto de ... de Gestão Pública destaca a presença do ex ... a necessidade de

www.brb.com.br BRB Telebanco 61 3322 1515SAC BRB 0800 648 6161

Ouvidoria 0800 642 1105SAC/Ouvidoria PcD 0800 648 6162

Sabe qual é o segredo da evolução? É nunca perder a vontade de continuar crescendo. Pois cada ano que passa não signifi ca envelhecimento, mas a construção de mais experiência e conhecimento. E nisto, somos experts: em conhecer Brasília e os brasilienses como ninguém. Por isso, há 49 anos, a cada ano, investimos mais em tecnologia, conectividade, serviços e atendimento, para que, cada vez mais, sejamos ainda mais parceiros da cidade e próximos de você. BRB. Há 49 anos o Banco de Brasília.