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Oo | OUSAR SABER 11.° ANO | 1 CONCURSO de TEXTO FILOSÓFICO OUSAR SABER COMO PODE A PERGUNTA SER A SOLUÇÃO? © www.pascal-lecocq.com Oo

CONCURSO de TEXTOOUSAR FILOSÓFICOSABER · a reflexão sobre a pergunta a concurso. 2. Seleção de textos filosóficos sobre o conhecimento e a construção da ciência, acompanhados

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CONCURSO de TEXTO

FILOSÓFICOOUSARSABER

COMO PODE A PERGUNTA SER A SOLUÇÃO?

© www.pascal-lecocq.com

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“Sapere aude”! Tem a coragem de te servires do teu próprio entendimento!

Immanuel Kant

Imagem da capa: Pascal Lecocq, The Painter of Blue ®, 54x64, Em busca do caminho, 1990; óleo sobre tela

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Vem de tempos remotos o lema Ousar Saber retomado por Immanuel Kant no célebre texto O que é o Iluminismo em que apresenta o desafio de um uso autónomo do entendimento. O acomodamento dado num entendimento passivo e pouco empreendedor dissuade a pergunta e demora a mudança. A coragem de pensar é o repto que transcende os tempos do Iluminismo e continua hoje a ecoar nas aulas de Filosofia. É este o dinamismo que se pretende atualizar neste concurso de texto filosófico PORTO EDITORA, destinado aos alunos do 11.° ano, através da questão:

Como pode a pergunta ser a solução?

O concurso de Texto Filosófico é uma iniciativa da Porto Editora, apresentada pela equipa de professores que prepara o manual do 11.° ano: OUSAR SABER.

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Com o objetivo de preparar os alunos para a participação no Concurso de Texto Filosófico OUSAR SABER 2014, este documento apresenta os seguintes recursos:

1. Plano de discussão com questões que procuram estimular a reflexão sobre a pergunta a concurso.

2. Seleção de textos filosóficos sobre o conhecimento e a construção da ciência, acompanhados de questões de reflexão.

3. Exercícios a realizar individualmente e em grupo pelos alunos.

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ÍNDICE

Plano de discussão .................................................................................................................... 6

Texto 1 – Immanuel Kant, O que é o Iluminismo ........................................................... 7

Texto 2 – Immanuel Kant, Crítica da Razão Pura .......................................................... 7

Texto 3 – René Descartes, Meditações Sobre a Filosofia Primeira ....................... 8

Texto 4 – René Descartes, Regras para a Direção do Espírito ................................ 8

Texto 5 – David Hume, Investigação sobre o Entendimento Humano ................ 9

Texto 6 – Karl Popper, Em busca de um Mundo Melhor ............................................ 10

Texto 7 – Karl Popper, Um Mundo de Propensões ...................................................... 10

Texto 8 – Karl Popper, O Futuro está Aberto .................................................................. 11

Texto 9 – Thomas Kuhn, A Estrutura das Revoluções Científicas ......................... 11

Texto 10 – Thomas Kuhn, A Estrutura das Revoluções Científicas ....................... 12

Atividades ...................................................................................................................................... 13

Regulamento ................................................................................................................................ 15

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PLANO DE DISCUSSÃO

Em que situações afirmo ter um problema para resolver?

Em que situações afirmo ter um problema para resolver e uma pergunta pode solucioná-lo?

Em que situações uma solução pode não ser eficaz?

Quando podemos dizer que um problema está solucionado?

Existem problemas só meus? O que os torna exclusivamente meus?

Há problemas mais importantes que outros? Como distingui-los?

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Texto 1

lluminismo é a saída do Homem da sua menoridade de que ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem. Tal menoridade é por culpa própria, se a sua causa não residir na carência de entendimento, mas na falta de decisão e de coragem em se servir de si mesmo, sem a guia de outrem. Sapere aude! [Ousar saber] Tem a coragem de te servires do teu próprio entendimento! Eis a palavra de ordem do Iluminismo.A preguiça e a cobardia são as causas de os homens em tão grande parte, após a Natureza os ter há muito libertado do controlo alheio, […] continuarem, todavia, de bom grado menores durante toda a vida; e também de a outros se tornar tão fácil assumir-se como seus tutores. É tão cómodo ser menor. Se eu tiver um livro que tem entendimento por mim, um diretor espiri-tual que em vez de mim tem consciência moral, um médico que por mim decide da dieta, etc., então não preciso de eu próprio me esforçar. Não me é forçoso pensar, quando posso simples-mente pagar; outros empreenderão por mim essa tarefa aborrecida. Porque a imensa maioria dos homens [...] considera a passagem à maioridade difícil e também muito perigosa é que os tutores de bom grado tomaram a seu cargo a superintendência deles. Depois de terem, pri-meiro, embrutecido os seus animais domésticos e evitado cuidadosamente que estas criatu-ras pacíficas ousassem dar um passo para fora da carroça em que as encerraram, mostram--lhes em seguida o perigo que as ameaça se tentarem andar sozinhas. Ora, este perigo não é assim tão grande, pois acabariam por aprender muito bem a andar. Só que um tal exemplo intimida e, em geral, gera pavor perante todas as tentativas ulteriores.É, pois, difícil a cada homem desprender-se da menoridade que para ele se tomou quase uma natureza. Até lhe ganhou amor e é por agora realmente incapaz de se servir do seu próprio entendimento, porque nunca se lhe permitiu fazer semelhante tentativa. Preceitos e fórmulas, instrumentos mecânicos do uso racional ou, antes, do mau uso dos seus dons naturais são os grilhões de uma menoridade perpétua. Mesmo quem deles se soltasse só daria um salto inse-guro sobre o mais pequeno fosso, porque não está habituado ao movimento livre. São, pois, muito poucos apenas os que conseguiram mediante a transformação do seu espírito arrancar--se à menoridade e encetar então um andamento seguro.

KANT, I., O que é o Iluminismo, in A Paz perpétua e outros opúsculos, Edições 70, 1995, p. 11

1. Quais são os problemas que se pretendem vencer com o lema Ousar Saber? 2. Em que situações uma pergunta pode ser uma ousadia?

Texto 2

Quando Galileu fez rolar no plano inclinado as esferas, com uma aceleração que ele próprio esco-lhera, quando Torricelli fez suportar pelo ar um peso, que antecipadamente sabia idêntico ao peso conhecido de uma coluna de água, ou quando, mais recentemente, Stahl transformou metais em cal e esta, por sua vez, em metal, tirando-lhes e restituindo-lhes algo, foi uma ilumi-nação para todos os físicos. Compreenderam que a razão só entende aquilo que produz segundo os seus próprios planos; que ela tem de tomar a dianteira com princípios que determinam os seus juízos segundo leis constantes e deve forçar a Natureza a responder às suas interrogações em vez de se deixar guiar por esta; de outro modo, as observações feitas ao acaso, realizadas sem plano prévio, não se ordenam segundo a lei necessária, que a razão procura e de que neces-sita. [...] Assim, a própria Física tem de agradecer a revolução, tão proveitosa, do seu modo de pensar, unicamente à ideia de procurar na Natureza [e não imaginar], de acordo com o que a

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razão nela pôs, o que nela deverá aprender e que por si só não alcançaria saber; só assim a Física enveredou pelo trilho certo da ciência, após tantos séculos em que foi apenas simples tateio.

KANT, I., Crítica da Razão Pura, FCG., Lisboa, 1997, p. 18

1. Porque deve a razão forçar a Natureza?2. Como pode uma pergunta servir à razão para guiar a Natureza?

Texto 3

Notei, há alguns anos já, que, tendo recebido desde a mais tenra idade tantas coisas falsas por verdadeiras, e sendo tão duvidoso tudo o que depois sobre elas fundei, tinha de deitar abaixo tudo, inteiramente, por uma vez na minha vida, e começar, de novo, desde os primeiros funda-mentos, se quisesse estabelecer algo de seguro e duradoiro nas ciências. Mas esta pareceu--me uma obra ingente, pelo que esperei uma idade tão madura que não se lhe seguisse outra em que fosse mais apto para dominar as ciências. Por isso hesitei tanto tempo que, a partir de agora, cairia em culpa se consumisse em deliberações o tempo que me resta para agir. Então, hoje, eu que oportunamente libertei o espírito de todos os cuidados e me procurei um ócio seguro num retiro solitário, vou dedicar-me , por fim com seriedade e livremente, a destruir em geral as minhas opiniões.Para isso não será necessário mostrar que todas são falsas, o que possivelmente eu nunca poderia conseguir. Mas, porque a razão me persuade logo que não devo menos cuidadosa-mente coibir-me de dar o meu assentimento às coisas que não são plenamente certas e indu-bitáveis do que às abertamente falsas, para rejeitá-las todas basta que se me depare em uma delas qualquer razão de dúvida. Para isso, não tenho de percorrê-las cada uma em particular, trabalho que seria sem fim: porque uma vez minados os fundamentos, cai por si tudo o que está sobre eles edificado, atacarei imediatamente aqueles princípios em que se apoiava tudo o que anteriormente acreditei.Sem dúvida, tudo aquilo que até ao presente admiti como maximamente verdadeiro foi dos sen-tidos ou por meio dos sentidos que o recebi. Porém, descobri que eles por vezes nos enganam, e é de prudência nunca confiar totalmente naqueles que, mesmo uma só vez, nos enganaram.Mas ainda que os sentidos nos enganem algumas vezes sobre coisas pequenas e afastadas, há todavia muitas outras de que não podemos absolutamente duvidar, embora as recebamos por eles: como, por exemplo, que estou aqui sentado junto à lareira, vestido com um roupão de inverno, que toco este papel com as mãos, e outros factos semelhantes.

DESCARTES, R., Meditações Sobre a Filosofia Primeira, Almedina, Coimbra, 1992, p.105-108

1. Qual o problema que Descartes pretende resolver com a destruição das suas opiniões?2. Qual o papel da pergunta na análise dos fundamentos das coisas?

Texto 4

Os mortais são possuídos por uma curiosidade tão cega que muitas vezes introduzem o espí-rito em vias desconhecidas, sem nenhuma esperança racional, unicamente para correr o risco de aí encontrarem o que procuram: com eles se passa o mesmo que com um homem ardendo de um desejo tão estúpido de encontrar um tesouro que erraria sem cessar pelas praças públi-cas para ver se encontraria por acaso algum perdido por um viajante. É assim que estudam

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quase todos os químicos, a maior parte dos geómetras e um bom número de filósofos. Claro que não nego que não tenham por vezes sorte bastante nos seus caminhos errantes para acharem alguma verdade; todavia, não lhes concedo por tal o serem mais hábeis, mas apenas o serem mais felizes. Ora, vale muito mais nunca pensar em procurar a verdade de qualquer coisa do que fazê-lo sem método: é, com efeito, certíssimo que os estudos feitos desordena-damente e as meditações confusas obscurecem a luz natural e cegam os espíritos. Quem quer que se acostume a caminhar assim nas trevas enfraquece de tal forma a acuidade do olhar que depois não pode suportar a luz do dia: o que é comprovado até pela experiência, pois vemos muitíssimas vezes os que nunca se dedicaram às letras julgarem as coisas que se lhes apre-sentam com muito mais solidez e clareza do que os que frequentaram sempre as escolas. Quanto ao método, entendo por tal regras certas e fáceis cuja observação exata fará que qual-quer pessoa nunca tome nada de falso por verdadeiro, e que, sem despender inutilmente o mínimo esforço de inteligência, chegue, por um aumento gradual e contínuo de ciência, ao ver-dadeiro conhecimento de tudo o que for capaz de conhecer.

DESCARTES, R., Regras para a Direção do Espírito, Estampa, Lisboa, 1987, p. 23-24.

1. Quais são os problemas que o método resolve?2. Qual o lugar da pergunta no método proposto por Descartes?

Texto 5

Suponhamos que uma pessoa, embora dotada das mais fortes faculdades da razão e reflexão, é trazida subitamente para este mundo; observaria, de facto, imediatamente uma contínua sucessão de objetos e um evento seguindo-se a outro, mas nada mais seria capaz de desco-brir. Não conseguiria, a princípio, mediante qualquer raciocínio, alcançar a ideia de causa e efeito, visto que os poderes particulares pelos quais todas as operações da Natureza são exe-cutadas, nunca aparecem aos sentidos; nem é justo concluir, unicamente porque um evento, num caso, precede outro, que o primeiro é, pois, a causa, e o segundo, o efeito. A sua conjunção pode ser arbitrária e casual. Pode não haver motivo para inferir a existência de um a partir do aparecimento do outro. E, numa palavra, tal pessoa, sem mais experiência, nunca poderia utili-zar a sua conjetura ou raciocínio acerca de qualquer questão de facto ou certificar-se de coisa alguma para além do que está imediatamente presente à sua memória e aos seus sentidos.Suponhamos, de novo, que ela adquiriu mais experiência e viveu durante tanto tempo no mundo que observou que objetos ou eventos familiares se combinam constantemente; qual é a consequência desta experiência? Imediatamente infere a existência de um objeto a partir do aparecimento do outro. Apesar de tudo, não adquiriu, mediante toda a sua experiência, ideia ou conhecimento algum do poder secreto pelo qual um objeto produz o outro, nem é induzida, por processo algum do raciocínio, a tirar essa inferência. Mas, apesar de tudo, vê-se determinada a tirá-la e, embora deva estar convencida de que o seu entendimento não participa na operação, continua, no entanto, no mesmo rumo de pensamento. Existe algum outro princípio que a determina a formar uma tal conclusão.Este princípio é o costume ou hábito, pois, onde quer que a repetição de qualquer ato ou opera-ção particular manifeste uma propensão para renovar o mesmo ato ou operação, sem ser impulsionado por raciocínio ou processo algum do entendimento, dizemos sempre que essa propensão é o efeito do costume.

HUME, D., Investigação sobre o Entendimento Humano, Lisboa, Edições 70, 1998, p. 46-47

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1. Como pode o hábito constituir um problema? 2. Como pode o hábito de perguntar não constituir um problema?

Texto 6

O problema é […] sempre o ponto de partida; e a observação só constituiu uma espécie de ponto de partida quando deteta um problema, ou, por outras palavras, quando nos surpreende, quando nos mostra que algo no nosso saber – nas nossas expectativas, nas nossas teorias – não está totalmente certo. As observações, portanto, só são geradoras de problemas quando contrariam as nossas expectativas conscientes ou inconscientes. E então o que constitui o ponto de partida do trabalho científico não é tanto a observação enquanto tal, mas a observa-ção no seu sentido específico, ou seja, justamente a observação-geradora-do-problema. […]A tensão existente entre saber e não saber conduz ao problema e à tentativa de solução. Porém, jamais é superada. Isto porque o nosso saber nunca é mais do que propostas de solu-ção provisórias e a título de ensaio e, consequentemente, encerra em si, em princípio, a possi-bilidade de se revelar erróneo, logo, não saber. E a única forma de explicação do nosso saber é também ela apenas provisória. Consiste na crítica, ou mais precisamente, no facto de as tenta-tivas de solução parecerem resistir “até agora” às nossas críticas mais severas.

POPPER, K., Em busca de um mundo melhor, Fragmentos, Lisboa, 1992, p. 73

1. É necessária uma expectativa para haver uma pergunta? Justifique. 2. Como pode ser menos provisório saber a pergunta do que saber a resposta?

Texto 7

Reconhecidamente, a ciência padece da falibilidade humana, tal como qualquer outro empreen-dimento humano. Mesmo se fizermos os possíveis por descobrir os nossos erros, não podere-mos ter a certeza que os nossos resultados estejam certos e eles poderão mesmo não ser verdadeiros. Mas podemos aprender com os nossos erros: grandes cientistas mostraram-nos como transformar a nossa falibilidade em conhecimento conjetural objetivamente testável. Ainda agora eles continuam a fazer isso.Tudo quanto eu disse até agora foi uma tentativa para me apresentar como um amante da ciência que tem a maior admiração pelos resultados maravilhosos e frequentemente verda-deiros da ciência, sem no entanto acreditar que eles sejam certos. Os resultados da ciência continuam a ser hipóteses que podem ter sido bem testadas, mas não provadas: quer dizer, não foi demonstrado que sejam verdadeiras. Claro que podem ser verdadeiras. Mas mesmo que não o sejam, são hipóteses ótimas, abrindo caminho a outras ainda melhores.As nossas teorias, as nossas hipóteses, são as nossas tentativas arrojadas. Reconhecida-mente, a maior parte delas acabam por se revelar erróneas; sob o impacto dos nossos testes, pode revelar-se a sua falsidade. As teorias que nós não conseguimos refutar com os testes mais duros, presumimos serem verdadeiras. E, na verdade, elas podem ser verdadeiras; mas novos testes podem vir a provar que são falsas.Este método de teorização arrojada e audaciosa, seguida de exposição a testes severos, é o método da própria vida, à medida que vai evoluindo para formas superiores; é o método de tenta-tivas de exposição e eliminação dos erros através de testes. Tal como a vida conquista novos mundos, novas terras, o oceano, o ar e o espaço, também a ciência conquista novos mundos,

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novas terras, o oceano, o ar e o espaço. O que nós queremos conhecer e perceber é o mundo, o cosmos. Toda a ciência é cosmologia. É uma tentativa para sabermos mais sobre o mundo, sobre átomos, sobre moléculas. Sobre os organismos vivos e sobre os enigmas da origem da vida na Terra. Sobre a origem do pensamento, da mente humana e sobre como funciona a nossa mente.

POPPER, K., Um Mundo de Propensões, Fragmentos, s.d, p. 17-18

1. Como se pode progredir na ciência?2. Qual o papel da pergunta diante da falibilidade humana?

Texto 8

Esta é a pedagogia habitual: respostas sem perguntas e perguntas sem respostas. [...] É nisso que consiste essencialmente a nossa pedagogia. Acontece, porém, que todos os organismos, e não apenas o Homem, mas todos os organismos, questionam incessantemente o mundo e procuram incessantemente resolver problemas.Cito-me a mim próprio: “Da amiba a Einstein é apenas um passo”. Se desejarem persuadir-se disto, recomendo-lhes o excelente livro de J. S. Jennings “O Comportamento dos Organismos Inferiores“. Os organismos mais ínfimos colocam permanentemente questões ao mundo e tentam, permanentemente, resolver problemas. Onde não há perguntas, as respostas não podem ser entendidas. [...]Todos os organismos colocam e resolvem problemas continuamente; e por isso a ciência na realidade não é mais do que a continuação da atividade dos organismos inferiores. Existe uma grande diferença entre a amiba e Einstein, e essa diferença está em que Einstein defronta criti-camente as soluções dos seus próprios problemas. E pode fazê-lo unicamente porque existe uma linguagem, uma linguagem humana, em que é possível formular as soluções dos nossos problemas. E desse modo transferimo-las para fora do nosso corpo. Como o fazemos com outros instrumentos que criámos. Em vez de deixarmos crescer uma glândula na extremidade dos dedos – uma glândula de tinta – para escrevermos, criámos uma caneta. É isto que distin-gue o Homem dos animais.

POPPER, K., O Futuro está Aberto, Fragmentos, s.d, p. 49-50

1. De acordo com a perspetiva de Popper, qual a relação da pergunta com a sobrevivência dos organismos?

2. Quais são os efeitos de defrontar criticamente as soluções dos problemas?

Texto 9

Haveremos de salientar [...] que os primeiros passos no desenvolvimento da maioria das ciên-cias se caracterizaram por uma contínua competição entre visões distintas da Natureza, cada uma delas parcialmente ditada pela observação e método científicos, e todas grosso modo compatíveis com estes. O que diferenciava estas diferentes escolas não era esta ou aquela falha de método – todas elas eram “científicas” –, mas o que iremos designar como a inco-mensurabilidade entre formas de ver o mundo e de nele praticar a ciência. A observação e a experiência podem e têm de restringir drasticamente o âmbito das crenças admissíveis como crenças científicas, pois de outra maneira não haveria ciência. Mas não podem só por si deter-minar um dado conjunto desse tipo de crenças. Um elemento aparentemente arbitrário,

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composto de acidentes pessoais e históricos, é sempre um ingrediente formativo das crenças adotadas por uma dada comunidade científica numa dada época. No entanto, este elemento de arbitrariedade não indica que um grupo científico possa praticar o seu ofício na ausência de um determinado conjunto de crenças herdadas. Nem ele diminui as consequências da conste-lação de ideias com que o grupo está, num determinado momento, de facto comprometido. A investigação efetiva quase só começa quando uma comunidade científica se convence de que adquiriu respostas firmes para questões como as seguintes: quais são as entidades funda-mentais das quais o Universo é composto? Como interagem elas entre si e com os nossos sentidos? Que perguntas podem ser legitimamente levantadas a respeito dessas entidades e que técnicas podem ser empregues na busca de soluções? Pelo menos nas ciências maduras, respostas [ou substitutos perfeitos de respostas] a perguntas como estas estão firmemente entranhadas na iniciação educativa que prepara e habilita o estudante para a prática profissio-nal. Porque a educação é rigorosa e rígida, estas respostas acabam por exercer uma profunda influência na mentalidade científica.

KUHN, T., A Estrutura das Revoluções Científicas, Guerra e Paz, Lisboa, 2009, p. 23-24

1. É possível que a pergunta não seja influenciada pela crença? Como?

Texto 10

Assuma-se que as crises são uma pré-condição necessária para a emergência de novas teo-rias e perguntemos de seguida como Ihes reagem os cientistas. Parte da resposta, tão óbvia quanto importante, pode ser descoberta se procurarmos perceber o que os cientistas nunca fazem quando confrontados com anomalias, mesmo quando sérias e duradouras. Embora possam começar por perder a sua fé e começar a considerar alternativas, eles não renunciam ao paradigma que os conduziu à crise. Quer dizer, eles não olham para as anomalias como contraexemplos, apesar de ser isso mesmo que, no vocabulário da filosofia das ciências, estas são. Em parte, esta generalização é inferida simplesmente de factos históricos e baseada em exemplos como os já apresentados e como os que serão apresentados, em maior numero, mais adiante. Estes permitem entrever o que mostrará um exame mais completo sobre a rejeição de paradigmas: após atingir o estatuto de paradigma, uma teoria científica só é declarada inválida se houver uma candidata alternativa para ocupar o seu lugar. Nenhum estudo histórico do desenvol-vimento científico revela qualquer processo que se assemelhe ao estereótipo metodológico da falsificação por comparação direta com a Natureza. Esta observação não significa que os cientis-tas não rejeitem teorias científicas ou que a experiência e a experiência científica não sejam essenciais nesse processo. Porém [e este aspeto será, em última análise, um aspeto central], significa que o juízo que leva os cientistas a rejeitar uma teoria previamente aceite se baseia sem-pre em algo mais do que uma comparação entre essa teoria e o mundo. A decisão de rejeitarem um paradigma é também a decisão de aceitar um outro e o juízo que leva a essa decisão envolve a comparação de ambos os paradigmas com a natureza e dos paradigmas entre si.

KUHN, T., A Estrutura das Revoluções Científicas, Guerra e Paz, Lisboa, 2009, p. 115-116

1. É inevitável que a decisão de rejeitar um paradigma seja a decisão de aceitar um outro? Justifica a tua resposta.

2. A pergunta pode originar rejeição de paradigma? Justifica a tua resposta.

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ATIVIDADE DE GRUPO 1

Cada grupo deverá encontrar 2 exemplos para cada um dos tipos de problemas que se seguem.

a) Problemas conhecidos com solução conhecida.b) Problemas conhecidos com solução desconhecida.c) Problemas desconhecidos com soluções conhecidas.d) Problemas desconhecidos com soluções desconhecidas.

ATIVIDADE DE GRUPO 2

A atividade de exploração de texto que sugerimos em seguida pode ser aplicada de duas formas:

1. visando apenas um texto, cada grupo faz a respetiva análise segundo uma única perspetiva (sugerida no quadro A)

2. visando vários textos, cada grupo analisa o respetivo texto distribuindo as diferentes perspetivas (sugeridas no quadro A) pelos vários elementos do grupo.

Em qualquer dos casos:– O professor seleciona previamente uma frase dos textos (seguindo ou não as sugestões da

tabela 1). Pode ainda pedir aos alunos que sugiram as frases que devem ser analisadas.– O professor seleciona previamente uma frase da tabela 1.– O professor constitui grupos e atribui uma cor e a respetiva tarefa do Quadro A a cada grupo.– Cada grupo cumpre as tarefas do Quadro B.

Tabela 1

TEXTO 1 [...] A menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem.

TEXTO 2 [...] a razão só entende aquilo que produz segundo os seus próprios planos.

TEXTO 3 [...] uma vez minados os fundamentos, cai por si tudo o que está sobre eles edificado.

TEXTO 4[…] vale muito mais nunca pensar em procurar a verdade de qualquer coisa do que fazê-lo sem método.

TEXTO 5[...] nem é justo concluir, unicamente porque um evento, num caso, precede outro, que o primeiro é, pois, a causa, e o segundo, o efeito.

TEXTO 6[...] As observações, portanto, só são geradoras de problemas quando contrariam as nossas expectativas conscientes ou inconscientes.

TEXTO 7[...] Mesmo se fizermos os possíveis por descobrir os nossos erros, não poderemos ter a certeza que os nossos resultados estejam certos e eles poderão mesmo não ser verdadeiros.

TEXTO 8 [...] Onde não há perguntas, as respostas não podem ser entendidas.

TEXTO 9[...] A observação e a experiência podem e devem restringir drasticamente a extensão das crenças admissíveis, porque de outro modo não haveria ciência.

TEXTO 10[...] A decisão de rejeitar um paradigma é também a decisão de aceitar um outro, e o juízo que leva a essa decisão envolve a comparação de ambos os paradigmas com a natureza e dos paradigmas entre si.

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QUADRO A *

GRUPO TAREFA

Que informações temos e que informações precisamos de obter acerca desta afirmação?

Que emoções e sentimentos nos desperta esta afirmação? Que pensamos desta afirmação

A afirmação é verdadeira? Justifica.

Quais as vantagens da concordância com esta afirmação?

Há alternativas em relação ao que é proposto pelo autor?

Como pensar sobre esta questão? Para aprofundar o estudo desta afirmação que programa definiríamos?

QUADRO B

Tarefas comuns a todos os grupos:

a) Interpretação da questãob) Discussão – registo de ideias centraisc) Redação de um pequeno texto com a apresentação dos fundamentosd) Elaboração de uma frase-resumo e) Cada grupo encontra uma imagem ilustrativa para as suas conclusõesf) Apresentação à turma – Cada elemento apresenta os resultados concretos do seu trabalho

[texto síntese, frase resumo e imagem]

ATIVIDADE INDIVIDUAL

Redigir um comentário sobre o seguinte texto:

Galileu apenas formulou o problema da determinação da velocidade da luz, não o resolveu. A formulação de um problema é muitas vezes mais importante que a sua solução, a qual cons-titui apenas matéria de matemática ou de habilidade experimental. Propor novas questões, admitir novas possibilidades, encarar velhos problemas sob novos ângulos, isso requer imagi-nação criadora e assinala reais avanços na ciência. O princípio da inércia e a lei da conservação da energia subiram unicamente em consequência de pensamentos novos e originais acerca de experiências e fenómenos já bem conhecidos.

EINSTEIN, A., INFELD, L. A Evolução da Física, Livros do Brasil, Lisboa, s/d, p. 88

* Adaptação de Os seis chapéus do raciocínio de Edward de Bono. BONO, E., (1995). Ensine os seus filhos a pensar. Círculo de Leitores.

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REGULAMENTOArtigo 1.° – Descrição

O concurso de texto filosófico Ousar Saber 2014 é uma iniciativa da Porto Editora e dos autores do manual de Filosofia de 11.° ano “Ousar Saber” a publicar em abril de 2014. O concurso destina-se aos alunos do 11.° ano de escolaridade.

Artigo 2.° – ObjetivoO concurso de texto filosófico Ousar Saber 2014 tem como objetivo eleger o melhor texto argumenta-tivo, submetido anonimamente a concurso, sobre o seguinte problema: “Como pode a pergunta ser a solução?“.

Artigo 3.° – Condições de admissão

Serão considerados os textos que, cumulativamente, obedeçam às seguintes condições:

a) sejam originais não publicados;b) se apresentem redigidos em língua portuguesa;c) não excedam os 6000 caracteres;d) não incluam nenhuma referência reveladora da identidade dos autores.

Artigo 4.° – Critérios de avaliação dos textos a concurso

Os textos a concurso serão avaliados pelo júri segundo os seguintes critérios:

a) capacidade crítica e reflexiva [50%]b) criatividade [25%]c) estrutura do discurso argumentativo [15%]d) correção da expressão escrita [10%]

Artigo 5.° – Apresentação das candidaturas

Os textos a concurso deverão ser enviados por email para [email protected] da seguinte forma:

a) O assunto da mensagem deve ser “Ousar Saber 2014“;b) O texto para apreciação do júri deverá ser enviado em ficheiro anexo em formato word ou pdf.c) o nome de cada autor, do respetivo professor, da escola e os contactos dos autores deverão ser indi-

cados apenas no corpo da mensagem e, em caso algum, deverão constar no ficheiro com o texto submetido a concurso.

Artigo 6.° – Júri

O júri do concurso de texto filosófico Ousar Saber 2014 será constituído por professores de Filoso-fia do ensino secundário e universitário que serão designados oportunamente na página especial www.portoeditora.pt/ousarsaber .

Artigo 7.° – Prémio

a) Os 10 melhores textos serão premiados com a respetiva publicação na página especial da Porto Editora, em edição conjunta e em versão e-book.

b) O texto vencedor será premiado com um cheque-livro no valor de 50 euros e com a publicação em versão e-book referida no ponto anterior.

c) A escola do texto vencedor receberá ainda um cheque-livro no valor de 150 euros para apetrechamento da biblioteca.

d) No caso de o texto vencedor ter sido elaborado em coautoria, o prémio será dividido em partes iguais pelos seus autores.

Artigo 8.° – Prazos

a) As candidaturas poderão ser apresentadas até ao dia 11 de abril de 2014.b) O júri deverá tomar uma decisão até ao dia 16 de maio de 2014.c) A entrega do prémio deverá ter lugar até ao final do corrente ano letivo, em data e lugar a designar.

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COMO PODE A PERGUNTA SER A SOLUÇÃO?“A formulação de um problema é

muitas vezes mais importante que a

sua solução, a qual constitui apenas

matéria de matemática ou de habilidade

experimental. Propor novas questões,

admitir novas possibilidades, encarar

velhos problemas sob novos ângulos,

isso requer imaginação criadora e

assinala reais avanços na ciência.”

Albert Einstein, A Evolução da Física

Saiba como participar com a sua turma em www.portoeditora.pt/ousarsaber