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51 Cadernos de Geografia nº 28/29 - 2009/10 Coimbra, FLUC - pp. 51-60 Condicionantes físicas e humanas da qualidade das águas fluviais na bacia do rio Tejo. Adélia Nunes Departamento de Geografia, Faculdade de Letras, Universidade de Coimbra, adelia.nunes@fl.uc.pt Resumo: Neste trabalho analisam-se alguns parâmetros físicos, químicos e biológicos das águas em vários cursos, afluentes e sub-afluentes, do rio Tejo e relacionam-se as suas características com um conjunto de factores, físicos e antrópicos, tais como a litologia, precipitação, temperatura, escoamento e a ocupação do solo. Para o efeito, seleccionaram-se 20 pontos de monitorização, cujas bacias de drenagem, a montante, apresentavam diferentes áreas e contrastes relevantes do ponto físico e antrópico. Os resultados obtidos mostram, por um lado, a existência de diferenças estatisticamente significativas, nas propriedades observadas em cada uma das bacias e, por outro, que a concentração de nitratos, fósforo, coliformes totais e a condutividade estão dependentes do tipo de ocupação conferida ao solo, sendo que a presença de floresta se revela positiva no incremento da qualidade da água enquanto a concentração de actividades urbanas-industriais contribui, definitivamente, para a sua deterioração. Palavras-chave: Qualidade da água. Bacia hidrográfica. Factores físico-humanos. Rio Tejo, Portugal. Resumé: Conditionnantes physiques et humaines de la qualité des eaux fluviales dans le bassin du Tage. Nos analysons dans ce travail quelques paramètres physiques et chimiques des eaux dans divers cours d’eau, affluents et sous-affluents, du Tage et nous établissons un lien entre leurs caractéristiques et un ensemble de facteurs, physiques et anthropiques, tels que la lithologie, la précipitation, la température, l’écoulement et l’occupation du sol. Pour ce faire, nous avons sélectionné et monitorisé 20 points, dont les bassins de drainage, en amont, présentaient des zones différentes et des contrastes manifestes du point de vue physique et anthropique. Les résultats obtenus montrent qu’il existe, d’un côté, des différences, statistiquement significatives, en ce qui concerne les propriétés observées dans chacun des bassins et, de l’autre, que la concentration en nitrates, en phospho- re, en coliformes totaux ainsi que la conductivité dépendent du type d’occupation qui est faite du sol. Révélant ainsi que la présence de forêt s’avère positive dans l’amélioration de la qualité de l’eau alors que la concentration d’activités urbaines et industrielles contribue, indéniablement, à sa détérioration. Mót Clés: Qualité des eaux. Facteurs physiques et humaines. Bassin hydrographique. Rivière Tage, Portugal. Abstract: Physical and human influences on fluvial water quality in the Tagus river catchment. In this work we analyze some physical, chemical and biological parameters of water in different sub-catchments of Tagus river and their characteristics are correlated with a set of physical and human factors such as lithology, rainfall, temperature, runoff and land use. To achieve this issue, 20 monitoring sites were selected with relevant contrasts in physical and antrophic features. The obtained results show, on one hand, significant statistical differences among the analyzed properties and subcatchments and, on the order hand, that nitrate, phosphate, total coliforms concentration and conductivity are dependent on land use and cover; then forest cover dominance reveal a positive influence on the water quality whilst the urban and industrial activities favours, definitely, their deterioration. Keywords: Water quality. Catchment scale. Physical and human factors. Tagus river, Portugal.

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Cadernos de Geografia nº 28/29 - 2009/10Coimbra, FLUC - pp. 51-60

Condicionantes físicas e humanas da qualidade das águas fluviais na bacia do rio Tejo.

Adélia NunesDepartamento de Geografia, Faculdade de Letras,Universidade de Coimbra,[email protected]

Resumo:

Neste trabalho analisam-se alguns parâmetros físicos, químicos e biológicos das águas em vários cursos, afluentes e sub-afluentes, do rio Tejo e relacionam-se as suas características com um conjunto de factores, físicos e antrópicos, tais como a litologia, precipitação, temperatura, escoamento e a ocupação do solo. Para o efeito, seleccionaram-se 20 pontos de monitorização, cujas bacias de drenagem, a montante, apresentavam diferentes áreas e contrastes relevantes do ponto físico e antrópico.

Os resultados obtidos mostram, por um lado, a existência de diferenças estatisticamente significativas, nas propriedades observadas em cada uma das bacias e, por outro, que a concentração de nitratos, fósforo, coliformes totais e a condutividade estão dependentes do tipo de ocupação conferida ao solo, sendo que a presença de floresta se revela positiva no incremento da qualidade da água enquanto a concentração de actividades urbanas-industriais contribui, definitivamente, para a sua deterioração.

Palavras-chave: Qualidade da água. Bacia hidrográfica. Factores físico-humanos. Rio Tejo, Portugal.

Resumé:

Conditionnantes physiques et humaines de la qualité des eaux fluviales dans le bassin du Tage.

Nos analysons dans ce travail quelques paramètres physiques et chimiques des eaux dans divers cours d’eau, affluents et sous-affluents, du Tage et nous établissons un lien entre leurs caractéristiques et un ensemble de facteurs, physiques et anthropiques, tels que la lithologie, la précipitation, la température, l’écoulement et l’occupation du sol. Pour ce faire, nous avons sélectionné et monitorisé 20 points, dont les bassins de drainage, en amont, présentaient des zones différentes et des contrastes manifestes du point de vue physique et anthropique.

Les résultats obtenus montrent qu’il existe, d’un côté, des différences, statistiquement significatives, en ce qui concerne les propriétés observées dans chacun des bassins et, de l’autre, que la concentration en nitrates, en phospho-re, en coliformes totaux ainsi que la conductivité dépendent du type d’occupation qui est faite du sol. Révélant ainsi que la présence de forêt s’avère positive dans l’amélioration de la qualité de l’eau alors que la concentration d’activités urbaines et industrielles contribue, indéniablement, à sa détérioration.

Mót Clés: Qualité des eaux. Facteurs physiques et humaines. Bassin hydrographique. Rivière Tage, Portugal.

Abstract:

Physical and human influences on fluvial water quality in the Tagus river catchment.

In this work we analyze some physical, chemical and biological parameters of water in different sub-catchments of Tagus river and their characteristics are correlated with a set of physical and human factors such as lithology, rainfall, temperature, runoff and land use. To achieve this issue, 20 monitoring sites were selected with relevant contrasts in physical and antrophic features.

The obtained results show, on one hand, significant statistical differences among the analyzed properties and subcatchments and, on the order hand, that nitrate, phosphate, total coliforms concentration and conductivity are dependent on land use and cover; then forest cover dominance reveal a positive influence on the water quality whilst the urban and industrial activities favours, definitely, their deterioration.

Keywords: Water quality. Catchment scale. Physical and human factors. Tagus river, Portugal.

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1. Introdução

Os rios constituem importantes fontes de água potável, lugares lúdico-recreativos e ecossistemas com elevado potencial biológico. A qualidade das suas águas resulta da influência do clima, geologia, fisiografia, so-los e, sobretudo, das actividades antrópicas desenvolvi-das na respectiva bacia de drenagem (aheaRn et al., 2005; ChanG, 2005; li et al., 2008).

Historicamente, as actividades agropecuárias bem como os esgotos industriais e urbanos têm contribuído para a deterioração da qualidade das águas fluviais. Mais recentemente, o aumento da procura de alimentos, face ao contínuo crescimento da população, a par do incre-mento da densidade populacional nos centros urbanos, têm determinado alterações significativas nos padrões de vida da sociedade moderna, com reflexo no aumento constante da procura de água e no lançamento, em par-ticular, nas águas superficiais e subterrâneas, de quanti-dades cada vez maiores de resíduos provenientes das suas actividades.

À escala da bacia hidrográfica, as intervenções antrópicas têm determinado várias alterações, com es-pecial destaque para a construção de grandes empreen-

dimentos hidráulicos e ampliação das áreas impermea-bilizadas, cujas consequências são visíveis ao nível do ciclo hidrológico, alterações no regime, na quantidade de sedimentos transportados, na flora e fauna aquática, entre outras. Por outro lado, o cenário de mudança cli-mática, traduzido num aquecimento gradual e global do planeta irão, decerto, introduzir alterações na hidrolo-gia da maioria dos nossos rios, o que coloca novos desa-fios à análise e gestão da qualidade da água ao nível da bacia hidrográfica.

Em Portugal, importantes alterações socioeco-nómicas ocorreram na segunda metade do século XX, com destaque para o processo de litoralização, que se traduziu pela forte concentração de actividades eco-nómicas e da população, em particular, na faixa litoral ocidental, em centros urbanos, ao mesmo tempo que o espaço rural sofria um processo de esvaziamento de-mográfico e de abandono das áreas agrícolas margi-nais. Em contrapartida, os solos mais produtivos assi-nalaram uma intensificação nos processos de produção agrícola.

Neste trabalho analisam-se alguns parâmetros físico-químicos das águas em vários cursos, afluentes e sub-afluentes, do rio Tejo e interrelacionam-se as suas

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Figura 1 Bacia hidrográfica do Tejo, localização dos pontos de monitorização e da respectiva área de drenagem.

Figura 2 Principais unidades litológicas. Fonte: Atlas do Ambiente, Carta Litológica, 1978

Figura 1Bacia hidrográfica do Tejo, localização dos pontos de monitorização e da respectiva área de drenagem.

Adélia Nunes

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glomerados, e a Bacia Terciária do Tejo, com uma di-mensão espacial próxima da do Maciço Antigo, onde prevalecem rochas sedimentares, constituídas por alu-viões, areias, arenitos e conglomerados.

Em termos climáticos a bacia do Tejo manifesta grandes contrastes, quer em termos de distribuição da precipitação média anual (Figura 3) quer no que se re-fere à variação da temperatura média anual (Figura 4). As isoietas variam entre os 500 e os 2800mm enquanto as isotérmicas oscilam entre valores inferiores as 7.5ºC e os 17.5ºC. É na margem Norte do rio Tejo, em particu-lar nas serras da Cordilheira Central, que se atingem os mais altos valores de precipitação, a que correspondem os menores valores médios de temperatura, enquanto na respectiva margem Sul a pluviosidade média anual não ultrapassa os 1200mm e as temperaturas médias anuais situam-se acima dos 12.5ºC.

Como consequência desta desigual distribuição dos valores termopluviométricos, a que se associam ou-tros de natureza litológica, também o escoamento mé-dio anual manifesta grande heterogeneidade em termos espaciais, com valores a oscilar entre os 50mm e os 1800mm (Figura 5).

No que se refere à ocupação do solo, é dominada pelas florestas e incultos, sendo que as áreas agrícolas se localizam predominantemente nas planícies aluviais das principais linhas de água, com destaque para a planície

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Figura 1 Bacia hidrográfica do Tejo, localização dos pontos de monitorização e da respectiva área de drenagem.

Figura 2 Principais unidades litológicas. Fonte: Atlas do Ambiente, Carta Litológica, 1978

Figura 2Principais unidades litológicas.Fonte: Atlas do Ambiente, Carta Litológica, 1978

Condicionantes físicas e humanas da qualidade das águas fluviais na bacia do rio Tejo.

características com um conjunto de factores, físicos e antrópicos, tais como a litologia, precipitação, tempe-ratura, escoamento e ocupação do solo. Para o efeito, seleccionaram-se 20 pontos de monitorização, cujas bacias de drenagem, a montante, apresentam diferen-tes áreas, localização geográfica e contrastes relevan-tes do ponto de vista litológico, hidroclimático e em termos de ocupação do solo.

2. Materiais e Métodos

2.1. Área de estudo

Na figura 1 apresenta-se a bacia hidrográfica do rio Tejo, em território português, e assinalam-se os 20 pontos de monitorização seleccionados e a respectiva área de drenagem, a montante dos mesmos. Treze des-sas sub-bacias localizam-se na margem Norte do Rio Tejo enquanto as restantes se situam a Sul da mesma linha de água.

Pelo facto da bacia do Tejo abranger uma vasta área territorial, estende-se do ponto de vista morfo-es-trutural pelas três unidades presentes em Portugal Con-tinental (Figura 2): o Maciço Antigo Ibérico, de maior extensão e com o predomínio de rochas granitóides e do complexo xisto-grauváquico, uma reduzida faixa da Orla Mesocenozóica, com a presença de calcário e con-

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Figura 3 Variação espacial da precipitação média anual na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Precipitação Média Anual (1931-60), 1974.

Figura 4 Variação espacial da temperatura média mensal na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Temperatura Média Anual (1931-60), 1974.

Figura 3Variação espacial da precipitação média anual na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Precipitação Média Anual (1931-60), 1974.

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Figura 3 Variação espacial da precipitação média anual na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Precipitação Média Anual (1931-60), 1974.

Figura 4 Variação espacial da temperatura média mensal na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Temperatura Média Anual (1931-60), 1974.

Figura 4Variação espacial da temperatura média mensal na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Temperatura Média Anual (1931-60), 1974.

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Condicionantes físicas e humanas da qualidade das águas fluviais na bacia do rio Tejo.

Figura 5Variação espacial do escoamento médio mensal na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Escoamento - quantidade de água na rede hidrográfica, 1974.

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Figura 5 Variação espacial do escoamento médio mensal na bacia do rio Tejo. Fonte: Atlas do Ambiente, Escoamento - quantidade de água na rede hidrográfica, 1974.

Em termos climáticos a bacia do Tejo manifesta grandes contrastes, quer em termos de

distribuição da precipitação média anual (Figura 3) quer no que se refere à variação da

temperatura média anual. As isoietas variam entre os 500 e os 2800mm enquanto as

isotérmicas oscilam entre valores inferiores as 7.5ºC e os 17.5ºC. É na margem Norte do rio

Tejo, em particular nas serras da Cordilheira Central, que se atingem os mais altos valores de

precipitação, a que correspondem os menores valores médios de temperatura, enquanto na

respectiva margem Sul a pluviosidade média anual não ultrapassa os 1200mm e as

temperaturas médias anuais situam-se acima dos 12.5ºC.

Como consequência desta desigual distribuição dos valores termopluviométricos, a

que se associam outros de natureza litológica, também o escoamento médio anual manifesta

grande heterogeneidade em termos espaciais, com valores a oscilar entre os 50mm e os

1800mm (Figura 5).

Figura 6Ocupação do solo na bacia hidrográfica do rio Tejo.

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No que se refere à ocupação do solo, é dominada pelas florestas e incultos, sendo que

as áreas agrícolas se localizam predominantemente nas planícies aluviais das principais linhas

de água, com destaque para a planície aluvial do Tejo. Em torno do estuário do Tejo

concentram-se as maiores manchas urbano-industriais.

Figura 6 Ocupação do solo na bacia hidrográfica do rio Tejo.

2.2. Fonte e metodologia

Os dados relativos aos parâmetros físico-químicos das águas fluviais analisados foram

recolhidos do Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH) do Instituto da

Água (INAG). No total foram seleccionados 20 pontos de monitorização, com séries de dados

relativamente longas para as seguintes propriedades: Nitratos, Fósforo, Condutividade

Oxigénio dissolvido e Total de coliformes1. Para cada uma destas propriedades, o INAG

estabeleceu uma classificação qualitativa, desde excelente até muito má (quadro I)2.

1 O número de amostras disponibilizado é variável para cada uma das propriedades e dos pontos de monitorização, oscilando

entre um mínimo de 44 e um máximo de 180. 2 Significado da classificação: EXCELENTE - Água com qualidade equivalente às condições naturais, aptas a satisfazer potencialmente as utilizações mais exigentes em termos de qualidade. BOA - Águas com qualidade ligeiramente inferior à excelente mas podendo também satisfazer potencialmente todas as utilizações. RAZOÁVEL - Água com qualidade aceitável,

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aluvial do Tejo. Em torno do estuário do Tejo concentram-se as maiores manchas urbano-industriais (Figura 6).

2.2. Fonte e metodologia

Os dados relativos aos parâmetros físico-químicos das águas fluviais analisados foram recolhidos do Siste-ma Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH) do Instituto da Água (INAG). No total foram selecciona-dos 20 pontos de monitorização, com séries de dados relativamente longas para as seguintes propriedades: Nitratos, Fósforo, Condutividade Oxigénio dissolvido e Total de coliformes1. Para cada uma destas proprieda-des, o INAG estabeleceu uma classificação qualitativa, desde excelente até muito má (quadro I)2.

1 O número de amostras disponibilizado é variável para cada uma das propriedades e dos pontos de monitorização, oscilando entre um mí-nimo de 44 e um máximo de 180.

2 Significado da classificação: EXCELENTE - Água com qualidade equivalente às condições naturais, aptas a satisfazer potencialmente as utilizações mais exigentes em termos de qualidade. BOA - Águas com qua-lidade ligeiramente inferior à excelente mas podendo também satisfazer potencialmente todas as utilizações. RAZOÁVEL - Água com qualidade aceitável, suficiente para irrigação, para usos industriais e produção de água potável após tratamento rigoroso. Permite a existência de vida pis-cícola (espécies menos exigentes) mas com reprodução aleatória; apta para o recreio sem contacto directo. MÁ - Águas com qualidade medíocre apenas potencialmente aptas para irrigação, arrefecimento e navegação. A vida piscícola pode subsistir mas de forma aleatória. MUITO MÁ - Água extremamente poluída e inadequada para a maioria dos usos.

Com recurso a ferramentas de Sistema de Informa-ção Geográfica (SIG) procedeu-se à delimitação das áreas drenadas a montante dos diferentes pontos de monitori-zação, e ao seu cruzamento com os elementos cartográfi-cos relativos às variáveis físicas e ocupação do solo.

A criação de uma base de dados numérica com as componentes físicas, humanas e referentes às proprie-dades físico-químicas das águas, para cada uma das ba-cias observadas, permitiu a análise da informação atra-vés do recurso a estatísticas uni e multivariadas, tendo sido utilizado o programa estatístico SPSS. Das estatís-ticas multivariadas, utilizou-se a Classificação Hierár-quica de Clusters, um dos métodos que serve essencial-mente para medir a hierarquia da “proximidade” entre

objectos análise e detectar grupos homogéneos nos da-dos, podendo a observação destes grupos ser feita atra-vés de variáveis ou casos (Pestana e GaGeiRos, 1998).

3. Resultados

3.1. Variação espacial das propriedades das águas

No quadro II sistematizam-se os valores máximos e médios observados em cada um dos pontos de moni-torização. Com o intuito de avaliar a existência de dife-

Quadro IIValores máximos, médios e ANOVA para cada um dos parâmetros, nos pontos de monitorização/bacias analisados

Nitratos Fósforo Condutividade Oxigénio dissolvido Total de ColiformesPonto de monitorização/bacia Máximo Média Máximo Média Máximo Média Máximo Média Máximo Média1. laVeiRas/ Ribª. de baRCaRena 28,0 11,6 1,7 0,8 774 648 197 109 3100000 700002. sRª da RoCha/Rio jaMoR 27,0 9,6 1,8 0,6 1100 620 198 98 61000000 3300003. Ponte ResinGa/Ribª. de fRielas 113,0 21,0 18,1 2,0 1583 971 102 26 89000000 42000004. Ponte Pinhal/Ribª. de louRes 150,0 51,6 15,9 5,5 2701 941,5 157 66 68000000 10000005. quinta do Conde/Rio Coina 110,0 12,5 3,1 0,9 1426 617 174 75 380000000 365006. Rib. sto esteVão/Rio alMansoR 40,2 12,7 12,0 1,8 472 350 170 86 300000 47007. alb. diVoR/Rio diVoR 16,7 4,9 1,3 0,2 812 231 177,7 89,3 52000 1808. alb. MaRanhão/Ribª. da Raia 27,9 8,5 0,7 0,1 680 316 178 71,5 5800 1209. Moinho noVo/Rio sôR 39,9 14,0 3,7 0,4 549 144 152 75,8 30100000 15500010. Ponte de fReiRia/Rio MaioR 12,8 4,1 26,0 3,1 1645 624 184 50,5 130000000 4900011. Ponte s. ViCente do Paúl/Rio alViela (jusante) 40,4 5,1 0,7 0,2 3978 900 158 72 7000000 1600012. Ponte do alViela/Rio alViela (Montante) 16,0 6,0 0,4 0,1 2000 475 138 95 3700000 540013. quinta da bRoa (noRte)/Rio alMonda 11,0 4,4 3,8 0,6 1300 583,5 93 50,5 18000000 1900014. fábRiCa da MatRena/Rio nabão (jusante) 7,7 2,3 0,6 0,1 670 483 121 87 17000000 6800015. Ponte do aGRoal/Rio nabão (Montante) 8,9 1,3 0,9 0,2 520 351,5 134 97 700000 580016. alb. PóVoa Meadas/Ribª. de nisa 7,7 1,6 2,9 0,1 303 112,5 192 80,4 58500 15017. alMeiRão/Rio oCReza 11,1 2,2 3,0 0,4 340 89,5 179,9 95,1 50000 48018. alb. santa luzia/Ribª. de unhais 40,2 12,7 2,9 0,2 170 32 149 91 4400 41,519. Ponte MeiMôa/Ribª. da MeiMoa 11,2 2,9 0,9 0,1 338 81 151 91,5 49000 240020. alb. touliCa/Rio touliça 9,9 1,9 0,5 0,1 388 75 169,03 95,7 23000 200ANOVA (p-value) 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000

Adélia Nunes

Quadro IClassificação das águas segundo o INAG

Excelente Boa Razoável Má Muito má Nitratos (NO3

-) (ml/l) <5 5-25 25-50 50-80 >80Fósforo Total (P) (mg/l) <0.2 0.2-0.25 0.25-0.4 0.4-0.5 >0.5

Condutividade (µS/cm, 20ºC) <750 750-1000 1000-1500 1500-3000 >3000Oxigénio dissolvido (%) >90 70-90 50-70 30-50 <30

Total de coliformes (MPN/100ml) <50 50-5000 5000-50000 >50000

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renças entre esses pontos de observação realizaram-se análises de variância ANOVA, para cada uma das pro-priedades. Os resultados obtidos mostram que existem discrepâncias, com significado estatístico, para um in-tervalo de confiança de 99.9%, para todos os parâme-tros analisados, entre as bacias observadas.

A classificação das águas, de acordo com o INAG (Figura 7), mostra que a concentração de nitratos é particularmente alta em apenas uma bacia, na ribeira

de Loures (4. Ponte do Pinhal), com um valor médio de 51,6 ml/l e com cerca de metade das análises da água a serem classificadas entre más e muito más. Na ribeira de Frielas (3. Ponte Resinga), a qualidade da água no que toca à concentração deste nutriente, é classificada entre razoável e má em mais de 1/3 das colheitas. Nas restantes bacias, as águas foram classificadas dominan-temente com boa e excelente qualidade. A utilização de adubos na agricultura, os produtos de rejeição da

Condicionantes físicas e humanas da qualidade das águas fluviais na bacia do rio Tejo.

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Figura 7 Classificação das águas, segundo o INAG, nos pontos de monitorização/bacias analisados.

1. Laveiras/ Ribª. de barcarena 2. Srª da rocha/Rio Jamor 3. Ponte resinga/Ribª. de Frielas 4. Ponte pinhal/Ribª. de loures 5. Quinta do conde/Rio coina 6. Rib. Sto estevão/rio almansor 7. Alb. divor/rio Divor 8. Alb. maranhão/ribª. da raia 9. Moinho novo/Rio sôr 10. Ponte de freiria/rio Maior 11. Ponte s. vicente do paúl/rio alviela (Jusante) 12. Ponte do alviela/rio Alviela (montante) 13. Quinta da broa (norte)/rio almonda 14. Fábrica da matrena/Rio Nabão (Jusante) 15. Ponte do agroal/Rio Nabão (Montante) 16. Alb. Póvoa meadas/ribª. de Nisa 17. Almeirão/rio Ocreza 18. Alb. Santa luzia/ribª. de Unhais 19. Ponte meimôa/Ribª. da Meimoa 20. Alb. Toulica/Rio Touliça

Figura 7Classificação das águas, segundo o INAG, nos pontos de monitorização/bacias analisados.

1. Laveiras/ Ribª. de Barcarena2. Srª da Rocha/Rio Jamor3. Ponte Resinga/Ribª. de Frielas4. Ponte Pinhal/Ribª. de Loures5. Quinta do Conde/Rio Coina6. Rib. Sto Estevão/Rio Almansor7. Alb. Divor/Rio Divor8. Alb. Maranhão/Ribª. da Raia9. Moinho Novo/Rio Sôr10. Ponte de Freiria/Rio Maior11. Ponte S. Vicente do Paúl/Rio Alviela (Jusante) 12. Ponte do Alviela/Rio Alviela (montante)13. Quinta da Broa (norte)/Rio Almonda14. Fábrica da Matrena/Rio Nabão (Jusante)15. Ponte do Agroal/Rio Nabão (Montante)16. Alb. Póvoa Meadas/Ribª. de Nisa17. Almeirão/Rio Ocreza18. Alb. Santa Luzia/Ribª. de Unhais19. Ponte Meimôa/Ribª. da Meimoa20. Alb. Toulica/Rio Touliça

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criação de animais e os sistemas sépticos deficientes são os principais responsáveis pela presença deste ele-mento no meio hídrico, o qual pode ser altamente pre-judicial para a saúde humana.

Os compostos de fósforo, dos mais importantes factores limitantes da vida dos organismos aquáticos e fundamentais no controle ecológico das algas, apresen-tam valores especialmente altos em 7 pontos de monito-rização (ribeira de Frielas e Loures, rios Almansor e Maior, ribeira de Barcarena, rio Jamor e Coina) onde a percen-tagem de amostras integradas nas classes de má e muito má supera os 70% e ultrapassa os 90% em 3 dos casos (ri-beira de Frielas e Loures e rio Maior). Os efluentes domés-ticos, bem como alguns tipos de despejos industriais, constam entre os principais factores de enriquecimento das águas com esse nutriente. Com os menores valores de fósforo, isto é com médias iguais ou inferiores 0,2 mg/l, destacam-se os rios Alviela, Nabão, Touliça e Divor, e as ribeiras da Meimoa, de Nisa, da Raia e de Unhais. Nestes, casos a água classifica-se, em termos médios, de elevada qualidade no que toca a esta propriedade.

A par do fósforo, também os coliformes totais assu mem particular relevância nas bacias anteriormen-te referidas, onde as amostras classificadas de má/mui-to má atingem valores superiores a 50%. A presença de um número alto de coliformes na água, por se tratar de organismos patogénicos, significa um nível elevado de poluição com riscos para a saúde. Por regra, são utiliza-dos como indicadores de poluição produzida por esgo-tos domésticos.

O oxigénio dissolvido, outra variável de extrema relevância, pois é necessário para a respiração da maio-

ria dos organismos que habitam o meio aquático, ao mes-mo tempo que permite detectar impactos ambientais como eutrofização e poluição orgânica, assume os valo-res mais baixos nas ribeiras de Loures e Frielas e nos rios Almansor e Maior, integrando-se um elevado número de amostras nas classes má/muito má quali dade da água.

No que se refere à condutividade, com excepção do rio Alviela e das ribeiras de Loures e Frielas, os valo-res observados conferem à qualidade da água uma classi ficação de razoável, boa ou até excelente, na maioria dos pontos de observação.

3.2. Correlações entre as propriedades da água e as condicionantes físicas e humanas

Os coeficientes de correlação de Pearson estabele-cidos entre pares de variáveis físico-químicas e as condi-cionantes físico-humanas são apresentados no Quadro III e testemunham um elevado número de associações estatis-ticamente representativas (p-value <0.05). Como seria também de esperar, as propriedades físico-químicas das águas interrelacionam-se entre si; com sinal positivo sa-lientam-se os nitratos, o fósforo, a condutividade e o total de coliformes, enquanto o oxigénio dissolvido demonstra uma correlação negativa com as anteriores variáveis.

Entre as condicionantes físicas susceptíveis de interferir na qualidade das águas, destaca-se a associa-ção positiva entre a percentagem de depósitos aluviais e arenosos com a condutividade (0.806, p=0.01), os ni-tratos (0.538, p=0.05) e o fósforo (0.485, p=0.05). A temperatura média anual apenas se associa, positiva-mente, com a condutividade.

Adélia Nunes

Quadro IIICorrelações entre os parâmetros das águas e as condicionantes físico-humanas das respectivas bacias de drenagem.

NO3 P CD OD TC DAA RC G+X PMA TMA EMA AA AF AI

Total de nitratos -média (NO3) 1

Total de fósforo – média (P md) 0.883** 1

Condutividade – média (CD md) 0.713** 0.610** 1

Oxigénio dissolvido - média (OD md) -0.651** -0.783** -0.534* 1

Total coliformes -media (TC md) 0.902** 0.934** 0.522* -0.655** 1

Depósitos aluviais e arenosos, em % (DAA) 0.538* 0.485* 0.806** -0.346 0.346 1

Rochas calcárias, em % (RC) -0.137 -0.161 -0.033 0.199 -0.103 -0.009 1

Rochas granitóides + Compl. xisto-grauváquico, % (G+X) -0.489* -0.432 -0.776** 0.288 -0.311 -0.970** -0.234 1

Prec. média anual , em mm (PMA) -0.187 -0.269 -0.221 0.275 -0.199 -0.214 0.181 0.164 1

Temp. média anual, em ºC (TMA) 0.115 0.157 0.444* -0.170 0.105 0.333 0.162 -0.363 -0.321 1

Escom. médio anual, em mm (EMA) -0.151 -0.199 -0.204 0.267 -0.132 -0.195 0.165 0.15 0.976** -0.379 1

Área agrícola, em % (AA) -0.083 0.094 0.285 -0.309 -0.009 0.071 0.139 -0.103 -0.478* 0.254 -0.487* 1

Área florestal , em % (AF) -0.517* -0.496* -0.670** 0.238 -0.444* -0.428 0.188 0.370 0.230 -0.392 0.195 -0.336 1

Área inculta, em % (AI) 0.176 -0.027 0.187 0.201 0.017 0.082 -0,272 -0.013 0.336 0.221 0.297 -0.322 -0.590** 1

Área urbana, em % (AU) 0.753** 0.751** 0.609** -0.283 0.724** 0.572** -0.143 -0.521* -0.265 0.151 -0.154 -0.159 -0.624** 0.189

** Correlação significativa ao nível de 0.01. *Correlação significativa ao nível de 0.05.

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Contudo, as correlações mais significativas são as que se estabelecem entre a percentagem de área urba-na e o total de nitratos (0.753, p=0.01), fósforo (0.751, p=0.01), coliformes (0.724, p=0.01) e condutividade (0.609, p=0.01). Com sinal negativo, destacam-se tam-bém as correlações entre as anteriores propriedades da água e a percentagem de área florestal. O oxigénio dis-solvido é a única variável a não manifestar correlações, com significado estatístico, com nenhuma das condicio-nantes físico-humanas analisadas.

Os resultados obtidos sugerem, assim, que as propriedades das águas na bacia do rio Tejo, sobretudo no que toca à concentração de nitratos, fósforo e coli-formes, e também no que se refere à respectiva condu-tividade, estão dependentes do tipo de ocupação con-ferida ao solo, sendo que a presença de floresta se revela positiva no incremento da qualidade da água, enquanto a concentração de actividades urbanas con-tribui, definitivamente, para a sua deterioração.

A agregação dos diversos pontos de monitoriza-ção, segundo o método de análise hierárquica, faz emergir dois clusters principais (Figura 8). Do primeiro fazem parte 11 pontos de monitorização, os quais po-dem ser classificados como pertencendo a cursos que drenam águas de boa/muito boa qualidade, pelos bai-xos conteúdos de nitratos, fósforo, coliformes totais e condutividade e pela maior oxigenação das respectivas

massas de água. Deste grupo fazem parte as seguintes pontos monitorização: (14) fábRiCa da MatRena, (15) Ponte do aGRoal, (18) alb. santa luzia, (17) alMeiRão, (19) Ponte MeiMôa, (16) alb. PóVoa Meadas, (6) Rib. sto esteVão, (9) Moinho noVo, (8) alb. MaRanhão, (20) alb. touliCa e a (7) alb. diVoR. No segundo cluster integram-se os restantes pontos de monitorização: (4) Ponte Pinhal, (10) Ponte de fReiRia, (5) quinta do Conde, (13) quinta da bRoa (noRte), (1) laVeiRas, (2) sRª da RoCha, (11) Ponte s. ViCente do Paúl, (12) Ponte do alViela e (3) Ponte ResinGa. Nestes casos, trata-se de linhas com água de má/muito má qualidade, devido às elevadas proporções de nutrientes, em particular fósforo e coliformes e baixos conteúdos de oxigénio.

4. Conclusão

Todos os parâmetros analisados, relativos à qua-lidade da água, apresentam variações espaciais signifi-cativas nos cursos de água tributários do rio Tejo. Neste conjunto de afluentes e sub-afluentes do rio Tejo, o to-tal de nitratos, de fósforo e de coliformes demonstram correlações positivas com a área ocupada pelo espaço urbano, a qual pode ser utilizada na previsão dos res-pectivos valores.

De um modo geral, pode afirmar-se que as linhas de água pobres em nutrientes se localizam em áreas de

Figura 8Dendrograma resultante da análise hierárquica dos parâmetros físico-químicos das águas e dos factores físicos e humanos condicionantes da respectiva qualidade nos 20 pontos de monitorização.

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14. Fábrica da matrena/Rio Nabão (Jusante) 15. Ponte do agroal/Rio Nabão (Montante) 18. Alb. Santa luzia/ribª. de Unhais 17. Almeirão/rio Ocreza 19. Ponte meimôa/Ribª. da Meimoa 16. Alb. Póvoa meadas/ribª. de Nisa 6. Rib. Sto estevão/rio almansor 9. Moinho novo/Rio sôr 8. Alb. maranhão/ribª. da raia 20. Alb. Toulica/Rio Touliça 7. Alb. divor/rio Divor 4. Ponte pinhal/Ribª. de loures 10. Ponte de freiria/rio Maior 5. Quinta do conde/Rio coin 13. Quinta da broa (norte)/rio almonda 1. Laveiras/ Ribª. de barcarena 2. Srª da rocha/Rio Jamor 11. Ponte s. vicente do paúl/rio alviela (Jusante) 12. Ponte do alviela/rio Alviela (montante) 3. Ponte resinga/Ribª. de Frielas

Figura 8 Dendrograma resultante da análise hierárquica dos parâmetros físico-químicos das águas e dos factores físicos e humanos condicionantes da respectiva qualidade nos 20 pontos de monitorização.

4. Conclusão

Todos os parâmetros analisados, relativos à qualidade da água, apresentam variações

espaciais significativas nos cursos de água tributários do rio Tejo. Neste conjunto de afluentes

e sub-afluentes do rio Tejo, o total de nitratos, de fósforo e de coliformes demonstram

correlações positivas com a área ocupada pelo espaço urbano, a qual pode ser utilizada na

previsão dos respectivos valores.

De um modo geral, pode afirmar-se que as linhas de água pobres em nutrientes se

localizam em áreas de fracas densidades populacionais, enquanto os cursos de água com

elevada concentração de nutrientes drenam, sobretudo, áreas de forte concentração de

população e actividades económicas. Estes resultados estão de acordo com os obtidos em

outros trabalhos, como por exemplo o de FERRIER et al. (2001), quando analisa a qualidade

14. Fábrica da Matrena/Rio Nabão (Jusante)15. Ponte do Agroal/Rio Nabão (Montante)18. Alb. Santa Luzia/Ribª. de Unhais17. Almeirão/Rio Ocreza19. Ponte Meimôa/Ribª. da Meimoa16. Alb. Póvoa Meadas/Ribª. de Nisa6. Rib. Sto Estevão/Rio Almansor9. Moinho Novo/Rio Sôr8. Alb. Maranhão/Ribª. da Raia20. Alb. Toulica/Rio Touliça7. Alb. Divor/Rio Divor4. Ponte Pinhal/Ribª. de Loures10. Ponte de Freiria/Rio Maior5. Quinta do Conde/Rio Coina13. Quinta da Broa (norte)/Rio Almonda1. Laveiras/ Ribª. de Barcarena2. Srª da Rocha/Rio Jamor11. Ponte S. Vicente do Paúl/Rio Alviela (Jusante) 12. Ponte do Alviela/Rio Alviela (montante) 3. Ponte Resinga/Ribª. de Frielas

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Cadernos de

Geografia

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fracas densidades populacionais, enquanto os cursos de água com elevada concentração de nutrientes drenam, sobretudo, áreas de forte concentração de população e actividades económicas. Estes resultados estão de acor-do com os obtidos em outros trabalhos, como por exem-plo o de feRRieR et al. (2001), quando analisa a qualidade das águas nos rios da Escócia, ou o de sliVa e williaMs (2001), ao estudarem a qualidade das águas em três bacias do sudeste de Ontário.

Com efeito, como a água drena a superfície ter-restre, transporta os resíduos nela existentes. Assim, o escoamento de diferentes tipos de usos do solo pode ser enriquecido em distintos tipos de contaminantes. Por exemplo, o escoamento a partir de áreas agrícolas pode traduzir-se em águas enriquecidas em nutrientes, pelo uso de pesticidas, adubos químicos em excesso, efluen-tes pecuários e sedimentos.

Do mesmo modo, o escoamento a partir de áreas altamente urbanizadas pode ser enriquecido com frag-mentos de lixo, metais pesados e esgotos não tratados, entre outros. Em Portugal, os principais focos de polui-ção continuam a ser os esgotos domésticos, que não têm tratamento ou que têm um tratamento deficiente e o abandono de resíduos, agro-pecuários e industriais, que contaminam as linhas de água.

Por outro lado, a intercepção, a infiltração, a percolação e absorção por diferentes tipos de ocupação do solo e coberturas vegetais pode modificar o ciclo hi-drológico e as características físicas, químicas e bioló-gicas das águas, como a temperatura, o pH, entre ou-tras (wu e haith, 1993; ChanGnon e deMissie, 1996; tonG e Chen, 2002). A ocupação do solo com floresta parece deter, assim, um papel importante na mitigação da de-gradação da qualidade da água (sliVa e williaMs, 2001).

A absoluta dependência do Ser Humano, das res-pectivas actividades e dos ecossistemas naturais do recur-so água torna a sua gestão sustentável num dos principais desafios da actualidade. Por conseguinte, no conjunto dos países da União Europeia, tem-se assistido a uma integra-ção progressiva de políticas ambientais, constituindo a Directiva-Quadro da Água, Directiva n.º 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2000, a qual foi posteriormente transposta para a ordem jurídica nacional pela Lei da Água, Lei n.º50/2005, de 29 de Dezembro de 2005, um dos mais relevantes instrumen-tos de planeamento e gestão da água.

Nela se procura uma abordagem integrada de pro-tecção das águas (águas doces superficiais lênticas e ló-ticas, águas subterrâneas, águas de transição e águas costeiras), constituindo um enorme desafio às estruturas institucionais existentes, pois obriga-as a repensar ob-

jectivos e modelos administrativos que incor porem estes desígnios de gestão integrada. Com os Planos de Bacia Hidrografia juntamente com o Plano Nacional da Água, instrumentos fundamentais de suporte a uma política de gestão da água em Portugal, espera-se um salto qualita-tivo no seu uso sustentado, por via a enfrentar o futuro com maior equidade no acesso a este recurso, que ape-sar de renovável, se encontra fortemente ameaçado.

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