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Conexões para a vida

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Entender as conexões entre o cérebro, a consciência e as práticas espirituais pode transformar sua vida e seus relacionamentos.

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A Phyllis, Rachel e Nathan, que, juntos, me têm concedido a graça de “me conhecer e de ser conhecido”.

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introdução

o quarto do hospital era claro, mas sem vida. Era Dia das Mães, 2004, e eu estava sentado junto à cama da mulher que me havia dado à luz. Minha mãe de 86 anos parecia exaurida e apática, e movia-se muito pouco, exceto pelos olhos. Sua voz estava mais fraca do que o normal, reflexo de sua deterioração física generalizada.

Na semana anterior, enquanto eu participava de um congresso médico, meu irmão me ligou para dizer que a saúde de mamãe minguava rapi-damente. O mais preocupante, segundo ele, era sua resignação diante do fim da vida. Parecia que ela não estava interessada em sobreviver, muito menos em melhorar.

Nos dias entre o telefonema do meu irmão e a visita, minha esposa obser-vou que minha reação a toda aquela situação parecia vacilar entre distância, indiferença clínica e ira absoluta. Eu tinha sido conciso nas respostas às in-dagações da minha esposa sobre a condição da minha mãe e certamente não estava sendo sincero a respeito dos meus verdadeiros sentimentos. Lá estava eu, um psiquiatra experiente e bem-sucedido, um médico bem treinado na ciência e arte da cura, mas que relutava em oferecer apoio à própria mãe. Era um seguidor de Jesus, mas achava praticamente impossível sentir até mesmo uma semente de mostarda de compaixão por minha mãe.

Não era à toa que minha mãe desistia. Não era à toa que estava passiva, como ficava às vezes, o que reforçava ondas emocionais angustiantes por toda a família. Éramos hábeis em manter a ilusão de que estávamos bem, quando, em alguns aspectos, estávamos na verdade bem doentes.

A apatia da minha mãe reativou meu senso de inadequação e isolamento no mundo. Eu não encontrava consolo nem mesmo na minha experiência espiritual. Nem na oração. Nem nas Escrituras. Nem nas amizades mais pro-fundas e significativas. Minha mãe caminhava para a morte e parecia não se

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importar com o que eu sentia a respeito. Ela estava fragilizada, mas eu, cheio de medo, solidão, impotência e raiva, não sentia compaixão por sua situação.

Nas seis horas ao volante, enquanto seguia para o hospital naquele do-mingo, tive tempo para refletir sobre minha reação e o motivo para tanto. Ao longo do caminho, lembrei-me de um seminário no congresso médico do qual acabara de participar. Fora conduzido pelo dr. Daniel Siegel, um psiquiatra que explicara como descobertas recentes em neurociência estavam de fato ajudando as pessoas.

Ele disse com todas as letras que um fator importante para as pessoas mu-darem — não só as experiências, mas também o próprio cérebro — é contar sua história a um ouvinte empático. Quando uma pessoa conta sua história e é realmente ouvida e compreendida, tanto ela como o ouvinte sofrem mu-danças reais no circuito cerebral. Eles têm um senso maior de conexão emo-cional e relacional, sentem diminuir a ansiedade e aumentar o interesse e a compaixão pelos sofrimentos alheios. Usando a linguagem da neurociência, o dr. Siegel denominou a mudança como “integração intensificada”.

Enquanto dirigia pela alça da rodovia Interstate 76 até o hospital, per-cebi que o trabalho do dr. Siegel tinha algo a dizer sobre meu dilema. Eu me perguntava se parte da resposta para meus conflitos estavam, de algum modo, na história de vida da minha mãe, que começava com uma série de perdas. Percebi que a ouvira contar essa história ao longo dos anos, mas de maneira apressada. Nunca permitira que sua história realmente me tocasse. Conhecia os fatos, sem nenhuma emoção. Resolvi que era tempo de mergulhar naquele mar de sentimentos e esperava que a excursão me salvasse de algum modo.

Então me sentei ao lado dela em seu quarto de hospital. Orava pedindo que pudesse estar aberto para o que Deus teria reservado para mim, fosse o que fosse — ainda que me sentisse silenciosamente aterrorizado com o que poderia acontecer. Pedi à minha mãe que recontasse a história que eu já havia ouvido mil vezes, porém jamais deixara que me penetrasse a alma.

Os detalhes me eram familiares — ela ficou órfã aos 3 anos com a morte prematura da mãe, e o pai era incapaz de cuidar dela. No entanto, a minha disposição de permitir que sua história me comovesse era nova. Dessa vez escutei minha mãe sem ver uma mulher angustiada e passiva, mas uma órfã assustada e triste que fora abandonada e desprezada.

Nem sei se percebi quando comecei a chorar. Eu não conseguia enxergar por causa das lágrimas. A dor era massacrante e sem perceber fiquei submer-so num mar de emoções. Já não conseguia distinguir entre os sentimentos dela e os meus. Era visível a desorientação que eu sentia. O tempo parecia

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simultaneamente parar e entrar pela eternidade. Talvez fossem apenas mi-nutos. Pareciam horas.

Uma coisa era certa. À medida que minha mãe contava a história, fui per-cebendo minha própria narrativa de outra maneira. A voz amedrontada da menininha que minha mãe fora outrora evocou sentimentos de compaixão no fundo do meu ser. À medida que ela revelava sua história, eu experimen-tava minha própria história de maneira diferente. Por muito tempo eu acre-ditara que seria mais fácil minha mãe ter optado por uma vida de confiança e coragem, em vez de uma trilha de dependência passiva e medo — que no final das contas havia provocado em mim um senso de inadequação. Eu me ressentia daquilo, mas escondia minha indignação sob vestes de polidez e respeito, talvez esperando que minha calma exterior acabasse criando espaço suficiente para ela se tornar a mãe de que eu precisava.

Minha história — como eu a entendia até aquele Dia das Mães — fora influenciada pelo fato de eu ser o apoio da minha mãe. Meu pai, ainda que um homem excelente, nem sempre conseguia entender-se emocionalmen-te com ela, muito menos quando ficava ansiosa. Naqueles momentos, eu tentava servir de amortecedor para seu estresse emocional. Na realidade (ainda que não tivesse consciência disso quando criança), eu a consolava para reduzir minha ansiedade; se ela estivesse bem, eu também estava. Por mais que tentasse, porém, eu nunca fazia o suficiente para conseguir que ela me desse conforto. Então, no fim, concluí que só podia depender de mim mesmo.

À medida que ouvia minha mãe à beira da morte e sentia a compaixão brotar dentro de mim, o entendimento que eu tinha de mim mesmo foi mudando. Não se tratava apenas do que eu compreendia pela lógica acerca dos fatos da minha vida, mas o que sentia sentado ali no quarto. Eu sentia fisicamente a mudança.

Eu passei não apenas a ver minha mãe com novos olhos, mas também a sentir sua vida — e a minha — de outra maneira. Como se as chamadas escamas tivessem caído dos meus olhos, vi que minha mãe não tinha simples-mente escolhido viver como viveu. Ela fez o melhor que pôde, sem ninguém para cuidar de seu coração, seu estado emocional, suas angústias e esperanças. Sua ansiedade, seu medo e sua passividade não eram intencionais; eram sua estratégia de defesa. A partir dos 4 anos de idade, ela desenvolveu estratégias para ter certeza de que não estava incomodando ninguém e, por fim, acabou incluindo Deus nisso. Era o único modo que conhecia de evitar os sentimen-tos insuportáveis de abandono, e essa postura defensiva se manteve na vida adulta. Ela não havia feito uma escolha ativa daquele caminho, mas reagiu

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inconscientemente. Em outras palavras, sua timidez e sua cautela tornaram-se o padrão automático dos disparos neurais que moldaram sua mente.

Percebi vários pontos importantes naquele quarto de hospital. Talvez não houvesse nada que eu pudesse fazer para mudar minha mãe. Mais impor-tante, talvez a culpa pelas dificuldades que eu havia experimentado não fosse tanto dela como eu havia acreditado. E, ainda mais importante, talvez meus sentimentos de inadequação não fossem tanto culpa minha, como eu havia suspeitado. Tive a certeza da voz de Deus dizendo-me naquele momento que eu já não estava mais vinculado a meu passado.

Quando comecei a compreender de outra forma a história da minha mãe, iniciei o processo de realmente perdoar a ela e a mim mesmo. Bem ali, na-quele quarto de hospital, vi minha própria narrativa de outro modo. Comecei a ver que eu também havia vivido da melhor maneira que me era possível. Eu já não estava tão pronto a me condenar por não ser suficiente. Nem sufi-cientemente esperto. Nem suficientemente divertido. Nem suficientemente confiante. Nem suficientemente firme. Simplesmente insuficiente.

De repente fui liberado dessas ideias de inadequação e dos consequentes sentimentos de vergonha. Enxerguei-me como alguém amado como real-mente é, com a expectativa daquilo em que se está tornando. Eu não conse-guia entender o que se passava enquanto tudo aquilo acontecia. Mas, quando minha mãe morreu algumas semanas depois, senti-me livre para prosseguir sem remorso.

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Nos anos seguintes desde aquele encontro com minha mãe, venho desen-volvendo alguma terminologia para expressar e comunicar o que experimen-tei. Passei a chamar essa experiência de processo de ser conhecido. Essa é uma experiência muito mais profunda e rica do que o mero conhecimento bruto dos fatos da minha história. Ela reflete o que a neurociência e as disciplinas correlatas nos ensinam sobre o que significa viver uma vida integrada — como indivíduo e também como parte de uma comunidade.

Por causa da minha experiência, fiquei mais que entusiasmado com as novas descobertas da neurociência. Passei a explicá-las a meus pacientes e a ensiná-los a prestar atenção às várias interações dentro da própria mente. Testemunhei transformações na vida deles à medida que refletiam sobre es-sas descobertas e as incorporavam. Eu nunca estivera tão perto daqueles com quem interagia como agente de cura. À medida que cada uma das histórias repletas da graça de Deus se abria diante de mim, passei a me conectar melhor a partes da minha própria história. As histórias deles deram-me nova energia

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e me desafiaram a reconsiderar meu próprio percurso de vida. Memórias e sentimentos que eu havia deixado passar em branco estavam despertando.

Durante esse tempo, percebi que desde a residência psiquiátrica minha curiosidade profissional nunca fora tão revigorada quanto ocorreu a partir do seminário de Dan Siegel. Quando compartilhei minhas descobertas com amigos e colegas, fui encorajado a fazer uma compilação das reflexões sobre neurociência e espiritualidade cristã.

A jornada que começou no quarto de hospital da minha mãe é descrita em mais detalhes neste livro. Meu objetivo é mostrar como sua vida também pode ser transformada pela renovação da mente, levando-o à saúde que Deus deseja para você. Em seu íntimo — quer viva por trás da fachada de riqueza, poder e prazer, quer em uma prisão de sofrimento, pobreza e desespero — você, como qualquer outra pessoa, busca desesperadamente alegria, bondade, coragem, generosidade, benignidade e fidelidade. Você anseia manifestar es-sas qualidades e vê-las em seus filhos, em sua família e em sua comunidade.

As novas descobertas da neurociência e de áreas correlatas oferecem cha-ves para desenvolver esses atributos. Primeiro, você precisa tomar consciên-cia de que todos somos moldados pelas interações que ocorrem dentro da nossa mente e entre uma mente e outra. Sabendo disso, você pode ser mais intencional nos relacionamentos.

Se você, como muitos outros, achava que a neurociência lidava estrita-mente com as estruturas físicas do cérebro e com a psicologia, pode sur-preender-se ao saber quanto ela nos ensina a respeito das interconexões da mente — tanto como indivíduos como dentro da comunidade.

Talvez você saiba que seu cérebro é formado dos hemisférios esquerdo e direito. Embora os dois lados do cérebro estejam envolvidos em quase todas as atividades, eles funcionam de maneiras diferentes. O hemisfério esquerdo processa de maneira lógica e sequencial; o direito processa de maneira mais intuitiva e holística. Os dois hemisférios funcionam melhor, porém, de ma-neira integrada. Aliás, a neurociência confirma muito do que as Escrituras ensinam sobre a importância de viver com coração e mente não divididos.

É verdade que cada um tem seu cérebro, mas a mente das pessoas se inter-relaciona de muitas maneiras complexas e misteriosas. Creio que nossa vida só será abundante, alegre e cheia de paz à medida que tivermos envolvi-mento, conhecimento e compreensão mútuos. Também creio que não pode-mos separar o que fazemos com nosso cérebro e com nossos relacionamentos daquilo que fazemos com Deus. Deus projetou nossa mente, parte de sua criação, a fim de nos convidar para um relacionamento mais profundo, mais seguro e mais corajoso com ele e com os outros.

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Então, qual a relevância disso para a sua vida? Esse é o tema deste livro. Primeiro, vamos explorar questões fundamentais da estrutura e do funciona-mento cerebral para ver como aspectos da neurociência apontam para Deus e afirmam o que os cristãos têm experimentado como comunidade de fé há mais de quatro mil anos.

Terminado esse trabalho de base, vamos considerar como descobertas re-centes da neurociência podem prover respostas a algumas das perguntas que muitos fazem hoje. Você mesmo pode estar fazendo algumas:

• Nummundomaisconectadoquenunca,porquemesintotãosó?• Porqueétãodifícilmudar?• Porquenãoconsigodeixaropassadoparatrás?• Paraqueservemeuladoemocional,senamaioriadasvezeselesóme

cria problemas?• Porquenãoconsigosimplesmenteresolverascoisassozinho?• Porquevivoperdendoapaciênciacomosoutros?• ComoJesusabreocaminhoparaeumelivrardasgarrasdopecado

aqui e agora — não só nos novos céus e nova terra?• Oquerealmenteacontecequandovivemosemcomunidadecomoo

Corpo de Cristo?

Se você luta com uma ou mais dessas perguntas, está convidado a se juntar a mim nesta maravilhosa jornada a fim de compreender melhor sua mente e encontrar respostas significativas, surpreendentes e práticas. Este livro inclui alguns exercícios nas páginas marcadas e perguntas para reflexão (a partir da p. 286) para ajudá-lo a aplicar o que você está aprendendo.

Nós, que desejamos seguir Jesus, que ansiamos por Deus como a corça anseia por água, recebemos insights da própria criação divina — as descober-tas da neurociência, do apego e do ato de compartilhar a própria história — que não só oferecem uma maneira diferente de pensar a respeito da mente, mas também cria espaço para Deus nos mudar. Essas descobertas oferecem uma nova linguagem a fim de nos reapresentar ao que Deus tinha para nós desde o princípio em Jesus — outro dialeto com o qual Deus nos chama, acena para nós e nos convida para a dança de sua nova criação.

Se essa promessa soa como a lembrança de uma canção que você re-conhece, mas nunca ouviu, sinta-se livre para aproximar-se da orquestra. Talvez você sinta que a música é ao mesmo tempo calmante, revigorante e perturbadora. Mas não tenha medo. Como proclamou Tolstoi, fomos cria-dos para a alegria, e este é o lugar onde, espero, você se encontrará à medida que prosseguir na leitura deste livro.

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Capítulo 1

neuroCiênCia: uma janela para a mente

Karen tinha 30 e poucos anos quando me procurou. Ela buscava ajuda para livrar-se da depressão com a qual vinha lutando desde os 14 anos. Tinha amigos, mas muito do que eles já haviam conseguido — casamento, sucesso profissional e aparente felicidade — só servia para lembrá-la daquilo que ela não tinha.

Solteira, mas desejando um compromisso, Karen se considerava pouco desejável. Já estava levando um ano a mais que os colegas para terminar seu doutorado em economia e era pessimista quanto à possibilidade de com-pletar a tese no ano seguinte. Ela queria lecionar em alguma universidade, mas não havia perseguido a ideia com muito afinco.

Ainda que tivesse sido atleta na faculdade e afirmasse que estar em forma era importante, Karen raramente se exercitava. Comia mal e, às vezes, bebia demais na tentativa de desligar-se dos sentimentos de tristeza e vergonha. O vinho servia para trazer sono, e ela acordava no dia seguinte com ressaca.

Karen me procurou quando começaram os ataques de ansiedade. Ela acordava no meio da noite com o coração acelerado, batendo forte, e sen-tia um medo inexplicável que lhe percorria o corpo e a mente por um tempo que parecia durar uma eternidade. Era evidente que o vinho não estava funcionando.

A jovem declarou que não se importava se morresse durante o sono ou atropelada por um ônibus, mas jamais cogitaria suicidar-se. Perguntei o mo-tivo. “Não quero ir para o inferno”, respondeu, explicando como sua vida ha-via mudado durante a faculdade, quando ela começou a seguir Jesus. Sentira os primeiros lampejos de otimismo depois de se tornar cristã, mas nem seu intelecto aguçado nem sua fé recém-descoberta conseguiram afastar suas feras emocionais.

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Karen descreveu a infância como uma progressão sombria de aflições. Acreditava que os pais a amavam, mas com frequência se sentia profunda-mente triste, sem motivo aparente. Ainda que as conversas em casa fossem estimulantes em termos intelectuais raramente, talvez nunca, entrassem no âmbito da emoção ou daquilo que os membros da família estavam sentindo.

Quando Karen estava com 14 anos, o pai sofreu um inesperado ataque cardíaco e morreu. A mãe reagiu mergulhando no trabalho como médica. A reação do irmão mais velho foi ir para a faculdade e nunca voltar para casa. Karen reagiu tornando-se atleta de nível estadual e estudante destaca-da. Todos os que a conheciam acharam que ela estava bem. Mas não estava. Não estava naquela época e certamente não agora.

Quando Karen sentou-se em minha sala, os maneirismos deixaram seus problemas bem à vista. Ainda que atraente, ela se afundava na cadeira. Mexia as mãos o tempo todo. Seu comportamento vacilava entre risos nervosos e lágrimas fáceis, pontuados por momentos de grande esforço para retomar a compostura — acompanhados de pedidos de desculpas pelo “descontrole”. Era como se ela estivesse segurando um reservatório inteiro de aflições e lhe sobrasse pouquíssima energia para mantê-lo sob controle. Talvez a jovem temesse que, caso a represa se rompesse, ela e tudo o que estava ali contido fossem varridos para o esquecimento por um maremoto de emoções.

Karen tentou psicoterapia. Tentou medicação. Orou. Leu as Escrituras e literatura devocional. Fazia parte de uma comunidade de adoração e de um pequeno grupo de mulheres que se reunia regularmente para apoio e crescimento espiritual. Aquilo ajudava, mas não sustentava um senso de es-tabilidade ou confiança. O que mais incomodava a jovem era que ela não conseguia compreender por que seu relacionamento com Jesus parecia não fazer diferença. Por que a oração tinha tão pouco efeito sobre sua angús-tia psicológica? Por que Deus interferia tão pouco em sua vida?

Descobertas recentes da neurociência e campos afins fornecem respostas relevantes às perguntas de Karen. Mesmo assim, ela foi cética ao dizer que essas descobertas podiam dar-lhe um rumo e ajudá-la a dar um sentido para a vida. É a Karen e a outros como ela — você e eu — que este livro se destina. Foi escrito para anunciar um novo modo de compreender e experimentar nossa vida com Deus, usando a linguagem da neurociência e do apego — elementos essenciais da boa criação de Deus —, como nosso guia.

Ao longo de muitos meses de terapia, Karen começou a explorar a co-nexão entre sua mente e seus relacionamentos com Deus e com as outras pessoas. Os conceitos seguintes — muitos dos quais são funções do cérebro humano — foram a chave para a jovem ser curada, e um ou mais desses

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conceitos podem ser a chave para você também. Uma vez que cada conceito é construído sobre o anterior, eles também servem de esboço dos capítulos que seguem:

ser conhecido. Nosso mundo ocidental há muito tem destacado o conhe-cimento — informações factuais e “provas” — acima do processo de ser conhecido por Deus e pelos outros. Não surpreende, portanto, que, apesar de todo o progresso tecnológico e da proliferação das mídias sociais, es-tejamos mais que nunca isolados intra e interpessoalmente. No entanto, é só quando nos tornamos conhecidos que nos posicionamos para sermos condutores de amor. E é o amor que transforma nossa mente, possibilita o perdão e entrelaça uma comunidade de pessoas dispersas para formar a tapeçaria da família de Deus.

Atenção. O objeto da nossa atenção afeta nossa vida. Isso pode parecer óbvio, mas em geral o menos óbvio é exatamente aquilo em que estamos concentrados — afinal, boa parte das coisas ocorre de maneira automática ou inconsciente. Além disso, muitas vezes dirigimos a atenção principalmente para o que existe fora de nós. A neurociência tem muito a dizer acerca do motivo pelo qual é tão crítico para cada um de nós prestar atenção em nossos sentimentos, sensações físicas e pensamentos.

Memória e emoção. A pesquisa neurocientífica revela quão profunda é a influência da memória e da emoção, boa parte delas abaixo do nosso nível de consciência, em todos os nossos relacionamentos. A consciência dessas funções mentais leva-nos a uma intimidade maior com Deus, com nossos amigos e nossos inimigos.

Apego. Para entrarmos num relacionamento pleno com Deus, é extrema-mente útil termos plena consciência dos padrões pelos quais nos apegamos às primeiras pessoas que cuidaram de nós. Nossa maneira de formar vínculos tem correlações importantes com a estrutura e a função do nosso cérebro.

Mente integrada. Vamos explorar como a mente, quando segue sua volição, tende à desconexão. Com frequência ela conspira para esconder a verdade (as profundezas da emoção, da memória e dos padrões relacionais, bem como a realidade de um Deus que nos ama muito mais do que conseguimos imagi-nar) de nós mesmos e dos outros. Então, sofremos as consequências pessoais e coletivas. E o que significa ter a mente de Cristo? Minha tese é que isso

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inclui tê-la plenamente integrada — o princípio bíblico de “coração indiviso” —, o que nos leva para mais perto de Jesus e nos torna mais parecidos com ele. Quando prestamos atenção nos aspectos discrepantes da nossa mente que às vezes (ou até com frequência) desconsideramos, ficamos mais pareci-dos com Jesus.

Pecado e redenção. Um modo de compreender a dinâmica do pecado é vê-la como uma questão de escolher ser inconsequente, em vez de consequente, o que acaba por deixar a mente desintegrada. (Emprego o termo desintegrado em todo o livro em referência não a algo que está decaindo ou se desfa-zendo em pedaços, mas a oposto de integração, especialmente entre várias partes do cérebro.) Aliás, a história do Éden mostra como, à semelhança de Adão e Eva, estamos mais interessados em distinguir o certo e o errado (uma função dominante no hemisfério esquerdo, usado para lidar com o medo e a vergonha) do que em conhecer Deus, o que requer a integração de todas as partes do cérebro. Com nossa redenção, é possível reverter essa tendência, permitindo que cada um de nós viva com a mente integrada e desempenhe um papel maior no plano redentor divino. Podemos experimentar isso como indivíduos e, o que é mais significativo, no contexto de uma comunidade que é uma demonstração viva do amor, da misericórdia e da justiça de Deus.

Comunidade. Em 1Coríntios, o apóstolo Paulo estabelece a perspecti-va divina da comunidade, algo mais viável do que talvez já possamos ter imaginado. Quando atentamos para as várias funções da mente, podemos experimentar a misericórdia e a justiça de Deus no contexto de uma comu-nidade diferenciada e integrada. Isso se realiza por meio do amor ofertado e recebido, o que experimentamos de maneira mais poderosa no processo de sermos conhecidos.

Como Karen, vivemos num mundo que parece mais desesperado que nunca, atrás de cura, despertamento e transformação. Ainda que isso seja mais evidente em nossas lutas internas e conflitos interpessoais, aparece em toda parte. Por exemplo, à medida que avançamos em termos tecnológicos, tornamo-nos invariavelmente mais isolados em termos intra e interpessoais e com isso nos impelimos contra o princípio irrevogável que declara sem rodeios: “Não é bom que o homem esteja só” (Gênesis 2.18). Além disso, problemas globais como terrorismo, tráfico humano e aquecimento global polarizam as nações, dividindo-nos ainda mais. Como seguidores de Jesus, cremos que ele é a resposta para todas as formas de rupturas e divisões.

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Novas descobertas nos campos da neurociência e apego oferecem novos meios pelos quais podemos compreender e experimentar a vida abundante para a qual Jesus nos chamou.

Essas novas descobertas a respeito de como o cérebro e os relacionamen-tos interpessoais se moldam mutuamente são um reflexo do que tem sido transmitido pela tradição oral; escrito em histórias, poemas e instruções das Escrituras; e experimentado pelo povo de Deus por quase quatro mil anos. Em essência, Deus está empregando sua criação como um sinal, sustentando e moldando o entendimento que temos dele e apontando o caminho para Jesus. Estamos aprendendo que uma parte da boa criação divina — a neuro-ciência e o apego — fala conosco, servindo de idioma paralelo que afirma e enriquece nosso dialeto da fé condensado nas Escrituras e em nossas expe-riências espirituais.

Criação e neuroCiênCia

O apóstolo Paulo nos diz que “desde a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis” (Romanos 1.20). Todas as complicações e complexidades, desde os terremotos até os ouriços do mar, dos quarks até as órbitas dos planetas, tudo aponta para o poder e a natureza de Deus.

Assim é a criação. E Paulo afirma que, quando prestamos atenção nela, descobrimos verdades acerca do poder e da natureza de Deus. A criação aponta para Deus. É claro que não define Deus por completo — não com-preendemos Deus por inteiro ao compreendemos plenamente a criação. O caráter caprichoso de um maremoto que mata centenas de milhares de pessoas não é uma indicação de que Deus é volúvel nem deve ser usado como medida de sua misericórdia. Pelo contrário, tomada como um todo, a criação nos direciona para a força e a personalidade divinas.

Uma parte da criação é a humanidade. E um elemento muito importante que nos torna distintamente humanos é a matriz cérebro/mente. Nos últi-mos dez anos, avanços em vários campos da pesquisa científica a respeito do cérebro e dos relacionamentos interpessoais têm produzido informações empolgantes que nos ajudam a descrever melhor do que nunca como eles se moldam mutuamente.

Os campos da psiquiatria, genética, psicologia do desenvolvimento e psi-cologia comportamental, psicanálise, neurologia e neuropsicologia, neuro-biologia do desenvolvimento e neuroimagem estrutural e funcional (criação

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de imagens visuais que representam a anatomia do cérebro e sua atividade fisiológica e elétrica) contribuem para entendermos como chegamos a ser o que somos e por que fazemos o que fazemos ao longo do tempo. Cada um desses campos distintos, porém, descreve a experiência humana de uma perspectiva específica, sem integrar informações das outras áreas de estudo.

O resultado pode ser resumido na antiga história de cegos que tocam di-ferentes partes de um elefante e descrevem o animal inteiro de acordo com a parte específica que cada cego está tocando. Para um, o animal é liso e duro, como uma lança. Para outro, é de pele firme, como uma couraça, e assim por diante. Do mesmo modo, os conhecimentos dos muitos campos científicos não foram integrados num único corpo coerente de conhecimentos que des-creve como nossa mente funciona.

Em 1999, Daniel Siegel publicou o livro The Developing Mind [A men-te em desenvolvimento], um marco que descreve como seria compreender a mente de uma perspectiva mais integrada. Em outras palavras, como aqueles cegos teriam uma compreensão mais completa do elefante inteiro se conversassem entre si, integrando os dados que cada um obtém de sua perspectiva particular. É provável que cada um formasse um quadro mais preciso. Esse é o modelo que Siegel propõe para compreender a mente. Juntando descobertas comuns de campos de pesquisa distintos, temos um quadro mais completo não só de como funciona a mente, mas também das mudanças mais eficazes em benefício da saúde e da cura da mente — e, por conseguinte, em todo o resto, desde os relacionamentos até as comunida-des e a criação danificada.

Siegel dá a esse modelo integrado de compreensão da mente o nome neurobiologia interpessoal. Esse termo expressa a realidade de que a mente é, no fundo, uma confluência dinâmica e misteriosa de cérebro e experiências, e muitos aspectos deles estão profundamente (ou potencialmente) ligados de formas que com frequência nos passam despercebidas. As interações dentro dos relacionamentos interpessoais moldam e influenciam profundamente o desenvolvimento do cérebro; de igual maneira, o cérebro e seu desenvolvi-mento moldam e influenciam esses mesmos relacionamentos. Vamos ex-plorar os detalhes dos desdobramentos desse mistério considerando alguns conceitos neurocientíficos importantíssimos para a comunidade de fé.

Vale mencionar que esses vários ramos de estudo do comportamento humano raramente consideram a espiritualidade em geral ou a experiência espiritual cristã particular. Por décadas, a percepção entre muitos cientis-tas comportamentais era que o desenvolvimento espiritual é anátema para a saúde mental. Isso criou em pessoas de muitos credos uma barreira de

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desconfiança e medo contra a comunidade científica organizada de pesqui-sadores e patrocinadores, e a reação é compreensível.

Desde o início da década de 1990, porém, o lugar da espiritualidade na evolução da saúde mental e no entendimento da mente passou a ser mais aceito. O influente Handbook of Religion and Health [Manual de religião e saúde], escrito por Harold G. Koenig, Michael E. McCullough e David B. Larson, falecido, trouxe essa discussão para o centro da mesa ao ser publi-cado em 2001. Aliás, a importância do desenvolvimento espiritual é agora reconhecida por muitos pesquisadores e clínicos respeitados como uma das lentes mais importantes através das quais devemos considerar nossa vida.

Em sua articulação da neurobiologia interpessoal, Siegel lança nova pers-pectiva à importância da interseção entre a neurociência e a espiritualidade cuidadosa. A integração do que entendemos da mente e o desenvolvimento comportamental, aliado à nossa espiritualidade, torna-se agora um para-digma aceito e necessário para combater nossos problemas interpessoais e interculturais.

Menciono problemas interculturais por um bom motivo. Não é difícil imaginar como uma discussão sobre o cérebro pode aprimorar sua vida interior. Ela até pode afetar a interação que você tem com seu cônjuge ou filhos. Mas é realmente possível que tenha alguma relação com a paz no Oriente Médio? Pode parecer exagero. Mas considere a interação de Jesus com a mulher sa-maritana no capítulo 4 do evangelho de João. Pense como a autoconsciência de Jesus (apesar de não ser neurocientista) lhe permitiu transpor o profundo abismo de cultura e gênero que os separava.

Veremos como a neurobiologia interpessoal (parte da criação de Deus) nos apresenta a justiça e a misericórdia, dois temas fundamentais nas Escrituras. E somos chamados a estender essa misericórdia e justiça, espe-cialmente onde residem rupturas e conflitos culturais. O Reino de Deus é um reino de justiça e misericórdia que ele deseja disseminar até os confins da terra, englobando todos os aspectos da vida. Somos convidados a nos juntar a ele na criação e no anúncio desse Reino, até que chegue à sua plenitude na manifestação de Jesus. (Trataremos das questões de comunidade, justiça e misericórdia no capítulo 13.)

tenha em mente (nenhum troCadilho)Uma questão de confiança

Como psiquiatra, vejo como é difícil para as pessoas tomarem consciên-cia de todas as informações, sentimentos e impressões que lhes sobrevêm.

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Meu trabalho é principalmente ouvir bem, fazer boas perguntas (assim espero) e especular em voz alta acerca das descobertas que podem estar bem à porta da consciência dos meus pacientes.

Creio que uma dinâmica comum no meu papel como psiquiatra é o de engendrar confiança nos pacientes. Confiança em mim, sim, mas em última análise, confiança em si mesmos. Confiança no que sentem, compreenden-do que aqueles sentimentos brotam de uma cacofonia de vozes cujo coro lhes fala à mente, comunicando seu desejo de falar com eles. Ainda que as vozes possam soar às vezes confusas e estridentes, é principalmente essa desorganização ou a absoluta predominância de algumas sobre outras que faz o paciente não confiar em nenhuma delas — ou só confiar em algumas, excluindo outras. Mas essas vozes brotam, sim, da mente e do coração de meus pacientes. E eles devem passar a confiar em sua capacidade de ouvir e discernir o que as vozes estão tentando dizer.

Vejo de modo semelhante a criação deste livro. Nele apresento a síntese de uma grande dose de informações que têm ressoado à minha cabeça há alguns anos — mas na realidade é o produto de dúzias, se não centenas, de encontros com outras pessoas. A maior parte, aliás, corresponde à colheita da safra produzida por sementes lançadas por outros.

Tome-se de novo a obra de Dan Siegel, cujo seminário exerceu tamanho impacto em mim. Há cinco anos, este livro não seria possível. Os esforços de Dan pavimentaram o caminho para a integração dos distintos campos da saúde mental e da espiritualidade cristã que examinamos aqui. Também te-nho sido tão profundamente influenciado por muitos outros, gente amorosa, desafiadora e cheia de esperança, tanto em contato direto como mediante seus escritos, que não consigo distinguir onde terminam suas ideias e onde começam as minhas.

Citar cada ponto dos dados que contribuem para uma ideia dominante no livro pode ser bastante útil, especialmente para os pesquisadores que os comparam com os seus. No entanto, para os propósitos de um livro como este, que desafia o leitor a integrar o pensamento racional com outras formas de consciência, essas citações poderiam acabar servindo mais de obstáculos que de auxílio, valendo apenas como um exercício para organizar o pen-samento de outros. Não estou insinuando que os escritos científicos não passam disso. De modo algum. Aliás, esse é o padrão para a maior parte dos textos que apresentam dados objetivos.

Este livro, porém, não tem por objetivo principal apresentar dados. Essa forma de envolvimento é obscurecida por um modo de operação mental característico do cérebro esquerdo que se envolve com o mundo de maneira

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neurociência: uma janela para a mente || 23

lógica e linear. Tal maneira de processar é absolutamente necessária e bem--vinda, mas cresceu ao longo dos últimos quatro séculos, passando a dominar nosso modo cultural de pensar, a ponto de outras maneiras importantes de per-ceber o mundo, ou seja, as relacionadas ao cérebro direito, serem relativamente subestimadas. A pesquisa é importante e útil, mas não deve ser idolatrada.

O processo mental do cérebro esquerdo desconsidera os elementos emo-cionais de confiança do cérebro direito, necessários para que a vida deslanche. Quando sei que sei algo porque posso provar pela lógica, afasto-me da con-fiança. Quando deixo de confiar, deixo de estar aberto para ser conhecido, para estabelecer relacionamentos, para amar. Este livro convida você a confiar à medida que lê o texto e, ao fazê-lo, a passar da confiança à esperança, até que passe para a maneira seguinte de se envolver com o texto.

Ao mesmo tempo, não quero que você engula minhas palavras sem questionamento, nem acredite nelas simplesmente porque parecem fazer sentido (embora eu espere que façam). Por isso resolvi fornecer os dados científicos por trás das minhas ideias numa lista de livros que me influen-ciaram, e que você encontrará no final deste livro. Creio que eles também serão úteis se você quiser discutir mais profundamente algum aspecto do assunto aqui apresentado.

A linguagem da menteEm todo este livro as palavras cérebro e mente serão usadas com frequên-

cia. Conforme descreverei brevemente, esses termos não se referem a concei-tos idênticos, embora estejam inter-relacionados o suficiente para parecerem intercambiáveis. Entretanto, quando se fala a respeito, é importante ter cons-ciência de que a mente (ou cérebro) é fluida, em constante mudança, ainda que com frequência só de modo imperceptível. Dessa forma, a mente nunca é estática, e faremos bem se lidarmos com ela com a mesma humildade com que nos aproximamos do Deus que a criou e a moldou para refletir sua pró-pria natureza.

Não é só a mente que muda: o entendimento que os cientistas têm de como o cérebro humano funciona também está em desenvolvimento. Isso significa que, sempre que você lê “o cérebro faz isso” ou “a mente faz aquilo”, isso está mais perto de: “No momento, é assim que entendemos que o cére-bro funciona”.

A linguagem da féPor fim, é importante salientar que esta não é uma obra apologética. Não

estou, de modo algum, tentando provar a realidade das dimensões espirituais

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da vida ou uma posição teológica ou filosófica específica por meio do estudo do cérebro. Também não escrevi este livro para provar a existência de Deus ou confirmar que os seguidores de Jesus estão certos, e todos os outros, errados.

Quando você chegar ao final deste livro, não poderá dizer a um amigo: “Agora sei que Deus existe porque este livro identificou o chip espiritual no lobo temporal do meu cérebro”. Se você busca um relacionamento mais pro-fundo com Jesus, creio que este livro será útil. Se o desejo do seu coração é viver com bondade, paciência, misericórdia, benignidade e coragem, não o deixe de lado. Mas receio que você não encontrará provas empíricas aqui. Ainda que o material valide a experiência espiritual cristã, este livro não tenta escorar o cristianismo neurologicamente nem invalidar outras expe-riências religiosas. (Alguns podem ficar um tanto desapontados com isso.)

Quando a neurociência se tornou mercadoria valiosa, alguns acadêmicos proeminentes, como Steven Pinker e Daniel Dennett, tentaram de fato usá--la para provar a irrealidade de Deus e a invalidade da experiência religiosa. Parece-me que um modo de expressar a perspectiva deles é dizer que, se pudermos reduzir nossa experiência (nesse caso, com Deus) ao que pode ser medido (nossos genes e neurônios), podemos eliminar a necessidade do Deus que pensamos existir.

Essa declaração é uma simplificação exagerada da posição desses estudio-sos, mas meu ponto aqui é o seguinte: penso que é justo dizer que no íntimo (ainda que talvez não na superfície), a maioria ou deseja crer em Deus e ter um relacionamento com ele, ou não. De um modo ou de outro, encontrare-mos meios para que nosso hemisfério esquerdo “prove” aquilo pelo qual nos-so hemisfério direito anseia — ou está temeroso demais para desejar. Este livro, portanto, não provará nada. Mas, se você tem fome e sede de Deus e se de algum modo sente que em Jesus você estará mais perto de satisfazer essa fome ou saciar essa sede, sinta-se livre para mergulhar por inteiro. Espero que você aprecie o que descobrirá aqui.