Considerações sobre a evolução filogenética do SN

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  • 7/31/2019 Consideraes sobre a evoluo filogentica do SN

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    Consideraes sobre a evoluo filogentica do

    sistema nervoso, o comportamento e a emergncia

    da conscincia

    Considerations about the nervous system phylogeneticevolution, behavior, and the emergence of

    consciousness

    Resumo

    Tendo como base dados de literatura, esta reviso trata dos aspectos genricos da evoluo filogentica do sistema nervoso

    central, ressaltando em particular o desenvolvimento evolutivo das estruturas enceflicas relacionadas com o comportamento ecom as funes cognitivas que vieram caracterizar o ser humano. Sobre as estruturas lmbicas, que por ocasio do advento dosmamferos evolutivamente se desenvolveram sobre o topo do sistema nervoso mais primitivo dos seus ancestrais, o ulteriordesenvolvimento cortical com neurnios dispostos em camadas constituiu a base estrutural que viabilizou a discriminao finadas funes sensitivas e sensoriais, a maior complexidade das funes motoras e o desenvolvimento das funes cognitivas eintelectuais que acabaram caracterizando o ser humano. O conhecimento da evoluo filogentica do sistema nervoso central nospermite inferir possveis correlaes entre as estruturas enceflicas que se desenvolveram ao longo do processo evolutivo e ocomportamento dos seus respectivos seres. Nesta direo, sem se deter em questes de ordem conceitual, a presente revisotermina discutindo possveis paralelos entre a evoluo do sistema nervoso central e a emergncia da conscincia, luz dasrecentes contribuies sobre o assunto.

    Descritores: Filogenia; Neuroanatomia; Sistema lmbico; Manifestaes neurocomportamentais; Estado de conscincia

    Abs tract

    This text reviews the generic aspects of the central nervous system evolutionary development, emphasizing the developmentalfeatures of the brain structures related with behavior and with the cognitive functions that finally characterized the human being.Over the limbic structures that with the advent of mammals were developed on the top of the primitive nervous system of theirancestrals, the ultimate cortical development with neurons arranged in layers constituted the structural base for an enhancedsensory discrimination, for more complex motor activities, and for the development of cognitive and intellectual functions thatfinally characterized the human being. The knowledge of the central nervous system phylogeny allow us particularly to inferpossible correlations between the brain structures that were developed along phylogeny and the behavior of their related beings.In this direction, without discussing its conceptual aspects, this review ends with a discussion about the central nervous systemevolutionary development and the emergence of consciousness, in the light of its most recent contributions.

    Descriptors: Phylogeny; Neuroanatomy; Limbic system; Neurobehavioral manifestations; Consciousness

    1 Departamento de Cirurgia, Faculdade de Medicina, Universidade de So Paulo (USP), So Paulo (SP), Brasil

    Rev Bras Psiquiatr. 2006;28(4):326-38

    ARTIGO ESPECIAL

    Guilherme Carvalhal Ribas1

    Financiamento: Inexistente

    Conflito de interesses: Inexistente

    Submetido: 19 Maio 2006Aceito: 31 Julho 2006

    Correspondncia

    Guilherme Carvalhal Ribas

    Rua Prof. Eduardo Monteiro, 567

    05614-120 So Paulo, SP, Brasil

    Fax: (55 11) 3744-5063 / 3747-3508E-mail: [email protected]

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    In t roduo

    A anlise da evoluo filogentica do sistema nervoso per-mite a compreenso da sua morfologia, que sejam inferidasrelaes entre os desenvolvimentos e interaes das estrutu-ras nervosas e os possveis comportamentos dos seus respec-tivos seres, e suscita questionamentos sobre a prpria noode fenmenos, como a conscincia.

    A presente reviso trata da filognese do sistema nervoso,

    descrevendo as principais aquisies pertinentes s mais im-portantes etapas evolutivas, destacando o desenvolvimento dasestruturas nervosas relacionadas com os comportamentos dosseus respectivos seres. Para tanto, este artigo se inicia comconsideraes genricas sobre a filognese, continua comcomentrios sobre os primrdios do sistema nervoso e sobre asua evoluo nos vertebrados mais primitivos, trata a seguirmais pormenorizadamente da sua evoluo nos mamferos emgeral e nos primatas em particular e, aps breves comentriossobre o possvel paralelismo existente entre a filognese e aontognese, encerra-se com consideraes pertinentes evo-luo da organizao do sistema nervoso e conseqenteemergncia da conscincia.

    A filognese como ferramenta de estudo daneuroanatomia do comportamento

    Para Sarnat, do ponto de vista anatmico, h trs maneirasbsicas de se estudar o sistema nervoso central (SNC).1 Aprimeira consiste em estudar a simples disposio espacialdas suas estruturas j desenvolvidas, campo de estudo deno-minado neuroanatomia; a segunda, em estudar o seu desen-volvimento ontogentico*;e a terceira, em estudar o seu de-senvolvimento filogentico - ocorrido ao longo da chamadaevoluo das espcies -, o que feito principalmente atravsda paleontologiae da anatomia comparada.

    Para a discusso de consideraes de ordem anatmica per-tinentes a questes comportamentais, paralelamente s rele-

    vantes contribuies experimentais em animais e s observa-es clnicas em seres humanos, a anlise dos conhecimentosexistentes sobre a evoluo filogentica das estruturas nervo-sas nos parece ser particularmente til, uma vez que ela nospossibilita fazer especulaes sobre o aparecimento, o desen-volvimento e o embricamento dessas estruturas e as possveiscaractersticas e comportamentos dos seus respectivos elemen-tos evolutivos. Ao propiciar uma viso progressiva das comple-xidades nervosa e comportamental ao longo da evoluo, aanlise f i logentica tambm acarreta, a cada passo,questionamentos sobre a prpria conceituao de termos comoconscincia e psiquismo, entre outros, principalmente por pro-piciar especulaes sobre os possveis paralelos comportamentais

    existentes entre as diferentes espcies e o prprio ser humano.Em relao ao processo evolutivo, importante lembrar queeste diz respeito a mudanas que ocorreram por fora de fato-res principalmente ambientais que influenciaram todos os seresvivos, e no atravs de simples adies terminais de novasestruturas. Os processos evolutivos tm como principais de-nominadores comuns a adaptao, a expanso da diversidadee o aumento da complexidade.2-5

    Do ponto de vista evolutivo, o que ns, seres humanos,temos em comum com outros animais apenas o fato de quenos originamos de elementos ancestrais comuns hoje extin-tos e que deram origem a diferentes espcies que, por suavez, sofreram as suas prprias evolues.2-3 Enquanto, porexemplo, os vertebrados mais primitivos no possuam qual-quer crtex, hoje mesmo os animais menos complexos apre-sentam algum manto cortical, uma vez que eles tambm so

    produtos de uma longa evoluo; portanto, o que mais dis-tingue o crebro humano no a simples existncia da nos-sa chamada camada neocortical, mas sim a sua dimensoe, principalmente, a sua organizao.1,6-9 Ao longo de mi-lhes de anos, o SNC dos vertebrados se desenvolveu atatingir a complexidade do SNC humano, e particularmenteinteressante e intrigante como o desenvolvimento embrion-rio e fetal** do SNC humano refaz grosseiramente este mes-mo curso, conforme ser discutido adiante.10-11

    As maiores dificuldades dos estudos filogenticos evidente-mente se devem escassez de informaes sobre os elemen-tos j extintos, ao longo tempo necessrio para observao dequaisquer mudanas evolutivas naturais ou experimentais e

    veracidade das inferncias sugeridas pelos estudos de anato-mia comparada. O desenvolvimento de tcnicas deseqenciamento do DNA seguramente propiciar avanos nestecampo, dadas as suas possibilidades de comparar genomasde diferentes espcies e mesmo de espcies extintas.

    Consideraes sobre a evoluo filogentica inicialdo SNC

    Os primeiros seres vivos foram organismos unicelulares,sendo que o seu fssil mais antigo at hoje conhecido foidenominado Eobactria e data de aproximadamente 3,4 bi-lhes de anos. O nvel de organizao a seguir atingido pelaschamadas clulas eucariticas as tornou capazes de se dividire se reproduzir; a ocorrncia de mecanismos de simbiose fez

    surgir os primeiros organismos multicelulares h cerca de700 milhes de anos. Esses organismos logo invadiram o meiomarinho, onde encontraram condies mais estveis para asua evoluo, vindo a dar origem a peixes primitivos com es-queletos mineralizados h aproximadamente 570 milhes deanos.2-3,8,12

    Desde os seres vivos mais primitivos, a principal funo dosistema nervoso propiciar a adaptao ao meio ambientee, para tanto, se fazem necessrias trs propriedades impor-tantes: irritabilidade, condutibilidade e contratilidade. Assim,um ser unicelular, como uma ameba, ao ser estimulado,afasta-se de onde foi tocado, evidenciando que o sistemanervoso nestes seres vivos corresponde s prprias estrutu-

    ras da sua superfcie.1,13-14

    Com a evoluo dos seres vivos, as suas funes evidente-mente foram se tornando mais complexas, surgindo clulasespecializadas para cada funo e desenvolvendo-se uma or-questrada coordenao entre o controle da vida de relaocom o meio externo e o prprio controle da economia internadestes organismos.

    Nas esponjas, os receptores de superfcie passaram a trans-

    *Ontogenia: estudo do desenvolvimento do indivduo desde a fecundao at a maturidade para a reproduo.Filogenia: estudo das relaes existentes entre as diferentes espcies de vertebrados no que diz respeito s suas localizaes no processo deevoluo das espcies.Paleontologia: estudo das espcies j extintas.Anatomia comparada: estudo das diferenas anatmicas entre as diferentes espcies existentes.

    **O perodo embrionrio estende-se da fecundao at a 8 semana, e o perodo fetal da 8 semana at o nascimento.

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    formar os diferentes estmulos fsicos e qumicos em impulsosnervosos, como verdadeiros rgos de sensibilidade, e osmsculos e glndulas se desenvolveram como rgosefetores.3,8 Nos metazorios mais diferenciados, as clulasmusculares passaram a se localizar mais profundamente e,nas suas superfcies, as clulas se diferenciaram para discri-minar os di ferentes estmulos do meio ambiente. Noscelenterados, as clulas especializadas em irritabilidade e

    condutibilidade passaram a se caracterizar como clulas ner-vosas propriamente ditas. Nas anmonas do mar j existemclulas nervosas unipolares com prolongamentos que fazemcontato com as clulas musculares situadas profundamente.Admite-se, assim, que redes de neurnios propriamente ditostenham surgido h cerca de 700 milhes de anos em seresmarinhos ainda invertebrados.15

    Paralelamente ao aprofundamento dos msculos e ao de-senvolvimento de diferentes receptores sensitivos, nosplatelmintos e aneldios o sistema de coordenao, antesdifuso, passa tambm a se agrupar, caracterizando a centrali-zao do sistema nervoso. Esta centralizao aparentementefoi conseqente s foras da seleo natural, dada a maior

    vulnerabilidade das estruturas superficiais e a necessidade decoordenao de respostas mais complexas.3,13

    Nos aneldeos, alm do neurnio sensitivo, j se encontramdesenvolvidos neurnios eferentes, cujos axnios se ligam aomsculo e desencadeiam a resposta motora. A conexo doneurnio sensitivo como o neurnio motor se faz atravs desinapse, caracterizando-se, assim, os elementos bsicos de umarco reflexo simples, segmentar. O elemento mais simples quepossui um sistema nervoso bsico, porm completo, a hidra.Ao contrrio das esponjas, que so seres vivos que no semovimentam, a hidra j se locomove. O seu corpo constitudopor uma camada externa (ectoderma) principalmente sensiti-va, por uma camada interna (endoderma) responsvel pelosprocessos de digesto e de eliminao de detritos alimentares e

    por uma fina camada intermediria (mesoderma).13Em seguida evolutivamente, apareceram os neurnios de

    associao, que passaram a viabilizar a interao de um seg-mento com outro: o axnio do neurnio sensitivo passou afazer sinapse com o neurnio de associao que, por sua vez,ao fazer sinapse com o neurnio motor do segmento vizinho,viabilizou o arco reflexo intersegmentar. O conhecimento dasconexes dos neurnios do sistema nervoso da minhoca, porexemplo, j nos permite entender algumas das conexes damedula espinhal dos vertebrados.1,3,13

    A integrao anatmica dos nveis segmentares e dosneurnios de associao intersegmentares passou a consti-tuir a medula espinhal e, no seu topo, desenvolveram-se cen-

    tros nervosos que controlam o funcionamento do corpo e assuas reaes ao meio externo. Esses agrupamentos neuronaisdesenvolvidos no topo medular passaram a constituir os equi-valentes dos futuros tronco enceflico e do hipotlamo e, emconjunto com a medula, compuseram o SNC mais bsico ecomum a todas as espcies e j existente nos primeiros ani-mais vertebrados, que foram os peixes mais primitivos quesurgiram h cerca de 400 milhes de anos.1,3

    Agregados neuronais dispostos centralmente e ao longo das

    pores mais superiores do segmento correspondente ao tron-co enceflico vieram constituir a chamada formao reticular,que nos elementos mais primitivos , principalmente, respon-svel por regulaes posturais atravs de influncias retculo-espinais e pelo controle de funes orgnicas em conjunocom o hipotlamo. Posteriormente, com o desenvolvimentode estruturas nervosas mais superiores, a formao reticularveio a ser tambm responsvel pelo ciclo sono-viglia e por

    mecanismos relacionados com a ateno por meio da atua-o do chamado sistema reticular ativador ascendente.13,16-18

    O conglomerado celular no hipotlamo provavelmentecorresponde poro filogeneticamente mais antiga do encfaloe, desde os seus primrdios, exerceu o controle interno dosdiferentes organismos atravs da sua atividade neurosecretria,sendo responsvel pelo controle do metabolismo da gua eeletrlitos, da termorregulao, do sistema nervoso autno-mo, do apetite e pelo controle endcrino propriamente dito jnos vertebrados mais primitivos. Nestes, a proeminnciahipotalmica basal, denominada tuber cinereum, que abrigaos neurnios cujos axnios constituem a haste hipofisria,constitui a maior parte do hipotlamo.1

    Os elementos primordiais do cerebelo e dos tratosespinocerebelares tambm comeam a se mostrar mais evi-dentes nos peixes primitivos, principalmente medida queestes desenvolvem as suas musculaturas do tronco. O corpoconstitudo por estes conglomerados celulares cerebelaresprimitivos equivale ao vermis dos vertebrados mais evoludos.1

    Sobre esta constituio bsica e fundamentalmente segmen-tar do SNC dos primeiros vertebrados, as foras evolutivas de-sencadearam a continuidade do desenvolvimento nervoso emfuno dos eventos a que estes elementos e os seus descen-dentes vieram a ser submetidos. Entre estes eventos, desta-cam-se a incurso terrestre que estes seres marinhos vieram aefetuar e o ulterior desenvolvimento dos mamferos. que culmi-nou com o surgimento dos primatas e do ser humano.3,8-9

    O desenvolvimento neural decorrente do advento dosanfbios e rpteis

    As primeiras plantas comearam a cobrir os continentes ain-da desertos h cerca de 400 milhes de anos. Elementos ma-rinhos evoluram vindo a constituir os anfbios e rpteis primi-tivos, que ento ousaram sair do mar h aproximadamente 350milhes de anos.3 Sair do oceano constituiu para esses ele-mentos um desafio de enormes propores, uma vez que re-quereu grandes mudanas necessrias principalmente paravencer o seu prprio peso, evitar a perda excessiva de lquidose mudar a maneira de respirar, o que causou o desenvolvimen-to de novos modos de reproduo e de novas maneiras de per-

    ceber e de se relacionar com o mundo externo.Entre as vrias mudanas desencadeadas pelas novas in-curses terrestres, as foras evolutivas causaram no sistemanervoso o desenvolvimento progressivo dos lobos olfatrios,que fizeram do olfato a primeira modalidade sensorial de per-cepo do mundo externo. Concomitantemente, os desenvol-vimentos dos primrdios das estruturas que vieram a originaro complexo amigdalide e o hipocampo, em embricada con-juno com o hipot lamo, vieram tornar o compor tamento

    Ramo de vermes achatados dorsoventralmente, hermafroditas, que compreende parasitas como as tnias e os esquistossomos.Ramo de invertebrados que compreende animais de forma alongada e corpo segmentado, sendo os seus principais representantes as minhocas.Os animais com medulas nervosas compem o filo dos cordados e os que possuem vrtebras pertencem ao subfilo dos vertebrados e os

    sanguessugas.

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    destas novas espcies mais complexo e mais sofisticado.1 Porse disporem em torno do topo do segmento que constitua oSNC mais primitivo, essas estruturas foram denominados es-truturas lmbicas, uma vez que Limbus, em latim, significaanel. A amgdala (Gr. amndoa) e o hipocampo (Gr. cava-lo-marinho) receberam estes nomes pelas suas conformaesfinais.19-20

    Enquanto que nos anfbios o hipocampo ainda muito ru-

    dimentar, correspondendo somente poro mais dorsomedialda parte mais anterior do seu crebro, nos rpteis j surge oseu aspecto laminar cortical mais primitivo e denominado dearquicrtex.1,21-22

    As amgdalas se formam atravs da confluncia de vriosncleos ao longo da filognese.1 Situadas anteriormente acada hipocampo j nos animais mais primitivos, recebem ba-sicamente eferncias olfatrias e se relacionam principalmentecom os prprios hipocampos e com o hipotlamo.13,21

    Dado o surgimento imbricado das estruturas olfatrias,hipocampais e do complexo amigdalide, a primeira modali-dade de memria adquirida pelos vertebrados mais primitivosfoi a memria olfativa, que veio permitir que esses animais

    pudessem assim identificar nutrientes, elementos venenosos,parceiros sexuais, presas e predadores. Enquanto uma cama-da de clulas desse crtex primitivo passou a possibilitar aidentificao e a categorizao do cheiro, a atuao de umasegunda camada de clulas passou a desencadear o compor-tamento apropriado quela situao, portanto um comporta-mento j inteligente e no automtico. Por sua vez, as co-nexes existentes entre as mencionadas estruturas lmbicas eo hipotlamo, principal coordenador da vida vegetativa, propi-ciaram o desenvolvimento de sensaes bsicas como asaciedade, o desejo sexual e o medo, que ento constituramos primrdios da vida emocional. Do ponto de vista biolgico ecomportamental, interessante aqui ressaltar que o ato decopular aparece pela primeira vez ao longo da evoluo com

    os rpteis,3 constituindo, portanto, um fenmeno intrinseca-mente relacionado com estas mesmas estruturas lmbicas eneurovegetativas.

    O desenvolvimento enceflico dos mamferos

    Os hipocampos e as estruturas que com eles se desenvolve-ram com a evoluo dos mamferos - entre as quais se desta-cam os frnices e as reas corticais adjacentes -, so denomi-nados conjunto de formao hipocampal13,20-21,23 e, do pontode vista funcional, tornaram-se os responsveis pela aquisi-o da capacidade de armazenar informaes, viabilizando,portanto, o que se conceitua como memria e aprendizado.

    Nos mamferos menos evoludos, o hipocampo ainda ocu-

    pa uma posio dorsal ao longo de cada parede medial doshemisfrios cerebrais e apenas com o posterior desenvolvi-mento do neocrtex e do corpo caloso que os hipocamposvieram a ser deslocados posterior, inferior e lateralmente.1

    Este deslocamento hipocampal pstero-inferior que ocorreem torno do tlamo que origina as caracterizaesanatmicas do frnix sob o corpo caloso e do indsio cin-zento sobre o corpo caloso, que constituem, portanto, verda-deiros prolongamentos do hipocampo. Com este deslocamentodo hipocampo, o espao entre o frnix e o tlamo passa aconstituir a fissura coriidea.18,21,24

    interessante ressaltar que esse crtex hipocampal maisprimitivo possui uma substncia branca correspondente situadaexternamente, de maneira equivalente disposio da subs-

    tncia branca da medula e do tronco cerebral, e que este

    arranjo persiste durante toda a evoluo, inclusive no ho-mem, com o hipocampo coberto pelo chamado alveus, que ,portanto, constitudo pelos axnios que originam a fmbria dofrnix. O grande desenvolvimento ulterior do neocrtex e docorpo caloso, que ocorre de forma a encobrir as vesculas ouventrculos telenceflicos, acaba fazendo com que oshipocampos situados nas suas paredes mesiais passem a seras nicas superfcies corticais intraventriculares.

    As amgdalas, que por sua vez se relacionam funcional-mente com a gnese das emoes (que nos animais primiti-vos dizem respeito basicamente s reaes do tipo de alerta,de fuga e vegetativas e que visam fundamentalmente a so-brevivncia e a manuteno da espcie), desde os seusprimrdios se relacionam topogrfica e funcionalmente comas estruturas ipsolaterais que compem cada formaohipocampal. Por ocasio do ulterior desenvolvimento doneocrtex, desenvolvem-se inter-relaes principalmenteentre as amgdalas e as pores mais anteriores dos hemis-frios cerebrais.17,21,25

    Com o desenvolvimento do neocrtex dos mamferos, hcerca de 230 milhes de anos, o progressivo aumento do

    nmero e da complexidade dos estmulos sensitivos gerais (sen-sibilidade tctil, trmica, dolorosa e profunda) e sensoriais(gustao, audio e principalmente viso), que passaram aser processados pelo SNC, requereu tambm o desenvolvi-mento de uma estrutura receptora e integradora de todas es-tas eferncias. Os conglomerados de ncleos desenvolvidosna base de cada hemisfrio cerebral para este fim vieram aconstituir os tlamos (Gr. cmara interna, provavelmentepor constituir, de cada lado, parte da parede lateral da cavida-de central que o III ventrculo),22 que ento se situaramsobre o topo do sistema nervoso j pr-existente. Por acabarse situando inferiormente a ambos os tlamos, a regio quealberga os ncleos responsveis principalmente pela vidavegetativa e controle neuroendocrinolgico , portanto,

    justificadamente denominada de hipotlamo.O desenvolvimento evolutivo dos tlamos ocorreu

    concomitante com o dos hemisfrios cerebrais, dadas as es-treitas inter-relaes destas estruturas, com os tlamos vindoa se caracterizar como conglomerados de centros receptorese integradores de estmulos aferentes e as estruturashemisfricas cerebrais como centros de coordenao e de dis-criminao. As numerosas inter-relaes existentes entre ostlamos e o crtex dos hemisfrios cerebrais, constitudas prin-cipalmente pelas projees talmicas, geram uma situaode interdependncia entre o diencfalo e o telencfalo que sereflete praticamente sobre todas as funes corticais.13,17,21

    Apesar do tlamo a princpio se constituir primariamente

    como sendo um grande centro receptor, o fato dessa estruturaj receber as informaes de forma discriminada por meio devias especficas e que terminam em ncleos talmicos distin-tos j possibilita que ocorram percepes tambm j em partediscriminadas em nvel subcortical, deixando para o crtex aexecuo de um papel mais analtico, modulador e integradorcom outras reas corticais.13,17,21,23 interessante ressaltar quea nica via aferente que se projeta diretamente sobre o crtexsem passar pelo tlamo a que veicula a olfao, uma vezque esta modalidade sensorial filogeneticamente bem maisantiga do que as estruturas talmicas e hemisfricas.

    Enquanto os primitivos anfbios no possuam qualquer ele-mento hemisfrico telenceflico bem desenvolvido, os rpteisj apresentavam os j mencionados lobos olfat ivos, hipocampos,

    amgdalas e septum , constitudo pelos ncleos septais. Alm

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    destas, as outras estruturas telenceflicas mais primitivas soos corpos estriados de cada hemisfrio, que so particular-mente relacionados com as funes motoras.1

    Do ponto de vista morfolgico, a progressiva incorpora-o de novas estruturas e o estabelecimento de novas co-nexes se fizeram de maneira a no acarretar um aumentoexagerado de volume e, para tanto, as estruturas axiais maisprimitivas do SNC foram sendo dobradas sobre si mesmas

    originando flexuras, e as estruturas mais novas foram tam-bm se curvando de maneiras variadas e de forma a envol-ver as anteriores. Este processo, que visou principalmenteotimizar a disposio espacial dos diversos componentes doSNC ao longo da evoluo, o responsvel pela conforma-o final do SNC no ser humano, e explica porque muitasdas estruturas telenceflicas profundas e superficiais se dis-pem em forma de C em torno do seu centro constitudopor ambos os tlamos que se encontram dispostos no topodo tronco enceflico.1,18,24,26

    O corpo estriado, que se dispunha como uma massa nicade cada lado do topo do tronco enceflico dos seres maisprimitivos, foi evolutivamente dividido ao meio pelas conexes

    tlamo-corticais e pelas fibras de projeo originadas no crtexe advindas do desenvolvimento do neocrtex nos mamferos.Isso deu origem ao ncleo caudado medialmente e putamelateralmente, separados, portanto, pela cpsula interna.1 Doponto de vista evolutivo, a amgdala denominada dearquiestriado, o globo plido de paleoestriado e o ncleocaudado e o putame de neoestriado.22

    Em relao superfcie cerebral, estudos de citoarquiteturasugerem que o seu desenvolvimento ocorreu conforme umadeterminada organizao topogrfica. Os crtices mais anti-gos, constitudos pelo arquicrtex (hipocampo) e pelopaleocrtex (crtex piriforme ou olfatrio) dos rpteis primiti-vos, originaram ao seu redor um crtex intermedirio que, aseguir, gerou um primeiro anel concntrico constitudo por

    um crtex mais diferenciado (seis camadas). Este, ao se de-senvolver, originou as estruturas parahipocampais da facemedial dos hemisfrios (giros paraterminal, paraolfatrio, docngulo e parahipocampal) e o crtex insular lateralmente.Posteriormente, desenvolveu-se em cada hemisfrio um outroanel lateral (constitudo pelo neocrtex mais diferenciado),que originou as reas corticais paralmbicas e parainsularesconstitudas pelos crtices especializados (crtex motor, sen-sitivo, auditivo e visual).1,18,22

    Dada a constituio trilaminar do arquicrtex e a constitui-o j com seis camadas - mas ainda mal caracterizadas - dopaleocrtex, ambos so atualmente denominados de alocrtex,em contraposio ao neocrtex constitudo por seis camadas

    bem distintas, que denominado de isocrtex. Apesar de tam-bm j possuir seis camadas, o crtex das reas adjacentesao hipocampo e o crtex da nsula so tambm denominadosde mesocrtex, por terem uma citoarquitetura intermediriaentre o arquicrtex e o neocrtex1,13,18,21-22,27-29

    Do ponto de vista anatmico, o derradeiro desenvolvimentocort ical se fez atravs da ocorrncia de progressivasinvaginaes e dobraduras da superfcie cerebral ao longo detoda a sua extenso, gerando, assim, os seus sulcos e fissuras.Esse processo visou fundamentalmente a expanso da super-fcie cerebral sem que houvesse um aumento proporcional doseu volume cerebral e acabou sendo o principal responsvelpela morfologia final da superfcie cerebral humana, tipica-mente caracterizada pelos seus giros ou cincunvolues dis-

    postas entre os seus sulcos e fissuras. A eficincia deste pro-

    cesso poupador de espao pode ser apreciada pela observaodo fato de que, considerando a fissura inter-hemisfrica, cer-ca de dois teros da superfcie cortical humana se encontramcomo que soterradas nos seus sulcos e fissuras, dispondo-se,ento, como reas que se confrontam no interior destas de-presses e que se continuam ao longo dos seus bojos.18,29

    Definem-se como sulcos os espaos que separam e que

    delimitam os giros cerebrais. Quando pronunciados eanatomicamente constantes, os sulcos so denominados defissuras. Dada a anatomia das meninges que recobrem o SNC,os sulcos e f issuras consti tuem expanses do espaosubaracnideo.29-30

    Ao longo da evoluo, os animais podem ser classificadosem lisencfalos e em girencfalos conforme possuam opallium ou o manto cerebral liso (como os rpteis e as aves),ou j apresentem sulcos delimitando giros, o que se iniciacom o advento dos mamferos. Os primeiros sulcos que sur-gem na superfcie cerebral ao longo da filognese so os sul-cos hipocampal e rinal.1,18

    Evolutivamente, o sulco hipocampal surge em funo dodeslocamento nfero-lateral do hipocampo e acaba delimitan-

    do o aspecto mais medial desta estrutura do subiculum , quej parte do giro hipocampal. Uma vez que o hipocampo uma estrutura constituda por arquicrtex e o subiculum porpaleocrtex, o sulco hipocampal, portanto, delimita estas duasreas corticais mais primitivas.1

    O sulco rinal, por sua vez, surge como decorrncia do des-locamento ventral da rea olfatria lateral, ou crtex piriforme,causado pelo desenvolvimento do neocrtex temporal adja-cente. Como a rea olfatria lateral constituda por paleocrtex,o sulco rinal ento delimita o paleocrtex do neocrtex.1

    A fissura lateral ou silviana surge evolutivamente de formasui generis, no sentido em que ela constitui o nico sulcocerebral que no decorrente apenas de um processo de

    invaginao, sendo tambm devida a um fenmeno de justa-posio de duas superfcies cerebrais. Esta ocorrncia evolutivase deve aos progressivos desenvolvimentos das pores fron-tais dorso-laterais e da poro superior do lobo temporal, queacabam por encobrir o mais antigo crtex insular de cadahemisfrio, constituindo, acima desta, a fissura silviana queabriga a cisterna silviana.1,18,29-30 As pores cerebrais que as-sim encobrem as nsulas so denominadas de operculares(do latim: cortinas) frontais e temporais.19,22

    A fissura silviana - que separa os lobos frontal e temporal -e o sulco central ou de Rolando - que separa os giros pr eps-centrais -, j se encontram presentes nos primeirosprimatas. Os antropides, como o orangotango, o chimpanze o gorila, j possuem uma disposio sulcal relativamente

    semelhante do homem, sendo que as suas maiores diferen-

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    as residem na anatomia dos sulcos frontais que se desenvol-vem mais marcadamente por ocasio da caracterizao docrtex humano. No entanto, importante tambm mencionarque a complexidade do seu padro no por si unicamenteresponsvel pela maior diferenciao do crtex humano, umavez que outros animais, como os elefantes e as baleias, almde possurem encfalos maiores, tambm exibem maior com-plexidade das suas disposies de sulcos e giros.1,9,31

    Concomitantemente com o crescimento do neocrtex, de-senvolveu-se um volumoso e intricado contigente de fibras cons-titudas principalmente pelos axnios dos seus neurnios e pe-los axnios que se originam nos tlamos e que se dirigem paraas diversas reas corticais, denominadas radiaes talmicas.

    Este universo de feixes e tratos tem como finalidade conectaros diferentes centros e ncleos nervosos entre si, e compos-to basicamente por dois contingentes de fibras. O primeiro,denominado de fibras de projeo, composto por fibras quese originam no crtex e que se dirigem para centros nervososmais inferiores (entre as quais se destacam as fibras relacio-nadas com a motricidade), e pelas radiaes talmicas (sen-sitivas e sensoriais). Ao convergirem centralmente, as fibras

    de projeo constituem a chamada cpsula interna. O segun-do contigente formado pelas fibras de associao, que sesubdividem em intra-hemisfricas e inter-hemisfricas, estasltimas tambm denominadas de comissuras, das quais a maisimportante o corpo caloso.13,17-18,21,24

    Dadas as suas importncias funcionais, cabe aqui tambmdestacar as fibras que constituem o sistema reticular ativadorascendente e o feixe prosenceflico medial. As fibras que com-pem o sistema reticular ativador ascendente se originam nosncleos da formao reticular ponto-mesenceflica, projetam-se em ambos os hemisfrios cerebrais por meio do tlamo epor vias extra-talmicas, e so responsveis pelo ciclo sono-viglia e por mecanismos relacionados com ateno. O feixeprosecenflico medial, por sua vez, se dispe entre os ncleos

    septais, ncleos hipotalmicos e ncleo interpeduncular domesencfalo, constituindo a principal via de ligao entre asestruturas lmbicas e a formao reticular, veiculando basica-mente estmulos viscerais.16-18,21

    Consideraes sobre a evoluo cerebral dos primatas

    O grande desenvolvimento do SNC que ocorreu durante aevoluo dos vertebrados e dos mamferos em particular, como advento do neocrtex se fez de maneira marcadamente des-proporcional em relao ao desenvolvimento do restante docorpo destes animais, caracterizando um fenmeno evolutivodenominado encefalizao.1,9,32-34 Segundo a teoriaevolucionista, tanto o aumento do volume enceflico quanto

    a especializao progressiva das suas estruturas ocorreramem funo das foras evolutivas ambientais e como conseqnciado prprio desenvolvimento de novas capacidades.8,31,33

    Os primeiros primatas, denominados Ramapithecus, surgi-ram no continente africano h 50 milhes de anos, e hcerca de 13 milhes de anos vrios sculos de estiagem tor-naram o clima das florestas mais seco, fazendo com que al-guns destes primatas primitivos sassem das florestas em dire-o s savanas. Os primatas que permaneceram nas florestasevoluram como chimpanzs, gorilas e orangotangos, enquantoos que saram deram origem aos nossos ancestrais.3,33 Pro-

    gressivamente, estes ltimos passaram a andar de forma ere-ta, o que liberou as mos para a execuo de manipulaesmais complexas e acarretou o desenvolvimento da funo vi-sual em detrimento da olfao, que ento involuiugradativamente. Esses fenmenos evidentemente foram acom-panhados no s de alteraes corpreas especficas, mastambm do desenvolvimento particular de reas neocorticaisespecializadas para estes fins.3,9,31,33

    Em relao viso, em particular, enquanto os animaisque possuem os olhos posicionados lateralmente enxergamcampos visuais diferentes com uma pequena superposiocentral que propicia a simples continuidade de ambas as vi-ses, o alinhamento das rbitas que se desenvolveu nosprimatas passou a possibilitar a visualizao de um mesmocampo visual a partir de dois pontos de vista ligeiramente dife-rentes. A integrao neural destas duas imagens veio propor-cionar a percepo de profundidade, que caracteriza a cha-mada viso tridimensional ou estereoscpica. Esta significati-va evoluo visual proporcionou uma percepo bem maisapurada do meio ambiente e ocorreu custa de um grandedesenvolvimento do crtex visual e das vias de associao

    visual, o que anatomicamente refletido pelo maior volumedos plos occipitais e pelas grandes dimenses das poresposteriores do corpo caloso.8,9,35

    Os homindeos mais antigos conhecidos so os membros dognero Australopithecus, ou macacos meridionais, que sur-giram h cerca de 4 milhes de anos. O fssil correspondentemais antigo que foi encontrado conhecido como Lucy e um membro da espcie Austra lopithecus Afarensis, assimdenominada por ser oriunda de uma regio da Etipia conhe-cida como Afar. Estes primeiros homindeos j caminhavameretos, tinham aproximadamente 1,40 m de altura, j viviamem grupos sociais e, muito provavelmente, eram cobertos deplos como os chimpanzs modernos. Os seus crebros pos-suam volume de aproximadamente 400 cm3, equivalente ao

    tamanho dos crebros dos chimpanzs adultos modernos e dehumanos recm-nascidos.3,7-9,33-34

    Os primeiros membros do gnero Homo*** surgiram haproximadamente 2 milhes de anos. O chamado Homo habilis,j capaz de fabr icar instrumentos e ferramentas simples, du-rou apenas cerca de 500 anos e o seu sucessor, Homo erectus,aprendeu a controlar o fogo, espalhou-se pelo mundo a partirda frica, e durou cerca de 1,5 milho de anos. Os volumesdos seus crebros variavam de 700 a 1.200 cm3. O homemmoderno, ou Homo sapiens, se originou na frica entre 150a 100 mil anos atrs, conforme o registro fssil de uma mu-lher, denominada de Eva, que data de 125 mil anos. Com umvolume cerebral j de aproximadamente 1.400 cm3, o conhe-

    cido fssil humano denominado Homem de Cro-Magnon, des-coberto na Frana em 1864, data de aproximadamente 80.000anos e corresponde ao gnero que povoou a Europa. A deno-minao Homo sapiens sapiens diz respeito ao homem mo-derno que evolutivamente data de 50 mil anos.6-7,31,33

    O chamado Homem de Neanderthal surgiu h 150 mil anos,possua um tamanho cerebral ligeiramente maior que o dosseres humanos, com cerca de 1.500 cm3, mas a sua duraofoi transitria por razes ainda no esclarecidas.7,33-34

    O fenmeno de encefalizao pode ser mensurado objetiva-mente por meio do chamado quociente de encefalizao,

    *** Termo proposto pelo cientista sueco Carlos Lineu (1707-1778), que fez a clssica classificao do reino animal que ficou conhecida como

    classificao de Lineu.

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    que calculado pela relao existente entre o tamanho realdo crebro e o seu tamanho esperado dado pela mdia dosmamferos viventes. Durante o desenvolvimento dos primataspassou a ocorrer concomitantemente um crescimento tam-bm francamente mais pronunciado das chamadas reas pr-frontais, o que demonstra a direta relao destas regies comas funes ditas mais superiores. As pores anteriores doslobos temporais e os plos occipitais tambm so bem mais

    desenvolvidos no homem, estes ltimos devido ao aumentode reas associativas visuais.9,31,34,36-37

    Em relao evoluo do seu tamanho propriamente dito,ao longo da evoluo dos primatas o encfalo apresentou umaumento de trs a quatro vezes em 6 bilhes de anos. Esteaumento se deu mais s custas de conexes do que deneurnios e, sobretudo, com um aumento do ndice cone-xes locais/distantes, o que equivale a um aumento prepon-derante das conexes de associaes intra e inter-hemisfricascerebrais.7,9,13,34

    Entretanto, entre todos os eventos evolutivos que culmina-ram com o advento do SNC do homem, sem dvida o quemais se destaca a aquisio da linguagem, uma vez que

    esta qualidade que tornou possvel todo o desenvolvimento dacultura humana, inclusive no sentido real de viabilizar a pr-pria continuao da evoluo humana, que deixou de serbiolgica e passou a ser cultural.

    Evolutivamente, difcil estabelecer o momento em que sur-giu a linguagem, mas as mudanas oronasofarngeas necess-rias para a emisso de sons em particular foram tambm possi-bilitadas e desencadeadas pela adoo da postura ereta.1,33

    As reas corticais responsveis pelas funes lingsticas sedesenvolveram em torno da fissura lateral ou silviana do he-misfrio, que passou, ento, a ser chamado de hemisfrio do-minante, e que, geralmente, corresponde ao hemisfrio cere-bral esquerdo. Entre estas reas corticais, destacam-se umarea mais anterior, denominada rea motora da linguagem

    ou rea de Broca, e uma rea mais posterior, denominadarea sensitiva da linguagem ou rea de Wernicke.17-19,21,23,38

    A rea motora da linguagem, descrita por Broca,38-39 pos-sui uma localizao anatmica relativamente bem determina-da dispondo-se nas partes triangular e opercular do giro fron-tal inferior dominante do ser humano. Viabiliza a palavra fala-da atravs das suas conexes diretas com a regio do giromotor que desencadeia e coordena a motricidade orofarngea.A rea sensitiva da linguagem, por sua vez, foi descrita porWernicke 39 e possui uma topografia menos definida,espraiando-se em torno da poro terminal da fissura silvianadominante ao longo dos giros supramarginal, angular e tem-poral superior. Por meio das suas conexes com a rea audi-

    tiva primria do oprculo temporal e com reas occipitais vi-suais torna possvel, respectivamente, a compreenso da pa-lavra falada e a leitura. A existncia de conexes entre asreas de Broca e de Wernicke, que proporcionam oentrosamento da compreenso com a expresso, fazem comque toda a regio perisilviana do hemisfrio dominante sejarelacionada com funes lingsticas.

    As observaes de que as crianas de diferentes origensadquirem a linguagem de maneira quase que automtica en-tre os dois e quatro anos, e com seqncias e velocidades

    tambm semelhantes, levou os estudiosos do assunto, entreos quais se destaca o lingista Noam Chomsky,40 a acreditarque todas as linguagens humanas compartilham um mesmoconjunto inato de mecanismos equivalentes a regras gramati-cais que so geneticamente determinadas, e que estariamcomo que impressas em circuitos cerebrais humanos. Estanoo pode ser mais bem compreendida pelo comentrio deSteven Pinker que, do ponto de vista chomskiano, se um

    cientista marciano viesse a visitar a Terra concluiria que, dei-xando de lado vocbulos ininteligveis, os terrqueos falamuma nica lngua.31,35 Portanto, paralelamente organiza-o neurofisiologicamente mais superficial da linguagem fa-lada e escrita, h um conjunto de mecanismos lingsticosque se organizam em um nvel mais profundo e que dizemrespeito basicamente a algo como significados puros.

    As manifestaes evolutivas das diferentes formas de lin-guagem indiretamente j refletem as capacidades de comuni-cao e criativas do crebro humano. Nesse sentido, inte-ressante destacar que expresses artsticas em forma de pin-turas j surgiram h cerca de 30.000 anos, enquanto aescrita teve os seus primrdios h aproximadamente 10.000

    anos.9,34-35,41

    As obras de arte mais primitivas foram desco-bertas ao longo da faixa do territrio europeu que se estendeda Espanha ao sul da Rssia, e so constitudas principal-mente por pinturas em paredes de cavernas feitas por oca-sio de uma nova idade do gelo. As figuras caracterizamprincipalmente bises, cavalos, lees e renas, estando ge-ralmente relacionadas com motivos de caas e parecendoter o propsito de aplacar as foras da natureza da qual ascomunidades dependiam. Representaes de figuras meiohomens meio animais, por sua vez, sugerem a existncia demitos, e foram feitas em pocas em que j se enterravam osmortos com adornos.33,41

    Descobertas de bastes feitos com ossos ou chifres e rica-mente entalhados de forma a caracterizar representaes sim-

    blicas, que datam de cerca de 20.000 anos, j sugerem aexistncia de uma linguagem mais complexa, e os crniosdos seres humanos desta poca demonstram conformaescompatveis com um maior desenvolvimento das regies fronto-temporais e da fissura silviana, que abrigam as reas corticaismais especificamente relacionadas com as funes de lin-guagem.7,9,32-22,41

    Nos seus primrdios, a escrita dizia respeito utilizao desmbolos que visavam constituir numeraes. Os seus primei-ros registros, encontrados em montanhas da regio dos atuaisIr e Turquia, datam de aproximadamente 12.000 anos e vi-sam quantificar colheitas e rebanhos. No entanto, o conceitode numerao independente de qualificao parece ter surgi-

    do h 5.000 anos, na chamada Mesopotmia, regio do mo-derno Iraque. O equivalente s primeiras linguagens escritas,por sua vez, aparentemente foi desenvolvido entre 10.000 e6.000 anos atrs e era constitudo por minsculos objetoscermicos padronizados encontrados no Oriente Prximo, querepresentavam diferentes itens e quantidades.41

    A civilizao egpcia, que se iniciou h cerca de 5.000anos, criou os hierglifos, que constituem uma escritaideogrfica, portanto representativa e ainda no composta desons. A escrita egpcia era composta por duas verses, sendo

    Pierre Paul Broca (1824-1880) cirurgio e antroplogo francs que descreveu a afasia motora e introduziu o conceito de localizao cerebral.

    Carl Wernicke (1848-1905) psiquiatra alemo que descreveu vrias alteraes neurolgicas, incluindo a afasia sensitiva. Fenmenos glaciais cclicos que ocorrem com intervalo de milhares de anos.

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    uma utilizada para textos religiosos e oficiais (hiertica) e outramais popular (demtica), que procurava exprimir conceitosabstratos. A sua difuso foi particularmente possibilitada pelasfolhas de papiro, que cresciam profusamente ao longo do Nilo,e pelo comrcio tambm proporcionado por este rio. A escritacuneiforme dos assrios, contemporneos dos egpcios, erasemelhante no sentido de que se baseava em combinaesde smbolos que pareciam pregos ou cunhas - da o seu nome.

    Coube aos fencios, ao entrarem em contacto principalmentecom os egpcios e motivados pelas suas necessidades comer-ciais, serem os responsveis pela criao da primeira escritaalfabtica, de base fontica. Este alfabeto teve, portanto, in-fluncia da escrita egpcia, e se difundiu na ocasio por todoo ocidente, tendo atingido tambm a ndia e vindo a se cons-tituir como a base de praticamente todos os alfabetos que seseguiram. Posteriormente, os gregos desenvolveram muito aescrita atravs do alfabeto grego que, por sua vez, deu origemao alfabeto latino.

    Como conseqncia direta, ainda na Grcia, a linguagemdesencadeia o incio do pensamento moderno. No sculo VIa.C., nasce a filosofia com os pensadores de Mileto e, mais

    tarde, aps as contribuies de Scrates e Plato, Aristteles(384-322 a.C.) estabelece a lgica como mtodo de pensar.

    Consideraes entre as possveis correlaes entre afilognese e a ontognese

    A existncia de relaes entre a fi lognese (evoluofi logentica das espcies) e a ontognese (evoluoembriolgica, fetal e ps-natal do ser humano) constitui umaquesto j aventada e discutida desde os tempos da Grciaantiga. Entre os fi lsofos pr-socrticos, Anaximandro,Anaximenes e Demcritus conceberam o cosmos como sedesenvolvendo circundado por um envelope que lembra amembrana amnitica. Anaximandro e Empdocles chegarama comparar os estgios da embriologia humana com etapas

    prvias do ciclo csmico por eles imaginado. Aristteles(384-322 a.C.), considerado pai da anatomia comparada,ao classificar os animais o fez conforme um critrio progressivode perfeio. Ele acreditava que, durante o seu desenvolvi-mento, o embrio humano incorporava almas tambm pro-gressivamente mais diferenciadas, por ele denominadas nu-tritiva, sensitiva e racional.11

    No entanto, coube a Ernest Haeckel (1834-1919) for-mular o conhecido dito de que a ontogenia recapitula afilogenia, ao afirmar, a partir dos seus estudos, que arpida e breve ontogenia uma sinopse condensada dalonga e lenta histria da filognese.10 Para Haeckel, cadaetapa embriolgica se caracterizaria como tendo caracte-

    rsticas semelhantes ao produto adulto final de cada ances-t ra l correspondente quela e tapa, e que ter iam s idorealocadas nos estgios in ic iais do desenvolvimentoontogentico humano por foras decorrentes da evoluoda sua l inhagem.11 Os chamados recapi tu lac ion is tasevolucionrios que o seguiram se fundamentaram em doismecanismos bsicos para relacionar a evoluo com aembriologia: 1) a lei ou fenmeno de adio terminal, queexplica as mudanas evolutivas como ocorrendo pela adi-o de novas etapas sobre o estgio final de cada respecti-vo ancestral; e 2) a lei ou fenmeno de condensao, naqual os processos de desenvolvimento evolucionrio ocor-rem e so acelerados pelo deslocamento de caractersticasancestrais para fases mais precoces do desenvolvimento em-

    brionrio dos respectivos descendentes.

    Entre os autores que se opuseram s hipteses de Haeckel,destaca-se o embriologista e antropologista alemo Karl Ernestvon Baer (1792-1876), que refutou a concepo de estgiosembrionrios caracterizados por particularidades ancestraisadultas e sugeriu que estas etapas equivaliam simplesmentea estgios precoces comuns ontogenia de todos os verte-brados.11

    Stephen Jay Gould (1941-2002), professor de Zoologia da

    Universidade de Harvard e grande evolucionista da atualida-de, ao tratar das relaes entre a filognese e a ontognesehumana, admite que as mudanas evolutivas se expressamna ontogenia do homem e valoriza, em particular como me-canismo evolutivo, a importncia da chamada heterocronia(ou variao temporal do aparecimento de caractersticasontogenticas) como determinante das mudanas filogenticas.Portanto, para Gould, as mudanas de regulao dos genespor fim responsveis pelas mutaes evolutivas so, em gran-de parte, determinadas pelas mudanas dos momentosembriolgicos de desenvolvimento de caractersticas comunsa ancestrais e descendentes.4,11

    Em contraposio s dvidas pertinentes aos paralelos even-

    tualmente existentes entre a filognese e a ontognese, a se-melhana das conformaes apresentadas pelo SNC nas pro-gressivas etapas filogenticas e embriolgico-fetais do ser hu-mano so particularmente evidentes (Figura 1).

    Consideraes sobre a evoluo da organizao ner-vosa e a emergncia da conscincia

    A Tabela 2 e os esquemas da Figura 2 ilustram o progressi-vo desenvolvimento e a disposio das estruturas enceflicasao longo do processo evolutivo.

    Tendo como base esses conhecimentos evolutivos, McLean,em 1973, props a Teoria do Encfalo 3 em 1 (TriuneBrain),44 a qual caracteriza de forma sinttica a evoluofilogentica do SNC como ocorrendo atravs de trs etapas

    bsicas, por ele denominadas: 1) encfalo reptiliano (medulae tronco enceflico, com as estruturas olfatrias, amgdala ehipocampo ainda rudimentares); 2) encfalo do mamfero (de-senvolvimento significativo do hipocampo, caracterizao dosistema lmbico, desenvolvimento inicial do neocrtex); e 3)encfalo humano (desenvolvimento final do neocrtex, emparticular das reas corticais associativas, e caracterizaodas reas de linguagem) (Figura 3), com os seus cerca de100 bilhes de neurnios que se conectam atravs de 1.000e 10.000 sinapses por neurnio.

    Para Edelman, o emaranhado de fibras nervosas origi-nadas nos neurnios enceflicos se organiza em trs con-juntos de circui tos bsicos: o sistema de projeo di fusa,

    o conjunto de sistemas crtico-subcorticais e o sistematlamo-cortical. 6

    O sistema de projeo difusa se origina no tronco enceflicoe no hipotlamo, projeta-se difusamente principalmente so-bre o crtex cerebral e tambm sobre o hipocampo, gngliosda base, cerebelo e medula. Esse sistema se origina em n-cleos noradrenrgicos (locus ceruleus), serotoninrgicos (n-cleos de rafe) e tambm em ncleos dopaminrgicos,histaminrgicos e colinrgicos.6,13 Compe o j mencionadosistema reticular ascendente originado principalmente na for-mao reticular do tronco enceflico e responsvel por res-postas adaptativas que envolvem integraes sensrio-motorase pelo ciclo sono-viglia. Ao sinalizar a ocorrncia de eventosimportantes, atua como verdadeiro modulador do tnus da

    atividade cerebral.6

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    PERCA LISTRADA

    CREBO

    R LEOPARDO

    CREBOCREBO CREBO

    COBRA DO BREJO POMBO

    CREBO

    GAMB

    CREBO

    GATO

    CREBO

    HOMEM

    CREBO

    CHIMPANZ

    CREBO

    SMIO MACACO

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    Os sistemas crtico-subcorticais so compostos por circui-tos polisinpticos unidirecionais, portanto no recprocos, quetm como epicentro os gnglios da base que recebemeferncias do crtex cerebral e que, aps processamento, asdevolvem ao crtex por via talmica e extra-talmica, almde gerarem eferncias tambm para o hipocampo e cerebelo.Em complemento s suas conhecidas funes motorasusualmente denominadas extrapiramidais,13,17-19,21,23 a des-crio de que esses circuitos funcionalmente isolados queconectam os gnglios da base ao crtex se organizam emalas unidirecionais, reentrantes e paralelas, feita por

    Alexander et al.45 ao longo da ltima dcada, possibilitouvincular a sua atuao tambm com funes comportamentaisda esfera neuropsiquitrica.6,25,46-48 Desta forma, enquantoas pores mais posteriores dos gnglios da base (str iatumcaudal) se relacionam com o planejamento e a execuo deatos motores complexos, as suas pores mais anteriores(str iatum ventral) se relacionam mais particularmente comrotinas que envolvem atividades cognitivas e padres de com-portamento.25,46-48

    Para Edelman,6 o sistema tlamo-cortical constitudo pe-las conexes recprocas existentes entre o tlamo e o crtexcerebral e tambm pelas fibras hemisfricas de associao.Portanto, envolve a ativao das reas especializadas do crtexe das suas reas e fibras de associao. Enquanto a poroposterior desse sistema se relaciona particularmente com fe-nmenos de percepo, a sua poro anterior se relacionaprincipalmente com planejamentos e aes.

    interessante ressaltar que, nesta concepo de Edelmande trs conjuntos de circuitos bsicos, o sistema lmbico noconstitui um sistema bsico da organizao das fibrasenceflicas e, sim, um conjunto de estruturas cerebraismesiais que se dispem como um crculo em torno do topodo tronco enceflico e que se encontram conectadas aostrs sistemas bsicos.6

    No entanto, apesar de todo o atual conhecimentoneuroanatmico, neurofisiolgico e de reas correlatas, a fi-siologia do psiquismo humano, que tem como cerne a cons-

    cincia, persiste ainda muito pouco esclarecida.

    Paralelamente s conhecidas controvrsias pertinentes suaprpria conceituao e s dificuldades metodolgicas ineren-tes ao seu estudo, Albright chama a ateno para o fato deque ainda no existe um consenso sobre o que seria umasoluo apropriada do esclarecimento do fenmeno da cons-cincia humana.37

    Em relao difcil e controversa conceituao de conscincia,e tendo em vista o escopo da presente reviso, particular-mente oportuna e apropriada a diferenciao proposta porEdelman entre conscincia primria (primary consciousness)e conscincia superior (higher-order consciousness).6,49

    Para este autor, a conscincia primria diz respeito a estarmentalmente consciente do mundo no sentido de poder for-mular apenas imagens mentais no presente e sem qualquersentido pessoal de passado e de futuro. Esta se encontra pre-sente nos animais desprovidos de linguagem e de capacida-des semnticas. Fenmenos neurofisiolgicos de reentradapropiciariam abstraes e comportamentos de adaptao aomeio atravs da contnua construo de um cenrio de lem-branas do presente (remembered present).6,49

    A conscincia superior, por sua vez, a conscincia dosseres humanos, composta pelo pensamento no sentido pessoalde considerar passado, presente e futuro, e de no dependerobrigatoriamente do envolvimento de receptores e rgos sen-sitivos e sensoriais. Edelman enfatiza que a conscincia su-perior se baseia fundamentalmente na ocorrncia de per-cepes diretas apenas do ser humano - que possui as capa-cidades de linguagem e de descrever a sua vida subjetiva - eque a sua distino da conscincia primria se faz principal-mente pela ocorrncia de estados fenomenolgicos constitu-dos pela coleo de experincias pessoais objetivas e subjeti-vas que acompanham quaisquer percepes, a que esse au-tor denomina qualia.6,49

    Entre as estruturas nervosas mais particularmente relacio-nadas com a conscincia primria destacam-se o sistemareticular ativador ascendente (que se origina no troncoenceflico), as estruturas lmbicas e o hipotlamo, e o siste-ma tlamo-cortical, enquanto a conscincia superior acres-cida e fundamentalmente dependente das reas cerebrais en-volvidas com os processos de linguagem.8,50-52 Tendo em vistao desenvolvimento evolutivo dessas estruturas que foi aqui revisa-do, justifica-se o comentrio de Marijun de que a conscinciase constitui em um fenmeno gradual, com as suas gradua-es sendo relacionadas com a diferenciao filogentica eontogentica principalmente do crtex cerebral,53 em con-cordncia com as concepes de Eccles.54

    O advento da teoria da complexidade e a considerao dos

    seus conceitos nas reas biolgicas em geral e em neurocincias

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    em par ticular,31,50,55-60 fez com que a hiptese de que a conscin-cia tenha surgido ao longo da evoluo como um fenmeno deemergncia viesse a constituir praticamente um consenso en-tre os estudiosos desse assunto.6,8,31,53,61-65 A propriedade deemergncia inerente aos sistemas complexos no-lineares secaracteriza pelo fato de que a cada nvel hierrquico de com-plexidade podem surgir novas qualidades que no podemser explicadas tendo-se como base apenas as caractersticasdos seus constituintes. Desta forma, com o todo se sobrepujan-do soma das suas partes - como exemplos, a umidade surgea partir da interao de molculas de gua; o calor emana dofogo; e sons se originam a partir de vibraes de molculas dear. Adotando-se essa concepo, a conscincia resultaria deuma particular complexidade estrutural atingida pelo arranjodo emaranhado neuronal ao longo da evoluo.

    Francis Crick, em seu conhecido livro The astonishinghypothesis,63 tambm aceita a hiptese de emergncia e, apartir de um estudo detalhado da funo visual em mamferose sem se deter em questes de ordem mais conceitual, defen-de a idia de que a conscincia seja fundamentalmente umproduto da circuitaria neural tlamo-cortical. Ele admite que

    noes mais complexas devam estar mais particularmenterelacionadas com determinadas reas corticais. Nesta dire-o, Crick enfatiza, em seu texto, a relao da noo de livrearbtrio com a atividade da poro anterior do giro do cngulo.

    Apesar da concordncia existente entre os diversos estudio-sos a respeito das estruturas nervosas mais envolvidas com agnese da conscincia e com o destaque do papel do sistematlamo-cortical, pouco se sabe e muito se especula sobre aintimidade dos processos que a viabilizam.15,51,56,64-68 Os estu-dos desses processos abrangem os campos da biologiamolecular, da neurocomputao e as mais recentes contri-buies da fsica.53 Nessa direo, atualmente destaca-se acomplexa proposta de Roger Penrose e de StuartHameroff,31,53,69-70 que defendem a idia de que os processosfundamentais que ocorrem ao nvel dos microtbulos docitoesqueleto neuronal ocorrem sob as leis da fsica quntica,e que atravs de uma orquestrada sincronizao tmporo-es-pacial otimizam o processamento de informaes dirigidas aneurnios piramidais. Como alternativa mais ousada e pura-mente especulativa, autores como Siler, tendo como base assemelhanas das conformaes circulares das estruturas ce-rebrais profundas e de magnetos e certos tipos de reatoresnucleares, sugerem a possibilidade de que alguma forma deenergia possa emanar paralelamente e conseqentemente aofuncionamento da circuitaria neural.71

    Por outro lado, so interessantes as observaes de Albrigthde que todo o estudo cientfico sobre o processo da vida

    atualmente fundamentalmente baseado no que se sabe sobreo DNA e, apesar de que muitas questes pertinentes cons-cincia possam vir a ser explicadas por estudos dos genes epor diferentes estudos comportamentais, ainda difcil imagi-nar como o progresso cientfico vir a explicar as questesrelativas natureza subjetiva das nossas experincias.37

    Paralelamente ao notrio desenvolvimento das contribui-es experimentais em animais, que so limitadas funda-mentalmente pelos seus prprios elementos de investigao,os estudos das questes pertinentes relao mente-crebro- a partir de dados neurolgicos e psicopatolgicos no ho-mem, que tm como base alteraes quantitativas e qualita-

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    tudo desta questo.Os estudos que seguramente sero realizados no futuro pr-

    ximo com o emprego de tcnicas genticas, como o implantede clulas-troncopara regenerao de reas nervosas, porum lado acarretaro o levantamento de importantes questesconceituais e ticas e, por outro lado, devero se constituir emuma nova janela para o estudo da conscincia e do psiquismo.

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