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28/12/12 inatura mensal de telefone fixo - Revista Jus Na… 1/11 jus.com.br/revista/texto/5701/…/print Considerações sobre a ilegalidade da tarifa de assinatura mensal de telefone fixo http://jus.com.br/revista/texto/5701 Publicado em 09/2004 Paulo Andreatto Bonfim (http://jus.com.br/revista/autor/paulo-andreatto-bonfim) Sumário: I – INTRODUÇÃO; II - Dos fundamentos para instituição da "tarifa de assinatura mensal"; III - Da Ilegalidade da "Tarifa de Assinatura Mensal"; VI – Do Dever de Restituir os Valores Pagos Indevidamente ; V - Conclusão. I - Introdução Chamou nossa atenção a atual discussão envolvendo a eventual ilegalidade da cobrança por parte das empresas de telefonia da chamada "assinatura mensal", culminando na busca dos advogados por argumentos fáticos e jurídicos que permitam maior reflexão sobre o tema, principalmente após a vitória de uma consumidora de São Paulo já amplamente divulgada nos meios de comunicação. Opiniões ponderadas e devidamente fundamentadas nos tem sido gentilmente fornecidas por colegas advogados legitimamente interessados em engrandecer o debate jurídico, dentre as quais citados a dos eminentes juristas Dr. Daniel Diniz Manucci (advogado em Minas Gerais) e Dr. Marcio Adriano Caravina (advogado em Presidente Prudente – SP, Coordenador do Projeto a OAB vai à escola e Presidente da Comissão de Informática Jurídica da 29ª Subsecção da OABSP - Presidente Prudente), que bem refletem a importância do estudo consciente e dedicado dos operadores do direito a fim de evitar as famigeradas "aventuras jurídicas". Nesta linha de conduta, decidimos refletir sobre o tema e, como resultado de tais considerações, apresentamos para a análise e discussão os argumentos que entendemos ser os que mais se aproximam do verdadeiro debate jurídico que poderá/deverá ser travado em nosso Poder Judiciário em razão da instituição e cobrança da "tarifa de assinatura mensal". Como todo operador do direito temos sempre como valiosa toda e qualquer contribuição para o embate de idéias e desenvolvimento de teses jurídicas, principalmente quando se almeja tão nobre fim, qual seja, a defesa dos consumidores, considerando- se o desrespeito e "pouco-caso" com que sempre são tratados em nosso país. O presente estudo, portanto, foi por nós desenvolvido com base na legislação aplicável, nos contratos de concessão e de prestação de serviços e na melhor doutrina e jurisprudência, tudo a fim de trazer mais elementos para o debate e servir de modesta contribuição àqueles que pretendam discutir, por si ou por seus clientes, a referida cobrança. Limitamo-nos, para facilitar o desenvolvimento de nosso trabalho, a analisar unicamente a prestação de serviços fornecida pela Telefônica de São Paulo (empresa concessionária dos serviços de telefonia em nossa região), o que não obsta a que o presente estudo também possa ser aplicado a outras concessionárias, haja vista que a legislação aplicável e os contratos envolvidos são, via de regra, os mesmos. II - Dos fundamentos para instituição da "tarifa de assinatura mensal" Todo e qualquer estudo a que se pretenda atribuir o mínimo de característica de "ciência do direito" deve partir de premissas aceitáveis e dotadas do mínimo de credibilidade, razão pela qual partimos da Lei Fundamental do país, a Constituição Federal de 1998. Deveras, a Carta Magna, em seu artigo 21, inciso XI (com redação dada pela Emenda Constitucional nº 08/95), estabelece que: "Compete à União: (...)XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais". Como se pode notar, ficou definida a competência exclusiva da União para a exploração direta ou mediante autorização, concessão ou permissão, dos serviços de telecomunicações, além de restar fixada a necessidade da criação de um órgão regulador para o setor. Coube à Lei nº 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações), atualmente vigente, a tarefa de organizar os serviços de telecomunicações, bem assim estabelecer a criação funcionamento do respectivo órgão regulador, a Agencia Nacional de Jus Navigandi http://jus.com.br

Considerações Sobre a Ilegalidade Da Tarifa de Assinatura Mensal de Telefone Fixo - Revista Jus Navigandi - Doutrina e Peças

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TARIFA - JURISPRUDÊNCIA

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1/11jus.com.br/revista/texto/5701/…/print

Considerações sobre a ilegalidade da tarifa de assinatura mensalde telefone fixohttp://jus.com.br/revista/texto/5701

Publicado em 09/2004

Paulo Andreatto Bonfim (http://jus.com.br/revista/autor/paulo-andreatto-bonfim)

Sumário: I – INTRODUÇÃO; II - Dos fundamentos para instituição da "tarifa de assinatura mensal"; III - Da Ilegalidade da "Tarifa de

Assinatura Mensal"; VI – Do Dever de Restituir os Valores Pagos Indevidamente ; V - Conclusão.

I - Introdução

Chamou nossa atenção a atual discussão envolvendo a eventual ilegalidade da cobrança por parte das empresas de telefonia da

chamada "assinatura mensal", culminando na busca dos advogados por argumentos fáticos e jurídicos que permitam maior reflexão sobre

o tema, principalmente após a vitória de uma consumidora de São Paulo já amplamente divulgada nos meios de comunicação.

Opiniões ponderadas e devidamente fundamentadas nos tem sido gentilmente fornecidas por colegas advogados legitimamente

interessados em engrandecer o debate jurídico, dentre as quais citados a dos eminentes juristas Dr. Daniel Diniz Manucci (advogado em

Minas Gerais) e Dr. Marcio Adriano Caravina (advogado em Presidente Prudente – SP, Coordenador do Projeto a OAB vai à escola e

Presidente da Comissão de Informática Jurídica da 29ª Subsecção da OABSP - Presidente Prudente), que bem refletem a importância do

estudo consciente e dedicado dos operadores do direito a fim de evitar as famigeradas "aventuras jurídicas".

Nesta linha de conduta, decidimos refletir sobre o tema e, como resultado de tais considerações, apresentamos para a análise e

discussão os argumentos que entendemos ser os que mais se aproximam do verdadeiro debate jurídico que poderá/deverá ser travado em

nosso Poder Judiciário em razão da instituição e cobrança da "tarifa de assinatura mensal".

Como todo operador do direito temos sempre como valiosa toda e qualquer contribuição para o embate de idéias e

desenvolvimento de teses jurídicas, principalmente quando se almeja tão nobre fim, qual seja, a defesa dos consumidores, considerando-

se o desrespeito e "pouco-caso" com que sempre são tratados em nosso país.

O presente estudo, portanto, foi por nós desenvolvido com base na legislação aplicável, nos contratos de concessão e de

prestação de serviços e na melhor doutrina e jurisprudência, tudo a fim de trazer mais elementos para o debate e servir de modesta

contribuição àqueles que pretendam discutir, por si ou por seus clientes, a referida cobrança.

Limitamo-nos, para facilitar o desenvolvimento de nosso trabalho, a analisar unicamente a prestação de serviços fornecida pela

Telefônica de São Paulo (empresa concessionária dos serviços de telefonia em nossa região), o que não obsta a que o presente estudo

também possa ser aplicado a outras concessionárias, haja vista que a legislação aplicável e os contratos envolvidos são, via de regra, os

mesmos.

II - Dos fundamentos para instituição da "tarifa de assinatura mensal"

Todo e qualquer estudo a que se pretenda atribuir o mínimo de característica de "ciência do direito" deve partir de premissas

aceitáveis e dotadas do mínimo de credibilidade, razão pela qual partimos da Lei Fundamental do país, a Constituição Federal de 1998.

Deveras, a Carta Magna, em seu artigo 21, inciso XI (com redação dada pela Emenda Constitucional nº 08/95), estabelece que:

"Compete à União: (...)XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos

termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais".

Como se pode notar, ficou definida a competência exclusiva da União para a exploração direta ou mediante autorização, concessão

ou permissão, dos serviços de telecomunicações, além de restar fixada a necessidade da criação de um órgão regulador para o setor.

Coube à Lei nº 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações), atualmente vigente, a tarefa de organizar os serviços de

telecomunicações, bem assim estabelecer a criação funcionamento do respectivo órgão regulador, a Agencia Nacional de

Jus Navigandi

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Telecomunicações (ANATEL), esta com regulamentação aprovada pelo Decreto nº 2.338/97.

No ano de 1998 (mais precisamente em 30 de julho) o Governo Federal acabou por privatizar a área de telecomunicações,

privatizando todo o sistema Telebrás, sendo que no Estado de São Paulo antiga Telesp foi adquirida pela Telefônica, razão pela qual,

conforme citamos, nossa análise se concentra em sua atuação.

Atendendo ao que determina o artigo 19, VI da Lei nº 9.472/97, a ANATEL celebrou com a Telefônica o "Contrato de concessão do

serviço telefônico fixo comutado local" (Contrato PBOG/SPB nº 52/98 ANATEL), mediante o qual permitiu que fosse oferecido aos

consumidores o "Plano Básico do Serviço Local" (o modelo do contrato é disponibilizado no site da ANATEL), nos seguintes termos:

"ANEXO Nº 03

PLANO BÁSICO DO SERVIÇO LOCAL

1 – Generalidades

1.1 O Plano Básico do Serviço Local é regido pelas Portarias citadas neste anexo, demais regulamentações vigentes e por outras

que venham a sucedê-las. 1.2 As tarifas apresentadas são máximas, líquidas de impostos e contribuições sociais.

2- Acesso ao Serviço Telefônico Fixo Comutado - STFC

2.1 Para o acesso ao Serviço Telefônico Fixo Comutado, a Prestadora poderá cobrar Tarifa de Habilitação, cujo valor é

limitado a R$ 80,00 (oitenta reais), conforme definido na Portaria nº 508, de 16/10/97, do Ministro de Estado das Comunicações;

2.2 Para manutenção do direito de uso as Prestadoras estão autorizadas a cobrar tarifa de assinatura, segundo a tabela

abaixo, conforme Portarias nºs 217 e 226, ambas de 03/04/97, do Ministro de Estado das Comunicações.

Classe de Assinantes R$

Residencial 10,00 (dez reais)

Não Residencial 15,00 (quinze reais)

Tronco de CPCT 20,00 (vinte reais)

2.2.1 A assinatura do STFC Local inclui uma franquia de 90 pulsos.

2.3 A mudança de endereço de assinante habilitado poderá ser cobrada, sendo o valor limitado a R$ 62,40 (sessenta e dois reais e

quarenta centavos);

3 A utilização do STFC

3.1 STFC Local

3.1.1 O STFC Local é regulamentado pela Portaria n.º 216, de 18.09.91, do Secretário Nacional de Comunicações, alterada

pela Portaria nº 218, de 03 de abril de 1997, do Ministro de Estado das Comunicações, que dispõe sobre os processos de tarifação

das chamadas locais no Serviço Telefônico Público.

3.1.2 O STFC Local será tarifado:

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a) pelo método Karlsson Acrescido - KA - 240 (multimedição), onde a cobrança é feita pela aplicação de uma unidade de

tarifação (pulso) por chamada estabelecida e de unidades adicionais a cada 240 segundos, sendo a primeira cobrança efetuada ao acaso

em relação ao início da chamada.

b) pelo Método de Medição Simples, onde a cobrança é feita pela aplicação de uma unidade de tarifação (pulso) por chamada

atendida, independentemente de sua duração.

Dias Sistema de Medição

De Segunda a Sexta-feira das 06:00h às 24:00 h Multimedição (KA 240)

De Segunda a Sexta-feira das 00:00h às 06:00 h Medição Simples

Sábados das 06:00 h às 14:00 h Multimedição (KA 240)

Sábados das 00:00 h às 06:00 h e das 14:00 h às 24:00 h Medição Simples

Domingos e Feriados das 00:00 às 24:00 horas Medição Simples

3.1.3 A unidade de tarifação do STFC Local é o Pulso, cujo valor médio, estabelecido pela Portaria n.º 226, de 03.04.97,

do Ministro de Estado das Comunicações, é R$ 0,058. (...) ". Grifos postos.

Como se pode notar, foram previstas três cobranças distintas a serem impostas ao consumidor, duas delas referentes ao "acesso

ao serviço telefônico fixo comutado – STFC" (tarifa de habilitação e tarifa de assinatura mensal), e, uma terceira relacionada à "utilização

do STFC" (tarifa pela utilização do serviço telefônico).

A sistemática é também adota no "Contrato de Prestação do Serviço Telefônico Comutado (STFC)" – contrato de adesão padrão,

disponibilizado pela Telefônica em seu site (http://www.telefonica.net.br/sp/download/stfc.pdf

(http://www.telefonica.net.br/sp/download/stfc.pdf)) - o qual estabelece em sua cláusula quarta que "o Assinante pagará tarifas e preços,

estabelecidos no Plano Básico de Serviços".

É possível encontrar, ainda, na Resolução nº 85/98 da ANATEL a previsão das tarifas de assinatura e habilitação, "in verbis":

"Art.3º Para fins deste Regulamento, aplicam-se as seguintes definições:

(...)

XXI - Tarifa ou Preço de Assinatura: valor de trato sucessivo pago pelo Assinante à Prestadora, durante toda a prestação do

serviço, nos termos do contrato de prestação de serviço, dando-lhe direito à fruição contínua do serviço;

XXII - Tarifa ou Preço de Habilitação: valor devido pelo Assinante, no início da prestação de serviço, que lhe possibilita a fruição

imediata e plena do STFC;"

Assim é que, o consumidor ao adquirir a linha telefônica encontra-se sujeito à cobrança de valores sob os seguintes títulos:

a. Tarifa de habilitação para acesso ao serviço telefônico fixo comutado;

b. Tarifa de assinatura para manutenção do direito ao uso das prestadoras;

c. Tarifa pela utilização efetiva do serviço, seja pelo método "Karlsson Acrescido", seja pelo método de "medição simples".

No que respeita ao item "a" (tarifa de habilitação), o pagamento é realizado apenas uma vez, quando da contratação do serviço

com a concessionária. Os demais itens, no entanto, são cobrados mensalmente, sendo o item "c" (tarifa pela utilização do serviço) o único

que reflete a cobrança pela efetiva utilização do serviço prestado pela Telefônica.

A anomalia, portanto, encontra-se no item "b" acima descrito, qual seja, a tarifa de assinatura mensal, exigida, como o próprio

contrato prevê, para a "manutenção do direito de uso" por parte dos proprietários de linha telefônica, e, descrita pela própria Telefônica

como sendo:

"TARIFA DE ASSINATURA: É o valor de trato sucessivo pago pelo Assinante à Prestadora, durante toda a prestação do serviço,

nos termos do contrato de prestação de serviço, dando-lhe direito à fruição contínua do serviço." (1). Grifos postos.

Assim, em que pese a previsão da cobrança da tarifa de assinatura mensal quer no contrato de concessão feito entre a Telefônica

e a ANATEL, quer no contrato de prestação do serviço telefônico fixo comutado, celebrado com os consumidores, tem-se que a exigência

de valores a tal título revela-se abusiva e ilegal, conforme será visto no tópico seguinte.

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III – Da Ilegalidade da "Tarifa de Assinatura Mensal"

Como se pode aferir no tópico infra, a cobrança da "tarifa de assinatura mensal" encontra amparo na Resolução nº 85/98 da

ANATEL, bem assim nos (i) contrato de concessão (ANATEL/Telefônica), e, (ii) contrato de prestação de serviço (Telefônica/Usuário).

Todavia, tal cobrança não encontra guarida no ordenamento jurídico pátrio, pelas seguintes razões:

1. A Lei nº 9.472/97 não contempla a tarifa de assinatura mensal como condição para que se tenha direito à fruição contínua do

serviço;

2. A cobrança da "assinatura mensal" implica em ofensa aos ditames do Código de Defesa do Consumidor.

Dada a importância da acurada e pormenorizada análise dos argumentos supra citados, faz-se necessário discorrer,

separadamente, sobre cada um deles.

1. A Lei nº 9.472/97 não contempla a tarifa de assinatura mensal como condição para que se tenha direito à fruição

contínua do serviço

Conforme dito alhures, tanto a Resolução nº 85/98 como os contratos de concessão e de prestação do serviço telefônico fixo

criaram a "taxa de assinatura mensal" como requisito para que seja conferido ao consumidor o direito à fruição contínua do serviço.

Todavia, a Lei nº 9.472/97, em nenhum momento previu a citada cobrança para "fruição contínua", primando, ao revés, por

ressaltar o princípio da continuidade do serviço público, sem qualquer tipo de ressalva atinente a eventual contraprestação pela fruição

contínua, "in verbis":

"Art. 5º. Na disciplina das relações econômicas no setor de telecomunicações observar-se-ão, em especial, os

princípios constitucionais da soberania nacional, função social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do

consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e continuidade do serviço

prestado no regime público". Grifos postos.

Não bastasse tal disposição, logo no Livro I do texto normativo, sob o título "DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS", a citada Lei nº

9.472/97 trouxe, ainda, capítulo específico para tratar "Das Obrigações de Universalização e de Continuidade" (Título II, Capítulo I),

atinentes aos serviços prestados em regime público, esclarecendo em seu artigo 79 que:

"Art. 79. A Agência regulará as obrigações de universalização e de continuidade atribuídas às prestadoras de serviço

no regime público.

§ 1° Obrigações de universalização são as que objetivam possibilitar o acesso de qualquer pessoa ou instituição de interesse

público a serviço de telecomunicações, independentemente de sua localização e condição sócio-econômica, bem como as destinadas a

permitir a utilização das telecomunicações em serviços essenciais de interesse público.

§ 2° Obrigações de continuidade são as que objetivam possibilitar aos usuários dos serviços sua fruição de forma

ininterrupta, sem paralisações injustificadas, devendo os serviços estar à disposição dos usuários, em condições adequadas

de uso." Grifos postos.

Inexiste, no citado capítulo, qualquer alusão a necessidade de remuneração para a disponibilização do serviço de telefonia de

forma contínua, razão pela qual não se mostra possível aceitar que a Resolução nº 85/98 ou mesmo os contratos de concessão e de

prestação do serviço telefônico fixo possam inovar estabelecendo obrigação que a lei não autorizou de forma expressa.

Por outro lado, ao disciplinar a instituição e cobrança das tarifas, a Lei de Telecomunicações (Lei nº 9.472/97), deixou claro que

estrutura tarifária seria desenvolvida de acordo com "cada modalidade de serviço" (art. 103), inexistindo qualquer correlação entre a

cobrança de tarifa e o direito à fruição contínua deste.

Vale lembrar, que não se está tratando de "taxa", modalidade de tributo exigível, segundo o Código Tributário Nacional, pela fruição

efetiva ou potencial dos serviços prestados diretamente pela administração pública, mas, ao revés, de "tarifa", que deve refletir o exato

preço pago pelo consumidor pela efetiva prestação do serviço.

Sempre valiosa a lição do saudoso mestre Hely Lopes Meirelles, que, ao comentar a remuneração das concessionárias de serviços

públicos, ensinava que "o serviço concedido deve ser remunerado por tarifa (preço público) e não por taxa (tributo)" (grifos

postos). (2)

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Nota-se, portanto, que o serviço deve ser remunerado e não o direito a sua fruição contínua, posto que este, como bem restou

especificado na Lei nº 9.472/97, é intrínseco ao serviço prestado sob o regime público.

Ademais, a Lei nº 9.7425/97 elenca a matéria que poderá ser tratada nos contratos de concessão dos serviços de telefonia, "in

verbis":

"Art. 93. O contrato de concessão indicará:

I - objeto, área e prazo da concessão;

II - modo, forma e condições da prestação do serviço;

III - regras, critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da implantação, expansão, alteração e modernização do

serviço, bem como de sua qualidade;

IV - deveres relativos à universalização e à continuidade do serviço;

V - o valor devido pela outorga, a forma e as condições de pagamento;

VI - as condições de prorrogação, incluindo os critérios para fixação do valor;

VII - as tarifas a serem cobradas dos usuários e os critérios para seu reajuste e revisão;

VIII - as possíveis receitas alternativas, complementares ou acessórias, bem como as provenientes de projetos associados;

IX - os direitos, as garantias e as obrigações dos usuários, da Agência e da concessionária;

X - a forma da prestação de contas e da fiscalização;

XI - os bens reversíveis, se houver;

XII - as condições gerais para interconexão;

XIII - a obrigação de manter, durante a execução do contrato, todas as condições de habilitação exigidas na licitação;

XIV - as sanções;

XV - o foro e o modo para solução extrajudicial das divergências contratuais.

Parágrafo único. O contrato será publicado resumidamente no Diário Oficial da União, como condição de sua eficácia." (Grifos

postos).

Resta nítido que os princípios de universalidade e continuidade, já aludidos nos artigos 5º e 79 da Lei nº 9.472/97, tem sua

importância e eficácia ressaltada devendo, inclusive, constar no próprio corpo do contrato de concessão, não sendo mencionada, frise-se,

qualquer espécie de contraprestação específica para que tal "DEVER" seja cumprido pela concessionária.

Em suma, comete abuso e ilegalidade o legislador infraconstitucional, no caso a ANATEL, ao prever em Resolução – instrumento

que tem como única função a de operacionalizar a aplicação da lei – obrigação que não consta expressamente do texto legal que lhe dá

fundamento de validade. E, de igual sorte, incorre na mesma conduta ilícita a Ré por desvirtuar o comando legal expresso, de forma a

obter nítido enriquecimento sem causa.

Deveras, se a continuidade do serviço é tratada pela Lei como "PRINCÍPIO", e, ainda, como "OBRIGAÇÃO/DEVER" imputado a Ré,

não fazendo qualquer ressalva quanto a possibilidade de cobrança de valores específicos para que tal princípio/obrigação/dever seja

cumprido, não é possível admitir-se a fixação e cobrança de valores com tal escopo sem que tal exigência implique em verdadeiro

enriquecimento sem causa por parte da empresa Ré.

No mesmo sentido ilegais os contratos que prevêem a cobrança da "tarifa de assinatura mensal", haja vista que criaram ao

consumidor obrigação que não possui respaldo na legislação aplicável, e, o que é pior, permite a cobrança pelo exercício de direito que lhe

é concedido de forma absoluta pelo documento normativo, sem qualquer ressalva ou requisitos para sua fruição.

Suficiente, portanto, a análise da Lei nº 9.472/97 para obtenção de juízo no sentido de acolher a ilegalidade da "tarifa de

assinatura mensal", principalmente considerando-se que inexiste, como dito, previsão de qualquer requisito para a fruição contínua do

serviço de telefonia.

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2. A cobrança da "assinatura mensal" implica em ofensa aos ditames do Código de Defesa do Consumidor

Não bastassem as considerações atinentes a ilegalidade da "tarifa de assinatura mensal" frente à própria Lei nº 9.472/97, que por

si só implica no necessário afastamento da cobrança e restituição dos valores pagos, resta patente, ainda, a ofensa a vários preceitos do

Código de Defesa do Consumidor.

Cabe inicialmente destacar que os dispositivos incertos no Código de Defesa do Consumidor são de "ordem pública", isto é,

deverão ser aplicados ainda que exista prescrição diversa em eventual ajuste entre as partes ou mesmo em normas infra-legais, conforme,

aliás, esclarece o artigo 1º da Lei nº 8.078/90:

"Art. 1º. O presente Código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos

termos dos arts. 5º, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 das Disposições Transitórias.". Grifos postos.

Corroborando tal assertiva, pertinente colacionar o V. Acórdão exarado nos autos do Recurso Especial nº 292942 / MG, que teve

como relator o Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA:

"DIREITO CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. EXTINÇÃO. INICIATIVA DO PROMISSÁRIO COMPRADOR. PERDA DAS

PARCELAS PAGAS. CLÁUSULA ABUSIVA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. NORMA DE ORDEM PÚBLICA. ARTS. 51–IV

E 53. DERROGAÇÃO DA LIBERDADE CONTRATUAL. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. RECURSO DESACOLHIDO.

I – A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça uniformizou–se pela redução da parcela a ser retida pelo promitente

vendedor, nos casos de desfazimento do contrato de promessa de compra e venda, por inadimplência do comprador.

II – O caráter de norma pública atribuído ao Código de Defesa do Consumidor derroga a liberdade contratual para

ajustá–la aos parâmetros da lei, impondo–se a redução da quantia a ser retida pela promitente vendedora a patamar

razoável, ainda que a cláusula tenha sido celebrada de modo irretratável e irrevogável. (...)" (Resp nº 292.942/MG – STJ – 4ª

Turma – rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira – j. 03.04.2001). Grifos postos.

Nota-se, portanto, que não é possível apresentar qualquer justificativa juridicamente aceitável para afastar a aplicação da Lei nº

8.078/90 no presente caso, ainda que documentos normativos infra-legais ou mesmo disposições contratuais disponham de forma diversa.

Ressalte-se, que o próprio Códex Consumerista também prevê a necessidade de os serviços públicos, ainda que prestados sob o

regime de concessão, serem fornecidos de forma contínua, "ex vi" do disposto no artigo 22 do citado diploma legal:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de

empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos."

Grifos postos.

Poder-se-ia questionar quanto à essencialidade dos serviços de telefonia, de forma a aplicar,quanto a estes, o princípio da

continuidade dos serviços públicos.

Todavia, eventuais dúvidas que pudessem ser suscitadas são lidimamente sanadas ante o teor do artigo 10 da Lei nº 7.783/89,

que, alem de dispor sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades

inadiáveis da comunidade, e dá outras providências:

Art. 10. São considerados serviços ou atividades essenciais:

I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;

II - assistência médica e hospitalar;

III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;

IV - funerários;

V - transporte coletivo;

VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;

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VII - telecomunicações;

VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;

IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;

X - controle de tráfego aéreo;

XI - compensação bancária. " Grifos postos.

No mesmo sentido, foi editada pelo Secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça a Portaria nº 3/99, que, com o intuito

de regulamentar o artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, trouxe, de forma clara, o serviço de telefonia como sendo de natureza

essencial, como segue:

PORTARIA Nº 3, DE 19 DE MARÇO DE 1999

O Secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, no uso de suas atribuições legais,

CONSIDERANDO que o elenco de Cláusulas Abusivas relativas ao fornecimento de produtos e serviços, constantes do art. 51 da

Lei n0 8.078, de 11 de setembro de 1990, é de tipo aberto, exemplificativo, permitindo, desta forma a sua complementação;

CONSIDERANDO o disposto no artigo 56 do Decreto n0 2.181, de 20 de março de 1997, que regulamentou a Lei n,0 8.078/90, e

com o objetivo de orientar o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, notadamente para o fim de aplicação do disposto no inciso IV do

art. 22 deste Decreto, bem assim promover a educação e a informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e

deveres, com a melhoria, transparência, harmonia, equilíbrio e boa-fé nas relações de consumo, e

CONSIDERANDO que decisões administrativas de diversos PROCONs, entendimentos dos Ministérios Públicos ou decisões

judiciais pacificam como abusivas as cláusulas a seguir enumeradas, resolve:

Divulgar, em aditamento ao elenco do art. 51 da Lei n0 8.078/90, e do art. 22 do Decreto n0 2.181/97, as seguintes cláusulas que,

dentre outras, são nulas de pleno direito: (...)

3. Permitam ao fornecedor de serviço essencial (água, energia elétrica, telefonia) incluir na conta, sem autorização

expressa do consumidor, a cobrança de outros serviços. Excetuam-se os casos em que a prestadora do serviço essencial informe e

disponibilize gratuitamente ao consumidor a opção de bloqueio prévio da cobrança ou utilização dos serviços de valor adicionado;". Grifos

postos.

Destarte, se o serviço de telecomunicações, independentemente de ser prestado por concessionária, é considerado serviço

essencial, devendo ser fornecido de forma contínua, conforme determina o Código de Defesa do Consumidor, não se vislumbrando

possível permitir a cobrança de uma "tarifa" do usuário para que tal obrigação seja cumprida pela concessionária do serviço de telefonia.

Assim não fosse, a continuidade do serviço seria imposta ao usuário não como um direito, dentre tantos outros assegurados pelo

Códex Consumerista, mas, em verdade, como uma obrigação, um ônus, de que não poderia sequer se ver livre ante a essencialidade do

serviço prestado.

A ressalva consubstanciada na necessidade de que o serviço seja "essencial", no que tange à continuidade da prestação do

serviço público estabelecida pelo Código de Defasa do Consumidor, deixa nítido que não há que se exigir qualquer contraprestação para

que se efetive tal direito.

A única hipótese de "quebra" de tal princípio, admitida pela jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça, envolve o

inadimplemento das tarifas cobradas pela efetiva prestação do serviço, conforme se aduz da leitura dos seguintes julgados:

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ADMINISTRATIVO - SERVIÇO PÚBLICO - CONCEDIDO - ENERGIA ELÉTRICA - INADIMPLÊNCIA.

1. Os serviços públicos podem ser próprios e gerais, sem possibilidade de identificação dos destinatários. São financiados pelos

tributos e prestados pelo próprio Estado, tais como segurança pública, saúde, educação, etc. Podem ser também impróprios e individuais,

com destinatários determinados ou determináveis. Neste caso, têm uso específico e mensurável, tais como os serviços de telefone, água

e energia elétrica.

2. Os serviços públicos impróprios podem ser prestados por órgãos da administração pública indireta ou, modernamente, por

delegação, como previsto na CF (art. 175). São regulados pela Lei 8.987/95, que dispõe sobre a concessão e permissão dos serviços

público.

3. Os serviços prestados por concessionárias são remunerados por tarifa, sendo facultativa a sua utilização, que é

regida pelo CDC, o que a diferencia da taxa, esta, remuneração do serviço público próprio.

4. Os serviços públicos essenciais, remunerados por tarifa, porque prestados por concessionárias do serviço, podem

sofrer interrupção quando há inadimplência, como previsto no art. 6º, § 3º, II, da Lei 8.987/95, Exige-se, entretanto, que a

interrupção seja antecedida por aviso, existindo na Lei 9.427/97, que criou a ANEEL, idêntica previsão.

5. A continuidade do serviço, sem o efetivo pagamento, quebra o princípio da igualdade da partes e ocasiona o enriquecimento

sem causa, repudiado pelo Direito (arts. 42 e 71 do CDC, em interpretação conjunta).

6. Recurso especial provido." (RESP 525500 / AL – STJ – 2ª Turma – Min. ELIANA CALMON – j. 16.12.2003). Grifos postos.

Pertinente o comentário externado no voto da Ministra Eliana Calmon, "in verbis":

"(...) Os serviços essenciais, na atualidade, são prestados por empresas privadas que recompõem os altos investimentos com o

valor recebido dos usuários, através dos preços públicos ou tarifas, sendo certa a existência de um contrato estabelecido entre

concessionária e usuário, não sendo possível a gratuidade de tais serviços.

Assim como não pode a concessionária deixar de fornecer o serviço, também não pode o usuário negar-se a pagar o

que consumiu, sob pena de se admitir o enriquecimento sem causa, com a quebra do princípio da igualdade de tratamento das partes.

A paralisação do serviço impõe-se quando houver inadimplência, repudiando-se apenas a interrupção abrupta, sem o aviso, como

meio de pressão para o pagamento das contas em atraso. Assim, é permitido o corte do serviço, mas com o precedente aviso de

advertência. (...)

À prestadora do serviço exige-se fornecimento de serviço continuado e de boa qualidade, respondendo ela pelos defeitos,

acidentes ou paralisações, pois é objetiva a sua responsabilidade civil, como claro está no parágrafo único do art. 22 do CDC. Como

então Sob o aspecto da norma específica, estão as concessionárias autorizadas a suspender os serviços, quando não pagas

as tarifas (art. 6º, § 3º da Lei 8.987/95); sob o aspecto ontológico, não se conhece contrato de prestação de serviço, firmado

com empresa pública, cujo não-pagamento seja irrelevante para o contratado; sob o ângulo da lógica capitalista, é

impossível a manutenção de serviço gratuito por parte de grandes empresas que azem altos investimentos.". Grifos postos.

Deveras, o fornecimento contínuo do serviço é característica intrínseca à prestação dos serviços públicos ditos essenciais, e por

seu implemento nada pode ser cobrado. A ressalva é feita, conforme demonstrado, quanto à possibilidade de interrupção pelo não

pagamento, por parte do consumidor, da tarifa exigida pelo serviço efetivamente prestado e consumido.

De fato, se é verdade que a continuidade não implica em gratuidade do serviço, de forma a que possa ser utilizado pelo

consumidor inadimplente em sua obrigação de "pagar pelo que consumiu", também é certo que não se vislumbra aceitável, ou

juridicamente possível, que além do preço do serviço seja-lhe exigida uma "tarifa" pela sua disponibilização de forma contínua.

A ilegalidade, portanto, vai além da ofensa ao princípio da continuidade dos serviços essenciais (art. 22 do CDC), que, conforme

visto, somente pode ser ressalvado em caso de não pagamento da tarifa pelo seu uso. Resta certo, ainda, que a cobrança da chamada

"tarifa de assinatura mensal" viola ainda o princípio constitucional da livre iniciativa (art. 170, CF), especialmente no que respeita ao risco/

ônus do empreendimento, o qual deve ser assumido pelo empreendedor e não pelo consumidor destinatário.

Deveras, a própria Lei nº 9.472/97, em seu artigo 83, parágrafo único, estabelece que: "Concessão de serviço de

telecomunicações é a delegação de sua prestação, mediante contrato, por prazo determinado, no regime público, sujeitando-se a

concessionária aos riscos empresariais, remunerando-se pela cobrança de tarifas dos usuários ou por outras receitas alternativas e

respondendo diretamente pelas suas obrigações e pelos prejuízos que causar".

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Ora, a remuneração exigida pela prestação contínua do serviço além de ferir o próprio princípio da continuidade - haja vista que, o

pagamento efetuado pelo consumidor em razão do serviço utilizado já lhe assegura o direito à prestação contínua - implica na exclusão, às

expensas do usuário, de todo e qualquer risco envolvendo o empreendimento, vez que a concessionária irá receber a citada "tarifa"

independentemente da efetiva prestação do serviço, ou seja, irá obter receitas sem que tenha de prestar qualquer tipo de serviço ao

consumidor, implicando em verdadeiro desvirtuamento e ofensa ao princípio constitucional da livre iniciativa.

A nulidade da cláusula contratual que estabeleceu a cobrança da citada "tarifa de assinatura mensal", merece, assim, ser

reconhecida, em especial ante o comando expresso constante do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, "in verbis":

"Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e

serviços que: (...)

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem

exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio

contratual;

III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das

partes e outras circunstâncias peculiares ao caso." Grifos postos.

Não se fazem necessárias maiores digressões para subsumir, com perfeita adequação, a conduta da Telefônica ao exigir a "tarifa

de assinatura mensal" ao conceito de "cláusula contratual abusiva" previsto no inciso IV do supra citado artigo 51 do Código de Defesa do

Consumidor.

Resta nítido que há ofensa à "equidade" e a boa-fé, além da exagerada desvantagem quando se estabelece obrigação que

somente onere o consumidor, exigindo deste valores para a manutenção dos serviços, ao mesmo tempo em que cobra pela sua efetiva

utilização (considerando-se, como visto, que a continuidade é intrínseca a noção de serviço público essencial, somente podendo ser

relevada ante o inadimplemento do serviço efetivamente prestado, não podendo ser considerada um fim em si mesma, com a

possibilidade de cobrança específica).

Assim é que, a vantagem exigida pela Telefônica (e demais concessionárias do serviço de telefonia) implica em verdadeira afronta

ao princípio da continuidade do serviço público essencial, vez que, independentemente da cobrança e pagamento pela sua real utilização,

permite que o consumidor seja considerado inadimplente tão somente por não recolher a citada "tarifa de assinatura mensal", ainda que

esteja corretamente pagando pelos serviços utilizados.

Há, portanto, nítida transferência do risco do empreendimento para o consumidor, com o conseqüente enriquecimento sem causa

da concessionária, o que também é vedado pelo ordenamento jurídico vigente, "ex vi" do teor do artigo 884 do Código Civil.

Imperioso, assim, que seja afastada a cobrança da "tarifa de assinatura mensal", bem como que seja determinada a devolução dos

valores indevidamente recolhidos a tal título, ante a flagrante ilegalidade de sua instituição e cobrança.

Portanto, resta de meridiana clareza que a "tarifa de assinatura mensal", instituída e cobrada para possibilitar a fruição contínua do

serviço de telefonia, não encontra respaldo no ordenamento jurídico pátrio, estando, ao revés, em flagrante contrariedade com os

dispositivos legais que lhe são aplicáveis, razão pela qual revela-se absolutamente pertinente a busca pela decretação judicial de sua

ilegalidade com a conseqüente determinação da devolução, em dobro, dos valores pagãos e cessação de cobranças futuras.

IV – Do Dever de Restituir os Valores Pagos Indevidamente

Devidamente demonstrada a ilegalidade da cobrança da "tarifa de assinatura mensal", cabe tecer algumas considerações sobre o

fundamento jurídico para a perfeita caracterização do dever da empresa concessionária de restituir os valores indevidamente cobrados.

Assim é que, o ordenamento jurídico pátrio é contumaz em estabelecer diretrizes para salvaguardar os direitos daqueles que são

lesados na relações intersubjetivas, seja de cunho civil, seja no âmbito das relações de consumo.

Mister destacar o dispositivo do Código Civil (Lei nº 10.406/2002) atinente à matéria:

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"Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe

dívida condicional antes de cumprida a condição."

Na esfera específica das relações de consumo, que envolvem o presente estudo, a proteção é igualmente positivada e acrescida

de um "agravante" consubstanciado no dever não só de restituir os valores indevidamente cobrados, mas, de fazê-lo em dobro.

É o que se verifica da leitura do artigo 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor:

"Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de

constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao

dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável."

Grifos postos.

Revela-se nítido, portanto, o direito dos consumidores de ver restituídos os valores indevidamente recolhidos a título de "tarifa de

assinatura mensal", sendo que o prazo prescricional, neste caso, não é aquele estabelecido no artigo 27 do Código de Defesa do

Consumidor, haja vista limitar-se à reparação de danos causados por fato do produto ou do serviço.

Deveras, ante a inexistência de previsão específica em relação ao prazo prescricional para restituição dos valores pagos

indevidamente aplica-se o disposto no artigo 205, "caput", do Código Civil, que estipula o lapso temporal de 10 (dez) anos (que deverá ser

analisado em conjunto com o artigo 2.028 do Código Civil).

Assim, têm os consumidores o direito de obter a restituição, em dobro, dos valores indevidamente pagos desde a utilização dos

serviços de telefonia oferecidos pela empresa concessionária do serviço, observado, por óbvio, o prazo prescricional citado, até o

momento em que for decretada a ilicitude da cobrança e suspensa a referida exigência.

Mister destacar que deverá ser pleiteada a inversão do ônus probatório - conforme previsto no artigo 6º, VIII do Código de

Defesa do Consumidor - a fim de que seja determinado à concessionária a apresentação de planilha com a indicação de

todos os valores pagos a tal título, desde a aquisição da linha telefônica, após o que será possível quantificar o valor exato a ser

restituído.

V - Conclusão

Acreditamos que os argumentos suso transcritos são pertinentes e bastantes para caracterizar a ilegalidade da cobrança da "tarifa

de assinatura mensal" bem assim para externar o dever de restituição dos valores pagos e cessão das cobranças futuras, podendo ser

sintetizados nas seguintes assertivas:

i. os valores exigidos a título de "tarifa de assinatura mensal" têm por escopo "manter a prestação contínua do serviço de telefonia

fixa", conforme reconhecem a ANATEL e a própria empresa concessionária, "ex vi" da Resolução nº 85/98 da ANATEL, bem assim

dos (i) contrato de concessão (ANATEL/Telefônica), e, (ii) contrato de prestação de serviço (Telefônica/Usuário);

ii. a referida cobrança, todavia, não é autorizada pela Lei nº 9.472/97, que em nenhum momento permite a exigência de qualquer tipo

de contraprestação pela "prestação contínua do serviço de telefonia", limitando-se, em seu artigo 103, a autorizar a cobrança de

tarifa de acordo com cada modalidade de serviço (ou seja, tarifa como contraprestação por cada tipo de serviço prestado);

iii. por expressa determinação da Lei nº 9.472/97 a continuidade na fruição dos serviços de telefonia é direito do usuário e

obrigação/dever da concessionária, conforme determinam os artigos 5º e 79, além de ser mencionada expressamente como cláusula

que deve constar dos contratos de concessão, sem qualquer tipo de alusão a eventual necessidade de "pagamento" para exercício

de tal direito;

iv. patente, portanto, a ilegalidade da Resolução nº 85/98 da ANATEL, bem assim do (i) contrato de concessão (ANATEL/Telefônica), e

do (ii) contrato de prestação de serviço (Telefônica/Usuário), vez que nitidamente contrários ao que determina a Lei nº 9.472/97,

criando, por veículos infra-legais, obrigação que inexiste na legislação aplicável, desvirtuando o consagrado princípio da

continuidade do serviço prestado no regime público;

v. de igual sorte, o Código de Defesa do Consumidor, dispositivo legal de ordem pública, estabelece como obrigatória à prestação dos

serviços públicos essenciais, entre os quais encontra-se o serviço de telefonia, "ex vi" do disposto no artigo 10, VII da Lei nº 7.783/89

e item 3 da Portaria nº 3/99 do Ministério da Justiça, inexistindo também na Lei Consumerista qualquer alusão à necessidade de

pagamento de tarifa específica para manutenção de tal direito;

vi. julgados recentes do Superior Tribunal de Justiça são uníssonos em asseverar que a "quebra" do princípio da continuidade na

fruição dos serviços públicos essenciais somente poderá ocorrer quando houver inadimplência, pelo usuário, da tarifa exigida pela

prestação do serviço, o que não se confunde com a "tarifa de assinatura mensal", cobrada, como visto, exclusivamente para a

aplicação do princípio;

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vii. a cobrança de valores sem qualquer tipo de contraprestação por parte da empresa concessionária – considerando-se que a

continuidade é corolário lógico do pagamento pelo serviço efetivamente usufruído - implica em verdadeiro desvirtuamento do

princípio constitucional da livre iniciativa (art. 170 da Constituição Federal), vez que seu único escopo é o de transferir unicamente

ao consumidor os riscos empresariais inerentes ao negócio, sendo a Ré beneficiada independentemente da ocorrência ou não de

consumo de seu produto (no que infringe também o artigo 83, parágrafo único da Lei nº 9.472/97);

viii. a previsão contratual da cobrança da "tarifa de assinatura mensal" subsume-se ao disposto no artigo 51, IV e § 1º do Código de

Defesa do Consumidor, caracterizando hipótese de nítida "cláusula contratual abusiva", devendo ser considerada nula de pleno

direito, ante a ofensa à "equidade" e a boa-fé além da exagerada desvantagem em que é colocado o consumidor em razão do

estabelecimento de obrigação que somente onera o usuário, exigindo deste valores para a manutenção dos serviços, não obstante

exista previsão de cobrança específica pela sua efetiva utilização;

ix. mister destacar que, ante os dispositivos legais e entendimentos jurisprudenciais atualmente existentes, o primado da continuidade

na prestação dos serviços públicos essenciais somente pode ser relevada ante o inadimplemento da tarifa pela prestação do

serviço; não podendo esta (a continuidade) ser entendida como um fim em si mesma a fim de sustentar a possibilidade de cobrança

específica;

x. o dever de restituir os valores pagos indevidamente encontra fundamento no ordenamento jurídico pátrio, em especial no artigo 42,

parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que a repetição do indébito será feita "em dobro";

xi. o prazo prescricional, pelo que entendemos, não é aquele descrito no artigo 27 da Lei Consumerista, visto que não se está diante de

"reparação de danos causados por fato do produto ou do serviço, mas sim o prazo geral inserto no artigo 205 do Código Civil (sendo

pertinente citar a necessidade de análise da regra de transição constante do art. 2.028, CC).

NOTAS

(1) Fonte: http://www.telefonica.com.br/internas/links/link_telefonica_fprecos.htm

(2) In: Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1990, p. 342.

Autor

Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):

BONFIM, Paulo Andreatto. Considerações sobre a ilegalidade da tarifa de assinatura mensal de telefone fixo. Jus Navigandi, Teresina, ano 9

(/revista/edicoes/2004), n. 436 (/revista/edicoes/2004/9/16), 16 (/revista/edicoes/2004/9/16) set. (/revista/edicoes/2004/9) 2004 (/revista/edicoes/2004) .

Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/5701>. Acesso em: 28 dez. 2012.

Paulo Andreatto Bonfim (http://jus.com.br/revista/autor/paulo-andreatto-bonfim)

advogado em Campinas (SP), especialista em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, pós-graduando

em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET)