Upload
habao
View
215
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
CONSTRUÇÃO DE MEMÓRIAS GEOGRÁFICAS NO ENSINO DE GEOGRAFIA:
UMA CONTRIBUIÇÃO A PARTIR DOS OBJETOS E MUSEUS NO PROJETO DE
ESTÁGIO SUPERVISIONADO
Viviane Melo Santos
[email protected] – UFS
Karine dos Santos Sobral
[email protected] – UFS
GT6: Educação: formação, ensino e prática docente.
RESUMO
A execução do Projeto de Estágio pode ser considerada uma das mais importantes
experiências vividas pelos alunos da Educação Básica e pelos estudantes universitários do
curso de licenciatura, pois é no processo de ensino-aprendizagem que os sujeitos expressam
na prática todo o conhecimento acumulado e adquirido, além de ser um campo de atuação que
possibilita o intercâmbio de saberes e experiências sociais. Visto isso, o trabalho que se segue
objetiva relatar as experiências dos sujeitos do processo de ensino cujas práticas estão
intrínsecas à execução do Projeto de Ensino. Memórias, objetos e museus assinalam enquanto
conceitos necessários, sobremodo trabalhados no Ensino de Geografia, para a análise do
conteúdo geográfico presente, bem como para construção de memórias geográficas tendo nas
relações cotidianas, o ponto de partida.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Geografia; Estágio Supervisonado; Memórias
Geográficas; Prática Docente.
INTRODUÇÃO
Entendemos que através do resgate da memória para construção no presente sobre um
passado, aqui entendido como processo para se chegar ao conhecimento geográfico
historicamente produzido e socialmente acumulado, porque “o conhecer é um processo social
e histórico, não um fenômeno individual e natural” (CAVALCANT, 2005, p. 189). Embora a
relação entre Geografia e Museu seja pouco explorada no ensino, os espaços-lugares [museus]
falam ou ocultam o conteúdo geográfico através dos tempos e espaços, podendo ser um
instrumento dialógico viabilizador, amplamente utilizado como recurso na mediação do
ensino de geografia em interdisciplinaridade e diálogo íntimo com outras ciências (SANTOS,
2016, KUNZ, 2016).
Explicita-se, portanto, para os propósitos de compreensão deste trabalho, analisar a
contribuição das memórias geográficas, dos objetos e museus para o Ensino de Geografia,
compreendendo a importância da execução do Projeto de Estágio para a prática docente.
Assim, foi resultado da disciplina de Estágio Supervisionado em Ensino de Geografia III,
aplicado no Colégio Municipal Clara Meireles Teles, com os alunos do 8º ano B. Nessa
leitura, a aplicação do Projeto de Estágio pode ser considerada uma das mais importantes
experiências vividas pelos alunos da Educação Básica, bem como estudantes universitários do
curso de licenciatura, pois é no processo de ensino-aprendizagem que os sujeitos expressam
na prática todo o conhecimento acumulado e adquirido, além de ser um campo de atuação que
possibilita o intercâmbio de saberes e experiências sociais.
1. Relação entre Geografia, Memórias Geográficas, Objetos e Museus
Materializado no espaço geográfico, os objetos devem ser lidos para além de um
vestígio na paisagem que explica um acontecimento histórico e geográfico, já que “muito
antes da escrita, para transmitir a memória coletiva do grupo usavam desenhos [pinturas
rupestres] para representar eventos importantes e preservar o saber acumulado pela
experiência” (PANIZZA, 2014. p. 175). Assim, o espaço geográfico como resultado da junção
dos sistemas de objetos e ações, concede aos geógrafos entender o resultado das ações
humanas mediante a análise do presente sobre o passado” (SANTOS, 1997). Por isso,
relaciona-se com a memória, consequentemente com a ciência geográfica e devem ser lidos,
os objetos como formas de garantia da preservação de uma memória passada, na qual se
estabelece uma linguagem complexa composta de signos, sentimentos e símbolos
representativos de uma dada realidade, pois “o objeto se manifesta não por palavras mas pelo
que representa” (SANTOS, 2000, p. 18).
Numa proposta de ênfase dada a articulação necessária entre a Geografia e a Memória,
Braga (2009) defende estimular os sentimentos de pertencimento de um espaço ou de um
objeto correspondente a um período, problematizar a mutação desse espaço a partir da
memória a fim de resgatar as lembranças e significados físicos ou não, sem priorizar a
memorização pura do conteúdo. O museu enquanto instituição de poder corrobora para
criação de uma identidade nacional – cultura, memória, língua, ciência, relações comerciais,
raça, educação - atribuindo-lhe materialidade e força simbólica, que por vezes, esteve
fortemente ligada à formação dos Estados Nacionais, além de explicação sistemática e
científica do universo (CARVALHO E FUNARI, 2011).
Numa visão geográfica da importância social e educativa das instituições
museológicas, os objetos contidos nos museus se constituem numa ferramenta de leitura
espacial, ao passo que carregam um conteúdo geográfico e ideológico a ser explorado no
ensino como ferramenta pedagógica na construção do conhecimento, além disso conforme
Santos (2000), contribui para reconstrução, preservação e difusão da memória da sociedade.
Partindo das nossas vivências e da percepção dos sujeitos envolvidos no processo de
ensino-aprendizagem alunos/estagiárias/professores, bem como das leituras teóricas
acumuladas em nosso processo de formação docente, cujo objetivo é a aproximação da
Geografia com o nosso lugar, nosso espaço vivido, trabalhado na compreensão de Cavalcant
(2013) a importância dos saberes, experiências, significados que os alunos já trazem para a
sala de aula, incluindo, obviamente, os conceitos cotidianos.
Nessa linha de pensamento, o fazer geográfico docente toma como ponto norteador o
lugar experienciado enquanto possibilidade para o saber ensinar-aprender, tendo o aluno
como principal sujeito no processo de ensino crítico e questionador das relações sociais
(CARVALHO, 2013). Portanto, há uma necessidade de fazer um resgate às memórias
geográficas contidas nos elementos de pesquisas: objetos e museus, enquanto recursos
necessários à construção de memórias geográficas.
2. Passos que nortearam a aplicação do Projeto de Ensino
O processo para se alcançar a construção do conhecimento no transcorrer da execução
prática do Projeto de Ensino “Construção de Memórias Geográficas: Uma leitura a partir de
objetos e museus”, contribuiu para apurarmos nosso olhar geográfico sobre os objetos e
museus. É preciso adquirir consciência da complexidade da mediação pedagógica em
interação social, tendo o outro como uma referência para se chegar na compreensão dos
significados dos conceitos que devem ser apreendidos (CAVALCANT, 2005), observando a
diacronia nas transformações sociais ocorridas no passado, porém lidas no presente, pois
como aborda Panizza (2014) o tempo como mutabilidade demanda por transformações no
espaço geográfico.
Das leituras teóricas sobre o tema proposto, entendida aqui enquanto “indissociável da
prática” (PIMENTA E LIMA, 2008), em sala de aula ocorreu a execução do Projeto, através
de aulas e recursos didáticos1 para compreensão do tema, a sistematização dos resultados
obtidos pelos alunos a partir da aplicação de questionários2 sobre os objetos escolhidos pelos
alunos, envolvendo-os diretamente na elaboração do projeto de ensino em que os alunos
foram incentivados a participarem do projeto na condição de pesquisadores (SILVA, 2011).
Além disso, houve a necessidade de um trabalho de campo para o Museu Artístico e Histórico
“Antônio Nogueira”, localizado em Itabaiana/SE.
Compreendemos as relações espaciais e temporais, exercitamos a comparação e a
linguagem oral e escrita, em forma de um evento expositivo na própria sala de aula, no qual
dos 28 alunos, apenas 10 além das 4 estagiárias, expuseram as experiências e os saberes novos
sobre os objetos escolhidos. Portanto, o resultado da aplicação do projeto proporcionou novas
memórias, novos olhares sobre a história e cultura de uma sociedade, ilustradas nas relações
mediatizadas pelos símbolos que podem ser uma realidade material heterogênea de diversos
povos qualitativamente distintos e que une-se a uma ideia, um valor, um sentimento
(CAVALCANT, 2005; COSTA, 2017).
A iniciativa em dialogar com os objetos e museus em interdisciplinaridade com a
ciência geográfica, busca o reconhecimento de um saber geográfico crítico produzido
socialmente, sob a perspectiva da „Geografia Cultural‟ como base teórico-metodológica ao
conhecer partindo dos fatos históricos culturais e perceptíveis, que os temas abordados trazem
uma originalidade, que por vezes foram negligenciados (CLAVAL, 2012). “Preservar a
memória é um exercício de cidadania, no processo contínuo de construção e formação de
gerações, objetivando interagir o passado com o presente, visando projeção para o futuro”
1 Produzimos um material didático para os alunos sobre o conteúdo.
2 Os alunos receberam os questionários para responder as questões referentes aos objetos escolhidos por eles.
(CARVALHO, 2007, p.17). Isto porque, a memória fornece o entendimento de que “o
presente é efêmero e com ele não temos o recuo necessário para entender o ambiente passado”
(PANIZZA, 2014, p.136). Portanto, pode ser concebida na compreensão do espaço geográfico
quando questionada a capacidade que os alunos possuem em refletir sobre as mudanças como
uma possibilidade de reconhecimento das relações sociais apreendidas no cotidiano.
Conforme abordagem levantada por Fontana e Fávero (2013, p. 3, grifo nosso):
“[...] o docente como profissional reflexivo não atua como um mero
transmissor de conteúdos, mas, em sua interação com os alunos,
professores, e toda a comunidade escolar, é capaz de pensar sobre
sua prática, confrontando suas ações e aquilo que julga acreditar
como correto para sua atuação profissional com as consequências a
que elas conduzem. Dessa forma, fica evidente a necessidade de
adequar as teorias utilizadas em sala de aula com a realidade e a
necessidade dos educandos [...]”.
A noção espacial adquirira pelos alunos no processo de ensino-aprendizagem a partir
da leitura sobre as memórias geográficas, os objetos e museus volta-se para um fazer
pedagógico crítico-reflexivo dos conteúdos, cujas práticas são revistas para atender as
necessidades dos sujeitos envolvidos com o propósito de alcançar a aprendizagem
significativa, quando alunos/estagiários/professores se reconhecem na construção de
conhecimento.
3. Em sala de aula: onde o fazer pedagógico desafiou os limites
O propósito do primeiro contato com a turma consistiu em apresentar o projeto, as
possiblidades e desafios a serem encarados. Destacamos a pertinência do assunto enquanto
um tema pouco trabalhado no Ensino de Geografia. As aulas predominantemente
caracterizaram-se por serem expositivas e dialogadas com debates de cunho crítico-reflexivo.
Objetivou-se problematizar como os objetos, museus e memórias na perspectiva do cotidiano
para a construção do conhecimento geográfico. Para isso, iniciamos com uma sondagem sobre
as memórias geográficas contidas nos elementos de pesquisas, objetos e museus, para saber o
que os alunos entendiam sobre esses elementos. Entre eles, indagou-se: Quais as
características esse objeto apresenta? Quem pertence? Qual o conteúdo geográfico presente
nele? Para que serve/utilidade? O que ele revela sobre o clima, vegetação, a sociedade?
A partir daí os alunos começaram a opinar acerca dos elementos sociais e físicos que
permeiam os objetos, além de contribuírem com mais exemplos que eles possuíam em seu
cotidiano. Dessa maneira, os alunos mostraram-se interessados e participativos na discussão.
Embora a escola não ofereça a estrutura adequada – salas apertadas e minúsculas, corredores
estreitos, sem acessibilidade - para o desenvolvimento das práticas pedagógicas, a execução
das mesmas ocorreram de forma satisfatória, sobretudo porque fomos bem recebidos pela
equipe de direção, alunos e funcionários de apoio da escola.
4. Das experiências no Trabalho de Campo
Ficou evidente que os alunos gostaram da ideia de serem os pesquisadores, visto que
sentiram-se com autonomia e determinação na escolha dos respectivos objetos. Além disso,
quando anunciada a visita ao museu local, o ambiente foi tomado por certa euforia pelo fato
de que nenhum deles havia tido a oportunidade de conhecer, embora tenham faltado 6 dos 28
alunos. (FIGURAS 01 e 02):
Figura 01: Alunos observando os objetos no museu, 2017
Fonte: Viviane Melo Santos, Trabalho de Campo.
Figura 02: Alunos interagindo com a museóloga, 2017
Fonte: Viviane Melo Santos, Trabalho de Campo.
No museu, fomos recebidos por uma museóloga, a qual estabeleceu de acordo com
Galvão (2001, p.4), “a informação museológica relacionada ao processo comunicacional
efetivado pela disseminação [do discurso]”. Dito de outro modo, o diálogo e a comunicação
museológica sobre a história dos objetos, em relação com a história local, do próprio
munícipio de Itabaiana, porém abrangeu-se para as escalas nacional e global. Fora solicitado
desde o primeiro encontro que os alunos começassem a pensar num objeto – a visita ao museu
contribui para escolha - o qual lhe remetesse alguma memória passada, pois eles trariam para
exposição e falar sobre o mesmo, partindo de um questionário que auxiliou na pesquisa sobre
este objeto. Assim, foi disponibilizado um ônibus da prefeitura, para efetivação do Trabalho
de Campo para o Museu Municipal de Itabaiana/SE - “Antonio Nogueira”, observar os
objetos contidos, bem como sua importância e contribuição para a construção do
conhecimento geográfico, a partir de suas respectivas memórias.
5. Socialização dos saberes geográficos sobre os objetos
Após a visita, realizamos um debate em sala, sobre as experiências adquiridas por eles.
Essa foi uma experiência legal, porque o museu não guarda apenas coisas „velhas‟, como
também objetos interessantes (informação verbal)3. Percebe-se com esse relato os conceitos
de „velho‟, „moderno‟, „antigo‟ remontando algo que não possui valor. Entretanto, com a
visita ao museu acaba sendo desconstruída essa ideia. Portanto, é reconhecida a importância
de preservar esse „velho‟. Na apresentação sobre as informações geográficas contidas nos
objetos, somente 10 dos 28 alunos apresentaram seus textos e expuseram os objetos.
(FIGURAS 03 e 04):
Figura 03: Apresentação dos textos e exposição dos objetos, 2017
Fonte: Viviane Melo Santos.
3 Relato do aluno A. na sala de aula sobre o Trabalho de Campo ao Museu “Antônio Nogueira”, em
Itabaiana/SE, em abril de 2017.
Figura 04: Objetos em exposição, 2017
Fonte: Viviane Melo Santos.
Em sala, pedimos a turma para formarem um círculo, e os que apresentariam, ficassem
no meio, para expressarem-se à vontade. Foi bem produtivo, principalmente por parte dos que
expuseram as memórias e o conteúdo geográfico contido nos objetos. Dentre as
apresentações, destacaram os depoimentos sobre o sentimento de pertencimento, valor e
apego que os objetos carregam, pois revelam as particularidades daqueles que os preservam.
Entre eles, os familiares próximos como os avós e pais foram em unanimidade, os
entrevistados. Descrições dos depoimentos dos alunos:
_ Esta cabaça pertenceu ao meu avô. Ele utilizava quando saía de casa para
trabalhar na roça. Ela era usada para colocar água, nos momentos que ele sentia sede. Meu
avô deu para o meu pai. Ele [avô] morreu faz 23 anos. E meu pai ainda guarda (informação
verbal)4.
_ “Este açucareiro de porcelana pertence a minha vó. Faz parte do enxoval do
casamento. Naquela época, a família que possuía um objeto como esse era conhecida por ter
„posses‟ ou „condições financeiras‟. Ele é feito de porcelana, um material raro para o tempo
dela” (informação verbal)5.
4 Relato do aluno V. na sala de aula sobre o objeto pesquisado, em Itabaiana/SE, abril de 2017.
5 Relato da aluna A. sobre o objeto pesquisado, em Itabaiana/SE, abril de 2017.
_ “Escolhi um pano feito de crochê. Esse pano foi feito artesanalmente pela minha tia
para enfeitar os móveis da casa. Ele é feito de algodão” (informação verbal)6.
_ “Trouxe esse chapéu de couro. Ele pertence ao meu avô. É feito do couro do gado, e
sua função serve para proteger a cabeça do sol, os olhos e o rosto dos espinhos das árvores,
quando ele ia pra „pega de boi no mato‟7. Essa é uma atividade comum aqui na região”
(informação verbal)8.
_ “Essa cédula e moeda são de um amigo meu. Elas representam a riqueza do nosso
país. É utilizada pelas pessoas para comprar alimentos e outras coisas. É fabricada de papel
que vem das árvores e de prata um mineral retirado do subsolo” (informação verbal)9.
Essas descrições revelam conteúdos geográficos a serem problematizados, como os
materiais que são feitos tais objetos, muitos deles utilizam-se de matérias primas com pouco
valor agregado no processo de transformação, ou seja, recursos minerais extraídos muitas
vezes por trabalhadores explorados sob condições precárias de trabalho nas minas, como por
exemplo a argila na fabricação da moringa, a prata na fabricação das moedas, as árvores na
fabricação das cédulas, em que as florestas nativas são desmatadas para dar espaço ao
eucalipto, a lã utilizada na confecção do pano de crochê, o qual trazia a resistência da cultura
através do artesanato. Sobre a moringa exposta, discutimos sobre esse recurso frequentemente
utilizado em nossas casas para armazenar água. Recentemente, está perdendo espaço para os
conhecidos „vasos de refrigerantes‟, „garrafas estrangeiras personalizadas‟ e filtros modernos.
Entretanto, ainda resistem como fora levantado pelos alunos.
Foram expostos ainda, imagens reveladas de uma antiga máquina de costura, disco de
vinil - nessa apresentação, foi abordado o gosto musical que o pai de um aluno em ouvir as
músicas do rei Roberto Carlos. Essa discussão em especial, nos levou a questionar sobre
alguns estilos musicais e cantores que foram exilados no contexto da Ditadura Militar porque
foram reprimidos em expor seus ideais. Enfim, foram criativos e atingiram o objetivo
esperado. E o mais importante, é que além de reconhecerem os valores dos objetos, sejam
sentimentais ou culturais, perceberam a relação com a Geografia.
6 Relato da aluna M. sobre o objeto pesquisado, em Itabaiana/SE, abril de 2017.
7 Expressão utilizada pelos vaqueiros quando estavam montados em um cavalo para laçar o boi. Essa
atividade ainda ocorre aqui em nossa região do Agreste e Sertão de Sergipe, nas matas da nossa caatinga. 8 Relato da aluna G. na sala sobre o objeto pesquisado, em Itabaiana/SE, abril de 2017.
9 Relato do aluno B. sobre o objeto pesquisado, em Itabaiana/SE, abril de 2017.
Travado o debate entre o „antigo‟ e o „moderno‟ que perfez nas apresentações
contribuiu para a conscientização de que não devemos sentir sentimentos de „vergonha‟,
„estranhamento‟ ou „desprezo‟ de um objeto que possuímos, que, mediante os discursos da
modernidade “perde valor” “deve se jogar fora porque é velho” para dar lugar a um “objeto da
atualidade, sustentável”. Sendo que, o que está oculto é a ideologia da sustentabilidade
irradiada pelos grupos financeiros com o propósito de aumentar a produção de mercadorias no
processo mundial de reprodução e acumulação capitalista, sem a preocupação com a
destruição da natureza e de comunidades tradicionais.
Portanto, nesse contexto Neoliberal, resulta da total transformação da natureza em
mercadoria necessária, apropriada pelo discurso sustentável como alternativa ao crescimento
econômico (CONCEIÇÃO, 2013; HARVEY, 2004). Trata-se portanto, de uma opção política
ou consenso determinados pelos países centrais aos países de economias subdesenvolvidas,
que ainda possuem alguma reserva natural, para o estabelecimento de fronteiras da soja, do
eucalipto, mineração, transgênicos, materializadas no espaço geográfico, principalmente
Latino Americano e Africano (MARTINEZ ALIER, 2014; SVAMPA, 2016).
6. Conclusão
Lembrar que, a Geografia não pode ser compreendida sem o espaço cotidiano
convalida para valorizar os saberes locais de um grupo ou sociedade, que historicamente
construíram de diversas formas as bases e elementos de interpretação de seus modos de vida.
Assim, o conhecimento geográfico está contido nos objetos, por sua vez nas instituições
museológicas, servindo para compreensão da realidade vivenciada, organizada, apropriada e
produzida socialmente pelos seres humanos em intermédio do trabalho.
A possibilidade de aprender a ler, aprendendo a ler o mundo; e escrever, aprendendo a
escrever o mundo, resgata na leitura de Callai (2005), o que estamos tentando demonstrar
neste trabalho, que, os museus constituem uma parte de leitura e compreensão desse mundo,
contendo também as paisagens, na medida que, estabelecem “ricos diálogos sobre as
construções dos espaços, dos lugares, dos territórios e, principalmente, da cultura de cada
tempo” (KARPINSKI, 2011, p. 26).
Em outros termos, como laboratórios vivos na construção do conhecimento,
consubstanciado na existência dos tempos que convergem para uma análise da identidade e
pertencimento, em contribuição para valorizar a memória geográfica, seja de um indivíduo,
grupo ou sociedade. Por isso, pretendeu-se ir além da Geografia Tradicional, entendida pela
enumeração de dados geográficos, espaços fragmentados, ao levantar questões desconexas,
isolando a realidade complexa, em vez de construir a ideia de espaço na sua dimensão
cultural, econômica, ambiental e social no contexto geográfico que é o mundo da vida
(CALLAI, 2011; CASTELLAR, 2005).
REFERÊNCIAS
BRAGA, Altamiro E. A Memória Geográfica: as imagens do espaço habitado como
instrumento de ensino de geografia. ENEG 10º Encontro Nacional de Prática de Ensino em
Geografia. Porto Alegre, 2009.
CARVALHO, ALINE; PUNARI, PEDRO PAULO. Museu e Identidade Nacional: reflexões
e propostas. In: III SEMANA NACIONAL DE MUSEUS NA UNIFAL, IX SEMANA
NACIONAL DE MUSEUS: MUSEUS E MEMÓRIAS; 2011; Minas Gerais. Anais... Minas
Gerais: UNIFAL, 2011.
CARVALHO, Ana Conceição S. de. Sergipe e sua Memória. In: ANA, C. S. de C; ROSINA,
F. R. (org.). Monumentos Sergipanos: Bens protegidos por lei e tombados através de Decretos
do Governo do Estado. Aracaju: Sercore, 2007.
CARVALHO, Márcia E. S. Ensino de geografia e formação docente: reflexões e ações para o
cotidiano escolar. In: O Fazer Geográfico: Teoria e Prática. (Orgs.) CARVALHO, E. S.;
SANTOS, Ana R. dos. Editora FUS: São Cristóvão, 2013. cap. 7, p. 161-180.
CAVALCANT, Lana de Souza. Geografia, Escola e Construção de Conhecimentos. 18º ed.
Campinas, SP: Papirus, 2013.
______. Cotidiano, mediação pedagógica e formação de conceitos: uma contribuição de
Vygotsky ao ensino de geografia. Cadernos Cedes, Campinas, v. 25, n. 66, p. 185-207, 2005.
CASTELLAR, Sonia M. V. Educação geográfica: a psicogenética e o conhecimento escolar.
Cadernos Cedes, Campinas, v. 25, n. 66, 2005, p. 209-225. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v25n66/a05v2566.pdf. Acesso em: 20 mar. 2017.
CLAVAL, Paul. A geografia cultural no Brasil. In: BARTHE-DELOIZY, F., and SERPA, A.,
orgs. Visões do Brasil: estudos culturais em Geografia [online]. Salvador: EDUFBA; Edições
L'Harmattan, 2012, p. 11-25. ISBN 978-85-232-1238-4. Available from SciELO Books http://books.scielo.org
CONCEIÇÃO, Alexandrina Luz. A Insustentabilidade do Desenvolvimento Sustentável. p.
13, 2013. Disponível em: https://gpect.files.wordpress.com/2013/11/a-insustentabilidadade-do-
desenvolvimento-sustentc3a1vel.pdf. Acesso em: 08/04/2017 as 13:02 mim.
COSTA, Otávio. Memória e paisagem: em busca do símbolo dos lugares. Espaço e Cultura,
Rio de Janeiro, edição comemorativa 1993-2008, p. 149-151. Disponível em: www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/espacocultura/article/view/6143/4415. Acesso em: 20 mar. 2017.
FONTANA, Maire Josiane; FÁVERO, Altair Alberto. Professor Reflexivo: uma integração
entre teoria e prática. REI – Revista de Educação do IDEAU (Instituto de Desenvolvimento
Educacional do Alto Uruguai), v. 8, nº 17, 2013.
GALVÃO, GEYSA KARLA ALVES. A relação museu-visitante: o caso do Museu do
Homem do Nordeste. In: XXVI SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA; 2011; São Paulo.
Anais... São Paulo: ANPUH, 2011.
______. O “Novo” Imperialismo: acumulação por espoliação. In: ______ Socialist Register
2004: O novo desafio imperial. Buenos Aires: CLACSO, 2006. Traduzido por: Rodrigo
Rodrigues. Disponível em:
http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/ar/libros/social/2004pt/01_boron.pdf. Acesso em:
04/12/2016.
KARPINSKI, Cezar. Paisagem e História: notas de leitura. Espaço Plural, Cascavel, ano XII,
n. 25, 2011, p. 26-36.
KUNZ, Sidelmar Alves da S.; CASTIONE, Remi. ESPAÇO GEOGRÁFICO E
INTERDISPLINARIDADE: natureza do conhecimento geográfico no saber escolar. Revista
Brasileira de Educação em Geografia, Campinas, v. 6, n. 12, p. 259-273, jul./dez., 2016.
MARTÍNEZ ALIER, Joan. O ecologismo dos pobres: conflitos embientais e linguagens de
valoração. Tradução de Maurício Waldmam. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2014.
NETO, Otávio Cruz. O Trabalho de Campo como descoberta e criação. In: DESLANDES,
Suely F.; NETO, Otávio C.; GOMES, Romeu e MARIA, Cecília de S. (Org.). Pesquisa social:
Teoria, método e criatividade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. p. 51.
PANIZZA, Andrea de Castro. Paisagem. 1 ed. São Paulo: Melhoramentos, 2014. Coleção
Como eu Ensino. 175 p.
SANTOS, Fabrícia de O. GEOGRAFIA E MUSEUS: proposta de diálogos. Revista Brasileira
de Educação em Geografia, Campinas, v. 6, n. 12, p. 259-273, jul./dez., 2016.
SANTOS, Fausto Henrique dos. Metodologia Aplicada em museus. São Paulo: Editora
Mackenzie, 2000.
SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço. Técnica e Tempo. Razão e Emoção. 2ª ed. São
Paulo: Hucitec, 1997. p. 64.
SILVA, Vicente de P. da. O ensino de geografia por meio de projetos de pesquisa:
experiências em escolas públicas no município de Uberlândia – MG. Revista Ensino de
Geografia, Uberlândia, v. 2, n. 2, p. 23-38, 2011.
SVAMPA, Maristella. Extrativismo neodesenvolvimentista e movimentos sociais. In:
DILGER, Gerhard; LANG, Miriam; Filho, Jorge Pereira (org.). Descolonizar o Imaginário:
Debates sobre pós-extrativismo e alternativas ao desenvolvimento. Tradução de Igor Ojeda.
São Paulo: Elefante, 2016. cap. 4, p. 141-171.