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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
ISSN 2236-1855 2695
CONSTRUINDO AS REDES DE SOCIABILIDADES NA TRAJETÓRIA E OBRA DE PRIMITIVO MOACYR1
Raphael Ribeiro Machado2
Rosana Areal de Carvalho3
Nos últimos anos temos nos debruçado sobre os caminhos percorridos por Primitivo
Moacyr ao longo de sua vida bem como de sua obra, a fim de entender sua inserção no
universo da História da educação, do pensamento educacional e suas contribuições para a
Historiografia da Educação. Perguntas inúmeras foram levantadas: como ele trabalhou suas
fontes? Ele se perguntava ou apresentava alguma anotação sobre seu trabalho metodológico?
Como ele se considerava: um escritor de histórias? Um arquivista? Um historiador?
Jornalista? Um intelectual? Outras perguntas levantavam hipóteses sobre a produção,
circulação e apropriação de sua obra. Ainda, questionamentos sobre seu itinerário e trajetória
de vida, formação acadêmica, casamento, amizades, enfim, perguntas sobre como ele vivera
sua vida e se constituíra como um dos primeiros produtores de obras sobre a História da
Educação Brasileira. Estas perguntas e muitas outras ainda não foram esgotadas. Nem todas
as questões históricas são respondidas, como já sabemos, mas as que conseguimos alcançar
êxito estiveram em torno do olhar metodológico com o qual privilegiamos as nossas análises.
Decidimos encarar a vida e a obra de Primitivo Moacyr como fonte e como objeto,
seguindo os rastros teóricos de Sirinelli e Ângela de Castro Gomes, a fim de encontrarmos a
trajetória de vida bem como a construção de suas redes de sociabilidades ao qual o intelectual
se inseria e utilizava em suas relações sociais e profissionais como um todo. A trajetória de
Primitivo Moacyr nos abriu um campo de possibilidades para a construção das redes de
sociabilidades, pois nela encontramos os locais de atuação profissional, circulação social, os
laços de amizade e os contatos diversos que uma vida na cidade do Rio de Janeiro, no início
do século XX, poderia trazer para um sujeito dessa estirpe.
Dentro dessas possibilidades privilegiamos, para este texto, a apresentação de alguns
dados coletados e esmiuçados sobre a presença de Primitivo Moacyr nas revistas e jornais
1 Este trabalho conta com o apoio da FAPEMIG e do CNPq. 2 Mestre em Educação pelo CEFET-MG, professor das redes municipal de Ouro Branco e estadual de Minas
Gerais. E-Mail: <[email protected]>. 3 Doutora em Ciências Humanas pela USP; professora associada do Departamento de Educação da Universidade
Federal de Ouro Preto. E-Mail: <[email protected]>.
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brasileiros na primeira metade do século XX, necessários para a construção da trajetória de
vida e das redes de sociabilidades. Estas revistas e jornais nos mostraram que a atuação
profissional e social de Primitivo Moacyr ia muito além das salas do Congresso Brasileiro –
enquanto redator da casa – e da sua produção historiográfica.
Construindo nosso aparato metodológico
Em primeiro lugar, nos pareceu evidente as incursões da obra e da figura de Primitivo
Moacyr na História da Educação brasileira, bem como na própria História do Brasil. Se a
educação fora lócus importante para a disseminação e efetivação de um modelo de Estado
nas décadas de 1930 e 1940, seu papel deve ser destacado, tanto pela obra que produziu
quanto por ser sujeito atuante na construção da história educacional nacional. Por isso,
entender o caminho de vida, suas redes de sociabilidades, mostraria o lugar de fala do
intelectual, o local da escolha das fontes, dos meios discursivos, de sua condição de sujeito
que, como redator na Câmara dos Deputados, além de organizar e sistematizar arquivos e
fontes publicou livros por destacadas instituições e desfrutou de amizades influentes.
Trajetórias são importantes para traçarmos um panorama de vida de um sujeito. No
caso de Primitivo Moacyr é importante para localizarmos o sujeito nos diversos momentos de
sua vida, buscando delinear as redes de sociabilidades a partir das relações estabelecidas por
ele.
De início, encontramos algumas informações no trabalho monográfico de Guaraci
Melo, no qual explorou a rede de relações e a vida social de Moacyr, buscando entender, por
um lado, sua ausência no Manifesto dos Pioneiros da Educação (1932) e, por outro lado, sua
relação com o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro - IHGB. Luiz Antônio Oliveira, na
tese defendida em 2014, utilizando a imprensa como base de pesquisa, esboçou um sujeito
ativo e articulado. Em consonância a esses trabalhos buscamos delinear o perfil e a trajetória
de Primitivo Moacyr, utilizando fontes menos usuais, como as revistas de entretenimento.
Entendendo-o como intelectual, buscamos pelo lugar de Primitivo Moacyr na sociedade
carioca e brasileira, entrelaçado aos debates próprios do campo. Para Carlos Vieira (2015) a
identidade social dos intelectuais está inegavelmente associada ao gosto e à familiaridade
com a cultura, mas também ao sentimento de missão ou de dever social. Em outras palavras
no enfoque que propomos, não basta ser sábio e erudito para ser identificado como intelectual, pois o intelectual é aquele que mobiliza o seu prestígio como especialista em favor de causas públicas, muitas delas completamente distantes das suas especialidades. Ainda que a educação e a pedagogia tenham dimensões técnicas, práticas e teóricas próprias, parte significativa
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das discussões que perpassam essas áreas estão associadas aos impactos produzidos pelos investimentos educacionais na sociedade. Nessa chave de leitura, o debate educacional ultrapassa o espaço dos especialistas, para se constituir em questão pública e política, estratégia para pensar as relações sociais em sentido ampliado (VIEIRA, 2015, p.8)
Ainda sobre o perfil do intelectual, mobilizamos a ideia/conceito proposta por Sirinelli:
o intelectual como produtor de conhecimento e mediador social e cultural. Os caminhos
metodológicos utilizados por este autor nos instigaram como referência analítica sobre o
caminho documental a ser perseguido. A ação dos intelectuais que é política estaria inscrita
na curta duração, se estendendo para a média ou até mesmo longa por meio de seus legados
intelectuais podendo, assim, influir nos acontecimentos em diferentes durações do tempo
caracterizando-os como elementos detentores de poder. Por isso mesmo as perguntas da
História dos Intelectuais, por sua vez, são de como as ideias vem a estes intelectuais, como
aparecem em determinada data, porque alguns permanecem na penumbra e outros não.
Sirinelli defende que a cultura política é apenas, em parte, elaborada pelo meio intelectual,
com o qual, algumas vezes, está de acordo (Sirinelli, 1996, p.237). Nesse sentido uma tradição
política compõe um grupo maior que é a cultura política.
Pode-se pensar a relação entre História Intelectual e História das Culturas Políticas
subordinando a primeira à segunda, pois os domínios destas disciplinas não são estranhos
entre si. Delineia daí um entendimento sobre o que é o intelectual:
Por esta última razão, é preciso, a nosso ver, defender uma definição de geometria variável, mas baseada em invariantes. Estas podem desembocar em duas acepções do intelectual, uma ampla e sócio-cultural, englobando os criadores e ‘mediadores’ culturais, a outra mais restrita, baseada na noção de engajamento. No primeiro caso estão abrangidos tanto o jornalista como o escritor, o professor secundário como o erudito. (SIRINELLI, 1996, p.242-243)
O autor conclui que o debate entre as duas definições é um falso problema, pois, os dois
elementos são de natureza sociocultural. Para resolver essa questão faz-se necessário as
abordagens a partir de conceitos como os de itinerário, geração e sociabilidade. Para o de
itinerário objetiva-se desenhar mapas dos grandes eixos de engajamento dos intelectuais,
tomando o gênero biográfico e a perspectiva de trajetórias cruzadas de forma a identificar os
‘despertadores’ de ideias e suas influências, em abordagem diacrônica. Desta maneira
procura-se analisar a procedência dos intelectuais a partir de seu lugar de formação no viés
da reconstituição crítica.
As sociabilidades se constituem no seio do ‘pequeno mundo estreito’ em torno da
redação de uma revista ou de um conselho editorial, ressaltando a importância do termo
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‘redes’ para captar tal fenômeno. Dessas redes também emergem as posições antagônicas e
pela análise destas é possível captar o movimento de ideias.
O conceito de gerações diz respeito à solidariedade de idade. O exemplo utilizado pelo
autor é a Revista dos Annales, a partir de duas razões: no meio intelectual os processos de
transmissão cultural são essenciais, pois, um intelectual se define sempre por referência a
uma herança, como intermediação, ou mesmo como ruptura, mas sempre em referência a
algo. A segunda razão está no papel explicativo de cada faixa etária diante de um fenômeno.
A noção de rede de sociabilidades indica um acordo na realização de um projeto
político cultural e, no caso, tendo como ponto nodal a educação. Evidentemente, não retira da
noção de sociabilidade o aspecto afetivo, mas faz com que esta adquira, também, um sentido
engajado nas redes de relações em que o sujeito estava envolvido. Tal noção teórica indica um
caminho semelhante na construção de nossa metodologia ao que Vieira aponta:
Na experiência brasileira do final do século XIX até o século XX, muitas das iniciativas dos intelectuais engajados na cena pública estiveram associadas, direta ou indiretamente, a projetos educacionais. Tais iniciativas visavam à ampliação e ao aprimoramento da escola nos seus mais diversos níveis ou ao desenvolvimento de redes públicas e privadas de formação, envolvendo a organização de empreendimentos editoriais, redes de museus, teatros, cinemas e bibliotecas, atividades artísticas, esportivas e de lazer, entre outras políticas e ações culturais. Sendo assim, se entendemos a educação como uma questão que detém uma ampla dimensão política, somos obrigados a refletir sobre os agentes dessa política, aqueles que ocupam posições de prestígio e de poder. (VIEIRA, 2015, p.8)
Entre estes agentes estão os intelectuais que ocuparam a cena pública brasileira em
diferentes tempos da História. Um exemplo disso são os que gravitaram em torno do
Manifesto dos Educadores de 1932, capaz de exemplificar essa atitude de manifestação dos
intelectuais em torno de projetos educacionais. Também, tal contexto de atuação de
intelectuais nos instiga a pensar as diferentes manifestações e locais de tomada de poder
destes atores sociais que, no contexto das décadas de 1930 e 1940 no Brasil, atuaram em
postos políticos estratégicos para viabilizar seus projetos. Reconhecemos a disputa das elites
intelectuais por espaços e poder e, no caso brasileiro, a produção intelectual e a ação política
e sociocultural são maneiras de intervir na sociedade, tendo na educação o lugar de
convergência de tais ações. E por isso mesmo, o intelectual é um ser político por essência.
Portanto, um estudo sobre a obra moacyrniana e sobre o próprio sujeito produtor da
mesma perpassa o entendimento de como o governo Vargas (1930-1945) estabeleceu os
pilares de suas políticas estatais mais gerais e estruturou a educação nacional, em
conformidade com a lógica da modernidade e do “novo”. Em paralelo, a publicação da obra
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moacyrniana pela Editora Nacional, pelo INEP e pelos órgãos de imprensa deixou a marca
intelectual histórica do autor no cenário brasileiro.
Por meio da leitura da obra moarcyrniana descobrimos certas raízes e filiações do
indivíduo, restituindo a este as coerências do seu comportamento, estabelecendo uma lógica
do preferível na argumentação, de sua adesão a determinados grupos organizados à volta de
uma cultura. Grupos, porque esta chave de leitura nos permite pensar de forma mais coesa o
coletivo em que o individual se apresenta, pois, a adesão a determinada visão de mundo
perpassa escolhas partilhadas. Assim, essa visão de mundo, esse senso comum partilhado, é o
lócus comum de onde os indivíduos retiram seus meios argumentáveis, feitos de forma
individual. Um estudo sobre os argumentos retóricos utilizados por Moacyr para construir
suas obras, sua visão sobre a educação e sua escrita histórica nos mostra possível de ser
entendido como parte de uma escolha de visão de mundo, de gestos, valores e crenças postos
na e para a coletividade bem como construtora da mesma. Argumentos retóricos que são
extraídos de um repertório, como nos adverte Ângela Alonso, partindo das formulações de
Charles Tilly e Ann Swindler, que são compostos por padrões analíticos, por noções,
argumentos, conceitos, teorias, esquemas explicativos, formas estilísticas, figuras de
linguagem e metáforas, não importando a consistência teórica entre seus elementos, pois,
respondem a necessidades históricas e práticas. Para Alonso, repertório pode ser definido da
seguinte maneira:
um conjunto de recursos intelectuais disponível numa dada sociedade em certo tempo. É composto de padrões analíticos; noções; argumentos; conceitos; teorias; esquemas explicativos; formas estilísticas; figuras de linguagem; metáforas (SWINDLER, 1986 apud ALONSO, 2002, p.39-40). [...] são criações culturais aprendidas, mas elas não descendem de uma filosofia abstrata ou ganham forma como resultado de propaganda política; eles emergem da luta [...] e designam [...] um conjunto limitado de esquemas que são aprendidos, compartilhados e postos em prática através de um processo relativamente deliberado de escolha. (TILLY, 1993, p. 264 apud ALONSO, 2002, p.39-40). (ALONSO, 2002, p.40).
Acrescenta a autora que os repertórios funcionam como “caixas de ferramentas” às
quais são acessadas de forma seletiva, respondendo às necessidades de compreensão e ação.
Portanto, um estudo sobre intelectuais recai sobre problemas políticos, listados de forma
dialética, racional e por meio de argumentos que buscam a persuasão, na lógica do preferível,
para a construção de um modelo cultural e social a ser seguido no e pelo Estado Republicano
Brasileiro nos anos de 1930 e 1940. A associação a questões sociológicas e à História das
ideias e dos conceitos também pode estar presente. Por conseguinte, estudos sobre os
intelectuais demandam que existam no contexto de análise indivíduos que reclamem essa
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identidade ou definidos como tais dentro de um grupo que se proclama intelectual, assim
como outros grupos sociais que reconheçam e reiterem essa representação.
Por fim, para além da identificação dos atores da vida intelectual, é necessário precisar
o potencial de poder político dos intelectuais em relação aos demais grupos sociais e
compreender os objetivos, as estratégias e as posições ocupadas pelos intelectuais no interior
do campo cultural, entendendo-os na perspectiva das diferentes posições e hierarquias entre
os mesmos incluindo os outsiders.
Sob este ponto, Gomes (1999) revela o elo que necessitávamos para definir nosso
aparato metodológico. Encontramos a necessidade de captar a ambiência sócio-político-
cultural da cidade, para então mapear a dinâmica de articulação de seus vários grupos
intelectuais reunidos em lugares de sociabilidade por eles legitimados para o debate e a
propagação das ideias, indissociáveis de formas de intervenção na sociedade. Os estudos
sobre as sociabilidades concentram sua atenção na lógica de construção e estabelecimento de
seus grupos, postulando interdependência entre a formação de certas redes e os tipos de
sensibilidades desenvolvidos nestes locais. Este tipo de abordagem se mostrou interessante
porque concentrou nossa análise sobre os intelectuais, por “permitir uma aproximação das
obras dos intelectuais, através do privilegiamento das condições sociais em que foram
produzidas, enquanto constitutivas de um certo campo político-cultural.” (GOMES, 1999, 11).
Tal prática trás o reconhecimento da existência de um campo intelectual com vinculações
amplas,
porém com uma autonomia relativa que precisa ser reconhecida e conhecida. Isto poderia ser alcançado com uma investigação que acompanhasse as trajetórias de indivíduos e grupos; que caracterizasse seus esforços de reunião e de demarcação de identidades em determinados momentos; e que associasse tais eventos às características estéticas e políticas de seus projetos. (GOMES, 1999, p.11)
Nosso trabalho se concretizou pela construção da trajetória de Primitivo Moacyr que
nos trouxe um itinerário de vida do mesmo, bem como a possibilidade, por meio deste, de
construir redes de sociabilidades que ajudaram a demarcar sua identidade como intelectual e
a nos oferecer horizontes de inteligibilidade de sua obra e o lugar desta no momento de
produção e leitura da mesma.
Construindo redes de sociabilidades: a imprensa como local privilegiado
Baiano de Salvador, nascido em 1867, Moacyr teve seus primeiros contatos com a
instrução pública como professor de primeiras letras em Lençóis, no interior da Província da
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Bahia. Em seguida, transferindo-se para Recife, a convite do presidente da Província de
Pernambuco, trabalhou no Liceu da capital. Para coroar esse percurso evolutivo,
provavelmente instigado pelas experiências e pelo ambiente ali vivenciado, seguiu para o Rio
de Janeiro. Em 1894 diplomou-se em Direito pela Faculdade Livre do Rio de Janeiro.
O início do século XX já o encontrou funcionário da Câmara de Deputados. Na função
de redator e relator dos debates parlamentares dedicou mais de trinta anos de sua vida.
Ainda acadêmico de Direito, Moacyr apresentava uma personalidade atuante e envolvida
com questões jurídicas e nacionais. A partir de 1896 passou a ocupar o cargo de redator dos
debates parlamentares na Câmara Federal, lugar que lhe permitiu contatos e o
desenvolvimento do gosto pelos arquivos. É também a partir desse espaço, principal em sua
vida trabalhista, cultural e política, que teve a oportunidade de aprofundar as relações com
políticos, intelectuais, dentre os quais muitos educadores que, como ele, comungavam do
princípio indeclinável da instrução como formação do povo e responsabilidade do Estado.
Moacyr também ocupou um cargo na Procuradoria dos Feitos da Saúde Pública,
permanecendo de 1905 até 1911, quando foi exonerado por acúmulo de cargo.
Do ponto de vista social, Primitivo era presença certa nas festas particulares e oficiais,
nas homenagens, em concursos e eventos culturais. Outra atividade desenvolvida por Moacyr
e sobre a qual se encontrou o primeiro registro somente em 1929, refere-se à sua atividade
oficial como inspetor para os institutos particulares de ensino secundário. 4 Aposentou-se em
julho de 1933, na condição de redator de documentos parlamentares da Secretaria da Câmara
dos Deputados.
Conforme Luiz Antônio Oliveira (2014), a sistematização da produção do discurso da
instrução pública por parte de Moacyr insere-se em sua compreensão de República. A
história da instrução nas províncias e no Império é lida e demarcada por Moacyr à luz do
presente, de forma a evidenciar que a atualidade era responsável pela solução que se insistia
em impetrar ao passado. Concordamos com Oliveira no tocante ao debate mais premente em
Moacyr: a instrução primária sob a responsabilidade do Estado. Embora esteja presente em
todos os livros os demais níveis escolares, incluindo o ensino profissional.
Em 1916, Primitivo Moacyr já havia publicado O ensino público no Congresso
Nacional. Breve notícia, pela Imprensa do Jornal do Commércio, um trabalho que revelava o
interesse pelo assunto e a familiaridade com os documentos parlamentares que sua atuação
profissional possibilitava. Sobre o debut de Moacyr, Carvalho e Mesquita (2013) inferem que
4 Estas informações foram retiradas de OLIVEIRA (2014) e CARVALHO (2012, 2013, 2014).
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ao expor tal documentação, Primitivo Moacyr produziu elementos para uma crítica contundente à produção legislativa brasileira, cuja inoperância aparece em cada projeto, independente da qualidade e acerto deste. Assim, é possível justificar e cultivar uma descrença quanto ao futuro educacional se este dependesse, apenas, das ações legislativas. (CARVALHO; MESQUITA, 2013, p.52)
Este livro inaugura uma trajetória de dimensão inigualável que terá lugar entre os anos
de 1936 e 1942 quando, já desfrutando da aposentadoria, Moacyr dedicou-se quase
exclusivamente à escrita educacional. Nesse curto espaço de seis anos – tendo falecido em
outubro de 1942, publicou quinze livros tratando da educação brasileira no período imperial
e republicano até os anos 30 e mais dois trabalhos apresentados em congressos organizados
pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro - IHGB. Além disso, ao longo das décadas de
1920, 1930 e 1940 publicou quase que mensalmente no Jornal do Commercio do Rio de
Janeiro, no chamado “Mensário do Jornal do Commercio”, espaço de publicação de colunas
“jornalísticas” de diversos temas brasileiros como Medicina, História e Educação. Sujeitos
como Otto Prazeres, Affonso D. Taunay e Primitivo Moacyr eram figuras recorrentes nestas
colunas. Outros jornais da capital federal – como O Imparcial – e de São Paulo – como o
Correio Paulistano – foram locais de publicação e circulação de temas sobre a História da
Educação Brasileira pelas mãos de Moacyr.
A obra moacyrniana se insere no processo de construção da História da Educação
brasileira, bem como sua proposição, estipulada pelo próprio produtor como subsídio para as
produções posteriores. Insere-se numa lógica maior do que sua própria intencionalidade.
Suas marcas ao longo do tempo deixaram vestígios distintos em cada momento e por cada
leitor que dela fez uso. Ao longo do século XX, fora palco de discussões historiográficas
acaloradas acerca de seu papel, ora como fonte da História da educação brasileira, ora como a
própria história escrita, ora ainda como produto de uma forma positivista ou “antiquada” de
se produzir História. Sua incursão no tempo histórico possibilitou à mesma se tornar
presente em diferentes propostas de estudos, desde a formatação da história da educação no
Brasil. Por isso, nossa proposta recaiu sobre um olhar metodológico que privilegiou os
estudos sobre a trajetória e a construção de redes de sociabilidades para encontrar respostas
sobre as condições de produção de sua obra. Como objeto, sua vida nos trouxe importantes
contribuições neste caso. E na imprensa encontramos condições de tal análise.
Quando a imprensa começou a ser vista como fonte histórica, os jornais e revistas
foram sendo usados para analisar um determinado período histórico, para entender a
sociedade, economia e pensamentos que eram comuns ao tempo estudado. Para entender a
importância da imprensa na época e porque deste tipo de fonte para a construção da
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trajetória de vida e as redes de sociabilidades de Primitivo Moacyr, utilizamos da ideia de
Monica Velloso (2004) que analisa o jornalista como mediador social e de grande
importância para a formação da sociabilidade moderna, “ditando a moda, padrões de
comportamento, formando gostos, opinião e sensibilidades, a imprensa busca traduzir o
almejado espírito do moderno.” (VELLOSO, 2004, p.21). Desvela a cartografia urbanística do
pertencimento, “fixando o lugar de cada grupamento étnico-cultural, o novo projeto
urbanístico determina também padrões de conduta e sociabilidade.” (VELLOSO, 2004, p.49).
A cartografia urbanística é importante para o grupo em que Primitivo fazia parte, uma
vez que para cada grupo social, a legitimidade do espaço em que se está, há a necessidade de
uma conduta social, por isso a cada espaço em que estes intelectuais ocupavam tinha uma
conduta adequada, o qual Moacyr teria de seguir para estar dentro do padrão do lugar. Pode-
se observar este padrão e a tentativa de legitimidade de um espaço para estes intelectuais nos
encontros que aconteciam aos domingos no jardim do high-life ou fazer parte, como sócio
honorário, de duas Sociedades de Alienistas Allemães5 junto com Afrânio Peixoto.
Para mapear os principais sujeitos ligados à trajetória de Primitivo Moacyr elaboramos
uma lista a partir daqueles citados por Oliveira (2014) e Melo (2012) composta por vinte e
três nomes. Destes, selecionamos doze sujeitos com destacadas posições políticas e sociais:
Anísio Teixeira, Afrânio Peixoto, Carlos Peixoto Filho, Fernando de Azevedo, Francisco de
Paula Rodrigues Alves, Francisco Venâncio Filho, Gustavo Capanema, Lourenço Filho, Luiz
Vianna, Max Fleiuss, Miguel Calmon e Tavares de Lyra. Estes nomes foram utilizados na
busca pela trajetória de Primitivo Moacyr nas revistas Fon-Fon! e Careta, revistas de ampla
circulação na sociedade carioca.
A revista FON-FON! foi lançada no ano de 1907, com circulação semanal, aos sábados,
com informações da vida social e, por vezes, privada de pessoas influentes – políticos,
artistas, profissionais liberais, socialites. Encerrou suas atividades em 1958. Careta foi
lançada em julho de 1908 e encerrou suas atividades em outubro de 1960, também de
periodicidade semanal, saindo aos sábados. As edições tinham volume variado, de 19 a 80
páginas, sendo as maiores edições aquelas que divulgavam grandes eventos do jet-set carioca
por meio de muitas imagens: inaugurações, carnaval, recepções, dentre outros. As
propagandas também ocupavam muitas páginas: medicamentos, anúncios imobiliários,
produtos de beleza, vestuário e calçados para homens e mulheres, etc.
5 Revista FON-FON! 1908, 26ª edição. p 25. “Raio-X”
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Os números da revista Fon-Fon! 6 e Careta7 estão disponíveis online, mas, infelizmente,
não há instrumentos de busca automática. Procuramos localizar Primitivo Moacyr e os
sujeitos listados anteriormente para traçar alguns laços de amizade, filiações intelectuais,
locais de sociabilidade e outros dados necessários à construção das redes de sociabilidades.
Tais dados também são úteis para delinear algo do repertório utilizado pelo intelectual na
construção de si e de sua obra.
Na revista FON-FON! identificamos algumas colunas mais afins com a pesquisa tais
como Vida da Mulher e Vida ultra-chic, dedicadas a noticiarem o vai-e-vem de pessoas
socialmente reconhecidas, incluindo os intelectuais, e produzir informações do tipo “com
quem”, “onde” e “o que” estavam fazendo. Outras informações tinham origem em entrevistas
e, claro, informações que agradavam o público e garantiam a tiragem da revista. Outra coluna
trazia o sugestivo nome de Raio-x: a coluna funcionava como um aparelho radiológico
direcionado, especialmente, para as “celebridades”. A coluna tinha “capacidade”, por
exemplo, de enxergar o que traziam nos bolsos ou junto ao corpo.
Outra sugestiva coluna era Caixa de Gazolina, geralmente nas últimas páginas da
revista, na qual eram publicados trechos de correspondências trocas entre políticos, convites
para café da tarde nas residências de intelectuais e políticos como Carlos Peixoto8 e Afrânio
Peixoto9. Reproduzia elogios e homenagens, fatos e livros publicados; e, como não podia
deixar de ter, os capítulos de novelas. Como uma parcela da sociedade do Rio de Janeiro
ainda era analfabeta, como explica Ana Luiza Martins (2008), a FON-FON! publicava
ilustrações e fotos para atender a esse público.
As páginas da Careta, em grande parte, eram preenchidas com propagandas de
produtos. Algumas sessões eram voltadas para o público feminino. Os capítulos de novelas
vinham, geralmente, no final da revista; alguns trechos no meio da revista com continuação
nas ultimas páginas. O futebol tinha coluna fixa, com fotos, comentários e os resultados. As
charges10 sempre estavam presentes, expressando assuntos de política e parlamentares.
Levantamos a hipótese de que a revista recebia doações públicas, ou mesmo particulares,
pois as charges, ao longo dos anos, alteravam a acidez das críticas. As tirinhas, assim como as
charges, não tinham autoria, mas garantiam a dose de humor em cada edição.
6 http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_periodicos/fonfon/fonfon_anos.htm 7 http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_periodicos/careta/careta_anos.htm 8 Revista FON-FON! 1908, 28ª edição, p.14. 9 Revista FON-FON! 1908, 32ª edição. p 24. 10 Revista Careta 1926, edição 926, p. 18.
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Voltaire (nome ou codinome?) assinava as reportagens de cunho político da Careta:
noticiava as sessões parlamentares, recheava com explicações e críticas, ora apoio, as
decisões tomadas. Na revista FON-FON! o noticiário político não incorporava opiniões.
A coluna de correspondências na Careta, aberta ao público, não anunciava remetentes
ou destinatários. Em geral, o conteúdo das cartas era de opiniões sobre a política; por vezes
eram convites para festas e banquetes. A revista ainda contava com uma sessão cinema – A
influência poderosa dos “astros”, tratando de atores e atrizes de sucesso, os filmes por eles
estrelados, etc.
Na revista FON-FON! Primitivo Moacyr aparece, seja em citações ou cartas, vinte e três
vezes entre 1907 e dezembro de 1942 (ano de sua morte). Observamos que foi citado entre
1908 e 1912 e volta a aparecer em 1916 e, por fim, em 1919. Moacyr enviava cartas para a
coluna Caixa de Gazolina, da qual obtinha resposta: “O Dr. Miguel Calmon continua a residir
no Hotel dos Estrangeiros. Porque nos faz essa pergunta?”11. A coluna Raio-x revela que
Moacyr “levava cuidadosamente o cartucho de bon-bons francezes que havia comprado,
meia hora antes, de sociedade com o Dr. Eloy de Souza.”12.
A festa de aniversário de Carlos Peixoto Filho, que morava com Primitivo Moacyr, foi
notícia na coluna “Nota da Semana” da revista FON-FON!, com traços de ironia:
Foi toda de Alegrias intimas e effusões sinceras de longa e cuidadosa amizade. Não teve a consagração da Rua, nem as inconveniências da popularidade, mas a ternura encantadora de corações que se querem, que se compreendem e se acompanham unidos na viagem penosa pelos sarçais da Vida. [...] Foi toda sentimental e intima a <<nota>> predominante da semana, apanhada pela nossa decidida argucia de repórter e agora transmitida indiscretamente à curiosidade terrível dos leitores, nestas poucas linhas. Fazia annos Carlos Peixoto Filho (Perdôe-nos S. Ex., a liberdade com que o tratamos, mas é pra conservar na descripção a mesma feilçao familiar da scena). Depois de ter sofrido todos os supplicios da manifestação officiaes ; depois de ter recebido, com aquele seu cellebre sorriso histórico, os abraços, os apertos de mão, as felicitações, os cumprimentos de uma multidão incalculável que lhe foi <<desejar a continuação de sua preciosa saúde>> e fazer <<votos pela sua prosperidade>>, S. Ex. recolheu-se a seu sumptuoso 66 e ahí reuniu meia dúzia de velhas amizades para os regalos de uma ceia elegante e magnifica. Foram convivas desta deliciosa festa, desconhecida cá fora, o João Luiz Alves, o Camillo Soares de Moura, o Gastão da Cunha, o Afrânio Peixoto, o Calmon, e mais alguns, rapazes do tempo e do gênio do festejado. [...] Serviu-se um chá delicioso, que fazia esquecer completamente aquelle celebre cosimento, acompanhado de pão de queijo, que era o legado das noitadas da casa do Peres, na legendaria Laranjeiras do Piques, em São
11 Revista FON-FON! 1908, edição 16, p.16 12 Revista FON-FON! 1910, edição 2, p.12.
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Paulo, de onde o Camillo com seu bello ar de mosqueteiro, ao retirar-se noite alta, perguntava infallivelmente ao afável Julião: Julião, que horas são? E o Julião curvando respeituosamente o dorso, respondia infallivel: São meia-noite, seu doutô. [...] Z.(FON-FON! (1908, edição 25, p.20, grifos no original)
A notícia provocou reações, como podemos apreciar pela carta enviada por Moacyr,
intitulada “Uma rectificação” publicada pela mesma revista:
Senhor Redactor do Fon-Fon. Saudações amistosas. No seu numero de sabbado passado, Fon-Fon publica uma nota da semana, descrevendo a festa íntima realizada em nossa residência, por occasião do aniversário natalício do meu illustre amigo, Dr. Carlos Peixoto Filho. Posso affiançar-lhe Sr. Redactor, que o Fon-Fon foi mal informado, ou melhor, abusaram da má fé do seu elegante semanário. Como deve saber, o 66, que se refere a citada nota, é o vistoso palacete da rua dos Voluntários da Patria, onde eu, o Dr. Carlos Peixoto, e o Dr. Affranio, também, Peixoto, armamos o nosso sossegado tugúrio de celibatários. Na mencionada noite do aniversário do Dr. Carlos Peixoto, o meu illustre amigo, depois de ter assistido a brilhante manifestação que lhe fez o Centro Mineiro, comemorando tão auspiciosa data, recolheu-se pacatamente á casa, no bonde das 11 horas mais ou menos. O chá que houve, foi o chá costumeiro, de todas as noites, sem accrescimo, sequer, de um simples biscouto mineiro, e, não havia mais ninguém, se não os moradores do 66, eu, Dr. Affranio e o Dr. Carlos. A meia-noite estávamos todos recolhidos e a casa completamente fechada. Já vê Sr. Redactor, que a informação que lhe transmitiram, não é verdadeira.’ (FON-FON! 1908, edição 25, p.20.)
À essa carta a revista responde:
Embora nos mereça toda a consideração, a affirmação do illustrado Dr. Moacyr, não podemos deixar de estranhal-a, porquanto a nota, que publicamos foi colhida em uma conversa ouvida num bond do Largo dos Leões, entre o Dr. Affranio Peixoto e Celso Bayma que por sinal, lamentava profundamente, não ter assistido à festa descripta por nós. (FON-FON! 1908, edição 25, p.20.)
Este episódio revela Primitivo Moacyr como alguém de visibilidade social. Ainda sobre
o, porque era seguido, junto com amigos íntimos, para saber sobre a vida pessoal deles. Duas
edições depois, encontramos a notícia da mudança de Carlos Peixoto Filho para a Rua das
Laranjeiras 12713, feita com a ajuda do amigo Moacyr.
13 Revista FON-FON! 1908, edição 27, p.26.
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A presença em festas e peças teatrais também era noticiada: Afrânio Peixoto e Primitivo
foram flagrados pela revista com metade do bilhete no bolso do fraque, no caso de Afrânio, e
na carteira, no caso de Moacyr, para a tournée Ferandy-Brandés14.
Na coluna Notas Mundanas, da revista FON-FON!, encontramos notícias dos chás
oferecidos por Moacyr, em sua residência, para um seleto grupo do mundo político. Esses
encontros eram concorridos e a presença era reservada aos solteiros, sendo proibido falar da
vida alheia15.
Na coluna Raio-X, algo pitoresco, dirigido a Moacyr: “Singular o que vimos. Porque S.
S. teria calçado, naquele dia, as meias de seu amigo Eloy de Souza?”16. Não encontramos
réplica a essa informação.
Moacyr viajou várias vezes à Europa, acompanhado dos filhos17. Na revista FON!FON!
as viagens foram noticiadas com fotografias, como na edição de setembro de 1910: os filhos
de Moacyr – Carlos e Primitivo, Agenor de Roure Filho, Francisco Valadares e a Madame
Fonseca Hermes, acompanhados de Madame Brunel, diretora do Colégio Chateau de
Laucy18. Outra dessas viagens feitas à Europa foi publicada na coluna “Noticiario”. Nesta
viagem, a bordo de um navio a vapor da Mala Real Ingleza19, estava com os amigos Octavio de
Souza Leão, Jayme Darcy e Humberto Gottuzo. Outra foto, numa edição de 1912, tem como
legenda: “alunos brasileiros no Chateau de Lancy em Genebra, Carlos Moacyr, Primitivo
Moacyr, Hilton Nabuco de Castro, Agenor de Roure e José de Alencar”. Neste caso, Primitivo
Moacyr é Primitivo Bueno Moacyr, filho de Primitivo Moacyr; assim como Agenor de Roure é
Agenor de Roure Filho.
Com as informações levantadas nessas revistas construímos, parcialmente, a rede de
sociabilidades formada em torno de Primitivo Moacyr, composta por políticos e intelectuais.
Dessas redes emanam pensamentos e ideias; têm lugar intercâmbios e debates, projetos e
ações. Os vínculos que formam essas redes se estabelecem em espaços públicos e de âmbito
privado, em festas pessoais e/ou encontros casuais; nos salões da Câmara de Deputados, nos
teatros e calçadas, nas cafeterias e bares, ou seja, em lugares legitimados pelos grupos. Além
daqueles com relação direta, Primitivo Moacyr também tem contato com pessoas que
pertencem à rede de sociabilidades de seus amigos, ampliando as interpretações, as
compreensões, o olhar de mundo.
14 Revista FON-FON! 1908, edição 26, p.25. 15 Revista FON-FON! 1908, edição 30, p.12. 16 Revista FON-FON! 1909, 45ª edição. p. 23. 17 Revista FON-FON! 1909, edição 16, p.18. 18 Revista FON-FON! 1910, edição 37, p.28. 19 Revista FON-FON! 1911, edição 34, p.19.
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Na revista Careta encontramos apenas uma referência a Moacyr, apesar de muitas
informações sobre sujeitos de seu relacionamento. A referência encontra-se na coluna
Folhinha da Careta, uma reprodução irônica dos calendários religiosos. Neste caso, tratando
da Igreja Positivista: “dia 18 de julho, segunda-feira, (...) S. Primitivo Moacyr, apóstolo
saudável.”20 18 de julho seria o aniversário de Moacyr? Filiado à Igreja Positivista?
Com esses dados foi possível esboçar uma rede de sociabilidades relativamente
complexa, envolvendo Primitivo Moacyr e um conjunto de intelectuais que, por sua vez,
estabelecem outras relações. Não havendo outras referências a Moacyr na revista Careta,
buscamos pelos sujeitos a ele relacionados na revista FON!FON! o que nos permitiu ampliar
a rede. Por exemplo: Miguel Calmon e Tavares de Lyra são referenciados na Careta com
vários outros sujeitos tais como: David Campista (deputado federal), Almirante Alexandrino
(ministro da marinha), José Marcelino (senador), Afonso Penna21 (presidente do Brasil) e
João Francisco. Moacyr ainda poderia ter sido amigo de Ruy Barbosa (conhecido de
Fernando de Azevedo, Miguel Calmon e Tavares de Lyra22), Nilo Peçanha (conhecido de
Rodrigues Alves e Fernando de Azevedo23), Marechal Hermes (conhecido de Miguel Calmon,
Tavares de Lyra24, Afrânio Peixoto e Carlos Peixoto Filho), Rio Branco (conhecido de Carlos
Peixoto Filho, Miguel Calmon e Tavares de Lyra25) e Eloy de Souza (conhecido de Fernando
de Azevedo e Tavares de Lyra26).
Além desses, Moacyr teve oportunidade de conhecer outros tantos, por intermédio de
Afrânio Peixoto e Carlos Peixoto Filho, com os quais dividiu moradia: Euclydes da Cunha27,
Felix Pacheco, Araripe Junior, Paulo Barreto, Souza Bandeira28, Oswaldo Cruz, James Darcy,
Dantas Barreto, Joaquim Nabuco29 e Joaquim Sales30. Por ora ainda não obtivemos provas
efetivas tais como correspondências, atividades em conjunto, para subsidiar essa rede de
sociabilidades. A questão aqui é pensar que tais relações se estabeleciam porque estes
sujeitos faziam parte de um grupo social, elitizado, que pensava e fazia o Brasil na primeira
metade do século XX e suas atuações conformaram as relações políticas e intelectuais de sua
20 Revista Careta, 1910, edição 111, p.21 21 Revista Careta, 1908, edição 7, p. 16 “[...] mundanas”. 22 Revista Careta, 1908 edição 3, p.16 “O momento político”. 23 Revista Careta, 1913, edição 246, p. 35 “No campo da ‘megéra’”. 24 Revista Careta 1912, edição 194, p. 13. 25 Revista Careta, 1908, edição 7, p. 16 “[...] mundanas”. 26 Revista Careta, 1908, edição 5, p. 6 “Careta parlamentar”. 27 Revista Careta, 1913, edição 243, p. 22. 28 Revista Careta 1913, edição 273, p. 13 “Academia brasileira de lettras”. 29 Revista Careta, 1913, edição 266, p. 20 “Academia brasileira de lettras”. 30 Revista Careta, 1910, edição 91, p. 26 “Telegrapho sem fio”.
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época junto a outros grupos, em conflito e/ou comunhão, e que conferiram ao intelectual
analisado aqui o grau de mediador por sua vida e obra.
Em paralelo, realizamos uma pesquisa no site da Hemeroteca da Biblioteca Nacional
com o nome de Primitivo Moacyr. O resultado da empreitada, entre os anos de 1890 e 1950,
foram 1019 ocorrências em jornais de 12 estados diferentes. Tais achados apresentam
informações sobre a vida pessoal, profissional, social e até mesmo política do intelectual, o
que nos possibilitará ampliar as informações para confirmar as redes de sociabilidades e
possibilitar a verificação de seu repertório intelectual a serviço da História e da Educação
brasileiras.
Dentre os jornais de ampla circulação na sociedade brasileira e, em especial, na carioca,
lócus de atuação privilegiado do intelectual Primitivo Moacyr, identificamos sua presença em
O Paiz (RJ), O Estado de Pernambuco (PE), O Imparcial(RJ), O Estado(PR), Jornal do
Commercio(RJ) e Correio Paulistano(SP). São jornais que circularam, cada um com sua
temporalidade de existência, tiragem e localidade de circulação próprios, apresentando
acontecimentos de âmbito nacional e internacional nos quais figuras do alto escalão político,
social e intelectual desfilavam entre uma ou outra notícia. Jornais que noticiavam a grande
pluralidade existente na composição das cidades, em especial a capital federal, tanto em
camadas sociais, de origem nacional ou regional, etnia e gênero, adaptando seus conteúdos
para que toda essa diversidade social fosse alcançada e consumissem os jornais. Divulgavam
acontecimentos passados na capital federal, possuindo seções que retratavam a vida nos
Estados, fatos mundanos, vida da mulher, classificados e ensaios fotográficos, para assim
disseminar o modo de vida e os valores cariocas, já que a cidade era o eixo administrativo,
econômico e cultural do país.
Alguns jornais estavam ligados a grupos políticos, como o Correio Paulistano, jornal
oficial do Partido Republicano Paulista ou o Jornal do Commercio, veículo de viés comercial
e propagandista da economia nacional. Sob os diversos tipos de jornais e suas localidades, a
figura de Primitivo Moacyr fez parte de suas páginas de forma efetiva, ora como participante
de eventos sociais, ora como autor de suas obras, ou ainda, como um brasileiro no exterior e
sendo citado por outros intelectuais e membros da sociedade brasileira por seus feitos como
intelectual.
Considerações por ora...
Nossa missão era trazer um pouco do caminho que temos nos debruçado nos últimos
anos em nossas pesquisas acerca da vida e da obra de Primitivo Moacyr. O intuito era
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mostrar como pensamos nosso objeto e como definimos nossos horizontes metodológicos. A
construção da trajetória de Primitivo Moacyr nos permitiu identificar suas origens, seu
itinerário e suas redes de sociabilidade. Essas conformaram sua atuação de vida nas áreas
pessoais e profissionais bem como o campo de possibilidades de sua atuação como intelectual
e a produção de sua obra. Mais do que produtor de textos histórico ou historiador, Primitivo
Moacyr é um intelectual de seu tempo. Um intelectual mediador que utilizou dos meios que
tinha em mãos para conduzir seus passos. Assim, a fronteira entre a história das ideias
políticas e a historia dos intelectuais, ou o da aculturação dessas ideias no meio dos
intelectuais, por meio dos estudos sobre itinerários de vida e as redes de sociabilidades de
intelectuais se abriram. E a exploração desse campo pode ser feita pela reinserção destas
ideias no seu ambiente social e cultural, e por sua recolocação em situação num contexto
histórico. Neste caminho cabe-nos pensar agora como a obra de Primitivo Moacyr e suas
ideias, bem como dos grupos com os quais caminhou, vão da intelligentsia à sociedade civil e
seus sobressaltos na comunidade nacional e pela cultura política da época.
Referências
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