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CONTROVÉRSIAS E POSSIBILIDADES NA INCLUSÃO ESCOLAR DE PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAISESPECIAIS Vânia Teodoro da Silva Junqueira 1 RESUMO O presente artigo tem por objetivos contextualizar a Educação Especial, desde os seus primórdios, até a atualidade, destacando-se alguns períodos de segregação histórica e restrição dos direitos de pessoas que apresentam deficiências. Pontua-se o crescente processo de exclusão social e escolar, que se desenvolve paralelo ao nascimento de novas concepções, pensamentos e ideais, sendo consideradas as implicações educacionais e pessoais, relativas à falta de oportunidades de convívio e participação. Destaca-se a premência da efetivação do processo de Inclusão Escolar do indivíduo com necessidades educacionais especiais, como elemento fundamental para se oportunizar o pleno desenvolvimento e o acesso aos bens e serviços comuns destinado a todos os cidadãos, amplamente garantidos pelas legislações vigentes. 1 Especialização em Educação Especial Generalista e Didática Geral, Pedagoga, Bacharel em Teologia, Graduando em Psicanálise.

CONTROVÉRSIAS E POSSIBILIDADES NA INCLUSÃO … · Vânia Teodoro da Silva Junqueira1 ... história, ela constitui uma ... esfera privada, família e religião, a responsabilidade

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CONTROVÉRSIAS E POSSIBILIDADES NA INCLUSÃO ESCOLAR

DE PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAISESPECIAIS

Vânia Teodoro da Silva Junqueira1

RESUMO

O presente artigo tem por objetivos contextualizar a Educação

Especial, desde os seus primórdios, até a atualidade, destacando-se

alguns períodos de segregação histórica e restrição dos direitos de

pessoas que apresentam deficiências. Pontua-se o crescente processo

de exclusão social e escolar, que se desenvolve paralelo ao

nascimento de novas concepções, pensamentos e ideais, sendo

consideradas as implicações educacionais e pessoais, relativas à falta

de oportunidades de convívio e participação. Destaca-se a premência

da efetivação do processo de Inclusão Escolar do indivíduo com

necessidades educacionais especiais, como elemento fundamental

para se oportunizar o pleno desenvolvimento e o acesso aos bens e

serviços comuns destinado a todos os cidadãos, amplamente

garantidos pelas legislações vigentes.

1 Especialização em Educação Especial Generalista e Didática Geral, Pedagoga, Bacharel em Teologia, Graduando em Psicanálise.

Palavras-chave: Deficiência, Educação Especial, Inclusão Escolar.

FEASIBILITY AND CONTROVERSY IN THE SCHOOL INCLUSION OF PEOPLE WITH NECESSITIES EDUCATION SPECIAL

ABSTRACT

The present article has for objectives wholeness to study the Special

Education, since its beginning, until the present time, being

distinguish some periods of segregation and restriction historical the

rights of disable people. Full description the increasing process of

social and pertaining to school exclusion, that if develops parallel to

the birth of new conceptions, thoughts and ideals, being considered

the educational and personal, relative implications to the lack of

chances of conviviality and participation. It is distinguish with utmost

urgency of the to make permanent the process school Inclusion of the

individual with educational necessities special, as basic element to let

us give him a chance the full development and the access to the

common goods and services destined to all the citizens, widely

guaranteed for the effective in vigour body of law.

Keywords: Disabled people, Special Education, School Inclusion.

INTRODUÇÃO

Atualmente, existe um movimento mundial para que se

efetive a inclusão escolar de pessoas com deficiências. Debates,

teses acadêmicas, artigos e legislações defendem que a verdadeira

inclusão tem como objetivo a reunião, no mesmo ambiente

educacional, de alunos que apresentam dificuldades (seja quais forem

suas origens) com educandos que aprendem com facilidade. Todos,

sem discriminação, devem participar e aprender, juntos, usufruindo

de todos os benefícios (e também da precariedade) de uma

instituição escolar. O fracasso histórico do sistema educacional

demonstra que não são apenas as pessoas com necessidades

educacionais especiais as grandes vítimas da exclusão, pois a mesma

alcança uma abrangente parcela da população escolar, que apresenta

dificuldades de aprendizagem devido a problemas familiares ou

privações culturais e econômicas. Os fatores que desencadeiam o

fracasso escolar são múltiplos e variados. No entanto o grupo que

apresenta deficiências orgânicas são aqueles que têm suscitado

maior resistência e insegurança quanto ao atendimento no ensino

regular, por parte dos profissionais da educação.

A despeito dos argumentos favoráveis e ‘politicamente

corretos’, as pessoas deficientes ainda são situadas num mesmo

patamar pela sociedade: o da incapacidade absoluta, sendo

consideradas todas iguais, independente da deficiência e do nível real

de comprometimento. A cegueira, a surdez, a paralisia cerebral, as

síndromes recebem o unânime tratamento da ignorância, do

preconceito, do desprezo ou da assistência. As pessoas, classificadas

nos padrões vigentes de ‘normalidade’ consideram razoavelmente

plausível proporcionar um tratamento diferenciado para as minorias,

no que se refere à forma de viver, ao trabalho, ao lazer e à educação.

O direito à convivência e ao acesso a bens comuns é

inerente a todos os seres humanos, independente de suas limitações

e/ou diferenças. O debate sobre a igualdade de direitos é um tema

reincidente no cenário mundial. Nos primórdios das civilizações,

podem ser encontrados resquícios de um desequilíbrio sócio-político-

econômico, que clamavam por uma ação no sentido de solucionar as

contradições. Aristóteles declarava que: “a igualdade consiste em

tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”. Rousseau,

em 1755, escreveu um discurso sobre a desigualdade entre os

homens. Os gregos preocupavam-se com o assunto e até o

cristianismo traz referências ao mesmo em seus fundamentos. O

século XVIII é o marco inicial para o reconhecimento de direitos e três

princípios são citados como imprescindíveis à sobrevivência humana:

Liberdade, Igualdade e Fraternidade. A consolidação desses princípios

na consciência dos homens aconteceu pela desigualdade entre

aqueles que detinham muitos privilégios em visível contradição com o

estado de miserabilidade em que a maioria vivia.

Se as condições sociais e de acesso aos bens comuns pelas

minorias sempre foram objetos de discussões cujas conseqüências

foram praticamente nulas, a questão de atender às necessidades de

pessoas com deficiência também recebeu semelhante tratamento,

insignificante para que se alterasse a forma com que as mesmas

seriam aceitas pela sociedade.

Conquanto existam muitos avanços, no que concerne à

redação de políticas públicas, infelizmente, as ações de investigação

da Inclusão Escolar e suas nuances, são superiores ao compromisso

de efetivação da prática inclusiva nos estabelecimentos oficiais de

ensino.

DA EDUCAÇÃO ESPECIAL À ESCOLA INCLUSIVA: CONQUISTAS E

RETROCESSOS

A negação de direitos primordiais verifica-se desde o início

dos registros sobre a deficiência e sobre a educação em geral.

No século XVII os deficientes eram afastados do ambiente

social e familiar por meio de internações. Loucos, mendigos,

vagabundos, prisioneiros, prostitutas e deficientes recebiam o mesmo

tratamento: reclusão e isolamento.

Na segunda metade do século XIX, ocorre o Movimento

Higienista, cujos objetivos centravam-se na saúde pública, na

tentativa de controle de epidemias. Nesse período houve a chegada

da família real ao Brasil. Como a medicina na Europa era a ciência por

excelência, esse conceito aportou no país juntamente com a realeza.

As pessoas eram dispostas em locais pré-determinados, de acordo

com sua classe social. A visão de que a deficiência seria um problema

inerente à criança, anulava a perspectiva de que pudesse haver

intervenções educativas. O diagnóstico rigoroso do transtorno era

exigido, para que se pudesse situar as pessoas em níveis diferentes

de ‘normalidade’, o qual determinava em qual escola iria estudar.

Generalizou-se a opinião de que o trabalho educativo do aluno com

algum prejuízo ou deficiência seria realizado em escolas especiais,

fato que promoveu a expansão das instituições com esta finalidade.

Os testes de QI (Quociente de Inteligência) eram os parâmetros que

determinavam o melhor local de escolarização.

Na passagem do século XIX para o século XX nascem as

primeiras classes especiais, sob a égide da necessidade científica de

separação dos alunos normais dos anormais. O médico era o

cientista, planejador do urbano, que criou hospícios, transformou

hospitais e clínicas em centros de cura. A família e a escola foram

objetos do movimento higienista. As posições ambientalistas e

behavioristas se fortalecem no campo das Ciências e, além de testes

de QI, as influências sociais e culturais tornam-se elementos

representativos da deficiência. Noções de adaptação social e de

aprendizagem reforçam as possibilidades de intervenção. As Escolas

Especiais continuam ampliando seu atendimento.

Muitas das práticas, desenvolvidas na contemporaneidade, têm suas raízes fundadas nas primeiras percepções da sociedade em relação a esse grupo de pessoas, fortalecendo mitos e estereótipos acerca de suas limitações e possibilidades. A organização da Educação Especial sempre esteve determinada por um critério básico: a definição de um grupo de sujeitos que, por inúmeras razões, não corresponde à expectativa de normalidade ditada pelos padrões sociais vigentes. Assim, ao longo da história, ela constitui uma área da educação destinada a apresentar respostas educativas a alguns alunos, ou seja, àqueles que, supostamente, não apresentariam possibilidades de aprendizagem no coletivo das classes comuns, que foram, entre outras denominações estigmatizantes, rotulados como excepcionais, retardados, deficientes... Essa concepção que motivou a sua natureza de atendimento esteve, portanto, vinculada a um movimento social de sistematização de práticas de disciplinamento relacionadas à ‘caracterização’ dos indivíduos (loucos, marginais, doentes mentais, deficientes), a fim de enquadrá-los em categorias que facilitariam seu tratamento. Essa situação remete à questão histórica dos diagnósticos e prognósticos que, muitas vezes, perpetuaram-se como práticas de exclusão social (PARANÁ, 2006, p.17).

Com o advento do Positivismo, a escola adquiriu um cunho

disciplinador. A elite não tinha meios para educar os filhos e a

medicina tomou a si esse encargo, por dois motivos principais: o

despreparo dos mestres e a impossibilidade familiar em assumir tal

responsabilidade. Permaneceram as concepções higienistas para a

educação, no sentido de adequação e disciplinarização, seguindo o

modelo europeu. A higiene forneceu os primeiros protótipos de escola

instituída em padrões médicos. O movimento higienista retirou da

esfera privada, família e religião, a responsabilidade da educação das

crianças da elite. Principia-se, então, a consolidação do conceito de

que a homogeneidade oferta a garantia de aprendizagem. A

organização de salas de aula neste critério era admitida como uma

medida racional e produtiva. À época, a separação das crianças era

considerada humanitária, baseada em uma pedagogia científica e

eugênica. Desde a segunda metade de 1800 até 1900, o caráter de

atendimento assistencial e filantrópico tinha por finalidade a proteção

dos membros da sociedade, por meio da reclusão dos ‘anormais’.

No Brasil, com a Proclamação da República, a clientela

escolar passa a abranger a população em geral, com a adesão da

Psicologia e Sociologia como ciências cuja incumbência seria a

instrumentalização da educação. A Psicologia rotulou, classificou,

mediu a capacidade e concretizou a distinção das pessoas deficientes

em níveis diferentes, porém ainda com atendimento

institucionalizado. A concepção médico-pedagógico da deficiência

fortaleceu-se, no que se refere à busca da cura e da adequação.

Acontece o processo de retirada do desvio do contexto escolar. Nessa

ocasião a terminologia ‘deficiência mental leve’ é construída, através

de sua detecção na escola. Casos diagnosticados como severos e

moderados encontram-se confinados nos manicômios.

Em 1854 criam-se duas instituições para atendimento aos

cegos e surdos.

Na década de 1920, começam a funcionar as instituições

especiais, como um sistema paralelo de ensino. Quando se

desenvolveu a preocupação com a Educação de pessoas deficientes,

paralelamente criou-se o termo ‘ Educação Especial’, estimulando a

organização de entidades assistenciais para esse atendimento. A

Educação Especial constituiu-se fora do ensino regular. Houve um

movimento em torno da avaliação classificação e segregação dos

desvios. A escola especial deveria cumprir função dupla: educar,

enquanto tentava normalizar o sujeito.

As classes especiais não atendem à demanda. Faz-se uma

menção ao currículo escolar e acontece o favorecimento da iniciativa

privada para a ‘educação’ dos deficientes, com a abertura de

entidades assistenciais de caráter filantrópico (responsável

atualmente por 80% do atendimento). Os ‘alunos’ dessas instituições

são oriundos da psiquiatria e do sistema regular de ensino.

A partir de 1934 a legislação brasileira não apresenta um

sistema educacional para as pessoas com deficiências. Toda verba

que poderia destinar-se para o ensino especial é direcionado para

entidades de cunho beneficente. A partir desta fase JANNUZZI (2004)

expõe:

...vamos percebendo a mudança de atuação, a penetração de teorias de aprendizagem psicológicas que passam a influenciar fortemente a educação, seja a geral, seja a relacionada aos deficientes. Seria a concepção Psicopedagógica. É a época do movimento conhecido como Escola Nova, que vai enfatizar a importância da escola e nela a ênfase nos métodos e nas técnicas de ensino. Se no início da República a escola é ressaltada pela possibilidade de participação política, direito ao voto, o “entusiasmo pela educação”, depois ela passa a ser considerada a redentora, a solucionadora dos nossos problemas sociais, num “otimismo pedagógico” (p.10).

A partir de 1960, a Educação Especial principia profundas

transformações, em vários países, devido a alguns fatores:

A percepção de que o déficit não apresenta perfis clínicos

estáveis, mas que o sistema educacional pode favorecer o

desenvolvimento e a aprendizagem. Nesse período, nasce

a terminologia “necessidades educativas especiais”.

O papel ativo do educando em seu aprendizado fica

evidente e o processo de ensino converte-se numa

experiência compartilhada, porém individualizada,

suscitada pela observação de que os alunos de uma

mesma sala de aula enfrentam de maneiras distintas as

situações de aprendizagem.

A avaliação psicométrica passa a ter outros instrumentos

paralelos, para detecção das potencialidades de

aprendizagem de alunos com deficiências, relacionados

ao currículo e à orientação da prática educativa.

A educação torna-se obrigatória e essa particularidade,

com o conseqüente aumento da heterogeneidade da

clientela, desafia a escola a ofertar um ensino

generalizado, que atendesse à diversidade presente em

sala de aula. Questiona-se, nessa ocasião, qual seria o

real objetivo da escola.

O abandono escolar assume proporções alarmantes,

ocasionados por fatores sociais, culturais e educativos. As

fronteiras entre normalidade, fracasso e desistência são

reformuladas.

As Escolas de Educação Especial são avaliadas e sua

função repensada, conquanto seus resultados sejam

insignificantes e as expectativas de evolução dos seus

alunos sejam quase nulas. A noção de que possa existir

alguma outra forma de escolarização começa a se

instaurar.

Algumas experiências de Integração (teoria, nascida na

Dinamarca, incorporada na legislação em 1959, que tinha

por objetivo “criar condições de vida para a pessoa

retardada mental semelhantes, tanto quanto possível, às

condições normais da sociedade em que vive”, in:

JANNUZZI, 2004) em vários países propagam uma

atmosfera favorável a esse modelo de educação. COLL,

MARCHESI e PALACIOS (2004) explicam:

As formulações integradoras e normalizadoras estendem-se a todos os serviços sociais. Algumas de suas manifestações podem ser encontradas na aproximação dos atendimentos médicos, psicológicos e educacionais nos locais de residência dos cidadãos, na importância cada vez maior que se atribui aos fatores ambientais, no papel crescente dos serviços próprios da comunidade, dos quais participam também homens e mulheres voluntários, e na relevância do enfoque comunitário nas diferentes disciplinas relacionadas à saúde. Tudo isso conta a favor de que todos os cidadãos se beneficiem igualmente dos serviços, o que supõe evitar que haja sistemas paralelos que diferenciem alguns poucos da maioria (p.19).

Desperta a sensibilidade, em geral, pela defesa dos

direitos das minorias e por sua integração à sociedade.

Grupos sociais assumem a bandeira em prol dos

desfavorecidos raciais, culturais e lingüísticos.

Esses elementos contribuíram para a difusão de uma nova

maneira de se entender a deficiência, sob uma perspectiva

educacional.

No sistema educacional brasileiro, a Lei de Diretrizes e

Bases da Educação (LDB) 4024/61 defendia o pensamento de que a

Educação dos deficientes deveria enquadrar-se no sistema geral de

ensino. Neste momento da história, é garantido apoio financeiro, com

verbas públicas, às instituições particulares para atendimento aos

deficientes, com isenção do estado das responsabilidades com esse

alunado. Publicações oficiais esclarecem:

De maneira inovadora, destinava um título à Educação Especial, com menção à oferta de serviços educacionais aos portadores de deficiência [sic], “dentro do possível no ensino regular”, integrando-os, pela primeira vez em um texto de diretrizes da educação nacional, como um grupo-alvo das políticas do Estado. Ainda que estivesse expressa a intenção do atendimento na rede pública regular, no mesmo texto, resguardava-se o incentivo financeiro às instituições particulares que ofertassem esses serviços, convalidando ações que já ocorriam, havia quase uma década, com a criação da Sociedade Pestalozzi e das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apaes) (PARANÀ, 2006, p.22).

Na Emenda Constitucional de 1969 encontra-se a primeira

ação no sentido de proteger as pessoas com deficiências.

Constituições posteriores também abordam este tema.

A LDB 5692/71 pondera sobre a necessidade de

profissionalização desse segmento social e os caracteriza como

alunos com deficiências físicas ou mentais e aqueles que se

encontram em atraso quanto à idade regular de matrícula. O impulso

para a educação era vinculá-la ao desenvolvimento econômico do

país, portanto a concepção era:

A escola como necessária à produção, produtora de “recursos humanos”, entendidos como mão-de-obra. A educação passa a ser vinculada diretamente ao setor produtivo. Esta posição, iniciada com Adam Smith (1723-1790), ganhou relevo entre nós nas décadas de 1960-1970 através da economia da educação. A escola “prepara”, desenvolve o “capital humano”, a “força do trabalho” que deve ser “investida no setor produtivo” (Rodrigues, 1982). O mercado passa a ser seu objetivo último. E isso é acentuado em diversos textos oficiais. Assim o Plano Setorial de Educação e Cultura explicitava: “Enquanto não se puder abrir largamente as portas da educação a cada um, o interesse nacional recomenda que se favoreça a ascensão cultural dos mais talentosos, os mais capazes de

mobilizar a ciência e a técnica em favor do progresso social. O único bem que nação alguma está em com condições de desperdiçar é o talento de seus filhos”. E continuava: “Mas o mesmo interesse social exige que se eduquem os deficientes, no sentido de torná-los, quanto possível, participantes de atividades produtivas”. E num rasgo de generosidade acrescentava: “E, nesse caso, o interesse fala mais baixo que os reclamos da eqüidade e da justiça” (MEC/SG, 1971, p. 16, apud JANNUZZI, 2004, p. 13).

Ocorre, então, a expansão da exclusão escolar e o inchaço

das classes especiais. Legitima-se a transformação das crianças com

problemas de aprendizagem em deficientes. Tais alunos foram alvos

dos discursos de integração e inclusão das décadas de 70 e 80.

A aniquilação dos conteúdos pedagógicos no processo

educacional dos deficientes subsiste até a década de 1970.

A Constituição de 1988 proclama a igualdade de direitos

para todos os cidadãos. Entretanto, a concepção de tratar o desigual

de acordo com suas diferenças foi histórica e constantemente

aperfeiçoada, arraigando no imaginário social e individual atitudes

discriminatórias e de exclusão de direitos.

Com as discussões desencadeadas durante a elaboração da

Constituição, em 1996, a nova redação da LDB foi aprovada e

considerada uma conquista na defesa dos direitos dos deficientes, por

apresentar um capítulo específico sobre a Educação Especial. Neste

destaca-se a concepção de que alunos com deficiências devem

receber atendimento educacional, preferencialmente na rede regular

de ensino, com currículos, métodos, técnicas, recursos e organização

específicos. Acrescenta que o cidadão não tem garantido apenas o

direito à educação, bem como a possibilidade de exigir seu

cumprimento, de forma legal, individualmente ou por decisão

coletiva. Porém, a forma como a lei é redigida promove uma

flexibilidade indesejável, com possibilidades de ser interpretada

erroneamente, inclusive para que a Educação Especial tenha sua

continuidade, quase que exclusivamente, em instituições

segregativas. No entanto, tornou-se exeqüível (em tese) a inserção

de alunos com deficiências na rede pública.

O Plano Nacional de Educação (2001) apresenta como

metas o desenvolvimento e ampliação de programas educacionais, a

parceria com áreas de saúde e assistência social, a implementação

de ações preventivas das deficiências, o atendimento aos alunos na

Educação Infantil e Ensino Fundamental, o atendimento na rede

regular de ensino, em classes ou escolas especiais e a educação e

formação continuada dos professores. A redação deste documento foi

utilizada para reafirmar a provisão da Educação do aluno deficiente

em instituições segregativas.

Também no ano de 2001, as Diretrizes para a Educação

Especial citam, pela primeira vez, a inclusão. LAPLANE (2006) explica

que:

As Diretrizes destacam o surgimento de uma nova mentalidade (Brasil, 2001, p. 8) e assumem como princípios: o direito à dignidade, à busca de identidade e o exercício da cidadania (p. 9). A noção de inclusão é objeto de nova elaboração, enfatizando-se que ela não é um mero mecanismo, mas requer a revisão de concepções e paradigmas (p. 12). A discussão interna sobre a função social da escola, a construção de um projeto pedagógico que privilegie práticas heterogêneas e o protagonismo dos professores são vistos como chaves para a inclusão. Os sistemas escolares são instados a assegurar a matrícula de todos os alunos e a organizar-se para atendê-los. Devem oferecer os recursos pedagógicos necessários e capacitar profissionais para atender às demandas dos alunos (p. 12). A política inclusiva exige a intensificação da formação de recursos humanos, a garantia de recursos financeiros e de apoio pedagógico e o exercício da descentralização do poder. Deverão ser criados sistemas de informação que permitam a avaliação das condições reais para a inclusão e o conhecimento da demanda, assim como a identificação, análise, divulgação e intercâmbio de experiências educacionais inclusivas (p. 13). A capacitação dos professores e a flexibilização do currículo são fatores que colaborarão para o sucesso da política inclusiva. No que se refere aos aspectos pedagógicos, as escolas devem avaliar os alunos e prover serviços e apoios requeridos. O atendimento fora da sala de aula regular será considerado como recurso extraordinário e temporário, a não ser nos casos que necessitem de atendimento especial contínuo, que poderão ser encaminhados para escolas especiais (públicas ou privadas) (Online).

Entretanto, persiste o pensamento coletivo na comunidade

de que o Atendimento educacional Especializado ou a Educação

Especial é uma forma válida de promover o ‘ensino diferente’ para

pessoas deficientes. Seus adeptos e defensores justificam que dessa

maneira, está sendo garantido o direito à igualdade, porque estão

recebendo ‘algum tipo de educação’. Esse acesso ao ensino,

determinado pelas possibilidades visíveis, apregoado pelas Escolas

Especiais, é insuficiente para atender ao que preconizam as

constituições, tratados e convenções, por não promoverem o pleno

gozo e exercício da cidadania. BAPTISTA (2008) explica que:

No que se refere ao plano pedagógico, muitas dessas instituições têm a escolarização como uma meta secundária, pois inexistem exigências de metas específicas quanto à trajetória escolar de seus alunos e, freqüentemente, somam-se as precariedades profissionais em seu interior.{...} Vale lembrar que aos olhos da comunidade (nós somos a comunidade!) trata-se de alunos para os quais o pouco parece muito, pois predomina a idéia que dificilmente chegarão a ocupar espaços sociais relevantes (p.207).

O Atendimento Educacional Especializado por não ter suas

ações explicitadas em lei, permanece sendo utilizado como um

reforço escolar ou como uma opção para a continuidade do trabalho

com foco essencialmente clínico.

No ano de 2007, um debate sobre a Política Nacional de

Educação Especial propôs a revisão dos princípios orientadores dessa

área. A conclusão foi de que se deve engendrar uma retomada crítica

da dimensão ‘preferencial’ da inclusão escolar, preconizadas pelos

documentos legais brasileiros. Segundo esse debate, as escolas

devem assumir a responsabilidade pela escolarização dos alunos com

necessidades educacionais especiais e as escolas especiais passariam

a ter um papel complementar para o aluno e para a formação de

educadores.

Os deficientes, apesar de todo avanço, continuam sendo

obrigados a aceitarem os atendimentos que são impostos, sem terem

oportunidades de emitir opinião própria sobre aquilo que gostariam

que lhes fosse ofertado.

Todas as ações em prol dos direitos de pessoas com

deficiências não têm logrado êxito em assegurar um dos direitos

básicos de todo cidadão: o acesso, a permanência e a assimilação de

conteúdos da Educação Formal.

A sociedade, historicamente e por suas ações, perpetua uma

cultura de seleção e classificação dos seres humanos, segundo

critérios pré-concebidos e sem fundamentação coerente que os

justifique. Existem grupos de referência aos quais se exige que o

deficiente se adapte. Nessa perspectiva, o sujeito ‘ diferente’ é

impedido de assumir uma posição atuante no ambiente que o cerca,

pois suas limitações são os elementos que definem a sua (in)

capacidade. Forças culturais, historicamente construídas, valorização

excessiva de padrões uniformes para usufruto dos serviços públicos

exercem pressão para que o deficiente se enquadre nos modelos

designados como apropriados e desejáveis. A manutenção de tais

conceitos reforça a continuidade da educação assistencial em

instituições, onde a ‘diferença’ é o foco central do atendimento e o

trabalho desenvolvido consiste em ações de caráter clínico e

restritivo.

A freqüência a uma Escola Especial produz uma marca

indelével na vida do ser humano, cerceando todas as suas

oportunidades de desenvolvimento. O estigma é tão intenso, que

atinge até mesmo os profissionais que trabalham nessas instituições,

vítimas secundárias da rejeição social entre seus pares. A visão, de

uma parcela expressiva da população, é a de que professores

especializados possuem conhecimentos superficiais dos conteúdos

das escolas regulares e, inclusive, da cultura em geral. Despreza-se o

fato de que a maioria desses professores aprofundou-se nessa área,

após terem cursado as várias etapas e modalidades de ensino, pelas

quais passam os demais educadores, sendo a Especialização em

Educação Especial apenas um atributo adicional em sua formação

profissional.

Entretanto, como mais uma comprovação de que o meio

exerce influências (positivas e/ou negativas), infelizmente alguns

profissionais dessa especialidade estagnam em suas formações

iniciais, desconsiderando pressupostos básicos da educação e

abandonando o aperfeiçoamento contínuo, que suas funções exigem.

Estes ‘educadores’ assumem posições antagônicas ao processo de

Inclusão Escolar. Como não evoluíram em suas concepções,

acreditam piamente na impossibilidade de adaptação e benefícios

para seus alunos especiais no acesso ao ensino ofertado pelas

instituições regulares de ensino. Constroem argumentos

pormenorizados sobre a incapacidade, mesmo quando tais

educandos, a despeito do ambiente restritivo, estejam apropriando-se

de todo conteúdo que lhes é ministrado e apresentem relações

interpessoais muito satisfatórias, dentro e fora do recinto escolar.

A convivência que homogeneíza o deficiente, em classes e

escolas especiais, contribui negativamente para o desenvolvimento

como pessoa, porque a aprendizagem ocorre somente através dos

desafios que são constituintes do recinto escolar. Participar de uma

ambiente onde seus limites são ‘respeitados’ e as atividades

‘propostas de acordo com a capacidade individual’ contribui,

perniciosamente, para que toda capacidade de aprendizado se

atrofie.

O mundo, por sua própria constituição, não é homogêneo

nem padronizado, composto por indivíduos produzidos em série. A

igualdade apregoada por certos segmentos, neste sentido, é injusta,

pois os diferentes não podem ser tratados de maneira igual. Cada

indivíduo tem qualidades e necessidades singulares que precisam de

atendimentos específicos. Toda a raça humana apresenta qualidades,

defeitos e alguma dificuldade, que são constitutivos de cada

personalidade. Nestes parâmetros, o sujeito que apresenta alguma

deficiência é apenas mais um cidadão, semelhante a todos por

também apresentar características respectivas. O fato de ser

deficiente não torna o sujeito pior, ou melhor, do que seus

semelhantes, pois o mesmo é apenas mais uma pessoa na intrincada

rede de relações sociais diversificadas da humanidade. Apesar de

suas ‘limitações’, ele existe, tem sentimentos, pensa e é criativo,

como qualquer pessoa do planeta. Portanto, a tarefa de toda equipe

escolar é oferecer auxílios, suportes e meios para que essa pessoa

consiga demonstrar todo o seu potencial. A compreensão, a

solidariedade sem paternalismo, o entendimento das implicações da

deficiência e o respeito aos direitos não é uma concessão

complacente, mas uma questão de Ética e Justiça.

A Inclusão Escolar é um direito inalienável apoiado por

políticas públicas que devem sustentar, ainda, todo processo

inclusivo. Texto publicado, em janeiro de 2008, pelo Ministério da

Educação e Cultura (MEC) declara que:

O movimento mundial pela inclusão é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à idéia de eqüidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola.

Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas nos sistemas de ensino evidenciam a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas para superá-las, a educação inclusiva assume espaço central no debate acerca da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação da lógica da exclusão. A partir dos referenciais para a construção de sistemas educacionais inclusivos, a organização de escolas e classes especiais passa a ser repensada, implicando uma mudança estrutural e cultural da escola para que todos os alunos tenham suas especificidades atendidas (Online).

Atendendo ao disposto em muitos artigos na legislação,

algumas escolas garantem o acesso e a permanência de alunos com

necessidades educacionais especiais em classe comum. Contudo, o

conceito e a efetivação da Inclusão Escolar são muito mais

abrangentes do que a simples inserção do aluno deficiente numa sala

de aula. O direito de TODOS à educação apresenta especificidades

que necessitam ser contempladas. A aprendizagem deste educando,

a apropriação dos conteúdos historicamente construídos, a

participação significativa no processo educacional não são garantidos

no momento da matrícula. No entanto, tais elementos são requisitos

essenciais para que a Inclusão possa acontecer de fato. A pessoa que

freqüenta apenas uma sala especial de uma escola regular não deve

ser considerada, para efeitos de estatísticas, como um aluno incluído,

não obstante todo discurso favorável da equipe que o circunda no

recinto escolar. Pesquisas têm demonstrado que muitos alunos são

recebidos nas escolas regulares e permanecem esquecidos, alienados

do conhecimento, sem nenhum investimento em sua participação e

desenvolvimento, com serviços pedagógicos ineficientes. A pretensa

‘socialização’ dos alunos incluídos não exige construções cognitivas e

compreensão das relações interpessoais. O que acontece, na

realidade, é a tolerância forçada da presença, estabilizando-se a

segregação, mesmo em ambiente escolar comum. Estatísticas

veiculadas no meio educacional enunciam que a inclusão já é uma

realidade. Entretanto, um exame mais acurado da situação revela

que a maior porcentagem de ‘alunos incluídos’ consiste de educandos

que fogem às regras estabelecidas, geralmente por um quadro de

hiperatividade. O diagnóstico dessas crianças é realizado até mesmo

por professores, estressados pelas condições de trabalho e ansiosos

por libertarem-se de uma realidade que consideram não ser de sua

competência administrar. Alunos com deficiências orgânicas

permanecem recebendo atendimento em escolas especializadas.

Não obstante haja um progresso expressivo na caminhada

pela Inclusão, as possibilidades de desenvolvimento educacional

desses educandos permanecem desconhecidas, pois o diagnóstico

inicial influencia todo o ensino de caráter restritivo destinado a essas

pessoas. As barreiras impostas, a partir do momento do diagnóstico

de deficiência, são determinantes do curso total da vida familiar,

social e educacional do indivíduo. O impedimento à participação no

ambiente escolar regular, limita suas possibilidades, ao privar de

contatos que podem estimular todo desenvolvimento psíquico, social,

emocional e cognitivo.

Pesquisadores pontuam que os fatores que promovem o

crescimento e a maturação individual de qualquer ser humano,

independente de características particulares, são as experiências

vividas, por meio de suas relações sociais. O processo de assimilação

de conhecimentos não flui naturalmente, sendo um elemento inato,

mas é fruto de intervenções externas ao indivíduo, das relações

humanas, mediadas por evoluções e transformações sociais. A

relação com o outro permite o uso e criação de signos e

instrumentos. Há uma multiplicidade de influências que determinam o

grau de desenvolvimento.

As instituições de ensino, enquanto espaço de conflito e

contradições, detém um papel insubstituível na evolução dos

indivíduos em sociedades escolarizadas. Todo entorno influencia a

aquisição de habilidades, do nascimento até morte, porém, para o

deficiente, o diagnóstico torna-se uma condenação perpétua ao

distanciamento das pessoas ‘normais’.

A sociedade não reconhece a deficiência como sendo mais

um atributo da pessoa e que, necessariamente, não compõe um

empecilho intransponível à construção de relacionamentos sociais e

conhecimentos significativos, similares àqueles que se sucedem na

vivência de qualquer pessoa. Exemplo disso, são as pessoas com

deficiências, principalmente no meio rural, que nunca receberam um

diagnóstico e suas diferenças não foram percebidas por aqueles que

as circundavam. Sua sobrevivência ocorreu de maneira análoga ao de

seus pares, com os quais, cresceu e se desenvolveu, sendo um

sujeito atuante, tratado como alguém cuja participação não era

questionada, mas solicitada. São pessoas que tiveram uma vida

absolutamente igual à de seus semelhantes, muitos até constituindo

família. Para este, se fosse citada a sua ‘diferença’, em relação ao

restante dos seres humanos de seu entorno, certamente essa

alegação causaria espanto. Tais acontecimentos sinalizam para a

capacidade natural de evolução de todo ser humano. Um discurso

recorrente entre educadores de alunos especiais refere-se à

facilidade com que esses aprendem aquilo que é socialmente

incorreto, assimilando hábitos e costumes de outros educandos. Se

tais alunos estivessem na escola regular, provavelmente

direcionariam essa habilidade imitativa para a aprendizagem de

conhecimentos históricos, além de que suas condutas teriam modelos

socialmente “adequados’.

Contrariando os argumentos sobre a inviabilidade da

inclusão, existem outros exemplos de investigação que apontam para

as possibilidades: um deles direcionado a adultos com síndrome de

Down, que fizeram todo percurso escolar até o ensino superior e, em

razão dessa trajetória, apresentam autonomia de vida e capacidade

de gerir processos ligados à dimensão cognitivas e às relações

pessoais (BAPTISTA, 2008).

As escolas regulares, em sua esmagadora maioria, eximem-

se de suas responsabilidades com a transformação das práticas

tradicionais e obsoletas, a despeito do fracasso e evasão crescentes

dos educandos considerados ‘normais’. Essa situação de ineficiência

do sistema é amplamente utilizada como desculpa para manter a

deficiência ‘num ambiente específico em que os educandos recebam

atenção especializada’. As dificuldades na vida escolar, geralmente,

são atribuídas às falhas do sujeito e jamais consideradas como

conseqüência lógica de um falido e precário sistema educacional, que

necessita urgentemente de uma revisão em suas estruturas.

As características da escola são fatores determinantes que

podem promover o aprendizado ou desencadear problemas

cognitivos. O ambiente competitivo e classificatório precisa ser

banido da escola regular para que a mesma atenda aos preceitos da

Constituição de 1988 e a LDB de 1996, onde a condição humana e a

preparação emocional são requisitos indispensáveis para a eficácia do

ensino destinado a todos, sem acepção. Neste sentido, o conteúdo

curricular é essencial, desde que seja ministrado a todos. Cabe

esclarecer que não se pode construir uma ‘classe especial’ para

alunos regulares. Portanto, há necessidade de preocupar-se em não

nivelar os conteúdos à presumida (in) capacidade de alunos incluídos

(fato que é um pilar na Educação Especial). Um aluno incluído e/ou

com problemas de aprendizagem demanda respostas educativas

específicas: recursos de adaptação, diversificação de metodologia,

comprometimento dos profissionais com suas próprias atribuições,

critérios de avaliação diferenciados, materiais curriculares.

Na contramão da Inclusão Escolar, a legislação pressupõe a

autonomia e a capacidade do sistema educacional em atender a

todos os alunos. O texto de Políticas Públicas contempla expressões

que delegam às escolas uma superação mística de seus problemas.

Atribuem ao sistema uma ‘qualidade’ irreal, capaz de atender com

eficácia a diversidade nas salas de aula. A idéia de flexibilidade

curricular traz em si duas conotações: a possibilidade de

diversificação das atividades para apropriação de um mesmo

conteúdo por todos; e o grande equívoco que tem surgido no meio

educacional: o empobrecimento e seleção daqueles considerados

apropriados para alunos sem condições de aprendizagem.

O despreparo alegado pelos professores também é

perpetuado e não se observa nenhum movimento no sentido de

alterarem-se as condições do sistema. Os educadores estão

antecipadamente orientados pelo princípio do preconceito e

pressupõem que características genéticas, psicológicas e

comportamentais formam uma barreira intransponível e definitiva

para o desenvolvimento e apreensão de conceitos. A formação dos

profissionais continua alicerçada no aluno ideal, que aprende com

fórmulas prontas, disciplinado e perfeitamente ajustado aquilo que

lhe é disponibilizado. Todo professor precisa saber que, segundo

neurologistas, a inteligência não vem do neurônio, aquilo que a forma

é a quantidade de informações que pessoa recebe; aprender é um

assunto do cérebro, que tem regras próprias de funcionamento, que

não são determinadas pela discriminação.

A tradição histórica de separação entre ensino regular e o

especial deve ser rompido e estimular a articulação entre os

profissionais de ambos os contextos educacionais, para que se

promova uma educação realmente destinada a todos. A

reorganização escolar e a interface entre atendimento comum e

especializado repercutirão em benefícios mútuos, pela troca de

experiências e valorização do conhecimento acumulado em cada área

de atuação.

A efetivação da Inclusão Escolar trará consigo muitas

questões, que deverão ser enfrentadas por pais, professores,

pesquisadores e pela comunidade em geral:

Ampliação das controvérsias e oposições;

Expansão da demanda por recursos e apoios específicos,

cujo fornecimento pelos órgãos competentes é previsto

em lei;

Percepção da necessidade de comprometimento

individual do educador;

O engajamento do educador na contínua reflexão sobre a

própria atuação;

Reformulação do sistema educacional de forma global,

incluindo-se a adoção de novas metodologias de trabalho

e critérios de avaliação escolar;

Reconhecimento de que é imprescindível o envolvimento

coletivo da equipe escolar e de órgãos oficiais, posto que

o processo não pode ser concretizado pela ação isolada

de um único e solitário professor;

Retorno ao principal objetivo da educação, qual seja: a

apropriação de conhecimentos formais, historicamente

produzidos pela humanidade;

A percepção de que a inclusão não reduz o espectro da

deficiência e suas conseqüências reais: as limitações

orgânicas e funcionais existem e não se pode exigir dos

profissionais que as ignorem transferindo suas

concepções do fenômeno educacional para uma outra

ilusória, onde todos os problemas solucionam-se por si

mesmos;

Aceitação da realidade efetiva de que nem todos os

alunos corresponderão às expectativas criadas

hipoteticamente.

Nas Diretrizes para a Educação Especial do Estado do

Paraná, encontra-se o seguinte:

A compreensão da Educação Especial como modalidade que dialoga e compartilhaos mesmos princípios e práticas da educação geral é recente e exige das famílias, alunos, profissionais da educação e gestores das políticas públicas um novo olhar sobre o aluno com necessidades educacionais especiais. Buscamos um novo olhar em que valores como compreensão, solidariedade e crença no potencial humano superem atitudes de preconceito e discriminação em relação às diferenças. Convidamos a um novo olhar que inspire a educação na e para a diversidade, em que currículos que marginalizam as diferenças dêem espaço à construção de práticas curriculares calcadas no compromisso com a pluralidade das manifestações humanas presentes nas relações cotidianas da escola.No entanto, a construção dessa nova ética social é um processo complexo e de longo prazo. Envolve mobilização coletiva pois é assim que se provocam mudanças sociais. Nesse percurso, exige-se disposição para dialogar, confrontar idéias e valores, compartilhar experiências, articular ações e não negar, jamais, o passado. Não neguemos a construção histórica que possibilita, atualmente, vislumbrar novos caminhos, refletir sobre erros e acertos e propor alternativas para superação de práticas que não mais respondam às necessidades sociais (p.09).

Alunos que forem incluídos podem jamais vir a atingir a

‘normalidade’, culturalmente reconhecida como tal. No entanto, seus

padrões de conduta, suas dimensões cognitivas, sua capacidade de

interação nas relações pessoais atingirão o máximo de

desenvolvimento, propiciando uma semelhança real com sua

geração. O que se propõe é uma abertura que permita ver a pessoa,

além da deficiência, e que se considere todo um contexto onde esse

sujeito será educado. O tipo de educação oferecida pode originar,

manter, intensificar ou amenizar dificuldades e diferenças.

CONCLUSÃO

A palavra ‘Inclusão’, por si só, já se apresenta carregada de

preconceitos. Porém, incluir é necessário, pois o recinto escolar, com

todas as suas peculiaridades representa o espaço de preparação real

para a vida. Há que se dirimir a resistência de pais, professores e

demais profissionais da educação regular, cujos argumentos são

pautados pelo desconhecimento das reais possibilidades de

aprendizagem e participação das pessoas com deficiências da vida

escolar. O conformismo e acomodação são, entre outros fatores,

alvos que precisam de extinção imediata no meio educacional para

que a Inclusão seja uma realidade.

Profissionais comprometidos com seu trabalho precisam se

aprimorar, buscar aperfeiçoamento contínuo e informações

pertinentes às variadas deficiências e o real significado das mesmas

na vida do indivíduo. O conhecimento traz consigo uma nova visão e

minimiza os receios de tratar com as diferenças.

O aluno com deficiências necessita de condições específicas

para sua aprendizagem e desenvolvimento que podem ser oferecidas

pela escola regular. A participação não segregada produz auto-estima

e influi diretamente nos resultados acadêmicos dos educandos com

necessidades educacionais especiais. O envolvimento com a própria

geração gera oportunidades insubstituíveis de relações em contexto

propiciador de aprendizagem e transformação. A escola tem uma

função social que somente pode ser cumprida em seu contexto,

sendo constitutiva do sujeito, independente de sua qualidade.

O atendimento educacional especializado, numa nova

perspectiva, tornar-se-á uma das condições para o sucesso da

Inclusão Escolar de alunos especiais, podendo transformar-se num

recurso adicional para o processo de ensino-aprendizagem, por

disponibilizar conhecimentos e apoios para a superação das barreiras

impostas pela condição de deficiência. Modifica-se, dessa maneira,

sua função de opção exclusiva para a educação dos deficientes, que

fere o princípio de igualdade, para tornar-se um suporte valioso, na

consecução de objetivos e metas mais abrangentes.

REFERÊNCIAS

BAPTISTA, Cláudio Roberto. Inclusão Escolar e Educação Especial: o universo das políticas e o debate brasileiro sobre contornos e limites. Artigo impresso, 2007.

BRASIL, MEC. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Disponível em < http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/ pdf/politica.pdf >Acesso em 26/11/2008.

COLL, César; MARCHESI, Álvaro & PALACIOS, Jesùs. Desenvolvimento psicológico e educação-Transtornos de desenvolvimento e necessidades educativas especiais. 2ª Edição, volume 03. Porto Alegre: Artmed Editora, 2004.

JANNUZZI, Gilberta. Algumas Concepções de Educação do Deficiente. Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 25, n. 3, p. 9-25, maio 2004.

KASSAR, Mônica de Carvalho Magalhães. Marcas da história social no discurso de um sujeito: uma contribuição para a discussão a respeito da constituição social da pessoa com deficiência. Cad. CEDES, Campinas, v. 20, n. 50, abril 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0 101-32622000000100004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 24 de novembro de 2008.

LAPLANE, Adriana. Uma análise das condições para a implementação de políticas de educação inclusiva no Brasil e na Inglaterra. Educ. Soc. Campinas, v.27, n. 96, Oct. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script= sci_arttext&pid=S0101-73302006000300004&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 22 de novembro de 2008.

O Princípio da Igualdade e os Portadores de Deficiência. Disponível em <www.berbert.adv.br/artigos/ig_portadores.doc > Acesso em 12/11/2008.

PARANÁ, SEED. Diretrizes Curriculares da Educação Especial para a Construção de Currículos Inclusivos. Curitiba, PR:SEED, 2006. Também disponível na página do Portal Educacional do Estado do Paraná <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br>.