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7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
1/19
C O N V M
FA Z E R
U M
C D I G O CIVIL
?
Outorgando
a
Constituio
d e
2 5
d e
maro,
o
primeiro
Im -
perador
f e z a
promessa
dum
cdigo
civil.
Ao
implante dum regime
politico
importado
d e
Frana
devia seguir,
s i
o s
motins
d e
1 8 3 1 o
no
impedissem,
a adopo
mais
o u
menos
disfarada
do
Cdigo
Napoleo,
em
que
o
gnio
d o classicismo,
supprimindo
a
elaborao
nacionalista
d a
Meia-
Idade,
religava
o
mundo moderno
Roma
Imperial.
D .
Pedro
em -
penhava-se
n a reorganizao
d a
justia,
o u
antes
d o
Poder
Judi-
ciario,
ramo
principal,
dizia
a
Falado
Throno
d e
1827 ,
que
muito
concorrer
para
o
novo
systema
d e
finanas,
que
espero
ver
crear.
No
h a
Cdigo,
accentuava
o
monarcha,
no
h a
frma
apro-
priada
s
luzes
d o
tempo
nos
processos,
a s
leis
so
contrarias
umas
s
outras,
o s
juizes
vccm-sc
cmlaraadcs
nos
julgamentos,
a s
partes
padecem.
O
que
elle
principalmente
recommendava
s
Cmaras
que
sobre
qualquer
das
duas
matrias,
finanas e
7om
vii
1 8 0 9
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
2/19
258REVSTA
B R A Z I L E I R A
justia,
que
no
seu entender
andavam
muito
ligadas,
houvesse
unidade,
para
perfeio
do
instrumento
que
pretendia
manejar.
O
voto
de
graas,
redigido
por
Gonalves
Ledo,
reconhecia
que
a
formao
t i o
systema
judicirio
estava estreitamente
unida
estabilidade
do systema
jurado
mas,
ponderava
a commisso
com
lucidez e
senso
pratico,
a
assumptos
de
tamanha
impor-
tancia
devia
dar
a
Cmara
mais
sisuda
meditao
e
porventura
uma
sabia
lentido,
para
evitar
a
versatilidade,
sempre
funesta
c m taes casos,
a
que
devido
esse labyrintho
cm
que
hoje
est
o
edifcio das
nossas leis.
E,
emquanto
no se
conclua
to
grave
tarefa,
a
Cmara
estava
persuadida
de
que
uma depurada
escolha d e
funecionarios
pblicos
e cscrupulosa obedincia das
leis
actuaes
podia
remediar
em
grande parte
o s
abusos
apontados
pelo
Imperante.
D .
Pedro
no
s e
deu
por
convencido;
a
meditao
sisuda
e
a
sabia lentido
que
o s
legisladores
reputavam
indispensveis
a uma
reforma
do direito
vigente,
no
se
casavam
com
a sua
anci
de
reinar,
a soffreguido
do
seu
caracter
e
o
desejo
de
ver
tudo
logo
pautado
franceza,
dentro
das riscas
(pie
a
sua
autoridade
traasse.
Abrindo
a Assembla
Geral
em
1 8 2 8
insistiu
n o
assumpto,
lamentando
que
o
Poder
Judicirio
no
tivesse
recebido
melhora
alguma,
a o
que
retorquiu
o
parlamento
que
a s
mais
sabias
leis,
s i
no
tm
f i e l
execuo,
no
passam
de
formosas
composies,
onde
apenas
o
philosopho
s e apraz
de
achar
b e m
desenvolvidos
o s
princpios
eternos
da
razo
c
da
justia.
A
falta
d e
execuo
das
leis,
continuava
Ledo
no
pro-
jecto
de
voto
de
graas
daquelle
anno,
bem
como
a
corrupo
da
moral,
restos
falacs
d o
absolutismo,
so
a
causa
da
exor-
bitancia
d o
poder
judicirio
e
dos
males
que
gravitam
sobre
os
subditos
d e
V .
A I .
/.
na
mor
parte
d o
Imprio.
Mas
o
Impe-
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
3/19
CONVM
FAZER
U M
C D I G O
C I V I L
59
rador
te imou
como
q u e m
estava
acostumado
a
mandar
e a
ser
obedecido,
e no
anno
seguinte
forou
o
emperrado
Ledo
a
de-
clarar,
batendo
nos
peitos,
que
na
verdade
sobre
o
gothico
pio
d o
velho
systema
no
podia
girar
o
luminoso
machinismo
da
constituio
brazileira.
Vai,
todavia,
alguma
distancia
da
taa
aos
lbios,
e a s
palavras
lisongeiras
dirigidas
carta
constitu-
cional
no
apressaram
a reforma
exigida,
que
o
parlamento
ia
dilatando,
promettendo
occupar-se
do
assumpto
quando
lhe
so-
brasse
tempo,
pois
havia
outros
de
maior
urgncia,
bastando
para
s e
tolerarem
o s males
do
systema
judicirio
em
vigor
que
se
executassem
fielmente
as
leis
existentes.
A
sesso
ordinria
de 1S30
foi
encerrada
com
a
sarabanda
celebre
em
que
D. Pedro
manifestou
o
seu
desagrado
por
nao
terem
sido
expedidos
alguns
actos
que
a
constituio
exigia e
elle havia rccommendado.
Mas
n a reunio
extraordinria
que
convocara
limitou-se,
descorooado,
a
pedir,
alm
das
leis
de
meio
e
de
circulao, a discusso
do
cdigo
penal
e
do
processo
criminal,
adiando
para
tempos
mais
calmos
a reforma
do direito
civil.
Veiu
depois
o
7
de
abril
e o filho de
Carlota
Joaquina
no
teve
o
gosto
de
ver
unido
e
codificado
o
direito
regulando
uma
justa
liberdade, conforme
a
expresso
favorita
dos
seus
conselheiros.
Apertar
a sociedade
nos
moldes
de uma
regulao
de
theoristas
e
doutrinrios,
fundir no
cadinho
da
lei
escripta
usos,
costumes
e
tradies
sem atcender s condies
especiaes
de cada
povo
era
o
ideal
desses
philosophos
de
que
falara Ledo,
desses
pr-
goeiros
do
direito
immanenle
e
absracto,
regra
inflexvel
que
do
alto
se
impe
amorphia
das
massas
governadas.
A '
educao
philosophico-juridica
dos
estadistas daquella
epocha
vinha
juntar-se
a
tendncia
natural
do
fundador
de um
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
4/19
25 REVSTA
BRAZILEIRA
novo
Imprio.
O s
governantes
sempre
so
estimulados
pela
vaidade
d e
decretar
o
direito,
e
o
ideal
d e
um
cdigo,
em
q ue
n o
silencio
do
quarto
s e
dispe
das
relaes sociaes,
da
proprie-
dade,
d a
liberdade
e
dos
affectos
d o
cidado,
formando
combi-
naes
como
s e
arrumam
no
taboleiro
a s
figuras
d o
xadrez,
seduz
a
todos
o s
tyrannos,
aos
reformadores
d o
direito,
aos
fundadores
de
novos
regimes
polticos,
como
alirmao
solemne
d o
seu
i l
limitado
poder.
Tal
regulamentao
da
vida
civil
corre-
sponde
alis
a
uma
necessidade
politica,
favorece
o
despotismo,
consolidando
o
poder
central
e facilitando
a
tarefa
administrativa.
S i
Carlos
Magno
com
a
decretao
dos
Capitulares
segura
a
unidade
politica
d o
Imprio,'
Luiz
XI,
a
braos com
o feudalismo,
sonha
com
a
unidade
d o
direito
nacional,
desejando
que
no
seu
reino
no
haja
mais
que
um
costume,
um
s
peso,
uma
s m e-
dida,
tudo
contido
num livro
belloc
nico.
E'
a
frma
attenuada
daquelle
delrio
romano
que
queria
a
todo
o
povo
uma
s cabea
para
decepal-a
d e
uma
vez.
Napoleo
dominando
a
Europa,
fazendo
tremer
o
cosaco
n o
fundo
dos
seus
steppes,
sente
q ue
tem
d e
cumprir
a
promessa
jacobina
d e
unificar
o
direito
para
fazer-se
bastante
poderoso.
Pelas
victorias
n a
guerra
o
soberano
domina
o
presente,
mas
estende
o
poder
sobre
a s
geraes
fu-
turas
por
meio
desse
admirvel
instrumento
d e tyrannia
que
se
chama
cdigo
civil.
Sujeitar
o s
vindouros
a o critrio
que
a
auto-
ridade
escolheu
libertar
d a
l e i d a
morte
a
vontade
d o dspota,.
o
que
s e
consegue
muito
mais
efticazmente
com
a s
reformas
do
direito
d o
que
com
a s
alteraes
constitucionaes
d o
systema
poltico.
A
lio
dos sculos
passados
aproveita
constituio
dos
grandes
Estados d o
nosso
tempo, e
o s
dictadores
no
se
illudem
n a
preferencia
com
(pie
s e
voltam
para
a s
reorganizaes
jurdicas.
Desde Napoleo
nenhum organismo s e
constituiu,,
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
5/19
C O N V M
FAZER
U M
C D I G O
C I V I L
6
nenhum
Imprio
s e formou,
nenhuma
dictadura
mpoz-se
nao
que
no
cuidasse
logo de cimentar
a
sua
permanncia,
abafando
a s
iniciativas,
impedindo
a
gnese
espontnea
d o
direito,
to -
lhendo
a
liberdade
dos
actos
d a
vida
civil
pela
decretao
de
um
canon
jurdico
que
acantonasse
o
rebanho
nas
tapadas
regu-
lamentares.
A
instituio
dos
estados
militares
acompanhada
n o
mundo
moderno
d a
refundio
d o
direito
privado,
no
s
para
o
amoldar
nova
ordem
poltica,
como
para
obedecer
neces-
sidade
d e
unificar
n a
regra
geral
o s
elementos
livres
e
parti-
cularistas,
reunindo
tudo
num
bello
livro
conforme
o
ideal
q ue
fazia
a s
delicias
d e
Luiz
XI.
A
guerra
franco-prussiana
de
1870 ,
que
produziu
a
unidade
alleman
e
a
dictadura
militar
dos
Ho-
henzollern,
tornou
indispensvel
o
cdigo
civil,
o
trabalho
t o
elogiado
dos
jurisconsultos
imperialistas
e
offerecido
por
modelo
s
republicas
liberaes
da
America.
A
Itlia,
unindo-se
sob
a
casa
d e
Saboia,
trata
de
substituir
a o
direito
provincial
um a
l e i
geral,
e
ainda
a
caminho
d e
Roma,
Victor
Emmanuel
pro-
mulga
em
Florena
o
cdigo
civil.
A
Moldo-Valaquia
semi-
barbara
para
transformar-se
e m
reino
moderno,
importa
um
Hohenzollern
e
copia
o s
cdigos
estranhos.
A
nova
phase
do
imperialismo
japonez
necessita
d o
concurso
d o
jurista
francez
Boissonade
para
amoldurar
a
antiga
civilizao
oriental
n o
quadro
d o
direito
napoleonico,
e
no
tardar
que
a
livre
America
do
Norte,
proseguindo
n a
misso
imperial
que
era
o
partido
re-
publicano
lhe
aponta,
substitua
a common
law
por
um
cdigo
decretado
pela
dictadura
militar
que
lhe
traro
a s
velleidades
conquistadoras.
Por
toda
a
parte
a
codificao
d o
direito
privado,
mais
ou
menos
impregnada
d o
espirito
justinianico,
segue
d e
perto
a
fundao
dos
grandes
estados
militares,
a unificao
dos
povos
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
6/19
262REVSTA
B RAZ ILE IRA
da
m e s m a
raa,
o
estabelecimento
do regime
cesariano.
O
espirito
de
unidade,
de regulao
e de
igualdade,
to
prejudicial
ao surto
do direito e
ao
progresso
scientifico,
com
(pie
vive
ha
sculos em
porfiada
campanha,
recupera vitalidade
e
alento
cada
vez
que
as naes
em
crise,
desconfiadas
de
si,
abrigam-se
dos
vendavaes
que
desencadearam
seus
erros sob
o
despotismo
militar,
protector
e brilhante.
Uma
luta
surda
se
trava
entre
a
espontaneidade
popular,
reparadora
e
fecunda,
e
a
disciplina
que
a
tortura
para
a
obrigar
ao
leito
predeterminado, embora
com
risco
de
atrophia,
s i
uma
revoluo
no
destre
a
tempo
os entraves.
Entre
o
despotismo
e
a
revoluo
balana
a
alma
popular
nas
naes
mal
constitudas
o u
decadentes,
e
o
direito
solicitado
alternadamente
pelos
dois
pulos
oscilla,
e
se
esteriliza
e
obscurece.
Mas
o s
actos
do
despotismo
vencem
os d a
revoluo
em
durabilidade,
e
os
vestgios
ficam
mais
proiundos,
principalmente
quando
se
relacionam
com
o direito
privado.
Napoleo,
decretando
a
herana
necessria
e
a
igual-
dade
das
partilhas
fez
mais
pela
democracia
franceza
e
pelo
enfraquecimento
econmico
do
pai/,
do
que
a
junta
de
salvao
publica
matando
os
reis
e
despojando
o s
nobres.
A
pro-
hibio
de
indagar
da
paternidade
concorreu
mais
para
o
desequilbrio
social
e
a
immoralidade
dos
costumes
pblicos
no
segundo
Imprio
francez
do
que
o
exemplo
de
corrupo
elegante
da
camarilha
de
Saint-Cloud.
S i
o
nosso
Governo
Provisrio
houvesse
logrado
aclimar
no
Brazil
o
systema
da
lei
Torrens,
teria
feito
mais
pela
reorganizao
econmica
que
a
Republica
projectara
do
que
todos
os
planos
financeiros
in-
tercalados
em
vistosos
programmas
polticos.
Ainda
assim
taes
so
a
vitalidade
e
a
fora
creadora
da
liberdade,
que
consegue
s
vezes
romper
a
tela
legislativa,
e
o
sentimento
popular
ir-
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
7/19
C O N V M
F A Z E R
U M
C D I G O
C I V I L
63
rompe
affirmando
solemnemente
o
direito
d a
vontade
individual.
No
cdigo
civil
allemo,
que
ha
d e
entrar
e m
vigor
e m
1900,
todas
a s
cautelas
foram
tomadas
para
nada
deixar
sem
a
re-
gulao
legal.
Destinado
a
completar
a
unidade
nacional
sob
a
disciplina
providencial
d o
Kaiser,
tudo
nelle
s e
subordina
tutella
d o
governo
e d a
l e i
mas
a
trechos
o
individualismo
ger-
manico
rebella-se
contra
o
critrio
doutrinrio,
e
e m
instituio
conservadora
por
excellencia,
o casamento
por
exemplo,
per-
mitte-se
aos
cnjuges
alterar,
na
constncia
d o
matrimnio,
o
pacto
ante-nupcial
sobre
o
regime
dos
bens.
Quantos
inconvenientes
para
o
progresso
d o
direito
scien-
tifico,
para
a
instituio
d e
um
regime
jurdico
baseado
no
contracto,
segundo
a
evoluo
observada
por
Sumner
Maine
e
descripta
por
Fouille,
e
sobretudo,
para
a
soluo
dos
graves
problemas
sociaes
d a
familia
e
d a
propriedade,
resultem
deste
embate
da
espontaneidade
popular
com
o
critrio
racional
do
legislador,
no
preciso
especificar.
Baste,
para
o
alvo
q ue
nos
propomos,
indicar
b
innegavel
phenomeno
histrico
d a
con-
comitancia,
o u
melhor,
d a
correspondncia
entre
a
codificao
d o
direito
privado
e
o
assentamento
d e
um
regime
monarchico
autoritrio,
cesariano,
baseado
na
unidade
d e
povos
d e
tradio
diversificante,
de
vida
autnoma,
d e
usos
e
costumes
gerados
directamente
das
condies
especiaes
d a
civilizao
local.
As
tentativas
feitas
n o
Brazil
durante
o
segundo
reinado
para
codificar
a s
leis
civis
e
a
que
s e
acbam
ligados
o s
n o m e s
d e
Teixeira
de
Freitas,
Seabra,
Zacharias,
Nabuco,
J .
Felicio
e
Coelho
Rodrigues,
s i
no
obedeciam
exactamente
a
intuitos
de
predomnio
imperialista
que
a
ndole
apathica
e
sorna
d o
m o-
narcha
parecia
repellir,
vinham
sem
duvida
d o
vao
imitativo
da
regulao
franceza,
com
que
polticos
e
juristas,
tendo
em
es-
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
8/19
26REVSTA
BRAZILUIRA
quecimento
o u
desprezo
a
tradio
d o direito
nacional,
bus-
cavam,
copiando
a legislao
napoleonica,
empurrar
a
jovcn
nao
brazileira
para
o
meio
d a
civilizao
que
o s
deslumbrava.
Educados
por
autores
francezes,
conhecendo
d a
literatura
jri-
dica
moderna
o s
commentarios
a o cdigo
francez
e
algumas
obras
allemans
d e
direito
romano,
imbuiram-se
o s
nossos
le -
gisladores
e
jurisconsultos
daquelle
espirito
d e
regra
e
disciplina
que
pelo
metro
autoritariamente
fixado
bitola
todas
a s
paixes
humanas
d e
envolta
com
o s
sentimentos
eternos
d e
justia.
Foi
por
isso
que
s e
praticou
entre
ns
o nefando
attentado
d a l e i
d e
d e
setembro
d e
1847 ,
que
prohibiu
a
indagao
d a
paternidade,
animando
o
desregramento
dos
pais
e
con-
demnando
o s
filhos
naturaes
que
a s
calumniadas
Ordenaes
do
Reino
protegiam
a o
menos
quando
nasciam
plebeus.
Como
quer
que
fosse,
a
tentativa
de
organizar
um
cdigo
civil
obedecia,
1 1
regime
passado,
a o
espirito
lgico,
era
um a
conseqncia
razovel
d a
centralizao
que
asphixiava
o
paiz
e
correspondia,
a o
menos
e m
theoria,
ndole
d o
systema
poltico
que
s e
arremedava
e
era
to
alheio
a o
sentimento
nacional,
ao
nosso
grau
d e
civilizao
que
bastou
um
piparote
para
o
lanar
por
terra.
E
a
par
d a
risonha
incredulidade,
sino
indifferena,
com
que
o
povo
assistia
a o
ensaio
poltico,
elle
oppunha
a
re-
sistencia
tenaz
d a inrcia,
d a
desconfiana
das
novidades,
do
apego
s
tradies
portuguezas
preteno
dos
jurisconsultos
d e vasar
o
direito
inteiro
n a
frma
chegadinha
de
Frana.
Leis
isoladas,
curtas
e
vibrantes
marteladas
no
antigo
edifcio
direito-nacional,
conseguiu
o
legislador
obter
da
surpresa
de
uns
e d a
ignorncia
d e
muitos,
mas
quando
o snobismo
refor-
mador
s e
abalanava
obra
d e
grande
flego,
esmorecia
na
preguia
nacional,
e
o
monarcha
adiava
para
melhores
tempos
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
9/19
C O N V M
F Z E R
U C D I G O
C I V I L
6
a
gloria
to
desejada
dos
Justinianos
e
Napolees.
Abenoada
preguia
nacional
Porm
depois
que
Pedro I
tentara
a
codificao civil
e
realizara a
criminal
a
Jurisprudncia
fizera o seu caminho.
O s
descobrimentos
scientificos,
a diffuso d e novos
methodos
philo-
sophicos
e
um
estudo
mais
acurado
e
lcido
d a
historia
dos
povos
antigos,
a comparao
dos
monumentos
juridicos,
as
reformas econmicas,
a
nova
distribuio
da
riqueza
e
a
fun-
dao
da
moral
positiva
operaram
grande
mudana
d o
ideal
jri-
dico,
apontando
outra
orientao
aos
legisladores,
aos
juriscon-
sultos,
aos
estadistas.
O
direito
reno/ou-se
sobre
bases
mais
justas
e
equitativas,
mais
de
accordo
com
a
ndole
d e
cada
povo,
entrando
todavia
e com
franqueza
n a
corrente
das
idias
m o-
dernas.
A
opinio
esclarecida insurgiu-se
contra
a s
velhas
regras
das
taboas
sacramentaes,
e
e m
face
d o
espirito
clssico,
q ue
perpetua
o direito
romano,
ergueu-se
a
iniciativa
dos
povos
reclamando
novas
leis
para
um
regime
novo,
um
systema
mais
liberal
e
mais
amplo,
d e
accordo
com
a s
tradies
nacionaes,
deixando
a
vontade
individual
agir
n a
plenitude
d a
fora,
enca-
minhando-se
para
reduzir
a
l e i a
simples
disciplina
dos
con-
tractos
e
a
misso
d o
legislador
a o
minimo
d e
interveno.
Menos
leis
e
mais
liberdade.
As
necessidades
sociaes
bradam
pela
suppresso
d e
institutos
oppressores,
pela
reparao
de
iniquidades
millenarias.
Os
problemas
d o
trabalho,
do
prole-
tariado,
e
d a
propriedade agraria,
a
questo
dos
filhos
naturaes,
a
reconstituio
d a
familia,
a
campanha
reivindicadora
dos
femi-
nistas
impoem-se
cogitao
dos
philosophos,
dos
juristas,
dos
socilogos,
dos
economistas
e
dos
financeiros
que
s e
no
em -
balam
docemente
n o
goso
d o
melhor
dos
mundos;
d e
todos
que
possuem
a
acuidade
nervosa
necessria
para
perceber
q ue
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
10/19
266
REVSTA
BRAZILEIRA
o s
fundamentos
da
sociedade
esto
sendo
fortemente
abalados
neste
final
de
sculo
pela
corrente
impetuosa
das
idias
c
dos
sentimentos.
Na
Allemanha, n a
Frana,
na
Inglaterra,
na
Itlia,
na
Suissa,
no mundo
civilizado
emfim, os moldes
do
antigo Di-
reito
arrebentam
com
a
expanso
das
idias.
Na
ordem
pessoa
e
familiar
j
se no
pde
manter
por
muito tempo
a disciplina,
prpria
de um
estado
rudimentar
da
sociedade,
e
na
ordem
econmica
os
entraves
postos
liberdade
dos
contractos,
a
superstio feudal
da
terra
no
resistem s
engenhosas
creaes
do
commercio,
actividade
industrial
e
s
exigncias
da
fome,
de modo
que
o
direito
vai
cotejando
apenas o s institutos
que
s e
geram
fora delle
e
a
seu
pezar.
Mas
sobre
todas
estas
questes
jurdico
sociaes
o
accordo
da
opinio
est
muito
longe
de fazer-se,
apezar
do methodo
scientifico
introduzido
no
estudo
d o
direito,
cuja
complicao
corresponde
sua
collocao
na
escala
dos
conhecimentos
humanos.
A
discusso
anda
no
mais
ardoroso
da
peleja,
no
j
na
primeira
phase
entre o s
innovadores
e
o s
louvaminbeiros
do
bom
tempo
antigo,
nias
entre
os
pr
gadores
das
doutrinas
novas
na
disputa
da
sobreexcellencia
dos
remdios
lembrados.
Algumas
theorias
so
acquisies
que
se vo
firmando
em
disposies
legislativas,
mas
muitas
outras
no
passam
de
controvrsias
vivazes
que
no
mereceram,
nem
talvez
meream
o
aceite
constitutivo
dessa
razo
geral
que
se
chama
a
lei.
E
decennios
correro
antes
que
taes
problemas
tenham
soluo
digna
da
sua
importncia,
vencendo
a
rotina, a
tradio,
os
hbitos,
a
indifferena.
Em
tal
estado
de
trans-
formao
que
soffrem
a s
instituies
bsicas
da
sociedade
occidental,
pensar
em
crystallizar.
no
texto
de
um
cdigo
a
disciplina
de
todos
os
actos
da
vida
civil
parece
tarefa
de
quem
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
11/19
C O N V M
FAZER
U M
CDIGO CIVIL
67
suppe
que
o s
povos
s e
governam
pela
regra
mysteriosa
dos
livros
sagrados,
confiada
a
um
pequeno
numero
de eleitos.
Nas
condies peculiares
do
nosso
paiz
em
(pie
apenas
se
admitte
a
possibilidade
de
uma
nova
concepo
do
direito,
em
que
a
opinio
da classe
dos
juristas
mal s e
preoccupa
da
necessidade de
estudar
a
Jurisprudncia
luz
diversa da
que
allumiou
os
jurisconsultos
reinicolas e
o s
seus
discpulos
bra-
zileiros
em
que
a
grande
maioria
do Congresso
Legislativo
se
mostra
to
alheio
conscincia do
direito
que
fulmina
de
nullidade
o s
mais
solemnes
contractos
por
vicio de
formalidades
fiscaes
em
que
as correntes de
idias
que
atravessam o
Atlan
tico
apenas despertam
sympathias
vagas
no
grupo
resumido
dos
chamados intellectuaes
;
cuidar de
formular e fixar
o
direito
civil
no
medir
o alcance
e
no
pesar
as
difriculdades
da
tarefa.
Certo
que
o
Brazil
j
conta
jurisconsultos
que
alliam
ao c o-
nhecimento
das
leis
vasta
literatura
jurdica
e
espirito
philoso-
phico,
e entre
esses
tem
conspicuo
lugar
o
Sr.
Clovis
Bevilacqua'
de
q u e m
se
confiou
a
redaco
do
projecto
do cdigo
civil,
mas
esses no
podem
alimentar
a
preteno
de
arrastar
aps
as
theorias discutveis
e
incertas
a
grande
maioria
do
paiz,
nem
siquer
p o d e m
garantir
o apoio
da
opinio
jurdica
actual
que
mais
depressa
lhes
ser
contraria
do
que
favorvel.
Para
fazer
obra
com
o
que
existe,
seguindo
as
doutrinas
dominantes
no
nosso
acanhado
meio,
melhor
ser
que
fiquemos
onde
estamos
a
no
prendamos
a evoluo,
que
se opera
lentamente,
na
tes-
situra
metlica
de
um cdigo.
Baste-nos
o trabalho
de
Teixeira
de
Freitas,
modificado
pelas
leis
posteriores,
principalmente
pelos
grandes
actos
do
Governo
provisrio,
e no
se
faa
seno
uma
nova
consolidao
das
leis
civis
para
commodidade
dos
indoutos
e
facilidade
dos
indolentes.
Mas
s i o s
autores
do
projecto
querem
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
12/19
68REVISTA
B R Z I L E I R
obedecer,
como
natural,
l u z
que
o s allumia
n o
estudo
d a
Jris-
prudncia
faro coisa
que
o s
legisladores
e a opinio
publica
sane-
cionem
?
Tero
a
coragem
necessria
para
consagrar
a
plena
liberdade
d e
testar,
fortificando o
ptrio
poder
e
abolindo a
herana
necessria,
anti-social
e
jacobina?
Como
suppol-o
s i
a
iniqidade
n a
ordem
d a
suecesso
intestada
v a i a o
ponto
d e
despojar
o
con-
juge
sobrevivente
e m
favor
d e
parentes
mais
o u
menos
prximos
e
o s
autores
d e
projectos
at agora offerecidos
julgam-se
audazes
s
porque
o
aproximam
u m
pouco
mais
n a
escala
hereditria
?
Como
encarar a
questo
do divorcio
ante a diviso
profunda
dos
sentimentos
e
das
opinies
?
Os
filhos
naturaes
obtero d o
futuro
cdigo
a
justia
que
reclamam,
e o
p a i
desregrado e
egosta
ver emfim surgir
diante
d e s i
a
prole
irregular
reclamando
a
proteco
e
assistncia
vida
que
gerou
?
A
pobre
rapariga se-
duzida
ver-se-
condemnada,
desclassificada,
pelo
erro d e
um
momento,
emquanto
o
seduetor
convolando
para
novos
amores
saneciona
com o
sacramento
d o
matrimnio
a acquisio
d e
um a
fortuna,
d e
uma
situao
honrada
e
farta?
A
posio
d a mulher
continuar
a
ser
essa
tutela
disfarada
o u
clara
em
que
a
filha,
a
irman,
a
esposa
e
a
mi
s e
resentem
d a
desconfiana
d o
le-
gislador
que
a
custo
e
a
retalho
lhes
vai
dando
a capacidade
civil?
Que
faro
o s
autores
d o
cdigo
s
reivindicaes
da
mulher
?
Proseguiro
n a
obra
encetada
pela
l e i
d o
casamento
civil,
segundo
a
corrente
universal
d e
que
o
projecto
de
cdigo
civil
suisso
o
documento
legislativo
mais
adiantado,
ou,
pelo
contrario,
afferrar-se-o
a o
systema
d e
perpetua
minoridade
q ue
nos
herdou
a
antigidade
?
No
d e
crer
que
s e
norteie
para
o
lado
das
justas
reivindicaes
feministas
a
conscincia
jurdica
de
uma nao
e m
que
o s
governos
cogitam
a
serio
d e regular
o exer-
ciejo
d a
profisso
meretrcia,
infmia
a
que
a
misera
prostituta
te m
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
13/19
C O N V M
FAZER U M C D I G O
CIVIL? 9
escapado
at
agora n o Brazil
graas
a o
sentimento
hereditrio
d o
respeito
pela
mulher
branca
que
o
passado
servil
nos
legou.
E
n o
tocante
a o
regime
legal
dos
bens
a
tarefa
dos que
nos
querem
dotar
com
um
cdigo
civil
no ser
menos
rdua
nem
menos
perigosa.
A s
condies
d o nosso
organismo
econmico
necessitam
ser
bem
ponderadas
por quem
tiver
d e
traar o
quadro
legal
e m
q ue
futuramente
s e
ho de
desenvolver
a s foras
vitaes
d a
nao.
Antes
d e tudo,
nesta
matria
principalmente,
dever
pr
d e
lado
o s
preconceitos
d e
doutrina,
o s systemas
fechados,
a s
solues
prohibitivas
e
a s
medidas
promptas
para
inspirar-se
das
neces-
sidades
praticas
mesologicas
d o
vastssimo
habitai
em
que
nos
movemos.
Attender
a o
systema
d e
viao
publica,
a o
reta-
lhamento
dos
latifndios,
facilidade
das
transmisses,
s
insti-
tuies
d e
credito
territorial
e
agrcola,
situao
dos
operrios
d a
lavoura,
pertencentes
a
raas
diversas
e
d e
differentes
graus
d e
civilizao,
cuidar
dos
contratos
d e
parceria
e
locao
de
servios,
da
responsabilidade
dos
commissarios
d e
transporte,
das
providencias
d e seguro
contra
o
abigeato
e
o
furto
em
geral,
o
incndio,
a
geada, tarefa
ingente,
irrealizavel
mesmo,
no'
actual
estado
das
idias
e das
coisas
em
um
paiz
que
tem
todos
os
climas,
todas
a s
raas,
todos
o s
gneros
d e
producao,
com
grandes
irregularidades
d e
civilizao
e d e
cultura
e onde
apenas
s e
enceta
a
reorganizao
d o
trabalho
industrial
e
agrcola.
Sejamos
condescendente
e admitamos
que
o s
autores
do
futuro
cdigo
sabero
arcar
com
todos
o s
bices
que
o
espirito
d e
rotina
e
o
atrazo
das
concepes
jurdicas
pem
renovao
d o
direito
e
tero
a
fora
necessria
para
impor
o
seu
critrio
s
legislaturas
hesitantes.
Aceitemos
a
legitimidade
dessa
im -
posio,
dessa
substituio
d o
methodo
histrico
pelo
racional
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
14/19
27 REVSTA
BRAZILEIRA
e metaphysico,
Podero
estar
certos
de
que
o ideal
traduzido
nos
textos
do
cdigo
corresponder
s
necessidades
e
convenincias
mltiplas
e
complicadas
do
organismo
brazileiro,
nascente
apenas
amorpho;
de
que
no ser unia
roupa
de francez
com
que
o
tapuyo
inconsciente
s e vai
apresentar
na
praa
rivalizando
em
ridiculice
com ojaponez
mascarado
em
occidental
?
Setenta
annos
de
experincia monarchico-parlamentar
nos
mostraram
que
no
se
talham
constituies
como
nas lojas
da
d^orre
Eiffel
ou
da
casa
Colombo
se ordenam
confeces
por
um
typo
ideal
de
gcntleman
a
que
o s freguezes
s e
ho
de sujeitar
com
as aproximaes
do
mais
o u
menos.
E
quando
se
trata
do
que
um
povo
tem
de
mais intimo,
de
mais
peculiar,
de
mais
individual
emfim,
da
sua
organizao
civil
em
que
preponderam
as influencias
particulares
de
clima,
de
habitai,
de
raa,
de
lingua,
de
religio,
de
costumes,
cuida-se
poder
de
repente
sujeital-o
formula
sabia
que
a
dou-
trina
importa
da Allemanha
o u
da
Frana,
d a
Suissa
ou
da Itlia,
cortada
pelo
padro
ideal
de
uma
perfeio
indefinida
e
cosmo-
polua
?
Na
polemica
(pie
n o
principio
do
sculo
sustentou
Savigny
sobre
a
vocao
do
nosso tempo
para
a
jurisprudncia
e
a
legis-
lao
lanou
o chefe
d a
escola
histrica
esta
verdade
que
nem
todas
a s
pocas
so
prprias
para
a
codificao.
O
que
pensava
o illustre
romanista
d a
Allemanha
do
seu
tempo
e
bem
applicavel
ao
Brazil
actual.
Um
cdigo
reflecte
o
direito
nacional
n o
seu
estado
permanente,
statico,
leito
paia
durar,
enquadra
a
civi-
H/ao
de
um
povo
sem
me
tolher
o
processo
resultante
da
evoluo
das
suas
tendncias
tspeciaes.
Um
tal
organismo
jurdico
presuppe,
portanto,
uma
constituio
definitiva
e
assente,
sanecionada
por
um
largo
perodo
de
experincia,
de
calma.de
fio-
rescencia,
de
paz
interna
e
externa
em
que
a
jurisprudncia
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
15/19
CONVM
FAZER
U M
C D I G O C I V I L
7
possa
livremente
fazer
colheita, exame e
aproveitamento
dos
ele-
mentos espontneos
que
se ho
de
i r incorporando ao direito.
No
nos
tempos
torturados
pelas
crises moraes,
polticas
t :
econmicas,
quando
a
sciencia
apenas
se
constitue,
a
doutrina
vacilla
e busca
base mais
segura,
o s
povos
anceiam
por
novos
ideaes,
em
face
d a definitiva
condemnao
do
regime
politico-
religioso
em
que
viveram
que
se
deve
pensar
em
fixar regras
definitivas
ao
direito,
sino em
indagar onde
esteja
o direito
e a
que
necessidades
reaes
elle
corresponda.
Ha
pouco
mais
'
de nove annos
que
o
Brazil
substituiu
pela
republica
federal
a
monarchia
parlamentar,
e a
mudana
no
feriu
somente
a
frma
poltica
do
governo.
A
nacionalidade
tenta
re-
constituir-se
sobre bases
inteiramente
diversas,
visivel
o
esforo
para
romper
com
todas
a s
tradies,
propondo,
em
vez do
ideal
politico
e
jurdico
que
viera do
latinismo
cezariano,
o
federa-
lismo
americano
com
o
seu
espirito
de
individualismo
anglo-
germnico.
A'
centralizao
governamental
e administrativa
succede
a
autonomia
incoercivel
dos
Estados,
sino
das
oligar-
chias
que
se
nelle
enthronizaram,
e
tudo
entra
em
jogo,
tudo
se
discute
e
se
renova.
O
direito
resente-se
da
revoluo p o-
litica
e
econmica
que
s e
operou
n o
paiz.
Depois
das
grandes
reformas
tentadas
no regime
da
dictadura,
clares
projectados
sobre
o
velho
monumento
do
direito
nacional
pelos
trabalhos
de
Ruy
Barbosa,
Baptista
Pereira,
Carlos
d e Carvalho
e
Coelho
Rodrigues,
a
jurisprudncia
e
toda
incerteza,
vacillaes,
retro-
cessos
bruscos
para
o
passado
o u
inesperados
avanos
para o
desconhecido;
Como
tudo
incerto
n a
poltica,
na
administrao,
nas
relaes
sociaes,
cumo
o
povo
estranha
e desconhece
a
nova
urdem
de
idias,
como
ningum
est
de accordo
sobre
coisa
nenhuma,
a
prpria
noo
do
direito
se altera
e
se
dissolve.
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
16/19
272REVSTA
BRAZILEIRA
A s
l e i s
succedem-se
medida
das
exigncias
da
occasio,
os
apertos
d a
politica
e
o s
apuros
d a
insolvencia
nacional.
O s
males
d a
crise
financeira
e
econmica
mais
tremenda
que
< >
paiz
te m
atravessado,
oriundos
d a mesma
adaptao
t i o
systema
po-
litico
s condies
d o
meio,
querem-nos
remediar
com
m e-
zinhas
legislativas,
e
nesse desespero
d e
salvar
o
doente
j
no
h a orbitas
d e
attribuies
que
traar,
respeitos
a
q ue
attender, doutrinas
que proclamar,
s
debellar
o s
symptomas ,
fazer trabalho
d e
emprico
para
acudir
imininencia
d o
des-
astre
final.
Que
vale o
direito
scientifico
em
t a l
situao
dos
espritos?
Quem
com
serenidade
medita
sobre
o s
materiaes
accumulados
pela
tradio
dos
antepassados
e elaborao
po-
pular
d o
direito,
s i
antes
d e
philosophar
preciso
viver
e
s
incertezas
d o
dia
seguinte
sacrificam-se principios,
normas
e
tendncias,
a
liberdade
individual
e
a
prpria
conscincia
ju-
ridica?
Que
trabalho
serio
s e
pde
esperar
d e
um
parlamento
e m
que
o
interesse
partidrio
sobreleva
a
tudo,
em
que
as
opinies
vagueam
a o
sabor
das
convenincias
polticas?
O
cri-
s o l
legislativo
por
que
h a
d e
passar
o
projecto
antes
de se
transformar
e m
l e i
restituil-o- deformado e
troncho,
talvez irre-
conhecivel,
o u
ento
a
aco
parlamentar
no
passar
d e
appro-
vao
indifferente
e
servil,
s i
lhe
gritarem
como
o
guarda-sellos
Lebret
aos
deputados
francezes:
olhai
fora
o s
vossos
collegios
eleitor
aes
Nos
perodos
como
este
que
a
nossa
ptria
atravessa
a
perfeio
legislativa
s
pede
vir
d a
dictadura,
no
s e
pde
contar
com
a
collaborao
popular
representada
pelo
elemento
legislativo,
mas
ento
o
cdigo
ser
a
falsificao
d o
direito,
no
passar
d e
formosa
composio
em
que
o
professor
Bevi-
laqua,
emrito
jurisconsulto-
philosopho,
mais
philosopho
d o
q ue
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
17/19
C O N V M
F A Z E R U M
CDIGO
CIVL?73
jurisconsulto,
rever-se- no
acabado
d a
frma,
n o
bem alinhado
das
disposies, na
articulao
lgica,
na
exhibio das
doutrinas
allemans
e
italianas,
ser
enifim
um
bello
livro
sem
alma
q ue
tanto
servir
para
reger
Brazileiros,
o s
gachos
do
Rio
Grande
e
o s
tapuyos
do Amazonas
como
para
thema
de
estudos
das
Universidades
mais illustradas.
Ora
uma
tal
obra,
por
bella e
perfeita
(pie
fosse,
no
seria
legitima,
nem
era
licito
ao
poder
publico
substituir
o critrio
do
philosopho,
as
suas theorias
e
imaginaes,
vida orgnica
do
direito,
elaborao
popular
espontnea,
lenta, mas segura,
nem
mesmo
o
conceito
racional,
scientifico,
lgico,
razo
geral,
opinio
publica,
ao
senti-
mento
c o m m u m
dos
Brazileiros
por
mais atrazados
que
pa-
ream.
A imposio
a b
alto
de regras
jurdicas
formuladas
pelo
espirito
lgico
ou
racional
dos
jurisconsultos
titulados
o u
lau-
reados
s
se
pde
equiparar
em
illegitimidade
e
despotismo
ao
canon
da
verdade
revelada.
S i
em
vez
de um
cdigo
saltando
inteirio
e
prompto
da
cabea
do
autor
com
o
brilho
reluzente
de theorias
novas,
no
se
tratasse
sino
de
enfeixar
as disposies
do
direito
vigente
com
ligeiras modificaes
por
amor
da
symetria,
moda
do
cdigo
belga
de
Laurent,
a
obra
ser
de
pouca
relevncia,
mas
no
menos
perigosa
e inconveniente,
porque
o
periodo
em
que
nos
achamos
de
reconstruco
e
de transformao
social,
e
um
cdigo
seria
um
impecil io
serio,
um embarao
a
quaesquer
reformas
que
as
necessidades
indicassem.
De
frma
que
deste
dilemma
no
ha
fugir
o
monumento
pro-
jectado:
ou
ficar-lhe-
alheia
a
alma
nacional,
ser
um
cdigo
adeantado
de
mais,
como
o
fazem
receiar
as tendncias
j
re-
veladas
pelo
redactor
escolhido,
ou
dentro
de
poucos
annos
ser
um
systema
atrazado
que
precisar
de
reforma.
T O M O
XVII
1M ) >)
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
18/19
274REVSTA
BRAZILEIRA
Nem
somente
razes
politicas
e
sociaes
s e
levantam contra
a
tentativa
imprudente
que
nos
ameaa.,
mas
tambm
motivos
pro-
priamente
jurdicos
de
que
perfunctoriamente
se
tratar
na
Re-
vista
Brazileira,
pois
teriam
melhor
lugar
em
um
jornal
de
jurisprudncia.
S i
ha
uma doutrina
triumphante
entre
o s
juristas que
co-
gitam
da
formao
systematica
tias
diversas
disciplinas
a
que
apregoa
a
necessidade
inadivel
da
unificao
do
direito
privado,
fazendo
desaparecer
a
dualidade
dos
cdigos,
essa
separao
entre
o
direito civil
e
o
direito
commercial,
filha
de um estado
social
que
se
sumiu
na voragem
da revoluo
econmica
presidida
por
Turgot.
A
tendncia
da
nossa
legislao
para
sujeitar s
mesmas regras
todas
as relaes
econmicas
incontestvel, e
do-lhe especial relevo
alguns
trabalhos legislativos
do
Governo
Provisrio,
adiantando
muito
nesta
questo
que,
a
contar
de
1 8 7 1 ,
tanto occupou
o
grande
espirito
de Teixeira de
Freitas,
aponto de
o
levar a escusar
a tarefa
de
organizar
um
cdigo
civil.
No
corresponde,
portanto,
indispensvel
systematizao
do
direito
privado,
principalmente
em matria
de
obrigaes,
esse
tentamen de
um
cdigo
civil,
deixando subsistir o
antiquado,
incompleto,
mal
ferido
cdigo
do commercio,
e
perpetuando
a
dichotomia
antiga,
aggravada
pela
antithese
profunda
entre
o ramo
civil
regulado
pelo
espirito
mais
adiantado
e
o
mercantil
sujeito
ainda
s
normas
preferidas
pelos
legisladores
de ha
quasi
5 0
annos
No
se
justifica
por
nenhuma
convenincia
publica
a
codifi-
cao
das
nossas
leis
civis,
nem
a
opinio
jurdica
est
preparada
para
essa
ingente
tarefa,
nem o
momento
azado
para
pensar
em
traar
definitivamente
o
circulo
em
que
ho
de
girar
as actividades
sociaes
nas
relaes
de direito
privado.
D o
nosso
momento
legislativo
e
jurdico
se
pde
dizer
o
que
de sua
ptria
escreve
7/24/2019 Convm fazer um Cdigo Civil?
19/19
C O N V M
FAZER
U M
C D I G O
C I V I L
75
Enrico
Cimbali:
tarde
demais
para
rever
e
reordenar
o
cdigo
velho
e cedo
demais
para
elaborar
u m novo
para
que
no
sue-
ceda
como
a o
cdigo
italiano
d e
1 8 6 5 e m
que
a
pressa
de
unificar
e a s
preoecupaes
polticas
d a poca
impediram
a elabo-
rao
de
uma
l e i
mais
vasta e
menos incompleta.
Deixemos
para
a s
reformas
polticas
a s
impaciencias
juvenis,
j
que
preciso
dar
pasto
a o
espirito
irrequieto
dos
innovadores
quando
s e
ensaia
a
roupa
nova
d o
federalismo americano
e
q ue
a
gloria
de
ligar
o
nome
a
um cdigo
civil no
perturbe
a
marcha
d a
elaborao
lenta,
mas
asss
progressiva,
do
nosso
di-
reito
privado,
terreno
neptuniano
que
s e ir formando n o
seio
das
ondas
revoltas
d a
politicagem
pela
precipitao
d o
que
nos
resta
ainda
d e
bom senso,
de
cultura
moral,
de amor
justia
e
d e
respeito
tradio
dos
nossos
maiores.
H.
Inglez
de
Souza