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CPI
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SUMRIO
1. INTRODUO ................................................................................................................ 6
1. 1. BREVE HISTRICO DA CRIAO DA CPI......................................................... 6 1.2. APRESENTAO ...................................................................................................... 10
2. O PROBLEMA DO MARCO LEGAL DOS JOGOS NO BRASIL.......................... 13
2.1. LEGISLAO BRASILEIRA SOBRE JOGOS DE AZAR E LOTERIAS ......... 13 2.1.1. DISPOSIES CONSTITUCIONAIS .................................................................. 14 2.1.2. LEGISLAO FEDERAL SOBRE JOGO DE AZAR E LOTERIAS .............. 15 2.1.2.1. LEGISLAO PENAL .......................................................................................... 15 2.1.2.2. LEGISLAO FEDERAL SOBRE LOTERIAS................................................... 18 2.1.2.3. LEGISLAO FEDERAL SOBRE O JOGO DE AZAR...................................... 23 2.1.2.3.1. LEGISLAO FEDERAL SOBRE O JOGO DE BINGO ................................. 24 2.1.2.3.1.1. A MEDIDA PROVISRIA N 168, DE 2004.................................................. 28 2.1.3. LEGISLAO ESTADUAL SOBRE O JOGO DE AZAR E AS LOTERIAS .31 2.1.3.1. LEGISLAO ESTADUAL SOBRE LOTERIAS................................................ 31 2.1.3.2. LEGISLAO ESTADUAL SOBRE O JOGO DE BINGO................................. 33 2.2. O PODER JUDICIRIO E A EXPLORAO DE JOGOS DE BINGO............. 34 2.2.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL...................................................................... 34 2.2.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA................................................................. 35 2.2.3. JUSTIA ESTADUAL ............................................................................................ 42 2.2.4. JUSTIA FEDERAL............................................................................................... 46 2.2.4.1. TESE DA NO-REPRISTINAO DA NORMA PENAL.................................. 46 2.2.4.2. TESE DO DIREITO ADQUIRIDO ........................................................................ 47 2.2.4.3. TESE DA COMPETNCIA ESTADUAL PARA LEGISLAR SOBRE DESPORTO ......................................................................................................................... 47
3. A LEGISLAO INTERNACIONAL ........................................................................ 48
3.1. ANLISE DA LEGISLAO INTERNACIONAL SOBRE JOGOS DE AZAR48 3.1.1. ASPECTOS INSTITUCIONAIS ............................................................................ 51 3.1.2. CONDIES E LIMITES CONCESSO ........................................................ 58 3.1.3. OBRIGAES FINANCEIRAS ............................................................................ 68 3.1.3.1. OBRIGAES FISCAIS........................................................................................ 69 3.1.3.2. OBRIGAES EXTRAFISCAIS .......................................................................... 70 3.1.4. CONCLUSO........................................................................................................... 74
4. O MERCADO DE JOGOS NA AMRICA LATINA................................................ 76
2
5. O MERCADO DE JOGOS NO BRASIL..................................................................... 81
5.1. LOTERIAS FEDERAIS E ESTADUAIS.................................................................. 86 5.1.1. LOTERIAS EXPLORADAS PELA UNIO......................................................... 86 5.1.2. LOTERIAS ESTADUAIS...................................................................................... 100 5.1.3. BINGOS E CAA-NQUEIS ................................................................................ 103 5.2. PERFIL DAS CASAS DE BINGO NO BRASIL.................................................... 107 5.3. PESQUISA DE OPINIO SOBRE BINGOS......................................................... 118
6. O JOGO E O CRIME ORGANIZADO ..................................................................... 122
6.1. A MFIA E O JOGO NO BRASIL......................................................................... 141 6.2. O JOGO E A LAVAGEM DE DINHEIRO ........................................................... 149 6.3. O JOGO E O FINANCIAMENTO DE CAMPANHAS POLTICAS ................. 163
7. ANLISE DE CASOS ENVOLVENDO LOTERIAS ESTADUAIS ...................... 204
7.1. CASO LOTERJ: O ESQUEMA DE PROPINAS ENVOLVENDO O MERCADO DE JOGOS NO RIO DE JANEIRO............................................................................... 204 7.1.1. DEPOIMENTOS COLHIDOS PELA CPI DA LOTERJ E ANLISE........ 206 7.1.2. DEPOIMENTOS COLHIDOS PELA CPI DO SENADO FEDERAL E ANLISE .......................................................................................................................... 236 7.1.3. ELEMENTOS COLHIDOS PELA POLCIA CIVIL DO RIO DE JANEIRO............................................................................................................................................ 290 7.2. OUTROS CASOS ESTADUAIS .............................................................................. 404 7.2.1. MINAS GERAIS .................................................................................................... 404 7.2.2. RIO GRANDE DO SUL ........................................................................................ 424 7.2.3. ESPRITO SANTO ................................................................................................ 442 7.2.4. MATO GROSSO .................................................................................................... 451 7.3. CONCLUSES.......................................................................................................... 455
8. MFIA DO LIXO ........................................................................................................ 459
8.1. INTRODUO ......................................................................................................... 459 8.2. OS ENVOLVIDOS.................................................................................................... 461 8.3. ESQUEMA DE FRAUDE EM LICITAES E SUPERFATURAMENTO EM OUTROS MUNICPIOS ................................................................................................. 465 8.3.1. INQURITO POLICIAL N 050/2004................................................................. 465 8.3.2. DEPOIMENTOS CORRELATOS NA CPI DOS BINGOS............................... 470 8.3.2. DEPOIMENTOS NA DELEGACIA SECCIONAL DE POLCIA DE RIBEIRO PRETO/SP ................................................................................................... 472 8.3.2.1 FERNANDO FISCHER......................................................................................... 472 8.3.2.2 LUIZ CLUDIO FERREIRA LEO .................................................................... 488 8.3.3. PROVAS DOCUMENTAIS .................................................................................. 490
3
8.3.3.1 PLANILHAS BALANO DESPESAS DIVERSAS ......................................... 491 8.3.3.2 PLANILHAS RELATRIO DE DESPESAS .................................................... 492 8.4. SUPERFATURAMENTO EM RIBEIRO PRETO............................................. 494 8.4.1. O CONTRATO DE VARRIO ......................................................................... 494 8.4.2. O ESQUEMA FRAUDULENTO.......................................................................... 509 8.5. DEPOIMENTOS NA CPI DOS BINGOS............................................................... 512 8.5.1. DO SR. ROGRIO BURATTI ............................................................................. 512 8.5.2. DO ENTO MINISTRO ANTNIO PALOCCI FILHO.................................. 517 8.5.3. DA SR. MARILENE DO NASCIMENTO FALSARELLA.............................. 523 8.5.4. DOS SENHORES MAURO PEREIRA JNIOR E PAULO ANTNIO HENRIQUES NEGRI ...................................................................................................... 532 8.5.5. DO DELEGADO BENEDITO ANTONIO VALENCISE.................................. 560 8.5.6. DA SR. ISABEL BORDINI.................................................................................. 567 8.5.7. DO SR. FRANCISCO DAS CHAGAS COSTA .................................................. 589 8.5.8. DO SR. FRANCENILDO DOS SANTOS COSTA ............................................. 592 8.6. DEPOIMENTOS NA DELEGACIA SECCIONAL DE POLCIA DE RIBEIRO PRETO/SP......................................................................................................................... 609 8.6.1. ROGRIO TADEU BURATTI............................................................................. 609 8.6.2. LUCIANA MUSCELLI ALECRIM..................................................................... 614 8.6.3. MAURO PEREIRA JNIOR ............................................................................... 619 8.6.4. MARILENE DO NASCIMENTO FALSARELLA............................................. 626 8.6.5. PAULO ANTNIO HENRIQUES NEGRI ......................................................... 631 8.6.6. ACAREAO MARILENE DO NASCIMENTO FALSARELLA, PAULO ANTNIO HENRIQUES NEGRI E LUCIANA MUSCELLI ALECRIM................ 637 8.6.7. SRGIO ANTNIO DE FREITAS...................................................................... 647 8.6.8. GILBERTO SIDNEI MAGGIONI ....................................................................... 650 8.6.9. NELSON COLELA FILHO.................................................................................. 655 8.6.10. ANTNIO PALOCCI FILHO............................................................................ 660 8.6.11. SEVERINO SABINO FERREIRA ..................................................................... 664 8.6.12. FORTUNATO SPINELLI NETO....................................................................... 669 8.6.13. CACILDO ALVES DE SOUZA.......................................................................... 673 8.6.14. APARECIDO MIRANDA DA SILVA ............................................................... 676 8.6.15. ADEMIR GUIDONI ............................................................................................ 679 8.6.16. ANTNIO OSVALDO GREGRIO................................................................. 680 8.6.17. DARVIN JOS ALVES....................................................................................... 681 8.6.18. WILNEY MRCIO BARQUETE...................................................................... 684 8.6.19. MARCELO FRANZINE ..................................................................................... 696 8.6.20. FERNANDO FISCHER....................................................................................... 714 8.6.21. EUCLYDES RENATO GARBUIO .................................................................... 719 8.6.22. CLIO AMARAL ................................................................................................ 721 8.6.23. GERALDO TREVISANUTO.............................................................................. 723 8.6.24. PAULO DOS SANTOS ROSA............................................................................ 725 8.6.25. LUIZ CLUDIO FERREIRA LEO ................................................................ 727 8.7. PROVAS DOCUMENTAIS ..................................................................................... 737 8.7.1. PLANILHAS QUE INDICAM CONTRIBUIES A PREFEITURAS.......... 737 8.7.2. ORDENS DE SERVIO E BOLETINS DE MEDIO ................................... 740 8.7.2.1. ANLISE DOS DADOS ...................................................................................... 743
4
8.7.2.1.1. LIMPEZA, LAVAGEM E DESINFECO DE FERIAS................................ 743 8.7.2.1.2. LAVAGEM E DESINFECO DE PRAAS E LOGRADOUROS PBLICOS............................................................................................................................................ 744 8.7.2.1.3. VARRIO DE AVENIDAS SEM CALADAS............................................ 745 8.7.2.1.4. VARRIO DE VIAS E LOGRADOUROS PBLICOS................................ 747 8.7.2.1.5. VARRIO DO BOSQUE MUNICIPAL ........................................................ 749 8.7.2.1.6. VARRIO EXTRA CALADO CENTRAL ........................................... 752 8.7.2.1.7. VARRIO EXTRA(SETOR 1A).................................................................... 753 8.7.2.1.8. VARRIO DE AVENIDAS COM CALADAS........................................... 754 8.7.2.1.9. VARRIO VOLANTE COM CALADAS................................................... 755 8.7.2.1.10. PREOS UNITRIOS X FATURAMENTO ................................................. 757 8.7.3. AUTO DE CONSTATAO................................................................................ 760 8.7.4. NOTAS FISCAIS FRIAS....................................................................................... 762 8.7.5. SIGILO BANCRIO DA EMPRESA LEO&LEO....................................... 767 8.7.6. INTERCEPTAES TELEFNICAS ............................................................... 775 8.7.6.1. REFERNCIA PARTE DO COLELA - CONVERSA N 03671...................... 776 8.7.6.2. REFERNCIA A UM COMPLEMENTO - CONVERSA N 03934.................... 777 8.7.6.3. REFERNCIA A REMESSA DE ENVELOPE - CONVERSA N 04143 ............ 779 8.7.6.4. REFERNCIA A QUINHENTO E O DOBRO AT O FIM DO MS - CONVERSA N 04183 ...................................................................................................... 781 8.7.6.5. REFERNCIA A ACERTOS PENDENTES - CONVERSA N 04169 .............. 783 8.7.6.6. REFERNCIA A WISKY PARA O COLELA - CONVERSA N 03838 .............. 784 8.7.6.7. REFERNCIA A UM PRESENTE PARA ISABEL BORDINI - CONVERSA N 04407 .................................................................................................................................. 786
9. CASO TONINHO DE CAMPINAS............................................................................ 789
9.1. INTRODUO ......................................................................................................... 789 9.2. ANTECEDENTES .................................................................................................... 790 9.3. O CRIME E A INVESTIGAO ........................................................................... 800 9.4. TESTEMUNHA-CHAVE......................................................................................... 810 9.5. CONCLUSO............................................................................................................ 845
10. CASO CELSO DANIEL............................................................................................ 848
10.1. INTRODUO ....................................................................................................... 848 10.2. HISTRICO ............................................................................................................ 854 10.3. O CRIME DE MANDO .......................................................................................... 859 10.3.1. A PARTICIPAO DE SERGIO GOMES DA SILVA .................................. 859 10.3.1.1. A DENNCIA PELO MINISTRIO PBLICO ............................................... 859 10.3.1.2. O DEPOIMENTO DE SERGIO GOMES DA SILVA CPI............................ 870 10.3.2. A COMPROVAO DO CRIME DE MANDO .............................................. 877 10.3.3. CRUZAMENTO PARCIAL DE LIGAES E ROTEIROS ......................... 883 10.4. O ESQUEMA DE CORRUPO EM SANTO ANDR.................................... 894
5
10.4.2. A CONEXO DO ESQUEMA DE SANTO ANDR COM O COMENDADOR ARCANJO...................................................................................... 909 10.5. A EXTENSO DO ESQUEMA DE CORRUPO PARA A ARRECADAO DE RECURSOS PARA O PARTIDO DOS TRABALHADORES. ............................ 915 10.5.1. A CONEXO SANTO ANDR.......................................................................... 915 10.5.2. O ACOBERTAMENTO DAS INVESTIGAES........................................... 922 10.5.3.DENNCIAS SOBRE OUTRAS ADMINISTRAES ................................... 926
11. OUTROS FATOS DA INVESTIGAO................................................................ 931
11.1. TRFICO DE INFLUNCIA (SERPRO, COFIEX, BANCO PROSPER) ...... 932 11.2. DLARES DE CUBA............................................................................................. 955 11.3. CORRUPO NAS PREFEITURAS DO INTERIOR (CEPEM, PAULO OKAMOTTO, ROBERTO TEIXEIRA)........................................................................ 960
12. COMPLEMENTO AO CASO GTECH................................................................... 963
12.1. O RELATRIO PARCIAL ................................................................................... 963 12.2. ADENDO AO RELATRIO PARCIAL .............................................................. 981
13. POSICIONAMENTO DA CPI ACERCA DO JOGO DE BINGO E DAS LOTERIAS ESTADUAIS................................................................................................ 990
13.1. DO JOGO DE BINGO............................................................................................ 990 13.2. DAS LOTERIAS ESTADUAIS.............................................................................. 998 13.3. OUTRAS PROPOSTAS LEGISLATIVAS ........................................................ 1002
14. QUALIFICAO DE CONDUTAS .................................................................. 1005
14.1. CASO LOTERJ:.................................................................................................... 1005 14.2. CASO MFIA DO LIXO:.................................................................................... 1008 14.3. CASO CELSO DANIEL:...................................................................................... 1011 14.4. ADENDO AO CASO GTECH:............................................................................ 1012 14.5. FINANCIAMENTO DE CAMPANHAS POLTICAS: .................................... 1013
15. ENCAMINHAMENTOS ......................................................................................... 1014
16. PROPOSIES LEGISLATIVAS ........................................................................ 1017
17. PROPOSTA DE ESTUDO ...................................................................................... 1025
6
RELATRIO FINAL CPI DOS BINGOS
1. INTRODUO
1. 1. BREVE HISTRICO DA CRIAO DA CPI
Em fevereiro de 2004, a divulgao pela imprensa de uma fita
gravada nos idos de 2002 por um empresrio do setor de jogos, Carlos
Augusto Ramos, conhecido como Carlinhos Cachoeira, exps o assesssor
parlamentar da Casa Civil, Waldomiro Diniz, na poca presidente da Loteria
do Rio de Janeiro (Loterj) que aparecia pedindo propina para campanhas de
candidatos do Partido dos Trabalhadores (PT) e para si prprio , e deu incio
a uma crise no governo federal, que afetou diretamente um dos ministros mais
influentes da administrao Lula, Jos Dirceu, da Casa Civil. Requerimento de
criao de comisso parlamentar de inqurito foi prontamente protocolado em
maro no Senado Federal, por iniciativa do Senador Magno Malta,
acompanhado por outros Senadores, redigido nos seguintes termos:
REQUERIMENTO N 245, DE 2004
Requeremos em conformidade com o art. n 145, do Regimento Interno,
conjugado com o art. 58, 3, da Constituio Federal, a criao de uma
comisso parlamentar de inqurito, composta de 15 membros e igual nmero
de suplentes, com o objetivo de investigar e apurar a utilizao das casas de
7
bingo para a prtica de crimes de lavagem ou ocultao de bens, direitos e
valores, bem como a relao dessas casas e das empresas concessionrias de
apostas com o crime organizado, com a durao de cento e vinte dias,
estimando-se em R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) os recursos necessrios
ao desempenho de suas atividades.
JUSTIFICAO
Crime organizado e jogos de azar so irmos siameses. No mundo inteiro,
existem fortes evidncias de que cassinos e similares funcionam como um
biombo para ocultar os verdadeiros negcios muitas vezes ilcitos de
quem os controla.
Por fora do Decreto-Lei n 9.215, de 30 de abril de 1946, no permitida a
prtica e explorao de jogos de azar no territrio nacional. Desde ento,
algumas excees regra tm sido abertas, como os concursos de
prognsticos explorados pela Caixa Econmica Federal e, mais
recentemente, os bingos.
Desde o incio de suas atividades, em 1993, as casas de bingos tm prestado
um desservio Nao. Alm de incentivar o terrvel vcio do jogo, sob o
falso manto de contribuir para o financiamento de clubes desportistas,
algumas dessas entidades vm sendo utilizadas para dar ares de legalidades a
recursos oriundos de atividades criminosas.
Importante observar que os bingos tm por scios, por vezes ocultos, pessoas
notoriamente relacionadas ao crime e a contraveno, as quais no raro,
representam os interesses de organizaes mafiosas com razes no exterior.
Nossa firme convico de que os bingos devem ser extintos est expressa no
documento que cria a Frente Parlamentar contra a legalizao da explorao
dos jogos de azar no Brasil.
8
Ressaltamos, contudo, que na Frente Parlamentar possui carter
eminentemente preventivo. Para investigar e apurar os abusos que vm
sendo observados, julgamos que somente uma comisso parlamentar de
inqurito, com poderes de investigao prprios de autoridades judiciais, ter
fora para desbaratar as quadrilhas que se valem da explorao das casas de
bingo para lavar dinheiro proveniente das atividades criminosas.
Em face de todo o exposto, conclamamos os ilustres Senadores e Senadoras
a assinarem o presente requerimento, com a finalidade de ver instalada uma
comisso parlamentar de inqurito para investigar e apurar a utilizao das
casas de bingo para a prtica de crimes de lavagem ou ocultao de bens,
direitos e valores, bem como a relao dessas casas e das empresas
concessionrias de apostas com o crime organizado.
Sala das Sesses, 5 de maro de 2004.
O requerimento apresentado Mesa do Senado, em maro de
2004, cumpria todos os requisitos constitucionais para a instalao da
Comisso: contou com mais de um tero de assinaturas dos integrantes do
Senado, apontou fato objetivo e prazo determinado para a realizao das
investigaes.
Todavia, a Comisso no foi instituda por falta de indicao dos
membros por parte dos lderes dos partidos que compem a base governista,
em manobra para impedir a investigao, no tendo o ento Presidente do
Senado, o Senador Jos Sarney, suprido essa indicao. Dos 15 integrantes
que deveriam compor a Comisso, apenas seis foram indicados: os
representantes do PDT , PFL e PSDB. As lideranas dos partidos aliados ao
governo se recusaram a apresentar os nomes de suas bancadas.
9
Diante desse quadro, os Senadores Jefferson Pres (PDT-AM) e
Pedro Simon (PMDB-RS) impetraram, pessoalmente, no dia 17 de maro de
2004, Mandado de Segurana (MS n 24831) no Supremo Tribunal Federal
(STF), para instalar a CPI dos Bingos.
Na ao, pediam que o Supremo determinasse que o Presidente
do Senado, Jos Sarney, em respeito ao direito da minoria, indicasse os
membros da CPI, j que os lderes partidrios da base governista no o
fizeram, assegurando, assim, a instalao da CPI.
Vrios outros Mandados de Segurana foram impetrados junto ao
STF com a mesma finalidade (MS ns 24845, 24846, 24847, 24848 e 24849),
ou seja, contra a Mesa Diretora do Senado Federal, que teria deixado de
indicar os integrantes da CPI dos Bingos, para suprir a no-indicao dos
mesmos por parte dos lderes dos partidos polticos.
Em deciso prolatada em 22 de junho de 2005, mais de um ano
depois, o STF, por 9 votos a 1, determinou que os senadores fossem indicados
pelo Presidente do Senado Federal, Renan Calheiros, para compor a CPI. O
STF reconheceu que a controvrsia defrontava-se com tema constitucional,
uma vez que a nossa Lei Maior garante s minorias o direito de fazer
oposio, e o princpio da separao dos poderes no pode ser invocado por
uma pessoa, um grupo ou uma instituio para impor as suas determinaes.
A deciso, conforme consta na tramitao do processo divulgada
na pgina eletrnica do STF, se deu nos seguintes termos:
(...) por votao majoritria, o Tribunal concedeu o mandado de segurana,
nos termos do voto do Relator, para assegurar, parte impetrante, o direito
efetiva composio da Comisso Parlamentar de Inqurito, de que trata o
10
Requerimento n 245/2004, devendo, o Senhor Presidente do Senado,
mediante aplicao analgica do art. 28, 1 do Regimento Interno da
Cmara dos Deputados, c/c o art. 85, caput, do Regimento Interno do
Senado Federal, proceder, ele prprio, designao dos nomes faltantes dos
senadores que iro compor esse rgo de investigao legislativa, observado,
ainda, o disposto no 1 do art. 58 da Constituio da Repblica, vencido o
Senhor Ministro Eros Grau. Votou o presidente, Ministro Nelson Jobim.
Ausente, justificadamente, a Senhora Ministra Ellen Gracie. Plenrio,
22.06.2005.
No dia seguinte, em 23 de junho de 2005, o Presidente do Senado
designou os membros da Comisso indicados pelas lideranas.
A CPI foi finalmente instalada no dia 29 de junho 2005, quando
foram eleitos o Presidente da Comisso, Senador Efraim Morais (PFL-PB) e o
Vice-Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR). Na reunio
seguinte, realizada no dia 30 de junho de 2005, foi indicado o relator da CPI,
Senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN)
1.2. APRESENTAO
A presente CPI, popularmente conhecida como CPI dos
Bingos, foi criada pelo Requerimento n. 245, de 2004, de autoria do
Senador Magno Malta, para investigar e apurar a utilizao das casas de
bingo para a prtica de crimes de lavagem ou ocultao de bens, direitos e
valores, bem como a relao dessas casas e das empresas concessionrias de
apostas com o crime organizado.
11
Esta CPI iniciou seus trabalhos no dia 29 de junho de 2005, tendo
como foco inicial as relaes do mercado de jogos com a administrao
pblica, notadamente as atividades suspeitas de Waldomiro Diniz no Rio de
Janeiro/RJ, quando presidente da Loterj, e em Braslia/DF, quando assessor
parlamentar da Casa Civil do governo federal. No primeiro caso, envolvendo
dennicas de existncia de um esquema de corrupo entre agentes pblicos e
empresrios de jogos de azar e de financiamento de campanhas eleitorais com
o dinheiro proveniente desse mercado de jogos, e, no segundo caso,
envolvendo dennicas de corrupo no processo de renovao de contrato
milionrio entre a empresa multinacional de processamento de loterias Gtech
Corporation, concessionria de servio pblico, e a Caixa Econmica Federal
(CEF).
Durante as investigaes, novos temas foram sendo colocados
para a CPI, como o caso da morte do prefeito de Santo Andr/SP Celso
Daniel, em janeiro de 2002. A pertinncia do enquadramento desse caso deu-
se em razo da similaridade do modus operandi identificado na prefeitura de
Santo Andr em relao prtica da propina na administrao pblica petista
associada a esquemas de jogos ilegais ou a empresas de servios pblicos,
tratados nos itens 7.1, 7.2.2, 8 e 9 deste Relatrio.
A principal linha que vem sendo investigada a de que o
homicdio do prefeito decorreu de ligaes com esquemas de arrecadao de
propinas de empresas prestadoras de servios pblicos ao municpio de Santo
Andr que seriam encaminhadas para a direo nacional do PT. Esses
esquemas funcionariam junto a empresas de transportes urbanos e de coleta de
lixo, a exemplo de outras cidades administradas pelo PT, como Campinas e
Ribeiro Preto. Eventualmente, haveria ligao entre os esquemas de
12
corrupo praticados em Santo Andr e outros relacionado a jogos ilegais,
como se pde observar no caso de Toninho do PT (item 9 deste Relatrio).
Alm disso, o Ministrio Pblico de So Paulo encontrou elos
entre o que seria o esquema de corrupo na prefeitura de Santo Andr e Joo
Arcanjo Ribeiro, o Comendador chefe do crime organizado em Mato
Grosso, preso em Cuiab depois de ter sido extraditado do Uruguai. O
Comendador explorava mquinas caa-nqueis e manteria ligaes com
empresrios do jogo do bicho no Distrito Federal, em Minas Gerais e na
Paraba. Esta CPI tambm colheu elementos nesse sentido com os
depoimentos de Zildete Leite dos Reis e de Joacir das Neves.
No dia 18 de janeiro de 2006, a Relatoria desta CPI apresentou
Relatrio Parcial sobre a relao contratual entre a Gtech e a CEF (Anexo I),
momento em que props o indiciamento de 34 pessoas fsicas e jurdicas, o
qual foi aprovado pela Comisso no dia 31 do mesmo ms.
Durante as investigaes desta CPI em relao ao caso Gtech, os mesmos
nomes de investigados foram sendo ligados a outro caso, o de corrupo na
prefeitura de Ribeiro Preto/SP, principalmente durante a gesto do ento
prefeito Antnio Palocci Filho, depois ministro da Fazenda no perodo em que
foi feita a renovao contratual da CEF com a multinacional Gtech, em 2003.
Nos depoimentos colhidos nesta CPI e na Polcia Civil, nomes e fatos
comearam a se cruzar, principalmente envolvendo os personagens Rogrio
Buratti, Ralf Barquete, Antonio Palocci e a empresa Leo & Leo. Por essa
razo, esta CPI iniciou investigao sobre o que julgou ser um caso conexo ao
caso Gtech, e que poderia trazer novas luzes em relao a ele.
13
O presente Relatrio Final trata desses outros temas investigados
por esta CPI, assim como do problema jurdico que envolve o marco legal dos
jogos no Brasil e da relao do mercado de jogos com o crime organizado e
com a lavagem de dinheiro.
2. O PROBLEMA DO MARCO LEGAL DOS JOGOS NO
BRASIL
2.1. LEGISLAO BRASILEIRA SOBRE JOGOS DE AZAR E
LOTERIAS
A regra, no ordenamento jurdico brasileiro, a proibio do jogo
de azar. O Decreto-Lei n 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das
Contravenes Penais LCP), estabelece, no caput do art. 50, que
contraveno penal estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar pblico ou
acessvel ao pblico. O 3, alnea a, do referido artigo define como jogo de
azar aquele em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente
da sorte, como o caso do jogo de bingo.
Uma exceo a essa regra geral a loteria. A prpria lei penal
permite a promoo de loterias, desde que autorizadas legalmente. Assim, o
art. 51 da LCP prescreve que ilcito penal Promover ou fazer extrair loteria,
sem autorizao legal. Nesse sentido, o prembulo do Decreto-Lei n 204, de
27 de fevereiro de 1967, trouxe o seguinte esclarecimento: Considerando que
a explorao de loteria constitui uma exceo s normas de direito penal, s
14
sendo admitida com o sentido de redistribuir os seus lucros com finalidade
social em termos nacionais.
Excetuando-se as autorizaes do Decreto-Lei n 6.259, de 1944
(sorteio para resgate de aes ou debntures, de aplices da dvida pblica e os
demais citados no art. 41), do Decreto-Lei n 204, de 1967 (loterias federais e
alguns produtos administrados por loterias estaduais), da Lei n 5.768, de 1971
(sorteios filantrpicos) e da Lei n 7.291, de 1984 (apostas turfsticas), a
explorao de todos os demais jogos, que apresentem como caracterstica o
fato de o ganho e a perda dependerem exclusiva ou principalmente da sorte,
caem no campo de ilicitude determinado pelo direito penal.
No obstante, outras exceces norma penal viriam a partir de
1993, com a Lei Zico, a Lei Pel, entre outros atos normativos, conforme
veremos a seguir.
2.1.1. DISPOSIES CONSTITUCIONAIS
Nos termos dos incisos I e XX do art. 22 da Constituio Federal
(CF), compete privativamente Unio legislar sobre direito penal e sobre
sistemas de consrcios e sorteios.
Como se ver ao longo deste Relatrio, o Supremo Tribunal
Federal (STF), julgando Aes Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) de leis
estaduais que criavam loterias, decidiu pela inconstitucionalidade dessas leis,
tendo em vista a competncia legislativa privativa da Unio para legislar sobre
sorteios estatuda no referido inciso XX do art. 22 da CF, que abrange, no
entender daquela Corte de Justia, loterias e bingos.
15
2.1.2. LEGISLAO FEDERAL SOBRE JOGO DE AZAR E
LOTERIAS
2.1.2.1. LEGISLAO PENAL
O Decreto-Lei n 3.688, de 3 de outubro de 1941 (LCP),
estabelece, no caput do art. 50, que contraveno estabelecer ou explorar
jogo de azar em lugar pblico ou acessvel ao pblico. O 3, alnea a, do
referido artigo define como jogo de azar aquele em que o ganho e a perda
dependem exclusiva ou principalmente da sorte.
A LCP tambm trata, nos arts. 51 a 57, de vrios ilcitos penais
relativos explorao de loterias sem autorizao legal.
A Lei tipifica em seu art. 51 a conduta de promover ou fazer
extrair loteria, sem autorizao legal, sujeita pena de priso simples, de seis
meses a dois anos, e multa, estendendo-se os efeitos da condenao perda
dos mveis existentes no local. Nos termos do referido dispositivo, incorre na
mesma pena quem guarda, vende ou expe venda, tem sob sua guarda para o
fim de venda, introduz ou tenta introduzir na circulao bilhete de loteria no
autorizada.
A LCP estabelece, ainda, que considera-se loteria toda operao
que, mediante a distribuio de bilhete, listas, cupes, vales, sinais, smbolos
ou meios anlogos, faz depender de sorteio a obteno de prmio em dinheiro
ou bens de outra natureza.
16
Em 1944 foi publicada lei especial em relao a essa lei penal
Decreto-Lei n 6.259, de 10 de fevereiro de 1944, que dispe sobre o servio
de loterias, e d outras providncias. Seu art. 45 caracteriza como
contraveno penal a extrao de loteria sem concesso regular do poder
competente, e sujeita pena de um a quatro anos de priso simples, e multa,
alm da perda para a Fazenda Nacional de todos os aparelhos de extrao,
mobilirio, utenslios e valores pertencentes loteria. Os arts. 46 a 56
tipificam outras contravenes relacionadas s loterias, e o pargrafo nico do
art. 40 estabelece que considera-se loteria toda operao, jogo ou aposta para a
obteno de um prmio em dinheiro ou em bens de outra natureza, mediante
colocao de bilhetes, listas, cupes, vales, papis, manuscritos, sinais,
smbolos, ou qualquer outro meio de distribuio dos nmeros e designao
dos jogadores ou apostadores, bem prxima da definio da LCP.
Esse Decreto-Lei permitia a explorao de loterias tanto pela
Unio quanto pelos Estados1.
J o Decreto-Lei n 204, de 27 de fevereiro de 1967, determina,
em seu art. 1, que a explorao de loteria constitui servio pblico exclusivo
da Unio no suscetvel de concesso, vedando a criao de loterias estaduais
e autorizando, apenas, a manuteno das loterias estaduais existentes poca
da entrada em vigor daquele diploma legal, limitadas as emisses s
quantidades de bilhetes e sries em vigor naquela oportunidade (art. 32).
1 Art. 2 Os Governos da Unio e dos Estados podero atribuir a explorao do servio de loteria a concessionrios de comprovada idoneidade moral e financeira. ................................................................................................................................................................................ Art. 4 Somente a Unio e os Estados podero explorar ou conceder servio de loteria, vedada quela e a estes mais de uma explorao ou concesso lotrica.
17
Tanto a LCP, em seu art. 58, quanto o Decreto-Lei n 6.259, de
1944, tambm em seu art. 58, caracterizam a realizao do jogo do bicho
como contraveno penal.
Existem posies divergentes em relao tipologia penal de
loterias ilegais: os tipos penais trazidos pelo Decreto-Lei n 6.259, de 1944
(arts. 45 a 57) so normas especiais em relao ao art. 51 da LCP ou
derrogaram esse dispositivo da lei penal? No consideramos que houve
derrogao parcial da LCP. O Decreto-Lei n 6.259, de 1944, apenas lei
especial em relao LCP, lei geral. Esta se tornou, na verdade, uma norma
subsidiria no que se refere explorao ilegal de loteria: quando a conduta
no puder ser subsumida nos dispositivos do Decreto-Lei n 6.259, de 1944,
poder ser no tipo genrico do art. 51 da LCP.
H, contudo, os que preferem falar em derrogao parcial das
normas penais da LCP. No obstante, qualquer que seja o entendimento ou
seja, coexistindo os ilcitos penais relacionados s loterias e ao jogo do bicho
estabelecidos na LCP e aqueles estabelecidos no Decreto-Lei n 6.259, de
1944, ou estando em vigor apenas os ilcitos penais previstos neste ltimo
diploma legal , o fato que a explorao de loterias e do jogo de bicho sem
autorizao legal constitui contraveno penal.
Cabe ressaltar que, a despeito de as loterias e o jogo do bicho
constiturem jogos de azar, tendo em vista a abrangncia da definio contida
no j mencionado 3, alnea a, do art. 50 da LCP, o qual define como jogo de
azar aquele em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente
da sorte, a Lei Penal deu-lhes tratamento especfico, tipificando, ...................................................................................................................................................
18
separadamente da explorao de jogos de azar, as contravenes relativas
explorao de loterias e explorao do jogo do bicho.
2.1.2.2. LEGISLAO FEDERAL SOBRE LOTERIAS
O Decreto-Lei n 204, de 27 de fevereiro de 1967, que dispe
sobre a explorao de loterias e d outras providncias, determina, em seu
art. 1, que a explorao de loteria, como derrogao excepcional das normas
de Direito Penal, constitui servio pblico exclusivo da Unio no suscetvel
de concesso (grifo nosso).
Tal Decreto-Lei proibiu, ainda, em seu art. 32, a criao de novas
loterias estaduais, ficando as loterias estaduais existentes poca proibidas de
aumentar as suas emisses, que estariam limitadas s quantidades de bilhetes e
sries em vigor na data da publicao daquele diploma legal.
Cabe destacar os seguintes trechos do prembulo do Decreto-lei
n 204, de 1967:
Considerando que dever do Estado, para salvaguarda da integridade da vida social, impedir o surgimento e proliferao de jogos
proibidos que so suscetveis de atingir a segurana nacional;
Considerando que a explorao de loteria constitui uma
exceo s normas de Direito Penal, s sendo admitida com o sentido de
redistribuir os seus lucros com finalidade social em termos nacionais.
.................................................................................................(grifos nossos)
.............................
19
A destinao dos recursos arrecadados com as loterias para
finalidades sociais condizente com a legislao de vrios pases do mundo,
como demonstrado nos quadros a seguir, constantes de documento
encaminhado a esta CPI pela CEF.
Destinao Social Mundo
Mxico Educao e Sade Irlanda Cultura e EsporteFinlndia Esporte, Cincias e Artes Canad - Ontrio Hospitais e Aes SociaisInglaterra Artes, Esporte, Aes Sociais e SadeNoruega Esporte, Cultura e PesquisasBelgica Deficientes Fsicos e CulturaAlemanha Cultura, Aes Sociais, Esporte e EducaoPortugal Sade e Bem Estar de CrianasEstados Unidos Educao e Sade Porto Rico SadeHolanda EducaoDinamarca Educao
Fonte: www.lotteryinsider.com - Jan/05
BENEFICIRIOS LEGAIS DAS LOTERIAS NO MUNDO
20
Destinao Social EUA
Fonte: CEF
O mencionado Decreto-Lei n 204, de 1967, disciplinou o
funcionamento da Loteria Federal.
Em 1969, foi editado o Decreto-Lei n 594, instituindo a Loteria
Esportiva Federal, para a explorao, em qualquer parte do territrio
nacional, de todas as formas de concursos de prognsticos esportivos (art. 1).
E s t a d o E D U C A O S A D EC o n n e c t ic u t 3 , 9 3 8 ,9F lo r id a 3 9 ,5 4G e o r g ia 3 4 , 2I d a h o 2 1 , 5I l l in o is 3 7 ,1 2I n d ia n a 4 , 4 3I o w a 1 2 ,2 1K e n tu c k y 1 9 , 5L o u is ia n a 3 5M ic h ig a n 3 8 , 6M is s o u r i 2 7 , 5N e w H a m p s h ir e 3 0 ,6 6N o v o M x ic o 2 2 , 1O h io 3 2 ,5 4O r e g o n 1 9P u e r t o R ic o 5R h o d e I s la n d 6 , 1 7S o u th C a r o l in a 3 9T e x a s 3 0V e r m o n t 2 0V ir g in ia 3 3W a s h in g to n 1 8 , 9W e s t V i r g in ia 9 ,3
21
O art. 1 do Decreto n 66.118, de 26 de janeiro de 1970, que
regulamenta o referido Decreto-Lei n 594, estabelece que os concursos de
prognsticos sobre os resultados de competies esportivas, nacionais ou
internacionais, constituem servio pblico exclusivo da Unio.
A Lei n 6.717, de 12 de novembro de 1979, autoriza a CEF a
realizar, como modalidade de Loteria Federal regida pelo Decreto-Lei n 204,
de 1967, concurso de prognsticos sobre o resultado de sorteios de nmeros.
Por fim, o Decreto n 99.268, de 31 de maio de 1990, cria a
Loteria Federal sob a modalidade instantnea.
Portanto, a legislao federal determina que a Unio tem
competncia privativa para a explorao de loterias, que constitui servio
pblico exclusivo seu, ressalvadas as loterias estaduais existentes quando da
edio do referido Decreto-Lei n 204, de 1967.
O rgo incumbido da explorao desses servios a Caixa
Econmica Federal, conforme dispe o Decreto-Lei n 759, de 12 de agosto de
1969, que autoriza o Poder Executivo a constituir a empresa pblica Caixa
Econmica Federal e d outras providncias, cujo art. 2, alnea d, estabelece
que a CEF ter por finalidade [entre outras] explorar, com exclusividade, os
servios da Loteria Federal do Brasil e da Loteria Esportiva Federal, nos
termos da legislao vigente.
Essa competncia confirmada pelo Estatuto da CEF, aprovado
pelo Decreto n 4.371, de 11 de setembro de 2002, cujo art. 5, inciso III,
estabelece que a CEF tem por objetivo administrar, com exclusividade, os
servios das loterias federais, nos termos da legislao vigente.
22
Com base nessa legislao, a CEF explora atualmente as
seguintes modalidades lotricas:
Loteria Federal (Decreto-Lei n 204, de 1967);
Loteria Instantnea (Decreto n 99.268, de 1990);
Loteria Esportiva e Lotogol (Decreto-Lei n 594, de 1969);
Lotomania, Mega-Sena, Quina, Dupla Sena e Lotofcil (Lei n
6.717, de 1979).
Alm dessa legislao, existem vrias outras normas legais que
dispem sobre a destinao dos recursos arrecadados com cada uma das
modalidades lotricas exploradas pela CEF, prevendo a sua distribuio a
rgos e entidades cuja atividade prepoderante tem finalidade social2.
A explorao de quaisquer modalidades lotricas, sem amparo na
legislao federal mencionada, constitui contraveno penal, nos termos dos
arts. 51 a 57 da LCP (Decreto-Lei n 3.688, de 1941) e dos arts. 45 a 57 do
Decreto-Lei n 6.259, de 1944.
2 A distribuio da arrecadao das loterias federais ser tratada em tpico especfico deste Relatrio (item 5.1.1).
23
2.1.2.3. LEGISLAO FEDERAL SOBRE O JOGO DE AZAR
Como j mencionado, a explorao de jogo de azar em lugar
pblico ou acessvel ao pblico contraveno penal, nos termos do art. 50 da
LCP.
Algumas leis excepcionam essa norma, como o caso da Lei n
5.768, de 20 de dezembro de 1971, que trata, entre outros assuntos, da
distribuio gratuita de prmios a ttulo de propaganda quando efetuada
mediante sorteio, vale-brinde, concurso ou operao assemelhada, e dos
sorteios organizados por instituies declaradas de utilidade pblica em
virtude de lei e que se dediquem exclusivamente a atividades filantrpicas,
com o fim de obter recursos adicionais necessrios manuteno ou custeio
de obra social a que se dedicam.
Do mesmo modo, a Lei n 7.291, de 19 de dezembro de 1984, que
dispe sobre as atividades da eqideocultura no Pas e d outras
providncias, permite a realizao de corridas de cavalo, com explorao de
apostas, com a finalidade de suprir os recursos necessrios coordenao e
fiscalizao da eqideocultura nacional.
Os sorteios tambm so permitidos nos consrcios para aquisio
de bens e servios e para fins de distribuio de prmios aos adquirentes de
ttulos de capitalizao, atividades sujeitas regulamentao e fiscalizao do
Banco Central do Brasil e da Superintendncia de Seguros Privados.
24
Como j frisado, no havendo lei excepcionadora da ilicitude da
atividade, toda explorao de jogo de azar constitui contraveno penal.
2.1.2.3.1. LEGISLAO FEDERAL SOBRE O JOGO DE BINGO
A lei federal, durante algum tempo, excepcionou a ilicitude da
explorao do jogo de bingo.
Excepcionando a norma penal, a Lei n 8.672, de 6 de julho de
1993 (Lei Zico), em seu artigo 573, autorizou as entidades de direo e de
prtica desportiva a explorar o jogo de bingo ou similar, obedecidas as
condies nela previstas.
Determinou, ainda, que o credenciamento se faria junto s
Secretarias da Fazenda das diversas Unidades da Federao e que o rgo
competente de cada Estado e do Distrito Federal normatizaria e fiscalizaria a
realizao do jogo de bingo.
A Lei Zico foi regulamentada pelo Decreto n 981, de 11 de
novembro de 1993, cujos arts. 40 a 48 tratavam dos jogos de bingo. O art. 45
da referida norma autorizou a explorao das seguintes modalidades lotricas:
bingo, sorteio numrico, bingo permanente e similares, que seriam outras 3 Art. 57. As entidades de direo e de prtica desportiva filiadas a entidades de
administrao em, no mnimo, trs modalidades olmpicas, e que comprovem, na forma da regulamentao desta lei, atividade e a participao em competies oficiais organizadas pela mesma, credenciar-se-o na Secretaria da Fazenda da respectiva Unidade da Federao para promover reunies destinadas a angariar recursos para o fomento do desporto, mediante sorteios de modalidade denominada Bingo, ou similar. 1 O rgo competente de cada Estado e do Distrito Federal normatizar e fiscalizar a realizao dos eventos de que trata este artigo.
25
modalidades previamente aprovadas pelas Secretarias da Fazenda das
Unidades da Federao4. A autorizao para explorao de jogo similar ao
bingo, como consta na Lei Zico, e de modalidades lotricas similares ao
bingo, como consta no Decreto n 981, de 1993, deram ensejo autorizao
para explorao de videoloterias (caa-nqueis) pelas casas de bingo.
A Lei n 9.615, de 24 de maro de 1998 (Lei Pel), revogou a Lei
Zico e, conforme previsto em seus arts. 59 a 81, passou a permitir a
explorao de jogos de bingo, em todo o territrio nacional, por entidades de
administrao e prtica desportiva, diretamente ou atravs de empresa
comercial, nas modalidades permanente ou eventual, mediante
credenciamento junto Unio e obedecidas as condies que fixava.
Os arts. 73 e 74 da Lei Pel proibiam a instalao de qualquer
tipo de mquinas de jogo de azar ou de diverses eletrnicas nas salas de
bingo e estabeleciam que nenhuma outra modalidade de jogo ou similar, que
no seja o bingo permanente ou eventual, poderia ser autorizada.
2 Quando se tratar de entidade de direo, a comprovao de que trata o caput deste artigo limitar-se- filiao na entidade de direo nacional ou internacional.
4 Art. 45. Os sorteios mencionados no artigo 40 deste Decreto ficam restritos utilizao das seguintes modalidades lotricas:
I - Bingo: loteria em que se sorteiam ao acaso nmeros de 1 a 90 , mediante sucessivas extraes, at que um ou mais concorrentes atinjam o objetivo previamente determinado, utilizando processo isento de contato humano que assegure integral lisura aos resultados;
II - Sorteio Numrico: sorteio de nmeros tendo por base os resultados da Loteria Federal;
III - Bingo Permanente: a mesma modalidade prevista no inciso I, com autorizao para ser aplicada nas condies especficas neste Decreto;
IV - Similares: outras modalidades previamente aprovadas pelas Secretarias da fazenda das Unidades da Federao, com aplicao restrita na rea de atuao da autoridade que as aprovou. .......................................................................................................................................
26
A Lei Pel foi regulamentada pelo Decreto n 2.574, de 29 de
abril de 1998, que atribuiu ao Instituto Nacional do Desenvolvimento do
Desporto (INDESP) competncia para expedir normas regulamentares de
credenciamento, autorizao e fiscalizao dos jogos de bingo.
O referido decreto determinou que o credenciamento para a
explorao dos jogos de bingo, a autorizao e a fiscalizao da atividade
seriam feitos pelo INDESP ou mediante convnio com as Loterias Estaduais
ou com as Secretarias de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal.
Alm disso, a despeito da incompatibilidade com os citados
artigos 73 e 74 da Lei Pel, o 2 do artigo 74 daquele diploma legal permitia
a instalao e operao, em salas prprias, de mquinas eletrnicas
programadas para a explorao do jogo do bingo (videobingo).
O referido dispositivo foi posteriormente revogado pelo Decreto
n 3.214, de 21 de outubro de 1999, que, portanto, proibiu a explorao de
jogo em mquinas eletrnicas programadas (videobingo).
A Lei n 9.981, de 14 de julho de 2000 (Lei Maguito), revogou, a
partir de 31 de dezembro de 2001, os referidos artigos 59 a 81 da Lei Pel, que
permitiam a explorao do bingo, determinando, porm, que fossem
respeitadas as autorizaes que estivessem em vigor at a data de sua expirao.
Essa Lei transferiu, ainda, para a CEF, a competncia para
autorizar e fiscalizar os jogos de bingo, mantendo o credenciamento das
entidades como atribuio do INDESP.
27
Posteriormente, a Medida Provisria (MPV) n 2.049-24, de 26
de outubro de 2000 (que em sua ltima reedio tem o n 2.216-375, de 31 de
agosto de 2001), alterou o artigo 59 da Lei Pel, dando-lhe a seguinte redao:
Art. 59. A explorao de jogos de bingo, servio pblico de competncia da
Unio, ser executada, direta ou indiretamente, pela Caixa Econmica
Federal em todo o territrio nacional, nos termos desta Lei e do respectivo
regulamento.
A referida MPV extinguiu o INDESP, transferindo para a CEF
suas atribuies relativas aos jogos de bingo.
O Decreto n 3.659, de 14 de novembro de 2000, regulamentou a
autorizao e a fiscalizao dos jogos de bingo, em consonncia com as
reformas promovidas na legislao, e revogou o Decreto n 2.574, de 1998.
Portanto, a partir de 31 de dezembro de 2001, ressalvadas as
autorizaes que estavam em vigor nessa data6, a explorao de jogos de
bingo voltou a caracterizar contraveno penal, tendo em vista no existir
mais a legislao especial que a autorizava, voltando a incidir a lei geral o
art. 50 da LCP, que tipifica como contraveno a explorao de jogos de azar.
5 Medida Provisria ainda no votada pelo Congresso Nacional (art. 2 da Emenda
Constitucional n 32, de 2001).
6 As ltimas autorizaes tiveram seu prazo expirado no final de 2002.
28
2.1.2.3.1.1. A MEDIDA PROVISRIA N 168, DE 2004
A despeito desse quadro legal, em 20 de fevereiro de 2004, foi
editada a MPV n 168, que proibia a explorao de todas as modalidades de
jogos de bingo e jogos em mquinas eletrnicas denominadas caa-nqueis.
O seu art. 1 proibia a explorao de todas as modalidades de
jogos de bingo e os jogos em mquinas eletrnicas caa-nqueis em todo
territrio nacional. O jogo de bingo deixava de ser considerado servio
pblico.
O art. 2 estabelecia que ficariam declaradas nulas todas as
licenas, permisses, concesses ou autorizaes para explorao dos jogos de
bingo e caa-nqueis, direta ou indiretamente expedidas pela CEF, por
autoridades estaduais, do Distrito Federal, ou municipais.
O art. 3 determinava que a CEF e as autoridades estaduais, do
Distrito Federal, ou municipais deveriam proceder resciso unilateral
imediata dos contratos vigentes ou revogar os atos autorizadores do
funcionamento dos respectivos estabelecimentos, sem nenhum tipo de
indenizao.
Os arts. 4 e 5 estabeleciam que a explorao de jogos de bingo
e caa-nqueis sujeitaria o infrator multa diria no valor de R$ 50.000,00
(cinqenta mil reais), a ser aplicada pelo Ministrio da Fazenda, que deveria
remeter cpia do auto de infrao ao Departamento de Polcia Federal, para
investigao quanto a delitos de natureza penal.
O art. 6 determinava que o servidor pblico federal ou
empregado da CEF que se omitisse na aplicao das disposies da MPV
29
ficaria sujeito s penalidades de demisso do servio pblico ou, conforme o
caso, de despedida por justa causa, sem prejuzo das sanes penais cabveis.
O art. 7 estabelecia que a MPV entraria em vigor na data de sua
publicao e o art. 8 revogava os arts. 2, 3 e 4 da Lei n 9.981, de 14 de
julho de 2000, o art. 59 da Lei n 9.615, de 24 de maro de 1998, e o art. 17 da
Medida Provisria n 2.216-37, de 31 de agosto de 2001.
Como de conhecimento geral, a referida MPV foi rejeitada pelo
Congresso Nacional, por falta de atendimento aos pressupostos de relevncia e
urgncia.
Ocorre que a MPV n 168, de 2004, trazia poucas inovaes em
relao ao sistema legal ento vigente. A novidade consistia, basicamente, na
caracterizao da explorao de jogos de bingo e mquinas caa-nqueis
como ilcito administrativo, sujeitando o infrator multa diria no valor de R$
50.000,00 (cinqenta mil reais).
Quanto proibio de explorao da atividade (objeto do art. 1),
o jogo de bingo, antes da edio da MPV, j caracterizava contraveno penal,
como j observamos. A prpria Exposio de Motivos da MPV n 168 fazia
referncia a esse fato.
Com relao s licenas, permisses, concesses ou autorizaes
para explorao dos jogos de bingo e caa-nqueis referidas nos arts. 2 e 3,
como j mencionamos, desde 31 de dezembro de 2001 a CEF no mais podia
autorizar o funcionamento de bingos. Alm disso, em 2004, j se haviam
expirado todas as autorizaes concedidas pela CEF durante a vigncia dos
artigos da Lei Pel que regulamentavam a explorao dos jogos de bingo. Os
30
Estados, por sua vez, no detinham competncia para autorizar a explorao
de jogos de bingo, tendo em vista a competncia privativa da Unio para
legislar sobre sorteios e sobre direito penal, nos termos do art. 22, incisos I e
XX da CF. Esse registro tambm feito na Exposio de Motivos da MPV,
em cujo texto consta o seguinte trecho:
No demais salientar que se proliferam pelo Brasil estabelecimentos
destinados explorao desses jogos sem nenhuma autorizao legal ou com
base em normas locais de clara inconstitucionalidade formal.
O nico prejuzo, portanto, do ponto de vista da represso ao jogo
de bingo, com a rejeio da MPV n 168, de 2004, consistiu em se deixar de
caracterizar a sua explorao como ilcito administrativo.
Alis, a aprovao da MPV poderia at ensejar uma interpretao
desfavorvel represso do jogo de bingo. A edio de uma normal legal
pressupe a inovao do direito. No se deve interpretar um dispositivo legal
de forma a que resulte intil. Trata-se de vcio de antijuridicidade, que ofende
o art. 7, IV, da Lei Complementar n 95, de 1998, que dispe sobre a
elaborao das leis, segundo o qual o mesmo assunto no poder ser
disciplinado por mais de uma lei, exceto quando a subseqente se destine a
complementar lei considerada bsica, vinculando-se a esta por remisso
expressa.
Portanto, quando a MPV probe a explorao dos jogos de bingo
e das mquinas caa-nqueis, supe-se que at ento essa explorao era
autorizada, o que juridicamente falso. Essa interpretao poderia, inclusive,
dar ensejo a que as empresas que exploram essa atividade se utilizassem desse
argumento para legitimar a sua atividade anterior edio da MPV.
31
O fato que a rejeio da MPV n 168, de 2004, no afastou a
ilicitude da explorao do jogo de bingo e das mquinas caa-nqueis, como
querem alguns, prevalecendo a norma penal que estabelece que a explorao
dessas atividades constitui contraveno penal.
2.1.3. LEGISLAO ESTADUAL SOBRE O JOGO DE AZAR E AS
LOTERIAS
A maior parte dos Estados da Federao legisla e explora loterias
estaduais. Quanto aos jogos de azar, normalmente tais Estados tambm
legislam sobre a matria, enquadrando a explorao desses jogos como
modalidade lotrica.
2.1.3.1. LEGISLAO ESTADUAL SOBRE LOTERIAS
A despeito da legislao federal que estabelece que a explorao
de loteria constitui servio pblico exclusivo da Unio, no suscetvel de
concesso, e que veda a criao de loterias estaduais autorizando, apenas, a
manuteno das loterias estaduais existentes em 1967, limitadas as emisses
s quantidades de bilhetes e sries em vigor naquela oportunidade , bem
como da lei penal que tipifica a explorao de loterias sem autorizao legal
como contraveno penal, a maior parte dos Estados da Federao criaram
loterias estaduais e regulamentaram a sua explorao.
Para respaldar essa explorao, baseavam-se em pareceres de
renomados juristas, cujo entendimento de que a loteria um servio pblico
32
comum Unio e aos Estados. A tese por eles defendida de que a CF no
atribui Unio competncia privativa para legislar nem para explorar esse
servio pblico, o que implica, tendo em vista a competncia residual
estabelecida pelo 1 do art. 25 da CF, que os Estados podem legislar
livremente a respeito.
Vrios desses autores argumentam que a competncia privativa
da Unio para legislar sobre sistemas de sorteios ou sorteios a que se
refere o inciso XX do art. 22 da CF h de ser entendida em sentido estrito, a
partir de uma anlise de sua localizao no texto constitucional, que ensejaria
a interpretao de que diz respeito apenas aos sorteios relacionados com as
atividades consorciais ou assemelhadas.
Ocorre que no julgamento da Ao Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) n 2.847-2 Distrito Federal, ocorrido em 5 de
agosto de 2004, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu: A legislao
sobre loterias da competncia da Unio, conforme artigo 22, incisos I e XX.
Entendeu aquela Corte de Justia que a palavra sorteio, contida no inciso
XX do art. 22 da CF, abrange loterias e bingos. No julgamento da ADI n
2.948, o STF tambm declarou a inconstitucionalidade de leis editadas pelo
Mato Grosso, por ofensa aos mesmos dispositivos constitucionais.
Outras 14 aes aguardam julgamento no STF, envolvendo
competncia legislativa em matria de loterias e jogos, contra leis editadas
pelos Estados de Alagoas, Gois, Maranho, Mato Grosso do Sul, Minas
Gerais, Par, Paraba, Pernambuco, Piau, Rio de Janeiro, Rio Grande do
Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins.
33
Considerando a deciso do STF e a legislao federal sobre a
matria (Decreto-Lei n 204, de 1967, e Decreto-Lei n 6.259, de 1944), a
explorao de loteria constitui servio pblico exclusivo da Unio. Quanto s
loterias estaduais, foram mantidas apenas aquelas existentes em 1967
limitadas as emisses s quantidades de bilhetes e sries em vigor naquela
poca , sendo vedada, desde ento, a criao de novas loterias estaduais. A
explorao de loteria sem a observncia dessas normas constitui contraveno
penal.
Portanto, a criao de loterias pelos Estados Federados no
encontra respaldo na Constituio, que atribui competncia privativa Unio
para legislar sobre a matria, nem na legislao editada pela Unio, que
determina que a explorao de loterias servio pblico privativo da Unio e
probe a criao de loterias estaduais.
2.1.3.2. LEGISLAO ESTADUAL SOBRE O JOGO DE BINGO
Assim como ocorre em relao a outros jogos de azar, vrios
Estados da Federao tm autorizado a explorao dos jogos de bingo como
modalidade de loteria estadual.
Como j referido no item anterior, no julgamento da ADI n
2.847-2 Distrito Federal, ocorrido em 5 de agosto de 2004, o Supremo
Tribunal Federal decidiu: A legislao sobre loterias da competncia da
Unio, conforme artigo 22, incisos I e XX. Alm disso, a legislao federal
em vigor, como j explanado, veda a criao de loterias estaduais.
34
Portanto, a autorizao dos Estados Federados para explorao do
bingo como modalidade de loteria estadual no encontra respaldo na
legislao editada pela Unio, a quem a CF atribui competncia privativa para
legislar sobre a matria.
2.2. O PODER JUDICIRIO E A EXPLORAO DE JOGOS DE
BINGO
2.2.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O STF, no segundo semestre de 2004, julgou as ADIs ns 2847 e
2948, nas quais decidiu pela inconstitucionalidade de leis do Distrito Federal e
do Estado de Mato Grosso que criavam loterias no mbito daquelas unidades
da Federao.
O STF entendeu que, em vista do disposto no art. 22, inciso XX,
da CF, o qual estabelece a competncia privativa da Unio para legislar sobre
sistemas de consrcio e sorteios, somente a Unio pode dispor sobre loterias
e bingos que, no entender daquela Corte de Justia, esto contemplados na
palavra sorteios, ou seja, sorteios seria gnero, do qual loterias e bingos
so espcies.
Como j antecipado, h, ainda, cerca de 14 outras ADIs
pendentes de julgamento pelo STF, nas quais se argi a inconstitucionalidade
de leis editadas pelos Estados de Alagoas, Gois, Maranho, Mato Grosso do
Sul, Minas Gerais, Par, Paraba, Pernambuco, Piau, Rio de Janeiro, Rio
35
Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins, envolvendo
competncia legislativa em matria de loterias e jogos.
Considerando:
1) a competncia privativa da Unio para legislar sobre a matria,
confirmada pelo STF;
2) que a legislao federal estabelece que a explorao de loterias
constitui servio pblico exclusivo da Unio; e
3) que a explorao de jogos de azar e do jogo de bicho constitui
contraveno penal;
Pode-se concluir que os Estados federados esto impedidos de
criar loterias e de autorizar a explorao de quaisquer modalidades de jogos de
azar.
2.2.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA
O Superior Tribunal de Justia (STJ), em vrias oportunidades, j
se manifestou pela ilicitude da explorao de jogos de bingo e da explorao
de mquinas de jogos eletrnicos.
A seguir, transcrevemos as ementas de alguns julgados
importantes e mais recentes do STJ:
Processo AgRg na MC 10784 / RS ; AGRAVO REGIMENTAL NA MEDIDA CAUTELAR
36
2005/0183973-4 Relator(a)
Ministro CASTRO MEIRA (1125) rgo Julgador
T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento
13/12/2005 Data da Publicao/Fonte
DJ 06.02.2006 p. 231 Ementa
MEDIDA CAUTELAR. AGRAVO REGIMENTAL NA MEDIDA CAUTELAR.RECURSO ESPECIAL. DESTRANCAMENTO E EFEITO SUSPENSIVO. BINGO.ENQUADRAMENTO COMO JOGO DE AZAR. REVISO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SMULA 7/STJ. EXPLORAO COMERCIAL DE MQUINAS DE JOGOS ELETRNICOS. ILICITUDE. 1. O Tribunal a quo concluiu que a atividade efetivamente desenvolvida pela agravante, ainda que sob a nomenclatura de bingo eletrnico, consistia, em verdade, na explorao de jogo de azar, prtica vedada pelo art. 50 do Decreto-Lei n. 3.688/41 (Lei das Contravenes Penais). 2. Concluso distinta da perfilhada na origem demandaria, necessariamente, o reexame do suporte ftico dos autos, proibido pelo teor da Smula n. 7/STJ, de seguinte contedo: "A pretenso de simples reexame de prova no enseja recurso especial". 3. Ainda que no incidisse o bice da smula referenciada, a pretenso da agravante esbarraria na jurisprudncia pacfica deste Sodalcio que se firmou pela ilicitude da explorao e funcionamento das mquinas de jogos eletrnicos. Precedentes. 4. Agravo regimental improvido.
Processo
RMS 18915 / PR ; RECURSO ORDINRIO EM MANDADO DE SEGURANA 2004/0125964-8
Relator(a) Ministro FRANCISCO FALCO (1116)
rgo Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA
Data do Julgamento
37
25/10/2005 Data da Publicao/Fonte
DJ 19.12.2005 p. 209 Ementa
CONSTITUCIONAL. SISTEMAS DE CONSRCIO E DE SORTEIO. MATRIA CUJA COMPETNCIA LEGISLATIVA PRIVATIVA DA UNIO. ART. 22, INC. XX, DA CONSTITUIO FEDERAL. MANIFESTA INCONSTITUCIONALIDADE DA RESOLUO N. 27/2002 DO ESTADO DO PARAN, BEM COMO DA LEI PARANAENSE N. 11035/95. I - A autorizao concedida pelo Estado do Paran, atravs da Resoluo n. 27/2002, a qual foi revogada pelo Decreto n. 1046/2003 era inconstitucional, na medida em que falece aos Estados competncia para legislar sobre sistemas de consrcio e de sorteio, em que se insere o concurso de prognstico na modalidade lotrica (bingo). que, a despeito do art. 22, pargrafo nico, da Constituio Federal dispor que lei complementar poder autorizar os Estados a legislar sobre questes especficas atinentes ao tema, tal lei no foi editada. II - Consoante a hodierna jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal "A Constituio do Brasil determina expressamente que compete Unio legislar sobre sistemas de consrcios e sorteios (art. 22, inciso XX)". E, "nos termos do disposto no art. 22, inciso I, da Constituio, lei que opera a migrao dessa atividade do campo da ilicitude para o campo da licitude de competncia privativa da Unio" (ADI n.2948/MT, in DJ de 13/05/2005). III - Recurso ordinrio desprovido, ausente de direito certo e lquido a ser amparado.
Processo
REsp 703156 / SP ; RECURSO ESPECIAL 2004/0163092-4
Relator(a) Ministro GILSON DIPP (1111)
rgo Julgador T5 - QUINTA TURMA
Data do Julgamento 19/04/2005
Data da Publicao/Fonte DJ 16.05.2005 p. 402
Ementa CRIMINAL. RESP. EXPLORAO DE JOGOS DE BINGO. MANDADO DE
38
BUSCA E APREENSO. MANDADO DE SEGURANA. ORDEM CONCEDIDA PARA LIBERAR O MATERIAL APREENDIDO E AUTORIZAR A CONTINUAO DA ATIVIDADE. REVOGAO DO ART. 50 DA LCP. INOCORRNCIA. RECURSO PROVIDO. I. Hiptese em que foram apreendidos diversos materiais correlacionados explorao comercial de jogos de bingos. II. O art. 50 da LCP no restou revogado pela Lei Pel (Lei 9.651/98), que veio apenas permitir o funcionamento provisrio de "bingos", desde que autorizados por entidades de direito pblico. III. Com o advento da Lei 9.981/2000 (Lei Maguito Vilela) foram revogados, a partir de 31/12/2001, os artigos 59 a 81 da Lei 9.651/98 (Lei Pel), respeitando as autorizaesque estivessem em vigor at a data de sua expirao, autorizao esta, com validade de 12 meses, conforme a legislao especfica. IV. A partir de 31/12/2002, ningum mais poderia explorar o jogo do bingo por violao expressa ao art. 50 da Lei 3.688/41 (Lei de Contravenes Penais). V. Se o ato impugnado ocorreu em 2003, quando as referidas empresas j no mais poderiam estar explorando a atividade, tem-se a correo da medida de busca e apreenso. VI. Recurso provido.
Processo MC 8315 / PR ; MEDIDA CAUTELAR 2004/0074623-7
Relator(a) Ministro FRANCISCO FALCO (1116)
rgo Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA
Data do Julgamento 14/12/2004
Data da Publicao/Fonte DJ 28.02.2005 p. 185
Ementa PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. JOGO DE BINGO. COMPETNCIA DA UNIO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR. PLAUSIBILIDADE JURDICA. INOCORRNCIA. I - O artigo 22, XX, da Constituio Federal determina ser de competncia privativa da
39
Unio legislar sobre sorteios, tendo sido, por isso, editadas as Leis federais n 9.615/1998 e 9.981/2000, bem como o Decreto n 3.659/2000, que estabelece ser o bingoum servio pblico de competncia da Unio, executado, direta ou indiretamente pela CAIXA ECONMICA FEDERAL, em todo o territrio nacional. II - Nesse panorama, as leis estaduais criadas para regular a atividade estariam a invadir a competncia constitucionalmente deferida UNIO. III - Recentemente a matria sofreu apreciao do Supremo Tribunal Federal atravs da ADIN n 2.847/DF, onde ficou assentado que a Legislao sobre loterias da competncia da Unio. IV - Medida cautelar improcedente.
Processo
AgRg na STA 69 / ES ; AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSO DE TUTELA ANTECIPADA 2004/0019097-0
Relator(a) Ministro EDSON VIDIGAL (1074)
rgo Julgador CE - CORTE ESPECIAL
Data do Julgamento 25/10/2004
Data da Publicao/Fonte DJ 06.12.2004 p. 172
Ementa SUSPENSO DE TUTELA ANTECIPADA. CABIMENTO. MQUINAS ELETRNICAS PROGRAMADAS. EXPLORAO. PROIBIO. CONTRAVENO. AGRAVO REGIMENTAL. 1. tutela antecipada aplicam-se as disposies da Lei n 8.437/92, art. 4, quando a magnitude da deciso atacada implicar em grave leso aos valores sociais nela tutelados (ordem, sade, segurana e economia pblicas). 2. Tratando, a hiptese, de matria afeta ordem administrativa e jurdico-penal, deve prevalecer o interesse pblico sobre o particular. 3. O tipo contravencional proibitivo dos jogos de azar inclui a explorao do jogo de bingo, do que resulta inadmissvel a concesso de tutela antecipada a permitir a adoo de conduta penalmente tipificada, ou determinar, autoridade competente, que se abstenha de tomar as medidas necessrias a coibi-la.
40
4. Agravo Regimental no provido.
Processo
AgRg no AgRg na STA 69 / ES ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSO DE TUTELA ANTECIPADA 2004/0019097-0
Relator(a) Ministro EDSON VIDIGAL (1074)
rgo Julgador CE - CORTE ESPECIAL
Data do Julgamento 25/10/2004
Data da Publicao/Fonte DJ 06.12.2004 p. 180
Ementa AGRAVO REGIMENTAL. PEDIDO DE EXTENSO DOS EFEITOS DE SUSPENSO DE LIMINAR. IDENTIDADE FTICA E JURDICA. LESO AOS VALORES TUTELADOS PELA LEI N 8.437/92 DEMONSTRADA. EXPLORAO DE MQUINAS DE CAA-NQUEIS. ATIVIDADE ILCITA. PEDIDO DEFERIDO. 1. A extenso dos efeitos de qualquer deciso judicial pressupe, obrigatoriamente, a existncia de perfeita identidade ftica e jurdica entre as hipteses sob exame, situao constatada no caso dos autos. 2. A suspenso de liminar, como medida de natureza excepcionalssima, somente deve ser deferida quando demonstrada a possibilidade real de que a deciso questionada cause conseqncias graves e desastrosas a pelo menos um dos bens tutelados pela Lei n 8.437/92, art. 4: ordem, sade, segurana e economia pblicas. 3. Evidencia-se o risco de grave leso ordem social e ordem jurdica conquanto a explorao de jogo de azar mediante mquinas de caa-nqueis, definida no art. 50 da Lei de Contravenes Penais j foi reconhecida como atividade ilcita por inmeras decises desta Corte, dentre as quais destaca-se o RESP 474365/SP, 5 Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ de 25/08/2003; ROMS-15593/MG, 1 Turma, DJ de 02/06/03 e ROMS-13965/MG, 1 Turma, DJ de 09/09/2002, ambos tendo como Relator o Min. Jos Delgado. 4. Agravo Regimental no provido.
Processo
RMS 17480 / RS ; RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANA
41
2003/0209558-0 Relator(a)
Ministro JOS DELGADO (1105) rgo Julgador
T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento
28/09/2004 Data da Publicao/Fonte
DJ 08.11.2004 p. 164 Ementa
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINRIO EM MANDADO DE SEGURANA. EXPLORAO COMERCIAL DE MQUINAS DE JOGOS ELETRNICOS. ILEGALIDADE. 1. Cuidam os autos de mandado de segurana preventivo, com pedido de liminar, impetrado por GSGAMES DIVERSES ELETNICAS LTDA. em face do SECRETRIO DE JUSTIA E SEGURANA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, almejando a liberao de mquinas de jogos eletrnicos que porventura viessem a ser apreendidas sob o argumento de que as mesmas esto legalizadas de acordo com os arts. 195, III, e 217 da Constituio Federal, Leis Federais ns 8212/91 e 9615/98, Decreto n 2574/98, Lei Estadual n 11561/00 e Decreto Estadual n 40593/01, sendo denegada a ordem pelo Tribunal de Justia do Rio Grande do Sul sob o fundamento de no haver direito lquido e certo assegurado. Neste momento, a empresa interpe recurso ordinrio defendendo a explorao da atividade lcita de acordo com a Lei Previdenciria e lei de incentivo ao esporte, opinando o representante do Ministrio Pblico pelo improvimento do recurso. 2. Somente cabe Unio legislar sobre sistemas de consrcios e sorteios (art. 22, XX, CF/88). 3. Revogados os artigos que dispunham sobre a autorizao dos bingos pela Lei n 9.981/00 regulamentada pelo Decreto n 3.659/00. 4. de natureza ilcita a explorao e funcionamento das mquinas de jogos eletrnicos (bingo e similares). 5. Precedentes desta Corte Superior. 6. Recurso ordinrio improvido.
(grifos nossos)
42
Como se pode observar, a questo est bem assentada em nossos
tribunais superiores, que tm firmado posio no sentido de que:
1) a Unio tem competncia privativa para legislar sobre a
matria;
2) na expresso sistemas de consrcios e sorteios, constante do
art. 22, XX, da CF, inclui-se qualquer concurso de prognstico na modalidade
lotrica, como o bingo;
3) a legislao federal estabelece que a explorao de loterias
constitui servio pblico exclusivo da Unio;
4) a explorao de jogos de azar e do jogo de bicho constitui
contraveno penal;
5) o tipo contravencional proibitivo dos jogos de azar (art. 50 da
LCP) inclui a explorao de jogo do bingo;
6) a explorao e o funcionamento de mquinas de jogos
eletrnicos (caa-nqueis e videobingo) constitui contraveno penal, punida
nos termos do art. 50 da LCP.
2.2.3. JUSTIA ESTADUAL
Esta CPI solicitou aos Tribunais de Justia dos Estados que lhe
fossem encaminhadas as decises judiciais proferidas no mbito de sua
jurisdio autorizando o funcionamento de casas de bingo.
43
Atenderam solicitao da CPI os Tribunais dos seguintes
Estados: Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraba, Maranho, Rondnia,
Mato Grosso do Sul, Alagoas, Santa Catarina, Piau, So Paulo e Esprito
Santo.
De modo geral, exceo do Estado de Mato Grosso do Sul7, as
decises judiciais tm sido no sentido de no autorizar o funcionamento das
casas de bingo, tendo em vista a competncia privativa da Unio para legislar
sobre a matria, conforme decises do STF proferidas em ADIs contra leis
estaduais que disciplinavam a explorao de loterias estaduais.
Muitas vezes, os tribunais estaduais tm alegado a competncia
da Justia Federal para apreciar a matria, tendo em vista o disposto no art.
109, inciso I, da CF, segundo o qual compete aos juzes federais processar e
julgar as causas em que a Unio, entidade autrquica ou empresa pblica
federal forem interessadas na condio de autoras, rs, assistentes ou
oponentes.
Em Minas Gerais, a explorao de mquinas caa-nqueis tem
sido enquadrada no apenas como contraveno penal, prevista no art. 50 da
LCP, mas tambm como crime contra a economia popular, previsto no art. 2,
inciso IX da Lei n 1.521, de 1951, que altera dispositivos da legislao
vigente sobre crimes contra a economia popular, segundo o qual crime 7 Em Mato Grosso do Sul, logo aps a entrada em vigor da MPV n 168, de 2004, foi editado um decreto revogando as autorizaes de funcionamento das casas de bingo e prevendo novas autorizaes, mediante licitao. As decises judiciais so no sentido de manter a autorizao para funcionamento dos bingos sob o argumento de que a revogao de autorizao para atividade de bingo permanente, atravs de decreto estadual fundado em medida provisria, ato vinculado, e no discricionrio do Poder Pblico; logo, no convalidada a medida provisria, a manuteno da revogao ofende direito lquido e certo, reparvel pelo writ.
44
contra a economia popular obter ou tentar obter ganhos ilcitos em
detrimento do povo ou de nmero indeterminado de pessoas mediante
especulaes ou processos fraudulentos ("bola de neve", "cadeias",
"pichardismo" e quaisquer outros equivalentes).
Os tribunais estaduais, em regra, tambm no tm acatado os
argumentos de muitos interessados, que alegam, baseados inclusive em
percias, que as mquinas caa-nqueis no so jogos de azar, mas apenas
diverso eletrnica.
H decises em Minas Gerais nas quais se afirma que as
mquinas caa-nqueis constituem espcie de sorteio, com premiaes pr-
fixadas, no podendo ser confundidas com diverso eletrnica, onde o usurio
apenas paga pela utilizao do aparelho8. E, ainda, que qualquer jogo baseado
na sorte, na lea e na premiao, em dinheiro ou em bens, sorteio, matria
inserida na competncia legislativa privativa da Unio.
Os interessados alegam, ainda, que, com a revogao da norma
que autorizava a explorao dos bingos, no ocorreu a repristinao da norma
que enquadra essa atividade como contraveno penal. Alegam que haveria,
para tanto, necessidade de repristinao expressa.
Os tribunais tambm no tm acatado o argumento9, como bem
demonstra o seguinte trecho de uma deciso proferida pelo Tribunal de Justia
do Estado de Minas Gerais:
8 Ver item 7.2.1 deste Relatrio. 9 Em 2003, o TJRS proferiu algumas decises no sentido de que a revogao das leis que autorizavam a explorao de bingo no implicava a repristinao da norma do art. 50 da
45
O artigo 50 da Lei de Contravenes Penais no foi revogado tacitamente
pela autorizao da explorao da atividade de bingo contida
originariamente no artigo 57 da Lei n 8.672/93, pois aquele tipo penal
estende-se a todos os jogos de azar em geral. Dessa forma, deixando o bingo
de ser atividade lcita pelo disposto na Lei n 9.981/00, volta a se enquadrar
na hiptese prevista no 3, alnea 'a', do artigo 50 da Lei de Contravenes
Penais, o qual, nunca tendo sido revogado, prescinde de disposio
repristinatria expressa.
As decises do Tribunal de Justia do Maranho remetidas a esta
CPI, todas proferidas em 2001, foram no sentido de que as mquinas
eletrnicas programadas (MEPs) seriam legais, por no caracterizar jogo, alm
do fato de que a importao dos equipamentos era autorizada pelo Governo e
a atividade era autorizada na Lei Pel.
O Tribunal de Justia de Santa Catarina, em algumas
oportunidades, decidiu no sentido de permitir o funcionamento das mquinas
caa-nqueis at a deciso do STF sobre a ADI que questiona a legislao
estadual sobre loterias.
O Tribunal de Justia de So Paulo no tem acolhido mandados
de segurana impetrados pelas casas de bingo com vistas a manter seus
estabelecimentos em funcionamento.
No Estado do Esprito Santo, a LOTERES foi extinta, no
havendo nenhuma deciso autorizando o funcionamento de bingos10.
LCP, no que diz respeito especificamente aos bingos. Para tanto, de acordo com essas decises, haveria necessidade de repristinao expressa. 10 Ver item 7.2.3 deste Relatrio.
46
2.2.4. JUSTIA FEDERAL
Muitas empresas que exploram o jogo de bingo tm conseguido
junto Justia Federal se manter em funcionamento, base de liminares,
invocando diversos argumentos, entre os quais, os seguintes:
2.2.4.1. TESE DA NO-REPRISTINAO DA NORMA PENAL
Um dos argumentos sustentados pelas empresas o de que a
revogao das normas que autorizavam a explorao do bingo no implica a
revigorao das normas de direito penal que a caracterizam como
contraveno. Isso porque o 3 do art. 2 da Lei de Introduo ao Cdigo
Civil (Decreto-Lei n 4.657, de 04 de setembro de 1942) estabelece que, salvo
disposio em contrrio, a lei revogada no se restaura por ter a lei revogadora
perdido a vigncia.
No tendo havido restaurao das normas de direito penal que
caracterizam a explorao do jogo de bingo como contraveno e no mais
havendo qualquer outra disciplina legal no tocante matria, prevaleceria, em
relao a essa atividade, o princpio da livre iniciativa, podendo quaisquer
interessados explor-la.
Como j esclarecemos, esta CPI no concorda com essa tese,
dado que as normas que autorizam a explorao de jogos de azar no revogam
normas penais; so normas especiais em relao norma geral da LCP. Uma
vez revogada a norma especial de exceo, a norma geral passa a enquadrar os
casos antes enquadrados naquela.
47
2.2.4.2. TESE DO DIREITO ADQUIRIDO
Outras empresas alegam direito adquirido de permanecer em
funcionamento, tendo em vista os altos investimentos realizados para
instalao dos empreendimentos.
Esta CPI tambm discorda dessa tese, dado que no se pode
invocar o direito adquirido contra normas constitucionais. Sobre isso, o STF j
se manifestou:
A supremacia jurdica das normas inscritas na Carta Federal no permite,
ressalvadas eventuais excees proclamadas no prprio texto constitucional,
que contra elas seja invocado o direito adquirido. (ADI n 248, Rel. Min.
Celso de Mello, DJ 08/04/1994).
2.2.4.3. TESE DA COMPETNCIA ESTADUAL PARA LEGISLAR
SOBRE DESPORTO
Invoca-se, ainda, o inciso IX do art. 24 da CF, segundo o qual
compete Unio, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente
sobre desporto, sob o argumento de que a legislao sobre jogos de bingo,
quando prev a destinao de recursos para entidades desportivas, diz respeito
a desporto, o que legitima a legislao estadual que autoriza a explorao dos
jogos de bingo.
Como j referido no item 2.2.1, o STF j decidiu que o tema se
insere no art. 22, inciso XX, da CF, e que, portanto, competncia privativa
48
da Unio dispor legislativamente sobre loterias e bingos, expresses
contempladas na palavra sorteios (ADIs ns 2.847 e 2.948).
3. A LEGISLAO INTERNACIONAL
3.1. ANLISE DA LEGISLAO INTERNACIONAL SOBRE JOGOS
DE AZAR
O Parecer sobre Jogos de Azar - Regulamentao dos Cassinos e
Bingos em Direito Comparado, datado de 17 de fevereiro de 2005, elaborado por Castro&Lee Advogados e Consultores Associados, por solicitao da Federao Brasileira de Bingos (FEBRABAN) que teve por objetivo comparar o modo pelo qual a legislao de diversos pases que autorizam a explorao comercial e no caritativa dos jogos de azar (cassinos e bingos) regulamenta, estrutura, limita e condiciona esta atividade econmica analisou as legislaes em vigor dos seguintes pases:
1. frica do Sul National Gambling Act, 2004; 2. Argentina Ley de Juegos con Apuestas da cidade de Buenos
Aires; 3. Austrlia Australian Capital Territory Casino Control Act,
1988, conforme consolidado em abril 2004; 4. Blgica Loi sur les jeux de hasard, les tablissements de jeux
de hasard et la protection des joueurs, 07/05/1999;
49
5. Canad Casino Regulations, regulamentando o Nova Scotia Gaming Control Act, 1994, conforme consolidado em abril 2004;
6. Chile Ley n 19.995, 4/1/2005; 7. Espanha Real Decreto-Ley n 16, 25/02/1977, Real Decreto
n 444, 11/03/1977, Orden por la que se aprueba el Reglamento de Casinos de Juego, 09/01/1979, Orden por la que se aprueba el Reglamento del juego del Bingo, 09/01/1979;
8. Frana Loi du 15 juin 1907, Dcret n 1489, 22/12/1959; 9. Luxemburgo Loi relative I' exploitation des jeux de hasard
et des paris relatift aux preuves sportives, 20/04/1977; 10. Malta Gaming Act 1998, conforme consolidado em 2004; 11. Portugal Decreto-Lei n 422, 02/12/89, conforme
modificado pelo Decreto Lei n 10, 02/01/1995; 12. Reino-Unido Gaming Act, 1968; 13. Sua Loi fdrale sur les jeux de hasard et les maisons de
jeu, 18/12/1998, Ordonnance sur lesjeux de hasard et les maisons dejeu, 24/09/2004;
14. Uruguai Ley n 1392/,1970; e
50
15. Venezuela Ley para el Control de Casinos, Salas de Bingo y Mquinas Traganqueles, 1997.
Para uma melhor clareza metodolgica, os temas propostos pelo
Parecer so estudados no sob a tica de cada legislao nacional considerada individualmente, mas sim sob a perspectiva de grupos de legislaes que adotem uma postura comum face a uma mesma questo.
Assim, so enfatizadas as diversas solues consagradas no plano
de direito comparado, este enfoque permitindo no somente uma viso panormica das diferentes polticas legislativas existentes na matria, mas tambm proporcionando uma compreenso das diferentes funes e importncia atribudas aos jogos de azar nas sociedades e economias nacionais.
Os pases que possuem uma legislao em matria de explorao
comercial dos jogos de azar cassinos e bingos , concentraram parte significativa de seus esforos na regulamentao dos procedimentos de concesso da licena necessria ao exerccio destas atividades no mbito de seus respectivos territrios.
A anlise realizada pela Castro&Lee Advogados e Consultores
Associados permite identificar e classificar os diferentes sistemas legislativos conforme a natureza das regras que eles consagram, da seguinte forma:
1) Enfoque sobre os aspectos institucionais que precedem a
concesso da licena, notadamente aqueles aspectos relativos legislao e autoridade competente para decidir da concesso.
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2) Anlise dos aspectos materiai