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CRÔNICA: A LITERATURA NOS JORNAIS por Carolina Lima (Aluna do Curso de Comunicação Social) Monografia apresentada à Banca Examinadora na disciplina Projetos Experimentais. Orientadora Acadêmica: Prof. Márcia Falabella. 1

crônica a literatura nos jornais

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C R Ô N I C A :

A L I T E R A T U R A N O S J O R N A I S

por

Carolina Lima

(Aluna do Curso de Comunicação Social)

Monografia apresentada àBanca Examinadorana disciplina ProjetosExperimentais.Orientadora Acadêmica:Prof. Márcia Falabella.

UFJF FACOM 2. sem. 2003

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Quero dedicar este trabalho ao meu pai Manoel e a meus irmãos Rafa e Pat, por todo apoio e pelo sacrifício que fizeram ao se mudarem para Juiz de Fora para que eu pudesse cursar a Faculdade e ainda, à minha irmã Fab, que mesmo longe, sempre esteve perto. De forma especial dedico-o também à minha mãe, Rita, que em todos os momentos difíceis do curso e principalmente desta monografia, quando eu pensava em desistir, nunca deixou que eu enfraquecesse e sempre me dizia que eu iria vencer.A Deus, por estar presente em todos os momentos de minha vida, até quando esqueço de rezar, mas que nunca me abandonou e que tornou possível o momento presente.

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A G R A D E C I M E N T O S

Agradeço em especial a Malu, que sem obrigação nenhuma, aceitou o desafio de me ajudar. Muito obrigada por sua disponibilidade, atenção e orientação na construção deste trabalho.Agradeço também a Marcinha, que confiou inteiramente em mim e se dispôs a ser minha orientadora.Ao Zé Luiz Ribeiro, por ter sido uma figura importantíssima durante minha vida acadêmica. Obrigada por seus conselhos, (inclusive para pensar o sumário deste trabalho) opiniões e por ter me acolhido de forma tão bonita no Forum da Cultura, que por muito tempo foi minha segunda casa.À Fiorese, por ter me ajudado a dar respostas às minhas inquietações profissionais.À Cláudia, que sempre foi uma pessoa com que pude contar e com cuja garra e determinação, aprendi muito.À Leila, pela ajuda, dicas e empréstimos de livros.À Evelyn, minha grande amiga, por sempre estar comigo, pelos livros, pelo aluguel do seu ouvido e por quatro anos de ótima convivência.Aos amigos e amigas, em especial à Ana e Xexeta, que sempre dividiram comigo os momentos de alegria e tristeza.Com grande amor, agradeço ao Léo, por estar sempre ao meu lado me apoiando, me ajudando e me dando sustentação. Obrigada por sempre me consolar nos momentos em que achava que nada ia dar certo mas, sempre tinha seu colo ao alcance.

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S I N O P S E

Estudo da crônica e sua evolução através dos tempos, principalmente no Brasil. Demonstração da crônica como a literatura no jornalismo. Análise dos recursos literários, em especial do subjetivismo, lirismo e coloquialismo para sua construção. As especializações da crônica: a crônica esportiva, social e política.

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1.INTRODUÇÃO

2. O TEMPO E A CRÔNICA

2.1. A crônica no jornal

2.2. A linguagem da crônica

3. A LITERATURA NO JORNALISMO ATRAVÉS DA CRÔNICA

3.1. A crônica como gênero literário

3.2. O cronista e o repórter

4. A CRÔNICA ESPECIALIZADA

4.1. Crônica esportiva

4.2. Crônica social

4.3. Crônica política

5. CONCLUSÃO

6. BIBLIOGRAFIA

7. NOTAS

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A crônica é um hiato, uma interrupção da notícia, um suspiro da frase, um desabafo do parágrafo, um relax do estilo direto e seco da escrita de jornal, do qual se arroga de ser hiato literário, a literatura do jornal. O jornalismo da literatura.

ARTUR DA TÁVOLA

No bazar das vociferações que é o jornal moderno, com o escândalo diário de suas manchetes, a crônica de sabor literário é música de câmara para qual sempre haverá escuta dedicada.

AFRÂNIO COUTINHO

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1. INTRODUÇÃO

Este trabalho é reflexo do nosso interesse por literatura.

Sempre gostamos de ler romances e todo tipo de ficção em geral

e esse foi um dos prazeres que nos levou a cursar jornalismo.

Ao procurar um tema que pudesse ser o assunto de nossa

monografia, pensamos que poderia ser interessante unir essas

duas paixões: jornalismo e literatura, buscando atentar para a

influência desta no texto jornalístico.

Para delimitar essa ascendência, recortamos o tema, muito

abrangente, e delimitamos o estudo somente na crônica,

delineando a presença desse gênero literário nos jornais da

atualidade. A pesquisa deste trabalho foi baseada na leitura de

livros teóricos sobre o assunto, antologias de crônicas, textos

falando do assunto na Internet e crônicas em jornais.

A crônica, na maioria das vezes, é um relato breve, de

linguajar descompromissado, coloquial, que é capaz de

transformar um fato da atualidade, (que no jornal é noticiado

de forma séria e objetiva), em um texto repleto de lirismo,

subjetividade e emoção, trazendo-nos uma visão nova e

diferente, que muitas vezes nem tínhamos imaginado, acerca do

fato. É a literatura presente no jornalismo.

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Porém, o jornais raramente permitem que em seus textos

haja a utilização desses recursos literários, já que seu

principal intuito é informar e contribuir para formar a opinião

pública. Para isso, conta com a veiculação de textos

opinativos como o editorial, a carta dos leitores, o comentário

e o artigo. Até na charge e na caricatura encontramos opinião.

Mas a crônica também informa, a seu modo, (suavemente) e também

emite opinião – a do cronista:

A crônica é um gênero opinativo de responsabilidade do jornalista ou escritor especializado. Esta premissa serve para distanciar sua estrutura da do editorial, cuja opinião emerge oficialmente da empresa. Também serve para diferenciar a crônica da carta, que é um veículo de opinião do leitor, e do artigo, expresso através da opinião do colaborador no jornal. A caricatura, por sua vez, pode ser opinião livre do desenhista, como ocorre na maioria das vezes, ou da empresa.1

Somente aqui no Brasil, a crônica tem o significado que

tem, e esse é um dos aspectos que abordaremos no trabalho.

Evanir Brunelli, formado pela Facom em 1988 (e que muito ajudou

na construção deste trabalho com sua monografia sobre o tema),

dá uma pista para entender o porquê da crônica brasileira ser

tão única: “No Brasil, a infinidade de autores propicia

inovações constantes, com uso livre de elementos[...]”2

1BRUNELLI, E. 1988: p.72

2Ibidem, p.66

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Portanto, para entender esse gênero tão nosso, no segundo

capítulo deste trabalho mostraremos como surgiu a crônica, que

no início não era carregada de literatura e sim de história.

Também veremos a pré-história da crônica no Brasil, através de

textos que continham em si a semente da crônica, do registro do

circunstancial. Buscamos traçar uma exposição histórica da

crônica, desde que chegou ao Brasil no século XIX, (ainda como

folhetim), sua presença nos jornais da época e os principais

autores. Falaremos ainda da linguagem da crônica e de suas

características.

No terceiro capítulo entraremos na questão que para nós é

a essencial: como a crônica é a literatura no jornal, mostrando

opiniões diferentes a respeito do jornalismo influenciado pela

literatura. Pensando que se pode informar de uma maneira

alternativa e diferente da que conhecemos hoje, mostramos como

o jornalismo pode ser enriquecido pela ótica literária:

Tanto no desenvolvimento de uma crônica quanto de uma reportagem ou mesmo de uma simples notícia deve estar presente aquilo que distingue um cronista de outro cronista e um jornalista de outro jornalista: a criatividade.3

Na quarta e última parte analisaremos como as crônicas da

atualidade seguiram o caminho do jornalismo e agora, tratam de

assuntos de forma especializada. Para exemplificar, usaremos as

crônicas esportivas, sociais e políticas e alguns nomes em cada

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campo para ilustrá-las.

Reafirmando o que dissemos há pouco, com este trabalho

buscamos, através da crônica, pensar a contribuição da

literatura para o jornalismo na construção de textos suaves,

interessantes e prazerosos de se ler, que não perdem em nada ao

transmitir a informação:

Um dos caminhos para o jornalista dos meios impressos é o procedimento mesmo do cronista: sentir com emoção e dedicar-se à ação das palavras. O narrador-repórter é, enfim, um ser capaz de trabalhar com o olho vivo do repórter e a fala encantada do cronista.4

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2. O TEMPO E A CRÔNICA

Ao folhear as páginas dos jornais encontramos um tipo de

texto de agradável leitura, curto, descompromissado, que

carrega em si ares de literatura e cujo objetivo parece ser

apenas o de entreter e distrair os leitores. Um texto que “por

meio dos assuntos, da composição aparentemente solta, do ar de

coisa sem necessidade[...] se ajusta à sensibilidade de todo

dia.”5 Esse texto é a crônica, que nos traz um momento de pausa

e descanso depois da leitura de tantas notícias sérias e

objetivas que compõem o jornal. Porém, sua origem é bem mais

remota e distante do Brasil, onde adquire características tão

peculiares.

Do latim chronica, orum, derivada do grego chronika, que,

por sua vez, vem de kronos (tempo), a crônica é, inicialmente,

uma narração dos acontecimentos em sua ordem cronológica.6

Na Era Cristã, a crônica era uma maneira de registrar os

acontecimentos históricos, seguindo o curso do tempo, sem

aprofundamento do porquê ou a interpretação dos fatos. Tínhamos

dessa forma, a crônica histórica. Ela era apenas uma forma de

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documentar através do texto, não tendo o objetivo de causar

questionamentos no leitor.7 Com esse sentido, o vocábulo foi

substituído pela palavra história, que é a atividade científica

que documenta, narra e interpreta os eventos de que o homem

participa, segundo Dino Del Pino, et al.8

Foi na Europa, durante o Renascimento, que a narrativa

histórica passou a ter como principal característica a

interpretação e busca de causas para os fatos, enquanto a

crônica ficou somente na descrição dos acontecimentos.9

A crônica e a história têm em comum o enfoque da temática

temporal e, talvez, seja só nesse ponto em que se assemelham.10

“O cronista pode ser visto como um historiador vivencial,

porque os fatos são contados com o espírito do seu tempo.”11

Segundo Afrânio Coutinho em A Literatura no Brasil, no

sentido atual, a palavra crônica, em português, desvinculou-se

de sua conotação histórica e foi se transformando

semanticamente, passando a significar um gênero literário, que

tem grande relação com o jornalismo.12 A crônica, de histórica,

passa então a literária, ou lítero-jornalística. Agora, não

apenas descreve os acontecimentos, mas tenta interpretá-los e

buscar suas causas.

E aqui, é importante ressaltar, logo no começo deste

estudo, que a crônica no Brasil, assumiu um caráter sui

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generis, chegando a ser considerada uma invenção nacional.

Antônio Cândido no livro A Crônica: o gênero, sua fixação e

suas transformações no Brasil, coloca que “[...]é um gênero

brasileiro, pela naturalidade com que se aclimatou aqui e a

originalidade com que aqui se desenvolveu.”13

No país, a crônica teve muita aceitação e cativou os

brasileiros por causa de sua linguagem solta, rápida e

atraente. É um gênero que se abrasileirou no estilo, língua,

assuntos, técnica, ganhando contornos inéditos na literatura

brasileira, talvez por causa do coloquialismo, que é seu

registro predileto. O cronista se torna um interlocutor do

leitor, diz o que ele pensa, lhe dá idéias sobre fatos,

sentimentos e idéias que lhe são próximas.

Massaud Moisés em A Criação Literária apóia-se em Brito

Broca e assim a define: “Crônica é para nós hoje, na maioria

dos casos, prosa poemática, humor lírico, fantasia, etc.,

afastando-se do sentido de história, de documentário[...]”14

Ivan Lessa no texto A crônica (disponível no site

Releituras) procura saber o porquê do gênero ter encontrado

terreno tão fértil no Brasil. Para ele, o primeiro fator, é

que, excluindo o escritor Euclides da Cunha, nosso fôlego

literário é curto, trabalhamos bem com poucas armas, como é o

caso do texto da crônica. Em segundo lugar, porque temos

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consciência da enorme violência com que o tempo vai eliminando

tudo, levando as coisas e as pessoas, daí a necessidade de

registrar, de alguma forma, o que se passou e passa no espaço

pessoal e inalienável, sendo o registro do acontecimento a

característica essencial do gênero. O terceiro aspecto está

ligado ao fato de que somos muito pessoais e emocionais, vemos

e vivemos muito a nossa vida e a celebramos quase que no

próprio momento em que ela se passa, de maneira que a

subjetividade é outro fator importante para se escrever

crônicas. O último fator está ligado à questão econômica:

“O cronista [...] mesmo mal pago - e quando é bom não é esse o

caso —, tem uns cobres garantidos no fim do mês, se o

empregador for bom pagador.”15

Ainda antes de falarmos da crônica literária, que, como

vimos, encontrou campo bastante propício no Brasil, temos que

voltar no tempo para falar da crônica histórica e daquela que é

considerada por alguns como a primeira crônica sobre o Brasil:

a Carta de Pero Vaz de Caminha.

A carta de Pero Vaz de Caminha a el-rei D. Manuel assinala o momento em que, pela primeira vez, a paisagem brasileira desperta o entusiasmo de um cronista, oferecendo-lhe a matéria-prima para o texto que seria considerado nossa certidão de nascimento.16

Para entender a Carta de Pero Vaz de Caminha como a

primeira crônica brasileira precisamos saber o que distingue um

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texto como tal. De acordo com Antônio Cândido, geralmente, as

características da crônica são: a composição solta que assume

um ar descompromissado, a linguagem coloquial, o registro dos

acontecimentos, a atenção aos detalhes, o lirismo e o uso do

humor.17

Cientes do que um texto deve conter para ser classificado

como uma crônica, podemos destacar na Carta de Pero Vaz de

Caminha, aspectos que facilmente a nomeariam como esse gênero

literário, como por exemplo, o registro excessivamente

detalhado do que aconteceu quando os portugueses chegaram ao

Brasil:

Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! Primeiramente dum grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã com grandes arvoredos: ao monte alto o Capitão pôs o nome – o MONTE PASCOAL e à terra – a TERRA DA VERA CRUZ. Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças; e, ao sol posto, obra de seis léguas da terra, surgimos âncoras, em dezenove braças – ancoragem limpa. Ali permanecemos toda aquela noite. E à quinta-feira, pela manhã, fizemos vela e seguimos direto à terra, indo os navios pequenos diante, por dezassete, dezasseis, quinze, quatorze, treze, doze, dez e nove braças, até meia légua da terra, onde todos lançámos âncoras em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem às dez horas pouco mais ou menos.18

Na narrativa pormenorizada dos aspectos que constituíam

aquele cenário exótico para os portugueses, Caminha descreve

peculiarmente os índios e seus costumes, outro caráter que dá a

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este texto o aspecto de crônica:

A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Não fazem o menor caso de encobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocência como em mostrar o rosto. Ambos traziam os beiços debaixo furados e metidos neles seus ossos brancos e verdadeiros, do comprimento duma mão travessa, de grossura dum fuso de algodão, agudos na ponta como furador. Metem-nos pela parte de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feita como roque de xadrês, ali encaixado de tal sorte que não os molesta, nem os estorva no falar, no comer ou no beber.19

Durante todo o texto podemos averiguar o uso da linguagem

coloquial mais próxima da oralidade e ainda, a utilização do

humor, outro aspecto essencial para que consideremos a Carta

uma crônica:

Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem moças e bem gentis, com cabelos muito pretos e compridos pelas espáduas, e suas vergonhas tão altas, tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as muito bem olharmos, não tínhamos nenhuma vergonha.20

Segundo Jorge de Sá em A crônica, nossa literatura surgiu

da Carta de Pero Vaz, ou seja, nasceu da circunstância, de um

documento histórico em forma de epístola que pode ser

considerado uma crônica.21 Porém, Evanir Brunelli na monografia

A crônica: o gesto humano no registro do acontecimento,

discorda da afirmação de que a literatura brasileira tenha

nascido com a Carta de Pero Vaz de Caminha. Para ele, a

literatura de Caminha não deve ser entendida como brasileira

16

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pois, no Brasil de 1500, não havia ninguém que pudesse

registrar o circunstancial na ótica da terra, livre de padrões

e da religiosidade do colonialismo português.22

Outro narrador de viagem, o alemão Hans Staden, escreveu

crônicas históricas que, na atualidade, são importantes fontes

de pesquisa para o estudo de nossos primeiros anos do período

colonial. Consistiam em relatos de bordo, textos de divulgação

geográfica e etnológica que traziam em si aspectos

cronológicos.23 Diferentemente de Caminha, que na Europa não foi

reconhecido por seus escritos, o livro do alemão Hans Staden

ficou famoso no continente, sendo traduzido para diversas

línguas. Com o título de Viagens, os textos de Staden versavam

sobre os acontecimentos das duas expedições que fez ao Brasil

em 1547 e 1550. A narrativa é típica da crônica histórica com

elementos literários, o que pode ser notado, por exemplo, na

perda da objetividade do relato ao descrever, aterrorizado, o

hábito nativo de devorar estrangeiros, fato que presenciou

quando foi preso pelos índios tupinambás:

Cunhambebe tinha à sua frente um grande cesto cheio de carne humana. Comia uma perna. Segurou-m´a diante da boca e perguntou-me se também queria comer. Respondi: Um animal racional não come um outro parceiro; um homem deve devorar outro homem? Mordeu-a, então, e disse: Jauára ichê. Sou um jaguar. Está gostoso. Retirei-me dele, à vista disso.24

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Ao final do primeiro século de colonização brasileira,

não se podia falar do circunstancial em nossa literatura, até

porque não havia imprensa e a cultura estava em poder dos

jesuítas.25 Observamos nessa época, a transferência da crônica

enquanto registro de costumes para os sermões, autos

religiosos, cartas e pequenos fragmentos históricos que se

preocupavam em relatar as missões jesuíticas nas capitanias.

Porém, Sílvio Romero em A História da Literatura Brasileira,

destaca também a figura do padre José de Anchieta como

cronista. Em seus textos, podemos constatar o registro dos

fatos, principalmente aqueles relacionados com as ações

missionárias na colônia que desejavam cooptar almas para o

Senhor, mas também estão presentes a caracterização do modo de

vida e o retrato das capitanias na época, como nessa descrição

da capitania do Espírito Santo:26

Na Capitania de Espírito Santo, há duas vilas de portugueses perto uma da outra meia légua por mar. Em uma delas, que está na barra e chamam de Vila Velha por ser a primeira que ali se fez, está num monte mui alto e em um penedo grande uma ermida de abóbada que se chama Nossa Senhora da Pena, que se vê longe do mar e é grande refrigério e devoção dos navegantes e quase todos vêm a ela em romaria, cumprindo as promessas que fazem nas tormentas, sentindo particular ajuda na Virgem Nossa Senhora, e diz-se nela missa muitas vezes.27

O registro do circunstancial se dará sobretudo no século

XVII através do poeta barroco Gregório de Matos. Apesar de

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escrever poesia, em seus versos ele também deixou influências

para a crônica brasileira atual, com o registro do

circunstancial, a sátira, o humor, a crítica e o pitoresco.

Gregório criticou com fúria a sociedade urbana da época como

autoridades, governantes, comerciantes, padres, freiras,

juízes, militares, brancos, pretos, mulatos e índios.

No poema abaixo notamos o emprego da sátira e

maledicência que Gregório usa para criticar a passividade dos

baianos, a voracidade do comércio e o sistema colonial. Também

percebemos o tom coloquial com que se dirige a seu leitor, como

um interlocutor presente:

Triste Bahia, oh quão dessemelhanteEstás e estou do nosso antigo estado; Pobre te vejo a ti, tu a mim empenhado,Rica te vi eu já, tu a mim abundante.

A ti trocou-te a máquina mercanteQue em tua larga barra tem entrado,A mim foi-me trocando e tem trocadoTanto negócio e tanto negociante

Deste em dar tanto açúcar excelente Pelas drogas inúteis, que abelhudaSimples aceitas do sagaz Brichote

Oh, se quisera que de repenteUm dia amanheceras tão sizudaQue fora de algodão o teu capote.28

Durante o Arcadismo também tivemos contribuições

importantes para a configuração da crônica brasileira, com as

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Cartas Chilenas do escritor Tomás Antônio Gonzaga, publicadas

em 1854. As Cartas Chilenas são um poema satírico que denuncia

a corrupção e critica a grave crise econômica de Vila Rica,

indo contra o senhor da capitania de Minas Gerais, Luís da

Cunha Pacheco e Meneses. O escritor manteve-se no anonimato,

utilizando diversos pseudônimos. Os escritos eram na maior

parte das vezes, assinadas por alguém de nome Critilo e

destinados a um suposto Doroteu. A irreverência apontava as

arbitrariedades de um hipotético chefe de Estado chileno,

Fanfarrão Minésio, que era, na verdade, o governador Menezes.29

Neste excerto das Cartas Chilenas, podemos observar a

denúncia dos maus tratos sofridos pelos presos e as doenças a

que estavam expostos, fazendo uma crítica ao governador da

capitania mineira:

Passam, prezado amigo, de quinhentosOs presos que se ajuntam na cadeia.Uns dormem encolhidos sobre a terra,Mal cobertos dos trapos, que molharamDe dia, no trabalho. Os outros ficamAinda mal sentados, e descansamAs pesadas cabeças sobre os braços, Em cima dos joelhos encruzados.O calor da estação e os maus vaporesQue tantos corpos lançam, mui bem podemEmprestar, Doroteu, extensos ares.A pálida doença aqui bafeja,Batendo brandamente as negras asas.30

Temos nas Cartas Chilenas, a denúncia marginal a partir

do desligamento da história oficial, que geralmente, nunca

20

Page 21: crônica a literatura nos jornais

tocava em pontos polêmicos do governo das capitanias.

Infelizmente, notamos que o ensino médio não se preocupa em

mostrar aos alunos a importância desse documento para a

literatura brasileira. Quando se fala de Tomás Antônio Gonzaga,

os livros didáticos se atêm somente na sua obra poética, As

Liras de Marília de Dirceu, e um ou outro apenas cita as Cartas

Chilenas, exemplificando de forma tão pobre que os estudantes

dificilmente se dão conta do belo trabalho em que constitui-se.

Podemos, por exemplo, registrar o simplismo com que o livro de

2º grau Literatura I, de Fernando Teixeira de Andrade trata da

questão: “Literariamente, é a obra satírica mais importante do

século XVIII brasileiro e continua sendo o índice de uma

época.”31 Se tão importante, por que apenas citar?

Cabe-nos, portanto, levantar uma hipótese: seriam as

Cartas Chilenas e não a Carta de Pero Vaz de Caminha, as

precursoras da crônica brasileira? Concordamos com Luiz

Roncari, quando afirma que a Carta de Pero Vaz de Caminha faz

parte da história da literatura portuguesa, não da brasileira,

já que o Brasil entra apenas como objeto da narrativa.32 Por

esse motivo, as Cartas Chilenas poderiam ocupar o lugar de

anunciadoras da nossa crônica, na medida em que eram produzidas

por um quase brasileiro, o inconfidente Tomás Antônio Gonzaga

(na verdade ele nasceu em Portugal, mas veio para o Brasil com

21

Page 22: crônica a literatura nos jornais

sete anos), que estava à par da situação do país, da capitania

de Minas Gerais e especialmente de Vila Rica, produzindo dessa

maneira, uma obra nacional. Obra essa, que apesar de não se

configurar em uma revolta contra a metrópole (Portugal),

criticava abertamente o abuso de poder e o desrespeito à lei

por parte do Governador da capitania de Minas Gerais, chamado

Fanfarrão Minésio. Utilizava ainda elementos característicos

das crônicas modernas como as metáforas, troca de nomes,

malícia, ironia, humor, pitoresco e o circunstancial para fazer

a crítica política e social das mazelas cometidas na capitania

de Minas Gerais.

Continuando o estudo da crônica desde os tempos remotos

no Brasil, chegamos ao Romantismo. É nessa época que a

influência da Revolução Industrial começa a ser sentida pelos

escritores brasileiros, pois tínhamos o crescimento da

população com o aparecimento das cidades, a urbanização e a

ascendência da burguesia.33

2.1. A crônica no jornal

Ao final da escola romântica, o folhetim já havia aparecido

22

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no Brasil. Seguindo as orientações de Marlyse Meyer, no texto

Voláteis e Versáteis. De variedades e folhetins se fez a

chronica34, buscamos entender as relações entre o folhetim e a

crônica e como o primeiro contribuiu para o surgimento do

gênero crônica no Brasil.

O folhetim nasceu na França no começo do século XIX e era

publicado na primeira página, no espaço do jornal chamado rez-

de-chaussée traduzido, no caso, como rodapé.

Quanto ao conteúdo dos folhetins, Meyer afirma que:

Aquele espaço vale-tudo suscita todas as formas e modalidades de diversão escrita: nele se contam piadas, se fala de crimes e monstros, se propõem charadas, se oferecem receitas de cozinha ou de beleza; aberto às novidades, nele se criticam as últimas peças, os livros recém-saídos, o esboço do Caderno B, em suma.35

Porém, folhetim não era somente o nome dado ao espaço do

rodapé do jornal, mas também ao romance publicado em partes no

mesmo lugar, que foi nomeado como folhetim-romance,

justificando-se assim a expressão: romance publicado em

folhetim.

No Brasil36, o folhetim começou com o nome de Variedades, que

passou do rodapé da página para dentro do jornal. Compreendia

várias coisas: traduções, resenhas, folhetins literários,

tiras, charges, palavras cruzadas, coluna social e outros tipos

de textos que tratavam de forma leve os assuntos do cotidiano,

23

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incluindo as crônicas.

À época, os jornais que incorporaram a idéia dos europeus,

em especial o Correio Mercantil, o Marmota e o Diário do Rio de

Janeiro, começaram a publicar o folhetim de variedades. Era

“[...]aberto a qualquer recheio, apelando tanto para o

acontecido como para o imaginário, livre o conteúdo, como é

livre e sem empostação a linguagem que o expressa.”37

Agora que os termos folhetim/crônica já foram bastante

esclarecidos, vamos retomar a questão da crônica nos jornais.

Ligada à grande imprensa, ela apareceu no Brasil no século XIX,

tirando proveito da ampla difusão, evolução e modernização dos

jornais na época.

A atividade jornalística naquele século, seguia o ritmo da

industrialização e da urbanização crescentes, juntamente com a

criação da consciência burguesa no Brasil. Com a transformação

do jornal em empresa, foram adotadas as ilustrações a pena, as

gravuras, os clichês fotográficos e aumentou-se o número de

páginas das edições. Tendo mais espaço, o jornal se encheu de

atrativos como: o noticiário, o artigo de fundo, as seções

ordinárias e a crônica, que virava matéria freqüente.38

Na época, a idéia do progresso e da industrialização,

principalmente no Rio de Janeiro, tomam conta da vida

cotidiana. Margarida Souza Neves, em Uma escrita do tempo:

24

Page 25: crônica a literatura nos jornais

memória, ordem e progresso nas crônicas cariocas, afirma que os

cronistas do século XIX viam no progresso, um projeto de futuro

sendo que suas crônicas se configuravam em metáforas da ordem e

do progresso. Eles tentavam, através de seus textos, entender

as transformações e mudanças pelas quais o país passava:39

[...]busca-se assim, de múltiplas formas, reconstruir a história, por uma releitura do passado como pela definição de uma meta comum de futuro, através de uma memória coletiva que se pretende nacional e que sublinha as descontinuidades representadas pela implantação da forma republicana por sobre as continuidades de uma sociedade marcada por seu caráter historicamente excludente e hierarquizador.40

Olavo Bilac era um dos que empolgava-se com a idéia de

renovação, mudança e progresso que ocorria naquele tempo, como

podemos constar no trecho que se segue:

Há poucos dias, as picaretas, entoando um hymno (sic) jubiloso, iniciaram os trabalhos na Avenida Central, pondo abaixo as primeiras casas, condemnadas (sic). No aluir das paredes, no ruir das pedras, no esfarelar do barro, havia um longo gemido. Era o gemido soturno a lamentoso do Passado, do Atraso, do Oppróbio (sic). A cidade colonial, inmunda (sic), retrógrada, emperrada nas velhas tradições, estava soluçando no soluçar d´aqueles materiaes (sic) apodrecidos que desabavam. Mas o hymno claro das picaretas abafava esse protesto impotente.41

Naquele século, os jornais eram lidos somente pelos homens

do governo e pela elite letrada, que era muito reduzida:

estudos mostram que o índice de alfabetização da população

brasileira em 1872 girava em torno de 1,56% e em 1920 em 7,9%.42

25

Page 26: crônica a literatura nos jornais

A crônica significou no Brasil, a abertura dos jornais para

novas camadas sociais,43 pois, apoiando-se na linguagem fácil,

rápida, breve e coloquial, circulava de boca em boca. Difundiu-

se também por ser um gênero popular mais próximo do leitor e

mais fácil de entender, por tratar de assuntos efêmeros:

pequenos fatos que aconteciam no cotidiano da cidade e a

crítica das pessoas da sociedade, tudo isso com uma linguagem

cheia de estilo, variedade e graça. “[A] crônica, por seu

estilo literário próprio como pelo suporte de sua difusão, o

jornal, atinge um número maior de leitores que qualquer outro

gênero.”44

O jornal no século XIX, cresceu sob a atmosfera romântica,

contribuindo para que o lirismo predominasse sobre a crônica

desde suas primeiras manifestações. A crônica era publicada

tradicionalmente aos domingos, pois tinha como objetivo

realçar, de forma suave, a informação de certos fatos da semana

(ou do mês), tornando-os acessíveis a todos, e também, por se

tratar de um dia em que as pessoas têm mais tempo livre e estão

dispostas a ler coisas leves e amenas, com os escritos versando

sobre os mais diversos assuntos: a política, o teatro, os

eventos sociais, os esportivos, os acontecimentos do cotidiano

e o universo íntimo de cada autor.

As crônicas falavam também do universo feminino,

26

Page 27: crônica a literatura nos jornais

contribuindo para criar um clima de educação e civilidade que

exerceu efeito sobre o refinamento e o progresso da vida social

brasileira.45

José de Alencar, como veremos mais adiante, foi um

importante cronista brasileiro. Por agora, é interessante

apenas notar que ele também se dedicava a escrever sobre e para

as mulheres. Em algumas de suas crônicas conversava diretamente

com as leitoras:

Estou hoje com bem pouca disposição para palestra; por isso, minha bela leitora, [o grifo é nosso] em vez de conversarmos, vou ler-vos alguma coisa bonita e agradável.O que há de ser? Uma página de Stendhal, um romance de Mery, uma poesia de Lamartine, ou algum trecho de Alfonso Karr?46

Conforme ressalta Brito Broca os jornais, naquele século,

eram uma forma dos escritores ganharem dinheiro e assim, terem

a possibilidade de exercer de forma mais tranqüila, o ofício de

escrever seus livros47; uma espécie de trabalho digno e ao mesmo

tempo era a chance de ter sempre seu nome em evidência, ainda

que em escritos de menos fôlego:

[...]não se pode negar que os jornais, proporcionando trabalho aos intelectuais, mesmo quando se tratava de simples rotina de redação, sem nenhum cunho literário, facilitava a vida de muitos deles, dando-lhes um second métier condigno, no qual podiam, certamente, criar ambiente para as atividades do escritor.48

27

Page 28: crônica a literatura nos jornais

José de Alencar e Machado de Assis, trouxeram para a crônica

os interesses do leitor brasileiro, o estudo da sociedade, os

hábitos corriqueiros e a necessidade Realista-Naturalista de

analisar casos patológicos individualmente.49

Agora sim, falaremos de José de Alencar. Ele atuou como

cronista no Correio Mercantil e foi nesse jornal que publicou

os folhetins intitulados Ao Correr da Pena, mais tarde reunidos

em livro com o mesmo nome. Ele deu à crônica um ar de respeito.

Fazia, com o mesmo tom, o folhetim da semana e a obra de ficção

que publicava na mesma folha. Como cronista, ele transformava o

sórdido e repulsivo da vida real em beleza, idealidade e

encantamento.50

Em suma a sua [de José de Alencar] coluna jornalística de comentários semanais tinha o aspecto de um bazar asiático, onde a imaginação poética dava imprevistas transfigurações às coisas mais vulgares ou prosaicas, por ser precisamente o que se exigia de um cronista naqueles ociosos tempos.51

As crônicas de Alencar, assim como a da maioria dos

cronistas, refletiam a idéia de prosperidade que tomava conta

do mundo. Era a época em que se inauguravam a iluminação a gás

e o Jóquei Clube. Companhias construtoras modificam as fachadas

das casas comerciais e das residências, além de mudar as

calçadas e pavimentação das ruas. O Rio respirava a influência

francesa. Alencar falava de tudo nos seus folhetins, de teatro

28

Page 29: crônica a literatura nos jornais

e de igreja, do sacro e do profano.52

Na crônica de José de Alencar, observamos o uso de grande

lirismo, subjetividade, coloquialismo e comentários leves, como

podemos constatar no trecho abaixo, em que Alencar justifica o

porquê do nome Ao Correr da Pena, para dar título a seus

escritos:

O título que leva este artigo me lembra um conto de fada que se passou não há muito tempo[...]Um belo dia, não sei de que ano, uma linda fada,[...]a poesia ou a imaginação, tomou-se de amores por um moço de talento[...] Ora, dizem que as fadas não podem sofrer a inconstância, no que lhes acho toda a razão; e por isso a fada de meu conto, temendo a rivalidade dos anjinhos cá deste mundo,[...]tomou as formas de uma pena, pena de cisne, linda como os amores, e entregou-se ao seu amante de corpo e alma.[...]Só vos direi[...]que, depois de muito sonho e de muita inspiração, a pena se lançava sobre o papel, deslizava docemente, brincava como uma fada que era, bordando as flores mais delicadas, destilando perfumes mais esquisitos que todos os perfumes do Oriente[...][...]Assim se passou muito tempo; mas já não há amores que durem sempre[...] Acabou o poema fantástico no fim de dois anos; e um dia o herói do meu conto,[...]lembrou-se de um amigo obscuro, e deu-lhe a sua pena de ouro. O outro aceitou-a como um depósito sagrado[...] Com efeito, a fada tinha sofrido uma mudança completa: quando a lançavam sobre a mesa, só fazia correr. Havia perdido as formas elegantes, os meneios feiticeiros, e deslizava rapidamente sobre o papel sem aquela graça e faceirice de outrora[...] Por fim de contas, o outro, depois de riscar muito papel e de rasgar muito original, convenceu-se que, a escrever alguma coisa com aquela fada que o aborrecia, não podia ser de outra maneira senão – Ao correr da pena.[...]53

José de Alencar não era sempre suave, como na crônica acima.

29

Page 30: crônica a literatura nos jornais

Em certas ocasiões era crítico, se inconformava e denunciava as

altas figuras da sociedade e da política. Exigia também a

limpeza na cidade, reclamava da lama presente nas ruas, dos

péssimos serviços públicos e dos hábitos mal-educados dos

cidadãos. Criticava a especulação desmedida, o jogo das bolsas

de valores e o nossos índices de atraso econômico54, como por

exemplo, no trecho abaixo:

[...]Hoje não aparecem mais desses fatos brilhantes de coragem e heroísmo. A época mudou: aos feitos de armas sucederam as conquistas da civilização e da indústria. O comércio se desenvolve; o espírito de empresa, servindo-se dos grandes capitais e das pequenas fortunas, promove o engrandecimento do pais, e prepara um futuro cheio de riqueza e de prosperidade.[...]Todo o mundo quer ações de companhias; quem as tem vende-as, quem não as tem compra-as. As cotações variam a cada momento, e sempre apresentando uma nova alta no preço. Não se conversa mais sobre outra coisa. Os agiotas farejam a criação de uma companhia; os especuladores estudam profundamente a idéia de alguma empresa gigantesca. [...]Este espírito da empresa e esta atividade comercial prometem sem dúvida alguma grandes resultados para o país; porém é necessário que o governo saiba dirigi-lo e aplicá-lo convenientemente; do contrário, em vez de benefícios, teremos de sofrer males incalculáveis.[...]O governo, pois, que chame a atenção do corpo legislativo sobre este assunto e que inicie um projeto de lei, no qual se adotem as medidas tomadas pelos Estados Unidos para promover a emigração... Não temos nada a invejar à América Inglesa em recursos naturais, em fertilidade do solo, em elementos de riqueza. O nosso clima é mais salubre; desde o sul ao norte temos no alto das nossas serras uma temperatura quase européia.[...]pensemos[...] que é levando por toda parte este título de cidadão brasileiro, que é recebendo na nossa

30

Page 31: crônica a literatura nos jornais

comunhão todos os irmãos que nos estendem a mão, que um dia faremos aquele nome grande e poderoso, respeitado da Europa e do mundo.55

Machado de Assis, assim como José de Alencar, abandonou o

estilo rebuscado da prosa literária e jornalística do século

XIX. O tratamento de seu texto é um divisor de águas em nossa

crônica: entre 1888 e 1889, ele escreveu uma série de textos

iniciados por Bons dias! na Gazeta de Notícias.56

Nessas crônicas, por causa de maior liberdade criativa,

observa-se a tendência de Machado de Assis para o

divertissement que chegava próximo do delírio. Falava de

diversos assuntos, passava do particular para o geral, voltava

do abstrato para o concreto, ia do atual ao clássico, do

pequeno para o grandioso, voltando logo em seguida, passava do

real para o imaginário, e vice-versa, às vezes

vertiginosamente, outras vezes com comicidade. É nisto que

consistia a técnica da composição machadiana57, e é o que

podemos notar na crônica abaixo:

BONS DIAS! Agora fale o senhor, que eu não tenho nada mais que lhe dizer. Já o saudei, graças à boa criação que Deus me deu[...] Eu, em menino fui sempre um primor de educação. Criou-me uma ama escrava; e, apesar de escrava e ama, nunca lhe pus a boca no seio para mamar.[...]Aos cinco anos[...] como já sabia ler, davam-nos no colégio A Pátria[...] A minha alma que nunca se deu

31

Page 32: crônica a literatura nos jornais

com política, dormia que era um gosto; mas os olhos não, esses iam por ali fora, risonhos, aprobatórios. Agora mesmo, lendo naquela folha que o governo é que deu o dinheiro com que os jornais fizeram as festas abolicionistas, pensam que, se tivesse de explicar-me, fá-lo-ia como a comissão da imprensa? Não[...] Nunca se deve desmentir ninguém. Eu diria que sim, que era verdade, que o governo tinha pago tudo[...] O redator ouvia tudo satisfeito...Podia citar casos honrosíssimos, como prova de boa criação. Um, deles nunca me há de esquecer, e é fresquinho. Estando há dias a almoçar com alguns amigos, percebi que alguma coisa os amargurava[...] Senão quando, com um modo delicado, perguntei o que é que tinham. Calaram-se; eu, como manda a boa criação, calei-me também e falei de outra cousa. Foi o mesmo que se os convidasse a pôr tudo em pratos limpos[...]Um dos convivas confessou que no meio das festas abolicionistas não aparecia o seu nome, outro que era o dele que não aparecia, outro que era o dele, e todos que os deles. Aqui é que eu quisera ser um homem malcriado. O menos que diria a todos, é que eles tanto trabalharam para a abolição dos escravos, como para a destruição de Nínive, ou para a morte de Sócrates[...] Eu[...] respondi que a história era um livro aberto, e a justiça a perpétua vigilante. Um dos convivas, dado a frases, gostou da última, pediu outra e um cálice de Alicante. Respondi, servindo o vinho, que as reparações póstumas eram mais certas que a vida, e mais indestrutíveis que a morte[...] Podia citar outros muitos casos de boa criação, realmente exemplares. Nunca dei piparotes nas pessoas que não conheço, não limpo a mão à parede, não vou bugiar, que é ofício feio, e ando sempre com tal cautela, que não piso os calos aos vizinhos. Tiro o chapéu, como fiz agora ao leitor; e dei-lhe os bons-dias do costume. Creio que não se pode exigir mais. Agora, o leitor que diga alguma cousa, se está para isso, ou não diga nada, e boas noites.58

Os textos de Machado apresentam elementos das crônicas

atuais: são prazerosos de se ler, repletos de humor, sarcasmo

32

Page 33: crônica a literatura nos jornais

sem se esquecer do lirismo. Era também o próprio intimismo

traduzido, como se pode observar pelo cumprimento que abria os

textos. O escritor, definia o folhetim como a fusão do útil e

do fútil, a associação do sério com o frívolo.

Para Afrânio Coutinho, Machado de Assis contribuiu para a

nossa literatura com grande número de crônicas. Elas refletiam

os acontecimentos do mundo e episódios da sociedade fluminense

a partir de 1859, quando escreveu em O Espelho. Seus escritos

estiveram presentes também em Diário do Rio de Janeiro, O

Futuro, A Semana Ilustrada, Ilustração Brasileira, O Cruzeiro e

Gazeta de Notícias. Sua obra folhetinesca reflete as

modificações do gênero, desde o Romantismo até o Realismo, com

passagens pelo Parnasianismo e Simbolismo.59

Quando começou a ser cronista, Machado de Assis freqüentava

os círculos da sociedade, onde colhia a matéria-prima para suas

crônicas: as reuniões sociais, o teatro, o parlamento.

Justificando Machado, Coutinho afirma que “a crônica exigia

naturalmente participação direta e movimentada na vida mundana,

de que era um eco ou espelho da imprensa.”60

Contemporâneo de Machado de Assis, temos João do Rio, cujo

verdadeiro nome era Paulo Barreto, um dos intelectuais

brasileiros mais polêmicos do início do século XIX. Se as

crônicas de Machado de Assis inovaram na sintaxe, as de João do

33

Page 34: crônica a literatura nos jornais

Rio foram responsáveis por preparar o terreno para moldar de

vez a linguagem ainda próxima do literário usada pelo

jornalismo na época. Ele foi um intensificador das

experimentações de Machado, que tinha percebido a necessidade

de maior contato com as fontes do acontecimento. João do Rio

fez dessa prática uma constante em sua atividade jornalística,

chegando mesmo a investigar os fatos.

Segundo Afrânio Coutinho, a imprensa, até então, mantinha-se

comum, vulgar e vaga. Possuía poucas páginas de texto, sempre

com artigo de fundo, imponente e retórico, influência do

Romantismo. Os jornais não se davam conta das grandes mudanças

que aconteciam no país, principalmente no Rio de Janeiro, onde

o presidente Rodrigues Alves reconstruía a cidade com largas

avenidas para os primeiros automóveis que apareciam. Surgia a

eletricidade, os bondes de burros eram substituídos pelos

modernos trilhos e o cinematógrafo formava filas na calçada,

pois todos queriam conhecer a novidade. O Rio civiliza-se foi a

frase que marcou a época.61

Podemos perceber a recriação de uma época vivida e como João

do Rio estava embebido do espírito do seu tempo, ao contar em

fragmentos de A Rua, como eram as ruas no Rio de Janeiro do

século XIX:

34

Page 35: crônica a literatura nos jornais

OH! SIM, as ruas têm alma. Há ruas honestas, ruas ambíguas, ruas sinistras, ruas nobres, delicadas, trágicas, depravadas, puras, infames, ruas sem histórias, ruas tão velhas que bastam para contar a evolução de uma cidade inteira, ruas guerreiras, revoltosas, medrosas, spleenéticas, esnobes, ruas aristocráticas, ruas amorosas, ruas covardes, que ficam sem pinga de sangue...Vede a rua do Ouvidor. É uma fanfarronada em pessoa, exagerando, mentindo, tomando parte em tudo, mas desertando, correndo os taipais das monstras à mais leve sombra de perigo. Êsse (sic) beco inferno de posse, de vaidade, de inveja, tem a especialidade da bravata. E, fatalmente oposicionista, criou o boato, o diz-se... aterrador e o fecha-fecha prudente. Começou por chamar-se Desvio do Mar. Por ela continua a passar para todos os desvios muita gente boa. No tempo em que os seus melhores prédios se alugavam modestamente por dez mil réis, era a rua do Gadelha. Podia ser ainda hoje a rua dos Gadelhas, atendendo ao número prodigioso de poetas nefelibatas que a infestam de cabelos e de versos. Um dia resolveu chamar-se do Ouvidor sem que o senado da câmara fosse ouvido. Chamou-se, como calunia e elogia, como insulta e aplaude, porque era preciso denominar o lugar em que todos falam de lugar do que ouve; e parece que cada nome usado foi como a antecipação moral de um dos aspectos atuais dessa irresponsável artéria da futilidade....62

Segundo Cremilda Medina em Notícia, um produto à venda,

muitos anos mais tarde, João do Rio, consciente do seu papel de

testemunhar as transformações ocorridas em nossa belle époque,

nos deu a definição moderna de jornalismo: a observação direta

sobre os fatos colhidos nas ruas para construir uma narrativa

dos acontecimentos. Por retratar um tempo em que a pressa

tomava conta da vida cotidiana, a obra de João do Rio parecia

efêmera, passageira, caleidoscópica e cinematográfica.63

35

Page 36: crônica a literatura nos jornais

De acordo com o próprio João do Rio:

Minha obra só poderá ser vista em conjunto dentro de dez anos. Aí verão, talvez, que eu tentei ser o reflexo tumultuário de transformações e que nos meus livros não está a obra-prima, mas que está em todos os seus aspectos morais, mentais, políticos, sociais, mundanos, ideológicos e míticos – a vida do Rio.64

Podemos dizer que a observação da realidade, a coleta de

informações por meio de entrevista, a ampliação da informação

nuclear com o aprofundamento do contexto pela humanização e

pela reconstituição histórica, o diálogo repórter-fonte, a

reportagem escrita em ritmo de narrativa e a utilização de

recursos literários são as heranças herdadas do jornalismo pós-

João do Rio.65 Foi o olhar do repórter que ele levou para a

crônica ao incorporar a figura do flâneur, aquele vagamundo

especial que tudo vê e sobre tudo revela um sentido. João do

Rio foi capaz de mostrar o que há por trás do trivial,

construir o painel de uma época através da crônica – esse

escrito marginal sobre futilidades... A crônica com ele

transforma-se em literatura na medida em que utilizava-se do

lirismo, da poesia e explorava a liberdade do cronista. Fez

mais: ampliou a crônica transformando-a em reportagem e

contribuindo dessa forma para dar à linguagem jornalística a

qualidade literária.

A esta altura, a crônica estava diferente, com cara de

36

Page 37: crônica a literatura nos jornais

ensaio. Um dos que contribuíram para que isso acontecesse foi o

já citado escritor Olavo Bilac, que foi o substituto de Machado

de Assis na coluna semanal da Gazeta de Notícias. Bilac

concentrava os seus comentários em determinado fato, dava às

suas crônicas um tom lírico humorístico e usava uma linguagem

leve, diferente do estilo rebuscado (parnasiano) de sua poesia

e prosa de conferências e discursos.

É a concentração da crônica em somente um assunto e a

linguagem que se aproxima do coloquial que vemos na crônica

Menor Perverso, de Olavo Bilac. Ele fala a respeito de um tema

que dominou os jornais da época, o assassinato de uma criança

por um menino de dez anos, tecendo comentários e sua visão

acerca do assunto. É interessante notar como o Brasil não mudou

nada, e que os argumentos que ele usa no século XIX, poderiam

ser transportados facilmente para o século XXI:

É este o título, com que aparece em todos os jornais a notícia de um caso triste, - uma criança de três anos assassinada por outra de dez, em condições que ainda não foram bem tiradas a limpo. Diz-se que o menor perverso ensopou em espírito de vinho as roupas da vítima e ateou-lhes fogo. Propositalmente? Parece impossível...Mas nada é impossível na vida.O fato é que, consumado o seu ato de perversidade (ou de imprudência?) o pequeno fugiu[...] E os jornais[...] pedem[...] que se castigue esse precoce facínora, cujos instintos precisam ser refreados. Que se castigue, como? Metendo-o na Correção? Mandando-o para o Acre? fuzilando-o?[...]Um criminoso de dez anos não é positivamente um criminoso... Se é verdade que esse menino

37

Page 38: crônica a literatura nos jornais

conscientemente praticou a maldade de que é acusado, o nosso dever não é castigá-lo: é salvá-lo de si mesmo[...] Como? Naturalmente, dando-lhe uma educação especial, uma certa disciplina de espírito. Mas onde? É aqui que surge a dificuldade, e é aqui que somos forçados a reconhecer que, se estamos muito adiantados em matéria de politicagem e parolagem, ainda estamos atrasadíssimos em matéria de verdadeira civilização...Já sei que há por aí uma Escola Correcional. Mas, ainda há pouco tempo, o que se soube da vida íntima dessa escola serviu apenas para mostrar que, lá dentro, os pequenos maus, pelo vício da organização do estabelecimento, estão arriscados a ficar cada vez piores.[...]Tive também muita pena da pobre criança de três anos, morta no meio de horríveis torturas. Mas tenho também muita pena dessa outra criança, que uma brincadeira funesta (ou uma inconsciente moléstia moral, perfeitamente curável) levou à prática de um ato tão cruel. Nesse pequeno infeliz, que os jornais consideram um grande criminoso, há um homem que se vai perder, por nossa culpa, - porque não lhe podemos dar o tratamento que sua enfermidade requer...66

Pela influência do Parnasianismo, a crônica preocupava-se

muito com a forma, enquanto os simbolistas faziam o oposto:

divagavam muito e isso tornava a leitura do texto um pouco

cansativa como podemos observar no trecho da Crônica

paudarquense de Augusto dos Anjos:

Houve na Idade Média quem, materializando as bases precípuas do panteismo (sic) psicológico, quisesse uniformizar as inteligências humanas, sob a mesma trama de identidade, a ponto de lhes não reconhecer a menor brecha discrepante, nem conferir a uma certa parte, porventura mais fecunda em serviços, qualquer insígnia de predomínio.Destarte a Humanidade, em sua essência, constituiria um só indivíduo guardando infalivelmente com a supina exatidão dos planos geométricos as mesmas tendências

38

Page 39: crônica a literatura nos jornais

absolutas a uma bem equilibrada engrenagem de pensadores homogêneos, verdadeiras agulhas fixas, sem alterações e desvios quiçá atentatórios do nivelamento geral.67

O Modernismo no Brasil influenciou a crônica. Nos anos de

1910 a 1920 ou seja, no período pré-modernista, a literatura

brasileira tinha a corrente conservadora, que era muito ligada

ao Parnasianismo e a outra, que era mais livre e tinha em si a

semente da nova estética literária que se afirmaria na Semana

de 22. A crônica modernista, era irreverente e sem o

rebuscamento da linguagem acadêmica, continha críticas e

impressões pessoais, e ainda, buscava aproximar-se da realidade

nacional.68

Tomemos como exemplo da crônica modernista, aquela produzida

por Mário de Andrade no final dos anos 20 e começo dos anos 30,

no jornal Ilustração Brazileira. Vemos um cronista utilizando

elementos do coloquialismo ao recriar fatos reais e sobretudo,

entusiasmado com a visão da São Paulo moderna do século XX:69

(...)São Paulo, como centro que é bastante largo, prescinde já de applausos incondicionaes (sic). A sua vida já repete, embora com menor fulgor e às vezes como um reflexo, o que vae (sic) pelas cidades adultas do velho mundo. Não cabem mais razões para a palma sempre forte ou o prêmio sempre igual.A cidade palpita num esto incessante de progresso e civilização. Nella (sic) formiga um povo multifário, internacional. Tudo são contrastes, neologismos. Os habitantes movem-se ageis (sic), a lingua é molle (sic), saboreada.70

39

Page 40: crônica a literatura nos jornais

Evanir Brunelli observa que, para os cronistas, esta

ascendência do nacionalismo era importante para que pudessem

dar margem às inovações. A liberdade do cronista, iniciada por

João do Rio, era cada vez maior devido à modificação da

linguagem, fruto do Modernismo. Nos anos 30, os cronistas

discorriam sobre os mais diversos assuntos, falavam até mesmo

3BRUNELLI, E. 1988: p.258

4BRUNELLI, E. 1988: p.259

5CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.13

6Cf. MOISÉS, M. 1978: p.245

7Cf. COUTINHO, A. 1999: p.121

8Cf. PINO, D. del. et al. 1980: p.281

9Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.5-6

10Cf. DAMULAKIS, G. (s.d.)

11DAMULAKIS, G. (s.d.)

12Cf. COUTINHO, A. 1999: p.121

13CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.15

14MOISÉS, M. 1978: p.246

15LESSA, I. 1999

16SÁ, J. de 1987: p.5

17Cf. CÂNDIDO, A. et al. 1992. p.13-20

18RONCARI, L. 1995: p.29

19RONCARI, L. 1995: p.30-31

40

Page 41: crônica a literatura nos jornais

do nosso passado colonial e histórico, recuperando a memória e

o tempo.71

A linguagem jornalística foi contagiada pela crônica e

modificou-se. É nessa época que surge Rubem Braga. Ele relatava

suas experiências da infância, do interior e do meio rural

20Ibidem, p.32

21Cf. SÁ, J. de 1987: p.7

22Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.7

23Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.7-8

24ARNT, R. 1997: p.65

25Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.8

26Cf. ROMERO, S. 1980: p.350-351

27ROMERO, S. 1980: p.354

28MATOS, G. de. 1985: p.93-94

29Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.11

30GONZAGA, T. A. 1982 (s.p.)

31ANDRADE, F. T. de. 1987: p.28

32Cf. RONCARI, L. 1995: p.26

33Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.12

34Cf. CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.96

35CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.96

36A crônica, propriamente dita, começou no Brasil com Francisco

Otaviano de Almeida Rosa no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro em

41

Page 42: crônica a literatura nos jornais

através de um eu contador de causos, falando até mesmo da

monotonia e da falta de assunto quando não tinha mais nada do

que falar.

Rubem Braga ocupa lugar muito importante na história da

crônica brasileira, pelo fato de ter se tornando conhecido

2 de dezembro de 1852, com a seção A Semana. Cf. COUTINHO, A. 1999:

p.124

37CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.105

38Cf. COUTINHO, A. 1999: p.123

39Cf. CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.78

40CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.78

41Ibidem, p.87

42Cf. CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.79

43Cf. FERNANDES, P. (s.d.)

44CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.80

45Cf. COUTINHO, A. 1999: p.123

46ALENCAR, J. de 1995: p.126-127

47Cf. BROCA, B. 1956: p.216

48BROCA, B. 1956: p.216

49Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.15

50Cf. COUTINHO, A. 1999: p.124-125

51COUTINHO, A. 1999: p.125

52Cf. ALENCAR, J. de 1955: p.17

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Page 43: crônica a literatura nos jornais

somente com a produção desse gênero. Ele é a representação do

que melhor se tem produzido na crônica lírica, sendo capaz de

buscar na difícil realidade do dia-a-dia e nos pequenos

acontecimentos, o traço lírico e emotivo. Como características

de seu texto, temos a simplicidade, a variedade de temas, o

53ALENCAR, J. de. 1995: p.15-17

54Cf. CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.309

55ALENCAR, J. de. (s.d.): p.101-106

56Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.16

57ASSIS, M. 1959: p.326-327

58ASSIS, M. 1997: p.14-16

59Cf. COUTINHO, A. 1999: p.126

60COUTINHO, A. 1999: p.126

61Cf.COUTINHO, A. 1999: p.129

62RIO, J. do. 1991: p.7-8

63Cf. MEDINA, C. 1978: p.67-68

64BARBOSA. A. R., CAVALHEIRO, E. 1955: (s.p.)

65Cf. MEDINA, C. 1978: p.70

66BILAC, O. 1997: p.737-738

67ABDALA JÚNIOR, B., CAMPEDELLI, S. Y., 1999: p.162

68Cf. FERNANDES, P. (s.d.)

69Cf. CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.165-188

70CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.176-177

43

Page 44: crônica a literatura nos jornais

pitoresco e o clima de melancolia. Foi capaz de aprofundar-se

em si mesmo trazendo-nos um eu que nos fala.

O uso do lirismo e da subjetividade ao utilizar uma simples

notícia de jornal como pretexto para escrever sua crônica e o

aprofundamento do eu do cronista, é o que podemos constatar na

crônica Flor-de-maio, de Rubem Braga:

Entre tantas notícias do jornal - o crime de Sacopã, o disco voador em Bagé, a nova droga antituberculosa, o andaime que caiu, o homem que matou outro com machado e com foice, o possível aumento do pão, a angústia dos Barnabés – há uma pequenina nota de três linhas, que nem todos os jornais publicaram.[...]É assinada pelo senhor diretor do Jardim Botânico, e nos informa gravemente que a partir do dia 27 vale a pena visitar o Jardim, porque a planta chamada flor-de-maio está, efetivamente, em flor.Meu primeiro movimento, ao ler esse delicado convite, foi deixar a mesa de redação e me dirigir ao Jardim Botânico, contemplar a flor e cumprimentar a administração do horto pelo feliz evento. Mas ainda havia muita coisa para ler e escrever, telefonemas a dar, providências a tomar. Agora, já desce a noite, e as plantas em flor devem ser vistas pela manhã ou à tarde, quando há sol – ou mesmo quando a chuva despenca e elas soluçam no vento, e choram gotas e flores no chão.[...]No fundo, a minha secreta esperança é de que estas linhas sejam lidas por alguém – uma pessoa melhor do que eu, alguma criatura correta e simples que tire desta crônica a sua única substância, a informação precisa e preciosa: do dia 27 em diante as flores-de-maio do Jardim Botânico estão gloriosamente em flor. [...]Se entre vós houver essa criatura, e ela souber por mim a notícia, e for, então eu vos direi que nem tudo está perdido, e que vale a pena viver entre tantos sacopãs de paixões desgraçadas e tantas COFAPs de preços irritantes; que a humanidade possivelmente ainda poderá ser salva, e que às vezes ainda vale a

44

Page 45: crônica a literatura nos jornais

pena escrever uma crônica.72

Os cronistas nos anos 30 surgiram apoiados na modernização

da imprensa nesta época, que alcançava um maior número de

leitores e lançava novas publicações como as revistas O

Cruzeiro, A Gazeta Esportiva, A Revista da Semana. Os jornais O

Globo, Diário Carioca, Diário Nacional e Diário de S. Paulo,

procuravam mostrar uma idéia mais real do Brasil. Com essa

evolução da imprensa, a crônica ganhava espaço certo nos

jornais de todos os lugares do país.

A crônica tomaria grande força com a Geração de 40/45 com o

já citado Rubem Braga, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino,

Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de Moraes e depois com

Cecília Meireles, Stanislaw Ponte Preta, Clarice Lispector e

muitos outros, que neste trabalho, esporadicamente, usaremos

suas crônicas como exemplos.

2.2. A linguagem da crônica

Para fazermos um estudo da linguagem da crônica, é

importante lembrar que a observação direta é o primeiro ponto

para que o cronista registre os fatos, fazendo com que até o

mais efêmero e sutil acontecimento permaneça em nossa memória.

As crônicas, como estamos percebendo, apresentam linguagem

simples, espontânea, situada entre o oral e o literário, sendo,

45

Page 46: crônica a literatura nos jornais

dessa forma, um gênero mais popular, por estar mais próximo do

receptor da mensagem, no caso o leitor.

[...]o estilo do cronista deve tender para as formas simples e, sobretudo, para o tom comunicativo, de conversa, de bate-papo. Por esse modo haverá sempre possibilidade de um diálogo mais ou menos permanente entre o cronista e o leitor; em caso contrário, os seus comentários e reflexões correrão sempre o risco de perder-se no ar.73

Há uma aproximação maior entre as normas da língua que se

escreve e a que se fala, resultando no coloquialismo, em que o

fato observado pelo cronista toma uma dimensão inovadora,

recriadora do real.

Por ser veiculada no jornal, a crônica absorve esse lado

passageiro, diário e periódico e é por isso que assume essa

escrita simples. Assim, a crônica também dirige-se a leitores

apressados, viventes no mundo moderno e o cronista, como o

jornalista, precisa adequar-se a esse ritmo acelerado:

A necessidade de escrever às pressas para atender à demanda de originais por parte da oficina, a intranqüilidade das salas de redação que obriga a todo instante a interrupção do serviço, ora para satisfazer a uma pergunta, ora para receber uma visita, tudo isto perturba gravemente as lucubrações cerebrais.74

Temos em trechos de O exercício da crônica, de Vinícius de

Moraes referências a essa rapidez com que precisa se escrever

a crônica, além de características da linguagem desse gênero:

46

Page 47: crônica a literatura nos jornais

O cronista trabalha com um instrumento de grande divulgação, influência e prestígio, que é a palavra impressa. Um jornal, por menos que seja, é um veículo de idéias que são lidas, meditadas e observadas por uma determinada corrente de pensamento formada à sua volta. [...]A crônica é matéria tácita de leitura, que desafoga o leitor da tensão do jornal e lhe estimula um pouco a função do sonho e uma certa disponibilidade dentro de um cotidiano[...]Daí a serenidade do ofício do cronista e a freqüência com que ele, sob a pressão da tirania diária, aplica-lhe balões de oxigênio[...] Sua obrigação [do cronista] é ser leve, nunca vago; íntimo, nunca intimista; claro e preciso, nunca pessimista. Sua crônica é um copo d’água em que todos bebem, e a água há de ser fresca, limpa, luminosa para a satisfação real dos que nela matam a sede.[...]75

Vinícius de Moraes coloca que a crônica utiliza-se da palavra

impressa como meio de alcançar seu leitor e assim contribui

para formar opiniões. Imbuída desse dever, deve ser clara,

límpida, leve e sobretudo, funcionar como uma válvula de

escape, uma fuga da realidade, um deleite, mesmo quando é

produzida sob a pressão do jornalismo diário.

A crônica, geralmente, é um texto curto e narrado na

primeira pessoa, como se o escritor estivesse dialogando com o

leitor, como vimos, por exemplo, com José de Alencar ao se

referir diretamente às suas leitoras; Machado de Assis ao

cumprimentar com bons dias os seus leitores e Rubem Braga ao

convidar os mesmos a irem ao Jardim Botânico para visitar a

flor-de-maio. Isso faz com que a crônica apresente uma ótica

47

Page 48: crônica a literatura nos jornais

própria de determinado assunto: a visão do cronista, que

transmite ao leitor seu modo de pensar o mundo e expõe sua

forma pessoal de compreender os acontecimentos à sua volta.

Segundo Afrânio Coutinho, a crônica deve usar a linguagem da

atualidade, podendo utilizar os idiomatismos, epítetos

circunstanciais e certos jogos de palavras que se formam e logo

desaparecem para refletir o espírito da época.76 Em concordância

com Coutinho, Proença Filho77 salienta que a língua é uma

criação social que está em permanente mutação, acompanhando as

mudanças e transformações da sociedade, que a coloca como

instrumento primeiro de comunicação.

É a utilização do coloquialismo no diálogo com as leitoras,

e de um assunto nacional (o jeitinho brasileiro), que podemos

ver na crônica Vamos acabar com esta folga de Stanislaw Ponte

Preta:

O negócio aconteceu num café. Tinha uma porção de sujeitos, sentados nesse café, tomando umas e outras. Havia brasileiros, portugueses, franceses, argelinos, alemães, o diabo.De repente, um alemão forte pra cachorro levantou e gritou que não via homem pra ele ali dentro. Houve a surpresa inicial, motivada pela provocação e logo um turco, tão forte como o alemão, levantou-se de lá e perguntou:— Isso é comigo?— Pode ser com você também — respondeu o alemão.Aí então o turco avançou para o alemão e levou uma traulitada tão segura que caiu no chão. Vai daí o alemão repetiu que não havia homem ali dentro pra ele. Queimou-se então um português que era maior ainda do

48

Page 49: crônica a literatura nos jornais

que o turco. Queimou-se e não conversou. Partiu para cima do alemão e não teve outra sorte.[...] Até que, lá do canto do café levantou-se um brasileiro magrinho, cheio de picardia para perguntar, como os outros:— Isso é comigo?O alemão voltou a dizer que podia ser. Então o brasileiro deu um sorriso cheio de bossa e veio vindo gingando assim pro lado do alemão. Parou perto, balançou o corpo e... pimba! O alemão deu-lhe uma porrada na cabeça com tanta força que quase desmonta o brasileiro.Como, minha senhora? [o grifo é nosso] Qual é o fim da história? Pois a história termina aí, madame. Termina aí que é pros brasileiros perderem essa mania de pisar macio e pensar que são mais malandros do que os outros.78

Hoje, presente nos jornais, revistas e profusa na Internet

temos a crônica literária tratando dos mais diversos assuntos,

como veremos adiante, quando falarmos das diferentes espécies

de crônica. Por ora, ficamos com o tema que se segue: a

literatura no jornalismo, tendo na crônica uma forma de

expressão dessa presença.

Segundo Hélio Consolaro em Jornalismo e Literatura: dois

irmãos que se rejeitam, praticamente o único resquício de

literatura no jornal é a crônica:

A crônica foi o que sobrou de literatura no jornal depois que os jornalistas, com formação específica, criaram a reserva de mercado, intelectuais e escritores fugiram dos jornais, mas ainda assim o resquício, o cronista, é visto como um elemento estranho nas redações. Um mal necessário.79

49

Page 50: crônica a literatura nos jornais

3. A LITERATURA NO JORNALISMO ATRAVÉS DA CRÔNICA

Para entender a crônica como o aspecto literário no jornal,

temos de fazer uma breve análise do que é o jornalismo.

O jornalismo é, em um conceito amplo, a informação de

idéias, situações e acontecimentos da atualidade que interessa

à coletividade e são transmitidos com uma certa periodicidade.

50

Page 51: crônica a literatura nos jornais

É uma ciência que tem a intenção de ampliar os conhecimentos e

orientar o público na tomada de opiniões, buscando ainda,

promover o bem comum.

O jornalismo moderno, possuidor de tais características,

é um produto típico das sociedades urbanas e industrializadas.

Ampliando a feição que tomou a partir do século XIX, quando

começou a se tornar um produto para atingir as massas, é

(re)produzido em larga escala. Por ser um produto da sociedade

urbanizada e industrializada que vivemos, conta com recursos

tecnológicos que venceram o tempo e o espaço. Esses recursos

colaboram para realizar a atividade jornalística de forma muito

acelerada, já que o ritmo da sociedade e do mercado impõem essa

velocidade.

Exatamente por essas características, achamos que o

jornalismo praticado atualmente é pobre, as notícias são

tratadas de forma breve e superficial e que a informação, que

precisa ser transmitida de forma rápida, objetiva acaba por se

tornar sem aprofundamento, enfim, informando pouco e não

formando qualquer opinião pública sólida.

De acordo com Cremilda Medina em Notícia, um produto

à venda, o jornalismo é fruto de uma sociedade urbana-

industrial e da cultura de massa e por conta disso, é produzido

para ser efêmero:

51

Page 52: crônica a literatura nos jornais

[...]os mass media produzem um fluxo contínuo de mensagens de toda espécie, de todos os sentidos, dirigindo sem esforço e sem duração os fragmentos de conhecimentos disparatados, perpetuamente submetidos ao esquecimento. Vista no complexo da comunicação de massa, a mensagem jornalística é realmente um dos produtos de consumo da indústria cultural.80

Ainda segundo Medina, a incessante produção de

informações rápidas e objetivas, causam a perda da imaginação e

da espontaneidade do consumidor. Os produtos culturais acabam

com o trabalho de pensar do receptor, que deve consumi-los

velozmente, ou então, corre o risco de não acompanhar os fatos,

que acontecem rapidamente na sua frente.81

Clóvis Rossi em O que é jornalismo, também atenta para o

fato que por causa da padronização do jornalismo moderno,

muitos profissionais apoiam-se somente nas regras do fazer

jornalístico e esquecem-se do mais importante, construir um

texto gramaticalmente correto e interessante de se ler:

O esquematismo exagerado conduziu a tal padronização que repórteres e redatores deixaram de ter como característica central o domínio do idioma, de seu próprio estilo pessoal e da melhor maneira de captar o interesse do leitor (conduzindo-o a ler todo o texto) para se transformarem em especialistas em uma técnica: a de redigir informações que respondam as seis perguntas fundamentais, de preferência sintetizando-as no lead ou na abertura da matéria.82

Exatamente por essas características apontadas por Medina

e por Rossi, cremos que o jornalismo acelerado, fugaz, rápido

52

Page 53: crônica a literatura nos jornais

que conhecemos hoje, não dá espaço para que a literatura possa

atuar em conjunto com ele. A não ser na crônica, a literatura

praticamente não encontra lugar no jornalismo.

Essa exclusão da literatura no jornalismo, advém do fato

de que a primeira trabalha com a criação artística através da

palavra, com a multiplicidade interpretativa, com a elaboração

estética textual, que geralmente, não cabem no jornalismo, já

que este, ao contrário da literatura, tem como fundamento a

objetividade, a comprovação dos fatos, a busca da verdade,

utilizando uma linguagem fácil, rápida e acessível a todos e,

sobretudo niveladora e capaz de ser apenas instrumento da

informação, nem sempre levando em conta o teor crítico

escondido por detrás da realidade.

Artur da Távola na crônica Há duas mil e tantas

crônicas... publicada no jornal O Globo em 05.11.1978, refere-

se ao aspecto da crônica como a literatura do jornal e sua

inalienável ligação com o tempo, trazendo-nos uma bonita

homenagem ao gênero crônica:

[...]A crônica é o samba da literatura. Pode dizer o mesmo que a Sinfonia. Mas faz aos poucos. Simples. Para todos. No volume diário de oferta de leitura, a crônica é, ao mesmo tempo: a poesia, o ensaio, a crítica, o registro histórico, o factual, o apontamento, a filosofia, o flagrante, o miniconto, o retrato, o testemunho, a opinião, o depoimento, a análise, a interpretação, o humor. Tudo isso ela contém, a polivalente.

53

Page 54: crônica a literatura nos jornais

[...]Não conseguimos viver sem registrar a dor, o encanto, o riso, o escárneo, a ironia, a lágrima, a capacidade de pensar sobre o contingente e sobre o necessário. A esperança, nossa guia.A crônica é tímida e perseverante. Não se engalana com os grandes edifícios da literatura; mas pode conter alguns dos seus melhores momentos. Não se enfeita com os altos sistemas de pensamento; mas pode conter a filosofia do quotidiano e da vida que passa. Não se empavona com a erudição dos tratados; mas pode trazer a agudeza de percepção dos bons ensaios.[...]Amo-te crônica, gênero menor mas que permite a possibilidade de um encontro diário com o outro ser. Amo as tuas limitações, o teu espaço reduzido, o esforço de pôr numa frase vivências que levaram anos e dores para ficar claras e conhecidas.[...]A crônica é o ar da respiração, feito som, palavra, frase ilusão e esperanças. A crônica é a permanente espera do encontro do eu e do outro no mesmo instante de afinidade e revelação.83

Artur da Távola expressa nesta crônica, tudo o que já

dissemos a respeito do assunto. É a crônica a literatura no

jornal, e ao mesmo tempo que é simples e breve, também é

múltipla, podendo abrigar tudo o que o cronista desejar: pode

ser poética, emitir opinião, filosofar, ensaiar, registrar a

história, utilizar personagens ou humor e pode, ainda, misturar

isso tudo e através desse mix de coisas, comunicar a poesia da

vida e retratar um tempo, como vimos com os cronistas do século

XIX. Machado de Assis, José de Alencar, Olavo Bilac, João do

Rio e tantos outros, deixaram crônicas que na atualidade podem

ser vistas como documentos na medida em que servem, melhor do

54

Page 55: crônica a literatura nos jornais

que os estudos pomposos e científicos, para mostrar como era a

vida do Rio de Janeiro naquela época de transformações.

De acordo com Evanir Brunelli, o meio jornalístico da

atualidade admite que a subjetividade (elemento literário)

possa fazer com que as reportagens e matérias jornalísticas se

tornem mais criativas, prazerosas de se ler e interessantes -

no que nós também concordamos. Seriam as produções

jornalísticas com influência literária, outros afirmam se

tratar do jornalismo literário.84

Sabemos que o jornalismo impresso concorre com o rádio, a

televisão e a Internet pela transmissão da notícia. Pelas

características dos meios, o rádio é o mais fugaz de todos, as

notícias são breves, acessíveis, rápidas, podendo ser

absorvidas enquanto se faz outra atividade, sendo por isso

necessária a repetição das informações; a TV trabalha com a

imagem aliada ao texto, sendo importante que este seja claro,

conciso, breve; a Internet também tem como principal

característica a brevidade e objetividade; já o jornalismo

impresso, dentre todos, tem um limite um pouco maior de tempo

para tratar a notícia, podendo recuperá-la e fazer um certo

aprofundamento do acontecimento. Aí está o ponto em que poderia

se aliar jornalismo e literatura, para a construção de um texto

polêmico, criativo e permanente, sendo talvez, o desafio

55

Page 56: crônica a literatura nos jornais

necessário para o jornalismo impresso: o de superar o

imediatismo e construir algo mais interessante, que não

estivesse tão à mercê do relógio, do tempo e da velocidade.

Apenas para se ter uma idéia de como a discussão da

possibilidade do jornalismo entrar ou não no campo da

literatura é longa, trazemos duas opiniões diversas a respeito

do assunto. Uma é de Alceu Amoroso Lima e outra, de Carlos

Heitor Cony.

Alceu Amoroso Lima acredita que o jornalismo e a

literatura têm suas inter-relações, podendo o primeiro, ser

considerado um gênero literário:

[...]enquanto o jornalismo utilizar a palavra como simples utilidade, então será tampouco literatura como o caso da palavra numa aula de ciência. Jornalismo só é literatura, enquanto empregar a expressão verbal com ênfase nos meios de expressão... O jornalismo não é literatura pura, sem dúvida, como é um poema, no qual a palavra vale apenas como palavra (embora nele se contenha o mundo) e não como transmissão de um pensamento ou de uma mensagem. O jornalismo tem sempre, por natureza... um fim que transcende ao meio. O jornalismo, por conseguinte, tem todos os elementos que lhe permitem a entrada no campo da literatura.85

Amoroso Lima acredita que o jornalismo, quando usar a

palavra não como um meio, mas com um fim em si própria, será

literatura, pois para ele, literatura é toda expressão verbal

com ênfase nos meios de expressão. Exemplificando: na aula de

ciência, a palavra serve apenas como um meio através do qual o

56

Page 57: crônica a literatura nos jornais

professor explica sua matéria. Se o jornalismo utiliza a

palavra somente para informar um fato, não é literatura, mas se

emprega a arte da palavra, ou seja, se faz uso do subjetivismo

e dos elementos literários, pode ser considerado um gênero

literário chamado prosa de apreciação dos acontecimentos, de

acordo com a classificação do próprio estudioso.

Discordando de Amoroso Lima, Carlos Heitor Cony é um dos

que não concebem o jornalismo como um gênero literário. Essa

opinião é expressa em A crônica como gênero do jornalismo e da

literatura, publicada na Folha de São Paulo em 06.12.2002:

O jornal é como um trem - dizia Kafka. Tem que sair [...]todos os dias[...] Com assunto ou sem assunto, tem que ocupar todas as suas páginas, seja com anúncios, ilustrações ou textos paralelos, desvinculados de sua função natural, que é a notícia[...] O veículo-jornal, ao contrário do veículo-trem, não pode sair com lugares não ocupados. E, para encher[...] cada edição, apelou-se, entre outras coisas, para a crônica[...] Nos séculos 16 e 17, a crônica era um gênero-bonde, um gênero-ônibus, onde tudo cabia com o nome de crônica. Qualquer relato levava o nome de crônica[...] cobrindo um período, sendo, portanto, um periódico[...] A literatura é, em essência, o oposto do período, do tempo. Ela procura ser intemporal, sem vínculo com a data - nada mais frustrante do que a literatura datada. Daí a conclusão de que a crônica, como gênero jornalístico ou como gênero literário, é uma contrafação. Os mais radicais poderão considerá-la subjornalismo ou subliteratura[...] Resumindo a ópera: pode-se concluir que não há jornalismo literário. Há jornalismo e há literatura. Funcionam por meio de sinais ou símbolos, que são as palavras compostas por letras, mas nem todas as letras formam necessariamente aquilo que se compreende como literatura...86

57

Page 58: crônica a literatura nos jornais

Cony coloca que pelo fato do jornalismo e da crônica

serem datados, periódicos, não podem ser literatura, já que

esta caracteriza-se por sua não-efemeridade. Conclui que não há

jornalismo literário e sim jornalismo e literatura. Discordamos

deste no que toca ao fato de essas duas ciências não poderem se

intercambiarem e portanto, ser inconcebível o jornalismo

literário. O fato de o jornalismo brasileiro na maioria das

vezes só se ater em notícias urgentes, prestação de serviços e

outras matérias menores é uma questão de opção dos veículos,

não de inexistência do jornalismo literário.

Acreditamos, que o jornalismo, por se utilizar da

palavra, assim como a literatura, às vezes, pode ser produzido

visando alcançar o status de um jornalismo literário. O uso do

termo às vezes se justifica, pois assim como Cony, também

acreditamos que nem tudo aquilo que está presente no jornal é

literatura, pelo contrário, é cada vez mais difícil encontrar,

no jornalismo diário, textos bem produzidos e com caráter

literário.

Entendemos como jornalismo literário, o texto que se

utiliza da investigação para o aprofundamento das questões

abordadas (fazendo aqui um paralelo como o jornalismo

investigativo), nos quais não há apenas a perspicácia do autor

58

Page 59: crônica a literatura nos jornais

para julgar os fatos, mas também seu talento, que o leva a

criar textos perenes (talvez perdidos em sua maioria apenas

pela utilização comum do jornal, que acaba nos armazéns ou na

reciclagem). Dessa forma, mesmo uma matéria publicada há muito

tempo no jornal, por seu caráter literário, alcança a

perenidade e se configura em uma obra de literatura.

Porém, como tema do trabalho é a crônica e não a

influência da literatura no jornalismo (entretanto justifica-

se, já que a crônica é expressão literária no jornal), voltemos

ao objeto de pesquisa desta monografia, buscando definir a

crônica como um gênero literário e abordando as divergências em

torno desse assunto. Seria a crônica realmente um gênero

literário ou poderia também ser definida como jornalística ou

mesmo híbrida?

3.1. A crônica como gênero literário

Quanto à questão da classificação da crônica, já vimos logo

no segundo capítulo, a afirmação de Coutinho de que a crônica é

um gênero literário que tem bastante relação com o jornalismo.

59

Page 60: crônica a literatura nos jornais

Retomamos esta definição por ser imprescindível para entender a

crônica, já que alguns autores se posicionam da mesma forma.

Proença Filho diz que a crônica situa-se entre o literário e o

não-literário, retirando sua configuração da dinâmica do tempo,

liberando-se dos limites que ele impõe. Constrói-se dos fatos e

comentários do autor sobre a realidade próxima ou distante, mas

sempre a partir de uma ótica atual.87

Massaud Moisés que também acredita que a crônica é um gênero

que possui em si os dois lados, jornalismo e literatura:

Ambígua, duma ambigüidade irredutível, de onde extrai seus defeitos e qualidades, a crônica move-se entre ser no e para o jornal, uma vez que se destina, inicial e precipuamente, a ser lida no jornal ou revista. Difere, porém, da matéria substancialmente jornalística naquilo em que, apesar de fazer do cotidiano o seu húmus permanente, não visa à mera informação: o seu objetivo, confesso ou não, reside em transcender o dia-a-dia pela universalização de suas virtualidades latentes.88

A nosso ver, a crônica configura-se como um gênero

literário, pois, baseada na livre atuação do cronista, este

pode criar bons quadros de costumes, preenchendo assim as

grandes narrativas da história oficial, com registros das

pequenas circunstâncias que realmente poderão nos fazer

compreender os fatos históricos.

Porém, muitos críticos se recusam a ver a crônica como algo

durável e permanente (caráter da literatura tradicional),

60

Page 61: crônica a literatura nos jornais

considerando-a uma arte menor. Quanto ao fato de ser tratada

como um gênero menor, Antônio Cândido concorda com essa

nomenclatura, mas ao invés de ver isso como uma coisa ruim,

acha que é um fator positivo porque assim ela é acessível.

Qualquer jornal, revista ou publicação, por mais ínfimos que

sejam, na maioria das vezes, abrem espaço para ela:

Graças a Deus – seria o caso de dizer, porque sendo assim ela fica perto de nós. E para muitos pode servir de caminho não apenas para a vida, que ela serve de perto, mas para a literatura[...]89

A crônica só será considerada um gênero literário quando

tiver qualidade literária. A linguagem literária seria aquela

que está a serviço da criação artística. O texto da literatura

é um objeto de linguagem em que se juntam a representação de

realidades típicas, sociais e emocionais tendo como meio a

palavra configurada como objeto estético. O texto repercute nos

leitores na medida em que revele emoções profundas, iguais as

que existem em nós, como seres sociais. O fenômeno literário se

produz na inter-relação entre autor/texto/leitor.90

A título de exemplo, na crônica O grito de Clarice

Lispector, percebemos um grande grau de emoção e subjetivismo,

com ela chegando mesmo a ser intimista e falando de suas dores

mais profundas:

Sei que o que escrevo aqui não se pode chamar de crônica nem de coluna nem de artigo. Mas sei que hoje

61

Page 62: crônica a literatura nos jornais

é um grito. Um grito! de cansaço. Estou cansada! É óbvio que o meu amor pelo mundo nunca impediu guerras e mortes. Amar nunca impediu que por dentro eu chorasse lágrimas de sangue. Nem impediu separações mortais. Filhos dão muita alegria. Mas também tenho dores do parto todo os dias. O mundo falhou para mim, eu falhei para o mundo. Portanto não quero mais amar. O que me resta? Viver automaticamente até que a morte natural chegue. Mas sei que não posso viver automaticamente: preciso de amparo e é do amparo do amor.91

Coutinho não concorda com o questionamento entre literatura

e jornalismo e pergunta se a crônica pode ser jornalismo e não

literatura ou se seria um gênero anfíbio, podendo viver tanto

no jornal quanto em um livro. Afirma que a crônica que não é

excessivamente frívola ou uma simples reportagem, é uma obra de

pensamento ou arte, embora não saia nunca das folhas de um

periódico. Diz ainda, que muitos afirmam que só o livro pode

sustentar a permanência de um determinado gênero92, e um bom

exemplo seria Massaud Moisés ao colocar que o tratamento

crítico de um texto pede que este esteja presente em um livro,

o que com a crônica, só irá acontecer sob a forma de seleção do

autor. “[...]a própria instituição do livro, não sendo sua

morada permanente, mas a eventual, semelha um ataúde, florido e

pomposo, mas ataúde.”93

A crônica se aproximará da literatura quanto mais fugir às

exigências da reportagem, atingindo a realização da forma

62

Page 63: crônica a literatura nos jornais

quando mesclar literatura e jornalismo com a autonomia do

cronista em seu estilo e idéias. O cronista que tiver uma

intenção ideológica ao escrever dará mais substância e unidade

às suas crônicas, mas deve evitar assumir um tom dogmático para

não espantar os leitores que não tiverem o mesmo pensamento. O

cronista esperto faz o leitor absorver, sem sentir, as suas

idéias.

A crônica, uma vez entendida como um gênero literário, pode

subdividir-se em: crônica episódica ou narrativa, crônica

lírica ou poema-em-prosa e crônica metafísica.

A crônica episódica é aquela que utiliza um ou mais

personagens, desenvolve pequeno núcleo fictício, com ambiente

(espaço) e enredo (tempo) determinados, sendo gérmens de

contos. É dessa forma que se desenvolve a crônica O Hemistíquio

de Fernando Sabino. Nessa crônica Sabino nos conta de um

estudante que começou a ler livros de literatura inglesa no

original. Logo seus colegas passaram a admirá-lo e tomá-lo como

um mentor intelectual da turma chamando-o de Britânico. Porém

havia outro rapaz, o Bardo, que também era conhecido por sua

inteligência e gosto pela literatura nacional; eles começam uma

disputa de egos para ver quem era o melhor. Um certo dia o

Bardo quis saber a opinião do Britânico sobre uma poesia sua.

Este leu-a e mostrando-se indiferente disse que estava boa; mas

63

Page 64: crônica a literatura nos jornais

um outro colega que também havia lido o poema, quis saber o que

ele tinha achado do hemistíquio. O Britânico tentou

desconversar, pois não sabia o que isso significava; mas logo

ele, o mais inteligente, não podia admitir isso. Até que, sem

saída, resolveu retirar-se e todos perceberam sua ignorância. A

partir desse dia deixou de ser o Britânico e ficou conhecido

como Hemistíquio.

Personagens, assim como o Britânico e o Bardo podem ou não

fazer parte da crônica lírica. Ela é dominada pelo sentimento

do autor. Não há um enredo definido e o fio condutor é a emoção

configurada mediante imagens ou metáforas. É um simples

extravasamento da alma do artista mediante o espetáculo da

vida, das paisagens ou episódios para ele carregado de

significados, como é o caso do já citado Rubem Braga e de Paulo

Mendes Campos.

Na crônica lírica Mulheres bonitas de Paulo Mendes Campos,

encontramos um homem perplexo com as beldades cariocas,

descrevendo liricamente as formas corporais, a magia e a beleza

feminina:

No meu tempo de menino, em Belo Horizonte, havia, de moças bonitas, duas dúzias e mais três. Três que a gente não tinha muita certeza de escalar no time de cima. O número é estimativo, mas a verdade era concreta.[...]Na fase poética da feiúra, o mineiro descia para o Rio como a alma do purgatório ingressa no clarão do

64

Page 65: crônica a literatura nos jornais

Paraíso: arrebatada pela quantidade e pela qualidade dos anjos. Já quando o trem noturno ardia sob o sol de Cascadura, os olhos de Minas desfrutavam as premissas dum andar diferente, ancas largas ao ritmo do corpo, formas que não se ocultavam sob as vestes, pernas fornidas e nuas, timbre de voz sem timidez – a carioca. [...]Copacabana doía de tanta mulher linda. Nós, mineirões, disfarçávamos o terror (que terror?), e esse que e mulher bela e desenvolta provoca nos homens sombrios e desconfiadamente virtuosos. Nem só o céu, diz o mestre, talha a bondade, mas também a timidez: éramos bonzinhos. Os grandes pecados públicos não são para Minas Gerais, e o Rio pecava às escâncaras, sem pudor, com alegria e confiança.94

A crônica metafísica é feita de reflexões de cunho mais ou

menos filosófico ou meditações sobre acontecimentos ou sobre os

homens. Constatamos essas reflexões acerca da vida e de Deus em

trechos da crônica Pedindo a Deus que ele seja mais fácil, de

Artur da Távola:

Meu Deus: quero lhe fazer uma crítica, talvez até por eu não ser capaz de alcançar os Seus desígnios: você podia ser mais fácil! O mistério da Sua existência deveria prescindir da Teologia da Fé ou da Graça e fluir claro, natural e nítido como as coisas da natureza. Você deveria ser manifesto; apreensível sem apreensão. Verdade e não necessidade.[...]Ah, meu Deus, há horas em que me canso de tê-Lo como esperanças, há horas em que desesperadamente eu precisava tê-Lo como certeza! Já estou grande demais para ser tratado como uma criança que não pode entrar em conversa de adulto! Já estou grande demais para ficar chorando por dentro a dor do cansaço de procurá-Lo e, este pavor desconhecido que se mistura à mais deslumbrante das sensações, a do novo que está em Você, a do além e adiante que são Você, da surpresa que é Você, a do encontro final liberados com a paz da Sua transparência.95

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Page 66: crônica a literatura nos jornais

A pretexto de utilizar mais cronistas como exemplos, eis uma

crônica narrativa: A descoberta do mar, de Carlos Drummond de

Andrade, em que conta sobre um grupo de garotos que vê o mar

pela primeira vez, refletindo sobre a importância desse

encontro na vida deles:

[...]Não fantasio sensações. Quem nasceu ao pé do mar talvez não perceba essas coisas. O mar é seu irmão, e ele costuma passar indiferente ao longo da praia, como fazem irmãos de tanto se habituarem à convivência. Quantas pessoas vão diariamente do Leblon ao centro, sem olhar, e como o urbanismo vai aterrando a baía com método, cada vez reparamos menos no que sobrou ou nos lembramos do que acabou. Mas quem veio do sertão ou da mata, quem vive no subúrbio onde o trem que passa ao entardecer ou de madrugada convida à viagem que nunca será feita, sempre sabe o que é desejo, apetite de mar.Os garotos mitigaram – por alguns momentos – esse

desejo. Fizeram a descoberta, agora são homenzinhos nostálgicos e importantes, que podem dizer aos companheiros: O mar? É aquela coisa infinita, azul, verde-arroxeada, que solta um gemido fundo e deixa uma neblina salgada na cara da gente...96

Com o mesmo intuito, temos agora uma crônica poema-em-prosa.

Chama-se Chegada da primavera, e é de Cecília Meireles. Ela nos

fala da natureza e descreve minuciosamente toda a poética que

está presente na chegada da estação das flores:

Não podemos andar distraídos; mas a trepadeira da casa abandonada, de dentro de seu verde silêncio, começa a oferecer ao dia radioso suas grandes campânulas roxas, delicadamente modeladas e pintadas. Também os lírios amarelos e alaranjados desenrolam suas sedas franzidas, lentamente, cuidadosos, para que não se rompam em nenhuma prega e encham de estrelas perfeitas todo o jardim. De mil arbustos diferentes vão aparecendo inflorescências coloridas e perfumosas, que

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Page 67: crônica a literatura nos jornais

até ontem jaziam adormecidas no segredo dos caules e das hastes e agora desabrocham em pequeninas pálpebras multicores.[...]97

Ainda podemos falar da crônica metalinguagem, que busca

explicar o que consiste em refletir sobre o ato de fazer as

crônicas. Temos aqui a crônica metalinguagem de Carlos Eduardo

Novaes A laranja da crônica:

[...]O pomar da literatura, vocês sabem, é composto de diferentes espécies: a poesia, que, pela sua delicadeza, compara à uva; o romance, que, pela sua densidade, me lembra uma jaca (não dá para comer toda de uma vez e se presta muito para fazer doces e filmes); o conto, que, para ter qualidade, precisa ser redondo como uma lima; a novela, que, a meio caminho entre o conto e o romance, poderia ser um melão; e a crônica, que, pela variedade e popularidade, eqüivale à laranja. O conto e a crônica, como se vê, são parecidos e às vezes até confundidos sob um olhar apressado. O conto, como a lima, tem a casca mais fina e pode ser mais agradável a um paladar delicado. A crônica, casca mais grossa, não requer tantos cuidados para frutificar. Cresce até em publicações periódicas, como jornais e revistas, mas nem por isso seu valor nutritivo é menor: contém todas as vitaminas necessárias à formação de um leitor.98

3.2.O cronista e o repórter

Assim como o repórter, o cronista se utiliza dos

acontecimentos diários, que são a base da crônica. Porém, a

diferença é que, estando a par desses acontecimentos do dia-a-

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Page 68: crônica a literatura nos jornais

dia, o cronista dá a eles um toque pessoal, incluindo elementos

como ficção, fantasia e até críticas, o que não existe no texto

informativo. Pode-se dizer que o cronista é o poeta do

cotidiano: “[...]o fato que é para o repórter em geral um fim,

para o cronista é um pretexto. Pretexto para divagações,

comentários, reflexões do pequeno filósofo que nele exista.”99

As semelhanças da crônica com o jornalismo se dão pela

necessidade de se trabalhar com a atualidade, pelo compromisso

de levar uma variedade de assuntos para o jornal e pelo relato

breve. O que traz o ingrediente literário é a abordagem, a

crônica fala da dor da gente que não sai no jornal, ela capta

exatamente o sentimento comum e não os grandes gestos, o

inusitado que constitui o fait divers, a notícia.

Essa ligação com o jornalismo se intensifica a partir do

entendimento de que o referencial da crônica é um

acontecimento. Para a crônica, o fato é aquilo que é vivido

circunstancialmente, é algo que se aproxima da vivência

cotidiana das pessoas em seus pequenos detalhes. Essa forma da

crônica tratar os acontecimento, deforma o fazer jornalístico,

mas é a prova incontestável da ligação do gênero com o

jornalismo. A distorção dos gêneros é evidência da

possibilidade da crônica ser tomada em dois sentidos. Ela deixa

de ser jornalística para ser literária quando abre mão e

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Page 69: crônica a literatura nos jornais

distorce as regras do jornalismo; para ser jornalística, faz o

contrário. É na linguagem e no estilo de narrar que a crônica

se faz literária, utilizando elementos poéticos como o humor, o

lirismo e o sonho.

José Augusto Guerra coloca que as opiniões do cronista são

quase sempre iguais às nossas, “na linguagem com que tomamos

café, telefonamos, dizemos ‘oi’, enquanto esmagamos o cigarro

no cinzeiro ou no bico do sapato.”100 Ainda de acordo com

Guerra, nós leitores comuns, somos também de certa forma

cronistas:

O cronista é bem um escrevinhador de ontem e de hoje, de anteontem, de todas as épocas.[...] Se o cronista é tudo isso e mais alguma coisa, se ele faz o que eu faço, se pensa o que eu penso, e se eu vou na conversa dele quando ele conversa comigo, então[...] todos nós somos, à nossa maneira, cronistas.101

O cronista é, dentre os escritores, o menos enigmático e o

mais comunicável, é o tecelão do tempo. A arte do cronista é a

de escrever como se o mundo se vestisse de novo todos os dias.

“[Possui] prosa muito pessoal, em que O Tecedor do Tempo, neste

mundo de medo e violência, assemelha-se a um profeta do

intemporal. Um profeta às avessas.”102

Um profeta porque é capaz de, com sua sensibilidade e com

seu olhar para dentro de si, falar sobre aquilo que toca mais

fundo no coração da gente. É como se todas as coisas estivessem

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Page 70: crônica a literatura nos jornais

no mesmo lugar de sempre, porém somente o cronista possui as

palavras certas para falar da vida diária, do episódico, do

acidental, daquilo que é relativo ao ser humano.

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Page 71: crônica a literatura nos jornais

4. A CRÔNICA ESPECIALIZADA

Depois de conhecermos a crônica, vamos agora, nos

concentrarmos nas suas especializações. Quando compramos o

jornal de domingo, geralmente, os diferentes cadernos presentes

no periódico, são divididos pela família: o pai fica com o

caderno de esportes, a mãe com o caderno da família, a filha

pega a revista da TV, o filho que estuda administração lê a

parte de economia e a filha militante do PT, quer saber da

parte de política.

Isso acontece porque o jornal impresso é separado em

partes especializadas. A respeito disso, Clóvis Rossi coloca

que muitos jornais recorrem a artigos de especialistas em

determinado ramo do conhecimento, porém ele não acha

adequado103, já que os especialistas roubam um espaço que seria

do jornalistas, o que também concordamos, pois, o jornalista,

afinal de contas, estudou (os que tem diploma, claro) para

exercer essa função e, atento para a linguagem jornalística,

tem a tarefa de colocar de modo fácil e acessível os artigos,

ou seja, traduzir para o público o que os especialistas

escrevem.

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Page 72: crônica a literatura nos jornais

Rossi, falando sobre essa especificação, defende que:

“A fórmula correta para a boa informação jornalística deveria

ser a especialização dos jornalistas e não apenas especialistas

praticando jornalismo.”104

Dessa forma, assim como acontece com o jornalismo, as

crônicas presentes nos jornais também se especializam. Temos

então a crônica esportiva, a crônica social, a crônica

policial, a crônica política, a crônica econômica, a crônica de

televisão e muitas outras.

Por vivermos em uma sociedade superinformada, há a

necessidade de selecionarmos e escolhermos o que vamos

apreender durante o dia, com o risco de não absorvermos todas

as idéias que nos chegam. É com essa visão que o jornalismo e,

em conseqüência, a crônica compartimentalizam-se para que

possam atender um diversificado número de pessoas que possuem

interesses distintos. Para Luiz Beltrão, a crônica

especializada é preferida pelos leitores que não têm tempo para

ler o jornal inteiro, gostam de saber das opiniões individuais

do cronista e querem estar sempre com o conhecimento

atualizado.105

Partindo do pressuposto da subdivisão dos assuntos, vamos

agora, estudar as crônicas especializadas esportivas, sociais e

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Page 73: crônica a literatura nos jornais

políticas e perceber quais elementos de literatura elas

utilizam para compor seu texto.

4.1. Crônica esportiva

A crônica esportiva, como o próprio nome já diz, trata dos

assuntos relacionados ao esporte, de maneira geral. Porém,

muitos afirmam que a crônica esportiva poderia ser chamada de

crônica de futebol, pois este é o tema quase unânime dentro

delas, sendo que esportes como vôlei, tênis, ginástica olímpica

e outros, são relegados à segundo plano.

Patrícia Oliveira, no artigo Mídia esportiva na UTI

(disponível no site Observatório da Imprensa), acredita que “a

crônica esportiva no Brasil,[...]com a febre da bola, sempre

priorizou o futebol, em detrimento dos outros esportes.”106 Para

ela, a não ser quando algum brasileiro ganha um título em

outras áreas, essas outras atividades são noticiadas, então um

esporte não muito conhecido no país toma um aspecto importante.

Em parte isso é verdade, porém temos que atentar para o fato de

que no Brasil o esporte mais famoso, praticado e comentado é o

futebol, sendo natural que este predomine nas crônicas

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Page 74: crônica a literatura nos jornais

esportivas.

Temos na Folha de São Paulo, a crônica Zé Cabala prevê o

futuro, de José Roberto Torero:

Quando cheguei, Zé Cabala estava em cima da mesa, tirando uma luminária do teto.[...]Então o sereníssimo guia desceu da mesa e veio falar comigo:- Quem você quer entrevistar desta vez? - Hoje não pretendo falar com nenhum craque do passado. [...] Hoje quero ouvi-lo falar sobre o Brasileiro. Quero saber como cada time estará posicionando daqui a um mês.[...] Fomos para seu escritório. Ele colocou o lustre sobre a mesa, como se ela fosse uma bola de cristal, e começou a passar as mãos sobre ela.- O que você quer saber, caríssimo plumitivo?- Guia dos guias, diga-me quem será o líder do Brasileiro no final de junho?-[...] Em primeiro continuará o Cruzeiro.- Quem estará nos seus calcanhares?- Santos, São Paulo, Corinthias e Vasco, mesmo que o Eurico me cause asco.- E abaixo destes? - Guarani e Vitória de perto verão a glória.- Grande líder do além, quais serão os principais cavalos paraguaios, aqueles que largam na frente, mas vão perdendo posições ao longo da corrida?- O Inter, o Atlético-MG e o Paraná. Para estes a esperança logo acabará. [...]- Bem, creio que por hoje é só, iluminado mestre. Meus leitores ficarão muito contentes com sua futurologia. [...] E daqui há um mês eu voltarei para lhe cobrar as previsões.[...]- Tudo bem, mas já lhe aviso: não devolvo o dinheiro.107

É uma crônica sátiro-humorística sobre o futebol, onde

constatamos um uso acentuado de elementos literários como o

humor, a conversa-fiada no diálogo entre o cronista e o

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Page 75: crônica a literatura nos jornais

vidente, a oralidade, a linguagem coloquial e leve e ainda, o

uso de versos rimados para dar ritmo ao texto. Até quem não é

muito fã e não entende de futebol é capaz de se deliciar com

esta crônica, pois ela trata desse esporte de um jeito mais

entendível, mais saboroso, mais literário.

Outro cronista esportivo que também utiliza muitos recursos

da literatura para escrever suas crônicas é Armando Nogueira.

Temos como exemplo a crônica A explicação:

A janela do apartamento, nono andar, fundos, dá vista pra um quintal; lá está, sentada, uma mulher, fazendo tricô. Em volta dela, três meninas brincam de jogar futebol com uma bolinha de borracha. A mais velha das três deve ter, no máximo, sete anos; a mais novinha, uns cinco, talvez, e a do meio tem um chute poderoso, de direita. Não diria que são perfeitas, mas direi que levam jeito no drible, na ginga do corpo. A mãe não tira os olhos do tricô, as pernas estendidas pra frente, o corpo descontraído de quem está feliz ao sol do inverno. O jogo das meninas é uma algazarra só. Vai e vem, a bolinha toca-lhe as pernas estendidas, perturbando a cadência do tricô. Os dois agulhões, transitam nas mãos ágeis da madame como se estivessem disputando uma corrida. Na terceira bolada, a mulher não resiste. Levanta, atira o tricô pro lado, tira os sapatos, e entra no jogo, acertando, de saída, um chute de bico que a filha do meio, defende a corner com o melhor dos reflexos. Parece um menino. A família toda, agora, em ação. É um jogo pra valer: a mãe e a filha mais moça contra as duas mais velhas. Pelas tantas, a bola vai cair no quintal do vizinho. As crianças saem correndo na direção da bola e a moça se senta, de novo, estica as pernas e retoma o fio da meada. Um gringo, vendo aquela cena, talvez entendesse o fenômeno que faz do Brasil uma terra de campeões mundiais de futebol.[...]108

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Page 76: crônica a literatura nos jornais

Aqui podemos observar que o cronista usa a linguagem

coloquial, o lirismo e transcendência do fato para falar sobre

o futebol. Este é o pretexto que ele utiliza para explorar o

poético, o inusitado, o fato pequeno e banal – a mãe que larga

o tricô e cede à essa paixão nacional indo jogar com as filhas

pequenas uma pelada com uma simples bolinha de borracha.

Depois de observamos essas crônicas esportivas, não podemos

deixar de falar do maior cronista brasileiro de futebol até

hoje: Nelson Rodrigues. Suas crônicas esportivas retratavam

quase sempre, jogos de futebol. Ele falava do comportamento dos

jogadores, do placar, do técnico, da atuação do juiz, dos

bandeirinhas, da torcida ou de algum fato engraçado ocorrido

durante as partidas, expondo livremente sua opinião.109

Vamos agora saborear um trecho da crônica de Nelson

Rodrigues escrita para o jornal Manchete Esportiva em 1958,

chamada Descoberta de Garrincha, em que ele tece elogios a esse

jogador e ao mesmo tempo, nos transmite sua emoção e

subjetivismo ao se dirigir diretamente aos leitores:

Amigos: a desintegração da defesa russa começou exatamente na primeira vez que Garrincha tocou na bola. Eu imagino o espanto imenso dos russos diante desse garoto de pernas tortas, que vinha subverter todas as concepções do futebol europeu. Como marcar o imarcável? Como apalpar o impalpável? Na sua indignação impotente, o adversário olhava Garrincha, as pernas tortas de Garrincha e concluía: - Isso não

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Page 77: crônica a literatura nos jornais

existe!110

4.2. Crônica social

Muitas pessoas confundem a coluna social com a crônica

social. Na verdade tratam-se de coisas distintas. A coluna

social é crônica no sentido setorizado, ou seja, trata-se de um

grupo de notícias que faz a crônica daquele dia. Por exemplo,

todos os escritos sobre teatro são a crônica teatral do dia e

nessa crônica em sentido genérico pode estar presente a crônica

teatral propriamente dita, essa que estamos estudando. Quando

se fala em crônica social, ela deve ser entendida como um texto

literário que fale de alguém conhecido ou relate uma festa,

reunião, evento social e não um texto jornalístico que enfoca

viagens, festas, eventos e traz fotos de pessoas que possuem

prestígio social como é a coluna social.

Rachel de Queiroz, na crônica O trezentos do Gedeão, traça o

histórico deste tipo de crônica no país, homenageando-a:

Eles começaram praticamente com o século, contemporâneos, aqui no Rio, do Prefeito Passos e da abertura da Avenida Rio Branco, então Avenida Central. Davam conta, na imprensa, da vida elegante da cidade.Diziam-se os trezentos de Gedeão; os escribas fiéis da haute gomme... Arriscavam uma palavrinha de inglês -

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Page 78: crônica a literatura nos jornais

footing, five o'clock -, mas a sua língua base, como a de toda a sociedade da época, era o francês. Moça se chamava mademoiselle, senhora era madame, declamadora era diseuse.[...]111

Como vimos com Rachel de Queiroz, a crônica social não se

trata de objeto recente. No século XIX, o já citado João do

Rio, produzia crônicas no jornal O País sobre a vida mundana da

elite carioca: a vida social, as festas, chás e teatros a que

poucos tinham acesso.

Podemos averiguar na crônica de João do Rio o uso do termo

trezentos de Gedeão a que Rachel de Queiroz se referia acima:

- Todas as cidades têm apenas um pequeno grupo conhecido. Mesmo em Londres, em Viena, em Paris, acabamos reconhecendo que não há mais de 300 pessoas citadas e citáveis. Aqui, Bilac chamou-os: os 300 de Gedeão. Há uma outra denominação, talvez preciosa, mas que eles próprios se dão. São os encantadores...- Encantadores, por quê?- Pela delicadeza de maneiras, pela segurança de só quererem ser amáveis e gentis, pela continuidade de mostrar na vida apenas o lado frívolo e brilhante, pelo heroísmo sem esforço de manter a sociedade e o convívio elegante. Encantadores! São os encantadores.112

Como exemplo do gênero, temos o trecho de uma crônica social

lírica de João Ubaldo Ribeiro, O Blablablá de sempre:

Estou escrevendo meio sem jeito, porque escrevo muito antes do Natal e do Ano Novo (antigamente, chamado também de ano-bom, mas acho que perdemos a prática e ficamos um pouco mais realistas, agora é só ano-novo mesmo e já é suficiente). No dia em que batuco aqui as

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Page 79: crônica a literatura nos jornais

palavras que vocês estão lendo neste domingo,[o grifo é nosso] vai rolando lá fora a mesma confusão de sempre, em lojas e shopping centers e alguns padecentes descolam uma graninha extra, vestidos de Papai Noel, neste calor que vem fazendo, pelo menos aqui. E repetem-se as mesmas coisas de sempre.[...]113

Observamos que o cronista usa o coloquialismo e

subjetividade para falar ao leitor sobre seus sentimentos em

relação às festas de final de ano, que para ele são sempre a

mesma coisa. Notamos também a oralidade explícita na conversa

com o leitor.

Temos ainda a crônica social sátiro-humorística Sexo seguro,

de João Ximenes Braga:

[...]Festa de bacanas no 00. Com certeza eu era o único lá a ter ido de ônibus. Havia empresários de sobrenome composto, atores globais, atrizes que já foram globais e outros tantos que querem ser. No meio disso, um amigo aponta uma mulher alta, usando um macacão vermelho justíssimo, com capuz vermelho sobre a cabeça, e óculos escuros tipo mosca. Só nariz e boca ficavam visíveis. Meu amigo falou:- O... que... é... aquilo? É a Veluma de Homem-Aranha!

Sim, Veluma, modelo-ícone dos anos 80. De fato, ela parecia estar fantasiada de Homem-Aranha; totalmente deslocada no ambiente. Mas aí a vimos as mulheres de tubinho preto tipo caça-marido. As de terninho preto tipo já-tenho-marido. As de calça atochadas tipo sabe-se-lá-o-que-estão-caçando. Os homens não eram muito diferentes. Havia os de paletó tipo eu-já-tenho-dinheiro. E os de blusão e jeans tipo eu-já-herdei-dinheiro ou eu-ainda-vou-ter-dinheiro. No meio disso, Veluma de Homem-Aranha. Se à primeira vista ela parecia errada, logo deu para ver que ela estava se divertindo com a própria roupa. Deu saudades de um tempo, não muito distante, em que mais pessoas no Rio se vestiam com a intenção de não parecer com

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Page 80: crônica a literatura nos jornais

todo o resto e se encaixar numa forma. Quando estilo era mais importante que elegância.Viva Veluma.114

O cronista aqui utiliza-se da oralidade, dos diálogos e do

coloquialismo para falar da vida social do Rio de Janeiro. Faz

ainda uma crítica pertinente, dizendo que hoje em dia no Rio,

as pessoas vestem-se seguindo a ditadura da moda, não há mais o

estilo próprio de cada um, todos usam mais ou menos as mesmas

roupas, os mesmos acessórios e sentem-se confortáveis e

incluídas socialmente com isso. Braga até elogia a moça que

estava vestida com um traje, no mínimo exótico (que a fazia

parecida com um personagem de quadrinhos), e que essa sim, era

uma mulher de estilo, que usava a roupa sem pudores e sem medo

de parecer fora de moda ou extravagante demais.

4.3. Crônica política

A crônica política refere-se a textos onde o principal

assunto é a política, nacional ou internacional. No tratamento

do tema, o cronista exprime sua opinião e utiliza, na maior

parte dos casos, elementos como o humor, a ironia, a sátira

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Page 81: crônica a literatura nos jornais

para criticar o governo e os problemas sociais que são notícia

na imprensa.

Como exemplo temos a crônica política Das tripas, o Alcorão

por Affonso Romano de Sant´Anna publicada no Estado de Minas:

Na minha caderneta de ginásio, onde os professores registravam notas e observações, ao pé de cada página havia um provérbio. Um deles ficou na minha memória: É fraqueza entre ovelhas ser leão. Dizia-se um provérbio russo.Digo isso e vou confabulando.Era uma vez dois lutadores que resolveram se desafiar. Impropérios daqui, impropérios dali, a situação foi ficando cada vez mais conflituosa. Chegou o momento em que tinham que pisar no ringue e decidir o conflito.Um dos lutadores, apesar de menor, era uma velha raposa. Artimanhoso, afirmava e negaceava ao mesmo tempo. Meio arruaceiro, já tinha aprontado várias brigas com seus vizinhos.[...]Já o outro – o grandalhão -, por sua vez, era um forte estouvado. Achava-se o rei do pedaço. Verdadeiro pitboy, vivia na malhação e julgava que na pancadaria resolveria tudo. Com ele não tinha conversa. Quem discordava levava pau no lombo.Mesmo assim, com a vantagem que sua forma física lhe dava, tratou de se acautelar diante do pequeno. Não era bobo de se meter num duelo com aramas iguais de lado a lado. [...]mandou dizer à liga dos juizes que alterassem as regras da luta. A tal liga, mesmo apavorada, disse que não podia fazer isso. Então, o grandalhão mandou dizer que não ligava mais para a liga. [...]A luta era realmente desigual. Mas isto não era suficiente para tranqüilizar o brutamontes. Como tinha que se garantir de todo modo que sairia vitorioso, conseguiu que amarassem um dos braços do adversário.[...][...]E assim ia a luta chegando ao seu fim. O menor já todo esfrangalhado, roto e ensangüentado, caído num canto, estava, como se dizia antigamente, nas vascas da agonia. E no centro do ringue, o grandalhão erguendo os braços bradava:

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- Eu sou o maior! Eu sou o melhor!E diante da perplexidade geral, desafiou o estádio:- Quem é o próximo?115

Sant´Anna fala de um assunto muito em voga na época: a

guerra EUA X Iraque, porém de uma forma lírica. Parte de um

provérbio e utiliza-se de uma metáfora para explicar a

situação. Nesta metáfora ele coloca que o grandalhão,

representando os EUA, parte para a luta com um mais fraco, no

caso o Iraque. Mostra que assim como aconteceu na guerra, o

fortão quer se certificar de todas as maneiras que iria sair

vencedor da luta e trata de cometer injustiças contra o

fracote, que não tinha como se safar. Como aconteceu na vida

real, em que os EUA não deram a mínima para a ONU, o personagem

passa por cima da liga e faz as próprias regras do jogo. É

representativa de como a crônica trata de fatos reais dando o

toque de lirismo e fantasia que lhe convém.

Na Folha de São Paulo, temos a crônica política de Carlos

Heitor Cony chamada Palpite infeliz:

Um lugar-comum na mídia (cheia de lugares-comuns, tanto mais comum, melhor) foi o pretexto para que alguns colegas de profissão me telefonassem pedindo minha opinião sobre os cem primeiros dias do governo Lula.Delicadamente, afastei a seringa, dizendo que não tenho opinião sobre nada, volta e meia dou um palpite, no mais das vezes infeliz[...][...]A aprovação popular de Lula continua alta, é isso que conta. O povo, ou melhor, o povão, que é muito

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mais do que um simples aumentativo da palavra povo, continua confiando nele e, embora eu não tenha votado em nenhum candidato nesta última eleição presidencial, acho que ele está se saindo muito bem, com exceção da desastrada idéia do Fome Zero – que ele não mencionou uma só vez nas quatro campanhas que disputou.[...]Afora isso, e repetindo que cem dias é pouco para julgar um mandato de quatro anos, acho que Lula está se saindo bem, fazendo o que pode para conter os radicais do seu partido. E, dentro das circunstâncias que herdou do governo passado, procurando corrigir as pioridades do neoliberalismo, voltando-as para o campo social, em que o nosso déficit é bem maior que o déficit econômico.116

No texto acima, o cronista fala sobre o atual governo e faz

uma análise dos cem primeiros dias deste. Pega uma notícia de

jornal e a transforma em crônica ao utilizar elementos como o

coloquialismo e o subjetivismo na exposição de opiniões e

comentários sobre a política atual.

Citamos ainda Luís Fernando Veríssimo como um escritor em

cujas crônicas utiliza com maestria a sátira, o humor,

metáforas e a ironia para criticar em especial a política

atual. Podemos constatar isso dando como exemplo a crônica

sátiro-humorística Represálias onde também refere-se à guerra

Estados Unidos X Iraque:

Não concordo que haja o risco de represália dos Estados Unidos se o governo brasileiro insistir numa posição crítica em relação à invasão do Iraque, como andam dizendo. E se houver represália, o que pode nos acontecer? Um bombardeio de Brasília, desde que não seja entre terças e quintas, não afetará o funcionamento do Congresso, que não estará lá.

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Page 84: crônica a literatura nos jornais

[...]São poucas as probabilidades de o presidente ou sua família serem atingidos, a não ser que a Michelle fuja do abrigo e Lula corra atrás dela. No Judiciário, os processos empilhados esperando julgamento, agiriam como sacos de areia, dando proteção adicional aos juizes.[...] Por enquanto, no entanto, os americanos se limitam a nos atacar com agências internacionais de fragmentação sob o seu controle que subjugam nossa economia e tratados multinacionais teleguiados que eternizam nossa dependência, em represália a... Em represália a o que mesmo?117

Veríssimo fala da política internacional, da lentidão da

justiça e até mesmo da cadela do presidente, utilizando a

ironia e humor para tratar desses temas. A metáfora se faz

presente na hipótese de uma possível represália ao Brasil - que

se colocou contra a guerra iniciada por Bush - porém, ao invés

de nos causar receio e medo de que algo terrível aconteça,

Veríssimo nos causa mesmo é o riso.

Contamos ainda com o escracho de Agamenon Mendes Pedreira,

que na verdade são os meninos do Casseta & Planeta em trechos

da crônica política Coisas da ‘polititica’.

E a política, ao contrário do meu bilau, vive em constante movimento. Na verdade, a política é a única forma consentida de criminalidade. Eu não entendo o ex-presidente Fernando Henrique Invejoso. Com ciúmes dos altos índices de popularidade do presidente Luiz Inácio Tá Se Achando Lula da Silva, THC, quer dizer, FHC, está reclamando que o Lula está fazendo a mesma coisa que ele fez por oito anos. Não foi para isso que o Fernando Henrique votou no Lula!Irritado com as declarações do ex-presidente, Lula, numa feira de doces frescos em Pelotas, fez mais um discurso cheio de metáforas e outras figuras de

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linguagem. Lula disse que o governo é igual macarrão: entra duro e sai mole pingando, e quem tem pressa come cru, e que penico de barro não enferruja. Na emocionante falação, Lula recordou a sua noite de núpcias com Dona Marisa, insinuando que vai fazer a mesma coisa com os juízes, professores e funcionários públicos que forem contra a reforma da Previdência. Por conta de seu desabafo, Lula acabou sendo vaiado em Pelotas, mas isso não é problema pois o que não falta em Pelotas é vaiado.[...]118

Nessa crônica podemos observar o coloquialismo, o

subjetivismo, o humor, a ironia e a sátira, já no próprio

título da crônica. Agamenon trata de um assunto que também

rendeu matérias nos jornais, porém de forma lúdica e engraçada.

Utiliza epítetos para caracterizar as pessoas, faz referências

ao sexo e transmite opiniões. O cronista, com sua visão de

mundo, nos traz uma crítica gostosa e ao mesmo tempo real. É

essa a função do cronista, tratar de maneira leve os assuntos

do dia-a-dia e nos levar a alçar vôos mais altos em matéria da

compreensão do ser humano, ao retirar um fato de sua banalidade

e tranformá-lo em literatura.

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Page 86: crônica a literatura nos jornais

5. CONCLUSÃO

Partimos para a execução deste trabalho pensando em quão

positiva e interessante seria a contribuição literária para o

texto jornalístico. Tomando como objeto de estudo a crônica,

procuramos entender o que esta significa. Observamos que cada

cronista tem um estilo pessoal, portanto, não há uniformidade

naquilo que chamamos de crônica. Rubem Braga transmitia-nos

toda a poesia da vida; Fernando Sabino e Carlos Eduardo Novaes

contavam uma estorinha; Stanislaw Ponte Preta criticava as

mazelas sociais com muito humor assim como hoje faz Veríssimo;

86

Page 87: crônica a literatura nos jornais

Carlos Drummond de Andrade era também poético e lírico assim

como Vinícius de Moraes, Cecília Meirelles, Affonso Romano de

Sant´Anna e Paulo Mendes Campos; Artur da Távola profundo, da

mesma maneira que Clarice Lispector, que de tão intimista e

imersa em si, quase se podia conhecê-la, como se fosse uma

velha amiga. Muitos outros cronistas não foram citados neste

trabalho, porém não deixam de dar sua contribuição para este

gênero lítero-jornalístico que se desenvolveu de forma tão

plena no Brasil.

Através do estudo da crônica como essa expressão da

literatura nos jornais, nos convencemos ainda mais de que o

jornalismo ao utilizar os recursos literários, principalmente o

subjetivismo, coloquialismo e doses de lirismo para a

construção do texto, seria lido por um número muito maior de

pessoas. Assim como a crônica, seria um momento de pausa,

relaxamento e possibilidade de imaginação e sonho para o

leitor.

É claro que não propomos que todas as matérias que

compõem os jornais façam uso de literariedade, não é isso. Mas

matérias de comportamento, sociedade, viagens, moda e outras,

poderiam sim, fazer um uso maior dos recursos literários e até

mesmo as matérias de utilidade pública, com a literatura

contribuindo para dar um enfoque novo.

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Page 88: crônica a literatura nos jornais

Como dissemos antes, reafirmamos aqui, que o jornalismo

da atualidade, por conta de ser produto de uma sociedade

urbana, industrializada e que preza a velocidade, na maioria

das vezes, não se preocupa muito em construir textos corretos

gramaticalmente, interessantes, convidativos, criativos e que

despertem o interesse do leitor para ler a matéria completa, e

não apenas o lead. Os textos geralmente são homogêneos,

massificados, pobres, superficiais e desinteressantes. E neste

ponto é que a contribuição da literatura seria importante para

quebrar essa pasteurização do meio jornalístico, na produção de

matérias ricas em tipos humanos, personagens, aprofundamento

das causas do fato, uso do subjetivismo e chamamento à

imaginação do leitor.

Pode-se apontar os motivos para que não se permita a

influência da literatura no jornalismo brasileiro: como já

lembrado acima, a falta de interesse pelo aprofundamento do

fato, preferindo-se temas curtos por conta da pressa do mundo

moderno e o fato de que há cada vez menos jornalistas exercendo

mais funções dentro das redações, o que impossibilita que um

jornalista atenha-se mais pormenorizadamente em uma notícia.

Soma-se a isso a falta de verba para viagens que colocariam o

repórter perto do fato a ser analisado. Existe também a crença

de que o brasileiro não gosta de ler, que as pessoas não

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Page 89: crônica a literatura nos jornais

compreenderiam temas mais elaborados. Por causa desses fatores,

parece que as empresas e os jornalistas não conseguem imaginar

que é possível alternar notícia com jornalismo influenciado

pela literatura nos jornais e revistas.

Como sabemos, a função da imprensa é informar

corretamente, mas cremos que para realizar bem esse objetivo,

os jornalistas precisariam se libertar do imediatismo e

utilizar-se da literatura e outras ciências para a análise dos

acontecimentos, construindo uma narrativa que seja, no mínimo,

inteligente.

A imprensa atual, na maioria das vezes, é carente em

fundamentos humanísticos que devem dar embasamento para sua

tarefa de informar. Esse é um dos reflexos de um ensino técnico

de jornalismo, voltado para o mercado de trabalho e que deixa

de lado matérias de conhecimentos gerais, que são tão caras ao

jornalista como História, Sociologia, Antropologia, Artes,

entre outros, que contribuem para que o profissional possa

desenvolver um texto rico e criativo.

Numa época em que não se necessita mais do diploma para

exercer a profissão de jornalista, temos que mostrar cada vez

mais nossa capacidade e criatividade através de matérias que

fujam do convencionalismo da pirâmide invertida e do lead, e

que experimentem e causem, de certa forma, uma mudança na

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Page 90: crônica a literatura nos jornais

linguagem jornalística. Que sejam capazes de fazer o leitor

refletir, não apenas através da informação correta, precisa e

com credibilidade, mas também através da indução à imaginação e

ao sonho, papel que cumprem tão bem as crônicas.

6. BIBLIOGRAFIA

1) ABDALA JÚNIOR, Benjamim, CAMPEDELLI, Samira Youssef. Tempos da Literatura Brasileira. 6ª edição. São Paulo: Editora Ática, 1999.

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3) ------. Ao correr da pena. São Paulo: Melhoramentos, 1955.

4) ------. Crônicas escolhidas. Coleção Folha de São Paulo. São Paulo: Editora Ática, 1995.

5) ANDRADE, Carlos Drummond de. Cadeira de balanço. 12ª edição.

90

Page 91: crônica a literatura nos jornais

Rio de Janeiro: J. Olympio, 1979.

6) ANDRADE, Fernando Teixeira de. Literatura I. São Paulo: Centro de Recursos Educacionais, 1987.

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11)BARRETO, Cristine, ALVES, Janaina. Nosso personagem da semana é...Nelson Rodrigues. Juiz de Fora: UFJF, Facom, 1995, fl. Projeto Experimental do Curso de Comunicação Social.

12)BELTRÃO, Luiz. Jornalismo Opinativo. Porto Alegre: Sulina, 1980.

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14)BRAGA, João Ximenes. Sexo seguro. (2003) Disponível em <http://oglobo.globo.com/oglobo/colunas/ximenes.htm> Acesso em: 25 jun. 2003

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17)BRUNELLI, Evanir. Crônica: O gesto humano no registro dos acontecimentos. Juiz de Fora: UFJF, Facom, 1988, fl. Projeto Experimental do Curso de Comunicação Social.

18)CAMPOS, Paulo Mendes. Mulheres bonitas. In: SANT´ANNA Affonso Romano de et al. Crônicas Mineiras. São Paulo: Ática, 1984, p.99-100.

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19)CÂNDIDO, Antônio et al. A Crônica: o gênero, sua fixação e suas transformações no Brasil. Campinas: Editora da UNICAMP, Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1992.

20)CONSOLARO, Hélio. Jornalismo e Literatura: dois irmãos que se rejeitam. Disponível em< http://portrasdasletras.folhadaregiao.com.br/jornalitera.html > Acesso em: 01 mai. 2003.

71Cf.BRUNELLI, E. 1988: p.25

72BRAGA, R. 1991: p.33-34

73COUTINHO, A. 1999: p.134

74SANTOS, R. M dos. (s.d.)

75MORAES, V. 1992: p.52-53

76Cf. COUTINHO, A. 1999: p.134

77Cf. PROENÇA FILHO, D. 1997: p.44

78PONTE PRETA S. 1980: p.71

79CONSOLARO, H. (s.d.)

80MEDINA, C. 1978: p.40-41

81Cf. MEDINA, C. 1978: p.42

82ROSSI, C. 1980: p.27

83TÁVOLA, A. da 1980b: p.114-115

84Cf. BRUNELLI, E. 1988: p.178

85LIMA, A. A. 1960: p.23

86CONY, C. H. 2002: p.E16

87Cf. PROENÇA FILHO, D. 1997: p.68-69

88MOISÉS, M. 1978: p.247

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Page 93: crônica a literatura nos jornais

21)CONY, Carlos Heitor. A crônica como gênero do jornalismo e da literatura. Folha de São Paulo, São Paulo, 6 dez 2002, Folha Ilustrada, p.E16.

22)------. Palpite infeliz. Folha de São Paulo, São Paulo, 11 abr 2003, c.1, p.A2.

23)COUTINHO, Afrânio. Ensaio e crônica. In:--- A Literatura no Brasil. v.6. 5ª edição. São Paulo: Global, 1999, p.117-143.

89CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.13

90Cf. PROENÇA FILHO, D. 1997: p.7-8

91LISPECTOR, C. 1999: p.81

92Cf. COUTINHO, A. 1999: p.135

93MOISÉS, M. 1978: p.257

94CAMPOS, P. M. 1984: p.99-100

95TÁVOLA, 1980a: p.102-104

96ANDRADE, C. D. de. 1979: p.103-105

97MEIRELLES, C. 1980: p.100-101

98NOVAES, C. E. 1995

99COUTINHO, A. 1999: p.134

100GUERRA, J. A. 1980: p.197

101Ibidem, p.198

102Ibid., p.200

103Cf. ROSSI, 1980: p.72

104Ibidem, p.73

105BELTRÃO, L. 1980: p.67

106OLIVEIRA, P. 2003

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Page 94: crônica a literatura nos jornais

24)DAMULAKIS, Gerana. O conselheiro na crônica do bruxo. Disponível em<http://www.secrel.com.br/jpoesia/1gerana2c.html> Acesso em: 01 mai. 2003.

25)FERNANDES, Priscila. No Brasil, poesia e informação. Disponível em<http://www.uel.br/projeto/trialogos/emprosa/ep_cr3.htm>Acesso em: 01 mai. 2003.

26)GONZAGA, Tomás Antônio. Cartas Chilenas. In: VENTURELLI, Isolde. Profetas ou Conjurados. Campinas: Edição do Autor, 1982.

27)GUERRA, José Augusto. Que é um cronista? In:--- Caminhos e descaminhos da crítica. Rio de Janeiro: Editora Cátedra, 1980, p.197-207.

28)LESSA, Ivan. A crônica. (1999) Disponível em<http://www.releituras.com/ivanlessa_cronica.asp >Acesso em: 01 mai. 2003.

107TORERO, J. R. 2003: p.D3

108NOGUEIRA, A. 2003

109Cf. BARRETO, C., ALVES, J. 1993: p.17

110RODRIGUES, N. 1993: p.53

111QUEIROZ, R. 2001

112CÂNDIDO, A. et al. 1992: p.226

113UBALDO, J. 1998

114BRAGA, J. X. 2003

115SANT´ANNA, A. R. de. 2003: p.8

116CONY, C. H. 2003: p.A2

117VERÍSSIMO, L. F. 2003: p.7

118PEDREIRA, A. M. 2003

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Page 95: crônica a literatura nos jornais

29)LIMA, Alceu Amoroso. O jornalismo como gênero literário. Rio de Janeiro: Agir, 1958.

30)LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

31)MATOS, Gregório de. In: GOMES, João Carlos Teixeira. Gregório de Matos, o Boca de Brasa. Ed. Vozes: Petrópolis, 1985, p.93-94.

32)MEDINA, Cremilda. Notícia, um produto à venda: jornalismo na sociedade urbana e industrial. São Paulo: Alfa Ômega, 1978.

33)MEIRELLES, Cecília. O que se diz e o que se entende. Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 1980.

34)MOISÉS, Massaud. A crônica. In:--- A Criação Literária. São Paulo: Editora Cultrix. 1978, p.245-258.

35)MORAES, Vinícius. Para uma menina com uma flor. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

36)NOGUEIRA, Armando. A explicação. Disponível em < http://www.armandonogueira.com.br/antologia.htm > Acesso em: 24 jun. 2003.

37)NOVAES, Carlos Eduardo. A laranja da crônica. (1995). Disponível em<http://www.sitedeliteratura.com/CarlosEduardo.htm>Acesso em: 19 mai. 2003

38)OLIVEIRA, Patrícia. Mídia esportiva na UTI. (2003) Disponível em<http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/da020420036.htm>Acesso em: 27 mai. 2003.

39)PEDREIRA, Agamenon Mendes. Coisas da ‘polititica’. (2003) Disponível em <http://oglobo.globo.com/oglobo/colunas/agamenon.htm> Acesso em: 25 jun. 2003.

40)PINO, Dino del, MARTINS, Dileta, ZILBERKNOP, Lúbia Scliar. Introdução Didática à Literatura Brasileira. Porto Alegre: Edições Redacta-Prodil, 1980.

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Page 96: crônica a literatura nos jornais

41)PONTE PRETA, Stanislaw. Vamos acabar com esta folga. In: Armando Nogueira et al. O Melhor da crônica brasileira. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1980, p.71.

42)PROENÇA FILHO, Domício. A linguagem literária. São Paulo: Editora Ática, 1986.

43)QUEIROZ, Rachel de. Os trezentos do Gedeão. (2001) Disponível em<http://www.estado.estadao.com.br/colunistas/rachel/2001/05/rachel010505.html>Acesso em: 27 mai. 2003.

44)RODRIGUES, Nelson. À sombra das chuteiras imortais: crônicas de futebol. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

45)RIO, João do. A alma encantadora das ruas. 2a.tiragem. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Dep. Geral de Doc. e Inf. Cultural, 1991.

46)ROMERO, Sílvio. Estado do país nos fins do século XVI: Poetas e cronistas nesse tempo. In:---. História da Literatura Brasileira. 7ª edição. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1980. p.345-363.

47)RONCARI, Luiz. Literatura Brasileira: Dos primeiros cronistas aos últimos românticos. São Paulo: Edusp, 1995.

48)ROSSI, Clóvis. O que é jornalismo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1994.

49)SÁ, Jorge de. A crônica. São Paulo: Editora Ática, 1987.

50)SANTOS, Regma Maria dos. O labor da pena: história e literatura no jornalismo brasileiro. Disponível em<http://www.anphlac.hpg.ig.com.br/ensaiob20.htm>Acesso em: 01 mai. 2003.

51)SANT´ANNA, Afonso Romano de. Das tripas, o Alcorão. Estado de Minas, Belo Horizonte, 06 abr 2003, Caderno Em Cultura, p.8.

52)TÁVOLA, Artur da. Cada um no meu lugar. 3ª edição. Rio de Janeiro: PLG – Comunicação, 1980a.

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Page 97: crônica a literatura nos jornais

53)------. Há duas mil e tantas crônicas... In: BELTRÃO, Luiz. Jornalismo Opinativo. Porto Alegre: Sulina, 1980b, p.114-115.

54)TORERO, José Roberto. Zé Cabala prevê o futuro. Folha de São Paulo, São Paulo, 27 mai 2003. Folha Esporte, p. D3.

55)UBALDO, João. O Blablablá de sempre.(1998) Disponível em <http://www.vicosa.com.br/lerbr/jub_blablabla.html> Acesso em: 25 jun. 2003.

56)VERÍSSIMO, Luís Fernando. Represálias. O Globo, Rio de Janeiro, 03 abr 2003, c.1, p.7.

7. NOTAS

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