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CULTURAS AFRICANAS E AFRO-BRASILEIRAS … · culturas africanas e afro-brasileiras nas aulas de educaÇÃo fÍsica: reflexÕes a partir de uma experiÊncia. eliana santos de oliveira

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CULTURAS AFRICANAS E AFRO-BRASILEIRAS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA: REFLEXÕES A PARTIR DE UMA EXPERIÊNCIA.

Eliana Santos de Oliveira. ¹

Verônica Regina Müller. ²

RESUMO

O artigo aqui apresentado tem como objetivo sintetizar as informações obtidas, após uma abordagem teórica sobre as Culturas Africanas e Afro-Brasileiras nas aulas de Educação Física, buscando com isto evidenciar os valores étnico-raciais, cultural e social no ambiente escolar, com o intuito de analisar as diferentes Culturas, refletir e interpretar criticamente a forma com que as culturas que não se encaixam nos padrões estabelecidos são percebidas pelo meio em que estão inseridos. A proposta foi desenvolvida no Colégio Estadual Alfredo Moisés Maluf, localizado em uma região da periferia de Maringá, Estado do Paraná.

Palavras-chave: Cultura negra, práticas escolares.

INTRODUÇÃO

___________

¹Graduada em Educação Física (Universidade estadual de Maringá), especialista em Administração, Supervisão e Orientação Educacional (Universidade norte do Paraná), professora do Colégio Estadual Alfredo Moisés Maluf, Maringá Paraná.

² Doutora em Teoria da Educação Social Contemporânea pela Universidade de Barcelona.

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“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele,

por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar as

pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar,

podem ser ensinadas a amar”. (NELSON MANDELA)

Este artigo é resultado dos estudos da formação continuada realizada

pelo Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE do governo do Estado

do Paraná.

O objetivo da produção didático pedagógica foi o de apresentar

atividades que destacassem os valores étnico-raciais, culturais e sociais no

ambiente escolar, para que crianças e adolescentes afrodescendentes ou não,

conheçam, entendam e sintam orgulho de seu pertencimento étnico. A

proposta de intervenção foi realizada no Colégio Estadual Alfredo Moisés

Maluf, localizado em um bairro da periferia da cidade de Maringá/PR.

Durante a aplicação do projeto de intervenção os alunos tiveram

acesso a novas informações bem como foram levados a realizar pesquisas

com as quais puderam obter novas informações a respeito das Culturas

Africanas e Afro-Brasileiras, de forma que, algumas informações equivocadas

ou mesmo preconceituosa puderam ser revistas e redimensionadas.

A pesquisa foi fundamental neste processo de valorização e resgate de

informações sobre as Culturas destes povos. Acredito que só o conhecimento é

capaz de mudar as posturas em relação ao negro. Para tanto, precisamos olhar

para os povos africanos com respeito, um olhar de quem quer e necessita

também aprender sobre suas peculiaridades, seus conhecimentos, suas

tradições e redescobrir aquele Continente grandioso, seus países, suas

línguas, seus costumes, seus valores.

O mundo pode ser melhor, nós podemos nos transformar em pessoas

melhores. E para que isto ocorra são necessárias as mudanças de posturas.

Precisamos nos envolver com as dores dos que sentem na pele o olhar de

desprezo. Os desafios que os homens, as mulheres e as crianças negras

enfrentam a cada dia, sejam eles no ambiente escolar ou na sociedade em

geral, precisam ser os nossos também.

Ser educadora é ser revolucionária, é sentir as inquietudes do tempo e

dos homens. Esse desassossego é capaz de nos impulsionar para um caminho

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de transformações tão necessárias ao tempo presente e ao homem moderno.

As pessoas ao longo da história tem se mobilizado, se organizado nesta busca

de mudanças, consequentemente coibindo atos de racismo e muitos tipos de

preconceito que permeiam nossa sociedade.

Em nossa história aprendemos e continuamos a ensinar sobre os

povos europeus e toda sua trajetória de conquistas e sucessos por eles

alcançados, o mesmo não ocorrendo em relação aos povos negros. Não se

consegue perceber o Continente africano da mesma forma que o europeu.

O que chamamos de cultura de valor na Europa, na África são

costumes exóticos. O que os europeus chamam de filosofia e

religião toma os nomes de crendice ou superstição na África.

As lutas de classes são reduzidas a lutas tribais. No estudo da

formação de nossa nacionalidade, a participação dos africanos

e de seus descendentes é escamoteada e relegada a uma

“contribuição do folclore, à culinária e misticismo”. Conhecemos

a África das tribos, do Simbá, dos safáris, da AIDS, da fome e

das guerras. O Continente africano permanece para a maioria

dos brasileiros reduzida a uma imagem simplificada por quatro

t: tribo, tambor, terreiro e Tarzan (Pereira, 1978: p. 16, in

Santana).

Precisamos enquanto educadores, ainda aprender muito sobre o

Continente africano e em determinados assuntos reaprender sobre os mesmos.

Necessitamos ensinar os nossos olhos a ter uma visão diferenciada e de

respeito em relação a esse Continente, nossas palavras também precisam ser

cuidadosas ao se referir à África, cabe a nós educadores o comprometimento

com o conhecimento e transmitir aos nossos alunos alguns valores que já se

perderam: o respeito, que permitira ao aluno ter uma nova postura em relação

ao outro, a ética, que possibilitara uma melhor conduta humana e social, a

justiça, que é capaz de promover o respeito à igualdade de todos.

Chego até mesmo a pensar na existência em uma perfeita trama para

diminuir as outras culturas, os outros povos. As formas como estes povos e

seus conhecimentos são percebidas e ensinados acabam por naturalizar as

formas de preconceitos existentes. Quando insistimos em pregar nossos

conhecimentos e culturas como verdades absolutas, não respeitando o outro,

estamos contribuindo para que todas as formas de divisões continuem a fazer

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parte do nosso cotidiano. Isto fica evidente nas palavras de Bizzocchi referindo-

se a forma como as línguas dos nativos são percebidas:

Nas comunidades tribais da África e da América, o

imperialismo linguístico-cultural branco tem mais um forte

aliado: os pregadores religiosos de seitas cristãs

fundamentalistas, que combatem não só as crenças, mas

também as línguas dos nativos como “coisa do diabo”.

(BIZZOCCHI, 2006).

No caso das crianças e adolescentes negros (as), tudo isto em doses

homeopáticas acaba por gerar ao longo de uma vida pessoas retraídas,

tímidas, inseguras e com uma autoestima baixa. Pessoas que não conseguem

se perceber enquanto cidadãos, que fizeram e ainda fazem parte da

construção do mundo.

Completando, Marcos (2008, p.190) aponta que:

Entre as pessoas que são socialmente “desvalorizadas” e “discriminadas”, a sua autoestima depende em grande medida da sua capacidade para reconduzir e apreciar suas qualidades individuais e definitivamente rejeitar de forma crítica os estereótipos negativos que lhes são impostos.

Os caminhos para as transformações e mudanças passam pela

educação. Só através do conhecimento que se adquire, é possível aos homens

uma nova visão e entendimento da vida e de seus valores e tudo só é possível

com o auxilio da arma mais poderosa que temos que é a educação. Uma

educação libertadora que permita aos homens realizarem a difícil luta de

poderem conviver com as diferenças do outro, sem que para isto seja

necessário diminuir a presença do outro. Como nos ensina Mandela (...): “A

educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo”.

É desta arma que precisamos. Educação que possibilite aos homens

melhores condições de vida e convivências. A escola precisa exercer este

papel fundamental de transmissão dos conhecimentos produzidos pela

humanidade ao longo da história, de forma imparcial e efetiva. Neste processo

há de se ter o respeito e cuidado necessário com todos os conhecimentos

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produzidos pelos povos em diferentes épocas e lugares, não permitindo que

grandezas sejam ofuscadas ou mesmo omitidas simplesmente por não

pertencerem à cultura dominante.

A escola tem papel fundamental na construção de identidades positivas

junto a grande parte do alunado negro, que diante de toda uma história

equivocada e preconceituosa não consegue se perceber enquanto cidadão

atuante na construção de sua própria história, na história de um povo e de uma

nação. A escola precisa de forma urgente reconhecer este papel, rever suas

práticas pedagógicas e posturas. É papel da escola e nosso enquanto

educadores reconhecer e valorizar as outras culturas, dar oportunidades aos

nossos alunos negros e brancos de conhecerem a história, as lutas, as

resistências que homens e mulheres africanos desencadearam quando para cá

foram trazidos para serem então escravizados, e mostrar que essas lutas não

ficaram paradas no tempo, mas que foram e ainda são realizadas por

afrodescendentes em suas atitudes no dia a dia e também por movimentos

organizados na atualidade. Fazem parte desse movimento homens e mulheres

pertencentes a todos os grupos étnicos que não aceitam nenhuma forma de

preconceito e discriminação e que fazem de suas vidas uma bandeira de luta

contra as opressões sofridas por homens, mulheres e crianças neste mundo

globalizado.

Completando, Lopes (2006, p. 257), diz que:

“É preciso refletir com mais profundidade sobre os

ensinamentos que ocorrem no dia a dia, por meio de cada

ação, de cada escolha, de cada intervenção, pois cada ação da

escola e do professor pode inaugurar possibilidades de

construção identitária positiva ou apenas confirmar aquilo que a

sociedade brasileira vem reservando à população negra e

mestiça – um lugar marcado pela falta de oportunidades e de

acesso às condições de prestígio social”.

Precisamos ter a coragem de aprender para ensinar e reaprender

ensinando. Somos capazes de ensinar aquilo que aprendemos e o fazemos de

maneira melhor, quando acreditamos no que estamos aprendendo e

realizando. Mas ensinar não é algo muito fácil, ensinar exige dedicação, querer,

paciência e muita pesquisa. E em se tratando da Cultura Afro-Brasileira e

Africana a exigência será muito maior, é necessário à existência de um

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compromisso com a educação e com o educando por parte da escola, que

precisa ser um local agradável e aberto as diferentes manifestações culturais

que podem e devem ocorrer em seu interior e para que isto ocorra é preciso o

envolvimento de todos os quadros que compõem a escola.

O papel do professor mais uma vez pode ser decisivo neste processo

de ensino, reconhecimento e conhecimento das outras culturas, aqui em

particular, da Cultura Africana e Afro-Brasileira. Este ensinar irá exigir dos

docentes o compromisso com a busca de informações verdadeiras e livres de

preconceitos.

Neste sentido Paulo Freire (1996, p.29), enfatiza que:

Ensinar exige pesquisa, não há ensino sem pesquisa e

pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no

corpo do outro. Enquanto ensino contínuo buscando,

reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque

indago e me indago. Pesquiso para constatar, intervenho

intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que

ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade.

Tenho total convicção que pequenas ações realizadas dentro de uma

escola podem tomar proporções gigantescas, saindo das salas de aula,

atravessando os muros das escolas e são estas ações que podem mudar os

olhares que temos e as ideias que fazemos uns dos outros.

O PROJETO NA ESCOLA

Ler a diferença no espaço das aprendizagens, não significa ler

como inferior – A cultura do outro, jeito de ser, pensar/agir. Mas

bem nos parece que toda nossa formação linear, na escola,

está calcada na leitura do outro como um ser inferior a nós

mesmos. (Arruda, 2006, p.81)

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A escola precisa exercer este papel precioso que é o de informar e

formar cidadãos com dignidade e orgulhosos de seu pertencimento étnico. E foi

pensando nesta questão que idealizamos este trabalho pedagógico tendo

como objetivo propor o estudo e atividades que evidencie os valores étnico-

raciais, culturais e sociais no ambiente escolar nas aulas de Educação Física,

para que crianças e adolescentes afro-brasileiros ou não, conheçam, entendam

e sintam orgulho de seu pertencimento étnico.

Fala-se hoje muito em inclusão, e quando se fala ou pensa em

inclusão, estamos normalmente nos referindo aos portadores de necessidades

especiais, sejam elas físicas ou intelectuais.

Para Mantoan “inclusão é o privilégio de conviver com as diferenças”. A

mesma autora ainda nos fala que “A inclusão possibilita aos que são

discriminados pela deficiência, pela classe social ou pela cor que, por direito,

ocupem o seu espaço na sociedade. Se isso não ocorrer, essas pessoas serão

sempre dependentes e terão uma vida cidadã pela metade”.

Não se pode mais conceber um espaço escolar como um local hostil as

diferenças nele encontradas. Mas afinal o que são as diferenças? A minha

cultura, o meu conhecimento tem que ser necessariamente o diferente? O que

determina as diferenças? Eu sou o diferente ou ele, o outro que é o diferente?

A estes questionamentos caberia mais um capítulo, conhecer e

entender a filosofia da diferença, passando por filósofos como Foucault,

Guattari, entre outros, que fazem parte desta linha que se interessa pela

diversidade, pluralidade e singularidade.

Estamos sempre partindo de um ponto como referência e

frequentemente este ponto é o da cultura europeia. Desta forma acabamos por

mais uma vez afirmar uma pseudo superioridade de um povo sobre outro.

Precisamos entender e aceitar que existe culturas que são diferentes das

nossas e que há também outras formas de saberes.

A escola de que hoje fazemos parte necessita passar por um processo

de desconstrução de valores e ideais apreendidos ao longo de toda sua

história. Ela não pode mais ser um local de reprodução das desigualdades.

Lopes (2006, p. 13), destaca que:

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As experiências iniciais com a escola precisam ser levadas a

sério, pois podem definir a base de uma trajetória escolar

tranquila ou mais atribulada. Sentir-se acolhido, incluído e

integrado facilita a construção de uma autoestima positiva,

elemento fundamental no sucesso escolar.

Na perspectiva de mudança de olhares e conhecimentos já adquiridos,

se fez necessário um levantamento prévio através de questionários aplicados

sobre preconceito e racismo, o senso comum e sobre a temática dançar na

escola, uma vez que a dança foi o instrumento prático para a abordagem do

tema.

As Diretrizes Curriculares (2008) nos apontam a dança como um:

“elemento significativo da disciplina de Educação Física no

espaço escolar, pois contribui para desenvolver a criatividade,

a sensibilidade, a expressão corporal, a cooperação, entre

outros aspectos”. “Além disso, ela é de fundamental

importância para refletirmos criticamente sobre a realidade que

nos cerca, contrapondo-se ao senso comum”.

É através da dança que também podemos libertar nossas emoções,

deixar o corpo falar. A dança nos permite a comunicação, através dela

podemos transmitir mensagens ou simplesmente expressar os próprios

sentimentos.

Em um primeiro momento pensou-se em aplicar os questionários só

em uma turma, mas dado à repercussão, optei por aplicá-los em todas as

turmas do ensino médio. Sempre após as aplicações dos questionários

reservou-se um tempo para discussão dos mesmos.

A visão que os alunos possuem em relação aos temas abordados,

reflete nitidamente as informações que receberam até agora, carregadas de

preconceitos e distorções. Muitos se manifestaram dizendo que, os próprios

negros são preconceituosos em relação aos próprios negros. Diante deste fato

foi preciso uma discussão e pesquisa sobre a negação das origens.

Após a aplicação dos questionários e tendo a dança como um

instrumento muito válido para se abordar as questões culturais e os

conhecimentos produzidos pelos povos do Continente africano ao longo de

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toda sua história, buscamos abordar em cada dança escolhida, o país de

origem, suas invenções, arquitetura, questões biológicas: cabelo, pigmentação,

nariz, a resistência frente às dominações, as diversas línguas faladas pelos

povos que compõem o Continente africano.

Ferreira, (2009) enfatiza que:

A dança escolar deve possibilitar o resgate da cultura brasileira

por meio da tematização das origens culturais, sejam do índio,

do branco ou do negro, como forma de despertar a identidade

social do aluno no projeto de construção da cidadania.

A seguir disponibilizo os questionários que os alunos responderam

através dos quais foi possível ter uma melhor visão de como eles percebem e

entendem o tema preconceito e racismo.

QUESTIONÁRIO 1 - PRECONCEITO E RACISMO – SENSO COMUM

1) O Brasil é um País racista?

( ) Sim

( ) Não

2) O que é racismo?

3) O que é discriminação racial?

4) O que é preconceito?

5) O que é Cultura Popular?

6) Dentro da escola, de que forma o preconceito devem ser tratados: ( ) Só quando ocorrer casos de preconceito no ambiente escolar. ( ) Esta é uma questão que deve ser tratada pelos movimentos sociais organizados. ( ) De forma pedagógica pela escola, que é o principal local de formação dos indivíduos como cidadão críticos.

7) Em nossa escola a história dos povos negros é estudada: ( ) Em várias disciplinas ; ( ) Nunca é tratada; ( ) Só em datas específicas como: 13 de maio e 20 de novembro.

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8) Em sua opinião a mídia brasileira (TV, revista, jornal,), auxilia na reprodução de atitudes racista?

( ) Sim

( ) Não

De que forma?--------------------------------------------------------------------

9) Você consegue perceber racismo nas propagandas, filmes e novelas brasileiras?

( ) Sim

( ) Não

Se sim, de que forma isso ocorre?-----------------------------------------

10) As Danças de origem africanas também são alvo de preconceito ?

( ) Sim

( ) Não

Se sim, onde você percebe isto?-------------------------------------------

Os alunos responderam ao segundo questionário, desta vez voltada para a dança na escola e sua aceitação.

QUESTIONÁRIO 2 - DANÇAR NA ESCOLA.

1) O que é dança para você ?

2) Você gosta de dançar ?

( ) Sim ( ) Não

Por quê?------------------------------------------------------------------------------------------- 3) Você tem alguma experiência com dança?

( ) Sim

( ) Não

Se sim, em qual tipo?--------------------------------------------------------------------------

4) Quando sua escola promove atividades artísticas e gincanas, onde a dança se faz presente, você participa ?

( ) Sim

( ) Não

Se sim, em quais atividades?---------------------------------------------------------------

Sendo não sua resposta, por quê?-------------------------------------------------------

5) Nas aulas de Educação Física, o conteúdo Dança, deve ser visto e praticado só por: ( ) Mulheres

( ) Homens

( ) Por todos. ( ) Por ninguém. Por quê?------------------------------------------------------------------------------------------

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Precisávamos de um modo de divulgação do projeto a ser

desenvolvido na escola e a forma escolhida foi o jornal mural. Uma vez que

este pode contribuir como canal de comunicação dentro do espaço escolar

entre professores e alunos.

Procurou-se em cada edição do jornal mural trabalhar com

informações relevantes e positivas em relação ao Continente africano. Cada

passo do jornal foi discutido e acordado. Utilizamos as cores do Continente

africano para fazer as molduras do jornal mural. Até chegarmos ao primeiro

jornal tivemos momentos difíceis, principalmente quanto à indiferença por parte

de alguns alunos. Nesta construção do jornal pudemos mais uma vez conviver

com atitudes de vandalismo em relação ao jornal mural, que foi danificado

algumas vezes, tendo a moldura arrancada aos pedaços, e também roubaram

as bonecas negras confeccionadas em e.v.a, que faziam parte da decoração

do jornal. Durante todo o processo de pesquisa e confecção do jornal mural a

função da professora foi a de mediar continuamente os trabalhos.

Iniciamos o jornal com um resumo sobre a Lei 10.639/03, que torna

obrigatório o ensino da História e Cultura Afro – Brasileira e Africana nos

estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares. Na

sequência trabalhamos com os temas; “As pirâmides do Sudão e os reinos

africanos e os Faraós negros”. Além de imagens foram realizadas pesquisas a

respeito dos reinos de Núbia e Meroé. O que chamou a atenção de todos foi

descobrir que no Sudão existiam mais pirâmides do que no Egito.

Um jornal foi dedicado às mulheres, dando destaque a “Tradição das

rainhas africanas”. Fizemos um passeio na história destas mulheres, histórias

estas que não são contadas nas salas de aula. Começamos por conhecer a

rainha Nzinga – a rainha guerreira dos reinos de Ndongo e Matamba (Angola

1623 – 1663), que lutou contra o domínio Português e Holandês. Os alunos

tiveram a oportunidade de também saber sobre outras rainhas entre elas, Yaa

Asantewaa de Gana, que é uma das figuras mais reverenciadas da história

moderna de Gana, rainha Amanishakheto, rainha Amanirenas, uma das

rainhas Candaces (Kushitas) mais famosas que liderou uma guerra de defesa

nacional, que durou cinco anos, contra o exército romano, rainha Cleópatra

entre outras.

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Figura 1 – Jornal mural, Maringá, Paraná.

Fonte: Oliveira, 2011.

Outro jornal teve a responsabilidade de informar sobre “O

desenvolvimento tecnológico africano”, destacando as tecnologias de

mineração, metalurgia, agricultura. A medicina do povo banyoro, que

demonstrava conhecimento de conceitos e técnicas como assepsia, anestesia,

hemóstase, cauterização entre outros. Obtivemos informações sobre a

complexidade do desenvolvimento Cultural pré-histórico na África Subsaariana

– observatório astronômico. A astronomia também fazia parte dos

conhecimentos africanos, os Dogons, povo que viveu na região do antigo Mali,

envolvia uma concepção moderna do universo e um saber extremamente

complexo a respeito da astronomia.

As danças de origem africana também foram temas de pesquisas no

jornal mural, começamos por Moçambique que é uma dança que leva o nome

dado a este país localizado na costa oriental da África Austral. Fizeram parte

destas pesquisas o Batuque, o Jongo, o Lundu que é uma dança que foi trazida

para o Brasil por negros Bantos escravizados no século XVIII, o Maracatu que

é uma dança associada aos reis congos, o Samba de Roda, o Bumba Meu Boi

que une elementos culturais dos três povos que formaram a nação brasileira, o

índio, o branco e o negro e também houve espaço para as pesquisas de

danças de outras etnias, buscando contemplar as etnias mais expressivas do

colégio, os alunos decidiram pesquisar e vivenciar algumas danças japonesas,

italianas e espanholas. Eles ainda optaram por pesquisar uma dança de origem

francesa.

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Figura 2 – samba de roda

Fonte: Oliveira, 2011.

Em nossos primeiros encontros para decidirmos quais danças seriam

vivenciadas na prática, houve muita euforia, os alunos davam muitas sugestões

e articulavam entre si como seriam as apresentações e de que forma estas

deveriam ocorrer. Eles queriam vivenciar o jongo, o coco, o samba de roda, o

maculelê, o tambor de crioula e finalizar com um pot-pourri de danças étnicas,

e foi o que decidiram.

Figura 3 – pot-pourri de danças étnicas.

Fonte: Oliveira, 2011.

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Existe uma grande distância entre aquilo que se quer e o que se pode

fazer. Desde as pesquisas sobre as danças até os momentos de ensaios, tudo

foi um grande aprendizado, tanto para os alunos bem como para mim enquanto

professora. Foi um construir juntos.

Todo o processo de pesquisa, confecção de figurino, ensaio e a

apresentação final, foram marcados por vitórias e fracassos. O

descompromisso por parte de alguns alunos com o acordo assumido perante

todo o grupo ocorreu de várias formas, foi quando deixavam de comparecer

para um ensaio, a pontualidade que muitas vezes não existia, as tarefas eram

divididas em grupos e quando um não as cumpria todos os demais sofriam as

consequências. O mais grave foi a desistência de alguns grupos no dia da

apresentação. Eles não avaliam o prejuízo que causaram com um

comportamento assim, sem responsabilidade e respeito para com o grupo,

afinal foi um compromisso assumido.

Mesmo com todos os contra tempos conseguiu-se no final do processo

realizar as apresentações de samba de roda e o pot-pourri das danças étnicas

contemplando a Itália, Espanha, Japão e França.

1. A AVERSÃO AO NEGRO

No decorrer das aulas, o tema preconceito sempre esteve presente, o

tema que antes era indiferente às questões do dia a dia escolar passou a fazer

parte das discussões diárias entre os alunos e a professora. Os alunos

começaram a questionar e analisar situações onde o preconceito se evidencia.

Em algumas situações não foi raro ouvir de alunas, a expressão, não suportar

“negros”. Admitem certa “amizade com negros, mas pensar em

relacionamentos, jamais”. Em depoimento, algumas alunas disseram “que

sentem ódio”, elas expressam repulsa só em pensar em negros. Estas não são

as primeiras manifestações neste sentido e em algumas vezes, são expressões

de alunas afro descendentes também. É o querer estar o mais longe possível

de tudo e de todos que as façam pensar em suas origens, é a negação de toda

uma história.

Tentar entender este comportamento de negação não é tarefa fácil, é

preciso toda uma analise desta sociedade que foi moldada nos preceitos

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históricos e preconceituosos. Nossas crianças foram e ainda são

continuamente bombardeadas por termos pejorativos em relação ao negro,

informações equivocadas e preconceituosas em relação ao Continente

africano, é possível compreender um comportamento de negação quando se

aprende na escola o que uma parte da sociedade pensa e acredita ser o

correto e faz de suas convicções normas estabelecidas. Em nossa vida escolar

fomos ensinados a fazer uma comparação entre os dois mundos distintos: o

mundo dos brancos e o mundo dos negros. Quem em sua vida escolar não

aprendeu a diferenciar brancos e negros desta forma:

Homem Branco: Europa. Homem Negro: África.

É homem civilizado É selvagem

Moderno Atrasado

Possui Nação Pertence a uma Tribo

É cristão É pagão.

Nossa sociedade é preconceituosa e muitas pessoas possuem uma

predisposição deliberada de desvalorizar o outro. E o fazem sem culpas ou

remorsos.

Nas informações oficiais que recebem estas crianças são mais uma

vez vitimas de todo um processo escolar que até então não percebia o aluno

negro em sua totalidade. Ao analisarmos o dicionário da língua portuguesa,

Novo Aurélio, de Buarque de Holanda Ferreira, 1999, nos deparamos com

definições em relação à palavra negro e branco que só contribuem para que a

visão de inferioridade tenha mais força.

Negro – de cor preta, encardido, melancólico; funesto; maldito, sinistro;

perverso; individuo da raça negra; escravo. Já a palavra branco é positiva: -

Sem mácula; inocente; puro; cândido; ingênuo; homem de raça branca. Não é

difícil imaginar as reações de crianças negras em uma sala de aula ao ouvirem

estas definições. É muito difícil ser negro e para muitos mesmo que todas as

evidências os classifiquem como negro eles não querem ser negros.

Quando falamos de crianças e adolescentes na faixa etária de 10 a 14

anos são comuns às brincadeiras, onde a agressão verbal ao outro se

evidencia, quando um aluno insinua que o colega beijou uma aluna negra ou

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vice versa. Mas estes comportamentos ocorrem da mesma forma com alunos

(as) do ensino médio. O que é muito preocupante é a total falta de

sensibilidade demonstrada por eles, pois muitas vezes as piadas e

brincadeiras, são feitas na presença de alunos (as) negros (as), e neste

momento um olhar mais atencioso e sensível por parte do docente consegue

perceber a dor e o constrangimento que o aluno afrodescendente sente. Quase

sempre ele mesmo acaba rindo da situação juntamente com os demais

colegas, desta forma ele é aceito, e o momento torturante acaba. Quando

questionados sobre as atitudes, eles se defendem dizendo que é só brincadeira

e que até os alunos negros dão risadas. O sorriso mesmo que forçado acaba

dando o aval para estas situações que possuem um misto de desconforto e

conformismo. Quando damos o tom de “brincadeiras”, pensa-se em coisas

inofensivas, portanto não passíveis de julgamentos e censuras.

A exclusão de toda uma história dos povos negros e suas conquistas

por parte da sociedade como um todo e lamentavelmente do mundo

acadêmico, o não admitir a participação do negro na formação do povo

brasileiro de forma efetiva, tudo isto só vem a contribuir para que alunos

afrodescendentes não sintam o orgulho de pertencimento. Nas escolas o que

foi ensinado só fez aumentar o preconceito em relação aos diferentes. Ao longo

da história em períodos distintos, usou-se de teorias racistas e teológicas para

justificar o domínio sobre os povos conquistados, isto aconteceu com os índios

em um primeiro momento, os interesses econômicos contribuíam para que

estas visões sobre os povos vistos como inferiores se perpetuassem.

Já não bastava desumanizar e negar a humanidade dos

indígenas para justificar a conquista e a fortíssima exploração

dos mesmos. Havia agora, de justificar o novo sistema

escravista no qual envolveram os negros africanos e mais tarde

os asiáticos. (DUNCAM apud SANTANA in MUNANGA, 2005,

p.40).

Estas e muitas outras informações passaram a fazer parte do nosso dia a dia

escolar. A escola e a sociedade como um todo fazem uso de uma visibilidade

negativa e inferior em relação ao negro, e certamente essa transmissão de

valor tende a acentuar a forma como a criança negra se vê e também como o

outro lhe percebe. O Movimento Negro Organizado sempre buscou exatamente

o contrário, a quebra da invisibilidade do negro nos livros didáticos, na

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participação efetiva da história de construção deste país, na participação de

forma digna em programas de TV, enfim perante toda a sociedade brasileira e

esta ainda continua sendo a luta por uma visão positiva dos homens e

mulheres negras, sua cultura, seus conhecimentos.

Estamos aqui nos referindo à inclusão das culturas dos outros povos,

em particular do povo negro que hoje chega a uma soma de 96,7 milhões de

pessoas, o que representa 50,7% por cento da população brasileira, segundo o

censo do IBGE em 2010.

Como falar em minorias se hoje a população negra brasileira é maioria,

há uma incoerência nas falas, neste momento a população de negros no Brasil

é maioria, mas tem seus conhecimentos e culturas vistos como minoria.

Parece-nos proposital a forma como tudo é orquestrado, ao assistir uma novela

à criança negra não se vê, os filmes brasileiros não diferem muito das novelas,

nas propagandas também não ocorre a participação efetiva das pessoas

negras. Por este prisma chega-se a pensar que realmente o povo negro é a

minoria no Brasil.

As crianças e adolescentes afro-brasileiros querem ser vistas,

admiradas, aceitas, respeitadas, da mesma forma que as crianças e

adolescentes pertencentes a outras etnias são. E este caminho começa por

uma reeducação de valores e posturas por parte de todos os homens e

mulheres que compõem a sociedade brasileira e que são de forma direta ou

indireta os responsáveis pela formação das crianças cidadãs. Esta

responsabilidade também passa por nossa classe, a dos educadores

compromissados com as transformações sociais. E essa transformação

começa com o cuidado do repasse de informações positivas em relação às

outras culturas.

Segundo Paixão (2007, p.28),

“Ao omitir conteúdos sobre a história do país, relacionadas à população negra, ao omitir a contribuição do continente africano para o desenvolvimento da humanidade e ao reforçar determinados estereótipos, a escola contribui fortemente para o reforço das construções ideológicas racistas”.

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Ao agirmos de forma contrária, ou seja, possibilitando o estudo da

história do Continente africano estaremos contribuindo para a mudança das

visões equivocadas que temos e perpetuamos dos povos africanos.

O povo brasileiro precisa aceitar e valorizar sua ancestralidade

africana. E isto só ocorrerá de forma positiva com a aquisição do conhecimento

em relação ao Continente africano, o respeito às outras culturas, o

reconhecimento da contribuição do negro na formação deste país, quando as

pessoas que fazem parte desta sociedade forem capazes de olhar para o povo

negro e percebê-lo como co-autores da história do Brasil.

“Olhamos para o negro com rancor como se eles estivessem

escolhido vir para cá “manchar a sociedade branca”. Após

escravizá-los, reclamamos do seu caráter submisso. Após

esmagá-los de trabalho, por séculos, falamos de sua preguiça.

Depois de deixá-los na rua, quando da abolição, não nos

conformamos com sua pobreza. O problema do negro deve ser

explicado pela história e nunca pela biologia”. (PINSKY,2003,

p.23).

2. RETORNOS EDUCATIVOS

Quando as informações são positivas e o olhar tem um encanto,

começam as mudanças de comportamentos.

Em tão poucas ações promovidas pelo projeto que desenvolvi foi

possível perceber algumas mudanças de comportamento e atitudes por parte

de alunos (as) e professores (as) no ambiente escolar. O cabelo do negro em

especial da mulher negra foi tratado sobre uma nova perspectiva, em

discussões que ocorriam durante as aulas. Em um determinado momento

viam-se as alunas negras usando o cabelo solto com uma flor do lado e a cada

elogio por parte da professora era muito gratificante a alegria presente no olhar

destas meninas. Mas não é tarefa fácil a ruptura com os padrões já

estabelecidos de beleza, com esta ditadura que quer e determina a forma que

eu devo usar o meu cabelo. Que roupa a moda me permite usar de acordo com

meu biotipo e também de acordo com meu poder aquisitivo.

Caberia neste momento discursarmos sobre o capitalismo, os

interesses da classe proprietária e sua influência no mundo moderno, o

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consumo exagerado de bens e produtos. Este sistema que usa de subterfúgios

para sempre dominar as pessoas em suas vidas sociais e particulares. Sistema

este que necessita para sua sobrevivência de consumo e mais consumo que

resulta em lucros para os que detêm o poder.

Os interesses imediatos da classe proprietária correspondem

às suas necessidades de acumular riquezas, gerar mais renda,

ampliar o consumo, o patrimônio etc.(COLETIVO DE

AUTORES, 1992, p.24).

Desta forma hoje os grandes proprietários do sistema capitalista se

valendo de regras ditadas pela indústria da moda, determinam que os cabelos

das mulheres para serem bonitos precisam ser lisos, e derrama sobre nós

inúmeros produtos e objetos com a finalidade de tornar liso o que não for liso,

fazendo desta forma com que milhões de mulheres sejam dominadas e levadas

a pensarem que realmente é isto que pode torná-las bonitas e atraentes. Basta

um simples olhar de observação nas propagandas de shampoos e cremes, o

que prevalece são cabelos lisos em uma população majoritariamente composta

por negros (as). Hoje temos uma gama de produtos para cabelos afros, não

porque se percebeu a importância de se divulgar e ensinar valores para a

população como um todo ou por que se percebeu ser politicamente correto e

justo que uma população imensa de mulheres afro descendentes tivesse

acesso a produtos feitos e pensados exclusivamente para elas, mas porque se

percebeu que o mercado seria promissor, mais consumo, mais lucro, mais

domínio. Amanhã será a vez dos cabelos cacheados e uma nova onda de

consumo de produtos e objetos para que os cabelos voltem a ser crespos ou

cacheados ocorrerá.

Com a realização deste trabalho, percebemos o quanto a escola

necessita de ações voltadas para estas questões, e também de formação/

capacitação para os docentes.

Durante o período de aplicação do projeto na escola a curiosidade e os

questionamentos sobre os temas abordados foram muitos. Neste período

estava em andamento um curso de formação para professores, para o qual fui

convidada a proferir uma palestra sobre o tema em destaque, “Culturas

Africanas e Afro-Brasileiras”. Na ocasião confeccionamos bonecas negras.

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Figura 4 – Bonecas negras em e.v.a. e tecidos.

Fonte: Oliveira, 2011.

Os professores demonstravam desconhecimento quase que total em

relação aos conteúdos ministrados, o que prova que não fomos e ainda não

somos formados para trabalhar com as diferenças, as outras culturas não

fazem parte dos currículos acadêmicos. É o descaso com que a cultura e

conhecimento dos povos negros são tratados, ressaltamos que este descaso

ocorre também em relação às demais culturas consideradas minoritárias.

Quando destacamos o desenvolvimento tecnológico africano, o

conhecimento em medicina do povo Banyoro, o conhecimento em astronomia

dos Dogons, uma professora disse: “Por Deus que isto é verdade?”. Percebeu-

se um rubor em seu rosto ao fazer esta indagação, ela nunca ouviu falar nada

sobre isto ou qualquer outra coisa de forma positiva em relação aos povos

negros do Continente africano.

Falamos também sobre o porquê do cabelo do negro ser carapinha e

também sobre a função do nariz mais largo para o homem negro africano,

mostrando a diferença do nariz do homem branco e sua função. E o porquê da

necessidade de se ter mais melanina na pele negra e, tudo isto foi recebido por

muitos como novidade e mais uma vez notou-se o desconhecimento por parte

dos docentes ali presentes.

São estas e muitas outras histórias submersas que precisam ser

contadas. A história da África negra precisa ser vista por um novo prisma e não

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mais sobre uma visão de desqualificação e carregada de preconceitos como

ainda ocorre nos dias de hoje.

Desta forma o cotidiano escolar poderá dar os primeiros passos rumo

ao enfrentamento às rejeições aos negros presentes no ambiente escolar.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

A Lei 10.639/03 em seu contexto geral é potencialmente capaz de

produzir transformações significativas no cenário da educação nacional e

consequentemente na sociedade brasileira. Vale destacar que são as nossas

iniciativas enquanto professores, governos e movimentos sociais organizados

que será capaz de fazer cumprir o seu propósito.

Pensar nos resultados alcançados com esta proposta, podemos afirmar

que o objetivo maior foi atingido. Conseguimos chamar a atenção da

comunidade escolar para este tema. Outras manifestações neste sentido vêm

ocorrendo no espaço escolar de forma mais frequente.

Após a aplicação do mesmo foi possível observar uma mudança de

postura por parte dos alunos e de alguns professores. As pessoas começaram

a ter mais cuidado com as palavras e com as brincadeiras. Mas ainda teremos

uma grande caminhada, precisamos avançar em nossos conteúdos de forma

que nas escolas as atividades culturais, conhecimentos, valores de outros

povos façam parte do ensino cotidiano de uma escola, não podemos mais

resumir nossas práticas escolares em comemorações folclóricas ou

simplesmente fazermos uma referência alusiva às datas comemorativas em

especial o dia 20 de novembro, 13 de maio entre outras.

Em relação aos alunos não aconteceu da forma como esperávamos, as

transformações não ocorrem de um dia para o outro, não se poder querer que

valores, costumes e informações sejam simplesmente esquecidos ou

substituídos por outros em tão pouco tempo.

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