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REDE INTERNACIONAL DE ENSINO LIVREINTERNATIONAL COURSES COLLEGE INTERNATIONAL OF FREE COURSES

CURSO PROFISSIONAL DE AGENTE COMUNITRIO DE SADELIVRE E PARA FINS CULTURAIS E DE CONHECIMENTOS

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REDE INTERNACIONAL DE ENSINO LIVREA MAIOR E MAIS COMPLETA UNIVERSIDADE DO BRASIL E DO MUNDO, MAIS DE 2.500 CURSOS CULTURAIS E SOCIAlS Desde 1990, com mais de 40 mil alunos em dezenas de pases.

1-NVEL BSICO 2-NVEL AVANADO A - ESPECIALIZAO; B - MESTRADO; C - DOUTORADO e; D - PS-DOUTORADO - PhD.

AV. PARANAIBA N 3.393 BAIRRO MARTA HELENA CAIXA POSTAL 91, FONES 0...34.3.268-1750 0800.940.1750 ITUIUTABA-MG. BRASIL, CEP 38.300-000 WWW.FACULDADELIVRE.COM.BR

APRESENTAO

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Parabns por estar se ingressando nesse momento na maior universidade de cursos livres do Brasil e do mundo. So mais de 2.500 cursos em todas as reas de trabalhos, para satisfazer as necessidades das pessoas que precisam de documentos para fins curriculares em busca de emprego; promoo e classificao para quem j est trabalhando e, para aperfeioamento em alguma rea onde o aluno j atua e trabalha e que depende de colocar o lindo CERTIFICADO no escritrio, escola, oficina ou ambiente de trabalho como distino e reconhecimento da cultura perante os olhos do pblico em geral e, ainda a carteirinha. Inovar requer ousadia e coragem, mas acima de tudo sabedoria. preciso valorizar as experincias adquiridas no passado, perceber todas as nuances da realidade que o presente nos coloca, e finalmente estar atento s mudanas e s oportunidades que o futuro nos reserva. Em 1990, nascamos como a primeira Escola de Cursos Livres do pas a oferecer curso na rea de vendas. Naquela poca, muitos no entendiam a amplitude do segmento de vendas, nem mesmo sua importncia para a economia do Pas. Conceitos como potenciais de Venda e Consumos foram introduzidos, e o mais importante: iniciamos um processo efetivo de qualificao profissional, cada dia mais valorizado pelo mercado de trabalho. Desde ento, o pioneirismo marca a histria da FACULDADE LIVRE, determinando mudanas profundas tambm nos rumos do ensino brasileiro e mundial. Crescemos muito e so muitos os exemplos de cursos inditos lanados pela Instituio como os de nveis avanados: especializaes, mestrados, doutorados e ps-PhD, onde os

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estudos, embora sejam tambm livres, mas avanado, ou seja, so mais aprofundados e por isso so apropriados para pessoas que j concluram alguma faculdade, e, exigimos como requisito para se matricular que o aluno j tenha o de graduao na rea respectiva, contudo somente para conhecimento e cultura. Nossos certificados no so tcnicos, no so profissionalizantes e nem de graduaes, e, por si s no do direito ao exerccio da profisso, so to somente culturais e de conhecimento. Em 2005, ratificando sua capacidade de antecipar-se s tendncias e a preocupao em atualizar profissionais alinhados s expectativas do mercado, passou a integrar a Rede Internacional de Universidades Livres e a oferecer aos alunos benefcios exclusivos, pautados em qualidade internacional, formao multicultural e

empregabilidade global. A busca constante pela excelncia em formao educacional outro ponto marcante na trajetria da FACULDADE LIVRE. Ao longo dos anos, a FACULDADE LIVRE no tem medido esforos para oferecer o que h de mais avanado em infra-estrutura virtual, bem como cursos livres do mais alto nvel, formado por profissionais de grande destaque. Por isso, com orgulho que convido para conhecer um pouco mais a FACULDADE INTERNACIONAL DE CURSOS LIVRES: uma instituio criativa e inovadora, comprometida com sua misso de contribuir para a construo de um mundo melhor, produzindo conhecimento e formando talentos criativos e empreendedores, capazes de ter sucesso em sua vida pessoal, social e profissional. Sucesso e boa sorte. A diretoria.

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CURSO PROFISSIONAL EM AGENTE COMUNITRIO DE SADE NDICE MDULO I INTRODUO 01- Realizar Mapeamento da Comunidade 02- Sociedade Contempornea 03- Vida Social e Comunicao 04- Histrico das Polticas de Sade do Brasil 05- Fundamentos de Assistncia a Famlia em Sade MDULO II CONCEITOS BSICOS 06- Sade de Informao da Ateno Bsica(SIAB), como Instrumento de Trabalho da Equipe do PSF 07- Epidemiologia das Doenas no Transmissveis 08- Administrao de Servios de Sade 09- Nmeros de Epidemiologia 10- Mensurao MDULO III PRINCPIOS GERAIS 11- Doenas causadas por Fungos 12- Doenas causadas pelo Lixo 13- Controle da Poluio 14- Sade Pblica 15- Doenas causadas por Mosquito

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CURSO BSICO PROFISSIONAL AGENTE COMUNITRIO DE SADE

01- Realizar mapeamento da comunidade Mapeamento da comunidade Uma vez que as pessoas estiverem cientes da necesidade de se fazerem preparativos para um possvel desastre, pode ser muito til que elas faam um mapa da sua comunidade. Os mapas do s pessoas a oportunidade de examinar sua comunidade por inteiro e considerar as coisas de diferentes maneiras. Os mapas podem ajudar a mostrar como certas coisas podem estar ligadas: por exemplo, moradias pobres em terras em que freqentemente h enchentes ou poos perto de casas de pessoas ricas. Os mapas desenhados por diferentes grupos, tais como homens, mulheres ou pessoas mais idosas, podem mostrar algumas diferenas interessantes.

Os mapas podem ser desenhados no cho, com varetas, folhas e pedras para

representar coisas, ou em folhas grandes de papel, com canetas. As pessoas devem ser incentivadas a marcar as caractersticas naturais, tais como rios, fontes de gua, solo elevado e rvores grandes, assim como os postos de sade, as escolas, as igrejas, as casas ou as estradas. Elas devem tambm marcar os locais em que pode haver algum risco em particular, como, por exemplo, pontes fracas, poos abertos, ladeiras ngremes com risco de desmoronamento.

Incentive os participantes a relaxar e permitir que todos dem seus pontos de vista

dentro de cada grupo. Uma vez que todos os grupos tiverem terminado, d tempo para que todos apresentem seus mapas e permita que haja uma discusso.

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Discusso

Reserve um dia para fazer o mapeamento da comunidade. O melhor fazer este

exerccio com grupos de 10 a 20 pessoas. As pessoas de diferentes idades, os homens e as mulheres podem ter idias bem diferentes. Use grupos mistos ou faa com que diferentes grupos de pessoas desenhem seus prprios mapas. Por exemplo, jovens, mulheres casadas, homens, e pessoas mais idosas poderiam todos produzir mapas.

Quais poderiam ser os resultados positivos de se fazer um mapeamento da Por que os diferentes grupos etrios, os homens e as mulheres mencionaram

comunidade?

aspectos diferentes em seus mapas? Como as diferentes observaes podem ser combinadas? Os pontos de vista e as observaes de quem so as mais importantes?

Como as descobertas deveriam ser compartilhadas e usadas? H alguma coisa que apenas um grupo tenha identificado? O que foi? Por que alguns

grupos tm mais probabilidade de observar certas coisas?

02- Sociedade Contempornea A sociedade contempornea em que vivemos, precisamente o sculo XXI, marcada por mudanas. Mudanas de paradigmas, mudanas culturais, scio-econmicas e de valores, que implicam necessariamente em uma re-adaptao do indivduo em seu meio. Frente a tantas mudanas, que no deixam de interferir no afeto e no comportamento, o indivduo em sua unicidade e a prpria coletividade tm sentido os efeitos desses impactos.

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Ao contrrio do que muitos pensam, a Dependncia Qumica no uma causa dos males atuais da sociedade, mas, um dos efeitos do caos em que emerge esta mesma sociedade. Esta falta de identidade contempornea tem trazido ao indivduo uma necessidade de se alienar de toda esta angstia conseqente. Por outro lado, paradoxalmente, quando o indivduo busca as drogas, este tem a uma possibilidade de encontrar a identidade perdida por meio da identificao grupal. Diante de todos os efeitos que a sociedade tem presenciado frente a este processo mutante contemporneo, sobre a Dependncia Qumica enquanto efeito que vamos discutir neste artigo. Relacionamentos e Qualidade de Vida: A sociedade contempornea marcada pelo individualismo. A necessidade crescente do indivduo precisar cada vez mais de se qualificar, estudar, se informar, um processo solitrio, mesmo que acontea em grupo. A internet e as possibilidades cada vez maiores de o indivduo poder resolver seus problemas via computador, fazem com que as relaes interpessoais cotidianas sejam cada vez mais desnecessrias. Desta forma, ao contrrio do que acontecia nas sociedades tradicionais, a sociedade contempornea no muito apropriada para sustentar amizades. As amizades, que outrora eram preservadas desde a infncia, hoje esto cada vez mais superficiais. Uma das grandes queixas do indivduo usurio de drogas, a solido. falta de compreenso, a falta de amigos. No Centro de Acolhimento SOS Drogas, 37% dos adolescentes que buscam o servio relatam experimentar a droga devido influncia de colegas, seguido de problemas familiares, que correspondem a 27%. Este acontecimento que os usurios relatam como influncia mostra a necessidade de o indivduo se inserir em um grupo e ser reconhecido a qualquer custo. Mesmo que para isto ele deva usar drogas. Esta influncia e esta superficialidade nas relaes no aparecem somente nos grupos externos. No Centro de Acolhimento SOS Drogas, 76% dos usurios que buscam o servio tm parentes que usam drogas. Ao contrrio do que se poderia esperar, h mais discusses em famlias emocionalmente prximas; quando a famlia realmente tem problemas, pais e filhos se evitam, em vez de discutir. (CSIKSZENTMIHALYI, 89). Desta forma, o indivduo se aliena usando drogas para que possa se sentir includo.

9 Algum outro familiar faz e fez uso de drogas?

Sim No No consta

Centro de Acolhimento SOS Drogas O fsico John Archibaldo Wheeler expressa seu ponto de vista diretamente: Se voc no discute suas idias, voc est por fora. Ningum, eu sempre digo, pode ser algum sem que haja pessoas por perto (CSIKSZENTMIHALYI, 95). Este pensamento tem congruncia com a Psicanlise, onde Lacan ressalta que a criana existe para e pelo outro, j que um plo de expectativas, projetos e atributos (LACAN, 659) Quanto aos relacionamentos, um outro tpico a ser levantando a sexualidade. Uma das grandes revolues da nossa cultura foi a Revoluo Sexual do sculo XX. A sexualidade foi descontextualizada, porm, e gerou-se a idia errnea de que a felicidade estaria presente na variedade e na freqncia dos encontros sexuais em detrimento de sua intensidade e profundidade. Paradoxalmente, percebe-se no indivduo contemporneo que, quanto mais ele busca sua essncia nos relacionamentos sexuais, mais distante ele fica deste encontro. E mais uma vez, a droga entra para tamponar a angstia gerada por mais este conflito. Enquanto no passado a sexualidade era reprimida, hoje podemos perceber a sexualidade sendo de todas as formas encorajadas e com uma forte influncia da sociedade de consumo, que d a iluso de uma realizao sexual. Desta forma, assim como as amizades e as famlias, os relacionamentos sexuais tornam-se tambm cada vez mais superficiais. O Trabalho e o cio Uma outra mudana que a sociedade vem sofrendo diz respeito dualidade trabalho X cio. Por incrvel que parea, um dos grandes desafios da sociedade contempornea aprender a usar seu tempo de maneira sensata. A maneira de se perceber o trabalho mudou muito. Enquanto as sociedades tradicionais percebiam o trabalho como um esforo fsico, a sociedade contempornea percebe o trabalho como

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uma manifestao de genialidade e criatividade, uma vez que a especializao faz-se cada vez mais dominante e atuante. Karl Marx j defendia esta idia quando dizia que s mediante a atividade produtiva que podemos realizar nosso potencial humano. Por outro lado, por mais que a sociedade evolua, os esteretipos sexuais ainda existem e os homens experienciam o trabalho de maneira diferenciada. O homem ainda se sente o provedor da casa e a mulher, aquela que proporciona famlia um ambiente adequado fsico e emocionalmente. Ao mesmo tempo, a cada gerao o conceito de trabalho torna-se mais vago, devido ao excesso de informaes contrapondo escassez de formaes. A natureza mutvel do trabalho e a falta de oportunidades aos jovens tem deixado-os confusos quanto carreira que pretendem seguir. Enquanto as crianas das sociedades tradicionais j eram educadas para a execuo de um ofcio, os jovens contemporneos se perdem ante as alternativas. No emprego, as pessoas tm a oportunidade de usar mente e corpo e com isto se sentem teis. Desta forma, a ociosidade uma porta aberta para que o indivduo busque alternativas, como as drogas, para mais uma vez tamponar esta angstia. O indivduo mdio est despreparado para o cio. Sem metas e sem outros com quem interagir, a maioria das pessoas perde a motivao e a concentrao. A mente comea a viajar, e geralmente se concentra em problemas insolveis que provocam ansiedade. Para evitar essa condio indesejvel, a pessoa recorre a estratgias que afastam o pior (...), envolver-se no jogo obsessivo ou na sexualidade promscua, ou ficar bbado ou se drogar. Essas so maneiras rpidas de reduzir o caos na conscincia a curto prazo (...).(CSIKSZENTMIHALYI, 68). No Centro de Acolhimento SOS Drogas, 88% dos usurios que buscam o servio relataram no estudar nem

SituaoProfissionaltrabalha estuda no trabalha/no estuda aposentado desem pregado trabalha e estuda outros no consta

trabalhar no momento. Este ndice nos mostra a dificuldade do indivduo, principalmente o homem, de adaptar ociosidade, uma vez que apenas 18% eram mulheres.

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Centro de Acolhimento SOS Drogas

SexoMasculino Feminino No consta

Centro de Acolhimento SOS Drogas Uma outra caracterstica acerca desta relao cio X trabalho, a crescente prtica do lazer passivo. Enquanto outrora as pessoas utilizavam seu tempo ocioso com prticas como esportes, jardinagem, dentre outras que proporcionavam ao indivduo uma satisfao de se sentir til, hoje, o lazer passivo tem sido uma prtica crescente como assistir televiso, estar com amigos, acessar a Internet. Essa ausncia de movimento at para o lazer, isola o sujeito cada vez mais, e o insere cada vez mais na atual sociedade individualista. Concluses: A Dependncia Qumica uma doena bio-psico-social. Ela se origina e se alimenta das adversidades orgnicas, psquicas e sociais. Desta forma, a Dependncia Qumica vista isoladamente, de nada serve para que se possa fazer algo contra ela. Ela fruto da sociedade contempornea, que se encontra adoecida pela falta de identidade. Fatores mencionados como as relaes, o trabalho e o cio, so problemas atuais que s se tornaram entraves, porque os indivduos no sabem mais se posicionar ante estas questes inerentes vida humana. Desta forma, a preveno Dependncia Qumica uma ao isolada, porm conjunta ao mesmo tempo. Quando o indivduo na sua unicidade, paralelamente a sociedade como um todo perceberem estas questes que perpassam pela vida cotidiana, conseguiro se encontrar, se adaptar aos novos paradigmas, aos novos modos de vida e no precisaro mais se alienar para conseguirem viver. A Idade Contempornea um tempo histrico em aberto. Compreendendo o final do sculo XVIII at os dias atuais, a contemporaneidade atrai o interesse de muitas pessoas devido emergncia e o apelo que as questes histricas e filosficas observadas neste perodo trazem

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tona. O desenvolvimento do capitalismo e a ascenso dos valores de um mundo em progresso ininterrupto figuram importantes fatos e correntes de pensamento do sculo XIX. No ltimo sculo, os problemas e transformaes de um mundo globalizado fizeram desta poca, conforme apontado pelo historiador Eric J. Hobsbawn, um sculo breve. A sociedade contempornea tem se caracterizado por um conjunto de acontecimentos que esto induzindo o desenho de uma nova realidade social, resultado de fenmenos econmicos, polticos, culturais que discutem mecanismos clssicos do direito, exigindo por isso dos operadores e pesquisadores da rea jurdica respostas eficazes para a configurao da complexibilizao desses fatores. Alguns fatores dessa mudana de perspectiva esto diretamente relacionados edificao dos Direitos Humanos como princpio orientador da preocupao maior do sistema jurdico e que tem no Estado o maior garantidor de sua eficcia; a internacionalizao voraz da economia que subtrai de tudo um valor econmico suscetvel de comercializao e de apropriao; o avano das descobertas cientficas e tecnolgicas que induzem o surgimento de novos temas que passam a ser objeto de discusso da comunidade acadmica para sua configurao. O ser humano o verdadeiro detentor da qualidade de pessoa, e deve sempre destacar sua maior caracterstica que vem a ser a sua dignidade tica, que o faz titular de direitos inatos, inalienveis e imprescritveis, dos quais o Estado e a comunidade cientfica devem muito respeito. A dignidade da pessoa humana no vem a ser uma criao jurdica do direito pblico ou privado, mas um elemento preexistente a toda a experincia jurdica, logo, este elemento encontra-se ameaado, tendo em vista todos os avanos da tecnologia cientfica, pois hoje se fala at mesmo em Biopirataria de DNA humano; ou seja, em pleno sculo XXI a sociedade se defronta com problemas de patenteamento de seres vivos, que esto diretamente ligados com a influncia da economia hoje em nossa sociedade. importante que a sociedade comece a se precaver e tente estimar acima dos valores propriamente econmicos os valores ticos, visando a impedir que as atividades se desenvolvam ao sabor exclusivo dos interesses apenas individuais, sem ateno aos interesses coletivos, e sociais. Todos os seres humanos devem estar convictos de que existem interesses superiores aos da ordem econmica, como a preservao da dignidade humana, que levam a ordem jurdica a submeter a economia a certos ditames, como por exemplo normas que preservam a integridade fsica e a sade do ser humano, como as que limitam as horas de trabalho, entre outras normas que

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atuam nos mais variados campos de proteo ao ser humano, sendo que infelizmente ainda no temos ditames que minimizem a situao deprimente hoje enfrentada com a Biopirataria e demais problemas que colocam o ser humano como protagonista deste cenrio de violncia. Diante da anlise da sociedade contempornea esta tem se caracterizado por um conjunto de acontecimentos que esto induzindo o desenho de uma nova realidade social, resultado de fenmenos econmicos, polticos, culturais. Ser que esta nova realidade social a realidade ideal? Respondendo pergunta, no o ideal, e no tem ainda a menor possibilidade de ser o ideal, pelo simples motivo de que este conjunto de acontecimentos evolutivos so importantes, mas no esto devidamente controlados, estando como principal problema a necessidade de regulamentao. Diante do estudo dos direitos humanos de quarta gerao, deve-se adicionar a observao de todos os princpios da biotica, como por exemplo, a autonomia, a justia, e a beneficncia, sendo estudados de forma unificada, e conseguindo resguardar bens maiores, como o direito vida e dignidade da pessoa humana, sendo importante destacar que esta atitude no vem sendo obedecida. A quarta gerao de direitos humanos refere-se a um jogo de interesses e uma diversidade de valores que por muitas vezes causam conflitos, cabendo aqui destacar que o problema da atualidade desfrutar dos avanos e progredir. Paralelamente a isso, a humanidade deve se preparar para os problemas que necessitaram de solues mais complexas no futuro, tanto que os estudos mais recentes justificam que as novas descobertas cientficas no campo da cincia da vida so grandiosas, mas podem gerar problemas que no sero to fceis de se resolver em perodos posteriores. lgico que se consideram os questionamentos de ordem tica, moral e jurdica que nascem com o avano da biotica, bem como o crescente desenvolvimento das pesquisas cientficas e a utilizao da biotecnologia, como tcnica aplicada ao estudo da vida, pois a biotica deve ser estudada em conjunto com seus princpios, visto que quando se leva em considerao o estudo da tica da vida, est se permitindo o progresso da cincia perante a humanidade; porm no devendo nunca ser esquecida a dignidade humana como interesse prevalecente, a qual traz resultados positivos ao homem, como por exemplo, a melhoria da sade humana. A idia trazer um momento de discusso para a sociedade, para que todos possam parar e refletir acerca dos avanos apresentados na cincia da vida, que tm sido em grande escala e em ritmo alucinante. Importa ressaltar que a sociedade tambm deve e precisa ser esclarecida e ouvida, a fim de que uma regulamentao justa e unnime seja imposta e que venha realmente atender aos

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interesses de toda a humanidade, pois o assunto no discute qualquer bem pertencente ao homem, e sim o seu bem maior que a vida, o material gentico humano. Apesar de todas as tentativas em sentido contrrio, realizadas, sobretudo a partir da Modernidade, impossvel negar que toda reflexo sobre as relaes entre tica e trabalho se assenta, a rigor, sob um paradoxo, estabelecido pela estrita separao entre esses dois domnios. Em virtude dessa necessria, porm abrupta entrada na matria, temo, no entanto que a incompreenso inicial, longe de despertar a curiosidade, suscite no leitor a desconfiana e o desinteresse, seno pela filosofia, ao menos pelo texto que, no encerramento desta coletnea, ela inspira. Assim sendo, devo prevenir-me e, para faz-lo, vou permitir-me um desvio pelo territrio to eminentemente filosfico das definies, antes de dar a vislumbrar o cenrio contemporneo em que, enfim, as relaes entre tica e trabalho devero ser examinadas. Tomemos, pois, esse desvio, no para retardar a discusso, mas para evitar que ela incida sobre o campo da moral da discusso, normativa ou simplesmente interrogativa, sobre os bons costumes, sobre o cdigo de conduta, sobre o comportamento julgado adequado em ambiente de trabalho. Seja, pois, por um lado, a tica, como reflexo sobre os princpios ou, o que vem a dar exatamente no mesmo, sobre os fins ltimos, sobre as finalidades do agir humano, sobre o prprio sentido da existncia individual e coletiva; seja ainda, por outro lado, o trabalho, como atividade que meio para produo de alguma coisa, que est relacionada a um fazer eficaz, a uma ao apropriada e conforme a fins que so exteriores atividade. Apresentada como reflexo, a tica diz respeito deciso, que incumbe a cada indivduo e a cada sociedade, de julgar, escolher e instituir em sua prpria existncia os princpios, os valores que devero guiar suas relaes com o mundo, com as coisas, com os outros homens, submetendo-os a permanente questionamento. As decises relativas ao trabalho dependem, quanto a elas, do que se poderia chamar, numa acepo bastante ampla, de tcnica: escolha dos saberes a serem convocados, dos instrumentos, dos procedimentos, das aes a serem empregados na consecuo do resultado final. Ser foroso constatar que assim definidos os dois termos, no existe uma tica do trabalho, embora possam (e devam!) existir formas ticas de se investir a atividade do trabalho. Mas, nesse caso, essas formas devero estar continuamente submetidas ao exerccio da auto-reflexo e do questionamento constante.

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com tal atitude que o presente artigo se prope a contribuir. O trabalho como significao imaginria social Muito embora sob o termo genrico de humanidade possamos reconhecer uma srie de caractersticas biolgicas, funcionais, psquicas, comuns a todos os humanos, sempre de maneiras muito diferentes que essas determinaes so incorporadas, trabalhadas e retrabalhadas pelas diversas culturas e momentos histricos, sob a forma de costumes, de representaes, de formas de encarar o mundo, de definir sua existncia e, no caso que nos interessa aqui, de organizar e valorar as atividades humanas. Assim, cada sociedade, cada poca, institui aquilo que C. Castoriadis denominava seus tipos antropolgicos prprios. O modo de ser e de agir dos antigos babilnios no o mesmo dos revolucionrios franceses de fins do sculo XVIII; as formas de trabalhar, de raciocinar, de sentir, de desejar, de fazer planos, de se afetar, de temer de um tupi-guarani, h quinhentos anos, em nada se assemelhava quelas do portugus navegador, ou dos brasileiros e brasileiras atuais. Encarnando-se em tipos antropolgicos especficos, os indivduos formados e socializados em e por uma sociedade especfica, do existncia e realidade s significaes que cada sociedade institui para si, que a fazem ser como tal sociedade, e no uma outra: Toda sociedade cria seu prprio mundo, criando, precisamente, as significaes que lhe so especficas O papel dessas significaes imaginrias sociais, sua funo para empregar o termo sem qualquer conotao funcionalista tripla. So elas que estruturam as representaes do mundo em geral, sem as quais no pode existir ser humano. Essas estruturas so, a cada vez, especficas: nosso mundo no o mundo grego antigo, e as rvores que vemos por estas janelas no abrigam, cada uma delas, uma ninfa, simplesmente madeira, esta a construo do mundo moderno. Em segundo lugar, elas designam as finalidades da ao, elas impem o que deve ser feito, ou no deve ser feito: deve-se adorar a Deus, ou ento deve-se acumular as foras produtivas ainda que nenhuma lei natural ou biolgica, nem mesmo psquica, diga que se deve adorar Deus ou acumular as foras produtivas. E, em terceiro lugar ponto, sem dvida, mais difcil de abordar elas estabelecem os tipos de afetos caractersticos de uma sociedade. () Mas, entre as significaes institudas por cada sociedade, a mais importante , sem dvida, a que concerne prpria sociedade. So precisamente essas significaes imaginrias sociais que fornecem, de maneira mais ou menos explcita, e de acordo com o grau de autonomia da sociedade, sentido para as atividades humanas. Ora, a reflexo tica comea, exatamente, quando os sentidos para a existncia que nos

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so fornecidos pela sociedade passam a ser objeto de nosso questionamento consciente e contnuo. Por isso, a relao que buscamos, entre tica e trabalho, nos impe o questionamento dos sentidos que so associados a essa atividade e da centralidade que lhe foi concedida por toda a sociedade ocidental contempornea. Centralidade do trabalho industrial Foi apenas h relativamente pouco tempo, na histria, que aquilo que denominamos de trabalho foi erigido condio de valor central da existncia. claro que as diferentes sociedades sempre tiveram que lidar com as necessidades relativas sua sobrevivncia, que foram a cada vez institudas, organizadas e orientadas de acordo com cada cultura especfica; claro tambm que nenhuma sociedade sobreviveria se no fosse capaz de atribuir significado s atividades que visavam a garantir, exatamente, sua continuidade. Assim, era prpria vida, considerada valor mximo, que o trabalho devia seu reduzido sentido. No entanto, de modo geral, a idia de que se pudesse passar toda a vida a trabalhar foi a maior parte do tempo encarada com perplexidade: punio dos deuses ou condio dos povos vencidos, reduzidos escravido, a consagrao integral ao trabalho, longe de conferir dignidade, marcava a fatalidade e o oprbrio que sobre alguns recaa. Essa , pois, a grande novidade introduzida pela Modernidade: que o trabalho e, muito particularmente, o trabalho industrial, tenha se estabelecido como referncia absoluta para todas as atividades da vida. Conhecemos bem as condies objetivas que serviram de base para essa profunda transformao radical: acmulo de riquezas sob a forma de capital financeiro, rpido avano da cincia e de suas aplicaes tecnolgicas, incessante inveno de mquinas e procedimentos destinados atividade industrial. E conhecemos, tambm, suas condies histricas e culturais: declnio das formas tradicionais de organizao poltica e social, emergncia de nova atitude de confiana indiscriminada na razo humana e suas possibilidades, instituio do projeto de domnio absoluto da natureza e de um verdadeiro fascnio pela idia de progresso. Em poucos sculos, o trabalho passou do lugar de desconfiana e desprezo a que foi relegado tradicionalmente para o topo da hierarquia das atividades humanas: entre os sculos XVII e XIX ele se transformou, de fonte de toda propriedade legtima (Locke), em condio da prpria humanidade e expresso mxima do homem (Marx). E, em que pesem as recusas que enfrentou, as terrveis polmicas, as infinitas anlises e as tantas vezes sangrentas aes que suscitou, em sua campanha vitoriosa, o trabalho moderno foi, at meados do sculo XX, no apenas uma realidade inexorvel, mas igualmente objeto de uma verdadeira glorificao terica.

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Isso no significa que no se tenha percebido desde logo que o preo a ser pago por essa ascenso do trabalho era extremamente caro: mas no pareciam restar dvidas, nem para os tericos, nem para os homens de ao, de que a empreitada no s valia a pena como era digna da imensa confiana que nela se depositava. Assim, ainda que as primeiras crticas ao trabalho moderno coincidam com sua instaurao, elas no chegam a abalar a crena de que a mudana era um caminho sem volta, uma exigncia histrica que se fazia, a partir dali, verdadeiro princpio e condio da emancipao dos indivduos e da felicidade social. E, por toda parte onde se espraiou, o trabalho moderno modificou definitivamente os hbitos e as mentalidades, modelando as antigas culturas s suas novas exigncias: urbanizao, aparelhamento burocrtico, racionalizao dos comportamentos e vnculos. Na tarefa, demonstrou um vigor historicamente inaudito de propagao e, tambm sob esse aspecto, proclamou-se o advento de uma nova temporalidade, a partir da qual se pde conceber o destino da espcie e avaliar os mritos de cada sociedade. Redesenhadas, as fronteiras de poder reafirmam a diviso do mundo em reas desenvolvidas, e reas que passaro a buscar, permanentemente, o desenvolvimento; em povos e naes que podiam desfrutar imediatamente das benesses da nova era, da nova humanidade, e aqueles que deviam dedicar muito afinco e muito esforo at que pudessem ver realizadas as promessas de incluso no paraso moderno. As ltimas dcadas do sculo XX precipitaram, porm, de forma ainda mais brusca todo o edifcio construdo pela modernidade. Crises de diversas ordens financeiras, ocupacionais, infraestruturais obrigaram ao reconhecimento da fragilidade das bases sobre as quais o projeto de organizao social dos modernos fora construdo. At ento, a ascenso do trabalho se fez passar, sob certos aspectos, por uma verdadeira conquista do den: vitria definitiva sobre o tempo cclico da natureza, pela aquisio do tempo progressivo da produo, todo feito de superao; triunfo, at mesmo, sobre o tempo linear em que se realiza a existncia humana, sempre submetido inexorvel lei segundo a qual tudo que floresce conhece tambm o declnio, j que o desenvolvimento indefinido da cincia e da tcnica tornou-se simplesmente o paradigma a partir do qual se imaginava um tempo fora daquilo que faz, precisamente, existir para ns a noo do tempo: os limites. A realidade revelou-se, porm, outra: longe de promover um sempre crescente e ampliado bem-estar, o modelo de organizao social correspondente ao trabalho moderno s fez acentuar as desigualdades e excluses, tanto entre os pases, como no interior de praticamente todos os pases do mundo. Assentado sob a iluso de uma explorao ilimitada da natureza, o modelo civilizatrio que produziu a ascenso do trabalho conduziu rpida devastao das reservas de matrias primas

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e de energia necessrias produo e no um detalhe que, ao faz-lo, colocou em risco as prprias condies de vida no planeta. O pressuposto fundante, historicamente presente na maior parte das correntes de pensamento econmico, foi o de que possvel a anlise do processo de criao da riqueza por meio da abstrao da natureza, limitando a visada da teoria aos aportes relativos do capital e do trabalho ou, mais recentemente, ao papel do conhecimento. A partir desse pressuposto se constri o paradigma de crescimento sem limite, que foi hegemnico na cultura ocidental desde a consolidao da idia de progresso. Todavia, como argumentou com lucidez Herman E. Daly, a economia um subsistema aberto que opera no interior de um sistema mais amplo, fechado e com limites finitos que o planeta Terra, com o qual estabelece relaes de permanente intercmbio. Por meio desses intercmbios, o subsistema econmico obtm, como insumos, os recursos naturais e energticos que est a requerer, enquanto descarrega sobre a natureza os resduos e dejetos de sua atividade. Assim sendo, s possvel abstrair essas relaes de intercmbio na teoria e no clculo econmico enquanto a dimenso ou escala desse subsistema econmico pequena, em relao dimenso do planeta podendo-se, assim, para propsitos prticos, trabalhar com o pressuposto de uma natureza sem limites. Sem embargo, na medida em que o subsistema econmico cresce e se apropria de uma proporo crescente, tanto dos recursos como da capacidade de carga da Terra, j no mais possvel manter a fico da economia como um sistema fechado e auto-suficiente. Atingido esse ponto, j no mais possvel ignorar os limites do crescimento. Tampouco era a capacidade de consumo social inesgotvel, sobretudo em vista da lgica de concentrao de renda, que levou o capital financeiro a autonomizar-se no somente em relao aos riscos permanentes a que est submetida a atividade produtiva, mas tambm em relao forma de organizao nacional que lhe era correlata. Assistiu-se, em conseqncia, a uma profunda retrao do emprego, contra a qual os governos, apesar de toda a retrica economicista, nada puderam e que vem se revelando quase insuportvel em pases como o Brasil. Na dcada de 1950, H. Arendt advertira: o ltimo estgio de uma sociedade de operrios a sociedade de detentores de emprego; e, ento, j no a confiana no progresso, a crena nas promessas da razo, o desejo obscuro de colocar-se fora do tempo que sustentam a relao dos sujeitos com o trabalho, mas apenas o mero instinto de sobrevivncia, a requerer um funcionamento puramente automtico dos indivduos. Em suma: o trabalho industrial, que pde se apresentar como figura e modelo no s do trabalho na modernidade, mas de todas as atividades humanas, d hoje provas evidentes de seu total esgotamento o que sem dvida no quer dizer que sua influncia no se faa mais sentir

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sobre a existncia individual e coletiva. Antes pelo contrrio: paradoxalmente, ainda o trabalho industrial que serve de figura e de modelo a partir do qual se pensa o conceito mais amplo de trabalho em nossas sociedades. O trabalho, a ao, o sentido Marx definia o domnio do trabalho como o da objetivao humana: para ele, o trabalho cria o homem. Mais do que nunca antes, a afirmao valida para os tempos modernos e para a contemporaneidade, tambm. Mas, de forma mais geral, igualmente verdadeiro que, pelo trabalho, o sujeito faz existir aquilo que no existia anteriormente, que no estava na natureza, que s existe em funo da vida social: o mundo objetivo das coisas. H. Arendt afirmava que essa atividade de fabricao se distingue nitidamente das atividades visando a mera sobrevivncia, que ela denominava labor, e que, a rigor, no produzem mais do que as condies objetivas de manuteno da vida. O labor guarda, assim, uma estreita associao com a dimenso natural, diramos, fisiolgica do humano. O trabalho, no entanto, cria a artificialidade da vida humana, ele a atividade correspondente ao artificialismo da existncia humana O trabalho produz um mundo artificial das coisas, nitidamente diferente de qualquer ambiente natural. Dentro de suas fronteiras habita cada vida individual, embora este mundo se destine a sobreviver e transcender todas as vidas individuais. () O trabalho e o seu produto, o artefato humano emprestam certa permanncia e durabilidade futilidade da vida mortal e ao carter efmero do tempo humano. Em comparao objetividade dos produtos do trabalho, os produtos da atividade direta entre os homens da atividade ao, que j no se realiza sobre a natureza ou com a matria, mas com a linguagem, sobre si prprio e sobre os outros aparecem como extremamente fteis, isso , frgeis e intangveis. a ao, o discurso e o pensamento no produzem nem geram coisa alguma: so to fteis quanto prpria vida. Para que se tornem coisas mundanas, isso , feitos, fatos, eventos e organizaes de pensamento ou idias, devem primeiro ser vistos, ouvidos e lembrados, e em seguida transformados, coisificados, por assim dizer, em ditos poticos, na pgina escrita ou no livro impresso, em pintura ou escultura, em algum tipo de registro, documento ou monumento. Todo o mundo fatual dos negcios humanos depende, para sua realidade e existncia contnua, em primeiro lugar da presena de outros que tenham visto e ouvido e que lembraro; e em segundo lugar, da transformao do intangvel na tangibilidade das coisas. Tudo aquilo que, para o humano, sentido, a comear por sua prpria auto-representao, sua identidade, mas tambm o mundo de significaes que o fazem existir, suas crenas, seus objetivos, seus valores, suas relaes, depende

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de uma certa objetivao que garantida, em primeiro lugar, pelo outro, pela comunidade em que o indivduo se insere e com a qual compartilha, por via da socializao, esses sentidos; e, em seguida, pelas diferentes coisas que, constituindo o mundo objetivo dos humanos, sem esses sentidos seriam apenas um amontoado de artigos incoerentes, um no-mundo. E tambm obra dessa comunidade a construo da significao atribuda prpria materialidade de que a vida humana no pode se passar. Em outras palavras, se o trabalho condio para emergncia da realidade mundana, a criao de um mundo comum de significaes a condio de possibilidade para a construo, pelo sujeito, do sentido de sua existncia individual, que sempre parte dos sentidos coletivos que essa sociedade pe a disposio de seus membros. Os muros da cidade, os monumentos, as casas, os utenslios cotidianos e os objetos rituais, as obras de arte, os livros, tudo isso faz existir um mundo mais ou menos durvel de coisas materiais, fornece tangibilidade experincia humana no mundo. No entanto (e bem por essa razo que grifei, duas citaes acima, a palavra certa) mesmo esse sentimento de permanncia concedida existncia pela materialidade dos frutos do trabalho jamais puderam se comparar imperecibilidade daquilo que Arendt denomina a ao a atividade de constituio do espao comum, a poltica, que cria a esfera pblica, que condio para a emergncia da memria e da histria que sobrevivero a ns. Subsiste, pois, uma contnua tenso entre o movimento de criao dos sentidos da existncia coletiva e individual e a necessidade de sua materializao, de sua realizao como produtos objetivos do trabalho humano. Ora, dizer que o trabalho assumiu, a partir da Modernidade, uma crescente centralidade no seio da vida social implica dizer que essa tenso tendeu a ser rompida: que o fazer coisas prevaleceu sobre o agir, que houve perda do sentido comum da existncia, reduzida agora materialidade dos produtos objetivos do trabalho. E, de fato, s incertas conquistas que a ao realizou, nos tempos modernos, correspondeu nos primeiros momentos a triunfante e inquestionvel evidncia dos avanos do fazer humano. Foi s ento que se acreditou que, ao invs de receber seu sentido da ao, o trabalho poderia, ele prprio, passar a fornecer sentido para a existncia e a convivncia humanas: no outro o movimento de retrao da esfera pblica, ou de racionalizao da sociedade que o liberalismo apregoa. O poltico substitudo pelo especialista, a frgil matria das deliberaes coletivas pela objetividade da lgica de mercado tudo, enfim, parece poder ser dominado pelo fazer instrumental: E, realmente, entre as principais caractersticas da era moderna, desde o seu incio at o nosso tempo, encontramos as atitude tpicas do homo faber: a instrumentalizao do mundo, a

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confiana nas ferramentas e na produtividade do fazedor de objetos artificiais; a confiana no carter global da categoria de meios e fins e a convico de que qualquer assunto pode ser resolvido e qualquer motivao humana reduzida ao princpio da utilidade; () o equacionamento da inteligncia com a engenhosidade, ou seja, o desprezo por qualquer pensamento que no possa ser considerado como o primeiro passo para a fabricao de objetos artificiais, principalmente de instrumentos para fabricar outros instrumentos e permitir a infinita variedade de sua fabricao; e, finalmente, o modo natural de identificar a fabricao com a ao. Assim, o trabalho passa a ser o que h em comum entre os homens, a produtividade critrio de todo o valor, o correlato objetivo, universalmente vlido e inapelavelmente fiel a partir do qual todos os homens devem passar a ser medidos e hierarquizados, tanto em sua representao de si quanto em seu lugar na sociedade. Ocorre que o desaparecimento da esfera pblica, que correlativo expanso desmesurada da atividade privada, resulta na prpria fragilizao do sentido da existncia: pois agora o modelo de uma produo de objetos cada vez mais efmeros, prontos a serem consumidos e substitudos, que serve de base para a criao das referncias e valores que estabelecem o mundo comum. Um mundo do qual a perenidade, a estabilidade foram inteiramente banidas. Privatizao, crise do sujeito, crise da tica No somente a esfera pblica tendeu a desaparecer no mundo moderno, sob o impacto da racionalizao da sociedade e do conjunto de atividades humanas; tambm as certezas, os valores, as instituies, as verdades, as referncias culturais e histricas sobre as quais o mundo comum se apoiava passam a ser objeto de um radical questionamento. Relacionando-se cada vez mais com os outros na esfera do trabalho e quase que somente a, o homem moderno descobriu-se s na tarefa de fornecer sentido e direo para sua existncia. Analisando os impasses da tica na sociedade atual, M. R. Kehl considera que o sujeito contemporneo , na verdade, um ser duplamente dividido: apartado dos outros, ele foi institudo como indivduo, ser solitrio para quem j no contam as dimenses coletivas da existncia humana. A ausncia do outro priva o sujeito de modos de pertinncia, de produo de sentidos para a vida, de filiao, de amparo simblico, enfim, das referncias que forneciam sustentao sua constituio como sujeito social, sua socializao. Mas tambm da prpria experincia de si, que tanto depende dos outros, que o sujeito contemporneo se encontra privado: ele se desconhece, no entende mais o que determina seus prprios impulsos, tendncias, no reconhece o seu desejo.

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essa a outra face da privatizao: o aprisionamento do sujeito em uma subjetividade annima que no encontra nenhum correlato na cultura, na vivncia social. ao final do processo assistimos emergncia de um sujeito que passa a desconhecer tanto suas determinaes ntimas como o carter coletivo, social, das foras que o atravessam. Para se acreditar independente, individual entre seus semelhantes, ele tem que ignorar (recalcar?) todas as evidncias de sua dependncia. O sujeito contemporneo est s, com seus apetites e desejos: ao invs de um sentido mais perene e durvel para sua existncia, ele quer apenas a segurana e o conforto; ao invs de construir um projeto para sua vida, interessa-lhe usufruir ao mximo, evitar ao mximo toda dor e frustrao. Dessa forma, crise objetiva do mundo que se ergueu sob as bases do trabalho moderno, soma-se a crise da subjetividade, a falncia dos processos de identificao e dos modelos de socializao que faziam existir os indivduos e serviam de referncia para suas atividades. Como pode o sistema, nessas condies, continuar a existir? pergunta-se C. Castoriadis. Sua resposta , no mnimo, embaraosa: Ele se mantm por que se beneficia ainda de modelos de identificao produzidos no passado: o matemtico que acabo de mencionar, o juiz ntegro, o burocrata legalista, o operrio consciencioso, o pai responsvel por seus filhos, o professor que, sem qualquer razo, ainda se interessa por seu trabalho. Mas nada no sistema tal como justifica os valores que estes personagens encarnam, que eles investem e que se espera que persigam em sua atividade. Mas por que um juiz deveria ser ntegro? Por que um professor deveria se cansar com seus guris, ao invs de deix-los passar o tempo, salvo em dia de visita do inspetor? Por que um operrio deveria se matar tentando apertar o centsimo qinquagsimo parafuso, se ele pode dar um jeitinho face ao controle de qualidade? No h, nas significaes capitalistas, desde o comeo, mas, sobretudo, em vista do que se tornaram atualmente, nada que possa fornecer uma resposta a esta questo. Eu comecei afirmando que os domnios da tica e do trabalho so separados: no h uma tica que derive espontaneamente do trabalho, no da lgica do trabalho que se pode implicar uma tica capaz de fornecer sentido existncia. Ao insistir no contrrio, a modernidade fez mais do que tornar a distncia entre tica e trabalho ainda mais descomunal: ela levou a sociedade e os indivduos por ela socializados a uma existncia cada vez mais esvaziada, cada vez mais empobrecida. isso que faz Castoriadis afirmar que a sociedade se mantm s custas da contraditria sobrevivncia de valores e de sentidos do passado, s custas de modelos de

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identificao produzidos no passado. Triste a sociedade que forada a se amparar nas runas daquilo que conscienciosamente destruiu, pois ela reserva a seus membros uma nica e dolorosa alternativa: continuar se agarrando a valores que no mais se objetivam nas produes, instituies e comportamentos sociais valores que carecem, pois, de qualquer visibilidade, que so continuamente desacreditados pela lgica social; ou, ento, viver uma vida ancorada na efemeridade e na instabilidade dos valores disponveis, na expectativa de um consumo e de uma fruio que no vm para a maioria dos indivduos, mas que condena a todos frustrao. Mas, valeria a pena continuar buscando no trabalho um sentido que ele no pode fornecer? Parece-me que no! No entanto, isso no implica necessariamente como tantos j pensaram em adotar a atitude contrria, imaginando outro den, este agora em que os homens estariam todos libertos do trabalho, do labor, da pena relativa labuta diria. Em que condies poder, ento, a atividade do trabalho assegurar a necessria objetivao existncia humana, sem por isso cobrar dessa existncia sua integral submisso ao que, por si s, carece de sentido? Esse parece ser, a meu ver, o grande desafio da atualidade: a construo de sentidos mais durveis, mas estveis, mais generosos para a existncia depende da reconstruo dos laos sociais, e esses, por sua vez, se tecem pela experincia de participao em uma obra comum. Serme- objetado que essa afirmao nada tem de novo, que h muito os socilogos do trabalho j descobriram pelo menos desde meados do sculo passado que a valorizao das relaes humanas, o cuidado com o outro, o estabelecimento de condies de trabalho satisfatrias eram essenciais para o desempenho do trabalhador. Mas, a rigor, esses socilogos jamais puderam comprovar suas teses; muito ao contrrio, face crise do trabalho, que no previram, elas revelaramse inteiramente infundadas. Ora, onde essa sociologia errou foi em acreditar que se poderia extrair da lgica do trabalho moderno um sentido de humanizao que limitasse seus excessos, que suavizasse sua inflexvel busca de lucro, que ponderasse sua irrefrevel tendncia a tudo reduzir ao critrio da produtividade. Em outras palavras, errou em buscar justificar pelas prprias exigncias do trabalho uma tica de humanizao, em propor uma compatibilidade entre a tica e as exigncias de eficcia e rendimento. No nos preocupamos com a felicidade dos outros porque isso nos tornar mais eficazes e racionais, mas porque somos humanos, e escolhemos nos preocupar com os humanos; no investimos na autoconstruo humana porque essa uma exigncia do desenvolvimento tcnico e cientfico, pelos ganhos materiais que da adviro, mas porque decidimos acreditar que o desenvolvimento tcnico e cientfico, que os ganhos materiais no tm sentido em si, mas s valem a pena ser buscados se deles puder usufruir toda a sociedade.

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Em suma, a tica que pode, hoje ainda, significar o trabalho depende de outra coisa, que no o prprio trabalho, por si s: depende de uma deciso que, tomada solitariamente, insuportvel; depende da conscincia de que o sentido da existncia individual se ancora nos sentidos coletivamente construdos; depende da deciso de conceber a verdadeira finalidade da atividade humana no mundo como sendo muito mais do que a produo de bens materiais ou imaterais; como sendo, antes de tudo, o da auto-criao, por parte de cada humano, de sentidos mais generosos para sua existncia individual e coletiva. E como dessa auto-criao, o outro tem, necessariamente, que participar, penso que a tica depende, finalmente, da deciso de abandonar os mveis de fruio e gozo individuais pelo projeto de construo comum da sociedade em que habitaremos.

03- Vida social e comunicao Vida social um padro de comportamento que envolve o indivduo e a sociedade, caracterizado pela suas inter-relaes. De modo simplificado, a vida social o contato com amigos, o conhecimento de novas pessoas e a viso que os outros tm sobre a pessoa na sociedade, que o motiva a aprender coletivamente e perceber responsabilidades e compromissos sociais. Em Sociologia, uma sociedade o conjunto de pessoas que compartilham propsitos, gostos, preocupaes e costumes, e que interagem entre si constituindo uma comunidade. A sociedade objeto de estudo comum entre as cincias sociais, especialmente a Sociologia, a Histria, a Antropologia e a Geografia. Em Biologia, sociedade um grupo de animais que vivem em conjunto, tendo algum tipo de organizao e diviso de tarefas, sendo objeto de estudo da Sociobiologia. Uma sociedade um grupo de indivduos que formam um sistema semi-aberto, no qual a maior parte das interaes feita com outros indivduos pertencentes ao mesmo grupo. Uma sociedade uma rede de relacionamentos entre pessoas. Uma sociedade uma comunidade interdependente. O significado geral de sociedade refere-se simplesmente a um grupo de pessoas vivendo juntas numa comunidade organizada. A origem da palavra sociedade vem do latim societas, uma "associao amistosa com outros". Societas derivado de socius, que significa "companheiro", e assim o significado de sociedade intimamente relacionado quilo que social. Est implcito no significado de sociedade que seus membros compartilham interesse ou preocupao mtuas sobre um objetivo comum. Como

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tal, sociedade muitas vezes usado como sinnimo para o coletivo de cidados de um pas governados por instituies nacionais que lidam com o bem-estar cvico. Pessoas de vrias naes unidas por tradies, crenas ou valores polticos e culturais comuns, em certas ocasies tambm so chamadas de sociedades (por exemplo, Judaico-Crist, Oriental, Ocidental etc.). Quando usado nesse contexto, o termo age como meio de comparar duas ou mais "sociedades" cujos membros representativos representam vises de mundo alternativas, competidoras e conflitantes. Tambm, alguns grupos aplicam o ttulo "sociedade" a eles mesmos, como a "Sociedade Americana de Matemtica". Nos Estados Unidos, isto mais comum no comrcio, em que uma parceria entre investidores para iniciar um negcio usualmente chamada de uma "sociedade". No Reino Unido, parcerias no so chamadas de sociedade, mas cooperativas. Margaret Thatcher no foi a nica a dizer que no existe sociedade. Ainda h um debate em andamento nos crculos antropolgicos e sociolgicos sobre se realmente existe uma entidade que poderamos chamar de sociedade. Tericos marxistas como Louis Althusser, Ernesto Laclau e Slavoj Zizek argumentam que a sociedade nada mais do que um efeito da ideologia dominante e no deveria ser usada como um conceito sociolgico. Tendo como fio condutor as anlises que procuram discutir como se do as relaes que as pessoas mantm com o seu tempo, este texto busca examinar os vnculos entre tempo, indivduo e vida social, acentuando, principalmente, as diferenas existentes entre uma vivncia orientada pela perspectiva do futuro, caracterstica da modernidade, e outra que, centrada no momento presente, para alguns analistas, indicaria o nascimento de uma nova ordem social. Ser tambm avaliada a hiptese que aponta para a emergncia de um novo tempo social dominante e de novas formas de manifestao da individualidade, elementos que caracterizariam o surgimento dessa nova ordem. O tempo social dominante de uma sociedade aquele que lhe permite cumprir os atos necessrios para a produo dos meios que garantem sua sobrevivncia, possibilitando a criao, manifestao, realizao e atualizao de seus valores fundamentais. Os procedimentos envolvidos nesse processo qualificam aqueles que os utilizam, a sociedade em que vigoram e as relaes sociais que desencadeiam. Em cada tipo de coletividade, e em todos os nveis, a satisfao das existentes e a criao de novas necessidades, a transmisso descendncia do modo adequado de ser e da maneira desejvel de agir, atribui significados, faz nascer valores que passam a ser compartilhados, constituindo modos de vida e tipos de sociabilidade.

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A forma pela qual uma dada sociedade garante a manuteno da vida, expressa no seu modo de produzir, nas regras que a organizam e nas principais atividades exigidas por essa produo, interfere sobre o seu ritmo temporal e indica qual o tempo que nela predomina. Como as atividades que so secundrias para a definio desse processo articulam-se em torno dele, os tempos sociais em que essas atividades se desenvolvem: articulam-se em torno do tempo social dominante e submetem-se a seu ritmo. As mais diferentes teorias sociais qualificam a ordem social moderna como "sociedade do trabalho", exatamente porque reconhecem na categoria trabalho sua dinmica central. O tempo do trabalho regular, homogneo, contnuo, exterior, coercitivo, linear e abstrato o tempo social nela dominante. Por conseguinte, qualquer dos outros tempos sociais existentes, referentes a atividades que no so determinantes para sua caracterizao, penetrado por esses traos, que adquirem a conotao de identificadores do tempo. Pessoas e instituies lhe esto submetidos, fazendo com que a prpria definio de ser social individual e coletivo sofra a mediao dos conceitos de trabalho e tempo de trabalho. Entretanto, atualmente, o trabalho vem sendo questionado como valor central da vida social, tanto objetiva como subjetivamente. identificada uma crise, ligada ao fim da percepo da categoria trabalho como dimenso qualificadora da sociedade, e do tempo a ele referente, como tempo dominante, sugerida a transio para um novo conjunto de significados, a emergncia de uma nova ordem e, em decorrncia, de um novo tempo social dominante, ainda que no plenamente configurados. A perspectiva temporal, como a concebemos, s se concretizou quando, alm da percepo de um ontem, referente ao passado, e de um hoje, relativo ao presente, tornou-se possvel pensar a emergncia de um amanh que pudesse, realmente, representar uma alternativa futura ao que existia. A forma com que nos habituamos a perceber o mundo e nele viver tornou-se vigente somente quando, no apenas individualmente, mas tambm em termos sociais, surgiu a possibilidade efetiva de apreenso dessa tripla dimenso temporal. Substituindo um andamento cclico, o surgimento de um tempo tridimensional, marcado pela distino entre passado, presente e futuro, um dos elementos qualificadores da vida moderna. O presente identifica o momento no qual, amparada pela experincia do passado e lanando mo da razo, a humanidade projetaria o seu futuro. A prpria relevncia do tempo "depende[ria] da capacidade de interrelacionar o passado e o futuro no presente" (4 apud 5). A emergncia da possibilidade de uma viso histrica do (e no) mundo estaria, portanto, vinculada ao surgimento dessa forma de percepo temporal.

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Ainda mais importante, a idia de progresso, a crena no planejamento como controle racional dos processos sociais e na possibilidade de construo de um projeto, coletivo ou individual, s passaram a atuar na orientao das condutas humanas a partir do momento em que o futuro passou a ser prefigurado, almejado, buscado. Dessa forma, a sociedade moderna e seus valores bsicos esto referidos crena na possibilidade de um futuro visualizado no presente e a partir deste construdo, de um futuro pressentido como abertura um possvel configurado pela ao humana. Em contraste, atualmente, alguns autores afirmam que a memria histrica j no est viva. Para eles, a intensificao crescente do ritmo temporal implica que j no se tenha memria do passado e esteja cada vez mais distante a possibilidade de um futuro. O esforo para manter-se em dia com o seu prprio tempo provoca, nas pessoas, o afastamento dos padres significativos do passado, sem que suas prprias referncias de valor se enrazem; com isso, as perspectivas de um (possvel) futuro ficam tambm obscurecidas. Do mesmo modo, a experincia do passado j no garante a base para atuao no presente.

Beck afirma que, na sociedade contempornea, entendida por ele como sociedade de risco, "o passado perde o poder de determinar o presente; seu lugar tomado pelo futuro". Dessa forma, algo inexistente, inventado, fictcio aparece como causa de uma experincia atual. "Tornamo-nos ativos, hoje, para prevenir, aliviar ou tomar precaues contra crises e problemas de amanh e de depois de amanh" e notvel a rapidez com que ocorre a obsolescncia das formas de fazer, de agir e/ou de pensar. Sua anlise ressalta a transformao crucial em curso na prpria noo de tempo, acentuando que a conscincia do risco repousa no no presente, mas no futuro: em conseqncia, necessrio projetar o que vir depois a fim de determinar e organizar (agora) as aes. Esse segundo ponto deve ser enfatizado: para prevenir riscos, o futuro deve ser antecipado, de forma a gerar aes preventivas no presente. Dessa forma, mesmo considerando que, como no passado, o

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futuro ainda aparece como dimenso importante, hoje, o presente o tempo acentuado, enquanto, anteriormente, o futuro a ser construdo aparecia como a dimenso temporal forte. Paralelamente, a destruio do passado surge como um dos fenmenos mais terrveis do sculo XX perdem-se os mecanismos sociais capazes de vincular a experincia pessoal da atual gerao das geraes passadas. Ao mesmo tempo, os jovens contemporneos parecem habitar uma espcie de presente contnuo, expresso na vivncia repetida do agora, a busca desenfreada do momento atual. Alis, essa uma caracterstica da vida contempornea: a busca intensificada do prazer, a necessidade de viver para o momento, "viver para si, no para os que viro a seguir, ou para a posteridade". A intensificao dessa percepo do presente tambm expressa na idia de que "a categoria temporal do futuro suprimida e substituda pela do presente prolongado", um presente ampliado, que passa a absorv-lo. Problemas que, antes, podiam ser remetidos a um tempo futuro, penetram o presente, impem solues que poderiam esperar o amanh, mas exigem ser tratadas hoje mesmo. Dessa forma, o futuro no mais oferece o campo livre para a projeo dos desejos, esperanas e crenas, cada vez mais obscurecido pelas questes do momento, criando uma dinmica prpria do presente, que se torna seu prprio centro. Fala-se na falncia da perspectiva do futuro, sentimento disseminado que estaria na raiz do desencantamento e da desesperana que caracteriza(ria)m no s a vivncia das novas geraes mas contaminam a totalidade da vida contempornea. Diferentemente das sociedades tradicionais, centradas no passado, ou daquelas orientadas para o futuro, o presente (seria), atualmente, cada vez mais privilegiado. Eis aqui, portanto, o problema: o nosso seria um tempo de dissoluo dos elementos que, h pelo menos trs sculos, tem constitudo a base temporal em que ocorrem os processos sociais. Essa constatao sugere estar em curso uma assustadora re-significao do tempo, caracterizada pela crescente desvalorizao cultural do passado, a progressiva perda de perspectiva e de esperana em relao ao futuro, e a acentuao exasperada da vivncia do presente, preenchido exaustivamente. Portanto, no haveria mais passado ou futuro, e, considerando que, sem conexo com o que foi e com o que est por vir, rigorosamente, o presente acaba por no ter existncia e que um tempo unidimensional no pode, a rigor, receber essa qualificao, tampouco se poderia falar em presente, pois "um presente eterno no pode ser um presente" (13 apud 5). Essa assertiva aplicarse-ia tanto aos conjuntos quanto aos indivduos. Lasch, por exemplo, salienta que o homem

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psicolgico do sculo XX nega o passado e tem dificuldade de enfrentar o futuro, o que acarreta a perda de significado do prprio presente. Tem sido sugerido que atingimos um momento em que prpria sobrevivncia da sociedade, da forma que aprendemos a perceb-la, est ameaada. A desintegrao dos velhos padres de relacionamento humano e, com ela, a quebra dos elos entre geraes, entre passado e presente, foi a mudana mais perturbadora ocorrida no sculo XX. Castoriadis, entre outros, j havia tratado de questo semelhante, lembrando a necessidade do restabelecimento desses vnculos, a fim de que no naufraguem os valores da civilizao, no se instale a barbrie nas relaes humanas e possa ser superada a crise no processo de identificao, que se manifesta atualmente. Sem dvida, as alteraes que se processam nas formas de produo da vida, por um lado, e na percepo e vivncia da temporalidade, bem como na dimenso temporal que valorizada, por outro, repercutem no processo de constituio dos indivduos do nosso tempo, na prpria maneira como se vm e queles com os quais compartilham o mesmo sentido de tempo. necessrio lembrar que um dos traos marcantes da relao entre indivduo e tempo, caracterstica da modernidade, era a possvel construo do traado da prpria vida pelos indivduos. Tratava-se, pois, da afirmao bem sucedida de suas prprias capacidades, implicando que seu futuro podia ser, pelo menos em parte, escolhido livremente, com a nfase incidindo sobre a escolha livre. Essa forma de conceber a trajetria individual afastava a crena atuante desde a antigidade at o Renascimento , em um destino inexorvel, irrevogvel e imutvel que, mesmo conhecido previamente, no podia ser evitado, o que exigia das pessoas, para serem bem sucedidas, que atuassem de modo adequado, conformando-se a (e com) ele. A idia da sociedade de/do risco, trabalhada por Beck, traz de volta a idia do destino, ainda que de forma no idntica. "Agora, na civilizao desenvolvida, existe uma espcie de destino de risco, no interior do qual se nasce, do qual no se pode escapar, com a pequena diferena (que tem um grande efeito) que estamos todos igualmente confrontados com ele.". Presentemente, tem sido com freqncia questionada a possibilidade da existncia de pessoas com as qualidades e caractersticas louvadas pelo discurso moderno, em seus primrdios: indivduos capazes de serem livres para alcanarem um grau mais alto de verdade, condio que traduzia o ideal ocidental do que significava ser humano. Em outras palavras, cada vez mais, tem-se duvidado que, em nosso tempo, ainda seja factvel a emergncia de seres humanos racionais, livres e iguais, nos quais se tenham desenvolvido, de maneira equilibrada, os sentidos de alteridade e de

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pertena. Pessoas que sejam orientadas para o futuro, capazes de, mediante atos voluntrios, sacrificarem a satisfao imediata de seus desejos, em nome da segurana e da preservao material e moral - da prpria existncia. Na emergncia da modernidade, a habilidade em utilizar a experincia do passado para conhecer o presente e, dessa forma, poder antecipar racionalmente uma sociedade alternativa futura, pela mediao de um projeto transformador, distinguia o indivduo, era o cerne da manifestao da individualidade. Esta se caracterizava pela capacidade de pensar e de agir autonomamente, de dar incio ao novo, pela capacidade de previso e proviso do prprio futuro e daqueles que eram prximos, tendo um horizonte que ultrapassava, de longe, a expectativa de vida de algum, tomado isoladamente. Ainda durante o perodo da II Grande Guerra, Horkheimer j havia sugerido serem cada vez mais difceis as possibilidades de planejar o futuro. Acreditava que o "indivduo contemporneo pode[ria] ter mais oportunidades do que seus ancestrais, mas suas perspectivas concretas tm prazo cada vez mais curtos, [uma vez que o] futuro no entra rigorosamente em suas transaes.". Esse impedimento, j percebido em meados do sculo XX, desdobrou-se em uma situao incomparavelmente mais complexa, no incio do sculo XXI. Hoje, difcil visualizar um futuro factvel, as perspectivas parecem inexistentes, circunstncia vivenciada como ameaa de derrota, unida sensao do retorno de um destino irrevogvel, contra o qual no h oposio possvel. Alm dessa, uma outra questo est presente, ligada crescente dificuldade que as pessoas tm de valorizar o tempo disponvel como aquele em que se torna possvel a realizao de expectativas, a fruio do que se almeja, a expresso de si naquilo que feito. No mesmo momento em que o valor realizao de si emerge como um dos pontos principais de manifestao da individualidade, acentuam-se as contradies inerentes ao processo de individualizao contemporneo, atuante num processo societrio que torna a autonomizao individual crescentemente impossvel. Explico-me. O indivduo se efetiva, ao lado da identidade genrica derivada do fato de ser membro da espcie humana, pelo talento e possibilidade que demonstra de cultivar, em si, aquelas qualidades que o tornam nico e singular. No sculo XIX, atingia o status de indivduo, na acepo forte do termo, aquela pessoa capaz de constituir a si mesma enquanto obra, aplicando-se cotidiana e continuamente ao cultivo daqueles traos que a distinguissem das outras, sem qualquer equvoco. Essa tarefa, simultaneamente estressante e dignificadora, imprimia um sentido vida de cada um, comportando busca consciente, planejamento deliberado e liberdade de escolha.

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Nesse registro, trabalhar era sinnimo de disciplina, dignidade, auto-estima, bem-estar, progresso, conquista de autonomia. Sucesso ou fracasso dependia do tipo de trabalho exercido e da atitude de cada um diante dele. A possibilidade de trabalhar (acreditava-se) estava aberta para todos os que se dispunham a conquistar seu lugar no mundo, (bem) utilizando suas capacidades e habilidades. A situao atual mudou, em vrios sentidos. De um lado, ocorre que, hoje, cada vez mais intensamente, cresce o nmero de pessoas que, embora procurando trabalhar, no conseguem colocao e no contam com qualquer outra forma de sobrevivncia. Assim, ainda que, objetivamente, haja condies para que disponham de mais tempo livre e possam preench-lo de forma mais independente, aumenta o nmero daqueles que, ao invs de tempo livre, vivem um tempo sem ocupao, sentem-se pressionados pela condio de no-trabalho e, portanto, impedidos de crescerem enquanto indivduos. Por outro lado, a utilizao do tempo livre com atividades prazerosas e significativas vinculadas ao trabalho, ao estudo, arte ou ao artesanato no mais capaz de preencher as expectativas das pessoas. Aparentemente, a dimenso do consumo ocupa todos os domnios, inclusive o tempo livre. Ainda no mesmo registro, possvel constatar que o foco preferencial no agora impe uma vida social em que, quanto mais amigos se tm, menos tempo possvel dedicar a cada um, os relacionamentos so efmeros, mesmo sendo intensos, os laos sociais so, continuamente, produzidos, reproduzidos e consumidos, e muito difcil compartilhar narrativas e experincias. Tempo, individualidade, vida social. Aparentemente, dizendo respeito a processos ultrapassados, so noes que supostamente j no possibilitam compreender o momento histrico em que vivemos e, em conseqncia, interferir sobre as condies que o constituem. Entretanto, mesmo reconhecendo que as mudanas em curso no permitem, como parecia se dar anteriormente, que a apreenso das situaes se processe em noes mais ou menos cristalizadas, imensa a dificuldade de projetar uma nova percepo do tempo, uma estruturao diversa da vida social, uma noo de indivduo radicalmente distinta. Sem dvida, o momento em curso crucial. Entretanto, o que talvez deva ser acentuado que, hoje, est havendo uma radicalizao to intensa das caractersticas atribudas ao tempo, ao indivduo e vida social, desde o incio dos tempos modernos, que parece alterar sua qualidade. Em conseqncia, diferentemente do que, no passado, era anunciado como condio generalizvel, o

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processo de individualizao/individuao est agora restrito queles(as) poucos(as) capazes de sucesso na criao de suas personalidades e de atribuio de significado e dignidade s suas vidas. Diante das questes suscitadas pelas consideraes acima, guisa de concluso, emprego palavras utilizadas num outro contexto: "No centro (...) [da profunda transformao da vida social contempornea, de seus valores e significados, e do tempo no qual operam] no est um novo tipo de sociedade, mas um novo tipo de indivduo, que no cultiva nem a nostalgia de um passado dourado, nem a esperana por um futuro redentor, mas que, possuindo uma 'inflexibilidade treinada para enxergar as realidades da vida', est apto para responder 's demandas do dia.".

04- Histrico das polticas de sade do Brasil A Histria do Brasil um domnio de estudos de Histria focado na evoluo do territrio e organizao social do Brasil que, canonicamente, se estende da chegada dos portugueses at os dias atuais. No entanto, este artigo tambm contm informaes sobre a pr-histria do Brasil, ou seja, o perodo em que no houve registros escritos sobre as atividades desenvolvidas pelos povos indgenas no Brasil. O primeiro europeu a chegar nas terras que hoje formam o Brasil foi o espanhol Vicente Yez Pinzn no dia 26 de Janeiro de 1500. Apesar disso oficialmente o Brasil foi descoberto em 22 de Abril de 1500 pelo navegador portugus Pedro lvares Cabral, que, no comando de uma esquadra com destino ndia, chegou ao litoral sul da Bahia, na regio da atual cidade de Porto Seguro, mais precisamente no distrito de Coroa Vermelha, onde foi realizada a primeira missa no Brasil. A partir de 1530, a Coroa Portuguesa implementou uma poltica colonizadora, inicialmente com as capitanias hereditrias, depois com o governo geral, instalado em 1548. No final do sculo XVII foram descobertas ricas jazidas de ouro nos atuais estados de Minas Gerais, Gois e Mato Grosso que foi determinante para o povoamento do interior do Brasil. Em 1789, quando a Coroa portuguesa anunciava a derrama, medida para cobrar supostos impostos atrasados, eclodiu em Vila Rica (atual Ouro Preto) a Inconfidncia Mineira. A revolta fracassou e, em 1792, um de seus lderes, Tiradentes, morreu enforcado. No incio do sculo XIX, com a transferncia da Corte Portuguesa para o Brasil, fugindo das tropas de Napoleo Bonaparte, o regente Dom Joo VI abriu os portos do pas, permitiu o funcionamento de fbricas e fundou o Banco do Brasil. Com isso, o pas tornou-se Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves e Dom Joo VI, coroado rei. Logo depois voltou para Portugal, deixando seu filho mais velho, Dom Pedro I do Brasil, como regente do pas.

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Em 7 de setembro de 1822, Dom Pedro proclamou a independncia e reinou at 1831, quando foi sucedido por seu herdeiro, Dom Pedro II, que tinha apenas cinco anos. Aos catorze anos em 1840, Dom Pedro II teve sua maioridade declarada, sendo coroado imperador no ano seguinte. No final da primeira dcada do Segundo Reinado, o regime estabilizou-se. As provncias foram pacificadas e a ltima grande insurreio, a Revolta Praieira, foi derrotada em 1849. Nesse mesmo ano, o imperador extingue o trfico de escravos. Aos poucos, os imigrantes europeus assalariados substituram os escravos. No contexto geopoltico, o Brasil se alia Argentina e Uruguai e entra em guerra contra o Paraguai. No final do conflito, quase dois teros da populao paraguaia estava morta. A participao de negros e mestios nas tropas brasileiras na Guerra do Paraguai deu grande impulso ao movimento abolicionista e ao declnio da monarquia. Pouco tempo depois, em 1888, a princesa Isabel, filha de Dom Pedro II, assina a Lei urea, que extingue a escravido. Ao abandonar os proprietrios de escravos, sem os indenizar, o imprio brasileiro perde a ltima base de sustentao. Em 15 de novembro de 1889, ocorre a proclamao da repblica pelo marechal Manuel Deodoro da Fonseca e tem incio a Repblica Velha, terminada em 1930 com a chegada de Getlio Vargas ao poder. A partir da, a histria do Brasil destaca a industrializao do Brasil e a participao brasileira na Segunda Guerra Mundial ao lado dos Estados Unidos; o movimento militar de 1964, onde o general Castelo Branco assumiu a presidncia. O Regime Militar, a pretexto de combater a subverso e a corrupo, suprimiu direitos constitucionais, perseguiu e censurou os meios de comunicao, extinguiu os partidos polticos e criou o bipartidarismo. Aps o fim do regime militar, os deputados federais e senadores se reuniram , em 1988, em assemblia nacional constituinte e promulgaram a nova Constituio, que amplia Periodizao. A periodizao tradicional divide a Histria do Brasil normalmente em quatro perodos gerais:

Ano

Perodo

Antes de Pr1500 Descobrimento 1500 a 1822 1822 a 1889 Colnia Imprio

Depois Repblica de 1889

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Perodo pr-descobrimento (at 1500) Quando descoberto pelos portugueses em 1500, estima-se que o atual territrio do Brasil (a costa oriental da Amrica do Sul), era habitado por 2 milhes de indgenas, do norte ao sul. A populao amerndia era repartida em grandes naes indgenas compostas por vrios grupos tnicos entre os quais se destacam os grandes grupos tupi-guarani, macro-j e aruaque. Os primeiros eram subdivididos em guaranis, tupiniquins e tupinambs, entre inmeros outros. Os tupis se espalhavam do atual Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte de hoje. Segundo Lus da Cmara Cascudo, os tupis foram a primeira raa indgena que teve contacto com o colonizador e () decorrentemente a de maior presena, com influncia no mameluco, no mestio, no lusobrasileiro que nascia e no europeu que se fixava. A influncia tupi se deu na alimentao, no idioma, nos processos agrcolas, de caa e pesca, nas supersties, costumes, folclore, como explica Cascudo: O tupi era a raa histrica, estudada pelos missionrios, dando a tropa auxiliar, recebendo o batismo e ajudando o conquistador a expulsar inimigos de sua terra. () Eram os artfices da rede de dormir, criadores da farinha de mandioca, farinha de pau, do complexo da goma de mandioca, das bebidas de frutas e razes, da carne e peixe moqueados, elementos que possibilitaram o avano branco pelo serto. Do lado europeu, a descoberta do Brasil foi precedida por vrios tratados entre Portugal e Espanha, estabelecendo limites e dividindo o mundo j descoberto do mundo ainda por descobrir. Destes acordos assinados distncia da terra atribuda, o Tratado de Tordesilhas (1494) o mais importante, por definir as pores do globo que caberiam a Portugal no perodo em que o Brasil foi colnia portuguesa. Estabeleciam suas clusulas que as terras a leste de um meridiano imaginrio que passaria a 370 lguas martimas a oeste das ilhas de Cabo Verde pertenceriam ao rei de Portugal, enquanto as terras a oeste seriam posse dos reis de Castela (atualmente Espanha). No atual territrio do Brasil, a linha atravessava de norte a sul, da atual cidade de Belm do Par atual Laguna, em Santa Catarina. Quando soube do tratado, o rei de Frana Francisco I teria indagado qual era "a clusula do testamento de Ado" que dividia o planeta entre os reis de Portugal e Espanha e o exclua da partilha.

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Perodo colonial (1500-1808) A chegada dos portugueses

O perodo compreendido entre o Descobrimento do Brasil em 1500, (chamado pelos portugueses de Achamento do Brasil), at a Independncia do Brasil, chamado, no Brasil, de Perodo Colonial. Os portugueses, porm, chamam este perodo de A Construo do Brasil, e o estendem at 1825 quando Portugal reconheceu a independncia do Brasil. No dia 22 de abril de 1500, o ento portugus Pedro lvares Cabral, saindo de Lisboa, iniciou viagem para oficialmente descobrir e tomar posse das novas terras para a Coroa, e depois seguir viagem para a ndia, contornando a frica para chegar a Calecute. Levava duas caravelas e 13 naus, e por volta de 1 500 homens - entre os mais experientes Nicolau Coelho, que acabava de regressar da ndia;] Bartolomeu Dias, que descobrira o cabo da Boa Esperana, e seu irmo Diogo Dias, que mais tarde Pero Vaz de Caminha descreveria danando na praia em Porto Seguro com os ndios, ao jeito deles e ao som de uma gaita. As principais naus se chamavam Anunciada, So edro, Esprito Santo, El-Rei, Santa Cruz, Fror de la Mar, Victoria e Trindade. O vice-comandante da frota era Sancho de Tovar e outros capites eram Simo de Miranda, Aires Gomes da Silva, Nuno Leito, Vasco de Atade, Pero Dias, Gaspar de Lemos, Lus Pires, Simo de Pina, Pedro de Atade, de alcunha o inferno, alm dos j citados Nicolau Coelho e Bartolomeu Dias. Por feitor, a armada trazia Aires Correia, que havia de ficar na ndia, e por escrives Gonalo Gil Barbosa e Pero Vaz de Caminha. Entre os pilotos, que eram os verdadeiros navegadores, vinham Afonso Lopes e Pero Escobar. Diz a Crnica do Serenssimo Rei D. Manuel I: E, porque el Rei sempre foi mui inclinado s coisas que tocavam a nossa Santa f catlica, mandou nesta armada oito frades da ordem de S. Francisco, homens letrados, de que era Vigrio frei Henrique, que depois foi confessor del Rei e Bispo de Ceuta, os quais como oito capeles e um vigrio, ordenou que ficassem em Calecut, para administrarem os sacramentos aos portugueses e aos da terra se se quisessem converter f. ncoras levantadas em Lisboa, a frota passou por So Nicolau, no arquiplago de Cabo Verde, em 16 de maro. Tinham-se afastado da costa africana perto das Canrias, tocados pelos ventos alsios em direo ao ocidente. Em 21 de abril, da nau capitnea avistaram-se no mar, boiando, plantas. Mais tarde surgiram pssaros martimos, sinais de terra prxima. Ao amanhecer de 22 de abril ouviu-se um grito de "terra vista", pois se avistou o monte que Cabral batizou de Monte Pascoal, no litoral sul da atual Bahia.

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Ali aportaram as naus, discutindo-se at hoje se teria sido exatamente em Porto Seguro ou em Santa Cruz Cabrlia (mais precisamente no ilhu de Coroa Vermelha, no municpio de Santa Cruz Cabrlia), e fizeram contato com os tupiniquins, indgenas pacficos. A terra, a que os nativos chamavam Pindorama ("terra das palmeiras"), foi a princpio chamada pelos portugueses de Ilha de Vera Cruz e nela foi erguido um padro (marco de posse em nome da Coroa Portuguesa). Mais tarde, a terra seria rebatizada como Terra de Santa Cruz e posteriormente Brasil. Estava situada 5.000 km ao sul das terras descobertas por Cristvo Colombo em 1492 e 1.400 quilmetros aqum da Linha de Tordesilhas. Srgio Buarque de Holanda descreve, em Histria Geral da Civilizao Brasileira: Tendo velejado para o norte, acharam dez lguas mais adiante um arrecife com porto dentro, muito seguro. No dia seguinte, sbado, entraram os navios no porto e ancoraram mais perto da terra. O lugar, que todos acharam deleitoso, proporcionava boa ancoragem e podia abrigar mais de 200 embarcaes. Alguma gente de bordo foi terra, mas no pode entender a algaravia dos habitantes, diferente de todas as lnguas conhecidas. No dia 26 de abril, um domingo (o de Pascoela), foi oficiada a primeira missa no solo brasileiro por frei Henrique Soares (ou frei Henrique de Coimbra), que pregou sobre o Evangelho do dia. Batizaram a terra como Ilha da Vera Cruz no dia 1 de maio e numa segunda missa Cabral tomou posse das terras em nome do rei de Portugal. No mesmo dia, os navios partiram, deixando na terra pelo menos dois degredados e dois grumetes que haviam fugido de bordo. Cabral partiu para a ndia pela via certa que sabia existir a partir da costa brasileira, isto , cruzou outra vez o Oceano Atlntico e costeou a frica. O rei D. Manuel I recebeu a notcia do descobrimento por cartas escritas por Mestre Joo, fsico e cirurgio de D. Manuel e Pero Vaz de Caminha, semanas depois. Transportadas na nau de Gaspar de Lemos, as cartas descreviam de forma pormenorizada as condies geogrficas e seus habitantes, desde ento chamados de ndios. Atento aos objetivos da Coroa na expanso martima, Caminha informava ao rei: Nela at agora no podemos saber que haja ouro nem prata, nem alguma coisa de metal nem de ferro lho vimos; pero a terra em si de muitos bons ares, assi frios e temperados como os d'antre Doiro e Minho, porque neste tempo de agora assi os achamos como os de l; guas so muitas infindas e em tal maneira graciosa, que querendo aproveitar-se dar-se- nela tudo por bem das guas que tem; pero o melhor fruto que nela se pode fazer me parece que ser salvar esta gente () boa e de boa simplicidade.

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Damio de Gis narra o descobrimento em sua lngua renascentista: Navegando a loeste, aos xxiiij dias do mes Dabril viram terra, do que foro muito alegres, porque polo rumo em que jazia, vio no ser nenhuma das que at ento eram descubertas. Padralures Cabral fez rosto para aquela banda & como foro bem vista, mandou ao seu mestre que no esquife fosse a terra, o qual tornou logo com novas de ser muito fresca & viosa, dizendo que vira andar gente baa & nua pela praia, de cabelo comprido & corredio, com arcos & frechas nas mos, pelo que mandou alguns dos capites que fossem com os bateis armados ver se isto era assi, os quaes sem sairem em terra tornaram capitaina afirmando ser verdade o que o mestre dixera. Estando j sobrancora se alevantou de noite hum temporal, com que correram de longo da costa ate tomarem hum porto muito bom, onde Pedralures surgio com as outras naos & por ser tal lhe pos nome Porto Seguro. Alm das cartas acima mencionadas, outro importante documento sobre o descobrimento do Brasil o Relato do Piloto Annimo. De incio, a descoberta da nova terra foi mantida em sigilo pelo Rei de Portugal. O resto do mundo passou a conhecer o Brasil desde pelo menos 1507, quando a terra apareceu com o nome de Amrica na carta (mapa) de Martin Waldseemller, no qual est assinalado na costa o Porto Seguro. Expedies exploratrias Em 1501, uma grande expedio exploratria, a primeira frota de reconhecimento, com trs naus, encontrou como recurso explorvel apenas o pau-brasil, de madeira avermelhada e valiosa usada na tinturaria europia, mas fez um levantamento da costa. Comandada por Gaspar de Lemos, a viagem teve incio em 10 de maio de 1501 e findaria com o retorno a Lisboa em 7 de setembro de 1502, depois de percorrer a costa e dar nome aos principais acidentes geogrficos. Sobre o comandante, podem ter sido D. Nuno Manuel, Andr Gonalves, Ferno de Noronha, Gonalo Coelho ou Gaspar de Lemos, sendo este ltimo o nome mais aceito. Em 1501, no dia 1 de novembro, foi descoberta a Baa de Todos os Santos, na atual Bahia, local que mais tarde seria escolhido por D. Joo III para abrigar a sede da administrao colonial. Alguns historiadores negam a hiptese de Gonalo Coelho, que s teria partido de Lisboa em 1502. O Baro do Rio Branco, em suas Efemrides, fixa-se em Andr Gonalves, que a verso mais comumente aceita. Mas Andr Gonalves fazia parte da armada de Cabral, que retornou a Lisboa quando a expedio de 1501 j partira para o Brasil e com ela cruzou na altura do arquiplago de Cabo Verde.

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Assim, diversos historiadores optam por Gaspar de Lemos, que entre junho e julho de 1500 havia chegado a Portugal com a notcia do descobrimento. O florentino Amrico Vespcio vinha como piloto na frota (e por seu nome seria batizado todo o continente, mais tarde). Depois de 67 dias de viagem, em 16 de agosto, a frota alcanou o que hoje o Cabo de So Roque (Paraba) e, segundo Cmara Cascudo, ali plantou o marco de posse mais antigo do Brasil. Houve, na ocasio, contatos entre portugueses e os ndios potiguares. Ao longo das expedies, os portugueses costumavam batizar os acidentes geogrficos segundo o calendrio com os nomes dos santos dos dias, ignorando os nomes locais dados pelos nativos. Em 1 de novembro (Dia de Todos os Santos), chegaram Baa de Todos os Santos, em 21 de dezembro (dia de So Tom) ao Cabo de So Tom, em 1 de janeiro de 1502 Baa da Guanabara (por isso batizada de "Rio de Janeiro") e no dia 6 de janeiro (Dia de Reis) angra (baa) batizada como Angra dos Reis. Outros lugares descobertos foram a foz do rio So Francisco e o Cabo Frio, entre vrios. As trs naus que chegaram Guanabara eram comandadas por Gonalo Coelho, e nela vinha Vespcio. Tomando a estreita entrada da barra pela foz de um rio, chamaramna Rio de Janeiro, nome que se estendeu cidade de So Sebastio que ali se ergueria mais tarde. Em 1503 houve nova expedio, desta vez comandada (sem controvrsias) por Gonalo Coelho, sem ser estabelecido qualquer assentamento ou feitoria. Foi organizada em funo um contrato do rei com um grupo de comerciantes de Lisboa para extrair o pau-brasil. Trazia novamente Vespcio e seis navios. Partiu em maio de Lisboa, esteve em agosto na ilha de Fernando de Noronha e ali afundou a nau capitnia, dispersando-se a armada. Vespcio pode ter ido para a Bahia, passado seis meses em Cabo Frio, onde fez entrada de 40 lguas terra adentro. Ali teria deixado 24 homens com mantimentos para seis meses. Coelho, ao que parece, esteve recolhido na regio onde se fundaria depois a cidade do Rio de Janeiro, possivelmente durante dois ou trs anos. Nessa ocasio, Vespcio, a servio de Portugal, retornou ao maior porto natural da costa brasileira, a Baa de Todos os Santos. Durante as trs primeiras dcadas, o litoral baiano, com suas inmeras enseadas, serviu fundamentalmente como apoio rota da ndia, cujo comrcio de produtos de luxo seda, tapetes, porcelana e especiarias era mais vantajoso que os produtos oferecidos pela nova colnia. Nos pequenos e grandes portos naturais baianos, em especial no de Todos os Santos, as frotas se abasteciam de gua e de lenha e aproveitavam para fazer pequenos reparos. No Rio de Janeiro, alguns navios aportaram no local que os ndios chamavam de UruuMirim, a atual praia do Flamengo. Junto foz do rio Carioca (outrora abundante fonte de gua doce) foram erguidas uma casa de pedra e um arraial, deixando-se no local degredados e galinhas. A

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construo inspirou o nome que os ndios deram ao local (cari-oca, "casa dos brancos"), que passaria a ser o gentlico da cidade do Rio. O arraial, no entanto, foi logo destrudo. Outras esquadras passariam pela Guanabara: a de Cristvo Jacques, em 1516; a de Ferno de Magalhes (que chamou o local de Baa de Santa Luzia), em 1519, na primeira circunavegao do mundo; outra vez a de Jacques, em 1526, e a de Martim Afonso de Sousa, em 1531. Outras expedies ao litoral brasileiro podem ter ocorrido, j que desde 1504 so assinaladas atividades de corsrios. Holanda, em Razes do Brasil, cita o capito francs Paulmier de Gonneville, de Honfleur, que permaneceu seis meses no litoral de Santa Catarina. A atividade de navegadores no-portugueses se inspirava doutrina da liberdade dos mares, expressada por Hugo Grotius em Mare liberum, base da reao europia contra Espanha e Portugal, gerando pirataria alargada pelos mares do planeta. Extrao de pau-brasil O pau-brasil (que os ndios tupis chamavam de ibirapitanga) era a principal riqueza de crescente demanda na Europa. Estima-se que havia, na poca do descobrimento, mais de 70 milhes de rvores do tipo, abundando numa faixa de 18 km do litoral do Rio Grande do Norte at a Guanabara. Quase todas foram derrubadas e levadas para a Europa. A extrao foi tanta que atualmente a espcie protegida para no sofrer extino. Para explorar a madeira, a Coroa adotou a poltica de oferecer a particulares, em geral cristos-novos, concesses de explorao do pau-brasil mediante certas condies: os concessionrios deveriam mandar seus navios descobrirem 300 lguas de terra, instalar fortalezas nas terras que descobrissem, mantendo-as por trs anos; do que levassem para o Reino, nada pagariam no primeiro ano, no segundo pagariam um sexto e no terceiro um quinto. Os navios ancoravam na costa, algumas dezenas de marinheiros desembarcavam e recrutavam ndios para trabalhar no corte e carregamento das toras, em troca de pequenas mercadorias como roupas, colares e espelhos (prtica chamada de "escambo"). Cada nau carregava em mdia cinco mil toras de 1,5 metro de comprimento e 30 quilogramas de peso. Em 1503, toda a terra do Brasil foi arrendada pela coroa a Ferno de Noronha (ou Loronha), e outros cristos-novos, produzindo 20 mil quintais de madeira vermelha. Segundo Capistrano de Abreu, em Captulos da Histria Colonial, cada quintal era vendido em Lisboa por 2 ducados, mas lev-lo at l custava apenas meio ducado. Os arrendatrios pagavam 4 mil ducados Coroa. Comerciantes de Lisboa e do Porto enviavam embarcaes costa para contrabandearem pau-brasil, aves de plumagem colorida (papagaios, araras), peles, razes medicinais e ndios para escravizar. Surgiram, assim, as primeiras feitorias. O nufrago Diogo lvares, o Caramuru,

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estabeleceu-se desde 1510 na barra da Baa de Todos os Santos, onde negociava com barcos portugueses e estrangeiros. Outra feitoria foi chamada de Aldeia Velha de Santa Cruz, prxima ao local da descoberta. Alm dos portugueses, seus rivais europeus, principalmente franceses, passaram a freqentar a costa brasileira para contrabandear a madeira e capturar ndios. Os franceses contrabandearam muito pau-brasil no litoral norte, entre a foz do rio Real e a Baa de Todos os Santos, mas no chegaram a estabelecer feitoria. Outro ponto de contrabando, sobretudo no sculo XVII, foi o Morro de So Paulo (Bahia). At que Portugal estabelecesse o sistema de capitanias hereditrias, a presena mais constante na terra era dos franceses. Estimula