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Curso.infância e ARte

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Arte

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Curso Educação Infantil

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Formação, experiência e criação: curso educação inFantil,

inFâncias e arte

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Ficha catalográfica

ORGANIZADORES

REvISORA

PRODUTOR EDITORIAL Projeto Gráfico, Diagramação e Capa

CRIAÇÃO LOGO DO CURSO

COORDENAÇÃO

EqUIPE DE PROFESSORES

ESTAGIáRIOS DA GRADUAÇÃO

ESTAGIáRIOS DA PóS-GRADUAÇÃO

vOLUNTáRIAS

Ana Cristina Carvalho PereiraRicardo Carvalho de Figueiredo

vivien Gonzaga

Marcos Alves

Nathalia Ridolfi

Ana Cristina Carvalho PereiraRicardo Carvalho de Figueiredo

Aline Nunes CarneiroAna Cristina Carvalho PereiraGabriela Córdova ChristófaroMarina Marcondes MachadoRosvita Kolb Bernardes

Bruno PontesFlaviane LopesMariana SilvaNathalia RidolfiRafela Kênia Alves da Silvavânia Pereira Silvério

Marlaina Fernandez Roriz

Jéssica Luiza BorgesSarah villar Lignani

Copyright © 2014, Os autores e organizadoresEste livro ou parte dele não pode ser reproduzido por qualquer meio sem autorização escrita do editor.

UNIvERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAISCursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil

Educação Infantil Infâncias e Arte

F723 Formação, experiência e criação : curso educação infantil, infâncias earte / Ana Cristina Carvalho Pereira e Ricardo Carvalho de Figueiredo(orgs.). - Belo Horizonte: UFMG/FaE, 2014.

144 p., enc., il., color.

ISBN: 978-85-8007-075-0Inclui Bibliografias.

1. Professores de educação pré-escolar -- Formação. 2. Educaçãode crianças. 3. Arte -- Estudo e ensino. 4. Dança para crianças. 5. Teatrona educação. 6. Teatro escolar. 7. Escolas maternais -- Musica.8. Musica na educação. 9. Arte e crianças. 10. Arte e educação.

I. Título. II. Pereira, Ana Cristina Carvalho. III. Figueiredo, RicardoCarvalho de

CDD- 370.7122

Catalogação da Fonte: Biblioteca da FaE/UFMG

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EBA/FaE/UFMG2014

Formação, experiência e criação: curso educação inFantil,

inFâncias e arte

Ana Cristina Carvalho PereiraRicardo Carvalho de Figueiredo

(organizadores)

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agradecimentosAo Ministério da Educação por ser um órgão atento às demandas de políticas

públicas do campo da Educação Infantil e viabilizar a realização deste curso.

À Faculdade de Educação da UFMG em nome da professora Samira Zaidan pela gestão dos recursos à ela destinados de forma transparente e democrática.

Ao Núcleo de Estudos e Pesquisa de Educação Infantil e Infância (NEPEI) coordenado pela professora Mônica Correia Baptista e seu olhar

atento à política e direito educacional da criança pequena.

Aos colegas coordenadores dos cursos do CAEI: Levindo Diniz e Rogério Correia da Silva pela parceria e disposição em lidar com as esferas administrativas de coordenação.

À Escola de Belas Artes, em nome da professora Maria Beatriz Mendonça (Bya Braga).

Ao Curso de Licenciatura em Dança coordenado pelo professor Arnaldo Alvarenga.

Ao Curso de Licenciatura e Bacharelado em Teatro coordenado pelo professor Eugênio Tadeu.

À Prefeitura Municipal de Belo Horizonte em nome da GECEDI, Mayrce Terezinha da Silva Freitas e viviane de Cassia Maia Trindade.

Às UMEI’s e Creches Conveniadas.

À Luciana Esmeralda Ostetto pela parceria e contribuição.

Aos professores do curso: Aline Nunes Carneiro, Ana Cristina Carvalho Pereira, Gabriela Córdova Christófaro, Marina Marcondes Machado e Rosvita Kolb Bernardes

por compartilharem com as professoras cursistas suas mais importantes experiências no campo da docência em Arte e Infância e trazer poesia ao ofício de mestres.

Aos estagiários do curso: Bruno Pontes, Flaviane Lopes, Mariana Silva, Nathalia de Souza Ridolfi, Rafaela Kênia Alves da Silva, vânia Pereira Silvério.

Às bolsistas do Projeto Linguagem Corporal na Educação Infantil: Jéssica Luiza Borges e Sarah villar Lignani.

À estagiária de Pós-Gradução: Marlaina Fernadez Roriz.

À FUNDEP pela gerencia do projeto.

E finalmente, às quarenta e duas professoras cursistas para quem esse curso foi destinado e a quem dedicamos toda essa rica experiência aqui relatada.

Ana Cristina Carvalho Pereira

Ricardo Carvalho de FigueiredoCoordenação do projeto

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sumárioPREFÁCIO ...........................................................................................................................................................Luciana Esmeralda Ostetto

FORmaçãO, ExPERIênCIa E CRIaçãO: CuRsO EduCaçãO InFantIl, InFânCIas E aRtE ......................................................................................................................................................................Ana Cristina Carvalho PereiraRicardo Carvalho de Figueiredo

FORmaçãO dO PROFEssOR da EduCaçãO InFantIl: dEsaFIOs PaRa a COnstRuçãO dE um dIREItO sOCIal da PRImEIRa InFânCIa .........................................Mônica Correia Baptista

aRtE, FEnOmEnOlOgIa E InFânCIa ....................................................................................................Marina Marcondes Machado

lInguagEm CORPORal: dança ............................................................................................................Ana Cristina Carvalho PereiraGabriela Córdova Christófaro

lInguagEm CORPORal: tEatRO ...........................................................................................................Marina Marcondes Machado

lInguagEm musICal ................................................................................................................................Aline Nunes Carneiro

lInguagEm PlÁstICa VIsual ................................................................................................................Rosvita Kolb Bernardes

CuRsOs dE aPERFEIçOamEntO Em aRtE: a FORmaçãO COntInuada dO PROFEssOR dE EduCaçãO InFantIl .................................................................................................marlaina Fernandez Roriz

RElatOs dE ExPERIênCIa: O EstÁgIO nO COntExtO dO CuRsO dE FORmaçãO COntInuada dE PROFEssOREs dE EduCaçãO InFantIl ..................................................Bruno PontesFlaviane LopesMariana SilvaRafaela Kêniavânia Silvério dos Reis

tORnaR VIsÍVEl QuandO sE aPREndE O QuE a aRtE tEm PRa EnsInaR nO COntExtO da FORmaçãO dO PROFEssOR da EduCaçãO InFantIl .............................Nathalia de Souza Ridolfi

FICHa tÉCnICa ......................................................................................................................................

sOBRE Os autOREs ..........................................................................................................................

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prefácioO EnCantamEntO da FORmaçãO dE PROFEssOREs Em CuRsO: QuandO a aRtE COnVIda a ExPERImEntaR, BRInCaR, sEntIR, InVEntaR FORmas, CRIaR POssIBIlIdadEs

A formação do professor, como possibilidade de transformar-se e transformar seus saberes e práticas, estende-se a vários domínios, para além de conteúdos com aplicabilidade imediata à prática pedagógica. Particularmente na educação infantil, a dimensão estética, como elemento constitutivo de um projeto educacional-pedagógico comprometido com a formação humana em sua inteireza, há tempos vem sendo destacada, seja através de pesquisas, experiências ou projetos educativos desenvolvidos em diferentes regiões e países.

Nesta direção segue a proposta documentada no presente livro, que articula, em um curso de extensão, educação infantil, infâncias e arte, por meio de experiências de formação que privilegiam saberes e fazeres sensíveis. Uma proposta que, além de uma simples oferta de um curso de formação continuada, assumiu o desafio de construir e compartilhar novas abordagens sobre o tema, traçando um caminho que poderia ser resumido nas belas palavras de uma das autoras: “Aproximar as professoras da arte, pela arte! Tocá-las com a arte!”, restituindo-lhes a possibilidade de resgate do encantamento e do seu próprio processo expressivo.

No papel de professora formando professores, tenho defendido a necessidade de constituição de espaços que viabilizem programas de educação estética, propostas de formação cultural que considerem a pessoa na pessoa do educador, abrindo espaço para a imaginação e o espanto, com vivências que contribuam para romper o olhar tradicional, cristalizado sobre certezas e direcionado por um pensar-fazer enquadrado previamente. Propostas que criem uma nova qualidade de tempo, que apontem outras direções e proponham ritmos mais compassados, feitos de pausas, esperas, entregas e encontros, aproximando realidades, diversificando repertórios em diálogo com o cotidiano e com a vida do professor.

A presença da arte nos cursos de formação, seja inicial ou continuada, não pode acontecer nos moldes de uma disciplina, com conteúdos, conceitos e técnicas, a serem dominados pelos professores para que “repassem” para as crianças. Em sentido contrário, é imprescindível marcar e articular múltiplos saberes e fazeres, promovendo encontros, oferecendo pontes de sensibilidade para a escuta do que ordinariamente nos escapa; provocar histórias através das quais os professores possam aventurar-se a escolher (e confiar em) seu próprio caminho, afirmando sua autoria em um processo que passa, necessariamente, pela experimentação de tempos e espaços de criação.

A experiência do curso de extensão “Educação infantil, infâncias e arte”, desenvolvida pelo EBA/NEPEI/UFMG, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte e o Ministério de Educação, cujas atividades e processos são aqui narrados, reafirma a essencialidade da arte na formação de professores,

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compreendida no campo de um programa de formação cultural que, chamando atenção para o universo circundante - das diferentes linguagens artísticas, das imagens, das cores, das formas, dos sons, dos corpos, dos movimentos -, possibilite o exercício do olhar e a expansão de pensamento e sentimento. Uma proposta enfim, que ajude a balançar as certezas pedagógicas e, promovendo o encontro com a arte, abra espaço para o cultivo da dúvida – potência do ato criador de cada um.

Nota-se, ao longo da leitura dos artigos que compõem o livro, que as ações desenvolvidas no âmbito do curso seguiram potencializando dimensões do humano nem sempre positivadas ou colocadas em primeiro plano: experimentar, brincar, sentir, fantasiar, inventar formas, criar possibilidades. Testemunhamos uma proposta que, aliando teoria e prática, não se pautou na transmissão de “modos de fazer”, não pretendeu ensinar modelos de brinquedos, brincadeiras, jogos, atividades artísticas, para serem copiados e transmitidos às crianças. Em todo o processo fica visível a busca partilhada, as interações e os diálogos engendrando aprendizagens significativas também nos campos afetivo e de grupo, apostando no cultivo de contextos relacionais. Desta maneira o “ser da poesia”, presente-perdido no adulto-educador, foi sendo alimentado, resgatado das sombras a que é relegado no mundo contemporâneo. No convite à experiência sensível, o curso foi viabilizando possibilidades de caminhar rompendo as barreiras de certas atitudes e pensamentos culturalmente construídos e revelados, por exemplo, nas expressões frequentes entre adultos: “Eu não sei desenhar”, “Eu não sei fazer”, “Não tenho o dom”, “Não tenho jeito para isso”...

Mas, para percorrer um caminho como o proposto, há que se dispor ao aprendizado de se despojar de certos hábitos, para chegar mais perto das “coisas mesmas”: aceitar o convite, tirar os sapatos, agachar, sentar, deitar, rolar no chão, dançar, pintar, espantar-se, sentir. Como dizem as estagiárias participantes do curso, “Para aprender, foi preciso ouvir com o corpo, dizer com o movimento, ver as ideias, experimentar, se permitir, sentir. Porque nas artes, se não sentir, não faz sentido”.

A experiência que atravessa o livro dialoga com pressupostos que temos discutido, sobre a formação do educador, sobre a necessidade de uma formação que articule o que culturalmente teima em ser fragmentado: pensar-fazer, razão-sensibilidade, desejos-possibilidades. No resgate das expressões esquecidas pelos adultos-professores, nas coisas simples como uma brincadeira, na busca do desenho, da pintura, nas vivências corporais e musicais, no ato performativo, no sair e reparar o mundo ao redor, anunciam-se novas possibilidades, apoiando e encorajando, permitindo o ensaio e a ousadia de realizar. E, no coração da possibilidade gestada, o espaço franqueado para o contínuo exercício de uma prática pedagógica pautada na criatividade e imaginação, que pode ser conquistada com o resgate do processo de criação dos educadores, na sua singularidade e beleza.

A proposição de cursos de extensão como tempo e lugar de oportunizar experimentações diversas, dentro e fora dos espaços tradicionais de formação

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profissional (como a universidade), levando os professores lá onde pulsa a arte e vivem os artistas - nas ruas, no teatro, no museu, na galeria, na sala de concerto - é relevante e oportuna: ao propiciar contato com as tão decantadas múltiplas linguagens, alimenta os percursos formativos, amplia repertórios. Contribui efetivamente para recriar a prática pedagógica como tempo e lugar, também, de experiência estética, de fazer, sentir e pensar. Este é um aspecto que precisa ser destacado: os professores participantes do curso “Educação infantil, infâncias e arte” saíram das suas unidades de educação infantil, foram até a universidade e, de lá, perambularam por diferentes territórios, da Escola de Belas Artes às ruas da cidade, levando seus olhares a passear, conduzindo seus corpos sensíveis a interrogar o real, observando o mundo circundante, revisitando cenas e situações cotidianas, ampliando significações e construindo novos sentidos. Percurso fundamental!

Trabalhar em um curso de formação que tematiza a arte, no diálogo com as infâncias e a educação infantil, é como fazer um chamamento a novos olhares e sensibilidades, à experimentação de outros passos em direção à consciência dos modos de ver, sentir e fazer. As experiências realizadas pela equipe da EBA/UFMG e que foram aqui compartilhadas, reafirmam a arte como conhecimento e um “modo de ser” que rompe fronteiras, reclama a inteireza do ser, na tensão de polaridades que nos constituem. Arte é totalidade. E não é de totalidade que estamos em falta na educação?

Estão de parabéns os organizadores do curso e toda a equipe que o tornou realidade. Em especial, parabéns aos educadores que disseram sim à proposta e se entregaram, certamente com uma porção de ousadia e coragem, a novas experiências, caminhando para si, ao reencontro de suas linguagens, de sua dimensão criadora, descobridora, brincante. Assim, acredito, poderão estar mais próximos das crianças, acolhendo seus modos próprios de ser e estar no mundo, apoiando suas criações, observando e valorizando o que expressam de conhecimento e sensibilidade sobre as grandezas e as simplicidades do mundo, vasto mundo como dizia o poeta...

vasto mundo, de sons e silêncios, de encantos e desencantos, de alegrias e tristezas, de luzes e sombras, de possibilidades e limites, polaridades que nos constituem e que a arte nos ajuda a integrar. vasto mundo a ser (re)descoberto, a ser (re)escrito, a ser (re)inventado, na parceria potente entre arte, crianças e professores, na educação infantil, de mãos dadas com a esperança, com a poesia tecida na vida, com vivacidade e inteireza.

Na beleza da publicação, fica o convite à leitura da obra.

que o diálogo com os autores possa fertilizar novas experiências!

Luciana Esmeralda Ostetto Universidade Federal Fluminense

Niterói, inverno de 2014.

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Formação, experiência e criação:

curso educação inFantil, inFâncias e arte

Ana Cristina Carvalho PereiraRicardo Carvalho de Figueiredo

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Curso Educação Infantil

um PEQuEnO HIstÓRICO

A formação continuada dos professores da Educação Básica encontra-se entre as prioridades do Ministério da Educação explicitadas no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), para garantir educação de qualidade, centrada no aprendizado do educando. A criação da Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica (instituída pelo Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009) é uma das respostas a esse compromisso. Sua finalidade é apoiar a formação inicial e continuada dos professores da Educação Básica das redes públicas, sob a responsabilidade da Secretaria de Educação Básica (SEB), do Ministério da Educação (MEC), em parceria com as Instituições de Ensino Superior (IES) e as secretarias municipais de educação.

Conforme atestam vários estudos e pesquisas na área, e mesmo documentos oficiais do Ministério da Educação, a Educação Infantil mostra qualidade bastante aquém da adequada. Entre os fatores responsáveis por essa situação, encontra-se a formação insuficiente dos profissionais que atuam na área, seja por falta de habilitação prévia, seja porque essa habilitação não tem sido capaz de prepará-los para as especificidades da educação de crianças na faixa de zero a seis anos, explicitadas nas novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, instituídas pela Resolução CNE/CEB nº 5, de dezembro de 2009.

Frente a essas demandas, o Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Infância e Educação Infantil, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (NEPEI/FaE/UFMG) propôs quatro cursos, inseridos no âmbito da Política Nacional de Formação de Professores para a Educação Infantil, sintonizados com as necessidades formativas da Educação Básica e com os problemas da sala de aula. São eles:

•EducaçãoInfantil,InfânciaseArte•Currículo, Planejamento e Organização do Trabalho Pedagógico na EducaçãoInfantil•CamposdeExperiências,SabereseAçãoPedagógicadaEducaçãoInfantil•EspecializaçãoemEducaçãoInfantil

Desses cursos, os três primeiros eram de aperfeiçoamento e estavam vinculados ao Curso de Aperfeiçoamento em Educação Infantil (CAEI NEPEI/FaE/UFMG).

No que diz respeito ao curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, devido à especificidade da área de Arte, o NEPEI/FaE buscou parceria com a Escola de Belas Artes (EBA), o que se tornou possível com a participação de dois professores da EBA que já faziam parte do NEPEI: o professor Ricardo Carvalho de Figueiredo, desde 2010, e a professora Ana Cristina Carvalho Pereira, desde 2011, tendo sido ambos indicados para a coordenação do curso.

Nessa mesma direção, o Colegiado do Curso de Licenciatura em Dança da EBA recebeu, em 2012, da Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte (SMED), o pedido de um estudo para a criação do curso de formação em Linguagem Corporal: Artes Cênicas, para professores e educadores infantis, em nível de extensão.

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a PROPOsta dO CuRsO

Sabe-se que, desde a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, 1996), a Educação Infantil passou a integrar o sistema de ensino brasileiro, a fim de auxiliar o desenvolvimento das capacidades de conhecimento e apropriação das potencialidades cognitivas, corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, a partir de diferentes linguagens, na perspectiva de contribuir para a formação da criança pequena.

As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, de 2009, no Art. 6º, apresenta princípios que devem ser respeitados nas propostas pedagógicas, entre eles, destacamos os princípios estéticos: “da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais”.

Nesse mesmo documento, o Art. 9º define que as práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter como eixos norteadores o incentivo às interações e à brincadeira, garantindo experiências que:

I - promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movimentação ampla, expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criança;II - favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão; gestual, verbal, plástica, dramática e musical.III - promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotografia, dança, teatro, poesia e literatura.

A partir daí, a escola passa a ser reconhecida como espaço educativo que deve possibilitar vivências e experiências organizadas conscientemente, de maneira intencional, a fim de propiciar o desenvolvimento integral das crianças pequenas em todos os aspectos, entre eles, o estético.

Especificamente no campo da Arte1, as linguagens: artes visuais, dança, música, teatro, apresentam-se como um grande desafio que os professoras e educadores enfrentam para a superação das lacunas existentes na sua formação inicial.

No que diz respeito à área de Arte na Educação Infantil, sabe-se que a maioria dos professores foi privada tanto da vivência de sua expressividade em atos artísticos quanto do acesso ao repertório cultural da Arte. Geralmente, têm restritas suas experiências estéticas às produções culturais disponíveis nos meios de comunicação de massa (Tv, revistas, jornais, rádio, etc.) e são destituídos de uma formação que busque ou que propicie uma maior vivência estética, que lhes “desperte” o 1 Daqui para frente, o termo será grafado com maiúscula, como designador de uma área de conhecimento e não na acepção de uma simples atividade manual.

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senso poético, portanto, sem a possibilidade de refletir sobre os conteúdos da Arte em sua formação. Infelizmente, essa realidade tem refletido negativamente nas ações desses professores, principalmente nas escolhas e no encaminhamento de situações de sala de aula que envolvam as linguagens artísticas na Educação Infantil.

Na tentativa de atender às demandas das diretrizes e também no que diz respeito à aproximação entre universidade e escola, visando a capacitar os profissionais segundo as especificidades das linguagens artísticas dança, teatro, plástico visual e musical, foi apresentada pela coordenação a proposta do curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, em reunião do NEPEI, em dezembro de 2012. Nesse mesmo dia, foram apresentadas as propostas dos outros dois cursos de aperfeiçoamento. Todos os três cursos tiveram suas propostas discutidas e aprovadas para terem início em 2013.

PaRCERIa COm a sECREtaRIa munICIPaldE EduCaçãO dE BElO HORIZOntE

A parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte se deu a partir da demanda da Gerência de Coordenação da Educação Infantil (GECEDI), apresentada ao Curso de Licenciatura em Dança da EBA, em 2012, e também pelo diálogo já estabelecido entre a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e a coordenadora

Reunião para apresentação das propostas dos cursos na FaE, em 2012.

Reunião para apresentação das propostas

dos cursos na FaE, em 2012.

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do curso, professora Ana Cristina Carvalho Pereira, que atuou como assessora das Proposições Curriculares para Educação Infantil do município, no campo da Linguagem Corporal, em 2009.

A partir do momento em que o projeto foi apresentado à PBH, a secretaria responsável teve adesão imediata, vislumbrando um aprofundamento da sua equipe de professoras no que diz respeito às linguagens artísticas e à educação de crianças.

Para tanto, foi solicitado à prefeitura que cedesse as quarenta profissionais, duas vezes por semana (segunda-feira e sábado), durante os quatro meses de curso, totalizando uma carga horária semanal de oito horas. A importância nesse tipo de investimento oportunizado pela prefeitura e enfatizado pelas escolas nas quais as professoras atuavam é o processo de formação continuada pelo qual todo professor deve passar e receber incentivo. Além de o professor sentir-se valorizado na sua promoção profissional, mantém contanto com novas metodologias de ensino, tem a oportunidade de conhecer novos parceiros para futuros trabalhos e colabora, com seu conhecimento adquirido em sala de aula, para a construção de saberes do curso. Investir no professor de sala de aula é, portanto, dar oportunidade para que a educação se mantenha atualizada com as demandas da sociedade contemporânea e em consonância com os estudos mais recentes veiculados pela universidade.

RElatO da ExPERIênCIa

Em fevereiro de 2013, o curso Educação Infantil, Infâncias e Arte passa a ser oferecido a 42 professoras da Rede Municipal de Educação Infantil de Belo Horizonte e das Creches Conveniadas da capital.

Dada a especificidade da aprendizagem em Arte, propusemos a realização do curso no espaço da Escola de Belas Artes. Nosso objetivo era que as alunas cursistas tivessem contato com as salas especializadas, sem carteiras ou cadeiras, com piso de madeira, para a realização de práticas corporais, revelando que há um aspecto político no cuidado com o modo de ensinar arte; além de possibilitar que tivessem um contato com uma parte da universidade em que se pratica cotidianamente ações artísticas. Desse modo, no intervalo das aulas, as cursistas se deparavam com atores ensaiando pelos corredores e gramados da escola, com dançarinos se preparando para entrar em cena, com atelieristas elaborando seu material de criação a céu aberto.

Em consonância com as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (2009) e as Proposições Curriculares da Educação Infantil da Rede Municipal de Belo Horizonte (2009) o curso tinha como principais objetivos:

•PropiciaraosprofissionaisdaEducaçãoInfantiloportunidadesdeampliaro conhecimento na área da Arte:- das especificidades das crianças de 0 a 3 e de 4 a 6 anos, relacionando-as

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às práticas pedagógicas de ensino de Arte para a educação em creches e pré-escolas e à identidade do profissional da Educação Infantil;- das relações entre cultura, subjetividade e currículo na Educação Infantil;- de estudos e pesquisas na área de ensino de Arte na Educação Infantil.

• Proporcionar aos profissionais da Educação Infantil oportunidades dedesenvolver e analisar propostas de organização do trabalho pedagógico do ensino de Arte para:- desenvolver a sensibilidade estética para o trabalho com as artes na Educação Infantil;- apresentar modos de apreciação artística, no fruir e fazer arte com crianças;- promover discussão acerca das apresentações artísticas que envolvem as crianças.

•CapacitaroprofessordaEducaçãoInfantil,apartirdaabordagemteórico-metodológica da Arte-Educação, segundo as linguagens artísticas, tendo como referência as proposições curriculares da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte.•Instrumentalizaroprofessornoâmbitodaeducaçãoestéticaesuasrelaçõescom as culturas da infância, e quanto aos modos de apreciação artística no fruir e fazer arte com crianças.

A seguir, faremos um breve relato da experiência de oferta do curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, no período de fevereiro a dezembro de 2013, tendo como base a sua proposta curricular, conforme detalhado no quadro 1, a seguir. vale a pena destacar que a proposta optou por uma abordagem teórico-metodológica da Arte-Educação para a infância, garantindo o caráter prático e vivencial das linguagens artísticas – dança, teatro, plástico visual e musical.

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Quadro 1: Proposta curricular do curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, 2013.

EIXO I – Fundamentos da Arte-Educação

Esse eixo foi organizado em duas etapas e tinha o objetivo de possibilitar ao educador compreender as relações entre as concepções de “infância” e “ensino de arte” que perpassam a cultura e as metodologias mais apropriadas para o trabalho sensível de arte com crianças. Foi, assim, estruturado em torno de três referências: . abordagem teórico-metodológica do ensino das artes para crianças; . integração das linguagens artísticas; . fenomenologia da percepção.

Como primeira etapa desse eixo, no dia 16 de março de 2013, no auditório da Escola de Belas Artes/UFMG, aconteceu o seminário “Interfaces artísticas – Abordagem teórico-metodológica da Arte-Educação para a infância”, com a intenção de apresentar a linha metodológica e a visão integradora das linguagens artísticas, além de dar boas vindas às cursistas. Nesse seminário, cada professora do curso teve um momento para colocar, em linhas gerais, quais seriam as bases da sua disciplina, priorizando o caráter prático e vivencial das linguagens.

CursO EduCAçãO InFAntIl, InFânCIAs E ArtE

Eixos temáticos disciplinas CH

Eixo IFundamentos da

Arte-Educação30 h

seminário: Interfaces Artísticas - Abordagem teórico-metodológica da arte-educação para a infância (Todos os professores do curso)

15h

Arte, Fenomenologia e Infância Prof.ª Marina Marcondes Machado

15h

Eixo IIlinguagens/

Poéticas Artísticas120 h

linguagem Corporal: dançaProf.ª Gabriela Córdova Christófaro e Prof.ª Ana Cristina Carvalho Pereira

- 20h curso- 5h fruição

25h

linguagem Corporal: teatroProf.ª Marina Marcondes Machado

- 20h curso- 5h fruição

25h

linguagem MusicalProf.ª Aline Nunes Carneiro

- 20h curso - 5h fruição

25h

linguagem Plástica Visual Prof.ª Rosvita Kolb Bernardes

- 20h curso - 5h fruição

25h

seminário: Interfaces Artísticas - relato de Experiências Estéticas (Todos os professores do curso)

20h

Eixo IIIseminários IntegradosCAEI/ FAE/

EBA – uFMG30h

I seminário Integrado dos Cursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil - Múliplos olhares sobre as infâncias e a educação infantil

15h

II seminário Integrado dos Cursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil - Diretrizes Curriculares no Cotidiano da Educação Infantil: desafios e práticas

15h

total 180h

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Seminário “Interfaces artísticas – Abordagem teórico-metodológica da Arte-Educação para a infância”.

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Na segunda etapa, a disciplina Arte, Fenomenologia e Infância buscou aproximar o olhar do educador do trabalho fenomenológico, que intenta compreender a criança, ao contato com as artes, como um ser repleto e dotado de saberes fundamentais. Também se propôs a atualizar o professor da Educação Infantil nas novas perspectivas em educação, arte e ensino-aprendizagem; trabalhar com o paradigma compreensivo para definir as noções de ser humano, ato educativo, ato performativo e artisticidade, além de propor ao professor maior proximidade com as culturas da infância.

EIXO II – linguagens/Poéticas Artísticas

Esse eixo foi organizado em cinco etapas, a fim de garantir a vivência prática e reflexiva das professoras, possibilitando que essas tivessem seu momento de criação individual e coletiva em um espaço devidamente organizado para a prática artística.

. Nas quatro primeiras etapas desse eixo, foram trabalhadas as linguagens/poéticas artísticas: dança, teatro, plástico visual e musical, pelas quais as cursistas eram provocadas a pensar, debater e propor ações que, a partir de sua aprendizagem sensível, pudessem ressignificar sua prática docente.

Cada uma das linguagens garantiram vivências práticas associadas aos seus conteúdos específicos, como também momentos de fruição artística relatados nos capítulos a seguir. vale a pena ressaltar que os autores, em seus textos, imprimiram características próprias, advindas das especificidades tanto das linguagens artísticas quanto da abordagem metodológica desenvolvida durante o curso.

. A quinta etapa caracterizou-se como eixo prático e reflexivo do trabalho com as artes, integrando os conteúdos das quatro linguagens/poéticas artísticas trabalhadas ao longo do curso.

O PROCEssO: RElatO dE ExPERIênCIas EstÉtICas

Para a efetivação desse eixo, o curso Educação Infantil, Infâncias e Arte realizou o seminário: “Interfaces artísticas – relato de experiências estéticas”. Nesse seminário, ao invés de apresentarem um trabalho teórico ou apenas discursivo, as alunas tiveram acesso a um local onde deveriam, depois de um processo criativo desenvolvido durante um mês, dar materialidade, a partir de uma proposta estética, à sua experiência com as linguagens artísticas, no curso, e ao seu trabalho no contexto da Educação Infantil.

Como estratégia motivadora, as cursistas foram provocadas com a pergunta: “Como dar materialidade à sua experiência sensível durante o curso Educação Infantil, Infâncias e Arte?”.

Além disso, o local escolhido para o seminário foi ao ar livre, com uma natureza privilegiada e motivadora, ao mesmo tempo em que apresentava alguns desafios.A partir daí, cada cursista precisou criar um projeto, com auxílio dos estagiários,

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Curso Educação Infantil

aluna de pós-graduação, professoras e coordenação, para, com os recursos disponíveis em seu ambiente de trabalho, materializar sua proposta estética.

Foram vários os momentos de orientação. Entre eles, destacamos o encontro realizado no auditório da SMED, durante toda a manhã do dia 17 de junho. Nesse dia, foi possível perceber que cada uma das cursistas tinha a expectativa de obter respostas às suas questões e dúvidas e até, quem sabe, um roteiro ou “receita” de como dar materialidade ao seu projeto. Ao contrário, a atividade promoveu a possibilidade de cada uma relatar a sua proposta para todo o grupo, responder dúvidas das colegas e até ouvir algumas sugestões.

Momentos de orientação para o trabalho final no auditório da SMED.

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Para a coordenação, foi um momento muito rico, pois foi possível perceber o quanto e como cada uma das cursistas foi “tocada” pela proposta do curso e da atividade. Também percebemos que, apesar da proposta ser individual, priorizando a autoralidade, as cursistas sentiram-se estimuladas a trocar ideias com os coordenadores, os estagiários e entre elas.

seminário: “Interfaces artísticas – relato de experiências estéticas”

Em um sábado de sol, num clima de grande expectativa, euforia e aprendizagem, se deu essa experiência sensível, na qual as cursistas foram provocadas a fazer e pensar a Arte no contexto da Educação Infantil.

Foram articulados temas como: corporalidade, sonoridade, sensibilidade, expressividade na Educação Infantil, focalizando as identidades pessoais, profissionais e institucionais do grupo.

A partir das referências que cada uma construiu durante a sua vivência no curso, perpassadas por suas experiências de vida, as cursistas puderam ter uma experiência sensível constituída tanto nos momentos individuais, em que eram

Momentos de orientação para o trabalho final no auditório da SMED.

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Curso Educação Infantil

propositoras, quanto nos momentos coletivos, quando eram espectadoras. Assim, a superação da distância entre o desejo de realização das propostas e a realidade concreta do encontro com os espectadores ajudou a romper a distância entre o trabalho de Arte de forma “escolarizada” e não artística, isto é, padronizada com finalidade de um produto final, e vislumbrar um trabalho artístico que envolvesse vários aspectos como: experimentação, investigação, procedimentos de criação, valorização do processo que, mesmo inacabado, fosse fruto de conquistas e reflexões e, principalmente, de um saber sensível.

EIXO III – seminários Integrados CAEI/FaE/EBA

Durante o andamento dos três cursos de aperfeiçoamento filiados ao NEPEI/FaE/UFMG, buscou-se uma integração entre as propostas que tinham em comum a temática Educação Infantil e o profissional da área. Houve, ao longo da realização dos seminários integrados, na Fae/UFMG, uma aproximação entre coordenadores, professores e cursistas.

. Nos dias 19 e 20 de abril de 2013, no auditório Luiz Pompeu, FaE/UFMG, foi realizado o “I Seminário Integrado dos Cursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil”, visando à integração dos participantes, com palestras,

2 Disponível no blog <http://www.infanciasearte.blogspot.com.br>, criado durante o curso, o leitor poderá encontrar fotos que registraram essa experiência.

A “experiência do sensível”.2

A “experiência do sensível”.2

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mesa-redonda, relato de experiências, oficinas e apresentação artística. Esse encontro promoveu a atualização dos participantes, por meio da fala de especialistas na área da Educação Infantil.

I Seminário Integrado dos Cursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil.

I Seminário Integrado dos Cursos de

Aperfeiçoamento em Educação Infantil.

I Seminário Integrado dos Cursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil.

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Curso Educação Infantil

. Já no dia 28 de junho de 2013, no auditório Prof. Neidson Rodrigues, também na FaE/UFMG, aconteceu o “II Seminário Integrado dos Cursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil: Diretrizes Curriculares no Cotidiano da Educação Infantil – desafios e práticas”, que, além da integração dos três cursos, propiciou a vinda de palestrantes da área da Educação Infantil, para conversar sobre registros e práticas inovadoras com bebês. Também foram oferecidas oficinas para que houvesse um conhecimento de outros repertórios artísticos e educacionais, no âmbito da Educação Infantil, além da apresentação de um número artístico.

II Seminário Integrado dos Cursos de Aperfeiçoamento em Educação Infantil: Diretrizes Curriculares no

Cotidiano da Educação Infantil – desafios e práticas.

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É importante destacar que a iniciativa coletiva dos dois seminários integrados, envolvendo os três cursos de aperfeiçoamento, foi realizada em parceria entre o Ministério da Educação e Cultura (MEC), o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), a Faculdade de Educação e a Faculdade de Belas Artes (ambas da Universidade Federal de Minas Gerais) e o Departamento de Ciências da Educação da Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ).

REgIstRO: BlOg InFânCIas E aRtE

Principalmente na Educação Infantil, o registro das atividades é um importante instrumento, que impulsiona a reflexão e um diálogo contínuo entre teoria, prática docente e aprendizagem. Em se tratando de um curso de formação em linguagens artísticas, o registro ganha uma dimensão muito maior. Dessa forma, a coordenação do curso trabalhou com o registro nas perspectivas de: registro e memória do curso e dos processos nele desenvolvidos; fonte de dados para pesquisa, como possibilidade de dar visibilidade ao processo de aprendizagem; socialização das práticas desenvolvidas no contexto de formação de professores de Educação Infantil.

Este tema é tratado no capítulo "Tornar visível quando se aprende o que a arte tem para ensinar no contexto da formação do professor da educação infantil" deste livro.

No que diz respeito ao registro, as alunas-cursistas assinaram um termo autorizando o uso de imagens, vídeos e depoimentos para fins de pesquisa e publicação, o que nos possibilitou a utilização desse acervo neste livro.

No intuito de inserir as alunas-cursistas no campo das mídias e também de promover um debate on line com as mesmas e com a comunidade externa ao curso, foi criado o blog: <http://www.infanciasearte.blogspot.com.br>.

Demos ênfase ao registro integral do curso, com fotografias de todas as ações, para que as cursistas pudessem colher o material posteriormente e ter uma memória da experiência vivenciada por elas. Além disso, durante as aulas, podiam ficar atentas ao que estava sendo trabalhado, uma vez que o registro era feito por nós para ser disponibilizado ao final do curso.

aPROxImaçÕEs E dIÁlOgOs nOs dIZEREs E FaZEREs da EduCaçãO InFantIl

A equipe de estagiários que trabalhou durante o curso foi composta por três alunos da Licenciatura em Dança e três da Licenciatura em Teatro. Esses estagiários já haviam iniciado estudos sobre a Arte e a primeira infância, em projetos coordenados pelos professores Ana Cristina Carvalho Pereira (Dança) e Ricardo Carvalho de Figueiredo (Teatro), responsáveis pela elaboração da proposta. Assim, a relação dos estagiários com as professoras cursistas favoreceu uma aproximação

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com os dizeres e fazeres da Educação Infantil e, também, com os saberes docentes (TARDIF, 2011) já adquiridos pelas cursistas, uma vez que todas possuíam grande experiência de ensino com crianças.

Esse aprendizado pode ser verificado no capítulo “Relatos de experiência: o estágio no contexto do curso de Formação Continuada de Professores da Rede Municipal de Educação Infantil” deste livro, no qual os estagiários elucidam o trabalho realizado e a aproximação com as professoras da Educação Infantil, corroborando o pensamento universitário que promove o encontro entre futuros professores e professores experientes.

vale a pena destacar que, para viabilizar a atuação dos estagiários, foram realizadas várias reuniões com a coordenação, a fim de construir uma sintonia entre: a proposta pedagógica do curso; a metodologia de ensino dos professores de cada linguagem artística (dança, teatro, plástico visual e musical); a busca pela experiência e liberdade de criação das alunas cursistas. Além disso, buscava-se oferecer aos estagiários um processo capaz de estabelecer um diálogo entre o que aprendiam nos cursos de licenciatura de Dança e de Teatro e os desafios da prática apresentada a todo o momento pelas cursistas.

Coordenação, estagiários e a bolsista da pós-

graduação,em reunião de acompanhamento pedagógico,

durante o curso, no prédio da EBA/UFMG.

Coordenação, estagiários e a bolsista da pós-graduação,em reunião de acompanhamento pedagógico,

durante o curso, no prédio da EBA/UFMG.

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EnsInO, PEsQuIsa E ExtEnsãO

Com base na tríade ensino-pesquisa-extensão, este projeto foi desenvolvido tendo o campo do ensino de Arte na Educação Infantil garantido a partir da composição da equipe de professoras por especialistas; o campo da extensão foi efetivado com a vinda das professoras cursistas para o campus universitário, representado com o movimento de aproximação de saberes entre universidade e escola formal; e, finalmente, o campo da pesquisa teve seu ponto alto com a inserção de uma aluna de mestrado da Escola de Belas Artes, que tem como tema da sua pesquisa em andamento “Cursos de aperfeiçoamento em arte: a formação continuada do professor de educação infantil da rede municipal de Belo Horizonte”, tema tratado no capítulo "Cursos de Aperfeiçoamento em Arte: A formação continuada do professor de Educação Infantil" deste livro.

HORa dE IR PaRa a COxIa PaRa QuE EntREm Os PROtagOnIstas

Para finalizarmos este breve relato, e darmos voz às práticas artísticas e aprendizagens desenvolvidas durante o curso, podemos dizer que, a partir de agora, fomos para a “coxia” – que é o espaço existente dentro da área do palco, onde ficam os artistas (atores ou dançarinos), esperando a sua vez de entrar em cena.

“Estar na coxia” é permanecer em estado de alerta, pois, a qualquer instante, pode ser o momento de entrar novamente em cena. E, para aqueles que já estiveram na cena e aguardam o fim do espetáculo, estar na coxia é vibrar para que todo o restante do trabalho seja primoroso, afinal, trabalhar em equipe é estar atento a todas as etapas do processo.

Do lugar da coordenação (ou da coxia), podemos dizer que o curso trilhou significativas experiências no campo do ensino de Arte para profissionais da Educação Infantil, realizou trocas de experiências entre os envolvidos e, principalmente, despertou o cuidado estético e a atenção das professoras cursistas, que seguem, agora, com um repertório enriquecido e uma experiência renovada no ensino de Arte diferenciado para o trabalho com as crianças, motivo primeiro de todas as nossas ações.

Esperamos que este livro chegue às mãos de cada profissional da Educação Infantil e contribua para novas experiências artísticas de qualidade com as crianças pequenas de todo o país.

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Curso Educação Infantil

REFERênCIas

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução CEB n. 05, de 17 dez. 2009. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 18 dez. 2009. Seção 1, p. 8.

BELO HORIZONTE. Proposições Curriculares da Educação Infantil da Rede Municipal de Belo Horizonte. Belo Horizonte: Prefeitura de Belo Horizonte, Secretaria de Educação, 2009.

TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Tradução: Francisco Pereira.. 12. ed. Petrópolis: vozes, 2011.

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Formação do proFessor da educação inFantil:

desaFios para a construção de um direito social da primeira inFância

Mônica Correia Baptista

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Curso Educação Infantil

A Educação Infantil como um direito da criança de aprender e de se desenvolver em espaços coletivos ainda não se consolidou como um direito social. Apesar da ênfase das pesquisas sobre a importância dos primeiros anos de vida para o desenvolvimento e a aprendizagem humana; apesar do crescente reconhecimento do papel fundamental da infância não apenas no desenvolvimento individual, mas também na perspectiva social; apesar da pressão dos movimentos sociais e, ainda, apesar das conquistas obtidas no âmbito da legislação nacional será preciso superar alguns desafios para que a Educação Infantil se efetive como um dever de Estado, como direito dos pais trabalhadores urbanos e rurais e como direito das crianças de se desenvolverem a partir de uma ação pedagógica sistematicamente planejada, em instituições coletivas.

Um dos desafios a ser enfrentado para que a Educação Infantil se consolide como um direito das crianças consiste na expansão da oferta de vagas. O Brasil não atingiu sequer os 30% (trinta por cento) de matrículas em creches previstos para a primeira etapa do Plano Nacional de Educação PNE 2001, que deveria se concluir em 20051. Em relação à pré-escola, é muito recente o alcance dos 80% de matrículas previstos para a primeira fase do Plano e ainda não se verifica a universalização desse atendimento, reafirmada recentemente pela Lei 12.796 de abril de 2013.

Se, de um lado, não atingimos os padrões e os parâmetros em relação ao quantitativo desse atendimento estabelecidos pela sociedade civil e expressos pelos legisladores, por outro lado, os dados revelam uma situação de rápida transformação e de evidente melhoria em relação à democratização do acesso das crianças de zero a seis anos a creches e pré-escolas. Comparando-se os dados do Censo Demográfico de 2000 com o último Censo Demográfico realizado em 2010, pelo IBGE, constatamos algumas transformações que impactaram no atendimento educacional e corroboraram para a superação de alguns desafios.

Conforme evidencia a Tabela 1 abaixo, a população de zero a seis anos , em todas as faixas etárias que a constituem, sofreu, nesses últimos dez anos, uma redução que variou entre 19%, de zero a três anos e de aproximadamente 16% de quatro a seis anos respectivamente. Em 2000, o Brasil contava com uma população de zero a três anos de 13.020.216 crianças. Em 2010, esse mesmo segmento passou a ser de 10.925.892 crianças. Também se observou uma redução nas demais faixas etárias. Em 2000, eram 10.121.197 crianças de quatro, cinco e seis anos e, em 2010, passaram a ser 8 696 673.

1 A Lei 10.172 de 2001 estabelecia como meta ampliar a oferta de educação infantil de forma a atender, em cinco anos, a 30% da população de até três anos de idade e 60% da população de quatro e seis anos (ou quatro e cinco anos) e, até o final da década, alcançar a meta de 50% das crianças de zero a três anos e 80% das de quatro e cinco anos de idade.

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TABELA 2CENSO 2000 - POPULAÇÃO DE 0 A 6 ANOS - FREQUÊNCIA À CRECHE

E À PRÉ-ESCOLAFaixa etária População total Frequência à creche ou à pré-

escola%

0 a 3 anos 13 020 216 1.229.133 9,44

4 anos 3 355 512 1.375.149 40,98

5 anos. 3 445 580

6 anos 3 320 105

5 e 6 anos 6.765.685 4.816.385 71,47

TABELA 1POPULAÇÃO DE 0 A 6 ANOS -

2000 e 2010Grupos de idade 2000 2010

Menos de 1 ano 3 213 310 2 713 244

1 ano 3 191 309 2 694 909

2 anos 3 282 937 2 726 957

3 anos 3 332 660 2 790 782

SUBTOTAL 13 020 216 10 925 892

4 anos 3 355 512 2 870 266

5 anos 3 445 580 2 931 988

6 anos 3 320 105 2 894 419

SUBTOTAL 10 121 197 8 696 673

TOTAL 23 141 413 19 622 565

TABELA 3CENSO 2010 – POPULAÇÃO DE 0 A 6 ANOS - FREQUÊNCIA À CRECHE

E À PRÉ-ESCOLA

Faixa etária População total Frequência à crecheou à pré-escola

%

0 a 3 anos 10.925.892 2.575.954 23,6

4 anos 2.870.266 2.085.264 72,7

5 anos 2.931.988 2.561.747 87,4

6 anos 2.894.419 2.746.435 94,9

5 e 6 anos 5.826.407 5.308.182 91,1

Fonte: IBGE, Censo Demográfico, 2000

Fonte: IBGE, Censo Demográfico, 2010

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 2000 e 2010

Um número menor de crianças implicaria uma quantidade menor de vagas necessárias para acolher essa população em instituições educacionais. Entretanto, considerando o déficit histórico de oferta de vagas nessa etapa da Educação Básica e as políticas implantadas para sua superação, apesar do decréscimo da população, observou-se, nessa última década, um aumento significativo da oferta de vagas, conforme evidenciam os dados das Tabelas 2 e 3 abaixo.

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Curso Educação Infantil

No que se refere ao atendimento educacional de zero a três anos, o Brasil, na última década, passou de uma oferta de 9,5% da população, para mais de 23,5%, o que representa, em 2010, 109% a mais de vagas em creches do que em 2000.

As vagas para crianças de quatro anos alcançavam, segundo Censo Demográfico de 2000, a casa dos 41% e passaram a representar, no último Censo de 2010, 73%, da população dessa faixa etária atendida, conforme dados do IBGE. Também para esse segmento o aumento foi bastante significativo, da ordem de 51% no número de vagas em pré-escolas. Já para o segmento entre cinco e seis anos, o percentual que, em 2000, variava em torno de 70% atingiu, em 2010, 87% e 95%, respectivamente.

Se a ampliação das vagas é condição urgente e indispensável para que o direito à educação se cumpra, essa ampliação deve assegurar que diferentes segmentos da população passem a ter acesso, sobretudo, aqueles aos quais esses direitos vêm sendo, histórica e sistematicamente, denegados.

Além de garantir vagas numa perspectiva de democratização do ensino, as políticas públicas precisam também considerar o desafio da qualidade que implica a permanência das crianças em instituições educacionais capazes de cumprir o preceito legal de desenvolver integralmente a criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (Brasil, 1996). Por sua vez, qualidade educacional requer profissionais bem formados, capazes de assumir autonomamente a tarefa de conduzir o processo educativo.

FORmaçãO dOCEntE E a gaRantIa da QualIdadE na EduCaçãO InFantIl

Além de assegurar boas e adequadas condições de funcionamento das instituições, é no âmbito das práticas pedagógicas que a instituição educativa pode tornar-se, ela mesma, expressão ou não do direito que as crianças possuem de aprender, de compartilhar práticas e processos coletivos que favoreçam sua inserção social e de participarem do processo de construção de conhecimentos. Refletir sobre os desafios e as possibilidades de se constituir uma prática educativa capaz de [...] articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, promovendo o desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos (Brasil, 2009), nos remete à discussão sobre a atuação dos profissionais e, mais especificamente, sobre sua formação.

As Tabelas 4 e 5 abaixo apresentam os números de funções docentes em creches e pré-escolas, nos anos 2000 e 2010, considerando o grau de formação.

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TABELA 4 - NÚMERO DE FUNÇÕES DOCENTES EM CRECHE E PRÉ-ESCOLA PORGRAU DE FORMAÇÃO, EM 29/03/2000

Subetapa/Grau deformação

FundamentalMédio

completo%

Superiorcompleto

% Total

Incompleto Completo Total %Creche 4.502 6.621 11.123 18,13 33.360 54,38 5.741 9,36 61.347

Pré-escola 7.354 13.980 21.334 9,34 154.315 67,58 52.686 23,07 228.335

TABELA 5 - NÚMERO DE FUNÇÕES DOCENTES EM CRECHE E PRÉ-ESCOLA POR GRAUDE FORMAÇÃO, EM 2010

Subetapa/Grau de

formação

Fundamental % Médio total % Superiorcompleto

% Total

Creche 2.674 1,76 70.248 46,35 68.624 45,28 151.546

Pré-escola 2.547 0,99 121.678 47,20 133.565 51,81 257.790

Fonte: INEP, Sinopse Estatística 2010.

Fonte: INEP, Sinopse Estatística 2010.

O primeiro dado que chama a atenção é o expressivo aumento no número de funções docentes nas creches e nas pré-escolas brasileiras nesta última década. Observa-se um aumento de 147% de novas funções nas creches, e de 12% nas pré-escolas, o que corresponde às exigências de novas contratações, considerando o aumento de vagas, conforme apresentamos anteriormente.

Além do acréscimo já esperado no número de funções docentes, considerando o aumento do número de matrículas, observou-se, nesta última década, uma importante mudança com relação ao grau de formação dos professores que atuam na Educação Infantil brasileira. Em 2000, 18% das funções docentes em creches eram exercidas por pessoas com apenas o Ensino Fundamental, dentre essas, algumas sequer haviam completado essa etapa da educação. Menos de 10% desses professores possuíam Ensino Superior e a grande maioria, 54%, possuía o Ensino Médio. Transcorridos dez anos, o número de professores com apenas o Ensino Fundamental praticamente deixou de existir (menos de 2%). Por outro lado, houve um aumento de mais de dez vezes no número de professores com formação em Nível Superior atuando junto a crianças de zero a três anos de idade. As creches brasileiras contam hoje com o mesmo percentual de professores formados em Nível Médio e de professores com formação em Nível Superior, 46% e 45% respectivamente.

Nas pré-escolas, algumas das tendências observadas no atendimento em creches se mantiveram. Também para esse segmento da Educação Infantil, os professores com apenas Ensino Fundamental praticamente deixaram de existir (menos de 1%). A formação em Nível Médio, que representava, em 2000, 68% das funções docentes, em 2010, foi reduzida a 47%, a formação em Nível Superior atingiu a maioria (51%). Em dez anos, passaram a atuar, na pré-escola brasileira, 153% a mais de professores graduados em relação ao ano 2000.

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Os dados acima mostram que houve um avanço significativo no grau de formação dos professores que atuam com as crianças de zero a seis anos, na última década. Entretanto, ainda que consideremos o impacto positivo desse aumento na melhoria do atendimento, é imprescindível avaliar as condições nas quais os professores vêm sendo formados. Para tanto, os cursos de formação inicial e continuada, bem como as políticas públicas voltadas para essa formação devem ser objeto de análise.

O CuRRÍCulO dO CuRsO dE PEdagOgIa da FaCuldadE dE EduCaçãO da uFmg: ExEmPlIFICandO a QuEstãO da FORmaçãO InICIal dO PROFEssOR da EduCaçãO InFantIl

No Brasil, a formação para atuar na Educação Básica deve se dar em nível superior, admitindo-se, entretanto, como formação mínima para o exercício do magistério na Educação Infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos do Ensino Fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade Normal (Brasil, 2013). De acordo com a legislação nacional, os cursos em nível superior responsáveis pela formação do professor da Educação Infantil são os cursos de Pedagogia e Normal Superior.

Tomando-se como exemplo o curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UFMG, constata-se um movimento de adaptação em função das determinações contidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia, homologadas, em 2006 (Brasil, 2006). Uma análise não muito detalhada da grade curricular do curso revela alterações significativas na oferta de disciplinas voltadas para a formação do professor da Educação Infantil.

Considerando as categorias de análise empregadas por Gatti (2009)3 na comparação dos dois currículos do curso de Pedagogia da FaE/UFMG, vigentes em 2003 e em

3 Na pesquisa “Formação de professores para o ensino fundamental: estudos de currículos das licenciaturas em pedagogia, língua portuguesa, matemática e ciências biológicas”, Gatti (2009) buscou analisar o que se propõe como disciplinas e conteúdos formadores nas instituições de ensino superior dos cursos presenciais das licenciaturas em Pedagogia, Língua Portuguesa, Matemática e Ciências Biológicas. Foram listadas 3.513 disciplinas (3107 obrigatórias e 406 optativas) nas grades curriculares de 71 cursos de Pedagogia que compuseram a amostra da pesquisa. As categorias empregadas para analisar as grades curriculares e as ementas das disciplinas foram as seguintes: Fundamentos teóricos da educação - disciplinas que cumprem a função de embasar teoricamente o aluno de Pedagogia, a partir de outras áreas do conhecimento, tais como Antropologia, História, Psicologia, Sociologia. Conhecimentos relativos aos sistemas educacionais - disciplinas de conhecimentos pedagógicos que objetivam dar uma formação ampla da área de atuação do professor, bem como de outros profissionais da educação. Por exemplo: Estrutura e Funcionamento do Ensino, Financiamento, Políticas, legislação, planejamento, currículo, avaliação da aprendizagem, gestão escolar, coordenação pedagógica, formação, carreira docente. Conhecimentos relativos à formação profissional específica - disciplinas que fornecem instrumental para atuação do professor, ou seja, disciplinas que tratam dos conteúdos do currículo da educação básica: alfabetização e letramento, arte e educação, fundamentos e metodologia do ensino de, didáticas, novas tecnologias. Conhecimentos relativos a modalidades de ensino específicas - educação especial, educação de jovens e adultos, educação social. Pesquisa e trabalho de conclusão de curso: disciplinas que abordam as metodologias de pesquisa e a elaboração dos trabalhos de conclusão de curso, incluindo sua orientação. Atividades complementares: atividades integradoras. Estágios: componente obrigatório.

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TABELA 6FREQUÊNCIA DAS DISCIPLINAS DO CURSO DE PEDAGOGIA DA FaE/UFMG PORCARGA HORÁRIA (CH) CONFORME CATEGORIAS DE ANÁLISE DE GATTI (2009)

CURRÍCULOS 2003 E 2008

Categorias de análiseCurrículo 2003

Total de CH%

Currículo 2008Total de CH

%

Fundamentos teóricos da educação 600 28 570 20

Sistemas Educacionais 300 14 240 8

Formação específica 555 26 1020 35

Modalidade de ensino 0 0 0 0

Pesquisa 60 3 60 2

Atividades complementares 120 5 330 12

Estágios 240 11 420 15

Optativas 300 13 240 8

Total 2175 100 2880 100

Fonte: Tabela elaborada pela autora deste texto.

Observa-se um aumento no total da carga horária passando de 2.175 horas para 2.880 horas. Três categorias de análise obtiveram uma redução de carga horária: Fundamentos teóricos, Sistemas educacionais e Disciplinas optativas, sendo mais significativa a redução nas duas últimas categorias. Em contraposição, as disciplinas que compõem as categorias Formação Específica, Atividades Complementares e Estágios tiveram um significativo aumento na carga horária. Considerando a definição das categorias realizada por Gatti (2009), podemos argumentar que a diminuição da carga horária incidiu, principalmente, sobre as disciplinas que instrumentalizavam teoricamente o aluno a compreender o funcionamento dos sistemas de ensino e sobre as disciplinas optativas. Contrariamente, o aumento da carga horária ocorreu nas disciplinas que “fornecem instrumental para atuação do professor” (Gatti, 2009) e para a aprendizagem a partir da observação e reflexão sobre a prática, como é o caso dos estágios curriculares obrigatórios.

Em relação ao alcance das disciplinas que tinham como foco a formação do professor para atuar na Educação Infantil, no currículo de 2003, essas disciplinas se destinavam a um reduzido número de alunos, ou seja, somente para aqueles que optassem, em certo momento, por uma determinada trajetória dentro do curso. Dessa forma, um aluno do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UFMG, até 2008, poderia ser certificado para atuar como docente da Educação Infantil sem haver cursado nenhuma disciplina que tratasse especificamente de temas relacionados a essa etapa da Educação Básica. A Tabela 7 abaixo mostra a

2008, e tomando como referências as disciplinas comuns4, encontramos a seguinte situação apresentada na Tabela 6.

4 Além das 2880 horas de atividades acadêmicas comuns, deve ser cumprida uma carga horária relativa a disciplinas das cinco formações complementares – Educação de Jovens e Adultos, Educador Social, Ciências da Educação, Administração de Sistemas e Instituições Educacionais e Formação Complementar Aberta. A partir do sétimo período, o aluno deve optar por um desses percursos formativos que implica em cinco disciplinas específicas distribuídas ao longo dos três últimos períodos do curso. Para nossa análise, foram consideradas somente as disciplinas comuns a todos os alunos do curso de Pedagogia da FaE/UFMG.

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TABELA 7DISCIPLINAS ESPECÍFICAS DA ÊNFASE EM EDUCAÇÃO INFANTIL -

CURRÍCULO DO CURSO DE PEDAGOGIA FaE/UFMG 2003DISCIPLINAS PERÍODO CH

Fundamentos psicológicos da Educação Infantil 7º 60

Didática: alternativas da Educação Infantil 7º 60

Arte e movimento na Educação Infantil 7º 60

Organização da Educação Infantil 7º 60

Estágio supervisionado em Educação Infantil 8º 20

TOTAL 360

Fonte: Tabela elaborada pela autora deste texto.

distribuição das disciplinas específicas da chamada "Ênfase em Educação Infantil", vigente no currículo até 2008. Por sua vez, na tabela 8, são apresentadas as disciplinas obrigatórias a serem cursadas por todos os alunos matriculados no curso de Pedagogia e que integram a grade curricular atual, desde 2008.

TABELA 8DISCIPLINAS OBRIGATÓRIAS QUE ABORDAM ESPECIFICAMENTE

TEMAS DA EDUCAÇÃO INFANTILCURRÍCULO DO CURSO DE PEDAGOGIA FaE/UFMG 2008

DISCIPLINASPERÍOD

OCH

Organização da Educação Infantil 5º 30

Arte na Educação Infantil 7º 60

Didática na Educação Infantil 7º 60

Estágio curricular na Educação Infantil 7º 120

Observatório do currículo: educação infantil 8º 30

Total 300

Fonte: Tabela elaborada pela autora deste texto.

Observa-se que o total da carga horária se manteve praticamente inalterado nas duas propostas curriculares (360/h e 300/h respectivamente). Entretanto, duas modificações importantes ocorreram. A primeira refere-se ao fato de as disciplinas serem distribuídas de forma mais dispersa ao logo do curso (quinto, sétimo e oitavo períodos). A segunda e mais significativa é o fato de se ter ampliado o alcance dessa formação a todos os alunos matriculados no curso, passando a ser condição de certificação do pedagogo.

A análise do currículo do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UFMG exemplifica um percurso vivenciado, com diferentes nuances, pelas instituições de ensino superior desde a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Pedagogia (Brasil, 2006). Ainda que se evidenciem avanços nessas trajetórias em relação a uma maior definição quanto ao papel do curso de Pedagogia na formação do professor da Educação Infantil, alguns desafios persistem. É preciso

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que se analise, por exemplo, em que medida disciplinas voltadas para temas que não são exclusivos da Educação Infantil, tais como as que abordam fundamentos teóricos da Educação (Filosofia da Educação, Sociologia da Educação, História da Educação, Psicologia da Educação); conhecimentos relativos aos sistemas educacionais (Política e Administração de Sistemas, Gestão escolar, Política educacional, Teorias do Currículo); disciplinas que fornecem instrumentais para atuação do professor, (Alfabetização e Letramento, Fundamentos e Metodologia do ensino “de” e Atividades Complementares) contemplam aspectos relacionados à criança de zero a seis anos e seu processo de apropriação e construção de conhecimentos.

Igualmente importante é avaliar como os cursos de Pedagogia vêm equacionando a complicada magnitude da formação de licenciados. Cada uma das licenciaturas que abrangem a formação do pedagogo conforme estabelecido pelas Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia – licenciado para docência na Educação Infantil, nos anos iniciais do Ensino Fundamental e nas disciplinas pedagógicas dos cursos de formação de professores – é exigente do ponto de vista da formação profissional e requer conhecimentos específicos que dificilmente podem ser todos eles abordados na profundidade necessária e esperada, num período de quatro ou cinco anos que, em geral, é o tempo de duração dos cursos de Pedagogia. Como se não bastasse a dificuldade de conciliar as especificidades das licenciaturas para as quais o curso de Pedagogia habilita, é ainda mais desafiante conciliar tais especificidades com a formação para atuar como pedagogo em diferentes instâncias nas quais a ação pedagógica é requerida, tais como, nos espaços de gestão e nos espaços não escolares. Essa difícil tarefa conciliatória vem impondo, aos cursos de formação continuada, a missão de complementar a formação básica requerida para atuar com as crianças menores de seis anos.

a FORmaçãO COntInuada dOs PROFEssOREs da EduCaçãO InFantIl: a COntRIBuIçãO dO nEPEI/uFmg

O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Infantil e Infâncias, NEPEI, da UFMG, foi criado no ano 2000, a partir de uma iniciativa conjunta de professores e funcionários. Inicialmente, articulou-se em torno de questões relacionadas às disciplinas que constituíam a ênfase em Educação Infantil que, como vimos acima, compunha o currículo do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UFMG. Ao longo de sua história, o NEPEI vem ampliando sua atuação, por meio de projetos de ensino, extensão e pesquisa, enfatizando a produção de conhecimentos relacionados às políticas públicas, às práticas educativas, à infância e às famílias das crianças de zero a seis anos de idade.

Para melhor compreender a realidade, os problemas e as tendências que caracterizam a infância em seus diferentes contextos, o Núcleo vem se constituindo em um espaço interdisciplinar, capaz de congregar diferentes áreas do conhecimento humano, tais como, a Sociologia, a Antropologia, a Psicologia, a Pedagogia, a Saúde, as Artes e o Direito. As ações do Núcleo buscam cumprir três objetivos. O primeiro refere-se à formulação de propostas para o ensino

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de graduação e pós-graduação da UFMG com vistas a consolidar a formação de especialistas na docência, na gestão de instituições e na pesquisa educacional voltada para a primeira infância. O segundo busca organizar e analisar informações sobre fenômenos que afetam a infância e a Educação Infantil. O terceiro é o de constituir espaços plurais e democráticos, nos quais se discutam e se elaborem propostas de intervenção nas práticas educacionais e nas políticas públicas, tomando-se como referência o desafio de incluir a infância nos processos culturais e sociohistóricos da sociedade contemporânea.

Esses objetivos têm, nessa última década, se materializado em inúmeras ações relacionadas ao ensino, à pesquisa e à extensão universitária.

No eixo do ensino, os professores do NEPEI são majoritariamente responsáveis pela oferta das disciplinas específicas que constituem a grade curricular do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UFMG. A participação desses professores possibilita uma maior articulação entre essas disciplinas e o necessário e urgente debate sobre as carências do curso em relação à formação desse profissional. A participação de docentes do NEPEI no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência - PIBID - também tem sido fundamental para a reflexão sobre a formação inicial e sua articulação com os desafios enfrentados por professores que atuam com as crianças menores de seis anos, no seu cotidiano pedagógico. Na pós-graduação, os professores do NEPEI têm atuado no mestrado acadêmico e, na linha de pesquisa Educação Infantil, do Mestrado Profissional – PROMESTRE, recentemente aprovado e com a primeira turma em andamento, desde o início deste ano de 2014.

No campo da pesquisa, além dos projetos coordenados por professores do NEPEI ou realizados por alunos da graduação e da pós-graduação, vinculados às temáticas dos seus respectivos campos de interesse5, são significativas as participações em projetos de pesquisa realizados em parceria com o Ministério da Educação, por exemplo: Educação Infantil no Campo, Trabalho Docente e Condições de Trabalho na Educação Básica Brasileira, Avaliação na Educação Infantil, Leitura e Escrita na Educação Infantil.

A extensão universitária também ocupa a centralidade das ações do Núcleo. Podemos citar como exemplo, a participação dos pesquisadores do NEPEI na elaboração de documentos propostos pelo Ministério da Educação, por sistemas municipais ou redes de ensino para orientar políticas e práticas educativas. Por exemplo, a participação na elaboração dos Indicadores de qualidade na Educação Infantil; a elaboração de textos que compuseram o relatório do programa Currículo em Movimento que aprofundou temas emergentes, e por vezes polêmicos, presentes nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (Brasil, 2009); a elaboração da regulamentação da Educação Infantil pelo Conselho Municipal de

5 Cabe ressaltar os seis projetos de pesquisa aprovados pelo Edital 13/2012 da FAPEMIG/CAPES que apoiou financeiramente projetos de pesquisa e intervenção em escolas de Educação Básica relacionados à solução de problemas na educação pública. Acessível em http://www.fapemig.br/admin/editais/upload/Edital%2013-2012%20CAPES-FAPEMIG%20Pesquisa%20em%20Educacao.pdf Acesso em 23 de março de 2014.

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Educação de Belo Horizonte; a participação na formulação de documentos e textos veiculados pelo Fórum Mineiro de Educação Infantil – FMEI -, coordenado por representante do NEPEI e a participação em programas do Ministério da Educação como foi o caso do desenvolvimento e implantação do Programa Proinfantil.

Finalmente, no campo da formação continuada, dois cursos de especialização vêm sendo coordenados e algumas de suas disciplinas vêm sendo ofertadas por professores do NEPEI. O primeiro deles, Programa de pós-graduação em especialização lato sensu em docência na educação básica (LASEB), foi uma parceria entre UFMG e Prefeitura Municipal de Belo Horizonte que se iniciou em 2006 e possuía uma área de concentração voltada aos professores da Educação Infantil. Atualmente, o Programa de Pós-Graduação Lato Sensu para educadores da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte, área de concentração - Múltiplas Linguagens em Educação Infantil, continua sendo coordenado e algumas das disciplinas ministradas por professores do NEPEI. Esse programa busca cumprir o objetivo de formar em nível de especialização os professores que atuam na Educação Infantil da rede municipal de ensino de Belo Horizonte.

O segundo curso, Especialização em Docência na Educação Infantil, é uma ação do Ministério da Educação (MEC), em parceria com aproximadamente 20 (vinte) Instituições Federais de Ensino Superior e Secretarias Municipais de Educação, para formar professores da Educação Infantil, em nível de pós-graduação lato sensu. O curso tem como objetivo constituir um espaço de reflexão e análise sobre a prática educativa destinada à criança de 0 (zero) a 6 (seis) anos, formando teórica e metodologicamente, em nível de especialização, professores de instituições públicas de Educação Infantil. A Faculdade de Educação da UFMG, por meio do NEPEI, incorporou mais essa ação da política de formação por entender que, além de contribuir para a formação de especialistas em docência para a primeira etapa da Educação Básica, também se constitui numa oportunidade para integrar, efetivamente, as discussões nacionais sobre a Educação Infantil e posicionar-se acerca das prioridades da política voltada para a qualificação do atendimento educacional de crianças de 0 (zero) a 6 (seis) anos de idade.

Esse curso de especialização, juntamente com três cursos de aperfeiçoamento destinados aos professores que atuam em instituições públicas de Educação Infantil, em todo o Brasil, integra a política do Ministério da Educação voltada para a formação do docente da Educação Infantil. A proposta desses cursos de aperfeiçoamento nasceu do debate que os especialistas das instituições de ensino superior responsáveis pela coordenação dos cursos de especialização promoveram em torno da necessidade de expansão das ações de formação como estratégia para a melhoria da qualidade do atendimento na primeira etapa da Educação Básica. Foram elaboradas três propostas de curso: Currículo, planejamento e organização do trabalho pedagógico na Educação Infantil; Campos de Experiências, Saberes e Ação Pedagógica da Educação Infantil e Educação Infantil, Infâncias e Arte.

A adesão aos cursos de aperfeiçoamento e de especialização foi distinta no caso de cada instituição federal de ensino superior. Na UFMG, a primeira turma do curso de

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especialização em docência na Educação Infantil – DOCEI - concluiu as atividades em março de 2014. Já as primeiras turmas dos três cursos de aperfeiçoamento foram concluídas em meados de 2013 e destinaram-se a professores e coordenadores pedagógicos de escolas de Educação Infantil de Belo Horizonte, de cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte e de São João del Rey, nesse último caso, graças a uma parceria entre UFMG e Universidade Federal de São João Del Rey6. Os cursos iniciaram-se em maio de 2013 e foram concluídos em agosto de 2013. Três novas turmas deverão ser abertas no ano de 2014.

A existência de cursos que possuem programas unificados e oferta sistemática, periódica e abrangente, atingindo diversas redes de ensino das diferentes regiões do País, representa, sem dúvida, uma conquista para a área da Educação Infantil. A persistência dessa oferta assegurará a um número expressivo de profissionais o acesso aos conhecimentos que as universidades vêm produzindo em relação às temáticas que permeiam as disciplinas e atividades acadêmicas dos cursos. Além de ampliar o acesso a conteúdos mais atualizados que podem impactar na melhoria do atendimento educacional para a primeira infância, esses cursos permitem também que os pesquisadores se comprometam com a elaboração de políticas públicas e com a execução de ações que advêm dessas políticas. O grupo de especialistas que coordena esses cursos e que atua neles como docente passa a ter a oportunidade de debater a prática cotidiana do professor da Educação Infantil e, ambos, pesquisadores e professores, problematizam essa prática e formulam juntos alternativas para a superação dos problemas. Tendo a sala de aula como um espaço de conhecimento da prática e também de formulação teórica, esses cursos podem superar antigas noções que fundamentaram as ações de capacitação de docentes da Educação Básica, em partícula as voltadas para professores da Educação Infantil.

Durante um longo período, os professores da Educação Infantil brasileira ficaram à margem das políticas nacionais de capacitação em serviço. Poucas e assistemáticas ações de capacitação eram ofertadas pelos municípios. Muitas dessas ações se restringiam a palestras, conferências, reuniões promovidas por editoras ou grandes empresas interessadas na venda de materiais didáticos. A existência de cursos de especialização e de aperfeiçoamento com programas definidos por especialistas da área e com a oferta assegurada por meio de parcerias entre Governo Federal, Universidades e poder público municipal é, sem dúvida, uma iniciativa auspiciosa e apresenta, ao mesmo tempo, um novo desafio, o de superar as tradicionais ações fragmentadas, esporádicas, superficiais e distantes da realidade da sala de aula que durante muito tempo caracterizaram as ações de formação a que foram

6 O curso "Currículo, planejamento e organização do trabalho pedagógico na Educação Infantil", coordenado por professor da Faculdade de Educação, membro do NEPEI/FAE/UFMG, foi ofertado a coordenadores pedagógicos de instituições de educação infantil de cidades que integram a Região Metropolitana de Belo Horizonte. O curso "Campos de experiências e saberes e ação pedagógica na Educação Infantil" foi coordenado por professor da Universidade Federal de São João Del Rey e destinou-se a professores de instituições de Educação Infantil de São João del Rey e outras cidades vizinhas. O curso "Educação Infantil, Infâncias e Arte", coordenado por professores da Escola de Belas Artes da UMFG e membros do NEPEI, teve como público alvo professores de instituições de Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino ou da Rede Conveniada de creches e pré-escolas com a Prefeitura de Belo Horizonte.

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submetidos os profissionais da Educação Infantil. Trata-se de uma oportunidade para superarmos o maior desafio da formação docente: assegurar ao professor autonomia por meio do domínio das ferramentas teóricas e práticas que lhe permitirão eleger as melhores estratégias e realizar as melhores mediações para garantir à criança o seu direito de aprender em instituições formais de ensino.

FORmaçãO COntInuada E InICIal dOs PROFEssOREs da EduCaçãO InFantIl: PaRa alÉm da OFERta dE CuRsOs, O dEsaFIO da COnstRuçãO dE nOVas aBORdagEns

As transformações históricas pelas quais passou o magistério impuseram diferentes perspectivas e expectativas com relação à formação necessária, os saberes básicos, as habilidades e competências demandadas para o exercício da função de ensinar. Em um determinado período, predominava o ensino livresco, cujos métodos pedagógicos procuravam reforçar o apelo à autoridade, à disciplina, à submissão. O professor, portanto, era o agente responsável pela transmissão da cultura letrada e detentor de todo o conhecimento.

Em outro momento, a crença de que os problemas educacionais poderiam ser solucionados com a modernização dos métodos de ensino levou a uma discussão acirrada acerca da adequação ou inadequação de modelos e métodos pedagógicos. Deu-se ênfase à experimentação, à racionalização, à exatidão e ao planejamento visando dar à educação certo estatuto de ciência. A Psicologia tornou-se uma das áreas privilegiadas que subsidiaria os métodos de análise, fornecendo medidas de comparação, testes de inteligência. Técnicos e especialistas de ensino tornaram-se os responsáveis pela sistematização e organização das técnicas e testes a serem aplicados e encaminhados pelos professores.

Num outro contexto, observamos uma busca intensa por uma redefinição das funções da escola, procurando identificá-la com a luta pela redemocratização do País. A ênfase, naquele momento, recaiu sobre o caráter político da educação e passou-se a se requerer do educador um compromisso com a emancipação das camadas populares. A polarização entre compromisso político e competência técnica tomava conta do cenário educacional.

A partir do final dos anos oitenta e ao longo dos anos noventa, com a alteração dos modos de produção e com as modificações que ocorreram na base dos setores produtivos, o capital passou a demandar profissionais cujo perfil em muito se distanciava daquele que predominava até alguns anos atrás. As indústrias e empresas passaram a exigir novos profissionais, mais flexíveis, capazes de desempenhar tarefas distintas num curto espaço de tempo, que soubessem tomar decisões e pudessem assumir diferentes tarefas e funções. A partir dessas modificações, alguns setores da sociedade passaram a demandar da escola a formação desse novo perfil profissional. A relação da escola com a sociedade, portanto, estaria alicerçada aos clamores do mercado e teria o compromisso de contribuir para o desenvolvimento econômico do País. A partir dessas novas demandas por profissionais que pudessem atuar num mercado cada vez mais

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competitivo, retomaram-se algumas antigas convicções que procuravam enaltecer a técnica, o método, o desenvolvimento de certas habilidades, de maneira a assegurar a “cientifização” da Educação. A ação docente, dentro dessa perspectiva, pressupunha a capacidade de aplicar técnicas e métodos de ensino considerados adequados e eficientes.

Donald Schon, citado por Santos (1991), ao criticar essa perspectiva, afirma que a atividade profissional não se restringe à resolução instrumental de problemas, levada a cabo pela aplicação de teorias e técnicas científicas como quer essa perspectiva de formação. A crítica de Schon a esse modelo se baseia em duas premissas. De um lado, os pesquisadores são tidos como aqueles que fornecem a ciência básica e aplicada e as técnicas para diagnosticar e resolver os problemas da prática. De outro lado, os profissionais que atuam nas escolas de Educação Básica são os "fornecedores" dos problemas a que os pesquisadores deverão se encarregar de equacionar e testar resultados das pesquisas. O conhecimento profissional consistiria, pois, nessa abordagem criticada por Schon, na aplicação de teorias científicas e técnicas delas derivadas, para a resolução dos problemas da prática.

Esse modelo da “racionalidade técnica”, segundo Schon (1992), baseado em resoluções técnicas para a solução de problemas, começa a ser questionado já na década de sessenta. Outros aspectos como, complexidade, incerteza, instabilidade, singularidade, conflito de valores passam a ser considerados. Schon (1992) descreve duas características da prática docente que nos ajudam a entender a crítica que se faz ao modelo da racionalidade técnica.

Em primeiro lugar, os problemas, na prática, não se apresentam aos profissionais de forma definida ou dados a priori. Para esse teórico, a capacidade de problematizar a realidade depende do quadro de referência político e filosófico do profissional. Assim, a atividade profissional não se volta exclusivamente para a busca de soluções, mas antes disso, para a estruturação do problema e envolve a definição de decisões, os fins e os meios para atingir essas decisões.

Em segundo lugar, a prática docente envolve uma série de ações que as pessoas não sabem descrever com precisão. Esse saber tácito ou conhecimento prático é adquirido através do exercício da atividade, a partir da experiência adquirida. Os professores dão respostas imediatas a problemas que se enquadram dentro da mesma estrutura que outros problemas já resolvidos.

Uma nova concepção acerca da carreira docente procura ressaltar que os professores se tornam os professores que são porque retraduzem para si, a partir das suas características pessoais, os conhecimentos teóricos, as interações que vivenciam dentro e fora da escola, as observações que fazem de outras práticas docentes antes de se tornarem professores e no próprio contexto onde atuam. De acordo com essa perspectiva de análise, os profissionais criam, a partir de sua experiência, soluções para os problemas que eles próprios definiram como sendo relevantes. Ou seja, os professores constroem saberes, constroem conhecimentos

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e não apenas se utilizam dos conhecimentos produzidos nas instâncias de formação docente. A partir dessa concepção, contrapõe-se a idéia do professor como um técnico que passa a ser visto como alguém capaz de participar ativamente da construção da sua profissão.

No sentido de possibilitar a construção e a reconstrução do saber-fazer construído a partir da experiência, as novas propostas pedagógicas e didáticas têm dado ênfase à necessidade de os professores estarem constantemente refletindo sobre suas ações: a partir de suas ações, sobre suas ações e durante suas ações. Schon (1992) chama atenção para a importância da reflexão como fonte de produção de um saber-fazer que se consolida através da análise da própria prática. Através da reflexão, o profissional pode criticar a compreensão tácita subjacente, a avaliação e o julgamento de uma situação. Além disso, por meio da reflexão, o professor é também capaz de questionar as estratégias utilizadas e descobrir as teorias implícitas que fundamentam sua ação. Essa reflexão-na-ação, segundo Schon (1992), torna o profissional um pesquisador que define os meios e os fins da sua ação de forma interativa.

No caso da Educação Infantil, a definição normativa de que o atendimento da criança de zero a seis anos em uma instituição coletiva é uma prática educativa determinou critérios e parâmetros próprios da área educacional. De um lado, essa definição reforçou a noção de que a Educação Infantil, assim como os demais níveis e etapas de ensino, é a única forma profissionalizada de educar e, como tal, requer, para o seu exercício, um profissional devidamente capacitado. O professor da Educação Infantil, assim como seus colegas que atuam nas demais etapas da Educação Básica, precisa ser alguém capaz de ampliar as experiências infantis por meio de ações planejadas, sistematizadas e devidamente acompanhadas. Por outro lado, como sugere Zabalza ( 1998), o peso das relações de vínculo afetivo, nessa etapa da Educação Básica, é muito forte. Ao tratar das crianças de três anos e de como a sua incorporação nas escolas espanholas revolucionou a organização das aulas, Zabalza (1998, 26) destaca:

Certamente, trata-se de crianças ainda muito pouco socializadas, vivas e dinâmicas, que custam muito a concentrar a sua atenção nas suas atividades, prestar atenção às instruções, manter-se dentro de processos minimamente prolongados, aceitar as regras básicas da convivência. Todos esses aspectos se transformam em conteúdos da aprendizagem do seu primeiro ano de contato com a escola. O instrumento fundamental de que o professor dispõe é a sua própria presença (a "pedagogia da presença" como linha fundamental de ação) e a disposição de um espaço físico especialmente enriquecido e estimulante.

No caso brasileiro, a incorporação dos bebês e crianças bem pequenas ao sistema educativo torna ainda mais peremptórias, essas ponderações feitas pelo autor. Ser professora de crianças tão pequenas impõe alguns desafios que esbarram em limites tênues entre a vida privada e a atuação profissional; entre as práticas sociais vivenciadas no âmbito familiar e as da instituição educativa; entre os saberes e habilidades pessoais adquiridos na prática cotidiana e aqueles conteúdos próprios

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da profissão docente; entre as dimensões de cuidados físicos com a criança e o compromisso de alargar suas experiências nos diversos campos de saberes e conhecimentos. Por isso, justifica Zabalza (1998), as características pessoais do professor da Educação Infantil possuem um forte peso na definição do seu perfil profissional.

Pelo que se argumentou, importa enfatizar que o processo de construção da identidade profissional do professor da Educação Infantil precisa reconhecê-lo como alguém que define os problemas que merecem ser levados em conta, a partir da sua filosofia de vida, das suas concepções de educação e ainda, a partir da maneira como percebe sua atividade docente. É fundamental também que, nesse processo, se considerem os saberes da experiência, ou seja, os saberes que o professor constrói na sua relação cotidiana com o contexto educativo.

COnsIdERaçÕEs FInaIs

Procuramos mostrar como o direito à Educação Infantil no Brasil ainda não se consolidou. Ao mesmo tempo, evidenciou-se o muito que avançamos, sobretudo na última década, em relação à ampliação de vagas e na reconfiguração do perfil dos profissionais que atuam nessa etapa da Educação Básica no que se refere ao seu grau de formação.

Muito ainda se faz necessário em termos de ampliação da oferta de vagas e na garantia de condições de funcionamento das instituições de Educação Infantil. É preciso ampliar o atendimento e garantir a qualidade da oferta. Essa qualidade depende de diversos fatores, tais como: a constituição de ambientes físicos que levem em conta as especificidades da primeira infância; a adequação dos equipamentos e dos materiais ofertados às crianças; a organização dos tempos e das rotinas capaz de considerar os ritmos próprios de cada criança e o desafio de tornar possíveis progressos pessoais que não seriam alcançados sem a frequência a uma instituição de Educação Infantil e a garantia de condições básicas para que a carreira docente incentive os melhores profissionais a nela permanecerem. Dentre os diversos aspectos a serem contemplados para que se supere o desafio de assegurar às crianças menores de seis anos o seu direito à educação, demos especial destaque à questão da formação do professor.

Nesse aspecto da formação, ressaltamos que além da necessária reformulação dos cursos de formação inicial a fim de que contemplem as especificidades da educação das crianças de zero a seis anos é preciso ainda pensar na oferta de cursos de formação continuada. Assim como não basta ampliar a oferta de vagas na Educação Infantil, também na formação continuada, além da expansão da oferta de cursos e ações de formação, é preciso que tais ações levem em conta o contexto no qual o professor se forma e as relações que estabelece com os diferentes sujeitos com os quais compartilha suas experiências cotidianas. Em suma, é preciso levar em conta o que os professores pensam e fazem no seu cotidiano. É ainda essencial que o professor seja tomado como um sujeito capaz

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de participar ativamente da construção da sua própria identidade profissional e que tal identidade não se separa da sua identidade pessoal. O que o professor é, como ele se vê e como desempenha a sua função profissional tem estreita relação com sua prática docente. As identidades profissionais e as identidades pessoais estabelecem relações análogas em diversas dimensões: a identidade feminina, a identidade de classe, a identidade étnica etc. Como afirma Nia, citado por Novoa (1992:25): “O professor é a pessoa. E uma parte importante da pessoa é o professor”.

Os cursos de formação, nessa perspectiva, devem se perguntar: como cada um se tornou o professor que é? Por quê? De que forma a ação pedagógica é influenciada pelas características pessoais e pelo percurso de vida profissional de cada professor? Por que fazemos o que fazemos nas salas de aula? Trata-se de levar em consideração o processo de construção da identidade dos professores, percebendo esse processo como construção das formas de ser e de estar na profissão.

Como procuramos argumentar, as especificidades da Educação Infantil, por lidar com sujeitos que iniciam a construção de sua própria identidade e pela presença determinante dos vínculos afetivos na estrutura da relação adulto/criança nessa fase da vida, requer um aprofundamento e uma radicalidade desses princípios nas ações de formação dos professores. Somente a ação de refletir sobre as histórias de vida, sobre as ações educativas e a relação delas com as dimensões pessoais é que nos ajudará a construir a identidade do professor da primeira infância. O exercício da docência, nessa faixa etária, impõe o exercício constante do afeto, do acolhimento, da compreensão do outro como um sujeito de direitos desde a mais tenra idade. Esperamos que os cursos ofertados pelas instituições federais de ensino superior e em parceria com o Ministério da Educação caminhem nesse sentido.

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REFERênCIas

BRASIL. Lei n. 12. 796, de 04 de abril de 2013. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12796.htm . Acesso em 24 de março de 2014.

BRASIL. Emenda Constitucional 59, de 11 de novembro de 2009. Acrescenta § 3º ao art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para reduzir, anualmente, a partir do exercício de 2009, o percentual da Desvinculação das Receitas da União incidente sobre os recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino de que trata o art. 212 da Constituição Federal, dá nova redação aos incisos I e vII do art. 208, de forma a prever a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar a abrangência dos programas suplementares para todas as etapas da educação básica, e dá nova redação ao § 4º do art. 211 e ao § 3º do art. 212 e ao caput do art. 214, com a inserção neste dispositivo de inciso vI. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc59.htm Acesso em 24 de março de 2014.

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BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. SECRETARIA DA EDUCAÇÃO BáSICA. Indicadores da Qualidade na educação Infantil, Brasília, 2009. Disponível em http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/indic_qualit_educ_infantil.pdf Acesso em 24 de março de 2014.

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BRASIL. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm Acesso em 24 de março de 2014.

GATTI, Bernadete A. e NUNES, Mariana Muniz Rossa (org.). Formação de professores para o ensino fundamental: estudo de currículos das licenciaturas em Pedagogia, Língua Portuguesa, Matemática e Ciências Biológicas. São Paulo: FCC/DPE, 2009. Coleção Textos FCC.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Disponível em http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/default.shtm Acesso em 24 de março de 2014.

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SANTOS, Lucíola Licínio de C. P. Problemas e alternativas no campo da formação de professores. CBE - 1991.

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ZABALZA, Miguel A. Qualidade em Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 1998.

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arte, Fenomenologia e inFância

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IntROduçãO: COlOCaR EntRE PaRêntEsEs a IdEIa dE “gRadE EVOlutIVa” na InFânCIa

Esta reflexão tem como ponto de partida a fenomenologia da criança, tal como proposta por Maurice Merleau-Ponty (1990a; 1990b). Por quatro anos, o filósofo lecionou a cátedra de psicologia e pedagogia da criança na Sorbonne, e suas aulas foram compiladas por alunos, revistas pelo autor e publicadas postumamente. Sua contribuição nos cursos é grande no campo do grafismo, mas sua concepção de infância é inédita e poderá ser transposta para os diversos mundos de vida infantis. O filósofo nos convida a pensar de maneira a afastar-nos do paradigma clássico da psicologia evolutiva, ou seja, da psicologia desenvolvimentista que pensa o ser humano a partir de uma classificação por fases e idades.

Merleau-Ponty positiva o fenômeno da infância de modo que possamos compreender a criança tal como ela se apresenta a nós; esse convite acontece conectado ao clássico lema da fenomenologia: “de volta às coisas mesmas”. Para chegar lá, devemos colocar entre parênteses noções previamente dadas, tais como as etapas do desenvolvimento afetivo-cognitivo infantil, de modo a conhecermos quem é a criança diante de nós. Essa atitude é nomeada pelos fenomenólogos de “um empirismo radical” – raiz empírica, vivencial, observacional; copa da árvore descritiva e hermenêutica.

Estive debruçada sobre a obra de Maurice Merleau-Ponty durante os anos de meu doutoramento, cuja tese foi publicada em livro em 2010 (Merleau-Ponty & a Educação, Editora Autêntica, Belo Horizonte). O leitor que desejar poderá aprofundar-se com a leitura do livro; aqui, apenas compilarei brevemente as ideias ou os traços que definem, para Merleau-Ponty, o modo de ser e estar da criança pequena: são palavras-chave o “polimorfismo”, o “onirismo” e a “não representacionalidade”. Ensina-nos o filósofo que:

não existe uma “natureza infantil”: conceber uma natureza infantil a priori foi um dos grandes erros daquilo que Merleau-Ponty nomeia “a psicologia clássica”. Para ele, um grande objetivo da “nova psicologia” precisará ser “reintegrar a criança ao conjunto do meio social e histórico no qual ela vive e diante do qual ela reage” (1990b: 221). Para tal, é necessário compreender que a criança é polimorfa, e essa característica de polimorfismo permite à criança a coexistência de possibilidades; a criança não é nem um “outro” absoluto, nem “o mesmo” que nós.

O polimorfismo é uma característica que se desdobra em todos os âmbitos da vida da criança: seu corpo é polimorfo, sua noção de tempo e espaço são polimorfos, sua expressividade na fala e no desenho também. (MACHADO, 2010, p. 19)

Merleau-Ponty nomeou como “onirismo” a maneira de viver sua intensa vida imaginativa: a criança habitaria uma espécie de zona híbrida entre sonho e realidade. Seu onirismo e seu polimorfismo são características que a impedem de possuir uma “visão de mundo” representacional:

A experiência da vida infantil não se dá de maneira objetiva por não haver como ela distanciar-se (de modo a fazer alguma representação do que quer

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que seja): há na criança uma unidade anterior à unidade intelectual, unidade vivida, pré-lógica, que Merleau-Ponty define como “uma ordem que não é uma ordem racional mas que também não é o caos” (1990b:229). Não haveria como “mediatizar” as experiências vividas pelas crianças por meio do pensamento formal ou pela linguagem adulta objetivista. O desafio proposto por Merleau-Ponty é resumido em uma frase: “Às vezes, nós não somos também pré-lógicos?” (1990b, 218). (MACHADO, 2010, p. 21)

De maneira elegante e contextualizada, Merleau-Ponty também questiona os princípios mais enraizados da psicologia projetiva, a saber, a crença de que todos os gestos, desenhos, brincadeiras, dizeres da criança “representam” sua realidade psíquica. A elegância merleau-pontiana revela-se em sua brilhante capacidade para, em conexão com o lema “de volta às coisas mesmas”, propor uma fenomenologia da infância, nos convidando a perscrutar as relações adulto-criança – antes de nos filiarmos a uma das teorias do desenvolvimento, por exemplo.

O olhar fenomenológico burila, aprofunda, observa e conecta as relações estabelecidas pela criança com os existenciais “temporalidade” (relação criança-tempo), “espacialidade” (relação criança-espaço), “mundaneidade” (relação criança-mundo), “linguisticidade” (relação criança-língua mãe) e “outridade” (relação criança-outro).

Trabalhar em sintonia com os “Cursos na Sorbonne” nos leva a abrir mão da noção de “sujeito” e de “indivíduo”, como nos propõe o desenvolvimentismo e a psicanálise infantis, em busca da compreensão dos modos de ser e estar das crianças no mundo compartilhado: seres-em-situação. Assim, não há como avaliar “objetivamente” a “gênese exata” da pessoa em geral; nosso contorno nunca se apronta, estamos lançados no mundo, desde o parto até a morte. Essa é uma outra maneira de ver a vida humana: uma maneira existencial. Maneira que não nega nem joga fora os dados do amadurecimento biológico, mas os inclui em um âmbito de significações das relações da criança e seu corpo, do adulto com o corpo da criança, e do adulto em relação à cultura dos cuidados e da educação de crianças… Pois a criança mesma não se sente criança!

mERlEau-POntY E O gRaFIsmO InFantIl

A contribuição do filósofo Maurice Merleau-Ponty para a compreensão da arte na contemporaneidade, seja no âmbito da arte como profissão e cultura compartilhada (seus escritos sobre filosofia estética) ou no âmbito do desenho infantil (suas lições nos “Cursos na Sorbonne”) é algo que vale muito a pena conhecer.

Merleau-Ponty nos ensina que a estética realista é “um dos modos de representar” – e positiva a produção gráfica das crianças não letradas, do 0 aos 5 anos, considerando o espaço gráfico como o espaço do gesto, espaço do traço. Merleau-Ponty nos convida a apreciar os desenhos das crianças a partir do que eles mostram: não mais a partir do que não está ali, como se costumou fazer nos estudos desenvolvimentistas, que criaram uma linha evolutiva rumo ao “realismo

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visual” (terminologia do pesquisador Georges-Henri Luquet).

A leitura fenomenológica dos desenhos das crianças vai sempre positivar o que se vê na folha de papel, no risco na areia, no mural, na tela, ou na lousa da sala de aula… Positivar o que se vê implica poder observar e descrever generosamente as capacidades atuais das crianças, capacidades reveladas no momento vivido da criação do desenho; faz-se isso a partir de um jeito de olhar, implicando uma atitude frente à criança: atitude nomeada époché, ou redução fenomenológica, cuja definição é, grosso modo, esvaziar-se de expectativas, colocar entre parênteses nosso conhecimento prévio, para observar e entrar em contato com “as coisas mesmas”.

“As coisas mesmas” do ato de desenhar infantil são: o material oferecido à criança e o modo de oferecê-lo; a maneira de a criança de utilizar o material, entrando em contato com um dado do mundo cultural compartilhado com adultos. Crianças têm acesso aos materiais de artes há pouco tempo, considerando a temporalidade contida na História da Arte: os materiais ficaram mais acessíveis apenas com a industrialização do papel, dos lápis e tintas, e a infância foi emoldurada e escolarizada, de modo que o desenho tornou-se “atividade” infantil.

Nesse campo, os professores trabalharam, por décadas, no sentido da “representação perfeita” do espaço perceptivo, por meio da observação e modelo. A criança dita “pré-escolar” foi sempre convidada a desenvolver-se na direção da estética realista, aquela na qual o adulto reconhece formas e conteúdos do “mundo real”.

Com o advento da arte moderna, artistas profissionais e pesquisadores valorizaram o “gesto espontâneo” das crianças; seus rabiscos e garatujas foram considerados algo importante para a desconstrução de uma “representação convencional” – momento da industrialização da fotografia, inclusive, invenção que, de certa maneira, desbancou a pintura realista. A arte figurativa foi questionada, novas possibilidades surgiram para as artes visuais. Performances, instalações e happenings propuseram outra noção de espacialidade, para além do papel e da tela, suportes tradicionais. O movimento surrealista chegou a idealizar a criança, a infância, como momento único de criatividade e liberdade. Mesmo assim, os educadores da primeira infância continuaram a propor um caminho desenvolvimentista (explicação por etapas e faixas etárias) nas práticas do desenho da criança.

Merleau-Ponty é um pensador que nos ajuda a imaginar outros modos e meios de propor o contato da criança com a plasticidade dos materiais. Ele nos faz lembrar que é o adulto que se encontra fixado ou acomodado na expectativa naturalista de encontrar… o céu no topo da página, o sol bem amarelo e uma montanha marrom no centro! Essa expectativa, quanto mais forte e atuante, atrapalhará a possível interpretação fenomenológica dos grafismos infantis.

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A interpretação fenomenológica dos desenhos das crianças não é classificatória ou evolutiva; a interpretação é descritiva daquilo que se vê: “as coisas mesmas”. Longe da chave da psicologia projetiva e perto da criança mesma, a boa leitura do desenho é a busca de quem é a criança: em que momento e circunstância fez o desenho, qual a sua maneira de iniciar, dar continuidade, dar por terminado o desenho; enfim, o ponto de partida é situar o momento vivido; o ponto de chegada é o modo de ser e estar da criança que desenha.

O bom intérprete dos desenhos da criança pequena é observador, meticuloso e cuidadoso nas suas observações: será alguém capaz de descrever em palavras a imagem, o desenho, a produção gráfica diante de si. Mas não se busca uma “mera descrição”: a descrição fenomenológica cria uma rede de remissões na qual o olhar adulto vai usufruir da pequena obra da criança como expressão do momento, de si, do mundo e da relação criança-cultura. quem desenha e quem aprecia o desenho são parte de um momento relacional: entre a expressividade da criança e a percepção adulta daquela expressividade. Como o adulto percebe a produção gráfica é a matéria-prima da interpretação fenomenológica do ato de desenhar – bem como, é claro, a própria produção gráfica infantil. O adulto aberto às novas vertentes da arte contemporânea se libertará da necessidade de enxergar formas conhecidas nas produções das crianças; ele vai se sensibilizar para enxergar, no grafismo, as formas de ser e estar no mundo da criança que desenha.

Esse olhar fenomenológico pode ser traduzido por um olhar antropológico, que situe a criança em um tempo e um espaço: não o tempo do relógio, não o espaço topológico, mas, antes, o tempo vivido e o espaço apropriado pela criança – inicialmente, talvez a folha de papel. Para tal, é preciso sintonizar na descrição detalhista do uso da folha de papel: formas, cores, lateralidade, uso das margens, etc. Precisamos elaborar um vocabulário mais preciso sobre a maneira com que a criança demonstrou suas relações de espacialidade na folha de papel (seu modo de experienciar o espaço papel pelo grafismo). A temporalidade estará dada nas formas instantâneas, ou seja, no aqui/agora quando se vê formas, detalhes e minúcias que revelem quem é a criança e como se debruçou em seu projeto – mesmo que desenhado com rabiscos e garatujas.

Há uma temporalidade do momento vivido pela criança ao desenhar e outra temporalidade da observação do desenho depois de “pronto”: o desenho em processo e o desenho no mundo. Outros desenhos do mesmo desenhista poderiam ser guardados e analisados por nós, de modo comparativo e descritivo, em busca de uma compreensão hermenêutica do que é singular e do que é plural, comum a todos os desenhos. Em rabiscos e garatujas também! O adulto precisará desenvolver nele mesmo a habilidade para apreciação de cores, formas, detalhes, bordas, cantos, etc.

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a ExPREssIVIdadE InFantIl E sua amPlItudE: Eu, COm O OutRO, nO mundO

Tudo aquilo comentado sobre o desenho é passível de ser transposto para a corporalidade da criança (seu modo de habitar seu corpo, brincar, saltar, dançar, aquietar…), bem como para a musicalidade do bebê nos primeiros anos de vida. Assim, pode surgir um vocabulário diferente para compreender as linguagens artísticas na infância: “teatralidades”, “espacialidades”, “corporalidades”, “musicalidades”; trabalhei com esses termos e essa proposição hermenêutica em um artigo publicado recentemente (MACHADO, 2012). Nessa reflexão, convido o leitor a vestir os óculos do brincar imaginativo para, tal como o lobo mau diante da Chapeuzinho vermelho, “enxergar melhor”…

Como pode o adulto enxergar melhor os modos de ser e estar próprios da criança pequena com as lentes da fenomenologia?

Não parta de uma teoria pré-concebida ou pré-estabelecida; não procure criar “atividades de artes” por “faixas etárias”. Parta de quem é você e de quem são as crianças com as quais você convive; parta da relação adulto-criança implicada no ato de educar. O caminho do auto-conhecimento é a janela para uma educação para a sensibilidade: conheça a si mesmo e às crianças; permita à criança expressar-se, bem como esteja atento, de maneira respeitosa, à expressão do outro. Educar para a sensibilidade é abrir a porta do conhecimento artístico criador e transformacional. E, como adulto, abra diante de si uma espécie de mapa do brincar – partindo dele, territorialize as potencialidades das crianças para fazer teatro, artes visuais, dança e música.

Minha proposta de utilização de outro vocabulário (teatralidades, espacialidades, corporalidades e musicalidades) conecta-se com os “Cursos na Sorbonne” de Merleau-Ponty, que nos convidou a buscar “uma nova linguagem” que proporcione

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o conhecimento efetivo das relações adulto-criança. Penso ser essencial que o adulto não adote a posição daquele que sabe (teatro, artes visuais, dança, música) diante da criança “aprendiz” – infante, que nada saberia. Na chave fenomenológica, o balbucio dos bebês já é um saber musicalizado; a compreensão do ponto de vista do bebê deitado em seu berço, olhando para rostos adultos, uma arte da decifração hermenêutica!

voltando ao mapa do brincar, faça o rabisco dos relevos, montanhas, planícies, mares e ilhas das maneiras de ser e estar no mundo das crianças. quem é João, Maria, Laura e Ronaldo? Como brincam, quando brincam? quanto tempo passam arrumando a brincadeira? Seria essa arrumação uma ilha ou uma passagem ou estreito? Como organizam o espaço? Como se dão os combinados? E assim por diante. O brincar de faz de conta, na pequena infância, será o caldo mais essencial do fazer artístico. Há teatralidade em potencial em cada etapa do brincar e imaginar: tempo, espaço, falas, corporalidade de personagens…

Todos os dias, na rotina cotidiana da escola, o professor pode e deve proporcionar o enriquecimento plástico, corporal, cênico, musical do brincar; enriquecimento feito de modo adulto e até planejado, mas com base nas maneiras de ser das crianças mesmas. Para que isso aconteça, há que observar as crianças por muito tempo, registrando de modo detalhado como brincam, do que brincam, se não brincam, as dinâmicas de relação de poder nas etapas do brincar. Esse registro, estudado com cuidado, é que levará o adulto a um projeto em arte. Também maiores informações sobre arte e contemporaneidade vão fazer com que o adulto tenha mais repertório, referências e capacidade imaginativa para inventar ambientes e situações propícias para a expressividade das crianças.

Do brincar para as instalações; do brincar para o canto da sereia, o som da ambulância, do galope do cavalo; do brincar para as cenas, que não são “produtos”, mas, antes, “processos” de brincadeiras tornadas mais sofisticadas, pelas próprias crianças; do brincar para o conhecimento do corpo vivido, estátuas, animais, coisas e atmosferas corporificadas. Todas essas ações são passos na direção da arte, tal como vista na contemporaneidade: arte relacional, arte da surpresa, estranhamento/encantamento reconhecido como forma humana, não divina nem mística.

A mudança anunciada pelo percurso fenomenológico está em deixar de lado a concepção de “atividades” adequadas; é preciso aproximar o educador das crianças mesmas e tentar responder quem são as crianças e em que contexto vamos ensinar arte. É preciso desenvolver uma capacidade grande de observação e, desde o início dos processos, manter o hábito dos “Diários de Bordo” – cadernos de anotações sobre as crianças e o passar dos dias; como as crianças se apresentam e como suas ideias adultas são recebidas por elas. O mote é trazer a leitura fenomenológica da infância para as práticas cotidianas, com simplicidade e rigor. Ao longo do tempo, “atividades” podem ser renomeadas por “atos performativos”, quando surgirem propostas relacionais entre o adulto educador e as crianças, as crianças entre si e as crianças e o mundo.

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COnClusãO: COmO ExPandIR O OlHaR antROPOlÓgICO PaRa a CRIança E a InFânCIa

O ponto de vista desta reflexão é de que a expansão do olhar adulto, na direção da antropologia da criança, deverá trazer grandes benefícios para a infância na contemporaneidade, bem como para a leitura das infâncias e suas culturas e contextos específicos no passado. Trata-se de um tipo de inteligência a ser exercida pelo adulto na lida com crianças e seus mundos de vida: uma reorganização constante dos dados iniciais, diria Merleau-Ponty; a reorganização transforma e areja as teorias sobre a criança e a infância.

Podemos adotar o modo de compreensão culturalista para situar as infâncias, e os modos relacionais entre adultos e crianças. Também as noções de tempo e espaço ampliados nos farão ver as possibilidades existenciais, expressivas, vivenciais das crianças tal como vivem hoje.

O olhar antropológico busca uma rede de remetimentos na direção de significados para a mundaneidade, ou seja, nosso olhar deve focar nos modos de relação criança-mundo. Seria essa relação ordenada, colorida, branco e preto, intimidada, lúdica, raivosa, expandida? Longe de tornarem-se palavras-chave de uma leitura projetiva (do “mundo interno” para o “mundo externo”), as palavras relacionais nos guiam na direção da leitura hermenêutica – aquela que doa significados para aquilo que se vê. Apuramos esse modo de olhar a partir dos referenciais culturais, tais como: as culturas da infância, a simbologia já dada pela cultura ancestral compartilhada, a memória de brincadeiras e canções, contos e poesias…

Ao invés de lutarmos contra a tecnologia e as relações virtuais, por exemplo, podemos, adultos que somos, trabalhar de maneira inteligente e sensível a apresentação dessa realidade para as crianças pequenas. Tal qual a primeira vez de ver, conhecer, entrar no mar: sabemos da cultura da praia, da necessidade de um tipo de roupa, toalha, boias ou coletes, pranchas e outros brinquedos… O que é necessário, hoje, para inserir a criança na realidade compartilhada, de modo transformacional, lúdico e vivo? Penso ser essa a pergunta inicial mais importante para pesquisas adultas – mas relacionais, sempre – nos âmbitos da arte, fenomenologia e infância.

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REFERênCIas

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MACHADO, M. M. A poética do brincar. São Paulo: Edições Loyola, 1998.

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MACHADO, M. M. Fazer surgir antiestruturas: abordagem em espiral para pensar um currículo em arte. Revista E-curriculum. São Paulo: Programa de Pós Graduação Educação: Currículo. v. 8, n. 1, p. 1-21, 2012.

MERLEAU-PONTY, M. Merleau-Ponty na Sorbonne – resumo de cursos: filosofia e linguagem. Tradução Constança Marcondes César. Campinas: Papirus, 1990a.

MERLEAU-PONTY, M. Merleau-Ponty na Sorbonne – resumo de cursos: psicossociologia e filosofia. Tradução Constança Marcondes César e Lucy Moreira César. Campinas: Papirus, 1990b.

ROCHA, G.; TOSTA, S. P. Antropologia & Educação. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2009.

STEINBERG, S.; KINCHELOE, J. Cultura infantil: a construção corporativa da infância. Tradução George Eduardo Japiassú Bricio. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

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linguagem corporal: dança

Ana Cristina Carvalho PereiraGabriela Córdova Christófaro

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Curso Educação Infantil

dança: aRtE E dOCênCIa

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, instituídas pela Resolução CNE/CEB nº 5, em 2009, definem a concepção e o currículo da Educação Infantil no território nacional. Nesse documento, como citado anteriormente no capítulo “Formação, experiência e criação: curso Educação Infantil, Infâncias e Arte”, os princípios estéticos devem ser respeitados nas propostas pedagógicas da Educação Infantil, garantindo a ampliação de experiências sensoriais, expressivas, corporais, favorecendo a imersão das crianças nas diferentes linguagens, de modo a promover o domínio de vários gêneros e formas de expressão, entre eles, o gestual.

Como desdobramento, temos as Proposições Curriculares da Educação Infantil da Rede Municipal de Belo Horizonte (2009) que define a linguagem corporal como uma das sete linguagens que representam as diversas áreas de conhecimento que a criança utiliza para se comunicar, se expressar, construir novos conhecimentos, significados, enfim, se apropriar do mundo.

Especificamente no que diz respeito à linguagem corporal, os professores se deparam com um grande desafio: como trabalhar essa linguagem para além da função comunicativa, visando a um conhecimento estético que possibilite à criança pequena a experiência corporal com movimentos extra-cotidianos?

Diante de uma proposição curricular como a da Educação Infantil, que insere conteúdos artísticos no processo educativo da criança pequena de 0 a 6 anos de idade, apresentamos a proposta de trabalho com a linguagem corporal estruturada sobre a área de conhecimento da Dança. Para abordá-la, traçamos um percurso que articulou o fazer artístico e a apreciação estética.

Ressaltamos que esse curso não se constituiu apenas como uma formação continuada, mas, sobretudo, como o início de uma experiência corporal, já que os cursistas que o frequentaram não fizeram Dança em sua formação profissional. Assim, reforçamos que a expressividade do corpo, de forma intencional e simbólica, deva ser algo explorado pelo professor da Educação Infantil, com o intuito de acompanhar as diretrizes atuais. Mais ainda, tal estudo irá torná-lo apto a desenvolver esse tipo de trabalho com os alunos.

A experiência corporal em Dança, proposta para compor o curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, foi elaborada a partir de alguns princípios: o conceito de movimento e de dança, conforme Rudolf von Laban; a prática da criação artística; algumas abordagens corporais relativas ao campo da educação somática; e a apreciação estética. A seguir, discorremos sobre tais princípios.

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PROPOsta: mOVImEntO E dança

Para compreendermos o movimento sob a perspectiva de Rudolf von Laban, é indispensável considerarmos que esse autor concebe o ser humano segundo a ideia da integração entre corpo e mente. Assim, as ações do corpo que configuram o movimento estão articuladas às emoções, aos pensamentos ou à imaginação, como propõe Laban.

Ainda, segundo Laban, o movimento humano pode ser criado, observado e analisado a partir de quatro fatores: a Fluência, o Espaço, o Peso e o Tempo. Tais elementos estão relacionados a determinadas atitudes internas. Assim, o Espaço diz respeito à atitude de Atenção; o Peso é relativo à Intenção; e, o Tempo tem relação com a atitude de Decisão. quanto à Fluência, esse é um fator que envolve todos os outros. Ele pode ser percebido através do modo como um movimento flui – se de forma controlada ou liberada –, e está relacionado à sensação de unidade corporal. Sob o ponto de vista da Dança, os fatores de movimento compõem um arcabouço técnico e poderão ser utilizados simbolicamente pelo atuante, para o desenvolvimento de uma experiência artística.

Além desses aspectos, Lenira Rengel (2003) nos apresenta outra questão, relevante no contexto do curso de que tratamos aqui: a autora relaciona os fatores do movimento – Fluência, Espaço, Peso e Tempo – e as atitudes internas correspondentes a eles às fases do desenvolvimento infantil:

•AFluênciaeanoçãodeunidadecorporalsurgemcomoprópriocorpoepodem ser percebidos através de como o movimento acontece, ou flui;•AsrelaçõesdeEspaçoeaatitudeinternadaAtenção,relativaaele,passama ser elaboradas aproximadamente aos 3 meses de idade, quando o bebê começa a focar objetos e pessoas e se dirigir a eles;•AexperiênciacomofatorPesoeodesenvolvimentodaatitudedeIntençãodizem respeito à relação do sujeito com a gravidade; podem ser identificados, por exemplo, nas brincadeiras nas quais o bebê joga objetos várias vezes ao chão ou na conquista da verticalidade, quando a criança ganha a posição em pé;•O fatorTempoeaatitudedeDecisão,que lhe corresponde, começamase desenvolver surgem por volta dos 5 ou 6 anos de idade, quando a criança passa a compreender o que significa início, meio e fim, ou presente, passado e futuro de um acontecimento.

Segundo Laban, ao realizar o movimento e enfatizar o trabalho com esses fatores, o indivíduo estará exercitando as atitudes internas de Atenção, Intenção e Decisão, como diz: “O indivíduo que aprendeu a relacionar-se com o Espaço, dominando-o fisicamente, tem Atenção. Aquele que detém o domínio de sua relação com o fator de esforço-Peso tem Intenção; e quando a pessoa se ajustou no Tempo, tem Decisão” (LABAN, 1978, p. 131).

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RECOnHECEndO O CORPO: RECuRsOs sOmÁtICOs PaRa a dança

O campo somático está relacionado ao conhecimento do sujeito sobre seu corpo e sobre si mesmo. E, a partir da percepção sobre o soma, ou o corpo em estado de vitalidade e movimento, o sujeito se reconhece como ser autônomo e potencialmente capaz de construir expressão por meio de uma tessitura corporal. Richard Shustermann (2012, p. 15), ao falar sobre a presença do corpo na história da filosofia ocidental, destaca a recorrência do enfoque teórico. Do mesmo modo, esse autor nos chama a atenção sobre a importância das abordagens somáticas, ressaltando que as mesmas favorecem, inclusive, o desenvolvimento de incursões intuitivas e intelectuais sobre o corpo. No módulo “Linguagem corporal: Dança”, apresentado aqui, como nos propõe Shustermann, a experiência somática tem papel relevante e foi desenvolvida através da sensibilização e mobilização dos sistemas esquelético e articular. Também nos apoiamos no conhecimento e na experimentação de movimentos relativos à organização motora humana.

A escolha por tais conteúdos deveu-se a alguns aspectos específicos: no caso dos sistemas esquelético e articular, consideramos a importância que ambos apresentam para o movimento, sendo determinantes, por exemplo, no deslocamento pelo espaço e na construção formal do movimento; em relação à coordenação motora, trabalhamos com os movimentos de enrolamento, endireitamento e torção, de modo a possibilitar o reconhecimento de movimentos basais do desenvolvimento humano, a fim de que o professor possa acompanhar as crianças na sua rotina escolar. Além disso, tais aspectos favoreceram, além de um estudo consciente do movimento e a sua utilização em uma construção poética, o olhar generoso do docente sobre seu corpo, reconhecendo suas características e possibilidades.

CRIaR E FRuIR: mOdOs dE COnHECER a dança

Em uma perspectiva artística, os fatores de movimento, propostos por Rudolf von Laban e descritos anteriormente, poderão ser utilizados na tessitura da criação, conferindo-lhe diferentes dinâmicas e configurando o caráter simbólico, próprio do universo da arte. Nesse sentido, destacamos, nas ideias desse autor, o fato de que todo ser humano tem o potencial para desenvolver experiências criativas em arte, e que, pelo reconhecimento do corpo e das suas possibilidades de movimento, podemos criar, de forma intencional e artística, ou seja, “construir danças”.

Sobre o potencial criativo natural do sujeito, Duarte Jr. (2006) afirma que, por sermos seres simbólicos, por excelência, somos capazes de inventar símbolos, interpretando e ordenando o mundo por meio de representações. Nesse processo, o nosso corpo e toda a sensibilidade que ele carrega é a fonte primeira das significações que, no correr da existência, vamos emprestando ao mundo. Esse autor afirma que:

Ao longo da vida aprendemos sempre o “mundo vivido”, através de nossa sensibilidade e nossa percepção, que permitem nos alimentarmos dessas espantosas qualidades do real que nos cerca; sons, cores, sabores, texturas e

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odores, numa miríade de impressões que o corpo ordena, na construção do sentido primeiro. O mundo, antes de ser tomado como matéria inteligível, surge a nós como objeto sensível. (DUARTE JR., 2006, p 12-13)

Considerando que o aspecto simbólico se constrói no e a partir do corpo, e sua importância fundamental no desenvolvimento do ser humano, ressaltamos a pertinência e a relevância do trabalho intencional do professor da Educação Infantil, no que diz respeito ao simbolismo e à corporeidade.

Outra questão que se coloca, nesse curso, como parte do percurso didático, é o processo de apreciação estética, isto é, ver e apreciar Arte. É importante lembrar que o objeto de Arte age sobre quem o observa, organizando sentimentos e ideias e permitindo que o processo de interpretar mobilize o potencial criativo do observador, da mesma forma que o processo de produzi-lo mobiliza o artista. Para tanto, são necessários conhecimentos específicos da área das Artes, não só teóricos e históricos, mas também o contato com a produção artístico-cultural.

Aprender a ver e apreciar a Arte, ou seja, a “fruição”, requer um desenvolvimento pessoal específico de percepção de obras de arte, ou seja, a necessidade da apreensão dos seus códigos e de sua estrutura. A fruição é reconhecida por sua relevância no processo de ensino de arte. De acordo com a Abordagem Triangular para o Ensino de Arte, de Anna Mae Barbosa, a apreciação estética é estruturante nesse contexto e se constitui como um modo de conhecer o universo artístico. Também, Cassirer, aponta que:

A arte [...] ensina-nos a visualizar as coisas, e não apenas conceitualizá-las ou utilizá-las. A arte nos propicia uma imagem mais rica, mais viva e mais colorida da realidade, e uma compreensão mais profunda de sua estrutura formal. É característico da natureza do homem não estar limitado a uma única abordagem específica da realidade, mas poder escolher seu próprio ponto de vista e assim passar de um aspecto das coisas para outro. (CASSIRER, 1994, p. 277-278)

Porém, não são poucos os professores que assistem a um espetáculo de dança somente quando estão levando seus alunos, ou mesmo aqueles que não conhecem nada sobre a história da Dança, ou ainda, aqueles que nunca moveram o seu corpo para além da rotina, isto é, para além de uma situação extra-cotidiana.

PERCuRsO dIdÁtICO: FRagmEntOs dE uma ExPERIênCIa

No processo de elaboração desta proposta, nos deparamos com a seguinte questão crucial: Como promover uma aprendizagem significativa se o professor não conhece princípios fundamentais que delimitam a área de Dança?

Propusemos, então, uma experiência formativa que pudesse estimular os professores da Educação Infantil a refletirem sobre tal questão e, ao mesmo tempo, modificar a sua prática docente. Sob a perspectiva de realizar um percurso

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em território ainda pouco explorado para o cursista, percebemos a experiência proposta como um desafio. Desse modo, propusemos que o professor da Educação Infantil se aproximasse daquele que Jorge Larossa (2002, p. 24) considera que seja o “sujeito da experiência”, que apresenta receptividade, disponibilidade e abertura para lidar com o desconhecido e o imprevisível (2002, p. 28).

Assim, estruturamos o módulo “Linguagem corporal: Dança”, a partir de aspectos específicos – fatores de movimento, de Rudolf von Laban, das atitudes internas relativas a eles, das fases do desenvolvimento da criança, da capacidade criadora, e da apreciação estética. Consideramos a pertinência de tais elementos para orientar o professor da Educação Infantil em um trabalho fundamentado em questões corporais e artísticas. Pretendíamos, com isso, aproximar esse professor do universo do aluno, através do compartilhamento de uma experiência corporal estética.

Apresentamos, a seguir, fragmentos do percurso didático desenvolvido:

Corpo, desenho e dança

1) Em grupos, os alunos delimitaram o espaço do corpo em uma folha de papel.

2) Utilizando o conhecimento prévio que tinham, os alunos desenharam o sistema esquelético dando continuidade ao desenho no papel branco. Apesar de não contar com a dimensão tridimensional do corpo, o desenho cumpriu a função de chamar a atenção do cursista sobre sua percepção corporal. Essa atividade estimulou uma observação mais apurada do corpo e a utilização do toque com as mãos para a localização e o reconhecimento da forma de estruturas ósseas.

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3) O sistema esquelético foi, então, visualizado em peça anatômica, e visto sob a perspectiva tridimensional que lhe caracteriza. Destacamos o esqueleto axial, formado pelo crânio, coluna vertebral e caixa torácica, e sua localização, que nos informa sobre o eixo do corpo; o esqueleto apendicular, constituído pelos membros superiores e inferiores, e a relação dessas partes com o deslocamento do corpo pelo espaço; e, os cíngulos, superior, formado por escápulas e clavículas, e inferior, constituído pelos ossos da pelve, sacro e cóccix, que podem ser identificados como conexões entre os esqueletos, axial e apendicular. No estudo em peça anatômica, foi localizado o sistema articular, especificamente algumas articulações sinoviais, mais envolvidas com movimentos de maior amplitude, dos membros superiores e inferiores, e da coluna vertebral.

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4) Por meio de exercício realizado em duplas e utilizando o toque das mãos, os alunos desenvolveram um exercício de percepção corporal, no qual destacamos a forma e o volume do sistema esquelético e também a sensibilização do aluno quanto à presença do seu corpo.

5) O trabalho de percepção corporal, que envolveu os sistemas esquelético e articular, deu origem à criação de movimentos estimulada pela forma e pelo volume do corpo, e pela mobilidade articular. O movimento construído a partir de uma intencionalidade simbólica fez com que a dança fosse naturalmente identificada pelos cursistas.

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do chão à posição em pé: criando a partir de princípios da coordenação motora

A partir do estudo sobre a coordenação motora, desenvolvido por Marie-Madeleine Beziérs (1994), os alunos experimentaram movimentos de enrolamento e endireitamento. A referência esquelética básica para fazê-los foi a coluna vertebral e os dois volumes, cabeça e bacia. Beziérs esclarece que “enrolar” e “endireitar” são movimentos que integram a organização motora do ser humano, estruturam o desenvolvimento de sua relação com o espaço, além de favorecer a integridade e o bem-estar corporal. A proposta desse exercício teve como finalidade, além da organização motora, aproximar o professor da Educação Infantil da criança pequena, que utiliza essa movimentação de forma intensa no seu dia-a-dia.

No movimento do enrolamento, a cabeça se aproxima da bacia pela face anterior do corpo.

No endireitamento, a coluna retorna à sua posição natural.

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Os movimentos de “enrolar” e “endireitar” foram posteriormente utilizados como estímulos para a criação do movimento simbólico.

Criação em dança: corpo, fluência, espaço, peso, tempo

Experimentamos o movimento estimulado pela noção relativa aos fatores de movimento – Fluência, Espaço, Peso e Tempo. E, com o intuito de potencializar a experiência corporal, utilizamos diversos materiais.

Por meio de uma dinâmica de criação de movimento, os grupos construíram células coreográficas.

Fruição1

Ensaio: as alunas assistiram ao ensaio, feito em sala de aula, do espetáculo “Los Hermanos”, do Ballet Jovem do Palácio das Artes (BH/MG). Além disso, ao final, puderam conversar com os bailarinos e a ensaiadora e diretora do grupo. Com essa experiência, foi possível revelar aquilo a que o espectador raramente tem acesso, como as repetições de movimento, a escuta e o esforço para conquistar um estado corporal e a integridade da obra. Assim, as cursistas tiveram contato com modos de tratar os recursos corporais, com a elaboração de uma intencionalidade simbólica de movimentos, com a construção de obras coreográficas, e, finalmente, com o processo do trabalho.

Espetáculo: as cursistas assistiram ao espetáculo “Los Hermanos”, apresentado pelo Ballet Jovem do Palácio das Artes, no Grande Teatro do Palácio das Artes (BH/MG).

1 As atividades relacionadas à fruição foram realizadas por meio dos Programas Educativos da Gerência de Extensão do Palácio das Artes (BH/MG).

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O que ficou da experiência

Com o módulo, “Linguagem corporal: Dança”, pretendíamos chamar a atenção dos professores da Educação Infantil para a importância da experiência corporal do docente no desenvolvimento de um processo de ensino e aprendizagem com a criança pequena, cuja corporalidade encontra-se, ainda, naturalmente apta e sedenta de experiência com o corpo. É importante que o professor crie condições de estimular, possibilitar e, principalmente, não impedir o desenvolvimento saudável da criança.

Sob a perspectiva do professor e da sua história corporal, ressaltamos que deverá haver esforço, persistência, paciência e generosidade, para que o conhecimento e o reconhecimento do corpo possam ocorrer e gerar novos modos de lidar com a própria corporalidade e sensibilidade.

A realização do módulo “Linguagem corporal: Dança” nos permite identificar que a experiência corporal e artística orienta o professor a elaborar propostas de ensino e aprendizado no ensino regular. Além disso, nos faz compreender a importância da continuidade de experiências desse caráter, já que o corpo é algo em movimento, e que precisamos de tempo para aprendê-lo.

A partir da experiência no módulo “Linguagem corporal: Dança”, as cursistas também nos apresentam seu corpo, seu movimento e sua dança:

Márcia Cabral escreve:

um corpo que escolheu bailarTem corpos que falam,

Outros que preferem calar-se,Tem corpos que sentem,

E outros que mentem,Tem corpos que tentam

E alguns que se entregam,Tem corpos que vivem,

Enquanto outros preferem morrer,Enfim, todos, corpos sensíveis,

que hora se rendem,Ora se surpreendem

Ou simplesmente Bailam ....”.(Márcia Cabral, 2013)

O corpo, nas palavras de Liliane Canhestro Santos:um corpo

Um corpo que dormeAcorda indisposto

Alimenta malTrabalha sem parar

Porque se parar, dorme.

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Parece que ele não existeNão sente

Não vêNão escuta

Mas ele está por aíDesempenhando bem ou mal suas funções

Acho que bem mal.Mas esse corpo insiste em despertar pra vida

Pro mundo das emoçõesDas belas canções

Da dança que encantaDa arte que envolve

E alimenta nosso ser.

E ele está descobrindo que podeMais que isso

que deveChega a ser uma questão até de sobrevivência

Mas eu quero ainda maisNão quero sobreviver

E sim, viver intensamenteE alimentar este corpo

que clama pela arte do sentidoMais amplo desta palavra.

(Liliane Canhestro Santos, 2013)

Também Adriana Maria do E. S. Alonso Coelho nos fala:O corpo

que sempre foiAgora já não o é mais

Algo mudouO seu valor

Ao ser um todoEle agora

Se desmembrouE lembra

Como era ouvirComo era tocar

Como era cheirarComo era degustar

Como era olharOlhar pelas mãosOuvir pela pele

Tocar pelos olhosExperimentar

Pelo cheiroNão há mais divisão

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A dimensãoSe ampliaO corpo

Se apropriaSe expande

Emancipação!(Adriana Maria do E. S. Alonso Coelho)

REFERênCIas

BELO HORIZONTE. Prefeitura de Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Educação. Proposições Curriculares: Educação Infantil – Rede Municipal de Educação e Creches Conveniadas com a PBH: desafios da formação. Belo Horizonte: SMED/PBH, 2009.

BEZIÉRS, Marie-Madeleine. HUNSINGER, Yva. O bebê e a coordenação motora – os gestos apropriados para lidar com criança. Tradução Lucia Campello Hahn. São Paulo: Editora Summus, 1984.

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linguagem corporal: teatro

Marina Marcondes Machado

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FEnOmEnOlOgIa da EstÁtua VIVa: EVIdênCIas da tEatRalIdadE nO COtIdIanO da CRIança PEQuEna

IntROduçãO

As alunas do curso Educação Infantil, Infâncias e Arte – educadoras da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte – foram convidadas por mim, no mês de junho de 2013, a fazer um trabalho reflexivo diferente: ir a um lugar público, onde houvesse uma “estátua viva”, e observar a situação relacional entre crianças, adultos e performer. Suas observações seriam, a seguir, escritas e contemplariam três momentos, não necessariamente de maneira separada, revelados nos verbos: observar, descrever, interpretar. Essa proposta substituiu a fruição de um espetáculo de teatro no cronograma do módulo intitulado “Linguagem corporal: Teatro”, de modo que as alunas foram convidadas a mergulhar na percepção de um fenômeno de teatralidade do cotidiano, observando e relatando uma prática teatral a céu aberto.

A proposta teve como cerne o necessário e urgente questionamento do modelo, bastante arraigado pelo Brasil afora, nas unidades escolares de Educação Infantil: o modelo espetacular, no entanto amador, revelado nas práticas do “teatro de final de ano”, “teatro do dia das mães” ou “teatro da primavera” – foi, então, feito o convite para que as educadoras sintonizassem em algo simples, mas não simplista e extremamente afinado com os estudos cênicos da contemporaneidade, de modo a compreender quão rica pode ser a vida imaginativa das crianças, algo que se empobrece quando um adulto coreografa, dirige ou distribui falas para “montar um teatro”.

Historicamente, durante o século XX, as telas e retratos pularam do museu para os muros grafitados; também os corpos, de todos os tipos, formas, tamanhos, etnias, ganharam alforria dos parâmetros tradicionais e seletivos da dança… e, hoje, todos dançam; a música também ampliou seus modos de produção e usufruto, redesenhando-se como paisagem sonora, na busca de uma linguagem não mais definida por técnicas de voz, canto ou instrumento. Também o teatro do século XX extravasou a sala de espetáculo; o teatro pode estar onde quer que pessoas estejam – paradigma que implica uma arte cênica definida por uma qualidade espacial-relacional. Nessa chave, o teatro dá-se entre mim e você; pertence à nossa corporalidade no mundo compartilhado, e prescinde de um prédio construído para tal (para existir teatro, não haveria mais necessidade da formação palco-plateia, de recursos técnicos poderosos de ilusionismo, tais como projeto de luz, figurinos sofisticados, etc.).

Este texto conversará diretamente com os trabalhos escritos pelas alunas, procurando uma fenomenologia das estátuas vivas que tecerá uma rede de significações, cujos fios iniciais são a noção de infância apresentada por Maurice Merleau-Ponty (1990a, 1990b). São termos-chave para compreender a pequena

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infância nessa ótica: onirismo, polimorfismo e não-representacionalidade. Esses termos serão nossas lentes para analisar ações e reações das crianças espectadoras, em contato, ao ar livre, na rua, encontro com a arte do estatuísmo: quietude física considerada como arte, cuja técnica envolve exercícios de respiração, autoconsciência corporal, estudos da biomecânica, entre outros.

nOssO OBJEtO É suJEItO: a EstÁtua VIVa

A escolha da “estátua viva” como objeto de observação tem como mote a fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty (1990a, 1990b) e sua leitura de mundo, na qual “sujeito” e “objeto” nunca se separam. Noção importante e especial para as ciências humanas e as artes, lugares nos quais o “objeto” de pesquisa é… o próprio sujeito! Isso implica conectar em uma visão de mundo de não-separação entre pessoas e coisas, algo que pode ser resumido na frase: “eu estou no mundo tanto quanto o mundo está em mim” – ou nas expressões emblemáticas da fenomenologia como método filosófico, ao definir ser humano como “ser-no-mundo” e propor uma “volta às coisas mesmas”.

A escolha da observação do fenômeno Estátua viva foi situacional e contextualizada: existem diferentes locais na cidade de Belo Horizonte, e diversos artistas, de diferentes formações, que trabalham o estatuísmo nas ruas e praças públicas. As alunas do curso tiveram como desafio ir a um desses espaços e ficar entre meia hora a uma hora observando o artista e seus espectadores, com especial foco nas crianças de 0 a 5 anos. Seus relatos são surpreendentes. Possuem características em comum, especialmente na descrição das reações das crianças entre 0 e 3 anos: curiosidade, medo e pavor; maneiras de reagir à estátua viva diretamente relacionadas ao espaço corpo próprio e à proximidade (ou distanciamento) do estatuísta com relação à criança. Também é comum a todos os pequenos espectadores as formas de evitação: chorar, virar o rosto, empurrar a mão do adulto pedindo distância – maneiras que as crianças menores desenvolvem para comunicar que o trabalho do artista causa estranhamento. São reações conhecidas, e, portanto, já esperadas pelos estatuístas: iludem-nos com sua exemplar capacidade para o não-movimento, para, em seguida, moverem-se, desiludindo nossa leitura primeira.

mEdO, dEsIntEREssE, PREssa dOs PaIs; CuRIOsIdadE E PaVOR

Observar uma situação cotidiana nas ruas de Belo Horizonte foi rico e intenso para praticamente todas as professoras que o fizeram. Procuraram captar o ponto de vista da criança mesma. Perceberam como a espacialidade da criança é absolutamente dependente do acolhimento do adulto que a conduz; e quando sua gestualidade não é compreendida, a criança fica desconfiada e tensa, chegando a reações aparentemente desproporcionais, de medo e pavor.

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vejamos alguns dos trechos de descrições fenomenológicas das alunas:

Medo, desconfiança, sorrisos e outros / O valor da observação[…]Observei que as crianças com a idade de 2, 3 e 4 anos têm quase sempre as mesmas impressões de medo, observação, insegurança, desconfiança.As reações observadas são de choro, grito, afastamento, manter distância, sensação de perigo, não aceitam a proximidade sem a companhia de um adulto. A satisfação fica clara ao se despedir, e o olhar se torna curioso quando estão de longe.[...] posso dizer que a experiência de observar foi algo novo, interessante, pude perceber que, se reservarmos um tempo para observar as crianças, vamos perceber o que elas estão sentindo, quando aplicamos uma proposta de trabalho, o rostinho delas irá demonstrar as diversas sensações que cada um, da sua forma [vive] na sua singularidade de criança pequena.

Ana Karine vesper da MattaFeira Hippie na Av. Afonso Pena

Manhã de domingo, dia 2 de junho de 2013

ter medo, mesmo no colo[...] encontrei uma estátua uniformizada de soldado do exército. Esta estátua não tinha muito público admirando. Mas, assim que eu cheguei parou um casal e depositou uma moeda; ele então fez o gesto de agradecimento e o casal com o semblante feliz fotografou e a criança que estava no colo do pai [com aparência de dois anos] teve medo. virou o rosto e só deu tchau para a estátua depois de alguns metros de distância.[...]Este trabalho me enriqueceu muito. Pois aprendi a observar e valorizar o trabalho do outro. Aprendi a saber, a olhar com olhar de ver a arte. [...]

Eneida Santos de OliveiraFeira Hippie, manhã de domingo

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Medo, desinteresse ou pressa dos pais / A estátua quieta e a criança inquieta[...]No meio de todas as crianças observadas escolhi para falar uma em particular, um menino de aparentemente dois anos de idade, que estava próximo à estátua e não viu que ela se movia, quando se assustou com o som que a estátua fez ao se mover e isso lhe chamou a atenção. A criança não tirou mais os olhos de cima da estátua, a estátua quieta e a criança inquieta.A criança somente se acalmou quando a estátua lhe acenou e sua mãe lhe deu algumas moedas para colocar dentro do balde que havia próximo à estátua.A criança e sua mãe foram embora e depois disso, fiquei mais uma hora ali e nenhuma criança ficou mais de dois minutos perto da estátua, seja por medo, por desinteresse ou pressa dos pais.

Maísa Maciel RosaMercado de Flores de Belo Horizonte

Domingo, 9 de junho de 2013

no que será que pensam as estátuas enquanto ficam horas paradas e de olhos fechados?

Nos trabalhos escritos e entregues pelas alunas, um deles chama a atenção por ser um depoimento acerca daquilo que “não aconteceu”. É interessante, pois a aluna foi capaz de falar, de modo descritivo e reflexivo, sobre sua “não ida” ao encontro das estátuas:

sobre imaginar ir – sem ir ao encontro das Estátuas Vivas[...] tentei imaginar como seria estar na feira e realizar a atividade proposta por você. Só que esta visita não aconteceu e tenho algumas questões que só indo e vendo verdadeiramente para que eu encontre as pistas para as perguntas abaixo:•Oquelevaumadultoaseexpordestamaneira?•Comoele“elabora”osolharesquerecebe?•Queestratégiaeleusaparamantersuaimobilidadepormuitooupoucotempo?• Será que as pessoas que o rodeiam ao colocarem moedas se veemautoras, donas da dinâmica corporal do outro?•Comosuarespiraçãoéorganizada?•Existemposesoumovimentosmenosoumaisconfortáveisquepropiciamuma imobilidade maior?•Qualesforçoenvolvidonestaquietude?•Eletemconsciênciaqueestásecomunicando,utilizandoumalinguagemmuito sutil que quer dizer o que para quem o observa?

Ele se torna uma forma real de se explorar a realidade – mas só estando lá para procurar responder às questões acima e se propor outras!

Adriana Maria Alonso Coelho

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As alunas, talvez por não serem artistas nem estudiosas das artes cênicas, muitas vezes, apreendem o estatuísmo como uma forma de exibir-se ou de exposição de si, mais do que um trabalho de caracterização de um personagem, com algo a dizer na linguagem escolhida pelos artistas para suas pesquisas. Algumas professoras registraram depoimentos de adultos, também leigos, perguntando-se como e por que alguém faria essa “escolha”: expor-se de tal modo, procurando não movimentar-se. Entendo que, se estivessem mais familiarizadas com as diferentes modalidades da performance e da dança contemporânea, talvez não se perguntassem “no que pensam” as estátuas quando estão de olhos semicerrados… Talvez a pergunta do adulto mais letrado no assunto pudesse ser: quais as técnicas que o artista desenvolve para obter esse incrível efeito? E, para além da técnica, no âmbito da experiência sensível, perguntariam qual o trabalho anterior de escolha de personagem, figurinos, maquiagem e preparo corporal que fazem parte da linguagem e da pesquisa profissional do estatuísta. Ficou clara a impossibilidade de o adulto leigo responder às perguntas, sem necessitar do diálogo estrito senso com o artista – o que, talvez, revele a necessidade de ampliação de um conhecimento estético, ético e político sobre arte contemporânea, arte de rua, noções tais como as de site specific e espaços encontrados, etc., conteúdos que não foram contemplados no curso, por ser um módulo de apenas quatro encontros.

BusCa POR um OlHaR dIRECIOnadO PaRa sEntImEntOs, ExPREssãO, mOVImEntOs COm IntEnCIOnalIdadE

Também o possível “olhar direcionado” que o educador da primeira infância pode apurar foi problematizado pelos relatos das alunas, o que explicitou um ganho importante da experiência da introdução às noções fenomenológicas: compreensão do ponto de vista das crianças, bem como, no caso das Estátuas vivas, o ponto de vista do artista. Deixar de ser leigo nesses assuntos (fenomenologia da criança e estatuísmo) é justamente descentrar o olhar, isto é, conseguir ir além e aquém do senso comum e traduzir o estatuísmo como forma-conteúdo artístico, e a apreensão da criança como um modo próprio de relacionar-se com um dado do mundo cultural compartilhado. Ser estatuísta é uma profissão possível, sinal dos nossos tempos, e sua acolhida pelos transeuntes, o estímulo traduzido pela moeda no chapéu e pelo dinheiro na cuia, a comoção por sua gestualidade precisa, tudo isso faz parte de uma situação a ser lida e compreendida em plenitude.

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se reservamos um tempo para observar as crianças…

Um ganho muito importante das professoras, na experiência vivida nos módulos de fenomenologia e linguagem teatral, foi a compreensão do significado de agachar-se para ir ao chão, onde a criança está: simbólica e concretamente. Para tal, é preciso desapegar-se da temporalidade cronológica adulta, e mergulhar no modo de experienciar tempo e espaço das crianças. O mundo compartilhado é o mesmo: o que difere é nossa apreensão. As crianças apreendem o mundo, o outro e a si mesmas com uma dose enorme de fantasia e onirismo, ou seja, vivem imersas na mescla de realidade e imaginatividade:

Euforia e encantamento[...]A criança [um menino aparentando 3 a 4 anos] se sentia à vontade, brincava espontaneamente com seus pais, apontava para a Estátua viva, comentava “que legal ele mexe”, perguntava: “É de verdade?” Batia palma ao ver uma performance, que ao meu ver parecia ser de improvisação (um improviso muito bem executado).Estavam em uma distância de aproximadamente dois metros da Estátua viva. Foi neste espaço que pude observar seu comportamento, exalava euforia e encantamento.Neste momento, pude percebê-lo em sua faceta onírica, imaginativa – criava, era também uma estátua. Parava com a mão para cima, fazia bico, entortava os pés, ficava imóvel por algum tempo, depois voltava a pular, olhar, sorrir e imitar os movimentos da estátua. Sua mãe alimentava a sua imaginação, afirmando “É uma estátua de verdade”.Foi neste clima onírico que sua mãe pegou em sua mão e foi se aproximando da estátua.A partir das cenas que aconteceram neste episódio pude compreender sua essência polimorfa.

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O menino puxou a mão de sua mãe em um movimento contrário, impulsivo, mudou a expressão do seu rosto, seu corpo endurecia, ficou tenso, não estava mais se divertindo, chorou.Agarrou as pernas da mulher e disse entre suspiros “quero ir embora, cadê o papai?”A mulher não respondeu, segurou-o no colo, continuando a se aproximar da estátua dizendo “vamos lá dá um dinheirinho pra ele… pode parar de chorar, nemmmmm, ele não vai fazer nada com cê”.Então, ela tirou uma moeda do bolso e ofereceu ao menino. Ele pegou a moeda, murmurando alguma coisa, que não ouvi direito, somente consegui entender que pudesse estar experimentando sensações de medo, ao ouvir a palavra “bobo”. Penso que o menino se referia à estátua.A mãe continuou andando lentamente, ao chegar perto da estátua, parou e disse: “Dá o dinheirinho pra ele, coloca na cuia”. O menino abraçou seu pescoço, voltando o corpo para trás, escondendo seu rosto debaixo do queixo dela.Neste momento, o cowboy prateado fez um movimento devagar e tocou levemente as costas do menino, que se virou, fixando seus olhos naquela imagem.Foi quando, como um toque de mágica, as coisas pareciam clarear para aquele menino, a estátua não era mais estátua, começou a se movimentar normalmente.Após alguns segundos olhando atentamente os movimentos normais da estátua que o menino, um pouco ressabiado, porém menos assustado, entregou a moeda ao artista.Sua mãe, ainda com ele no colo, foi se afastando, sorrindo e dizendo: “tava com medo, filho, seu pai tá ali, vamos embora”.O menino voltou a sorrir, um pouco acanhado, e foram embora.[...]

Adriana Bom Sucesso GomesCentro de Belo Horizonte: Praça Sete Tarde

do sábado, 15 de junho de 2013

Faz sentido positivarmos a condução do estatuísta do momento da criança relacionando-se com ele: saber brincar lentamente, saber conquistar seu pequeno espectador sem pressa e sem obrigatoriedade; mostrar que a estátua está viva, é humana, por meio da própria ação performativa. A “explicação”, em palavras, que os adultos acompanhantes fazem não tem tanta eficácia quanto o contato mesmo estabelecido entre criança e estátua viva. quando na criança aflora essa percepção, experiência vivida do par ilusão-desilusão, tudo se esclarece – no entanto, seu polimorfismo a deixa ressabiada, acanhada, tímida; e, se o adulto forçar o contato, ela apresentará medo e pavor. Isso nos remete à importância do adulto conversar com a criança nos moldes infantis: percebendo sua rica vida imaginativa, e permitindo o afastar-se de modo a… “voltar a sorrir”.

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uma manhã rica de significados Entrar na brincadeira com facilidade e prazer[...]Laila, de quatro anos, me chamou a atenção. Uma menina linda, com uma fisionomia bem alegre. Estava bem arrumada. Usava um vestido de estampa floral bem rodado, cabelos longos cacheados, trazia uma bela tiara que combinava bem com seu vestido. Calçava uma sapatilha de plástico vermelha. Comecei a observá-la de longe, quando percebi que ela, ao ver a estátua brincando com outras crianças, não parou mais de olhar em sua direção. A menina vinha andando de mãos dadas com a mãe. Uma mulher bonita de mais ou menos trinta anos, cabelos longos e soltos, bem maquiada, usava uma calça jeans, uma blusa branca e sandália de salto alto. A mulher vinha parando de barraca em barraca, olhando as roupas dependuradas nas araras. [...] Enquanto a Laila, nada mais a interessava. quando perdia a estátua de vista, esticava-se para procurá-la. várias vezes chamou a mãe para continuarem. [...][...] quando chegaram próximas à estátua, a menina não parou de sorrir. Ficou radiante e tudo que o performer fazia, ela achava engraçado. Ele a chamou, deram-se as mãos, a menina subiu no pequeno banquinho, ficaram abraçados e imóveis por alguns minutos. Foi o único momento em que ela ficou séria, mal piscava. Entrou no faz de conta que era uma estátua e só parou quando foi colocada no chão. Riu muito ao receber cócegas, participou ativamente das brincadeiras que lhe eram propostas. [...] Ao observar a relação daquela menina com a estátua viva, fiquei encantada com a alegria que ela manifestou ao chegar perto da estátua. Era nítida a satisfação que sentia ao ver a estátua e participar do faz de conta. quando se abraçaram ficou imóvel e concentrada, entrou na brincadeira com facilidade e prazer, sem que ninguém a forçasse. Saiu daquele momento não porque quis, mas porque teve que sair.A manhã que seria nublada, e em que ficaríamos provavelmente dentro de casa, foi rica e cheia de significados, com observações de fatos que certamente passariam desapercebidos por mim e minhas filhas em outra situação.

Maria do Rosário Paulino Matos9 de junho de 2013

Feira Hippie da av. Afonso Pena

Há crianças que demonstram menos medo e maior maturidade psíquica: capazes de associar o trabalho do estatuísta como uma espécie de faz de conta, usufruem de sua teatralidade com muita alegria, gosto e prazer. Sua temporalidade permitiria um contato intenso e, por vezes, epifânico com a alegria, situada entre realidade e fantasia: “saiu daquele momento não porque quis, mas porque teve que sair”. Os adultos apresentam o mundo às crianças; esse momento do papel dos adultos precisa ser cuidado, lapidado, tecido com fios conjuntos; as educadoras, em seus relatos, parecem ter compreendido muito bem isso, e mostram-se, nas suas descrições, capazes de discernir boas e más conduções dos fenômenos relacionais. As boas conduções sempre conectam com aquilo que a criança está comunicando aos adultos, muitas vezes, mais em gesto do que em palavra.

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Curso Educação Infantil

COnClusãO

Concluímos que a proposição e execução de um trabalho descritivo sobre o fenômeno Estátua viva foi suficientemente interessante; as alunas demonstraram sua capacidade para compreender o modo de ser e estar das crianças diante dos artistas estatuístas, compreenderam que as crianças pequenas oscilaram entre curiosidade, medo e pavor, e que poucas sentiram-se seguras e alegres com a aproximação corporal na direção das estátuas. Muitas das crianças não verbalizam seus medos ou curiosidade; portanto, a leitura corporal de seus gestos e atitudes, por parte do adulto cuidador, é que fornece pistas claras do que se passa: virar o rosto; chorar; empurrar a mão do adulto para se afastarem. É, assim, primordial que o educador da primeira infância “alfabetize-se” na leitura de gestos e atitudes corporais.

Em quase todos os relatos das professoras, vimos que as crianças, quando afastavam-se das estátuas vivas, sentiam-se seguras novamente, e continuavam curiosas, voltando seu rosto para trás mais uma vez, chamadas por aquele convite: convite à apreciação do corpo parado em movimento, convite a decifrar o mistério do par ilusão-desilusão, palavras-chave que nos dão o mote do trabalho criativo e expressivo do estatuísta – assim como do teatro contemporâneo e das pesquisas de poéticas da cena.

As alunas ficaram satisfeitas com o desafio cumprido e foram capazes de associá-lo às nossas práticas, tanto nos quatro encontros que tematizaram arte, fenomenologia e infância quanto nos quatro encontros que tematizaram o fazer teatral. Por meio de uma via longa, ou seja, permutando a fruição de um espetáculo de “teatro infantil”, por exemplo (via curta), propusemos a simplicidade da teatralidade relacional, algo experienciado como nova luz sobre o fenômeno do faz de conta e suas interfaces com o teatro contemporâneo.

As participantes também realizaram um exercício de escrita de um discurso próprio, um dizer daquilo que foi visto, em busca de um ponto de vista possível que reconheceu o modo de ser do outro – nesse caso, a criança e a estátua viva observadas –, em conexão com quem observa e descreve. Considero que essa prática inaugurou a possibilidade, para as educadoras, de continuar a escrever textos autorais que revelem quem são, como veem as crianças no mundo compartilhado e o que poderiam propor para que suas rotinas se tornassem mais significativas, na direção do enriquecimento das referências e fontes para trabalhar as artes cênicas junto às crianças pequenas.

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linguagem musicalAline nunes Carneiro

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Curso Educação Infantil

a linguagem musical: formação continuada de professores da educação infantil

IntROduçãO

O Curso de Extensão Educação Infantil, Infâncias e Arte, realizado na Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, veio consolidar e explicitar a necessidade de se conhecer o porquê, o que, e o como trabalhar alguns aspectos que embasam o processo de ensino e aprendizagem da linguagem musical na Educação Infantil. Porém, antes de qualquer relato sobre o que aconteceu nos encontros, entende-se a importância de se fazer um breve comentário sobre o ensino da música na escola, no Brasil.

[...] Art. 26. Os currículos da educação infantil e do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos. [...]§2° O ensino de arte, especificamente em suas expressões regionais, constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos. [...]§6° A música deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular de que se trata o §2° deste artigo (Incluído pela Lei nº 11.769, de 2008). Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso: 18/08/2013

A alteração da Lei nº 9.394, de 1996, que dispõe o dever da inclusão da música como conteúdo obrigatório do componente curricular de Arte, com a Lei nº 11.769, de 2008, contribui para mais um capítulo da história do ensino de música no Brasil. A necessidade desse argumento neste artigo advém do seguinte pressuposto: a maioria dos professores da Educação Infantil não teve, nos diversos níveis da Educação Básica, e nem na sua formação inicial do Ensino Superior, diretrizes e bases curriculares sobre o ensino de música nas escolas. Portanto, numa formação continuada para professores, estabelece-se a complexidade de vivenciar e compreender uma possível abordagem teórico-metodológica da educação musical, sobre música para bebês e crianças pequenas, da Educação Infantil, tendo essa defasagem na formação. Não é objetivo deste artigo abordar outras variáveis dessa discussão inicial, mas se deixam como possibilidade de futura reflexão temas como: a história da Educação Infantil no Brasil e em Belo Horizonte; os estudos tão recentes sobre o ensino de música na escola no segmento da Educação Infantil; e, enfim, o ensino das linguagens artísticas e sua importância e lugar na educação. Não obstante, pretende-se sim anunciar a complexidade e a necessidade dessa formação, mediante os novos deveres que a legislação outorga para a educação na atualidade.

O objetivo principal deste artigo é relatar as vivências e aprendizagens dos professores/educadores que participaram do curso Educação Infantil; Infâncias e Arte, ocorridas na ministração do curso de extensão em foco, especificamente na

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linguagem musical integrada a outras linguagens artísticas – artes plásticas visuais e corporais (dança e movimento) e as artes cênicas.

Como, no curso, o tempo estabelecido para o ensino sobre a linguagem musical não comportaria uma explanação mais aprofundada da abordagem teórico-metodológica e das práticas pedagógicas musicais, incluindo as possíveis estratégias pedagógicas para a apropriação dos conteúdos temáticos referenciais do discurso musical, decidiu-se por dar uma visão mais panorâmica do processo de ensino-aprendizagem e de desenvolvimento da linguagem musical, com uma incursão mais específica na rítmica natural e musical dos bebês e das crianças pequenas, tendo como base estudos da psicologia da aprendizagem e desenvolvimento (PAPALIA, 2010; PIAGET apud WADSWORTH, 1993) e da educação musical, e algumas metodologias de educadores musicais do século XX e XXI (CARNEIRO; PARIZZI, 2011; MATEIRO; ILARI, 2011; CARNEIRO, 2006, 2006a; KOELLREUTTER apud BRITO, 2001) e da psicologia do desenvolvimento musical (CARNEIRO, 2006, 2006a; DELALANDE, 1995; FRANÇA; SWANWICK, 2002).

Para isso, foram realizados encontros que trouxeram reflexões sobre a abordagem teórico-metodológica explicitada no documento Proposições Curriculares da Educação Infantil da Prefeitura de Belo Horizonte (BRASIL, 2009), além de práticas pedagógicas musicais e atividades complementares que testemunhassem as discussões propostas no curso.

As práticas desenvolvidas basearam-se no Modelo de Educação Musical amplo e integrado, da experiência musical de Keith Swanwick, adaptada para a Educação Infantil, pela autora deste artigo. Dentro dessa abordagem são valorizadas as expressões vocais, corporais e instrumentais/objetos sonoros dos bebês e das crianças pequenas. No planejamento de aulas, as fontes sonoras voz, corpo e instrumentos/objetos sonoros são associadas ao desenvolvimento da linguagem oral e da linguagem corporal, visualizando o aspecto sensório-motor (CARNEIRO, 2006, 2006a).

Na avaliação da aprendizagem e do desenvolvimento musical dos conteúdos constitutivos do discurso musical, foram mencionadas as camadas do discurso musical que são consideradas como conceitos fundantes da música – os materiais sonoros; a expressão musical comunicativa e a organização dos elementos da música. Por fim, a concepção de criança nas práticas pedagógicas musicais é revelada, quando se considera o brincar e as interações dentro do contexto sociedade e natureza.

Este relato de experiência aborda desde a estrutura do curso da linguagem musical até as escolhas pontuais, no curso da linguagem sonoro-musical e, enfim, os depoimentos finais das professoras, os quais encorajam esta autora em persistir, apesar dos obstáculos já mencionados, numa formação tão gratificante, contribuindo para a vida dessas professoras e ao mesmo tempo recebendo um retorno tão animador.O RElatO dE ExPERIênCIa

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Mediante o exposto sobre a defasagem do ensino de música na formação básica dos professores e na sua formação inicial do Ensino Superior, pretendeu-se organizar uma formatação do curso que pudesse contemplar um pouco essa defasagem, propondo, assim, ações que mobilizassem esse profissional para a fruição; o fazer musical e a conscientização frente à formação básica em música, tendo o professor como centro na formação (SILvA, 2002). Não deixando de contemplar, porém, o objetivo central dessa formação: a apropriação, através das interfaces artísticas, de uma das abordagens teórico-metodológicas da Arte-Educação para a infância, explicitadas nas Proposições Curriculares da Educação Infantil da Rede Municipal de Belo Horizonte, no nosso caso, a linguagem sonoro-musical. Basicamente, a participação dos professores no módulo da “Linguagem musical” se organizou em três momentos: 20 horas de curso, realizado em cinco encontros de 4 horas; 5 horas dedicadas à fruição musical; e 5 horas de relato de experiência, no total de 30 horas/aula.

PRImEIRO mOmEntO

aperfeiçoamento e formação continuada dos professores/educadores

Em relação aos professores, foram realizadas diversas atividades de preparação e aquecimento corporal, e também, rítmicas musicais, a fim de proporcionar a vivência de elementos musicais rítmicos que seriam trabalhados com os bebês e as crianças pequenas. Percebeu-se um grande envolvimento das professoras, através da expressão corporal rítmica e o início de uma conscientização e sensibilidade rítmica/musical. Ou seja, elas começaram a entender/viver que existe um ritmo natural em seu corpo e em suas expressões corporais que podem ser relacionados com uma rítmica musical. A partir desse exercício pedagógico-musical, foram descobertos e apresentados os conceitos referentes à rítmica musical para serviriam de posterior reflexão e aprendizado de estratégias didáticas para o trabalho na Educação Infantil, trazendo, assim, uma consciência pedagógica musical, dentro da abordagem teórico-metodológica apresentada nas Proposições Curriculares. Nas fotos abaixo, algumas das vivências e elementos musicais trabalhados:

Aquecimento corporal trabalhando elementos importantes para a preparação do corpo para o fazer musical: eixo, articulação, respiração, expansão e expulsão.

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Expressão corporal trabalhando flexibilidade, dissociação, equilíbrio e lateralidade.

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Práticas pedagógicas rítmicas musicais, buscando propiciar uma vivência de aspectos rítmicos, como regularidade e irregularidade; parâmetro do som – duração em seus contrastes curto e longo; durações indeterminadas; modos rítmicos como pulso, apoio, divisão, ritmo real e padrões rítmicos básicos; além de experiências com a métrica musical e a banda rítmica.

Reflexão pedagógica e aprendizado sobre a rítmica musical; atividades de sensibilização rítmica, refletindo o tempo todo sobre a concepção de criança, aspectos sobre criatividade, espontaneidade, ludicidade, interação social; intencionalidade pedagógica musical, entre outros assuntos referentes ao processo de ensino-aprendizagem rítmico-musical.

•Osbebês,ascriançaspequenasearítmicamusicalForam realizados encontros direcionados à aprendizagem e ao desenvolvimento rítmico dos bebês e das crianças pequenas. O foco era observar a rítmica natural dos bebês e das crianças pequenas e realizar ações pedagógicas musicais que se relacionem com a rítmica musical e seu desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial. Para isso, foram apresentadas atividades de composição/

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improvisação, apreciação de performance musical, acionando expressão vocal, corporal e instrumental ou objetos sonoros para proporcionar uma aprendizagem e desenvolvimento musical, vivenciando os conceitos fundamentais do discurso musical – materiais sonoros, expressão musical e organização do fazer musical.

É importante ressaltar que a concepção de “criança” e tópicos referentes ao brincar e à interação social estão sempre sendo refletidos dentro das atividades propostas. A partir da explanação sobre a abordagem teórico-metodológica nas Proposições Curriculares, outros aspectos da linguagem sonoro-musical também foram trabalhados: o som e o silêncio; andamento; dinâmica para exemplificar as capacidades e habilidades possíveis de serem desenvolvidas.

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sEgundO mOmEntO

a fruição musical

As professoras participaram de um ensaio aberto do espetáculo Rabiola Ola Catibiribola, de Sílvia Negrão, do qual a autora deste artigo participa como violonista, e também com canto, percussão e arranjo de algumas músicas do espetáculo e do CD. Ao fim, comentaram que suas escutas haviam sido transformadas no decorrer do curso.

Assim, espera-se que o trabalho com a apreciação musical ativa, na Educação Infantil, possa trazer maior compreensão sobre o som, a música e outros impactos fundamentais para aprendizagem nas escolas e para a vida cotidiana desses bebês e crianças pequenas, como a atenção, concentração, memória, linguagem, pensamento, percepções e sentidos.

tERCEIRO mOmEntO

um passeio ao ar livre pelas linguagens artísticas - um olhar compartilhado

Num último encontro, as professoras/educadoras realizaram trabalhos no espaço aberto da Universidade Federal de Minas Gerais, gerando seus relatos de

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experiências. Mediante os registros desse momento, pelos relatos e depoimentos, foi possível verificar como as professoras se apropriaram dos fundamentos e da essência proposta pelo curso, no tempo estabelecido. Abaixo, algumas experiências compartilhadas, relacionadas à linguagem musical e interações com outras linguagens artísticas.

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dEPOImEntOs sOBRE a FORmaçãO na lInguagEm sOnORO-musICal

Os depoimentos realizados foram gratificantes para a autora, pois ratificou a relevância da formação continuada para os professores da Educação Infantil e a importância da abordagem exposta nas Proposições Curriculares para o ensino de música para os bebês e crianças pequenas. Abaixo, serão comentados alguns depoimentos:

• Os professores relataram que houve um maior entendimento sobreo trabalho com a música na Educação Infantil e que a linguagem musical pode ser construída nas suas inter-relações com outros saberes; o curso proporcionou também uma compreensão real das propostas dos documentos tanto nacionais como regionais que trazem referências para a prática pedagógica musical.•Paraalgumas,aformaçãocontinuadaabriuum“leque”depossibilidadese as transformou como pessoa e como formadoras, suscitando novas ideias; assim, o curso possibilitou uma reflexão e discussão sobre as práticas pedagógicas musicais já realizadas nas escolas e uma possível ampliação dessas experiências musicais com mais conhecimento e consistência, e que, portanto, suas práticas podem elevar as experiências musicais dos alunos;•Comentaramqueampliaramseusconceitossobreosomeamúsica,sobrea sonoridade e a música na vida cotidiana e nos ambientes dentro e fora de sala de aula, enriquecendo as possibilidades do fazer musical, explorando e manipulando os elementos fundantes da música; que aprenderam sobre a importância do corpo como fonte de expressão dos elementos fundantes do som e da música, e que a integração entre a música e o corpo possibilita uma aprendizagem musical significativa; a preparação corporal das crianças integrada à música como uma expressão espontânea de sentimentos e emoções.•Foramprovocadasabuscarmaisconhecimentosobrealinguagemmusicale ficaram mais sensíveis à música e conscientes sobre sua força na educação.•Tiveramumaaproximaçãomaior comos teóricosquedissertam sobre amúsica na Educação Infantil, por intermédio dos textos indicados para leitura.• Conscientizaram-se sobre a importância do cultivo de um repertóriomusical, também enquanto patrimônio cultural.•Relataramqueovalordavivênciasonoro-musicalémuitoimportanteeque,muitas vezes, extrapola os aspectos meramente de registro (alfabetização musical).•Obtiveramumentendimentosobreaimportânciadaintegraçãodoouvir,ver e movimentar (corpo) na educação musical dos bebês e das crianças pequenas.•Foramtransformadasnasuapercepçãoauditiva;aescutaapósocursoficoumais apurada, se deram conta disso no seu dia-a-dia e na fruição oferecida.•Perceberamquealudicidadeealinguagemmusicaltêmumaforteligação.•Aaplicaçãonasescolasdasexperiênciasvividasesugeridasduranteocursofoi muito positiva.• Aprenderam a ter intencionalidade pedagógica musical, a partir doconhecimento dos conceitos fundantes da linguagem sonoro-musical; como,

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por exemplo, trabalhar com os instrumentos musicais.• Entenderam que devem propiciar um ensino às crianças, de modo atorná-las sensíveis à música; precisam, também, desfocar a música de um papel utilitário, rotineiro e apenas de entretenimento, para uma posição de conhecimento; sentiram-se mais preparadas e com mais vontade de se arriscarem no ensino da linguagem musical; aprenderam a organizar melhor os conhecimentos da linguagem musical no planejamento de suas práticas.• Entenderam sobre a importância da escuta ativa e do processo criativodentro da linguagem musical.• Descobriram que a rítmica está dentro das pessoas e o que é preciso éaprender a ligar o ritmo natural ao musical.

COnClusãO

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Foi um privilégio participar como formadora de um curso que propõe uma concepção de ensino integrado na Educação Infantil, a partir das linguagens artísticas, nesse caso, tendo a linguagem musical como parte dessas interfaces, junto com a linguagem corporal, artes cênicas e plásticas visuais.

Por mais que uma proposta de formação continuada para os professores da Rede de Ensino de Belo Horizonte tenha significados ambíguos, sendo positivos e/ou negativos para as suas vidas pessoais e profissionais, há motivações que podem fundamentar essa continuidade, como: o interesse e a busca pela profissão, pelos saberes que constituem um ser humano e, principalmente, o prazer e a realização de se relacionar com uma infância que se mostra como premissa da Educação Básica, tudo isso justifica ser não mais um, mas o professor/educador na Educação Infantil.

No decorrer dessa formação, foram observados muitos sentimentos e valores que podem confirmar os significados explicitados. Percebeu-se valores sendo (re)significados, mentes sendo transformadas, paradigmas sendo quebrados ou reafirmados, emoções sendo manifestadas por esses bebês e crianças pequenas de um segmento educacional considerado como pérola para os que amam a educação. Observar a busca, o interesse, o encanto das professoras pelo aprendizado e pelo desenvolvimento musical na Educação Infantil foi muito estimulador e gratificante.A ideia de sensibilizar musicalmente os professores quanto aos aspectos rítmicos, pela escuta, em atividades que desenvolvessem a expressão rítmica-corporal foi recebida por eles com muito entusiasmo e satisfação. Pôde-se, ainda, perceber mudanças em suas expressões e entendimento sobre o que poderiam fazer com os bebês e as crianças pequenas na Educação Infantil. quando foram expostos os aspectos teóricos-metodológicos sobre a aprendizagem e desenvolvimentos rítmicos-musicais relacionados com a rítmica corporal natural e com a vida cotidiana desses bebês e crianças pequenas, tudo ficou mais claro na prática.

Por fim, os resultados obtidos, através de observações, atividades e registros, de uma maneira geral, culminaram numa mudança de valores sobre a linguagem sonoro-musical, tanto na dimensão teórica quanto na prática; e na vida pessoal de cada professor/educador, além de ampliar as possibilidades de planejamento e de avaliação dentro do processo de ensino e aprendizagem musicais.

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REFERênCIas

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BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso: 18 ago. 2013.

BRITO, Teca Alencar de. Koellreutter educador: o humano como objetivo da educação musical. São Paulo: Peirópolis, 2001.

CARNEIRO, Aline Nunes. Desenvolvimento musical e sensório-motor da criança de zero a dois anos: relações teóricas e implicações pedagógicas. 2006. 96 f. Dissertação (Mestrado em Música) – Escola de Música, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2006.

CARNEIRO, Aline Nunes; FRANÇA, Cecília Cavalieri. O desenvolvimento de condutas sensório-motoras dos bebês: implicações para a estimulação musical no primeiro ano de vida. Xv Encontro Anual da ABEM, 2006, João Pessoa. Anais..., 2006. p. 1-6.

CARNEIRO, Aline Nunes; PARIZZI, Betânia.“Parentalidade intuitiva” e “musicalidade comunicativa”: conceitos fundantes da educação musical no primeiro ano de vida. Revista da ABEM, Londrina, v. 19, p. 89-97, jan./jun., 2011.

DELALANDE, François. La música es un juego de niños. Buenos Aires: Ricordi, 1995.

FRANÇA, Cecília Cavalieri; SWANWICK, Keith. Composição, apreciação e performance na educação musical: teoria, pesquisa e prática. Porto Alegre, Revista Em Pauta, v. 13, n. 21, p. 5-41, dez., 2002.

FRANÇA, Cecília Cavalieri. Composição, audição e performance na educação musical. Monografia (Especialização) – Escola de Música, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1995.

FONSECA, Maria Betânia Parizzi. O canto espontâneo da criança de três a seis anos como indicador de seu desenvolvimento cognitivo-musical. 2005. 144 f. Dissertação (Mestrado em Música) – Escola de Música, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2005.

MATEIRO, Teresa; ILARI, Beatriz (organização). Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibpex, 2011. (Série Educação Musical)

PAPALIA, Diane E.; OLDS, Sally W.; FELDMANN, Ruth D. Desenvolvimento humano. Tradução Carla Filomena Marques Pinto vercessi et al. 10 ed. Porto Alegre: AMGH, 2010.

SILvA, Ana Paula Soares da. Formação dos profissionais da Educação Infantil: a pessoa no centro da ação. In: MARFAN, Marilda Almeida. Congresso Brasileiro de qualidade na Educação: formação de professores. v. 1. Brasília, DF: SEF/MECM, 2002. p. 193-197.

WADSWORTH, Barry J. Inteligência e afetividade da criança na teoria de Piaget. 5. ed. São Paulo: Pioneira, 1993.

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linguagem plástica Visualrosvita Kolb Bernardes

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experiência FormatiVa:eu me encanto, tu te encantas, nÓs nos encantamos

Início das aulas do curso de “Linguagem Plástica visual”, tudo pronto! Sala arrumada com os materiais de arte disponíveis para receber as alunas-professoras da rede municipal.

Na sala de aula no chão, no meio da roda, um tecido azul esticado, contendo várias bandejas de acrílico transparente, com quarenta bonecas em miniatura. Bonecas de plástico, sem roupa, todas iguais. O convite feito foi para que escolhessem e transformassem o objeto-boneca e criassem uma identidade própria para o seu objeto escolhido.

Foi um exercício visual no qual a subjetividade estava presente, como testemunho da expressão de cada um. Como precisavam de algum tempo para se aproximar desse objeto-boneca, pensar o que e como fazer, pediram para levar o objeto-boneca para casa.

Todo início de um novo encontro me perguntavam: você vai recolher as bonecas hoje? Intrigada com a pergunta, interroguei-me: por que será que elas queriam me devolver a boneca? A produção foi delas! Seria a necessidade de considerar uma tarefa cumprida? Ou seria a vontade de mostrar, socializar o que produziram em casa e poder dizer para o outro: eu sou assim!

Afinal, quem eram elas? que histórias de vida traziam? qual a trajetória de cada uma? O que queriam dividir ou não? O que queriam compartilhar com o outro? Eram professoras mulheres-tarefeiras? Ou rendeiras? Ou eram mulheres-professoras-tecelãs? quem sabe costureiras da sua própria história?

Por alguns instantes, me veio a imagem da moça tecelã da escritora Marina Machado. Ela conta a história de uma moça tecelã cheia de desejos, sonhos e cores. História da alma feminina posta no mundo, e para a qual o tear se torna o espaço de acalentar o desejo.

Assim, como fui tocada pela história da moça tecelã cheia de desejos e beleza, fui tocada por essas professoras. Pelo seu silêncio, pelo seu olhar contemplativo, pela sua predisposição em querer saber, pela sua generosidade em dividir a escrita do seu caderno de artista, pelos fios ainda fora do lugar, fios que pareciam intermináveis.

Em cada encontro, parecia que se abria mais uma fresta no processo de criação de cada uma, talvez um campo de possibilidades. Talvez o que mais tenha me tocado foi o momento em que elas perceberam que, do gesto repetitivo, dos desenhos todos iguais, feitos anos a fio, na escola, o que sobrava era um esvaziamento da própria ação (DERDYK, 2010, p. 42). que essa ação não fazia parte da arte. A minha intenção era a de aproximá-las, tocá-las pela arte e com a arte. Desejava o que

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Katia Canton indica com tanta propriedade:

A arte ensina justamente a desprender os princípios das obviedades que são atribuídas aos objetos, às coisas. Ela parece esmiuçar o funcionamento dos processos da vida, desafiando-os, criando novas possibilidades. A arte pede um olhar curioso, livre de “pré-conceitos”, e repleto de atenção. (2009, p. 12-13)

tu tE EnCantas: O tECIdO a COR a FORma

Panos, tecidos, espalhados pelo chão de forma caótica. Cores diversas. Tecidos finos, lisos, coloridos, aveludados, sedosos. De tudo um pouco. No primeiro momento, iriam experimentar, explorar, sentir, olhar o material. No segundo momento, iriam ordenar, juntar, organizar os tecidos por cor, textura e forma. A ideia era que ocupassem/pintassem o espaço-chão, com tons, sobreposições de tons, cores, estampas. Fazer uma pintura sem pincel e sem tinta, esse foi o desafio.Depois que todas pintaram o chão com as cores e formas mais diversas, seguimos para ver as fotografias do artista Nino Cais. Assim como o artista, que incorpora na sua obra objetos do cotidiano, do universo doméstico, experimentamos deslocar alguns objetos que fazem parte do nosso cotidiano, como a bolsa, a mochila, tecidos, cadernos, vassoura, balde, cadeira, bacia, bonecas, carrinhos. A experiência consistia num jogo estético, no qual existia o desejo de brincar de construir, mesclado ao sentimento de estranhamento e afeto.

A intenção, nesse encontro, foi estabelecer um diálogo entre a prática da docência e a prática artística. Luise Weiss, em dos seus textos, destaca que, como artista ela tem inquietações, mas como professora não quer regras pré-estabelecidas, e sim, estimular os alunos para as pesquisas, para o que está latente, ir ao encontro do próprio caminho. O corpo neste momento estava no caminho e entrou em ação. Foi o suporte e a própria obra (2010, p. 13). Brincamos com um corpo presente que narrou, por intermédio de elementos visuais, a história de cada um.

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nós nos encantamos: “Porque a sombra se estica atrás da gente?”

Entusiasmada com a vivência e o contato que tive, durante dez dias, com as escolas da infância de Reggio Emilia, Pistóia e San Miniato, na Itália, tentei partilhar com as professoras o meu encantamento com essa experiência. Porque a sombra se estica atrás da gente? Pergunta feita por uma criança pequena. Alguém sabe responder? Silêncio na sala de aula. Inspirada na pedagogia de Loris Malagguzi, que coloca a criança como protagonista do seu processo de aprendizagem, e pelo encantamento com a experiência das escolas da infância italianas, iniciamos um percurso investigativo, projetando objetos diversos no retroprojetor.

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Da exploração dos objetos, partimos para o corpo em movimento, na luz, na sombra, na transparência. Ficamos, durante algum tempo da aula, mobilizados e encantados com a exploração dos materiais no retroprojetor. A cada momento acontecia uma nova descoberta: nossa, a renda ficou linda! vejam a textura dela... Deixa eu ver como fica com o papel celofane por cima... e esta pedra? Será que a luz passa por ela? E a bandeja de acrílico, me empresta? Deixa ver como fica... É possível girar... vejam o que eu fiz! Nesse momento, uma das professoras descobre que a bandeja de acrílico, que era transparente e que estava em cima do projetor, poderia se movimentada. Criou-se então, uma imagem em movimento. As mulheres-professoras pareciam crianças que vibram com as suas descobertas e se encantam com as coisas. Colocaram o seu corpo em movimento, na luz e na sombra. Projetaram objetos, criaram cenários, fizeram uma performance. Por alguns instantes, tive a nítida sensação de que elas eram protagonistas de seu processo de aprendizagem. que estavam envolvidas em um processo de criação, ampliando o seu repertório vivencial, estético e cultural. E, talvez, naquela aula, tenhamos chegado perto da “educação do ser poético” apontada por Luciana Ostetto (2004, p. 5)

se pretendemos a educação do ser poético, implicado na totalidade do olhar, da escuta, do movimento, que se expressa mobilizando todos os sentidos, será importante vermos tais ações como educação estética (mais do que ensino de arte) que se realiza no dia a dia.

Penso que o desafio de arriscar-se por outros territórios desconhecidos foi apresentado para essas professoras. Os sentidos foram acordados. E, mesmo sem saber, ainda, porque a sombra se estica atrás da gente, seguimos adiante.

narramos o que nos encanta: caderno de artista

Último dia de aula, momento de abrir os cadernos de artista, expor as ideias, dividir com o outro as impressões, as reflexões e os desenhos.

Entre os artistas plásticos, o registro de reflexões, esboços, anotações diversas sobre suas produções é chamado de “caderno de artista” ou “livro de artista”. Para o pesquisador e professor Paulo Silveira, o livro de artista “é o livro em que o artista é autor e livro-obra é a obra de arte dependente da estrutura de um livro” (2001, p. 47). Na arte contemporânea, é bastante comum o livro de artista. Desde os anos de 1960 e 1970, os artistas brasileiros têm incorporado esses livros ao seu trabalho, usando os mais diversos materiais para sua obra-livro. Prática trazida do campo da arte, o caderno de artista foi, então, nessa experiência, incorporado à prática das professoras.

No campo da educação, alguns autores, como Madalena Freire (1983), com o seu livro A paixão de conhecer o mundo, Cecilia Warschauer (1987), com A roda e o registro: uma parceria entre professor, e conhecimento, e Luciana Ostetto (2011), com o livro Educação Infantil: saberes e fazeres da formação de professores, incorporam na sua prática docente o registro reflexivo. Numa linha muito semelhante, o pedagogo italiano Loris Malaguzzi (2001) introduziu o registro

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em sua prática, como instrumento para documentação. Foram essas referências que me motivaram a introduzir o uso do caderno de artista para esse grupo de professoras.

Para Walter Benjamin (1995), a construção do passado é fundamental enquanto ação para mudanças no presente. Inspirada pelo caminho do rememorar que esse autor assinala, escolhi um trecho de um caderno que narra a ação do rememorar e também o possível encantamento de se ver no outro.

a visita à escola silva lobo: para onde direcionou-se o meu olhar?

Durante a visita da Escola Municipal Silva lobo, que fez parte do curso, o meu olhar voltou-se para o passado. Parecia que eu estava entrando na Escola Estadual Barão de Aiuruoca em Barra Mansa-RJ. Escola onde estudei ainda criança nos anos 80. Lugar de muitas árvores, horta, de corredores coloridos, salas iluminadas com os nossos trabalhos. Cada canto da escola, trabalhava com um tema. Hoje diria que são como os ateliês que eu vi na UMEI Silva Lobo. Entrar na UMEI Silva Lobo foi me ver. ver o meu passado, o meu desejo para o futuro de todas as escolas que trabalham com este nível de ensino que eu acredito. ver a força de uma coordenadora que acredita no que faz... vi uma equipe de professores que não tem medo do novo, que tem coragem de se abrir para uma nova prática... quero dizer que um dia estarei como vocês onde eu estiver. Agradeço aos colegas que sugeriram esta visita. (Carla Degani)

Ao ler as anotações que essa professora fez no seu caderno de artista não tem como não pensar no que António Nóvoa salienta, quando fala sobre formação.

O formador forma-se a si próprio, através de uma reflexão sobre os seus percursos pessoais e profissionais (autoformação); o formador forma-se na relação com os outros, numa aprendizagem conjunta que faz apelo à consciência, aos sentimentos e às emoções (heteroformação); o formador forma-se através das coisas (dos saberes, das técnicas, das culturas, das artes, das tecnologias) e da sua compreensão crítica (ecoformação). (2004, p. 16).

Gosto da ideia de que o formador forma-se através das coisas, forma-se a si próprio e na relação com os outros. As anotações dessa professora, na relação que estabelece com a escola da sua infância e com a experiência que está vivendo hoje, como profissional, revelam-me uma reflexão sobre o seu percurso pessoal e profissional, destacado por Nóvoa.

Observei em outros cadernos que, no momento em que as professoras entraram em contato com as experiências escolares, e ao refletirem sobre essas experiências, aprenderam com a sua própria história, pois:

O trabalho centrado nas histórias de vida, diários biográficos e narrativas de formação, adota, além da reflexividade, outros aspectos e questões relativas à subjetividade e à importância de se ouvir a voz do professor ou compreender o sentido da investigação-formação, centrada na abordagem experiencial, por partir da teoria da atividade do sujeito, que aprende a partir da sua própria história. (SOUZA, 2007, p. 3)

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naRRamOs O QuE nOs EnCanta

Durante as aulas, que aconteceram no mês de junho, percebi a dificuldade de algumas, a facilidade de outras na sua jornada de ser professora. “Dizer-se” por escrito no caderno de artista foi um desafio. “Dizer-se” pela linguagem plástica e visual foi outro desafio. Susana Rangel vieira da Cunha, ao falar da influência que os professores provocam no modo como as crianças produzem sua visualidade, diz que,

para que as crianças tenham possibilidades de desenvolverem-se na área expressiva, é imprescindível que o adulto rompa seus próprios estereótipos, a fim de que consiga realizar intervenções pedagógicas no sentido de trazer à tona o universo expressivo infantil. Uma maneira de o adulto romper suas formas cristalizadas é resgatar seu próprio processo expressivo, voltando a brincar com os materiais. (2005, p. 10)

Penso que, além da necessidade de romper com a forma cristalizada de relacionar-se com a arte, existe também a necessidade de o professor “reencontrar-se com porções esquecidas do ser”, ao que Luciana Ostetto chama de o “encontro com a sua criança” (2005, p. 129).

Encanta-me poder pensar que as professoras podem se reencontrar com a sua dimensão esquecida de criança, voltando a brincar e a se encantar com a diversidade de materialidade ao seu redor e, quem sabe, assim desbravar outras possibilidades com a arte na escola. Se esse é o caminho, as professoras-alunas demonstraram reafirmar que, para manter viva a chama arte-infância até a fase adulta, existe a necessidade de conexão com a sua experiência de criança. Nos seus testemunhos, as professoras deram pistas de que pensar sobre as possibilidades estéticas e expressivas-criativas vividas na infância permitiu-lhes um diálogo estético mais próximo com os seus alunos, pois, para poder narrar o que encanta, é preciso encantar, cantar.

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REFERênCIas

BENJAMIN, W. Obras escolhidas I: magia e técnica, arte e política. 7. ed. Tradução brasileira Editora Brasiliense S. A. São Paulo: Brasiliense, 1994.

CANTON, K.. Narrativas enviesadas.São Paulo: Martins Fontes,2009.

DERDIK, E.Linha de costura. Belo Horizonte: Editorac/Arte, 2010.

FREIRE, M. A paixão de conhecer o mundo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

KAHLO, F. Gemaltes Tagebuch. Munchen: Kindler verlag, 1995.

KENSKI, v. M. Sobre o conceito de memória. In: FAZENDA, I. (organização). A pesquisa em educação e as transformações do conhecimento. 5. ed. Campinas: Papirus, 2004.

KRAMER, S. Por entre as pedras: armas e sonho na escola. São Paulo: ática, 2006.

MALAGUZZI, L. La Educacion Infantil em Reggio Emilia. Espanha: Octaedro, 2001.

MICHALISZYN, P. Da serra ao pé da serra ou escavando “medicinas”. 1988. 344 f. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Universidade de Campinas, Campinas. 1988.

NóvOA, A. (organização). vidas de professores. Porto: Porto Editora, 2007.

OSTETTO, L. E. (organização). Educação infantil: saberes e fazeres da formação de professores. Campinas: Papirus, 2011.

OSTETTO, L. E. Arte, infância e formação de professores: autoria e transgressão. Campinas: Papirus, 2004.

SILvEIRA, P. A página violada: da ternura à injúria na construção do livro de artista. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 2001.

SOUZA, E. C. O conhecimento de si: estágio e narrativas de formação de professores. Rio de Janeiro: DP&A; Salvador: UNEB, 2007.

WARSCHAUER, C. A roda e o registro: uma parceria entre professor, alunos e conhecimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.

WEISS, L. Mar. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2011.

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cursos de aperfeiçoamento em arte: a formação continuada do professor de educação infantil

Marlaina Fernandez roriz

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Curso Educação Infantil

cursos de aperfeiçoamento em arte: a formação continuada do professor de educação infantil

Sabe-se que, no Brasil, as décadas de 1970 e 1980 representaram um período importante para a construção dos paradigmas da Educação Infantil, tal como a vemos hoje. Movimentos iniciados pela sociedade civil apontavam para a necessidade da efetivação do direito à educação para crianças pequenas, com locais e profissionais preparados para essa demanda. Somam-se a esses grupos os próprios profissionais da educação que reivindicavam novas diretrizes que viessem regulamentar sua atuação nessa etapa do ensino (SANTOS, 2010).

Nesse período, a necessidade por creches e pré-escolas crescia no país, em virtude do aumento do número de mães trabalhadoras que, ao atuarem fora do ambiente doméstico – nova configuração social que se solidifica a partir da Revolução Industrial, nos séculos XIX e XX –, precisavam de um lugar apropriado para deixarem seus filhos enquanto cumpriam sua jornada de trabalho. Dessa maneira, da perspectiva dessas mulheres, a Educação Infantil deveria ser entendida como um direito delas e também de seus filhos (CAMPOS, 1999).

Inicialmente, os lugares destinados a atender a população de baixa renda tinham cunho somente assistencialista-custodial (cuidado com alimentação, higiene e segurança física), ao passo que as instituições privadas já despertavam para a importância dos aspectos pedagógicos no atendimento à primeira infância (SANTOS, 2010). Desse modo, por muito tempo, as ações voltadas para a Educação Infantil e a população pobre no Brasil caracterizaram-se como caridade, voluntariado e filantropia. Somente a partir do final do século XX, com reinvindicações feministas acerca da qualidade das instituições que atendiam às crianças, mudanças mais significativas referentes às políticas públicas e à Educação Infantil, de fato, ocorrem (MORENO, 2007).

Somados a essa conjuntura de reinvindicações e questionamentos sobre a importância do aspecto pedagógico na Educação Infantil, dois momentos na legislação brasileira, notadamente, alavancam as conquistas obtidas sobre do binômio cuidar-educar na educação de crianças pequenas. O texto da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, em seu artigo 208, inciso Iv, coloca a Educação Infantil como direito do cidadão, a ser assegurado pelo Estado. Dessa maneira, além de considerar a criança de 0 a 6 anos como sujeito de direitos, a Carta Constitucional de 1988 entende que o direito à educação se estendeu à criança pequena, e, por essa condição, começou a ser zelado pelo Estado e pela família, o que vem a ser ratificado com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990 e 2009.

Além da Constituição da República de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/1996) afirma, em seu artigo 29, que a Educação Infantil representa a primeira etapa da Educação Básica, possuindo como objetivo

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maior o desenvolvimento global da criança em seus aspectos físicos, psicológicos, intelectual e social (BRASIL, 1996). Nessa nova perspectiva, as creches passaram a ter compromissos educativos e não exclusivamente assistencialistas.

A LDB faz deliberações importantes sobre a formação do docente que atua na Educação Básica, incluindo, portanto, aquele que atua na Educação Infantil,

Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidade e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos de ensino fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade normal. (BRASIL, 1996)

Acredita-se que a formação do professor represente um dos fatores mais importantes para a promoção de padrões de qualidade apropriados na educação. Estudos afirmam que a formação do professor da Educação Básica mostra-se defasada e insuficiente. Principalmente na Educação Infantil, dadas as especificidades da faixa etária atendida, o professor cumpre diariamente funções que se delineiam a partir do binômio cuidar-educar. Essa demanda aumenta a dificuldade de garantia da qualidade de ensino, haja vista que sua formação, muitas vezes, não é contemplada de maneira eficiente. Sobre isso, Campos, Füllgraf e Wiggers (2006), em seus estudos sobre a qualidade da Educação Infantil brasileira, ratificam a assertiva sobre a formação incompleta desses professores, dizendo que:

quanto à formação prévia, mesmo professoras formadas no curso de magistério ou até mesmo em pedagogia, no nível superior, não recebem a qualificação necessária para desenvolver seu trabalho educativo, principalmente com as crianças menores atendidas em tempo integral nas creches. As educadoras ou monitoras, por sua vez, que na maioria não contam nem mesmo com o curso secundário, baseiam seu trabalho no conhecimento que desenvolvem no âmbito doméstico, priorizando as atividades de higiene, alimentação e segurança. Os programas de supervisão e formação em serviço, quando existentes, também apresentam falhas em sua concepção e enfrentam a dificuldade desses profissionais geralmente não contarem com horário remunerado para planejamento e trabalho em equipe nas instituições. (CAMPOS; FÜLLGRAF; WIGGERS, 2006, p. 106).

Em continuidade às transformações iniciadas na década de 1980 e prevendo uma melhora no atendimento da Educação Infantil, foi elaborado, em 1998, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), documento cuja função é apontar diretrizes, objetivos, métodos e estratégias, visando à melhoria da qualidade da Educação Infantil. O RCNEI foi elaborado pelo Ministério da Educação, como uma tentativa governamental de auxiliar o professor da Educação Infantil em sua prática educativa. É um documento de abrangência nacional e deveria atuar como norteador da ação desses professores, apesar de seu uso não ser obrigatório.

Sabe-se que, na Educação Infantil, não há divisão de conteúdos em disciplinas, tal como acontece nas demais etapas da educação. Para o ensino da criança pequena,

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há trabalho por linguagens, considerando que a aprendizagem da criança se mostra particular, por desenvolver-se de modo global, por associação dessas linguagens. Essa condição singular representa mais um elemento importante a ser discutido no âmbito da formação de professores e consequente qualidade do ensino, pois, a partir do que mostra o RCNEI, os professores da Educação Infantil deveriam desenvolver trabalhos em sala de aula que contemplassem todas as linguagens propostas. No entanto, mesmo com professores devidamente habilitados, muitas vezes, ao fim de sua formação, esses não estão preparados para esse tipo de trabalho. Especialmente, o trabalho com as linguagens artísticas, que vivenciam grandes barreiras dentro do cotidiano da Educação Infantil.

Ainda na legislação brasileira, sobre os profissionais da Educação Infantil e sua formação, em 2004, o parecer CNE/CEB1 04/2000 define que:

• os professores das instituições de educação infantil públicas ou privadasdeverão possuir, pelo menos, o diploma de curso normal de formação de professores de nível médio, conforme o Art. 62 da LDB/96 e Pareceres números 10/97, 1/99 e 2/99 da CEB do CNE;•todasasinstituiçõesdeEducaçãoInfantil,qualquerquesejasuacaracterização,terão o prazo até 2007 para ter todos os seus professores com, pelo menos, o curso normal de nível médio. Dentro do mesmo prazo, será também exigida a escolaridade de ensino médio, admitindo-se como mínimo o ensino fundamental, para outros profissionais. (BRASIL, 2000).

Além disso, dispõe sobre a mobilização de universidades públicas e privadas, no sentido de promover estratégias de colaboração que possibilitem a habilitação dos profissionais da Educação Infantil, bem como indica que

as Universidades, Institutos Superiores de Educação e Escolas Normais de Nível Médio em colaboração com as instituições de Educação Infantil, deverão estabelecer estratégias para garantir que os professores com habilitação de nível médio possam dispor de alternativas para formação continuada. (BRASIL, 2000, p. 628)

Apesar do que define a legislação brasileira sobre a formação dos profissionais que atuam na Educação Infantil e seus prazos para habilitação, observa-se uma significativa distância entre a realidade das instituições existentes no Brasil e o parâmetro eleito como ideal pelas leis. No que se refere à rede pública de ensino brasileira, em todas as etapas da educação, compreende-se que “o círculo vicioso ‘baixa remuneração – pouca qualificação’ estabelecido na área requer, para que seja superado, o investimento nos dois lados da equação” (BRASIL, 1994, p. 13).Compreendendo a importância da formação dos professores da Educação Infantil e sua estrita relação com a qualidade do ensino oferecido às crianças de 0 a 5, realizou-se, durante o primeiro semestre de 2013 (de março a junho), o curso de aperfeiçoamento teórico-prático intitulado Educação Infantil, Infâncias e Arte.

1 Conselho Nacional de Educação e Câmara de Educação Básica.

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Esse curso atendeu 42 professoras da Educação Infantil da Rede Municipal de Belo Horizonte, e foi oferecido pela Escola de Belas Artes (EBA/ UFMG), em parceria com a Faculdade de Educação (FaE/UFMG), NEPEI (Núcleo de Estudos e Pesquisas da Educação Infantil), Ministério da Educação (MEC), Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte (SMED). Com 180 horas, divididas em três eixos (Fundamentos da Arte-Educação; Linguagens Poético-artísticas e Seminários Integrados), o curso teve como objetivo trabalhar, por meio de aulas teóricas e práticas, as quatro linguagens artísticas presentes nas Proposições Curriculares da Educação Infantil de Belo Horizonte – Desafios da formação. Esse documento, escrito em 2009, atua como instrumento norteador da ação pedagógica dos professores da Educação Infantil de UMEIS da Rede Municipal e creches conveniadas de Belo Horizonte, e tem como objetivo balizar a práxis desses profissionais da educação. Ademais, aponta possibilidades e reitera a importância do trabalho com as sete linguagens presentes no currículo da Educação Infantil, entre elas: corporal, musical e plástica visual.

Durante a realização desse curso, desenvolveu-se uma pesquisa de Mestrado cujo objetivo era investigar a concepção de corpo do professor na Educação Infantil de Belo Horizonte. Buscando compreender e tomando como ponto de partida as vivências desses professores em sala de aula, assim como suas trajetórias docentes. E esse estudo contou com um grupo de 42 sujeitos participantes, todos professores da Rede Municipal de Educação Infantil de Belo Horizonte e das Creches Conveniadas.

A fim de coletar dados para a pesquisa, foi distribuído, a cada professor participante, no ato da matrícula, um questionário inicial, semiestruturado. A justificativa para a aplicação desse questionário, naquele momento, baseava-se na busca por respostas sem possíveis interferências e/ou influências advindas das novas experiências proporcionadas pelo curso que se iniciaria a seguir. O que nos interessava mais era a concepção inicial e real desses professores sobre corpo, e, ainda, sua percepção, ou não, de diálogos estabelecidos entre a linguagem corporal e a prática docente. Sobre o cuidado com pesquisas que tratem de fatores humanos, Piovesán e Temporini (1995) nos alertam para a necessidade de planejamento prévio que considere a realidade dos participantes, de modo que os instrumentos utilizados durante a coleta de dados contemplem as experiências reais desses sujeitos participantes “no seu vocabulário e ambiente de vida” (PIOvESáN; TEMPORINI, 1995, p. 319).

Considerando as orientações dos autores supracitados, pensou-se na construção de um questionário inicial que, além de questões objetivas relacionadas aos dados pessoais, tais como nome, sexo, idade, escolaridade e contatos, entre outros, continha dez questões discursivas em que os professores podiam expor suas concepções de corpo; demonstrar se identificavam ou não alguma relação entre sua linguagem corporal e sua práxis enquanto docente; se planejavam suas atividades considerando o corpo como elemento a ser trabalhado; de que forma realizavam esse planejamento e se, nessas atividades, participavam ou somente observavam. Continha, ainda, uma questão que buscava investigar o grau de conhecimento

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desses professores acerca das Proposições Curriculares para Educação Infantil da Prefeitura de Belo Horizonte (2009): se conheciam o documento, se leram integralmente ou mesmo parcialmente. Já a última questão se referia aos cursos de formação do docente e ao trabalho com as linguagens artísticas durante essa formação. Pretendeu-se, assim, tendo por base a experiência desses professores, na condição de discentes, verificar se os cursos de formação de professores contemplavam o diálogo arte-educação e se preparavam, efetivamente, os futuros professores para desenvolverem as diversas linguagens artísticas durante os ciclos da Educação Infantil.

Apesar de reconhecer que as respostas discursivas serão a base de importante trecho da trajetória a ser percorrida ainda durante o Mestrado, que se dedica às investigações sobre o lugar do corpo do professor e seus diálogos com a práxis docente – dada a riqueza de temáticas possíveis e pertinentes às reflexões – neste artigo, optou-se por uma abordagem sobre a formação do professor e suas possíveis reverberações na qualidade do ensino. Além disso, lança olhares sobre a importância ou não de cursos que possibilitem a formação continuada desses profissionais, nos moldes do que propôs o Curso Educação Infantil, Infâncias e Arte.

Assim, a partir da sistematização dos dados coletados, considerando, inicialmente, somente as questões objetivas, traçou-se um perfil desses participantes. Para isso, foram construídos alguns quadros fundamentados nas respostas obtidas e consideradas válidas até a data em que os questionários foram aplicados – em fevereiro de 2013:

É possível observar que a presença majoritária de mulheres no grupo pesquisado reflete uma situação que se que construiu historicamente, e que se mostra presente

PORCENTAGEM FAIXA ETÁRIA NÚMERO

26,19% Maior que 45 anos 11

52,38% Entre 35 e 45 anos 22

21,42% Entre 25 e 35 anos 9

0% Menor que 25 anos 0

PORCENTAGEM IDENTIDADE DE

GÊNERO

NÚMERO

100% Sexo feminino 42

PORCENTAGEM TEMPO DE TRABALHO NA

EDUCAÇÃO INFANTIL

NÚMERO

45,24% Há mais de 10 anos 19

33,33% Entre 5 e 10 anos 14

21,42% Há menos de 5 anos 9

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em toda a Educação Infantil. Ainda hoje, os homens não conseguiram consolidar um espaço institucional que se equipare ao número de professoras na Educação Infantil. A prática de educar e cuidar, portanto, não sendo compreendida como uma atividade também masculina, representa um entrave à entrada e permanência de homens nesse período da educação. Sobre isso, Ramos (2011), em seus estudos sobre a presença masculina na Rede Municipal de Educação Infantil, fala que, para serem aceitos no contexto escolar, “os professores do sexo masculino passam pelo crivo e pela vigilância dos adultos, especialmente quando a função no interior da instituição infantil exige a execução das funções relacionadas ao cuidado das crianças” (RAMOS, 2011, p. 61). A assertiva do autor é reforçada ao se deparar com os resultados obtidos, já que todos os sujeitos participantes eram mulheres.

Observa-se, também, que a grande maioria dessas professoras já possui experiência significativa na Educação Infantil, haja vista seu tempo de atuação e faixa etária. Essa experiência, no entanto, não representa garantia de um trabalho efetivo e intencional das linguagens artísticas tal como aponta o documento das Proposições Curriculares da Educação Infantil da Prefeitura de Belo Horizonte, de 2009. De modo geral, percebe-se que o trabalho desenvolvido com foco nas linguagens artísticas ainda permanece no campo intuitivo e, muitas vezes, também estão limitados aos projetos esporádicos, não se consolidando na rotina das crianças, como parte integrante de atividades cotidianas. Soma-se a isso o fato de existir certa preferência pelo trabalho com a linguagem que a professora tem mais habilidade ou disposição para desenvolver. Essa situação excluiu do processo de aprendizagem das crianças pequenas a possibilidade de diálogo com as demais linguagens, o que imprime certa defasagem à qualidade do ensino. A fala da professora nº 8 endossa essa observação:

O professor dá mais enfoque naquilo que tem mais intimidade. Gosto de música e de seguir o ritmo com o corpo. (Profa. nº 8).

No que tange especificamente à formação dessas professoras, as seguintes informações foram obtidas a partir dos questionários aplicados:

PORCENTAGEM ESCOLARIDADE NÚMERO

16,67% Ensino Médio 7

52,39% Ensino Superior Completo 28

16,67% Ensino Superior Incompleto 7

PORCENTAGEMCURSO DE

GRADUAÇÃONÚMERO

60,71% Pedagogia 17

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PORCENTAGEM PÓS-GRADUAÇÃO NÚMERO

46,43% Possuem 13

Dentre aquelas que possuem Ensino Superior completo, dezessete se graduaram em Pedagogia e treze já possuem Pós-Graduação2. No entanto, 14 professoras ainda não possuem curso superior completo, sendo que sete têm somente o Ensino Médio.”

2 Os dados não estabelecem entre si relação de interdependência.3 Os dados não estabelecem relação de interdependência.

PORCENTAGEM ESCOLARIDADE NÚMERO

0% Ensino Fundamental 0

16,67% Ensino Médio 7

66,66% Ensino Superior Completo 28

16,67% Ensino Superior Incompleto 7

16,67% Ensino Superior Incompleto 7

PORCENTAGEM

CURSO DE

GRADUAÇÃO NÚMERO

60,07% Pedagogia 17

25% Outros 7

14,28% Não informou 4

PORCENTAGEM PÓS-GRADUAÇÃO NÚMERO

46,43% Possuem 13

53,57% Não possuem 15

A partir dos quadros apresentados aqui, observa-se que todas as cursistas possuem a habilitação mínima exigida por lei para atuarem como professores da Educação Infantil, como define o Parecer CNE/CEB emitido em 2004. Entre aquelas que possuem Ensino Superior completo, dezessete se graduaram em Pedagogia e treze já possuem pós-graduação3. No entanto, quatorze professoras ainda não possuem curso superior completo, sendo que sete têm somente o Ensino Médio.

Apesar de avanços significativos estarem se consolidando no campo da Educação Infantil, acredita-se que ainda há muito a se fazer no que diz respeito à formação de professores no sentido de diminuir a discrepância entre o grau de formação desses profissionais. Por meio da atuação da pesquisadora como bolsista no Curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, foi possível perceber como os professores da Educação Infantil – aqui representados por 42 docentes da Rede Municipal e Creches Conveniadas de Belo Horizonte – se mostram dispostos a aperfeiçoar seu currículo, dando continuidade ao seu processo de formação.

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A relevância dos cursos de aperfeiçoamento, nos moldes da proposta do Curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, está na possibilidade de diminuir a distância existente entre teoria e prática. Além do caráter multiplicador, esses cursos trazem a reflexão para a sala de aula e para essas professoras, e apontam caminhos para tornar palpável e aplicável à realidade da sala de aula o que estudos e conteúdos teóricos, muitas vezes, não conseguem fazer por si só.

Essa carência presente na formação dos docentes é identificada por eles mesmos. No questionário inicial aplicado, quando indagadas a respeito de sua formação e em que medida ela dá subsídios para que o profissional trabalhe todas as linguagens presentes nas Proposições Curriculares de Belo Horizonte, das 42 participantes, 27 acreditam que a formação recebida não contempla o trabalho de todas as linguagens existentes. Esse número expressivo, e que representa mais da metade do grupo entrevistado, aponta para a necessidade de modos regulares de formação e especialização; também indica a carência de estruturas que propiciem que atualização dos profissionais seja contínua e assegurada, de maneira que, além de alcançar o nível de formação ideal apresentado na legislação brasileira, sejam garantidos à Educação Infantil parâmetros regulares e homogêneos de qualidade no ensino e atendimento às crianças pequenas.

A fala da professora nº. 42 traz à luz a certeza da necessidade de investimentos regulares na formação e no aperfeiçoamento dos profissionais da educação, seja na modalidade de cursos ou pelo acesso à graduação e à pós-graduação, entre outros:

Todas as linguagens que nós vimos até agora, por serem das artes, possuem um elemento em comum que é o sensível. Estamos sendo instrumentalizados para essa expressão através do corpo, dos sons, do que é visível... Todas elas nos deram dicas de como a gente pode partir da própria criança, que está muito ligada às expressões através do sensível. Se eu quiser fazer uma graduação vai ser ótimo para mim, mas eu posso lançar mão da biblioteca pública e fazer minha formação de maneira autônoma. O que a gente precisa pensar é que este curso, no tempo que nos foi oferecido, que, aliás, é um grande deleite, nos abre os olhos para muitas possibilidades. (Profa. nº 42)

Acredita-se ser necessário compreender que investimentos direcionados à formação do professor na educação, de modo geral, reverbera diretamente na qualidade de ensino. Especialmente na Educação Infantil, a demanda por profissionais capacitados é urgente. A criança, cidadã e sujeito de direitos, deve ter assegurados pelo Estado serviços de qualidade, principalmente a educação. Só é possível pensar em formação, aprendizagem, criticidade e cidadania de crianças se os adultos envolvidos nesse processo estiverem devidamente preparados para isso. Faz-se necessário ver “os mecanismos de formação como prática social inevitavelmente coerente com a prática que se pretende implantar na sala de aula e implica em salários, planos de carreira e condições de trabalho dignas” (SOUZA; KRAMER, 1994, p. 54-55).

À guisa de conclusão, ainda sobre a estreita relação entre formação de professores e qualidade de ensino na Educação Infantil, Pascal e Bertrán (1994) corroboram,

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com seus estudos sobre a Educação Infantil, e reiteram a importância de uma formação adequada e de qualidade para que se garanta às crianças pequenas também um ensino de qualidade:

Há clara evidência de que a qualidade do professor é um determinante central na qualidade e eficiência dos programas de Educação Infantil [...] se quisermos melhorar a qualidade da educação de crianças pequenas, devemos nos preocupar com a qualidade de seus professores. (PASCAL; BERTRáN, 1994, p. 296).

REFERênCIas

BELO HORIZONTE. Prefeitura de Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Educação. Proposições Curriculares: Educação Infantil – Rede Municipal de Educação e Creches Conveniadas com a PBH: desafios da formação. Belo Horizonte: SMED/PBH, 2009. Disponível em <http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/>. Acesso: 25 jul. 2013.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf_legislacao/superior/legisla_superior_const.pdf>. Acesso: 10 set. 13.

BRASIL. Ministério da Educação. Por uma política de formação do profissional de Educação Infantil, Brasília, DF, 1994.

BRASIL. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n° 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1996.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. Dispõe sobre o aperfeiçoamento da sistemática prevista para garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes, na forma prevista pela Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2009.

BRASIL. Parecer CNE n. 4/2000. Diretrizes Operacionais para a Educação Infantil. Brasília, DF, 2000. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PCB004v03.pdf>. Acesso: 20 dez. 2013.

CAMPOS, M. M. A. Formação de professores para crianças de 0 a 10 anos: modelos em debate. Educação & Sociedade. (Número especial: Formação de profissionais da educação: políticas e tendências). v. 20. n. 68, 1999.

CAMPOS, M. M.; FÜLLGRAF, J.; WIGGERS, v. A qualidade da educação infantil brasileira: alguns resultados de pesquisa. Cadernos de Pesquisa. v. 36, n. 127, 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/cp/v36n127/a0536127.pdf>. Acesso: 12 dez. 2013.

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MORENO, L. G. Organização do Trabalho Pedagógico na Instituição de Educação Infantil. In: PASCHOAL, Jaqueline Delgado (Org.). Trabalho Pedagógico na Educação Infantil. Londrina: Humanidades, 2007, p. 54-62.

PASCAL, C.; BERTRáN, T. In: ROSEMBERG, F.; CAMPOS, M. M. Creches e pré-escolas no hemisfério norte. São Paulo: Cortez/FCC, 1994.

PIOvESAN, A.; TEMPORINI, E. R. Pesquisa exploratória: procedimento metodológico para o estudo de fatores humanos no campo da saúde pública. Revista Saúde Pública, v. 29, n. 4, 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rsp/v29n4/10>. Acesso: 1º ago. 2013.

RAMOS, J. Um estudo sobre os professores homens da educação infantil e as relações de gênero na Rede Municipal de Belo Horizonte - MG. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Pontifícia Universidade Católica. Belo Horizonte, 2011.

SANTOS, N. F. R. Educação infantil no Brasil: o paradigma entre o cuidar e o educar no centro de educação infantil. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Londrina. Paraná, 2010. Disponível em: <http://www.uel.br/ceca/pedagogia/pages/arquivos/Nathalia%20Fernanda%20Ribeiro%20dos%20Santos.pdf>. Acesso: 19 jul. 2013.

SOUZA, S. J.; KRAMER, S. Esboço de uma proposta curricular para a formação de educadores de creche de 2º grau. In: ROSEMBERG, F.; CAMPOS, M. M.; vIANA, C. P. (organização). A formação do educador em creche. São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 1992.

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relatos de experiência: o estágio no contexto do curso de formação continuada de

professores de educação infantilBruno Pontes, Flaviane lopes, Mariana silva,

rafaela Kênia, Vânia silvério dos reis

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Curso Educação Infantil

relatos de experiência: o estágio no contexto do curso de formação continuada de professores

da rede municipal de educação infantil

O curso Educação Infantil, Infâncias e Arte foi realizado no primeiro semestre de 2013, na Universidade Federal de Minas Gerais. Contou com a coordenação da professora doutora Ana Cristina Carvalho Pereira, e co-coordenação do professor doutorando Ricardo Carvalho de Figueiredo, ambos da Escola de Belas Artes, dos cursos de graduação em Dança e Teatro, respectivamente. O curso permitiu que um grupo de 42 professoras da Educação Infantil, que atuam em Unidades Municipais de Educação Infantil e Creches Conveniadas em Belo Horizonte, pudesse viver um processo de formação que abordou e possibilitou que elas experienciassem processos criativos, em diálogo com quatro linguagens artísticas no campo das artes: teatro, música, dança e artes visuais. Elas foram convidadas a conhecer a perspectiva do ensino de artes para a criança pequena. Para isso, foi necessário tirar os sapatos, agachar, sentar no chão, deitar e rolar, interpretar, ouvir e dançar.Para a realização do curso, alunos da graduação em Teatro, graduação em Dança e pós-graduação em Artes foram selecionados para atuar como bolsistas nesse projeto. O trabalho desenvolvido pelos bolsistas consistiu em fazer as inscrições das professoras para o curso; apresentar a elas o espaço da Escola de Belas Artes e o prédio do curso de graduação em Teatro, que abriga também o curso de licenciatura em Dança; preparar os espaços e materiais usados durante o curso; registrar, a partir de fotografias, filmagens e relatos escritos, todo o processo de formação vivido pelas professoras; e, ainda, atuar como mediadores de todas as articulações necessárias para a efetivação do curso.

Numa via de mão dupla, a atuação dos bolsistas, nesse contexto, foi importante para o acontecimento do curso – afinal, foram colaboradores para a concretização da rotina e do funcionamento, ao longo do semestre; do mesmo modo, o curso e a vivência com as professoras da Educação Infantil foram fundamentais para que esses bolsistas, enquanto futuros professores, pudessem trocar experiências com quem já está inserido no mercado de trabalho e no cotidiano da escola regular.O curso Educação Infantil, Infâncias e Arte possibilitou às alunas-professoras uma imersão no mundo das artes, e tinha por objetivo específico:

propiciar aos profissionais da educação infantil oportunidades de ampliar o conhecimento na área da Arte: das especificidades das crianças de 0 a 3 e de 4 a 6 anos, relacionando-as às práticas pedagógicas de ensino de Arte para a educação em creches e pré-escolas e à identidade do profissional da educação infantil; das relações entre cultura, subjetividade e currículo na educação infantil; de estudos e pesquisas na área de ensino de Arte na educação infantil. [...] Propiciar aos profissionais da educação infantil oportunidades de analisar e desenvolver propostas de organização do trabalho pedagógico do ensino de Arte para creches e pré-escolas. – desenvolver a sensibilidade estética para o trabalho com as artes na educação infantil; apresentar modos de apreciação artística no fruir e fazer arte com crianças; promover discussão acerca das apresentações artísticas envolvendo crianças. (SIEX, 2013; grifo nosso)

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Buscar uma sensibilização para as artes, pautada no fazer reflexivo, era fator primordial para que elas pudessem levar as várias artes para suas práticas em sala de aula. De início, para integrarem-se, já em sua inscrição no curso, apresentamos-lhes a Escola de Belas Artes e o prédio do curso de Teatro. Não apenas para situá-las do local onde iriam desfrutar de momentos de aprendizado naquele semestre, mas essa atitude já trazia em si um dizer: este é um campo de produção e reflexão artística, dentro de uma academia, sendo também, a Arte, uma área própria de conhecimento.

Nesse contato inicial com as alunas-professoras, percebemos que muitas delas entendiam a Arte partindo de um ponto de vista básico e precário, que englobava apenas as artes visuais. Elas se mostraram surpresas ao saber que o objetivo do curso era mais amplo e que iriam conhecer e estudar também outras linguagens artísticas.

O curso teve sua abertura com o módulo “Fenomenologia”, ministrado pela professora Marina Marcondes Machado. Entre os relatos levantados, o que mais se ouviu foi sobre a expectativa das recém-chegadas e a curiosidade do que estava por vir em relação ao curso. Em sua maioria, as professoras-alunas chegaram ao curso instigadas pelas novidades e preocupadas em levar para as instituições em que trabalham o conteúdo aprendido e, assim, compartilhar as experiências com as colegas de trabalho: “Minha expectativa com o curso é tentar entender e aprender a importância da arte na vida e na construção do conhecimento da criança pequena” (Amélia Cristina Mendes do valle).

As aulas iniciais foram permeadas, principalmente, por histórias de insatisfação com o regime educacional e a carência da participação efetiva dos pais na vida escolar do aluno. Assim, de um lado, estavam as professoras-alunas já dentro do cotidiano escolar que estavam aprendendo com as linguagens artísticas, reelaborando e transformando suas práticas pedagógicas, formular novos repertórios, buscando sensibilizar seus corpos a partir de uma delicadeza que é da criança pequena, se aventurando em processos criativos que valorizam o processo e não um “resultado final”, valorizando a experiência mesma do dia-a-dia da escola e das relações que surgem entre crianças e adultos se permitindo lhe dar com incertezas, fazendo disso ferramenta de auto-observação e pesquisa. Do outro lado, futuros professores, aprendizes que buscam o fortalecimento de práticas artísticas dentro da escola, que investigam um modo de aliar o fazer artístico às suas práticas pedagógicas, amenizando a fragmentação entre as áreas da docência e a da criação artística, indagando qual o lugar que cada linguagem quer ocupar e como. A convivência entre bolsistas e professoras da Educação Infantil abriu espaços para diálogos e reflexões sobre práticas pedagógicas, realidade escolar e seus múltiplos contextos, regras institucionais, “choque entre realidades” e, sobretudo, para a reflexão desafiante sobre: que professores queremos ser?

Em seguida, aconteceram os módulos “Linguagem corporal: Dança”, ministrada pelas professoras Ana Cristina Carvalho Pereira e Gabriela Córdova Christófaro, e “Linguagem corporal: Teatro”, também ministrada pela professora Marina

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Marcondes Machado. Ambas as linguagens pediam movimento, ação, criatividade e, acima de tudo, disposição. O fator convivência fez com que as professoras-alunas se sentissem mais soltas e confiantes. Elas criaram células coreográficas, protagonizaram cenas lúdicas e, assim, mergulharam nas sensações que o movimento corporal e intelectual criativo produz: “Se a gente elabora um conceito, o gesto surge naturalmente e foge do que é estereotipado” (Adriana Maria do Espírito Santo).

A grande questão levantada foi a dificuldade em registrar e atender à expectativa dos pais, que esperam algum produto final que seja, de preferência, visível. A cada nova linguagem inserida, iam mergulhando em experiências, descobrindo formas e narrativas e formulando novos repertórios; mais, ainda, acima de tudo, iam se (re)descobrindo e se questionando enquanto seres produtores e consumidores de arte.

A próxima linguagem artística trabalhada foi a musical, ministrada pela professora Aline Nunes Cordeiro. Nessas aulas, foi mostrado que a música na Educação Infantil não deve ser trabalhada de forma limitada. As dinâmicas propostas em sala revelaram uma diversidade de possibilidades que a música dispõe e que, muitas vezes, passam despercebidos: “A vivência está em sentir a música e não decorar” (Márcia Maria Amâncio C. Martins).

Ouvir é um exercício importante e deve ser praticado. “Fazer barulho” também faz parte: a música apresenta vários elementos que podem ser explorados para a criação de atividades diferenciadas no cotidiano escolar. As professoras-alunas aprenderam a importância de se trabalhar com um repertório diversificado de canções e ainda tiveram acesso a vários tipos de instrumentos musicais industrializados e artesanais, investigando, também, um instrumento comum a todas: o corpo. Conheceram um pouco da estrutura musical básica e se surpreenderam com as várias possibilidades de se trabalhar com a música, de forma contextualizada e intencional.

Por último, aconteceu o módulo da “Linguagem visual: artes plásticas”, com a professora Rosvita Kolb Bernardes. Entre os relatos, os assuntos mais pautados foram a falta de espaço adequado para a realização das atividades artísticas e o aproveitamento de materiais diversos:

você pode pegar materiais que não parecem interessantes e usar. O educador infantil tem que pesquisar muito sobre isso. você descobre utilidade para tudo que você quiser. Eu já trabalhei em creche muito pobre que não tinha material. Foi aí que minha criatividade veio à tona, porque eu fui buscar onde não tinha. (Denise Lúcia Madeira Antunes)

Ao longo das práticas vivenciadas, as alunas se depararam com uma multiplicidade de alternativas para dialogar com as artes plásticas que vão muito além do colorir, recortar e colar os desenhos, prática muitas vezes cristalizada nas instituições. Esses exercícios fazem parte da formação do aluno, mas, se praticados de forma fundamentada, os resultados serão um tanto mais satisfatórios. As professoras-

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alunas se viram incentivadas a experimentar e ousar em relação às formas de usar objetos, sejam eles quais forem. Além disso, exploraram mecanismos de iluminação e projeção de imagens.

Foram, então, dentro de suas possibilidades, construindo e, principalmente, desconstruindo sua relação com as linguagens artísticas. E, para isso, várias de suas práticas em sala de aula foram problematizadas, sendo convidadas, como diz Ostetto (2008), a (re)pensar sobre seus automatismos pedagógicos:

Do ato quase corriqueiro, na educação infantil, de oferecer uma folha em branco para as crianças desenharem, revistas para recortarem ou rasgarem, massinha para modelarem, tinta para pintarem, e ao final, guardar o que foi feito na pasta de trabalhinhos; de ler histórias para depois fazer atividades; de ensaiar uma dancinha, ou teatrinho, para apresentação aos pais, de confeccionar lembrancinhas para datas comemorativas. (OSTETTO, 2008, p. 24)

Dessa forma, foram se envolvendo, corporalmente, em sua plenitude, em práticas das linguagens artísticas, e, com isso, puderam refletir, teorizar e discutir suas práticas pedagógicas. Um fator de grande importância vivenciado no curso foi a imersão corporal, o aguçamento da sensibilidade pessoal, para que, depois, pudessem (re)transformar sua prática pedagógica com as crianças pequenas.

Depararam-se também com alguns desafios. Para que essas professoras pudessem levar para suas crianças pequenas o caos criativo, a potência de cada linguagem, era preciso que elas mesmas se disponibilizassem a entrar nesse campo. Percebemos que esse exercício não foi fácil e gerou minimamente uma reflexão de suas práticas, de sua formação e mesmo de seus objetivos enquanto ser humano e enquanto educadoras, e um entendimento, ou não, da importância da experiência artística na Educação Infantil.

Em seus trajetos, desenvolveram criações e dizeres acerca do corpo, de um quem sou eu, para onde dirigiu o olhar, o que observou e o que chamou a sua atenção, acreditando em si mesmas, em suas potências criadoras e imaginativas, proporcionando, assim, um desenvolvimento pessoal, uma imersão na experiência. vivendo um processo de aprendizagem artística, um mergulho no campo das artes.É importante lembrar que estamos relatando, até então, de uma forma mais generalista, o que observamos enquanto espectadores privilegiados e imersos nesse percurso feito pelas 42 professoras de UMEIs e Creches Conveniadas de Belo Horizonte. Claramente, o processo de cada uma foi único, os tempos de apropriação se deram ou ainda irão se dar em momentos singulares. Mas, de maneira geral, pudemos perceber que a experiência perpassada em seus corpos já refletia em seus dizeres. E que se chocavam, também, com as “realidades” múltiplas de cada ambiente de trabalho, com regras institucionais, com práxis imutáveis do ponto de vista do correto, normal e cotidiano. Afinal, às práticas artísticas soma-se uma pitada de ousadia, “anormalidade” e quebra de paradigmas, não sendo muito diferente em sala de aula. Como adentrar esse universo dialogando, então, com essa rotina instaurada?

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De certo, ao final do curso, compreendemos que as respostas às perguntas que surgem no cotidiano escolar não estão somente nas palavras, mas também nos gestos, nas cores e nos sons – no conhecimento sinestésico. Para aprender, foi preciso ouvir o corpo, dizer com o movimento, ver as ideias, experimentar, se permitir, sentir. Porque, nas artes, se não sentir, não faz sentido.

Os desdobramentos dessa experiência vivida por bolsistas, futuros professores e professoras, já com experiência dentro da escola, fez fomentar a investigação da formação do professor-artista inserido no campo de trabalho, e desafiar, a partir de um olhar voltado para si próprio, quais narrativas e práticas pedagógicas o professor se arrisca a ter.

Não sabemos ao certo quais as transformações ocorreram em cada professora; nem qual será a reverberação desse curso dentro das salas de aula das creches conveniadas e UMEIs de Belo Horizonte, mas, nos momentos finais do curso, quando elas organizaram e expuseram seus trabalhos de conclusão, pudemos perceber algo que havia se transformado, mesmo que sutilmente, em alguns casos. Conceitos foram ampliados, criatividade aguçada, sensibilidade à flor da pele, a tentativa de dilatar as fronteiras das artes, indo numa direção que leva além da busca por resultados, rumo à descoberta e valorização do fazer, da experiência artística que produz conhecimentos, inquietações e transformações. O que sabemos é que, hoje, existem 42 pessoas, mulheres, professoras sensíveis espalhadas pela cidade e dispostas a dividir com colegas de trabalho e alunos as experiências vividas dentro das paredes da Escola de Belas Artes da UFMG, e isso vale muito a pena.

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REFERênCIas

OSTETTO, Luciana Esmeralda. Educação Infantil, arte e criação: ensaios para transver o mundo. Conferência para Educadores da Rede Municipal de Educação Infantil – SME/ Florianópolis, 11 de Agosto de 2008.

SIEX/PROEX/UFMG – Sistema de Informação da Extensão. 2013. Curso de Formação Continuada de Profissionais: Educação Infantil, Infâncias e Arte. Descrição; Objetivos específicos. Disponível em: <https://sistemas.ufmg.br/siex/AuditarCurso.do?id=20528>. Acesso em dez., 2013.

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tornar VisÌVel Quando se aprende o Que a arte tem pra ensinar no contexto da Formação do proFessor da educação inFantil

Nathalia de Souza Ridolfi

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Curso Educação Infantil

tornar VisÌVel Quando se aprende o Que a arte tem pra ensinar no contexto da Formação

do proFessor da educação inFantil

O desenvolvimento tecnológico trouxe para o dia-a-dia da sociedade as tecnologias de informação, como o computador, o acesso a internet, o data show, a câmera fotográfica e a filmadora. Aliado a isso a prática de registrar vem acompanhando a humanidade desde as pinturas rupestres e a escrita cuneiforme até os grafites em muros e as diversas formas de comunicação em rede, ou as ciberculturas. Seja através da escrita, do desenho, da imagem ou da escultura, registrar sobre pensamentos, experiências ou sobre a própria realidade da qual participa é uma ação inerente do ser humano, maneira pela qual a história da humanidade vai sendo reconstruída.

Na mesma direção, a educação por longas datas tem utilizado distintas formas de se registrar as experiências educativas. Na maioria das vezes este registro teve um caráter burocrático onde o foco é no resultado, em posses prontas e momentos selecionados, não espontâneos e que acontecem esporadicamente.

Diferentemente, o curso Infâncias e Arte priorizou o registro das alunas durante suas experiências do ato de aprender. Um registro não burocrático que valorizou as experiências e a sensibilidade dos gestos, os movimentos e as expressões das professoras cursistas. O registro que destacamos aqui é aquele que visa às experiências, as descobertas, o processo completo da aprendizagem, muito diferente do registro burocrático onde o foco é no resultado, em posses prontas e momentos selecionados.

Esta escolha fundamenta-se numa concepção da "abordagem da documentação pedagógica" de Loris Malaguzzi na Educação Infantil. Hoyuelos nos dá algumas pistas sobre o que é documentar fotograficamente no contexto da educação infantil para Malaguzzi:

o grande valor a experiência, de atuar, de pensar, da investigação e de aprender das crianças. Como se apropriam do novo, do cognitivo, como organizam sua curiosidade, como constroem sentimentos, seus pontos de vista, como colocam a prova suas energias, sua vitalidade, como satisfazem seus desejos, necessidades, como estabelecem relações e intercâmbios, como chegam a interpretar o mundo dos coetâneos, dos adultos e das coisas. A documentação fotográfica pode revelar todas essas questões através dos rostos, dos olhos, da boca, dos gestos, das posturas, dos pequenos sinais que são as espias dos sentimentos, das tensões, dos esforços, do prazer, do desejo, das expectativas. (HOYUELOS, 2006 p.200)

Em consonância com a proposta de registro de Loris Malaguzzi, no curso Educação Infantil, Infâncias e Arte optou-se por sistematizar o registro de todos os seus momentos através de fotografias e vídeos levantando, durante seis meses, resultando num acervo de:

•4.810fotos;•17h47min21segdevídeos.

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Para obter esse material durante as aulas práticas e teóricas, seminários e momentos de fruição, dois ou três estagiários acompanhavam a turma munidos cada um com uma filmadora ou com a câmera fotográfica e ao final de cada aula esse equipamento era recolhido para gravação e organização dos dados. Sistematicamente, fotos e vídeos eram salvos em disco rígido, organizados em pastas separadas, cada uma dessas pastas possuía outras que indicavam as disciplinas, e em cada pasta da disciplina as fotos e vídeos eram organizados de acordo com a aula, nomeadas de: aula 1, aula 2, aula 3, aula 4 e momento fruição.

É importante destacar que o registro em vídeo, onde se tem uma sucessão de imagens com impressão de movimento, foi uma escolha eficaz para registro, pois valorizou um dos aspectos importantes do curso que foram as aulas práticas. Capturar os movimentos das alunas consolidou a questão da corporeidade amplamente discutida nas aulas. Nesta concepção a aprendizagem tem um registro corporal, pois "não existe internalização da aprendizagem sem corporalização. O corpo é entendido aqui como referência de toda aprendizagem e mediador dos processos cognitivos". (PEREIRA, 2009, p. 71)

O registro realizado possibilitou maior visibilidade do processo ensino-aprendizagem durante todo o período de realização do curso, possibilitando que fotos e vídeos fossem utilizados posteriormente como instrumento auxiliar no processo de avaliação do curso e das professoras cursistas, como também para construção da memória através da confecção de portfólio e de um blog1, este último, criado com o objetivo de divulgar o curso e estabelecer um canal permanente de comunicação com equipe pedagógica, professoras cursistas e ex-alunos.

Registrar através de fotos e vídeos no curso Infâncias e Arte constituiu um processo formativo, tanto para quem registrava in loco - na sala de aula, quanto para quem sistematizava e selecionava o material. O que significa duas visões distintas: uma da pessoa que acompanhou ao vivo as aulas fotografando e ou filmando, outra de quem acompanhava as aulas pelos registros e assim, os organizava e selecionava. As duas visões são importantes na constituição do registro. Sem prejuízo em relação a pessoa que registra em sala de aula, quem organiza o material tem uma noção maior do todo como também desenvolve uma percepção, sensível e voltada para a ideia de registro como processo educativo.

Outro aspecto importante é que todas as alunas receberam, ao final do curso, todo o acervo de fotos. Desta maneira, estávamos oferecendo as alunas cursistas a possibilidade de utilizar este registro para refletirem sobre o seu processo de aprendizagem durante todo o Curso Educação Infantil, Infâncias e Arte. Acreditamos que esse modo de se fazer e pensar o registro também influenciou as alunas cursistas a refletirem sobre suas próprias práticas de registro durante suas aulas nas UMEIs (Unidades Municipais de Educação Infantil) ou creches conveniadas. O que é um resultado esperado, uma vez que fotos e vídeos foram utilizados no curso como ferramentas importantes no processo educativo e aproveitadas de maneira consciente podem TORNAR vISÌvEL o processo de aprendizagem em ARTE no contexto da EDUCAÇÃO INFANTIL.

1 http://infanciasearte.blogspot.com.br/

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Curso Educação Infantil

REFERênCIas

HOYUELOS, Alfredo. La estética em el pensamiento y obra pedagógica de Loris Malaguzzi Barcelona: Octaedro, 2006.

PEREIRA, Ana Cristina C. A linguagem Corporal. In: BELO HORIZONTE. Proposições Curriculares da Educação Infantil da Rede Municipal de Educação Infantil e Creches Conveniadas com a PBH, 2009.

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Curso Educação Infantil

COORdEnaçãO

PROFEssOREs

Prof.ª Ana Cristina C. Pereira Prof. Ricardo C. de Figueiredo

Prof.ª Aline Nunes Carneiro Prof.ª Ana Cristina C. Pereira

Prof.ª Gabriela C. Christófaro

Prof.ª Marina Marcondes Machado

Rosvita Kolb Bernardes

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EstagIÁRIOs

Nathalia Ridolfi, Rafaela Kênia Alves da Silva, Mariana Silva, Flaviane Lopes, Marlaina Fernandez Roriz, vânia Pereira Silvério, Bruno Pontes

Jéssica Luiza Borges Sarah villar Lignani

EstagIÁRIas VOluntÁRIas

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Curso Educação Infantil

PROFEssOREs

Profa. Aline nunes CordeiroOrientadora de Estágio Curricular Supervisionado. Responsável e Orientadora do Projeto de Extensão – Programa Escola Integrada – PEI, pela Agência de Estudos e Práticas Pedagógicas – AGESPPE. Orientadora de Trabalhos de Conclusão de Curso – TCC. Disciplinas Ministradas: Práticas Pedagógicas – Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental; Práticas Pedagógicas em Espaços Não-Escolares; Fundamentos da Educação Musical; Tópicos em Arte e Educação; Tópicos em Educação e Linguagem; Teorias e Psicologia da Aprendizagem; Metodologia da Educação Musical, Práticas Pedagógicas e Musicais – Educação Infantil. Membro da Comissão de Reforma Curricular. Coordenadora Pedagógica Musical do Estágio Curricular Supervisionado.

Profa. Ana Cristina Carvalho PereiraProfessora Adjunta do curso de Licenciatura em Dança e do Programa de Pós Graduação em Artes, ambos da Escola de Belas Artes/UFMG. Bailarina e maitre de dança. Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário de Belo Horizonte Uni-BH, mestre em Educação Tecnológica (Linguagem e Cognição) pelo CEFET/MG e doutora pela UFMG, com foco em Processamento da Linguagem (gesto e cognição). É membro da Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas – ABRACE, membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Infantil e Infância (NEPEI/FaE/UFMG) e assessora das Proposições Curriculares da Educação Infantil da Prefeitura de Belo Horizonte. Coordena os projetos de Extensão Linguagem Corporal na Educação Infantil e Profissionalização da Dança e o Laboratório GESTOLab (http://dancaufmg.wix.com/gestolab).

Profa. Marina Marcondes MachadoProfessora Adjunta no curso de Teatro da Escola de Belas Artes/UFMG; pesquisadora das relações entre infância e cena contemporânea, artista-professora, escritora e formadora de professores de teatro. Mestre em Artes pela ECA/USP e doutora em Psicologia da Educação pela PUC/SP, com pós-doutorado em Pedagogia do Teatro, é autora de quatro livros sobre infância, arte e cotidiano. Mantém, desde 2011, o site-blog <www.agachamento.com>.

Profa. Mônica Correia BaptistaDoutora em Educação, pela Universidade Autônoma de Barcelona (2008). É professora da Faculdade de Educação da UFMG. Sua área de interesse no campo da pesquisa, do ensino e da extensão universitária relaciona política, infância e linguagem escrita. Para isso, dedica-se ao estudo das práticas pedagógicas desenvolvidas em instituições de educação infantil e das ações e projetos que constituem as políticas públicas para a primeira infância relacionadas ao ensino e à aprendizagem da leitura e da escrita. Coordena a linha de pesquisa Educação Infantil do mestrado profissional PROMESTRE - da Faculdade de Educação da UFMG. Coordena o Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Infantil e Infância (NEPEI/FaE/UFMG) e o Fórum Mineiro de Educação Infantil (FMEI). É conselheira do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte, como representante titular da UFMG.

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Profa. Gabriela Córdova ChristófaroArtista, professora e pesquisadora de dança. Mestre em Artes e bacharel em Artes Cênicas pela Escola de Belas Artes – EBA, da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Professora do Curso de Graduação Licenciatura em Dança da EBA – UFMG. Coordenadora da área de Dança do PIBID/FAE/UFMG.

Prof. ricardo Carvalho de FigueiredoÉ professor do curso de Graduação em Teatro da Escola de Belas Artes/UFMG, onde atua no campo da Pedagogia do Teatro. Desenvolve projetos de pesquisa e extensão universitárias com formação de professores (inicial e continuada), formação de espectadores e ensino de teatro na escola e na educação não-formal. É coordenador do PIBID Teatro na FaE/UFMG, e coordenador do projeto “Teatro-Educação: experimentos teatrais na Educação Infantil”, desde 2010.

Profa. rosvita Kolb BernardesPossui Licenciatura em Desenho e Plástica pelo Centro Universitário Feevale, Especialização em Arte-Educação pela USP e Mestrado em Educação (Currículo) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Leciona Arte no Ensino Fundamental, desde 1978. Atualmente, é professora da Escola Balão vermelho e professora efetiva da Escola Guignard da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), onde leciona para cursos de graduação e pós-graduação. Foi professora do curso de Estilismo e Moda da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Tem experiência na área de Ensino de Arte, com ênfase em Educação Artística e formação de professores.

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Curso Educação Infantil

EstagIÁRIOs

Marlaina Fernandes rorizLicenciada e Bacharel em Dança, pela Universidade Federal de viçosa (2010). Desde agosto de 2012, é aluna do Programa de Pós-Graduação em Artes na Escola de Belas Artes, pela Universidade Federal de Minas Gerais, com ênfase em Ensino de Arte. Faz parte da equipe do projeto de extensão Linguagem Corporal na Educação Infantil: Capacitação de Educadores da Rede Municipal de BH numa perspectiva Teórico-Prática, o qual atua em UMEI´s de Belo Horizonte. É bolsista de pesquisa no Curso Educação Infantil, Infâncias e Arte, cujo objetivo é ampliar o conhecimento na área de Arte e propiciar aos professores da Rede Municipal da Educação Infantil de Belo Horizonte oportunidades de ampliar e vivenciar propostas de organização do trabalho pedagógico do Ensino de Arte. Atua também como professora de Ballet Clássico em cursos livres.

nathalia de souza ridolfiGraduanda em Dança na Universidade Federal de Minas Gerais, integrante da equipe do projeto de extensão Linguagem Corporal na Educação Infantil: Capacitação de Educadores da Rede Municipal de BH numa perspectiva Teórico-Prática, o qual atua em UMEI´s de Belo Horizonte. Enquanto bolsista dedicou-se a criação do blog do curso Educação Infantil Infâncias e Arte.

Bruno PontesGraduou-se em Licenciatura em Teatro pela Universidade Federal de Minas Gerais. Atualmente cursa o mestrado em Educação da UFMG, pela linha de pesquisa "Educação, Cultura, Movimentos Sociais e Ações Coletivas", onde pesquisa o ensino de Teatro na Educação Infantil.

Flaviane Angélica lopes de OliveiraArtista da Dança e Circense, atualmente estudante do curso de Licenciatura em Dança pela UFMG, integrante do grupo de Dança Contemporânea “Entrecorpos” e da “Companhia Circulantes” de pesquisa e criação em circo-teatro, desenvolve também trabalhos solos e em parceria com outros artistas além de pesquisa em práticas de educação somática. É arte-educadora desde 2008, tem atuado em escolas da rede pública de ensino em Belo Horizonte pelo Pibid-UFMG e através do programa escola integrada. Atua como instrutora de oficinas de dança, iniciação as artes circenses, consciência corporal e noções sobre figurino.

Mariana silva Gomes Graduanda em Dança na Universidade Federal de Minas Gerais. Enquanto bolsista, dedicou-se à função de registro e memória da trajetória do curso Educação Infantil Infâncias e Arte. Professora, bailarina e coreógrafa, com experiência em Dança do ventre foca seu aprendizado no Flamenco – Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade - e compõe a equipe de uma das escolas pioneiras de Dança Flamenca no estado de Minas Gerais.

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rafaela Kênia Atualmente, frequenta a graduação em Teatro na Universidade Federal de Minas Gerais. Iniciou a sua formação na Escola Técnica Teatro Universitário da UFMG em 2004, formando-se em 2006. Integra o Grupo Caixa quatro de Bonecos desde 2003. Integra o Grupo Teatro Público desde 2011 e atua nos projetos Circulação "Naquele Bairro Encantado" aprovado pela Lei Municipal de Cultura de Belo Horizonte, dirigido pelo diretor Rogério Lopes e "Saudade" aprovado pela Lei Municipal de Cultura de Belo Horizonte, direção coletiva.

Vânia Pereira silvérioLicenciada em Teatro pela Universidade Federal de Minas Gerais é professora e pesquisadora do ensino de Teatro. Pesquisa a utilização de Memórias como mote para expressão teatral e aulas como Atos Performativos. Atua como atriz - intérprete no Grupo Rosa dos ventos e como atriz e produtora no Mamãe Tá na Platéia Coletivo de Teatro.

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