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Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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Cursos de Especializaccedilatildeo para o quadro do Magisteacuterio da SEESPEnsino Fundamental II e Ensino Meacutedio

Rede Satildeo Paulo de

Filosofia Geral e Problemas Metafiacutesicosd01

Rede Satildeo Paulo de

Cursos de Especializaccedilatildeo para o quadro do Magisteacuterio da SEESP

Ensino Fundamental II e Ensino Meacutedio

Satildeo Paulo

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edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01ficha sumaacuterio bibliografia TEMAS

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Sumaacuterio1 A Filosofia e a perplexidade 4

11 - A ineacutercia do haacutebito 5

12 - Preconceitos e estereoacutetipos 6

13 - Coragem e honestidade intelectuais 7

2 Os problemas filosoacuteficos 9

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia 9

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas 11

3 O problema do meacutetodo na filosofia 13

31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia 13

32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico 17

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico 22

4 Filosofia e Ensino da Filosofia 28

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica 28

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia 32

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia 33

Bibliografia 36

Ficha da Disciplina 37

sumario

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tema 1

1 A Filosofia e a perplexidadeO espantoperplexidade como origem da episteme

A primeira grande tese a ser desenvolvida e compreendida eacute a seguinte o sentimento de perplexidade de espanto sempre foi e continua sendo a origem da episteme (e em particular da Filosofia) Esse eacute o sentimento de se surpreender de se admirar com o fato de as coisas serem como satildeo ou ocorrerem como ocorrem e de se perguntar por que seraacute que elas satildeo assim e natildeo de outro modo e ocorrem do modo como ocorrem e natildeo de outro Um exemplo eacute por que seraacute que o vidro eacute transparente e natildeo opaco como a madeira ou o tijolo Por que razatildeo ele quebra com facilidade ao inveacutes de ser mais resistente como outros materiais

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11 - A ineacutercia do haacutebito

No dia-a-dia natildeo temos muita ocasiatildeo de experimentar esse sentimento e isso por forccedila de alguns fatores que bloqueiam sua emergecircncia Satildeo eles o haacutebito o costume os preconceitos os estereoacutetipos o apego agraves ideacuteias recebidas e o receio de questionar coisas aceitas Em contraste com isso podemos discernir sobre as condiccedilotildees que favorecem que promovem o apareci-mento desse sentimento bem-vindo Elas satildeo descritas abaixo

Natildeo se deixar dominar pela ineacutercia do haacutebito O haacutebito embora seja em geral uma coisa van-tajosa pois sem ele teriacuteamos que estar sempre reaprendendo as coisas e as habilidades tem o inconveniente de gerar uma impressatildeo falsa de conhecimento Para neutralizar esse inconve-niente eacute preciso vencer a tendecircncia para se comportar segundo a ineacutercia do haacutebito do cos-tume Suponha que eu saiba que a lacircmpada do meu quarto estaacute queimada Mesmo sabendo o haacutebito me faz agir mecanicamente e faz com que ao entrar no quarto eu acione de um modo maquinal o interruptor de luz O problema eacute que essa accedilatildeo maquinal se daacute tambeacutem e muito frequumlentemente em nossa conduta intelectual Todos noacutes temos essa tendecircncia a agir fiacutesica e intelectualmente em conformidade com o haacutebito

Portanto uma primeira condiccedilatildeo para trilhar o caminho da episteme portanto da Filosofia eacute procurar desvencilhar-se da ineacutercia do haacutebito Somente vencendo a ineacutercia do haacutebito podemos fazer uma pergunta sobre determinado objeto como se estiveacutessemos vendo-o pela primeira vez Por exemplo noacutes estamos habituados a ver a chama sem fazer muitas perguntas porque a chama eacute algo que vemos e com que convivemos desde crianccedila Mas no momento em que olhamos a chama com espiacuterito investigador passamos a contemplaacute-la com outros olhos e isso nos leva a refletir sobre ela a nos perguntar por que ela queima ao inveacutes por exemplo de pro-vocar coacutecegas a priori a chama poderia provocar coacutecegas ou acariciar mas a experiecircncia nos mostra que ela queima o que entatildeo nos leva a perguntar pela razatildeo desse calor que queima O espiacuterito investigador do cientista e do filoacutesofo se liberta do habitual do costumeiro e desse modo consegue olhar para o objeto como se estivesse vendo-o pela primeira vez e se pergunta que coisa eacute essa de onde vem por que eacute assim e natildeo de outro modo

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tema 2

12 - Preconceitos e estereoacutetipos

Coragem e honestidade intelectual Este eacute um segundo elemento propiacutecio a gerar o senti-mento de perplexidade Eacute uma predisposiccedilatildeo e uma coragem de nos desprendermos de nossas opiniotildees quando suspeitamos que estas possam natildeo ser corretas Assim como vencer a ineacutercia do haacutebito natildeo eacute faacutecil tambeacutem natildeo eacute faacutecil admitir que estamos enganados Natildeo eacute faacutecil admitir que nossa opiniatildeo agraves vezes arraigada natildeo tem o fundamento que pensaacutevamos que tivesse

Por que isso eacute difiacutecil O que faz de noacutes o que somos eacute um conjunto de vaacuterias coisas heranccedila geneacutetica heranccedila cultural e as crenccedilas que temos sejam elas factuais ou valorativas tudo isso eacute parte do que somos ou seja uma boa parte do que somos estaacute nas crenccedilas mais fortes e mais permanentes que temos Elas formam nossa identidade pessoal nossa identidade psiacutequica e social Assim sendo abandonar essas crenccedilas ou algumas delas significa abdicar um pouco da nossa identidade pessoal da pessoa que somos Daiacute a dificuldade de romper com elas Re-conhecer que estamos errados que nossas crenccedilas natildeo tecircm bom fundamento significa renun-ciarmos agrave parte de nossa identidade Questionar e rever crenccedilas religiosas ideologia poliacutetica ideaacuterio profissional etc eacute algo gerador de crise de identidade Desse modo compreende-se que seja difiacutecil para algueacutem abandonar suas crenccedilas mais fortes

No entanto eacute necessaacuterio ter essa predisposiccedilatildeo de admitir que podemos estar errados que nossas crenccedilas podem natildeo ter fundamento que aquilo em que acreditaacutevamos eacute ao contraacuterio do que pensaacutevamos bem discutiacutevel ou mesmo falso Um bom nome para essa predisposiccedilatildeo eacute coragem intelectual De fato a coragem eacute muitas vezes necessaacuteria para reconhecer-se perante os outros e perante si proacuteprio como (redondamente) equivocados Com efeito o que vem a ser essa coisa que chamamos genericamente de coragem Podemos dizer que ela consiste na predisposiccedilatildeo para enfrentar resolutamente uma realidade adversa ou perigosa de qualquer natureza que ela seja em vez de fugir dela Podemos dizer entatildeo que a coragem intelectual eacute a disposiccedilatildeo de admitir para si mesmo a forccedila de evidecircncias contraacuterias agraves proacuteprias crenccedilas o que eacute agraves vezes difiacutecil Eacute preciso coragem para admitir erros agraves vezes erros sobre todo um con-junto de crenccedilas nossas Por que eacute preciso coragem Porque admiti-los ndash no interior de uma comunidade de interessados composta por colegas eou estranhos ndash eacute numa situaccedilatildeo puacuteblica declarar-se errado e agraves vezes redondamente errado ora uma confissatildeo mais ou menos puacuteblica de erros importantes embora tenha seu lado meritoacuterio eacute tambeacutem em diferentes graus sempre penosa e diminuidora do auto-conceito

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13 - Coragem e honestidade intelectuais

Predisposiccedilatildeo para se livrar de preconceitos e estereoacutetipos O preconceito seja ele racial sexual religioso esteacutetico ou filosoacutefico eacute uma opiniatildeo que carece de fundamento Eacute um julgamento sem base na realidade na loacutegica na experiecircncia Os preconceitos satildeo ideacuteias prontas satildeo res-postas prontas

Preconceito natildeo eacute prerrogativa de pessoas tolas de pessoas lsquoburrasrsquo ou despreparadas todos noacutes inteligentes ou natildeo honestos ou natildeo temos preconceitos Todos noacutes temos uma forte propensatildeo para uma visatildeo tendenciosa uma visatildeo unilateral de noacutes mesmos e dos grupos a que pertencemos Essa condiccedilatildeo dificulta o exerciacutecio da episteme dificulta a experiecircncia do sentimento e perplexidade porque o preconceito eacute o tipo da atitude que tem uma resposta pronta Ele eacute um inimigo insidioso porque estaacute presente em noacutes sem que muitas vezes pos-samos percebecirc-lo

O que podemos fazer para detectar o preconceito em noacutes proacuteprios Como agir para nos livrarmos da prisatildeo dos preconceitos Em primeiro lugar eacute preciso identificaacute-los

Um grupo social em que as pessoas que o integram soacute convivem entre si e evitam a con-vivecircncia com pessoas de outros grupos tende a alimentar o preconceito contra outros grupos A distacircncia fiacutesica e a ausecircncia de interaccedilatildeo com pessoas diferentes soacute faratildeo crescer o precon-ceito contra estas ao passo que a proximidade fiacutesica e a interaccedilatildeo social tenderatildeo a minimizar ou mesmo diluir tal preconceito Ter contato mais ou menos regular com grupos sociais dife-rentes do nosso eacute uma oportunidade de nos libertarmos de preconceitos e adquirir sobre esses grupos distantes ideacuteias mais corretas menos distorcidas e preconceituosas

Vamos a um exemplo ilustrativo Na ocasiatildeo da guerra dos Estados Unidos contra o Talebatilde no Afeganistatildeo uma cantora americana de 23 anos foi enviada para laacute representando um or-ganismo internacional numa visita de boa vontade agraves mulheres afegatildes Da convivecircncia com a sociedade feminina afegatilde essa representante americana extraiu experiecircncias e observaccedilotildees so-bre as mulheres e as famiacutelias afegatildes que depois veio a apresentar em depoimento na televisatildeo Foi um depoimento sincero que expressava um sentimento de identificaccedilatildeo e simpatia para com as mulheres afegatildes porque ndash dizia ela ndash no fundo e em grande parte elas satildeo em suas vidas familiares em seu amor com os filhos em seu o cuidado com a casa em sua dedicaccedilatildeo e pro-teccedilatildeo da vida conjugal muito semelhantes agraves mulheres ocidentais As mulheres afegatildes foram

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

bibliografia

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                                                                            1. Paacutegina 37 Off
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                                                                            3. Paacutegina 39
                                                                              1. Botatildeo 7
                                                                              2. Botatildeo 8
                                                                              3. Botatildeo 4
Page 2: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

Rede Satildeo Paulo de

Cursos de Especializaccedilatildeo para o quadro do Magisteacuterio da SEESP

Ensino Fundamental II e Ensino Meacutedio

Satildeo Paulo

2011

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isciplina 01ficha sumaacuterio bibliografia TEMAS

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Sumaacuterio1 A Filosofia e a perplexidade 4

11 - A ineacutercia do haacutebito 5

12 - Preconceitos e estereoacutetipos 6

13 - Coragem e honestidade intelectuais 7

2 Os problemas filosoacuteficos 9

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia 9

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas 11

3 O problema do meacutetodo na filosofia 13

31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia 13

32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico 17

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico 22

4 Filosofia e Ensino da Filosofia 28

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica 28

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia 32

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia 33

Bibliografia 36

Ficha da Disciplina 37

sumario

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tema 1

1 A Filosofia e a perplexidadeO espantoperplexidade como origem da episteme

A primeira grande tese a ser desenvolvida e compreendida eacute a seguinte o sentimento de perplexidade de espanto sempre foi e continua sendo a origem da episteme (e em particular da Filosofia) Esse eacute o sentimento de se surpreender de se admirar com o fato de as coisas serem como satildeo ou ocorrerem como ocorrem e de se perguntar por que seraacute que elas satildeo assim e natildeo de outro modo e ocorrem do modo como ocorrem e natildeo de outro Um exemplo eacute por que seraacute que o vidro eacute transparente e natildeo opaco como a madeira ou o tijolo Por que razatildeo ele quebra com facilidade ao inveacutes de ser mais resistente como outros materiais

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11 - A ineacutercia do haacutebito

No dia-a-dia natildeo temos muita ocasiatildeo de experimentar esse sentimento e isso por forccedila de alguns fatores que bloqueiam sua emergecircncia Satildeo eles o haacutebito o costume os preconceitos os estereoacutetipos o apego agraves ideacuteias recebidas e o receio de questionar coisas aceitas Em contraste com isso podemos discernir sobre as condiccedilotildees que favorecem que promovem o apareci-mento desse sentimento bem-vindo Elas satildeo descritas abaixo

Natildeo se deixar dominar pela ineacutercia do haacutebito O haacutebito embora seja em geral uma coisa van-tajosa pois sem ele teriacuteamos que estar sempre reaprendendo as coisas e as habilidades tem o inconveniente de gerar uma impressatildeo falsa de conhecimento Para neutralizar esse inconve-niente eacute preciso vencer a tendecircncia para se comportar segundo a ineacutercia do haacutebito do cos-tume Suponha que eu saiba que a lacircmpada do meu quarto estaacute queimada Mesmo sabendo o haacutebito me faz agir mecanicamente e faz com que ao entrar no quarto eu acione de um modo maquinal o interruptor de luz O problema eacute que essa accedilatildeo maquinal se daacute tambeacutem e muito frequumlentemente em nossa conduta intelectual Todos noacutes temos essa tendecircncia a agir fiacutesica e intelectualmente em conformidade com o haacutebito

Portanto uma primeira condiccedilatildeo para trilhar o caminho da episteme portanto da Filosofia eacute procurar desvencilhar-se da ineacutercia do haacutebito Somente vencendo a ineacutercia do haacutebito podemos fazer uma pergunta sobre determinado objeto como se estiveacutessemos vendo-o pela primeira vez Por exemplo noacutes estamos habituados a ver a chama sem fazer muitas perguntas porque a chama eacute algo que vemos e com que convivemos desde crianccedila Mas no momento em que olhamos a chama com espiacuterito investigador passamos a contemplaacute-la com outros olhos e isso nos leva a refletir sobre ela a nos perguntar por que ela queima ao inveacutes por exemplo de pro-vocar coacutecegas a priori a chama poderia provocar coacutecegas ou acariciar mas a experiecircncia nos mostra que ela queima o que entatildeo nos leva a perguntar pela razatildeo desse calor que queima O espiacuterito investigador do cientista e do filoacutesofo se liberta do habitual do costumeiro e desse modo consegue olhar para o objeto como se estivesse vendo-o pela primeira vez e se pergunta que coisa eacute essa de onde vem por que eacute assim e natildeo de outro modo

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tema 2

12 - Preconceitos e estereoacutetipos

Coragem e honestidade intelectual Este eacute um segundo elemento propiacutecio a gerar o senti-mento de perplexidade Eacute uma predisposiccedilatildeo e uma coragem de nos desprendermos de nossas opiniotildees quando suspeitamos que estas possam natildeo ser corretas Assim como vencer a ineacutercia do haacutebito natildeo eacute faacutecil tambeacutem natildeo eacute faacutecil admitir que estamos enganados Natildeo eacute faacutecil admitir que nossa opiniatildeo agraves vezes arraigada natildeo tem o fundamento que pensaacutevamos que tivesse

Por que isso eacute difiacutecil O que faz de noacutes o que somos eacute um conjunto de vaacuterias coisas heranccedila geneacutetica heranccedila cultural e as crenccedilas que temos sejam elas factuais ou valorativas tudo isso eacute parte do que somos ou seja uma boa parte do que somos estaacute nas crenccedilas mais fortes e mais permanentes que temos Elas formam nossa identidade pessoal nossa identidade psiacutequica e social Assim sendo abandonar essas crenccedilas ou algumas delas significa abdicar um pouco da nossa identidade pessoal da pessoa que somos Daiacute a dificuldade de romper com elas Re-conhecer que estamos errados que nossas crenccedilas natildeo tecircm bom fundamento significa renun-ciarmos agrave parte de nossa identidade Questionar e rever crenccedilas religiosas ideologia poliacutetica ideaacuterio profissional etc eacute algo gerador de crise de identidade Desse modo compreende-se que seja difiacutecil para algueacutem abandonar suas crenccedilas mais fortes

No entanto eacute necessaacuterio ter essa predisposiccedilatildeo de admitir que podemos estar errados que nossas crenccedilas podem natildeo ter fundamento que aquilo em que acreditaacutevamos eacute ao contraacuterio do que pensaacutevamos bem discutiacutevel ou mesmo falso Um bom nome para essa predisposiccedilatildeo eacute coragem intelectual De fato a coragem eacute muitas vezes necessaacuteria para reconhecer-se perante os outros e perante si proacuteprio como (redondamente) equivocados Com efeito o que vem a ser essa coisa que chamamos genericamente de coragem Podemos dizer que ela consiste na predisposiccedilatildeo para enfrentar resolutamente uma realidade adversa ou perigosa de qualquer natureza que ela seja em vez de fugir dela Podemos dizer entatildeo que a coragem intelectual eacute a disposiccedilatildeo de admitir para si mesmo a forccedila de evidecircncias contraacuterias agraves proacuteprias crenccedilas o que eacute agraves vezes difiacutecil Eacute preciso coragem para admitir erros agraves vezes erros sobre todo um con-junto de crenccedilas nossas Por que eacute preciso coragem Porque admiti-los ndash no interior de uma comunidade de interessados composta por colegas eou estranhos ndash eacute numa situaccedilatildeo puacuteblica declarar-se errado e agraves vezes redondamente errado ora uma confissatildeo mais ou menos puacuteblica de erros importantes embora tenha seu lado meritoacuterio eacute tambeacutem em diferentes graus sempre penosa e diminuidora do auto-conceito

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13 - Coragem e honestidade intelectuais

Predisposiccedilatildeo para se livrar de preconceitos e estereoacutetipos O preconceito seja ele racial sexual religioso esteacutetico ou filosoacutefico eacute uma opiniatildeo que carece de fundamento Eacute um julgamento sem base na realidade na loacutegica na experiecircncia Os preconceitos satildeo ideacuteias prontas satildeo res-postas prontas

Preconceito natildeo eacute prerrogativa de pessoas tolas de pessoas lsquoburrasrsquo ou despreparadas todos noacutes inteligentes ou natildeo honestos ou natildeo temos preconceitos Todos noacutes temos uma forte propensatildeo para uma visatildeo tendenciosa uma visatildeo unilateral de noacutes mesmos e dos grupos a que pertencemos Essa condiccedilatildeo dificulta o exerciacutecio da episteme dificulta a experiecircncia do sentimento e perplexidade porque o preconceito eacute o tipo da atitude que tem uma resposta pronta Ele eacute um inimigo insidioso porque estaacute presente em noacutes sem que muitas vezes pos-samos percebecirc-lo

O que podemos fazer para detectar o preconceito em noacutes proacuteprios Como agir para nos livrarmos da prisatildeo dos preconceitos Em primeiro lugar eacute preciso identificaacute-los

Um grupo social em que as pessoas que o integram soacute convivem entre si e evitam a con-vivecircncia com pessoas de outros grupos tende a alimentar o preconceito contra outros grupos A distacircncia fiacutesica e a ausecircncia de interaccedilatildeo com pessoas diferentes soacute faratildeo crescer o precon-ceito contra estas ao passo que a proximidade fiacutesica e a interaccedilatildeo social tenderatildeo a minimizar ou mesmo diluir tal preconceito Ter contato mais ou menos regular com grupos sociais dife-rentes do nosso eacute uma oportunidade de nos libertarmos de preconceitos e adquirir sobre esses grupos distantes ideacuteias mais corretas menos distorcidas e preconceituosas

Vamos a um exemplo ilustrativo Na ocasiatildeo da guerra dos Estados Unidos contra o Talebatilde no Afeganistatildeo uma cantora americana de 23 anos foi enviada para laacute representando um or-ganismo internacional numa visita de boa vontade agraves mulheres afegatildes Da convivecircncia com a sociedade feminina afegatilde essa representante americana extraiu experiecircncias e observaccedilotildees so-bre as mulheres e as famiacutelias afegatildes que depois veio a apresentar em depoimento na televisatildeo Foi um depoimento sincero que expressava um sentimento de identificaccedilatildeo e simpatia para com as mulheres afegatildes porque ndash dizia ela ndash no fundo e em grande parte elas satildeo em suas vidas familiares em seu amor com os filhos em seu o cuidado com a casa em sua dedicaccedilatildeo e pro-teccedilatildeo da vida conjugal muito semelhantes agraves mulheres ocidentais As mulheres afegatildes foram

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

tema2

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

tema3

31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

bibliografia

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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Page 3: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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isciplina 01ficha sumaacuterio bibliografia TEMAS

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Sumaacuterio1 A Filosofia e a perplexidade 4

11 - A ineacutercia do haacutebito 5

12 - Preconceitos e estereoacutetipos 6

13 - Coragem e honestidade intelectuais 7

2 Os problemas filosoacuteficos 9

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia 9

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas 11

3 O problema do meacutetodo na filosofia 13

31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia 13

32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico 17

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico 22

4 Filosofia e Ensino da Filosofia 28

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica 28

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia 32

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia 33

Bibliografia 36

Ficha da Disciplina 37

sumario

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isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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tema 1

1 A Filosofia e a perplexidadeO espantoperplexidade como origem da episteme

A primeira grande tese a ser desenvolvida e compreendida eacute a seguinte o sentimento de perplexidade de espanto sempre foi e continua sendo a origem da episteme (e em particular da Filosofia) Esse eacute o sentimento de se surpreender de se admirar com o fato de as coisas serem como satildeo ou ocorrerem como ocorrem e de se perguntar por que seraacute que elas satildeo assim e natildeo de outro modo e ocorrem do modo como ocorrem e natildeo de outro Um exemplo eacute por que seraacute que o vidro eacute transparente e natildeo opaco como a madeira ou o tijolo Por que razatildeo ele quebra com facilidade ao inveacutes de ser mais resistente como outros materiais

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11 - A ineacutercia do haacutebito

No dia-a-dia natildeo temos muita ocasiatildeo de experimentar esse sentimento e isso por forccedila de alguns fatores que bloqueiam sua emergecircncia Satildeo eles o haacutebito o costume os preconceitos os estereoacutetipos o apego agraves ideacuteias recebidas e o receio de questionar coisas aceitas Em contraste com isso podemos discernir sobre as condiccedilotildees que favorecem que promovem o apareci-mento desse sentimento bem-vindo Elas satildeo descritas abaixo

Natildeo se deixar dominar pela ineacutercia do haacutebito O haacutebito embora seja em geral uma coisa van-tajosa pois sem ele teriacuteamos que estar sempre reaprendendo as coisas e as habilidades tem o inconveniente de gerar uma impressatildeo falsa de conhecimento Para neutralizar esse inconve-niente eacute preciso vencer a tendecircncia para se comportar segundo a ineacutercia do haacutebito do cos-tume Suponha que eu saiba que a lacircmpada do meu quarto estaacute queimada Mesmo sabendo o haacutebito me faz agir mecanicamente e faz com que ao entrar no quarto eu acione de um modo maquinal o interruptor de luz O problema eacute que essa accedilatildeo maquinal se daacute tambeacutem e muito frequumlentemente em nossa conduta intelectual Todos noacutes temos essa tendecircncia a agir fiacutesica e intelectualmente em conformidade com o haacutebito

Portanto uma primeira condiccedilatildeo para trilhar o caminho da episteme portanto da Filosofia eacute procurar desvencilhar-se da ineacutercia do haacutebito Somente vencendo a ineacutercia do haacutebito podemos fazer uma pergunta sobre determinado objeto como se estiveacutessemos vendo-o pela primeira vez Por exemplo noacutes estamos habituados a ver a chama sem fazer muitas perguntas porque a chama eacute algo que vemos e com que convivemos desde crianccedila Mas no momento em que olhamos a chama com espiacuterito investigador passamos a contemplaacute-la com outros olhos e isso nos leva a refletir sobre ela a nos perguntar por que ela queima ao inveacutes por exemplo de pro-vocar coacutecegas a priori a chama poderia provocar coacutecegas ou acariciar mas a experiecircncia nos mostra que ela queima o que entatildeo nos leva a perguntar pela razatildeo desse calor que queima O espiacuterito investigador do cientista e do filoacutesofo se liberta do habitual do costumeiro e desse modo consegue olhar para o objeto como se estivesse vendo-o pela primeira vez e se pergunta que coisa eacute essa de onde vem por que eacute assim e natildeo de outro modo

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tema 2

12 - Preconceitos e estereoacutetipos

Coragem e honestidade intelectual Este eacute um segundo elemento propiacutecio a gerar o senti-mento de perplexidade Eacute uma predisposiccedilatildeo e uma coragem de nos desprendermos de nossas opiniotildees quando suspeitamos que estas possam natildeo ser corretas Assim como vencer a ineacutercia do haacutebito natildeo eacute faacutecil tambeacutem natildeo eacute faacutecil admitir que estamos enganados Natildeo eacute faacutecil admitir que nossa opiniatildeo agraves vezes arraigada natildeo tem o fundamento que pensaacutevamos que tivesse

Por que isso eacute difiacutecil O que faz de noacutes o que somos eacute um conjunto de vaacuterias coisas heranccedila geneacutetica heranccedila cultural e as crenccedilas que temos sejam elas factuais ou valorativas tudo isso eacute parte do que somos ou seja uma boa parte do que somos estaacute nas crenccedilas mais fortes e mais permanentes que temos Elas formam nossa identidade pessoal nossa identidade psiacutequica e social Assim sendo abandonar essas crenccedilas ou algumas delas significa abdicar um pouco da nossa identidade pessoal da pessoa que somos Daiacute a dificuldade de romper com elas Re-conhecer que estamos errados que nossas crenccedilas natildeo tecircm bom fundamento significa renun-ciarmos agrave parte de nossa identidade Questionar e rever crenccedilas religiosas ideologia poliacutetica ideaacuterio profissional etc eacute algo gerador de crise de identidade Desse modo compreende-se que seja difiacutecil para algueacutem abandonar suas crenccedilas mais fortes

No entanto eacute necessaacuterio ter essa predisposiccedilatildeo de admitir que podemos estar errados que nossas crenccedilas podem natildeo ter fundamento que aquilo em que acreditaacutevamos eacute ao contraacuterio do que pensaacutevamos bem discutiacutevel ou mesmo falso Um bom nome para essa predisposiccedilatildeo eacute coragem intelectual De fato a coragem eacute muitas vezes necessaacuteria para reconhecer-se perante os outros e perante si proacuteprio como (redondamente) equivocados Com efeito o que vem a ser essa coisa que chamamos genericamente de coragem Podemos dizer que ela consiste na predisposiccedilatildeo para enfrentar resolutamente uma realidade adversa ou perigosa de qualquer natureza que ela seja em vez de fugir dela Podemos dizer entatildeo que a coragem intelectual eacute a disposiccedilatildeo de admitir para si mesmo a forccedila de evidecircncias contraacuterias agraves proacuteprias crenccedilas o que eacute agraves vezes difiacutecil Eacute preciso coragem para admitir erros agraves vezes erros sobre todo um con-junto de crenccedilas nossas Por que eacute preciso coragem Porque admiti-los ndash no interior de uma comunidade de interessados composta por colegas eou estranhos ndash eacute numa situaccedilatildeo puacuteblica declarar-se errado e agraves vezes redondamente errado ora uma confissatildeo mais ou menos puacuteblica de erros importantes embora tenha seu lado meritoacuterio eacute tambeacutem em diferentes graus sempre penosa e diminuidora do auto-conceito

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13 - Coragem e honestidade intelectuais

Predisposiccedilatildeo para se livrar de preconceitos e estereoacutetipos O preconceito seja ele racial sexual religioso esteacutetico ou filosoacutefico eacute uma opiniatildeo que carece de fundamento Eacute um julgamento sem base na realidade na loacutegica na experiecircncia Os preconceitos satildeo ideacuteias prontas satildeo res-postas prontas

Preconceito natildeo eacute prerrogativa de pessoas tolas de pessoas lsquoburrasrsquo ou despreparadas todos noacutes inteligentes ou natildeo honestos ou natildeo temos preconceitos Todos noacutes temos uma forte propensatildeo para uma visatildeo tendenciosa uma visatildeo unilateral de noacutes mesmos e dos grupos a que pertencemos Essa condiccedilatildeo dificulta o exerciacutecio da episteme dificulta a experiecircncia do sentimento e perplexidade porque o preconceito eacute o tipo da atitude que tem uma resposta pronta Ele eacute um inimigo insidioso porque estaacute presente em noacutes sem que muitas vezes pos-samos percebecirc-lo

O que podemos fazer para detectar o preconceito em noacutes proacuteprios Como agir para nos livrarmos da prisatildeo dos preconceitos Em primeiro lugar eacute preciso identificaacute-los

Um grupo social em que as pessoas que o integram soacute convivem entre si e evitam a con-vivecircncia com pessoas de outros grupos tende a alimentar o preconceito contra outros grupos A distacircncia fiacutesica e a ausecircncia de interaccedilatildeo com pessoas diferentes soacute faratildeo crescer o precon-ceito contra estas ao passo que a proximidade fiacutesica e a interaccedilatildeo social tenderatildeo a minimizar ou mesmo diluir tal preconceito Ter contato mais ou menos regular com grupos sociais dife-rentes do nosso eacute uma oportunidade de nos libertarmos de preconceitos e adquirir sobre esses grupos distantes ideacuteias mais corretas menos distorcidas e preconceituosas

Vamos a um exemplo ilustrativo Na ocasiatildeo da guerra dos Estados Unidos contra o Talebatilde no Afeganistatildeo uma cantora americana de 23 anos foi enviada para laacute representando um or-ganismo internacional numa visita de boa vontade agraves mulheres afegatildes Da convivecircncia com a sociedade feminina afegatilde essa representante americana extraiu experiecircncias e observaccedilotildees so-bre as mulheres e as famiacutelias afegatildes que depois veio a apresentar em depoimento na televisatildeo Foi um depoimento sincero que expressava um sentimento de identificaccedilatildeo e simpatia para com as mulheres afegatildes porque ndash dizia ela ndash no fundo e em grande parte elas satildeo em suas vidas familiares em seu amor com os filhos em seu o cuidado com a casa em sua dedicaccedilatildeo e pro-teccedilatildeo da vida conjugal muito semelhantes agraves mulheres ocidentais As mulheres afegatildes foram

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

tema2

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

tema3

31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

bibliografia

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                                                                        3. Paacutegina 39
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                                                                            1. Paacutegina 37 Off
                                                                            2. Paacutegina 38
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                                                                              1. Botatildeo 7
                                                                              2. Botatildeo 8
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Page 4: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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tema 1

1 A Filosofia e a perplexidadeO espantoperplexidade como origem da episteme

A primeira grande tese a ser desenvolvida e compreendida eacute a seguinte o sentimento de perplexidade de espanto sempre foi e continua sendo a origem da episteme (e em particular da Filosofia) Esse eacute o sentimento de se surpreender de se admirar com o fato de as coisas serem como satildeo ou ocorrerem como ocorrem e de se perguntar por que seraacute que elas satildeo assim e natildeo de outro modo e ocorrem do modo como ocorrem e natildeo de outro Um exemplo eacute por que seraacute que o vidro eacute transparente e natildeo opaco como a madeira ou o tijolo Por que razatildeo ele quebra com facilidade ao inveacutes de ser mais resistente como outros materiais

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11 - A ineacutercia do haacutebito

No dia-a-dia natildeo temos muita ocasiatildeo de experimentar esse sentimento e isso por forccedila de alguns fatores que bloqueiam sua emergecircncia Satildeo eles o haacutebito o costume os preconceitos os estereoacutetipos o apego agraves ideacuteias recebidas e o receio de questionar coisas aceitas Em contraste com isso podemos discernir sobre as condiccedilotildees que favorecem que promovem o apareci-mento desse sentimento bem-vindo Elas satildeo descritas abaixo

Natildeo se deixar dominar pela ineacutercia do haacutebito O haacutebito embora seja em geral uma coisa van-tajosa pois sem ele teriacuteamos que estar sempre reaprendendo as coisas e as habilidades tem o inconveniente de gerar uma impressatildeo falsa de conhecimento Para neutralizar esse inconve-niente eacute preciso vencer a tendecircncia para se comportar segundo a ineacutercia do haacutebito do cos-tume Suponha que eu saiba que a lacircmpada do meu quarto estaacute queimada Mesmo sabendo o haacutebito me faz agir mecanicamente e faz com que ao entrar no quarto eu acione de um modo maquinal o interruptor de luz O problema eacute que essa accedilatildeo maquinal se daacute tambeacutem e muito frequumlentemente em nossa conduta intelectual Todos noacutes temos essa tendecircncia a agir fiacutesica e intelectualmente em conformidade com o haacutebito

Portanto uma primeira condiccedilatildeo para trilhar o caminho da episteme portanto da Filosofia eacute procurar desvencilhar-se da ineacutercia do haacutebito Somente vencendo a ineacutercia do haacutebito podemos fazer uma pergunta sobre determinado objeto como se estiveacutessemos vendo-o pela primeira vez Por exemplo noacutes estamos habituados a ver a chama sem fazer muitas perguntas porque a chama eacute algo que vemos e com que convivemos desde crianccedila Mas no momento em que olhamos a chama com espiacuterito investigador passamos a contemplaacute-la com outros olhos e isso nos leva a refletir sobre ela a nos perguntar por que ela queima ao inveacutes por exemplo de pro-vocar coacutecegas a priori a chama poderia provocar coacutecegas ou acariciar mas a experiecircncia nos mostra que ela queima o que entatildeo nos leva a perguntar pela razatildeo desse calor que queima O espiacuterito investigador do cientista e do filoacutesofo se liberta do habitual do costumeiro e desse modo consegue olhar para o objeto como se estivesse vendo-o pela primeira vez e se pergunta que coisa eacute essa de onde vem por que eacute assim e natildeo de outro modo

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tema 2

12 - Preconceitos e estereoacutetipos

Coragem e honestidade intelectual Este eacute um segundo elemento propiacutecio a gerar o senti-mento de perplexidade Eacute uma predisposiccedilatildeo e uma coragem de nos desprendermos de nossas opiniotildees quando suspeitamos que estas possam natildeo ser corretas Assim como vencer a ineacutercia do haacutebito natildeo eacute faacutecil tambeacutem natildeo eacute faacutecil admitir que estamos enganados Natildeo eacute faacutecil admitir que nossa opiniatildeo agraves vezes arraigada natildeo tem o fundamento que pensaacutevamos que tivesse

Por que isso eacute difiacutecil O que faz de noacutes o que somos eacute um conjunto de vaacuterias coisas heranccedila geneacutetica heranccedila cultural e as crenccedilas que temos sejam elas factuais ou valorativas tudo isso eacute parte do que somos ou seja uma boa parte do que somos estaacute nas crenccedilas mais fortes e mais permanentes que temos Elas formam nossa identidade pessoal nossa identidade psiacutequica e social Assim sendo abandonar essas crenccedilas ou algumas delas significa abdicar um pouco da nossa identidade pessoal da pessoa que somos Daiacute a dificuldade de romper com elas Re-conhecer que estamos errados que nossas crenccedilas natildeo tecircm bom fundamento significa renun-ciarmos agrave parte de nossa identidade Questionar e rever crenccedilas religiosas ideologia poliacutetica ideaacuterio profissional etc eacute algo gerador de crise de identidade Desse modo compreende-se que seja difiacutecil para algueacutem abandonar suas crenccedilas mais fortes

No entanto eacute necessaacuterio ter essa predisposiccedilatildeo de admitir que podemos estar errados que nossas crenccedilas podem natildeo ter fundamento que aquilo em que acreditaacutevamos eacute ao contraacuterio do que pensaacutevamos bem discutiacutevel ou mesmo falso Um bom nome para essa predisposiccedilatildeo eacute coragem intelectual De fato a coragem eacute muitas vezes necessaacuteria para reconhecer-se perante os outros e perante si proacuteprio como (redondamente) equivocados Com efeito o que vem a ser essa coisa que chamamos genericamente de coragem Podemos dizer que ela consiste na predisposiccedilatildeo para enfrentar resolutamente uma realidade adversa ou perigosa de qualquer natureza que ela seja em vez de fugir dela Podemos dizer entatildeo que a coragem intelectual eacute a disposiccedilatildeo de admitir para si mesmo a forccedila de evidecircncias contraacuterias agraves proacuteprias crenccedilas o que eacute agraves vezes difiacutecil Eacute preciso coragem para admitir erros agraves vezes erros sobre todo um con-junto de crenccedilas nossas Por que eacute preciso coragem Porque admiti-los ndash no interior de uma comunidade de interessados composta por colegas eou estranhos ndash eacute numa situaccedilatildeo puacuteblica declarar-se errado e agraves vezes redondamente errado ora uma confissatildeo mais ou menos puacuteblica de erros importantes embora tenha seu lado meritoacuterio eacute tambeacutem em diferentes graus sempre penosa e diminuidora do auto-conceito

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13 - Coragem e honestidade intelectuais

Predisposiccedilatildeo para se livrar de preconceitos e estereoacutetipos O preconceito seja ele racial sexual religioso esteacutetico ou filosoacutefico eacute uma opiniatildeo que carece de fundamento Eacute um julgamento sem base na realidade na loacutegica na experiecircncia Os preconceitos satildeo ideacuteias prontas satildeo res-postas prontas

Preconceito natildeo eacute prerrogativa de pessoas tolas de pessoas lsquoburrasrsquo ou despreparadas todos noacutes inteligentes ou natildeo honestos ou natildeo temos preconceitos Todos noacutes temos uma forte propensatildeo para uma visatildeo tendenciosa uma visatildeo unilateral de noacutes mesmos e dos grupos a que pertencemos Essa condiccedilatildeo dificulta o exerciacutecio da episteme dificulta a experiecircncia do sentimento e perplexidade porque o preconceito eacute o tipo da atitude que tem uma resposta pronta Ele eacute um inimigo insidioso porque estaacute presente em noacutes sem que muitas vezes pos-samos percebecirc-lo

O que podemos fazer para detectar o preconceito em noacutes proacuteprios Como agir para nos livrarmos da prisatildeo dos preconceitos Em primeiro lugar eacute preciso identificaacute-los

Um grupo social em que as pessoas que o integram soacute convivem entre si e evitam a con-vivecircncia com pessoas de outros grupos tende a alimentar o preconceito contra outros grupos A distacircncia fiacutesica e a ausecircncia de interaccedilatildeo com pessoas diferentes soacute faratildeo crescer o precon-ceito contra estas ao passo que a proximidade fiacutesica e a interaccedilatildeo social tenderatildeo a minimizar ou mesmo diluir tal preconceito Ter contato mais ou menos regular com grupos sociais dife-rentes do nosso eacute uma oportunidade de nos libertarmos de preconceitos e adquirir sobre esses grupos distantes ideacuteias mais corretas menos distorcidas e preconceituosas

Vamos a um exemplo ilustrativo Na ocasiatildeo da guerra dos Estados Unidos contra o Talebatilde no Afeganistatildeo uma cantora americana de 23 anos foi enviada para laacute representando um or-ganismo internacional numa visita de boa vontade agraves mulheres afegatildes Da convivecircncia com a sociedade feminina afegatilde essa representante americana extraiu experiecircncias e observaccedilotildees so-bre as mulheres e as famiacutelias afegatildes que depois veio a apresentar em depoimento na televisatildeo Foi um depoimento sincero que expressava um sentimento de identificaccedilatildeo e simpatia para com as mulheres afegatildes porque ndash dizia ela ndash no fundo e em grande parte elas satildeo em suas vidas familiares em seu amor com os filhos em seu o cuidado com a casa em sua dedicaccedilatildeo e pro-teccedilatildeo da vida conjugal muito semelhantes agraves mulheres ocidentais As mulheres afegatildes foram

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

bibliografia

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                                                                        3. Paacutegina 39
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                                                                            1. Paacutegina 37 Off
                                                                            2. Paacutegina 38
                                                                            3. Paacutegina 39
                                                                              1. Botatildeo 7
                                                                              2. Botatildeo 8
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Page 5: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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11 - A ineacutercia do haacutebito

No dia-a-dia natildeo temos muita ocasiatildeo de experimentar esse sentimento e isso por forccedila de alguns fatores que bloqueiam sua emergecircncia Satildeo eles o haacutebito o costume os preconceitos os estereoacutetipos o apego agraves ideacuteias recebidas e o receio de questionar coisas aceitas Em contraste com isso podemos discernir sobre as condiccedilotildees que favorecem que promovem o apareci-mento desse sentimento bem-vindo Elas satildeo descritas abaixo

Natildeo se deixar dominar pela ineacutercia do haacutebito O haacutebito embora seja em geral uma coisa van-tajosa pois sem ele teriacuteamos que estar sempre reaprendendo as coisas e as habilidades tem o inconveniente de gerar uma impressatildeo falsa de conhecimento Para neutralizar esse inconve-niente eacute preciso vencer a tendecircncia para se comportar segundo a ineacutercia do haacutebito do cos-tume Suponha que eu saiba que a lacircmpada do meu quarto estaacute queimada Mesmo sabendo o haacutebito me faz agir mecanicamente e faz com que ao entrar no quarto eu acione de um modo maquinal o interruptor de luz O problema eacute que essa accedilatildeo maquinal se daacute tambeacutem e muito frequumlentemente em nossa conduta intelectual Todos noacutes temos essa tendecircncia a agir fiacutesica e intelectualmente em conformidade com o haacutebito

Portanto uma primeira condiccedilatildeo para trilhar o caminho da episteme portanto da Filosofia eacute procurar desvencilhar-se da ineacutercia do haacutebito Somente vencendo a ineacutercia do haacutebito podemos fazer uma pergunta sobre determinado objeto como se estiveacutessemos vendo-o pela primeira vez Por exemplo noacutes estamos habituados a ver a chama sem fazer muitas perguntas porque a chama eacute algo que vemos e com que convivemos desde crianccedila Mas no momento em que olhamos a chama com espiacuterito investigador passamos a contemplaacute-la com outros olhos e isso nos leva a refletir sobre ela a nos perguntar por que ela queima ao inveacutes por exemplo de pro-vocar coacutecegas a priori a chama poderia provocar coacutecegas ou acariciar mas a experiecircncia nos mostra que ela queima o que entatildeo nos leva a perguntar pela razatildeo desse calor que queima O espiacuterito investigador do cientista e do filoacutesofo se liberta do habitual do costumeiro e desse modo consegue olhar para o objeto como se estivesse vendo-o pela primeira vez e se pergunta que coisa eacute essa de onde vem por que eacute assim e natildeo de outro modo

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tema 2

12 - Preconceitos e estereoacutetipos

Coragem e honestidade intelectual Este eacute um segundo elemento propiacutecio a gerar o senti-mento de perplexidade Eacute uma predisposiccedilatildeo e uma coragem de nos desprendermos de nossas opiniotildees quando suspeitamos que estas possam natildeo ser corretas Assim como vencer a ineacutercia do haacutebito natildeo eacute faacutecil tambeacutem natildeo eacute faacutecil admitir que estamos enganados Natildeo eacute faacutecil admitir que nossa opiniatildeo agraves vezes arraigada natildeo tem o fundamento que pensaacutevamos que tivesse

Por que isso eacute difiacutecil O que faz de noacutes o que somos eacute um conjunto de vaacuterias coisas heranccedila geneacutetica heranccedila cultural e as crenccedilas que temos sejam elas factuais ou valorativas tudo isso eacute parte do que somos ou seja uma boa parte do que somos estaacute nas crenccedilas mais fortes e mais permanentes que temos Elas formam nossa identidade pessoal nossa identidade psiacutequica e social Assim sendo abandonar essas crenccedilas ou algumas delas significa abdicar um pouco da nossa identidade pessoal da pessoa que somos Daiacute a dificuldade de romper com elas Re-conhecer que estamos errados que nossas crenccedilas natildeo tecircm bom fundamento significa renun-ciarmos agrave parte de nossa identidade Questionar e rever crenccedilas religiosas ideologia poliacutetica ideaacuterio profissional etc eacute algo gerador de crise de identidade Desse modo compreende-se que seja difiacutecil para algueacutem abandonar suas crenccedilas mais fortes

No entanto eacute necessaacuterio ter essa predisposiccedilatildeo de admitir que podemos estar errados que nossas crenccedilas podem natildeo ter fundamento que aquilo em que acreditaacutevamos eacute ao contraacuterio do que pensaacutevamos bem discutiacutevel ou mesmo falso Um bom nome para essa predisposiccedilatildeo eacute coragem intelectual De fato a coragem eacute muitas vezes necessaacuteria para reconhecer-se perante os outros e perante si proacuteprio como (redondamente) equivocados Com efeito o que vem a ser essa coisa que chamamos genericamente de coragem Podemos dizer que ela consiste na predisposiccedilatildeo para enfrentar resolutamente uma realidade adversa ou perigosa de qualquer natureza que ela seja em vez de fugir dela Podemos dizer entatildeo que a coragem intelectual eacute a disposiccedilatildeo de admitir para si mesmo a forccedila de evidecircncias contraacuterias agraves proacuteprias crenccedilas o que eacute agraves vezes difiacutecil Eacute preciso coragem para admitir erros agraves vezes erros sobre todo um con-junto de crenccedilas nossas Por que eacute preciso coragem Porque admiti-los ndash no interior de uma comunidade de interessados composta por colegas eou estranhos ndash eacute numa situaccedilatildeo puacuteblica declarar-se errado e agraves vezes redondamente errado ora uma confissatildeo mais ou menos puacuteblica de erros importantes embora tenha seu lado meritoacuterio eacute tambeacutem em diferentes graus sempre penosa e diminuidora do auto-conceito

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13 - Coragem e honestidade intelectuais

Predisposiccedilatildeo para se livrar de preconceitos e estereoacutetipos O preconceito seja ele racial sexual religioso esteacutetico ou filosoacutefico eacute uma opiniatildeo que carece de fundamento Eacute um julgamento sem base na realidade na loacutegica na experiecircncia Os preconceitos satildeo ideacuteias prontas satildeo res-postas prontas

Preconceito natildeo eacute prerrogativa de pessoas tolas de pessoas lsquoburrasrsquo ou despreparadas todos noacutes inteligentes ou natildeo honestos ou natildeo temos preconceitos Todos noacutes temos uma forte propensatildeo para uma visatildeo tendenciosa uma visatildeo unilateral de noacutes mesmos e dos grupos a que pertencemos Essa condiccedilatildeo dificulta o exerciacutecio da episteme dificulta a experiecircncia do sentimento e perplexidade porque o preconceito eacute o tipo da atitude que tem uma resposta pronta Ele eacute um inimigo insidioso porque estaacute presente em noacutes sem que muitas vezes pos-samos percebecirc-lo

O que podemos fazer para detectar o preconceito em noacutes proacuteprios Como agir para nos livrarmos da prisatildeo dos preconceitos Em primeiro lugar eacute preciso identificaacute-los

Um grupo social em que as pessoas que o integram soacute convivem entre si e evitam a con-vivecircncia com pessoas de outros grupos tende a alimentar o preconceito contra outros grupos A distacircncia fiacutesica e a ausecircncia de interaccedilatildeo com pessoas diferentes soacute faratildeo crescer o precon-ceito contra estas ao passo que a proximidade fiacutesica e a interaccedilatildeo social tenderatildeo a minimizar ou mesmo diluir tal preconceito Ter contato mais ou menos regular com grupos sociais dife-rentes do nosso eacute uma oportunidade de nos libertarmos de preconceitos e adquirir sobre esses grupos distantes ideacuteias mais corretas menos distorcidas e preconceituosas

Vamos a um exemplo ilustrativo Na ocasiatildeo da guerra dos Estados Unidos contra o Talebatilde no Afeganistatildeo uma cantora americana de 23 anos foi enviada para laacute representando um or-ganismo internacional numa visita de boa vontade agraves mulheres afegatildes Da convivecircncia com a sociedade feminina afegatilde essa representante americana extraiu experiecircncias e observaccedilotildees so-bre as mulheres e as famiacutelias afegatildes que depois veio a apresentar em depoimento na televisatildeo Foi um depoimento sincero que expressava um sentimento de identificaccedilatildeo e simpatia para com as mulheres afegatildes porque ndash dizia ela ndash no fundo e em grande parte elas satildeo em suas vidas familiares em seu amor com os filhos em seu o cuidado com a casa em sua dedicaccedilatildeo e pro-teccedilatildeo da vida conjugal muito semelhantes agraves mulheres ocidentais As mulheres afegatildes foram

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

bibliografia

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UnespR

edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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ficha sumaacuterio bibliografia

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                              1. Botatildeo 62
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                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
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                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
                                                    1. Paacutegina 13 Off
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                                                    3. Paacutegina 15
                                                    4. Paacutegina 16
                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
                                                    8. Paacutegina 20
                                                    9. Paacutegina 21
                                                    10. Paacutegina 22
                                                    11. Paacutegina 23
                                                    12. Paacutegina 24
                                                    13. Paacutegina 25
                                                    14. Paacutegina 26
                                                    15. Paacutegina 27
                                                      1. Botatildeo 56
                                                        1. Paacutegina 28 Off
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                                                        3. Paacutegina 30
                                                        4. Paacutegina 31
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                                                        6. Paacutegina 33
                                                        7. Paacutegina 34
                                                        8. Paacutegina 35
                                                          1. Botatildeo 57
                                                            1. Paacutegina 28 Off
                                                            2. Paacutegina 29
                                                            3. Paacutegina 30
                                                            4. Paacutegina 31
                                                            5. Paacutegina 32
                                                            6. Paacutegina 33
                                                            7. Paacutegina 34
                                                            8. Paacutegina 35
                                                              1. Botatildeo 64
                                                                1. Paacutegina 36 Off
                                                                  1. Botatildeo 65
                                                                    1. Paacutegina 36 Off
                                                                      1. Botatildeo 52
                                                                        1. Paacutegina 37 Off
                                                                        2. Paacutegina 38
                                                                        3. Paacutegina 39
                                                                          1. Botatildeo 53
                                                                            1. Paacutegina 37 Off
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                                                                            3. Paacutegina 39
                                                                              1. Botatildeo 7
                                                                              2. Botatildeo 8
                                                                              3. Botatildeo 4
Page 6: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

6

UnespR

edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

1

2

3

4

tema 2

12 - Preconceitos e estereoacutetipos

Coragem e honestidade intelectual Este eacute um segundo elemento propiacutecio a gerar o senti-mento de perplexidade Eacute uma predisposiccedilatildeo e uma coragem de nos desprendermos de nossas opiniotildees quando suspeitamos que estas possam natildeo ser corretas Assim como vencer a ineacutercia do haacutebito natildeo eacute faacutecil tambeacutem natildeo eacute faacutecil admitir que estamos enganados Natildeo eacute faacutecil admitir que nossa opiniatildeo agraves vezes arraigada natildeo tem o fundamento que pensaacutevamos que tivesse

Por que isso eacute difiacutecil O que faz de noacutes o que somos eacute um conjunto de vaacuterias coisas heranccedila geneacutetica heranccedila cultural e as crenccedilas que temos sejam elas factuais ou valorativas tudo isso eacute parte do que somos ou seja uma boa parte do que somos estaacute nas crenccedilas mais fortes e mais permanentes que temos Elas formam nossa identidade pessoal nossa identidade psiacutequica e social Assim sendo abandonar essas crenccedilas ou algumas delas significa abdicar um pouco da nossa identidade pessoal da pessoa que somos Daiacute a dificuldade de romper com elas Re-conhecer que estamos errados que nossas crenccedilas natildeo tecircm bom fundamento significa renun-ciarmos agrave parte de nossa identidade Questionar e rever crenccedilas religiosas ideologia poliacutetica ideaacuterio profissional etc eacute algo gerador de crise de identidade Desse modo compreende-se que seja difiacutecil para algueacutem abandonar suas crenccedilas mais fortes

No entanto eacute necessaacuterio ter essa predisposiccedilatildeo de admitir que podemos estar errados que nossas crenccedilas podem natildeo ter fundamento que aquilo em que acreditaacutevamos eacute ao contraacuterio do que pensaacutevamos bem discutiacutevel ou mesmo falso Um bom nome para essa predisposiccedilatildeo eacute coragem intelectual De fato a coragem eacute muitas vezes necessaacuteria para reconhecer-se perante os outros e perante si proacuteprio como (redondamente) equivocados Com efeito o que vem a ser essa coisa que chamamos genericamente de coragem Podemos dizer que ela consiste na predisposiccedilatildeo para enfrentar resolutamente uma realidade adversa ou perigosa de qualquer natureza que ela seja em vez de fugir dela Podemos dizer entatildeo que a coragem intelectual eacute a disposiccedilatildeo de admitir para si mesmo a forccedila de evidecircncias contraacuterias agraves proacuteprias crenccedilas o que eacute agraves vezes difiacutecil Eacute preciso coragem para admitir erros agraves vezes erros sobre todo um con-junto de crenccedilas nossas Por que eacute preciso coragem Porque admiti-los ndash no interior de uma comunidade de interessados composta por colegas eou estranhos ndash eacute numa situaccedilatildeo puacuteblica declarar-se errado e agraves vezes redondamente errado ora uma confissatildeo mais ou menos puacuteblica de erros importantes embora tenha seu lado meritoacuterio eacute tambeacutem em diferentes graus sempre penosa e diminuidora do auto-conceito

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13 - Coragem e honestidade intelectuais

Predisposiccedilatildeo para se livrar de preconceitos e estereoacutetipos O preconceito seja ele racial sexual religioso esteacutetico ou filosoacutefico eacute uma opiniatildeo que carece de fundamento Eacute um julgamento sem base na realidade na loacutegica na experiecircncia Os preconceitos satildeo ideacuteias prontas satildeo res-postas prontas

Preconceito natildeo eacute prerrogativa de pessoas tolas de pessoas lsquoburrasrsquo ou despreparadas todos noacutes inteligentes ou natildeo honestos ou natildeo temos preconceitos Todos noacutes temos uma forte propensatildeo para uma visatildeo tendenciosa uma visatildeo unilateral de noacutes mesmos e dos grupos a que pertencemos Essa condiccedilatildeo dificulta o exerciacutecio da episteme dificulta a experiecircncia do sentimento e perplexidade porque o preconceito eacute o tipo da atitude que tem uma resposta pronta Ele eacute um inimigo insidioso porque estaacute presente em noacutes sem que muitas vezes pos-samos percebecirc-lo

O que podemos fazer para detectar o preconceito em noacutes proacuteprios Como agir para nos livrarmos da prisatildeo dos preconceitos Em primeiro lugar eacute preciso identificaacute-los

Um grupo social em que as pessoas que o integram soacute convivem entre si e evitam a con-vivecircncia com pessoas de outros grupos tende a alimentar o preconceito contra outros grupos A distacircncia fiacutesica e a ausecircncia de interaccedilatildeo com pessoas diferentes soacute faratildeo crescer o precon-ceito contra estas ao passo que a proximidade fiacutesica e a interaccedilatildeo social tenderatildeo a minimizar ou mesmo diluir tal preconceito Ter contato mais ou menos regular com grupos sociais dife-rentes do nosso eacute uma oportunidade de nos libertarmos de preconceitos e adquirir sobre esses grupos distantes ideacuteias mais corretas menos distorcidas e preconceituosas

Vamos a um exemplo ilustrativo Na ocasiatildeo da guerra dos Estados Unidos contra o Talebatilde no Afeganistatildeo uma cantora americana de 23 anos foi enviada para laacute representando um or-ganismo internacional numa visita de boa vontade agraves mulheres afegatildes Da convivecircncia com a sociedade feminina afegatilde essa representante americana extraiu experiecircncias e observaccedilotildees so-bre as mulheres e as famiacutelias afegatildes que depois veio a apresentar em depoimento na televisatildeo Foi um depoimento sincero que expressava um sentimento de identificaccedilatildeo e simpatia para com as mulheres afegatildes porque ndash dizia ela ndash no fundo e em grande parte elas satildeo em suas vidas familiares em seu amor com os filhos em seu o cuidado com a casa em sua dedicaccedilatildeo e pro-teccedilatildeo da vida conjugal muito semelhantes agraves mulheres ocidentais As mulheres afegatildes foram

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 7: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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13 - Coragem e honestidade intelectuais

Predisposiccedilatildeo para se livrar de preconceitos e estereoacutetipos O preconceito seja ele racial sexual religioso esteacutetico ou filosoacutefico eacute uma opiniatildeo que carece de fundamento Eacute um julgamento sem base na realidade na loacutegica na experiecircncia Os preconceitos satildeo ideacuteias prontas satildeo res-postas prontas

Preconceito natildeo eacute prerrogativa de pessoas tolas de pessoas lsquoburrasrsquo ou despreparadas todos noacutes inteligentes ou natildeo honestos ou natildeo temos preconceitos Todos noacutes temos uma forte propensatildeo para uma visatildeo tendenciosa uma visatildeo unilateral de noacutes mesmos e dos grupos a que pertencemos Essa condiccedilatildeo dificulta o exerciacutecio da episteme dificulta a experiecircncia do sentimento e perplexidade porque o preconceito eacute o tipo da atitude que tem uma resposta pronta Ele eacute um inimigo insidioso porque estaacute presente em noacutes sem que muitas vezes pos-samos percebecirc-lo

O que podemos fazer para detectar o preconceito em noacutes proacuteprios Como agir para nos livrarmos da prisatildeo dos preconceitos Em primeiro lugar eacute preciso identificaacute-los

Um grupo social em que as pessoas que o integram soacute convivem entre si e evitam a con-vivecircncia com pessoas de outros grupos tende a alimentar o preconceito contra outros grupos A distacircncia fiacutesica e a ausecircncia de interaccedilatildeo com pessoas diferentes soacute faratildeo crescer o precon-ceito contra estas ao passo que a proximidade fiacutesica e a interaccedilatildeo social tenderatildeo a minimizar ou mesmo diluir tal preconceito Ter contato mais ou menos regular com grupos sociais dife-rentes do nosso eacute uma oportunidade de nos libertarmos de preconceitos e adquirir sobre esses grupos distantes ideacuteias mais corretas menos distorcidas e preconceituosas

Vamos a um exemplo ilustrativo Na ocasiatildeo da guerra dos Estados Unidos contra o Talebatilde no Afeganistatildeo uma cantora americana de 23 anos foi enviada para laacute representando um or-ganismo internacional numa visita de boa vontade agraves mulheres afegatildes Da convivecircncia com a sociedade feminina afegatilde essa representante americana extraiu experiecircncias e observaccedilotildees so-bre as mulheres e as famiacutelias afegatildes que depois veio a apresentar em depoimento na televisatildeo Foi um depoimento sincero que expressava um sentimento de identificaccedilatildeo e simpatia para com as mulheres afegatildes porque ndash dizia ela ndash no fundo e em grande parte elas satildeo em suas vidas familiares em seu amor com os filhos em seu o cuidado com a casa em sua dedicaccedilatildeo e pro-teccedilatildeo da vida conjugal muito semelhantes agraves mulheres ocidentais As mulheres afegatildes foram

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
                            1. Paacutegina 3 Off
                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
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Page 8: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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apresentadas no depoimento como basicamente semelhantes agraves mulheres de nosso mundo lsquomais civilizadorsquo Com toda a certeza essa moccedila americana natildeo teria essa visatildeo e natildeo traria um depoimento dessa natureza se natildeo tivesse ultrapassado a distacircncia fiacutesica que a separava daquele outro mundo e natildeo tivesse passando laacute um certo periacuteodo de tempo convivendo e interagindo com as mulheres afegatildes Proximidade fiacutesica e interaccedilatildeo social acabaram derrubando ideacuteias preconceituosas

Com isso jaacute temos uma compreensatildeo melhor do que alimenta o preconceito noacutes temos preconceito contra os diferentes A diferenccedila eacute um fator que parece atuar por si proacuteprio Noacutes temos de fato uma tendecircncia a simpatizar com os semelhantes e a nos sentirmos perturbados com o que eacute diferente com o que tem comportamento diferente do nosso O diferente tende a ter um efeito de agressatildeo sobre noacutes Uma opccedilatildeo ou preferecircncia sexual diferente da socialmente padronizada tende a agredir No entanto e tomando como exemplo a homossexualidade o conhecimento baseado em fatos mostra que com exceccedilatildeo da dimensatildeo fiacutesico-eroacutetica o relac-ionamento afetivo homossexual eacute indistinguiacutevel do heterossexual Nesse caso tambeacutem a prox-imidade e o conhecimento dos fatos tendem a minar o preconceito enquanto que a distacircncia e a desinformaccedilatildeo tende a reforccedilaacute-lo

Falamos de preconceitos mas tambeacutem de estereoacutetipos Um estereoacutetipo eacute tambeacutem uma ideacuteia preacute-formada e eacute um retrato distorcido e exagerado de algo Exemplos estereoacutetipo da boa aluna da boa matildee do poliacutetico do aluno de ciecircncias humanas da UNESP

O estereoacutetipo eacute uma imagem distorcida que exagera as caracteriacutesticas do estereotipado em direccedilotildees que seguem emoccedilotildees desfavoraacuteveis de quem estereotipa Os estereoacutetipos assim como os preconceitos satildeo toacutepicos estudados em Psicologia Social Eles funcionam como uma maneira de darmos vazatildeo agraves nossas reservas ou mesmo hostilidade contra um grupo em parte marcando nossa identidade por contraste com o diferente Mas o que interessa eacute que os es-tereoacutetipos e os preconceitos satildeo uma rede cultural na qual vivemos porque crescemos inadver-tidamente com eles e eles nos aprisionam uma vez que bloqueiam o caminho que nos leva agrave experiecircncia do sentimento de perplexidadeespanto que daacute origem agrave episteme

Lembro que tudo o que dissemos ateacute agora eacute vaacutelido para todas as modalidades da episteme e natildeo apenas para a Filosofia Vamos agora nos concentrar especificamente nesta uacuteltima e examinar seus problemas e depois o meacutetodo para trabalhaacute-los e buscar respostas a eles

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

Acessado em 01092010

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                          1. Botatildeo 11
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                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
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                                        3. Paacutegina 11
                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
                                                    1. Paacutegina 13 Off
                                                    2. Paacutegina 14
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                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
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Page 9: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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2 Os problemas filosoacuteficos

21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

De iniacutecio a melhor maneira de caracterizar as questotildees da Filosofia eacute enumeraacute-las pura e simplesmente ou seja dar exemplos dessas questotildees Aqui vatildeo vaacuterios deles o que eacute democra-cia justiccedila verdade liberdade virtude etc Essas questotildees satildeo chamadas conceituais e diferem das seguintes que eacute mais importante a seguranccedila da coletividade ou a liberdade individual Noutras palavras nas ocasiotildees em que uma delas conflita com a outra qual deve prevalecer Quais satildeo os limites da interferecircncia do Estado na vida particular dos indiviacuteduos Por outro lado em que consiste a superioridade do Belo sobre o Feio Isto eacute em que exatamente o belo eacute melhor do que o feio O homem eacute realmente livre tem de fato livre arbiacutetrio Ou toda accedilatildeo humana estaacute submetida a uma causaccedilatildeo forte com uma causa provocando uma accedilatildeo esta pro-vocando outra e assim por diante como bolas de bilhar se movimentando e fazendo as outras se movimentarem Se esse princiacutepio da causaccedilatildeo universal (ou determinismo causal) vige seraacute

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
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                      2. Botatildeo 3
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Page 10: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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que haacute lugar para a liberdade individual Noutras palavras eacute a liberdade humana compatiacutevel com o determinismo Outra questatildeo quais satildeo as funccedilotildees principais da linguagem humana e quais satildeo as relaccedilotildees entre linguagem e pensamento e entre linguagem e accedilatildeo Quais satildeo as relaccedilotildees que os processos mentais mantecircm com os estados e processos do ceacuterebro

Exemplos na filosofia moral que criteacuterios devemos usar para distinguir o moralmente certo do moralmente errado Seraacute que o certo e o errado satildeo percebidos por intuiccedilatildeo ou por um senso moral interior e irredutiacutevel ou ao contraacuterio existe um criteacuterio articulaacutevel formulaacutevel que se possa comunicar entre as pessoas O que eacute exatamente conduzir-se de um modo eacutetico e conduzir-se de um modo antieacutetico

Todo mundo acha que o certo e o errado existem Mas ao aprovarmos um comportamento e louvaacute-lo ou criticar um outro e atacaacute-lo estamos nos baseando em que criteacuterios

Para ser mais especiacutefico como eacute que vocecirc sabe que eacute eticamente louvaacutevel por exemplo ajudar uma pessoa necessitada numa situaccedilatildeo em que o seu interesse individual faria vocecirc simplesmente ignoraacute-la Por que eacute eticamente condenaacutevel e mesmo repugnante e covarde para qualquer um de noacutes maltratar gratuitamente uma velhinha indefesa caminhando sozinha num terreno baldio Que eacute eacute Mas a pergunta eacute em que criteacuterio nos baseamos para fazer esse julgamento severo Responder a essa questatildeo de um modo claro e convincente eacute bem mais complexo incerto e trabalhoso do que muitas pessoas imaginam

Mas se quisermos podemos tentar evitar a reflexatildeo a respeito dessas coisas Algueacutem pode simplesmente dizer ldquoEu sei quando algo eacute certo ou errado Minha educaccedilatildeo familiar me ori-entou quanto a isso Sei que certas coisas satildeo corretas e que devo fazecirc-las e sei quais coisas satildeo incorretas e natildeo devo fazerrdquo No entanto o grande problema eacute que nesta questatildeo de certo e errado outras pessoas igualmente inteligentes e honestas divergem e agraves vezes muito de nos-sas opiniotildees

Por exemplo o incesto a relaccedilatildeo amorosasexual entre pais e filhos eacute um tabu Eacute uma proibiccedilatildeo forte na grande maioria das sociedades mas natildeo em todas haacute sociedades em que o incesto natildeo eacute eticamente condenaacutevel A pergunta eacute quem eacute que tem razatildeo neste caso quanto ao certo e o errado Para os cristatildeos existe uma forma de responder a proibiccedilatildeo estaacute explicita ou implicitamente na Escritura e a Escritura eacute a palavra revelada de Deus de modo que nada

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

Acessado em 01092010

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
                                        3. Paacutegina 11
                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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Page 11: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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do que ela permite eacute errado e tudo o que ela proiacutebe eacute incorreto Dessa forma os adeptos do cristianismo justificam suas posiccedilotildees eacuteticas Poreacutem para quem natildeo tem religiatildeo ou tem uma religiatildeo muito diversa essa justificativa natildeo serve para nada e com isso a pergunta pelo porque da proibiccedilatildeo permanece natildeo-respondida eacute neste ponto que comeccedilamos a filosofar e vemos o quanto eacute difiacutecil oferecer uma resposta convincente a essa pergunta eacute nesse ponto noutras pa-lavras que experimentamos o sentimento de perplexidade que nos causa uma certa surpresa e desconforto e nos motiva para a busca de uma soluccedilatildeo para o problema

22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Os problemas da Filosofia satildeo personagens absolutamente centrais nela e em toda a sua Histoacuteria desde o comeccedilo na Greacutecia Perguntemo-nos agora sobre a relaccedilatildeo entre o problema filosoacutefico (e sua centralidade) e o espanto como origem da Filosofia Em todas as questotildees que nos formulamos a perplexidade quando ela existe eacute sempre a respeito de qual seria a res-posta satisfatoacuteria para elas No caso por exemplo da questatildeo da liberdade e do determinismo a perplexidade vem do seguinte de um lado seria muito complicado e incocircmodo rejeitar o princiacutepio do determinismo e tambeacutem seria quase impensaacutevel negar que o homem seja dotado de liberdade por outro lado parece fortemente que o determinismo conflita mesmo com a liberdade Entatildeo como sair dessa

Podemos formular a relaccedilatildeo referida acima do seguinte modo um problema e soacute um prob-lema eacute o que gera espanto ou perplexidade com efeito nada eacute capaz de provocar espantoperplexidade a natildeo ser uma problema uma questatildeo

O que eacute um problema A coisa mais simples que se pode dizer a respeito dele eacute a seguinte afirmaccedilatildeo banal um problema eacute formulaacutevel na linguagem em uma sentenccedila interrogativa Se natildeo for formulaacutevel numa sentenccedila interrogativa natildeo eacute problema Mas para secirc-lo satildeo ne-cessaacuterias mais coisas referidas abaixo

Algo decisivo a respeito do problema filosoacutefico o interesse por ele Vocecirc se daacute conta de que por alguma razatildeo esta ou aquela questatildeo tem a ver com vocecirc com seus interesses com sua personalidade Ora sabemos que vaacuterias coisas satildeo ensinaacuteveis mas o interesse (por uma coisa ou outra) natildeo eacute uma dessas coisas Eacute verdade que ele pode mediante iniciativas ser encorajado aumentado diminuiacutedo Mas natildeo pode ser lsquoimplantadorsquo numa pessoa natildeo pode ser ensinado a

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 12: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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ela Quando ele existe existe quando natildeo existe natildeo existe

Outra coisa decisiva eacute que a pessoa o filoacutesofo ou aprendiz de filoacutesofo tem de vivenciar a situaccedilatildeo como problema isto eacute sinta necessidade de resolvecirc-lo Por exemplo se acontece uma coisa muito insoacutelita incomum mas a respeito da qual eu sou mais ou menos indiferente ela natildeo vai ser um problema para mim Eacute preciso que esse acontecimento incomum aleacutem de ser incomum provoque em mim uma necessidade emocional de busca de explicaccedilatildeo para ele Para ser genuinamente problema ele tem de provocar no sujeito uma necessidade emocional de busca de soluccedilatildeo Essa necessidade interior de se buscar uma resposta eacute fundamental e ela vem do fato de que um problema que permanece pendente natildeo-resolvido por isso mesmo incomoda ateacute que receba uma soluccedilatildeo uma questatildeo interessante como que lsquopedersquo para ser respondida e natildeo se completa ateacute que o seja um pouco com um gesto que se inicia pede para ser completado Esta situaccedilatildeo eacute bem descrita por dois filoacutesofos recentes Karl Popper para quem um problema filosoacutefico funciona como algo que perturba ou desequilibra o psiquismo do sujeito e Gilbert Ryle que sugere que um problema filosoacutefico funciona como ldquoum distuacuter-bio no sistemardquo da pessoa e que pede para ser eliminado E ele eacute eliminado justamente com a produccedilatildeo de uma resposta satisfatoacuteria para a questatildeo

Se imaginarmos uma peccedila de teatro que conte a histoacuteria da Filosofia verificaremos que nela vaacuterias coisas importantes satildeo no entanto relativamente passageiras eacute o caso das escolas filosoacuteficas ndash racionalismo empirismo idealismo materialismo espiritualismo ndash e dos proacuteprios filoacutesofos nenhum desses eacute o personagem principal da peccedila Eles aparecem em determinados momentos depois somem e agraves vezes reaparecem para depois desaparecerem novamente Mas haacute dois personagens que esses sim aparecem o tempo todo e por essa razatildeo entre outras satildeo os personagens centrais da Filosofia e de sua Histoacuteria um eacute o problemaquestatildeotema filosoacute-fico de que acabamos de falar e o outro eacute o meacutetodo utilizado no tratamento daqueles do qual falaremos agora

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

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31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

Acessado em 01092010

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
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                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
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                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
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                                                    11. Paacutegina 23
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Page 13: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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3 O problema do meacutetodo na filosofia

tema3

31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia

Vamos aceitar com Karl Marx2 que o homem soacute potildee problemas que ele eacute capaz de resolver de um modo ou de outro seja lsquodissolvendorsquo os problemas - mostrando por exemplo que satildeo falsos problemas ou mostrando que noacutes natildeo precisamos resolver esses problemas para chegar aos objetivos que noacutes queremos ndash seja solucionando-os diretamente Bem se todos os prob-lemas satildeo solucionaacuteveis de uma maneira ou de outra entatildeo deve ser possiacutevel discernir alguns procedimentos recorrentes adotados na resoluccedilatildeo deles O conjunto desses procedimentos constituiria o nuacutecleo do meacutetodo de resoluccedilatildeo daqueles problemas

Ocorre no entanto que no caso em que os problemas satildeo filosoacuteficos surgem algumas dificuldades uma das quais eacute a seguinte Se noacutes jaacute tiveacutessemos um bom nuacutemero de prob-lemas filosoacuteficos resolvidos na opiniatildeo da maioria dos estudiosos noacutes poderiacuteamos com base na resoluccedilatildeo feita tentar descrever quais foram os procedimentos de meacutetodo que levaram agrave

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

Acessado em 01092010

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
                            1. Paacutegina 3 Off
                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
                                        3. Paacutegina 11
                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
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Page 14: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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soluccedilatildeo deles Mas infelizmente ao que parece natildeo temos nenhum ou quase nenhum problema filosoacutefico substantivo resolvido na opiniatildeo con-sensual da comunidade dos filoacutesofos Isso dificulta bastante as coisas em contraste por exemplo com o que ocorre no caso das epistemes mais soacutelidas as cientiacuteficas Isso dificulta comeccedilar a dar uma res-posta mais objetiva agrave questatildeo de qual seja o meacute-todo em Filosofia

Mas talvez existam algumas verdades univer-salmente aceitas em Filosofia (quer dizer aceitas por quase todos) em particular em metafilosofia ndash que eacute a reflexatildeo sobre a proacutepria Filosofia Enu-meremos algumas dessas verdades

A primeira eacute a tese de que a origem da filosofia estaacute na perplexidade no espanto Uma segunda eacute as interrogaccedilotildeesquestotildeesproblemas da Filosofia satildeo pelo menos tatildeo importantes quanto e talvez ateacute mais importantes do que as respostas que foram e tecircm sido dadas a elas Uma terceira eacute que a superaccedilatildeo do que se pode chamar ignoracircncia ignara isto eacute a ignoracircncia que pensa que sabe e natildeo sabe e que se opotildee agrave ignoracircncia douta (em latim docta ignorantia e que consiste no recon-hecimento da ignoracircncia de muitas coisas) sendo esta superaccedilatildeo condiccedilatildeo indispensaacutevel para ascender agrave ignoracircncia douta e para se percorrer o caminho de encontrar soluccedilotildees para os prob-lemas filosoacuteficos Uma quarta tese eacute que a Filosofia enquanto estudo de determinadas inter-rogaccedilotildees e tentativa de respondecirc-las precisa apoiar-se na sua histoacuteria escrita sua historiogra-fia alimentar-se desta de um modo vital A historiografia eacute um discurso que expotildee e interpreta as obras filosoacuteficas situando-as em um desenvolvimento histoacuterico que revele as continuidades as rupturas as influecircncias o nascimento e renascimento de escolas etc Uma quinta tese e de que natildeo se pode ensinar a filosofia se esta eacute entendida como um corpo de doutrinas subscritas pela comunidade dos filoacutesofos jaacute que esse corpo simplesmente natildeo existe soacute se pode ensinar a

2 ldquoKarl Heinrich Marx nasceu no dia 5 de maio de

1818 em Treacuteveris na Alemanha e morreu em 14 de

marccedilo de 1883 em Londres na Inglaterra Eacute conhe-

cido por ser o fundador da doutrina comunista mo-

derna e foi tambeacutem um intelectual e revolucionaacuterio

Marx foi um estudioso que ingressou na Universida-

de de Bonn para estudar direito em 1835 Por influ-

ecircncia de seu pai acabou transferindo-se para a Uni-

versidade de Berlim alguns anos mais tarde onde

teve contato com a obra do professor e filoacutesofo Ge-

org Wilhelm Friedrich Hegel Interessado o jovem

voltou-se para a aacuterea da filosofia onde mais tarde

concluiu um doutorado O pensamento de Karl Marx

afetou radicalmente a histoacuteria poliacutetica da humanida-

de e eacute ateacute hoje um dos mais conhecidos de todo

o mundo Influenciado por filoacutesofos como Imannuel

Kant e pelo proacuteprio Hegel e com a colaboraccedilatildeo de

seu amigo Friedrich Engels Marx foi autor da teoria

marxista Trata-se substancialmente de uma criacuteti-

ca ao sistema capitalista que natildeo se limita apenas

agrave teoria tentando uni-la agrave praacutetica e por causa disso

ficando conhecida tambeacutem como teoria do ldquosocia-

lismo cientiacuteficordquo Aleacutem disso Marx foi o criador de

termos que repercutiram em posteriores discussotildees

nas sociedades como a lsquomais-valiarsquordquo (Acesso em

01092010 no endereccedilo

httpwwwkarlmarxcombrbiografia-marxhtm

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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tema 3

humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 15: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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filosofar E a uacuteltima tese eacute a de que em Filosofia como em qualquer outra forma de episteme deve-se cultivar o enfoque racional e desinteressado na produccedilatildeo e formulaccedilatildeo das hipoacuteteses e dos princiacutepios a serem demonstrados ou defendidos

Assinalei acima uma dificuldade para se formular o meacutetodo em filosofia Uma outra dificul-dade eacute a seguinte Parece haver uma inseparabilidade entre a praacutetica metodoloacutegica do filoacutesofo e sua doutrina substantiva Se dois filoacutesofos diferem muito um do outro no que diz respeito agrave doutrina provavelmente vai haver uma divergecircncia tatildeo grande quanto ao meacutetodo que fica inviaacutevel pensar uma metodologia que ambos aceitem Para dar um exemplo O filoacutesofo (e tam-beacutem psicoacutelogo) William James3 (1842-1910) americano fundador do pragmatismo afirma que a histoacuteria da filosofia eacute numa grande medida a histoacuteria de um conflito de temperamentos humanos Ora o temperamento natildeo eacute reconhecido como uma razatildeo a qual tem de ser rela-tivamente impessoal para poder sustentar adequadamente as conclusotildees O temperamento do filoacutesofo eacute algo muito pessoal e segundo James atua muito mais fortemente do que as premissas apresentadas como objetivas e impessoais James tem uma visatildeo pragmatista e natildeo racionalista nem empirista nem cientificista da Filosofia Vejam que a confianccedila na utilizaccedilatildeo de uma metodologia depende de se excluiacuterem certas visotildees da Filosofia como esta de James que a tornam demasiado pes-soal e subjetiva

Quem tem essa visatildeo pragmatista da Filosofia natildeo pode estar de acordo com algueacutem que pensa por exemplo que a filosofia deve ser fruto de um intelecto comprometido com procedi-mentos que natildeo dependam da subjetividade de cada um Uma concepccedilatildeo deste uacuteltimo tipo eacute defendida por exemplo por Bertrand Russell4 (1872-1970) matemaacutetico filoacutesofo educador e ativista de causas sociais Dele eacute o seguinte trecho ndash aliaacutes semelhante a um outro de Ni-etzsche5 que citarei em seguida ndash sobre esse assunto ldquoOs filoacutesofos desde Platatildeo a William James permitiram que suas opiniotildees sobre a constituiccedilatildeo do Universo fossem influenciadas pelo desejo de edificaccedilatildeo Sabendo ou julgando saber quais crenccedilas tornariam os homens mais virtuosos eles inventaram argumentos alguns dos quais bem falaciosos para provar que essas crenccedilas satildeo verdadeirasrdquo Subjacente a esse pensamento estaacute a crenccedila de que eacute possiacutevel produzir uma filosofia objetiva

3 JAMES William (1842-1910) Filoacutesofo e Psicoacutelo-

go estadunidense em 1875 foi o primeiro a ministrar

um curso de Psicologia no mundo Sua obra Princiacute-

pios de Psicologia constitui um claacutessico da aacuterea ateacute

hoje James foi um dos formuladores e defensores

da filosofia pragmatista a qual ele apresenta em

obra intitulada Pragmatismo Mais informaccedilotildees so-

bre o filoacutesofo podem ser encontradas no endereccedilo

httpptwikipediaorgwikiWilliam_James

(acessado em 01092010)

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 16: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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isciplina 01TEMAS

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Eis agora o trecho de Friedrich Nietzsche (1844-1900)ldquoPara ex-plicar como um filoacutesofo chegou agraves suas mais remotas afirmaccedilotildees metafiacutesicas eacute sempre bom e saacutebio se perguntar que morali-dade ou edificaccedilatildeo eacute visada por essa metafiacutesica Em conformi-dade com isso natildeo acredito que um impulso ao conhecimento tenha sido o pai da filosofia mas acredito ao contraacuterio que um outro impulso apenas em-pregou o conhecimento ndash e um falso conhecimento ndash como in-strumentordquo O outro impulso de que o texto fala eacute a vaidade Nietzsche chama os grandes filoacute-sofos do passado de ldquomonstros de vaidaderdquo No texto de Russell com certeza ndash o de Nietzsche tambeacutem talvez ndash noacutes temos um pensamento que eacute aproveitaacutevel para quem quer defender uma posiccedilatildeo da filosofia como uma episteme respeitaacutevel no mesmo niacutevel pelo menos que muitas outras e criticar aquela posiccedilatildeo do subjetivismo temperamentalista de William James Temos aiacute portanto duas grandes posiccedilotildees contraacuterias e eacute claro que vai ser impossiacutevel vocecirc reunir es-ses dois grupos de filoacutesofos e tentar fazer com que eles cheguem a algum acordo a respeito do meacutetodo em Filosofia dada essa inseparabilidade que parece existir entre a teoria e a praacutetica do meacutetodo de um lado e a doutrina substantiva do outro Essa entatildeo eacute mais uma dificuldade para se responder a questatildeo de qual eacute o meacutetodo em Filosofia

Mas esqueccedilamos um pouco essas dificuldades e tentemos dizer algo de positivo sobre o meacutetodo em Filosofia Vou enumerar o que por falta de melhor nome chamarei de componentes subjetivos e componentes objetivos do meacutetodo em Filosofia

4 RUSSELL Bertrand (1872-1970) foi um dos mais importantes pen-

sadores ingleses do seacuteculo XX Assim como outros contemporacircneos

Russell criticou o idealismo inglecircs de Francis Bradley e John Mactaggart

preponderante no final do seacuteculo XIX restaurando em um certo sentido

a tradiccedilatildeo empirista Rusell foi responsaacutevel por introduzir o pensamento

de Gottlob Frege (1848-1925) aos filoacutesofos ingleses especialmente no

que se refere agraves ferramentas providas pela loacutegica matemaacutetica Um de

seus principais objetivos era detalhar a relaccedilatildeo entre os objetos abstratos

e a experiecircncia Aleacutem de sua extensa produccedilatildeo intelectual nas aacutereas de

Filosofia e Loacutegica ele produziu obras sobre poliacutetica moral educaccedilatildeo

religiatildeo dentre outros temas

5 NIETZSCHE Friedrich (1844-1900) filoacutesofo e filoacutelogo alematildeo eacute conhe-

cido pela forccedila conceitual de seu pensamento e pela qualidade literaacuteria

de suas obras No iniacutecio de seu percurso intelectual foi influenciado pelo

pensamento de Schopenhauer o que se reflete em seu primeiro livro O

Nascimento da Trageacutedia (1872) Nessa obra Nietzsche considera que

a trageacutedia grega uma forma artiacutestica de salvaccedilatildeo e associou a trageacutedia

grea agraves oacuteperas de Wagner Em vaacuterios trabalhos como Aleacutem do Bem e do

Mal (1886) adota o meacutetodo da ldquofilosofia agraves marteladasrdquo em relaccedilatildeo a con-

cepccedilotildees religiosas e eacuteticas (particularmente a cristatilde) defendendo uma

ldquovaloraccedilatildeo (e reavaliaccedilatildeo) de todos os valoresrdquo Nietzsche continua sendo

um dos mais influentes filoacutesofos alematildees no pensamento contemporacircneo

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edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 17: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Nos componentes subjetivos vou distinguir duas coisas um elemento eacutetico e um outro que vou chamar de elemento temperamental No que diz respeito ao primeiro estou pensando por exemplo numa reflexatildeo feita para Claude Bernard (1818-1878) fisiologista meacutedico e pen-sador da ciecircncia Ele afirma que o cientista antes de entrar em seu laboratoacuterio tem de tomar uma atitude importante que eacute a de desprender-se dos preconceitos e das ideacuteias recebidas Ora esse eacute um esforccedilo que podemos com propriedade caracterizar como eacutetico

O filoacutesofo deveraacute estar comprometido com as normas ou regras do lsquojogo filosoacuteficorsquo Quais satildeo essas normas ou regras Essas normas mandam que o filoacutesofo ou o aprendiz de filoacutesofo ponha o seu amor agrave verdade e seu empenho em chegar ao conhecimento acima digamos as-sim de quaisquer outros amores seus em si mesmos legiacutetimos que possam conflitar com esse primeiro amor Entatildeo na medida em que vocecirc se apresenta aos outros e a si mesmo como filoacutesofo como genuinamente filoacutesofo vocecirc implicitamente estaraacute fazendo digamos um lsquoju-ramento profissionalrsquo que embora natildeo seja puacuteblico ou registrado em ata nem conste formal-mente de instrumentos juriacutedicos eacute muito significativo e poderia ser enunciado por exemplo nos seguintes termos ldquoPrometo na medida de minha capacidade pocircr o interesse pela descobe-rta da verdade e pela sua justificaccedilatildeo acima de qualquer outro interesse meu que possa conflitar com elerdquo E promessa mesmo informal eacute diacutevida isto eacute o sujeito tem uma obrigaccedilatildeo para com a comunidade de seus interlocutores de agir em conformidade com essa promessa Esse eacute portanto o componente eacutetico que tem de estar presente no caraacuteter e na conduta intelectual do pesquisador em geral talvez mais particularmente em ciecircncias humanas e mais ainda nessa forma de episteme que se chama Filosofia Esse eacute o componente eacutetico e eacute nele que reside a car-acteriacutestica da episteme de ser desinteressada referida no iniacutecio do artigo

Vamos agora ao componente de temperamento Haacute nesse amor agrave verdade ndash nesse amor que ama mais a verdade do que a proacutepria doutrina que se tem num certo momento da vida ndash um elemento que natildeo eacute eacutetico e que estou chamando de temperamental Ele consiste em se iden-tificar emocionalmente com o que haacute de mais excitante nesse jogo ndash que eacute o jogo da verdade o jogo de buscar a verdade ndash jogo no qual vocecirc lsquomarca golrsquo quando encontra a verdade ou algo proacuteximo dela e marca gol contra quando defende o erro porque deseja que ele fosse a verdade Suponhamos que num jogo amador e amistoso de futebol vocecirc marque um gol agindo em

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

Acessado em 01092010

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

tema4

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 18: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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desacordo com as regras do jogo Pois bem assim como nessa situaccedilatildeo natildeo tem graccedila ganhar do adversaacuterio roubando por exemplo marcando gol com a matildeo sem que o juiz veja tambeacutem natildeo tem graccedila ndash eacute esse o elemento puramente temperamental psicoloacutegico isto eacute extra-moral ndash natildeo tem graccedila defender uma proposiccedilatildeo teoacuterica uma tese sabendo que vocecirc estaacute escondendo dos outros e possivelmente de vocecirc mesmo evidecircncias contraacuterias a essa proposiccedilatildeo ou que vocecirc estaacute como que lsquofabricando evidecircnciasrsquo favoraacuteveis a ela Com esse comportamento seu o jogo perde justamente o que ele tem de mais essencial de mais excitante que eacute a uacutenica grande razatildeo de ele ser disputado

De onde vecircm a conveniecircncia e a necessidade de se enfatizarem esses elementos eacuteticos e tem-peramentais Vecircm do fato de que haacute forccedilas poderosas dentro de noacutes mesmos que agem insid-iosamente numa direccedilatildeo contraacuteria a eles Essas forccedilas foram objeto de atenccedilatildeo de uma tradiccedilatildeo de pensamento que se constituiu na Europa continental na eacutepoca moderna Ela se chama a vertente dos moralistas franceses e comeccedila com Michel de Montaigne no seacuteculo XVI passa pelo seacuteculo XVII com La Rochefoucauld6 e Blaise Pascal7 (que eacute por sinal uns dos gigantes do pensamento ocidental) percorre o seacuteculo XVIII com La Bruyegravere Chamford Vauvegnargues e outros e tem continuadores no seacuteculo XIX e mesmo no seacuteculo XX Essa tradiccedilatildeo pensou os fatores internos que atuam como obstaacuteculos tanto ao cultivo do temperamento sintonizado com o que haacute excitante nas regras do jogo da verdade quanto agrave adoccedilatildeo de condutas em con-formidade com a norma eacutetica de natildeo fabricar evidecircncias natildeo ocultar elementos desfavoraacuteveis agrave opiniatildeo proacutepria etc Essas forccedilas satildeo de fato poderosas daiacute a necessidade de se enfatizar tanto o lado eacutetico quanto o lado temper-amental dessa coisa que se chama o amor da verdade o apreccedilo pelo saber a filosofia (Aproximada-mente em grego ldquosofiardquo e ldquofilordquo se traduzem respectivamente por ldquosabedoriardquo e ldquoamante derdquo

Com a ajuda dessa tradiccedilatildeo reflitamos entatildeo sobre esses fa-tores internos Entre os traccedilos de temperamento que prejudicam o

6 Franccedilois Duque de La Rochefoucauld (1613-1680) Filoacutesofo francecircs

ldquoLa Rochefoucauld foi um dos introdutores e certamente o maior cultor do

gecircnero de maacuteximas e epigramas divertimento social que ele transformou

em gecircnero literaacuterio escrevendo textos de profundo pessimismo Seu mais

famoso livro ldquoReflexotildees ou sentenccedilas e maacuteximas moraisrdquo apareceu pela

primeira vez em 1664 Ateacute a quinta ediccedilatildeo do livro La Rochefoucauld foi

condensando suas maacuteximas ao mesmo tempo em que abrandava o tom

restringindo o seu amargor Espiacuterito caacuteustico amargurado ele atribui ao

amor-proacuteprio um papel preponderante na motivaccedilatildeo das accedilotildees humanas

Todas as qualidades da nobreza - as falsas virtudes - tecircm a movecirc-las o

egoiacutesmo e a hipocrisia atributos inerentes a todos os homens Segundo

La Rochefoucauld a necessidade de estima e de admiraccedilatildeo estaacute por traacutes

de toda manifestaccedilatildeo de bondade sinceridade gratidatildeo Ele eacute um pessi-

mista desencantado com o gecircnero humanordquo

httpptwikipediaorgwikiFranccedilois_de_La_Rochefoucauld

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

Acessado em 01092010

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
                            1. Paacutegina 3 Off
                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
                                        3. Paacutegina 11
                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
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Page 19: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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exerciacutecio do amor ao saber figuram o amor-proacuteprio (num certo sentido desse termo) e a vaidade Ouccedilamos Pascal a respeito de um e de outro ldquoA natureza do amor-proacuteprio desse eu humano eacute de amar apenas a si e natildeo con-siderar a natildeo ser a si Mas ele natildeo vai conse-guir impedir que esse objeto que ele ama seja cheio de defeitos e de miseacuteria Ele quer ser grande ele se vecirc pequeno ele quer ser feliz ele se vecirc miseraacutevel ele quer ser perfeito ele se vecirc cheio de imperfeiccedilotildees ele quer ser objeto de amor e de estima dos homens e ele vecirc que seus defeitos natildeo merecem senatildeo a aversatildeo e o desprezo deles Esse embaraccedilo em que ele se encontra produz nele a paixatildeo a mais injusta e criminosa que se possa imaginar porque ele concebe um oacutedio mortal contra essa verdade que o repreende e que o convence de seus de-feitos Ele desejaria aniquilaacute-la e natildeo poden-do destruiacute-la nela proacutepria ele a destroacutei tanto quanto ele pode no seu conhecimento dela Isto eacute ele toma todo o cuidado em cobrir os seus defeitos aos olhos dos outros e aos seus proacuteprios olhosrdquo (grifo meu) Essa descriccedilatildeo que o autor faz do amor-proacuteprio eacute a descriccedilatildeo de algo que estaacute arraigado na natureza hu-mana e que natildeo poupa ningueacutem conforme se infere desta outra passagem dele ldquoHaacute dife-rentes graus dessa aversatildeo pela verdade mas pode-se dizer que ela estaacute em todos os homens em algum grau porque ela eacute inseparaacutevel do amor-proacutepriordquo Pascal tambeacutem inclui a todos noacutes inclusive a ele proacuteprio entre as viacutetimas in-telectuais desse outro inimigo interno insidioso que eacute a vaidade ldquoA vaidade estaacute tatildeo arraigada

7 PASCAL Blaise (1623-1662) Filoacutesofo matemaacutetico

fiacutesico e literato francecircs contemporacircneo de Descartes

Desde menino se interessou por matemaacutetica e publi-

cou seu primeiro tratado sobre o tema com 16 anos

de idade Aos 18 anos comeccedilou a construccedilatildeo de um

mecanismo capaz de realizar as quatro operaccedilotildees

aritmeacuteticas obtendo sucesso depois de dez anos de

tentativas Fiacutesico experimental realizou a ceacutelebre ex-

periecircncia de Torricelli sobre a possibilidade do vaacutecuo

na natureza contrariando desse modo teses sobre

a continuidade da mateacuteria defendidas por Descartes

Como menino prodiacutegio aos 12 anos trabalhava por

conta proacutepria com base nos Elementos de Euclides

Ele tambeacutem inventou a seringa e a prensa hidraacuteulica

A partir de 1651 comeccedila a sofrer graves problemas de

sauacutede que permaneceratildeo ateacute sua morte prematura

Sua principal obra filosoacutefica foi publicada postumamen-

te sob o tiacutetulo Pensamentos Trata-se de fragmentos de

textos de diferentes tamanhos em torno e inuacutemeros te-

mas (tais como a natureza do conhecimento da moral

da metafiacutesica da religiatildeo entre inuacutemeros outros) mas

que se considera como parte do material que Pascal

utilizaria para elaborar uma ldquoApologia da religiatildeo cris-

tatilderdquo Parte de seus trabalhos nesta eacutepoca diziam res-

peito aos fundamentos do caacutelculo das probabilidades

Passou por uma experiecircncia religiosa que levou-o a

frequumlentar o mosteiro jansenista em Port-Royal Ajudou

os jansenistas em sua disputa com os jesuiacutetas escre-

vendo anonimamente Cartas Provinciais (1656-7) que

ajudaram a abalar significativamente o prestiacutegio e au-

toridade dos jesuiacutetas Seus Pensamentos publicados

postumamente em 1670 estabeleceram seu influente

princiacutepio do intuitivismo que ensinava que Deus pode-

ria ser lsquoexperimentadorsquo atraveacutes do coraccedilatildeo e natildeo da

razatildeoPara uma breve bibliografia de Blaise Pascal

consulte o endereccedilo

httpeducacaouolcombrbiografiasult1789u647jhtm

Acessado em 01092010

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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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tema 3

humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
                                        3. Paacutegina 11
                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
                                                    1. Paacutegina 13 Off
                                                    2. Paacutegina 14
                                                    3. Paacutegina 15
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                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
                                                    8. Paacutegina 20
                                                    9. Paacutegina 21
                                                    10. Paacutegina 22
                                                    11. Paacutegina 23
                                                    12. Paacutegina 24
                                                    13. Paacutegina 25
                                                    14. Paacutegina 26
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                                                        7. Paacutegina 34
                                                        8. Paacutegina 35
                                                          1. Botatildeo 57
                                                            1. Paacutegina 28 Off
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no coraccedilatildeo do homem que um soldado um criado um cozinheiro um carregador se vangloria e quer ter seus admiradores e os filoacutesofos tambeacutem querem ter E aqueles que escrevem contra tambeacutem querem ter a gloacuteria de terem escrito bem e aqueles que os lecircem querem ter a gloacuteria de tecirc-los lido E eu que escrevo isso talvez tenha essa vontade tambeacutemrdquo E podemos e devemos acrescentar noacutes outros que escutamos essas palavras de Pascal ndash noacutes outros quer dizer eu que escrevo isso e vocecircs que me lecircem ndash tambeacutem talvez tenhamos essa vontade

Estas reflexotildees se alinham com outras que mostram quanto poderosas satildeo as forccedilas subje-tivas e psicossociais que bloqueiam o cultivo do temperamento amante das regras do jogo e do senso de obrigaccedilatildeo e de obediecircncia a elas

Mais tarde e mais ou menos no mesmo espiacuterito escreveu Arthur Schopenhauer8 ldquoEssa filosofia universitaacuteria carregada de uma centena de interesses e mil comprometimentos diver-sos caminha usando rodeios e avanccedilando por caminhos tortuosos sem jamais perder de vista o temor do Senhor a vontade do ministeacuterio as exigecircncias do editor o favor dos estudantes e a boa amizade dos colegasrdquo Schopenhauer eacute do seacuteculo XIX o que nos faz ver que essa eacute uma temaacutetica recorrente e isso soacute acentua a importacircncia para o filoacutesofo e o cientista tanto quanto para os aprendizes de filoacutesofo e de cientista de se protegerem contra esses obstaacuteculos internos poderosos Daiacute a necessidade de se insistir sobre a importacircncia de se educar o espiacuterito de educar a sensibilidade para que cultivemos tanto o gos-to pelas regras do jogo da verdade quanto a dis-posiccedilatildeo de se obrigar a agir em conformidade com o preceito que manda colocar o amor da verdade acima de outras possiacuteveis inclinaccedilotildees conflitantes com ele o que natildeo raro eacute muito difiacutecil e agraves vezes talvez mesmo impossiacutevel de se fazer

Um parecircnteses Temos aqui trecircs filoacutesofos do passado um do Seacuteculo XVII o francecircs Pascal e os outros dois os alematildees Schopenhauer e Nietzsche do seacuteculo XIX Ocorre que quanto mais o tempo passa ndash o tempo das uacuteltimas quatro ou cinco deacuteca-

8 SCHOPENHAUER Arthur (1788-1860) Filoacute-

sofo alematildeo cuja principal obra eacute O Mundo como

Vontade e Representaccedilatildeo (1818) Leitor de Kant

Schopenhauer parte da metafiacutesica kantiana segun-

do a qual o mundo externo eacute construiacutedo por nossa

mente atraveacutes de representaccedilotildees (ou ideacuteias) Dife-

rentemente de Kant poreacutem natildeo considera que as

coisas em si mesmas estejam aleacutem de nosso al-

cance Para ele a natureza do mundo eacute a vontade

uma forccedila irracional sem finalidade ou direccedilatildeo A

vontade seria o princiacutepio uacuteltimo de tudo e um impul-

so jamais inteiramente satisfeito Neste mundo re-

pleto de dor e sofrimento a arte e a contemplaccedilatildeo

esteacutetica minimizam o impacto dessa forccedila cega no

destino humano O reconhecimento da cegueira da

vontade gera uma moral pessimista mas que pela

contemplaccedilatildeo eacutetica da vontade permite a compai-

xatildeo e a renuacutencia em moldes semelhantes agrave moral

budista (que tanto influenciou seu pensamento)

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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tema 3

humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

tema4

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 21: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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das ndash tanto mais fica patente a atualidade deles especialmente talvez a de Nietzsche e a de Pascal Mas no caso deste pensador francecircs a atualidade eacute mais surpreendente e admiraacutevel do que no dos dois alematildees estes e Nietzsche mais do que Schopenhauer nos satildeo bem mais proacuteximos natildeo soacute no tempo mas culturalmente Jaacute Pascal era contemporacircneo de Descartes e viveu a maior parte de sua vida na primeira metade do seacuteculo XVII um seacuteculo jaacute remoto e culturalmente muito contrastante com o nosso o que torna ainda mais admiraacutevel a grande atualidade que ele tem tanto como filoacutesofo moral quanto como filoacutesofo da mente ndash com suas reflexotildees sobre a imaginaccedilatildeo e os traccedilos de temperamento e de caraacuteter ndash e tambeacutem como pen-sador do conhecimento humano

Duas palavras sobre a relaccedilatildeo entre o componente eacutetico e o componente temperamental Primeiro natildeo haacute uma distinccedilatildeo completa entre os dois um ou outro elemento de um deles pode ser tambeacutem elemento do outro Por exemplo a coragem intelectual de que falei no Toacutepico 33 do Tema 1 estaacute incluiacuteda na aacuterea fronteiriccedila entre o componente temperamental e o com-ponente eacutetico com um peacute num deles e o outro peacute no outro Com efeito a coragem parece exigir tanto um temperamento condizente quanto um apropriado senso de dever Segundo a praacutetica da dimensatildeo eacutetica eacute indispensaacutevel ou seja o exerciacutecio da dimensatildeo temperamental natildeo basta por si soacute Natildeo basta a vantagem da virtude temperamental mesmo quando ela existe num grau elevado E o exerciacutecio do primeiro do eacutetico eacute grandemente facilitado pelo cultivo do temperamento que seja mais ou menos naturalmente amante das regras do jogo amante do jogo limpo Ou seja o traccedilo temperamental tem de figurar no equipamento com o qual o investigador empreende a busca de respostas aceitaacuteveis para as questotildees filosoacuteficas mas ele natildeo eacute suficiente

O traccedilo temperamental e o componente eacutetico satildeo mais importantes ndash atenccedilatildeo para isso ndash onde se tem menos controle cientiacutefico tanto na formulaccedilatildeo quanto na defesa de hipoacutete-ses Sem a quantificaccedilatildeo e os conceitos da matemaacutetica e da loacutegica que inclusive algumas disciplinas humanas como a Economia utilizam sem os procedimentos experimentais que certas psicologias usam e sem o sofisticado aparato tecnoloacutegico posto a serviccedilo das ciecircncias bioloacutegicas e biomeacutedicas da astronomia sem isso tudo o fato eacute que noacutes filoacutesofos dependemos daquelas duas condiccedilotildees num grau bem maior do que nas modalidades da episteme em que haacute recursos daqueles tipos Entatildeo esse bipecirc eacute um suporte fundamental para a sustentaccedilatildeo ainda que relativa da busca do saber em Filosofia e na maior parte das ciecircncias humanas Dentro das

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
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                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
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                                                8. Paacutegina 20
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                                                10. Paacutegina 22
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                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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                                                    2. Paacutegina 14
                                                    3. Paacutegina 15
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                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
                                                    8. Paacutegina 20
                                                    9. Paacutegina 21
                                                    10. Paacutegina 22
                                                    11. Paacutegina 23
                                                    12. Paacutegina 24
                                                    13. Paacutegina 25
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                                                        7. Paacutegina 34
                                                        8. Paacutegina 35
                                                          1. Botatildeo 57
                                                            1. Paacutegina 28 Off
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                                                            3. Paacutegina 30
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                                                            8. Paacutegina 35
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                                                                    1. Paacutegina 36 Off
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                                                                        1. Paacutegina 37 Off
                                                                        2. Paacutegina 38
                                                                        3. Paacutegina 39
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                                                                            1. Paacutegina 37 Off
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                                                                            3. Paacutegina 39
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                                                                              2. Botatildeo 8
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Page 22: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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humanidades eacute a Filosofia que precisa deles mais lsquodesesperadamentersquo Por exemplo a ciecircncia poliacutetica trabalha com dados quantitativos (por exemplo com resultados de eleiccedilotildees) embora esses dados sejam sujeitos eles proacuteprios a serem interpretados diversamente por diferentes estudiosos Ou seja o praticante da episteme filosoacutefica precisa ser mais virtuoso no que diz respeito agravequelas duas qualidades do que os praticantes das demais modalidades da episteme Estou falando portanto da posse de um equipamento que inclui elementos intelectuais emo-cionais e eacuteticos que eacute parte de um discurso do meacutetodo para bem conduzir o intelecto e procu-rar se natildeo a verdade na Filosofia pelo menos evitar o erro nela

33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Encerrada a reflexatildeo sobre as condiccedilotildees subjetivas entro na consideraccedilatildeo das condiccedilotildees que por falta de termo melhor chamei de objetivas Voltemos agrave tese segundo a qual os problemas da Filosofia satildeo mais importantes do que as respostas a eles Eacute possiacutevel defender essa tese com pelo menos duas ou trecircs boas razotildees mas isso natildeo seraacute feito aqui Apenas registro a respeito o testemunho de dois filoacutesofos um dos quais eacute Bertrand Russell jaacute mencionado antes Escreve ele ldquoEm filosofia o que eacute importante natildeo satildeo tanto as respostas que satildeo dadas mas antes as questotildees que satildeo colocadas A esse respeito a Escola de Mileto merece a fama que temrdquo As respostas que essa Escola deu sobre a constituiccedilatildeo do mundo fiacutesico hoje soam infantis para noacutes mas permanecem as perguntas que eles foram capazes de fazer bem como o meacutetodo que eles utilizaram para respondecirc-las O outro eacute o alematildeo Karl Jaspers9 (1883-1969) que foi tam-beacutem um psiquiatra influente Ele escreveu ldquoFilosofia significa ir a caminho seguir continuar suas questotildees satildeo mais essenciais do que as respostas e toda resposta se converte numa nova questatildeordquo

Reflitamos novamente sobre as questotildees fi-losoacuteficas Observe-se que elas satildeo interessantes intrinsecamente isto eacute nelas mesmas As pessoas que cuidam de respondecirc-las querem ndash simples-mente querem ndash encontrar respostas para elas Esse parece ser um desejo mais ou menos natu-ral Mas conforme foi desenvolvido mais atraacutes um problema filosoacutefico natildeo eacute definido como tal

9 JASPERS Karl (1883-1969) Jaspers foi um dos

principais pensadores existencialistas do seacuteculo

XX Para ele ldquoa existecircncia humana e o incomensu-

raacutevel que a envolve satildeo sobretudo experimentaacuteveis

em situaccedilotildees consideradas como limite nomea-

damente o fracasso a culpa ou a morte Defende

igualmente que eacute na comunicaccedilatildeo com os outros

que a liberdade humana se realiza plenamenterdquo

(httphistoriaecienciaweblogcomptarqui-

vo006221html Acesso em 01092010) Para

maiores informaccedilotildees sobre este autor visitar o site

httpptwikipediaorgwikiKarl_Jaspers

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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
                                        3. Paacutegina 11
                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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(isto eacute como problema) independentemente de um sujeito particular Um filoacutesofo espanhol con-temporacircneo Juliaacuten Mariacuteas10 nascido em 1916 es-creveu sobre isso e afirmou que natildeo basta o assim chamado problema vir numa forma interrogativa e versar sobre um assunto dito filosoacutefico Por ex-emplo ldquoO que eacute a liberdaderdquo ldquoComo se concil-iam liberdade individual e controle socialrdquo Eacute pre-ciso aleacutem disso que aquilo que se pergunta tenha com a pergunta uma relaccedilatildeo visceral tal que essa interrogaccedilatildeo linguumliacutestica se torne um problema vi-tal para ele um problema mesmo no sentido de incomodaacute-lo de ser um obstaacuteculo que ele tem de transpor para continuar no caminho Quer dizer o assim chamado problema tem de ter uma real problematicidade Esse eacute um elemento que faz o problema interessante que torna a questatildeo filosoacutefica interessante As questotildees da Filosofia estatildeo entre as questotildees teoacutericas que mais forte-mente despertaram e continuam despertando o interesse dos seres humanos satildeo questotildees que estes colocaram em diversos momentos do passado e insistem em continuar colocando hoje

Boa parte do que chamamos Filosofia consiste portanto em levantamento de certas questotildees e tentativa de respondecirc-las a Filosofia se apresenta como levantadora de questotildees como clarificadora de questotildees como modificadora de questotildees como criacutetica de questotildees e como investigadora do relacionamento dessas questotildees umas com as outras e com o momento sociocultural em que elas se formulam Vamos pensar entatildeo na Filosofia como um certo con-junto de questotildees e nossa pergunta eacute qual seria o meacutetodo para investigar essas questotildees Diz um interessante filoacutesofo inglecircs Isaiacuteas Berlin (nascido em 1909 e morto em 1997) pensador poliacutetico e historiador das ideacuteias ldquoUma marca das questotildees filosoacuteficas eacute esta que vocecirc natildeo sabe bem onde olhar para buscar uma respostardquo ou seja vocecirc natildeo sabe como proceder exatamente para chegar a uma resposta entre outras coisas por natildeo se tratar de uma questatildeo cientiacutefica ex-perimental ou natildeo E continua ele ldquoQuando natildeo existe um meacutetodo estabelecido para se fazer algo vocecirc faz o que pode Vocecirc simplesmente tenta resolver paciente e esforccediladamente

10 MARIAS Juliaacuten (Juliaacuten Marias Aguilera 914-

2005) ldquoFiloacutesofo espanhol disciacutepulo de Joseacute Or-

tega y Gasset Estudou filosofia na Universidade

de Madrid nos anos da Repuacuteblica (1931-1936) [o

autor refere-se agrave Repuacuteblica espanhola anterior agrave

guerra civil que culmina em 1939 com a ascensatildeo

de Franco ao poder] onde foi aluno de Ortega y

Gasset Zubiri Gaos y Garciacutea Morente [alguns dos

mais renomados pensadores espanhois do seacuteculo]

En 1941 publica a primeira ediccedilatildeo de sua Historia

da Filosofiacutea que foi muito difundido En 1948 fun-

da junto com Ortega o Instituto de Humanidades de

Madrid En 1951 apresentou ante a Universidade

de Madrid sua tese doutoral intitulada A metafiacutesica

do conhecimento em Gantry Foi fecundo escritor e

conferencistardquo

httpwwwfilosofiaorgave001a064htm acesso

em 01092010

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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

tema4

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
                            1. Paacutegina 3 Off
                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
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A Filosofia assim concebida isto eacute como o estudo de certos problemas eacute pensada portanto essencialmente como uma atividade e natildeo como um corpo de proposiccedilotildees afirmadas como verdadeiras como por exemplo a Aritmeacutetica e a Geografia Encontramos a Filosofia assim concebida em autores tatildeo diferentes como Ludwig Wittgenstein (1889-1951) e Juliaacuten Mariacuteas sendo o primeiro um pensador austriacuteaco naturalizado britacircnico para quem a Filosofia eacute uma atividade de lsquoterapecircutica intelectualrsquo que visa livrar-nos de males doutrinais Para Mariacuteas que nesse ponto segue seu mestre Ortega y Gasset um outro espanhol a Filosofia eacute um ldquoquehacerrdquo (um afazer) ou seja um fazer mais do que qualquer outra coisa

O meacutetodo entatildeo qual seria Em conformidade com o que foi dito antes ele teria de ser um meacutetodo para a atividade de estudar e trabalhar essas questotildees Seria um meacutetodo primeiro para melhor detectar questotildees que vale a pena levantar no sentido de que vai ser fecundo levantaacute-las em um dado momento em que elas deveratildeo encontrar repercussatildeo Segundo para fazer avanccedilar nossa compreensatildeo desses temas e questotildees bem como da histoacuteria de seu surgimento ressurgimento e transformaccedilotildees sofridas ao longo do tempo de seu relacionamento com a histoacuteria passada e da interligaccedilatildeo desses temas com elementos natildeo-filosoacuteficos do momento histoacuterico Terceiro um meacutetodo que nos guie em como melhor se abrir a influecircncias retificado-ras de nossa visatildeo atual da problemaacutetica e de sua atualidade ou natildeo

Nesse quadro haacute uma disciplina que passa a ocupar um lugar especial na teoria do meacutetodo filosoacutefico e ela eacute a Filosofia da Linguagem Por que isso Pelo seguinte De um modo geral eacute prudente metodologicamente apoiar-se no mais proacuteximo para se conhecer o mais distante no mais concreto para se conhecer o mais abstrato no mais familiar e observaacutevel para se conhecer o menos familiar e natildeo-observaacutevel Sendo assim uma ideacuteia que parece boa eacute observar a lingua-gem estudar a linguagem que eacute afinal de contas o instrumento com o qual noacutes filosofamos nosso instrumento natildeo eacute o telescoacutepio nem o microscoacutepio nem qualquer outro produto de avanccedilos tecnoloacutegicos A linguagem eacute feita de comportamentos verbais de accedilotildees linguumliacutesticas e a ideacuteia eacute analisar esses comportamentos e accedilotildees com vistas a aprender a direcionaacute-los para melhor pensar as questotildees filosoacuteficas

Nesse terreno uma das coisas que foi feita eacute refletir sobre o que se chama erro categorial e avanccedilos foram feitos aiacute Um erro categorial ocorre quando vocecirc confunde categorias dife-rentes ou de niacuteveis diferentes vocecirc potildee numa categoria um objeto que natildeo pertence a essa

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

tema4

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 25: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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categoria e noacutes somos levados a isso pela linguagem pelo que podemos chamar de armadilhas da linguagem que nos induzem ao erro que nos ludibriam nos ldquoenfeiticcedilamrdquo Um exemplo A linguagem inclui substantivos como lsquomentersquo lsquoconsciecircnciarsquo Ora muitos substantivos denotam objetos entidades Entatildeo passamos a subentender que do mesmo modo que o objeto denotado por lsquomesarsquo ex-iste tambeacutem deve existir um objeto uma coisa deno-tado por lsquomentersquo por lsquoconsciecircnciarsquo Ocorre no entanto que eacute duvidoso que esses objetos existam o que parece existir satildeo processos mentais e natildeo ldquoa menterdquo proces-sos conscientes ndash tambeacutem processos preacute-conscientes processos inconscientes ndash e natildeo ldquoa consciecircnciardquo mas a tendecircncia eacute deixando-se enfeiticcedilar pelos substantivos supor que existam como entidades a mente a con-sciecircncia e outras coisas Entatildeo a partir da existecircncia de substantivos ndash que satildeo reais sim mas satildeo uma re-alidade linguumliacutestica ndash lsquosubstantivamosrsquo a coisa no niacutevel da realidade isto eacute inventamos uma espeacutecie de sub-stacircncia a que a palavra se refere Ou seja de tanto falar ldquoa menterdquo ldquoa consciecircnciardquo acabamos por acreditar que existe uma coisa um objeto uma entidade referida pela palavra

Esse tipo de contribuiccedilatildeo foi trazida por filoacutesofos como Gottlob Frege11 tambeacutem loacutegico e matemaacutetico (1848-1925) Ele via a tarefa da Filosofia como a de ldquoromper com o domiacutenio da palavra sobre o espiacuteritordquo tema ecoado na obra de Wittgenstein12 para quem o nuacutecleo do exerciacutecio da Filosofia eacute libertar-se do feiticcedilo do enfeiticcedilamento da linguagem Entatildeo parece que a Filosofia da Linguagem eacute uma disciplina metodoloacutegi-ca primeira Frequumlentemente o exerciacutecio da filosofia da linguagem eacute clarificar conceitos mas natildeo se trata de

11 FREGE Gottlob (1848 - 1925) Matemaacutetico

alematildeo que concentrou seus estudos na loacutegica

ldquoFrege foi o primeiro a formular com precisatildeo

a diferenccedila entre variaacutevel e constante assim

como o conceito de funccedilatildeo loacutegica a ideacuteia de

uma funccedilatildeo de vaacuterios argumentos o conceito

de quantificador A ele se deve uma conceitua-

ccedilatildeo muito mais exata da teoria aristoteacutelica sobre

sistema axiomaacutetico assim como uma clara dis-

tinccedilatildeo entre lei e regra linguagem e metalingua-

gem Ele eacute autor da teoria da descriccedilatildeo e quem

elaborou sistematicamente o conceito de valor

Mas isto natildeo eacute tudo pois todas estas coisas satildeo

apenas produtos de um empreendimento muito

maior e fundamental que o inspirou desde suas

primeiras pesquisas uma investigaccedilatildeo das ca-

racteriacutesticas daquilo que o homem diz quando

transmite informaccedilatildeo [por meio da linguagem

natural] por meio de juiacutezosrdquo (httpwwwgeoci-

tieswshifi_eventosLogica-fregehtml Acesso

em 01092010)

12 WITTGENSTEIN Ludwig (1889-1951) fi-

loacutesofo de origem austriacuteaca engenheiro de for-

maccedilatildeo Wittgenstein se aproximou da filosofia

graccedilas agraves leituras que fez de textos de Gottlob

Frege e Bertrand Russell sobre a loacutegica mate-

maacutetica No Tratado Loacutegico-Filosoacutefico (1922)

Wittgenstein considera necessaacuterio solucionar

os problemas relacionados com o significado

das afirmaccedilotildees simples ou contingentes uma

vez que boa parte dos problemas filosoacuteficos

decorreria segundo ele de confusotildees trazidas

agrave tona pela ambiguumlidade proacutepria da linguagem

comum Para ele um dos objetivos da Filoso-

fia eacute dissolver os falsos problemas atraveacutes de

uma clarificaccedilatildeo dos conceitos Sua segunda

grande obra Investigaccedilotildees Filosoacuteficas (1953)

adota uma perspectiva pragmaacutetica ao analisar

os denominados ldquojogos de linguagemrdquo em seu

contexto

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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

tema4

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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fazer clarificaccedilotildees linguumliacutesticas sem interesse substantivo para a episteme filosoacutefica Natildeo se trata tampouco meramente de clarificar o discurso do senso comum Trata-se de tomar as ideacuteias e o vocabulaacuterio do senso comum apenas como um ponto de partida para uma compreensatildeo analiacutetica elaborada Vamos dar exemplos desse tipo de pergunta que eacute filosoficamente rel-evante ldquoO que eacute um direito humanordquo ldquoSomos naturalmente dotados de direitos ou os direitos satildeo uma atribuiccedilatildeo convencionalrdquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia da Accedilatildeo eacute um traccedilo que se descreve como se descreve por exemplo o comportamento agressivo Ou natildeordquo ldquoA liberdade no sentido da Filosofia Poliacutetica tem a natureza de um direito que o sujeito tem Ou eacute um traccedilo factualrdquo Eacute no exame dessas questotildees e das implicaccedilotildees delas que a Filosofia da Linguagem ajuda ou pode ajudar Entatildeo a linguagem eacute de fato ndash e isso eacute um ponto paciacutefico ndash orientadora e desorientadora do intelecto Eacute um instrumento do acerto quando se acerta e do erro quando se erra Ora o conhecimento desse instrumento dos seus meandros de suas ar-timanhas de suas funccedilotildees permitiria podemos acreditar promover o acerto e prevenir o erro

O tratamento do que chamei de condiccedilotildees subjetivas e objetivas constitui uma reflexatildeo so-bre o meacutetodo sobretudo em ciecircncias humanas e em especial em Filosofia Sobre o meacutetodo fiz uma reflexatildeo que tem duas partes basicamente Uma sobre as condiccedilotildees subjetivas e aiacute temos uma grande e fantaacutestica contribuiccedilatildeo da filosofia europeacuteia continental especialmente da ver-tente dos moralistas franceses e de seus continuadores No que diz respeito aos componentes objetivos aproveitei-me de uma tradiccedilatildeo filosoacutefica de um tipo diferente da primeira que eacute a Filosofia Analiacutetica Essas duas tradiccedilotildees confluem para o mesmo ponto E natildeo surpreende que assim seja porque no fundo e em uacuteltima anaacutelise ambas as tradiccedilotildees pensaram e estatildeo pen-sando as questotildees da Filosofia tanto as questotildees de meacutetodo quanto as questotildees substantivas

Observaccedilatildeo necessaacuteria

Tentar dizer o que a Filosofia eacute e desse modo esperar transmitir a quem ouve ou lecirc o espiacuterito dela o lsquocoraccedilatildeo e a mente delarsquo eacute uma empreitada nela mesma com uma seacuteria limitaccedilatildeo mesmo que algueacutem consiga dizecirc-lo de um modo excepcio-nalmente bom ou o melhor possiacutevel Eacute que a Filosofia propriamente dita ndash isto eacute aquela que eacute praticada por aqueles que chamamos filoacutesofos e que natildeo incluiacute nem estudos de comentador nem histoacuterico-filosoacuteficos propriamente ditos ndash eacute uma ativi-

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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tema 4

4 Filosofia e Ensino da Filosofia

tema4

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
                            1. Paacutegina 3 Off
                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
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Page 27: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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dade uma arte portanto algo que envolve o cultivo de determinados interesses e habilidades E como toda arte ela natildeo eacute suscetiacutevel de ser explicada apenas por meio de discurso Eacute necessaacuterio para se ter dela uma explicaccedilatildeo menos abstrata mais concreta e aprofundada que se a pratique eacute preciso que o dizer de quem explica se combine intimamente com o fazer filosoacutefico com a atividade filosofante ndash ainda que em niacutevel do aprendiz de filoacutesofo ndash daquele para quem a explicaccedilatildeo estaacute sendo dirigida Suponhamos que algueacutem fosse explicardescrever para um grupo de dan-ccedilarinos todos os passos e a coreografia de uma danccedila natildeo-familiar Uma maneira seria fazecirc-lo apenas discursivamente digamos com grande precisatildeo vocabular e riqueza de detalhes Uma outra maneira seria combinar a primeira com exibiccedilatildeo de fotografias com a exibiccedilatildeo de um viacutedeo ou melhor ainda com a encenaccedilatildeo ao vivo pelos praticantes dela Com isso os ouvintesespectadores teriam da nova danccedila uma compreensatildeo boa mas limitada A compreensatildeo mais completa e aguda da plateacuteia viria com a combinaccedilatildeo do anterior com a atividade de seus componentes em tentar praticar a proacutepria danccedila objeto da explicaccedilatildeo Embora filosofia e danccedila sejam coisas muitiacutessimo diferentes haacute um importante e decisivo elemento comum entre elas que eacute serem formas de arte (ao menos no sentido amplo mas alguns diriam que natildeo soacute nele) Na segunda trata-se de arte de movimentar e controlar o corpo de criar e executar movimentos associados com o ritmo e a melodia da muacutesica Na primeira se trata-se da arte de levantar uma questatildeo nestes ou naqueles termos (ou de abster-se de levantaacute-la quando se julgar epistemicamente inapro-priado fazecirc-lo) da arte de buscar respostas e avaliaacute-las da arte de argumentar (ou de abster-se de fazecirc-lo quando se pressente que jaacute se chegou ao lsquoinargumentaacutevelrsquo ao lsquoaxiomaacuteticorsquo) As teorias num caso e as instruccedilotildees no outro estatildeo ambas nos liv-ros no discurso mas somente incluindo o exerciacutecio da arte eacute possiacutevel comeccedilar a ter uma compreensatildeo mais realista e aprofundada do objeto que estaacute sendo explicado As consideraccedilotildees deste paraacutegrafo final tecircm consequumlecircncias (construtivas) para os estudiosos no campo do comentaacuterio filosoacutefico e no da histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas Apresentarei algumas consideraccedilotildees a respeito na proacutexima unidade

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tema 4

4 Filosofia e Ensino da Filosofia

tema4

41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                          1. Botatildeo 11
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                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
                                        2. Paacutegina 10
                                        3. Paacutegina 11
                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
                                                    1. Paacutegina 13 Off
                                                    2. Paacutegina 14
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                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
                                                    8. Paacutegina 20
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4 Filosofia e Ensino da Filosofia

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41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Podemos distinguir trecircs aacutereas de investigaccedilatildeo dos profissionais universitaacuterios da Filosofia a filosofia propriamente dita - isto eacute aquilo que os filoacutesofos fazem e produzem - o comentaacuterio de obras filosoacuteficas ndash aqui entendido de modo a incluir estudos que natildeo entram nos detalhes das ligaccedilotildees da obra comentada com a literatura filosoacutefica anterior eou posterior ndash e a histoacuteria da filosofia ndash aqui entendida no sentido menos abrangente que o habitual de estudos que contam o itineraacuterio das ideacuteias e doutrinas no tempo e no espaccedilo examinando portanto o surgimento e desenvolvimento desta ou daquela doutrina ou escola num determinado lapso de tempo agraves vezes maior as vezes menor Essas trecircs modalidades satildeo em graus bem diferentes distintas umas das outras embora as duas uacuteltimas sejam usualmente confundidas sob a de-nominaccedilatildeo ldquohistoacuteria da filosofiardquo

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

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bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

bibliografia

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UnespR

edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                              1. Botatildeo 62
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                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
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                                    2. Paacutegina 5
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                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
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                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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                                                    3. Paacutegina 15
                                                    4. Paacutegina 16
                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
                                                    8. Paacutegina 20
                                                    9. Paacutegina 21
                                                    10. Paacutegina 22
                                                    11. Paacutegina 23
                                                    12. Paacutegina 24
                                                    13. Paacutegina 25
                                                    14. Paacutegina 26
                                                    15. Paacutegina 27
                                                      1. Botatildeo 56
                                                        1. Paacutegina 28 Off
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                                                        4. Paacutegina 31
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                                                        6. Paacutegina 33
                                                        7. Paacutegina 34
                                                        8. Paacutegina 35
                                                          1. Botatildeo 57
                                                            1. Paacutegina 28 Off
                                                            2. Paacutegina 29
                                                            3. Paacutegina 30
                                                            4. Paacutegina 31
                                                            5. Paacutegina 32
                                                            6. Paacutegina 33
                                                            7. Paacutegina 34
                                                            8. Paacutegina 35
                                                              1. Botatildeo 64
                                                                1. Paacutegina 36 Off
                                                                  1. Botatildeo 65
                                                                    1. Paacutegina 36 Off
                                                                      1. Botatildeo 52
                                                                        1. Paacutegina 37 Off
                                                                        2. Paacutegina 38
                                                                        3. Paacutegina 39
                                                                          1. Botatildeo 53
                                                                            1. Paacutegina 37 Off
                                                                            2. Paacutegina 38
                                                                            3. Paacutegina 39
                                                                              1. Botatildeo 7
                                                                              2. Botatildeo 8
                                                                              3. Botatildeo 4
Page 29: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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UnespR

edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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Quando se examina o ensino dessa mateacuteria eacute necessaacuterio fazer a triparticcedilatildeo acima uma vez que as motivaccedilotildees e as habilidades a serem ensinadas satildeo especiacuteficas de cada uma delas Cursos para a formaccedilatildeo de filoacutesofos seratildeo muito distintos de cursos para a formaccedilatildeo de comentadores e estes por sua vez diferiratildeo em boa medida dos de formaccedilatildeo de historiadores

Parece inegaacutevel que um sistema (regional estadual ou nacional) de cursos universitaacuterios de Filosofia ndash uso esta palavra com a inicial maiuacutescula para designar o conjunto das trecircs mo-dalidades ndash deve ter idealmente como objetivo a formaccedilatildeo dos trecircs tipos de estudiosos e natildeo apenas de um ou dois deles Ou seja quando um determinado sistema de ensino natildeo estaacute fa-zendo isso entatildeo ele deve ter a forte preocupaccedilatildeo de passar a fazecirc-lo E tal proposiccedilatildeo decorre da importacircncia e indispensabilidade dessas trecircs aacutereas coisas que nos limites deste artigo darei como assentes isto eacute aceitas sem necessidade de argumentaccedilatildeo aqui

Natildeo me ocuparei neste trabalho com o importante tema do ensino da histoacuteria da filoso-fia nem do comentaacuterio filosoacutefico Meu foco seraacute o ensino da filosofia ou da filosofia propria-mente dita bem como a situaccedilatildeo de tal ensino na universidade brasileira

Na maior parte das aacutereas do conhecimento haacute no que diz respeito ao seu ensino uma duali-dade a da atividade e a do conteuacutedo produto dela este vem a ser o corpo de teses e proposiccedilotildees metodoloacutegicas mais ou menos consensualmente aceitas na comunidade dos investigadores e a atividade eacute a de fazer essa ciecircncia isto eacute praticar os meacutetodos e gerar os resultados na forma de um corpo de leis de teses ou de hipoacuteteses Por exemplo o ensino da fiacutesica pode abranger tanto ensinar as teorias aceitas quanto a arte de pesquisar de se tornar um fiacutesico neste ou naquele campo dessa aacuterea Ocorre que em filosofia eacute sabido que natildeo existe um corpo de teses nem aproximadamente aceitas como verdadeiras numa comunidade adequadamente ampla de estudiosos pelo contraacuterio a filosofia chama a atenccedilatildeo pelo volume de controveacutersia e desacordo tanto em temas substantivos quanto em questotildees metodoloacutegicas Uma vez que em filosofia natildeo haacute nem metodologia nem teoria substantiva minimamente aceitas para serem transmiti-das e ensinadas o que sobra para ser ensinado eacute uma atividade que eacute a de levantar questotildees discuti-las e buscar respostas para elas na esperanccedila de num futuro se chegar a um grau satis-fatoacuterio de acordo e consenso Portanto a dualidade pedagoacutegica que existe em graus diferentes ndash na verdade muito diferentes ndash nas ciecircncias simplesmente inexiste em filosofia Portanto o que existe para ser ensinado eacute uma atividade a do filosofar Daiacute que ensinar filosofia venha a ser essencialmente ensinar a filosofar ou seja ensinar a arte de filosofar

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
                            1. Paacutegina 3 Off
                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
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Page 30: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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Ao dizer isso natildeo estou evidentemente enunciando nada de novo muito pelo contraacuterio estou reafirmando aquilo que jaacute foi dito no passado e continua a ser lembrado O nome ao qual essa tese estaacute mais famosamente associada eacute naturalmente o de Kant que a afirma e a enfatiza em particular na Criacutetica da Razatildeo Pura (no final na ldquoArquitetocircnica da razatildeo purardquo) e no pequeno livro Loacutegica

Um filoacutesofo eacute algueacutem que pratica uma certa atividade isto eacute ele se define muito mais pela atividade que faz e que o insere no conjunto dos outros filoacutesofos isto eacute de pessoas que praticam a mesma atividade do que pelos produtos doutrinaacuterios particulares de sua atividade Desse modo podemos dizer que um curso que se proponha a formar filoacutesofos vai encarar seus alunos como aprendizes de filoacutesofo Assim senso o aprendiz de filosofo vai ser um aprendiz da arte de filosofar

De que maneira teria lugar o aprendizado da atividade de filosofar Em primeiro lugar o estudante de filosofia natildeo vai aprender a filosofar a natildeo ser que ele tenha agrave sua disposiccedilatildeo ini-cialmente duas coisas importantes Uma eacute que haja entre os docentes de seu curso professores que ministrem cursos filosoacuteficos propriamente ditos isto eacute que ofereccedilam ao longo de todo o periacuteodo aprendizado cursos propriamente filosoacutefico-temaacuteticos Estes cursos eacute bom obser-var natildeo precisam ser necessariamente aqueles em que o ministrador exponha suas doutrinas proacuteprias neste ou naquele campo da filosofia Pode ser que seja assim e eacute desejaacutevel que algu-mas vezes assim seja mas natildeo eacute necessaacuterio que o curso seja dessa natureza para que ele seja filosoacutefico-temaacutetico no sentido em que estou usando a expressatildeo O que ela tem de ter mini-mamente para ser filosoacutefica eacute o seguinte ela tem de por e manter no centro das atenccedilotildees o interesse pelos temas pelas questotildees o espetaacuteculo central seraacute o do levantamento de questotildees temaacuteticas de clarificaccedilatildeo delas e de discussatildeo das respostas que foram ou podem ser dadas a elas Cursos temaacuteticos nesse sentido ndash nos quais figuras histoacutericas e doutrinas vatildeo entrar de um modo essencial mas somente na medida em que contribuem para a reflexatildeo sobre essas questotildees - satildeo absolutamente essenciais Se o estudante passa todo o seu curso de graduaccedilatildeo sem ter cursos temaacuteticos ministrados no estilo de um filoacutesofo e natildeo de um historiador das ideacute-ias ou de um comentador de obras eacute muito difiacutecil que ele venha a ter alguma ideacuteia adequada do que eacute aprender filosofia do que eacute aprender a filosofar ele certamente natildeo teraacute nenhuma ideacuteia minimamente precisa e profunda do que eacute ser um aprendiz de filosofo (a menos eacute claro

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                          1. Botatildeo 11
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                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
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                                        1. Paacutegina 9 Off
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                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
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                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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                                                    2. Paacutegina 14
                                                    3. Paacutegina 15
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                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
                                                    8. Paacutegina 20
                                                    9. Paacutegina 21
                                                    10. Paacutegina 22
                                                    11. Paacutegina 23
                                                    12. Paacutegina 24
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                                                          1. Botatildeo 57
                                                            1. Paacutegina 28 Off
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                                                            3. Paacutegina 30
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                                                            6. Paacutegina 33
                                                            7. Paacutegina 34
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Page 31: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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que ele faccedila esse aprendizado por ele mesmo fora do projeto didaacutetico-pedagoacutegico de seu curso) O seu curriacuteculo e o modo como o curriacuteculo eacute praticado precisam por a discussatildeo de temas no centro do curso

Tratemos de figurar em algum detalhe como isso se passaria O professor o qual precisamos supor ser algueacutem que conhece a arte de filosofar tem de ser tambeacutem um mestre na arte de ensinar a filosofar Ele propotildee temas talvez de preferecircncia temas claacutessicos ou ldquosemi-claacutessicosrdquo porque aiacute eacute mais faacutecil encontrar um conjunto de textos do passado e contemporacircneos sobre aqueles temas cada um desses textos tem de ser apropriado para em conjunto com os demais textos fornecer material adequado para que o aprendiz se exercite e se desenvolva numa pri-meira dimensatildeo da arte do filosofar Que dimensatildeo eacute essa exatamente Eacute a da discussatildeo de um problema isto eacute da busca de procedimentos para clarificar os termos em que o problema eacute colocado e de caminhos para compreender em profundidade as respostas inclusive as res-postas conflitantes entre si e avaliar-lhe os meacuteritos e demeacuteritos relativos Qualquer iniciativa que aumente nossa compreensatildeo de um problema filosoacutefico bem como das dificuldades em resolvecirc-lo satisfatoriamente e da facilidade de incorrer em erros por si soacute faz parte valiosa do aprendizado da filosofia De fato este uacuteltimo estaacute longe de se manifestar apenas nas habili-dades de formulaccedilatildeo de teorias que julgamos aceitaacuteveis Como afirma acertadamente Popper no Prefaacutecio de sua obra Conjecturas e Refutaccedilotildees ldquotrazer agrave luz nossos erros nos permite entender as dificuldades do problema que estamos tentando resolver Eacute assim que passamos a conhecer melhor nosso problemardquo

Sem estas duas coisas um tema e um conjunto de textos apropriados natildeo haacute como proceder para tentar formar filoacutesofos Precisa haver em um curso de filosofia filoacutesofos que ministrem regularmente disciplinas centradas em temas e que utilizem a literatura do passado na medida em que ela pode contribuir tanto para a compreensatildeo do problema quanto para a discussatildeo das soluccedilotildees para ele Eacute preciso trazer a noccedilatildeo de problema de tema para o centro do palco para o centro de nossa atenccedilatildeo Com efeito boa parte da importacircncia da pesquisa em filosofia e do seu ensino reside no interesse que tecircm para a vida individual e grupal dos homens as questotildees notadamente as grandes questotildees que ela estuda isto eacute na relevacircncia des-sas questotildees para a vida na ldquoterra dos homensrdquo Precisamos estar e permanecer em contacto proacuteximo e tangiacutevel com a problemaacutetica proacutepria que eacute podemos dizer o coraccedilatildeo da filosofia e desse modo sentir as ldquopulsaccedilotildees desse coraccedilatildeordquo isto eacute vivenciar o problema em ser caraacuteter

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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
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interessante relevante palpitante Sem esse contacto vivo cultivado e regular com a prob-lemaacutetica permaneceremos estranhos agrave filosofia Para isso precisamos conjugar o estudo dos filoacutesofos do passado com o interesse crucial pelos problemas para poder exercitar a intelecto na reflexatildeo pessoal sobre temas e poder ter a possibilidade de contribuir para o debate filosoacute-fico contemporacircneo

42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Examinemos mais de perto o modo como a histoacuteria da filosofia sua historiografia e a litera-tura de comentaacuterio interviriam no ensino do filosofar O mestre-filoacutesofo que eacute um estudioso de temasproblemasconceitos da filosofia estaacute numa dependecircncia grande e inescapaacutevel dos pensadores do passado e tambeacutem da literatura historiograacutefica sobre eles Esta dependecircncia se manifesta em vaacuterios pontos alguns mais oacutebvios outros menos Entre os menos oacutebvios figura o seguinte Eacute no conviacutevio meditado com a literatura do passado recente ou natildeo que o filoacute-sofo retira parte do interesse ativo pelos temas e da energia intelectual usada em seu trabalho Ora isto eacute particularmente importante quando se trata de aprender a filosofar o aprendiz de filoacutesofo precisa conviver com os autores do passado e tambeacutem do presente precisa lecirc-los ha-bitualmente para entre outras coisas ajudar a desenvolver e manter vivo seu proacuteprio interesse pelas questotildees se natildeo eacute muito difiacutecil sustentar esse interesse De fato e em consonacircncia com o que foi observado mais atraacutes em boa medida o interesse pela filosofia eacute o interesse pelas questotildeestemas dela O aprendiz de estudioso de temas filosoacuteficos estaacute nessa dependecircncia ele necessita se perceber e se descobrir como algueacutem que partilha com grandes pensadores do passado (e tambeacutem com os do presente) os interesses temaacuteticos que satildeo os seus proacuteprios sem a percepccedilatildeo desse compartilhamento resulta em parcialmente enfraquecida a energia intelectual necessaacuteria para manter vivo o interesse pelas questotildees da filosofia

Um outro ponto pedagoacutegico-formador importante no conviacutevio com textos claacutessicos eacute que o aprendiz na medida em que trabalha uma temaacutetica recorrendo a uma variedade de visotildees alternativas (por exemplo em Filosofia Poliacutetica Aristoacuteteles Maquiavel Locke Hobbes Rous-seau Montesquieu Marx) teraacute oportunidade de descobrir algo muito precioso para ele que satildeo as afinidades ou a falta de afinidades dele com esta ou aquela escola de pensamento A descoberta e o cultivo dessas afinidades bem como a interlocuccedilatildeo com os afins e com os dis-cordantes satildeo fundamentais para estimular o prosseguimento do estudo nesses temas

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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UnespR

edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

1

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3

4

Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                              1. Botatildeo 62
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                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
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                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
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                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
                                            3. Paacutegina 11
                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
                                                    1. Paacutegina 13 Off
                                                    2. Paacutegina 14
                                                    3. Paacutegina 15
                                                    4. Paacutegina 16
                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
                                                    8. Paacutegina 20
                                                    9. Paacutegina 21
                                                    10. Paacutegina 22
                                                    11. Paacutegina 23
                                                    12. Paacutegina 24
                                                    13. Paacutegina 25
                                                    14. Paacutegina 26
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                                                      1. Botatildeo 56
                                                        1. Paacutegina 28 Off
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                                                        8. Paacutegina 35
                                                          1. Botatildeo 57
                                                            1. Paacutegina 28 Off
                                                            2. Paacutegina 29
                                                            3. Paacutegina 30
                                                            4. Paacutegina 31
                                                            5. Paacutegina 32
                                                            6. Paacutegina 33
                                                            7. Paacutegina 34
                                                            8. Paacutegina 35
                                                              1. Botatildeo 64
                                                                1. Paacutegina 36 Off
                                                                  1. Botatildeo 65
                                                                    1. Paacutegina 36 Off
                                                                      1. Botatildeo 52
                                                                        1. Paacutegina 37 Off
                                                                        2. Paacutegina 38
                                                                        3. Paacutegina 39
                                                                          1. Botatildeo 53
                                                                            1. Paacutegina 37 Off
                                                                            2. Paacutegina 38
                                                                            3. Paacutegina 39
                                                                              1. Botatildeo 7
                                                                              2. Botatildeo 8
                                                                              3. Botatildeo 4
Page 33: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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UnespR

edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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Quando se fala em histoacuteria da filosofia e comentaacuterio filosoacutefico pensa-se logo na anaacutelise e explicaccedilatildeo de texto no paciente trabalho loacutegico e semacircntico de compreensatildeo e exegese dos textos A disciplina da anaacutelise de texto eacute um meio necessaacuterio e muito importante para todos os que trabalham com Filosofia inclusive para o aprendiz de filoacutesofo Ela coloca aquele que a pratica bem numa situaccedilatildeo privilegiada para entender corretamente os textos e fazer utilizaccedilatildeo desse entendimento natildeo soacute em estudos de histoacuteria da filosofia mas tambeacutem no empreendi-mento de investigaccedilatildeo temaacutetica O profissional da Filosofia eacute ou um filoacutesofo ou um comenta-dor ou um historiador das ideacuteias (ou uma combinaccedilatildeo destes) e em qualquer desses casos estaacute crucialmente envolvida embora talvez em graus variaacuteveis a anaacutelise e explicaccedilatildeo cuidadosas de textos Assim sendo o estudante de Filosofia aiacute incluiacutedo o aprendiz de filoacutesofo precisa de um treinamento continuado em anaacutelise de texto e mais ainda que os de outras aacutereas das ciecircn-cias humanas jaacute que aquilo com que ele vai sempre estar lidando satildeo sempre textos os quais requerem uma habilidade para o seu entendimento que o estudante estaacute longe de ter quando entra na universidade

43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

Examinemos agora a situaccedilatildeo do ensino da Filosofia na universidade brasileira A implan-taccedilatildeo dos cursos universitaacuterios de Filosofia no Brasil inicialmente de graduaccedilatildeo caracterizou-se inicialmente pela rejeiccedilatildeo generalizada e indiscriminada por motivos que natildeo mencionarei aqui dos manuais tanto de filosofia quanto de histoacuteria da filosofia No que diz respeito a esta uacuteltima isso consistiu na substituiccedilatildeo desses manuais pelo estudo direto de textos originais e frequumlentemente no idioma original especialmente nos cursos ministrados nos anos de 1960 e 1970 Isso foi naturalmente um grande avanccedilo uma grande contribuiccedilatildeo que devemos credi-tar agraves primeiras geraccedilotildees de professores de Filosofia no Paiacutes O estudo das obras no original veio acompanhado de uma concepccedilatildeo de anaacutelise de texto rigorosa a mais isenta possiacutevel na eacutepoca associada ao estruturalismo Como resultado disso em poucas deacutecadas formou-se no Paiacutes um corpo de docentespesquisadores com grande conhecimento de todas as principais liacutenguas estrangeiras filosoficamente importantes e com um niacutevel de competecircncia verdadeira-mente internacional no gecircnero do comentaacuterio de obras filosoacuteficas

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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
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                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                        4. Paacutegina 12
                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
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                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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                                                    5. Paacutegina 17
                                                    6. Paacutegina 18
                                                    7. Paacutegina 19
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                                                    11. Paacutegina 23
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Ocorre no entanto que esse gecircnero acabou ocupando praticamente todo o espaccedilo que nos departamentos universitaacuterios deveria ser destinado agrave Filosofia como um todo tanto no que diz respeito ao conteuacutedo dos cursos de graduaccedilatildeo e mais tarde de poacutes-graduaccedilatildeo quanto ao da pesquisa produzida Com isso os estudos propriamente de filosofia e tambeacutem os de histoacuteria das ideacuteias filosoacuteficas simplesmente natildeo foram implantados na universidade Esse regime car-acterizado pelo domiacutenio generalizado nos cursos de graduaccedilatildeo e de poacutes do comentaacuterio de obras com a exclusatildeo quase total do gecircnero filosoacutefico e do histoacuterico no sentido estreito vou chamaacute-lo de regime do comentarismo

Este regime que tem sido praticado durante muitas deacutecadas e continua vigente constitui obviamente uma violaccedilatildeo da proposiccedilatildeo enunciada no iniacutecio deste trabalho de serem o en-sino e a investigaccedilatildeo em filosofia (propriamente dita) um dos objetivos essenciais do cultivo universitaacuterio da Filosofia

O comentarismo eacute o principal fator que tem entravado a atrasado o aparecimento na uni-versidade brasileira de uma reflexatildeo filosoacutefica original regular e consistente O ensino e a pes-quisa em Filosofia jaacute nasceram assim e assim continuam ateacute hoje Portanto o passado com essa deformaccedilatildeo comentarista ainda estaacute conosco quase que em sua inteireza ele constituiu como que um pecado original que como tal foi sendo transmitido de geraccedilatildeo para geraccedilatildeo de professores

Nesse regime do comentarismo natildeo haacute lugar para o elemento de interesse pelo objeto da filosofia pelo tema pelo problema Uma vez que a origem da filosofia estaacute no espanto na perplexidade entatildeo a esperanccedila de que a reflexatildeo filosoacutefica tenha finalmente sua plena ori-gem e desenvolvimento na universidade brasileira vai precisar esperar ateacute que o interesse pela temaacutetica e problemaacutetica filosoacuteficas deixe de ser bloqueado e sufocado pelo regime do comen-tarismo Com efeito espanto e perplexidade satildeo experiecircncias feitas em relaccedilatildeo com problemas filosoacuteficos e natildeo em relaccedilatildeo a obras que vatildeo ser objeto de comentaacuterio

Esta situaccedilatildeo anocircmala e crocircnica tem felizmente gerado um descontentamento crescente entre professores e estudante de Filosofia no Brasil E na verdade este descontentamento eacute uma das coisas mais valiosas que temos agora tanto mais que ele vem acompanhado do desejo de mudanccedila de reforma Esses portadores do desejo de mudanccedila de reforma filosoacutefica satildeo neste momento um contingente muito precioso O descontentamento com esse estado de

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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                          1. Botatildeo 11
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                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
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                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
                                            2. Paacutegina 10
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                                            4. Paacutegina 12
                                              1. Botatildeo 58
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                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
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                                                8. Paacutegina 20
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                                                10. Paacutegina 22
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                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
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                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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Page 35: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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coisas comentarista e o associado desejo de mudanccedila satildeo sinal de seriedade e profundidade filosoacuteficas de desejo de libertaccedilatildeo do modelo dominante que trava e sufoca o ensino e a pes-quisa em filosofia entre noacutes

Desde os iniacutecios da episteme e em todos os lugares onde ela foi cultivada existe algo que responde pelo nome de aprender a filosofar e nenhum filoacutesofo maduro ndash tenha sido ele genial muito bom ou apenas bom -- chegou a secirc-lo antes de aprender a filosofar e se aperfeiccediloar nesse aprendizado Ora aprender a filosofar eacute uma arte ensinaacutevel tanto quanto qualquer outra arte acadecircmica ou natildeo-acadecircmica Contudo podemos assumir que (quase) ningueacutem aprende a fi-losofar sem que haja uma organizaccedilatildeo projetada montada estruturada e equipada para atingir esta finalidade a de ensinar a filosofar Essa organizaccedilatildeo ou instituiccedilatildeo existe nos lugares onde surgiram ou continuam a surgir filoacutesofos a bem dizer estes natildeo surgiram espontaneamente mas foram formados e produzidos por instituiccedilotildees cujo objetivo era precisamente este Seraacute preciso lembrar que por exemplo a Academia platocircnica e a Liceu aristoteacutelico eram escolas de formaccedilatildeo de filoacutesofos Estas instituiccedilotildees tinham no passado e tecircm no presente uma poliacutetica de formaccedilatildeo de filoacutesofos Soacute aparecem filoacutesofos de modo regular e consistente onde existe uma poliacutetica de ensino que seja orientada para a objetivo de formar filoacutesofos vale dizer de ensinar a filosofar E no caso da situaccedilatildeo brasileira eacute possiacutevel formular-se uma poliacutetica especiacutefica que que aplicada coerentemente deveraacute no futuro dar frutos na direccedilatildeo de corrigir a distorccedilatildeo comentarista e desse modo implantar e implementar na universidade o ensino e a pesquisa regulares de filosofia propriamente dita

Uma das consequumlecircncias beneacuteficas de uma reforma desse tipo eacute sua repercussatildeo no ensino da filosofia no niacutevel meacutedio preacute-universitaacuterio De fato atualmente os professores que satildeo for-mados em sua maioria soacute tecircm condiccedilotildees de dar bons cursos se estes forem de comentaacuterio de filoacutesofos Ora esse tipo de curso natildeo eacute adequado para o niacutevel meacutedio ou o ensino fundamental para os quais os cursos temaacuteticos parecem ter mais sentido

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
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                          1. Botatildeo 11
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                                1. Paacutegina 4 Off
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                                3. Paacutegina 6
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
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                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                              1. Botatildeo 58
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                                                                            1. Paacutegina 37 Off
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Page 36: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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ficha sumaacuterio bibliografia

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Bibliografia

bull FREGE G Begriffschrift In GEACH P BLACK M (Org) Translations from the philosophical writings of Gottlob Frege Oxford Blachwell 1970

bull JAMES W Pragmatismo textos selecionados Satildeo Paulo Abril 1974 (Os Pensadores v 40)

bull JASPERS K Introduccedilatildeo ao pensamento filosoacutefico Satildeo Paulo Cultrix 1971

bull LA ROCHEFOUCAULD F Maacuteximas e reflexotildees Satildeo Paulo Escala 2003

bull MARIacuteAS J Introduccedilatildeo agrave filosofia Satildeo Paulo Duas Cidades 1966

bull MARX K Contribuiccedilotildees agrave criacutetica da economia poliacutetica Satildeo Paulo Martin Fontes 1983

bull NIETZSCHE F A gaia ciecircncia Traduccedilatildeo e notas de Rubens Rodrigues Satildeo Paulo Abril (Os Pensadores v )

bull POPPER K Conjecturas e refutaccedilotildees Traduccedilatildeo Sergio Bath Brasiacutelia UnB 1982 (Pen-samento Cientiacutefico)

bull SCHOPENHAUER A Sobre a filosofia universitaacuteria Traduccedilatildeo ML Cacciola e M Su-zuki Satildeo Paulo Polis 1991

bull WITTGENSTEIN L Investigaccedilotildees filosoacuteficas 2 ed Petroacutepolis Vozes 1994

bibliografia

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
                            1. Paacutegina 3 Off
                              1. Botatildeo 62
                                1. Paacutegina 4 Off
                                2. Paacutegina 5
                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
                                    1. Paacutegina 4 Off
                                    2. Paacutegina 5
                                    3. Paacutegina 6
                                    4. Paacutegina 7
                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
                                        1. Paacutegina 9 Off
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                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
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edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

1

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Autoria

Antonio Trajano Menezes Arruda

Ficha da Disciplina

Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Ficha da disciplina

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edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                                3. Paacutegina 6
                                4. Paacutegina 7
                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
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                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
                                                2. Paacutegina 14
                                                3. Paacutegina 15
                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
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Page 38: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

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isciplina 01TEMAS

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Apresentaccedilatildeo

Nosso ponto de partida seraacute a ideacuteia de problema ou questatildeo da Filosofia Satildeo vaacuterios os problemas da Filosofia em suas vaacuterias disciplinas Eacutetica Teoria do Conhecimento Filosofia Poliacutetica Filosofia da Arte Filosofia da Mente e da Accedilatildeo Filosofia da Linguagem etc Em geral os problemas filosoacuteficos satildeo de natureza especulativa isto eacute se referem a conceitos ob-jetos ou eventos que as ciecircncias naturais por diferentes motivos parecem inadequadas para abordar ou sua abordagem se mostra insuficiente Apresentaremos mais adiante alguns exem-plos de problemas filosoacuteficos

Assumindo caracterizada a noccedilatildeo de problemas filosoacuteficos podemos considerar a Filoso-fia como sendo a atividade de busca de respostas para esses problemas busca essa marcada por trecircs traccedilos principais que satildeo a de ser racional e intersubjetivamente partilhaacutevel e de ser desinteressada Com a primeira caracteriacutestica a da racionalidade queremos dizer que ela natildeo recorre a elementos miacutesticos como a feacute ou a iluminaccedilatildeo religiosa A segunda significa o seguinte o processo de raciociacutenio do filoacutesofo e o resultado a que ele chega tecircm de poder ser feitos ou refeitos por outros filoacutesofos que se apliquem ao assunto Quanto agrave terceira caracter-iacutestica ela seraacute tratada mais adiante

Na verdade a Filosofia eacute apenas uma entre muitas outras modalidades da busca de conhe-cimento caracterizadas pelos elementos acima As outras modalidades satildeo as vaacuterias ciecircncias naturais a matemaacutetica a loacutegica e as ciecircncias humanas Todas elas satildeo modalidades do saber teoacuterico que chamamos com o nome geneacuterico de episteme Falaremos primeiro dos elementos que a Filosofia partilha com essas outras modalidades isto eacute de iniacutecio discorreremos sobre a episteme em geral (Seccedilatildeo 2) e depois mais especificamente sobre os problemas e o meacutetodo dessa forma particular de episteme que eacute a Filosofia (seccedilotildees 3 e 4 respectivamente)

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edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

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Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
                      3. Botatildeo 10
                        1. Paacutegina 3 Off
                          1. Botatildeo 11
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                                5. Paacutegina 8
                                  1. Botatildeo 63
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                                    5. Paacutegina 8
                                      1. Botatildeo 60
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                                          1. Botatildeo 61
                                            1. Paacutegina 9 Off
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                                              1. Botatildeo 58
                                                1. Paacutegina 13 Off
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                                                4. Paacutegina 16
                                                5. Paacutegina 17
                                                6. Paacutegina 18
                                                7. Paacutegina 19
                                                8. Paacutegina 20
                                                9. Paacutegina 21
                                                10. Paacutegina 22
                                                11. Paacutegina 23
                                                12. Paacutegina 24
                                                13. Paacutegina 25
                                                14. Paacutegina 26
                                                15. Paacutegina 27
                                                  1. Botatildeo 59
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Page 39: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

39

UnespR

edefor bull Moacutedulo I bull D

isciplina 01TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia

1

2

3

4

Estrutura da Disciplina

Disciplina Filosofia geral e problemas metafiacutesicos

Tema 1 A Filosofia e a perplexidade

Toacutepico 11 ndash A ineacutercia do haacutebito

Toacutepico 12 ndash Preconceitos e estereoacutetipos

Toacutepico 13 ndash Coragem e honestidade intelectuais

Tema 2 Os problemas filosoacuteficos

Toacutepico 21 ndash A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia

Toacutepico 22 ndash A problematicidade das questotildees filosoacuteficas

Tema 3 O problema do meacutetodo na Filosofia

Toacutepico 31 ndash Dificuldade para se formular um meacutetodo na FilosofiaToacutepico 32 ndash Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico

Toacutepico 33 ndash Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico

Tema 4 Filosofia e Ensino da Filosofia

Toacutepico 41 ndash Trecircs tipos de atividade filosoacutefica

Toacutepico 42 ndash A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia

Toacutepico 43 ndash A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 40: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoCoordenadoria de Estudos e Normas PedagoacutegicasGabinete da CoordenadoraPraccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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Page 41: Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da ... · como são, ou ocorrerem como ocorrem, e de se perguntar por que será que elas são assim, e não de outro modo,

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeoMaacutercio Antocircnio Teixeira de Carvalho

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Liliam Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • 1 A Filosofia e a perplexidade
    • 11 - A ineacutercia do haacutebito
    • 12 - Preconceitos e estereoacutetipos
      • 13 - Coragem e honestidade intelectuais
      • 2 Os problemas filosoacuteficos
        • 21 - A primordialidade dos problemas filosoacuteficos nas vaacuterias aacutereas da Filosofia
          • 22 - A problematicidade das questotildees filosoacuteficas
          • 3 O problema do meacutetodo na filosofia
            • 31 - Dificuldade para se formular um meacutetodo na Filosofia
              • 33 - Componentes objetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 32 - Componentes subjetivos do meacutetodo filosoacutefico
              • 4 Filosofia e Ensino da Filosofia
                • 41 - Trecircs tipos de atividade filosoacutefica
                  • 43 - A relevacircncia da abordagem temaacutetica no ensino da Filosofia
                  • 42 - A relevacircncia da Histoacuteria da Filosofia no ensino da Filosofia
                  • Bibliografia
                  • Ficha da Disciplina
                      1. Botatildeo 2
                      2. Botatildeo 3
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