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Auta Stella Medeiros Germano Joel Câmara de Carvalho Filho Astronomia DISCIPLINA Galileu e a nova Física Autores aula 09

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Auta Stella Medeiros Germano

Joel Câmara de Carvalho Filho

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Galileu e a nova Física

Autores

aula

09

Aula 09  AstronomiaCopyright © 2007 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da

UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Divisão de Serviços TécnicosCatalogação da publicação na Fonte. UFRN/Biblioteca Central “Zila Mamede”

Governo Federal

Presidente da RepúblicaLuiz Inácio Lula da Silva

Ministro da EducaçãoFernando Haddad

Secretário de Educação a Distância – SEEDCarlos Eduardo Bielschowsky

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

ReitorJosé Ivonildo do Rêgo

Vice-ReitoraÂngela Maria Paiva Cruz

Secretária de Educação a DistânciaVera Lúcia do Amaral

Secretaria de Educação a Distância- SEDIS

Coordenadora da Produção dos MateriaisMarta Maria Castanho Almeida Pernambuco

Coordenador de EdiçãoAry Sergio Braga Olinisky

Projeto GráficoIvana Lima

Revisores de Estrutura e LinguagemEugenio Tavares BorgesJânio Gustavo BarbosaThalyta Mabel Nobre Barbosa

Revisora das Normas da ABNTVerônica Pinheiro da Silva

Revisoras de Língua PortuguesaJanaina Tomaz Capistrano

Sandra Cristinne Xavier da Câmara

Revisores TécnicosLeonardo Chagas da Silva

Revisora TipográficaNouraide Queiroz

IlustradoraCarolina Costa

Editoração de ImagensAdauto HarleyCarolina Costa

DiagramadoresBruno de Souza Melo

Dimetrius de Carvalho FerreiraIvana Lima

Johann Jean Evangelista de Melo

Adaptação para Módulo MatemáticoAndré Quintiliano Bezerra da SilvaKalinne Rayana Cavalcanti Pereira

Thaísa Maria Simplício Lemos

Imagens UtilizadasBanco de Imagens Sedis - UFRN

Fotografias - Adauto HarleyStock.XCHG - www.sxc.hu

Carvalho Filho, Joel Câmara de. Astronomia: Interdisciplinar / Joel Câmara de Carvalho Filho, Auta Stella de Medeiros Germano. – Natal, RN: EDUFRN, 2007.

300 p. : il.

1. Astronomia. 2. Sistema Solar. 3. Fenômenos astronômicos. 4. Astrofísica. 5. Cosmologia. I. Germano, Auta Stella de Medeiros.

ISBN

CDD 520RN/UF/BCZM 2007/54 CDU 52

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Copyright © 2007 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da

UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Apresentação

N esta aula, estudaremos as grandes mudanças ocorridas na Ciência, particularmente na Física e na Astronomia, durante os séculos XVI e XVII. Com a divulgação do sistema heliocêntrico de Copérnico e a revisão das idéias e conceitos aristotélicos,

astrônomos e matemáticos como Tycho Brahe, Johannes Kepler, Galileu Galilei e Isaac Newton puderam desenvolver uma teoria do universo baseada não apenas em hipóteses, mas em observações e experimentos. Assim, nasce a Ciência Moderna e o método científico como o conhecemos hoje. Veremos a revisão dos conceitos de Aristóteles sobre o movimento dos corpos e as conseqüências disso nas novas idéias introduzidas por Galileu e suas grandes descobertas.

ObjetivosEntender as idéias de Aristóteles sobre a constituição do universo e sobre o movimento dos corpos no ambiente terrestre e no mundo dos objetos celestes.

Descrever as críticas feitas à Física aristotélica por Galileu e os experimentos realizados por ele, os quais constituem o advento do método científico e da Ciência Moderna.

Conhecer as contribuições de Galileu para a Astronomia com a utilização pioneira do telescópio.

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A teoria aristotélica sobre o movimento

V ocê deve estar lembrado que, como mencionamos na aula anterior, Aristóteles (Figura 1) acreditava que o mundo terreno ou sublunar (a Terra e todos os objetos que nela existem) era formado pelos quatro elementos fundamentais: terra, água, ar

e fogo. Esses elementos possuíam lugares bem definidos no Universo que seriam o “lugar natural” de cada um. Por outro lado, o cosmos e os objetos celestes eram compostos por um quinto elemento chamado “quintessência”, o qual conferiria um caráter de perfeição aos corpos celestes e ao cosmos ou mundo supralunar, em contraposição ao caráter imperfeito do mundo sublunar.

Ele acreditava que o movimento dos objetos era determinado pela natureza da substância da qual era feito. Por exemplo, uma pedra caía no chão porque a pedra e o chão eram feitos de uma substância similar, no caso, “terra”. Ou, ainda, a pedra caía porque o lugar natural dos corpos pesados era o centro do Universo e era por essa razão que ali estava a Terra (Figura 2). Quanto mais pesado um corpo, mais terra ele continha e mais rápido caía no chão.

Figura 1 - O filósofo Aristóteles

No caso da água, ela se espalhava pelo chão porque seu lugar natural é a superfície da Terra. As gotas de chuva que estão no ar caem em direção à Terra sobre a qual está a água, seu lugar natural. As bolhas de ar na água subiam à procura da camada de ar que fica mais alta. A fumaça subia porque, sendo feita de ar e fogo, procuraria estar junto do ar e longe da terra e da água. Por sua vez, como o fogo fica na esfera mais alta acima de nós, as chamas queimam para cima.

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Primeiro motor

Esfera das estrelas fixas

Esferas planetárias

Fogo

Ar

Água

Terra

Figura 2 - A estrutura do Universo segundo Aristóteles

É importante também notar que, para Aristóteles, os objetos mais pesados teriam uma tendência maior de atingir o seu lugar próprio original. Dessa forma, o corpo mais pesado cairia mais rapidamente que o mais leve. Como veremos mais adiante, essa idéia, juntamente com outros conceitos da Física aristotélica, foi contestada experimentalmente por Galileu.

Para Aristóteles, os diferentes objetos que encontramos no mundo terreno, sublunar (em oposição ao mundo da esfera celeste, supralunar), são constituídos de diferentes proporções dos quatro elementos fundamentais terra, água, ar e fogo. Assim, um objeto pode ser mais ou menos pesado de acordo com a proporção que possua de cada um dos quatro elementos.

Em relação à quintessência, considerada a substância mais perfeita, os corpos celestes que dela eram feitos deviam executar um movimento também perfeito no céu, ou seja, o movimento circular.

Por outro lado, no seu modelo geocêntrico, Aristóteles propunha que, para além de todas as esferas celestes, para além da esfera das estrelas fixas, havia o que ele chamava de Primeiro Motor. Este era o motor imóvel que impulsionava todas as coisas sem que ele mesmo se movesse. Os corpos celestes eram impulsionados em suas esferas de fora para dentro pelo Primeiro Motor, o qual os fazia moverem-se numa trajetória circular perfeita com velocidade constante.

Outro aspecto fundamental da Física aristotélica é que os objetos só se movem enquanto forem empurrados. As esferas celestes se movem porque sofrem a ação do Primeiro Motor, que está continuamente aplicando uma força às esferas mais externas e que faz se mover todo o cosmos. Os objetos na Terra param de se mover se removermos a força a eles aplicada.

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Atividade 1

Como você pode ver, na cosmologia aristotélica, cada coisa tem seu lugar, e ali deve permanecer. Se você desloca um objeto de sua posição própria ou natural, ele tende a voltar imediatamente para a mesma, por meio de um “movimento natural”. Por essa razão, um objeto pesado quando elevado do chão cai de volta, pois o chão é o seu lugar “próprio”. Essa lei aplica-se tanto aos objetos inanimados como às coisas vivas, de maneira que, por exemplo, os pássaros voam e os peixes nadam porque essa é a sua natureza.

Note que a Física de Aristóteles está muito próxima do senso comum e da nossa experiência quotidiana. É bastante freqüente pensar que não pode haver movimento sem força e que força e velocidade são proporcionais. Contudo, para a Física Moderna, essas noções não são corretas e as idéias de Aristóteles significaram um entrave ao desenvolvimento científico durante toda a Idade Média. Como veremos a seguir, coube a Galileu demonstrar suas falhas e erros e estabelecer um novo método de investigação da natureza e uma nova Física.

Um argumento contrário a essa teoria é: como explicar o fato de uma flecha continuar se movendo no ar mesmo depois de deixar o arco e não estando mais em contato com a corda que exerce a força que a impulsiona? Tente explicar tal situação a partir das idéias de Aristóteles. Mais tarde, indicaremos uma resposta.

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Voltando à atividade 1, podemos oferecer uma explicação possível para o caso da flecha com base na Física aristotélica. Ao se movimentar pelo ar, a flecha criaria um vácuo atrás dela. O ar então tenderia a preencher esse vácuo e uma força seria aplicada à flecha, impulsionando-a para frente.

A revolução de Galileu - contexto histórico

A s mudanças na visão de mundo predominante durante toda a Idade Média tiveram lugar no período compreendido entre os séculos XVI e XVII. Profundas transformações sociais ocorreram a partir do século XIV na Itália e aprofundaram-

se durante o Renascimento na literatura, artes plásticas, música, ciências, tecnologia, cosmologia e filosofia. Uma verdadeira revolução científica acontece em tal período, fruto de uma grande efervescência intelectual que propunha uma nova maneira de conhecer e explicar o mundo. A humanidade redescobria o conhecimento greco-romano e rompia com a tradição cristã medieval.

Nesse contexto, surge a figura de Galileu Galilei que, com suas idéias e pesquisas, principalmente no campo da Astronomia e da Mecânica, formulou o método experimental e estabeleceu os fundamentos da Ciência Moderna. No entanto, por sua audácia e determinação, pagaria um preço bem alto. A reação da Igreja Católica ao movimento separatista da Reforma Protestante, o qual questionou seus dogmas e práticas, veio com a Contra-Reforma, intensificando a perseguição àqueles que desafiavam suas crenças. A Inquisição seria agora implacável, não somente com feiticeiros e bruxas, mas também com os sábios e cientistas cujas idéias fossem consideradas heréticas. Quem se atrevesse a propagar opiniões opostas aos dogmas religiosos da Igreja era banido, torturado ou executado.

O homem medieval estava limitado às verdades contidas na Bíblia e não cabia a ele questioná-las. O seu conhecimento tinha como fronteira a fé e a teologia. Segundo São Tomás de Aquino, todas as coisas que, nas ciências, iam contra a verdade da teologia eram condenadas como falsas. Com o Renascimento, abriram-se novos horizontes: separava-se a “ordem divina”, a “ordem humana” e a “ordem natural”, de maneira que se podia investigar e explorar a Natureza através da razão. O homem não mais contempla a Natureza para a glória de Deus, mas pode agora intervir sobre ela e dominá-la.

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Galileu Galilei - uma breve biografia

G alileu Galilei (Figura 3) nasceu em Pisa, Itália, no dia 15 de fevereiro de 1564. O pai dele, Vincenzo Galilei, era músico e mercador e a mãe chamava-se Julia Ammanati di Pescia. Galileu foi o primeiro dos seis filhos do casal. Apesar de ser descendente

de nobres florentinos, sua família não possuía muitos recursos. No início do anos 1570, a família se mudou para Florença onde Galileu completou seus estudos. Seu pai era um homem de cultura e desejava uma boa posição social para o filho. Assim, aos dezessete anos, ele ingressou na Universidade de Pisa como estudante de Medicina. Contudo, após dois anos Galileu abandonou o curso e descobriu a paixão pela Física e pela Matemática.

Figura 3 - Galileu Galilei

Nessa época, mais precisamente em 1581, realizou suas primeiras observações: estudou o movimento do pêndulo. Diz-se que, observando as oscilações do candelabro da Catedral de Pisa, ele, sentindo o próprio pulso, usou os batimentos do coração para medir o seu período. Mas, somente em 1602, fez a mais importante descoberta sobre o assunto. Concluiu que a oscilação de um pêndulo apresenta uma freqüência constante que independe da sua amplitude, um fenômeno chamado de isocronismo. Tal descoberta o levaria mais tarde a estudos adicionais sobre os intervalos de tempo e o desenvolvimento de um relógio de pêndulo.

Depois de abandonar a universidade contra a vontade do pai, Galileu voltou para Florença em 1585, dedicando-se por conta própria ao estudo da Física. Suas pesquisas no campo da Mecânica resultaram na invenção da balança hidrostática em 1586 que despertou a atenção do grão-duque da Toscana, Fernando de Médici. Com isso, conseguiu um posto para lecionar Matemática na Universidade de Pisa, em 1589. Mais tarde, em 1592, o cientista mudou-se para Pádua, onde assumiu a Cátedra de Matemática com o apoio dos Médici.

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Figura 4 - Balança hidrostática

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Ao contrário de muitos dos cientistas contemporâneos de Galileu, ele não era apenas um teórico, mas possuía também um senso prático. Um bom exemplo disso foi a invenção da balança hidrostática, concebida quando ele tinha apenas 22 anos (Figura 4). Possuía um grande interesse pela mecânica e costumava ir ao porto de Veneza, onde aprendeu muito sobre a tecnologia da construção naval. Em 1594, o Senado de Veneza concedeu-lhe a patente de uma bomba capaz de puxar água com o uso da tração de cavalos (Figura 5). Já mencionamos anteriormente seus estudos sobre o isocronismo do pêndulo que levariam à construção de relógio de pêndulo, cuja precisão era muito maior que a dos relógios usados na época.

Figura 5 - Maquete da bomba d’água de Galileu

Em 1593, Galileu inventou o termoscópio, um tipo primitivo de termômetro (Figura 6). Ele acoplou um fino tubo de vidro a uma esfera oca também de vidro. A esfera era então aquecida com as mãos e a extremidade do tubo submergido num recipiente com água. Depois que a esfera era resfriada, a água subia pelo tubo. Desenvolvimentos posteriores, atribuídos a outros inventores, incluíram a substituição da água por álcool e, depois, pelo mercúrio e o uso de tubos fechados.

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Figura 6 - Modelo do termômetro concebido por Galileu

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Construiu também um instrumento (o setor) que auxiliava no apontamento preciso dos canhões de artilharia (Figura 7). Como muitos estudantes de Galileu eram membros da nobreza européia que, além dos temas tradicionais, precisavam aprender assuntos práticos, ele os ensinava fortificação, cosmografia e o uso do setor. Em 1598, Galileu escreveu um manual que ensinava o uso do setor e contratou um artesão para fabricar e vendê-lo a seus discípulos.

Figura 7 - O setor desenvolvido por Galileu e seu emprego no apontamento de canhões

O mais importante instrumento do século XVII, que se constituiu num fator decisivo para a revolução científica ocorrida naquele período, é sem dúvida alguma o telescópio. Ele teve uma grande influência na controvérsia entre os defensores do modelo geocêntrico de Ptolomeu e os defensores das idéias propostas por Copérnico no seu modelo heliocêntrico. Pela primeira vez na história, o Homem estendia seus sentidos, o que permitia a qualquer um observar e investigar os fenômenos naturais.

Pode-se dizer que o telescópio foi o protótipo dos instrumentos científicos modernos. Contudo, o seu desenvolvimento não foi apenas obra de cientistas, mas, principalmente, de artesãos, o que torna difícil a determinação exata da sua origem. As lentes já tinham

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sido introduzidas na Europa Ocidental no século XIII; com a melhoria da qualidade dos vidros, houve um grande aperfeiçoamento na confecção de lentes; e, por volta de 1350, já se construíam óculos para leitura. Estes eram feitos de lentes convexas que produziam imagens aumentadas dos objetos. Óculos feitos com lentes côncavas foram usados para corrigir a visão de pessoas míopes em meados do século XV. Um telescópio podia agora ser construído usando uma combinação desses dois tipos de lente.

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Figura 8 - O telescópio de Galileu

Hoje, sabemos que os primeiros telescópios apareceram na Holanda. Em outubro de 1608, Hans Lipperhey e Jacob Metius requereram a patente de um dispositivo capaz de “aproximar” coisas distantes. Era constituído de uma lente convexa e uma côncava colocadas em um tubo, sendo essa combinação capaz de ampliar três ou quatro vezes. Instrumentos similares se espalharam rapidamente pela Europa e, numa visita a Veneza em 1609, Galileu ficou sabendo da invenção. De volta a Pádua, conseguiu adquirir um desses instrumentos (Figura 8). Em agosto de 1609, ele apresentou ao senado veneziano um instrumento com poder de aumento de oito vezes. Em outubro ou novembro do mesmo ano, usou um instrumento com poder de aumento de vinte vezes para a observação do céu.

Com esse instrumento, Galileu observou a Lua (Figura 9), Júpiter e milhares de estrelas não visíveis a olho nu. Em março de 1610, publicou um pequeno livro de 24 páginas sob o título Sidereus nuntius (Mensageiro das Estrelas), no qual descrevia suas observações. Constatou que a superfície da Lua não era perfeitamente lisa como se pensava até então, mas cheia de montanhas, vales e crateras. Revelou também a descoberta das quatro luas de Júpiter. Posteriormente, também observou as fases de Vênus, confirmando que este girava em torno do Sol, as manchas solares e os anéis de Saturno que ele não conseguiu identificar devido às limitações do seu telescópio.

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Figura 9 - Observações da Lua feitas por Galileu

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Todas essas descobertas astronômicas realizadas em 1610 fizeram de Galileu um homem famoso. Como conseqüência, foi designado matemático da corte do duque da Toscana, em Florença no ano de 1611.

Nessa época, Galileu escreveu uma carta na qual argumentava que as passagens bíblicas eram irrelevantes no contexto científico, e que a posição da Ciência não deveria depender da fé religiosa. Em 1616, Galileu foi, pela primeira vez, proibido pela Inquisição, na pessoa do Cardeal Bellarmino, de divulgar as idéias heliocêntricas de Copérnico. Ele ficou um longo período em silêncio até publicar, em 1623, o livro Il Saggiatore (O Experimentador). Nesse livro, expunha os princípios do raciocínio científico e do processo experimental.

Também em 1623, o Cardeal Barberini, amigo e patrono de Galileu, é eleito papa sob o nome de Urbano VIII. No ano seguinte, Galileu vai a Roma e tem seis audiências com o papa. Nessas conversas, Urbano VIII assegura que ele pode escrever sobre o sistema de Copérnico desde que o considere apenas como uma hipótese matemática.

Mas, em 1632, seu livro intitulado Diálogos sobre os Dois Grandes Sistemas do Mundo despertou a ira da Inquisição. O livro confronta os sistemas geocêntrico e heliocêntrico e constitui-se numa defesa inconteste do sistema copernicano. Um longo processo tem então início para apurar as acusações feitas contra ele. Uma comissão de Cardeais é encarregada de examinar as acusações e Galileu, com quase setenta anos e muito doente, é preso e ameaçado com torturas para que se retratasse das suas idéias. Chegou-se então a um acordo pelo qual foi obrigado a negar suas idéias para escapar de ser queimado vivo como herege. Finalmente, Galileu é condenado e colocado sob prisão domiciliar para o resto de sua vida. Dizem que, após renegar sua convicção sobre o movimento da Terra, afirmando que ela não se movia, teria murmurado em voz baixa: “Eppur si muove!” (“no entanto, ela se move!”).

Em meados de 1633, começa a trabalhar na sua segunda grande obra: Diálogos sobre as Duas Novas Ciências, na qual lança as bases da Mecânica moderna. Nessa obra, analisa a queda dos corpos e estabelece o princípio da inércia que seria depois usado por Newton na concepção de sua teoria (ver próxima aula).

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Atividade 2

Galileu continua a realizar experimentos e fazer descobertas na sua residência em Arcetri perto de Florença e, já completamente cego, morre em 8 de janeiro de 1642.

Um pouco da vida pessoal de Galileu

Galileu nunca se casou. Porém, teve uma relação com Marina Gamba, que ele conheceu durante suas muitas viagens a Veneza. Moraram juntos em Pádua onde tiveram três filhos: Virgínia, Lívia e Vincenzio. Em 1610, Galileu mudou-se de Pádua para Florença. Ali, assumiu um posto na corte da família Médici. Ele deixou o filho Vincenzio com Marina Gamba em Pádua e levou suas duas filhas. Em 1613, Marina casou-se com Giovanni Bartoluzzi e seu filho foi morar com Galileu em Florença. Nesse mesmo ano, ele decidiu colocar as filhas no convento São Matteo. Virgínia e Lívia tornaram-se Irmã Maria Celeste e Irmã Arcângela, respectivamente.

Galileu cultivou uma estreita relação de amizade com sua filha Maria Celeste. Eles mantiveram uma extensa correspondência que demonstra o cuidado e carinho que a filha tinha com o pai. Sua morte em 1634 deixou Galileu muito abalado.

Liste as principais invenções de Galileu.

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Atividade 3

A Física de Galileu versus a Física de Aristóteles

A forma de pensar e ver o mundo passava por uma crise na Europa nos séculos XVI e XVII. A visão medieval de Deus no centro do universo (visão teocêntrica) aos poucos dava lugar a uma visão centrada no homem (antropocêntrica). O conhecimento e a fé

começavam a se separar e tinha início uma discussão entre os filósofos sobre a possibilidade de um novo método baseado na experimentação.

Para melhor entender a diferença entre a nova Física que nasceu com Galileu, é importante primeiramente notar que a Física aristotélica medieval é essencialmente qualitativa. Ou seja, devemos conhecer a natureza das coisas, pois é isso que determina o seu comportamento. No mundo terreno ou sublunar, o movimento de um corpo é determinado pela sua natureza – uma pedra cai para baixo à procura de seu lugar natural junto ao elemento do qual é constituída, ou seja, terra. Um corpo leve sobe porque, se composto de ar e fogo, procura o seu lugar próprio, o qual está no alto.

Por outro lado, podemos explicar o movimento dos astros, um movimento circular uniforme, devido à natureza perfeita dos mesmos. Os corpos celestes possuem movimentos que são próprios da sua natureza perfeita e imutável. Daí eles se moverem eternamente seguindo trajetórias circulares numa taxa uniforme. Giram eternamente em torno de um centro comum fixo, ou seja, o centro do Universo, a Terra.

Quais as mais importantes observações realizadas por Galileu com o telescópio?

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As observações astronômicas de Galileu revelaram que não existia diferença entre o mundo supra e sublunar, entre o céu e a Terra. Os astros não pareciam ser feitos de uma substância perfeita e imutável. Suas observações também confirmavam a hipótese de Copérnico de que a Terra era apenas mais um planeta feito do mesmo material dos outros planetas. As montanhas e vales vistos na Lua e as manchas solares, por exemplo, indicavam que esses astros deveriam possuir a mesma natureza que as coisas na Terra e deveriam ser governados pelas mesmas leis.

Além do mais, essas leis deveriam ter um caráter universal e quantitativo, em oposição ao caráter qualitativo da Física aristotélica. O movimento deveria ser descrito matematicamente a partir das medidas do espaço, tempo, massa e velocidade dos objetos estudados.

Galileu lançou as bases para o nascimento de uma nova Física que se constituiria num “golpe mortal” para a Física e cosmologia aristotélica. Como veremos na aula 10 (Leis de Kepler e a gravitação universal), coube a Isaac Newton fazer uma grande síntese e demonstrar que as mesmas leis que regem o movimento dos corpos celestes se aplicam ao movimento dos objetos na superfície da Terra.

O conceito de inércia de Galileu se opunha às idéias de Aristóteles acerca do movimento. Voltando ao exemplo da flecha, esta continua seu movimento através do ar devido a sua inércia. Da mesma forma, quando a força aplicada cessa de agir sobre um objeto que está sendo empurrado sobre uma mesa ele atinge o repouso devido às forças de atrito.

As idéias de Galileu acerca do movimento dos corpos

Nesta seção, apresentaremos as duas mais importantes idéias de Galileu sobre o movimento, ou seja, a queda livre dos corpos e o conceito de inércia.

Corpos em queda livreNa filosofia de Aristóteles, não existe efeito sem causa. Como já vimos anteriormente,

essa idéia aplicada aos corpos em movimento implica não poder haver movimento sem a ação de uma força. Conseqüentemente, a velocidade seria proporcional à força. Como o peso determina a velocidade, um objeto mais pesado cai mais rapidamente que um mais leve. Assim, um objeto de 10 kg atingiria o solo num tempo 10 vezes menor que um de 1 kg quando largados da mesma altura.

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Atividade 4

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Pegue uma folha de papel e um outro objeto mais pesado, como um limão ou uma laranja. Solte os dois (movimento de queda livre) simultaneamente de uma altura acima de sua cabeça. Escreva a seguir qual dos dois atinge o solo primeiro. O resultado está ou não de acordo com as idéias de Aristóteles?

Agora, amasse bem a folha de papel até ela tomar uma forma aproximadamente esférica. Repita a experiência e escreva o resultado observado.

A que conclusões você pôde chegar a partir desse experimento? Existe alguma contradição com a teoria aristotélica para o movimento?

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Atividade 5

O que na verdade Galileu conseguiu provar em sua época é que, quando desprezamos a resistência do ar, os objetos sofrem a ação única e exclusivamente da aceleração gravitacional. Como você verá mais adiante, ele ainda descobriu uma relação matemática para a queda dos corpos analisando o problema de uma forma mais precisa.

Galileu discordava de Aristóteles no que concerne à queda dos corpos. Ele realizou vários experimentos para testar a tese aristotélica e concluiu que objetos de pesos diferentes caem com a mesma velocidade. Mostrou também que os objetos leves eram retardados por causa da resistência do ar. Diz a lenda que Galileu realizou experiências largando balas de canhão de diversos pesos do alto da torre inclinada de Pisa.

Partindo dos resultados advindos da experimentação, ele anunciou que na ausência do ar, todos os corpos caem com velocidades iguais, não importando o seu peso ou forma. Tal afirmativa é válida até os dias atuais.

Vemos aqui o triunfo do método científico introduzido na Ciência por Galileu, a forma mais correta de estudar o mundo em nossa volta. Segundo esse método, o cientista deve primeiro observar o fenômeno na sua complexidade e reduzir essa complexidade em elementos mais simples capazes de serem traduzidos quantitativamente em linguagem matemática. Em seguida, deve formular uma hipótese para sua explicação. Na etapa subsequüente, deve fazer experimentos para testar a validade da sua hipótese e, finalmente, formular a sua teoria sobre o fenômeno em questão.

Comente os resultados que você obteve na atividade 4, considerando as experiências e resultados obtidos por Galileu sobre a queda dos corpos.

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Atividade 6

Conceito de inérciaOutro resultado obtido por Galileu e, certamente, o mais importante foi o conceito

de inércia. Nossa experiência diária parece confirmar a hipótese de Aristóteles segundo a qual o estado de repouso seria o estado natural dos corpos. Por outro lado, um corpo em movimento estaria num estado forçado, ou seja, tem que continuamente sofrer a ação de uma força. Se você colocar um livro sobre a mesa, ele ali permanecerá em repouso; se empurrar o livro, ele se movimentará até o instante em que você parar de empurrar. Quando a força cessa, o livro retorna ao seu estado natural de repouso. Assim, a Física aristotélica defendia que para o corpo manter seu estado de movimento retilíneo uniforme é necessária a ação de uma força.

Galileu, ao contrário de Aristóteles, pensava que o livro voltava ao estado de repouso devido à força de atrito entre ele e a mesa. Se fosse possível eliminar o atrito entre as superfícies, o livro continuaria em movimento retilíneo uniforme, mesmo depois de cessada a ação da força que o colocou em movimento.

Galileu percebeu as dificuldades de fazer medidas precisas de espaço, tempo e velocidade. Afinal, devido a um objeto em queda livre adquirir rapidamente uma velocidade tão grande, tornava-se difícil fazer medições precisas com os instrumentos da época. Para sanar tal problema, ele usou o que chamamos um “plano inclinado” sobre o qual a velocidade de deslocamento de um objeto é bem menor.

Nesta atividade, vamos reproduzir os experimentos de Galileu com o plano inclinado. Tome uma tábua de aproximadamente 2 metros de comprimento, coloque-a sobre uma superfície horizontal e numa de suas extremidades deixe ela apoiada sobre um objeto de mais ou menos 5 cm de altura (uma pilha de livros, por exemplo). Este é seu “plano inclinado”. Consiga uma esfera (uma bola de gude), prenda uma fita métrica sobre a tábua e use um relógio para fazer algumas medidas. Solte a esfera na parte mais elevada da tábua, deixe-a rolar e tome nota de quantos centímetros ela se desloca no primeiro segundo de tempo transcorrido desde que foi largada. Repita a medida para um tempo transcorrido de 2 s, 3 s e 4 s. Escreva os resultados no quadro a seguir.

Tempo 1 s 2 s 3 s 4 s

Distância (cm)

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As distâncias deverão ser aproximadamente 12 cm, 49 cm, 110 cm e 196 cm. O que faremos agora é verificar se existe uma relação matemática entre esses números. Foi o que Galileu deve ter feito. Você poderia construir um novo quadro como o seguinte:

Tempo � s 2 s 3 s � s

Distância 12 cm 4 x 12 cm 9 x 12 cm 16 x12 cm

4 = 2x2 9 = 3x3 16 = 4x4

Fator 22 32 42

Verifique que existe um fator multiplicativo que nos dá a distância percorrida depois de 2, 3 e 4 segundos em função da distância percorrida no primeiro segundo, ou seja, 12 cm. Vemos que o fator é igual ao tempo transcorrido elevado ao quadrado. Podemos concluir que esse resultado também é válido para um corpo em queda livre, pois, se aumentarmos a inclinação da tábua até chegar a 90 graus, teremos a queda livre. Os tempos vão ficando menores, mas o fator permanece o mesmo. Galileu concluiu que a distância percorrida por um corpo em queda livre é proporcional ao quadrado dos tempos de percursos.

Observação - Esta atividade é baseada no exercício encontrado no seguinte endereço na internet: <http://www.fisicabrasil.hpg.ig.com.br/calculando.html>. Acesso em: 23 jul. 2007.

Galileu usou o método experimental para demonstrar que um corpo mantém seu estado de movimento retilíneo uniforme sem a necessidade da ação contínua de uma força, contrariamente ao que defendia a Física aristotélica. Para tanto, largava uma esfera no topo de um plano inclinado, deixava-a rolar através de uma superfície horizontal, para em seguida subir por um segundo plano inclinado. As superfícies deveriam estar bem polidas para minimizar o efeito do atrito. Ele notou que, à medida que diminuía a inclinação do segundo plano, a esfera quase sempre atingia a mesma altura. Concluiu então que, na ausência de atrito, se o declive do segundo plano fosse nulo e, portanto, horizontal, a esfera rolaria indefinidamente.

Essas experiências com o plano inclinado levaram Galileu a concluir que existe uma propriedade chamada inércia, tal que a tendência natural de um corpo é manter seu estado de repouso ou seu estado de movimento retilíneo uniforme.

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Resumo

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Nesta aula, estudamos as idéias de Aristóteles a respeito do movimento dos corpos e vimos as grandes mudanças ocorridas na Ciência durante os séculos XVI e XVII com a divulgação do sistema heliocêntrico e a revisão da cosmologia aristotélica. Vimos que Galileu usou pela primeira vez o telescópio para observar o céu e sugeriu que a constituição dos corpos celestes era semelhante aos corpos terrestres; estabeleceu a lei que rege a queda livre dos corpos, introduziu o conceito de inércia e formulou o método experimental que estabeleceu os fundamentos da Ciência Moderna.

Auto-avaliaçãoO que pensava Aristóteles sobre o movimento dos corpos?

Faça uma breve descrição do contexto histórico que caracteriza o período das mudanças no pensamento humano para as quais Galileu tanto contribuiu.

Como você descreveria o princípio da inércia desenvolvido por Galileu?

De acordo com as idéias de Galileu sobre a inércia, a afirmação de Aristóteles: “Para manter um corpo em movimento, é necessário a ação contínua de uma força sobre ele” é falsa ou verdadeira? Por quê?

Quais os principais resultados das observações de Galileu com o telescópio?

Descreva o método experimental usado por Galileu.

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Anotações

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