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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
CONSTRUÇÃO ÉTNICA IDENTITÁRIA EM CASCAVEL-PR A PARTIR DA
FESTA DAS COLÔNIAS
Autora: Tânia Regina Frizzo Gnoatto1
Orientador: Nilceu Jacob Deitos2
Resumo
O presente artigo atende à solicitação do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE-2009, à professora Tânia Regina Frizzo Gnoatto. Trata-se da apresentação dos resultados de pesquisa de investigação histórica desenvolvida a partir de abordagem cultural e regional, considerando aspectos das relações étnico-culturais, buscando perceber a transmissão do saber historicamente acumulado num processo de colonização que envolve a comunidade local de Cascavel-PR, aliada à produção de material pedagógico, com formato de vídeo-DVD intitulado: “Construção étnica identitária em Cascavel-PR a partir da festa das colônias”, oportunizando, através de sua implementação, o caráter vivencial da mesma. Teve por público alvo os alunos de um colégio estadual de Cascavel-PR. O objetivo foi perceber o cotidiano cultural e identitário a partir de uma festa tradicional local: a Festa das Colônias, construindo meios para elaboração de arquivos que colaborassem na ampliação do conhecimento sobre a história regional, sua relação étnico-identitária, cultural e religiosa. Dessa forma, a professora pesquisadora se dedicou a apurar o impacto, os resultados alcançados e as dificuldades da construção e implementação de recursos áudio-visuais em sala de aula. Sendo possível apurar que apesar de todas as discussões a respeito da importância do reconhecimento da cultura afro-brasileira, enquanto fator de inclusão social, ainda há muito que mudar nas práticas sociais como forma de inserção desta etnia no mesmo patamar das demais descendências.
Palavras-chave: Festas; Etnias; Identidade.
1 Professora da Rede Pública do Estado do Paraná graduada em História com especialização em
Didática e Metodologia de Ensino.
2 Professor Dr. em História da Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE.
2
1 Introdução
Percebe-se que estudos históricos já desenvolvidos sobre os aspectos
regionais, principalmente no que tange às relações étnico-culturais, em grande
parte, não se preocupam ao que se refere ao objetivo primeiro deste trabalho, a
transmissão do saber historicamente acumulado, com o intuito de formar cidadãos
críticos capazes de transformar o meio no qual vivem, uma vez que a religiosidade
popular é um importante campo de estudo da história cultural como linha de estudo.
A sua importância está desvelada no fato de que essas culturas permeadas
pela religiosidade são formas de representação que uma determinada sociedade faz
de si mesma.
O trabalho de investigação histórica desenvolvido partiu de uma abordagem
cultural e regional, considerando aspectos das relações étnico-culturais, buscando
perceber a transmissão do saber historicamente acumulado num processo de
colonização que envolve a comunidade local de Cascavel-PR.
Figura 1 – Primeiros colonos chegando em Cascavel-PR Fonte: SECOM – Secretaria Municipal de Comunicação da Prefeitura de Cascavel-PR
3
Neste sentido, a presente pesquisa, integrou o Programa de
Desenvolvimento Educacional (PDE), na área de História, pretendendo estudar a
importância da Festa das Colônias, promovida pela Igreja Católica, com o apoio do
poder público municipal, que anualmente, há mais de uma década e meia é
realizada na Catedral Nossa Senhora Aparecida de Cascavel, com envolvimento de
representantes de diversos grupos étnicos.
Figura 2 – Catedral Nossa Senhora Aparecida em Cascavel-PR Fonte: SECOM – Secretaria Municipal de Comunicação da Prefeitura de Cascavel-PR
Esta festa caracteriza, entre outros aspectos, uma manifestação cultural,
religiosa e social.
Entende-se que as pessoas buscam nessas manifestações culturais uma
identificação étnica porque, por meio desses movimentos, fazem uma re-construção,
ou seja, uma releitura das suas etnias, principalmente buscando reproduzir as
características gastronômicas de cada um dos principais grupos étnicos presentes
na cidade.
4
Trata-se de uma representação da reafirmação e da construção identitária
de etnias em Cascavel.
Para o homem religioso, o espaço não é homogêneo, havendo duas porções de espaço qualitativamente diferente umas das outras. Há um espaço sagrado, “forte”, significativo, e há outros espaços não-sagrados, profanos, sem estrutura nem consistência. Essa experiência corresponde a uma “fundação do mundo”. Daí que compreendemos a importância das festas dentro das tradições religiosas, apesar da sua aparência profana e, talvez para alguns, maléfica (DURKHEIN, 1996, p. 351).
Pretendeu-se refletir, ainda, sobre a formação da Festa das Colônias em um
determinado momento histórico regional.
Não houve a pretensão de esgotar o assunto, mas se objetivou melhor
entender a sua produção na especificidade da formação das festas religiosas e sua
relação com a colonização do município, fornecendo assim elementos para discutir
no coletivo do ensino de História.
No trabalho de investigação, buscou-se analisar uma realidade específica
em um viés da história regional e como tal revelador no conjunto social.
Entende-se que processos educacionais são partes integrantes das relações
sociais historicamente determinadas, reveladoras de aspectos fundamentais para
analisar o conjunto social, uma vez que os processos educacionais são partes
integrantes de História.
A experiência sobre o sagrado e o profano tem em sua raiz elementos de
adoração, de culto, de reverência e dos desejos fundamentais a serem atendidos
pelas divindades, o que ocorre nitidamente durante o espaço sagrado da festa.
Considera-se ainda que trabalhar o tema é fundamental para preservar a
historicidade regional, incluindo gastronomia, festas tradicionais, folclore, símbolos
culturais, entre outros, pois estes preservam a história e o conhecimento no sentido
de abrir novos caminhos e horizontes para o aprimoramento contínuo do ensino de
história nas escolas públicas.
Para Durkheim (1968)
5
(...) toda festa, mesmo quando puramente laica em suas origens, tem certas características de cerimônia religiosa, pois, em todos os casos ela tem por efeito aproximar os indivíduos, colocar em movimento as massas e suscitar assim um estado de efervescência, às vezes mesmo de delírio, que não é desprovido de parentesco com o estado religioso.[...] Pode-se observar, também, tanto num caso como no outro, as mesmas manifestações: gritos, cantos, música, movimentos violentos, danças, procura de excitantes que elevem o nível vital etc. Enfatiza-se frequentemente que as festas populares conduzem ao excesso, fazem perder de vista o limite que separa o lícito do ilícito. (DURKHEIN, 1968, p.547)
É por esse motivo que foi delimitado este estudo num dos aspectos da
história de Cascavel: A Festa das Colônias e sua relação étnica, cultural e religiosa
que é quase inexistente nos trabalhos de pesquisa.
As escolas públicas devem colaborar neste trabalho, que visa principalmente
conhecer a história regional e incrementar a organização de documentos sobre a
História do Paraná.
Devido também, à solicitação do PDE, o professor pesquisador elaborou
material didático em formato de DVD, ou seja, material voltado aos professores,
apresentando imagens da cidade e da Festa das Colônias, acompanhado de
narrativa, o qual pode ser usado nas aulas como motivação.
Desenvolveu-se ainda, Grupo de Trabalho em Rede, o qual teve por público
alvo professores da rede pública estadual de ensino, sendo uma oportunidade para
análise e reflexão a respeito da temática proposta pela professora pesquisadora.
2 Compreendendo o contexto
Para melhor compreender estas análises, é importante fazer uma referência à
história de Cascavel. Conforme Sperança (1980), município que começou a se
formar em 28 de março de 1928, quando José Silvério de Oliveira, o Nhô Jeca,
arrendou as terras do colono Antônio José Elias nas quais se encontrava a
Encruzilhada dos Gomes, localizada no entroncamento de várias trilhas abertas por
ervateiros, tropeiros e militares, onde montou seu armazém.
Seu espírito empreendedor foi fundamental para a chegada de novas
pessoas, que traziam ideias e investimentos.
6
Figura 3 – Marco Zero do município de Cascavel-PR Fonte: SECOM – Secretaria Municipal de Comunicação da Prefeitura de Cascavel-PR
O trabalho da pesquisa que procuramos apresentar refere-se especificamente
a uma festa religiosa tradicional realizada em Cascavel, município de
aproximadamente 300 mil habitantes localizado no Oeste do Paraná.
Como ponto de partida a pesquisa procura focalizar a atenção em um dos
aspectos identitários da Festa das Colônias, realizada pela Catedral Nossa Senhora
da Aparecida, que tem seu ápice dia 12 de outubro, feriado nacional em
comemoração ao Dia da Padroeira do Brasil e também do município e da
Arquidiocese de Cascavel.
7
Figura 4 – Vista aérea do município de Cascavel-PR Fonte: SECOM – Secretaria Municipal de Comunicação da Prefeitura de Cascavel-PR
A Festa das Colônias reúne as pessoas que colonizaram a cidade e uma
legião que também trabalham voluntariamente para que o evento se concretize,
representando suas respectivas etnias e, conforme informação do site oficial do
município, a programação conta com 67 barracas com diversos pratos típicos,
atendendo das 18 às 23 horas.
As principais barracas gastronômicas são: alemã (tortas e bolos), francesa
(estrogonofe), italiana (pizza, macarronada), capixaba (pão de Nossa Senhora com
alho), colônia gaúcha (espeto gigante), portuguesa (bolinho de bacalhau) e
paranaense (pastel).
Além dos pratos típicos, também entram no cardápio: porco à paraguaia,
tainha recheada, Festival da Picanha, sukiyaki e costelão.
Há dois momentos distintos na festa: do lado de dentro da catedral, onde a
santa é cultuada, no templo sagrado e do lado de fora, onde o público participa das
festividades, ouve música, aprecia os pratos, as danças, participa de jogos, entre
outras atividades.
8
No dia 12 de outubro, comemoram-se três datas, embora poucos se
lembrem de todas elas: Nossa Senhora Aparecida, padroeira oficial do Brasil, o Dia
das Crianças e o Descobrimento da América.
O feriado nacional, no entanto, deve-se somente à primeira data, e, embora
a devoção à santa remonte aos idos do século XVIII, só foi decretado em 1904, que
a imagem de Nossa Senhora fosse coroada “Rainha do Brasil” e, em 1930, o Papa
Pio IX declarou Nossa Senhora Aparecida como “Padroeira do Brasil”.
No dia 3 de junho de 1980, o então presidente da República, João
Figueiredo, assinou a lei 6.802, que declara como Feriado Nacional o dia 12 de
outubro, consagrado à Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil: “Art. 1º É
declarado feriado nacional o dia 12 de outubro, para culto público e oficial a Nossa
Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil”.
Em 4 de julho de 1980, o Papa João Paulo II, em sua histórica visita ao
Brasil, consagrou a Basílica Nova de Nossa Senhora Aparecida o maior Santuário
Mariano do mundo.
3 Festas e etnias: aportes teóricos
O autor de História em Migalhas, Peter Burke, num dos seus trabalhos
acerca da cultura popular, observa
A fronteira entre as várias culturas do povo e as culturas das elites (e estas eram tão variadas quanto aquelas) é vaga e por isso a atenção dos estudiosos do assunto deveria concentrar-se na interação e não na divisão entre elas (...) biculturalidade das elites, suas tentativas de „reformar‟ a cultura popular, sua „retirada‟ delas e finalmente sua „descoberta‟, ou mais exatamente „redescoberta‟ da cultura do povo (BURKE, 1989, p. 21).
O trabalho em questão esteve atento às normas, valores e rituais, o que
trouxe a possibilidade de uma análise significativa de um determinado momento
histórico.
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Nos últimos anos, houve um movimento acadêmico que levou a repensar
aspectos da vida considerados até então sem muita importância, como o calendário
de ritos e festas.
Nestes termos, o significado do ritual pode ser interpretado quando os dados
deixam de ser visualizados apenas como fragmentos do folclore, como "relíquias", e
passam a ser contextualizados na história.
Como fundamentação teórica importante, é possível citar “As Formas
Elementares da Vida Religiosa” (1912) de Émile Durkheim (1858-1917), ao discutir
que as representações coletivas passam a ser vistas como resultado de uma
consciência coletiva.
Já a partir de Max Weber (1864-1920) surge a “sociologia compreensiva” e
os “tipos ideais”, abrindo espaço para a ideia de racionalidade dos fenômenos
religiosos – sociologia da religião – elaboração de conceitos básicos para a história
das religiões.
Max Müller (1867) inaugura a chamada “ciência das religiões” – com ele o
surgimento do conceito, enquanto disciplina, de “História das Religiões” (1873) –
origem da vida e do homem religioso e a essência da vida e do homem religioso –
caráter fenomenológico.
A partir de Carlo Ginzburg (atitudes religiosas) – cultura e religiosidade são
encaradas numa complexa discussão em torno da temporalidade (O Queijo e o
Vermes – 1986) – discute-se, então, a difusão, transmigração.
Ao analisar a festa no aspecto sagrado e profano da festividade foi utilizado
como referencial o autor romeno Mircea Eliade (1999), o qual propõe o termo
hierofania para indicar o ato da manifestação do sagrado; esse termo, aliás, é
prático, porquanto apenas exprime o conteúdo etimológico, que “algo sagrado se
nos mostra”.
A festa das Colônias realizada em Cascavel-PR tem sua matriz na
religiosidade popular e traz um conjunto de práticas simbólicas de raiz popular,
acompanhado por costumes populares cujos significados são mostrados em gestos
e atitudes que expressam a relação pessoal do homem com o sagrado pelo culto à
Santa e com o profano, por meio das festividades.
Nos dias do evento, a gastronomia típica dos colonizadores do município é
apreciada, mas não há nenhuma referência à comida de afro-descendentes, apesar
10
de a Santa cultuada ser de cor negra e haver na região uma presença significativa
de descendentes afro-brasileiros.
Percebe-se que estudos históricos já desenvolvidos sobre os aspectos
regionais, principalmente no que tange às relações étnico-culturais, em grande
parte, não se preocupam ao que se refere ao objetivo primeiro deste trabalho, a
transmissão do saber historicamente acumulado, com o intuito de formar cidadãos
críticos capazes de transformar o meio no qual vivem.
O sagrado equivale ao poder e, em última análise, à realidade por excelência. O sagrado está saturado de ser. Potência sagrada quer dizer ao mesmo tempo realidade, perenidade e eficácia. A oposição sagrado/profano traduz-se muitas vezes como uma oposição entre real e irreal ou pseudo real. (Não se deve esperar encontrar nas línguas arcaicas essa terminologia dos filósofos – real-irreal etc. –, mas encontra-se a coisa.) É, portanto, fácil de compreender que o homem religioso deseje profundamente ser, participar da realidade, saturar-se de poder (ELIADE, 1999, p. 18).
Por ser uma festa ligada a Nossa Senhora Aparecida, pode-se observar o
fato de que a Igreja Católica traz consigo diversos símbolos que despertam a
experiência individual, mas transmudam-na em ato espiritual, em compreensão
metafísica do mundo.
Não é uma tarefa fácil desvelar o sentido de um evento desta natureza, que
traz grande complexidade: a festa e seus aspectos, o sagrado e o profano, a
religiosidade do povo e também todo o processo de colonização da cidade.
Sobre isto Mircea Eliade define que:
O homem toma conhecimento do sagrado porque este se manifesta, se mostra como algo absolutamente diferente do profano. A fim de indicarmos o ato da manifestação do sagrado, propusemos o termo hierofania. Este termo é cômodo, pois não implica nenhuma precisão suplementar: exprime apenas o que está implicado no seu conteúdo etimológico, a saber, que algo de sagrado se nos revela. Poder-se-ia dizer que a história das religiões – desde as mais primitivas às mais elaboradas – é constituída por um número considerável de hierofanias, pelas manifestações das realidades sagradas. A partir da mais elementar hierofania – por exemplo, a manifestação do sagrado num objeto qualquer, urna pedra ou uma árvore – e até a hierofania suprema, que é, para um cristão, a encarnação de Deus em Jesus Cristo não existe solução de continuidade (ELIADE, 1999, p.17).
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Figura 6 – Imagem de Nossa Senhora Aparecida em frente à Catedral de Cascavel-PR Fonte: SECOM – Secretaria Municipal de Comunicação da Prefeitura de Cascavel-PR
Entende-se, ainda, que fazer um levantamento dessas fontes é fundamental
para preservar a historicidade regional, incluindo gastronomia, festas tradicionais,
folclore, símbolos culturais, entre outros.
É uma forma de preservar a história e o conhecimento no sentido de abrir
novos caminhos e horizontes para o aprimoramento contínuo do ensino de história
nas escolas públicas.
No entanto, ao escolher este viés é possível perceber a importância social,
cultural e também histórica da festa para os seus atores:
Os participantes da festa tornam-se os contemporâneos do acontecimento mítico. Em outras palavras, “saem” de seu tempo histórico – quer dizer, do tempo constituído pela soma dos eventos profanos, pessoais e intrapessoais – e reúnem se ao Tempo primordial, que é sempre o mesmo, que pertence à Eternidade. O homem religioso desemboca periodicamente no Tempo mítico e sagrado e reencontra o Tempo de origem, aquele que “não decorre” – pois não participa da duração temporal profana e é constituído por um eterno presente indefinidamente recuperável (ELIADE, 1999, p. 47).
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Observações feitas em relação ao tema dão conta de que muitas festas,
mesmo que sejam puramente laicas em suas origens, possuem certas
características de cerimônia religiosa, pois têm por efeito aproximar os indivíduos,
colocar massas em movimentos e suscitar assim um estado e efervescência.
Algumas vezes mesmo em delírio, que não é sem parentesco com o estado
religioso, porque são elas, sem dúvida, os momentos sagrados que consagram o
sentido da vida humana, inserindo-a num contexto sacral.
4 Aplicação da proposta: metodologia
Esta pesquisa pretende analisar como se formou a Festa das Colônias em
um determinado momento histórico regional.
Para tanto, utilizou-se de procedimentos metodológicos numa perspectiva
qualitativa observacional e da interpretação de dados históricos a partir de coleta de
materiais junto à Catedral Nossa Senhora da Aparecida, a qual produz uma revista
própria, e também, junto aos arquivos jornalísticos do município.
Foi analisada, portanto, uma realidade específica de um dado momento da
história regional e, como tal, reveladora de aspectos do conjunto social.
Utilizaram-se técnicas de observação, registros de comportamento e análise
de interpretação da realidade.
Os procedimentos metodológicos envolveram: análise histórica, estudo
comparativo e estudo de caso.
Apoiados nas seguintes técnicas de pesquisa:
- Pesquisa bibliográfica;
- Observação de determinados aspectos sobre as relações étnico-
culturais e religiosa sobre a Festa das Colônias;
- Organização de imagens e fontes primárias sobre a festa com o objetivo
de elaborar um documento que será trabalhado como material didático
pedagógico;
- Coleta de depoimentos a respeito da festa.
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Como produção didático-pedagógica, foi elaborado material multimídia em
formato de DVD, utilizando-se para isso de imagens cedidas por fotógrafos locais e
de texto narrativo sendo o que segue:
“FESTAS
As festas são manifestações culturais, religiosas e sociais.
Entende-se que as pessoas buscam nestas manifestações, ou seja, nas
festas identificar-se, pois é por meio desses movimentos que fazem uma
reconstrução ou uma releitura de suas etnias.
Nas festas é que estão as representações das características e onde se
conserva a cultura e a identidade de um povo.
Para melhor compreender estas análises, é importante fazer uma referência
à história de Cascavel. Município que começou a se formar em 28 de março de
1928, quando José Silvério de Oliveira, o Nhô Jeca, arrendou as terras do colono
Antônio José Elias nas quais se encontrava a Encruzilhada dos Gomes, localizada
no entroncamento de várias trilhas abertas por ervateiros, tropeiros, caboclos e
militares, onde montou seu armazém.
A partir dessa época vieram muitos migrantes italianos, alemães que
contribuíram para a colonização e a formação étnico identitária deste município que
atualmente está localizado no Oeste do Paraná e tem aproximadamente 300 mil
habitantes.
Partindo deste pressuposto do que são as festas vamos para uma
abordagem cultural e regional, considerando aspectos das relações étnico-culturais,
buscando perceber a transmissão do saber historicamente acumulado num processo
de colonização que envolve a comunidade local de Cascavel.
Sendo assim, vamos estudar a importância da festa das colônias, promovida
pela Igreja Católica com apoio do Poder Público Municipal que anualmente a mais
de uma década e meia é promovida pela catedral Nossa Senhora Aparecida, que
tem o envolvimento de diversos grupos étnicos e tem seu ápice dia 12 de outubro,
feriado nacional em comemoração ao dia da Padroeira do Brasil e também do
município e da arquidiocese de Cascavel.
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Uma vez que a religiosidade popular é um importante campo de estudo da
história cultural à “Festa das Colônias” é uma representação que a sociedade faz de
si mesma.
Para isso pretendemos melhor entender a sua produção na especificidade
da formação da festa das colônias e a sua relação com a colonização do município,
fornecendo assim elementos para discutir no coletivo do ensino de história.
A experiência sobre o sagrado e o profano tem em sua raiz elementos de
adoração, de culto, de reverência e dos desejos fundamentais a serem atendidos
pelas divindades, o que ocorre nitidamente durante o espaço sagrado das festas.
Na festa das colônias há esses dois momentos distintos, do lado de dentro
da catedral, onde a Santa é cultuada no templo sagrado e no lado de fora onde o
público participa das festividades, houve música, aprecia os pratos típicos, as
danças, participa de jogos, entre outras atividades essa festa reúne as pessoas que
colonizaram a cidade e uma legião de voluntários que também trabalham
voluntariamente para que o evento se concretize, representando assim suas
respectivas etnias apresentando na gastronomia os respectivos grupos étnicos que
ali se fazem presente.
Mas não há nenhuma referência à comida de afro-brasileiros, apesar de a
Santa cultuada ser de cor negra e haver uma presença significativa desses
descendentes no município.”
Além destes elementos, foi utilizada ainda, uma fala do professor e
historiador Nilceu Jacob Deitos, o qual expôs sobre a temática: religiosidade e
questão étnico-identitária em Cascavel-PR.
Ao trabalhar com o material de maneira didática foi obedecido o seguinte
roteiro:
1º Trabalhar o conceito de: Festas, Etnia e Identidade partindo para
uma abordagem cultural e regional, considerando aspectos das relações
étnico-culturais;
2º Fazer um apanhado de dados sobre a colonização de Cascavel e os
grupos étnicos que formaram esse município. Questionando grupos que
estão ocultos na colonização que envolve a comunidade local desse
município;
3º Fazer um estudo sobre a festa: quando é realizada, quem promove,
quais as pessoas que estão envolvidas e a gastronomia da mesma,
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questionando dentro da gastronomia a ausência de pratos típicos que fazem
referência a cultura afro-brasileira apesar de a Santa cultuada ser de cor
negra, além de haver uma presença significativa desses descendentes no
município;
4º Apresentar a festa em seus dois momentos distintos: o Sagrado e o
Profano. Promovendo questionamentos como os alunos veem estes dois
momentos, onde se sentem mais identificados e por quê?
5º Utilizar o material – vídeo/DVD - como apoio a todos esses
questionamentos e demais dúvidas que surgirem; sendo que há uma
participação do professor Dr. Nilceu Jacob Deitos, explanando sobre
religiosidade e a questão étnico-identitária em Cascavel. Partindo dessa
exposição, serão feitas outras abordagens a partir dos questionamentos dos
próprios alunos. Todas as etnias que contribuíram para a colonização do
município se fazem representar na festa?
6º Como resultado, produzir textos, organizar exposições, seminários,
trabalhos de pesquisa e apresentações do vídeo pelos próprios alunos para
os demais colegas em outras turmas.
5 Resultados e discussão
Anterior ao trabalho com os alunos, foi desenvolvido durante o Programa de
Desenvolvimento Educacional – 2009, o Grupo de Trabalho em Rede – GTR, no
qual foi apresentado o projeto de intervenção pedagógica produzido pelo presente
professor pesquisador.
Inscreveram-se três professores de História e não houve desistência.
As discussões foram muito valorosas inclusive pelo fato de que as
professoras solicitaram o acesso ao material em DVD para posteriormente
trabalharem com seus alunos.
Foi muito refletido sobre as questões de etnia e identidade.
E, realmente, nenhum dos participantes tinha se atentado para o fato de que
nunca viram nas festas das colônias que são comumente realizadas, a menção à
cultura africana.
16
Especificamente, para o desenvolvimento das atividades com os alunos, os
trabalhos tiveram início com a apresentação da proposta às turmas.
Na sequência, os alunos foram levados ao laboratório de informática para
pesquisar os conceitos das seguintes palavras: festas, etnias e identidade.
Após esta leitura, realizou-se um debate em sala de aula, o qual foi de
grande valia para o andamento dos trabalhos, chegando-se a questão do
pertencimento, ou seja, cada aluno refletiu sobre qual ou quais etnias pertencia e
também se se sentia identificado dentro dessas ou não.
Aliando-se os conceitos de etnia e identidade a festas, foi também realizada
uma análise da Festa das Colônias de Cascavel-PR para verificar se na mesma há
identificação da etnia de cada aluno, bem como em seu contexto social.
Neste momento, foi apresentado o DVD produzido pela professora
pesquisadora com o documentário sobre a Festa das Colônias.
O debate que se seguiu foi a respeito do sagrado e do profano da festa,
sendo questionado sobre qual aspecto as pessoas se identificam mais.
Voltando-se ao conceito de festas como reunião de pessoas que têm um ou
vários objetivos em comum, foi realizada a reflexão sobre a tendência cultural na
manutenção destes momentos sociais.
Ao analisar a organização da Festa das Colônias, os alunos perceberam a
ausência de representação da etnia afro-brasileira, tanto na gastronomia quanto na
parte folclórica, apesar de a santa cultuada na festa ser de cor negra.
Também, não há reconhecimento dos colonizadores afro descendentes
deste município neste ato cultural que não deixa de ser cívico.
Esta questão foi levada para casa e depoimentos das famílias demonstraram
o espanto de algumas e o conformismo de outras.
Ao se aproximarem as festividades, um grupo de alunos se dispôs a fazer
uma pesquisa na mesma e depois, organizar um novo debate, repassando
informações obtidas.
Após esta ação, percebeu-se que muitas barracas são terceirizadas e que
somente as principais etnias se fazem ali representadas.
Colheram dados importantes a respeito do sagrado, contando que a imagem
de Nossa Senhora Aparecida, que vem do Santuário de Aparecida, é uma réplica, a
qual é recebida pelo grupo dos motociclistas de Cascavel e que com o término das
festividades ela retorna para São Paulo.
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Para finalizar, os alunos produziram textos, desenhos e cartazes referentes
ao assunto. Expressaram nestes materiais, seus sentimentos, questionamentos,
depoimentos e angústias.
Foi em seguida, organizada uma exposição e os alunos apresentaram para
as turmas que não haviam participado do projeto.
6. CONCLUSÃO
Michel Vovelle (1991), em sua reflexão sobre o trabalho com o silêncio,
afirma que
A coleta de dados, para todas as direções para onde ela leva, tende a mascarar as armadilhas de sua prática. Não há métodos fáceis para reconstituir a religião popular e todos os procedimentos de abordagem devem enfrentar as dificuldades comuns de cada fonte. A mãos geral se prende à necessidade (exceto da pesquisa oral) de recorrer a uma abordagem indireta das expressões do comportamento coletivo. Essa é uma História feita de silêncio: silêncio dos interessados e silêncio mantido pela sociedade. (...) Na História da Festa, onde as conotações religiosas são essenciais, assistimos ser posta de lado e passar em silêncio toda uma rede de heranças muito antigas. (VOVELLE, 1991, p.183)
Considerando-se esta concepção, pode-se afirmar que através da realização
desta pesquisa foi possível concluir que apesar de todas as discussões a respeito da
importância do reconhecimento da cultura afro-brasileira, enquanto fator de inclusão
social, ainda há muito que mudar em nossas práticas sociais como forma de
inserção desta etnia no mesmo patamar das demais descendências.
Comprova-se isto no fato de que a Festa das Colônias - evento que resgata
culturas e origens diversas - de um dos municípios de maior importância no Estado
do Paraná, Cascavel, não apresentar representatividade afro de nenhuma natureza.
Na maioria das vezes, as pessoas acabam observando somente um aspecto
da festa das colônias, podendo se prender apenas ao evento religioso.
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Bem como aproveitar a oportunidade para prestação de trabalho social, seja
trabalhando como voluntários ou visitando e desfrutando da gastronomia como
forma de colaborar com os trabalhos da igreja.
Outros fazem do momento uma forma de lazer, distração e diversão, indo à
festa somente para comer, beber e badalar. É preciso lembrar que as festas
populares exprimem a cultura e a tradição de determinados povos.
No caso da festa analisada, isto é possível observar tanto pelos rituais
religiosos quanto pela festividade em si. São todas celebrações que reafirmam laços
sociais e raízes que aproximam as pessoas, movimentam e resgatam lembranças e
emoções.
Através do canto, da dança, da música e, principalmente, pela oportunidade
de troca de informações e divulgação de suas raízes culturais, são eternizados os
laços dos antepassados, traduzindo também, a cultura popular, a linguagem do povo
e tudo o que dele vem.
Por outro lado, a que se lembrar ainda de dois aspectos relevantes deste
momento cultural: o sagrado e o profano, os quais, segundo a antropologia, são
duas categorias para analisar símbolos sociais.
O sagrado seria o anormal, especial, do outro mundo, no caso da festa em
questão seria a parte religiosa. E, o profano seria o normal, quotidiano, deste
mundo, plebeu e permitido.
Pode-se dizer, então, que o sagrado e o profano estão presentes o tempo
todo na festa das colônias, independente da consciência ou não dos envolvidos.
Percebeu-se com a produção do material didático em formato de DVD que
se torna muito mais envolvente o trabalho didático-pedagógico ao se utilizar de
mídias diversas. O efeito visual faz com que seja atingida com mais facilidade a
compreensão do conteúdo.
É uma grande evolução a integração das Tecnologias da Informação e
Comunicação nas escolas. Nesta proposta pedagógica, representou a disposição
para aceitar um novo desafio e usá-las para novas transformações.
Segundo Correia (2011)
19
A acessibilidade às mídias e tecnologias permitirá o manuseio, a criatividade na utilização desse recurso, a percepção sobre a necessidade de conhecimento, de planejamento e de organização, propiciando oportunidades para a ressignificação desses recursos didáticos no processo de ensino-aprendizagem. A aplicabilidade das TICs favorecerá o investimento no ambiente escolar, possibilitando a construção de projetos educativos que desenvolvam a autonomia dos alunos enquanto sujeitos de sua aprendizagem, bem como, favorecerá a interação entre alunos e professores na operacionalização de uma aula dinâmica e participativa, com o uso da escrita, da oralidade, do som e da imagem estática ou não. Substratos oferecidos pelas mídias que irão enriquecer o trabalho de professores e alunos no chão da escola.
Conclui-se que as práticas pedagógicas que são desta forma planejada
permitem que o aluno desenvolva autonomia, competência de análise e reflexão,
organização do pensamento e um trabalho interdisciplinar.
No aspecto da interdisciplinaridade, ao apresentarem para os demais alunos
as suas conclusões, os envolvidos desenvolveram a capacidade de exposição tanto
escrita quanto oral, sendo recomendada tal tática.
Esta pesquisa foi de grande importância para a comunidade escolar, pois,
temas abstratos como: etnia e identidade puderam ser compreendidos e abstraídos
através da análise da realidade social e cultural do município, propiciada por um
evento tradicional local.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996.
________. Declara Feriado Nacional o Dia 12 de outubro, Consagrado a Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, Lei no 6.802, de 30 de junho de 1980. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília: 30 de junho de 1984.
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