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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4 Cadernos PDE VOLUME I

DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 - … · dados que permitissem verificar a relação entre as concepções de acadêmicos dos cursos de Pedagogia e Matemática, bem como as concepções

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE

VOLU

ME I

PROBLEMAS, QUAL É O PROBLEMA?

Autora: Marli Ribeiro Maia Eslompo1 Orientadora: Marlene Perez2

Resumo

O presente artigo é resultado dos estudos realizados e das ações propostas em Unidade Didática, abordando a resolução dos problemas aditivos – por meio dos registros das representações semióticas – desenvolvidos durante o Programa de Desenvolvimento Educacional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED) – PDE 2009/2010 – na Universidade de Ponta Grossa. Nesta produção consta a descrição dos resultados da implementação das ações desenvolvidas com 18 alunos de 5as séries do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Professor Júlio Teodorico, em Ponta Grossa, Paraná, os quais apresentavam baixo rendimento em matemática. Trata-se de uma proposta que visa a superação das dificuldades encontradas na resolução dos problemas aditivos. Numa abordagem significativa, com o emprego de Recursos Didáticos, mediadores do processo de ensino e aprendizagem da matemática, buscamos favorecer a compreensão e construção do conhecimento por meio dos registros de representações semióticas. Intencionou-se oferecer aos alunos condições de se envolverem em processos de observação e identificação dos dados dos problemas e das questões propostas, aprofundar conhecimentos matemáticos e, também, sugerir aos professores instrumentos úteis para aulas significativas. Como resultado os alunos passam a dar mais atenção aos dados dos problemas quando fazem algum tipo de registro antes de realizar cálculos numéricos.

Palavras-chave: Problemas Aditivos; Educação Matemática; Registros de Representações Semióticas; Ensino e Aprendizagem.

Abstract

This article is the result of studies performed and actions proposed in Unit Curriculum, addressing the resolutions of additive problems - through the registers of semiotic representations - developed during the Educational Development Program of Ministry of Education of Paraná (SEED) - PDE 2009/2010-University of Ponta 1 Especialista em Ensino de Física pela UEPG, Graduada em Licenciatura em Matemática e Física,

pela UEPG, atua no Colégio Estadual Prof. Júlio Teodorico. 2 Doutora em Educação pela UFPR (2008), mestre em Educação pela UEPG (1998), graduada em

Licenciatura em Matemática pela UEPG(1975). Atua como professora adjunta da UEPG, principalmente nas seguintes áreas: educação matemática, metodologia e prática de ensino de matemática, formação de professores na licenciatura em Matemática e no curso de Pedagogia.

2

Grossa. In this production is included the description of the results of implementing the actions carried out with 18 students from the 5th grades of elementary school in State School Professor Julio Teodorico, in Ponta Grossa, Paraná, which had a low income in mathematics. This is aproposal aimed at overcoming the difficulties encountered in solving additive problems. A significant approach, with the use of Instructional Resources, mediators of the process of teaching and learning of mathematics, we seek to foster understanding and knowledge construction through the registers of semiotic representations. Intentioned members areable to offer students engage in processes of observation and identification of data problems and questions proposed to deepen mathematical knowledge and also to suggest to teachers useful tools for teaching material. As a result students begin to pay more attention to data problems when they do some kind of registry before performing numerical calculations. Keywords: Additive Problems; Mathematics Education; Registers of Semiotic Representations, Teaching and Learning.

1 Introdução

Este artigo relata o trabalho com a resolução de problemas aditivos, por meio

dos registros de representações semióticas nas séries iniciais, com ênfase no

embasamento teórico e no uso das representações intermediárias que permitam aos

alunos selecionar os dados necessários à resolução dos problemas aditivos e organizá-

los, de forma que a passagem do enunciado ao tratamento aditivo ocorra naturalmente.

Apresentamos alguns pressupostos teóricos resultantes de estudos realizados que

fundamentam o trabalho e, ainda, o relato da proposta.

Partimos do pressuposto de que o trabalho com os problemas de estrutura

aditiva pode oferecer oportunidades aos professores de escolher a melhor maneira de

apresentar tais problemas − metodologia − e os resultados obtidos, sejam eles

negativos ou positivos. Isso revela a necessidade de um processo de formação dos

professores, no que se refere aos problemas aditivos, que promova a intervenção em

sala de aula e na maneira como tais problemas serão apresentados, para que haja a

superação dos fracassos encontrados.

É de fundamental importância a produção de materiais que possam facilitar o

trabalho educativo e minimizar as dificuldades de aprendizagem na disciplina de

3

matemática, com a melhoria da prática docente e do desempenho do aluno na

resolução dos problemas aditivos.

2 Os estudos realizados Nosso interesse em realizar uma proposta de intervenção em turmas de 5ª

série (6º ano) justifica-se pelas dificuldades que a maioria dos alunos tem ao resolver

problemas matemáticos de adição e subtração. Buscamos interpretar essas

dificuldades à luz de quadros teóricos e de pesquisas desenvolvidas por outros autores,

tais como: Fayol (1996); Magina (2008); Duval (1995); Vergnaud (2010) e Nunes

(1997), tendo por objetivos a organização e implementação de atividades, visando à

superação das dificuldades encontradas pelos alunos no trabalho com os problemas de

estrutura aditiva. Consideramos, ainda, que o professor tem um papel fundamental na

superação das dificuldades em relação aos problemas de estrutura aditiva.

Diante dessa discussão que ora trazemos, julgamos necessário que os

professores mobilizem conhecimentos e busquem transformar suas práticas, para que a

matemática seja ensinada de forma a garantir um real aprendizado, levando os alunos à

compreensão e à resolução dos problemas. Os estudos e as discussões apresentadas

vêm ao encontro do proposto pelas Diretrizes Curriculares Estaduais (DCE) de

Matemática. De acordo com as DCE (2008, p. 63), “Cabe ao professor assegurar um

espaço de discussão no qual os alunos pensem sobre os problemas que irão resolver,

elaborem uma estratégia, apresentem suas hipóteses e façam o registro da solução”.

É comum, durante uma aula com a resolução de problemas, no momento de

realizar a operação, ouvirmos sempre a mesma pergunta: – “Professora, é de mais ou

de menos?”. Segundo Vasconcelos,

Quem já não ouviu perguntas como essas formuladas quando alunos do primeiro grau tentam resolver problemas de adição ou subtração? Por que as crianças têm dificuldade com esse tipo específico de problema aritmético? Por que nem sempre conseguem identificar a operação aritmética necessária para a resolução dos problemas? (VASCONCELOS, 1988, p.55).

Em relação a essa situação, Centurion (1994) explica que, se o aluno não

compreender qual é a operação que precisa resolver, ele não conseguirá identificar no

problema quais as ideias envolvidas e, dessa forma, não associará, logicamente, as

4

operações a serem realizadas a essas ideias. Essa dificuldade está muito presente nos

alunos que se encontram nas 5ª séries.

Os últimos dados publicados pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação

Básica (SAEB, 2001) revelam um baixo desempenho dos alunos diante de situações-

problema que envolvem as quatro operações. Nessas avaliações, as dificuldades

encontradas pelos alunos estavam relacionadas tanto ao raciocínio, quanto ao domínio

dos procedimentos de cálculo. Diante do exposto, uma prática pedagógica que se

baseia apenas na introdução de um conceito, seguida de situações problema, às quais

regras e procedimentos devem ser aplicados, visando à fixação do conteúdo para uma

avaliação quantitativa, leva os alunos somente a associarem o conteúdo à operação

solicitada. Além disso, existe outro agravante: os professores lidam com as operações –

adição e subtração – como se fossem opostas, quando, na verdade, de acordo com a

Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud (1982), elas são componentes de uma

mesma família, de um mesmo campo conceitual. Todavia, a maioria dos professores,

por desconhecimento de teorias dessa natureza, repete práticas sem sucesso nas salas

de aula, o que faz com que a matemática deixe de ser uma atividade humana em

construção para um grande número de alunos, que se tornam privados de experiências

que lhes possibilitariam a compreensão do objeto estudado.

A esse respeito, pesquisas que discutem as dificuldades dos alunos e a

formação continuada dos professores apontam para a necessidade de uma mudança

no encaminhamento que é dado à resolução de problemas aditivos, no Ensino

Fundamental. Guimarães (2007), em pesquisa realizada com a intenção de coletar

dados que permitissem verificar a relação entre as concepções de acadêmicos dos

cursos de Pedagogia e Matemática, bem como as concepções de professores da

Educação Básica acerca do trabalho com a resolução de problemas aditivos, observou

um discurso comum entre estes sujeitos: essas dificuldades decorrem das limitações

dos próprios alunos, pelo fato de não conseguirem interpretar os problemas propostos

e/ou não diferenciarem as operações em questão.

Em estudo diagnóstico que visou identificar as competências referentes às

estruturas aditivas trazidas pelas crianças ao entrar na escola, e desenvolvidas ao longo

das quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, Magina (1998) revela que a

evolução das competências dos alunos pesquisados não segue um mesmo padrão.

Elas variam de acordo com o tipo de problema, exigindo da criança o domínio de

raciocínios distintos e tipo de contextos.

5

Em outra visão, Quintas (2007) investigou os sentidos e as percepções dos

professores polivalentes sobre as dificuldades do ensino e da aprendizagem da

matemática na resolução de problemas aditivos, por meio de um Programa de

Formação Continuada, in loco. As reflexões e os conflitos revelaram que a

compreensão dos professores a respeito de si, como Educadores Matemáticos, passa

pelas mediações que eles estabelecem na busca de soluções para os desafios de sua

condição e prática docente. A autora ressalta que um dos obstáculos encontrados

poderia residir nas dificuldades dos professores em relação ao conhecimento

matemático, pois a formação inicial oferecida nos cursos de Magistério e Pedagogia não

contempla os estudos pós-piagetianos, além de possuir uma carga horária insuficiente

ao estudo da Didática da Matemática. Ainda, ao destacar o papel da formação

continuada, Quintas (2007) enfatiza que as pesquisas e os trabalhos relacionados ao

tema devem ser divulgados, para que professores das séries iniciais do Ensino

Fundamental tenham melhor visão das estruturas aditivas e possam compreender

adequadamente o desempenho dos alunos na resolução de problemas.

Por sua vez, Guimarães (2005), em pesquisa cujo objetivo geral foi analisar a

resolução de problemas de estrutura aditiva de alunos de 3as séries do Ensino

Fundamental, propôs identificar que tipos de problemas apresentam dificuldades para

os alunos, bem como os prováveis aspectos − de ordem cognitiva ou didática − que os

condicionam. Para tanto, fez o levantamento de dados em duas etapas: na primeira

etapa, foram analisados tipos de problemas de estrutura aditiva, apresentados pelas

produções dos alunos, comparados às relações de base aditiva, propostas por

Vergnaud, com o intuito de descrever a variedade de situações apresentadas por essas

produções; na segunda etapa, mediante aos resultados obtidos, Guimarães selecionou

nove problemas de estrutura aditiva para compor uma prova aplicada aos alunos de

duas formas: coletiva e individual.

Do ponto de vista didático, os resultados mostraram que não é possível atribuir

a origem das dificuldades dos alunos no momento da resolução à frequência e à

natureza dos problemas de estrutura aditiva nos materiais didáticos. Isso porque houve

bom desempenho tanto com poucos problemas quanto com muitos problemas

presentes no livro didático ou no material apostilado. Do mesmo modo, houve ruim

desempenho com muitos e poucos problemas. Os resultados apontaram ainda que a

escolha do material didático não foi suficiente para formar bons solucionadores de

6

problemas, tendo em vista que escolas que utilizavam o mesmo material apresentaram

desempenho diferente.

Do ponto de vista dos aspectos cognitivos, Guimarães (2005) verificou que,

independentemente da forma de aplicação das provas (individual ou coletiva), o índice

de acertos continuou o mesmo. A autora concluiu que o grau de dificuldade passou a

ser maior quando os problemas: a) apresentavam incongruência entre a operação a ser

realizada e entre os verbos ou expressões portadoras de informação; b) não buscavam

os estados (inicial, intermediário ou final), mas, sim, as relações ou transformações; c)

exigiam inversão da sequência temporal.

A partir das leituras dos trabalhos acima expostos, acreditamos que o professor

tem papel fundamental na superação das dificuldades em relação aos problemas

aditivos. De acordo com Magina (2008, p. 61), “o desenvolvimento do campo conceitual

aditivo passa, necessariamente, pelo processo de aprendizagem”. Nesse caso, é

importante que o professor trabalhe com uma grande quantidade de problemas, para

que os alunos possam consolidar cada tipo de raciocínio. Ainda segundo a autora

citada, a maioria dos tipos de raciocínio não acontece de forma espontânea, mas

depende da maneira como o professor encaminha as atividades. Para que isso

aconteça, o professor deve entender que os problemas apontam para a construção dos

conceitos e que a sua operacionalidade deve ser provada em face de diversas

situações.

Portanto, é relevante que os professores mobilizem saberes e procurem

transformar suas práticas, a fim de que a matemática seja ensinada de forma a garantir

o aprendizado real, que leve os alunos ao entendimento e à resolução dos problemas.

As Diretrizes Curriculares da Educação Básica em Matemática trazem os

conteúdos estruturantes e seus desdobramentos vêm acompanhados de sugestões de

abordagens metodológicas para a sala de aula.

Propõe-se, assim, o estudo dos números, tendo como meta primordial, no campo da aritmética, a resolução de problemas e a investigação de situações concretas relacionadas ao conceito de quantidades. Da mesma forma, sugere-se que o trabalho com as operações: adição, subtração, multiplicação e divisão se dêem, principalmente, por meio de situações-problema e que o professor faça correlações com o cotidiano dos alunos, como também estimule os cálculos por estimativas. Ressalta-se, ainda, a importância de compreender as várias ideias envolvidas numa mesma operação e as relações existentes entre as operações que, a partir dos conteúdos específicos, são: - na adição: combinar física ou conceitualmente a falta do todo, a falta de uma parte;

7

- na subtração: comparar e ou igualar diferença desconhecida; sentença que indica a solução; sentença que indica o oposto da solução. (DIRETRIZES CURRICULARES..., 2006, p. 27).

Apesar de constar no currículo da escola o ensino das quatro operações desde

as séries iniciais, muitos alunos, ao final desse período, ainda sentem dificuldades em

saber, no momento da resolução, qual operação deve fazer diante de um problema.

Alguns dos procedimentos utilizados pelos alunos muitas vezes não coincidem com os

algoritmos tradicionalmente ensinados na escola, o que acaba por passar despercebido

pelos professores e colegas, e que, no entanto, poderia tornar-se, para todos os alunos

e professores, procedimentos significativos ao abrir possibilidades de aprendizagem.

Smole e Diniz (2001, p. 125) argumentam sobre a importância de o professor

“propiciar um espaço de discussão no qual eles pensem sobre os problemas que irão

resolver, elaborem uma estratégia e façam o registro da solução encontrada ou dos

recursos que utilizaram para chegar ao resultado”. As autoras afirmam que:

Para representar seus pensamentos, as crianças podem lançar mão dos recursos que lhes sejam mais familiares como a oralidade e o desenho, além da utilização de escritas matemáticas. O resolvedor faz sua opção, dependendo do problema proposto, do seu grau de envolvimento com a situação e dos conhecimentos prévios que possui para lidar com o problema (SMOLE; DINIZ, 2001, p. 126).

Esses aspectos apontam para a figura do professor e sua maneira de conduzir

a resolução de problemas em suas aulas. Cabe a ele planejar ações que assegurem

um espaço para a elaboração individual de estratégias e momentos coletivos, ou em

pequenos grupos, para que as crianças apresentem hipóteses e possam ouvir a opinião

dos colegas a respeito de seu procedimento de resolução. Garantir o registro individual

é o primeiro caminho, pois, ao fazê-lo, a criança exterioriza um conhecimento, revela

sua compreensão do próprio problema e o domínio que possui dos conteúdos

matemáticos que fazem parte daquela atividade. (SMOLE; DINIZ, 2001).

Neste trabalho, discutimos formas de encaminhamentos metodológicos que

podem contribuir para a superação das dificuldades dos alunos na resolução dos

problemas aditivos, ou seja, problemas cujos enunciados geralmente descrevem

situações econômicas ou sociais e a resolução é feita somente por meio das operações

de adição e subtração. Com relação a tais problemas, pesquisadores em educação

matemática classificaram-nos em várias categorias. Utilizaremos a classificação de

8

Vergnaud3 (1993), o qual, em seus estudos sobre as estruturas aditivas, fez uma

classificação segundo as dificuldades dos problemas e raciocínios requeridos para

resolvê-los. O autor define Campo Conceitual como um conjunto de problemas e

situações cujo tratamento requer conceitos, procedimentos e representações de tipos

diferentes, mas intimamente relacionados. Para Vergnaud (1993, p. 10), o Campo

Conceitual das Estruturas Aditivas é "[...] por um lado, o conjunto das situações, cujo

tratamento implica uma ou várias adições ou subtrações e, por outro lado, o conjunto

dos conceitos e teoremas que permitem analisar essas situações como tarefas

matemáticas".

Nas estruturas aditivas, encontramos três grupos básicos de problemas que,

segundo suas características, podem classificar-se em: composição, transformação e

comparação. Magina et al. (2008) citam, com base nos estudos de Vergnaud (1982):

a) Problemas de composição: compreendem as situações que envolvem parte-

todo – juntar uma parte com outra parte para obter o todo, ou subtrair uma parte

do todo para obter a outra parte.

b) Problemas de transformação: são aqueles que tratam de situações em que a

ideia temporal está sempre envolvida – no estado inicial tem-se uma quantidade

que se transforma (por acréscimo ou decréscimo), chegando ao estado final com

outra quantidade.

c) Problemas de comparação: dizem respeito aos problemas que comparam duas

quantidades, uma denominada referente, e a outra, o referido.

Vergnaud (1982) faz uma distinção entre o Cálculo Numérico − que se refere às

operações usuais – e o Cálculo Relacional − que se refere às operações de

pensamento necessárias para a manipulação das relações envolvidas. Ao considerar o

cálculo relacional, Vergnaud isola seis categorias de relações, em função de três tipos

principais de conceitos: a medida, as transformações temporais e as relações estáticas.

São elas: 1. Composição de medidas; 2. Transformação unindo duas medidas; 3.

Relação estática entre duas medidas; 4. Composição de duas transformações; 5.

Transformação entre duas medidas estáticas; 6. Composição de duas relações

estáticas.

3 Gerard Vergnaud é um matemático, filósofo e psicólogo francês. Formado em Genebra, compôs o

segundo conjunto de pesquisadores doutorados por Jean Piaget. Professor emérito do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), em Paris. Vergnaud é pesquisador em didática da matemática, tendo elaborado a "teoria dos campos conceituais".

9

Os problemas aditivos aparentemente simples ainda causam desconforto a

professores e alunos. Para muitos professores, de acordo com os resultados de

pesquisa, as dificuldades decorrem das limitações dos próprios alunos, pelo fato de não

conseguirem interpretar os problemas propostos e ou diferenciar as operações em

questão. Assim, o papel do professor é fundamental para conhecer os diversos

raciocínios envolvidos e diagnosticar melhor os avanços e as dificuldades de seus

alunos, baseando-se nas estratégias de que eles se utilizam na resolução dos

problemas.

3 Problemas aditivos

Os problemas aditivos de Vergnaud (1982) foram por classificados segundo

as dificuldades e os raciocínios requeridos para resolvê-los. Elaboramos diferentes

quadros a partir da classificação do autor citado, nos quais foram levantados um total

de 16 (dezesseis) problemas aditivos. Nesses quadros, trazemos as contribuições de

outros autores que discutem a mesma temática, destacando suas características em

relação à estrutura, cálculos relacionais envolvidos e sentidos de números.

3.1 Problemas de transformação

Segundo Magina (2008), as situações de transformação podem ser

consideradas positivas, quando há ganhos, ou negativas, quando há perdas. Isso porque

a associação de “ganho” com a operação de adição e de “perda” com a de subtração,

além da situação de juntar partes, constitui as primeiras representações que os alunos

formam sobre essas operações. O Quadro 1 apresenta os problemas de transformação.

10

Problema Diagrama e Cálculo relacional

1. Pedro tinha 3 figurinhas. Em seguida João lhe deu 5. Quantas figurinhas Pedro tem agora?

2. Maurício tinha 8 bolas. Em seguida deu 5 para Eduardo. Quantas bolas Maurício tem agora?

3. Marta tinha 3 pulseiras. Sandra lhe deu algumas pulseiras. Agora Marta tem 8 pulseiras. Quantas pulseiras Sandra deu a Marta?

4. Mônica tinha 8 dados. Ela deu alguns para Adriano. Agora Mônica tem 3 dados. Quantos dados deu a Adriano?

5. Rafael tinha canetas. Renata lhe deu mais 5. Agora Rafael tem 8 canetas. Quantas canetas Rafael tinha?

6. Felipe tinha pirulitos. Deu 5 a Bruna. Agora Felipe tem 3 pirulitos. Quantos pirulitos ele tinha?

Quadro 1 – Problemas de transformação elaborados pela autora, com diagramas de Vergnaud (1990),

informações, definições, características dos diferentes autores citados. Fonte: A autora (Adaptado de VERGNAUD, 1990; MAGINA, 2008).

De acordo com Magina (2008), denominam-se protótipo 2 os raciocínios

utilizados para a resolução dos problemas de adição e subtração de transformação, em

que são dados o estado inicial e uma transformação, e pede-se o estado final. Classifica

como problemas de 4ª extensão os que envolvem transformação e comparação, os

quais requerem do aluno um raciocínio aditivo mais sofisticado dentre o grupo de

problemas básicos.

Vergnaud considera esses problemas como os mais difíceis da classe de transformação, porque a solução deles envolve a operação inversa. Neste tipo de problema, o fato de o estado inicial ser desconhecido, faz com que, muitas vezes, o aluno não saiba por onde iniciar a resolução do problema, dificultando, assim a sua sistematização e, consequentemente, a obtenção da resposta correta. (MAGINA, 2008, p. 48).

Há que se considerar igualmente os sentidos dos números envolvidos, dentre

os quais os números que expressam transformações temporais – aditivas ou

subtrativas. Isso não significa que a operação para a resolução seja aditiva ou

subtrativa. O raciocínio envolvido refere-se a uma quantidade inicial que se transforma a

partir de uma ação (que pode ser de ganho ou de perda) para atingir um valor final.

11

3.2 Problemas parte-todo

Dizem respeito a situações estáticas e não a transformações. Pode-se tratar da

pesquisa de um total ou de um estado inicial – juntar uma parte com outra parte para

obter o todo, ou subtrair uma parte do todo para obter outra parte.

Problema Diagrama e

Cálculo relacional Problema

Diagrama e Cálculo relacional

11. Em uma jarra tem 3 rosas vermelhas. Na outra jarra tem 5 rosas brancas. Quantas rosas as duas jarras têm juntas?

12. Em um quintal tem 8 galinhas de cor preta e cor cinza. Cinco são de cor preta, quantas são as galinhas de cor cinza?

Quadro 2 – Problemas parte-todo elaborados pela autora, com diagramas de Vergnaud (1990),

informações, definições, características dos diferentes autores citados. Fonte: A autora (Adaptado de VERGNAUD, 1990; MAGINA, 2008).

Magina (2008) denomina protótipo 1 os raciocínios de adição e subtração

utilizados pelas crianças para a solução dos problemas em que se conhecem as partes

e se procura calcular o todo; estão relacionados "com as primeiras experiências da

criança com a operação de adição, as quais acontecem dentro do seu cotidiano e bem

antes de ela iniciar a 1a série do Ensino Fundamental" (p. 30). A autora enfatiza ainda

que “o raciocínio que a criança usa nessa situação é intuitivo, porque foi formado

espontaneamente, sem que ela se desse conta, e seguirá com ela, como modelo –

protótipo – pelo resto de sua vida" (Idem).

Já os problemas que apresentam o todo e uma das partes devem ser

trabalhados com as crianças em um segundo momento, como extensão, pois o

raciocínio requerido para resolver a situação já não é mais intuitivo. Segundo Magina

(2008, p. 38), a solução envolve a operação de subtração, enquanto a situação parte-

todo se relaciona, em geral, com a operação de adição. Esse é o motivo pelo qual

muitas crianças resolvem o problema utilizando o procedimento de complementação.

3.3 Problemas de comparação

Trata-se, conforme Magina (2008), de comparar quantidades estáticas

apresentadas com a ajuda de fórmulas, tais como: “mais de”, “menos de”. Como nos

A

B

+ ?

todo desconhecido

A

?

- T

Parte desconhecida

12

problemas de tipo mudança (transformação), tem-se a relação com uma organização

subjacente que leva a calcular ora o conjunto de chegada, ora o de partida, ora o

operador. As quantidades comparadas são denominadas referente e referido. O

Quadro 3 explicita os problemas de comparação.

Problema Diagrama e Cálculo relacional

7. Carlos tem 4 anos. Maria é 7 anos mais velha. Quantos anos têm Maria?

8. Rita tem 8 gibis da Turma da Mônica Jovem. Cássia tem 5. Quantos gibis Cássia têm a menos que Rita?

9. Maria tem 9 bonecas. Regina tem algumas bonecas. Ela tem 3 bonecas a menos que Maria. Quantas bonecas têm Regina?

10. Márcia tem 9 bonecas. Luciana tem algumas bonecas. Márcia tem 3 a menos que Luciana. Quantas bonecas tem Luciana?

Quadro 3 – Problemas de comparação elaborados pela autora, com diagramas de Vergnaud (1990),

informações, definições, características dos diferentes autores citados. Fonte: A autora (Adaptado de VERGNAUD, 1990; MAGINA, 2008).

Magina (2008, p. 41) denomina 2a extensão os problemas de comparação, cujo

“referente” e “resultado da comparação” são dados (problema 9). Requerem da criança

formas distintas de representar as operações de adição e subtração, sendo necessário

que o aluno perceba “relação” como uma comparação entre os grupos. No caso de

comparação, a criança deve partir do valor conhecido do grupo de referência (que é o

referente), adicionar (ou subtrair) um valor (que é a relação entre os dois grupos) e obter

o valor do outro grupo (que é o referido).

Os problemas de comparação (denominados 3a extensão), em que os grupos

são conhecidos e o resultado da comparação entre eles é desconhecida (problema 8),

surgem com um grau de complexidade maior. Dados os valores dos dois grupos, em

geral, não fica explícito para a criança quem é o referente e quem é o referido. Algumas

vezes, quando a criança não compreende qual é a natureza do problema e, portanto, não

tem ainda um modelo de estratégia que dê conta de resolvê-lo, é possível propor outro

problema que envolva esta mesma situação de comparação, que a ajude nessa busca.

Para Magina (2008), trata-se de sinalizar para a criança a possibilidade da estratégia de

?

A

X

Referido desconhecido

Referido

Referente

Relação

B

A

?

Resultado da comparação desconhecido

Referido

Referente

Relação

?

A

X

Referido desconhecido

Referido

Referente

Relação

B

?

X

Referente desconhecido

Referido

Referente

Relação

13

complementação para resolver o problema. A classe de situações de comparação em

que se pede para encontrar o referente, conhecendo-se o referido e a relação entre eles

é considerada difícil (problema 10), porque normalmente pensamos sobre o referente e, a

partir dele, achamos o referido. Aqui a situação é justamente inversa.

3.4 Problemas de equalização

Têm um status intermediário entre os problemas do tipo Comparação – devido

ao caráter “estático” das situações mencionadas – e os do tipo Mudança – em

consequência da transformação implicada.

Problema Diagrama e Cálculo relacional Problema Diagrama e Cálculo

relacional

13. Paulo tem 3 bolinhas de gude. Juliano tem 8. Quantas bolinhas faltam para que Paulo fique com a mesma quantidade de Juliano?

14. Aline tem 8 canetinhas coloridas. Carla tem 3. Quantas canetinhas faltam para que Carla fique com a mesma quantidade de Aline?

Quadro 4 – Problemas de Equalização elaborados pela autora, com diagramas de Vergnaud (1990),

informações, definições, características dos diferentes autores citados. Fonte: A autora (Adaptado de VERGNAUD, 1990; MAGINA, 2008).

De acordo com Nunes e Bryant (1996/1997), “um problema de equalização

é, de alguma forma, semelhante a um problema de transformação desconhecida; a

questão é descobrir quanto somar a a para torná-lo igual a b.” Assim, no problema

de equalização, a pergunta feita é diretamente sobre quanto somar a um conjunto

para torná-lo igual a outro, enquanto em um problema de transformação

desconhecida a pergunta é muito menos direta. Para quantificar a diferença entre os

conjuntos, é necessário conectar uma ação sobre objetos, com a situação à qual a

pergunta se refere, a uma relação estática. Ao mudarmos a pergunta de uma

comparação para uma pergunta de equalização, as crianças têm êxito, pois são

levadas a pensar em um procedimento para obter a resposta.

3.5 Problemas de composição de transformações

Problema Diagrama e Cálculo relacional

15. Ana saiu de casa com certa quantia, gastou R$7,00 para almoçar, depois gastou R$5,00 para jantar. Quanto Ana gastou ao todo?

Quadro 5 – Problemas de composição de transformações elaborados pela autora, com diagramas de

Vergnaud (1990), informações, definições, características dos diferentes autores citados. Fonte: A autora (Adaptado de VERGNAUD, 1990; MAGINA, 2008).

B

A

?

Relação desconhecida

Referido

Referente

Relação

B

A

?

Relação desconhecida

Referido

Referente

Relação

14

7 5

4 8

Os dados iniciais e finais nas duas ações de Ana são desconhecidos e

irrelevantes para a solução do problema, mas podem ser elementos dificultadores. Não

tendo um valor de partida, muitas crianças consideram o problema impossível. Magina

(2008, p.53) diz que “outras atribuem um valor aleatório como estado inicial, calculam o

estado final e, então, consideram uma única transformação do inicial ao final”.

3.6 Problemas de transformação de composição

Problema Diagrama e Cálculo relacional

16. No meu viveiro havia sete pássaros amarelos e cinco pretos. Ontem ganhei de meu amigo 4 pássaros amarelos e 8 pretos, os quais coloquei no viveiro. Quantos pássaros ao todo ficaram no viveiro?

Quadro 6 – Problemas de Transformação de composição elaborados pela autora, com diagramas de Vergnaud (1990), informações, definições, características dos diferentes autores citados.

Fonte: A autora (Adaptado de VERGNAUD, 1990; MAGINA, 2008).

Temos aqui uma situação que envolve tanto transformação quanto

composição, um protótipo de adição em que, somando as partes, obtemos o todo.

Segundo Magina (2008), as situações aditivas envolvem diferentes conceitos que

fazem parte das estruturas aditivas (campo conceitual aditivo). É importante conhecer

a classificação dos diferentes problemas classificados como sendo de estrutura

aditiva, para compreender os diferentes processos de resolução utilizados pelos

alunos e para entender as dificuldades que encontradas para a resolução.

4 Analisando as dificuldades na resolução de problemas aditivos à luz da Teoria

de Representações Semióticas de Duval

Duval, teórico e estudioso preocupado com a educação4, com foco no processo

de ensino e aprendizagem dos alunos, apresenta a noção de registros de

representação semiótica, a qual permite analisar a influência das representações dos

objetos matemáticos. O autor toma a questão dos registros de representação semiótica

4 Raymond Duval é psicólogo e filósofo de formação e investiga sobre a aprendizagem matemática.

Atualmente, é professor emérito na Université du Littoral Cote d'Opale, França.

?

15

como premissa para suas investigações. Busca compreender não apenas os aspectos

ligados à aprendizagem e ao ensino, mas, também, à forma como o saber pode ser

estruturado para ser ensinado e aprendido. O autor considera que, no estudo da

atividade cognitiva em matemática, é necessário considerar, além da importância das

representações semióticas, a sua forte presença na matemática. O tratamento

matemático depende do sistema de representação e os objetos matemáticos que são

ideais, isto é, não físicos, e permitem o acesso somente por meio de registros de

representação semióticas. (DUVAL, 1983).

Por meio do estudo desta teoria, podemos identificar alguns fatores que trazem

dificuldade de compreensão dos problemas. No caso deste trabalho, dos problemas

que apresentam estrutura aditiva, as diferenças de significado de uma expressão na

linguagem matemática para a linguagem do cotidiano; a variedade de significados

matemáticos que pode assumir uma palavra ou expressão; a forma e a ordem com que

os dados são apresentados; a presença de informações, e, ainda, a presença de

informações não pertinentes. A matemática é formada por várias linguagens: a figural

(não-verbal), a natural (articula, geralmente, outros elementos em outras linguagens), a

aritmética, a algébrica, a gráfica etc. Smole e Diniz argumentam que:

Há uma especificidade, uma característica própria na escrita matemática que faz dela uma combinação de sinais, letras e palavras que se organizam segundo certas regras para expressar ideias. Além dos termos mais específicos, existe na linguagem matemática uma organização de escrita nem sempre similar àquela que encontramos nos textos de língua materna, o que exige um processo particular de leitura. (SMOLE; DINIZ, 2001, p.125).

Para Duval (1993), é necessária uma abordagem cognitiva, que estuda o

funcionamento cognitivo do aluno frente a uma situação de ensino. Tal abordagem

procura estudar essa especificidade da matemática, o que a diferencia de outras áreas

do conhecimento. Os registros de representação semiótica têm importância

fundamental nas atividades cognitivas também pelo fato de atenderem funções de

comunicação, tratamento intencional e de objetivação – tomada de consciência. Um

registro de representação, para Duval (1995), consiste num sistema semiótico – sistema

de signos – que tem funções fundamentais no nível do funcionamento consciente. O

autor (2003) considera as operações cognitivas:

16

� de formação (identificação do objeto matemático representado:

enunciado de uma frase, elaboração de um texto, desenho de uma

figura, elaboração de um esquema e escrita de uma fórmula);

� de tratamento (operação cognitiva que vai compreender uma

transformação da representação no interior do mesmo sistema semiótico

em que foi formado, como, por exemplo, efetuar um cálculo, ficando

estritamente no mesmo sistema de escrita ou de representação de

números);

� de conversão (transformação de um dado registro de representação

pertencente a um sistema semiótico em outro registro pertencente a

outro sistema semiótico, por exemplo, passar da escrita algébrica de

uma equação à sua representação gráfica).

A operação cognitiva de conversão pode apresentar o fenômeno da não-

congruência semântica, responsável por dificuldades de aprendizagem de objetos

matemáticos representados por registros de representação semióticos pertencentes a

sistemas semióticos diferentes.

Existem três condições a serem satisfeitas para que dois registros de

representação semióticos sejam congruentes:

� correspondência semântica entre unidades significantes que as

constituem;

� mesma ordem possível de apreensão destas unidades, nas duas

representações;

� conversão de uma unidade significante da representação de partida a uma

só unidade significante na representação de chegada.

Para que a aprendizagem ocorra, é necessário que se tenham duas ou mais

representações do mesmo objeto matemático, de preferência em sistemas semióticos

diferentes. Duval (1993) afirma que a compreensão (integral) de um conteúdo

conceitual repousa sobre a coordenação de, no mínimo, dois registros de

representação, e esta coordenação se traduz pela rapidez e a espontaneidade da

atividade cognitiva de conversão. Para o autor, é no trânsito entre os diversos registros

de representação que se encontra a chave para o aprendizado de matemática. Quando

escolhemos um registro mais apropriado para aplicar os tratamentos, isso implica que

temos uma desenvoltura do raciocínio, resolvemos os problemas matemáticos e, assim,

aprendemos. Aponta, ainda, para a impossibilidade de determinar a natureza de uma

17

atividade de conhecimento sem considerar os objetos sobre os quais ela incide e os

meios pelos quais se pode acessar esses objetos. Segundo o autor,

[...] os objetos matemáticos, começando pelos números, não são objetos diretamente perceptíveis ou observáveis com a ajuda de instrumentos. O acesso aos números está ligado à utilização de um sistema de representação que os permite designar. (DUVAL, 2003,p.14 )

Damm5 (1992, p. 51) nos diz que uma análise da congruência e da não-

congruência da conversão do enunciado, em língua materna, para a escrita da equação

aritmética que corresponde à solução do problema permite prever a ordem das

dificuldades dos problemas. Essa dificuldade reside na escolha da operação a ser

efetuada entre os dois números do enunciado.

Duval (1995) afirma que, quando estamos diante do fenômeno de não-

congruência, a passagem de um registro a outro não pode ser feita diretamente – é

necessário passar para um terceiro registro que permita uma representação

intermediária.

Segundo Brandt (2005), alguns problemas aditivos foram utilizados por Duval

para ilustrar a congruência e a não-congruência entre dois sistemas semióticos de

representação; um na língua materna, e a sua conversão para outro, que utiliza a

escrita da equação aritmética. Por exemplo, no problema:

Ganho 3 bombons e ganho mais 6. Fico com 9 bombons.

(ganha) 3 + (ganha) 6 = (ganha) 9.

Brandt interpreta que

[...] nesse caso há correspondência semântica (ganhar → +), mesma ordem de apreensão das unidades nas duas representações (ganha 3, ganha 6, ganha 9 → 3, 6, 9) e conversão de uma unidade significante na representação de partida em uma só unidade significante na representação de chegada (ganha 3 → +3, ganha 6 → +6, ganha 9 → + 9). (BRANDT, 2005, p. 73).

Brandt (2005) alerta que, segundo Duval, esse não é o caso do problema:

5 Regina Flemming Damm é professora aposentada do Departamento de Matemática da

Universidade Federal de Santa Catarina. Fez seu doutorado na Universidade Louis Pasteur, em Estrasburgo (França), com orientação de Raymond Duval.

18

Ganha 3 bombons e perde 6 bombons. Perde 3.

(ganha) 3 + (perde) 6 = (perde) 3. Nesse caso, segundo a autora,

[...] os verbos portadores de informação semântica são antônimos (ganhar/perder) e, portanto, não há mais identidade semântica terminal, o que vai significar que as duas representações semióticas não serão congruentes, pois uma das condições não foi verificada. Esse segundo problema é mais difícil para os alunos quando se tratar de conversão. (BRANDT, 2005, p. 73).

Ou o caso do problema: Ganhou algumas, ganhou 3, no total ficou com 8. A

ordem tem que ser invertida: (ganhou) + (ganhou) 3 = ...8...

Esclarece que:

Se esse problema for resolvido [...] por um procedimento da diferença, a ordem tem que ser invertida e não há nenhuma informação semântica no enunciado em língua natural que indique a subtração exigida para o mesmo. Porém, se o problema for resolvido pelo procedimento do complemento, a ordem também tem que ser invertida, pois a comutatividade é uma exigência: (ganhou) 3 + (ganhou) ... = (ganhou) 8.. (BRANDT, 2005, p. 211)

Assim, os problemas do tipo não-congruente passam a apresentar menos

dificuldades a partir do uso de novas linguagens ou de representações intermediárias,

pelo fato de que enfrentam o fenômeno da não congruência semântica, diminuindo-a,

de acordo com os resultados obtidos por Damm (1998).

São três os fatores que comandam essa dificuldade:

− Pode haver ou não correspondência entre a operação semanticamente

sugerida pelos verbos portadores da informação numérica no enunciado e a

operação aritmética a ser usada, por exemplo, “ganhar” correspondendo a

“+” e “perder”, a “-”. Há correspondência quando há congruência semântica

entre os verbos do enunciado e o sentido da operação a ser efetuada.

− Os verbos portadores de informações numéricas podem ser ou não

antônimos. Quando os verbos são antônimos, não há univocidade semântica

terminal. Por exemplo, no problema: Miguel joga duas partidas de bolinhas

de gude. Na primeira, ganha 4. Na segunda, perde 6. O que aconteceu? É

19

preciso escolher o verbo portador da informação numérica para a solução

(ganha 4 e perde 6 e o aluno efetua 6 – 4).

− Por haver ou não conservação da ordem de apresentação dos dados

numéricos na passagem para a equação aritmética, dependendo da heurística

de resolução escolhida para a solução do problema. No problema: Cristiano

joga duas partidas de bolinhas de gude. Na primeira partida ganha 5. Joga

uma segunda partida. Depois dessas partidas, ele ganhou ao todo nove

bolinhas. O que aconteceu na segunda partida? Temos que fazer uma

inversão na ordem da apresentação dos dados para resolvê-lo (na primeira,

ganha 5, na segunda, ?, e ao todo ganha 9; para resolver o problema, o aluno

efetua 9 – 5).

Damm (1992, p. 52) faz uma análise, baseada nos critérios acima dos 12

problemas de Vergnaud e classifica-os em: “a) estritamente congruentes – quando há

correspondência, não há inversão, nem a presença de verbos antônimos. b) fortemente

não-congruentes – quando não há correspondência, há inversão e os verbos são

antônimos”.

Constata, ainda, que os três fatores não têm o mesmo peso. O da inversão, por

exemplo, é mais forte do que o da correspondência. Que os problemas fortemente não-

congruentes, se não trabalhados adequadamente, são os que persistem como

obstáculos mesmo para alunos da faixa etária de 10-11 anos.

5 O desenvolvimento da proposta

Centramos esta proposta de intervenção na organização de uma prática de

ensino que possa auxiliar os professores que ensinam matemática, na resolução de

problemas aditivos, a partir do conhecimento das estruturas desses problemas e da

interpretação das dificuldades apresentadas pelos alunos para resolvê-los. Além do

que, esta proposta está de acordo com as DCE de Matemática (2008, p. 48), que

afirma: “almeja-se um ensino que possibilite aos estudantes análises, discussões,

conjecturas, apropriação de conceitos e formulação de ideias". Neste contexto, a

proposta que apresentamos procura desenvolver aspectos das ideias citadas

20

anteriormente, utilizando para isso, os registros de representações semióticas. A

proposta de ensino para os problemas aditivos constituiu-se em diferentes fases.

Na primeira fase, realizamos uma sondagem com o grupo de 18 alunos para

diagnosticar o conhecimento e as dificuldades encontradas por eles nos algoritmos da

adição e da subtração. Na segunda fase, individualmente, os alunos trabalharam com

problemas aditivos de transformação com incógnitas em diferentes posições: no estado

final, no estado inicial e na transformação, tendo como recurso representacional o eixo

cartesiano. Na terceira fase, foram apresentados os problemas de adição e

subtração em situações correspondentes a novos significados (busca do estado

inicial, incógnita na transformação, combinação de transformações etc.), por meio de

diferentes estratégias e posterior comparação das mesmas.

PRIMEIRA FASE −−−− Sondagem com o grupo para diagnosticar o conhecimento e as dificuldades encontradas nos algoritmos

Elaboramos algumas adições e subtrações de acordo com os critérios

estabelecidos no Quadro 7, a seguir. Os itens de a até h referem-se a cada um dos

cálculos.

a) Adição de dezenas com dezenas - sem recurso à ordem superior.

A) 23 + 54 =

b) Adição de dezenas com dezenas - com recurso na ordem das dezenas

B) 39 + 87 =

c) Adição de unidades com dezenas e com centenas – com recurso nas ordens das dezenas e das centenas.

C) 13 + 589 + 5 + 503 =

d) Adição de unidades com dezenas, centenas e unidades de milhar - com recurso nas ordens das dezenas, nas centenas e nas unidades de milhar.

D) 3 415 + 78 + 9 + 895 =

e) Subtração de dezena por dezena - sem recurso à ordem superior

E) 75 - 24 =

f) Subtração de dezena por dezena - com recurso na ordem das unidades.

F) 85 - 19 =

g) Subtração de centena por centena - com recurso nas ordens das unidades e das dezenas.

G) 300 - 199 =

h) Subtração de unidades de milhar com centenas - com recurso nas ordens das unidades, das dezenas e das centenas.

H) 1 738 – 279 =

Quadro 7 − Critérios e operações utilizados para diagnosticar os conhecimentos e as dificuldades

encontrados pelos alunos nos algoritmos utilizados. Fonte: A autora

21

Resultados e discussões:

Observamos que a maioria dos alunos apresentou alguma dificuldade em

realizar as operações de adição e, principalmente, as de subtração. O levantamento

das dificuldades dos alunos revelou-se importante estratégia na busca de atividades

que pudessem realmente sanar as dificuldades dos mesmos.

O diagnóstico mostrou que as dificuldades estavam na compreensão do próprio

Sistema de Numeração Decimal e não somente nos algoritmos. Erraram adições com o

recurso a partir da ordem das centenas (c e d). Ao armar a operação, colocaram a

unidade embaixo da dezena e, consequentemente, erraram o resultado da operação(

adições c e d). No entanto, observamos que somaram corretamente os números,

inclusive quando havia necessidade de recurso a uma ordem superior. Os erros nas

adições foram erros na contagem, possivelmente engano ao somar. O recurso à ordem

superior é realizado corretamente em todas elas. A subtração teve o maior índice de

erros.

Alguns alunos realizam a subtração tirando do numeral maior o menor,

independente da posição destes numerais, mesmo o maior estando no minuendo.

Alguns cometeram esse erro apenas na posição das unidades. Outros, independente

da posição do numeral. Observamos ainda que o recurso à ordem superior começa de

forma correta em alguns casos e, só depois, a partir da ordem das dezenas, é que

iniciam os erros.

Realizamos, então, um trabalho inicial, para a superação das dificuldades

apresentadas, oportunizando aos alunos atividades diversificadas visando à

compreensão do sistema de numeração decimal (SND) e dos algoritmos usuais de

adição e subtração, ampliando as possibilidades com cálculo mental, utilizando, para

isso, jogos, representação geométrica da tabuada, dentre outros. Este trabalho nos

auxiliou a planejar melhor e trabalhar com mais segurança e na dificuldade de cada

aluno.

Os alunos mostraram-se mais estimulados ao realizarem as atividades que

permitiam a compreensão do SND. Foram realizadas atividades com o quadro valor e

lugar; com o material dourado; atividade interativa realizada no laboratório de informática

para compreensão do recurso à ordem superior; atividade com a tabuada, realizada na

malha quadriculada, na qual os alunos representavam geometricamente todos os

divisores dos números dados; atividade com o baralho (rouba monte) para exercitar o

22

cálculo mental na formação de dezenas de diferentes maneiras e atividades de adição e

subtração por meio do cálculo mental, com o registro da forma a qual o aluno pensou

para realizar cada operação.

Os alunos começavam a sanar as suas dificuldades, num processo lento de

assimilação do valor posicional, dos agrupamentos e dos diversos raciocínios

necessários à compreensão dos algoritmos da adição e da subtração. Porém, o

interesse dos alunos na realização das atividades aumentou em relação às atividades

iniciais, demonstrando maior e melhor compreensão por meio do envolvimento com os

materiais e as representações. O desafio de realizar as atividades corretamente exige

mais atenção, o que estimulamos durante toda a implementação.

Figura 2 − Atividades realizadas pelos alunos. Fonte: a autora

23

SEGUNDA FASE −−−− Trabalho com problemas aditivos de transformação com incógnitas em diferentes posições: no estado final, no estado inicial e na transformação, tendo como recurso representacional o eixo cartesiano.

A Atividade 1 (Recurso representacional eixo

cartesiano – o baú de transformação) foi planejada com muito

cuidado, pois temos como pressuposto que os alunos

geralmente têm grande dificuldade para solucioná-los. Nela

aparecem situações que são pouco usuais na sala de aula.

Esta atividade, além dos problemas, volta-se a trabalhar o

algoritmo da subtração.

Atividade 1 6

1ª etapa:

Na primeira etapa, com a ajuda dos alunos, solicitamos que um deles

colocasse 8 palitos de sorvete no baú e, em seguida, acrescentasse 7 palitos que

ganhou do amigo. Em seguida, questionamos a turma para saber quantos palitos

ficaram lá dentro. A resolução foi feita individualmente e os procedimentos anotados

na folha de registros. Perguntamos como fizeram para resolver e, por fim, propusemos

que um dos alunos conferisse, contando os palitos que ficaram na caixa.

2ª etapa:

Com outros valores, mudamos a posição da incógnita do enunciado.

Problemas de transformação com incógnita no estado final: 8 + 7 = ? ou 8 – 7 = ?

• Com incógnita no estado inicial: ? + 12 = 25 ou ? –12 = 25

• Com incógnita na transformação: 7 + ? = 19 ou 27 - ? = 19

Solicitamos que um aluno da classe pegasse 7 palitos e os colocasse no baú.

Depois, colocamos, sem contar, mais um punhado lá dentro. Pedimos que outro aluno

contasse o total de palitos do baú. Então, perguntamos aos estudantes: "Eu tinha 7

palitos no baú. Coloquei alguns e agora tenho 19. Quantos palitos eu coloquei?"

Como já prevíamos, de acordo com os estudos realizados, alguns alunos

somaram os números do enunciado (7 + 19 = 26), repetindo a mesma estratégia que

utilizaram para resolver o primeiro problema. Ou, então, associando a palavra “mais” 6 A Atividade 1 é apresentada em etapas, as quais pertencem a um mesmo raciocínio, portanto serão

aplicadas gradativamente, de acordo com o nível de compreensão e assimilação pelos alunos.

Figura 3 − Baú da transformação

Fonte: Ilustração de Meiri Marques de

Camargo

24

com a operação a ser realizada. Colocamos esse procedimento em discussão,

explicitando que o número encontrado era maior do que o total.

3ª etapa:

Esvaziamos o baú e, sem que os alunos observassem, colocamos lá 13 palitos.

Na frente dos alunos, colocamos mais 12 palitos. Em seguida, lançamos o desafio:

"Neste baú, já havia alguns palitos. Coloquei 12 e ficaram 25. Quantos palitos havia no

começo?" Dois caminhos surgiram:

a) Alguns alunos partiram de 12 e acrescentaram palitos até obter 25

(procedimento do complemento que exige a comutatividade, isto é, que

“alguns” mais 12 é a mesma coisa que 12 mais “alguns”), isto é, 12 + 13 = 25

b) Outros retiraram 12 palitos dos 25 que havia no baú ao final (procedimento

da diferença, que exige a reversibilidade, isto é, 25 – 12 = 13

Propusemos outros problemas como os anteriores e solicitamos aos alunos

que explicassem como fizeram os cálculos e as estratégias utilizadas. A proposta

considerou o trabalho em grupos com três alunos. Cada componente do grupo assumiu

um dos papéis: aquele que colocou os palitos, aquele que respondeu às questões e

aquele que fez o registro.

Observamos e fizemos as intervenções, quando necessário, levando em conta

todas as estratégias e raciocínios utilizados pelos alunos, além do preenchimento do

Quadro 8. Organizamos as estratégias em um painel para exposição na classe.

ALUNO TOTAL DE PALITOS PALITOS QUE FORAM RETIRADOS

PALITOS QUE FICARAM NA CAIXA

Quadro 8 – Atividade dos palitos

Fonte: A autora.

4ª etapa:

Nessa etapa, com eixo cartesiano (em tamanho ampliado num papel A3),

peças de madeira com os valores de uma unidade, cinco unidades e uma dezena, lápis,

borracha, distribuímos para as duplas de estudantes cópias do Quadro 9,

apresentado abaixo.

25

ALUNO TOTAL DE PALITOS PALITOS QUE FORAM RETIRADOS PALITOS QUE FICARAM NA CAIXA

1 - ANA 65 15

2 - BEATRIZ 65 20

3 - GABRIEL 65 18

4 - CARLOS 65 49

5 - FERNANDA 65 27

6 - TALITA 65 29

7 - EMANUEL 65

Quadro 9 – Sugestão para a realização dos cálculos relacionais e aritméticos Fonte: A autora

A situação 1, da aluna Ana, será considerada problema 1, e a situação 2, da

aluna Beatriz, o problema 2. E assim sucessivamente para as demais situações. A

última situação, problema 7, foi elaborada pelo aluno. Os alunos tiveram que

completar o quadro com base na seguinte informação:

A professora entrega 65 palitos para cada aluno realizar a sua atividade;

� Em sua vez, cada aluno registra no quadro o número de palitos que deixou

no baú ou que foram retirados;

� A dupla precisa descobrir quantos palitos ficaram no baú e quantos foram

retirados pelos alunos que constam no quadro;

� Os alunos registraram as estratégias utilizadas para chegar aos resultados.

Ajudamos os alunos a entenderem a disposição dos números no quadro e no

plano cartesiano, antes do cálculo, propondo, ainda, a seguinte questão: Se cada dupla

recebeu 65 palitos, a soma do número de palitos que ficaram no baú com o número de

palitos retirados pode ser maior do que esse número?

Na última linha do quadro, os alunos tiveram que inventar o número de palitos

que ficaram no baú, para o aluno de número 7, e preencher o quadro e o gráfico de

acordo com os valores obtidos, podendo escolher e descobrir o número de palitos

retirados ou aquele que ficou no baú.

Para preenchimento do quadro, os alunos representaram inicialmente cada

situação por meio das peças de madeiras, num sistema cartesiano, e, posteriormente

faziam os cálculos relacionais e aritméticos, preenchendo devidamente o quadro. No

eixo cartesiano, as peças de madeiras representativas dos estados iniciais, dos

acréscimos ou retiradas, foram posicionadas pelos alunos com os valores

correspondentes àqueles que foram dados e a solução da situação. Nas figuras 4a e 4b

temos a representação do problema.

26

Importante:

� Problemas como os de número 3 e

6 colocaram, diante dos estudantes,

a possibilidade de utilizarem

estratégias variadas para resolução

de problemas do campo aditivo;

� Alguns alunos resolveram os

problemas usando adição,

completando com a quantidade necessária para chegar ao resultado, outros

pensaram na utilização da subtração como uma forma de desvendar o desafio;

� Coube à professora organizar uma discussão em torno dessas formas de resolução

– nenhuma está equivocada – e depois, foram elaborados outros problemas como

estes para verificar se seus alunos faziam uso das estratégias discutidas.

Resultados e discussões:

De posse dos materiais manipulativos previstos para a atividade, os alunos

compreenderam rapidamente como deveriam organizar os dados dos problemas, antes

de realizarem os cálculos numéricos. Alguns tiveram dificuldades para representar,

inicialmente, os dados dos problemas (cálculo relacional) antes de efetuar o cálculo das

operações numéricas, devido ao hábito e à pressa em obter um resultado; não

importavam se este era ou não, a solução do problema.

Conforme já citamos, para Duval (1993), é no trânsito entre os diversos

registros de representação que se encontra a chave para o aprendizado de matemática.

Quando escolhemos um registro mais apropriado para aplicar os tratamentos, isso

implica que temos uma desenvoltura do raciocínio, resolvemos os problemas

matemáticos e, assim, aprendemos. Os alunos liam os problemas, representavam os

dados por meio do material, dispondo as peças no eixo cartesiano. Observando onde

estava a incógnita, eles visualizavam e podiam comparar os valores indicados pelas

peças, o que os levava a fazer as operações de pensamento (cálculo relacional), que

na maioria das vezes não é feito sem a passagem pelas representações intermediárias.

Uma nova leitura do problema era necessária, o que normalmente não é feito quando

se passa diretamente da leitura para o cálculo numérico.

Figuras 4a e 4b - Representação gráfica, passo a passo, da atividade Baú de transformação

Fonte: A autora

27

Realizado o cálculo relacional, os alunos partiam para o registro do cálculo

numérico e a posterior conferência, para ver a coerência do resultado encontrado. A

verificação do resultado obtido para certificar se o mesmo estava de acordo com a

pergunta do problema, não era realizada por todos os alunos. Este procedimento foi

cobrado em todas as atividades.

1ª etapa:

No problema: Eu tinha 7 palitos no baú, coloquei alguns e agora tenho 19.

Quantos palitos eu coloquei? Dois alunos somaram 7+ 19 e obtiveram 26. Questionados

de que esse valor ficava maior que o total de palitos no baú, que era 19, fazem a

representação com auxílio do material e concluem que deveriam subtrair 7 de 19.

O problema requer uma subtração em sua solução. Porém, Vergnaud

(1985/1991) adverte que este pode ainda ser resolvido por meio do cálculo do

complemento, podendo partir do 7 e contar até o 19 e constatar a quantia que falta. Tal

cálculo não requer um cálculo relacional complexo e é utilizado com certa frequência

pelos alunos ainda nas séries iniciais. Esse procedimento não vale para o cálculo com

números grandes. Vergnaud considera essa operação como complexa. Explica que a

operação não é colocada em termo de perder, tirar. Daí a sua complexidade.

Segundo Nunes; Bryant (1996/1997), a resolução destes problemas requer que

o sujeito entenda sobre as relações de inversão que há entre as operações de adição e

subtração. Também, é necessário que compreendam a propriedade comutativa da

adição.

2ª e 3ª etapas: erros no registro da operação.

Ao analisarmos os registros das resoluções nos problemas: “Eu tinha 7 palitos no

baú. Coloquei alguns e agora tenho 19. Quantos palitos eu coloquei?” e “Neste baú, já

havia alguns palitos. Coloquei 12 e ficaram 25. Quantos palitos havia no começo?”,

verificamos que três alunos, de um total de 18, registraram os dados na ordem que

apareceram no problema, o que levaria a um outro resultado. Porém, mesmo com o

registro dos números de forma incorreta, os alunos obtiveram o resultado esperado,

conforme apresentamos a seguir:

7-19 = 12 e 12 – 25 = 13.

28

Percebemos que o aluno faz um registro e, mentalmente, opera de forma

diferente. Para Duval (2008, p. 31),

É enganosa a idéia de que todos os registros de representações de um mesmo objeto tenham igual conteúdo ou que se deixem perceber uns nos outros. Nessa perspectiva, a oposição muitas vezes feita entre a compreensão que seria conceitual ou puramente mental e as representações semióticas que seriam externas aparece como enganadora.

Portanto, por meio da coleta de dados foi possível verificar e procurar

compreender as verdadeiras causas de algumas dificuldades dos alunos e, ainda, nos

permitiu induzir o quanto é complexo o funcionamento cognitivo, mesmo nas atividades

mais simples. Sabemos que a passagem do enunciado para o cálculo numérico

necessita de uma seleção e organização dos dados que permitem resolver o problema.

Assim, concordamos com Damm (2008, p. 42), ao afirmar que:

Para efetuar a passagem do enunciado ao tratamento aritmético, existe a necessidade de selecionar e de organizar todos os dados pertinentes para a resolução do problema. A escolha da operação é algo complexo, em virtude dos fenômenos de não-congruência.

A autora sugere que uma aprendizagem dos problemas aditivos deve começar

por essas questões de seleção de dados pertinentes e de sua organização, ou seja,

pela compreensão dos enunciados. Assim, quando ensinamos aos alunos a separar e

articular os dois tipos de dados encontrados, organizando-os num eixo cartesiano, por

meio do material manipulável, não observamos aquelas formas de registro.

4ª etapa:

Possivelmente, por se tratar de uma situação pouca explorada nas salas de

aulas, a maioria dos alunos não sabia como descobrir o valor referente à

transformação, no registro abaixo:

65 - ........= 29

De 13 alunos que realizaram a atividade, apenas 3 acertaram. Argumentam

que não sabem como proceder para descobrir o valor desconhecido. Por meio da

representação, com o eixo cartesiano e as peças de madeira, os alunos

encontraram o resultado de forma correta. Nas situações em que o aluno deveria

elaborar, surgem erros no cálculo numérico. Como no exemplo: 65 - ........= ........

De 13 alunos, 4 erraram o cálculo numérico. Alguns exemplos:

29

a) 65 – 28 = 38 b) 65 – 30 = 36 c) 65 – 59 = 11 d) 65 – 49 = 21

As situações que envolviam as subtrações foram aquelas com maior número

de erros. Os erros se concentraram nas duas últimas atividades. Alguns alunos

lançaram mão dos recursos utilizados na primeira fase para resolverem os problemas,

como por exemplo, no caso das subtrações, tirando primeiro as unidades do total de

dezenas e unidades para depois retirar apenas dezenas de dezenas. Ex. 65 – 15.

Fizeram 65 – 5 e, depois, 60 – 10.

Kamii, Lewis e Livingston (1993) relatam que, quando encorajadas, as crianças

são capazes de inventar seus próprios procedimentos, diferentes daqueles ensinados

na forma tradicional. Para tanto, é necessário que os sujeitos raciocinem e discutam

seus diferentes pontos de vista.

Na Atividade 2, com o objetivo de resolver problemas aditivos de

transformação, com a incógnita na transformação, no estado inicial, em situações

correspondentes a novos significados, introduzimos a reta numerada como recurso

representacional.

Atividade 2 − Jogos com uso da linha numérica natural

1a etapa:

Distribuímos aos alunos organizados em duplas, cópias dos

problemas e das trilhas (Figura 5) respectivas com os

marcadores das casinhas. Em seguida, propusemos os

seguintes problemas: [

1) Alice está jogando um jogo. Ela estava na casinha 5.

Chegou a sua vez. Ela jogou o dado e andou com sua peça.

Agora ela está na casa 9. Qual foi o número que ela tirou?

2) Carla está jogando. Tirou 4 e agora está na casinha 13.

Em que casinha ela estava antes?

2a etapa:

Nessa etapa, os alunos deveriam resolver problemas aditivos de comparação,

em situações correspondentes a novos significados, tendo a reta numerada como

recurso.

Figura 5 − Trilha de números.

Fonte: Ilustração de Meiri Marques de Camargo

Adaptado de Nunes (2005).

30

3) Jane está na casinha 14. Márcia está na casinha 5. Quem está na frente

no jogo? Quantas casinhas na frente ela está?

Um erro comum nesse tipo de problema é dizer que Jane está 14 casinhas à

frente. Para provocar mais reflexão, perguntamos:

Quantas casas Márcia precisa avançar para chegar até Jane? Tal questão

se refere a uma transformação que, em geral, leva à resposta certa.

Ao perceber a contradição entre as duas respostas, os alunos tentam

analisar as duas soluções. Compararam as posições das pedras no tabuleiro, o que

facilitou a compreensão. Utilizamos, ainda, a formulação contrária: ao invés de

perguntarmos quantas casinhas o jogador está na frente perguntamos, desta vez,

quantas casinhas ele está atrás, como no problema abaixo:

4) Pedro está na casinha 13. Joaquim está na casinha 7. Quem está atrás

no jogo? Quantas casinhas atrás ele está? Quantas casas Joaquim precisa

avançar para chegar até Pedro?

Os alunos formularam perguntas comparativas diferentes que levaram à

mesma resposta. Com a finalidade de expandir esse problema, apresentamos outros

mais complexos:

� Marcos está na casinha 14. Ele está 8 casinhas na frente de João. Onde

está a pedra de João?

� Patrícia está na casinha 9. Ela está 7 casinhas atrás de Ana. Onde está a

pedrinha de Ana?

Resultados e discussões

Registramos os raciocínios e as

estratégias utilizados pelos alunos e

socializamos. Os alunos podem resolver o

problema contando 4 casinhas para trás.

Outros tentaram adivinhar o ponto de

partida e contar para frente. Sugerimos que

os alunos comparassem seus métodos de

resolução.

Observamos as diferenças entre a

forma de raciocínio dos alunos; enquanto

Figura 6 – representação dos dados dos problemas por intermédio da linha numérica

natural. Fonte: A autora

31

uns já fazem os cálculos mentalmente, outros ainda necessitam da contagem. Esta

atividade visa justamente desenvolver o cálculo mental, embora nem todos possam

fazê-lo. Porém, se já conseguem realizar as operações por contagem, já avançaram

no seu raciocínio. Outra questão importante é que ao planejar atividades com

estratégias diferenciadas fazemos com que os alunos não mecanizem ou decorem

os conteúdos abordados, pelo contrário, faz com que eles pensem.

TERCEIRA FASE −−−− Problemas de adição e subtração em situações correspondentes a novos significados: busca do estado inicial; incógnita na transformação; combinação de transformações etc., por meio de diferentes estratégias e posterior comparação das mesmas.

A Atividade 3, proposta para essa ação, tinha como recurso

representacional a reta numérica.

Atividade 3 - Recurso Representacional Reta Numérica7

Os alunos realizaram, nesta fase, a resolução dos problemas envolvendo a

ideia de comparação. Para cada um deles fornecemos uma régua de 60 cm, com

marcadores (alfinetes) para os dados numéricos do problema. Em duplas,

propusemos os seguintes problemas:

7 Atividade adaptada de proposta da educadora Priscila Monteiro, formadora do Projeto Matemática

é D+, na Revista Nova Escola (set. 2009).

Figura 7 − Reta numerada com marcadores. Fonte: A autora

32

A lista de chamada

1) O Colégio Brasil tem duas classes de 3o ano. A turma A tem 36 alunos, e

a B, 31.

a) Marcaram, na reta numerada, o número que corresponde ao total de

alunos da turma A.

b) Marcaram, na sequência, o número que corresponde ao total de

alunos da turma B.

c) Qual das duas classes tem mais alunos?

d) Quantos alunos a mais?

Bola na rede

2) Pedro e Tiago são ótimos jogadores de futebol e

participaram de um campeonato para escolher o melhor

atacante. Pedro fez 28 gols. Tiago marcou 19.

a) Os alunos deveriam, como no problema anterior, marcar

nas réguas os valores correspondentes aos dados do

problema.

c) Após, comparavam os números de gols marcados por

Pedro e Tiago para responder as questões:

� Qual deles marcou mais gols? Quantos gols ele marcou?

� Quantos gols Tiago precisaria fazer para ficar igual a Pedro?

� Quantos gols Tiago fez a menos que Pedro?

Os alunos já estavam mais familiarizados em fazer as representações antes

do registro do cálculo numérico. Faziam as representações na régua com os

marcadores (alfinetes). Alguns ainda têm dificuldades, pois não frequentam

regularmente os encontros.

Os problemas de comparação, de acordo com os estudos realizados, são

aqueles em que os alunos encontram mais dificuldades na resolução, o que foi

verificado com os alunos participantes do projeto. Dentre dois valores os alunos

conseguem saber quem é o maior e o menor. Porém, quanto “a mais” ou" a menos”

Figura 8 − Bola na rede

Fonte: Ilustração de Meiri Marques de Camargo

33

um valor tem em relação ao outro, sem as representações, na maioria das vezes,

erraram. Uma resposta errada típica é dizer o número total do conjunto menor.

Percebemos que os termos “a mais” e" a menos” são assimilados pelos alunos como

“somar” e “subtrair”, respectivamente.

Um ponto que é ressaltado por Nunes; Bryant (1996/1997) é que, ao seguir

indícios linguísticos superficiais levam o sujeito ao erro. Portanto, precisam

coordenar os dados existentes no problema e não somente se guiar por indícios

linguísticos. Consideramos como uma hipótese possível que o uso de problemas

padrão nas séries iniciais, pode ter levado alguns alunos a centrar-se em

determinadas palavras chaves ou procedimentos mecânicos de resolução,

dificultando o entendimento das relações envolvidas.

Percebemos que os alunos já estavam fazendo a representação da situação

antes do registro do cálculo, o que representa um avanço. Nesta ação, discutimos os

problemas que envolvem a comparação, que conforme os estudos anteriores são

situações muito complexas para a criança porque elas estão habituadas que, ao ver

no enunciado, as palavras “a mais” devem somar. Realizamos um planejamento

exaustivo, em que procuramos trabalhar com atividades que levassem os alunos a

elaborar as representações das situações com mais segurança levando-os a utilizar

tabelas e gráficos, o que auxiliou bastante a compreensão.

Os resultados apontam grande avanço dos alunos na resolução dos problemas

de comparação, considerados os mais difíceis na literatura estudada, o que nos sugere

que esses problemas podem ser resolvidos adequadamente, mesmo pelos alunos das

sereis iniciais com o auxílio dos registros de representações semióticas. Assim, os

resultados que obtivemos neste estudo sugerem um possível caminho para o trabalho

com a resolução de problemas de estruturas aditivas já nas séries iniciais, envolvendo

um planejamento adequado, de modo que os alunos participem de atividades

elaboradas que possibilitem sua postura ativa.

A diversificação das atividades se faz necessária para a melhor compreensão

do que está sendo trabalhado. Podemos auxiliar os alunos no trabalho com a resolução

dos problemas de estruturas aditivas, no sentido de que a situação vivenciada com o

uso das representações intermediárias possa garantir o cálculo relacional e,

posteriormente, o cálculo numérico. Com a devida sensibilidade do professor ao

selecionar os problemas pelos níveis de complexidade, para garantir aos alunos a

34

atenção necessária, possibilita-se que eles ultrapassem os obstáculos e atinjam cada

vez mais patamares superiores de conhecimento.

A Figura 9 exemplifica algumas das estratégias e procedimentos

apresentados pelos alunos nesta questão.

6 Considerações finais

Ao analisarmos os resultados da aplicação das atividades previstas à luz dos

objetivos estabelecidos, podemos afirmar que estes foram alcançados. A resolução de

problemas aditivos por meio dos registros de representações semióticas possibilitou um

trabalho centrado nas atividades dos alunos e, também, a reflexão por parte do

professor sobre as complexidades das estruturas aditivas.

A aprendizagem deu-se em diferentes graus de compreensão devido à falta dos

alunos e ao pouco envolvimento da família, mesmo esta sendo conscientizada da

Figura 9 − Estratégias e procedimentos para realização da atividade. Fonte: a autora

35

importância da assiduidade de seus filhos. Foi possível perceber que os alunos

sentiram-se mais seguros, capazes de “compreender” os enunciados dos problemas ao

fazerem representações intermediárias. Como já mencionamos, os alunos que

participaram da pesquisa apresentavam baixo rendimento em matemática e não

estavam acostumados a resolver problemas matemáticos de modo frequente.

Todavia, o estudo mostra que esses alunos podem apresentar bons

desempenhos quando estimulados a resolver problemas matemáticos com as

representações intermediárias. Os resultados revelaram também que, dadas as

condições adequadas, as crianças conseguem resolver tanto os problemas de

combinação quanto os problemas de comparação.

Vergnaud (1991) afirma que as dificuldades em resolver problemas ocorrem

pelo fato de a criança ainda não compreender as relações entre estados e

transformações envolvidas. Assim, ao ler o problema, ou, ao ouvir um problema

matemático e transportar para o cálculo numérico, é necessário que a criança tenha a

oportunidade para reorganizar os dados apresentados num novo plano, elegendo os

elementos pertinentes à resolução. Outro aspecto interessante a ser destacado é que,

ao mesmo tempo em que a criança está refletindo sobre os problemas matemáticos, ela

também demonstra o deleite no jogo, ou seja, a matemática estava inserida em um

contexto significativo e prazeroso de aprendizagem.

Em relação aos tipos de problemas apresentados, observa-se que todos os

grupos pesquisados resolveram com maior facilidade problemas de combinação,

comprovando resultados mostrados na literatura que apontam que tal tipo de problema

é resolvido desde bem cedo (NUNES; BRYANT, 1997). Nas atividades finais,

verificamos que os alunos já faziam a leitura do problema e procuravam realizar alguma

representação dos dados. Exigimos, durante todas as atividades, esse cuidado no

tratamento dos dados, que as operações de pensamento fossem registradas antes do

cálculo numérico. Do grupo, a maioria já realiza as operações com sucesso. Em alguns

casos, nos problemas de comparação, que segundo os estudos apresentam maior nível

de dificuldade, os alunos já identificam as operações de forma natural e bastante rápida.

Os que têm mais dificuldade recorrem às representações e demoram um pouco mais

para identificar o raciocínio requerido, mas o fazem.

Verificamos que o estudo das estruturas aditivas (Vergnaud) e das

representações semióticas (Duval) traz ótimos resultados quando aplicados

adequadamente na sala de aula. As situações didáticas foram significativas para os

36

alunos e sua aplicação se deu sempre retornando a conceitos anteriores por meio de

novas atividades. O trabalho desenvolvido foi realmente significativo para fazer avançar o

ensino e a aprendizagem da estrutura aditiva. Pensamos que, na 5ª série (6°ano) do

Ensino Fundamental, é o momento para se fazer esse trabalho, sobretudo nas classes de

apoio. Diante das necessidades contemporâneas em relação ao ensino e à

aprendizagem da matemática, e da escassez de práticas significativas compatíveis com

as atuais exigências dos currículos, esperamos que este artigo contribua para o processo

de reflexão sobre as mudanças necessárias na escola em relação à formação continuada

dos professores. Isso conduz à transformação de conceitos, como os envolvidos na

resolução de problemas aditivos, permitindo que a matemática deixe de ser temida por

professores e alunos e possam ter um novo olhar sobre este conhecimento.

Em relação ao objetivo da identificação dessas dificuldades a partir da teoria de

representações semióticas, pode-se sustentar que esse quadro teórico mostra-se

adequado e eficaz para a interpretação das dificuldades e aponta para caminhos de

superação, não estudados nessa pesquisa.

Segundo Magina (2008), as situações aditivas envolvem diferentes conceitos

que fazem parte das estruturas aditivas (campo conceitual aditivo). É importante

conhecer todos os problemas, classificados como sendo de estrutura aditiva, para

compreender os diferentes processos de resolução utilizados pelos alunos e para

entender as dificuldades encontradas para a resolução. Segundo a autora, planejar e

desenvolver experiências didáticas é algo proveitoso para que possamos entender

melhor como esse campo conceitual aditivo é construído. Em tais experiências, é

essencial que o professor preocupe-se em fazer auto-perguntas do tipo: Quais

estruturas e classes de problemas são mais facilmente entendidas pelos alunos mais

novos? Quais problemas viriam em seguida? E assim por diante.

A pesquisa revela a necessidade de um processo de formação dos professores

voltado para os problemas aditivos, que promova a intervenção em sala de aula na

maneira como tais problemas deverão ser apresentados aos alunos, para que haja,

desse modo, a superação dos fracassos em relação a esses problemas. Essa

intervenção pode contar com as contribuições da teoria de representações semióticas

de Duval, que se volta para a redução da não-congruência semântica.

Nunes e Bryant concluem de forma diferente sobre essas dificuldades, ao

citarem que:

37

[...] a compreensão das crianças da adição e subtração se desenvolve à medida que elas se tornam cada vez mais capazes de perceber a conexão entre sua compreensão inicial de adição e subtração e situações novas e à medida que elas se tornam capazes de usar sistema diferentes de sinais ou ferramentas para pensamento. (NUNES; BRYANT, 1997, p. 138-9)

Isto porque Duval (1995) propõe analisar as dificuldades dos problemas em

função da congruência semântica, o que emerge uma proposta de ensino que

contemple a operação cognitiva de conversão, associada às outras duas (tratamento e

formação), e que deve ser contemplada na proposta de intervenção.

Na resolução de um problema, a escolha da operação é algo complexo, além de

poder ocasionar fenômenos de não-congruência. Por essa razão, as representações

utilizadas nas resoluções dos problemas podem auxiliar a compreensão do tratamento

de um registro ou conversão entre diferentes registros, permitindo ao professor detectar

a dificuldade do aluno, tanto no tratamento operatório ou numa conversão. Por meio

dessas representações, o professor consegue trazer o aluno para um contexto em que

os objetos matemáticos se tornem significativos para ele.

Conclui-se com o apontamento de que muitas pesquisas a respeito dos

problemas aditivos já foram desenvolvidas. Evidencia-se, no entanto, a importância das

análises das dificuldades das crianças à luz da teoria das representações semióticas e

da manifestação do fenômeno da congruência semântica, que pode se apresentar

dependendo da estratégia de solução adotada pelo aluno. Esse quadro teórico sustenta

as análises e nos autoriza a afirmar que as dificuldades dos alunos não se devem

exclusivamente a problemas de interpretação. Elas podem ser oriundas dos verbos ou

palavras portadores de informações semânticas, da natureza das relações (estáticas ou

dinâmicas), das estratégias de resolução, dentre outras situações.

As análises realizadas à luz da congruência semântica entre a representação do

problema na língua natural e a representação da solução do problema, com utilização

de outro sistema semiótico de representação, permitiu-nos verificar o papel das

representações intermediárias para minimizar as dificuldades que são relacionadas à

não congruência.

Nossas análises não estão esgotadas e outras pesquisas poderão ser

desenvolvidas na continuidade, como, por exemplo, elaborando outras atividades para

serem propostas na situação de intervenção, voltadas para a superação das

dificuldades identificadas em virtude da natureza do problema, dos cálculos relacionais

envolvidos e do fenômeno da congruência semântica que se manifesta, concretizando

38

as situações propostas com os próprios alunos. Ainda, voltar a propor a resolução de

problemas aditivos aos alunos e avaliar o progresso advindo dessa intervenção.

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