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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
1
A INDISCIPLINA NA ESCOLA E A CRISE DA AUTORIDADE DOCENTE
Orientanda:1 Beloni D’aparecida de Souza Pinto E-mail: [email protected]
Orientadora:2 Ms. Solange Aparecida de Oliveira Collares E-mail: [email protected]
Resumo
Este trabalho apresenta a sistematização do trabalho realizado na implementação do projeto de intervenção pedagógica realizado com professores do Quadro Próprio do Magistério, no Município de Mangueirinha, Estado do Paraná. A proposta foi fazer uma reflexão acerca do envolvimento dos professores em torno da problemática da indisciplina na escola e a crise da autoridade do professor. O objetivo principal foi debater, junto aos professores, os percursos didáticos pedagógicos que possam prevenir os conflitos em sala de aula, elencando, a partir de diversas situações escolares difíceis, algumas possibilidades de intervenção e ações práticas que o professor pode fazer para administrá-las de modo educativo. Procurou-se responder a questionamentos como: a indisciplina é o único fator responsável pela defasagem de aprendizagem dos alunos? Que estratégias e/ações podemos criar para amenizar o problema da indisciplina em sala de aula? Que tipo de disciplina queremos? Que tipo de professor eu sou? Repressivo ou libertador? A metodologia utilizada foi a de pesquisa de campo e o referencial teórico teve como principais autores:Zaguri (2006), Blin & Gallais- Deulofeu (2005), Pimenta (1999), Tardiff (2002), entre outros. Entendemos que as crises que decorrem dentro da escola derivando da relação entre aluno e professor não se restringem ao campo educacional, mas estão relacionadas com as crises da instituição familiar, dos valores, dos costumes, da economia, dos preceitos religiosos, da instituição política, da força das mídias, etc.
PALAVRAS-CHAVES: indisciplina - disciplina – autoridade - educação
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo pretende relatar o que foi proposto no projeto de
intervenção intitulado: A indisciplina na escola e a crise da autoridade docente, bem
como socializar a sua implementação, procurando levantar, não somente os erros,
mas também os acertos. O objetivo principal deste artigo é apresentar os resultados
da discussão realizada com os professores do Quadro Próprio do Magistério que
1 Professora pedagoga da Secretaria de Estado da Educação-Núcleo regional de Pato Branco, Mamgueirinha-Pr , cursando o programa de Desenvolvimento Educacional-PDE. 2 Professora do Departamento de Pedagogia da Universidade Estadual do Centro Oeste/Mestre em Educação, pertence ao grupo de pesquisa do HISTEDBR.
2
atuam nas séries finais do ensino fundamental, dos turnos matutino, vespertino e
noturno, a fim de buscar estratégias de ações pedagógicas, as quais possam,
coletivamente, corroborar a fim de enfrentar os desafios causados pela indisciplina
em sala de aula e englobar regras de trabalho coletivo e de convivência, tanto na
sala de aula como na escola.
Observamos que cresce o número de casos de indisciplina não só
envolvendo depredação ou situações de violência explícita, mas também as relações
interpessoais entre professores e alunos. Em especial, em relação ao professor, que
não consegue realizar seu trabalho, devido à dificuldade em administrar conflitos
diários na sala de aula. São muitos os alunos que não participam efetivamente da
aula, o que impossibilita a aprendizagem causando, tanto no professor como no
aluno, descontentamento, desmotivação, conflitos e angústia.
Iniciamos o trabalho de implementação com um grupo de estudo, discutindo
a questão da indisciplina na sala de aula e a crise da autoridade docente.
A indisciplina atualmente é, sem dúvida, um tema muito discutido, seja no
âmbito escolar, familiar ou social. Por que os jovens, hoje, são tão indisciplinados e,
muitas vezes, desrespeitosos? Os valores mudaram? Por quê? Se nossos ideais de
vida em sociedade caminham ainda no mesmo sentido, em busca de: paz, felicidade
e integração social? Afinal, de quem é a culpa?
Sem almejar apontar soluções ou "receitas" fantásticas, discutimos, neste
estudo, como podemos melhorar os relacionamentos entre professor aluno e
refletirmos sobre que saberes são necessários hoje para ensinar.
Pode-se afirmar que não há mais inocência na indisciplina escolar; portanto,
há uma compreensão de que esta indisciplina escolar torna-se um processo que
deve ser compreendido a partir das suas relações com o processo pedagógico, com
a organização da escola e das políticas educacionais.
Ao abordar o tema indisciplina na escola e a crise da autoridade docente,
baseando-se principalmente em situações que acontecem na escola e no cotidiano
da sala de aula, nos conflitos existentes entre os próprios alunos na classe e com o
professor, procurei, assim, fundamentar este trabalho que, nesta perspectiva vai
abrindo caminho para reflexão sobre os problemas da escola.
No primeiro momento, propus alguns questionamentos para os professores
refletirem sobre as perturbações do cotidiano escolar em algumas propostas de Blin
e Gallais- Deulafeu (2005, p. 19). Segundo eles, essas situações de conflitos e
3
perturbações do cotidiano escolar vêm afligindo educadores em diferentes contextos.
Esses problemas são os que se identificam com a violência simbólica, comumente
vivenciada pelos alunos e são descritas pelos professores que a testemunham, na
sua prática escolar. São várias as situações, tais como: o aluno chegar atrasado ou
sair antes de bater sinal; falta de atenção ou dificuldade de atenção; dormir na aula,
bocejar; barulho, bagunça, agitação, conversa; fazer outra coisa em lugar da tarefa
solicitada; recusar-se a fazer uma tarefa solicitada e outras.
Blin & Gallais-Deulofeu (2005, p. 19) descrevem os tipos de violências
simbólicas praticadas pelos professores em relação aos alunos: falta de controle dos
alunos: incivilidades, violências verbais, delitos, violências físicas.
Estudiosos como Bordieu e Passeron desenvolveram a teoria da reprodução
baseado no conceito de violência simbólica. Para Bordieu (1975, p. 20), “toda ação
pedagógica é objetivamente uma violência enquanto imposição, por um poder
arbitrário.”
O professor é quem exerce esse poder arbitrário em sala de aula.
Para Tragtenberg (1982, p. 24), os professores servem,
Para reproduzir o poder na medida que determinam as questões que devam estudar e essa reprodução não se dá pelo pagamento imediato ao mestre para planejar isso ou aquilo, ministrar esse ou aquele curso, mas ele recebe subsídios na medida em que sua linha de orientação é essa ou aquela. Portanto, em educação não existe neutralidade: ou você é a favor ou contra. (Tragtenberg,1982, p. 24)
A primeira forma de poder reproduzido pelo professor é quando ele expulsa
o aluno da sala de aula, muitas vezes, enviando-o à sala da equipe pedagógica para
que esta solucione os problemas que ocorrem. O professor esquece que se o
problema originou-se na sala de aula, ele enquanto profissional, deverá tomar
decisões adequadas para a solução do problema. Como isso não acontece na
prática do cotidiano, o professor corrobora para a acentuação da indisciplina no
ambiente escolar.
Constatamos que a falta de estimulo e de atitudes adequadas viabilizam o
afastamento do aluno das regras, no contexto escolar. Se a escola, enquanto espaço
educativo, não acolhe o aluno com suas limitações e problemas, não procura
modificar o sujeito por meio de atitudes e comportamentos, ele acaba se afastando
do convívio escolar, abrindo espaço para seu envolvimento com o trafico. A exclusão
4
do mundo do trabalho para uma parcela significativa da população, principalmente os
mais jovens, leva nossos jovens a encontrarem, no bairro, na favela e nos amigos, o
envolvimento em delinqüências e atos violentos.
Parafraseando Hannah Arendt (1989) ao analisar os problemas ocorridos no
cotidiano escolar salienta que são, duas causas podem ter relação profunda com a
crise da educação em nossa época: a incapacidade de a escola levar os alunos a
pensarem e a perda da autoridade dos pais e dos professores. Ambas fazem com
que crianças e adolescentes fiquem sujeitos à tirania de uma maioria qualquer (grupo
social, tribos, gangs), ou de um líder carismático ou populista.
Outro agravante é o incivismo3 e o cinismo4 dos adultos que, diariamente são
relatados nos jornais televisivos, e provocam, no jovem, uma erosão dos valores
fundadores de uma sociedade (tolerância, honestidade, esforço. etc). Nesse clima
deletério5, atribui-se mais à escola civilizar e moralizar seus jovens. No ambiente
escolar, as incivilidades se manifestam pela rebeldia dos alunos que não querem
mais obedecer às regras e normas da escola ou do professor. Demonstram
comportamentos e condutas que exigem do professor muito jogo de cintura, pulso
firme e postura. O
cinismo de certos alunos nos leva a pensar que nossas crianças e adolescentes
estão sendo criados sem nenhuma regra moral de conduta, sem tolerância e respeito
com os colegas e com os professores. Já o contexto sócioeconômico, cada vez mais
brutal, exclui algumas famílias do reconhecimento social pelo trabalho. Pais
rejeitados que não conseguem mais fazer exigências quanto à educação de seus
filhos, sugados pelo trabalho, estressados pelo medo de perder o emprego,
resultando na falta de diálogo familiar e abandono em relação ao acompanhamento
educativo de seus filhos. Cada vez mais as crianças se encontram sozinhas em
casa, na rua e na saída da escola.
Outro fator que influencia a violência escolar é o ambiente social, como
expressão da vida cotidiana, que gera um mal-estar relacionado à soma dos
3 Segundo o Dicionário Aurélio (1986) Incivismo ato ou expressão incivil, grosseria, descortesia, indelicadeza. Incivismo- refere-se, aqui, à violência verbal e delitos. 4Segundo o Dicionário Aurélio (1986) cinismo significa impudência, desvergonha, desfaçatez, descaramento. Cinismo- refere-se a insolência, deboches, atitude provocativa. 5Segundo o Dicionário Aurélio (1986) Clima deletério – que corrompe ou desmoraliza aqui trata do ataque que os meios de comunicação e as mídias fazem todo dia ao mostrar, cotidianamente, casos de violência explícita, banalizando-a.
5
problemas econômicos e sociais. Além destes, a falta de estrutura familiar, as
questões relacionadas ao emprego, ao preconceito resultam em violência.
Capera, (2005, p. 14) ao analisar a violência social, verifica que segundo os
autores Abramovay e Pinheiro (2004), no Brasil, a violência está ligada à
vulnerabilidade social de alguns fragmentos populacionais, como por exemplo, o
jovem e a criança, pois esses sujeitos padecem dos riscos da exclusão social devido
aos desequilíbrios provenientes do mercado. Outro fator que marca a vulnerabilidade
é a pouca disponibilidade de recursos materiais ou simbólicos aos sujeitos excluídos
da sociedade.
Segundo a Constituição Federal, no seu artigo 6º, são direitos sociais: a
educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a
educação, a proteção à maternidade e à assistência social, a proteção à maternidade
e à infância, a assistência aos desamparados. No entanto, somos sabedores que
estes direitos estão muito longe de serem assegurados a todos os cidadãos. Os
resultados das pesquisas divulgadas nos noticiários, diariamente ilustram inúmeras
situações de transgressão desses direitos. Saliento aqui que, uma vez que não há
acesso à educação, ao trabalho, à saúde, ao lazer, à cultura, não se pode ascender
socialmente e usufruir uma vida digna.
No nosso país, as políticas públicas não têm garantido, a uma grande
parcela da população, melhoria nas suas condições básicas de vida. Em relação à
educação, temos ainda, milhões de analfabetos, evasão e repetência escolar. Sem
contar que nossos alunos têm demonstrado resultados nada animadores em provas
que medem o nível de conhecimento dos alunos, feitas por institutos contratados
para este fim (Prova Brasil, Enen. Enade). Portanto, apesar dos esforços
empreendidos, pouco se tem notado de melhoria na qualidade de vida da população;
isto ainda não saiu do papel. No entanto, são programas paliativos que não têm
surtido efeito. Nada adianta nossas famílias receberem um valor irrisório, se muitas
não têm uma casa para morar, um emprego fixo e segurança pois, quando ficam
doentes, têm que, em muitos casos, esperar dias para poderem ser atendidos. Para
Arroyo (2009), as condições em que são condenados milhões de crianças e
adolescentes e jovens exigem:
Responsabilidades das políticas públicas e de todas as instituições da sociedade e dos profissionais de múltiplas áreas. Às escolas e aos professores cabe parte dessas responsabilidades. Na especificidade de
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seu papel docente e educativo, mas não cabe a única responsabilidade. Redefinir responsabilidade social não é fácil. Porém urgente. (Arroyo, 2009, p.22).
Portanto, cabe a toda sociedade se engajar nesta luta para cuidar da infância
e adolescência no Brasil. Todos precisam fazer sua parte, partindo da família e
atingindo outras instâncias constituídas que tratam desta parcela da população que
precisa de ajuda urgente.
2 RELAÇÃO PROFESSOR ALUNO: desafios e compromissos quanto à indisciplina
As causas internas podem ser vistas no ambiente escolar e nas condições de
ensino e aprendizagem, na “relação professor/aluno”, no perfil dos alunos e na
capacidade que eles têm de se adaptar aos esquemas da escola. A falta de
motivação no aluno, a ausência de regras claras que permitam uma distribuição
eqüitativa da comunicação, a falta de consideração com os ritmos biológicos das
crianças e a “falta de autoridade do professor” são, todas elas, causas de
indisciplina.
Para Blin & Gallais-Deulofeu (2005, p. 42), a explicação dos problemas
escolares não deve ser buscada somente no ambiente social. Além disso, a escola é
lugar das mais diversas expressões das escolhas políticas, institucionais e das
realizações de práticas pedagógicas. A escola também desencadeia violência ao
produzir fracasso escolar para uma parcela grande de alunos. Desse modo, os
problemas escolares, como: humilhação, estigmatização, reprovação, etc., também,
devem ser interpretados como violência racional dos jovens em resposta às
violências que também sofrem na escola. Observa-se que, nos relatos descritos por
Blin &Gallais-Deulofeu (2005, p. 42 ), evidencia-se a violência institucional que é
experimentada dolorosamente por muitos alunos, em diversas experiências descritas
pelos autores.
Parafraseando Blin &Gallais-Deulofeu (2005) afirmam que, a seleção
permanente onde o percurso escolar assemelha-se, com frequência, a uma corrida
com obstáculos repleta de fracassos e renúncias. Os jovens estudantes veem,
muitas vezes, sua escolaridade como uma sequência de fracassos escolares. Áreas
elitistas contribuem para o sentimento de desigualdade escolar, bem como têm
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efeitos (reprovação, competição) significativos no que diz respeito à continuidade dos
estudos após o fim do ensino médio.
Também o ensino pode ser inadequado, quando a escola tem pouca
consideração pela experiência e pela vivência dos alunos, privilegiando as disciplinas
intelectuais, que valorizam a capacidade de abstração. Hoje, para todos os jovens,
continuam-se ensinando os mesmos conteúdos e da mesma maneira que se fazia, há
muito tempo, para uma minoria proveniente das classes favorecidas.
A escola privilegia uma forma cultural muito livresca em vez das potencialidades manuais, experimentais, artísticas e técnicas de certos jovens (...). Para muitos alunos, como sendo é artificial e teórico em relação ao mundo do trabalho e do social. (Blin & Gallais- Deulafeu, p.45).
Temos, também, a síndrome do fracasso escolar que corresponde segundo Blin
& Gallais- Deulafeu (2005) como uma:
Forma de patologia relacionada à duração e à repetição de uma situação de mal desempenho escolar e, posteriormente, à instalação de um comportamento de fracasso (...). Uma aflição escolar, solitária, desconhecida, que se situa no coração da situação de aprendizagem: não participação, falta de atenção, dependência afetiva em relação ao professor; percurso ametódico (falta de clareza), falta de projeto pessoal e exclusão dos mais vulneráveis. Nos estabelecimentos, nos quais inúmeros alunos apresentam desempenho ruim ou são orientados contra sua vontade, o sentimento de humilhação lhes dá uma imagem depreciativa de si mesmos. Eles rejeitam a estrutura para defender sua dignidade e adotam o papel de “maus alunos”, contra a escola. . (Blin & Gallais- Deulafeu, p.45).
Todos os dias na escola e na sala de aula vivenciamos este tipo de situação
descrita acima confirmando que todo aluno que não consegue aprender torna-se um
aluno indisciplinado.
A palavra é confiscada, segundo Blin & Gallais-Deeulafeu (2005, p. 45):
(...) No espaço fechado da sala de aula: o aluno deve permanecer sentado, em silêncio para escutar a palavra, ou a verdade, do professor. Responder a perguntas que não se faz, reproduzir discursos e maneiras de pensar em descompasso com suas questões, (...) (Blin & Gallais-Deeulafeu, 2005, p 45)
Para o autor, essas experiências são vividas por muitos jovens como violência,
enfrentada com indiferença, passividade, fatalismo, ou contestações, oposições,
incivilidades.
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O estresse com as provas também interfere, pois os alunos detestam as pressões
exercidas pelos adultos e pela instituição escolar em relação à sua escolarização.
O Espaço escolar é a estrutura física e humana que comporta um número efetivo
de alunos e professores os quais desempenham papéis importantes em todas as
modalidades entre os autores e, desse modo, na construção de um sentimento de
pertencimento a uma comunidade. A arquitetura também favorece mais ou menos a
comunicação e a circulação de informação e das pessoas. Numa escola que tem uma
estrutura concentrada em torno de um espaço central de passagem e de encontros,
existe mais facilidade de se conseguir coesão entre seus partícipes, comprometimento e
censo de coletividade. Quando o ambiente não favorece, sendo segmentado, pode
causar isolamento entre seus membros.
Parafraseando Blin & Gallais-Deeulafeu (2005) A coerência entre equipe
pedagógica, conselho escolar e direção é de fundamental importância e é, também,
importante que as escolas evitem lógicas contraditórias e promovam atividades que unam
os profissionais da escola. Aqueles que souberem construir um espaço coletivo de
negociação, decisão e se mostrarem capazes de definir escolhas e orientações,
conseguirão encontrar coerência local mais eficaz para enfrentarem os que os
confrontam.
O clima escolar é importantíssimo, mas também o estado de espírito familiar
sustenta o sentimento de confiança e de segurança de cada um, na escola. Algumas
escolas sofrem com perturbações porque a lei não é afirmada e os códigos de
funcionamento permanecem implícitos e vagos, sujeitos a diferentes interpretações. O
clima escolar depende da transparência de suas regras. O cumprimento destas é
referência e dá segurança.
Enfim, a relação com as famílias é de fundamental importância. As expectativas
dos pais mudam conforme o meio sociocultural dos mesmos. As famílias dos meios mais
favorecidos privilegiam o respeito pelos outros e a curiosidade de espírito (relação cultural
com o saber), ao passo que a família dos meios populares valoriza, sobretudo, a polidez
e o trabalho na escola (relação utilitária com o saber). No entanto, todos os pais
concordam sobre a necessidade de melhorar o diálogo com os professores e sobre uma
verdadeira política de co-educação.
Os estilos de direção são importantes e a mobilização dos educadores nas
escolas depende muito da ação pessoal do diretor que não deve se limitar somente às
ações administrativas, mas também, envolver-se com o pedagógico. Esses diretores têm
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sua autoridade aceita e são vistos por todos com grande qualidade humana: pessoa de
convicção e coragem na empreitada.
3 RELAÇÃO PROFESSOR ALUNO: desafios e compromisso quanto à indisciplina
Cabe salientar, aqui, que a indisciplina não tem uma causa única ou
especifica. Ela esta associada a normas e regras sociais e morais. Hoje, a escola é
para todos e esta massificação fez com que alunos de diferentes camadas sociais e
culturais freqüentem a mesma escola. Pode, portanto, a indisciplina ser atribuída ao
fato de se aplicarem indevidamente normas e regras ou maneiras de ser. E, ainda, os
costumes possuírem aspectos diferentes de uma cultura para a outra além do que, a
cultura do professor não é a mesma do aluno. A sociedade e a família também
mudaram, sendo possível perceber que os pais tornaram-se menos autoritários e
mais permissivos em relação à educação. Daí que a má interpretação do que seja
permissividade, ou a ausência de limites possa gerar condutas difíceis de controlar.
Para Arroyo (2009), as condutas dos alunos, atualmente, devem nos
preocupar mais do que os processos de aprendizagem. Ele pergunta-se.
Do foco dos processos cognitivos estaríamos passando para os processos morais? Pela insegurança instalada nas escolas parece ser que nos é mais difícil lidar com as condutas do que os conteúdos e com suas aprendizagens. Sempre foi difícil esta separação. O fato é que se muitos docentes sentiam-se incomodados com os problemas de aprendizagem e alguns ficam indiferentes, os reprovavam e pronto, ficou muito difícil sermos indiferentes aos problemas de conduta. Todos somos desafiados. (Arroyo, 2009, p.45)
É importante salientar que, nos conselhos de classe, observar-se que a fala
do professor é verdadeira. Discutimos e apontamos muito mais os atos de
indisciplina e as condutas dos alunos do que as questões de aprendizagem deles.
Além do que, os professores, na hora de aprovar um aluno no conselho de classe,
geralmente, dizem o seguinte: na minha aula ele é bonzinho e se comporta por isso o
aprovo. Ou o contrário: comigo não para quieto, conversa, atrapalha a aula, por isso
eu o reprovo. Portanto, fica bem claro que o que mais pesa são as condutas dos
alunos em sala de aula ou fora dela. Casos de indisciplina são resultantes de um
conjunto de causas diversas podendo ter sua origem externa ou interna à escola.
Segundo Parrat-Dayan (2008, p. 55),
10
As causas externas podem ser vistas na relativa influência dos meios de comunicação, na violência social, e também no ambiente familiar. O divórcio, a droga, e o desemprego, a pobreza, a moradia inadequada, a ausência de valores, a anomia familiar, a desistência por parte de alguns pais de educar seus filhos, a permissividade sem limites, a violência doméstica e a agressividade de alguns pais com os professores podem estar na raiz do problema. (Parrat-Dayan,2008, p. 55),
Parafrasenado Parrat-Dayan (2008) salienta que, a falta de referência que a
sociedade atual apresenta, de regras e valores que foram relegados a segundo plano
explicita, em parte, a indisciplina gerada na sociedade e no interior da escola. Os
meios de comunicação também favorecem e contribuem para o aumento da violência
e da indisciplina na escola quando põem em evidência pessoas e instituições que
não respeitam as regras reconhecidas socialmente ou quando banalizam a violência
fazendo pensar que esta é algo comum e cotidiana.
Também o mundo áudio visual, hoje, ocupa grande tempo de nossas
crianças e adolescentes e a competição da escola com a internet, celulares, games
entre outros, os quais mostram tudo pronto e não exigem grande esforço, faz com
que muitos não gostem da escola; afinal, ela exige esforço e estudo. Uma das
formas de amenizar essa concorrência seria a de se apropriar desses recursos como
ferramenta para melhorar a metodologia usada em sala de aula
Para a autora Parrat-Dayan (2008, p.56) define que além das causas
externas, existe também as causas internas que podem,
Ser vistas no ambiente escolar e nas condições de ensino e aprendizagem, na “relação professor/aluno”, no perfil dos alunos e na capacidade que eles têm de se adaptar aos esquemas da escola. A falta de motivação no aluno, a ausência de regras claras que permitam uma distribuição eqüitativa da comunicação, a falta de consideração com os ritmos biológicos das crianças e a “falta de autoridade do professor” ou a má formação acadêmica são, todas elas, causas de indisciplina na sala de aula.
Para a autora citada acima, as transformações ocorridas na escola
relacionam-se com as condutas dos alunos que passaram de um regime de castigos
e proibições para um sistema de conveniência no qual se privilegiam as negociações
e os contratos entre os protagonistas do processo educativo. Porém, a grande
dificuldade dos educandos e da própria escola é como lidar com estas negociações
que, em muitos casos, não funcionam, porque muitas das crianças não gostam da
escola, tornando-se indisciplinadas porque ficam entendiadas, ou não compreendem
11
nada do que fazem, ou do que é repassado pelos professores; ou ainda, porque são
obrigados a permanecerem na escola devido às ordens judiciais ou programas
governamentais. São alunos agressivos, em trânsito, entre uma família desunida que
não lhe repassou valores e regras de convivência, sendo desrespeitosos com os
professores, não encontrando interesse nenhum em aprender, pois não vislumbram
futuro ou não veem sentido naquilo que lhe é ensinado na escola.
Hoje, a mídia televisiva contribui para a indisciplina quando naturaliza cenas
de violência colocando o sujeito em uma situação de insensibilidade. Quando a
criança adquire o hábito de ver cenas violentas, e quando há uma situação de
violência, ela não estanha, porque passou a ser algo rotineiro.
Outro agravante é o tempo que as crianças passam em frente à televisão. A
família perde espaço no que se refere à transmissão cultural e valores. Em muitos
casos, a TV assume o papel da família quando se torna responsável pela educação
não formal, produzindo um discurso perigoso onde tudo pode.
É fato que a profissão docente sofreu considerável desgaste intelectual, cultural e
econômico e que, no imaginário social, “a figura do professor” de outrora cedeu lugar
a um profissional sucumbido à atual massificação da sociedade capitalista.
Professores sofrem, hoje, de um desgaste profissional: as péssimas condições de
trabalho, o pouco reconhecimento profissional, a sobrecarga de tarefas, baixos
salários, a necessidade de multiplicar empregos para manutenção de despesas, a
proletarização da profissão, o desinteresse das estruturas políticas e dos sistemas de
ensino pelos quais são gestados. Além do que, há uma queixa geral: a forma como é
trabalhado o conteúdo. O desinteresse pelos estudos de boa parte do alunado é tido
como uma das causas dessa desautorização do professor. O descaso, a zombaria, o
boicote e a omissão dos alunos induzem ao que se pode denominar de crise da
escola ou crise de autoridade.
O professor hoje apesar ao trabalhar dentro de uma concepção de educação
onde a relação professor aluno deve ser igual cabe ao professor o papel de mediador
do conhecimento que o aluno traz para escola e transformá-lo em conhecimento
sistematizado. Nem todos os professores conseguem estabelecer esta relação com o
aluno, alguns pela formação que obtiveram, outros pelo despreparo em lidar com os
diferentes tipos de alunos e sua aprendizagem.
Para Parrat-Dayan (2008 p. 58), o papel do professor deve ser de mediador,
mas, para isso deve ser capacitado.
12
Se é verdade que o professor deixou de ser modelo a ser seguido e a escola já não é garantia de ascensão social, também é verdade que os dois seguem junto com a família, sendo uma referência indiscutível para promover e desenvolver valores humanos nos jovens. Neste sentido, muitos profissionais lamentam a pouca colaboração dos pais, que só se interessam nas notas e na aprovação das crianças para o curso seguinte. (Parrat-Dayan,2008 p. 58)
Portanto, o grande desafio dos educadores hoje, é compreender quem é o
sujeito aluno e, então, adequar sua prática de sala de aula, levando em conta o
contexto no qual a escola está inserida.
Mas, como Zagury (2006) nos diz,
“A supervalorização da relação professor / aluno tornou-se uma faca de dois gumes. Sem dúvida foi um avanço acabar com o autoritarismo dando vez ao entendimento e ao diálogo nas escolas? Mas a distorção na interpretação do que seja uma boa” relação professor / aluno “abriu caminho para o desrespeito e até agressões físicas a professores” (Zagury. 2006, p. 68).
Essa relação é importante não se pode negar. Então, preferencialmente, ela deve ser amigável, o que não se pode querer é que seja o mais importante dentro da escola. Temos que ter bem definido para o aluno que o professor é a autoridade e este não deve abrir mão dela em hipótese alguma. Em outras palavras, significa não delegar a outrem o que é sua responsabilidade. O professor precisa ter claro que a sala de aula é o seu espaço de atuação. Ele determina as regras de funcionamento; não dá para ser sempre bonzinho, relevar tudo porque o aluno é coitadinho, carente, a família não dá apoio, etc.
4 DIFERENTES OLHARES SOBRE INDISCIPLINA
Num segundo momento foi feita a análise do filmes Entre os Muros da
Escola6 utilizando-se da análise efetuada por LOPES, (2009 p.70-75), que descreve
a vida cotidiana de uma turma de adolescentes durante um ano, bem como a vida de
um professor e de sua turma, numa escola de um bairro em Paris. O filme também
retrata a cultura de uma população formada por imigrantes, espelho dos contrastes
multiculturais dos grandes centros urbanos de todo mundo. Embora o ambiente seja
o de uma escola francesa, qualquer professor ou aluno do mundo inteiro pode se
6 LOPES, José de Sousa Miguel, Entre os muros da escola: a vida, a sociedade em movimento. Revista, Presença pedagógica. V.15, n. 87, mai/jun. 2009.
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reconhecer entre os personagens do filme de Laurent Cânter. François é um jovem
professor de francês de uma turma de nível médio e não hesita em enfrentar
Esmeralda, Souleymane, Khoumba e outros estudantes, numa estimulante
competição verbal, como se fosse um verdadeiro divertimento. Mas, às vezes, a
aprendizagem da democracia pode conter verdadeiros riscos.
Podemos considerar que, diferentemente de outros professores,
confrontados com um ambiente difícil e ingrato, François sente prazer em ensinar
nas disputas verbais, nas quais tenta colocar seus estudantes como responsáveis
pela aprendizagem. Num episódio no qual, supostamente, tem direito à palavra (nos
limites da civilidade, como ele faz questão de afirmar), ele ensina diferentes níveis de
linguagem a estudantes que têm um vocabulário limitado.
Outra questão ressaltada no filme é a que diz respeito às sanções. Em
primeiro lugar, existem os avisos aos estudantes e aos pais, praticamente, sem
concessões. O que é dominante é a pesada sanção, a expulsão. O trabalho conjunto
é o que, provavelmente, possibilita eliminar o conflito entre professor e aluno. É o
que revela o trabalho em torno do autorretrato pedido aos alunos, após a leitura do
Diário de Anne Frank. Trata-se da primeira tentativa, por escrito, realizada no
computador da sala de aula, com posterior exibição no final do ano.
A perseverança e o empenho do professor François só serve para realçar o
enorme fracasso que é a escola (pelo menos uma escola como aquela) hoje em dia.
Nem uma pessoa com seu encanto e vocação consegue fazer algo com aquele
grupo de adolescentes que não aceitam a autoridade nem a disciplina; que estão
interessados em tudo, menos em aprender, muito menos em cultura e língua
francesa. Para Arroyo (2009), não há um consenso entre os educadores e a escola
em o que fazer e que posturas adotar:
Os controles, as disciplinas, as advertências, castigos e até expulsões não funcionam como no nossos tempos. A consciência pedagógica já avançou a tal ponto que resultam posturas antiquadas e anti-educativas . Entretanto, esses avanços poderão regredir diante dos medos que estão se criando perante a chamada explosão de indisciplina na sociedade e nas escolas. Está em marcha a construção coletiva de um imaginário do medo: tempos de terrorismo, de violência, de descontrole, de indisciplinas, até nas escolas. (Arroyo, 2009, p. 123)
14
Ao observar o cotidiano da escola vemos crianças cada vez mais violentas e
agressivas; em muitos casos, o professor não consegue repassar o conteúdo; perde-
se muito tempo tentando acalmar os alunos, fazendo-os sentar no seu lugar.
Assim, os diferentes tipos de professores parecem estar alinhados como num
painel: o professor que mente, o que defende medidas mais duras, mas que não
confessa; todos participantes de um jogo de surdos durante todo ano. Os alunos,
todos diferentes, cada um com sua trajetória, alguns deles com suas características,
(insolência, violência verbal, boa vontade, passividade, que importa).
Mesmo questionados, os professor não têm claro como reagir diante de
alunos com diversos problemas e desinteressados em aprender, indisciplinados,
agressivos e com déficit de aprendizagem. Apresentam apenas posições, mas não
uma prática que se torne ferramenta para as mudanças necessárias. A professora A,
da Escola Misael, diz que não existe uma fórmula pronta, e todos os dias estamos
aprendendo, na prática e na convivência.
Já a professora B diz que temos que valorizar os alunos, mas não podemos
banalizar a escola deixando-os livres para fazerem o que estão acostumados.
Importante é ensiná-los mostrando limites, pois muitos alunos pedem limites ao
professor.
Enfim, Entre os Muros da Escola não pretende dizer a verdade, toda a
verdade e nada mais que a verdade da educação. O filme não cai nem no discurso
catastrofista do apocalipse escolar, nem nas piedades ingênuas das pedagogias
redentoras. Não crucifica ou endeusa os professores nem transforma os estudantes
em estereótipos. Não esconde que ensinar pode ser por vezes, uma missão quase
impossível, frente a quem não quer, não consegue, ou resiste, com insolência e
hostilidade a ser ensinado.
Já o filme Escritores da Liberdade7 relata de uma forma sutil e instigante, o
desafio da educação em um contexto social problemático e violento. O filme inicia
com uma recém formada professora, Erin, que entra como novata em uma instituição
de ensino médio, a fim de lecionar Língua Inglesa e Literatura para uma turma de
adolescentes rebeldes e violentos, envolvidos com gangues. Nos primeiros contatos,
quando percebe os problemas enfrentados pelos estudantes, a professora Erin
7 Fonte: Escritores da Liberdade: breve resenha sobre o filme “Escritores da Liberdade” ( Freedom, EUA, 2007) disponível em : recantodasletras.uol.com.br> todos>resenhas. Autora Valis, J.S./06/09/2007
15
resolve inovar e apresenta novos métodos de ensino, ainda que sem a autorização
da diretora do colégio.
A professora G (chamada assim por seus alunos) entrega-lhes um caderno
para que escrevam, diariamente, sobre aspectos de suas próprias vidas, podendo
relatar conflitos internos gerados por problemas ocorridos na escola ou problemas
familiares. Também indicou a leitura de obras sobre problemas cruciais da
humanidade, tais como o livro O Diário de Anne Frank, com o intuito de que os
alunos percebessem valores como de tolerância mútua, nos quais tragédias
ocorreram. Com o tempo, os alunos vão tomando gosto e iniciam seus escritos nos
diários, trocando experiências de vida e mudam a forma de conviverem com os
colegas diferentes, sendo mais tolerantes, e conseguindo revolver problemas de
suas próprias rotinas. Os textos dos diários foram juntados em um livro que foi
publicado nos Estados Unidos em 1999, com muita dificuldade. Projetos inovadores
geralmente, nas escolas públicas, enfrentam muitas dificuldades, muita burocracia e
resistência às inovações pedagógicas.
Esta realidade apontada no filme está muito próxima da nossa realidade. E
nos faz pensar que, muitas vezes, a escola é o único lugar onde o indivíduo pode se
expressar e talvez até resolver alguns de seus problemas. Ele pode encontrar, ali, no
seu professor, um amigo em quem confiar.
Torna-se necessário discutir com os educadores que a sociedade mudou e a
família também. E em decorrência, o aluno hoje é diferente, mas a escola contínua
com os mesmos métodos e, dessa forma, mesmo que os alunos indisciplinados
sinalizem que algo, na escola e na sala, não está correspondendo às suas
expectativas como estudantes, e ainda, que estariam reivindicando mudanças
necessárias para que se realize o objetivo da escola, nada é feito objetivamente.
A professora F diz que em tese parecem fáceis, mas quando se encara a
realidade nua e crua a sua frente, são muitos os desafios. E, às vezes, não estamos
dispostos a pagar o preço tão alto como a professor G do filme.
No Brasil, então, as dificuldades são imensas. É somente com muito esforço
e luta que projetos semelhantes podem se tornar possíveis. Escritores da Liberdade
merece destaque pela ênfase que dá ao papel da educação como mecanismo de
transformação individual e coletiva.
Quando se questiona o educador sobre que relação o filme tem com nossa
realidade, ouve-se o seguinte relato da professora N: em nossa escola, não temos
16
tanto problemas com violência, mas tudo serve de exemplo e pode ajudar-nos em
nossa prática.
Outro ponto de discussão foi sobre a violência na instituição escolar, pois as
mudanças que a sociedade está vivendo nos mostram os desafios que a escola e os
professores devem enfrentar para responder pedagogicamente à exigência dos
novos tempos e, aqui, especificamente, confirma-se que a crise que a escola vem
enfrentando não se restringe ao campo educacional, mas está relacionada com a
crise da instituição familiar, dos valores, dos costumes, da economia, dos preceitos
religiosos etc.
É fundamental que se mencione o que La Taille (1999, p.27) considera que
três são as fontes de autoridade: a delegação da autoridade dos pais para as
instituições educacionais, a formação para o exercício da cidadania e o valor do
saber.
Segundo o autor num passado não muito distante:
os pais conferiam, de “olhos fechados” autoridade aos professores (até para ministrarem castigos físicos), a escola era vista como legítima representante de valores compartilhados por todos os membros da sociedade e aos quais todos deviam se conformar, e a escola também era, de fato praticamente o único lugar onde se encontrava o patrimônio cultural. O vento da democratização, que soprou no mundo ocidental no século xx, também passou pela escola. Deu-se aos alunos voz e espaço para que não se limitassem a copiar, mas também criassem, para que não somente obedecessem, mas também tomassem parte das decisões da gestão da escola, reconheceu-se que a sociedade, longe de ser um todo homogêneo, é composta de várias singularidades, de diversidade, e no que se refere ao saber, o acesso a ele também se democratizou. (La Taille, 1999, p. 27)
Após as mudanças ocorridas, principalmente na relação professor aluno e no
papel que cada um deve desempenhar na escola, observamos que muitos de nossos
educadores, oriundos de uma formação na qual o professor era reconhecido como
detentor do conhecimento, não eram preparados para administrarem essa nova
relação entre aluno e professor, isto é, a de respeitar o aluno, reconhecer que ele já
tem um conhecimento mesmo que seja apenas do senso comum, e que o papel do
professor é o de mediador do conhecimento. O professor deve acolher o aluno nas
suas dificuldades e procurar compreender as diversas situações de risco e
vulnerabilidade dos mesmos na escola.
Avançamos em alguns aspectos e, um deles, foi a criação do sistema de
cotas para negros sendo uma espécie de compensação que o Estado oferece à
17
população negra. Esta compensação se dá na forma de reserva de vagas nas
Universidades públicas e em concursos públicos para empregos. É um projeto
polêmico, pois para muitas pessoas que entendem de outra forma a discriminação,
consideram que tal benefício não é justo, já que o Brasil é um país de abrangente
miscigenação sendo difícil a comprovação de a que raça se pertence.
Mas todas as mudanças que atingiram as sociedades sopraram também
sobre a escola e não vieram sozinhas! O consumismo, o mundo da informação, a
tirania do dinheiro, o individualismo egoísta vieram juntos e, acredito, aproveitaram o
espaço de liberdade, aberto pela democracia, para instalar novas condutas e
mentalidades que nada têm de democrático. Se a sociedade fosse realmente
democrática, a autoridade dos professores permaneceria existindo, mais respeitosa e
mais esclarecida do que antes. Penso que temos que buscar uma medida entre a
rigidez da escola do passado e a aceitação da autoridade, do respeito mútuo, que
garanta a harmonia nas relações interpessoais na escola.
5 TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS: do castigo ao ler e escrever?
Na escola tradicional se exigia disciplina e, por conseguinte castigo, ou seja,
o ensino exigia disciplina e a disciplina exigia castigo. Quem era submisso era
obediente e bonzinho, quem era indisciplinado era rebelde e mal educado.
Podemos dizer, portanto, que segundo Parrat-Dayan (2008, p.20) o conceito
de disciplina pode ser definida como um conjunto de regras e obrigações de um
determinado grupo social e que vem acompanhado de sanções nos casos em que as
regras e obrigações sejam desrespeitadas.
Para La Taille (1996 p.10), “se enterdermos por disciplina comportamentos
regidos por um conjunto de normas, a indisciplina poderá se traduzir de duas formas:
a revolta contra estas normas e o desconhecimento delas”.
No modelo da pedagogia histórico-crítica, a indisciplina pode ser vista como
um termômetro para a escola e para os educadores sobre o processo ensino-
aprendizagem, dizendo que a forma de ensinar não está sendo eficiente e que é
urgente repensar o trabalho como um todo
Sacristán e Gómez declara que,
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(…) provocar a reconstrução crítica do pensamento e da ação nos alunos/as exige uma escola e uma aula onde se possa experimentar e viver a comparação aberta de pareceres e a participação real de todos na determinação efetiva das formas de viver, das normas e padrões que governam a conduta, assim como das relações do grupo da aula e da coletividade escolar. (Sacristán, 1998, p.26)
Portanto, se realmente levarmos em conta o sujeito, temos que respeitar o
aluno em sua especificidade.
Segundo Parrat-Dayan (2008), os alunos precisam estar conhecendo, na
escola, as normas básicas de convivência, nas quais eles se sintam seguros, sem
serem ridicularizados, discriminados ou agredidos; sabendo e aceitando as sanções
que um mau comportamento possa receber. Essas regras devem estar
implementadas no Projeto político pedagógico da escola como um objetivo
educacional. Supõe-se, a participação dos alunos, sentindo-se responsáveis também
junto à escola.
Para Parrat- Dayan (2008):
Os alunos devem ser tratados com respeito, e este tema deve ser discutido em sala de aula. Eles podem pensar sobre a necessidade de estabelecer regras, de respeitá-las e de ter o poder de aplicar sanções, elaboradas por eles, no caso de não cumprimento dessas regras. Assim os alunos entram num processo de responsabilização progressiva.( Parrat- Dayan 2008, p. 130-131)
Mas, para caracterizar a indisciplina, temos que relacioná-la com o conceito
de disciplina que, na linguagem comum, pode ser definida como regra de conduta
comum a uma coletividade para a boa ordem e, por extensão, a obediência à regra.
O conceito de disciplina está relacionada com a existência de regras e a indisciplina,
com a desobediência a essa regras.
Para Parrant- Dayan (2008, p.19), o conceito de indisciplina relaciona-se:
Com um conjunto de valores e expectativas que variam ao longo da história, entre culturas diferentes, nas diferentes classes sociais. No plano individual, a palavra indisciplina pode ter significados diferentes, e se, para um professor indisciplina é não ter o caderno organizado, para outro, uma turma será caracterizada como indisciplinada se não fizer silêncio absoluto e, já para um terceiro, a indisciplina até pode ser vista de maneira positiva, considerada sinal de criatividade e de construção de conhecimentos.(...) As condutas indisciplinadas se generalizam, as crianças já não obedecem mais, a idéia de limites desapareceu, a sociedade se transformou, as crianças também mudaram e já não sabemos é preciso fazer. (Parrant- Dayan, 2008, p.19).
19
O conceito de indisciplina pode ter muitas interpretações podendo ser
observada a partir de diferentes marcos de referência segundo Parrat-Dayan (2008,
p. 21):
Do aluno do professor ou da escola. Se considerarmos o referencial do aluno, a noção de indisciplina se expressa em suas condutas, inter-relações com seus pares e com os profissionais no contexto escolar e, ainda, no contexto do seu desenvolvimento cognitivo. (Parrat-Dayan, 2008, p. 21).
E depois, tomarmos o professor como ponto de referência, são as condutas
que aparecem como indisciplinadas quando ele não respeita as normas
estabelecidas. Além do mais, muitas vezes, a forma de intervir, do professor para
estabelecer ordem, pode gerar indisciplina nos alunos.
Arroyo (2009) nos diz que:
É legítimo que os mestres sonhem com alunos bondosos, ordeiros, condescendentes, porém não é profissional condenar crianças e adolescentes e jovens por serem feitos violentos e ameaçadores pela vida. O fato que as escolas vivem impasses antes não vividos.As imagens da infância são quebradas exatamente em tempos em que as condições de trabalho docente se deterioram.( Arroyo, 2009, p.39)
Parafraseando Arroyo (2009), salienta que a indisciplina na escola não é um
fenômeno estático, elas mudam em função da época e do contexto e cabe perguntar
qual a parcela de contribuição da escola para que ela aconteça. Não a quereremos
ingênua ou autoritária, pois se queremos a formação de um aluno crítico, capaz de
intervir na realidade social e exercer seu papel de cidadão, o exercício do
pensamento crítico pode se dar em forma de rebelião ou “indisciplina”, atitudes com
as quais os professores não estão preparados para lidar. É evidente que se
quisermos que os alunos avancem no sentido de exercer sua vida cidadã, é
necessário prepará-los para serem capazes de pensar e resolver conflitos pois, se
não se sentirem capazes de elaborar e participar na solução de problemas
começando na escola, as condutas de indisciplina serão inevitáveis. Mas é
importante voltar a atenção para o fato de que muitos professores não foram e não
estão preparados para resolver muitos dos distúrbios que acontecem em sala de
aula.
Posso afirmar isso pelos longos anos de trabalho que exerço como
pedagoga. Tenho visto que a escola tem um discurso de escola democrática, mas
20
pela prática de seu dia a dia e pelas ações que se concretizam, por parte da própria
escola e dos professores, estamos muito longe de uma escola cidadã.
Parafraseando Parrat-Dayan (2008), o professor deve ter consciência de que
irá encontrar, ao longo da sua carreira, classes difíceis que irão desafiá-lo e,
enquanto condutor da classe, não pode se deixar afetar emocionalmente, caso
contrário pode criar situações de tensões e angústias para ambos. Ser professor
exige muito jogo de cintura e argumentação para poder conduzir de maneira
adequada a classe, praticamente todos os dias, já que, geralmente, as classes são
muito heterogêneas não podendo ser gerida por igual.
Para se dar bem com as turmas, o professor precisa determinar regras e
estabelecer limites para dar segurança: todo aluno tem necessidade de se sentir
seguro para poder aprender; para estruturar-se; o aluno precisa encontrar adultos
que lhe imponham os limites que foram construídos no coletivo; para socializar-se,
precisa ter atenção para que não se instaurem na sala de aula relações de força. O
professor deve cuidar para que ele mesmo não crie relações de força na aula
(insulto, deboche, humilhação, etc). Também, faz-se necessário trabalhar uma
comunicação social educativa. Para isso, aconselha-se, entre outros procedimentos:
lançar um olhar positivo para os alunos, mesmo para os difíceis; administrar os
conflitos interpessoais entre alunos, entre professor e aluno; propor diálogo é uma
estratégia de negociação para se chegar a soluções aceitáveis para ambas as partes
(fora do horário das aulas). É indispensável instituir a demonstração de afetividade,
confiança e respeito; emitir mensagens positivas, de encorajamento à turma a fim de
tranqüilizá-la; ter atenção com o desinteresse coletivo, que pode ser resultado de
mensagens negativas e de comparações com outras turmas, pois isso agride e
desestimula sobremaneira os alunos.
Tragtenberg (1982) nos diz que:
A preocupação maior da educação consiste em formar indivíduos cada vez mais adaptados ao seu local de trabalho, porém capacitados a modificar seu comportamento em função das mutações sociais. Não interessa, pelo menos nos países industrializados desenvolvidos, operários embrutecidos, mas seres conscientes de sua responsabilidade na empresa e perante a sociedade capitalista. (Tragtenberg,1982, p.35)
Para Tragtenberg (1982, p.36) na sociedade atual, o objetivo do sistema de
ensino insere-se no mesmo “corpo professoral encarregado de transmitir o saber e,
21
mais ainda, preocupado em inserir-se na sociedade, ter reconhecimento oficial, êxito
no magistério enquanto carreira.”
A escola se organiza em um sistema burocrático hierarquizado em cargos
que se articulam na forma de carreira, onde o diploma, o tempo de serviço, e a
conformidade com as regras formam requisitos para ascensão na carreira.
O pessoal do magistério no sistema burocrático, segundo Tragtenberg
(1982),
É recrutado por concursos de títulos e provas, contratado a título precário, cujo nível de vencimento dependerá do número de aulas atribuídas por escolha fundada em pontos obtidos a critérios da secretaria de educação. (Tragtenberg,1982, p.36)
Além do que a burocratização da escola ocorre de forma hierarquizada:
diretor, secretário, pedagogos, professor, serventes.
Em relação aos professores, estes procuram manter sua autoridade, sem
aceitar intromissões dos pais no seu trabalho, pois isso pode prejudicar sua posição
de autoridade, isto é, de detentor do conhecimento, além do que pode se sentir
ameaçado e sujeito a críticas por elementos estranhos.
Segundo Tragtenberg (1982), o diretor, por sua vez, funciona
Como mediador entre o poder burocrático da secretaria e da escola como conjunto; sofre pressão dos professores no sentido de alinhar-se com eles, dos alunos para satisfazer reclamos racionais ou não, dos pais para manter a escola no nível desejado pela comunidade. (Tragtenberg,1982, p. 39)
Assim, a escola com toda a sua equipe pedagógica e membros contribuem
para a reprodução da força de trabalho, na medida em que transmite saber e regras
de conduta: ler, escrever, contar. O que é ensinado na escola tem como objetivos
definidos; dar notas, classificar, e sancionar os indivíduos (aprovar ou reprovar).
Além do que, toda escola é conservadora e está a serviço da sociedade atual
quando segundo, Tragtenberg (1982, p.42), divide o trabalho intelectual, entre teoria
e prática, pois legitima a separação entre a consciência e a prática. Portanto, coloca
a escola como aparelho ideológico que inculca a ideologia dominante e está a seu
serviço. É possível considerar a escola como um dos “aparelhos ideológicos do
Estado”.
22
6 CONCLUSÃO
Ser professor, hoje, está se tornando uma missão muito difícil. O aluno chega à
escola sem ter recebido uma socialização prévia. Quando, como escola, temos que
atender toda a população, com suas diferentes culturas, valores e ambiente social,
nos vemos diante de crianças que não foram preparadas para as situações de
aprendizagem. Além do que, temos que ter consciência de que as condições físicas
do ambiente, como sala de aulas superlotadas, salas abafadas, apertadas, grandes
demais, carteiras quebradas, falta de ventilação, iluminação insuficiente, levam
professores e alunos a um clima de mal estar que gera conflitos e angústia.
O fenômeno da violência e da indisciplina é uma questão que vem
preocupando muito, afinal, já não conseguimos mais ensinar, pois a conduta dos
alunos na sala de aula não nos permite mais ficar alheios às suas prováveis
consequências. Se antes, nossa preocupação era com os alunos que não
aprendiam, hoje é, também, com o aluno indisciplinado.
Arroyo (2009) nos diz:
As condições a que são condenados milhões de crianças, adolescentes e jovens exigem responsabilidades das políticas públicas e de todas as instituições da sociedade e dos profissionais das múltiplas áreas. Às escolas e aos professores cabe parte destas responsabilidades na especificidade de seu papel docente e educativo, mas não cabe a única responsabilidade. Redefinir responsabilidades sociais não é fácil. Porem é urgente. (Arroyo, 2009, p.22)
Portanto, para enfrentar a violência e a indisciplina na escola faz-se
necessário promover, em todos os âmbitos da vida individual, coletiva, familiar, social
e cultural, fóruns para discussão coletiva e redefinição de papéis e funções, pois
ações isoladas não resolverão os problemas que as escolas e a própria sociedade
enfrentam.
Temos que, junto com outros profissionais, dedicados a também cuidar da
infância e da adolescência, assumir a responsabilidade que é de todos nós.
Outra consciência que, como professores e como pais devemos ter, é que, ser
professor nunca foi tarefa fácil e harmoniosa. Arroyo (2009) nos diz:
Faz décadas que não é fácil, nem sequer ser vizinhos em espaços tão estreitos como a sala de aula. Se diretores, técnicos, gestores e até alguns professores (as) acreditavam nas escolas como comunidades de convívio
23
feliz, as tensões vividas nestes tempos aconselham decepção. (...) A empreitada de tornar o ser humano mais humano nunca foi tarefa fácil.Exatamente porque faz parte da conduta humana a liberdade. (Arroyo, 2009,p.48)
Afinal o discurso das escolas sempre foi de formar um sujeito livre, crítico e
consciente. Acredito que quanto mais aprenderem sobre liberdade, nossos alunos, mais
difíceis serão de educá-los e ensiná-los.
Somos sabedores de que os alunos de hoje já não são os mesmos de outrora.
O aluno ideal, bonzinho, respeitador, ordeiro, que idealizamos e com o qual
sonhamos, já não existe mais, resultado da situação em que vivem nossos alunos,
tanto crianças quanto adolescentes e que, a cada dia que passa, vem piorando.
Somando-se a tudo isso, as condições de trabalho dos educadores também se
agravam. Parafraseando Arroyo (2009), as escolas vivem impasses antes não
vividos. As imagens da infância são quebradas exatamente ao tempo em que as
condições de trabalho se deterioram. E, muitas vezes, sem saber ao certo como lidar
com os conflitos na escola, tomamos medidas e temos reações adversas que
provocam tensões internas no ambiente escolar;
Afirma Arroyo (2009) que a reação menos freqüente, porém mais chamativa,
na escola, é
Condenar essas condutas, cortar o “mal” pela raiz. Advertência, suspensão de aulas, expulsão, entregar à polícia não apenas os alunos, mas até as escolas situadas em comunidades “violentas”. Soluções extremas, mas que são um atestado tanto da incompetência pedagógica da escola para educar quanto da falta de condições de trabalho para dar um trato pedagógico exatamente àquela infância e adolescência que mais precisa da escola e dos educadores (as). (Arroyo, 2009, p. 40)
O Estado nada tem feito para que as condições de trabalho melhorem o que
vivenciamos são salas de aulas super lotadas, docentes trabalhando em três
jornadas de trabalho, inúmeras turmas e centenas de alunos.
Todos os dias ouvimos nossos educadores dizerem que os alunos estão mais
arrogantes e desafiadores frente a eles e à própria direção da escola. Talvez isso
seja resultado do mundo onde vivem sem serem ouvidos. Podemos interpretar essa
rebeldia como sendo um grito de socorro para serem ouvidos e entendidos.
Entendemos que a reflexão coletiva sobre a conduta negativa dos alunos
propicia momentos tensos na escola. Reconhecemos, também, que tivemos avanços
na escola, mas ainda temos muito que melhorar em relação a dar voz e vez aos
24
alunos, sendo verdade que pouco estimulamos a participação dos alunos nas
decisões coletivas da escola.
Outro ponto que devemos levar em conta é se estamos interpretando a
sociedade violenta na qual nossos educandos vivem, bem como, considerando a
crise de valores que regula os comportamentos das pessoas que os influenciam. É
certo que reproduzem, na escola, o que vivem na rua e na família.
Mas cabe aqui perguntar. Como avançar e melhorar? Em Arroyo (2009)
encontramos uma diretriz:
A forma mais coerente de avançar será mapear coletivamente as mudanças que, os próprios professores (as) vêm fazendo nas suas rotinas de trabalho e nos saberes sobre o seu fazer. O que mais está mudando nas escolas e nas salas de aula são os processos, as didáticas, a organização dos alunos, os agrupamentos. A produção coletiva dos alunos nas salas e dos docentes nas áreas está mudando rituais de avaliação, reorganização de tempos, trocas indisciplinares, reorganização de espaços, aulas geminadas, estudos, oficinas coletivas. (Arroyo, 2009, p.403)
Portanto, é urgente ressignificarmos nosso olhar sobre os educandos, bem
como suas trajetórias e expectativas de vida, entrelaçando-as com as dos mestres.
Temos que olhar para as duas categorias indistintamente, pois ambos caminham
juntos. As políticas públicas têm que priorizar ambos, pois ações isoladas não
surtirão nenhum efeito.
Parafraseando Arroyo (2009), tornar-se um professor competente não é uma
tarefa fácil, pois requer a quebra de paradigmas e o despertar da consciência de que
em uma sala de aula não há aprendizado homogêneo ou imediato. Há situações que
exigem a prontidão e percepção apurada do professor, pois é certo que o aluno
precisa da orientação do professor, acompanhamento de cada passo do aluno, de
forma que ele, gradativamente, liberte-se e demonstre seu potencial mental. Para
seu crescimento profissional, o professor deverá perceber que a formação
continuada se faz necessária justamente para poder compreender a importância de
que a teoria e a prática andam juntas. Além disso, repensar a sua posição de
autoridade: não considerar que, por ocupar, tradicionalmente o papel central no
processo de ensino aprendizagem e por exercer a função pedagógica de determinar
normas de conduta e o que será feito em sala, não necessita ouvir seus alunos. Para
esses professores que ficaram engessados numa posição legalista, os alunos não
têm permissão para expressarem suas opiniões e suas dúvidas, ou seja, eles
25
silenciam seus aprendizes, uma vez que não permitem que pensem por si próprios,
mas sim os obrigam a repetir a fala do mestre, do livro didático, ou da instituição.
Parafrasenado Novais, (2004, p.24) que diz: é imprescindível frisar que a
autoridade docente somente será garantida se houver clareza dos propósitos da
interação, tanto para professores quanto para alunos; uma nítida percepção dos
papéis e das atribuições inerentes a cada parte envolvida; hábitos e regras de
convivência claros, estabelecidos e respeitados por todos, e resultados que
espelhem o processo cotidiano de interação e, principalmente, um compromisso
genuíno com o processo pedagógico, ou seja, com a construção de sujeitos que,
conhecendo sua realidade, disponham-se a mudá-la (Aquino, 1999). Assim, para
garantir um ambiente favorável à construção da autonomia é necessário,
primeiramente, que se faça uma profunda reflexão sobre a organização da escola e
sobre o tipo de relações sociais existentes no ambiente educacional.
Aquino (1999, p. 134) declara que,
(...) que toda relação institucionalizada, que se queira fecunda, não pode prescindir de algumas condições fundamentais quanto a seu funcionamento, as quais implicam desde o estabelecimento dos parâmetros de conduta para ambas as partes até, e principalmente, a explicitação contínua dos objetivos, limites e possibilidades da relação (...).
Parafraseando Aquino (1999), salienta que conseguiremos criar ordem e
respeito dentro da sala de aula de maneira que os alunos aprendam, se adotarmos
algumas atitudes, tais como: ter domínio dos conteúdos da disciplina com que
trabalhamos; saber adaptar a forma de ministrar os conteúdos disciplinares às
características especificas de cada turma, pois cada uma tem diferentes
especificidades; ter bem claras e aplicar, sem qualquer exceção, as regras de
funcionamento da sala de aula(contrato didático) ; ser coerente entre aquilo que diz e
aquilo que faz; dominar técnicas de comunicação (saber questionar, saber ouvir);
criar momentos para falar individualmente com cada aluno, criando laços de
confiança.
É fundamental pensar que a autoridade não decorre de imposição, mas de
respeito e conquista; e ela se expressa na forma como o professor exerce o seu
papel de educador, sendo responsável, não só por transmitir conhecimentos, mas,
principalmente, por ajudar os alunos a ressignificarem esses conhecimentos,
26
entendendo a sua importância e aplicando-os no seu contexto. Dessa forma, estará
preparando-os para serem sujeitos de sua própria história. A autoridade permitirá ao
professor optar pelos melhores caminhos para desenvolver sua própria formação,
comprometido com a educação e manejando a autoridade em prol de seus alunos, e
não baseado em satisfazer desejos pessoais e autoritários. É possível que, dessa
forma, a indisciplina, frente à autêntica autoridade, seja transformada em
oportunidade de amadurecimento dos sujeitos escolares.
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