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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Produção Didático-Pedagógica
Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE
VOLU
ME I
I
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃOSUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO
DIRETORIA DE POLÍTICAS E PROGRAMASEDUCACIONAIS
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL - PDE
MARILIZA DA SILVA
UNIDADE DIDÁTICA
NARRATIVAS AFRO- BRASILEIRAS: RESGATANDO A DIGNIDADE ATRAVÉS DA LITERATURA
Orientadora: Professora Mestre Cristian Pagoto
CURITIBA2010
IDENTIFICAÇÃO: PROFESSORA PDE – MARILIZA DA SILVANRE: CURITIBAORIENTADORA: PROFESSORA MESTRE CRISTIAN PAGOTO ÁREA DE INVESTIGAÇÃO: LÍNGUA PORTUGUESATEMA DE ESTUDO: LITERATURAESCOLA DE IMPLEMENTAÇÃO: COLÉGIO ESTADUAL AVELINO ANTÔNIO VIEIRAPÚBLICO OBJETO DA INTERVENÇÃO: ALUNOS DA 1ª SÉRIE DO ENSINO MÉDIO
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1
1.1 Apresentação...... .........................................................................................................4 1.2 A transformação do ambiente escolar......................................................................5
1.3 Qual é o papel do Professor?...................................................................................6
1.4 Um pouco de História.................................................................................................7
1.5 O Negro e a Mídia.........................................................................................................8
1.6 O Professor pode ser um mediador.........................................................................10
1.7 Mudando o Currículo................................................................................................12
CAPÍTULO 2
Proposta para atividades.................................................................................................14
Racismo é burrice............................................................................................................14
Negrinha............................................................................................................................17
Pai contra mãe.................................................................................................................27
Civilização Branca............................................................................................................37
Grito Negro.......................................................................................................................39
Preto e Branco.................................................................................................................41
Sites Pesquisados............................................................................................................43
Indicações para Leitura...................................................................................................43
Dicas de filmes que tratam da questão racial..............................................................44
Referências.......................................................................................................................45
CAPÍTULO 1
1.1 APRESENTAÇÃO
Caríssimos professores!
Espero que esta unidade didática possa auxiliá-los em suas aulas, pois queremos
garantir uma educação multicultural e racial.
O objetivo é trabalhar o resgate de valores, melhorar os laços de amizades e
também resgatar a auto-estima do aluno afrodescendente. Outro fato também relevante,
é levar todos os discentes a repensar os valores e respeitar as diferenças. .
A escola é um espaço onde diversas culturas se intercruzam e as diferenças se
encontram, portanto, é preciso que os profissionais da escola trabalhem com esses
valores étnicos, dando a devida importância no que diz respeito à diversidade para que os
educandos possam conviver dignamente.
A literatura, as músicas, os textos jornalísticos, as propagandas e filmes
constituem material fundamental para que o professor possa abordar esta temática e
possibilitar uma discussão sobre o tema, bem como promover o respeito e a igualdade
entre todos os alunos.
Para isso, você professor(a), deve transformar sua sala de aula em um ambiente
agradável e interativo, visando a participação social de todos!
Bom trabalho a todos!
4
1.2 A TRANSFORMAÇÃO DO AMBIENTE ESCOLAR
Diante do interesse de transformar o ambiente escolar em um lugar onde os alunos se
respeitem e convivam em harmonia, percebemos a relevância de se implantar este
projeto no Colégio Estadual Avelino Antônio Vieira.
Esta Unidade Didática tem como objetivo principal resgatar a dignidade dos alunos
negros e também de outras etnias que sofrem algum tipo de preconceito tanto no
ambiente escolar como fora dele. A intenção é formar cidadãos críticos, conscientes e
capazes de compreender que fazem parte de uma sociedade multicultural, bem como de
todo esse leque de nação mestiça.
E assim, com certeza, nossos alunos terão um novo olhar para o seu
pertencimento, para a sua etnia e sentindo-se parte integrante da mesma, se orgulharão
de sua própria raça.
A escola é um espaço de diversidade, formado por indivíduos com diferentes
histórias de vida, opiniões, culturas e posição social. É no âmbito escolar que se
estabelecem as relações sociais de forma harmônica ou conflituosa, pois por um lado
encontra-se arraigado o discurso de igualdade e respeito ao próximo e por outro se
revelam os preconceitos e discriminações que às vezes acontecem de forma implícita no
cotidiano escolar.
A discriminação racial, em particular do negro, não acontece só no ambiente
escolar e sim na sociedade em geral. Para que não exista um alheamento da própria
história, que é parte da história do povo brasileiro, é necessário que a diversidade
humana seja tratada como um componente de nossa formação ética.
Para tanto, as escolas devem adotar uma metodologia de ensino, visando a
capacitação dos profissionais em educação, para que sejam sensibilizados, no sentido de
assegurar o respeito e a dignidade entre os alunos, excluindo do espaço escolar as
posturas racistas e discriminatórias.
Nesse sentido, a literatura, pelo seu caráter simbólico, pode contribuir para
reflexões que rompam com uma visão construída sob o fundamento da desigualdade
étnico-racial e se construa, junto com os alunos, uma visão sob uma base de valorização
da diversidade e da pluralidade que permeiam a sala de aula. Assim, as histórias
populares podem trazer muitos exemplos para a vida cotidiana, incluindo lições sobre o
mistério da natureza humana.
5
Embora, os antigos africanos das mais diversas etnias que foram trazidos para o
Brasil não mais existam, o universo cultural que veio com eles, permanece como memória
e deve ser valorizado e tratado no ambiente escolar.
Ana Célia da Silva, professora assistente do departamento de educação da
Universidade do Estado da Bahia – UNEB, afirma que precisamos “Conhecer para
entender, respeitar e integrar, aceitando as contribuições das diversas culturas, oriundas
das várias matizes culturais presentes na sociedade brasileira”.(SILVA, 1987, p.96-98)
1.3 QUAL É O PAPEL DO PROFESSOR?
O preconceito racial é uma constante em nossa sociedade e já está impregnado
dentro dos padrões de comportamento. E a criança e o jovem negro sofrem com o
preconceito não só em sala de aula mas no ambiente onde vive. Essas posturas
racistas precisam ser desmontadas, banidas, pois elas interferem no aprendizado e no
desenvolvimento do educando negro, uma vez que ele se sente inferiorizado, físico e
intelectualmente, prejudicando assim, sua auto-estima.
Não podemos culpar os professores ou a escola por essas práticas racistas, mas é
necessário refletir sobre o papel de cada um, para a transformação dessas posturas. O
professor tem a função de proporcionar o conhecimento e a sociabilidade entre os
educandos. Para isso, ele precisa estar preparado e saber como lidar com essa
situação, que por si só, é polêmica e delicada: o racismo no ambiente escolar.
Sabemos que é uma situação que gera conflitos, mas que se não solucionada,
estaremos omitindo ao não dar a devida importância, ou estaremos nos calando diante
de uma causa tão importante que é o combate ao racismo. O silêncio só vai reforçar o
preconceito e gerar novas ações preconceituosas. Mas será que é possível
assegurarmos o respeito e dignidade entre os alunos, e excluirmos do espaço escolar
as posturas racistas e discriminatórias?
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1.4 UM POUCO DE HISTÓRIA
Relatos do século XV já apontavam para a discriminação racial sofrida pelo
negro e pelo índio quando eram tratados como seres inferiores. Os colonizadores
europeus racistas, destruíam sua cultura e até o cristianismo lhes era negado, pois
julgavam os negros e os índios como seres inferiores.
Segundo Alves Filho ( 2008, p.192),
A longa duração do escravismo marcou profundamente a formação brasileira, e nossa vida de todos os dias. Ela é responsável perante a História, de alguma forma, pela marginalização da população negra, da qual amplos setores sobrevivem em condições infra-humanas nos milhares de favelas e bairros proletários espalhados por todo o país. (...)Vez por outra, determinados setores dirigentes do Estado dão a impressão de estar tomando consciência desses problemas, mas isto não significa que lhes deem soluções.
Após a Abolição dos Escravos, os negros sentiram a necessidade de se
organizar, criando associações para combater o preconceito e a discriminação racial. A
partir da segunda década do século XX , foi criado o jornal O Clarim da Alvorada que
era o canal de expressão do grupo negro. Por volta 1930, foi fundada a Frente Negra
Brasileira, cujo objetivo era integrar o negro, estimulado-o ao trabalho, ao estudo e
aquisição de casa própria.
De acordo com Valente (1994, p.63),Para melhor divulgar suas ideias, a Frente Negra criou um jornal próprio, de nome A Voz da Raça. Em 1936, foi transformada em partido político: Partido Frente Negra Brasileira. Não foi fácil obter o registro de partido. Muitas discussões sobre a constitucionalidade ou não da criação de um partido político negro marcaram o episódio. A Constituição brasileira, declara que todos são iguais perante a lei. Por isso questionava-se a existência de um partido que apontava para a diferença e, por que não dizer, para a desigualdade.
Sabemos que o racismo é uma constante não só nas salas de aula, como
também em outros ambientes frequentados por pessoas negras. Quando o assunto é o
“racismo”, a primeira imagem que nos remete é a do negro, mas por que? Qual é a
origem do racismo? Por que a raça negra? Por que existe desigualdade de valores entre
raças? Sendo assim, uma não deveria ser superior à outra. Por isso, devemos
respeitar os valores culturais das pessoas e aceitar as diversidades, buscando um mundo
7
mais igualitário e mais humano. Na verdade, existem várias formas de racismo: contra os
homossexuais, contra os nordestinos, os índios etc.
A presença de palavras africanas que fazem parte do nosso vocabulário passam
desapercebidas e não são valorizadas como deveriam, bem como são desconhecidas as
personalidades negras que foram marcantes para formação do povo brasileiro, heróis
que ajudaram a construir o Brasil ( sua cultura, literatura, dança, música, arte, culinária e
religião). O negro não pode continuar na marginalidade e sendo tratado como ser inferior
e discriminado na vida pessoal e na vida profissional como acontece hoje. Infelizmente
percebemos que ainda se tem dificuldade de acesso à leitura (de contos, lendas, poesias
e dramatizações de textos) pelos educandos e também à escola e à universidade
independente dos sistemas de cotas.
De acordo com Munanga, (2005, p.16),
O resgate da memória coletiva e da comunidade negra não interessa apenas aos alunos de ascendência negra. Interessa também aos alunos de outras ascendências étnicas, principalmente branca, pois ao receber uma educação envenenada pelos preconceitos, eles também tiveram suas estruturas psíquicas afetadas. Além disso, essa memória não pertence somente aos negros. Ela pertence a todos, tendo em vista que a cultura da qual nos alimentamos quotidianamente é fruto de todos os seguimentos étnicos que, apesar das condições desiguais nas quais se desenvolvem, contribuíram cada um de seu modo na formação da riqueza econômica e social e da identidade nacional.
Para Sant’Ana (2005, p. 41), discorrendo sobre história e conceitos básicos sobre
o racismo e seus derivados, “O racismo é a pior forma de discriminação porque não pode
mudar as características raciais que a natureza lhe deu.”, ou seja, o negro tem que lutar
para vencer o preconceito racial, pois o mesmo não tem culpa de ter nascido negro. Além
do mais, ele precisa sentir orgulho de sua raça e procurar sua identidade social. Para
isso, é necessário fazer um trabalho de resgate, para que se diminua o problema da
desigualdade.
1.5 O NEGRO E A MÍDIA
Podemos também observar que existe preconceito quando se trata de um
personagem em um filme ou em uma novela, por exemplo, pois para o negro só são
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escolhidos papéis de coadjuvantes, onde servem de caricaturas do empregado
doméstico, ou seja, aquele que tem uma posição social inferior, sempre servindo às
classes dominadoras. Este pensamento, no entanto, parece estar mudando, mesmo que
lentamente.
De acordo com Ana Lúcia Lopes, (2006, p.25),
A igualdade pressupõe semelhanças e diferenças, mas não contempla a inferioridade, que é a marca do preconceito e da discriminação racial. É preciso crer que as diferenças encontradas nos indicadores socioeconômicos, em relação à população não-branca, evidenciam apenas a falta de oportunidades e de acesso, e não a falta de capacidades e competências.
Um outro exemplo de discriminação racial está nos livros didáticos, onde são
atribuídos estereótipos e preconceitos, segundo a Pesquisadora Professora Ana Célia da
Silva, da Universidade Federal da Bahia,
Constatou-se a existência de uma ideologia de inferiorização do negro que é fortalecida na escola através do livro didático e do professor, sob a forma de estereótipos e preconceitos. Constatou-se também que o professor, figura importantíssima na educação do aluno, lamentavelmente não percebeu a presença destes estereótipos, bem como o papel que exerce como o grande mediador no processo ideológico, reforçando a transmissão destes estereótipos.(SILVA, 1987, p. 91-98).
Por exemplo, no livro Caminho Certo, 3º série (BRASIL, 1983, p.138), aparece a
seguinte frase no texto: “...querem ver que o demônio do negrinho tornou a cair?”. A
frase modificada por professores, ficou assim: “...querem ver que o garoto traquinas
tornou a cair?”
E a quadrinha popular “boi da cara preta, pega o menino que tem medo de
careta” foi modificada assim:
O boi da cara preta, tem uma cara bonita, não é uma careta; o boi da cara preta é irmão do boi da cara branca, do boi da cara malhada. O boi da cara preta tem a cor do rosto da mamãe, o rosto que você, criança, se alegra quando olha... (ANDRADE, 1989, p.8).
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Os cabelos crespos das crianças afro-descendentes são identificados como
cabelo “ruim”, primeiro pelas mães, que internalizaram o estereótipo; e, depois, na
escola, pelos coleguinhas, que põe os mais variados apelidos nas trancinhas e nos
cabelos crespos ao natural.
Trabalhar a razão de ser dos diferentes tipos de cabelo, ensinar como tratá-los,
realizar concursos de penteados afros, trazer trançadeiras para trançar na sala de aula,
são algumas atividades que podem desconstruir a negatividade atribuída à textura dos
cabelos crespos.
Barbosa, Apud Munanga, (2005, p.28), desconstrói o estereótipo através da
poesia:
Crespo cabelo trançado com a mais pura graça, (…)Apenas poesia e imaginação dos desenhos transbordaCriando os mais belos caminhos na carapinhaSedutoramente tecido na raça das tranças
Os educadores podem ajudar a combater este tipo de preconceito que
infelizmente representa uma atitude negativa e pode promover a exclusão, a auto-
rejeição e a baixa auto-estima do educando.
1.6 O PROFESSOR PODE SER UM MEDIADOR
O professor pode ser um mediador criando atividades que sejam favoráveis às
diferenças étnicas e raciais. Se conseguirmos desconstruir ideias que desqualificam a
identidade étnico racial, não só no tocante à beleza, cor da pele, mas também no
que diz respeito à parte intelectual e moral, então temos certeza de que o educando
resgatará sua da auto-estima e conquistará a sua cidadania .
De acordo com SILVA, ( 1987, p.96-98)
Identificar e corrigir a ideologia, ensinar que a diferença pode ser bela, que a diversidade é enriquecedora e não é sinônimo de desigualdade, é um dos passos para a reconstrução da auto-estima, do auto-conceito, da cidadania e da abertura para o acolhimento dos valores das diversas culturas presentes na sociedade.
Para tanto, será interessante que os educadores, preocupados e engajados com
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essa causa, participem mais e ajudem no sentido de verificar se os livros didáticos estão
de acordo com a lei, se não trazem textos ou figuras que possam de alguma forma
expor ao ridículo, não só o aluno negro, que geralmente vem marcado pela
estereotipia e caricatura, mas qualquer outro tipo de preconceito, seja por gênero, raça
ou diversidade. Outra questão de maior importância, é se fazer cumprir a lei 10.639, a
qual torna obrigatório o ensino da História Africana nos currículos em todas as escolas
públicas ou privadas.
De acordo com Munanga, (2005, p.15), Professor do Departamento de
Antropologia da USP,
Alguns professores, por falta de preparo ou por preconceitos neles introjetados, não sabem lançar mão das situações flagrantes de discriminação no espaço escolar e na sala como momento pedagógico privilegiado para discutir a diversidade e conscientizar seus alunos sobre a importância e a riqueza que ela traz à nossa cultura e à nossa identidade nacional.
O estímulo dos alunos de diferentes ascendências étnico-raciais ou sociais, vai
depender de como o professor vai conduzir suas aulas, sabendo tratar dessa polêmica
de forma profissional, incentivando-os a lutar por seus ideais com dignidade.
A lei n.10.639, de 9 de janeiro de 2003, altera a lei n.9394, de 20 de dezembro de
1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, para incluir no
currículo oficial, da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “ História e Cultura Afro-
Brasileira, e dá outras providências”.
“Art.1ª A lei n.9.394/1996 passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos 26-
A, 79-A e 79-B:
Art. 26-A nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e
particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá
o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura
negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a
contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História
do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão
ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial, nas Áreas de Educação
11
Artística e de Literatura e Histórias Brasileiras”.
De acordo com lopes, (2006, p.26),
A lei deixa nítida a obrigatoriedade do ensino de conteúdos sobre a matriz negra africana na constituição da nossa sociedade no âmbito de todo o currículo escolar e sugere as áreas de História, Literatura e Educação Artística como áreas especiais para o tratamento desse conteúdo, tanto no Ensino fundamental como no Ensino Médio.
A criança negra precisa se identificar dentro do seu espaço e de forma positiva,
para que ela tenha orgulho de seus antepassados. Quando isso acontece de forma
contrária, ela pode se sentir rejeitada na fase adulta ou se envergonhar de sua própria
raça. Portanto se faz necessário que o professor estimule o resgate da auto estima do
educando.
1.7 MUDANDO O CURRÍCULO
Depois da família, a escola é a segunda instituição responsável pelas relações de
sociabilidade do educando, portanto, é fundamental que ele se sinta acolhido para que
melhore sua auto-estima.
Cabe á escola transmitir visões de mundo, construir valores e participar na
formação do cidadão. E no caso do afro descendente, é preciso que se traga para o
espaço escolar situações que elevem a auto estima e amplie sua compreensão do
problema.
Se toda a comunidade escolar estiver envolvida, ( diretores, professores,
funcionários, pais e alunos), se cada um fizer a sua parte, então estaremos no rumo certo,
estaremos combatendo o preconceito e o racismo.
Acreditamos que através da literatura conseguiremos não só valorizar os nossos
alunos, mas também elevar sua auto- estima. Queremos trabalhar principalmente com
textos de autores afro-brasileiros, para que os alunos se identifiquem com essas
narrativas e possam fazer um paralelo com outros autores que também defendem esta
causa.
12
É também relevante que se inclua no currículo, ações pertinentes ao combate à
discriminação e ao preconceito racial. Um currículo escolar que possa privilegiar negros e
mestiços na sociedade e na cultura brasileira.
De acordo com Lopes, (2006),
É preciso olhar mais de perto as experiências escolares que essas crianças e jovens vivenciam. A escola precisa aprender, para assim propor situações de aprendizagem que considerem a presença fundamental dos negros e mestiços em nossa sociedade e, com isso, proporcionar, no currículo cotidiano, outros encontros identitários, mas, dessa vez de inclusão, de sucesso e, portanto de aprendizagens positivas.
Portanto, se o professor promover essa mudança de postura e direcionar a sua
prática para novos rumos, com certeza conseguiremos transformar o espaço escolar em
um ambiente de interação e comunicação, podendo dessa forma garantir a participação
social de todos.
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CAPÍTULO 2
PROPOSTAS PARA ATIVIDADES
Professor(a)!
Que tal você iniciar as atividades apresentando e questionando oralmente aos
alunos sobre o autor da música?
Seus alunos conhecem e costumam ouvir músicas deste gênero?
Coloque o título da música no quadro e pergunte ao alunos, o quê eles acham da
frase escrita: “Racismo é burrice”. Em seguida, vá acrescentando cada sugestão no
quadro.
Professor(a)! Agora distribua o texto com o trecho da letra da música para que os alunos
possam analisar e em seguida peça a eles que façam a leitura silenciosa.
RACISMO É BURRICE Autor: Gabriel O Pensador
Salve, meus irmãos africanos e lusitanos, do outro lado do oceano
"O Atlântico é pequeno pra nos separar, porque o sangue é mais forte que a água do mar"
Racismo, preconceito e discriminação em geral;
É uma burrice coletiva sem explicação
Afinal, que justificativa você me dá para um povo que precisa de união
Mas demonstra claramente
Infelizmente
Preconceitos mil
De naturezas diferentes
Mostrando que essa gente
Essa gente do Brasil é muito burra
E não enxerga um palmo à sua frente
14
Porque se fosse inteligente esse povo já teria agido de forma mais consciente
Eliminando da mente todo o preconceito
E não agindo com a burrice estampada no peito
[...]
http://letras.terra.com.br/gabriel-pensador/137000/
Interpretação de textos: 1) Como podemos ver o autor se expressa dizendo que somos irmãos, mas por que
então, há tanta desigualdade ?
2) Como você interpreta a expressão “O Atlântico é pequeno para nos separar, porque o
sangue é mais forte que a água do mar”?
3) De acordo com o trecho da música:
"Afinal, que justificativa você me dá para um povo que precisa de união
Mas demonstra claramente
Infelizmente
Preconceitos mil"
Responda a seguinte questão:
a) Você concorda que no Brasil o preconceito seja demonstrado claramente? Ou é um
preconceito velado? Por quê?
4) Qual é a sua posição em relação ao título da música? Explique.
15
Caro Professor(a)!
Agora, vamos ouvir a letra do Rap: "Racismo é
Burrice", e em seguida, responder as questões
abaixo:
Professor(a) ! Você poderá propor uma atividade em grupo, solicitando que os alunos debatam
mais algumas questões a respeito do Racismo e Preconceito e depois peça a eles que
apresentem para a sala toda.
Sugestões para questionamento:1) Você já sofreu algum tipo de Preconceito?
2) Você conhece alguém que já tenha sofrido algum tipo de preconceito?
Professor(a) !
O objetivo desta atividade é que os alunos debatam entre si e tomem consciência
da seriedade do fato.
A verdade é que infelizmente, ainda hoje nos deparamos com atitudes
preconceituosas no ambiente escolar. Você poderá orientá-los a respeito desta questão,
ensinando que todos tem os mesmos direitos como cidadão independente da cor, raça
ou classe social.
Agorá é com você!
Redija um texto de no mínimo 10 linhas sobre o tema: “Racismo é Burrice”.
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Professor(a), você pode sugerir aos seus alunos que tragam
depoimentos sobre o preconceito racial, de seus familiares,
pais, avós ou vizinhos.
SUGESTÃO:
Professor(a) você deve pedir para que seus alunos leiam o conto, mas por ser
longo você pode sugerir que eles leiam em casa.
Negrinha Monteiro Lobato
Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fusca, mulatinha escura,
de cabelos ruços e olhos assustados.
Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos cantos
escuros da cozinha, sobre velha esteira e trapos imundos. Sempre escondida, que a
patroa não gostava de crianças.
Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres,
com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu. Entaladas as banhas no
trono (uma cadeira de balanço na sala de jantar), ali bordava, recebia as amigas e o
vigário, dando audiências, discutindo o tempo. Uma virtuosa senhora em suma — “dama
de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião e da moral”, dizia o reverendo. Ótima, a
dona Inácia.
Mas não admitia choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva. Viúva
sem filhos, não a calejara o choro da carne de sua carne, e por isso não suportava o
choro da carne alheia. Assim, mal vagia, longe, na cozinha, a triste criança, gritava logo
nervosa:
17
Professor(a), agora peça aos alunos para analisar o
conto “Negrinha” de Monteiro Lobato!
— Quem é a peste que está chorando aí?
Quem havia de ser? A pia de lavar pratos? O pilão? O forno? A mãe da criminosa
abafava a boquinha da filha e afastava-se com ela para os fundos do quintal, torcendo-lhe
em caminho beliscões de desespero.
— Cale a boca, diabo!
No entanto, aquele choro nunca vinha sem razão. Fome quase sempre, ou frio,
desses que entanguem pés e mãos e fazem-nos doer...
Assim cresceu Negrinha — magra, atrofiada, com os olhos eternamente
assustados. Órfã aos quatro anos, por ali ficou feito gato sem dono, levada a pontapés.
Não compreendia a ideia dos grandes. Batiam-lhe sempre, por ação ou omissão. A
mesma coisa, o mesmo ato, a mesma palavra provocava ora risadas, ora castigos.
Aprendeu a andar, mas quase não andava. Com pretextos de que às soltas reinaria
no quintal, estragando as plantas, a boa senhora punha-a na sala, ao pé de si, num
desvão da porta.
— Sentadinha aí, e bico, hein?
Negrinha imobilizava-se no canto, horas e horas.
— Braços cruzados, já, diabo!
Cruzava os bracinhos a tremer, sempre com o susto nos olhos. E o tempo corria. E
o relógio batia uma, duas, três, quatro, cinco horas — um cuco tão engraçadinho! Era seu
divertimento vê-lo abrir a janela e cantar as horas com a bocarra vermelha, arrufando as
asas. Sorria-se então por dentro, feliz um instante.
Puseram-na depois a fazer crochê, e as horas se lhe iam a espichar trancinhas
sem fim.
Que ideia faria de si essa criança que nunca ouvira uma palavra de carinho?
Pestinha, diabo, coruja, barata descascada, bruxa, pata-choca, pinto gorado,
mosca-morta, sujeira, bisca, trapo, cachorrinha, coisa-ruim, lixo — não tinha conta o
número de apelidos com que a mimoseavam. Tempo houve em que foi a bubônica. A
epidemia andava na berra, como a grande novidade, e Negrinha viu-se logo apelidada
assim — por sinal que achou linda a palavra. Perceberam-no e suprimiram-na da lista.
Estava escrito que não teria um gostinho só na vida — nem esse de personalizar a
18
peste...
O corpo de Negrinha era tatuado de sinais, cicatrizes, vergões. Batiam nele os da
casa todos os dias, houvesse ou não houvesse motivo. Sua pobre carne exercia para os
cascudos, cocres e beliscões a mesma atração que o ímã exerce para o aço. Mãos em
cujos nós de dedos comichasse um cocre, era mão que se descarregaria dos fluidos em
sua cabeça. De passagem. Coisa de rir e ver a careta...
A excelente dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças. Vinha da
escravidão, fora senhora de escravos — e daquelas ferozes, amigas de ouvir cantar o
bolo e estalar o bacalhau. Nunca se afizera ao regime novo — essa indecência de negro
igual a branco e qualquer coisinha: a polícia! “Qualquer coisinha”: uma mucama assada
ao forno porque se engraçou dela o senhor; uma novena de relho porque disse: “Como é
ruim, a sinhá!”...
O 13 de Maio tirou-lhe das mãos o azorrague, mas não lhe tirou da alma a gana.
Conservava Negrinha em casa como remédio para os frenesis. Inocente derivativo:
— Ai! Como alivia a gente uma boa roda de cocres bem fincados!...
Tinha de contentar-se com isso, judiaria miúda, os níqueis da crueldade. Cocres:
mão fechada com raiva e nós de dedos que cantam no coco do paciente. Puxões de
orelha: o torcido, de despegar a concha (bom! bom! bom! gostoso de dar) e o a duas
mãos, o sacudido. A gama inteira dos beliscões: do miudinho, com a ponta da unha, à
torcida do umbigo, equivalente ao puxão de orelha. A esfregadela: roda de tapas,
cascudos, pontapés e safanões a uma — divertidíssimo! A vara de marmelo, flexível,
cortante: para “doer fino” nada melhor!
Era pouco, mas antes isso do que nada. Lá de quando em quando vinha um
castigo maior para desobstruir o fígado e matar as saudades do bom tempo. Foi assim
com aquela história do ovo quente.
Não sabem! Ora! Uma criada nova furtara do prato de Negrinha — coisa de rir —
um pedacinho de carne que ela vinha guardando para o fim. A criança não sofreou a
revolta — atirou-lhe um dos nomes com que a mimoseavam todos os dias.
— “Peste?” Espere aí! Você vai ver quem é peste — e foi contar o caso à patroa.
Dona Inácia estava azeda, necessitadíssima de derivativos. Sua cara iluminou-se.
— Eu curo ela! — disse, e desentalando do trono as banhas foi para a cozinha,
19
qual perua choca, a rufar as saias.
— Traga um ovo.
Veio o ovo. Dona Inácia mesmo pô-lo na água a ferver; e de mãos à cinta,
gozando-se na prelibação da tortura, ficou de pé uns minutos, à espera. Seus olhos
contentes envolviam a mísera criança que, encolhidinha a um canto, aguardava trêmula
alguma coisa de nunca visto. Quando o ovo chegou a ponto, a boa senhora chamou:
— Venha cá!
Negrinha aproximou-se.
— Abra a boca!
Negrinha abriu aboca, como o cuco, e fechou os olhos. A patroa, então, com uma
colher, tirou da água “pulando” o ovo e zás! na boca da pequena. E antes que o urro de
dor saísse, suas mãos amordaçaram-na até que o ovo arrefecesse. Negrinha urrou
surdamente, pelo nariz. Esperneou. Mas só. Nem os vizinhos chegaram a perceber
aquilo. Depois:
— Diga nomes feios aos mais velhos outra vez, ouviu, peste?
E a virtuosa dama voltou contente da vida para o trono, a fim de receber o vigário
que chegava.
— Ah, monsenhor! Não se pode ser boa nesta vida... Estou criando aquela pobre
órfã, filha da Cesária — mas que trabalheira me dá!
— A caridade é a mais bela das virtudes cristas, minha senhora —murmurou o
padre.
— Sim, mas cansa...
— Quem dá aos pobres empresta a Deus.
A boa senhora suspirou resignadamente.
— Inda é o que vale...
Certo dezembro vieram passar as férias com Santa Inácia duas sobrinhas suas,
pequenotas, lindas meninas louras, ricas, nascidas e criadas em ninho de plumas.
Do seu canto na sala do trono, Negrinha viu-as irromperem pela casa como dois
anjos do céu — alegres, pulando e rindo com a vivacidade de cachorrinhos novos.
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Negrinha olhou imediatamente para a senhora, certa de vê-la armada para desferir
contra os anjos invasores o raio dum castigo tremendo.
Mas abriu a boca: a sinhá ria-se também... Quê? Pois não era crime brincar?
Estaria tudo mudado — e findo o seu inferno — e aberto o céu? No enlevo da doce
ilusão, Negrinha levantou-se e veio para a festa infantil, fascinada pela alegria dos anjos.
Mas a dura lição da desigualdade humana lhe chicoteou a alma. Beliscão no
umbigo, e nos ouvidos, o som cruel de todos os dias: “Já para o seu lugar, pestinha! Não
se enxerga”?
Com lágrimas dolorosas, menos de dor física que de angústia moral —sofrimento
novo que se vinha acrescer aos já conhecidos — a triste criança encorujou-se no cantinho
de sempre.
— Quem é, titia? — perguntou uma das meninas, curiosa.
— Quem há de ser? — disse a tia, num suspiro de vítima. — Uma caridade minha.
Não me corrijo, vivo criando essas pobres de Deus... Uma órfã. Mas brinquem,
filhinhas, a casa é grande, brinquem por aí afora.
— Brinquem! Brincar! Como seria bom brincar! — refletiu com suas lágrimas, no
canto, a dolorosa martirzinha, que até ali só brincara em imaginação com o cuco.
Chegaram as malas e logo:
— Meus brinquedos! — reclamaram as duas meninas.
Uma criada abriu-as e tirou os brinquedos.
Que maravilha! Um cavalo de pau!... Negrinha arregalava os olhos. Nunca
imaginara coisa assim tão galante. Um cavalinho! E mais... Que é aquilo? Uma criancinha
de cabelos amarelos... que falava “mamã”... que dormia...
Era de êxtase o olhar de Negrinha. Nunca vira uma boneca e nem sequer sabia o
nome desse brinquedo. Mas compreendeu que era uma criança artificial.
— É feita?... — perguntou, extasiada.
E dominada pelo enlevo, num momento em que a senhora saiu da sala a
providenciar sobre a arrumação das meninas, Negrinha esqueceu o beliscão, o ovo
quente, tudo, e aproximou-se da criatura de louça. Olhou-a com assombrado encanto,
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sem jeito, sem ânimo de pegá-la.
As meninas admiraram-se daquilo.
— Nunca viu boneca?
— Boneca? — repetiu Negrinha. — Chama-se Boneca?
Riram-se as fidalgas de tanta ingenuidade.
— Como é boba! — disseram. — E você como se chama?
— Negrinha.
As meninas novamente torceram-se de riso; mas vendo que o êxtase da bobinha
perdurava, disseram, apresentando-lhe a boneca:
— Pegue!
Negrinha olhou para os lados, ressabiada, com o coração aos pinotes. Que
ventura, santo Deus! Seria possível? Depois pegou a boneca. E muito sem jeito, como
quem pega o Senhor menino, sorria para ela e para as meninas, com assustados
relanços de olhos para a porta. Fora de si, literalmente... era como se penetrara no céu e
os anjos a rodeassem, e um filhinho de anjo lhe tivesse vindo adormecer ao colo.
Tamanho foi o seu enlevo que não viu chegar a patroa, já de volta. Dona Inácia
entreparou, feroz, e esteve uns instantes assim, apreciando a cena.
Mas era tal a alegria das hóspedes ante a surpresa extática de Negrinha, e tão
grande a força irradiante da felicidade desta, que o seu duro coração afinal bambeou. E
pela primeira vez na vida foi mulher. Apiedou-se.
Ao percebê-la na sala Negrinha havia tremido, passando-lhe num relance pela
cabeça a imagem do ovo quente e hipóteses de castigos ainda piores. E incoercíveis
lágrimas de pavor assomaram-lhe aos olhos.
Falhou tudo isso, porém. O que sobreveio foi a coisa mais inesperada do mundo —
estas palavras, as primeiras que ela ouviu, doces, na vida:
— Vão todas brincar no jardim, e vá você também, mas veja lá, hein?
Negrinha ergueu os olhos para a patroa, olhos ainda de susto e terror. Mas não viu
mais a fera antiga. Compreendeu vagamente e sorriu.
Se alguma vez a gratidão sorriu na vida, foi naquela surrada carinha...
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Varia a pele, a condição, mas a alma da criança é a mesma — na princesinha e na
mendiga. E para ambos é a boneca o supremo enlevo. Dá a natureza dois momentos
divinos à vida da mulher: o momento da boneca — preparatório —, e o momento dos
filhos — definitivo. Depois disso, está extinta a mulher.
Negrinha, coisa humana, percebeu nesse dia da boneca que tinha uma alma.
Divina eclosão! Surpresa maravilhosa do mundo que trazia em si e que
desabrochava, afinal, como fulgurante flor de luz. Sentiu-se elevada à altura de ente
humano. Cessara de ser coisa — e doravante ser-lhe-ia impossível viver a vida de coisa.
Se não era coisa! Se sentia! Se vibrava!
Assim foi — e essa consciência a matou.
Terminadas as férias, partiram as meninas levando consigo a boneca, e a casa
voltou ao ramerrão habitual. Só não voltou a si Negrinha. Sentia-se outra, inteiramente
transformada.
Dona Inácia, pensativa, já a não atazanava tanto, e na cozinha uma criada nova,
boa de coração, amenizava-lhe a vida.
Negrinha, não obstante, caíra numa tristeza infinita. Mal comia e perdera a
expressão de susto que tinha nos olhos. Trazia-os agora nostálgicos, cismarentos.
Aquele dezembro de férias, luminosa rajada de céu trevas adentro do seu doloroso
inferno, envenenara-a.
Brincara ao sol, no jardim. Brincara!... Acalentara, dias seguidos, a linda boneca
loura, tão boa, tão quieta, a dizer mamã, a cerrar os olhos para dormir. Vivera realizando
sonhos da imaginação. Desabrochara-se de alma.
Morreu na esteirinha rota, abandonada de todos, como um gato sem dono. Jamais,
entretanto, ninguém morreu com maior beleza. O delírio rodeou-a de bonecas, todas
louras, de olhos azuis. E de anjos... E bonecas e anjos remoinhavam-lhe em torno, numa
farândola do céu. Sentia-se agarrada por aquelas mãozinhas de louça — abraçada,
rodopiada.
Veio a tontura; uma névoa envolveu tudo. E tudo regirou em seguida,
confusamente, num disco. Ressoaram vozes apagadas, longe, e pela última vez o cuco
lhe apareceu de boca aberta.
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Mas, imóvel, sem rufar as asas.
Foi-se apagando. O vermelho da goela desmaiou...
E tudo se esvaiu em trevas.
Depois, vala comum. A terra papou com indiferença aquela carnezinha de terceira
— uma miséria, trinta quilos mal pesados...
E de Negrinha ficaram no mundo apenas duas impressões. Uma cômica, na
memória das meninas ricas.
— “Lembras-te daquela bobinha da titia, que nunca vira boneca?”
Outra de saudade, no nó dos dedos de dona Inácia.
__“Como era boa para um cocre!...”
MONTEIRO LOBATO
Monteiro Lobato, natural de Taubaté (SP), nasceu em 18/04/1882. É uma das
figuras excepcionais das letras brasileiras. Jornalista, contista, criador de deliciosas
histórias para crianças, suscitador de problemas, ensaísta e homem de ação, encheu com
seu nome um largo período da vida nacional.
Com a publicação do livro de contos "Urupês", em julho de 1918, quando já
contava com 36 anos de idade, chama para o seu talento de escritor a atenção de todo o
país. Cita-o Ruy Barbosa, em discurso, encontrando no seu Jeca Tatu um símbolo da
realidade rural brasileira. Lança-se à indústria editorial, publica livros e mais livros —
"Onda Verde", "Ideias de Jeca Tatu", "Cidades Mortas", "Negrinha", "Fábulas", "O
Choque", etc.
Fracassa como editor, ao lançar a firma Monteiro Lobato & Cia., mas volta com a
Companhia Editora Nacional, ao lado de Octales Marcondes, e triunfa. Tenta a exploração
de petróleo, e acaba na cadeia, perseguido pela ditadura de Getúlio Vargas. Não só
24
Professor(a) , vamos conhecer um pouco mais sobre a vida do autor?
escreve, como traduz sem pausa, dezenas e dezenas de livros, especialmente de Kipling.
Uma vida cheia. E uma grande obra, que lhe preservará o nome glorioso. Foi um grande
homem, um grande brasileiro e um dos maiores escritores — em todo o mundo — de
histórias para crianças. Basta dizer que, no período de 1925 a 1950 foram vendidos
aproximadamente um milhão e quinhentos mil exemplares de seus livros.
Era, de fato, um ser plural: escritor precursor do realismo fantástico, escritor de
cartas, escritor de obras infantis, ensaísta, crítico de arte e literatura, pintor, jornalista,
empresário, fazendeiro, advogado, sociólogo, tradutor, diplomata, etc. Faleceu na cidade
de São Paulo (SP), no dia 04 de julho de 1948.
Professor(a), como se trata de palavras arcáicas, ou seja, que já caíram em desuso, peça a seus alunos que procurem o seu significado no dicionário.vagia:
fusca:
cabelos ruços:
amimada:
entanguem:
desvão:
ramerrão:
azorrague:
Agora peça aos alunos para que façam a interpretação das seguintes passagens do texto:a) “Sentadinha aí e bico, hein?”
b) “Nunca se afizera ao regime novo — essa indecência de negro igual a branco e
qualquer coisinha: a polícia! “Qualquer coisinha”: uma mucama assada ao forno porque
se engraçou dela o senhor; uma novena de relho porque disse: “Como é ruim, a sinhá!”...”
c) “Varia a pele, a condição, mas a alma da criança é a mesma — na princesinha e na
25
Professor(a) , vamos usar o dicionário?
mendiga. E para ambos é a boneca o supremo enlevo”
d)” Cessara de ser coisa — e doravante ser-lhe-ia impossível viver a vida de coisa. Se
não era coisa! Se sentia! Se vibrava!”
e) “O 13 de Maio tirou-lhe das mãos o azorrague (chicote de várias correias ou corda),
mas não lhe tirou da alma a gana.” Qual é o sentido dessa afirmação?
Compreensão do texto:
Responda:
a) Por que Negrinha muda o seu comportamento quando as sobrinhas de dona Inácia
vão embora?
b) Qual foi a causa da morte de negrinha?
c) Você concorda com a forma como a dona Inácia tratava Negrinha?
d) Qual foi o estado emocional de Negrinha ao se deparar com a boneca?
e) Cite uma frase do texto que demonstre claramente a existência do preconceito racial.
PRODUÇÃO DE TEXTO:
Sugestão:Professor(a) você pode pedir aos alunos que escrevam um outro final para este conto,
de forma coletiva ou individual.
Outra forma que poderá ser trabalhada, é pedir aos alunos que façam um um texto de
opinião a respeito deste conto.
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Professor(a), agora peça aos alunos para que façam a análise desta crônica: Pai contra mãe de Machado de Assis.
PAI CONTRA MÃE MACHADO DE ASSIS
A ESCRAVIDÃO levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras
instituições sociais. Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um
deles era o ferro ao pescoço, outro o ferro ao pé; havia também a máscara de folha-de-
flandres.
A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos, por lhes tapar a
boca. Tinha só três buracos, dous para ver, um para respirar, e era fechada atrás da
cabeça por um cadeado. Com o vício de beber. perdiam a tentação de furtar, porque
geralmente era dos vinténs do senhor que eles tiravam com que matar a sede, e aí
ficavam dous pecados extintos, e a sobriedade e a honestidade certas.
Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança
sem o grotesco, e alguma vez o cruel. Os funileiros as tinham penduradas, à venda, na
porta das lojas. Mas não cuidemos de máscaras.
O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa,
com a haste grossa também à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada
atrás com chave. Pesava, naturalmente, mas era menos castigo que sinal. Escravo que
fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente, e com pouco era pegado.
Há meio século, os escravos fugiam com frequência. Eram muitos, e nem todos
gostavam da escravidão. Sucedia ocasionalmente apanharem pancada, e nem todos
gostavam de apanhar pancada. Grande parte era apenas repreendida; havia alguém de
casa que servia de padrinho, e o mesmo dono não era mau; além disso, o sentimento da
propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói. A fuga repetia-se,
entretanto.
Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de contrabando, apenas
comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade. Dos que
seguiam para casa, não raro, apenas ladinos, pediam ao senhor que lhes marcasse
aluguel, e iam ganhá-lo fora, quitandando.
Quem perdia um escravo por fuga dava algum dinheiro a quem lho levasse. Punha
anúncios nas folhas públicas, com os sinais do fugido, o nome, a roupa, o defeito físico,
se o tinha, o bairro por onde andava e a quantia de gratificação. Quando não vinha a
quantia, vinha promessa: "gratificar-se-á generosamente", -- ou "receberá uma boa
gratificação". Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de
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preto, descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa. Protestava-se com
todo o rigor da lei contra quem o acoutasse.
Ora, pegar escravos fugidios era um ofício do tempo. Não seria nobre, mas por ser
instrumento da força com que se mantêm a lei e a propriedade, trazia esta outra nobreza
implícita das ações reivindicadoras. Ninguém se metia em tal ofício por desfastio ou
estudo; a pobreza, a necessidade de uma achega, a inaptidão para outros trabalhos, o
acaso, e alguma vez o gosto de servir também, ainda que por outra via, davam o
impulso ao homem que se sentia bastante rijo para pôr ordem à desordem.
Cândido Neves, -- em família, Candinho,-- é a pessoa a quem se liga a história de
uma fuga, cedeu à pobreza, quando adquiriu o ofício de pegar escravos fugidos. Tinha um
defeito grave esse homem, não aguentava emprego nem ofício, carecia de estabilidade;
é o que ele chamava caiporismo. Começou por querer aprender tipografia, mas viu cedo
que era preciso algum tempo para compor bem, e ainda assim talvez não ganhasse o
bastante; foi o que ele disse a si mesmo.
O comércio chamou-lhe a atenção, era carreira boa. Com algum esforço entrou de
caixeiro para um armarinho. A obrigação, porém, de atender e servir a todos feria-o na
corda do orgulho, e ao cabo de cinco ou seis semanas estava na rua por sua vontade.
Fiel de cartório, contínuo de uma repartição anexa ao Ministério do Império, carteiro
e outros empregos foram deixados pouco depois de obtidos.
Quando veio a paixão da moça Clara, não tinha ele mais que dívidas, ainda que
poucas, porque morava com um primo, entalhador de ofício. Depois de várias tentativas
para obter emprego, resolveu adotar o ofício do primo, de que aliás já tomara algumas
lições.
Não lhe custou apanhar outras, mas, querendo aprender depressa, aprendeu mal.
Não fazia obras finas nem complicadas, apenas garras para sofás e relevos
comuns para cadeiras. Queria ter em que trabalhar quando casasse, e o casamento não
se demorou muito.
Contava trinta anos. Clara vinte e dous. Ela era órfã, morava com uma tia, Mônica,
e cosia com ela. Não cosia tanto que não namorasse o seu pouco, mas os namorados
apenas queriam matar o tempo; não tinham outro empenho. Passavam às tardes,
olhavam muito para ela, ela para eles, até que a noite a fazia recolher para a costura.
O que ela notava é que nenhum deles lhe deixava saudades nem lhe acendia
desejos. Talvez nem soubesse o nome de muitos. Queria casar, naturalmente. Era, como
lhe dizia a tia, um pescar de caniço, a ver se o peixe pegava, mas o peixe passava de
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longe;algum que parasse, era só para andar à roda da isca, mirá-la, cheirá-la, deixá-la e ir
a outras.
O amor traz sobrescritos. Quando a moça viu Cândido Neves, sentiu que era este o
possível marido, o marido verdadeiro e único. O encontro deu-se em um baile; tal foi--
para lembrar o primeiro ofício do namorado, -- tal foi a página inicial daquele livro, que
tinha de sair mal composto e pior brochado. O casamento fez-se onze meses depois, e
foi a mais bela festa das relações dos noivos. Amigas de Clara, menos por amizade que
por inveja, tentaram arredá-la do passo que ia dar. Não negavam a gentileza do noivo,
nem o amor que lhe tinha, nem ainda algumas virtudes; diziam que era dado em
demasia a patuscadas.
--Pois ainda bem, replicava a noiva; ao menos, não caso com defunto.
--Não, defunto não; mas é que...
Não diziam o que era. Tia Mônica, depois do casamento, na casa pobre onde eles
se foram abrigar, falou-lhes uma vez nos filhos possíveis. Eles queriam um, um só,
embora viesse agravar a necessidade.
--Vocês, se tiverem um filho, morrem de fome, disse a tia à sobrinha.
--Nossa Senhora nos dará de comer, acudiu Clara.
Tia Mônica devia ter-lhes feito a advertência, ou ameaça, quando ele lhe foi pedir a
mão da moça; mas também ela era amiga de patuscadas, e o casamento seria uma festa,
como foi.
A alegria era comum aos três. O casal ria a propósito de tudo. Os mesmos nomes
eram objeto de trocados, Clara, Neves, Cândido; não davam que comer, mas davam que
rir, e o riso digeria-se sem esforço.
Ela cosia agora mais, ele saía a empreitadas de uma cousa e outra; não tinha
emprego certo. Nem por isso abriam mão do filho. O filho é que, não sabendo daquele
desejo específico, deixava-se estar escondido na eternidade. Um dia. porém, deu sinal de
si a criança; varão ou fêmea, era o fruto abençoado que viria trazer ao casal a suspirada
ventura. Tia Mônica ficou desorientada, Cândido e Clara riram dos seus sustos.
--Deus nos há de ajudar, titia, insistia a futura mãe.
A notícia correu de vizinha a vizinha. Não houve mais que espreitar a aurora do dia
grande. A esposa trabalhava agora com mais vontade, e assim era preciso, uma vez que,
além das costuras pagas, tinha de ir fazendo com retalhos o enxoval da criança. À força
de pensar nela, vivia já com ela, media-lhe fraldas, cosia-lhe camisas. A porção era
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escassa, os intervalos longos.
Tia Mônica ajudava, é certo, ainda que de má vontade.
--Vocês verão a triste vida, suspirava ela.
--Mas as outras crianças não nascem também? perguntou Clara.
--Nascem, e acham sempre alguma cousa certa que comer, ainda que pouco...
--Certa como?
--Certa, um emprego, um ofício, uma ocupação, mas em que é que o pai dessa
infeliz criatura que aí vem gasta o tempo?
Cândido Neves, logo que soube daquela advertência, foi ter com a tia, não áspero
mas muito menos manso que de costume, e lhe perguntou se já algum dia deixara de
comer.
--A senhora ainda não jejuou senão pela semana santa, e isso mesmo quando não
quer jantar comigo. Nunca deixamos de ter o nosso bacalhau...
--Bem sei, mas somos três.
--Seremos quatro.
--Não é a mesma cousa.
-- Que quer então que eu faça, além do que faço?
-- Alguma cousa mais certa. Veja o marceneiro da esquina, o homem do
armarinho, o tipógrafo que casou sábado, todos têm um emprego certo... Não fique
zangado; não digo que você seja vadio, mas a ocupação que escolheu é vaga. Você
passa semanas sem vintém.
-- Sim, mas lá vem uma noite que compensa tudo, até de sobra. Deus não me
abandona, e preto fugido sabe que comigo não brinca; quase nenhum resiste, muitos
entregam-se logo.
Tinha glória nisto, falava da esperança como de capital seguro. Daí a pouco ria, e
fazia rir à tia, que era naturalmente alegre, e previa uma patuscada no batizado.
Cândido Neves perdera já o ofício de entalhador, como abrira mão de outros
muitos, melhores ou piores. Pegar escravos fugidos trouxe-lhe um encanto novo. Não
obrigava a estar longas horas sentado. Só exigia força, olho vivo, paciência, coragem e
um pedaço de corda.
Cândido Neves lia os anúncios, copiava-os, metia-os no bolso e saía às
pesquisas. Tinha boa memória. Fixados os sinais e os costumes de um escravo fugido,
gastava pouco tempo em achá-lo, segurá-lo, amarrá-lo e levá-lo. A força era muita, a
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agilidade também.
Mais de uma vez, a uma esquina, conversando de cousas remotas,
via passar um escravo como os outros, e descobria logo que ia fugido, quem era, o
nome, o dono, a casa deste e a gratificação; interrompia a conversa e ia atrás do vicioso.
Não o apanhava logo, espreitava lugar azado, e de um salto tinha a gratificação
nas mãos. Nem sempre saía sem sangue, as unhas e os dentes do outro trabalhavam,
mas geralmente ele os vencia sem o menor arranhão.
Um dia os lucros entraram a escassear. Os escravos fugidos não vinham já, como
dantes, meter-se nas mãos de Cândido Neves. Havia mãos novas e hábeis. Como o
negócio crescesse, mais de um desempregado pegou em si e numa corda, foi aos jornais,
copiou anúncios e deitou-se à caçada. No próprio bairro havia mais de um competidor.
Quer dizer que as dívidas de Cândido Neves começaram de subir, sem aqueles
pagamentos prontos ou quase prontos dos primeiros tempos. A vida fez-se difícil e dura.
Comia-se fiado e mal; comia-se tarde. O senhorio mandava pelo aluguéis.
Clara não tinha sequer tempo de remendar a roupa ao marido, tanta era a
necessidade de coser para fora. Tia Mônica ajudava a sobrinha, naturalmente. Quando
ele chegava à tarde, via-se-lhe pela cara que não trazia vintém. Jantava e saía outra vez,
à cata de algum fugido. Já lhe sucedia, ainda que raro, enganar-se de pessoa, e pegar
em escravo fiel que ia a serviço de seu senhor; tal era a cegueira da necessidade.
Certa vez capturou um preto livre; desfez-se em desculpas, mas recebeu grande
soma de murros que lhe deram os parentes do homem.
--É o que lhe faltava! exclamou a tia Mônica, ao vê-lo entrar, e depois de ouvir
narrar o equívoco e suas consequências. Deixe-se disso, Candinho; procure outra vida,
outro emprego.
Cândido quisera efetivamente fazer outra cousa, não pela razão do conselho, mas
por simples gosto de trocar de ofício; seria um modo de mudar de pele ou de pessoa. O
pior é que não achava à mão negócio que aprendesse depressa.
A natureza ia andando, o feto crescia, até fazer-se pesado à mãe, antes de nascer.
Chegou o oitavo mês, mês de angústias e necessidades, menos ainda que o nono,
cuja narração dispenso também. Melhor é dizer somente os seus efeitos. Não podiam ser
mais amargos.
--Não, tia Mônica! bradou Candinho, recusando um conselho que me custa
escrever, quanto mais ao pai ouvi-lo. Isso nunca!
Foi na última semana do derradeiro mês que a tia Mônica deu ao casal o conselho
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de levar a criança que nascesse à Roda dos enjeitados. Em verdade, não podia haver
palavra mais dura de tolerar a dous jovens pais que espreitavam a criança, para beijá-la,
guardá-la, vê-la rir, crescer, engordar, pular... Enjeitar quê? enjeitar como?
Candinho arregalou os olhos para a tia, e acabou dando um murro na mesa de
jantar. A mesa, que era velha e desconjuntada, esteve quase a se desfazer inteiramente.
Clara interveio.
--Titia não fala por mal, Candinho.
--Por mal? replicou tia Mônica. Por mal ou por bem, seja o que for, digo que é o
melhor que vocês podem fazer. Vocês devem tudo; a carne e o feijão vão faltando. Se não
aparecer algum dinheiro, como é que a família há de aumentar? E depois, há tempo;
mais tarde, quando o senhor tiver a vida mais segura, os filhos que vierem serão
recebidos com o mesmo cuidado que este ou maior.
Este será bem criado, sem lhe faltar nada. Pois então a Roda é alguma praia ou
monturo? Lá não se mata ninguém, ninguém morre à toa, enquanto que aqui é certo
morrer, se viver à míngua. Enfim...
Tia Mônica terminou a frase com um gesto de ombros, deu as costas e foi meter-se
na alcova. Tinha já insinuado aquela solução, mas era a primeira vez que o fazia com tal
franqueza e calor, -- crueldade, se preferes.
Clara estendeu a mão ao marido, como a amparar-lhe o ânimo; Cândido Neves fez
uma careta, e chamou maluca à tia, em voz baixa. A ternura dos dous foi interrompida por
alguém que batia à porta da rua.
--Quem é? perguntou o marido.
--Sou eu.
Era o dono da casa, credor de três meses de aluguel, que vinha em pessoa
ameaçar o inquilino. Este quis que ele entrasse.
--Não é preciso...
--Faça favor.
O credor entrou e recusou sentar-se, deitou os olhos à mobília para ver se daria
algo à penhora; achou que pouco. Vinha receber os aluguéis vencidos, não podia esperar
mais; se dentro de cinco dias não fosse pago, pô-lo-ia na rua. Não havia trabalhado para
regalo dos outros. Ao vê-lo, ninguém diria que era proprietário; mas a palavra supria o
que faltava ao gesto, e o pobre Cândido Neves preferiu calar a retorquir. Fez uma
inclinação de promessa e súplica ao mesmo tempo. O dono da casa não cedeu mais.
--Cinco dias ou rua! repetiu, metendo a mão no ferrolho da porta e saindo.
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Candinho saiu por outro lado. Nesses lances não chegava nunca ao desespero,
contava com algum empréstimo, não sabia como nem onde, mas contava. Demais,
recorreu aos anúncios. Achou vários, alguns já velhos, mas em vão os buscava desde
muito. Gastou algumas horas sem proveito, e tornou para casa.
Ao fim de quatro dias, não achou recursos; lançou mão de empenhos, foi a
pessoas amigas do proprietário, não alcançando mais que a ordem de mudança.
A situação era aguda. Não achavam casa, nem contavam com pessoa que lhes
emprestasse alguma; era ir para a rua. Não contavam com a tia. Tia Mônica teve arte de
alcançar aposento para os três em casa de uma senhora velha e rica, que lhe prometeu
emprestar os quartos baixos da casa, ao fundo da cocheira, para os lados de um pátio.
Teve ainda a arte maior de não dizer nada aos dous, para que Cândido Neves, no
desespero da crise começasse por enjeitar o filho e acabasse alcançando algum meio
seguro e regular de obter dinheiro; emendar a vida, em suma. Ouvia as queixas de Clara,
sem as repetir, é certo, mas sem as consolar. No dia em que fossem obrigados a deixar a
casa, fá-los-ia espantar com a notícia do obséquio e iriam dormir melhor do que
cuidassem.
Assim sucedeu. Postos fora da casa, passaram ao aposento de favor, e dous dias
depois nasceu a criança. A alegria do pai foi enorme, e a tristeza também. Tia Mônica
insistiu em dar a criança à Roda. "Se você não a quer levar, deixe isso comigo; eu vou à
Rua dos Barbonos." Cândido Neves pediu que não, que esperasse, que ele mesmo a
levaria.
Notai que era um menino, e que ambos os pais desejavam justamente este sexo.
Mal lhe deram algum leite; mas, como chovesse à noite, assentou o pai levá-lo à
Roda na noite seguinte.
Naquela reviu todas as suas notas de escravos fugidos . As gratificações pela
maior parte eram promessas; algumas traziam a soma escrita e escassa. Uma, porém,
subia a cem mil-réis. Tratava-se de uma mulata; vinham indicações de gesto e de vestido.
Cândido Neves andara a pesquisá-la sem melhor fortuna, e abrira mão do negócio;
imaginou que algum amante da escrava a houvesse recolhido. Agora, porém, a vista
nova da quantia e a necessidade dela animaram Cândido Neves a fazer um grande
esforço derradeiro.
Saiu de manhã a ver e indagar pela Rua e Largo da Carioca, Rua do Parto e da
Ajuda, onde ela parecia andar, segundo o anúncio. Não a achou; apenas um farmacêutico
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da Rua da Ajuda se lembrava de ter vendido uma onça de qualquer droga, três dias antes,
à pessoa que tinha os sinais indicados. Cândido Neves parecia falar como dono da
escrava, e agradeceu cortesmente a notícia. Não foi mais feliz com outros fugidos de
gratificação incerta ou barata.
Voltou para a triste casa que lhe haviam emprestado. Tia Mônica arranjara de si
mesma a dieta para a recente mãe, e tinha já o menino para ser levado à Roda. O pai,
não obstante o acordo feito, mal pôde esconder a dor do espetáculo. Não quis comer o
que tia Mônica lhe guardara; não tinha fome, disse, e era verdade. Cogitou mil modos de
ficar com o filho; nenhum prestava. Não podia esquecer o próprio albergue em que
vivia. Consultou a mulher, que se mostrou resignada.
Tia Mônica pintara-lhe a criação do menino; seria maior a miséria, podendo
suceder que o filho achasse a morte sem recurso. Cândido Neves foi obrigado a cumprir a
promessa; pediu à mulher que desse ao filho o resto do leite que ele beberia da mãe.
Assim se fez; o pequeno adormeceu, o pai pegou dele, e saiu na direção da Rua
dos Barbonos. Que pensasse mais de uma vez em voltar para casa com ele, é certo; não
menos certo é que o agasalhava muito, que o beijava, que cobria o rosto para preservá-lo
do sereno.
Ao entrar na Rua da Guarda Velha, Cândido Neves começou a afrouxar o passo.
--Hei de entregá-lo o mais tarde que puder, murmurou ele. Mas não sendo a rua
infinita ou sequer longa, viria a acabá-la; foi então que lhe ocorreu entrar por um dos
becos que ligavam aquela à Rua da Ajuda. Chegou ao fim do beco e, indo a dobrar à
direita, na direção do Largo da Ajuda, viu do lado oposto um vulto de mulher; era a mulata
fugida.
Não dou aqui a comoção de Cândido Neves por não podê-lo fazer com a
intensidade real. Um adjetivo basta; digamos enorme. Descendo a mulher, desceu ele
também; a poucos passos estava a farmácia onde obtivera a informação, que referi
acima. Entrou, achou o farmacêutico, pediu-lhe a fineza de guardar a criança por um
instante; viria buscá-la sem falta.
--Mas...
Cândido Neves não lhe deu tempo de dizer nada; saiu rápido, atravessou a rua, até
ao ponto em que pudesse pegar a mulher sem dar alarma. No extremo da rua, quando ela
ia a descer a de S. José, Cândido Neves aproximou-se dela. Era a mesma, era a mulata
fujona. --Arminda! bradou, conforme a nomeava o anúncio.
Arminda voltou-se sem cuidar malícia. Foi só quando ele, tendo tirado o pedaço de
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corda da algibeira, pegou dos braços da escrava, que ela compreendeu e quis fugir. Era
já impossível. Cândido Neves, com as mãos robustas, atava-lhe os pulsos e dizia que
andasse. A escrava quis gritar, parece que chegou a soltar alguma voz mais alta que de
costume, mas entendeu logo que ninguém viria libertá-la, ao contrário. Pediu então que
a soltasse pelo amor de Deus.
--Estou grávida, meu senhor! exclamou. Se Vossa Senhoria tem algum filho, peço-
lhe por amor dele que me solte; eu serei tua escrava, vou servi-lo pelo tempo que quiser.
Me solte, meu senhor moço!
-- Siga! repetiu Cândido Neves.
--Me solte!
--Não quero demoras; siga!
Houve aqui luta, porque a escrava, gemendo, arrastava-se a si e ao filho. Quem
passava ou estava à porta de uma loja, compreendia o que era e naturalmente não
acudia. Arminda ia alegando que o senhor era muito mau, e provavelmente a castigaria
com açoutes,--cousa que, no estado em que ela estava, seria pior de sentir. Com certeza,
ele lhe mandaria dar açoutes.
--Você é que tem culpa. Quem lhe manda fazer filhos e fugir depois? perguntou
Cândido Neves.
Não estava em maré de riso, por causa do filho que lá ficara na farmácia, à espera
dele. Também é certo que não costumava dizer grandes cousas. Foi arrastando a escrava
pela Rua dos Ourives, em direção à da Alfândega, onde residia o senhor. Na esquina
desta a luta cresceu; a escrava pôs os pés à parede, recuou com grande esforço,
inutilmente. O que alcançou foi, apesar de ser a casa próxima, gastar mais tempo em lá
chegar do que devera. Chegou, enfim, arrastada, desesperada, arquejando. Ainda ali
ajoelhou-se, mas em vão. O senhor estava em casa, acudiu ao chamado e ao rumor.
--Aqui está a fujona, disse Cândido Neves.
-- É ela mesma. --Meu senhor!
--Anda, entra...
Arminda caiu no corredor. Ali mesmo o senhor da escrava abriu a carteira e tirou os
cem mil-réis de gratificação. Cândido Neves guardou as duas notas de cinquenta mil réis,
enquanto o senhor novamente dizia à escrava que entrasse. No chão, onde jazia,
levada do medo e da dor, e após algum tempo de luta a escrava abortou.
O fruto de algum tempo entrou sem vida neste mundo, entre os gemidos da mãe e
os gestos de desespero do dono. Cândido Neves viu todo esse espetáculo. Não sabia
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que horas eram. Quaisquer que fossem, urgia correr à Rua da Ajuda, e foi o que ele fez
sem querer conhecer as consequências do desastre.
Quando lá chegou, viu o farmacêutico sozinho, sem o filho que lhe entregara. Quis
esganá-lo. Felizmente, o farmacêutico explicou tudo a tempo; o menino estava lá dentro
com a família, e ambos entraram. O pai recebeu o filho com a mesma fúria com que
pegara a escrava fujona de há pouco, fúria diversa, naturalmente, fúria de amor.
Agradeceu depressa e mal, e saiu às carreiras, não para a Roda dos enjeitados,
mas para a casa de empréstimo com o filho e os cem mil-réis de gratificação. Tia Mônica,
ouvida a explicação, perdoou a volta do pequeno, uma vez que trazia os cem mil-réis.
Disse, é verdade, algumas palavras duras contra a escrava, por causa do aborto,
além da fuga. Cândido Neves, beijando o filho, entre lágrimas, verdadeiras, abençoava a
fuga e não se lhe dava do aborto.
--Nem todas as crianças vingam, bateu-lhe o coração.
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000245.pdf
INTERPRETAÇÃO DE TEXTO:
a) Que tipo de aparelhos eram utilizados para torturar ou marcar os escravos?
b) Qual era a utilidade da máscara de folha de flandres?
c) Segundo o autor, “Era tal máscara era grotesca, mas a ordem social e humana nem
sempre se alcança sem o grotesco, e alguma vez o cruel.” Você concorda com esta
afirmação? Por quê?
d) Como eram feitos os anúncios dos escravos fugidos?
e) Por que pegar escravos fugidos tornou-se um ofício daquela época?
f) Por que Cândido Neves não conseguia parar em nenhum emprego (ofício)? E quais
eram esses ofícios?
g) Você concorda com as atitudes e com os conselhos de Tia Mônica?
ATIVIDADE ORAL:
a) Como você agiria no lugar de Clara? Você permitiria que seu próprio filho fosse
levado à Roda dos enjeitados?
b) Você já sabia da existência da Roda dos enjeitados?
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c) Você concorda com o que Cândido Neves faz para tentar salvar seu próprio filho?
PROPOSTA PARA ESCRITA:
Professor(a), você pode dividir a turma em equipes de 4 alunos e sugerir que eles
escrevam um final diferente para este conto.
Que tal um final feliz também para a mulata Arminda e o filho que ela traz em
seu ventre?
Civilização BrancaLincharam um homem
entre arranha-céus
( li num jornal )
procurei o crime do homem
o crime não estava no homem
estava na cor de sua epiderme.
Solano Trindade, Cantares ao meu Povo, p.37, Ed. Fulgor
São Paulo,1961.
Interpretação do Texto:
1- De acordo com o texto, qual foi o motivo do crime?
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Professor(a), agora peça aos alunos para que façam a análise desta Poesia “Civilização Branca” de Solano Trindade.
2- Você concorda que alguém possa ser julgado simplesmente pela cor de sua pele?
3- Dentro da atual realidade social que estamos vivendo, você conhece algum fato
parecido?
4- O que você acha que pode ser feito para mudarmos essa realidade?
5- Para você esse texto é uma forma de protesto ou é somente uma poesia fazendo
alusão ao Negro?
6- Faça um breve relato de 4 linhas e leia para seus colegas.
SOLANO TRINDADE
Solano Trindade era negro, nasceu em Recife, no dia 24 de Julho de 1908. Seu
pai, o sapateiro Manuel Abílio, e de Emerenciana, quituteira e operária. Solano Trindade
fez muitas poesias e protestou contra a exploração do negro.
Solano fundou o Centro Cultural Afro-Brasileiro e a Frente Negra Pernambucana,
uma extensão da Frente Negra Brasileira; publicou o livro Poemas Negros. Solano criou,
em Pelotas, um Grupo de Arte Popular.
Em 1944, publicou o livro Poemas de uma Vida Simples. Em 1945, junto com
Abdias Nascimento, criou o Comitê Democrático Afro-Brasileiro. Com Haroldo Costa
fundou o Teatro Folclórico. Atuou em filmes como A hora e a vez de Augusto Matraga e O
Santo Milagroso.
Preocupava-se com o folclore e com as danças populares. Dizia sempre que era
necessário pesquisar nas fontes de origem e devolver ao povo em forma de arte.
Orgulhava-se ser chamado de "poeta negro".
Solano era sensível às injustiças e denunciava as condições de vida às quais o
povo era submetido. Muitos críticos insistam em dizer sua poesia era mais social do que
negra.
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Professor(a) vamos conhecer o autor?
Um de seus trabalhos mais famosos, intitulado "Tem gente com fome", foi musicado e
gravado por Nei Matogrosso: Trem sujo da Leopoldina correndo correndo parece dizer
tem gente com fome tem gente com fome tem gente com fome O ritmo é o de um trem em
movimento.
Grito NegroEu sou carvão!
E tu arrancas-me brutalmente do chão
e fazes-me tua mina, patrão.
Eu sou carvão!
E tu acendes-me, patrão,
para te servir eternamente como força motriz
mas eternamente não, patrão.
Eu sou carvão
e tenho que arder sim;
queimar tudo com a força da minha combustão.
[...]
Ler mais:
http://www.luso-poemas.net/modules/newbb/viewtopic.php?
topic_id=273&forum=53#ixzz0oWh7tcaW
Under Creative Commons License: Attribution Non-Commercial No Derivatives
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E AGORA, VAMOS LER UM TRECHO DO POEMA “GRITO
NEGRO” DE UM DOS PRINCIPAIS ESCRITORES
AFRICANOS DA LÍNGUA PORTUGUESA: JOSÉ
CRAVEIRINHA.
José Craveirinha (1922-2002) é considerado o principal escritor africano de língua
portuguesa. Moçambicano, participou ativamente do processo de libertação do seu país.
Entre outras obras, escreveu Chigubo, Karingana ua karingana, Maria e Hamina e outros
contos.
Analise do Poema:
1) “Eu sou o carvão!
E tu me arrancas brutalmente do chão
e faze-me tua mina, patrão.”
a) Que relação tem esses versos com o negro?
b) Que relação tem com a sua condição de escravo que é retirado de sua pátria?
c) Por que ele se compara a uma mina de carvão?
2) Faça a interpretação da seguinte estrofe do poema:
“Eu sou o carvão!
E tu acendes-me, patrão,
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Nasci a primeira vez em 28 de Maio de 1922. Aonde? Na Av. do Zichacha
entre o Alto Maé e como quem vai para o Xipamanine. Bairros de quem?
Bairros de pobres. Nasci a segunda vez quando me fizeram descobrir que
era mulato. A seguir fui nascendo à medida das circunstancias impostas
pelos outros.” José Craveirinha.
Professor(a), agora vamos analisar o texto? Antes seria interessante retomar os fatos históricos que permitam lembrar como os negros foram trazidos para o Brasil. Peça para que os alunos façam a interpretação dos versos que estão em sentido figurado e que estão relacionados à condição do escravo.
para te servir eternamente como força motriz
mas eternamente não, patrão.”
3) Destaque a frase que representa o “grito de liberdade do Negro”.
PRETO E BRANCO
Fernando Sabino
Perdera o emprego, chegara a passar fome, sem que ninguém soubesse: por
constrangimento, afastara-se da roda boêmia que antes costumava frequentar –
escritores, jornalistas, um sambista de cor que vinha a ser o seu mais velho companheiro
de noitadas.
De repente, a salvação lhe apareceu na forma de um americano, que lhe ofereceria
o emprego numa agência. Agarrou-se com unhas e dentes à oportunidade, vale dizer, ao
americano, para garantir na sua nova função uma relativa estabilidade.
E um belo dia vai seguindo com o chefe pela Rua México, já distraído de seus
passados tropeços, mas tropeçando obstinadamente no inglês com que se entendiam –
quando vê do outro lado da rua um preto agitar a mão para ele.
Era o sambista seu amigo. Ocorreu-lhe desde logo que ao americano poderia
parecer estranha tal amizade, e mais ainda incompatível com a ética ianque a ser mantida
nas funções que passara a exercer. Lembrou-se num átimo que o americano em geral
tem uma coisa muito séria chamada preconceito racial e seu critério de julgamento dos
subordinados talvez se deixasse influir por essa odiosa deformação. Por via das dúvidas
correspondeu ao cumprimento do amigo da maneira mais discreta que lhe foi possível,
mas viu em pânico que ele atravessava a rua e vinha em sua direção, sorriso aberto e
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Professor(a), agora peça aos alunos para que façam a leitura desta crônica: “Preto e Branco” de Fernando Sabino.
braços prontos para um abraço.
Pensou rapidamente em se esquivar – não dava tempo: o americano também se
detivera, vendo o preto aproximar-se. Era seu amigo, velho companheiro, um bom sujeito,
dos melhores mesmo que já conhecera – acaso jamais chegara sequer a se lembrar que
se tratava de um preto? Agora, com o gringo ali a seu lado, todo branco e sardento, é que
percebia pela primeira vez: não podia ser mais preto. Sendo assim, tivesse paciência:
mais tarde lhe explicava tudo, haveria ele de compreender. Passar fome era muito bonito
nos romances de Knut Hamsun, lidos depois do jantar, e sem credores à porta. Não teve
mais dúvidas: virou a cara quando o outro se aproximou e fingiu que não o via, que não
era com ele.
E não era mesmo com ele.
Porque antes de cumprimentá-lo, talvez ainda sem tê-lo visto, o sambista abriu os
braços para acolher o americano – também seu amigo.
(Fernando Sabino)
Análise da crônica:
a) Professor(a), explique aos alunos o Gênero Textual Crônica, (tipo de texto, tempo,
espaço, personagens, etc).
b) Peça aos alunos que leiam a crônica, e identifiquem as palavras desconhecidas
( vocabulário , variações linguísticas ou gírias, se houver no texto).
c) Em seguida faça a analise das personagens do texto: Na sua opinião, quais as
características que elas tem?
INTERPRETAÇÃO DO TEXTO:a) Você acha que devemos nos preocupar tanto com as aparências?
b) Qual é o conceito que você tem sobre a “Amizade”?
c) Você concorda com a atitude do amigo branco? Será que é somente nas horas
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Professor(a), a crônica é um gênero textual
narrativo e geralmente trata de temas do cotidiano,
onde o autor pode incluir a ficção e a fantasia.
difíceis é que devemos cultivar nossas amizades?
d) Que outro título você daria a esse texto?
e) Você conhece o ditado popular: “Amigo até debaixo d'água”? Explique o seu
significado.
SUGESTÃO PARA PRODUÇÃO DE TEXTO:Professor(a) você pode sugerir aos alunos para que elaborem um texto dando a sua
opinião sobre o final da crônica, ou ainda que criem um outro final para crônica.
Sites Pesquisados:http://letras.terra.com.br/gabriel-pensador/137000/
http://www.youtube.com/watch?v=1ID7Zh9IYO8&NR=1
http://www.youtube.com/watch?v=ibKKYyVmEMQ&feature=relatedhttp://www.alb.com.br/anais16/sem03pdf/sm03ss16_09.pdf
http://www.youtube.com/watch?v=qwWnKtj0Mp0&feature=related
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000245.pdf
www.curtanaescola.com.br.
Indicações para Leitura:
Título do Livro: Superando o racismo na escola.Autor: Kabengele Munanga
Edição: 3.ª
Local da Publicação: Brasília
Editora: Ministério da Educação, Secretária da Educação Fundamental.
Ano da Publicação: 2001
Comentários:Esse livro discorre sobre temas como: A desconstrução da discriminação nos livros
didáticos, conceitos básicos sobre racismo, a importância das diversidades e auto-estima
da criança negra.
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Título do Livro: Você me deixe, viu? eu vou bater meu tambor!Autora: Cidinha da Silva
Mazza Edições, Belo Horizonte, 2008.
Comentário: Este livro é muito interessante e estruturado em um conjunto de 26 textos, entre crônicas
e mini-contos.
Título do Livro: Cada Tridente em seu LugarAutora: Cidinha da Silva
Edição: 2.ª
Mazza Edições, Belo Horizonte, 2007.
Título do Livro: Do Silêncio do lar ao Silêncio escolar. Racismo, preconceito e discriminação na educação infantil.Autora: Eliane Cavalleiro
Edição:4.ª
Editora: Contexto, São Paulo, 2005.
Dicas de filmes que tratam da questão racial:- Kiriku
- O xadrez das cores (20 min.) o qual aborda a questão do preconceito racial. E pode ser
encontrado no site www.curtanaescola.com.br.
- A Negação do Brasil
- Quanto vale ou é por Quilo
- Vista a minha Pele
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REFERÊNCIAS
ALVES FILHO, Ivan, Memorial dos Palmares, 2.ed. Brasília: Fundação Astrogildo Pereira, 2008.
ARRUDA, Jorge. Africanidades e Brasilidades Saberes, Sabores e Fazeres.1.ed. João Pessoa-PB,
Editora Dinâmica, 2007.
ARRUDA, Jorge. Educando pela Diversidade Afro-brasileira e Africana. João Pessoa-PB,
Editora Dinâmica, 2006.
BORGES, Edson; MEDEIROS, Carlos Alberto; D'ADESKY, Jacques. Racismo, preconceito e
intolerância. São Paulo: Atual, 2002.
GRIGULEVICH, José . Religión, Racismo y Discriminación Racial. Revista Investigaciones
Sovieticas, 1983.
LOPES, Ana Lúcia. Caminhos e descaminhos da inclusão: O aluno negro no sistema
educacional. Tese de Doutoramento em antropologia Social. USP. São Paulo, 2006.
LOPES, Nei, Enciclopédia brasileira da diáspora africana. São Paulo: Selo Negro. ( Não consta
Ano).
MUNANGA, Kabengele. Superando o Racismo na Escola. 2. ed. Brasília: Ministério da
Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005.
SANT' ANA, Antonio Olímpio de. História e conceitos básicos sobre o racismo e seus derivados.
Superando o racismo na escola. 2ªed. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005.
VALENTE, Ana Lúcia E. F., 1959- Ser Negro no Brasil de Hoje/Ana lúcia Valente.11ª ed., rev. e
ampl. - São Paulo: Moderna, 1994.- (Coleção Polêmica)
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