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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4 Cadernos PDE VOLUME I

DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · Ter em mente a necessidade de levar a uma reflexão de ... Brasil está baseada na desigualdade natural ... de 80% da população carcerária

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE

VOLU

ME I

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ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA NA 8ª SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA ABORDAGEM TEÓRICO-PRÁTICA E INTERDISCIPLINAR

Autora: Lourdes Fröhlich. Kolling1

Orientador: Odinei Fabiano Ramos2

FAFIPAR

Secretaria do Estado de Educação do Paraná

Projeto de Desenvolvimento Educacional

Resumo:

O objetivo do presente estudo foi enfatizar o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira na 8ª série do Ensino Fundamental com uma abordagem teórica-prática e interdisciplinar no Colégio Estadual Gilberto Alves do Nascimento - EFM. O projeto foi implementado junto com as disciplinas de Língua Portuguesa, História, Geografia, Arte e Educação Física, como ressalta a Lei 10.639/2003, que institui a obrigatoriedade do Ensino da História e Cultura Afro-brasileira no currículo oficial da rede de ensino. Esse fato nos remete a um repensar sobre nossa prática pedagógica em relação aos conteúdos que normalmente são trabalhados de forma fragmentada até mesmo superficial. Essa realidade nos instigou a buscar uma nova forma de abordar a temática. Assim sendo buscamos fazer um resgate das contribuições do povo negro nos diferentes segmentos da nossa sociedade no que se refere à história de nosso país. Ter em mente a necessidade de levar a uma reflexão de como superar barreiras quando se trata de situações de preconceito e racismo existente nas relações dentro e fora do ambiente escolar. No entanto a implementação da proposta se propôs a fazer a articulação entre as várias disciplinas do currículo, foi um avanço na efetivação das ações voltadas ao referido tema, uma vez que o mesmo deve estar contemplado no trabalho pedagógico do dia a dia da escola. Finalizou-se com a apresentação dos resultados dos trabalhos realizados nas disciplinas envolvidas através de exposição das pesquisas e atividades confeccionadas pelos alunos e professores e o materiais de apoio utilizados no dia 20 de novembro de 2010, com a presença de todos os envolvidos e da comunidade escolar.

Palavras-chave: Cultura Afro-brasileira; Lei 10.639/2003; Interdisciplinaridade

Abstract:

1 Autora.... Lourdes Fröhlich. Kolling (Profª. Colégio Estadual Dr. Gilberto Alves do Nascimento – EFN)2Orientador... Odinei Fabiano Ramos (Ms. FAFIPAR – Paranaguá)

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The aim of this study is to emphasize the teaching of History and Afro-Brazilian Culture in the 8th grade of elementary school through a theoretical-practical and interdisciplinary approach at State College Gilberto Alves do Nascimento - EFM. The project was implemented along the studies of Portuguese, History, Geography, Art and Physical Education, as stressed by Law 10639/2003, establishing the compulsory teaching of History and Afro-Brazilian Culture in the official curriculum of the school system. This fact leads us to rethink our educational practice in relation to the contents which are normally dealt in a fragmented or even superficial way. This reality prompted us to seek a new way of approaching the subject. Therefore, we intended to rescue the contributions of afro-Brazilian people in different segments of our society regarding the history of our country. It’s important to keep in mind the necessity of bringing a discussion about how to overcome barriers when it comes to situations of prejudice and racism in relations inside and outside school. However, the implementation of this proposal aimed to make the link between the various disciplines of the curriculum. This was an advance at the actions effectiveness when directed to this matter, since it must be included in everyday pedagogical work at school. It was concluded by presenting the results of the work done in the disciplines through research and exhibition activities made by students and teachers and support materials used on November 20, 2010, in the presence of all involved and the school community.

Keywords: Afro-Brazilian Culture, Law 10639/2003; Interdisciplinarity

1 INTRODUÇÃO

Trabalhar a história e cultura afro-brasileira de modo articulado com outras

disciplinas contribui para a superação das práticas de ensino-aprendizagem

fragmentadas e com reduzido significado social para os alunos das séries finais do

Ensino Fundamental e possibilita a formação de educandos capazes de pensar

como seres históricos, de modo que possam inserir-se dignamente na sociedade,

mediante o tripé: democracia participativa, controle social e cidadania. Entende-se

que a cidadania é pautada na apropriação de bens simbólicos (cultura, educação),

materiais e sociais (relacionados à estrutura de poder e participação).

Segundo CUNHA Jr, “A história do Brasil sem o conhecimento da história

africana era uma história unilateral, branca, marcada por concepções eurocêntricas.

Por vezes essas concepções eurocêntricas eram marcadas pelos preconceitos e por

concepções históricas racistas” (2006, p. 85). Tendo em vista a formação

multicultural da sociedade brasileira e as contribuições das diferentes culturas no

trabalho e nas relações de poder, estando a sociedade brasileira marcada

fortemente pela presença dos negros africanos, é indispensável à inclusão no

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currículo escolar dos estudos sobre a cultura afro-brasileira, na perspectiva de

superar o eurocentrismo no ensino de história apontada por Cunha Jr.

Foi no contexto da redemocratização da sociedade brasileira, que teve como

marco a aprovação da Carta Magna de 1988, que a sociedade conseguiu,

progressivamente, discutir questões como justiça social, cidadania, formação étnica,

cultural, religiosa da sociedade brasileira. No bojo desse movimento ganharam força

os debates sobre o redimensionamento do currículo escolar, centrado até então no

eurocentrismo. Neste sentido, destaca-se o marco da Lei nº 10.639/03, que altera a

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional no 9.394/96, para incluir no currículo

oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática da História e Cultura Afro-

Brasileira. Cinco anos mais tarde, um novo marco regulatório, a Lei nº 11.645/08,

modificou a Lei no 10.639/03, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a

obrigatoriedade, além da temática da História e Cultura Afro-Brasileira, da temática

da cultura Indígena, igualmente de grande importância no Brasil. O objetivo é

resgatar as contribuições dessas culturas na política, na economia e na sociedade

brasileira.

Por meio de uma retrospectiva histórica, nota-se que a cultura africana foi

bastante afetada por ocasião do tráfico negreiro para o Brasil devido a separação

dos grupos étnicos que aqui ocorreu e que resultou na perda de identidade dos

mesmos. Cabe destacar que muitos negros morreram nas viagens devido às

precárias condições. Por causa da cor da pele os negros eram tidos como raça

inferior e seres sem alma, e foram obrigados ao trabalho braçal pesado,

aproveitados como instrumentos de trabalho nas grandes fazendas, portanto, não

eram respeitados na sua condição de seres humanos. A escravidão africana no

Brasil está baseada na desigualdade natural das pessoas, no exercício do poder

pelos povos brancos, mesmo após o progressivo fim da escravidão, agora sob a

forma de racismo.

Dentre as formas de resistência têm-se as manifestações culturais como as

lutas corporais (com destaque para a capoeira), as manifestações religiosas

(candomblé, umbanda, etc.), as línguas (tais como Yorubá), a organização dos

Quilombos (fugas em busca de liberdade para a expressão e resgate cultural)

(SEED/PR, 2006).

No final do século XIX, já não interessava mais aos donos de escravos

mantê-los em suas propriedades, pois um novo modelo econômico estava sendo

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construído e era importante que se tornassem consumidores e trabalhadores

assalariados. Na prática, sendo analfabetos, alguns preferiam continuar nas

fazendas na condição subalterna, dadas as dificuldades para se inserirem no novo

sistema produtivo. Interessava também aos donos de fábricas, de serviços e aos

agricultores, contratar imigrantes europeus que eram tidos como mais produtivos e

eficientes. Nesse processo de inserção no mundo do trabalho, os afro-brasileiros

foram marginalizados, o que pode ser um indicativo, por exemplo, do fato de cerca

de 80% da população carcerária ser formada por pessoas de origem étnica africana.

Diante deste contexto, nosso objetivo consistia em propor uma abordagem

teórico-prática para o ensino da história e cultura afro-brasileira na 8ª série do

Ensino Fundamental, mediante análise de filmes, imagens, documentos e livros de

literatura, articulando a disciplina de História com as disciplinas de Arte e Língua

Portuguesa, História, Geografia e Educação Física.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

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A escravidão e a servidão foram formas de trabalho forçado que marcaram,

de forma negativa, parte da história da humanidade. Perduraram em todos os

continentes durante longo período histórico. Esta escravidão, denominada de

doméstica, não se tratou de um sistema amplo de produção, nem mesmo dirigido

para um determinado povo e por um período longo de séculos seguidos. Na Europa,

este sistema existiu até o século XV, na maioria dos países e, até o século XIX, se

considerarmos a Rússia. Depois de 1500, o escravismo sofrido pelos africanos deu

incremento à forma de produção intensiva e comercial realizada pelos europeus em

benefício próprio. (CUNHA Jr. 2005: 250).

As formas de servidão praticadas na África baseavam-se na captura de

prisioneiros de guerra. A condição servil era reversível e não reduzia o indivíduo à

condição de simples mercadoria. Além de manter intacta a sua humanidade, o cativo

gozava de certos direitos e ao sair da servidão poderia elevar seu nível social. Havia

reinados em que era rigorosamente proibido mencionar a origem servil de uma

pessoa; assim, um antigo cativo poderia tornar-se chefe de aldeia. (NASCIMENTO,

2006: 37)

As populações das regiões bantas da África foram as primeiras a serem

trazidas para o Brasil. Estes vieram em maior número e foram os que mais

marcaram a cultura brasileira. Um número significativo de yorubanos e daomeanos

seguiram-se às populações bantas. (CUNHA Jr., 2005). A maioria dos negros

trazidos para o Brasil como escravos, pertenciam a dois grandes grupos: os bantos

originários de Angola, Moçambique e Congo, e que se tornaram mais numerosos no

centro-sul e no nordeste, e acabaram tendo maior influência na nossa cultura; e os

sudaneses, provenientes da Guiné, Nigéria e Costa do Ouro, e que foram levados

principalmente para a região da Bahia. Eram altos e fortes, tinham acentuado

espírito de liberdade e promoveram muitas revoltas contra seus senhores aqui no

Brasil.

Ao assinar o Tratado de Comércio e Navegação com a Inglaterra, Dom João

VI, rei de Portugal (1767-1826), comprometeu-se com o fim do comércio de

escravos. Apenas em 1831, foi votada a lei que determinou o fim do tráfico, mas

esta nunca foi posta em prática.

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No Brasil, anos mais tarde, surgiu a campanha abolicionista em prol da

libertação dos escravos, intensificada a partir do final da Guerra do Paraguai, para a

qual os negros foram convocados para as frentes de batalha. A guerra era outra

para os negros; ao invés do combate, procuravam uma fuga pela liberdade.

Enquanto que o Parlamento Inglês promulgou a Lei Bill Aberdeen em 08 de

agosto de 1845, proibindo o tráfico negreiro em todo o mundo e outorgando ao

Reino Unido o dever e o direito de aprisionar qualquer navio suspeito de carregar

escravos, no Brasil o fim do tráfico de negros foi definido pela Lei Eusébio de

Queiroz, aprovada em 04 de setembro de 1850. Já em 28 de setembro de 1871 foi

promulgada a Lei do Ventre Livre, com poucos efeitos práticos, uma vez que deu

liberdade aos filhos de escravos nascidos depois daquela data, mas os manteve sob

a tutela de seus senhores até os 21 anos de idade. Outra lei aprovada em 1885 foi a

Lei Sexagenária (Lei Saraiva-Cotegipe) que libertou os escravos com mais de 60

anos. A lei não apresentou resultados significativos. (Revista Diálogo, nº 38 de maio

de 2005: 54-55).

Em 13 de maio de 1888, o Brasil aboliu a escravidão, tendo como fator

determinante a pressão externa exercida pela Inglaterra, pois o Brasil era o único

país das Américas que ainda mantinha o regime de escravatura. A lei assinada pela

princesa Isabel desagradou aos proprietários de terras e de escravos que aderiram

ao movimento republicano como forma de pressão.

Em síntese, a abolição preconizava uma igualdade jurídica entre os povos,

mas na prática o preconceito racial continuou a existir junto a uma nítida

desigualdade econômica e social entre brancos e negros. O preconceito e a

discriminação que incidiram sobre os negros tiveram origem no Brasil colonial,

quando com a exploração da mão-de-obra escrava nos engenhos de cana-de-

açúcar onde os africanos geravam lucros para seus senhores. Com o trabalho

escravo, os negros recebiam o mínimo para sua sobrevivência: a terra para morar.

Costumava-se dizer que para o escravo eram necessários apenas três “PPP”, a

saber: pão, pano e pau. (CAMPOS apud Boulos Júnior, 2006: 34)

Com o fim da escravatura, eles se tornaram cidadãos, “homens livres” e,

portanto, ficaram sem terra e sem trabalho, ou seja, sem nenhuma perspectiva de

melhoria nas condições de vida. Em conseqüência disso, os negros se tornaram

vulneráveis à marginalidade social, vivendo pelas ruas das cidades. Os que se

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encontravam na zona rural foram substituídos pelos imigrantes europeus no trabalho

da colheita do café.

Em pleno século XXI, os afro-descendentes ainda lutam por direitos

humanos fundamentais. A cidadania plena é um sonho. Eles deram grandes

contribuições para a nossa história, embora sem o reconhecimento devido.

Misturando-se aos povos que aqui já se encontravam, os negros deram origem à

mestiçagem. Construíram uma nova identidade e nos legaram o que hoje chamamos

de cultura afro-brasileira.

Partindo-se do pressuposto de que nossa cultura é híbrida, e que grandes

contribuições foram dadas pelos povos da África, podemos nos perguntar: o que

sabemos sobre a África? Muitas vezes, se não somos afro-descendentes, nosso

primeiro contato com a África se dá pelo livro didático na escola. Este acaba

permitindo que guardemos e mesmo reproduzamos aspectos estereotipados acerca

desse continente. Como afirma Joel Zito, 2008:

[a]o mergulhar na história da África – dos Egípcios aos povos da África do Sul – tem que se preocupar o peso e a riqueza civilizatória da contribuição da África para o mundo e para a história dos negros, ou seja, dar um pouco dessa complexidade civilizatória africana para o mundo tanto no passado como no presente. (JORNAL 30 de Agosto – outubro-novembro de 2008, ano XVII, nº 138).

Além dos complicadores eurocêntricos, que se dão na denominada cultura

universal e da história universal, aparecem outros, produtos dos grupos de

pensamento sobre a cultura brasileira. Os problemas surgem do desconhecimento

sobre a África e sua cultura, além do desconhecimento de seu legado para a cultura

brasileira, uma vez que toda cultura é diversa e não se constitui de forma isolada.

Se pretendemos realmente despertar nos jovens um sentimento de

nacionalidade, de pertencimento, precisa-se fazer uma nova leitura da sociedade

brasileira, sem esquecer desta vez de uma parcela significativa que a constitui que

até então tem sido vista e tratada como subalterna, a afro-descendente. Para

garantir-se como “sociedade democrática, multicultural e pluriétnica”, como afirma o

artigo 2º da Deliberação Estadual 04/06, aprovada em 02/08/2006, a sociedade

brasileira precisa fazer uso de ambientes de construção do conhecimento, tais como

a escola, para promover discussões que ampliem a visão de mundo e sociedade dos

envolvidos.

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Tais discussões contariam com o apoio de diferentes materiais. Considera-

se relevante o levantamento e a pesquisa de materiais impressos e audiovisuais que

possam ser utilizados como referência para a configuração deste trabalho, e para a

proposta de atividades a serem desenvolvidas em sala de aula. Acrescente-se a isso

a necessidade de produção de material pedagógico que venha a contribuir para que

o conteúdo de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana possa ser trabalhado de

forma sólida e abrangente.

Para estudar a cultura de um povo, a análise de suas práticas e

representações é primordial. Nesse sentido, o historiador e estudioso Roger Chartier

contribui com noções sobre as bases teóricas para a compreensão do conceito de

representações. Para ele, estas representações traduzem as posições e interesses

dos autores e grupos sociais, mesmo à revelia destes, descrevendo a sociedade

conforme seus pontos de vista ou desejos. (CHARTIER, 1990: 19 apud CASTRO &

ARAÚJO, 2008). É a partir dos discursos, das imagens, dos objetos, das obras de

arte, dos vários signos, considerados documentos, que compõem uma cultura, que

percebemos suas representações.

As representações presentes em cada um dos documentos (vestígios do

passado) nos propiciam diferentes análises e interpretações. Os sujeitos que

viveram em contextos específicos tiveram suas próprias representações e

interpretações diante da realidade, expressas e concretizadas por meio de

documentos históricos, entre eles a iconografia, que ocupa na contemporaneidade

um papel central na constituição da memória coletiva.

As imagens que se formam a respeito de algo, portanto, não são isoladas do

conjunto do discurso nas sociedades; elas revelam significados e permitem que os

sujeitos sintam-se pertencentes a um determinado grupo. As construções sociais

que as imagens revelam quando transpõem o limite da forma recuperam histórias e

heranças culturais. Mais do que a linha, a cor, a forma e o volume, as imagens

modelam visões de mundo, assim como a ausência, o oculto e o não revelado

também contribuem na construção das representações e das interpretações. E

nesse processo os produtores de imagens criam testemunhos, documentos de um

determinado tempo e espaço.

Os diálogos com as imagens e as representações do passado podem

acontecer de formas diferentes. Na escola, principalmente no Ensino Fundamental,

a forma mais comum de contato com obras de arte e documentos de época é por

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meio do livro didático. Os conteúdos selecionados, assim como as imagens, têm

uma série de implicações na educação, podendo estimular a valorização ou a

depreciação de uma determinada cultura, a construção de referenciais positivos ou

negativos sobre uma determinada parcela da população, a percepção do papel de

cada sujeito no mundo, entre outros.

Analisou-se como as imagens dos personagens afro-descendentes são

apresentadas nos livros didáticos utilizados nas disciplinas de História, Língua

Portuguesa e mesmo outras disciplinas. Imagens foram coletadas e organizadas na

forma de painéis e cartazes identificando características físicas e sociais, e o país de

origem desses povos para que nas visitações empreendidas pela comunidade

escolar esses aspectos sejam facilmente identificados. Aquarelas de Rugendas e

Debret, conceituadas como imagens canônicas, que trazem referência aos aspectos

da escravidão na América e que apresentam os costumes dos africanos e dos afro-

descendentes, tais como: moradia, vestimentas, trabalho, castigos, práticas sociais e

comerciais, foram analisadas. É preciso levar em consideração que a maioria

dessas imagens foi produzida por viajantes estrangeiros, que visitaram o Brasil em

meados do século XIX, reproduzindo aspectos pontuais da vida aqui. Além disso,

sua produção visava o mercado europeu, onde as mesmas eram modificadas.

Por trazer uma história fundamentada nos aspectos políticos e econômicos,

em detrimento dos aspectos culturais, os livros didáticos acabam por omitir a

diversidade dos povos africanos e suas heranças para o Brasil. Os mesmos

normalmente trazem uma representação, baseada em determinadas imagens dos

africanos e afrodescendentes, que induzem à manutenção de estereótipos de

submissão e inferioridade dos negros frente aos brancos, ainda hoje. Tanto essas

imagens, quanto as representações explícitas em tais obras não auxiliam no resgate

da real contribuição dos africanos e afrodescendentes na construção da história do

país, nem na valorização da auto-estima dos alunos pertencentes a esses grupos.

Os educadores, de uma forma geral, precisam estar atentos a essas representações

no momento de trabalhar com os conteúdos historicamente construídos que fazem

parte dos currículos. Para tanto, se faz necessária a inclusão dos conteúdos

referentes à história e cultura africana e afro-brasileira, bem como a real

implementação da educação para as relações étnico-raciais nas disciplinas

curriculares das escolas da Educação Básica.

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O referencial teórico para análise de imagens apresentado no material

didático (OAC – Objeto de Aprendizagem Colaborativo), disponibilizado

eletronicamente para os professores da rede pública do estado serve para qualquer

tipo de imagem e pode ser acessado para auxiliar nessa tarefa.

O currículo escolar não consiste somente do que está planejado, mas de

todo um conjunto que se vive na escola. A escola é, por excelência, um espaço de

relacionamento humano, de negociação, de aprendizagem de regras de convívio e

intercâmbio entre pessoas. É preciso focalizar a escola como um espaço de

solidariedade, de promoção da pessoa humana no respeito e na dignidade. Na

escola, os educadores e diretores acabam esquecendo que apesar desta ter sido

montada para fazer educação eurocêntrica, precisa ter compromisso com a

diversidade racial, com a democracia racial e não com o eurocentrismo. Tal atitude

ampliaria a noção da complexidade civilizatória que é o Brasil.

As disciplinas escolares, em especial a de História, tiveram a partir do século

XIX, a função de formar uma identidade, de construir referenciais para a Nação.

Nesse sentido, ao mesmo tempo em que privilegiava alguns grupos, omitia o papel

de outros na constituição do país. Essa concepção histórica considerava como

relevante apenas as questões políticas e econômicas na formação das sociedades.

O papel do povo era deixado em segundo plano e os heróis eram os grandes

representantes das nações em construção. No Brasil, o ensino de História enfatizava

apenas as heranças dos europeus concretizadas no modelo de civilização, na

língua, na organização política, no modo de vida e na cultura (erudita). Durante o

século XX, quando representados, os africanos e afro-descendentes têm sua

contribuição resumida apenas à culinária, ao samba, à capoeira e algumas termos

presentes na língua portuguesa.

A importância da escola é inegável na promoção da inovação e criação de

situações que favoreçam o aprendizado, respeito e solidariedade principalmente

quando se trata das questões étnico-raciais, promovendo assim uma sociedade

mais justa e humana. O homem é um ser histórico, por isso capaz de produzir, de

pensar, de lidar com o diferente, reconhecer a identidade que o torna um ser único.

Defendendo as idéias do educador Antonio Gramsci, DORE (2009: 58),

assim coloca:

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de nada valiam os direitos conquistados com a ampliação da democracia, como o direito político do cidadão de escolher seus dirigentes, se as massas tinham dificuldades para se organizar politicamente, para se expressar com coerência e de forma unitária e ainda lhes faltavam elementos conceituais para criticar seus governantes.

Este cenário, identificado pelo educador nas primeiras décadas do século

XX, ainda se faz atual e pode ser transposto da Rússia comunista para o Brasil

capitalista democrático. Para GRAMSCI (2009: 59), portanto, a formulação de uma

proposta para a educação que integre um programa político em direção à igualdade

social é referência para a crítica às desigualdades produzidas pelo sistema

capitalista e que se exprimem nas diversas instâncias da sociedade e da cultura,

como também na escola.

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3 METODOLOGIA DA IMPLEMENTAÇÃO

As ações que foram desenvolvidas na implementação do projeto são as

seguintes:

Educação Física : o professor desenvolveu em suas aulas teóricas uma

discussão a partir do filme proposto, fazendo a articulação entre as diferentes

modalidades de esporte, buscando destacar histórias vitoriosas de atletas afro-

descendentes. Os alunos realizaram pesquisas em revistas, jornais e on-line e

fizeram fichas com a biografia dos personagens de destaque que encontraram e em

seguida transpuseram esses dados para cartazes e painéis os quais foram expostos

para a comunidade no dia 20 de novembro quando do fechamento de todo o

desenvolvimento do projeto de implementação.

História: o trabalho iniciou-se a partir do filme “Vista a minha pele” do diretor

Joel Zito Araújo”, com a proposição de uma discussão acerca de seu enredo, a qual

levou os alunos a uma reflexão acerca da trajetória dos negros e afro-descendentes

desde sua saída da África até a atualidade. Sendo assim, os mesmos tiveram a

oportunidade de realizar pesquisas acerca do tráfico de negros para o Brasil, de

personalidades como Nelson Mandela e Martim Luther King e outros exemplos de

histórias vitoriosas. Como referência de informações específicas acerca da África

pré e pós- escravidão temos a obra de Marina de Mello e Souza: África e Brasil Africano, que foi utilizado nas aulas, bem como a obra Educação Africanidades Brasil produzida pelo CEAD da UNB. As atividades foram se desenvolvendo de

forma gradativa onde a partir de uma série de questões os alunos foram

respondendo e fazendo suas interações, em alguns momentos observou-se

curiosidade, em outros ansiedade por se tratar de um tema desafiador e em que as

opiniões divergem e que são de difícil consenso. Após terem assistido o filme os

alunos fizeram suas colocações de forma clara demonstrando a compreensão da

mensagem que ali estava inserida e até em dar continuidade no enredo visto que o

final não se apresentou muito claro. Concluiu-se que os alunos conseguiram fazer

uma leitura bem criteriosa e crítica dos diferentes momentos em que aparecem as

questões de raça e preconceito com relação ao outro e as de poder, educação e

sobrevivência.

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Algumas questões propostas na implementação na disciplina de História

estão descritas a seguir:

- Quais são os esteriótipos em relação a afro-descendentes e brancos em

nossa sociedade?

- “Quem luta mais, tem mais chances de vencer.” O que você pensa a

respeito dessa afirmativa?

- O que você entende por “Vista a minha pele?”.

- Como você se sentiu assistindo ao filme?

- O que você observou nesse filme que remete às questões de identidade e

etnia anteriormente discutidas?

- Como são as relações familiares apresentadas no filme? Quais as

semelhanças e diferenças com o que você observa nos locais de sua convivência?

- O que pode ser entendido pelos objetos encontrados no quarto de Maria, e

nas observações que ela faz em relação à realidade brasileira?

- Desigualdade racial: de quem é o problema?

Língua Portuguesa: os alunos fizeram a leitura e interpretação de alguns

contos africanos (como por exemplo, o conto “A criação do mundo e dos homens”

encontrado no livro Ogum, o rei de muitas faces de Lidia Chaib e Elizabeth

Rodrigues) com vistas e identificar a influência do vocabulário africano na formação

da Língua Portuguesa e posteriormente produziram histórias em quadrinhos

utilizando-se de tal vocabulário. Esta atividade teve um resultado positivo, visto que

os alunos conseguiram representar em suas ilustrações os diferentes personagens

do conto e identificar as diferentes funções de cada personagem presente no

enredo, ainda atribuir as falas presentes no diálogo a cada elemento. Após análise

e reflexão do conto, os alunos elaboraram histórias em quadrinhos partindo da sua

leitura, buscando a influência do vocabulário africano na língua portuguesa,

utilizando como material de apoio o conto. Para divulgar as pesquisas, foi realizada

uma exposição aberta de cartazes com palavras de origem africana usadas em

nossa língua, também realizou-se a leitura das informações constantes nos cartazes

em voz alta com o objetivo de exercitar a pronúncia e a oralidade na Língua

Portuguesa.

A professora ao trabalhar o conto, procurou fazer algumas relações e

semelhanças com a história da criação do mundo relatado na Bíblia. A mesma

relatou ter encontrado algumas dificuldades e certa resistência por parte dos alunos,

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visto os mesmos não conseguirem relacionar algumas passagens do conto com a

linguagem figurativa presente na Bíblia. Neste contexto a professora realizou as

intervenções e fez a contraposição explicando como cada povo e grupo étnico

detém suas próprias interpretações e crenças.

Arte: após análise e reflexão do filme foram feitas pesquisas, confecção e

exposição de painéis com a expressão da beleza negra especificamente destacando

os diferentes tipos de penteados, suas simbologias, contemplando os mais variados

grupos étnicos de origem africana.

A professora ao desenvolver a atividade através da pesquisa, inicialmente

sentiu um pouco de resistência por parte dos alunos, mas com sua experiência

profissional conseguiu convencê-los que em sua disciplina se trabalha com o

diferente, expressão corporal e intelectual e a arte em si, nesta atividade enfocando

a arte negra. Buscando em site, revistas e outros materiais de pesquisa, a mesma

juntamente com os alunos conseguiu um resultado relevante com inúmeras

expressões e imagens com representação da beleza negra que foram utilizadas

para a confecção dos painéis. A mesma procurou ressaltar que cada ser humano

tem suas características físicas próprias, e que cada grupo étnico possue suas

especificidade. Ainda enfatizou a importância do gostar-se e sentir-se pertencente

no grupo do qual está inserido, em qualquer ambiente social.

Geografia: a professora trabalhou, o conteúdo sobre as várias regiões da

África, atentando para os recursos naturais e materiais explorados nesses lugares,

juntamente com dados acerca da densidade demográfica e renda per capita dos

mesmos.

Partindo do filme a professora analisou com seus alunos as relações entre

os diferentes espaços ocupados pela população branca e afro-descendente.

Buscando ampliar a implementação do trabalho em sala realizou pesquisa buscando

conhecer mais detalhadamente a grande diversidade natural e cultural existente no

Continente africano que é desconhecida da grande maioria dos alunos e da

sociedade, contrapondo a idéia de um continente pobre e sem contribuir com o seu

legado para a humanidade, ignorando a riqueza da civilização egípcia e outras.

Ao desenvolver a pesquisa houve uma participação efetiva e comprometida

por parte dos alunos que perceberam o quanto ainda não conheciam sobre a

existência das riquezas naturais e culturais do continente em estudo.

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Com a conclusão desse estudo foram feitos cartazes com os contrapontos

dos assuntos pesquisados das diferentes regiões do Continente africano e

apresentados em sala de aula para toda a turma, visto que as regiões estudadas

foram divididas em várias equipes. Após esta atividade o resultado da pesquisa foi

transposto em painéis os quais foram expostos para a comunidade no dia 20 de

novembro quando do fechamento de todo o desenvolvimento do projeto de

implementação.

3.1. O filme “Vista a minha pele”

Iniciaram-se as atividades de implementação do projeto com o filme “Vista a

minha pele” do diretor Joel Zito Araújo. O filme, de 2003, é um curta-metragem em

língua portuguesa com 15 minutos de duração. “Vista a minha pele” é uma paródia

da realidade brasileira, que pode servir de material básico para discussões sobre

racismo e preconceito em sala de aula. Nesta história invertida, os negros são a

classe dominante e os brancos foram escravizados. Os países pobres são, por

exemplo, Alemanha e Inglaterra, e os países ricos são, por exemplo, África do Sul e

Moçambique. No enredo do filme, a personagem Maria é uma menina branca pobre

que estuda num colégio particular graças à bolsa de estudos que tem pelo fato de

sua mãe ser faxineira nesta escola. A maioria de seus colegas a hostiliza por sua cor

e por sua condição social, com exceção de sua amiga Luana, filha de um diplomata

que, por ter morado em países pobres, apresenta uma visão mais abrangente da

realidade. Maria quer ser “Miss Festa Junina” da escola, mas isso requer um esforço

enorme de superação de obstáculos, que vai desde a predominância da supremacia

racial negra (a mídia só apresenta modelos negros como sinônimos de beleza), à

resistência de seus pais, a aversão dos colegas e a dificuldade em vender os

bilhetes para seus conhecidos, em sua maioria muito pobres. Maria tem em Luana

uma forte aliada e as duas vão se envolver numa série de aventuras para alcançar

seus objetivos. Vencer ou não o concurso não é o principal foco do vídeo, mas sim a

disposição de Maria em enfrentar essa situação. Ao final, ela descobre que, quanto

mais confia em si mesma, mais possibilidades tem de convencer os outros de sua

chance de vencer. (Extraído na íntegra de:

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http://brasildosnegros.arteblog.com.br/33863/Documentario-Vista-a-minha-pele.

Acessado em: 01/06/2010.)

Após assistir ao filme, o professor retomou as noções dos alunos sobre

identidade e etnia de maneira bem informal. As questões trabalhadas na

implementação estão descrita a seguir:

- Quais são os esteriótipos em relação a afro-descendentes e brancos em

nossa sociedade?

- “Quem luta mais, tem mais chances de vencer.” O que você pensa a

respeito dessa afirmativa?

- O que você entende por “Vista a minha pele”.

Após assistir ao filme, as questões anteriormente propostas foram revisadas

e verificou-se uma mudança de posicionamento e de perspectiva por parte dos

alunos. Além disso, foram propostas outras discussões, na forma das perguntas que

seguem:

- Como você se sentiu assistindo ao filme?

- O que você observou nesse filme que remete às questões de identidade e

etnia anteriormente discutidas?

- Como são as relações familiares apresentadas no filme? Quais as

semelhanças e diferenças com o que você observa nos locais de sua convivência?

- O que pode ser entendido pelos objetos encontrados no quarto de Maria, e

nas observações que ela faz em relação à realidade brasileira?

- Desigualdade racial: de quem é o problema?

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4 DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

Ao buscar desenvolver a temática História e Cultura Afro-brasileira

em uma abordagem interdisciplinar aliando teoria e prática objetivou-se a

valorização do aluno afro-descendente considerando-o um cidadão de direitos e de

valor fazendo-o sentir-se pertencente ao grupo de seu convívio social. Assim foi

possível constatar que houve uma boa aceitação, e participação expressiva dos

alunos nos diferentes e diversificados trabalhos realizados. Observou-se na

expressão dos mesmos a alegria em serem vistos e lembrados de forma mais

positiva e sujeitos da história valorizando-os e participando desta história contada

com outro enfoque.

Trabalhando a interdisciplinaridade com as outras áreas do conhecimento,

pesquisamos as diferentes modalidades de esportes, buscando destacar histórias

vitoriosas de atletas afro-descendentes que estão presentes no cenário nacional e

internacional e se destacam na mídia, valorizando assim o atleta negro. Outro ponto

relevante na implementação do projeto foi à análise e reflexão do conto “A Criação

do Mundo e dos Homens”, no qual os alunos elaboraram histórias em quadrinhos

partindo da sua leitura, buscando a influência do vocabulário africano na língua

portuguesa, onde foi possível constatar o envolvimento e a preocupação em

representar de forma original os personagens presentes no enredo.

Ao abordar as questões propostas na implementação do projeto referente à

disciplina de História, buscando respostas às inquietações que permeiam o currículo

escolar sobre as questões étnicas raciais o estudo atingiu o objetivo pelo fato de ser

possível perceber o envolvimento do coletivo da escola em uma abordagem mais

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positiva dessa temática juntamente com as demais áreas do conhecimento e fazer

com que o educando se sinta pertencente e não retraído em função de seu grupo

étnico.

O momento em que na disciplina de artes se enfoca a beleza negra, com os

diferentes tipos de cabelos, ornamentos, o orgulho dos alunos e seu efetivo

envolvimento nas atividades mostrou-nos a importância de valorizar os diferentes

grupos étnicos e suas culturas. Também mostrando os trajes com multicoloridos e

adornos usados principalmente pelas mulheres com seus devidos significados, foi

considerado de uma riqueza ímpar.

Os alunos pesquisaram as diferentes regiões do Continente Africano

mostrando as belezas e diversidades naturais e culturais contrapondo àquilo que é

relatado nos diversos materiais bibliográficos disponível em sua grande maioria, com

passagem triste e repudiante como doenças, miséria e fome.

Após a análise do filme constatou-se uma certa inquietação dos alunos com

relação ao conceito de preconceito e esteriótipos existente nas relações

interpessoais e na convivência social. Os mesmos demonstraram interesse no

assunto, e após em diálogo verificou-se que houve um bom entendimento sobre a

questão de preconceito e levando a uma leitura positiva e reflexão mais profunda

sobre esta temática que muitas vezes é ignorada ou até esquecida de ser abordada

no ambiente escolar. Assim foi possível aprofundar a discussão sobre como

podemos melhorar as relações humanas e étnicos raciais nos diferentes ambientes

de convívio social e buscar um entendimento mais completo e reflexivo, permitindo

assim uma ampliação sobre o conhecimento do tema em estudo.

Outro ponto relevante da implementação foi o envolvimento dos professores

das disciplinas envolvidas, da equipe pedagógica e apoio da equipe diretiva e

demais profissionais que colaboraram para que o projeto se desenvolvesse de

maneira satisfatória, alcançando aos objetivos propostos, confirmando assim a idéia

de que é possível o trabalho interdisciplinar se efetivar, desde que o colegiado todo

se comprometa com a proposta em si.

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Além dos recursos descritos no projeto, utilizou-se ainda outras fontes de

pesquisa e estudos, como matérias jornalísticas e imagens que serviram de

subsídios para enriquecer e ampliar o projeto.

Assim foram realizadas oficinas abordando a temática e apresentando a

proposta interdisciplinar no Curso de Formação de Docentes do Colégio em que

implementamos o projeto. Ao término de todas as atividades desenvolvidas pelos

professores e alunos envolvidos, que culminou no dia 20 de novembro de 2010, dia

da Consciência Negra, contamos ainda com a valorosa contribuição de uma equipe

de alunas do Ensino Médio que pesquisaram e apresentaram alguns pratos típicos

de algumas regiões do Continente africano para a degustação dos presentes, e de

algumas ervas medicinais as quais eram utilizadas como medicamentos nas suas

comunidades e serviram chá de algumas delas.

Foram realizadas, também, oficinas em três Unidades dos Sistema

Penitenciário no município de Piraquara, a convite da equipe pedagógica e direção

por considerarem de grande importância a abordagem a que nos propusemos em

uma perspectiva interdisciplinar, levando aos alunos do sistema um enfoque

diferenciado da temática em questão. Estas foram ações complementares que não

estavam previstas inicialmente no projeto, mas que ao chegar ao conhecimento das

equipes pedagógicas e dos professores de outras escolas fizeram o convite para

uma apresentação e reflexão.

Trabalhar a história e cultura afro-brasileira de modo articulado com outras

disciplinas, contribuiu para a superação das práticas de ensino-aprendizagem

fragmentadas e com reduzido significado social para os alunos o que contribui para

formação de educandos capazes de pensar como seres históricos, de modo que

possam inserir-se dignamente na sociedade.

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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. CASA CIVIL. SUBCHEFIA PARA ASSUNTOS JURÍDICOS. Lei nº 10.639/03, que altera a Lei no 9.394/96, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira". Disponível em:

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. CASA CIVIL. SUBCHEFIA PARA ASSUNTOS JURÍDICOS. Lei nº 11.645/08, que altera a Lei no 9.394/96, modificada pela Lei no

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