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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL CURSO DE DOUTORADO DA HISTÓRIA À PRÉ-HISTÓRIA: AS OCUPAÇÕES DAS SOCIEDADES PURI E COROADO NA BACIA DO ALTO RIO POMBA (O CASO DA SERRA DA PIEDADE) Vlademir José LUFT Rio de Janeiro - RJ 2.000

DA HISTÓRIA À PRÉ-HISTÓRIA: AS OCUPAÇÕES DAS SOCIEDADES PURI E COROADO NA BACIA DO ALTO RIO POMBA (O CASO DA SERRA DA PIEDADE)

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tese de doutoramento apresentada no IFCS-UFRJ em fevereiro de 2000

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL

CURSO DE DOUTORADO

DA HISTÓRIA À PRÉ-HISTÓRIA: AS OCUPAÇÕES DAS

SOCIEDADES PURI E COROADO NA BACIA DO ALTO RIO

POMBA (O CASO DA SERRA DA PIEDADE)

Vlademir José LUFT

Rio de Janeiro - RJ

2.000

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL

CURSO DE DOUTORADO

DA HISTÓRIA À PRÉ-HISTÓRIA: AS OCUPAÇÕES DAS

SOCIEDADES PURI E COROADO NA BACIA DO ALTO RIO

POMBA (O CASO DA SERRA DA PIEDADE)

Vlademir José LUFT

Tese apresentada ao Curso de Doutorado em história Social, do Instituto de Filosofia e

Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos

necessários para obtenção do grau de Doutor em História.

Rio de Janeiro - RJ

2.000

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL

CURSO DE DOUTORADO

Orientação:

Professor Doutor Ondemar Ferreira Dias Júnior

Banca Examinadora:

TITULARES

..................................................................................................................................................

..................................................................................................................................................

..................................................................................................................................................

..................................................................................................................................................

..................................................................................................................................................

SUPLENTES

..................................................................................................................................................

..................................................................................................................................................

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LUFT, Vlademir José.

Da História à Pré-história: as ocupações das sociedades Puri

e Coroado na bacia do alto rio Pomba – MG (o caso da serra

da piedade) / Vlademir José Luft, Universidade Federal do Rio

de Janeiro / Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Rio de

Janeiro – RJ, 2.000. 175 pp.; 45 il.

1. história

2. pré-história

3. arqueologia

4. sociedades indígenas - Puri, Coroado e Coropo

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AGRADECIMENTOS

Ao meu Professor e Orientador, Ondemar Dias, que me deu a possibilidade de realizar

este Curso. Sem sua ajuda isto não teria sido possível. Obrigado

Um dia, sem motivos aparentes ele passou a acreditar em meu potencial, confiou em

meu trabalho, ensinou-me tudo o que poderia ter ensinado, deu-me a oportunidade que eu

havia pedido. Com o tempo vieram as diferenças, mas apesar disso, quanta saudade do meu

amigo Alfredo. Você está fazendo falta, pode acreditar ...

À Professora Gabriela, uma pessoa de alma muito generosa, a primeira pessoa do

circuito profissional a considerar-me como tal e que confiou e respeitou meu trabalho, fato

muito importante para meu desenvolvimento, meu sincero agradecimento.

Você é o responsável pela forma deste trabalho. Provavelmente não está como você

esperava, desculpa. Apesar disso, obrigado Alberto Frederico.

Na vida há Pessoas que passam e Pessoas que ficam. Aos que ficaram, obrigado.

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ÍNDICE

AGRADECIMENTOS.......................................................................................................vii

RESUMO..............................................................................................................................x

RESUME..............................................................................................................................xi

SUMMARY........................................................................................................................xii

APRESENTAÇÃO...............................................................................................................1

PARTE I

1.1 Uma proposta de trabalho...........................................................................................6

1.1.1 O instrumental prático....................................................................................7

1.1.2 O instrumental teórico..................................................................................12

1.2 A História como concepção (História, Ciência e Método Científico)......................26

1.3 O Materialismo Histórico como método de trabalho...............................................32

1.4 As Categorias de trabalho.........................................................................................36

1.4.1 O Espaço Físico............................................................................................36

1.4.2 O Espaço Temporal......................................................................................39

1.4.3 A Tecnologia................................................................................................40

1.4.4 O Cotidiano..................................................................................................43

1.4.5 A Totalidade.................................................................................................45

1.5 As técnicas e as ciências auxiliares como meio de trabalho.....................................49

PARTE II

2.1 O Projeto de Pesquisa...............................................................................................54

2.2 A área de trabalho.....................................................................................................62

2.3 O panorama atual (uma visão da Arqueologia)........................................................65

2.4 O trabalho de pesquisa histórica ..............................................................................75

2.4.1 - a fonte documental........................................................................................75

2.4.2 - a fonte oral....................................................................................................86

2.5 O trabalho de pesquisa arqueológica......................................................................112

2.6 Uma formação social como resultado....................................................................144

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

1. Obras diversas..............................................................................................................156

2. Cartas............................................................................................................................170

3. Decretos........................................................................................................................171

4. Discursos......................................................................................................................171

5. Instruções......................................................................................................................172

6. Ofícios..........................................................................................................................172

7. Relatórios......................................................................................................................172

8. Termos de Junta............................................................................................................173

9. Mapas...........................................................................................................................174

ANEXOS • Anexo 1

o organização espacial de um sítio arqueológico (proposta de trabalho) ....................... 20

• Anexo 2

o mapa etno-histórico do Brasil e regiões adjacentes de Kurt Nimuendaju - mapa n° 1 ... 58

• Anexo 3

o mapa etnográfico do Brasil - índios atuais de João Américo Peret - mapa n° 2 ............. 59

o mapa etnográfico do Brasil - índios do passado de João Américo Peret - mapa n° ......... 59

• Anexo 4

o mapa do município de Visconde do Rio Branco - MG - mapa n° 4 ........................... 62

• Anexo 5

o erosão na serra da Piedade - foto n° 1 ............................................................................... 64

• Anexo 6

o vale no sopé da serra da Piedade - foto n° 2 .................................................................... 64

• Anexo 7

o material em ossos, dentes, sementes e fibras, da fase Mucuri - foto n° 3 ........................ 69

o material em fibra, da fase Mucuri - foto n° 4 ................................................................... 69

o material em fibra, da fase Mucuri - foto n° 5 ................................................................. 69

o material cerâmico, da fase Mucuri - foto n° 6 ................................................................. 69

o material cerâmico, da fase Mucuri - foto n° 7 .................................................................. 69

• Anexo 8

o material cerâmico identificado como de origem Puri - desenho n° 1 .............................. 72

• Anexo 9

o Decreto número 426 - documento n° ................................................................................ 76

• Anexo 10

o tipologia de ocorrências de fontes históricas do PAP-C - roteiro n° 1 ............................. 77

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• Anexo 11

o relatório de entrevistados do PAP-C................................................................................. 97

• Anexo 12

o primeira versão do roteiro de entrevistas do PAP-C - roteiro n° 2.................................. 101

o segunda versão do roteiro de entrevistas do PAP-C - roteiro n° 3.................................. 103

o terceira versão do roteiro de entrevistas do PAP-C - roteiro n° 4.................................... 104

• Anexo 13

o Entrevista com Terezinha de Almeida Pinto - entrevista n° 1......................................... 109

o Entrevista com Honório e Jacira Imaculado - entrevista n° 2.......................................... 110

• Anexo 14

o carta topográfica com a serra da Piedade e os locais de ocupação - mapa n° 5.............. 112

• Anexo 15

o local de ocupação VRB-MG-002 - fotos n° 3 e n° 4................................................... 117

• Anexo 16

o local de ocupação VRB-MG-003 - fotos n° 5 e n° 6 ...................................................... 117

• Anexo 17

o local de ocupação VRB-MG-004 - fotos n° 7 e n° 8 ...................................................... 117

• Anexo 18

o local de ocupação VRB-MG-006 - fotos n° 9 e n° 10 .................................................... 117

• Anexo 19

o local de ocupação VRB-MG-007 - fotos n° 11 e n° 12 .................................................. 117

• Anexo 20

o local de ocupação VRB-MG-008 - fotos n° 13 e n° 14 .................................................. 117

• Anexo 21

o local de ocupação VRB-MG-011 - fotos n° 15 e n° 16 .................................................. 118

• Anexo 22

o sítio "da Galhada" - fotos n° 17 e n° 18 .......................................................................... 120

• Anexo 23

o pintura rupestre do sítio "da Galhada" - fotos n° 19 e n° 20 ........................................... 120

• Anexo 24

o quantificação do material cerâmico do sítio "da Galhada" - tabela n° 1 ........................ 121

• Anexo 25

o atributos tipológicos de análise para o material cerâmico .............................................. 123

• Anexo 26

o sítio "Toca dos Anões" - fotos n° 21 e n° 22 .............................................................. 129

• Anexo 27

o quantificação do material cerâmico do sítio "Toca dos Anões" - tabela n° 2 ................. 130

• Anexo 28

o quantificação do material dentário do sítio "Toca dos Anões" - tabela n° 3 .................. 135

• Anexo 29

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o sítio "Toca dos Anões" - conj. cerâmico n° 1 - foto n° 23 - desenho n° 2 ...................... 142

o conj. cerâmico n° 2 - foto n° 24 - desenho n° 3.......................................................... 142

o conj. cerâmico n° 3 - foto n° 25 - desenho n° 4.......................................................... 142

o conj. cerâmico n° 4 - foto n° 26 - desenho n° 5.......................................................... 142

o conj. cerâmico n° 5 - foto n° 27 - desenho n° 6.......................................................... 142

o conj. cerâmico n° 6 - foto n° 28 - desenho n° 7.......................................................... 142

o conj. cerâmico n° 7 - foto n° 29- desenho n° 8.............................................................. 142

o conj. cerâmico n° 8 - foto n° 30- desenho n° 9................................................................ 142

o conj. cerâmico n° 9 - desenho n° 10................................................................................ 142

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo analisar a ocupação indígena da serra da

Piedade, no município de Visconde do Rio Branco, no Estado de Minas Gerais, onde teríamos

a presença dos grupos indígenas Puri e Coroado, que de forma geral, são dois grupos muito

pouco conhecidos e que raramente têm servido de objeto de estudo e trabalho a pesquisadores

de qualquer áreas.

Tomando como ponto de partida o elemento indígena, em função de acreditarmos que

a arqueologia deve identificar, quando possível, a sociedade, ou o grupo, indígena com o qual

está trabalhando, e entendendo ser necessário seguí-lo, no tempo e no espaço para identificar

como, historicamente, esteve organizado, é que escolhemos estes grupos como nosso objeto

de estudo, buscando com isso localizá-los, identificá-los e analisá-los, histórica e

arqueologicamente, através das fontes orais, escritas e materiais disponíveis.

Assim, elaboramos um trabalho em termos da análise de um processo, que é histórico,

e que merece, portanto, uma análise histórica, em todos os seus sentidos. No que diz respeito

ao procedimento arqueológico, nosso trabalho é no sentido da recuperação das estruturas,

materializadas ou não, deixadas como vestígios quando da ocupação da serra da Piedade por

estas sociedades, e que nos permitem reconstituir o seu modo de vida.

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RESUME

La présente étude a pour but l’analyse de l’occupation indigène de la Serra da Piedade

située à la ville de Visconde de Rio Branco, Minas Gerais, où il y aurait la présence des

sociétés indigènes Puri et Coroado qui, en général, sont deux groupes peu connus et qui

rarement ont constitué l’ objet d’étude et de recherche des scientifiques de n’importe quels

champs des sciences sociales.

C’est en prenant comme point de départ l’indigène, une fois qu’on croit que

l’Archéologie doit identifier la société ou le groupe indigène avec lequel elle est en train de

travailler et en comprenant qu’il est nécessaire d’accompagner son parcours dans le temps et

l’espace afin d’identifier comme il s’est organisé historiquement, que nous avons choisi ces

groupes comme objet d’étude, essayant de les localiser, les identifier et les analyser, selon

les concepts de l’Histoire et de l’Archéologie, d’après les sources orales, écrites et matérielles

disponibles.

Ainsi, nous avons élaboré une étude basée sur l’analyse d’un procédé historique et qui

mérite, alors, une analyse historique dans tous ses sens. En ce Qui concerne le procédé

archéologique, notre recherche a pour but la récuperation des structures, matérielles ou pas,

laissées comme vestiges d’un passé d’occupation de la Serra da Piedade par ces sociétés, et

qui nous permettent de reconstituer leur manière de vivre.

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SUMMARY

The present study’s aim is to analyse the occupation of the Serra da Piedade in

Visconde do Rio Branco, Minas Gerais, by the Puri and Coroado indians. These indian

groups are anyway almost unknown and rarely have been studied and investigated by any

kinds of researchers.

We chose the indian as a point of departure because we believe Archeology might

identify whenever it’s possible, the society or the indian group which is its object of research,

and also that it’s necessary to follow this group through time and space in order to find out

how it had been historically organized. We also chose these groups as our subject of research

because we intend to locate, identify and analyse them according to History and Archeology,

basing ourselves upon the oral, writen and material sources

Therefore, we worked up a project in terms of a historical procedure’s analysis in a

broad sense. Concerning the archeological procedure, our intention is to salvage the material

or non material structures left as traces by the time of the occupation os Serra da Piedade by

these societies, what makes possible the reconstitution of their way of living.

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“Enquanto subsistirem privilégios

exclusivistas e hereditários, as formas de

tirania mudarão segundo as

circunstâncias, mas a própria tirania

subsistirá.” (Nicolas BONNEVILLE,

Journal la Bouche de Fer, 1790, Paris)

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apresentação

De hoje em diante, quando avistarem índios na estrada de ferro ninguém mais deverá pesquisar se estes vinham com intenções pacíficas ou não, mas abrir fogo contra eles, e não deverão atirar para o ar e nem para o chão, mas fazer pontaria certa! Ficarei como responsável por todas as conseqüências (...) ou se acaba com os índios ou estes acabam com a civilização. (Palavras de Carlos Teles, Diretor da Fundação Brasil Central e Delegado Regional de Polícia, em discurso ao seu pessoal de campo em outubro de 1945. In: NIMUENDAJÚ, Curt.. Textos Indigenistas, Editora Loyola, São Paulo, 1982, p. 244).

Existem duas maneiras de entendermos o elemento indígena no Brasil, e quem sabe no

mundo. A primeira maneira remete-nos ao conhecimento popular, onde o índio é

considerado um elemento exótico e totalmente diferente do “civilizado”, portanto, passível de

ser tutelado. A segunda maneira, relaciona-se a forma de como o mundo acadêmico-

intelectual entende este elemento indígena. É evidente que esta visão dependerá das

flutuações ideológicas de cada época ou período histórico. De qualquer forma, pode-se

perceber que, com raras exceções, o indígena é encarado como um elemento que raramente

faz parte do domínio da História.

Infelizmente esta tendência da historiografia brasileira tem sido de mantê-los no

domínio da Antropologia e/ou da Etnologia. Isso faz com que estes trabalhos, que são de

suma importância para as respectivas áreas, fiquem sem uma visão comtemporizada e crítica

das sociedades indígenas. Além disso, o historiador fica com a impressão de que este assunto

não faz parte de seu objeto de estudo, logo, ele não tem qualquer responsabilidade sobre sua

análise. Vilas Bôas1, referindo-se a Minas Gerais, faz a mesma observação

O índio está ali e resiste. E, no entanto, para a historiografia mineira, os indígenas em Minas Gerais tornaram-se como que invisíveis. Eles existem. ... As populações indígenas de Minas Gerais são invisíveis

1 - VILAS BÔAS, Crisoston Terto. A Questão indígena em Minas Gerais: um balanço das fontes e da bibliografia. In: LPH: Revista de História, número 5, Universidade

Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, 1995, pp. 42-55.

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até mesmo para aqueles pesquisadores influenciados pelos paradigmas da "nova história", esse vasto leque que engloba os estudos orientados pela idéia de cultura, cotidiano e mentalidade, e que procuram atingir o "homem comum", os que não deixaram de si testemunhos diretos. p. 43

É evidente que se tivermos em mente um conceito de História tradicional, ou seja, a

História que inicia-se, no caso brasileiro, com a chegada da armada de Pedro Alvares Cabral

em 22 de abril de 1500, logicamente as populações indígenas anteriores à esta data não serão

do âmbito da História, e as posteriores somente o serão na medida em que complementarão o

contexto europeu da época. Para os autores desta linha de raciocínio, os índios aparecem

somente em alguns momentos da História do Brasil, como por exemplo quando da chegada da

armada de Pedro Alvares Cabral, quando das tentativas de escravização ou quando dos

aldeamentos.

Se a Arqueologia que defendemos é uma História das sociedades passadas, que busca

tratar o maior número possível de documentos, sejam eles escritos e/ou materiais, é necessário

que comecemos, urgentemente, a trabalhar com os grupos indígenas. Como o historiador,

que volta-se cada vez mais para as análises interdisciplinares envolvendo as mais diversas

áreas do conhecimento, cabe ao arqueólogo fazer uso de fontes, teorias e metodologias o mais

abrangente possível, visando conhecer o processo histórico da sociedade com a qual estiver

trabalhando.

Esta não foi a preocupação da grande maioria dos que escreveram sobre as sociedades

indígenas no Brasil em épocas passadas. Observando a historiografia tradicional sobre o

indígena brasileiro, pode-se constatar que este, o índio, é visto como sendo um bloco único

com características gerais. Isto ocorreu por falta de conhecimento prévio de cada grupo por

parte dos viajantes, cronistas e dos autores posteriores a eles. Desta maneira, o conhecimento

sobre o índio brasileiro foi sendo passado de geração a geração de forma pouco crítica por

parte dos historiadores.

Como conseqüência desta visão “acrítica”, a maior parte das obras sobre os índios

brasileiros não são análises que se detêm nas particularidades de cada um dos grupos, mas sim

em suas generalidades.

Por sua vez, a Arqueologia, que trabalha com esses grupos nos mais diversos

momentos de sua história, através principalmente de sua cultura material, muito pouco tem

feito no sentido de recuperar aquela sociedade com a qual está trabalhando, tampouco de

seguí-la, no tempo e no espaço, ou mesmo de escolher a sociedade com a qual irá trabalhar.

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Seu intuito, na maioria das vezes, é de estabelecer panoramas gerais, muito longe das

particularidades e dos modos de vida de cada grupo nos mais diversos momentos históricos.

Um bom exemplo do que acabamos de mencionar é a área denominada Norte

Fluminense, no Estado do Rio de Janeiro, também conhecida, em sua quase totalidade, pela

expressão “baixada dos Goitacases”, tradicionalmente identificada como tendo sido ocupada

pelos índios Goitacá. O que se pode verificar é que podemos encontrar nesta área diversos

outros grupos, tais como os Puri, os Coroado e os Coropó. Os viajantes e cronistas primeiro,

e os historiadores e arqueólogos depois, não se preocuparam, ou não tiveram conhecimentos

suficientes, para fazer as distinções entre cada um dos grupos. Desta maneira, foi traçado um

“modelo” do que poderia ser o indígena e a ocupação desta área somente a partir dos Goitaca.

Este fato tem provocado, em nosso entender, uma série de distorções na realidade da

ocupação desta e de muitas outras áreas.

Portanto, nosso objetivo é o de trabalhar, enquanto arqueólogo, com uma sociedade,

ou um grupo indígena específico, procurando seguí-lo no tempo e no espaço para demonstrar

a forma como o mesmo tem vivido.

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parte i

1.1 - uma proposta de trabalho

... un método es un procedimiento para tratar un conjunto de problemas. Cada classe de problemas requiere un conjunto de métodos o técnicas especiales. (BUNGE, Mário.. La investigación cientifica - su estrategia y su filosofia, 2a edicion, Editorial Ariel, Barcelona, 1989, p. 34)

Entendendo a metodologia como os meios práticos e teóricos pelos quais um

pesquisador busca resolver determinado problema ou tratar determinado objeto de estudo,

apresentamos a seguir a forma como estamos trabalhando com os grupos indígenas Puri e

Coroado2.

Antes disso, devemos ressaltar, que a parte técnica de um trabalho deve estar, sempre,

de acordo com a teoria proposta, uma vez que acreditamos ser ela quem determina a técnica,

que por sua vez nos permite chegar ao objetivo proposto. Além disso, vale lembrar que a

teoria, entendida como o conjunto de princípios fundamentais de caráter racional que

norteiam o ato de realizar uma tarefa, estaria presente em tudo o que fazemos. Neste sentido,

Kern e Schmitz3, arqueólogos brasileiros, concordam com o exagero nas "discussões teóricas"

em algumas situações da arqueologia, principalmente a brasileira. Para eles, e entendemos

ser verdadeira tal afirmativa, em tudo o que realizamos há uma teoria implícita, proposta,

testada e concretizada.

Dessa forma, concordando com Becker4, entendemos que

" ... toda pesquisa tem o propósito de resolver um problema que, em aspectos importantes não é parecido com nenhum outro problema, e deve fazê-lo dentro de um ambiente específico diferente de todos os que existiram antes." pp. 12-13

Por isso, como Becker5, preferimos

2 - Para a grafia dos nomes dos grupos indígenas, seguimos a convenção estabelecida pela Associação Brasileira de Antropologia - ABA, em 1953, onde normatiza que os

nomes de povos e de línguas indígenas sejam empregados na forma invariável, sem flexão de gênero e número. In: Revista de Antropologia, volume 2, número 2, USP, São

Paulo, 1954, pp. 150-154.

3 - Comunicação oral em Simpósio do IX Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira, Rio de Janeiro, 1997.

4 - BECKER, Howard S.. Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais, Coleção Ciências Sociais, volume 31, Editora Hucitec, São Paulo, 1993.

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" ... um modelo artesanal de ciência, no qual cada trabalhador produz as teorias e métodos necessários para o trabalho que está sendo feito." p. 12

De acordo com isso, nosso objeto de estudo, problematizado, requer um tratamento

específico para que possamos chegar ao resultado desejado, conforme exposto nos objetivos

estabelecidos. Para tal, apresentamos a seguir o instrumental prático e o instrumental teórico

com os quais estamos trabalhando.

1.1.1 - o instrumental prático

Com o intuito de facilitar e de melhor orientar a pesquisa, preparamos, com base nas

obras de Wied6, Casal7, Lamego8, Teixeira9 e Araújo10, uma série de palavras-chaves que nos

auxiliam durante a pesquisa com as fontes bibliográficas. Esta lista de termos-chaves tem

sofrido alterações no decorrer do tempo. Assim, novos termos são acrescentados a ela, e

muitos outros, já existentes, deixam de ser utilizados. Em momento algum os termos que

deixados de ser utilizados são retirados da lista, uma vez que com isso poderemos demonstrar,

a qualquer momento e com facilidade, a evolução da pesquisa. Dessa forma, nossa lista

inicial constava de:

índios

Puri

Coroado

Coropo

Goitaca

rios

Itabapoana

Paraiba do Sul

Doce

Pomba

5 - Op. Cit.

6 - WIED, Maximilian. Viagem ao Brasil, Editora Itatiaia / EDUSP, Coleção Reconquista do Brasil, volume 156, série 2, Belo Horizonte, 1989.

7 - CASAL, Manuel Aires de. Chorographia brasileira ou relação histórico-geográfica do Reino do Brasil, Editora Itatiaia / EDUSP, Coleção Reconquista do Brasil, volume

27, Belo Horizonte, 1978.

8 - LAMEGO, Alberto Ribeiro. A Terra Goytacá, 8 volumes, L’Édittion D’Art, Paris, 1913.

9 - TEIXEIRA, Francisco Camargo. Bom Jesus de Itabapoana, Academia Bonjusuense de Letras, EDUF / DAMADA, Rio de Janeiro, 1985.

10 - ARAUJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. Memória Histórica do Rio de Janeiro, 0 volumes, Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1941.

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Muriahé

serrras

do Caparaó

do Tardin

da Onça

do Pico

das Frexeiras

fazendas

Puri

Muribeca

aldeias

Camapuana

Sant‘Anna dos Ferros

provincias

do Rio de Janeiro

do Espirito Santo

de Minas Geraes

Campo dos Goitaca

A partir disso, no trato com arquivos e bibliotecas, toda a referência bibliográfica

consultada é fichada, retirando-se dela localizações e descrições a respeito da cultura material,

do modo de vida, da estrutura social, da estrutura física dos indivíduos e das relações internas

e externas dos grupos, bem como todas as referências a autores e trabalhos sobre o assunto.

No que se refere ao contato com as populações, no sentido de verificar as informações

obtidas junto as fontes escritas, a abordagem para obtenção de informações acontece sempre

com a cordialidade e paciência, tendo como intuito, saber da existência de indicações

rupestres, de material cerâmico, de material lítico e de enterramentos. A linguagem usada

para tal deve ser, sempre, compatível com o nível das populações com as quais estamos

tratando. Assim, as indicações rupestres podem vir a ser “desenho”, o material lítico ser

“pedra de corisco”, os enterramentos serem “cemitério de caboclo” e o material cerâmico ser

“pote de barro”.

Da parte técnica da Arqueologia, todas as etapas são importantes para o resultado.

Com isso, até mesmo a coleta de material de superfície é criteriosamente realizada,

identificando e localizando, precisamente, o material disperso pela área do assentamento e

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20

não apenas da área a ser escavada. Lembramos que todo o material deve ser coletado,

sempre no sentido de evitar possíveis erros no selecionamento do material, bem como no

sentido de buscar a totalidade, possível, daquele assentamento. Entre outras coisas, essa

coleta de material de superfície servirá para se entender a dispersão, horizontal, do material e

auxiliar na identificação das áreas de produção e consumo da sociedade que ali esteve.

A área a ser escavada deverá, em princípio, ser total. Quando houver falta de

condições, financeiras, de pessoal ou técnica, a mesma poderá ser reduzida, sem deixar de ser

representativa. Nesse caso, a escolha será pessoal e aleatória, podendo ser guiada, entre

outras coisas, pela maior concentração do material de superfície.

Temos como coordenada de trabalho, planimétrico e altimétrico, o ponto zero. Ele,

além de nos indicar o Norte Magnético, também é a base para a tomada de uma série de

pontos que são utilizados no momento da localização, por triangulação, dos restos materiais

encontrados na escavação. Além disso, o ponto zero também é utilizado como coordenada

básica para as curvas de nível.

Já a técnica de escavação a ser usada, não poderia ser outra que não a decapagem por

superfícies de deposição do material. Essa técnica permite detectar não somente o material

existente, localizado tanto horizontalmente quanto verticalmente, como também toda e

qualquer estrutura ou modificação que possa existir na sedimentação. Embora julgando que a

técnica de escavação utilizada nos permite recuperar “in loco” todo e qualquer resto material,

faremos uso de peneiras. Esse instrumento recupera, embora parcialmente, as falhas

cometidas no momento da escavação, com o agravante de que o material ali encontrado perde

suas coordenadas. Vale lembrar também do material coletado para análises posteriores de

teor diverso. Entre eles, os principais são os sedimentos, da região e do local escavado,

sementes de frutos e da vegetação local e esqueletos de animais locais, para futuras

comparações.

Todo o restante do material recuperado será identificado, embalado e armazenado de

forma adequada, evitando denificá-lo. Além disso, buscaremos realizar a mais completa

documentação possível desse trabalho, seja por fotografias, descrições, plantas, perfis, croquis

ou relatórios.

Uma vez em laboratório, todo o material recuperado, arqueológico ou não, é analisado

utilizando-se para isso “todo” o conhecimento técnico existente, para cada um destes tipos de

material. Lembramos que esta etapa não tem por objetivo analisar um ou outro material,

especificamente, mas estudar, através deles, o contexto histórico, social, econômico, cultural,

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21

etc., no qual foram produzidos, utilizados, descartados e recuperados. Isso significa revelar,

entre outras coisas, a tecnologia da sociedade que os produziu.

Assim, quando houver a necessidade de um estudo mais aprofundado, especialistas

poderão ser procurados, uma vez que acreditamos não ser essa a tarefa do arqueólogo, e com

isso produzir os dados necessários para o avanço do trabalho.

1.1.2 - o instrumental teórico

Como dezenas de pequenos grupos indígenas brasileiros, principalmente os

considerados de língua isolada, dos índios Puri e Coroado existem poucos e frágeis relatos.

Considerados selvagens e sem alma, como o restante dos indígenas americanos, além

de muito ferozes, resistentes e de difícil contato, até o século XVII, esses grupos são muito

pouco citados e/ou descritos por viajantes e cronistas. A partir do século XVIII, com a

ocupação mais intensa do território brasileiro e com a chegada, em maior número, de

viajantes com o intuito de identificar, catalogar e descrever a fauna, a flora e a geografia da

região, essa situação passou a se modificar.

Nos séculos XIX e XX, a Antropologia e a Etnologia estiveram mais voltadas para os

grupos maiores e “mais ricos” culturalmente. O aldeamento, pacífico, acabou por ser a única

saída para alguns grupos, como foi o caso dos Coroado de São Fidélis. Aos Puri, grupos

mais rebeldes, nem mesmo sua extinção foi motivo de notícias. Hoje, raríssimos

remanescentes escondem sua descendência. Quadro caótico para grupos que dominaram

parte dos sertões dos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.

No que diz respeito ao conhecimento sobre os grupos indígenas Puri e Coroado, as

informações existentes dão conta, de modo geral, de suas origens e de sua distribuição

geográfica. Os autores que mais e melhor discorrem sobre esses assuntos são Eschwege11,

Wied12, Carvalho13, Casal14, Reis15, Senna16 e Burmeister17. Outras informações, como as de

11 - ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig. Diário do Brasil ou notícias diversas acerca do Brasil (Journal von Brailien), Edição do GR. H. S., Landes Ind. Comp., Weimar, 1818.

Tradução da Dra. Lúcia L. Lahmeyer, Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, 1946.

12 - Op. Cit.

13 - CARVALHO, Augusto de. Apontamentos para a história da Capitania de São Thomé, Typ. e Lith. de Silva, Carneiro e Co., Campos, 1888.

14 - Op. Cit.

15 - REIS, Paulo Pereira dos. O Indígena do Vale do Paraíba: apontamentos históricos para o estudo dos indígenas do vale do Paraíba e regiões circunvizinhas, Coleção

Paulística, volume XVI, Governo do Estado de São Paulo, 1979.

16 - SENNA, Nelson Carneiro de. A terra mineira (chorographia do estado de Minas Geraes), Imprensa Oficial do Estado de Minas Geraes, tomo I e II, Belo Horizonte,

1926.

17 - BURMEISTER, Hermann. Índios e sertões do Pomba. In: Revista do Archivo Público Mineiro, volume III, Belo Horizonte, Imprensa Oficial do Estado de Minas

Gerais, 1987, pp. 761-765.

BURMEISTER, Hermann. Viagem ao Brasil através das Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais, São Paulo, Livraria & Editora Matins, 1952.

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cunho etnográfico, que dêem conta da cultura, do modo de vida, da estrutura física, da

estrutura social e de suas relações internas e externas, entre outras coisas, não são comuns.

Dessa forma, para trabalharmos estes dois grupos indígenas, é necessário estabelecer

qual nosso entendimento sobre questões e relações como o método científico, a ciência e a

história, uma vez que nossa concepção da Arqueologia, é de uma ciência que tem por base a

História. A partir disso, nossas principais categorias de trabalho têm sido, até o momento, o

espaço físico, o espaço temporal, a tecnologia, a totalidade e o cotidiano.

Metodologicamente falando, o trabalho está elaborado em termos da análise de um

processo, que é histórico, e que merece, portanto uma análise histórica, em todos os seus

sentidos e não apenas no sentido técnico. É importante mencionarmos o fato de que a

metodologia está sendo entendida por nós como os meios práticos e teóricos pelos quais um

pesquisador busca resolver determinado problema, ou tratar determinado objeto de estudo.

Assim, entendemos, como Becker18, que

“A metodologia é importante demais para ser deixada aos metodólogos.”. p.17

e também que

“... a metodologia é assunto de todos os cientistas sociais, ...”. p.9

Da mesma forma, a parte técnica do trabalho deve estar, sempre, de acordo com a

teoria proposta, uma vez que acreditamos ser ela quem determina a técnica e que por sua vez

nos permite chegar ao objeto proposto. Neste sentido, Cassirer19 nos diz que

“Os objetos primeiros e imediatos do nosso conhecimento histórico não são coisas ou eventos, mas documentos ou monumentos.”. p. 285

e que

“O historiador precisa aprender a ler e a interpretar os documentos e monumentos não apenas como restos mortos, mas como mensagens vivas do passado, mensagens que se dirigem a nós com uma linguagem própria. ... Se o historiador não conseguir decifrar a

18 - BECKER, Howard S.. Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais, Tradução de Marco Estevão e Renato Aguiar, Editora hucitec, São Paulo, 1993.

19 - CASSIRER, Ernest. Ensaio Sobre o Homem - Introdução a uma filosofia da cultura humana, Tradução Tomás Rosa Bueno, Coleção Tópicos, Editora Martins Fontes,

São Paulo, 1994.

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mensagem simbólica dos monumentos, para ele a história continuará sendo um livro fechado.”. p. 289

Portanto, os pressupostos teóricos, metodológicos e técnicos a serem utilizados para a

atingir nossos objetivos e assim melhor compreender nosso objeto de trabalho deverão seguir

estes parâmetros mínimos, incluindo neste sistema o que está sendo chamado neste momento

de “ciência da complexidade”, que segundo Lewin20,

“... tem a ver com a estrutura e a ordem.”. p. 22

e que

“Nos sistemas não-lineares (A maior parte da natureza, entretanto, é não-linear, não sendo facilmente previsível.), estímulos pequenos podem levar a conseqüências dramáticas ... diferenças mínimas nas condições iniciais produzem resultados muito diferentes.”. p. 23

Em nosso objeto de estudo, identificamos exatamente esta questão, onde, por

trabalharmos com um documento material, verificamos que a menor mudança, por mais

insignificante que possa parecer, pode mudar toda uma estrutura até então planejada.

Dessa forma, é importante o uso do maior número de tipos de fontes possíveis, que

possam fazer referência ao tema. Por este motivo, estamos trabalhando com três tipos

específicos de fontes:

1. a fonte escrita, nosso ponto de partida para a obtenção de informações que dêem conta de

sua origem, sua localização, sua dispersão;

2. a fonte oral, que servirá para confirmar e identificar, ou não, as informações obtidas junto

às fontes escritas;

3. a fonte cultural, na qual estarão representadas naquele local identificado pelo arqueólogo

como sendo o sítio arqueológico.

Quanto ao procedimento técnico, de cunho puramente arqueológico, nossa proposta é

trabalhar, sempre que possível, com uma escavação por pisos de ocupação, onde a

recuperação das estruturas, da maneira mais minuciosa possível, é um dos fatores mais

importantes e fundamentais na etapa de campo. É exatamente este tipo de escavação, e

somente ela, que vai permitir trabalharmos com as questões de espaço, tempo e cotidiano de 20 - LEWIN, Roger. Complexidade, a vida no limite do caos, Tradução de Marta Rodolfo Schmidt, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1994.

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determinada sociedade dentro de um sítio arqueológico. Além dela, também o trabalho de

laboratório é fundamental, uma vez que será ele quem reconstituirá, a partir da análise técnica

do instrumental e dos subsídios do trabalho de campo, o modo de vida daquela sociedade em

estudo.

A Arqueologia, ciência que ainda hoje está baseada na técnica, apesar de todos os

ensaios teóricos, seja para a recuperação dos restos deixados sobre o terreno pelo homem e

pela natureza, seja para a análise desses restos, tem sofrido muito com a falta de um método

que ultrapasse essa questão. A prova está em que o material cerâmico, o material lítico, os

restos humanos diretos, os restos alimentares, bem como todo e qualquer elemento recuperado

durante uma escavação arqueológica têm um tratamento técnico a cada dia mais aprimorado,

mais detalhado, a fim de que possam oferecer, se não todas, ao menos uma grande parte das

informações que contêm, para explicar o próprio material e nunca recompor a sociedade da

qual fazem parte. Sobre isto, vale citar Cardoso21 quando diz, ao ser perguntado sobre a

superespecialização tão habitual no meio da História, que:

"... minha crítica hoje em dia é quanto àqueles que fazem uma superespecialização em que se sabe quase tudo sobre quase nada e fora do contexto. São pessoas que sabem muito sobre um assunto específico, conhecem bem as fontes, mas até o contexto de época desconhecem.". p. 6

Isso, concordando com os arqueólogos que dizem não ter a Arqueologia um método

próprio, é devido a falta de um método que tenha por base o homem, a sociedade. O que há

na realidade, são pesquisas utilizando-se de métodos diversos, e até mesmo da mescla de

alguns, segundo a preferência ou interesse de cada pesquisador, trazidos de outras áreas do

conhecimento, sem no entanto delas comungarem.

Nós, por acreditarmos ser a Arqueologia uma ciência histórica que tem como objeto de

estudo, principalmente as sociedades pré-históricas, propomos o uso, como base para o

entendimento dessas sociedades, de um metodologia da História. Para explicarmos melhor o

que estamos dizendo, vale citar Childe22, quando diz que

"Desde o seu aparecimento, o homem tem continuamente procurado não só o controle da natureza como também a organização desse controle em sociedade. Os resultados de tais tentativas encontram-se, por um lado, no arquivo arqueológico - relíquias e monumentos do

21 - CARDOSO, Ciro Flamarion. Entrevista ao Jornal História & Memória, número 4 - junho, UFRJ, Rio de Janeiro, 1998.

22 - CHILDE, Very Gordon. Teorias da História, coleção Problemas, volume 7, Portugália Editora, Lisboa, 1964.

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passado - e, por outro, nos documentos transmitidos oral ou pictoricamente e ainda, o melhor de todos, por escrito. A História deve ser o estudo científico desses documentos. Deve constituir uma ciência do progresso, embora não necessariamente uma ciência exata, como a Física, nem uma ciência abstrata descritiva, como a Anatomia. Deve, por outras palavras, senão revelar as leis matemáticas ou um esquema geral estático, pelo menos uma ordem tão inteligível por si mesma como a da Astronomia ou a da Anatomia." p. 15

Dessa forma, a pesquisa, desde o momento de sua preparação até a sua conclusão,

passando pela análise, onde estão incluídos o trabalho de campo, que não deixa de ser uma

análise, e a análise propriamente dita, dos elementos recuperados, deve levar em consideração

que o objetivo é a recuperação, total ou em parte, de uma sociedade, histórica, e não apenas de

elementos isolados e na maioria das vezes sem nexo, já que ao serem recuperados sem elevar

em consideração o contexto do qual fazem parte, não passarão de simples objetos ou

utensílios pertencentes a uma sociedade qualquer e não àquela sociedade específica.

Assim, por acreditarmos ser esse processo todo, um processo histórico que merece

uma análise histórica, em todos os sentidos e não apenas no sentido técnico, propomos o uso

de uma metodologia da História para melhor analisá-lo e entendê-lo. Para isso, escolhemos o

materialismo histórico, método capaz de, em nosso entender, tratar o sítio arqueológico

respeitando a realidade da sociedade ali existente, procurando explicá-lo como parte, ou

componente, de um todo, de uma sociedade.

O uso do materialismo histórico no estudo das sociedades pré-históricas, ou

primitivas, não é algo recente como pode-se imaginar. Desde Childe23, o primeiro no

Ocidente a usar suas idéias e seus princípios, embora não em sua plenitude, até os jovens

cientistas de hoje, tem-se procurado manter a linha básica de pensamento e sempre que

possível inserir outros elementos que auxiliem, não apenas na manutenção, mas também na

sua adaptação e aprimoramento. Nesse ponto, concordamos com Lênin24 quando diz

“ ... não considerar, em absoluto, a teoria de Marx como algo acabado e intangível; estamos convencidos, pelo contrário de que esta teoria não tem feito senão colocar as pedras angulares da ciência que os socialistas devem impulsionar em todos os sentidos ... ”. p. 210

e Netto25 que diz que

23 - CHILDE, Very Gordon. La evolución social, Alianza Editorial, Madrid, 1973.

24 - LENIN, Vladimir Ilyich. Nuestro Programa, Editorial Cartago, 1899.

25 - NETTO, José Paulo. O que é marxismo ?, Editora Brasiliense, Coleção Primeiros Passos, número 148, São Paulo, 1985.

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“ ... os que se limitam à citações dos “clássicos” e `a repetição das velhas formulas caem, necessariamente, no folclore ideológico. É a História mesma que passa a exigir um “retorno a Marx” ou - sob a inspiração não de suas conclusões, mas de seu método - o que Lukács denominou de “renascimento do marxismo”. ”. p. 68

Assim, categorias como formação social, modo de produção, forças produtivas e

relações sociais, entre tantas outras, perdem aquele caráter rígido, ortodoxo, e com

perspectivas puramente de luta de classes que lhes são características, e passam a ter um

caráter universal, amplo e com aplicabilidade em qualquer sociedade, estando ela viva ou

morta.

Dessa forma, pensando o sítio arqueológico, nosso ponto de partida e o local no qual

estão representadas as sociedades das quais se ocupa o arqueólogo, não como o local onde o

homem pré-histórico deixou seus restos, mas como sendo esse local apenas parte de um

espaço maior, organizado, onde uma determinada sociedade viveu, é que iremos trabalhar.

Essa concepção, deve-se ao fato de considerarmos o homem como um ser que vive em

sociedade e ocupa espaços, os quais são utilizados de acordo com sua necessidade, tendo cada

sociedade suas necessidades específicas. Por isso, acreditamos que o sítio arqueológico não

seja apenas o local onde encontramos elementos de uma sociedade, mas todos os espaços

utilizados por ela, espaços que por sua vez compõem-se de locais que têm aspectos distintos e

podem, até mesmo, estarem subdivididos, conforme proposto no anexo 1.

Além disso, devemos acrescentar que dentro dessa nossa concepção de sítio, um

mesmo local ocupado pelo homem, como por exemplo um abrigo ou uma caverna, pode ter

sido ocupado por mais de uma sociedade e que nesse caso devem ser percebidas, se possível,

quando da escavação e estudadas separadamente, pois seriam dessa forma, sítios

arqueológicos distintos.

Com isso, não temos mais um sítio rupestre, um sítio lítico, um sítio cerâmico e tantos

outros, mas sim uma sociedade ocupando um espaço dentro do qual encontramos seu local de

produção, de habitação, de cerimonial, etc.. Portanto, quando identificarmos um desses

locais não podemos perder de vista que ele representa apenas uma parte de determinada

sociedade e que não deve, quando de sua conclusão, ser dado como resultado final daquela

sociedade, uma vez que ela não desapareceu, apenas mudou de local, foi habitar outro espaço,

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27

talvez com novas forças produtivas, novas relações sociais, novas condições naturais. A esse

respeito, temos Marx26 que diz que

“ Na produção social de sua vida, os homens estabelecem relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade, relações de produção que correspondem a um determinado grau de desenvolvimento de suas forças materiais ... em certo estágio de desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ... de formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações transformam-se no seu entrave. Surge então uma época de revolução social ... uma organização social nunca desaparece antes que se desenvolvam todas as forças produtivas que ela é capaz de conter; nunca relações de produção novas e superiores se lhe substituem antes que as condições materiais de existência destas relações se produzam no próprio seio da velha sociedade.”. p. 24

Por isso, acreditamos ser importante seguir uma formação social, para entendermos

essas mudanças e vermos como a sociedade as absorveu. A partir dessa concepção,

conforme Sonoja27,

“ ... poderíamos establecer que um sítio arqueológico está compuesto por materiales de diversa naturaleza, origem y significacion. ”. p. 35

e que

“ ... no es pues, una asociacion casual de artefatos, sino un conjunto de asociaciones de artefatos, aspectos y áreas de actividad cuya estructura representa la organizacion de la vida cotidiana de um grupo de individuos reunidos también para cumplir tareas objetivas y concretas dentro de un espacio conscientemente delimitado. ” p. 41

Dessa forma, buscamos, em nosso trabalho, demonstrar e analisar a racionalidade

existente, e evidenciada, pelos elementos provenientes, ou resultantes, das relações entre a

sociedade e a natureza, entre a sociedade e o meio em que vive e entre a sociedade com outras

sociedades e/ou regiões, espaços, meio, etc..., ou seja, conforme Marx28, a de que estes

elementos, que representam a ação dos indivíduos em sociedade

26 - MARX, Karl. Contribuição à crítica da economia política, Editora Martins Fontes, Coleção Novas Direções, São Paulo, 1983.

27 - SONOJA, Mario. La inferencia en la arqueologia social. In: Boletín de antropologia americana, Instituto Panamericano de Geografia e História, Cidade do México, 10

-diciembre, 1984, pp. 35-44.

28 - MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã, Editora Moraes, São Paulo, 1984.

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"... são representações ou da sua relação com a natureza ou da sua relação uns com os outros, ou sobre a sua própria natureza." p. 21

1 - relações entre a sociedade e a natureza, seu principal obejto de trabalho, entendendo-se

a natureza, aquí, como o ser do qual a sociedade depende e de onde obtem os

elementos para sua produção e reprodução física e social. Os elementos que

evidenciam estas relações que acabamos de mencionar aparecem:

1.1 - Através do solo, no qual estão representadas as mudanças climáticas,

faunísticas, topográficas, geológicas, etc. e de onde pode-se obter informações

a respeito de processos climáticos, geomorfológicos e paleobotânicos, entre

outros.

1.2 - Através da topografia, onde pode-se inferir o modo como o espaço no qual a

sociedade estava assentada foi utilizado, sendo possível, até mesmo, o

levantamento de seus limites territoriais, o potencial de consumo desse

território, etc..

1.3 - Através da flora, atual e passada. A flora atual, será usada como elemento

referêncial no estudo das modificações ambientais provocadas pelo clima, pela

natureza e/ou pelo homem no decorrer do tempo. A flora passada, recuperada

durante a escavação dos sítios arqueológicos, seja pelos pólens, sementes,

fibras, etc., nos dará os elementos para inferirmos a seu respeito naqueles

períodos com os quais trabalha-se, da evolução de determinadas espécies, da

flora da região e modo de processamento de alguns de seus elementos,

principalmente através dos instrumentos de produção que puderem ser

recuperados.

1.4 - Através da fauna, atual e passada. A fauna atual será usada como excelente

elemento referencial para comparação, bem como de índices para a evolução

das espécies. A fauna passada serve para identificarmos as espécies

consumidas ou abatidas, existentes no período com o qual trabalhamos. Serve

também para inferirmos quanto as técnicas de apropriação desses animais,

quanto as possíveis estratégias de trabalho do grupo em relação à exploração

do meio em que vivia, os recursos utilizados na transformação dessa matéria

prima para consumo do grupo e os ambientes de exploração e/ou o período em

que isso ocorreu.

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2 - relações entre a sociedade e o meio em que vive, entendendo-se como meio, o espaço

do qual a sociedade se utiliza para sua produção e reprodução e onde estão melhor

representados, entre outras, as relações sociais. Entendemos essas relações sociais,

que são determinadas pelo estágio das forças produtivas e que por sua vez estão

intimamente relacionadas à evolução técnica, como sendo as relações existentes ou

estabelecidas entre indivíduos, sociedade e natureza, no processo de produção, troca,

consumo e distribuição dos bens necessários para a manutenção e reprodução da

sociedade;

Neste segundo caso, as evidências são identificadas nos espaços que compreendem o

seu território, o qual deve ser identificado, sempre que possível, com brevidade, e que serve

para determinar a área de exploração daquela formação social, o que auxiliará na

compreensão das relações entre a sociedade e a natureza.

Um território, em nosso entendimento, compreende três tipos de espaços: de

habitação, de reprodução e de cerimonial. O espaço de habitação, onde se desenvolve a vida

de um grupo, que poderá ser permanente ou temporário, será composto por locais de

produção, de cerimonial e doméstico, este último considerado por nós como o local de maior

importância na organização espacial de uma sociedade e com o qual o arqueólogo trabalha

direta e intensamente. Esses locais são por sua vez, constituídos por áreas de atividades

diferenciadas, como as de circulação, dormida, alimentação, produção e cerimonial.

Os espaços de produção representam os mais diversos momentos da produção lítica,

cerâmica, alimentar, artística ou outra qualquer. Esses espaços são específicos e representam,

normalmente, uma única atividade. Como exemplo, podemos citar entre outros, as oficinas

líticas, os locais de confecção de cerâmica, os locais de descarnamento da caça e os locais de

pintura e/ou gravura rupestre.

Por sua vez, os espaços de cerimonial, como os espaços de produção, também são

específicos e representam uma única atividade, os cemitérios.

Devemos ressalvar ainda, que da mesmo forma que o espaço de habitação, os espaços

de produção e de cerimonial, que têm uma ocupação temporária, também podem apresentar

áreas de atividades que representam aquela sociedade específica e que tem uma ordem

específica, sempre de acordo com a atividade ali estabelecida.

No que diz respeito ao espaço de cerimonial, essas áreas de atividade podem ou não

estar presente. Essa presença dependerá basicamente de alguns fatores, entre os quais, o tipo

de sepultamento e a distância do espaço de habitação.

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Apresentamos em anexo, de forma esquemática, o modo como estamos entendendo o

sítio arqueológico e que representa, na verdade, as diversas possibilidades de organização

espacial de uma sociedade.

3 - relações entre a sociedade com outras sociedades e/ou regiões, espaços, meio, etc...

No terceiro caso, as evidências são encontradas nos restos da sociedade que estiver

sendo estudada, podendo esses elementos serem de natureza diversa, como diz

Sonoja29. Assim, entre eles pode ser recuperado material lítico confeccionado em

matéria-prima que não é encontrada em seu território e que exige uma técnica de

preparo não conhecida pelo grupo; restos de animais não encontrados em sua região;

pintura rupestre representando animais somente encontrados em outras regiões; e

material cultural comprovadamente pertencente a outras sociedades, como por

exemplo uma nova forma cerâmica sem que as forças produtivas daquela sociedade

tenham atingido um estágio que a fizesse necessária.

1.2 - a história como concepção (história, ciência e método científico)

“Estou persuadido de que um dos aspectos da crise do nosso século é o estado de barbárie das nossas idéias, o estado de pré-história da mente humana que ainda é dominada por conceitos, por teorias, por doutrinas que ela produziu, do mesmo modo que achamos que os homens primitivos eram dominados por mitos e por magias. Nossos predecessores tinham mitos mais concretos. Nós somos controlados por poderes abstratos.” (MORIN, Edgar.. Ciência com consciência, Editora Bertrand Brasil, Rio de Janeiro, 1996, p. 193)

Após encaminharmos nossa proposta de trabalho, falar em História, ou a concepção de

História com que estamos trabalhando, poderia tornar-se uma tarefa muito fácil, bastaria

fazermos a transcrição do capítulo I de "A Ideologia Alemão", de Karl Marx e Friedrich

29 - Op. Cit.

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Engels. Mas, como já foi demonstrado em algumas páginas, principalmente em citações, não

podemos ficar apenas com os clássicos, mas fazer uma releitura que possa melhor representá-

los neste tem e neste campo.

Assim, se é verdade, como diz Marx30,que

"A primeira premissa de toda a História humana é, naturalmente, a existência de indivíduos humanos vivos.". p. 14

e que

"O primeiro ato histórico destes indivíduos pelo qual se distinguem dos animais não é o de pensarem, mas o de começarem a produzir os seus meios de vida.". (Marx, p. 14)31,

também é correto dizer, como Marx32 continua afirmando, que

"Aquilo que eles são, coincide, portanto com a produção, com o que produzem e também com o como produzem. Aquilo que os indivíduos são, depende, portanto das condições materiais da sua produção.". p. 15

Desta forma,

"A História pode ser considerada de dois lados, dividida em História da natureza e História dos homens. No entanto, estes dois aspectos não se podem separar; enquanto existirem homens, a história da natureza e a história dos homens condicionam-se mutuamente.". (Marx, p. 11)33

natureza esta que existe somente na medida em que existe o próprio homem, resultado de seu

"desenvolvimento" físico, mental e cultural. Assim,

"O fato de a vida física e espiritual do homem estar vinculada à natureza não tem nenhum outro sentido a não ser o de que esta está vinculada consigo mesmo, pois o homem é uma parte da natureza.". (Médici, p. 9)34

30 - MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã, Editora Moraes, São Paulo, 1984.

31 - MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã, Editora Moraes, São Paulo, 1984.

32 - Op. Cit.

33 - Op. Cit.

34 - MÉDICE, André Cezar. Marx e o meio ambiente. In: Porque Marx ? (Orgs. FIGUEIREDO, E.L.; CERQUEIRA FILHO, G. & KONDER, L..), Editora Graal,

Biblioteca Ciências Sociais, volume 24, Rio de Janeiro, 1983

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e portanto,

"Ao modificar a natureza, o homem transforma em essência sua própria natureza.". (Médici, p. 12)35

Com isto posto, pensar em História significaria pensar, em primeira instância,

necessariamente, nas relações entre o homem e a natureza. Todas as relações deste homem,

em sociedade, teriam como "pano de fundo", a natureza.

Numa análise dos tempos atuais, estas relações, que continuam existindo, são pouco

perceptíveis aos olhos rápidos e desatentos de nosso dia-a-dia quando nas sociedades

construídas nas cidades, principalmente nos grandes centros urbanos. Mas elas podem mudar

totalmente de panorama quando tratamos de sociedades "pré-históricas", como é o caso de

nosso objeto de estudo.

Nestas sociedades, as relações com a natureza estão presentes em todas as situações

cotidianas, seja do indivíduo, seja do coletivo social, e demonstra que

"O indivíduo humano só existe porque existe uma sociedade que lhe permite nascer e crescer, formar-se e desenvolver-se, a partir de uma cultura determinada, com a qual, por assim dizer, ele não pode deixar de "dialogar". ... Não se pode entender o que as pessoas sentem e pensam sem saber como elas vivem, e o que fazem. A vida social - assegurava Marx na oitava Tese - "é essencialmente prática". E prosseguia: "Todos os mistérios que levam a teoria para o misticismo encontram sua solução racional na práxis humana e na compreensão dessa práxis". (Konder, p. 121-122)36

ou seja,

"Pelo simples fato de existir, o homem se coloca em relação com o mundo e esta sua relação subsiste antes mesmo que ele passe a considerá-la e dela faça objeto de investigação, e antes mesmo que a confirme ou a negue prática ou intelectualmente.". (Kosik, p. 196)37

São estes elementos que nos levam, ou nos trazem, a questão maior desta concepção

de História: a dialética e a práxis.

A primeira, a dialética,

35 - Op. Cit.

36 - KONDER, Leandro. O futuro da filosofia da praxis: o pensamento de Marx no século XXI, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1992

37 - KOSIK, Karel. Dialética do concreto, 4a edição, Coleção Resumos da Cultura Moderna, volume 26, Editora Pz e Terra, São Paulo, 1976

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33

"... não é o método da redução: é o método da reprodução espiritual e intelectual da realidade, é o método do desenvolvimento e da explicação dos fenômenos culturais partindo da atividade prática objetiva do homem histórico. (Konder, p. 32)38

onde

"O processo do abstrato ao concreto, como método materialista do conhecimento da realidade, é a dialética da totalidade concreta, na qual se reproduz idealmente a realidade em todos os seus planos e dimensões.". (Kosik, p. 30)39

"A dialética da totalidade concreta não é um método que pretenda ingenuamente conhecer todos os aspectos da realidade, sem exceções, e oferecer um quadro "total" da realidade, na infinidade dos seus aspectos e propriedades; é uma teoria da realidade e do conhecimento que dela se tem como realidade. A totalidade concreta não é um método para captar e exaurir todos os aspectos, caracteres, propriedades, relações e processos da realidade; é a teoria da realidade como totalidade concreta.". (Kosik, p. 36)40

Mas, sem o pleno domínio de um método de investigação adequado e pertinente,

qualquer dialética não passa de mera especulação. Este método de investigação, segundo

Kosik41, compreende três momentos:

"1 - minuciosa apropriação da matéria, pleno domínio do material, nele incluídos todos os detalhes históricos aplicáveis, disponíveis; 2 - análise de cada forma de desenvolvimento do próprio material;

3 - investigação da coerência interna, isto é, determinação da unidade

das várias formas de desenvolvimento.". p. 37

É a partir disso, que a práxis humana, que é cotidiana, objetiva e se baseia no

conhecimento da realidade humana, torna-se elemento da concepção dialética e, portanto,

passível de investigação e de compreensão de sua estrutura social, que por sua vez é

necessária para o conhecimento do todo. A práxis, por sua vez, de acordo com Konder42,

38 - Op. Cit.

39 - Op. Cit.

40 - Op. Cit.

41 - Op. Cit.

42 - Op. Cit.

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34

"... é a atividade concreta pela qual os sujeitos humanos se afirmam no mundo, modificando a realidade objetiva e, para poderem alterá-la, transformando-se a si mesmos. É a ação que, para se aprofundar de maneira mais consequente, precisa da reflexão, do autoquestionamento, da teoria; e é a teoria que remete à ação, que enfrenta o desafio de verificar seus acertos e desacertos, cotejando-os com a prática.". p. 115

ou seja, é toda a ação humana, objetiva e produtiva; é a atividade humana na produção de

algo, entendendo-se por atividade, como Vazquez43,

"... o ato ou conjunto de atos em virtude do qual um sujeito ativo (agente) modifica uma determinada matéria-prima. ... O resultado da atividade, isto é, seu produto, também se dá em diversos níveis: pode ser uma nova partícula, um conceito, um instrumento, uma obra de arte ou um novo sistema social. ... a atividade mostra, nas relações entre as partes e o todo, os traços de uma totalidade concreta.". p. 186

"Neste sentido, podemos dizer que a atividade prática é real, objetiva ou material. ... O objeto da atividade prática é a natureza, a sociedade ou os homens reais. A finalidade dessa atividade é a transformação real, objetiva, do mundo natural ou social para satisfazer determinada necessidade humana. E o resultado é uma nova realidade, que subsiste independentemente do sujeito ou dos sujeitos concretos que a engendraram com sua atividade subjetiva, mas que, sem dúvida, só existe pelo homem e para o homem, como ser social.". (Vazquez, p.194)44

Portanto, pensar em práxis é pensar numa atividade humana cotidiana de forma

dialética e, porque não dizer, contraditória, uma vez que, enquanto a atividade prática

presupõe uma ação efetiva sobre o mundo, que tem como resultado sua transformação real, a

atividade teórica apenas transforma nossa consciência dos fatos, nossas idéias sobre as coisas,

mas não as próprias coisas. Há portanto, neste ponto, como afirma Vazquez45, "... uma

contraposição entre teoria e prática ...".

"Por seu objeto, finalidade, meios e resultados, a atividade teórica se distingue da prática. Seu objeto ou matéria-prima são as sensações ou percepções - ou seja, objetos psíquicos que só têm uma existência

43 - VASQUES, Adolpho Sanches. Filosofia da práxis, 3a edição, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1977.

44 - Op. Cit.

45 - Op. Cit.

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35

subjetiva - ou os conceitos, teorias, representações ou hipóteses que têm uma existência ideal. A finalidade imediata da atividade teórica é elaborar ou transformar idealmente, e não realmente, essa matéria-prima, para obter, como produtos, teorias que expliquem uma realidade presente, ou modelos que prefigurem idealmente uma realidade futura. A atividade teórica proporciona um conhecimento indispensável para transformar a realidade, ou traça finalidades que antecipam idealmente sua transformação, mas num e outro caso fica intacta a realidade efetiva.". p. 202-203

1.3 - o materialismo histórico como método de trabalho

“Muitas vezes a consciência crítica do “principiante” é mais explícita do que a do profissional.” (QUAINI, Massimo.. Marxismo e Geografia, Coleção Geografia e Sociedade, volume 1, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1979, p. 11)

Diante desta perspectiva apresentada a pouco, entendemos que o materialismo

histórico possua uma estrutura capaz de responder, em um nível mais do que satisfatório, às

questões apresentadas no trabalho da arqueologia.

Assim, embora haja um sem número de definições e concepções acerca do

materialismo histórico, e que variam de acordo com a tendência do pesquisador, em apenas

algumas das que conhecemos, talvez por serem mais sucintas e objetivas em suas idéias e

proposições, temos encontrado o que julgamos essencial nessa que consideramos uma teoria

científica, ou seja, um corpo de conceitos sistemáticos de uma ciência, que nos dá os

instrumentos, os meios de trabalho, o intelectual, da teoria marxista da História, que nos

permitem conhecer, cientificamente, uma realidade histórica concreta e determinada, ou seja,

uma sociedade. A primeira delas vem de Engels46, para quem o materialismo histórico

"... designa uma visão do desenrolar da história que procura a causa final e a grande força motriz de todos os acontecimentos históricos importantes no desenvolvimento econômico da sociedade e nas transformações dos modos de produção e de troca, na consequente divisão da sociedade em classes distintas e na luta entre essas classes."

46 - ENGELS, Friedrich

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Para Harnecker47, simplista e reducionista,

"... o materialismo histórico é uma teoria científica e ... como toda a teoria, não nos da nenhum conhecimento concreto, mas nos dá os meios (instrumentos de trabalho intelectual) que nos permitem alcançar um conhecimento científico dos objetos concretos." p. 205

Afanássiev48, por sua vez, ferrenho marxista-leninista,

"... o materialismo histórico, ao contrário das ciências concretas sobre a sociedade, estuda as leis mais gerais do desenvolvimento social. Segundo uma parte inalienável da concepção marxista-leninista do mundo, o materialismo histórico oferece uma interpretação científica, dialético-materialista dos fenômenos da vida social." p. 193

"No processo do estudo do desenvolvimento da sociedade, o materialismo histórico elabora também as respectivas categorias e noções que refletem os aspectos mais gerais e essenciais do desenvolvimento social." p. 194

Quiroga49 por sua vez, em uma análise histórica, diz que

"O materialismo histórico é um avanço do materialismo filosófico, estendendo o conhecimento da natureza ao conhecimento da sociedade humana e mostrando a significação do desenvolvimento das forças produtivas no florescimento de uma forma de vida social superior, gestada na forma anterior." p. 65

Já em Plekhânov50, o melhor conhecedor de Hegel entre os marxistas, segundo Lenin,

"O marxismo é toda uma concepção do mundo. Em poucas palavras, é o materialismo contemporâneo que representa o mais alto grau daquela concepção do mundo, cujas bases foram lançadas, na velha Hélade, por Demócrito, assim como pelos pensadores, seus precursores. O hilozoismo não é, pois, outra coisa que um materialismo ingênuo. O mérito principal de ter recuperado e formulado os princiípios fundamentais do materialismo moderno pertence incontestavelmente a Karl Marx e Friedrich Engels." p. 7

47 - HARNECKER, Marta. Os conceitos elementares do materialismo histórico, 2a edição, Coleção Bases - teoria, volume 36, Global Ed., São Paulo, 1983.

48 - AFANÁSSIEV, V.G.. Fundamentos da filosofia, Edições Progresso, Moscou, 1985

49 - QUIROGA, Consuelo. Invasão positivista no marxismo: manifestações no ensino da metodologia no Serviço social, 3a edição, Editora Cortez, São Paulo, 1991.

50 - PLEKÂNOV, Guiorgui V.. Os princípios fundamentais do Marxismo, 2a edição, Coleção Pensamento Socialista, Editora Hucitec, São Paulo, 1989.

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37

Portanto, conceber o materialismo histórico como método de trabalho é antes de mais

nada, como nos diz Fleischer51, conceber o homem

"... como um ser natural, com uma organização particular, que realizou a sua atividade vital de uma forma especial e que vive com grupos sociais." p. 94-95

A partir disso, é a integração deste homem com a natureza que tornará o materialismo

histórico um método de análise capaz de dar conta de suas mais diversas formas e relações.

Sem o homem não existe a sociedade e portanto a História. Por outro lado, sem a natureza,

não existe o homem e sem isso a possibilidade da existência, mais uma vez, da História. Isso

se explica na medida em que o processo de reconstrução histórica contido nele leva em

consideração estes dois elementos: o homem e a natureza, pregados principalmente na

Ideologia Alemã de Marx & Engels, onde ambos estão em relação constante, mediados pelo

trabalho. Relação essa que, conforme diz Caldas Filho52, é necessariamente histórica.

Também para Sonoja53

"En el materialismo histórico, las condiciones mesoambientales constituyen, por el contrario, una mediación, una posibilidad para el alejamiento de los hombres de las condiciones de la economia natural, alejamiento que se produce en la medida en que las relaciones entre instrumentos y medios de producción, condiciones de la fuerza de trabajo conducen a una mayor efectividad y continuidad de la producción, de manera que cada acto de la producción se convierta, motivado a su contínua repeticón, en un acto de reproducción, esto es, que la sociedade no solamente reproduzca sus medios de subsistencia, sino que esa producción no se detenga y que cuando se renueve no se produzca sienpre en la misma escala." p. 34

Dessa forma, de acordo com Caldas Filho54,

"A primeira conseqüência metodológica é que o objeto da arqueologia necessariamente deverá ser a estrutura social, isto é, a sociedade como um todo e não partes-significativas, partes-restantes ou restos. ... é preciso apreender os vestígios materiais enquanto estrutura e não como restos soltos ou parcialmente somados." p. 63

51 - FLEISCHER, Helmut. Concepção Marxista da História, coleção Lugar da História, volume 3, Edições 70, Lisboa, 1978.

52 - CALDAS FILHO, Alberto Frederico Lins. A sedução do espelho (avaliação epistemológica da arqueologia brasileira), Dissertação de Mestrado, Universidade Federal

de Pernambuco, Recife, 1991.

53 - SONOJA, Mario. La inferencia en la arqueologia social. In: Boletín de antropologia americana, Instituto Panamericano de Geografia e História, Cidade do México, 10

-diciembre, 1984, pp. 35-44.

54 - Op Cit.

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38

Sem um método histórico, perde-se o sentido da estrutura social, das relações entre o

homem e a natureza, da construção histórica presente no documento arqueológico. Será o

materialismo histórico, em nosso caso que trará estes elementos, analisados sempre sob uma

ótica concebida pela dialética e numa perspectiva histórica, uma vez que estas sociedades são

únicas.

1.4 - as categorias de trabalho

"... as categorias não são elementos de uma arquitetura hierárquica e sistemática. Ao contrário, são na realidade "formas de ser, determinações da existência", elementos estruturais de complexos relativamente totais, reais, dinâmicos, cujas inter-relações dinâmicas dão lugar a complexos cada vez mais abrangentes, em sentido tanto extensivo quanto intensivo." (Lukács55, p. 28)

1.4.1 - o espaço físico

O espaço físico está sendo visto por nós, como Lefébvre56, como

“... o locus da reprodução das relações sociais de produção”,

ou seja, de acordo com Corrêa57,

“Uma sociedade só se torna concreta através de seu espaço, do espaço que ela produz e, por outro lado, o espaço só é inteligível através da sociedade. Não há, assim, por que falar em sociedade e espaço como se fossem coisas separadas que nós reuniríamos a posteriori, mas sim de formação sócio-cultural.”. pp. 26-27

Dessa forma, segundo Santos58,

55 - LUKÁCS, George. A ontologia do Ser Social: a falsa e a verdadeira ontologia de Hegel, Livraria Editora Ciências Humanas, São Paulo - SP, 1979

56 - LEFÉBVRE, Henri. Espacio y política, Ediciones Peninsula, Barcelona - Espanha, 1973.

57 - CORRÊA, Roberto Lobato. Espaço: um conceito-chave da geografia. In: Geografia: Conceitos e Temas, Orgs. CASTRO, I.E.; GOMES, P.C.C. & CORRÊA, R.L.,

Editora Bretrand Brasil, Rio de Janeiro, 1995, pp. 15 -47.

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“... o espaço deve ser analisado a partir das categorias estrutura, processo, função e forma, que devem ser consideradas em suas relações dialéticas.”

Assim, o sítio arqueológico não deveria ser visto apenas como o local onde aparecem

restos materiais de uma dada sociedade, e que estaria sendo escavado, mas a área geográfica

que aquela sociedade que o produziu teria ocupado. Caberia ao arqueólogo recuperar,

durante as escavações e as análises espaciais, elementos, materiais e imateriais, que indiquem,

ou possam sugerir, a extensão e os limites deste espaço.

É assim, portanto, que deveriam ser buscados os locais de sepultamento; as possíveis

fontes de matéria-prima para o instrumental lítico e o vasilhame cerâmico; os possíveis locais

de caça, de coleta de determinados elementos vegetais e de "produção artística", entre outros,

daquela sociedade.

Com isso estaríamos evitando a existência de vários sítios arqueológicos numa mesma

área, cada um deles com uma função diferente, quando poderiam fazer parte de uma mesma

sociedade que ocupou aquele espaço em um determinado momento de tempo e portanto serem

partes de um mesmo sítio arqueológico. Concordamos com o que nos fala Binford59,

"... uno de los Grandes Interrogantes que los arqueólogos intentan normalmente dilucidar es la forma en que el hombre primitivo organizaba su espacio de vida; es decir, conocer la ubicación y relación espacial de actividades tales como dormir, comer, conseguir alimentos, elaborar útiles, etc. Queremos saber hasta qué punto el hombre primitivo hizo un uso adecuado y especializado del espacio." p. 154

Além disso, falando de sua experiência etnoarqueológica realizada junto aos

Nunamiut, no Alaska, Binford60 nos diz que:

"... los arqueólogos deben recalibrar la perspectiva que poseen de los cazadores y recoletores en función de una unidad de excavación de 0,5 m2 y trasladaria a un área de mas de 300.000 km2. Si descontamos ciertos casos excepcionales, que se dan en las zonas ecuatoriales, esta área de enormes dimensiones representa la amplitud del domínio del medio ambiente por parte de un grupo típico de cazadores-recoletores, compuesto quizá por sólo treinta o cuarenta personas. La banda raras

58 - SANTOS, Milton. Espaço e Método, Editora Nobel, São Paulo, 1985.

59 - BINFORD, Lewis R. En buca del passado, decifrando el registro arqueológico, 3a edición, Editora Crítica, Barcelona, 1994.

60 - Op. Cit.

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40

veces explota todo el espacio en un momento dado, pero necesita disponer de toda la región para contar com un surtido de opciones seguro. Com el fin de comprender cómo una banda reducida de personas se servía de un espacio tan grande, creo que puede se útil un examem inicial de la unidad espacial utilizada por un grupo durante una estación, demonstrando a continuación cómo las variaciones observadas en dicha unidad durante un largo período de tiempo están relacionadas com la explotación de una región de grandes dimensiones." p. 118

Vale fazer, ainda, três observações. Em primeiro lugar de que cada sociedade, dentro

de seus conhecimentos, concebe o espaço geográfico de uma forma, o que faz com que não

tenhamos duas formas de ocupação iguais, principalmente quando se tratar de um espaço

temporal diferente. Em segundo lugar, de que um mesmo espaço físico poderia possuir dois,

ou mais, sítios arqueológicos, ou seja, poderia possuir duas, ou mais, sociedades ocupando-o,

mas sempre em momentos de tempo distintos e por conseqüência com formas de ocupação

diferentes. Finalmente, que não estamos mudando a conceituação existente, na arqueologia,

para sítio61 ou sítio arqueológico62, mas propondo uma nova forma de olhar para aquele local,

entre tantos outros, que foi ocupado por uma determinada sociedade, em um determinado

tempo.

1.4.2 - o espaço temporal

O espaço temporal, por sua vez, está sendo tratado de acordo com o que pensam

Coveney & Highfield63, principalmente quando colocam sobre a possibilidade de um “tempo

cultural”, onde

“A idéia de um tempo direcional nem sempre existiu. As marés, os solstícios, as estações e os movimentos cíclicos dos corpos celestes levaram muitas sociedades primitivas a encarar o tempo em termos de ritmos orgânicos, como se tivesse uma natureza basicamente circular. Essas sociedades achavam que, já que o tempo era inseparável dos movimentos circulares dos céus, ele, em si, era circular. O dia vem depois da noite, a lua vem depois da cheia, o verão vem depois do inverno: por que não pode acontecer a mesma coisa com a história ?” p. 21

61 - "Designação genérica para o local onde se encontram testemunhos arqueológicos de quaisquer gêneros." MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro..

Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, p. 117.

62 - "Local onde se encontram restos de cultura passada." MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro.. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997,

p. 117.

63 - COVENEY, Peter & HIGHFIELD, Roger. A flecha do tempo, Tradução de J.E. Smith Caldas, Editora Siciliano, São Paulo, 1993.

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41

Esta concepção, que é um fato, é cultural e por este motivo muda de uma sociedade

para outra. Toda a sua estrutura estará ligada e/ou voltada para esta concepção. Entendemos

que será com estas concepções que estaremos trabalhando quando estivermos escavando um

sítio arqueológico, quando estivermos trabalhando com uma sociedade determinada, de um

dado tempo e de um dado espaço.

Este tempo deverá, sempre que possível, ser constatado, verificado, checado, junto a

todo o tipo de documentos, não importando sua procedência. Eles trarão, sempre, elementos

de temporalidade, de forma absoluta ou relativa, e que poderão ser associados aos resultados

que estão sendo produzidos quando do trabalho com o sítio arqueológico.

1.4.3 - a tecnologia

A tecnologia é, em nosso entender, uma das mais importantes categorias de trabalho a

ser utilizada pelo arqueólogo, uma vez que, de acordo com Marx64, é ela quem vai

“ ... revelar o modo de proceder do homem para com a natureza, o processo imediato de produção de sua vida e assim elucida as condições de sua vida social e as concepções mentais que delas decorrem.” p. 425

Em outras palavras, Médice65, diz que

“ ... a tecnologia de um dado tempo revela a forma pela qual se dá a relação homem x natureza num momento da história.” p. 12

Assim, a tecnologia, em nosso trabalho, não é o estudo sistemático e analítico de um

tipo de material recuperado pelo arqueólogo, mas a análise do processo que o produziu e que

serviu para manter aquela sociedade naquele espaço e naquele tempo, ou seja, o conhecimento

daquela sociedade na produção de sua vida. Dessa forma, não temos mais um tecnologia

lítica, uma tecnologia cerâmica e tantas outras, mas um conhecimento que fez com que aquela

sociedade pudesse produzir, não apenas aquele material específico, mas aquele modo de vida,

naquele tempo e naquele espaço.

64 - MARX, Karl. O capital, crítica da economia política, Tradução de Reginaldo Sant’Anna, livro primeiro, volume , Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1968.

65 - MÉDICE, André Cezar.. Marx e o meio ambiente. In: Porque Marx ? (Orgs. FIGUEIREDO, E.L.; CERQUEIRA FILHO, G. & KONDER, L..), Editora Graal,

Biblioteca Ciências Sociais, volume 24, Rio de Janeiro - RJ, 1983.

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42

Utilizando-nos, novamente, de Marx, poderiamos dizer estar recuperando o modo de

produção daquela sociedade. O modo de produção que é, talvez, a categoria mais utilizada,

debatida e conceituada de todas com que trabalha o materialismo histórico. Do ponto de

vista clássico, modo de produção seria um conceito puramente teórico, que se refere a

totalidade social dominante e que estaria constituído pelos níveis ideológico, jurídico-político

e econômico, este último, seu elemento determinante. De acordo com Meillassoux66,

"Os seres humanos, por serem os únicos agentes da economia, a única fonte de energia, o único meio de produção, e de reprodução, constituem o polo de todas as relações econômicas.". p. 223

Na realidade, o modo de produção, que depende basicamente das forças produtivas e

está caracterizado pelo grau de desenvolvimento dessas forças, é a expressão concreta de uma

totalidade social historicamente determinada, entendendo-se por esta totalidade a realidade

como um todo estruturado, dialético, e no qual um fato qualquer pode vir a ser racionalmente

compreendido.

Entendendo modo de produção como um sistema determinado, entre outras, pelo

processo de trabalho67, pela relação social de produção68, pelo estágio das forças produtivas e

pelos meios de produção69, poderíamos ter, para a pré-história, basicamente dois modos de

produção: o caçador-coletor e o agricultor, tendo o primeiro um modo de vida comunitário

simples ou apropriador e o segundo um modo de vida tribal ou produtor.

As forças produtivas, que são o indicativo maior dos estágios de desenvolvimento da

sociedade com a qual estivermos trabalhando, graças ao desenvolvimento dos meios de

trabalho70 desenvolvem-se constantemente, aperfeiçoando-se no decorrer do tempo. Elas, as

forças produtivas, que representam a soma dos meios de produção - que por sua vez são o

somatório dos objetos de trabalho71 e dos meios de trabalho, estes, divididos, para um melhor

66 - MEILLASSOUX, Claude.. Antropologie econômique des Gouro, Mouton Editeur, Paris, 1964.

67 - Seria todo o processo de transformação de uma determinada matéria em um produto, através de uma atividade humana, utilizando-se de instrumentos de trabalho. Todo

processo é constituído, fundamentalmente, pela força de trabalho, pelos objetos de trabalho e pelos meio de trabalho.

68 - Seria a relação restabelecida ou existente entre os indivíduos da sociedade, no processo de produção, troca, consumo e distribuição, ou seja, no trabalho social. Como

exemplo poderíamos citar a divisão social do trabalho. Ela determina todas as relações existentes entre os homens e é determinada pelo estado das forças produtivas, que por

sua vez teria uma evolução igual a evolução técnica.

69 - Seriam os objetos de trabalho, somados aos meios de trabalho.

70 - Seriam os meios, utilizados direta ou indiretamente no processo de produção de bens materiais e que estão relacionados ao grau de desenvolvimento do trabalho e às

relações sociais do grupo. Eles podem ser indiretos - meios auxiliares - quando relacionados às condições materiais indispensáveis à realização do trabalho, sem intervir

diretamente em seu processo, ou diretos - instrumentos de trabalho - quando relacionados à intermediação direta sobre o objeto de trabalho.

71 - Seria o elemento provindo da natureza, com ou sobre o qual se trabalha. Ele pode ser bruto, quando utilizado da mesma forma como provem, ou modificado, quando

sofreu algum tipo de modificação, pela natureza ou pelo homem, antes de sua utilização atual.

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tratamento, em instrumentos de trabalho72 e meios auxiliares73 - e da força de trabalho74

empregada, são evidenciadas no conjunto das condições materiais de produção e

influenciadas pelo meio, pela densidade, pelas necessidades da sociedade, etc ... É assim,

que o advento da cerâmica teria trazido às sociedades pré-históricas um importante elemento

de trabalho, consumo e produção, aumentando com isso, entre outras coisas, a produtividade e

por consequência gerando um maior desenvolvimento das forças produtivas.

É dessa forma e com este instrumental que estamos tratando o que, como já dissemos

anteriormente, entendemos ser uma das categorias mais importantes de trabalho a ser utilizada

pelo arqueólogo: a tecnologia. Na verdade, ela é o todo com o qual trabalhamos. Basta que

para isso tenhamos o instrumental de trabalho.

1.4.4 - o cotidiano

O cotidiano é a representação prática de todas as atividades, individuais ou coletivas,

de uma sociedade. Como nos diz Maggiolo75,

"En la vida cotidiana está la explicación de sus quehaceres, su organización, sus modos de trabaljo, sus modos de vida. ... deseamos hacer hincapié en que us estudio de vida cotidana, es entonces, fundamental para entender el modo de vida, la menera como la gente se organizó para sobrevivir dentro de unas mismas relaciones de produción y en un nivel similar de fuerzas productivas." p.14

Para Marx76 por sua vez, o cotidiano é a própria vida do homem e portanto a própria

História.

"... a primeira premissa de toda a existência humana, e portanto, também, de toda a história, ou seja, a premissa de que os homens têm de estar em condições de viver para poderem fazer história. Mas da vida fazem parte sobretudo comer e beber, habitação, vestuário e ainda algumas outras coisas. O primeiro ato histórico é, portanto, a produção dos meios para a satisfação destas necessidades, a produção da própria vida material, e a verdade é que este é um ato histórico,

72 - Instrumento de trabalho seria qualquer objeto, aparelho ou utensílio que serviria para executar uma obra ou levar a efeito uma operação mecânica em qualqeur arte,

ciência ou ofício. Seria assim, o instrumental utilizado na produção de algo, tal como máquinas, ferramentas, mecanismos, etc ...

73 - Seriam os meios utilizados no trabalho que auxiliam numa produção qualquer, tais como canais, estradas, etc ...

74 - Seria a energia humana disponível e despendida numa atividade produtiva objetiva.

75 - MAGGIOLO, Marcio Veloz. La arqueología de la vida cotidiana: matices, historia y diferencias. In: Boletín de Antropologia americana, Instituto Panamericano de

Geografia e História, 10 - diciembre, Cidade do México, 1984, pp. 9-22.

76 - MARX, Karl & ENGELS, Friedrich.. A ideologia Alemã, Editora Moraes, São Paulo, 1984.

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uma condição fundamental de toda a História, que ainda hoje, tal como há milhares de anos, tem de ser realizado dia a dia, hora a hora, para ao menos manter os homens vivos." pp. 30-31

Já, de acordo com Heller77,

“A vida cotidiana é a vida de todo homem. Todos a vivem, sem nenhuma exceção, qualquer que seja seu posto na divisão do trabalho intelectual e físico. ... Nela, colocam-se “em funcionamento” todos os seus sentidos, todas as suas capacidades intelectuais, suas habilidades manipulativas, seus sentimentos, paixões, idéias, ideologias. ... São partes orgânicas da vida cotidiana: a organização do trabalho e da vida privada, os lazeres e o descanso, a atividade social sistematizada, o intercâmbio e a purificação. ... O homem já nasce inserido em sua cotidianidade.”. pp. 17-18

Assim, o conhecimento do espaço físico e de todas as relações possíveis entre este

espaço e as atividades detectadas durante a escavação arqueológica é de fundamental

importância para se falar em cotidiano. Serão elas que irão demonstrar, qualificar e

quantificar o cotidiano ali presente e que pode ou não, dependendo da forma como o trabalho

arqueológico for conduzido, ser recuperado.

Portanto, a melhor forma de falarmos em cotidiano é buscando identificar, dentro dos

diversos espaços de ocupação de uma sociedade e seus sucessivos pisos, as áreas de suas

diversas atividades. Estes espaços, conforme sugere Binford78, podem variar dependendo do

tipo de sociedade, do tipo de espaço ocupado, das necessidades e do tamanho do grupo, etc ...

Assim, será o arqueólogo, durante o trabalho de campo, quem irá identificá-los e com isso

possibilitar o levantamento de questões sobre o cotidiano.

1.4.5 - a totalidade

Das três concepções fundamentais de totalidade, ou do todo, que conhecemos no

pensamento filosófico, a concepção dialética, de Heráclito, Hegel e Marx, nos parece ser a

única a conceber o real como um todo estruturado e portanto dentro das concepções com que

estamos trabalhando79.

77 - HELLER, Agnes. O cotidiano e a História, Tradução de Carlos Nelson Coutinho e Leandro Konder, Série Interpretações da História do Homem - volume 2, 2a edição,

Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1985.

78 - Op. Cit. - capítulos 6 e 7 - pp. 117-209.

79 - As outras duas concepções sobre o todo, ou a totalidade, são a organicista e organicístico-dinâmica, de Schelling e Spann, que formaliza o todo e afirma a predominância

e a prioridade do todo sobre as partes; e a atomística-racionalista, de Descartes e Wittgenstein, que concebe o todo como totalidade dos elementos e dos fatos mais simples.

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45

Das definições, ou representações, sobre a totalidade, a de Kosik80 é a que melhor

representa aquilo com que concordamos:

"... totalidade não significa todos os fatos. Totalidade significa: realidade como um todo estruturado, dialético, no qual ou do qual um fato qualquer pode vir a ser racionalmente compreendido. Acumular todos os fatos não significa ainda conhecer a realidade; e todos os fatos não constituem, ainda, a totalidade. Os fatos são conhecimento da realidade se são compreendidos como fatos de um todo dialético - isto é, se não são átomos imutáveis, indivisíveis e indemonstráveis, de cuja reunião a realidade saia constituída - se são entendidos como partes estruturais do todo." pp. 35-36

Tratarmos do todo significa, antes de mais nada, tratarmos das partes, Morin81.

"Considero impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, como conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes." p. 259

e ainda,

"O todo é efetivamente uma macrounidade, mas as partes não estão fundidas ou confundidas nele, têm dupla identidade, identidade própria que permanece (portanto, não redutível ao todo) identidade comum, a da sua cidadania sistêmica." p. 260

Dessa forma, quando tratamos do espaço físico, do espaço temporal, do cotidiano e da

tecnologia estamos tratando das partes, mas das partes como um todo, possível, estruturado,

historicamente construído e que não tem sentido algum se analisado em separado.

É a partir desse ponto que juntamos a nossa estrutura conceitual de análise à

complexidade. Como nos diz Morin82,

"... é necessário interrogar-se sobre a carência de toda explicação que se baseia em simplificação de princípio. A complexidade não está na espuma fenomenal do real. Está em seu próprio princípio. O fundamento do que denominamos realidade não é simples, mas complexo; ..." p. 272

80 - KOSIK, Karel.. Dialética do concreto, 4a edição, Coleção Resumos da Cultura Moderna, volume 26, Editora Pz e Terra, São Paulo, 1976.

81 - MORIN, Edgar.. Ciência com consciência, Editora Bertrand Brasil, Rio de Janeiro, 1996, pp. 259 e 260.

82 - Op. Cit.

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Devemos lembrar que não estamos tratando a complexidade como um conceito que

considera as coisas complexas ou simples, mas sim a complexidade como uma teoria que

concebe o conhecimento, dentro de sua totalidade, complexo. Lewin83 exprime exatamente o

que dizemos:

"... complexidade é uma palavra muito escorregadia. Pode significar muitas coisas." p. 163

"... nenhuma disciplina seria excluída; todas elas estariam sob a cobertura dos sistemas complexos." p. 27

Também Morin84 manisfesta-se, dizendo que:

"A complexidade não tem metodologia, mas pode ser seu método. ... O método da complexidade pede para pensarmos nos conceitos, sem nunca dá-los por concluídos, para quebrarmos as esferas fechadas, para restabelecermos as articulações entre o que foi separado, para tentarmos compreender a multidimensionalidade, para pensarmos na singularidade com a localidade, com a temporalidade, para nunca esquecermos as totalidades integradoras." p. 192 "... se tentamos pensar no fato de que somos seres ao mesmo tempo físicos, biológicos, sociais, culturais, psíquicos e espirituais, é evidente que a complexidade é aquilo que tenta conceber a articulação, a identidade e a diferença de todos esses aspectos, enquanto o pensamento simplificante separa esses diferentes aspectos, ou unifica-os por uma redução mutilante." p. 176

"Ela não quer dar todas as informações sobre um fenômeno estudado, mas respeitar suas diversas dimensões: ..." p. 177

"... a complexidade surge como dificuldade, como incerteza e não como uma clareza e com resposta." p. 177

É diante deste panorama que temos entendido a totalidade, como algo fundamental,

mas necessariamente complexo em sua estrutura.

Todas estas categorias, eleitas para nosso trabalho, estão mediadas pela dialética,

concebida, principalmente, por Lukács85, Kosisk86, Konder87, Plekhânov88, Löwy89 e

83 - Op. Cit.

84 - Op. Cit.

85 - LUKÄCS, George.. Ontologia do Ser Social: os princípios ontológicos fundamentais de Marx, Liv. e Ed. Ciências Humanas, São Paulo, 1979.

LUKÄCS, George.. A ontologia do Ser Social: a falsa e a verdadeira ontologia de Hegel, Livraria Editora Ciências Humanas, São Paulo, 1979.

86 - KOSIK, Karel.. Dialética do concreto, 4a edição, Coleção Resumos da Cultura Moderna, volume 26, Editora Pz e Terra, São Paulo, 1976.

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47

Vasquez90. Dissemos, no princípio, “até o momento” na medida em que entendemos não ser

este o final do trabalho, mas apenas uma parte do mesmo.

1.5 - as técnicas e as ciências auxiliares como meio de trabalho

"A minha segunda máxima consistia em ser tão firme e resoluto quanto me fosse possível em meus atos e em seguir as opiniões mais duvidosas, desde que me tivesse decidido por elas, com constância não menor do que se elas fossem exatíssimas." (DESCARTES, Renè, Discurso sobre o método, Editora Hemus, São Paulo, 1986, p.56.)

Necessárias para o melhor desenvolvimento de um trabalho, as técnicas, específicas ou

gerais, e as ciências ou suas disciplinas, são, no processo de produção do conhecimento, as

reais e efetivas responsáveis pelo resultado alcançado, uma vez que não basta o trabalho estar

teoricamente bem construído se não estivermos em condições de usar, ou produzir, os meios

que recuperem os elementos para a construção daquele objetivo desejado. Denominadas

"auxiliares", estas técnicas, disciplinas ou ciências são, para o trabalho do arqueólogo,

fundamentais, e nós, não poderíamos ser exceção em seu uso.

Devemos admitir que falar em técnicas, ciências ou disciplinas "auxiliares" é falar

também em interdisciplinaridade, multidisciplinaridade, transdisciplinaridade e talvez outros

termos, todos com o objetivo de demonstrar a necessidade do conhecimento, na produção de

um novo conhecimento. Da mesma forma, falar em técnicas, ciências ou disciplinas

"auxiliares" não significa apenas relacionar técnicas, disciplinas e ciências com as quais pode-

se eventualmente trabalhar, mas identificar conhecimentos e técnicas produzidas por elas e

que podem nos ser úteis na produção deste novo conhecimento.

Sejam nos trabalhos de construção teórica, de campo ou de laboratório, os

conhecimentos e técnicas advindas destas técnicas, ciências ou disciplinas "auxiliares", são

inúmeros e constantes e apenas ratificam o estado atual da ciência, ou seja, o de que não é 87 - KONDER, Leandro.. O futuro da filosofia da praxis: o pensamento de Marx no século XXI, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1992.

88 - PLEKÂNOV, Guiorgui V.. A concepção materialista da História, 7a edição, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1980.

PLEKÂNOV, Guiorgui V.. Os princípios fundamentais do Marxismo, 2a edição, Coleção Pensamento Socialista, Ed. Hucitec, São Paulo, 1989.

89 - LÖWY, Michael.. As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhaussen: Marxismo e Positivismo na sociologia do conhecimento, 2a edição, Editora Busca

Vida, São Paulo, 1977.

90 - VASQUES, Adolpho Sanches.. Filosofia da práxis, 3a edição, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1977.

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mais possível produzirmos qualquer tipo de conhecimento se não estivermos inteirados do

conhecimento e das técnicas que o produziu, caso contrário estaríamos correndo o risco de

produzir algo já produzido, falar algo já falado, criar algo já criado, pensar algo já pensado.

Não que nada disso possa ser feito, mas com nova perspectiva, sob nova ótica, com novas

técnicas, sempre informado daquilo produzido, falado, criado, pensado.

Dessa forma, a Arqueologia que trabalha com um documento inédito e possui um

método específico e próprio para recuperá-lo, a escavação arqueológica, necessita, em muito,

destas técnicas, ciências ou disciplinas "auxiliares". É talvez, a ciência que mais necessita

das outras. Talvez, por isso, a ciência mais completa.

Dentre as muitas áreas, embora pudéssemos citar desde a genética até a física, as mais

freqüentemente utilizadas são a topografia, a geografia, a geologia, a biologia e a anatomia.

Todas elas têm sua importância, seu lugar e sua contribuição, sem as quais torna-se

impossível o trabalho do arqueólogo.

Até este ponto, entendemos não haver, em nosso texto, nada além do que já é realizado

pelo arqueólogo em seu trabalho. O que propomos diferente é o fato de entendermos-as

como meios de trabalho e não apenas como técnicas, ciências ou disciplinas "auxiliares", ou

seja, entendendo-as como os meios utilizados direta ou indiretamente no processo de

produção do conhecimento. Aparentemente parece tudo igual. Mas estaríamos mudando o

princípio com o qual trabalhamos.

Como exemplo, gostaríamos de citar algumas observação que costumamos fazer no

que concerne à forma de conceber a escavação de um sítio arqueológico, ou seja, escavaremos

o sítio todo ou apenas parte dele ?

Se uma sociedade ocupou um espaço e nele realizou suas atividades, com as mais

diversas características, o que nos cabe, como arqueólogos, na medida em que estamos

estudando-a e admitindo que após nosso trabalho teremos destruído seus vestígios,

independentemente de termos escavado o todo ou apenas parte, é recuperá-la. O que

buscamos é a totalidade possível e não o todo efetivo, até mesmo porque muito dificilmente

saberemos qual é este todo.

Se, ao contrário, independentemente do tipo de sítio ou do tipo de sociedade com que

estaremos trabalhando, embora saibamos que a escavação de um sítio arqueológico como um

todo é impossível, seja por questões técnicas, econômicas, naturais ou de pessoal, admitirmos,

como princípio, que o sítio arqueológico deve ter escavada apenas parte de sua área, é

admitirmos um erro antes mesmo de cometê-lo, fato que poderia invalidar nosso trabalho.

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49

Assim, as técnicas, ciências ou disciplinas "auxiliares" são pensadas não como áreas

estanques, separadas, isoladas, com as quais mantemos contato quando necessário, mas como

conhecimentos necessários na produção deste novo conhecimento. Além disso, elas estariam

presentes no trabalho no momento de sua concepção e não apenas no momento da elaboração

do Projeto de Pesquisa ou na realização de suas etapas. É dessa forma que estaremos

transformando-as em conhecimento que servirá como meio de trabalho na produção deste

novo conhecimento.

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50

parte ii

2.1 - o projeto de pesquisa

"Pesquisa de real interesse para a história de qualquer região é aquela que se relaciona com seus primitivos habitantes, principalmente quando de remota presença local e, mais ainda, se lembrados por fósseis de reconhecido valor." (JOSÉ, Oiliam. Visconde do Rio Branco: terra-povo-história, Imprensa Oficial, Belo Horizonte, 1982, p. 19)

Falar deste trabalho, ou de seu projeto de pesquisa significa, antes de mais nada, falar

do Programa Arqueológico Puri-Coroado, uma vez que este é conseqüência daquele. O

Programa Arqueológico Puri-Coroado é um progama de pesquisas criado em 1992 e que visa

trabalhar com os gurpos indígenas Puri e Coroado em "todas" as suas representações e

desdobramentos. Para isso, sua equipe com pesquisadores e consultores das mais diversas

áreas, trabalha hoje em três projetos de pesquisa, abordando temas como aldeamentos, meio-

ambiente e arqueologia. Foi desta forma e por estes motivos que escolhemos este tema para

nosso trabalho de curso.

Nossa escolha recaiu sobre estes dois grupos indígenas, os Puri e os Coroado, ao invés

de apenas um, devido ao fato de alguns autores, em diversos momentos, mencionarem uma

tradição oral e, talvez por esse motivo, levantarem como hipótese, uma origem comum para

Puri, Coroado e, algumas vezes, Coropó. As informações mais contundentes estão na obra de

Eschwege91. Diz ele:

“ Segundo tradição de alguns velhos índios, eles constavam então de três tribos, segundo outros de duas, uma das quais se denominava Meritong, a outra Camabipaque; a alcunha de Coroado entretanto, predominou tanto entre estas designações, que apenas só poucos anciões ainda se lembram de fato, e podem dela dar notícia; também o modo, como antigamente raspavam a coroa, só se verifica atualmente em muito poucos indivíduos. Tradições de boca em boca ainda persistem entre eles quando outrora constituíam Coroado e Puri uma só nação, porém sobrevindo depois tremenda rixa entre as duas

91 - Op. Cit.

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importantes famílias, separam-se. O fato é que a linguagem dos Coroado e dos Puri têm muita afinidade entre si, de sorte que se compreendem uns e outros, sendo entretanto diferente o seu físico e a sua moral. São os Puri de muito mais forte constituição do que os Coroado, e particularmente nestes últimos em geral, estranha-se a extraordinária pequenez dos membros virilis. ” p. 121

“ Desta grande indiferença se assim posso dizer, percebe-se que a separação de ambas as tribos, de Coroado e Puri, não se deve ter realizado há muito tempo, senão já estaria a noção enterrada com os bisavós, o que é admissível, à vista dos acima citados exemplos em que a tradição do nome da tribo só se conservou até os netos; a legenda da separação entre Coroado e Puri, conservada como época maravilhosa durou o dobro do tempo, entretanto só se escoaram pouco mais de cem anos. ” p. 150

“ Como descobrir qual das duas nações conservou o idioma. Que descendem ambas de uma mesma origem, não se pode negar, pois as duas nações ainda se compreendem. Que os Coropó também fazem parte desta tribo, também não se pode por em dúvida. ” pp. 150-151

Apesar da dispersão dos grupos indígenas Puri e Coroado por quatro Estados - Rio de

Janeiro, Espirito Santo, Minas Gerais e São Paulo - este nosso trabalho está restrito a uma

“pequena” área no Estado de Minas Gerais. Apresentada por praticamente todos os autores

que fazem referência a eles, o rio Pomba, o rio Chopotó, o rio Casca, o rio Piranga, a serra da

Onça, a serra de São Geraldo, a serra de São José e a serra das Frexeiras são os locais mais

freqüentemente citados.

“ Os habitantes indígenas pertencem à tribo dos Coroado, Coropó e Puri, esta ainda selvagem e vagueante pelas vastas solidões situadas entre o mar e a margem Norte do Paraíba, projetando-se para Oeste, até o rio Pomba, em Minas Gerais. ” (Wied, p. 103)92

“ ... os Coroado têm suas possessões entre a margem septentrional do Parahiba (a Oeste da primeira cachoeira) e a serra da Frexeira; e passando além desta, chegam a barra do rio Pomba, e sobem até perto das suas vertentes, (já próximas as Minas Geraes). Bem que entre este sertão e o Murihaé que também possuem parte, passe huma porção de terra no chamado a travessia, de que raras vezes se servem, por ser passagem frequentada pelo gentio Pori. ” (Carvalho, p. 258)93

92 - Op. Cit.

93 - Op. Cit.

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52

“ O Puris e Croatos dominaram as matas dos rios Pomba, Murihaé, Chopotó, Casca, Piranga, etc., na região Oriental e de Sudeste, em Minas Geraes. ” (Senna, p. 48)94

“ ... especialmente aos Coroados, tem produzido os mais vantajosos resultados. Habita essa nação a bacia do rio Xopotó ... entre as duas serras, da Onça e de São Geraldo. ” (Carneiro, p 17)95

“ Os Puris, seus inimigos, ... habitam a encosta Oriental da serra da Onça ... ” (Carneiro, p. 17)96 “ A zona banhada pelo rio Xopotó era habitada pelas tribus indígenas Croatas, Puris, de origem Tupy. ” (Gonçalves, p. 0 )97

“ Têm os Coroados o domínio sobre a fértil planície que se estende entre a serra de São José e a serra da Onça e forma um grande oval. É banhada esta planície por oito pequenos rios, os quais correm todos na direção Norte-Sul, juntando suas águas uns nos outros, e por fim formam o rio Xopotó Novo ou dos Coroados, o qual vem a reunir-se ao rio Pomba. ” (Eschwege, p. 117)98

Dessa forma, nosso trabalho estará limitado à bacia do rio Pomba, mais

especificamente à sua margem esquerda, na serra da Piedade, mesma região onde estão as

freqüentemente citadas serras da Onça, de São Geraldo e de São José e por onde corre seu

principal afluente, o rio Chopotó, bem como todos os seus tributários.

No que diz respeito a delimitação temporal, nosso projeto poderia parecer

extremamente amplo para um historiador, se considerados, apenas e tão somente, os séculos

XVI a XIX. Mas nossa pretensão é maior, pois além dos quatro séculos já mencionados,

pretendemos trabalhar, também, com a "pré-história", que poderá nos levar para uma data de

até alguns milhares de anos antes de nosso calendário gregoriano. Absurdo dirão alguns.

Explicaremos.

É objeto e objetivo da Arqueologia, o estudo de sociedades passadas através de sua

cultura material, encontrada em local denominado sítio arqueológico. A definição parece

correta se não levarmos em conta que inúmeras dessas sociedades de um tempo pré-histórico,

não houvessem chegado até nosso tempo, o histórico. Delas belíssimos trabalhos foram

realizados. Morgan, Herder, Rivers, Boas, Tylor, Radiclif-Brow, Malinowski, Lévi-Strauss,

94 - Op. Cit.

95 - CARNEIRO, Palmyos da Paixão.. Os índios de São Januário de Ubá, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte - MG, 1989.

96 - Op. Cit.

97 - GONÇALVES, Joaquim Teixeira.. Memórias para a história do Alto Rio Doce, Typ. Almeida, Queluz de Minas, 1932.

98 - Op. Cit.

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Baldus, Murray, Métraux, Nimuendaju, entre tantos outros, são os expoentes maiores. Além

disso, informações históricas a seu respeito não nos faltam. Os relatos sobre contatos,

catequisação e aldeamentos - e as descrições sobre cultura material, meio, tipo e religião -

principalmente nos séculos XVIII e XIX, também nos são fartos.

Embora teoricamente a Arqueologia tenha como objeto de estudo sociedades passadas,

na prática esse objeto não é materializado, uma vez que, tanto os estudos e informações

etnológicas e antropológicas quanto as históricas, não são, normalmente, utilizados. A prova

está em que raramente chega-se a relacionar o sítio estudado a uma sociedade. Acreditamos

que isso deva-se ao fato de buscar-se, em primeira instância, o sítio arqueológico e não a

sociedade.

É dessa forma que este trabalho, que é "arqueológico" e que tem como objetivo de

estudo os grupos indígenas Puri e Coroado, trabalha tendo como ponto de partida o século

XX. Trabalhamos com as fontes documentais até o séculos XVI, com as fontes orais

contemporâneas e com as fontes culturais em um tempo que não pode ser estabelecido nesse

momento, pois vai depender dos sítios arqueológicos a serem encontrados e escavados e do

seu tempo de ocupação.

Nesse trabalho, utilizamos três tipos de fontes: a escrita, a oral e a cultural, que é a

arqueológica. Nosso ponto de partida são as informações obtidas em todas as fontes

documentais possíveis, primárias ou secundárias, para sabermos, da melhor forma, suas

origens, localização, dispersão, etc..

Nosso referencial são as obras de Curt Nimuendaju,

“ ... o mais profundo conhecedor dos aborígines do Brasil em seu tempo. ” (Correa Filho - IN: Nimuendaju, p. 9)99

Dentre elas, o mapa etno-histórico (anexo 2, mapa 1) é uma de nossas obras de

referência, como tem sido para outros estudos sobre indígenas no Brasil. Vale lembrar que

outros dois mapas também têm sido utilizados por nós, embora com menor freqüência, são os

mapas produzidos por Peret100 (anexo 3, mapas 2 e 3) e por Loukotka101. Além disso, as

obras, algumas já citadas, bem como todas as informações e referências sobre os mesmos são

de extrema necessidade e valia. Ressalvamos, novamente, que uma relação de autores, que

99 - NIMUENDAJU, Curt.. Mapa etno-histórico, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 1987.

100 - PERET, João Américo. Mapa Etnográfico do Brasil, índios atuais. In: População indígena do Brasil, Civilização Brasileira, Brasília, 1975.

PERET, João Américo. Mapa Etnográfico do Brasil, índios do passado. In: População indígena do Brasil, Civilização Brasileira, Brasília, 1975.

101 - LOUKOTKA, Chestmir.

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certamente não representa a totalidade sobre o tema neste momento, nem o esgota, é usada

apenas como ponto de partida para nosso trabalho.

Devido ao pouco conhecimento e às poucas referências sobre Puri e Coroado, não é

possível encontrar, em uma única biblioteca ou arquivo, "todas" as informações necessárias.

Assim, trabalhamos em locais como a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, a Biblioteca do

Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, a Biblioteca do Museu do Índio, a Biblioteca do

Museu Nacional do Rio de Janeiro, a Biblioteca do Real Gabinete Português de Leitura, o

Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, a Biblioteca do Arquivo Público Mineiro, o Arquivo da

Arquidiocese de Mariana, bem como em arquivos e/ou bibliotecas particulares, municipais e

da igreja.

Por sua vez, a fonte oral, de uso corriqueiro em Arqueologia, na localização de sítios

arqueológicos, é usada na medida em que são obtidas informações, sobre os Puri e os

Coroado, que são confirmadas, ou não, pela população local.

Normalmente o Arqueólogo, quando em campo, busca os sítios arqueológicos a partir

de informações obtidas com a população local. É dessa forma que a grande maioria das

descobertas de sítios arqueológicos têm sido feitas.

Como pode-se notar, embora os fins sejam os mesmos, o sítio arqueológico, os meios

e a sistemática de obtenção das informações são distintas. O arqueólogo escolhe uma

determinada área e parte para ela com a finalidade de encontrar sítios arqueológicos para

trabalhar, utilizando-se da informação oral local como meio para atingir esse objetivo, não

importando o grupo ali representado, e que nesse caso poderão ser inúmeros.

Nós, por sua vez, nos propomos a trabalhar com um grupo específico, que habitou um

espaço específico, em um tempo específico. Os meios para chegarmos a isso são as fontes

escritas, orais e culturais. Assim, para todos, a informação oral é o melhor meio para se

encontrar o sítio arqueológico. Apenas que, em nosso caso, ela está direcionada pelo objeto

da pesquisa e pela fonte bibliográfica, que nos fala de alguém, de um dado tempo, em um

determinado local.

O terceiro tipo de fonte, a fonte cultural, nada mais é que os restos, culturais, daquela

sociedade representada naquele sítio arqueológico. Estes restos, que representam a cultura

material, somente poderão ser alcançados através do instrumental técnico da Arqueologia,

principalmente a escavação.

Nesse ponto, outra proposta de trabalho. Pensamos que ao fazer Arqueologia,

estamos fazendo, ou recuperando, a História de uma sociedade, de um tempo e/ou de um

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espaço, através dos documentos ali deixados. É a nossa História, a História de nossos

antepassados.

O arqueólogo, como o historiador, trabalha com documentos. Distintos é verdade,

mas documentos. Documentos que necessitam ser descobertos, lidos, interpretados,

ralacionados, publicados ... Imaginemos a Biblioteca do Vaticano ou a Torre do Tombo.

Qual a quantidade de documentos existentes, ainda por serem descobertos, lidos, interpretados

e publicados ? Da mesma forma o sítio arqueológico é para o arqueólogo um grande arquivo,

uma grande biblioteca, com uma série de documentos e informações sobre uma sociedade,

sobre um tempo e sobre um local.

2.2 - a área de trabalho

"A história de cada um dos municípios mineiros, criteriosamente documentada, constitui fonte segura e insubstituível para termos uma visão geral e abrangente das diversas regiões que formam o extenso território do Estado." (RAMOS, Lincoln. Prefácio da obra Os índios de São Januário de Ubá, de CARNEIRO, Palmyos Paixão, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1989)

A região onde está situado o Município de Visconde do Rio Branco (anexo 4, mapa 3),

na Zona da Mata Mineira, Estado de Minas Gerais, é um território montanhoso formado por

um braço da serra da Mantiqueira. Ao que tudo indica, os seus primeiros habitantes

poderiam ter sido os índios Puri e Coroado.

Os primeiros europeus chegaram ao vale do rio Chopotó a partir da primeira metade

do século XVIII, fazendo o mesmo caminho que se supõe para uma das versões de dispersão

dos grupos indígenas Puri e Coroado, ou seja, a de que seriam provenientes da região Norte

Fluminense, no Estado do Rio de Janeiro, onde, segundo a documentação escrita, teriam

"fugido" do litoral temendo os ataques de outras tribos indígenas, principalmente os Goitacá,

migrando, através dos rios Paraíba do Sul, da Pomba e Muriahé, para o "sertão mineiro", até

atingirem as "fraldas da Mantiqueira", nas proximidades do rio Chopotó, tributário da

margem esquerda do rio da Pomba, que corta, entre outros, o atual território do Município de

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Visconde do Rio Branco. Com isso estavam estabelecidos e lançandos os fundamentos de

uma nova forma de ocupação daquela região.

As informações históricas indicam que até aquele momento, o uso dos recursos

naturais da região baseava-se em um modelo exclusivamente extrativista, isto é, exploravam-

se apenas os recursos naturais encontrados no ecossistema florestal, o que não teria provocado

grandes transformações ambientais naquela região.

É a partir do final do século XVIII, quando se tem uma ênfase na catequese indígena,

que surgem as primeiras lavouras "organizadas". Portanto, é a partir do século XIX que se

tem, com maior intensidade, as transformações daquele ambiente, antes coberto por densas

florestas e que começaram a dar espaço às lavouras de culturas trazidas pelo elemento

europeu. É neste momento que temos, de forma mais sistematizada, o surgimento das

primeiras vilas.

Desde então, as florestas, típicas da Zona da Mata Mineira, foram sistemática e

gradativamente substituídas pela monocultura da cana-de-açúcar, acompanhadas de culturas

de subsistência como o arroz, o milho e o café, além das pastagens para o desenvolvimento da

pecuária.

No século XX, os desmatamentos continuaram, aumentando na mesma proporção de

seu crescimento populacional. Segundo dados da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia

e Estatística, em 1991, dos 28.451 habitantes do Município de Visconde do Rio Branco - MG,

74% estariam vivendo na zona urbana, valores que, comparados aos da década de 50, indicam

um acentuado processo no êxodo rural, fato que reforçou a manutenção da monocultura da

cana-de-açúcar como sua principal atividade econômica. Estes dados indicam que o processo

de concentração urbana, decorrente de um êxodo rural continuado, vem se ampliando

juntamente com o empobrecimento das terras cultivadas, utilizadas, principalmente, para a

cana-de-açúcar.

Este processo de degradação ambiental tem provocado uma acentuada erosão do solo

(anexo 5, foto 1), dificultando, entre outras coisas, até mesmo o trabalho da Arqueologia,

principalmente no que diz respeito a possibilidade de encontrarmos os locais com os restos

das ocupações anteriores à chegada do elemento europeu. Isto ocorre devido a retirada da

vegetação das encostas que provocou, por conseqüência, com a ação do tempo, uma erosão

que retira o sedimento, e com ele os restos de ocupações, levando-o até as regiões mais

baixas, soterrando os restos ali já existentes e dispersando os que da serra foram trazidos.

Dessa forma as possíveis ocupações existentes no sopé das serras estariam soterradas pelo

sedimento que desceu das mesmas devido a erosão, bem como as ocupações existentes nas

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encostas estariam destruídas pela erosão e tendo seu material disperso pelos "vales" atuais

(anexo 6, foto 2).

Para a Arqueologia isto significa a impossibilidade de encontrar muitos dos locais de

ocupação indígena. Em nosso caso, esta poderia ser uma das explicação para o fato de

encontramos hoje, dispersos pelas regiões mais baixas, uma quantidade muito grande de

material arqueológico dos mais variados tipos. Sempre isolados e dissociados de qualquer

estrutura arqueológica.

2.3 - o panorama atual (uma visão da arqueologia)

"A pesquisa arqueológica nos Estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais vem se desenvolvendo de maneira boa nos últimos anos, quer seja pelo aumento dos pesquisadores capacitados, quer pela maior atenção que vem despertando esta área entre as instituições científicas nacionais e estrangeiras. O volume do material recolhido por todos os que se empenham nesta tarefa tem sido enorme e as notícias referentes têm aparecido com alguma regularidade, infelizmente, no entanto, muito aquém do necessário." (DIAS JÚNIOR, Ondemar Ferreira. Evolução cultural em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. In: Anuário de Divulgação Científica, Universidade Federal de Goías / Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia, números 3 e 4, Goiânia, 1977, p. 110)

Apresentar um panorama arqueológico atualizado sobre a área de nosso projeto de

trabalho significa, antes de mais nada, falarmos a respeito das pesquisas arqueológicas

realizadas nos Estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, sobre as quais Dias Júnior102, em

meados da década de 70, dizia que ...

“Um problema tem se afigurado ultimamente, o qual ainda não pode ser plenamente ultrapassado. Trata-se da necessária relação entre as pesquisas nos Estados de Minas Gerais e no Estado do Rio de Janeiro,

102 - DIAS JÚNIOR, Ondemar Ferreira.. Evolução Cultural em Minas gerais e no Rio de Janeiro. In: Anuário de Divulgação Científica, Universidade Católica de Goiás /

Instituto Goiano de Pré-História e Antropolgia, números 3 e 4, Goiânia, 1976 / 1977, pp. 110-130.

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pesquisas estas, até o momento, efetuadas completamente, isoladas umas das outras. Na realidade, os limites políticos atuais entre os dois Estados têm atuado como verdadeira barreira prática.”, p. 110.

Além disso, devido às especificidades e especificações das pesquisas arqueológicas

realizadas nesta região, dois distintos panoramas foram traçados. O primeiro deles, que pode

ser considerado como de caráter arqueológico, nos mostra os sítios arqueológicos, seu

respectivo material cultural e suas possíveis interpretações e associações. O segundo

panorama, que pode ser considerado como de caráter histórico, antropológico e/ou etnológico,

nos mostra as possíveis associações destes sítios arqueológicos e seu respectivo material

cultural, com os grupos indígenas historicamente, antropologicamente e etnologicamente

registrados para a região.

No que diz respeito ao panorama de caráter arqueológico, apesar de um acréscimo

substancial nas pesquisa realizadas no Brasil, em seus significativos resultados e de 20 anos

terem sido passados, pouco de seu panorama, construído em meados da década de 70, foi

modificado no que diz respeito ao Norte do Estado do Rio de Janeiro e ao Sudeste do Estado

de Minas Gerais. É dessa forma que o esboço para a ocupação destes Estados, traçado por

Dias Júnior em 1976-1977103; 1978-1979-1980104 e 1978-1979-1980105 continua válido. Seu

esquema operacional de ocupação foi construído da seguinte forma:

“No Estado do Rio de Janeiro, a evolução cultural pré-histórica pode ser sumarizada em pelo menos dois grandes períodos, com sub-divisões. Cada período deve corresponder a épocas distintas, mas é evidente que ocorreram variações e interrelacionamentos entre eles ao longo do espaço fluminense. O primeiro período, e mais antigo, corresponderia às comunidades de bando (segundo Service: 1966), onde a economia deveria ser, no nosso caso, basicamente coletora. A maior soma de informações se encontra no litoral e aí podemos ter dois momentos caracterizadores do período. ... O momento inicial corresponderia à economia sambaquiana ... O seguinte, com uma maior variação econômica e cultural, ao que denominamos “Itaipu”. ... O segundo período, que se relaciona aos coletores, agricultores, também pode ser dividido em dois. Um que corresponde aos grupos da Tradição local denominada Una ... o outro, Tupiguarani, que sem dúvida resulta da chegada de novos grupos tribais vindos do Sul e que muitas vezes, segue caminho para o Norte, ...

103 - Op. Cit.

104 - DIAS JÚNIOR, Ondemar Ferreira.. O Paleo-Índio em Minas Gerais. In: Anuário de Divulgação Científica, Temas de Arqueologia Brasileira # 1 – Paleo-Índio,

Universidade Católica de Goiás / Instituto Goiano de Pré-história e Antropologia, número 5, Goiânia, 1978 / 1979 / 1980, pp. 51-54.

105 - DIAS JÚNIOR, Ondemar Ferreira.. Os Cultivadores do Planalto e do Litoral. In: Anuário de Divulgação Científica, Temas de Arqueologia Brasileira # 5 – Os

Cultivadores do Planalto e do Litoral, Universidade Católica de Goiás / Instituto Goiano de Pré-história e Antropologia, número 9, Goiânia, 1978 / 1979 / 1980, pp. 15-74.

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Para o território mineiro, frente à vasta área ainda não pesquisada, esta reconstituição é muito mais difícil. ... pressupomos que a antigüidade do povoamento poderá atingir escala superior a 20.000 anos. ... O período cerâmico é representado por três grupos. Podemos caracterizar os primeiros grupos como ... vindos do interior, talvez de Goiás, sendo que alguns grupos se fixaram na região e outros alcançaram o litoral fluminense e o interior de São Paulo. Trata-se das fases filiadas à Tradição Una. Outro grupo, mais recente, mas que conviveu com o primeiro, ... deixou seus vestígios em grandes sítios de campo aberto. É bem possível que se relacione às migrações relatadas pelos cronistas como que vindas do Norte, subindo o vale sanfranciscano. É possível ainda que tenha se expandido igualmente para o interior paulista e muito possivelmente tenha relações com a Tradição Aratu, de Calderón. Trata-se da Tradição Sapucaí. O grupo que aparentemente chegou por último é o tupiguarani. Este se estendeu por todo o vale do São Francisco, da região da floresta atlântica ao cerrado. Grosso modo, deve refletir a migração Sul-Norte, mas também pode estar relacionado aos movimentos costa-interior referido por alguns autores, entre eles Pierson e Senna. ... O Estado de Minas Gerais, pois, ao que tudo indica, foi uma região de intensa troca de influências culturais, cujo estudo cada vez mais se reveste de importância e cujos resultados poderão esclarecer muitos problemas ainda pendentes na pré-história da região Sudeste e Centro-Oeste.”, pp. 124-126.

Dando continuidade a este esquema operacional de ocupação e reportando-se, desta

vez, especificamente ao Estado do Rio de Janeiro, Dias Júnior & Carvalho106 propõem que ...

“Em sístese, pois, a ocupação arqueológica do Estado pode assim ser sumariamente reconstituída, segundo os dados disponíveis até o momento: A – Pré-cerâmico: Grupos de economia coletora, sambaquianos em toda a costa, num horizonte antigo, possivelmente superior a 10.000 anos. Em parte contemporâneo, sucede-lhe o período da Tradição Itaipu, onde a coleta cede parcialmente a vez à pesca. A caça, muito provavelmente foi importante nos dois períodos. A agricultura parece, pelas provas indiretas, surgir no final do período. No interior, caçadores com pontas de projéteis e pequenos artefatos. Nenhum dado ainda tecnicamente comprovado da existência de grupos relacionados ao horizonte pré-pontas, embora o avanço da pesquisa posa vir a localizar sítios do tipo em ambas as áreas. Até o momento, dado ainda à escassez de sítios e aos trabalhos reduzidos, não dispomos de suficientes informes que possam nos dar idéias claras sobre as origens e a procedência dos elementos constituintes do período.

106 - DIAS JÚNIOR, Ondemar Ferreira & CARVALHO, Eliana.. A Pré-História Fluminense e a utilização das grutas do Estado do Rio de Janeiro. In: Pesquisas, série

Antropologia, número 31, Instituto Anchietano de Pesquisa, São Leopoldo, 1980, pp. 43-86.

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B – Período cerâmico: Provavelmente se desenvolveu localmente uma ocupação antiga de grupos ceramistas vinculados à Tradição Una. No litoral central e Norte, ocupando a planície, os grupos da fase Una; na serra, baixo e médio curso do rio Paraíba, aqueles da fase Mucuri. No início da Era Cristã, novas levas, desta vez vinculados à Tradição Tupiguarani e, provavelmente, oriundas do Sul: na costa central localizaram-se aqueles grupos denominados atualmente, dentro da fase Guaratiba, seguidos por aqueles da fase Sernambetiba, com os quais repartiram a região durante um certo tempo. Estes se estenderam mais para o Norte e devem ter mantido contato com os elementos da fase Una; ao Norte, após a foz do rio Paraíba, localiza-se a fase Itabapoana, mais recente. No médio curso do rio Paraíba, a montante da área da fase Mucuri, está situada a fase Itaocara, com ocupação que se estende até o início do alto curso daquele rio. Ainda em médio curso e se alongando em direção à foz do rio, atingindo ainda boa porção de seu afluente Muriaé, estabeleceu-se, mais recentemente, a fase Ipuca, com contatos marcantes com a fase Mucuri. É interessante notarmos que se não podemos observar traços deste contato na fase Itaocara, eles se materializam na morfologia cerâmica da fase Ipuca, demonstrando a existência de um processo de aculturação, que muito provavelmente foi prolongado, entre grupos pertencentes a Tradições culturais ceramistas diferenciadas.”, pp. 56-57.

Para o Sudeste do Estado de Minas Gerais, por sua vez, além de apresentar as mesmas

características arqueológicas, culturais, ambientais, históricas, antropológicas e etnológicas

identificadas nas ocupações do Norte do Estado do Rio de Janeiro, reconhece-se uma série de

fases107 (Piumhi, Unaí, Mucurí e Una, entre outras108) e tradições109 (Una, Sapucaí e

Tupiguarani, entre outras110) que auxiliam na conformação deste panorama, como por

107 - Definida por MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro.. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: “Qualquer complexo de

cerâmica, lítico, padrões de habitação, etc, relacionado no tempo e no espaço, num ou mais sítios (PRONAPA, 76).”, p. 55.

108 - A fase Unaí, com pontos de contato com a fase Mucuri, no Estado do Rio de Janeiro, possui uma datação de 1.135 DC; localizada inicialmente na bacia do alto rio

Paracatu; possui um sentido de deslocamento que vai de Oeste para Leste, ou seja do interior para o litoral.

A fase Piumhi, com sítios arqueológicos localizados basicamente em cavernas; possui um vasilhame cerâmico de pequeno porte, em formato globular, cônico e

piriforme e de cor predominantemente negra; com datação de 110 DC; foi localizada inicialmente na bacia do alto rio São Francisco; possui um sentido de deslocamento que

segue do interior para o litoral.

A fase Mucuri, com localização na região da bacia sedimentar de Campos dos Goitacases, possui datações de 520 à 1.230 DC; paupérrima em material lítico.

A fase Una, com localização litorânea, principalmente na área de Cabo Frio, possui uma datação de 890 DC; é possível encontrar seu material cerâmico sobre os sítios

arqueológicos da tradição Itaipú; possui um material lítico vasto e variado e em conformidade com as narrativas de viajantes e cronistas.

109 - Definida por MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro.. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: “1 - Grupos de elementos ou

técnicas, com persistência temporal (PRONAPA, 76). 2 - Uma seqüência de estilos ou de culturas que se desenvolvem no tempo, partindo uns dos outros, e formam uma

continuidade cronológica.”, p. 124.

110 - A tradição Sapucaí, associada, por viajantes e cronistas, ao grupos indígenas Cataguá, com sítios arqueológicos de grandes dimensões e associados a ocupações em

campo aberto. Apresenta grande quantidade de material cerâmico, onde o vasilhame, com pouca decoração, quando reconstituido, apresenta um porte que pode variar de

médio a grande. Suas urnas funerárias são geralmente em formato piriforme. Suas principais fase são Ibiraci, Paraopeba e Jaraguá.

A tradição Tupiguarani, a mais recente das ocupações pré-históricas da região, influênciou, provavelmente, vários outros grupos indígenas, fato registrado através da

mistura de seu material cultural arqueológico com o de vários sítios arqueológicos da tradição Una, principalmente em suas fases Piumhi e Mucuri. Não há certeza do

momento de sua chegada ao territ´roio mineiro.

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exemplo o material cultural, provenientes de escavações arqueológicas e identificados como

da fase Mucuri (anexo 7, fotos 3 a 7).

A Tradição Una, de definição arqueológica, constantemente identificada e relacionada,

por pesquisadores das mais diversas áreas, aos grupos indígenas Puri e Coroado, grupos estes

que, acrescidos dos Coropó, são o objeto de nosso trabalho, e citada como uma das principais

tradições arqueológicas para o Sudeste brasileiro, é apresentada por Dias Júnior111 da seguinte

forma:

“O material cerâmico da Tradição Una no Estado do Rio de Janeiro é geralmente de formas simples, vasilhames globulares, cônicos ou piriformes, de pequenas dimensões, paredes delgadas, resistentes e de cor predominantemente escura. As decorações são raras e, quando ocorrem, geralmente se limitam à área superior das peças e denotam influência tupiguarani (sobretudo no corrugado e ungulado). O material lítico de ambas é excepcionalmente pobre, mas, em compensação, ocorre regular variação em padrões de sepultamentos. O mais antigo é o enterramento secundário em urnas, seguindo-se-lhe o sepultamento secundário, ainda em urnas, mas sendo estas depositadas em cavernas de difícil acesso. Finalmente, próximo aos sítios da fase, ocorrem sepultamentos em cavernas, cujo único acompanhamento cultural é o “urucum” (Bixa Orellana Linn), em contraste com os outros tipos de enterramentos onde o acompanhamento cultural é variado e farto (tecidos, contas de osso, pingentes e adornos ósseos, cabaças, etc.).” pp. 117-118.

Schmitz112, por sua vez, diz que a Tradição Una

"Está localizada nos cerrados imediatamente ao Sul da Tradição Aratu/Sapucaí, estendendo-se numa estreita faixa desde o Araguaia até o litoral do Rio de Janeiro. No interios ocupava principalmente áreas acidentadas, onde a população vivia em abrigos rochosos, com ou sem aldeias externas complementares; mas em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, em áreas sem abrigos, construía pequenas aldeias a céu aberto. A cerâmica é simples, de pequeno tamanho e sem decoração. É a mais antiga do Planalto, recuando em Minas Gerais talvez a 2.000 anos AC. Os cultivos eram variados: milho, mandioca, amendoin, feijões, abóboras e cabaças; ao menos algumas dessas plantas eram ainda bastante primitivas e incompletamente domesticadas. Frutos do cerrado e caça completavam sua nutrição. É possível que essa tradição ceramista tenha nascido no meio dos caçadores e coletores que moravam nos abrigos, tocados pelos novos

111 - Op. Cit.

112 - SCHMITZ, Pedro Ignácio. O povoamento do Brasil. In: História Pré-Colonial do Brasil (Coordenado por ALVES FILHO, Ivan), Editora Europa, Rio de Janeiro,

1993, pp. 27-49.

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horizontes tecnológicos, portadores tanto dos cultivos como da cerâmica. As pequenas roças ficavam na frente mesmo dos alcantilados em que viviam. O fato de continuarem morando em abrigos naturais até a chegada do homem branco pode transmitir a impressão de que aí ficaram como que refugiados, enquanto os terrenos mais aplainados eram progressivamente invadidos pelos cultivadores das grandes aldeias da Tradição Aratu/Sapucaí, de cuja origem talvez sejam corresponsáveis. Também a Tradição Una certamente é da grande família lingüística Jê." p. 41

Já para Prous113, as manifestações da tradição Una estão

"... espalhadas sobre um grande território (rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás, Espírito Santo), enquanto sua duração parece abranger pelo menos dois milênios, as manifestações da tradição Una certamente não formam um conjunto homogêneo. Tentamos no presente trabalho, subdividi-las em duas variedades, sem que que esta operação, prática didaticamente, talvez não seja justificada pelas pesquisas posteriores. A tradição Una variedade "A", definida geograficamente (o Norte mineiro e Goiás meridional) e cronologicamente, já que forneceu as datações mais antigas atualmente disponíveis para a tradição. Parece, portanto que esta variedade corresponde à zona nuclear a partir da qual a tradição ter-se-ia espalhado." p. 333

"A tradição Una variedade "B", é formada pelos primeiros sítios encontrados em Minas Gerais, no Espírito Santo e, sobretudo, no Rio de Janeiro. Ocupam uma posição periférica em relação ao grupo "A", do qual poderiam ser oriundos." p. 338

Além disso, deve-se mencionar que em termos de pesquisa arqueológica, a região que

engloba o Norte do Estado do Rio de Janeiro e o Sudeste do Estado de Minas Gerais, que por

proposição e trabalho de Dias Júnior, por ter os mesmos problemas e questões, forma uma

área cultural e arqueológica única, possui:

• as pesquisas realizadas pelo Instituto de Arqueologia Brasileira, com seu Programa de

Pesquisas Grutas Mineiras;

• as pesquisas realizadas pelo Instituto Superior de Cultura Brasileira, com seu

Programa Arqueológico do Norte Fluminense;

• as pesquisas realizadas pelo Setor de Arqueologia do Museu Nacional do Rio de

Janeiro, com seu trabalho na Pedra da Babilônia, Município de Rio Novo – MG;

113 - PROUS, André. Arqueologia brasileira, Editora UNB, Brasília, 1992.

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• as pesquisas realizadas pelo Programa Arqueológico Puri-Coroado, primeiramente

com o apoio institucional da Universidade Estácio de Sá e atualmente do Centro

Regional de Ensino e Pesquisa e do Centro Educacional Palmieri.

Referindo-se aos aspectos da cultura material, Beltrão114 falando sobre o interior, diz

que sua cerâmica (anexo 8, desenho 1)

"... ocorre em acampamentos Puri e cemitérios Puri. A cerâmica Puri, das lapas de Santa Maria Madalena, descrito por Faria (1942, ms.) apresenta as seguintes características: "vasos de cor escura; superfície do corpo lisa;. bordo com ligeiro espessamento na face externa e decoração constituída de traços inclinados. Observando-se o bordo da peça na parte fraturada, verifica-se que o espessamento era obtido pela aposição de novos rolos, nesse caso três. Assim conseguiam uma espécie de escalonamento, e a cada um desses rolos correspondia uma faixa de ornatos. Pasta muito porosa, contendo grande quantidade de areia. Os traços. incisos no bordo são apenas inclinados mas com uma regularidade apreciável, de sorte que o conjunto se apresenta bastante harmonico"." p. 37

Por sua vez, sobre a morfologia das populações indígenas, Beltrão115, diz que

"Não puderam ainda ser definidas as características morfológicas do Puri. Seus esqueletos foram encontrados nas lapas de Santa Maria Madalena (zona montanhosa do interior do Estado do Rio de Janeiro). Essa indefinição da morfologia do grupo Puri (tronco Macro-Jê, família Coroado) deve-se não só ao reduzido número de esqueletos até agora encontrados, como também à exiguidade de informações por parte dos especialistas." p. 41-42

Com relação ao segundo panorama, de caráter histórico, antropológico e/ou

etnológico, temos o relacionamento constante e, ao que tudo indica, afirmativo, associado,

principalmente, aos sítios da tradição Una, nos Estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais,

aos grupos indígenas Puri e Coroado. Apesar dos diversos autores que fazem esta relação,

são nas conclusões de Dias Júnior & Carvalho116 que encontramos as principais colocações

sobre o tema.

114 - BELTRÃO, Maria da Conceição de Morais Coutinho. Pré-História do Rio de Janeiro, Forense Universitária / Instituto Estadual do Livro, Rio de Janeiro, 1978.

115 - Op. Cit.

116 - Op. Cit.

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“Embora não possamos relacionar com certeza absoluta os dados etnográficos aos arqueológicos, podemos utilizá-los como elementos de raciocínio e reconstituição e acreditar que o povoamento pré-histórico ... , da serra guardou traços de similaridade com aquele do período histórico e que existem elementos de coesão entre ambos. Por outro lado, as provas arqueológicas apontam um povoamento Tupiguarani (fase Ipuca) para a mesma área referida pelos cronistas como habitat dos Coroados (rio Muriaé) e também para o local onde eles foram aldeados no início do século XIX, em São Fidélis. Embora Métraux, entre outros, classifique-os como do mesmo grupo lingüístico do Puri (daí denominá-los Puri-Coroado) e avente a hipótese de que ambos tenham partilhado um passado comum, a reconstituição arqueológica não confirma a teoria, pela existência, até o momento, de vestígios não Tupiguarani na área designada para os Coroado. Aliás, observando-se atentamente NeuWied, nota-se que ele aponta diferenças somáticas e culturais entre os dois grupos, além de se referir à tradicional inimizade entre ambos. Ele se refere, ainda, ao uso dos antigos Coroado, de enterrar seus mortos sentados, isto é, fletidos, em urnas que chamavam "camucis", ... ”, pp. 75-76.

"Em todo caso, não nos parece haver dúvida de que os dados arqueológicos confirmam, aqui, o que a tradição etnográfica indica, de que Guaitacá, Coropó e Puri compartilhavam uma tradição cultural comum, da qual a evidência mais notada, além dos artefatos, era a língua aparentada." p. 77

2.4 - o trabalho de pesquisa histórica

"A incompreensão do presente nasce fatalmente da ignorância do passado. Mas talvez não seja mais útil esforçarmo-nos por compreender o passado se nada sabemos do presente." (BLOCH, Marc. Introdução à História, coleção Saber, volume 59, Publicações Europa-América, Mira Sintra, 1976, p. 42)

2.4.1 - a fonte documental

Identificar e analisar algum tipo de documentação sobre sociedades indígenas do

Brasil tem sido, para nós, pesquisadores do Programa Arqueológico Puri-Coroado117, uma

117 - O Programa Arqueológico Puri-Coroado é um Programa de Pesquisas criado em 1992 e que desde então vem trabalhando com os grupos indígenas Puri e Coroado.

Este Programa recebeu, no período de 1993 à 1998, apoio da Universidade Estácio de Sá e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e atualmente

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tarefa árdua, principalmente em função da exigüidade das fontes e de sua grande dispersão

pelos mais variados tipos de arquivos.

Quando conseguimos identificar, localizar e ter acesso a um tipo de fonte que poderá

permitir um conhecimento mais profundo sobre os índios, ou sobre as Instituições que se

acredita serem responsáveis pelos mesmos, é um indício de que provavelmente novos dados,

ainda desconhecidos, virão à tona.

Foi desta forma que ocorreu, por exemplo, com a documentação encontrada no

Arquivo Público Mineiro, em Belo Horizonte - MG, referente à Direção Geral de Índios,

criada em 24 de julho de 1845, pelo Decreto Lei número 426, do “Conselho d’Estado do

Império do Brasil” (anexo 9, documento 1). Através dele, ficou estabelecido o cargo de

Diretor Geral de Índios, escolhido, pessoalmente, pelo Imperador, para cada uma das

Províncias que ainda tivessem representantes de algum grupo indígena. Os Diretores,

escolhidos pelo Imperador, deveriam, por sua vez, escolher os membros que iriam exercer, de

forma efetiva, o cargo de Diretor de Índio, em cada um dos aldeamentos da Província. Estes

Diretores ficariam sob controle direto do Diretor Geral de Índios, que por sua vez, prestaria

conta de seus atos, e de seus subordinados, ao Presidente da Província, e este, por sua vez, ao

seu Ministério.

O Decreto 426, também conhecido como “Regimento das Missões”, estabeleceu o

conjunto das idéias básicas do Império a respeito da questão indígena e impôs o “paternalismo

oficial” sobre os indivíduos considerados, pelo Estado, incapazes de gerir seus próprios

interesses. Este foi o motivo pelo qual os deixou sob a responsabilidade do Juiz de Órfãos.

A importância desta documentação está no fato da mesma mostrar a “política oficial”

em relação a populações indígenas de uma determinada região, em nosso caso particular a

bacia do rio Pomba, na Província de Minas Gerais.

Devido ao pouco conhecimento e às poucas, e esparsas, referências sobre Puri e

Coroado, não é possível encontrar, em um único local, seja biblioteca ou arquivo, informações

suficientes para se falar, ou pensar, nestes grupos, de forma clara e segura.

Desta forma, o que pode-se observar até o momento, quando mais de 300 referências

bibliográficas já foram identificadas, consultadas e fichadas, é que estas referências podem ser

divididas, em termos de existência, em dois tipos principais, anexo 10, roteiro 1:

continua recebendo apoio da Prefeitura Municipal de Visconde do Rio Branco - MG, do Posto de Fomento do IBAMA em Visconde do Rio Branco - MG, do Museu

Municipal de Visconde do Rio Branco e do Centro Educacional Palmieri. Conta neste momento, com uma equipe de 11 pessoas trabalhando em torno de seu objeto de

estudo. Além disso, possui autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional para os trabalhos de campo.

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• pela autoria - viajantes, cronistas, religiosos, historiadores e pesquisadores em geral e

por documentos produzidos pelo Estado;

• pela forma - cartas, relatórios, decretos, ofícios, instruções, mapas, plantas, cartas

topográficas, livros, informações orais e material cultural, entre outras.

É importante lembrar que estes dois tipos de ocorrência podem estar presentes em

qualquer dos tipos de fontes: escrita, oral ou cultural.

Por sua vez, o tipo de informações apresentadas por estes documentos, no que se

refere aos Puri, Coroado e, eventualmente, Coropó, está dividida em três grandes grupos, aquí

apresentados na ordem de importância no que se refere a freqüência com que aparecem:

origem e dispersão, modo de vida e estrutura física, e aldeamentos.

No primeiro destes grupos, origem e dispersão, as referências dão conta, como já

mencionamos, de uma dispersão por quatro Estados - Norte do Estado do Rio de Janeiro,

Sudeste do Estado de Minas Gerais, Sul do Estado do Espírito Santo e Nordeste do Estado de

São Paulo - estando o maior, e mais freqüente, número de informações para o Estado de

Minas Gerais, onde, ao que tudo nos indica, teriam suas origens. Nesta área, que abrange os

quatro Estados, em forma aparentemente elipsoide, seus assentamentos aparecem

relacionados a dois tipos de locais, sempre interligados: as serras e/ou os rios.

É desta forma que os rios Paraíba do Sul, principalmente à sua margem esquerda, o rio

Pomba e o rio Murihaé, afluentes da margem esquerda do rio Paraíba do Sul, o rio Chopotó,

margem esquerda do rio Pomba, o rio Novo e o rio Pardo, margem direita do rio Pomba, o rio

Itabapoana e o rio Itapemirim, à sua margem direita, bem como todos os seus afluentes, são

freqüentemente citados. No que diz respeito às serras, a serra da Mantiqueira, em sua borda

sul - onde nascem a maioria destes rios, exceção feita, por exemplo, ao rio Paraíba do Sul - é

seu principal referencial, muito embora ela não seja citada, mas sim seus nomes regionais, tais

como a Serra da Onça, Serra de São José e a Serra de São Geraldo, entre tantas outras. Além

da serra da Mantiqueira, também podem aparecer informações relacionadas à serra do

Caparaó ou então a alguns pontos do movimentado, e ondulado, relevo desta área.

No que refere-se a origem, tudo nos leva a acreditar na hipótese de uma "origem" na

região do rio Pomba em Minas Gerais, embora muitos autores digam ser eles descendentes

dos Goitacá, portanto, do litoral Norte do Estado do Rio de Janeiro. Estas observações são

feitas, sempre, por europeus que os vêem, quando de sua chegada ao Brasil, a partir de 1500,

subindo, principalmente, o rio Paraíba do Sul e seus principais afluentes, rio Pomba e rio

Murihaé. Nossa hipótese de trabalho, neste caso, estará sendo pensada a partir de três pontos:

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a inexistência de informações, sejam arqueológicas ou históricas, de sua presença no litoral, o

amplo domínio territorial desta área litorânea pelos Goitacá, e a diferença cultural e

tecnológica entre eles. Assim, acreditamos que estes grupos, Puri e Coroado, já haviam

descido por estes rios, em um tempo ainda não estabelecido, e no momento da chegada dos

europeus, 1500, iniciavam seu retorno ao "sertão", seja em decorrência da chegada de um

elemento totalmente estranho a ele, seja pelo amplo domínio desta área pelos Goitacá, de

sabida bravura. É muito bom lembrar também, que alguns jamais conseguiram retornar,

adaptando-se às novas condições e chegando a aceitar a catequização e o aldeamento.

Outro ponto nesta questão da origem, que acreditamos ser importante, são os Coropó,

grupo que aparece sempre em território mineiro e ligado aos Coroado. Embora não

tenhamos, até o momento, referências a respeito, acreditamos serem, os Coropó, uma

corruptela regionalizada dos Coroado, uma vez que seus elementos são idênticos, ao ponto de,

quando não ter seu nome mencionado, ser muito difícil identificar a qual grupo refere-se a

informação.

O segundo grupo de informações, em termos de freqüência, apresentados pela

documentação, diz respeito ao modo de vida e a estrutura física dos Puri e Coroado. Estas

informações dão conta de dois grupos indígenas totalmente distintos, especialmente em

termos de sua estrutura física. Este fato faz com que muitos autores rejeitem,

veementemente, a hipótese de uma origem comum para Puri e Coroado.

Dos Puri sabemos, com grande freqüência, entre outras coisas, que eram ferozes, que

teriam uma compleição robusta, pele clara e uma forte dentição. Além disso eram nômades,

seja pela busca de locais que lhes garantissem alimento, seja pela desocupação em função da

morte de um de seus membros. Sua economia era baseada na caça e na coleta, bem como,

segundo Wied118, seriam antropófagos, embora jamais tenham confessado comer carne

humana.

“ Que os Puris coman, às vezes, os corpos dos inimigos mortos, confirmam-no várias testemunhas dessa parte do país. O Padre João, de S. Fidélis, assegurou-nos que, viajando certa vez para o rio Itapemirim, encontrou na selva o corpo de um negro, morto pelos Puris, sem braços nem pernas, em volta do qual havia uma porção de urubus. Acentuamos acima que os Puris jamais nos confessaram comer carne humana; ... ” p. 127

118 - Op. Cit.

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Dos Coroado por sua vez, em comparação aos Puri, eram grupos mais dóceis, com

uma estatura menor e uma pele mais escura. Também seriam nômades, embora com um

movimento de populações bem menor do que o apresentado pelos Puri. Também, baseavam

sua economia na caça e na coleta.

O terceiro grupo de informações, em termos de freqüência, apresentados pela

documentação diz respeito aos aldeamentos. Neste ponto, duas observações são marcantes.

A primeira diz respeito aos índios Puri, que devido ao seu modo de vida e sua tão propagada

bravura, não teriam sido aldeados. Alguns documentos sugerem, embora de forma indireta,

uma tentativa de aldea-los em São João Batista do Presídio, hoje Visconde do Rio Branco -

MG, pelo então Inspetor Geral dos Índios de Minas Gerais, Guido Thomaz Marlière. Mas

não passam, no caso desta área, de meras sugestões e interpretações. Além desta referência,

são raros, se comparados com as referências a respeito dos Coroado, os momentos que dêem

conta de aldeamentos Puri, como os relatados por Reis119.

Situação totalmente contrária acontece quando tratamos com os Coroado, que talvez

devido a sua índole, foram facilmente aldeados por quem com eles travassem contato. Um

dos vários exemplos disso podem ser as atuais São Fidélis, Itaocara e Conservatória, todas no

Estado do Rio de Janeiro, e que têm como origem o aldeamento de índios Coroado.

Para um assunto apresentado, no início da pesquisa, como de poucas referências

bibliográficas, o presente trabalho nos mostra que as referências existem, sendo possivel, com

um pouco de esforço, trabalhar com os grupos indígenas que teoricamente não têem muitos

elementos para serem considerados, por serem de lingua isolada ou de menor importância

para a História e/ou a Antropologia. Além disso, para o trabalho do arqueólogo este tipo de

pesquisa representa uma fonte muito rica na qual ele deveria buscar os elementos que lhe

permitam, com maior facilidade, identificar a sociedade com que está ou irá trabalhar.

Os principais documentos que nos informam sobre os grupos indígenas, e não poderia

ser diferente com os grupos Puri e Coroado, são os relatos de "viajantes" e "cronistas" que

passaram pelo território nacional desde o século XVI até o XIX.

Contudo, este grupo de documentos apresenta, em maior ou menor escala, problemas

de ordem prática, como por exemplo, o elevado etnocentrismo e o pouco, ou nenhum,

conhecimento sobre as diversas tribos que pretendiam descrever e analisar. Estes problemas

são ainda mais sérios na medida em que recuamos no tempo, uma vez que as obras não devem

ser totalmente confiáveis, devido principalmente às inúmeras falhas nas descrições.

119 - REIS, Paulo Pereira dos.. O aldeamento dos Puri ede São João de Queluz. In: Revista de história, número 61, São Paulo - SP, 1965, pp. 117-158.

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Todavia, ainda que apresentando problemas, estas obras, se lidas com um olhar crítico

e atento, permite atingir, ainda que de forma frágil, o universo destes grupos, ou seja, suas

características físicas, culturais, religiosas, políticas e econômicas. Além disso, permite-nos

também um contato com o meio ambiente que os cercavam, propiciando assim, subsídios para

as análises de paleoambiente, de paleoflora e de paleofauna.

O terceiro tipo de documento remete-nos às questões oficiais do aparelho de Estado,

ou seja, os documentos produzidos pelo "Estado". Estão incluídos neste item: os relatórios,

ofícios, instruções, cartas, decretos, mapas, plantas e cartas topográficas, entre outras formas

de documentos, dos Presidentes de Província, Diretores Gerais de Índios e dos

"desbravadores", que o faziam em nome do Estado.

Este grupo de documentos possuí em comum o fato de estarem ligados, diretamente,

aos interesses do Estado, ou seja, em todos eles há uma preocupação de situar, claramente, o

comportamento do índio em suas regiões: se estão pacificados, ou não; que tipos de

problemas estão provocando; se há condições de aldeá-los, ou não; enfim, questões ligadas

diretamente à idéia de ordem e de modernização das áreas.

Além dessas idéias básicas, há que ressaltar também uma preocupação geral com

respeito à terra. As tribos indígenas são, assim como os quilombolas, elementos que

atrapalhavam o avanço das fronteiras agrícolas. Por isso, no caso dos indígenas, há uma

preocupação em aldeá-los, seja em suas terras ou não, de forma pacifica ou não, mas com o

objetivo de que possam não apenas servirem de mão-de-obra, mas também de liberar mais

terras para os grandes proprietários.

Devido a este caráter de informação ao "Estado" sobre as condições da região, no que

diz respeito à seus habitantes primitivos, estes documentos não possuem um detalhamento

maior sobre os aspectos sociais, culturais, econômicos, religiosos e físicos dos grupos

indígenas envolvidos. Na maior parte das vezes, apenas é informada sua localização e o

estado em que se encontram, ou seja, se estão aldeados, se são pacíficos, se são arredios, etc..

Dos documentos que podemos identificar e relacionar dentro deste tipo de ocorrência,

destacam-se:

1o - Os documentos produzidos pelos Presidentes de Províncias, que são de geração

constante e portanto, podem nos fornecer dados qualitativos e quantitativos de grande

valia, na medida em que percebe-se as mudanças no tratamento dispensado aos

indígenas de acordo com as variações da política nacional.

2o - Os documentos produzidos pelos Diretores Gerais de Índios, através dos quais

percebe-se que a grande preocupação, não apenas do Diretor Geral de Índios, mas

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principalmente das autoridades regionais e nacionais, é a busca de soluções no sentido

de fazer com que o índio não atrapalhe o "Estado" na busca de novas fronteiras e ainda

sirva de mão-de-obra na implementação deste objetivo.

3o - Os documentos produzidos pelos "desbravadores", que têm uma preocupação muito

clara: conhecer para melhor explorar. Para tanto, é necessário percorrer grandes

extensões do território nacional, tendo contato com o maior número possível e os mais

variados tipos de tribos indígenas. São nestes contatos que se passa a conhecer um

pouco de suas culturas. Logo, seus relatórios são um manancial excelente para

sabermos como vivem, onde vivem, como pensam, em que acreditam, enfim,

conhecermos a vida destes grupos.

O quarto tipo de documento, são os que dizem respeito à "Igreja". De uma certa

forma, dependendo do tipo de documento em análise, poder-se-ia associá-lo ao grupo anterior,

ou seja, documentos produzidos pelo Estado, pois ambos nos remetem à visões oficiais, de um

lado, a do Estado, e de outro, a da Igreja. Apesar disso, este tipo de documento possuí uma

característica que o faz diferente do anterior: a preocupação em conhecer, e reconhecer, os

grupos indígenas com os quais estão tratando.

Para que pudesse haver um efetivo controle sobre os indígenas, era necessário, antes

de mais nada, que os mesmos fossem conhecidos, e reconhecidos, pelos religiosos. Daí,

decorre a preocupação em descrever seus aspectos culturais, políticos, religiosos, econômicos,

físicos, artísticos, etc.. Mas isto não significa dizer que esta preocupação fosse com vistas à

manutenção destes aspectos. Muito pelo contrário, o interesse era conhecer para transformar.

Estas descrições, em alguns casos feitas de forma minuciosa, são essenciais para a

identificação, em campo, dos vestígios materiais de um ou de outro grupo indígena, na

medida em que se preocupam em descrevê-los de acordo com suas especificidades,

propiciando-nos assim, a possibilidade de identificarmos a que sociedade pertenceu aquele

artefato.

O quinto tipo de fonte útil ao trabalho do arqueólogo, remete-nos às referências

bibliográficas secundárias, normalmente de "historiadores" e/ou de "pesquisadores em geral",

que de uma maneira ou de outra, tratam de questões indígenas, em nosso caso, mais

especificamente, dos Puri e dos Coroado. É uma lista de referências bibliográficas extensa

mas que de maneira geral, pouca preocupação teve com as sociedades indígenas. Logo, o

trabalho de leitura e de análise, é demorado e requer o confronto constante com os dados e

referências já disponíveis nas demais fontes.

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Em alguns casos, estas referências podem, ainda, ser primárias. Como exemplo,

podemos citar uma entrevista, escrita ou gravada, ou mesmo as cadernetas de campo de

pesquisadores como antropólogos, geógrafos, arqueólogos, sociólogos, etc.. Nela é comum

se encontrar, entre outras coisas, anotações, descrições, desenhos e croquis.

Ao sexto tipo de documentos pertencem as “declarações orais” feitas pela população

local que, de uma maneira ou outra, têm os Puri e os Coroado como sociedades próximas. A

forma deste documento é a entrevista, tornada documento pelos métodos da História Oral.

Podemos dizer que algumas regiões são conhecidas por terem abrigado alguns grupos

indígenas. Por conta disto, seus moradores mantêm viva na memória local, as estórias a

respeito destas ocupações e de suas ligações com os descendentes destes grupos. Em

entrevistas, muitas vezes declaram serem conhecedores dos locais onde pode-se encontrar os

restos indígenas - fornos, cemitérios, material cerâmico, material lítico, etc. - que comprovem

suas afirmações.

O sétimo tipo de documentos remete-nos diretamente aos “vestígios culturais”

produzidos por estas mesmas sociedades. Trata-se de sua cultura material e do uso que

fizeram da mesma. Esta fonte somente será manuseada e utilizada em uma etapa posterior, a

partir do momento que se iniciar os trabalhos de campo, escavações, e quando a maioria das

outras já tiverem fornecido dados suficientes e necessários para permitir escavações seguras e

análises pertinentes.

2.4.2 - a fonte oral

A busca de um sítio arqueológico, pelo arqueólogo, sempre foi algo muito pouco

considerado, seja em termos práticos, seja em termos de elaboração metodológica,

principalmente no sentido de poder retirar muito mais que simples indicações, fortuitas, de

locais com cerâmicas, ossos, pedras e pinturas, de alguém que pode ser o proprietário da terra,

um caçador, que ouviu, e/ou conhece, sobre a existência de tais materiais, ou mesmo pelo

próprio arqueólogo ao averiguar, em campo, a possibilidade de existência destes materiais em

locais propícios para isto, tais como cavernas e abrigos, entre outros.

Esta tarefa de busca do sítio arqueológico é normalmente incluída na etapa de pesquisa

denominada, pelo arqueólogo, de prospecção arqueológica e que significa, na verdade, a

exploração, do local escolhido, ou indicado, como sítio arqueológico e que pode, ou não,

apresentar material arqueológico de superfície. Normalmente, é justamente este material, de

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superfície, que serve de referência para a indicação, por outrem ou pelo próprio arqueólogo,

daquele local como sítio arqueológico.

Esta busca a sítios arqueológicos acontece, sempre, em função de uma, ou mais,

indicações para uma área ou região a qual, tendo confirmada a sua existência torna-se objeto

de projeto de pesquisa. Ela também acontece, quando o arqueólogo estiver trabalhando em

um determinado sítio arqueológico e buscar, através de informações de moradores, caçadores

ou conhecedores da região, os possíveis locais com indicativos, já mencionados, de outros

sítios.

Nossa proposta portanto, é de que este trabalho de busca seja algo metodologicamente

elaborado e não apenas um encontro fortuito de um sítio arqueológico. Assim, o encontro

deste passaria a ser documentado da forma mais completa possível, recuperando a forma

como aquela sociedade, ou aquele segmento social, percebe, entende, se relaciona e utiliza

aquele tipo de informação, seja a nível pessoal, seja a nível coletivo.

Desta forma, o uso da História Oral nesta etapa da pesquisa arqueológica nos parece

ser o método mais correto para a recuperação de tais informações, bem como de produzir

material primário para uma série de outras pesquisas na área da Arqueologia, Sociologia,

História, Antropologia, etc..

Em nosso trabalho com os grupos indígenas Puri e Coroado, já extintos, ao

trabalharmos na margem esquerda do rio Pomba, principalmente na serra da Piedade, Santa

Maria e São Geraldo, nos municípios de Visconde de Rio Branco e São Geraldo, Zona da

Mata mineira, estamos utilizando tal proposta. Para tal, propomos um roteiro mínimo a ser

seguido quando das entrevistas com as primeiras pessoas selecionadas. Nele tentamos

contemplar várias questões, embora as informações que mais nos interessam sejam as que

recuperam os locais ocupados ou utilizados pelos grupos Puri e Coroado. Com certeza,

inúmeras questões deverão ser acrescentadas ao roteiro, depois das primeiras entrevistas.

Dessa forma, propomos aqui, a ampliação deste trabalho do arqueólogo, ou seja, de

que esta racionalidade existente deva ser demonstrada e analisada a partir da busca e

identificação do sítio arqueológico, inserindo aí, através da História Oral, o tratamento às

fontes orais que nos levam até o sítio e que nos falam de seu envolvimento com ele, seja de

forma individual, seja de forma coletiva. Com isso, o arqueólogo poderá entender melhor

porque aquele local encontra-se da forma como está (intacto, destruído, preservado, ...) e

tratá-lo de maneira mais adequada, principalmente com relação ao método mais apropriado

para a recuperação daquele material arqueológico.

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Esta proposta de pensar o sítio arqueológico levando em consideração o conjunto de

espaços utilizados por uma sociedade em determinado tempo, associando-o, através da

História Oral, à forma como um segmento de nossa sociedade o vê e o concebe, nos faz

pensar de forma diferente, ou seja, de que aquele espaço não parou no tempo quando de sua

desocupação pelo homem "pré-histórico", mas, pelo contrário, continuou sendo ocupado até

nossos dias, por sociedades diversas e com concepções diferentes, seja em termos de espaço e

de mundo, ou de vida. É desta forma que os arqueólogos têm encontrado um sem número

sítios arqueológicos, de momentos muito diferentes, sendo ocupados ainda hoje. Se não

estivermos preparados e conscientes de tal fato tenderemos fazer interpretações que não

corresponderão a realidade que buscamos.

O arqueólogo, na busca do sítio arqueológico, entra em contato com três tipos de

referências: a fonte oral, a fonte escrita e a evidência material. A ordem, ou a seqüência,

desta lista é aleatória, dependendo exclusivamente do arqueólogo e de seu método de

trabalho.

Apesar disso, indiscutivelmente a referência mais utilizada e considerada é a evidência

material, por possuir indícios mais diretos, seguros e rápidos na localização do sítio

arqueológico. Nela podem ser utilizados vários métodos, tais como, observação direta,

fotografia aérea e detecção por resistibilidade, entre outros.

A fonte escrita, por sua vez, se comparada ao seu grande potencial, é muito pouco

utilizada. Acreditamos que este fato aconteça devido, principalmente, a maior familiaridade

do arqueólogo com a cultura material, com o trato dos restos materiais, com o material

arqueológico, em campo ou em laboratório. Isto é, com certeza, um dos principais motivos

que o afasta dos arquivos e do manuseio de fontes escritas, uma vez que, ao menos no caso

brasileiro, o arqueólogo deve ser aquele que trabalha com o documento material. O

responsável pelo documento escrito seria o historiador.

No que diz respeito a fonte oral, esta sim, raramente é utilizada, ou quando utilizada, é

subestimada. Quando falamos que raramente ela é utilizada, estamos nos referindo ao

depoimento do informante para a produção de uma fonte, e não apenas como um instrumento

a ser utilizado pelo arqueólogo, para que se possa chegar ao sítio arqueológico. Apesar do

depoimento de informantes, ser utilizado com extrema freqüência, muito raramente é

mencionado na literatura arqueológica. A prova pode estar ao analisar algumas referências120

120 - CAMPS, Gabriel.. Manuel de recherche préhistorique, Paris, Dois Editeurs, 1979.

ALIMEN, Marie-Henriette & STEVE, Marie-Joseph.. Prehistoria, Historia Universal - Siglo XXI, volumen 1, Madrid, Siglo XXI Editores, 1975.

RAHTZ, Philip.. Convite à arqueologia, Rio de Janeiro, Imago Editora, 1989.

FRÉDÉRIC, Louis.. Manual prático de arqueologia, Coimbra, Livraria Almedina, 1980.

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que tratam, "em termos teóricos", do trabalho de campo do arqueólogo. Verificamos que

apenas duas delas fazem menção direta à utilização de informações fornecidas pela população

local na busca dos sítios arqueológicos.

"A principal fonte de informação na localização de sítios arqueológicos são os próprios habitantes locais. Os residentes de Três Lagoas, por exemplo, poderiam indicar ao arqueólogo diversos sítios a serem usados como ponto de partida. Os demais seriam localizados viajando-se pelo rio e parando de casa em casa para tomar informações. ... No caso da vegetação ser muito densa e a área nunca ser atingida por inundações, então a pesquisa dependerá quase que exclusivamente das informações dos residentes locais. Felizmente, a maioria desses residentes é usualmente observadora, não lhe passando desapercebido qualquer aspecto fora do comum, como cacos lembrando-se freqüentemente da localização de tais ocorrências. " (Evans & Meggers, 1965, pp. 32-33)

" ... de uma maneira geral, uma grande parte das investigações arqueológicas exerce-se no terreno, em contacto com as fontes de informação no seu próprio lugar de origem. " (Moberg, 1986, p. 46)

Se, ao contrário disso, analisarmos referências que têm por base a apresentação

"prática" do trabalho do arqueólogo, também verificaremos que este mesmo quadro se

repetirá, ou seja, não há menção de como aquele sítio arqueológico foi encontrado e de que

forma a sociedade que o circunda, a sociedade no qual está inserido, o tem em sua realidade.

Embora este tema não esteja apresentado, e discutido, em nenhum manual de

arqueologia, seja para iniciantes, amadores ou profissionais, é algo com o qual os arqueólogos

vivem, e necessitam, permanentemente, quando estão em campo. Muitas vezes, dependendo

da região e do conhecimento que se tem da mesma, o que era, até então, um informante

fortuito, é transformado em guia, passando a acompanhar todos os passos das campanhas de

campo.

Algumas vezes o guia não é necessário, mas mesmo assim é incluído na equipe. Isso

ocorre porque esta pessoa, que sempre é moradora da região e conhecida da população,

domina a linguagem e os costumes usados por todos, podendo com isso facilitar, em um

primeiro momento, o acesso a esta população, bem como, posteriormente, aos locais de

CHILDE, Veri Gordon.. Introdução à arqueologia, coleção Saber, Mira-Sintra, Publicações Europa-América, 1980.

BRAY, Warwick & TRUMP, David.. Dictionary of archaeology, Harmondsworth, Penguin Books, 1982.

MOBERG, Carl-Axel.. Introdução à arqueologia, Lisboa, Edições 70, 1986.

EVANS, Clifford & MEGGERS, Betty J.. Guia para prospeção arqueológica no Brasil, série Guias - 2, Belém, Conselho Nacional de Pesquisa / Museu Paraense

Emílio Goeldi, 1965.

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interesse arqueológico, e que eventualmente poderão ser objeto de estudo daquela pesquisa

e/ou daquele arqueólogo.

O informante, que poderá ser um morador e/ou alguém que conhece a região escolhida

para a pesquisa, é a principal referência para a produção de informações que poderão nos

levar a locais de interesse arqueológico. A qualidade do informante, ou da informação, será

medida pelo conhecimento, pelo tempo e pelo grau de interação que o mesmo tem com a

região e com seus moradores.

Além das informações sobre os locais com restos arqueológicos, outro elemento que

nos será apresentado na entrevista, e que poderá ser utilizado também por Sociólogos,

Antropólogos, Historiadores, Etnólogos, Geomofólogos, Ecologistas, entre outros, será a

relação e a forma como estes locais, de interesse arqueológico, foram inseridos naquele

espaço durante os mais váriados momentos de tempo, e como aquela comunidade,

representante de um desses momentos de tempo, o concebe.

A relação entre arqueólogo e informante, ponto fundamental nessa proposta de uma

arqueologia pensada como uma Ciência da História, multidisciplinar, capaz de produzir

informações, e documentos, que poderão ser utilizados por outras áreas do conhecimento, tem

como uma de suas bases a História Oral. Este método, por conseqüência, transforma o

depoimento do informante em uma fonte, e como tal, o coloca a disposição do público e dos

pesquisadores para usos diversos.

O depoimento, principal momento na relação entre arqueólogo e informante, é o

instrumento que recupera, ou tenta recuperar, as informações tencionadas. Ele deverá ter

como base um questionário elaborado a partir das questões consideradas necessárias e

importantes para a elaboração de um parecer a respeito da realidade arqueológica da região.

Dentre as inúmeras questões que envolvem, ou que deveriam envolver, o trabalho do

arqueólogo quando da busca, em campo, do sítio arqueológico, estão as relações existentes

entre ele, sítio, e a comunidade que o envolve.

Embora este fato seja, na maioria das vezes, simplesmente ignorado, toda comunidade,

ou segmento dela, que tem um sítio arqueológico próximo a si, localizados em terras de

alguns de seus membros ou, quando não, próximos a elas, tem uma determinada postura em

relação a estes locais, provocando o estabelecimento de novas relações com eles, locais, e

com o mundo que o circunda, seja em termos familiares, de amizade, comunitários ou sociais.

Esta postura, em relação a estes sítios arqueológicos, podem variar desde sua total

destruição até sua total preservação, podendo passar por uma variada gama de atitudes, dentre

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as quais uma é extremamente comum, a de omitir ou esconder a informação. Isto pode

ocorrer principalmente por desinformação ou por medo.

No caso da desinformação, a mesma pode ser em função de várias questões. A mais

contundente refere-se ao valor, financeiro, que estes locais, e seu material, podem ter. Por

inúmeras vezes nos defrontamos com pessoas que desejam vender informações sobre locais

com material cerâmico, lítico ou ósseo, ou mesmo querem vender o próprio material já

retirado por eles. Além disso, pode haver casos onde, em função de uma notícia de que este

tipo de informação e de material não têm valor financeiro, acaba por destruí-lo, podendo

chegar, até mesmo, a dinamitá-lo.

O medo, por sua vez, é outro motivo importante que faz com que locais com restos

arqueológicos sejam destruídos ou tenham sua identificação omitida. Isto ocorre

principalmente por questões místicas. Neste caso, a estes locais, principalmente com restos

de sepultamentos expostos na superfície, são imputadas informações do tipo "local

assombrado", "local de despacho", "local de desova de cadáveres", etc. Sempre haverá uma

notícia de que naquele determinado local, à noite, houve-se "vozes, barulhos, luzes", etc..

Além da informação, também devemos lembrar de quem produz estas visões acerca

destes locais. As visões podem ser diferentes, dependendo de quem originalmente as criou.

Para tal, sua credibilidade perante a comunidade, seu grau de instrução e sua posição social

são os elementos mais marcantes. A velocidade e a amplitude alcançada pela versão serão

diretamente proporcional ao seu grau de conhecimento e credibilidade junto a comunidade.

Por sua vez, o grau de instrução terá influência na fidedignidade da localização e na descrição

do achado, ou seja, quanto maior o grau de instrução, mais detalhado será o achado, ao

mesmo tempo que, quanto menor o grau de instrução, mais precisa será a localização. Isto é

de fácil explicação. No interior, a regra, com algumas exceções, é de que as pessoas com

alguma instrução estejam morando na cidade, enquanto que os menos favorecidos neste item

morem no campo, na serra, no mato, etc..

Por outro lado, a preservação destes locais estará diretamente relacionada a influência

e a posição social que ocupam algumas pessoas dentro de sua comunidade. Isto fará com que

alguns segmentos desta comunidade se dediquem a preservação destes locais, bem como

procurarem pesquisadores capazes de dar conta de tais elementos. Um bom exemplo disto

podem ser os "Rotary Clube" ou as "Associações Comunitárias". Dentro delas existem

inúmeras pessoas dedicadas a preservar todo e qualquer elemento que possa dar conta de sua

história e de sua cultura.

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Portanto, a relação existente entre o sítio arqueológico e a comunidade que o envolve é

de fundamental importância para o arqueólogo, uma vez que poderá ser exatamente esta

relação que determinará a preservação do sítio, ou do resto, a integridade e a preservação da

informação, e o seu acesso a ele.

Com o exposto até o momento, podemos ter um quadro que nos da conta da realidade

encontrada pelo arqueólogo na busca do sítio arqueológico. Nela verificamos ser importante

não apenas o sítio em si, mas principalmente a percepção, a seu respeito, da comunidade que

o envolve, uma vez que com ela poderá se ter, ou não, a informação do sítio, mesmo que este

já esteja destruído, ou parcialmente destruído.

Dessa forma, já nos é possível traçar um quadro a respeito das novas relações entre o

sítio arqueológico, a comunidade circundante e o arqueólogo no momento da "prospecção

arqueológica".

Na verdade, as relações existente entre os dois primeiros, sítio arqueológico e

comunidade circundante ou envolvente, não são novas, como poderíamos pensar e estamos

propondo. Elas sempre existiram, sempre estiveram lá, fazendo parte da realidade e do

processo de conhecimento daquela comunidade em relação aquele seu espaço de ocupação e

dos elementos que dele fazem parte. Nova seria a percepção e a utilização das mesmas,

enquanto fonte, pelo arqueólogo.

Fonte. Esta, acreditamos, seja a palavra chave. Porque a utilização deste

conhecimento, transformado em informação pelo arqueólogo, como já demonstramos, sempre

foi utilizado. O necessário é a transformação deste tipo de informação, e suas relações, em

algo sistemático e metodologicamente estabelecido e previsto.

Assim, o encontro do sítio arqueológico, até então envolvido por uma grupo de tarefas

denominadas "prospecção arqueológica", passaria a ter no mínimo três etapas: a verificação

das fontes escritas, a busca das informações orais, em locais indicados pela fonte escrita, que

serão transformadas em fontes orais, e a checagem destas duas informações "in loco" através

da existência, ou não, dos restos arqueológicos.

As informações restantes, recuperadas quando da produção da fonte oral, e não

manuseadas pelo arqueólogo, deverão ser utilizadas por pesquisadores de outras áreas, como

Antropologia, Sociologia e História, entre outras, principalmente no sentido de instaurar,

quando não a tem, naquela comunidade, a noção de preservação, de sua história, de sua

cultura e de sua identidade.

Da mesma forma que dissemos a pouco que a utilização de informações na busca do

sítio arqueológico não era algo novo, também a história oral, enquanto método, não o é.

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Nova é sua possibilidade de utilização pela arqueologia. E enquanto possibilidade sua

perspectiva é infinita.

É importante lembrarmos que para que esta visão possa ser plenamente implantada e

utilizada há a necessidade de alterarmos a forma de concebermos a Arqueologia. Não

podemos continuar entendendo o sítio arqueológico apenas como aquele local onde estão

alguns restos, sem identificar a sociedade a que pertencem e sem levar em conta os diversos

tipos de informações e de fontes existentes, e que a ele dizem respeito.

Dessa forma, após vários anos de trabalho no Norte Fluminense, e a constatação da

presença, sempre muito marcante, de diversos grupos indígenas, decidimos pela criação do

Programa Arqueológico Puri-Coroado. Este programa tem por objetivo principal trabalhar

uma sociedade específica, procurando seguí-la no tempo e no espaço, para demonstrar como

viveu e têm vivido.

É assim que, procurando recuperar "todas" as informações possíveis sobre estes dois

grupos, estamos trabalhando com a população da região das serras da Piedade, São Geraldo e

Santa Maria, nos municípios de Visconde de Rio Branco e São Geraldo, na Zona da Mata de

Minas Gerais, onde existe uma concentração muito grande de informações escritas e culturais,

para uma possível ocupação Puri e Coroado.

Com base na metodologia da História Oral, preparamos um roteiro, que já recebeu

uma terceira versão, para a realização das entrevistas. Nele procuramos dar ênfase a três

pontos: história de vida do entrevistado, história sobre o que sabe e o quanto sabe sobre os

índios que viveram naquela área, e a sua percepção sobre arqueologia.

As pessoas entrevistadas foram escolhidas por sua importância no achado de alguns

restos, por sua antigüidade na região e por indicação de outros entrevistados. Assim, foram

feitas até o momento, seis entrevistas, anexo 11.

Como esperávamos, a inclusão da História Oral na pesquisa arqueológica preencheu

todas as nossas espectativas, recuperando informações que julgavamos não encontrar e nos

dando indicações que, de outra forma, muito dificilmente seriam alcançadas. A prova está na

entrevista do Senhor Honório, quando nos diz que

“... se não fossemos tão chatos, ele não teria nos dado as informações que nos deu”

Em termos técnicos, as entrevistas iniciaram com o objetivo de cobrir uma lacuna

deixada pela pesquisa arqueológica, mais especificamente pela etapa denominada prospecção

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arqueológica. Como pesquisador, vínhamos percebendo, em nosso trabalho de localização de

sítios arqueológico, em campo, que as informações apresentadas pelo(s) informante(s),

membro(s) daquela sociedade onde o(s) sítio(s) estão inseridos, ou não eram fornecidas, e os

motivos podem ser os mais variados, ou não representavam a totalidade das informações que

detinha(m). No caso da primeira hipótese, três possibilidades nos são visíveis: as

informações estarem incompletas, inclusive ao próprio informante; as informações serem

imprecisas; ou mesmo as informações não serem verdadeiras. Após percebermos e

analisarmos este quadro, chegamos a conclusão que isto pode ocorrer por quatro motivos

específicos:

1o - Pelo informante não confiar nas pessoas estranhas que acabam de chegar em busca de

informações sobre locais com determinado tipo de "resto" e que em sua realidade

podem representar um sem número de coisas, muitas delas de teor místico ou de teor

financeiro, tais como a existência de ouro, por exemplo. Neste caso muitas vezes as

informações existem e na maioria delas são verdadeiras, mas são omitidas. Estamos

considerando-o como informante(s) primário(s).

2o - Pelo informante simplesmente não conhecer, ou reconhecer, o local ou mesmo não

deter as informações necessárias ou procuradas. Neste caso estão principalmente as

pessoas com uma idade mais avançada. Poderíamos considerá-lo como uma

informação secundária.

3o - Pelo informante, que neste caso é uma pessoa "mais esperta", e normalmente mais

jovem, querer uma importância maior do que a que lhe pode ser dada, em função das

informações que poderá prestar, ou mesmo dos locais que poderá indicar e que

realmente possuam os elementos procurados. Neste caso, existe sempre a tentativa de

uma barganha e que envolve, sempre, termos financeiros. Pode-se tratar, também, de

uma informação primária.

4o - Pelo informante deter uma, ou mais, informações de outra(s) pessoa(s). Neste caso a

imprecisão é muito grande e o risco de estarmos diante de uma informação que não

será confirmada é muito grande. Poderíamos considerá-la uma informação

secundária.

Dissemos "percebemos e analisamos este quadro" porque da forma como aprende-se,

ou ensina-se, na escola ou nos manuais de arqueologia, normalmente a informação que é

prestada ao arqueólogo, em campo, por qualquer tipo de informante deve ser considerada.

Nunca nos é feita a observação de que poderemos, ou deveremos, analisá-las, interpretá-las, e

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que podem existir problemas nestas informações. Como poderíamos resolver este impasse e,

ao mesmo tempo, recuperar a informação da forma mais completa possível ? Seria isto

possível ?

Neste sentido Ferreira121 nos diz que

"... as possíveis distorções dos depoimentos e a falta de veracidade a eles imputada podem ser encaradas de uma nova maneira, não como uma desqualificação, mas como uma fonte adicional para a pesquisa.". p. 8

É desta forma que estamos tratando este nosso trabalho. Mas, devemos lembrar que o

tempo que dispomos para este trabalho, ou mesmo para o trabalho de campo, normalmente é

muito pequeno. Portanto, o tempo a ser gasto no trato com os informantes e com a

comunidade, na busca de informações sobre sítios ou locais com restos arqueológicos, deve

ser o menor possível. Aqui, outra questão: como conciliar a necessidade da pesquisa com a

falta de tempo ?

Neste momento estávamos com dois problemas. O primeiro era trabalhar com algo

totalmente novo para nós, teórica e metodologicamente, a História Oral. Até então,

acreditávamos ser possível fazer História Oral apenas com um gravador na mão e algumas

perguntas na cabeça. Numa primeira tentativa, a nível experimental, descobrimos que isso

não era possível.

A descoordenação das perguntas, a falta de um roteiro para a entrevista, a surpresa

diante das resposta do entrevistado, a demora na formulação das perguntas, a falta de

perguntas que direcionassem a entrevista para o tema que havíamos relatado, perguntas

muitos longas e elaboradas, a fala muito prolongada e desnecessária dos entrevistados, a

valorização excessiva de detalhes irrelevantes por parte do entrevistado sem que o

interrompêssemos e, principalmente, o comando da entrevista nas mãos do entrevistado,

foram os detalhes que mais nos chamaram a atenção e fizeram com que muitos dos

entrevistados percebessem nosso despreparo na realização e condução da entrevista.

Confirmamos, na prática, que História Oral não é apenas um gravador na mão. Não é

simplesmente uma entrevista.

O segundo problema estava no trato com a comunidade. Neste ponto, procuramos,

antes de realizarmos as entrevistas, entrar em contato com a comunidade com a qual iríamos

121 - FERREIRA, Marieta de Moraes. História Oral: um inventário das diferenças. In: Entre-vistas: abordagens e usos da história oral, Rio de Janeiro, Editora Fundação

Getúlio Vargas, 1994.

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trabalhar, ou seja, nos fazermos conhecidos, nos tornarmos reconhecidos, e dessa forma

passíveis de receber a confiança daquelas pessoas, daquela comunidade. Após convivermos,

por praticamente dois anos, com a comunidade de Visconde do Rio Branco - MG e,

principalmente, das serras da Piedade, Santa Maria e São Geraldo, este problema, ao menos

em termos teóricos, estava resolvido: éramos reconhecidos e solicitados por ela.

Nosso terceiro problema restante continuava a ser a História Oral. Para as entrevistas

necessitávamos de um roteiro. Elaboramos o primeiro deles, anexo 12, roteiro 2, onde

procuramos destacar três tipos de informações.

1o - O primeiro visava conhecer o entrevistado, saber quem era, quem eram seus

ascendentes, quem eram seus descendentes, qual era sua prole, porque morava ali,

quem eram as pessoas que conhecia, etc.. Era um pouco de sua história de vida.

Entendemos, pela convivência, que isso os valorizava e nos ajudava a conseguir não

somente um maior número de informações, mas também informações mais precisas,

bem como a indicação de outras pessoas com as quais poderíamos conversar ou

mesmo que pudessem nos levar aos locais indicados. A partir desta primeira parte do

roteiro, estávamos selecionando, automaticamente, o público alvo de nossas

entrevistas. Neste primeiro momento seriam as pessoas mais velhas da comunidade e,

obviamente, as que tivessem algum tipo de informação sobre locais com restos

arqueológicos e que interessassem a nosso trabalho. Direcionamos nossas entrevistas

desta forma por considerarmos estarem nestas pessoas as informações mais precisas e

importantes que buscamos. Esta primeira parte visa também, entender como aquele

indivíduo está inserido em sua sociedade ou naquele segmento do qual faz parte.

2o - O segundo tipo de informação visava saber do entrevistado, o que ele conhecia sobre

nosso objeto de estudo, os índios Puri, Coroado e Coropó, que teriam habitado aquela

região. É importante lembrar que neste caso estaríamos procurando e, eventualmente,

obtendo, uma visão de alguém sobre o passado. Estas informações, muitas vezes

sobre um passado distante, decorrem de uma tradição oral, passada, principalmente, de

pai para filho e, neste caso, a cada geração, pode ser alterada. Assim, a visão dos

filhos do Sr. Honório, por exemplo, é a mesma visão do pai sobre a questão da

ocupação indígena e sobre os sítios arqueológicos na serra da Piedade, que será

repassada a outrem, mesmo que aquela informação não seja verdadeira. Isto pode ser

visto quando da entrevista do Sr. Honório e de seus filhos Haroldo e Gasparino. É

provável que, no futuro, quando Haroldo e Gasparino estiverem com a idade do Sr.

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Honório, tenham uma nova versão sobre isto tudo, como já podemos observar hoje,

quando é possível falar com eles em separado, ou distante do pai.

3o - O terceiro tipo de informação que buscávamos neste primeiro "roteiro preliminar para

entrevistas", nos daria conta do material encontrado, quem o teria encontrado, onde

teria sido encontrado, para onde teria sido levado, o que teria sido feito com ele, etc..

Com isto estaríamos identificando e confirmando, ou não, com mais precisão, as

informações que teriam sido prestadas até então, uma vez que agora, com base na

cultura material, estariam sendo localizadas e materializadas.

Foi com este "roteiro preliminar para entrevistas" que realizamos as primeiras três

entrevistas. É importante mencionar que apesar deste roteiro, as entrevistas não foram

conduzidas de forma rígida. Procuramos, após dar a palavra ao entrevistado, interrompê-lo o

mínimo possível, tomando o cuidado de não induzi-lo nas respostas, embora algumas vezes

isto tenha ocorrido. Embora esta indução não seja intencional, as respostas que nos eram

dadas, nos chamavam a atenção e nos faziam pedir maiores informações, maiores

esclarecimentos e detalhes, nomes de pessoas, o local de alguns acontecimentos, quem seriam

e onde estariam as pessoas citadas, etc..

Foi justamente por este motivo que preparamos uma nova versão do "roteiro

preliminar para entrevistas", anexo 12, roteiro 3, onde alguns destes elementos estariam

contemplados, pois gostaríamos de verificar a forma como os outros entrevistados se

comportariam diante de tais informações e se as dominavam.

Além disso, incluímos duas questões sobre a Arqueologia, ou seja, o que o

entrevistado entendia ser Arqueologia, se já havia ouvido falar nela e o que ele pensava ser o

trabalho do arqueólogo. Isto foi, principalmente, para ver em que medida nosso trabalho de

identificação e recuperação do material arqueológico, através das escavações, seria, ou não,

bem recebido pela comunidade e se poderíamos ter algum tipo de interferência quando da

realização dos mesmos.

Após estas primeiras entrevistas, outro elemento que passamos a observar foi com

relação ao ritual que as estava envolvendo. Devido ao tipo de pessoas com quem estamos

tratando, na sua grande maioria muito simples, uma entrevista, que sempre procuramos

marcar com antecedência, representa um acontecimento especial para aquela pessoa e, muitas

vezes, para sua família. Em função disso, em apenas duas entrevistas - com a Sra. Terezinha

de Almeida Pinto, realizada em Visconde do Rio Branco - MG e com o Sr. Valdemiro Vianna

Filho, realizada em Mariana - MG -, das nove realizadas até o momento, foi possível ficarmos

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sozinhos com o entrevistado. Em alguns casos pareceu-nos que era uma tática, ou seja,

intencional. Seria para não ficarmos sozinhos com o entrevistado ou é mesmo a

simplicidade, e muitas vezes a ingenuidade, destas pessoas ? Como existe sempre na

entrevista a participação do acompanhante, normalmente opinando e/ou reforçando o dito

pelo entrevistado, estamos pensando em algo que possa evitar esta situação.

Isto talvez deva-se ao fato de termos optado por fazer com que as entrevistas sejam no

meio do entrevistado, ou seja, no local de sua preferência, a seu modo, assistidos por quem ele

julgar melhor. Sabemos que somos formadores de opinião e que qualquer ato ou fato que

gerarmos poderá dar origem a um produto diferente daquele que normalmente poderia surgir.

Por isso, procuramos influenciar o mínimo possível, seja em termos de idéia, seja em termos

de postura. Como já dissemos anteriormente, este nosso procedimento é por acreditarmos ser

necessário mostrar à comunidade o que estamos fazendo, quem somos e o que pretendemos

com este trabalho. É exatamente pela falta deste procedimento que muitos pesquisadores não

conseguem obter as informações que lhes possibilite chegar ao sítio arqueológico, ou então

pelo mau procedimento de alguns, em outros momentos, muitas vezes não muito distantes,

que as informações são omitidas por todos conscientemente.

Após estas observações e mais algumas entrevistas, preparamos a terceira versão do

"roteiro preliminar para entrevistas", anexo 12, roteiro 4. Desta vez, também as observações

da pessoa contratada para transcrever as fita foram proveitosas. Segundo ela, deveríamos,

além de identificar o entrevistado, o que já estávamos fazendo, deveríamos identificar

também:

• o seu endereço,

• a data da entrevista;

• o local onde está sendo realizada a entrevista;

• os acompanhantes ou presentes na entrevista;

• o ambiente em que foi realizada a entrevista;

• procurar não deixar mais de uma pessoa falar ao mesmo tempo.

Outro procedimento que tomaremos daqui por diante é, ao final da entrevista, a

elaboração de um relatório com impressões sobre a mesma. Neste relatório buscaremos

analisar, entre outras coisas, a forma como o local da entrevista se insere na realidade do

entrevistado e em nosso trabalho; quais foram as condições da entrevista, do entrevistado e do

entrevistador; qual era o clima, em termos emocionais, das pessoas envolvidas na entrevista;

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qual foi o nível de interferência das pessoas presentes na entrevista; qual é o envolvimento do

entrevistado, e das pessoas presentes na entrevista, com o projeto de pesquisa e com o tema,

em nosso caso os índios Puri, Coroado e Coropó; qual a reação do entrevistado, e dos

presentes na entrevista, em relação às perguntas, ou a alguma(s) pergunta(s) específica(s).

Este procedimento seria a reunião daquilo que Alberti122 apresenta em sua "ficha de

entrevista" e "caderno de campo".

Outro procedimento de que não sentimos necessidade até o momento, mas ao qual

achamos necessário estar alerta, refere-se à "liberação da entrevista". Embora todas as

pessoas que estamos entrevistando tenham conhecimento do uso que faremos deste material

em nossa pesquisa, inclusive para publicações, estamos tendendo a fazer uma solicitação, por

escrito, aos nossos entrevistados, liberando o uso "científico" do material proveniente de sua

entrevista. Esta preocupação apareceu quando das últimas entrevistas, principalmente com o

Sr. José Agripino. Nela apareceram, não do Sr. José Agripino, mas de seus filhos e genros,

preocupações sobre o tipo de informação que estava sendo dada por ele e o uso que faríamos

dela.

A preocupação mais freqüente está no fato de os sítios arqueológicos estarem, na

maioria das vezes, em terras de propriedade privada, e delas ser extraído algum tipo de metal

ou mineral de valor comercial que possa interessar ao proprietário. Apesar de toda nossa

preocupação em mostrar nosso trabalho, há sempre uma desconfiança: a de que estaríamos

procurando algo de valor comercial e não apenas ossos, pedras, cacos de cerâmica e restos de

índios velhos.

Como pretendemos encaminhar estas entrevistas ao Instituto do Patrimônio Histórico e

Artístico Nacional - IPHAN, onde nossa pesquisa está autorizada, propondo a criação de um

banco de entrevistas com informações sobre sítios arqueológicos e que poderá ser consultado

por outros pesquisadores, entendemos que a assinatura de um documento liberando o uso das

informações nela contida, apenas para fins científicos, seria muito bom e nos protegeria de

pesquisadores inescrupulosos.

Ter como objeto de estudo os grupos indígenas brasileiros requer um acentuado grau

de paciência e de perseverança. Suas fontes são escassas, de difícil localização e, quando

não, de acesso. Isto, em se tratando de grupos considerados "grandes". Quando o objeto de

estudo refere-se, como em nosso caso, a grupos "pequenos", de língua isolada, pouco

conhecidos, ou reconhecidos, e muitas vezes confundidos com outros grupos, a situação pode

ser muito mais difícil. 122 - ALBERTI, Verena. História oral: a experiência do CPDOC, Rio de Janeiro, Centro de Pesquisas e Documentação de História Contemporânea, 1989.

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O Programa Arqueológico Puri-Coroado, que tem por objeto de estudo a análise

arqueológica e histórica das sociedades Puri e Coroado, tem a necessidade de buscar fontes

dos mais diversos tipos e, normalmente, de caráter bastante geral, sempre no sentido de suprir

as enormes lacunas existentes no conhecimento sobre estes dois grupos.

Devido a estas questões relacionadas às fontes, a grande diversidade cultural destes

grupos, sua ampla área de ocupação e a abrangência teórico-metodológica que estamos

procurando dar ao trabalho, onde a ênfase não é apenas o material cultural recuperado do sítio

arqueológico, mas o contexto que o envolve, desde a Pré-história até nossos dias, a

recuperação de informações orais, que se tornam, pela História Oral, uma fonte de valor

histórico igual ao das fontes escritas, é de fundamental importância. No caso dos grupos Puri

e Coroado, onde a fragmentação, seja documental, arqueológica, cultural ou espacial é um

fato, a geração de mais uma fonte, capaz de aumentar as possibilidades de sua identificação, é

plenamente aceitável e esperado.

Apesar das dificuldades em identificar, até o momento, uma origem, seja espacial ou

cultural, praticamente todas as fontes e suas referências são unânimes em identificar a região

do rio Pomba, principalmente em sua margem esquerda, em território da Zona da Mata

mineira, como a principal concentração destes grupos. As serras de Santa Maria, Piedade,

São Geraldo e da Onça, nos municípios de Visconde do Rio Branco, São Geraldo e Guidoval

têm demonstrado, na prática, estas informações.

Nestas serras, sua população convive com os restos culturais, hoje transformados por

nós em arqueológicos, desde sua ocupação inicial. Grutas, cavernas e abrigos encrustrados

nas serras, são nichos onde podem ser encontrados, entre outras coisas, urnas funerárias,

restos de fogueiras, sepultamentos, vasilhames cerâmicos e material lítico. Na base das

serras, ou em seus vales, podem ser encontrados restos de, pequenas ou grandes, ocupações

do tipo aldeia, onde é abundante o material cerâmico. Além disso, encontra-se com

facilidade, muito material lítico polido.

É com esta realidade que a população convive. Sejam velhos ou novos, sempre há

alguém que já viu, ouviu ou sabe onde encontrar estes restos, ou mesmo onde eles estão

concentrados. São estas pessoas que estão sob nosso olhar, que nos fornecem as informações

mais concretas sobre locais com "restos de índios", e de onde vêm, após uma análise, nossos

entrevistados.

Foi com este perfil que preparamos nossos roteiros para as entrevistas e escolhemos

nossos entrevistados.

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Como exemplo, Os dois depoimentos que podem ser apresentados aqui demonstram as

principais, dificuldades encontradas na construção e/ou (re)construção do documento oral em

nosso trabalho arqueológico.

A primeira erntrevista, anexo 13, entrevista 1, foi com a Sra. Terezinha de Almeida

Pinto, e foi realizada após mais de um ano de constantes contatos. Dona Terezinha é uma

das pessoas mais influentes da comunidade, no que diz respeito a cultura, ao patrimônio e a

preservação da história local. Foi por sua iniciativa que criou-se, por Decreto Municipal, o

"Museu Municipal de Visconde do Rio Branco", onde hoje estão guardadas peças dos mais

diversos gêneros e épocas e que contam a história da região, da cidade e de seus moradores.

Além disso, também por sua iniciativa, criou-se a "Associação dos Amigos do Museu

Municipal de Visconde do Rio Branco", que tem por objetivo promover a cultura, a nível

popular, no município. Dona Terezinha tem hoje 70 anos de idade e sempre morou em

Visconde do Rio Branco. Conhece praticamente todos os seus moradores e praticamente

todos já ouviram falar de Dona Terezinha. Foi por insistência sua que levou-se para o museu,

o que sobrou dos restos de material arqueológico, ossos e cerâmica, encontrados na serra da

Piedade em 1986. Além disso, tem peregrinado pela região em busca de moradores que

tenham em suas casas material arqueológico. Foi exatamente por este motivo, e por seu

intermédio, que chegamos até o Sr. José Agripino, morador da vila de Santa Maria, e que tem

em sua casa mais de 80 peças de material lítico polido, recolhidas nas serras da região. A

intenção de Dona Terezinha é conseguir levar todo este material para o Museu Municipal.

Desde que a conhecemos, temos apoiado suas iniciativas, principalmente as ligadas a

arqueologia, uma vez que têm por princípio preservar, mesmo fora de contexto, o material

arqueológico da região.

Apesar de já a conhecermos a bastante tempo, a entrevista com Dona Terezinha era

inevitável. E para nossa surpresa, na entrevista, realizada nas dependências do Museu

Municipal, sem nenhum acompanhante, nos foram colocadas informações que ainda

desconhecíamos. Como exemplo, podemos citar o caso do Sr. José Agripino, hoje, uma das

nossas peças mais importantes em Visconde do Rio Branco.

A segunda entrevista, anexo 13, entrevista 2, foi realizada com o Sr. Honório, um

antigo morador da serra da Piedade, no distrito denominado Piedade de Cima, e muito

conhecido da comunidade de Visconde do Rio Branco. Foi em suas terras, através de seus

filhos Gasparino e Haroldo, que se descobriu, em 1986, uma série de urnas funerárias e

material arqueológico ligado a sepultamentos. O Sr. Honório é conhecido em toda Visconde

do Rio Branco, também, por sua grande capacidade de criar e aumentar fatos diversos. Em

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relação a presença de antigos grupos indígenas na serra da Piedade, sua versão é muito

criticada e ridicularizada. Apesar disso, todos os locais e histórias que a comunidade relata a

respeito dos índios, sempre aparece o seu nome. Além disso, ele, ou seus filhos, conhecem

toda a população e a região, bem como sabem de praticamente todas as histórias sobre locais

com "restos de índios".

Dessa forma, não poderíamos deixar de entrevistar o Sr. Honório, bem como os seus

filhos Gasparino e Haroldo. Eles são peças importantes em nosso trabalho de campo.

A entrevista com o Sr. Honório foi realizada em sua casa, na serra da Piedade e contou

com a presença de sua esposa, Dona Jacira, de seus filhos, Gasparino e Haroldo, e de nosso

motorista, Adilson, que trabalha na Prefeitura Municipal e também é morador de Visconde do

Rio Branco. Esta entrevista foi um acontecimento muito importante para a família, e como

pode ser visto na transcrição da entrevista, todos participaram e opinaram. Foi muito difícil

conduzir a entrevista. O Sr. Honório é uma pessoa muito difícil de controlar.

Hoje, praticamente dois anos após a entrevista, sabemos que a grande maioria dos

fatos relatados e localizados pelo Sr. Honório, e seus filhos, são verdadeiros. O que existe na

verdade, é uma má vontade da população em relação a eles, uma vez que são conhecidos por

serem muito espertos em seus negócios: a exploração das jazidas de pedras para

paralelepípedo, utilizados na pavimentação de ruas, calçadas e bases para casas e prédios.

2.5 - o trabalho de pesquisa arqueológica

Após sete anos de trabalho, o Programa Arqueológico Puri-Coroado possui hoje, entre

outros resultados, a identificação de aproximadamente 350 referências bibliográficas, o

esboço para um mapa da dispersão dos grupos indígenas Puri e Coroado, ainda em

elaboração, e a identificação de vários locais com restos de ocupação indígena, bem como um

outro sem número de informações que dêem conta de outros locais com restos deste tipo

ocupação.

No que diz respeito especificamente às referências bibliográficas123, faz-se necessário

ressaltar, mais uma vez, que a historiografia brasileira, infelizmente, tem mantido o elemento

indígena apenas no domínio da Antropologia e/ou da Etnologia. Este fato faz com que

qualquer trabalho que tenha por objeto de estudo o índio, apresente dificuldades, uma vez que

este elemento, que surge apenas com a descoberta do Brasil, aparece somente em alguns

123 - LUFT, Vlademir José. Historiografia Puri-Coroado. In: I Encontro Nacional de Pós-Graduandos em História, volume de Resumos das Comunicações,

UFF/ANPUH, Rio de Janeiro, 1995, pp. 12-13.

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momentos de nossa história. Apesar disso e também da dispersão, fragmentação e estado,

mais de 350 referências bibliográficas, sobre alguns destes índios, já foram identificadas,

lidas, fichadas e catalogadas.

No que se refere ao trabalho de arqueologia, já foram identificados, nas serras de Santa

Maria, Piedade e São Geraldo, nos municípios de Visconde do Rio Branco e São Geraldo, 12

locais com restos ou indícios de ocupação, conforme demonstrado no anexo 14, mapa 5, e em

sua relação anexa. Vale ressaltar que devido a escala desta carta topográfica, optamos por

não fazer a localização dos locais com restos ou indícios de ocupação, uma vez que um ponto

de l mm numa carta com escala de 1:50.000 significa uma área muito maior do que realmente

poderia ocupar. Além disso, devido a proximidade dos locais, alguns ficariam sobrepostos

quando marcados. Por este motivo, optamos por fazer uma relação anexa, com as devidas

coordenadas de localização, e marcar na carta apenas a área destas ocorrências.

Embora a descoberta de boa parte destes locais pela população, tenha acontecido

somente na segunda metade da década de 70, foi na década seguinte, devido a ação de alguns

dos moradores, comandados pelo então Prefeito Municipal de Visconde do Rio Branco, que

um destes locais foi dinamitado e tapado com uma grande pedra, para que ninguém retirasse o

material, e outros sete locais tenham sido destruídos, tendo seu material, cerâmico e ósseo,

retirado por diversas pessoas, sendo posteriormente, por motivos também diversos, jogados

fora, guardados em casa ou entregues à Prefeitura Municipal que mais tarde os colocou a

disposição do Museu Municipal. Apesar destes locais não apresentarem mais nenhum resto

ou indício de ocupação, são identificados e visitados pela população, até os dias de hoje,

como tendo sido ocupados "... pelos índios Puri ...". Isto ocorre, entre outros motivos,

devido, como já falamos no item 2.4.2 deste trabalho, a referência que este locais são para seu

passado na região, bem como por terem sido eles os atores destas descobertas ou deste

reencontro com a história da região, mesmo que seja ela de "destruição".

A seguir, apresentamos a relação destes locais, identificados pela sigla que receberam

ao serem visitados por nós. Nesta sigla, as três primeiras letras identificam o Município onde

estão localizados os restos, as duas seguintes indicam a Unidade Federativa e a numeração

indica o número de locais neste Município. Em nosso caso, indicam também a seqüência em

que foram "descobertos". Gostaríamos de lembrar que estas siglas não são as siglas de

registro dos sítios arqueológicos, normalmente encaminhadas ao Instituto do Patrimônio

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Histórico e Artístico Nacional, quando do registro do sítio arqueológico pelo pesquisador.

Sobre esta identificação Evans & Meegers124 dizem que

"Diferentes códigos têm sido empregados e a escolha de um deles dependerá da quantidade e do tipo de informações desejadas. O código mais utilizado fornece a localização do sítio em relação à área de drenagem, Município, Estado, província ou qualquer outra divisão geográfica. Dentro desta área, todos os sítios recebem um número que corresponde geralmente à ordem de descobrimento. Desde que o sítio receba um número, o mesmo não deverá mais ser alterado." p. 42

"No Brasil, ..., foi adotado o código do IBGE para os Estados e Territórios, ... Após a sigla do Estado, acrescenta-se a área do Estado em que se encontram os sítios, podendo ser feito pelos acidentes físicos, seguindo-se a numeração dos sítios por ordem de descobrimento." p. 44

Por sua vez, Dias Jr.125, baseado nisso, propõe que

"Cada Estado utiliza as iniciais pelas quais é oficialmente reconhecido. A esta sigla se somam duas letras indicativas de bacia hidrográfica, geralmente relativas aos nomes dos rios principais ou a qualquer acidente notável, ou mesmo arbitrárias, desde que não repetitivas de outras áreas do mesmo Estado. Cada sítio localizado, dentro de cada área, recebe um número próprio, de 1 a infinito. Desta forma, cada sítio tem uma sigla de quatro letras e um número." p. 299

"Desta forma, em princípio, cada bacia hidrográfica, considerando o rio principal, seus afluentes e sub-afluentes, se encontra dentro da mesma sigla, independente do lado da margem." p. 298

Com isso, para o Estado de Minas Gerais várias bacias hidrográficas foram

identificadas e para elas siglas foram designadas. Em nosso caso, estaríamos situados em

uma das três áreas da bacia do rio Paraíba, ou seja,

"MG-CP Engloba, sobretudo, a bacia do Pomba, mas também a de outros afluentes pequenos e isolados do Paraíba, como o Pirapetinga, Angu,

124 - EVANS, Clifford & MEGGERS, Betty J.. Guia para prospeção arqueológica no Brasil, série Guias - 2, Belém, Conselho Nacional de Pesquisa / Museu Paraense

Emílio Goeldi, 1965.

125 - DIAS JR., Ondemar. Mapa arqueológico do Estado de Minas Gerais. In: Arquivos do Museu de História Natural, volume IV-V, Universidade Federal de Minas

Gerais, Belo Horizonte, 1982, pp. 297-309.

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etc. Ao Norte limita-se com a bacia do Muriaé pelo divisor de águas e ao Sul vai até a bacia do pequeno Ribeirão Aventureiro, inclusive. Muitos são os Municípios da área, destacando-se: Visconde do Rio Branco, Guiricema, Ubá, Guidoval, Rodeiro, Astolfo Dutra, Palma, Laranja, Tocantins, Recreio, Piraúba, Rio Novo, Rio Pomba, Leopoldina, Pirapetinga, Estrala Dalva, Volta Grande, Oliveira Fortes, Piaú, Aracitaba, São João Nepomuceno, Rochedo de Minas, etc.." (Dias, 1982, p. 301-302)126

Portanto, as siglas de nossos sítios arqueológicos teriam MG, que identifica o Estado

da Federação em que estão situados; CP, que indica a bacia hidrográfica em que estão

localizados; e um número que indica a sua seqüência de descoberta.

Os locais identificados por nós na serra da Piedade, localizados127 na bacia do rio

Xopotó, margem esquerda, que por sua vez é afluente da margem esquerda do alto rio Pomba,

são:

• VRB-MG-002, conhecido como “Paredão”, posicionado a 20o 56’ 31” 5 de Latitude

Sul e 42o 54’ 11” 4 de Longitude Oeste; sua frente está voltada para Sul, direção 180o;

sua altitude é de 672 +/- 78 metros; consta que neste local foram encontrados, ha mais

de 10 anos, fragmentos cerâmicos; o local está em terras do Sr. Sebastião Gomes de

Freitas, morador da própria serra da Piedade. (anexo 15, fotos 3 e 4)

• VRB-MG-003, localizado a 20o 56’ 31” 7 de Latitude Sul e 42o 54’ 10” 6 de

Longitude Oeste; sua abertura principal está voltada para Sudeste, direção 150o;

estando a 719 +/- 12 metros de altitude; nele foi encontrado, segundo relatos, um

grande vasilhame cerâmico com restos ósseos dentro; o local está em terras do Sr.

Sebastião Gomes de Freitas, morador da própria serra da Piedade. (anexo 16, fotos 5

e 6)

• VRB-MG-004, localizado a 20o 56’ 31” 7 de Latitude Sul e 42o 54’ 10” 6 de

Longitude Oeste e a 719 +/- 12 metros de altitude. O local, um buraco no chão com

alguns metros de profundidade e túneis de tamanhos variados em seu interior, está a

três metros do local anterior, VRB-MG-003, e foi dinamitado quando de sua

descoberta, na intenção de afastar os curiosos e com isso ganhar algum dinheiro como

recompensa pela preservação do mesmo. Hoje, sua abertura principal, que está

tapada com uma rocha de algumas toneladas, está voltada para Sudeste, direção 150o.

126 - Op. Cit.

127 - O posicionamento dos locais identificados como tendo restos ou indícios de ocupação foram realizados por um aparelho de GPS (Global Positioning System), de marca

Garmin, modelo 45.

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Nele existe, segundo os relatos, vasilhame cerâmico com restos ósseos. O local está

em terras do Sr. Sebastião Gomes de Freitas, morador da própria serra da Piedade.

(anexo 17, fotos 7 e 8)

• VRB-MG-006, localizado a 20o 56’ 35” 4 de Latitude Sul e 42o 54’ 09” 3 de

Longitude Oeste e aproximadamente 630 +/- 17 metros de altitude. Sua abertura

principal está voltada para Oeste, direção 280o. Nele foi encontrado, segundo relatos,

fragmentos de um vasilhame cerâmico. O local está em terras do Sr. Sebastião

Gomes de Freitas, morador da própria serra da Piedade. Para este local existem

registros fotográficos feitos pelo Sr. Dalton Neves Duarte, do qual temos cópias, em

nossos arquivos. (anexo 18, fotos 9 e 10)

• VRB-MG-007, localizado a 20o 56’ 31” 7 de Latitude Sul e 42o 54’ 10” 6 de

Longitude Oeste e a 719 +/- 12 metros de altitude. Sua abertura principal está voltada

para Sudoeste, direção 220o. Nele foi encontrado, segundo relatos, vários vasilhames

cerâmicos com restos ósseos dentro. O local está em terras do Sr. Sebastião Gomes

de Freitas, morador da própria serra da Piedade. (anexo 19, fotos 11 e 12)

• VRB-MG-008, localizado a 20o 56’ 31” 7 de Latitude Sul e 42o 54’ 10” 7 de

Longitude Oeste e a 698 +/- 35 metros de altitude. Sua abertura principal está voltada

para Sudoeste, direção 230o. Nele foi encontrado, segundo relatos, vários vasilhames

cerâmicos com restos ósseos dentro. O local está em terras do Sr. Sebastião Gomes

de Freitas, morador da própria serra da Piedade. (anexo 20, fotos 13 e 14)

• VRB-MG-011, o local denominado de “Pedreira”, de propriedade do Sr. José Carlos

Ferbiani, morador da Piedade de Cima, de onde a mais de 20 anos foram retirados, por

várias pessoas, muito material arqueológico, principalmente cerâmica e ossos, material

este proveniente, provavelmente, de sepultamentos. Entre estas pessoas está o Sr.

Eduardo Cardoso de Lima, que atualmente reside em São Paulo e que tem sua mãe

morando no local conhecido por “Pinheiro”, na Piedade de Cima, próximo ao local

onde estava o material arqueológico. Junto a ele, quando da descoberta do local e

retirada do material, estava o filho do Sr. Vicente Cardoso de Paula e da Sra. Maria

Teixeira de Paula, entrevistados pelo Programa Arqueológico Puri-Coroado em 1995,

e que têm em sua casa restos de material ósseo (humano e animal), dentário (humano)

e vegetal recuperado pelo seu filho, que também está residindo em São Paulo. De

acordo com o Sr. Eduardo, com quem conseguimos falar por estar de visita na casa de

sua mãe, deste local, foram retirados ossos humanos, queimados e não queimados;

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dentes humanos e de animais; “apitos” em “coco de Bejaúba”, Astrocaryum

aculeatissimum; restos de colar; etc.. Lembra ele, que quando jovem este local era

“mata pura”, onde se podia caçar, pescar e coletar. Localizado a 20o 56’ 50” 8 de

Latitude Sul e 42o 53’ 40” 6 de Longitude Oeste o local está a uma altitude de 465 +/-

23 metros. Sua frente está voltada para o Sul, direção 180o. (anexo 21, fotos 15 e

16)

• VRB-MG-012, localizado a 20o 56’ 38” 2 de Latitude Sul e 42o 54’ 08” 9 de

Longitude Oeste; sua abertura principal está voltada para Sudeste, direção 165o;

estando a 641 +/- 23 metros de altitude; nele foi encontrado, segundo relatos, um

crânio e alguns ossos longos, sempre fragmentados; o local, que é um buraco de 23

metros de profundidade e com vários túneis de tamanhos variados em seu interior, no

qual pode-se descer apenas com cordas, está em terras do Sr. Sebastião Gomes de

Freitas, morador da própria serra da Piedade. Deste local não foi possível fazer

qualquer registro fotográfico.

Lembramos que nenhum destes locais foram registrados como sítio arqueológico128,

uma vez que não apresentavam restos arqueológicos no momento em que os visitamos.

Apenas relatos foram recuperados, o que não os caracterizam como sítio arqueológico.

Dos locais restantes, dois referem-se a pequenos abrigos - sítio da Galhada (MG-CP-1)

e sítio Toca dos Anões (MG-CP-2) -, de difícil acesso, no topo da serra da Piedade, e onde

foram depositados, em vasilhame cerâmico, restos de sepultamentos secundários. Outros

dois locais, sítio Aldeia Santa Maria (MG-CP-3) e sítio Aldeia Floresta (MG-CP- 4), estão,

um em terras nas proximidades do distrito de Santa Maria e o outro em terras da fazenda

Floresta, no distrito da Piedade do Meio. Ambos foram identificados como aldeias,

localizados em restos de mata preservada, mas que não fazem parte desta nossa tese de

doutoramento, no que diz respeito ao trabalho de escavação e análise de material.

MG-CP-1 - da Galhada

O sítio "da Galhada" é um abrigo identificado em 1995 e no qual apareciam, em

superfície, um fragmento cerâmico e alguns pequenos fragmentos ósseos. Seu 128 - Definida por MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: " SÍTIO - Designação genérica

para o local onde se encontram testemunhos arqueológicos de quaisquer gêneros." ou "SÍTIO ARQUEOLÓGICO - Local onde se encontram restos de cultura passada." p.

117.

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posicionamento é de 20o 56´ 31” 1 de Latitude Sul e 42o 54’ 10” 8 de Longitude Oeste. O

local está em uma altitude de aproximadamente 727 +/- 71 metros. O terreno possui uma

inclinação, no local do abrigo, como em toda a serra, de aproximadamente 45o, o que torna-o

protegido e de difícil acesso. A luminosidade no abrigo é baixa, somente sendo possível o

trabalho de arqueologia, auxiliado por luz artificial. O local está em terras do Sr. José Silvio

de Queiroz, residente na localidade denominada na região como Colônia, um distrito de

Visconde do Rio Branco. Apesar de possuir uma abertura de 31,6 metros, voltada para

Sudeste, direção 170o, a área propícia para ocupação resume-se a 5,3 m2. (anexo 22, fotos 17 e

18)

Em sua única camada arqueológica, com espessura variando entre 8 e 12 cm, o

sedimento é extremamente fino, seco, pulverulento e de cor marrom-avermelhado, misturado

a pedras, de tamanhos variados, provenientes da decomposição do próprio gnaisse, do qual é

formado o abrigo. A escavação se deu em toda a área útil do abrigo e atingiu, além da

camada onde havia o material arqueológico, a camada que estava sob ela, até alcançarmos a

rocha matriz, a menos de 40 cm da superfície. Houve muita dificuldade para o trabalho no

local: primeiro por suas dimensões e segundo pela falta de uma luminosidade adequada para

uma escavação arqueológica. Por estes motivos, entre outros, foi necessário fazer uso de

peneiras, com malha de 4 mm, uma vez que corríamos o risco de perder material

arqueológico. O material recuperado foi etiquetado, embalado e armazenado separadamente,

sempre de acordo com sua natureza e origem.

Neste local, aparecem os únicos elementos de uma possível "pintura rupestre

arqueológica" encontrados nesta região. São alguns pontos com indícios de pintura. A cor

utilizada é o vermelho, proveniente provavelmente da hematita, Fe2O3, conforme pode-se

constatar pelos fragmentos recuperados durante a escavação. Dividindo-a em painéis,

poderíamos dizer que encontramos dois: o primeiro com apenas um ponto vermelho, medindo

40 cm x 65 cm e o segundo, com vários pontos vermelhos, medindo 70 cm x 29 cm.. A

divisão e o tamanho destes painéis está apresentada de acordo com o próprio local onde estão

as pinturas, ou seja, pedaços de pedras caídos do teto e utilizados para esta representação

pictórica. (anexo 23, fotos 19 e 20).

No que refere-se ao restante do material, recuperamos:

ossos humanos - pode-se dizer que a quantidade de material ósseo humano é pequena,

todo extremamente fragmentado, embora em bom estado de

conservação, e indicando a presença de um único indivíduo. Alguns

ossos apresentam marcas que poderiam indicar corte, ou a tentativa

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deste, principalmente em ossos longos como o úmero, fêmur e tíbia, que

também apresentam suas epífises ainda não soldadas. Estas marcas de

corte podem ser resultante da preparação dos ossos para o sepultamento

secundário. As epífises ainda não soldadas, por sua vez, estariam

indicando ser de um indivíduo jovem, na faixa de 8-10 anos.

dentes humanos - os dentes recuperados são, em parte, de primeira dentição, o que de

acordo com classificação proposta por Ubelaker129, poderia colocar este

indivíduo na faixa etária entre 5 anos e 8 anos. No total, são 29 dentes,

anexo 24, tabela 1, dos quais 15 (11 molares, 2 pré-molares e 2 caninos)

são de dentição permanente e que apresentavam-se inclusos no

momento da morte. Dos 14 dentes restantes, 1 é canino, 1 é pré-molar

e 9 são molares, dos quais 3 são fragmentos. Nestes dentes raramente

temos a presença, ou marcas, de cálculo dentário; cáries e desgaste.

Dos que apresentam estas alterações temos:

• 1 pré-molar com pequeno desgaste plano que atingiu apenas o

esmalte. Neste mesmo dente aparecem sinais de cálculo dentário

em sua face lingual e um ponto de cárie em sua face superior, que

atingiu apenas o esmalte;

• 1 molar apresentando desgaste acentuado de dentina, com

inclinação lateral vestibular;

• 1 molar com desgaste acentuado de dentina e pequena inclinação

lateral vestibular;

Apesar disso, não nos é possível fazer qualquer afirmação neste

momento sobre o motivo destes desgastes, os quais poderiam ter sido

provocados pelo padrão alimentar, pela forma de mastigação ou mesmo

por um padrão cultural qualquer que pudesse resultar em desgaste,

mesmo em jovens, de molares e pré-molares.

ossos animais - representado basicamente por aves e roedores de pequeno porte, o

pouco material ósseo animal recuperado, não indica, em uma primeira

análise, ser fruto de resto alimentar, uma vez que não apresentam

marcas de queima, nem mesmo de fraturas que indiquem uso para

alimentação. Também não apresentam marcas de uso ou de trabalho.

129 - UBELAKER, D.H.. Human skeletal remains, Manual on Archaeology 2, Smithsonian Insitution, Washington, 1978.

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Apesar disso, este material está sendo encaminhado para análise130.

Acreditamos que este material possa ser em decorrência da morte

"natural" de alguns animais, ou provocada por predadores, quando no

abrigo.

lítico - apenas um fragmento foi identificado. Trata-se de uma "lasca" cortical de quartzo

rolado, de péssima qualidade e muito comum na área. Não foram identificadas

marcas de lascamento ou de uso. Acreditamos não se tratar, na verdade, de material

arqueológico.

cerâmica - a quantidade de material cerâmico é pequena, apenas 63 fragmentos.

Acreditamos que essa quantidade seja por conta deste ser um local de um único

enterramento, do tipo secundário, e que necessitava, portanto, de apenas um

único vasilhame. Isto nos leva a pensar também, por indução lógica, que este

material cerâmico pertence a um mesmo vasilhame, e portanto de um único

conjunto, o qual não foi possível reconstituir devido ao tamanho e o estado dos

fragmentos, embora todos pertençam, por suas características, ao bojo. Com

apenas 16 fragmentos foi possível fazer uma associação a outro fragmento e

portanto a colagem a seu devido parceiro. Apesar disso, pode-se dizer, a partir

destes fragmentos e baseados em nosso guia para análise tipológica de material

cerâmico131, anexo 25, que o material cerâmico do sítio arqueológico "da

Galhada" se apresenta com:

• manufatura - sua manufatura, como pode ser visto quando da análise de

fratura, teria sido acordelada em seu bojo. Sobre o restante do vasilhame,

como não possuímos dados e/ou material, torna-se impossível de

determinar. No que concerne à pasta, não foi possível encontrarmos a

possível fonte de argila conforme já justificamos no item 2.2. Apesar

130 -Este material deverá ser analisado pelo professor e pesquisador da Universidade Católica de Pernambuco, do Recife, Albérico Nogueira, biólogo e especialista em

zooarqueologia, doutorando pela Université, da Bélgica.

131 - Este nosso guia representa a compilação de algumas obras que têm por objetivo a análise tipológica sistemática de material cerâmico arqueológico. Entre elas estão:

a - FORD, James A. Método cuantitativo para determinar la cronología arqueológica. In: Divulgaciones Etnológicas, volume 6, Instituto de Investigación Etnológica,

Universidad del Atlántico, Barranquilla, 1957, pp. 9-44. b - MEGGERS, Betty J. & EVANS, Clifford. Como interpretar a linguagem cerâmica: manual para

arqueólogos, Smithsonian Institution, Washington D.C., 1970. c - MENDONÇA DE SOUZA, A. A. C. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997.

d - MUSEU PARANAENSE DE ARTES POPULARES. Terminologia arqueológica brasileira para a cerâmica, Cadernos de Arqueologia, Universidade Federal do Paraná,

ano 1, número 1, Paranaguá, 1976, pp. 119-148. e - OLIVEIRA, C. A. A cerâmica pré-histórica no Brasil: avaliação e proposta, Dissertação de Mestrado apresentada

no Curso de Mestrado em História da Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 1990. f - RYE, O. Pottery Technology; principles and reconstrution, Manuals on

Archaeology, número 4, Australian National University, Washington D.C., 1981. g - SERRANO, A. Normas para la descrición de la cerâmica arqueologica. In:

Revista do Instituto de Arqueologia, Linguistica y Folklore Dr. Pablo Cabrera, número XXIV, Imprensa de la Universidad Nacional de Córdoba, Córdoba, 1952, pp. 1-25.

h - SHEPARD, A. O. Ceramics for the archaeologist. Canegie Institution of Washington, Washington D.C., 1963.

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disso, é possível verificar que a pasta foi preparada com muito pouco

tempero, ou então o material encontrado, quando da análise, poderia

significar o material já existente na argila (grãos de quartzo) quando de sua

retirada da fonte. Talvez por este motivo sua distribuição e forma sejam

uniformes;

• forma do lábio - indeterminado pela insuficiência de dados e ausência de

material; da boca - indeterminada pela insuficiência de dados e

ausência de material; da borda - indeterminada pela insuficiência de

dados e ausência de material; do bojo - apesar dos fragmentos

recuperados pertencerem, todos, ao bojo, seu estado e tamanho não

permitem determinar o tipo, a forma, o diâmetro e/ou a altura. Apesar

disso foi possível determinar, na maioria dos fragmentos sua espessura, que

esta entre 8 e 14 mm; da base - indeterminada pela insuficiência de

dados e ausência de material;

• tratamento de superfície - apesar da existência de material, entendemos que

pela situação dos mesmos e devido principalmente a erosão e aos resíduos

de superfície, não é prudente determinar o tratamento de superfície deste

conjunto. Apesar disso, a partir dos fragmentos que permitem uma

visualização seria possível dizer que o vasilhame estaria "mal" alisado,

interna e externamente, tendo, esse acabamento, sido realizado antes da

queima;

• coloração - tons marron-avermelhado e sem diferenciação interna e externa.

Não há distinção de cor do material em relação ao núcleo;

• resíduos - do tipo vegetal, incrustados em sua superfície externa, e com

características pós-deposicionais. Neste sentido, em uma análise posterior

poderão ser retiradas amostras para análises e confrontação com o material

vegetal que serviu para proteger ou forrar a cova na qual a urna funerária

cerâmica foi depositada;

• erosão - de superfície interna e externa, com desgaste, em alguns casos, até

o núcleo. Além disso vale ressaltar, devido provavelmente ao processo de

queima, que alguns fragmentos apresentam uma descamação das

superfícies, principalmente a externa;

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• fratura - com fraturas diversas, este material traz indicações de ter sido mal

queimado, principalmente devido as fraturas nos roletes e sua fácil

fragmentação quando do manuseio;

• textura - de forma geral, devido aos fatores mencionados em alguns dos

itens de análise aqui apresentados, este conjunto cerâmico, provocado

principalmente pelo tipo de queima realizada: não apresenta bolhas em sua

estrutura; possui rachaduras visíveis, embora sem uma estrutura

determinada; uma porosidade considerável; e por conseqüência uma alta

permeabilidade;

• dureza - pelas mesmas razões da impossibilidade de determinação do

tratamento de superfície, entendemos que também a dureza não seja algo

fácil de identificar, uma vez que a principal é determinada a partir de suas

superfícies, interna e externa. Apesar disso, nos fragmentos que permitiram

a retirada desta medida, encontramos dureza entre 2 e 3 na escala de

Mohs132.

• queima - embora ainda sem a determinação da temperatura de queima, o

material indica ter sido queimado em baixa temperatura e em local aberto,

com a maior presença de oxigênio, ou seja, uma queima do tipo redutora;

vegetal - se considerarmos o tipo de local e o tipo de atividade ali representada, podemos

dizer que recuperamos uma grande quantidade de restos vegetais, em bom

estado de conservação, provavelmente devido à baixa umidade do local. Este

material ainda não foi enviado para as análises específicas, na qual deverão ser

identificadas, entre outras coisas, a espécie vegetal, a parte aproveitada, etc..

Dentre eles destacam-se elementos como:

• 49 (quarenta e nove) "coco Bejaúba”, Astrocaryum aculeatissimum133,

sendo 7 (sete) com perfurações, algumas naturais, e cortes diversos,

sugerindo, algumas vezes, “apitos” e/ou “pingentes”;

• 4 (quatro) tipos diferentes de sementes;

• boa quantidade de "palha", indicando um “trançado”, provavelmente para

cestaria, estava forrando a cova onde foi depositada a urna funerária

cerâmica com os ossos; 132 - Escala morfológica de dureza, estabelecida por Friederich Mohs para determinar a resistência superficial dos minerais. Em arqueologia é usada, principalmente na

análise cerâmica, para determinar a dureza de suas superfícies.

133 - Esta identificação deve-se à professora Lúcia Pangaio, pesquisadora do Instituto de Arqueologia Brasileira, do Rio de Janeiro.

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coprólito - recuperamos alguns poucos fragmentos. Embora ainda não tenhamos

encaminhado para análises, tudo indica que possam ser de origem animal.

sedimento - foram recuperados pequenos torrões de terra, de cor avermelhada, que parecem

não ter sido cozidos e ser de uma argila diferente da utilizada para a confecção

do material cerâmico, bem como do sedimento no local escavado. Também

foi recuperado, do local escavado, uma quantidade de aproximadamente 300

gramas de sedimento, do qual poderão ser feitas análises diversas. Além

disso, não foram identificados indício de fogueira ou mesmo de cinzas ou de

carvão, a não ser de alguns pequenos fragmentos de ossos humanos queimados,

provavelmente resultado da preparação para o sepultamento secundário.

Como impressão final, podemos dizer que estamos considerando este local como

tendo sido utilizado para um enterramento secundário134, de um único indivíduo jovem,

provavelmente criança, devido, principalmente, aos indícios apresentados pelos restos

dentários e ósseos, ou seja, pelas condições do local, pelo material arqueológico recuperado e

pelas informações orais e escritas obtidas junto as referências bibliográficas, nos levam a

pensar que este local, pode ser, de fato, um abrigo funerário de um dos grupos indígenas que

habitaram a Serra da Piedade, ou seja, Puri ou Coroado.

Entendemos que este conjunto de dados pode ser considerado muito frágil pela

arqueologia, ou até mesmo ser desconsiderado em algumas situações, uma vez que traz

consigo poucas informações, principalmente "material cultural". Mas se o objetivo for, como

deveria ser, resgatar uma sociedade, historicamente determinada, toda e qualquer informação

torna-se relevante. É assim que parte da cultura material do sítio "da Galhada", tal como a

palha, o coco e a pintura, embora em pequena quantidade, trazem consigo um significado

cultural essencial para a compreensão histórica da sociedade ali representada.

MG-CP-2 - Toca dos Anões

O sítio arqueológico “toca dos anões” é um sítio do tipo abrigo sob rocha, situado na

Serra da Piedade, no Município de Visconde do Rio Branco - MG, que está localizado no

terço superior da referida serra, que possui uma inclinação média de aproximadamente 45o, 134 - Definida por MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: "Enterramento - ato ou maneira

de depositar o morto. Sepultamento, inumação. O enterramento pode ser primário, se é realizado de uma só vez, ou secundário, se apresenta duas ou mais etapas; direto, se o

corpo é posto diretamente de encontro à terra, ou indireto, se em urna ou outro tipo de receptáculo; simples, se não apresenta acompanhamento, ou com mobiliário funerário;

individual ou coletivo, etc.", p. 48

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em um pequeno abrigo, de formação gnáissica, com aproximadamente 12 m2. O local está

protegido pela vegetação e por inúmeros blocos rolados da parte superior da serra, fato este

que dificulta em muito o acesso ao mesmo. Esta entrada possui uma altura máxima de 80

cm, enquanto no interior do abrigo a altura máxima é de 120 cm. Por este motivo, foi

necessário quebrar alguns dos blocos localizados em sua entrada para que fosse possível

entrar e trabalhar no interior do mesmo com uma facilidade maior. É provavelmente, por

esta razão, a dificuldade de acesso, que o local permanecia desconhecido da maioria dos

moradores locais, justificando assim o fato de o material arqueológico não apresentar sinais

de alteração humana recente. Seu posicionamento é de 20o 56´ 22” 6 de Latitude Sul e 42o

54’ 08” 4 de Longitude Oeste. O local está em uma altitude de aproximadamente 590 +/- 36

metros. (anexo 26, fotos 21 e 22)

A dispersão do material arqueológico demonstrava, no início dos trabalhos, que

poderíamos ter dois momentos de ocupação, uma vez que, aparentemente, o material

cerâmico e ósseo encontrado na parte externa do abrigo era de tamanho e conservação

diferente da encontrada na parte interna.. Na medida em que o material passou a ser

recuperado, rapidamente esta hipótese foi descartada, pois verificou-se que o mesmo estava

misturado e disperso por todos os setores, fazendo parte, no caso do material cerâmico, dos

mesmos conjuntos.

Para efeito de trabalho, o sítio foi dividido em sete setores: dois externos e cinco

internos. A concentração do material arqueológico estava nos setores 2 (parte externa - nível

baixo) e 4 (parte interna - centro do abrigo). A escavação, realizada apenas na parte interna,

por decapagem e com luz artificial, revelou a presença de apenas uma ocupação arqueológica,

com espessura média entre 8 a 10 centímetros, depositada sobre a rocha matriz. Devido ao

trabalho com luz artificial, fomos levados a peneirar, com malhas de 4 e 1 mm, todo o

sedimento retirado da escavação. Na parte externa não foi necessário realizar escavações,

uma vez que ali não existia sedimento, apenas a rocha matriz e blocos soltos com uma camada

de folhas e raízes que as recobria. O trabalho nessa parte externa consistiu na retirada desta

cobertura, onde encontramos material cerâmico e ósseo. O material recuperado foi etiquetado,

embalado e armazenado separadamente, sempre de acordo com sua natureza e origem.

Das escavações arqueológicas, recuperamos restos de:

cerâmica - é o material de maior freqüência durante a escavação, aparecendo em todos os

setores, formando pequenos nichos onde, em princípio, estariam a maioria dos

fragmentos de um mesmo vasilhame. De forma geral, material aparece muito

mal conservado, com muitos pontos de erosão e muito fragmentado. Dos

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fragmentos cerâmicos recuperados, 41,8 % possuem tamanhos entre 1 e 3 cm o

que dificulta em muito o processo de análise, anexo 27, tabela 2. Assim, a

partir desta realidade, deste material e baseados na análise dos conjuntos foi

possível traçar um perfil para o material cerâmico do sítio arqueológico "Toca

dos Anões", que apresenta como características gerais predominantes:

• forma da boca - circular;

• forma do lábio - arredondado;

• forma da borda - direta, inclinada internamente e lisa, exceção feita aos

conjuntos 3 e 5, que apresentam decoração ungulada135 em duas fileiras;

• tipo de bojo - ovóide e globular;

• tipo de base - cônica;

• espessura - entre 5 e 16 mm, embora as bases possam chegar a 23 mm;

• coloração - com predominância de tons marron, desde os mais claros até os

mais escuros. O conjunto de cor mais escura são os de número 1, 2 e 3. É

freqüente aparecerem manchas negras, em posições e tamanhos diversos,

devido ao tipo de queima;

• fratura - muito freqüente e com diversos tipos e sentidos este material traz

indicações, como já aconteceu com o sítio "da Galhada", de ter sido mal

queimado, principalmente devido as freqüentes fraturas nos roletes e o

grande número de pequenos fragmentos;

• rachadura - aparece em poucos casos e quando isso acontece é de

superfície. Isto poderia nos mostrar uma contradição na medida em que

teria sido mal queimada, mas entendemos que este fato foi compensado por

uma boa preparação da pasta e com um tempero bem distribuído;

• resíduos - sempre pós-deposicionais e de origem vegetal. Aparecem

basicamente nos conjuntos maiores;

• erosão - presente em todos os conjuntos, normalmente na superfície

externa, podendo, em alguns casos, atingir o núcleo, o que significa uma

erosão de até 12 mm. Atinge basicamente os fragmentos de bojo;

• manufatura - do tipo acordelada136;

135 - Definida por MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: " Tipo de decoração que consiste

em imprimir, com a ponta das unhas, marcas agrupadas em diversas posições, na superfície do vasilhame." p. 133

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101

• tratamento de superfície - a partir dos fragmentos que permitem uma

visualização da superfície não alterada pela erosão seria possível dizer que

os conjuntos estariam bem alisados, interna e externamente, tendo, seu

acabamento, sido realizado antes da queima. Não apresentam nenhum tipo

de decoração, a não ser os conjuntos 3 e 5, que apresentam a bordas com

decoração ungulada em duas fileiras;

• tempero - grãos de quartzo de tamanho regular em torno de 1 mm e com

arestas, na maioria das vezes, arredondadas, o que pode indicar serem

provenientes de material rolado e não preparado para servir de tempero.

Poucos são os fragmentos que apresentam grãos com arestas irregulares e

quando isso acontece, estes fragmentos fazem parte dos conjuntos menores;

• distribuição do tempero - o tempero apresenta-se bem distribuído, fato que

provavelmente evitou a presença de bolhas e rachaduras, o que corrobora

com o dito a pouco, ou seja, a boa preparação da pasta e um tempero bem

distribuído teria compensado uma queima mal feita;

• dureza - nos fragmentos que permitiram a retirada desta medida,

encontramos dureza, interna e externa, entre 2 e 5 na escala de Mohs,

estando a maioria entre 3 e 4. Dizemos isso porque nos fragmentos com

processo de erosão não foi feito este tipo de medida;

• queima - embora sem a determinação da temperatura de queima, o material

indica ter sido queimado em temperaturas não superiores a 400o C e em

local fechado, com a maior presença de oxigênio, ou seja, uma queima do

tipo redutora;

ossos humanos - encontrado tanto na parte externa quanto na parte interna, apresentam-

se "extremamente" fragmentados, frágeis na sua maioria e em pequena

quantidade, considerando-se o número de conjuntos cerâmicos

identificados. Na sua maioria foram recuperados na parte interna -

centro do abrigo. Vale ressaltar que os únicos ossos relativamente

inteiros e com alguma possibilidade de análise, foram encontrados na

parte externa do abrigo, em seu nível inferior. Alguns ossos, passíveis

de análise, apresentam marcas que poderiam indicar, como no sítio "da

136 - Definida por MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro. Dicionário de Arqueologia, ADESA, Rio de Janeiro, 1997, como: " ACORDELADO - "Técnica de

confecção de cerâmica que consiste na superposição helicoidal de roletes de pasta de comprimento variável, partindo da base ou de uma porção de barro modelado para tal

fim, até construir a parede do vaso." p. 12

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Galhada", corte, ou a tentativa deste, principalmente em ossos longos

como o úmero, fêmur e tíbia. Estas marcas de corte, muito

provavelmente, podem ser resultante da preparação dos ossos para o

enterramento secundário.

Vale ressaltar que não identificamos, aparentemente, nenhuma causa

possível para a "extrema" fragmentação e fragilidade destes ossos, a

não ser a de serem estes, enterramentos secundários e portanto terem

recebido um tratamento anterior que provavelmente expôs estes ossos a

condições que os deixaram assim.

Também vale dizer que na tentativa de fazer uma contagem mínima de

indivíduos, considerando o material ósseo e dentário, foi possível

identificar apenas 4 indivíduos, 3 adultos e 1 criança. A criança foi

identificada pela dentição, onde aparecem 3 dentes molares

permanentes não irrompidos. Os indivíduos adultos foram

identificados pela parte petrosa direita, que faz parte do osso temporal,

onde aparecem o meato acústico interno, 3 vezes, e o meato acústico

externo, 2 vezes. Além dele, também aparecem 3 vezes os ossos

navicular direito e o quinto metatarso direito, ambos ossos do pé.

Lembramos que uma contagem mínima de indivíduos leva em

consideração apenas os caracteres epigenéticos dos ossos, que em nosso

caso não são freqüentes e nem em quantidade. Provavelmente por

fazerem parte de enterramentos secundários.

dentes humanos - encontrado com relativa freqüência em todos os setores, na sua maioria

representando perda "post morten", os dentes deste sítio estão

relativamente bem conservados. Pode ser observado neste material

dentário:

São, no total, 47 dentes dos quais 3 molares são de dentição permanente

e que apresentavam-se inclusos no momento da morte. Estes dentes, de

primeira dentição, de acordo com classificação proposta por

Ubelaker137, poderia colocar este indivíduo na faixa etária entre 5 anos e

8 anos, como já aconteceu no sítio "da Galhada".

137 - UBELAKER, D.H.. Human skeletal remains, Manual on Archaeology 2, Smithsonian Insitution, Washington, 1978.

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103

Dos dentes restantes, todos de indivíduo adulto, 6 (1 incisivo, 2 caninos,

2 pré-molares e 1 molar) estão em perfeito estado; 7 (4 incisivos, 1 pré-

molar e 2 molares) estavam muito fragmentados; e 31 (11 incisivos, 3

caninos, 7 pré-molares e 10 molares) apresentavam algum tipo de

"problema", onde aparecem questões como desgaste, cárie, cálculo

dentário e um importante caráter epigenético: dentes incisivos em forma

de “pá. (anexo 28, tabela 3).

Apesar disso, não nos é possível fazer qualquer afirmação neste

momento sobre o motivo destes "problemas", os quais poderiam ter

sido provocados pelo padrão alimentar, pela forma de mastigação ou

mesmo por um padrão cultural qualquer que pudesse resultar em

desgaste, cárie ou cálculo, mesmo em indivíduos jovens.

ossos animais - da mesma forma que no sítio "da Galhada", aqui os restos ósseos

animais estão representados basicamente por aves e roedores de

pequeno porte. O pouco material ósseo animal recuperado, não indica,

em uma primeira análise, ser fruto de resto alimentar, uma vez que não

apresentam marcas de queima, nem mesmo de fraturas que indiquem

uso para alimentação. Por serem, todos, ossos muito pequenos,

também não apresentam marcas de uso ou de trabalho. Apesar disso,

este material está sendo encaminhado para análise138. Acreditamos que

este material possa ser em decorrência da morte "natural" de alguns

animais, ou provocada por predadores, quando no abrigo.

lítico - não foi identificado material desta natureza neste sítio. Acreditamos que seja por

conta da natureza do local, ou seja, para enterramentos secundários

vegetal - se considerarmos o tipo de local, o tipo de atividade nele representada e o fato

de que a poucos metros, outro local, o sítio "da galhada", com tipo e atividade

idêntica, apresentou, para um único enterramento, uma quantidade

considerável de restos vegetais, o sítio "Toca dos Anões" possui uma

freqüência reduzida de restos desta natureza. Apesar disso, alguns elementos

são os mesmos encontrados anteriormente, ou seja:

138 - Idem nota 130.

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• "coco Bejaúba”, Astrocaryum aculeatissimum139, um único coco, com

perfurações provavelmente naturais;

• a "palha", aqui, apresenta-se toda em pedaços. Embora não indicando com

muita clareza um “trançado”, como no caso do sítio "da galhada",

provavelmente o fim para o qual poderia ter sido utilizada é o mesmo, ou

seja, o de forrar o local onde foi depositado o vasilhame cerâmico com os

ossos, ou mesmo internamente, forrando o fundo do vasilhame. Podemos

pensar também, que devido a quantidade deste tipo de resto, ele poderia ter

sido utilizado para apenas alguns, ou um, enterramento. Este material,

como o material vegetal do sítio "da galhada", ainda não foi enviado para

análises específicas, na qual deverão ser identificadas, entre outras coisas, a

espécie vegetal e a parte aproveitada, ou seja, casca, folha, etc..

coprólito - de origem provavelmente animal, o coprólito aparece com freqüência e sempre

encontrado no parte central, setores 1 e 3, da parte interna do abrigo.

sedimento - foram recuperados do local escavado, uma quantidade de aproximadamente

300 gramas de sedimento, do qual poderão ser feitas análises diversas. Além

disso, não foram identificados indício de fogueira ou mesmo de cinzas ou de

carvão, a não ser de alguns pequenos fragmentos de ossos humanos queimados,

provavelmente resultado da preparação para o sepultamento secundário.

Com base neste material podemos fazer algumas observações: Devido ao caráter

específico do local onde se encontra o sítio “Toca dos Anões” (o difícil acesso já

mencionado), bem como da natureza do material encontrado, pode-se concluir que não

estamos tratando de um local de habitação, permanente ou temporária, e sim de um local

destinado a enterramentos. Esta hipótese é corroborada, entre outras coisas, pelo fato de que

a cerâmica existente neste local não exibe as marcas de uso corrente, presentes em vasilhames

destinados às atividades cotidianas. Além disso, a presença do material cerâmico, aliada à

ocorrência de fragmentos ósseos e dentários humanos, sugerem estarmos trabalhando com um

local destinado a enterramentos, um cemitério, que devido a algumas características

verificadas nos ossos, nos permitem sugerir ser este um cemitério de enterramentos

secundários simples140.

139 - Idem nota 133.

140 - Idem nota 134.

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105

Quanto a análise do vasilhame cerâmico, a mesma tem por base o tratamento e a

identificação de conjuntos, os quais foram formados levando-se em conta aspectos

morfológicos e plásticos. A partir disto pode-se chegar a uma reconstituição total ou parcial

dos vasilhames, bem como ao agrupamento, em torno dos conjuntos já estabelecidos, de um

sem número de fragmentos.

É a partir desta afirmativa que questionamos, o fato de se trabalhar o material

cerâmico arqueológico apenas com base em uma classificação feita a partir dos fragmentos e

que haja um limite mínimo determinado de fragmentos para que se possa realizar uma análise.

Neste ponto, fomos levados a pensar em como proceder quando, por hipótese, encontramos

uma pequena quantidade de fragmentos cerâmicos, como é o caso concreto do sítio "da

Galhada".

Nossa proposta para isto é uma análise feita com base no que passamos a chamar de

“conjunto” e que seria formado por "todos" os fragmentos cerâmicos que pudessem fazer

parte de um mesmo vasilhame. Entendemos que desta forma estaríamos evitando dar a

fragmentos de um mesmo vasilhame uma classificação diferente, visto que, com base nos

procedimentos e resultados verificados no PRONAPA, e perpetuados até os dias de hoje em

seus procedimentos de análise para com o material cerâmico, fragmentos pertencentes a um

mesmo “conjunto” poderiam ser enquadrados em uma classificação diferente, apesar de serem

parte de um único vasilhame, feito por um único indivíduo, em uma determinada época, e

portanto, com um único estilo, uma única função, um único objetivo.

No caso do material cerâmico recuperado, até o momento, nas escavações realizadas

nos sítios arqueológicos da região de Visconde do Rio Branco - MG, nos deparamos com uma

situação deste tipo, qual seja, a de enquadrarmos fragmentos de um mesmo vasilhame em

classificações diferentes. Segundo os procedimentos propostos, utilizados e difundidos pelo

PRONAPA, fragmentos da base, do bojo e da borda de um mesmo vasilhame, poderiam

receber diferentes classificações, por possuírem, por exemplo, cor, espessura, tempero e

tratamento de superfície diferentes. Por este motivo, entendemos que o “conjunto” seja

analisado como um todo, como uma unidade básica de análise, para que não seja separado em

forma de fragmentos, em classificações diferentes.

Para o agrupamento dos fragmentos em “conjuntos”, seriam usados critérios que

levariam em conta elementos básicos, embora altamente variáveis, que poderiam estar

presentes nos fragmentos de um mesmo vasilhame. Estes elementos básicos poderiam ser: a

técnica de manufatura, o tipo de queima e o tipo de tempero, de base, bojo e borda, em

conjunto ou separadamente. A quantidade e quais seriam estes elementos, depende da

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disponibilidade do material cerâmico para que possam ser testados e, por fim, definidos.

Portanto, estes critérios estarão sempre em fase de elaboração na medida em que entendemos

haver, sempre, novos elementos para seu melhor aproveitamento. Assim, o conjunto poderá

ser definido inicialmente pelo bojo e posteriormente, pelo desenvolvimento acurado da

análise, ser acrescido de seus outros elementos, de borda ou de base, sempre levando em

consideração os elementos básicos, lembrando que eles, quando da manufatura podem ter

construção e resultado diferente, embora fazendo parte do mesmo vasilhame, como por

exemplo uma base estendida e um bojo acordelado. Lembramos que este tipo de

procedimento acontece, por exemplo, com relação ao tratamento do material ósseo humano na

identificação do número mínimo de indivíduos. O que estaríamos fazendo aqui, quando

desta análise cerâmica, é identificar o número mínimo de vasilhames, não sendo relevante a

quantidade de fragmentos em que foram transformados.

Após estabelecidos os “conjuntos”, passaríamos a análise classificatória de acordo

com um guia para análise tipológica elaborado no intuito de abranger o maior número

possível de atributos que pudessem ser identificados no material cerâmico que viesse a ser

recuperado. Esta análise segue a terminologia para a cerâmica arqueológica brasileira,

levando em conta os estudos e propostas técnicas para análise cerâmica.

Nossa análise do material cerâmico consiste portanto, como já dissemos, na

identificação de conjuntos aos quais pertenceriam os diversos fragmentos e não apenas na

análise dos mesmos de forma individual. Assim, como resultado teríamos a reconstituição,

total ou em parte, do próprio vasilhame. Devemos lembrar que este procedimento de

reconstituição do vasilhame pode ser considerado por alguns como não sendo tarefa ou

trabalho do arqueólogo. Apesar disso, embora sabendo que esta poderia não ser uma função

da arqueologia e do arqueólogo em seu trabalho, ressaltamos que nossa intenção é recuperar

uma sociedade, da melhor forma possível, através, principalmente, dos restos de sua cultura

material e não uma cultura material através de seus fragmentos.

A proposta de trabalhar o material cerâmico em seu conjunto e não apenas de seus

fragmentos, pressupõe, necessariamente, uma prévia observação do mesmo, ainda em campo,

quando das escavações arqueológicas. Os sete setores em que foram divididos o sítio

representam não apenas nichos localizados, mas também uma caracterização do material neles

existentes, uma vez que em todos eles foi recuperado material cerâmico arqueológico.

Assim, inicialmente as análises previam a reconstituição dos fragmentos que se

encontravam dispersos no exterior do abrigo. Em sua segunda etapa, foram reunidos e

analisados os fragmentos que se encontravam no interior do abrigo, da mesma forma que na

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107

etapa anterior. Através desta análise pôde-se chegar a uma reconstituição parcial dos

vasilhames, bem como o agrupamento de um sem número de fragmentos.

Com os conjuntos formados iniciamos o diagnóstico deste material cerâmico. Os

fragmentos então analisados, com o auxílio de microscópios, forneceram inúmeras

particularidades, tais como: coloração, resíduos de queima, desgaste por erosão, fraturas,

marcas de uso e material vegetal.

Através da formação dos conjuntos, durante as análises de laboratório, foi possível

verificar que, na realidade, o posicionamento dos fragmentos, em cada um dos setores do

sítio, não correspondia à distribuição, "in loco", dos vasilhames, ou seja, o material

encontrado, disperso por cada um dos setores, não fazia parte, necessariamente, do mesmo

conjunto.

Desta análise resultaram nove conjuntos parcialmente reconstituídos (anexo 29, fotos

23-30, desenhos 2-10), além de outros ainda possíveis de serem formados com os fragmentos

restantes, principalmente de borda, e que não fazem parte de nenhum dos conjuntos

mencionados anteriormente. Como exemplo, passamos à descrição do conjunto número 1

(desenho 2, foto 23, do anexo 29), do sítio Toca dos Anões:

PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

SÍTIO ARQUEOLÓGICO TOCA DOS ANÕES - VRB-MG-005 (MG-CP-2)

ANÁLISE DE MATERIAL CERÂMICO

Conjunto 1

• manufatura - acordelada

• pasta - com distribuição regular do tempero, não apresenta bolhas e não permite fratura

com facilidade

• tempero - grãos de quartzo de tamanho regular em torno de 1 mm e com arestas

arredondadas, o que pode indicar serem provenientes de material rolado e não preparado

para servir de tempero

• distribuição do tempero - o tempero está bem distribuído, fato que provavelmente evitou a

presença de bolhas e rachaduras

• núcleo - de cor negra e com espessura regular variando entre 2 e 3 mm

• forma do lábio - arredondado

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• forma da boca - circular

• forma da borda - introvertida

• forma do bojo - ovóide

• forma da base - alto grau de convexibilidade, caracterizando uma base cônica

• espessura - a espessura do vasilhame é homogênea e varia entre 12 e 16 mm

• tratamento de superfície interna - alisada

• tratamento de superfície externa - alisada

• coloração - tons acinzentados, tendo sua parte meso-inferior uma coloração em tons de

cinza escuro para preto

• resíduos - aparecem dois tipos de resíduos: o primeiro seria uma fuligem em seu terço

meso-inferior, com espessura podendo chegar a 1 mm e o segundo seriam restos vegetais

incrustados em toda a parte externa do vasilhame

• erosão - aparecem principalmente em seu terço superior. Esta erosão representa a perda

de uma fina camada, de aproximadamente 1 mm, da superfície externa

• fratura - irregular, provavelmente em decorrência da pasta bem preparada, sem bolhas,

com uma boa distribuição do tempero e uma queima com temperatura regular durante

todo o processo

• textura - porosidade e permeabilidade baixa

• dureza - entre 3 e 5 da escala de Mohz, embora a maioria dos fragmentos apresentem

dureza 4

• queima - provavelmente realizada em ambiente redutor, sem a presença de oxigênio

2.6 - uma sociedade como resultado

Dentre as conclusões a que podemos chegar neste momento sobre o trabalho na serra

da piedade, a principal é a de estarmos diante de uma necrópole pré-histórica, onde um grupo

puri e/ou coroado enterrava, de maneira definitiva, seus mortos. Decidimos pensar esta área

como uma necrópole depois de pensar nos cemitérios atuais, onde verifica-se que um único

sepultamento não o caracteriza como tal, uma vez que isso pode acontecer em qualquer lugar

e com qualquer pretexto, mas vários sepultamentos, com um objetivo, transformam este

determinado espaço em cemitério. Portanto, um espaço com função delimitada. No caso de

uma necrópole pré-histórica, o funcionamento poderia ser o mesmo.

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Na serra da Piedade, após a visitarmos, seja percorrendo toda sua extensão, seja

entrevistando a população que nela habita, além das pessoas que não moram na serra mas que

sabem de fatos e "histórias" sobre ela, constatamos que apenas uma pequena área foi

utilizada, e somente com enterramentos do tipo secundário. O restante da serra, além

daqueles identificados como tendo sido ocupados, não foi utilizada, mesmo possuindo

abrigos, cavernas e grutas muito mais amplas, protegidas e adequadas ao uso, seja para

moradia, ou mesmo para a prática de enterramentos. Nem mesmo os locais propícios à

retirada de matéria-prima, tanto para o material lítico quanto para a cerâmica, não foram

utilizados, apesar de oferecer excelentes locais para isso, sendo que hoje são utilizados pela

população local com este fim.

Havia portanto, acreditamos assim, um objetivo claro para esta utilização: a de usar

aquela serra, ou aquela área daquela serra, como um local para sepultamentos definitivos.

Talvez uma prova disso seja o fato de não ter sido encontrado na serra, nem em relatos, orais

ou escritos, nenhum outro tipo de resto que não de sepultamentos, quando constatamos que

nas proximidades da região é abundante o material lítico disperso. Desta maneira, pode-se

inferir que o grupo que teria utilizado a serra da Piedade como a última "morada" de seus

mortos, acreditar em algum tipo de separação entre os espaços que deveriam ser ocupados

pelos que estavam vivos e pelos que estavam mortos. Evidentemente, não há como

comprovar esta hipótese. Trata-se de uma inferência, de uma possibilidade para melhor

entendermos o motivo desta separação tão nítida entre os espaços ocupados por este grupo, ou

seja, o espaço para os enterramentos primários, ainda não encontrado, e o espaço para os

enterramentos secundários, a serra da Piedade.

Com relação ao grupo que teria utilizado a serra da Piedade para realizar estes

enterramentos, ficam algumas questões em aberto. O trabalho de pesquisa histórica, com

fontes escritas e orais, realizado durante todo o projeto confirma ter sido esta área ocupada

por grupos indígenas Puri, índios nômades que percorriam as imediações da serra da Piedade

em constantes atritos com outros grupos, como os Coroado, os Coropó e os Botocudo. Com

base nestas informações é possível propormos duas explicações, que busquem entender esta

ocupação. Na realidade, estas duas explicações, possuem entre si uma continuidade de

práticas sociais bastante claras.

A primeira diria respeito a uma ocupação em tempo histórico, quando os grupos

indígena puri da região já teriam um modo de vida mais sedentário e usariam a área para o

sepultamento definitivo de seus mortos. Neste tempo já era grande a pressão exercida pelos

colonos que acabavam de chegar em busca de novas terras, as quais eram controladas, até

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aquele momento, pelos índios. Com isso, a área necessária para seus movimentos, tornou-se

cada vez menor em função da proximidade cada vez maior com a população colonial. Com o

conhecimento da história da região e o processo de conquista de suas terras pela sociedade

colonial, podería-se pensar que estes grupos indígenas estariam usando a serra da piedade

para o sepultamento definitivo de seus mortos, realizados de tempos em tempos, uma vez que,

por estarem constantemente envolvidos em conflitos, o que acarretava um número de mortos

acima do normal, e que poderiam estar sendo levados para a serra da Piedade, em momentos

de trégua, uma vez que necessitavam de tempo para prepará-los.

A segunda explicação diria respeito a uma ocupação mais antiga, anterior a chegada

do elemento europeu. Neste momento, os grupos Puri percorriam grandes extensões dos

territórios que hoje compreendem parte dos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito

Santo e até mesmo, São Paulo. Neste caso, os sepultamentos também poderiam acontecer de

tempos em tempos, uma vez que são secundários e portanto mais fáceis de serem

transportados por um grupo nômade, embora necessitando de maior tempo de preparação.

Como a cerâmica encontrada nos enterramentos é um material frágil, com pouca resistência e

sem marcas de uso, pode-se pensar que sua manufatura tenha ocorrido especificamente para

este fim e no próprio área, quando do sepultamento.

Destas possibilidades desmembram-se duas outras questões: a datação destes

enterramentos, que deverá ser feita em breve através dos restos ósseos, e a familiaridade entre

os sepultamentos, que também deverá ser vista em breve por uma análise do DNA destes

mesmos ossos. Neste caso do DNA, também já estão acertados a retirada de material de duas

pessoas descendentes dos índios Puri: D. Ratinha, moradora da serra da piedade e que embora

não lembre de sua idade, dizem os moradores da região, ter mais de 100 anos, e uma

professora, D. Carla, residente na cidade de Vitória - ES. Estas análises nos ajudarão a

definir o grupo indígena que ocupou a serra da Piedade, ou pelo menos, se teria sido, ou não,

um grupo Puri.

Outra questão, e que pretendemos tentar resolver com a escavação de alguns sítios já

encontrados, entre eles as aldeias Santa Maria (MG-CP-3), que já está com sua escavação

iniciada, e a aldeia Floresta (MG-CP-4), é o fato de que se há sepultamentos secundários na

serra, também é certo que existe, ou existiu, sepultamentos primários em outros locais. Onde

estariam é o que pretendemos responder. A localização destas aldeias, portanto de um espaço

utilizado pelos vivos, permitirá respondermos às questões levantadas acima e aprofundarmos

o conhecimento sobre este grupo.

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Como já dissemos anteriormente, entendemos que todo este conjunto de dados,

apresentado até o momento, pode ser considerado muito frágil pela arqueologia, ou até

mesmo ser desconsiderado em algumas situações, uma vez que traz consigo poucas

informações, principalmente as referentes ao "material cultural". A situação se agravaria

ainda mais, ao levar-se em conta que 8 dos locais relacionados neste trabalho apresentam

apenas relatos e informações. Mas se o nosso objetivo é, como deveria ser, resgatar uma

sociedade, historicamente determinada, toda e qualquer informação torna-se relevante.

É neste ponto, da importância ou não do sítio arqueológico, ou então de sua maior ou

menor importância, que nos surgem questões como a de que um determinado sítio ou área

arqueológica não necessita ser trabalhada por já pressupormos saber o que há nela, através das

pesquisas feitas anteriormente por outros arqueólogos em áreas similares ou próximas e que,

portanto, os resultados já são conhecidos, pois, o material seria igual àquela outra área ou

sítio, etc ... Com relação a isso Becker141 nos diz que

"erroneamente pressupomos que os observadores têm que estar estudando a mesma coisa porque supomos que apenas uma estrutura social está presente numa organização ou comunidade." p. 67

E que portanto,

"... Descrições distintas da mesma organização perturbam pessoas acostumadas à pesquisa modelada no paradigma experimental." p. 67

Entendemos que isso ocorre porque o que estamos vendo e tratando quase sempre, são

somente, os restos materiais, que nos levam, inevitavelmente, apenas à cultura material. Se

estivermos olhando e pensando uma determinada sociedade como um todo, área alguma, sítio

algum será igual, será previamente conhecido, etc ... Todos terão sua importância,

independentemente do tamanho, da quantidade e da qualidade do material.

Assim é, portanto, que por exemplo, parte da cultura material do sítio "da Galhada",

tal como a palha, o coco e a pintura, embora em pequena quantidade, traz consigo um

significado cultural essencial para a compreensão histórica daquela sociedade ali

representada.

Por isso que entendemos que a arqueologia não deve identificar um sítio e trabalha-lo,

mas escolher uma sociedade e pesquisá-la em todas as suas possibilidades, no tempo e no

141 - BECKER, Howard S.. Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais, Coleção Ciências Sociais, volume 31, Editora Hucitec, São Paulo, 1993

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espaço, através de todos os tipos de indícios possíveis. É o que estamos buscando fazer com

os grupos indígenas Puri e Coroado, dos quais apresentamos este trabalho com alguns

resultados e reflexões.

É neste ponto que a arqueologia sozinha, ou apenas com seu método, não é suficiente

ou capaz para tal. Uma ciência que pretende recuperar a história de uma sociedade, seja em

sua "totalidade" ou não, necessita utilizar-se de todos os recursos ao seu alcance, venham eles

das áreas denominadas humanas, sociais, físicas, biológicas ou qualquer outra. Não são os

avanços das áreas técnicas ou o aprimoramento de alguns segmentos de análise que nos

indicam o avanço da arqueologia, da mesma forma que não são os novos equipamentos ou

técnicas de exames que demarcam o avanço da medicina.

Assim, não basta uma boa análise, o aprimoramento de uma técnica de escavação, o

uso de equipamento adequado de registro de campo, a qualificação acadêmica formal do

profissional, se não ultrapassarmos as barreiras da cultura material, da análise descritiva, da

quantificação, do preconceito entre as áreas do conhecimento, do positivismo científico.

Reconhecemos o estatuto científico de cada uma das áreas do conhecimento, mas não

podemos deixar que este impeça o avanço de nossos estudos. O resultado deve ser muito

mais importante do que o nome daquilo que estamos fazendo ou a quem será atribuído o

mérito. Voltemos à medicina. De quem são os méritos pela descoberta de uma nova vacina

? Do médico que diagnosticou o problema no paciente, do biólogo que buscou o seu

desenvolvimento ou do sanitarista que pesquisou o problema social, entre outros profissionais

que trabalharam para resolver o problema que é social ? Entendemos que de nenhum deles.

O mérito é do homem, do ser humano, da sociedade. O mesmo deveria acontecer quando um

arqueólogo encontra uma ocupação humana de algumas centenas ou mesmo milhares de anos.

Não importa a ponta de flecha, o vaso cerâmico, a pintura rupestre, o enterramento, a

fogueira ou tantos outros registros que possam surgir. Para isso não é necessário um

profissional preparado durante anos. O mais simples dos homens do campo sabe fazer esta

identificação, contar "quantos índios estavam enterrados ali", dizer que "ali havia uma

fogueira", que "aquilo é uma pintura" ... Talvez não saiba fazer de uma maneira "científica",

com um vocabulário "técnico", mas sabe fazer, sabe identificar. Isoladamente estes registros

têm valor apenas como registros, o fato pelo fato, o material pelo material. Estaríamos

voltando à história fatual, criticada e execrada pela história contemporânea.

Devemos deixar claro que não estamos excluindo a grande importância da cultura

material, instrumento de trabalho, não apenas da arqueologia, mas de inúmeras áreas do

conhecimento. A cultura material não deve ser o fim e sim o meio com o qual deveremos

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chegar a sociedade. Ela representa para o arqueólogo o mesmo que o documento escrito

representa para o historiador.

É dessa forma que a arqueologia que pretendemos, e que nos propomos realizar neste

trabalho, leva em consideração "todas" as possibilidades de uma sociedade, representada

através de todo e qualquer indício de sua existência, sejam eles escritos, orais ou materiais.

Na verdade, o trabalho não acaba, o que acabam são as etapas da pesquisa, com suas

respectivas conclusões. Ele está sempre em elaboração, com uma nova etapa sendo iniciada.

Com novas hipóteses, com novas condições, com novos equipamentos, com novos

conhecimentos, com novos pesquisadores. São os princípios da teoria da complexidade,

onde o fim de uma etapa é o início de outra e assim sucessivamente, ao infinito. São as

palavras de Becker142, onde

"qualquer representação da realidade social - um filme documentário, um estudo demográfico, um romance realista - é necessariamente parcial, menor do que aquilo que se poderia vivenciar e achar disponível no ambiente." p. 140

Assim, justificamos, por exemplo, o trabalho com a história oral, uma técnica de

pesquisa histórica, para registrar formalmente a busca do sítio arqueológico e que possibilita a

sua inserção no tempo e no espaço, de forma mais ampla e não apenas no seu tempo e/ou no

seu espaço. Foi com essa perspectiva que nos foi possível constatar que as sociedades com

as quais trabalhamos, puri e coroado, fazem parte do dia-a-dia de uma região e não apenas de

uma comunidade, como acreditávamos no princípio, na medida em que a sociedade atual

procura tê-las como sua origem. Os antigos locais de ocupação tornaram-se referência,

gerando "status" e vantagens sociais a seus proprietários, moradores ou detentores daquele

conhecimento.

Outro exemplo é em relação aos indícios escritos e que representam hoje uma

referência para a pesquisa, principalmente em arqueologia histórica. No caso da pesquisa

com grupos pré-históricos, as referências escritas permitem informações, do período de

contato, sobre as áreas de ocupação, tipo de dispersão, tipo de comportamento social e

cultural, tipo de cultura material, entre outras. Devemos lembrar que este tipo de indício é

muito questionado por alguns, sejam arqueólogos, sejam historiadores. A alegação para isso

deve-se a pouca credibilidade dada aos relatos e documentos produzidos neste período,

142 - Op. Cit..

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principalmente pelos cronistas e viajantes, mas que infelizmente são os únicos. Embora

possamos questioná-los, nunca devemos abandoná-los ou ignorá-los.

Ao trabalharmos desta forma e com este tipo de indícios, além de estarmos tratando de

nosso objeto de estudo, estamos produzindo documentos para que outros pesquisadores, de

outras áreas, possam trabalhar. Seja criando seu próprio objeto de estudo, seja trabalhando

conosco na produção de elementos que farão avançar nossos resultados, gerando novos

objetos e assim sucessivamente, criando com isso um círculo que irá gerar elementos ao

infinito. Seria o feed-back proposto por Flannery143 ao estudar as culturas meso-americanas

no México, na década de 70.

Ainda sobre a ocupação, vale reforçar o fato de que a serra da Piedade apresenta as

mesmas conformações geológicas e geográficas encontradas na região serrana do estado do

rio de janeiro, onde aparecem as principais ocupações arqueológicas do norte fluminense,

também associadas aos grupos indígenas Puri e Coroado. Nela as grutas, abrigos e cavernas

também apresentam uma formação predominantemente de gnaisses, granitos e diabásios,

encontradas, da mesma forma que no norte fluminense, junto aos paredões de formação

natural ou em formações provocadas por grandes blocos de rochas - "matacões" - deslocados

destes paredões após fraturas provocadas por agentes físicos e químicos que agiram durante

milhares de anos sobre a rocha matriz. Isso nos leva a relacionar, com base nos registros

orais, escritos e arqueológicos, as duas regiões, claramente identificadas como áreas ocupadas

por índios puri e coroado. É exatamente neste tipo de local que aparecem todos os locais

com restos ou indícios de ocupação. Na serra da Piedade todos apresentam as mesmas

características:

• São pequenos;

• De difícil acesso;

• Com pouca luminosidade;

• Com sepultamento secundário;

• No fundo do abrigo;

• Contendo, com exceção feita à "Toca dos Anões", apenas um sepultamento.

Outro ponto comum entre ambas as áreas é a modificação do ambiente, provocada

primeiro pela retirada da vegetação e posteriormente pela erosão. Isso tem trazido à

arqueologia muitas dificuldades quando em trabalho de campo, pois devido a erosão, muitos

143 - FLANNRY, Kent.

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sítios arqueológicos desapareceram, seja porque foram destruídos, espalhando seu material

por imensas áreas, seja porque foram soterrados pelo sedimento rolado das encostas. Além

disso, associado a este fato, houve a destruição pela ação direta do homem, que, desprovido

de conhecimento e informações sobre aquele material, depredou e destruiu inúmeros sítios

arqueológicos. É por este motivo que o trabalho com as comunidades tem se revelado

importante, pois além de informar, também está educando para a não destruição daquilo que é

seu patrimônio. Em nosso trabalho na serra da piedade, bem como em toda região de

Visconde do Rio Branco, estamos realizando este trabalho, ou seja, de preservação do

patrimônio regional, seja ele ambiental, histórico, arqueológico ou arquitetônico. São estas

ações que têm preservado muito do patrimônio da região e gerado um grande interesse por sua

história, na qual o elemento índio foi o elemento gerador e fundamental para a criação do

presídio São João Batista, núcleo inicial daquela região.

Além disso, para concluir, gostaríamos de dizer que o Programa Arqueológico Puri-

Coroado, célula mãe de onde saiu retiramos este trabalho, não se esgota com ele. Além dele,

outros trabalhos já estão em andamento, bem como outros deverão ser inciados em breve. Os

resultados agora apresentados são apenas uma de suas etapas. O programa é muito mais do

que isso. Trata-se na realidade, de um projeto em que estão envolvidos diversos

pesquisadores, de diversas áreas do conhecimento. Mas, principalmente, envolve uma

comunidade que está resgatando, através do acompanhamento das pesquisas, o seu passado,

além de estar aprendendo a valorizar o seu a sua história, o seu patrimônio, o seu meio

ambiente, fonte de sobrevivência para muitos, mas também, da história que está latente em

cada uma de suas serras, em cada uma de suas cidades e em cada um de seus moradores.

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SEM AUTOR. SEM TÍTULO. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São

Paulo, volume XI, 1906.

2 – CARTAS

CARTA de Frederico Willner, engenheiro civil da Companhia do Rio Doce e encarregado da

abertura para Minas Geraes, ao Dr. Luiz Pedreira do Couto Ferraz, Presidente da

Provincia - Vitoria (ES), 13 de novembro de 1846.

CARTA por ordem do Principe Regente, ao Conde de Rezende, Dom José de Castro,

(Governador do Rio de Janeiro), Palácio de Queluz, 07 de março de 1800.

CARTA ao Capitão Ignácio de Sousa Vernek de Dom Fernando José de Portugal (vice-rei),

Rio de Janeiro, 20 de novembro de 1801.

CARTA a José Rodrigues da Cruz de Dom Fernando José de Portugal (vice-rei), Rio de

Janeiro, 20 de novembro de 1801.

CARTA de José Antonio Freire de Andrade ao Conde de Bobadella, Thomé da Costa Corte

Real, Rio de Janeiro, 04 de janeiro de 1759. In: Viagens no Brasil - documentos vários

- conselho ultramarino, pp. 162v-167v..

CARTA de Guido Thomaz Marlière a João Sturt, Guido-Wald, 20 de fevereiro de 1833.

CARTA com data de Lisboa, 27 de novembro de 1750. In: Archivo do Conselho

Ultramarino, Rio de Janeiro 1741-1754, pp. 147-149v..

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138

3 - DECRETOS

DECRETO de 26 de março de 1819, que declarava nula a concessão de sesmarias das terras

da aldeia de Valença, destinada para vila dos índios Coroado. In: Alvaras, decretos e

cartas régias, Rio de Janeiro, pp. 16-17.

4 - DISCURSOS

DISCURSO do Presidente de Província de Minas Geraes, José Cesário de Miranda Ribeiro,

dirigido à Assembléia Legislativa Provincial de Minas Geraes, em 01.02.1838, Ouro

Preto, Typ. do Correio de Minas, 1838

DISCURSO do Presidente de Província de Minas Geraes, Quintibano José da Silva, dirigido à

Assembléia Legislativa Provincial de Minas Geraes, em 03.02.1846, Ouro Preto, Typ.

Imparcial de Belo Horizonte, 1846

DISCURSO do Presidente de Província de Minas Geraes, Antonio da Costa Pinto, dirigido à

Assembléia Legislativa Provincial de Minas Geraes, em 03.02.1837, Ouro Preto, Typ.

do Universal, 1837

5 - INSTRUÇÕES

INSTRUÇÕES que deve observar o Diretor da Povoação e aldeamento dos índios Puris, e

Xamixumas. In: Livro de officios da junta da civilização e conquista dos índios e

navegação do Rio Doce - Arquivo Público Mineiro, 28 de julho de 1809, pp. 20v.-24.

6 - OFÍCIOS

OFÍCIO de Luiz Pedreira do Couto Ferraz a Joaquim Manuel de Macedo, Secretário do

Instituto Histórico, Rio de Janeiro, 20 de novembro de 1855.

OFÍCIO de Manoel da Roxa Pimentel para o Governador interino da Provincia do Espírito

Santo, Cel. Manoel Vieira Machado, Serra (ES), 20 de desembro de 1819.

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139

OFÍCIO do Diretor Geral dos índios, Sr. Antonio Luiz de Magalhães Mosqueira. In:

Registro de correspondência da Diretoria Geral dos índios da Provincia de Minas

Geraes - Arquivo Público Mineiro, 23 de julho de 1872, pp. 97v.-98v..

7 - RELATÓRIOS

FERRAZ, Luiz Pedreira do Couto. Relatório do Presidente da Provincia do Rio de Janeiro.

In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, número _____, volume

_____, tomo _____, Typ. do diário de N.L. Vianna, Rio de Janeiro, 1849, pp._____.

RELATÓRIO do Diretor Geral dos índios. In: Registro de correspondência da Geral dos

índios da Provincia de Minas Geraes - Arquivo Público Mineiro, 13 de julho de 1871,

pp. 39-43.

RELATÓRIO dos aldeamentos indígenas existentes sob a jurisdição da Diretoria Geral dos

índios da Provincia de Minas Geraes. In: Registro de Correspondência da Diretoria

Geral dos índios da Provincia de Minas Geraes - Arquivo Público Mineiro, abril de

1868, pp. 52-5

RELATÓRIO de Presidente de Província - Rio de Janeiro - Caldas Vianna, 01.03.1844 -

(cathequese e civilização dos índios, e estado de seus bens)

RELATÓRIO de Presidente de Província - Rio de Janeiro - João Pereira Darrigue Fro,

01.03.1850 - (cathequese e civilização dos ínidos)

RELATÓRIO de Presidente de Província - Rio de Janeiro - Luiz Pedreira do Couto Ferraz,

01.03.1849 - (cathequese e civilização dos índios)

RELATÓRIO de Presidente de Província - Rio de Janeiro - Luiz Antonio Barbosa,

apresentado ao Exmo. Sr. Vice-Presidente da Província do Rio de Janeiro, José Ricardo

de Sá Rego, 03.05.1855 - (cathequese e civilização dos índios)

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140

RELATÓRIO de Presidente de Província - Rio de Janeiro - Luiz Pedreira do Couto Ferraz,

apresentado ao Exmo. Sr. Vice-Presidente da Província do Rio de Janeiro, João Pereira

Darrigue Faro, 03.05.1852 - (cathequese)

RELATÓRIO de Presidente de Província - Rio de Janeiro - Luiz Pedreira do Couto Ferraz,

apresentado ao Exmo. Sr, Vice-Presidente da Província do Rio de Janeiro, João Pereira

Darrigue Faro, 05.05.1851 - (cathequese)

RELATÓRIO de Presidente de Província - Minas Geraes - 1853 (relatório do Diretor da Cia.

do Mucury, onde examina-se, detalhadamente, os índios desta região)

8 - TERMOS DE JUNTA

TERMO DA JUNTA a respeito do novo aldeamento dos índios Croatos estabelecidos no Rio

Casca para a guarnição dos certoens daquelle districto infestado dos índios brabos. In:

Papéis relativos ao sanctuario do senhor da Matosinhos de Congonhas de Campo -

Revista do Arquivo Público Mineiro, ano XVII, Belo Horizonte, Imprensa oficial do

Estado de Minas Geraes, 1913, pp. 426-431.

9 - MAPAS

ADAM, Visconde J. de Villiers de L'Ile. Carta chorográphica e administrativa da provindia

do Rio de Janeiro e do município neutro, Rio de Janeiro, Lith. Imperial de Vilarée,

1848, escala em légoas.

ADAM, Visconde J. de Villiers de L'Ile. Carta topográphica e administrativa da provincia do

Rio de Janeiro e do município neutro, Rio de Janeiro, Lith. Imperial de Vilarée-Garnier

Irmãos, 1850, sem escala.

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Minas Geraes, Rio de Janeiro, Garnier Irmãos Editores, 1849, escala em legoas.

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GERBER, Henrique. Carta da provincia de Minas Geraes, 1862, escala 1:l.500.000, sem

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Radambrasil, Levantamento de Recursos Humanos, volume 32, folha Rio de

Janeiro/Vitória (SF-23/24), SEPLAN/IBGE, Rio de Janeiro, 1983, escala 1:1.000.000.

NIEMEYER, Conrado Jacob de et alli. Carta chorográphica da provincia do Rio de Janeiro,

1939, escala 1:400.000, sem editor.

RENSBURG, Eduardo. Carta chorográphica da provincia do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,

Lith. Imperial, 1865, escala 1:300.000.

WAGNER, Frederico. Carta chorográphica da provincia de Minas Geraes, Ouro Preto, 1855,

escala em legoas, sem editor.

SEM AUTOR. Planta geral da Capitania de Minas Geraes, sem escala, sem data, sem editor.

SEM AUTOR. Mapa da Capitania de Minas Geraes, sem escala, sem data, sem editor.

SEM AUTOR. Provincia do Rio de Janeiro, E. & H. Laemmert, 1866, sem escala.

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SEM AUTOR. Provincia do Espírito Santo, Lith. do Archivo Militar, 1873, sem escala.

SEM AUTOR. Mapa da Capitania de Minas Geraes com a divisa de suas Comarcas, sem

escala, sem data, sem editor.

SEM AUTOR. Carta topográphica dos municípios e termos do Presídio, Pomba e São João

Nepomuceno com notícias do Paiz que delles seguem até o mar pela bula Oriental, sem

escala, sem editor, com data anterior a 1853.

SEM AUTOR. Carta da provincia do Rio de Janeiro, Lith. do Archivo Militar, 1840, escala

em légoas.

SEM AUTOR. Karte zur ubersicht von H. Burmeister reise in brasilien. In: Reife nad

brafilien, durd die brodinzien von Rio de Janeiro und Minas Geraes, Berlin, 1853,

escala em legoas, sem editor.

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Anexos (o material em anexo não apresentado neste texto, esta disponível, e pode ser acessado com o autor,

pelo endereço eletrônico [email protected])

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DE UM SÍTIO ARQUEOLÓGICO

(proposta de trabalho)

1 território 1.1 espaço de habitação 1.1.1 permanente 1.1.1.1 local doméstico 1.1.1.1.1 área de produção 1.1.1.1.1.1 bens materiais 1.1.1.1.1.2 bens de consumo 1.1.1.1.1.3 artística 1.1.1.1.1.3.1 pintura rupestre 1.1.1.1.1.3.2 gravação 1.1.1.1.1.3.2.1 rupestre 1.1.1.1.1.3.2.2 madeira 1.1.1.1.1.3.2.3 óssea 1.1.1.1.1.3.3 decoração cerâmica 1.1.1.1.2 área de cerimonial 1.1.1.1.2.1 enterramento 1.1.1.1.2.1.1 primário 1.1.1.1.2.1.2 secundário 1.1.1.1.2.1.2.1 c/ pintura 1.1.1.1.2.1.2.2 cremação 1.1.1.1.2.1.2.1 outra 1.1.1.1.3 área de alimentação 1.1.1.1.3.1 cozinha 1.1.1.1.3.1.1 fogueira* 1.1.1.1.3.1.1.1 comunitária 1.1.1.1.3.1.2.2 individual 1.1.1.1.3.1.2 lixo 1.1.1.1.3.1.2.1 comunitária 1.1.1.1.3.1.2.2 individual 1.1.1.1.4 área de dormida** 1.1.1.1.5 área de circulação 1.1.1.1.6 outra 1.1.1.2 local de produção 1.1.1.2.1 bens materiais 1.1.1.2.1.1 oficina lítica 1.1.1.2.1.2 olaria cerâmica 1.1.1.2.1.2.1 forno 1.1.1.2.1.2.2 confecção 1.1.1.2.1.2.3 decoração 1.1.1.2.1.3 outro 1.1.1.2.2 bens de consumo 1.1.1.2.2.1 roça 1.1.1.2.2.1.1 milho 1.1.1.2.2.1.2 mandioca 1.1.1.2.2.1.3 outra 1.1.1.2.2.2 olaria cerâmica 1.1.1.2.2.2.1 forno 1.1.1.2.2.2.2 confecção 1.1.1.2.2.2.3 decoração 1.1.1.2.2.3 descarnamento 1.1.1.2.3 artística 1.1.1.2.3.1 pintura rupestre 1.1.1.2.3.2 gravação

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1.1.1.2.3.2.1 rupestre 1.1.1.2.3.2.2 outra 1.1.1.3 local para cerimonial 1.1.1.3.1 cemitério 1.1.1.3.1.1 enterramento primário 1.1.1.3.1.2 enterramento secundário 1.1.1.3.1.2.1 com pintura 1.1.1.3.1.2.2 cremação 1.1.1.3.1.2.3 outra 1.1.2 temporário 1.1.2.1 área de produção 1.1.2.1.1 bens de consumo 1.1.2.1.2 bens materiais 1.1.2.1.3 artística 1.1.2.1.3.1 pintura rupestre 1.1.2.1.3.2 gravação 1.1.2.1.3.2.1 rupestre 1.1.2.1.3.2.2 madeira 1.1.2.1.3.2.3 óssea 1.1.2.1.3.3 decoração cerâmica 1.1.2.2 área de alimentação 1.1.2.2.1 fogueira 1.1.2.2.2 lixo 1.1.2.3 área de dormida 1.1.2.4 outra 1.2 espaço de produção*** 1.2.1 lítica 1.2.2 cerâmica 1.2.3 alimentar 1.2.4 artística 1.2.5 outra 1.3 espaço de cerimonial**** 1.3.1 cemitério 1.3.2 outro OBSERVAÇÕES

• * Para fogueira podemos ter dois tipo: uma para fogão e outra para aquecimento, iluminação e com intuito de afugentar animais

• ** Sempre individual, embora em aldeias possamos ter divisões por famílias, principalmente quando temos casas. Nesse caso, também teremos uma divisão na circulação, onde cada casa poderá apresentar um tipo

• *** Por ter uma ocupação temporária, a arrumação desse espaço será identica a do espaço de habitação temporário

• **** O espaço cerimonial terá a mesma arrumação dada ao local para cerimonial do espaço de habitção permanente. Quando existirem nesse espaço áreas de atividade, elas serão arrumadas da mesma forma que as do espaço de habitação temporário

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

ROTEIRO PRELIMINAR PARA ENTREVISTAS DO

(terceira versão)

i Endereço ii Data iii Local onde está sendo realizada a entrevista iv Acompanhantes v Ambiente 01 - Nome 02 - Idade 03 - Estado civil. A quanto tempo? 04 - Grau de instrução. Onde estudou? 05 - Profissão? Onde trabalha e/ou trabalhou? Ocupa e/ou ocupou algum cargo? 06 - Filhos? Quantos? Idade? Grau de instrução? Estado civil? 07 - Netos? Quantos? Idade? Grau de instrução? Estado civil? 08 - Nome dos pais, avós, bisavós? Qual o grau de instrução que tinham?

Os conheceu? Estão vivos? Que idade tinham ao morrer? 09 - Tem irmãos? Quantos? Que idade têm? Onde moram? Em que trabalham? 10 - Você nasceu aqui? (em caso negativo, Onde nasceu? Porque veio para Visconde do Rio Branco? A

quanto tempo? Porque veio morar na serra?) 11- Conhece muitas pessoas? 12 - Quais as pessoas mais velhas que você conhece? Onde moram? 13 - Já ouviu falar nos índios que moravam aqui na serra? 14 - Como você soube destes índios? 15 - Quem mais você conhece que sabe sobre esses índios? 16 - Onde moravam esses índios? 17 - Como eram? Como viviam? Eram muitos? Tinham inimigos? 18 - O que comiam? Caçavam? Como? 19 - Tinham cerâmica? De onde vinha o barro? 20 - Como você vê estes locais onde está, ou estava, este material? 21 - O que você pensa que eles são? 22 - O que eles representam para você? E para a sua comunidade? 23 - O que você sabe sobre os ossos e potes encontrados na serra? 24 - Porque você acha que estes ossos estão, ou estavam, desta, ou daquela, forma? 25 - Você conhece alguém que tenha encontrado estes potes e ossos? Onde moram? Quem são? 26 - Você sabe para onde levaram este material? 27 - Quem você indicaria para que também seja entrevistado sobre este assunto? 28 - Você já ouviu falar em Arqueologia? O que você pensa ser Arqueologia? 29 - Qual você pensa ser o trabalho do arqueólogo?

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE OCORRÊNCIAS DAS FONTES

HISTÓRICAS

1 Autoria 1.1 Cronista 1.2 Viajante 1.3 Estado 1.3.1 Presidente de Província 1.3.2 Diretor Geral de Índios 1.3.3 "desbravadores" 1.4 Igreja 1.5 Historiador 1.6 Pesquisador em geral 1.7 Sociedades Indígenas 2 Forma 2.01 Carta 2.02 Relatório 2.03 Decreto 2.04 Ofício 2.05 Instrução 2.06 Mapa 2.07 Planta 2.08 Carta Topográfica 2.09 Livro 2.10 Entrevista 2.10.01 oral (gravada) 2.10.02 escrita 2.11 Cultura Material 2.11.01 Pedra 2.11.02 Cerâmica 2.11.03 Osso

2.11.04 Malacológico 2.11.05 Vegetal 2.11.06 Dentário 2.11.07 Metal 2.11.08 Outros

2.12 Fala e Discurso 2.13 Caderneta de Campo 2.14 Foto

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

FONTE ORAL

ENTREVISTA 1

FITA 1 - LADO A

ENTREVISTADOR: VLADEMIR JOSÉ LUFT (VJL)

ENTREVISTADO: TEREZINHA DE ALMEIDA PINTO (TAP)

VJL O seu nome, por favor ?

TAP Terezinha de Almeida Pinto.

VJL A sua idade ?

TAP Eu estou com sessenta e oito anos.

VJL O seu estado civil, Dona Terezinha ?

TAP Eu sou viúva.

VJL É, há quanto tempo a senhora é viúva ?

TAP Há dez meses.

VJL Há dez meses ? Ah, exatamente, exatamente, eu acabei esquecendo. É, qual é o seu grau de instrução,

Dona Terezinha? E aonde é que a senhora estudou? Como é que é a sua história de ...

TAP Eu sou de um tempo que era difícil sair para estudar. Não me faltou vontade mas eu estudei por aqui

mesmo. Então, eu sou professora e depois eu fiz um curso de Inglês em Belo Horizonte. E então eu me

tornei professora de Inglês durante vinte e cinco anos. Eu estudei assim, curso assim, é não foi um curso

assim é desse comum, não é, eu ia na ocasião das férias, eu fazia curso intensivo no Instituto Brasil -

Estados Unidos. Então eu me tornei professora de Inglês e eu mantive aqui o Instituto Brasil-Estados

Unidos durante vinte e cinco anos.

VJL Aqui em Rio Branco ?

TAP Rio Branco, é. Depois eu tive que, eu cansei, não é, eu tive também um curso de audio-visual para

adultos e tudo , mas eu me cansei, então achei que era chegada a hora de, de "pendurar as chuteiras",

como se diz, não é, e desde então eu não consegui fazer um substituto. Agora, Graças a Deus, nós temos

um curso de Inglês aí na cidade. Gente daqui mesmo que morou nos Estados Unidos então está

mantendo aí o curso.

VJL Bom, quer dizer, que o primeiro curso de Inglês daqui de Rio Branco foi, foi a senhora que criou ?

TAP Sim, porque é, os cursos assim da Escola Normal ensinam Inglês , o Ginásio ensina Inglês, mas como

um curso mesmo assim foi o meu.

VJL Ótimo. É, a senhora ocupou, evidente a senhora foi coordenadora, criadora desse curso, mas a senhora

ocupou algum outro tipo de cargo, algum outro tipo de função? Além dos que a senhora ocupa agora?

Que eu gostaria que a senhora comentasse.

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TAP Eu inicialmente fui bancária. Eu trabalhei num banco daqui mesmo, um banco local chamado Banco

Mineiro. Eu fui a primeira moça a trabalhar em banco aqui. E isso, antes de eu me casar. Eu trabalhei

cinco anos nesse banco. Eu me formei muito nova e entrei para esse banco com dezessete anos.

VJL E as suas funções em função do Museu, em função dessa nova atividade sua, não é de cultura e tal,

começou quando? E como é que ela aconteceu?

TAP Bom, eu, essa questão de cultura eu acho que é assim, é um caso até familiar, tá entendendo? Porque o

meu pai era um homem culto, era um professor, ele era professor de História, ele era professor de

Português, então eu sempre ouvia dele, não é, as coisas, ele falava Francês muito bem, meu pai era uma

pessoa culta.Eu sempre ouvia dele as coisas da história da cidade, então desde criança me acostumei a

ouvir. Porque ele era uma pessoa que conversava então ele ajudava os filhos e tal e falava sobre a

História, sobre os políticos, ele foi Prefeito da cidade duas vezes. Então ele assim , passou isso pra

gente. Eu acho que eu sofri uma influência muito grande dele, gostar tanto da minha terra, era a

história da minha terra. Eu acho que vem daí.

VJL A senhora criou o Museu, não é, da cidade de Rio Branco e hoje é, também criou a Associação, hoje

também faz parte de uma Comissão, não é da cidade?

TAP Sim, para fins de Tombamento, não é? É isso mesmo, essa idéia de fazer o Museu de contar a história

da nossa cidade, isso eu já vinha assim fermentando há muitos anos na minha cabeça. Mas o ponto

inicial mesmo que, a mola propulsora mesmo foi esse altar que está aqui na nossa frente que ele estava

sendo vendido para o Rio de Janeiro, então eu soube disso, eu estava até fora, estava no Exterior na

época, e que ele foi oferecido. Então já tinha gente, tinha comprador até do Rio de Janeiro, para esse

altar aí. Eu cheguei, tal e fui informada que ele estavam vendendo ao altar. E eu achei que era um

absurdo uma coisa dessa que esse altar é um patrimônio da nossa cidade. Ele foi feito para a

inauguração da nossa Igreja Matriz em 1917. E outra coisa muito importante que ele foi feito aqui por

pessoas daqui, ele não foi importado. Ele, esse trabalho todo que nós estamos vendo aí foi trabalho de

um artesão muito, muito simples, muito humilde que nós tivemos, uma pessoa de cor negra, e , uma

pessoa até que, coitado, que ele morreu assim na sarjeta, morreu de tanto beber mas era um artista.

Então ele, aí ele fez, ele que encabeçou essa coisa toda, muitos trabalharam com ele, inclusive Seu

Crispinzin que foi um pessoa que trabalhou muito tempo nesse ramo e tudo e ele me deu, eu pedi a ele

que me contasse a história desse altar, ele já estava idoso, tanto que pouco tempo depois ele morreu já

estava com oitenta e tantos anos, ele falou: "Sim, eu trabalhei nesse altar quando eu tinha onze anos, eu

ajudei a fazer esse altar". Então achei que esse altar não deveria sair daqui, e como a gente tinha essa

idéia na cabeça assim, já amadurecendo há bastante tempo de fazer o Museu, eu falei, bom então

chegou a hora, porque agora eu vou fazer uma campanha para adquirir esse altar. Então eu fiz uma

campanha com as pessoas da cidade, com os riobranqueses ausentes eu feliz e em poucos meses eu

arranjei todo o dinheiro e as irmãs que estavam vendendo o altar que ele estava, ultimamente depois da

reforma da igreja ele foi colocado numa numa capela aqui num lugar chamado Barreiro e lá tinha umas

irmãs de caridade que estavam fazendo uma igreja nova e queriam fazer o forro da igreja, para isto elas

estavam vendendo esse altar. Aí eu resolvi o problema das irmãs dando aquele cheque para elas e

resolvi o nosso problema e foi daí então que eu comecei a trabalhar. Eu fiz esse trabalho, assim

sozinha, tá entendendo? E fui assim conversando com as pessoas, e fui assim é, adquirindo as coisas, as

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pessoas confiaram em mim que era o mais importante, eu acho, porque a pessoa não vai pegar uma

coisa e dar pra outra sem saber ao certo se que aquilo vai ser mesmo pra um Museu. Então, eu tive a,

eles acreditaram em mim, foi minha sorte. Eu pude fazer isso porque, por isso, não é, eles acreditaram

em mim.

VJL Quando é que isso começou, Dona Terezinha?

TAP Olha, isso tem oito anos.

VJL Só oito anos?

TAP Só oito anos.

VJL Em oito anos foi criado tudo isso?

TAP Tudo isso, é. Agora eu trabalhei mesmo, eu quis fazer, eu pra isso eu viajei, eu não dependi de dinheiro

de ninguém, eu tirava dinheiro do meu bolso, eu fazia as pesquisas fora, é no Rio de Janeiro, por

exemplo, no Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, lá no Museu do Índio onde as minhas fotos foram

ampliadas, eu tinha meu filho que estudava lá que era, que é o Antônio, não é, então ele se interessou

também pela coisa, ele mantinha contato com pessoas lá, ele era , ele era a pessoa que despachava pra

mim, de vez em quando eu ia lá e aqui no Arquivo Público Mineiro, no Museu Mariano Procópio onde

eu aprendi a mexer com fotografias eu ia a São Paulo, ia pra todo lado, visitava, visitar museu eu visito

desde que eu me entendo por gente, não é , então eu sou encantada com museu conforme o senhor está

vendo, deixar que eu fico lá a vontade que parece que é o meu habitat (risos) Então eu me sinto bem

dentro desse, dentro dessas velharias, essa coisa aí.

VJL A senhora nasceu aqui em Rio Branco, Dona Terezinha?

TAP Eu nasci em Guiricema que era uma, era distrito daqui pelo fato de que o meu avô morar em Guiricema.

Então eu nasci lá mas morava aqui, fui criada aqui, me considero daqui mesmo.

VJL Seus pais, seu avô também eram daqui?

TAP Tudo daqui. Só minha mãe também é nascida em Guiricema, meu avô materno morava lá. Agora o meu

pai, o meu avô, o pessoal todo daqui mas moraram muito em Guiricema então houve uma ligação muito

grande entre o Guiricema e Rio Branco, pra mim é uma coisa só, tá entendendo? Um coisa só.

VJL É aqui pertinho Guiricema é aqui pertinho? Então é praticamente...

TAP E ainda é .....(inaudível).

VJL ... praticamente a mesma coisa, a mesma coisa que Rio Branco. Então a história da senhora e da sua

família aqui em Rio Branco tem...

TAP É isso aí, tem laços aqui, em Guiricema e Rio Branco.

VJL Bem mais de cem anos?

TAP É, bem mais de cem anos, depois o meu avô materno ele era filho de italiano, não é e foi justamente na

época em que eles vieram pro Brasil e foi em mil e oitocentos e setenta e poucos, não é, que eles vieram

para Guiricema. Saíram lá da Itália de Salermo e vieram para Guiricema. Então e tem o lado do meu

pai que o, do bisavô era filho de espanhol, então era até de uma família importante então o pai dele era

Américo da Costa, que veio foragido da Revolução Espanhola e tudo, então há uma história

interessante.

VJL Os seus filhos também são todos daqui?

TAP Todos daqui.

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VJL Quantos são?

TAP São seis.

VJL Seis?

TAP É, eu tenho dois juízes que estão em até em Belo Horizonte já, eu tenho uma filha casada que mora em

São Paulo, ela é dentista, eu tenho uma arquiteta que mora aqui, que você conhece, a Laíse, não é, e

tem o Antônio que estudou no Rio, Informática, e tem o Léo que veio muito atrasado, ele está com vinte

e um anos só(risos).Então ele, esse é estudante.

VJL A senhora tem netos, lógico?

TAP Tenho sete netos.

VJL Sete netos?

TAP É, sete netos.

VJL É, pela história, quer dizer a senhora falou em mil e oitocentos, não é, final do século passado, é, quer

dizer, é, quando a sua família, seus parentes, seus pais, seus avós principalmente chegaram aqui, isso

aqui era tudo muito diferente, eles contaram, eles contavam alguma história, seu avô, seu pai? Que

história a senhora teria pra contar dessa região como isso era?

TAP Olha, isso aqui era , não era nada, não é, fazia parte, faz parte da Zona da Mata e que tem uma história

mais recente e isso aqui era mato puro, tá entendendo? E isso quando, quando o Padre Manoel de Jesus

Maria estava aqui, então aqui não tinha era nada mesmo, não é, tinha só índio e mato e português

lutando com índio. Só tinha isso aqui e tanto que era difícil que os naturalistas que passaram por aqui

eles contam isso na, na história no livro deles, tá entendendo, que tenho até aqui no Museu, é nos livros,

não é, então tem o Von Speeks, Von Martius, tem o Barão Eschweg ,tem o Langsdorf, e tem o Frires,

todos eles contaram a história, nossa primeira história e foi esse documento que é importantíssimo, sem

eles ,nós não teríamos notícia nenhuma, não é, quem é que ia escrever isso, não é? O Barão de Eschweg

, por exemplo, ele, ele tinha coisa minuciosa e os livros que eu tenho aqui dele, eles são cópias, eu

copiei o que está, as cópias manuscritas do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, eles deixaram

tirar cópia, então eu juntei em dois volumes e mandei fazer aqui na universidade em Viçosa, eles

fizeram pra mim e , a informação perfeita completa está em um desses livro que, é um livro inteiro

dedicado aos nossos índios Coroados. Aos índios, não é, da região, os Puri, os Coroados e os Cropós.

VJL A data de fundação ou a época de fundação de Rio Branco, Dona Terezinha?

TAP Mil e oitocentos e oitenta e dois.

VJL A história do presídio?

TAP Bom essa, essa aí é quando nós tivemos a nossa libertação, não é, política, político-administrativa, agora

atrás disso vem o, vem a, o Rio Branco teve vários nomes, não é, o primeiro nome foi Xopotó dos

Coroados ou Xipotó dos Coroados, é o nome do nosso rio que na língua indígena quer dizer: Incipotaua,

Cipó Amarelo é um rio pequeno até afluente do rio Pombo ele vai despejar no Pombo e o Pombo sobe e

vai no Paraíba e o Paraíba vai pro mar, não é. Então essa ligação que o rio fez pra nós foi muito

importante nos primórdios da nossa cidade porque é o primeiro caminho que foi pensado pelo Padre

Manoel de Jesus Maria levava a Campos de Goitacazes e justamente de Campos de Goitacazes que

eram os nosso índios, eles não eram autóctones, eles vieram de Campos de Goitacazes, vieram fugidos

das lutas, não é, com os portugueses, então ele acharam aqui a , o espaço aqui nessa região, então os da

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nossa região que eram maioria, eram os Coroados, não é, ou Croatos, agora tinha os Puris que eram da

região aqui de Bagres que é o Guiricema, que eu estou te falando aonde eu nasci e que vai até é Manoel

Burbo onde é hoje, Muriaé, tá entendendo? E os outros são os Puris que habitaram aqui, esses são os

Puris, aliás, também a região de Ubá, agora os outros são os Cropós ou Coropós que habitaram a região

do Pomba, esse eram um tipo assim mais atarracado, o Puri também era. Agora o nosso índio ele era,

assim não era briguento, não, os Puris eram mais bravos.Agora os que vinham da Barra do Rio Doce,

os Botocudos, esses eram ferozes, esses eram antropófagos, não é, eles vinham lutar aqui em baixo. Mas

para isso tinha que atravessa uma montanha inteira cheia de mato.Essa montanha que os naturalistas

contam como que era difícil atravessar...

VJL Essa montanha é a Mantiqueira, nào é?

TAP É a Mantiqueira, é que é a Serra de São Geraldo, é que é a Serra da Piedade, não é, eles atravessaram

isso tudo aqui pra poder chegar aqui no nosso, na nossa panela porque o Schweg disse que aqui era uma

espécie de caldeirão cercado de montanhas, não é, o nosso lugar é cercado de montanhas, então é um

braço da Serra da Mantiqueira, a Serra de São Geraldo é um braço da Serra da Mantiqueira.

VJL A senhora conhece muitas pessoas por aqui em Rio Branco, Dona Terezinha?

TAP Conheço todo mundo.

VJL Todo mundo ,não é?

TAP É, eu sou nascida e criada aqui.

VJL Quais as pessoas mais velhas que a senhora conhece?

TAP Bom, os mais velhos estão acabando, não é, eu tenho assim um cunhado meu é o filho mais velho, ele

está com oitenta e nove anos, mas aqui tinha uma senhora que eu até entrevistei, ela morreu há pouco

tempo,ela tinha cento e dezessete anos essa daí é Maria Teneflor o nome dela, uma preta, então ela me

contou, eu fui assim pegando, ela já estava na cama , a entrevista foi bem recente, é eu tenho essa

entrevista aqui no Museu, essa entrevista dela.Ela me contou, então eu perguntei assim pelas coisas

mais antigas, não é,ela falou assim : 'Ih, minha filha isso aqui era tudo um lodo, um barro , a gente tinha

que andar no meio do barro", realmente aqui aonde é que eles chamam de Rua Nova, hoje com a

Avenida Doutor Carlos Soares era um lamaçal, aqui o Barreiro, até o próprio nome tá falando, era puro

lodo, pura lama e era a parte baixa da cidade , não é, então eu perguntei a ela: "É verdade que há muito

tempo passou aqui um príncipe, um rei, um imperador? "Fui explicando a ela, não é, assim , ela falou

assim: "Ah, passou sim, aqui passou um príncipe",era o Dom Pedro que tinha vindo aqui, tá

entendendo? É, eu perguntei: "A Senhora pode me contar alguma coisa?"Ela falou: "Ah, eu só uma

coisa a cidade ficou cheia de gente pra ver o príncipe", mas ela não sabia explicar bem se era o príncipe,

só eu tive que fui dando as idéias pra ela.Então aí ela falou: "Ah, é mesmo é um príncipe que passou

aqui".

VJL Com cento dezessete anos ela tinha sido escrava, então?

TAP Ela tinha sido uma escrava.É tinha sido uma escrava, naturalmente, não é? Mas estava forte ainda e ela

morreu acho que uns três ou quatro anos depois dessa entrevista aí. Agora nós tínhamos uma outra aí

que infelizmente ela não foi entrevistada mas todo mundo chamava de vovó, essa morreu também, não

é, mais ou memos nessa idade, e essa era muito esperta também, muito ativa, era uma lavadeira de

roupa.

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VJL A Senhora diria que a gente teria alguma dessas pessoas ainda com possibilidade para entrevistar?

TAP Olha, eu tenho um senhor que...

VJL E que pessoas a senhora indicaria para entrevistar?

TAP Tem um senhor que estava muito doente, em cima da cama, mas ele tem a cabeça boa ainda.E olha,eu já

fiz uma entrevista com ele, Senhor Joaquim Pinto.Ele está com noventa e um anos.Esse é assim parte

política, assim essa parte, por exemplo, ele deu uma entrevista sobre o primeiro Ginásio daqui que ele

foi aluno desse primeiro Ginásio e meu deu entrevista sobre um tio dele que foi jornalista chamado

Firmino Pinto,esses,essas, isso eu tenho gravado, entendeu, tem uma outra senhora que já morreu

também, Dona Catarina entrevista sobre a parte musical da cidade, que ela era uma musicista, não é,

uma maestrina, então ela me deu falou sobre Teatro, sobre Música, sobre a Arte aqui.

VJL A Senhora falou há pouco sobre os índios que moravam aqui nessa região toda, não é? Que outras

histórias a senhora teria ou que a senhora ouviu dos seus pais, seus avós, ou das pessoas mais antigas

que moravam aqui que a senhora acha que deva mencionar e aonde é que eram alguns desses locais?

Como é que eles viviam?Quem eram esses índios?

TAP Tinha histórias assim, eu até sou uma pessoa curiosa e costumo as vezes tomar nota,tá entendendo? Mas

tinha um tio velho do meu marido que contava as histórias assim muito interessantes e do tempo que

aqui era uma terra assim, não tinha nada, não é, no século passado mesmo e ele então conta o caso no

princípio do século, não é, que os ladrões de cavalo que tinham por aqui (risos) e toda pessoa que

morria aqui eles jogavam lá na divisa de Ubá para ficar livre da parte jurídica da coisa, não é, então é

tinha esse negócio aí da fronteira, vamos jogar pro lado de lá, eu achava interessante ele contar isso e

tinha a história de ladrão de cavalo, tinha a história dos homens que eram muito brabos, que aqui era

uma escuridão, não tinha luz elétrica, que a luz elétrica foi colocada aqui em mil e novecentos e doze,

então assim quando apagava a luz, já, aliás quando o lampião apagava, não é, todo mundo tinha medo

porque tinha muita gente braba, tinha gente assim que, era a hora dos tiros, não é, das brigas, feia, era

justamente nessa hora em que o lampião apagava, e o lampião de querosene apagava justamente as

onze horas da noite.

VJL O desmatamento dessa área toda, a transformação disso tudo?

TAP Isso vem através dos anos, não é, é o pessoal, isso aí acabou. isso aí é Zona da Mata, cadê a mata?

Acabou, não é.Então isso aí é o rolar dos anos...

VJL Vem desde o café, não é?

TAP Isso, vem, a época do café é na segunda metade do século passado, não é? Ela perdurou até o princípio

do século.

VJL Foi aí que começou principalmente?

TAP É principalmente, principalmente.

VJL E a cana? Chegou quando?

TAP A cana chegou aqui assim nos anos assim, a usina de Rio Branco ela começou, mil e novecentos e sete

ela já estava funcionando, já estava sendo passada para os franceses, não é, ela foi inaugurada em 1885,

por aí você pode ver, a cana começou já no final do século passado, não é.Mas antes da inauguração da

usina já havia aqui um moinho, uma engenhoca, não é, de cana, já havia plantação de cana ejá faziam

aqui a aguardente e tudo e era e essa pessoa chamava Joaquim de Campos Bittencourt. E ele que foi,

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que pediu a licença pra funcionar aqui uma usina e ele foi atendido, não é, em 1882,ele foi atendido. Aí

ele não aguentou sozinho a coisa e formou um grupo de pessoas, não é, então depois mais tarde em

19O7 essa usina passou para um grupo francês e belga e com esse grupo ela ficou até os anos 50. Aí foi

trocando de grupo, não é, gente de São Paulo, gente daqui mesmo, e tal até que caiu com a família

que já explorava o ramo da cana há muitos anos, desde os anos 2O, não é, já explorava o ramo da cana.

VJL Voltando aos índios, Dona Terezinha, é qual é a sua opinião sobre esses índios? Qual é a importância

deles? Como é que , qual é a relação dessa cidade ou dessa população sobre esses índios ou com esses

índios?Com é que é essa relação?

TAP Olha, a principal coisa que eu acho é que nós temos que considerá-los nossos antepassados mais

importantes porque justamente a história começou com eles, não é, acho que é o ponto inicial da coisa, é

eu acho que a gente, não é dizer que a gente deve, eles não eram assim cultos, não era, nada mas eu

acho que eles representam um ponto muito importante nessa história.

VJL Quem mais a senhora conhece que sabe dessas histórias desses índios ou que, que teve alguma relação

em termos de antepassados com esses índios e que poderia dar informação?

TAP Bom aqui dentro nós temos, por exemplo, a família Barreto, que, nós temos um juíz, promotor, ele é,

exerceu a profissão dele em São Paulo, mas ele é fihlo daqui, ele está sempre aqui, é uma pessoa muito

inteligente, tem muitos livros publicados, inclusive eu tenho um livro dele aí "A Família Barreto". A

família Barreto ela é importante porque o Dionísio Barreto ele é que era o principal personagem dessa

pessoa, ele era um índio, era um índio, tá entendendo? O Dionísio, o índio Dionísio, então essa família é

descendente de índios e ela está aí até hoje.Aliás tem muitas famílias aí descendentes de índios, não

é?Mas essa ái tem a história. Tem a história do tronco da família, tem tudo, a família Barreto.

VJL Embora as pessoas, muitos tenham vergonha de ter descendência indígena.

TAP Eu acho que não tem nada a ver, acho que seria até um motivo de orgulho, isso aí é uma bobagem

muito grande

VJL Porque a história, a gente tem pesquisado, trabalhado nisso, é de que não havia descendente nenhum

desses índios e a senhora está dizendo, mostrando que na verdade existe.

TAP Isso aqui é tudo índio!(risos).Bom, nós somos uma mistura, claro não é, mas têm muitas famílias aqui

que são descendentes de índios...

VJL Desses Puris e Coroados que viviam aqui?

TAP É claro, a minha avó materna ela falava que a avó dela era índia, foi pega no laço.

VJL Quer dizer, a senhora de certa forma, tem a descendência também Puri ou Coroado?

TAP Sou também ,claro, claro, Coroado lá longe mas tenho, não é. Eu tenho o meu lado italiano, o lado

espanhol e tem meu lado índio também, o que é que tem isso? Eu sou uma mistura, não é. Então não

tem nada a a ver.

VJL É, como é que eram esses índios, aonde eles viviam, se eram muitos, tinham inimigos, brigavam entre

eles?

TAP Brigavam, eles brigavam.Então aqui os briguentos aqui mais conhecidos é os Puris, não é,(risos), os

mais brabos mas eles lutavam muito então tem uma luta ái dos Puris com os Coroados que justamente é

foi nas margens do Rio Piedade e o rio passou a chamar-se Piedade por causa desse episódio que foi

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uma matança, muito sangue e o sangue coloriu o rio. A história é essa e as índias gritavam "Piedade,

Piedade" e aí então veio o nome do rio.

VJL Que época é isso, Dona Terezinha?

TAP Isso foi final do século, não é.

VJL Final do século passado?

TAP Passado é, não, final não , foi no século passado, é essa passagem aí é muito, muito interessante muito

importante, não é.

VJL Como é que eles eram, que tipo de físico, como é que eles eram ?

TAP Olha, eles eram assim um tipo que eu tenho até fotografia deles aí, o retrato desenhado, não é,deles aí

que os naturalistas fizeram, eles eram assim tipo queimado, tipo assim de olhos assim meio orientais,

como todo índio, não é, e assim meio tipo atarracado, principalmente os Puris, tem as pernas curtas, os

Cropó então quando a gente quer falar que a pessoa tem a perna curta, assim tipo Cropó.(risos).

VJL Eram muitos , Dona Terezinha?

TAP Os Coroados eram em maioria, não é, tanto que o Guido quando veio pra cá ele foi mandado pra cá

justamente pra apaziguar que as lutas entre os índios e os portugueses, não é, e ele veio pra cá

justamente porque aqui era região de mais índios. Então ele foi destacado pra ficar aqui, aqui ele tinha o

seu quartel que foi uma coisa muito importante porque esses naturalistas , por exemplo, eles vieram

aqui porque? Tinha o quartel do Guido Ma aqui, que era um indianista, ele era, ele era o diretor

geral dos índios que pegava da Barra do Rio Doce até Campos de Goitacazes, quer dizer pegou a região

toda. Então ele era uma pessoa indicada, uma pessoa que conhecia os índios que...

VJL Como é que eles viviam, a senhora por acaso , quer dizer, que idéia a gente tem, ou que história tem de

como eles viviam, o que eles comiam?

TAP Viviam da caça e da pesca, não é, caça e da pesca, é, e eles viviam assim , é em cabanas, assim é

interessante que não eram nem daquele estilo assim de cone, tá entendendo? Era uma cabana normal,

agora vivia assim , 3O, 4O tudo misturado num lugar só...

VJL Tipo uma aldeia?

TAP É, numa cabana só e tinha uma vida assim comunitária, a roça era comunitária.

VJL Que tipo de roça eles tinham?

TAP Mais era de milho, não é. Plantavam outra coisa mas o básico era milho.Inclusive o milho era usado

para fazer a bebida deles chamada "Biru", que era fortíssima, era, as índias mastigavam o milho e

cospiam naquela panela grande que eles faziam numa forma assim cônica, enfiavam assim no chão,

aquela ponta era enfiada no chão e ali as índias iam cuspindo e a fermentação do milho com o cuspe

fazia aquela bebida, chamda que os portugueses chamaram "Biru"e aí todo mundo era obrigado a beber

daquilo inclusive os naturalistas que vieram aqui em princípio do século passado que era mais ou

menos em mil e oitocentos e treze, por aí, não é, que começaram a chegar, é mil e oitocentos e vinte,

mil oitocentos e vinte e quatro e então esses naturalistas eram obrigados, eles contam isso nos livros

deles, a tomar daquela bebida que era uma afronta muito grande não tomar, eles tinham medo também,

então eles tomavam, mas os índios tomavam aquilo até cair de bêbado e eles dançavam em volta

daquele panelão, tá entendendo, iam dançando ali até que não aguentava mais e caía.

VJL Pelo o que a senhora está dizendo eles tinham cerâmica?

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TAP Faziam cerâmica, faziam.

VJL De vários tipos? Como é que era essa cerâmica?

TAP Olha, essa, nós temos até amostras aí no Museu, não é, é desse tipo comum mesmo da cerâmica índia,

não é, só não era trabalhada assim, por exemplo, como o estilo Marajoara, aí não era, não é. Mas era

simples.

VJL Da onde é que eles tiraram esse barro, Dona Terezinha?

TAP Ah, da própria região onde eles ficavam mesmo, não é, ali eles trabalhavam o barro nas beiras de rio,

para todo o lado e eles têm barro, não é.

VJL Eles têm barro.E sobre o material encontrado na Serra, Dona Terezinha, que a senhora mesmo

comentou há pouco que tem material aqui e a gente tem trabalhado, tem andado por aí tem visto muito

material sendo retirado de lá. Que tipo de material está sendo retirado e que local da Serra e se é só na

Serra que está esse material, como é que é isso?

TAP Olha , a notícia que a gente tem é que há várias cavernas por aí, não só naquele local que já foi

descoberto, não é, mas isso aí é preciso de que haja uma pesquisa assim mesmo mais séria,quem achou

aquilo lá foi assim por acaso. Estavam lá trabalhando a terra e por acaso a terra rolou e apareceu aquele

buraco então, aliás o povo começou a entrar lá nas cavernas e não devia ter acontecido isso, tem lugar

assim de difícil acesso de descer até com corda e tudo e foram retiradas lá de dentro as urnas

funerárias, algumas assim de todo tamanho, sendo que algumas grandes, que a gente tem notícia disso,

por, notícias dadas por pessoas que estiveram dentro da gruta que eu até conheço uma senhora que tem

aqui no Barreiro, tá entendendo? Eu fui lá na casa dela, não é, pra ela me explicar direitinho a coisa, ela

falou: "Olha, foram retiradas urnas maiores bonitas até trabalhadas", ela falou comigo mas eu não vi

essas urnas e teve gente que plantou flor dentro então eu dei todas as dicas pra ver se arranjava a tal de

urna plantada com flor mas não deu jeito não . Quem plantou, escondeu bem escondido então até agora

não consegui nada.

VJL Esse material geralmente vai pra onde?O que que a senhora faz com esse material? Eu sei que a

senhora conseguiu recuperar alguma coisa.

TAP Eu consegui recuperar porque o prefeito na ocasião era o Doutor Júlio Carone ele era também

interessado nisso embora ele não tenha tocado assim o assunto pra frente mas ele ficou assim

interessado foi a sorte , ele trouxe assim aquele material que sobrou para a prefeitura, botou lá uma

vitrine, que ficava lá em exposição pública, aquela coisa, mas sem nenhum assim, estudo, nada, ficou lá

jogado. Aí , muda de prefeitura vem a outra pessoa e pega e manda botar aquilo no almoxarifado da

prefeitura. Eu então quando me interessei pela coisa fui atrás, chego lá, encontro a vitrine toda

quebrada, tá entendendo, e o material já assim pela metade, aí eu fui ao prefeito e pedi uma ordem e

ele falou :"A senhora pode levar pra casa ". Eu falei: "

"Quero fazer um museu e isso aí é importantíssimo". Aí fui atrás de um arqeuológo aqui da

Universidade de Minas Gerais que é o Professor Prous, André Prous, não é, e ele me recebeu muito bem

lá e tudo e ele falou comigo:"Olha, eu posso mandar uma equipe, o Doutor Júlio Carone até já esteve

aqui", ele foi lá, o prefeito foi lá, e...

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

FONTE ORAL

ENTREVISTA 1

FITA 1 - LADO B ENTREVISTADOR: VLADEMIR JOSÉ LUFT(VJL)

ENTREVISTADO: TEREZINHA DE ALMEIDA PINTO(TAP)

TAP ... Bom, eu disse sobre o professor André Prous, não é?

VJL Exato.

TAP E ele falou que se fosse o caso de ser assim uma coisa importante mesmo, ele mandaria até uma equipe

mas que ele precisava de mandar uma pessoa na frente pra poder averiguar aí direitinho a coisa , não

é.Mas logo depois, então você apareceu, aí a gente já deixa por sua conta e está sendo ótimo aqui a

visita sua, não é.

VJL Que tipo, porque que as pessoas, ou que tipo de pessoas entrou ou entra nesses locais e porque que a

senhora acha que esse pessoal entram nesses locais para retirar isso? O que significa esse material?

TAP Eu acho que é movido pela curiosidade, apenas , porque para estudo não tem nada, não é. É,só mesmo

curiosidade, ver o que é que tem lá dentro da caverna e guardar aquilo como souvenir, deve ser.Eu

tenho impressão de que é isso.

VJL A Senhora conhece algumas pessoas que retiraram isso e que pessoas eram, quer dizer aonde é que elas

estão, se elas estão com esse material.

TAP Não, eu conheço essa senhora que eu disse, mora lá no Barreiro, mas ela não tem material , ela tem

informação a dar, isso ela tem.

VJL E como é o nome dela mesmo?

TAP É... Esqueci o nome dela mas...

VJL É fácil da gente encontrar?

TAP É, claro, não, isso eu sei quem é, eu confundo os nomes, eu não sei se é Efigênia, não tenho

certeza,mas a gente, eu posso até ir lá com você, pra você conversar com ela, viu?

VJL Que outras pessoas? A Senhora comentou comigo de um senhor que tem uma coleção...

TAP Bom, esse senhor, eu estive na casa dele, meu filho conhece, também não sei o nome, mas quem

recebeu foi o filho e ele não pode me mostrar o material que ele tem pois está num quarto fechado e eu,

e ele, o pai dele viajando com as chaves, eu não pude ver, alguma coisa eu vi, tá entendendo? São

objetos, não é, mas ele falou comugo assim :"Olha, meu pai tem muita coisa aí dentro, mas ele tem

ciúme, então não posso mostrar a senhora a senhora volta em outra ocasião que aí ele pode mostrar a

senhora".

VJL Mora aqui na Piedade?

TAP Não é bem na Piedade, não é, pro lado mais parece que pro mais pro lado de Santa Maria.

VJL E ele coletou esse material todo lá na região?

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TAP Nas terras dele, nas terras dele. Aqui é assim, cavou encontra(risos). Nessa região onde teve mais índio,

não é,porque nós temos, por exemplo, um sítio chamado Aldeia, esse nome ninguém sabe quem pôs, ele

já veio de muito tempo e ali tinha índio também, eu tenho a impressão que se cavar...

VJL A Senhora tem esse sítio?

TAP É, eu tenho.

VJL Ah é?

TAP É, é um sítio chamado Aldeia e justamente vem da época, Aldeia, não é, esse nome é antigo.

VJL Agora, esse material que a senhora disse que cavou encontra, está mais aqui embaixo, não é?

TAP Na parte de baixo.

VJL Na parte baixa.É onde encontram que tipo de material?

TAP É assim, é objeto de trabalho, não é.

VJL Osso, pedra, cerâmica.

TAP Osso, eu não sei te informar. Mas cerâmica e ...

VJL E pedra.

TAP ...essas pedras de trabalho você encontra a três por dois.

VJL E na Serra encontra o que, Dona Terezinha?

TAP Olha, na Serra tem, segundo o Seu Honório, não sei, que eu nunca entrei lá nas cavernas, tem cavernas

que têm muita coisa ainda e inclusive uma borduna que foi tirada de dentro da coisa, essa sumiu, essa

não há meio de localizar, tinha uma borduna também, quando estava exposto lá na prefeitura.Essa

sumiu.

VJL Quer dizer, teria dois tipos de locais, na Serra onde o pessoal enterrava e aqui embaixo o pessoal vivia?

TAP E aqui embaixo também, vivia é, isso mesmo. Agora a Serra é assim um local assim muito

interessante,é tipo esconderijo mesmo deles, não é, eles tinha que ter uma proteção, não é.

VJL Tem muita caverna na Serra? Muito abrigo?

TAP Segundo as pessoas falam tem.

VJL O Seu Honório, que tipo de pessoa é o Seu Honório?

TAP Seu Honório, ele parece até um índio mesmo(risos) eu acho que ele é até descendente, não é, não posso

afirmar isso mas ele deve ser. Ele, ele são, ele é nascido aqui, ele e a mulher, não é, são nascidos ali na

região e ele tem tanto amor aquele negócio ali, tanto que ele no princípio andou até meio brabo, ele

falava que aquilo era dele, entendeu? Mas não é dele, mas ele achava que era dele ali por ele ser ali ser

morar ali...

VJL Ele é considerado pela população, principalmente da Piedade de Cima, uma figura um pouco

folclórica,não é?

TAP É, isso mesmo, é o pensamento que as pessoas têm dele porque ele parece assim, entusiasmado,

eleaumenta a coisa e tal mas ele não inventa.

VJL Não inventa?

TAP Não. Quer dizer...aumenta(risos).

VJL O que ele disser, tem um fundo de verdade?

TAP Tem, tem sim.É o que ele fala tem um certo fundo sim.Ele é interessante. Inclusive ele conhece aquela

Serra de cabeça pra baixo, ele sabe tudo ali.

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VJL Que tipo de pessoas, quer dizer, além do Seu Honório, dessa pessoa que a senhora disse que o seu filho

conhece, dessa outra senhora que a senhora se dispôs a ir comigo, que tipo de outra pessoa, outras

pessoas a senhora conhece que conhecem o lugar certo, que conhecem desse material, desse seu sítio

que eu não sabia, não é, nào conheci, a senhora indicaria pra gente entrevistar, pra gente visitar?

TAP Bom eu vou, eu posso até conversar com esse meu cunhado que é mais idoso pra ele ...

VJL Ele está vivo ainda?

TAP Ele está vivo. Ele é bem mais velho que o meu marido, é vinte e tantos anos mais velho que o meu

marido. É, ele pode as vezes dar alguma informação, tá entendendo? Pela idade dele, não é, e tudo e por

ser morador de roça a vida inteira, é um fazendeiro. Então talvez ele possa dar, inclusive até dar origem

por causa de que que a Aldeia que a gente acha é por causa disso mas não temos nada assim firme,

não é, mas a gente acha que é por causa que ali foi região de muito índio, então aquele local, todo ali

chama Aldeia...

VJL Estão encontrando alguma coisa lá, não, que a senhora lembra?

TAP Não, que eu me lembre não, que eu me lembre não.Mas eu acho até que é falta de curiosidade.É porque

aquilo pertenceu ao meu sogro, depois passou pro meu marido e meu marido não era muito ligado assim

na roça, ele era um professor...

VJL Que tipo de plantação era feito lá?

TAP Cana.

VJL Cana?

TAP Viu, a gente vai lembrando das pessoas, não é?

VJL Claro.Dona Terezinha, eu acho que é até meio é, evidente, uma pergunta que não deveria nem ser feita

as que eu estou fazendo em todas essas entrevistas até para saber um pouquinho como é que essas

pessoas, como é que as pessoas vêem isso, não é?Claro que a senhora já ouviu falar da Arqueologia, a

senhora sabe o que é Arqueologia, não é, a senhora sabe o tipo de trabalho, a senhora conhece o

Professor André Prous, a senhora conhece o pessoal do Rio de Janeiro, conheceu o Professor Manes

Bandeira, o Professor Barreto, não é, quer dizer...

TAP O Professor Garibaldi Nascimento.

VJL Perfeito.Que tipo, o que que a senhora pensa que seja a Arqueologia, quer dizer, o que é Arqueologia

pra senhora e qual é a utilidade do trabalho do arqueólogo para a comunidade, ou aqui para Rio Branco,

ou para...

TAP Nós estamos testando isso agora, a importância do trabalho do arqueólogo. Acho uma coisa

importantíssima, tá entendendo? É até uma coisa que eu se fosse jovem eu ia estudar Arqueologia, que

eu acho , eu sou gamada nesse negócio. Acho isso importantíssimo, viu? É vocês, é dão a gente as

informações que a gente quer e a importância maior é essa, não é? A História, pra saber as coisas, não é,

porque aconteceram, como é que aconteceram então essa é informação importantíssima.

VJL Nós temos dentro desse nosso trabalho, nós temos intenção de deixar o material encontrado na Serra

aqui em Rio Branco ou nas cidades a qual ele pertence. Aqui o Museu pode abrigar esse material?

TAP Inclusive eu tenho assim meu desejo fazer uma sala só disso, tá entendendo? Pra pesquisa mesmo,

coisa, eu penso assim, eu apesar de eu ter a minha idade, eu meu espírito ele funciona, eu quero fazer as

coisas para as pessoas, tá entendendo? Sou interessada nas pessoas em passar alguma coisa para as

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pessoase então eu acho assim que seria uma coisa que eu deixaria para as pessoas, tenho vontade de

fazer isso, como eu fiz o Museu, como eu continuo trabalhando, enquanto Deus me der força, eu estou

aí trabalhando e eu pretendo deixar isso pra minha cidade.É uma sala, por exemplo, que trata só dos

nossos índios que eu acho uma coisa mais importante é o primór..., por exemplo, os primórdios da

nossa história, não é? E aquilo ali, pra pessoa ver, pra criança ver.Eu viso muito a criança.Aliás, eu fui

professora assim eu peguei é menino para ensinar Inglês, depois eu passei para adulto.Eu sou muito

interessada na criança, muito mesmo.

VJL A Senhora também é , tem trabalhado, eu estou sabendo disso, é tem também em termos do meio

ambiente, preservar, recuperar e um dos frutos é a criação da APA, não é? Da proteção da Piedade, não?

TAP Sei, isso aí é um trabalho que nós nos oferecemos para ajudar e nós estamos a disposição, porque foi um

trabalho iniciado pelo Rotary e com o Miguel, não é, e tudo, então a Sociedade dos Amigos do Museu

se propôs a ajudar em qualquer coisa que precisar nesse sentido de preservar.

VJL A Senhora, o ano passado em função disso fez o primeiro Seminário, o primeiro encontro de

Arqueologia e Meio Ambiente, não é?

TAP É, foi uma coisa importante pra nós. Muito importante e nós não queremos que pare por aí não.Nós

queremos que haja sempre informação sobre o assunto e que vocês venham sempre aqui falar pra nós,

viu?

VJL Qual foi a receptividade da população em relação a isso? Das escolas, como é que as crianças, como é

que o pessoal mais jovem está recebendo essas informações?

TAP Bem demais, bem demais. Eu acho que o valor da coisa está nisso, tá entendendo?A gente tem assim

muito contato com essa parte jovem aí por causa do Museu, então a meninada da escola, por exemplo,

acaba lá a aula vem todo mundo pro Museu. Então tem menino aqui que vem assim toda semana, está

aí, vem toda semana, então a criança eu acho que ela deve ser dirigida, a educação deve ser dirigida pra

isso.Infelizmente nas escolas não ensinam essas coisas. É preciso que haja assim uma coisa paralela.

VJL Essa juventude então está tendo ou pelo menos está tendo noção de quem são as pessoas que fizeram

isso aqui, sabendo quem são esses índios que moraram por aqui.

TAP Mas é claro, mas o interesse é o mais importante pra mim , é a coisa mais gratificante é isso.É o

interesse dessa parte jovem por esse assunto. Aliás, não é só disso, por exemplo, tem as pessoas mais

simples, que vem da roça, então outro dia aí, uma visita apareceu aí, uma senhora, é assim mal vestida,

de chinelo de dedo e tudo, ela olhou e tudo e virou pra mim e falou assim: "Como que é importante

conhecer a história", eu achei interessante demais aquilo porque ela uma pessoa simples sem cultura

nenhuma e ela ficou empolgada com aquilo e não é só ela não, várias pessoas vêm e perguntam, quer

saber, e tudo e fala "Puxa, que coisa interessante, que coisa importante, como é bom ter o Museu", isso

aí é muito gratificante.

VJL Dona Terezinha, quase finalizando, Rio Branco tem uma série de personalidades importantes, é dentre

elas o Doutor William José, não é, é uma pessoa que é praticamente um historiador de Rio Branco...

TAP É, é o nosso historiador, ele é a nossa História mas ele é uma pessoa dedicada, ele já tem muitos, mais

de vinte livros publicados, então agora um deles foi até premiado lá em São Paulo, eu te falei, "A

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Importância do Negro da Economia Mineira", um livro muito bem feito, eu tenho ele até mandou o

livro pra mim com dedicatória e tudo e então ele é um trabalhador da História, interessante.

VJL Ele conta essas histórias todas que a gente acabou comentando que está um pouco nos viajantes e tal e

ele conta essas histórias?

TAP Conta, ele conta tudo no livro.Aliás, o livro dele é a minha Bíblia, é o meu ponto de referência.

VJL A Senhora comentou antes da entrevista pra mim que existe uma outra pessoa fazendo uma outra

história de Rio Branco.

TAP É, outra história, é, é o Professor Valdemiro Vianna, ele tem o apelido de "Mili", ele está fazendo a

história, ele foi professor de história aqui na Escola Normal muitos anos agora ele é aposentado e mora

em Mariana mas está sempre aqui, ele está escrevendo a história, ainda não terminou mas está

escrevendo.

VJL Está bom, Dona Terezinha, eu gostaria de agradecer a sua disponibilidade...

TAP Não, mas eu estou sempre as ordens no que eu puder servir, viu?

VJL ... de nos receber apesar do Museu estar em férias, a senhora abriu, abriu os arquivos...

TAP Não, mas isso aí é o maior prazer, o maior prazer...

VJL Eu gostaria de lhe agradecer.

TAP Não tem nada a agradecer.

VJL Se a senhora estiver disponível me levar a visitar as pessoas que a senhora deu informações

importantes aqui para o nosso trabalho.

TAP Levo com todo o prazer, viu? Com todo o prazer.

VJL Muito Obrigado.

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

FONTE ORAL

ENTREVISTA 2

FITA 2 - LADO A

ENTREVISTADOR: VLADEMIR JOSÉ LUFT(VJL).

ENTREVISTADO: HONÓRIO IMACULADA(HI) e JACIRA CAMPOS(JC).

VJL É, seu nome e sua idade?

HI Minha idade, tô com , eu já tô com setenta anos.

VJL Setenta anos, seu nome?

HI Honório Imaculada.

VJL O senhor é casado?

HI Sou casado, sim senhor.Sou pai de dez filhos.

VJL Há quanto tempo Seu Honório?

JC Vai fazer cinquenta anos no dia vinte e sete de julho. HI É, vai fazer cinquenta anos no dia vinte e sete de julho que eu sou casado, é.Eu sou nascido e criado

aqui. Sou nascido e criado aqui e nós "comecemo" e eu "caseio" aqui e criei meus filhos todos aqui. E daqui nós "comecemos" a "trabaiá" de cambuquira essa pedreira e nós e "mexemo" nessa pedreira, "mexemo"e aí "encontremo"essa caverna de índio lá.

VJL É, como é o nome da sua , da sua esposa? HI Jacira Campo.

VJL Que idade ela tem , Seu Honório?

HI Ela tá com ... Ei Jacira quantos "ano" "ocê"tá?

JC Fazer sessenta e sete agora. Sessenta e sete dia...

HI Vinte e sete.

JC ...dia nove de fevereiro.

HI Fevereiro.

VJL Tanto o senhor como a Dona Jacira estudaram? Até que série?O senhor chegou a estudar?

HI Não. No tempo que nós, que eu morava aqui nessa Serra, não havia escola.Eu só aprendi "sinar"o

nome eu pagava aqueles, uns analfabetinho que sabia mais ou menos e eu aprendi só assinar o nome,

não, não tinha escola, não tinha escola.

VJL A Dona Jacira também, Dona Jacira?

JC É, eu até que eu tinha, eu tinha lá tinha professora, lá no meu lugar, mas só que meus pais era muito

pobre não podia me dar nem um livro e um caderno e um lápis, então eu estudei mas vou falar pro

senhor, nem o primeiro ano eu não tirei.

VJL Mas mesmo assim deu para criar os dez filhos com uma boa educação?

HI Graças a Deus, Graças a Deus.

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JC Graças a Deus. Meus filhos, todos eles sabe ler, eu esforcei pra eles aprender como eu não aprendi mas

eu sentia aquela vontade assim de ter alguma coisa na vida então todos eles sabe ler.Graças a Deus.O

que é mais--- é Haroldo que não entra bem na cabeça mas ele ainda sabe um pouquinho...

VJL É mais teimoso, não é?

HI É mais teimoso mas é muito bom de coração, é muito bom mesmo, o que ele pega pra fazer Deus o

proteja que ele dá conta, né, mas não é que eu não esforcei não que a minha menina repetiu o quarto ano

duas vez, ra ele poder aprender mas não entrou na cabeça dele que que eu posso fazer?

VJL O senhor trabalha em que Seu Haroldo? Quer dizer, hoje o senhor está aposentado.

HI Hoje eu sou aposentado.Eu trabalhei o resto do final da minha vida eu trabalhei em pedreira, trabalhei

trinta e tantos anos aí na pedreira, trinta e dois anos...

VJL Sempre tirou pedra aqui?

HI Sempre tirei pedra aí. Depois houve um revés aí por causa dessa caverna de índio, eles ficaram com

olho grande em cima de mim por causa da caverna, tava achando muita coisa boa aí quando de fato

ainda tem muita coisa boa.

VJL O senhor é dono dessa terra aqui?

HI Sou, sim senhor, sou dono dessa terra aqui.

JC Não da pedreira.

VJL Não aqui dessa terra aqui.

HI Daqui dessa região, eu sou dono aqui, eu sou dono aqui.Eu,desde quando minha avó morava aqui ela

contava a história disso aqui.

JC É herdeiro.

VJL Como é o nome dos seus pais?

HI Meu pai chamava José Luca de Souza.

VJL E ele morreu faz tempo?

HI Morreu faz tempo quando ele morreu eu estava mais ou menos pequenininho tava na meia idade dos

quatro anos.

VJL Com que idade ele morreu?

HI Ah, aí agora...

VJL O senhor não lembra?

HI ... o senhor me apertou porque não tenho bem a idade do meu pai.

VJL E da sua avó, a sua mãe?

HI A minha mãe já morreu avançada já também, né.

JC ---- morreu? A sua mãe eu sei.

HI Quantos anos?

JC A sua mãe ela morreu foi mês de julho, dia quinze de julho sua mãe morreu.Trinta e oito ano que a sua

mãe morreu.

HI É, tem trinta e oito ano.

JC ---- fez quinze dia que ela morreu que----- nasceu.

VJL E os seus avós?

HI Os meus avô também morava aqui.

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VJL Ah, todos? O seu pai também morava aqui?

HI Morava aqui.E meus avô morava aqui e essa terra aqui era do meu avô.Ele até chamava Honório

também A minha avó chamava Francisca Rosa morou aqui também e ela foi criada aqui e ela contava

essa história dos índios aqui nessa pedreira.

VJL A sua avó já contava isso?

HI É, contava história desse da pedreira.Ela falava: "Ah, 'ocês' não pega roda aí não menino que aí nessa

pedreira tem índio aí tem muita paca aí, tem porco-do mato aí, 'ocês' não roda aí não porque ah lá índio

tá pegando menino ---- tá chorando lá na pedreira.Via chorar mesmo, isso aí é de vera mesmo que eu tô

contando.

VJL Isso aqui nessa época que o senhor está falando da sua avó, dos seus pais, isso aqui era tudo mato?

HI Era tudo mato virgem aqueles pau de barba, tinha muita coisa aqui.

VJL Quando é que começou a tirar a mata, quando é que eles tiraram a mata, quando é que isso aqui...?

HI Não foi muito longe não, porque essa mata aqui eu ainda, pouco tempo ainda tem filho dele aí que essa

mata aqui foi assim aqui Visconde do Rio Branco, esse artista é capaz de lembrar o defunto Delico,

lembra --- O defunto Delico matou índio nessa pedreira.

VJL O senhor já era nascido isso?

HI Oh já, era nascido.

VJL Então quer dizer há menos de setenta anos atrás tinha índio aqui então?

HI Tinha, tinha, matou aí mas eles veio aqui atirava em tanto índio com os índio saía carregando aquele

eles lavava naquela aguinha lá, não tem uma aguinha que o senhor passou nela? Aquela aguinha

escorria sangue que passava lá embaixo daquela ponte que "ocês"passou lá, o sangue passava lá de

tantos índios que eles atiraram, quer dizer era muito índio, atirava um, baleava um, matava, rapava o

outro aí depois que eles sossegava os índios saía carregando aqueles que tava mais, mais pra lavar

naquela aguinha.

JC Por isso que toma o nome de Piedade

HI Por causa os índios gritava qanto tava com os outros carregando e gritava:"Piedade, Piedade, Piedade"

carregando aqueles que tava mais querendo morrer.

VJL O senhor disse que tem dez filhos.

HI Eu tenho dez filhos.

VJL Todos casados?Não o Haroldo não é.

HI Não, tem dois solteiro ainda.

JC Tem dois solteiros, os dois caçula são solteiro.

VJL Quantos netos o senhor tem, Seu Haroldo?

HI Ah, eu ...

JC Vinte e um netos.

VJL Vinte e um netos?

HI É tudo---- mas tenho vinte e um netos.

VJL Tem gente em São Paulo, não é ?

HI Tem em São Paulo, tem no Rio.

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JC Tem quatro em São Paulo, tem dois, os dois ---- mora no Rio, um mora na Penha, outro mora em

Bangu.

VJL O senhor chegou a conhecer o seu avô? Seus avós?

HI Cheguei a conhecer todos dois.

VJL Ah, é?

JC Dos dois lados.

HI Dos dois lados.

VJL Bisavô também, não? Não bisavô já é mais...

HI Bisavô já está mais fora porque se já casou um pro lado e pro outro e sabe como é que é eu não tenho

mais bem relação.

VJL A Dona Jacira é daqui também da Piedade?

HI É daqui mesmo.

JC Eu nasci lá na Piedade e casei vim pra aqui e tô aqui até hoje.

VJL Os seus pais também eram daqui? Seus avós?

JC Era, o meu pai , meu pai ele era português agora ele era um homem que conversava muito pouco com a

gente então a gente não tinha muito assim de conversar com ele, saber direitinho porque ele era filho de

mãe "sorteira" então a gente não tinha aquela relação de...

VJL As histórias que o avô e o pai do Seu Honório contavam, seu pai não contava?

HI Contava não.

JC Não, talvez ele poderia até contar mas nessa época não tinha achado os pote de índio então não tinha

nem assunto pra poder continuar no assunto.

VJL E os seus avós, Dona Jacira?

JC Meus avós é...

VJL A senhora lembra deles?

JC Lembro que de uma avó do lado do meu pai, chamava Maria, e do lado da minha mãe, não conheci

nenhum, da minha mãe não conheci nenhum porque quando minha mãe casou, passou pouco tempo,

morreu todos dois, nenhum dos meus avós...

VJL Quer dizer tanto a senhora quanto o Seu Honório sempre moraram aqui?

JC Sempre morei aqui.

HI Eu sou nascido e criado aqui.

JC Eu só mudei da casa da minha mãe pra aqui e tô aqui até hoje.

VJL A senhora tem irmãos, Dona Jacira?

JC Irmãos? Eu tenho, a minha mãe teve treze filho mas resta vivo dois "home"e seis mulher.

VJL E o senhor, Seu Honório? O senhor tem irmãos?

HI Irmão só tenho um vivo o resto tudo já é morto.

VJL Ele mora aqui na Piedade também?

HI Não, senhor, ele morava mas hoje ele casou com uma viúva lá em Rio Branco, mora em Rio Branco.

VJL O senhor, claro, vocês conhecem muita gente aqui, quer dizer, praticamente conhecem todo mundo

aqui, em Rio Branco também todo mundo conhece vocês?

HI Todo mundo, conheço todo mundo.

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JC Todo mundo conhece a gente aqui, e todo mundo conhece a gente também.

HI Todo mundo conhece.

VJL Quais são as pessoas mais, mais antigas ou mais velhas que vocês conhecem?

JC Aqui?

VJL É, tanto em Rio Branco quanto aqui na Piedade.

HI O que é verdade aqui pra nós contar os mais velhos que têm aqui, vou falar pro senhor a verdade quase

não tem velho pra nós falar qual é o mais velho,os mais velho que tinha morreu tudo.

JC Só tem o ---- .

HI Os mais velhos que têm aqui é praticamente sou eu, o Zé Siriquinho, --- , Benedito ---- ,---- mais

velho que tem aqui.

JC De homem, de mulher tem Comadre Siana ---- , mais velha.

HI Mulher tem, caducou não consegue falar nada.

JC Mas é idade...

HI Mas tá----, nem sabe o que que tá falando.

VJL Mais de setenta anos?

JC Tem setenta e poucos anos...

HI Tá com uns oitenta e bordoada, quase noventa, não dá pra...(risos).

VJL Mora aqui?

HI Mora aí., mas ...

JC Agora em Rio Branco a gente conhece várias pessoas, né...

HI ---- Rio Branco tem...

JC ----

VJL Quer dizer essas pessoas mais velhas e aí incluíndo o seu avô e sua pais, eles falavam muito desses

índios, não é, o senhor disse que eles falavam, seu avô e seu pai contavam desses índios, não é?

HI Olha, contavam histórias os índios que eles primeiro contavam histórias deles aqui contava mesmo

quase que era esses índios deles quase assim, não se incomodava que era um era um tempos antigo era

um tempo muito bom, tempo de muita fruta, né, tinha de tudo, ninguém contava com laranja, ninguém

contava com a abóbora, ninguém contava com a cana, contava com amendoim, não contava com nada

isso aí inhame, lima, laranja, aqui ninguém contava com isso, isso aí era era banal.

JC -

VJL Tinha muita caça também?

HI Ih, caça tinha demais, tinha cotia, tinha macaco barbado.

VJL Hoje não tem mais nada disso?

HI Tem, tem mas tá mais afastado e hoje o negócio da IBAMA...

VJL Não permite mais caça.

HI ----

HI Ah, Nossa Senhora não quer caça de jeito nenhum e eu mesmo gosto muito de caçada.

VJL E esse rio aí, Seu Honório, esse riozinho, essa nascente aí, quer dizer, ela já foi maior?

HI Ela já foi maior, já foi maior mas até hoje é uma nascença muito boa é agua ---- de mina, até essa

cachoeira que tem aí, cachoeira limpa, a cachoeira que o sujeito que chegar doente sai até são.

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VJL Essa água lá na Piedade o pessoal bebe essa água?

HI Não, não bebe sabe porque não bebe porque sempre tem uns fazendeiro mais meio enjoado um

"cadinho"e faz curral de porco em cima dela, faz curral de boi.

VJL Mas antes disso usava...

HI Ah, usava, usava essa água, essa água lá embaixo naquela parede assim ---- você pode chegar e ----

água de mina, ela tá cachoeira agora pode ir lá, vê que ela é ---- , quase ----.

VJL Essas pessoas antigas, essas que o senhor diz que conhece, que não são da sua família mas também

contavam essas histórias de índio? Ou não?Essas mulheres que o senhor diz que tem mais de oitenta,

noventa anos?

HI Contavam, contava mas elas, é como eu tô dizendo ao senhor, antigamente os índio era uma coisa de

vizinho de nós.

VJL Quer dizer, tinha muito índio, quer dizer, era normal encontrar, falar com índios aqui?

HI Não, encontrava mas os índios é como eu tô dizendo ao senhor era igual a nós vizinho igual a outro

precisasse de um índio pedia um cigarro de fumo ele dava, pedia uma cachaça eles dava, o senhor

compreende como é que é, era tudo dado, só o bicho não tinha roupa, o bicho é pelado, o senhor vê que

o bicho é um bicho escondido.

VJL Como é que o senhor soube, quer dizer, além dos contatos que de repente o senhor teve com esses

índios, como é que o senhor soube das histórias desses índios? Quem contava essas histórias?

HI É feito----- posso falar pro senhor que é uma coisa assim mesmo banal porque eu, eu sou nascido e

criado aqui e vi o lugar onde eles morava e eles falava aí tem índio eu vi o lugar que eles morava, ----

, onde é que eles transitava, caçava tatu os índios, essa coisa só a gente não enfrentava porque os índios

era mais de, comia gente,---- comia.

VJL Qual é a sua opinião sobre esses índios, o que é que o senhor acha desses índios?O que que o senhor

achava, o que o senhor achava deles, mudou durante o tempo? Quer dizer, o que que o senhor pensa

deles hoje depois de que eles não existem mais aqui?

HI Não existe mais porque eles foi tomado, uma coisa do tempo do cativeiro, tomaram a terra deles como

se dizer matava eles, judiava com eles, "ocê"vê que foi afastando, não foi ficando mais naquele lugar, é

por causa disso que não não existe mais índio aqui, por causa disso, é o senhor que é pela televisão

mata índio pra tomar terra, esse negócio de ouro, Serra Pelada, essas coisa, eu não, eu é que achei essa

caverna de índio aí mesmo---- é uma caverna que desde o Brasil é ela mas por causa de que que eles

morava aí eu trabalhava cortando---- , cipó cortando--- achei essa caverna mas uma caverna rica, tem

muita coisa boa lá dentro garanto ao senhor que tem coisa boa.

VJL Quer dizer que a sua, a sua imagem, a sua opinião sobre esses índios é muito boa, quer dizer, eles eram

pessoas importantes, boas?

HI ---- é pessoa de ouro,mutios índios era pessoa que coitado eles tem sentimento de entregar esse pote de

bandeja pros outros mas a perseguição era ----

VJL E onde é que eles moravam , seu Honório?

HI Moravam aí.

VJL Moravam na pedra, lá embaixo não.

HI Rodava a pé era tudo mas morava era aqui.A morada que eles vivia que era aí .

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VJL No meio da mata, não é?

HI No meio da mata, eles morava aí, o senhor pode ver que as caverna deles é a morada deles.

VJL Quer dizer, eles não moravam em cabanas, eles não faziam cabanas?

HI Não, não morava só em toca de pedra.

VJL Só em toca de pedra.

VJL Tinha muito índio, Seu Honório?

HI Ah, tinha muito índio, essa região tinha muito índio, índio novo, índia nova, é igual a cigano(risos).

VJL Como é que eles eram, Seu Honório?

HI Os índios era, ---- , aqui embaixo tem uma senhora o senhor vê ela....

VJL A Dona Ritinha?

HI É índia purinha, até ---- , aquele cabelo espetado, aqueles olhos índio assim, cara de índio, a cor dela é

uma cor de índio, corpo de índio, tudo dela índio,---- precisava de pegar aquela índia tirar um retrato

dela pra mostrar que índia pura e a avó dela, a mãe dela e a avó dela ---- ele vinha tempo com essa

índia "véia", essa índia "véia"vinha aqui na casa da minha mãe socar café, vinha beber o café forte

tinha assim forte que a índia vinha aquele fumo, nós também plantava fumo aí sabe?

VJL Ah, plantava fumo também?

HI Plantava fumo aí.

VJL Hoje não planta mais?

HI Ah, hoje não planta mais, fazia aquele fumo forte, ela chegava e tirava aquele pedaço de ---- grande,

fazia aquele cigarrão: Hum, que gostoso, que fumo gostoso". Mamãe fazia aquele café forte,

a"veía":"Hum que café gostoso".

VJL Como é que esses índios viviam, Seu Honório?

HI Vivia pela caça do mato, comendo tatu, comendo os passarinho, alguma fruta.

VJL Como é que eles caçavam, eles caçavam com o quê?

HI Ah, tinha flecha, tinha, tinha o bodoque deles...

VJL Arco e flecha.

HI Tinha flecha, o bicho não errava uma flechada não, o índio não errava flechada, eles fazia as flecha eu

até sei de fazer as flecha que eles fazia, fazia as flecha e fazia aquele bodoque assim, ó, aí eles furava o

pau botava a flecha aqui, ó, aí eles mirava aquela flecha ou que eles mirava aquela flecha, taca aquela

flecha batia, varava.

VJL Tudo em madeira., não é?

HI Tudo feito de bambu, folha de ---- , fazia até bem feito, matar um tatu, sabia como é que eles comia um

tatu?Comer tatu era assim, lá na caverna, ele fazia um buraco no chão assim aqui. ó, aqui aí pegava o

tatu sabia ---- arrancava tudo, tudo e vai ---- ficava um tatu perfeito.Ali ele fazia o fogo lá, o fogo dele

é "rapi", é pegava uma folha, fala ---- contando mentira, né?(risos)Ele olhava pro "soi"e esfregava a

folha assim pro olho do "soi"assim, ó, aqui, ó, esfregando a folha, e bup! deixava o fogo aqui ali tratava

uns pedaço de pau ia fazendo quando tivesse aquele "brasil" no centro do buraco, ali ele vem com uma

folha de caeté só não que foi caeté, agora essa folha de ---- o senhor já viu uma folha ---- eles vão

forrar o fundo ---- fundo tatu na---- ali, ali botava ali vinha com a folha de ---- , botava por cima,

aquilo botava fogo por cima, botava fogo ali por cima , fogo por cima ali e ia pitar, ali botando fogo por

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cima, mais tarde as horas: "Tá pronto?", tirava aquilo ali, pegava aquele ---- tatu tá

"cozidinhozinho"comia e levava pra todos eles comia.

VJL Que outro tipo de caça eles comiam, tatu...

HI Ah, tatu, o que eles pegava no mato, tatu, cotia, paca essas ---- do mato.

VJL Tinha veado aqui?

HI Veado, tudo eles comia, cabrito eles caçavam muito, também comia é sé passava só a carne, não tinha

negócio de comer , frutas se eles ---- a fruta eles comia, ---- falar o nome da fruta, cabuta, chamava

cabuta eu , muito aqui no mato eu busquei muita cabuta é dá um refresco nem maracujá que desse

refresco dessa cambuta, trazia sempre do mato e eu se andasse em certos lugar ainda ia achar muito essa

cambuta lá nos---- deve ter pé dela ainda, madura a fruta, que cheiro, ---- de fruta cheirosa.

VJL Eles plantavam alguma coisa?

HI Não, não , não plantava não...

VJL Não tinha roça?

HI Não o índio não trabalha, o índio é bicho do mato, ele é bicho do mato mesmo.

VJL Esses que moravam aqui não plantavam nada?

HI Não, índio não plantava não.Índio é bicho do mato mesmo.É a gente podia ter um ---- com eles mas

"ocê"entende, era que eu pego um bicho do mato lá se tem vai em cima dele ele ---- igual a macaco

ele vira amigo da gente, agora esse---- aqui tem muito lobo, pega um lobo desse aí vai amansando

dentro de casa aí, "ocê"vive com o bicho e aí sente seu companheiro.

VJL Eles tinham cerâmica, Seu Honório?Pote?

HI A cerâmica deles é aqui na mão, que faz um negócio liso na taquara, isso aqui, ó...

VJL Não tinha cerâmica, então?

HI Não, não, a cerâmica deles eles faziam pote...

VJL Mas eles faziam o pote pra quê?

HI Ah, fazia o pote é a vasilha deles, morre uma pessoa, morre como morria uma criança, morria um

"véio"deles, eles picava ele...

VJL Ah, eles quebravam o osso?Então cortavam o osso?

HI Cortava o morto, picavam e botava aquele potão assim, em cima tapava, encostava num lugar lá na

caverna, bem encostadinho---- , deixava lá e dali que ele encostava, eles mudava daquele lugar, eles ia

pra outra caverna...

VJL Não ficavam ali?

HI Não,mudava dali , outra hora eles tinha lugar de pouso também deles tudo morto.

JC Diz até que eles colocava um foguinho por baixo, quando os meninos achava os potes tinha um sinal,

que eles colocava o foguinho por baixo dos pote.

HI Tinha um sinal.

VJL Fogo por baixo do pote?

JC Por baixo do pote.

HI Ali eles ficava, eles chorava.

JC Um sinal que a gente via que tinha que eles colocava mas tinha o sinalzinho do fogo que eles colocava

por baixo.

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HI A coisa é muito bem feita, coisa muito bem feita.

VJL Da onde eles tiravam o barro, Seu Honório?

HI Ah, o barro ---- eles tinha é, tinha o , eles fazia carreiro mesma coisa do bicho do mato, tatu e paca

fazia carreiro disso, daqui eles ia lá no alto da ---- lá de lá eles saía, o senhor quando veio do Raul

pra cá o senhor não---- uma ponte?Não---- uma ponte ali?Ali em cima tem barro.

VJL Eles tiravam de lá?

HI É o barro melhor que existe nesseBrasil pra fazer telha, fazer é lá.

VJL Quer dizer que os índios tiravam de lá, então?

HI Buscavam, chegava a fazer aquela pelota, carregava na cabeça, vinha dois três índios.

VJL Ah, eles pegavam o barro lá, botavam na cabeça e iam embora?

HI E iam embora.

VJL Eles faziam a cerâmica aqui em cima, então?

HI Não, cerâmica, eles faziam, não fazia cerâmica, cobria, eles iam pelo ---- aonde é que eles paravam

pra descansar já começava o trabalho.

VJL Eles queimavam aonde?

HI Eles queimava quando chegava , aí eles faziam no chão assim ---- que o pote do índio, o pote do

índio, capaz de não ter, é uma coisinha à toa de grossura assim.

VJL Muito fino?

HI É, mas é uma coisa lindo, é uma coisa linda, pequeno à toa, ali faz ele, tá feito mesmo.

VJL Qual é a cor?

HI Mesma cor desses potes aí que nós tamo vendo aí, que nós vê assim ...

VJL Meio marrom meio preto.

HI Meio preto, meio preto sim, da cor de ---- , da cor de ---- o pote de índio.Eu tinha um pedaço do

pote.Ainda tenho ainda.Eu vou procurar o---- do pote pro senhor aí, na hora que eu for na caverna aí,

vou trazer um pedaço de pote pro senhor aí.

VJL O senhor conhece muito esses lugares aonde os índios deixavam os potes, ou moravam.

HI Conheço.

VJL Aqui na Serra está cheio disso?

HI Isso, isso, tem uma caverna aqui que tá tampada, uma coisa linda, tá tampadaeu tenho um tanto de

vontade de abrir essa caverna, entrar nela pra ver que essa caverna tem muita coisa boa e já foi

examinada por que tem, os---- veio aí e meteu o aparelho e falou assim: "Não mexe mais aí que saí esse

bloco aí é uma riqueza que tem aí, não deixa ninguém entrar aí, não entra ninguém aí"Até papel,

outro acharam papel aí, pra não deixar entrar aí, o Julinho ia botar polícia ---- , polícia pra não deixar

entrar aíe deixaram o homem encarregado aí mas o senhor sabe, hoje, pessoal anda a cavalo, eles

marcam uma coisa com a gente a espera sentado que em pé cansa não vem mas isso aí foi embargado

pelo governo, o governo mandou dinheiro,o Sarney mandou dinheiro pro Julinho meter dinheiro em

mim aí fazer de mim até vinha eles aí é polícia, delegado, sargento, vinha tudo e fala va assim: "Se

Honório, o senhor tá podre de rico, o senhor --- sair daqui, o senhor tá podre de rico, Seu Honório, o

senhor tá podre de rico, que o projeto do governo é pro senhor ficar sentado no dinheiro de pernas pro

ar, o senhor tá rico.

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VJL O que o senhor acha que esses locais, quer dizer, aonde tem que o senhor diz que sabe muito bem, o que

que o senhor acha que são esses locais?

HI Esses locais, é locais dos índios, é dos índio, esse é dos índio, a maior caverna que tem no Brasil é essa.

VJL Mas o que que , o que que eles representam, era só pra morar, só pra, porque nos livros dizem é que

esses locais são aqui em cima da Serra era só pra enterrar, não é verdade?

HI Não, quem falou isso foi uma mentira.Quem foi falou mentira, não pode ser uma coisa dessa...

VJL Eles moravam aqui também?

HI Os índios só morava aqui, eles era nascido e criado aqui, igual eu sou.Eu já ouvi falar que é onde é a

caverna de índio é a maior riquaza que tem, tem muito ouro.

VJL O que que o senhor, o que que significa, o que que é isso, qual a importância desses locais ou desses

índios é que o senhor acha que tem isso pro senhor, pra população toda, pra Piedade, pra Visconde de

Rio Branco, como é que é isso, qual é o significado, qual é a importância?

HI Aí o que eu posso responder ao senhor é isto a importância que tem aí uma que eu moro em cima dela e

não descubro o que que é que é, tem muito ouro e tem caverna que tem muita coisa boa, a gente pode

dar uma explicação desta mas não tem---- isso precisava de ver pra acabar de crer, o senhor

compreende?Ver pra acabar de crer.De crer isso aí porque a caverna do índio aí, é uma caverna que os

índio foi nascido e criado aí, foi tomado.

VJL Tomaram deles?

HI Tomaram deles, deixo pra aí.Que senão não achava essa casa de pote aí, né, não achava essa casa de

osso de índio, osso de cabeça de índio, cama de índio pote de índio, pote cheio de casca, pote cheio de

osso,tudo tinha dente, cabelo do índio, tudo dentro do pote, o que é isto?Era lugar deles, é morada deles,

é ou não é? É lugar que eles mora, é lugar que eles mora,é morador daí, é efetivo aí, é efetivo, por isso

que eu falo pro senhor, isso pode ser uma terra rica porque são efetivo, foi matado e foi tomado os

outros que ficou aí, as vez uns índio mais novo, saiu correndo e foi embora, eles tão aqui no Mato

Grosso, o Mato Grosso daqui não tá longe de lá não.Eu conheço até o Mato Grosso, eles tão aí no Mato

Grosso, os índio tão lá no Mato Grosso, correram pra lá.

VJL O senhor conhece além do senhoe e do seu filho que contaram isso, o senhor conhece mais alguém que

tenha encontrado esses potes?

HI Não, não, não.Não, foi procurado mas não foi encontrado, foi procurado demais.

VJL Mesmo o pessoal daqui da Piedade...

HI Antigamente quando tinha o homem que era, o senhor sabe, inspetor, essas coisas, pra roça tinha

inspetor também não tinha, inspetor de polícia, essas coisas assim, como é que falava eles, inspetor e

delegado, é inspetor delegado, até que---- é delegado ---- os índio aqui, tinha o Nico Cardoso ái em

baixo que era inspetor depois delegado, esse andou caçando índio, pote de índio até que,

"ocê"lembra da pedreira do ---- naquela pedreira junto do Dorico ali, lá em cima tinha aquele salão

bonito, lá o senhor não entrou no salão lá não, né?

VJL Lá em cima não.

HI É, naquele salão lá em cima, ele encontrou lá o pote do índio lá em cima, até que o pote tinha osso ele

largou por lá , ele bagunçou os pote do índio, tirou as coisa que tinha lá as coisa e outra, guardou muita

coisinha que tinha no pote lá, bagunçou lá, mas ninguém entrou lá mais aí que o Nico Cardoso achou lá

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mas andaram cavucando essa pedreira aqui como---- e não achou nada.Não achou nada, aí eu comecei a

trabalhar napedreira mas esse menino é que nós encontremo essas cavernas do índio.

VJL Quer dizer, essa pessoa que encontrou, ela mora aonde, que o senhor disse que encontrou ali embaixo,

aonde é que ela mora?

HI O que encontrou?

VJL É.

HI O que encontrou, que encontrou esses pote do índio, tá morto, né, meu filho.Tá morto, Derico morto,o

Cardoso é morto, o que encontraram já tudo morto.

VJL E o que que faziam ou o que que fizeram com esses potes, com esses ossos, isso está aonde?

HI Não, esse que eu achei aqui, esse tá no Museu de Rio Branco, já não tá completo como eu achei.

VJL E o que que eles fizeram com o resto que não está .

HI Ah, uns mandou pra mostra essas coisas, tirou os ossos levou pra mostrar, essas coisa, carregaram

algum dente pra mostrar, e resto dos potes tá aí no Museu, o resto dos pote tá aí de vez em quando vem

gente aí e fala comigo aí eu começo a apertar o ----:"Ah, não, não, não ali nós ----ganhado do Doutor----

eabriu aquele museu lá, não vai dar mais pra ninguém não tem jeito de pegar mais".Digo que tá na mão

do governo, que tá ---- não dá mais.

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

FONTE ORAL

ENTREVISTA 2

FITA 2 - LADO B

ENTREVISTADOR: VLADEMIR JOSÉ LUFT(VJL).

ENTREVISTADO: HONÓRIO IMACULADA(HI); JACIRA CAMPOS(JC) e ADILSON(AD)

VJL ----disse pra mim que uma parte desses potes eles levaram para o Rio de Janeiro ou para Belo

Horizonte, não tem nada disso fora do Rio de Janeiro?Ou fora de Rio Branco?

HI Não, não.Eu mesmo quando eu tinha esses potes aqui, eu procurei ver se as----dava valor e assim e

ajudava um bocado eu fui até no Rio de Janeiro no museu.

VJL Museu Nacional?

HI Foi, fui lá até esse homem veio aqui mas lá como que se diz não deu valor ele só falou comigo

assim:"Ah, pra "ocê'" mexer com isso aqui "ocê"tem que mexer com o dono disso aqui, ele vai te

prender "ocê"e vai levar lá".Eu mas----bicho bobo na hora que falou prender deixa eu tirar meu time do

campo(risos).Rapei e vim embora aí cheguei aqui o "bafafá"foi correndo que os outros tava aí eu

cheguei ao ponto de enterrar---porque o povo tava demais aqui em casa por causa da caverna.A caverna

tava bonita eles tava querendo porque estava querendo tomar e eu----logo assim e aí o governo, o

prefeito baixou em cima, falou comigo: "Não nós tem que levar isso aí "...

VJL O Júlio Carone?

HI É, o outro por causa desse tipo de coisa também queria, também o Senador quis levar eu falei que não,

não leva não.

VJL O que que esses índios tinham, quer dizer, eles tinham algum colar, eles tinham alguma, quer dizer,

além do arco e flecha, além dos potes o que mais que eles tinham?

HI Ó, o que eles tinha era tanga, colares tinha.

VJL Colar de quê?

HI Aí que eu não posso explicar pro senhor que eles fazia o colar deles eles fazia do jeito deles lá, fazia de

frutos do mato, fazia de ----eles fazia era do jeito deles lá.

VJL Onde é que, como que eles dormiam?Onde é que eles dormiam, em rede ou no chão mesmo?

HI Ah, dormia tudo no chão, bicho do mato mesmo, dormia no chão hein, dormia no chão...

VJL Eles moravam, eles moram em muitos?

HI Ah, morava fazia uma roda assim, ó, tudo cada índio bonito pra danar, tudo de tanga.

VJL - Quantos eles eram?

HI Ah, isso aí tô por fora, uma família, o índio tinha uma família, o índio tinha família, tinha o "véio", tinha

a "véia", tinha os filhos mais velhos, tinha índio pequeno, era índio pequeno assim, o índio pequeno

desse tamanho assim passava a mão sob meu "subaco", --- aí botava o dedo na boca e saía assobiando

pros cara...

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VJL Quer dizer que eles não tinham muita coisa , então?

HI Podia, podia ter e ter mas ái eu não posso explicar mais porque o índio, o índio era, comparação eu já

pro senhor diversas vez, é bicho do mato, o índio é bicho do mato, o índio podia ter muita coisa e ----só

sei que eu posso explicar ao senhor que o índio é um bicho curador, que cura qualquer doença, que é o

bicho que sabia tudo quanto é raiz do mato eles sabe benzer esabe qual é a raiz do mato que cura tudo

enquanto é doença nesse mundo, o índio cura.

JC E você a semelhança do índio conhece todas raiz.

HI Eu Graças a Deus conheço e "ocê"vê que o índio é isso, o índio chegava aqui se visse uma pessoa

doente aqui como falava que era tuberculoso, essas coisas se ele viesse aqui, ele falava assim, ------

gemer,ele falava assim: "Hum, quem tá gamendo aí? "Ah, e o menino que tá aí, tá desandado, tá com----

e que muito dá disso, né, ele falava assim:"Ih, deixo eu ver, traz ele pra eu benzer "procê" e aí vinha

com aquele --- que o menino quando tá aguado, -----"Ih, tadinho, deita ele aqui e deixo eu benzer ele

"procê" ", vinha e passava a mão nas costas do menino, cruz passava outra vez: "Hum, coitado" virava a

mão pra atrás e botava a mão naquela cumbuca que ele tinha, tirava uma raiz, "Leva põe na água e

"ocê"vai tratando dele"Aí daqui um pouco nada ele uns nove, dez dias o menino já tava gordo, comendo

----

VJL Eles falavam Português mesmo?

HI Não senhor, falava tudo enrolado.Falava tudo enrolado, é "puã", ----, não entendia é muito difícil...

VJL E entre eles?

HI Entre eles ah, eles entendia um pro outro igual um português com outro entende o que que fala, né?E

ele também , ele entende a linguagem dele tudo, 'ocê"não vê que o índio tá no mato aí caçando aí uma

indinhadesse tamanho aí, um bichão tamanho de mim era só olhava e "Ô, índinha bonita, ô menina

bonita"atrás dela, ela não olhava pra "ocê" não, ela só ficava olhando, "Ô, vem cá que menina bonita,

vou pegar pra mim".---pegar ela----você ----"subaco"ó...

VJL Eram fortes?

HI Era forte, era índio era forte,--- botava o dedo na boca"Fi fi"chamando os piteiros pra poder vir topar

com ela.

VJL Não eram doentes?

HI Não, não, não, eu vi conta esse caso, o caçador tava no mato, quando ele vê vem aquela menina mais

forte, olhando os passarinho no mato afora, olhando, caçando, né, que todos eles caçador, e olhou e

"Que menina bonita vem, ô menina bonita "e saiu do meio do mato assim.Ela assustou com ele assim e

deu uma pulada pra poder pegar ele, ela veio pra topar com ele, ele boboeu ela mão nele, caçou debaixo

do braço, pra taquara afora, quebrando taquara dali, quebrando taquara daqui, quando ela fez botou o

dedinho na boca e"Fi fi"o caçador escutou , "Ela tá chamando os outros que vêm aí, como é que eu vou

fazer? "Arrancou da faca e matou ela.Matou ela e----.

VJL Eles brigavam entre eles? Não brigavam?

HI Não índio não brigava, índio ficava olhando pra cara assim um pra outro, briga com nós, e ----.

VJL E aquela história do sangue que correu de muito tempo que o rio ficou cheio de sangue, que o senhor

me contou?

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HI Ah, essa história foi defunto Delico que matou esses índios aqui, foi matado aqui.

JC Não foi só ele, Honório.

HI Não, foi só ele que matou que trouxe ele e----ele vinha, era---- dessa pedreira, o Zeca Teixeira tava com

ele e ...

JC Eu sei que os índio tava atacando senão ele não matava.

HI Não eles não atacava porque----atacar eles falava que as pedreira e as toca é dos índio, é mesma coisa de

dois que têm uma terra aí que é comum, o senhor interessar o senhor vai aqui e eu vou tomar aquilo dele

ali pra mim, eu vou procurar tomar dele aqui, ---- que foi que hove com os índio, foram tomar deles.

VJL Qual era o nome desses índios, era Puri era Coroado, quem eram?O senhor por acaso se lembra?Sabe?

HI Não, isso ái eu não tenho lembro direito...

JC ----fizeram entrevista....

HI ...fizeram a entrevista deu que os índio era Piquiri.

HOMEM Isso aí foi considerado das outras vez que veio aqui, fizeram análise nos ossos, ver o

comprimento.

VJL Que outras pessoas o senhor acha que conhecem essa história toda e tal e que o senhor acha que eu

poderia entrevistar para esse trabalho? Que o senhor acha que vale a pena, que tem informação, que

tenha essas histórias também, alguem que tá vivo por aqui?

HI Os índios vivo não...

JC Ele não tá dizendo isso, outras pessoa igual você que ele tá perguntando.

VJL De outras pessoas.

HI Ah, de outras pessoas pro senhor entrevistar isso aqui qual é que pode?

JC O Seu ----.

HI Será que pode, pode---- Bié, pode contar o senhor isso aqui só Bié, que o Bié tá com oitenta e quatro

ano ---- ...

VJL E ele mora aonde?

HI Mora aqui, e ele é até índio também.

VJL Ele mora perto da casa da Ritinha.

HI Ele é índio também, é um homem muito bom, muito bom.

VJL E a Ritinha? O que que o senhor acha da Ritinha?

HI A Ritinha é difícil que índio pra pegar ela só se amarrar ela na corda, a Ritinha não é fácil.

JC Eu falei até com o Haroldo que o Haroldo falou que ele vai tirar um retrato da Ritinha mas ela é muito

cismada...

HI Ela é índia, ela é cismada, não vai não---- se o senhor chegar lá o senhor meio ----dessa maneira assim,

olhar assim----aquilo, ó, ----.

JC Aí eu falei, você arruma a màquina de tirar retrato eu vou com você lá porque ela é muito chegada a

mim mesmo.

VJL Ela gosta da senhora?

JC Gosta muito mesmo.

HI Gosta demais.

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JC Então, tanto faz---- voc6e arruma a máquina de retrato eu vou com você lá, e enquanto eu bato um

papo com ela, você tira o retrato e só...

HI Mas-----

VJL Ela não deixa?

HI Deixa não, ela...

JC Ela é muito cismada.

HI Ela é muito cismada e se pegar ela até briga com a gente, que índio é assim se percebe

briga(risos).Agora o Benedito Rosa, eu te garanto que é meu "cumpadi"se eu chegar lá, agora o Haroldo

chegar com o senhor lá ele vem---- "Ah, como é que é esse é um Doutor que tá aqui, um ano que ele tá

passeando vem pra cá pra nós bater um papo aqui"Aí ele conta até da mãe dele, do pai dele.

VJL Tem muita gente aqui que é descendente de índio, né?

HI É, ele trabalhou muito também na pedreira dos índio, ele vai contar, ele vai contar, conta desde quando-

--- essa----aqui, ele conta tudo. O que pode contar ao senhor que eu garanto, só esse.

JC Ah, o Vicente também deve saber alguma coisa...

HI O Vicente não sabe que o Vicente---- mais ele...

JC Mas ele sabe Honório.

HOMEM "Ocês"sabe que as vez ele tem uns negócios lá dele que ele tava falando da outra vez que ele

veio aqui.

JC Ele tem o que eles acharam lá na pedra do...

HI Acho que o ----deu ele.

HOMEM O Hélio.

HI O Hélio deu ele.O Hélio era também sambuqueiro do boi também, menino moço.

JC É filho dele.

HI É filho dele, é?

VJL Seu Honório, o senhor já ouviu falar em Arqueologia?

HI Não sei bem...

VJL O senhor sabe o que é Arqueologia?

HI Não senhor.

VJL O senhor sabe o que que o arqueólogo faz? Quem é o arqueológo?

HI Ouvi de falar mas isso não tô lembrando disso não.

VJL A senhora, Dona Ritinha, a senhora também não?

JC Não sei não senhor.

VJL Esse, essa pessoa que o senhor foi lá no Museu Nacional lá no Rio , quem era?O senhor lembra?

HI Não, não lembro não, ele veio aqui, aquele "véio"que---- ele veio aqui mas ele não tava lá, tava lá o

senhor sabe é o guarda da porta, o guarda pra mim entrar lá dentro do museu, lá ver aqueles osso de

baleia, aquela baleia grande que ----o senhor capaz de ter visto, né?Vi aquelas coisas lá e eu tive que

pagar na portaria pra entrar lá dentro, depois que eu conversei com eles esse negócio, então o senhor faz

isso.Eu----uma corrida mas pra correr pra ver tudo precisa de ficar lá um...

VJL Eles não acreditaram muito não, né?

JC É isso aí, eles não acreditaram, né?

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HI O guarda acreditou, o guarda só olhou pra mim: "Mas aí você tem que topar com o chefe, mas o chefe

vai te prender "ocê" pra levar lá"eu falei :"Que negócio de prender eu não matei ninguém"e rapei fora,

né.E foi e foi e foi e essa conversa caiu lá, eles veio aqui.

VJL Já veio muita gente aqui . não é , Seu...

HI O quê, pergunta aos menino aí que tu pode duvidar de eu contar, aqui vem gente?Veio uns cara aqui

que é dessa "fia"do Doutor Edgar, veio, eu fui oferecer ao homem café na porta que o homem quase me

deu um murro na cara, eu não sabia que que eu tava falando com ele.

JC A gente falava, a gente falava com eles, ela explicava na língua delas, né, aí ele entendia, aí o que ele

falava pra gente ela explicava a gente...

HI Depois na cozinha, chegou e ficou bobo com medo daquele fogo na panela, e ele assim fazia com medo

do fogo na panela lá, eles ficou bobo----(risos).

VJL O Adilson estava dizendo pra mim há pouco que desde oitenta e quatro, oitenta e três, não é isso

Adilson?

AD Oitenta e três, o Doutor Júlio ganhou a prefeitura, aí um ano, um ano depois o rapaz filho do Seu

Honório aí descobriu, aí veio esse pessoal, entre oitenta e três pra oitenta e quatro.

HOMEM Oitenta e quatro.

VJL Quer dizer que tem doze anos mais ou menos que isso aí foi descoberto?

HI É foi descoberto.

AD E dessa data pra cá, que foi divulgada, saiu no MG TV, Jornal Nacional, tudo aí..

JC Veio gente da Brasília aqui.

AD ...aí veio gente inclusive o genro do Doutor Edgar.

JC Vinha gente da Brasília, veio de Belo Horizonte...

HI De tudo quanto é canto do mundo veio gente.

AD Todo mundo que mexe assim nesse setor quase que...

HI Agora o senhor que tá ---- o senhor é o único que tá dando esse----aqui, o senhor é(risos)..

AD Mas mesmo assim já tem dois anos que você tá...

HI Tem dois anos mexendo aqui?

HOMEM Depois que----teve aqui teve outros cara aqui.

VJL Teve?

HOMEM Aqueles que ficou acampado ali.

AD Mas tinha polícia

VJL É, eles falou que era...

JC Deixa, deixa essa roupa----

VJL Ah, o exército esteve aqui?

HI ----

AD ----

HOMEM ----

JC Mas eles falou...

HOMEM A roupa era do exército.Eles falou que era de Ubá.

VJL ----estiveram aqui?

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HI Tava----

AD Eles falou que tava fazendo pesquisa.

JC É, eles falou que tava fazendo pesquisa.

VJL Faz tempo isso?

HI Não, não, não...

HOMEM Não tem muito tempo não que tem marca do lugar que eles acamparam ali...

HI Eles vão voltar outra vez, nós não----eles tava---- eu fiquei ali----eu falei ah, chamei um deles aí ----veio

um o chefe veio com eles...

HOMEM Mas um deles já tinha vindo aqui antes, depois, veio os outros na frente.

HI Aí eu não.

VJL Tem muita gente, muita terra e tem muito dono de terra aqui igual ao senhor ou não?

HI Cada qual tem seu pedacinho.

VJL É, né?

HI Cada qual tem sua família.

AD Tem vários proprietários----

VJL E ela foi repartida, quer dizer a terra foi repartida faz muito tempo?

HI Não, o negócio é---- esse, ó, o meu avô era dono de uns pedaço de terra, ele morreu ficou pro meu pai

que é dono, é pai , é filho, né, ----vai ficando assim e aí vai ----

JC Saiu todo mundo só ficou a gente.

HI Eu morro e fica esse menino aí tomando conta, os filho meu toma conta aí, é assim, não posso garantir o

senhor qual é que isso aí...

VJL O senhor gosta muito daqui, não é?

HI Eu sou nascido e criado aqui, quer dizer que eu tenho que acabar o resto aqui.

VJL Tá bom Seu Haroldo, eu gostaria de agradecer o senhor mais uma vez, não é?

HI Muito Obrigado.

VJL Como sempre o senhor me recebe na sua casa, não é?

JC Tá sempre as ordens.

HI Muito Obrigado pro senhor também, tá sempre as ordens.

VJL E eu gostaria de agradecer, a gente vai retrabalhar isso, a gente vai estudar um pouco isso, eu estou

fazendo isso pra guardar essas informações pra gente poder recuperar melhor.

JC Eu quero que o senhor segue com a gente igual o Seu Júlio porque Seu Júlio era muito bom...

HI Aqui só vem gente bom, Graças a Deus, até hoje, o Adilson aqui, conheço ele desde menino...

AD Comecei minha carreira de motorista aqui.

HOMEM Essé pote de índio.Primeiro pote o dia que eu achei ninguém deles acreditou, nem papai, nem

ninguém, que eu trabalhava com caminhão , né, aí era um sábado eu não tava puxando pedra

não aí eu fui lá pra pedra pra o que eles tava trabalhando lá, aí tinha botado fogo na pedra, né

pai?

HI É botado fogo----

HOMEM Aí tinha limpado a caverna, aí eu cheguei e olhei que buraco bonito aqui ...

HI ----

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HOMEM ---- eu cheguei falei assim que buraco bonito é esse aqui?----esse negócio aqui, pai falava

sempre que tinha índio morando ali, eu cheguei mexi assim tinha aquela cinza do lugar que

tinha queimado, e falei ué, passei a mão assim e tinha um negócio assim----tem um negócio

aqui, mexi, mexi pra lá, aí saiu aquela tampa, aquela tampa assim por cima grandona, ela tinha

um buraquinho assim, ela foi até----mas eu curioso com aquilo ali peguei puxei, puxei ela

arrebentou, ela tava muita velha arrebentou a tampa de cima, quando eu olhei, até era um pote,

tava cheio de osso, osso---- eu vim cá chamei eles, eu disse:"Pai, achei um pote de índio

aqui","Ah, que achou o quê, achou pote de índio", "Vem cá pro senhor vê ué".Aí nós foi lá e

foi nisso aí continuou achando, aí entramo na caverna aí foi achando aí, achando quebrado, aí

depois o pessoal, o ----veio, ----começaram a achar, eles levaram muita coisa, né, os outros que

vinha daqueles que vinha primeiro.

VJL Mas isto não está tudo aqui em Rio Branco, não é?

HOMEM Eles catou, o que eles catava eles escondia...

AD Eles ---- que foi achado ----prefeitura foi o Pedro que fez, madeira com vidro pra poder expôr.Veio o

pessoal levou aqui, eu acho que ainda tinha----

HI Não, tá no Museu, tá no Museu...

VJL Que pessoal é esse?

AD Tá no Museu mas não tá tudo...

HI Roubaram tudo...

HOMEM Foi---- uns potes, praticamente um pote inteiro, um pote, e foi umas cambuca assim, ó, foi

outro pote desse tamanho...

AD Tinha um areia também, né, que ---- passava pra mudar de cor.

HOMEM Foi, isso, foi tudo junto, então, eu sei porque eu o último dia que o Julinho teve aqui em casa e

tal eu não queria deixar levar queria que ficar aqui depois o Julinho foi embora...

JC Ele e , como é que é o Sargento Veloso...

HOMEM Aí, ele ficou meio com raiva foi quando ele saiu, foi embora, "Ah, vocês não deixa levar, o que

é que tem que isso e aquilo".Eu falei"Pai quem vai caçar isso pra robar aqui, ---- segura ele".

Depois peguei o caminhão botei os pote tudo dentro do caminhão, cheguei e entreguei lá na

porta deles.Aí entregamo lá e deixamo por lá.De lá não tá o tanto que nós levou, eu tenho

certeza que não tá de jeito nenhum.

JC ----

VJL Porque no Museu tem pouca coisa.

HOMEM Mais é, ó, tudo que tava lá eles tiraram.

JC Mas era----pote...

HOMEM Eles ----lá no Museu, é aqui, aqui vem muitos colégio que vêm aqui, os alunos tinha um

pedaço de cabeça assim, não tinha?

HI Tinha.

HOMEM Tinha uma outra cambuca de barro assim, ó, igual a tigela, os aluno levou també, e fora que

muita gente pegou, levou, é osso, é dente, muitos dentes, desapareceu com isso, agora eu só sei

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dizer que eu já vi 'lá no Museu assim que o Julinho montou aquela exposição lá, deixou lá e---

-tá os pote lá mas não tão os que saiu daqui...

AD Depois da prefeitura que isso...

HOMEM Depois o Doutor João entrou e não quis nem saber daquilo, largou tudo lá.

HI Eu fui no Doutor João duas vez pra ele me entregar aquilo e ele falou comigo: "Olha, eu não posso

mexer com isso não que isso na mão do governo, não posso mexer com isso".

HOMEM Ele não mexeu mas também não deixou estragar.

HI Não deixou estragar e não deixou trazer.

HOMEM Adianta?

AD Eu sei que tinha muita coisa, muito pote, muita cambuca, muito dente, osso.

HI Mas tinha tudo----

HOMEM E os outros que chegava aqui em casa e pegava pedaço de pote,----,pedaço grande assim de

osso, dente, muita gente----.

VJL Tá bom, mais uma vez eu gostaria de agradecer Seu Honório, vamos ver o que que vai dar isso aqui.Tá

bom?Obrigada Seu Honório, Obrigado Dona Jacira...

JC Um cafezinho o senhor gosta?

VJL Hein?

JC Um cafezinho o senhor gosta com doce ou sem doce?

VJL Sem doce.

HI Ou um leite gelado?

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

GUIA PARA ANÁLISE TIPOLÓGICA DE MATERIAL CERÂMICO

• NOME DO SÍTIO ARQUEOLÓGICO • SIGLA DO SÍTIO ARQUEOLÓGICO • RESPONSÁVEL PELA ANÁLISE • DATA • MATÉRIA PRIMA

o ORIGEM o GRANULOMETRIA o ANTIPLÁSTICO

§ GRANULOMETRIA • QUANTIDADE • DISTRIBUIÇÃO • ESPÉCIE

• MANUFATURA o TÉCNICA o TEMPERO

§ GRANULOMETRIA § QUANTIDADE § DISTRIBUIÇÃO § ESPÉCIE

o BANHO § ANTES DA QUEIMA § DEPOIS DA QUEIMA

o ENGOBO § ANTES DA QUEIMA

• TIPO • ESPESSURA

§ DEPOIS DA QUEIMA • TIPO • ESPESSURA

• QUEIMA o TEMPERATURA

§ INTERNA § EXTERNA

o NÚCLEO o TIPO

• NÚCLEO o ESPESSURA o COR

• SUPERFÍCIE o TRATAMENTO

§ INTERNO § EXTERNO

o COR § INTERNA § EXTERNA

• ACABAMENTO

o BANHO

§ ANTES DA QUEIMA

§ DEPOIS DA QUEIMA

o ENGOBO

§ ANTES DA QUEIMA

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§ DEPOIS DA QUEIMA

o APÊNDICE

§ ANTES DA QUEIMA

§ DEPOIS DA QUEIMA

• DECORAÇÃO

o PLÁSTICA

§ INTERNA

• BASE

• BOJO

• PESCOÇO

• BORDA

• LÁBIO

• APÊNDICE

§ EXTERNA

• BASE

• BOJO

• PESCOÇO

• BORDA

• LÁBIO

• APÊNDICE

o PICTÓRICA

§ INTERNA

• BASE

• BOJO

• PESCOÇO

• BORDA

• LÁBIO

• APÊNDICE

§ EXTERNA

• BASE

• BOJO

• PESCOÇO

• BORDA

• LÁBIO

• APÊNDICE

• TEXTURA

o INTERNA

§ POROSIDADE

§ PERMEABILIDADE

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§ BOLHA

§ RACHADURA

o EXTERNA

§ POROSIDADE

§ PERMEABILIDADE

§ BOLHA

§ RACHADURA

o NÙCLEO

§ POROSIDADE

§ PERMEABILIDADE

§ BOLHA

§ RACHADURA

• DUREZA

o INTERNA

§ BASE

§ BOJO

§ PESCOÇO

§ BORDA

§ LÁBIO

§ APÊNDICE

o EXTERNA

§ BASE

§ BOJO

§ PESCOÇO

§ BORDA

§ LÁBIO

§ APÊNDICE

• FRATURA • EROSÃO • FORMA

o BASE § TIPO § ESPESSURA § DIÂMETRO

o BOJO § TIPO § ESPESSURA § DIÂMETRO

o PESCOÇO § TIPO § ESPESSURA § DIÂMETRO

o BORDA § TIPO § ESPESSURA § DIÂMETRO

o LÁBIO

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§ TIPO § ESPESSURA § DIÂMETRO

o BOCA § TIPO § ESPESSURA § DIÂMETRO

o APÊNDICE § TIPO § ESPESSURA § DIÂMETRO

• MARCAS DE USO • FUNÇÃO • INCRUSTAÇÕES PÓS-DEPOSICIONAIS

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO SÍTIO ARQUEOLÓGICO

SIGLAS

ANÁLISE CERÂMICA

Conjunto número 0

• manufatura do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• pasta • tempero

tipo -; distribuição -;

• núcleo espessura -; cor -;

• forma do lábio -; da boca -; da borda -; do bojo -; da base -;

• espessura do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• tratamento de superfície interna do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• tratamento de superfície externa do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• coloração interna do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• coloração externa do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• restos residuais internos -; externos -;

• erosão

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• fratura • textura • dureza interna

do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• dureza externa do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• queima -; • marcas de uso interna

do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -;

• marcas de uso externa do lábio -; da borda -; do bojo -; da base -; reconstituição -;

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

LEGISLAÇÃO

DECRETO NÚMERO 426

de 24 de julho de 1845

(Collecção das leis do Imperio do Brasi, tomo 8o, parte 2a, secção 25a, pp. 86-96, 1845)

Contêm o Regulamento ácerca das Missões de catechese, e civilisação dos Indios Hei por bem, Tendo ouvido o Meu Conselho d’Estado, mandar que se observe o Regulamento seguinte. Artigo 1o Haverá em todas as Províncias hum Diretor Geral de Indios, que será de nomeação do

Imperador. Compete-lhe: Parágrafo 1o Examinar o estado, em que se achão as Aldâs actualmente estabelecidas; as

occupações habituaes dos Indios, que nellas se conservão; suas inclinações, e propensões; seu desenvolvimento industrial; sua população, assim originária, como mistiça; e as causas, que tem incluido em seus processos, ou em sua decadencia.

Parágrafo 2o Indagar os recursos, que offerecem para a lavoura, e commercio, os lugares, em que estão collocadas as Aldêas; e informar ao Governo Imperial sobre a conveniencia de sua conservação, ou remoção, ou reunião de duas, ou mais, em huma só.

Parágrafo 3o Precaver que as remoções não sejão violentos os Indios, que fizerem ficar nas mesmas terrar, quando tenhão bom comportamento, e apresentem hum modo de vida industrial, principalmente de agricultura. neste ultimo caso, e em quanto bem se comportarem, lhes será mantido, e ás viuvas, o usofruto do terreno, que estejão na posse de cultivar.

Parágrafo 4o Indicar ao Governo Imperial o destino, que se deve das ás terras das Alêas, que tenhão sido abandonadas pelos Indios, ou que o sejão em virtude do Parágrafo 2o deste artigo. O proveito, que se tirar da applicação dessas terras, será empregado em beneficio dos Indios da Provincia.

Parágrafo 5o Indagar o modo, por que grangeão os Indios as terras, que lhes tem sido dadas; e se estão occupadas por outrem, e com que titulo.

Parágrafo 6o Mandar proceder ao arrolamento de todos os Indios aldeados,com declaração de suas origens, suas linguas, idades, e profissões. Este arrolamento será renovado todos os quatro annos.

Parágrafo 7o Inquirir onde ha Indios, que vivão em hordas errantes; seus costumes, e linguas; e mandar Missionarios, que solicitará do Presidente da Provincia, quando já não estejão á sua disposição, os quaes lhes vão pregar a Religião de Jesus Christo, e as vantagens da vida social.

Parágrafo 8o Indagar se convirá fazel-os descer para as Aldêas actualmente existentes, ou estabelecel-os em separado; indicando em suas informações ao Governo Imperial o lugar, onde deve assentar-se a nova Aldêa.

Parágrafo 9o Diligenciar a edificação de igrejas, e de casas para a habitação assim dos Empregados da Aldêa, como dos mesmos Indios.

Parágrafo 10o Distribuir pelos Directores das Aldêas, e pelos Missionarios, que andarem nos lugares remotos, os objectos, que pelo Governo Imperial forem destinados para os Indios, assim para a agricultura, ou para o uso pessoas dos mesmos, como mantimentos, roupas, medicamentos, e os que forem proprios para attrahir-lhes o desejo do trato social; requisitando-os do Presidente da Provincia, segundo as Instruções, que tiver do Governo Imperial.

Parágrafo 11o Propor ao Presidente da Provincia a demarcação, que devem ter os Districtos das Aldêas, e fazer demarcar as terras, que, na fórma do Parágrafo 15o deste Artigo, e do Parágrafo 2o do Artigo 2o, forem dadas aos Indios. Se a Aldêa

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já estiver estabelecida, e existir em lugar povoado, o Districto não se estenderá alêm dos limites das terras originariamente concedidas á mesma.

Parágrafo 12o Examinar quaes são as Aldêas, que precisão de ser enimadas com plantações em commum, e determinar a porção de terras, que deve ficar reservada para essas plantações, assim como a porção das que possão ser arrendadas, quando, attenta ainda a pequena população, não possão os Indios aproveital-as todas.

Parágrafo 13o Arrendar por tres annos as terras, que para isso forem destinadas, procedendo ás mais miudas investigações sobre o bom comportamento dos que as pretenderem, e sobre as posses, que tem. Nestes arrendamentos não se comprehende a faculdade de derrubar matos, para o que será necessario o concenso do Presidente, que será expresso no contracto, com declaração dos lugares, onde os possão derrubar.

Parágrafo 14o Examinar quaes são as Aldêas, onde , pelo seu adiantamento, se possão aforar terrar para casas de habitação; informar ao Governo Imperial com quantitativo do foro; e aforal-as segundo as Instrucções, que receber. Não são permittidos aforamentos para cultura.

Parágrafo 15o Informar ao Governo Imperial ácerca daquelles Indios, que, por seu bom comportamento, e desenvolvimento industrial, mereção se lhes concedão; terras separadas das da Aldêa para suas grangearias particulares. Estes indios não adquirem a propriedade dessas terras, senão depois de doze annos, não interrompidos, de boa cultura, o que se mencionará com especialidade nos relatorios annuaes; e no fim delles poderão obter Carte de Sesmaria. Se por morte do concessionario não se acharem completos os doze annos, sua viuva, e na sua falta seus filhos, poderão alcançar a Sesmaria, se, alêm do bom comportamento, e continuação de boa cultura, aquella preencher o tempo que faltar, e estes a grangearem pelo duplo deste tempo, com tanto que este nem passe de oito annos, e nem menos de quinze o das diversas posses.

Parágrafo 16o Dar licença ás pessoas, que quizerem ir negociar nas Aldêas novamente creadas, com estabelecimento ou fixo, ou volante; e retiral-a, quando o julgar conveniente. Quanto ás que já estão estabelecidas, examinará quaes as que estão nas circunmstancias de precisarem desta protecção; e as declarará sujeitas a esta diposição, com dependencia da Approvação Imperial.

Parágrafo 17o Representar ao Presidente da provincia a necessidade, que possa haver, de alguma força Militar, que proteja as Aldêas, a qual poderá ter hum Regulamento especial.

Parágrafo 18o Propor á Assembléa Provincial a creação de Escolas de primeiras Letras para os lugares, onde não baste o Missionario para este ensino.

Parágrafo 19o Empregar todos os meios licitos, brandos, e suaves, para attrahir Indios ás Aldêas; e promover casamentos entre os mesmos, entre elles, e pessoas de outra raça.

Parágrafo 20o Esmerar-se em que lhes sejão explicadas as maximas da Religião Catholica, e ensinada a doutrina Christã, sem que se empregue nunca a força, e violencia; e em que não sejão os pais violentados a fazer baptisar seus filhos, convindo attrahil-os á Religião por meios brandos, e suasorios.

Parágrafo 21o Cuidar na introducção da Vaccina nas Aldêas, e facilitar-lhes todos os socorros nas epidemias.

Parágrafo 22o Corresponder-se com os Missionarios, de quem receberá todos os esclarecimentos para a catechese, e civilisação dos Indios, providenciando no que couber em suas faculdades; e com todas as Autoridades, por quem possa ser auxiliado.

Parágrafo 23o Vigiar na segurança, e tranquilidade das Aldêas, e seus districtos, requerendo, ou constituindo procurador para requerer perante as Justiças, e requisitando das Autoridades competentes as providencias necessarias.

Parágrafo 24o Indagar se nas Aldêas, e seus districtos, morão pessoas de caracter rixoso, e de máos costumes, ou que introduzão bebidas esperituosas, ou que tenhão enganado aos Indios com lesão enorme; e fazel-as expulsar até cinco légoas fóra dos limites dos districtos.

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Parágrafo 25o Informar-se dos meios de subsistencia, que tem as Aldêas, para providenciar que não sobrevenha alguma fome, que seja causa de que os Indios abalem para os matos, ou se derramem pelas Fazendas, e Povoações.

Parágrafo 26o Promover o estabelecimento de officinas de Artes machanicas, com preferencia das que se prestão ás primeiras necessidades da vida; e que sejão nellas admitidos os Indios, segundo as propensões, que mostrarem.

Parágrafo 27o Indagar quaes as produções do lugar de mais facil cultura, e de mais proveito; esmerando-se em fazer adoptar aquelle genero de trabalho, e modo de vida, que offereça mais facilidade, e á que os Indios mais prontamente se acostumem.

Parágrafo 28o Exercer toda a vigilancia em que não sejão os Indios constrangidos a servir a particulares; e inquirir se são pagos de seus jornaes, quando chamados para o serviço da Aldêa, ou qualquer serviço publico; e em geral que sejão religiosamente cumpridos de ambas as partes os contractos, que com elles se fizerem.

Parágrafo 29o Vigiar que não sejão os Indios avexados com exercicios militares, procurando que se lhes dê aquella instrucção, que permitir o seu estado de civilisação, suas occupações diarias, e seus habitos, e costumes, os quaes não devem ser aberta, e desabridamente contrariados.

Parágrafo 30o Fiscalisar as rendas das Aldêas, quaesquer que sejão suas fontes; e exercer vigilante inspecção sobre as producções das lavouras, pescadas, e extracções de drogas, e de outro qualquer ramo da industria, e em geral sobre todos os objectos destinados para o uso, e consumo das Aldêas.

Parágrafo 31o Applicar os dinheiros, e outros quaesquer objectos, segundo as necessidades das Aldêas, e na conformidade das Ordens do Governo Imperial, dando huma conta circunstanciada todos os annos, e todas as vezes que huma urgente necessidade o obrigue a fazer alguma despeza extraordinária, da applicação, que houver resoluto.

Parágrafo 32o Servir de Procurador dos Indios, requerendo, ou nomeando Procurador para requerer em nome dos mesmos perante as Justiças, e mais Autoridades.

Parágrafo 33o Propor ao Presidente da provincia o Director da Aldêa, o Thesoureiro, Almoxarife, e o Cirurgião, preferindo-se para estes Empregos os casados aos solteiros; suspender os tres ultimos, e em geral a todos os que estão empregados no serviço das Aldêas, nomeando interinamente quem os substitua, e dando parte immediatamente ao Presidente, ou Director da Aldêa, segundo pertencer a nomeação ao primeiro, ou ao segundo.

Parágrafo 34o Organizar a Tabella dos vencimentos dos Pedestres, e dos salarios dos officiaes de officios, que estiverem no serviço das Aldêas; e leval-a ao conhecimento do Governo Imperial para sua approvação.

Parágrafo 35o Approvar, e mandar pôr em execução provisoriamente a Tabella, organisada pelos Directores das Aldêas, dos jornaes, que devem ganhar os Indios, que forem chamados para o serviço das mesmas, ou qualquer outro serviço publico; levando-a ao conhecimento do Governo Imperial para sua final aprovação.

Parágrafo 36o Propor ao Governo imperial os Regulamentos especiaes para o regimen da Aldêas, e as instrucções convenientes para o desenvolvimento de sua industria; tendo atenção ao estado de civilização dos Indios, sua indole, e caracter; às necessidades dos lugares, em que se acharem ellas estabelecidas; às producções do Paiz, e às proporções, que o mesmo offerece para o seu asiantamento moral, e material.

Parágrafo 37o Apresentar todos os annos ao Governo imperial o Orçamento da receita, e despeza das Aldêas, e hum Relatório circunstanciado do seu estado em população, instrucção, e industria, com huma exposição miuda da execução das disposições do regulamento; exigindo dos Directores das Aldêas outros iguaes, que o habilitem a estabelecer o Governo sobre os progressos, ou decadencia das mesmas, e as causas que para isso tem ocorrido; e apontado as providencias, que convenha ser adoptadas.

Parágrafo 38o Expor ao Governo Imperial os inconvenientes, que tenha encontrado na execução deste Regulamento, e de outros, que houver de fazer, indicando as

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medidas, que julgar apropriadas para se conseguir o grande fim da catechese, e civilisação dos Indios.

Artigo 2o Haverá em todas as Aldêas hum Director, que será de nomeação do Presidente da Provincia, sobre propostas do Director Geral. Compete-lhe: Parágrafo 1o Informar ao Director Geral a necessidade, que possa haver de trabalhos em

commum, e a natureza destes; assim como sobre a parte dos productos desses trabalhos, que deva ser reservada para o uso commum dos Indios.

Parágrafo 2o Designar as terras, que devem ficar reservadas para as plantações em commum, depois de determinada a porção, que o deve ser pelo Director Geral; assim como as que devem ficar para as plantações particulares dos Indios, e as que possão ser arrendadas, Artigo 1o, Parágrafo 12o.

Parágrafo 3o Inspeccionar essas plantações, ou outros quaesquer trabalhos da Aldêa; e procurar consumo aos seus productos, depois de feitas as reservar necessarias

Parágrafo 4o Nomear quem substitua o Thesoureiro, ou Almoxarife, nos impedimentos imprevistos, e de caso repentino.

Parágrafo 5o Nomear os Indios para as plantações, ou outros trabalhos em commum, ou para qualquer serviço Publico; procurando repartir o trabalho com igualdade, e ir de accordo, quanto ser possa, com o Maioral dos mesmos Indios.

Parágrafo 6o Fazer entregar ao Thesoureiro, ou Almoxarife, os productos dos trabalhos dos Indios, os objectos obtidos em troca dos que forem vendidos, o dinheiro pertencente à Aldêa, qualquer que seja sua origem, e em geral todos os objectos destinados para a Aldêa.

Parágrafo 7o Distribuir os objectos, que forem applicados pelo Director Geral para os trabalhos communs, e particulares dos Indios; e os que forem destinados para animar, e premiar os Indios já aldeados, e attrahir os que ainda o não estejão.

Parágrafo 8o Applicar os dinheiros, e mais objectos, segundo as determinações do Director Geral; podendo, em casos urgentes, gastar, sob reponsabilidade, do dinheiro, que houver em caixa, até a quantia de cem mil réis, de que dará conta ao mesmo Director para sua aprovação.

Parágrafo 9o Nomear, suspender, e despedir os Pedestres e Officiaes de officios, que estiverem ao serviço da Aldêa, e determinar o serviço que devem fazer.

Parágrafo 10o Vigiar sobre a segurança, e tranquilidade da Aldêa, e seu districto; podendo, em casos menores, reter em prisão, até seis dias, o que a perturbar, sendo Indio; e não sendo, fazel-o expulsar para fóra da Aldêa, e até do seu districto: e em casos maiores, prender, e remetter às Justiças ordinárias com todas as indicações, que esclareção a verdade.

Parágrafo 11o Requerer às Autoridades policiais contra os que, tendo sido expulsos em virtude do Parágrafo antecedente, ou do Parágrafo 24o do Artigo 1o, se estabelecerem dentro dos limites declarados no mandado de despejo, ou não quirão obedecer a este.

Parágrafo 12o Ter debaixo de suas ordens a força Militar, que se houver de mandar collocar na Aldêa, e seu districto; representando a necessidade, que della possa haver, ao Director Geral, conformando-se com as instrucções, que receber, e com o Regulamento Especial do Parágrafo 17o do Artigo 1o.

Parágrafo 13o Alistar os Indios, que estiverem em estado de prestar algum serviço militar, e acostumal-os alguns exercicios, animando com dadivas aos que mostrarem mais gosto, e zelo pelo serviço, e tendo todo o cuidado em que não se desgostem por excesso de trabalho. Dará huma conta circunstanciada ao Director Geral das disposições, que encontrar, para ser levada ao conhecimento do Governo Imperial, que resolverá sobre a oportunidade de se crearem algumas Companhias, as quaes poderão ter huma organisação particular.

Parágrafo 14o Procurar que sejão demarcadas as terras dadas aos Indios, e proceder à demarcação das porções das mesmas, que, em virtude deste regulamento, tenhão de ser demarcadas dentro dos seus limites.

Parágrafo 15o Esmerar-se em que as Festas tanto Civis, como Religiosas, se fação com a maior pompa, e apparato, que ser possa; procurando introduzir nas Aldêas o gosto da música instrumental.

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Parágrafo 16o Servir de Procurador dos Indios, podendo nomear quem faça as suas vezes para requerer perante as justiças, e outras Autoridades.

Parágrafo 17o Dar parte todos os trimestres ao Director Geral dos acontecimentos mais notaveis na Aldêa, e fazer hum Relatório annual do estado, em que se ella acha, com declaração da execução, que tem tido as disposições deste Regulamento, e com o orçamento da receita e despesa para o anno seguinte.

Parágrafo 18o Exercer as funcções do Artigo 1o, desde o Parágrafo 1o até o Parágrafo 9o, e desde o parágrafo 19o até o Parágrafo 30o, entendendo-se que suas faculdades são restrictas à Aldêa, de que he Director; e que em lugar do Presidente, ou Governador Imperial, deve dirigir-se ao Director Geral da provincia.

Artigo 3o Ao Thesoureiro compete: Parágrafo 1o Receber os dinheiros pertencentes à Aldêa qualquer que seja a origem

d’onde provenha, recolhendo-os em huma caixa, de que o Director da Aldêa terá huma chave; assim como receber todos os objectos, que forem destinados para o serviço, e uso da Aldêa.

Parágrafo 2o Ter a seu cargo a escripturação, e contabilidade, para o que terá os livros proprios fornecidos pela Fazenda Publica.

Parágrafo 3o Ajudar ao Director da Aldêa na sua correspondencia, particularmente na confecção dos Mappas Estatisticos.

Parágrafo 4o Fazer os pagamentos, e entregar os objectos, que estiverem debaixo de sua guarda, segundo as ordens, que receber do Director Geral, e as determinações do Director da Aldêa.

Parágrafo 5o Dar todos os annos huma conta circunstanciada ao Director Geral de todos os dinheiros, e objectos que houver recebido; dos empegos, que fez; e das ordens, que os autorisarão.

Parágrafo 6o Escrever em todos os actos, que houverem de ser remetidos às Justiças, e nos termos das demarcações das porçoes de terras, a que houver de proceder o Director da Aldêa dentro dos limites das terras da Aldêa.

Parágrafo 7o Substituir ao Director da Aldêa em seus impedimentos imprevistos, e de caso repentino; dando parte immediatamente ao Director Geral para prover interinamente.

Artigo 4o Quando o estado da Aldêa não exija hum Thesoureiro, hum Almoxarife receberá todos os objectos, que forem destinados para a Aldêa, e os entregará segundo as ordens do Director da mesma, dando annualmente conta ao Director Geral; e o Director da Ald6ea receberá os dinheiros, que à mesma pertencerem.

Artigo 5o O Cirurgião tem a seu cargo a botica, e os instrumentos cirurgicos; e cuidará da enfermaria com hum Enfermeiro, que será hum dos Pedestres, que proporá ao Director da Aldêa.

Artigo 6o Haverá hum Missionario nas Aldêas novamente creadas, e nas que se acharem estabelecidas em lugares remotos, ou onde conste que andão Indios errantes. Compete-lhe: Parágrafo 1o Instruir aos Indios nas maximas da Religiào Catholica, e ensinar-lhes a

Doutrina Christã. Parágrafo 2o Servir da Parocho na Aldêa, e seu Districto, em quanto não se crear parochia. Parágrafo 3o Fazer o arrolamento de todos os Indios pertencentes à Aldêa, e seu Districto,

com declaração dos que morão nas Aldêas, e fóra dellas; dos baptisados, idades, e profissões; e dos nascimentos, e obitos, e casamentos: para o que lhe serão fornecidos os livros pelo Bispo Diocesano, pela caixa das obras Pias.

Parágrafo 4o Dar parte ao Dispo Diocesano, por intermedio do Director Geral da Provincia, do estado espiritual da Aldêa; representando as necessidades, que encontrar, e apontando as providencias, que lhe parecerem mais proprias para ocorrer a ellas.

Parágrafo 5o Representar ao Director Geral, por intermedio da Aldêa, a necessidade, que possa haver de outro Missionario, que o ajude, principalmente se houver nas visinhanças Indios errantes, que seja mister chamar à Religião, e à Sociedade.

Parágrafo 6o Ensinar a lêr, escrever, e contar aos meninos, e ainda aos adultos, que sem violencia se dispuzerem a adquirir essa instrucção.

Parágrafo 7o Substituir ao Director da Aldêa, quando esteja impedido o Thesoureiro, e nos casos, em que este o póde substituir.

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Artigo 7o A creação de Thesoureiro, Almoxarife, e Cirurgião, dependerá do estado, em que se achar a Aldêa, e da sua importancia; e do lugar, em que estiver collocada: sobre o que o Director Geral informará ao Governo Imperial para resolver. O Cirurgião poderá servir de Thesoureiro, se as circunstancias o permitirem. Seus vencimentos, e os dos Missionarios, serão fixados segundo as informações dos Directores Geraes.

Artigo 8o A creação dos Pedestres, e Officiaes de officios; seu numero, salario, organisação, e a natureza dos officios, dependerão das circunstancias locaes segundo as informações dos Directores Geraes.

Artigo 9o As informações de que trata o Artigo antecedente, as do Artigo 7o, e as do Artigo 1o, Parágrafos 2o, 4o, 8o, 14o, 15o, 16o, 34o, 35o, 36o, 37o, serão transmitidas ao Governo Imperial por intermedio do Presidente da Provincia, que as acompanhará com as observações convenientes.

Artigo 10o Nos impedimentos do Director Geral o Presidente da Provincia nomeará quem o substitua; e nos impedimentos do Director da Aldêa, que não sejão imprevistos, e de caso repentino, fará a nomeação o Director Geral.

Artigo 11o Em quanto servirem, terão a Graduação Honoraria, o Director Geral de Brigadeiro, o Director da Aldêa de Tenente Coronel, e o Thesoureiro de Capitão, e usarão do uniforme, que se acha estabelecido para o Estado Maior do Exercito.

José Carlos Pereira d’Almeida Torres, Conselheiro d’Estado, Ministro e Secretario d’Estado dos Negocios do Imperio, assim o tenha entendido, e faça executar com os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro em 24 de julho de 1845, vigesimo quarto da Independencia, e do Imperio. Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador. José Carlos Pereira d’Almeida Torres

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193

PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

SÍTIO ARQUEOLÓGICO TOCA DOS ANÕES

VRB-MG-005 - MG-CP-2

ANÁLISE CERÂMICA

Conjunto 1

• manufatura - acordelada • pasta - com distribuição regular do tempero, não apresenta bolhas e não permite fratura com facilidade • tempero - grãos de quartzo de tamanho regular em torno de 1 mm e com arestas arredondadas, o que

pode indicar serem provenientes de material rolado e não preparado para servir de tempero • distribuição do tempero - o tempero está bem distribuído, fato que provavelmente evitou a presença de

bolhas e rachaduras • núcleo - de cor negra e com espessura regular variando entre 2 e 3 mm • forma do lábio - arredondado • forma da boca - circular • forma da borda - introvertida • forma do bojo - ovóide • forma da base - alto grau de convexibilidade, caracterizando uma base cônica • espessura - a espessura do vasilhame é homogênea e varia entre 12 e 16 mm • tratamento de superfície interna - alisada • tratamento de superfície externa - alisada • coloração - tons acinzentados, tendo sua parte meso-inferior uma coloração em tons de cinza escuro

para preto • resíduos - aparecem dois tipos de resíduos: o primeiro seria uma fuligem em seu terço meso-inferior,

com espessura podendo chegar a 1 mm e o segundo seriam restos vegetais incrustrados em toda a parte externa do vasilhame

• erosão - aparecem principalmente em seu terço superior. Esta erosão representa a perda de uma fina camada, de aproximadamente 1 mm, da superfície externa

• fratura - irregular, provavelmente em decorrência da pasta bem preparada, sem bolhas, com uma boa distribuição do tempero e uma queima com temperatura regular durante todo o processo

• textura - porosidade e permeabilidade baixa • dureza - entre 3 e 5 da escala de Mohz, embora a maioria dos fragmentos apresentem dureza 4 • queima - provavelmente realizada em ambiente redutor, sem a presença de oxigênio

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

SÍTIO ARQUEOLÓGICO TOCA DOS ANÕES

VRB-MG-005 - MG-CP-2

ANÁLISE CERÂMICA

Conjunto 2

• manufatura -; • pasta - ; • tempero - ; • distribuição - ; • núcleo - ; • forma do lábio - ; liso, não apresentando decoração • forma da boca - ; • forma da borda - ; introvertida, reconstituida em aproximadamente 90 % • forma do bojo - ; apenas uma pequena parte foi possível reconstituir • forma da base - ; • espessura - ; • tratamento de superfície interna - ; • tratamento de superfície externa - ; • coloração interna - ; tons marrons-avermelhados • coloração externa -; tons amarelos, aparecendo alguns pontos em tons de preto, cinza e marrom. Na

medida em que aproxima-se da base os tons tornam-se mais escuros. • resíduos -; • erosão -; na parte externa, chegando a atingir 40 % do seu bojo e em alguns momentos atinge até o

núcleo • fratura -; • textura -; • dureza -; • queima -;

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

SÍTIO ARQUEOLÓGICO TOCA DOS ANÕES

VRB-MG-005 - MG-CP-2

ANÁLISE CERÂMICA

Conjunto 3

• manufatura -; • pasta - ; • tempero - ; • distribuição - ; • núcleo - ; • forma do lábio - ; • forma da boca - ; • forma da borda - ; trata-se de um conjunto com uma borda do tipo extrovertida, apresentando decoração

plástica do tipo ungulada, em duas fileiras, e com traços relativamente próximos. Reconstituída em aproximadamente em 1/3 de seu aspecto original.

• forma do bojo - ; com aproximadamente 2/5 de seu formato reconstituído, provavelmente ovóide, possui contorno infletido. A coloração predominante é em tons de amarelo com manchas em tons de cinza, concentrando-se, a maioria delas, em seu terço inferior. Este bojo apresenta uma série de marcas de uso, cinzas e restos vegetais.

• forma da base - ; não podemos fazer qualquer inferência, por não ter sido recuperado, durante as escavações, restos da mesma.

• espessura - ; • tratamento de superfície interna - ; verifica-se a presença de erosão e de restos pós-deposicionais.

Como na borda, a coloração predominante é da própria matéria-prima mesclada a várias manchas em tons de branco, provavelmente oriundos da ação de fungos.

• tratamento de superfície externa - ; não apresenta decoração. Observa-se um desgaste, com predomínio da coloração em tons de cinza, característica da própria matéria-prima do vasilhame. Destacamos a presença de pontos em tons de branco provavelmente devido a ação de fungos.

• coloração -; tons amarelados e avermelhados • resíduos -; restos vegetais impregnados na superfície externa do bojo • erosão -; intenso desgaste interno e externo • fratura -; horizontal • textura -; • dureza -; • queima -; • marcas - ; no que refere-se aos restos vegetais, há dois pontos que merecem destaque: os que estavam

na superfície no momento da queima e os que aderiram esta superfície após a queima. Além disso, destaca-se uma mancha em tom de cinza, provavelmente devido à queima, e temos também a presença de rachaduras horizontais à borda.

• reconstituição - ; aproximadamente 1/3 de seu aspecto original.

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196

PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

SÍTIO ARQUEOLÓGICO TOCA DOS ANÕES

VRB-MG-005 - MG-CP-2

ANÁLISE CERÂMICA

Conjunto 4

• manufatura -; • pasta - ; • tempero - ; • distribuição - ; • núcleo - ; • forma do lábio - ; arredondado, liso • forma da boca - ; • forma da borda - ; extrovertida, lisa • forma do bojo - ; • forma da base - ; • espessura - ; • tratamento de superfície interna - ; bem alisado • tratamento de superfície externa - ; bem alisado • coloração -; tons de cinza escuro • resíduos -; vegetais na parte interna • erosão -; • fratura -; • textura -; • dureza -; • queima -;

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Material Vegetal

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Formas Cerâmica

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Tabelas

PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO SÍTIO ARQUEOLÓGICO TOCA DOS ANÕES - VRB-MG-005 (MG-CP-2) CERÂMICA

conjunto

base bojo borda total

1 8 109 6 123

2 123 9 132

3 69 5 74

4 33 3 36

5 16 2 18

6 12 12

7 19 19

8 5 141 3 149

9 12 5 17

* 14 149 44 149

** 567 625

total 27 1238 89 1354 * - fragmentos não enquadrados nos conjuntos definidos até o momento ** - fragmentos de 1 a 3 cm

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROADO

SÍTIO ARQUEOLÓGICO TOCA DOS ANÕES - VRB-MG-005 (MG-CP-2)

DENTES

frag

men

to

norm

al

criança

desgaste

total

desgaste

cárie

cálculo

plano

inclinad

o

esmalte

den

tina

distal

lingual

I 4

1

11

16

4

7 9

2 1

1

4 2

C

2

3

5

1

2 3

2

PM

1 2

7

10

7

7

7

M

2 1

3 10

16

4

6 9

1

1 3

4

total

7 6

3 31 47 16

15

28

3 1

2 3

17

2

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PROGRAMA ARQUEOLÓGICO PURI-COROAD0

SÍTIO ARQUEOLÓGICO DA GALHADA - VRB-MG-001 (MG-CP-1)

DENTES

frag

men

to

norm

al

criança

desgaste

total

desgaste

cárie

cálculo

plano

inclinad

o

esmalte

den

tina

vestibular

lingual

I

C

1

2

3

PM

1

2 1

4

1

1

1

1

M

3 6

11

2 22

2

2 2

total

3 8

15

3 29

1 2

1 2

2

1 1