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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X DA MILITÂNCIA FEMINISTA AO DOCUMENTÁRIO CONTEMPORÂNEO: A TRAJETÓRIA INCOMUM DE HELENA SOLBERG Mariana Ribeiro da Silva Tavares 1 Resumo: Este trabalho aborda os dezesseis filmes (quatorze documentários e duas ficções) realizados pela cineasta brasileira Helena Solberg nas últimas seis décadas. Questões pessoais vividas pela cineasta e suas contemporâneas de colégio no RJ são abordadas em seu primeiro filme A Entrevista (1966). O deslocamento para os Estados Unidos propicia reflexões históricas, sociais e políticas sobre a ação de mulheres estadunidenses e inglesas no ambiente doméstico e no espaço público originando The Emerging Woman (A Nova Mulher), de 1974. Essas investigações se estendem para Venezuela, México, Bolívia e Argentina, originando o primeiro documentário feminista latino-americano The Double Day (A dupla jornada), 1975 a abordar a mulher no ambiente de trabalho. Os deslocamentos geográficos tem continuidade em produções subsequentes, resultando numa trajetória incomum na qual o posicionamento político das mulheres frente à exploração sexual, no trabalho e política e mais recentemente, ao cerceamento do próprio corpo (como a questão da ilegalidade do aborto no Brasil) são alvo das investigações da cineasta. Palavras-chave: Cinema feminista. Documentário Cinema contemporâneo. A cineasta brasileira Helena Solberg apresenta trajetória singular no contexto da produção documental do país com filmografia que perpassa o cinema novo, a militância feminista na América Latina e nos Estados Unidos, a ficção e o documentário contemporâneo. Veremos neste artigo que as questões femininas confrontadas ao contexto social, politico e econômico nas Américas são recorrentes em seu trabalho. Em 1957 Helena ingressa na PUC-RJ para cursar Línguas Neo-Latinas onde convive com estudantes como Cacá Diegues, David Neves e Arnaldo Jabor. Com eles compartilha o trabalho em O Metropolitano suplemento do jornal Diário de Notícias, financiado pela UNE. Também frequentam as sessões na Cinemateca do MAM Museu de Arte Moderna, no Rio de Janeiro, onde assistem filmes do Neorrealismo italiano, da Nouvelle Vague francesa e outras filmografias. Nesse período, Solberg trabalha como continuísta em Capitu, 1968, de Paulo César Saraceni e como assistente de direção em A Mulher de todos, 1969, de Rogério Sganzerla. A convivência com expoentes desta geração possibilita à estudante de Neo-Latinas participar de um contexto de criação que impulsiona à experimentação audiovisual e conduz ao seu filme de estreia como diretora, o documentário em curta-metragem, A Entrevista, 1966. 1 Pós-Doutoranda (Bolsa PNPD-CAPES) no PPG Artes Programa de Pós Graduação da Escola de Belas Artes Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.

DA MILITÂNCIA FEMINISTA AO DOCUMENTÁRIO … · ... Belo Horizonte, ... A autonomia na escolha do tema – a condição da mulher carioca, de classe ... Nesta articulação da montagem,

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

DA MILITÂNCIA FEMINISTA AO DOCUMENTÁRIO CONTEMPORÂNEO: A

TRAJETÓRIA INCOMUM DE HELENA SOLBERG

Mariana Ribeiro da Silva Tavares1

Resumo: Este trabalho aborda os dezesseis filmes (quatorze documentários e duas ficções)

realizados pela cineasta brasileira Helena Solberg nas últimas seis décadas. Questões pessoais

vividas pela cineasta e suas contemporâneas de colégio no RJ são abordadas em seu primeiro filme

A Entrevista (1966). O deslocamento para os Estados Unidos propicia reflexões históricas, sociais e

políticas sobre a ação de mulheres estadunidenses e inglesas no ambiente doméstico e no espaço

público originando The Emerging Woman (A Nova Mulher), de 1974. Essas investigações se

estendem para Venezuela, México, Bolívia e Argentina, originando o primeiro

documentário feminista latino-americano – The Double Day (A dupla jornada), 1975 a abordar a

mulher no ambiente de trabalho. Os deslocamentos geográficos tem continuidade em produções

subsequentes, resultando numa trajetória incomum na qual o posicionamento político das mulheres

frente à exploração sexual, no trabalho e política e mais recentemente, ao cerceamento do próprio

corpo (como a questão da ilegalidade do aborto no Brasil) são alvo das investigações da cineasta.

Palavras-chave: Cinema feminista. Documentário Cinema contemporâneo.

A cineasta brasileira Helena Solberg apresenta trajetória singular no contexto da produção

documental do país com filmografia que perpassa o cinema novo, a militância feminista na América

Latina e nos Estados Unidos, a ficção e o documentário contemporâneo. Veremos neste artigo que

as questões femininas confrontadas ao contexto social, politico e econômico nas Américas são

recorrentes em seu trabalho.

Em 1957 Helena ingressa na PUC-RJ para cursar Línguas Neo-Latinas onde convive com

estudantes como Cacá Diegues, David Neves e Arnaldo Jabor. Com eles compartilha o trabalho em

O Metropolitano – suplemento do jornal Diário de Notícias, financiado pela UNE. Também

frequentam as sessões na Cinemateca do MAM – Museu de Arte Moderna, no Rio de Janeiro, onde

assistem filmes do Neorrealismo italiano, da Nouvelle Vague francesa e outras filmografias. Nesse

período, Solberg trabalha como continuísta em Capitu, 1968, de Paulo César Saraceni e como

assistente de direção em A Mulher de todos, 1969, de Rogério Sganzerla. A convivência com

expoentes desta geração possibilita à estudante de Neo-Latinas participar de um contexto de criação

que impulsiona à experimentação audiovisual e conduz ao seu filme de estreia como diretora, o

documentário em curta-metragem, A Entrevista, 1966.

1 Pós-Doutoranda (Bolsa PNPD-CAPES) no PPG Artes – Programa de Pós Graduação da Escola de Belas Artes –

Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.

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A concepção do filme é compartilhada em conversas com o cineasta Glauber Rocha que,

inclusive, avaliza o projeto para a obtenção de financiamento junto à Carteira de Auxílio à Industria

Cinematográfica (CAIC), que, naquele momento, apoiava as produções do novo cinema que surgia

no Brasil.

Mário Carneiro, que já havia fotografado O Padre e a Moça, 1965, de Joaquim Pedro de

Andrade, e Arraial do Cabo, 1959, dirigido por ele e Paulo César Sarraceni, dois filmes referenciais

para o movimento, assina a fotografia. A montagem fica a cargo de Rogério Sganzerla, que

participa do Cinema Novo e que se torna pouco depois, um dos principais nomes do Cinema

Marginal no Brasil.

A experimentação, a reflexividade, a encenação, a ambiguidade, as elipses temporais, a

ausência de narração off, a quase ausência de entrevistas em som direto, o uso da ficção e o

assincronismo entre sons e imagens apontam para uma singularidade estilística que irá marcar o

cinema de Solberg. A autonomia na escolha do tema – a condição da mulher carioca, de classe

média-alta – contraria a pauta cinemanovista que, com frequência, elegia como personagem “a

miséria de uma massa camponesa, sofredora e apática, não só do Nordeste brasileiro, como do

campesinato latino-americano e do Terceiro Mundo em geral” – como salientou Jean-Claude

Bernadet (BERNADET, 2003, p. 240).

Equipada com um gravador Nagra que ela mesma opera, a diretora entrevista 30 mulheres

que haviam sido suas contemporâneas de colégio. As conversas são gravadas ao longo do ano de

1964 e giram em torno das aspirações dessas mulheres na adolescência e suas atitudes em relação

ao casamento, sexualidade, virgindade, educação recebida dos pais, criação de filhos e engajamento

político. Neste mesmo ano, entidades femininas de perfil conservador, como a Campanha da

Mulher pela Democracia (CAMDE), setores da elite econômica dentre outros, organizam uma série

de marchas – Marcha da Família com Deus pela Liberdade – em resposta ao comício realizado no

Rio de Janeiro, em 13 de março de 1964, no qual o então presidente João Goulart anuncia seu

programa de reformas de base. Apoiada por boa parte da imprensa, a elite política e econômica

congrega segmentos da classe média, temerosos do “perigo comunista” e favoráveis à deposição do

Presidente da República.2

2 No dia 1º de abril de 1964, o presidente João Goulart seria deposto através de um golpe civil-militar.

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Parte significativa das jovens entrevistadas em A Entrevista pertence à esta elite e quando

interrogada no filme, revela sentimentos contraditórios e desinformação a respeito da realidade

social e política do país. Esta incoerência também se manifesta nos demais temas abordados. As

vozes das mulheres são montadas em over sobre imagens que reforçam o ritual de preparação para o

casamento em que uma noiva (interpretada por Glória Solberg) se veste de branco (ideal de pureza)

e se maqueia.

Nesta articulação da montagem, Solberg dá os primeiros passos na criação de um estilo

próprio que emerge em filmes posteriores. A Entrevista introduz imagens que farão parte de seu

arquivo pessoal: as bonecas aparecerem nesse primeiro filme em quartos de crianças, para em

filmes seguintes, surgir em vitrines de lojas (The Emerging Woman, 1974) ou esfaceladas (Carmen

Miranda, Bananas Is My Business, 1995).

Por fim, a contextualização do momento político – Marcha da Família com Deus pela

liberdade e o golpe militar de 1º de abril de 1964 – salienta outro procedimento recorrente em seu

cinema, que não se contenta em focar apenas os indivíduos. É preciso relacioná-los a um contexto

social, político e econômico.

O curta-metragem antecipa, do ponto de vista temático e formal, a Trilogia da Mulher

realizada em seguida, nos EUA, para onde Solberg se muda com a família em 1971. O primeiro

filme da trilogia é The Emerging Woman (A Nova Mulher, 1974), feito com mulheres do coletivo

International Women’s film Project criado para realizar filmes sobre temáticas feministas. Nesse

média-metragem, Solberg prossegue na utilização de elementos ficcionais para contar a história do

Movimento Feminista nos EUA e na Inglaterra. A ficção se manifesta no uso de vozes femininas na

interpretação de textos escritos na 1ª pessoa, por ativistas em 200 anos de história.

O diálogo criado no roteiro, entre a narração do filme e as interpretações do material original

escrito pelas militantes; o processo colaborativo de realização do International Women’s film

Project explicitados em imagens no início do documentário; a pesquisa de material de arquivo e o

poder de síntese do roteiro, ao percorrer, de forma pioneira em documentário, a trajetória das

mulheres nos EUA, fazem de The Emerging Woman um significativo documento histórico. No

mesmo ano, foi lançado o documentário Women’s rights in the U.S, an informal history (dir: Dan

Klugherz) com temática similar, mas sem a preocupação em percorrer a história com rigor

cronológico.

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The Emerging Woman é incluído como um dos filmes oficiais da Comissão Bicentenária

Americana, em 1976 – série de celebrações que homenageiam os eventos históricos que levaram à

criação dos Estados Unidos como república independente.

O filme é também a pedra fundamental do International Woman’s Film Project, coletivo de

mulheres de várias nacionalidades, que realiza também os próximos filmes da trilogia. O tema de

The Emerging Woman se estende para a América Latina e o coletivo para Argentina, México,

Venezuela e Bolívia, no intuito de registrar a condição da mulher de classe baixa no trabalho e em

casa. Esse processo resulta em seu primeiro longa-metragem, The Double Day (A dupla jornada,

1975).

O filme parte de uma hipótese: de que nos países subdesenvolvidos a necessidade de ligar a

opressão da mulher a uma análise econômica da sociedade se faz necessária. A maioria das

mulheres da América Latina é duas vezes oprimida: compartilha com os homens a opressão de

classe e, ao mesmo tempo, sofre opressão, por serem mulheres. Em The Double Day, pela primeira

vez, Solberg entrevista o “outro popular” ou o “outro de classe” (na acepção de Jean-Claude

Bernardet).

A limitação de tempo na montagem, feito para estrear na sessão de abertura da Primeira

Conferência Internacional da Mulher, na cidade do México, em 1975 e a articulação das entrevistas

e narração em voz over para comprovar a hipótese, fazem com que o documentário se assemelhe a

um debate entre mulheres dos países visitados.

A objetividade do tema se manifesta na forma que não abre espaço para os momentos

oníricos, a ficção, a oposição de significados e as imagens do universo autoral de Solberg. A

reflexividade é também evidenciada na apresentação da equipe de filmagem composta pelas

mulheres do coletivo, o que reforça a mulher no trabalho, exercendo funções comumente associadas

a equipes masculinas e insere o média-metragem no contexto da produção norte-americana de

documentários feministas da década de 1970 que eram fruto de trabalho colaborativo entre

mulheres.

O pesquisador estadunidense David William Foster acrescenta que The Double Day é

considerado o primeiro documentário latino-americano sobre o feminismo, no qual a cineasta

discute com as entrevistadas, o dia a dia no trabalho, demonstrando a natureza da dupla jornada,

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onde a primeira parte ocorre nas fábricas ou no campo e a segunda, no ambiente doméstico

(FOSTER, 2012, p.55).

Distante da pressão do tempo e com a liberdade de fazer o filme que desejava, Helena pôde

aproximar-se de seu universo poético, sem perder de vista, a análise histórica em Simplesmente

Jenny, 1977, feito a partir do material bruto de The Double Day.

O filme reverbera as mesmas questões mas se diferencia ao focar três personagens

femininas adolescentes – Jenny, Marly e Patrícia – estupradas e conduzidas à prostituição na

Bolívia. Presas em um reformatório para meninas, elas revelam consciência de sua condição, sem

perderem o ideal do casamento romântico, de se tornarem profissionais e terem acesso aos padrões

de consumo da classe média.

Os temas de The Double Day se repetem sob novo prisma, com mais liberdade na

articulação de seu universo poético. Observamos nesse terceiro filme da trilogia a transição para a

fase seguinte em que as relações políticas entre os Estados Unidos e a América Latina são

problematizadas, gerando seis documentários viabilizados e exibidos em Rede Pública Nacional de

Televisão naquele país, PBS (Public Broadcasting Service). São filmes que também utilizam

procedimentos do cinema militante, da reportagem televisiva e do documentário clássico

contemporâneo. Em geral, buscam identificar a ação da política externa estadunidense em apoio às

ditaduras latino-americanas nos anos de 1980. Questionam o papel da igreja Católica e identificam

a capacidade de mobilização dos civis frente aos regimes totalitários, como nos dez anos de ditadura

do General Augusto Pinochet no Chile (Chile, By Reason or By Force - Chile, pela Razão ou pela

Força, 1983) ou na mobilização popular na Nicarágua, contra os 45 anos de ditadura da família

Somoza, o que provoca a Revolução Sandinista (From the Ashes... Nicaragua Today/ Nicarágua

Hoje, 1982).

O primeiro da série é From The Ashes que marca o início da parceria com o produtor norte-

americano David Meyer e com a PBS. O longa parte das questões femininas ao eleger uma família

nicaraguense composta, em grande parte, por mulheres, para compreender, a partir do ponto de vista

dessa família, a Revolução Sandinista.

A reflexividade manifesta na voz over da própria cineasta (que não se identifica); a

apresentação da história da família Chavarría em fotografias de família; o uso de imagens de

arquivo de cine-jornais estadunidenses dos anos de 1940/1950; o uso de diversas vozes na

interpretação para o inglês, das entrevistas gravadas originalmente em espanhol; o elenco de

entrevistados entre trabalhadores das cidades e do interior, políticos e missionários fazem de From

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the Ashes... Nicaragua Today um dos documentários mais relevantes de sua filmografia. A

montagem acrescenta um material de arquivo significativo com os cine-jornais que contam a

relação histórica entre EUA e Nicarágua. Um fundamento que, na opinião da cineasta, contribue

para que o documentário ganhasse o “Oscar” da TV norte-americana: o National Emmy Award, em

1983, por Outstanding background analysis of a current story (excelente análise de fundo para uma

história atual).

From the Ashes... Nicaragua Today assim como os outros cinco filmes desta fase, são

concebidos e realizados em plena Guerra Fria, marcada pelo radicalismo da política anticomunista

do Presidente norte-americano Ronald Reagan, na África, Ásia, Europa e América Latina. A

diretora vivencia uma situação ímpar para uma realizadora latino-americana – a de poder viver e

trabalhar na América do Norte, com acesso à mecanismos internacionais de financiamento e

liberdade de expressão, sem paralelo entre seus contemporâneos latino-americanos que

permanecem na América do Sul, tendo de enfrentar a censura de regimes totalitários.

O reconhecimento do filme viabiliza a produção de dois projetos seguintes: Chile, By

Reason or By Force (Chile, pela razão ou pela força, 1983) e The Brazilian Connection, a struggle

for democracy (A Conexão Brasileira, a luta pela democracia, 1982/1983).

The Brazilian Connection introduz informações que despertam o interesse das audiências

norte-americanas. Cativa o espectador para, em seguida, conduzi-lo pela história do Brasil – os

governos dos Presidentes Getúlio Vargas e Juscelino Kubitscheck – e suas participações na

conformação da dívida externa brasileira. O Golpe Militar de 1964 é apresentado em imagens de

arquivo e narração off do âncora. É o filme de Helena Solberg que apresenta mais elementos do

jornalismo televisivo, com entrevistas de políticos, economistas e especialistas.

Após a realização, Solberg e sua equipe partem para o Chile para a cobertura do 10º

aniversário do governo do General Augusto Pinochet. A cobertura dá origem ao documentário

Chile, By Reason or By Force (Chile, pela razão ou pela força, 1983), realizado nas mesmas

condições de The Brazilian Connection (cronograma apertado e interferências da PBS quanto à

linguagem do filme). O filme realizado no Brasil, traz como âncora, o então editor-chefe do New

York Times, Warren Hoge, que havia trabalhado no Rio de Janeiro. Para o documentário sobre o

Chile, o jornalista John Dinges, que já tinha vasta experiência na cobertura de matérias sobre a

América Latina e havia trabalhado no jornal The Washington Post e, também, na revista Time.

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Ambos conferem credibilidade e, embora fossem uma exigência da rede de televisão, constatamos

que, através deles, está também a voz da diretora. As ideias, análises, e informações pesquisadas por

Solberg e Meyer em pareceria com esses jornalistas estão por trás das informações que a locução off

apresenta. Em última análise, o ponto de vista do âncora-narrador é também, o ponto de vista da

cineasta.

Outra interferência da PBS era a exigência de que os documentários apresentassem

diferentes pontos de vista - marca do jornalismo televisivo. Para a realização de The Brazilian

Connection, Helena e David entrevistam vinte profissionais que colaboram com suas opiniões sobre

as relações econômicas entre o Brasil e os EUA e sobre a estrutura política e econômica do Brasil

em 1982. O filme propõe amplo debate de ideias a respeito das relações entre os dois países e se

sustenta nas entrevistas, prendendo a audiência, que chega a solicitar à PBS, uma reprise, após sua

veiculação em rede nacional nos Estados Unidos.

Nos filmes políticos, a voz off é um elemento que conduz a narrativa, mas sem reivindicar o

discurso absoluto sobre os temas tratados. É uma voz que convive com outras, na composição de

painéis sobre as realidades investigadas. Desta forma é também estruturado, Portrait of a Terrorist

(Retrato de um terrorista, 1986).

O longa-metragem parte de um pretexto – o terrorismo – para abrir o leque a respeito dos

sucessivos atentados contra cidadãos e instituições norte-americanos no mundo, visando provocar a

reflexão das audiências no país, a respeito das causas desses atentados.

Nesse filme, excepcionalmente, Helena centra-se nos personagens que haviam vivido os

dois lados de um sequestro: um sequestrador - Fernando Gabeira3 e uma vítima de sequestro – o

então embaixador americano para o Brasil, Diego Asencio4 – para garantir a oposição de visões e

contribuir para o debate. O filme contrapõe as opiniões e, ao mesmo tempo, amplia as discussões ao

percorrer sucessivos atentados às instituições americanas no exterior, bem como o próprio conceito

de “terrorismo”.

3 Em 1969 Fernando Gabeira, integrante do MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de outubro) havia participado do

primeiro sequestro no mundo, de um diplomata americano, o embaixador Charles Elbrick que trabalhava na Embaixada

dos Estados Unidos na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. 4 Diego Asencio foi sequestrado junto com vários colegas pelo grupo guerrilheiro M19 em Bogotá, na Colômbia em

1980. Ficou cativo por mais de 60 dias, sendo libertado após extensas negociações que tiveram inclusive, ajuda do

governo cubano.

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A partir do panorama traçado pelo documentário que revisita a temática das relações

internacionais entre EUA e América Latina, a cineasta começa a encerrar o ciclo latino-americano

ao mesmo tempo em que lança o olhar sobre outras questões a respeito da região como a revisão do

papel da igreja Católica em The Forbidden Land (A Terra Proibida, 1990) e a relação das nações

indígenas com a terra em Home of the Brave (Berço dos Bravos, 1986). Ambos apresentam

discussões sobre as lutas/ mobilizações políticas de homens e mulheres do campo pela terra.

Em Home of the Brave a possibilidade de diálogo entre diversos povos indígenas do mundo

inteiro em torno dessas questões o insere num debate internacional. Nas filmagens, Helena e sua

equipe convivem durante uma semana, com uma família de índios Navajo no interior do país. No

centro da família, a índia Katherine Smith é acompanhada em seu dia-a-dia, na lida com os animais

e com a terra.

Em The Forbidden Land é feita a análise dos conflitos entre a igreja Católica conservadora e

sua ala progressista, manifesta na Teologia da Libertação, tendo como mote a luta dos trabalhadores

sem terra. Exibido pela PBS em 1990, o documentário encerra a Fase Política Latino-Americana e

conduz à Carmen Miranda: Bananas Is My Business (Carmen Miranda, Meu Negócio É

Bananas,1994) que marca o retorno à temática feminina centrada na personagem de Carmen tendo

como pano de fundo, a política da boa vizinhança entre Brasil e EUA no período da Segunda

Guerra Mundial.

O longa percorre a vida e obra da cantora luso-brasileira Carmen Miranda com o objetivo de

reconstituir sua história e sua contribuição para a cultura brasileira como uma das primeiras

intérpretes do samba a levar de forma pioneira e com estilo único, a música popular brasileira para a

América do Norte.

Helena arrisca-se ao potencializar de maneira reflexiva, a voz na primeira pessoa do singular

que, como um desabafo íntimo, expõe as dificuldades na coleta de documentos sobre Carmen e na

investigação de sua vida, ao mesmo tempo em que questiona os impasses vividos pela artista no

país. A abordagem da personagem é pessoal, afetiva. Solberg cria um terceiro plano que é o da

memória afetiva, como se sua voz fosse a de uma amiga, um parente próximo à cantora.

O uso da ficção; o intenso trabalho de pesquisa de imagens ao longo de três anos; a memória

de dezesseis entrevistados que conviveram com a artista e concedem seu último testemunho, fazem

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de Carmen Miranda, Bananas Is My Business um dos grandes documentários brasileiros da década

de 1990 e um dos filmes relevantes do período da retomada do cinema nacional.

Carmen Miranda, Bananas Is My Business é também um filme de transição para as

produções seguintes que evidenciam diferentes manifestações artísticas brasileiras como a

literatura, a música e a dança. O reconhecimento do filme em festivais nacionais e internacionais

alavanca a produção de Vida de Menina, 2004, rodado no Brasil, depois do retorno de Solberg ao

país. Produzir e filmar no Brasil torna-se novamente possível com a redemocratização, a criação da

Ancine – Agência Nacional do Cinema e a implementação de mecanismos de incentivo a produção

nacional.

Primeiro longa-metragem ficcional da cineasta, Vida de Menina é um adaptação de Helena

Morley, Minha Vida de Menina de Alice Dayrell Caldeira Brant. Publicado pela primeira vez em

1942, pela José Olympio, o livro é o diário da autora, escrito nos tempos de menina-moça, na

cidade de Diamantina/MG, entre 1893 e 1895. Alice Dayrell Caldeira Brant/ Helena Morley tinha

entre 13 e 15 anos de idade e presencia na província, um período de grandes transformações

políticas, econômicas e sociais: o fim da Monarquia; a Proclamação da República (1889); a

abolição da escravatura (1888) e, no plano regional, o esgotamento das jazidas de diamantes, o que

provoca a decadência e o empobrecimento de várias famílias, dentre elas, a da própria autora.

Alice Dayrell publica o diário no Rio de Janeiro, aos 62 anos de idade, para mostrar às

netas, que o período mais feliz de sua vida, havia sido a adolescência na província mineira. Época

sem luz elétrica, sem telefone, geladeira, fogão e outras comodidades que iriam revolucionar o

cotidiano de mulheres e homens no século XX.

Atenta às transformações nas relações sociais, políticas e econômicas à sua volta, Alice /

Helena escreve o diário com humor e perspicácia sobre o que vê, ouve e sente. Com a escrita, ela se

constrói. Ela interpreta os acontecimentos no dia à dia e desenvolve um olhar de fora, estrangeiro. A

escrita possibilita que crie um distanciamento com relação aos acontecimentos, permitindo

compreendê-los melhor. Possibilita também que se individue, se construa como pessoa, apesar de

toda a fragmentação dos tempos de adolescência. A personagem é interpretada pela atriz Ludmila

Dayer.

A relação com a palavra escrita iniciada no filme, se estende para o documentário Palavra

(En)cantada, 2009 que parte da relação entre a poesia e a canção brasileira para traçar um panorama

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da música popular no país, em momentos importantes – a conformação do samba e da canção nos

anos de 1930; os antecedentes da bossa nova; o tropicalismo; o rock nos anos de 1980; o rap e o hip

hop a partir da década de 1990 e a diversidade de estilos que encontramos na música popular

brasileira contemporânea. Para traçar o percurso, Solberg conta com os depoimentos e

performances de dezoito artistas, entre músicos, poetas, intérpretes e pensadores da música

brasileira. Como uma espécie de leitmotiv, a relação da música com a palavra é reiterada nas

questões que a cineasta propõe, incitando-os a refletirem sobre o lugar da literatura e da poesia em

seus processos criativos.

Palavra (En)cantada é um filme de depoimentos, embora utilize, igualmente, imagens de

arquivo e interpretações dos músicos. Percebemos um peso maior na entrevista/filmagem com a

cantora Adriana Calcanhoto que introduz e encerra o longa-metragem. Para o pesquisador Hernani

Heffner, Helena Solberg revela, com o filme, “estar extremamente afinada com a ideia de poética

contemporânea, onde a língua não só instrumentaliza o real, a língua cria o real”. E acrescenta:

“Helena tem um olhar que se manteve contemporâneo ao longo de toda a sua trajetória artística”.5

O filme acaba por apresentar um panorama denso da música popular no Brasil. Como

defende o professor, músico e pesquisador José Miguel Wisnik em um dos depoimentos: “Em um

país com uma forte cultura oral como o Brasil, a música popular pode ser a grande ponte entre a

poesia e a literatura”. Ideia reforçada por outros depoimentos, pelas performances musicais e

material de arquivo, tornando Palavra (En) cantada referância para a compreensão da história do

cancioneiro no país.

Três anos após o lançamento, a diretora junto com o produtor David Meyer, retoma um

projeto que haviam iniciado em 2002: acompanhar adolescentes do projeto Corpo de Dança da

Marés, coordenado pelo educador e coreógrafo Ivaldo Bertazzo. Por meio da expressão da fala e do

corpo desses jovens está a busca dos diretores pela expressão corporal, pela construção da fala e

pela individualidade dos jovens bailarinos. Todos enfrentam as condições precárias de moradia,

transporte, segurança e higiene do Complexo da Maré onde vivem. O local reúne diversas

comunidades e favelas às margens da baía de Guanabara, zona norte do Rio de Janeiro.

Assim como o clássico Cabra Marcado para Morrer 1984, de Eduardo Coutinho, o filme é

rodado em dois tempos: no acompanhamento dos ensaios para o espetáculo em 2002 e no retorno da

5 Hernani Heffner em entrevista a Mariana Tavares no Rio de Janeiro, em 04.01.11.

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Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

equipe, dez anos depois, em 2012, para saber se a experiência com a arte poderia ter despertado um

processo de transformação na vida dos adolescentes, agora jovens adultos.

A partir do depoimento de uma das jovens, surge o nome do filme A Alma da Gente assim

como, 35 anos antes, havia surgido o título de Simplesmente Jenny, 1977, quando Jenny (vítima de

um estupro com apenas 13 anos de idade e, como dito, presa em um reformatório para meninas na

Bolívia) disse para a câmera “eu queria ser simplesmente Jenny”.

Embora não seja um filme feminista, A Alma da Gente ,2013, tem uma forte presença de

adolescentes mulheres que, para a desolação da cineasta no reencontro dez anos depois, estavam

grávidas, ainda bem jovens. Entre as poucas exceções, Joana, a única que efetivamente, seguiu a

carreira artística e se tornou bailarina.

Em 2017, a cineasta lança o documentário Meu corpo minha vida que trata da questão da

ilegalidade do aborto no Brasil a partir da trajetória de Jandyra dos Santos, vítima fatal de um

procedimento em uma clínica clandestina em Campo Grande, zona oeste da cidade do Rio de

Janeiro. São retomadas questões presentes na Trilogia da Mulher como a imagem idealizada de

pureza e submissão da mulher, reforçada agora, pela Igreja Evangélica, assim como a idealização

do casamento romântico, com atenção aos movimentos de mulheres feministas da 3ª onda, que

saem às ruas das metrópoles brasileiras e reivindicam a liberdade de seus corpos e de suas vidas e

também, justiça para o caso Jandyra.

O amplo debate proposto em filmes anteriores se repete manifesto em depoimentos de

juízes, advogados, pastores evangélicos, ativistas, escritores, profissionais da saúde, politicos, além

de familiares de Jandyra. Meu corpo, minha vida chama a atenção para a urgência do debate a

respeito da discriminalização do aborto no país.

Aos 78 anos de idade, Helena Solberg está em plena maturidade profissional, com fôlego

para a realização de inúmeros projetos. A convivência intelectual e produtiva com David Meyer

(que é também cineasta) e os novos produtores, roteiristas, montadores e demais profissionais que

colaboraram em seu trabalho, propiciam discussões e o desenvolvimento de novos projetos. No

foco da câmera, a presença da mulher que critica seu meio, e investe em novas formas de

relacionamento com os parceiros, com os filhos, com o país. Um reflexo de sua postura enquanto

mulher - cineasta entre duas Américas: a Latina e a anglo-saxã.

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Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

Referências

BERNARDET, Jean-Claude. Cineastas e imagens do povo. 1ª reimpressão, São Paulo: Companhia

das Letras, 2003.

BURTON, Julianne. Helena Solberg-Ladd In: Cinema and Social Change in Latin America. Austin

Texas: University of Texas Press, 1986.

FOSTER, David William. This woman wich is One: Helena Solberg-Ladd’s The Double Day.

Disponível em: http://dx.doi.org/10.1080/13260219.2012.691261. Acessado em 09 de setembro de

2016. Publicado em: 17 julho 2012. Journal of Iberian and Latin American Research

SOLBERG, Helena. The Emerging woman. (Filme completo)

https://archive.org/details/theemergingwoman.

TAVARES, Mariana. Helena Solberg: do cinema novo ao documentário contemporâneo. 1ª ed. São

Paulo: Imprensa Oficial/É Tudo Verdade, 2014.

www.radiantefilmes.com Site oficial da produtora de Helena Solberg e David Meyer

From feminist militancy to contemporary documentary: the unusual trajectory of Helena

Solberg.

Abstract: This presentation approaches the sixteen films (fourteen documentaries and two fictions)

made by the brazilian filmmaker Helena Solberg in the last six decades. The domestic space and

personal issues of classmates from school in Rio de Janeiro are addressed in her first film The

Interview (1966). The consciousness of being latin american emerges in the United States where she

moves with her family in 1971. This shift will raise historical, social and political issues about the

200 years of the feminist movement in the US and in England covered in The Emerging Woman,

1974. Those issues are extended to four latin american countries resulting in the first latin american

feminist documentary - The Double Day about women in labor, 1975. Geographical shifts will

continue in subsequent productions, resulting in a an unusual trajectory in which the political

position of women against sexual exploitation, labor’s exploitation and Latin American

dictatorships and, more recently, against the restriction of their body itself (such as the question of

the ilegality of abortion in Brazil) are investigated by Solberg.

Keywords: Feminist cinema. Documentary. Contemporary cinema.