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Daniela Goya Tocchetto

Daniela Goya Tocchetto - Inicial — UFRGS | Universidade ... · utilitarismo como uma busca pela igualdade ... de utilidades marginais. Crítica ao utilitarismo ... que uma pessoa

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Daniela Goya Tocchetto

� Grande parte da discussão sobre moralidade na saúde aborda temas como o experimento e o uso de novas tecnologias (células-tronco), decisões referentes ao início e ao fim da vida (aborto e eutanásia) e os conflitos de direitos (aborto e eutanásia) e os conflitos de direitos e deveres de pacientes e profissionais de saúde.

� Isso determinou uma forte tendência de analisar a ética em saúde a partir de situações locais.

� Essas questões tratam da definição de direitos individuais sem que sua contextualização na coletividade assuma posição prioritária na análise.

� A escassez de recursos para a saúde restringe a possibilidade de ampla distribuição de bens e serviços públicos e, portanto, exige uma série de decisões alocativas que consistem, fundamentalmente, em selecionar quais serão os fundamentalmente, em selecionar quais serão os beneficiários do sistema público de saúde e quais serviços serão oferecidos.

� A alocação de recursos públicos em saúde é claramente uma questão que afeta direitos individuais e deve ser analisada sob a perspectiva da coletividade e de um horizonte de tempo extenso.

� Teorias Liberais de Justiça Social� Conceitos de Equidade� Necessidade em Saúde – Indicadores� Escolha e Responsabilidade Individual versus � Escolha e Responsabilidade Individual versus Igualdade

� Universalização e Focalização� Aplicação

� Princípios padronizados de justiça ou de resultado final

� Princípios históricos de justiçaNozick e os três princípios de justiça: � Nozick e os três princípios de justiça: aquisição, transferência e reparação de injustiça.

� Sistemas de saúde: princípios padronizados

� Rosseau

� Utilitarismo: Hume, Sidgwick� Utilitarismo: Hume, Sidgwick

� Rawls

� “… duas espécies de desigualdades: uma, que chamo natural ou física, porque já foi estabelecida pela natureza, e que consiste na diferença das idades, da saúde, das forças corporais e das qualidades do espírito ou da alma; outra, a que se pode chamar de desigualdade moral ou política, pode chamar de desigualdade moral ou política, pois que depende de uma espécie de convenção e foi estabelecida, ou ao menos autorizada pelo consentimento dos homens. Consiste esta nos diferentes privilégios desfrutados por alguns em prejuízo dos demais, como o de serem mais ricos, mais respeitados, mais poderosos, ou mesmo mais obedecidos.”

� Admiração pelo “estado de natureza”� Aprofundamento das desigualdades causado pelas desigualdades sociais

� Apenas o trabalho dá direito à propriedade e à desigualdade, introduzida pelo processo de à desigualdade, introduzida pelo processo de socialização.

� Critério de justiça: a cada um segundo seu próprio trabalho.

� Critério igualitário – igualdade de direitos.

� “Uma sociedade é corretamente ordenada, e portanto justa, quando obtém a maior soma de satisfação, independente da sua distribuição entre os indivíduos pertencentes a essa sociedade.”a essa sociedade.”

� Esse critério justifica a penalização e a exclusão de indivíduos para obtenção de uma soma maior de satisfação.

� O utilitarismo parte da aceitação de que quanto maior é a renda de um indivíduo, maior é a possibilidade de desfrutar as consequências de um bom estado de saúde. Dessa forma, dadas duas pessoas com o Dessa forma, dadas duas pessoas com o mesmo estado de saúde, seria lógico tentar melhorar o nível de saúde daquele que conta com uma renda maior, inclusive efetuando transferências, caso possível, do mais pobre para o mais rico.(Le Grand, 1988)

� Uma outra consequência está relacionada com a definição de assistência médica para dois indivíduos, um com melhor nível nutricional que o outro, portanto, com melhores possibilidades de responder ao melhores possibilidades de responder ao tratamento. A escolha utilitarista será a de oferecer atendimento àquele que tem um melhor nível de alimentação.(Le Grand, 1988)

� É uma teoria igualitária.� Sen (1979) em Equality of what? Caracteriza o utilitarismo como uma busca pela igualdade de utilidade marginal.de utilidade marginal.

� Maximizar a soma conjunta requer igualdade de utilidades marginais.

� Crítica ao utilitarismo� Bens primários (e não satisfação)� Posição original (“estado de natureza”)� Véu de ignorância� Dois princípios de justiça ordenados lexicograficamente: igualdade (liberdades –bens primários) no primeiro, e eficiência no segundo (minimiza desigualdades).

� A saúde é um bem natural que não pode ser distribuído nas mesmas bases que os bens sociais; e

� O princípio maximin é um macro critério, não implementável em situações micro como implementável em situações micro como saúde. Ex: vítima (ferimento mais leve) e assaltante – é justo atender o assaltante primeiro porque ele está numa situação menos privilegiada?(Le Grand, 1988)

� Tratamento igual para iguais (horizontal) e tratamento desigual para desiguais (vertical).

� A equidade vertical permite a discriminação � A equidade vertical permite a discriminação positiva e, nesse caso, um tratamento igual para todas as partes não é equitativo.

� Imagine que duas pessoas com o mesmo problema de saúde recebem o mesmo tratamento. Uma, entretanto, por desfrutar de condições físicas superiores, reage mais rapidamente ao tratamento. A igualdade de rapidamente ao tratamento. A igualdade de tratamento resultou em desigualdade de resultado. Teria sido mais equitativo proporcionar melhores cuidados ao paciente mais vulnerável, cuja capacidade de resposta fosse presumivelmente pior.

� Igualdade da despesa pública Igualdade da despesa pública Igualdade da despesa pública Igualdade da despesa pública per capita;� Igualdade do rendimento fiscal Igualdade do rendimento fiscal Igualdade do rendimento fiscal Igualdade do rendimento fiscal procurando compensar os rendimentos das populações de mais baixa renda através da despesa pública com políticas sociais, obtendo-se assim uma equiparação entre os rendimentos dos diferentes grupos sociais;sociais;

� Igualdade de utilizaçãoIgualdade de utilizaçãoIgualdade de utilizaçãoIgualdade de utilização, em que a despesa pública deverá favorecer a igualdade no consumo dos diferentes serviços;

� Igualdade do gastoIgualdade do gastoIgualdade do gastoIgualdade do gasto, de tal forma que todos tenham igualdade no gasto por unidade de serviço utilizado;

� Igualdade nos níveis de saúdeIgualdade nos níveis de saúdeIgualdade nos níveis de saúdeIgualdade nos níveis de saúde, através de uma distribuição da despesa orientada para obtenção de iguais resultados.

� Em relação à distribuição de recursos especificamente na área da saúde, Artells e Mooney (1983) trabalham com 7 conceitos possíveis de equidade em saúde:

� (1) Igualdade de despesa per capita – parte do pressuposto de que a distribuição é equitativa pressuposto de que a distribuição é equitativa quando efetuada em função do tamanho populacional;

� (2) Igualdade de recursos per capita: incorpora à distribuição realizada em base populacional correções em função das diferenças de preços entre regiões;

� (3) Igualdade de recursos para necessidades iguais –considera as diferentes necessidades sanitárias existentes, efetuando correções tanto a partir do perfil demográfico quanto do epidemiológico;

� (4) Igualdade de oportunidade de acesso para necessidades iguais – reconhece, além das diferentes necessidades iguais – reconhece, além das diferentes necessidades determinadas pelos perfis demográfico e epidemiológico, a existência de desigualdades no custo social do acesso (ex: distâncias aos serviços de saúde);

� (5) Igualdade de utilização para iguais necessidades –discriminação positiva em favor de grupos regionais ou sociais com menos predisposição para a utilização de serviços de saúde;

� (6) Igualdade de satisfação de necessidades marginais – parte do pressuposto de que as necessidades mantêm a mesma ordem de prioridades nas diferentes regiões. Assim, a equidade seria alcançada se, dado um incremento ou um corte nos recursos, o aumento ou a diminuição na cobertura das necessidades fosse o mesmo em todas as regiões;

� (7) Igualdade nas condições de saúde – tem por objetivo a igualdade nos indicadores de saúde. Ao contrário dos conceitos anteriores, que priorizam a distribuição dos recursos, esse conceito toma como ponto central os resultados obtidos.

� Não existe consenso no uso de um único conceito.

� Le Grand (1988) considera que a maioria dos conceitos de equidade, por representar variações de uma mesma idéia ou objetivo, variações de uma mesma idéia ou objetivo, pode ser sintetizada em 3 características:

� (1) tratamento igual para necessidades iguais;� (2) igualdade de acesso; e� (3) igualdade de saúde.

� Ainda de acordo com Le Grand, desigualdades motivadas pela livre eleição dos indivíduos não podem ser consideradas não-equitativas; unicamente as desigualdades que resultam de fatores que estão fora de seu controle devem ser entendidas como não-equitativas.

� É um conceito de difícil implementação: como saber se as É um conceito de difícil implementação: como saber se as escolhas foram autônomas e não determinadas por outros fatores?

� Implicações limitadas à responsabilidade no custeio dos tratamentos correspondentes.

� É justo que a assistência médica de problemas de saúde originados pela livre escolha de um indivíduo seja custeada pelos recursos da comunidade?

� O que Le Grand sugere é que cada indivíduo deve contribuir com uma porcentagem do custo do tratamento equivalente ao risco assumido através de suas escolhas.

� Exemplo: se 20% dos fumantes têm câncer de � Exemplo: se 20% dos fumantes têm câncer de pulmão, então cada um deveria pagar 20% do seu tratamento.

� Dificuldade elevada em definir a responsabilidade de cada um. Alternativa: penalização do consumo.

� “Que se entende por necessidade? A quantidade de serviços que os indivíduos desejam? Sua “demanda” de tratamento, como os economistas entendem o termo, i.e., a quantidade de tratamento que comprariam a quantidade de tratamento que comprariam ao preço vigente? O tratamento que um profissional considera necessário em cada caso?” (Le Grand, 1988)

� Não existe consenso na definição do termo.

� Serão apresentados os indicadores e variáveis mais utilizados para operacionalizar o termo e melhor dimensionar as diferenças existentes em nível de necessidades, entre regiões ou entre grupos populacionais.regiões ou entre grupos populacionais.

� Indicadores de necessidade em saúde são realionados com três aspectos distintos: perfil demográfico, perfil epidemiológico e perfil socioeconômico.

� São indicadores que permitem conhecer dados demográficos da população, como sexo e grupo etário.

� Diferentes grupos populacionais possuem diferentes necessidades, determinadas pelo próprio processo de envelhecimento.

� Exemplos: osteoporose em mulheres a partir de determinada idade, cardiopatias coronárias, etc.

� Problema: indicadores pouco explicativos das diferentes necessidades existentes; expressam apenas variações biológicas naturais e não incorporam variações intragrupos etários decorrentes de outros fatores (ex.: sociais).

� Expressado através das Taxas de Morbidade.

� Dificuldade: falta de informação pertinente e pouca confiabilidade dos dados existentes.

� Devido às dificuldades, muitas vezes se trabalha com taxas de mortalidade (relacionadas com as taxas de morbidade).

� Experiência mais importante de utilização das taxas de mortalidade para dimensionamento das necessidades regionais.

� Realizou sua distribuição de recursos � Realizou sua distribuição de recursos financeiros com base nesse indicador por trinta anos.

� As taxas de mortalidade, discriminadas por tipo de doença causadora, foram trabalhadas para cada faixa etária e segundo o sexo.

� (1) não existe correlação significativa entre as taxas de mortalidade padronizadas e doenças agudas – apenas com doenças crônicas;

� (2) mortalidade só é um indicador sensível quando as doenças infecciosas têm um peso grande no total dos problemas de saúde;

� (3) quando o número de mortes por ano, entre 1 semana e 55 anos de idade, é pequeno, a mortalidade não é representativa da necessidade de assistência em saúde;

� (4) a mortalidade regional pode ser utilizada como uma aproximação das necessidades em saúde quando os fatores socioculturais, juízos de valor e relação entre necessidades sentidas e demanda sejam homogêneos entre as diferentes regiões;

� (5) casos enquadráveis numa mesma causa de morte podem demandar diferentes quantidades de insumos. Ex: mortes prematuras versus mortes após longos períodos de internação;

� (6) a mortalidade não reflete a ampla gama de morbidades que uma pessoa pode ter ao longo da vida.

� Aplicação reiterada das taxas de mortalidade como critério distributivo pode levar à ineficácia das políticas implementadas.

� Uma região que apresentasse um melhor desempenho, em termos de suas taxas de mortalidade, seria penalizada com termos de suas taxas de mortalidade, seria penalizada com uma diminuição na disponibilidade de recursos financeiros.

� Importante: determinação de um período de tempo a partir do qual devem-se esperar resultados positivos manifestos na melhoria dos indicadores. Utilizar para a distribuição de recursos uma combinação de indicadores de desempenho e de necessidade.

� As taxas de mortalidade apresentam deficiências pela cobertura incompleta do sistema de informação e pelo sub-registro de óbitos.

� Limitantes do sistema podem ser utilizados como indicadores de necessidades.

� Exemplo: a mortalidade por causas mal definidas, em grande parte devido a óbito sem atendimento médico, representa mais de 50% da mortalidade observada em alguns estados no Brasil. Ainda que tenham recebido atendimento médico, as diferenças observadas podem ser interpretadas como um indicativo da necessidade de melhoria na qualidade dos serviços médicos (aprimoramento na formação médica e nas técnicas de diagnóstico e tratamento).

� São aqueles indicadores utilizados para identificar o nível socioeconômico regional, como grau de alfabetização, taxa de desemprego, saneamento básico, etc.

� Importância desses indicadores para o dimensionamento da necessidade em saúde (Musgrave, 1984):

� (1) correlação significativa entre educação dos pais e saúde dos filhos – discriminação segundo nível de escolaridade;

� (2) a porcentagem de habitações ligadas a redes de saneamento básico é um dos melhores indicadores das condições de saúde de uma população e é e fácil utilização (dado presente nos censos nacionais).

� São duas questões fundamentais que aparecem em todos os debates sobre Sistemas de Saúde.

� Mill, Nozick, Friedman e Dworkin enfatiazam a importância da responsabilidade individual: visão anti-paternalista de que os indivíduos possuem responsabilidade última pelo sucesso de suas vidas.suas vidas.

� Argumento controverso: indivíduos devem se esforçar para obter serviços de saúde e devem escolher o quanto de seguro de saúde querem comprar.

� Baseado em: importância moral da responsabilidade e ineficiência do acesso universal a serviços de saúde (problemas de moral hazard).

� “Estar saudável” não é um objetivo ou um meio de se atingir objetivos, mas sim uma pré-condição essencial para se ter uma vida normal.

� Gera uma resistência natural a distribuir o � Gera uma resistência natural a distribuir o acesso a serviços de saúde de acordo com capacidade de pagamento, e não de acordo com as necessidades.

� Dworkin: distinção entre escolha e circunstância. Saúde se enquadraria na segunda categoria.

� Princípios de igualdade e eqüidade remetem a um tema recorrente na formulação de políticas sociais: universalização versus focalização.

� Na universalização, todos os indivíduos têm direito de acesso a determinados serviços públicos devido a direitos de cidadania. A universalização é mais cara, mas garante os cidadania. A universalização é mais cara, mas garante os serviços indiscriminadamente.

� Na focalização, os recursos disponíveis são concentrados em uma população de beneficiários. Além das razões relacionadas à justiça baseadas no princípio da eqüidade, a focalização é motivada por fatores de natureza econômica: programas focalizados são mais baratos que programas universais.

� Universalização está relacionada com igualdade; enquanto focalização está relacionada com equidade.

� Sen, Equality of What? (1995):� (1) utilidade marginal� (1) utilidade marginal� (2) recursos� (3) bens primários� (4) capacitações

� NECESSIDADES?� Quando as necessidades são iguais, igualdade = equidade?

� De todos os objetivos de equidade seguidos pelos sistemas de saúde modernos, a prestação de cuidados de acordo com as necessidades da população é o que gera maior consenso.as necessidades da população é o que gera maior consenso.

� É também o mais discutido e avaliado, através de metodologias que medem e analisam o grau de associação entre os cuidados médicos efetivamente prestados e os níveis de morbidade observados para diferentes grupos da população.

� A maioria desses estudos conclui que as pessoas mais pobres recebem menos cuidados de saúde por unidade de necessidade.necessidade.

� Esse resultado é interpretado como indicativo da existência de não-equidade.

� O trabalho aqui apresentado busca verificar se esse fenômeno acontece em Portugal, analisando tanto o sistema público quanto privado de saúde, para o ano de 1987.

� Metodologia: curvas de concentração de Lorenz.� Ordenação da população de acordo com nível socioeconomico e comparação dos tratamentos recebidos socioeconomico e comparação dos tratamentos recebidos com queixas de morbidade relatadas por diferentes estratos.

� Equidade: curvas sobrepostas.

� Resultados:� concentração das morbidades nos grupos de menor renda;

� desigualdade varia com o tipo de morbidade: doença e mal-estar pouca desigualdade, dias de acamamento desigualdade muito elevada;muito elevada;

� déficit de equidade em favor dos mais ricos (despesa com saúde maior do que morbidades - necessidades);

� a desigualdade social na doença agrava-se quando as pessoas atingem a idade adulta.

� É essencial para a avaliação da justiça das decisões, em primeiro lugar, a existência de diretrizes que ordenem as políticas, evitando assim decisões discricionárias e, em segundo lugar, clareza em relação às diretrizes que orientam as políticas públicas.

� Essa clareza depende da explicitação dos paradigmas de justiça subjacentes à formulação das políticas, mesmo sabendo que em uma mesma política os princípios são utilizados alternadamente, às vezes de forma contraditória.