Demografia histórica de Minas Gerais no Período Colonial

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  • 7/31/2019 Demografia histrica de Minas Gerais no Perodo Colonial

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    LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci del Nero da. Demografia Histrica de MinasGerais no Perodo Colonial. Revista Brasileira de Assuntos Polticos, BeloHorizonte, Universidade Federal de Minas Gerais, (58): 15-62, 1984.

    DEMOGRAFIA HISTRICA DE MINAS GERAIS NO PERODO COLONIAL

    FRANCISCO VIDAL LUNA (*)IRACI DEL NERO DA COSTA

    Professores da Faculdade de Economia e Administrao da Universidade de So Paulo

    Nesta comunicao arrolamos alguns dos resultados de nossos estudos concernentes acertos ncleos populacionais existentes em Minas Gerais no perodo colonial brasileiro.No se trata, pois, de um sumrio exaustivo de nossos trabalhos; selecionamos, to-somente, uma srie de observaes que, embora superficialmente, ilustram o esforo quetemos votado ao entendimento dos processos demogrficos e econmicos verificados narea de Minas Gerais na qual predominou a explorao do ouro e das pedras preciosas.Deve-se frisar, ademais, que nossas pesquisas, conquanto se refiram a parcelasignificativa dos centros mineratrios e a amplo lapso temporal, no abarcam a totalidade

    da populao mineira nem abrangem todo o perodo colonial. Efetuadas estas ressalvaspreliminares, passemos s evidncias acima referidas.

    VILA RICA: CASAMENTOS, BITOS E BATIZADOS

    Neste item apresentaremos algumas informaes derivadas dos registros de batismos,bitos e casamentos da freguesia de Nossa Senhora da Conceio de Antnio Dias, umadas duas parquias existentes, no perodo colonial, em Vila Rica. Estes trs eventosapresentaram, no correr do sculo XVIII e incio do XIX, comportamento semelhante:

    correspondendo ao incremento (retrocesso) da atividade exploratria, observava-se ocrescimento (decrscimo) das cifras referentes a mortes, casamentos e batizados. Assim,verificou-se rpido aumento no nmero de bitos entre os decnios 1719-28 e 1744-53 --da mdia anual equivalente a 61 mortes, passou-se a quantidade quatro vezes superior(238 por ano). Altos nveis para os valores mdios anuais ocorreram at o decnio 1759-68; seguiu-se queda substancial na dcada 1769-78 -- de 232 caiu-se a 191 mortes porano. De ento at o final do sculo XVIII configurou-se um patamar no qual observou-seestreita faixa de variao -- entre o mnimo de 189 e o mximo de 196 bitos anuais. Defins do sculo XVIII e inicio do XIX at o limite cronolgico superior de nosso estudo(1818), apresentou-se persistente decrscimo na quantidade de falecimentos -- de 196mortes por ano (decnio 1789-98) passou-se a 137; quebra correspondente a pouco

    menos de um tero.

    Os batismos mostraram comportamento muito prximo ao observado para os bitos. De47, em mdia, correspondentes dcada 1719-28, passou-se para valor quatro vezes

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    mais elevado no perodo 1764-73 -- 170 batizados por ano --, desta cifra mxima passou-se, no decnio 1779-88, para a mdia anual de 147 batismos. Deste ltimo perodo aocompreendido pelos anos 1794-1803 configurou-se um patamar no qual a oscilaomxima foi de 4 batismos. De 1794-1803 ao fim do intervalo temporal analisado,observou-se queda substantiva na varivel em foco -- de 147 passamos para 126batismos anuais, em mdia, no decnio 1809-18, ou seja, quebra proporcional de 14,3%.

    Esboava-se, no fim do perodo estudado, o equilbrio entre nascimentos e bitos,

    prenncio de relevante mudana no crescimento vegetativo da populao de Antnio Dias-- que, de negativo, como se mostrara por quase todo o sculo XVIII e incio do XIX,passou a positivo nos ltimos anos do primeiro quinto do sculo passado.

    Como no caso de bitos e batismos, a anlise dos dados relativos evoluo doscasamentos evidencia, de imediato, perodos de acrscimo e queda nos valores mdios.Assim, de 1727 dcada 1760-69, verificou-se substancial aumento na quantidade deunies. De fins da dcada dos 60 dos 80 os casamentos rarefizeram-se segundo taxamais elevada do que a correspondente ao acrscimo ocorrido no perodo anterior.

    Ao final dos anos 70 e em todo o decnio dos 80, o nmero de casamentos estabilizou-se

    em torno da mdia prevalecente nos anos 30 e 40 -- em 1786 o nmero de casamentosigualou o registrado em 1737 e, em 1790, observou-se quantidade correspondente mdia dos anos compreendidos entre 1732 e 1741. Dos anos 80 ao incio do sculo XIXverificou-se rpida recuperao, seguida de baixa que se estendeu at o segundodecnio do sculo (Cf. Grfico 1).

    GRFICO 1NMERO ANUAL MDIO DE CASAMENTOS, BITOS, BATISMOS E EXPORTAO

    (PRODUO) DE OURO, POR PERODOS DE 10 ANOS.

    Cuidemos, agora, dos principais condicionantes das variaes observadas nos dados oraanalisados. Ressaltam, desde logo, trs fatores explicativos bsicos, intimamentecorrelacionados.

    Parece ter sido altamente relevante o grande afluxo e posterior retrao numrica naentrada do elemento africano. A populao escrava de Vila Rica apresentou rpidoincremento nas quatro primeiras dcadas do sculo XVIII. Em 1716 contaram-se 6.721cativos e, dois anos depois, 7.110; em 1728 a cifra subia a 11.521. Em 1735, segundo

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    dados incorporados ao Cdice Costa Matoso, o nmero de cativos atingia 20.863. Em1743, somaram 21.746. A partir desse ano a tendncia declinante mostrou-se evidente;em 1749 o nmero de escravos cai a 18.293.

    Com respeito aos cativos, deve-se lembrar, ainda, sua alta taxa de mortalidade. Martinhode Mendona, delegado da Coroa e conhecedor das condies reinantes em Minas,relatava, em 1734, que os senhores no esperavam conseguir, em mdia, mais de dozeanos de trabalho dos escravos comprados ainda jovens. Com base no documento

    annimo Consideraes sobre as duas classes mais importantes de povoadores daCapitania de Minas Gerais pode-se estabelecer que, grosseiramente, a taxa demortalidade dos escravos estaria entre 50 e 66 mortes por mil cativos. ndiceextremamente elevado e muito superior taxa bruta de mortalidade -- de 23,4 bitos pormil habitantes -- calculada para Vila Rica (Comarca) com base em dados referentes a1776.

    A estas consideraes devemos juntar a alta taxa de mortalidade infantil relativa aos filhosde cativos. Em que pese a baixa fecundidade das escravas, dado seu grande nmero, opeso relativo de nascimento (e, por conseqncia, de bitos) de crianas escravasmostrava-se elevado; fato a contribuir para o alto ndice de mortalidade.

    Ao afluxo dos africanos deve-se somar a rpida convergncia, para a rea mineratria, degrande contingente de livres e escravos que se deslocaram do Reino e de outras partesdo prprio territrio da Colnia.

    A relativa pobreza do solo na rea mineratria, em geral, e em torno de Vila Rica, emparticular, d-nos o embasamento do terceiro fator explicativo do evoluir das variveis emestudo: com a decadncia da atividade mineratria, a populao, sobretudo a parcelalivre, tendeu a deslocar-se para novas reas procura de ouro ou, em momento maistardio -- quando esgotado o estoque aurfero acumulado milenarmente --, a demandarterra mais rica que lhe pudesse garantir o sustento, baseado, agora, na lide agrcola.

    Subjacente ao processo demogrfico analisado, sempre esteve presente, pois, a atividadeexploratria. esta a concluso que deriva, justamente, do confronto entre as variaesreferentes ao nmero de casamentos, bitos e batizados e as relativas ao montanteextrado de ouro, conforme patenteado no Grfico 1.

    CASAMENTOS: 1727-1826

    Com respeito aos casamentos, caso se segmente a populao em estratoscorrespondentes a livres, forros e escravos, reconhecemos, associado a cadasubconjunto, comportamento diverso. Assim, o evoluir dos enlaces referentes a escravose forros apresenta grande similitude. Ambos os grupos -- o primeiro mais do que osegundo revelaram-se altamente correlacionados atividade aurfera em todo o perodoanalisado, enquanto a evoluo dos casamentos de livres ganha autonomia -- comrespeito extrao do ouro -- a partir do ltimo quinto do sculo XVIII. Assim, distinguem-se claramente os escravos dos livres e, em posicionamento intermedirio, dispem-se osforros (ver Grficos 2 e 3).

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    GRFICO 2NMERO ANUAL MDIO DE CASAMENTOS POR PERODOS DE 10 ANOS E

    EXPORTAO (PRODUO) DE OURO

    Alm dos empecilhos decorrentes de maneira imediata de maior ou menor dinamismo daatividade exploratria, ocorriam, tambm, condicionantes de ordem institucional.

    Assim, a par das diferentes vivncias relativas aos estratos sociais componentes dasociedade brasileira colonial, derivam-se limitaes colocadas pelo prprio mecanismoimposto pela Igreja consecuo do sacramento indispensvel legitimao dosconsrcios. bices advindos, por um lado, do procedimento formal exigido para seconseguir a autorizao necessria para que fosse celebrado o casamento e, por outro,dos custos monetrios associados s prescries ditadas pelo poder espiritual.

    GRFICO 3NMERO ANUAL MDIO DE CASAMENTOS POR PERODOS DE 10 ANOS E

    EXPORTAO (PRODUO) DE OURO

    Quanto aos segmentos populacionais aludidos, verificou-se que os casamentos "dentro"do mesmo segmento prevaleceram sobre as unies entre indivduos de "diferentes"grupos populacionais (ver Tabela 1). Por outro lado, no encontramos rigidez absolutacom respeito aos casamentos entre indivduos de grupos distintos; no se verificou

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    casamento a reunir escravos e livres, mas o nmero de consrcios entre escravos eforros parece-nos altamente significativo (ver Tabela 2).

    TABELA 1CASAMENTOS, SEGUNDO A CONDIO SOCIAL DOS CNJUGES

    Esposa Esposo

    Livres Forros Escravos Indeterminados

    Livres 957 20 -- --(60,16) (1,26)

    Forras 55 351 38 1(3,46) (22,07) (2,38) (0,06)

    Escravas -- 12 150 --(0,75) (9,44)

    Indeterm. 1 4 -- 2(0,06) (0,24) (0,12)

    OBS.: Os nmeros entre parnteses so porcentagens.

    Alguns dos casamentos a envolver libertos e escravos so muitos sugestivos e trazemsubsdios ao entendimento do papel representado pelo escravismo na sociedadebrasileira. Evidentemente, so casos isolados mas que, justamente por suaexcepcionalidade, emprestam colorido ao quadro, por vezes esquemtico, das relaespessoais e entre as camadas sociais ento vigentes.

    TABELA 2CASAMENTOS A ENVOLVER PELO MENOS UM CNJUGE ESCRAVO

    Esposa Esposo

    Forros Escravos

    Forras -- 38(19,0)

    Escravas 12 150(6,0) (75,0)

    OBS.: Os nmeros entre parnteses so porcentagens.

    Ocorriam, por exemplo, casamentos entre senhores e seus prprios cativos. Deste feitiofoi o enlace de "Garcia Pedroso preto forro com Maria da Costa tambm preta suaescrava" celebrado aos 15 de novembro de 1744; dois meses depois, aos 9 de janeiro de1745, celebrava-se a unio de "Toms de Freitas preto de nao Mina escravo dacontraente, Ana de Jesus, com a dita Ana de Jesus preta forra de nao Guin".

    Aos cinco de maio de 1740 acontecia outro casamento sui generis: "...na minha presenase casaram por palavras de presente Brs Gonalves negro Angola escravo de JoanaFernandes Lima com Juliana Fernandes Lima filha da dita Joana Fernandes crioulaforra..."

    Em termos de estrato social e cor -- considerados os trs segmentos populacionaisaludidos verificou-se, quanto escolha do parceiro, mais liberdade de opo para o sexomasculino, em geral, e para os homens livres, em particular. O estudo das mdias

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    mensais revelou variaes sazonais devidas s posturas religiosas contrrias acasamentos durante a Quaresma e o Advento. Em relao ao local de origem doscnjuges, nascidos e/ou batizados no Brasil, registrou-se menor mobilidade da massafeminina; quanto ao fluxo imigratrio, apresentou-se predominante o elemento masculino.

    BATISMOS: 1719-1818

    Como j salientamos, o comportamento das variveis demogrficas apresentou-sedistinto quando considerados os segmentos populacionais relativos a livres, forros eescravos. Assim, enquanto os batismos de livres mostraram tendncia ascendente at adcada 1799-1808 -- verificando-se, a seguir, ligeira queda, devida, ao que parece, emigrao dos habitantes de Vila Rica --, os valores relativos aos batizados de escravos,depois de subirem rapidamente nas primeiras quatro dcadas do sculo XVIII, tenderam adeclinar gradativamente (ver Grfico 4). Estes movimentos divergentes deveram-se a trscondicionantes: quebra no nmero de escravos entrados na rea; afluncia de livres,notadamente nas primeiras dcadas do sculo XVIII e, por fim, concesso ou comprade alforria, processo este que engrossava o contingente de crianas nascidas livres.

    GRFICO 4NMERO ANUAL MDIO, POR PERODOS DE 10 ANOS, DE BATISMOS,

    SEGUNDO A CONDIO SOCIAL

    Atenhamo-nos, agora, aos expostos. Tratam-se de recm-nascidos abandonados portade residncias particulares, igrejas ou do Senado da Cmara. O conhecimento do evoluirno tempo do nmero e peso relativo dos enjeitados mostra-se importante porque nospermite lanar luz sobre as condies econmicas gerais das comunidades estudadas;

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    espera-se, nos perodos de dificuldade econmica ou empobrecimento persistente, oaumento do peso relativo dos expostos. No perodo em foco, verificou-se incrementocontinuado no nmero dos expostos at a dcada 1799-1808; tal aumento numricoassumiu carter dramtico -- de 4 enjeitados batizados no decnio 1724-33 atingiu-se acifra de 167 na dcada 1799-1808. Desta ltima ao espao de tempo compreendido entre1809 e 1818 observou-se ligeira queda -- de 167 passou-se a 129 -- decorrente, comcerteza, do processo emigratrio que abatia a populao ouro-pretana.

    Referentemente ao peso relativo dos enjeitados sobre o total de batismos, verificou-semovimento igualmente significativo -- de 0,45% na dcada 1724-33 chegou-se a cifrasque giravam em torno de 11% no intervalo 1779-1818. Este incremento representa umdos aspectos do impacto, sobre as variveis demogrficas, da decadncia da atividademineratria (ver Grfico 5).

    GRFICO 5PORCENTAGENS DE EXPOSTOS SOBRE O TOTAL DE BATISMOS

    BITOS: 1719-1818

    Quanto aos bitos, ressalta, desde logo, o estreito liame entre a evoluo das mortes decativos e as quantidades extradas de ouro. Quanto s mortes de alforriados verifIcou-se,at a dcada 1774-83, rpido movimento ascendente seguido de patamar que seestendeu at o ltimo decnio do sculo XVIII, para, subseqentemente, revelar-setendncia decrescente condicionada, sobretudo, pelo decremento observado no nmerode novos escravos encaminhados a Vila Rica.

    O evolver dos bitos de livres expressa, tambm, os percalos da economia mineira; numprimeiro momento, por causa da grande concorrncia de pessoas para a rea mineratriano auge da atividade aurfera, observou-se rpido incremento no nmero de mortes delivres -- de 42 bitos ocorridos na dcada 1719-28 passou-se, no decnio 1764-73, para543; acrscimo correspondente a mais de 1.200%. A seguir observou-se um patamar quese estendeu at o perodo 1779-88. Deste ltimo decnio at o incio do sculo XIXverificou-se um acrscimo, condicionado, sobretudo, pelas geraes livres de pais forros.

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    Por fim, apresentou-se novo patamar, decorrente, a nosso ver, da dispora populacionalj referida (ver Grfico 6).

    GRFICO 6NMERO ANUAL MDIO, POR PERODOS DE 10 ANOS, DE BITOS (SEGUNDO A

    CONDIO SOCIAL) E PRODUO DE OURO

    Nossa ltima observao prende-se, ainda, ao Grfico 6 e diz respeito composiopopulacional em termos de condio social (livres e escravos). Mesmo admitida a elevada

    taxa de mortalidade dos cativos, no nos parece descabido afirmar que o equilbrio entrelivres (inclusive os forros) e escravos ocorreu "tardiamente", vale dizer, efetivou-se depoisdo auge da atividade mineradora; a preponderncia dos livres aparece, portanto, comocaracterstica do perodo de decadncia da economia de minerao. Evidentemente, talassertiva limita-se, concretamente, parquia em foco. Atrevemo-nos, no entanto,considerado o grande diferencial entre bitos de escravos e livres (inclusive alforriados)observado ao tempo do apogeu da lide mineratria, a generalizar tal afirmativa para todaa rea que se voltou, precipuamente, minerao.

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    ESTRUTURAS POPULACIONAIS TPICAS

    O estudo pormenorizado das populaes de dez localidades mineiras, (1) como seapresentavam no incio do sculo passado, sugeriu-nos a existncia de quatro estruturaspopulacionais distintas: urbana, rural-mineradora, intermdia e rural de autoconsumo. (2)

    Embora possamos identificar semelhanas genricas essenciais entre tais estruturaspopulacionais, impem-se algumas discrepncias da mais alta relevncia.

    Tais dessemelhanas, a nosso juzo, referir-se-iam, em ltima instncia, aoscondicionamentos derivados de distintos substratos econmicos. Assim, o maior oumenor peso de atividades vinculadas lida exploratria e/ou produo agrcola, osdestinos alternativos dados ao produto gerado pelo amanho da terra, o grau relativo dedesenvolvimento de ocupaes artesanais ou englobadas no setor de servios, assimcomo o correlato nvel de urbanizao comporiam o rol de caractersticas definidoras dosvrios embasamentos infra-estruturais nos quais enraizar-se-iam as diferentes estruturaspopulacionais acima aludidas.

    Como ficar evidente adiante, algumas variveis imediatamente relacionadas

    composio populacional revelaram-se decisivas na determinao da especificidade decada uma das distintas estruturas populacionais ora estudadas. Tais componentesbsicos consubstanciaram-se nos porcentuais de livres e escravos, no peso relativo deagregados e escravos na populao total, nos nmeros mdios de escravos, agregados,pessoas livres e indivduos em geral por domicilio. Impuseram-se significativamente,ademais, as relaes entre os valores acima referidos e o seu ordenamento, assim comoo grau relativo de urbanizao. Por outro lado, como veremos, a anlise do substratoeconmico das vrias estruturas populacionais revelou-se igualmente essencial nacaracterizao definitiva dessas estruturas.

    Estas observaes introdutrias antecipam algumas das concluses decorrentes da

    anlise comparativa exposta a seguir, passemos pois a ela.

    A estrutura populacional urbana distinguia-se das demais por apresentar, em termosgerais, grande porcentual de livres (3) e os menores valores para o nmero mdio deescravos, agregados e pessoas livres por domicilio. Ademais, a mdia de escravosrevelava-se maior do que a de agregados; a de livres, por seu turno, colocava-se entre osvalores referentes a cativos e agregados (Cf. Tabela 3).

    TABELA 3INDICADORES POPULACIONAIS

    Estruturas % de livres Nmero mdio, por domiclio, de % de Esc. e Agr.

    Populacionais Escravos Agregados Livres Pessoas na Populao

    Urbana 68,31 4,0 1,9 3,4 5,0 42,12Intermdia 50,32 7,2 2,8 3,3 6,5 56,53Rural de Autocons. 73,82 3,9 4,2 4,5 6,0 33,47Rural-Mineradora 44,16 18,2 23,6 9,1 20,7 80,28

    OBS.: (a) considerados apenas os domiclios em que havia escravos. (b) considerados apenas os domicliosnos quais havia agregados.

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    Quanto aos setores classicamente definidos pelos economistas, observa-se modestaparticipao do primrio, domnio do secundrio e presena marcante do setor deservios. Como se observa na tabela 4, o secundrio absorvia mais da metade daspessoas para as quais se identificou atividade econmica, o tercirio englobava mais deum tero, cabendo ao primrio pouco mais do que um vigsimo.

    TABELA 4PARTICIPAO DOS SETORES ECONMICOS

    (Em porcentagens)

    Estruturas Populacionais Primrio Secundrio Tercirio Total

    Urbana 6,4 56,4 37,2 100,0%

    Intermdia (a) 21,6 46,1 32,1 100,0%

    Rural de Autoconsumo 62,9 20,3 16,8 100,0%

    Rural-Mineradora (b):Capela do Barreto 52,5 37,7 9,8 100,0%Gama 5,5 82,2 12,3 100,0%

    OBS.: (a) exclusive Santa Luzia; (b) exclusive Abre Campo.

    A categoria rural-mineradora abrangia ncleos marcados pela agricultura voltada para acomercializao (Capela do Barreto), ou pela dominncia da atividade exploratriabaseada, provavelmente, na existncia de lavras relativamente ricas. Neste ltimo caso,ao que parece, os habitantes "especializavam-se" na minerao. No Abre Campo, lidaaurfera conjugava-se a agricultura de subsistncia destinada manuteno do pessoalempenhado na faina extrativa. No Gama, embora residissem alguns mineradores comavultado nmero de escravos, havia grande quantidade de faiscadores e desenvolvia-se aagricultura de subsistncia; observava-se, portanto, a decadncia da faina mineradora e oprocesso de diversificao de atividades produtivas do qual teria decorrido a estruturapopulacional aqui denominada "intermdia

    A estrutura rural-mineradora, marcada pela especializao, fundava-se no predomnioquantitativo dos cativos, indispensveis ao desenvolvimento das atividades extrativas ouagrcolas. Face s demais estruturas, a rural-mineradora caracterizava-se por apresentar

    a menor taxa de pessoas livres e os maiores valores mdios de escravos, agregados elivres por domiclio. Note-se, ainda, a supremacia do valor mdio de agregados sobre orelativo aos escravos e a inferioridade, face aos outros grupos, da cifra concernente aoslivres.

    Referentemente aos setores produtivos patenteava-se a inexpressividade do tercirio (agirar em torno de 10%) e a preponderncia absoluta do primrio ou do secundrio, eventoeste a depender do primado da agricultura ou da minerao (Cf. Tabela 4).

    Os ncleos nos quais definia-se a estrutura intermdia caracterizavam-se pela notriadecadncia da atividade aurfera. Nela os faiscadores predominavam decisiva e

    claramente sobre os mineradores; ocorria ainda o desenvolvimento da agricultura desubsistncia voltada para a comercializao e para o autoconsumo.

    Da Tabela 3 infere-se, imediatamente, a posio intermdia do peso relativo dos livres e

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    das mdias de agregados e cativos por domiclio. O nmero mdio de pessoas livrescolocava-se pouco abaixo do vigorante na categoria urbana; j o nmero mdio depessoas por domiclio ocupava posio intermediria. Ademais, o valor mdio referenteaos escravos superava o concernente aos agregados e o relativo aos livres entremeavaas referidas mdias de cativos e agregados.

    Os trs setores econmicos viam-se expressivamente representados na categoriaintermdia. O peso relativo do primrio alava-se a pouco mais de um quinto, o do

    secundrio colocava-se prximo dos cinqenta por cento e o do tercirio pouco abaixo deum tero. Deve-se notar, com respeito s estruturas urbana e intermdia, a marcantedivergncia relativa observada no setor primrio.

    Resta-nos caracterizar a categoria rural de autoconsumo. Definimo-la, como avanado, apartir das evidncias empricas propiciadas pelo estudo do distrito de N. Sa. dosRemdios. Nele encontramos grande participao relativa do elemento livre, o menornmero mdio de escravos por domiclio e valores intermedirios para as mdias deagregados e livres por domiclio -- superiores aos vigentes nas estruturas urbana eintermdia e inferiores aos imperantes na categoria rural-mineradora. Ademais, o nmeromdio de livres por domicilio superava o de agregados o qual, por sua vez, sobrepujava a

    mdia de escravos por unidade domiciliar. Como afirmamos, em N. Sa. dos Remdiospraticava-se, dominantemente, a nosso ver, a agricultura de subsistncia votada aoautoconsumo. Tal fato, alm de refletir-se nas relaes entre as variveis supracitadas,assinalava-se claramente nos pesos relativos concernentes aos setores econmicos.

    Destarte, ao primrio correspondia 63%, ao secundrio 20% e aos servios to-somente17%. Entre as atividades artesanais, cabia papel dos mais significativos s fiandeiras, asquais, certamente, utilizavam o algodo cultivado nas propriedades das unidadesfamiliares das quais elas mesmas eram integrantes.

    Antes de passarmos adiante, cabem algumas consideraes referentes s variveis

    "porcentagem de escravos e agregados na populao total" e "nmero mdio de pessoaspor domiclio". Como decorrncia das distintas participaes dos escravos na populaototal e da presena marcante dos agregados nos ncleos que apresentaram estruturapopulacional rural-mineradora, revelou-se distribuio coerente dos pesos relativos deagregados e escravos nas estruturas populacionais aqui analisadas. Assim, a participaodos mesmos deu-se em maior escala na estrutura populacional rural-mineradora (80,3%),a menor freqncia ocorreu na estrutura rural de autoconsumo (33,5%) e os pesosreferentes s demais categorias colocaram-se em faixa intermediria: 42,1% na estruturaurbana e 56,5% na intermdia, a qual, em face da urbana, exigia maior contingente deescravos.

    Evento similar, derivado de fatores anlogos aos enunciados acima, observou-se comrespeito ao nmero mdio de pessoas por domiclio: maiores valores para a estruturarural-mineradora, menores na urbana e intermedirios nas demais (Cf. Tabela 3).

    Identificadas as variveis mais significativas para a caracterizao das peculiaridades dasestruturas populacionais, passemos a considerar os elementos constitutivos daspopulaes estudadas que no revelaram grandes discrepncias e/ou comportamentosistemtico bastante para que fossem admitidos como definidores das distintas estruturaspopulacionais. Tais variveis denunciam as similitudes genricas essenciais entre asestruturas populacionais aqui estudadas; semelhanas estas para as quais j chamamos

    a ateno do leitor.

    O peso relativo das mulheres entre os livres superou, sistematicamente, o nvel de 50%.No entanto, para as estruturas intermdia e rural de autoconsumo o diferencial entre

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    homens e mulheres integrantes do estrato dos livres revelou-se desprezvel. J nasestruturas urbana e rural-mineradora a supremacia numrica do sexo feminino marcava-se mais claramente: representavam elas cerca de 55% dos livres. Digno de nota, a nossover, o fato de verificar-se justamente na estrutura rural de autoconsumo a distribuiomais equilibrada entre os sexos (Cf. Tabela 5).

    Entre os escravos, para todas as estruturas populacionais tpicas, predominaram oshomens. Por outro lado, as discrepncias observadas entre as distintas estruturas, ao que

    tudo indica, expressam as condies econmicas caractersticas de cada uma. Assim, naurbana, a participao dos homens entre os cativos atingiu, em face das demais, o menorvalor: 59%. Na rural de autoconsumo, dominada, pois, pela agricultura de subsistncia, acifra correlata alcanou 63%. Na intermdia, mais exigente em termos de mo-de-obramasculina, os homens representavam 67% dos mancpios. J na estrutura rural-mineradora, sobretudo por causa da atividade mineratria, a participao dos cativos dosexo masculino alou-se a 72% (Cf. Tabela 5).

    O peso dos agregados entre a populao livre variou de 9,9% a 55,0%. A divergnciamais significativa deu-se entre a estrutura rural-mineradora (55,0%) e as demais: 9,9% narural de autoconsumo, 13,6% na intermdia e 15,3% na urbana, Parece-nos sintomtico,

    por outro lado, que a menor participao tenha-se dado na estrutura rural deautoconsumo, justamente a que menos condies oferecia para "suportar" ou "exigir"nmero avultado de agregados. A existncia de parcela significativa de agregados naestrutura urbana pode ser explicada pelas condies econmicas adversas defrontadaspelos ncleos urbanos no incio do sculo XIX. A grande parcela de agregados naestrutura rural-mineradora pode ser explicada, ao que nos parece, pelo fato de existirem,nos centros estudados, umas poucas propriedades de porte relativamente grande;propriedades estas que "exigiam" e podiam "suportar" o contingente representado pelanumerosa parcela de agregados (Cf. Tabela 5).

    A considerao do peso relativo dos domiclios nos quais encontravam-se escravos

    permite-nos o estabelecimento de sugestivas ilaes.

    Impe-se desde logo a observao de que a posse de escravos apresentava-se muitodifundida, vale dizer, os cativos no apareciam concentrados em reduzido nmero dedomiclios. Assim, mesmo na estrutura rural de autoconsumo, na qual o porcentual dedomiclios com escravos era o mais baixo, os cativos faziam-se presentes em mais de umtero dos domiclios (exatamente em 36,1% deles). Na estrutura urbana cerca de doisquintos (39,3%) dos domiclios abrigava mancpios. A participao correlata atingia omaior valor na estrutura rural-mineradora (63,4%), a qual, como vimos, mostrava-se muitoexigente em termos de mo-de-obra. Na estrutura intermdia, a participao dosdomiclios com escravos atingia, igualmente, expressivos valor: 44,1%. V-se, ainda, queos pesos relativos dos domiclios com escravos mostravam coerncia em face dasatividades econmicas caractersticas de cada estrutura populacional tpica (Cf. Tabela 5).Os pesos relativos das famlias independentes (famlias cujo cabea do casal no eraagregado nem escravo) nas vrias estruturas populacionais aqui estudadas permitempoucas inferncias. Deve-se notar, por um lado, a pequena discrepncia observada entreas estruturas urbana (85,5%), intermdia (87,3%) e rural de autoconsumo (81,8%). Poroutro, dada a larga presena do elemento agregado, marca-se o baixo porcentualreferente estrutura. rural-mineradora (36,9%).

    Com respeito ao nmero mdio de filhos com vinte ou menos anos a viver com os pais,

    nota-se vincada divergncia entre a estrutura rural de autoconsumo (2,86) e as demais,para as quais a cifra correlata no apresentou grandes discrepncias: 1,80 para a urbana,1,81 referentemente intermdia e 1,67 concernente rural-mineradora.

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    Para os livres, os porcentuais de filhos legtimos (menores de 14 anos a residir com ospais) apresentaram larga discrepncia. A distino mais evidente marcou-se entre aestrutura populacional de auto consumo e as demais; conforme se pode observar natabela 5, o porcentual mais elevado (81,2%) verificou-se naquela estrutura, enquanto nasdemais os pesos relativos correlatos colocaram-se entre 50% e 60%. Parece-nossintomtico que, justamente na estrutura populacional mais "equilibrada", se tenhamobservado a maior porcentagem de filhos legtimos e o maior valor mdio de filhos (com20 ou menos anos) a viver com os pais.

    TABELA 5INDICADORES POPULACIONAIS

    Estruturas Livres Escravos Livres % de Domiclios N. Mdio de Filhos % de Famlias % de FilhosPopulacionais % Mu- % de Ho- % Agre com Escravos com 20 ou menos "Independen- Legtimos

    Lheres mens gados anos a viver com tes" entre osos pais Livres

    Urbana 55,43 59,33 15,28 39,33 1,80 85,50 49,2Intermdia 51,97 67,11 13,62 44,10 1,81 87,26 59,2Rural de Autocons. 50,63 62,85 9,87 36,10 2,86 81,80 81,2

    Rural-Mineradora 55,35 72,09 55,35 63,41 1,67 36,92 53,7

    Quanto s pirmides de idades e distribuio segundo grandes faixas etrias -- tantopara a populao total, como para os segmentos referentes e livres e escravos --,observou-se discrepncia marcante entre a estrutura rural de autoconsumo e as demais.Nela patenteou-se a existncia de uma populao relativamente mais "jovem" em facedas demais estruturas (Cf. Tabela 6). Tal evento decorreu, aparentemente, das prpriasrazes formativas de N. Sa. dos Remdios e/ou do fato de que os "choques" demogrficosderivados da decadncia exploratria j houvessem sido, poca, absorvidos pela

    comunidade; assim, em 1804, seu perfil populacional revelava-se mais "harmonioso.

    TABELA 6DISTRIBUIO DA POPULAO, SEGUNDO GRANDES FAIXAS ETRIAS

    Estruturas Livres Escravo Total

    Populacionais 0-14 15-64 65 e + 0-14 15-64 65 e + 0-14 15-64 65 e +

    Urbana 325 616 59 220 744 36 291 657 52

    Intermdia 322 613 65(a) 191 752 57(b) 293 643 64(a)Rural de Autocons. 421 554 25 311 660 39 394 580 26Rural-Mineradora(c) 303 561 136 212 720 68 252 650 98

    OBS.: Para cada estrutura tpica e conjunto de faixas etrias, os valores somam 1.000 no sentidohorizontal. (a) apenas Furquim; (b) Furquim e So Caetano; (c) Capela do Barreto e Abre Campo.

    Eis arroladas as principais caracteristicas das estruturas populacionais que identificamoscom base no estudo pormenorizado da populao de dez localidades mineiras.Evidentemente, este estudo tem um carter preliminar, no entanto, a nosso ver,conseguimos estabelecer as linhas gerais que definem a especificidade das aludidas

    estruturas. Acreditamos ademais, havermos indicado os elementos infra-estruturaisconcernentes a tais estruturas tpicas.

    Cabe lembrar, ainda, que nossa anlise referiu-se a um momento especfico do tempo.

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    Assim, afastamos consideraes relativas dinmica das vrias estruturas aqui definidas.Embora convidativas, assertivas com tal carter parecem-nos metodologicamentedesaconselhveis em face do fato de trabalharmos com dados censitrios referentes adistintas localidades e relativos, em sua maioria esmagadora, a 1804. No devemosdescartar, no entanto, a possibilidade de que a estrutura rural de autoconsumo se tenhageneralizado, em Minas Gerais, como decorrncia da prpria superao da atividadeextrativa.

    ESTRUTURA DA POSSE DE ESCRAVOS EM MINAS GERAIS

    Aspecto de grande interesse refere-se estrutura da posse de escravos, principal fator deproduo utilizado na lide extrativa e, provavelmente, um dos componentes de maiorimportncia no estoque de riqueza individual em Minas. Estudamos, ademais, algunstraos definidores da massa dos proprietrios de escravos, tais como o sexo e atividade.Em relao ao conjunto dos cativos, nosso interesse concentra-se no sexo e idade.

    A anlise contempla vrios momentos da histria mineira. Tomamos, em primeiro lugar, oano de 1718, caracterizado pela consolidao da atividade aurfera e implantao dos

    primeiros ncleos urbanos nas Gerais. Para tanto, consideramos dezoito diferenteslocalidades, distribudas pelas trs comarcas ento existentes. A seguir, preocupamo-noscom o mesmo tema, tendo por base cinco reas distintas em nove diferentes anos, dentrodo perodo que vai de 1718 a 1804. Por fim, voltamos nossa ateno especificamentepara 1804, apreciando, agora, um conjunto de dez ncleos mineiros.

    As fontes primrias de que nos servimos so constitudas por trinta manuscritos, dosquais vinte e um representados por documentos utilizados com finalidade tributria dearrecadao dos quintos e nove referentes a censos populacionais realizados nas Geraisem 1804. Consideramos, ademais, uma fonte impressa tambm correspondente a umcenso populacional de 1804. Os manuscritos, que pertencem ao conhecido Arquivo da

    Casa dos Contos, foram obtidos no Arquivo Pblico Mineiro e no Arquivo Nacional.

    ESTRUTURA DE POSSE (1718)

    Com referncia a 1718, contamos com informaes pertinentes a dezoito diferenteslocalidades distribudas pelas trs comarcas ento existentes. Pretendemos evidenciar arelativa homogeneidade dos vrios centros estudados; embora espacialmentedistanciados, tais ncleos derivavam de razes formativas existentes numa matriz scio-econmica comum; o estgio de expanso no qual se encontrava a minerao nas Geraisreforava, a nosso ver, o carter homogneo que parecia existir na rea em tela.

    Nos respectivos cdices, contamos 2.120 proprietrios e 14.665 escravos. Como ncleourbano mais representativo, quantitativamente, revelou-se a Vila do Carmo com seusdistritos e freguesias, que somaram 1.148 senhores e 9.838 cativos; tambm merecerealce Vila Rica, com 687 proprietrios e 4.328 escravos. A Vila de So Joo D'El Reycompareceu com 236 proprietrios e a do Pitangui com 49.

    A atividade extrativa, pela forma como se organizava, privilegiava a mo-de-obraenquanto fator de produo. Ademais, como a distribuio das datas minerais dava-se emfuno do nmero de escravos possudos, via-se estimulada a alocao macia dos

    recursos na aquisio de cativos.

    Ao confrontarmos os nmeros referentes s localidades em pauta, verifica-se, deimediato, a significativa representatividade dos indivduos com reduzido nmero de

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    escravos. De modo geral, cerca de 60% dos proprietrios possuam massa escravacomposta por cinco ou menos pessoas; destacam-se Bahependy-Ajuruoca, com 77,38%,e Congonhas do Campo, com 71,96%. No extremo oposto, encontramos So Sebastio eItatiaia com 41,44% e 46,58%, respectivamente (Cf. Tabela 7). Por outro lado, aparticipao de seus cativos na massa escrava como um todo situava-se em torno de22%, embora apresentasse significativas variaes por localidade: do mnimo de 9,32%,em So Sebastio, ao mximo de 50,28%, em Bahependy-Ajuruoca (Cf. Tabela 8).

    TABELA 7PROPRIETRIOS: DISTRIBUIO QUANTO AOS ESCRAVOS POSSUDOS (1718)

    (Porcentagens sobre o Total de Proprietrios, os valores somam100% na horizontal)

    Nmero de escravos possudos

    LOCALIDADES 1 a 5 6 a 10 11 a 20 21 a 40 41 e mais

    COMARCA DE VILA RICAVila Rica

    -Distritos de Vila Rica 63,96 20,06 11,90 2,38 1,70- Itatiaia 46,58 27,58 15,51 10,33 --- Congonhas do Campo 71,96 12,27 12,27 3,50 --- Ouro Branco 69,84 13,20 11,31 5,65 --- So Bartholomeu 68,01 18,22 8,00 4,44 1,33TOTAL 64,93 18,92 10,92 4,07 1,16

    Vila do Carmo- Distritos da Vila do Carmo 64,31 18,74 11,60 3,57 1,78- So Sebastio 41,44 18,02 21,62 15,32 3,60- Guarapiranga 55,33 19,50 21,39 3,15 0,63- Inficionado 55,00 29,00 12,00 2,50 1,50- Sumidouro 61,25 25,00 10,00 3,75 --

    - N. Senhora... 60,25 21,69 11,25 6,43 0,40- Brumado 53,98 30,16 11,11 3,96 0,79- N. Sra. dos Remdios 51,35 22,52 17,12 6,31 2,70TOTAL 55,75 23,26 14,28 5,40 1,31

    COMARCA DO RIO DAS MORTESVila de So Joo D'El Rey- Distritos de So Joo D'El Rey 60,00 18,00 14,00 6,00 2,00- Bahenpendy Ajuruoca 77,38 15,55 6,67 -- --- Itaverava 66,98 18,35 11,01 2,75 0,91- Localidade no Identificada 65,63 21,87 12,50 -- --TOTAL 67,39 18,22 11,01 2,54 0,84

    COMARCA DO RIO DAS VELHASVila de Pitangui 57,14 30,62 8,16 4,08 --

    TOTAL GERAL 60,05 21,46 12,69 4,62 1,18

    Quanto aos detentores de massa escrava composta de 6 a 10 elementos, seu pesorelativo situava-se em torno de 21%, entre os proprietrios, e 23% entre os cativos. Comreferncia participao entre os senhores, os limites -- inferior e superior -- eram dados,respectivamente, pela Vila de Pitangui (30,62%) e por Congonhas do Campo (72,27%).

    Se considerarmos o segmento seguinte, ou seja, o constitudo por indivduos que seanotaram com escravaria entre 11 e 20 pessoas, verifica-se que seu peso correspondia acerca de 12% entre os que possuam escravos; sua participao na massa escravaalcanava 26%.

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    Ao tomarmos os senhores mais ricos, indivduos que compareceram com mais de vinteescravos, evidencia-se que sua participao, entre os proprietrios, era de pequenamonta (em torno de 6%), embora a eles coubesse cerca de 27% da massa cativaarrolada. So Sebastio representou a freguesia de maior importncia no segmento emapreo: entre os senhores perfaziam 18,92% e seus escravos representavam 54,80% daescravaria existente no ncleo. Por outro lado, em Bahependy-Ajuruoca, nenhumproprietrio enquadrou-se no segmento correspondente aos elementos com mais de vinte

    escravos.

    TABELA 8PROPRIETRIOS: DISTRIBUIO QUANTO AOS ESCRAVOS POSSUDOS (1718)(Porcentagens sobre o Total de Escravos, os valores somam 100% na horizontal)

    Nmero de escravos possudos

    LOCALIDADES 1 a 5 6 a 10 11 a 20 21 a 40 41 e mais

    COMARCA DE VILA RICAVila Rica

    - Distritos de Vila Rica 26,44 23,94 26,38 10,13 3,11- Itatiaia 15,36 25,45 28,88 30,31 --- Congonhas do Campo 30,87 16,78 34,90 17,45 --- Ouro Branco 31,32 16,30 26,19 26,19 --- So Bartholomeu 25,96 23,32 18,31 22,31 10,10TOTAL 25,68 22,88 24,67 17,97 8,80

    Vila do Carmo- Distritos da Vila do Carmo 26,58 22,12 23,30 15,31 12,69- So Sebastio 9,32 10,70 25,18 34,79 20,01- Guarapiranga 19,98 20,87 43,80 10,89 4,46- Inficionado 20,20 31,52 24,93 8,81 12,54- Sumidouro 23,96 30,85 28,29 16,90 --- N. Senhora... 22,20 24,30 24,13 25,07 4,30- Brumado 23,24 32,80 23,82 15,19 4,95- N. Sra. dos Remdios 15,76 19,31 29,23 18,27 17,43TOTAL 15,76 23,36 27,66 19,09 10,13

    COMARCA DO RIO DAS MORTESVila de SoJoo D'El Rey- Distritos de So Joo D'El Rey 17,78 18,66 28,28 22,45 12,83- Bahependy - Ajuruoca 50,28 29,62 20,10 -- --- Itaverava 28,92 24,84 26,89 12,58 6,77- Localidade no Identificada 34,65 29,05 36,30 -- --TOTAL 29,84 24,50 27,54 11,66 6,46

    COMARCA DE RIO DAS VELHASVila de Pitangui 28,34 37,33 19,00 15,33 --

    TOTAL GERAL 22,61 23,61 26,59 18,00 9,19

    O uso de alguns indicadores estatsticos permite-nos complementar a anlise em pauta.Assim, a mdia de escravos por proprietrio manteve-se em torno de sete, destacando-seSo Sebastio (12,38) e N. S. dos Remdios (8,63); as menores mdias ocorreram emBahependy-Ajuruoca (4,20) e Congonhas do Campo (5,23). A moda predominante situou-se em um, havendo tambm vrias localidades com o valor dois, sendo estes os nicos

    resultados encontrados. Quanto mediana, os nmeros predominantes situaram-se entre3 e 5; So Sebastio, com 7, e Congonhas do Campo, com 2, corresponderam s nicasexcees (Cf. Tabela 9).

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    Vejamos o ndice de Gini. Seus resultados para as localidades em apreocompreenderam valores entre 0,450 e 0,550. Os distritos de So Joo D'El Rey (0,567) eSo Bartholomeu (0,559) foram os ncleos que apresentaram os maiores ndices deconcentrao; os menores couberam a Bahependy-Ajuruoca (0,392) e Vila de Pitangui(0,403).

    TABELA 9ESTRUTURA DA POSSE DE ESCRAVOS: INDICADORES ESTATSTICOS (1718)

    LOCALIDADES NDICE DE GINI MDIA MODA MEDIANA

    COMARCA DE VILA RICAVila Rica-Distritos de Vila Rica 0,499 6,28 2 4- Itatiaia 0,456 8,53 2 6- Congonhas do Campo 0,534 5,23 1 2

    - Ouro Branco 0,501 5,91 2 3- So Bartholomeu 0,559 6,12 1 3TOTAL 0,521 6,30 2 4

    Vila do Carmo-Distritos da Vila da Vila do Carmo 0,518 6,80 1 5- So Sebastio 0,538 12,38 2 7- Guarapiranga 0,481 7,05 1 5- Inficionado 0,477 6,98 2 5- Sumidouro 0,504 6,36 1 4- N. Senhora... 0,522 6,82 1 4- Brumado 0,445 6,90 2 5- N. Sra. dos Remdios 0,528 8,63 1 5

    TOTAL 0,511 7,57 1 5COMARCA DO RIO DAS MORTESVila de SoJoo D'El Rey- Distritos de So Joo D'El Rey 0,567 6,86 1 3- Bahependy Ajuruoca 0,392 4,20 2 3- Itaverava 0,508 5,83 1 4- Localidade no Identificada 0,433 5,59 1 5TOTAL 0,505 5,71 1 4

    COMARCA DO RIO DAS VELHAS- Vila de Pitangui 0,403 6,12 2 5

    TOTAL GERAL 0,515 6,92 1 4

    Pelas evidncias apresentadas, quanto estrutura da posse de escravos, revela-se asignificativa representatividade dos elementos com reduzido nmero de escravos, emMinas Gerais, na poca em questo. Raros os proprietrios com avultada escravaria;assim, por exemplo, dentre todos os senhores computados neste trabalho -- 2.120 --apenas dezenove detinham mais de quarenta escravos (possuam 9% da escravaria);acima de sessenta anotaram-se quatro indivduos, sendo que o maior proprietriocompareceu com 77 cativos.

    De modo geral, no se evidenciaram grandes disparidades entre as quatro vilas emestudo. Se tomarmos o ndice de Gini, para as localidades agregadas a nvel de vila,exceto Pitangui (0,403), as demais apresentaram resultados muito prximos: Vila Rica(0,521), Vila do Carmo (0,511) e Vila de So Joo D'El Rey (0,505). Quanto mdia,

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    encontramos um mximo de 7,57 na Vila do Carmo; 6,30, em Vila Rica; 6,12, em Pitangui,e 5,71 em So Joo D'El Rey. A mediana variou entre 4 e 5 nas quatro reas em foco.

    Pelos nmeros apresentados, embora com parmetros relativamente semelhantes sdemais, So Joo D'El Rey parece corresponder vila mais pobre, pois suas localidadesapresentaram o menor nmero de escravos por proprietrio e nelas revelou-se o maiorpeso relativo dos indivduos com escravaria igual ou inferior a cinco elementos, ademais,em duas de suas localidades, no encontramos nenhum indivduo com escravaria

    superior a vinte elementos.

    Como complemento desta anlise, vejamos algumas qualificaes dos proprietrios.Infelizmente, apenas no documento pertinente aos Distritos da Vila do Carmo anotaram-se tais informaes. Na localidade em apreo, trinta e oito indivduos compareceram comatividades extrativas -- trinta e seis mineiros e dois faiscadores -- e sua escravaria somava328 elementos. Note-se a significativa diferena entre a mdia de escravos dos mineiros edos faiscadores: para os primeiros tal indicador alou-se a 8,92; para os ltimos, alcanouapenas 3,50 (Cf. Tabela 10).

    TABELA 10PROPRIETRIOS: POR SEGMENTO SCIO-ECONMICO

    E ESCRAVOS POSSUDOS(Distritos da Vila do Carmo - 1718)

    Segmentos Proprietrios Escravos Possudos Mdia de EscravosN. % N. % por Proprietrio

    Atividade Extrativa 38 33,93 328 42,94 8,63

    - Mineiro 36 32,14 321 42,02 8,92- Faiscador 2 1,79 7 0,92 3,50Agricultura 30 26,79 126 16,49 4,20Artesanato 3 2,68 15 1,96 5,00Comrcio 8 7,14 50 6,54 6,25Patentes, Funcionriose Militares 3 2,68 70 9,16 23,33Outros(a) 2 1,79 3 0,39 1,50No Identificados 28 24,99 172 22,52 6,14TOTAL 112 100,00 764 100,00 6,80

    FORROS 4 3,57 18 2,36 4,50

    OBS.: (a) inclui um capito-do-mato e um indivduo que vivia "de sua agncia".

    Os agricultores compareceram em nmero de trinta (26,79% dos senhores) e possuamescravaria composta de 126 pessoas, o que representa 16,49% dos cativos; a mdia porproprietrio alcanava 4,20. Ademais, arrolaram-se trs indivduos dedicados aoartesanato (15 escravos); oito vinculados ao comrcio (50 escravos); trs pessoasclassificadas na categoria de patentes, funcionrios e militares (70 escravos), um capito-do-mato e um indivduo que declarou viver de sua agncia. Deve-se realar a elevadamdia de escravos por senhor referente ao segmento constitudo por patentes,

    funcionrios e militares (23,33), enquanto a mdia do ncleo alcanava 6,80. Ainda comoinformao referente aos proprietrios, evidencia-se o comparecimento de quatro forrosque, em conjunto, possuam dezoito cativos (mdia de 4,50).

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    Por fim, quanto anlise dos proprietrios, vejamos o sexo. Coube predomnio marcanteaos elementos do sexo masculino, com porcentuais acima de 95%. Da totalidade dossenhores com os quais estamos a trabalhar (2.120), apenas 39 pertenciam ao sexofeminino -- a maioria constituda por vivas ou forras.

    ESTRUTURA DE POSSE (1718 A 1804)

    Para o estabelecimento de uma viso ampla da sociedade mineira, tomamos para estudocinco diferentes localidades, em fases distintas do evolver da atividade extrativa. Estuda-mos a Vila de Pitangui, nos anos de 1718 a 1723, em fase de consolidao da lideextrativa; analisamos o Serro do Frio, em 1738, momento prximo ao apogeu daminerao, quando esta ltima j se encontrava definitivamente assentada; a terceiralocalidade correspondeu a Congonhas do Sabar, em duas pocas distintas: em 1771,quando se evidenciavam os primeiros sinais de esgotamento das minas e, no ano de1790, quando a decadncia se mostrava mais evidente e irreversvel. Por fim,

    consideramos Vila Rica e o Distrito de So Caetano, ambos em 1804, quando a economiamineira se encontrava em franca recesso, com o empobrecimento da populaoestabelecida nas Gerais e o esvaziamento dos ncleos urbanos ali existentes.

    Salta vista, de imediato, a elevada porcentagem de senhores com reduzido nmero decativos. Em todas as localidades estudadas, a maior freqncia coube aos proprietrioscom um e dois escravos, cujo peso relativo, na maioria delas, ultrapassava os quarentapor cento, com as maiores marcas no Serro do Frio, em 1738, com 56,0%, e Vila Rica, em1804, com 54,9%. Pitangui, em 1718 e 1723, constitua o ncleo de menor participaorelativa do segmento em apreo, com valores de 28,5% e 33,3%, respectivamente (Cf.Tabela 11).

    TABELA 11PROPRIETRIOS: DISTRIBUIO QUANTO AOS ESCRAVOS POSSUDOS,

    SOBRE O TOTAL DE PROPRIETRIOS

    Nmero de Pitangui Serro do Frio Congonhas do Sabar So Caetano Vila RicaEscravos 1718 1723 1738 1771 1790 1804 1804Possudos

    1 4,1 16,3 37,6 26,8 33,1 19,2 35,3

    2 24,4 17,0 18,4 17,4 19,4 21,2 19,63 4,1 15,6 10,1 14,0 9,7 18,3 12,64 14,3 9,6 7,8 5,5 9,7 4,8 9,65 10,2 11,1 4,5 7,2 3,2 6,7 5,21 a 5 57,1 69,6 78,4 70,9 75,1 70,2 82,36 a 10 30,6 15,6 12,0 12,8 16,1 15,4 12,211 a 20 8,2 8,9 5,9 12,8 6,4 8,7 4,421 a 40 4,1 4,4 2,8 2,6 2,4 2,9 0,841 e mais -- 1,5 0,9 0,9 -- 2,8 0,3

    OBS.: Os valores so porcentagens e expressam a participao dos escravistas sobre o nmero total deproprietrios.

    Note-se, ademais, a absoluta preponderncia do conjunto de senhores com cinco oumenos cativos; sua participao -- exceto em Pitangui, em 1718 (57,1%) -- superou os70%. Em relao aos escravos possudos, estes proprietrios detinham uma proporo a

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    variar entre o mnimo de 26,3% e o mximo de 47,1%, ambos no ano de 1804, o primeiroem So Caetano e o ltimo em Vila Rica.

    O peso dos proprietrios com uma quantidade entre seis e vinte escravos situou-se, noque se refere aos senhores, entre 16,6% (1804) e 38,8% (1718) e, quanto aos cativos,entre 37,4% (1804) e 56,4% (1718) -- Cf. Tabela 12.

    TABELA 12

    PROPRIETRIOS: DISTRIBUIO QUANTO AOS ESCRAVOS POSSUDOS,SOBRE O TOTAL DE ESCRAVOS

    Nmero de Pitangui Serro do Frio Congonhas do Sabar So Caetano Vila RicaEscravos 1718 1723 1738 1771 1790 1804 1804Possudos

    1 0,7 2,5 8,3 4,8 7,4 3,0 9,42 8,0 5,3 8,1 6,2 8,6 6,6 10,53 2,0 7,3 6,7 7,6 6,5 8,5 10,04 9,3 6,0 6,9 4,0 8,6 3,0 10,35 8,3 8,6 4,9 6,5 3,6 5,2 6,9

    1 a 5 28,3 29,7 34,9 29,1 34,7 26,3 47,16 a 10 37,4 18,5 20,2 17,3 26,1 18,7 24,111 a 20 19,0 21,3 17,9 32,3 22,0 18,7 16,021 a 40 15,3 20,7 16,9 13,3 17,2 15,2 5,941 e mais -- 9,8 10,1 8,0 -- 21,1 6,9

    OBS.: Os valores so porcentagens e expressam a participao dos escravos possudos sobre o nmerototal de escravos.

    Os senhores de grande cabedal -- proprietrios de escravaria superior a quarenta cativos-- compareceram em reduzido nmero em todos os anos considerados; mesmo sua

    participao na massa escrava no se revelou de grande monta. Exceto em So Caetano(1804), nas demais localidades seu peso entre os proprietrios alcanou um mximo de1,5% e entre os escravos possudos no ultrapassou a marca dos 10,1%.

    Os resultados obtidos em alguns indicadores estatsticos permitem-nos uma anliseadicional dos dados em foco. A mdia de escravos por proprietrio colocou-se entre omximo de 6,5 -- em So Caetano -- e o mnimo de 3,7 -- em Vila Rica --, ambascorrespondentes ao ano de 1804. Em Pitangui, tal resultado alcanou nmeros acima deseis para os dois anos considerados; no Serro, a mdia situou-se em 4,6 e, emCongonhas do Sabar, 5,6 e 4,5, respectivamente, nos anos de 1771 e 1790. Quanto moda, em todos os ncleos em apreo, os valores encontrados foram um ou dois; a

    mediana variou de um mximo de cinco, em 1718, a um mnimo de dois em trsdiferentes localidades (Cf. Tabela 13).

    TABELA 13INDICADORES ESTATSTICOS

    Localidade Ano ndice de Gini Mdia Moda MedianaPitangui 1718 0,403 6,1 2 5Pitangui 1723 0,532 6,4 2 4Serro do Frio 1738 0,573 4,6 1 2

    Congonhas do Sabar 1771 0,549 5,6 1 3Congonhas do Sabar 1790 0,537 4,5 1 2So Caetano 1804 0,573 6,5 2 3Vila Rica 1804 0,502 3,7 1 2

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    De modo geral, os resultados referentes estrutura de posse de cativos aquiapresentados demonstram uma sociedade na qual predominavam, incontestavelmente,os pequenos proprietrios; indivduos possuidores de escravaria de um, dois ou, nomximo, cinco escravos. Raros os proprietrios de grande escravaria; assim, porexemplo, dentre todos os senhores computados neste trabalho, que compreendem cercade 3.400, apenas vinte e seis possuam mais de quarenta cativos; acima de sessentaanotaram-se seis pessoas e com massa superior a cem, encontramos, to-somente, um

    proprietrio (com 126 cativos). Portanto, a nosso ver, em Minas, as grandes lavras devemter constitudo a exceo e no a regra quanto organizao da estrutura produtiva.

    De modo geral, no se obtiveram evidncias de mudanas ao longo do tempo naestrutura de posse de cativos, a acompanhar as vrias fases da economia mineira.Mesmo se tomarmos os dados do Serro do Frio e de Vila Rica -- dos centros aquiestudados, os de maior densidade populacional -- correspondentes a dois momentosradicalmente distintos da atividade extrativa, 1738 e 1804, no encontraremos diferenasmarcantes na estrutura de posse de cativos.

    Como complemento anlise realizada, vejamos os resultados obtidos pelo clculo do

    ndice de Gini. Exceto para 1718, em Pitangui, este indicador estatstico pouco variou,com valores compreendidos entre 0,502 e 0,573. Tais cifras, que podem ser consideradasbaixas, confirmam as observaes anteriormente feitas, pois revelam uma distribuio deescravos relativamente proporcionada.

    Outro aspecto a ser contemplado refere-se distribuio dos proprietrios de escravossegundo o sexo. Nos vrios anos e locais analisados, ocorreu franco predomniomasculino. Entretanto, ao longo do sculo dezoito e inicio do dezenove, nota-se umagradativa tendncia a uma situao menos desequilibrada. De uma primeira fase, aindade consolidao da atividade e na qual o esprito de aventura levava prepondernciamasculina nos centros mineratrios, v-se que, lenta mas persistentemente, as mulheres

    ampliaram sua participao no segmento dos proprietrios de escravos. Destarte, noperodo 1718-23, na Vila de Pitangui, o peso relativo dos homens alcanou marcasuperior a noventa por cento, a atestar ampla maioria masculina. Em 1738, no Serro doFrio, esse porcentual reduziu-se significativamente, mas, ainda se manteve elevado(83,6%). Na Freguesia de Congonhas do Sabar, verificou-se aumento na importnciarelativa das mulheres: 22,6%, em 1771, e 30,6% em 1790. Por fim, em Vila Rica e noDistrito de So Caetano (1804), o sexo feminino correspondeu a 37,3 e 28,9%,respectivamente.

    Tais nmeros podem ser confirmados pela razo de masculinidade dos proprietrios, quese reduziu, sistematicamente, de valores superiores a 1.100 em Pitangui (1718-23), para168,4 e 246,7, respectivamente, em Vila Rica e So Caetano, em 1804 (Cf. Tabela 14).

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    TABELA 14PROPRIETRIOS DE ESCRAVOS: DISTRIBUIO SEGUNDO O SEXO

    Localidade-ano Prop. Homens Prop. Mulheres Total Razo de Mas-

    Nmero % Nmero % culinidade

    Vila de Pitangui-1718 48 98,0 1 2,0 49 4.800,0Vila de Pitangui-1719 61 98,4 1 1,6 62 6.100,0

    Vila de Pitangui-1720 58 93,5 4 6,5 62 1.450,0Vila de Pitangui-1722 114 91,9 10 8,1 124 1.140,0Vila de Pitangui-1723 127 94,1 8 5,9 135 1.587,5Serra do Frio-1738 1.458 83,6 286 16,4 1.744 509,8Freg. de Congonhasdo Sabar-1771 182 77,4 53 22,6 235 343,3Freg. de Congonhasdo Sabar-1790 86 69,4 38 30,6 124 226,3Distr. de So Caetano-1804 74 71,1 30 28,9 104 246,7Vila Rica-1804 475 62,7 282 37,3 757 168,4

    ESTRUTURA DA POSSE DE ESCRAVOS (1804)

    Pretendemos neste item estudar a estrutura scio-econmica de Minas Gerais, em 1804,momento de franco declnio e desagregao da atividade aurfera. Nesse sentido, otrabalho dever compreender as caractersticas principais da populao escrava e dosrespectivos senhores, bem como considerar a estrutura de posse da mo-de-obraescrava.

    As reas analisadas, que se haviam estabelecido pelos efeitos da lide extrativa,encontravam-se em estado de profunda decadncia que, perdurando por algumas

    dcadas, se iniciara com o gradativo esgotamento das ocorrncias de ouro.

    Os resultados ora apresentados concernem a dez diferentes localidades das Gerais;apesar de derivadas de uma mesma raiz formativa, cada uma delas, medida que seconsolidava como ncleo populacional, adquiria caractersticas prprias, a nosso ver,reafirmadas quando o empobrecimento se abateu sobre a regio; cada rea adaptou-ses suas prprias peculiaridades e potencialidades econmicas. Assim, pretendemosestudar determinados elementos, tanto homogneos como desiguais, porventuraencontrados na estrutura scio-econmica de tais ncleos, distribudos espacialmentepelas Gerais.

    A documentao da qual nos servimos como fonte primria constitui-se de censospopulacionais efetuados em diferentes partes da colnia no ano aqui contemplado: 1804.

    As dez reas em apreo somavam uma populao total de 28.046 pessoas, das quais11.589 na condio escrava e 16.457 como homens livres. As localidades maisrepresentativas, quantitativamente, correspondiam a Santa Luzia, com um total de 12.212elementos (6.574 livres e 5.638 cativos) e Vila Rica, em cujo censo contaram-se 8.923habitantes (6.084 livres e 2.839 escravos). No extremo oposto, situava-se Abre Campo,com trinta pessoas livres e cinqenta e oito escravos.

    Em termos relativos quanto representatividade dos escravos na populao total,

    verifica-se significativa dessemelhana entre os vrios ncleos. A rea compreendida porMariana, Passagem e Vila Rica, eminentemente urbana, revelou participao escravafrancamente minoritria, constituindo menos da tera parte da populao. Por outro lado,em Capela do Barreto, Abre Campo e Gama, a maioria dos habitantes compunha-se de

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    elementos reduzidos condio escrava, destacando-se Abre Campo, ncleo localizadona Zona da Mata e predominantemente agro-extrativo, com 65,91% (Cf. Tabela 15).

    TABELA 15POPULAO POR LOCALIDADE: LIVRES E ESCRAVOS (1804)

    Localidades LIVRES ESCRAVOS TOTALNmero % Nmero %

    Mariana 701 72,72 263 27,28 964Passagem 736 63,78 418 36,22 1.154Vila Rica 6.084 68,18 2.839 31,82 8.923Furquim 1.269 55,37 1.023 44,63 2.292So Caetano -- -- 681 -- 681Santa Luzia 6.574 53,83 5.638 46,17 12.212N.Sa. dos Remdios 719 73,82 255 26,18 974Capela do Barreto 170 46,96 192 53,04 362Abre Campo 30 34,09 58 65,91 88Gama 174 43,94 222 56,06 396

    TOTAL 16.457 -- 11.589 -- 28.046

    Isso posto, efetuemos a partio dos proprietrios segundo o sexo. V-se que a presenafeminina no total dos proprietrios de escravos variava, nos ncleos aludidos, entre omnimo de 12,86% (N. Sa. dos Remdios) e o mximo de 42,11%, em Mariana. Nasreas nitidamente urbanas, Mariana, Passagem e Vila Rica, o peso relativo doselementos do sexo feminino alcanava 42,11%, 33,33% e 37,30%, respectivamente. Comreferncia razo de masculinidade, seus valores situavam-se entre 128,12, em Mariana,e 677,77, em N. Sa. dos Remdios (Cf. Tabela 16).

    TABELA 16PROPRIETRIOS: DISTRIBUIO SEGUNDO O SEXO (1804)

    Localidade-ano Prop. Homens Prop. Mulheres Total Razo de Mas-Nmero % Nmero % culinidade

    Mariana 41 53,95 32 42,11 76 128,12Passagem 64 66,67 32 33,33 96 200,00Vila Rica 475 62,70 282 37,30 757 168,44Furquim 99 69,72 41 29,29 142 241,46So Caetano 74 71,15 30 28,85 104 246,67Santa Luzia 663 70,83 241 25,75 936 275,10N. Sa. dos Remdios 61 87,14 9 12,86 70 677,77Capela do Barreto 11 61,11 7 38,89 18 157,14Abre Campo 5 88,83 1 16,17 6 500,00Gama 13 65,00 6 35,00 20 216,67

    Vejamos a estrutura de posse de escravos. Evidencia-se a significativa participao dopequeno proprietrio; assim, os senhores com cinco ou menos escravos representaram

    mais de 70% dos proprietrios em sete dos dez ncleos estudados, destacando-se nessesentido N. Sa. dos Remdios (84,28%), Mariana (84,21%), Vila Rica (82,30% e Passagem(80,22%). No extremo oposto, colocaram-se Gama, Abre Campo e Capela do Barreto, osdois primeiros com 50,00% e o ltimo com 66,66%. Tomando-se os indivduos que

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    compareceram com escravaria entre seis e dez cativos, resulta um porcentual varivelentre 11,28% (Furquim) e 20,00% (Gama).

    Ao considerarmos os indivduos que se anotaram com mais de dez escravos, observa-sea caracterizao de dois grupos de localidades com relativa distino: no primeiro,composto por Capela do Barreto, Abre Campo e Gama, tal segmento de senhoresapresentava-se significativo (acima de 30,00%), enquanto no segundo grupo, compostopelos demais ncleos, tal porcentual no ultrapassava a marca dos 15,00%, sendo que

    em Mariana, Passagem e Vila Rica essa participao situava-se abaixo dos 7,50% (Cf.Tabela 17).

    TABELA 17PROPRIETRIOS: DISTRIBUIO QUANTO AOS ESCRAVOS POSSUDOS (1804)

    (Porcentagens sobre o Total de Proprietrios, os valores somam100% na horizontal)

    Nmero de escravos possudosLOCALIDADES 1 a 5 6 a 10 11 a 20 21 a 40 41 e mais

    Mariana 84,21 13,16 -- 2,63 --Passagem 80,22 12,50 3,12 3,12 1,04Vila Rica 82,30 12,20 4,40 0,80 0,30Furquim 72,53 11,28 6,34 7,03 2,82So Caetano 70,19 15,38 8,65 2,88 2,88Santa Luzia 75,42 12,71 6,20 3,10 2,57N. Sa. dos Remdios 84,28 12,86 -- 2,86 --Capela do Barreto 66,66 -- 22,22 5,56 5,56Abre Campo 50,00 16,66 16,66 16,66 --Gama 50,00 20,00 20,00 5,00 5,00

    Ao verificarmos o peso de tais segmentos no conjunto dos escravos anotados, observa-se que os senhores de menores posses -- assim considerados aqueles com at dezescravos -- continuavam com participao marcante, particularmente nas reas maisurbanizadas como Vila Rica (71,25%), Mariana (77,95%) e Passagem (71,29%).Novamente, no extremo oposto, comparecem as regies de agricultura e minerao:Capela do Barreto (19,27%), Gama (22,52%) e Abre Campo (25,86%). Nestes trsncleos evidencia-se um peso mais expressivo dos mdios e grandes senhores; assim,se considerarmos os indivduos anotados com mais de vinte escravos, sua participao

    alcanaria cerca de 50,00%, porcentual tambm verificado em So Caetano (54,64%).Em contraposio, os cativos possudos por tal segmento de senhores representavamto-somente 12,80% da massa escrava anotada em Vila Rica e 22,05% da recenseadaem Mariana (Cf. Tabela 18).

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    TABELA 18PROPRIETRIOS: DISTRIBUIO QUANTO AOS ESCRAVOS POSSUDOS (1804)(Porcentagens sobre o Total de Escravos, os valores somam 100% na horizontal)

    Nmero de escravos possudosLOCALIDADES 1 a 5 6 a 10 11 a 20 21 a 40 41 e mais

    Mariana 50,19 27,76 -- 22,05 --Passagem 39,00 23,68 8,61 18,42 10,29

    Vila Rica 47,10 24,10 16,00 5,90 6,90Furquim 22,68 11,05 11,63 28,54 26,10So Caetano 26,31 18,68 18,69 14,80 21,52Santa Luzia 26,97 15,80 14,46 14,72 28,05N. Sa. dos Remdios 51,37 23,92 -- 24,71 --Capela do Barreto 19,27 -- 33,33 19,27 28,13Abre Campo 10,34 15,52 20,69 53,45 --Gama 8,56 13,96 23,87 16,22 37,39

    Os resultados acima apresentados podem ser melhor entendidos por meio de algunsindicadores estatsticos. A mdia de escravos por proprietrio confirma os nmeros

    discutidos, ao mostrar-se relativamente baixa em Mariana (3,461), Passagem (4,354), VilaRica (3,750) e N. Sa. dos Remdios (3,643) e significativamente mais elevada em Capelado Barreto (10,667), Abre Campo (9,667) e Gama (11,100). O mesmo tipo de evidnciasalta vista quando computamos a mdia de escravos por domiclio. Naquelas quatroprimeiras localidades, resultam valores entre 3,92 e 4,70, enquanto nas trs ltimasobservaram-se mdias de 32,00, 19,33 e 13,06, respectivamente.

    TABELA 19ESTRUTURA DE POSSE DE ESCRAVOS: INDICADORES ESTATSTICOS (1804)

    Localidades ndice de Gini Mdia Moda Mediana Mdia de Escravospor Domiclio

    Mariana 0,49625 3,461 1,00 2,056 4,11Passagem 0,55388 4,354 1,00 2,150 4,70Vila Rica 0,502 3,750 1,00 2,000 3,96Furquim 0,6492 7,204 1,00 2,750 7,10So Caetano 0,573 6,480 2,00 3,000 --Santa Luzia 0,62892 6,022 1,00 2,508 7,22N. Sa. dos Remdios 0,49473 3,643 1,00 2,233 3,92Capela do Barreto 0,58912 10,667 4,00 4,300 32,00Abre Campo 9,667 -- 3,500 19,33

    Gama 0,64324 11,100 1,00 5,500 13,06

    Alm da mdia de escravos por domiclio, vejamos a porcentagem de domiclios nosquais compareceram cativos. Destacam-se Capela do Barreto, Abre Campo e Gama, osdois primeiros com 100% e o ltimo com 53,12%. As menores marcas revelaram-se emMariana (28,70%), Passagem (37,71%), N. Sa. dos Remdios (40,77%) e Vila Rica(40,90%).

    Ainda com relao aos indicadores estatsticos, vejamos o ndice de Gini, que nos permiteanalisar o grau de concentrao da posse de escravos. Gama (0,64324) aparece como a

    localidade na qual se manifesta o maior grau de concentrao, seguida de Santa Luzia(0,62892) e Capela do Barreto (0,58912). Os menores ndices resultaram em N. Sa. dosRemdios (0,49473), Mariana (0,49625) e Vila Rica (0,502) -- Cf. Tabelas 19 e 20.

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    TABELA 20ESCRAVOS E DOMICLIOS (1804)

    Localidades Nmero N. de Domiclios % Domiclios Mdia de Esc.de Esc. Total Com Esc. com Escrav. por Domiclio

    Mariana 263 223 64 28,70 4,11Passagem 418 236 89 37,71 4,70

    Vila Rica 2.839 1.753 717 40,90 3,96Furquim 1.023 318 144 45,28 7,10So Caetano 681 -- -- -- --Santa Luzia 5.638 1.757 781 44,45 7,22N. Sa. dos Remdios 255 161 65 40,37 3,96Capela do Barreto 192 6 6 100,00 32,00Abre Campo 58 3 3 100,00 19,33Gama 222 32 17 53,12 13,06

    Resultado interessante a ser observado refere-se relao entre o sexo do proprietrio eo sexo correspondente a seus escravos. Apesar de o contingente masculino de cativos

    mostrar-se majoritrio em todas as localidades, sua distribuio efetuava-sedesigualmente entre os proprietrios do sexo masculino e feminino. Os primeirospossuam, proporcionalmente, mais homens, acima da mdia de cada ncleo, enquantoas proprietrias anotaram-se com uma composio de cativos com elevada proporo demulheres, sendo que em quatro dos oito ncleos para os quais temos tais dados ocontingente de escravas mostrava-se majoritrio na escravaria possuda pelas mulheres.O caso extremo deu-se em Passagem de Mariana, na qual os proprietrioscompareceram com uma proporo de escravas da ordem de 37,88%, enquanto entre asproprietrias tal porcentual alcanava 62,12% (Cf. Tabela 21).

    TABELA 21PROPRIETRIOS EM RELAO AO SEXO DOS ESCRAVOS POSSUDOS (1804)

    Localidades Proprietrios Homens Proprietrias MulheresSexo dos Escravos Sexo dos Escravos% H % M % H % M

    Mariana 71,21 25,13 37,88 62,12Passagem 71,00 29,00 51,69 48,31Furquim 69,15 30,61 57,97 42,03

    So Caetano 68,82 31,18 60,23 39,77N. Sa. dos Remdios 63,83 35,32 45,00 55,00Capela Barreto 60,13 39,87 44,12 55,88Abre Campo 78,57 21,43 50,00 50,00Gama 88,28 11,73 73,97 26,03

    OBS.: Dados no calculados para Vila Rica e no disponveis para Santa Luzia.

    O ltimo tpico a ser tratado contempla a relao entre proprietrios e suas atividadeseconmicas. Verifica-se, de imediato, que as informaes disponveis mostraram-se

    extremamente pobres, pois o grau de indeterminao revela-se excessivamente alto.Mesmo assim, tentemos extrair algumas evidncias. Observa-se, de modo geral, umsignificativo nmero de indivduos dedicados minerao, agricultura e, em algumaslocalidades como Vila Rica, Furquim, Passagem etc., expressiva participao de

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    elementos ligados ao artesanato, ao comrcio e aos servios em geral. Em Vila Rica, porexemplo, mais de duzentos proprietrios anotaram-se nestas ltimas categorias.

    Por fim, vejamos a mdia de escravos por atividade. Sob tal enfoque, destacam-seaqueles que se anotaram, simultaneamente, na agricultura e minerao, e queapresentaram mdia a variar de 15,60 (Passagem) a 51,00 (So Caetano). De modogeral, as mdias dos elementos dedicados alternativamente agricultura ou mineraomostravam-se elevadas, comparativamente s demais, a evidenciar seu relativo peso

    dentre as atividades econmicas das Gerais, no incio do sculo XIX. Com valores maismodestos, compareciam o artesanato, 1 a 4 escravos em mdia; o comrcio e osservios, com a mesma variao no valor mdio, e o jornal de escravos que mostrouresultados mdios mais altos distribudos entre os valores 2,00 e 9,00. Quanto aoseclesisticos, tomando-se como exemplo Vila Rica (na qual anotaram-se 31 elementosnesta categoria), computou-se a mdia de 4,90 (Cf. Tabelas 22-A e 22-B).

    TABELA 22-ANMERO DE PROPRIETRIOS, EM RELAO S ATIVIDADES ECONMICAS

    EM QUE SE ENGAJAVAM (1804)

    Localidades Mine- Agricul- Agricult. Artesa- Comrcio Eclesi- Jornal Outrasrao tura e Miner. nato e Servi. sticos de Esc. e Indet.

    Mariana 5 1 -- 9 14 3 1 43Passagem 25 6 5 11 18 2 4 25Vila Rica 33 11 -- 125 79 31 3 475Furquim 6 56 7 20 13 3 6 29So Caetano 32 29 1 12 9 7 1 14Santa Luzia -- -- -- -- 3 -- -- 933N. S. Remdios 1 46 -- 8 7 1 -- 7

    Capela do Barreto -- 13 2 3 -- -- -- --Abre Campo -- -- 3 -- -- -- -- 3Gama 9 4 -- 1 3 -- -- 3

    TABELA 22-BNMERO MDIO DE ESCRAVOS POSSUDOS PELOS PROPRIETRIOS INDICADOS

    NA TABELA 22-A, EM RELAO S ATIVIDADES ECONMICAS (1804)

    Localidades Mine- Agri- Agricult. Arte- Comrc. Eclesi- Jornal Outras MdiaRao cult. e Miner. san. e Serv. sticos de Esc. e Indet. Geral

    Mariana 9,00 6,00 -- 2,11 3,79 5,67 9,00 2,65 3,46Passagem 6,32 4,33 15,60 2,00 2,94 1,00 5,25 2,32 4,35Vila Rica 8,82 13,00 -- 3,04 2,86 4,90 4,33 3,47 3,75Furquim 5,50 7,73 32,86 2,65 2,31 8,67 4,33 6,10 7,20So Caetano 6,97 9,60 51,00 3,00 3,67 2,70 2,00 2,71 6,48Santa Luzia -- -- -- -- 2,00 -- -- 6,04 6,02N. S. Remdios 2,0 4,28 -- 1,37 3,86 1,00 -- 2,43 3,64Capela do Barreto -- 8,31 36,00 4,00 -- -- -- -- 0,67Abre Campo -- -- 17,33 -- -- -- -- 2,00 9,67Gama 17,11 13,25 -- 1,00 1,00 -- -- 3,67 11,10

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    NOTAS

    * Agradecemos FinancIadora de Estudos e Projetos (FINEP) e Fundao Instituto de PesquisasEconmicas (FIPE) o apoio financeiro que tornou possvel a realizao de vrios dos trabalhoscomentados neste artigo.

    1 As evidncias empricas sobre as quais se funda este tpico provm de arrolamentos efetuados ao fim

    do sculo XVIII e inicio do XIX. Para Santa Luzia de Sabar tomamos a "Relao dos Confessados", de1790; relativamente aos demais centros -- Mariana, Gama, Vila Rica, Passagem de Mariana, Serto doAbre Campo, Capela do Barreto, Furquim, Nossa Senhora dos Remdios e So Caetano -- adotamos olevantamento censitrio realizado em 1804.

    2 Na estrutura populacional urbana enquadraram-se Vila Rica, Passagem e Mariana; a rural-mineradoraenglobou os distritos de Abre Campo, Gama e Capela do Barreto; em Furquim, So Caetano e SantaLuzia definiu-se a estrutura populacional intermdia; a estrutura rural de autoconsumo foi definida a partirdas evidncias empricas propiciadas pelo estudo de apenas um ncleo: o distrito de Nossa Senhora dosRemdios.

    3 As excees a estas verificaes ver-se-o explicadas mais adiante. Repisemos, a ttulo deesclarecimento, que a especificidade das estruturas tpicas decorre no s dos valores alcanados pelas

    variveis demogrfico-econmicas com as quais trabalhamos, mas, tambm, da disposio e inter-relacionamentode tais valores.

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    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    Como avanado, nesta comunicao apresentamos, to-somente, uma viso parcial denossos estudos; remetemos o leitor interessado em conhec-los pormenorizadamente spublicaes abaixo relacionadas.

    COSTA, Iraci del Nero da. Vila Rica: mortalidade e morbidade (1799-1801). In: BUESCU,M. & PELEZ, C. M. A moderna histria econmica. Rio de Janeiro, APEC, 1976, p. 115-27.

    COSTA, Iraci del Nero da. Os registros paroquiais como fonte complementar da histriaeconmica e social. in ANAIS do VIII Simpsio Nacional dos Professores Universitrios deHistria: A propriedade rural. So Paulo, FFLCH-USP, 1976, v. III, p. 1.019-22.

    COSTA, Iraci del Nero da. Anlise da morbidade nas Gerais (Vila Rica, 1799-1801).Revista de Histria. So Paulo, FFLCH-USP, (107):241-62, 1976.

    COSTA, Iraci del Nero da. A estrutura familial e domiciliria em Vila Rica no alvorecer dosculo XIX. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. So Paulo, IEB-USP, (19):17-34,1977.

    COSTA, Iraci del Nero da. Vila Rica: casamentos (1727-1826). Revista de Histria. SoPaulo, FFLCH-USP, (111):195-208, 1977.

    COSTA, Iraci del Nero da. Histria e demografia. Revista de Histria. So Paulo, FFLCH-USP, (109):195-203, 1977.

    LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci del Nero da. Contribuio ao estudo de um ncleourbano colonial (Vila Rica: 1804). Revista Estudos Econmicos. So Paulo, IPE-USP,8(3):41-68, set./dez. 1978.

    COSTA, Iraci del Nero da. As populaes das Minas Gerais no sculo XVIII: um estudo dedemografia histrica. So Paulo, FEA-USP, 1978, 27 p. (Srie Histria Econmica, 2).

    COSTA, Iraci del Nero da. Registros paroquiais: o arquivo esquecido. O Estado de SoPaulo. So Paulo, 13 ago. 1978. Suplemento Cultural, p. 13-4.

    COSTA, Iraci del Nero da. Sobre a ocupao e povoamento das Gerais. So Paulo, FEA-USP, 1979, 48 p., mimeografado.

    LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci del Nero da. Algumas caractersticas docontingente de cativos em Minas Gerais. Anais do Museu Paulista. So Paulo, USP,1979, p. 79-97, t. XXIX.

    LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci del Nero da. A presena do elemento sudans nasMinas Gerais. O Estado de So Paulo, So Paulo, 2 mar. 1980, Suplemento Cultural, p. 6-7.

    LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci del Nero da. A presena do elemento forro noconjunto de proprietrios de escravos, Cincia e Cultura. So Paulo, SBPC, 32(7) :836-41, jul. 1980.

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    LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci del Nero da. Devassas nas Minas Gerais: do crime punio. Boletim do Centro de Pesquisas e Estudos de Histria da Igreja no Brasil(CEPEHIB),(3):3-7, jul. 1980.

    COSTA, Iraci del Nero da. Populaes mineiras: sobre a estrutura populacional de algunsncleos mineiros no alvorecer do sculoXIX. So Paulo, IPE-USP, 1981, 335 p. (EnsaiosEconmicos, 7).

    COSTA, Iraci del Nero da. Algumas caracteristicas dos proprietrios de escravos de VilaRica. Revista Estudos Econmicos. So Paulo, IPE-USP, 11(3):151-57, set./dez. 1981.

    LUNA, Francisco Vidal & COSTA, Iraci del Nero da. Estrutura da massa escrava dealgumas localidades mineiras (1804), Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. SoPaulo, IEB-USP, (23):137-42, 1981.

    COSTA, Iraci del Nero da & LUNA, Francisco Vidal. Vila Rica: nota sobre casamentos deescravos (1727-1826). frica. So Paulo, Centro de Estudos Africanos da USP, (4):105-9,1981.

    COSTA, Iraci del Nero da. Ocupao, povoamento e dinmica populacional. In: COSTA,Iraci del Nero da & LUNA, Francisco Vidal, Minas colonial: economia e sociedade. SoPaulo, Pioneira, 1982, (Estudos Econmicos - FIPE/Pioneira), p. 1-30.

    COSTA, Iraci del Nero da & LUNA, Francisco Vidal. Profisses, atividades produtivas eposse de escravos em Vila Rica ao alvorecer do sculo XIX. In: COSTA, Iraci del Nero da& LUNA, Francisco Vidal. Minas colonial: economia e sociedade. So Paulo, Pioneira,1982, (Estudos Econmicos - FIPE/Pioneira), p. 57-77.

    COSTA, Iraci del Nero da & LUNA, Francisco Vidal. A vida quotidiana em julgamento:devassas em Minas Gerais. In: COSTA, Iraci del Nero da & LUNA, Francisco Vidal. Minas

    colonial: economia e sociedade. So Paulo, Pioneira, 1982, (Estudos Econmicos - FIPE/Pioneira), p. 79-85.

    COSTA, Iraci del Nero da. Devassa nas Minas Gerais: observaes sobre casos deconcubinato. In: BARRETO, A. E. M. et alii. Histria Econmica: Ensaios. So Paulo,IPE/USP, 1983, (Relatrios de Pesquisa, 13), p. 43-58.

    LUNA, Francisco Vidal. Estrutura da posse de escravos em Minas Gerais (1718). In:BARRETO, A. E. M. et alii. Histria Econmica: Ensaios. So Paulo, IPE/USP, 1983,(Relatrios de Pesquisa, 13), p. 25-42.