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DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Declaro abertos os trabalhos da presente reunião de audiência pública da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, para discutir a regulamentação da profissão de óptico optometrista. Apresento-lhes minhas desculpas pelo atraso. O Sr. Hilbert David de Oliveira Souza, Coordenador-Geral da Regulamentação e Negociação do Trabalho em Saúde do Ministério da Saúde, está presente. Peço-lhe desculpas, porque, como não pôde comparecer à audiência na última quinta-feira, quando optometristas falaram, não faz sentido o comparecimento a esta. Então, segundo meu critério de justiça, de equilíbrio e de bom senso, peço ao Dr. Hilbert desculpas, mas vamos marcar para depois a participação do Ministério da Saúde nesta Comissão. Não faz sentido não participar de uma, na quinta-feira, e apenas participar da outra, nesta quarta- feira. Não seria um tratamento equânime em relação ao problema. Então, Dr. Hilbert, desculpe-me. Teremos outra oportunidade para ouvir o Ministério da Saúde. Convido para tomar assento à mesa os Srs. Elisabeto Ribeiro Gonçalves, Presidente do Conselho Brasileiro de Oftalmologia; Marco Antonio Becker, 1º Secretário do Conselho COMISSÃO DE TRABALHO, DE ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇO PÚBLICO EVENTO: Audiência Pública N°: 920/05 DATA: 22/6/2005 INÍCIO: 10h40min TÉRMINO: 13h57min DURAÇÃO: 3h17min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 3h16min PÁGINAS: 63 QUARTOS: 40 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO ELISABETO RIBEIRO GONÇALVES - Presidente do Conselho Brasileiro de Oftalmologia. GERSON ZAFALON MARTINS - Representante do Conselho Federal de Medicina. MARCOS PEREIRA DE ÁVILA - Professor da Universidade Federal de Goiás. FLÁVIO DE CASTRO WINKLER - Advogado do Conselho Brasileiro de Oftalmologia. SUMÁRIO: Debate sobre a regulamentação da profissão de óptico optometrista. OBSERVAÇÕES Houve exibição de imagens.

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E ......ótico e vias óticas até o córtex cerebral, visual, no qual a imagem é decodificada, para, então, tomarmos consciência do que estamos

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DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Declaro abertos os trabalhos da presente reunião de audiência pública da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, para discutir a regulamentação da profissão de óptico optometrista.

Apresento-lhes minhas desculpas pelo atraso.

O Sr. Hilbert David de Oliveira Souza, Coordenador-Geral da Regulamentação e Negociação do Trabalho em Saúde do Ministério da Saúde, está presente. Peço-lhe desculpas, porque, como não pôde comparecer à audiência na última quinta-feira, quando optometristas falaram, não faz sentido o comparecimento a esta. Então, segundo meu critério de justiça, de equilíbrio e de bom senso, peço ao Dr. Hilbert desculpas, mas vamos marcar para depois a participação do Ministério da Saúde nesta Comissão. Não faz sentido não participar de uma, na quinta-feira, e apenas participar da outra, nesta quarta-feira. Não seria um tratamento equânime em relação ao problema. Então, Dr. Hilbert, desculpe-me. Teremos outra oportunidade para ouvir o Ministério da Saúde.

Convido para tomar assento à mesa os Srs. Elisabeto Ribeiro Gonçalves, Presidente do Conselho Brasileiro de Oftalmologia; Marco Antonio Becker, 1º Secretário do Conselho

COMISSÃO DE TRABALHO, DE ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇO PÚBLICO

EVENTO: Audiência Pública N°: 920/05 DATA: 22/6/2005

INÍCIO: 10h40min TÉRMINO: 13h57min DURAÇÃO: 3h17min

TEMPO DE GRAVAÇÃO: 3h16min PÁGINAS: 63 QUARTOS: 40

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

ELISABETO RIBEIRO GONÇALVES - Presidente do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

GERSON ZAFALON MARTINS - Representante do Conselho Federal de Medicina.

MARCOS PEREIRA DE ÁVILA - Professor da Universidade Federal de Goiás.

FLÁVIO DE CASTRO WINKLER - Advogado do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

SUMÁRIO: Debate sobre a regulamentação da profissão de óptico optometrista.

OBSERVAÇÕES

Houve exibição de imagens.

Federal de Medicina; Marcos Pereira de Ávila, professor da Universidade Federal de Goiás, e Flávio de Castro Winkler, advogado do Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Não tendo comparecido o Dr. Becker, por questões de saúde, o Dr. Gerson Zafalon Martins, indicado pelo Conselho, vai representá-lo.

Já estão todos à mesa. Antes de conceder a palavra aos convidados, esclareço que a reunião está sendo gravada, para posterior transcrição. Por isso, solicito que falem ao microfone, declinando o nome, quando for o caso.

Cada orador terá o prazo de 5 minutos para sua exposição, logicamente com tolerância por parte desta Presidência. Somente após o término das exposições, passaremos ao debate com os Srs. Deputados. Os inscritos terão o tempo de, no máximo, 3 minutos para a réplica e a tréplica.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO ARNALDO FARIA DE SÁ - Sr. Presidente, cumprimento V.Exa. por sua atitude em relação ao representante do Ministério da Saúde. V.Exa. demonstrou que realmente é um magistrado. Meus cumprimentos por ter dispensado o representante do Ministério da Saúde, pela ausência na reunião passada.

Parabéns, Sr. Presidente!

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Muito obrigado, Deputado Arnaldo Faria de Sá.

Concedo a palavra ao Sr. Elizabeto Ribeiro Gonçalves.

O SR. DEPUTADO TARCISIO ZIMMERMANN - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO TARCISIO ZIMMERMANN - Sr. Presidente, hoje se está realizando sessão extraordinária na Câmara dos Deputados, cuja Ordem do Dia será iniciada daqui a alguns minutos. De fato, haverá pressão para o encerramento dos trabalhos em 1 hora. Portanto, nossas exposições devem ser mais sucintas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Agradeço a V.Exa. a observação.

Concedo a palavra ao Sr. Elisabeto Ribeiro Gonçalves.

O SR. ELISABETO RIBEIRO GONÇALVES - Bom dia. Agradecemos ao Deputado Henrique Eduardo Alves o honroso convite para trazer o CBO e a oftalmologia brasileira a esta audiência pública. Temos grande honra de representar a oftalmologia brasileira e vamos tentar mostrar o belo serviço que ela presta à saúde pública, ao cidadão brasileiro.

Agradeço ao Deputado Henrique Eduardo Alves, aos membros da Comissão e aos Deputados presentes.

O Conselho Brasileiro de Oftalmologia — CBO foi fundado em 1941 e, entre suas finalidades básicas, estão os cuidados com a promoção e a defesa da saúde pública popular. Trata-se do departamento de oftalmologia da AMB. Representamos cerca de 12 mil oftalmologistas. Temos 53 cursos de especialização credenciados e somos filiados também à Associação Pan-Americana de Oftalmologia e ao Concílio Oftalmológico Internacional.

Para dar uma noção a V.Exas., vamos tentar entender o processo visual, que é extremamente complexo. Inicia-se com a captação da imagem pelo olho, segue pelo nervo ótico e vias óticas até o córtex cerebral, visual, no qual a imagem é decodificada, para, então, tomarmos consciência do que estamos vendo.

(Segue-se exibição de imagens.)

Aqui é a retina, a estrutura da membrana mais interna do olho, extremamente delgada, também complexa e se compõe de 10 camadas. Parte do processo visual se inicia na estrutura retiniana.

Problemas refracionais e doenças oculares.

Até o final do século XIX, fazia-se diferenciação entre problemas refracionais, ametropias e doenças oculares. Mas são situações absolutamente idênticas. A separação artificial e falaciosa se devia à própria ignorância do conhecimento até o final do século XIX.

Tanto a ametropia é doença que a própria Organização Mundial da Saúde — OMS a cataloga assim. Estão aqui, das doenças do olho e seus anexos, os transtornos da refração, que merecem código alfanumérico. Então, a própria Organização Mundial da Saúde rotula as ametropias como doenças. Qualquer separação é meramente artificiosa e falaciosa.

Relação entre ametropias e outras doenças oculares.

Essas ametropias podem atuar como fatores de risco para doenças oculares graves. Por exemplo: obstrução venosa, enfarte venoso da retina, que leva, em geral, a uma situação extremamente complexa, como o glaucoma neovascular, um risco para a própria integridade do olho, degeneração macular relacionada à idade, glaucoma. São doenças em que as ametropias podem atuar como fator de risco.

A miopia maligna é uma doença ocular grave que afeta 2,7 milhões de brasileiros. Ela comporta também alterações extremamente graves do fundo de olho, da membrana mais importante, a retina.

Relação entre ametropias e outras doenças oculares sistêmicas.

A questão de a ametropia ser doença, como de fato é. Trouxemos pequena amostra da associação entre miopia, que é uma ametropia, manifestações oftálmicas e manifestações sistêmicas. Estão aqui relacionadas as alterações oftálmicas graves e também as manifestações sistêmicas graves, nas quais encontramos a presença da miopia. A hipermetropia igualmente participa dessas síndromes de malformação extremamente graves.

O olho não é um órgão estanque, isolado do restante do organismo. Ele integra, influencia o organismo e é por ele influenciado. Ele recebe também as manifestações, acolhe

manifestações graves de outros órgãos do corpo. Os tumores de mama, por exemplo: 54% deles podem dar metástase ocular, assim como tumores do pulmão, do trato digestório, da pele, do rim, da tireóide, da próstata, da laringe. Então, o olho pode sediar alterações extremamente graves, o que põe em risco não só a visão, mas principalmente a saúde do paciente.

Doença sistêmica e olho humano.

Várias doenças se manifestam no olho. O diagnóstico e o acompanhamento das alterações oculares provocadas pela AIDS são importantes até para orientar o colega, o médico que está cuidando do paciente, para que faça avaliações.

Arteriosclerose, manifestações também no fundo de olho, bartonelose, cândida, cisticercose, a infestação pela tênia, nematódeo, verme, lombriga, podem também afetar o olho, levando a alterações graves, até com atrofia do nervo ótico. Cito ainda lepra, sífilis, tuberculose, reumatismo, leishmaniose, toxoplasmose. Não há como separar doenças oculares das doenças locais e sistêmicas. Há toda uma inter-relação, à qual o olho reage.

Um aspecto muito importante. A primeira consulta, para muitos brasileiros, só acontece por volta de 40 anos, quando o cidadão começa a sentir a vista cansada, dificuldade para ler. Essa é uma oportunidade rara e importantíssima para avaliação das condições da saúde ocular. Quando o paciente procura o médico oftalmologista, em busca de óculos, nem sempre há alterações outras que temos de diagnosticar precocemente e orientar o tratamento. É importante que esse paciente, ao sair de uma consulta como essa, tenha a segurança de que foi atendido de maneira completa pelo profissional da medicina.

Fiz questão de inserir trecho do artigo de Claudio de Moura Castro, publicado pela revista Veja, em que ele critica o diploma, como algo danoso em algumas profissões, mas faz esta ressalva: "Nos dias de hoje, o monopólio do diploma justifica-se quando os clientes não sabem avaliar a competência de quem prestaria o serviço ou quando há riscos, como, por exemplo, nas áreas médica, legal e de aviação". Então, é importante que o paciente seja visto por quem tem diploma, nesse caso, pelo médico, para que tenha o seu olho total e cuidadosamente examinado.

Nem toda ametropia requer prescrição de lentes corretoras. Quando o médico oftalmologista determina um grau, não significa necessariamente que nós receitemos esse grau para o paciente. Há situações em que a prescrição de óculos agrava a sintomatologia. A receita de óculos resulta de uma avaliação, de um balanço muito criterioso entre as queixas do paciente e os resultados do exame oftalmológico colhidos na consulta. Muitas vezes a queixa do paciente nada tem a ver com seu quadro refratométrico, mas se fundamenta na existência de outras doenças oculares, em geral graves. Muitas vezes o paciente tem, por exemplo, miopia. Não é que ele tenha a ametropia, ele pode ter diabetes, que, desregulado, provoca miopia. Então, temos de estar atentos para isso, não para receitar óculos, mas para cuidar, orientar o tratamento, a normalização do diabetes.

Principiais causas de cegueira irreversível: glaucoma, degeneração macular, retinopatia diabética.

A próx A imagem traz um fundo de olho normal: a retina, os vasos e o nervo ótico. A próxima, um fundo de olho com atrofia do nervo ótico, causada por glaucoma. Um aspecto importante é que esse glaucoma é o chamado glaucoma de baixa pressão, ou seja, não há a pressão alta do olho justificando essa atrofia ótica. O paciente tem pressão normal e tem glaucoma, com atrofia ótica. Então, se não estamos preparados, se não temos

conhecimento dessas particularidades, como poderemos orientar corretamente o tratamento desse paciente? É claro que os óculos, neste caso, não vão resolver nada.

Exame oftalmológico — oportunidade única para diagnosticar a retinopatia diabética e tantas outras doenças, em fase inicial ou em fase avançada, proliferativa. Uma hipertensão arterial leva a alterações graves. É importante que nós médicos oftalmologistas tenhamos ciência disso, examinemos o fundo de olho, para que orientemos também o clínico na condução quanto à eficácia terapêutica da medicação que vem sendo usada para tratamento da pressão arterial.

Esse é um caso de associação de hipertensão arterial, retinopatia diabética e retinopatia hipertensiva — situação mais grave ainda.

Aqui um exemplo de tumor de nervo ótico, chamado melanocitoma. Temos obrigação de fazer o diagnóstico diferencial entre o melanoma e o melanocitoma. O melanocitoma não tem a malignidade de um melanoma, mas é importante que o diagnostiquemos. O melanoma incipiente é dificílimo de diagnosticar. Como vamos ter certeza de que isso aqui não se trata apenas de uma pinta no olho? Isso pode ser um melanoma. Então, temos de ter todos os elementos da semiologia, temos de ter o conhecimento exaustivo da fisiopatologia do olho, da retina, para que possamos estabelecer as diferenças e orientar corretamente o paciente.

Aqui um tumor grave da infância, um retinoblastoma, com manifestações, com metástases iridianas.

Optometria não médica e os riscos à população do mundo. Segundo a Associação Médica Britânica, 35% dos pacientes que procuram um optometrista apresentam afecções não reconhecidas por eles.

A Academia de Medicina de Nova York registrou mais de 50 casos de glaucomas, tumor cerebral e outras doenças não diagnosticadas pelos optometristas.

Há uma advertência do Dr. Bruce Spivey quanto à prática da optometria na América. Costuma-se passar a idéia de que as coisas lá funcionam bem, que existe harmonia e uma aceitação completa da oftalmologia em relação ao optometrista. Mas não é bem assim. Temos um dos muitos exemplos de colegas ilustres, profissionais absolutamente honestos, que dão seu registro da discordância da optometria, pelos riscos que implica à saúde ocular.

Trabalho recente, de 2004, mostra que os optometristas receitam 35% de óculos desnecessários, contra 29% do oftalmologista. E o pior, isso significa gasto desnecessário de 200 milhões de dólares por ano. O artigo afirma o que estou dizendo. Não estou inventando. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Registro a presença do Dr. Eleuses Vieira de Paiva, Presidente da Associação Médica Brasileira, que muito nos honra com o comparecimento a esta reunião.

Diversos optometristas estão presentes, ouvindo os palestrantes com respeito e educação. É importante ressaltar o caráter democrático de nossas reuniões. Agradeço às senhoras e aos senhores a presença. Parabenizo-os pela atitude democrática e respeitosa.

Concedo a palavra ao Dr. Gerson Zafalon Martins, representante do Conselho Federal de Medicina.

O SR. GERSON ZAFALON MARTINS - Bom dia a todos. O Conselho Federal de Medicina sente-se honrado em participar da audiência na Câmara Federal.

Serei breve, para que todos possam participar.

O Conselho Federal de Medicina é uma autarquia que fiscaliza e disciplina o exercício profissional da medicina. Essa atribuição legal é a garantia para a sociedade. Significa proteção da comunidade em relação ao atendimento médico.

Os Conselhos Regionais processam e apenam médicos que infringem o Código de Ética. Portanto, não somos corporativistas, como julgam muitas pessoas. Somos corporativos, isto é, atuamos ativamente para que a medicina seja ética, atualizada e beneficente.

O Código de Ética Médica praticamente não traz direitos ao médico. Ele prevê que o médico deve ser um bom médico e proíbe que a medicina seja exercida como comércio. O nosso Código de Ética não admite a interação de médicos com óticas, com vendedores de óculos. Nós coibimos, processamos, julgamos e condenamos eventuais médicos que têm conluio com óticas. Isso é inadmissível. Se alguém souber de fatos dessa natureza deve denunciá-los para o Conselho Regional de Medicina do Estado onde tenham ocorrido.

Dos quase 300 mil médicos brasileiros, 12 mil são oftalmologistas, sendo que 54% desses atendem por meio do Sistema Único de Saúde, sistema que nós médicos consideramos perfeito. Deveríamos todos, Congresso, médicos, sociedade, exigir dos vários níveis governamentais, federal, estadual e municipal, que esse sistema fosse cada vez mais utilizado pela sociedade.

O Conselho Federal de Medicina está atento às ações médicas em todos os rincões brasileiros. Não admitimos que uma área da medicina, seja ela qual for, possa ser exercida em feiras, bancas, corredores. Não queremos que pessoas sejam examinadas como se alguém estivesse distribuindo um presente ou uma guloseima para uma criança. O exame médico deve ser feito onde haja as devidas condições.

O exame oftalmológico não é para receitar óculos, é para proteger o brasileiro de futuras doenças, diagnosticar casos críticos. Um diagnóstico mal feito é irreparável. Um glaucoma não diagnosticado pode causar cegueira, um tumor de pulmão não diagnosticado atrasa o tratamento. A formação do médico é extensiva. São 6 anos de faculdade e mais 3 ou 4 de especialização em qualquer área. Quando ele sai, espera-se que tenha completa noção do corpo humano, não meramente da parte física, mecânica, computadorizada.

O Conselho Federal de Medicina, portanto, está protegendo a sociedade quando defende que o exame oftalmológico seja um ato médico. A medicina não precisa se defender, pois é histórica. Basta irmos aos livros mais antigos para vermos que o primeiro código de ética médica já previa a responsabilidade dos médicos que então exerciam a medicina de maneira mais simplista.

Então, a medicina como tal não precisa de defesa, quem precisa de defesa é a sociedade. E o Conselho Federal de Medicina, os Conselhos Regionais e as autarquias defendem a sociedade exigindo que as escolas de medicina tenham programas decentes e eficientes, que não se abram escolas de maneira desordenada e que os médicos sejam responsabilizados pelos seus atos.

Portanto, o Conselho Federal de Medicina apóia todo o trabalho dos médicos oftalmologistas brasileiros.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Dr. Marcos Pereira de Ávila, professor da Universidade Federal de Goiás.

O SR. MARCOS PEREIRA DE ÁVILA - Sr. Presidente da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, Deputado Henrique Eduardo Alves; Sras. e Srs. Deputados; nobre Deputada Dra. Clair; Dr. Eleuses Paiva, Presidente da Associação Médica Brasileira, entidade que representa a medicina nacional; Dr. Gerson Zafalon Martins, representante do Conselho Federal de Medicina; Prof. José Henrique Araújo, representante do Sindicato dos Médicos; representantes dos Estados brasileiros, oftalmologistas presentes a esta importante reunião, senhoras e senhores, inicialmente, quero agradecer este honroso convite para colaborar na elaboração do parecer técnico-científico que esta Comissão, tão nobremente presidida por V.Exa., caro Deputado, está por fazer.

A tarefa que o Presidente Elizabeto Ribeiro Gonçalves me delegou foi mostrar às Sras. e aos Srs. Deputados o empenho e a dedicação dos oftalmologistas brasileiros em prol da saúde pública ocular, em prol da inserção social do homem brasileiro. Alterações significativas precisam ser muito bem esclarecidas.

Nosso Presidente já nos mostrou causas impactantes de cegueira no Brasil e no mundo, mas precisamos estar atentos à população brasileira, pois 0,8% dela tem deficiência visual severa. De acordo com a lei ora vigente, são consideradas pessoas com cegueira legal aquelas que têm eficiência visual menor que 10%. E eu lhes pergunto: de quem é a responsabilidade pelo enorme contingente de brasileiros que padecem desse mal? Claro que são as autoridades constituídas, mas nós há muito nos apercebemos que essa vocação é também do oftalmologista brasileiro.

Assim, o Conselho Brasileiro de Oftalmologia elegeu prioridades: as crianças, que precisam enxergar para poder aprender a ler e, dessa forma, diminuir a taxa de evasão escolar, principalmente no ensino fundamental; a catarata, grande causa de cegueira no País; os diabéticos, cegueira irreversível; os pacientes com glaucoma, cegueira irreversível; e a refração.

A partir de agora, Sr. Presidente, quero repartir com os Srs. Deputados que não estão afeitos às situações ocorridas na oftalmologia uma história muito bonita, brasileiros que se dedicaram à saúde ocular. Um grupo de pessoas imbuído de um propósito. Poderíamos muito bem ficar com nossa tecnologia, receitando óculos, tratando e operando nossos pacientes, mas não. Décadas atrás, nossos líderes já anteviram a necessidade de a oftalmologia, além da assistência, do desenvolvimento tecnológico, do ensino, entrar também na agenda social.

(Segue-se exibição de imagens.)

Essa é uma fotografia muito cara para todos nós. Ela foi feita durante o I Congresso Brasileiro de Prevenção de Cegueira, há décadas e décadas. Aí começou a construção de uma história que se perpetuou por meio da presidência de homens importantíssimos não só para a oftalmologia como para a medicina nacional. Cito alguns: Cesário de Andrade; Moacyr Álvaro, de São Paulo; Ivo Corrêa Meyer, do Rio Grande do Sul; Prof. Hilton Rocha; Sylvio de Abreu Fialho, do Rio de Janeiro; Werther Duque Estrada, também do Rio de Janeiro; Paulo Magalhães; Penido Burnier, de Campinas; Heitor Marback, da Bahia; Leiria de Andrade, do Ceará; Paiva Gonçalves, do Rio de Janeiro; Renato de Toledo, de São Paulo; Clóvis Paiva; Carlos Moreira Júnior, do Paraná; Newton Kara José, grande

expressão da prevenção da cegueira no mundo; Prof. Joaquim Marinho, de Belém; João Ribeiro Gonçalves, do Piauí; Jacó Lavinsky, do Rio Grande do Sul; Adalmir Dantas, do Rio de Janeiro; Geraldo Vicente, de São Paulo. São algumas das poucas centenas de oftalmologistas que dirigiram as nossas entidades representativas, o nosso Conselho, a nossa sociedade, as 34 sociedades filiadas ao Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Falta mencionar o Prof. Suel Abujamra. Eles construíram uma história que tem começo, meio e fim e mostra de realizações. Que realizações são essas?

Nós e esses que nos antecederam, inclusive na Presidência do Conselho, vimos que há muito tempo era necessária a parceria com os Poderes Públicos, e em determinado momento isso passou a ser regra. Houve uma reunião muito importante com o então Presidente Fernando Henrique Cardoso para lançamento de projetos de cirurgia de catarata e de retinopatia diabética. Na sede do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, o então Ministro da Saúde, José Serra, assinou uma portaria que é de fundamental importância, que está tornando o Brasil zona livre de catarata. É o primeiro país em desenvolvimento a conquistar esse título.

E o atual Presidente, Lula, tem prestigiado as ações da oftalmologia brasileira. Esteve em várias solenidades, juntamente com o Governador Marconi Perillo, lançando um projeto de inserção fundamental, em que os oftalmologistas vão ao interior, à comunidade quilombola, aos calungas, para prestar atendimento oftalmológico gratuito, receitar óculos, receitar medicamentos necessários, realizar cirurgias e todo o tratamento terciário necessário. Então, de longa data nós sabíamos que haveria necessidade de parceria com os Poderes Públicos.

Quem não se lembra do 1º Fórum Nacional de Saúde Ocular, realizado no Congresso Nacional, no Auditório Petrônio Portela? Foram discutidos com os oftalmologistas brasileiros, durante 3 dias seguidos, os principais problemas que afetam a visão no Brasil e estabelecidas as diretrizes desse fórum. Criamos 33 novos serviços de banco de olhos, 34 centros de retinopatia diabética, a portaria de hierarquização dos centros, a sistematização dos colírios do glaucoma na rede pública, que até então não existia, além de outras iniciativas.

Como resultado, mais uma vez, da parceria efetiva da classe motivada e mobilizada que é a oftalmologia, oferecemos a este País 18 milhões de atendimentos nos últimos 6 anos. Sem dúvida, Sr. Presidente, para todos aqui que participam, viajam, vêem e têm exposição a programas semelhantes em outras partes do mundo, podemos com orgulho dizer que esses 18 milhões de atendidos representam o maior programa de saúde pública ocular no mundo.

Aqui estão os números. Os números falam por si, os números nos mostram a realidade. Campanha Olho no Olho, prevenção da cegueira na infância. Que programa bonito! Crianças no primeiro ano do ensino fundamental, 10% daqueles que freqüentam os bancos escolares, não estariam como estamos aqui hoje se não estivessem enxergando adequadamente. Dez por cento das crianças não têm condição de enxergar o quadro negro, de fazer as suas tarefas. A partir da campanha Olho no Olho, nas escolas públicas deste País, conseguimos atender números impressionantes. Três milhões de crianças, em 1999; 3 milhões e 200, em 2000; 3 milhões e 202 mil, em 2001. Esse programa está descontinuado, mas há ações importantes do CBO junto ao Ministério da Saúde e ao MEC, e provavelmente esse é um dos programas que vai vingar.

Aí estão as crianças, o Prof. Newton Kara, o pessoal das óticas responsáveis, os nossos parceiros que aviam as receitas por nós prescritas.

Quanto à cegueira do idoso, Sr. Presidente, Deputado Henrique Eduardo Alves, onde, no mundo, em 1 ano, fora da rotina normal, foram feitas 316 mil cirurgias de catarata? Só tendo uma classe motivada e mobilizada para fazer tantos pacientes voltar a enxergar.

Vejam os números: no início, tínhamos mil voluntários; em 2003, tínhamos 1.415 instituições, não médicos voluntários, a uma taxa de pelo menos 3 ou 4 oftalmologistas por instituição. Basta fazer a conta para ver o quanto isso significou de mobilização no País.

A Campanha Nacional de Cataratas foi uma vitória da Oftalmologia e dos Poderes Públicos brasileiros.

Quanto à Campanha Nacional de Retinopatias Diabéticas, não vou entrar em detalhes, mas os números são também expressivos: 100 mil brasileiros deixaram de ficar irreversivelmente cegos por retinopatia diabética, uma das principais causas de cegueira no Brasil e no mundo.

Campanhas estaduais foram igualmente realizadas, como, por exemplo, a campanha De Olho na Visão, modelo fantástico que está sendo adotado por outros Estados da Federação e por outros países na América do Sul. Treinamos os agentes de saúde para os cuidados oculares primários e a detecção das doenças oculares. Fazemos o exame oftalmológico e cirurgias de catarata na própria cidade do paciente, doação de óculos e tratamento diferenciado de doenças. Trezentos e vinte mil pessoas foram atendidas.

Outras inserções sociais: quem se preocupa com o deficiente visual como o oftalmologista brasileiro? Trabalhamos a inserção social do deficiente visual, em parcerias fantásticas com o Bradesco, a MicroPower, a Brasil Telecom, em projetos como Internet para Cegos e Projeto Cães Guias. Todos são deficientes visuais ligados a um oftalmologista ou à oftalmologia.

Ações sociais específicas: quem aqui não conhece a ação social do Conselho Brasileiro de Oftalmologia nas comunidades indígenas ou nas populações quilombolas, a respeito das quais temos parcerias importantes com Ministério da Saúde, Exército e voluntários?

Enfim, o exame oftalmológico é levado aos rincões mais distantes do Brasil, como nossa longínqua Manaus, Macapá e outras cidades.

Pergunto aos senhores: o reconhecimento social da Oftalmologia brasileira se deve só a essas campanhas, a esses números, a essa preocupação com o deficiente visual, com o Programa Internet para Cegos e com os programas de tradução de texto para quem não enxerga? A resposta é não. E por que é não? O Dr. Eleuses de Paiva tem orgulho disso. Aqui está a resposta, Srs. Deputados: entrem no sistema DATASUS e verão que, só no ano passado, a Oftalmologia brasileira realizou — além das campanhas de que falamos há pouco, com 18 milhões de atendimentos em poucos anos — 7.808.853 consultas. É a segunda maior especialidade em atendimento, inclusive superando outras de grande volume, como, por exemplo, as especialidades que fazem parte da Clínica Geral.

Nós, do CBO, demos alguns passos à frente. Temos trabalhado incessantemente. E aqui peço a ajuda dos Srs. Deputados, pois temos necessidade da interiorização da oftalmologia. Sonhamos com a sua interiorização, com a construção de consultórios comunitários no interior e o credenciamento universal do SUS. Não bastam 54%. O oftalmologista brasileiro quer atender no SUS. Ele paga mal? Paga. Mas é importante a quota do oftalmologista brasileiro. O credenciamento universal é uma meta. Com esse credenciamento, com a ajuda e a gestão dos senhores, usando todo o sistema disponível, poderemos facilmente duplicar ou até triplicar o atendimento oftalmológico de qualidade no

País, e com a absoluta segurança e certeza de trazer de volta a visão a uma grande quantidade de brasileiros.

Para finalizar, Sr. Presidente, já dizia o Prof. Hilton Rocha, muitos anos atrás — eu começava minha vida, como residente —, numa das suas célebres palestras:

"A Oftalmologia brasileira, dentro do sistema brasileiro de saúde pública, é uma gota d’água num mar de dificuldades, porque o oftalmologista brasileiro se preocupa em atender bem".

Sras. e Srs. Deputados, os números mostram o grau de envolvimento, de interesse e de responsabilidade social do oftalmologista brasileiro. Esse é, sem dúvida, um patamar que todas as especialidades médicas neste País gostariam de atingir.

Muito obrigado. (Palmas prolongadas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Dr. Flávio de Castro Winkler, advogado do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

O SR. FLÁVIO DE CASTRO WINKLER - Bom dia, Sr. Presidente, Exmos. Srs. Deputados e médicos presentes.

Feita a abordagem médica a respeito da inviabilidade da aprovação de projetos de lei que estão sendo hoje analisados por esta Comissão, incumbe ao Departamento Jurídico analisar a inviabilidade jurídica dos projetos de lei em questão, em face do ordenamento jurídico vigente, das normas de ordem pública que se incompatibilizam com os projetos de lei em tela.

A optometria não médica e os princípios de nosso Direito. Não há outra maneira de analisarmos a viabilidade jurídica de um projeto de lei se não verificarmos se ele vai ser recebido pelo nosso ordenamento jurídico.

O que nos diz a respeito disso os projetos de lei que estão sendo analisados, debatidos e que serão votados posteriormente por V.Exas.? Eles trazem no seu bojo uma confusão tamanha, data maxima venia dos Srs. Relatores e dos autores dos projetos, que é incompatível com o ordenamento jurídico pátrio. Por quê? Porque fazem confusão entre o profissional optometrista e outros, profissional que hoje não pode trabalhar no Brasil, não pode prescrever lente de grau; excluem do mercado de trabalho um profissional que há mais de 70 anos vem prestando serviços essenciais à saúde do povo brasileiro, que é o óptico prático, aviando as receitas dos médicos oftalmologistas; e tentam criar a figura de um técnico em ótica. Seria alguém supostamente habilitado a prescrever e a vender, dentro da casa ótica, à margem do que prescreve o Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 39, inciso I, que proíbe a venda casada. Tentam criar a ótica básica, a ótica plena, o optômetra, o ortoptista, confundindo todos eles com um profissional que há mais de 70 anos vem se dedicando ao exame da refração, prescrição de lentes de grau e aos cuidados com a saúde visual e ocular do povo brasileiro, o médico oftalmologista.

A solução para esse impasse precisa ser buscada nos princípios gerais do direito pátrio. Trazemos à baila nada mais, nada menos do que a assertiva de um jurista de renome nacional, o eminente Prof. Miguel Reale, conforme consta de seu livro Teoria do Direito e do Estado — São Paulo, Editora Saraiva, 1984, páginas 320 e 321. Diz o eminente jurista Miguel Reale:

"O Estado deve sempre ter em vista o interesse geral dos súditos; deve ser sempre uma síntese dos interesses tanto dos indivíduos quanto dos grupos particulares. Cabe ao Governo decidir segundo o bem comum. A autoridade do Estado deve manifestar-se no sentido da generalidade daqueles interesses, representando a totalidade do povo brasileiro".

Esse ensinamento de Miguel Reale nos leva a um princípio estampado no art. 196 da Constituição Federal, o qual torna incompatíveis os projetos de lei em pauta. Preconiza o art. 196 da Constituição Federal:

"Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos (...)"

Pergunto a V.Exas.: com a criação da categoria de profissional técnico, um vendedor de ótica — cuja formação é feita em curso de 2 anos, 6 meses e outros cursos de menor duração ainda — e a transferência para esse profissional da tarefa que há mais de 70 anos é exercida por médicos que estudam 6 anos para se graduar em Medicina, portanto plenamente capazes de diagnosticar as doenças que provocam a diminuição da visão, estarão esses projetos de leis sendo recepcionados pela Constituição Federal? Parece-nos óbvio que não, na medida em que o exame médico do mais nobre dos sentidos do ser humano seria realizado por um profissional técnico, não médico, incapaz de diagnosticar glaucoma, retinopatia diabética, degeneração macular, as 3 principais causas de cegueira no mundo, não somente no Brasil. Isso sem falar em câncer, AIDS e outras doenças aqui apresentadas

Nenhum projeto de lei pode ser analisado isoladamente, mas dentro de um contexto geral de normas, para ver se o conjunto de leis pátrias o receberá ou não e se há compatibilidade jurídica desse projeto com o ordenamento jurídico superior a ele. No caso, trazemos à baila o Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê, em seu art. 7º, que a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, e, no seu art. 11, assegura atendimento médico à criança e ao adolescente, através do Sistema Único de Saúde.

Isso não deixa dúvidas: os projetos de lei em tela são incompatíveis com o Estatuto da Criança e do Adolescente, porque o Estatuto prevê que o atendimento é médico. E vai mais adiante: "O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção (...) — vejam que a assistência é médica, não se fala em atendimento por tecnólogos e técnicos; fala-se de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que originariamente afetam a população infantil, segundo o art. 14 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

O Código de Defesa do Consumidor brasileiro, a legislação consumerista brasileira, é elogiado em todos os países como uma das mais modernas. O que nos diz o Código de Defesa do Consumidor?

"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde, segurança

contra riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

.................................................................................. X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral."

Não nos parece que os projetos de lei em tela, que procuram delegar a tarefa de médicos a técnicos, sejam recepcionados por esse ordenamento jurídico do Código de Defesa do Consumidor, que ainda estabelece:

"Art. 4º. A Política Nacional de Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito a sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida (...) atendidos os seguintes princípios:

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

..................................................................................

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho;

..................................................................................

VII - a racionalização e melhoria dos serviços públicos".

Parece-nos que os projetos de lei em tela não melhoram os padrões de qualidade e atendimento ao público. Pelo contrário, trazem novos profissionais que não são capazes de diagnosticar todas as doenças que provocam a diminuição da visão.

Nesse sentido, trago a esta colenda Comissão, Sr. Presidente, o Verbete nº 1 da Súmula de Trabalho da Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, que trata da regulamentação das profissões, que diz:

"O exercício de profissões subordina-se aos comandos constitucionais dos arts. 5º, inciso XIII, e 170, parágrafo único, que estabelecem o princípio da liberdade de exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão. A regulamentação legislativa só é aceitável, uma vez atendidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:

..................................................................................

f) que se estabeleçam os deveres e as responsabilidades pelo exercício profissional e,

g) que a regulamentação seja considerada de interesse social".

Esses 2 requisitos, dos 7 constantes do Verbete nº 1, são cumulativos e devem ser observados para que a profissão seja criada ou regulamentada.

O nobre Deputado Pedro Henry, ao relatar o Projeto de Lei nº 2.783, de 1997, rejeita a regulamentação da profissão de terapeuta holístico. E o que nos diz o nobre Deputado, que preside esta sessão? Em primeiro lugar, que deve ser observado que, para o Estado restringir a liberdade de trabalho, o interesse público deve estar envolvido — mais uma vez vemos que o interesse público é o que interessa a esta Comissão.

Diz ainda S.Exa. que as atividades profissionais não podem se confundir ou se sobrepor a outras profissões, o que efetivamente ocorre, pois o terapeuta holístico pode ter as suas funções confundidas com a dos médicos. Não é o caso dos projetos de lei em pauta? Será que os técnicos em óptica, optometristas, optômetras ou contatólogos não estarão invadindo ou exercendo funções que hoje, assim como há mais de 70 anos, são exercidas pelos médicos oftalmologistas, à luz do precedente desse projeto de lei? Parece-nos que os projetos de lei não poderão passar. Esse é um precedente desta Comissão específica.

Trazemos ainda, para exemplificar, 3 precedentes desta Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público: em 1997, o Projeto de Lei nº 2.783, que dispunha sobre a regulamentação do terapeuta holístico; em 2000, o Projeto de Lei nº 3.789, que dispunha sobre a criação dos Conselhos Federal e Regional de Técnicos em Prótese Dentária; em 2001, o Projeto de Lei nº 3.175-A, de 1997, que dispunha sobre o exercício da profissão de técnico em obstetrícia, também relatado pelo nobre Deputado Pedro Henry, que agora não mais preside os trabalhos.

Esses projetos, além de muitos outros, porque não vamos ficar aqui citando todos, foram rejeitados por esta Comissão, por não atenderem ao Verbete nº 1.

Parece-nos que não terão outra sorte os projetos de lei em pauta, senão a sua rejeição, por esbarrarem justamente no Verbete nº 1 da Comissão de Trabalho, Administração, Previdência Social e Serviço Público.

Onde poderemos identificar, nos projetos propostos, a definição de deveres e responsabilidades inerentes ao exercício da optometria?

Examinem V.Exas. os projetos de lei e vejam se em algum deles há artigo ou artigo que trate de deveres e responsabilidades dos optometristas, optômetras ou técnicos em optometria. Não há nem um; eles tratam só de direitos. E isso é incompatível com o Verbete nº 1 desta Comissão.

Onde se poderá encontrar nos projetos propostos o mínimo de interesse social, pré-requisito para a aprovação, criação e regulamentação de profissão da área da saúde? Como seus titulares, não médicos, formados por cursos de curta duração, em regime especial, em uma semana de atividade por mês, receberiam ampla competência profissional para substituir os médicos oftalmologistas no cuidado da saúde ocular da

população, dando consultas, examinando, diagnosticando e prescrevendo dentro de estabelecimentos comerciais, estando ainda livres para efetuar a venda de lentes de grau nos próprios estabelecimentos? Não conseguimos vislumbrar essa possibilidade senão associando isso à venda casada. É o mesmo que delegarmos aos farmacêuticos e balconistas de farmácia a possibilidade de receitar os medicamentos que eles mesmos vendem.

Saliento que o Conselho Brasileiro de Oftalmologia teve o cuidado de entregar a cada um dos Deputados aqui presentes e aos demais membros da Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público uma pasta com tudo o que aqui foi comentado, com documentos que inclusive comprovam que, lamentavelmente, o Conselho Estadual de Santa Catarina recebeu da Reitoria da Universidade do Contestado de Santa Catarina, para ter seu curso aprovado — e isso consta em ata, o original está conosco e temos cópia autenticada —, presentes natalinos.

O fato nos causou perplexidade e nos fez denunciá-lo ao Ministério Público, porque, certamente, caracteriza improbidade administrativa, para não falar de outros crimes previstos no ordenamento jurídico pátrio.

Agradeço publicamente a participação e a colaboração do Dr. Caio Márcio Cunha, advogado da Sociedade Catarinense de Oftalmologia, que me ajudou a realizar este trabalho, e dos demais colaboradores do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. DEPUTADO DR. FRANCISCO GONÇALVES - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO DR. FRANCISCO GONÇALVES - Sr. Presidente, apelo para V.Exa. no sentido de que conceda a palavra ao Presidente da Associação Médica Brasileira, Dr. Eleuses Vieira de Paiva, que sem dúvida alguma representa toda a classe médica.

O SR. DEPUTADO JOÃO FONTES - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

Sr. Presidente, em plenário se está discutindo matéria de extrema relevância, o salário mínimo. Estou sendo chamado para votar, embora estejamos aqui diante de matéria também importantíssima.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Sr. Deputado, já discutimos esse assunto com os Parlamentares. Até em respeito à audiência pública que se realiza hoje, com autoridades que vieram de toda a parte do País, estamos nos alternando na votação. Eu mesmo acabei de vir do plenário, onde fui votar, para podermos conciliar os trabalhos e não encerrarmos esta audiência pública.

Nesse sentido, peço a colaboração de V.Exa., para que possamos dar continuidade a esta audiência. (Palmas.)

Se não houver objeção das Sras. e dos Srs. Deputados, justifica-se a concessão da palavra ao Dr. Eleuses Vieira de Paiva, Presidente da Associação Médica Brasileira, por 3 minutos.

O SR. ELEUSES VIEIRA DE PAIVA - Agradeço ao Deputado Henrique Eduardo Alves e aos Srs. Parlamentares a oportunidade de me dirigir a este Plenário. Cumprimento ainda o Prof. Elizabeto Ribeiro Gonçalves e o Prof. Marcos Pereira de Ávila.

Em momento algum falarei nesta Comissão como médico, pois quero dar meu depoimento como cidadão brasileiro.

Presido a Associação Médica Brasileira. Não sou oftalmologista. Trabalho na área de imagem. Não me julgo qualificado para discutir profundamente esse assunto. Entretanto, Sr. Presidente, vou dar um depoimento sobre o que aconteceu comigo. Inclusive, se os Srs. Parlamentares quiserem, abro meu prontuário depois.

Há 5 anos, numa viagem ao exterior, minha esposa notou que, enquanto eu lia, eu estava modificando um pouco o meu foco da revista. Ela brincou comigo e disse que eu tinha de procurar um oftalmologista e fazer um check-up — minha atividade me dá muito pouco tempo para fazer check-up ou procurar um médico. Fiz aquela viagem para participar de um congresso médico. Depois, dediquei 3 ou 4 dias à família. Ao passar em frente a uma ótica, acabei entrando na loja. O profissional que estava na ótica, que não era médico, indicou-me um par de óculos, o que melhorou — e muito — a minha acuidade visual. Saí de lá muito satisfeito.

Alguns meses depois de ter voltado ao Brasil, notei que os óculos não estavam muito bons e procurei um oftalmologista na minha cidade. O Dr. Ibrahim fez um exame e percebeu que, infelizmente, eu tinha glaucoma. Tive perda de campo visual. A minha campimetria já é reduzida. Perdi acuidade visual e, mais do que isso, hoje tenho um comprometimento mais sério. Venho tratando com um oftalmologista indicado por esse médico em São Paulo.

Deixo meu prontuário aberto a todos para mostrar o que aconteceu comigo. Qualquer pessoa que quiser ter acesso ao meu prontuário poderá fazê-lo.

Portanto, a questão vai além do que estamos discutindo aqui, se é competência de A ou de B. Não podemos cometer equívocos que possam levar alguém — como eu, que sou médico, tenho 52 anos e presido uma sociedade médica — a ter um comprometimento futuro. O que aconteceu comigo espero que não ocorra com outras pessoas no País.

A discussão não é corporativa, Sr. Presidente. O que se discute é respeito. As pessoas devem entender que alguns atos médicos podem ser compartilhados; outros, jamais. Se tentarmos compartilhar alguns procedimentos, com certeza colocaremos em risco a saúde de milhares de brasileiros.

Por isso, presto este depoimento. Se alguém tiver dúvida sobre a veracidade dos fatos, meus médicos poderão abrir o meu prontuário para que todos possam acessá-lo.

É um grande equívoco esse projeto de lei que se tenta aprovar. Talvez tenhamos de conversar com esse grupo de jovens e orientá-los sobre seu futuro profissional, mas não da forma como hoje se faz, direcionada para o mercado. Isso, não tenho dúvida nenhuma, é mais do que um equívoco, talvez um crime, pois pode lesar a saúde do povo brasileiro.

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Encerrada a fase de exposições, passaremos aos debates.

Têm prioridade os autores do requerimento, a começar pela Deputada Dra. Clair, Relatora do PL nº 2.783/03, que dispõe sobre a regulamentação da profissão de optometrista.

Com a palavra a Deputada Dra. Clair.

A SRA. DEPUTADA DRA. CLAIR - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, demais presentes, expositores desta audiência pública, na condição de Relatora do projeto, tenho ouvido os 2 lados, tanto optometristas como oftalmologistas. Recebi material para análise, e agora, com essas audiências públicas, estou formando convencimento a respeito da matéria. Entregarei o parecer na próxima semana ou na primeira semana de agosto, quando, espero, votaremos o projeto em questão.

Como sou a Relatora, não quero tecer maiores considerações, mas entendo que as audiências públicas são importantes para propiciar o debate e também formar o convencimento.

Terei acesso aos documentos aqui apresentados e lerei as notas taquigráficas das duas audiências públicas para poder ilustrar o meu parecer.

Deixo o meu abraço a todos os presentes e, como disse, espero em agosto decidir essa questão.

Muito obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Deputado Pedro Henry.

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY - Sr. Presidente, prezados convidados, colegas Deputadas e Deputados, ilustre Relatora e autora do requerimento, não espero, ao final da minha fala, nem aplausos nem vaias. Estou aqui para discutir um assunto sério.

Sensibilizo-me bastante quando vejo, como vi hoje na entrada desta Casa, alguns jovens brasileiros lutando para regulamentar uma atividade que estão dispostos a exercer, porque sei que, no futuro, eles pretendem ter uma família e exercer uma atividade que lhes garanta o sustento. Mas a minha fala não é nesse sentido.

Esta Comissão, Sr. Presidente, tem um papel a cumprir, o de garantir a geração de postos de trabalho no País e fazer um disciplinamento que impeça lesões à sociedade brasileira. Por isso, se o que digo vai desagradar esse ou aquele segmento, não me incomodo, mas vou falar o que sinto e o que penso.

Sou médico, mas deixei o exercício da Medicina há mais de 12 anos, quando comecei a exercer meu primeiro mandato. Nunca busquei a classe médica para me eleger. Sempre fiz minhas campanhas de forma absolutamente independente. Na última eleição, diga-se de passagem, recebi 10% dos votos do meu Estado sem nunca ter escrito uma carta ao segmento médico. Portanto, falo com isenção. Não sou oftalmologista, a minha atividade era a de anestesiologia, mas estou preocupado com a política de saúde deste País.

Como disse a V.Exa. e a todos os que estão me ouvindo neste momento, não espero aplausos, mas também não quero vaias. Acho que os senhores estão aqui para ouvir. Quem tem que falar são os Deputados, que vão analisar e votar esse projeto. Por isso, dirijo-me aos meus colegas Parlamentares desta Casa.

Esse assunto está gerando polêmica no Brasil inteiro. Muitos aqui estão sendo pressionados, quer seja por oftalmologistas, quer seja por optometristas.

Tive o cuidado de fazer uma pesquisa. Fui estudar e ver alguns casos para poder agir com critério. O Dr. Flávio Winkler abordou, na sua exposição, algo que se tornou rotina nesta Comissão, a qual já tive o privilégio de presidir no passado, Sr. Presidente, assim como V.Exa. hoje o faz. Sei da pressão que as mais diversas categorias profissionais fazem para que aprovemos projetos e formemos verdadeiros cartéis.

Líder da bancada do meu partido nos últimos 2 anos, afastei-me da Comissão e, nesse período, algumas coisas aconteceram aqui. Acabou não prevalecendo uma jurisprudência, que era prática desta Comissão. Falo do Verbete nº 1 e do que foi aditado na seqüência, que não foram observados em anos anteriores. Alguns lapsos foram cometidos. Espero que consigamos corrigi-los no plenário da Casa quando o projeto for votado.

Estarei lá para defender o verbete, que é o entendimento desta Casa. Quem tem que opinar sobre regulamentação de profissões somos nós, Parlamentares desta Comissão. Temos o dever e a obrigação de discutir, porque o exame do mérito compete à nossa Comissão.

Peço um pouquinho de paciência aos colegas Parlamentares, porque preciso mostrar algumas coisas que descobri em minha pesquisa e que me assustaram sobremaneira.

Não conhecia o Dr. Flávio Winkler, que até me citou em sua explanação. Ratifico as palavras que escrevi naquele parecer, porque esse é o meu entendimento. Vou continuar defendendo as teses que adotei aqui em discussões passadas, e não apenas em relação às profissões da área médica.

Tive problemas com os decoradores — fui pressionado por uma Deputada que tinha uma faculdade de decoração. Ela veio aqui, chorou, me xingou, e eu não mudei a minha posição.

Continuo defendendo as teses em que acredito, porque é o entendimento da Comissão, não o meu, que está em jogo. O que fizermos com referência a esse projeto vamos ter que fazer em relação a todos os demais daqui para a frente. Então, a responsabilidade da decisão é muito grande.

Tudo que está sendo projetado aqui está no site do Ministério do Trabalho. Se alguém acessar o site do Ministério do Trabalho e digitar "optometristas", vai ver todos os itens de que vou falar.

(Segue-se exibição de imagens.)

Aqui estão algumas sinonímias usadas naquele site.

A descrição sumária da atividade proposta pelo Ministério do Trabalho no seu site:

"(Os optometristas) realizam exames optométricos; confeccionam lentes; adaptam lentes de contato; montam óculos e aplicam próteses oculares. Promovem educação em saúde visual; vendem produtos e serviços ópticos e optométricos; gerenciam

estabelecimentos. Responsabilizam-se tecnicamente por laboratórios ópticos, estabelecimentos ópticos básicos ou plenos e centros de adaptação de lentes de contato (...)"

E pasmem, Srs. Deputados:

"(...) Podem emitir laudos e pareceres ópticos-optométricos".

Essa é a descrição sumária que está no site do Ministério do Trabalho a respeito da regulamentação que se pretende fazer aqui hoje.

Condições gerais do exercício profissional:

"Exercem suas funções em laboratórios ópticos, em estabelecimentos ópticos básicos e plenos, em centros de adaptação de lentes de contato, podendo, ainda, atuar no ramo de vendas e em atividades educativas na esfera da saúde pública".

Quer dizer, eles vão promover vendas transvestidas em atividades educativas na esfera da saúde pública.

"São contratados na condição de trabalhadores assalariados, com carteira assinada e, também, na condição de empregador."

Quer dizer, os mais ferozes empresarial e comercialmente poderão ter empregados em seus estabelecimentos — e não apenas um, mas 10, 20, 30, 100 — atuando em todo o País de forma totalmente irresponsável.

"Atuam de forma individual e em equipe, sem supervisão, em ambientes fechados e também em veículos, no período diurno."

Então, não se assustem se colocarem uma parafernália dentro de um "fusca" e saírem dando consulta pelo Brasil inteiro, em qualquer esquina, em qualquer lugar.

Peço um pouco mais de paciência, porque os Parlamentares desta Comissão precisam tomar conhecimento disso. Ninguém pode votar esse projeto de lei, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, sem ter conhecimento do que está sendo proposto. Às vezes, a leitura de um projeto de lei pode fazê-lo parecer simples demais, mas o pano de fundo está sendo despido neste momento, a despeito de todos os depoimentos feitos nesta Casa por alguns profissionais da área médica e optometristas — e tomei o cuidado de ouvir o que foi discutido na sessão passada, à qual não pude estar presente.

"Formação e experiência.

O exercício dessas ocupações requer curso

técnico de nível médio (...)"

O que o verbete proíbe. O verbete diz claramente que tem de ser ensino superior,

"(...) oferecido por instituições de formação profissional. O pleno desempenho das atividades profissionais se dá após o período de três a quatro anos de experiência".

Então, na própria proposição já se dispõe que alguém, vamos dizer assim, entre aspas, "teoricamente" qualificado não vai poder exercer plenamente a profissão; precisa treinar mais 4 anos, e sem supervisão.

Acho que essa é uma prática que deixa claro a intenção do projeto de lei. Com todo o respeito que eu tenho pelos seus autores, não poderia assistir ao espetáculo que está sendo patrocinado; que envolve alguns jovens brasileiros que, no afã de terem uma profissão, no afã de conseguirem um posto de trabalho, entraram nessa empreitada sem conhecer o real pano de fundo desse negócio espúrio, sujo e que pretende lesar a sociedade brasileira.

Continuando com o que diz o site do Ministério do Trabalho:

"Áreas de atividade:

Realizar exames optométricos; adaptar lentes de contato; confeccionar lentes; montar óculos e auxílios ópticos; aplicar próteses oculares; promover educação em saúde visual; vender produtos e serviços ópticos e optométricos; gerenciar estabelecimento; comunicar-se."

Aqui vem a descrição do que significa cada um dos itens que vimos agora.

"Realizar exames optométricos:

1 - Medir acuidade visual".

Vamos admitir que a medição, a aferição da acuidade visual, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, seja uma tarefa relativamente fácil. Eu diria que é fácil. Não é difícil. Acho que, para um técnico bem treinado, medir a acuidade visual é uma coisa relativamente fácil. Mas, Dr. Elizabeto Gonçalves, quantas patologias sistêmicas podem alterar a acuidade visual e quem não tem o pleno conhecimento desses fatos que mal pode causar à sociedade brasileira? Registre para que o senhor possa me responder ao final.

"2 - Analisar estruturas externas e internas do olho."

Ou seja, fazer uma fundoscopia.

Na Casa, há vários Parlamentares diabéticos. Uma das complicações do diabetes é

exatamente a redução da acuidade visual por uma diminuição e enrijecimento do calibre dos vasos sangüíneos oculares, o que somente uma vista treinada, mais experiente pode diagnosticar. Mas, para isso, é preciso ter conhecimento, ter passado por uma Faculdade de Medicina por 6 anos e, depois, ter sido treinado em uma Residência, ter se especializado sob supervisão, para ter a destreza para perceber isso. No entanto, pretende-se aqui, com uma simples canetada, permitir que esse procedimento possa ser feito por quem não tem o preparo para isso.

Senhores, não adiantará chorar quando crianças e idosos ou mesmo adultos em idade produtiva forem lesados definitivamente, afastados da vida normal, como já aconteceu em muitos casos.

Isto feito pelo médico já tem as suas conseqüências, meu caro Presidente da Associação Médica Brasileira e do Conselho Federal. Quantos procedimentos temos em que médicos foram apenados por negligência, apesar de estarem treinados, apesar de serem qualificados? Pois, ainda assim, foram cometidos erros que levaram pessoas a sofrer lesões irreversíveis.

Queremos com esse projeto, em uma canetada pura e simples, permitir que pessoas que não têm qualificação, jovens brasileiros até bem intencionados, sejam legitimadas em uma função para a qual não foram preparadas?

Se fosse discorrer sobre cada um dos itens, poderia ficar falando indefinidamente. Por isso, peço-lhes apenas que leiam tudo isso no site do Ministério do Trabalho.

Há algumas atividades que os ópticos práticos fazem, e a Oftalmologia brasileira precisa deles, pois cumprem importante papel na sociedade e na atividade médica. Agora, o que se pretende aqui é uma abertura que não existe nem em países mais avançados, onde a formação profissional é mais rigorosa, é mais fiscalizada, onde o direito do consumidor é mais bem garantido, e ainda assim há distorções terríveis.

Então, aos senhores que vieram aqui hoje, tanto o Dr. Marcos Ávila, um dos mais renomados oftalmologistas brasileiros, como o Dr. Elizabeto Gonçalves, Presidente do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, a pergunta que faço é muito clara. Observando tudo isso — montar óculos, auxílios óticos, encaixar lente, lapidar lente —, é fácil notar que é trabalho do ótico prático, mas a aferição disso tudo deve ser feita por um profissional. E quando houver uma lesão em razão da má adaptação de uma lente, quem vai tratar esse paciente? Encaminha-se, então, ao profissional?! Quer dizer, depois do erro, passa-se a bola para o profissional preparado, a fim de corrigir o dano que foi causado. Não riam, senhores. Não estamos falando de animais, mas de seres humanos que serão submetidos a esse tipo de procedimento por pessoas que não estão qualificadas. Não é brincadeira o que estou fazendo. O que estamos discutindo é seríssimo. Temos de ter todo o cuidado possível.

"Venda de produtos e serviços." Sempre que se mistura venda e serviço, a prostituição prolifera numa velocidade fantástica. O objeto da venda passa a ser muito mais importante do que o serviço. O serviço passa a ser de graça, porque o custo é embutido no objeto da venda. E esse aspecto foi abordado pelo Dr. Elizabeto Gonçalves quando mencionou estudo realizado nos Estados Unidos. Mas é lógico que o optometrista receitará muito mais óculos. Para ele é interessante, porque ganha com os óculos. Por isso, sempre fui contra que o profissional de oftalmologia tivesse também a sua ótica ou que encaminhasse o paciente para o seu estabelecimento comercial. Os senhores deveriam proibir a participação acionária dos oftalmologistas no comércio de lentes. Deveriam recomendar que nenhum oftalmologista se inserisse nesse segmento comercial, para que não

houvesse dúvida em relação à emissão de um laudo. (Palmas.)

Não precisam me aplaudir. Não quero aplauso. Sou chamado, nesta Comissão, de Carlos Imperial, que gostava de levar vaia. Para quem não o conheceu, Carlos Imperial era um julgador de programa de televisão que só falava contra. Estou dizendo tudo isso para tentar mostrar-lhes que não podemos conviver com esse tipo de projeto de lei. Não podemos simplesmente assistir a tudo isso e achar que está tudo certo.

"Solicitar exames e pareceres de outros especialistas." A partir do momento em que for sancionada a lei que regulamenta essa profissão, laboratoristas outras especialidades médicas não se assustem se começarem a receber solicitação de parecer de exame de optometrista, sem nenhuma qualificação, até para encaminhar, porque não têm a concepção sistêmica da patologia humana.

"Emitir laudos e pareceres." Isso significa dizer que começará a competição. Entrará no jogo um profissional menos qualificado que vai começar tentar ocupar o espaço de trabalho daqueles que passaram anos e anos se qualificando. A despeito de estarmos preocupados com a geração de postos de trabalho para esses jovens brasileiros que precisam ter uma perspectiva de trabalho no futuro, não podemos admitir uma situação que causará um mal muito grande à sociedade brasileira.

Para encerrar, gostaria de ouvir as opiniões do Dr. Marcos Ávila e do Dr. Elizabeto Gonçalves, profissionais renomados, não como médicos, mas como futurólogos. O que senhores acreditam que acontecerá com a sociedade brasileira se um projeto dessa natureza for aprovado pela Câmara dos Deputados?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Tem a palavra o Sr. Deputado Capitão Wayne, autor do requerimento. (Palmas.)

O SR. DEPUTADO CAPITÃO WAYNE - Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço aos membros desta Comissão a forma como têm conduzido as sessões, visando sempre ao entendimento e ao debate franco e aberto. Era isso que realmente eu queria, porque esse projeto já se delongava demais. A partir do momento em que se apresenta um projeto nesta Comissão, temos que discuti-lo e, ao final, votá-lo.

Agradeço à Comissão, mais uma vez, a aprovação do requerimento, para que possamos terminar esse debate e definir a questão da optometria e da oftalmologia.

O que está em debate é o Projeto de Lei nº 2.783-A, de 2003, do Sr. Mário Assad Júnior, ao qual está apensado o Projeto de Lei nº 3.739, de 2004, do Deputado Benjamin Maranhão. O que esses projetos trazem em seu bojo? O que, na verdade, querem esses Deputados? A regulamentação da profissão de optometrista e que só sejam considerados habilitados para o exercício da profissão os portadores de diploma de curso superior em optometria, reconhecido e registrado pelo Ministério da Educação, o mesmo que reconhece a profissão de médico oftalmologista.

O art. 2º do projeto dos Deputados visa regulamentar as atividades do óptico optometrista e do oftalmologista: até aonde o optometrista e o oftalmologista poderão ir.

Neste momento, gostaria de expressar a minha felicidade pela realização desta audiência pública. O debate está sendo muito interessante.

As verdades têm de ser ditas. Na sessão passada, disse que estaríamos aqui, olho no olho, com oftalmologistas e optometristas. Diante disso, desejo fazer um encaminhamento.

Não sei se haverá outra audiência pública para definir a questão, mas gostaria de contar com a presença de representantes do Ministério da Saúde, do Ministério de Educação e da OMS. Documento que nos foi encaminhado pelos optometristas diz que eles também fazem parte da Organização Mundial de Saúde. Portanto, além do encaminhamento dos Deputados, teremos de ouvir os representantes dessas instituições sobre as funções de oftalmologista e de optometrista no mundo todo.

Dr. Flávio de Castro Winkler, quem regulariza a grade de matérias e expedição de diplomas dos médicos oftalmologistas: o Conselho Brasileiro de Oftalmologia, o Conselho Federal de Medicina ou o MEC?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - V.Exa. só tem essa pergunta?

O SR. DEPUTADO CAPITÃO WAYNE - Não, tenho outras.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Então, faça as perguntas. Ouviremos 3 Parlamentares de cada vez e depois faremos nova rodada, para agilizar os trabalhos.

O SR. DEPUTADO CAPITÃO WAYNE - Gostaria que o Dr. Flávio Winkler respondesse primeiro, porque a segunda pergunta depende da sua resposta.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Há outras perguntas a ser feitas aos demais debatedores?

O SR. DEPUTADO CAPITÃO WAYNE - Sr. Presidente, são só essas 2 perguntas. Será rápido.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Como V.Exa. é autor do requerimento, abro uma exceção.

O SR. FLÁVIO DE CASTRO WINKLER - Os títulos de oftalmologista no Brasil são reconhecidos pelo Ministério de Educação e pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia, que é Departamento de Oftalmologia da Associação Médica Brasileira.

O reconhecimento se dá por meio de portaria que reconhece os cursos de Medicina e as Residências de Oftalmologia, ao contrário do que acontece com os cursos de Optometria, que têm somente aprovação dos diplomas, mesmo assim para fins de emissão e registro.

Nenhum curso no Brasil possui regular regulamentação, à luz do que nós, do CBO, entendemos. É importante consignar que essa situação está sub judice no Superior Tribunal de Justiça, porque o reconhecimento se deu, segundo nosso entendimento, mesmo que seja somente dos diplomas, de forma irregular.

Acredito ter respondido a sua pergunta.

O SR. DEPUTADO CAPITÃO WAYNE - Sr. Presidente, na verdade, o que pedem os projetos é que a profissão de optometria seja regulamentada pelo Ministério da Educação e Cultura, que deu o mesmo direito aos médicos oftalmologistas. De duas uma, ou o Ministério da Educação não é competente para emitir diplomas de oftalmologia nem de optometria, ou deveremos verificar mais detidamente o porquê da liberação da profissão de optometria, pois sabemos que algumas universidades estão capacitadas para a formação de optometristas.

Temos de conversar sobre essa situação com o Ministério da Educação e Cultura, para que ele diga se o documento emitido por ele, que prevê a criação de uma Faculdade de Optometria, é válido ou não. Em cima disso, acho, as coisas devem acontecer.

O que o nobre Deputado Pedro Henry disse tem fundamento, e sei que S.Exa. estudou a questão. Mas a partir do momento em que for regulamentada, o exercício da profissão de optometrista será realizado na forma da lei. Os optometristas vão exercer a sua função de uma maneira e os oftalmologistas de outra, na forma reconhecida pelo MEC.

Então, essa é a minha preocupação: ou o MEC libera o credenciamento dos optometristas ou não. Sobre isso deveríamos conversar na próxima reunião de audiência pública. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Deputado Dr. Francisco Gonçalves.

O SR. DEPUTADO DR. FRANCISCO GONÇALVES - Sr . Presidente, Sras. e Srs. Deputados, caro Prof. Elizabeto Gonçalves, amigo de longa data; caro Dr. Gerson Martins, representante do Conselho Federal de Medicina; caríssimo colega Dr. Marcos Pereira, professor da Universidade de Goiás; ilustre Dr. Eleuses Vieira de Paiva, é muito importante a presença de todos neste debate tão amplo, claro e transparente.

Vendo os jovens formados em optometria aqui presentes, lembro-me de quando me formei, ainda moço, cheio de ilusões e com muita coragem de trabalhar. À medida que vamos nos aperfeiçoando e tendo uma vivência maior na Medicina, percebemos que não podemos ser tão corajosos sem o conhecimento necessário.

É inadmissível que os Ministérios da Educação, da Saúde e do Trabalho dêem alvará de funcionamento a uma faculdade de optometria sem garantias. Isso é enganar os jovens. Cria-se a ilusão de que eles poderão trabalhar abertamente como oftalmologistas sem que tenham o conhecimento de quem se sentou durante 6 anos nos bancos de uma Faculdade de Medicina e se especializou durante mais 3, 4 ou 5 anos.

Digo isso porque tenho um filho formado há 3 anos, mas que ainda está fazendo especialidade em cirurgia plástica e continuará estudando por mais 2 anos, para só então poder assumir responsabilidades como tal.

Portanto, não culpo os jovens aqui presentes, mas quem tentou enganá-los, liberando esses cursos. São esses os verdadeiros responsáveis.

Vejo aqui o Prof. Elizabeto Gonçalves, que trabalha há anos em prol da Oftalmologia brasileira na área social e que jamais se nega a atender uma pessoa simples — disso sou testemunha, professor. Como seu ex-aluno, sei do seu trabalho e capacidade.

Quero deixar um conselho aos jovens presentes: que tenham a noção exata de que com saúde não se brinca. Na saúde, é extremamente grave um diagnóstico errado, pois ele terá repercussões para o resto da vida do paciente.

Não me lembro dos meus sucessos, mas lembro plenamente de todos os meus insucessos.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Vamos dar a palavra, alternadamente, ao Dr. Elizabeto Gonçalves para as suas considerações.

O SR. ELIZABETO RIBEIRO GONÇALVES - Quero, primeiramente, louvar o espírito cavalheiresco e gentil com que V.Exa. emitiu sua opinião. As coisas são complicadas, ilustre Deputado. Para V.Exa. ter idéia, basta dizer que o olho, esse órgão tão pequeno, pode sediar 3.870 doenças. E isso requer, claro, um conhecimento a ser obtido ao longo de anos.

O Deputado Capitão Wayne indagou se o MEC deveria reconhecer o curso médico e o de optometrista. Quero lembrá-lo que o próprio Ministro Tarso Genro, em recente entrevista à revista Carta Capital, no final de março, disse claramente que a educação deve estar necessariamente atrelada ao bem público.

A minha dúvida é se a liberação da optometria terá algum compromisso com o bem público frente à complexidade anatômica, estrutural e patológica do olho. A profissão de optometrista vai guardar essa relação com o bem público? Essa é a minha preocupação.

Aliás, o próprio Ministro se contradiz — e V.Exa. disse que o MEC é o órgão do Estado responsável por oficializar o curso de optometria — quando insiste na vinculação necessária da educação à prática do bem público. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - O Deputado João Fontes não está presente.

Então, com a palavra o Deputado Márcio Fortes.

O SR. DEPUTADO MÁRCIO FORTES - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, por não ser titular, mas membro suplente desta Comissão, manifesto-me em substituição ao Deputado Carlos Alberto Leréia, que solicitou a mim que externasse sua posição.

Não sou médico, mas engenheiro. Da Medicina só guardo boas lembranças. Não há nada de errado com a minha saúde. Estou velho, mas ainda saudável. Não sou doente, mas cronicamente afetado na parte visual. Tenho glaucoma desde que nasci. É uma doença que muito me incomoda, já me levou 5 vezes à mesa de cirurgia e, proximamente, me levará novamente, porque a cirurgia para correção de glaucoma tem prazo de validade, não resolve definitivamente o problema.

O fato é que, em decorrência dessa doença, tive uma neurite e fiquei completamente cego de um dos olhos. Depois, recuperei a visão. Mas eu tive a neurite por ter sido mal examinado por um optometrista nos Estados Unidos, quando lá estudava, dado o certo desprezo que a medicina social americana devota àqueles que são jovens, saudáveis e que não são patológicos crônicos, aparentemente. Quer dizer, eu estudava numa universidade americana; tive um problema de visão; fui ao oculista, e ele me disse que o meu caso era de competência de outro profissional, que — mais tarde tomei conhecimento — não era profissional de Medicina. Aquele outro profissional, ao me examinar, não detectou, em momento algum, que eu fosse portador de glaucoma — o que eu já era, em alto grau.

Esse testemunho me faz temer pela qualidade do atendimento, caso seja aprovado o projeto.

Isso se aplica não só à Medicina, segundo meu raciocínio, mas à Engenharia e a tantas outras profissões em que se possa, não por delegação dos profissionais formados em

nível superior, mas por atribuições de funções próprias de grande responsabilidade, delegar àqueles que não tenham passado, como bem disse o Deputado Pedro Henry, por toda a liturgia de formação de um profissional de nível superior, com o acréscimo do exercício da prática profissional supervisionada necessária a questões vitais, as quais correspondem, um pouco, à seleção das profissões regulamentadas de antigamente, quando elas eram em pequeno número.

Com relação ao atendimento à saúde pública no Brasil, questiono a validade de improvisação, fazendo que tudo seja, enfim, automatizado, abandonando-se a excelência na forma. Porque o importante é que todos os seres humanos, particularmente os brasileiros, tenham o atendimento de melhor qualidade sempre.

A aprovação desse projeto submete a população brasileira ao risco de ser permanentemente não mal atendida — porque não duvido da boa vontade e da disposição de bem fazê-lo dos profissionais de optometria, caso haja essa regulamentação — mas deficientemente atendida, em razão da lacuna pelo desconhecimento integral do organismo humano, algo que só se aprende num curso universitário completo.

A semelhança com a profissão de engenheiro pode me levar a sérios defeitos, mas existe também. Quer dizer, o engenheiro civil tem que aprender eletrônica, senão o exercício de sua profissão será deficiente por não conhecer a complexidade da temática técnica. Ou seja, colocar o exame de um órgão vital, o olho, sob o crivo de profissionais que não tenham o conhecimento e a prática do atendimento ao complexo do organismo humano como um todo pode fazer com que não haja um diagnóstico seguro de doenças decorrentes de outras patologias do corpo humano, as quais não podem ser identificadas a não ser por profissionais formados em cursos regulares de Medicina.

Esse meu testemunho tem amparo em diversos outros exemplos que conheço. Os senhores hão de imaginar — eu tenho 62 anos de idade e 40 anos de profissão — que, convivendo com essa patologia, conheço todos os meandros da doença, além de conviver com colegas que sofrem do mesmo infortúnio. Na realidade, o que todos queremos — os mais abonados, os menos privilegiados, os mais ricos ou mais pobres, os jovens, os mais idosos e os que têm complexos problemas de saúde — é o atendimento de excelência sempre. Essa é uma questão. A outra é saber quem paga o atendimento de excelência. Não se pode misturar as coisas. Devemos saber se a estrutura de atendimento à saúde pública, num país complexo como o Brasil, está ou não habilitada à promoção da excelência do atendimento. Portanto, devemos evitar a improvisação que, consequentemente, ocasionará a massificação de questões vitais que podem nos levar, sistematicamente, à perda de qualidade da saúde, o que implica, para esta Comissão, questões muito graves, como o atendimento ao mercado de trabalho.

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Deputado Daniel Almeida.

O SR. DEPUTADO DANIEL ALMEIDA - Sr. Presidente, saúdo V.Exa, os autores do requerimento e os expositores que defendem o ponto de vista dos oftalmologistas.

Semana passada, a reunião de audiência pública desta Comissão esteve muito movimentada com a presença dos optometristas. Este é o melhor ambiente para tomarmos uma decisão adequada e que consulte os interesses do povo brasileiro e da saúde.

As decisões de melhor qualidade serão aquelas que contarem com a presença e

acompanhamento dos diversos segmentos interessados. É muito importante que isso seja feito, uma vez que os optometristas já estiveram nesta Casa debatendo a matéria. Como hoje estamos tendo esta nova oportunidade, vamos continuar discutindo os projetos que serão relatados pela Deputada Clair, que, com certeza, apresentará excelente parecer sobre eles.

Portanto, as coisas aqui não serão feitas na canetada ou no grito, mas por meio da consulta democrática, muito importante para uma boa deliberação desta Comissão.

Não sou da área de saúde. Todavia, tenho acompanhado este importante debate, que servirá para que eu forme opinião sobre temas como esses que suscitam muita discussão.

Em outra oportunidade, debatemos nesta Casa a regulamentação de profissões cujo conteúdo era, formalmente, semelhante ao de hoje.

Lembro-me da discussão a respeito de decoradores de ambiente e arquitetos; depois de longo debate, chegou-se a um entendimento para que as competências se harmonizassem. Lembro-me também dos debates acerca dos engenheiros de segurança e dos técnicos de segurança do trabalho, que esta Comissão também teve a oportunidade de fazer.

Neste caso específico, existem outros elementos. Estamos tratando de saúde, da vida das pessoas, e nessa área as preocupações e responsabilidades são maiores. Parece-me importante que a discussão sobre este tema deva estar articulada com a questão da educação. A Comissão de Educação já apreciou a matéria e proferiu parecer contrário ao projeto, mesmo já existindo um curso precariamente regularizado de optometria. Portanto, sob o ângulo da educação, o debate já foi realizado, e a contribuição da Comissão de Educação é muito valiosa.

Como já declarei na audiência passada, não há possibilidade de aprovação do projeto na forma em que apresentado. Desde o início, manifestei-me nesse sentido. O atual conteúdo do projeto torna difícil sua aprovação. Minha dúvida é sobre se temos a possibilidade de chegar a algum nível de compatibilização de procedimentos compartilhados entre a atividade de oftalmologista e de optometristas. Fiz esse questionamento na audiência passada, quando indaguei sobre se deveríamos partir para um ambiente de confronto ou se havia espaço para algum entendimento do ponto de vista do conteúdo do projeto, de modo que a profissão de optometrista pudesse existir com atribuições precisas e definidas sem invadir as competências dos oftalmologistas.

A indagação que repito agora é exatamente nesse sentido: há algum espaço para entendimentos ou a única alternativa que temos é rejeitar completamente o projeto, sem analisar a possibilidade de modificações em seu conteúdo?

Repito: do jeito como está o projeto não terá o meu voto, em razão das ponderações que tive a oportunidade de ouvir até agora.

Quero, no entanto, valorizar o ambiente de debate que estamos promovendo e questionar se é possível continuarmos na busca de algum tipo de consenso.

Obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra a Deputada Gorete Pereira.

A SRA. DEPUTADA GORETE PEREIRA - Meus cumprimentos aos membros da Mesa, em especial ao Prof. Marcos Ávila, por quem tenho o maior respeito.

A todos os presentes desejo deixar clara minha preocupação com referência à regulamentação.

Temos hoje no Brasil cerca de 12 mil oftalmologistas. Desses, 54% atendem pelo SUS. Nossa maior preocupação é com a saúde pública. Sou do Ceará e, como já disse, somente há oftalmologistas em 50 dos 184 Municípios do meu Estado. São muitos Municípios, portanto, sem qualquer profissional que possa pelo menos detectar alguma patologia e encaminhar o paciente ao médico especialista, e isso é para mim motivo de grande preocupação.

Como dizia, 54% dos oftalmologistas brasileiros atendem pelo SUS. Dividindo nossos 12 mil oftalmologistas pela população brasileira, chegamos à média de um oftalmologista para 14 mil habitantes. Se multiplicarmos os 250 dias úteis do ano por 10 atendimentos pelo SUS — atendimento de refração, primário —, chegamos a um número de atendimentos anuais de 2.500 pessoas pelo Sistema Único de Saúde. Para atingir a população necessária, portanto, as pessoas teriam de esperar por mais de 5 anos para serem atendidas por um oftalmologista.

Daí nossa preocupação no sentido de que, primeiro, esses profissionais freqüentem faculdades autorizada pelo MEC e, depois, de que nós regulamentemos a profissão. São 4 ou 5 anos de estudo apenas na atenção primária.

Pergunto a V.Sa. se essas pessoas que passaram 4 ou 5 anos estudando para o atendimento primário não estão preparadas para resolver o problema da falta de médicos oftalmologistas que há no País? Como a oftalmologia, a optometria está querendo construir a sua história, mas, no caso de a profissão não vir a ser regulamentada, pergunto: qual a proposta concreta para assegurar à população uma atenção necessária, uma atenção primária?

Creio que a situação ficaria muito difícil e, por isso, como o Deputado que me antecedeu, digo que temos de encontrar uma maneira de dizer até onde vai a atribuição do optometrista e onde entra a do oftalmologista. Não podemos deixar de considerar a importância dessas pessoas que freqüentaram os bancos das faculdades.

Tenho uma filha que cursa Medicina e que está optando por oftalmologia. Ela me disse que, se se computarem as horas de estudo que ela tem na oftalmologia e a horas de estudo dos optometristas nas faculdades autorizadas pelo MEC, a quantidade de horas é muito maior. Com certeza, um médico que conheço de perto, assim como o Dr. Marcos Ávila, não atuaria nem na refração. Estive lá, e essa atividade é feita por outras pessoas. (Palmas.)

Temos de dar condições aos optometristas. Examinando a quantidade de horas de estudo exigidas para o optometrista fazer atendimento primário, que já foi autorizada pelo MEC, ficamos numa situação muito difícil. Primeiro, mandam todos esses jovens para a faculdade, e muitos pagam para freqüentá-la, e depois é que nos mandam o projeto de regulamentação da profissão?

Enfim, a pergunta principal é qual a proposta concreta para que tenhamos a população brasileira atendida. Hoje, ela precisaria de mais de 5 anos para ser atendida pelos 12 mil oftalmologistas. Pergunto também se o curso de optometrista não permitiria ao profissional identificar as doenças mais comuns. Não teriam eles condições de detectar essas

patologias e encaminhar o paciente ao tratamento adequado?.

Às vezes, pensamos ser esse um problema de corporativismo, de reserva de mercado. O Brasil precisa realmente de uma abertura maior em determinadores setores. Ou, então, que não se crie nos jovens a expectativa de cursarem essas faculdade e depois serem coibidos de exercer a profissão. Mas tenho certeza de que a Deputada Dra. Clair vai encontrar solução.

Lamento a ausência do contraditório. Esta audiência deveria ter tido a participação dos 2 lados; nós os ouviríamos e tiraríamos nossa conclusão. Serviria também para o embasamento do trabalho da Relatora.

Preocupa-me realmente essa situação. O Brasil, com a quantidade de oftalmologistas que tem, não terá condições para desenvolver ação primária de saúde. Com isso, terá muito mais problemas. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Deputado João Fontes.

O SR. DEPUTADO JOÃO FONTES - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, membros da Mesa, demais presentes, lamentavelmente, do ponto de vista médico, fiquei um pouco prejudicado. Precisaria ter poder de ubiqüidade para estar em 4 lugares ao mesmo tempo. Hoje, discute-se na Comissão de Constituição e Justiça a reforma política; em plenário, o salário mínimo; e na CPI há o depoimento de Maurício Marinho. Temos de ficar correndo de um lado para outro, o que as vezes prejudica nossa atuação.

Ouvi quase todo pronunciamento do Dr. Flávio Winkler e também do Dr. Marcos Ávila e pude perceber que, do ponto de vista jurídico, não houve convencimento — peço vênia ao nobre advogado. O parecer apresentado por um ilustre jurista — parece-me que do Dr. Saulo Ramos —, como todo parecer encomendado, foi feito de acordo com o pedido pelo solicitante.

Quanto às referências ao Código de Defesa do Consumidor, é preciso estabelecer um limiar entre oftalmologia e optometria. Não sabemos se há vulnerabilidade em relação à receita ocular, não a oftalmológica, do médico ou do optometrista.

Eu não sou médico, mas sou a favor de uma medicina aperfeiçoada. Não se pode dar guarida a charlatanismo, mas é preciso saber se não se está tratando de um novo ramo da Medicina a ser desmembrado da oftalmologia, embora não do jeito que ocorre hoje.

De acordo com os dados apresentados, apesar do esforço que vem sendo feito pelo Conselho e pelos oftalmologistas, é impossível atender à demanda existente no Brasil. O País tem 180 milhões de habitantes e 12 mil oftalmologistas. É muito pouco. Mas é claro, também, que não se quer deteriorar a saúde do povo brasileiro, entregando-a a pessoas que não têm conhecimento científico correto para examinar a população.

A Constituição estabelece, no seu art. 196, que saúde é direito de todos e dever do Estado, mas o Estado não oferece à população a necessária assistência à saúde.

Quanto ao estabelecimento do contraditório, isso já foi feito, porque na audiência passada os optometristas expuseram seu ponto de vista. Agora, estamos ouvindo o outro lado.

Mas podemos precarizar o setor de saúde do País por não termos a Medicina que

gostaríamos. Precisamos melhorar a qualidade do serviço médico do País. E o de que precisamos aqui? Não tenho ainda convencimento firmado a respeito. Para mim, o ramo da optometria é novo. Sou oftalmologista e não sabia que havia optometristas.

Confesso que hoje sou uma pessoa muito consciente, até pela experiência que estamos tendo na administração política do País. Apesar de não ter preconceito contra alguém que não tenha cursado universidade chegar à Presidência da República, tenho certeza de que, se o Presidente Lula tivesse freqüentado a universidade, teria maior capacidade de governar. É lógico.

Quanto à Medicina, o médico que depois se especializa na oftalmologia não pode computar todo seu tempo de estudo, já que muito dele não é direcionado especialmente à oftalmologia.

Precisamos estabelecer um limiar de diferença. Até que ponto, cientificamente falando, há comprometimento da saúde pública do nosso País com esse limiar: o oftalmologista, que cuida mais da patologia, e o optometrista, que trabalha mais em cima da visão? Precisamos nos convencer com embasamento científico.

Recebo todo mundo no meu gabinete — o optometrista e o oftalmologista —, mas eu voto de maneira independente, de acordo com meu convencimento.

Então, queria que fosse mostrado pelos senhores esse limiar. Se é uma profissão nova, em que há a interdependência do ponto de vista científico, uma nova especialização da Medicina que pode ser cursada não em 6 meses, mas em universidades, como as que estão sendo criadas no Brasil, que oferecem condições de melhorar a condição de vida do povo, sou a favor. Se não há essa questão do ponto de vista oftalmológico, se a saúde do povo brasileiro puder ficar comprometida, eu me coloco em outra posição.

Quero que os senhores mostrem, do ponto de vista científico, até que ponto a aprovação desse projeto é positiva ou negativa. Temos que agir com muita responsabilidade. Não se trata de regulamentar uma profissão por causa de carência existente na área de saúde. Não vamos aprovar um projeto para esfacelar a saúde púbica no País. Quero que os senhores apresentem essa questão do ponto de vista científico.

Do ponto de vista jurídico, não adianta, porque há diversos entendimentos, assim como decisões no sentido de reconhecer a profissão dos optometristas. A questão jurídica não é o ponto principal, mas, sim, a questão científica, pela responsabilidade de aprovarmos algo para o povo brasileiro.

Quero me ater a esse ponto principal, eu, que não sou médico, preciso de esclarecimento maior a respeito dessa matéria. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Vamos conceder a palavra a mais um Parlamentar. Com a palavra a Deputada Alice Portugal.

A SRA. DEPUTADA ALICE PORTUGAL - Sr. Presidente, sou a nova suplente na Comissão, com muita honra.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Bem-vinda, Sra. Deputada.

A SRA. DEPUTADA ALICE PORTUGAL - Sr. Presidente, tenho tido dificuldade em comparecer a todas reuniões, porque elas ocorrem no mesmo momento das reuniões da

Comissão de Educação. Mas, como estamos tendo um mar de discussões de âmbito profissional, fiz questão de hoje faltar a reunião da Comissão de Educação e vir à Comissão de Trabalho.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Fez muito bem.

A SRA. DEPUTADA ALICE PORTUGAL - Obrigada, Sr. Presidente. Procurarei sempre fazer esse esforço.

De fato, estamos vivendo problemas muito graves de âmbito profissional no Brasil. Há profissões que deixaram de existir. Hoje, já não falamos do datilógrafo, porque o digitador tomou seu lugar. Recentemente, na Comissão de Educação, vivemos uma grande polêmica, porque o Conselho de Educação Física resolveu fazer uma reserva de mercado e exigir o diploma de nível superior do capoeirista e que as dançarinas clássicas fossem filiadas ao Conselho de Educação Física. Esse projeto já foi enviado a esta Comissão, depois de ter passado pelas Comissões de Educação e de Desporto. Então, os conflitos existentes em âmbito profissional são diversos.

Agora vem a esta Comissão o debate iniciado na Comissão de Educação sobre quiropraxia, também de interesse dos médicos e fisioterapeutas. Com uma franquia da Palm Beach, regulamentou-se o curso de quiropraxia no Brasil, com duração de cerca de 3 anos e o direito à manipulação de vértebras. Ora, sabemos que essa é uma atividade da maior responsabilidade, na qual o conhecimento anatômico e neurológico são pré-requisitos, e em 2,5 ou 3 anos é impossível o domínio completo da parte mecânica e neurológica do corpo humano. É um debate que também ocorrerá nesta Comissão.

Estamos tendo hoje uma inter-relação da Comissão de Educação, da Comissão de Trabalho e da Comissão de Seguridade Social e Família, e talvez fosse o caso, Sr. Presidente, de discutirmos a possibilidade de uma Subcomissão intercomissões, vamos assim dizer, para o debate desses objetos de caráter profissional. De fato, é muito complicado. Define-se a matéria sob o enfoque da educação e ela vem para cá sob o enfoque do trabalho, sem a interpolação de interesses.

No caso em tela, o MEC definiu a existência do curso, mas é necessário que se remonte à questão da quiropraxia, que acabei de mencionar, dentre outros cursos que o MEC acabou regulamentando, por pressão do setor privado, sem qualquer análise estrutural, tanto que neste momento todas as regulamentações estão suspensas, a não ser que todos os pré-requisitos estejam definidos.

Na nova proposta de reforma universitária, diga-se de passagem, alguns retoques são necessários, mas é um projeto que vem sendo discutido profundamente na sociedade, e é preciso que todos participem desse debate.

Está definido lá: cursos de saúde, só com a interação entre o MEC e o Ministério da Saúde, inclusive com a participação do Conselho Nacional de Saúde e do Conselho Nacional de Educação. Essa inter-relação constará da lei.

Por isso deveríamos, Sr. Presidente, retornando ao que dizia, tentar criar um fórum parlamentar, mesmo informal, e quando a matéria for de cunho profissional reuniríamos preliminarmente os responsáveis ou os Relatores nas Comissões de Educação, de Trabalho e de Seguridade.

Essa é uma questão preliminar. A simples liberação do curso não faz com que venhamos a transpor o debate conceitual da existência das profissões com similaridades. E em relação

à oftalmologia e à optometria, com todo o respeito aos jovens optometristas, com todo esse estímulo para a sua formação no campo óptico, no campo da refração, há a anamnese preliminar, que não pode ser abolida em decorrência da quantidade de doenças. O Dr. Elisabeto levantou a quantidade de doenças do olho, mas e as doenças cegantes? Eu sou farmacêutica; evidentemente, não tenho a incursão acadêmica necessária para levantar todos os casos, mas elas são gravíssimas, como o glaucoma, a diabetes, a degeneração macular relacionada com a faixa etária. Enfim, e até remetendo ao objeto das análises clínicas, como o optometrista poderia definir uma tendência cegante por toxoplasmose, por exemplo, sem o apoio laboratorial?

Eu julgo que a anamnese é a porta de entrada clínica, o que é importante para os optometristas também. A decorrência da responsabilidade do ato de não diagnosticar é inevitável. Isso também tem de ser analisado, do ponto de vista da própria proteção dos senhores no mundo do trabalho. A porta de entrada da anamnese tem que ser a anamnese clínica, e quem está preparado para fazer a anamnese clínica está inscrito no CRM. Quanto a isso não há dúvida. Repito: não há dúvida. São os médicos.

Estou participando do debate do ato médico. Sem dúvida, há um processo de evolução. Havia um corporativismo muito conservador, e há, vamos dizer assim, a desintegração do objeto da interdisciplinaridade. Não podemos, definindo que a anamnese clínica é a porta de entrada, desconsiderar a existência de outros saberes em desenvolvimento, como a fisioterapia, a enfermagem, a psicologia, dentre outros. Evidentemente, a interdisciplinaridade hoje é a realidade da saúde, das ciências da saúde. Essa é uma compreensão que os médicos necessitam ter, nesse processo. E o anteprojeto da Senadora Lúcia Vânia avança muito nesse sentido. Teremos até uma reunião hoje, às 14h.

Nesse caso específico, quero dizer, inclusive para reflexão pelos optometristas, que é necessário compreender que a porta de entrada do olho, uma grande porta de entrada para o corpo humano, é a anamnese clínica. Isso preocupa-me muito.

A democratização do acesso, questão que a Deputada Gorete levanta, também é uma necessidade. É preciso que façamos com que o SUS funcione no Brasil, que o SUS seja menos fraudado, Deputado João Fontes. (Palmas.) No meu Estado da Bahia, por exemplo, numa determinada década mais de mil homens deram à luz, utilizando-se da Autorização de Internamento Hospitalar, a AIH. Na época pagava-se bem a cirurgia cesariana, e muito Antônio acabou fazendo parto cesariano de mentira.

O que precisamos fazer é dar garantias. Essa regulamentação da atividade do optometrista, na minha opinião, não deve ser adotada, porque não se vai garantir dessa forma sua interiorização, já que a ótica não vai lá para a Amazônia vender lente de contato e outros produtos. (Palmas.)

Na verdade, precisamos constituir políticas públicas de interiorização da oftalmologia e das técnicas dela decorrentes, e objetivamente garantir um maior grau de acessibilidade, por exemplo, incluindo obrigatoriamente um oftalmologista no programa de saúde da família, o que ainda não é feito. (Palmas.)

Por último, quero sugerir uma mediação, porque o optometrista tem demonstrado que está sendo capacitado no campo da refração etc., mas na minha compreensão, sempre sob a preceptoria do oftalmologista, sendo a anamnese clínica do oftalmologista a porta de entrada. A refração pode até, Deputada, ser feita pelo optometrista. O optometrista pode fazê-la. A automação é gigantesca nessa área; então, usa-se o aparelho, e tal, mas o resultado vem para o oftalmologista, que vai compatibilizar aquele estudo ótico, em geral mecânico — e não mais apenas aquele: "Está bom dessa forma ou melhor da outra?" —,

com as lentes em mãos. O médico em geral complementa esse diagnóstico dessa forma, inclusive os oftalmologistas da Câmara dos Deputados, que são excelentes. Digo isso com segurança. Se assim for, com a preceptoria, dá muito bem para garantir espaço de trabalho a essa juventude qualificada, porque não é qualquer um que poderá fazer o que os senhores estão preparados para fazer, e também não correrão o risco de fazer uma anamnese imprecisa, colocando sobre si um manto de responsabilidade que sua formação não garante, o que é um perigo para a sociedade tanto quanto para o profissional, que estaria assumindo uma responsabilidade sem a garantia efetiva da formação compatível.

Quero colocar-me à disposição, inclusive para participar deste debate, para aprender, para ouvir mais.

Com todo o respeito aos optometristas, precisamos, no que tange à interdisciplinaridade, entender que a grande porta de entrada para o corpo em todo o mundo tem de ser sem dúvida a anamnese clínica, principal elemento inicializador de qualquer decisão diagnóstica e terapêutica em relação ao paciente.

Portanto, é assim que defendo a optometria: sob a tutela do oftalmologista. (Palmas.)

O SR. DEPUTADO JOVAIR ARANTES - Sr. Presidente, só quero saber qual é a ordem de inscrição.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Os Parlamentares querem concluir suas indagações para que depois as respostas sejam dadas pelos debatedores. Faltam apenas 3 inscritos. Vamos agilizar nossos trabalhos.

Concedo a palavra ao Deputado Carlos Alberto Leréia.

O SR. DEPUTADO CARLOS ALBERTO LERÉIA - Sr. Presidente, primeiro, cumprimento V.Exa. por presidir os debates. Cumprimento todos os nossos convidados na pessoa do Dr. Marcos Pereira de Ávila, profissional de renome no Brasil e no exterior, que é do nosso Estado de Goiás e que conhecemos há muito. Também cumprimento os autores do requerimento de realização desta audiência, os Deputados Walter Barelli e Capitão Wayne, também de Goiás, por trazerem esse importante assunto para discussão na nossa Comissão.

Não tenho pergunta a fazer. Há alguns dias ouvimos os optometristas, os seus representantes, e hoje estamos ouvindo os representantes dos oftalmologistas. Com certeza chegaremos a uma boa decisão, que tornaremos pública. Vamos anunciá-la na forma do nosso voto nesta Casa. Foi para isso que o povo nos enviou para cá.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra a Deputada Vanessa Grazziotin, que, a exemplo do Deputado Carlos Alberto Leréia, também será muito breve nas suas observações.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN - Não há mais o que dizer, Sr. Presidente. Concordo com o que disse o Deputado Pedro Henry, como também concordo com o que disse a Deputada Alice e tantos outros que já se pronunciaram.

Cumprimento o Dr. Cláudio Chaves, que dirige a sociedade amazonense de medicina e é um grande oftalmologista da nossa terra. Já foi nosso colega Parlamentar e está

acompanhando esta luta não em defesa da sua profissão, mas em defesa da saúde da população brasileira. Essa é a preocupação que deve nortear todos nós, sejam aqueles que defendem a regulamentação da profissão de optometrista, sejam aqueles que são contrários a ela.

Enfim, Sr. Presidente, por tudo que ouvimos e pelos problemas que a Comissão enfrenta no tratamento dos assuntos que aqui chegam para serem debatidos e que dizem respeito à regulamentação de profissões, precisamos fazer urgentemente uma audiência pública conjunta com as Comissão de Educação e do Trabalho e com o Ministério do Trabalho.

Na verdade, a origem do problema está no Ministério do Trabalho e no Ministério da Educação — que regulamenta, reconhece e autoriza a abertura de cursos sem um estudo mais aprofundado. Talvez haja vários projetos tramitando, principalmente com relação à área de saúde — inclusive um de minha autoria —, para obrigar a que, antes da abertura ou do reconhecimento de um curso, ou de novos cursos, sejam necessariamente ouvidos os conselhos das categorias profissionais da área de saúde, assim como acontece com a OAB, que sempre opina se um novo curso pode ou não ser aberto. E a área de saúde é muito mais sensível.

Enfim, não fosse o reconhecimento dado pelo Ministério da Educação, talvez não estivéssemos aqui discutindo esse problema. Estão aqui jovens que certamente se formaram iludidos e que agora têm de vir ao debate, de forma aberta, franca, porque o objetivo que nos move a todos é o mesmo: zelar pela saúde da população, e para isso é necessário, sim, estabelecer limites, definir o que o médico e o técnico, respectivamente, têm o direito de fazer.

Além dos exemplos citados, poderíamos citar outros, como o da área de odontologia, em que também há muitos problemas.

Li o parecer dado pelo Deputado Átila Lira na Comissão de Educação, que rejeitou o projeto por ampla maioria. O Relator cita, Dr. Cláudio Chaves, que numa pesquisa encomendada ao INEP ficou claro que existe no País apenas um curso reconhecido, que é o da ULBRA, e observa que é um curso reconhecido com restrição. V.Sa., Dr. Cláudio Chaves, disse aqui que há vários, inclusive de tecnólogos; talvez, mas não sei se eles são reconhecidos.

A Deputada falou muito a respeito da necessidade de mais profissionais. Eu concordo, mas não são só oftalmologistas que faltam no País. Faltam médicos ginecologistas, farmacêuticos, bioquímicos, dentistas, enfim, faltam profissionais, mas, muito mais do que isso, falta um sistema público de saúde mais eficaz, que chegue à população. Não basta aquele que lemos na Constituição, que é tão perfeito, amparado nos princípios da universalidade e da eqüidade, enfim, extremamente democrático, mas não chega à maioria da população.

Não é assim, não é reconhecendo uma profissão da forma como está sendo proposto que vamos resolver o problema da falta de médico. De jeito algum. Só estaremos piorando a situação.

Para concluir, vou referir-me à falta de profissionais no Brasil. Não precisamos buscar exemplos no Nordeste nem no Norte. Aqui, na própria Câmara dos Deputados, no Espaço Mário Covas, na entrada da Casa, há um stand de optometristas, que estão ali fazendo exames primários, e há uma fila enorme de pessoas interessadas nesses serviços. E estamos no Distrito Federal, a Unidade Federada que tem a maior renda per capita do País, e estamos vendo ali aquela fila. Trata-se das pessoas que trabalham nos serviços

gerais desta Casa, que de fato não têm acesso a esse tipo de exame. Mas não é assim que vamos resolver. Não é reconhecendo a profissão de forma açodada, como o MEC infelizmente tem feito, reconhecendo cursos sob pressão ou não da iniciativa privada. Não posso afirmar nada, mas não é dessa forma que vamos resolver o problema.

Cumprimento os profissionais médicos que aqui estão. Tenho ciência da responsabilidade desta Casa. Ciente da sua responsabilidade, o que ela aprovar vai ser o melhor para o nosso País.

Cumprimento todos os presentes. Certamente os senhores ajudaram muito para que possamos tomar a decisão mais acertada.

Muito obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Tem a palavra o Deputado Jovair Arantes.

O SR. DEPUTADO JOVAIR ARANTES - Sr. Presidente, pensei que não ia conseguir falar hoje.

Cumprimento o Dr. Marcos Pereira de Ávila, um goiano ilustre para todos nós, referência mundial na sua área de atuação, fato que nos orgulha a todos, principalmente ao Deputado Pedro Canedo, que também é da área. Cumprimento também o Sr. Solimar Moisés de Souza, Presidente da Sociedade Goiana de Oftalmologia.

Quero fazer apenas umas considerações que julgo necessárias.

Eu comentava ainda há pouco que a atuação do MEC precisa melhorar. Precisamos convocar o MEC para uma audiência pública, para discutir essa questão da autorização de cursos no Brasil. Eles criam o monstro e depois enviam-no para cá, e esta Câmara dos Deputados, com todas as suas complexidades, com todos os seus problemas, é quem tem de domá-lo, e nesse processo temos de entrar em conflito com a sociedade. É o que está acontecendo hoje neste debate. Estamos ouvindo esse segmento, já ouvimos o outro, e agora temos de formar uma opinião e tentar resolver um problema que o MEC criou.

Há no Brasil mais de 200 faculdades de odontologia. Ninguém consulta se podem ser criadas mais faculdades de odontologia. Em qualquer esquina há uma faculdade de Direito hoje, e a qualidade do ensino é a pior possível.

Os projetos que chegam aqui têm, cada um deles, a sua complexidade. Outro dia eu estive relatando um projeto que garantia reserva de mercado aos ortodontistas na área de odontologia. Ora, V.Exa., Sr. Presidente, bem sabe que sou dentista. Então, essas matérias já chegam bem atravessadas para que possamos discutir. Está lá o tal Ato Médico, no Senado, uma matéria absolutamente discutível. Os dentistas brasileiros historicamente dão receituário, há anos, e de repente vem o tal do Ato Médico para limitar a atuação dos dentistas. E o objetivo principal desse Ato Médico é limitar ao mesmo tempo várias áreas.

Repito: temos de chamar aqui o MEC. Quero acertar com a Comissão para na próxima semana ou no começo de agosto fazermos a convocação do MEC, a fim de discutirmos, junto com a Comissão de Educação e com o Ministério do Trabalho, essa questão da criação e da liberação de cursos. Não é possível que isso continue ocorrendo.

Essa questão da oftalmologia é muito séria. Sabemos da implicações que há, o quanto é complexa essa questão, o perigo, os riscos que existem nessa área, que são enormes. Graças a Deus, tenho as minhas faculdades até hoje absolutamente preservadas e não ainda precisei do trabalho de um oftalmologista, mas no dia em que precisar vou procurar o Dr. Marcos, e daí para cima, se é que há alguém melhor do que ele. Isso é muito sério. Fico preocupado com essa questão dos jovens que estão nessas faculdades. Não sei qual é a qualidade do ensino que elas oferecem. Ninguém sabe. Quando seus cursos são avaliados, vemos que as notas que eles obtêm são fracas.

Há outra regulamentação de profissão, que chegará a esta Casa na próxima semana, que é a de técnico de higiene dental, que também tem seus problemas. Nós já recebemos a Associação Brasileira de Odontologia.

Enfim, eu quero deixar uma pergunta para o Dr. Marcos Pereira de Ávila ou para quem quiser responder. Há uma afirmação no sentido de que a lei, ou seja, os Decretos-Leis nº20.931, de 1932, e nº 24.492, de 1934, segundo a análise dos optometristas, é superada, velha. Quer dizer, se a lei é superada e velha, qual é o caminho que nós temos de seguir para atualizá-la?

Essa lei é a que protege certamente a questão dos oftalmologistas. Eu não tenho conhecimento da lei. É uma afirmação que eles fazem. Pediram que eu fizesse essa pergunta. Eu a estou até encaminhando sem ter muito conhecimento. Mas gostaria de saber se a lei é realmente superada e velha.

Há muitas leis no Brasil que são superadas e velhas. Mas a nossa Constituição, por exemplo, é de 1988, e nós a estamos sempre reformando. A CLT é mais antiga ainda, da época de Getúlio Vargas, e está aí verdadeiramente a serviço dos trabalhadores brasileiros. Então, nem sempre a lei é velha é ruim.

Nós precisamos ouvir isso dos senhores. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Deputado Pedro Canedo. O último é o Deputado Rafael Guerra. Em seguida, passaremos a palavra aos debatedores, para esclarecer todas as alegações que foram feitas.

O SR. DEPUTADO PEDRO CANEDO - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados; querido Dr. Elisabeto Ribeiro Gonçalves, Presidente do Conselho Brasileiro de Oftalmologia; Dr. Gerson Zafalon Martins; Dr. Flávio de Castro Winkler; meu particular amigo e colega Marcos Pereira de Ávila; Dr. Eleuses Vieira de Paiva; colegas oftalmologistas aqui presentes; Dr. Cláudio Chaves, ex-Deputado e também oftalmologista, optometristas presentes, serei breve.

Na sessão da semana passada, dos optometristas, vários dirigentes da optometria brasileira e internacional puderam falar. Se for possível, eu gostaria que hoje fosse aberta uma exceção, a fim de permitir que, em rápidas palavras, o nosso ex-colega Dr. Cláudio Chaves, Presidente da Academia Amazonense de Medicina, também pudesse usar aqui parte do meu tempo, para fazer a sua explanação. Da mesma forma, o Dr. Eleuses Vieira de Paiva, Presidente da Associação Médica Brasileira.

De qualquer forma, eu quero dizer algumas coisas que não foram ditas aqui. Evidentemente, não vou repetir o que já foi dito.

É difícil limitar a optometria. Digo isso pela experiência de outros países. E não é por culpa da juventude. Antes de qualquer coisa, eu quero isentar essa juventude, todos aqueles que

freqüentaram e freqüentam os bancos nas faculdades e cursos de optometria aqui no Brasil.

Lamentavelmente, essas faculdades particulares — todas elas particulares, pois não existe o curso de Optometria em universidade pública —, existem em razão da malfadada autonomia universitária, que foi muito mal engendrada. Então, existe a ULBRA, a Faculdade em Limeira, a Universidade do Contestado, a Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, que já fechou o curso. São faculdades particulares.

Eu quero isentar, nessas minhas críticas à optometria, todos os estudantes, todos os brasileiros e brasileiras que fizeram e fazem o Curso de Optometria.

Os dirigentes é que são os grandes responsáveis. Porque os dirigentes, donos dessas faculdades, é que conseguiram, em razão da autonomia universitária, que houvesse esses cursos nas faculdades à espera do seu reconhecimento. Em outras palavras, trata-se de propaganda enganosa, que lesou o consumidor e principalmente os inocentes jovens brasileiros.

Em que nós temos de criticar a optometria?

Eu ouvi aqui alguns colegas dizerem que é preciso, quem sabe, nós fazermos um acordo em que se definam limites. Mas não existem limites para quem quer crescer.

E foi isso que aconteceu e acontece no mundo. Nos Estados Unidos, na Suprema Corte, há várias e várias ações, em virtude da intromissão, da invasão da optometria americana no campo da Oftalmologia. Para se conseguir fazer uma cirurgia, a correção de uma ametropia, miopia, astigmatismo ou hipermetropia, uma cirurgia dessas, a laser, que nós fazemos hoje — e esse aparelho do laser inicialmente era um monstro, só cabia nos grandes centros cirúrgicos — muitos anos de pesquisa se passaram, muitos gastos foram feitos. E, hoje, os optometristas querem para eles, somente para eles, a faculdade de poder fazer cirurgias com o uso do laser. Eles não querem que o oftalmologista faça, porque se trata de máquina, é ametropia e tem que ser da optometria.

Os cirurgiões, nos Estados Unidos, fazem a cirurgia de catarata. Após essa cirurgia, quase sempre fica uma ametropia, uma miopia ou um astigmatismo. Eles querem que esse paciente operado pelo oftalmologista seja depois encaminhado para os optometristas, porque só eles podem ter o direito de prescrever óculos. Estão tentando tirar dos oftalmologistas o direito de prescrever óculos, que passaria a ser uma exclusividade, um monopólio dos optometristas.

No início, não foi assim. No início, foi da mesma forma que aqui no Brasil. Nós aceitamos tudo; nós só queríamos fazer um teste aqui e ali. Nada disso que o Deputado Pedro Henry disse e mostrou, que está no site do Ministério do Trabalho, é a intenção. E isso tem sido passado para eles.

O exemplo maior da invasão, da falta de conhecimento de onde podem ir, está ocorrendo aqui na Câmara dos Deputados, onde exames de refração estão sendo feitos. É uma prática ilegal da Medicina. Estão enganando esses servidores, aos quais a Deputada Vanessa Grazziotin fez referência. Os aparelhos são montados em qualquer lugar. Acham um espaço, montam os aparelhos: refrator, cadeira, projetor. Faz-se o exame, dão-se os óculos. Alguns vão pegar aquela receita, fazem e resolvem o seu problema de 1,5 grau de miopia. Deus queira que não tenham nenhum problema de fundo de olho.

Eu quero mostrar para os senhores que não há limite. Não me refiro aos jovens, aos

optometristas, mas a quem os dirige. São os dirigentes que fazem isso, os dirigentes das sociedades, os donos das faculdades. São eles que estão colocando na cabeça desses indefesos e enganados jovens brasileiros essa situação.

Sr. Presidente, eu só quero mais uma vez agradecer a presença dos colegas oftalmologistas, da nossa diretoria. E, se possível, gostaria de passar a palavra ao ex-Deputado Cláudio Chaves, para que ele possa falar.

Eu, evidentemente, não tenho mais nada a dizer e nem a perguntar aos senhores. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Como deferência a um ex-Parlamentar, concedo a palavra ao Sr. Cláudio Chaves. Peço apenas que seja breve, porque ainda vai falar mais um Parlamentar, antes das respostas às indagações feitas.

O SR. CLÁUDIO CHAVES - Sr. Presidente, nobres Parlamentares, distintas autoridades que compõem a Mesa, queridos colegas, senhoras e senhores, é uma alegria muito grande voltar a esta Casa. Atuei aqui na Legislatura de 1995 a 1998.

Àquela altura, tive a honra de presidir, em exercício, porque eu era Vice-Presidente, a Comissão de Seguridade Social e Família. Esse mesmo assunto foi lá discutido. Na época, o projeto de lei não era para rotular ou tentar regularizar a optometria, mas para regularizar a profissão de ótico, já regulamentada, e para embutir nela a optometria.

Eu concordo praticamente em gênero, número e grau com os oradores que me antecederam. Todos são pontos de convergência, numa felicidade muito grande.

Mas é importante apresentar algo para reflexão, tendo vivido essa passagem por aqui, como ex-Parlamentar e como oftalmologista.

Aproveito para agradecer as palavras da minha querida Deputada Vanessa Grazziotin, do meu Estado, que se referiu a nossa pessoa. Não estou aqui como oftalmologista, mas como um cidadão defensor da saúde pública da população brasileira.

Uma das coisas importantes para reflexão, quando essas querelas acontecem na saúde, é o que bem disse o pensador e médico Michel Foucault. Ele disse que, quando há crise na saúde, a crise não é dela, é da antimedicina, que é justamente o que passa principalmente pela pressão da economia política. Se nós formos buscar o pano de fundo nisso aí, há uma pressão da economia política internacional da indústria ótica, que quer vender óculos de forma indiscriminada. E pessoas estão sendo vítimas, jovens que estão buscando o mercado de trabalho etc.

Outra coisa que eu vivi nesta Casa foi a autonomia universitária. Eu me rebelei à época. Eu pertencia ao PFL. Hoje não estou mais filiado a partido nenhum. O Relator dessa matéria foi o então Deputado José Jorge, hoje Senador. Eu lhe disse: "Zé, vou divergir do meu Líder Inocêncio e votar contra". E votei contra, porque, como educador que sou, professor da Universidade Federal do Amazonas há 30 anos, consultei técnicos do MEC como a Profa. Eunice. Eu disse: "Olha, isso não é autonomia, é soberania". E foi o que deu. Autonomia permite abrir qualquer curso. Depois, "toma que o filho é teu". Jogam os jovens no mercado de trabalho. Jogam para o Poder Legislativo tentar regularizar a situação, quando a coisa lá no nascedouro foi errada.

É o que está acontecendo. Formou-se a primeira turma. O Ministro Cristovam Buarque regulamentou a primeira turma. Parou o curso. Aí, entrou a querela no Judiciário. Arrasta-

se na Justiça Federal.

Então, quer dizer, essa coisa poderia ter sido respeitada. É uma prova cabal do desrespeito que o Poder Executivo tem por esta Casa. Mas aqui é a Casa do povo. As coisas tinham de nascer aqui e não vir goela abaixo.

E as coisas continuam. A história se repete, e mudam apenas os atores.

Então, isso precisa vir para reflexão. Quer dizer, se o Executivo quer fazer esse projeto para reconhecer curso de optometria ou coisa semelhante, que mandasse primeiro a matéria para cá para discutirmos. Nós estamos aqui discutindo a conseqüência de um problema já agravado.

A interdisciplinaridade é difícil por causa do seguinte: o ótico é importante na oftalmologia. Ele faz os óculos. O ortoptista é importante, pois mede o estrabismo. Mas, com a optometria em si não há interdisciplinaridade, porque o oftalmologista é um optometrista. Ele faz optometria e exame clínico. Então, não há interdisciplinaridade. Há uma intromissão de uma coisa sobre outra.

Para concluir, Sr. Presidente — obrigado pela deferência, pois é uma alegria rever colegas da minha época aqui —, o grande problema de não haver médicos nas pequenas cidades passa por uma coisa muito simples: o Sistema Único de Saúde. O SUS não tem credenciamento universal. Se o SUS abrir credenciamento universal, eu lhe garanto que mais de 90% dos oftalmologistas, senão a quase a totalidade, vai se credenciar.

O SUS não adotou uma política como fez o Canadá. Trata-se de um SUS diferenciado. Se, num lugar pequeno, no Vale do Ribeira, do Jequitinhonha ou na Amazônia, paga-se 7 reais por uma consulta, onde não há médico vão pagar 30, sem resolver os problemas. Quando saturar de médico lá em Pauini, vai-se pagar o que se paga na cidade, estimula-se o profissional a ir para lá.

Mas isso vai aumentar a conta. E o Ministério da Saúde não quer isso.

Nós todos aprovamos aqui, naquela época, a CPMF do querido Adib Jatene. Haveria, assim, os 17 bilhões de reais do Ministério à época mais a CPMF. Mas mudaram a regra do jogo. A CPMF passou a render quase 30 e não foi incorporada aos 17, para dar 47.

Então, o assunto é mais complexo do que se possa imaginar.

Eu acredito que tentar resolver os problemas à luz da conseqüência, até para descontrair a platéia, é reeditar aquele personagem do Anatole France, o Prof. Monsieur Bergeret, que encontrou a esposa cometendo adultério no sofá e disse: "Vou resolver o problema. Vou retirar o sofá!"

Obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o último Parlamentar inscrito, Deputado Rafael Guerra.

O SR. DEPUTADO RAFAEL GUERRA - Sr. Presidente, muito obrigado por me conceder a palavra e pela oportunidade de estar aqui na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público. Cumprimento os Parlamentares.

Na verdade, falta muito pouca coisa a ser dita. Eu acho que os Parlamentares já colocaram bem as coisas. Algumas pontos, entretanto, não podemos deixar de ressaltar.

Primeiro, em relação ao número de oftalmologistas, como se isso pudesse ser motivo para liberar exames de menor qualidade. Nós temos de trabalhar pela qualidade. O Governo, às vezes, tem falado muito em casas de parto e outras coisas, com profissionais não habilitados para a gravidade do que vão atender.

Vou citar um exemplo que é bem gritante e chamou muito a minha atenção. Eu estive, há algum tempo, numa atividade da Frente Parlamentar da Saúde, em Sergipe, na terra do Deputado João Fontes. Houve uma reunião à noite, e 2 ginecologistas se despediram de mim dizendo que estavam saindo cedo, porque no dia seguinte iriam fazer uma histerectomia. Daí a pouco, um outro me disse que no dia seguinte também iria fazer uma histerectomia. Aí eu perguntei: "Mas tem tanta histerectomia em Sergipe? Em Minas, está ficando raro fazer histerectomia por câncer. Por que será?" Ele respondeu: "Porque aqui tem muito parto feito por parteira, não tem pré-natal direito, e as doentes não estão tendo o diagnóstico precoce de câncer".

Essa é a questão que temos de trabalhar. Se o SUS está errado, vamos consertar o SUS. Não podemos fazer um atendimento de segunda classe porque não temos cidadãos de primeira e de segunda classe, não podemos aceitar isso. (Palmas.)

Segundo, vou fazer uma observação rápida. Não podemos restringir a discussão aqui a receitar ou não, examinar refração ou não. Não é essa a discussão. Não podemos ser simplistas dessa forma, porque isso não leva a um bom caminho. Existe optometria no exterior, existem formas. Podemos estudar como ocorre em outros países.

Foi falado aqui a respeito do ato médico. A Deputada Alice Portugal esteve em uma reunião comigo, inclusive, no Senado. E o Deputado Jovair Arantes disse que há leis velhas. A questão do ato médico basicamente é essa: a lei é velha, a lei tem 50 anos. Então, ela precisa ser revista. Mas estivemos discutindo esse assunto com a Senadora. A proposta é que se discuta essa regulamentação integrada com as outras profissões da área da saúde. Algumas foram regulamentadas recentemente. A regulamentação da fonoaudiologia é recente. Algumas são muito antigas. Então, em vez de uma proposta corporativa, em vez de defesa de mercado, de receitar óculos ou não, vamos fazer um projeto de fôlego, que atenda a todos, mas garantindo qualidade.

A Senadora Lúcia Vânia, por exemplo, já levantou, em relação ao ato médico, várias leis em países da Europa e nos Estados Unidos. Como é que está regulamentada? Dizem que ato médico é coisa corporativa, reserva de mercado de médico. Então, vamos ver como funciona e fazer algo que atenda a outras profissões, porque há uma interdisciplinaridade, uma interface. Vou procurar saber, na qualidade de Presidente da Frente Parlamentar da Saúde, quem autorizou esse exercício ilegal dentro da Câmara dos Deputados, porque isso não pode ser feito dessa forma. (Palmas.)

O SR. DEPUTADO JOÃO FONTES - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem, por 30 segundos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO JOÃO FONTES - Hoje, sinto-me muito mais feliz, porque estou vendo que esse assunto está sendo tratado com responsabilidade. Eu saí preocupado na semana passada. Eu fiquei no corredor pensando: "Um assunto tão sério desses está sendo tratado como programa de auditório!" Ouvi, na semana passada, praticamente todos

os Deputados afirmar que iriam aprovar. Diziam: "Eu já vi oftalmologistas cegarem pessoas, mas optometristas nunca". Aí todo mundo aplaudia. Então, sinto-me agora muito mais contemplado, porque estou vendo que um tema de tamanha relevância para o País e para o povo brasileiro está sendo tratado de forma extremamente responsável. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Vou conceder a palavra novamente aos senhores debatedores.

O SR. DEPUTADO JOVAIR ARANTES - Sr. Presidente, quero apenas defender a Comissão. Deputado João Fontes, V.Exa. é novo nesta Comissão. Estou nesta Comissão desde 1995, e ela sempre teve zelo absoluto com todas as matérias aqui observadas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Dr. Marcos Pereira de Ávila, para responder às indagações.

O SR. MARCOS PEREIRA DE ÁVILA - Sr. Presidente, muito obrigado por mais esta oportunidade de usar da palavra. Prezado Deputado João Fontes, V.Exa. usou uma palavra importante: "responsabilidade". Em uma situação tão séria como esta que envolve o principal dos sentidos, a visão, temos de ter realmente uma responsabilidade muito grande. E a decisão tem que ser séria, pautada, que programe a vida do nosso País para os tempos futuros. Não adianta querer trabalhar a curto e médio prazo, sendo que as leis é que direcionam o sucesso de uma empresa, de uma cidade, de um Estado, de um país. De forma que as leis, quando bem-feitas, são bem-vindas, e creio que todos nós vamos saber acolher com serenidade o resultado da análise criteriosa e crítica que V.Sas. vão fazer.

Vários pontos foram levantados. É interessante esse exercício de inteligência, esse exercício de trabalhar com pessoas que têm esse nível de educação e instrução.

Ouvi a Deputada Gorete Pereira dizer que a filha vai fazer oftalmologia. S.Exa. não está aqui, mas depois vou mandar uma carta cumprimentando-a e dizendo que pode ficar tranqüila. Uma das maiores preocupações de um pai, de uma mãe, de toda uma família que tem hoje como meta principal a educação e a formação dos filhos é uma carreira vitoriosa, passando pelos bancos da escola do ensino fundamental, chegando ao ensino superior, passando por uma especialização, que é o que fecha com chave de ouro todo esse processo. Se a filha de S.Exa. fizer oftalmologia, vai ter uma das melhores formações existentes no mundo.

Os 54 cursos de especialização do Conselho Brasileiro de Oftalmologia são, sem dúvida, alguns dos que melhor formam esse tipo de profissional hoje, em termos mundiais, haja vista o reconhecimento técnico, científico, educacional e de pesquisa que encontramos na oftalmologia brasileira.

Mas aproveito as palavras que S.Exa. usou para tranqüilizá-la e, ao mesmo tempo, aceitar, com um pouco de apreensão, os números que mencionou. Na verdade, essa democratização de acesso, tão necessária, é o grande sonho do oftalmologista brasileiro.

Os números são frios, prezados Deputados. Hoje, atendemos 8 milhões de consultas do SUS, segundo maior número de consultas em especialidade hoje no Brasil. Se fizermos uma conta simples, baseados naquilo que o Conselho Brasileiro de Oftalmologia recomenda, uma consulta a cada 3 horas, em uma jornada de trabalho diária de 8 horas, vamos fazer 24 consultas/dia, 3 consultas/hora, 20 minutos por consulta. Serão 24 consultas/dia.

Se tivermos que diminuir um pouco, vamos trabalhar com uma média menor, 20 consultas/dia. O mês tem 22 dias úteis. Vamos ter 440 consultas/mês. O ano tem 12 meses; logo, o total será de 5.400 consultas, por oftalmologista, por ano.

Se considerarmos que temos 6 mil oftalmologistas ávidos por entrar no Sistema Único de Saúde e que essas gestões são feitas a cada dia, a cada hora e a cada mês pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia, pela Associação Médica Brasileira, e há necessidade do credenciamento universal, essas 5 mil consultas/ano, de um único médico oftalmologista vão perfazer um total de 32 milhões e 400 mil consultas.

Trinta e dois milhões de consultas estão para ser feitas. Há pessoal técnico adequado, consultório adequado — e subutilizado —, esperando que, única e exclusivamente, o médico oftalmologista tenha credenciamento universal. A força de trabalho, a força instalada já está disponível para a sociedade brasileira. Basta que a usemos. E mais: 32 milhões de consultas, somadas aos 8 milhões de consultas que hoje já fazemos, serão 40 milhões.

Sabemos que a criança tem que ser examinada até os 5 anos, no máximo. Depois disso, se ela estiver bem, ela só vai ser examinada no primeiro ano do ensino fundamental, aos 7 anos. Depois disso, se ela estiver bem, vai ter que fazer um exame depois dos 10 anos e poderá passar toda a puberdade e a juventude e ser examinada de novo aos 40 anos. Daí as consultas ficam mais seguidas.

Temos que examinar toda a população em aproximadamente 15% de um país, 15% de um Estado, 15% de um Município ao ano. Quinze por cento de 180% milhões dá em torno de 27 milhões de consultas, quando a nossa capacidade é de 40 milhões.

Então, o que pretendemos? Pretendemos o credenciamento universal, e assim fazemos. Projetos do Ministério da Saúde. Estamos trabalhando e chegando a uma conclusão muito interessante em um projeto chamado Refração Brasil, sob orientação do nosso Presidente Elisabeto e do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

Estes os números.

Quero dizer que compartilho com a opinião da Deputada Alice Portugal, da Deputada Vanessa Grazziotin, dos nossos prezados Deputados de Goiás, Carlos Alberto Leréia, Capitão Wayne, Jovair Arantes, Dra. Clair, Pedro Canedo, e também do Deputados Rafael Guerra, de Minas Gerais.

Temos de regulamentar isso de maneira muito séria, porque a história é diferente. A optometria surgiu no início do século XIX, nos Estados Unidos, por uma situação diferente do que foi a nossa. A população que migrou da Europa para os rincões, para o deserto americano, para os estados interioranos dos Estados Unidos, era formada de pessoas letradas, de pessoas que liam a Bíblia, de pessoas que tinham nível de conhecimento maior. E junto com essas caravanas, que nos lembram a época dos filmes de faroeste, vieram os optometristas. Existe aquela célebre figura, que acho fantástica, do optometrista com vários óculos a testá-los nas crianças. Mas isso aconteceu nos Estados Unidos por uma necessidade.

No Brasil, a colonização foi diferente, a história é diferente. Não temos que seguir os caminhos de outros países. Esse colonialismo cultural, Elisabeto, em alguns países do Terceiro Mundo, principalmente, no Brasil, tem de deixar de existir. Aqui, a colonização se deu no litoral, na costa brasileira, e junto com a família imperial e as colonizações holandesa e francesa vieram médicos; a maioria dos colonizadores trouxe médicos

oftalmologistas.

Daí criou-se uma situação fantástica: o sistema oftalmológico nacional. E como isso funciona? Esse é um sistema em que o médico prescreve os óculos e envia a prescrição para o ótico através do paciente. O paciente manda que o óculos seja aviado. Existem no Brasil 18 mil óticas, cada uma emprega sei lá quantas pessoas — 4, 5 ou mais. Essas 18 mil casas óticas estão a favor desse projeto? Digo para os senhores que a maioria provavelmente não, não sei. Basta consultar a ABIÓPTICA, o SINDIÓPTICA para se ter uma opinião adequada de como isso funciona. Com certeza, eles vão dizer isso para nós.

Não quero fazer juízo antecipado dessa questão. Volto, então, ao nosso cronograma de atividades: o ótico avia a receita, manda para o oftalmologista, que a confere e coloca esse óculos no rosto do paciente. A partir daí o paciente usa os óculos. O paciente passou por um exame oftalmológico com controle de qualidade, e quem prescreveu os óculos não tem interesse outro a não ser a consulta médica. Daí o paciente ser beneficiado.

Esse é o sistema oftalmológico nacional que vem acontecendo nos últimos 150 anos ou mais. Essa boa aproximação, essa boa co-participação entre médico e ópticos existe há décadas e não podemos de uma hora para outra interromper esse processo.

Acreditamos, assim como o Deputado Rafael Guerra, que não devemos ter no Brasil — e o Presidente Elisabeto sempre nos dá essa orientação, em qualquer debate ou fórum em que participemos — medicina pobre para pobre. Temos de ter medicina de qualidade em todos os níveis. O Deputado Rafael Guerra disse isso de maneira muito pontual: "Temos que trabalhar com o sistema organizado".

E não sabemos quais as conseqüências que a desorganização de um sistema criado ao longo de uma cultura de anos vai trazer de dissabor. Vamos ter desemprego na classe oftalmológica, e o nosso problema é criar empregos. Se os 12 mil oftalmologistas empregam, como levantou o Conselho Brasileiro de Oftalmologia, em média 6 funcionários por médico, há uma quantidade enorme de famílias sustentadas. E os outros 18 mil ópticos, que têm suas óticas e pessoas empregadas? Em determinado momento, como vai ficar a responsabilidade do erro médico? Como vai ficar o paciente mal diagnosticado?

Pedimos a esta douta Comissão que nos ajude em nosso sonho de muitos anos: a interiorização do oftalmologista brasileiro, a construção de consultórios comunitários, como já existem centenas de experiência em todo o Brasil, a exemplo de Goiás, cuja Secretaria Estadual de Saúde presta esse atendimento nos 246 Municípios do Estado.

Queremos o credenciamento universal para que esses assuntos passem a não mais existir e que o brasileiro possa cada vez mais enxergar melhor.

Obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Com a palavra o Sr. Elisabeto Ribeiro Gonçalves.

O SR. ELISABETO RIBEIRO GONÇALVES - O Conselho Brasileiro de Oftalmologia se sente muito feliz e honrado com a presença dos Srs. Deputados na discussão sobre assunto tão relevante para a saúde ocular dos brasileiros.

O Conselho agradece a presença dos ilustres Deputados, todos com contribuições extraordinárias ao nosso próprio entendimento dos problemas levantados. Nesse sentido, agradecemos às Deputadas Dra. Clair, Alice Portugal e Vanessa Grazziotin; aos

Deputados Rafael Guerra, Jovair Arantes e Capitão Wayne; ao ilustre Presidente da AMB, Eleuses Paiva, e a todos os já se retiraram.

Como já foi dito, o Conselho Brasileiro de Oftalmologia tem uma longa história de prestação de serviço público, de defesa intransigente da saúde ocular do cidadão brasileiro. O que nos traz a esta douta Comissão é exatamente o desejo de reafirmar nossa vontade de continuar servindo, sem nenhum laivo corporativista, à saúde ocular de nosso cidadão.

O Prof. Marcos Ávila, ex-Presidente do CBO, fez uma síntese muito boa e oportuna do que faz e do que pode fazer a oftalmologia, e citou cifras. Lembro a V.Exas. que a Organização Mundial da Saúde preconiza uma relação médico oftalmologista/habitante de 1 para 20 mil. Nossa relação é de 1 para 14 mil ou 15 mil. Quer dizer, temos médicos oftalmologistas em excesso.

Precisamos incentivar a interiorização do médico, buscar o credenciamento universal, e para isso precisamos contar com o Poder Público. A política de saúde comporta vários equívocos, mas estamos certos de que não somos nós os responsáveis, como também não é o oftalmologista o ator principal desse teatro de equívocos. O ilustre colega Prof. Cláudio Chaves já apontou essas distorções.

O CBO quer reafirmar o desejo e a disposição de trabalhar em prol da saúde ocular do cidadão brasileiro. A questão é de qualidade, e não há como fazer concessões quando se trata de saúde e da qualidade do atendimento médico.

O Deputado Jovair Arantes levantou a questão da lei velha. Freqüentemente, optometristas dizem que as leis de 1932 e 1934 não protegem o oftalmologista, mas protegem, defendem e promovem a saúde ocular do cidadão brasileiro; alegam que as leis são velhas e que devem ser mudadas.

Confesso a V.Exas. que não sou um experto em leis; meu conhecimento em leis me basta para pautar minha cidadania e respeitar a cidadania e o direito do outro. Meu conhecimento legal é só esse. Mas quando o Deputado Jovair Arantes falou sobre a velhice da CLT, que, mesmo assim, está em vigor, me ocorreu perguntar a S.Exa. — e eu o faria se ainda se encontrasse presente — se concorda com a afirmativa de que nenhuma lei é ruim porque é velha; que só envelhece a lei que é boa.

As leis de 1932 e de 1934 são velhas, sim, mas são velhas porque são boas.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Antes de passar a palavra ao próximo orador, gostaria de agendar com a Deputada Dra. Clair, Relatora, audiência pública com representantes do Ministério da Saúde, do Trabalho e da Educação para que possamos concluir e votar o projeto até agosto.

Com a palavra o Sr. Gerson Zafalon Martins.

O SR. GERSON ZAFALON MARTINS - Serei breve, Sr. Presidente.

Ao sair desta Casa, é meu dever de cidadão dizer não só ao Conselho Federal de Medicina mas a todos com que me relaciono que o trabalho que esta semana testemunhei ser desenvolvido por esta Comissão, nesses tempos de agressão ao Congresso, tocou-me

profundamente. As Deputadas, em particular, por serem mulheres, captam muito bem e de forma sintética as questões.

A Deputada Alice Portugal falou sobre a interiorização; a Deputada Gorete Pereira questionou como aumentar o número de oftalmologistas; a Deputada Vanessa Grazziotin questionou a abertura de faculdades na área de saúde sem compromisso social anterior; a Deputada Dra. Clair quer, prudentemente, ouvir antes para então apresentar seu relatório.

Como aumentar o número de médicos ou especialistas? Aumentando o número de residências. Hoje, a maioria dos médicos recém-formados não conseguem residência, talvez, no máximo, 55% ou 60% tenham residência. Trata-se de investimento social de responsabilidade do Governo, e que redundaria num melhor aproveitamento do médico. Atualmente, as escolas não estão formando médicos de maneira eficiente, e a residência vai auxiliar muito na solução desse problema. São somente 54 residências médicas em oftalmologia. Se multiplicarmos por 2 esse número, ainda assim seria insuficiente. Esse é um desafio para todos os senhores.

Não é preciso apenas a interiorização do médico, há cidades que não têm padre, que não têm banco, que não têm nada. Proponho um plano de carreira para o médico que preveja um tempo no interior, assegurado o bom atendimento para sua família e, no retorno, curso de recapacitação ou promoção. Garanto que os médicos não ficariam nas periferias das Capitais quebrando o galho em prontos-socorros e atendendo gratuitamente, esperando que alguém sofra um acidente para ter alguma vantagem.

Relativamente à abertura de escolas, isso não pode ser assunto de mercado. A abertura de escolas, particularmente as da área de saúde, precisam de um sério comprometimento por parte do Governos, sobretudo do MEC e do Conselho Nacional de Educação —aparentemente, pela autonomia, que não é soberania, já citada, as faculdades podem tudo.

Quanto à preocupação de interiorizar, o Conselho Federal de Medicina fez convênio com o Sistema de Proteção da Amazônia — SIPAM, no sentido de utilizar a infra-estrutura desse sistema na Amazônia Legal para levar conhecimento não só para os médicos, mas também para os pajés do interior da Amazônia, porque são eles que dão atendimento àquela população.

Esse é um projeto que está avançando. Brevemente, V.Exas. serão convocados, particularmente o Sr. Presidente, para participar de integração que vai até o alto sertão, na alta Amazônia, em qualquer região. Onde houver alguém, um jeito de chegarmos, pela tecnologia, vamos ajudar a população.

Não há assistência médica, ou seja lá o que for, de segunda classe para qualquer ser humano, muito menos para os pobres que necessitam de toda a nossa doação e dedicação.

Muito obrigado. Boa tarde a todos. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Dr. Flávio, o senhor deseja usar da palavra, para encerrar?

O SR. FLÁVIO DE CASTRO WINKLER - Gostaria de lembrar que o Decreto nº 20.931, de 11 de janeiro de 1932, juntamente com o Decreto nº 24.492, de 28 de junho de 1934, foram os primeiros diplomas legais que definiram no Brasil a prescrição de lentes de grau como atividade médico-oftalmológica.

Teve o legislador a preocupação de pôr no primeiro decreto, em 1932, todos os direitos, deveres e obrigações dos médicos. Ele não criou uma reserva de mercado, mas uma preocupação com a saúde ocular. Proibiu que os médicos tivessem ótica. Anteviram uma situação que somente o Código de Defesa do Consumidor, em 1990, veio a proibir: a venda casada. Quer dizer, o legislador de 1932 proibiu a venda casada, a utilização de narcóticos no Brasil, criou manicômios, a regulamentação das profissões de odontólogo, de enfermeiras.

Dizer que essa legislação é velha, sinceramente, é um absurdo jurídico. É velha quando realmente há estudos jurídicos novos. O que se vê aqui é a tentativa de levar à população atendimento médico feito por comerciantes interessados não no exame, na saúde, mas sim na venda das lentes de grau.

Boa tarde. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Deputado Capitão Wayne, V.Exa. tem 30 segundos.

O SR. DEPUTADO CAPITÃO WAYNE - Sr. Presidente, Srs. Deputados, sinceramente, sinto-me convencido pela questão da audiência pública. Quero parabenizá-lo, Sr. Presidente, e a todos da Comissão, porque V.Exa. está fazendo o ciclo completo do debate. Primeiro, falaram os optometristas, posteriormente os oftalmologistas, e V.Exa., na próxima sessão, vai solicitar a participação dos Ministérios do Trabalho, da Educação e da Saúde. O OMS, se pudesse vir, seria excelente, fecharia o ciclo.

Os oftalmologistas devem estar pensando: "O Capitão está lá imaginando alguma situação". Longe disso. Da mesma forma, os optometristas devem pensar: "Vá lá, Capitão, brigue por nós!" Não é essa a situação. Os Deputados que aqui estão são isentos, vieram para ouvir todas as partes e para se convencerem dos votos.

O Dr. Marcos Ávila é uma pessoa da nossa convivência, recebeu o título de Cidadão Goianiense da mão do meu pai, que era Vereador e Presidente da Câmara Municipal de Goiânia; e o Dr. Eugênio, na semana passada, atendeu minha filha, a Jordana. Podem ter certeza de que nossa isenção é grande quanto a esse tema.

Agora, o que não pode é continuar como está. O que a Câmara dos Deputados, a Comissão está fazendo é justamente levantar esses dados para que todos tenham direito de voz. Não são só os oftalmologistas, não só os optometristas, como brasileiros, têm o direito de reivindicar o que querem ou não. Quem talvez vai decidir será a Câmara dos Deputados, por intermédio dos votos dos Deputados, que vão ser convencidos por cada um dos senhores.

Queremos deixar clara a isenção de todos os Deputados que participam desta Comissão.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Henrique Eduardo Alves) - Agradeço a V.Exa. as palavras.

Registro a presença, que muito nos honra nesta Comissão, de um dos oftalmologistas mais conceituados do meu Estado, Rio Grande do Norte, o Dr. Marco Rey. (Palmas.)

Agradeço a todos os presentes, aos debatedores e aos que se posicionam contrários, que

aqui vieram e souberam ouvir com educação e respeito.

Esta Comissão está fazendo sua parte e cumprirá seu papel finalmente em agosto, votando esse projeto.

Obrigado a todos.

Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos da presente reunião da Comissão de Trabalho , de Administração e Serviço Público.

Está encerrada a reunião.