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CÂMARA DOS DEPUTADOS
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
COMISSÃO DE RELAÇÃO EXTERIORES E DE DEFESA NACIONALEVENTO: Audiência Pública N°: 0680/03 DATA: 04/06/03INÍCIO: 10h33min TÉRMINO: 13h15min DURAÇÃO: 02h42minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 2h41min PÁGINAS: 49 QUARTOS: 33
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO
JORGE ARMANDO FÉLIX - Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional daPresidência da República.
SUMÁRIO: Esclarecimentos sobre a área de competência e as ações em desenvolvimento doGabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
OBSERVAÇÕES
Há exibição de imagens.Há expressões ininteligíveis.
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Relação Exteriores e de Defesa NacionalNúmero: 0680/03 Data: 04/06/03
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A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Está aberta a presente
reunião de audiência pública, com a presença do Exmo. Sr. Ministro-Chefe do
Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Jorge
Armando Félix, para falar sobre sua área de competência e as ações em
desenvolvimento.
Comunico aos senhores membros desta Comissão que o general Jorge
Armando Félix disporá de 30 minutos para a sua exposição inicial, prorrogáveis por
mais 15 minutos ou pelo tempo que S.Exa. quiser. Não há limite de tempo porque é
um prazer muito grande recebê-lo na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa
Nacional. O convidado não pode ser aparteado durante a exposição. Depois, é claro,
todos os Deputados que quiserem poderão fazer perguntas a S.Exa.
Vou dar início aos trabalhos, passando a palavra ao general Jorge Armando
Félix.
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX - Exma. Sra. Deputada Zulaiê
Cobra, Presidenta da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da
Câmara dos Deputados, Exmos. Srs. Deputados presentes que nos honram com
sua atenção, senhoras e senhores, é com muita satisfação que venho aqui pela
primeira vez, a fim de apresentar algumas considerações acerca do Gabinete de
Segurança Institucional, buscando discorrer, em síntese, sobre as suas missões,
competências, organização e articulações.
(Segue-se exibição de imagens.)
Gostaria, com a permissão de V.Exa., Sra. Presidenta, de fazer inicialmente a
apresentação da estrutura que compõe o Gabinete de Segurança Institucional.
Apresento o general Wellington Fonseca, o nosso Subchefe Militar; a seguir, o
Secretário Nacional Antidrogas, Paulo Roberto Yog de Miranda Uchôa; a Diretora da
Agência Brasileira de Inteligência, Profa. Marisa de Almeida Del’Isola e Diniz; e o
Secretário de Acompanhamento e Estudos Institucionais, José Alberto Cunha Couto.
Muito obrigado. Esses são os 4 braços que compõem a estrutura do Gabinete de
Segurança Institucional e que veremos a seguir.
Agradeço a oportunidade de estar aqui e quero caracterizar 2 aspectos que
me parecem muito importantes. O primeiro é a oportunidade que temos de mostrar
ao Congresso Nacional aquilo que fazemos, aquilo que pretendemos fazer e de que
forma o fazemos. O segundo aspecto a caracterizar é a importância, para nós, de
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percebermos de que forma nosso trabalho e nossas atividades são observados
pelos Congressistas, e quais as suas expectativas em relação ao trabalho que
realizamos. Isso para nós é muito importante porque nos dá uma outra visão, às
vezes bastante diferente daquela que imaginamos deva ser o objetivo dos nossos
trabalhos. Em última análise, isso nos ajuda a corrigir rumos e a realizar melhor o
nosso trabalho.
Quanto à sua atividade, o Gabinete de Segurança Institucional é um órgão
essencial da Presidência da República, que tem como área de competência os
seguintes assuntos, conforme prevê a Lei nº 10.683, recentemente aprovada neste
Congresso: assistência direta e imediata ao Presidente da República no
desempenho de suas atribuições; prevenção da ocorrência e articulação do
gerenciamento de crises em caso de grave e iminente ameaça à estabilidade
institucional.
Na verdade, o fator mais importante é a prevenção. É muito importante que as
crises não cheguem a se desencadear. Esta é uma das nossas principais tarefas:
permitir que o Governo antecipe a ocorrência de qualquer crise. Na verdade, o
grande papel do Governo nesse aspecto é exatamente evitar a ocorrência de crises.
E, ocorrendo, permitir que sejam resolvidas da forma mais pacífica possível.
Fazemos também assessoramento pessoal ao Presidente da República em
assuntos militares e de segurança; coordenação das atividades de inteligência
federal e de segurança das informações; segurança pessoal do Chefe de Estado, do
Vice-Presidente da República e respectivos familiares e dos titulares dos chamados
órgãos essenciais da Presidência da República; além disso, de outras autoridades,
quando determinado pelo Sr. Presidente da República. Também nessa atividade de
segurança é assegurado o chamado poder de polícia. Segurança dos palácios
presidenciais e das residências do Presidente da República e do Vice-Presidente da
República.
Além dessa gama de atividades, que consideramos da mais alta
responsabilidade, outras não menos relevantes competem da mesma forma ao
Gabinete de Segurança Institucional: coordenar e integrar as ações do Governo nos
aspectos relacionados com atividades de prevenção do uso indevido de substâncias
entorpecentes e drogas que causem dependência física ou psíquica, bem com
daquelas relacionadas com tratamento, recuperação e reinserção social dos
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chamados dependentes; supervisionar, coordenar e executar as atividades do
Sistema Nacional Antidrogas; executar as atividades permanentes, técnicas e de
apoio administrativo necessárias ao exercício do Conselho de Defesa Nacional e
também as atividades de Secretaria-Executiva da Câmara de Relações Exteriores e
Defesa Nacional do Conselho de Governo, em conformidade com as respectivas
legislações.
Cabe um comentário sobre essas últimas competências. O Conselho de
Defesa Nacional e a Câmara de Relações Exteriores e Defesa Nacional são
colegiados, respectivamente, de Estado e de Governo, que conferem caráter
sistêmico à atuação do Gabinete, interligando seus órgãos integrantes, que serão
mencionados a seguir.
Aí está a estrutura do Gabinete de Segurança Institucional. Ele se organiza
desta forma para exercer as suas competências. Um órgão de assistência direta e
imediata ao Ministro, que é o Gabinete; 3 órgãos específicos singulares; a Subchefia
Militar; a Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais; e a Secretaria
Nacional Antidrogas. O órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência é a
Agência Brasileira de Inteligência — ABIN, e o órgão colegiado é o Conselho
Nacional Antidrogas — CONAD.
Acrescento ainda que essa estrutura é composta por profissionais civis com
qualificação em diversas áreas do conhecimento humano, por militares das 3 Forças
Armadas e das Polícias Federal, Civil, Militar e do Corpo de Bombeiro Militar. A
maioria, pela facilidade de localização geográfica, daqui do Distrito Federal.
A Presidência da República, convém ressaltar também, não tem um quadro
específico de servidores. Ela se vale de servidores requisitados e de servidores sem
vínculo, que podem ocupar os DAS e as funções gratificadas.
Vamos passar a abordar, então, algumas atividades e articulações
desenvolvidas. Começaremos com a Secretaria Nacional Antidrogas.
Recentemente, o titular da Secretaria esteve nesta mesma Comissão, mas de certa
forma achamos importante repetir algumas coisas porque, possivelmente, alguns
dos presentes não participaram daquela reunião.
Em 1998, como conseqüência direta dos compromissos assumidos pelo
Brasil na 20ª Assembléia Geral Especial das Nações Unidas, foi criada a Secretaria
Nacional Antidrogas — SENAD, como Secretaria-Executiva do Conselho Nacional
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Antidrogas — CONAD, responsável pelo planejamento, pela coordenação e pela
supervisão das atividades relativas à redução da demanda de drogas no Brasil, bem
como pela gerência do chamado Fundo Nacional Antidrogas, cujos recursos são
destinados tanto às atividades de redução da oferta quanto de redução da demanda,
aproximadamente na proporção de 70% para redução da oferta e 30% para a
redução da demanda.
No final de 1998 realizou-se o primeiro Fórum Nacional Antidrogas, por meio
do qual foi efetuada ampla consulta aos meios científicos e à sociedade civil quanto
aos rumos a serem adotados pelo Brasil no enfrentamento do problema das drogas.
Comissão técnica então integrada por 15 destacados especialistas na questão das
drogas foi incumbida de elaborar um projeto de política nacional antidrogas com
base nos subsídios colhidos naquele primeiro fórum do qual participaram
organizações não-governamentais, sociedade civil, Governo, enfim, amplo espectro
de atores.
Após um processo de análise e experimentação prática, a Política Nacional
Antidrogas foi formalmente adotada, por ocasião do segundo fórum nacional, em
dezembro de 2001. Portanto, é uma política de vida relativamente curta, tem apenas
1 ano e meio de existência. Dado que o tempo disponível não permitiu exposição
detalhada, além da presença aqui há cerca de duas semanas, do Secretário
Nacional Antidrogas, vamos apenas realçar alguns aspectos que achamos
importantes. Primeiro: sendo o Município a cellula mater da organização político-
administrativa brasileira, é essencial levar as ações antidrogas a essa esfera de
governo, mediante a constituição dos chamados Conselhos Municipais Antidrogas,
com o apoio dos hoje já estruturados Conselho Nacional e Conselhos Estaduais
Antidrogas. Também é imprescindível a mobilização da sociedade civil, sem cujo
engajamento na causa antidrogas serão inócuos os esforços oficiais.
A política prioriza a prevenção primária, principalmente junto aos jovens, ou
seja, o fornecimento aos ainda não iniciados no universo das drogas de informações
cientificamente validadas, de forma acessível a seu contexto cultural, sobre as
conseqüências negativas do uso abusivo de drogas. Almeja-se proporcionar ao
jovem condições de decidir, com responsabilidade, sobre sua opção quanto ao uso
de drogas.
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As atividades de repressão ao tráfico ilícito, por um lado, e de tratamento e
reinserção social de dependentes químicos, por outro, são inegavelmente da maior
importância e devem ser executadas com todo o vigor. Atuam as mesmas, todavia,
no domínio das conseqüências do fenômeno das drogas e não das suas causas. Já
as ações da chamada prevenção primária — educação, informação, capacitação e
principalmente o desenvolvimento de habilidades psicossociais — atuam antes das
drogas agirem. Essas, sim, são ações que, quando bem conduzidas, têm caráter
duradouro e chegam para ficar.
Entre os pressupostos básicos da chamada Política Nacional Antidrogas,
alguns merecem especial menção: reconhecer as diferenças entre o usuário, a
pessoa em uso indevido, o dependente e o traficante de drogas, tratando-os de
forma diferenciada; evitar a discriminação de indivíduos pelo fato de serem usuários
ou dependentes de drogas; reconhecer o direito das pessoas com problemas
decorrentes do uso indevido de drogas de receber tratamento adequado. Assim, de
acordo com a política, o usuário não é um criminoso e não deve estar sujeito a
penas que o privem da liberdade. E o dependente químico é um doente, e como tal
faz jus a tratamento correspondente.
A legislação brasileira sobre esse aspecto ainda está aquém da política.
Permanece em vigor a Lei nº 6.368, de 1976, que prevê pena de detenção de 6
meses a 2 anos para aquisição, guarda ou posse ilícitas de drogas para uso próprio.
Ressaltamos ainda a mensagem do Presidente da República ao Congresso
Nacional, em fevereiro deste ano, na qual manifesta a preocupação de integrar as
políticas públicas setoriais à Política Nacional Antidrogas.
Esse é um trabalho que vem sendo desenvolvido com muita intensidade. No
final de março fizemos um seminário, cujo tema foi Novos Cenários para a Política
Nacional Antidrogas, e que contou com a participação de integrantes do Governo
Federal, de representantes de quase todos os Ministérios, bem com de diversas
organizações não-governamentais e representações da sociedade civil de outros
Poderes. Houve grande intercâmbio de conhecimentos, muitas contribuições foram
apresentadas, e foi assumido por todos o compromisso de trabalharmos unidos pela
redução da oferta e da demanda de drogas.
Onze Ministérios formalizaram o interesse de integração, com a assinatura
de um protocolo de intenções. Basicamente aqueles que têm vínculo maior com o
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problema. O Ministério do Trabalho, em função, fundamentalmente, do custo do
tratamento e dos problemas causados ao trabalho e ao emprego por causa do
fenômeno das drogas. Da mesma forma os Ministérios da Previdência Social, do
Esporte, das Cidades, da Educação e da Saúde. Houve consenso de que
precisamos trabalhar juntos e, atendendo à orientação do Presidente da República,
efetuar, no mais curto prazo, a integração de todas essas políticas setoriais voltadas
para um mesmo objetivo. Acredito que estamos fazendo isso de uma forma até
satisfatória.
Preparamos uma proposta para o Presidente da República sobre a diretriz
desse trabalho. Provavelmente será concluída sob a forma de decreto. Trata da
condução da Política Nacional Antidrogas neste Governo. Ainda não foi apresentada
ao Presidente Lula, mas provavelmente nesta ou na próxima semana será de
conhecimento geral. Pretendemos abordá-la também na Semana Nacional
Antidrogas, na terceira semana do mês de junho. Algumas coisas com certeza
constarão do repertório das diretrizes para o período de 2003 a 2006.
A seguir, vamos dar alguns exemplos.
Observar o necessário equilíbrio entre as ações governamentais de redução
da demanda e da oferta de drogas. Esse equilíbrio é importante, é uma lei que
ninguém consegue revogar: a chamada lei da oferta e da procura. Temos de
trabalhar com muita cautela, bastante integrados e equilibrados, como dissemos,
porque quando a oferta é pequena e a procura muito grande há conseqüências
econômicas: aumento de preços, por exemplo. De modo que esse trabalho tem de
ser muito bem coordenado e equilibrado.
Promover o diálogo sem preconceitos, dando voz à criança, ao jovem, ao
dependente químico e às pessoas que fazem uso prejudicial do álcool e de outras
drogas.
Garantir acolhimento solidário e isento de julgamento moral aos dependentes
químicos, às pessoas que fazem uso prejudicial de álcool e outras drogas e a seus
familiares.
Diferenciar o usuário de drogas das pessoas envolvidas no tráfico ilícito.
Promover o desenvolvimento sistemático do educador como elemento
essencial no processo de formação de cidadãos responsáveis e capazes de decidir
quanto ao uso indevido e ao tráfico ilícito de drogas.
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Desenvolver programas de redução da demanda e da oferta de drogas,
direcionados à família.
Descentralizar as ações de redução da demanda de drogas para as
estruturas estaduais, municipais e, fundamentalmente, comunitárias, integradas às
ações de redução da oferta. Consideramos que é na comunidade que o problema
tem de ser resolvido. A comunidade é que conhece os seus problemas e é ela que
tem condições de adotar as melhores soluções para resolvê-los. Daí essa busca da
municipalização, de chegarmos efetivamente às pequenas comunidades.
A SENAD tem hoje praticamente um só papel executivo na gestão do Fundo
Nacional Antidrogas. No mais, é um órgão normativo, de avaliação de propostas e
projetos, fundamentalmente de orientação quanto a técnicas e formas de combater o
fenômeno. Não podemos ter a pretensão de, instalados aqui em Brasília, resolver o
problema de pequena comunidade do Rio Grande do Sul, do Ceará ou de Mato
Grosso.
Consolidar o Observatório Nacional de Informações sobre Drogas como
sistema nacional de gestão do conhecimento e de suporte ao gerenciamento das
estruturas e agente da redução da demanda e da oferta de drogas. Temos muita
dificuldade de coletar informações confiáveis. Vai ser um grande esforço ao longo
deste ano e nos anos subseqüentes criar um banco de dados, com base no qual
possamos tomar decisões com um mínimo de confiabilidade. Esse é um dado muito
importante para nós.
Ampliar a rede de assistência ao dependente químico e às pessoas que
fazem uso prejudicial de drogas, de álcool e de outras drogas é, fundamentalmente,
tarefa do Ministério da Saúde, mas para a qual todos os demais Ministérios se
propõem a colaborar.
Promover a integração das ações dos órgãos nacionais que atuam na
redução de oferta de drogas, especialmente das Polícias Federal, Civil e Militar.
Realizar operações com outros países, dando ênfase a parcerias com países
vizinhos, na área de redução da oferta de drogas. Na área de redução da demanda,
tivemos 3 experiências muito bem-sucedidas em 3 grupos de cidades em que a
fronteira é aberta, ou seja, junto à Argentina, ao Paraguai e ao Uruguai. Essas
experiências são consideradas hoje, tanto pela OEA quanto pela ONU, modelo de
integração entre países vizinhos.
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Finalmente, podemos garantir que o Governo está promovendo debates com
a sociedade para construir suas próprias respostas sobre prevenção do uso indevido
de drogas, redução de danos, tratamento e reinserção social de pessoas que fazem
uso prejudicial de drogas.
A consolidação desse trabalho pretendemos que se dê num fórum a ser
realizado — o terceiro — no último trimestre deste ano, que será a base para uma
reavaliação e para eventuais mudanças da Política Nacional Antidrogas.
Vista a atribuição da Secretaria Nacional Antidrogas, vamos partir para a
Agência Brasileira de Inteligência. A ABIN veio suprir a necessidade de dotar o
Estado brasileiro de um organismo de Inteligência capaz de assessorar o Presidente
da República, principalmente em temas que digam respeito a ameaças internas e
externas à ordem constitucional, numa nova conjuntura internacional. A lei que
instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligência, de dezembro de 1999, e criou a ABIN,
resultou de amplo debate, tanto no âmbito do Executivo, que desejava um órgão de
alto nível e isento de ingerências político-partidárias, quanto no âmbito do
Legislativo, que aprovou pressupostos e controles para garantir isenção na sua
atuação.
Essa lei determina que as atividades de Inteligência a cargo da ABIN sejam
desenvolvidas de acordo com os limites de sua extensão, com o uso de técnicas e
meios sigilosos, com irrestrita observância dos direitos e garantias individuais,
fidelidade às instituições e aos princípios éticos que regem os interesses e a
segurança do Estado.
De acordo com a lei, compete à Agência Brasileira de Inteligência planejar e
executar ações, inclusive sigilosas, relativas a obtenção e análise de dados para
produção de conhecimentos destinados a assessorar o Presidente da República,
como já disse; planejar e executar a proteção de conhecimentos sensíveis relativos
ao interesse e à segurança do Estado e da sociedade; avaliar as ameaças internas e
externas à ordem constitucional; promover o desenvolvimento de recursos humanos
e a doutrina de Inteligência; e realizar estudos e pesquisas para o exercício e
aprimoramento da atividade de Inteligência.
Ainda segundo a lei de criação da ABIN, a execução da Política Nacional de
Inteligência fixada pelo Presidente da República será levada a efeito sob a
supervisão da Câmara de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Conselho de
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Governo — CREDEN. O controle e a fiscalização externos da atividade de
Inteligência são exercidos pelo Poder Legislativo, por meio da Comissão Mista de
Controle das Atividades de Inteligência do Congresso Nacional, criada para tal fim.
Abro um parêntese aqui para falar sobre a importância do trabalho desta
Comissão para as nossas atividades. Achamos da maior importância que ela
efetivamente desempenhe o seu trabalho com o máximo de empenho e fiscalize as
nossas atividades. Isso dará transparência à nossa atividade. E, mais do que isso,
será uma colaboração do Congresso, para corrigirmos os rumos das atividades de
Inteligência, com a absoluta convicção de que os representantes da população
brasileira nos orientarão a fazer o que é realmente necessário. Então,
caracterizamos aqui a importância para nós do funcionamento da Comissão Mista
de Controle das Atividades de Inteligência.
Enquanto o Governo, no âmbito da nossa Câmara de Relações Exteriores e
Defesa Nacional, prepara nova proposta de Política Nacional de Inteligência, a ABIN
desenvolve suas atividades obedecendo a diretrizes de atuação orientadas pelo
Presidente da República e baixadas pelo Gabinete de Segurança Institucional, por
delegação da Presidência. Essas diretrizes de atuação devem conduzir os trabalhos
da ABIN para o atendimento de duas metas prioritárias para o Governo na área de
Inteligência: produzir análise buscando identificar as causas e tendências dos fatos
e/ou situações, para avaliar seus reflexos nas políticas públicas do Governo Federal,
tendo em vista o alcance dos resultados propostos e o bom emprego dos recursos
públicos; implementar política de segurança da informação e incentivar as atividades
de pesquisa e desenvolvimento de tecnologia nacional, com vistas a assegurar a
proteção dos sistemas utilizados em âmbito governamental, considerando que a
tecnologia da informação é ferramenta imprescindível em todos os setores da vida
nacional.
Convém lembrar que a ABIN não desempenha esse trabalho de forma
isolada. Ela conta com a colaboração dos integrantes do Sistema Brasileiro de
Inteligência para as ações de planejamento e execução das atividades de
Inteligência no País.
Como órgão central desse Sistema, a ABIN amplia sua capacidade de
processamento de dados e conhecimentos valendo-se da multidisciplinaridade e
capilaridade que o sistema propicia. Conforme regulamentação aprovada por
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decreto de setembro de 2002, o Sistema Brasileiro de Inteligência é integrado por 13
órgãos da administração federal direta, ficando aberta ainda a possibilidade de
participação mediante convênio das unidades federadas.
No que se refere à produção de conhecimento, até o presente momento
foram difundidos 174 relatórios de Inteligência sobre temas com reflexos reais ou
potenciais nas políticas públicas governamentais. Destacamos algumas áreas:
aspectos da segurança pública no Brasil; dificuldades na implementação de
programas sociais; invasão e exploração de recursos naturais e minerais em terras
indígenas; acompanhamento dos diversos países da América do Sul, com prioridade
para alguns deles; evolução dos mecanismos internacionais de controle na área de
não proliferação de armas de destruição em massa; evolução do conflito no Iraque;
interesse brasileiro na integração econômica no âmbito da Área de Livre Comércio
das Américas — ALCA e do MERCOSUL; interesse especulativo de agente do
mercado; e desenvolvimento tecnológico de fontes alternativas na geração de
energia.
Na área de proteção ao conhecimento podemos destacar os trabalhos de
implementação do Programa Nacional de Proteção ao Conhecimento, que existe
desde 1996 e têm por objetivo primordial assessorar pessoas e instituições públicas
e privadas que detenham, lidem com ou tenham sob custódia conhecimentos
sensíveis do ponto de vista estratégico, para que adotem medidas de segurança
capazes de proteger adequadamente esses conhecimentos.
Dentre as principais parcerias realizadas com esse objetivo, destacamos as
efetuadas com a Comissão de Acompanhamento do Sistema de Proteção da
Amazônia — SIPAM; Indústrias Nucleares do Brasil — INB; PETROBRAS; Ministério
do Meio Ambiente; Comissão de Coordenação e Proteção ao Trabalho Nuclear
Brasileiro; Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de Justiça; EMBRAPA, entre
outros.
A ABIN, buscando atingir esse mesmo objetivo, realiza simpósios de proteção
ao conhecimento. Na semana passada estivemos em Manaus para a abertura do 6º
Simpósio de Proteção ao Conhecimento, voltado para a proteção dos
conhecimentos tradicionais de povos indígenas e populações amazônicas. Foi uma
iniciativa muito boa, a receptividade foi excelente. Fazemos referência ao assunto
porque se comemora aqui no Congresso Nacional a Semana da Amazônia.
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Pretendemos ainda este ano realizar o 7º Simpósio em Goiânia, previsto para
setembro; e o oitavo em Fortaleza, no mês de outubro.
Em relação às atividades de contra-inteligência, cabe destacar o
acompanhamento sistemático do terrorismo internacional, com especial atenção às
suspeitas de atuação de células terroristas na tríplice fronteira entre Brasil, Argentina
e Paraguai, no Município de Chuí, Estado do Rio Grande do Sul, em São Paulo,
Capital, e outras regiões do País; análise da atuação dos grupos guerrilheiros
colombianos na região da fronteira entre Brasil e Colômbia e de eventuais reflexos
para o País — venda de terras brasileiras para estrangeiros, políticas migratórias
nacionais, interesse de estrangeiros na biotecnologia brasileira, identificação e
acompanhamento de atividades de oficiais de Inteligências estrangeiros no Brasil.
Quanto ao crime organizado, salientamos o acompanhamento e a avaliação
da atuação de organizações criminosas, particularmente ligadas ao narcotráfico, ao
tráficos de armas, à lavagem de dinheiro e a outros crimes conexos que
comprometam a política pública de segurança do País; a coordenação e a
supervisão, em âmbito nacional, do fluxo de informações decorrentes das operações
de Inteligência executadas pelas agências estaduais, visando estabelecer as
tendências de atuação das organizações criminosas no território brasileiro.
Destacarei, mas não vou entrar em detalhes porque a linguagem é muito
técnica, as atividades relacionadas com o desenvolvimento e a aplicação de
tecnologias voltadas para a Inteligência:
- implementação em software de um algoritmo criptográfico para utilização em
equipamentos produzidos pela própria ABIN, para provimento de segurança
criptográfica e segurança computacional, tanto para ligações telefônicas quanto para
transmissão de dados entre computadores;
- montagem, configuração, parametrização, injeção de algoritmos
criptográficos em equipamentos para uso em máquinas e redes computacionais
seguras e telefone seguro, visando a atender demandas específicas de órgãos do
Governo Federal. Estamos iniciando a instalação de uma rede, usando um telefone
seguro desenvolvido pela Agência Brasileira de Inteligência entre todos os titulares
dos Ministérios, na Esplanada dos Ministérios. Pretendemos estender isso aos
Secretários-Executivos e às outras organizações que necessitem de sigilo.
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- levantamento de competências nacionais, incluindo cientistas,
pesquisadores, instituições acadêmicas e empresas genuinamente nacionais nas
áreas de criptografia, sistemas operacionais com código aberto, segurança das
comunicações e segurança da informação, para possíveis trabalhos conjuntos no
âmbito de parcerias institucionais estratégicas;
- gerenciamento, operação e manutenção de sistemas seguros de informação
e comunicações, dedicados especificamente às atividades de Inteligência; e
- pesquisa, especificação, desenvolvimento e implementação de módulo
criptográfico para rádios de comunicação, inicialmente voltados para uso do
Exército. Depois estenderemos a técnica para outros equipamentos.
Passemos para as atribuições da Subchefia Militar. Ela desenvolve inúmeras
atividades, dentre as quais podemos destacar:
- ligação imediata do Presidente da República com cada Força Armada, todas
representadas na Subchefia Militar. Evidentemente, é uma ligação imediata para
atender à imposição do Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, como
assessoria militar e pessoal do Presidente da República. Não há nenhum tipo de
envolvimento nas tarefas específicas do Ministério da Defesa. Temos um cuidado
muito especial em evitar qualquer ingerência em assuntos específicos do Ministério
da Defesa. Sem nenhum problema, nossa ligação é permanente, constante e muito
boa;
- organização e coordenação das viagens presidenciais em território nacional
e no exterior;
- organização e coordenação de eventos em Brasília, com a presença do
Presidente da República;
- provimento de segurança ao Presidente da República e a seus familiares em
tempo integral;
- a mesma ação com relação ao Vice-Presidente da República e, caso assim
o desejem, aos Ministros Chefes da Casa Civil, do Gabinete de Segurança
Institucional, ao Secretário de Comunicação e Gestão Estratégica, ao Secretário-
Geral e ao Chefe do Gabinete Pessoal, ou seja, os chamados órgãos essenciais da
Presidência;
- acompanhamento e assessoramento imediato ao Presidente da República a
respeito de temas militares e de outros assuntos de relevância como, por exemplo,
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estrutura militar na faixa de fronteira terrestre brasileira, em particular na região
amazônica; e emprego das Forças Armadas no apoio à manutenção da lei e da
ordem;
- sistematização, controle, produção e legislação relacionadas a materiais de
emprego militar; e
- transporte do Presidente da República em aeronaves da Força Aérea
Brasileira em todo o território nacional e no exterior.
Passemos agora ao último braço do Gabinete de Segurança Institucional, a
Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais.
Nos últimos anos, o funcionamento dessa Secretaria levou à construção de
um perfil de responsabilidades que abarca as mais diversas áreas. Por exemplo: a
SAEI acompanha aproximadamente 70 temas de competência do Conselho de
Defesa Nacional, órgão colegiado de Estado, e da Câmara de Relações Exteriores e
Defesa Nacional, colegiado de governo.
A SAEI também estuda e avalia a ocupação e a utilização de áreas
indispensáveis à segurança do território nacional, especialmente a faixa de fronteira.
Realiza estudos estratégicos, particularmente sobre temas relacionados com a
segurança das instituições. Mais especificamente, cabe à SAEI prevenir a ocorrência
de crises que possam corresponder a casos de grave e iminente ameaça à
estabilidade institucional.
No caso de tais crises se materializarem, à SAEI compete gerenciá-las, fato
que explica porque esta Secretaria, por vezes, também é conhecida, um tanto
imprecisamente, como “Gabinete de Crise”.
Pela listagem de responsabilidades pode emergir a impressão de que se trata
de instituição de grande porte. Em verdade, a SAEI congrega 14 funcionários,
representantes das mais variadas origens — Marinha, Exército, Aeronáutica,
Ministério das Relações Exteriores, ABIN —, além de advogados civis e militares,
engenheiros de meio ambiente e especialistas em temas sociais.
Por conseguinte, na medida em que governar é conseguir coordenação, a
SAEI também constitui ponto de encontro: sempre desperta curiosidade ver
integrantes de tantas instituições diferentes numa mesma sala. É uma equipe que
nos apresenta soluções bastante inteligentes e originais, pela variedade de origem
dos seus integrantes, o que confere multidisciplinaridade ao trabalho da SAEI.
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Como se pode imaginar, esses funcionários têm dificuldade em cobrir, de
forma adequada, todos os temas que lhe são atribuídos, o que é amenizado pela
estreita ligação entre a SAEI e a Agência Brasileira de Inteligência e pela estrutura
matricial existente no nosso Gabinete, que utiliza também os integrantes da
Subchefia Militar e de alguns dos próprios gabinetes nos trabalhos desenvolvidos
pelos grupos de estudo da SAEI.
A ABIN, com sua capilaridade em todo o território nacional, ajuda a identificar
temas passíveis de transformarem-se em crises. Quando funciona, o “Gabinete de
Crises” fornece os dados de Inteligência que permitem gerenciar a situação.
A título ilustrativo cito as tarefas executadas pela SAEI nos últimos meses.
Por vários meses coordenou os esforços de diversos setores governamentais com
parcial responsabilidade, excluída a área econômica, no que tange à preparação do
País para fazer frente às conseqüências da Guerra no Iraque. Começamos ainda em
janeiro esse trabalho de articulação entre os diversos Ministérios envolvidos.
Discutimos e planejamos desde o planejamento de estocagem de combustíveis até
os planos para lidar com um possível surto de varíola provocado por atentado
terrorista ou por afluência de pessoas de outras áreas do mundo, bem como
articulamos as medidas necessárias para evitar maiores conseqüências do incêndio
em Roraima, há cerca de 2 meses. Foi tão competente o trabalho que até choveu
fora do prazo.
Outro exemplo temos na constituição de um grupo interministerial de
biodefesa, em funcionamento há cerca de 1 mês, desde o início da ocorrência da
pneumonia atípica, como é chamada. Trata-se de trabalho integrado de diversos
Ministérios, com preponderância, evidentemente, para o Ministério da Saúde, mas
também estão envolvidos os de Relações Exteriores, Justiça e todos aqueles que
têm algo a ver com a possibilidade de atuação numa emergência, que esperamos
não ocorra, no caso da chegada dessa doença ao Brasil.
A partir do final de maio também está previsto o início do trabalho de um
grupo que vai preparar a ABIN para os novos tempos. Temos discutido e revisto as
necessidades brasileiras no campo da Inteligência de Estado, buscando também
definir os instrumentos necessários ao cumprimento de seu papel. Contamos com a
colaboração de representantes do mundo acadêmico, convidamos o nosso grupo de
controle externo para participar e realizamos reuniões de nível técnico. Esse convite
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será formalizado com mais propriedade quando realizarmos a reunião em âmbito
ministerial.
Para não alongar a listagem diária de atuação da SAEI, mencionarei apenas
mais um esforço pioneiro, ou seja, a coordenação dos vários órgãos governamentais
interessados no levantamento cartográfico e no sensoriamento remoto do País.
Constatamos que nossos grandes esforços nessas áreas praticamente pararam na
década de 80. Precisamos, assim, avançar muito e com velocidade. Demos muita
atenção ao IBGE e esquecemos que a geografia é fundamental para o trabalho de
estatística.
Coordenamos, então, uma série de instituições, todas interessadas na área
de cartografia: o próprio IBGE, as Forças Armadas, o INCRA, a EMBRAPA, a
FUNAI, o Departamento Nacional de Produção Mineral, a Agência Nacional de
Petróleo e o IBAMA. Vamos tentar, com essa articulação, fazer o verdadeiro resgate
da nossa cartografia.
Sras. e Srs. Deputados, como disse ao início da minha exposição, estamos
aqui para lhes fornecer subsídios, a fim de que conheçam melhor a estrutura, as
competências, as articulações e as atribuições do Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência da República.
Ao finalizar, registro minha satisfação pessoal pela oportunidade de conviver
com V.Exas. nesta Casa, da mais exponencial importância para o País. Tenho vindo
à Câmara dos Deputados com alguma freqüência, não apenas em visitas formais ou
sociais, mas também para buscar apoio às nossas necessidades. Tenho recebido
diversos integrantes das duas Casas do Congresso e reafirmo que as portas do
nosso modesto Gabinete sempre estarão abertas a V.Exas., a qualquer momento,
para esse contato extremamente importante e da maior relevância para os nossos
trabalhos.
De resto, meu agradecimento a todos. A partir de agora estou à disposição
para eventuais esclarecimentos ou aprofundamento de algum dos temas aqui
expostos.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Muito obrigada, Sr. Ministro.
Encerrada a exposição, passamos aos debates.
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O primeiro orador inscrito é o Deputado José Thomaz Nonô, a quem concedo
a palavra.
O SR. DEPUTADO JOSÉ THOMAZ NONÔ - Sra. Presidenta, caros colegas e
Sr. Ministro, a quem cumprimento, em primeiro lugar, pela exposição abrangente e
didática que, sem dúvida, trouxe luz para aqueles que, como eu, não compreendiam
bem o funcionamento do Gabinete de Segurança Institucional.
A exposição de V.Exa. é, sem dúvida alguma, abrangente e clara, da mesma
forma que a do Comandante da Marinha, que esteve na Casa semana passada.
Aliás, é uma característica dos expositores militares serem extremamente
ordenados, didáticos e claros nas suas exposições. Particularmente, não tenho hoje
nenhuma dúvida sobre o funcionamento do referido Gabinete, sua mecânica, sua
distribuição e seu âmbito de atuação.
Mas gostaria de aprofundar certos aspectos citados por V.Exa. Primeiro,
V.Exa. apontou o seguinte: “observar o necessário equilíbrio entre as ações
governamentais de redução da demanda e da oferta de drogas, visando garantir a
estabilidade, o bem-estar social”. Minha preocupação é apenas no sentido de
clarificar isso. Parece-me que ao Governo compete basicamente reprimir, educar,
prevenir, mas não necessariamente lhe cabe o papel de regulador do mercado
ilícito. Tanto a oferta quanto a procura de drogas são atos intrinsecamente ilícitos,
contrários à lei e à harmonia social, enfim, são ilegais. É esse o ponto que
especificamente pediria a V.Exa. que aprofundasse.
A outra questão é recorrente. Não sou especialista na matéria, mas sou
Promotor de formação, para repúdio da nossa Presidenta, que vê em mim exceção à
sua oposição sistemática em relação ao Ministério Público. Mas como S.Exa. me é
benevolente, Sr. Ministro, manifesto a V.Exa. minha dificuldade em entender essa
diferenciação entre usuário e pessoas envolvidas no tráfico. Estudos realizados no
mundo inteiro demonstram que os usuários têm, em boa parte, até para manter o
próprio vício, tendência a se transformarem em traficantes. Não digo que seja uma
regra, mas é um número estatisticamente impressionante. Pelo custo da droga, pela
dificuldade de manter o nível de utilização, aquele que originalmente era usuário, ao
longo do tempo e para manter o próprio vício, começa a prestar serviços para
pessoas e organizações envolvidas, como forma de sustentar seu próprio vício.
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Cada país tem enfrentado essa questão com diferente orientação. Vou citar
um sistema e gostaria de ouvir a opinião de V.Exa. Cingapura é muito interessante:
está localizada no centro de uma região com muitos problemas relativos às drogas.
Todo o sudeste asiático é produtor e consumidor de drogas e possui problemas de
toda a ordem. Cingapura tratou da questão de forma original. Até tantos gramas de
cocaína e de maconha, o surpreendido nessa ilicitude é, técnica e legalmente,
usuário. Não se discute. Nesse ponto, os advogados são criativos: permitem
milhares de (ininteligível) para tipificar ou qualificar como dependentes pessoas que,
na realidade, são traficantes. Assim, Cingapura executou o seguinte tratamento: até
tantos gramas de drogas, a pessoa é dependente; como tal, é doente; e é seu direito
a atenção do Estado, ou seja, internação compulsória por período de 1 a 3 anos,
para tratamento de sua doença. Acima de tantos gramas de drogas, o portador é
considerado traficante. Se encontrada com heroína ou com qualquer outra droga
pesada, o portador é tecnicamente considerado traficante. E a pena lá é de morte.
Da última vez em que lá estive, soube do caso de uma norte-americana condenada
ao fuzilamento, apesar de todos os protestos dos Estados Unidos e das
organizações defensoras dos direitos humanos.
O fato é que a droga — e V.Exa. sabe disso melhor do que eu — assumiu tal
dimensão que não pode mais ser tratada com Melhoral nem pelo Governo do Rio de
Janeiro, nem pelo de São Paulo, nem pelo de Alagoas, enfim, por nenhum Governo.
Ou mudamos o tipo de tratamento, ou as cenas a que assistimos se repetirão numa
progressão avassaladora. Aliás, com a leniência do Estado e dos órgãos
encarregados de reprimir o uso de drogas, com a conivência deste Congresso, que
sempre tratou o problema, talvez por influência de vertentes equivocadas de
esquerda, como se fosse de menor importância. E chegamos a esse ponto.
Portanto, uma das atribuições do Gabinete é repensar essas questões.
Gostaria de saber do titular do Gabinete de Segurança Institucional como
podemos repensar a sutil distinção entre usuário e dependente. Se V.Exa., conforme
declarou ao término de sua exposição, busca apoio na Casa, também queremos a
colaboração do Executivo, que lida operacionalmente com a matéria, principalmente
da instituição de V.Exa., que está distanciada da política e do dia-a-dia do Governo.
No Rio de Janeiro é muito difícil fazer a assepsia do tratamento da matéria, uma vez
que o ex-Governador é Secretário de Segurança e tem projeto político que está
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sendo tratado pelos jornais de uma outra forma. Portanto, gostaria que V.Exa.
fizesse abordagem isenta, científica e fria da matéria.
A outra questão também crucial sobre a qual gostaria de ouvir a opinião de
V.Exa. diz respeito ao famoso e recorrente emprego das Forças Armadas no apoio à
manutenção da lei e da ordem. Sei que as Forças Armadas têm disso salutar pavor.
Conheço os argumentos porque já os discuti com o ex-Ministro Zenildo de Lucena,
com o almirante Mário César, com todos os pensadores do Exército, da Marinha e
da Aeronáutica nos últimos 10 anos. Sei que, em última análise, a resistência
prende-se a diversos fatores, a saber: não foram treinados para esse tipo de
atividade; esse tipo de atividade não está previsto entre suas atribuições
constitucionais; não está escrito em lugar algum, mas está implícito que eles têm
tremendo receio de se estreparem nessa difícil tarefa.
O problema é que as ocasiões em que se torna necessário o uso
complementar ou principal das Forças Armadas estão se exacerbando com iniludível
freqüência. Os aparatos estaduais, teoricamente treinados, mas basicamente em
alguns casos profundamente infiltrados com o pessoal do tráfico, não dão as
respostas necessárias. No entanto, não só confiamos absolutamente, mas também
exaltamos a isenção, a competência, a idoneidade e o comportamento patriótico das
Forças Armadas brasileiras.
Portanto, gostaria de saber o que pensa V.Exa., Ministro do Gabinete de
Segurança Institucional, sobre eventuais ou intensos chamamentos das Forças
Armadas no apoio à manutenção da lei e da ordem. E circunscrevo-me à violência
urbana, conectada com o uso e o tráfico de drogas. Não quero que chamem o
Exército para defender refinaria porque me parece que isso já está um tanto quanto
démodé. Desta forma, trato de questões absolutamente contemporâneas que
angustiam o cidadão comum e, sem dúvida alguma, preocupam V.Exa.
Eram essas pequenas indagações que faria a V.Exa., aproveitando para
cumprimentá-lo, repito, pela brilhante exposição com que nos brindou na manhã de
hoje.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Sr.
Ministro Jorge Armando Félix.
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX - Deputado, muito obrigado
pelas perguntas que me dão a oportunidade de expandir um pouco mais as nossas
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idéias, e a V.Exas., de me conhecer melhor. Como disse no início da exposição,
desta maneira podemos saber o que pensam V.Exas. e, ao mesmo tempo, mostrar
como imaginamos a solução para alguns problemas.
Em relação ao primeiro caso, talvez tenha havido um erro de interpretação.
Na verdade, o que eu quis dizer quando citei a lei da oferta e da procura é que os
esforços devem ser equilibrados tanto na área da redução da demanda quanto de
redução da oferta. Essa é uma preocupação do Governo, particularmente minha, na
qualidade de Presidente do Conselho Nacional Antidrogras, no qual discutimos estes
2 aspectos: o Gabinete, via SENAD, fica com a redução da demanda; e o Ministério
da Justiça, com a redução da oferta. Mas nos parece que os esforços têm de ser de
igual intensidade. Às vezes isso se torna um pouco complicado porque a repressão,
desculpe-me o uso da expressão, é muito pirotécnica. A repressão vai para os
jornais, aparece em toda a mídia e faz sucesso. A prevenção tem longo prazo, é o
trabalho da formiguinha; trata-se, fundamentalmente, da conscientização e da
educação das pessoas. A tendência é aplicarmos os recursos naquilo que dá
manchete.
A nossa preocupação, quando falamos em equilíbrio, é que os esforços, e em
conseqüência os investimentos, tenham o mesmo nível de intensidade, para que
haja a redução simultânea dos 2 aspectos. Essa é a minha resposta à primeira
pergunta.
A segunda pergunta, desculpem-me, eu a transferirei para V.Exas., porque
vai ser votada, acredito que em breve, nova e efetiva Lei Nacional Antidrogras. O
que existe hoje, na verdade, é quase uma colcha de retalhos. Houve uma lei e
depois um outro projeto, que não foi aprovado na íntegra, mas em parte vetado por
vício de inconstitucionalidade. É extremamente importante que tenhamos um
diploma normativo ou uma lei mais abrangente, seja ela qual for, que realmente
balize com muita clareza, que defina efetivamente estes atores: o dependente, o
usuário e o traficante. Só a lei pode fazer isso.
Há duas semanas, se não me engano, houve ampla discussão no Congresso
sobre esse assunto. Todos os nossos especialistas participaram intensamente do
debate. Acreditamos que o resultado será muito positivo. Mas é extremamente
importante que tenhamos um diploma legal muito claro sobre o papel de cada um
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daqueles atores, para que a lei, no caso do aspecto repressivo e punitivo, seja
aplicada com nitidez.
No que diz respeito ao terceiro aspecto, V.Exa. utilizou o adjetivo “pavor”
corretamente. Posso até dar um testemunho. A minha primeira comissão foi em
Mato Grosso — na época era um só Estado —, em 1960. Naquela época, o Exército
combatia diretamente o contrabando de café. O nível de corrupção dos funcionários
da linha de frente, na fronteira, era relativamente grande para os nossos padrões, de
modo que a história nos mostra que é muito difícil combater o crime. Às vezes as
pessoas não são corrompidas para fazer algo, mas muito mais pela omissão, porque
basta fecharem os olhos. Isso aconteceu muito naquela época. Vivi esse tipo de
situação com alguma intensidade, participei da reação contra ela, e realmente nos
preocupa.
O poder de corrupção do dinheiro é grande, mesmo em estruturas como as
nossas, que têm formação básica e que enfocam muito o aspecto da lealdade com a
organização e os companheiros. Às vezes, a vida abre determinados caminhos, e as
pessoas perdem um pouco desta imunidade que nos é inoculada lá na base. Isso
nos preocupa muito, assim como o desvio funcional, ou seja, os nossos quadros
realmente não estão preparados para determinados tipos de ação. Isso pode
ocasionar, em determinadas circunstâncias, problemas de difícil solução. Em
pequena escala ocorre o fato de um cidadão romper a barreira e lamentavelmente
ser morto pela ação. A probabilidade de ocorrência de eventos desse tipo é maior
quando se usam jovens de 18, 19, 20 anos, com preparação de poucos meses. Eles
terminam o serviço militar e, depois de 9 meses, vão embora. Não temos quantidade
suficiente de servidores para fazer esse trabalho, profissionais mais maduros e com
mais experiência e que, portanto, sentem menos cócegas no dedo para puxar o
gatilho.
Entendemos impositivo que as Forças Armadas não se omitam e colaborem o
máximo possível, sem levar seu pessoal para essa linha de frente, salvo se não
houver alternativa, como ocorreu no Rio de Janeiro, na época do carnaval, quando
houve necessidade de solução imediata, pois o evento, além do valor cultural muito
grande, tem também uma resultante econômica indispensável para a vida do
Município e até mesmo do Estado. Realmente não tivemos alternativa senão colocar
nossos homens na rua.
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Mas, sempre que possível, devemos evitar isso, pelo desgaste que ocasiona
à nossa imagem, pelas razões que já mencionei e pela falta de preparação
específica da nossa gente. O treinamento do militar é feito de outra forma, causando
outro tipo de reação. Não podemos dar voz de prisão ao eventual adversário num
campo de batalha, nem ler seus direitos. Não é para isso que somos preparados,
mas para tirá-lo de combate, usando o máximo de força possível. Já na área de
segurança pública temos de usar o mínimo de força para atingirmos nossos
objetivos. São, portanto, conceitos muito contraditórios. É difícil mudarmos a cabeça
das pessoas: “hoje você tem de atuar como policial; amanhã você vai ter de atuar
como soldado”. É difícil.
Mais uma vez, muito obrigado.
O SR. DEPUTADO JOSÉ THOMAZ NONÔ - A rigor não há réplica, mas
quero apenas agradecer a V.Exa., Sr. Ministro, a clareza e a franqueza das
respostas, o que é fundamental.
Permita-me V.Exa. apenas uma sugestão. É claro que o Congresso vai
discutir a lei, mas entidades aptas a fazer reflexão científica sobre o problema têm
mais condições de dar contribuições isentas do que quem vive o dia-a-dia da
política, com todas essas injunções.
Vamos fechar o cerco contra as drogas. Para tanto, entendo que a legislação
brasileira terá de mudar e de forma mais vigorosa, já que também o problema
mudou. Aliás, tudo no mundo muda — o Presidente Lula já disse que a vida mudou,
o PT já disse que tudo mudou. É impossível que nos conservemos estáticos diante
da intensidade e da velocidade com que se tem agravado o problema da segurança
pública. Vamos todos, Parlamentares, militares e civis, repensá-lo.
Mais uma vez meus cumprimentos a V.Exa. pela franqueza das respostas.
Fossem outros segmentos do Governo, a exemplo do Itamaraty, tenho certeza de
que as respostas seriam mais elegantes, mas talvez menos produtivas.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Deputado
Antonio Carlos Pannunzio.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS PANNUNZIO - Sra. Presidenta, Sras
e Srs. Parlamentares, principio por cumprimentar o Exmo. Sr. Ministro, general Félix,
como bem disse o Deputado José Thomaz Nonô, pela clareza de sua exposição e
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pela franqueza de suas respostas, fundamentais para que possamos estabelecer o
entendimento e, a partir daí, trabalhar cada um de nós no seu setor, formando
parceria para o equacionamento e a solução dos problemas do Brasil.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Perdoe-me interrompê-lo,
Deputado Antonio Carlos Pannunzio, mas quero informar ao Sr. Ministro que o
Deputado José Thomaz Nonô é do PFL de Alagoas, e V.Exa., do PSDB de São
Paulo.
Obrigada.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS PANNUNZIO - Durante a sua
exposição, V.Exa. abordou com propriedade as funções da ABIN, discorrendo sobre
todos os segmentos, as seções que compõem a estrutura deste órgão, e falou
também sobre o Gabinete de Segurança Institucional como um todo.
Quanto à ABIN, V.Exa. disse que ela tem por objetivo identificar as eventuais
ameaças à lei e à ordem, tanto internas quanto externas, para informação adequada
ao Presidente da República, a fim de que S.Exa. tome as providências cabíveis. Ao
mesmo tempo, no Gabinete V.Exa. acumulou também responsabilidades sobre a
Secretaria Nacional Antidrogas. Portanto, a complexidade vai aumentando.
Quando falamos em ameaças à ordem — no caso vou falar de ameaças
internas —, quando nos referimos também às políticas antidrogas, de combate ao
narcotráfico, embora não sejam questões a serem combatidas pelos quadros do
Gabinete ou mesmo da SENAD, certamente, formulando a política, fornecem os
mecanismos necessários para que esse combate se trave.
Quero começar a pontuar algumas dúvidas. Sabemos, pois já foi
perfeitamente identificada, comprovada e fartamente divulgada pela mídia, da
ligação das FARC com o narcotráfico, o sustentáculo econômico financeiro da
organização. Por outro lado, também obtivemos informações — e não temos aqui
agentes que nos passem informações diretamente —, por meio da mídia ou
eventualmente até em exposições de autoridades do Executivo que aqui vieram e
que são ligadas à área, de que comprovadamente o território nacional é utilizado
pelas FARC, para obtenção de insumos necessários ao fabrico da droga. Sabemos
também que uma parte do território brasileiro é utilizada como rota para o
escoamento de drogas para outros países, e outra parte para abastecer o mercado
interno brasileiro, que certamente é importante para eles.
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Sendo do PSDB, estou muito à vontade para falar sobre o fato de que durante
o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso as FARC chegaram a ter em
território brasileiro alguns representantes posando como representação oficial. Eu
era o Presidente desta Comissão quando fui instado por alguns companheiros
simpáticos à causa das FARC — não ao narcotráfico, mas à causa política — a
recebê-los oficialmente, o que neguei porque entendo que temos relações com o
Governo colombiano legitimamente eleito. Portanto, não caberia aquele gesto. Mas
o fato é que eles andam livremente no território brasileiro. Também é fato que um
dos principais dirigentes do crime organizado brasileiro, o tal Beira-Mar, foi preso lá
na Colômbia, num combate que um grupo guerrilheiro travava na companhia de um
dos mais importantes líderes da FARC, o tal Negro Acácio.
Identificada a conexão, pergunto a V.Exa. se o Gabinete de Segurança
Institucional, tendo evidentemente conhecimento não só disso, mas também de
muitas outras coisas de que eu não sei, já alertou o Presidente da República a
respeito da relação direta das FARC com o crime organizado no Brasil. Se o alerta já
foi dado, que providências foram tomadas para coibir de fato essa liberalidade com
as FARC e o crime organizado?
A segunda pergunta diz respeito a algo que considero até ameaça à ordem
interna. Não posso dizer que seja um movimento geral, mas de suas lideranças mais
expressivas e dos seus segmentos mais importantes. Trata-se do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem-Terra. O MST se põe à margem e acima das leis
nacionais. Líderes maiores do movimento dizem que não acatarão, e não acatam
mesmo, a medida provisória que deixa muito claro que uma área produtiva invadida
não será objeto de desapropriação imediatamente após a invasão. Assim, se a
invasão ocorrer nessas condições, a medida provisória proíbe a intervenção do
Governo. O Ministro do Desenvolvimento Agrário, numa postura que me parece
esquisita, não se importa com a lei. E o MST descumpre a lei, pois continua
invadindo propriedades.
Ao mesmo tempo, lideranças do MST têm revelado postura de contestação
até mesmo a este Governo que aí está, cujo partido é intimamente ligado ao MST.
Tais lideranças dizem que, para elas, chegar ao Poder ou tomar o Poder não é fruto
de vontade política traduzida em eleições e voto livre. Estão proclamando isso alto e
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bom som. Temos ainda informações de que o MST tem mantido ligações com as
FARC, buscando o treinamento de seus quadros para a guerrilha rural.
Essas informações foram divulgadas pela mídia, e nunca vi nenhum
desmentido oficial por parte do Governo. Portanto, se chegaram ao Gabinete de
Segurança Institucional, gostaria de saber também que eventuais providências
tomou no sentido de levá-las ao conhecimento do Presidente da República e dos
órgãos competentes para a adoção de medidas adequadas.
Perdoe-me, mas tenho de estender um pouquinho esse questionamento. Já
que estamos falando sobre drogas, soube pelo noticiário GloboNews — e tenho
cópia da notícia aqui — que o Ministério da Saúde há poucos dias iniciou campanha
de distribuição de cachimbos a viciados em crack. É o que consta deste documento
obtido via Internet. A prevenção é parte fundamental da política de combate ao uso
de drogas, não tenho dúvida, e até para combater os malefícios decorrentes do uso
de drogas. Assim, a distribuição de seringas faz sentido; a distribuição de
preservativos para as relações sexuais faz sentido; agora, a distribuição de
cachimbos a viciados parece-me muito mais um incentivo ao uso da droga. Resta
perguntar se a marca que o Ministério da Saúde está distribuindo é (ininteligível) ou
outra tão famosa quanto esta.
Gostaria de saber se a Secretaria Nacional Antidrogas, a quem cabe a
propositura da política de combate às drogas no País, participou disso ou foi
iniciativa isolada do Ministério da Saúde. É muito importante saber até porque o
número de cachimbos que eles alegam ter distribuído mostra que deve ser no
mínimo uma idéia não sopesada nem dimensionada adequadamente. Ora, se tal
atitude de distribuir 40 cachimbos na cidade de São Paulo tiver alguma finalidade
que não seja a do incentivo, trata-se de subestimar a dimensão dos malefícios
causados pelo uso do crack de forma explícita.
E, finalmente, pedindo perdão por me estender demais, faço referência ao
que disse V.Exa. em resposta ao Deputado José Thomaz Nonô, sobre o não-
envolvimento das Forças Armadas no combate à violência, ao crime organizado, a
exemplo do que já fizeram outros Ministros. V.Exa. diz que os quadros das Forças
Armadas não foram preparados para tal atividade. Eu tenho certeza de que V.Exa.
está sendo absolutamente sincero; tive oportunidade de constatar sua sinceridade
com freqüência. Agora, o aumento da violência, a ausência do Estado em
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determinadas áreas do Rio de Janeiro — posso buscar exemplos em outros
Estados, mas cito este —, onde não consegue entrar a menos que o crime
organizado permita, revela a violência brutal e o atentado à soberania nacional.
Por isso, pergunto a V.Exa.: não seria recomendável a alteração na forma de
preparação dos quadros das Forças Armadas, para que pudessem fazer frente a
esse tipo de situação? Pessoalmente, não acredito que o estamento policial
brasileiro, sozinho, por mais que se recupere aqui e acolá, pontualmente, por mais
que haja programas de integração entre as Polícias brasileiras, consiga resolver o
problema sem a participação das Forças Armadas, notadamente da Polícia Federal,
exígua que é em dimensões. Pergunto, portanto, se não caberia a mudança nos
critérios de formação do militar brasileiro, que lhe permitisse, pelo menos por algum
tempo, fazer frente a esse desafio.
Por fim, indago a V.Exa. qual a posição do Gabinete de Segurança
Institucional relativamente à Lei do Abate aprovada nesta Comissão e no Congresso
Nacional e, no entanto, não sancionada pelo então Presidente da República,
Fernando Henrique Cardoso?
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Sr.
Ministro.
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX - Muito obrigado. Aliás, não sei
se agradeço o teor das perguntas ou se devo com ele me preocupar.
Vou procurar responder a V.Exa. dentro do possível porque existem aspectos
específicos da área de Inteligência que não poderia externar aqui. Talvez possam
ficar para mais tarde, quando se tratar de coisas mais específicas — quem sabe? —
em futura reunião da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência.
Talvez, então, possamos ser mais específicos quanto a alguns aspectos. Permitam-
me, portanto, abordar o assunto de modo genérico, pois não caberia aqui tecer
certos comentários. Vou, de qualquer modo, tentar responder às perguntas.
Quanto à relação incestuosa entre guerrilha, narcotráfico e crime organizado,
semanalmente fazemos relatório para o Presidente da República e outros órgãos,
quando necessário, sobre como andam as coisas nos países vizinhos,
particularmente aqueles sobre os quais recaem maior interesse de outro ponto de
vista. Semanalmente, portanto, o Presidente da República recebe relatório sobre o
que anda ocorrendo nesses países, tanto no aspecto político quanto no aspecto de
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insurreição, de contestação das estruturas políticas organizadas. Esse relatório é o
mais abrangente e o mais detalhado possível, dentro de nossa capacidade de obter
e trabalhar informações. Tudo aquilo que sabemos, ouvimos ou constatamos é
passado ao Presidente da República.
É importante caracterizar que à área de Inteligência cabe acompanhar,
analisar e informar. E só. Decisões, obrigatoriamente, são da área política. A
Inteligência de Estado não pode ter nenhum viés político e nenhuma preocupação
em imaginar o que é feito com o produto de seu trabalho. Essa é uma decisão
puramente política, que não cabe a nenhum serviço de Inteligência. Nós
simplesmente mantemos o Governo, basicamente o Presidente da República,
permanentemente informado sobre o que acontece; analisamos o que é divulgado
pela mídia; e procuramos confirmar ou negar o dado ou a informação. Tudo é
passado ao Presidente da República, mas não interferimos no uso político que se
faz disso.
Só poderia fornecer mais detalhes à Comissão Mista de Controle das
Atividades de Inteligência, à qual temos maior liberdade para falar sobre esse tipo de
assunto, que é classificado. Não podemos nem confirmar nem negar. Simplesmente
damos a ele o tratamento devido e passamos ao Presidente da República.
O segundo aspecto diz respeito aos chamados movimentos sociais, em
particular o Movimento dos Sem-Terra. Avaliamos e acompanhamos a chamada
questão agrária com ótica específica. E qual é a orientação do Governo? Qual é o
papel do Governo? O papel de um governo é administrar conflitos. E na questão
agrária existe um potencial de conflitos muito grande. Nosso papel é fazer o
acompanhamento e manter o Governo informado, de modo que se antecipe ao
conflito ou, quando comece a se instalar, procure dar-lhe solução pacífica. É assim
que vemos o papel do Governo e é neste sentido que trabalhamos: dar ao Governo
os instrumentos para evitar que o conflito se instale. Esse é o nosso papel, no que
diz respeito à área de Inteligência. Eventualmente, participamos de
aconselhamentos e decisões na área de segurança pública e em outras, mas
sempre de acordo com esse enfoque.
O terceiro item se refere à distribuição dos cachimbos de crack. Reunimo-nos
no Conselho Nacional Antidrogas por duas vezes, recentemente, e discutimos as
futuras propostas de diretrizes a serem apresentadas ao Presidente.
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Temos, tanto nos fóruns feitos em anos anteriores quanto no simpósio que
realizamos em março e nas reuniões do Conselho Nacional Antidrogas, a exata
dimensão da pluralidade de opiniões e abordagens sobre esse fenômeno das
drogas. Há todos os tipos de opinião, desde a liberação completa e absoluta até a
mais absoluta restrição. E temos de administrar, dentro do Conselho Nacional
Antidrogas. É claro que tentamos buscar o consenso, mas é impossível consegui-lo.
Então, dentro de uma filosofia que entendemos democrática, procuramos seguir a
tendência da maioria. É o que fazemos.
O problema é específico do Ministério da Saúde. Nele e na própria Secretaria
Nacional Antidrogas há sempre opiniões diferentes, e é bom mesmo que haja essa
pluralidade de opiniões porque podemos, eventualmente, enxergar ângulos
diferentes do fenômeno, extremamente complexo e mundial.
Participamos, recentemente, de uma reunião da Organização das Nações Unidas,
em nível ministerial. Todos os Ministérios que tinham algo a ver com o fenômeno das
drogas manifestaram-se, mas temos absoluta convicção de que ainda não há
nenhuma solução boa para o fenômeno em nenhum lugar do mundo. Lá tivemos a
oportunidade de realmente ter a convicção dessa nossa sensação. Como as
posições são variadas, às vezes apaixonadas, procuramos sempre seguir, como eu
disse antes, aquilo que nos parece ser tendência da maioria. A prática tem sido bem
aceita no Conselho Nacional Antidrogas, mesmo pelos grupos mais radicais, que
são ouvidos e ouvem os outros, de forma civilizada, educada — damos voz a todo
mundo.
Abrindo um parêntese, pretendemos ampliar o Conselho Nacional Antidrogas,
porque, como sempre dizem os jornalistas, é um conselho chapa branca, dele só
participam órgãos do Governo. Existem alguns representantes da sociedade civil,
mas são poucos. Nossa tendência é procurar uma representação quase paritária,
Governo e sociedade civil, para que tenhamos, efetivamente, uma medida de
opinião não apenas daqueles que estão engajados na questão, mas daqueles que
vivem o problema. Queremos que haja representação das famílias, que constituem
grupo social que mais sofre com o fenômeno das drogas, pois são atingidas
diretamente. É desta forma que procuramos conduzir a questão.
No mais, eu não gostaria de emitir opinião. Além do mais, parece-me que não
chega a ser muito significativo. Como o senhor, eu morei em São Paulo, vivi em São
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Paulo, via o problema diuturnamente. Então, 40 cachimbos para São Paulo
realmente é uma gota d’água. Nós, que já moramos em São Paulo, e o senhor, que
é de São Paulo, sabemos que é um fenômeno extremamente grave, que atinge
fundamentalmente as pessoas que não têm retaguarda, não têm família, não têm
apoio algum, que são os miseráveis das ruas, as crianças e adolescentes
abandonados. É um fenômeno extremamente triste. Temos uma preocupação muito
grande, dentro do Conselho Nacional Antidrogas — CNAD em dar um enfoque
especial a essas pessoas, que são as que não têm nenhum tipo de apoio, são os
largados da vida, com o perdão da franqueza.
Estamos na número 3. Vamos ao número 4: Forças Armadas na Segurança
Pública, dentro do aspecto de soberania.
As Forças Armadas têm um tipo de cooperação muito importante, na área de
inteligência e na área de poio logístico. Na área de inteligência, mais
especificamente o Exército do que as outras Forças, porque no Exército há o
fenômeno da conscrição, com o que, a cada ano, renovam-se os contingentes, e
recebemos jovens de todas as camadas sociais e muito particularmente aqueles que
moram nessas áreas quase que liberadas, como chamamos tecnicamente, onde o
Poder Público quase não está presente ou absolutamente não está presente.
O Exército tem grande capacidade de perceber o que está acontecendo.
Quem trabalha no Exército são pessoas que vivem esse dia a dia. Temos muito
cuidado, assim, de não criar nenhum comprometimento para essas pessoas, não
colocá-las, de forma alguma, em situação de risco, mas também aproveitamos a
vivência delas para colher alguma informação. Deste modo, o Exército é bastante
bem informado sobre como é o dia a dia dessas áreas aonde o Poder Público não
chegou.
À propósito, a Segurança Pública de São Paulo fez 2 experiências bastante
interessantes, em áreas desse tipo — não sei o resultado, pois acompanhei à
distância, já que saí de São Paulo há quase 3 anos. Numa das experiências,
primeiro chegava o Poder Público e depois a repressão e, na outra, chegava
primeiro a repressão e depois o Poder Público. Foi algo laboratorial mesmo. Não sei
como se deu. Tive curiosidade de saber o resultado. Parece-me que onde o poder
público chegou antes da repressão, com todos os riscos que isso acarreta, o
resultado foi menor que no outro caso. Não posso afirmar-lhe, mas é uma coisa do
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seu Estado, uma experiência bastante interessante. Em duas áreas praticamente de
risco semelhante foram feitas as experiências. Achei muito interessante isso aí, um
laboratório que precisamos saber qual é a melhor maneira de abordar e de chegar a
esse ponto.
Voltando então ao emprego das Forças Armadas, o Ministério da Defesa,
embora eu esteja na ativa, mas aqui na posição que estou, Gabinete de Segurança
Institucional, seria um assunto mais do Ministério da Defesa, mas envolveria talvez
uma mudança de estratégia de preparação da Força para um outro tipo de emprego
e, como eu disse antes aqui, envolveria determinados riscos, como envolve, mas
tudo na vida tem risco. É fundamentalmente uma decisão política.
Ainda há mais uma. Existe a Lei do Abate, cuja regulamentação tem sido
muito discutida, mas envolve aspectos extremamente complexos. Nós, de uma certa
forma, acompanhamos o envolvimento de vários Ministérios, como o da Defesa e o
das Relações Exteriores, convenções internacionais de que o Brasil é signatário e
que, de uma certa forma, nos inibem de fazer determinadas coisas e até mesmo
legislação estrangeira. É uma coisa muito complexa. Eu vou me aprofundar um
pouco aí, embora a legislação americana seja uma legislação antiga, parece-me que
da época em que foi abatida aquela aeronave coreana pela defesa aérea soviética
— na época, era ainda União Soviética. Então, os americanos fizeram uma
legislação em que o Governo não precisa tomar nenhuma posição. O funcionário, o
servidor público americano que, por força da sua função, estiver lidando com o
fornecimento de peças, suplemento, serviço, qualquer coisa para uma estrutura de
um país que tenha essa Lei de Abate, ele, funcionário, tem que tomar a iniciativa de
bloquear esse fornecimento, sob pena de ser processado e, se não me engano, ser
condenado a até 20 anos de prisão. Então, é uma legislação extremamente... Não
vou chamar de maquiavélica, mas fruto de uma época, uma legislação que faz com
que as coisas aconteçam, com que a retaliação aconteça independentemente da
posição do Governo. O funcionário é que vai correr o risco de ser processado e
ninguém quer correr o risco de ser processado. Então, simplesmente como ameaça
de regulamentação de uma lei dessas, ele, pequeno funcionário, vai tomar a
iniciativa e vai criar um problema institucional, internacional, mas para se proteger.
Então, uma lei é uma coisa muito complicada, de modo que merece e precisa
de um estudo muito aprofundado, precisa de muita negociação, porque existem
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formas de se evitar isso aí, mas essas formas envolvem consideração sobre
soberania, tem de ser submetido ao Presidente dos Estados Unidos, ele é que vai
dizer se podia ou não fazer. É muito complicado, de modo que o Governo tem de
tratar disso com muita cautela, tem que ver o nosso envolvimento em acordos
internacionais sobre tráfego aéreo. Já vimos também — vou usar uma franqueza
aqui —, isso já aconteceu na realidade, dois países adotaram isso aqui, o Peru e a
Colômbia, que no segundo e terceiro vôos depois do início da efetiva derrubada de
aviões, eles colocaram mulheres e crianças dentro dos aviões. Então, é uma coisa
que precisamos tratar com extrema cautela, porque o traficante não tem essas
restrições morais e humanitárias que temos. O problema deles é ganhar dinheiro. Se
é preciso sacrificar a vida de uma mulher, de uma freira ou de uma criança, ele vai
colocá-la dentro do avião. Na realidade, aconteceu um abatimento de aeronaves
com mulheres e crianças dentro.
Portanto, é uma preocupação muito grande. Temos que tratar essa questão
com muito cuidado e negociar com muita cautela, porque as conseqüências podem
ser imprevisíveis.
Desculpem-me a franqueza, mas é nesse sentido que temos que buscar
soluções para os problemas.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS PANNUNZIO - Sem a pretensão de
replicar, quero apenas esclarecer uma dúvida residual. V.Exa. disse que haveria,
pelo menos entendi dessa forma, uma resistência por parte de organismos
internacionais e citou particularmente o caso do Governo americano, em função do
acontecido entre a antiga União Soviética e a Coréia no que diz respeito ao caso
daquele avião de passageiros. Segundo informações recebidas, o próprio Governo
americano anterior seria hoje, e não o atual, quem estava inclusive incentivando
outros países — não sei se no mundo todo, mas particularmente na América Latina
— a adotarem uma lei semelhante, equivalente à essa lei do abate. Entendo
também, embora tenha votado favoravelmente no intuito de preservar a soberania
nacional, que a decisão final sobre a responsabilidade de delegar ou não o direito de
abater é complicada.
Portanto, quero saber se esse assunto está sendo analisado pelo gabinete. E
V.Exa. respondeu essa questão com muita propriedade.
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O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX – Fundamentalmente, os
Ministérios das Relações Exteriores e da Defesa são os principais envolvidos nessa
questão. Temos pessoas que há 5 anos acompanham esse problema, pessoas que
trabalham conosco no Ministério das Relações Exteriores com uma competência
indiscutível e sempre externaram essa preocupação. Procuramos também mostrar
isso sempre que possível. Os Ministérios das Relações Exteriores e da Defesa têm
conhecimento desse fato. Cabe-nos também fazer o acompanhamento e
eventualmente chamar a atenção de todos para esses aspectos, que, às vezes, não
são muitos conhecidos. Existe uma lei americana. O Governo não pode revogá-la,
somente o Congresso americano. No entanto, existem fórmulas de se evitar a
aplicação da lei, mas são extremamente complicadas, como disse.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS PANNUNZIO – Agradeço a V.Exa. o
esclarecimento.
Sra. Presidenta, fica claro que talvez valesse a pena, numa outra ocasião,
numa reunião reservada, ter o privilégio de ouvir novamente o Ministro Jorge
Armando Félix. Tenho certeza de que S.Exa. poderia ter sido mais conclusivo em
relação àquelas dúvidas, mas entendo perfeitamente que S.Exa não pôde ser muito
preciso em relação a elas.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) – Surgem aquelas situações
em que os contrabandistas de drogas levantam vôo quando chega a polícia, porque
no ar eles são absolutamente inatingíveis. Isso acontece muitas vezes no território
nacional. Quando a polícia aparece, eles levantam vôo, porque, assim, ninguém
pode fazer nada. Essa questão é importante e deve ser discutida.
Passo a palavra ao Deputado Arlindo Chinaglia, do PT de São Paulo.
O SR. DEPUTADO ARLINDO CHINAGLIA – Sra. Presidenta e demais pares,
cumprimento nosso convidado, General Jorge Armando Félix, Ministro-Chefe do
Gabinete de Segurança Institucional. Parabenizo S.Exa. pela exposição e pelo texto.
Comuniquei ao Deputado José Thomaz Nonô que faria referência a S.Exa., porque
quando fez a observação quanto ao combate à demanda de drogas e questionou,
até gravou na voz a sua condição de promotor público, falou a respeito da proibição
das leis. E o texto diz —quero cumprimentá-lo também por isso —, de forma clara,
que a legislação está atrasada frente à política nacional de combate às drogas.
Creio, portanto, que é muito importante ver isso constar do documento, porque as
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leis mudam de acordo com as mudanças da sociedade. Talvez a única coisa que
não mude no Brasil seja o PFL, com as características próprias do partido. O PT não
se envergonha de mudar, até porque V.Exa., como estrategista militar, sabe que não
abdicamos de princípios, de objetivos, mas a tática é que, às vezes, somos
obrigados a mudar, principalmente quando se recebe um país com essa dívida
interna e as circunstâncias internacionais.
Portanto, estamos cumprindo o que dissemos na companha: honrar contratos
internacionais. E isso tem um elevado preço. Lamentavelmente, uma dívida interna
que era de cerca de 60 bilhões e passou para 800 bilhões, tem conseqüências. O
grande esforço coletivo é exatamente recuperar a credibilidade do País. Chegamos
a um momento em que nem empresas privadas conseguiram financiamento lá fora,
o que não ocorreu nem na época da chamada moratória técnica do ex-Presidente
José Sarney. Digo isso para aplaudir o esforço da sociedade de fazer deste País
uma nação justa e soberana.
Exatamente por tratar de questão de soberania, a página 15 me chamou a
atenção pelo fato de abordar a questão das atividades de Contra-Inteligência e
menciona, com especial atenção, suspeitas de atuação de células terroristas na
tríplice fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai. Lembro-me de que isso foi
divulgado, pelo menos no que pude acompanhar, pela primeira vez, como uma
observação dos norte-americanos. À época, autoridades brasileiras negaram que
houvesse essa atividade na tríplice fronteira. E quando V.Exa. abordou essa
questão, isso me chamou atenção, porque das duas, uma: ou concordamos com
aquela observação americana, e fomos lá, ou, mesmo discordando, o Governo
brasileiro, particularmente o Serviço de Contra-Inteligência, na dúvida, foi lá para
esclarecer.
Portanto, quero que V.Exa., dentro dos limites exigidos pela função, explique
se, de fato, está confirmada a suspeita de que há célula terrorista na tríplice
fronteira.
O segundo ponto diz respeito ao controle de informações, que é fundamental.
Mas tenho dúvidas quanto à eficácia. Concordo com a tese, aplaudo as iniciativas,
mas quero apontar um exemplo concreto para que V.Exa. o comente. Quando da
implantação do SIVAM, fui eu quem, pela primeira vez, levantou dúvidas quanto à
condução do processo de seleção das empresas. Como quem iria deter a
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inteligência do sistema seria uma empresa brasileira, à época, a ESCA, descobri
que ela tinha um contrato sigiloso, desde 1992, com a Raytheon, que, ao final,
ganhou o certame, e também com a representante da Raytheon no Brasil, a Líder
Taxi Aéreo. E lá está escrito com todas as letras que o objetivo era desenvolver uma
proposta para vender ao cliente, que era o Brasil. Então, na minha opinião, e
coloquei em voto em separado na CPI do SIVAM — lamentavelmente, não pude
participar, porque era Secretário do Município de São Paulo, mas cheguei a tempo
de produzir um relatório em separado —, não foram as Forças Armadas brasileiras
que inventaram a proposta, tal como foi aprovada, do SIVAM. Trata-se de um projeto
elaborado pela Raytheon e vendido ao Brasil. É a minha opinião. Quando denunciei
a ESCA por ter falsificado mais de 100 guias de recolhimento do INSS, portanto, era
uma empresa inidônea, levamos ao Presidente da República, à época. Essa
denúncia foi recebida em audiência. Demorou um tempo, mas a ESCA acabou
sendo afastada por ser inidônea, o que resultou na retomada do processo de
financiamento no Senado Federal. E já preventivamente quero dizer que, uma vez
instalada, vão ter que ser usados os equipamentos até onde isso for possível. Então,
há várias questões.
A ESCA foi substituída pela Amazontec, que, se ainda não é, será, em algum
momento, uma empresa privada, que vai deter a inteligência do sistema. Por isso
digo que não confio muito. Portanto, a pergunta é: como vocês controlam uma
empresa privada que amanhã pode ter a tentação, na sua lógica comercial, de
vender as informações? Como se faz o controle disso? Tenho curiosidade para
saber como o nosso serviço de inteligência opera isso.
Estou dando esse exemplo porque trabalhei um pouco mais no tema e
continuo com essa preocupação. Creio que a inteligência do sistema deveria ter um
controle maior do que a empresa que foi substituída no nome, mantida com os
mesmos técnicos, e sabe-se lá como isso vai evoluir.
Por exemplo, a primeira declaração do Presidente da Colômbia eleito à época
foi que ele queria estender o SIVAM para a Amazônia colombiana. Eu estive na
Venezuela e soube pelos adidos militares que também... Entre ganhar dinheiro
ampliando o sistema e manter o sigilo, perdoem-me a opinião, mas acho difícil.
Então, quero saber qual é o mecanismo.
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Finalmente, uma terceira observação. A questão da violência está-se
sofisticando a tal ponto que ex-componentes das Forças Armadas muitas vezes são
alvo de sedução por parte do narcotráfico. Eles sabem manusear armas, têm
treinamento. Eventualmente, determinada informação pode servir ao narcotráfico. O
senhor já respondeu, e bem — quero cumprimentá-lo também por isso —, que,
evidentemente, o papel das Forças Armadas é distinto deste de fazer repressão, a
não ser em situações que o senhor bem qualificou como — vamos usar aqui uma
palavra minha — emergenciais. Então, acho que é no serviço de inteligência.
E aí vem a questão das fronteiras. Feli zmente, abriram concurso para a
Polícia Federal. Há muitos anos não havia. Vão contratar, parece-me, mais 7 mil
componentes para a Polícia Federal para controlar melhor as nossas fronteiras,
porque é ali que de alguma maneira passam armas e também drogas.
Mas o que fico pensando é que enquanto não houver uma integração de fato
entre os serviços de inteligência que o Brasil puder produzir, incluindo esse que o
senhor faz, a Polícia Federal etc. e as Polícias Militares nos Estados, não haverá
sistema. Isso que a Deputada Zulaiê falou que ocorre, eu gostaria que ocorresse
bastante, mas pressuponho que seja uma raridade.
O próprio SIVAM é um grande binóculo. Ele vê, mas não temos
destacamentos, vamos chamar assim, de nenhuma natureza para chegar onde o
ilícito ocorre. Então, vemos que o avião é clandestino, que levantou vôo, mas não
temos ainda capacidade de, quando ele pousar, chegarmos lá. Só vejo essa
possibilidade se houver a integração das polícias.
E aí chego ao outro ponto, que é a pergunta mais especifica. Há corrupção
em todo lugar, e nas polícias também, com uma dimensão que assusta. O serviço
que o senhor faz, de inteligência, chega também nesse controle das más polícias?
Se não chega, não deveria chegar? Se não chegar e se houver impedimento
constitucional, eu seria favorável à mudança constitucional. Penso que, a partir de
estruturas externas às polícias militares e civis dos Estados, devemos tentar
interferir. Parto do pressuposto de que — isso serve para o PT, para o Parlamento,
para as Forças Armadas, para o seu trabalho — instituição que não tem controle
externo sempre é um risco. É difícil controlar. É difícil segurar um órgão de
inteligência para se manter nos marcos democráticos, por exemplo, e assim vai. Mas
não digo isso como crítica, digo pela experiência de vida.
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Obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) – Com a palavra o Ministro.
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX - Muito obrigado. A primeira
questão, em relação à tríplice fronteira, é exatamente a segunda interpretação.
Posso adiantar que desde 1990 o Brasil se preocupa com aquela região. Trata-se de
uma preocupação natural, porque é uma região que, efetivamente, tem todos os
ingredientes para que aconteçam as coisas que dizem que acontecem lá. Mas nós
acompanhamos — a Polícia Federal acompanha, nós temos um grupo que
acompanha — permanentemente o que acontece na tríplice fronteira.
Já tive oportunidade de receber elementos da área de inteligência dos
Estados Unidos e de Israel que afirmam que existem células terroristas, que existe
remessa de recursos para apoio a atividades terroristas. Mas nunca, vou repetir,
nunca nos deram nenhum indício de que isso efetivamente ocorra. Eles afirmam.
Nós cobramos: “Vocês têm indícios? Então, forneçam os indícios para nós”. Nunca
forneceram.
Nós temos uma preocupação muito grande em relação a isso e
acompanhamos permanentemente, como eu disse. Em áreas como o Chuí existe
um potencial de ocorrência de atividades desse tipo. Mas nunca conseguimos
constatar a existência de células terroristas. Pessoas passam por ali e, se não
houver nenhuma caracterização de atividade criminosa, as pessoas têm o direito de
ir e vir e de passar por onde quiserem. Se entram no Brasil como turistas, fazem
turismo no Brasil, e não existe nenhum, vamos dizer, pedido de prisão internacional
ou qualquer coisa assim; não podemos fazer nada, e não devemos fazer nada.
Outro aspecto é que são comunidades muito específicas. Nós temos uma
preocupação muito grande em não satanizar nenhuma coletividade, seja qual for.
Temos que ter muito cuidado, sob pena de eventualmente estarmos discriminando
um grupo social sem nenhuma razão justa, o que é absolutamente indesejável em
um País como o nosso, em uma fase como a que estamos vivendo no momento.
Repito: nós acompanhamos, recebemos sistematicamente essas informações
de que existe isso, existe aquilo, e nenhum indício nos é fornecido. Nós até hoje não
levantamos nada. Evidentemente, levantamos remessa de recursos. Mas como
caracterizar uma remessa de recurso de um cidadão nascido em outro país para,
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por exemplo, uma organização religiosa? Como caracterizar isso como apoio a
terrorismo? É difícil.
O que posso lhe dizer é isso: acompanhamos com muita cautela, com muita
atenção, mas também com muita preocupação de não criar nenhuma injustiça do
ponto de vista de grupo social.
Vamos para a segunda pergunta. Hoje, o SIPAM, que é o grande
guarda-chuva do Sistema de Vigilância da Amazônia, está localizado na Casa Civil,
talvez até por algumas dessas razões que V.Exa. mencionou. E a Casa Civil,
garanto-lhe, olha esses aspectos mencionados com muita cautela.
Nós temos a preocupação, nas chamadas áreas sensíveis, particularmente
onde entra muita tecnologia, de conseguir desenvolver tecnologia própria. Temos
até um pequeno programa, modesto, na área de proteção da informação, o qual
estamos chamando, um pouco pomposamente, de Programa Tecnológico
Autônomo. Basicamente, o intuito é, na área de criptografia, de segurança da
informação, desenvolvermos mecanismos nossos, que estejam sob nosso controle,
que permitam que nós, Governo, possamos falar com um mínimo de probabilidade
de sermos detectados, ouvidos, gravados e coisas desse tipo. Essa é uma área
também sensível, depende de esforço diferente. Está sujeita a decisão do Governo.
Mas é uma situação complicada, porque os recursos são vultosos e já foram
alocados. Fica difícil mudar o rumo. São contratos internacionais de valores, do
nosso ponto de vista de gabinete de segurança institucional, quase assustadores.
Temos uma área de competência tecnológica bastante grande dentro da
Agência Brasileira de Inteligência, um centro de pesquisa que desenvolve produtos
voltados para a segurança da informação. Essas pessoas têm competência para
acompanhar isso. Observamos com a devida cautela o que se faz. Fica delicado
caracterizar a perda do controle.
Toda vez que um sistema desse porte é desenvolvido por uma empresa
estrangeira, ela tem necessariamente a capacidade de acesso. Não podemos ser
ingênuos a ponto de imaginar que isso não pode acontecer. Irá depender da nossa
capacidade de acompanhar e verificar esses acontecimentos e da idoneidade da
firma.
Acompanhei a distância o problema do SIVAM e do SIPAM. Agora mais de
perto. Mas esse risco existe. Quando a tecnologia não é nossa e não dominamos os
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algoritmos, forçosamente ficamos sempre dependendo da ética das pessoas e da
nossa capacidade de exercer esse controle.
Com relação ao controle da atividade de inteligência, temos um sistema
brasileiro de inteligência. A cabeça do sistema é a Agência Brasileira de Inteligência.
O sistema tem um sistema consultivo, do qual eu sou o Presidente. Fizemos reunião
este ano e discutimos exatamente o primeiro ponto que V.Exa. abordou: como
institucionalizar o tráfego de informações entre os diversos órgãos do sistema. O
sistema não inclui os Estados. Apenas mediante convênio, e não conseguimos
firmar nenhum, esses Estados podem participar do Sistema Brasileiro de
Inteligência. Mas o caminho ainda é longo e precisamos aperfeiçoar, entre os
organismos do Governo Federal, essa troca de informações que ainda depende
muito do grau de confiança que as pessoas têm entre si. Queremos institucionalizar
isso. No final do mês está prevista segunda reunião em que cada um dos
integrantes do sistema irá trazer a sua proposta. Iremos, então, fechar essa
institucionalização da troca de informações.
O próximo passo será atrair os Estados para fazerem convênios conosco, de
modo que possamos ter acesso direto ao sistema de inteligência deles e
proporcionar-lhes o tipo de informação de que precisam.
Gostaria de ressaltar — V.Exa. falou em mudanças na Constituição — que
temos muitas restrições para o exercício da atividade de inteligência. Primeiro, o
efetivo da Agência Brasileira de Inteligência está em torno de 25% do desejável.
Fizemos 2 concursos. O acesso a qualquer órgão do Governo hoje se faz mediante
concurso. A evasão desses 2 concursos beirou 40%, parte em função da
remuneração e parte porque até hoje não temos efetivamente carreira de Estado
dentro da Agência Brasileira de Inteligência. Fizemos uma proposta que já passou
pela Casa Civil, foi para o Ministério do Planejamento e está retornando para a Casa
Civil. Pretendemos que a proposta seja encaminhada ao Congresso e gostaríamos
que fosse olhada com muito carinho. É absolutamente indispensável que os
servidores da Agência Brasileira sejam tratados como servidores de Estados e
tenham a mesma mentalidade deles, além de uma perspectiva de carreira e de
remuneração à altura das outras carreiras de Estado.
Um empecilho constitucional e legal, mais do que legal, é a nossa
impossibilidade de efetuar interceptação telefônica. O tema é bastante complexo.
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Imaginem uma pessoa que chega a São Paulo e que seja suspeita de terrorismo.
Temos de acompanhá-la, mas não podemos saber o que fala ao telefone, nem
mediante autorização judicial. Autorização judicial só pode ser concedida ao agente
da polícia judiciária. A ABIN não faz investigação. Legalmente estamos
impossibilitados de usar instrumento que hoje é indispensável para o
acompanhamento de determinadas situações. Não podemos sequer pedir à Polícia
Federal para fazer, porque não há processo nem caracterização de atividade
criminosa. Isso é antecipação.
Às vezes, é penoso exercer atividade de inteligência como funciona nos
outros países. Sabemos que existem razões para as restrições. Mas temos de criar
uma estrutura que tenha a confiança do Estado. É preciso que ele olhe para ela com
confiança e deposite um mínimo de autonomia a essa instituição, mantendo
permanentemente o controle externo sobre ela. Os mecanismos nós já temos.
Deputado Arlindo Chinaglia, agradeço a V.Exa. por esta oportunidade.
O SR. DEPUTADO ARLINDO CHINAGLIA – Agradeço a V.Exa. a
participação e cumprimento-o pelas respostas.
Registro que foi a primeira vez que um oficial das Forças Armadas tão
graduado quanto V.Exa. disse o que para mim sempre foi óbvio: quem produz um
equipamento, obviamente, possui mecanismos de acesso a ele. Cumprimento-o
também pela sinceridade.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) – Quero, mais vez, que estas
palavras sirvam para o futuro presente. Já tivemos aqui o General Cardoso, do
Governo Fernando Henrique Cardoso, que enfrentava as mesmas dificuldades.
V.Exa. fala exatamente dos mesmos impedimentos que já tentamos mudar no
Congresso Nacional. Há um não-entrosamento total deste órgão tão importante com
relação às polícias. Precisamos quebrar esse mecanismo. O senhor pode enviar
projeto para o Congresso Nacional para que mudemos essa situação.
Concedo a palavra ao Deputado Coronel Alves
O SR. DEPUTADO CORONEL ALVES – Sra. Presidenta, Sras. e Srs.
Deputados, Sr. Ministro, General Jorge Armando Félix, é uma satisfação revê-lo.
Muito já foi falado sobre a forma franca, simples e clara de suas respostas. Para mim
não é surpresa. Conheço um pouco de sua personalidade e sei que sempre foi
assim ao longo de sua carreira. Fico grato que os companheiros que aqui estão
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possam desfrutar das características de sua personalidade, de sua franqueza e da
clareza de seus posicionamentos.
Falou-se muito aqui sobre vários temas. Fiz pequenas anotações e procurei
ser pragmático, como sempre fui nas minhas perguntas. Peço vênia para citar
algumas situações que foram expostas, por exemplo, sobre a lei que venha
combater as drogas, os traficantes e que também trate dos usuários. E quero trazer
ao conhecimento daqueles que ainda não sabem — acredito que a maioria já sabe
— que há 15 dias, na Comissão de Segurança Pública, Combate ao Crime
Organizado e à Violência, realizamos um seminário, sob a Presidência do Deputado
Moroni Torgan, e discutimos justamente isso. Entendemos que essa é uma lei...
Aliás, existem duas leis. Uma revogou a outra e acabou ficando um arranjo que não
traz tranqüilidade para aqueles aplicadores da lei em benefício da própria sociedade.
Portanto, dentro desta ótica, já existe o anteprojeto, que foi bastante discutido
com os profissionais que trabalham, que tratam da área, discussão inclusive de
quem é usuário, como foi falado pelo Deputado José Thomaz Nonô, e isso deve ser
apresentado na chamada semana de segurança pública, que ainda vai ser marcada
pela Presidência da Casa, para ser um dos projetos que tramitará com urgência e
vai realmente aplacar essa ansiedade da sociedade.
Também quero fazer uma citação, como foi dito pelo Deputado Antonio Carlos
Pannunzio, da questão do emprego das Forças Armadas na atividade de polícia, na
atividade de segurança pública. Fico tranqüilo, porque também já conhecia seu
posicionamento quando V.Exa. afirma que é um trabalho específico de polícia a
questão de segurança pública e que eventualmente, muito eventualmente, como
V.Exa. citou e deu os exemplos no caso do Rio de Janeiro, as Forças Armadas
venham a ser aplicadas.
Entendo que não é pela sua incapacidade, seja profissional, seja de material
bélico, seja dos seus meios, mas sim pela sua própria formação profissional, repito,
como V.Exa. afirmou, que é diferente. Estamos num teatro de guerra, onde a
finalidade das Forças Armadas é isolar, abater o inimigo. Já na questão de
segurança pública é um outro cenário, é um outro teatro de operações. Que
tenhamos, então, o cuidado de quando fizermos as observações — por que as
Forças Armadas não são inclusas, especificamente o Exército brasileiro? —
tomarmos a decisão correta.
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Segurança pública é caso de polícia, sabemos disso, de aplicação, não dos
elementos que a cercam, a ausência do Estado, a falta de oportunidade de
emprego, de lazer etc., mas quem trata diretamente é caso de polícia, seja federal,
estadual, militar, civil e agora também as próprias guardas municipais, que estão
gritando pela possibilidade de terem efetivamente esse poder de polícia.
Portanto, vejo que é muito mais salutar equipar e treinar as polícias brasileiras
para que elas possam realmente desempenhar seu papel, seja a Polícia Federal,
nas fronteiras, seja as polícias, nos seus Estados. Para nós, a preocupação, por
exemplo, de mudar a temática de treinamento das Forças Armadas, dando um
enfoque para seu emprego no combate à violência, emprego na segurança pública,
fico aqui pensando... O Deputado Arlindo Chinaglia estava conosco numa viagem
que fizemos, onde nos foi dito que depois que os militares que prestam o serviço
inicial obrigatório saem, após 9 meses, são captados pelos narcotraficantes. Vamos
imaginar agora — um raio de imaginação somente — que depois de treinarmos as
Forças Armadas, dando um preparo para o conscrito ir mudando para empregá-lo na
segurança pública, ele vai obrigatoriamente ter que sair, porque o Estado não
suporta manter todos. Ele, com todo o capital de conhecimento, com os dados
adquiridos, ficará livre para ser captado pelo narcotraficante, pelo crime organizado.
Portanto, é com muita preocupação que vejo essa questão. Espero que essa idéia
não prospere nesta Casa nem em outro lugar.
Vou começar a formatar minha pergunta em relação à questão da ABIN; por
enquanto, só fiz um pequeno comentário, mas estou preocupado com o tempo, Sra.
Presidenta, sei que a senhora não tem sido muito taxativa, mas estou preocupado.
Vejo aqui na sua exposição um número bom, 13, um número interessante. Está
aqui: “No que se refere à produção de conhecimentos, em 2003, foram difundidos
174 relatórios de inteligência, analisando temas diversos, com reflexos reais e
potenciais para as políticas públicas”. Fui para a matemática, que não é meu forte,
quero confessar, e peguei 174 e dividi por 5 meses: são 34,8 relatórios por mês,
mais de um relatório por dia. Portanto, a ABIN está trabalhando, está produzindo. E
a produção desse conhecimento, adquirido através de várias formas, da busca ou da
coleta, verificamos que é a busca do aperfeiçoamento da ABIN. Mais de um relatório
por dia sobre temas diversos significa dizer que o órgão está trabalhando. E para
que esses servidores que lá estão desempenhando sua funções possam ter um
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pouco mais de tranqüilidade, nada mais justo que a sua observação no sentido de
que nós nesta Casa e no Congresso Nacional tenhamos uma preocupação com a
atividade do Estado. Quem detém o conhecimento detém o poder. E não
concebemos um Estado soberano sem que os seus serviços de inteligência possam
realmente deter o conhecimento. Isso é importantíssimo para que a Nação brasileira
possa realmente desenvolver-se com a soberania tão falada nesta Casa e em tantos
outros locais.
Portanto, estão de parabéns nossos amigos da ABIN, que produzem
bastante, o que está confirmado num documento oficial incluído na sua exposição.
Sobre minhas perguntas, faço duas. A primeira, General, que me preocupa
muito e vou dar um exemplo. Havia suspeitas, indícios, dados de que o narcotráfico
poderia estar interagindo com o crime organizado. E com a detenção do criminoso
que se encontra preso em São Paulo, confirmou-se. O Deputado Antonio Carlos
Pannunzio falou sobre isso também. Não há mais dúvida, não há mais o que falar.
Eles estão realmente interagindo, há uma correlação constante entre essas duas
pontes. A minha preocupação — e aí vem a pergunta — é se existem dados
coletados ou a busca de indícios sobre o relacionamento do narcotráfico com o
terrorismo. É uma grande preocupação que já há algum tempo venho lendo,
conversando e discutindo. Queria ouvir de V.Exa. se já existe alguma coisa sobre
isso. Já conseguiram detectar alguma coisa? Esta é a primeira pergunta.
A segunda, General, é que em conversa com integrantes do sistema de
segurança pública — e aqui me permito reservar os nomes, até para não divulgá-los
mesmo —, uma grande afirmação foi feita. O Brasil, para falar de controle e combate
ao crime organizado, precisa dispor de várias situações, entre elas, não sei
exatamente o nome, um aparelho que faz a captação da escuta telefônica — não sei
se V.Exa. já ouviu falar sobre isso — que os narcotraficantes estão utilizando dentro
da selva colombiana e não há disposição desse aparelho para o Governo brasileiro.
É um aparelho de tecnologia israelense e que custa em torno de 5 milhões de reais.
Pergunto se a ABIN ou o Gabinete da Segurança Institucional já têm conhecimento
disso. Não sei como é exatamente o nome desse aparelho, mas foi citado na
Comissão de Segurança Pública e agora aproveito para ver se existe alguma coisa.
Finalmente, encerro com a minha terceira pergunta: esses relatórios que são
produzidos, tendo a ABIN como a gestora, vamos dizer assim, do sistema nacional
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de inteligência exatamente na questão da segurança pública, são compartilhados?
Essa é uma preocupação. V.Exa. sabe que tive oportunidade de desenvolver
alguma atividade dentro da ABIN e sou oriundo da Polícia Militar do Estado do
Amapá. Nossa grande dificuldade era justamente a interação, um trabalhando para
um lado, outro trabalhando para o outro. Ninguém chega a lado nenhum. Tenho
essa experiência própria porque trabalhei nos dois órgãos, o que muitos querem
reservar, mas tenho orgulho de dizer que trabalhei na ABIN e na Polícia Militar.
Como está hoje essa questão de a ABIN ser a gestora do Sistema Nacional de
Segurança Pública? Como está isso?
São essas as minhas três perguntas.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Sr.
Ministro.
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX - Essa associação do
narcotráfico com o terrorismo já se evidenciou, mas felizmente muito longe de nós.
Na Ásia isso acontece. Aconteceu no Afeganistão, por exemplo, local mais
característico dessa associação e em outros países, fundamentalmente na Ásia.
Mas aqui, na América do Sul, acreditamos que isso ainda não tenha se manifestado.
E muito particularmente no Brasil, porque de uma certa forma o terrorismo tem
passado ao largo do Brasil — felizmente, digamos. De modo que não conseguimos
caracterizar na nossa área de influência aqui da América do Sul nenhum tipo de
associação de terrorismo/narcotráfico.
Segunda pergunta, de caráter mais técnico: esse equipamento existe, mas
existe mais de um equipamento que tem essa capacidade, mas isso não é
suficiente.
Fiz uma citação, procurando identificar as excelências que existem no Brasil,
nas universidades, e precisamos criar uma estrutura de muita competência na área
de criptologia, porque essas transmissões não são feitas em claro. Todas elas são
feitas criptografadas, são feitas com segurança. E se não conseguirmos desenvolver
um núcleo com competência para abrir essa criptografia, vamos ouvir, gravar e não
vamos entender nada, de modo que essa é uma das preocupações, uma das metas.
Pretendemos começar isso em curto prazo. Estamos apenas terminando alguns
ajustes na estrutura de pessoal da ABIN para começarmos a fazer esse trabalho
com o Centro de Pesquisa que existe na ABIN, e mais, dentro do chamado Comitê
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Gestor da Segurança da Informação, que faz parte do Conselho de Defesa e que
envolve órgãos de diversos Ministérios.
Estamos preocupados, e uma das primeiras prioridades, talvez seja realmente
a primeira, é regulamentarmos o uso da criptografia comercial, que é um trabalho
mais do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, mas estamos com um
grupo de trabalho voltado especificamente para isso, de modo que o comércio possa
disponibilizar para uso de empresas um nível de criptografia que, em havendo
necessidade, possamos abri-la. Os Estados Unidos, por exemplo, limitam em 128
bits, porque eles têm essa capacidade. A França já limita na metade, porque a
capacidade dela é menor.
Estamos preocupados em definir essas coisas e transferir essa proposta para
os Ministérios, porque isso faz parte da nossa preocupação, que vai ao encontro do
que V.Exa. falou.
O terceiro item é sobre o compartilhamento, ao qual já me referi. Tivemos
uma primeira reunião com o Conselho Consultivo do Sistema Brasileiro de
Inteligência, a segunda será agora no final do mês, quando será efetivamente a
definição dos mecanismos de troca de informações, institucionalmente, sem
depender de pessoas. E, a partir daí, pretendemos, como eu disse, procurar os
convênios com os Estados, fundamentalmente os serviços de inteligência das
Polícias, de modo que possamos integrar todos. Talvez a melhor arma preventiva
para combater o que chamamos hoje de crime organizado seja a inteligência. Sem
inteligência não chegaremos a lugar algum.
Deputado, agradeço as referências elogiosas ditadas muito mais pelo nosso
relacionamento.
Muito obrigado.
O SR. DEPUTADO CORONEL ALVES - Mas são verdadeiras.
Para concluir, Excelência, quero saber: existe o aparelho e temos o aparelho?
Isso é importante para definir, porque se trata de outro grupo de trabalho. O Governo
brasileiro dispõe desse recurso tecnológico?
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX - Não. Temos outros aparelhos,
mas esse, especificamente, não. Temos outros que permitem, mas com essa
dificuldade. Está nos faltando no momento capacidade técnica para abrir a
criptografia ou criptofonia que os outros usam. E precisamos desenvolver isso em
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curto prazo. É uma área muito difícil, complexa, existe pouca gente no Brasil que faz
isso, que se preocupa com isso e que tem competência técnica. Isso exige não
apenas conhecimento, mas exige também um certo pendor para isso, é quase um
dom de enxergar as coisas ou não enxergar, de modo que é um universo bastante
restrito de especialistas nessa área.
O SR. DEPUTADO CORONEL ALVES - Estou satisfeito. Obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Deputado
Vittorio Medioli, do PSDB de Minas Gerais.
O SR. DEPUTADO VITTORIO MEDIOLI – Ministro, procurarei ser breve,
devido à hora, ao dirigir algumas perguntas.
Na sua exposição, que nos deixou extremamente satisfeitos pelo
detalhamento, senti falta de um cuidado específico com energia nuclear, com o
tratamento de resíduos nucleares levando em consideração que a imprensa
internacional está vinculado informações sobre a procura de resíduos nucleares para
a fabricação de artefatos, de bombas que possam servir ao terrorismo — a rede Al
Qaeda é muito citada quando se trata de artefatos nucleares. O Brasil possui
resíduos nucleares e é produtor de minerais radiativos, uma área da maior
importância hoje para a segurança mundial. E o Brasil pode estar sendo hoje alvo de
investidas externas para suprimento de matéria-prima. Há alguns anos, 4 ou 5 anos,
houve matérias na imprensa relatando um contrabando no Brasil de materiais
radiativos. Essa é uma das perguntas.
A segunda pergunta se refere ao SIVAM. O Ministro disse que atualmente o
SIPAM, que engloba o SIVAM, está sob responsabilidade da Casa Civil.
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX - O SIVAM é responsabilidade
do Ministério da Defesa; o SIPAM, que é o grande guarda-chuva, é da Casa Civil
atualmente.
O SR. DEPUTADO VITTORIO MEDIOLI – Desde quando?
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX – Não sei lhe informar, mas já
há algum tempo. Acho que há uns 2 ou 3 anos o SIPAM passou à responsabilidade
da Casa Civil e o SIVAM permaneceu no Ministério da Defesa.
O SR. DEPUTADO VITTORIO MEDIOLI – V.Exa. mencionou, e entendo o
seu drama, os grampos telefônicos. A lei impede o grampo telefônico e para uma
agente de informação, que tem de abastecer a Presidência da República com
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informações precisas e preventivas para defender a segurança nacional, ser
impedido de usar esse expediente é complicado. Mas, no final, V.Exa. disse que tem
equipamentos à disposição do Governo para escutas telefônicas. Não chegou a hora
do Governo, por intermédio do Gabinete de Segurança Institucional, propor uma
regulamentação disso?
Imaginamos que isso deve acontecer. Nos 174 relatórios deste ano
produzidos pela ABIN parece que é inevitável o grampo telefônico. Isso gera
constrangimentos. Todos os Ministros negam o uso do grampo, mas, ao mesmo
tempo, têm os equipamentos e sabem até da criptologia. V.Exa. disse que captar
uma conversa não é difícil, difícil é interpretá-la, captar seu significado e traduzir.
Esta a minha terceira pergunta, saber se existe por parte do Gabinete de Segurança
Institucional alguma proposta em estudo para enviar ao Congresso Nacional
regulamentando essa atividade de extrema importância para a segurança nacional.
O SR. MINISTRO JORGE ARMANDO FÉLIX – Sobre a primeira pergunta, a
grande responsabilidade sobre a área nuclear é do Ministério da Ciência e
Tecnologia. Todos os mecanismos de controle são desenvolvidos por um
Departamento do Ministério de Ciência e Tecnologia.
Fazemos o acompanhamento da questão nuclear do ponto de vista
estratégico, como de uma série de outros temas sensíveis — área química, área
bacteriológica e área nuclear. Mas o poder de fiscalizar, de acompanhar e de propor
política na área nuclear é específico do Ministério da Ciência e Tecnologia.
A respeito dos resíduos, posso falar-lhe alguma coisa, porque vim de uma
área técnica, fui Secretário de Ciência e Tecnologia do Exército durante dois anos e
afirmo que esse é um problema mundial. O resíduo nuclear não tem solução até
hoje. É uma carga que os países com usinas e reatores nucleares carregam porque
ainda não tem solução. Tem que colocar em algum lugar e ninguém quer resíduo
nuclear perto de si. É um grande problema ainda não resolvido.
Realmente produzimos resíduos e temos muitos minérios, mas os controles
internacionais, em função de acordos assinados pelo Brasil, são extremamente
rígidos. Permanentemente somos monitorados, como todas as nações que
assinaram esses acordos. É um monitoramento detalhado e permanente. Estamos
sempre prestando contas a um controle cientifico muito eficiente em relação ao que
é produzido por cada usina. E cada país signatário desses acordos tem obrigação
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de sempre prestar contas. De modo que não vejo risco de, voluntária ou
involuntariamente, colaboramos para abastecer um grupo terrorista com esse tipo de
material.
Quanto à intercepção das comunicações, a referência feita tanto pelo
Deputado quanto por mim é em relação à comunicação de rádio em alta freqüência.
É um receptor comum de rádio em que ouvimos o que as pessoas falam, mas,
eventualmente, ouvimos e não entendemos nada. É a esse tipo de equipamento que
o Deputado se referiu.
Posso dizer-lhe que não é inevitável, é perfeitamente evitável. Temos uma
preocupação muito grande para que a Agência Brasileira de Inteligência, até pela
história recente, não se envolva em atividades desse tipo, que siga rigorosamente o
que a lei prescreve, com todos os prejuízos que isso possa causar para a atividade,
com todas as deficiências que procuramos suprir de outras formas, mas lhe garanto
que a direção da ABIN faz o possível e o impossível para que isso não ocorra,
porque caracterizaria um comprometimento absolutamente indesejável em um
momento em que estamos exatamente querendo valorizar a atividade de
inteligência, dar a ela a característica de uma atividade de Estado, criar uma imagem
positiva junto à opinião pública e dar os instrumentos necessários para que ela
possa atuar, até mesmo esse, se for possível.
Essa proposta de regulamentação tem um longo caminho. Inicialmente
precisamos convencer setores dentro do Governo, para depois propor algum tipo de
projeto de lei. E será um caminho longo, porque significa uma modificação na
Constituição Federal. A Constituição só permite a interceptação telefônica para fins
de acompanhamento de atividades criminosas pelas autoridades que conduzem o
inquérito com autorização do Judiciário. Nós entendemos que é uma precaução
importante. Sabemos que isso é feito veladamente ou menos veladamente, por isso
entendemos a preocupação dos 3 Poderes com esse tipo de atuação.
Hoje há mecanismos que permitem um controle muito mais eficiente. Por
exemplo, é possível centralizar essa escuta em 5 ou 6 centros, uma para cada
operadora. Talvez até pudéssemos juntar todos em Brasília, tecnicamente isso é
possível. É possível exercer um controle rigoroso sobre quem acessou, quando
acessou, com que senha, só não se terá acesso, evidentemente, à informação, que
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só interessa a quem foi autorizado. De modo que existe hoje a possibilidade técnica
de exercer um controle muito mais eficiente sobre isso.
Evidentemente, carece de regulamentação da ANATEL, carece de aquisição
desse equipamento, que não é muito caro. Aqui mesmo na Secretaria de Segurança
do Distrito Federal existe um módulo adquirido e que faz todo esse controle com
muita eficiência — já tive oportunidade de conhecer. Hoje é possível a sociedade
exercer um controle muito mais efetivo sobre isso. Precisa de regulamentação e de
decisão e investimento para que isso seja feito. Mas até conseguirmos isso para a
Agência Brasileira de Inteligência, com todo o meu otimismo, ainda temos um
caminho relativamente longo e difícil pela frente. Mas, se Deus quiser, vamos
conseguir.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) – Ministro, sabemos da
responsabilidade de V.Exa. à frente de um Gabinete tão importante. Nesta Casa
temos alguns Deputados dedicados à área de segurança pública. Hoje V.Exa. nos
deu uma aula muito importante ao mencionar duas questões de extrema
necessidade, a questão das Forças Armadas e da segurança pública dos Estados.
V.Exa. deixou transparecer com muita habilidade, diga-se de passagem, que é
política a questão das mudanças de formação e mudança de estratégia. Essas duas
observações a respeito das Forças Armadas para que também entrem na briga
contra o crime organizado é uma questão eminentemente política que mais tarde
teremos de enfrentar.
Outra questão que V.Exa. abordou muitíssimo bem: a diferença entre uma
coisa e outra. No Exército a formação militar é para o combate, é diferente, é para
usar o máximo da força. E na área de segurança pública deve-se usar o mínimo da
força. Estamos tentando modificar a formação das Polícias Estaduais. Portanto,
V.Exa. deu aquilo que eu mais queria nessa sua constatação.
Sei também da importância do seu papel no Governo Federal. Em anos
anteriores — há aqui alguns Deputados de mandatos anteriores —, outro General,
na mesma função de V.Exa., tentou muitas vezes mas não conseguiu. Nós
mudamos, e considero muito boa a observação do Deputado Arlindo Chinaglia
quando diz que o PT mudou. Ótimo! Eu quero mudanças, mudanças para melhor.
V.Exa. fez com que pudéssemos hoje ter esperança. V.Exa. hoje nos fez
pensar que vamos ter chance, sim, de mudar; e mudar para melhor. Pela sua
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importância na segurança pública brasileira e no que diz respeito a tudo o que é
segurança do Estado e da sociedade, um cargo dificílimo, uma função dificílima,
temos a convicção de que V.Exa. muitas vezes não pode expressar-se com a sua
propensão à realidade e sinceridade. Percebemos que há um limite, mas ficamos
muito contentes. Agradecemos sua explanação e a possibilidade de termos outros
contatos, pois V.Exa. deixou claro que este é o primeiro de outros possíveis
contatos. Estamos passando por um momento muito importante. V.Exa. será o
grande propulsor dessas mudanças. Espero que V.Exa. esteja disposto a fazer
essas mudanças na segurança pública e institucional no Brasil.
Agradeço a todos a presença e convoco os Srs. Deputados para reunião
ordinária a realizar-se amanhã, quinta-feira, dia 5 de junho, às 10h, neste mesmo
plenário.
Está encerrada a sessão.
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