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articula~aa entre as tematicas desenvolvimento rural,
, u,;te"tabilidade e ordenamento territorialtraz uma
&bl~rdlaqem multidimensional e interdisciplinar sobre
que permitem novas formas de reflexao sobre os
~an'inl'os do desenvolvimento levando em conta a
~ u,!stiio da sustentabilidade nei senti do mais amplo do
bem como do ordenamento territorial como
~strategiia inclusiva e de organiza~ao racional da
,oc:iedlade, Estas tematicas sao objeto de estudo central
muitos,dos pesquisadores que assinam os artigos
compiiem este volume, Ao trazer abordagens
lnt,erc,on<!ctlld~,s destas tematicas, a publica~ao procura
' st i,mu·lar a sistematiza~ao com 0 proposito de
!XE,lor'aciio e apropria~ao da combina~ao dos
ion,hecilt,entos que, se tomados separadamente"nao sao
iap,aZl!s de abarcar a logica das suas inter-rela~iies,
forma, ainda que relacionados a realidade
,ocioe,co"o~nic,a, fisi,ca e tecnica de Brasil, Espanha e
~or'tuclal. os traba,lhos apresentados nessa edi~ao
, bl)rdam remas que ultrapassam fronteiras nacionais, a "
que focalizam questiies amplas e abrangentes
iehnil)nclda,s as formas de organizalao do uso,da terra
referencia para 0 desenvolvimento sustentavel.
DESE VO-LV'IMENTO RURAL, SUST NTABILIDADE E ORD AMENTO TERRITORIAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DE VJ(;OSA
Reitara: Nilda de Fatima Ferrei ra Soares
CE NTRO DE CIEN CIAS AG RARIAS
Diretor: Sergio H. Brommonschenkel
DEPARTAME NTO DE ECONOMIA RURAL
Chefe: Bricio dos Sa ntos Reis
© 2011, Programa de Pos-G radua,ao em Extensao Rural
Universidade Federa l de Vi~osa
Impressao:
Grafica Suprema
Tiragem: 1.000 exemplares
Capa, projeto grilfico e diag ra ma~ao;
Carlos Joaquim Einloft
Pedidos:
www.assentamentos.com.br
Ficha cataJografica pre parada peJa Se~ao de CataJoga~ao
e Classifica~ao da Biblioteca Central da UFV
Desenvolvi mento rura l, sustentabilidade e ordenamento territoria l /Jose Ambrosio Ferreira Neto, Carlos Joaqu im Einloft, Renata Luiz Gon<;alves. - Visconde do Rio Branco, MG: Suprema, 2011.
284p. ; 23cm .
Inclui bibliografia.
ISBN: 978.85.60249.99-2
1. Desenvo lvimento rural. 2. RecurSDS natura is. 3. Sistemas de infor
ma~ao geografica. I. Ferreira Neto, Jose Ambrosio, 1963-. II Einloft, Carlos
Joaquim, 1974-. III. Gon~a lves, Renato Lu iz, 1981-. IV. Un iversidade Fede
ral de Vic;osa. Departamento de Economia Rura l.
COD 22. ed. 307.1412
lODOS as DIREITOS RESERVADOS E proibida a reprodu!;.3o, total ou parcial, de qualquer forma ou
por qualquer meio. A vio la~ao dos direitos do au tor (Lei n!! 9.610/98) e crime estabelecido pelo art. 184 do C6digo Penal.
Desenvolvlmen to rural, Sustentabilidade e Ordenamento territorial
Dinamica e servi~os da paisagem no Nordeste de Portugal
RESUMO
Joao C. Azevedo
Joao P. Castro
Helena Pinheiro
Cesa r Moreira
Simone Magalhaes
Carlos Loureiro
Paulo M. Fernand es
Neste trabalho sao abordados as se rv i ~os de ecossistema relevantes a escala da pai
sagem num contexto de tra nsformac;ao do territ6r io. 0 principa l objetivo e avaliar as
efeitos potenciais das aJterac;oes da paisagem no servic;o de regulac;ao de pe rturbac;oes
(fogo) proporc ionado pel 05 sistemas ecolagicos na regiao do Nordeste de Portugal (Tras
os-Montes). Discute-se a co nceito de se rvic;o de ecoss istema explorando as aspetos que
mais co ntribu iram pa ra a popul arizac;aa desta abordagem e para a sua aplicaC;ao em
politicas e prilticas de gestao e conservac;ao de ecoss istemas e paisagens. Sao desta
cados os servic;os cujo enquadramento e exclusivo au apenas integralmente abordavel
a escala da paisagem, aqui designados par servic;os de paisagem, nomeadamente as
servic;os de regu lac;ao do fogo. Descrevem-se os processos de alterac;ao da paisagem em
curso na regiao do Nordeste de Portugal com base nos casas das freguesias de Franc;a e
Deilao onde nos ultimos 50 anos se verifica u uma reduc;ao acentuada da area agricola
e uma expansao das areas fio restai s, em bora com efeitos opostos na estrutura dessas
paisagens. Anal isa-se, neste contexto, a forma como estas a ltera~6es afetam a regulac;ao
do fogo com base em resultados de t rabalhos de modelac;ao e sirnu lac;ao do comporta
menta do fogo conduzidos nas mesmas freguesias. Verificou-se que a pa isagem tende
a acumular e a aumentar a conti nuidade espacial de combustivel ao longo do tempo a
que e correspond ida pel a aumento do ri sco de incendio na paisagem, favo recendo a
ocorrencia de fogos de maior intens idade em areas ma is extensas. No fi nal, discute-se a
pape l da gestio em pa isagens cultu ra is em rapida t ra nsforma<;aa e no fornecimento de
servic;os, nomeadamente de paisagem.
1. INTRODU<;:AO
Servic;os de ecossistema sa o os benefic ios que as socied ades obtem dos ecoss istemas
atraves de fun~6es ou processos parti cu lares a eles associ ados (Costanza et aI., 1997;
Hassan et al., 2005). Trata-se de um conceito Simp les e intuitivo mas com imp licac;6es
signi ficativas na abordagem aos sistemas naturais e sem i-naturals e na definic;ao de poli
ti cas ambientais, de gestao de recursos, conservac;ao da biodiversidade e ordenamento ~';-;;,;.---------------------
158
Dmamica e servl~os da paisagem no Nordeste de Portuga l
do territaria (de Groot, 1987). A ideia de servi,o (bens e servi,os, nalguma tipologias)
esta intima mente ligada ao conceito de valor e essa e, efetivamente, a origem e a jus
ti ficac;ao para a seu desenvolvimento. Os serv i~os de ecossistema tem a sua origem na
economia eco logica, ambiental ou dos recursos natu ra is onde a va lorat;,:ao da natureza
(e dos seus servi~os) e urn componente central. 0 co nce ito de se rvic;a de ecassistema
desenvolve-se a parti r de meados dos anos 60 com urn cresci menta exponencial nas
decadas mais recen tes (de Groot et aI., 2002). Em 1997 foi apresentada uma estimanva
do valor e do capital natural dos ecossistemas a esca la mundial (Costanza et aI., 1997) e
multi plicam-se esfor~os para a avaliac;ao, va lo ra~ao e mon itoriza<;ao de urn numero cres
cente de servic;os e dos ecossistemas que os gera m (Pe reira et aI., 2009) . A abordagem
aoS ecossistemas basea da nos se us servic;os tern atu al mente como proposito principa l a
con duc;ao de analises economicas comparativas au outras.
A classificaC;ao dos servic;os tem como papel fac ilitar a valorac;ao e monito riza~ao dos
ecossistemas com base na discretizac;ao das fu nc;6es e processos particulares dos ecos
sistemas que, indlvidualmente au em conj unro, sao responsaveis pela oferta de bens
ou se rvi~os. Costanza et al. (1997) util izou na sua anal ise de va lor e capital natura l dos
ecossistemas uma ti pologia si mplifi cada de bens e servic;os com base em 17 fu n~6es . de
Groot et al. (2002) expandiu 0 numero de fu nc;5es para 23, repa rtidas par 4 classes: re
gulac;ao, hab itat, produc;ao e informac;ao. Os servic;os resultam de processos eco16gicos
e componentes particulares dos ecossistemas, classificados de acordo com fu n~6es. A
tipologia do M illenium Ecosystem Assessment (MEA) e, porem a mais genera lizada. Nes
ta, os servic;os de ecossistema sao organ izados em servic;os de suporte, de prod w;ao e de
regu l a~ao e ainda se rvi~os culturais (Hassan et aI., 200S; Pereira et aI., 2009). Os se rvic;os
de su porte dizem respe ita aos se rvic;os dos ecossistemas necessa rios a oferta dos res tan
tes se rvic;os e incluem processos base como a form ac;ao de so lo, ci rculac;:ao de nutrien
tes e suporte de biodiversidade, entre outros. Os servic;os de produc;ao di zem respeito
a produc;ao de bens como al imentos, agua, madeira, lenha, fibras, cogumelos, plantas
med ici nais ou outros. Os servic;os de regu lac;ao incluem as beneficios resultantes dos
processos de regulac;ao desempenhados pelos ecossistemas, nomeadamente da com
posi<;ao da atmosfera, do clima, da qual idade e regularidade da agua, de perturba,6es
e ca tastrofes, entre outros. Os servic;os cu Jtu rais sao os benefic ios nao materiais obtidos
dos ecossistemas in cl uindo atividades de recreio e ed u ca~ao bem como de apreciaC;ao
estetica e emocionais proporcionadas par esses ecossistemas.
Uma abordagem aos sistemas naturais e semi-natu ra is tendo como base os servic;os
ce ecossistema apresenta uma serie de vantagens em relac;ao a outras, sobre tudo de
ordem pratica, que pe rmitem explicar 0 sucesso do usa destes se rvi~os em va l o ra~ao,
gestao e mon itor izac;ao dos ecossis temas. Em prime iro lugar, pe rmite atribu ir va lor aos
ecossistemas e aos seus servic;os. Qualque r ecoss isterna, mesmo nao produzindo bens
com va lor de mercado, tern va lor que res ulta do valor dos servic;os que proporciona. Essa
definic;ao e fe ita com base nas necessidades e expectativas das sociedades humanas e
nao em conceitos exotericos, ambiguos e de difici l concec;ao pDr parte da sociedade em
159
-Desenvolvimento rural. Sustentabili dade e Ord enamento territorial
geral mas tambem de decisores, planeadores e gestores de recursos naturais. E urn con
ceito totalmente antropocentrico e por isso fac ilmente compreens fve l pela sociedade 0
que faci li ta a comunicac;ao entre decisores, gestores, produtores e utilizadores dcs servi
<;:05, melhora ndo 0 re lacionamento entre ambos, 0 que e decisivo para a implementat;ao
de programas de gestao sustentavel dcs recursos. Dutra consequencia relevante resul ta
do facto de tal abordagem pressupor uma concer;ao e analise holfstica dcs ecossistemas
de acordo com a qual as beneficios obtidos pelas sociedades dependern da existencia
do ecossistema como urn todD (superior a soma das partes que 0 comp6e) e do qual
nao podem ser dissociados, apesar de, para efeitos de analise, se recor rer a disseca!,;ao
de fun~6es, processos e servit;:os. Oessa forma, torna-se mais natural e, eventualmente,
mais efetivo, suportar em termos eticos, socials e econo micos a gestao sustentada dos
ecossistemas e a conservac;:ao da biod iversidade. Torna tambem mais concreta a avalia
~ao do estado dos ecossistemas e dos efeitos da sua degrada~ao nas sociedades a partir
dos servi~os prestados e do seu valor. Os serv i~os de ecossistema sao atualmente uma
area de investiga~ao e desenvolvimento em rapida expansao e a adesao aos conceitos
e processos de avalia~ao dos servi!,;os (Millenium Ecosystem Assessment, por exemplo)
por parte tanto da comunidade cientifi ca, como das QNGs, das instituir;6es governamen
tais e da industria (f1orestat nomeadamente) tern side massiva.
2. SERV I<;:OS DE PAISAGEM - 0 CASO DA REGUlA<;:AO DO FOGO
A escala da pa isagem esta frequentemente presente na conceptualiza~ao de servir;os
de ecossistema. Determinadas funr;6es e processos responsaveis pela oferta de servir;os
particu lares sao apenas concebfveis considerando uma escala espacial mais ampla e ter
ritorios ecologicamente heterogeneos. Urn caso evidente e 0 do servir;o cu ltural de apre
cia~ao estetica de uma paisagem que depende de uma area consideravel e heterogenea,
pelo menos em relac;:ao a um fator ambiental, para a sua oferta. Os processos e servh;:os
hidralegicos Ipor exemplo, pradu,ao de agua, regula,ao da qualidade e da regularidade
da agua e conservat;ao do solo) sao abordados necessa ria mente a escala do ecossistema
mas sao apenas integralmente explicados e, por conseguinte, tratados como servic;:os, con
siderando 0 resu ltado desses processos ao nfvel de bacias hidrograficas, de var ias ordens,
onde habitual mente varios ecossistemas interagem. Qutros servic;:os de ecossistema que
dependem da escala da paisagem sao os servic;:os de regula!,;ao de perturbac;:oes. Embora
os processos responsaveis pela regulat;:ao de perturbac;:6es possam ser analisados a escala
do ecossistema, eles dependem de processos que ocorrem a escalas espaciais mais am
plas que inc!uem areas heterogeneas, habitu al mente designadas par paisagens (Forman,
1995). Par esse motiv~, a esca la da paisagem e essen cia I para abordar a regulat;:ao de pro
cessos como cheias, pragas florestais ou fogo (Coulson and Tchakerian, 2011).
Apesa r da esca la e do conceito de paisagem estarem presentes na ana lise dos servi
c;:os de ecossistema, eta raramente e considerada de forma implfcita . Algumas excec;:6es
recent es tem vindo a destaca r a papel das paisagens enquanto sistemas na abordagem
160
DiniHntca e servi<;os dJ paisagem no Nordest e de Portugal
de processos, funt;:6es, servit;:os e valor. A paisagem e a entidade natural de integrac;:ao
de aspetos biofisicos e socioeconomicos e, por esse motiv~, a sistema a considerar em
planeamento e gestao do territer io IMatthews and Selman, 2006; Selman et aI., 2006;
5wanwick, 2009). A paisagem apresenta condi t;:6es para assegurar 0 papel de conceito/
esca!a uniftcadora de interesses de especial istas de d iversas areas cientiftcas e proprie
tarios e/ou uti lizadores na definic;:ao de cenarios e politicas de desenvolvimento multi
funeional a eseala loeallTermorshuizen and Opdam, 2009; Willemen et aI., 2010).
Considera -se frequentemente que a paisagem tem um papel determinante na regu
la,ao do regime do fogo, prestando dessa forma um servi,o Ibenefieio) a comunidade
Ide Guenn i et aI., 2005). A dimensao da s areas cons umidas par urn fogo, a periodieida
de com que ocorre e a sua intensidade (Iibertac;:ao de energia) ou severidade (impacto
ecologico) deftnem a reg ime do fogo. 0 regime do fogo, e por conseguinte a sua regu
la~ao, esta relacionado com a combustibilidade de cada ecossistema particular, funt;:ao
da carga e arranjo estrutural do combustivel, mas em grande medida com a composic;:ao
(tipos e proport;:6es dos ecossistemas presentes) e configurac;:ao da paisagem (numeros,
dimensoes, formas e arranjo espacial desses ecossistemas) que afetam a comportamen
to espacial do fogo. Q efeito da estrutura da paisagem no fogo e tao importante que a
modelac;:ao do seu comportamento considera necessaria mente esta perspetiva (FARSITE
e FlamMap, por exemplo; ver detalhes ad iante). 0 fogo, por seu lado, altera a eompo
si,ao e configura,ao da paisagem IViedma et aI., 2006; Moreira et aI., 2011) . Paisagens
humanizadas (culturais) apresentam um padrao espadal de usos do solo muito diversi
fi cado e de baixa resolut;:ao que cond iciona a progressao do fogo (Figura 1). Por outro
lado, paisagens cultura is sao caracter izadas par elevados numeros de ign ic;:6es. Contudo,
a dimensao das areas ardidas e frequentemente pequena, em media, dadas as condi
~5es da paisagem para a ocorrencia de fogos de grande escala serem limitadas.
Alterac;::6es na paisagem podem resultar na modificac;:ao do regime de fogo com efei
tos nos servic;:os prestados (Moreira et ai., 2011) . As alterac;:6es em curso nas paisagens
de regi6es de montanha em Portugal tem efeitos potencia is nesses servil.;os, nomeada
mente ao nivel da biodiversidade, do valor cenico da paisagem e da regulal.;ao de per
turba,6es IAguiar et aI. , 2009). 0 servi,o de regu la,ao do fogo podera ser severa mente
afetado nessas pa isagens. Considerando, adicionalmente, os efeitos potenciais das al
tera,6es climaticas Imodifica,6es nos padr6es de precipita,ao e de temperatura), as
transforma<;oes do uso e coberto do solo em curso poderao ter efeitos muito re levantes
neste servi,o Ide Guenni et aI., 2005).
3_ AlTE RA<;:AO DA PAISAG EM EM TRAs-oS-M ONTES
Na reg iao do Nordeste Transmontano, que corresponde, grosse modo, ao distrito de
Braganc;::a, tem-se observado varios epis6dios de emigrac;:ao desde a inicio do Seculo xx.
Emigra c;:ao massiva para 0 Brasil entre 1900 e 1930 e para Franc;::a nos finais dos anos 50,
a par de migrac;::6es para as ex-col6nias portuguesas em Africa, causa ram uma redU(;ao
161
Desenvo lvimento rural, Su stentabil idade e Ordenamento terri t or ial
Figura 1. Em pa isagens rurais a complexidade do padrao e da dinamica interna afetam 0 comportamento do fogo e 0 seu regime. Sao Juliao de Palacios, Bragan~a, Portugal.
significativa na popular;ao local, principalmente entre as gerar;6es maisjovens. As causas
deste abandono sao diversas estando geralmente associadas ao subdesenvolvimento
desta regiao do interior, a insustentabilidade do aumento da popular;ao desde finais do
seculo XIX conducente a redur;ao da produtividade e degradar;ao dos sistemas natura is
(Aguiar et aI., 2009) e ao apelo das economias em rapido crescimento do Novo Mundo
e do Velho Continente no pas-guerra. Eventos como a f1orestar;ao dos baldios 1 a partir
dos anos 30 terao acelerado estes processos demograficos. A escassez de solos agr fcolas
de qualidade, 0 acidentado do terreno e os reduzidos perfodos de crescimento das cul
turas derivados do clima impediram a industrializar;ao da agricultura contribuindo para
o despovoamento da regiao. Mais recentemente, fluxos internos para 0 litoral, onde se
situam as principais centros urbanos, industriais e comerciais do pais, e do meio rural
para os centros urbanos da regiao, onde a oferta de trabalho e condir;6es de vida e, ape
sar de limitada, maior, aceleraram a processo geral de abandono.
No infcio do Seculo XXI os indices demograticos apontam para uma muito reduzida
densidade populacional e elevado envelhecimento das popular;6es rurais residen tes no
Nordeste (INE, 2011). Ao despovoamento correspondeu 0 abandono da atividade agr;-
1 Baldios sao areas comunitarias geridas localmente e com expressao significativa nas montanhas do Norte de
Portugal. 'i';4~."': ----------------------
162
Dinamica e servi~os da paisagem no Nordeste de Portugal
cola, com infcio nas areas marginais, e a substituic;ao das culturas temporarias por cultu
ras permanentes. Estas alterac;6es, com efeitos ma is marcados na paisagem nos ultimos
60 anos, afetam 0 seu padrao e funcionamento com efeitos potenciais sabre os servir;os
de ecossistema e paisagem.
A evoluc;ao da paisagem na regiao do Nordeste de Portuga l encontra-se estudada de
forma detalhada nas fregues ias de Fran,a (Moreira et aI., 2008; Azevedo et aI., 2011)
e Deilao (Moreira et aI. , 2008; Pinheiro, 2009; Magalhaes, 2011; Pi nheiro et aI., 2011)
(Figura 2). Fran,a (5700ha) e uma fregues ia tipicamente de montanha com vastas areas
a elevada altitude (acima de 1000m; maximo 1481m) e vales profundos e encaixados.
A precipitac;ao med ia anual e superior a 1200mm (maximo 1600mm) e a temperatura
media anual infe rior a 8QC. Nesta freguesia dominam as cond ic;6es bioftsicas do macic;o
montanhoso da Serra de Montesinho, fortemente condicionantes da atividade agrfcola
(solos escassos e dispersos, relevo compJexo, condic;6es cl imaticas extremas e perfodo
de crescimento vegetativo muito curto). A populaC;ao, repartida par 3 nucleos urbanos, e
de 239 habitantes (4.2 hab./km ' ) (INE, 2011). Esta fregues ia tem vindo a perder popu la
,ao desde 1960 quando registava 834 residentes. Na ultima decada (2001-2011) perdeu
36 habitantes (13%) (INE, 2011) .
A freguesia de Deilao (4200ha) loca liza-se numa regiao planaltica entre os 600 e os
900m (maximo 958m) de altitude de relevo ondu lado intercalado par vales encaixados.
A precipitar;ao media anual e de 732m m e a temperatura media anual de 12,2°C. Em
Deilao as condic;6es do relevo, dos solos e do clima sao menDs extremas que em Franc;a,
apesar de marcadamente continenta is . Nos tres nucleos urbanos que constituem a fre
guesia, residem 168 habitantes (4 hab./km2). menos 51 hab itantes que em 2001 (23%)
(INE, 2011). As duas freguesias integram 0 Parque Natu ra l de Montesinho (PNM) e a
Rede Natura 2000 (Uniao Europeia) (Figura 2).
"
Freguesia de Fran~a
\
, o
Freguesia de Deiliio
" / " J\
Figura 2. Localiza~ao das freguesias de Fran~a e Deilao em Portugal. A area sombreada representa 0 Sitio Montesinho/Nogueira (PTCON0002) da Rede Natura 2000.
163
--Desenvolv imento rural, Sustentabilidade e Qrdenamento terr itoria l
o estuda das altera,6es do usa do solo entre 1958 e 2005/06, com base em fa
tointerpreta!,;ao de fotografia aerea historica e atual, revelou altera~5e5 significativas
na composic;ao e configurac;ao da paisagem destas freguesias. Observou-se em ambos
as cases urn decrescimo acentuado da area agricola no perfodo em estudo (Figura
3). Em Fran,a esta classe passou de 1174ha (22% da fregues ia) em 1958 pa ra 260ha
(5%) em 2005 (redu,ao de 77%). A estas altera,6es corresponde uma taxa de aban
dono de 19,5ha/ano. Em Deilao a area agricola decresceu de 2228ha (53% da area da
freguesia) pa ra 1525ha (37%) no mesmo periodo (redu,ao de 32%; 14,6 ha/ano) . As
fiarestas aumentaram de expressao. No casa de Fran,a, de 741ha (14% da freguesia)
em 1958 para 1118ha (21%) em 2005 e em Deilao de 33ha em 1958 para 1354ha em
2006 (32% da area da freguesia) apesar de se ter observado urn maximo absoluto em
1992 com 1635ha de floresta. As areas de mates aumentaram ligeiramente em Fran!,;a
(de 47% para 52.5% da freguesia) e decresceram de forma marcada em Deilao (46%
para 30%).
Em Fran<;a houve urna te ndencia para a substitui<;ao das areas agrfcolas par mates
nurn curto es pa<;o de tempo. As flore stac;oes fcram feitas sobretudo em areas de matos
exceto no perlodo mais recente em que ocuparam tam bem areas agricolas. Transi~oes
entre areas de matos e f10resta foram muito irregulares devido a ocorrencia de fogos e
posterior refloresta~ao. Em Deilao as areas agricolas abandonadas foram ocupadas por
matos au par florestas. As florestas expandiram-se, no entanta, sabretudo a custa das
areas de matos. As flaresta<;:oes na area tiveram lugar principalmente entre 1980 e 1992
e entre 1992 e 2006.
As propor<;:6es das grandes classes de usa e coberto do solo na paisagem variaram
de forma distinta nas duas freguesias. Em Fran<;:a, a paisagem fai dominada por mates
desde 0 infcio do periodo em analise veriftcando-se mesmo um refor~o no final desse pe
riodo. Com a quase desaparecimento da agricultura e aumento das f1orestas, a pa isagem
e atualmente ocupada sobretudo par areas de matas e florestas que representam urn
tota l de 73% da area da freguesia. No caso de Deilao, a desequilibrio verificado em 1958
foi anulado observando-se em 2006 urn equi libria das tres principais classes (F igura 3).
A analise da configura~ao baseada em metricas (Tabela 1) indica uma redu<;:aa da
heterageneidade da paisagem em Fra n-;a e urn aumento em Deilao ao lango do periodo
estudado. Em Fran~a decresceu 0 numero de manchas e a metrica LP! (percenta gem da
paisagem ocupada pela mancha de maior dimensao entre tadas as classes de uso do
solo). As metricas de or la e forma das manchas apresentaram va\ores iniclais e finais
praticamente iguais apesar da forte varia<;:ao observada entre 1958 e 1993, periodo de
marcada transi<;:ao de areas agricolas para matos. A diversidade e equitabilidade de
cresceram. Metricas calculadas ao nivel das classes individuais (nao apresentadas neste
trabalho) indicaram que fiorestas e areas de matos se tornaram mais agregadas criando
menos unidades mas de maior dimensao enquanto as areas de agricultura se tornaram
muito fragmentadas e localizadas nas proximidades de areas urbanas e solos mais fe- rteis
(Azevedo et aI., 2011). 1;r~;;.;r. - ------ - --- - ------ - - --
164
Dinamica e servi1;os da paisagem no Nordeste de Portugal
60
• • • SO
• •
40 Franl;a
~ - ..... - Area Agricola
• 30 e • Area de Malos
-< .. . ... . . Area Floreslal
20 ... ---- --.. ...•. •.. 10
-...
0 1950 1960 1970 1960 1990 2000 2010
Ano
60
50 . " " • -..--,.-- ---- .-
40 --~.- .:t.. - - -_- - - -. Deilao
C • . ..... ..• - -- - Area Agricola
" 30 -~
• • Area de Matos .< . .. • . . Area Florestal ., ' •
20
10 .,'
o -.. '
1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010
Ano
Figura 3. Va ria(,:ao das prineipais classes de uso/ coberto do solo entre 1958 e 2005/ 6 nas freguesias de Franr;a e Deilao. Adaptado de Azevedo et al. (2011) e Pinheiro (2009) .
Em Deilao abservou-se um au mente nos indices de diversidade e equitabilidade
(Tabela 1). Observou-se tambem urn aumento acentuado do numero de manchas, da
extensao de arias e a dimjnui~ao de LPI. As areas floresta l e de matos aumentaram em
nurnero de manchas enquanta que na area agricola se registou urn dirninui-;ao. Aumen
tou ainda a area media das manchas e as orlas da classe floresta l diminuindo no caso da
classe agricola e matos. 0 Indice LPI decresceu acentuadam ente na area agricola e de
matos e aumentou na area de floresta.
As altera<;:6es registadas em Fran<;:a estao em concordancia com as tend€mcias ob
servadas noutras partes da Europa (Zomeni et aI., 2008). Par seu lado, as altera,6es
165
po
Desenvolvtmeoto rural, Suste nlabilidade e Ordena mento terri to rial
em curso em Dei lao tern sido observadas em pa isagens inicialmente simplificadas par
dominancia da atividade agricola (Aranzabal et aI. , 2008).
4. EFEITOS DA AlTERA<;:AO DA PAISAGEM NOS SE RVI<;:OS DE REG Ul A<;:AO DO FOGO
o se rv i ~o de regulac,:ao de perturbac;5es como 0 fogo e essencialmente urn servic;o da
paisage m. A al te rac;ao da composic,:ao e configura c;ao da paisa gem, atraves da alterac;ao de
condi c;oes de combustibilidade das unidades que a comp5e e das re lar;,:5es espaciais entre
essas unidades, afeta 0 comportamento do fogo . as efe itos da alterac;ao da paisagem no
com portamento potencial do fogo fcram estudados nas freguesias de Franc;a (Azevedo et
aI., 2011) e Deilao (Magalh aes, 2011) com recurso a modela,ao e simula,ao com base nas
cond i,oes do coberto vegetal nas duas areas entre 1958 e 2005/06. Fixando as parame
tros meteoro16gicos e do terreno entre datas foi possivel avaliar 0 efeito da alterac;:a o da
composil;ao e configural;ao da paisagem na dimensao das areas ardidas e na intensidade
potencia l do fogo ao longo do periodo no qual se estudaram as alteral;oes na paisagem.
Ta bela 1. Metricas da paisagem avali adas entre 1958 e 2005/6 pa ra as freguesias de Fra n~a e Deilao com base numa cla ss ifica~ao generica do uso e coberto do solo. Metricas caJculadas com FRAGSTATS (McGariga l and Marks, 1995). Adaptado de Azevedo et al. (2011) e Pinheiro (2009).
Ano 1958 1968 1978 1992-3 2005·6
Freguesia de Franr;a
Numero de M anchas (numero) 835 905 754 765 751
LPI (%) 23,9 14,6 19,1 14,9 15,7
Densidade de a rias (m/ lOOhaJ 166,1 170,3 168,3 164,5 166,6
rndice de Forma (sem unidades ) 30,4 31,2 30,8 30,1 30,5
indice de Diversidade de Shannon (s/ unidadesJ 1,3509 1,3477 1,3256 1,3662 1,3364
rndice de Diversidade de Simpson (s/unidades) 0,6880 0,6864 0,6607 0.6550 0,6551
indice de Equitabilidade de Shannon (s/unidades) 0,7540 0,7522 0,7398 0,7021 0,6868
indice de Equitabi lidade de Simpson (s/unidad es ) 0,8256 0,8237 0,7929 0,7770 0,7643
Freguesia de Oeilao
Numero de M anchas (mimero) 56 99 106 146 131
lPII%) 48,9 39,4 32,1 26.6 24,7
Densidade de Orlas (m/lOOha) 67,6 68,4 n ,5 76,3 73,3
Ind ice de Forma (s/un idades) 10,9 12,5 13,4 13,9 13,3
ind ice de Diversi dade de Shannon (s/unidades) 0,7512 0,9845 1,097 1,0997 1,1237
indice de Dive rsidade de Simpson (s/unidades) 0,5085 0,5948 0,6533 0,6544 0,6682
indice de Equ itabi lidade de Shannon (s/unidadesJ 0,5419 0,7101 0,7913 0,7933 0,8106
indice de Equitabili dade de Simpson (s/unidades) 0,678 0,7931 0,8711 0,8725 0,8909
LPI: percentagem da area ocupada pela mancha de maior dimensao. fndice de forma uti lizado: l SI (McGa-rigal and Marks, 1995).
166
Dinamica e se rvi~os da paisagem no Nordeste de Portugal
Azevedo et al. (2011) utiliza ram como ferramentas de modela,:;o FARSITE e FlamMap
enquanto Magalhaes (2011) utilizou FlamMap. FlamMap 3.0 (Finney, 2006) permitiu anali
sar espacialmente 0 comportamento potencial do fogo na totalidade da area de estudo em
cada uma das datas em consideral;ao, produzindo mapas de intensidade da frente de fogo,
velocidade de propaga,ao au comprim ento da chama. FARSITE (Finney, 1998) permitiu si
mular de forma espacia lmente explicita a progressao do fogo no terreno a partir de ignic;6es
num conjunto de locais selecionados ao acaso e em perfodos de tempo determinados.
Os resultados de FlamMap indicaram que, ao lango do periodo analisado, as areas
de Perigo de Incendio mais elevado (EXTREMO: Intensid ade da Frente de Fogo>10000
kW/ m) aumentaram consideravelmente nas duas freguesias (Figura 4). No entanto, em
Franc;a este aumento foi ma is pronuncia do. Para alem do aumento da area total desta
""" """ I """ """
_ 1500 t
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~ it 7-
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"'" ,~ , l D7S 1993 '"'' "'" ,- "'" ,~,
"'" '"' '"' • EXTREMa • ElEVAOO _ MOOERAOO SAI)(Q 0
Figura 4. Area (ha) por cia sse ~e Perigo de Incendio com base na Intensidade da Frente de Fogo (IFF) ent re 1958 e. 2005/2006 nas f~~gues las de Fra~-;a (E squerdaJ e Deilao (Di rei ta ). Resu ltados de simula-;oes em FAR. SITE (Finney, 1998) dasslficados nas segUintes Classes de Perigo de Incendio (Alexander and l anoville, 1989): BAIXO · IFF < 500kW/m; MODERADO - IFF de 500 a 2000 kW/m; ELEVADa· IFF de 2000 a 10000kW/m ' EX-TREMa · IFF >10000 kW/ m. '
" .. "" 1993 "'"
• EXTREMO
-ElEVADO
_ MOOERAOO
_ BAI XO
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Figura 5. Area media (hal por cl asse de Perigo de Incendio com base na Intensidade da Frente de Fogo (I FF) entre 1958 e. 2005/2006 nas freguesias de Fra n ~a. Resultados de simular;5es em FARSITE (Finney, 1998) . Ver legenda da Figura 4 para detalhes sobre a cJass ifica~ao utilizada.
167
Desenvolvimento rural, Sustentabilidade e Ordenamento territorial
cia sse, verificou-se ainda um aumento da dimensao media das suas areas individuais nas
duas freguesias (Figura 5; Figura 6).
As simula~5es efetuadas com FARSITE indicaram que, de acordo com as condi~6es da
paisagem de Fran<;a entre 1958 e 2005, houve uma tendencia para as fogos se propaga
rem de forma cada vez mais rapida nas horas in iciais apes a igni~ao. Isto foi particula r
mente evidente para as primeiras duas horas do fogo.
1958 1968
1992 2006
1980
Im .. nsidade da fr eme de fogo (J.:W m)
o 0·500
500 2000 _ 2000- 4000
_ 4000_ 10000
_ > 10000
Figura 6. Evolu~ao do perigo de incendio na freguesia de Deilao entre 1958 e 2006 com base na Intensidade da Frente de Fogo. Resultados de simu la~6es em FAR51TE (Finney, 1998).
400.00
350M
30000
~ I .,,'" g 25000
I 0 2.30
1.1 2 eOO
~ ' 00 00 I· m 1-30
1
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r"" . 030
100.00
5000
III 000 1958 "'" 1978 1993 2005
'eo Figura 7. Contribui~ao media de cada intervalo de tempo para a area ardida durante perfodo inicial de tres horas na f regues ia de Fran~a entre 1958 e 2005. Resultados de s i mula~6es em FlamMap (Finney, 2006) com
base em 20 repeti~6e s.
168
Dinamica e se rvi~os da paisagem no Nordeste de Portugal
Os resultados simplificados aqui apresentados indicam que as modifica~6es sofridas
pel a paisagem ao longo dos ultimos 50 anos favoreceram a surgimento de fogos ma is
intensos e em areas progressivamente maiores. Estas varia<;5es devem-se sobretudo as
altera~6es no uso e coberto do solo descritas inicialmente, simultaneamente em termos
de composi~ao e arranjo espacial. A ocorrencia de igni<;6es nas paisagens de Fran~a e
Deilao tem associada uma probabilidade elevada de resultar em fogos catastreficos.
Fran<;a e um caso extremo em termos de condi<;5es bioffsicas e de historia de ocu
pa~ao do te rritorio. 0 padrao da paisagem de Deilao aproximou-se, no entanto, con
sideravelmente do de Fran,a no periodo estudado, sendo igualmente de prever nesta
freguesia a ocorrencia de eventos catastroficos mantendo-se 0 modelo de transi~ao do
uso do solo observado nas ultimas decadas (Magalhaes, 2011). Dutra forma de abordar
os resultados obtidos e considerar que 0 efeito de regu la<;ao do fogo na paisagem foi
gradualmente reduzido ao longo do perfodo estudado, atraves das altera~5es observa
das na paisagem.
5. CON5IDERAI;OES FINAlS: PAPEL DA GESTAO NO FORNECIMENTO DE SERVII;OS EM PAISAGENS CULTURAIS EM TRANSFORMAI;AO
o conceito de servi~o de ecossistema/paisagem e independente do grau de naturalida
de dos ecossistemas/pa isagens considerados. As paisagens culturais oferecem um conjun
to de servi~os de elevado valor que incluem principalmente servi ~os de aprovisionamento
(alimentos, madeira, fibra, agua, etc.) mas tambem servi~os unicos que so paisagens huma
nizadas podem oferecer tais como a aprecia<;ao estetica da paisagem, particularmente no
caso de paisagens hist6ricas. A oferta de servi~os de paisagem e afetada pelas altera<;6es
da composi<;ao e configura<;:ao na paisagem resultantes de altera~6es de necessidades e in
teresses dos proprietarios/usufruidores diretos a que, por sua vez, e fun~ao das condi~5es
socioeconomicas desse sistema e de outros funcionando a escalas mais amplas.
As altera~6es em curso nas freguesias de Fran<;:a e Deilao resultaram sobretudo do des
povoamento destas areas, por motivos diversos, com efeitos no abandono da atividade
agricultura e da pastorfcia em areas marginais e a substitui~ao de culturas temporarias por
cu lturas perenes e de baixa manuten~ao como a fio resta ou os pomares de castanheiro.
Apesar do ba lan~o destas altera<;:6es nos servi~os de ecossistema e de paisagem ainda
estar por realizar, sao previsfveis determinadas tendencias de modifica~5es. Preveem-se
naturais redu~5es nos servir;os de produr;ao de alimentos. A diversidade genetica sofrera
perdas que podem ser significativas uma vez que 0 despovoamento abandona parte ou a
tota lidade das ra<;:as e cultivares desenvolvidas loca lmente e uti lizadas para fins alimenta
res, medicinais, artfsticos e outros. Para lela mente, desaparecera 0 conhecimento e a cultu
ra do uso desta biodiversidade (Frazao-Moreira et aI., 2007). A diversidade de ecossistemas
sera tambem reduzida por eliminar;ao de muitos tipos de agroecossistemas na paisagem e
dominancia de mates e fioresta. Os efeitos sobre a diversidade de especies podem ser mis
tos com a favorecimento das especies da fauna de maior porte e das especies associadas a
169
Desenvolvlln ento rural, Sustentabi lidade e Ordenamento terr ito r ial
habitats sem perturba,ces e a degrada,ao de condi,ces de habitat de especies associa das
a paisagens perturbadas e muito heterogeneas (Aguiar et aI., 2009). Pode esperar-se ainda
que a qualidade e a regularidade da oferta de agua superficial aumentem mas diminuira a
sua quantidade ao nivel das bacias hidrograficas. Os servi-;os de regula-;ao da composi-;ao
da atmosfera e do clima at raves da fixa~ao de dioxido de ca rbona pe[a paisagem au men·
tam de importancia (Pinheiro et aI., 2011). Pelo exposto nas seCl;6es anteriores, 0 servi~o
de regula~ao do fogo pela paisagem sofrera efeitos consideraveis com a evoluc;:ao da paisa·
gem para condi~6es que favorecem fogos de grande dimensao e intensidade.
Neste contexto, algumas quest5es relevantes podem ser colocadas. A primeira e a
da definic;:ao dos servic;:os que no futuro se pretende que estas paisagens assegurem.
Esta e uma questao central em planeamento e gestao da paisagem (Swanwick, 2009). E particularmente relevante em modelos de governa ~ao descentralizados e participativos,
da base para 0 tapa (bottom-up) na medida em que permite deftnir um sistema de refe
rencia com base nas necessidades e interesses dos agentes envolvidos diretamente na
pa isagem (Termorshuizen and Opdam, 2009). No entante, nesta e noutras areas prate·
gidas e classificadas do pais, a modele de governac;:ao e essencialmente top·down. Pelo
estatuto de conservac;:ao e pelos objetivos do ordenamento em vigor na area protegida
em que as areas de estudo se situam (ICN, 2007a, b), 0 pri ncipal servic;:o que se espera
garanti r e a do suporte de biodiversid ade, a todos as niveis.
o modelo de conservac;:a o preconizado para uma area protegida da categoria Par·
que Natural subentende, no entanto, a manuten~ao de niveis elevados de perturba~ao
de origem antropica nos ecossistemas e na pa isagem e a cl ass ifi ca~ao destas areas de
acordo com a Directiva s Aves e Habitats (Rede Natura 2000) nao impede que estes n[veis
de perturbac;:a o se mantenham. Nos instrumentos de planeamento e ordenamento em
vigor preconiza-se um model a de desenvolvimento sustentave l baseado na conserva·
C;ao e nas atividades econ6micas compativeis, gera lmente as desenvolvidas de forma
tradicional au com baixo nivel de impacto. Desta forma, a conservac;ao nao e servic;:o
exclusive da area e outres se rvic;:os podem/devem se r equacionad os no ambito do de·
senvolvimento desta regiao (Tabe la 2).
Os servic;:os referidos assentam em tres pilares fundamentais: biodiversidade, rique·
za paisagistica1 e comunidades humanas). Como resultado das alterac;:oes em curso as
servi,os de ecossistema e paisagem podem ser co mprometidos pelo despovoamento/
abandono, principalmente at raves de perdas de biodiversidade (ao nlve l genetico, es·
peciftco e da paisagem), do patrimonio cultural (sobretudo imateria l) e de altera,ces
1 "A riqueza natura l e paisagistica do macic;:o montanhoso Montezinho-Coroa e os val iosos elementos cultu rais
das comun idades humanas que ali se estabelecera m justificam que urgentemente se iniciem acc;:6es com vis
ta a sa lvaguarda do patrimonio e a anima~ao socio-cu ltural das popu lac;:6es." (Preambu lo do Decreto-Lei n.!!
355/79 de 30 de Agost o, relativo a cria~ao do Parque Natural de Montesinho). 3 "A insti t uit;ao de um parque natu ral capaz de mobil izar as populat;oes, levan do-as a participar na pracura de
soluc;:6es, na pesquisa de formas de relant;amento das suas economias trad icionais e da dignificac;:ao da sua
cultura, apresenta-se como 0 processo mais acon selhado" (Preambu lo do Decreto-l ei n.Q 355/ 79 de 30 de
Agosto, relativo a uiac;:ao do Parque Natural de M ontesinho) .
170
Din5mlCa e servi c;:os da paLsagem no Nordeste de Por tugal
na paisagem conducentes a alterac;:a o do regime do fogo. A presenc;a humana e, assim,
fu ndamenta l para assegurar as servic;os que atua lmente se esperam desta paisagem . No
entanto, esta presen<;a tem vindo a ser reduzida desde os anos 60 do secu lo passado e
as perspetivas de manutenc;:ao sao reduzidas. Apesar disso, 0 ordenamento e gestao da
area protegida (com urn horizonte temporal de algumas decadas) continua a assentar
no padrao paisagfstico dos anos 70, com base no qual foi estabelecida, e nos niveis de
povoamento existentes antes desse perfodo.
As solu~6es para este paradoxa nao sao lineares. Consideramos duas possiveis al
ternativas extremas para a futura gestao destes territorios: i) al tera~ao dos objetivos da
area protegida e ii) altera,ao da gestao da area protegida. A altera,a o dos objetivos per
mitir ia assumir e enquadrar as alterac;:6es em cu rsa no planeamento e gestao da area.
Permitiria rever, de forma mais realistica, os servic;os esperados para as ecossistemas e
da paisagem desta area, preferencialmente com a participac;ao dos utilizadores locais.
Permitiria tambem assumir inevitaveis efeitos negativos nalguns servic;os relevantes
pa ra a sociedade, nomeadamente as cultu ra is. Esta alternativa levaria, eventua l mente,
a reclassificac;ao da area com possiveis impactos negativos na economia e demografia
locais. A segunda alternativa consiste em mod ificar a gestae da area utilizando modelos
e praticas que substituam a presenc;a humana. Trata-se de definir praticas que imitem,
em intensidade, area e canfigurac;:ao, perturbac;6es antropicas. Ao nivel de alguns ecas
sis temas, particula rme nte dos agroecassistemas, naa ha substituic;6es possiveis. No en·
tanto, ao nrvel de outros ecossistemas e da paisagem, e passivel, quer atraves de meios
Tabela 2. Principais servic;:os de ecossist ema/paisagem nos terr ito ries de Fra nl;a e Deila o. Ad aptado de (Aguiar et aI., 2009) com base nas cla ss ificac;:6es de (Hassan et aI., 2005) e (Pereira et aI. , 2009).
C lassifica~ao Servi~o de ecossistema/paisagem
ProdUl; ao de alimentos (incluindo cogumelos, cal;a e pesca)
ProduI;50 Produ~ao de mater iais lenhosos
Produ~ao de alimentos an imais
Predu~ao de agua
Regulac,:ao dimatica
Regu lac,:a o Regula~ao da composic,:ao da atmosfera
Regula<;ao de processos hidrol6gicos
Regu lac,:ao do fogo
Atividades de recreac;:ao e tu rismo
Cult ural M anutenc;:ao do saber ecologico tradicional
Apreciac;:ao visual, espir itua l, emocional
Forma~a o e retenc,:ao do so lo
Suporte Cicio de nu trientes
Sequest ra de ca rbono
Refugio de biod iversidade
171
Desenvolvi mento rural, Sustentabilidade e Ordenamento territorial
medinicos quer do fogo, mimetizar urn conju nto de pe r tu rba~oes com urn resultado
que se pode aproximar da estrutura da paisagem humanizada, da mesma forma que se
gerem areas naturai s tendo como referencia regimes naturais de perturba<;ao (DeLong
and Tanner, 1996; Pe rera et aI. , 2004). Esta alte rnativa carece, no entanto, de senti do
(porque manter uma paisagem com caracteristicas de paisagem cu ltural nao sendo, de
facto, humanizada?). Par outro lad 0, a manuten<;ao deste tipo de praticas para garantir
as resultados desejaveis tem encargos previsivelrnente muito elevadas a que par si 56 inviabil iza ria a util izac;aa de urn modelo inteiramente assente nesta alternativa.
Considera-se, contudo, de forma mais realista, que possa existir sempre algum nivel
de presenc;:a humana neste terr it6rio (ligado ao turismo au por via de regresso ao cam
po das pessoas, par exemplo). Considera-se, por outro lado, que alterac;:5es na gestao
atual dos ecossistemas e da paisagem a par duma presenc;:a humana residual paderaa
justificar e permitir manter a car.kter humanizado da paisagem (nao 0 dos anos 70 mas
algo mais parecida com a situac;aa atual) e os servic;:os associados. Neste contexto, serao
prioritarias medidas que contribuam para 0 aumento do servic;o de regulac;ao do fogo.
Para qu e tal acontec;:a, terao que ser feitas modificac;6es importantes quer ao nfvel
dos objetivos e paradigma quer das medidas a adotar na gestao dos ecossistemas e da
paisagem. Atividades com inte rferencia na estrutura des ecossistemas e da pai sagem
devem, individual mente au de forma combinada, contrib ui r para a manute nc;:ao da he
terogeneidade na paisagem que garanta a servic;o de regulac;ao de perturbac;6es, nome
adamente nas areas do planeamento e ordenamento florestal, ordenamento cinegetico
e aquicola e do planeamento da preven~ao e combate aos fogos Oorestais. 0 fogo, en
quanta ferramenta de gestao, devera sempre te r um papel fundamental a desempenhar
na cr iac;:ao e manutenc;:ao de heterogene idade na paisagem que, de outra forma, tendera
para a total homogeneiza,ao (Morei ra et aI., 2011).
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