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DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO DE PRÓTESES ARTICULARES JOÃO MIGUEL CASTRO LEITE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA À FACULDADE DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE DO PORTO EM PRODUÇÃO DESENVOLVIMENTO E ENGENHARIA AUTOMÓVEL M 2014

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DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO DE PRÓTESES

ARTICULARES

JOÃO MIGUEL CASTRO LEITE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA À FACULDADE DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE DO PORTO EM PRODUÇÃO DESENVOLVIMENTO E ENGENHARIA AUTOMÓVEL

M 2014

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

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Desenvolvimento da Metodologia de Projeto e Fabrico de Próteses Articulares

INEGI

João Miguel Castro Leite

Relatório do Projeto Final / Dissertação do MIEM

Orientador no INEGI: Engenheiro Rui Neto

Orientador na FEUP: Prof. Jorge Lino

Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

Mestrado Integrado em Engenharia Mecânica

Junho de 2014

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

i João Leite

Resumo A presente dissertação tem como objetivos o estudo de especificações de próteses articulares e

a análise de arquiteturas de sistemas de gitagem para fundição de prótese articulares pelo

processo de fundição por cera perdida.

O trabalho desenvolvido insere-se no projeto MEDCAST, desenvolvido pela Zollern & Comandita

em pareceria com o INEGI, tendo em vista o desenvolvimento de novas soluções na produção de

próteses médicas por fundição.

Para que sejam alcançados os objetivos, é feita uma revisão bibliográfica que foca nas

particularidades das próteses articulares e no processo de fundição por cera perdida, sendo

também feita uma descrição dos materiais metálicos utilizados no fabrico de próteses articulares.

São apresentadas e analisadas as normas relevantes, bem como as especificações de próteses

existentes no mercado.

Na parte prática da presente dissertação, são desenvolvidas arquiteturas de sistemas de gitagem

para três próteses diferentes. Duas das próteses são de joelho, sendo fornecidas pela Zollern &

Comandita enquanto a restante é de anca, sendo concebida internamente no INEGI. O vazamento

das arquiteturas desenvolvidas foi simulado em ProCast, acabando por se concretizar o

vazamento de algumas destas e análise das peças obtidas.

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ii João Leite

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iii João Leite

Abstract This thesis aims to study the specifications of joint prostheses and aims to analyze different gating

systems for the production of joint prosthesis by the investment casting process.

This work is part of the MEDCAST project, developed by Zollern & Comandita in partnership with

INEGI, focusing on the development of new solutions for the production of cast medical

prostheses.

In order to achieve the purposed objectives, a literature review is performed focusing on the

peculiarities of joint prostheses and on the investment casting process. A description of the

metallic materials used in the manufacture of joint prostheses is also made. The standards and

specifications of existing prostheses found on the market are presented and analyzed.

In the practical part of this thesis, gating systems are developed for three different prostheses.

Two knee prostheses are provided by Zollern & Comandita while the third one is a hip prostheses

designed at INEGI. Pouring onto the developed gating systems was simulated using ProCast. Some

of the gating systems were cast and the resulting parts were analyzed.

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iv João Leite

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v João Leite

Agradecimentos Quero expressar a minha gratidão para com o Eng.º Rui Neto, orientador no INEGI, por todos os

conhecimentos transmitidos e também pela forma sempre acolhedora com que me tratou ao

longo deste desafio.

Agradeço também ao Eng.º Jorge Lino, orientador na FEUP, por todas as sugestões dadas e pela

disponibilidade para esclarecimento de dúvidas que foram surgindo.

À equipa do INEGI - Eng.º Paulo Machado, Sertório Lares, Armanda Marques, Fernando Moreira,

Nuno Azevedo - por toda a colaboração dada. Agradeço em especial ao Eng.º Bártolo Paiva por

toda a energia transmitida, pela contribuição na construção das carapaças cerâmicas, na

realização de vazamentos e também por todas as dúvidas esclarecidas. Agradeço também à Eng.ª

Nannan Song pelas simulações valiosas que realizou.

Agradeço à Zollern & Comandita pelas peças cedidas e também pela informação disponibilizada

para a realização deste trabalho.

Quero também agradecer a todos os intervenientes do projeto MedCast que contribuíram de

modo direto ou indireto para o desenvolvimento desta dissertação.

Agradeço ao projeto Tooling Edge, desenvolvido no INEGI, que tem como objetivo o estudo dos

processos de fabrico considerados como prioritários no sector de Engineering Tooling.

Quero agradecer ao Dr. José Pinto de Freitas, coordenador da Unidade de Ortopedia e

Traumatologia do Hospital Lusíadas Porto, pela sua disponibilidade e pelos conhecimentos

transmitidos na área da ortopedia e também pela bibliografia disponibilizada.

O autor agradece atenciosamente o financiamento do Projeto SAESCTN-PII&DT/1/2011 co-

financiado pelo Programa Operacional Regional do Norte (ON.2 - O Novo Norte), segundo o

Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), através de Fundo Europeu de

Desenvolvimento Regional (FEDER).

Por fim, agradeço à minha família e amigos por me terem apoiado ao longo deste grande desafio

que foi a realização desta dissertação.

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vi João Leite

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vii João Leite

Índice de conteúdos 1 - Introdução ................................................................................................................................ 1

1.1 - Introdução ao tema ............................................................................................................... 1

1.2 - Enquadramento ..................................................................................................................... 1

1.3 - Objetivos da dissertação ........................................................................................................ 1

1.4 - Abordagem ............................................................................................................................ 1

1.3 - Projeto MEDCAST - INEGI/ZCP ............................................................................................... 2

2 - Próteses articulares .................................................................................................................. 5

2.1 - História e desenvolvimento ................................................................................................. 10

2.2 - Soluções construtivas .......................................................................................................... 13

2.3 - Normalização de próteses ................................................................................................... 17

2.5 - Metodologia de desenvolvimento ....................................................................................... 21

2.6 - Desafios atuais ..................................................................................................................... 22

3 - Materiais metálicos para próteses articulares ........................................................................ 25

3.1 - Aços Inoxidáveis .............................................................................................................. 27

3.2 - Ligas de Cobalto-Crómio .................................................................................................. 28

3.3 - Ligas de Titânio ................................................................................................................ 30

3.4 - Comparação das ligas ...................................................................................................... 32

4 - Processo de fundição por cera perdida .................................................................................. 35

4.1 - Caracterização do processo ................................................................................................. 36

4.2 - Obtenção de modelos para fundição .................................................................................. 39

4.3 - Arquitetura de sistemas de gitagem .................................................................................... 42

4.4 - Formação de carapaças cerâmicas ...................................................................................... 51

4.4.1 - Diagrama de Ellingham ................................................................................................. 51

4.4.2 - α-case ........................................................................................................................... 53

4.5 - Especificações ...................................................................................................................... 54

4.5.1 - Especificações conseguidas por fabricantes ................................................................. 54

4.5.2 - Especificações definidas por normas ............................................................................ 57

4.5.3 - Especificações de próteses comerciais ......................................................................... 60

5 - Parte experimental ................................................................................................................. 63

5.1 - Metodologia ........................................................................................................................ 63

5.2 - Modelos iniciais ................................................................................................................... 64

5.3 - Obtenção de ficheiros CAD .................................................................................................. 65

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viii João Leite

5.4 - Projeto de moldes para injeção de ceras ............................................................................. 68

5.4.1 - Moldes em resinas carregadas ..................................................................................... 68

5.4.2 - Moldes maquinados em alumínio ................................................................................ 75

5.5 - Construção de cachos .......................................................................................................... 76

5.5.1 - Arquitetura de cachos .................................................................................................. 76

5.5.2 - Simulação de vazamentos ............................................................................................ 78

5.5.3 - Injeção de peças de cera .............................................................................................. 81

5.5.4 - Montagem de cachos ................................................................................................... 85

5.6 - Construção de carapaças cerâmicas .................................................................................... 86

5.7 - Descerificação e vazamento ................................................................................................ 88

5.8 - Análise de peças obtidas ..................................................................................................... 93

6 - Análise crítica do trabalho desenvolvido .............................................................................. 105

7 - Conclusões ............................................................................................................................ 107

8 - Trabalhos futuros ................................................................................................................. 109

Bibliografia ................................................................................................................................. 111

Anexos ....................................................................................................................................... 115

Anexo A...................................................................................................................................... 117

Anexo B ...................................................................................................................................... 121

Anexo C ...................................................................................................................................... 125

Anexo D ..................................................................................................................................... 131

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ix João Leite

Índice de Figuras Figura 1 - Aplicação de próteses articulares. ................................................................................. 5

Figura 2 - Estrutura de uma articulação sinovial. ........................................................................... 6

Figura 3 - Tipos de articulações sinoviais e graus de liberdade associados. .................................. 7

Figura 4 - Secção frontal da articulação do ombro. ....................................................................... 7

Figura 5 - Secção frontal da articulação da anca direita. ............................................................... 8

Figura 6 - Secção sagital da articulação do cotovelo direito. ......................................................... 8

Figura 7 - A: vista posterior profunda da articulação do joelho direito; B: secção sagital da

articulação do joelho direito. ......................................................................................................... 8

Figura 8 - A: angiograma duma cabeça de fémur esquerda em estado avançado de

osteoartrite num individuo com 76 anos de idade; note-se a elevada densidade de vasos

sanguíneos dilatados na zona que absorve mais esforços; B: angiograma da cabeça do

fémur direita do mesmo individuo; há menor concentração de vasos sanguíneos sendo a

articulação praticamente isenta de osteoartrite; C: radiografia de articulação da anca

direita afetada por osteoartrite de indivíduo de 78 anos. ............................................................. 9

Figura 9 - Prótese articular total de joelho concebida por Themistocles Glück. .......................... 10

Figura 10 - Prótese para anca de Charnley. ................................................................................. 11

Figura 11 - A: prótese anatómica duocondilar com ligamentos cruzados; B: prótese

funcional duopatelar sem ligamentos cruzados. ......................................................................... 12

Figura 12 - A: gama de perfis tibiais da linha Persona Knee da Zimmer; B: diferença de

perfis femorais entre o sexo masculino e o sexo feminino. ......................................................... 16

Figura 13 - A: simulação no AQ Fit Program, a prótese standard não encaixa; B: prótese à

medida com bom ajuste; C: componente acetabular com fixação por parafusos e um pino

interior (não introduzido na pélvis); D: componente acetabular com estrutura porosa na

superfície. .................................................................................................................................... 22

Figura 14 - Microestruturas do aço inoxidável 316. .................................................................... 28

Figura 15 - A: microestrutura da liga Haynes 21 após fundição; B: micrografia da liga

Haynes 21 após envelhecimento; C: microscopia eletrónica de varrimento da amostra da

imagem B. .................................................................................................................................... 29

Figura 16 - Microestruturas de Ti6Al4V. ...................................................................................... 31

Figura 17 - Vista esquemática de prensa hidráulica de forjamento............................................. 35

Figura 18 - Esquema de máquina de fabrico aditivo por EBM. .................................................... 36

Figura 19 - Moldação em bloco e moldação em carapaça. ......................................................... 37

Figura 20 - A: pás de turbina aeronáutica monocristalina oca em corte; B: turbina de

turbocompressor de motor automóvel em aço; C: componente da parede da câmara de

combustão de turborreator; D: componente femoral de uma prótese de joelho. ...................... 38

Figura 21 - Sequência do processo de fundição por cera perdida. .............................................. 38

Figura 22 - Fluxograma de metodologias de obtenção de peças de modelos perdidos para

fundição ....................................................................................................................................... 39

Figura 23 - A: Nikon Altera 12.10.8; B: sonda de contacto medindo impulsor. ........................... 40

Figura 24 - GOM Atos Triple Scan. ............................................................................................... 40

Figura 25 - A: molde obtido por fabrico aditivo; B: molde de silicone com pá de turbina

em cera; C: molde de alumínio; D: molde de resina com pós de alumínio. ................................. 42

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

x João Leite

Figura 26 - A: sistema de gitagem simples; B: sistema de gitagem com isolamento de fibra

de vidro no topo; C: sistema de gitagem com isolamento de fibra de vidro no topo e

refrigeração no fundo. ................................................................................................................. 45

Figura 27 - Simulações em ProCast da formação de rechupes (manchas pretas); A: sistema

de gitagem simples; B: sistema de gitagem com isolamento; C: sistema de gitagem com

isolamento e refrigeração. ........................................................................................................... 45

Figura 28 - Esquerda: solidificação curta lamelar; Direita: solidificação longa globular. ............. 46

Figura 29 - Prótese de anca antes da otimização; A: gradiente térmico; B: presença de

porosidade e fratura por fissuração a quente; C: vazamento de Co-Cr; D: peça em corte

obtida com defeitos internos. ..................................................................................................... 48

Figura 30 - Otimização da prótese de anca; A: gradiente térmico; B: presença de defeitos

apenas no topo da pia de vazamento (zona roxa indica ausência de defeitos); C:

vazamento de Co-Cr em carapaça com isolamento no sistema de gitagem; D: peça em

corte obtida isenta de defeitos. ................................................................................................... 49

Figura 31 - 1ª iteração; A: pia de vazamento; B: rechupes (manchas amarelas) no interior

das próteses. ............................................................................................................................... 50

Figura 32 - 2ª iteração; A: segunda pia mais massiva e com alimentação mais direta; B:

formação de rechupes (manchas amarelas) no interior das próteses. ........................................ 50

Figura 33 - 3ª iteração; A: terceira pia mais massiva; B: formação de rechupes (manchas

amarelas) sem isolamento; C: rechupes apenas na pia de vazamento após aplicação de

isolamento. .................................................................................................................................. 51

Figura 34 - Diagrama de Ellingham para vários compostos químicos. ......................................... 52

Figura 35 - Microestrutura da liga Ti-10V-2Fe-3Al; A: carapaça de ZrO2-Y2O3; B: carapaça

de ZrO2-CaO; C: carapaça cerâmica de Y2O3. ............................................................................... 53

Figura 36 - Designação normalizada das dimensões de um componente femoral de haste

reta típico para próteses articulares da anca............................................................................... 58

Figura 37 - Fluxograma da produção do componente de próteses de joelho segundo as

especificações técnicas resultantes do contrato entre a e a Zollern. ................................... 60

Figura 38 - . ......................................................................................................................................

Figura 39 - Excerto de um desenho de definição de um componente femoral duma

prótese de joelho apresentando uma vista de perfil cotada e algumas informações

relativas a tolerâncias, material e rugosidade. ............................................................................ 62

Figura 40 - Fluxograma da metodologia adotada para o trabalho experimental......................... 63

Figura 41 - A: desenho de definição do componente femoral da prótese da anca; B: vista

isométrica em SolidWorks. .......................................................................................................... 64

Figura 42 - Modelo em cera do componente tibial duma prótese de joelho da ZCP................... 65

Figura 43 - A: cacho cedido pela ZCP; B: peça fundida do componente femoral duma

prótese de joelho após remoção do cacho. ................................................................................. 65

Figura 44 - A: scan 3d; B: luz azul do scanner incidindo na peça pintada com pontos de

referência aplicados; C: processamento no software ATOS Professional. ................................... 66

Figura 45 - A: defeito do scan 3d; modelação em 3-mactic; B: superfície da peça original

isenta de defeitos; C: correção do defeito (a azul). ..................................................................... 67

Figura 46 - A: modelação CAD do componente tibial; B: modelação CAD do componente

femoral. ....................................................................................................................................... 67

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

xi João Leite

Figura 47 - Sequência de criação dum mole de injeção de ceras em resinas carregadas

tendo como ponto de partida um modelo duma peça em CAD. ................................................. 68

Figura 48 - A: canal de gitagem; B: junção do canal de gitagem à superfície da peça de

modo a ser possível distinguir-se a superfície plana da peça e o arredondamento da

aresta do canal de gitagem; C: pia de vazamento para componentes femorais de próteses

de anca existente no INEGI. ......................................................................................................... 69

Figura 49 - As duas metades da peça da anca com cavidades para pinos e canal de

gitagem. ....................................................................................................................................... 70

Figura 50 - A: 3D Systems Viper si2 SL; B: peça madre do componente femoral da anca

obtida por SL; C: construção da caixa para a primeira meia moldação; D: caixa da meia

moldação após vazamento da resina........................................................................................... 72

Figura 51 - Molde para injeção de ceras do componente femoral da anca. ................................ 73

Figura 52 - A: definição do plano de apartação e de duas cavidades para os pinos de

guiamento em SolidWorks; B: peça madre obtida por fabrico aditivo SL. ................................... 73

Figura 53 - Molde para injeção de ceras do componente tibial do joelho................................... 74

Figura 54 - A: molde com 4 placas moldantes; B: molde com 3 placas moldantes e pinos

guia. ............................................................................................................................................. 74

Figura 55 - A: resinas carregadas para reforço estrutural; B: molde fechado; C: molde

aberto. ......................................................................................................................................... 75

Figura 56 - Vista em corte do meio molde inferior da peça da tíbia mostrando o canal de

injeção. ........................................................................................................................................ 75

Figura 57 - Molde do componente tibial à esquerda e molde do componente femoral à

direita. ......................................................................................................................................... 76

Figura 58 - Detalhe do encosto entre meios moldes. .................................................................. 76

Figura 59 - Arquiteturas de cachos para fundição e respetivas designações............................... 77

Figura 60 - Resultados da simulação da geometria A2 obtidos no ProCAST. ............................... 79

Figura 61 - Resultados da simulação da geometria A3 obtidos no ProCAST. ............................... 79

Figura 62 - Resultados da simulação da geometria T1 obtidos no ProCAST. ............................... 80

Figura 63 - Resultados da simulação da geometria J1 obtidos no ProCAST. ................................ 80

Figura 64 - Fenómeno de descontinuidade do escoamento na geometria A2. ........................... 81

Figura 65 - A: cilindro de injeção; B: válvula reguladora de pressão; C: molde da pia de

vazamento média; D: molde do canal de alimentação de secção quadrada. .............................. 83

Figura 66 - A: defeito de enchimento; B: defeito superficial causado pela indentação no

molde; C: arranjo da indentação por preenchimento com cera; D: peça sem defeito

superficial após arranjo da cavidade moldante. .......................................................................... 84

Figura 67 - A: fuga de cera para plano de apartação; B: mal cheio na base do pino; C: vista

superior após modificações do molde; D: vista inferior após modificações do molde; E:

modificações no molde do componente femoral do joelho. ....................................................... 85

Figura 68 - A: ferro de soldar; B: junção incompleta; C: junção com cera cola e

arredondamento de arestas. ....................................................................................................... 86

Figura 69 - A: cacho J2; B: cacho A4; C: cacho T1. ....................................................................... 86

Figura 70 - A: Imersão de cacho em tina rotativa com barbotinas; B: mergulho em tina

com partículas cerâmicas fluidizadas; C: secagem de carapaças. ................................................ 88

Figura 71 - A: forno para descerificação por flash firing; B: forno para sinterização; C:

forno para pré-aquecimento. ...................................................................................................... 89

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

xii João Leite

Figura 72 - A: carapaça A1 inutilizada após descerificação; B: fissura. ........................................ 89

Figura 73 - Carapaças descerificadas e respetivas designações. ................................................. 90

Figura 74 - A: carapaça A2 com revestimento a fibra de vidro; B: forno de indução em

cadinho frio com levitação........................................................................................................... 90

Figura 75 - A: controlos; B: monitorização do controlador de potência e mostradores das

temperaturas em baixo; C: vista do topo do forno com cadinho incandescente e

termómetro a para medição da temperatura do metal no interior do cadinho. ......................... 91

Figura 76 - Fratura na carapaça A4. ............................................................................................. 92

Figura 77 - A: cacho T1 após abate e remoção das peças que ficaram completamente

cheias; B: vista laterial do cacho T1 evidenciando a falha de enchimento; C: peça após

separação do cacho por corte; D: peça em estado bruto de vazamento. ................................... 93

Figura 78 - Peças do cacho T1 após granalhagem. ...................................................................... 93

Figura 79 - Amostra 1 e amostra 2. ............................................................................................. 95

Figura 80 - Microscopias óticas da microestrutura da amostra 1; A: na periferia; B: no

interior. ........................................................................................................................................ 96

Figura 81 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 1; A: microporosidade (≈500

μm) na extremidade da haste; B: microporosidade de grandes dimensões (≈500 μm) na

proximidadede da periferia. ....................................................................................................... 96

Figura 82 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 1; A: microporisidades (≈500 μm

e ≈100 μm) no interior; B: microporosidade (≈500 μm) na periferia. ......................................... 97

Figura 83 - Microscopias óticas da microestrutura da amostra 2; A: na periferia com régua

graduada em mm; B: no interior. ................................................................................................ 97

Figura 84 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2; A: no interior; B:no interior

com técnica de polarização. ........................................................................................................ 98

Figura 85 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2; A: no interior; B:no interior;

C: no interior. ............................................................................................................................... 98

Figura 86 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2; A: microporisidades na

periferia; B: microporosidade (231 μm). ..................................................................................... 99

Figura 87 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2; A: microporisidade (57 μm);

B: microporosidade (≈20 μm). ..................................................................................................... 99

Figura 88 - A: detalhe da aresta do patamar da peça fundida sendo visíveis alguns defeitos

superficiais; B: CAD da geometria original mostrando a aresta viva do patamar. ..................... 100

Figura 89 - A: defeito superficial na aresta do patamar da peça fundida; B: CAD da

geometria original. .................................................................................................................... 101

Figura 90 - Variação dimensional da peça obtida relativamente à geometria original; vista

frontal. ....................................................................................................................................... 102

Figura 91 - Variação dimensional da peça obtida relativamente à geometria original; vista

por trás. ..................................................................................................................................... 103

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

xiii João Leite

Índice de Tabelas Tabela 1 - Interfaces utilizadas nas próteses de anca. ................................................................. 14

Tabela 2 - Análise dos materiais utilizados pela Smith and Nephew. .......................................... 17

Tabela 3 - Propriedades mecânicas do osso cortical humano segundo a direção

longitudinal. ................................................................................................................................. 26

Tabela 4 - Composição do 316L segundo ISO 5832-1. ................................................................. 27

Tabela 5 - Composição química das principais ligas de Co-Cr. ..................................................... 29

Tabela 6 – Designação, normas e composição química dos Titânios usadas em implantes;

A qualidade ELI do Ti6Al4V apenas é definida pela norma ASTM. ............................................... 32

Tabela 7 - Propriedades mecânicas de ligas comerciais. ............................................................. 33

Tabela 8 - Comparação dos tipos de ligas. ................................................................................... 34

Tabela 9 - Comparação entre diferentes processos de obtenção de moldes para injeção

de ceras. ...................................................................................................................................... 41

Tabela 10 - Categorias de precisão da diretiva VDG P 690. ......................................................... 55

Tabela 11 - Níveis de precisão de acordo com o tipo de material. .............................................. 55

Tabela 12 - Tolerâncias lineares (todas os valores em mm). ....................................................... 56

Tabela 13 - Rugosidades superficiais para os materiais do grupo D e grupo T. ........................... 57

Tabela 14 - Limites dos fornos de vácuo para fundição de ligas reativas da Zollern ................... 57

Tabela 15 - Caracterização da liga Ti6Al4V trabalhada segundo as normas da ISO e da

ASTM. .......................................................................................................................................... 59

Tabela 16 - Cálculo do módulo. ................................................................................................... 69

Tabela 17 - Cálculos dos rendimentos volumétricos de cada geometria; os valores não

resultantes de fórmulas foram medidos em SolidWorks. ............................................................ 78

Tabela 18 - Parâmetros de simulação. ......................................................................................... 78

Tabela 19 - Parâmetros de injeção de ceras. ............................................................................... 83

Tabela 20 - Metodologia para formação de carapaças cerâmicas e valores obtidos para a

viscosidade, pH e densidade das barbotinas. .............................................................................. 87

Tabela 21 - Comparação de massas de cachos com o limite do forno; o valor usado para a

massa volúmica do Ti6Al4V está na Tabela 7; para a massa de metal necessária sem

enchimento da pia, subtraiu-se Vpia ao Vtotal da Tabela 17, convertendo-se para massa

através da massa volúmica. ......................................................................................................... 92

Tabela 22 - Resultados da análise por espectrometria. ............................................................... 94

Tabela 23 - Comparação entre propriedades mecânicas mínimas e valores obtidos por

ensaio de tração. ......................................................................................................................... 94

Tabela 24 - Caracterização da superfície de acordo com as normas. ........................................ 100

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

xiv João Leite

Índice de Gráficos Gráfico 1 - Microdurezas em função da distância à superfície. ................................................... 54

Gráfico 2 - Expansão térmica do Ti6Al4V. .................................................................................... 71

Gráfico 3- Microdurezas (HV) no patamar e na haste das duas amostras em função da

distância à superfície (mm). ....................................................................................................... 101

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

1 João Leite

1 - Introdução 1.1 - Introdução ao tema O aumento da esperança média de vida tem apresentado novos desafios à comunidade científica.

Um dos desafios, inserido no contexto da medicina, é o tratamento de articulações afetadas por

osteoartrite, cuja incidência é mais elevada em indivíduos de idade avançada. Como forma de

aumentar a qualidade de vida dos indivíduos que padecem dessa condição física, é frequente a

substituição das articulações afetadas, por próteses articulares - artroplastia de substituição. A

produção de próteses articulares envolve elevado rigor para que todas as especificações sejam

cumpridas sendo que este domínio é da responsabilidade da engenharia.

1.2 - Enquadramento A presente dissertação foi realizada como prova de conclusão do Mestrado Integrado em

Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, inserindo-se no

projeto MEDCAST. As partes envolvidas neste projeto são o INEGI (Instituto de Engenharia

Mecânica e Gestão Industrial) e a ZCP (Zollern & Comandita Portugal).

1.3 - Objetivos da dissertação O tema abordado é: “Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses

articulares”. Inseridos neste tema, são definidos dois objetivos fundamentais na realização

desta tese:

Estudo de especificações de próteses articulares segundo normas existentes;

Análise de arquiteturas de sistemas de gitagem para fundição de próteses pelo

processo de fundição por cera perdida.

Análise das peças obtidas em Ti6Al4V e comparação com as normas.

1.4 - Abordagem Tendo em conta os objetivos definidos, a abordagem utilizada foi a seguinte:

Capítulo 2 - Próteses articulares - é feita uma caracterização aprofundada das próteses

articulares abordando-se o aspeto médico, a evolução das próteses até aos dias de hoje

sendo caracterizadas as próteses articulares modernas. São focadas as normas relativas

a próteses articulares, bem como a metodologia de desenvolvimento de próteses e os

desafios atuais.

Capítulo 3 - Materiais metálicos para próteses articulares - neste capítulo são

caracterizadas as principais ligas pertencentes aos grupos dos aços inoxidáveis, ligas de

cobalto-crómio e ligas de titânio.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

2 João Leite

Capítulo 4 - Processo de fundição por cera perdida - este processo é caracterizado dando-

se ênfase a sistemas de gitagem. Outros aspetos como a obtenção de modelos perdidos

e carapaças cerâmicas são também abordados. Por fim é feita uma análise aprofundada

das especificações relativas à produção de próteses articulares segundo normas. São

também apresentadas especificações da produção de uma haste femoral de uma prótese

de anca, bem como aspetos relativos a empresas de fundição por cera perdida.

Capítulo 5 - Parte experimental - são descritos todos os passos experimentais utilizados

para a obtenção de próteses articulares pelo processo de fundição por cera perdida,

tendo como ponto de partida dois modelos de próteses cedidas pela ZCP e também um

modelo em CAD criado no INEGI. São também apresentadas simulações de vazamento

das diferentes arquiteturas de sistemas de gitagem desenvolvidas.

1.3 - Projeto MEDCAST - INEGI/ZCP A Zollern & Comandita Portugal (ZCP) é uma empresa especializada na fundição por cera perdida

cujo complexo fabril se situa na Maia. A ZCP resulta do investimento por parte do Grupo Zollern

da Alemanha realizado em finais de 1990.

Desde 1990 que a ZCP tem vindo a produzir componentes fundidos por cera perdida sendo eles,

na sua maioria, parte integrante de turbocompressores, como pás de turbina ou impulsores. Até

2007 apenas foram produzidos componentes em aço, sem controlo de atmosfera de fusão e

vazamento. Em 2007 foi introduzido um novo processo de fundição de impulsores em ligas de

alumínio sendo o principal colaborador na investigação e desenvolvimento o INEGI. Os projetos

que contribuíram para este novo processo de produção foram:

Turbocast – Desenvolvimento do processo de obtenção de impulsores para

turbocompressores em moldações de gesso em contra-gravidade sob vácuo.

Fundimp – Otimização do processo de obtenção de impulsores para turbocompressores

em moldações de gesso.

Vabimp – Desenvolvimento do processo de obtenção de impulsores para

turbocompressores por fundição de baixa pressão de liga de alumínio.

A fundição de impulsores em ligas de alumínio foi abandonada em 2012 pois o volume de vendas

não era significativo. Em 2011 a ZCP iniciou-se na produção de componentes em superligas de

níquel para as indústrias automóvel e aeronáutica sendo a fusão e o vazamento realizado em

vácuo. A investigação e desenvolvimento de componentes em superligas de níquel também teve

a colaboração do INEGI.

O projeto MEDCAST consiste no desenvolvimento de processos de fundição de próteses médicas

em ligas de Co-Cr e ligas de Ti de alta qualidade a preços competitivos. Esta nova oportunidade

de negócio surgiu devido às solicitações feitas pela e pela à casa mãe da Zollern, na

Alemanha, para que esta apresentasse novas soluções a nível de próteses.

A possibilidade de fundição de ligas reativas como as ligas de Co-Cr e Ti para a área médica poderá

colocar a ZCP numa posição privilegiada de empresas dotadas dessas capacidades, assegurando

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

3 João Leite

melhores perspetivas de negócio. Devido ao abandono da produção de impulsores em ligas de

alumínio há excesso de capacidade tanto a nível de infraestruturas como também de algum

equipamento de modo a acomodar a nova produção de próteses.

O projeto MEDCAST passa por algumas metas:

Projeto de câmaras de fusão em cadinhos frios como resultado da cooperação entre o

INEGI e a ZCP.

Obtenção de moldações testadas no INEGI com fusão e vazamento de próteses em ligas

de titânio, em atmosfera controlada, em cadinhos frios com teores de oxigénio dentro

do admissível, com níveis de defeitos aceitáveis e tecnologia pronta a ser transferida para

a ZCP.

Instalação na ZCP de uma câmara de fusão e vazamento com fusão em cadinhos frios

sendo a capacidade superior à do INEGI de modo a estimar-se os custos de produção de

modo mais realista.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

4 João Leite

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

5 João Leite

2 - Próteses articulares Entende-se por prótese articular como sendo uma articulação artificial cujo objetivo é a

restituição das capacidades perdidas devido a doença ou deterioração dos componentes da

articulação original, tentando minimizar ou eliminar o sofrimento do paciente. Ao procedimento

cirúrgico de tratamento de articulações degeneradas, atribui-se a designação de artroplastia

(Davis 2003).

Nos dias de hoje existem soluções de próteses articulares para as principais articulações do corpo

humano, sendo possível melhorar significativamente a qualidade de vida do paciente. As

principais áreas de intervenção são as articulações da anca, dos joelhos, dos cotovelos e dos

ombros, como pode ser visto na Figura 1. Existem também próteses para as articulações das mãos

e dos pés, embora estas sejam pouco vulgares.

Figura 1 - Aplicação de próteses articulares; adaptado de (Wikipedia 2014b; Zimmer 2014b, 2014a; Integra 2014; Zimmer 2013b; DePuy 2014a, 2014b).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

6 João Leite

Anatomia de uma articulação saudável:

As articulações do corpo humano podem ser classificadas em três categorias (Enderle, Blanchard,

e Bronzino 2005):

Fibrosa: os ossos são ligados por tecidos fibrosos. Não permitem grandes movimentações

sendo caraterizadas por uma certa rigidez. Este tipo de articulações está presente nas

suturas do crânio.

Cartilaginosa: as cartilagens fazem a ligação entre os ossos permitindo movimentações

limitadas do tipo torsional ou de compressão. A coluna vertebral possui este tipo de

articulação nas ligações entre vértebras e também nas ligações entre as costelas e a

coluna vertebral.

Sinovial: são as articulações mais complexas do corpo humano pois permitem grande

liberdade de movimentos, estando presentes nos membros inferiores e superiores.

Neste tipo de articulações, as extremidades dos ossos estão cobertas por uma fina

camada de cartilagem articular (Figura 2). O líquido sinovial contido pela membrana

sinovial permite a lubrificação das superfícies da cavidade articular. Em algumas

articulações sinoviais, como é o caso das dos joelhos, existem estruturas

fibrocartilagíneas adicionais chamadas meniscos cuja finalidade é o aumento da

resistência da articulação (Seeley, Stephens, e Tate 2003).

Figura 2 - Estrutura de uma articulação sinovial (Seeley, Stephens, e Tate 2003).

Existem seis tipos de articulações sinoviais (Figura 3), consoante os graus de liberdade

associados a cada uma delas (Enderle, Blanchard, e Bronzino 2005).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

7 João Leite

Articulação plana

(artrodia)

Articulação em sela

(efipeartrose)

Articulação em roldana

(trocleartrose)

Articulação cilíndrica

(trocartrose)

Articulação esférica

(enartrose)

Articulação Elíptica

(condilartrose)

Figura 3 - Tipos de articulações sinoviais e graus de liberdade associados; adaptado de (Seeley, Stephens, e Tate 2003).

As articulações do joelho e do cotovelo são em roldana enquanto que as articulações do ombro

e da anca são esféricas. Como pode ser visto na Figura 3, as articulações esféricas permitem um

amplo leque de movimentos em quase todas as direções. As articulações em roldana apenas

permitem a rotação segundo um eixo. Estes dois tipos de articulações são as mais importantes

para o estudo das próteses articulares. As figuras seguintes ilustram articulações saudáveis do

ombro, da anca, do cotovelo e do joelho, respetivamente:

Figura 4 - Secção frontal da articulação do ombro (Seeley, Stephens, e Tate 2003).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

8 João Leite

Figura 5 - Secção frontal da articulação da anca direita (Seeley, Stephens, e Tate 2003).

Figura 6 - Secção sagital da articulação do cotovelo direito (Seeley, Stephens, e Tate 2003).

Figura 7 - A: vista posterior profunda da articulação do joelho direito; B: secção sagital da articulação do joelho direito; adaptado de (Seeley, Stephens, e Tate 2003).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

9 João Leite

Razões para a artroplastia total:

A taxa de sucesso de uma artroplastia é função de inúmeras variáveis. Embora o procedimento

cirúrgico seja cada vez mais eficaz, nem todos os pacientes são elegíveis para este tipo de

intervenções cirúrgicas. É importante abordar-se as razões que levam à substituição de

articulações e também qual o tipo de pacientes que reúne condições de viabilidade para a

artroplastia.

A designação médica atribuída à degradação das cartilagens das articulações é osteoartrite (L.

Turek 1984). Esta condição é uma forma de artrite e tem maior incidência em indivíduos com

idade avançada. A osteoartrite provoca dor nas articulações afetadas, dificultando a

movimentação. A dor e desconforto estão relacionados com os detritos resultantes da

degradação da cartilagem que ficam alojados nas superfícies da articulação afetando as

características tribológicas do movimento relativo entre superfícies. A qualidade de vida do

indivíduo fica bastante afetada. O envelhecimento dos constituintes da cartilagem, como os

colagénios, reduz gradualmente as capacidades de absorção de cargas, assim como piora o

comportamento quando sob estados de tensão (L. Turek 1984). Além das causas relacionadas

com o envelhecimento do indivíduo, existem também outras causas associadas à osteoartrite,

algumas delas são: imperfeições nas superfícies articulares, necrose avascular e infeções (L. Turek

1984). A necrose avascular é caracterizada pela falta de irrigação sanguínea nas extremidades dos

ossos, causando a morte dos tecidos e degradação precoce da articulação. Outras razões que

contribuem para a degradação das cartilagens articulares são fruto das vivências do quotidiano

do indivíduo. Um estilo de vida mais ativo poderá ter um grande impacto na durabilidade das

articulações pois para além do maior desgaste, há também maior probabilidade de lesões

resultantes de impactos localizados nas articulações. Certo tipo de movimentos poderão

acentuar o desgaste das articulações ao haver uma distribuição instável de cargas, como poderá

acontecer às articulações dos joelhos ou das ancas. A menopausa também é uma causa que

contribui para a osteoartrite.

Embora as causas enunciadas possam provocar osteoartrite, é importante salientar que o modo

como cada uma delas interage, varia consoante o tipo de articulação.

Figura 8 - A: angiograma duma cabeça de fémur esquerda em estado avançado de osteoartrite num individuo com 76 anos de idade; note-se a elevada densidade de vasos sanguíneos dilatados na zona que absorve mais esforços; B: angiograma da cabeça do fémur direita do mesmo individuo; há menor concentração de vasos sanguíneos sendo a articulação praticamente isenta de osteoartrite; C: radiografia de articulação da anca direita afetada por osteoartrite de indivíduo de 78 anos; adaptado de (L. Turek 1984).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

10 João Leite

O principal fator limitante de uma artroplastia é a longevidade das soluções atuais. A longevidade,

nos casos em que a fixação é perfeita e as reações biológicas do indivíduo anfitrião são favoráveis,

está em função do desgaste das superfícies móveis. Deste modo a idade do paciente e a

esperança média de vida são variáveis importantes na decisão. Não existe uma regra fixa para a

decisão sobre a intervenção cirúrgica sendo que cada equipa de médicos-cirurgiões define um

critério. O tipo de paciente e a articulação em questão têm influência. A substituição total de uma

articulação é um procedimento bastante invasivo sendo usado em casos avançados de

osteoartrite, quando os outros tratamentos já não se apresentam como sendo alternativas

duradouras e eficazes. L. Turek (1984) defende que a substituição total da anca (total hip

replacement) deverá ser realizada em indivíduos de idade superior a 60 anos em que os

tratamentos alternativos menos invasivos já não são eficazes ou falharam. A tendência da idade

mínima tem vindo a diminuir pois a tecnologia tem vindo a evoluir.

Associadas à artroplastia total, estão as cirurgias de revisão que se realizam quando os

componentes da prótese estão demasiado desgastados ou há problemas de fixação como

próteses soltas. Estas cirurgias são largamente influenciadas pelas decisões tomadas na primeira

cirurgia de substituição como o tipo de fixação. O tipo de fixação da prótese ao osso tem grande

influência nas eventuais cirurgias de revisão. A fixação pode ser feita por cimentação, ou seja, a

prótese é cimentada ao osso, ou por não-cimentação, havendo ligação da superfície da prótese

ao osso por osteointegração. A fixação não-cimentada é preferível para indivíduos mais jovens

pois preserva melhor a estrutura óssea. Nos indivíduos com idade mais avançada realiza-se

fixação por cimentação pois a probabilidade de ser necessária uma revisão é mais remota.

2.1 - História e desenvolvimento Os primeiros registos de tentativas de utilização de implantes para articulações datam de 1891,

na Alemanha, por Themistocles Glück, que apresentou os seus resultados na 10ª Conferência

Médica Internacional, em Berlim (Knight, Aujla, e Biswas 2011). O trabalho pioneiro de

Themistocles Glück inicialmente caracteriza-se pela experimentação de diversos materiais em

animais, assim como transplantes de órgãos de cadáveres em humanos. De todos os materiais

testados, aquele que demonstrou melhores resultados foi o marfim. No dia 20 de Maio de 1890,

Themistocles Glück realizou a primeira artroplastia a um joelho (Figura 9), substituindo a

articulação original por uma prótese em marfim (Eynon-Lewis, Ferry, e Pearse 1992). Três

semanas depois, foi feita a substituição total de um pulso. A curto prazo os resultados obtidos

foram bastante bons, no entanto, a longo prazo registaram-se complicações devido a infeções,

tornando as próteses num fracasso (Eynon-Lewis, Ferry, e Pearse

1992). Themistocles Glück desenvolveu também próteses

articulares para o ombro, cotovelo, tornozelo e anca.

Em 1925, o cirurgião americano Marius Smith-Petersen criou a

primeira prótese de vidro que consistia numa meia esfera oca

que se posicionava no topo da cabeça do fémur possibilitando

movimentos suaves (Knight, Aujla, e Biswas 2011). Esta tentativa

não foi bem sucedida pois a prótese fraturou, no entanto, o

material era biocompatível. Após o estudo de diversos materiais

Figura 9 - Prótese articular total de joelho concebida por Themistocles Glück; adaptado de (Eynon-Lewis, Ferry, e Pearse 1992).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

11 João Leite

cerâmicos e polímeros primitivos como a celuloide, Marius Smith-Petersen e seus colegas

focaram os seus esforços na utilização de materiais metálicos (Knight, Aujla, e Biswas 2011;

Ratner et al. 2013). Em 1939 foi aplicada a primeira prótese articular em Vitallium, que é uma liga

comercial à base de Cobalto-Crómio-Molibdénio, já usada na medicina dentária até à altura. O

primeiro cirurgião a utilizar próteses articulares com interface metal-metal foi o cirurgião inglês

George McKee na década de 50, ao desenvolver próteses de anca constituídas por componente

femoral com canal longo e também componente acetabular (Knight, Aujla, e Biswas 2011). Apesar

deste tipo de interface mostrar bons resultados, os detritos metálicos resultantes do atrito

provocavam reações adversas como dor e inflamações sendo a designação médica do fenómeno

conhecida como metalose. Por esta razão, a popularidade deste tipo de interfaces diminuiu.

O grande desenvolvimento na artroplastia total da anca deu-se nos anos 60 quando Sir John

Charnley desenvolveu a artroplastia de baixo atrito (low friction arthroplasty). Charnley foi um

dos grandes responsáveis pelo desenvolvimento de conceitos fundamentais relacionados com

biomecânica, técnicas cirúrgicas, desenho de implantes (Figura 10), materiais e métodos de

fixação (L. Turek 1984). Muito do conhecimento de Charnley é usado nos dias de hoje. A prótese

de anca de Charnley possui os seguintes princípios (Moura Relvas 2007):

Componente femoral metálico com canal

femoral longo e esfera;

Esfera de pequeno diâmetro em aço

inoxidável;

Componente acetabular em UHMWPE

(ultra-high molecular-weight

polyethylene), o componente polimérico

também é designado por liner;

Fixação por cimentação com recurso a

PMMA (poly(methyl methacrylate));

A razão por trás do diâmetro reduzido da esfera é a diminuição da superfície de contato,

diminuindo o atrito, dando origem a uma redução de detritos em relação aos conceitos

desenvolvidos anteriormente. A fixação por cimentação de Charnley diminuiu a taxa de próteses

que se soltavam dos ossos.

Apesar do sucesso de Charnley ter definido a artroplastia total da anca moderna, foram feitos

outros avanços que surgem em resposta aos inconvenientes da fixação por cimentação. Por vezes

a utilização de cimento causa necrose dos tecidos circundantes e também provoca doenças como

a osteólise (Moura Relvas 2007). Foi na década de 1970 que surgiram as primeiras próteses não

cimentadas que recorriam a fixação com ajuste por interferência e superfícies otimizadas para a

fixação.

Após Themistocles Glück, as primeiras próteses de joelho são criadas na década de 1950 por

McKeever. Este tipo de prótese era apenas constituído por um componente metálico aplicado na

tíbia com o intuito de recriar a superfície de apoio. Durante as décadas de 1950 e 1960 o

Figura 10 - Prótese para anca de Charnley; adaptado de (Al Muderis 2013).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

12 João Leite

desenvolvimento de próteses para joelho divergiu, focando-se em próteses que apenas

permitem movimento restringido do tipo dobradiça e na substituição condilar (condylar

replacement) (Amendola et al. 2012). A substituição condilar distingue-se da alternativa ao haver

separação do componente tibial do componente femoral, ou seja, não existe ligação mecânica. A

primeira prótese de joelho condilar foi a de Freeman-Swanson, que surgiu no fim da década de

1960 no Imperial College de Londres. Esta prótese caracterizava-se por um componente femoral

metálico que rolava sobre um componente tibial em polietileno.

As soluções existentes até então apresentavam resultados insatisfatórios causados por falhas

mecânicas devido ao excesso de componentes e também eram frequentes as infeções. A

evolução que se sucedeu, deu origem a dois novos ramos de desenvolvimento provenientes da

substituição condilar, abandonando-se as próteses com restrições do tipo dobradiça (Amendola

et al. 2012). O primeiro ramo (Figura 11-A) consistia numa abordagem anatómica que tinha como

fundamento a preservação dos ligamentos existentes na articulação do joelho. A segunda

abordagem (Figura 11-B) tinha carater funcional, em que a biomecânica do joelho era simplificada

pela remoção dos ligamentos cruzados.

Figura 11 - A: prótese anatómica duocondilar com ligamentos cruzados; B: prótese funcional duopatelar sem ligamentos cruzados; adaptado de (Amendola et al. 2012).

A aplicação da primeira prótese da abordagem anatómica foi realizada por Yamamoto no Japão

em 1970. Esta prótese era constituída por um componente femoral anatómico numa liga de Co-

Cr e por um componente tibial em polietileno. O componente tibial possuía um corte central de

modo a acomodar os ligamentos cruzados. Até 1980 foram surgindo novos aperfeiçoamentos

apenas a nível de desenho. Em Janeiro de 1980 foi implantada a primeira prótese de joelho não

cimentada por Hungerford no hospital John Hopkins. A superfície que ligava ao osso era porosa,

permitindo a adesão. Em 1986 surgiu a prótese de Miller-Galante que permitia fixação com ou

sem cimento. A inovação desta prótese residia na camada superficial de fibra de titânio compósita

(titanium fiber composite) que permitia a adesão ao osso. A liga de titânio utilizada era a Ti6Al4V.

A fixação do componente tibial desta prótese era feito por meio de pernos e parafusos.

A primeira prótese fruto da abordagem funcional surgiu em 1973 em Nova Iorque e pode ser

vista na figura B, em cima. Esta prótese foi bem sucedida sendo por isso bastante utilizada. No

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

13 João Leite

entanto, esta prótese apresentava alguma tendência para deslocamentos e a amplitude de

movimento era limitada a 90⁰. Em 1978 surgiu a prótese de Insall-Burstein em que a possibilidade

de translação era limitada mecanicamente e o ligamento cruzado posterior era removido.

Quando o ângulo entre a tíbia e o fémur chegava aos 70⁰, criava-se uma ligação mecânica por

meio de uma came de forma a evitar-se deslocamentos. As evoluções seguintes que se deram

foram no sentido de aumentar a amplitude e liberdade de movimentos.

Na década de 1990, a comunidade científica focou-se na melhoria do polietileno (UHMWPE)

(Amendola et al. 2012). Até então a taxa de sobrevivência após 15 anos era de 94%. Pretendia-se

aumentar a longevidade, pois esta era limitada pelo polietileno que se desgastava por abrasão. A

partir de 1995 o processo de esterilização foi alterado, deixando-se de usar radiação gama pois

prejudicava as propriedades do polietileno. O método que passou a ser utilizado foi a esterilização

em atmosfera inerte através de plasma de gás de óxido de etileno.

2.2 - Soluções construtivas Atualmente existe uma panóplia considerável de soluções construtivas. Deste modo, a

caracterização das próteses modernas de acordo com o tipo de soluções empregues torna-se

relevante para a presente dissertação. A caracterização nem sempre é fácil pois cada fabricante

afirma que a sua tecnologia oferece os melhores resultados, por esta razão, algumas fontes são

contraditórias.

Tipo de interface:

Entende-se por interface como sendo a superfície articular entre cada um dos componentes da

prótese que estão em contacto permanente. Como na interface há movimento relativo, a

consequente existência de atrito torna-se um ponto fulcral de cada prótese articular pois é um

fator limitante da longevidade. Por esta razão, a seleção de materiais adequados é uma das

formas de aumento da longevidade. De acordo com a natureza dos materiais empregues, existem

quatro tipos de interfaces, sendo a caracterização feita na Tabela 1:

Metal-polímero;

Metal-metal;

Cerâmica-cerâmica;

Cerâmica-polímero;

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

14 João Leite

Tabela 1 - Interfaces utilizadas nas próteses de anca (Davis 2003).

Componente

femoral

Componente

acetabular Observações

Co-Cr Co-Cr

Elevada taxa de próteses soltas a curto prazo; novos

desenvolvimentos permitem a taxa de desgaste mais

reduzida;

Co-Cr UHMWPE Bastante utilizado; baixo desgaste;

Alumina/zircónia UHMWPE Taxa de desgaste muito baixa; a zircónia possui maior

resistência a impactos;

Alumina Alumina Esta combinação oferece taxa de desgaste mínima;

causa dor no paciente, não sendo utilizada nos EUA;

Ti6Al4V UHMWPE Elevado desgaste do UHMWPE causado pela

superfície do titânio;

Ti6Al4V com

revestimento UHMWPE Resistência ao desgaste melhorada;

Tipo de fixação:

Existem dois tipos de fixação dos componentes à estrutura óssea: por cimentação ou por não-

cimentação.

Na fixação por cimentação, o cirurgião recorre a cimento que cria uma ligação do tipo adesiva

entre a superfície da prótese e a superfície do osso que está em contacto. O elemento ligante

normalmente empregue é o PMMA, também conhecido como cimento ósseo (Moura Relvas

2007). A ligação cimentada permite estabilidade na transferência de carga entre a prótese e o

osso envolvente. Outra vantagem inerente a esta técnica reside no grau de precisão da criação

de encaixes nos ossos, pois é mais reduzido dado que o cimento permite compensar folgas

existentes. O tempo de recuperação para a fixação por cimentação é o menor. Como

desvantagens, a polimerização do cimento na proximidade de tecidos ósseos provoca necrose

(Moura Relvas 2007). Outras desvantagens devem-se à possibilidade de fissuração devido a

tensões residuais e descontinuidade de rigidez entre o osso e o cimento. A longevidade do

cimento ósseo é também um problema pois este degrada-se, surgindo fissuras e detritos.

A fixação de próteses sem recurso a cimento é possível com ajuste por interferência. Com o

decorrer do tempo, a ligação mecânica passa também a ser uma ligação biológica pois o osso

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

15 João Leite

circundante cresce, ligando-se ao componente da prótese, fenómeno esse que é conhecido por

osteointegração. As superfícies da interface prótese-osso deste tipo de fixação caracterizam-se

pela elevada rugosidade. Algumas das soluções construtivas empregues passam pela recriação

da estrutura trabecular do osso na interface prótese-osso. Este tipo de fixação requer maior

precisão na execução de encaixes nos ossos de modo a garantir que as cavidades criadas exercem

pressão contra as paredes da prótese, apertando-a. Por causa deste tipo de ajuste, há maior

possibilidade de ocorrência de fraturas ósseas. Como a quantidade de osso removido é menor,

este tipo de fixação será preferível para pacientes mais jovens pois preserva melhor a estrutura

óssea, que poderá ser relevante na eventualidade de futuras intervenções de revisão. Os tempos

de recuperação variam entre 6 a 12 semanas e geralmente são acompanhados por dor (Moura

Relvas 2007).

Nível de personalização:

Quanto maior for o nível de personalização, melhor será a taxa de sucesso a longo prazo de uma

determinada prótese. A capacidade de uma prótese se adaptar a um determinado indivíduo é

função do ajuste de parâmetros, não só geométricos como também a nível de soluções

construtivas.

A nível geométrico as próteses poderão ser concebidas especificamente para um indivíduo,

garantindo-se o melhor ajuste possível. A tese de doutoramento de (Moura Relvas 2007)

concretiza uma prótese de anca com a haste maquinada a partir da geometria do canal femoral

obtida in situ de uma ovelha. A nível de próteses articulares, o exemplo apresentado por (Moura

Relvas 2007) permite grande adaptação ao canal femoral do indivíduo. No mercado de próteses,

existem fabricantes que produzem próteses à medida para casos específicos. A empresa alemã,

AQ Implant, oferece a possibilidade de próteses para anca à medida do paciente (AQ Implants

2014). O processo utilizado chama-se AQI Process e inclui o projeto de hastes femorais e

componentes acetabulares personalizados. As principais tecnologias utilizadas são: tomografia

axial computadorizada, programas de CAD próprios e fabrico aditivo. Este processo de produção

é descrito na secção 2.5 da presente dissertação.

A generalidade dos modelos de próteses existentes no mercado estão disponíveis numa série de

tamanhos a adaptarem-se melhor à anatomia do paciente como pode ser visto na Figura 12-A.

Também têm vindo a ser desenvolvidas próteses articulares para indivíduos do sexo feminino,

nomeadamente próteses de joelho, de forma a colmatar as falhas na oferta existente que não

cobriam da melhor forma as particularidades da anatomia do corpo humano feminino. O

fabricante de equipamento médico americano, Zimmer, possui a linha e próteses para joelho

Gender Solutions® Natural-Knee® Flex (Figura 12-B), com geometrias próprias tanto para

indivíduos do sexo masculino como feminino (Zimmer 2009).

Page 34: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

16 João Leite

Figura 12 - A: gama de perfis tibiais da linha Persona Knee da Zimmer; B: diferença de perfis femorais entre o sexo masculino e o sexo feminino; adaptado de (Zimmer 2013a, 2009).

Certas próteses poderão ser ajustadas de acordo com o paciente. No caso particular de uma

prótese de anca, uma construção modular do componente femoral, permite a seleção da esfera

mais adequada em termos de diâmetro e de material.

Materiais e revestimentos:

Os materiais metálicos utilizados atualmente variam entre as ligas de Titânio, Cobalto-Crómio e

também aços inoxidáveis. A principal utilização dos materiais metálicos é nos componentes

estruturais das próteses. Também se utilizam ligas de Tântalo para revestimentos da interface

prótese-osso que simulam a estrutura trabecular óssea permitindo osteointegração. Os

polímeros utilizados são da família das poliolefinas e têm como principal função permitir

movimentações com reduzidos níveis de atrito entre componentes adjacentes. Um dos mais

utilizados é o UHMWPE (ultra-high molecular-weight polyethylene), o outro é o XLPE (highly cross-

linked polyethylene), que é mais moderno que o primeiro.

OXINIUM é a designação comercial para o material de base metálica e superfície cerâmica à base

de Zircónio desenvolvido pela Smith & Nephew. Este tipo de material é caracterizado pelo

substrato numa liga de 97.5 % Zircónio e 2.5% de Nióbio e pela superfície que é tratada

quimicamente de modo a que haja transformação do metal em cerâmica, resultando numa

superfície de Zircónia (Smith&Nephew 2014b). Este tipo de material alia a elevada dureza e

resistência característica dos cerâmicos ao comportamento à fratura típico dos metais. Outra

vantagem reside no conteúdo muito reduzido de níquel, tornando-se numa mais valia para

indivíduos com sensibilidade a este metal.

Alguns fabricantes usam materiais cerâmicos para os componentes que estão em contato

permanente e possuem movimento relativo como esferas para próteses de anca. Alguns desses

materiais cerâmicos são o Biolox Forte e o Biolox Delta, que são à base de alumina.

A caracterização detalhada dos principais materiais metálicos é exposta no capítulo 3 da presente

dissertação.

Page 35: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

17 João Leite

Tabela 2 - Análise dos materiais utilizados pela Smith and Nephew (Smith&Nephew 2014a, 2014b, 2014c, 2014d).

Nome

comercial

da prótese

Fabricante Tipo de produto Materiais usados

GENESIS II

Knee

System

Smith &

Nephew

Prótese completa

para joelho

Componente femoral em Co-Cr ou em

OXINIUM; Componente tibial em Ti6Al4V;

esferas de CoCr sinterizadas na superfície na

variante por fixação não cimentada;

R3

Acetabular

System

Smith &

Nephew

Esfera e

componente

acetabular para

próteses de anca

modulares

Esferas femorais em OXINIUM, CoCr, Biolox

Forte e Biolox Delta; Liner em XLPE;

Componente acetabular metálico como

revestimento poroso STIKTITE;

SPECTRON Smith &

Nephew

Componentes

femorais e esferas

para anca; Inclui

também

ferramentas

específicas para

cirurgia; Fixação

por cimentação;

Componente femoral em Co-Cr forjado

(ASTM F 799); Esferas em OXINIUM ou em

Co-Cr (ASTM F799);

SYNERGY Smith &

Nephew

Componentes

femorais e esferas

para anca; Inclui

ferramentas

específicas para

cirurgia;

Possibilidades de

fixação cimentada

e não cimentada;

Haste do componente femoral para fixação

não cementada em Ti6Al4V disponível em 3

revestimentos: revestimento poroso de

titânio comercialmente puro, Revestimento

de hidroxiapatite, revestimento poroso de

titânio comercialmente puro com camada de

hidroxiapatite;

Haste do componente femoral para fixação

cimentada em Co-Cr forjado;

Esferas em OXINIUM ou em Co-Cr (ASTM

F799);

2.3 - Normalização de próteses Para que uma prótese articular possa ser comercializada e aplicada por médicos-cirurgiões, é

necessário respeitar um conjunto de regras.

Na União Europeia, em 1985 foi criada uma resolução pelo concelho de ministros conhecida

como “Nova Abordagem”. O objetivo desta resolução é facilitar o mercado interno através de

Page 36: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

18 João Leite

diretivas comunitárias que referem os requisitos essenciais de saúde, segurança e bem-estar de

pessoas e animais, de proteção do meio ambiente que os produtos devem cumprir e as formas

de comprovação da conformidade com esses requisitos. A nível nacional, as diretivas

comunitárias dão origem a decretos-lei, publicados em Diário da República. Em Portugal os

decretos-lei relativos a dispositivos médicos são:

Decreto-Lei n.⁰ 145/2009 de 17 de Junho

Decreto-Lei n.⁰ 258/2007 de 16 de Julho

Estes decretos-lei são resultantes das seguintes diretivas comunitárias:

Diretiva 90/385/CEE do Conselho, de 20 de Junho de 1990, relativa à aproximação das

legislações dos Estados-Membros respeitantes aos dispositivos medicinais implantáveis

ativos;

Diretiva 93/42/CEE do Conselho de 14 de Junho de 1993, relativa aos dispositivos

médicos;

Diretiva 2007/47/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 5 de Setembro de 2007,

que altera a Diretiva 90/385/CEE do Conselho relativa à aproximação das legislações dos

Estados-Membros respeitantes aos dispositivos medicinais implantáveis ativos, a Diretiva

93/42/CEE do Conselho relativa aos dispositivos médicos e a Diretiva 98/8/CE relativa à

colocação de produtos biocidas no mercado;

Diretiva 2005/50/CE da Comissão de 11 de Agosto de 2005, relativa à reclassificação das

próteses de substituição da anca, do joelho e do ombro, no âmbito da Diretiva 93/42/CEE

do Conselho relativa aos dispositivos médicos;

Os decretos-lei mencionados não definem parâmetros específicos relativos às próteses. Esse nível

de exigência é definido por normas. Na União Europeia, existem diversos organismos de

normalização, consoante a o tipo de atividades, produtos ou serviços a serem normalizados. O

organismo mais abrangente é o CEN, Comité Europeu de Normalização, que adota uma norma a

pedido da Comissão Europeia (EU-OSHA 2014). Deste modo obtém-se uma norma harmonizada,

ou seja, interpretada e adaptada tendo um caracter comunitário. Uma norma comunitária possui

um prefixo “EN” antes da designação da norma original. Cada país da União Europeia possui

organismos nacionais de normalização cuja finalidade é a coordenação da atividade normativa

nacional (CATIM 2014). As normas nacionais podem resultar da adoção de normas regionais ou

internacionais. Os organismos nacionais de normalização também possuem a capacidade de criar

novas normas, no entanto, na maior parte das situações, as normas resultantes apenas possuem

interesse nacional. Em Portugal, o organismo nacional de normalização é o IPQ (Instituto

Português de Qualidade) e a designação de cada norma por ele publicada é precedida pelo prefixo

“NP”. A avaliação de conformidade de produtos de acordo com as diretivas é feita através de

exames CE de tipo por organismos notificados. Existem diversos organismos notificados, mas nem

todos estão aptos a avaliar segundo qualquer diretiva.

O cumprimento de normas apenas é obrigatório mediante decretos-lei. Caso não seja obrigatória

a utilização de normas harmonizadas, o fabricante pode utilizar qualquer outra norma desde que

Page 37: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

19 João Leite

prove de forma convincente que o seu produto atende às necessidades do cliente. A utilização

de outras normas poderá acarretar complicações do ponto de vista legal, na situação de acidente.

O processo de criação e produção de próteses envolve diversas áreas, deste modo, optou-se por

expor apenas as normas mais recentes que estão relacionadas com os processos de fabrico.

ISO 13485:2003 - Medical devices - Quality management systems - Requiremets for regulatory

purposes

Esta norma estabelece os requisitos de um sistema de gestão da qualidade de uma organização

que produz dispositivos médicos. A ISO 13485 é uma adaptação da ISO 9001 para o caso particular

das organizações que produzem ou fornecem dispositivos médicos. Em Portugal, a aplicação

desta norma está referenciada no artigo 31 número 4 do Capítulo X do Decreto-Lei n.⁰145/2009

do Diário da Republica.

ISO 5832 - Implants for surgery - Metallic materials

Este grupo de normas define as características dos materiais metálicos empregues no fabrico de

implantes e também os respetivos métodos de ensaio. Esta norma define composições químicas,

microestrutura, incluindo o tamanho de grão, fases presentes e limites de inclusões e define

também as propriedades mecânicas do material em diversos formatos (varão, chapa, fio…).

Part 1:2007 - Wrought stainless steel

Part 2:1999 - Unalloyed titanium

Part 3:1996 - Wrought titanium 6-aluminium 4-vanadium alloy

Part 4:1996 - Cobalt-chromium-molybdenum-tungsten-nickel alloy

Part 5:2005 - Wrought cobalt-chromium-tungsten-nickel alloy

Part 6:1997 - Wrought cobalt-nickel-chromium-molybdenum alloy

Part 7:1994 - Forgeable and cold-formed cobalt-chromium-nickel-molybdenum-iron

alloy

Part 8:1997 - Wrought cobalt-nickel-chromium-molybdenum-tungsten-iron alloy

Part 9:2007 - Wrought high nitrogen stainless steel

Part 11:1994 - Wrought titanium 6-aluminium 7-niobium alloy

Part 12:2007 - Wrought cobalt-chromium-molybdenum alloy

Part 14:2007 - Wrought titanium 15-molybdenum 5-zirconium 3-aluminium alloy

ISO 7206 - Implants for surgery - Partial and total hip joint prostheses

Part 1:2008 - Classification and designation of dimensions

Part 2:2011 - Articulating surfaces made of metallic, ceramic and plastic materials

Part 4:2010 - Determination of endurance properties and performance of stemmed

femoral components

Part 6:2013 - Endurance properties testing and performance requirements of neck region

of stemmed femoral components

Part 10:2003 - Determination of resistance to static load of modular femoral heads

Page 38: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

20 João Leite

ISO 7207 - Implants for surgery - Components for partial and total knee joint prostheses

Part 1:2007 - Classification, definitions and designation of dimensions

Part 2:2011 - Articulating surfaces made of metal, ceramic and plastics materials

ISO 14242 - Implants for surgery - Wear of total hip-joint prostheses

Part 1:2012 - Loading and displacement parameters for wear-testing machines and

corresponding environmental conditions for test

Part 2:2000 - Methods of measurement

Part 3:2009 - Loading and displacement parameters for orbital bearing type wear testing

machines and corresponding environmental conditions for test

ISO 14243 - Implants for surgery - Wear of knee-joint prostheses

Part 1:2009 - Loading and displacement parameters for wear-testing machines with load

control and corresponding environmental conditions for test

Part 2:2009 - Methods of measurement

Part 3:2004 - Loading and displacement parameters for wear-testing machines with

displacement control and corresponding environmental conditions for test

ISO 14879 - Implants for surgery - Total knee-joint prostheses

Part 1:2000 - Determination of endurance properties of knee tibial trays

ISO 16087 - Implants for surgery - Roentgen stereophotogrammetric analysis for the

assessment of migration of orthopaedic implants

ISO 17853:2011 - Wear of implant materials - Polymer and metal wear particles - Isolation

and characterization

ISO 21534:2007 - Non-active surgical implants - Joint replacement implants - Particular

requirements

ISO 21535:2007 - Non-active surgical implants - Joint replacement implants - Specific

requirements for hip-joint replacement implants

ISO 21536:2007 - Non-active surgical implants - Joint replacement implants - Specific

requirements for knee-joint replacement implants

Page 39: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

21 João Leite

2.5 - Metodologia de desenvolvimento A metodologia de desenvolvimento depende de vários fatores condicionantes de diversas

naturezas: possibilidades e limitações das tecnologias existentes, parâmetros estabelecidos por

normas, tipo de prótese que se pretende produzir, dimensão da série, também fatores

económicos, entre outros.

O AQI Process, desenvolvido e utilizado pela AQ Implant para a produção de próteses de anca à

medida, é composto pelas seguintes etapas (AQ Implants 2014):

1. Tomografia Axial Computadorizada: a geometria da estrutura óssea dos membros

inferiores do paciente é recolhida para que possa ser interpretada;

2. Projeto Biomecânico: a informação recolhida na TAC é processada através de um

software desenvolvido pela AQ Implants, sendo feito o projeto da biomecânica da

prótese. Posiciona-se o componente acetabular e o componente femoral e o programa

avalia a amplitude de movimentos da combinação utilizada. Se a amplitude de

movimentos não é satisfatória, os componentes são reposicionados, havendo uma nova

iteração.

3. Projeto da haste e do componente acetabular: o AQI Fit Program permite simular o ajuste

entre a haste do componente femoral e o canal femoral do osso. Inicialmente são

testadas hastes standard, passando-se para hastes à medida no caso das primeiras não

derem bons resultados. A haste à medida é criada com base na TAC realizada

inicialmente. Nesta etapa é também projetado o componente acetabular que poderá ser

à medida consoante o estado da estrutura pélvica, onde é feita a fixação deste

componente (Figura 13-C). Nesta fase, é decidido o posicionamento dos parafusos de

fixação do componente acetabular à estrutura pélvica. Em alguns casos em que o osso

pélvico está bastante danificado, são adicionados pinos de fixação ao componente

acetabular. Por fim, adiciona-se um revestimento poroso em todas as superfícies que

estarão em contato com o osso para promoção da osteointegração.

4. Coordenação: todo o processo de projeto de uma nova prótese é acompanhado pelos

médicos-cirurgiões. O software desenvolvido pela AQ Implant desempenha um papel

importante nesta etapa pois permite a visualização de todo o projeto.

5. Produção: são produzidos os componentes que foram projetados através de processos

de fabrico aditivo.

6. Cirurgia

Page 40: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

22 João Leite

Figura 13 - A: simulação no AQ Fit Program, a prótese standard não encaixa; B: prótese à medida com bom ajuste; C: componente acetabular com fixação por parafusos e um pino interior (não introduzido na pélvis); D: componente acetabular com estrutura porosa na superfície; adaptado de (AQ Implants 2014).

O AQI Process da AQ Implant é um exemplo de metodologia para desenvolvimento de próteses

para anca à medida. A dimensão das séries de produção é reduzida a modelos únicos. Para séries

maiores, associadas a modelos standard, a metodologia é um pouco diferente pois os processos

de fabrico são também diferentes. Os processos aditivos dão lugar à fundição por cera perdida e

também ao forjamento. O projeto de novas próteses poderá ter como base, dados estatísticos

de modelos existentes bem conhecidos e estudados. A escolha da prótese certa dentro da gama

disponível do modelo é feita com base em imagens médicas como TACs que são processadas e

simuladas em software próprio à semelhança da metodologia da AQ Implant.

2.6 - Desafios atuais De um modo geral a evolução das próteses ortopédicas caminha no sentido de diminuir a idade

mínima para a realização da artroplastia, deste modo pretende-se aumentar a longevidade das

próteses articulares.

A nível de técnicas cirúrgicas há também evolução. A dimensão das incisões cirúrgicas é cada vez

menor, ou seja, a cirurgia é menos invasiva (Knight, Aujla, e Biswas 2011). A cirurgia de

substituição de anca assistida por computador já se realiza há mais de uma década. A utilização

de sistemas de mapeamento e posicionamento de instrumentos cirúrgicos permite melhorar a

precisão do posicionamento da prótese. Embora, estes avanços apresentem vantagens, ainda

não há dados estatísticos suficientes que permitem comprovar os efeitos benéficos da

intervenção assistida por computador (Knight, Aujla, e Biswas 2011). Como desvantagem, estas

técnicas aumentam a complexidade do procedimento e também os custos.

Um desafio importante na conceção de novas próteses é a recriação fiel do movimento da

articulação saudável. Este desafio é especialmente importante em próteses para joelho

(Amendola et al. 2012).

Page 41: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

23 João Leite

Atualmente registam-se avanços no domínio dos materiais. Uma das desvantagens de certas ligas

metálicas reside na reação adversa do anfitrião quando exposto a detritos resultantes do atrito.

Certas ligas são também impróprias para certos indivíduos pois alguns dos elementos de liga

provocam reações alérgicas nos indivíduos.

Page 42: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

24 João Leite

Page 43: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

25 João Leite

3 - Materiais metálicos para próteses articulares A substituição das articulações do joelho e da anca envolve procedimentos na anatomia do

paciente que não são reversíveis. Tanto no joelho como na anca, os ossos das articulações são

modificados de modo a acomodar os implantes. Pretende-se que a reparação das articulações

seja permanente, não sendo precisas futuras intervenções adicionais, de maneira a que o

paciente tenha o máximo conforto nas atividades quotidianas. A seleção de materiais adequados

é um dos fatores-chave para o sucesso a longo prazo. Para que tal aconteça é importante abordar-

se as condições químicas, mecânicas e biológicas às quais as próteses serão sujeitas quando

aplicadas no corpo humano.

A temperatura interna de um corpo humano saudável ronda os 37°C podendo ultrapassar os 40°C

em caso de febre. No caso de hipotermia, a temperatura do corpo humano pode ter valores

inferiores a 35°C (Wikipedia 2014a). Verifica-se que a temperatura não é uma condição exigente

pois é bastante inferior às temperaturas típicas de fusão das ligas metálicas utilizadas não

havendo qualquer perigo de fluência.

O PH dos fluidos do corpo humano que estão em contacto com os implantes tem como valor

saudável 7.4. Em caso de hematoma, os fluídos tornam-se ácidos, sendo que o PH pode descer

até 4.0 (Davis 2003).

Em termos de condições mecânicas, as ancas de um indivíduo com baixos níveis de atividade

física poderão ser solicitadas na ordem dos 1 × 106 a 2.5 × 106 ciclos por ano por anca. Para um

indivíduo com 20 a 30 anos de idade e esperança de vida entre os 70 a 80 anos isto equivale a

um número de solicitações na ordem de 108 ciclos (Davis 2003).

A par da resistência à fadiga, a resistência no limite de elasticidade e a resistência à rotura são

também características extremamente importantes a ter em conta no processo de seleção do

material para o implante. Pretende-se também que as próteses tenham um peso reduzido para

que não causem desconforto ao paciente, implicando dimensões mais reduzidas que as

estruturas ósseas que irão substituir. Dadas as dimensões mais reduzidas, os implantes poderão

ter que aguentar cargas superiores até cerca de 16 vezes o que as estruturas ósseas equivalentes

aguentam (Davis 2003). Através da análise Gait (estudo sistemático da locomoção) e da teoria de

contacto elástico de Hertz concluiu-se que em atividades quotidianas, os picos de tensão nas

articulações da anca (acetábulo e cabeça do fémur) variam entre 5.3 MPa e 11.9 MPa (DUAN et

al. 2005).

Para que a seleção das ligas metálicas a utilizar seja correta, é também importante conhecer-se

as propriedades mecânicas do osso humano. A Tabela 3 apresenta diversas propriedades

mecânicas do tecido ósseo cortical humano segundo a direção longitudinal. É de notar que o osso

humano é um material compósito e anisotrópico sendo constituído por dois tipos de tecidos com

funções e características distintas. O osso cortical é mais denso que o osso trabecular,

desempenhando um papel estrutural no esqueleto.

Page 44: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

26 João Leite

Tabela 3 - Propriedades mecânicas do osso cortical humano segundo a direção longitudinal (Edupack 2013).

Osso cortical humano

Massa volúmica (kg.m-3) 1.8 × 103 - 2.08×103

Módulo de Young (GPa) 18 - 26

Módulo de elasticidade ao corte (GPa) 4.5 - 6.7

Tensão limite de elasticidade (MPa) 90 - 144

Tensão de rotura (MPa) 135 - 167

Extensão após rotura (%) 0.6 - 1.4

Dureza (HV) 50 - 80

Resistência à fadiga a 107 ciclos (MPa) 23 - 80

Coeficiente de expansão térmica (μstrain/°C) 15 - 18

Embora seja desejável que o material do implante tenha características mecânicas iguais ou

superiores às do osso que vai substituir, no caso de uma rigidez demasiado elevada, esta torna-

se num inconveniente. Esta discrepância pode provocar, a longo prazo, degradação dos tecidos

ósseos danificando o ajuste entre o osso e o implante pois haverá uma descontinuidade de

comportamento quando o conjunto formado entre o osso e o implante é sujeito a solicitações

mecânicas. Este fenómeno é conhecido na literatura como “stress shielding”. Devido a este

fenómeno, o desenvolvimento e seleção de materiais para implantes ortopédicos tende a avançar

no sentido de aproximar os módulos de elasticidade dos materiais ao módulo de elasticidade do

osso humano (Davis 2003).

A escolha de materiais para implantes passa também pela caracterização a nível de

comportamento e resposta do corpo humano após a aplicação do implante. Define-se o conceito

de Biocompatibilidade como sendo a capacidade que um material tem para se comportar de

acordo com o anfitrião, segundo determinada aplicação (Davis 2003). O grau de

biocompatibilidade não é uma característica apenas intrínseca ao material, também depende do

tipo de aplicação médica. Para se averiguar o grau de biocompatibilidade existem diversos

ensaios normalizados que inserem na norma:

ISO 10993 - Biological evaluation of medical devices

A ASTM também possui normas relativas aos aspetos inseridos na biocompatibilidade:

Page 45: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

27 João Leite

ASTM F719 - 81(2012) - Standard Practice for Testing Biomaterials in Rabbits for Primary

Skin Irritation

ASTM F720 - 13 - Standard Practice for Testing Guinea Pigs for Contact Allergens: Guinea

Pig Maximization Test

ASTM F981 - 04(2010) - Standard Practice for Assessment of Compatibility of Biomaterials

for Surgical Implants with Respect to Effect of Materials on Muscle and Bone

ASTM F1089 - 10 - Standard Test Method for Corrosion of Surgical Instruments

As ligas metálicas consideradas aceitáveis para o fabrico de implantes são listadas no anexo A da

seguinte norma:

ISO 21534:2007 - Non-active surgical implants - Joint replacement implants - particular

requirements

Tendo em conta as ligas listadas na norma ISO, apresentam-se de seguida os principais materiais

metálicos.

3.1 - Aços Inoxidáveis

Os aços inoxidáveis são ligas de ferro-carbono tendo como principal elemento de liga o Crómio,

em proporções superiores a 11%. A resistência à corrosão é a principal característica que os

distingue de outros tipos de aços. O aço inoxidável mais popular é a liga AISI 316L sendo a sua

composição química segundo a norma ISO 5832-1 apresentada na Tabela 4.

Tabela 4 - Composição do 316L segundo ISO 5832-1 (ISO 2007).

Designação

Comercial

Norma

ISO

Norma

ASTM

equivalente

Composição mássica ISO (%)

C Si Mn P S N Cr Mo Ni Cu

316L ISO

5832-1 ASTM F138 <0,030 <1,0 <2,0 <0,025 <0,010 <0,10

17,0 -

19,0

2,25 -

3,0

13,0 -

15,0 <0,50

O aço 316L é uma variante do aço 316 tendo uma percentagem de carbono mais reduzida e é

também fundida em vácuo (Davis 2003). É também um aço austenítico devido à influência do

Níquel. Este elemento de liga torna mais predominante a presença de ferrite, que é a forma

alotrópica cúbica de corpo centrado (body-centered cubic) do ferro. A ferrite tem propriedades

mecânicas inferiores às da austenite, que é a forma alotrópica cúbica de faces centradas (face-

Page 46: DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA DE PROJETO E FABRICO …

Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

28 João Leite

centered cubic) do ferro. Por esta razão, adiciona-se Níquel para que o aço seja austenítico à

temperatura ambiente (Ratner et al. 2013). A Figura 14 ilustra microestruturas de amostras do

aço 316 no estado recozido compostas por austenite. A imagem B da Figura 14 é relativa à

amostra da imagem A após estágio a 593 ⁰C durante 1000 horas e recozimento. As juntas de grão

ficaram mais definidas devido à precipitação de carbonetos de crómio (Cr23C6).

Figura 14 - Microestruturas (500X, picral e ácido hidroclórico) do aço inoxidável 316 com; A: estado recozido durante 30 min a 1079 ⁰C, matriz de austenite com vestígios de inclusões não metálicas; B: estado recozido após exposição a 593 ⁰C durante 1000 horas; adaptado de (ASM 1972).

Segundo a norma ISO 5832-1, a microestrutura no estado totalmente recozido deverá ser

composta apenas por grãos de austenite de tamanho não superior ao número 5 normalizado (ISO

2007).

A formação de carbonetos de crómio na junta de grão é indesejável pois, deste modo, não se

forma a camada de óxidos protetora (Cr3O2) dando origem a corrosão. O conteúdo reduzido de

carbono reduz a possibilidade de precipitação de carbonetos (Ratner et al. 2013).

Os aços inoxidáveis têm um grande número de aplicações na medicina: instrumentos, parafusos,

placas de fixação, implantes, entre outras. Apesar dos aços inoxidáveis austeníticos serem

resistentes à corrosão, estes oxidam em condições específicas como quando estão em ambientes

com níveis de oxigénio muito baixos. Isto traz problemas a longo prazo, sendo que estas ligas não

são a melhor opção para implantes permanentes (Davis 2003; NACE International 2010).

O níquel presente nos aços inoxidáveis tem estado na origem de problemas relacionados com

reações adversas dos pacientes. Por esta razão, a investigação de ligas alternativas sem níquel

tem vindo a ser desenvolvida. Estas ligas possuem níveis elevados de azoto apresentando-se

como alternativas melhores que o 316L não só em termos de resistência à corrosão como

também apresentam propriedades mecânicas superiores (Yang e Ren 2010).

3.2 - Ligas de Cobalto-Crómio As ligas de Cobalto-Crómio (Co-Cr) foram primeiro utilizadas no fabrico de implantes no anos 30

tendo sido introduzidas na medicina dentária. Só depois é que passaram também a ser utilizadas

como implantes ortopédicos.

As ligas de Co-Cr mais utilizadas na indústria de produção de próteses ortopédicas são as

seguintes:

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

29 João Leite

Tabela 5 - Composição química das principais ligas de Co-Cr; adaptado de (Davis 2003).

Designação

Comercial

Norma

ASTM

Norma ISO

equivalente

Composição mássica ASTM (%)

Cr Mo Ni Fe C Si Mn W P S Outro

s

Vitallium;

Haynes 21;

Co-28Cr-

6Mo para

fundição

ASTM

F75 ISO 5832-4

27,0 -

30,0

5,0 -

7,0 <1,00 <0,75 <0,35 <1,00 <1,00 <0,20

<0,02

0

<0,01

0

<0,25

N;

<0,30

Al;

<0,01

B

Haynes 25;

L-605; Co-

20Cr-15W-

10Ni

ASTM

F90 ISO 5832-5

19,0 -

21,0 -

9,0 -

11,0 3,00

0,05 -

0,015 <0,40

1,00 -

2,00

14,00

-

16,00

<0,04

0

<0,03

0 -

Co-28Cr-

6Mo para

forjamento

ASTM

F799

ISO 5832-

12

26,0 -

30,0

5,0 -

7,0 1,00 <0,75 <0,35 <1,00 <1,00 - - -

<0,25

N

A liga ASTM F75 é tipicamente processada por fundição enquanto a ASTM F799 é uma versão da

ASTM F799 otimizada para forjamento. A liga ASTM F90 difere da F75 pela presença adicional de

tungsténio e níquel. Estes dois elementos de liga aumentam a capacidade de aumento da

resistência mecânica da liga através de mecanismos de endurecimento por solução sólida. No

estado recozido, ambas as ligas possuem propriedades semelhantes.

A microestrutura da liga ASTM F75 obtida por fundição, como pode ser observada na imagem A

da Figura 15, caracteriza-se pela presença da fase α, rica em cobalto, e por carbonetos

interdendritícos, nas juntas de grão e também dispersos no interior de grãos. Os carbonetos

poderão ser de cobalto, crómio ou molibdénio, representados pela letra M. A formação de

carbonetos origina defeitos na matriz, impedindo deslocações, resultando num acréscimo da

resistência mecânica.

Figura 15 - A: microestrutura (200X, ataque eletrolítico em ácido clorídrico) da liga Haynes 21 após fundição, partículas de M7C3 dispersas na matriz α; B: micrografia (500X, ataque eletrolítico em ácido clorídrico) liga Haynes 21 após

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

30 João Leite

envelhecimento durante 24 horas a 760 ⁰C, partículas dispersas de M7C3, precipitados de M23C6 nas juntas de grão e também nos grãos da matriz α; C: microscopia eletrónica de varrimento (3000X, ataque eletrolítico em ácido clorídrico) da amostra da imagem B, partículas de M7C3 e M23C6 nas juntas de grão e dispersas nos grãos; adaptado de (ASM 1972).

3.3 - Ligas de Titânio

O titânio como elemento químico caracteriza-se pela sua baixa densidade (cerca de 60% da

densidade do ferro), elevada resistência mecânica (através de adição de elementos de ligas ou

por encruamento) e excelente biocompatibilidade. A resistência à corrosão é também muito boa

pois o titânio e as suas ligas possuem a capacidade de formar uma camada protetora de óxidos

mesmo estando expostas aos tecidos e fluidos do corpo humano (Davis 2003). A camada

protetora é maioritariamente constituída por TiO2 e possui uma espessura que varia entre 2 a 20

nm (Brunette et al. 2001). Quando comparadas segundo a resistência mecânica específica

(resistência mecânica/densidade), as ligas de titânio são bastante superiores às ligas de Co-Cr e

aos aços inoxidáveis (NACE International 2010).

As ligas de titânio podem ser caracterizadas em grupos consoante as formas alotrópicas que

presentes na microestrutura. O titânio puro possui duas formas alotrópicas distintas sendo elas

α e β, consoante a temperatura. A primeira forma alotrópica caracteriza-se por ter um arranjo

hexagonal compacto (hexagonal close packed) que é estável até aos 882±2⁰C. Para temperaturas

superiores, a forma alotrópica estável é β, sendo cúbica de corpo centrado (body-centered cubic).

A forma α caracteriza-se por conferir anisotropia às ligas maioritariamente constituídas por esta

estrutura cristalográfica (Leyens e Peters 2003). As propriedades mecânicas das ligas de titânio

variam consoante as proporções das duas formas alotrópicas que são conseguidas através de

elementos de liga que influenciam as temperaturas de transformação. Deste modo as ligas de

titânio dividem-se maioritariamente em α, α+β e β.

Uma das primeiras ligas a ser utilizada no fabrico de implantes foi a Ti6Al4V. Cerca de 45% da

produção de Titânio mundial é desta liga (Davis 2003). Esta liga é popular na indústria aeronáutica

sendo o seu comportamento mecânico bem conhecido, em particular a resistência à fadiga

(Leyens e Peters 2003). A microestrutura é constituída pelas fases α e β, como pode ser visto na

Figura 16. Arrefecimentos lentos produzem microestruturas com grãos de α definidos e β nas

juntas de grão. Quanto mais súbito for o arrefecimento, após estágios no domínio β, mais

assinalável será a presença produtos da fase β transformada, obviamente dependendo da

influencia dos elementos de liga nas temperaturas de transição entre fases. Os produtos da fase

β transformada variam entre estruturas aciculares, serrilhadas, lamelares e martensíticas, à

semelhança do que acontece nos aços. A imagem E da Figura 16 é proveniente da norma ISO

20160, que define microestruturas para titânios α+β destinados a implantes, sendo referenciada

pela ISO 5832-3, que define os parâmetros da liga Ti6Al4V. Uma das variantes da Ti6Al4V possui

a designação ELI significando extra low interstitials. Esta liga diferencia-se pela presença inferior

de elementos intersticiais (O,N e H) nas estruturas cristalográficas. A resistência mecânica desta

liga é um pouco inferior.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

31 João Leite

Figura 16 - Microestruturas de Ti6Al4V; A: (100X, reagente de Keller) estado pós-fundição contendo fase β transformada em α devido ao arrefecimento e α acicular; B: (200X, solução de 2% HF+10%HNO3+88%H2O) amostra de varão (⌀ 1″) recozida 2 hr a 704 ⁰C e arrefecida a ar contendo grãos alongados de fase α (claro) e fase β intergranular (escura); C: (200X, solução de 2% HF+10%HNO3+88%H2O) amostra de varão arrefecida em forno após 1 hr a 954 ⁰C (< temp. de transição β) revelando grãos de α equiaxiais (claro) e β (escuro) nas juntas; D: (250X, reagente de Kroll) amostra arrefecida em água forjada após forjamento 1038 ⁰C (> temp. de transição β) constituída apenas por martensite; E: microestrutura (200X, solução de 2% HF+10%HNO3+88%H2O) A3 da norma ISO 20160; A, B,C e D adaptados de (ASM 1972); E adaptado de (ISO 2006).

O titânio comercialmente puro (Ti CP) é também um biomaterial importante e foi também dos

primeiros a ser utilizado. Pertence ao grupo dos titânios α e representa cerca de 30% da produção

mundial de titânio. Existem quatro variantes deste titânio, diferenciando no conteúdo de ferro,

oxigénio e azoto, consequentemente traduzindo-se em propriedades mecânicas diferentes,

sendo a resistência mecânica maior, quando mais elevada for a categoria (grade).

Os titânios CP e os Ti6Al4V não foram especialmente desenvolvidos para aplicações médicas.

Embora estas ligas apresentem propriedades bastante interessantes como biomateriais, novas

ligas têm vindo a ser desenvolvidas especialmente para essa área. Estas ligas especializadas,

pretendem colmatar certas falhas das ligas já mencionadas. Uma das desvantagens da Ti6Al4V

reside na presença de elementos de liga tóxicos como o vanádio (Leyens e Peters 2003). Outro

dos problemas associados às ligas tradicionais reside no módulo de elasticidade

consideravelmente mais elevado que o do osso, provocando o fenómeno de stress shielding a

longo prazo. Dadas estas questões, novas ligas foram investigadas. O vanádio como elemento de

liga foi substituído por elementos alternativos como o nióbio, o molibdénio, o ferro ou o tântalo

(Leyens e Peters 2003). Algumas dessas ligas são: Ti-5Al-2.5Fe, Ti-12Mo-6Zr-2Fe, Ti-15Mo-3Nb-

3Al, Ti-6Al-7Nb, Ti-6Al-7Nb, Ti-13Nb-13Zr-5Ta e Ti-30Ta. As novas ligas são também

maioritariamente constituídas pela fase β, sedo o módulo de elasticidade mais baixo e próximo

do osso (Leyens e Peters 2003). Ion R. et al. (2014) analisou a liga Ti-23Nb-0.7Ta-2Zr-0.5N a nível

de resposta biológica comparando-a à Ti6Al4V (Ion et al. 2014). Para além dos elementos de liga

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32 João Leite

alternativos ao vanádio e ao alumínio, esta liga possui um módulo de elasticidade da ordem dos

50 GPa, sendo bastante mais baixo que o módulo da Ti6Al4V (≈100 Gpa) e também próximo do

módulo do osso humano (18 a 26 GPa).

A Tabela 6 apresenta as composições químicas das principais ligas de titânio e também as normas

que as definem.

Tabela 6 – Designação, normas e composição química dos Titânios usadas em implantes; A qualidade ELI do Ti6Al4V apenas é definida pela norma ASTM (Brunette et al. 2001; TIMET 1999).

Designação

Comercial

Norma

ASTM

Norma

ISO

equival

ente

Composição mássica ASTM (%)

Al V Fe O C N H

Ti CP-1 ASTM

F67

ISO

5832-2 - - <0,20 <0,18 0,10 <0,03 <0,015

Ti CP-4 ASTM

F90

ISO

5832-2 - - <0,50 <0,40 <0,10 <0,05 <0,015

Ti6Al4V ASTM

F1108

ISO

5832-3 5,5 - 6,75 3,5 - 4,5 <0,20 <0,20 <0,10 <0,05 <0,015

Ti6Al4V ELI ASTM

F136 - 5,5 - 6,50 3,5 - 4,5 <0,25 <0,13 <0,08 <0,05 <0,012

3.4 - Comparação das ligas Para cada uma das normas, escolheu-se uma liga existente no mercado apresentando-se as

propriedades mecânicas e também as propriedades relevantes do ponto de vista do

processamento como as temperaturas de fusão e também os coeficientes de dilatação.

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33 João Leite

Tabela 7 - Propriedades mecânicas de ligas comerciais; Fontes: a- (TIMET 1999); b- (Carpenter 2000a); c - (Carpenter 2000b); d- (Carpenter 2000c); e- (Carpenter 1989); f- (Ratner et al. 2013); g- (ASTM 1987b); h- (ASTM 1987a).

Liga CP Titanium grade 2 (b)

CP Titanium grade 4 (c)

TIMET TIMETAL® 6-4

(a)

Carpenter BioDurTM CCM® (d)

Carpenter L-605 (e)

Norma ASTM F67 ASTM F67 ASTM F1472

ASTM F799/ ASTM F75/

ISO 5832-4

ASTM F90

Massa volúmica (Kg/m3)

4512 4512 4420 8276 9217

Coeficiente de expansão

térmica a 100⁰ (10-

6mm/mm.⁰C)

≈8.8 ≈8.8

Valor médio Valor médio Valor médio

0⁰ a 100⁰ - 9.0 20⁰ a 100⁰ -

13.2 21 a 316 - 13.7

20⁰ a 425⁰ - 9.4

20⁰ a 500⁰ - 14.1

21 a 538 - 15.0

20⁰ a 650⁰ - 9.7

20⁰ a 1000⁰ - 16.4

21 a 816 - 16.3

Módulo de elasticidade

(GPa) 103 103 107 - 122 241 243

Módulo de elasticidade ao

corte (GPa) n.d. n.d. 41 - 45 92.4 86.9

Tensão limite de elasticidade

(MPa) 335 - 545 480 - 635

Recozido: 827 - 828

ASTM F75 fundida (g):

>450

476 Solution Treat and Age: 999 -

1068

ASTM F799 (h): >827

Tensão de rotura (MPa)

335 - 545 655 - 690

Recozido: 895 - 896

ASTM F75 (g): >450

917 Solution Treat and Age: 1068

- 1137

ASTM F799 (h): >1172

Tensão limite de fadiga axial sem entalhes a

107 ciclos, R=Tmax/Tmin=-1

(MPa)

275 - 345 n.d.

Recozido: n.d. ASTM F75 fundida (f): 207 - 310

n.d. Solution Treat and Age: 430 -

700

ASTM F799 forjada a

quente (f): 600 - 899

Temperatura liquidus (⁰C)

1660 - 1671 1649 - 1671 1650 -

1660±14 1240 - 1470 1410 - 1440

Devido à elevada resistência mecânica, as ligas de Co-Cr são processadas pelo processo de

fundição por cera perdida ou por forjamento. Por forjamento é possível obter a máxima

resistência mecânica devido ao encruamento no caso de se realizar trabalho abaixo da

temperatura de recristalização. A fundição apresenta custos de processamento mais reduzidos

pois as peças obtidas são mais próximas das especificações finais, não necessitando de tantas

operações adicionais de remoção de excessos como no forjamento. Outro aspeto que distingue

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

34 João Leite

as peças produzidas por forjamento das produzidas por fundição é a microestrutura obtida, sendo

ela mais uniforme e com granulometria maior no caso da fundição. Também se pode recorrer

prensagem isostática a quente (hot isostatic pressing) para se diminuir a porosidade e melhorar

as propriedades mecânicas de peças obtidas por fundição tornando a microestrutura mais fina.

Este processo aumenta os custos das peças obtidas por fundição (Davis 2003).

A Tabela 8 permite obter uma perspetiva geral dos tipos de ligas abordados.

Tabela 8 - Comparação dos tipos de ligas; adaptado de: (Davis 2003).

Tipo de liga Aços inoxidáveis Ligas de Cobalto Ti e suas ligas

Vantagens Custos, disponibilidade,

facilidade de processamento

Resistência ao desgaste, resistência à corrosão, resistente à

fadiga

Biocompatibilidade, resistência à corrosão,

rigidez mínima, resistência à fadiga

Desvantagens Comportamento a

longo prazo, rigidez elevada

Elevada rigidez, biocompatibilidade

Resistência ao desgaste mais baixa, baixa

resistência ao corte

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

35 João Leite

4 - Processo de fundição por cera perdida No presente capítulo é feita uma descrição detalhada do processo de fundição por cera perdida

dando especial atenção à arquitetura de sistemas de gitagem, especificações conseguidas pelo

processo, especificações definidas por normas de próteses articulares e também especificações

de uma prótese existente no mercado. Antes da exposição dos temas referidos relativos ao

processo de fundição por cera perdida é feita um breve menção de outros processos alternativos,

também utilizados no fabrico de próteses articulares.

Os processos alternativos são o forjamento e os processos de fabrico aditivo. No forjamento, as

próteses são obtidas gradualmente por impacto de uma matriz superior em matéria prima no

estado sólido, estando esta posicionada no interior da matriz inferior com o formato pretendido

(ASM 1996). A temperatura da matéria prima tem um papel fundamental, pois quanto mais

elevada for a temperatura, maior será a ductilidade para a maior parte das ligas metálicas. A

obtenção do produto final requer vários forjamentos e são necessárias várias matrizes com

formatos graduais até à forma do produto final. O processo pode ser melhor compreendido

através da Figura 17.

Figura 17 - Vista esquemática de prensa hidráulica de forjamento (ASM 1996)

Os processos aditivos diferem de todos os outros processos de fabrico pois os modelos são

construídos apenas pela adição de material em camadas sucessivas (Lino Alves et al. 2001). O

modo como decorre o processo é automatizado, não requerendo operários especializados e tem

como ponto de partida um ficheiro num formato CAD. Uma das tecnologias particularmente

empregues no fabrico de próteses articulares é a EBM (electron beam melting). Nesta técnica um

feixe de eletrões funde camadas sucessivas de partículas metálicas (Figura 18).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

36 João Leite

Figura 18 - Esquema de máquina de fabrico aditivo por EBM (ARCAM 2014).

4.1 - Caracterização do processo O processo de fundição por cera perdida (investment casting) é um processo de fundição de

precisão. Na sua designação está patente a criação de componentes de uma só vez tendo como

ponto de partida metal no estado líquido que solidifica, adquirindo a geometria interna de uma

cavidade moldante cerâmica não havendo operações intermédias de remoção de material como

a maquinagem ou operações de conformação plástica (Beeley 2001). A particularidade que

distingue este processo de fundição dos restantes reside na aplicação de barbotinas cerâmicas

nas peças de cera de forma a criar-se uma moldação cerâmica, sendo as peças de cera destruídas

para que se possa vazar o metal para o interior. A desmoldagem é possível pois as carapaças não

são permanentes.

É importante distinguir as duas variantes de fundição por cera perdida. A diferença reside no tipo

de moldação, podendo ser em bloco (block mold process) ou então em carapaça cerâmica

(ceramic shell process), como pode ser visto na Figura 19. O segundo método é mais recente e

também o mais popular sendo o mais relevante para a presente dissertação (Twarog et al. 1993).

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37 João Leite

Figura 19 - Moldação em bloco e moldação em carapaça; adaptado de (Beeley 2001).

A fundição por cera perdida apresenta um vasto leque de vantagens tornando-se num processo

de fabrico de eleição para determinado tipo de componentes. Algumas das vantagens são:

Liberdade de geometrias superior à dos outros processos;

Especificações das peças obtidas próximas das finais (near net shape) necessitando de

menos operações de acabamento do que quando fabricadas por outros processos;

Idealmente não há limites na escolha da liga metálica a vazar;

Elevada precisão dimensional;

Reprodução fiel de detalhes complexos;

Possibilidade de geometrias internas através de machos cerâmicos;

A elevada precisão dimensional está associada ao facto de não haver plano de apartação, ou seja,

as carapaças cerâmicas diferem das moldações convencionais pois são apenas constituídas por

um componente, enquanto as moldações convencionais possuem no mínimo duas metades. A

não existência de plano de apartação também possibilita a fundição de geometrias complexas

que não poderiam ser fundidas com recurso a moldações permanentes. O facto de as carapaças

cerâmicas serem componentes unitários implica a sua destruição para que se efetue a

desmoldagem.

O tipo de liga que se pretende vazar está diretamente relacionado com o tipo de cerâmicas

empregues no fabrico da carapaça, deste modo, ao escolher-se cerâmicas adequadas é possível

fundir qualquer tipo de liga metálica, havendo ligas que apenas se fundem por este processo

como as ligas com elevado ponto de fusão. Este processo também é usado para ligas difíceis de

serem maquinadas ou forjadas. A elevadas temperaturas, certas ligas possuem grande afinidade

com os elementos químicos presentes na atmosfera. A fundição por cera perdida permite o

processamento deste tipo de ligas, no entanto, a fusão e o vazamento têm que ser efetuados em

atmosfera controlada, aumentando o nível de complexidade de todo o processo.

A nível de aplicações, este processo tem grande utilização nas indústrias aeronáutica, automóvel,

militar, entre outras, sendo alguns dos componentes mais fabricados (Figura 20) impulsores e pás

de turbinas, próteses maxilo-faciais, próteses articulares, próteses odontológicas. A fundição por

cera perdida também é um processo bastante utilizado na obtenção de peças de joalharia.

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38 João Leite

Figura 20 - A: pás de turbina aeronáutica monocristalina oca em corte; B: turbina de turbocompressor de motor automóvel em aço; C: componente da parede da câmara de combustão de turborreator; D: componente femoral de uma prótese de joelho; adaptado de (ASM 1998; Zollern 2014a).

Este processo de fabrico é bastante laborioso e envolve um grande número de etapas, sendo a

sequência típica apresentada de seguida:

1. Injeção de

modelos de cera

2.Construção do

cacho

3. Mergulho em

barbotinas

cerâmicas

4. Pulverização

com partículas

cerâmicas

5. Remoção da

cera

6. Sinterização da

carapaça

cerâmica

7. Vazamento do

metal

8. Abate da

carapaça

cerâmica

9. Acabamento

das peças

10. Inspeção

Figura 21 - Sequência do processo de fundição por cera perdida; adaptado de (Twarog et al. 1993).

Em geral, todo o processo de fundição por cera perdida é extremamente complexo. Existe um

grande número de variáveis que influenciam fortemente a qualidade do produto final. Algumas

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39 João Leite

das variáveis são definidas pela metodologia de fabrico enquanto outras são aleatórias não

podendo ser controladas como as condições meteorológicas. O conhecimento aprofundado de

todas as etapas do processo é imperativo.

4.2 - Obtenção de modelos para fundição O processo de fundição por cera perdida caracteriza-se pela perda de modelos correspondentes

aos componentes que se pretende obter. Deste modo, por cada componente fundido, é criado

um modelo. Essencialmente existem dois métodos (Figura 22) de obtenção de modelos

consoante a dimensão da série:

Injeção de cera em moldes:

Fabrico aditivo direto de modelos.

É também possível obter perfis de cera por extrusão para sistemas de gitagem.

Figura 22 - Fluxograma de metodologias de obtenção de peças de modelos perdidos para fundição

Modelo perdido

Fabrico aditivo de modelos

Injeção de cera em moldes

Moldes de silicone

Moldes de resinas

carregadas

Moldes por fabrico aditivo Moldes

metálicos

Impressão em cera

Estereolitgrafia

FDM

CAD original Peça existente que se pretende replicar

Levantamento de forma

CAD

Contacto Sem contacto

Ativo Passivo

Série muito

pequena?

Não

Sim

Fabrico aditivo de peça mestre

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40 João Leite

O levantamento de forma poderá ser feito por contacto ou sem contacto. Uma máquina de

medição de coordenadas (coordinate measuring machine) é um exemplo de um dispositivo de

levantamento de forma por contacto (Figura 23). Este tipo de aparelho movimenta uma sonda

segundo 3 eixos principais paralelos entre si. Associados à extremidade da sonda existem outros

eixos, permitindo grande amplitude de movimentos. Este tipo de equipamentos permite gerar

uma nuvem de pontos, sendo que cada um corresponde a um contacto entre a sonda e o

objeto a medir. Como desvantagens, a medição de objetos frágeis e delicados poderá ser

impossível devido ao contacto da sonda.

Figura 23 - A: Nikon Altera 12.10.8; B: sonda de contacto medindo impulsor; adaptado de (Nikon Metrology 2014).

A GOM ATOS Triple Scan insere-se no grupo de dispositivos por sem contacto ativo pois emite luz

que é refletida pelo objeto e captada por sensores integrados no dispositivo.

Figura 24 - GOM Atos Triple Scan (GOM 2014).

O levantamento de forma por não-contacto passivo difere do ativo ao apenas necessitar de

sensores de radiação, tanto no espetro visível como na gama dos infravermelhos.

Consoante a dimensão da série, poderão ser adotadas diferentes metodologias. Para produções

muito limitadas, da ordem das unidades, poderá ser viável o fabrico aditivo de modelos. A

produção de modelos com estrutura interna tipo “ninho de abelha” é preferível pois a menor

densidade facilita a eliminação do modelo através da carbonização (Lino Alves et al. 2001).

Quando se pretende obter várias peças metálicas com a mesma geometria, torna-se viável o

fabrico de moldes para injeção de ceras. A Tabela 9 permite obter uma perspetiva global das

possibilidades existentes.

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41 João Leite

Tabela 9 - Comparação entre diferentes processos de obtenção de moldes para injeção de ceras; adaptado de (Lino Alves et al. 2001; Simer 2013).

Tipo de

moldes Vantagens Desvantagens Observações

Fabrico

aditivo

(Figura

25-A)

Construção é mais fácil

relativamente aos moldes

de resinas carregadas; não

requer operários

especializados como os

moldes de alumínio;

elevada flexibilidade;

Qualidade e durabilidade

depende do tipo de

processo usado; elevada

rugosidade

Tecnologias possíveis: SLS,

SLSm, DMLS;

Silicone

(Figura

25-B)

Ideal para peças de difícil

desmoldação (com

contrassaídas); rapidez de

obtenção de molde;

Flexibilidade do silicone

torna o molde propenso a

empenos e distorções;

Alumínio

(Figura

25-C)

Elevada durabilidade;

elevada precisão e

acabamento superficial;

Possibilidade de

automatização do

processo;

Custo elevado

comparativamente às

alternativas;

Utilização industrial de

cadência elevada; fabrico

por maquinagem;

Resinas

carregadas

(Figura

25-D)

Pouco dispendioso

relativamente aos moldes

de alumínio e por fabrico

aditivo;

Certas geometrias tornam

a construção do molde

muito complexa;

durabilidade e precisão

inferiores à dos moldes de

alumínio;

Resinas epoxy ou de

poliuretanos; reforço com

cargas de alumínio

aumentam a

condutibilidade térmica e

a resistência mecânica;

indicado para pré-séries;

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42 João Leite

Figura 25 - A: molde obtido por fabrico aditivo (Simer 2013); B: molde de silicone com pá de turbina em cera (Vaezi, Safaeian, e Chua 2011); C: molde de alumínio (RP Tooling 2014); D: molde de resina com pós de alumínio (Vaezi, Safaeian, e Chua 2011).

No capítulo 6 da presente dissertação, são expostos casos práticos sobre obtenção de moldes

para injeção de ceras construídos em resinas carregadas e também em alumínio.

4.3 - Arquitetura de sistemas de gitagem A literatura existente acerca do tema versado nesta secção é limitada, no caso particular da

fundição por cera perdida. Pretende-se analisar a aplicabilidade do conhecimento existente sobre

os outros processos de fundição em geral na fundição por cera perdida.

Entende-se por gitagem (gating) como sendo o conjunto de canais existentes na cavidade

moldante, tendo a finalidade de conduzir o metal líquido desde o ponto de introdução na

moldação até à cavidade moldante da peça, garantindo o enchimento desta (Beeley 2001).

Existem várias considerações que devem ser tomadas em conta durante a arquitetura de cachos

de forma a maximizar a eficiência da produção:

O cacho tem que ser transportável;

No caso de a liga ter que ser vazada em vácuo, as dimensões do cacho não poderão

ultrapassar os limites da câmara de vácuo;

A separação de cada peça do cacho deve ser fácil;

O volume total do cacho deve ser inferior à capacidade do cadinho;

Em produções industriais, o rendimento volumétrico de cada cacho deve ser maximizado.

O rendimento volumétrico pode ser entendido como a razão entre o volume das peças do cacho

e o volume total do cacho. Para além do rendimento, outros aspetos económicos também devem

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

43 João Leite

ser tidos em conta. A nível metalúrgico, os requisitos aos quais o sistema de gitagem deve

obedecer são (Beeley 2001):

O caudal e a direção do escoamento do metal têm que ser conseguidos de maneira a que

haja enchimento total da carapaça antes que o metal comece a solidificar (freezing);

O escoamento de metal líquido deve ser o mais laminar e uniforme possível. Deste modo

minimiza-se a existência de defeitos como ar colapsado, inclusões de impurezas e a

formação de filmes de óxidos no metal é inferior;

A distribuição de temperaturas ao longo do cacho deve ser adequada de modo a que a

zona da pia de vazamento solidifique em último lugar e haja uniformidade no conjunto

das peças que constituem o cacho.

Alguns conceitos gerais sobre gitagem em moldações de areia também se aplicam na fundição

por cera perdida (Prasad 2012). Esses conceitos são explicados seguidamente.

Método do módulo:

Esta metodologia tem como base a regra de Chvorinov que permite ter uma aproximação do

tempo de solidificação (freezing) do metal numa secção de uma moldação (ASM 1998).

𝑡 = 𝑘2 (𝑉𝑐𝐴𝑐)2

= 𝑘2𝑀𝑐2 (1)

Sendo 𝑡 o tempo de solidificação da secção da moldação, 𝑉𝑐 o volume da moldação, 𝐴𝑐 a área

superficial da moldação e 𝑘 uma constante associada às propriedades do metal e da moldação

(ASM 1998). Apenas é contabilizada a área por onde há transferência de calor com a superfície

da moldação. A razão entre o volume, 𝑉𝑐, e a área, 𝐴𝑐, da moldação é designada por módulo, 𝑀𝑐.

Wlodawer desenvolveu a aplicabilidade prática deste conceito ao simplificar a equação de

Chvorinov, relativizando a variável tempo pois o interesse deste método reside na comparação

entre módulos de zonas adjacentes, dimensionando-as de forma a controlar-se a solidificação

como será descrito posteriormente (ASM 1998). A simplificação de Wlodawer é a seguinte:

𝑡~𝑉𝑐𝐴𝑐

(2)

De acordo com a teoria, o tempo de solidificação é proporcional ao respetivo módulo. Deste

modo, os módulos de zonas com solidificação mais tardia deverão ser superiores aos módulos de

zonas que solidificam primeiro (ASM 1998). Desta forma é possível controlar-se os tempos de

solidificação de forma a minimizar defeitos volumétricos como rechupes.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

44 João Leite

Alimentador:

É uma zona maciça do sistema de gitagem destinada a ter um arrefecimento mais lento que o da

peça. Os alimentadores também são conhecidos como masselotes, risers ou feeders. O objetivo

do alimentador é compensar a diminuição de volume da peça devido às contrações durante o

arrefecimento e solidificação. O dimensionamento de alimentadores pode ser feito através do

método do módulo, de maneira a que o módulo do alimentador seja suficientemente maior que

o módulo da peça, sendo que a ordem de grandeza varia consoante o tipo de metal. Um

alimentador bem dimensionado absorve os rechupes que se iriam formar na peça caso este não

existisse ou estivesse mal dimensionado.

Em grande parte das fundições por cera perdida o canal de gitagem principal faz o efeito de

alimentador (Prasad 2012).

Solidificação direcional:

Devido às diferentes massividades das zonas da peça, algumas zonas irão solidificar primeiro que

outras, pois a transferência de calor será mais intensa para zonas menos massivas, pois estas têm

uma proporção entre o volume e a área de transferência de calor mais baixa. Num sistema de

gitagem bem arquitetado, a solidificação dar-se-á desde as extremidades das peças do cacho, em

direção à entrada do canal principal ou dos alimentadores, caso estes existam (ASM 1998). Isto

implica que a massividade do sistema de gitagem seja superior à das peças, havendo relação com

o dimensionamento pelo método dos módulos. O gradiente térmico está também relacionado

com estes conceitos. É possível influenciar o gradiente térmico ao controlar-se a transferência de

calor em pontos específicos de um cacho (Stachovec et al. 2012). Se a intenção é retardar a

solidificação localmente, recorre-se à aplicação de isolante, sendo frequente a utilização de fibras

cerâmicas. No caso contrário aplica-se um chill, que poderá ser um material com condutibilidade

térmica elevada, facilitando a transferência de calor da zona da peça fundida para o exterior da

moldação. Este efeito também é bastante importante na fundição por moldações permanentes,

sendo prática corrente a integração de circuitos internos de fluido refrigerante. No caso da

fundição por cera perdida, não é possível a integração de circuitos de refrigeração nem é fácil a

utilização local de materiais de elevada condutibilidade térmica. No entanto, podem-se utilizar

escoamentos externos como meio de arrefecimento. Um exemplo de escoamento externo é a

utilização de ar comprimido à temperatura ambiente. Esta técnica apenas é viável para ligas que

não requerem atmosfera controlada durante o vazamento. No caso de ligas reativas, é mais fácil

a utilização de isolamento, uma vez que a integração de sistemas de refrigeração em câmaras de

atmosfera controlada poderá não ser viável nem prática.

No artigo científico “Gating Systems for Sizeable Castings from Al Alloys Cast into Ceramic

Moulds”, Stachove et al. (2012) apresentam um estudo comparativo sobre a utilização de

isolamento, refrigeração localizada por escoamento externo (blowing) numa extremidade da

carapaça e isolamento na outra, averiguando a formação de rechupes. O estudo é concretizado

com recurso à simulação em ProCAST. A peça que se pretende vazar tem um comprimento total

de 700mm e a sua espessura é reduzida, não possuindo zonas de elevada massividade. As

possibilidades ensaiadas podem ser vistas na Figura 26.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

45 João Leite

Figura 26 - A: sistema de gitagem simples; B: sistema de gitagem com isolamento de fibra de vidro no topo; C: sistema de gitagem com isolamento de fibra de vidro no topo e refrigeração no fundo; adaptado de (Stachovec et al. 2012).

Como se pode ver na Figura 27, a terceira solução minimiza mais a formação de rechupes no

interior da peça. As soluções térmicas empregues permitem melhorar a solidificação direcional

pois acentuam o gradiente térmico existente entre o fundo e o topo (Stachovec et al. 2012). É

importante reparar que os rechupes formaram-se nos últimos locais a solidificar. Devido às

soluções de condicionamento térmico empregues, a formação de rechupes foi mais acentuada

no canal de gitagem, perto da pia de vazamento.

Figura 27 - Simulações em ProCast da formação de rechupes (manchas pretas); A: sistema de gitagem simples; B: sistema de gitagem com isolamento; C: sistema de gitagem com isolamento e refrigeração; adaptado de (Stachovec et al. 2012).

Tipo de solidificação:

As ligas metálicas possuem formas distintas de solidificação sendo a aptidão para a promoção de

solidificação direcional diferente consoante o tipo de solidificação. A classificação das ligas

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46 João Leite

depende do intervalo de solidificação, desde que começa até que o metal está completamente

solidificado (ASM 1998):

Curto: inferior a 50 ⁰C;

Intermédio: entre 50 ⁰C e 110 ⁰C;

Longo: superior a 110 ⁰C.

No caso dos metais puros, o intervalo de solidificação é nulo. O mesmo também acontece para

ligas eutécticas (Monteiro 1996). As ligas com solidificação curta (Figura 28) caracterizam-se pela

formação de lamelas em estado sólido, começando na parede da moldação, sendo

perpendiculares a esta. A sua propagação dá-se em direção ao centro. Para ligas com solidificação

longa (Figura 28), há formação de glóbulos sólidos dispersos de forma aleatória.

Figura 28 - Esquerda: solidificação curta lamelar; Direita: solidificação longa globular; adaptado de (ASM 1998).

Para ligas com solidificação intermédia tanto há formação de lamelas como formação de glóbulos.

A aptidão para a solidificação direcional é tanto maior quanto menor for o intervalo de

solidificação. Devido à forma de solidificação das ligas com solidificação longa ser desorganizada,

a alimentação é prejudicada, havendo propensão para a formação de microrrechupes superior

do que em ligas com intervalo de solidificação menor (ASM 1998). Embora a solidificação

aconteça como foi descrito, o gradiente térmico entre o metal líquido e as zonas próximas é

também importante e influente pois quanto mais massiva for a zona da moldação, mais tempo

demorará a solidificar. Ligas com solidificação curta tenderão a apresentar comportamento de

ligas com solidificação longa em zonas mais massivas (ASM 1998). As condutibilidades térmicas

tanto da liga como da moldação são influentes no modo de solidificação.

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47 João Leite

Simulação de arquiteturas:

A simulação numérica é uma ferramenta muito importante na fundição pois permite validar

arquiteturas de sistemas de gitagem antes do seu vazamento. Desta forma é possível prever a

ocorrência de defeitos, efetuando-se alterações não só na geometria do cacho como também

nas condições de vazamento. O valor da simulação não assenta exclusivamente no software, pois

este não possui capacidade para arquitetar sistemas de gitagem autonomamente. Desta forma,

para que a utilização destes softwares seja de melhor proveito, são necessários conhecimentos

gerais sobre sistemas de gitagem, implicando um utilizador com um certo grau de especialização,

capaz de arquitetar sistemas que sirvam como pontos de partida. Recorrendo-se à simulação

numérica é possível comparar diferentes propostas ou iterações auxiliando na decisão final do

utilizador.

A simulação numérica assenta essencialmente no método das diferenças finitas ou no método

dos elementos finitos (ASM 1998). A realidade é discreteada em malhas de elementos. Quanto

menor forem as dimensões dos elementos, maior será a precisão da simulação. Em contrapartida,

a exigência computacional será mais elevada, aumentando a duração do processo. Embora o

aumento da densidade das malhas de simulação torne os resultados mais próximos da realidade,

é importante referir que a realidade é composta por um número infinito de variáveis sendo que

muitas se poderão considerar aleatórias. As variáveis associadas às temperaturas são exemplos

de variáveis com grande sensibilidade pois existem várias transferências de calor difíceis de

contabilizar.

O software ProCAST utiliza o método das diferenças finitas. Este software está dotado das

seguintes ferramentas (ESI Group 2014):

Análise térmica;

Análise de tensões;

Análise de escoamentos;

Ferramentas para processos específicos de fundição.

Apresenta-se um caso de estudo sobre a utilização de simulações em ProCAST na análise e

compreensão da fissuração a quente de uma prótese de anca (Alvarez-Vera et al. 2013). Este tipo

de defeito é provocado por estados de tensão adversos durante a solidificação, causando

fragilidade na interface ainda líquida entre grãos já solidificados (Alvarez-Vera et al. 2013). O

material vazado é a liga de Co-Cr, ASTM F 75. Como se pode ver pela Figura 29-B, a simulação

prevê a possibilidade de defeitos volumétricos na esfera das próteses de anca (áreas a vermelho).

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48 João Leite

Figura 29 - Prótese de anca antes da otimização; A: gradiente térmico; B: presença de porosidade e fratura por fissuração a quente; C: vazamento de Co-Cr; D: peça em corte obtida com defeitos internos; adaptado de (Alvarez-Vera et al. 2013).

A solução implementada para otimização foi a alteração das condições de fronteira de

transferência de calor recorrendo-se ao isolamento do sistema de gitagem com uma barreira

adiabática (Alvarez-Vera et al. 2013). Deste modo os defeitos apenas surgiram na pia de

vazamento (Figura 30-B).

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49 João Leite

Figura 30 - Otimização da prótese de anca; A: gradiente térmico; B: presença de defeitos apenas no topo da pia de vazamento (zona roxa indica ausência de defeitos); C: vazamento de Co-Cr em carapaça com isolamento no sistema de gitagem; D: peça em corte obtida isenta de defeitos; adaptado de (Alvarez-Vera et al. 2013).

Outro caso de estudo relevante para o tópico presente é a tese de metrado de Carlos Gonçalves,

antigo aluno de Engenharia Mecânica da FEUP (Gonçalves 2011). Nesta tese, é projetado um

sistema de gitagem para um cacho de 4 componentes femorais de uma prótese de anca na liga

Ti6Al4V. São feitas 3 iterações (Figura 31-33), alterando-se a massividade e orientação dos canais

de alimentação. Na última iteração (Figura 33-C) é aplicado isolamento de fibra no sistema de

gitagem, solucionando o problema dos rechupes.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

50 João Leite

Figura 31 - 1ª iteração; A: pia de vazamento; B: rechupes (manchas amarelas) no interior das próteses; adaptado de (Gonçalves 2011).

Figura 32 - 2ª iteração; A: segunda pia mais massiva e com alimentação mais direta; B: formação de rechupes (manchas amarelas) no interior das próteses; adaptado de (Gonçalves 2011).

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51 João Leite

Figura 33 - 3ª iteração; A: terceira pia mais massiva; B: formação de rechupes (manchas amarelas) sem isolamento; C: rechupes apenas na pia de vazamento após aplicação de isolamento; adaptado de (Gonçalves 2011).

4.4 - Formação de carapaças cerâmicas A escolha da cerâmica refratária deve ser feita de modo a que esta seja o mais quimicamente

inerte relativamente ao metal a vazar, evitando-se deste modo a formação de compostos

químicos indesejáveis. A escolha de cerâmicas adequadas é um passo crítico na obtenção de uma

peça fundida de qualidade aceitável.

4.4.1 - Diagrama de Ellingham

Uma das ferramentas mais importantes na escolha de materiais refratários são os diagramas de

Ellingham (Figura 34). Este tipo de diagramas representa a relação existente entre a força motriz

responsável pela ocorrência de uma reação química e a temperatura a que se encontram os

reagentes, ou seja, os diagramas de Ellingham permitem saber a estabilidade de certos

compostos químicos para um espetro alargado de temperaturas (University of Cambridge 2013a).

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52 João Leite

Figura 34 - Diagrama de Ellingham para vários compostos químicos (University of Cambridge 2013a).

A energia livre de Gibbs, G, pode ser entendida como a energia disponível de um sistema que

será responsável pela alteração do seu estado. Esta energia é função da entalpia, temperatura e

entropia do sistema:

𝐺 = 𝐻 − 𝑇 × 𝑆 (3)

Após a manipulação da equação é possível exprimir a energia livre de Gibbs como:

𝐺 = 𝐺0 + 𝑅 × 𝑇 × ln𝑝

𝑝0 (4)

Em que 𝐺0 é a energia livre padrão à pressão padrão 𝑝0. 𝑅 é a constante dos gases perfeitos. A

diferença de energia livre entre os produtos e os reagentes, ∆𝐺, é indicativa do tipo de

comportamento que poderá haver entre os reagentes e os produtos. Quanto mais negativo for o

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53 João Leite

valor, maior será a força motriz para que aconteça a reação química, que ocorrerá até que

diferença de energia livre seja nula, atingindo-se um estado de equilíbrio para as condições de

pressão e temperatura às quais estão expostos os reagentes (University of Cambridge 2013b).

Seguindo este raciocínio, quanto mais elevada for a posição de uma linha de um elemento

químico, maior será a sua estabilidade e inércia à ocorrência da reação química. Por esta razão

os metais nobres, como o ouro, a prata e a platina têm as linhas mais elevadas (não

representadas) e são encontrados na natureza no estado puro.

De acordo com o diagrama de Ellingham (Figura 34), quanto mais negativa for a energia livre dum

elemento químico para uma dada temperatura, menor será a possibilidade de este se oxidar,

reduzindo o óxido com energia livre menos negativa. A energia livre para a temperatura de

vazamento do metal deverá ser menos negativa que a energia livre do cerâmico. A linha do

cerâmico refratário deverá ter uma posição inferior à linha do metal que se pretende vazar. Os

elementos de liga do metal também poderão reagir, por isso deverão ser tidos em conta na

seleção do refratário.

4.4.2 - α-case As barbotinas cerâmicas mais frequentes são à base de sílica e aluminossilicatos. No caso

particular da fundição de titânio, as formulações que contêm silício e compostos derivados deste

são inadequadas, pois reagem com o titânio formando uma camada superficial de compostos

intermetálicos de elevada dureza e fragilidade denominada α-case (Duarte et al. 2008).

Duarte et al. (2008) apresenta resultados comparativos entre diferentes formulações cerâmicas

para a fundição de titânio. De entre as 3 formulações testadas (zircónia estabilizada com ítria,

zircónia estabilizada com cálcia e ítria) aquela que apresentou melhores resultados foi a última.

Como se pode ver pelas microestruturas da Figura 35, a última, que é resultante da carapaça

cerâmica de ítria, não apresenta camada superficial de α-case como as duas primeiras

microestruturas. O Gráfico 1 demonstra que não houve α-case na amostra fundida em carapaça

de ítria, uma vez que a dureza se manteve aproximadamente constante ao longo do perfil.

Figura 35 - Microestrutura da liga Ti-10V-2Fe-3Al; A: carapaça de ZrO2-Y2O3; B: carapaça de ZrO2-CaO; C: carapaça cerâmica de Y2O3; adaptado de (Duarte et al. 2008).

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54 João Leite

Gráfico 1 - Microdurezas em função da distância à superfície (Duarte et al. 2008).

4.5 - Especificações O estudo das especificações é um dos pontos-chave da presente dissertação. Pretende-se

conhecer as capacidades e limitações do processo de fundição por cera perdida, as especificações

exigidas pelas normas de fabrico de próteses articulares e também as especificações de modelos

de próteses articulares existentes no mercado.

São apresentadas as normas às quais foi possível aceder gratuitamente. Visto que as próteses de

anca e de joelho são as focadas na parte prática, apenas se abordam normas relativas a essas

próteses.

4.5.1 - Especificações conseguidas por fabricantes

Norma VDG P 690

As tolerâncias dimensionais, superficiais e sobre-espessuras de maquinagem (machining

allowances) são definidas pelo documento técnico VDG P 690, emitida pela Federação da

Indústria de Fundição Alemã (Bundesverband der Deutschen Gießerei-Industrie), BDG (Zollern

2014b). A BDG é constituída por cerca de 600 empresas de fundição.

O documento técnico VDG P 690 tem uma ampla aceitação na indústria da fundição por cera

perdida. A Zollern é uma das empresas que classifica as tolerâncias da sua fundição por cera

perdida de acordo com o VDG P 690.

No documento são definidas 3 categorias de precisão de acordo com as exigências funcionais das

peças fundidas:

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

55 João Leite

Tabela 10 - Categorias de precisão da diretiva VDG P 690 (Zollern 2014b).

Nível de precisão Aplicação

1 Dimensões livres de tolerâncias para peças de complexidade média

2 Dimensões limitadas por tolerâncias

3 Dimensões com elevadíssima exigência funcional

A seleção do nível de precisão implica uma análise de custos. Em certos casos o nível 3 poderá

não ser economicamente a melhor opção pois implica a correção de ferramentas. Uma

alternativa que poderá ser mais viável é garantir o toleranciamento dimensional pela outra peça

que estiver em contacto (Zollern 2014b).

Os níveis de precisão variam de acordo com as três categorias de materiais:

Tabela 11 - Níveis de precisão de acordo com o tipo de material (Zollern 2014b).

Grupo de material Materiais Níveis de precisão

D Ligas à base de ferro,

níquel, cobalto e cobre

D1

D2

D3

A Ligas à base de alumínio e

magnésio

A1

A2

A3

T Ligas à base de titânio

T1

T2

T3

As tolerâncias dimensionais lineares variam de acordo com a dimensão nominal. Os valores

apresentados na tabela seguinte são relativos a materiais dos grupos D e T, relativos às ligas

abordadas no capítulo 3:

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56 João Leite

Tabela 12 - Tolerâncias lineares (todas os valores em mm); adaptado de (Zollern 2014b; BDG 2010).

Dimensões

nominais

(mm)

D1

(mm)

D2

(mm)

D3

(mm)

T1

(mm)

T2

(mm)

T3

(mm)

Até 6 0.3 0.24 0.2 0.5 0.4 0.4

6 até 10 0.36 0.28 0.22 0.6 0.4 0.4

10 até 18 0.44 0.34 0.28 0.7 0.5 0.44

18 até 30 0.52 0.4 0.34 0.8 0.7 0.52

30 até 50 0.8 0.62 0.5 1.0 0.8 0.62

50 até 80 0.9 0.74 0.6 1.5 1.2 0.9

80 até 120 1.1 0.88 0.7 1.7 1.4 1.1

120 até 180 1.6 1.3 1.0 2.0 1.6 1.3

180 até 250 2.4 1.9 1.5 2.4 1.9 1.5

250 até 315 2.6 2.2 1.6 3.2 2.6

315 até 400 3.6 2.8

3.6 2.8

400 até 500 4.0 3.2 4.0 3.2

500 até 630 5.4 4.4 5.4 4.4

630 até 800 6.2 5.0 6.2 5.0

800 até 1000 7.2

7.2

1000 até 1250

A escolha do terceiro nível de precisão está limitada a certas dimensões mediante acordos

estabelecidos entre o cliente e a empresa de fundição.

No documento VDG P 690 também estão definidas as rugosidades (Tabela 13). A classificação das

rugosidades é estabelecida de acordo com a norma DIN 1302. A rugosidade obtida por defeito

corresponde à classe N9 resultante da granalhagem.

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57 João Leite

Tabela 13 - Rugosidades superficiais para os materiais do grupo D e grupo T; adaptado de (Zollern 2014b; BDG 2010).

Rugosidade

superficial

normalizada

Materiais do

grupo D

Materiais do

grupo T

Ra (μm) Ra (μm)

N7 1.6 -

N8 3.2 -

N9 6.3 6.3

Capacidades de fundição

Como já foi referido anteriormente, as dimensões dos cachos são importantes pois terão que ser

compatíveis com os fornos onde irão ser processadas. A

Tabela 14 apresenta algumas características relevantes sobre a fundição por cera perdida em

vácuo da Zollern:

Tabela 14 - Limites dos fornos de vácuo para fundição de ligas reativas da Zollern (Zollern 2014b)

Limites de vácuo (mbar) 10-2 - 10

Limites geométricos (mm3) ⌀250×300

Limites mássicos 15 kg para ligas à base de Ni, Co, aço, Cu

4.5.2 - Especificações definidas por normas

As normas relevantes são as que definem os parâmetros dos produtos obtidos pelos processos

de fabrico, mais concretamente pela fundição por cera perdida.

Parâmetros dimensionais:

As normas publicadas pela ISO, relativas a implantes cirúrgicos, não definem dimensões

específicas nem gamas de valores aceitáveis para as dimensões geométricas. Deste modo, o

projetista possui uma certa liberdade na criação de novas próteses pois não está totalmente

restringido por normas no que toca a aspetos dimensionais. A norma ISO 7206 atribui

designações às principais dimensões de geometrias típicas de próteses articulares de anca (Figura

36). O modo como são definidas as dimensões serve como base para os ensaios mecânicos

definidos na norma.

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58 João Leite

Figura 36 - Designação normalizada das dimensões de um componente femoral de haste reta típico para próteses articulares da anca (BSI 2008).

Composição química:

As diferentes ligas metálicas utilizadas no fabrico de dispositivos médicos, como os implantes

ortopédicos, são cobertas na sua totalidade por normas, como já foi mencionado ao longo da

presente dissertação, em particular no capítulo 3, onde é feita a caracterização química de cada

uma.

De todas as normas analisadas é necessário referir que a maioria das ligas existe na variedade

para fundição e na variedade para semi-produtos. Um aspeto curioso foi o da inexistência de

norma ISO para a liga Ti6Al4V para fundição. Esta variedade está normalizada segundo a ASTM

F1108. Embora esta liga seja própria para dispositivos médicos, durante a pesquisa bibliográfica

não foi encontrada qualquer menção a esta norma ASTM. Das ligas aceites pela norma BS 7254:

part 2: 1990 para produção de próteses ortopédicas, não está prevista a fundição de Ti6Al4V.

Apenas é aceite o forjamento desta liga.

Microestrutura:

É possível caracterizar a morfologia da microestrutura segundo as fases presentes, tamanho e

formato de grão, presença de inclusões e de precipitados. A microestrutura aceitável é definida

nas respetivas normas das ligas.

Liga de cobalto-crómio-molibdénio trabalhada: a respetiva norma da ASTM F 799, não

define parâmetros microestruturais. Desconhece-se o conteúdo da norma ISO 5832-12.

Liga de cobalto-crómio-molibdénio fundida: tanto a norma ASTM F 75, como a norma

equivalente ISO 5832-4 não definem nenhum dos parâmetros microestruturais

apontados como relevantes.

Liga Ti6Al4V trabalhada: a caracterização é descrita pela Tabela 15.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

59 João Leite

Tabela 15 - Caracterização da liga Ti6Al4V trabalhada segundo as normas da ISO e da ASTM.

Norma Fases Inclusões Observações

ISO 5832-3 α+β globulares

Livre de inclusões

visíveis quando

ampliado 200X

Ver

microestruturas A1

a A9 da norma ISO

20160 no anexo A

ASTM F

136

α+β dispersas resultantes

de processamento no

domínio α+β; os grãos de α

não deverão ser grosseiros

e alongados

Não especificado Não deve ter α-

case

Liga Ti6Al4V fundida: não está normalizada pela ISO. A norma ASTM F 1108 relativa a este

tipo de liga não define parâmetros microestruturais.

Tratamentos térmicos:

A norma ASTM F 1108 relativa à fundição de componentes na liga Ti6Al4V especifica que deverá

ser realizada prensagem isostática a quente aos componentes produzidos segundo esta norma

antes da maquinagem química para remoção da camada de α-case. Também poderão ser

realizados outros tratamentos térmicos como o recozido, o recozido de solução (solution

treated), o envelhecimento ou então outros métodos que permitam alterar as propriedades

mecânicas mediante acordo estabelecido entre o fabricante de implantes e a fundição.

Relativamente à liga de cobalto-crómio-molibdénio para fundição, a aplicabilidade de

tratamentos térmicos não é definida por nenhuma norma.

Qualidade superficial:

O artigo 3.1 da norma ASTM F 86-84 especifica:

“Os implantes metálicos, quando inspecionados segundo o método estabelecido, deverão ser

livres de imperfeições superficiais tais como as provocadas por ferramentas (toolmarks), entalhes,

fendas, cavidades, rebarbas e outros defeitos que comprometam a funcionalidade do dispositivo.

A superfície deverá também ser livre de detritos resultantes do acabamento e de outros

contaminantes indesejáveis.”

O método de inspeção especificado na norma é a observação à vista desarmada de todas as

superfícies. A possibilidade de utilização de outros métodos de inspeção mais sofisticados quando

especificados pelo fabricante é aceite.

A norma BS 7254:part 2, relativa a materiais e acabamentos de materiais metálicos para

implantes ortopédicos, especifica que a superfície deve ser livre de contaminação e também de

defeitos superficiais, à semelhança da norma ASTM F 86-84. Todas as arestas salientes deverão

ser removidas. No caso da liga de cobalto-crómio-molibdénio fundida, o acabamento deverá ser

mate, exceto quando é necessário que a superfície seja polida por processos mecânicos. Em

ambos os casos, a substância abrasiva (medium) deverá ser ter uma composição isenta de ferro.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

60 João Leite

A norma BS 7254:part 2 não prevê a utilização da liga Ti6Al4V por fundição. O tipo de acabamento

para a liga Ti6Al4V trabalhada poderá ser polimento por meios mecânicos ou acabamento mate

por jato de vapor, granalhagem e polimento mecânico. Os métodos abrasivos utilizados deverão

ser isentos de ferro.

4.5.3 - Especificações de próteses comerciais

As especificações apresentadas nesta secção são relativas à produção de componentes de Co-Cr-

Mo fundidos para próteses ortopédicas. A liga de Co-Cr-Mo utilizada é definida pela norma ISO

5832-4.

O fluxograma da Figura 37 permite ter uma compreensão simplificada da produção dos dois

componentes da prótese de joelho da Zollern para a .

Figura 37 - Fluxograma da produção do componente de próteses de joelho segundo as especificações técnicas resultantes do contrato entre a e a Zollern.

Fornecedor reconhecido

Master melt de Co-Cr-Mo (ISO 5832-4)

sem refundição

Fundição

em vácuo por indução

a ar com “roll over”

Marcação de cada

componente

Inspeção

Visual

Teste por líquido penetrante (ISO 9583)

Raio-X

Defeitos?

Reparação por soldadura

Sucata

Não reparáveis

Reparáveis

Não defeituosas

Análise completa à comp. Química

(ISO 5832-4) Provetes

Ensaios de tração (ISO 5832-4)

Prensagem isostática a quente:

Aquecimento a 10 ⁰C/min até 1150-1210⁰C

100-140 MPa durante 3 hr em árgon (pureza: 99,996%)

Arrefecimento a 10 ⁰C/min

Tratamento térmico:

4 horas

1170-1210 ⁰C

vácuo 5×10-2

mbar min. ou gás protetor

Arrefecimento rápido em gás ventilado

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

61 João Leite

A finalidade da marcação de cada peça é facilitar a identificação aquando da inspeção por raio-X.

A reparação por soldadura é realizada por técnicos da indústria aeronáutica, qualificados segundo

a norma DIN EN 29591. O material de adição é obrigatoriamente o mesmo que o material base.

Para além dos métodos de inspeção mencionados na Figura 37, são feitas análises à

microestrutura medindo-se o tamanho de grão (secção inferior a 12.6 mm2), a presença de

impurezas e de microrrechupes. A análise microestrutural apenas deverá ser feita nas séries

iniciais de novos componentes ou quando há alterações significativas ao processo de fundição.

As inclusões de óxidos, e os elementos para afinação do grão não deverão ter dimensões

superiores a 20 μm. São aceites partículas singulares com tamanhos até 150 μm. O limite máximo

para microrrechupes é de um microrrechupe com área de 1% em 1 mm2 de secção, 2 mm abaixo

da superfície da haste de uma prótese. Noutras zonas da prótese são aceites microrrechupes com

área até 3% em 1 mm2. Não são aceites próteses com inclusões à superfície superiores a 20 μm,

após os processos de granalhagem e polimento. A inspeção dimensional é feita de acordo com

os desenhos de definição de cada componente devendo-se utilizar medidores (gauges) próprios

no caso de estes existirem. Por fim, os ensaios à fadiga são realizados pelo cliente.

Relativamente aos métodos de inspeção, é possível consultar no anexo C do presente

documento, as tabelas com os limites aceitáveis para cada método.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

62 João Leite

A Figura 38 faz parte do desenho de definição de um componente femoral de uma prótese de

joelho, sendo representativo da produção da Zollern apresentada. Como pode ser constatado, o

intervalo de tolerâncias mais apertado é ±0,1mm. O acabamento superficial corresponde a uma

rugosidade de 3,2 Ra, como pode ser visto na Figura 38.

Figura 38 - Excerto de um desenho de definição de um componente femoral duma prótese de joelho apresentando uma vista de perfil cotada e algumas informações relativas a tolerâncias, material e rugosidade.

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63 João Leite

5 - Parte experimental 5.1 - Metodologia Os objetivos práticos passam pela fundição de cachos com três geometrias diferentes de próteses

na liga Ti6Al4V de forma a poder-se comparar a qualidade das peças obtidas pelas diferentes

arquiteturas de sistemas de gitagem e também comparar com os resultados obtidos por

simulação. Outro objetivo é a análise das peças obtidas segundo as normas expostas na pesquisa

bibliográfica da presente dissertação.

A parte experimental desenvolveu-se de acordo com a Figura 39.

Figura 39 - Fluxograma da metodologia adotada para o trabalho experimental.

Obtenção de ficheiros CAD

Obtenção de moldes para injeção de ceras

Projeto de moldes de alumínio para injeção de ceras

Definição arquiteturas de cachos

Injeção de peças de cera

Construção de cachos de cera

Formação de carapaças

Descerificação e sinterização

Simulação das arquiteturas

Vazamento das carapaças

Análise das peças obtidas

Componente femoral da anca

Componente tibial do joelho

Componente femoral do joelho

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

64 João Leite

5.2 - Modelos iniciais O trabalho experimental desta dissertação incide em três componentes de próteses articulares.

A primeira peça apresentada faz parte de uma prótese de anca e foi obtida num formato CAD. As

restantes peças fazem parte de uma prótese de anca os modelos físicos são provenientes da ZCP.

Ficheiro CAD de uma prótese de anca: este modelo foi criado pelo Eng. Paulo Machado

do INEGI, com base em componentes femorais de próteses standard típicas de anca

pretendendo ser um modelo representativo.

Figura 40 - A: desenho de definição do componente femoral da prótese da anca; B: vista isométrica em SolidWorks.

Modelo em cera do componente tibial duma prótese de joelho da ZCP: esta peça de cera

faz parte duma pré-série de testes da ZCP para a produção duma prótese de joelho. Esta

peça iria ser convertida num componente metálico pelo processo de fundição por cera

perdida na ZCP. O seu acabamento superficial é uniforme e livre de imperfeições pois

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65 João Leite

resulta da injeção de cera num molde de alumínio com 2 placas moldantes. É necessário

realçar que o canal de gitagem é parte integrante da geometria (não visível na Figura 41).

Figura 41 - Modelo em cera do componente tibial duma prótese de joelho da ZCP.

Peça fundida do componente femoral duma prótese de joelho da ZCP: é parte integrante

da prótese de joelho juntamente com o componente tibial referido anteriormente. Foi

removida de um cacho vazado da ZCP numa liga metálica (Figura 42-A). O cacho

encontra-se no estado após abate da carapaça. Os canais de gitagem ainda estão

presentes na peça. Foi feita uma análise química por espectrometria e concluiu-se que a

liga é uma de Co-Cr-Mo respeitando as composições definidas tanto pela norma ASTM

F75 como a ISO 5832-4. Os resultados obtidos podem ser encontrados no anexo B da

presente dissertação.

Figura 42 - A: cacho cedido pela ZCP; B: peça fundida do componente femoral duma prótese de joelho após remoção do cacho.

5.3 - Obtenção de ficheiros CAD O processamento dos modelos iniciais através de softwares de CAD é necessário para que se

possa otimizar as geometrias para os métodos de produção seguintes. A obtenção de ficheiros

de CAD apenas é necessária para os dois componentes do joelho uma vez que a peça da anca foi

obtida já no formato CAD.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

66 João Leite

O método utilizado passa pelo scan tridimensional e processamento do ficheiro obtido,

convertendo-o para um formato CAD compatível com os programas de CAD disponíveis. O

scanner utilizado foi o GOM ATOS Triple Scan e o software de processamento foi o ATOS

Professional.

A primeira peça a ser processada por scan tridimensional foi o componente femoral do joelho.

Começou-se por aplicar pontos de referência na superfície da peça, sendo necessários para a

orientação espacial do scan tridimensional. Os pontos de referência possuem adesivo numa das

superfícies. O passo seguinte foi cobrir a peça com uma película branca projetada por spray

(Helling Standard-Chek Medium Ne.3 Entwickler Spray weiß), que se caracteriza por ser uma lata

de spray contendo uma suspensão à base de álcool de partículas brancas com baixa

granulometria (Helling 2014). A finalidade da camada branca é reduzir o brilho da superfície de

modo a que não haja interferências causadas pela reflexão da luz emitida pelo scanner na

superfície da peça.

Figura 43 - A: scan 3d; B: luz azul do scanner incidindo na peça pintada com pontos de referência aplicados; C: processamento no software ATOS Professional.

A obtenção da geometria final necessitou de várias iterações pois é necessário reorientar a peça

de modo a que todas as superfícies sejam expostas à luz do scanner. O software utilizado no

processamento permitiu conjugar as superfícies obtidas após as sucessivas iterações, eliminando

detalhes residuais como as interferências causadas pela mesa que serviu de apoio à peça.

O formato do modelo obtido após o processamento foi em STL (SterioLithography). A modelação

em CAD do componente femoral do joelho não estava isenta de imperfeições. Essas imperfeições

poderão estar associadas a diversos fatores podendo ser falha de película branca na zona ou

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

67 João Leite

então a orientação da luz incidente poderá não ser a mais adequada relativamente à zona

afetada. A correção dos modelos (Figura 44) foi realizada com recurso ao 3-matic dadas as suas

capacidades de trabalho em ficheiros STL.

Figura 44 - A: defeito do scan 3d; modelação em 3-mactic; B: superfície da peça original isenta de defeitos; C: correção do defeito (a azul).

O procedimento para o componente tibial do joelho foi semelhante ao que foi descrito para o

componente femoral do joelho. A Figura 45 apresenta as modelações das peças em SolidWorks

após os procedimentos que foram relatados.

Figura 45 - A: modelação CAD do componente tibial; B: modelação CAD do componente femoral.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

68 João Leite

5.4 - Projeto de moldes para injeção de ceras Como se pretende vazar várias peças de cada um dos componentes, foi necessário criar-se

moldes para injeção de peças em cera. Criaram-se moldes em resina de poliuretano carregadas

de alumínio para o componente tibial da prótese do joelho e para o componente femoral da

prótese da anca. O molde para o componente femoral da prótese do joelho foi criado por fabrico

aditivo. Foram também projetados moldes em alumínio apenas para o componente tibial e para

o componente da anca.

5.4.1 - Moldes em resinas carregadas

A obtenção de moldes em resinas carregadas para o componente tibial da prótese do joelho e

para o componente femoral da prótese de anca foi conseguida através de fabrico aditivo para a

criação da peça madre, sendo o molde construído manualmente. A sequência pode ser melhor

compreendida através do seguinte fluxograma:

Figura 46 - Sequência de criação dum mole de injeção de ceras em resinas carregadas tendo como ponto de partida um modelo duma peça em CAD.

Modelo em CAD

Adição do canal de

gitagem

Cálculo do módulo da

peça (𝑀𝑝𝑒ç𝑎)

Cálculo do módulo da

pia (𝑀𝑝𝑖𝑎)

𝑀𝑝𝑒ç𝑎 <

𝑀𝑝𝑖𝑎 ?

Criação do plano de

apartação

Criação de cavidades

para pinos

Definição do fator de

contração

Fabrico aditivo da peça

madre

Construção do molde

Molde para injeção de

ceras

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

69 João Leite

Componente femoral da anca

Em primeiro lugar foi criado o molde para o componente femoral da prótese da anca devido à

simplicidade de execução. O canal de gitagem foi adicionado de modo a criar-se ligação desde a

zona mais maciça até à pia de vazamento, promovendo-se a solidificação direcional. A pia

utilizada para o dimensionamento já existia no INEGI, tendo sido usada noutras ocasiões para o

vazamento de outros componentes femorais de anca (Gonçalves 2011). Foi dada atenção ao

modo como o canal de gitagem faz a ligação à peça pois o corte após vazamento deve ser fácil,

sendo notória a distinção entre a peça e o canal de gitagem.

Figura 47 - A: canal de gitagem; B: junção do canal de gitagem à superfície da peça de modo a ser possível distinguir-se a superfície plana da peça e o arredondamento da aresta do canal de gitagem; C: pia de vazamento para componentes femorais de próteses de anca existente no INEGI.

A arquitetura do canal de gitagem foi validada pelo método dos módulos, sendo usada a

ferramenta Mass Properties do SolidWorks para medição das áreas e dos volumes:

Tabela 16 - Cálculo do módulo.

Área (𝑚𝑚2) Volume (𝑚𝑚3) Módulo (𝑚𝑚)

Pia 24680.28 359077.89 14.55

Peça 11356.88 44952.08 3.96

Os valores apresentados para a área não são os totais de cada um dos corpos. Foram subtraídas

as superfícies que não estão em contato direto com a superfície da cavidade moldante sendo

elas: as superfícies de ligação entre a pia e o canal de gitagem da peça, a superfície do topo da

pia e a superfície interna da pia que serve para fixação de um macho que permite a manipulação

do cacho no momento de formação da carapaça cerâmica. Como se pôde verificar (Tabela 16), o

módulo da pia é superior ao módulo da peça. Desta forma, é expectável que as peças solidifiquem

primeiro que a pia, após o vazamento.

O plano de simetria existente no componente femoral da anca foi adotado como plano de

apartação pois permite uma desmoldagem fácil devido à inexistência de contrassaídas. Foram

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

70 João Leite

criadas duas cavidades cilíndricas (⌀2.5mm×4mm) em cada uma das metades da peça. O objetivo

destas cavidade é permitir o alinhamento entre cada metade no momento de execução o molde.

Figura 48 - As duas metades da peça da anca com cavidades para pinos e canal de gitagem.

A conversão de formato CAD para formato STL foi feita no SolidWorks variando-se os parâmetros

de maneira a que o tamanho do ficheiro fosse próximo de 6Mb.

Foi também feita a verificação volumétrica total de um cacho contendo 4 peças da anca e

também a pia de vazamento apresentada, se estaria dentro dos limites de um cadinho para

fundição de ligas de titânio do INEGI. Verificou-se que havia défice de capacidade do cadinho, no

entanto, a experiência de fundições semelhantes realizadas no INEGI indicou que seria suficiente

para o presente caso pois a pia não seria completamente cheia.

O coeficiente de contração escolhido foi de 2.6% sendo constituído pela soma de duas parcelas,

uma relativa à contração da cera e outra do Ti6Al4V:

O coeficiente de dilatação para a liga de titânio varia consoante a fonte bibliográfica

consultada, não havendo uma fonte que indique exatamente qual o valor entre a

temperatura de fusão (1670⁰C) e ambiente (20⁰C). Por esta razão adotou-se o valor de

9.7*10-6mm/mm.⁰C correspondente ao coeficiente de dilatação médio entre 650⁰C e

20⁰C (TIMET 1999). A relação entre o valor e a temperatura não é linear, como se pode

observar no Gráfico 2 (Carpenter 2000c):

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71 João Leite

Gráfico 2 - Expansão térmica do Ti6Al4V (Carpenter 2000c).

O fator de contração calculado para a liga de titânio foi:

𝛼 ∙ ∆𝑇 = 9.7 × 10−6 × (1670 − 20) × 100 = 1.6% (5)

O valor da contração médio da cera é 1% (Campos 2013).

A criação da peça mestre foi conseguida por fabrico aditivo, mais concretamente, por

estereolitografia (SL). Após a peça ter sido feita, esta é lavada numa imersão de água corrente e

é feita pós-cura numa camara com radiação ultravioleta. Os suportes são removidos por corte e

a peça é lixada tentando-se minimizar o efeito de escada para que a superfície seja o mais lisa

possível sem que se comprometa a geometria original da peça. A Figura 49 ilustra o processo de

obtenção do molde de resinas carregadas a partir da peça madre materializada por fabrico

aditivo.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

72 João Leite

Figura 49 - A: 3D Systems Viper si2 SL; B: peça madre do componente femoral da anca obtida por SL; C: construção da caixa para a primeira meia moldação; D: caixa da meia moldação após vazamento da resina.

A primeira metade do molde fez-se pousando uma das metades da peça numa superfície lisa,

construindo-se uma caixa envolvente com 4 tábuas de contraplacado coladas. A colagem foi

acelerada utilizando-se um catalisador entre cada aplicação. Na superfície de apoio da peça,

correspondente ao plano de apartação, são pousadas 4 fêmeas que servirão de guiamento à

outra metade do molde. São feitas aplicações de plasticina nas junções das tábulas e também no

interior das fêmeas de modo a que não haja fugas de resina durante o vazamento desta. Aplica-

se desmoldante QZ 5111 nas superfícies internas da caixa. A resina é preparada misturando-se 2

porções de pó de alumínio PD 200 com 1 de resina de poliuretano R19 de forma a obter-se uma

mistura homogénea. Após o vazamento manual da mistura, a cura é feita ao ar livre durante

aproximadamente 1 hora e meia, não sendo necessário qualquer tipo de intervenção. Antes da

resina solidificar, as bolhas de ar aprisionado sobem para a superfície devido à diferença de

densidades.

A segunda metade do molde é feita do mesmo modo que a primeira exceto a superfície base que

neste caso corresponde ao plano de apartação do meio molde já feito. O alinhamento entre as

duas metades da peça é feita por pinos inseridos nas cavidades existentes em cada metade da

peça.

Em certos casos, após as duas metades dos moldes estarem curadas, a desmoldagem poderá ter

o auxílio de um forno a 70⁰C durante aproximadamente 1 hora. O molde completo poderá ser

visto na Figura 50.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

73 João Leite

Figura 50 - Molde para injeção de ceras do componente femoral da anca.

Componente tibial do joelho

O plano de apartação e a localização das cavidades para os pinos foi feita da seguinte forma:

Figura 51 - A: definição do plano de apartação e de duas cavidades para os pinos de guiamento em SolidWorks; B: peça madre obtida por fabrico aditivo SL.

O coeficiente de contração adotado foi o da liga de Co-Cr-Mo ASTM F 75, pois inicialmente

pretendia-se fundir peças nessa liga. Devido à inexistência de dados no INEGI relativos à

contração desta liga, usou-se como referência um artigo científico da revista “The Journal of

Prosthetic Dentistry”, em que Diwan et al. (1997) adotou o valor de 2.3% para a contração total,

incluindo a da cera. Apesar de se ter escolhido este valor fundiu-se esta peça em Ti6Al4V. (Diwan

et al. 1997)

Como a peça já possui um canal de alimentação, não foi necessário fazer-se o dimensionamento

pela regra dos módulos.

O molde foi construido de forma semelhante ao descrito anteriormente. A diferença reside na

forma circular e também no guiamente entre os meios moldes. Neste caso o guiamente é

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

74 João Leite

garantido por sulcos. A injeção é feita por um furo existente no canal de gitagem. O pino metálico

introduzido no furo de injeção como pode ser visto na Figura 52 é supérfluo.

Figura 52 - Molde para injeção de ceras do componente tibial do joelho.

Componente femoral do joelho

O projeto e construção do molde para esta peça foi mais complexo que nos casos anteriores. O

tipo de geometria implicou a escolha de mais que um plano de apartação de modo a evitar

contras-saídas. A primeira versão deste molde era constituída por 4 placas moldantes. Após

reflexão chegou-se à conclusão que era possível concretizar o molde com apenas 3 peças. Essa

solução é mais vantajosa pois o menor número de placas moldantes garante melhores resultados

a nível geométrico havendo menores distorções associadas ao número inferior de planos de

apartação. É um aspeto importante, principalmente no interior da concavidade que é constituída

por superfícies de encaixe ao fémur do paciente.

Figura 53 - A: molde com 4 placas moldantes; B: molde com 3 placas moldantes e pinos guia.

O molde foi materializado através de SL na sua totalidade. A obtenção deste molde através do

processo de resinas carregadas descrito anteriormente seria bastante mais complicada e a

qualidade do produto final seria bastante inferior.

O fator de contração escolhido foi o mesmo que o do componente tibial, sendo 2,3%. Como o

componente já possuía canais de gitagem para fundição não foi necessário dimensioná-los.

Após os componentes criados por estereolitografia estarem curados, foi feito reforço estrutural

do molde por meio de furos cheios de resinas de poliuretano carregadas de alumínio. A

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

75 João Leite

formulação e os componentes da resina são os mesmos já descritos na construção dos moldes

para o componente da anca e da tíbia. O canal de injeção foi realizado por furação como pode

ser visto na placa moldante do meio, na imagem C da Figura 54.

Figura 54 - A: resinas carregadas para reforço estrutural; B: molde fechado; C: molde aberto.

5.4.2 - Moldes maquinados em alumínio Optou-se por fazer o guiamento entre os meios moldes através de paredes com inclinação de 5⁰.

Comparativamente aos guiamentos por pino e furo, este método não requer peças adicionais e

tem maior durabilidade e precisão. As arestas do guiamento foram quebradas por chanfros para

que haja maior precisão no encosto de superfícies (Figura 57). A superfície de apartação serve de

encosto entre os meios moldes. Foi criada uma folga no plano exterior (Figura 57) (paralelo ao

plano de apartação), para que este não interfira no encosto entre as cavidades moldantes. A

injeção no molde da peça da tíbia é feita perpendicularmente ao plano de apartação de modo a

que haja alimentação na zona de ligação ao canal de gitagem não afetando a geometria da

prótese (Figura 55).

Figura 55 - Vista em corte do meio molde inferior da peça da tíbia mostrando o canal de injeção.

Optou-se pelo alumínio 7075 pois é utilizado na ZCP (Campos 2013).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

76 João Leite

Os desenhos de definição dos moldes estão incluídos no anexo D da presente dissertação. Não

foi realizado o toleranciamento dimensional. A cotagem das cavidades não foi realizada pois esses

valores resultam de ficheiros CAD.

Figura 56 - Molde do componente tibial à esquerda e molde do componente femoral à direita.

Figura 57 - Detalhe do encosto entre meios moldes.

5.5 - Construção de cachos Nesta secção é feita a descrição de todos os passos para a obtenção de cachos vazados.

5.5.1 - Arquitetura de cachos

Foram concebidas as seguintes arquiteturas de cachos com base na experiência e conhecimento

existentes no INEGI:

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

77 João Leite

Figura 58 - Arquiteturas de cachos para fundição e respetivas designações.

O aspeto económico é um fator importante na arquitetura de cada cacho. A Tabela 17 apresenta

o rendimento volumétrico de cada cacho. Este valor é a proporção volumétrica entre as peças

fundidas que se pretende obter e o cacho. Quanto mais elevado for o valor, menor é o desperdício

de material no sistema de gitagem. Para o cálculo do volume do cacho, considerou-se que apenas

é enchido 1/3 do volume da pia pois não há necessidade de a encher na sua totalidade. É

importante salientar que é possível aumentar o rendimento, reduzindo-se o material vazado. No

entanto poderá haver implicações a nível metalúrgico, existindo a possibilidade de não haver

pressão suficiente para encher totalmente as peças nas geometrias em nascente (A3, A4). A

redução do material vazado poderá também provocar defeitos volumétricos como rechupes,

devido à redução da massividade do sistema de gitagem. A otimização da quantidade de

enchimento passa pela realização de sucessivas simulações.

Relativamente aos cálculos da Tabela 17, o volume total de próteses (VTP) foi calculado da

seguinte forma:

𝑉𝑇𝑃 = 𝑉𝑝𝑟ó𝑡𝑒𝑠𝑒 × 𝑛𝑝𝑟ó𝑡𝑒𝑠𝑒 (6)

O volume do cacho (Vcacho) considerando que este é enchido até 1/3 do volume da pia é calculado

do seguinte modo:

𝑉𝑐𝑎𝑐ℎ𝑜 = 𝑉𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 −2𝑉𝑝𝑖𝑎3

(7)

A fórmula utilizada para o cálculo do rendimento foi:

𝑅𝑒𝑛𝑑𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 =𝑉𝑇𝑃𝑉𝑐𝑎𝑐ℎ𝑜

× 100 (8)

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

78 João Leite

Tabela 17 - Cálculos dos rendimentos volumétricos de cada geometria; os valores não resultantes de fórmulas foram medidos em SolidWorks.

A1 A2 A3 A4 T1 T2 J1 J2

Vprótese (mm3) 44952 30953 35177

npróteses 8 6 6 6 8 8 6 6

VTP (mm3) 359619 269714 269714 269714 247623 247623 211062 211062

Vpia (mm3) 353606 743552 332642 332642 332642 332642 743552 743552

Vtotal (mm3) 702344 1103851 808354 822340 695776 697534 1196340 1241148

Vcacho (mm3) 466606 608149 586593 600578 474015 475773 700638 745447

Rendimento (%) 77.1 44.4 46.0 44.9 52.2 52.0 30.1 28.3

Analisando-se os rendimentos da Tabela 17 conclui-se que a geometria A1 é a melhor em termos

de aproveitamento de material pois possui um rendimento mais elevado.

5.5.2 - Simulação de vazamentos

As simulações foram realizadas por Nannan Song da unidade CETECOF do INEGI. O software

utilizado foi o ProCAST e os parâmetros de simulação foram os indicados na Tabela 18. A

geometria A1 não foi simulada pois foi abandonada após a carapaça cerâmica ter fraturado ao

descerificar. Em nenhuma das simulações foi utilizado qualquer tipo de isolamento entre as

carapaças e o exterior. O parâmetro IHTC (Tabela 18) quantifica a condução de calor da cerâmica

utilizada nas carapaças. Os materiais cerâmicos da Tabela 18 são os mesmos que são utilizados

na construção das carapaças cerâmicas.

Tabela 18 - Parâmetros de simulação.

Parte Material Temperatura

inicial (⁰C)

Espessura

(mm)

IHTC

(W/m2K) Arrefecimento

Liga metálica Ti6Al4V 1750 -

900 Ar ambiente Facecoat IMERYS yittra-FullAlumina 1100 2

Backup IMERYS FullAlumina 1100 5

Não foram simuladas todas as geometrias pois algumas são semelhantes. De entre as geometrias

criadas, simularam-se as seguintes: A2, A3, T1, J1. Para cada uma destas geometrias, simulou-se

o enchimento, tempos de solidificação e presença de defeitos volumétricos.

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79 João Leite

Geometria A2:

Enchimento Solidificação (secção) Defeitos (secção)

Velocidade do fluido (m/s) Tempo de solidificação (s) Rechupes (%)

Figura 59 - Resultados da simulação da geometria A2 obtidos no ProCAST.

Geometria A3:

Enchimento Solidificação Defeitos (secção)

Velocidade do fluido (m/s) Tempo de solidificação (s) Rechupes (%)

Figura 60 - Resultados da simulação da geometria A3 obtidos no ProCAST.

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80 João Leite

Geometria T1:

Enchimento (secção) Solidificação (secção) Defeitos

Velocidade do fluido (m/s) Tempo de solidificação (s) Rechupes a roxo

Figura 61 - Resultados da simulação da geometria T1 obtidos no ProCAST.

Geometria J1:

Enchimento Enchimento (secção) Defeitos

Velocidade do fluido (m/s) Tempo de solidificação (s) Rechupes a roxo

Figura 62 - Resultados da simulação da geometria J1 obtidos no ProCAST.

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81 João Leite

Interpretação dos resultados

Nenhuma das geometrias simuladas é isenta de rechupes no interior das peças. De acordo com

os casos apresentados na secção 4.3 do presente documento, a solução para evitar os rechupes

nas peças poderá passar pela influência no gradiente térmico através da aplicação de isolante nas

zonas dos canais de gitagem perto da pia de vazamento. O tempo de solidificação dessas zonas

aumentará relativamente ao tempo de solidificação das peças reduzindo-se as falhas de

alimentação ao interior das peças.

Na simulação de enchimento do cacho A2 ocorre um fenómeno de descontinuidade de

escoamento. O fluido atinge a estrela e pinga como pode ser visto na Figura 63. Este fenómeno

não é desejável pois causa turbulência. A geometria A3 não apresenta um escoamento tão

turbulento como em A2 pois há enchimento das próteses em nascente.

Figura 63 - Fenómeno de descontinuidade do escoamento na geometria A2.

O enchimento das geometrias T1 e J1 revelam turbulência, principalmente no momento de

enchimento das peças do fundo. Se a carapaça fosse inclinada de modo a que o fluido escorresse

pela superfície lateral poderia haver uma redução da turbulência no fundo, no entanto haveria

perdas térmicas do fluido podendo afetar de modo nefasto a solidificação. Outra forma mais

válida de redução da turbulência consiste em diminuir o efeito de esquina para que não haja

mudanças abruptas de escoamento. As arestas do sistema de gitagem deverão ser mais

arredondadas.

5.5.3 - Injeção de peças de cera

Os cachos da Figura 58 requerem os seguintes componentes:

A1: 8 componentes de anca, 1 pia de vazamento para componentes femorais de anca;

A2: 6 componentes de anca, pia de vazamento grande, estrela de 6 pontas;

A3: 6 componentes de anca, pia de vazamento média, estrela de 6 pontas, canal de

gitagem de secção quadrada;

A4: 6 componentes de anca, pia de vazamento média, estrela de 6 pontas, canal de

gitagem de secção quadrada;

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82 João Leite

T1: 8 componentes tibiais de joelho, pia de vazamento média, canal de gitagem de secção

quadrada;

T2: 8 componentes tibiais de joelho, pia de vazamento média, canal de gitagem de secção

quadrada;

J1: 6 componentes femorais de joelho, pia de vazamento grande, canal de gitagem de

secção retangular;

J2: 6 componentes femorais de joelho, pia de vazamento grande, canal de gitagem de

secção retangular.

É importante referir que após a injeção, alguns dos componentes foram adaptados segundo as

particularidades inerentes a cada arquitetura de cacho. O número de peças de cera injetadas foi

consideravelmente superior ao necessário pois a injeção de peças de cera é um processo que

necessita de uma cadência estacionária para que haja consistência nas peças obtidas. A cera

utilizada foi a CERITA PATTERN WAX F27-74.

A metodologia geral adotada para obtenção de peças de cera foi a seguinte:

Aplicação de desmoldante e limpeza com ar comprimido: foi usado Domax Special Silicone

com um intervalo de aplicação aproximadamente de 5 peças dependendo do grau de

dificuldade com que as peças são desmoldadas. A limpeza entre cada peça foi feita com

recurso a ar comprimido sendo de especial importância a limpeza do canal de escape de

ar. Após algumas dezenas de peças injetadas é importante efetuar uma limpeza mais

profunda do molde, principalmente nos guiamentos e no plano de apartação a fim de

garantir que as superfícies de contacto entre cada meio molde se mantém planas, para

que não haja fuga de cera para falhas no plano de apartação. Esse tipo de limpeza foi

realizado com recurso a ar comprimido, papel de limpeza e ferros com ponta afiada para

raspar os resíduos de desmoldante gasto e sujidade.

Fecho do molde e aperto com grampos: o número de grampos utilizados depende das

dimensões do molde. Na generalidade foram aplicados dois grampos em cada molde.

Nos moldes das pias, cujas dimensões são maiores, foi necessária a aplicação de quatro

grampos. O método utilizado para o molde do componente femoral do joelho foi mais

complexo devido à natureza do molde. Os grampos não foram aplicados diretamente,

usando-se contraplacado como superfície intermédia para distribuir a carga e evitar

distorções.

Injeção: encostando a ponta da válvula de injeção ao furo existente no molde, aplica-se

uma força no molde contra o cilindro injetor (Figura 64-A), a ponta da válvula recua e há

caudal de cera líquida. A estanquicidade da ligação é favorecida pela aplicação de um

tubo curto de silicone entre o furo do molde e a válvula injetora. Após a injeção é

necessário tapar-se o furo de injeção com um dedo para contrariar a tendência da cera

para a fuga.

Arrefecimento e desmoldagem: o arrefecimento é feito a ar com o molde inicialmente

fechado. Após o tempo de arrefecimento necessário, o molde é aberto e a peça é

desmoldada com o auxílio de ar comprimido. Quanto mais arrefecida estiver a peça

injetada, maior é a facilidade em desmoldar pois o fenómeno de contração já ocorreu,

havendo folgas entre a cavidade moldante e a peça injetada, sendo também a resistência

mecânica da peça injetada mais elevada.

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83 João Leite

Os parâmetros utilizados para a injeção foram os da Tabela 19. Os tempos mais elevados são para

geometrias mais volumosas e também mais complexas como as pias de vazamento e o

componente femoral de joelho, respetivamente. Em certas situações os tempos de

arrefecimento foram mais elevados pois a produção de peças alternou segundo os vários moldes

existentes, ou seja, enquanto alguns moldes injetados arrefeciam, outros iam sendo injetados.

Figura 64 - A: cilindro de injeção; B: válvula reguladora de pressão; C: molde da pia de vazamento média; D: molde do canal de alimentação de secção quadrada.

Tabela 19 - Parâmetros de injeção de ceras.

Parâmetro Valor Instrumento de medição

Tempo de injeção (s) 15 - 20 Cronómetro

Tempo de arrefecimento (min) 1 - 5 Cronómetro

Pressão de injeção (bar) 1.4 - 2.0 Válvula reguladora de pressão

(Figura 64-B)

Temperatura interna do cilindro injetor (⁰C) 69 Termómetro interno do cilindro

Em termos particulares, o molde da peça da tíbia necessitou de especial atenção na limpeza do

canal de escape de ar. Durante as primeiras injeções foi frequente a obstrução do canal de escape

levando à sua reabertura por furação. A solução encontrada foi a pulverização de desmoldante

no canal e limpeza com uma vareta metálica existente na oficina após a desmoldagem de cada

peça. A cavidade moldante possuí uma indentação, já existente desde o fabrico do molde,

levando ao aparecimento consistente de defeitos superficiais nas peças de cera. Uma solução

encontrada para este problema foi o preenchimento da indentação com cera e pulverização com

desmoldante à superfície para que a cera se mantenha. Os resultados obtidos foram satisfatórios,

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84 João Leite

no entanto esta solução revelou ter um período de vida curto sendo necessário repetir o processo

após cada injeção. Através da experiência, concluiu-se que a pressão de injeção mais bem

sucedida é aproximadamente 1.4 bar pois, pressões mais elevadas davam origem a defeitos de

enchimento como se pode ver na Figura 65-A.

Figura 65 - A: defeito de enchimento; B: defeito superficial causado pela indentação no molde; C: arranjo da indentação por preenchimento com cera; D: peça sem defeito superficial após arranjo da cavidade moldante.

Inicialmente o molde do componente femoral do joelho originava defeitos ao desmoldar-se.

Dificilmente se conseguia desmoldar sem que houvesse fratura dos pinos. A causa deste

problema residia na elevada massividade da zona dos pinos, sendo a solidificação mais tardia,

fragilizando a ligação dos pinos ao resto da peça. A solução passou pela alteração do molde, como

pode ser visto na Figura 66. A introdução de insertos metálicos diminuiu a massividade e

melhorou a condução de calor na zona. O canal de injeção foi alterado para outra zona. Estas

medidas permitiram solucionar o problema.

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85 João Leite

Figura 66 - A: fuga de cera para plano de apartação; B: mal cheio na base do pino; C: vista superior após modificações do molde; D: vista inferior após modificações do molde; E: modificações no molde do componente femoral do joelho.

5.5.4 - Montagem de cachos

A soldadura de cachos foi realizada com um ferro de soldagens para circuitos elétricos adaptado

(Figura 67-A). O tipo de cera utilizado para as uniões foi cera-cola. Como já foi mencionado, alguns

dos componentes foram alterados, nomeadamente os canais de gitagem, cujo comprimento foi

ajustado por corte ou soldadura de extensões consoante o cacho. Uma boa junção deverá ser

arredondada, livre de arestas e reentrâncias. Para se atingir o efeito pretendido, pode ser

necessário fundir pingos de cera nas junções, inclinando-se para que a cera preencha toda a

junção. As juntas poderão também ser aperfeiçoadas por remoção de excessos com uma

pequena faca. Não foram usados instrumentos na medição das distâncias de montagem. Devido

ao excesso de peças de cera injetadas como se pode ver na Figura 67-D, selecionaram-se as de

melhor qualidade.

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86 João Leite

Figura 67 - A: ferro de soldar; B: junção incompleta; C: junção com cera cola e arredondamento de arestas.

Figura 68 - A: cacho J2; B: cacho A4; C: cacho T1.

5.6 - Construção de carapaças cerâmicas Os procedimentos e formulações cerâmicas foram os mesmos para todos os cachos. O tipo de

formulação cerâmica adotado foi em função da liga Ti6Al4V, existente no INEGI. Esta liga é

bastante utilizada no INEGI, pelo que os procedimentos e formulações cerâmicas já estão

desenvolvidos. A cerâmica utilizada tem como base ítria para o facecoat e alumina para as

camadas de reforço. A sequência de camadas foi a seguinte:

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87 João Leite

Tabela 20 - Metodologia para formação de carapaças cerâmicas e valores obtidos para a viscosidade, pH e densidade das barbotinas.

Tem

po

de

seca

gem

(h

)

Tem

po

de

imer

são

(s)

Bar

bo

tin

a

(lig

ante

/cer

âmic

o/o

rdem

)

Are

ia

Cachos

A1, A2, A3, A4 T1, T2 J1, J2

Vis

cosi

dad

e

pH

Den

sid

ade

Vis

cosi

dad

e

pH

Den

sid

ade

Vis

cosi

dad

e

pH

Den

sid

ade

3 30 AY Ítria 125-

150 μm 21.97 10.55 3.06 21.97 10.55 3.06 21.97 20.55 3.06

1,5 Imersão

Impregnação

50% AF+50%

H2O

- - - - - - - - - -

2 60 AY Ítria 125-

150 μm 12.85 10.25 3.03 12.85 10.25 3.03 12.85 10.25 3.03

2 60 AFAl Al2O3 60

FEPPA - - - - - - - - -

2 60 AFAl Al2O3 60

FEPPA - - - - - - - - -

2 60 AFAl Al2O3 60

FEPPA 9.35 - - 9.35 - - - - -

2 60 AFAl Al2O3 60

FEPPA 9.44 - - 9.44 - - 8.90 8.57 2.49

2 60 AFAl Al2O3 60

FEPPA 9.40 8.56 2.80 9.40 8.56 2.50 - - -

2 60 AFAl Al2O3 60

FEPPA 8.90 8.57 2.49 8.90 8.57 2.49 9.72 8.55 2.50

12 60 AFAl Banho - - - - - - - - -

Cada camada é formada mergulhando-se o cacho numa tina rotativa (Figura 69) contendo a

barbotina no estado líquido, de seguida são pulverizadas partículas cerâmicas mergulhando-se o

cacho numa tina contendo partículas fluidizadas através dum escoamento interno de ar. Cada

camada é seca através de convecção forçada e humidade controlada. Não foram usados

instrumentos de medição para o tempo de imersão. Após cada camada foram realizadas

medições à viscosidade, densidade e pH das barbotinas. Para a medição destas grandezas físicas,

utilizaram-se instrumentos de medição apropriados. Os resultadas relativos a cada carapaça

podem ser consultados na Tabela 20.

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88 João Leite

Figura 69 - A: Imersão de cacho em tina rotativa com barbotinas; B: mergulho em tina com partículas cerâmicas fluidizadas; C: secagem de carapaças.

Durante as primeiras camadas do cacho A4, uma das próteses fraturou acidentalmente na zona

de junção entre a estrela e a prótese (Figura 72). Apesar do sucedido, prosseguiu-se com a

formação da carapaça.

5.7 - Descerificação e vazamento Antes da descerificação, foram furados os canais de gitagem para que a cera fundida possa

escapar mais facilmente durante a descerificação, como pode ser visto nos cachos T2 e J1 da

Figura 71. A descerificação foi realizada num forno a 1100 ⁰C durante 2 horas por flash firing

(Figura 70-A). Os furos de escape da cera foram tapados com cerâmicas após a descerificação,

como pode ser visto nos cachos T1 e J2 da Figura 71

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89 João Leite

Figura 70 - A: forno para descerificação por flash firing; B: forno para sinterização; C: forno para pré-aquecimento.

A primeira carapaça a ser descerificada foi a A1, acabando por fraturar e ficar totalmente

inutilizada (Figura 71). Uma possível explicação para o sucedido poderá residir na elevada

concentração de tensões na aresta da gola (Figura 71-B). O facto de as peças estarem demasiado

juntas poderá ter resultado em distribuições térmicas adversas provocando deformações

excessivas nos pontos de maior proximidade.

Figura 71 - A: carapaça A1 inutilizada após descerificação; B: fissura.

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90 João Leite

Figura 72 - Carapaças descerificadas e respetivas designações.

Após a descerificação as carapaças foram sinterizadas a 1450 ⁰C no forno da Figura 70-B. Quando

é especificado pelos objetivos da fundição de determinado cacho, certas partes da carapaça

poderão ser revestidas com duas camadas de fibra de vidro da Morgan, referência Super wood

SW Plus de densidade 96 e 13 mm de espessura.

Figura 73 - A: carapaça A2 com revestimento a fibra de vidro; B: forno de indução em cadinho frio com levitação.

A fundição e vazamento do Ti6Al4V é realizada num forno de indução em cadinho frio com

levitação (Figura 73-B).

O procedimento de fundição é o seguinte:

Limpeza com ar comprimido da câmara inferior onde se introduz a carapaça;

Limpeza da vedação entre a câmara inferior e superior com papel embebido em álcool;

Colocação de lã de vidro no fundo da câmara inferior para servir de apoia a carapaças;

Introdução da carapaça no interior da câmara inferior, diretamente após esta ter estado

no forno de pré-aquecimento a 1100 ⁰C mais de 1 hora. São usados tijolos para fixar a

carapaça encostando-se;

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91 João Leite

Duas lavagens do interior do forno com árgon, variando-se a pressão entre 7.2×10-2 mbar

e 50 mbar;

Controlo e inertização com árgon a 120 mbar;

Aumento da potência do circuito de indução progressivamente por patamares para fusão

do metal;

Abertura do stopper após o metal estar completamente fundido e a levitar;

Arrefecimento da carapaça vazada no interior.

Durante o processo de fundição é fundamental a leitura dos valores das temperaturas (Figura 74-

B) de entrada do circuito de refrigeração, do stopper e do cadinho. Outros parâmetros a ter em

conta são a tensão e corrente do circuito de potência (Figura 74-B).

Figura 74 - A: controlos; B: monitorização do controlador de potência e mostradores das temperaturas em baixo; C: vista do topo do forno com cadinho incandescente e termómetro a para medição da temperatura do metal no interior do cadinho.

O vazamento das carapaças ficou bastante atrasado devido à disponibilidade do forno de

vazamentos, que foi bastante afetada por problemas técnicos e por outros trabalhos decorrentes

no INEGI. Apesar disso, houve três tentativas de vazamento. Numa das tentativas ocorreu o

fenómeno de arcos elétricos entre o metal fundido e as partes metálicas do cadinho. Noutra

situação, o sistema de segurança do forno desligou o sistema ao regular-se a corrente elétrica

para 298 A sendo o limite de 300 A. O valor real da corrente poderá ter ultrapassado o limite

devido a picos na alimentação elétrica. Na terceira tentativa mal sucedida, foi excedida a

capacidade máxima de fundição de titânio ao tentar fundir-se aproximadamente 1.7 Kg. O metal

não ficou totalmente líquido, tentando-se vazar a parte líquida para a carapaça. Devido à abertura

reduzida do stopper, o metal líquido continuou a levitar, não sendo possível vazar.

O problema mais limitante da fundição está relacionado com a capacidade insuficiente de

vazamento. O circuito de potência do forno está limitado a 75% da sua capacidade total. De

acordo com a experiencia de casos passados semelhantes neste equipamento, o limite ronda 1.6

Kg de titânio sendo insuficiente para a maioria dos casos expostos na Tabela 21.

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92 João Leite

Tabela 21 - Comparação de massas de cachos com o limite do forno; o valor usado para a massa volúmica do Ti6Al4V está na Tabela 7; para a massa de metal necessária sem enchimento da pia, subtraiu-se Vpia ao Vtotal da Tabela 17, convertendo-se para massa através da massa volúmica.

Cacho A2 A3 A4 T1 T2 J1 J2

mTi6Al4V (kg) (1/3 da pia cheia) 2.69 2.59 2.65 2.10 2.10 3.10 3.29

m’Ti6Al4V (kg) (sem pia) 1.59 2.10 2.16 1.60 1.61 2.00 2.30

Limite Ti do forno a 75% de potência (kg) 1.6

A consequência do longo período de espera foi o deterioramento de algumas das carapaças. A

carapaça T1 fraturou na zona da pia de vazamento, como pode ser visto na Figura 72. A fratura

não tornou a carapaça inutilizável pois foi possível repará-la com massa cerâmica. A carapaça A4

fraturou na zona da gola (Figura 75) de uma prótese ficando inutilizada.

Figura 75 - Fratura na carapaça A4.

A escassez de tempo para realização de vazamentos impôs restrições aos cachos a vazar. O

historial do estudo de próteses de anca no INEGI tornou a fundição dos cachos com próteses do

joelho (T1, T2, J1, J2) prioritária pois não existem estudos de fundição de próteses de joelho no

INEGI até à data. Abandonaram-se os cachos A2, A3 e A4.

Os resultados das simulações apontam para a possibilidade de haver rechupes no interior das

peças de joelho. Como forma de testar a precisão das simulações, os vazamentos foram

realizados em concordância com as simulações. Não foi utilizado qualquer tipo de isolamento

térmico.

A primeira carapaça a ser vazada foi a T1, após ser feita a reparação da fratura na pia utilizando-

se cerâmica. Esta carapaça, cuja quantidade de material necessário é a mais reduzida de entre as

carapaças criadas, não encheu completamente todas as peças (Figura 76-A). Embora a

quantidade de material requerida sem pia seja igual à capacidade máxima do forno de

vazamentos, algum metal fundido fica retido no cadinho não fluindo na sua totalidade para o

interior da carapaça. Este acontecimento contribui para o não enchimento total das peças do

cacho. O défice de metal fundido causou deficiência de pressão no enchimento do terceiro

patamar de peças (Figura 76-C), resultando em falhas de enchimento.

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93 João Leite

Figura 76 - A: cacho T1 após abate e remoção das peças que ficaram completamente cheias; B: vista laterial do cacho T1 evidenciando a falha de enchimento; C: peça após separação do cacho por corte; D: peça em estado bruto de vazamento.

Após o corte, cada peça foi granalhada (Figura 77), a fim de remover a sujidade resultante da

fundição e do abate da carapaça cerâmica. Só após a granalhagem é que é possível examinar a

presença de defeitos na superfície das peças.

Figura 77 - Peças do cacho T1 após granalhagem.

5.8 - Análise de peças obtidas Após o abate das carapaças cerâmicas, separação e granalhagem de cada peça, procedeu-se à

análise das mesmas de forma a poder-se comparar com os parâmetros definidos por normas.

Análise química:

A liga vazada é a Ti6Al4V. A composição desta liga processada por fundição é definida pela norma

ASTM F 1108. Esta norma requer o método E 120 da ASTM para análise da composição química.

O método utilizado para análise da composição química foi a análise por espectrometria.

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94 João Leite

É possível concluir (Tabela 22) que a liga das amostras analisadas é a Ti6Al4V pois os principais

elementos de liga são o Alumínio e o Vanádio, sendo o elemento base Titânio.

O método analítico (espectrometria) não permite a deteção de Oxigénio, de Azoto nem de

Hidrogénio. Foram detetados outros elementos para além dos especificados pela norma ASTM F

1108, usada como referência.

Tabela 22 - Resultados da análise por espectrometria.

Propriedades mecânicas da liga vazada:

As propriedades mecânicas mínimas são definidas pela norma da liga, que neste caso, é a ASTM

F 1108. Esta norma requer utilização do método E 8, definido pela ASTM. Este método especifica

o procedimento dos ensaios de tração a realizar. De acordo com a norma ASTM F 1108, os

provetes deverão ser fundidos na mesmas condições que as utlizadas na produção das próteses.

Após a fundição, os provetes deverão ser maquinados até às suas dimensões padrão.

Os resultados apresentados na Tabela 23 são fruto do trabalho desenvolvido por Frederico Silva

Gomes na sua dissertação (Silva Gomes 2014). Os provetes foram vazados nas mesmas condições

que as próteses obtidas, sendo maquinados até à sua forma final.

Tabela 23 - Comparação entre propriedades mecânicas mínimas e valores obtidos por ensaio de tração.

Propriedades mecânicas mínimas ASTM F1108

(no estado pós-fundição, recozido, HIP)

Resultados do ensaio de

tração

Tensão de rotura (MPa) 860 821

Tensão limite de

elasticidade (0,2%) (MPa) 758 748

Extensão após rotura (%) 8 8

Composição Química

Al V Fe O C N H Outros

ASTM F 1108

(%)

5.5 -

6.75

3.5 -

4.5 <0.20 <0.20 <0.10 <0.05 <0.015 -

Espectrometria

(%) 6.38 3.88 0.048 - 0.053 - -

%Sn <0.009; % Zr <0.0005;

%Mo=0.020; %Si=0.026;

%Mn=0.005; %Cr=0.027;

%Ni=0.020; %Cu=0.021;

%Nb=0.061; %Pd=0.014

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

95 João Leite

Os resultados obtidos estão um pouco abaixo dos valores mínimos exigidos. No entanto é

importante salientar que os valores mínimos pressupõe da realização de HIP.

Microestrutura:

A norma da liga, ASTM F 1108, não estabelece parâmetros microestruturais. No entanto, é

também importante a análise microestrutural no contexto do presente trabalho. A norma ISO

5832-3, relativa à liga Ti6Al4V para conformação plástica, define a microestrutura no estado

recozido. Esta deverá ser do tipo α+β globular, livre de inclusões visíveis quando usada uma

ampliação de 200×. A norma ISO 5832-3 usa como referências (Anexo A) para comparação de

microestruturas, a norma ISO 20160.

Para análise microestrutural, foram preparadas duas amostras de duas peças diferentes da tíbia

do cacho T1, segundo o plano de simetria (Figura 78). Imediatamente após o corte das peças, é

notória a ausência de rechupes segundo o plano de simetria. As amostras foram analisadas por

microscopia ótica e também por estereomicroscopia no laboratório de materialografias do INEGI.

O ataque químico foi feito com o reagente de Kroll (solução aquosa de ácido fluorídrico com ácido

nítrico). Este reagente torna as estruturas α mais claras enquanto as estruturas β ficam escuras.

A existência de defeitos nas amostras, nomeadamente microporosidades, é impercetível a olho

nu (Figura 78). Pela Figura 82-A conclui-se que o tamanho de grão varia entre 1 e 2 mm. A

microestrutura possui duas fases distintas sendo a morfologia acicular (Figura 83 e Figura 84).

Não é percetível a existência de camada de α-case. Foram detetadas algumas porosidades de

origem gasosa devido à forma circular que apresentam (Figura 80, Figura 81, Figura 85 e Figura

86)

Figura 78 - Amostra 1 e amostra 2.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

96 João Leite

Amostra 1:

Figura 79 - Microscopias óticas da microestrutura da amostra 1 (objetiva 0.5, zoom 20×, reagente de Kroll); A: na periferia; B: no interior.

Figura 80 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 1 (reagente de Kroll,23×); A: microporosidade (≈500 μm) na extremidade da haste; B: microporosidade de grandes dimensões (≈500 μm) na proximidadede da periferia.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

97 João Leite

Figura 81 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 1 (reagente de Kroll,75×); A: microporisidades (≈500 μm e ≈100 μm) no interior; B: microporosidade (≈500 μm) na periferia.

Amostra 2:

Figura 82 - Microscopias óticas da microestrutura da amostra 2 (objetiva 0.5, zoom 20×, reagente de Kroll); A: na periferia com régua graduada em mm; B: no interior.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

98 João Leite

Figura 83 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2 (reagente de Kroll,75×); A: no interior; B:no interior com técnica de polarização.

Figura 84 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2 (reagente de Kroll); A: no interior (150×); B:no interior (150×, polarização); C: no interior (300×).

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

99 João Leite

Figura 85 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2 (reagente de Kroll); A: microporisidades na periferia (23×); B: microporosidade (231 μm) (150×).

Figura 86 - Estereoscopias da microestrutura da amostra 2 (reagente de Kroll, 750×); A: microporisidade (57 μm); B: microporosidade (≈20 μm).

Superfície:

A superfície deverá estar de acordo com a Tabela 24.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

100 João Leite

Tabela 24 - Caracterização da superfície de acordo com as normas.

Norma Superfície

ASTM F 1018-88 α-case totalmente removida por maquinagem química ou por maquinagem

convencional.

ASTM F 86-84 “Os implantes metálicos, quando inspecionados segundo o método

estabelecido, deverão ser livres de imperfeições superficiais tais como as

provocadas por ferramentas (toolmarks), entalhes, fendas, cavidades,

rebarbas e outros defeitos que comprometam a funcionalidade do

dispositivo. A superfície deverá também ser livre de detritos resultantes do

acabamento e de outros contaminantes indesejáveis.”

Segundo as especificações apresentadas na revisão bibliográfica, não serão aceites próteses com

inclusões superficiais superiores a 20 μm após conclusão de todos os processos de granalhagem

e polimento. As peças fundidas foram apenas sujeitas a granalhagem após fundição. A superfície

apresenta defeitos superficiais como pode ser visto na Figura 87 e na Figura 88. É também visível

que a aresta do patamar não ficou viva como no CAD original.

Figura 87 - A: detalhe da aresta do patamar da peça fundida sendo visíveis alguns defeitos superficiais; B: CAD da geometria original mostrando a aresta viva do patamar.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

101 João Leite

Figura 88 - A: defeito superficial na aresta do patamar da peça fundida; B: CAD da geometria original.

Microdurezas:

Foram feitas medições de microdurezas (Gráfico 3) na zona do patamar e também da haste.

Gráfico 3- Microdurezas (HV) no patamar e na haste das duas amostras em função da distância à superfície (mm).

Não há grande variação dos resultados obtidos entre a periferia e o interior, sendo que estes

variam entre 280 e 380 HV. Os valores típicos da camada de α-case variam entre 600 e 800 HV

(Duarte et al. 2008). Conclui-se então que não houve formação da camada de α-case pois os

valores apresentados estão bastante abaixo dos valores típicos de α-case não havendo grandes

variações entre a periferia e o interior da peça.

0

50

100

150

200

250

300

350

400

0,03 0,1 0,3 0,5 1 5

Mic

rod

ure

za (

HV

)

Distância à superfície (mm)

Microdurezas em função da distâcia à superfície

Amostra 1 - Haste

Amostra 2 - Haste

Amostra 1 - Patamar

Amostra 2 - Patamar

Carga utilizada: 50g

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102 João Leite

Análise dimensional:

A variação dimensional de todo o processo foi feita por scan tridimensional, através do GOM

ATOS Triple Scan, sendo a geometria resultante sobreposta à geometria original que se pretende

obter. A sobreposição foi realizada pelo software de processamento ATOS Professional. Para

efeitos comparativos, a geometria original (em CAD) utilizada não possui qualquer fator de

contração, enquanto o fator de contração adotado foi de 2.3% para a peça fundida. As diferenças

dimensionais entre as duas geometrias estão realçadas por cores e por valores locais, como pode

ser visto na Figura 89 e na Figura 90. Os valores negativos indicam que a peça fundida contraiu

mais que o desejado enquanto os valores positivos têm o significado oposto.

Figura 89 - Variação dimensional da peça obtida relativamente à geometria original; vista frontal.

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

103 João Leite

Figura 90 - Variação dimensional da peça obtida relativamente à geometria original; vista por trás.

Pela análise das duas figuras conclui-se que no geral a peça fundida contraiu mais do que se

pretendia embora as geometrias estejam relativamente próximas na sua generalidade. Na

extremidade do pino, é notório o excesso de contração sendo que a diferença dimensional

máxima entre geometrias anda próxima de 0.89 mm. A zona circundante do patamar também

revela excesso de contração.

O coeficiente de contração adotado (2.3%) não está muito longe do valor real, no entanto, este

valor revela-se um pouco insuficiente pois a peça obtida apresenta dimensões mais reduzidas

que as desejadas. O coeficiente de contração que deverá ser adotado em trabalhos futuros para

a Ti6Al4V deverá ser superior a 2.3%.

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104 João Leite

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105 João Leite

6 - Análise crítica do trabalho desenvolvido De todas as carapaças criadas foi realizado o vazamento de uma carapaça. Embora tivesse sido

interessante vazar as restantes carapaças, os resultados obtidos da carapaça vazada foram

importantes e são úteis para trabalhos futuros.

O desenvolvimento de arquiteturas de gitagem poderia ter sido melhor no aspeto do volume de

metal necessário pois a limitação do forno foi sobrestimada. Como forma de testar a capacidade

de produção industrial, poderiam ter sido criados cachos de dimensões superiores até 15 Kg, que

é a capacidade máxima de algumas empresas. Seria impossível vazar totalmente este tipo de

cachos no INEGI, sendo necessária colaboração com outras empresas. O vazamento das

geometrias desenvolvidas também poderia ter sido feito para ligas de Cobalto-Crómio.

Relativamente à análise de especificações e normas de próteses efetuada, foram analisadas as

normas às quais foi possível aceder. Em alguns casos, as normas analisadas não foram as mais

atuais, devido aos elevados custos associados à aquisição de todas as normas atualizadas. Apesar

disso foi possível uma compreensão aprofundada acerca dos requisitos exigidos pelas normas

relativos à produção de próteses articulares.

Com a realização desta dissertação foi possível colocar em prática diversos conhecimentos

adquiridos ao longo do curso. Foram identificados pontos de melhoria, que são apresentados

como possíveis propostas de trabalhos futuros.

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106 João Leite

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107 João Leite

7 - Conclusões Em relação às normas analisadas:

Não há requisitos geométricos para próteses articulares.

A superfície deve ser livre de imperfeições e de detritos resultantes do acabamento não

podendo ser usados processos abrasivos com partículas de ferro.

O acabamento de componentes trabalhados na liga Ti6Al4V poderá ser polido ou mate.

O mesmo também se aplica para componentes na liga de cobalto-crómio-molibdénio.

A microestrutura da liga Ti6Al4V é apenas normalizada para a variante trabalhada

(wrought), sendo do tipo α+β globular.

A microestrutura da liga de cobalto-crómio-molibdénio não é definida por qualquer uma

das normas analisadas. Não foi possível aceder à norma ISO 5832-12, relativa a esta liga

fundida.

A liga Ti6Al4V fundida deverá ser processada por prensagem isostática a quente após

maquinagem química. Para além destes tratamentos, também poderão ser realizados

tratamentos térmicos que alterem as propriedades mecânicas. A aplicabilidade de

tratamentos térmicos na liga de cobalto-crómio-molibdénio para fundição não está

normalizada.

De acordo com as especificações da produção de próteses comerciais apresentadas:

O intervalo de tolerâncias mais apertado é ±0.1 mm, estando fora dos limites das

tolerâncias lineares definidos por VDG P 690 para fundição por cera perdida.

A rugosidade definida é de 3.2 Ra, correspondendo ao grau N8, segundo VDG P 690.

Relativamente às arquiteturas de sistemas de gitagem:

A geometria A3 (em nascente) apresenta um enchimento menos turbulento

relativamente à geometria A2.

Todas as simulações das arquiteturas de sistemas de gitagem apresentam rechupes no

interior das peças. A utilização de isolamento no exterior das carapaças para controlo da

solidificação e diminuição de rechupes é uma possibilidade a encarar.

A geometria A2 é propícia a descontinuidades no escoamento (pingas) do metal durante

o enchimento;

O cacho A1 possui o rendimento mais elevado pois tem um sistema de gitagem

relativamente pouco volumoso, enquanto os cachos J1 e J2 possuem sistemas de gitagem

de baixo rendimento.

Sobre as peças do cacho T1:

Não houve rechupes.

A microestrutura obtida foi bifásica acicular.

A superfície não tem α-case.

A coeficiente de contração adotado (2.3%) foi insuficiente.

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108 João Leite

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109 João Leite

8 - Trabalhos futuros Existem bastantes trabalhos que poderão ser desenvolvidos a partir da presente dissertação.

Dado que o forno de vazamentos foi uma das principais limitações no desenvolvimento do

trabalho experimental, seria interessante o projeto e desenvolvimento de um forno de com maior

capacidade e fiabilidade superior. Um dos pontos de melhoramento poderá residir na criação de

um sistema de suporte para carapaças cerâmicas no interior do forno, pois o método atual poderá

ser pouco preciso e seguro, uma vez que a carapaça é simplesmente apoiada em tijolos.

A análise dos defeitos e conformidade com as normas poderá ser outro trabalho futuro, sendo a

presente dissertação um bom ponto de partida.

O estudo da variação dimensional ao longo de todo o processo de fundição por cera perdida é

interessante para que se possa caracterizar o modo como cada fase influencia as variações

dimensionais do produto.

Na presente dissertação, não foi explorada a possibilidade de reparação por soldadura de peças

fundidas. Esta é uma área interessante para o desenvolvimento de futuros trabalhos.

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110 João Leite

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

114 João Leite

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

115 João Leite

Anexos

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

116 João Leite

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117 João Leite

Anexo A Microestruturas de A1 a A9 da norma ISO 20160

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118 João Leite

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119 João Leite

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120 João Leite

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121 João Leite

Anexo B Resultados da análise química por espectrometria da

prótese metálica proveniente do INEGI

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

122 João Leite

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123 João Leite

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124 João Leite

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125 João Leite

Anexo C

Limites de defeitos admissíveis por inspeção visual,

por líquido penetrante e por raio-x

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

126 João Leite

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

127 João Leite

Limites aceitáveis para inspeção visual

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128 João Leite

Limites aceitáveis para teste do líquido penetrante

(ISO 9583)

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129 João Leite

Limites aceitáveis para radiografia segundo ISO 9584

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130 João Leite

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131 João Leite

Anexo D

Desenhos de definição dos moldes para injeção de

ceras em alumínio para o componente femoral e

para o componente tibial

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Desenvolvimento da metodologia de projeto e fabrico de próteses articulares

132 João Leite

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250

2

1

130

80

1

ISO 8015, ISO 2768

03/06/2014João Leite FATOR DE CONTRAÇÃO: 1.6%

MATERIAL: Al 7075

Desenhou

Verificou

Aprovou

NOME

Indicação

Escala 1:2 Folha: 1/3

A4Molde - Anca INEGI - CeraDATA

Quantidade Descrição

1

Meio Molde Superior - Anca INEGI - Cera2

1

1

Meio Molde Inferior - Anca INEGI - Cera

PESO: 14.294 Kg

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250

130

1 X 45°

15

15

R5

90°

10,

50

45 R5

10

40

R2,50 5°

48

Meio Molde Inferior - Anca INEGI - Cera A4

Folha: 2/3Escala 1:2

DATANOME

Aprovou

Verificou

Desenhou

MATERIAL: Al 7075

FATOR DE CONTRAÇÃO: 1.6%João Leite 03/06/2014

ISO 8015, ISO 2768

PESO: 6.879 Kg

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250

130

1 X 45° 90°

10,

50

49

9

R2,50 5°

48

ISO 8015, ISO 2768

03/06/2014João Leite FATOR DE CONTRAÇÃO: 1.6%

MATERIAL: Al 7075

Desenhou

Verificou

Aprovou

NOME DATA

Escala 1:2 Folha: 3/3

A4Meio Molde Superior - Anca INEGI - Cera

PESO: 7.415 Kg

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100

1

2

1

120

120

Meio Molde Inferior - Tíbia INEGI - Cera

1

1

2 Meio Molde Superior - Tíbia INEGI - Cera

1

DescriçãoQuantidade

DATA

Molde - Tíbia INEGI - Cera A4

Folha: 1/3Escala 1:2

Indicação

NOME

Aprovou

Verificou

Desenhou

MATERIAL: Al 7075

FATOR DE CONTRAÇÃO: 2.3%João Leite 03/06/2014

ISO 8015, ISO 2768

PESO: 3.931 Kg

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120

1 X 45°

DD

90°

10 5

10

40

120

SECTION D-D

ISO 8015, ISO 2768

03/06/2014João Leite FATOR DE CONTRAÇÃO: 2.3%

MATERIAL: Al 7075

Desenhou

Verificou

Aprovou

NOME DATA

Escala 1:2 Folha: 2/3

A4Meio Molde Inferior - Tíbia INEGI - Cera

PESO: 1.430 Kg

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120

10

R5

1 X 45°

DD

120 9

69

SECTION D-D

Meio Molde Superior - Tíbia INEGI - Cera A4

Folha: 3/3Escala 1:2

DATANOME

Aprovou

Verificou

Desenhou

MATERIAL: Al 7075

FATOR DE CONTRAÇÃO: 2.3%João Leite 03/06/2014

ISO 8015, ISO 2768

PESO: 2.501 Kg