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7/25/2019 Desidrio Murcho - O Erro de Leibniz
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21/01/2016 O erro de Leibniz
http://criticanarede.com/errodeleibniz.html 1/4
O erro de Leibniz
Desidrio Murcho
Universidade Federal de Ouro Preto
Num texto de 1697, Leibniz formula uma pergunta radical: "Por que halgo em vez de nada?" O seu objectivo sustentar a existncia de um
deus que seria a origem da realidade. Esta ideia, contudo, precisa de ser
cuidadosamente formulada, para no dar origem ao absurdo de sustentar
que h algo porque Deus, que no algo, o criou. Ao invs, a ideia
sustentar que Deus, que algo, eterno e no poderia no existir, pelo
que assim est explicado por que h algo: porque sempre houve e no
poderia no haver.
No decurso da sua argumentao, contudo, Leibniz comete um erro
crucial. Quando se faz a pergunta radical por ele formulada, as
alternativas bvias de resposta so as seguintes:
1. Cada acontecimento ou objecto do universo tem a sua origem noutro
acontecimento ou objecto anterior, que a sua explicao e razo de
ser, ad infinitum
2. Os objectos e acontecimentos formam um crculo explicativo, de modo
que A explica B que explica C que explica A
3. H um algo especial Deus que fez tudo o resto.
Leibniz favorece 3, mas para isso tem de se livrar de 1, que pelo menos
primeira vista no mais implausvel. 2, evidentemente, no
particularmente atraente como modelo terico da razo de ser da
realidade. Alm disso, Leibniz pensa ter um argumento que refutasimultaneamente 1 e 2. Acontece que o argumento est errado.
Matematicamente errado.
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Imaginemos que temos uma explicao da realidade nos moldes de 1. A
analogia bvia a fazer com a srie infinita dos nmeros. Do mesmo
modo, os objectos e acontecimentos do universo estender-se-iam para
sempre, infinitamente. Dado cada objecto ou acontecimento da srie de
objectos e acontecimentos que constituem a realidade ter uma explicao
apelando ao objecto ou acontecimento anterior parece que tudo
est explicado.
Mas no est, argumenta Leibniz. Fazendo uma analogia com o
livro Elementos de Geometria, Leibniz argumenta que podemos explicar a
existncia de cada exemplar apelando ao exemplar anterior do qual foi
copiado e caso essa srie fosse infinita, teramos sempre explicao
para a existncia de cada exemplar do livro mas no podemos explicar
por que razo h a prpria srie dos livros, em vez de outra ou nenhuma.
Assim, apesar de podermos explicar todos os acontecimentos e objectos
do mundo apelando a acontecimentos e objectos anteriores, resta aindaexplicarpor que h algo em vez de nada, resta explicar por que existe a
srie de acontecimentos e objectos, em que cada membro explicado
por outro membro.
Este argumento est inequivocamente errado, pois exige uma explicao
depois de tudo ter sido explicado. Isto compreende-se melhor sedeixarmos de falar no infinito e passarmos a falar de um conjunto finito e
muito pequeno, pois apesar de a mente de Deus ser supostamente
infinita e sbia, a dos seres humanos finita e dada a erros elementares.
Tome-se um conjunto de quatro pessoas, em que a primeira me da
segunda, esta da terceira e esta da quarta. Se perguntarmos por que
existe cada uma delas, a resposta que a sua me a gerou. Claro que
num modelo finito no temos explicao para a primeira delas. A ideia de
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um modelo infinito , precisamente, haver desse modo explicao para
todas, pois nunca falta uma me anterior para explicar a existncia da
pessoa posterior. O argumento de Leibniz ento admitir que numa srie
infinita cada membro est plenamente explicado pelo membro anterior,
mas exigir explicao para a srie em si. Aplicando o seu argumento ao
modelo com quatro pessoas, Leibniz considera que depois de explicar a
existncia de cada uma delas com base na sua me, temos de explicar a
existncia da srie. A resposta a este argumento que nada h para
explicar agora, excepto apelar noo matemtica de conjunto. Nada h
num conjunto excepto os membros do conjunto, e como os membros no
podem existir sem que exista o conjunto, explicar a existncia dos
membros eo ipsoexplicar a existncia do conjunto. A pergunta de
Leibniz o mesmo que, depois de se ter explicado a existncia de cada
uma das trs bananas em cima da mesa, exigir que se explique a
existncia do conjunto das trs bananas. A resposta bvia que j
explicmos a existncia do conjunto das trs bananas depois de termos
explicado a existncia de cada uma das bananas. Mais: nada pode
explicar a existncia do conjunto das trs bananas excepto o que explica
a existncia de cada uma das trs bananas. No como se Deus
pudesse criar trs bananas em sucesso e depois pudesse decidir no
criar o conjunto das trs bananas. Criar cada uma das bananas eoipso criar o conjunto das trs bananas, e explicar a existncia de cada
uma das trs bananas explicar a existncia do conjunto das trs
bananas.
A estratgia de Leibniz, note-se, admitir a possibilidade de uma srie
infinita na qual cada membro explicado por outro membro anterior. Aideia mostrar que mesmo admitindo tal possibilidade, no teramos uma
explicao da realidade alternativa explicao supostamente dada por
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Deus. Dado que o seu argumento est errado, resta-lhe negar a
possibilidade de uma srie infinita na qual cada membro seja explicado
por outro membro anterior. Mas isso exige um argumento diferente.
Desidrio Murcho
mailto:[email protected]