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Design de moda com Memória de Forma Fashioning Shape Memory Design Laschuk, Tatiana; Universidade do Minho [email protected] Souto, Antonio; Dr; Universidade do Minho [email protected] Resumo Os avanços na área da tecnologia e da ciência têm se refletido na área têxtil por meio do desenvolvimento de novas fibras, acompanhando o comportamento do mercado consumidor ansioso por novidades e valores funcionais e estéticos. A consolidação dessa área resultou no surgimento de uma nova área de pesquisa, que são os têxteis inteligentes. O trabalho a seguir pretende abordar essa área de pesquisa focando nos Shape Memory Materials – SMM (materiais com memória de forma) e as suas principais aplicações e desenvolvimentos na área têxtil e do vestuário, identificando novas oportunidades e adaptações a serem efetuadas. Palavras Chave: Shape memory materials; Têxteis inteligentes; Design Têxtil. Abstract Advances in the field of technology and science has been reflected in the textile area through the development of new fibres accompanying the consumer market behaviour for news as well as functional and aesthetic values. The consolidation of this area has resulted on the emergence of a new area of research, the smart textiles. The research aims to explore this area focusing on Shape memory materials - SMM (materials with memory in order) and their main applications and developments in the textile and clothing area identifying new opportunities and adjustments to be made. Keywords: Shape memory materials, Smart textiles, Textile Design. Anais do 8º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design 8 a 11 de outubro de 2008 São Paulo – SP Brasil ISBN 978-85-60186-03-7 ©2008 Associação de Ensino e Pesquisa de Nível Superior de Design do Brasil (AEND|Brasil) Reprodução permitida, para uso sem fins comerciais, desde que seja citada a fonte. Este documento foi publicado exatamente como fornecido pelo(s) autor(es), o(s) qual(is) se responsabiliza(m) pela totalidade de seu conteúdo. 1784

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Design de moda com Memória de Forma Fashioning Shape Memory Design Laschuk, Tatiana; Universidade do Minho [email protected] Souto, Antonio; Dr; Universidade do Minho [email protected] Resumo Os avanços na área da tecnologia e da ciência têm se refletido na área têxtil por meio do desenvolvimento de novas fibras, acompanhando o comportamento do mercado consumidor ansioso por novidades e valores funcionais e estéticos. A consolidação dessa área resultou no surgimento de uma nova área de pesquisa, que são os têxteis inteligentes. O trabalho a seguir pretende abordar essa área de pesquisa focando nos Shape Memory Materials – SMM (materiais com memória de forma) e as suas principais aplicações e desenvolvimentos na área têxtil e do vestuário, identificando novas oportunidades e adaptações a serem efetuadas. Palavras Chave: Shape memory materials; Têxteis inteligentes; Design Têxtil. Abstract Advances in the field of technology and science has been reflected in the textile area through the development of new fibres accompanying the consumer market behaviour for news as well as functional and aesthetic values. The consolidation of this area has resulted on the emergence of a new area of research, the smart textiles. The research aims to explore this area focusing on Shape memory materials - SMM (materials with memory in order) and their main applications and developments in the textile and clothing area identifying new opportunities and adjustments to be made. Keywords: Shape memory materials, Smart textiles, Textile Design.

Anais do 8º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design 8 a 11 de outubro de 2008 São Paulo – SP Brasil ISBN 978-85-60186-03-7 ©2008 Associação de Ensino e Pesquisa de Nível Superior de Design do Brasil (AEND|Brasil) Reprodução permitida, para uso sem fins comerciais, desde que seja citada a fonte.

Este documento foi publicado exatamente como fornecido pelo(s) autor(es), o(s) qual(is) se responsabiliza(m) pela totalidade de seu conteúdo.

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INTRODUÇÃO

Hoje vive-se uma era de mudanças revolucionárias, nos domínios da ciência e da tecnologia. Ambas áreas, que trabalhavam em campos separados e distintos, têm aliado esforços e conseguido resultados surpreendentes com profundo impacto sobre a vida do ser humano (TAO, X. 2001). Essa nova era proporcionou profundos avanços na indústria têxtil com o desenvolvimento de novas fibras, produto de pesquisa científica que nas duas últimas décadas revolucionaram a indústria têxtil no mundo, comparando-se a revolução industrial (TAYLOR, M. 1999)

Olhando para frente, o futuro promete ainda mais. O mercado para novas tecnologias está crescendo, assim como as exigências e necessidades dos consumidores estão mudando, esperando cada vez mais de seu guarda-roupa. Esses consumidores estão se tornando cada vez mais ousados e interessados por produtos que tenham agregado valores funcionais e estéticos, possibilitando a interação, surpresa e entretenimento do usuário.

Em resposta a essas novas exigências, experimentos e tecnologias radicais estão entrando em cena no desenvolvimento de novos materiais, sendo um importante fator na área da criação de novos tecidos e vestuários, permitindo que designers e cientistas trabalhem em colaboração multidisciplinar tendo como resultado um design dinâmico e interactivo (MATILLA, H. 2006). Designers têxteis japoneses são pioneiros nesse campo, pois testam as limitações práticas em relação às propriedades físicas dos materiais aliando a isso a tecnologia experimental dos tecidos. A inversão de estratégia ocorrida na indústria têxtil tradicional, que tem apostado na criação inovadora de produtos e funcionalidades, permitiu a consolidação de uma área emergente de estudo e desenvolvimento científico-tecnológica: a dos têxteis inteligentes.

OBJETIVOS

A partir da projeção das novas necessidades dos consumidores e do uso de têxteis inteligentes para prover a satisfação das mesmas, o presente artigo tem como principal objetivo prover um estudo sobre os têxteis inteligentes com foco nos shape memory materials – SMM (materiais com memória de forma) e as suas aplicações na área têxtil e do vestuário. METODOLOGIA

O estudo se realizará por meio da pesquisa, descrição e discussão dos novos desenvolvimentos das tecnologias relacionadas aos shape memory materials identificando novas oportunidades e problemas a serem melhorados a partir das diferentes propriedades entre shape memory alloys (ligas metálicas) e shape memory polymers (polímeros). O trabalho aqui apresentado é parte do projeto de mestrado “Têxteis inteligentes aplicados a produtos de moda” que está sendo realizado no Departamento de Engenharia Textil da Universidade do Minho, em Guimarães, Portugal. TÊXTEIS INTELIGENTES

O termo têxteis inteligentes deriva de materiais inteligentes ou espertos. O conceito de material inteligente foi pela primeira vez definido no Japão em 1989. O primeiro material têxtil inteligente que foi rotulado como “têxtil inteligente” foi a seda com tratamento de memória de forma (LANGENHOLVE, L 2004). Têxteis inteligentes são materiais que estão

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aptos a sentir e a responder de maneira controlada ou prevista aos estímulos do meio ambiente, que podem ser de origem elétrica, térmica, química, magnética ou outras. Como resposta diretas a esses estímulos, estão as mudanças na forma, cor, geometria, volume e outras propriedades físicas visíveis, podendo responder também de forma indireta, que inclui mudanças a nível molecular, magnético ou eléctrico (TAO, X 2001).

Os têxteis inteligentes satisfazem de forma plena os critérios em relação ao valor acrescentado de um produto de alta tecnologia, tornando-o competitivo. Seu mercado global tem crescido muito e foi estimado em $300 milhões de dólares em 2003, e prevê-se o crescimento para $720 milhões de dólares no ano de 2008 (TANG, S e STYLIOS, G 2006). Uma das principais razões para o crescimento acelerado dos têxteis inteligentes é o importante investimento por parte da indústria militar. Além dessas, outras áreas têm se beneficiado com essas novas tecnologias, como a indústria médica, automotiva, espacial e vestuário de proteção. Com a progressiva evolução dos têxteis inteligentes e a gradual redução dos seus custos, a sua comercialização tem se tornado viável. O vestuário casual, embora não tenha sido a primeira área a se beneficiar dessas tecnologias, está aos poucos incorporando-as no desenvolvimento de seu design, com o intuito de melhorar seus aspectos funcionais e estéticos.

Uma nova geração de vestuário está prevista com o uso destes têxteis inteligentes, e acomoda funções que vão para além do estilo, conforto e desempenho. No mundo da moda, novos têxteis tecnológicos tem surtido um imenso impacto com seu visual único, toque e desempenho (BRADDOCK, S 2005). Muitas aplicações inovadoras foram demonstradas em todo o mundo, como, por exemplo, os materiais com memória de forma (shape memory materials), que na área têxtil têm sido aplicados em forma de filmes, revestimentos e fibras, resultando em tecidos e vestuário de alta performance e valor estético agregado. SHAPE MEMORY MATERIALS

Shape memory materials - SMM, ou materiais com memória de forma, pertencem a classe de materiais ultra inteligentes que têm a capacidade de sentir aos estímulos do meio ambiente e reagir a estes estímulos adaptando o seu comportamento às circunstancias. Há uma variedade de fatores que podem estimular um SMM, incluindo corrente eléctrica, energia solar, energia magnética, e produção de calor produzidas por mudanças na temperatura do corpo. Estes fatores físicos estão aptos a estimular o Shape Memory Effect - SME (efeito de memória de forma), capacidade que o material possui em memorizar uma forma quando aquecido a altas temperaturas, e após resfriamento, o material recuperará a forma a que foi memorizada sob o estimulo apropriado, a temperaturas moderadas. O SME capacita os SMMs a responder e a transformar-se a uma determinada forma, posição, força, rigidez, frequência natural, humidade, fricção, e outras características dinâmicas e estáticas do sistema do material.

Os SMMs têm propriedades adicionais, os quais incluem pseudoelasticidade ou recuperação de força, alta capacidade de humidificação e propriedades adaptativas, devidas a habilidade de inverter a transformação durante a fase de transição. Como um material adaptável, este tem a capacidade de converter energia térmica em energia mecânica. Os SMMs podem ser encontrados em uma variedade de materiais como ligas metálicas, cerâmicas, polímeros e géis, mas o efeito de memória é observado principalmente em ligas metálicas (Shape Memory Alloys - SMA) e polímeros (Shape Memory Polymers – SMP) (SHISHOO, R 2002)

Shape Memory Materials (SMM), os quais adquirem uma forma a determinada temperatura e transformam-se em outra forma quando aquecidos, não são novos: a verdade é que os Shape Memory Alloys (SMA) datam da década de 1930. (COLCHESTER, C 2007).

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SHAPE MEMORY ALLOY

O SMA (shape memory alloy) é uma liga metálica sensitiva que tem a habilidade de retornar a uma forma pré-programada quando estimulado pelo calor ou corrente eléctrica. Cria-se SME através de um processo de aquecimento e rápido resfriamento, definindo-se assim a relação entre as diferentes estruturas cristalinas. O SMA retém a sua forma programada a uma temperatura ambiente, mas quando deformada sempre retornará a sua forma original, quando um estímulo apropriado for aplicado.

O efeito de memória de forma e a pseudoelasticidade estão associados com a maneira particular como a fase de Martensitic Phase Transformation (MPT) ocorre (PATOOR ET AL, 2006). A MPT possui duas fases estáveis, a fase martensite, que corresponde ao estado cristalino a baixas temperaturas e ao efeito de memória de forma, e a fase austenite, que corresponde ao estado cristalino a altas temperaturas e à forma memorizada. (DUMONT,G e KUHL, C 2005).

A figura 1 ilustra o processo de memorização das ligas metálicas. Observa-se a memorização da forma a altas temperaturas correspondente à fase austenite (forma a). Após resfriamento, a liga metálica pode ser deformada (forma b), e recupera a forma que foi memorizada, sob aquecimento moderado (forma a).

Figura 1. Processo de programação e memorização do SMA

Durante os primeiros anos de desenvolvimento dos SMAs, uma grande variedade de ligas foram desenvolvidas para expor efeito de memória de forma, mas apenas aqueles que podem recuperar quantidades substanciais de força são de interesse comercial. Hoje, as principais ligas que cumprem este critério são ligas de níquel-titânio (NiTi) e as ligas a base de cobre. Apesar das ligas a base de cobre terem menor custo e fácil processabilidade, as ligas de NiTi tem características e propriedades mecânicas únicas que são determinadas pela sua composição. Entre as suas principais propriedades mecânicas estão: alta força de memória de forma, características super-elásticas, alta ductilidade, excelente resistência a abrasão, estabilidade térmica bem como alta resistência térmica. Sua fabricação pode ser feita em forma de barras, tiras, fibras, fios, tubos, filmes (MATILLA. H, 2006). As aplicações dos SMAs têm evoluído e uma das maiores áreas de expansão tem sido a área da medicina, sendo esta promissora também em muitas outras áreas como aeroespacial e aeronáutica, automotora,

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e do vestuário. As características de superelasticidade do material têm sido o artifício mais importante em questão de valores comerciais e de consumo dos SMAs.

SHAPE MEMORY POLYMERS

Os Shape memory polymers – SMPs são uma nova classe de materiais funcionais inteligentes os quais têm se desenvolvido rapidamente nas ultimas décadas. Seu desenvolvimento foi feito pela primeira vez em 1984, no Japão. Shape memory polymers são materiais que respondem a estímulos, principalmente a temperatura, tendo como resposta a mudança de forma. (MONDAL, S, 2006)

Os polímeros com memória de forma termicamente ativados pertencem a um tipo de material funcional que pode deter uma deformação temporária, a uma temperatura inferior a temperatura de transição (Tg - temperatura de transição vítrea), e recuperar a sua forma inicial se for aquecido acima da sua temperatura de transição. (MENG, Y, et al 2007). A figura 2 ilustra o processo de programação e recuperação de forma. O protocolo típico consiste em aplicar uma deformação inicial específica a qual chamamos pré-deformação (forma a), a uma temperatura elevada, resfriar o material pré-deformado sob uma forma temporária a uma temperatura baixa onde a forma é fixada (forma b) e depois aquecer o material para recuperar sua forma original (forma b). (MCCLUSKEY. P, 2003).

Fig. 2 - Processo de deformação do polímero

Convencionalmente, a recuperação de forma em um SMP é acionada pelo calor externo. (HUANG, W, 2005). O efeito de memória nos polímeros resulta da morfologia e estrutura do polímero junto com o processamento e programação tecnológicos devidamente aplicados.

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O desenvolvimento de shape memory polymers tem demonstrado grande interesse por causa do seu baixo peso, alta força de recuperação de forma, manipulação e processamento mais econômicos, processo de programação mais rápido em comparação com os shape memory alloys. Outro benefício dos SMPs é o leque de temperaturas controláveis que podem ser ativadas que estão vinculadas a Tg e podem ser manipuladas mudando a composição do co-polimero ou o grau de ligações cruzadas. (LIU, Y, 2007)

O estudo relacionado a esse material está ainda em fase de desenvolvimento. Muito trabalho tem sido feito para explorar o potencial desse material, que pode ser aplicado em forma de laminados, revestimentos, filmes, fibras e esponjas a diversos produtos da vida cotidiana, como componentes indústriais do setor automotivo e da construção, dispositivos e implantes médicos, sensores. Assim como nas áreas citadas, a área do vestuário também tem obtido grandes avanços na utilização de SMPs, principalmente no vestuário de proteção, casual e desportivo.

Em recente estudo comparativo realizado pelos autores, entre os dois shape memory materials mais utilizados, o SMP em particular o SMPU e o SMA de NiTi, é possível reconhecer a diferença entre eles assim como suas vantagens e desvantagens. Os SMAs têm sido utilizados devido a sua excepcional pseudoelasticidade, propriedades de memória de forma, biocompatibilidade, óptima resistência, assim como a habilidade recuperação de forma em 100%, são resistentes à corrosão e possuem elevada resistência mecânica. Possuem porém baixa força de recuperação, por volta dos 8%, e seu uso excessivo no vestuário pode trazer um aspecto táctil não desejável. Por outro lado, os SMPs tem sido foco de grande interesse por parte da industria têxtil devido a sua leveza, alta força de recuperação, fácil manipulação, superior processabilidade, alta estabilidade de forma, baixo custo em comparação aos SMAs e possuem um largo campo de controlo da temperatura de recuperação de forma.

Apesar da vasta utilização dos SMAs no vestuário de moda íntima, casual, e de protecção, os SMPs possuem maior potencial para a aplicação na área têxtil e do vestuário em geral por possuírem fácil manipulação, bom toque, e leveza. Porém, poucas aplicações com a utilização de SMPs têm sido trazidas ao mercado, e o número de fornecedores do material ainda é muito pequeno e os mesmos são de difícil acesso, dificultando a aplicação na área têxtil. (LASCHUK, T e SOUTO, A 2008).

APLICAÇÃO DE SMMS À ÁREA TÊXTIL E DO VESTUÁRIO

O uso de Shape memory materials na área têxtil reflete a importância da inovação tecnológica e dos beneficios do seu potencial estético e funcional no vestuário. O efeito de memória de forma pode criar nos tecidos significantes e expressivos efeitos tridimensionais na sua forma ou superficie proporciando “vida” ao tecido, quando estes receberem estímulos magnéticos, eléctricos, térmicos ou energia solar. As inclusões de SMMs em estruturas têxteis resultam em novos conceitos de vestuário, que têm se utilizado das duas principais tecnologias da área de Shape memory materials: os Shape Memory Alloys (SMA) e Shape Memory Polymers (SMP) para criar efeito estéticos e funcionais em tecidos, assim como o desenvolvimento de peças de vestuário.

Recentemente o uso de SMM foi iniciado no setor da moda e do vestuário, sendo um dos seus primeiros exemplos a entrar no setor a Corpo Nove, uma marca italiana que elaborou uma camiseta de manga longa (fig. 3), feita a partir de fios de SMA, que ergue as mangas por si só quando o ambiente aquece a uma determinada temperatura (MARKS, P, 2001). Além de seu uso na área da moda, o SMA pode ser utilizado para o vestuário funcional, como o vestuário de proteção. Tal utilização pode ser feita através da incorporação de molas de SMA entre duas camadas de tecidos (fig.4). O mecanismo deste tecido funciona da seguinte

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maneira: quando a temperatura diminui, a mola cresce, e cria uma camada de ar entre os dois tecidos, proporcionado o isolamento térmico. (RUSSELL, D. et al 2001). Fig. 3 –

Camiseta Corpo Nove Fig. 4 - Mola de SMA entre duas camadas de tecido

O designer de moda Hussein Chalayan, através da habilidade de surpreender na

construção e na utilização de tecnologias em suas roupas, criou na sua colecção primavera/verão 2000, chamada: “Before Minus Now” um tecido com mudança de forma na saia. Um fio de SMA electricamente activado foi costurado na barra da saia. Ao activar o fio com estímulos eléctricos, a barra da saia muda de forma, aumentando o volume do ondulado (Fig. 21) (LEE, S 2005).

Fig. 5 – Aplicação de SMA ao vestuário por Hussein Chalayan A utilização de SMA por Hussein teve continuação sete anos mais tarde na colecção

primavera/verão 2007 “One Hundred and Eleven”. Com uma variedade de cinco modelos, que tem como características o movimento, a contracção e a expansão. Zíperes que se abrem, partes do vestido que se recolhem, saia que diminui de comprimento. Quando um estímulo eléctrico é aplicado, a roupa “relembra” a forma que foi memorizada. A aplicação de diferentes estímulos eléctricos possibilita a criação de diferentes formas.

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Fig. 6 – Movimento de fechamento do zíper Apesar da aplicação das ligas metálicas com memória de forma, os SMA na área têxtil,

através do seu uso em laminados, fios e tecidos na aplicação na área de vestuário de proteção, casualwear e underwear femininas, os SMPs tem mostrado grande potencial na área têxtil e confecção e em produtos relacionados. Tais produtos incluem tecidos funcionais, tecidos com valor estético agregado, aplicados a acessórios, calçados e vestuário.

Uma variedade de SMPs, como o trans-polyisoprene (TPI), poly(atyrene-co-butadiene) e polynorboenene, têm sido desenvolvidos. Em particular, shape memory polyurethanes, (SMPUs) têm despertado atenção maior desde que foram desenvolvidos pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Nagoya da MHI (Mitsubishi Heavy Industries) em 1988. (HU, J 2005) Esse polímero tem chamado muita atenção devido às suas propriedades mecânicas e térmicas, podendo ser utilizado em forma de fibras, revestimentos ou laminados proporcionando aos tecidos as seguintes propriedades funcionais: tecidos para vestuário com resistência a água, retardante de chama, respiráveis, non-ironing, easy care, além de utilizar sua inteligência de memória de forma para fins estéticos. Um dos exemplos mais conhecidos comercialmente sobre a aplicação de SMPU em roupas é a membrana Diaplex (fig.7), desenvolvida pela MHI. Com o aumento da temperatura, a estrutura da membrana muda a forma, permitindo que o vapor d´água e o calor do corpo passem pelo tecido, respondendo de forma inteligente as mudanças do meio ambiente e do corpo humano (DING, X, 2006).

Fig. 7 Representação funcionamento da membra DIAPLEX e a aplicação em jaqueta da Corpo Nove.

O desenvolvimento de fibras de SMPs pode ser feita através do processo de extrusão, como nas fibras desenvolvidas a partir de SMPU, realizado pelo Shape Memory Textile Center

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de Hong Kong. Tal desenvolvimento resultou em fibras de SMPU com completa recuperação de forma. Em comparação a outras fibras, possui boas propriedades mecânicas e térmicas e diminuição de encolhimento além de total recuperação responsiva.

Em outro experimento, foi possível o desenvolvimento de nanofibras com efeito de memória de forma, extrudidas a partir de uma solução de SMPU através de método eletrospinning. O experimento resultou em nanofibras ultra finas com satisfatório SME: 98% de recuperação de forma e 80% de fixação da forma (ZHUO, H 2005). Além da possibilidade de produção de fios compostos 100% de SMP, existe também a possibilidade de misturá-los junto a outras fibras (fig. 8), porém, a mistura de fios convencionais a SMMs pode diminuir o efeito de mudança de forma do fio.

Fig. 8 – Mistura de filamentos de SMP a fios tradicionais, fios fantasia.

Os fios de SMP puros ou fantasia podem passar por uma série de processos têxteis. O processamento têxtil a partir de filamentos de SMP permite que a estrutura do tecido mude de forma, proporcionando ao tecido qualidades estéticas e funcionais. Os tecidos a base de SMP podem ser planos ou tridimensionais. Os efeitos visuais que o tecido consegue memorizar sob calor incluem a abertura de plissados, movimentos superficiais, estruturas tridimensionais. A mudança na forma do tecido depende do seu design e o treinamento dado ao SMP podendo criar diferentes efeitos estéticos em resposta às mudanças no meio ambiente. A figura 9 ilustra uma variedade de efeitos tridimensionais que podem ser criados a partir da memorização da forma e posterior recuperação quando o mesmo for submetido a um estímulo apropriado. (VILI, Y 2007).

Fig. 9 - Efeitos tridimensionais criados a partir da memorização de tecidos com filamentos de SMP. Além dos processamentos têxteis e da produção de fibras, que são desenvolvidos com

o SMP, os revestimentos feitos a partir deste material tem gerado muito interesse devido a possibilidade de aplicação em tecidos ou malhas sem que seja necessário tecer ou tricotar o tecido ou a malha com SMP. Os revestimentos podem ser utilizados com o propósito funcional ou estético. A mudança na forma do tecido depende do design e do treinamento especifico atribuído ao SMP.

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Os revestimentos podem ser incorporados em roupas de proteção como isolamento térmico adaptável e podem ser utilizados como vestuário de proteção. Em roupas casuais, a permeabilidade de revestimentos ou laminados em SMP muda, assim como a temperatura do corpo muda, formando uma combinação ideal entre isolamento térmico e permeabilidade ao vapor d´água para roupas interior e exterior. Para roupas esportivas as fibras de SMPU respondem aos estímulos do meio ambiente de forma pré-determinada proporcionando protecção contra o vento e intempéries, dissipação de transpiração e possui excelentes propriedades elásticas.

A incorporação de SMMs aos têxteis tem sido testada durante anos, e ainda existem dificuldades na sua processabilidade. Os SMAs são difíceis de serem tricotados ou tecidos, enquanto que os SMPs, os quais têm alta resistência a tensão, são mais fáceis de serem processados como fios, e consequentemente tecidos. No caso da criação de fios de SMA, a memorização de forma do fio deve ser feita antes de sua tecelagem ou incorporado a outras fibras, como é o caso das fibras bicomponentes, com materiais como poliéster, viscose, poliamida, pois a alta temperatura necessária para a memorização da forma pode danificar as mesmas (CHAN, Y. 2003A). Porém a mistura do fio de SMA a fios tradicionais de composição natural como o algodão podem ser adicionados antes da programação da forma a altas temperaturas. Tal mistura é feita com o intuito de melhorar a processabilidade do fio de SMA no processamento têxtil (LASCHUK,T E SOUTO, A 2008B).

Os SMAs devem ser utilizados em áreas especificas e não no tecido como um todo, pois podem causar efeito negativo no toque e no conforto, um tecido que seja desenvolvido inteiramente de SMA tem dificuldades de tecelagem devido baixa extensibilidade do fio que cria dificuldades na formação do ponto, na estabilidade e regularidade.

No caso dos SMPs, estes são tratados após a incorporação aos fios e tecidos, sendo possível assim programar a forma no tecido como um todo, para se conseguir o efeito de memória de forma. Os altos níveis de deformação e elasticidade possíveis com os SMPs em combinação com sua baixa taxa de rigidez, fazem do material próprio para ser trabalhado através de processos como malharia e tecelagem, formando estruturas flexíveis com boa textura e toque. (CHAN, Y. 2003B). CONCLUSÃO

É notável o potencial uso dos shape memory materials em muitas áreas, devido à sua característica estrutura inteligente e ao grande leque de aplicações a que esses podem ser utilizados. Porém o material ainda possui muitos obstáculos a serem superados, como os aspectos de processabilidade, engenharia e fabricação sob alta qualidade a preços reduzidos. Os avanços recentes com os SMPs e SMAs têm inspirado designers a utilizarem essas tecnologias inteligentes para criarem tecidos com estruturas com desempenho às respostas do meio ambiente. O efeito de memória de foram aplicados aos tecidos com SMMs reforça o apelo estético e funcional. A aplicação de materiais com memória de forma na área têxtil ainda tem grande potencial a ser desenvolvido, e muito tem a ser investigado, principalmente no que diz respeito aos SMPs, que são uma classe relativamente nova e com muito potencial a ser descoberto, devido à suas vantagens em relação ao SMA já citadas. Contudo, ainda são poucas as tecnologias com SMP agregados trazidas ao mercado, e o número de fornecedores ainda é pequeno, dificultando a exploração dessa tecnologia por parte dos designers.

De qualquer forma, deve-se levar em conta que os SMPs têm resposta mais lenta ao meio ambiente em comparação aos SMAs, por isso um esforço maior deve ser feito para força de recuperação dos SMPs sejam melhoradas. Tanto os SMAs quanto os SMPs devem melhorar seus processos de fabricação de fios especialmente para tecelagem e malharia e melhoria das suas propriedades, com a ajuda de testes com relação a diferentes testes termomecânicos, em diferentes velocidades e em diferentes ambientes. REFERÊNCIAS BRADDOCK, S. Techno-textiles 2, London: Thames and Hudson, 2005.

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COLCHESTER, C. Textiles Today, a global survey of trends and traditions, London: Thames and Hudson, 2007. CHAN, Y. Y. F.; STYLIOS, G. K. ‘Designing Aesthetic Attributes with Shape Memory Alloy for Woven Interior Textiles’ in INTEDEC 2003, Fibrous Assemblies at the Design and Engineering Interface, Edinburgh, UK, Set 2003(A). CHAN, Y. Y. F.; STYLIOS, G. K. ‘Engineering the Design Attributes of Woven Interior Textiles Using Shape Memory Polymer’, Advanced Flexible Materials and Structures: Engineering with fibres, The Fibre Society 2003 Spring Symposium, Loughborough, UK, Jul. 2003(B) DING, X. Preparation of Temperature-Sensitive Polyurethanes for Smart Textiles, Textile Research Journal, nº 76; p. 406, 2006. DUMONT, G; KÜHL, C. ‘Finite element simulation for design optimisation of shape memory alloy spring actuators’, International Journal for Computer-Aided Engineering and Software, nº 7, Vol. 22, p. 835-848, 2005. HU, J. Dependency of the shape memory properties of a polyurethane upon thermomechanical cyclic conditions, Polymer International, Vol. 54, p. 600-605, 2005. HUANG, W. Effects of moisture on the glass transition temperature of polyurethane shape memory polymer filled with nano-carbon powder, European Polymer Journal, Vol. 41, p. 1123-1128, 2005. LANGENHOVE, L. Smart clothing, a new life. International Journal of Clothing Science and Technology, No. 1, p. 63-72, 2004. LASCHUK, T; SOUTO, A, Comparative Research of two Smart Materials for application in Fashion Textile Design, Proceedings of 3rd International Nanotechnology on ‘Nanotechnology and Smart Textiles for Industry, Healthcare and Fashion’, 19th March 2008, The Royal Society London, mar 2008 (A). LASCHUK, T; SOUTO, A. Incorporation of SMA Technologies in Fashion Underwear Apparel, Proceedings of Ambience 08, Boras Sweden, jul 2008 (B). LEE, S 2005. Fashioning the future: Tomorrow's Wardrobe. London: Thames and Hudson. MATILLA, H. Intelligent textiles and clothing. Cambridge: Woodhead Publishing, 2006. MARKS, P. Sleeves up, New Scientist, nº 2301, p. 24, jul 2001. MCCLUSKEY, P. Thermomechanical recovery couplings of shape memory polymers in flexure, Smart materials and structures, Vol. 12, p. 947-954, 2003.

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