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1 DESIGN, INDÚSTRIA FONOGRÁFICA E SONORIDADES ALTERNATIVAS: POR UMA “HISTÓRIA VISUAL” DAS CAPAS DOS LP`S DA VANGUARDA PAULISTA Juliana Wendpap Batista Doutoranda em História – PPGH UFF [email protected] 1. Podemos dizer que vivemos em um mundo no qual a sensorialidade é imperativa. Caminhando pelas ruas da cidade, a todo o momento somos convocados a ouvir os sons, sentir os odores ou esbarrar nos transeuntes… Em nosso trajeto, por vezes, podemos ser tomados por uma sinestesia que encherá nossos olhos. Este pode ser um momento em que a admiração de uma imagem nos absorva de forma a esquecermos os ruídos, os cheiros. Ainda pode ocorrer o inverso, fechando-se os olhos, sons, odores e toques, são capazes de construir imagens belíssimas em nossa imaginação. Falamos em sensibilidade pensando na maneira com que estas capacidades nos conectam com a materialidade das coisas e objetos que permeiam nosso universo. Neste sentido, gostaríamos de propor uma análise que contemple a visualidade de um conjunto específico de objetos: as capas de discos de artistas e grupos musicais que compuseram a chamada “Vanguarda Paulista1 . Acreditamos ser possível abordar estes objetos enquanto documentos visuais, estabelecendo a relação entre o registro visual impresso nos mesmos e os anseios de renovação estético-musical proposta pelos integrantes desta vanguarda. Dimensionando a questão visual a aspectos relevantes da produção musical, nossa pesquisa percorre sucintamente a história do design das capas de discos e pontua questões acerca da produção fonográfica brasileira, para então, somente, efetuar a análise dos encartes selecionados. Vários são os desafios da realização de uma história com imagens, assim como são variáveis as abordagens metodológicas aplicáveis. Tendo isto em vista, optamos por nortear esta discussão pelos rumos de uma “História Visual”, aos moldes da proposta de Ulpiano Bezerra de Menezes. Segundo o autor, devemos estar atentos à execução de uma permanente dialética entre nossas fontes e a problemática histórica de nossa pesquisa, sendo a última a 1 Este foi um movimento que se tornou conhecido, na década de 1980, pela postura estética renovadora dos seus músicos. Seus principais representantes foram Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção e os grupos musicais Rumo, Premeditando o Breque e Língua de Trapo.

DESIGN, INDÚSTRIA FONOGRÁFICA E SONORIDADES … · Doutoranda em História – PPGH UFF [email protected] 1. Podemos dizer que vivemos em um mundo no qual a sensorialidade é

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DESIGN, INDÚSTRIA FONOGRÁFICA E SONORIDADES ALTERNATIVAS: POR UMA

“HISTÓRIA VISUAL” DAS CAPAS DOS LP`S DA VANGUARDA

PAULISTA

Juliana Wendpap Batista Doutoranda em História – PPGH UFF

[email protected]

1. Podemos dizer que vivemos em um mundo no qual a sensorialidade é imperativa.

Caminhando pelas ruas da cidade, a todo o momento somos convocados a ouvir os sons,

sentir os odores ou esbarrar nos transeuntes… Em nosso trajeto, por vezes, podemos ser

tomados por uma sinestesia que encherá nossos olhos. Este pode ser um momento em que a

admiração de uma imagem nos absorva de forma a esquecermos os ruídos, os cheiros. Ainda

pode ocorrer o inverso, fechando-se os olhos, sons, odores e toques, são capazes de construir

imagens belíssimas em nossa imaginação. Falamos em sensibilidade pensando na maneira

com que estas capacidades nos conectam com a materialidade das coisas e objetos que

permeiam nosso universo. Neste sentido, gostaríamos de propor uma análise que contemple

a visualidade de um conjunto específico de objetos: as capas de discos de artistas e grupos

musicais que compuseram a chamada “Vanguarda Paulista”1. Acreditamos ser possível

abordar estes objetos enquanto documentos visuais, estabelecendo a relação entre o registro

visual impresso nos mesmos e os anseios de renovação estético-musical proposta pelos

integrantes desta vanguarda. Dimensionando a questão visual a aspectos relevantes da

produção musical, nossa pesquisa percorre sucintamente a história do design das capas de

discos e pontua questões acerca da produção fonográfica brasileira, para então, somente,

efetuar a análise dos encartes selecionados.

Vários são os desafios da realização de uma história com imagens, assim como são

variáveis as abordagens metodológicas aplicáveis. Tendo isto em vista, optamos por nortear

esta discussão pelos rumos de uma “História Visual”, aos moldes da proposta de Ulpiano

Bezerra de Menezes. Segundo o autor, devemos estar atentos à execução de uma permanente

dialética entre nossas fontes e a problemática histórica de nossa pesquisa, sendo a última a

1 Este foi um movimento que se tornou conhecido, na década de 1980, pela postura estética renovadora dos seus

músicos. Seus principais representantes foram Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção e os grupos musicais Rumo,

Premeditando o Breque e Língua de Trapo.

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que deve prevalecer no final. Bezerra de Menezes ressalta, ainda, que a decorrência disto no

trabalho com as imagens se encontra na necessidade de percorrer o ciclo completo de sua

produção, circulação e consumo, tomando as imagens enquanto artefatos que não possuem

significados em si, imanentes. Conforme sustenta, os significados destas imagens são dados

a partir da interação social, e suas apreensões apenas são possíveis por meio daquilo que

chama de biografia da imagem.

É a interação social que produz sentidos, mobilizando diferencialmente (no tempo,

no espaço, nos lugares e circunstâncias sociais, nos agentes que intervêm)

determinados atributos para dar existência social (sensorial) a sentidos e fazê-los

atuar. Daí não se poder limitar a tarefa à procura do sentido essencial de uma

imagem ou de seus sentidos originais, subordinados às motivações subjetivas do

autor, e assim por diante. É necessário tomar a imagem como um enunciado, que

só se apreende na fala, em situação. Daí também a importância de retraçar a

biografia, a carreira, a trajetória das imagens (MENEZES, 2003, p. 28).

A “História Visual”, segundo Bezerra de Menezes, vem entre aspas, não para indicar

mais uma fragmentação da disciplina histórica, “mas simplesmente como um campo de

operação de grande valor estratégico para o conhecimento histórico da sociedade, na sua

organização, funcionamento e transformação” (MENEZES, 2005, p. 1). Esta é a perspectiva

de abordagem que nos interessa nas imagens. Tratá-las como fontes que possam contribuir

em nossa compreensão do fenômeno da Vanguarda Paulista, o que inclui suas várias formas

de manifestação, produção e também de recepção. Visando seguir a proposta de Menezes,

tentaremos, a princípio, traçar a biografia das capas de discos, buscando a origem de suas

utilizações, assim como o desenvolvimento de um senso estético alinhado à finalidade das

mesmas.

2. Nosso trajeto dos primeiros anos das capas de discos tem início nos Estados

Unidos, em fins do século XIX. Foi lá que Thomas Alva Edison (1847-1931), tentando criar

o telégrafo, em 1887 inventou o fonógrafo, a primeira tecnologia para mídias sonoras

conhecida. Três anos após, Alexander Graham Bell (1847-1922) apresentou um aparelho

similar, diferenciado do modelo de Edison pela utilização de agulhas flutuantes de gravação.

Tal invento foi patenteado como graphophone em 1886, mas foi em 1888 que o invento foi

aperfeiçoado por Emile Berliner (1851-1929) e passou a ser comercializado com o conhecido

nome de gramophone. Enquanto o fonógrafo de Edison usava cilindros de cera para o

processo de gravação, os aparelhos de Berliner usavam chapas gravadas, as quais deram

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origem aos discos que conhecemos hoje. A partir de 1893, a produção dos aparelhos de

Berliner se intensificou, fazendo surgir o que hoje denominamos, no mundo da música, de

indústria do entretenimento.

Egeu Laus assinala a chegada da música gravada no Brasil em 1892, por meio de

Frederico Figner (1866-1892), o qual foi responsável pela fundação da Casa Edison no Rio

de Janeiro, em 1900, local em que realizou as primeiras gravações comerciais de música

brasileira. É interessante frisar que estas produções incluíam os primeiros discos com

gravação nos dois lados, a “chapa dupla”, lançada no Brasil por Figner, antes mesmo dos

estadunidenses e europeus. Em 1913 iniciaram os trabalhos da primeira fábrica de discos da

América Latina - a Odeon – uma filial de uma empresa Alemã que se instalou no bairro

carioca de Vila Isabel. A Odeon chegou a produzir um milhão e meio de discos por ano,

ocupando a posição de quarta maior produtora mundial do segmento. Neste contexto, as

gravações eram feitas pelo sistema mecânico e as composições musicais eram marcadas pela

influência dos ritmos dançantes do ragtime, do fox-trot, do paso doble, do charleston e

também do maxixe, irradiados de Paris para o mundo por meio do teatro musicado, dos

cabarés e do cinema. A indústria fonográfica cresceu muito no Brasil neste período e

ampliou-se ainda mais a partir de 1927, com a chegada das gravações elétricas. Com o

sistema de gravação eletro-magnético, dotado de uma superior sensibilidade, deu-se espaço

a um número bem mais amplo de cantoras e cantores. O sistema mecânico exigia uma

potência vocal grande para o registro das vibrações sonoras nas chapas, o que restringia o

número de intérpretes e resultava na supremacia das gravações instrumentais. Com o novo

sistema foi inaugurado o período considerado como os anos de ouro da música popular

brasileira, os quais foram embalados pelas canções de Francisco Alves e incrementados pelo

surgimento da Rádio Nacional em 1936 (LAUS, 2005, p. 296-300).

É importante salientar que estas informações nos permitem refletir sobre o processo

que trouxe a música para dentro de nossas casas por meio de suportes físicos que a tecnologia,

a cada dia que passa, torna menores. Interessante lembrar que a música, até então, era um

fenômeno muito mais praticado na esfera pública e prestigiado em concertos, recitais e outras

formas de manifestação artística. Com estas invenções, a música se materializou em chapas

sonoras que passaram a fazer parte dos lares de famílias no mundo todo. Em meados da

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década de 1940, o gramophone já era peça de museu e as vitrolas eram as novas estrelas.

Perderam o reinado devido ao tamanho e capacidade sonora de seus discos, que eram pesados

e frágeis, feitos de um composto de goma laca e cera de carnaúba e rodavam em 78 rpm, o

que possibilitava a gravação de músicas de até cinco minutos de cada lado. Fato bastante

incômodo para os amantes da música de concerto. Estes problemas foram resolvidos pela

indústria com o lançamento do LP, o long playng ou long-play. Estes discos eram

confeccionados em vinil, um composto material aperfeiçoado durante a Segunda Guerra

Mundial, muito mais leve e resistente. Com esse advento surgiram no mercado variados tipos

de Lp`s que diferiam em tamanho e velocidades de rotação (poderiam rodar em 78, 45 e 331/3

rpm). Surgiram também discos menores, de sete polegadas, o single, que ficou conhecido no

Brasil como compacto simples, com uma única música de cada lado. Havia até os discos

coloridos da empresa RCA/Victor, uma cor para cada estilo. No Brasil, os coloridos ficaram

bem populares nas versões infantis. Esta variedade de tipos de Lp`s fez com que os modelos

de toca-discos, a partir de 1950, tivessem uma chave para comutação de velocidades com

três opções: 78, 45 e 331/3rpm. Com o passar do tempo, os formatos foram se padronizando

até chegar à preponderância do formato que nos interessa, o LP de doze polegadas e 45 rpm

(LAUS, 2005, p. 301-304).

3. Percorremos rapidamente o caminho do surgimento dos discos e Lp’s. Neste

momento vamos nos direcionar às suas embalagens, sendo cabível uma discussão acerca da

questão do Design. Pensamos nesse ofício como um elo que interliga a funcionalidade das

capas, que a princípio foram criadas apenas para embalar os discos do trajeto da loja à casa

de seu comprador, referente às questões pertinentes à comunicação sobre o conteúdo e, por

fim, às noções de estética. Laus relata que as primeiras capas eram, na verdade, envelopes,

confeccionados em papel pardo, semelhante ao Kraft. Tinham formato quadrado e possuíam

um círculo central, vazado nos dois lados, para possibilitar a leitura do rótulo do disco. O

rótulo apresentava as informações em uma tipografia simples, a qual descrevia o nome do

artista, nome das músicas, autores, o estilo musical e alguma informação complementar. A

parte superior do rótulo sempre era tomada pelo logotipo da casa gravadora e a cor plana do

fundo indicava a série dos discos, além da companhia fonográfica. As gravadoras se

esforçavam para tornar os rótulos atraentes, algumas, em casos especiais, chegaram a

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imprimir neles a foto do artista. A princípio os discos eram comercializados, quase que

exclusivamente pelas casas gravadoras, sendo que muitas passaram a imprimir envelopes

padrões. Estes envelopes apregoavam as virtudes dos discos destas companhias e ajudavam

a promover os equipamentos para a reprodução dos mesmos. Com o passar do tempo outras

lojas passaram a revendê-los e assim imprimiam seus próprios envelopes, aproveitando o

espaço para divulgar outros produtos. (LAUS, p. 304-305).

O fato interessante é que, em tese, para os consumidores, os envelopes não tinham

grande importância, pois serviam para acondicionar e proteger os discos até que os mesmos

fossem re-acondicionados em álbuns. Estes álbuns eram semelhantes aos álbuns fotográficos,

apresentavam uma capa que podia ser de diferentes materiais como couro ou tecido e

possuíam várias divisões internas onde eram colocados os discos. Há indícios que somente

em fins dos anos 1940 começaram a surgir envelopes com fotos dos artistas, impressas em

uma só cor, com a relação do repertório. No entanto, não eram capas personalizadas, pois

eram intercambiáveis. Um disco de Francisco Alves poderia vir em um envelope de Orlando

Silva, por exemplo. Naquele contexto surgiram as capas temáticas. Em 1945, a RCA/ Victor

criou uma capa-padrão para todos os discos de carnaval produzidos naquele ano,

aproximando-se assim, de um projeto de embalagem que viria, anos mais tarde, caracterizar

as capas de disco.

Devemos apontar que o surgimento da primeira capa de disco ocorreu nos Estados

Unidos em 1939. O criador foi Alex Steinweiss, na época diretor de arte da Columbia

Records. Steinweiss convenceu os executivos da gravadora sobre a importância de tornar as

capas mais atrativas e acrescentou desenhos e pinturas às mesmas. Foi ele também que, em

1948, ao ser lançado o Long-play nos Estados Unidos, desenvolveu a versão clássica das

capas de LP, uma folha de cartão impressa e dobrada ao meio (LAUS, p. 309).

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1. Modelo de álbum para os singles ou compactos simples (331/3 rpm) e envelopes padrões das casas

gravadores e distribuidoras (Acervo pessoal Juliana W. Batista)

O destaque da atuação deste diretor de arte em meio à produção fonográfica nos

remete a uma reflexão sobre a atuação destes profissionais e a importância das imagens na

composição deste artefato, o disco. Nota-se também como, no decorrer do século XX, o

próprio interesse do público frente ao apelo visual vai se transformando e as imagens ficam

cada vez mais importantes no comércio destes produtos. Neste viés é prudente entender as

formas e imagens não apenas como expressão artística, mas também, a exemplo da capa do

disco, enquanto um objeto que pretende comunicar sobre seu conteúdo e sobre o(s) autor(es)

das canções que contém, sem esquecer que apresenta o objetivo de venda. Segundo Villas-

Boas:

Design gráfico é a área de conhecimento e a prática profissional específicas que

tratam da organização formal de elementos visuais – tanto textuais quanto não-

textuais – que compõem peças gráficas feitas para reprodução, que são

reproduzíveis e que têm um objetivo expressamente comunicacional. Ou seja: foi

feito para comunicar, não comunica por acaso ou porque tudo comunica, mas

porque este é seu objetivo fundamental (VILLAS-BOAS, 2003, p. 17).

Música, arte, comércio e comunicação, áreas que convergem na indústria fonográfica.

Após discorrer acerca do surgimento das primeiras capas de discos, direcionamos nossa

discussão para alguns aspectos sumários deste segmento da indústria do entretenimento.

4. Nossa discussão a respeito da indústria fonográfica situa-se entre a relação da

Vanguarda Paulista com a música independente. Estes anseios de renovação estética e

liberdade de criação, expressos pelos artistas deste contexto, são aspectos importantes para a

posterior análise das capas de suas produções sonoras. Leonardo de Marchi, em seu estudo

sobre a produção da música independente no Brasil, aponta que:

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A década de setenta foi um importante período de reorganização da indústria

fonográfica nacional. Fenômenos como a expansão do mercado consumidor, a

entrada de novas empresas no mercado, o surgimento de novas tecnologias, a

reformulação de importantes setores tais como a distribuição, de divulgação e

arrecadação dos direitos autorais contribuíram para uma profunda mudança da

estrutura do comércio de música. Ao final deste processo, notou-se uma

considerável preponderância das gravadoras transnacionais na dinâmica da cadeia

produtiva da economia da música. Apesar deste fato não ter implicado em prejuízos

para a produção de música brasileira, sua constatação gerou insatisfações em

determinados setores da classe de músicos brasileiros (MARCHI, 2006, p. 66).

O autor ressalta que estas insatisfações enfatizavam o caráter estrangeiro destas

empresas. Alguns artistas sentiram-se pressionados pelas exigências de produtividade

denotadas pelos altos investimentos realizados no setor por estas gravadoras, pautadas em

uma política internacional da indústria fonográfica. Para muitos artistas brasileiros estas

pressões interferiam sobre suas performances comerciais e, consequentemente, no processo

criativo de suas composições.

Na verdade, tais transformações da indústria criaram um forte sentimento de

insatisfação em setores da classe dos músicos brasileiros em relação às gravadoras

estrangeiras. Assim, constituiu-se uma situação paradoxal de expansão do mercado

e descontentamento com a indústria. É deste contexto que emerge uma via

alternativa de produção fonográfica no país, em outras palavras, uma produção

independente. (MARCHI, 2006, p. 64).

Segundo Gil Nuno Vaz, esta produção, dita independente, dos anos 1970 e início de

1980, processou-se sob três formas. Por meio de uma atuação autônoma, quando o artista

arcava com todos os custos e responsabilidades da produção, conforme o feito de Antonio

Adolfo que, para lançar seu primeiro Lp independente, criou seu próprio selo. Produções

aconteceram também por intermédio de associações cooperativas, como a exemplo da

COMUSA (Cooperativa Mista dos Músicos Profissionais do Rio de Janeiro). Dessa forma,

questões técnicas referentes à gravação e, também, divulgação do trabalho tornavam-se

facilitadas para os artistas. Uma terceira prática também foi corrente, na qual se estabelecia

uma relação comercial entre o músico e o produtor fonográfico, baseada na negociação de

condições. Este é o caso do Lira Paulista que, como outras produtoras, atuaram para fomentar

o mercado fonográfico alternativo (VAZ, 1988, p. 14-15). Gil Nuno Vaz problematiza o

conceito independente utilizado para denominar o movimento destes artistas ponderando

que, de qualquer forma, sempre existia algum grau de dependência por parte dos artistas. Na

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verdade, o autor acredita não ser fundamental discutir a utilização ou não de um termo

adequado, mas sim a compreensão de tal fenômeno. Uma segunda questão interessante

apontada por Vaz faz referência às motivações que encaminharam estes músicos para esta

via alternativa. Vaz indaga quanto à natureza da característica fundamental da postura do

músico independente. Tal postura seria constituída apenas por uma relação econômica de

produção ou configuraria, em primeiro plano, a adoção de uma atitude para preservar valores

estéticos? (VAZ, 1988, p. 11).

O autor salienta ser inquestionável que o caráter inovador da proposta de alguns

compositores e intérpretes do contexto esteve ligado ao interesse que circundava os

“independentes”. Ressalta, todavia, que essas contribuições não aconteceram a partir de

qualquer elemento artístico unificador marcante, o qual configurasse um novo padrão de

proposta estética. Desta forma, a música independente não teria se apresentado com

características de ‘movimento’, como a bossa-nova ou o tropicalismo (VAZ, 1988, p. 12).

Nuno Vaz enfatiza que, apesar das questões estéticas, é inegável o aspecto mercadológico

envolvido no processo. Segundo ele, “Uma gravadora não recusa um trabalho artístico por

ser novo, revolucionário, medíocre ou ruim. O julgamento é feito em termos de aceitação e

popularidade, dentro dos segmentos de públicos visados, e o retorno que o investimento

proporcionará” (VAZ, 1988, p. 13-14). Nesta direção, sua conclusão aponta que o artista

independente possui, para além da intenção de preservar seus valores estéticos, uma natural

e interior convicção que seu trabalho, considerado de maior ou menor qualidade por outros,

é merecedor de uma divulgação, muitas vezes negada pelos veículos de comunicação

estabelecidos.

Se, conforme Vaz, a Vanguarda Paulista não se constituiu enquanto um movimento

a partir de um processo estético unificador, continuamos a procura de elementos que

componham a argamassa desta Vanguarda. Um trecho da entrevista de Arrigo Barnabé,

cedida à Revista Veja, de 15 de dezembro de 1982 (SOUZA, 1982), endossa a premissa de

Vaz. Arrigo, considerado um dos principais representantes deste grupo, declarou então:

Não existe vanguarda paulista nenhuma […]. Há pessoas fazendo história,

com propostas importantes e novas, mas não existe este movimento. O que

há é uma resistência à pretensão das grandes gravadoras de exercer um

domínio total sobre o processo histórico da música brasileira (SOUZA,

1982).

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Segundo Marchi, se não havia um “sentimento musical”, uma peculiaridade

encontrada na prática destes artistas “independentes”, certamente eram as contínuas críticas

feitas pelos mesmos a determinado tipo de gravadora. Marchi cita aquela experiência como

central para a criação de um “sentimento político” da produção independente no contexto

fonográfico brasileiro. “Na medida em que se identificavam enquanto alternativa às

gravadoras transnacionais, aqueles artistas acabaram enfatizando cada vez mais o caráter

‘nacional’ dos empreendimentos independentes e o ‘estrangeiro’ das grandes gravadoras”

(MARCHI, 2006, p. 73).

Outro aspecto importante refere-se à relação espacial que circunscreveu este

movimento, que mesmo a contragosto acabou sendo reconhecido como Vanguarda Paulista.

Gil Nuno Vaz faz menção à importante atuação dos alunos da Escola de Comunicação e

Artes da Universidade de São Paulo, enfatizando que as propostas alavancadas pelos artistas

desta vanguarda tiveram o respaldo do conhecimento técnico, e que os nomes mais

representativos foram muito felizes ao conseguir criar dados novos a partir de fontes eruditas.

Expõe, ainda, que os mesmos também obtiveram sucesso na conciliação de linguagens

abstratas com o universo prático e imediato da música popular. Para Vaz:

É razoável afirmar, assim, que o ensino musical clássico – representado

basicamente pelo ECA-USP- contribuiu em grande escala para o surto de

renovação da MPB que se manifestou através das produções independentes. O I

Festival Universitário de MPB da TV Cultura teve, entre as doze finalistas, metade

das canções assinadas e apresentadas por alunos dessa escola. Ou seja, o estudante

de música, com formação acadêmica e informação atualizada no seu campo

específico de atuação, assume a posição que coube ao universitário, de formação

geral ou mais diversificada, na fase da bossa-nova e do tropicalismo (VAZ, 1988,

p. 60).

5. Devemos finalmente, realizar a devida exposição da Vanguarda Paulista. No início

dos anos de 1980, em São Paulo, surgiu uma geração de músicos com uma postura estética

renovadora. Ressaltamos que “agradar ao público” não era a principal intenção dos

integrantes dessa vanguarda, cuja preocupação estava focada em confrontar-se aos modelos

artístico-musicais do passado, visando novas formas de produções estéticas. Tal postura

entrou em choque com o desenvolvimento da indústria fonográfica brasileira, o que fez com

que a produção destes músicos emergisse como uma “movimentação artístico-musical

alternativa e independente” (SILVA, 2005, p. 125). Os principais representantes do

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movimento foram Arrigo Barnabé, Itamar Assunpção e os grupos musicais Rumo,

Premeditando o Breque (Premê) e Língua de Trapo.

O músico e compositor paranaense Arrigo Barnabé recebeu destaque em meio a esta

vanguarda. Com o lançamento do LP Clara Crocodilo, em 1980, Arrigo Barnabé causou

forte impacto no cenário da música popular urbana brasileira. O trabalho rendeu-lhe elogios

da crítica e o compositor passou a ser considerado pela imprensa como “a maior novidade

surgida na música brasileira desde a tropicália” (CAVAZOTTI, 2000, p. 5). Além disso, foi

apontado como o primeiro compositor popular a utilizar as técnicas da música serial2 em

suas composições. O legado da vanguarda musical europeia do início do século XX, deixado

por compositores como Schoenberg, Weber e Berg, é incorporado nas produções da

Vanguarda Paulistana, assim como a utilização da estética dos quadrinhos. As histórias em

quadrinhos foram fonte de inspiração e ponto de referência estética para vários personagens

das canções de Arrigo Barnabé, como no caso do LP Clara Crocodilo e também em Tubarões

Voadores (1984), uma composição que segundo Silva foi feita para “ver”. “Em ajustada

sincronicidade, cada fala das personagens se encaixa com o tempo certo para leitura e a

visualização de cada quadrinho (do balão ao conjunto do desenho) que acompanha o disco

num encarte especial” (SILVA, 2005, p. 129). Estas duas capas foram produzidas pelo

quadrinista Luiz Gê3 que se tornou amigo de Barnabé no período em que estudou arquitetura

na FAU em São Paulo. Foi Luiz Gê que lhe apresentou os gibis da Marvel, os quais se

tornaram uma fonte de inspiração para a principal obra de sua carreira. Foi neste mundo de

ficção que o compositor descobriu o Homem-Aranha. Segundo Arrigo, “o lagarto, que é o

2 Tal música consiste “num método de composição que consiste em produzir uma obra a partir de uma série de

um determinado número de sons. Estes são regidos pela sua ordem de apresentação e não estão submetidos a

nenhuma hierarquia, mostrando-se iguais em direito. A série, tal como Shönberg a definiu em 1923, foi

considerada como ‘dodecafônica’, porque ela utiliza os 12 meios tons da escala cromática. Uma vez definida a

sua ordem original, a série shönbergiana presta-se a diversas transformações: a inversão (...), retrogradação (...),

retrogradação da inversão (...). E como cada uma destas quatro formas (...) pode ainda ser transposta nos 12

meios-tons da escala cromática, uma série dá portanto lugar a 48 apresentações diferentes (...)”.LELONG, Guy;

SOLEIL, Jean-Jacques. As obras chaves da Música. Lisboa: Editora Pergaminho LTDA, 1991, p. 249. 3 O ilustrador Luiz Geraldo Ferrari Martins é mais conhecido como Luiz Gê, um dos maiores expoentes dos

quadrinhos brasileiros nos anos 80. Formou-se em arquitetura na Universidade de São Paulo em 1977. Foi um

dos fundadores da revista Balão (1972-75), editor de arte da revista Status (1985-86) e editor da revista Circo

(1986-87. Possui importantes obras publicadas e atualmente, é professor de quadrinhos no Curso de Desenho

Industrial da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Prebisteriana Mackenzie, em São Paulo.

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inimigo do Homem-Aranha, é meio Clara Crocodilo. O próprio herói é meio Clara Crocodilo,

porque é picado por uma aranha radioativa e assim se transforma no Homem Aranha”4.

A ilustração criada por Gê para representar este monstro híbrido, Clara Crocodilo,

criado a partir de uma experiência em laboratório, e a qual estampa a capa do Lp, consiste

em um grande olho de réptil circundado por letras vermelhas que simulam sangue e

expressam o nome do álbum. A figura denota um olhar à espreita que pode ser interpretado

tendo em vista o contexto da criação do personagem. A faixa-título do Lp, composta em

1975, narra a saga de um office-boy transformado em monstro após ser submetido a testes

em uma empresa de produtos químicos. A partir desta experiência, este ser transforma-se em

um inimigo público, um fora-da-lei que, ao não se sujeitar às normas sociais em vigor, é

impelido ao refúgio e a uma constante fuga. É importante ressaltar que o personagem desta

canção foi criado no contexto da ditadura-civil-militar no Brasil, eram vividos “os anos de

chumbo” do governo Médici, o que nos encaminha a considerar esta expressão como um ato

de resistência ao invés de uma apologia ao crime5.

2. Frente da capa do LP Clara Crocodilo, ilustrada por desenho feito à mão por Luiz Gê.

Em Tubarões Voadores, a influência dos quadrinhos vai além da criação de um roteiro

temático como o feito em Clara Crocodilo. A faixa-título abre o Lp e inclui um encarte

especial que contém a história em quadrinhos completa. Luiz Gê também foi o responsável

pela criação destas ilustrações. Ao passo que Clara Crocodilo apresentava um anti-herói

4 Declaração de Arrigo Barnabé presente em matéria sobre o artista, publicada pela revista +SOMA

(Julho/2010). Disponível em: http://www.maissoma.com/2010/8/20/ensaio-clara-crocodilo-por-raquel-setz. 5 Devemos atentar que as oito canções que compõem este álbum foram compostas entre 1972 e 1980, durante

o período da Ditadura Civil-Militar no Brasil.

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pelos subterrâneos e esgotos de São Paulo, Tubarões Voadores apresentava enormes aviões

voando pelas ruas devorando adultos e crianças. A figura de aviões, com dentes afiados,

remete a uma provável inspiração nos aviões americanos do modelo P-40, pertencentes à

esquadrilha aérea Tigres Voadores, cujos aviões exibiam uma grande boca pintada em

vermelho. Novamente as imagens contribuíram para o estabelecimento de uma crítica social.

Em Clara Crocodilo, Arrigo Barnabé chamou a atenção para a marginália urbana de São

Paulo. Tubarões Voadores, por sua vez, sintetiza o temor e a paranóia da classe média, que

se trancava em seus apartamentos e carros com insufilm por medo da violência urbana.

Com relação aos aspectos de produção, estas duas obras de Arrigo Barnabé denotam

uma questão bastante interessante, que traz novamente ao debate as relações destes músicos

com a indústria fonográfica. O primeiro álbum, Clara Crocodilo, foi produzido em um

estúdio menor, com recursos reduzidos. Tendo em vista o sucesso alcançado, o qual mais se

remete à questão das críticas realizadas pela imprensa do que pelos números efetivos de

vendagem do Lp, para gravação de Tubarões Voadores, Arrigo Barnabé fechou parceria com

a Ariola/Barclay, posteriormente comprada pela Polygram. É notável que este fato propiciou,

além de uma qualidade superior em termos de sonoridade, também um maior investimento

na qualidade e impressão do encarte deste álbum.

3. Frente do álbum Tubarões Voadores. Ao lado imagem do encarte, com a história em quadrinhos que

acompanha o disco.

Marchi ressalta que, apesar da boa vontade de muitos artistas, o projeto da música

independente declinou rapidamente por vários motivos, que vão desde a assinatura de

contratos com as grandes gravadoras, por alguns dos integrantes do movimento, até o

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surgimento de uma nova geração de músicos promovida pelas gravadoras. Estes últimos

estavam ligados ao pós-punk e à new-wave e acabaram por dividir o público das produções

alternativas. No entanto, o autor atenta ao fato de que, apesar da curta duração, os integrantes

deste movimento chamaram a atenção da classe artística para as condições de produção da

música popular brasileira. Tal atuação trouxe à tona discussões sobre o papel de uma indústria

fonográfica nacionalizada, o que acabou, conforme Marchi, por imprimir uma identidade ao

setor. Isto foi bastante importante para uma nova geração de empreendedores que passaram

a atuar no país posteriormente (MARCHI, 2006, p. 75-77).

Por este viés, é pertinente ressaltar esta atitude de crítica social e certo caráter

nacionalista expresso pelo movimento da Vanguarda Paulista. Tendo em vista a referida

dinâmica do mercado fonográfico, serão abordadas, a seguir, mais duas obras de grupos do

contexto. Gilberto Xavier Silva enfatiza a importância de um entendimento do objeto-disco

enquanto algo que envolve o texto e o contexto. Também aponta que, para projetar novas

dinâmicas artísticas, os integrantes desta vanguarda optaram por não apenas priorizar as

feições melódico-musicais de seus discos, mas também passaram a dar grande importância

às relações que abarcavam a produção e recepção de suas obras, o que envolvia a confecção

das capas de seus discos. Para exemplificar esta relação de contigüidade ou similaridade

contextual dos encartes, o autor cita a capa de O melhor dos iguais, do Premê, e o primeiro

disco do Língua de Trapo (SILVA, 2005. p. 126-127).

Silva indica a marcante ligação da produção do Língua de Trapo com a sátira e a

paródia, já anunciada pela capa do primeiro álbum do grupo. Segundo o autor, a capa opera

como uma espécie de “vitrine” para um conteúdo extremamente debochado que percorre

paródias de canções da jovem guarda até uma canção denominada “O que é isso

companheiro”, a qual em ritmo de toada sertaneja tem como alvo os episódios das guerrilhas

urbanas do período do regime militar. Daí o nome da canção, o livro escrito por Fernando

Gabeira, envolvido em um acontecimento desta natureza. Este disco apresenta o título

homônimo ao nome do grupo e aparece de forma centralizada em uma capa chapada em azul.

Silva aponta que “o nome da banda está escrito a partir de letras extraídas de marcas e

logotipos de multinacionais, como o ‘L’ da Light, o ‘N’ da Nestlé, o ‘T’ da Texaco, o ‘A’ da

Atlantic, e o dabliu inscrito numa circunferência conformando a letra ‘O’ da logomarca da

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Volkswagen” (2005, p. 128). Tal análise nos remete à crítica do grupo à intervenção

internacional na economia brasileira, o que, por conseguinte, inclui também o ingresso no

país das gravadoras transnacionais ocorrida, de forma intensa, a partir da década de 1970.

4. Frente da capa do primeiro Lp do Língua de Trapo (1982).

Neste processo de aperfeiçoamento e valorização das capas de discos, por parte da

Vanguarda Paulista, Silva nos oferta mais uma interessante interpretação, agora de uma

produção do grupo Premeditando o Breque. O exemplo remete, conforme citado

anteriormente, ao disco O melhor dos iguais, lançado por Prême, em 1985. Nesta capa,

podemos observar a exibição de uma série de palitos de fósforos, cotonetes, clipes e palitos

de dentes, os quais se encontram alinhados, uma série sobre a outra. Para Silva, é possível

relacionar essa imagem com uma crítica frente ao grande número de lançamentos musicais

que ocorriam naquele contexto, em que cantores e grupos faziam sucesso instantaneamente

e, tal como surgiam, também tão rapidamente desapareciam do cenário musical. A imagem

também pode fazer menção aos considerados “medalhões” da MPB, sempre com os mesmos

estilos de arranjo e composição, quando não, com as mesmas músicas. Por outro lado, ainda,

segundo o autor, “num universo em que as coisas podem ser facilmente reproduzidas e/ou

substituídas e estar ao alcance de todos, os objetos expostos nessa capa equivalem também,

ironicamente, ao grupo e às suas canções: são materiais a serem consumidos e descartados”.

(SILVA, 2005, p. 127).

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5. Capa do Lp O melhor dos iguaisdo/1985. Premeditando o Breque.

Neste caso, também a crítica é elemento constante na obra do grupo, e podemos

considerar que, apesar de todas as diferenças, os integrantes da Vanguarda Paulista

comungaram aquilo que Gilberto Xavier Silva muito bem denominou de “inquietação

estética” (2005, p. 130), motivada, segundo o autor, acima de tudo, por uma grande vontade

de realizar um trabalho diferenciado do que circulava então no mercado da música. Estes

músicos marcaram época por meio de posturas artísticos-musicais inovadoras, sendo assim

merecedores da nomeação enquanto vanguardistas.

6. Em nossas considerações finais retomaremos a proposta inicial infringida no

sentido de uma “História Visual”, conforme a proposta de Bezerra de Menezes. Buscamos,

por meio do surgimento das primeiras capas de discos, assim como do desenvolvimento da

indústria fonográfica e sua incrementação, refletir acerca da importância das imagens no

processo de identificação de um produto musical, o objeto-disco. Foi possível observarmos

que estas relações incluem fatores estéticos, ideológicos e mercadológicos. Pensamos em

traçar este percurso, também com o intuito de identificação de sistema de comunicação visual

envolvido no processo de produção musical da Vanguarda Paulista. Neste sentido,

acreditamos ser possível, por meio do conjunto das imagens das capas analisadas, estabelecer

relações com os três grandes feixes que, segundo Ulpiniano Bezerra de Menezes, alicerçam

uma almejada história com as imagens: o visual, o visível e a visão. As imagens agregam

elementos da iconosfera em que foram produzidas. A obra de Arrigo Barnabé é marcante

neste sentido. Através dela, podemos visualizar a influência das histórias em quadrinhos no

imaginário da época. O visível ou invisível pode ser interpretado como presente nestas capas

por meio das críticas sociais realizadas por estes artistas, tais como, a referência à

marginalidade e violência urbana ou a efemeridade do universo pós-moderno. Para tanto,

apostamos em uma reflexão que considere os aspectos destas imagens que convergem para

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os sistemas sociais de dominação, poder e controle. Em última instância, ressaltamos o

interesse em cogitar sobre a forma com que a visão se transformou em meio a este processo

de utilização das imagens nos encartes de Lp’s. Conforme referenciamos anteriormente, Laus

argumenta que no início do processo de comercialização de discos, os envelopes recebiam

pouca atenção, pois o apelo visual na época era bem menor. Com o decorrer do tempo,

podemos notar que as capas receberam crescentes inovações e investimentos em suas

produções, o que apenas vem comprovar uma alteração nos padrões visuais em fins do século

XX e justificar o crescente interesse pelos estudos da imagem.

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