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SGAS 915 Lote 72 | CEP: 70390-150 | Brasília-DF | FONE: (61) 3445 5900 | FAX: (61) 3346 0231| http://www.portalmedico.org.br DESPACHO SEJUR N.º 308/2014 (Aprovada em Reunião de Diretoria em 23/09/2014) Expediente n.º 3241/2012 Assunto: Dúvida inserção CID receitas médicas de medicamentos controlados. Lei nº 9965/2000. Inserção do CID na receita médica para compra de esteroides. Aparente inconstitucionalidade. Trata-se de expediente encaminhado pela Coordenação de Produtos Controlável da ANVISA no qual é questionada a opinião do Conselho Federal de Medicina sobre a possibilidade da inserção do CID (Código Internacional de Doença) na receita médica de medicamentos de controle especial, tendo em vista a existência de lei que determina a colocação do CID para compra dos medicamentos existente na Lista C da RDC 32/2014 ANVISA. Acreditamos que a norma referida no expediente seja a Lei nº 9.965, de 27 de abril de 2000, a qual estabelece a obrigatoriedade da inserção do CID na receita médica para compra de esteroides e peptídeos anabolizantes. Estabelece a referida norma que: Art. 1º A dispensação ou a venda de medicamentos do grupo terapêutico dos esteróides ou peptídeos anabolizantes para uso humano estarão restritas à apresentação e retenção, pela farmácia ou drogaria, da cópia carbonada de receita emitida por médico ou dentista devidamente registrados nos respectivos conselhos profissionais. Parágrafo único. A receita de que trata este artigo deverá conter a identificação do profissional, o número de registro no respectivo conselho profissional (CRM ou CRO), o número do Cadastro da Pessoa Física (CPF), o endereço e telefone profissionais, além do nome, do endereço do paciente e do número do Código Internacional de Doenças (CID), devendo a mesma ficar retida no estabelecimento farmacêutico por cinco anos. Art. 2º A inobservância do disposto nesta Lei configurará infração sanitária, estando o infrator sujeito ao processo e penalidades previstos na Lei no 6.437, de 20 de agosto de 1977, sem prejuízo das demais sanções civis ou penais. Art. 3º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão celebrar convênios para a fiscalização e o controle da observância desta Lei.” Portanto, a norma transcrita obriga a inserção do CID nas receitas para compras de esteroides e peptídeos anabolizantes, estando em aparente conflito com o

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DESPACHO SEJUR N.º 308/2014 (Aprovada em Reunião de Diretoria em 23/09/2014)

Expediente n.º 3241/2012 Assunto: Dúvida inserção CID receitas médicas de medicamentos controlados. Lei nº 9965/2000. Inserção do CID na receita médica para compra de esteroides. Aparente inconstitucionalidade.

Trata-se de expediente encaminhado pela Coordenação de Produtos

Controlável da ANVISA no qual é questionada a opinião do Conselho Federal de Medicina

sobre a possibilidade da inserção do CID (Código Internacional de Doença) na receita

médica de medicamentos de controle especial, tendo em vista a existência de lei que

determina a colocação do CID para compra dos medicamentos existente na Lista C da RDC

32/2014 – ANVISA.

Acreditamos que a norma referida no expediente seja a Lei nº 9.965, de 27 de

abril de 2000, a qual estabelece a obrigatoriedade da inserção do CID na receita médica

para compra de esteroides e peptídeos anabolizantes.

Estabelece a referida norma que:

“Art. 1º A dispensação ou a venda de medicamentos do grupo terapêutico dos esteróides ou

peptídeos anabolizantes para uso humano estarão restritas à apresentação e retenção, pela

farmácia ou drogaria, da cópia carbonada de receita emitida por médico ou dentista

devidamente registrados nos respectivos conselhos profissionais.

Parágrafo único. A receita de que trata este artigo deverá conter a identificação do profissional,

o número de registro no respectivo conselho profissional (CRM ou CRO), o número do

Cadastro da Pessoa Física (CPF), o endereço e telefone profissionais, além do nome, do

endereço do paciente e do número do Código Internacional de Doenças (CID), devendo a

mesma ficar retida no estabelecimento farmacêutico por cinco anos.

Art. 2º A inobservância do disposto nesta Lei configurará infração sanitária, estando o infrator

sujeito ao processo e penalidades previstos na Lei no 6.437, de 20 de agosto de 1977, sem

prejuízo das demais sanções civis ou penais.

Art. 3º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão celebrar convênios para

a fiscalização e o controle da observância desta Lei.”

Portanto, a norma transcrita obriga a inserção do CID nas receitas para

compras de esteroides e peptídeos anabolizantes, estando em aparente conflito com o

SGAS 915 Lote 72 | CEP: 70390-150 | Brasília-DF | FONE: (61) 3445 5900 | FAX: (61) 3346 0231| http://www.portalmedico.org.br

inciso X do art. 5º da Constituição Federal, que garante a inviolabilidade da intimidade do

paciente.

Em diversas oportunidades o CFM já se manifestou pela impossibilidade de se

obrigar o médico a colocar o CID em receitas e documentações públicas, sem a existência

de uma lei específica e com autorização do paciente.

O caso em análise é um pouco mais complexo, pois há uma lei impositiva à

inserção do CID nas receitas para compras de determinados medicamentos, o que já

respeita o Princípio da Reserva Legal (art. 5º, II, CF/88).

Contudo, aparentemente, a norma em análise pode ser inconstitucional, por

ferir o mencionado inciso X do art. 5º da CF/88. Em um juízo perfunctório, é possível

encontrar uma desproporção na norma em análise, pois a exigência do CID nas receitas

para compra de medicamentos pode não ser necessária à finalidade da lei.

O Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Ferreira Mendes explica que é

“possível que o vício de inconstitucionalidade substancial decorrente do excesso de poder

legislativo constitua um dos mais tormentosos temas do controle de constitucional hodierno.”

Assim, o mesmo autor ensina que para sanar o excesso do Poder Legislativo, é

cabível ao Poder Judiciário, via Ação Direta de Inconstitucionalidade, afastar do

ordenamento jurídico a norma maculada de vício (desproporcional).

Neste diapasão, pondera que “a utilização do princípio da proporcionalidade ou

da proibição de excesso no direito constitucional envolve, como observado, a apreciação da

necessidade (erforderlichkeit) e adequação (geeignetheit) da providência legislativa.”

Valendo-nos da doutrina alemã, temos que uma lei será julgada

inconstitucional “se se puder constatar, inequivocamente, a existências de outras medidas

menos lesivas.”

No caso em análise, aparentemente é possível vislumbrar uma desproporção

na norma, pois a exigência de inserção no CID na receita para compra de medicamentos se

mostra desnecessária e até mesmo temerária, pois irá tornar pública a moléstia do paciente,

sem qualquer motivo que justifique a quebra do sigilo.

Neste sentido, nos parece também inadequada a parte da norma que

determina a colocação do CID, pois não há razão teleológica para justificar uma quebra do

sigilo médico, maculando a intimidade do paciente. É, portanto, desproporcional e

inadequada, padecendo aparentemente de um vício substancial de inconstitucionalidade.

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Especificamente no que tange aos medicamentos sujeitos a controle especial,

por não existir sequer Lei que determine a inserção do CID, entendemos por ilegal essa

exigência, além e principalmente de macular e quebrar o sigilo médico.

É o parecer, s.m.j.

Brasília, 26 de agosto de 2014.

Turíbio Teixeira Pires de Campos

Advogado do CFM

OAB – DF 15.102

De Acordo: José Alejandro Bullón Chefe do Setor Jurídico

Desp.SEJUR.308.2014. exp 6817.2014. lei CID receita medicamentos controle especial.ttpc.26.08.2014