Deu a Louca No Tempo

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  • Marcelo Duarte

    DEU A LOUCA NO TEMPO

    Srie Vaga-Lume

    TEXTO Editor: Fernando Paixo

    Editora assistente: Carmen Lcia Campos Preparao de originais: Maria Ceclia Garcia

    Suplemento de trabalho: Antonio Carlos Olivieri, Shirley Aparecida de Souza Reviso: Sandra Brazil (Coord.), Mrcio Guimares de Arajo

    ARTE

    Ilustraes: Alcy Linares Editor: Marcello Arajo

    Editorao eletrnica: Antonio Ubirajara Domiencio ISBN 85 08 07140 X

    Editora tica, 2002, 3 edio, 6 impresso

    Este e-book Digitalizao: SCS em outubro/2013

  • Sumrio

    Incrvel mquina do tempo ........................................................................................................... 4 Conhecendo Marcelo Duarte ........................................................................................................ 5 1. Uma misso no salo de beleza ................................................................................................ 6 2. O pequeno inventor .................................................................................................................. 9 3. Um cavalo com nome esquisito .............................................................................................. 11 4. As provocaes de Arnaldo..................................................................................................... 15 5. A primeira vtima..................................................................................................................... 18 6. O sonho de viajar no tempo.................................................................................................... 20 7. Professor em transe ................................................................................................................ 24 8. Um torcedor incendirio ......................................................................................................... 27 9. Atitudes muito estranhas........................................................................................................ 29 10. Retrato falado bem familiar .................................................................................................. 32 11. Essa mquina um perigo! ................................................................................................... 36 12. Uma rainha na agncia de matrimnio................................................................................. 38 13. A coxinha de Napoleo Bonaparte........................................................................................ 42 14. Escorpio tatuado no brao .................................................................................................. 45 15. Chegaram as fotos................................................................................................................. 48 16. Um novo amor para Nero ..................................................................................................... 50 17. "Vocs ficaro ricos com a mquina".................................................................................... 52 18. Ataque geladeira ................................................................................................................ 56 19. Sem ningum por perto ........................................................................................................ 57 20. O encontro de Clepatra e Jlio Csar.................................................................................. 61 21. A ala dos Napolees .............................................................................................................. 64 22. O Secador do Tempo foi roubado!........................................................................................ 66 23. Matando duas bolas de sorvete............................................................................................ 68 24. Em algum lugar do passado .................................................................................................. 70 25. Morrendo de cimes............................................................................................................. 72 26. A paixo no s para os jovens .......................................................................................... 76 27. Os trs patetas ...................................................................................................................... 78 28. "Quero ser sua mulher!" ....................................................................................................... 81 29. O sanduche gigante.............................................................................................................. 83 30. A senha do Palcio de Cristal ................................................................................................ 87 31. O buraco da liberdade........................................................................................................... 92 32. Uma mala cheia de dinheiro ................................................................................................. 94 33. Uma agenda deixada para trs.............................................................................................. 97 34. Convite para um jantar macabro .......................................................................................... 98 35. , raios! ............................................................................................................................... 101 36. Luza vira cobaia .................................................................................................................. 107 37. Hora de preparar as armadilhas.......................................................................................... 108 38. O plano vai dar certo? ......................................................................................................... 110 39. Voc est preso!.................................................................................................................. 112 40. Bem-vindos Expo-Cobra ................................................................................................... 114 41. Por que Nero no apareceu? .............................................................................................. 119 42. Lasanha envenenada........................................................................................................... 121 43. A destruio do secador...................................................................................................... 124 44. A prova final de Portugus .................................................................................................. 127 Contracapa ................................................................................................................................ 130

  • Incrvel mquina do tempo

    Que Feira de Cincias mais louca!!! O que o Secador do Tempo fez com o bedel Laurentino e os professores Tom e Cssia? Esse invento do Rodrigo parece deixar as pessoas bem estranhas...

    Sem entender muito bem como sua inocente mquina adquiriu tamanho poder, Rodrigo descobre que muitos personagens da Histria esto perambulando por a. Ele e sua turma tentam dar um jeito na situao, mas acabam se metendo em mais confuso ainda. O invento roubado e agora tudo pode acontecer!

    Bandidos, risadas e muitas surpresas aguardam Rodrigo, Fef, Hugo e Luza nessa aventura que pode deixar maluco at o mais certinho dos cientistas. Com um secador de cabelo e muita imaginao essa turma convida voc para uma divertida viagem no tempo.

  • Conhecendo Marcelo Duarte

    Escrever seu primeiro livro para a Vaga-Lume, Jogo sujo, foi a realizao de um grande sonho do jornalista e escritor Marcelo Duarte. Desde menino, quando lia os livros da srie, ele imaginava o dia em que veria um texto seu entre eles.

    Agora o Marcelo quem faz todo mundo sonhar com suas histrias. Deu a louca no tempo desperta aquele desejo maluco, que temos, de viajar atravs do tempo. S que faz isso de um jeito diferente: trazendo o passado para os dias de hoje, o invento de Rodrigo provoca as maiores confuses.

    Alis, Rodrigo o nome do filho mais velho de Marcelo que, segundo ele, ainda no um grande inventor, mas vive "inventando" bons motivos para no fazer a lio ou adiar o banho para mais tarde. Beatriz, sua outra filha, ficou morrendo de cimes e ter de esperar uma nova aventura para estrelar. A gente espera junto, no?

  • 1. Uma misso no salo de beleza

    Por aqui! O secador est l no fundo... Os trs garotos entraram no salo de beleza de dona

    Agripina, muito cheio naquele horrio. Todos os sbados era a mesma loucura. Mulheres arrumavam o cabelo, faziam as unhas das mos e dos ps, davam aquela caprichada para o final de semana. Era incrvel o que um bom penteado e uma maquiagem podiam fazer: verdadeiros milagres!

    Nossa, como voc est grande! uma cliente saudou Rodrigo.

    Eu ando tomando ch de trepadeira! respondeu. Ele no gostava nada de passar por ali em dias assim. Sempre era obrigado a parar e cumprimentar alguma amiga ou freguesa antiga de sua me. Pior era que algumas insistiam em lhe espanar os cabelos, mesmo ele j sendo um rapazinho de 13 anos. Naquela manh, porm, era preciso atravessar o salo de qualquer maneira para chegar at o quartinho do fundo. Rodrigo e seus dois amigos, Hugo e Fef, tinham uma misso muito importante.

    Estas mulheres parecem estar dentro de torradeiras gigantes comentou Fef, ao passar por uma fila de secadores. Ser que os miolos no ficam assados?

    um desses que ns viemos buscar explicou Rodrigo.

    Pra qu? Ns no estamos com o cabelo molhado... estranhou Hugo.

    Cala a boca e anda! comeou a se irritar Rodrigo. O gordinho Fef tem um sorriso de dentes certinhos e

    bochechas rosadas que sobressaem num rosto branquinho. Fica reclamando de fome o dia inteiro. Ele pensa tanto em comida que, enquanto todo mundo tem massa cinzenta, alguns amigos acreditam que Fef deva ter outro tipo de massa no crebro. Algo como talharim, canelone ou ravili. Gosta ainda de misturas aparentemente estranhas, que causam enjo a quem est por perto, como Coca-Cola batida com iogurte ou dobradinha com queijo ralado.

  • Olha ali! gritou Hugo. O que foi? quis saber Rodrigo, assustadssimo

    com o berro do amigo. Um monstro, um monstro! a Abominvel Mulher

    das Neves continuou Hugo, agora em tom zombador. Deixa de ser bobo riu Rodrigo. s uma

    mulher com uma mscara de creme no rosto... Hugo magrinho, com os olhos fundos e os cabelos

    totalmente despenteados escondidos debaixo do bon (dona Agripina, zelosa com a aparncia de todos, sempre perguntou ao filho se o colega no tinha um pente ou uma escova em casa...). Outro detalhe que Hugo s anda com as mos no bolso e as calas parecem estar sempre caindo.

    Chegamos! Ali est ele apontou Rodrigo. A me de Rodrigo concordara em emprestar para os

    trs um secador que havia quebrado. Ela s pretendia mand-lo para a assistncia tcnica na semana seguinte. Os trs iriam us-lo na Feira de Cincias e Inventos da escola. L estava ele, num canto do depsito, cercado de caixas de xampu, condicionador, bbis, grampos, gel e algumas latas de laqu.

    Olha aqui, laqu! disse Hugo. Pra que serve isso? perguntou Fef. Quando algumas mulheres acabam de se arrumar,

    elas espirram isso na cabea para o penteado no se desmanchar! explicou Rodrigo, dos trs a maior autoridade em cortes, penteados e afins.

    Uma vez, eu passei laqu no plo do meu cachorrinho. Parecia at que ele tinha tomado um choque. Ficou muito engraado brincou Hugo.

    Cera para depilao mostrou Fef. As mulheres usam para tirar os plos das pernas, no ?

    respondeu secamente Rodrigo, enquanto enrolava o fio do secador.

    A minha irm faz depilao entrou na conversa Hugo. S que ela usa um cortador de grama!

  • 2. O pequeno inventor

    Rodrigo levou a mquina para a sua casa, que ficava no andar de cima do salo. Em seu quarto, havia psteres de inventores famosos por todos os cantos. Um dos lados do armrio estava abarrotado de livros, ferramentas e um grande microscpio. Do outro lado, Rodrigo deixava em exposio aquilo que j tinha criado.

    Antes de comearmos, preciso dar comida para o Thomas Alva Edison! avisou Rodrigo.

    E o nome mais estranho que j vi para uma tartaruga... observou Hugo.

    Quantas vezes vou precisar dizer que o Thomas Alva Edison no uma tartaruga, um ja-bu-ti? Quando ser que voc vai aprender a distinguir um jabuti de uma tartaruga?

    Pra mim tudo a mesma coisa emendou Hugo. E esse nome muito estranho para uma tartaruga, para um jabuti, para um camelo e para qualquer integrante do reino animal. Se eu tivesse uma tartaruga, ela se chamaria Flecha Ligeira!

    Vocs j experimentaram sopa de tartaruga? perguntou Fef.

    Como a discusso dos dois pegava fogo, eles nem ouviram o ltimo comentrio de Fef. Hugo sempre dava um jeito de provocar os amigos com comentrios maldosos e piadinhas.

    Hugo, eu j expliquei que Thomas Alva Edison meu dolo! afirmou Rodrigo. Foi o maior inventor de todos os tempos. Um dia, quero ser como ele.

    Lerdo como uma tartaruga? riu Hugo. Rodrigo fez que no gostou da brincadeira e jogou uma

    almofada no amigo. Ele sempre foi o garoto mais srio da classe. Sua me se esforava para pagar a escola depois que o marido morrera e Rodrigo no queria decepcion-la. Acabou virando o xod dos professores. Essa fama causava um certo atrito com a ala mais barulhenta e indisciplinada da classe. A

  • discusso de Rodrigo e Hugo no durou muito tempo. Os dois voltaram a se concentrar no aparelho.

    O que vamos fazer com isso? perguntou Hugo. Ele no est pifado?

    Est. Mas ns no estamos pensando em secar o cabelo de ningum, certo? explicou Rodrigo.

    Olha, pra passar de ano eu sou capaz de engraxar o sapato, pentear o bigode e dar o n na gravata do professor disse Fef.

    No precisaremos de nada disso anunciou Rodrigo, com um ar de cientista maluco. Nossa mquina de realidade virtual far o maior sucesso!

    Como que esse troo vai funcionar??? perguntou Fef, coando a cabea.

    Primeiro a gente seleciona personagens importantes da Histria em nossos livros. A fotografamos essas figuras e mandamos fazer slides. Vou instalar um projetor de slides e um minigravador na parte de trs do aparelho.

    Ei, por que voc est mexendo nesses parafusos? estranhou Hugo.

    Quero que o tampo desa at embaixo explicou Rodrigo. A as pessoas iro se sentar numa cadeira e colocaro a cabea inteira aqui dentro.

    Se algum quiser, eu posso aproveitar e fazer as unhas das mos brincou Hugo. Cobro baratinho!

    Dos ps tambm? perguntou Fef. Dos seus, no. Sua meia cheira queijo gorgonzola! Vocs dois vo deixar eu acabar de explicar?

    Rodrigo ficou bravo. Oh, sim, claro obedeceu Hugo. Nessa hora, comeo a projetar os slides no tampo de

    acrlico falou Rodrigo. Enquanto as pessoas vem as imagens, ouvem as informaes passadas pelo gravador. Todos vo se sentir num tnel do tempo.

    J sei: o "Secador do Tempo" batizou Hugo.

  • 3. Um cavalo com nome esquisito

    Enquanto Hugo ia abrindo as pginas do livro de Histria, Rodrigo fotografava as imagens de algumas personalidades: Nero, Clepatra, Napoleo Bonaparte e Marco Polo.

    Olha s o que est escrito aqui: "Os sapatos de Napoleo Bonaparte eram usados e amaciados por seus serviais antes de o imperador cal-los" leu Hugo em voz alta.

    Sei. E da? perguntou Fef. Como ser que Napoleo resolvia depois o problema

    do chul? Hugo soltou a piadinha, para logo depois continuar contando: Tem outra aqui pior: numa carta para sua amada Josefina, Napoleo pediu que ela no se banhasse por duas semanas antes que eles se reencontrassem. Que horror... Deve ser pior que dormir com um gamb.

    Poxa, turma! reclamou Rodrigo. Vamos acabar logo. Precisamos montar o trabalho hoje tarde!

    Pra variar, a gente deixou tudo para a ltima hora disse Fef.

    O que voc prefere: Michelangelo, Rafael ou Leonardo da Vinci? perguntou Rodrigo.

    Ei, voc est filmando "As Tartarugas Ninjas"??? brincou Hugo.

    No. Os pintores do Renascimento corrigiu Rodrigo.

    Renascimento? Eu nem sabia que eles tinham morrido.

    Hugo tinha sempre uma piadinha na ponta da lngua. Se tivesse vivido na Idade Mdia repetia sempre a inspetora de alunos no lhe faltaria emprego de bobo da corte.

    Deixa de ser burro, Hugo. Vou fotografar Leonardo da Vinci e pronto. Esse livro aqui traz as figuras da Mona Lisa e da ltima Ceia, dois quadros famosos de Da Vinci.

  • Poxa, voc foi falar em ltima Ceia reclamou Fef.

    ltima Ceia me lembra comida. Comida me lembra que eu estou faminto. Eu fiz a minha ltima ceia h mais de meia hora.

    , mas depois disso voc j comeu uma barra de chocolate, um picol e um pastel disse Hugo.

    Estou em fase de crescimento, seu metido! Calma, calma! Rodrigo interrompeu o incio de

    mais uma briga. Vou descer para pegar refrigerantes e salgadinhos.

    Boa, Rodrigo vibrou Fef. Sabia que voc no iria me decepcionar!

    Quando Rodrigo saiu, os dois amigos resolveram terminar de selecionar as figuras.

    Acho que ns esquecemos de um personagem muito importante! disse Hugo.

    Quem? perguntou Fef. Lembra daquele cavalo com nome esquisito da aula

    de Histria da semana passada? Malvolo? No. Acfalo? Tambm no. J sei:

    Bucfalo! isso a! Bucfalo era o nome do cavalo de Alexandre, o

    Grande. Sei, sei, aquele do p de feijo... Nada disso, Hugo. Alexandre, o Grande, foi o

    imperador da Macednia, um reino da sia. Quanta decoreba, hein?! Temos fotos dele e do cavalo neste livro. Podemos

    fotograf-las tambm. Boa idia, Fef. S estou com uma dvida sobre esse

    tal de Alexandre, o Grande... Qual ?

  • Como ele se chamava quando era criana? Alexandre, o Pequeno? Alexandre, o Nanico? Se j existisse o programa da Xuxa naquele tempo, ele seria Alexandre, o Baixinho!

    Que tal esperar o Rodrigo voltar e perguntar se ele concorda em incluir mais um personagem?

    No, no. Vamos fazer uma surpresa para ele. Pode ir me passando o livro que eu me encarrego disso. Vou trocar o Leonardo da Vinci pelo Bucfalo.

  • 4. As provocaes de Arnaldo

    O ginsio da escola foi todo reservado para a Feira de Cincias e Inventos. Na tarde do sbado, os alunos das oitavas sries comearam a montar seus trabalhos nos lugares indicados pelo professor Maurcio, responsvel pelo evento. Rodrigo e Fef entraram carregando o secador, enquanto Hugo trazia uma sacola com o projetor de slides e o gravador.

    Olha s o filhinho da cabeleireira... apontou Arnaldo, o garoto mais detestado da classe. Sua me vai dar expediente aqui, ?

    Embora tivesse a mesma idade dos outros, Arnaldo parecia mais velho. Arrogante, adorava provocar brigas. A maioria preferia levar os desaforos para casa, pois sabia que ele lutava jiu-jtsu. Mexer com o seu rabinho de cavalo tambm valia um murro na certa. Por isso, Rodrigo, que era da paz, fez que no ouviu.

    Se eu soubesse, teria trazido a Lulu, minha poodle continuou Arnaldo.

    At que ela iria fazer um bom par com voc cortou Luza, que surgiu por trs deles.

  • Luza era a menina mais bonita e inteligente da classe. Pelo menos na opinio de Rodrigo. E na de Arnaldo tambm. Era loira, tinha os cabelos no ombro e um sorriso devastador. Estava usando uma saia preta, blusa branca e um casaco de l crua. Sua matria preferida era Geografia, porque sonhava viajar pelo mundo.

    Por que voc vive protegendo esse bobo? irritou-se Arnaldo.

    Rodrigo no um bobo. Ele tem timas idias! Voc deveria primeiro saber o que ele bolou, antes de ficar fazendo suas piadinhas.

    Arnaldo era apaixonado por Luza. Filho de um poderoso construtor, ele gostava de ficar exibindo aparelhinhos eletrnicos e camisetas do "World Hollywood" que trazia de suas viagens de frias pelo exterior. Luza gostava de ouvir histrias sobre os pases. Sempre que as aulas se reiniciavam, os dois eram vistos conversando no ptio. Em sua ltima festa de aniversrio, Luza ganhou de Arnaldo um walkman todo incrementado. Rodrigo chegou com uma caixinha de msica e se sentiu inferiorizado. Foi embora mais cedo, logo depois do bolo. Ele jamais conseguiria vencer Arnaldo.

    Obrigado por me defender, Luza disse Rodrigo. Eu nem ligo mais. J me acostumei com as provocaes dele.

    Eu no gosto dessas brincadeiras estpidas justificou Luza. O que vocs aprontaram a, meninos?

    Voc j ouviu falar em lavagem cerebral? Pois ns inventamos a secagem cerebral! brincou Hugo.

    No nada disso corrigiu Rodrigo. o nosso "Secador do Tempo". As pessoas iro saber tudo sobre a vida dos personagens da Histria aqui dentro.

    Parece muito legal! elogiou Luza, com sinceridade.

    Onde est o seu trabalho? perguntou Rodrigo. No consegui preparar nada explicou ela. Tive

    um probleminha l em casa e no fiz nada. Vou ter que enfrentar a recuperao...

  • De jeito nenhum! interrompeu Hugo. No vou deixar de recuperao a pessoa que mais me deu cola este ano. Seu passe acaba de ser comprado pelo nosso grupo.

    No, no. Eu no fiz nada! Isso no justo. O Hugo est certo! Rodrigo concordou, embora

    estivesse se penitenciando por dentro por no ter se manifestado primeiro. Voc pode entrar para o nosso grupo.

    Mas o que eu posso fazer para ajudar? perguntou Luza.

    Bem, estamos precisando de uma cadeira para a nossa mquina lembrou Fef.

    Pode deixar comigo! Luza bateu continncia para brincar com os trs. Vou at em casa buscar uma.

    J que voc est indo at a sua casa, que tal trazer um lanchinho para ns? Carregar esse negcio me deu uma baita fome disse Fef.

  • 5. A primeira vtima

    Quando os alunos saram, Laurentino, o bedel da escola, ficou encarregado de fechar todas as portas do ginsio. A feira s seria aberta na manh seguinte.

    Preciso correr, antes que comece a chover pensou Laurentino.

    No deu tempo. Um temporal desabou do lado de fora. Ele achou melhor ficar por ali at a chuva passar. O bedel gostava de contar a histria de um primo de Pernambuco, sua terra natal, que havia morrido eletrocutado, atingido por um raio. Depois disso, Laurentino tinha se transformado num especialista em chuvas e trovoadas. Sabia, por exemplo, o nome de todos os tipos de nuvens.

    preciso ter cuidado com os cmulos-nimbos, que so temporal na certa repetia sempre que o cu escurecia.

    Ensinava tambm a garotada a saber a que distncia o raio caiu:

    Quando o relmpago aparecer, comecem a contar o tempo, segundo por segundo, at comear o trovo. Depois dividam o nmero de segundos por trs. Se vocs contarem "seis" entre o relmpago e o trovo, o raio caiu a aproximadamente dois quilmetros.

    A chuva continuava forte. A gua batia nas janelas e o cu parecia estar desabando.

    Essa tempestade no vai acabar to j resignou-se. Viu a cadeira em frente ao secador e tratou de se acomodar. O sono veio sem ele perceber; nem ouviu o raio que caiu em cheio na escola. Uma descarga eltrica foi engolida pelo pra-raios do ginsio e produziu um estrondo forte, seco, assustador. De to forte, provocou uma reao no secador, o nico aparelho ligado a uma tomada. O tampo de acrlico baixou e ligou a mquina de projeo por alguns segundos.

    Meu Deus! Laurentino acordou assustado. Chamem a arca de No!

  • Ao abrir os olhos, o bedel acabou vendo a projeo dos primeiros slides. Quando o aparelho se desligou, ele estava com um ar estranho. Olhou para os lados, para o seu corpo, para suas roupas. Ps a mo no seu rosto, alisou os cabelos grisalhos.

    O que estou fazendo aqui? perguntou. Tomou a direo de sua casa debaixo da chuva. Ao

    chegar l, abriu o armrio, revirou tudo e no encontrou o que procurava. Ah, ali estava, em cima da cama. Depois foi at a cozinha. Pegou alguns ramos de agrio na gaveta de verduras da geladeira e fez uma coroa para colocar em volta da cabea.

    Nero est pronto! disse Laurentino.

  • 6. O sonho de viajar no tempo

    No domingo, logo cedo, a entrada do ginsio fervia, cheia de gente. A abertura da Feira de Cincias estava marcada para as 9 horas. J passava das nove e meia, e o bedel Laurentino ainda no havia aparecido com a chave.

    Que irresponsabilidade! queixava-se o professor Maurcio.

    Se algum tiver um grampo a, eu dou um jeito de abrir esse porto dizia Hugo, todo fanfarro.

    Depois de dez minutos, o diretor chegou. Ficou irritado com o sumio do funcionrio:

    O Laurentino receber uma boa reprimenda mais tarde.

    Finalmente, o prprio diretor abriu o ginsio e a exposio foi oficialmente inaugurada. Pais, alunos e professores entraram ansiosos e experimentavam todas as novidades.

    Essa a minha mquina de fazer minifios de ovos explicava uma garota para vrios interessados.

    Por que minifios de ovos? perguntou um deles. que s d para usar ovos de codorna respondeu

    ela. Outra parada obrigatria era o vulco feito pelos alunos

    da oitava srie E. Eles cobriram um copo com massa de modelar. Colocaram trs colheres de bicarbonato no copo. Quando algum se aproximava, eles despejavam l dentro uma mistura com meio copo de vinagre, uma colherinha de anilina vermelha, uma xicarazinha de detergente e meio copo de gua.

    Agora, prestem ateno para o resultado um dos alunos anunciava a experincia, com ar de suspense.

    A espuma resultante da mistura parecia lava. A brincadeira dava a sensao de que o vulco estava mesmo entrando em erupo.

  • Havia sistemas solares de isopor, experincias com eletricidade, bichos dissecados. E, bem perto da entrada, o Secador do Tempo. Ao lado do aparelho, os garotos colaram uma cartolina com um texto tirado de uma revista cientfica. Estava escrito assim:

    No existe sonho mais fantstico do que viajar atravs

    do tempo, voltar ao passado ou avanar pelas dcadas frente. O problema que, alm de fantstico, esse um sonho comprometedor. Nenhum cientista pode sonh-lo em pblico sem correr o risco de dar uma de maluco. Por enquanto, essa mquina do tempo s existe na teoria. Mas, exatamente porque s existe na teoria, tem aquele fascnio dos avies e helicpteros esboados nas pranchetas do sculo XV por Leonardo da Vinci.

    A professora de Portugus, Cssia, parou em frente do

    secador de Rodrigo. Ela era uma das professoras mais exigentes da escola. Tanto que todas as lies valiam nota e eram corrigidas com rigor. Suas aulas, porm, eram superdivertidas e os alunos adoravam suas sugestes de livros.

    O que temos aqui? interessou-se ela. A senhora vai gostar! Rodrigo fez as vezes de

    anfitrio. Ela sentou-se na cadeira e o garoto ligou a mquina.

    Imagens de Clepatra comearam a ser mostradas no visor. "Clepatra foi a ltima rainha do Egito. Ocupava vinte

    damas na preparao de seus banhos. Ficava at 6 horas mergulhada na gua extrada de plantas aromticas."

    Os olhos da professora ficaram vidrados. Ela parecia

    em estado de choque, mas Rodrigo, Luza e Hugo estavam to eufricos com o bom funcionamento da geringona que nem perceberam.

  • "Clepatra testava a eficincia de seus venenos, dando-os aos escravos."

    Fef chegou com um pacote de batatas fritas e ficou

    feliz em ver que at a professora estava experimentando o brinquedo.

    "Clepatra se matou com uma picada de cobra." Ao final da terceira frase, Rodrigo desligou o projetor e

    o gravador. Abriu o tampo de acrlico e esperou a professora levantar. Cssia se ergueu com um olhar distante. No disse uma palavra.

  • Que estranho! desanimou-se Hugo. Ser que ela no gostou? fez coro Rodrigo. Espero que sim torcia Fef. Quem sabe assim

    ela d uma maneirada na prxima prova. Estou precisando tirar nota 8 em Portugus ou vou ficar de recuperao.

    Ainda bem que a prova sobre Machado de Assis. J pensou se fosse de um livro bem difcil, como Os Lusadas? perguntou Luza.

    Toda vez que penso em Cames me lembro de camares e me d uma fome incrvel. A eu paro e vou tomar um lanchinho... Voc j experimentou camaro com pasta de amendoim?

    Arghhh! Isso deve ser horrvel, Fef! uma delcia! Delcia, delcia! Estou com gua na

    boca. Depois de mais algumas mastigadas, o comilo da

    turma comeou a falar em tom de confisso: Outro dia, quase fiz uma loucura. Que loucura? espantaram-se os outros. Eu quase roubei o dirio de classe da dona Cssia.

    Se eu tivesse aquilo em minhas mos, poderia mudar as notas de todo mundo. Onde estivesse um 6, eu colocaria 8. Trocaria o 1 pelo 7 e o zero pelo 10.

    E voc acha que ela no iria desconfiar? Luza jogou gua fria nos planos.

    , seria muito bandeiroso disse Hugo. Eu pegaria o Livro do Professor. Todos os exerccios com as respostas certas. J imaginou? Meu sonho ter um daqueles s para mim. Eu poderia fazer a lio em dois minutinhos e acertar tudo sempre.

  • 7. Professor em transe

    Quem estava se aproximando agora era Tom, o professor de Histria. Tom integrou a Primeira Diviso de Infantaria Expedicionria do Exrcito brasileiro na Segunda Guerra Mundial. Vivia contando o histrico dia da conquista do Monte Castelo, importante batalha vencida pelos soldados brasileiros contra os alemes. Ele sempre ficava de p, em sinal de profundo respeito, ao se referir ao comandante do batalho, o general Mascarenhas de Morais.

    Agora no vai ter graa. O professor Tom to velhinho que viu tudo isso pessoalmente... disse Hugo.

    No se diz "velho", Hugo bronqueou Fef. Isso falta de educao. O certo "idoso".

    Entendi. Ah, o professor Tom tem um Opalo azul-claro. Outro dia, eu cruzei com ele no estacionamento do supermercado. No sei como ainda no jogaram esse carro no "ferro-idoso"...

    Fef no teve tempo de dar um soco na cabea do amigo. O professor parou e ajeitou os culos na frente deles. Ele sempre dava aula de terno. Revezava entre um marrom, um verde e um azul, bastante apertados, verdade. No costumava pr gravata, a no ser em dias de festividade na escola.

    Bom dia, professor saudou Luza. Que tal conhecer a vida de Napoleo Bonaparte?

    Hum, que interessante! Gostei de saber que vocs se inspiraram na minha disciplina para fazer esse trabalho. Claro que quero ver. Vamos l!

    Pode sentar aqui, professor, eu vou ligar disse Rodrigo.

    A cena se repetiu. Ao ouvir as frases e ver as fotos, Tom parecia ter entrado em transe. Levantou-se e saiu calado.

    No estamos mesmo fazendo sucesso com os professores lamentou Fef.

  • Assim que o professor Tom saiu dali, Luza pediu licena para ir ao banheiro. Arnaldo apareceu. Deu uma volta ao redor do secador. A aproveitou para soltar um veneninho:

    Se voc tirar mais do que um 4 com essa bobagem, Rodrigo, vou trazer o microondas da minha me no ano que vem!

    Qual , Arnaldo? reagiu Rodrigo. Isso uma mquina do tempo.

    Ah! Ah! Ah! Deve ser uma mquina de perder tempo...

    Arnaldo chegou mais perto de Rodrigo e colocou o dedo em riste:

    E mais uma coisinha para o seu prprio bem, prncipe do xampu: melhor voc ficar longe da Luza, entendeu? Ela merece coisa melhor que voc. Eu serei um grande mdico, respeitado e muito rico. E voc? No mximo, vai abrir uma assistncia tcnica de foges e geladeiras.

    Hugo e Fef bolaram uma maneira de acabar com a discusso.

    Por que voc no experimenta nossa mquina, Arnaldinho? sugeriu Fef.

    de graa mesmo... completou Hugo. Com cara de poucos amigos, Arnaldo concordou.

    Sentou-se na cadeira e colocou a cpula do secador na cabea. O personagem seguinte era Bucfalo.

    "Cavalo de Alexandre, o Grande, rei da Macednia, no

    sculo IV antes de Cristo. Juntos, eles conquistaram todas as terras que encontraram da Grcia at a ndia."

    Quando Arnaldo saiu relinchando, Rodrigo desconfiou

    que alguma coisa estranha estava acontecendo.

  • 8. Um torcedor incendirio

    Nero ainda estava um pouco zonzo, com um ar perdido. Ao dobrar uma esquina, ele deu de cara com um grande estdio.

    O Coliseu! At que enfim, me localizei. Roma est crescendo rpido demais. Toda a plebe vai indo para l. Vou acompanh-los.

    Foi andando na direo do estdio, misturado a dezenas de torcedores. Cutucou um deles:

    Vocs so gladiadores? No! Ns somos os Boinas Pretas. Os Gladiadores

    esto proibidos de entrar no estdio. No vieram? Quem vai enfrentar os lees? Pode deixar com a gente! Nero no sabia que eles se referiam aos Lees

    Incendirios, torcida do Dnamo, time mais popular da cidade.

    Quem voc? quis saber um torcedor, assustado com aquela tnica feita de lenol.

    Sou Nero, de Roma! Roma? Gente, o cara deve ser olheiro de um time

    italiano cochichou um outro torcedor. Aposto que veio contratar o Zuba. O Zuba um craco.

    A notcia foi se espalhando por todo o estdio feito um rastilho de plvora. At que chegou aos ouvidos de um dos diretores do Dnamo, que fez questo que Nero acompanhasse a partida das tribunas de honra, como seu convidado. Confortavelmente instalado no estdio, Nero ouvia os diretores da equipe paulista falando maravilhas do futebol de Zuba, dispostos a valorizar ao mximo seu passe. Nero, no entanto, estava confuso com tudo aquilo.

    O que estou fazendo aqui? perguntava-se. A partida se iniciou. Nero contou 22 gladiadores, mais

    trs sujeitos de preto que ele no entendia direito o que faziam ali. Continuava sentindo falta dos lees. Na metade do

  • primeiro tempo, um dos diretores do Dnamo resolveu puxar conversa com ele:

    Vocs costumam ver jogos to disputados assim em Roma?

    No, no. L muito diferente. S uma pergunta: aqui vocs no tm bichos?

    Temos, claro. Mas ns s pagamos no final da partida, em caso de vitria ou empate.

    Nesse momento, o time adversrio, com uniforme preto e branco, marcou um gol. A torcida se levantou e passou a gritar:

    Bo-ta-fo-go! Bo-ta-fo-go! Bo-ta-fo-go! Ao escutar aquilo, Nero teve um estalo e pensou

    baixinho: isso! Agora eu me lembrei: tenho que botar fogo

    nessa cidade!!!

  • 9. Atitudes muito estranhas

    Rodrigo reuniu todo o grupo em seu quarto. Estava muito, muito bravo. Uma verdadeira fera:

    Por que vocs colocaram a foto do Bucfalo e no me avisaram?

    Era s uma brincadeirinha! desculpou-se Hugo. Brincadeirinha??? Hugo tinha uma admirao muito grande pelo trabalho

    de Rodrigo e no gostava de brigar com ele. Por influncia do amigo, ele tambm se interessou por invenes. Comprou livros e gastou trs meses de mesada em material. Seu primeiro invento foi um periscpio de cartolina preta, espelhinhos, cola e durex.

    Parabns, Hugo! Voc leva jeito elogiou Rodrigo na ocasio.

    Depois disso, Hugo construiu um estetoscpio com um funil e um pedao de mangueira velha. Estava muito feliz com tantas novidades. Partiu ento para aquela que seria a sua obra-prima:

    Vou inventar o desentortador de banana. Depois de investir uma penca de dinheiro em vrios cachos de banana na feira, Hugo desenvolveu um tubo plstico bem comprido e muito estreito. Segundo seus clculos, a banana deveria entrar por uma extremidade e, ao passar por todo o cano, sairia retinha do outro lado. O resultado final, no entanto, foi uma catstrofe. Hugo sujou tudo de banana: o tapete, a cama, a escrivaninha. Naquela noite, a me ps um ponto final em sua promissora carreira de inventor.

    Luza tratou de interromper a discusso dos dois: Me desculpe, Rodrigo, mas acho que essa histria do

    Bucfalo no o mais importante agora. O que est feito, est feito. Aconteceu algo muito estranho com as pessoas que experimentaram a sua mquina. Por que o Arnaldo saiu relinchando quando viu as fotos desse cavalo?

  • Ele s estava querendo tirar um sarro da nossa cara disse Rodrigo.

    S que, depois disso, o meu irmo disse que viu o Arnaldo rondando o carrossel de um parque de diverses contou Fef. Ele estava de quatro, como se fosse um cavalo de verdade. Por falar em cavalo, me deu uma vontade de comer um file cavalo agora...

    E no s avisou Luza. Depois que saiu de nosso secador, a dona Cssia foi direto para a lanchonete e colocou uma lingia ao redor do pescoo, dizendo que aquilo era sua cobra de estimao. Eu vi a cena quando estava indo ao banheiro.

    Cobra? Ela viu as imagens de Clepatra! lembrou Rodrigo.

    Isso o fim da picada! emendou Hugo. Fim da picada usar uma lingia como colar. Que

    desperdcio! reclamou o gluto Fef. Ser que a mquina hipnotizou as pessoas?

    deduziu Rodrigo.

  • Hipnose? Fef coou a cabea. Eles esto achando que so aqueles personagens de nosso secador?

    No possvel. A dona Cssia continuou falando em portugus, e no em egpcio observou Luza.

    Tem razo. O Arnaldo tambm saiu relinchando em portugus completou Hugo, imitando um cavalo.

    No, no. Vocs no entenderam. Acho que aconteceu o seguinte: a mquina mudou apenas uma parte da personalidade das pessoas teorizou Rodrigo.

    Ser? perguntou Luza. Pelo que a gente viu, s pode ser isso respondeu

    Rodrigo. Nossa, que coisa mais maluca assustou-se Fef.

    Eles so eles mas tambm so os outros? Pode ser... concordou Rodrigo. Se for isso, embora tenha vivido no antigo Egito,

    dona Cssia ou Clepatra, sei l quem, no vai estranhar algumas modernidades, como o microondas, o automvel e a TV, certo? perguntou Luza.

    Possivelmente, sim respondeu Rodrigo. Mas ela poder sentir falta de alguns objetos que existiam no seu tempo.

    Estou todo confuso! disse Hugo. Algum pode me explicar isso direito?

  • 10. Retrato falado bem familiar

    O televisor, que estava ligado, anunciou um boletim extraordinrio. A TV Planeta comeou a transmitir ao vivo as impressionantes cenas de princpio de incndio no estdio. Milhares de pessoas se acotovelavam para sair pelas portas estreitas. Pais desesperados tentavam proteger seus filhos no meio daquela loucura. Outros pediam calma, mas ningum parecia ouvir no epicentro do tumulto. Os reprteres entrevistavam algumas testemunhas:

    Eu vi um sujeito muito estranho. Ele estava vestindo um lenol por cima da roupa e usando um ramo de agrio em volta da cabea. S um maluco faria isso!

    A emissora tratou de colocar no ar um retrato falado do suposto autor do incndio. Fef engasgou com o pedao de bolo de fub que estava comendo e deu um pulo da mesa:

    Nossa, a cara do Laurentino, l da escola! Aquela verruga no meio da testa igualzinha...

    Todos pararam de conversar e se concentraram nas imagens.

    No, no. Aquele s pode ser o Laurentino! disse Rodrigo. A verruga, o bigode e os dentes separados na frente.

    E por que ele colocaria fogo num estdio? O time dele nem jogava hoje! estranhou Fef.

    No demorou muito para Luza encontrar a resposta: Qual foi o personagem da Histria que ficou famoso

    por incendiar um local? Se a tese do Rodrigo estiver certa, ele deve estar achando que o Nero. Nero fazia parte do trabalho de vocs, no?

    Era o primeiro personagem informou Rodrigo. Que Nero? O imperador de Roma? estranhou

    Hugo. Mas o Laurentino no descendente de portugueses?

    Como isso foi acontecer com o secador? questionou Rodrigo.

  • Lembra do temporal de ontem noite? Ouvi uma professora dizendo que um raio muito forte caiu na escola... disse Luza.

    Deve ter dado um curto-circuito no negcio estalou os dedos Rodrigo.

    Ah, no! brecou Fef. Vocs andam vendo cinema demais. Isso aconteceu em De volta para o futuro e mais uns 5 milhes de filmes. Pensem em algo mais original, por favor.

    Mas s pode ser isso, Fef insistiu Luza. T bom. Quando resolvermos escrever um livro com

    essa nossa histria, seremos acusados de plgio! Precisamos lembrar de todos os que passaram pela

    mquina esta manh voltou ao assunto Luza. Eu sei disse Hugo. Primeiro foi a professora

    Cssia, depois o professor Tom e o nosso querido Arnaldinho.

    O Laurentino deve ter experimentado a mquina antes de ns chegarmos ao ginsio! acrescentou Rodrigo.

    Como estava chovendo, ele deve ter molhado o cabelo tentava explicar Hugo. A ele resolveu dar uma secadinha com a nossa mquina.

    Houve um breve silncio. Todos estavam com olhares pensativos.

    O que faremos para eles voltarem ao normal? pensou alto Rodrigo.

    J que vocs insistem nessa linha de raciocnio absurda, imagino que deveramos chamar aquele cientista maluco do filme, o Doc Brown, para nos ajudar ironizou Fef.

    Chega de gracinhas irritou-se Rodrigo. Precisamos bolar um plano rpido.

    Quando algum leva uma pancada e fica com amnsia, o que devemos fazer para ela voltar ao normal? Luza fez um certo suspense.

    No sei, no lembro. Quem sou eu? brincou Hugo.

  • Dar outra pancada disse Luza. Teremos que bater neles? voltou a perguntar

    Hugo. Estou entendendo o seu raciocnio... Rodrigo

    incentivou. A gente precisa procurar fotos de nossas vtimas e

    gravar uma nova fita. A s coloc-los no secador de novo e eles voltaro ao normal. O problema reuni-los.

    Ser que a coisa to simples assim? perguntou Fef.

    Algum tem alguma idia melhor? quis saber Luza.

    Prefiro aquela idia da pancada... interrompeu Hugo.

    Vamos colocar em prtica o plano de Luza ordenou Rodrigo.

    Posso pedir uma coisinha antes? O que , Fef? Antes, eu gostaria de ser hipnotizado como Dom

    Joo VI. Logo Dom Joo VI? Por qu? estranhou Luza. Eu fiquei sabendo, num livro de curiosidades, que

    ele ficava o dia inteiro comendo frango assado...

  • 11. Essa mquina um perigo!

    Na manh de segunda-feira, Rodrigo foi at a sala do diretor e explicou tudo o que tinha acontecido. A princpio, o diretor pareceu no acreditar muito naquela histria. Para tirar a dvida, ele ligou para a casa de todos os envolvidos.

    O Laurentino arrancou o lenol de sua cama e sumiu. No o vejo desde ontem! disse a irm do bedel.

    Acho que o meu Tom tem outra mulher! choramingava a esposa do professor de Histria. Ele me chamou de "Josefina" e saiu de casa. Fez um chapu esquisito com jornal e colocou na cabea.

    A minha filha estava mesmo muito estranha contou a me da professora Cssia. Imagine, senhor diretor, que ela mandou nossa empregada experimentar veneno para rato. A coitada ficou to assustada que pediu demisso na hora. J liguei para o meu genro. Ele disse que vai lev-la a um mdico!

    O diretor desligou o telefone com um ar apalermado. Agora o senhor acredita em ns? perguntou Fef,

    com o nariz erguido. Desculpem, garotos! tudo verdade. Pelo bigode de

    Santos Dumont, essa mquina um perigo! Enquanto no tivermos localizado todos eles, precisaremos deix-la bem guardada. Devemos manter isso em sigilo absoluto. Para no criar pnico, ningum deve saber o que est acontecendo aqui, certo?

    Todos deram a sua palavra. Rodrigo, traga o secador para c. Vamos escond-lo

    aqui, nesse armrio. O que eles no imaginavam que, na ante-sala,

    Eurpedes, o ex-chefe de almoxarifado da escola, aproveitou a ausncia da secretria para grudar o ouvido na porta. Prestou ateno em tudo. Ele tinha sido demitido ao tentar aplicar um golpe financeiro na compra de mapas e atlas para a escola. Estava ali apenas para assinar a papelada de desligamento. Ao xeretar a conversa, ficou curioso em

  • conhecer melhor a geringona. Quando os garotos saram da sala do diretor e viram o ex-funcionrio, foram cumpriment-lo.

    Como vai, Eurpedes? disse Hugo. Muito bem, garotos. Muitssimo bem.

  • 12. Uma rainha na agncia de matrimnio

    Cssia folheava um lbum cheio de fotos de rapazes. Gordos, magros, calvos, brancos, negros, orientais, barbudos. Havia de tudo. Ao lado de cada foto, uma ficha informava o nome e as principais caractersticas de cada um: idade, peso, altura, profisso, hobbies e tipo ideal de companheira.

    Gostou de algum? perguntou a recepcionista da agncia matrimonial.

    Ainda no encontrei o que estou procurando! Loiros de olhos verdes esto em falta riu a

    mocinha. No, no. Quero um namorado chamado Jlio

    Csar! Jlio Csar? . Qualquer Jlio Csar? Qualquer Jlio Csar. Que estranho! Nunca ningum escolheu um marido

    s pelo nome... J sei: a sua cartomante disse que sua alma gmea chamaria Jlio Csar, certo? Pois voc deu muita sorte. Eu tenho um Jlio Csar bem aqui.

    Ela correu algumas pginas do lbum e mostrou a foto de um homem calvo, com um grande sorriso. A ficha dizia que seu nome era Jlio Csar Barros, tinha 35 anos, profissional liberal. Procurava uma mulher jovem, solteira, sem filhos e que curtisse viagens e muita aventura.

    esse mesmo! O meu Jlio Csar! Que mulher decidida. Vou ligar para ele e marcar

    um encontro. Qual mesmo o seu nome? Clepatra.

  • * * *

    O recm-transformado Napoleo Bonaparte andava pela cidade com aquele ar de turista perdido. No foi toa que acabou parado por um espertalho.

    O que o senhor acha de entrar numa pirmide? tima idia! respondeu Napoleo. "Um trouxa perfeito!", vibrou por dentro o vendedor. Meu exrcito esteve no Egito entre 1798 e 1801

    relatou ele. Fizemos o registro de seus antigos monumentos. Foi um trabalho excelente. Levei comigo 167 pesquisadores.

  • O golpista no estava entendendo nada. Napoleo continuou:

    Eu no esqueo a frase que disse para os meus soldados ao passar diante daquelas pirmides: "Do alto destas pirmides, quarenta sculos vos contemplam". No uma frase linda?

    Sem dvida, sem dvida. Mas o que o senhor veio me oferecer mesmo? Deixa pra l! disse o vendedor, j saindo fora.

    * * *

    Marco Antnio jogou o bluso de couro sobre uma das

    poltronas da sala e apanhou o jornal que estava em cima da mesa. Passou a mo pelo rosto, que, dois dias e trs noites sem ver barbeador, parecia uma lixa. Entrou na cozinha e encontrou a sogra com um ar beirando o desespero.

    Boa tarde, dona Shirley! Onde est a Cssia? No sei, Marco Antnio. Ela chegou muito estranha

    da escola ontem. No quis incomod-lo porque sei que as suas noites de planto so muito agitadas. Hoje, ela ficou trs horas na banheira.

    Trs horas? A senhora deve estar exagerando... Nada disso. Trs horas cronometradas. Ela ainda

    encheu a banheira de ervas aromticas. Cada vez que eu batia na porta para perguntar se estava tudo bem, ela dizia uma frase estranha.

    Que frase estranha? Eu ouvi tantas vezes que at decorei. Era assim:

    "Clepatra foi a ltima rainha do Egito. Ocupava vinte damas na preparao de seus banhos. Ficava at seis horas mergulhada na gua extrada de plantas aromticas".

    Ih, tem alguma coisa estranha. Se tem! Ela tentou envenenar a empregada... A Cssia? No possvel! Ela no capaz de matar

    uma formiga!

  • Eu sei, eu sei. Mas eu vi com esses olhos que a terra h de comer. A Cssia, minha filha, apertou o pescoo da Dalva e ameaou despejar veneno para rato l dentro. A Dalva, coitadinha, no parava de chorar. Arrumou a mala e foi embora. Ela trabalhava conosco h quinze anos. Ela viu a Cassiazinha crescer!

    Deve ser uma crise de estresse. Ela anda lecionando demais. So muitas aulas para preparar, provas para corrigir, alunos bagunceiros. Nesse horrio, a Cssia deve estar na escola.

    No, no. Ligaram do colgio, procurando por ela. A voz do diretor parecia bastante preocupada. Ser que ela aprontou alguma por l tambm?

  • 13. A coxinha de Napoleo Bonaparte

    Na fila do pronto-socorro, o sujeito com o chapu feito de jornal na cabea chamava a ateno. Os adultos apontavam, as crianas riam. Ele tinha uma das mos dentro da camisa, como se estivesse segurando o estmago. Reclamava de dores. At que chegou a sua vez:

    Seu nome perguntou, mecanicamente, a atendente.

    Napoleo I. Napoleo do qu? Bonaparte. Na verdade, eu sou de origem italiana.

    Mas preferi mudar o Buonaparte para Bonaparte, uma forma mais francesa.

    Sei. Napoleo Bonaparte. Data de nascimento? 15 de agosto de 1769.

  • Como? 15 de agosto de 1769. T de sacanagem comigo, ? Essa vida de

    funcionrio pblico um inferno. S aparece maluco por aqui... Profisso?

    Imperador. Encanador? No, no. Imperador. Fui coroado imperador da

    Frana no dia 2 de dezembro de 1804, numa cerimnia inesquecvel na Catedral de Notre Dame. J ouviu falar?

    O senhor parente daquele corcunda? Que corcunda? Deixa pra l, imperador. Qual o seu problema? Ao ouvir a pergunta, ele repetiu uma das frases do

    trabalho dos garotos: Tenho uma enorme lcera gstrica e um depsito de

    clcio no sistema urinrio. Por isso, ando com a mo no estmago.

    O ex-Tom repetiu exatamente a frase que ouvira no secador.

    Comeu alguma coisa diferente hoje? continuou a atendente.

    Ah, sim. Vinha caminhando pelas ruas do meu imprio e me deparei com uma iguaria muito cheirosa. Era uma tal de "coxinha", j ouviu falar? uma ilhota de frango, cercada de massa por todos os lados. Resolvi experimentar uma daquelas.

    Sei, sei ouvia a recepcionista. Tenho a impresso que o acepipe no me caiu muito

    bem. Estou sentindo uma queimao aqui dentro. No posso ir desse jeito para o campo de batalha.

    Naturalmente que no. Um minutinho s, por favor pediu a atendente, j se levantando. A moa entrou numa sala. Napoleo percebeu que uma cabea apareceu para espi-lo. Uma enfermeira veio at ele.

    Imperador Napoleo?

  • Sou eu mesmo! Vossa Alteza tem algum documento? Alteza, no. Ao falar com um imperador, voc deve

    dizer Vossa Majestade. Alm do mais, todos me conhecem. Sabem que sou Napoleo Bonaparte.

    Mil perdes, mil perdes. Vossa Majestade est acompanhado de algum parente?

    No, estou sozinho. Por acaso, Vossa Majestade sabe o seu endereo? Ora, ora. No tenho endereo. Sou um cidado do

    mundo. Minhas tropas dominaram a Europa desde o Canal da Mancha at a fronteira com a Rssia. Sabe o que significa isso?

    aquele tal Mercado Comum Europeu, no? H?!? J entendi. Por aqui, por favor! Ele a seguiu at uma sala toda branca, com uma cama.

    A enfermeira lavou as mos na torneirinha, puxou uma toalha de papel para enxug-las e vestiu luvas descartveis.

    Vou precisar lhe aplicar uma injeo para acabar com essa dor no seu estmago, est bem? avisou ela.

    Quando ela mostrou a seringa e a agulha, Napoleo deu um pulo da cadeira:

    Que arma essa? No encoste isso em mim! Um homem desse tamanho ainda tem medo de

    agulha? J sei. Voc deve ser uma soldado do Exrcito

    inimigo infiltrada em nossas fileiras reagiu ele. Eu, do exrcito? S se for do Exrcito da Salvao! A enfermeira deixou a sala e voltou com dois ajudantes,

    que j foram agarrando os braos de Napoleo. Ele tentou reagir, mas os homens eram bem mais fortes. A moa, ento, arregaou a manga de seu brao esquerdo, limpou o local com um algodo embebido em lcool e aplicou a injeo. Napoleo sentiu uma tontura e apagou na hora.

  • 14. Escorpio tatuado no brao

    Sentados numa mesa, quatro homens mal-encarados ouviam a explicao de Eurpedes.

    No sei, no. E se for mais uma de suas armaes? disse o que parecia ser o chefe do bando.

    Estou falando a verdade, Escorpio. Essa mquina vale ouro. Ela pode hipnotizar as pessoas e elas se transformam em quem voc quiser. Imagine s: podemos trazer tila, o Huno; Gngis Khan; Butch Cassidy e Sundance Kid...

    Butch Cassidy e Sundance Kid? alguma dupla country??? perguntou um com mais ar de panaca.

    Cala a boca, Cara-de-Fuinha! berrou Escorpio. O chefo era um homem gigantesco. Tinha a cabea

    toda rapada e usava cavanhaque. Musculoso, vestia camisetas sem mangas para destacar os bceps. O apelido vinha de um enorme escorpio tatuado em seu brao direito.

    Estou falando dos maiores viles da Histria explicou Eurpedes. Voc ter a melhor quadrilha de bandidos trabalhando ao seu lado.

    Mas ele j tem os melhores profissionais! reagiu Cara-de-Fuinha.

    A sua opinio a que menos conta aqui cortou Escorpio. Deixa ver se eu entendi. O malandro aqui quer que a gente esquea a sua dvida e, em troca, diz onde est a mquina de fazer bandidos?

    Perfeitamente concordou Eurpedes. Eu levo vocs at ela e no devo mais nada a ningum. Vocs podem ainda lucrar uma grana, vendendo a mquina para alguma organizao terrorista.

    Acho que vale a pena tentar, chefe! disse o segundo, apelidado de Caixa-de-Ferramentas, por ser o encarregado de dirigir o carro.

  • T bom, t bom. Mas se for mais uma de suas

    trapaas, voc um homem morto. Vamos lambuzar seu corpo de marshmallow e jog-lo num buf infantil cheio de crianas famintas.

    Nossa, chefe, que crueldade! vibrou Chave-de-Brao, o terceiro, ajeitando o palito no canto da boca. S mesmo o senhor para ter uma idia to genial.

  • 15. Chegaram as fotos

    Tera-feira, na hora marcada, os quatro garotos se

    encontraram na casa de Rodrigo. Cada um tinha uma novidade para contar. Era uma verdadeira torre de babel, pois todos queriam falar ao mesmo tempo.

    Ningum abriu o jogo sobre a mquina, certo? perguntou Luza.

    Eu fiz aquilo que foi combinado disse Fef. Pedi as fotos aos parentes, dizendo que os alunos iriam fazer cartazes e espalhar por toda a cidade.

    Aqui esto as fotos do professor Tom mostrou Hugo. Consegui at uma tirada no campo de batalha, em plena Segunda Guerra Mundial! Aquelas histrias que ele conta na classe so verdadeiras. Olha s que uniforme engraado. Veja s a dedicatria aqui atrs: "Para a minha

  • amada Carmen Lcia, lembranas do seu Tom. Monte Castelo, Itlia, 21-02-45".

    O que temos mais? impacientava-se Rodrigo. Fef abriu a agenda e tirou trs fotos da professora

    Cssia: A me da dona Cssia arrumou estas trs fotos aqui! timo! Esto excelentes. Quem ficou de procurar as

    fotos do Arnaldo? perguntou Rodrigo. Fui eu levantou o dedo Fef. Mas eu estava

    pensando. Ser que devemos fazer aquele cara voltar ao normal? Ele muito chato! Vive batendo na gente. S porque sabe lutar jiu-jtsu.

    Em vez das fotos dele, podemos colocar uma da madre Teresa de Calcut sugeriu Hugo. A ele fica bonzinho o tempo todo.

    No podemos fazer isso argumentou Rodrigo. Eu no sou amigo dele, mas devemos fazer tudo voltar a ser como era antes. Ningum tem o direito de mexer na personalidade das pessoas.

    No seria mesmo m idia complementou Luza. Mas o Rodrigo est com a razo.

    A Luza concorda com tudo o que o Rodrigo diz, sempre reclamou Hugo. Que coisa mais chata!

    Lembrou baixinho de uma msica que ensinavam no jardim-de-infncia ("dois namoradinhos, s falta um beijinho"), que ele obviamente no cantou.

    Agora s falta o mais importante, turma: localizar os nossos heris! avisou Luza.

    Isso no ser nada fcil disse Rodrigo, um tanto desanimado. Esta cidade grande demais.

    Luza tentou dar uma ducha de energia nos amigos. Mas, s vezes, eles podem estar debaixo de nossos narizes e ns nem percebemos.

  • 16. Um novo amor para Nero

    Nero vinha cami-nhando pela rua, brincando com seu isqueiro. Ele abandonou o lenol e passou a usar calas compridas. que Nero deu vexame ao cruzar com algumas tubulaes de ar na calada. O lenol vivia subindo e os outros pedestres morriam de dar risada. S continuava com o agrio ao redor da cabea. O imperador romano olhava para os prdios e suspirava.

    Ainda tenho muito o que incendiar

    nesta cidade dizia, com um sorriso nos lbios. sua frente, percebeu que um garoto puxara a bolsa

    de uma mulher e agora tentava escapar com ela. Num gesto rpido, ele conseguiu agarrar o pequeno assaltante e tirou-lhe a bolsa da mo.

    Parado a, seu ladrozinho! O garoto acertou um pontap em Nero e fugiu. A bolsa

    ficou. A senhora, assustada, veio ao seu encontro, cheia de salamaleques.

    Muito obrigada, muito obrigada. No se tem mais paz nesta cidade.

    Enquanto ela falava, Nero olhou para o seu rosto. Agripina percebeu que estava sendo observada por seu heri e baixou os olhos, num misto de vergonha e charme.

    Estou muito grata, senhor... Nero. Meu nome Nero.

  • Que bonito nome! disse ela. Obrigado. Espero que a senhora no tenha se

    machucado. Estou muito bem. Talvez mais tarde Agripina se sentisse envergonhada

    por sua ousadia, mas naquele momento achou o gesto mais natural do mundo. Tirou um carto de visitas de sua bolsa e o entregou a Nero.

    Tenho um salo de beleza aqui ao lado. Se precisar de algo...

    Salo de beleza? estranhou ele. O que isso? O senhor no sabe o que um salo de beleza? No. Desculpe, mas eu no sou daqui. Eu venho de

    Roma. O senhor estrangeiro? Ento, deixe que eu lhe

    explico. Salo de beleza um lugar em que as mulheres vo cuidar dos cabelos, das unhas, da pele.

    Ah, entendi. Cuidar da aparncia algo muito importante. Em Roma, costumo tingir meus cabelos de preto com lentilhas, vinho e folhas de cipreste, fervidos com alhos-pors.

    "Que espirituoso!", pensou Agripina. A senhora tem uma pele muito bem cuidada. Deve

    usar lesmas modas, no ? continuou Nero. Ela deu uma gargalhada. "Um homem bem-humorado

    to raro hoje em dia", continuou pensando. Gostaria muito de convid-lo para tomar um caf

    comigo disse Agripina. Me ligue quando puder. Ele agradeceu o convite e apanhou o carto. Estava

    escrito em letra de forma bem no centro: "Instituto de Beleza Agripina". Ao ler aquele nome, uma frase comeou a soar em sua mente:

    "Nero era to cruel que matou a sua prpria me, Agripina".

  • 17. "Vocs ficaro ricos com a mquina"

    Cara-de-Fuinha deu um pontap forte na porta e ela se escancarou. Todos entraram na sala do diretor.

    Onde est a mquina? perguntou, j nervoso, Escorpio.

    Deve estar por aqui, em algum armrio respondeu Eurpedes. Pelo menos, foi o que eu escutei.

    Algum abra aquela porta. Se for um truque, j sabem o que fazer com esse vigarista, no? ordenou Escorpio.

    Chave-de-Brao colocou um silenciador no cano do revlver e disparou um tiro seco na fechadura do armrio de metal. A porta se abriu facilmente.

    Que brincadeira essa? urrou Escorpio. Isso um secador de cabelos de mulher, no mquina do tempo coisa nenhuma.

    Quem tambm levou um choque foi Eurpedes. Ele ouvira a histria, mas no sabia como era a tal mquina dos garotos. Ser que era isso mesmo ou ele tinha acabado de entrar numa fria? Escorpio j comeava a espumar de raiva. Como sua vida corria perigo, ele resolveu arriscar.

    Cavalheiros, esta a mquina do tempo da qual eu lhes falei. Vocs ficaro ricos com ela.

    Escorpio olhou desconfiado: Como podemos ter certeza de que ela funciona? Vocs tero que test-la! decretou Eurpedes. Boa idia! foi a primeira vez que Escorpio tirou a

    braveza do rosto. E apontou para ele: Sente-se a! Eu no posso esquivou-se Eurpedes. Se eu

    sentar a, quem ir coloc-la em funcionamento? Tem razo. Cara-de-Fuinha, sente-se voc a! Por que logo eu?

  • Porque voc o mais intil de ns todos aqui. Se

    alguma coisa acontecer, a humanidade no perder nada de significativo.

    Tudo eu, tudo eu! Cara-de-Fuinha ficou na cadeira e Eurpedes baixou o

    tampo do secador. O que fazer agora? Como colocar a geringona para funcionar? Um fio de suor escorria por seu rosto. Pelo reflexo do tampo de vidro, o ex-chefe do almoxarifado observava a ansiedade dos bandides. Ligou primeiro o projetor e depois o gravador. As imagens foram aparecendo e Cara-de-Fuinha escutava frases sobre Marco Polo:

    "Depois de uma viagem de trs anos China, o explorador Marco Polo trouxe, em 1295, delcias como o macarro e o sorvete".

    Os ladres ouviram o "trec" que indicava o final da fita. Cara-de-Fuinha levantou-se como se nada tivesse acontecido e Escorpio passou a bufar. As veias de seu pescoo pareciam pular fora.

    Sabia que era mais uma de suas palhaadas, Eurpedes. Pode ir rezando. Voc j pode se considerar um homem morto. Cara-de-Fuinha, amarre ele. Cara-de-Fuinha! Cara-de-Fuinha!!!

    Meu nome Marco Polo. Nasci em Veneza no ano de 1254 e estou voltando de uma expedio China. Com licena, estou muito cansado.

    Todos olharam espantados para Cara-de-Fuinha. At o seu tom de voz havia mudado. Era mais srio, com voz pausada. Parecia mesmo um personagem da Histria. Quando saiu da sala, ningum conseguiu esboar qualquer reao para segur-lo.

  • 18. Ataque geladeira

    Ao chegar em casa, Fef seguiu o seu tradicional roteiro: ligou a TV da sala e foi direto para a cozinha. Abriu a geladeira e fez um exame minucioso para saber o que atacar. A tenso dos ltimos dias vinha aumentando o seu j feroz apetite. Pegou um pedao generoso de torta de frango, meia dzia de empadinhas de queijo, um pedao de bolo de chocolate, uma tigelinha de mousse de limo e uma latinha de refrigerante.

    Que fome! deliciou-se Fef. Voltou geladeira e trocou o refrigerante normal por

    um refrigerante diettico. Mame disse que eu no posso engordar! Quando deu a primeira garfada na torta, Fef parecia

    querer se vingar das brincadeiras que era sempre obrigado a ouvir por ser gordo. Usava calas com elstico na cintura, geralmente puxadas pelos amigos. Nas aulas de Educao Fsica, era sempre o ltimo a ser escolhido na hora dos times serem formados. No futebol, s deixavam ele jogar no gol. Fora a enxurrada de apelidos: "Jquei de elefante", "Rolha de poo", "Orca". Fef procurava encarar tudo com bom humor. No tinha inimigos e vivia feliz com seu peso. Bem, ele no era muito fantico por balanas. Da ltima vez, parou na farmcia e conferiu o peso: 48 quilos. A resolveu colocar o outro p em cima da balana tambm.

  • 19. Sem ningum por perto

    Uma semana j havia se passado e os meninos continuavam sem pistas dos desaparecidos. Mesmo assim, os quatro se reuniam diariamente depois da escola para trocar as ltimas notcias.

    No posso mais faltar aula de piano! avisou Fef.

    Voc tem aula de piano? riu Luza. Tenho, sim, e da? ficou irritado. Eu s sei tocar campainha! brincou Hugo. Fef foi o primeiro a deixar a casa de Rodrigo. Hugo iria

    embora logo em seguida: Essa histria do secador est nos roubando muito

    tempo disse ele. Faz um tempo que no jogo videogame e no brigo com a minha irm.

    Luza ficou esperando sua me voltar da casa de uma tia para apanh-la. Ela e Rodrigo estudavam na mesma escola havia quatro anos, mas nunca tinham ficado tanto tempo juntos. Era a primeira vez que conversavam sem ter os outros colegas por perto.

    Sabe aquele dia da Feira de Cincias e Inventos? disse Rodrigo.

    Sei. Vocs foram muito legais comigo. Voc disse que estava com um problema em casa.

    Ser que eu posso ajudar em alguma coisa? Luza sorriu com os olhos. Muito obrigada, Rodrigo. Mas acho que voc no

    pode fazer nada. O que aconteceu? Meu pai e minha me se separaram no ms passado.

    um momento delicado. Minha me ainda est muito triste. Sei que meu pai no anda bem, embora ele faa de tudo para disfarar. Eu gosto dos dois e no quero ficar nem de um lado nem do outro.

  • Entendo. A gente sempre quer que os pais fiquem juntos. Mas,

    se melhor para os dois, o que podemos fazer? Agora, em vez de ter uma casa, vou ter duas.

    Rodrigo estava com um ar pensativo: assim mesmo que voc deve pensar. Seu pai vai

    estar sempre junto de voc, mesmo morando em outro lugar. Triste mesmo quando o pai da gente morre. Fiquei muito mal.

    Agenor era o farmacutico mais respeitado do bairro. Diziam que ele entendia mais de doenas do que muitos mdicos. Brincalho, tinha uma clientela cativa. Fisicamente, Rodrigo saiu quase uma cpia do pai. At o jeito de andar era idntico. Apenas os olhos e os cabelos castanhos-claros tinham sido herana da me. Uma lgrima escorregou dos olhos de Luza. Rodrigo continuou falando:

    No comeo, achava que era tudo mentira. Ficava esperando ele chegar noite para brincar comigo e a campainha no tocava mais. Eu at conhecia o jeito de ele tocar a campainha, sabia?

    Isso triste. No consigo imaginar a minha vida sem meu pai...

    Seu pai est vivo, vai continuar ao seu lado, Luza! Sei disso. Estou dando a maior fora para os dois.

    Hoje noite, convidei minha me para ir ao cinema comigo. Ela precisa se distrair um pouco. Parar de pensar no meu pai. No meio de suas invenes, no tem a nenhuma mquina para a pessoa ser sempre feliz?

    Bem que eu gostaria. Mas as pessoas devem lutar para encontrar a sua felicidade. A coisa mais importante da vida ser feliz.

    Luza aproveitou para mexer na at ento intocvel prateleira de invenes do quarto de Rodrigo. Agenor tinha, no fundo da farmcia, um quartinho com ferramentas para pequenos consertos. O lugar virou tambm depsito de brinquedos quebrados, mveis sem uso, garrafas velhas. Foi ali que Rodrigo deu os primeiros passos na sua carreira de inventor. Aos 5 anos, com alguns pedaos de madeira, ele fez

  • um alimentador automtico para a casinha de seu hamster, que ganhou do pai. O alimentador era uma caixinha com trs compartimentos, cada um separado por uma tabuazinha, amarrada a um barbante. Sempre que o hamster acabava de comer as sementes de girassol de um compartimento, ele acionava o outro puxando a cordinha.

    O que isso aqui? perguntou a garota. uma cala que inventei com bolsos prova d'gua.

    Outro dia, deixei toda a minha mesada no bolso e a mame ps a cala para lavar. Perdi toda a grana. Foi a que tive a idia!

    Que barato! mesmo muito til! suspirou Luza. Rodrigo estava to interessado em mostrar as suas

    engenhocas que nem tinha tempo de perceber os olhares apaixonados que Luza deixava escapar a todo instante.

    Est vendo esta pipa? mostrou Rodrigo. Estou. uma pipa normal! Parece, mas no . Olhe aqui dentro. Coloquei um

    miniventilador embutido nela. D para empin-la em dias sem vento.

    Puxa! Estou pensando em construir agora um bumerangue

    com controle remoto. Se o bumerangue no voltar sozinho, s acionar o boto.

    Luza estava se divertindo como nunca. Mas sentia seu corao diferente, palpitante. Ela estava sentindo algo novo por aquele ar srio e, ao mesmo tempo, moleco de Rodrigo. Ele vibrava com cada uma de suas invenes. De repente, um som de buzina quebrou o encanto. Luza espiou pela janela e viu o carro de sua me.

    Minha me chegou. Preciso ir. Adorei ver as suas invenes.

    Que bom! Tenho algumas outras para voc ver uma outra vez.

    Luza chegou perto de Rodrigo e encostou levemente seus lbios nos dele. A foi a vez de o corao do garoto disparar.

  • Tchau, amore! acenou Luza, saindo pela porta do quarto.

  • 20. O encontro de Clepatra e Jlio Csar

    O clima na delegacia andava meio tenso. O delegado Marco Antnio estava ainda mais preocupado com o desaparecimento de sua mulher. Ele tratou de distribuir fotos dela para todos os distritos, mas no tinha recebido ainda qualquer notcia. Ficou assustado ao saber da descoberta de um corpo de mulher no-identificado numa favela da Zona Sul. Foi at l, mas no era a sua Cssia. De volta, enfrentou outros problemas.

    Marco Antnio, a quadrilha do dinheiro falso continua agindo! disse o chefe dos investigadores. Veja s: o dono de uma joalheria recebeu estas seis notas falsas de 100 reais. Elas so cpias quase perfeitas; trabalho de profissionais mesmo.

    Mais cedo ou mais tarde, vamos colocar as mos nesse bando.

    Espero que seja mais cedo do que mais tarde! O investigador Tadeu e eu vamos dar um pulinho na joalheria e conversar com o gerente. Talvez ele se lembre de algum detalhe que possa nos ajudar.

    * * *

    s oito e meia em ponto, Clepatra entrou no bar, bem-

    vestida, com roupas de linho. Pela foto, logo identificou Jlio Csar, que a aguardava no balco. Ele se levantou, apanhou a mo de Clepatra e a beijou.

    Encantado! Jlio Csar, seu criado! Ave, Csar! Ele levou o maior susto. Olhou para a sua roupa.

    Conferiu o hlito. Ps a mo no cabelo para conferir o penteado.

    O que foi? Alguma coisa errada comigo? perguntou, ainda se observando.

    apenas uma saudao. Ave, Csar!

  • Ah, sim. Eu s conhecia "Ave-Maria!" Voc deve ser Clepatra, acertei?

    Sim, Clepatra! Realmente, a moa da agncia estava certa. Voc

    encantadora. Jlio Csar reparou que ela tinha as sobrancelhas

    rapadas. Era a primeira vez que via uma mulher assim. Deve ser uma nova moda, imaginou ele.

    Encontrou fcil o bar? perguntou Jlio Csar. Eu apanhei um... como mesmo o nome? Eu

    apanhei um txi. Vocs aqui no tem servio de liteira? Liteira? O que isso? Voc nunca viu uma? aquela cadeirinha,

    carregada por dois homens, um na frente e outro atrs. Acho que sei o que . Mas no temos isso aqui, no.

    De onde voc ? Do Egito. Poxa vida! E como que voc veio parar no Brasil?

  • Nem eu sei direito. Quando vi, j estava aqui. Aceita um aperitivo? Um copo de leite de jumenta! Jlio Csar arregalou os olhos e depois comeou a rir. Pelo visto, voc tambm bastante divertida. Acho

    que aqui no servem leite de jumenta. Que tal uma cerveja? Jlio Csar pediu mais um copo e serviu Clepatra. Ela

    experimentou a bebida e percebeu algo familiar. gua de cevada! Ns temos essa bebida no Egito. Ento, tintim! Temos muito o que conversar. Espero

    que voc goste de comida italiana.

  • 21. A ala dos Napolees

    Quando o efeito da injeo passou, Napoleo percebeu que estava deitado numa cama de ferro muito gelada. S havia uma grande folha de papel fazendo as vezes de lenol. Num segundo instante, ele notou que vestia um avental cinza e seu chapu havia desaparecido. Seus braos e suas pernas estavam amarrados. Ele comeou a gritar e um homem grande e musculoso apareceu. Usava um uniforme todo azul, com as letras SH bordadas no bolso.

    Ol, Napoleo! Tudo em cima? Onde estou? O que estou fazendo aqui?

    perguntou Napoleo, tentando se livrar das amarras. O senhor est na Ala dos Napolees. Ala dos Napolees? O que o senhor quer dizer com

    isso? que juntamos aqui mais de quarenta loucos que

    pensam ser Napoleo... Evidente que so todos loucos. O nico e verdadeiro

    Napoleo Bonaparte, imperador da Frana, sou eu! Ento, me responda uma pergunta muito fcil: qual

    era a cor do cavalo branco de Napoleo? Branco. Viu como sou o verdadeiro? O funcionrio levou-o at um enorme salo, onde

    outros quarenta homens, todos com chapu de jornal na cabea e mo no estmago se amontoavam.

    A esto os seus amigos! disse o funcionrio, que ao sair dali ainda soltou sonoras gargalhadas.

    Napoleo ainda estava intrigado com as letras SH do uniforme daquele sujeito. SH. SH. SH. Sim, SH de Santa Helena. Ele comeou a se lembrar de uma frase: "Depois de perder a Batalha de Waterloo, vencida por ingleses e prussianos, Napoleo Bonaparte foi preso na ilha inglesa de Santa Helena, no Atlntico Sul, onde morreu seis anos depois". Morrer? Mas ele nem se lembrava de ter participado da tal Batalha de Waterloo. Perder para ingleses e prussianos? No,

  • ele sabia que podia vencer. Antes, porm, precisava sair dali. Enquanto pensava, olhou para os rostos, um por um, de todas aquelas cpias que estavam ali e no se conteve: Seus impostores!

  • 22. O Secador do Tempo foi roubado!

    Uma rpida troca de telefonemas e os quatro garotos estavam reunidos no quarto de Fef. O ltimo a chegar foi Hugo, que trazia uma notcia:

    Acabei de encontrar o Douglas no caminho para c. Ele disse que viu o Arnaldo rondando o Jquei Clube...

    O Jquei? estranhou Fef. , deve ser a primeira vez que esse filhinho de papai

    pasta na vida! Ningum riu da piada de Hugo, s ele mesmo. Ei, por que vocs esto com essa cara? estranhou

    Fef. O Secador do Tempo foi roubado! disse Luza. Como assim? Hugo parecia no ter entendido. Roubado. Afanado. Surrupiado. Levado embora.

    Algum passou a mo nele. Entendeu agora? disse Rodrigo, irritado.

    Algum entrou na diretoria da escola, arrombou o armrio e levou o secador embora explicou, mais calma, Luza. Estamos sem nenhuma pista... Quem poderia ter feito isso?

    Com certeza no foi o professor Fernando interrompeu Hugo. Ele careca.

    Hugo, uma nica vez tente levar o assunto a srio! Como vamos fazer todos voltarem ao normal agora?

    Ora, o salo de sua me est cheio de outros secadores iguaizinhos quele. s pegar outro! Hugo pareceu no levar em considerao a bronca do colega.

    Ningum sabe o poder do secador. S ns e o diretor. Quem o levou deveria estar querendo um secador de cabelo, no uma mquina do tempo deduziu Rodrigo. Aquela mquina muito perigosa. Se cair em mos erradas, pode fazer um grande estrago.

  • Ser que ela j foi usada? Poderemos ter outros Napolees, outros Neros e outras Clepatras espalhados pela cidade! Luza parecia assustada. O ladro est com a faca e o queijo na mo...

    A faca e o queijo na mo? arregalou os olhos Fef. Podemos comprar uns pezinhos e fazer sanduches!

  • 23. Matando duas bolas de sorvete

    Enquanto seus pais, seus tios e seus primos olhavam o grande cardpio vermelho, Fef comeou a atacar a cestinha de po e as bolinhas de manteiga que o garom colocou em cima da mesa. Na hora de fazer os pedidos, ele foi o primeiro a se manifestar:

    Eu quero um prato de macarro. Ou melhor, traga logo uma travessa.

    Macarro? Boa pedida! Voc sabia que fui eu que trouxe o macarro da China para o Ocidente em 1295? cochichou o garom no ouvido do garoto.

    Quando? arregalou os olhos Fef. isso mesmo: 1295. Nossa, voc o sujeito de 700 anos mais conservado

    que eu conheo riu Fef. E eu que pensei que garom no podia beber em servio...

    Eu nasci numa rica famlia de mercadores. Tinha 17 anos quando meu pai e meu tio me levaram para a corte de Kublai Khan, na China.

    Fef ficou com a impresso de que j tinha ouvido aquela frase. Daquele jeito. Palavra por palavra. O garom continuou anotando os pedidos. Algo muito estranho estava se passando com aquele homem. Na hora de pedir a sobremesa, a suspeita se confirmou.

    Eu quero um sorvete de duas bolas: uma de melancia e outra de carambola. Anotou?

    Hum, excelente escolha. Sorvete muito bom. Fui eu tambm que trouxe o sorvete para o Ocidente.

    J sei! Em 1295. Fef j estava achando que era gozao e tambm entrou na brincadeira. Depois que a conta foi paga, ele se despediu do garom:

    Voc novo aqui, n?

  • Sim, sim. Comecei ontem. Estava chegando da

    China e passei aqui em frente. Havia uma placa: "Precisa-se de um garom com experincia". Ora, ningum tem mais experincia em macarro do que eu.

    Qual mesmo o seu nome? Marco Polo.

  • 24. Em algum lugar do passado

    Luza e Rodrigo conversavam na sada da escola. A me do Arnaldo veio falar com os professores hoje

    disse a garota. E a? Ela explicou que o Arnaldo no est vindo s aulas

    porque est muito doente. Ontem, eles estiveram no mdico, que no conseguiu descobrir nenhuma doena.

    Melhor seria se ele tivesse ido ao veterinrio! o diabinho do cime de Rodrigo no conseguiu deixar de dar a sua espetadinha.

    No brinque! reprovou Luza. O que voc quer que eu faa? Ns no podemos

    contar nada para ela, lembra? Ainda mais agora que a mquina sumiu.

    O tom esquentou. Era a primeira briguinha dos dois.

    * * *

    Desde a morte de seu marido, Agripina havia sado duas, no mximo trs vezes com outros homens. Nada srio.

    Estou me sentindo de volta adolescncia dizia para si mesma.

    O convite de Nero a fez lembrar do primeiro passeio com Agenor. Eles comearam a namorar em 1980, ano da estria de um filme que eles (como todo casal de namorados) achavam ter sido feito especialmente para os dois. Foram at um cinema no centro de So Paulo para ver Em algum lugar do passado, a histria de um escritor que se apaixona pela imagem de uma mulher pintada num quadro de hotel. Fazendo auto-hipnose, ele consegue regressar no tempo para encontr-la. A msica-tema acabou virando a trilha sonora do casamento dos dois (e tambm de tantos outros casais).

    Ah, o namoro, o comeo de uma paixo... suspirava, lembrando do primeiro encontro com Agenor.

  • A me de Agripina estava muito doente nessa poca e um jovem auxiliar do farmacutico vinha sua casa uma vez ao dia para lhe aplicar injeo. Esse jovem era Agenor. Foi assim que se conheceram e comearam um namorico.

    Agripina achou que ele demorou muito a lhe fazer o convite. Ela tinha 20 anos. Namoraram trs anos e se casaram na igrejinha do bairro com direito a Em algum lugar do passado e Marcha Nupcial na entrada da noiva.

    Agora, loucura, ela estava ali com um homem que acabara de conhecer na rua. Agripina escolhera o local, longe de sua casa, para no dar o azar de encontrar uma cliente.

    Isso to diferente para mim. Estamos aqui e nem nos conhecemos direito... procurou quebrar o gelo Agripina.

    verdade! Eu no sei nada sobre voc. O que voc faz? Toco ctara. Ah, voc msico? Essa vida artstica deve ser fogo,

    no? Fogo? Sim, fogo. Muito fogo!

  • 25. Morrendo de cimes

    Rodrigo estava preparando um cachorro-quente na cozinha quando o telefone tocou. Ele chupou os dedos sujos de catchup e atendeu:

    Rodrigo? Aqui a Luza! Sempre que Luza ligava, Rodrigo abenoava o escocs

    Alexander Graham Bell, inventor dessa maravilha que o telefone.

    Oi, Luza. Tudo bem? Voc no est bravo comigo, n? O corao parecia a banda baiana Olodum. Eu, bravo? No, por qu? Acho que fui um pouco agressiva com voc na porta

    da escola. Me desculpe. Prefiro que voc se lembre de ontem. Quando eu estava saindo de seu quarto, fiquei com muita vontade de te dar aquele beijo.

    Bateria de escola de samba era pouco. O corao de Rodrigo estava prestes a explodir. Ele no conseguia dizer nada.

    Sei que no devia falar isso pelo telefone, mas gosto muito de voc continuou Luza. Voc tem sido muito carinhoso comigo e eu fiquei com vontade de demonstrar isso.

    Rodrigo continuava mudo. Ei, voc ainda est a? brincou ela. Acho que sim. Espere um pouco. Preciso me beliscar

    para ver se no estou sonhando. Deixa de ser bobo, Rodrigo. Pensa que me engana?

    Vai dizer que voc nunca beijou outra menina? Uma vez, numa festa... No, no. No quero saber. Vou ficar morrendo de

    cimes!

  • Ser que ele ouvira direito? Luza disse que estava com

    cimes dele. Muita gente diz que cime coisa de gente insegura. Outra ala, no entanto, garante que excesso de amor. Rodrigo preferia a segunda hiptese. Ele tinha um cime enorme de Luza. No gostava de v-la conversando com outros garotos no recreio.

    "E se a Luza se interessar por um deles e no quiser mais saber de mim?", era uma das perguntas que martelavam a cabea de Rodrigo. "Ou se ela se encantar pela riqueza de Arnaldo e pelos presentes caros que ele poderia lhe oferecer?"

    Ah, ento era insegurana, certo? Algum mais experiente diria se tratar de um pensamento de quem ainda no descobriu todos os segredos do corao. De qualquer modo, Rodrigo achou que era hora de desconversar:

    Como esto as coisas a, na sua casa? Minha me j est um pouco mais conformada.

    preciso dar tempo ao tempo. Hoje, vou dormir pela primeira vez na nova casa de meu pai. Ele montou um quarto para mim. Eu no vi nada ainda. Ele disse que ser uma surpresa.

    E voc, como est se sentindo? perguntou Rodrigo.

    uma sensao diferente. Ele me disse que vai preparar o jantar... O engraado que, em casa, meu pai nunca cozinhou. Ele est fazendo descobertas nessa nova vida. Isso bom.

    Descobrir coisas muito bom mesmo concordou Rodrigo, relembrando o beijo de Luza.

    * * *

    Os quatro colegas vinham fazendo reunies dirias

    havia uma semana e meia, desde que tudo acontecera. Para no levantar suspeitas, a direo da escola resolvera que as aulas continuariam normalmente. Disseram que Laurentino fora visitar um parente doente, que Cssia tinha ganhado uma bolsa de estudo e viajado para fazer um curso, e que o professor Tom tirara uma licena para se tratar de uma crise

  • de reumatismo. Para o lugar deles, o diretor contratou professores substitutos.

    Achei, achei! Hugo chegou para o encontro com a mo na bochecha direita. Acabei de chegar de um lugar em que o sujeito deve ter usado a nossa mquina para ficar com a personalidade de Tiradentes. Ele arrancou um dente meu sem mais nem menos.

    De onde voc veio? quis saber Rodrigo, entusiasmado com a possibilidade de conseguir a primeira pista.

    Do consultrio do dentista! Antes que Hugo fosse linchado por todos os seus

    amigos, Fef fez o barulho de um estalo com o dedo mdio e o polegar:

    O que o Hugo disse agora acabou de me abrir os olhos. Eu posso estar enganado, mas acho que eu sei onde devemos procurar!

  • 26. A paixo no s para os jovens

    Antes de fechar a porta, Agripina fez um ltimo aceno para Nero. Depois, deu um enorme suspiro e trancou a porta. Encostou-se na parede e ficou lembrando de detalhes da noite. Ela mesma vivia repetindo que no se faziam mais homens como antigamente. Mas aquele era um homem como antigamente. Gentil, cavalheiro, encantador. Agripina tirou os sapatos de salto e subiu as escadas com eles na mo.

  • Viu pela fresta que as luzes do quarto de Rodrigo ainda estavam acesas. Deu uma batidinha leve na porta:

    Rodrigo, a mame chegou! O que voc est fazendo acordado ainda?

    Pode entrar! Ela abriu a porta. Rodrigo estava na cama, com dois

    travesseiros servindo de apoio para suas costas. Nas mos, um livro de capa verde, sobre invenes.

    No consigo pegar no sono. Ento resolvi ler um pouquinho.

    Est bem. Mas s um pouquinho. Sinto que voc anda preocupado ultimamente. Aconteceu alguma coisa?

    No, nada. que as provas j esto chegando. S isso. Ah, e como foi o jantar?

    Foi bom. Voc est com uma cara muito feliz. No me diga

    que est apaixonada? Que isso? No, no. apenas um novo amigo. Boa

    noite. Ao entrar no quarto, Agripina tirou o vestido e comeou

    a se olhar no espelho da penteadeira. Via ainda uma mulher vistosa, bonita. Pensamentos comearam a passar em sua mente como se ela estivesse conversando com aquela imagem refletida. Que mal h em amar de novo? Quem disse que a paixo s para os jovens? Seu corao parecia dizer que no.

    No caminho de volta para sua casa, Nero continuava escutando a frase que no parava de martelar a cabea:

    "Nero matou a sua prpria me, Agripina".

  • 27. Os trs patetas

    Eurpedes chegou ao esconderijo do Escorpio com uma pasta cheia de livros. O Secador do Tempo estava no centro da sala, coberto por um lenol todo amarelado e vigiado pelos dois brutamontes.

    Consegui! A biblioteca municipal tinha os livros de que eu precisava. J tenho fotos dos maiores criminosos de todos os tempos.

    Muito bem! T com pressa bronqueou Escorpio. Quando vamos comear com isso?

    Agora mesmo. Eu j fiz os slides. Para no perdermos tempo, que tal vocs trs sentarem juntos na mquina?

    Os trs??? estranhou Caixa-de-Ferramentas. Impossvel! Eu no vou sentar no colo de ningum

    j foi dizendo Chave-de-Brao. Tenho medo que a energia do secador esteja fraca

    explicou Eurpedes. Precisamos encontrar um jeito de vocs trs entrarem embaixo do secador ao mesmo tempo.

    Voc pensa que eu sou trouxa, ? interrompeu Escorpio. Se esse negcio pifar com a gente a dentro, voc vai escapar. Nada disso. Primeiro eles dois. Depois eu.

    Chave-de-Brao e Caixa-de-Ferramentas ficaram espremidos em frente ao secador. Com muita dificuldade, os dois enfiaram as cabeas dentro do tampo. Eurpedes ligou o aparelho e os viles comearam a ver imagens.

    Quando a mquina parou, Escorpio perguntou a Caixa-de-Ferramentas:

    Quem voc agora? Larry... Larry James, o maior matador do Velho Oeste

    disse Eurpedes. E voc, Chave-de-Brao?

  • Curly... Curly The Kid, o mais temido assaltante de bancos

    da histria dos Estados Unidos completou Eurpedes. Genial! Genial! vibrou Escorpio. a minha

    vez! O que voc reservou para mim? O maior vilo de todos: Moe Killer! respondeu

    Eurpedes. Escorpio tomou seu lugar no secador e, ansioso,

    mandou que Eurpedes o ligasse logo. A ordem foi cumprida. Em trs minutos, o trabalho estava terminado.

    A esto vocs: Moe, Larry e Curly, os Trs Patetas gargalhou Eurpedes. Otrios! Caram direitinho no meu plano. Vocs acham que eu iria perder essa chance de ficar milionrio? Vou vender essa mquina para bandidos de verdade. Vocs so ladres de galinha, nem imaginam o poder dessa coisa.

    Eurpedes aproveitou que os trs estavam puxando o cabelo, dando socos na cabea, enfiando o dedo nos olhos um do outro para tranc-los num quarto.

    Agora vou atrs do Cara-de-Fuinha. Preciso encontr-lo antes que ele faa alguma bobagem e estrague o meu plano. Ainda bem que eu sei onde ele est. Nada como ser um homem bem-relacionado e cheio de informantes.

  • 28. "Quero ser sua mulher!"

    Clepatra saiu do banheiro e foi ao encontro de Jlio Csar, na mesa. Nunca tinha entrado num lugar daqueles. Se ela reparou direito, o luminoso da entrada dizia "Boate Fara's". As paredes tinham imitaes de hierglifos por toda a parte. Ela tinha pedido um drinque muito esquisito, batizado no cardpio de "Enigma da Esfinge". Enigma porque, segundo o garom, a receita era um segredo da casa.

    Que noite fantstica! disse Jlio Csar. Sim, est sendo uma noite muito agradvel

    concordou ela. Posso te fazer uma pergunta? Claro. Agora h pouco no restaurante, Cleozinha, voc me

    falou de um tal de Nilo. Voc j foi casada? Voc no entendeu direito. Eu disse que, na minha

    terra, sou chamada de "Rainha do Nilo". o nome do principal rio do Egito.

    Ah, bom! Meu sangue da gua do Nilo. Por isso meus

    cabelos so to ondulados... Jlio Csar sorriu. Clepatra continuou falando: Mas, j que voc perguntou, preciso contar que fui

    casada com meus dois irmos... Jlio Csar levou um susto: H? O que voc disse? um costume egpcio. Casei com meu irmo

    Ptolomeu XIII quando ele tinha 18 anos. Quando ele morreu, quatro anos depois, eu me casei com Ptolomeu XIV, de 12 anos. Antes que voc pense bobagem: no havia relacionamento sexual nesses casamentos.

    Jlio Csar estava cada vez mais atnito com as histrias que Clepatra lhe contava. Quando colocou sua foto na agncia de casamentos, ele procurava apenas mulheres

  • para ajud-lo a espalhar notas falsas pela cidade, sem que soubessem. Ele as convidava para bares, restaurantes, lojas. Comprava jias, roupas, sapatos. Muitas garotas se apaixonavam com tanto mimo e... ento, ele desaparecia.

    Poxa, a vida de vocs no Egito bem diferente da nossa. Casar com um irmo de 12 anos! Qual a inteno disso?

    Se voc a princesa mais velha, quem desejar assumir o poder deve se casar com voc, para adquirir o direito de governar. Por isso, voc pode ter que se casar com seu irmo.

    Rainha? No Egito? Essa mulher deve ser muito rica, comeou a imaginar Jlio Csar. Sua mente passou a maquinar um grande golpe. Para que ficar correndo riscos a todo instante com aquelas notas falsas? Era o momento de aplicar o golpe do ba naquela mulher. Mas como ele faria para pedi-la em casamento sem que ela desconfiasse de suas pssimas intenes?

    Eu quero ser sua mulher, Jlio Csar! Clepatra disparou, enquanto bebia mais um pouco de seu drinque azulado.

    O qu? Jlio Csar fingiu no ter ouvido para que ela repetisse.

    Quero ser sua mulher!

  • 29. O sanduche gigante

    Fef descobriu que o tal Marco Polo havia sido demitido da cantina. Ele se recusava a atender qualquer fregus que no pedisse macarro e sorvete. Um gerente lhe informou seu novo emprego. Agora ele trabalhava numa lanchonete. Quando se aproximava do lugar, Fef percebeu que Eurpedes entrava. Disfarou e se escondeu atrs de um poste. Depois, deu uma espiada e viu o ex-chefe do almoxarifado conversando com o prprio Marco Polo. Correu at um orelho e ligou para a casa de Rodrigo.

    Al, Rodrigo. o Fef. Descobri onde o Marco Polo est