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81 Educação, Batatais, v. 8, n. 2, p. 81-96, jan./jun. 2018 Diagnóstico ambiental do córrego Wenzel na cidade de Rio Claro, São Paulo, Brasil Carolina DORANTI-TIRITAN 1 Marco Antônio Gomes SOUTO 2 Resumo: O presente trabalho teve como objetivo fazer um levantamento dos principais problemas ambientais numa região de Área de Preservação Permanente, localizada na cidade de Rio Claro, estado de São Paulo. Trata-se do córrego Wenzel, afluente do córrego da Servidão, sub-bacia da Bacia do Rio Corumbataí. A expansão urbana acelerada trouxe uma série de consequências para o córrego e também para a população. Os principais problemas são as canalizações irregulares, o acúmulo de lixo na cabeceira e o despejo do esgoto doméstico diretamente do corpo d’água. Há evidencias de tentativas do Poder Público de recuperar a mata ciliar em vários pontos, e também de remoção do entulho na nascente, porém é claro que não há conscientização da população, que torna a jogar o lixo assim que a prefeitura o retira. Assim, conclui-se que há necessidade de participação da comunidade e do poder público na recuperação do córrego, visto que as maiores consequências dessa falta de cuidado com a APP são as enchentes e o mau cheiro, que causam transtornos a toda a população. Palavras-chave: Diagnóstico Ambiental. Córrego Wenzel. Área De Preservação Pemanente. 1 Carolina Doranti-Tiritan. Doutora e mestra em Geologia Regional pela Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (UNESP). Especialista em Gestão Ambiental pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Geografia Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (UNESP). E-mail: <[email protected]>. 2 Marco Antônio Gomes Souto. Mestre em Ecologia e Conservação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Especialista em Sistemas de Gestão Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Graduado em Ciências Biológicas pela mesma instituição. Docente do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.

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Diagnóstico ambiental do córrego Wenzel na cidade de Rio Claro, São Paulo, Brasil

Carolina DORANTI-TIRITAN1

Marco Antônio Gomes SOUTO2

Resumo: O presente trabalho teve como objetivo fazer um levantamento dos principais problemas ambientais numa região de Área de Preservação Permanente, localizada na cidade de Rio Claro, estado de São Paulo. Trata-se do córrego Wenzel, afluente do córrego da Servidão, sub-bacia da Bacia do Rio Corumbataí. A expansão urbana acelerada trouxe uma série de consequências para o córrego e também para a população. Os principais problemas são as canalizações irregulares, o acúmulo de lixo na cabeceira e o despejo do esgoto doméstico diretamente do corpo d’água. Há evidencias de tentativas do Poder Público de recuperar a mata ciliar em vários pontos, e também de remoção do entulho na nascente, porém é claro que não há conscientização da população, que torna a jogar o lixo assim que a prefeitura o retira. Assim, conclui-se que há necessidade de participação da comunidade e do poder público na recuperação do córrego, visto que as maiores consequências dessa falta de cuidado com a APP são as enchentes e o mau cheiro, que causam transtornos a toda a população.

Palavras-chave: Diagnóstico Ambiental. Córrego Wenzel. Área De Preservação Pemanente.

1 Carolina Doranti-Tiritan. Doutora e mestra em Geologia Regional pela Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (UNESP). Especialista em Gestão Ambiental pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Geografia Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (UNESP). E-mail: <[email protected]>.2 Marco Antônio Gomes Souto. Mestre em Ecologia e Conservação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Especialista em Sistemas de Gestão Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Graduado em Ciências Biológicas pela mesma instituição. Docente do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.

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Environmental report from the Wenzel stream in Rio Claro city, São Paulo, Brazil

Carolina DORANTI-TIRITANMarco Antônio Gomes SOUTO

Abstract: The present work had as objective to reseach the main environmental problems in a region of Permanent Preservation Area located in the city of Rio Claro, state of São Paulo. It is the Wenzel Stream, tributary of the Stream of the Servidão, sub-basin of the Corumbataí River Basin. The accelerated urban expansion brought a series of consequences for the stream and for the population. The main problems are the irregular pipelines, the accumulation of garbage at the head and the dumping of domestic sewage directly from the body of water. There is evidence of attempts by the Government to recover the riparian forest at various points, and to remove the rubble at the source, but it is clear that there is no awareness of the population that throws away the garbage as soon as the municipality removes it. Thus, it is concluded that there is a need for community and public authorities to participate in the recovery of the stream since the greatest consequence of this lack of care with APP is the floods and unpleasant smell that cause disruption to the entire population.

Keywords: Environmental Diagnosis. Wenzel Stream. Permanent Preservation Area.

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1. INTRODUÇÃO

Segundo Silveira (2009), a bacia hidrográfica pode ser con-siderada um sistema físico, em que a entrada é o volume de água precipitado e a saída é o volume de água escoado pelo exutório. Esse sistema hidrológico possui o papel de transformar chuva em vazão, ou seja, transformar o volume de água concentrada no tempo (precipitação) em saída de água distribuída no tempo (escoamen-to). Sendo assim, áreas de bacia hidrográficas que estão localizadas dentro de áreas urbanas, ou seja, aquelas de que expansão urbana já tomou conta, devem ter cuidados especiais.

Uma das formas de monitoramento dessas bacias é o zone-amento ambiental. Ele ressalta a preocupação ambiental tanto no diagnóstico como na identificação, no mapa de zoneamento, das áreas de preservação permanente (APPs) ao longo dos cursos d’água correntes e dormentes, como determina o Código Flores-tal – questão simples, mas ainda não consensual na sociedade. Sua implantação apresenta limitações. Por exemplo, o zoneamento não foi instrumento legal eficaz para reformular os loteamentos aprova-dos que tinham áreas/quadras (lotes residenciais, circulação e áreas verdes e institucionais) nas APPs. Dependendo da administração municipal e das pressões imobiliárias, as APPS são preservadas do parcelamento do solo. Algumas vezes, as próprias administrações não respeitam o zoneamento (CARVALHO; BRAGA, 2008), como ocorre com o córrego Wenzel.

O córrego Wenzel, localizado no município de Rio Claro, é um dos afluentes do Córrego da Servidão, que, por sua vez, é uma das sub-bacias do rio Corumbataí. Segundo o Plano Diretor do mu-nicípio de Rio Claro, a bacia em estudo localiza-se na unidade de planejamento central, estando totalmente inserida na área urbana do município, cuja ocupação predominante é residencial, havendo resíduos de vegetação no entorno do córrego Wenzel.

O rio Corumbataí, é afluente do rio Piracicaba, uma das dre-nagens que compõem a Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHI) 5, referente às bacias dos rios Piracicaba, Capi-vari e Jundiaí.

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Regionalmente a bacia do córrego Wenzel está inserida no contexto da Formação Rio Claro, que possui idade Mesozoica, sendo constituída de arenitos arcoseanos mal consolidados e mal classificados, arenitos conglomeráticos e argilitos dispostos em ní-veis topográficos entalhados por superfícies de erosão. A Formação Rio Claro é interpretada como tendo sido depositada em condições continentais fluviais em clima semiárido (IPT, 1981). Essa litologia favorece as bacias de drenagem nessa região, que é denominada geomorfologicamente de Depressão Periférica que em termos de características gerais de relevo, é recoberta por uma densa rede de drenagem, com tendência para a direção noroeste em direção ao eixo da bacia do Rio Paraná (ALMEIDA, 1964).

Estudos efetuados na região, ou seja, na bacia do Córrego da Servidão, mostram que a expansão urbana da cidade de Rio Claro tem feito com que haja uma expansão da impermeabilização, au-mentando consideravelmente os eventos de inundação nos últimos anos. Assim, apesar da classificação hidrológica dos solos e da bai-xa probabilidade natural de concentração de escoamento, refleti-da pelo baixo índice de circularidade, a topografia plana, quando submetida à impermeabilização, dificulta o escoamento das águas, criando situações de inundação (MORAES et al., 2012).

Essas características servem para a bacia do córrego Wen-zel, que, por sua vez, apresenta um perímetro de aproximadamente 7,1 km, abrangendo uma superfície aproximada de 2,59 km2, sendo mais de 65% de sua área total urbanizada (RIO CLARO, 2006). O córrego, que drena a microbacia da lagoa do Wenzel, nasce no Jardim Wenzel; a partir daí, passa pelos bairros Jardim São Paulo II, Jardim São Paulo, Cidade Claret e Jardim Mirassol; segue até a sua confluência com o córrego da Servidão pela margem direita junto ao Terminal Rodoviário Municipal, desenvolvendo elevações na cota 625 m nas cabeceiras até a cota 588 m na foz, totalizan-do 2,4 km de extensão, sendo que, em média, 0,4 km do córrego encontra-se na forma de galerias subterrâneas e, do ponto em que o córrego tem seu curso a céu aberto até ao local em que desembo-ca no córrego da Servidão, existem cerca de 2 km (MONTEIRO; VIADANA, 2009).

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De acordo com Monteiro e Viadana (2009), nos cruzamentos com as ruas e avenidas, onde existem galerias para que o córrego mantenha o curso, o leito do córrego Wenzel é alargado e apro-fundado em consequência de obras, não sendo uma característica original do curso d’água. A nascente do córrego caracterizava-se pelo afloramento do lençol freático, no qual, durante os meses de chuva, havia um aumento da vazão em virtude do aumento do ní-vel de base do lençol freático; já no período de estiagem, a lagoa praticamente secava, o que chamamos de lagoa intermitente, po-pularmente conhecida como “lagoa seca”. A lagoa do Wenzel, em detrimento da expansão urbana desordenada e da expansão de uma indústria cerâmica que se instalou à sua margem, teve cerca de 90% de sua área aterrada e drenada, o que trouxe inúmeras consequên-cias no balanço hidráulico da microbacia (MONTEIRO; VIADA-NA, 2009).

Monteiro e Viadana (2009) mostram, em seu trabalho, que os principais problemas encontrados na bacia eram: aterramento da nascente do córrego que drena a bacia; falta da cobertura vegetal original na nascente do córrego; rejeitos de atividade industrial de-positados nas proximidades da nascente; construção de um campo de futebol na área da nascente; esgoto despejado diretamente no leito do córrego, desde a nascente até a foz; deposição de entu-lho na região da cabeceira; lixo residencial jogado por moradores nas margens do córrego; inexistência de mata ciliar no alto curso; cultivos diversos em APP; inserção de espécies ícticas no córrego; moradias irregulares; impermeabilização do solo da bacia

Considerando o exposto, o trabalho a seguir pretende apre-sentar o atual estado da arte com relação a essa bacia de drenagem, mostrando quais providências foram ou não tomadas, e quais cami-nhos devem ser seguidos para que haja um controle e um monito-ramento dessa bacia de drenagem tão importante para o município.

2. METODOLOGIA

A metodologia utilizada no trabalho se constituiu da leitura do material bibliográfico encontrado, e posteriormente da observa-

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ção de campo para efetuar os registros dos atuais impactos desde sua nascente até sua foz. Foram também elaborados mapas, mos-trando os pontos mais críticos e os mais preservados. Posteriormen-te, os dados obtidos foram comparados aos dados que constam na literatura, sendo feita uma correlação e discussão, para que sejam propostas possíveis soluções.

A observação de campo foi realizada em duas etapas:• Primeira: toda a drenagem foi analisada, desde a foz até a

sua nascente, sendo alguns trechos percorridos a pé e ou-tros trechos, percorridos de carro. O dia estava claro, sem previsão de nenhuma chuva. Foram detalhados os aspec-tos fisiográficos e socioeconômicos. Foram tiradas diver-sas fotografias de diversos pontos da drenagem.

• Segunda: identificação e análise da degradação ambiental – distribuição espacial da degradação ambiental, aplicação da legislação ambiental, zoneamento ambiental.

Localização

O córrego Wenzel está localizado no município de Rio Claro, estado de São Paulo. É afluente direto do córrego da Servidão, sen-do ambos sub-bacias do Rio Corumbataí.

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Figura 1. Localização do Córrego Wenzel, na cidade de Rio Claro--SP.

Fonte: SRTM (2017).

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Ao analisar o córrego Wenzel, foi possível constatar que os vários problemas detectados por Monteiro e Viadana, em 2009, continuam os mesmos, ou se agravaram. Há apenas algumas exce-ções, como a presença da mata ciliar, que se encontra preservada em vários trechos.

A maior problemática atualmente é o aterramento das nascen-tes, que são os dois sumidouros ou lagoas que já quase nem existem mais. As nascentes são elementos muito importantes na dinâmica hidrológica. Elas são nada mais que os focos da passagem da água subterrânea para a superfície e responsáveis pela formação dos ca-nais fluviais (FELIPPE; MAGALHÃES-JUNIOR, 2009).

Em termos legais, estabelece-se que “nascente ou olho d’água é o local onde aflora naturalmente, mesmo que de forma intermi-tente, a água subterrânea” (BRASIL, 2002, n.p.). Essa definição é o ponto de partida para a gestão ambiental, posto que, a partir dela,

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são definidas as áreas de preservação permanente – APP (FELI-PPE; MAGALHÃES JUNIOR, 2009). A Resolução CONAMA nº 303 regulamenta essa condição:

Art. 3º Constitui Área de Preservação Permanente a área situada:

[...]II – ao redor de nascente ou olho d’água, ainda que intermitente, com raio mínimo de cinqüenta metros de tal forma que proteja, em cada caso, a bacia hidrográfica contribuinte (BRASIL, 2002, [n.p.]).

A existência de uma lei que preserva as regiões de manan-ciais, especialmente as nascentes, já seria o suficiente, no entanto o que se vê na realidade é um desrespeito generalizado à legislação ambiental brasileira, que reflete na degradação das nascentes. Além do não cumprimento do raio mínimo de preservação, a bacia hidro-gráfica contribuinte é completamente ignorada. Se, por um lado, a aplicabilidade da legislação é questionável, por outro, também o é seu cumprimento (FELIPPE; MAGALHÃES JUNIOR, 2009)

Nos últimos anos, as APPs têm sido simplesmente ignoradas na maioria dos núcleos urbanos, realidade que se associa a gra-ves prejuízos ambientais, como o assoreamento dos corpos d’água (ARAÚJO, 2002).

Como pode ser visto na figura 2, tem havido uma tentativa de preservação da área por meio da manutenção da área verde e da proibição da construção de qualquer tipo de obra ao redor, com ex-ceção das existentes, como algumas residências, a cerâmica (antiga cerâmica Wenzel) e o pequeno campo de futebol (Juventude).

A reforma do campo, como pode ser visualizada na Figura 2, foi realizada recentemente, e parece ter sido feita de maneira adequada, sem prejudicar ainda mais a nascente. Essa alternativa para a conservação da área foi interessante, visto que acaba por revitalizá-la, fazendo com que a população do bairro passe a se identificar com a área, passando a não mais jogar lixo e entulho na região. Além disso, vai evitar a expansão de construções urbanas que impermeabilizam o solo. No entanto, vale ressaltar que não é o ideal.

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Figura 2. Anexo do campo do Juventude que ajudou a revitalizar a região.

Fonte: acervo dos autores (2012).

Na nascente principal do córrego é possível ver o principal problema da bacia, o aterramento da nascente por entulhos e a reti-rada da cobertura vegetal natural. É possível visualizar com clareza esse problema nas Figura 3. Esse é um dos problemas que mais se acentuaram desde 2009, sendo que as caçambas de entulho ficam visivelmente expostas na região, e mesmo que a prefeitura limpe o terreno, nada é feito para evitar novos lançamentos de entulhos.

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Figura 3. Aterramento da nascente do córrego que drena a bacia sob outra perspectiva.

Fonte: acervo dos autores (2012).

Apesar desse entulhamento da nascente, é possível verificar uma tentativa de recuperação da mata ciliar ao longo do alto curso, como pode ser visto na Figura 4. Entende-se por matas ciliares as formações que ocorrem ao longo de cursos d’água, com drenagem bem definida ou mesmo difusa (RODRIGUES; NAVE, 2001). As-sim, as condições locais de topografia, clima, solo e regime hídricos dos rios e cursos d’água vão determinar os mosaicos vegetacionais de cada mata ciliar. Sua importância é fundamental, tanto do ponto de vista hidrológico como ecológico.

De acordo com Van der Berg e Oliveira Filho (1999), as ma-tas ciliares são as responsáveis pela manutenção da qualidade da água, estabilidade do solo das áreas marginais e regularização do regime hídrico por meio da sua influência no lençol freático. Fun-cionam como filtro do escoamento superficial, protegem os cursos d’água de adubos e defensivos agrícolas, e fornecem alimento para a fauna aquática e silvestre ribeirinha. Essa recuperação da mata

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ciliar pode ajudar na recomposição do rio, mas não é o suficiente, caso o restante continue na mesma situação.

Figura 4. Tentativa de reflorestamento da mata ciliar no alto curso.

Foto: acervo dos autores (2012).

Observa-se, ainda, que, nos cruzamentos do córrego por ruas e avenidas, a canalização é malfeita, sendo que os dutos e as mani-lhas ficam acima do seu leito, o que reduz a velocidade das águas no período de chuvas, provocando uma série de alagamentos, es-pecialmente nas proximidades do médio curso, quando o córrego cruza uma grande avenida. Nos períodos de estiagem, ocorre o barramento do fluxo e o acúmulo de lixo, como pode ser visto na Figura 5.

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Figura 5. Acúmulo de dejetos no leito do córrego devido a enge-nharia malfeita de dutos e manilhas nos cruzamentos entre ruas e avenidas.

Fonte: acervo dos autores (2012).

Fica bastante claro e evidente que a qualidade da água no cór-rego é precária, visto que o acúmulo de lixo e o esgoto doméstico são despejados sem nenhum tipo de tratamento desde a nascente até a sua foz, no córrego da Servidão. O volume de água no baixo curso é um pouco maior, pois acaba recebendo mais água superficial e subterrânea nesse trecho.

Esses problemas são causados principalmente pela imperme-abilização do solo, que acelera o escoamento por meio da cons-trução dos condutos e canais, fazendo com que a quantidade de água que chega ao mesmo tempo no sistema de drenagem aumente, produzindo as inundações (TUCCI; BERTONI, 2003). Essas inun-dações são muito comuns ao longo do córrego Wenzel, mas espe-cialmente frequentes na região da foz.

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Esse ponto da drenagem é bastante crítico na época das cheias, pois o volume de água é muito grande, bem como a imper-meabilidade nessa região, fazendo com que essa região da foz seja um grande ponto de alagamento e de transtorno para a população, especialmente porque se trata de uma das saídas da cidade para a rodovia Washington Luiz (SP-310) e onde está também localizado o Terminal Rodoviário da cidade.

Assim, de acordo com Moraes (2011), atualmente a questão dos sistemas de drenagem é entendida como parte integrada do am-biente urbano, sendo agregada com os elementos que o compõem, como os aspectos legais, sociais e políticos. Nesse contexto, diver-sos autores, como Collischonn (2001), Tucci (2009), Porto et al. (2009) e Canholi (2005), destacam as medidas não convencionais como soluções diferentes do conceito tradicional de drenagem ur-bana (MORAES, 2011).

Essas medidas, associadas à adequação e à otimização do sistema de drenagem, buscam incrementar o processo de infiltra-ção, reter o escoamento em reservatórios, retardar o fluxo dos rios e reduzir os picos de vazão (MORAES, 2011). A autora destaca principalmente a geração de superfícies de infiltração pela implan-tação de jardins em edifícios, calçadas e quintais e a construção de pavimentos porosos e valetas de infiltração, complementadas por trincheiras de percolação em canteiros de ruas e estacionamentos.

A partir das observações feitas, é possível perceber que mui-tos dos problemas poderiam ser amenizados ou solucionados se houvesse uma conscientização da população e, principalmente, do Poder Público. O zoneamento ambiental deve atentar para os problemas de falta de estrutura nas regiões periféricas da cidade, principalmente próximo a áreas que deveriam ser preservadas. O poder público deve tomar as atitudes mais adequadas na solução dos problemas, fazer estudos prévios com especialistas na questão.

Assim é possível afirmar que:A ação comunitária no cuidado com o meio ambiente deve ser favorecida. As comunidades e grupos locais constituem os melhores canais para as pessoas expressarem suas pre-ocupações e tomarem atitudes relativas à criação de bases

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sólidas para sociedades sustentáveis. No entanto, essas co-munidades precisam de autoridade, poder e conhecimento para agir. As pessoas que se organizam para trabalhar pela sustentabilidade em suas próprias comunidades podem constituir uma força efetiva, seja a sua comunidade rica ou pobre, urbana, suburbana ou rural (MILARÉ, 2001, p. 45).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A região de Rio Claro cresceu consideravelmente nos últimos anos e é evidente que a ocupação da área da bacia do córrego Wen-zel vem prejudicando consideravelmente a qualidade de sua água. Apesar de não haver muitas indústrias na região da bacia, o lixo e o esgoto doméstico têm sido o principal problema. Mesmo que haja preocupação da prefeitura com a preservação da mata ciliar em grande parte da bacia, observa-se que há necessidade da remoção do lixo e do entulho na área da nascente e também de reestruturação das canalizações onde há o cruzamento com ruas e avenidas. Essas medidas irão evitar alagamentos, processos erosivos e, principal-mente, o entulho de lixo e sedimentos.

Sendo assim, é necessário que haja uma política de plane-jamento e zoneamento ambiental que venha contribuir com a re-vitalização da região e a valorização do espaço urbano. Há ainda necessidade de uma política de educação ambiental e orientação da população para que evite o despejo de lixo e entulho na área da bacia, pois observa-se que esse é um problema grande não só na região estudada, mas na cidade como um todo, pois infelizmente há outros pontos críticos que poderiam ser melhorados somente com a conscientização da população.

REFERÊNCIAS

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CARVALHO, P. F.; BRAGA, R. Zoneamento ambiental urbano por micro-bacias hidrográficas: estudo de viabilidade em cidade média no estado de São Saulo – BR. Grupo de Pesquisa Análise e Planejamento Territorial – GPAPT, 2008.

COLLISCHONN, W. Simulação hidrológica de grandes bacias. 2001. 194f. Tese (Doutorado em Engenharia de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre, 2001. Disponível em: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream_id/3231/>. Acesso em: 26 set. 2017.

FELIPPE, M. F.; MAGALHÃES JUNIOR, A. P. Consequências da ocupação urbana na dinâmica das nascentes em Belo Horizonte. In: ENCONTRO SOBRE MIGRAÇÕES, 6, 2009, Belo Horizonte. Anais. Belo Horizonte, 2009.

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