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Fichamento CORAZZA, Sandra Mara; TADEU, Tomaz. (2003) "Manifesto por um pensamento da diferença em educação". In: _________. Composições. Belo Horizonte: Autêntica, p.9-17. “Desconfiar de qualquer nostalgia por uma origem perdida: subjetividades inteiriças, consciências lúcidas, saberes imaculados, comunidades solidárias, sociedades integradas. Não existe nenhuma origem perdida a ser recuperada, nenhum passado mítico ao qual regressar, nenhum tempo feliz a ser revivido. Resistir a qualquer anseio por um estado de graça antes da queda - no capitalismo, no patriarcado, no Nome-do-Pai. Renunciar a qualquer ilusão de regresso a um estado de idílica inocência, de edênica virtude, de universal comunhão. Nenhuma fantasia de restauração de uma união rompida - com o cosmo, com a natureza, com o Eu, com o Outro” pag.1. “A história não é nenhuma procissão posta em uma trajetória de evolução, progresso e aperfeiçoamento. Toda continuidade é apenas o efeito de uma interpretação após o fato. O que temos, em vez disso, são falhas, quebras, hesitações, movimentos inesperados, arranques e paradas abruptas. Não uma lógica, nem uma teleologia, mas o movimento errático do acaso.” Pag.1. “O sujeito não existe. O sujeito é um efeito da linguagem. O sujeito é um efeito do discurso. O sujeito é um efeito do texto. O sujeito é um efeito da gramática. O sujeito é o efeito de uma ilusão. O sujeito é o efeito de uma interpelação. O sujeito é o efeito da enunciação. O sujeito é o efeito dos processos de subjetivação. O sujeito é o efeito de um endereçamento. O sujeito é o efeito de um posicionamento. O sujeito é efeito da história. O sujeito é efeito do différance. O sujeito é uma derivada. O sujeito é uma ficção. O sujeito é um efeito” pag.2. “Dissolver o mito da interioridade. A interioridade é a expressão topológica, geográfica, do sujeito autônomo e soberano. O pressuposto da interioridade está na base do sujeito cartesiano. Nenhuma das pedagogias modernas - das humanistas e tradicionais às construtivistas e liberais, passando pelas críticas e emancipatórias - subsistiria sem a noção de

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Fichamento

CORAZZA, Sandra Mara; TADEU, Tomaz. (2003) "Manifesto por um pensamento da diferena em educao". In: _________. Composies. Belo Horizonte: Autntica, p.9-17.Desconfiar de qualquer nostalgia por uma origem perdida: subjetividades inteirias, conscincias lcidas, saberes imaculados, comunidades solidrias, sociedades integradas. No existe nenhuma origem perdida a ser recuperada, nenhum passado mtico ao qual regressar, nenhum tempo feliz a ser revivido. Resistir a qualquer anseio por um estado de graa antes da queda - no capitalismo, no patriarcado, no Nome-do-Pai. Renunciar a qualquer iluso de regresso a um estado de idlica inocncia, de ednica virtude, de universal comunho. Nenhuma fantasia de restaurao de uma unio rompida - com o cosmo, com a natureza, com o Eu, com o Outro pag.1.

A histria no nenhuma procisso posta em uma trajetria de evoluo, progresso e aperfeioamento. Toda continuidade apenas o efeito de uma interpretao aps o fato. O que temos, em vez disso, so falhas, quebras, hesitaes, movimentos inesperados, arranques e paradas abruptas. No uma lgica, nem uma teleologia, mas o movimento errtico do acaso. Pag.1.

O sujeito no existe. O sujeito um efeito da linguagem. O sujeito um efeito do discurso. O sujeito um efeito do texto. O sujeito um efeito da gramtica. O sujeito o efeito de uma iluso. O sujeito o efeito de uma interpelao. O sujeito o efeito da enunciao. O sujeito o efeito dos processos de subjetivao. O sujeito o efeito de um endereamento. O sujeito o efeito de um posicionamento. O sujeito efeito da histria. O sujeito efeito do diffrance. O sujeito uma derivada. O sujeito uma fico. O sujeito um efeito pag.2.

Dissolver o mito da interioridade. A interioridade a expresso topolgica, geogrfica, do sujeito autnomo e soberano. O pressuposto da interioridade est na base do sujeito cartesiano. Nenhuma das pedagogias modernas - das humanistas e tradicionais s construtivistas e liberais, passando pelas crticas e emancipatrias - subsistiria sem a noo de interioridade. O mito da interioridade essencial aos diversos avatares do sujeito que povoam os territrios das pedagogias contemporneas: o cidado participante, a pessoa integral, o indivduo crtico. A filosofia da interioridade o correlato da metafsica da presena. A interioridade tem negcios com a conscincia, com a representao, com a intencionalidade. Privilegiar, em vez da interioridade e suas figuras, as conexes e superfcies de contato, as dobras e as flexes, os poros e as fendas, os fluxos e as trocas. Preferir, sempre, a exterioridade interioridade. Pag.2.

No conceder qualquer trgua ao humanismo, ao antropocentrismo. O corpo do Homem: mutvel, clonvel, intensificvel, desmontvel-montvel, desmembrvel-remembrvel. O deslocamento, o descentramento, o desalojamento do Homem. A diminuio ou apagamento das fronteiras e distines entre o Homem e a mquina (ciborgues), entre o Homem e o animal, entre o Homem e os seres inanimados: um ser entre outros seres e no um ser em um ambiente desfrutvel. Em seu lugar, um homem (uma mulher) sem qualidades (antropolgicas) e sem privilgios (antropocntricos). Celebrar os prazeres - e at mesmo os perigos - da confuso de fronteiras. Nenhuma tentativa de recompor um Uno cindido, fragmentado, corrompido. Estimular, em vez disso, a diviso, a multiplicao, a proliferao. Em vez da recomposio de integridades e totalidades perdidas, privilegiar as operaes de desmontagem e remontagem, de decomposio e recomposio. Pag.3.

Privilegiar a multiplicidade em vez da diversidade. Fazer proliferar o sinal de multiplicao. A diversidade esttica, um estado, estril. A multiplicidade ativa, um fluxo, produtiva. A multiplicidade uma mquina de produzir diferenas - diferenas que so irredutveis identidade. A diversidade limita-se ao existente. A multiplicidade estende e multiplica, prolifera, dissemina. Pag.4.

Renunciar s idias de libertao, emancipao e autonomia. No existe nenhuma pedagogia emancipatria. A promessa de autonomia re-introduz, pela porta dos fundos, a fantasia de um sujeito soberano no pleno comando de seus atos. Libertar significa restaurar uma essncia que foi alienada, corrompida ou pervertida. Libertar ou reprimir: a eterna dialtica que se resolve na re-instaurao do mesmo - a conscincia plena. A expresso "pedagogia emancipatria" um oxmoro: "voc deve se emancipar". essa incompatibilidade intrnseca entre, de um lado, as noes de autonomia, libertao e emancipao e, de outro, a idia mesma de pedagogia, que corri por dentro o edifcio do projeto educativo iluminista. Pag.4.

Dar as costas s epistemologias da verdade e do verdadeiro. A verdade no uma coisa a ser descoberta. A verdade no uma questo de identidade com o "real" ou com a natureza. Fundar, em vez disso, uma epistemologia do verdico: o que conta como verdade ou como verdadeiro? Como se define o que verdadeiro, quem o define e sob que condies? Centrar-se no na verdade, mas nos seus efeitos. Buscar no a verdade, mas as relaes de poder que possibilitam sua existncia. Destacar no as condies lgicas e empricas, mas as condies histricas e polticas de produo da verdade. Buscar descrever no a "verdade", mas os seus regimes. Pag.6.