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CAPÍTULO 1. PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. 1.1. Considerações gerais: O Direito Ambiental, como ciência autônoma, está escorado nos seus próprios princípios, que irão informar as suas normas jurídicas e vincular o legislador, os operadores do direito, como de resto toda a sociedade. Os princípios constitucionais do Direto Ambiental estão traçados no art. 225 da Carta Magna. Em face da norma constitucional, é possível enumerar alguns dos seus principais princípios como veremos a seguir. 1.2. Princípio do desenvolvimento sustentável: Estabelecido no caput do art. 225 da Constituição Federal, o princípio do desenvolvimento sustentável busca conciliar a proteção do meio ambiente com o desenvolvimento socioeconômico para a melhoria da qualidade de vida do homem. E o desenvolvimento econômico de uma nação passa necessariamente pela utilização de bens ambientais, seja como matéria prima na produção industrial (insumo), ou como destinatário dos dejetos dessa produção (poluição). O Direito Ambiental não pretende proibir pura e simplesmente o desenvolvimento econômico, e nem poderia ser diferente, na medida em que ordem econômica nacional é fundada na livre iniciativa (art. 170 da Constituição Federal). Entretanto, esse desenvolvimento deve observar alguns fatores de limitação. A livre iniciativa propagada pela Lei Maior não é aquela de outras épocas, em que vigorava o modelo de liberalismo econômico e estatal. A livre iniciativa em que se funda a ordem econômica nacional está condicionada à observação de alguns limites, tais como a valorização do trabalho (caput), a defesa do consumidor (inciso V), e o meio ambiente (inciso VI). A Constituição Federal estabelece, no seu art. 255, a obrigação de todos em defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, considerando o meio ambiente como um bem de uso comum do povo. Pretendeu com isso, o legislador constituinte, adotar o seguinte princípio: o bem ambiental pode e deve ser usado por todos, e por isso mesmo todos têm o dever de defendê-lo e preservá-lo, para que as futuras gerações também possam dele se utilizar. A Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO/92) definiu o desenvolvimento sustentável como aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades.

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CAPÍTULO 1. PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE

1988.

1.1. Considerações gerais:

O Direito Ambiental, como ciência autônoma, está escorado nos seus próprios princípios,

que irão informar as suas normas jurídicas e vincular o legislador, os operadores do direito, como

de resto toda a sociedade. Os princípios constitucionais do Direto Ambiental estão traçados no

art. 225 da Carta Magna. Em face da norma constitucional, é possível enumerar alguns dos seus

principais princípios como veremos a seguir.

1.2. Princípio do desenvolvimento sustentável:

Estabelecido no caput do art. 225 da Constituição Federal, o princípio do desenvolvimento

sustentável busca conciliar a proteção do meio ambiente com o desenvolvimento

socioeconômico para a melhoria da qualidade de vida do homem. E o desenvolvimento

econômico de uma nação passa necessariamente pela utilização de bens ambientais, seja como

matéria prima na produção industrial (insumo), ou como destinatário dos dejetos dessa produção

(poluição).

O Direito Ambiental não pretende proibir pura e simplesmente o desenvolvimento

econômico, e nem poderia ser diferente, na medida em que ordem econômica nacional é fundada

na livre iniciativa (art. 170 da Constituição Federal). Entretanto, esse desenvolvimento deve

observar alguns fatores de limitação. A livre iniciativa propagada pela Lei Maior não é aquela de

outras épocas, em que vigorava o modelo de liberalismo econômico e estatal. A livre iniciativa

em que se funda a ordem econômica nacional está condicionada à observação de alguns limites,

tais como a valorização do trabalho (caput), a defesa do consumidor (inciso V), e o meio ambiente

(inciso VI). A Constituição Federal estabelece, no seu art. 255, a obrigação de todos em defender

e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, considerando o meio

ambiente como um bem de uso comum do povo. Pretendeu com isso, o legislador constituinte,

adotar o seguinte princípio: o bem ambiental pode e deve ser usado por todos, e por isso mesmo

todos têm o dever de defendê-lo e preservá-lo, para que as futuras gerações também possam

dele se utilizar. A Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO/92) definiu

o desenvolvimento sustentável como aquele que atende às necessidades do presente sem

comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades.

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O meio ambiente não é intocável. Pelo contrário, a maioria das empresas utiliza-se de

recursos naturais como insumo na sua produção. São bens retirados da natureza, os chamados

bens ambientais. Não pretende a lei proibir que nós nos utilizemos desses bens (até porque se

trata de bem de uso comum do povo). O que se pretende, sim, é que as mesmas pessoas que

usam esses bens, criem mecanismos de preservação e recuperação do meio ambiente. O

conceito de desenvolvimento sustentável apresenta, assim, uma feição conciliatória, propondo

que pode ocorrer o progresso técnico, o desenvolvimento, dentro de parâmetros que respeitam

os limites ambientais ao mesmo tempo em que reafirma a necessidade do crescimento

econômico como condição necessária para a gestão de problemas sociais. Os recursos naturais,

os bens ambientais, são finitos. Isso significa que a sua utilização indiscriminada, sem a

preocupação com a sua preservação, irá conduzir à sua extinção. Não se pode admitir que as

atividades empresariais fiquem alheias a essa realidade. Quem se propõe a desenvolver uma

atividade econômica tem, como obrigação legal, a responsabilidade com a preservação do meio

ambiente.

1.3. Princípio do poluidor-pagador:

Encontramos as bases do princípio do poluidor-pagador no parágrafo 3º do art. 225 da

Constituição Federal. Uma vez que todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente

equilibrado (art. 225, citado, caput), as atividades e as atitudes que causam lesão ao meio

ambiente não podem ficar impunes. Por isso que aquele que polui tem o dever legal de pagar

por isso. Essa é a idéia central do princípio em comento.

A definição jurídica de “poluidor” é encontrada no art. 3°, inciso IV, da Lei n° 6.938/81:

poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou

indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental. Desta forma, toda pessoa, seja

ela física ou jurídica, que causar um dano ambiental deverá repará-lo. Devemos observar,

entretanto, que o princípio do poluidor-pagador não se traduz apenas na responsabilidade pela

reparação do dano ambiental. Ele vai mais além, contendo o princípio em comento uma natureza

primeiramente cautelar e preventiva. O princípio do poluidor-pagador importa na transferência

dos custos, normalmente suportados pela sociedade, referentes à poluição, para que seja pago

primeiramente pelo poluidor, não apenas como forma de reparação do dano, mas com a

implementação de medidas preventivas.

3.4. Princípio da prevenção:

Previsto no caput do art. 225 da Constituição, o princípio da prevenção

revela a preocupação com a segurança do meio ambiente, sua manutenção e

preservação para que as próximas gerações possam dele usufruir. Prevenção vem

de prevenir, evitar que aconteça. O princípio da prevenção determina a todos que

se preocupem com a preservação ambiental, evitando que ocorra o dano ambiental.

Trata-se de um princípio de importância impar para o Direito Ambiental, na medida

em que os danos ambientais ocorridos, na grande maioria das vezes, não têm

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reparação, são irreversíveis, de forma que se torna impossível retornar ao status

quo ante. O objetivo precípuo é evitar que o dano ocorra – que é preferível a ter

que repara-lo após a sua eclosão –, eis que o dano ambiental dificilmente é

corrigível e muitas vezes não indenizável. A prevenção busca minimizar os riscos

aos quais o meio ambiente está exposto. Como já tivemos a oportunidade de

afirmar, o Direito Ambiental deve se harmonizar com a livre iniciativa, e vice versa.

O princípio da prevenção não busca impedir as atividades econômicas e humanas.

Muito pelo contrário. O princípio da prevenção objetiva exatamente possibilitar o

desenvolvimento humano, controlando os riscos ambientais.

3.5. Princípio da participação:

Previsto no caput do art. 225 da Constituição Federal, o princípio da

participação implica no reconhecimento de que a defesa do meio ambiente incumbe

a toda a sociedade, ou seja, ao Estado e à sociedade civil organizada. Desta forma,

observa-se o dever de “uma atuação conjunta entre organizações ambientalistas,

sindicatos, indústrias, comércio, agricultura e tantos outros organismos sociais

comprometidos nessa defesa de preservação”. A idéia central é de que, se o bem

ambiental é um bem de uso comum do povo, é o povo, em todas as suas formas de

organização, que deve cuidar e decidir acerca do seu uso. Desta forma, toda a

sociedade deve estar engajada, juntamente com o Poder Público, na defesa e

preservação do meio ambiente.

MÓDULO 2. O MEIO AMBIENTE E O BEM AMBIENTAL

2.1. Meio ambiente – conceituação:

Meio ambiente é tudo aquilo que está à nossa volta. A preocupação do ser humano com

o meio ambiente é relativamente recente, ganhando espaço principalmente após a Revolução

Industrial ocorrida no final do Século XIX, quando o desenvolvimento econômico desordenado

acarretou uma maior deterioração da qualidade ambiental, revelando, ainda, a limitação dos

recursos ambientais. Tal situação acabou por despertar a consciência de diversos seguimentos

da população mundial para a necessidade da preservação ambiental. O conceito de meio

ambiente deverá englobar obrigatoriamente o homem e a natureza, com todos os seus

elementos. É que, para o homem, a natureza apresenta-se de duas formas: como fonte de

recursos econômicos e como fonte de bem-estar. Da natureza o homem tanto pode extrair

recursos e insumos necessários à produção de riquezas, como usufruir momentos de lazer.

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2.2. Meio ambiente – definição jurídica:

Juridicamente, a definição de meio ambiente encontra-se no art. 3º, inciso I, da Lei da

Política nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81):

Art. 3º. Para os fins previstos nesta lei, entende-se:

I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Com base na definição de meio ambiente acima mencionada e nas disposições

constitucionais, podemos classificar o meio ambiente, a ser protegido juridicamente, da seguinte

forma:

a) Meio ambiente natural: É constituído por solo, água, ar atmosférico, flora e fauna.

Encontramos sua previsão constitucional nos inciso I e VII do art. 225:

I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

b) Meio ambiente artificial. É o espaço urbano construído, constituído pelo conjunto de

edificações e pelos equipamentos públicos. Encontramos previsão constitucional principalmente

no art. 182, que trata da Política Urbana. No plano infraconstitucional, temos o Estatuto da Cidade

(Lei 10.257/2001).

c) Meio ambiente do trabalho. É o local onde as pessoas executam suas atividades

laborais, cujo equilíbrio baseia-se na salubridade do meio a na ausência de agentes que

comprometem a saúde dos trabalhadores. Está previsto na Constituição federal, no art. 200, VIII:

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Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:

VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

d) Meio ambiente cultural. É integrado pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico,

paisagístico, turístico de um povo. Encontramos previsão constitucional no art. 216, que trata do

Patrimônio Cultural Brasileiro.

2.3. O bem ambiental

2.3.1. Um novo tipo de bem jurídico:

A exata compreensão do Direito Ambiental passa necessariamente pela conceituação do

que seja bem ambiental. É que, com a Constituição Federal de 88, um novo tipo de bem jurídico

foi introduzido no nosso ordenamento jurídico, que veio afastar aquela tradicional dicotomia até

então existente entre bens públicos x bens privados. Esse novo tipo de bem é o bem ambiental,

previsto expressamente no art. 225 da Constituição Federal, verbis:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (g.n.).

O bem ambiental é, portanto, um novo tipo de bem jurídico, inserido no ordenamento

jurídico pela Constituição de 88, que deve ser considerado de forma autônoma, não se

confundindo com os bens públicos nem com os privados.

2.3.2. Bem de uso comum do povo:

Afirmando a Constituição Federal que o bem ambiental é de uso comum do povo e que

todos têm o direito de usá-lo, resta claro estar-se diante de um bem que não é público, muito

menos particular, eis que não se refere a uma pessoa (física ou jurídica, de direito privado ou

público) individualmente considerada, mas sim a uma coletividade de pessoas, configurando um

direito coletivo (lato sensu). Estabelecendo que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é

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um bem de uso comum do povo a que todos têm direito, o legislador constitucional traçou as

diretrizes que permitem a identificação da natureza jurídica desse direito. Ora, se o uso do bem

é garantido a todas as pessoas, não resta dúvida que estamos diante de um bem metaindividual,

que supera o indivíduo. Sua titularidade é indefinida, representada pelo pronome

indefinido todos, que dá maior amplitude à abrangência a norma jurídica, “pois, não

particularizando quem tem direito ao meio ambiente, evita que se exclua quem quer que seja”. E

ao determinar o uso comum, estabeleceu-se a natureza indivisível deste direito ao meio ambiente

equilibrado.

2.3.3. Direitos e interesses difusos:

Os direitos coletivos lato sensu, referidos na Carta Magna, ganharam definição legal

infraconstitucional com o advento da lei 8078/90, que estabeleceu em seu art. 81, parágrafo

único, inciso I o que são interesses difusos:

I – interesses ou direito difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, o transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

Assim sendo, fazendo a conexão do dispositivo constitucional em conformidade com o

disposto no art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, o bem ambiental configura um direito

difuso, metaindividual, não limitado ao interesses privados ou públicos, e não subordinado ao

direito de propriedade, não guardando “qualquer compatibilidade com institutos outros que não

estejam adstritos ao direito de usar aludido bem”. O titular do bem ambiental é a coletividade,

assim entendida como os brasileiros e estrangeiros residentes no País (CF, art. 5º, caput). Trata-

se, pois, de um direito transindividual, de natureza indivisível, cujos titulares são pessoas

indeterminadas, ligadas por uma circunstância de fato.

2.3.4. Bem essencial à sadia qualidade de vida:

Como o bem ambiental se trata de um bem essencial à sadia qualidade de vida, deveremos

enfrentá-lo à luz do que dispõem o art. 1º, III combinado com o art. 6º, ambos da Constituição

Federal. Para se ter uma vida saudável, necessária a satisfação dos fundamentos democráticos

previstos na Constituição Federal, em especial o da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III),

além de valores fundamentais mínimos como a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o

lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência

aos desamparados (art. 6º). Tais valores constituem um piso vital mínimo de direitos que devem

ser assegurados pelo Estado, para o desfrute da sadia qualidade de vida. Uma vida digna e

saudável é aquela em que se tem garantidos e efetivados os direitos componentes desse piso,

de forma que a definição jurídica de bem ambiental “está vinculada não só à tutela da vida da

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pessoa humana mas particularmente à tutela da vida da pessoa humana com dignidade,

remetendo o intérprete ao conceito doutrinário de piso vital mínimo”.

2.3.5. Bem ambiental – conclusão:

É da somatória desses dois aspectos, ser de uso comum do povo e ser essencial à sadia

qualidade de vida, que se estrutura constitucionalmente o bem ambiental criado pela Constituição

Federal de 1988. O bem ambiental, assim, constitui um terceiro tipo de bem jurídico, que não é

particular e tampouco público. É um bem de interesse difuso, de uso comum do povo e essencial

à sadia qualidade de vida da coletividade.

MÓDULO 3. DANO AMBIENTAL

3.1. Qualidade ambiental:

Qualidade ambiental pode ser conceituada como o “estado do meio ambiente

ecologicamente equilibrado que proporciona uma sadia qualidade de vida”. Desta forma, todos

têm direito a viver com qualidade ambiental, situação que se relaciona com a atividade contínua

e ininterrupta das funções essenciais do meio ambiente, adequada para as presentes e as futuras

gerações.

3.2. Degradação ambiental:

A degradação da qualidade ambiental está definida no art. 3°, II, da Lei

6.938/81: degradação da qualidade ambiental é a alteração adversa das características do meio

ambiente. Desta forma, haverá degradação da qualidade ambiental toda vez que houver

alteração adversa das características dos recursos ambientais (ar atmosférico, águas superficiais

e subterrâneas, estuários, mar, solo, subsolo, elementos da biosfera, fauna e flora – art. 3°, V,

da Lei 6.938/81). Na forma do que dispõe o decreto 97.632, de 10 de abril de 1989, que

regulamentou o art. 2°, VIII, da Lei 6938/81, “... são considerados como degradação os processos

resultantes dos danos ao meio ambiente, pelos quais se perdem ou se reduzem algumas de suas

propriedades, tais como, a qualidade ou capacidade produtiva dos recursos ambientais”.

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3.3. Poluição:

Primeiramente, é preciso deixar claro que poluição não se confunde com degradação da

qualidade ambiental. Embora ambos os termos possuam uma correspondência direta, eles

definem situações diferentes, eis que a poluição exige a atuação humana, o que não ocorre com

a degradação. A definição legal de poluição está no inciso III, do art. 3°, da Lei n° 6.938/81:

III – poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;

Poluição tem correspondência direta com a degradação da qualidade ambiental, posto

que a lei “vincula, de modo indissociável, poluição e degradação ambiental, pois, conforme visto,

salienta expressamente que a poluição resulta da degradação”. Anotamos, no entanto, que

poluição não é a simples degradação ambiental, mas uma degradação ambiental qualificada por

uma atividade humana. Destarte, verificamos que o termo degradação tem um sentido mais

amplo do que poluição: o conceito de poluição está contido no conceito de degradação. Toda

poluição contém uma degradação ambiental, mas nem toda degradação ambiental será

considerada poluição. Poluição, assim, é a degradação ambiental intolerável causada de

uma atividade humana.

3.4. Dano ambiental:

Dano ambiental é a lesão a um bem ambiental. Ele decorre de uma atividade humana

que causa uma degradação da qualidade ambiental, acima do limite do tolerável. O dano

ambiental é fator indispensável para que surja a responsabilidade ambiental. Não haverá

obrigação de indenizar se não houver dano. Por isso mesmo é necessário indagar-se se qualquer

dano ambiental será passível de indenização.

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Toda atividade humana, de uma forma ou de outra, causa um dano ao meio ambiente. A

interação do homem com a natureza, através dos tempos, sempre ocasionou algum tipo de dano

ambiental. Desde as mais remotas eras, o ser humano subjugou a natureza, utilizando-a em seu

benefício próprio e isso, de uma forma ou de outra, implicava numa alteração da qualidade

ambiental. Tolerada pela sociedade, dentro daquele determinando contexto histórico, social e

econômico, aquela alteração não se constituía num dano indenizável. É certo que com a

Revolução Industrial essa interação homem-natureza intensificou-se, tornando-se

assustadoramente danosa ao meio ambiente, o que despertou na sociedade a preocupação com

a situação ambiental no planeta, exigindo preservação, proteção e, especialmente, reparação do

dano. Mas não menos certo é que isso também decorre de um contexto social, cultural,

econômico e histórico. Assim colocado, veremos que a reparação do dano ambiental decorrerá

da valoração desse dano, e do grau de intolerabilidade que ele irá gerar. O dano tolerado não

será indenizado. Dano ambiental indenizável é aquele que desborda do limite da tolerabilidade

aceitável.

3.5. Dano ambiental x crime ambiental:

Necessário, então, estabelecer a diferença entre dano ambiental e crime ambiental. Já

vimos que poluição é a alteração da qualidade ambiental decorrente de uma atividade humana.

Em sentido lato, a poluição abrange a poluição strictu sensu, o dano ambiental e o crime

ambiental.

A poluição em sentido estrito é a alteração da qualidade ambiental que não é capaz

de alterar a ordem ambiental vigente, eis que “suas repercussões sobre a normalidade do

ambiente são desprezíveis e, por isto, não são capazes de transtorná-las”. É que, embora haja

uma alteração da qualidade ambiental qualificada por uma ação humana, essa alteração não é

intolerável, conforme o paradigma se esteja adotando, de modo que “a poluição, em sentido

estrito, é, portanto, um acontecimento irrelevante”. Logo, ela não será punível. Quando essa

alteração ultrapassa os limites do desprezível e causa alterações adversas no ambiente, teremos

o dano ambiental, que será objeto da responsabilidade civil, conforme vimos acima. E quando

o dano ambiental for de tal monta que dele resulte ou possa resultar danos à saúde humana, ou

provoque a mortandade de animais ou a destruição da flora, estaremos diante de um crime

ambiental, cuja previsão legal encontra-se no art. 54 da Lei 9605/98:

Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora.

Por isso mesmo que não é qualquer atividade poluidora que será punível como crime

ambiental, mas apenas aquela que, produzida em níveis tais, resulte ou possa resultar em danos

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à saúde humana ou provoque a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora. A

criminalização de condutas lesivas ao meio ambiente demonstra a intenção do legislador de

considerar o meio ambiente como um bem jurídico próprio e relevante.

MÓDULO 4. A RESPONSABILIDADE PELO DANO AMBIENTAL

4.1. Responsabilidade total: administrativa, criminal e civil:

O meio ambiente foi alçado à condição de bem jurídico pela Carta Constitucional de 88.

O bem ambiental passou a ser tutelado expressamente pelo art. 225 da Constituição Federal em

todas as suas facetas jurídicas, consagrando a responsabilidade total do poluidor pelas condutas

e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente. Destarte, em se tratando de dano causado

ao meio ambiente natural, é preciso observar que a responsabilidade é total, ou seja, o poluidor

responderá pelo dano causado nas esferas administrativas, criminal e civil. É o que dispõe o §

3° do art. 225 da Constituição Federal:

§ 3°. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio

ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a

sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação

de reparar os danos causados.

A defesa do meio ambiente deve ser a mais ampla possível e isso se revela ao comando

do caput do art. 225, que coloca o meio ambiente equilibrado como um direito de todos ao mesmo

tempo em que atribui a todos (o Poder Público e a coletividade) o dever de defendê-lo e preservá-

lo para as presentes e futuras gerações. Desta forma, a tutela jurídica do meio ambiente se faz

de forma ampla, nas esferas administrativa, penal e civil. Isso significa que, para um mesmo fato,

um único fato, o poluidor poderá ser responsabilizado administrativa, civil e criminalmente,

concomitantemente, sem que uma exclua a outra. A importância de se possibilitar a

responsabilização total do agente poluidor é garantir que o dano ambiental seja efetivamente

reparado e/ou punido. A impunidade conduz à reincidência e não gera o desestímulo necessário

a evitar que outros danos ambientais ocorram. Em razão disso a responsabilização do infrator

deve ocorrer da forma mais ampla possível, de sorte a incutir nele o receio de praticar alguma

atividade nociva ao meio ambiente. Muitas vezes a simples imposição de multa administrativa

não resolve o problema causado, sendo necessário restituir o ambiente, reparando-o. Outras

vezes, a simples reparação não é suficiente para desestimular o poluidor, sendo necessário

partir-se para a esfera penal. O direito penal, aliás, que vem se tornando a grande arma jurídica

para reprimir o dano ambiental. É de se mencionar, ainda, que a empresa, enquanto pessoa

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jurídica, poderá ser responsabilizada criminalmente pelos danos causados ao meio ambiente,

como veremos a seguir.

4.2. A responsabilidade penal da empresa pelo dano ambiental

4.2.1. Responsabilidade penal ambiental:

A importância e a relevância do meio ambiente para a dignidade da vida humana, como

bem jurídico autônomo, se mostra de tal maneira fundamental que o legislador constituinte

cuidou, inclusive, de estabelecer a responsabilização penal do poluidor. É o que se vê

expressamente no parágrafo 3° do art. 225 da Constituição Federal. Um determinado fato

somente será considerado uma infração penal (crime ou contravenção penal) quando houver

expressa previsão legal. Isso decorre do princípio de que não há crime sem lei anterior que o

defina, nem pena sem prévia cominação legal, expresso no art. 5°, XXXIX, da Constituição

Federal. Com os crimes ambientais não é – nem poderia ser – diferente. No plano infra-

constitucional, até o ano de 1998, encontrávamos a definição de crimes ambientais em vários

diplomas legais, como, por exemplo, o próprio Código Penal (art. 271), o Código Florestal (Lei n°

4771/65 – arts. 26 e 45), a Lei de Proteção à Fauna (Lei n° 5197/67 – arts. 27 e 34), entre outros.

No entanto, todas essas leis foram revogadas pela Lei n° 9605, de 12 de fevereiro de 1998, que

dispôs sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao

meio ambiente, separando os crimes segundo o objeto de tutela, à seguinte forma: crimes contra

a fauna (arts. 29 a 37), crimes contra a flora (arts. 38 a 53), poluição e outros crimes (arts. 54

a61) e crimes contra a administração ambiental (arts. 66 a 69), revogando expressamente as

disposições em contrário (art. 82). As infrações penais contra o meio ambiente são de ação

pública incondicionada, cabendo ao Ministério Público propor a ação penal cabível, conforme

previsto no Código de Processo Penal. No entanto, aplicam-se aos crimes de menor potencial

ofensivo os dispositivos do art. 89 da Lei n° 9099/95 (Lei do Juizado Especial), na forma do

disposto nos arts. 27 e 28 da citada Lei de Crimes Ambientais (Lei n° 9605/98).

4.2.2. A responsabilidade penal da pessoa jurídica:

Um tema que sempre desperta algum tipo de discussão mais acalorada, especialmente

por parte dos tradicionalistas do direito, diz respeito à responsabilidade penal da empresa. A

evolução do mundo, especialmente nos séculos XIX e XX, viu florescer uma era de tecnologia

nunca antes imaginada. A industrialização da produção, a informatização e a biotecnologia

mudaram a forma de ser do próprio homem, na sua relação com a natureza. Com isso, grandes

corporações surgiram para explorar o nicho aberto por essa nova ordem. A partir da Revolução

Industrial, as relações sociais se modificaram profundamente. Antes, apenas o indivíduo, pessoa

física, que praticasse o ato ilícito poderia ser responsabilizado criminalmente. Com a Revolução

Industrial, a empresa passa a ser vista como elemento potencializador de riscos e, “como pólo

agregacional de interesses, passa a ser, em algumas circunstâncias e dentro de determinados

contextos, o centro de atenção da cena criminal”, eis que “nas últimas décadas, a poluição, o

desmatamento intensivo, a caça e a pesca predatória não são mais praticados só em pequena

escala. O crime ambiental é principalmente corporativo”. O assunto ora ventilado constitui

verdadeiro dogma do Direito Penal. Os tradicionalistas não admitem, em hipótese alguma, que

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a pessoa jurídica possa ser sujeito ativo de um delito penal. Mas o fato é que, desde o advento

da Constituição Federal de 88, a responsabilidade penal da pessoa jurídica é uma realidade com

a qual todos os operadores do Direito têm de conviver, concordem ou não.

No mundo moderno, globalizado e massificado, as grandes atividades econômicas são

exploradas através de grandes corporações, que se organizam de maneira empresarial em

sociedades. Tais sociedades, legalmente constituídas para esse fim, adquirem personalidade

jurídica própria. Os princípios da atividade econômica encontram-se no art. 170 da Constituição

Federal: livre iniciativa, livre concorrência e livre exercício de qualquer atividade econômica. Mas

ao lado desses princípios liberais, encontramos outros limitadores dessa liberdade, como, por

exemplo, a defesa do meio ambiente. Isso faz nascer uma obrigação legal para a empresa, que

é a responsabilidade socioambiental. As sociedades constituídas para o desenvolvimento de

uma atividade econômica denominam-se sociedades empresárias. Essas sociedades são, na

maioria das vezes, as causadoras dos danos ambientais de grande proporção. Responsabilizá-

las civil e administrativamente pelos danos causados é simples. O problema surge quando a

questão é atribuir-lhes responsabilidade penal.

4.2.2.1. O dogma “societas delinquere non potest” e o crime ambiental corporativo:

Durante anos, o direito vedou a possibilidade de responsabilizar criminalmente a pessoa

jurídica, opondo obstáculos legais e forte oposição doutrinária e jurisprudencial, observando,

como regra, a máxima “societas delinquere non potest” (a sociedade não pode delinqüir).

Entrementes, se a responsabilidade penal da pessoa jurídica antes era discutível, hoje é

reconhecida constitucionalmente. A Constituição de 1988, rompendo com a tradição da doutrina

penal, considera a pessoa jurídica - sem distinguir se pública ou privada - como ente capaz de

cometer delitos. A doutrina contemporânea reconhece que o princípio do direito penal tradicional

de que a sociedade não pode delinqüir encontra-se hoje mitigado. Para Sérgio Salomão

Shecaira, “a tendência do direito penal moderno é romper com o clássico princípio societas

delinquere non potest. Isso porque a pessoa jurídica não pode ser vista com os olhos conceituais

da doutrina clássica”.

4.2.2.2. A responsabilidade penal da pessoa jurídica na Constituição e na lei:

A Constituição Federal prevê a responsabilização criminal da pessoa jurídica em duas

oportunidades. A primeira está situada no capítulo que trata dos princípios gerais da atividade

econômica; a segunda, no que disciplina o meio ambiente. No primeiro caso, diz o artigo 173, §

5º, da Constituição:

A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa

jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições

compatíveis com a sua natureza nos atos praticados contra a ordem econômica

e financeira e contra a economia popular.

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Na segunda hipótese, o artigo 225, § 3º da Constituição preceitua que

as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os

infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,

independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Seguindo a norma constitucional, no plano infraconstitucional a Lei 9.605/98 (que trata

dos crimes ambientais), em seu art. 3º estabelece que

as pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente

conforme disposto nesta lei, nos casos em que a infração seja cometida por

decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado,

no interesse ou benefício da sua entidade.

Devemos lembrar que o Direito Penal inicia-se a partir da Constituição Federal, e não a

partir do Código Penal, que é apenas um subsistema do nosso sistema constitucional. Assim é

que o art. 5º, inciso XXXIX, da Carta Magna estabelece que “não há crime sem lei anterior que

o definam, nem pena sem prévia cominação legal”. O significado disso é que é a lei, em

sentido lato, que define o que é crime e que estabelece qual será a pena. Desta forma, nada há

de inconstitucional na Lei 9.605/98, muito menos no que se refere ao disposto no mencionado

art. 3º, eis que em perfeita sintonia com a Constituição Federal. E a mesma Constituição, ao

tratar das penas, contempla cinco possibilidades, das quais apenas uma é restritiva de liberdade.

É o que dispõe o inciso XLVI do mencionado art. 5º, verbis:

XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre

outras, as seguintes:

a) privação ou restrição de liberdade;

b) perda de bens;

c) multa;

d) prestação social alternativa;

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e) suspensão ou interdição de direitos.

Podemos observar que apenas 20% das penas previstas na Constituição Federal são

privativas ou restritivas de liberdade. As outras 80% referem-se à perda de bens e de direitos,

perfeitamente aplicáveis à pessoa jurídica. E isso se dá porque o Direito Penal moderno,

inaugurado a partir da Carta Magna de 88, tem outras preocupações que não simplesmente o

indivíduo, mas principalmente com a coletividade. Os bens jurídicos que atualmente comportam

proteção do direito penal são diferentes daqueles de outrora. Afinal, é na própria natureza do

bem, seja difuso ou coletivo, que reside o alcance do direito penal na sociedade de risco. O

sujeito passivo, nesses crimes, “não é um indivíduo, como no estelionato ou nas lesões corporais.

É toda a coletividade. O alcance é maior”. Enquanto o direito penal tradicional ocupava-se

apenas de bens individuais, tais como a vida, a saúde ou a honra, a realidade da sociedade de

massa, decorrente da revolução tecnológica, trouxe profundas alterações na concepção de

criminalidade, que se encontra mais e mais atrelada a atividades lícitas. São atos próprios dessa

sociedade surgida posteriormente à revolução industrial e que geralmente atingem interesses

difusos. A função do direito penal moderno é, pois, tutelar esses bens difusos. É, pois, interesse

de toda a sociedade e não de apenas um indivíduo ou de um pequeno grupo.

Numa sociedade capitalista, cuja ordem econômica é fundada na livre iniciativa (art. 170

da Constituição Federal), os potenciais agentes criminosos são as grandes empresas (pelos

chamados crimes corporativos), especialmente aqueles praticados contra o meio ambiente. E

para tal situação, de nada servem as penas privativas ou restritivas de liberdade: a efetividade

da pena somente se dará através da perda de bens (ou dinheiro) ou da suspensão ou interdição

de direitos, como a suspensão total ou parcial das atividades. Desta forma, ao lado da tradicional

pena da restrição da liberdade, o Direito Penal moderno criou outras formas de penalização,

como, por exemplo, a multa, a dissolução, a interdição, a suspensão da atividade, o confisco, a

perda de benefícios fiscais, entre outros, plenamente em condições reais de serem aplicadas à

pessoa jurídica. O mais importante, no entanto, é haver a possibilidade jurídica legal

(constitucional e infra-constitucional) de se responsabilizar penalmente a pessoa jurídica.

4.3. A responsabilidade objetiva na reparação do dano ambiental

4.3.1. Responsabilidade civil:

Responsabilidade, no seu sentido etimológico, revela a idéia de obrigação, encargo,

contraprestação. Em sentido jurídico, a idéia é praticamente a mesma. A responsabilidade

decorre da violação de um dever jurídico que acarreta um dano a outrem, que deve ser reparado,

não apenas como forma de justiça, mas para restaurar o equilíbrio antes existente. A

responsabilidade civil nos moldes como conhecemos no direito moderno tem suas origens na Lex

Aquilia do direito romano. Embora se saiba que tal lei não dispunha de uma regra de conjunto,

ela tornou-se fonte direta da moderna concepção da responsabilidade civil aquiliana,

fundamentada na culpa do agente. Foi na França, no entanto, que se esboçaram os contornos

da responsabilidade civil moderna, estabelecendo-se alguns princípios básicos como o direito à

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reparação sempre que houvesse culpa, ainda que leve, separando-se a responsabilidade civil

(perante a vítima) da responsabilidade penal (perante o Estado); a existência de uma culpa

contratual (de quem descumpre as obrigações) e que não se liga nem a crime nem a delito, mas

que decorre da negligência ou da imprudência.

No Brasil não foi diferente, e em 1916 o Código Civil brasileiro foi promulgado

contemplando a teoria da responsabilidade civil aquiliana tal qual o direito civil francês. O art. 159

daquele Código estabelecia que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou

imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”.

Escorava-se assim, a responsabilidade civil, na culpalato sensu, que abrange o dolo (que é o

conhecimento do mal e intenção de praticá-lo) e a culpa strictu sensu ou aquiliana (a violação de

um dever que o agente podia conhecer e observar, segundo os padrões de comportamento do

homem médio). A imprevidência do agente, que pode resultar no ato lesivo, assenta-se sob a

forma de imprudência, negligência ou imperícia (esta, contida no conceito de negligência). A

expressão “ação ou omissão voluntária” está diretamente ligada à vontade de agir ou se omitir,

que caracteriza o dolo, enquanto que “negligência ou imprudência” está diretamente ligada à

culpa. Para a reparação do dano, no entanto, não há diferença entre dolo ou culpa (strictu sensu).

O objetivo central da indenização é recompor o patrimônio do lesado ao status quo ante, de modo

que pouco importa se o fato ou ato ilícito é proveniente de dolo ou de culpa: o resultado é o

mesmo em uma ou outra situação. Por isso que “havendo culpa, a obrigação de reparar o dano

é a mesma, haja dolo ou culpa em sentido estrito”. A responsabilidade civil aquiliana, para gerar

a obrigação de indenizar, ao lado da ação ou omissão do agente, tem que conjugar outros três

fatores indispensáveis: dano, nexo causal e culpa (lato sensu). É que o instituto da

responsabilidade civil, alicerçado no nexo causal entre o dano e o fato ou ato jurídico imputado

ao agente, desponta no ordenamento jurídico como o meio eficaz de atrelar a agentes

identificados o dever de promover a indenização dos danos acarretados injustamente às vitimas.

O novo Código Civil não mudou essa orientação. O art. 186 praticamente repete o teor

do revogado art. 159, dispondo que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou

imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato

ilícito”, mantendo o elemento subjetivo como requisito indispensável da responsabilidade civil.

Desta forma, podemos afirmar que a responsabilidade civil subjetiva, ou seja, aquela baseada

na culpa do agente, permanece como regra no Código Civil brasileiro. Mas se é certo que a

responsabilidade civil subjetiva é a regra no Código Civil, o mesmo não pode ser dito no que

tange ao ordenamento jurídico pátrio como um todo. É que, numa sociedade de massa, de

economia globalizada, a esmagadora maioria das relações privadas será conceituada como

relação de consumo, que consagra a responsabilidade objetiva como regra.

4.3.2. Responsabilidade civil objetiva:

Diz-se objetiva a responsabilidade que prescinde do elemento subjetivo, ou seja, que não

depende de culpa para gerar a obrigação indenizatória, bastando que haja nexo causal e dano.

A evolução tecnológica decorrente da Revolução Industrial acelerou o processo de

desenvolvimento industrial e fez surgir atividades perigosas, que punham em risco a sociedade.

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Em razão disso, uma vez que a responsabilidade subjetiva mostrava-se insatisfatória, novas

teorias foram surgindo objetivando propiciar maior proteção às vítimas, buscando fundamentos

para a imputação da responsabilidade dos danos ensejados pelo risco da atividade decorrentes

do progresso. Foi na França que surgiu um movimento que buscava alternativas à teoria clássica

da culpa, iniciado por Saleilles e seguido por Josserand, considerando que, restrito ao âmbito da

culpa, não seria possível resolver todos os problemas decorrentes da responsabilidade civil.

Surgia a teoria do risco criado, segundo a qual aquele que exercesse uma atividade de risco,

responderia pelo dano causado objetivamente, ou seja, independentemente de culpa.

No Brasil, os contornos da responsabilidade objetiva começaram a ser desenhados com

o Decreto n° 2.681 de 7 de dezembro de 1912 (a histórica Lei das Estradas de Ferros), que

regulou a responsabilidade civil das companhias ferroviárias com base na atividade

desenvolvida. Mas o marco decisivo foi dado pelo Código de Defesa do Consumidor, nos arts.

12 e 14 que, ao consagrar que a responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto ou do

serviço se dá independentemente de culpa, acabou adotando a teoria da responsabilidade

objetiva fundada no risco da atividade para responsabilizar o fornecedor. No mesmo sentido, o

novo Código Civil adotou a teoria do risco, no parágrafo único do art. 927.

4.3.3. Teoria do risco:

A teoria do risco foi a principal, e a mais bem aceita, teoria sobre responsabilidade objetiva.

Ela traduz-se no seguinte enunciado: todo aquele que desenvolve uma atividade que implique

risco para outrem, fica obrigado a reparar o dano causado, independentemente de culpa. A teoria

do risco deve ser conjugada juntamente com os princípios constitucionais da ordem econômica,

tendo relação direta com a livre iniciativa. Tendo o empreendedor liberdade de ação, ele deve

arcar com os riscos da sua atividade, da mesma forma como ele absorve e aproveita os seus

lucros. A liberdade de ação, garantida pela Constituição Federal, acarreta como conseqüência a

responsabilização de empresa pelo risco da sua atividade. Trata-se da Teoria do Risco da

Atividade ou do Risco Proveito, segundo a qual “quem desenvolve uma atividade com fins de

lucro, tem que assumir as responsabilidades decorrentes da própria atividade”.

A responsabilidade objetiva prescinde da culpa para obrigar o ofensor à reparação,

bastando que se demonstre o nexo de causalidade e o dano. Desta forma, é possível nascer a

obrigação de indenizar independentemente da prática de qualquer ato ilícito. Havendo previsão

legal de responsabilização, ou sendo a atividade considerada de risco, o responsável pela

reparação pode até não ter praticado nenhum ilícito e mesmo assim haverá o dever de indenizar.

Mais ainda, o dever da reparação poderá até mesmo surgir de um ato lícito, como vai ocorrer

nas hipóteses de danos ambientais, como veremos a seguir.

4.3.4. A responsabilidade pelo dano ambiental:

A responsabilidade civil por dano ambiental é objetiva. Com efeito, vivemos numa

sociedade de risco, onde os perigos da ocorrência dos danos ambientais decorrentes da

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evolução tecnológica, verificada especialmente no século passado, são eminentes e freqüentes,

o que força que a reparação se dê independentemente de culpa do agente. De fato, esse

desenvolvimento econômico e tecnológico vai trazer como conseqüência um fator de risco, que

poderá se manifestar nos processos de produção (na exploração de energia nuclear, por

exemplo), no aumento de substâncias perigosas (resíduos tóxicos), e na forma com que se lida

com elas (transporte, armazenamento, descarte). É evidente que, de uma forma ou de outra,

todas essas atividades afetarão o meio ambiente. Quando isso se der de maneira negativa,

ensejando uma degradação da qualidade ambiental que resulta na poluição, o responsável

deverá compensar o dano, pelo simples fato de se beneficiar diretamente do exercício daquelas

atividades perigosas, sem qualquer consideração acerca da sua culpa. Por conta disso tudo, a

Lei. 6938/81, em seu art. 14, § 1°, adotou a responsabilização objetiva do poluidor:

§ 1°. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo,

é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a

indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a

terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e

dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade

civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

Esse artigo 14 foi totalmente recepcionado pela Constituição Federal, que

estabeleceu, no § 3°, do art. 225:

§ 3°. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio

ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a

sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação

de reparar o dano.

Uma vez que a Constituição não adotou nem estabeleceu nenhum critério ou elemento

vinculado à culpa como fundamento da obrigação de reparar o dano ambiental, ela recepcionou

e consagrou a responsabilidade objetiva, que a norma infraconstitucional já havia estabelecido

quase uma década antes, através do citado art. 14, § 1°, da Lei 6938/81. A responsabilidade civil

pelo dano ambiental é, pois, objetiva e se apóia na teoria do risco, de maneira que “não se aprecia

subjetivamente a conduta do poluidor, mas a ocorrência do resultado prejudicial ao homem e seu

ambiente”. Devemos observar, entrementes, que o direito ambiental assenta a responsabilidade

civil objetiva na teoria do risco integral. Desta forma, ocorrido o dano ambiental, o poluidor estará

obrigado à reparação, não podendo se valer de nenhum tipo de excludente em sua defesa. Isso

ocorre porque, em se tratando de dano ambiental, devemos sempre conjugar a responsabilidade

objetiva prevista o art. 14, § 1°, da Lei 6938/81, com os princípios do poluidor-pagador e da

prevenção. Destarte, a aplicação da responsabilidade objetiva pressupõe a existência de uma

atividade de risco, impondo à empresa o dever de segurança (princípio da prevenção),

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internalizando-o no processo produtivo (princípio do poluidor-pagador), sob pena de ter de

indenizar todo dano que ocorrer.

4.3.5. Reparação do dano ambiental: reparação integral e reparação específica:

Reparação pressupõe a idéia de ressarcimento ou compensação do dano sofrido: aquele

que causar prejuízo a outrem fica obrigado à reparação. A reparação é, assim, o sucedâneo da

responsabilidade civil. Partindo-se dessa premissa, é necessário primeiramente observar, com

base nos princípios que norteiam o direito ambiental, que a reparação do dano deve ser integral

(restitutio in integrum). Isso se dá, porque em se tratando de meio ambiente, o dano é exatamente

o que se quer evitar, razão pela qual toda lógica jurídica de proteção e gestão ambiental

fundamenta-se numa dinâmica preventiva (desenvolvimento sustentável, prevenção, poluidor-

pagador etc.), e uma vez que o dano ocorreu, ele deve ser reparado da forma mais ampla

possível, servindo como desestímulo para outros poluidores potenciais. A reparação integral do

meio ambiente lesado deriva do art. 225, § 3° da Carta Constitucional, juntamente com o art. 14°,

§ 1° da Lei 6938/81, que não restringiram a extensão da reparação. Não havendo restrição, a

reparação deve ser a mais ampla possível, para que não ocorra a indesejável impunidade.

Somente com punição exemplar é que se desestimulará os poluidores a continuar poluindo. É

por isso que se pode afirmar, no que se refere à responsabilidade civil por dano ambiental, que

a “reparabilidade é integral, levando em conta o risco criado pela conduta perigosa do agente,

impondo-se ao mesmo um dever-agir preventivo, como meio de se eximir da reparabilidade

integral do eventual dano causado”. Sabe-se, entretanto, que a natureza, quando danificada,

dificilmente poderá ser restaurada, voltando ao seu estado anterior: a extinção de uma espécie

é um fator irreversível. A reparação integral vai compreender não apenas o prejuízo causado

ao bem ou recurso ambiental como também toda extensão dos danos produzidos em

conseqüência do evento danoso. Destarte, a reparação integral exige a reparação dos danos

ambientais – casos sejam passíveis de reparação – bem como o dever de indenizar aqueles

danos irreparáveis.

Duas são as formas pelo qual o dano ambiental pode ser reparado: a primeira é a

denominada reparação natural ou específica, onde é feito o ressarcimento in natura; a segunda

é a indenização, que é feita através do pagamento de quantia em dinheiro. Vamos encontrar no

art. 4º, VII, da Lei 6938/81 a obrigação do poluidor de restaurar e/ou indenizar os danos

causados. Essa opção legislativa indica que, primeiramente, deve-se tentar a restauração do

bem ambiental lesionado e, somente se inviável esta partir-se para a indenização.

Como visto essas duas formas de reparação do dano ambiental não são opcionais. A

reparação não pode ser feita de uma ou de outra forma indiferentemente. Como assinala Fiorillo,

“primeiramente, deve-se verificar se é possível o retorno ao status quo ante por via daespecífica

reparação, e só depois de infrutífera tal possibilidade é que deve recair a condenação sobre

um quantum pecuniário...”. É necessário que primeiro se busquem todos os meios possíveis para

a restauração do bem ambiental lesado, que é o objetivo precípuo do direito ambiental brasileiro.

Pode-se até afirmar que a principal opção da responsabilidade civil ambiental não é a justa

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compensação da vítima, mas a prevenção do dano ecológico e a reintegração dos bens

ambientais lesados. Desta forma, a reparação específica, in natura, será sempre a prioridade, ao

fundamento do disposto no art. 4º, inciso VI, da Lei 6938/81:

Art. 4°. A Política Nacional do Meio Ambiente visará:

(...)

VI – à preservação e restauração dos recursos ambientais, com

vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente,

concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à

vida.

Nesse compasso, a idéia de recuperar o bem ambiental lesado como

medida primeira a ser buscada vem expressa no § 2º do art. 225 da Constituição

Federal:

§ 2º. Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a

recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução

técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

Como se vê, tanto a Constituição Federal quanto a norma infraconstitucional se

harmonizam no sentido de indicar que o caminho primeiro a ser trilhado é o da reparação

específica, com o objetivo de retornar o meio ambiente lesado ao status quo ante, preservando-

o, assim, para as futuras gerações.

MÓDULO 5. O licenciamento ambiental

5.1. Conceito e previsão legal

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Licenciamento ambiental é o processo administrativo por meio do qual o Poder Público procura controlar as atividades humanas potencialmente poluidoras. Ele tem caráter nitidamente preventivo, com o objetivo de evitar, ou ao menos minimizar, o impacto ambiental negativo. Trata-se, sem dúvida, do mais importante instrumento de controle dessas atividades e de proteção ao meio ambiente.

O licenciamento ambiental é um instrumento de caráter preventivo de tutela do meio ambiente, consubstanciado num procedimento administrativo, por se tratar não de apenas um ato, mas de um encadeamento de atos administrativos. Ele decorre do exercício do poder de polícia do Estado, alicerçado nos princípios da prevenção e da supremacia do interesse público sobre o particular.

Do ponto de vista legal, a definição de licenciamento ambiental encontra-se na Resolução 237/97 do CONAMA, art. 1º, inciso I:

Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições: I - Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.

O licenciamento ambiental está alçado à condição de instrumento de efetivação do desenvolvimento sustentável, conforme se observa, em análise sistemática, do cotejo do inciso I do art. 4º com o inciso IV do art. 9º, ambos da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81).

Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico; Art. 9º - São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente: (...) IV - o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras;

A exigência do licenciamento ambiental está prevista na Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), art. 10:

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Art. 10 - A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.

Tal exigência legal é reforçada no art. 2º da Resolução 237 do CONAMA:

Art. 2º- A localização, construção, instalação, ampliação, modificação e operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento do órgão ambiental competente, sem prejuízo de outras licenças legalmente exigíveis.

Destarte, qualquer empresa cuja atividade se utilize de recursos ambientais e que contenha um risco de causar poluição ou degradação ambiental, obrigatoriamente deverá realizar o licenciamento ambiental, e somente pode se desenvolver após a obtenção da licença ambiental que lhe autorize o funcionamento.

Nada há de inconstitucional no licenciamento ambiental. Muito pelo contrário.

A exigência e obrigatoriedade do licenciamento ambiental para tais atividades estão em consonância com a Constituição Federal, especialmente no que diz respeito à ordem econômica, no art. 170, que ao mesmo tempo em que tem a livre iniciativa como fundamento, admite um controle dessa liberdade, ao estabelecer a defesa do meio ambiente como um de seus princípios (inciso VI).

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

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A liberdade de ação preconizada no caput do referido art. 170 não é total. É uma liberdade vigiada, controlada pelo Poder Público, em razão dos objetivos sociais preconizados pela Carta Magna (arts. 1º e 3º). Daí a razão de ser do seu parágrafo único, que ressalva essa liberdade de ação à autorização dos órgãos públicos, nos casos previstos em lei.

Art. 170. (...) Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. (grifei)

Deste modo, a Constituição admite o controle das atividades empresariais efetiva ou potencialmente poluidoras, de sorte que podemos afirmar que o licenciamento previsto no art. 10 da Lei 6.938/81 foi devidamente recepcionado pela Constituição Federal de 88.

5.2. Empresas obrigadas ao licenciamento ambiental.

Como vimos, conforme o art. 10 da Lei 6.938/81, o licenciamento é obrigatório para empresas que utilizem recursos ambientais e/ou que sejam efetiva ou potencialmente poluidoras.

Destarte, não é toda empresa que está sujeita ao licenciamento ambiental, mas tão somente aquelas que usam recursos ambientais e aquelas cuja atividade apresente risco para o meio ambiente, possível de causar poluição “lato sensu”.

Para tornar mais fácil a identificação das atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, o CONAMA listou-as, no anexo 1 da Resolução 237. Referida lista contempla atividades das mais diversas, abarcando praticamente todos os setores da economia. Para se ter uma ideia, as atividades ali contempladas referem-se a: a) Extração e tratamento de minerais; b) Indústria de produtos minerais não metálicos; c) Indústria metalúrgica; d) Indústria mecânica; e) Indústria de material elétrico, eletrônico e comunicações; f) Indústria de material de transporte; g) Indústria de madeira; h) Indústria de papel e celulose; i) Indústria de borracha; j) Indústria de

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couros e peles; k) Indústria química; l) Indústria de produtos de matéria plástica; m) Indústria têxtil, de vestuário, calçados e artefatos de tecidos; n) Indústria de produtos alimentares e bebidas; o) Indústria de fumo; p) Indústrias diversas; q) Obras civis; r) Serviços de utilidade; s) Transporte, terminais e depósitos; t) Turismo; u) Atividades diversas; v) Atividades agropecuárias; Uso de recursos naturais;

É de se observar, entrementes, que a referida lista não é exaustiva nem taxativa. Isso significa dizer que qualquer outra atividade, ainda que não constante da lista, pode ser considerada poluidora pelo órgão ambiental e estar sujeita ao licenciamento. Isso pode ser confirmado pelo teor do § 2º do art. 2º da própria Resolução 237:

§ 2º – Caberá ao órgão ambiental competente definir os critérios de exigibilidade, o detalhamento e a complementação do Anexo 1, levando em consideração as especificidades, os riscos ambientais, o porte e outras características do empreendimento ou atividade.

O que se pode afirmar, com toda razão, é que as atividades listadas pelo CONAMA estão obrigadas ao licenciamento, sem maiores discussão.

5.3 Etapas procedimentais do licenciamento ambiental

O licenciamento ambiental é um ato administrativo complexo, que envolve três etapas distintas entre si e que são indispensáveis:

a) licença prévia (LP): prevista no inciso I, do art. 8º, da Resolução 237 do CONAMA, ela será concedida na fase preliminar do planejamento da empresa. A licença prévia terá validade pelo período estabelecido no cronograma, não podendo ser superior a 5 anos.

b) licença de instalação (LI): prevista no inciso II, do art. 8º, da Resolução 237 do CONAMA, ela autoriza a instalação da empresa. A licença de instalação terá validade pelo prazo estabelecido no cronograma de instalação, não podendo ser superior a 6 anos.

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c) licença de operação (LO): prevista no inciso IiI, do art. 8º, da Resolução 237 do CONAMA, ela autoriza a operação da empresa. A licença de operação, que deverá obedecer aos planos de controle do meio ambiente, será de, no mínimo, 4 anos e, no máximo, 10 anos.

A renovação da licença de operação deverá ser requerida com antecedência mínima de 120 dias antes do término de seu prazo de validade. Respeitado esse prazo, o protocolo do pedido torna a licença automaticamente prorrogada, até ulterior manifestação do órgão ambiental.

É bom observar que tais licenças podem ser concedidas de forma isolada ou sucessivamente, tendo em vista a natureza, as características e a fase em que se encontra o empreendimento. Todavia, é de se observar que, como procedimento único, a etapa anterior condiciona a etapa seguinte. Destarte, não sendo concedida a licença anterior, não há como se conceder a licença seguinte.

Assim, a licença prévia deve ser buscada antes do projeto sair do papel, vale dizer, no planejamento do empreendimento. Ela aprova a localização e concepção da empreitada, atestando a sua viabilidade ambiental. Ela também irá estabelecer os requisitos básicos e as condições a serem cumpridas nas próximas etapas.

É de se observar que a concessão da licença prévia não dá autorização para os inícios da obra, nem para o funcionamento da empresa.

A próxima etapa é a licença de instalação. Após a obtenção da licença prévia, o empreendedor deve elaborar o “projeto executivo”, onde são fixadas as diretrizes técnicas adequadas que permitirão conjugar a obra de instalação da empresa com a proteção ao meio ambiente. Aprovado o “projeto executivo” – que não poderá ser alterado sem autorização do órgão ambiental responsável – será expedida a licença de instalação, que permitirá a implantação do estabelecimento empresarial.

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Por fim, verificado o cumprimento de todas as diretrizes traçadas nas licenças anteriores, será expedida a licença de operação. É através dessa licença que o poder público autoriza o início das atividades da empresa.

5.4. Licenciamento ambiental simplificado

Previsto no art. 12 do Regulamento 237/97 do CONAMA, o Licenciamento ambiental simplificado poderá ser utilizado quando se pretende o licenciamento ambiental de atividades de baixo impacto ambiental:

Art. 12 - O órgão ambiental competente definirá, se necessário, procedimentos específicos para as licenças ambientais, observadas a natureza, características e peculiaridades da atividade ou empreendimento e, ainda, a compatibilização do processo de licenciamento com as etapas de planejamento, implantação e operação. § 1º - Poderão ser estabelecidos procedimentos simplificados para as atividades e empreendimentos de pequeno potencial de impacto ambiental, que deverão ser aprovados pelos respectivos Conselhos de Meio Ambiente. § 2º - Poderá ser admitido um único processo de licenciamento ambiental para pequenos empreendimentos e atividades similares e vizinhos ou para aqueles integrantes de planos de desenvolvimento aprovados, previamente, pelo órgão governamental competente, desde que definida a responsabilidade legal pelo conjunto de empreendimentos ou atividades. § 3º - Deverão ser estabelecidos critérios para agilizar e simplificar os procedimentos de licenciamento ambiental das atividades e empreendimentos que implementem planos e programas voluntários de gestão ambiental, visando a melhoria contínua e o aprimoramento do desempenho ambiental.

A proposta da referida norma é clara: tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida da sua desigualdade.

Assim, não tem sentido tratar uma empresa cujo impacto ambiental seja pequeno ou nenhum, com outra potencialmente poluidora. Salutar, portanto, que para aquelas, o procedimento do licenciamento ambiental seja simplificado.

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O grande problema é que, até o momento, não há regulamentação necessária, em nível nacional, para o mencionado art. 12, de sorte que os órgãos ambientais encontram dificuldades para a sua aplicação.

5.5. Outros instrumentos de controle ambiental.

Antes de obter a licença prévia, o empreendedor deve promover estudos técnicos para determinar o impacto que seu empreendimento poderá causar ao meio ambiente. Tal situação já era prevista no art. 8º, da Lei 6938/81:

Art. 8º Compete ao CONAMA: (...) II - determinar, quando julgar necessário, a realização de estudos das alternativas e das possíveis conseqüências ambientais de projetos públicos ou privados, requisitando aos órgãos federais, estaduais e municipais, bem assim a entidades privadas, as informações indispensáveis para apreciação dos estudos de impacto ambiental, e respectivos relatórios, no caso de obras ou atividades de significativa degradação ambiental, especialmente nas áreas consideradas patrimônio nacional.

A Constituição Federal de 88 trata da questão no inciso V do § 1º do art. 225, dispondo como incumbência do Poder Público:

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

A Resolução 237 do CONAMA define-o no inciso III do art. 1º:

Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições: (...) III - Estudos Ambientais: são todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos ambientais relacionados à localização, instalação, operação e ampliação de uma atividade ou empreendimento, apresentado como subsídio para a análise da licença requerida, tais como: relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental, relatório ambiental preliminar, diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e análise preliminar de risco.

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Tais estudos são de extrema importância, pois é através deles que se pode começar a avaliar o impacto que o empreendimento pode causar ao meio ambiente, possibilitando a melhor decisão sobre a concessão ou não da licença.

5.5.1. Estudo de impacto ambiental (EIA).

Talvez o mais conhecido dos estudos ambientais, o EIA deve ser realizado antes do início do procedimento de licenciamento ambiental. Sua função é exatamente dotar o órgão responsável pelo licenciamento de subsídios para sua decisão.

Trata-se, como define Barros, de um instrumento formal, editado sob os auspícios do interessado declarando que o projeto de uma determinada atividade econômica é apto em termos ambientais, não causando impactos ambientais.

Impacto ambiental é qualquer alteração negativa do meio ambiente decorrente de atividade humana. Sua definição encontra-se no art. 1º, da Resolução n. 1/86 do CONAMA:

Artigo 1º - Para efeito desta Resolução, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais.

Destarte, o que vai determinar a obrigatoriedade do licenciamento ambiental é o impacto ambiental que a empresa pode causar. Daí a importância do EIA.

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A Resolução n. 1/86 do CONAMA, em seu art. 2º, determina a obrigatoriedade do EIA para uma série de atividades ali relacionadas, em razão do grande impacto que podem causar ao meio ambiente

Artigo 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA e1n caráter supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, tais como: I - Estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento; II - Ferrovias; III - Portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos; IV - Aeroportos, conforme definidos pelo inciso 1, artigo 48, do Decreto-Lei nº 32, de 18.11.66; V - Oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários; VI - Linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230KV; VII - Obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10MW, de saneamento ou de irrigação, abertura de canais para navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d'água, abertura de barras e embocaduras, transposição de bacias, diques; VIII - Extração de combustível fóssil (petróleo, xisto, carvão); IX - Extração de minério, inclusive os da classe II, definidas no Código de Mineração; X - Aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos; Xl - Usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10MW; XII - Complexo e unidades industriais e agro-industriais (petroquímicos, siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de álcool, hulha, extração e cultivo de recursos hídricos); XIII - Distritos industriais e zonas estritamente industriais - ZEI; XIV - Exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 hectares ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental; XV - Projetos urbanísticos, acima de 100 ha. ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes; XVI - Qualquer atividade que utilize carvão vegetal, em quantidade superior a dez toneladas por dia.

Na elaboração do EIA, deve-se atentar para as diretrizes básicas, traçadas pelo art. 5º da referida Resolução:

Artigo 5º - O estudo de impacto ambiental, além de atender à legislação, em especial os princípios e objetivos expressos na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, obedecerá às seguintes diretrizes gerais:

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I - Contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização de projeto, confrontando-as com a hipótese de não execução do projeto; II - Identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de implantação e operação da atividade; III - Definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza; lV - Considerar os planos e programas governamentais, propostos e em implantação na área de influência do projeto, e sua compatibilidade.

Além disso, devem-se realizar estudos técnicos. O art. 6º daquela Resolução apresenta os estudos técnicos mínimos que devem ser realizados quando da elaboração do EIA:

Artigo 6º - O estudo de impacto ambiental desenvolverá, no mínimo, as seguintes atividades técnicas: I - Diagnóstico ambiental da área de influência do projeto completa descrição e análise dos recursos ambientais e suas interações, tal como existem, de modo a caracterizar a situação ambiental da área, antes da implantação do projeto, considerando: a) o meio físico - o subsolo, as águas, o ar e o clima, destacando os recursos minerais, a topografia, os tipos e aptidões do solo, os corpos d'água, o regime hidrológico, as correntes marinhas, as correntes atmosféricas; b) o meio biológico e os ecossistemas naturais - a fauna e a flora, destacando as espécies indicadoras da qualidade ambiental, de valor científico e econômico, raras e ameaçadas de extinção e as áreas de preservação permanente; c) o meio sócio-econômico - o uso e ocupação do solo, os usos da água e a sócio-economia, destacando os sítios e monumentos arqueológicos, históricos e culturais da comunidade, as relações de dependência entre a sociedade local, os recursos ambientais e a potencial utilização futura desses recursos. II - Análise dos impactos ambientais do projeto e de suas alternativas, através de identificação, previsão da magnitude e interpretação da importância dos prováveis impactos relevantes, discriminando: os impactos positivos e negativos (benéficos e adversos), diretos e indiretos, imediatos e a médio e longo prazos, temporários e permanentes; seu grau de reversibilidade; suas propriedades cumulativas e sinérgicas; a distribuição dos ônus e benefícios sociais. III - Definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos, entre elas os equipamentos de controle e sistemas de tratamento de despejos, avaliando a eficiência de cada uma delas. lV - Elaboração do programa de acompanhamento e monitoramento (os impactos positivos e negativos, indicando os fatores e parâmetros a serem considerados.

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O EIA deve ser realizado por uma equipe técnica multidisciplinar, que não mantenha um vínculo, direto ou indireto, de dependência com a empresa. Essa equipe será tecnicamente responsável pelos resultados apresentados.

Todos os custos da elaboração do EIA correm por conta da empresa.

O EIA deve ser apresentado em, no mínimo, cinco vias.

5.5.1.1. Relatório de impacto ambiental (RIMA)

O RIMA está umbilicalmente ligado ao EIA. Em realidade ele retrata, de uma maneira mais simples, a conclusão do EIA. Ele representa uma forma simplificada e em linguagem acessível ao homem médio o conteúdo e resultados no EIA.

O RIMA, que deve ser apresentado de forma objetiva e adequada à sua compreensão, com as informações traduzidas em linguagem acessível, ilustradas por mapas, cartas, quadros, gráficos e demais técnicas de comunicação visual, deverá conter os itens dispostos no art. 9º, da Resolução 1/86:

Artigo 9º - O relatório de impacto ambiental - RIMA refletirá as conclusões do estudo de impacto ambiental e conterá, no mínimo: I - Os objetivos e justificativas do projeto, sua relação e compatibilidade com as políticas setoriais, planos e programas governamentais; II - A descrição do projeto e suas alternativas tecnológicas e locacionais, especificando para cada um deles, nas fases de construção e operação a área de influência, as matérias primas, e mão-de-obra, as fontes de energia, os processos e técnica operacionais, os prováveis efluentes, emissões, resíduos de energia, os empregos diretos e indiretos a serem gerados; III - A síntese dos resultados dos estudos de diagnósticos ambiental da área de influência do projeto; IV - A descrição dos prováveis impactos ambientais da implantação e operação da atividade, considerando o projeto, suas alternativas, os horizontes de tempo de incidência dos impactos e indicando os métodos, técnicas e critérios adotados para sua identificação, quantificação e interpretação; V - A caracterização da qualidade ambiental futura da área de influência, comparando as diferentes situações da adoção do projeto e suas alternativas, bem como com a hipótese de sua não realização;

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VI - A descrição do efeito esperado das medidas mitigadoras previstas em relação aos impactos negativos, mencionando aqueles que não puderam ser evitados, e o grau de alteração esperado; VII - O programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos; VIII - Recomendação quanto à alternativa mais favorável (conclusões e comentários de ordem geral).

O RIMA deve ser entregue junto com o EIA, em no mínimo 5 vias.

5.5.2. Estudo de impacto de vizinhança (EIV)

O EIV está previsto no arts. 36 a 38 da Lei n. 10.257/01 (Estatuto da Cidade). Ele será necessário para a obtenção de licença municipal para construção, ampliação ou funcionamento da empresa, em atividades desenvolvidas em área urbana, assim definidas por lei municipal. Os objetivos do EIV estão previstos no art. 37 daquele Estatuto:

Art. 37. O EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes questões: I – adensamento populacional; II – equipamentos urbanos e comunitários; III – uso e ocupação do solo; IV – valorização imobiliária; V – geração de tráfego e demanda por transporte público; VI – ventilação e iluminação; VII – paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.

Vê-se que os objetivos traçados pelo legislador, em relação ao EIV, é o de garantir o uso ordenado e sustentável da cidade (cf. art. 2º do próprio estatuto), possibilitando o desenvolvimento econômico (cf. art. 1º, IV c.c. 3º, da Constituição Federal), mas assegurando à população local uma vida digna (cf. art. 1º, III c.c. art. 6º e 225, todos da Constituição Federal).

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É importante observar que o EIV não substitui a elaboração e aprovação do EIA. Tratam-se de estudos complementares, que são exigidos concomitantemente, pois cuidam de assuntos diferentes. O EIA se ocupa especialmente do meio ambiente natural, enquanto o EIV do meio ambiente artificial, em questões ligadas à densidade demográfica, infraestrutura, transporte, uso do solo, entre outros, em relação à população residente na área.

As atividades sujeitas ao EIV são definidas por lei municipal. Somente estarão obrigadas ao estudas as atividades referidas na lei. Para as demais, não há essa obrigação. Assim sendo, não é caso de se definir em lei nenhum tipo de dispensa, pois se determinada atividade não está relacionada na lei, ela estará automaticamente dispensada da obrigação.

MÓDULO 6. O Código Florestal.

6.1. Considerações iniciais.

Após mais de 10 anos de discussão no Congresso Nacional, em 25 de maio de

2012, cercado de muita polêmica, foi finalmente aprovado o novo Código Florestal, em

substituição ao anterior que datava do ano de 1965 (Lei 4771/65). Esse novo Código

Florestal – que decorre do Projeto de Lei 1876/99 – foi promulgado com 12 vetos da

Presidenta Dilma Rousseff (o texto original tinha 84 artigos). Posteriormente, a Lei

12.727/2012 introduziu diversas modificações ao texto original.

6.2. Âmbito de incidência da lei.

O Código Florestal estabelece normas gerais para proteção da flora, vale dizer,

da vegetação nativa, das áreas de preservação permanente, de uso restrito e das

reservas legais. Também se aplica para a exploração florestal, o suprimento de matéria-

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prima florestal, o controle da origem dos produtos florestais e o controle e prevenção dos

incêndios florestais. Prevê, ainda, instrumentos econômicos e financeiros para controle

de seus objetivos.

Ele se insere no contexto da tutela jurídica do meio ambiente, estando sujeito aos

princípios do direito ambiental. O principal deles, que informa expressamente a lei, é o

desenvolvimento sustentável. Isso revela que as florestas, assim consideradas a

vegetação nativa, as áreas de preservação permanente, de uso restrito e as áreas de

reserva legal não são intocáveis. São recursos naturais, bens de uso comum do povo. A

sua regulamentação, então, é no sentido de protegê-los e preservá-la para as futuras

gerações.

6.3. Interesse comum e limitação da propriedade privada.

Sabendo que as florestas são consideradas bens ambientais, na forma prevista

no art. 225 da Constituição Federal, vamos observar, no Código Florestal, que as

florestas e as demais formas de vegetação constituem também bens de interesse

comum a todos os habitantes do Brasil. Com isso, a referida lei estabelece um princípio

de limitação da propriedade privada em benefício do interesse social. Essa limitação vai

incidir na propriedade imobiliária, restringindo o seu uso, estabelecendo-se a proibição

total ou parcial da supressão da vegetação, conforme se classifique o imóvel em área

de preservação permanente, de uso restrito ou de reserva legal.

O Código Florestal, assim, estabelece regras que limitam o direito de propriedade

privada, na medida em que retiram do proprietário o direito de usá-lo plenamente, não

tendo, pois, a livre disposição do seu bem. Trata de uma limitação administrativa que

tem fundamento no interesse público e na função socioambiental da propriedade.

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A demarcação de áreas de Preservação Permanente e a delimitação da área de

Reserva Legal, para citar os mais comuns, impedem o pleno uso da propriedade por seu

proprietário, traduzindo-se numa clara limitação ao direito de propriedade. Mas nada há

de ilegal ou inconstitucional nisso. Muito pelo contrário.

Devemos observar – e isso é extremamente importante – não existe mais direito

de propriedade que seja absoluto. Pelo menos não no direito pátrio. Aqueles direitos

tradicionais e clássicos de propriedade – de usar, gozar, fruir, dispor e destruir a coisa –

não podem ser opostos ao interesse público.

O direito de propriedade, hoje, só é legítimo quando respeitada a sua função

social, de sorte que, para realizar o bem comum, poderá o Estado intervir na propriedade

privada.

Colocar limites no direito de propriedade não é tema novo. O direito administrativo

consagra várias formas que o Poder Público adota para impor esses limites, como, por

exemplo, o tombamento.

Podemos afirma, destarte, que as disposições contidas no Código Florestal,

especialmente aquelas relativas a área de Preservação Permanente e as da área de

Reserva Legal, constituem limitação administrativa, pois impõe ao proprietário do

imóvel rural a obrigação negativa, vale dizer, de não suprimir a vegetação da área

correspondente.

Tal obrigação decorre da prevalência do interesse público sobre o particular,

consubstanciado na necessidade da preservação ambiental e não gera nenhum tipo de

indenização ao proprietário que teve limitado o seu direito de propriedade.

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Nas áreas de Preservação Permanente, assim como na área de Reserva Legal,

registrada na forma mencionado acima, a vegetação nativa não pode ser suprimida,

devendo ser conservada pelo proprietário (ou detentor, a qualquer título) do imóvel.

O proprietário ou detentor que, não respeitando essas áreas, promover a

supressão da vegetação nativa poderá sofrer embargo na sua propriedade, além de

multa e a obrigação de recomposição da vegetação.

6.4. Das Áreas de Preservação Permanente (APP).

6.4.1. Conceito e classificação.

Área de Preservação Permanente é uma área protegida por lei,

onde não pode haver supressão da vegetação, salvo em casos de utilidade pública ou

interesse social, devidamente autorizados.

São consideradas áreas de preservação permanente:

I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os

efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros

de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:

a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície,

cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;

b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;

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III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou

represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento

IV - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação

topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros;

V - as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento)

na linha de maior declive;

VI - as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

VII - os manguezais, em toda a sua extensão;

VIII - as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a

100 (cem) metros em projeções horizontais;

IX - no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e

inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3

(dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano

horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota

do ponto de sela mais próximo da elevação;

X - as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação;

XI - em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta)

metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.

Serão consideradas áreas de preservação permanente, quando assim declaradas

por ato do chefe do Poder Executivo, as destinadas:

I - conter a erosão do solo e mitigar riscos de enchentes e deslizamentos de terra e de rocha;

II - proteger as restingas ou veredas;

III - proteger várzeas;

IV - abrigar exemplares da fauna ou da flora ameaçados de extinção;

V - proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico, cultural ou histórico;

VI - formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;

VII - assegurar condições de bem-estar público;

VIII - auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares.

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IX - proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional.

6.4.2. O regime de proteção legal da APP.

Nas Áreas de Preservação Permanente, o detentor da área, seja ele proprietário,

possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, deverá manter a

vegetação existente intacta.

No caso de supressão da vegetação, sem autorização legal, o detentor ficará

obrigado a promover a recomposição da vegetação. É importante observar que essa

obrigação tem natureza real, de sorte que ela se transmite ao sucessor, no caso de

transferência de domínio ou de posse da área.

A supressão da vegetação em APP só é permitida em casos de utilidade

pública, interesse social, ou de baixo impacto ambiental. Todavia, em se tratando

devegetação nativa protetora de nascentes, dunas e restingas, a supressão só será

permitida em caso de utilidade pública.

Em restingas e manguezais a supressão poderá ser

autorizada, excepcionalmente, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja

comprometida, para execução de obras habitacionais e de urbanização, inseridas em

projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas

ocupadas por população de baixa renda.

Para a realização, em caráter de urgência, de atividades de segurança nacional e

obras de interesse da defesa civil destinadas à prevenção e mitigação de acidentes em

áreas urbanas, a autorização do órgão ambiental para a supressão da vegetação

está dispensada.

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6.5. Das Áreas de Uso Restrito.

São considerados de uso restrito os pantanais e as planícies pantaneiras.

Nessas áreas, é permitido o uso ecologicamente sustentável, desde que apoiado em

recomendação técnica dos órgãos oficiais de pesquisa.

A supressão de vegetação nativa para o uso alternativo do solo está condicionada

a autorização do órgão ambiental do Estado que, para tanto, deve se basear nas

recomendações mencionadas acima.

Em se tratando de área com inclinação entre 25º e 45º, serão permitidos o manejo

florestal sustentável e o exercício de atividades agrossilvipastoris, bem como a

manutenção da infraestrutura física associada ao desenvolvimento das atividades,

observadas boas práticas agronômicas.

6.6. Do uso ecologicamente sustentável de Apicuns e Salgados.

Apicuns e salgados são áreas encontradas na zona costeira e, como tal, seu uso

deve se dar de maneira ecologicamente sustentável.

Os apicuns e salgados podem ser utilizados para as atividades de carcinicultura

e salinas, desde que observados os requisitos legais.

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As atividades desenvolvidas nos apicuns e salgados estão sujeitas

ao licenciamento ambiental. Essa licença terá validade por 5 anos, podendo ser

renovada apenas se o empreendedor cumprir as exigências da legislação ambiental e

do próprio licenciamento, mediante comprovação anual, inclusive por mídia fotográfica.

6.7. Das Áreas de Reserva Legal.

6.7.1. Conceito e classificação.

Todo imóvel rural deve ter uma área de Reserva Legal, onde manterá a cobertura

vegetal nativa, não se permitindo a sua supressão. A área de reserva legal deverá ser

delimitada da seguinte forma:

Se o imóvel for localizado na Amazônia Legal:

- 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;

- 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;

- 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;

Se o imóvel for localizado nas demais regiões do País:

- 20% (vinte por cento).

Todavia, em algumas situações, o Código Florestal permite a alteração desses

percentuais, que podem ser reduzidos, ampliados e mesmo isentados.

6.7.2. O regime de proteção da Reserva Legal

Para a sua formalização, a área de Reserva Legal, estabelecida conforme

percentuais acima destacados, deve ser registrada no órgão ambiental competente,

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através do Cadastro Ambiental Rural (CAR), com aprovação do órgão ambiental

competente. Esse registro desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis.

O registro no CAR deverá ser feito mediante apresentação de planta e memorial

descritivo, contendo a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto

de amarração, conforme ato do Chefe do Poder Executivo.

Uma vez registrada, a área de Reserva Legal não poderá sofrer alteração de sua

destinação, mesmo – e especialmente – em casos de transmissão do imóvel por

qualquer forma, ou de desmembramento.

Em se tratando de posse, a área de Reserva Legal é assegurada por termo de compromisso firmado pelo

possuidor com o órgão competente do Sisnama, com força de título executivo extrajudicial, que explicite, no mínimo,

a localização da área de Reserva Legal e as obrigações assumidas pelo possuidor por força do previsto nesta Lei.

Atransferência da posse implica a sub-rogação, pelo novo possuidor, das obrigações assumidas naquele termo de

compromisso.

A área de Reserva Legal devidamente registrada persegue o imóvel gravado

perpetuamente. Como ela é própria para imóveis rurais, a única possibilidade de sua

extinção é o imóvel deixar de ser rural e ser considerado urbano.

Todavia, é preciso observar que a inserção do imóvel rural em perímetro

urbano definido mediante lei municipal, por si só, não desobriga o proprietário ou

posseiro da manutenção da área de Reserva Legal.

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Para que haja a extinção da obrigação, deve haver o registro do parcelamento

do solo para fins urbanos aprovado segundo a legislação específica e consoante as

diretrizes do plano diretor municipal.

6.8..2. Da compensação ambiental

A compensação ambiental é um poderoso instrumento econômico de prevenção

e preservação ambiental. Assim, ao lado do que já era previsto para as Unidades de

Conservação e para a proteção da Mata Atlântica, o Código Florestal também a prevê,

principalmente sob a forma de Reposição Florestal e do Plano de Suprimento

Sustentável.

Módulo 7. Recursos hídricos

7.1. A Política Nacional de Recursos Hídricos.

Em atenção ao disposto no art. 21, XIX, da Constituição Federal, foi promulgada

a Lei 9.433/97, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos.

A preocupação com a água não é novidade no direito pátrio. Desde a década de

30, o País contava com o Código de Águas (Decreto n. 24.643/34). Todavia, tal código

é de uma época em que o Brasil não se preocupava com problemas de escassez e de

poluição.

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Desta forma, a lei 9.433/97 veio preencher uma lacuna importante no ordenamento

jurídico, no que tange à proteção das águas.

7.1.1. Fundamentos, objetivos e diretrizes da Política Nacional de Recursos

Hídricos.

7.1.1.1. Fundamentos

Evidente que, por se tratar de uma lei de caráter ambiental (e que vai integrar o

sistema nacional de proteção ambiental) a Lei 9.433/97 está subordinada aos princípios

que informam o próprio direito ambiental. Mas ela assenta-se também em seus próprios

fundamentos.

Assim, vamos observar que a água é um bem ambiental: trata-se de um bem

de domínio público (Lei 9.433/97, art. 1º, I), o que significa dizer que os recursos hídricos

não têm um dono. As águas são inalienáveis, de sorte que ninguém, seja a que título for,

poderá se assenhorear delas (Lei 9.433/97, art. 18).

Ela é um bem de uso comum do povo (Código Civil, art. 99, I) e essencial à sadia

qualidade de vida, como já vimos no capítulo 6.

Além disso tudo, a Lei 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente), no seu art.

3º, V, dispõe que as águas inferiores, superficiais e subterrâneas e os estuário e o mar

territorial são considerados como recursos ambientais.

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Todavia, a água é um recurso natural limitado e, por isso mesmo, ela tem um

valor econômico (Lei 9.433/97, art. 1º, II), o que autoriza a cobrança pelo seu uso, como

veremos abaixo.

A prioridade no uso da água é o consumo humano. O uso empresarial é

secundário. Deste modo, havendo escassez e racionamento do uso da água, deve-se

priorizar o uso da água pelos seres humanos (Lei 9.433/97, art. 1º, III).

A gestão dos recursos hídricos é um direito – e um dever – de toda a sociedade.

Por isso mesmo, tal gestão deve ser descentralizada, contando com o Poder Público, os

usuários e comunidades (Lei 9.433/97, art. 1º, VI).

A política de recursos hídricos terá, assim, dois extremos, quais sejam: os planos

de recursos hídricos de um lado e a cobrança pelo uso da água, de outro. No meio disso,

estão os instrumentos de controle administrativo como a outorga e o licenciamento

ambiental.

7.1.1.2. Objetivos

A lei 9.433/97 é uma lei de proteção ambiental, de sorte que seus objetivos,

obviamente, estão voltados a isso. A proteção dos recursos hídricos é importante, pois,

tratando-se de recursos naturais limitados, eles podem desaparecer. Deste modo, a

Política Nacional de Recursos Hídricos vai se preocupar com o uso sustável das águas,

com vistas à utilização racional e integrada desses recursos (art. 2º, II), bem como com

a prevenção de danos a eles (art. 2º, III), para assegurar para as presentes e futuras

gerações a sua disponibilização, com qualidade adequada, para uso e consumo (art. 2º,

I).

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7.1.1.3. Diretrizes.

Para tornar eficaz a proteção aos recursos hídricos, a Lei 9.433/97 traça diretrizes

a serem observadas na gestão de tais recursos. Tendo em vista que essa gestão deve

ser descentralizada, com a participação do Poder Público e da sociedade civil, as

diretrizes dispostas na referida lei apontam nesse sentido, de gestão integrada. Destarte,

temos que a gestão dos recursos hídricos deverá ser realizada de maneira sistemática,

sem dissociação de aspectos de qualidade e quantidade (art. 3º, I), com a adequação às

diversidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diversas

regiões do País (art. 3º, II).

Uma vez que a Política Nacional de Recursos Hídricos faz parte do Sistema

Nacional de Defesa do Meio Ambiente, a gestão desses recursos deve estar integrada

com a gestão ambiental (art. 3º, III). Para as empresas, em especial, a gestão dos

recursos hídricos, quando necessária, deverá integrar o processo de licenciamento

ambiental.

Além disso, o planejamento dos recursos hídricos deve ser implementado de

forma articulada com o planejamento dos usuários e com os planejamentos regional,

estadual e municipal (art. 3º, IV).

E ainda, a gestão dos recursos hídricos deve estar articulada com a gestão do

uso do solo (art. 3º, V) e a gestão das bacias hidrográficas, articulada com a gestão dos

sistemas estuarinos e zonas costeiras (art. 3º, VI).

7.1.2. A cobrança pelo uso da água

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A água é um recurso natural limitado e, em razão dessa limitação, a água não

pode ser desperdiçada, devendo ter seu uso racionalizado. Por conta disso, a água é

dotada de valor econômico e o seu uso pode estar sujeito a cobrança. A Lei 9.433/97

prevê essa cobrança como um dos instrumentos da Política Nacional de Recursos

Hídricos (art. 5º, IV).

A cobrança pelo uso da água, menos do que ter um caráter arrecadatório, tem

por objetivos primeiros a conscientização do usuário, dando a ele uma real indicação do

valor da água (art. 19, I) e incentivando ao seu uso racional (art. 19, II). O dinheiro

arrecadado pelo uso dos recursos hídricos deverá ser utilizado no financiamento dos

programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos (art. 19, III).

O valor cobrado pelo uso da água deve ser definido pelo Poder Público. Mas esse

valor não é aleatório, devendo observar alguns critérios:

I - nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu regime de variação;

II - nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o volume lançado e seu

regime de variação e as características físico-químicas, biológicas e de toxidade do afluente.

Os valores que forem arrecadados com essa cobrança deverão, com prioridade, ser aplicados na bacia

hidrográfica em que foram gerados, sendo utilizados para a)financiamento de estudos, programas, projetos e obras

incluídos nos Planos de Recursos Hídricos e b) pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo dos

órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Nessa última hipótese,

o valor é limitado a 7,5% do valor total arrecadado.

Há de se observar, todavia, que os valores arrecadados, na sua totalidade, poderão ser aplicados a fundo

perdido em projetos e obras que alterem, de modo considerado benéfico à coletividade, a qualidade, a quantidade e

o regime de vazão de um corpo de água.

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7.1.3. O uso da água e as atividades humanas.

Algumas empresas, em razão da atividade que desenvolvem, precisam de uma

outorga de direitos para o uso da água. Essa outorga tem como objetivos a) assegurar o

controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e b) o efetivo exercício dos direitos

de acesso à água.

As empresas sujeitas ao regime de outorga são as que fazem uso da água nas

seguintes situações:

I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final,

inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;

II - extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo;

III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou

não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;

IV - aproveitamento dos potenciais hidrelétricos;

V - outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo

de água.

A concessão da outorga está condicionada às prioridades de uso que tenham

sido estabelecidas nos Planos de Recursos Hídricos. No caso de uso dos recursos

hídricos para fins de geração de energia elétrica, a outorga está condicionada ao Plano

Nacional de Recursos Hídricos.

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A outorga está condicionada ainda ao pagamento pelo uso da água. A Lei

9.433/97, no art. 20, dispõe que “serão cobrados os usos de recursos hídricos sujeitos a

outorga, nos termos do art. 12 desta Lei”.

Essa outorga de direito de uso, que não poderá ser superior a 35 anos, está à

cargo da autoridade competente do Poder Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito

Federal. A outorga vencida poderá ser renovada.

Não é demais lembrar que, sendo bem de uso comum do povo, as águas são

inalienáveis. Desta forma, a outorga não significa alienação, por qualquer forma, dos

recursos hídricos, mas simples direito de seu uso.

Algumas atividades não dependem da outorga. São elas:

I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais,

distribuídos no meio rural;

II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;

III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.

A outorga poderá ser suspensa por ato da mesma autoridade que a concedeu.

Essa suspensão poderá ser total ou parcial, em definitivo ou por prazo determinando.

São motivos que implicam na suspensão:

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I - não cumprimento pelo outorgado dos termos da outorga;

II - ausência de uso por três anos consecutivos;

III - necessidade premente de água para atender a situações de calamidade, inclusive as decorrentes

de condições climáticas adversas;

IV - necessidade de se prevenir ou reverter grave degradação ambiental;

V - necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo, para os quais não se disponha

de fontes alternativas;

VI - necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade do corpo de água.

A empresa não poderá realizar a derivação ou utilização dos recursos hídricos,

sem a respectiva outorga de uso. Também não poderá utilizar-se dos recursos hídricos

ou executar obras ou serviços relacionados com os mesmos em desacordo com as

condições estabelecidas na outorga.

São atos que constituem infração às normas de utilização dos recursos hídricos

(Lei 9.433/97, art. 49, I e IV), sujeitando o infrator às seguintes sanções:

I - advertência por escrito, na qual serão estabelecidos prazos para correção das irregularidades;

II - multa, simples ou diária, proporcional à gravidade da infração, de R$ 100,00 (cem reais) a R$

10.000,00 (dez mil reais);

III - embargo provisório, por prazo determinado, para execução de serviços e obras necessárias ao

efetivo cumprimento das condições de outorga ou para o cumprimento de normas referentes ao uso,

controle, conservação e proteção dos recursos hídricos;

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IV - embargo definitivo, com revogação da outorga, se for o caso, para repor incontinenti, no seu

antigo estado, os recursos hídricos, leitos e margens, nos termos dos arts. 58 e 59 do Código de

Águas ou tamponar os poços de extração de água subterrânea.

Módulo 8. Resíduos sólidos

8.1. Considerações gerais

A Lei 12.305/2010 introduziu no País a Política Nacional de Resíduos Sólidos,

sendo regulamentada pelo Decreto n. 7404/2010.

Tal lei destina-se a pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado,

responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que

desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos

sólidos.

Resíduo sólido é o lixo gerado por qualquer atividade humana. Conforme definição

dada pela própria lei, no art. 3º, XVI, é qualquer

material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades

humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder

ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como

gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável

o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam

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para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor

tecnologia disponível.

A resolução n. 5 do CONAMA, de 1993, já tratava desse assunto, definindo-os,

com base na NBR n. 10.004 da ABNT, como sendo

resíduos nos estados sólido e semi-sólido, que resultam de atividades da

comunidade de origem: industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de

serviços e de varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos provenientes de

sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e

instalações de controle de poluição, bem como determinados líquidos cujas

particularidades tornem inviável seu lançamento na rede pública de esgotos ou

corpos d'água, ou exijam para isso soluções técnica e economicamente

inviáveis, em face à melhor tecnologia disponível.

8.2. Princípios e objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos

A política nacional de resíduos sólidos é uma ação pública integrada e coordenada

com o sistema de proteção ambiental – a política nacional do meio ambiente – que

reúne o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações

adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime de cooperação com

Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao

gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos.

A Lei 12.305/2010 estabelece seus princípios informadores no art. 6º, que traz

um rol extenso que abrange praticamente todos os princípios do direito ambiental.

Todavia, embora essa lei seja esteja baseada em diversos princípios do direito

ambiental, não temos dúvida de que o princípio que melhor lhe orienta é o do poluidor-

pagador, pois impõe ao poluidor os custos relativos aos resíduos sólidos gerados pela

sua atividade.

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Dentre os objetivos dessa lei, consignados no art. 7º, destacamos o inciso I, que

se refere à “proteção da saúde pública e da qualidade ambiental”. A preocupação do

legislador com esses dois itens é salutar e importantíssima, pois a inadequada

disposição de resíduos sólidos é causa de problemas de saúde pública, como vimos no

caso da Shell em Paulínia, o do Condomínio Barão de Mauá, na cidade de Mauá.

Desta forma, as empresas deverão cuidar dos resíduos sólidos que sua atividade

produz, adotando um sistema de gerenciamento e gestão. Para tanto, deverão observar,

em ordem de prioridade, as seguintes ações:

1) não geração de resíduos,

2) redução dos resíduos gerados,

3) reutilização dos resíduos gerados,

4) reciclagem,

5) tratamento dos resíduos,

6) disposição final ambientalmente adequada.

Isso significa que as empresas deverão cuidar para não gerar resíduos sólidos

na sua atividade, ou seja, zerar a produção de resíduos. Em não sendo possível, devem

buscar meios para diminuir a geração de resíduos, bem como tentar reutilizá-los, reciclá-

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los e tratá-los. E quando nada disso for possível, devem, dar destinação adequada a

eles, de sorte a não promover um impacto ambiental.

O custo para tanto deve ser carreado exclusivamente à empresa responsável,

promovendo, destarte, a internalização dessa externalidade. Dá-se, com isso, a

concreção do princípio do poluidor-pagador.

8.3. Classificação dos resíduos sólidos

A Lei 12.305/10, no art. 13, classifica os diversos tipos de resíduos sólidos em

duas categorias, considerando a sua origem e o seu grau de periculosidade.

8.3.1. Quanto à origem:

a) resíduos domiciliares: os originários de atividades domésticas em residências urbanas;

b) resíduos de limpeza urbana: os originários da varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e outros

serviços de limpeza urbana;

c) resíduos sólidos urbanos: os englobados nas alíneas “a” e “b”;

d) resíduos de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços: os gerados nessas atividades,

excetuados os referidos nas alíneas “b”, “e”, “g”, “h” e “j”;

e) resíduos dos serviços públicos de saneamento básico: os gerados nessas atividades, excetuados os

referidos na alínea “c”;

f) resíduos industriais: os gerados nos processos produtivos e instalações industriais;

g) resíduos de serviços de saúde: os gerados nos serviços de saúde, conforme definido em regulamento

ou em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS;

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h) resíduos da construção civil: os gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de obras de

construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis;

i) resíduos agrossilvopastoris: os gerados nas atividades agropecuárias e silviculturais, incluídos os

relacionados a insumos utilizados nessas atividades;

j) resíduos de serviços de transportes: os originários de portos, aeroportos, terminais alfandegários,

rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira;

k) resíduos de mineração: os gerados na atividade de pesquisa, extração ou beneficiamento de minérios;

8.3.2. Quanto à periculosidade:

a) resíduos perigosos: aqueles que, em razão de suas características de inflamabilidade, corrosividade,

reatividade, toxicidade, patogenicidade, carcinogenicidade, teratogenicidade e mutagenicidade, apresentam

significativo risco à saúde pública ou à qualidade ambiental, de acordo com lei, regulamento ou norma

técnica;

b) resíduos não perigosos: aqueles não enquadrados na alínea “a”.

8.3. Plano de gerenciamento

O plano de gerenciamento é um dos instrumentos da Política Nacional de Resíduos

Sólidos (art. 8º, I), ao lado dos demais planos que devem ser implementados pelo Poder

Público.

O plano de gerenciamento é um instrumento de iniciativa particular. A empresa

deverá elaborar esse plano conforme a sua atividade. Nem toda empresa está obrigada

a elaborá-lo.

Trata-se de um documento, integrante do licenciamento ambiental, que aponta

e descreve as ações relativas ao manejo de resíduos sólidos, contemplando os aspectos

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referentes à geração, segregação, acondicionamento, coleta, armazenamento,

transporte, tratamento e disposição final, bem como a proteção à saúde pública.

Estão obrigados à elaboração de um plano de gerenciamento de resíduos sólidos:

I - os geradores de resíduos sólidos previstos nas alíneas “e”, “f”, “g” e “k” do inciso I do art. 13 da

Lei 12.305/10 (resíduos dos serviços públicos de saneamento básico, resíduos industriais, resíduos

de serviços de saúde e resíduos de mineração, respectivamente)

II - os estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços que:

a) gerem resíduos perigosos, assim classificados no inciso II do art. 13;

b) gerem resíduos que, mesmo caracterizados como não perigosos, por sua natureza, composição ou

volume, não sejam equiparados aos resíduos domiciliares pelo poder público municipal;

III - as empresas de construção civil, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos

órgãos do Sisnama;

IV - os responsáveis pelos terminais e outras instalações referidas na alínea “j” do inciso I do art. 13

e, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e, se couber, do

SNVS, as empresas de transporte;

V - os responsáveis por atividades agrossilvopastoris, se exigido pelo órgão competente do Sisnama,

do SNVS ou do Suasa.

O plano de gerenciamento deverá conter, ao menos:

I - descrição do empreendimento ou atividade;

II - diagnóstico dos resíduos sólidos gerados ou administrados, contendo a origem, o volume e a

caracterização dos resíduos, incluindo os passivos ambientais a eles relacionados;

III - observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa e, se houver,

o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos:

a) explicitação dos responsáveis por cada etapa do gerenciamento de resíduos sólidos;

b) definição dos procedimentos operacionais relativos às etapas do gerenciamento de resíduos

sólidos sob responsabilidade do gerador;

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IV - identificação das soluções consorciadas ou compartilhadas com outros geradores;

V - ações preventivas e corretivas a serem executadas em situações de gerenciamento incorreto ou

acidentes;

VI - metas e procedimentos relacionados à minimização da geração de resíduos sólidos e, observadas

as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, à reutilização e reciclagem;

VII - se couber, ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, na

forma do art. 31;

VIII - medidas saneadoras dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos;

IX - periodicidade de sua revisão, observado, se couber, o prazo de vigência da respectiva licença de

operação a cargo dos órgãos do Sisnama.

Esse plano deve ser elaborado conforme o plano municipal de gestão de resíduos

sólidos e das normas estabelecidas pelos órgãos ambientais do SISNAMA, SNVS E

SUASA e deverá estar integrado ao licenciamento ambiental.

Estão dispensadas da elaboração do plano de gerenciamento

as microempresas e empresas de pequeno porte, como definidas na Lei

Complementar 123/2006, que gerem apenas resíduos domiciliares ou equiparados.

8.4. Responsabilidade pelos resíduos sólidos

As empresas têm responsabilidade concorrente (junto com o Poder Público e a

coletividade) pela efetividade das ações voltadas para assegurar a observância da

Política Nacional de Resíduos Sólidos e das diretrizes e demais determinações

estabelecidas em lei. No caso daquelas empresas que estão obrigadas, em razão de sua

atividade, à elaboração do plano de gerenciamento, é sua responsabilidade a

implementação e operacionalização integral do referido plano, que deve ser aprovado

pelo órgão competente.

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É importante observar que a contratação de outra empresa para realização dos

serviços de coleta, armazenamento, transporte, transbordo, tratamento ou destinação

final de resíduos sólidos, ou de disposição final de rejeitos, não isenta a empresa

contratante da responsabilidade pelos danos que vierem a ser provocados em razão do

gerenciamento inadequado dos respectivos resíduos ou rejeitos. Trata-se, em realidade,

de uma responsabilidade subsidiária, pois quando a empresa contratada não tiver

condições financeiras de suportar a indenização devida pelo dano causado, quem deverá

pagar é a empresa contratante.

As empresas que operam com resíduos perigosos, em qualquer fase do seu

gerenciamento, têm a obrigação de se registrar no Cadastro Nacional de Operadores de

Resíduos Perigosos, cuja coordenação está a cargo do IBAMA. Tais empresas deverão

contar com um responsável técnico pelo gerenciamento dos resíduos perigosos,

devidamente habilitado, cujos dados, sempre atualizados, devem constar do cadastro.

A responsabilidade das empresas pelos resíduos sólidos decorrentes de sua

atividade é objetiva, como de resto é toda responsabilidade em matéria ambiental, como

se vê do art. 14, § 1º, da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei 6938/81).

Mas para não dar margem a qualquer tipo de dúvida, a Lei 12.305/10, no seu art.

51, reforça essa idéia, estabelecendo que a obrigação de reparar o dano

causadoindepende de culpa. Desta forma, a afirmação de que tal responsabilidade é

do tipo objetiva decorre de própria previsão legal.

8.5. Responsabilidade subsidiária do Poder Público

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A empresa é responsável pelo lixo que produz na sua atividade. É dela a obrigação

legal de promover redução dos resíduos, a sua reutilização e reciclagem, como veremos

a seguir. Tem responsabilidade, ainda, pelos resíduos decorrentes do pós-venda

(logística reversa). Logo, ela tem responsabilidade pelos danos que os resíduos sólidos

por ela produzidos venham causar ao meio ambiente.

Todavia, o art. 29 da Política Nacional de Resíduos Sólidos, estabelece a

responsabilidade subsidiária do Poder Público nessa questão, estabelecendo que cabe

a ele “atuar, subsidiariamente, com vistas a minimizar ou cessar o dano, logo que

tome conhecimento de evento lesivo ao meio ambiente ou à saúde pública

relacionado ao gerenciamento de resíduos sólidos”.

Isso significa que, quando necessário ou quando a empresa responsável não

tomar as providências necessárias para evitar, minimizar, fazer cessar ou reparar o

dano, o Poder Público deverá agir.

Mas é preciso observar que em tais situações, a empresa responsável pelo dano

deverá ressarcir integralmente o Poder Público pelos gastos das ações por ele

empreendidas.

8.6. Responsabilidade compartilhada

O princípio da participação tem especial importância ao direito ambiental, na

medida em que impõe a todos – ao Poder Público e à coletividade – o cuidado com o

meio ambiente. Esse princípio é adotado pela Lei 12.305/10 ao tratar da

responsabilidade dos geradores, ao dispor, no art. 25, que o poder público, o setor

empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações voltadas

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para assegurar a observância da Política Nacional de Resíduos Sólidos e das

diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta Lei e em seu regulamento.

Partindo desse princípio, a Lei 12.305/10, no art. 30, estabelece

a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. Essa

responsabilidade é compartilhada entre fabricantes, importadores, distribuidores e

comerciantes, os consumidores e os titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e

de manejo de resíduos sólidos.

Por ciclo de vida do produto entende-se todo o período que compreende desde

a fabricação até o consumo e consequente descarte do produto, principalmente.

A responsabilidade compartilhada será implementada de forma individualizada e

encadeada pelas pessoas acima mencionadas, conforme atribuições e procedimentos

estabelecidos para cada um na própria Lei 12.305/10.

A atribuição da responsabilidade objetivo tem objetivos claros: que todos aqueles

que participam da cadeia de consumo sejam responsáveis pelos resíduos dela

decorrentes. Assim, produtores, distribuidores, comerciantes e consumidores têm

atribuídos a si responsabilidades pelo lixo que produzem.

A responsabilidade compartilhada vai atingir a todos na cadeia de consumo,

inclusive o próprio consumidor. Mas não resta dúvida de que a responsabilidade maior

recai sobre as empresas, pois são essas que auferem lucro e, logo, devem destinar parte

desses lucros para a preservação ambiental, como vimos ao tratar da relação entre a

livre iniciativa e o meio ambiente.

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A Lei 12.305/10, observando tal princípio, estabeleceu, no art. 31, obrigações que

as empresas deverão observar, no que se refere aos seus produtos, e que não se

confundem com as obrigações estabelecidas no plano de gerenciamento. Tais

obrigações visam, basicamente, a promover produtos reutilizáveis ou recicláveis,

diminuir a quantidade de resíduos na produção, e recolher os resíduos do pós-consumo

(logística reversa). São elas:

I - investimento no desenvolvimento, na fabricação e na colocação no mercado de produtos:

a) que sejam aptos, após o uso pelo consumidor, à reutilização, à reciclagem ou a outra forma de

destinação ambientalmente adequada;

b) cuja fabricação e uso gerem a menor quantidade de resíduos sólidos possível;

II - divulgação de informações relativas às formas de evitar, reciclar e eliminar os resíduos sólidos

associados a seus respectivos produtos;

III - recolhimento dos produtos e dos resíduos remanescentes após o uso, assim como sua

subsequente destinação final ambientalmente adequada, no caso de produtos objeto de sistema de

logística reversa na forma do art. 33;

IV - compromisso de, quando firmados acordos ou termos de compromisso com o Município,

participar das ações previstas no plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos, no caso

de produtos ainda não inclusos no sistema de logística reversa.

8.7. Logística reversa

A logística reversa é um instrumento de controle do lixo produzido pela atividade

empresarial. Trata-se de um processo de planejamento, gestão e controle dos resíduos

sólidos decorrentes do pós-venda e do pós-consumo. O seu objetivo é tanto de recuperar

valor (reciclagem), como promover o descarte adequado (evitando seu descarte com o

lixo comum). Ela baseia-se, indubitavelmente, no princípio da prevenção.

A definição legal de logística reversa encontra-se no art. 3º, inciso XII, da Lei

12.305/10, que trata da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

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A logística reversa é aplicada diretamente às empresas. A sua definição legal

não deixa dúvidas a respeito disso, ao mencionar expressamente o setor empresarial.

O objetivo é que as empresas promovam o retorno do resíduo sólido causado por seus

produtos, após o consumo, promovendo a internalização dessa externalidade ambiental.

Algumas empresas, em razão da atividade que desenvolvem, são obrigadas a

implantar um sistema de logística reversa, independentemente de haver um serviço

público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. Conforme dispõe o art. 33 da

Lei 12.305/10, tal obrigação atinge as empresas que fabricam, importam, distribuem e/ou

comercializam os seguintes produtos:

I - agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o

uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos

previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do

Suasa, ou em normas técnicas;

II - pilhas e baterias;

III - pneus;

IV - óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens;

V - lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista;

VI - produtos eletroeletrônicos e seus componentes.