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Duarte Nuno Laranjeira – Direito do Trabalho (2003-2004) PARTE INTRODUTÓRIA – NOÇÕES INICIAIS CAPÍTULO I CARACTERIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO Objecto do Direito do Trabalho Podemos, inicialmente, afirmar que é errado dizer-se que o Direito do Trabalho regulamenta todo o trabalho. Trocar uma lâmpada fundida em casa, consertar um aparelho eléctrico, embora sejam actividades humanas produtivas, não são reguladas pelo Dto do Trabalho. Exclui-se, pois, as actividades desenvolvidas pelos indivíduos para satisfação imediata de necessidades próprias. Desta forma, podemos avançar uma primeira definição de trabalho: trabalho é a actividade humana produtiva e socialmente útil. Este ramo de direito regulamenta relações sociais. No Dto do Trabalho apenas releva o trabalho prestado em benefício alheio. Por outro lado, o Dto do Trabalho pressupõe que exista um trabalho prestado no exercício da autonomia da vontade (trabalho livre, isto é, trabalho livremente exercido pelo seu prestador). Exclui-se, portanto, o trabalho desempenhado por escravos, ou as actividades forçadas ou compelidas. Ao D.T. interessa, somente, a actividade que tenha como contrapartida uma remuneração, um salário fornecido pelo seu beneficiário directo. De fora fica, então, o trabalho realizado gratuitamente. Trabalho subordinado (dependente ou heterodeterminado) e trabalho autónomo (ou independente) Todo o trabalho prestado por uma pessoa em benefício de outrem pode ser desenvolvido segundo os dois estatutos a seguir mencionados: 1

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Duarte Nuno Laranjeira – Direito do Trabalho (2003-2004)

PARTE INTRODUTÓRIA – NOÇÕES INICIAIS

CAPÍTULO I CARACTERIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO

Objecto do Direito do Trabalho

Podemos, inicialmente, afirmar que é errado dizer-se que o Direito do Trabalho regulamenta todo o trabalho. Trocar uma lâmpada fundida em casa, consertar um aparelho eléctrico, embora sejam actividades humanas produtivas, não são reguladas pelo Dto do Trabalho. Exclui-se, pois, as actividades desenvolvidas pelos indivíduos para satisfação imediata de necessidades próprias.

Desta forma, podemos avançar uma primeira definição de trabalho: trabalho é a actividade humana produtiva e socialmente útil.

Este ramo de direito regulamenta relações sociais. No Dto do Trabalho apenas releva o trabalho prestado em benefício alheio. Por outro lado, o Dto do Trabalho pressupõe que exista um trabalho prestado no exercício da autonomia da vontade (trabalho livre, isto é, trabalho livremente exercido pelo seu prestador). Exclui-se, portanto, o trabalho desempenhado por escravos, ou as actividades forçadas ou compelidas.

Ao D.T. interessa, somente, a actividade que tenha como contrapartida uma remuneração, um salário fornecido pelo seu beneficiário directo. De fora fica, então, o trabalho realizado gratuitamente.

Trabalho subordinado (dependente ou heterodeterminado) e trabalho autónomo (ou independente)

Todo o trabalho prestado por uma pessoa em benefício de outrem pode ser desenvolvido segundo os dois estatutos a seguir mencionados:

O trabalho subordinado é aquele em que o prestador está sujeito ás ordens, directrizes e orientações do beneficiário do trabalho quanto ao local, tempo e modo de execução desse trabalho (p.e., o operário fabril).

O trabalho autónomo é aquele em que o prestador do trabalho decide, dirige e planifica o modo de prestação desse trabalho, isto é, é o próprio prestador que decide quanto ás circunstâncias de tempo, lugar e modo da prestação do trabalho (p.e., o advogado ou o médico). O D.T. apenas regula o trabalho subordinado ou dependente.

Dentro do trabalho subordinado, podemos fazer a seguinte distinção: trabalho subordinado público e trabalho subordinado privado. O trabalho subordinado público é o trabalho prestado ao serviço do Estado e seus entes públicos. Esta forma não é regulada pelo D.T., mas sim pelo Dto Administrativo. Há, todavia, uma tendência para a privatização do trabalho subordinado público (art. 5º do diploma que aprova o Código do Trabalho). Por vezes, no âmbito das

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empresas públicas estaduais, o Estado actua de forma privada, despido do seu ius imperium. Nestas empresas, aplica-se, por regra, o regime do D.T..

Por seu turno, o trabalho subordinado privado é prestado ao serviço de empregadores privados.

O Direito do Trabalho abrange relações laborais privadas e assimiladas.

Relação individual de trabalho e relação colectiva de trabalho

No âmbito do Dto do Trabalho, existem dois tipos de relações laborais: a relação individual de trabalho e a relação colectiva de trabalho. A relação que se cria entre empregador e empregado denomina-se relação individual de trabalho. A relação que se estabelece entre os colectivos toma a designação de relação colectiva de trabalho (relevam aqui, os sindicatos e as associações patronais, p.e., que prosseguem os interesses colectivos das respectivas classes que representam).

O Dto do Trabalho regula tanto as relações individuais como as colectivas.

Definição de Direito do Trabalho

Ramo de direito constituído por um conjunto de normas jurídicas aplicáveis ás relações individuais e colectivas que se estabelecem entre empregadores privados ou assimilados e aqueles que trabalham sob sua autoridade e direcção, mediante uma retribuição.

Direito do Trabalho: Direito Público ou Direito Privado?

Podemos, hoje em dia, afirmar sem grande margem de dúvida que o Direito do Trabalho é um ramo de Direito Privado especial, não obstante ser fortemente influenciado pelo Direito Público.

Originariamente, o D.T. surge como forma de regular o contrato de trabalho que é, na sua essência, um contrato de Direito Civil (aliás, a definição de contrato de trabalho vem consagrada no Código Civil – art. 1152º).

O Estado impõe limites à liberdade contratual das partes, o que faz realçar a grande influência que aquele (pode ler-se Estado, ou Direito Público) exerce sobre o Dto do Trabalho, sendo que a intervenção do Estado se vai destinar a proteger a parte mais fraca e com menor poder económico no âmbito da relação laboral: o trabalhador. Daí, existirem autores que questionam a classificação de D.T. como Dto privado.

Em suma, a relação de emprego público está fora da definição de Dto do Trabalho como ramo de Dto privado.

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Fundamento da elaboração do Código do Trabalho

O Código do Trabalho veio revogar cerca de 50 diplomas legais, contribuindo assim para a reformulação e compilação deste ramo do Direito.

Importará salientar três aspectos desta importante mudança legislativa:1. a extrema necessidade de se proceder a uma revisão geral das leis de

trabalho;2. esta revisão foi feita num curto espaço de tempo;3. a ampla discussão pública que motivou esta reforma da legislação laboral,

contribuiu sobremaneira para o enriquecimento do Código e do Dto do Trabalho.

O Código procede à revisão e à unificação de múltiplas leis que regulam a prestação do trabalho subordinado, devendo notar-se que estas leis (avulsas e, em variados casos, contraditórias) em muito dificultavam a tarefa da sua aplicação, o que acrescido ao facto de muitas delas datarem, p.e. de 1969, tornava difícil à sua aplicabilidade prática à realidade actual.

Em face disto, o XIV Governo Constitucional nomeia uma comissão para a análise e sistematização da legislação laboral (1.ªs conclusões: relatórios apresentados em Setembro de 2001 e Maio de 2002). A vontade de reformulação do Dto do Trabalho vai ser reforçada no programa de governo do XV Governo Constitucional.

O anteprojecto de Código do Trabalho é apresentado aos parceiros sociais a 23/07/2002. Em todo o processo de elaboração do Código foram ouvidas organizações de trabalhadores e empregadores, organizações de docentes universitários, advogados e outros especialistas em Dto do Trabalho. A orientação que presidiu à elaboração do Código do Trabalho (C.T.) pode ser sintetizada através de algumas linhas-vector:

abertura à introdução de novas formas de trabalho (como p.e., o tele-trabalho), mais adequadas às necessidades dos trabalhadores e das empresas;

promoção da adaptabilidade e flexibilidade da disciplina laboral (p.e., a polivalência funcional);

maior acessibilidade do regime existente; sistematização da legislação dispersa, elaborada em épocas distintas.

È importante lembrar que a elaboração do Código não significa que o campo de matérias fica fechado; aliás, o Dto está permanentemente em mutação, e dessa forma, o Código não pressupõe a estagnação nem das relações sociais, nem dos preceitos que as regem. A maioria das normas é não imperativa, permitindo com facilidade alterações. As normas não têm aplicabilidade a profissões ou actividades específicas, mas sim, a todas genericamente (excepção: art. 107º/C.T.).

Note-se ainda, o importante papel da jurisprudência dos últimos 40 anos como inspiração de um vasto conjunto de novas disposições legais, constantes do C.T.. Aliás, houve a preocupação de não romper com a tradição jurídica nacional em assuntos laborais, pelo que muitas normas são idênticas às de

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diplomas agora revogados. O C.T. permitiu, também, a concretização de inúmeras directivas comunitárias.

O novo Dto do Trabalho assenta numa relação laboral com outro dinamismo (que não o de outrora), que pressupõe regras adaptadas à nova realidade. Assim, “o Código fundamenta-se na comunhão de interesses que deve existir no moderno Direito do Trabalho” (de “Exposição de Motivos” – Lei 99/2003 de 27/08 que aprova o Código do Trabalho).

Sistematização do Código do Trabalho

O Código do Trabalho está sistematizado da seguinte forma: Livro I (art. 1º a art. 606º) – Parte Geral; Livro II (art. 607º a art. 689º) – Responsabilidade penal e contra-

ordenacional.

O Livro I è composto pelas “Fontes e aplicação do Direito do Trabalho” (Título I – art. 1º a art. 9º), “Contrato de trabalho” (Título II – art. 10º a art. 450º - toda a matéria relativa ao contrato de trabalho está organizada segundo uma perspectiva cronológica) e “Direito colectivo” (Título III – art. 451º a 606º - regras aplicáveis ás entidades representativas dos trabalhadores e empregadores).

O conteúdo do Código do Trabalho é composto por princípios gerais, sendo que em variadíssimas normas somos remetidos para a legislação especial / complementar (ver art. 20º do decreto preambular que aprova o C.T.). Aliás, a breve prazo, a legislação especial será também compilada num único documento (ver art. 21º do decreto preambular).

CAPÍTULO IIFONTES DO DIREITO DO TRABALHO

Noção de fontes do Direito do Trabalho

Na sua acepção técnico-jurídica, fontes de direito são os modos de produção e revelação de normas jurídicas. No sentido jurídico-laboral, fontes do Direito do Trabalho são os modos de formação e revelação das normas jurídico-laborais.

Podemos inicialmente afirmar que a lei, o decreto-lei e o decreto regulamentar são fontes comuns à generalidade dos ramos de dto, entre os quais o Dto do Trabalho não é excepção.

Já a convenção colectiva de trabalho é uma fonte própria (ou privativa) do Dto do Trabalho.

Podemos fazer a distinção entre fontes autónomas e fontes heterónomas de D.T.. As fontes autónomas são normas produzidas pelos próprios destinatários, através de um processo negocial (forma de auto-regulamentação

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de interesses, como p.e., a convenção colectiva de trabalho). As fontes heterónomas são as normas jurídicas emanadas por entidades (p.e., o Estado) diferentes daquelas para as quais se vão aplicar.

Podemos ainda fazer a distinção entre fontes internas e fontes internacionais. Enquanto as internas são produto de mecanismos internos do ordenamento jurídico nacional, as internacionais resultam do estabelecimento de relações internacionais entre Estados, no âmbito de organizações existentes na sociedade internacional.

Fontes internacionais de Direito do Trabalho

Tratados; Convenções e recomendações da O.I.T.; Direito Comunitário.

No âmbito dos tratados (como fonte internacional de Dto do Trabalho), existe uma organização internacional com capital importância no desenvolvimento do Dto do Trabalho: a Organização Internacional do Trabalho (ou O.I.T.), fundada em 1919 e sediada em Genéve.

A O.I.T. é uma organização tripartida (nela têm assento representantes dos governos, das entidades patronais e dos trabalhadores dos Estados-membros), e a sua principal função é preparar determinados acordos que devem ser celebrados entre os países membros da Organização e que têm como objecto a regulamentação de certos aspectos relacionados com a relação de trabalho (convenções e recomendações).

A convenção da O.I.T. é um instrumento legislativo constituído por normas jurídicas com força vinculativa para os E-M., isto é, é directamente aplicável e “integrável” no dto interno. A recomendação é um conselho ou directriz dirigida pela Organização ao E-M., com vista à prossecução de determinados fins, apresentando ao Estado os meios para os alcançar, se bem que caberá a este criar os instrumentos legislativos para os alcançar.

São inúmeras as convenções da O.I.T. que vigoram no dto português (note-se que Portugal é um dos membros fundadores), e com elas tende-se para a uniformização do Dto do Trabalho nos vários Estados que integram a O.I.T.. Refira-se que a integração das convenções da Organização vigoram no dto português, mediante o seguinte requisito: as convenções devem já fazer parte da ordem internacional (isto é, 10 meses após o registo de ratificação por 2 E-M.). No entanto, a criação das Comunidades Europeias e o consequente Direito por elas emanado, conduziu a uma clara perda da influência da O.I.T., sobretudo sobre os países europeus do espaço comunitário.

Relativamente ao Dto Comunitário, distingue-se entre dto comunitário originário (tratados que procederam à criação das Comunidades e que são automaticamente recebidos pelo dto interno – art. 8º, 2/CRP) e dto comunitário derivado (conjunto de normas emitidas pelos órgãos comunitários competentes: recomendações e pareceres, fontes não vinculativas; regulamentos, directivas e decisões, fontes vinculativas). No art. 2º da lei preambular do Código do

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Trabalho é referido um conjunto de directivas comunitárias que foram transpostas para o dto interno, através do Código.

Fontes internas de Direito do Trabalho

Constituição da República Portuguesa; Legislação ordinária comum; Normas legais de regulamentação do trabalho; Instrumentos de Regulamentação Colectiva (IRC):

Negociais: Convenção Colectiva de Trabalho (contrato colectivo de trabalho, acordo colectivo de trabalho e acordo de empresa), Acordo de adesão e Arbitragem voluntária;

Não negociais: Arbitragem obrigatória, Regulamentos de trabalho (Regulamento de condições mínimas e Regulamento de extensão).

Constituição da República Portuguesa

A CRP é sempre uma fonte de dto, independentemente de qual ramo de dto se trata. Além disso, é sempre a fonte primordial, pois nela estão previstas as normas de organização do Estado, DLG`s dos cidadãos, etc..

Relativamente ao Dto do Trabalho, a Lei Fundamental consagra uma importante série de disposições: p.e., dos arts. 53º a 57º (DLG`s dos trabalhadores), e 58º e 59º (direitos e deveres económicos). Deve, ainda, frisar-se que a CRP contem normas directa e exclusivamente aplicadas ao D.T. (p.e., art. 51º e ss.), mas também normas indirectamente aplicáveis ao D.T. (p.e., art. 13º).

Legislação ordinária comum(leis, decretos-leis e decretos regulamentares)

São exemplos de legislação ordinária comum: o Código Civil, aplicado subsidiariamente ao D.T.. Todavia, o C.C. dispõe também de normas directamente aplicáveis ao D.T., como é o caso do art. 1152º (noção de contrato de trabalho). São também exemplo de legislação ordinária comum aplicável ao D.T., as normas do Código de Processo Civil e as normas do Código de Processo Penal.

Enquanto a legislação ordinária comum não é especificamente elaborada para aplicar ao Dto do Trabalho, as normas legais de regulamentação do trabalho aplicam-se e regulam, somente, o Dto do Trabalho.

Normas legais de regulamentação do trabalho

As normas legais de regulamentação do trabalho são todas as normas jurídicas (de regulamentação do trabalho), criadas e emitidas pelos órgãos do Estado dotados de competência originária para o efeito.

Na elaboração destas leis de trabalho, os trabalhadores e os empregadores poderão participar, emitindo opiniões, sugerindo alterações à lei quando esta está

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ainda em fase de projecto ou anteprojecto (art. 525º/C.T.). Os projectos e propostas têm de ser publicados (art. 527º/C.T.).

Exs. de normas legais de regulamentação do trabalho são os documentos constantes do art. 21º do decreto preambular do C.T.; e, também, o Código de Processo do Trabalho.

Instrumentos de Regulamentação Colectiva (IRC)

Os Instrumentos de Regulamentação Colectiva (ou IRC) são a única fonte do Dto do Trabalho que não resulta da acção do poder legislativo. Aliás, esta característica difere-a de todas as outras fontes.

Os IRC podem ser emanados por via negocial (convenção colectiva de trabalho, acordo de adesão e decisão de arbitragem voluntária. As convenções colectivas podem ser contratos colectivos de trabalho, acordos colectivos de trabalho e acordos de empresa) ou por via não negocial (regulamento de extensão, regulamento de condições mínimas e decisão de arbitragem obrigatória) – art. 2º/C.T..

Quanto aos IRC, aplica-se o princípio da subsidiariedade (art. 3º/C.T.): “os IRC não negociais só podem ser emitidos na falta de IRC negociais, salvo tratando-se de arbitragem obrigatória” (este artigo fundamenta-se na seguinte ideia: o legislador prefere os IRC negociais pois são os próprios indivíduos que negoceiam o IRC, que melhor conhecem o sector em questão – auto-regulamentação).

Sob pena de nulidade, os IRC revestem a forma escrita (art. 532º). Os limites aos IRC estão consagrados no art. 533º do C.T..

O art. 534º/C.T. consagra a publicidade: “o empregador deve afixar na empresa, em local apropriado, a indicação dos IRC aplicáveis” (ver também art. 581º).

Os IRC por via negocial resultam de um acordo entre as entidades representativas dos trabalhadores e dos empregadores. Os IRC por via administrativa (ou não negocial) são impostos por uma entidade diferente daquelas que negoceiam o IRC por via negocial.

As fontes autónomas do D.T. coincidem com os IRC por via negocial. As fontes heterónomas coincidem com os IRC por via não negocial, mais a Constituição.

O regime específico dos IRC está consagrado entre os arts. 531º e 581º do C.T..

No art. 540º é nos dada a conhecer a capacidade para a criação (trabalhadores = associações sindicais; empregadores = associações de empregadores ou os próprios empregadores). A expressão do art. 540º, 1, “conforme os casos”, abre o leque de possibilidades de entidades criadores, se interpretada conjuntamente com o art. 2º, 3:

Associação sindical e associação de empregadores – contrato de trabalho;

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Associação sindical e vários empregadores individualizados – acordo colectivo;

Associação sindical e um único empregador – acordo de empresa.Verificamos, portanto, que do lado dos trabalhadores encontramos sempre

a mesma entidade representativa, o que já não acontece do lado dos empregadores.

Convenção colectiva de trabalho

A convenção colectiva de trabalho (CCT) é um acordo entre associações sindicais e associações patronais ou empresas que tem por fim a regulamentação das condições de trabalho de determinado sector.

São formas de CCT: o contrato colectivo de trabalho (art. 2º, 3-a), o acordo colectivo de trabalho (art. 2º, 3-b) e o acordo de empresa (art. 2º, 3-c).

A CCT reveste uma faceta negocial (resulta de um acordo – art. 540º e 541º-a) e uma faceta regulamentar (acto criador de normas jurídicas incidentes sobre os contratos de trabalho – art. 541º-e e art. 552º).

O art. 543º versa sobre os elementos identificativos e conteúdos obrigatórios da convenção.

Nos art. 549º e 550º consagra-se o depósito. A publicação e a entrada em vigor são referenciadas no art. 581º.

A convenção colectiva de trabalho é a mais importante forma de IRC.

Acordo de adesão

O acordo de adesão é uma forma de Instrumento de Regulamentação Colectiva por via negocial e o seu regime está consagrado no art. 563º do Código do Trabalho.

Arbitragem (voluntária / obrigatória)

A arbitragem voluntária é uma forma de IRC por via negocial, enquanto a arbitragem obrigatória é um IRC por via não negocial.

O regime jurídico da arbitragem voluntária vem consagrado entre os arts. 564º e 566º. Por seu turno, a arbitragem obrigatória é regulada entre os arts. 567º e 571º.

Regulamentos de trabalho

Os regulamentos de trabalho são uma forma de IRC por via não negocial, e dividem-se em: regulamentos de extensão (573º a 576º) e regulamentos de condições mínimas (577º a 580º), anteriormente designados portarias de extensão e portarias de regulamentação do trabalho, respectivamente.

O conteúdo do RCM é inovador; por seu lado, o RE não inova, aliás, não tem conteúdo. O RE faz aplicar uma convenção colectiva a indivíduos que até aí não estavam abrangidos por ela.

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(*) Uma breve nota para os usos laborais referenciados no art. 1º/C.T..

Segundo este artigo, o contrato de trabalho está sujeito aos IRC, assim como aos usos laborais que não contrariem o princípio da boa fé.

Usos laborais são as práticas habituais de um determinado sector ou empresa. Os usos laborais apresentam-se como elemento de integração das estipulações individuais (ou seja, destinam-se a preencher condições a que as partes não se referiram, de harmonia com aquilo que elas presumivelmente estariam dispostas a aceitar, ou como seria a sua conduta usual no que se referia a dado aspecto).

Hierarquia das fontes de Direito do Trabalho

O problema da hierarquia das fontes do Dto do Trabalho coloca-se devido à possível coincidência, no domínio espacial, pessoal e material entre normas pertencentes a diferentes fontes do D.T..

Relativamente ao dto internacional e à questão de saber qual fonte se deve aplicar (a interna ou a internacional) afirmaremos que, segundo o art. 8º, 2/CRP, as normas internacionais vigoram no dto português enquanto vincularem internacionalmente o Estado. Daí que, possamos dizer que o dto internacional terá supremacia hierárquica sobre o dto interno, com a devida ressalva da CRP.

No que toca à hierarquia entre as fontes internas, é seguro afirmar a seguinte pirâmide: 1) CRP; 2) legislação ordinária comum; 3) normas legais de regulamentação do trabalho; 4) IRC; 5) cláusulas do contrato individual de trabalho.

Porém, no Direito do Trabalho temos de ter em conta o princípio da tratamento mais favorável (art. 4º e art. 531º/C.T.) – destas disposições se depreende que, em caso de conflito, aplicar-se-á a norma que consagra um tratamento mais favorável para o trabalhador. A excepção é feita relativamente à norma da convenção colectiva de trabalho que pode ser aplicada, caso favoreça ou não o trabalhador, mas desde que não contrarie a norma de carácter superior.

Tipos de normas do Código do Trabalho

Normas absolutamente imperativas, que não consentem qualquer derrogação, seja in melius (sentido favorável para o trabalhador), seja in pejus (sentido desfavorável para o trabalhador) (Exs.: arts. 210º; 383º, 1-1ªparte);

Normas parcialmente imperativas, que consentem derrogação apenas num desses sentidos (in melius: art. 110º, p.e.; in pejus: art. 167º, 2 e 369º, 1);

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Normas dispositivas, que consentem derrogações em ambos os sentidos (Exs.: art. 66º, 2; 194º, 1; 314º, 2; 315º, 3; 316º, 2; 383º, 2);

Normas supletivas, em que a norma do C.T. só actua se houver regulação por instrumento colectivo ou por contrato individual de trabalho (Exs.: art. 166º, 1; 178º, 2; 184º, 3; 256º, 2 e 3; 268º, 1).

Significados possíveis do princípio do tratamento mais favorável (ou favor laboratoris )

Este princípio pode ter aplicação a três níveis:1) Hierarquia das normas (admite apenas a derrogação das normas laborais

por outras de conteúdo mais favorável);2) Interpretação das normas legais (todas as normas laborais devem ser

interpretadas no sentido mais favorável ao trabalhador ou, em caso de dúvida, deve prevalecer esse sentido);

3) Prova (aplicação ao nível do Dto Processual judicial, caso o juiz tenha dúvidas, deve decidir a matéria de facto no sentido mais favorável ao trabalhador).

O princípio do tratamento mais favorável deve aplicar-se apenas no âmbito da hierarquia das normas (com a introdução do novo Código, o princípio do favor laboratoris passa a aplicar-se, somente, ao nível da hierarquia das normas).

No Direito do Trabalho predominam as normas que estabelecem uma injuntividade mínima, sendo admissível a sua derrogação por contrato individual de trabalho apenas em sentido mais favorável ao trabalhador, e se das normas não resultar o contrário.

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PARTE II – A RELAÇÃO INDIVIDUAL DE TRABALHO

CAPÍTULO I O CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO

Noção de contrato de trabalho

O art. 10º do CT consagra a seguinte definição de contrato de trabalho: “contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante uma retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direcção destas”.

O Código Civil (art. 1152º) dá uma definição bastante semelhante à do Código do Trabalho: “contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual e manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta”.

Análise dos elementos do contrato de trabalho

O contrato de trabalho é composto por quatro elementos fundamentais. A saber:

Sujeitos (trabalhador e entidade patronal); Objecto (a actividade do trabalhador); Retribuição; Subordinação jurídica.

Sujeitos

Os sujeitos do contrato de trabalho são, como já tivemos oportunidade de ver, o trabalhador e a entidade patronal.

O termo trabalhador (ou empregado, assalariado, operário, etc.) é usado no sentido de trabalhador subordinado, isto é, a pessoa que se obriga a prestar a sua actividade sob a autoridade e direcção de outra.

A entidade patronal (entidade empregadora, empregador, etc.) é a pessoa individual ou colectiva que, por contrato, adquire o poder de dispor da força de trabalho de outrem, mediante uma retribuição.

Deve salientar-se que hoje em dia, o trabalhador poderá prestar serviço a uma pluralidade de empregadores (art. 92º/CT), devendo esta prestação de serviço a uma multiplicidade de empregadores preencher uma série de requisitos constantes das alíneas a, b, c do art. 92º, 1/CT.

Objecto

Fundamentalmente, o objecto do contrato de trabalho reside na actividade do trabalhador, obrigando-se este a estar disponível para realizar as funções que lhe forem cometidas pelo empregador (disponibilidade para prestar trabalho).

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Com o contrato de trabalho gerar-se-á uma relação de trabalho subordinado (o objecto é a actividade) e de trabalho autónomo (o objecto é o resultado da actividade).

O trabalho deve ser executado com diligência (art. 121º, 1-c), embora o trabalhador não suporte o risco pela eventual frustração do resultado. Por outro lado, à luz do art. 111º, 3, a actividade para a qual o trabalhador foi contratado poderá envolver a prática de negócios jurídicos.

Na eventualidade de as funções para as quais o trabalhador foi contratado não estarem definidas no contrato de trabalho, esta poderá ser feita por remissão para categoria constante do IRC de trabalho aplicável ou de regulamento interno de empresa (art. 111º, 2).

Retribuição

A retribuição, também denominada remuneração, vencimento, salário, etc., é o dever principal do empregador.

A sua noção consta do art. 249º/CT, onde se consagra que se considera retribuição “aquilo a que, nos termos do contrato, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho”. Frise-se que num contrato de prestação de serviços, a retribuição é feita em função dos objectivos alcançados; no contrato de trabalho depende do factor tempo.

O regime jurídico relativo a este elemento do contrato de trabalho consta dos arts. 249º e ss./CT.

Subordinação jurídica

A subordinação jurídica resulta da expressão “sob autoridade e direcção”. A subordinação poderá assumir dois significados:

1. situação de facto com relevância jurídica;2. outros tipos de subordinação (p.e., económica ou técnica).

Por subordinação jurídica entendemos a relação da dependência necessária da conduta do comportamento do trabalhador, perante as ordens, orientações e directrizes do empregador, emitida no âmbito contrato de trabalho e das regras que o regem.

A subordinação jurídica implica um dever de obediência (art. 121º, 1-d), e comporta diferentes graus: a) compatibilidade com a autonomia técnica, segundo a qual o empregador não tem poder de dar ordens ao trabalhador, como acontece, p.e., nas profissões liberais (art. 112º); b) é suficiente um estado de dependência potencial.

A subordinação jurídica surge no momento de celebração do contrato, extinguindo-se com a extinção do contrato; por sua vez, o dever de obediência surge a partir do momento em que é dada a primeira ordem pelo empregador e, somente quando são dadas ordens.

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Contrato de trabalho e figuras contratuais afins

Contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços. Critério de distinção

Por contrato de prestação de serviços entendemos aquele contrato em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.

A distinção entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços deriva da, já abordada, distinção entre trabalho subordinado e trabalho autónomo, assentando na determinação do âmbito de aplicação do Dto do Trabalho.

Todavia, esta distinção reveste-se de alguma dificuldade prática devido a alguns aspectos: situações de dependência económica e não jurídica; dependência jurídica sem dependência económica; variabilidade dos regimes de retribuição.Veja-se, então: o contrato de prestação de serviços pode ser oneroso ou não oneroso. O contrato de trabalho é sempre oneroso.

Há situações em que o trabalhador depende economicamente do empregador, mas não juridicamente (trabalho autónomo em que o trabalhador se encontra numa situação mais precária do que os trabalhadores subordinados). Outras situações há, em que os trabalhadores dependem juridicamente de uma empresa, mas não estão dependentes economicamente (o trabalhador tem outros rendimentos mais importantes que o salário. Estes trabalhadores não se encontram numa situação normal de trabalho subordinado).

Relativamente à retribuição, esta no trabalho subordinado é certa (isto é, recebe-se uma determinada quantia mediante o tempo que se trabalha – forma normal do contrato de trabalho). No contrato de prestação de serviços, a forma normal de cálculo da retribuição é em função das tarefas realizadas, ou de acordo com o rendimento obtido.

Distinção cont.de trabalho / cont.de prestação de serviços (determinação da subordinação)

A subordinação é o elemento decisivo para que se possa distinguir o contrato de trabalho do contrato de prestação de serviços.

A determinação da subordinação vai depender da utilização de um método tipológico, através da interpretação dos indícios extraídos da situação real (veja-se o seguinte exemplo: na eventualidade de um indivíduo faltar, não podendo prestar a sua actividade, o facto de ser substituído é um inequívoco indício de que estamos perante um contrato de prestação de serviços, pois no contrato de trabalho o trabalhador não se pode fazer substituir por outrem no exercício da sua actividade laboral).

O art. 12º estabelece uma presunção legal (iuris tantum), através da qual avaliaremos os indícios que não permitirão afirmar se dado contrato é um contrato de trabalho ou um contrato de prestação de serviços. O art. 12º corresponde à situação típica de trabalho subordinado (p.e.: o local de trabalho é indicado no contrato e está na disponibilidade do empregador; os instrumentos de trabalho pertencem ao empregador e por este são fornecidos para a execução do trabalho; existência de horário de trabalho; etc.).

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Desta forma, sempre que se verifiquem, cumulativamente, os requisitos do art. 12º, estamos perante um contrato de trabalho (este artigo novo, permite resolver situações em que haja dúvidas sobre se as pessoas quiseram celebrar um contrato de trabalho ou um contrato de prestação de serviços). Todavia, não é inteiramente líquido que, se um contrato não preencher todos os requisitos seja, por exclusão de partes, de prestação de serviços.

Modalidades típicas do contrato de prestação de serviços

Contrato de mandato (art. 1157º/CC) – contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta de outra (p.e., o advogado). Ao contrário do contrato de trabalho, no contrato de mandato não há subordinação jurídica. O objecto deste tipo de contrato é a prática de actos jurídicos;

Contrato de depósito (art. 1185º/CC) – contrato pelo qual uma parte entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que a guarde e a restitua quando for exigida (p.e., o contrato de depósito bancário). O objecto deste contrato guardar uma coisa e restitui-la quando tal for exigida;

Contrato de empreitada (art. 1207º/CC) – contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço (sujeitos: dono da obra e empreiteiro; objecto: realização da obra). O objecto deste contrato é o resultado; por seu lado, no contrato de trabalho, o objecto é a própria actividade.Enquanto o empreiteiro está dependente do dono da obra, o dono da obra tem o dto de controlar a execução do contrato, como forma de verificar a sua correspondência ás cláusulas previamente acordadas, pese embora não haja subordinação do empreiteiro em relação ao dono da obra.

Contrato de trabalho com regime especial

Por contrato de trabalho com regime especial entende-se aquele contrato excluído do âmbito de aplicação das normas do Código de Trabalho e outra legislação geral do trabalho, pois carece de regulamentação particularizada.

Aplica-se-lhe o princípio geral do art. 11º: aos contratos de trabalho com regime especial aplicam-se-lhe as regras gerais do Código do Trabalho que não sejam incompatíveis com a especificidade desses contratos.

Aliás, estes contratos são contratos de trabalho, contudo dispõem de algumas especificidades que os permitem distinguir dos contratos individuais de trabalho típicos.

São exemplos de contratos com regime especial: Contrato de trabalho doméstico (DL 235/92 de 24/10); Contrato de trabalho rural (PRT de 08/06/79); Contrato de trabalho com desportistas profissionais (Lei 28/98 de 26/06);

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Contrato de trabalho a bordo (DL 74/73 de 01/03 – pessoal da marinha mercante);

Contrato de trabalho portuário (DL 280/93 de 13/08 e DL 298/93 de 28/08).

“Contratos equiparados” ao contrato de trabalho

Contratos equiparados são contratos de trabalho que têm por objecto a prestação de trabalho sem subordinação jurídica, mas nos quais o trabalhador deva considerar-se na dependência económica do beneficiário da actividade (art. 13º/CT). Foi, aliás, a dependência económica inerente a estes contratos, que levou o legislador a inseri-los no Código.

Da análise do art. 13º se depreende que estão sujeitos aos princípios gerais do Código do Trabalho. No entanto, estes contratos são também, em alguns casos, alvo de legislação especial (DL 440/91 de 14/11 – trabalho domiciliário: o indivíduo trabalha em casa, onde recebe o material, tendo apenas de entregar a produção à entidade com quem contrata o serviço, entidade essa à qual o trabalhador estará em exclusiva dependência económica).

Caracterização jurídica do contrato de trabalho

Contrato sinalagmático ou bilateral – contrato do qual resultam obrigações para ambas as partes, ligadas por um laço de interdependência (art. 364º - consequências da mora do empregador);

Contrato consensual – o contrato de trabalho não depende da observância de forma especial (art. 102º). As excepções vêm previstas no artigo seguinte (contrato-promessa de trabalho, contrato de trabalho a termo, etc., para os quais é exigida a forma escrita);

Contrato duradouro (ou de execução duradoura) – este contrato pressupõe prestações contínuas ou repetidas. Contrapõe-se-lhe o contrato instantâneo ou de execução instantânea (extingue-se com o cumprimento do contrato);

Contrato oneroso – contrato que pressupõe prestações para ambas as partes e equilíbrio ou equivalência entre aquelas.

Os sujeitos do contrato de trabalho1) O trabalhador

O trabalhador é a pessoa individual que, por contrato, presta a sua actividade por conta e autoridade de outrem.

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A figura do trabalhador só pode ser ocupada por uma pessoa individual ou singular. Esta pessoa está juridicamente subordinada ao empregador, algo que só poderá acontecer se estivermos a falar de uma pessoa individual.

Tipos de trabalhador

Trabalhador manual (ou assalariado); Trabalhador intelectual – o novo Código do Trabalho não distingue

trabalhador manual de trabalhador intelectual, sendo que nas leis anteriores, o seu estatuto era diferente;

Trabalhador de direcção ou administração – (comissão de serviço – art. 244º);

Trabalhador de cargos de complexidade técnica ou funções de confiança – possui um diverso período experimental (art. 107º).

A lei laboral tem, no entanto, uma visão perfeitamente unitária do conceito de trabalhador.

Caracterização do estatuto do trabalhadorA) A categoria

A categoria é a forma de concretizar o objecto do contrato de trabalho e de estabelecer limites ao poder de direcção.

As categorias profissionais estão previstas em IRC`s próprios, onde se definem as funções relativas a dada profissão, local de trabalho, valor da retribuição, horário de trabalho, etc., mas também os direitos e deveres do trabalhador.

Diferentes acepções do termo categoria

Categoria pré-contratual – qualificação ou habilitação profissional do trabalhador, isto é, a profissão que o trabalhador tem (categoria em sentido subjectivo – ver art. 113º relativo à carteira profissional);

Categoria-função ou categoria contratual – diz respeito ao conjunto de funções para as quais o trabalhador foi contratado, e as quais foram definidas aquando da celebração do contrato de trabalho [categoria em sentido objectivo – corresponde à ideia de trabalhador-tipo ou padrão (art. 111º, 1 e 2)];

Categoria real – corresponde à actividade que, na realidade, o trabalhador desenvolve na empresa (independentemente das funções que constam do contrato de trabalho, isto é, pode ter sido contratado para desempenhar uma função e está, de facto, a desempenhar outra). Existem as denominadas funções diversificadas. Ainda assim, a categoria real deve coincidir com a categoria contratual (esta é, aliás, a regra geral consagrada

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no art. 151º, 1). Se não houver concordância entre as funções reais e as funções contratuais há que fazer uma reclassificação do trabalhador ;

Categoria normativa ou estatutária – corresponde à enumeração de tarefas que, nos IRC e Regulamentos internos de empresa (RI), determinam a relação entre a função e os dtos mínimos do trabalhador, nomeadamente, os remuneratórios. Há, inclusive, tabelas das CCT onde vêm inscritas tanto a designação da actividade (nomen iuris) como as tarefas e as remunerações mínimas;

Categoria hierárquica – posição hierárquica que o trabalhador ocupa na empresa, isto é, o seu enquadramento no organigrama da empresa;

Polivalência funcional e mobilidade funcional (ou ius variendi )

No que toca à qualificação contratual, há, em princípio, coincidência entre a categoria real, a categoria-função e as categorias normativa e hierárquica. Aliás, todas elas são, nada mais nada menos, que diferentes perspectivas de encarar um mesmo conceito.

A atribuição da categoria dependerá de alguns factores:- Vaga aberta na empresa;- Aptidão profissional do trabalhador.

Estes dois factores são pré-contratuais, isto é, verificam-se antes mesmo da celebração do contrato. Ao empregador caberá atribuir a categoria, no âmbito do acordo das partes (esta é a regra que resulta dos arts. 111º, 1 e 2; e 151º).

A actividade contratada abrange funções afins ou funcionalmente ligadas. A este propósito fala-se de polivalência funcional (= faculdade de o empregador exigir do trabalhador a realização de tarefas acessórias da actividade profissional – art. 151º, 2). O exercício desta faculdade depende da verificação de algumas condições:

Tem de haver uma afinidade ou ligação funcional entre as tarefas (art. 151º, 3);

O trabalhador deverá ter qualificação profissional adequada e, no caso de não a ter, tem o dto à formação profissional (art. 151º, 2 e 4);

Não pode do exercício das funções acessórias resultar para o trabalhador desvalorização profissional;

As funções acessórias estabelecem o direito a uma retribuição mais elevada (art. 313º, 2).

Ainda relativamente à categoria, falamos de mobilidade funcional (ou ius variandi), cujo conceito está enunciado no art. 314º, 1 (o empregador pode, quando o interesse da empresa o exigir, encarregar temporariamente o trabalhador de funções não compreendidas na actividade contratada, desde que tal não implique modificação substancial da posição do trabalhador).

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O exercício deste dto depende da verificação de alguns requisitos (art. 314º, 1, 2, 3 e 4):

A actividade tem de ser desempenhada em virtude do interesse da empresa;

Deve ter uma natureza transitória ou temporária (é necessário que a entidade patronal estabeleça a fundamentação da ordem e indique o tempo previsível). Poderá o trabalhador adquirir direito à categoria das funções que venha a exercer? Se as funções corresponderem a uma categoria superior, o trabalhador terá dto a uma reclassificação desde que continue a desempenhar as funções para além do período transitório ou temporário, sendo-lhe então atribuída em definitivo a categoria da função que vem desempenhando, pese embora o art. 313º, 2 estabeleça o contrário;

Não pode implicar a modificação substancial da posição do trabalhador, ou seja, não pode implicar uma situação hierárquica injustamente penosa que provoque desprestígio ou afecte a dignidade profissional do trabalhador; nem deverá traduzir-se em inexistência de qualquer afinidade entre as tarefas;

Não poderá implicar diminuição da retribuição; O trabalhador tem o direito ao tratamento mais favorável, isto é, se ás

funções que ele exerce são atribuídas melhores condições, ele tem o dto ao tratamento mais favorável.

No ius variandi, as funções do trabalhador podem nada ter a ver com aquelas para as quais foi contratado, nada tendo a ver com as suas habilitações ou com a sua categoria profissional. O limite reside no facto de não poder haver uma modificação substancial da posição do trabalhador (a modificação substancial terá a ver com a orgânica interna da empresa, isto é, com a situação hierárquica dos trabalhadores. Veja-se o seguinte exemplo, supondo uma pirâmide hierárquica em que A é o topo e C a base da pirâmide: se C faltar, B será o indivíduo que ocupará o lugar, pois se fosse A a descer, B estaria hierarquicamente acima de A, havendo aquilo a que se designa de inversão de chefias.

O tempo é também um facto importante. Na mobilidade funcional haverá um carácter temporal ou provisório da modificação da actividade, enquanto na polivalência funcional não é feita qualquer referência temporal.

Acresce o facto de, na polivalência funcional o trabalhador tem, em princípio, o direito a uma remuneração mais elevada.

Uma vez atribuída, a categoria não pode ser alterada, unilateralmente, por iniciativa do empregador. Aliás, esta ideia é suportada pelo princípio da irreversibilidade da carreira (art. 122º, e), isto é, a posição hierárquica não pode descer, apenas subir.

Porém, pode haver alteração da categoria sendo que tanto em caso de promoção como despromoção, deve ser respeitado o princípio Pacta Sund Servanda (a alteração só pode dar-se por acordo das partes, e desde que a modificação seja pela mesma forma à que procedeu à criação do contrato). Se a

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alteração da categoria for em sentido descendente, deverão verificar-se três requisitos:

Fundamento (ligado a necessidades prementes da empresa, como p.e., reestruturação; ou ligada à estrita necessidade do trabalhador, como p.e., deficiência física);

Acordo do trabalhador; Autorização da Inspecção Geral do Trabalho.

Caracterização do estatuto do trabalhador (continuação)B) A antiguidade

A antiguidade deriva da continuidade da relação laboral que determina, na esfera jurídica do trabalhador, essa mesma antiguidade.

O Código do Trabalho aponta três tipos de antiguidade:- Antiguidade na empresa (art. 403º, 2-4º);- Antiguidade na actividade ou função (art. 403º, 2-1º);- Antiguidade na categoria (art. 403º, 2-2º).

Contagem da antiguidade

A antiguidade está relacionada com a duração do contrato de trabalho e não com a sua execução efectiva, pois há situações em que o trabalhador não presta a actividade, que não são contabilizáveis para a execução mas continuam a contar-se para a duração do contrato, como p.e., as férias, os feriados, as faltas (sendo que as faltas quando injustificadas são a excepção – art. 231º, 1, parte final).

Para efeitos da antiguidade, descontam-se as faltas injustificadas e a sanção disciplinar que resulta em suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade (art. 366º-e; art. 368º).

Efeitos da antiguidade

Promoções (podem ser automáticas – decorrem por força do decurso do tempo, não dependendo da qualificação ou qualidade do trabalho desempenhado pelo trabalhador; ou consensuais – resultam de decisão do empregador);

A antiguidade poderá conferir ao trabalhador um acréscimo retributivo, denominado diuturnidade (art. 250º, 2-b = prestação pecuniária, de natureza retributiva e com vencimento periódico, devida ao trabalhador, nos termos do contrato ou do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, com fundamento na antiguidade);

A antiguidade tem muita importância na quantificação da indemnização por despedimento (art. 439º, 1).

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A antiguidade está legalmente protegida e consta dos arts. 122º, j (é proibido fazer cessar o contrato, readmitindo posteriormente o trabalhador, com o intuito de reiniciar a contagem da antiguidade); art. 130º, 2; 132º, 3, do Código do Trabalho.

Deveres do trabalhador

De entre os deveres do trabalhador, destacamos aquele que julgamos ser o seu dever principal: o dever de prestação da actividade.

Relativamente aos deveres acessórios, estes são exemplificativamente enumerados no art. 121º. Atentaremos em alguns deles, sendo relevante afirmar-se que o art. 119º consagra o princípio geral da boa fé no cumprimento do trabalho, que se aplica tanto ao trabalhador como ao empregador (dever mútuo de boa fé):

Art. 121º, 1-a (“o trabalhador deve respeitar e tratar com urbanidade e probidade o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as demais pessoas que estejam ou entrem em relação com a empresa”) – é uma norma de conduta social que implica o dever de um tratamento cordial, cumprido em relação ao empregador, aos companheiros de trabalho, bem como a terceiros que se relacionem com a empresa;

Art. 121º, 1-b – dever de assiduidade (estar presente no local de trabalho, dentro do horário de trabalho, nos dias em que estiver contratual e legalmente obrigado) e pontualidade;

Art. 121º, 1-c – dever de zelo e diligência (ou seja, obrigação de realizar o trabalho com um certo grau de cuidado, responsabilidade e atenção, sendo que o zelo ou a diligência são valorados segundo a figura do “bom pai de família”);

Art. 121º, 1-d; art. 121º, 2 – dever de obediência ás ordens, instruções e directivas emitidas pelo superior hierárquico. Este dever refere-se, somente, à execução e disciplina do trabalho, desde que não viole os seus DLG`s;

Art. 121º, 1-f – dever de custódia ou de guarda (ou seja, dever de velar pela conservação e boa utilização dos bens relacionados com o seu trabalho que lhe forem confiados pelo empregador). A intensidade do dever de custódia ou guarda varia consoante a natureza do trabalho e com o grau de exclusividade do uso do instrumento de trabalho ou da máquina;

Art. 121º, 1-e – dever de lealdade. O dever de lealdade tem um conteúdo bastante amplo, podendo assumir duas diferentes vertentes:

- Vertente ou conteúdo negativo – a actividade corresponde à utilidade visada pelo empregador, devendo o trabalhador evitar comportamentos que neutralizem essa utilidade ou determinem situações de perigo para o interesse do empregador ou da organização empresarial. Entre estas obrigações de non facere

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destacaremos duas: a obrigação de não-concorrência; e a obrigação de sigilo profissional;

- Vertente ou conteúdo positivo – o trabalhador deve tomar as medidas necessárias perante uma ameaça de prejuízos ou qualquer perturbação da exploração ou perante comportamentos de terceiros susceptíveis de causar danos.

Por outro lado, o dever de lealdade tem:- uma faceta subjectiva – relação com a permanência da confiança

entre as partes (o trabalhador deve abster-se de comportamentos que possam colocar em causa essa relação);

- uma faceta objectiva – necessidade do ajustamento da conduta ao princípio da boa fé no cumprimento das obrigações (art. 119º, 1; art. 762º, C.C.

Os sujeitos do contrato de trabalho (continuação)2) O empregador

O empregador é, por um lado, o credor da actividade (isto é, credor da obrigação do trabalhador) e, por outro lado, apresenta-se como o devedor da remuneração.

Ao contrário do que acontece com o trabalhador, o empregador pode ser uma pessoa singular ou uma pessoa colectiva. Via de regra, a posição de empregador é ocupada por pessoas de Direito Privado; no entanto, pode também verificar-se empregadores enquanto pessoas colectivas de Direito Público.

Note-se que para designarmos empregador, podemos utilizar uma série de expressões, todas com o mesmo significado: entidade patronal, entidade empregadora, dador de trabalho, etc..

A empresa

O empregador, pessoa individual ou colectiva, é, normalmente, entendido como uma empresa. Utilizamos e expressão empresa (em sentido objectivo) para designar uma organização de pessoas e bens para a prossecução de um determinado objectivo.

No Direito do Trabalho, a ideia de empresa funda-se na organização empresarial e no facto de a situação jurídica laboral ter deixado de se basear numa relação pessoal (a este fenómeno dá-se o nome de despersonalização da relação de trabalho).

O conceito de empresa vem substituir a ideia de patrão. Aliás, deve notar-se que a legislação laboral associa o empregador à empresa. Quando isso não acontece, o contrato de trabalho terá regulamentação avulsa (p.e., o contrato de trabalho doméstico).

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Tipos de empresas

O Código do Trabalho define os vários tipos de empresas, segundo o critério do número de trabalhadores (art. 91º):

Microempresa – emprega no mínimo 10 trabalhadores; Pequena empresa – emprega mais de 10 até ao máximo de 50

trabalhadores; Média empresa – emprega mais de 50 até um máximo de 200

trabalhadores; Grande empresa – emprega mais de 200 trabalhadores.

O art. 472º refere-se às empresas de dimensão comunitária (uma empresa que empregue um mínimo de 1000 trabalhadores, dos quais 150 prestem serviço em dois Estados membros diferentes).

Pluralidade de empregadores

No art. 92º prevê-se a pluralidade de empregadores no âmbito dos grupos de empresas (“O trabalhador pode obrigar-se a prestar trabalho a vários empregadores entre os quais exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo”). Estão assim previstas:

Sociedades em relação de participações recíprocas – duas sociedades que participam reciprocamente no capital uma da outra, em 10% do capital (art. 485º/Código das Sociedades Comerciais);

Sociedades em relação de domínio – quando uma das sociedades (a dominante) possa exercer domínio sobre a outra em virtude de ter uma participação majoritária no capital ou de dispor de maioria dos votos ou de poder designar mais de metade dos administradores (art. 486º/CSC);

Sociedades em relação de grupo: Grupos constituídos por domínio total (art. 488º/CSC) – uma

sociedade pode constituir uma sociedade anónima de cujas acções seja inicialmente a única titular;

Por contrato de grupo paritário (art. 492º/CSC) – sociedades independentes que, por contrato, aceitam submeter-se a uma direcção unitária e comum;

Por contrato de subordinação (art. 493º/CSC) – sociedade que, por contrato, aceita submeter-se à direcção de outra.

Exclui-se as sociedades em relação de simples participação (art.

483º/CSC) – se, entre duas sociedades, uma delas participa no capital da outra em montante igual ou superior a 10%.

No entanto, o art. 92º do Código do Trabalho alarga o regime a empregadores que, independentemente da natureza societária, mantenham estruturas organizativas comuns (p.e., o consórcio).

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Requisitos formais da pluralidade de empregadores

Relativamente à pluralidade de empregadores, o art. 92º, 1 enumera uma série de requisitos que devem verificar-se cumulativamente:

- Contrato escrito (art. 103º, 1-f) no qual devem estar identificados:- o local de trabalho;- o período normal de trabalho;- a identificação de todos os empregadores;- a identificação do empregador representante.

No que concerne ao grupo de empresas verifica-se o princípio da responsabilidade solidária passiva de todos os empregadores, isto é, os empregadores beneficiários da prestação de trabalho são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das obrigações que decorram do contrato de trabalho celebrado, cujo credor seja o trabalhador ou terceiros (art. 92º, 3).

Cessando a relação de grupo, o trabalhador fica vinculado ao empregador-representante (art. 92º, 4). Não havendo identificação do representante no contrato (ou seja, ocorrendo a não verificação de um dos requisitos), o trabalhador tem direito de opção sobre qual empregador escolherá (art. 92º, 5).

A empresa em sentido objectivo está sujeita a situações com grande relevância ao nível jurídico-laboral: a empresa pode, p.e., ser objecto de relação jurídica por via da transmissão (art. 318º).

O Código do Trabalho prevê a transmissão da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica.

Havendo transmissão, via de regra, o adquirente ocupa a posição jurídica do transmitente nos contratos de trabalho, isto é, a entidade patronal muda para o adquirente. Os contratos de trabalho realizados com os trabalhadores mantêm-se (há uma transmissão da posição contratual “ope legis” – sub-rogação legal – e não cessão da posição contratual). A excepção verifica-se relativamente à transferência dos trabalhadores para outro estabelecimento (art. 319º).

Responsabilidade solidária do transmitente e adquirente pelas obrigações vencidas até à data da transmissão (ou seja, quem é o responsável pelas dívidas vencidas e por vencer):

limitação temporal – o transmitente apenas responde durante o ano subsequente à transmissão;

dever de informação e consulta dos representantes dos trabalhadores ou dos próprios trabalhadores (art. 320º);

afixação de aviso nos locais de trabalho (art. 319º, 3).Este regime aplica-se aos casos de transmissão, cessão ou reversão de

exploração da empresa (art. 318º, 3).

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Frise-se que a empresa condiciona a natureza das relações de trabalho (despersonalização e diferentes regimes consoante a dimensão).

Poderes patronais

Relativamente aos poderes patronais, podemos afirmar que o empregador dispõe, segundo o seu estatuto, de poder de autoridade.

Este poder caracteriza-se num poder de direcção que poderá ser subdividido em quatro poderes de direcção de âmbito mais restrito:

1) Poder determinativo da função – poder através do qual o empregador atribui uma categoria profissional e define as funções do trabalhador (art. 151º, 5);

2) Poder conformativo da prestação – poder através do qual a entidade patronal define os termos em que o trabalho deve ser prestado (art. 150º). A este poder corresponde o dever de obediência por parte do trabalhador;

3) Poder regulamentar – poder que tem o empregador de elaborar regulamentos internos de empresa contendo normas de organização e disciplina do trabalho (art. 153º, 1). Este poder é uma concretização do poder conformativo da prestação.

Limites ao poder regulamentar: Deve ser ouvida a comissão de trabalhadores; Deve ser publicitado o regulamento interno; Deve ser enviada uma cópia do RI à Inspecção Geral de Trabalho,

para aí ser inspeccionado e registado; As normas que constam do RI estão subordinadas às normas legais

e convencionais.4) Poder disciplinar – poder que o empregador dispõe de aplicar sanções

disciplinares aos trabalhadores que cometam infracções, isto é, que não cumpram correctamente o contrato de trabalho. As sanções disciplinares têm uma função conservatória e intimidativa (art. 365º, ss.).

As sanções disciplinares estão enumeradas no art. 366º. Além destas, outras poderão ser criadas por IRC, que serão válidas desde que não contrariem direitos e garantias do trabalhador.

A lei estabelece, porém, limites a estas sanções disciplinares (368º): as sanções pecuniárias têm como limite mínimo um terço da retribuição diária, e, em cada ano civil, a retribuição correspondente a 30 dias (art. 368º, 1); a perda de férias não pode pôr em causa o gozo de 20 dias úteis de férias (art. 368º, 2).

O art. 369º consagra o agravamento das sanções disciplinares.

Critério disciplinar(ou, qual a sanção que será aplicada ?)

Em primeira instância, deverá ser escolhido qual o tipo de sanção e, consequentemente, a medida da pena.

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Além disso, dispõe o art. 367º que a sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infracção (elemento objectivo) e à culpabilidade do infractor (elemento subjectivo), não podendo aplicar-se mais do que uma pela mesma infracção.

Procedimento disciplinar

Existem, hoje em dia, dois tipos diferentes de procedimentos disciplinares: um, para a sanção de despedimento (que trataremos mais tarde), e outro, para a sanção conservatória, que não o despedimento.

Relativamente a esta, não há a necessidade de forma escrita; contudo, via de regra, as empresas reduzem o procedimento a escrito.

Deste procedimento constam as fases da nota de culpa (ou acusação), da defesa e da decisão.

É importante salientar que os prazos ocupam um papel extremamente relevante no que toca ao procedimento disciplinar (art. 372º):

Prazo de caducidade – 60 dias a contar do conhecimento da infracção; Prazo de prescrição da infracção – um ano a contar do momento da prática

da infracção. Acrescente-se que o Código introduziu uma nova regra, constante do art. 372º, 2: “a infracção disciplinar prescreve ao fim de um ano a contar do momento em que teve lugar, salvo se os factos constituírem igualmente crime, caso em que são aplicáveis os prazos prescricionais da lei penal”. Segundo o art. 373º, o prazo para a aplicação da sanção disciplinar é

de três meses a contar da data da decisão.O art. 371º, 3 (suspensão preventiva do trabalho) prevê a possibilidade de

o empregador suspender o trabalhador do trabalho, não podendo, porém, suspender o pagamento da retribuição.

Deveres patronais (art. 120º)

Os deveres patronais encontram-se, exemplificativamente, enumerados no art. 120º.

Imediatamente resulta um dever principal de pagamento pontual da retribuição ao trabalhador, e um conjunto de deveres acessórios enumerados no referido art. 120º, como p.e., o dever de urbanidade (art. 120º-a).

Analisaremos, então, alguns desses deveres acessórios: Dever de assistência, que é facilmente desdobrável em quatro sub-

deveres:1. promoção humana, social e cultural (art. 119, 2);2. promoção de boas condições de trabalho (120º-c, h; art. 272º, ss.);3. dever de formação profissional (art. 120º-d; art. 123º);4. prevenção de riscos profissionais – cumprir, nomeadamente, as

normas sobre acidentes de trabalho e doenças profissionais (art. 120º-g; art. 281º, ss.)

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Dever de cooperação creditória – dever que tem qualquer credor de cooperar com o devedor no cumprimento da obrigação. Assim, o credor da prestação de trabalho (empregador) deve cooperar com o devedor da prestação (trabalhador), colocando-lhe à disposição as condições materiais e organizatórias para que o trabalhador possa cumprir a prestação.

Dever de ocupação efectiva – discutia-se se este dever era ou não acolhido na nossa lei, pois não estava expressamente consagrado.Segundo a doutrina, embora não estivesse expressamente consagrado, devia ser levado em conta pois a sua justificação (ou inspiração) encontra-se no art. 59º, 1-b/CRP.Hoje, este dever de ocupação efectiva está expressamente consagrado no Código (art. 122º, b): dever de o empregador não manter o trabalhador inactivo sem uma justificação (evitar colocar o trabalhador “na prateleira”, como é comum afirmar-se). Como forma de reacção, o trabalhador pode, à luz do art. 363º, pedir uma indemnização por incumprimento do contrato, tendo ainda a possibilidade de ser indemnizado por danos resultantes da inactividade. Além disso, pode requerer a condenação da empresa a dar-lhe trabalho. Todavia, tal sentença não seria exequível.O modo mais eficaz será requerer uma sentença na qual se condene a empresa a uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de incumprimento (art. 829º-A /CC).

CAPÍTULO II FORMAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

Conforme dispõe o art. 102º, o contrato é, por regra, consensual, ou seja, não está sujeito à observância de qualquer forma específica.

Por outro lado, a formação do contrato de trabalho resulta de duas declarações negociais: a proposta e a aceitação (art. 217º/Código Civil).

Relativamente à formação do contrato, vigora a regra da culpa in contrahendo (responsabilidade pré-contratual), em virtude do eventual desrespeito dos princípios da boa fé (art. 227º/C.C. e art. 93º/Cód. do Trabalho).

Formas de celebração do contrato

Proposta verbal e aceitação expressa ou tácita; Proposta e aceitação escritas (art. 103º); Contrato de adesão (art. 95º) – a proposta do empregador é feita através de

regulamento interno, sendo que o trabalhador aceitará tácita ou expressamente o regulamento e, consequentemente, a proposta contratual.

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Antes da celebração do contrato de trabalho, pode haver um contrato-promessa de trabalho, regulamentado no art. 94º do Código do Trabalho.

O contrato-promessa para ser válido está sujeito a alguns requisitos:- Só é válido se for celebrado sob a forma escrita, sendo que no

documento deve estar inscrita: uma manifestação inequívoca da vontade de se obrigar; a espécie de trabalho; e a retribuição. A falta de um destes requisitos gera a invalidade do contrato.

Devemos distinguir o contrato-promessa de trabalho e o contrato de trabalho com termo suspensivo (art. 127º).

O contrato-promessa de trabalho não está sujeito ao regime da execução específica, isto é, se uma das partes se recusar a celebrar a contrato, não se poderá fazer substituir por outrem.

O incumprimento do contrato-promessa dá lugar a responsabilidade nos termos gerais (art. 94º, 2).

O dever recíproco de informação (art. 97º)

O dever de informação é um dever recíproco, que consiste na obrigação reciproca de ambas as partes se informarem acerca dos aspectos relevantes da prestação de trabalho.

O art. 98º refere-se ao objecto do dever de informação do empregador.

Quanto ao meio (art. 99º), a informação deverá ser prestada por escrito (ou por documento escrito assinado pelo empregador – art. 99º, 1; ou por inclusão das informações no contrato de trabalho ou no contrato-promessa de trabalho – art. 99º, 3).

O prazo para cumprir este dever é de 60 dias, subsequentes ao início da execução do contrato de trabalho (art. 99º, 4).

Existe, ainda, o dever de informação sobre eventuais alterações (art. 101º). Deste dever resultam igualmente obrigações recíprocas para o empregador e para o trabalhador, devendo tal informação ser feita nos 30 dias subsequentes à data em que a alteração produz efeitos (art. 101º, 1 e 3).

Consoante as diferentes circunstâncias, o incumprimento do dever de informação pode gerar:

Invalidade do contrato; Justa causa de resolução do contrato; Obrigação de indemnização (responsabilidade civil).

Pressupostos do contrato de trabalho

Na celebração do contrato de trabalho, devemos atender aos pressupostos, que constituem condições de validade do contrato. Temos, então, os pressupostos

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subjectivos (dizem respeito aos sujeitos) e os pressupostos objectivos (dizem respeito ao objecto do contrato de trabalho).

1) Pressupostos subjectivos do contrato de trabalho

Relativamente aos pressupostos subjectivos do contrato de trabalho, releva a capacidade para celebrar o contrato. Regra geral, aplica-se o regime do direito civil (art. 14º): “a capacidade para celebrar contratos de trabalho regula-se nos termos gerais e pelo disposto no Código do Trabalho”.

A capacidade para admissão ao trabalho, isto é, a capacidade para se ser trabalhador vem regulada no art. 55º e ss.. Existem então três condições mínimas de aquisição da capacidade para prestar trabalho:

Idade mínima (16 anos) – art. 55º, 2; Escolaridade obrigatória concluída (9º ano de escolaridade); Capacidade física e psíquica adequadas ao posto de trabalho (esta

condição nunca pode ser afastada).

Todavia, um menor sem idade mínima mas com escolaridade obrigatória concluída pode prestar aquilo a que a lei designa por trabalhos leves (ou seja, trabalhos que não são susceptíveis de afectar o desenvolvimento físico e psíquico dos indivíduos – art. 55º, 3, 1ª parte; art. 16º Decreto preambular que aprova o Código do Trabalho).

Tratando-se de um menor com 16 anos completados, mas sem escolaridade obrigatória ou sem qualificação profissional, este poderá ser admitido a prestar trabalho, desde que se cumpram, cumulativamente, os seguintes requisitos, referidos no art. 56º, 1:

Formação educativa e/ou profissional; 40 % do período normal de trabalho reservado à formação; horário de trabalho adaptado ás necessidades de formação; se estivermos perante um contrato a termo, releva a relação entre a

duração do contrato e a duração da formação.

Quanto à celebração do contrato, deve esta ser feita pelo próprio menor, desde que possua os requisitos necessários para a admissão ao trabalho: idade mínima de 16 anos e escolaridade obrigatória concluída (art. 58º, 1). Poderá acontecer que, eventualmente, os representantes legais se oponham à celebração do contrato, sendo que, nesse caso, tal deverá ser feito por escrito. Esta oposição poderá ser feita a todo o tempo (entre a data do contrato até à data em que o menor faz 18 anos) – art. 58º, 3.

Nos casos em que o menor não tenha idade ou escolaridade mínima, a celebração do contrato só é válida se houver uma autorização por escrito por parte dos representantes legais (art. 58º, 2). O art. 58º, 3 aplica-se também quanto à eventual revogação do contrato por parte dos representantes legais.

A participação de menores em espectáculos e outras actividades de natureza cultural, artística e publicitária é objecto de regulamentação em legislação especial (art. 70º).

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2) Pressupostos objectivos do contrato de trabalho

Relativamente aos pressupostos objectivos, aplica-se o regime geral do direito civil (art. 280º/CC).

São requisitos do objecto de trabalho:1. a determinabilidade;2. a possibilidade física;3. a licitude (a licitude abrange a não contrariedade à lei, à ordem pública e a

conformidade com os bons costumes).

1. Determinabilidade:No momento da celebração do contrato de trabalho, o objecto pode não

estar determinado mas terá, obrigatoriamente, de ser determinável.A determinação pode fazer-se através do exercício do poder determinativo

da função, isto é, o empregador tem o poder de determinar a função, ou tarefas que o trabalhador vai realizar ou prestar.

2. Possibilidade física:Em Direito do Trabalho, releva tanto a impossibilidade física objectiva

como a subjectiva porque a prestação é pessoal e infungível. Significa isto que o contrato é fisicamente impossível quando não é passível de ser cumprido não só por aquele trabalhador, como também por todos os indivíduos (ponto de vista subjectivo). É fisicamente impossível (sob o ponto de vista objectivo) quando a realização é manifestamente impossível para aquele trabalhador que se propõe a celebrar o contrato.

3. Licitude:Haverá que considerar não só a actividade prometida mas também o fim

dessa actividade.

Período experimental (arts. 104º a 110º)

A noção de período experimental está regulada no art. 104º, 1 do Código do Trabalho (“o período experimental corresponde ao tempo inicial de execução do contrato e a sua duração obedece ao fixado nos artigos seguintes”). Este período experimental corresponderá ao tempo em que se verifica se as partes estarão interessadas na prestação de trabalho. Este é, aliás, o fundamento do período experimental. As partes devem, no decurso no período experimental, agir de modo a permitir que se possa apreciar o interesse na manutenção do contrato de trabalho (art. 104º, 2).

A duração do período experimental está regulada nos arts. 107º e 108º (deve-se distinguir se se trata de um contrato por tempo indeterminado ou um contrato a termo). A duração regra, para a generalidade dos trabalhadores é de 90 dias. Há, contudo, cargos para os quais o período experimental pode variar:

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180 dias para os trabalhadores que exerçam cargos de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação, bem como para os que desempenhem funções de confiança (art. 107º-b);

240 dias para pessoal de direcção e quadros superiores (art. 107º-c).

O art. 105º regula o regime especial da denúncia (art. 384º-d) do contrato (qualquer das partes durante o período experimental pode proceder à denúncia imediata do contrato, não tendo de prestar nenhuma obrigação à outra parte – denúncia imediata e não fundamentada), como p.e., uma indemnização, salvo acordo escrito em contrário.

O Código do Trabalho exige, porém, que se o período experimental tiver durado mais de 60 dias, o empregador é obrigado a dar um aviso prévio de 7 dias (art. 105º, 2).

Contagem do período experimental

De acordo com o art. 106º, o período experimental conta-se a partir do início da execução do contrato, sendo que não são tidas em conta as faltas justificadas, licenças, suspensão da prestação de trabalho, etc., não sendo, portanto, contabilizáveis para o tempo de período experimental. Os feriados e os fins-de-semana são contabilizáveis por se considerarem períodos de disponibilidade do trabalhador.

Regime legal do período experimental

O regime legal do período experimental tem uma natureza de imperatividade mínima (ou injuntividade mínima) pois poderá ser alterado por qualquer uma das partes:

podem as partes estabelecer um regime segundo o qual não se pode proceder à denúncia do contrato (art. 105º, 1);

prevê-se a possibilidade de redução da duração do período experimental, não podendo, todavia, ser aumentado além do disposto na lei (art. 110º, 1);

o período experimental poderá ser ainda excluído por acordo verbal ou por acordo escrito (art. 110º, 2).

Invalidade do contrato de trabalho

Quanto ao regime jurídico da invalidade do contrato de trabalho, regra geral, aplicam-se as normas e princípios de direito civil (arts. 240º, ss.; 285º, ss./CC).

São causas de invalidade: os vícios da vontade, as divergências entre a vontade e a declaração, a incapacidade e a inidoneidade. Todas estas situações podem gerar a invalidade do contrato. Como sabemos, a invalidade do

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contrato pressupõe duas distintas consequências, cujos regimes estão consagrados nos arts. 286º a 288º do CC:

- a nulidade;- a anulabilidade.

Particularidades do regime laboral: Há, desde logo, que ter em atenção os efeitos da invalidade do contrato.

Veja-se, p.e., o art. 289º/CC – efeitos retroactivos (ex tunc) – as partes que celebraram o contrato estão obrigadas a restituir tudo aquilo que prestaram. No âmbito do Direito do Trabalho, a declaração de invalidade tem efeitos para futuro (ex nunc), conforme resulta do art. 115º do Código do Trabalho.

O art. 116º regula a invalidade e cessação do contrato. Assim, se uma parte estiver de má fé, estando a outra de boa fé, esta situação provocará a imediata cessação do contrato (com invocação da nulidade), tendo a parte que está de má fé de indemnizar a outra parte:

se o empregador estiver de má fé, aplica-se o art. 439º; se o trabalhador estiver de boa fé, aplica-se o art. 448º.

Ainda relativamente à invalidade do contrato de trabalho, a norma especial do art. 117º regulamenta a invalidade por ilicitude do objecto (isto é, de um contrato com objecto ou fim contrário à lei, à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes). A parte que está de má fé (aquele que conhecer a ilicitude do objecto) perde as vantagens auferidas a favor do Instituto da Gestão Financeira da Segurança Social, não podendo ainda, reaver aquilo que pagou nem eximir-se ao cumprimento das suas obrigações.

A causa de invalidade pode desaparecer por convalidação, ab initio, do contrato de trabalho, isto é, o contrato torna-se válido desde o início (convalidação do contrato – art. 118º).

No entanto, se a causa da invalidade for a ilicitude do objecto, a convalidação só opera para futuro.

Pode ainda haver uma invalidade parcial do contrato de trabalho (art. 114º), isto é, o contrato pode ser inválido em apenas algumas cláusulas. Quando isto acontece, regra geral, aproveita-se a parte “saudável” do contrato, ou seja, a invalidade parcial provocará, neste caso, a redução do contrato se a vontade hipotética das partes o permitir.

Por outro lado, se a invalidade resultar da derrogação de normas imperativas, as cláusulas inválidas são substituídas por estas (conversão legal), isto é, se, p.e., se estipular no contrato que o período de férias é de 20 dias, essa estipulação que é nula, será substituída pela norma legal (neste caso, a norma que consagra um período mínimo de férias de 22 dias úteis de férias).

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Elementos acidentais do contrato de trabalho

Entramos agora no estudo dos elementos acidentais ou cláusulas acessórias do contrato de trabalho, isto é, aquelas cláusulas que podem, ou não, ser apostas ao contrato de trabalho. São elas:

1) O termo [que pode ser suspensivo ou resolutivo; certo (certus an, certus quando) ou incerto (certus an, incertus quando)];

2) A condição (que pode ser suspensiva ou resolutivo) – incertus an, incertus quando;

3) As cláusulas de limitação da liberdade de trabalho.

BREVES NOTAS: Se o facto futuro for efectivamente acontecer, estamos perante um termo; se não houver a certeza de que o facto acontecerá, então estaremos perante uma condição (essa certeza ou não, será tida no momento em que o contrato é celebrado e não durante a sua execução, independentemente, do que venha a acontecer posteriormente).

O termo (quer suspensivo quer resolutivo) pode ser certo ou incerto: No momento da celebração do contrato, sabemos exactamente quando é que se vai

verificar o facto (termo certo); No momento da celebração, não sabemos exactamente quando se vai verificar o facto

(termo incerto).

O termo e a condição

O termo e a condição são elementos acidentais (ou, elementos não essenciais), isto é, elementos que não participam do conteúdo essencial ou típico do contrato de trabalho.

O termo pressupõe um acontecimento futuro e certo, enquanto a condição pressupõe um acontecimento futuro e incerto.

Termo e condição suspensiva ou inicial = cláusula que difere os efeitos do contrato para um momento ulterior à sua conclusão.

Termo e condição resolutiva ou final = cláusula que determina que os efeitos do contrato cessam com a verificação do termo ou condição.

A lei admite a celebração de contrato de trabalho a termo suspensivo e sob condição suspensiva – art. 127º (como se verifica pela análise do texto da lei, “é admissível nos termos gerais”, sendo que tal cláusula estará sujeita a forma escrita).

Por outro lado, é inadmissível apor ao contrato de trabalho condições resolutivas. Invocaremos aqui dois argumentos fundamentais para justificar esta posição: 1) a aposição de condições resolutiva coloca em causa a segurança no emprego – art. 53º/CRP; 2) os casos que, sendo condição resolutiva, o legislador quis admitir, estão previstos nas situações consideradas como de termo (ou seja,

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embora sejam situações de condição, o legislador classifica-as como sendo de termo – ver art. 143º).

Regime jurídico do contrato de trabalho a termo resolutivo

O regime jurídico do contrato a termo vem regulado entre os arts. 129º e 145º do Código do Trabalho.

As disposições gerais (art. 129º a art. 138º) aplicam-se tanto aos contratos de trabalho a termo certo como as contratos de trabalho a termo incerto. Seguem-se as disposições específicas do contrato a termo certo (art. 139º a art. 142º), e, finalmente, as relativas ao contrato a termo incerto (art. 143º a art. 145º).

No entanto, ao longo do Código existem outras disposições legais relativas ao contrato a termo.

O regime legal não é imperativo pois, segundo o art. 128º, poderá ser alterado por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho (IRCT).

Exceptua-se, todavia, a imperatividade do art. 129º, 3-b (primeiro emprego ou desempregado de longa duração).

O legislador estabelece um critério geral para a admissibilidade da contratação a termo, consagrado no art. 129º, 1: “O contrato de trabalho a termo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades”.

Para ser válido, o contrato a termo tem de respeitar dois requisitos:a) Requisito relativo ao fundamento do contrato (o contrato deve estar

devidamente fundamentado);b) Requisito relativo à forma (o contrato deve estar devidamente

formalizado).

a) Fundamentação do contrato a termo

O contrato a termo tem sempre de ter a indicação do motivo justificativo (isto é, a razão pela qual a empresa contrata determinada pessoa).

A contratação a termo deverá ser utilizada nas situações de necessidade temporária da empresa, pelo que, se deve indicar o motivo justificativo (art. 131º, 1-e; art. 131º, 3), de forma a que se apure a relação entre o motivo justificativo e os factos – temporários – que levam a empresa a contratar a termo.

Tais factos deverão ser suficientes para justificar a contratação a termo, sendo que a prova de tais factos que constam do contrato, nos termos do art. 130º, 1 (ónus da prova), cabe sempre ao empregador.

Por seu lado, o art. 138º tenta desmotivar a contratação a termo, aumentando o pagamento da taxa social única para aquelas empresas que celebrem muitos, e durante muito tempo, contratos a termo.

A necessidade de uma boa fundamentação, aliás, exigida pelo legislador, vê acrescida tal ideia através do disposto no art. 130º, 2 (a conversão do contrato

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a termo em contrato sem termo, em virtude de eventuais cláusulas apostas ao contrato por parte do empregador, como forma de iludir a lei).

Quanto aos motivos , de acordo com o art. 129º, 1, os motivos justificativos devem preencher o facto de ser uma necessidade temporária da empresa, sendo que o contrato deve durar durante o período em que tais factos temporários durarem.

O n.º2 do mesmo artigo, elenca, exemplificativamente (“nomeadamente”), as causas mais vulgares que suscitam a contratação a termo. Vejamos, então, alguns exemplos demonstrativos:

Substituição directa (quando a empresa contrata alguém para substituir o trabalhador que está a faltar) ou indirecta (ou substituição “em cascata” – p.e., um trabalhador adoece e em virtude desse facto, a empresa desloca um seu trabalhador para o posto do faltoso, contratando, então, um indivíduo para o lugar do trabalhador que vai substituir o faltoso) de trabalhador ausente ou que, por qualquer razão, se encontre temporariamente impedido de prestar serviço – alínea a;

Substituição directa ou indirecta de trabalhador em situação de licença sem retribuição – alínea c;

Substituição do trabalhador a tempo completo que passe a prestar trabalho a tempo parcial por período determinado (situações nas quais um trabalhador que trabalha a tempo inteiro ou completo, mas que, durante a execução do contrato passa, temporariamente, a trabalhar a tempo parcial – Exs. destas situações – art. 43º, 1-b; art. 45º, 1; art. 61º, 1-b) – alínea d;

Actividades sazonais (actividades que se repetem todos os anos, em determinados períodos do ano) ou outras actividades cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matérias primas – alínea e;

A alínea h, refere-se a necessidades temporárias de empresas ligadas ao ramo das obras públicas, etc..No art. 129º, 3 são enumeradas duas situações justificativas da

celebração de contratos a termo, independentemente da natureza temporária da necessidade (os fundamentos da alínea b, reportam-se à política de emprego: contratação de trabalhadores à procura do primeiro emprego; desempregados de longa duração.

DL 34/96: Trabalhadores à procura do primeiro emprego – pessoas com idade igual ou superior a

16 anos e igual ou inferior a 30 anos, inscritos nos centros de emprego que nunca tenham prestado a sua actividade mediante a celebração de contratos sem termo;

Desempregados de longa duração – desempregados inscritos nos centros de emprego há mais de 12 meses.

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b) Formalidades do contrato a termo

À luz do art. 103º, 1-c, o contrato de trabalho a termo está sujeito a forma escrita (devendo dele constar a identificação e a assinatura das partes – art. 103º 2).

O contrato de trabalho a termo deverá, ainda, conforme dispõe o art. 131º, fazer menção às seguintes indicações: nome ou denominação e domicílio ou sede dos contraentes; actividade contratada e retribuição do trabalhador; local e período normal de trabalho; data de início do trabalho; indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo; data de celebração do contrato e, sendo a termo certo, da respectiva cessação.

Art. 131º, 2: na falta da referência à data de início do trabalho, considera-se que o contrato tem início na data da sua celebração.

O n.º 3 do art. 131º, refere-se à forma de justificação (“... a indicação do motivo justificativo da aposição do termo deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”).

A consequência para a falta de formalidades essenciais será a conversão em contrato sem termo (art. 131º, 4). A falta das formalidades não-essenciais não conduz, em princípio, à conversão do contrato.

O caso especial dos contratos de trabalho a termo sucessivos

A lei proíbe a celebração dos denominados contratos de trabalho a termo sucessivos – art. 132º, 1 (“a cessação, por motivo não imputável ao trabalhador, de contrato de trabalho a termo para o mesmo posto de trabalho, antes de decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato, incluindo as suas renovações”).

A norma do art. 132º só se aplica se o contrato terminar por vontade da empresa. Se assim for, a empresa está proibida de contratar outra ou a mesma pessoa para o mesmo posto de trabalho, a termo. A proibição é, todavia, meramente temporal, pois deixa de se aplicar depois de decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato, incluindo renovações (p.e., um contrato a termo de um ano implica que durante 4 meses a empresa não possa contratar para o mesmo posto de trabalho ninguém, seja a mesma ou outra pessoa).

Suponha-se agora que o contrato a termo de 1 ano destinava-se a suprir a falta de um trabalhador que se encontrava doente, e que decorrido esse ano, o trabalhador comunica que continua incapacitado. Neste caso, gera-se uma excepção à proibição da celebração de contrato a termo sucessivo (veja-se o art. 132º, 2-a). O art. 132º, 2 elenca um conjunto de excepções à proibição da celebração de contratos a termo sucessivos.

A violação da norma do art. 132º, implica, como consequência, o entendimento de que tal contrato foi celebrado sem termo (art. 132º, 3).

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Deveres do empregador

O art. 133º consagra um dever de informação, segundo o qual, o empregador deve comunicar à comissão de trabalhadores e associação sindical (se for caso disso), no prazo de 5 dias, a celebração (com indicação do fundamento) e a cessação do contrato a termo.

O empregador deverá, ainda, comunicar: À Inspecção-Geral de Trabalho, os elementos acima

indicados, trimestralmente (art. 133º, 2); À Comissão de Igualdade de Oportunidades de Emprego, o

motivo de não renovação de contrato a termo sempre que estiver em caso uma trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, no prazo de 5 dias (art. 133º, 4);

Informação relativa à existência de postos de trabalho permanentes que se encontrem disponíveis na empresa ou estabelecimento (art. 133º, 5).

Com o novo Código do Trabalho, foi introduzida uma nova disposição (art. 137º), segundo a qual o empregador deve proporcionar formação profissional ao trabalhador contratado a termo.

Direitos do trabalhador

Os trabalhadores contratados a termo têm preferência na admissão para um posto de trabalho com um contrato sem termo, enquanto o contrato a termo durar ou nos 30 dias subsequentes à sua cessação (art. 135º). É a denominada preferência na admissão.

Além disso, o trabalhador contratado a termo tem o direito de igualdade de tratamento, à luz do art. 136º.

Limites à duração do contrato a termo. Renovação. Caducidade.

Findo o contrato de trabalho a termo certo, pode o contrato ser renovado nos casos em que se mantenha a necessidade que levou à celebração do contrato (art. 129º, 1).

O contrato renova-se por igual período ao do contrato inicial (neste caso, a renovação não carece de qualquer declaração das partes), ou por outro período se tal for acordado pelas partes (art. 140º, 2). Se se verificar a segunda hipótese, a renovação sujeita-se ás exigências materiais e formais que conduziram à celebração do contrato (art. 140º, 3).

A renovação tem, porém, limites – simultâneos – resultantes do art. 139º, 1: a) só são possíveis duas renovações; b) o contrato a termo não pode durar mais de três anos (P.e., um contrato a termo de 6 meses, renovado duas vezes, o que perfaz, portanto, 18 meses, cessará sem que se atinjam três anos; por

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outro lado, se um contrato a termo é inicialmente celebrado por três anos, a renovação já não será possível).

Todavia, prevê-se que decorrido o período de 3 anos ou verificado o número máximo de renovações, o contrato poderá ser renovado mais uma vez (renovação extra), não podendo exceder o período mínimo de 1 ano e máximo de 3 anos. Note-se que esta norma (art. 139º, 2) ainda não entrou em vigor, o mesmo acontecendo com o art. 138º, referente à taxa social única (leia-se, a propósito, o art. 3º, 3 do decreto preambular do Código do Trabalho).

Caso a empresa viole os limites à renovação ou o prazo máximo de duração supracitados, o contrato considera-se sem termo (art. 141º).

Em conclusão, o contrato a termo pode ser celebrado por um período máximo de 3 anos. Já a duração, com a entrada em vigor do art. 139º, 2, tem como limite máximo 6 anos.

Caducidade do contrato a termo:Além da renovação e da conversão em contrato sem termo, o contrato

pode caducar (art. 387º). Para que o contrato caduque, isto é, acabe assim que se conclua o termo inicialmente celebrado, é necessário que quem lhe quiser por fim avise a outra parte, por escrito e no prazo de 15 dias, se for o empregador a querer por fim ao contrato, e de 8 dias se a vontade for do trabalhador (art. 387º, 1).

Se o empregador ou o trabalhador não denunciar o contrato com o aviso prévio, este renova-se no final do termo estipulado (art. 140º, 2) ou considera-se que o contrato não tem termo (art. 141º). Mas o trabalhador que, por omissão da denúncia, veja o contrato renovado ou convertido contra a sua vontade não fica vinculado até ao final do novo termo ou indefinidamente. Como resulta do art. 447º, ainda que o contrato seja a termo, o trabalhador pode a todo o tempo desvincular-se, desde que respeite o aviso prévio (15 a 60 dias).

Se for o empregador a invocar a caducidade do contrato, por não querer renovar o contrato, o trabalhador tem direito a uma compensação (art. 388º, 2). A compensação corresponderá a três ou dois dias de retribuição base e diuturnidades por cada mês de duração do vínculo, consoante o contrato tenha durado por um período que, respectivamente, não exceda ou seja superior a 6 meses. Além disso, a fracção do mês (isto é, o número de dias) é calculado proporcionalmente (art. 388º, 3). ***VER TABELA RELATIVA AO CÁLCULO DA COMPENSAÇÃO NA PÁGINA SEGUINTE ***

Limite especial e mínimo à duração do contrato a termo:Quanto à duração do contrato de trabalho a termo é estipulado um limite

especial, que se refere às situações do art. 129º, 3: nos casos de início de laboração de uma nova actividade de duração incerta, início de laboração de uma empresa ou estabelecimento, bem como desempregados de longa

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duração, o contrato a termo não poderá exceder dois anos, incluindo renovações.

É ainda estabelecido um limite máximo de 18 meses, no que concerne a contratos a termo celebrados com trabalhadores à procura do primeiro emprego.

Finalmente, aludiremos ao limite mínimo de duração de um contrato de trabalho a termo (art. 142º): o limite mínimo é de 6 meses.

Todavia, o n.º 1 do artigo, consagra situações para as quais se pode estabelecer, excepcionalmente, um prazo inferior a 6 meses: são as situações previstas no art. 129º, 2, alínea a) a g). Por violação desta disposição, o contrato considera-se celebrado pelo prazo de 6 meses.

Cálculo do valor da compensação

1º Calcular retribuição horária (art. 264º):

RH = RM x 1252 x N RM = retribuição mensal

N = número de horas que trabalha por semana (horas por dia x dias por semana)

2º calcular retribuição diária (art. 264º)

RD = RH x número de horas que trabalha por dia

3º Calcular a compensação

(RD x 2) x número de meses do contrato de trabalho (CT entre 7 a 72 meses) ou (RD x 3) x número de meses do contrato de trabalho (CT entre 1 a 6 meses)

4 o Calcular a fracção do mês

Suponha-se que o contrato de trabalho durou 6 meses (será RD x 3) e 15 dias: (RD x 2) ou (RD x 3) 30

x fracção do mês (no exemplo, 15, dias)

Ao valor alcançado no cálculo da compensação soma-se a fracção do mês (isto é, os dias que trabalhou a mais. O resultado alcançado dar-nos-à o valor da compensação total que o trabalhador terá de receber.

Contrato de trabalho a termo incerto

O art. 143º estipula as situações segundo as quais será possível celebrar um contrato a termo incerto (hipóteses de admissibilidade do contrato a termo incerto.

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Exceptuando-se o art. 129º, 2-d (substituição do trabalhador a tempo completo que passe a prestar trabalho a tempo parcial por período determinado) e o art. 129º, 3 (lançamento de novas actividades, início de laboração da empresa, trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração), as hipóteses de admissões do contrato a termo incerto, são bastante mais restritas que as do contrato a termo certo.

Quanto à duração, o contrato de trabalho a termo incerto dura por todo o tempo necessário para a substituição do trabalhador ausente ou para a conclusão da actividade, tarefa, obra ou projecto cuja execução justifica a celebração (art. 144º).

Considera-se contratado sem termo (conversão) o trabalhador que permaneça no desempenho da sua actividade após a data da produção de efeitos da denúncia ou, na falta desta, decorridos 15 dias depois da conclusão da actividade, serviço, obra ou projecto para que haja sido contratado ou o regresso do trabalhador substituído ou a cessação do contrato deste (art. 145º, 1).

A caducidade do contrato a termo incerto (art. 389º) depende da ocorrência do termo e da cessação do trabalho.

A falta de comunicação da cessação do contrato, implica para o empregador o pagamento da retribuição correspondente ao período de aviso prévio em falta (ver arts. 389º, 1 e 3).

A cessação do contrato confere ao trabalhador o direito a uma compensação (art. 389º, 4).

Ainda, no que concerne à cessação de contrato a termo, dispõe o art. 440º, 1, que, ao contrato de trabalho a termo aplicam-se as regras gerais de cessação do contrato, com as alterações constantes do n.º 2. Assim, em caso de despedimento declarado ilícito, tem o empregador direito a:

- indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais;- retribuições vincendas desde a data de despedimento até ao termo, se este

ocorrer antes do trânsito da sentença em julgado, ou;- retribuições vincendas até ao trânsito da sentença em julgado, se o termo

ocorrer posteriormente.Se o termo ocorrer depois do trânsito da sentença em julgado, o trabalhador

tem o direito a ser reintegrado na empresa.

As cláusulas de limitação da liberdade do trabalho

Durante a vigência do contrato de trabalho, o trabalhador encontra-se obrigado pelo dever de não concorrência (art. 121º, 1-e).

Relativamente à limitação da liberdade de trabalho, a regra geral é a da proibição de restrições, por via negocial, à liberdade de trabalho após a cessação

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(arts. 146º, 1 e 148º). Mesmo que não fosse regulada no Código de trabalho, tal restrição seria inconstitucional, à luz dos arts. 47º e 50º, ambos da CRP.

Excepções à regra geral:1. Pacto de não concorrência (art. 146º)

É, excepcionalmente, admitido que trabalhador e empregador possam, por acordo escrito, limitar o acesso a determinadas actividades por parte do trabalhador.

Este pacto de não concorrência deverá respeitar os seguintes requisitos: Forma escrita (art. 146º, 2-a); A actividade cujo exercício é vedado ao trabalhador, tem de ser susceptível

de resultar num prejuízo efectivo para a entidade patronal (art. 146º, 2-b); O trabalhador tem o dto a uma compensação retributiva durante o período

de limitação da sua actividade (art. 146º, 2-c); O pacto só poderá valer durante o prazo de 2 anos, ou 3 anos (este último,

relativo a actividades de especial relação de confiança).

2. Pacto de permanência (art. 147º)Este pacto torna admissível a celebração de acordo que obriga o

trabalhador a permanecer ao serviço da entidade patronal durante um período de tempo mínimo, não podendo, portanto, desvincular-se do contrato.

O pacto de permanência obedece, também, a uma série de requisitos: Não poderá haver diminuição da retribuição do trabalhador (art. 147º, 1); O pacto só é possível quando o empregador tiver tido despesas

extraordinárias com a formação profissional do trabalhador (art. 147º, 1); Limitação temporal máxima de 3 anos.

De qualquer forma, o trabalhador tem a possibilidade de se desvincular do contrato de trabalho, desde que efectue o pagamento das despesas gastas pelo empregador na sua formação profissional.

Nos casos em que o trabalhador seja objecto de despedimento ilícito e não opte pela reintegração, ou proceda à resolução do contrato de trabalho, não tem obrigação de restituir as importâncias gastas pelo empregador com a sua formação profissional.

CAPÍTULO IIIO TEMPO E O LOCAL DE TRABALHO

CAPÍTULO III.I – O LOCAL DE TRABALHO

Determinação do local de trabalho

A norma geral sobre o local de trabalho é o art. 154º, no qual se consagra:

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“1. O trabalhador deve, em princípio, realizar a sua prestação no local de trabalho contratualmente definido, sem prejuízo do disposto nos artigos 315º a 317º.

2. O trabalhador encontra-se adstrito ás deslocações inerentes ás suas funções ou indispensáveis à sua formação profissional.”

O local de trabalho pode definir-se como o espaço geográfico em que deve ser realizada a prestação do trabalho.

Relativamente ao local de trabalho, vigora o princípio geral de estipulação das partes, isto é, o local de trabalho deve ser fixado por acordo entre o empregador e o trabalhador. Se o local não estiver definido no contrato de trabalho, competirá ao empregador determinar o local de trabalho, no âmbito do seu poder de direcção.

Refira-se ainda que, a delimitação do local de trabalho abrange as deslocações exigidas pelo exercício das funções ou formação profissional do trabalhador (art. 154º, 2).

Relevância da determinação do local de trabalho

Em primeiro lugar, a determinação do local de trabalho delimita o âmbito espacial (ou geográfico) da obrigação da prestação de trabalho.

Em segundo lugar, vigora, relativamente a esta matéria, o princípio da inamovibilidade, consagrado no art. 122º-f.

Em terceiro lugar, a retribuição deve ser paga no local de trabalho (art. 268º).

Além disso, a determinação do local de trabalho é importante no que concerne aos acidentes de trabalho, pois consideram-se acidentes de trabalho os que ocorrem no local e tempo de trabalho (art. 284º, 1).

Por último, a determinação do local de trabalho determina a aplicabilidade dos IRCT.

Princípio da inamovibilidade (art. 122º-f)

Segundo este princípio, o trabalhador não pode ser transferido do local de trabalho. O fundamento justificativo deste princípio encontra-se na necessidade de assegurar estabilidade à posição profissional do trabalhador, com reflexo na sua vida familiar e social.

No entanto, o princípio da inamovibilidade é objecto de excepções. Aliás, podemos mesmo dizer que este princípio tem um carácter meramente supletivo.

A alteração do local de trabalho é admitida por: Acordo individual; IRCT; Disposição legal (art. 315º a 317º).

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Transferência do local de trabalho

1. Alteração definitiva (ou mobilidade geográfica) – art. 315ºDentro da alteração definitiva, poderemos falar em transferência

individual e transferência colectiva.A transferência individual justifica-se através de um interesse da

empresa. Note-se que na transferência individual pode estar incluído mais que um trabalhador. Além do interesse da empresa, não poderá a transferência individual resultar em prejuízo sério para o trabalhador.

Este tipo de transferência deverá, ainda, respeitar os seguintes requisitos (art. 317º): o trabalhador deverá ser previamente avisado (30 dias), devendo tal transferência ser fundamentada e assumir a forma escrita. A ausência destes requisitos torna a ordem ilegítima e, por isso, o trabalhador pode desobedecer.

Por sua vez, a transferência colectiva (que abrange todos os trabalhadores do estabelecimento) resulta da mudança de instalações do estabelecimento.

Relativamente a esta forma de transferência, apenas se têm de cumprir os requisitos formais (isto é, o interesse da empresa e a ausência de prejuízo sério para o trabalhador). Caso haja prejuízo sério, o trabalhador pode resolver o contrato com dto à indemnização prevista no art. 443º. Se, eventualmente, não houver prejuízo sério, o trabalhador terá de obedecer.

2. Alteração temporária (ou ius variandi geográfico) – art. 316ºConstituem requisitos materiais da transferência temporária, o

interesse da empresa, a ausência de prejuízo sério para o trabalhador. Além disso, a duração não poderá exceder 6 meses.

Relativamente aos requisitos formais, a transferência deverá ser comunicada por escrito, com aviso prévio de 8 dias, com indicação do fundamento e do tempo previsível da transferência.

Não se deve confundir transferência temporária com as deslocações ocasionais: a transferência temporária exige que o trabalhador seja integrado numa outra organização, fora do âmbito geográfico, para executar funções correspondentes a um posto de trabalho.

Efeitos da transferência

No que toca à alteração ou transferência definitiva, há por parte do empregador a obrigação do pagamento das despesas com acréscimo de custos da deslocação ou/e com a mudança de residência.

Já no que concerne à alteração ou transferência temporária, deverá o empregador efectuar o pagamento das despesas correspondentes ao acréscimo dos custos de deslocação e alojamento.

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CAPÍTULO III.II – O TEMPO DE TRABALHO

Noção de tempo de trabalho

À luz do art. 155º, o tempo de trabalho define-se como qualquer período durante o qual o trabalhador está a desempenhar a actividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como as interrupções e os intervalos previstos no artigo seguinte.

É necessário definir a quantidade de trabalho exigível ao trabalhador, sendo que a medida da prestação do trabalho faz-se através da sua duração.

A duração do trabalho constitui: Medida de retribuição (a determinado tempo de trabalho corresponde

determinada retribuição); Medida do tempo de repouso e auto-disponibilidade do trabalhador

(tempo durante o qual o trabalhador dispõe livremente sem estar dependente da vontade do trabalhador).

Na definição concreta de tempo de trabalho, dever-se-ão conjugar três factores:

1) O período normal de trabalho;2) O período de funcionamento do local de trabalho;3) O horário de trabalho.

1) A noção de período normal de trabalho consta do art. 158º: o tempo de trabalho que o trabalhador se obriga a prestar, medido em número de horas por dia e por semana, denomina-se período normal de trabalho.

Daí que se possa falar em período normal de trabalho semanal e diário (isto é, o número de horas que o trabalhador presta a sua actividade por semana e por dia).

O período normal de trabalho é fixado por acordo, acordo esse que terá de ter em conta os limites máximos (art. 163º - 8 horas por dia e 40 horas por semana), podendo este limite ser ultrapassado até um período não superior a 15 minutos (tempo de tolerância – art. 163º, 2).

Excepções aos limites máximos (art. 167º):a) Por IRCT (art. 167º, 2) – podem ser fixados limites máximos ao período

normal de trabalho em caso de actividade sem fim lucrativo de interesse público; ou em caso de trabalho intermitente ou de simples presença;

b) Por previsão legal – relativamente ao trabalho de substituição nos dias de descanso semanal (até 4 horas, salvo IRCT) – art. 163º, 3.

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Os arts. 164º e 165º regula o regime da adaptabilidade, regime esse que poderá ser excepcionado relativamente aos limites máximos.

No caso de isenção de horário de trabalho, leia-se o art. 178º, 1-a) e b): a isenção do horário de trabalho pode compreender: não sujeição aos limites máximos dos períodos normais de trabalho; possibilidade de alargamento da prestação a um determinado número de horas, por dia ou por semana.

Regime da adaptabilidade

Neste tipo de regime, o cálculo do tempo de trabalho é feito em termos médios num período pré-determinado.

Este regime poderá ser fixado por IRCT (art. 164º) ou por acordo individual com os trabalhadores (art. 165º).

À luz do art. 164º, o período normal do tempo de trabalho diário poderá ser aumentado até um máximo de 4 horas. Relativamente ao trabalho semanal poderá ser aumentado até um máximo de 60 horas, não excedendo 50 horas em média num período de 2 meses.

No art. 165º, estipula-se para o período normal de trabalho diário um aumento máximo até um máximo de 2 horas. O período normal de trabalho semanal poderá ser aumentado até um máximo de 50 horas.

Relativamente ás reduções do tempo de trabalho, pode no tempo de trabalho diário ser retirado um máximo de 2 horas. No que toca ao tempo de trabalho semanal, pode eliminar-se dias ou meios dias de trabalho.

O art. 166º define o período de referência (intervalo de tempo para apuramento da duração média dos períodos normais de trabalho organizados no regime da adaptabilidade).

O período de referência poderá ser fixado em IRCT no máximo de 12 meses. Poderá ainda ser fixado supletivamente por um máximo de 4 meses, ou, excepcionalmente, 6 meses (art. 166º, 2 e 3).

Regra geral, as alterações ao período normal de trabalho só poderão ser feitas por acordo.

2) O art. 160º define o período de funcionamento: entende-se por período de funcionamento o intervalo de tempo durante o qual os estabelecimentos podem exercer a sua actividade.

A designação do período de funcionamento poderá assumir diferentes terminologias: no que toca aos estabelecimentos de venda ao público, o período de funcionamento denomina-se período de abertura; quanto aos estabelecimentos industriais, denomina-se período de laboração.

A regulamentação do período de funcionamento consta de legislação especial (art. 171º, 2). Este período é definido pela entidade patronal, no respeito pelas regras legais e administrativas e está relacionado com os horários de trabalho (art. 171º, 1).

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3) O horário de trabalho define-se como: entende-se por horário de trabalho a determinação das horas do início e do termo do período normal de trabalho diário bem como dos intervalos de descanso (art. 159º).

Existem várias formas de organização do horário de trabalho: Horário rígido; Horário por turno rotativos (art. 188º); Horário flexível (art. 178º, 1-c).

A definição do horário de trabalho é feita por decisão unilateral do empregador (art. 170º) ou por acordo (art. 173º, 1).

No que toca à alteração do horário de trabalho, se a definição tiver sido feita por decisão unilateral do empregador, o mesmo acontecerá como a alteração; se o horário tiver sido fixado por acordo, só poderá ser alterado por acordo (art. 173º, 1).

Excepcionalmente, prevê-se no art. 437º/CC, que por alteração de circunstâncias, os horários podem ser alterados.

Formalidades da alteração do horário de trabalho (art. 173º):

O art. 173º regula as formalidades relativas à alteração do horário de trabalho.

Estabelece o n.º 1 que não podem ser unilateralmente alterados os horários individualmente acordados.

O empregador tem o dever de consultar o trabalhador e os representantes dos trabalhadores. A alteração deverá ser afixada com antecedência máxima de 7 dias ou 3 dias, nos casos de microempresas. Deverá, ainda ser comunicada à Inspecção-Geral do Trabalho. (nºs 2 e 3).

O empregador tem, também, o dever do pagamento do acréscimo de despesas, caso existam – direito a uma compensação económica (n.º 5).

Exceptua-se o caso de alterações temporárias por períodos máximos de uma semana (n.º 4).

Isenção do horário de trabalho

A isenção do horário de trabalho está dependente do cumprimento de algumas condições, constantes do art. 177º:

Só pode ocorrer por acordo escrito; Só pode ocorrer nas situações previstas no art. 177º, 1, a), b) e c). Por IRC

podem ser fixadas outras situações para além das previstas na lei; O acordo celebrado deverá ser comunicado à IGT.

Os trabalhadores sujeitos à isenção do horário de trabalho têm direito a uma retribuição especial (art. 256º). Tal retribuição especial é fixada por IRCT. Caso não esteja fixada em IRCT, a isenção do horário de trabalho corresponde a um acréscimo retributivo de 1 hora de trabalho suplementar por dia, ou de 2 horas por semana, em caso de trabalho flexível.

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O art. 178º estipula as modalidades de isenção do horário de trabalho:a) Não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho;b) Alargamento do período normal de trabalho num determinado número de

horas;c) Horário flexível (a fixação do início e termo do período normal de trabalho

é feita pelo trabalhador).A isenção não prejudica o direito ao descanso diário, semanal e aos

feriados obrigatórios.

Trabalho suplementar

O trabalho suplementar vem definido no art. 197º, 1: considera-se trabalho suplementar todo aquele que é prestado fora do horário de trabalho.

O trabalho suplementar poderá compreender o trabalho que exceda o período normal de trabalho diário ou o trabalho prestado fora do horário de trabalho, embora dentro do período normal de trabalho diário.

Excepções: Situações que correspondem às novas modalidades de isenção do horário de

trabalho – ultrapassagem do período normal de trabalho (art. 197º, 2 e 3); Trabalho prestado para compensar as “pontes” (art. 197º, 4-b); Incentivo ao cumprimento das obrigações de formação profissional por parte

do empregador (art. 197º, 4-d).

Fundamentos da prestação de trabalho suplementar:1) Fundamento normal – acréscimos eventuais e transitórios de trabalho

(art. 199º, 1);2) Fundamento excepcional – motivo de força maior ou para prevenir ou

reparar prejuízos graves (art. 199º, 2).

Limites à duração do trabalho suplementar

Relativamente ao trabalho suplementar com base no fundamento normal, aplicam-se os limites do art. 200º:

Limite anual (175 horas / ano – micro e pequena empresa; 150 horas / ano – média e grande empresa; até 200 horas / ano – se estabelecido em IRC);

Limite diário – o limite será de 2 horas por dia normal de trabalho; ou o período normal de trabalho diário nos dias da suspensão da prestação de trabalho.

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Aplica-se, ainda, o art. 169º, 1, quanto ao regime da adaptabilidade: a duração média do trabalho semanal, incluindo trabalho suplementar, não pode exceder 48 horas durante o período de referência.

Relativamente ao trabalho suplementar com fundamento excepcional, apenas se aplicam os limites do art. 169º, 1 (art. 199º, 3).

A prestação de trabalho suplementar, desde que exigida pelo empregador, tem carácter obrigatório (art. 198º). No entanto, tal obrigatoriedade estará dependente de ordem “legítima”.

O trabalhador pode, em caso de motivos atendíveis, solicitar ao empregador a dispensa da prestação de trabalho. Note-se que a não dispensa por parte do empregador não legitima desobediência, apenas responsabilidade pelos danos causados.

Ainda assim, não estão obrigados a prestar trabalho suplementar: art. 46º, 1 – a trabalhadora grávida ou com filho de idade inferior a doze

meses; art. 64º - o trabalhador menor; art. 76º - o trabalhador com deficiência ou doença crónica.

Efeitos da prestação de trabalho suplementar

Quanto aos efeitos resultantes da prestação de trabalho suplementar, saliente-se que o trabalhador adquire o direito a um acréscimo retributivo, regulado no art. 258º. No que concerne ao trabalho suplementar em dias normais de trabalho, o trabalhador tem direito a 50% na primeira hora e 75% nas seguintes. Nos dias de suspensão da prestação de trabalho (isto é, dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e em dia feriado), o acréscimo é de 100% - art. 258º, 2.

À luz do art. 258º, 3, a compensação horária que serve de base ao cálculo do trabalho suplementar é apurado segundo a fórmula do art. 264º, considerando-se, nas situações de determinação do período normal de trabalho semanal em termos médios, que n significa o número médio de horas do período normal de trabalho semanal efectivamente praticado na empresa (VER QUADRO ANEXO, NA PÁGINA SEGUINTE).

Os acréscimos podem ser fixados por IRCT. Frise-se ainda que, o pagamento só é devido se o trabalho foi expressamente exigido ou se não for previsível a oposição do empregador à sua realização.

O trabalhador adquire também o direito a um descanso compensatório (art. 202º).

Quanto ao trabalho suplementar prestado em dia de descanso semanal obrigatório, o trabalhador tem direito a gozar de um dia num dos três dias seguintes. Nos outros casos, tem direito a:

25% do número de horas de trabalho suplementar realizado; vence-se quando perfizer um número de horas equivalente ao período

normal de trabalho diário;

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Duarte Nuno Laranjeira – Direito do Trabalho (2003-2004)

deve ser gozado nos 90 dias seguintes.O trabalho suplementar não prestado em dia de descanso semanal,

obrigatório ou complementar, pode ser substituído por prestação de trabalho pago com acréscimo mínimo de 100% (art. 203º, 2).

CÁLCULO DO ACRÉSCIMO RETRIBUTIVO (art. 258º, 3) – exemplo prático

O art. 258º, 3 aplica a fórmula de cálculo do art. 264º:

RH = RM x 12 52 x n n significa o horário de trabalho semanal

Ex.: Um trabalhador presta actividade de 2ª a 6ª feira (9:00 às 12:00 e 14:00 às 18:00) e num determinado dia trabalhou das 18:00 às 20:00. Estas duas horas constituem trabalho suplementar.

O seu rendimento mensal é de 990€. De acordo com o art. 258º, devemos inicialmente calcular a retribuição por hora normal de trabalho. Dessa forma:

990 x 12 = 11880 = 6, 53€ 52 x 35 1820 Posteriormente, deve-se calcular o acréscimo remuneratório relativo à 1ª e à 2ª hora de trabalho suplementar:1ª Hora (18:00 – 19:00) – 6,53 + (6,53 x 0,5) = 9,80€2ª Hora (19:00 – 20:00) – 6,53 + (6,53 x 0,75) = 11,43€

Assim, o trabalhador recebe por hora normal de trabalho 6,53€; 9,80€ na 1ª hora de trabalho suplementar; e 11,43€ na 2ª hora.

Trabalho nocturno

A noção de trabalho nocturno consta do art. 192º, 1 (“Considera-se período de trabalho nocturno o que tenha a duração mínima de sete horas e máxima de onze horas, compreendendo o intervalo entre as zero e as cinco horas”), sendo que esta definição pode ser feita por IRCT. Caso não haja definição em IRCT, então será ditada supletivamente – das 22 horas até ás 7 horas do dia seguinte (ver art. 192º, 3).

A definição por IRCT está sujeita a determinados limites (art. 192º, 1 e 2): extensão (duração mínima de 7 horas e máxima de 11 horas); localização no tempo (intervalo entre as zero e as cinco horas, isto é, o

período entre as zero e as cinco horas deve estar compreendido no tempo efectivo de trabalho nocturno).

Para os trabalhadores que habitualmente trabalham entre as 20:00 e as 7:00, aplica-se o art. 11º do Decreto Preambular de aprovação do Código do Trabalho (O trabalhador que tenha prestado, nos 12 meses anteriores à publicação do Código do Trabalho, pelo menos 50 horas entre as 20:00 e as 22:00 ou 150 horas de trabalho nocturno depois das 22:00 horas mantém o dto ao acréscimo de retribuição sempre que realizar a sua prestação entre as 20:00

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e as 22:00 horas), daí que o art. 192º, 3 não se aplique a estes trabalhadores (note-se, novamente, que este artigo configura o período nocturno das 22:00 às 7:00 do dia seguinte).

Existem outras situações para as quais se adopta também o conceito que vigorava anteriormente, isto é, das 20:00 até ás 7:00: neste período de tempo, não poderão prestar trabalho trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes (art. 47º, 1), menores com idade inferior a 16 anos (art. 65º, 1) e trabalhadores com deficiência ou doença crónica (art. 77º).

Entende-se por trabalhador nocturno aquele que presta no mínimo 3 horas de trabalho no período nocturno durante o seu horário de trabalho – art. 193º.

Relativamente à protecção do trabalhador nocturno, o art. 195º prevê a realização de exames médicos ao trabalhador.

O art. 257º estipula um acréscimo retributivo para aqueles trabalhadores que desempenham trabalho nocturno: O trabalho nocturno deve ser retribuído com um acréscimo de 25% relativamente à retribuição do trabalho equivalente prestado durante o dia (n.º 1); este acréscimo pode também ser fixado por IRCT através de uma redução equivalente dos limites máximos do período normal de trabalho ou de aumentos fixos das retribuições base, quando se trate de pessoal incluído em turnos rotativos, e desde que esses aumentos fixos não importem tratamento menos favorável para os trabalhadores (n.º 2). Estas disposições não se aplicam relativamente às situações previstas no n.º 3, salvo se estiverem previstas em IRC.

Deve referir-se que, existe um conjunto de obrigações a que o empregador está sujeito no que respeita à formalização e registo do trabalho nocturno.

Desde logo, a obrigação de registo do período normal de trabalho diário e semanal (este registo permite a verificação do número de horas prestadas por cada trabalhador) – art. 162º.

O empregador é ainda obrigado a elaborar os mapas de horários de trabalho. Tais mapas devem ser afixados na empresa e comunicados, com cópia, à IGT com 48 horas de antecedência (art. 179º).

À luz do art. 204º, também o trabalho suplementar necessita ser registado, registo este que pressupõe três diferentes formas:

1. registo do trabalho suplementar visado pelo trabalhador;2. relação nominal dos trabalhadores que efectuaram trabalho suplementar (art.

204º, 5);3. relação semestral dos trabalhadores a enviar à IGT (art. 204º, 6).

Caso não existam estes registos, a lei confere ao trabalhador, por cada dia em que tenha desempenhado a sua actividade fora do horário de trabalho, o dto a uma retribuição correspondente ao valor de 2 horas de trabalho suplementar (art. 204º, 7).

Finalmente, deverão ainda ser registados os trabalhadores nos casos de regime de trabalho por turnos, conforme consta do art. 191º.

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Duarte Nuno Laranjeira – Direito do Trabalho (2003-2004)

Uma última nota para se referir que o trabalho suplementar poderá, em determinados casos, coincidir com o trabalho nocturno: o trabalhador tem dto ao acréscimo relativo ao trabalho suplementar e ao trabalho nocturno.

Suponha-se o seguinte exemplo:Um trabalhador presta a sua actividade das 9:00 ás 12:00 e das 16:00 às 20:00. Em determinado dia trabalhou ainda das 20:00 às 22:00.

Sabendo de antemão que o seu rendimento mensal é de 990€, e que aufere por hora normal de trabalho 6,53€, o trabalhador:

Sobre a 1ª hora de trabalho suplementar teria um acréscimo retributivo de 9,80€; e sobre a 2ª hora de trabalho suplementar, um acréscimo de 11,43€.

Tendo em conta que o trabalho suplementar do trabalhador coincidiu com o trabalho nocturno, sobre a 1ª hora terá um acréscimo de 12,25€ e sobre a 2ª hora um acréscimo de 14,29€.

Fórmula de cálculo dos acréscimos correspondentes à 1ª hora e 2ª hora de trabalho suplementar (caso coincida com o trabalho nocturno)

1ª hora – 9,80 + (9,80 x 0,25) = 12, 25€2ª hora – 11,43 + (11,43 x 0,25) = 14,29€

NOTA: nos cálculos apresentados são utilizados os dados referentes ao exemplo supracitado

CAPÍTULO IV O DIREITO AO REPOUSO (tempo de descanso ou de não trabalho)

NOTA: O Código do Trabalho trata conjuntamente o tempo de trabalho e o tempo de descanso (Secção III, Capítulo II do Título II) – arts. 155º a 232º.

Significado do direito ao repouso e significado do corolário constitucional deste direito

O tempo de descanso abrange o direito ao repouso, as faltas e os feriados.

O direito ao repouso encontra-se consagrado na Lei Fundamental, no art. 59º, 1-d, pelo que este direito constitui um direito subjectivo público dos trabalhadores perante o Estado (os trabalhadores podem exigir do Estado as condições que permitam o efectivo gozo do direito ao repouso). Por outro lado, o Estado deverá garantir aos trabalhadores os créditos de repouso, isto é, o Estado deve garantir aos trabalhadores que efectivamente usufruirão do seu direito ao repouso. Esta garantia é feita junto das empresas, através da IGT.

Repouso diário

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A lei protege o repouso diário ao estabelecer um limite máximo de período normal de trabalho diário, no art. 163º, 1 (limite máximo de 8 horas por dia e 40 horas por semana).

A lei impõe ainda que o período normal de trabalho diário seja separado por um intervalo de descanso que, conforme a regra geral do art. 174º, deverá ter uma duração não inferior a uma hora, nem superior a duas, de modo a que os trabalhadores não prestem mais de cinco horas de trabalho consecutivo.

O art. 175º consagra, no entanto, algumas excepções: o intervalo de descanso poderá ser reduzido ou suprimido, por IRC, em determinadas situações (n.º 1). A redução ou supressão do intervalo de descanso deverá ser autorizada pela IGT (n.º 2).

Note-se que, durante a jornada de trabalho poderão ser fixadas pausas no trabalho, além do intervalo obrigatório de descanso, como p.e., uma pausa de 10 minutos a meio da manhã.

Devemos também considerar o denominado descanso diário, segundo o qual deverá haver um intervalo mínimo de 11 horas entre as jornadas de trabalho (art. 176º). Este intervalo mínimo é, porém, passível de algumas excepções.

Repouso semanal

Os arts. 205º a 207º prevêem o repouso semanal obrigatório correspondente a um dia de calendário e não a um período de 24 horas. Deve-lhe ser adicionado o período mínimo de descanso diário, salvo se o descanso semanal complementar existir e for contíguo.

Por regra, o descanso semanal acontece ao domingo (art. 205º, 2). O art. 205º, 2 e 3 prevê, todavia, algumas excepções a esta regra.

Para além do período de repouso semanal, poderá existir um período de descanso complementar, período este plasmado no art. 206º.

O descanso semanal complementar poderá ser repartido e descontinuado (p.e., um sábado à tarde e uma segunda-feira de manhã).

Relativamente ao trabalho suplementar, isto é, aquele que é prestado num dia que deveria ser de descanso, diga-se que o trabalho suplementar e pago com um acréscimo de 100% (art. 258º, 2).

O descanso compensatório (art. 202º) prevê que o trabalhador goze de 1 dia de descanso num dos 3 dias seguintes, nos casos de trabalho desempenhado em dia de descanso semanal obrigatório.

O período de descanso compensatório não pode ser substituído por trabalho remunerado.

Repouso anual (o direito a férias)

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O fundamento do direito a férias justifica-se como forma de proteger a saúde dos trabalhadores e de lhes proporcionar um período de auto-disponibilidade (art. 211º, 2).

O direito a férias reporta-se ao trabalho prestado no ano civil anterior e não depende da assiduidade (art. 211º, 4). Este princípio não é, contudo, absoluto, comportando, portanto, algumas excepções:

no ano da contratação, o trabalho tem dto, após 6 meses completos de execução do contrato, a gozar de 2 dias úteis de férias por cada mês de duração do contrato, até ao máximo de 20 dias úteis (art. 212º, 2);

à luz do art. 214º, 1, o trabalhador admitido com contrato cuja duração total não atinja 6 meses tem dto a gozar 2 dias úteis de férias por cada mês completo de duração do contrato;

no ano da cessação do impedimento prolongado o trabalhador tem dto às férias nos termos do art. 212º, 2 – art. 220º, 2.

Aquisição e vencimento do direito (art. 212º, 1, 2, 3 e 4)

O direito a férias encontra-se dividido em três fases ou momentos obrigatórios: aquisição, vencimento e gozo do direito a férias.

O direito a férias adquire-se com a celebração do contrato de trabalho, e vence no dia 1 de Janeiro de cada ano civil (art. 212º, 1). Após a aquisição, o trabalhador passa a ter na sua esfera jurídica o direito ao gozo de férias.

Relativamente à regra geral respeitante ao vencimento do direito a férias, temos de analisar conjuntamente quatro artigos:

1) art. 212º, 1 – o direito a férias vence no dia 1 de Janeiro de cada ano civil;2) art. 211º, 4 – o direito a férias reporta-se, em regra, ao trabalho prestado

no ano civil anterior;3) art. 213º, 1 – o número de dias que se vencem é de 22 dias úteis;4) art. 215º, 1 – as férias devem ser gozadas no decurso do ano civil em que

se vencem.A esta regra geral, colocam-se algumas situações excepcionais. O art.

212º, 3 e 4, prevê um regime especial relativo às férias a gozar no ano da contratação: no ano em que é admitido, o trabalhador tem direito a 2 dias úteis por cada mês em que presta a actividade, até um máximo de 20 dias de férias. Utiliza-se aqui a regra da proporcionalidade. Deve ainda notar-se que, o gozo de férias no ano da contratação pressupõe que o trabalhador já tenha prestado trabalho durante 6 meses.

Veja-se o seguinte exemplo: o trabalhador inicia a sua actividade no dia 04/03/2004. Terá este trabalhador dto a férias, no ano de 2004?

Tendo em conta que as férias se vencem 6 meses após o início da actividade (ou seja, em 04/09/2004), o trabalhador usufruirá de 2 dias por cada mês completo de trabalho até um máximo de 20 dias de gozo efectivo do dto a férias. Se o trabalhador quiser gozar as férias a partir de 05 de Setembro (isto é, no dia imediatamente após o vencimento), terá dto a 12 dias de férias; se,

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eventualmente, quiser gozar as suas férias a partir de 05/11, terá dto a 16 dias de gozo de férias.

Suponha-se agora que o trabalhador iniciou a sua actividade no dia 24/06/2004. Sendo que a data de vencimento é 24/12/2004, o trabalhador não terá até ao fim do ano civil dias suficientes para gozar o período devido de férias. Neste caso, à luz do art. 212º, 3, poderá usufruir do seu dto até 30/06 do ano civil subsequente. Esta situação verificar-se-ia, também, na hipótese de no final do ano civil, o trabalhador ainda não ter cumprido 6 meses de trabalho efectivo.

Nas situações de contratos de trabalho com duração não superior a 6 meses, aplica-se o art. 214º.

A transferência de férias para o ano seguinte não invalida o gozo do tempo normal de férias – 22 dias úteis – relativo a um ano completo de trabalho desempenhado. No entanto, a soma das férias do ano da contratação e do ano subsequente não pode ultrapassar 30 dias úteis (art.212º, 4). Esta regra pode, contudo, ser afastada por IRCT.

Analisemos agora algumas situações práticas de aplicação do art. 212º:

INÍCIO DO CT VENCIMENTO DURAÇÃO GOZO01 de Jan., Fev.

ou Mar.Jul., Ago., Set. –

6 meses20 diasúteis

Ano da contratação

01/04 Outubro 18 diasúteis

Ano da contratação

01/05 Novembro 16 diasúteis

Ano da contratação

01/06 Dezembro 14 diasúteis

Ano da contratação

Até 15/06, excepto dia 1

Dezembro 12 diasúteis

Ano da contratação

De 16 a 30/06 Dezembro 12 diasúteis

Entre 1 e 11 no ano da

contratação. Entre 1 e 8 até 30/06 no

ano seguinte01/07, 08 ou 09 Jan. / Mar. do ano

seguinte8 diasúteis

Até 30/06 do ano seguinte

01/10 Abril do ano seguinte

6 diasúteis

Até 30/06

01/11 Maio 4 diasúteis

Até 30/06

01/12 Junho 2 diasúteis

Até 30/06

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O direito a férias

Relativamente ao período de férias, o art. 213º vem estabelecer a sua duração.

Á luz do n.º 1 (no qual se prevê a duração mínima), o período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis. Este período poderá, eventualmente, ser aumentado por IRCT ou por acordo individual.

Refira-se, a propósito das férias, que o seu início não poderá coincidir com o dia de descanso semanal (art. 213º, 2).

Aumento do período de férias

O art. 213º, 3 prevê os aumentos dos períodos de férias dos trabalhadores.

Assim, caso não haja no ano respectivo faltas justificadas ou haja apenas uma falta justificada ou dois meios dias, o trabalhador verá o seu período de férias aumentado em 3 dias.

Até um máximo de duas faltas justificadas ou quatro meios dias, o trabalhador gozará de mais 2 dias de férias.

Por sua vez, terá apenas 1 dia de aumento do período de férias nos casos em que haja 3 faltas justificadas ou 6 meios dias.

Para efeitos da atribuição de aumentos ao período de férias, são equiparados às faltas os dias de suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao trabalhador (213º, 4).

A norma do art. 213º, 3 ( aumento da duração mínima do período de férias ) não se aplica:

no caso de o período de férias ser superior por IRCT ou contrato; no ano de admissão; no ano subsequente à admissão, salvo se o trabalhador tiver sido

contratado no início desse ano, tendo em conta que a norma parece exigir um ano completo de trabalho (“no que a que as férias se reportam”).Note-se que, o aumento do período de férias determina

correspondente aumento do valor do subsídio de férias (art. 255º, 2).

O trabalhador pode renunciar parcialmente ao dto a férias, recebendo a retribuição e o subsídio respectivos, sem prejuízo de ser assegurado o gozo efectivo de 20 dias úteis de férias (art. 213º, 5). Esta é uma solução nova que permite a regulação por via da autonomia individual das partes.

A norma do art. 213º, 5 é, de certo modo, contraditória ao que estipula o art. 223º. Segundo este artigo, o trabalhador não pode exercer durante as férias qualquer outra actividade remunerada, salvo se já a viesse exercendo cumulativamente ou o empregador o autorizar a isso.

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Além desta aparente contradição, o disposto no art. 213º, 5 conflitua, também, com o que dispõe o art. 211º, 3: o dto a férias é irrenunciável e, fora dos casos previstos no Código, o seu gozo efectivo não pode ser substituído, ainda que com o acordo do trabalhador, por qualquer compensação económica ou outra.

Regime de férias nos contratos de duração inferior a 6 meses

O regime geral que consagra o dto a férias nos contratos com duração inferior a 6 meses está consagrado no art. 214º.

No n.º 1 estipula-se que o trabalhador admitido com contrato cuja duração total não atinja 6 meses tem dto a gozar 2 dias úteis de férias por cada mês de trabalho completo de duração do contrato.

O art. 214º, no que toca ao âmbito de aplicação, vale para contratos, a termo ou sem termo, de duração efectiva inferior a 6 meses, qualquer que seja o modo de cessação. Com esta nova norma, desaparece a regra especial do regime de férias no contrato a termo por período inferior a 1 ano (art. 5º/LFFF – Lei das Férias, Feriados e Faltas).

No n.º 3 do art. 214º, estabelece-se que o gozo de férias deverá ter lugar antes da cessação do contrato, salvo acordo das partes. Regra idêntica consagra o art. 218º, 5.

O art. 214º deve ser lido conjugadamente com o art. 221º - o contrato que termine antes de decorridos 6 meses quer sejam do mesmo ano civil ou de anos diferentes, gera 2 dias úteis de férias por cada mês completo.

Se o contrato tiver uma duração igual ou superior a 6 meses, passa a aplicar-se o regime geral quanto à aquisição, vencimento e duração (art. 212º e 213º), bem como, se for esse o caso, quanto à duração (art. 221º).

Cumulação de férias

As férias, à luz do art. 215º, 1, devem ser gozadas no decurso do ano civil em que se vencem, não sendo permitido acumular no mesmo ano férias de 2 ou mais anos. Este princípio geral é igual àquele que vigorava na lei anterior – art. 7º, 1/LFFF.

As excepções apresentam enunciados gerais sem, no entanto, referirem as circunstâncias que as motivam. Apenas se exige:

acordo entre empregador e trabalhador (art. 215º, 2 e 3); que o trabalhador pretenda gozar férias com familiares residentes no

estrangeiro (n.º 2).

Encerramento da empresa (art. 216º)

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O empregador pode encerrar, total ou parcialmente, a empresa ou estabelecimento, sendo que nesta hipótese legal, o empregador tem à sua disposição um alargado leque de situações possíveis, como p.e., o encerramento até 15 dias consecutivos entre 1 de Maio e 31 de Outubro (art. 216º-a).Marcação do período de férias

O art. 217º, 1 consagra que o período de férias é marcado por acordo entre o empregador e o trabalhador.

Na falta de acordo, o empregador marcará as férias devendo, contudo, ouvir a comissão de trabalhadores. Está, ainda assim, temporalmente limitado no período entre 1 de Maio e 31 de Outubro.

Saliente-se que este limite temporal não se aplica relativamente ás microempresas, conforme dispõe o art. 217º, 8.

Suspensão das férias por motivo de doença

No caso de o trabalhador adoecer durante o período de férias, são as mesmas suspensas desde que o empregador seja do facto informado, prosseguindo, logo após a alta, o gozo dos dias de férias compreendidos ainda naquele período, cabendo ao empregador, na falta de acordo, a marcação dos dias de férias não gozados (219º, 1).

O procedimento de fiscalização dos motivos que levaram à suspensão, por motivo de doença, do período de férias, é ampla e exaustivamente descrito no art. 229º.

Havendo violação das obrigações por parte do trabalhador, os dias de alegada doença são, à luz do art. 219º, 7, considerados dias de férias.

Aliás, esta situação poderá, eventualmente, conduzir a despedimento com justa causa, como se avalia pelo estabelecido no art. 396º, 3-f.Efeitos da suspensão do contrato de trabalho por impedimento prolongado

Esta matéria vem regulada no art. 220º.No n.º 1 estipula-se que no ano da suspensão do contrato de trabalho

por impedimento prolongado, respeitante ao trabalhador, se se verificar a impossibilidade total ou parcial do gozo do dto a férias já vencido, o trabalhador tem dto à retribuição correspondente ao período de férias não gozado e respectivo subsídio.

No ano da cessação do impedimento prolongado, o trabalhador tem dto às férias, nos termos previstos no art. 213º, 2:

aumento de 3 para 6 meses de execução do contrato; duração de férias deixa de ser um período completo, passando a 2 dias por

mês.Consagra o n.º 4 do art. 220º que cessando o contrato após

impedimento prolongado respeitante ao trabalhador, este tem dto à retribuição e ao subsídio de férias correspondentes ao tempo de serviço prestado no ano de início da suspensão.

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Esta norma parece aplicar-se quando a causa do termo do impedimento é a cessação do contrato; se houve prestação de trabalho, a norma aplica-se em conjunto com o n.º 2 (se tiverem decorrido 6 meses); caso contrário, conjuga-se com o art. 221º, 1.Efeitos da cessação do contrato (art. 221º)

Os nºs 1 e 2 do art. 221º correspondem aos anteriores nºs 1, 2 e 3 do art. 10º/LFFF.

Por força do n.º 1 do art. 221º, cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem dto a receber a retribuição correspondente a um período de férias, proporcional ao tempo de serviço prestado até à data da cessação, bem como ao respectivo subsídio. (Ex.: supondo que ganha 500€/mês, far-se-á o seguinte cálculo:

500€ ------- 365x ------ Dias de trabalho efectivo desempenhado no ano de cessação

Além disso, o n.º 2 estipula que se o contrato cessar antes de gozado o

período de férias vencido no início do ano de cessação, o trabalhador tem ainda dto a receber a retribuição e o subsídio correspondentes a esse período, o qual é sempre considerado para efeitos de antiguidade. Isto é, se aquando da cessação do contrato as férias já tiverem sido gozadas, o trabalhador não terá dto a férias. Caso ainda não tenha gozado férias, o dto será retribuído e receberá o subsídio correspondente àquele período.

O n.º 3 (221º) constitui uma nova disposição segundo a qual, se a duração do contrato não atingir, por qualquer causa, 12 meses, não pode resultar um período de férias superior ao proporcional à duração do vínculo, sendo esse período considerado para efeitos de retribuição, subsídio e antiguidade. Esta norma resulta, de certa forma, numa correcção do regime geral.

Veja-se agora o seguinte exemplo: um trabalhador contratado em 01/08/2003 e despedido em 30/06/2004, teria, à luz do art. 212º, 1 e 2, 41 dias de férias. Com a aplicação do n.º 3, para a apenas ter dto à proporção.

O regime jurídico das faltas

O regime jurídico das faltas consta dos arts. 224º a 232º do Código do Trabalho.

Este regime legal é imperativo (art. 226º), o que significa que as disposições legais que regulamentam os tipos de faltas e a sua duração não podem ser reguladas por IRCT ou convenção colectiva de trabalho. A única excepção aplica-se às situações referentes às faltas dadas pelos trabalhadores eleitos para as estruturas de representação colectiva.

O regime de faltas pode, no entanto, ser regulamentado por via individual, isto é, por contrato de trabalho.

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A noção de falta ao trabalho está consagrada no art. 224º, segundo o qual falta é a ausência do trabalhador no local de trabalho e durante o período em que devia desempenhar a actividade a que está adstrito.

Relativamente aos tipos de faltas, podemos afirmar que existem dois tipos: as faltas justificadas e as faltas injustificadas (art. 225º).

A falta justificada está sujeita a três requisitos: fundamentação legal; comunicação; prova.

Caso falte qualquer um destes requisitos, a falta será considerada injustificada. Aliás, a definição de falta injustificada é dada por exclusão (art. 225º, 3 e 229º, 6).

Fundamentação das faltas

Os fundamentos das faltas encontram-se taxativamente consagrados no art. 225º, 2.

Assim, constituem fundamentos de faltas: o casamento (durante 15 dias seguidos); o luto (falecimento do cônjuge, parentes ou afins, nos termos do art.

227º); a prestação de provas escolares, quando se trate de trabalhadores-

estudantes (Estatuto do trabalhador-estudante – art. 79º a 85º do Código do Trabalho) – direito a dispensa do trabalho para frequência de aulas e direito de não comparência para prestação de provas;

o facto não imputável ao trabalhador (p.e., doença, acidente ou cumprimento de obrigações legais);

a assistência inadiável ou imprescindível a membros do agregado familiar (regime da protecção da maternidade e da paternidade – arts. 40º, 41º, 42º e 50º) – note-se que estas faltas, embora justificadas, não são retribuídas;

o acompanhamento escolar dos filhos (ausências não superiores a 4 horas e só pelo tempo estritamente necessário, uma vez por semestre, para deslocação à escola tendo em vista as informações sobre a situação educativa do filho menor);

o exercício de funções de representação colectiva (ver art. 455º); a campanha eleitoral para cargos públicos (art. 230º, 4); a autorização ou aprovação do empregador; os que por lei forem qualificados como faltas justificadas. Aqui se

incluem todas as situações regulamentadas em legislação especial.

No art. 225º, 2-h, foi incluída uma situação que, anteriormente, figurava regulamentada em legislação especial: são as faltas dadas por candidatos a eleições para cargos públicos, durante o período legal da campanha eleitoral.

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Estas faltas conferem, no máximo, direito à retribuição relativa a um 1/3 do período de duração da campanha eleitoral.

Á luz do art. 230º, 4, o trabalhador só poderá faltar meios dias ou dias completos, com aviso prévio de 48 horas.Comunicação das faltas justificadas (art. 228º)

As faltas classificam-se de previsíveis ou imprevisíveis, consoante o trabalhador saiba previamente que terá de faltar ou não.

Caso a falta seja previsível, o trabalhador tem de efectuar a comunicação com 5 dias de antecedência mínima. Relativamente ás faltas injustificadas, o trabalhador terá obrigatoriamente de comunicar “logo que possível” (art. 228º, 2).

Note-se que, à luz do n.º 3 do art. 228º, a comunicação tem de ser reiterada para as faltas justificadas imediatamente subsequentes ás previstas nas comunicações indicadas nos números anteriores.

Prova das faltas justificadas (art. 229º)

No que concerne à prova das faltas justificadas, o empregador tem a faculdade de, nos 15 dias seguintes à comunicação, exigir ao trabalhador a prova dos factos invocados para a justificação.

Saliente-se que, para as faltas justificadas com fundamento em doença, existe um regime especial de prova e fiscalização (art. 229º, 2, 3, 4 e 5).

Efeitos das faltas

Os efeitos das faltas dependem do tipo, isto é, haverão diferentes efeitos caso a falta seja justificada ou injustificada.

Em princípio, as faltas, quando justificadas, não implicam perda de retribuição (art. 230º, 1). Há, contudo, algumas situações relativamente ás quais as faltas, embora justificadas, implicam perda de retribuição (p.e., as faltas por acidente de trabalho, quando o trabalhador tenha direito a subsídio ou seguro – art. 230º, 2-b).

Quanto ás faltas injustificadas, vigora o art. 231º, segundo o qual, no n.º1, “as faltas injustificadas constituem violação do dever de assiduidade e determinam perda da retribuição correspondente ao período de ausência, o qual será descontado na antiguidade do trabalhador”.

São consideradas infracções disciplinares graves, as faltas injustificadas a um ou meio período normal de trabalho diário, imediatamente anteriores ou posteriores aos dias ou meios dias de descanso ou feriados (art. 231º, 2). À luz do art. 363º, se esta falta causar danos ao empregador, o trabalhador é civilmente responsável pelos danos.

Efeitos das faltas no direito a férias (art. 232º)

O trabalhador tem a possibilidade de compensar as faltas dadas sacrificando dias de férias, com a salvaguarda do gozo efectivo de 20 dias

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úteis ou da correspondente proporção, caso se trate de férias no ano de admissão.

Em comparação com a legislação anterior, verifica-se que o período insubstituível aumentou de 15 para 20 dias de gozo efectivo das férias.

O caso particular dos feriados

Os feriados correspondem a situações em que não há prestação da actividade, pese embora, o fundamento dos feriados não seja um direito dos trabalhadores, mas sim uma obrigação dos empregadores perante o Estado de suspenderem o trabalho.

Há dois tipos de feriados: os feriados obrigatórios (art. 208º) e os feriados facultativos (art. 209º).

Atente-se na definição jurídico-laboral de feriado obrigatório: os feriados obrigatórios são dias em que, por força da lei, deve ser obrigatoriamente suspensa a laboração nas empresas, tendo em vista a comemoração colectiva de acontecimentos considerados notáveis, nos planos político, religioso, cultural, etc..

Relativamente ao regime anterior, estabeleceu-se no Código do Trabalho a obrigatoriedade do feriado correspondente ao Domingo de Páscoa (208º, 1). Além deste, são também feriados obrigatórios: 1 de Janeiro, Sexta-Feira Santa; 25 de Abril; 1 de Maio; Corpo de Deus (festa móvel); 10 de Junho; 15 de Agosto; 5 de Outubro; 1, 8 e 25 de Dezembro.

À luz do art. 208º, 3, mediante legislação especial determinados feriados obrigatórios podem ser observados na segunda-feira da semana subsequente.

Já no que respeita aos feriados facultativos, podemos afirmar que a facultatividade apenas se verifica enquanto não for imposta a sua observância (ou seja, logicamente, os feriados deixam de ser facultativos quando passam a ser obrigatórios).

São feriados facultativos: a terça-feira de Carnaval (este feriado perde o seu carácter facultativo por imposição governamental) e o feriado municipal (deixa de ser facultativo por imposição municipal) – art. 209º, 1.

Saliente-se, por fim, que as normas do Código consagradas aos feriados tem o carácter de imperatividade, isto é, são nulas as disposições de contrato de trabalho ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que estabeleçam feriados diferentes dos indicados nos artigos anteriores (art. 210º).

CAPÍTULO VA RETRIBUIÇÃO

Generalidades

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Duarte Nuno Laranjeira – Direito do Trabalho (2003-2004)

A retribuição é um elemento essencial do contrato de trabalho, na medida em que não existem contratos de trabalho gratuitos.

O contrato de trabalho pressupõe sempre uma compensação pelo trabalho prestado. Essa compensação denomina-se retribuição.

A retribuição constitui uma das principais obrigações do empregador perante o trabalhador.

Concepções do salário

O salário, desde logo, não é visto da mesma forma pelo trabalhador (é visto como um rendimento para satisfação de necessidades próprias e familiares) e pelo empregador (neste caso, o salário é visto como um custo de produção).

Em termos metodológicos, o salário é entendido segundo três concepções distintas: jurídica, social e económica. Analisem-se, então, tais concepções:

1) Concepção jurídica

Sob o ponto de vista jurídico, o salário é visto como um pagamento pela contrapartida da disponibilidade do trabalhador para prestar o trabalho (art. 249º, 1 – só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem dto como contrapartida do seu trabalho); pelo que só se deve pagar o salário quando haja prestação de trabalho.

A contrario sensu, quando não há prestação de trabalho, não há a obrigação de pagar salário. Vejam-se, a este propósito, alguns exemplos:

faltas ao trabalho (art. 230º, 2; art. 231º, 1); suspensão do contrato de trabalho por impedimento respeitante ao

trabalhador (art. 331º); greve (art. 597º); suspensão do contrato de trabalho por facto imputável ao empregador (art.

351º); suspensão preventiva (art. 371º, 3).

2) Concepção social

Na concepção social, o salário é considerado um rendimento essencial para a satisfação das necessidades pessoais e familiares do trabalhador. Nesse sentido, o salário é, segundo esta concepção, um elemento fundamental.

Vejamos agora as várias manifestações da concepção social de salário no ordenamento jurídico:

Remuneração mínima (art. 266º), pelo que a todos os trabalhadores é garantida uma retribuição mínima mensal com o valor que anualmente for fixado por legislação especial, ouvida a Comissão Permanente de

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Duarte Nuno Laranjeira – Direito do Trabalho (2003-2004)

Concertação Social. A remuneração mínima encontra o seu fundamento na Constituição no art. 59º, 2-a.

À luz do DL 19/2004 de 20 de Janeiro, a retribuição mínima fixada para o ano de 2004 é de 365,60€;

Inadmissibilidade da compensação integral da retribuição mensal com créditos da entidade patronal (art. 270º) – a lei proíbe que o empregador compense directamente com a retribuição eventuais créditos que tenha com o trabalhador, nomeadamente créditos derivados da prestação de trabalho, como p.e., uma indemnização sobre prejuízos causados;

Impenhorabilidade e insusceptibilidade parcial de cessão dos créditos salariais (art. 271º; art. 824º, 1/CPC);

Rendimentos substitutivos do salário – nos casos em que o trabalhador está impedido de prestar trabalho, o Estado garante-lhe as condições mínimas salariais, através de subsídio de doença, prestação por acidente de trabalho (a cargo da seguradora) e subsídios de desemprego;

Garantias do pagamento do salário. À luz do art. 377º, o trabalhador goza de privilégios creditórios (ou melhor, os créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, gozam de privilégios creditórios).

Em certas situações, de acordo com o art. 378º, haverá responsabilidade solidária das sociedades em relação de domínio ou de grupo, isto é, todas as sociedades respondem solidariamente perante o trabalhador pelos créditos vencidos há mais de 3 meses. O mesmo se poderá verificar ao nível dos sócios e administradores (art. 379º - no entanto, só respondem os sócios dominantes, isto é, aqueles que detenham uma posição maioritária no que diz respeito ao capital social).

Em qualquer dos casos, a garantia do pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação e cessação, pertencentes ao trabalhador, que não possam ser pagos pelo empregador por motivo de insolvência ou de situação económica difícil é assumida e suportada pelo Fundo de Garantia Social, nos termos previstos em legislação especial (art. 380º).

3) Concepção económica

Sob uma perspectiva económica, o salário é um custo de produção das mercadorias e influencia decisivamente a procura de bens de consumo (a nível nacional, o conjunto dos rendimentos distribuídos constitui a amplitude da procura dos bens de consumo). Desta forma, o salário deve ser levado em conta em qualquer política económica governamental.

O salário, enquanto concepção económica, manifesta-se ao nível da denominada Concertação Social.

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Determinação qualitativa da retribuição

O problema coloca-se no seguinte patamar: o que é efectivamente a retribuição? Verificamos, então, que tal qualificação se afigura difícil. Vejamos porquê:

Em primeiro lugar, verifica-se a proliferação de “títulos” das atribuições patrimoniais, isto é, existem inúmeras retribuições que não apenas o salário mensal pelo trabalho prestado. Assim, o trabalhador, além do salário mensal base, poderá receber verbas por subsídio de turno, férias, Natal, alimentação, gratificações diversas, etc.. Desta forma, a questão será saber quais as prestações patrimoniais que têm carácter de retribuição e quais as que não têm.

Em segundo lugar, porque a retribuição funciona como uma medida de direitos do trabalhador, ao nível, p.e., das retribuições vincendas (art. 437º).

O trabalhador dispõe ainda de uma importante garantia: o princípio da irredutibilidade da retribuição (art. 122º-d).

A lei não estabelece uma definição de retribuição. Porém, no art. 249º são estabelecidos uma série de princípios gerais, princípios esses que encontram a sua aplicação nos arts. 260º a 262º.

Ainda assim, definiremos retribuição como um conjunto de valores pecuniários ou não que o empregador está obrigado a pagar periódica e regularmente ao trabalhador como contrapartida pelo trabalho desempenhado.

A retribuição pode ser paga totalmente em dinheiro, mas também parcialmente em dinheiro e em espécie (p.e., através da entrega de bens ou prestação de serviços que se destinam à satisfação das suas necessidades, como sejam o fornecimento de alojamento, alimentação, etc.). Daí se dizer que a retribuição poderá constituir um conjunto de valores patrimoniais ou não. No entanto, à luz do art. 267º, 3, a parte da retribuição satisfeita em prestações não pecuniárias não pode exceder a parte paga em dinheiro, salvo se outra coisa for estabelecida em IRCT.

As prestações que o empregador atribui ao trabalhador são obrigatórias, pois são atribuídas no cumprimento de uma obrigação. Excluem-se, aqui, as prestações com animus donandi (art. 261º, 1-a). Esta obrigatoriedade pode resultar de lei, IRCT, contrato individual de trabalho ou regulamento interno, mas também dos usos laborais, conforme dispõe o art. 249º, 1.

Relativamente à regularidade ou periodicidade no pagamento, podemos afirmar que as retribuições deverão ser periódicas e regulares, podendo a periodicidade variar: mensal, trimestral, semestral, anual.

Deverá, ainda, vislumbrar-se um nexo de causalidade entre a prestação e a disponibilidade do trabalhador. Estipula o art. 249º, 3, através de presunção legal, que, até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador. A prestação patrimonial destina-se a pagar a disponibilidade do trabalhador para prestar a sua actividade.

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Assim, uma prestação terá carácter retributivo se reunir, cumulativamente, as seguintes características:

Obrigatoriedade das prestações; Pagamento periódico e regular; Nexo de causalidade entre a prestação e a disponibilidade do

trabalhador.

Componentes da retribuição(parcelas que integram a retribuição do trabalhador)

Retribuição base

Entende-se por retribuição base aquela que, nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido (art. 250º, 2-a).

A retribuição base pode ser certa, variável ou mista (arts. 251º e 252º, 1).É certa a retribuição calculada em função do tempo de trabalho. A

retribuição variável tem a ver com o trabalho à peça ou à tarefa. Constitui também retribuição variável a participação nos lucros da empresa por parte do trabalhador (art. 262º).

À luz do n.º 3 do art. 253º, a retribuição mista deve consistir numa parcela fixa e noutra variável, com o nível de produtividade determinado a partir das respectivas bases de apreciação.

Gratificações de diversa natureza

Trata-se de determinadas prestações patrimoniais atribuídas pelo empregador ao trabalhador ou, mais correctamente, são prestações patrimoniais correctivas da retribuição base.

Constituem exemplos de gratificações os subsídios de férias, subsídios de Natal, balanços, prémios de assiduidade, etc..

O n.º 2 do art. 261º está consagrado ás denominadas gratificações ordinárias.

O art. 254º regula o subsídio de Natal. Este subsídio é, à luz do n.º 1, de igual valor a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano.

Relativamente ao subsídio de Natal, colocar-se-á a questão de saber se se trata de retribuição base e diuturnidades ou apenas retribuição global. No art. 250º, 1 estabelece-se um princípio geral segundo o qual quando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades. Desta

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forma, parece-nos correcto afirmar que o valor do subsídio de Natal abrange apenas a retribuição base e diuturnidades.

O Código do Trabalho regula no art. 255º, a retribuição respeitante ao subsídio de férias.

O subsídio de férias compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho – art. 255º, 2.

Nestas “prestações retributivas” estão incluídas as prestações que se referem ao condicionalismo externo da prestação de trabalho, isto é, trabalho nocturno, trabalho por turnos, isolamento, risco, penosidade, etc.. Por sua vez, estão excluídas as prestações que correspondem à efectiva prestação do trabalho, como p.e., as respeitantes ao desempenho do trabalhador (prémios, gratificações, comissões), bem como as respeitantes a despesa por causa da prestação de trabalho (isto é, subsídio de refeição, transportes, renda de casa, etc.).

O subsídio de férias deixou de ser igual à retribuição de férias, pelo que, o que deverá ser incluído no subsídio de férias dependerá da interpretação das normas legais ou convencionais que criam e regulam cada prestação.

Acréscimos patrimoniais específicos

Existem determinadas situações específicas que conferem ao trabalhador o direito a ser retribuído especialmente sobre o trabalho desempenhado naquelas situações, como acontece p.e., nos casos de trabalho suplementar e trabalho nocturno.

Existem também acréscimos ou aditivos patrimoniais que constituem subsídios de risco, isolamento ou turno. Estes acréscimos constituem meras especificações do salário, na medida em que se destinam a pagar trabalho prestado em condições especiais. Além disso, tendo em conta um critério de regularidade ou periodicidade, se forem regulares e periódicas, consideram-se integrantes da retribuição salarial base.

Note-se que os acréscimos patrimoniais específicos só são devidos enquanto se mantiver o especial circunstancialismo da prestação de trabalho.

Outras prestações

Entre as restantes prestações, enquanto componentes da retribuição, destacamos, desde logo, as comissões. Saliente-se que, se as comissões forem devidas no âmbito de um contrato de trabalho, aquelas integram a retribuição, sob a forma de retribuição variável.

Além das comissões, referimos também as diuturnidades, definidas no art. 250º, 2-b: prestação pecuniária, de natureza retributiva e com vencimento periódico, devida ao trabalhador, nos termos do contrato ou do instrumento de

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regulamentação colectiva de trabalho, com fundamento na antiguidade. As diuturnidades têm claramente um carácter retributivo.

Entre as diversas prestações, destacaremos ainda o abono por falhas. O abono por falhas não constitui, em princípio, prestação retributiva. Pode, no entanto, com carácter excepcional, à luz do art. 260º, 2, constituir uma forma de prestação retributiva.

Por último, faremos referência ao subsídio de refeição que, só excepcionalmente, constituirá retribuição (art. 260º, 2).

Determinação quantitativa da retribuição

A Lei Fundamental consagra no art. 59º, 1-a um princípio geral, segundo o qual para trabalho igual, salário igual. Este princípio está também plasmado no Código do Trabalho – art. 263º –, onde se estipula que na determinação do valor da retribuição deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que para trabalho igual, salário igual.

Significa este princípio que dois trabalhadores que, na mesma empresa, desempenham funções qualitativamente coincidentes, em idêntica quantidade (duração), devem receber salário igual.

O rendimento do trabalho releva para justificar diferenciação salarial, isto é, as diferenciações retributivas não constituem discriminação se assentes em critérios objectivos, comuns a homens e mulheres, sendo admissíveis, nomeadamente, distinções em função do mérito, produtividade, assiduidade ou antiguidade dos trabalhadores (art. 28º, 2).

Refira-se, porém, que, no plano das normas ou critérios gerais não há discriminação de salários. Todavia, no plano do valor concreto da retribuição, pode diferenciar-se o salário com base no mérito ou rendimento.

A retribuição pode não estar fixada com precisão, sendo que tal imprecisão poderá ser motivada por variadas razões.

Desde logo, porque a retribuição pode ser variável (art. 252º).Constituem factores de interferência – segundo os quais as empresas não

fixam com precisão o valor exacto da retribuição do trabalho – a lei, os IRCT (tabelas salariais por categorias), os regulamentos internos (tabelas salariais).

Contudo, por múltiplas razões, dever-se-á conhecer exactamente o valor da retribuição. Neste contexto, afirmamos que, pese embora a retribuição possa não estar determinada, esta é sempre determinável. À luz do art. 265º, 1, compete ao julgador, tendo em conta a prática na empresa e os usos do sector ou locais, fixar a retribuição quando as partes o não fizeram e ela não resulte das normas de IRCT aplicável ao contrato.

Caso a retribuição seja variável, aplicam-se os nºs 2 e 3 do art. 252º.

Vencimento e pagamento da retribuição

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Quanto à forma, a retribuição pode ser paga totalmente em dinheiro, ou parcialmente em dinheiro e em espécie (art. 267º, 1, 2 e 3).

À luz do art. 267º, 4, o empregador pode efectuar o pagamento por meio de cheque bancário, vale postal ou depósito à ordem do trabalhador, observadas que sejam as seguintes condições: o montante da retribuição deve estar à disposição do trabalhador na data do vencimento ou no dia útil imediatamente anterior (alínea a); as despesas comprovadamente feitas com a conversão dos títulos de crédito em dinheiro ou com o levantamento, por uma só vez, da retribuição, são suportadas pelo empregador (alínea b).

A retribuição deve ser paga no local de trabalho, conforme consta do art. 268º, 1. Tendo sido estipulado lugar diverso do da prestação de trabalho, o tempo que o trabalhador gastar para receber a retribuição considera-se tempo de trabalho (art. 268º, 2).

Relativamente ao tempo do cumprimento, dispõe o art. 269º a periodicidade do pagamento, segundo a qual, a obrigação de satisfazer a retribuição vence-se por períodos certos e iguais, que, salvo estipulação ou usos diversos, são a semana, a quinzena ou o mês do calendário.

O tempo do cumprimento pode funcionar como unidade de medida da retribuição e como unidade de vencimento.

Prazo de prescrição dos créditos salariais

O prazo de prescrição dos créditos salariais vem regulado no art. 381º.Todos os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua

violação ou cessação, pertencentes ao empregador ou ao trabalhador, extinguem-se por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho (art. 381º, 1).

Este período de um ano a contar da cessação do contrato de trabalho é, portanto, aplicável ao trabalhador e ao empregador.

Há determinados créditos em relação aos quais o legislador impôs um regime especial de prova, como p.e., para os créditos mais antigos. Assim, de acordo com o n.º 2 do art. 381º, os créditos resultantes da indemnização por falta do gozo de férias, pela aplicação de sanções abusivas ou pela realização de trabalho suplementar, vencidos há mais de 5 anos, só podem ser provados por documento idóneo.

CAPÍTULO VI

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A SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

Modalidades e regime jurídico

A sustentação do contrato de trabalho resulta de determinadas situações que impedem o trabalhador de prestar trabalho, ou a empresa de o receber.

Constituem exemplos de tais situações: a situação de doença do trabalhador, o seu cumprimento do serviço militar obrigatório, mas também um incêndio que torna impraticável a prestação de trabalho na empresa.

A situação será superveniente, isto é, ocorre depois da celebração do contrato de trabalho. O impedimento tem natureza temporária e, por outro lado, é inimputável ao trabalhador, ou seja, resulta de uma situação que não foi voluntariamente criada pelo trabalhador.

O regime jurídico da suspensão do contrato de trabalho consta dos arts. 330º a 362º do Código do Trabalho.

Efeitos gerais da suspensão (art. 331º)

A primeira característica da suspensão é a conservação do vínculo contratual. A finalidade deste instituto é permitir a manutenção do contrato de trabalho nas situações em que, caso não existisse este instituto o contrato cessaria.

O vínculo contratual mantém-se até ao momento em que surja uma causa que motive a cessação do contrato.

Uma segunda característica da suspensão é a conservação da antiguidade. A antiguidade do trabalhador continua a contar-se durante o período de suspensão do contrato.

Finalmente, a suspensão do contrato não obsta à permanência dos dtos e deveres não dependentes da efectiva prestação de trabalho. Durante aquele período, o trabalhador fica exonerado do cumprimento da prestação de trabalho.

A obrigação de pagamento do salário (dever principal do empregador) cessa nas situações derivadas de facto respeitante ao trabalhador; e nas situações de crise empresarial (sendo, nesta hipótese, substituída pela compensação retributiva). Por seu turno, a obrigação de pagamento do salário permanece integralmente, nos casos previstos no art. 351º (no caso de encerramento temporário do estabelecimento ou diminuição da actividade por facto imputável ao empregador ou por motivo do interesse deste, os trabalhadores afectados mantêm o dto à retribuição), e parcialmente, nos casos do art. 350º (quando o encerramento temporário do estabelecimento ou a diminuição temporária da actividade forem devidos a caso fortuito ou motivo de força maior, o empregador passa a pagar 75% da retribuição aos trabalhadores).

Relativamente aos deveres acessórios, o dever geral de lealdade permanece, bem como, todos os outros deveres que não estejam directamente

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dependentes da prestação de trabalho; por sua vez, todos os outros (aqueles deveres que não podem existir se não houver prestação de trabalho) suspendem-se.

Causas e modalidades de suspensão do contrato de trabalho

1. Suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao trabalhador (art. 333º e 334º) – o impedimento está ligado à pessoa do trabalhador;

2. Suspensão por facto respeitante ao empregador – é exemplo deste tipo de suspensão, o encerramento temporário do estabelecimento ou a diminuição temporária da actividade (art. 350º a 353º), por facto imputável ao empregador ou por motivo do seu interesse; mas também, por caso fortuito ou de força maior. Um outro exemplo reside nas situações de crise empresarial (335º a 341º);

3. Suspensão por acordo das partes – licença sem retribuição (354º e 355º), ou pré-reforma (356º a 362º).

1) Esta forma de suspensão encontra os seus requisitos plasmados no art. 333º: Existência de um impedimento temporário – o impedimento temporário

terá, por regra, a duração mínima de 1 mês. No entanto, a suspensão do contrato pode verificar-se antes de decorrido 1 mês quando o impedimento tiver uma duração (previsível) superior àquele prazo (art. 333º, 1 e 2).

No momento em que se torne certo que o impedimento é definitivo, o contrato de trabalho caduca (art. 333º, 3).

Note-se ainda que, terminado o impedimento, o trabalhador deve retomar imediatamente o trabalho: no dia imediato ao da cessação do impedimento, o trabalhador deve apresentar-se ao empregador, para retomar a actividade, sob pena de incorrer em faltas injustificadas (art. 334º);

O impedimento deverá estar ligado à pessoa do trabalhador – no art. 333º, 1, são referidas, exemplificativamente, algumas situações (serviço militar obrigatório ou serviço cívico substitutivo, doença ou acidente). Além destas, temos, p.e., as situações de exercício de funções políticas, de gestão pública, etc.;

Não imputabilidade do impedimento ao trabalhador – haverá imputabilidade se o impedimento for voluntariamente provocado (imputável a título de dolo).

Nos casos previstos na lei, a imputabilidade não impede a suspensão.

No que concerne aos efeitos para esta forma de suspensão do contrato de trabalho, a entidade patronal deixa de estar obrigada a pagar a

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retribuição, isto é, o direito do empregador à retribuição suspende-se (veja-se o art. 220º relativo aos efeitos da suspensão do contrato de trabalho por impedimento prolongado, no âmbito do regime do dto a férias).

2) 2.1.) Quando se verifica o encerramento temporário do estabelecimento motivando a suspensão do contrato de trabalho (por facto respeitante ao empregador), aplica-se o disposto no art. 351º.

Esta hipótese abrange: Situações resultantes de decisão unilateral do empregador (p.e.: remodelação

de instalações, diminuição de encomendas; etc.); Situações resultantes de decisão de autoridade pública (ex.: delitos contra a

saúde pública, violação de regras de higiene e segurança; etc.).

Como vimos, o empregador poderá proceder ao encerramento temporário do estabelecimento. No entanto, esta decisão poderá ser passível de confusão com a figura do lock-out [art. 605º: 1) É proibido o lock-out. 2) Considera-se lock-out qualquer decisão unilateral do empregador que se traduza na paralisação total ou parcial da empresa ou na interdição do acesso aos locais de trabalho a alguns ou à totalidade dos trabalhadores e, ainda, na recusa em fornecer trabalho, condições e instrumentos de trabalho que determine ou possa determinar a paralisação de todos ou alguns sectores da empresa ou desde que, em qualquer caso, vise atingir finalidades alheias à normal actividade da empresa].

A distinção haverá de resultar do elemento intencional: a entidade patronal terá de demonstrar que o encerramento é imposto por razões de ordem técnica ou económica.

Quando se verifica a suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador, os trabalhadores mantêm o dto à retribuição. No entanto, poderá ser deduzido no montante a pagar, o valor que o trabalhador aufira em virtude de qualquer outra actividade remunerada que passe a exercer durante o período em que o impedimento subsista e que não pudesse desempenhar não fora o encerramento (art. 352º - dedução do alliunde perceptum).

2.2.) À luz do art. 350º, a suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador pode dar-se por caso fortuito ou de força maior.

Assim, o evento impeditivo da laboração da empresa será imprevisível (nos casos fortuitos) ou inevitável (nos casos de força maior).

Terá de haver, porém, um nexo de causalidade imediato entre o evento e o encerramento, como p.e., a falta de energia eléctrica, combustível, etc..

De acordo com o art. 350º, o empregador está obrigado a pagar 75% da retribuição aos trabalhadores.

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2.3.) A suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador pode ainda acontecer nas situações de crise empresarial. Estas situações são designadas de lay-off.

Os pressupostos estão consagrados no art. 335º, 1: Motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras

ocorrências; Afectação grave da actividade normal da empresa; Necessidade da medida para assegurar a viabilidade da empresa e a

manutenção dos postos de trabalho.Esta medida empresarial tem uma forte aproximação ao despedimento

colectivo dos trabalhadores (semelhança de motivos – art. 397º).A suspensão do contrato de trabalho em situações de crise empresarial

está sujeita à verificação de um determinado procedimento (art. 336º a 340º).

Nesta forma de suspensão, a obrigação de pagamento da retribuição é substituída pela compensação retributiva (art. 343º):

2/3 da retribuição normal; limite mínimo – retribuição mínima mensal (art. 341º, 1-a e 2); limite máximo – triplo de retribuição mínima mensal (art. 342º, 2).

A compensação retributiva é comparticipada em 70% pela Segurança Social, conforme consta do art. 344º.

Redução da laboração:

A suspensão do contrato de trabalho por motivo respeitante ao empregador pode ser substituída pela redução da actividade.

O art. 335º, 2 prevê as formas de redução: redução do período normal de trabalho diário; eliminação de dias de trabalho.

3) A definição de pré-reforma consta do art. 356º: situação de redução ou de suspensão da prestação do trabalho em que o trabalhador com idade igual ou superior a 55 anos mantém o direito a receber do empregador uma prestação pecuniária mensal até à data de verificação de qualquer das situações previstas no n.º 1 do art. 361º.

O acordo respeitante à pré-reforma está sujeito à forma escrita (art. 357º).À luz do art. 359º, 1 (prestação de pré-reforma): a prestação de pré-

reforma inicialmente fixada não pode ser inferior a 25% da última retribuição auferida pelo trabalhador, nem superior ao montante desta retribuição.

A situação de pré-reforma extingue-se pela desvinculação definitiva do trabalhador, isto é, pelo retorno ao regime normal de trabalho (este retorno só é permitido por acordo ou por incumprimento do empregador por mora no pagamento da prestação de pré-reforma) – art. 361º.CAPÍTULO VII A CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

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O regime jurídico da cessação do contrato de trabalho consta dos arts. 382º a 450º do Código do Trabalho.

O momento em que se extingue a relação ou vínculo jurídico assume enorme relevância, desde logo, porque nesta fase se vislumbram divergências entre o empregador e o trabalhador motivadas por tal extinção.

A cessação do contrato de trabalho acarreta diferentes efeitos para o trabalhador (p.e., a perda do emprego e, consequentemente, a perda da retribuição, etc.) e para o empregador (perda de um colaborador, sendo que tal perda será suprido, no mercado de trabalho, pela admissão de um outro). Conclui-se que os efeitos são menos graves para o empregador do que para o trabalhador.

Aliás, é por esta razão que a matéria em questão é tratada de diferente modo, consoante se trate do empregador ou do trabalhador.

Formas de cessação do contrato de trabalho (art. 384º)

O contrato de trabalho pode extinguir-se por:1) Forma automática, independentemente da vontade das partes

(caducidade);2) Acordo das partes (aqui a cessação assume a forma de revogação)3) Decisão unilateral das partes: Caso seja por decisão do trabalhador, a

cessação assume duas diferentes formas: a resolução e a denúncia. Caso seja por iniciativa do empregador, temos a resolução / despedimento.

O despedimento poderá ser individual (subdividido em: despedimento por facto imputável ao trabalhador ou despedimento disciplinar; despedimento por extinção de postos de trabalho; despedimento por inadaptação) ou colectivo.

1) Caducidade:O contrato de trabalho pode terminar por caducidade (art. 387º), isto

é, os efeitos deixam de se produzir de forma automática pela verificação de determinados pressupostos.

O contrato de trabalho cessará por caducidade: No caso dos contratos a termo; Pela impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva (isto é, pela

impossibilidade de o trabalhador prestar trabalho ou de o empregador o receber, sendo que esta impossibilidade será total e não-temporária);

Em caso de reforma do trabalhador (por velhice ou invalidez); Nos termos gerais do direito.

Para que o contrato de trabalho caduque, não basta a verificação de um facto; é necessário também um comportamento declarativo (p.e., uma declaração da empresa, no final do tempo de contrato, afirmando que não deseja a continuação do contrato), pois o contrato não caduca de per si. Ou seja, a

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caducidade tem efectivamente carácter automático, no entanto, para que opere é necessário um facto, mas também um comportamento declarativo do trabalhador ou do empregador.

No art. 390º é tratado um caso especial de impossibilidade de continuação do cumprimento do contrato.

Neste caso, a caducidade pode dar-se por: Morte do empregador individual – à luz do n.º 1, a morte do empregador

em nome individual faz caducar o contrato de trabalho na data do encerramento da empresa, salvo se os sucessores do falecido continuarem a actividade para que o trabalhador foi contratado ou se se verificar a transmissão da empresa ou estabelecimento. Verifica-se, pois, que a caducidade opera na data do encerramento da empresa;

Extinção da pessoa colectiva empregadora – a extinção da pessoa colectiva empregadora determina a caducidade do contrato de trabalho, salvo se se verificar a transmissão da empresa ou estabelecimento – n.º 2;

Encerramento total e definitivo da empresa – o encerramento total e definitivo da empresa determina a caducidade do contrato de trabalho, devendo, porém, seguir-se o procedimento próprio do despedimento colectivo – n.º 3 e art. 419º, ss., com as devidas adaptações.

Esta regra não se aplica ás microempresas, mas o trabalhador deverá ser avisado com 60 dias de antecedência acerca do encerramento.

Os trabalhadores, via de regra, têm dto à compensação por antiguidade, conforme consta do art. 401º (“compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade”).

O art. 392º regula a caducidade por reforma ou limite de idade:Relativamente à reforma por velhice, esta só opera com o

conhecimento de ambas as partes.Nesta situação, o contrato de trabalho termina no momento do

conhecimento ou num dos 30 dias subsequentes. Contudo, a permanência ao serviço do mesmo empregador no trigésimo dia provoca a conversão em contrato de trabalho a termo de seis meses.

Note-se que, no momento em que o trabalhador perfizer a idade de 70 anos, o contrato de trabalho converte-se em contrato a termo resolutivo de 6 meses (art. 392º, 3) – estabelecimento pelo legislador de um limite de idade.

2) Revogação:Nos termos do art. 393º, o empregador e o trabalhador podem fazer

cessar o contrato de trabalho por acordo.

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A revogação trata-se de um negócio formal, e que por via disso deverá ser reduzido a escrito (exigência de forma escrita – art. 394º).

No n.º 4 do art. 394º prevê-se o denominado despedimento negociado : se, no acordo de cessação, ou conjuntamente com este, as partes estabelecerem uma compensação pecuniária de natureza global para o trabalhador, presume-se que naquela foram pelas partes incluídos e liquidados os créditos já vencidos à data da cessação do contrato ou exigíveis em virtude dessa cessação.

A compensação pecuniária de natureza global é uma verba que não está discriminada em parcelas, não se especificando, portanto, a que é que se refere. A presunção constante daquela disposição legal não é susceptível de ser afastada por prova em contrário (presunção iuris et de iure).

À luz do art. 395º, 1, os efeitos do acordo de revogação do contrato de trabalho podem cessar por decisão do trabalhador até ao sétimo dia seguinte à data da respectiva celebração, mediante comunicação escrita; verificando-se, neste caso, uma denúncia do acordo revogatório.

Esta possibilidade não abrange o acordo de revogação com assinaturas reconhecidas presencialmente pelo notário (art. 395º, 4).

O legislador estabelece aquela faculdade com o objectivo de evitar despedimentos dissimulados. Por outro lado, visa consagrar uma espécie de direito ao arrependimento, direito este que favorecerá a parte mais fraca ou débil da relação, ou seja, o trabalhador.

3) 3.1.) Cessação do contrato por iniciativa do trabalhador:Em primeiro lugar, convém afirmar que nesta situação estão em causa

alguns interesses do trabalhador, como p.e., a recuperação da sua liberdade pessoal e a obtenção de um melhor emprego, etc..

Por iniciativa do trabalhador, o contrato de trabalho pode cessar por: Denúncia – a denúncia pode ser expressa ou tácita (esta é tratada pela lei

sob a forma de abandono do trabalho); Resolução – a resolução baseia-se numa justa causa, pelo que deverá ser

devidamente fundamentada.

No que respeita à denúncia, o seu regime legal consta dos arts. 447º a 450º.

A denúncia não carece de causa justificativa, isto é, o trabalhador não é obrigado a afirmar porque é que decide fazer cessar o contrato. Deverá apenas comunicar, por escrito, através de pré-aviso:

Caso se trate de contrato de trabalho sem termo, 30 dias até 2 anos de antiguidade, ou 60 dias se tiver mais de 2 anos de antiguidade. Caso se trate de contrato de trabalho a termo, deverá comunicar com antecedência de 30 dias nos contratos de duração igual ou superior a 6 meses, ou 15 dias se o contrato tiver duração inferior.

O pré-aviso tem como função a possibilidade de preparação da substituição do trabalhador por parte do empregador.

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O art. 448º prevê as consequências para o não cumprimento do prazo de pré-aviso:

Indemnização do valor da retribuição base e diuturnidades correspondente ao período em falta;

Responsabilidade civil nos termos gerais.

Tacitamente, o trabalhador poderá denunciar o contrato de trabalho através do designado abandono do trabalho, regulado no art. 450º.

Por abandono do trabalho (art. 450º, 1) entende-se a ausência do trabalhador ao serviço acompanhada de factos que, com toda a probabilidade, revelem a intenção de o não retomar.

Assim, são pressupostos do abandono do trabalho, a ausência do trabalhador e eventuais factos reveladores da intenção de não regresso.

A lei prevê uma presunção legal de abandono. Esta presunção acontece quando o trabalhador se ausente sem notícias durante o período de 10 dias úteis, sendo que tal presunção é susceptível de prova em contrário (presunção iuris tantum).

Para poder invocar o abandono do trabalho, o empregador deverá enviar uma carta registada com aviso de recepção ao trabalhador. Caso o empregador não envie a dita carta, não poderá invocar o abandono.

As consequências para o abandono do trabalho são iguais às que se verificam para a denúncia sem aviso prévio.

A resolução baseia-se numa justa causa, pelo que deverá ser devidamente fundamentada. Daí se afirmar que a resolução se trata de uma desvinculação motivada.

Anteriormente, a resolução designava-se rescisão com justa causa.Assim, a motivação que constitui fonte da cessação do contrato de

trabalho chama-se justa causa. O art. 441º enumera, exemplificativamente, situações que constituem justa causa de resolução do contrato de trabalho.

Desde logo, podemos distinguir a justa causa subjectiva (situações referidas no n.º 2 do art. 441º - a justa causa subjectiva baseia-se em comportamento culposo do empregador) e a justa causa objectiva (situações que são imputáveis ao empregador, ou que nem sequer dependem da vontade do empregador – art. 441º, 3).

A resolução com justa causa subjectiva confere ao trabalhador o direito a uma indemnização, conforme decorre do art. 443º (indemnização por antiguidade).

Note-se ainda que, para a apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes (art. 396º, 2 e art. 441º, 4).

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Verificada uma situação de justa causa, o trabalhador deverá desencadear o procedimento consagrado no art. 442º.

Inicialmente, terá de enviar ao empregador uma comunicação escrita e fundamentada. Esta comunicação está sujeita ao seguinte prazo de caducidade: 30 dias a contar do conhecimento do facto ou, logo que possível no caso de falta culposa do pagamento da retribuição.

Relativamente à impugnação da resolução (art. 444º), refira-se que a ilicitude da resolução do contrato pode ser declarada por tribunal judicial em acção intentada pelo empregador. Saliente-se ainda que, na acção em que for apreciada a ilicitude da resolução apenas são atendíveis para a justificar os factos constantes da comunicação referida no n.º 1 do art. 442º.

Por outro lado, a lei possibilita ao trabalhador a correcção de determinados vícios respeitantes à forma como a comunicação foi feita (vícios formais – art. 445º).

A resolução do contrato pelo trabalhador com invocação de justa causa, quando esta não tenha sido provada, confere ao empregador o direito a uma indemnização pelos prejuízos causados não inferior ao montante calculado, nos termos do art. 448º (art. 446º - responsabilidade do trabalhador em caso de resolução ilícita).

O art. 449º regula a revogação da declaração de denúncia ou resolução.Deste modo, o trabalhador poderá, dentro de determinado prazo,

comunicar à entidade empregadora que, afinal, não quer fazer cessar o vínculo contratual.

Tal comunicação deverá ser feita até ao sétimo dia seguinte à data da recepção pelo empregador. Além disso, tal decisão do trabalhador leva a que se deva proceder à devolução das compensações recebidas.

Caso a comunicação enviada ao empregador a declarar a denúncia ou resolução do contrato de trabalho tenha sido assinada com reconhecimento notarial presencial, o trabalhador não tem a possibilidade de revogar a dita declaração (1ª parte do n.º 1 do art. 449º).

3.2.) Cessação do contrato por iniciativa do empregador:O contrato de trabalho pode terminar por decisão unilateral do

empregador.A esta forma de cessação dá-se o nome de despedimento. O

despedimento pode subdividir-se em:a) Despedimento individual , que se subdivide em despedimento

individual por justa causa subjectiva (por causa imputável ao trabalhador ou despedimento disciplinar) e despedimento individual por justa causa objectiva (despedimento por extinção do posto de trabalho e despedimento por inadaptação);

b) Despedimento colectivo .Qualquer que seja a forma de despedimento, é necessário para que esse

despedimento seja lícito a verificação de dois requisitos:

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existência de justa causa (requisito material ou substancial); elaboração de processo de despedimento válido (requisito formal ou

processual).

Requisitos do despedimento:A justa causa

O conceito de justa causa resulta, por um lado, da CRP e, por outro lado, da lei laboral.

O art. 53º/CRP proíbe o despedimento sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos. São assim proibidos os despedimentos sem uma motivação, ou seja, os despedimentos ad nutum.

O conceito constitucional de justa causa distancia-se, de certa forma, da definição do Código do Trabalho, plasmada no art. 396º, 1: o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho constitui justa causa de despedimento.

Efectivamente, à luz do Código do Trabalho, a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho, constitui elemento comum no fundamento dos vários tipos de despedimentos individuais (art. 396º, 1; art. 403º, 1-b; art. 406º, 1).

Por sua vez, a orientação constitucional aponta a seguinte definição de justa causa: toda a situação de natureza subjectiva ou objectiva, capaz de, em concreto, suscitar a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho (nesta definição estão englobadas a justa causa objectiva e a justa causa subjectiva).

Desta forma, tal impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho não se trata de uma impossibilidade material, mas sim de uma inexigibilidade.

Justa causa disciplinar ou subjectiva:Para efeitos de despedimento disciplinar, o comportamento culposo do

trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho constitui justa causa de despedimento (art. 396º, 1).

Analisando esta disposição, verificamos um elemento fundamental justificativo da justa causa: o comportamento culposo do trabalhador. Este comportamento culposo deverá ser entendido como um acto ilícito e censurável do trabalhador, resultante da violação de deveres contratuais.

No n.º 3 do art. 396º, são, exemplificativamente, elencados os comportamentos do trabalhador que constituem justa causa de despedimento. Esta norma encontra a sua justificação no art. 366º, no qual se consagra a possibilidade de despedimento como sanção disciplinar.

O comportamento, além de culposo, deverá ser grave e com consequências danosas no âmbito da empresa. Neste caso, deve atender-se ao critério disciplinar objectivado na prática da empresa, pois o empregador deverá

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pautar-se pela igualdade de comportamento, ou seja, para comportamentos iguais, sanções iguais.

Por último, tem de haver um nexo de causalidade entre o comportamento do trabalhador e a impossibilidade de subsistência da relação de trabalho. À luz do art. 396º, 2 (relativo à determinação em concreto da inviabilidade do vínculo), para apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes. Justa causa objectiva:

A justa causa objectiva funda-se na extinção do posto de trabalho, sendo que os motivos justificativos se encontram consagrados nos arts. 402º e 397º, 2.

Desde logo, estes motivos só provocam o despedimento do trabalhador quando for praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho conforme, aliás, decorre do n.º 1 do art. 403º.

A subsistência da relação de trabalho torna-se praticamente impossível desde que, extinto o posto de trabalho, o empregador não disponha de outro que seja compatível com a categoria do trabalhador (art. 403º, 3).

A justa causa objectiva pode ainda fundamentar-se na inadaptação superveniente ao posto de trabalho, provocando o despedimento por inadaptação (art. 405º).

A inadaptação terá de ser objectivada pelo modo de exercício das funções, conforme estipula o art. 406º.

A situação de inadaptação tem de tornar praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho para que motive o despedimento. No entanto, a impossibilidade prática será aferida perante o cumprimento de algumas diligências prévias do empregador – art. 407º, 1-b) c) d) e e).

Despedimento colectivo:À luz do art. 397º, 1, considera-se despedimento colectivo a cessação de

contratos de trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respectivamente, de microempresa e de pequena empresa, por um lado, ou de média e grande empresa, por outro, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução de pessoal determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos.

Neste caso, releva fundamentalmente a pluralidade de trabalhadores. Note-se ainda que o despedimento colectivo deverá fundamentar-se num motivo comum a todos os trabalhadores.

Procedimento de despedimento(Especial relevância do processo disciplinar)

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O despedimento está sujeito ao requisito da elaboração do procedimento de despedimento. Tal procedimento vem plasmado entre os arts. 411º a 428º.

O processo de despedimento deverá ser analisado de diferente forma, consoante se trate de cada um dos diferentes modos de despedimento.

Daremos, em sede desta matéria, especial relevância ao processo de despedimento por facto imputável ao trabalhador ou processo disciplinar, constante dos arts. 411º a 418º.

Assim, este processo deverá, em primeira linha ser reduzido à forma escrita.

Na sua forma comum, o processo inicia-se, à luz do art. 411º, 1, com uma declaração com nota de culpa enviada ao trabalhador, onde são descritos os factos de forma circunstancial. Na mesma data, é remetida à comissão de trabalhadores da empresa uma cópia daquela comunicação e da nota de culpa.

O art. 413º regula a defesa do trabalhador ou resposta à nota de culpa: o trabalhador dispõe de 10 dias úteis para consultar o processo e responder à nota de culpa, deduzindo por escrito os elementos que considere relevantes para o esclarecimento dos factos e da sua participação nos mesmos, podendo juntar documentos e solicitar as diligências probatórias que se mostrem pertinentes para o esclarecimento da verdade.

A esta fase segue-se a instrução (ou apuramento ou não da verdade dos factos imputados ao trabalhador) – art. 414º.

Note-se que, de acordo com o n.º 3 do art. 414º, concluídas as diligências probatórias, o processo é apresentado, por cópia integral, à comissão de trabalhadores e, no caso do n.º 3 do art. 411º, à associação sindical respectiva, que podem, no prazo de cinco dias úteis, fazer juntar ao processo o seu parecer fundamentado.

Finalmente, dar-se-á a fase da decisão (art. 415º). À luz do n.º 1, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção, o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão. A decisão deverá ser fundamentada e constar de documento escrito.

Por sua vez, na forma simplificada, aplicável ás microempresas (art. 418º), verificamos que há um conjunto de requisitos que fazem parte da forma comum, mas que aqui não se aplicam.

Desde logo, não são exigíveis as comunicações à comissão de trabalhadores. Em segundo lugar, conforme dispõe o art. 418º, 2, a defesa do trabalhador pode ser feita por depoimento verbal, ao contrário do que acontece na forma comum, em que é exigida uma comunicação escrita.

Saliente-se que, conforme consagra o art. 417º, 1, o empregador pode suspender preventivamente o trabalhador, sem perda da retribuição, sempre que a sua presença se mostrar inconveniente.

Note-se ainda que, poderá ser instaurado um processo prévio de inquérito: a instauração do procedimento prévio de inquérito interrompe os prazos a que

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se refere o n.º 4 do art. anterior, desde que, mostrando-se aquele procedimento necessário para fundamentar a nota de culpa, seja iniciado e conduzido de forma diligente, não mediando mais de 30 dias entre a suspeita de existência de comportamentos irregulares e o início do inquérito, nem entre a sua conclusão e a notificação da nota de culpa (art. 412º).

Ainda no que se refere ao processo disciplinar, analisaremos algumas especificidades:

a) representante de trabalhadores – quando um representante de trabalhadores for alvo de um processo disciplinar, no âmbito de uma microempresa, de acordo com o n.º 4 do art. 418º, o processo segue a forma comum.

Em qualquer dos casos, se se tratar de um representante sindical, deverá ser contactada a associação sindical;

b) trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes (art. 51º) – o despedimento de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante carece sempre de parecer prévio da entidade que tenha competência na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres (ou seja, a Comissão para a Igualdades no Trabalho e no Emprego).

Se, eventualmente, o parecer for desfavorável, terá de haver apreciação judicial prévia.

Outros processos de despedimento

Quanto ao despedimento colectivo, aplicam-se os arts. 419º a 422º.No que respeita ao despedimento por extinção do posto de trabalho,

aplicam-se os arts. 423º a 425º.Finalmente, para o despedimento por inadaptação, aplicam-se as

disposições constantes dos arts. 426º a 428º.

Para estes três processos, existe, em geral, inicialmente uma comunicação fundamentada ao trabalhador e às estruturas colectivas, na qual se inclui a intenção de despedir o trabalhador, bem como as razões que motivam tal posição da entidade patronal.

Seguir-se-á a fase da defesa, que será individual ou colectiva, conforme os casos.

Por fim, a empresa proferirá uma decisão devidamente fundamentada.

Direitos dos trabalhadores resultantes de despedimento por causas objectivas

Os trabalhadores que são objecto de despedimento, que não o despedimento disciplinar, estão abrangidos pelas disposições dos arts. 398º a 401º, disposições essas consagradoras de alguns direitos.

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De acordo com o art. 404º, ao despedimento por extinção do posto de trabalho, aplicam-se, por remissão, os arts. 398º a 401º. Ao despedimento por inadaptação, aplica-se o art. 405º e ss.

Direitos dos trabalhadores: aviso prévio de 60 dias – a inobservância do aviso prévio implica para o

empregador o pagamento da retribuição correspondente ao período de antecedência em falta (art. 398º);

crédito de horas – durante o prazo de aviso prévio o trabalhador tem dto a utilizar um crédito de horas correspondente a 2 dias de trabalho por semana, sem prejuízo da retribuição (art. 399º);

direito de denúncia – durante o prazo de aviso prévio, o trabalhador pode, mediante declaração com a antecedência mínima de 3 dias úteis, denunciar o contrato, sem prejuízo do direito à compensação (art. 400º);

direito a compensação – o trabalhador cujo contrato cesse em virtude de despedimento colectivo tem dto a uma compensação correspondente a 1 mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade (art. 401º). Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação – presunção iuris tantum.

Causas de ilicitude do despedimento

O despedimento só é considerado lícito se se verificarem cumulativamente dois requisitos: o requisito formal e o requisito substancial.

Desde logo, o despedimento é ilícito se não houver uma justa causa, se não houver um processo de despedimento ou esse processo de despedimento for declarado nulo. Por sua vez, o despedimento é também ilícito no caso de se fundar num motivo discriminatório, que se prenda com razões de cariz político, religioso, ideológico, etc..

Relativamente às várias formas de despedimento, valem especificadamente algumas disposições normativas do Código do Trabalho: despedimento disciplinar (art. 430º); despedimento colectivo (art. 431º); despedimento por extinção do posto de trabalho (art. 432º); despedimento por inadaptação (art. 433º).

Efeitos da ilicitude do despedimento

Os efeitos da ilicitude do despedimento vêm regulados nos arts. 436º a 439º.

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Em primeira linha, podemos afirmar que em caso de despedimento declarado ilícito a situação será reposta tal qual se encontrava antes do despedimento.

Haverá, assim, uma reposição do status quo ante, sendo que o trabalhador terá direito a uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Se o despedimento é declarado ilícito, o trabalhador terá o direito à reintegração no posto de trabalho, sem perda da antiguidade.

À luz do art. 438º, a entidade empregadora poderá fazer uso da denominada oposição à reintegração do trabalhador. De acordo com o n.º 2 do art. 438º, em caso de microempresa ou relativamente a trabalhador que ocupe cargo de administração ou de direcção, o empregador pode opor-se à reintegração se justificar que o regresso do trabalhador é gravemente prejudicial e perturbador para a prossecução da actividade empresarial.

Ainda relativamente à reintegração, o trabalhador pode, em vez desta, optar por uma indemnização (art. 439º - indemnização em substituição da reintegração). O montante da indemnização é fixado pelo tribunal de entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade.

Esta indemnização não poderá ser inferior a 3 meses de retribuição base e diuturnidades (art. art. 439º, 3).

Deve notar-se que na fixação do montante pelo tribunal, atender-se-á ao valor da retribuição, mas também ao grau de ilicitude decorrente do disposto no art. 429º, ou seja, deve atender-se ao fundamento e à culpa do empregador (art. 439º, 1).

Finalmente, conforme consagram os nºs 4 e 5 do art. 439º, se a oposição à reintegração for julgada procedente, a indemnização é calculada entre 30 e 60 dias de retribuição base e diuturnidades, não podendo ser inferior a 6 meses.

Um outro efeito da ilicitude do despedimento reside no pagamento das retribuições vincendas, consagrado no art. 437º.

Desta forma, o trabalhador tem dto a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal.

No entanto, a este montante deverão ser deduzidos: as importâncias que o trabalhador tenha comprovadamente obtido com a

cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento (alliunde perceptum);

o montante do subsídio de desemprego, devendo tal quantia ser entregue pelo empregador à Segurança Social;

o montante das retribuições respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da data da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento.

Ainda quanto aos efeitos da ilicitude, existe, de acordo com o n.º 2 do art. 436º, a possibilidade de sanação de vícios formais.

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Assim, conforme consta desta norma, no caso de ter sido impugnado o despedimento com base em invalidade do procedimento disciplinar, este pode ser reaberto até ao termo do prazo para contestar, iniciando-se o prazo interrompido nos termos do n.º 4 do artigo 411º, não se aplicando, no entanto, este regime mais do que uma vez.

Este artigo correspondia ao art. 13º, 1-b da Lei de Cessação do Contrato de Trabalho.

Meios de impugnação da declaração de despedimento

Conforme sabemos, para que se declare a ilicitude do despedimento o trabalhador terá de recorrer ao tribunal.

Entre os meios de defesa judiciais encontram-se a providência cautelar de suspensão judicial de impugnação (meio provisório) e a acção judicial de impugnação do despedimento (meio definitivo).

De acordo com o art. 434º, e relativamente à providência cautelar, o trabalhador pode, mediante providência cautelar regulada no Código de Processo do Trabalho, requerer a suspensão preventiva do despedimento no prazo de cinco dias úteis a contar da data da recepção da comunicação de despedimento.

O regime jurídico está previsto no Código de Processo do Trabalho: despedimento individual (art. 34º a 40º/CPT); despedimento colectivo (art. 41º a 43º/CPT).

O art. 435º regula a acção judicial de impugnação do despedimento.De acordo com o n.º 2 deste artigo, a acção de impugnação tem de ser

intentada no prazo de um ano a contar da data do despedimento, excepto no caso de despedimento colectivo em que a acção de impugnação tem de ser intentada no prazo de seis meses contados da data de cessação do contrato.

Na acção de impugnação do despedimento, o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador (art. 435º, 3).

PARTE III – AS RELAÇÕES COLCETIVAS DE TRABALHO

O DIREITO DE GREVE

O regime jurídico do direito de greve

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O art. 57º da Lei Fundamental consagra o direito à greve:1. É garantido o direito à greve;2. Compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender

através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito;3. A lei define as condições de prestação, durante a greve, de serviços

necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.

No Código do Trabalho, pese embora não se faça uma definição de greve, o art. 591º dispõe que a greve constitui, nos termos da Constituição, um direito dos trabalhadores. De acordo com este artigo, o direito à greve é irrenunciável, sendo que competirá aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve.

No entanto, podemos elaborar um conceito clássico de greve: abstenção colectiva e concertada da prestação de trabalho, através da qual um grupo de trabalhadores procura exercer pressão no sentido de obter a realização de certo interesse ou objectivo comum.

Deste conceito resulta que a greve se trata de uma abstenção colectiva da prestação de trabalho (carácter colectivo quanto ao comportamento e quanto ao fim). O direito de greve só existe para aqueles que têm a qualidade de trabalhadores subordinados. Além disso, o objectivo fundamental da greve será o da defesa de interesses colectivos (nomeadamente, interesses de natureza económica, política, social, etc.).

O exercício do direito de greve

A nossa lei contem um conjunto mais ou menos alargado de normas relativas ao exercício do direito de greve.

Conforme consta do art. 592º, 1 (competência para declarar a greve), o recurso à greve é decidido pelas associações sindicais. Porém, dispõe o n.º 2 que também as assembleias de trabalhadores podem declarar a greve, desde que a maioria dos trabalhadores da empresa não esteja representada por associações sindicais.

Quanto aos efeitos, a declaração de greve não vincula qualquer trabalhador a aderir à greve, pelo facto de o acto de adesão ser individual e posterior à declaração de greve.

O art. 593º consagra que os trabalhadores em greve são representados pela associação ou associações sindicais ou por uma comissão especialmente eleita para o efeito.

O art. 595º regulamenta o aviso de greve.Assim, dispõe o n.º 1 que as entidades com legitimidade para decidirem o

recurso à greve devem dirigir ao empregador ou à associação de empregadores, e ao Ministério responsável pela área laboral, por meios idóneos, nomeadamente por escrito ou através dos meios de comunicação social, um aviso prévio, com o prazo mínimo de 5 dias úteis.

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O pré-aviso ali disposto tem por função: minorar os prejuízos para a empresa e possibilitar uma eventual tomada de posição conciliadora por intermédio do Ministro do Trabalho.

Do aviso deverá constar a identificação do âmbito pessoal e geográfico da greve, a enunciação dos objectivos que se pretendem prosseguir com a greve, bem como a sua data de início.

A data de termo da greve pode não constar da declaração de greve; contudo, caso seja mencionada, tem efeitos de carácter vinculativo.

Finalmente, de acordo com o n.º 3 do art. 595º, deverá constar uma proposta de cumprimento das obrigações colectivas.

Piquetes de greve

No que concerne à admissibilidade dos denominados piquetes de greve, estipula o art. 594º que a associação sindical ou a comissão de greve pode organizar piquetes para desenvolver actividades tendentes a persuadir os trabalhadores a aderirem à greve, por meios pacíficos, sem prejuízo do reconhecimento da liberdade de trabalho dos não aderentes.

Deve notar-se, no entanto, que a actuação dos piquetes não poderá colocar em causa a liberdade de trabalho dos não aderentes.

A justificação para a existência de piquetes de greve é a seguinte: a actividade dos piquetes tem em vista compensar o condicionamento da vontade individual dos trabalhadores pela situação de subordinação.

Obrigações durante a greve (art. 598º)

Conforme consagra o n.º 1 do art. 598º, nas empresas ou estabelecimentos que se destinem à satisfação de necessidades sociais impreteríveis ficam as associações sindicais e os trabalhadores obrigados a assegurar, durante a greve, a prestação dos serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação daquelas necessidades.

Desta norma decorre a existência de duas formas de obrigações: A obrigação geral – assegurar os serviços necessários à segurança e

manutenção do equipamento e instalações; A obrigação sectorial – a obrigação sectorial abrange a prestação dos

serviços mínimos indispensáveis realizada por empresas e estabelecimentos que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, como p.e., correios e telecomunicações, bombeiros, abastecimento de águas, serviços médicos, etc..

Os serviços mínimos deverão ser definidos por meio de IRCT ou por acordo entre o empregador e os trabalhadores (art. 599º, 1).

Na ausência de previsão em instrumento de regulamentação colectiva e não havendo acordo anterior ao aviso prévio quanto à definição dos serviços

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mínimos, o Ministério do Trabalho convoca os representantes dos trabalhadores referidos no art. 593º e os representantes dos empregadores, tendo em vista a negociação de um acordo quanto aos serviços mínimos e quanto aos meios necessários para os assegurar (art. 599º, 2).

De acordo com o n.º 3, não havendo acordo, a definição dos serviços mínimos é feita por despacho conjunto do Ministro do Trabalho e do ministro da tutela.

A definição poderá ainda, em última instância, resultar de decisão de um colégio arbitral, no caso de empregador do sector público.

De acordo com o n.º 6 do art. 599º, a designação dos trabalhadores que ficam adstritos à prestação dos serviços mínimos é feita pelos representantes dos trabalhadores, até 48 horas antes do início da greve. Tal designação pode também ser feita pelo empregador.

Os trabalhadores afectos à prestação de serviços mínimos mantêm-se, na estrita medida necessária à prestação desses serviços, sob a autoridade e direcção do empregador, tendo direito, nomeadamente, à retribuição – art. 600º,1.

O art. 601º regula o incumprimento da obrigação de prestação de serviços mínimos.

Assim, desta forma, no caso de não cumprimento da obrigação de prestação de serviços mínimos, sem prejuízo dos efeitos gerais, o Governo pode determinar a requisição ou mobilização, nos termos previstos em legislação especial.

A requisição civil, decretada pelo Governo, está fixada no DL 637 / 74 de 20 de Novembro. Haverá, então, de acordo, com este decreto-lei, uma resolução do Conselho de Ministros e, posteriormente, uma portaria conjunta com eficácia imediata, antes da publicação.

Efeitos jurídicos da greve

Durante a greve, o contrato de trabalho suspende-se. Associada a este efeito principal, verifica-se a cessação do dever de prestação de trabalho e, consequentemente, a desvinculação, por parte da entidade empregadora, do dever de retribuição. Isto mesmo decorre do n.º 1 do art. 597º.

Em virtude da greve, cessarão também os deveres acessórios dependentes da efectiva prestação de trabalho. Por outro lado, os restantes deveres acessórios mantêm-se, bem como, a contagem da antiguidade.

Note-se ainda que, de acordo com o art. 603º (proibição de discriminações devidas à greve), é nulo e de nenhum efeito todo o acto que implique coacção, prejuízo ou discriminação sobre qualquer trabalhador por motivo de adesão ou não à greve.

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A este propósito vale ainda o art. 374º, 2, no qual se dispõe que se presume abusivo o despedimento pronunciado durante a greve ou até 6 meses depois.

Conforme consta do n.º 1 do art. 596º, o empregador não pode, durante a greve, substituir os grevistas por pessoas que à data do aviso prévio referido no número anterior não trabalhavam no respectivo estabelecimento ou serviço, nem pode, desde aquela data, admitir novos trabalhadores para aquele efeito.

Assim, o empregador não pode: admitir novos trabalhadores; proceder à movimentação interna; recorrer à contratação de outra empresa, salvo se houver incumprimento dos

serviços mínimos.Esta proibição legal tem como objectivo obviar ao esvaziamento do

direito de greve.

Nos casos em que ocorra a denominada greve irregular (isto é, aquela que não preencha os requisitos supracitados, como p.e., o pré-aviso), os trabalhadores grevistas incorrem no regime de faltas injustificadas. Poderá ainda haver lugar a responsabilidade civil, nos termos gerais (art. 604º).

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