Direito Internacional Público

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Direito Internacional Público Rezek

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Direito Internacional Publico - 001-024.inddDIREITOINT,,E,,,... RNACIONALPUBLICOC U R S OE L E M E N T A R13 ediorevista, aumentada e atualizada 2011 Rua Henrique Schaumann, 270, Cerqueira Csar So Paulo SP CEP 05413-909PABX: (11) 3613 3000SACJUR: 0800 055 7688De 2 a 6, das 8:30 s 19:30 [email protected] Acesse: www.saraivajur.com.br ISBN 978-85-02-12668-8Rezek, Jos FranciscoDireito internacional pblico : curso elementar / Francisco Rezek. 13. ed. rev., aumen. e atual. So Paulo : Saraiva, 2011.Bibliografia.1. Direito internacional pblico I. Ttulo.10-13895CDU-341Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)FiliaisAMAZONAS/RONDNIA/RORAIMA/ACRERua Costa Azevedo, 56 CentroFone: (92) 3633-4227 Fax: (92) 3633-4782 ManausBAHIA/SERGIPERua Agripino Drea, 23 BrotasFone: (71) 3381-5854 / 3381-5895Fax: (71) 3381-0959 SalvadorBAURU (SO PAULO)Rua Monsenhor Claro, 2-55/2-57 CentroFone: (14) 3234-5643 Fax: (14) 3234-7401 BauruCEAR/PIAU/MARANHOAv. Filomeno Gomes, 670 Jacarecanga Fone: (85) 3238-2323 / 3238-1384Fax: (85) 3238-1331 FortalezaDISTRITO FEDERALSIA/SUL Trecho 2 Lote 850 Setor de Indstria e Abastecimento Fone: (61) 3344-2920 / 3344-2951Fax: (61) 3344-1709 BrasliaGOIS/TOCANTINSAv. Independncia, 5330 Setor Aeroporto Fone: (62) 3225-2882 / 3212-2806Fax: (62) 3224-3016 GoiniaMATO GROSSO DO SUL/MATO GROSSORua 14 de Julho, 3148 CentroFone: (67) 3382-3682 Fax: (67) 3382-0112 Campo GrandeMINAS GERAISRua Alm Paraba, 449 LagoinhaFone: (31) 3429-8300 Fax: (31) 3429-8310 Belo HorizontePAR/AMAPTravessa Apinags, 186 Batista Campos Fone: (91) 3222-9034 / 3224-9038Fax: (91) 3241-0499 BelmPARAN/SANTA CATARINARua Conselheiro Laurindo, 2895 Prado Velho Fone/Fax: (41) 3332-4894 CuritibaPERNAMBUCO/PARABA/R. G. DO NORTE/ALAGOASRua Corredor do Bispo, 185 Boa VistaFone: (81) 3421-4246 Fax: (81) 3421-4510 RecifeRIBEIRO PRETO (SO PAULO)Av. Francisco Junqueira, 1255 CentroFone: (16) 3610-5843 Fax: (16) 3610-8284 Ribeiro PretoRIO DE JANEIRO/ESPRITO SANTORua Visconde de Santa Isabel, 113 a 119 Vila IsabelFone: (21) 2577-9494 Fax: (21) 2577-8867 / 2577-9565 Rio de JaneiroRIO GRANDE DO SULAv. A. J. Renner, 231 FarraposFone/Fax: (51) 3371-4001 / 3371-1467 / 3371-1567Porto AlegreSO PAULOAv. Antrtica, 92 Barra FundaFone: PABX (11) 3616-3666 So Paulo ndice para catlogo sistemtico:Direito internacional pblico341Diretor editorial Antonio Luiz de Toledo Pinto Diretor de produo editorial Luiz Roberto Curia Gerente de produo editorial Lgia Alves Editor Jnatas Junqueira de MelloAssistente editorial Sirlene Miranda de SalesAssistente de produo editorial Clarissa Boraschi MariaPreparao de originais Camilla Bazzoni de MedeirosRaquel Modolo de NardoArte e diagramao Cristina Aparecida Agudo de FreitasLdia Pereira de MoraisReviso de provas Rita de Cssia Queiroz GorgatiRita de Cassia S. PereiraServios editoriais Ana Paula MazzocoCarla Cristina MarquesCapa Orlando Facioli Design Produo grfica Marli Rampim ImpressoAcabamentoData de fechamento da edio: 27-12-2010Dvidas?Acesse www.saraivajur.com.brNenhuma parte desta publicao poder ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prvia autorizao da Editora Saraiva.A violao dos direitos autorais crime estabelecido na Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.102.469.013.001Parece que o rebaixamento dos padres estticos na guerra desempenha um papel dificilmente menor em nossa revolta do que sua crueldade. [...] Pode no ser utpico esperar que esses dois fatores, a atitude cultural e o justificado medo das consequncias de uma guerra futura, venham a resultar, dentro de um tempo previsvel, em que se ponha um trmino ameaa da guerra. Por que caminhos ou atalhos isto sedar, no podemos adivinhar. Mas uma coisa podemos dizer: tudo quanto estimula o crescimento da civilizao trabalhasimultaneamente contra a guerra.(Sigmund Freud, CARTA A ALBERT EINSTEIN, Viena, setembro de 1932) memria de Elias Rezek.2021NDICE GERALDo Prefcio de Jos Sette Camara 1 edio21Do Prefcio do autor 12 edio23INTRODUOOrdem jurdica numa sociedade internacional descentra- lizada 25Fundamento do direito internacional pblico27Direito internacional e direito interno: teorias em confronto.28 4. Roteiro do curso29Parte INORMAS INTERNACIONAISO rol das fontes no Estatuto da Corte da Haia33Captulo IO TRATADO INTERNACIONALPerspectiva histrica35Seo I ENTENDIMENTO DO FENMENO CONVENCIONALConceito38Terminologia38Formalidade40Atores42Efeitos jurdicos42Regncia do direito internacional46Base instrumental47Troca de notas: um meio de comunicao47Troca de notas: um mtodo negocial48Seo II CLASSIFICAO DOS TRATADOSProposio da matria49Nmero de partes49Procedimento49Natureza das normas52Execuo no tempo54Execuo no espao56Seo III PRODUO DO TEXTO CONVENCIONALCompetncia negocial57Chefes de Estado e de governo58Plenipotencirios59Delegaes nacionais61Negociao bilateral: roteiro e circunstncias62Negociao coletiva: roteiro e circunstncias65Estrutura do tratado68Seo IV EXPRESSO DO CONSENTIMENTOAssinatura70Intercmbio instrumental71Ratificao: entendimento72Ratificao: caractersticas74Competncia75Discricionariedade76Irretratabilidade77Ratificao: formas79Ratificao: o depositrio80Pressupostos constitucionais do consentimento: generali-dades 81Pressupostos constitucionais do consentimento: o sistema brasileiro83O problema dos acordos executivos84Acordos executivos possveis no Brasil86O acordo executivo como subproduto de tratado vigente...86O acordo executivo como expresso de diplomacia ordi-nria87Procedimento parlamentar88Reservas90Vcios do consentimento93Consentimento viciado pela desobedincia ao direito pblico interno93Erro, dolo, corrupo e coao sobre o negociador95Coao sobre o Estado95Seo V ENTRADA EM VIGORSistemas97Vigncia contempornea do consentimento97Vigncia diferida98Registro e publicidade98O sistema da Sociedade das Naes99O sistema das Naes Unidas100Registros regionais e especializados101Incorporao ao direito interno102Promulgao e publicao de tratados no Brasil102Seo VI O TRATADO EM VIGOR41.Efeitos sobre as partes .........................................................10342.Efeitos sobre terceiros .........................................................109a) Efeito difuso: as situaes jurdicas objetivas ................109b) Efeito aparente: a clusula de nao mais favorecida ....110c) Previso convencional de direitos para terceiros............111d) Previso convencional de obrigaes para terceiros. Osistema de garantia .........................................................11143.Durao................................................................................11244.Ingresso mediante adeso ....................................................11345.Emendas ..............................................................................11646.Violao ...............................................................................11747.Interpretao ........................................................................120a) Sistemas..........................................................................121b) Mtodos ..........................................................................12248.Conflito entre tratados .........................................................124a) Identidade da fonte de produo normativa ...................124b) Diversidade da fonte de produo normativa .................12549.Conflito entre tratado e norma de direito interno ................126a) Prevalncia dos tratados sobre o direito interno infra-constitucional..................................................................128b) Paridade entre o tratado e a lei nacional.........................128Situaes particulares em direito brasileiro atual130Domnio tributrio: o art. 98 do Cdigo Tributrio Na-cional130Direitos e garantias fundamentais: o art. 5, 2 e 3,da Constituio131Seo VII EXTINO DO TRATADOA vontade comum133Predeterminao ab-rogatria134Deciso ab-rogatria superveniente135A vontade unilateral137Denncia e direito interno140Mudanas circunstanciais144A execuo tornada impossvel144Rebus sic stantibus144Jus cogens146Captulo IIFORMAS EXTRACONVENCIONAIS DE EXPRESSO DO DIREITO INTERNACIONALProposio da matria148Seo I O COSTUME INTERNACIONALElementos do costume148O elemento material149Elemento subjetivo: a opinio juris150O problema da generalidade151Prova do costume: atos estatais152Prova do costume no plano internacional153Costume e tratado: a questo hierrquica154Costume e tratado: a evoluo histrica155Codificao do direito costumeiro156Fundamento de validade da norma costumeira159Fundamento do costume: a doutrina e a Corte160Seo II PRINCPIOS GERAIS DO DIREITOSignificado original162Entendimento extensivo163Fundamento de validade dos princpios gerais163Seo III ATOS UNILATERAISControvrsia165Ato e norma166Seo IV DECISES DAS ORGANIZAES INTERNACIONAIS 73. Ainda a controvrsia167Nomenclatura e eficcia168Natureza jurdica. Autonomia169Captulo III INSTRUMENTOS DE INTERPRETAOE DE COMPENSAOProposio da matria171Seo I JURISPRUDNCIA E DOUTRINAO juiz no legisla171Determinao do teor das normas no escritas172Que jurisprudncia?173Doutrina: a difcil sintonia174Seo II ANALOGIA E EQUIDADEMtodos de raciocnio jurdico175Entendimento da equidade176Parte II PERSONALIDADE INTERNACIONALEstados e organizaes internacionais181Indivduos e empresas182Rus em foro internacional184Litgios transnacionais entre o particular e o Estado190Proposio da matria192Captulo I O ESTADOTrs elementos193Seo I TERRITRIO DO ESTADOJurisdio ou competncia193Aquisio e perda de territrio194Delimitao territorial197Seo II IMUNIDADE JURISDIO ESTATALUm velho tema199Diplomacia propriamente dita e servio consular200Privilgios diplomticos201Privilgios consulares202Aspectos da imunidade penal204Renncia imunidade205Primado do direito local206Estado estrangeiro e jurisdio local207Imunidade do Estado: fatos novos e perspectivas209Seo III DIMENSO PESSOAL DO ESTADOPopulao e comunidade nacional212Conceito de nacionalidade212Subseo 1 A nacionalidade em direito internacionalPrincpios gerais e normas costumeiras213Tratados multilaterais215Subseo 2 A nacionalidade brasileiraMatria constitucional218Brasileiros natos219Brasileiros naturalizados222Perda da nacionalidade brasileira222Subseo 3 O estatuto de igualdadeGnese224Dois padres de igualdade224Extino do benefcio estatutrio225Seo IV CONDIO JURDICA DO ESTRANGEIROAdmisso discricionria226Subseo 1 Ttulos de ingresso e direitos do estrangeiroVariedade dos vistos226Diversidade dos direitos227Subseo 2 Excluso do estrangeiro por iniciativa localDeportao228Expulso229Subseo 3 A extradioConceito e fundamento jurdico230A extradio no Brasil: reciprocidade e poderes constitucio-nais do Congresso232Discrio governamental e obrigao convencional232Submisso ao exame judicirio233Controle jurisdicional234Legalidade da extradio235Efetivao da entrega do extraditando240Subseo 4 Variantes ilegais da extradioDilemas da Justia241Indiferena do direito internacional244Vocao protetiva do direito interno245O sistema protetivo no direito brasileiro246A doutrina do caso Biggs247Subseo 5 Asilo polticoConceito e espcies250Natureza do asilo diplomtico251Disciplina do asilo diplomtico252Seo V PROTEO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOSNormas substantivas253Declarao de 1948: direitos civis e polticos254Declarao de 1948: direitos econmicos, sociais e culturais255 135. Direitos humanos de terceira gerao255Tratados sobre os direitos humanos256Mecanismos de implementao257Seo VI SOBERANIANoo de soberania259Roteiro da matria262Subseo 1 Reconhecimento de Estado e de governoNatureza declaratria do reconhecimento de Estado263Formas do reconhecimento de Estado264Reconhecimento de governo: circunstncias265Doutrina Tobar: a expectativa da legitimidade267Doutrina Estrada: uma questo de forma268Harmonizao das doutrinas. Prtica contempornea269Subseo 2 Estados federados e territrios sob administraoO fenmeno federativo e a unidade da soberania270Atuao aparente de provncias federadas no plano inter- nacional272Territrios sob administrao: a ONU e o sistema de tutela274Subseo 3 Soberania e hipossuficinciaO problema dos microestados275Naes em luta pela soberania277A Santa S: um caso excepcional278Seo VII MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTOAtualidade das normas280Matrizes do direito ambiental282Captulo II ORGANIZAES INTERNACIONAISIntroduo284Seo I TEORIA GERALPersonalidade jurdica292rgos293Aspectos do processo decisrio294A organizao frente a Estados no membros298Sede da organizao299Representao, garantias, imunidade300Finanas da organizao303Admisso de novos membros304Sanes306Retirada de Estados-membros308Seo II ESPCIESAlcance e domnio temtico309Alcance universal, domnio poltico: a SDN e a ONU309Alcance universal, domnio especfico311Alcance regional, domnio poltico312Alcance regional, domnio especfico313Captulo III RESPONSABILIDADE INTERNACIONALConceito315Fundamento316Seo I ELEMENTOS ESSENCIAISO ato ilcito317A imputabilidade317O dano320Seo II PROTEO DIPLOMTICATeoria geral321O endosso322Primeira condio do endosso: a nacionalidade do parti-cular323Dupla nacionalidade324Nacionalidade contnua325Nacionalidade efetiva325Proteo funcional327Segunda condio do endosso: o esgotamento dos recursos internos328Efeito jurdico do endosso329Renncia prvia proteo diplomtica: a doutrina e a clu-sula Calvo330Seo III CONSEQUNCIAS DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONALA reparao devida332Formas e extenso da reparao devida332Captulo IVO FENMENO SUCESSRIOO princpio da continuidade do Estado335Seo I SUCESSO DE ESTADOS: MODALIDADESFuso ou agregao de Estados336Secesso ou desmembramento de Estados336Transferncia territorial337Seo II SUCESSO DE ESTADOS: EFEITO JURDICONormas aplicveis337Nacionalidade das pessoas338Bens pblicos338Tratados e dvida externa339Seo III SUCESSO DE ORGANIZAES INTERNACIONAISUm quadro recente341Dois exemplos341Parte IIIDOMNIO PBLICO INTERNACIONALProposio da matria345O polo norte345A Antrtica346Captulo I O MARCodificao do direito costumeiro349Navios: noo e espcies350Seo I GUAS INTERIORES, MAR TERRITORIAL E ZONA CONTGUAVariedade das guas interiores351Regime jurdico352Mar territorial: natureza e regime jurdico353Mar territorial: extenso354Mar territorial: delimitao355Zona contgua357Seo II ZONA ECONMICA EXCLUSIVAEntendimento357Direitos do Estado costeiro358Direitos da comunidade358Seo III PLATAFORMA CONTINENTAL E FUNDOS MARINHOSRegime jurdico da plataforma continental359Regime jurdico dos fundos marinhos360Seo IV ALTO MARPrincpio da liberdade361Restries liberdade361Disciplina da navegao362Seo V TRNSITO MARTIMO: ESTREITOS E CANAISEstreitos: algumas normas gerais363Canais: regimes singulares364Captulo IIRIOS INTERNACIONAISConceito368Seo I ALGUNS PRINCPIOSUm direito casustico368Seo II REGIMES FLUVIAIS SINGULARESRios da Amrica do Sul369Outros regimes370Captulo III O ESPAODistino preliminar372Seo I O ESPAO AREOPrincpios elementares372Normas convencionais373Nacionalidade das aeronaves374O sistema das cinco liberdades375Segurana do trfego areo376Seo II O ESPAO EXTRA-ATMOSFRICOGnese das normas377Cooperao e pacifismo relativo378Parte IV CONFLITOS INTERNACIONAISNoo de conflito internacional381Proposio da matria382Captulo I SOLUO PACFICAEvoluo dos meios385Seo I MEIOS DIPLOMTICOSO entendimento direto em sua forma simples386Bons ofcios386Sistema de consultas388Mediao388Conciliao390Inqurito: uma preliminar de instncia391Seo II MEIOS POLTICOSrgos polticos das Naes Unidas391Esquemas regionais e especializados394Seo III MEIOS JURISDICIONAISConceito395Subseo 1 A arbitragemJurisdio ad hoc395rbitros e tribunais arbitrais396A Corte Permanente de Arbitragem397Base jurdica da arbitragem397Natureza irrecorrvel da sentena arbitral399Obrigatoriedade da sentena arbitral400Carncia de executoriedade400Subseo 2 A soluo judiciriaUma opo soberana400Uma histria recente401A Corte da Haia: duas fases4021945: a ressurreio da Corte403Juzes da Corte da Haia403Competncia contenciosa404Clusula facultativa de jurisdio obrigatria406Linhas gerais do procedimento407Natureza do acrdo408Competncia consultiva412Cortes regionais e especializadas412Captulo IIA GUERRA FRENTE AO DIREITO INTERNACIONAL CONTEMPORNEOJus in bello415Seo I DIREITO ANTERIOR PROSCRIO DA GUERRAVelhas regras costumeiras416Codificao: primeiros passos417O direito da Haia: guerra e neutralidade418Seo II EVOLUO DA NORMA PROIBITIVA DA GUERRA (1919-1945)Pacto da SDN: o prazo moratrio420Pacto Briand-Kellog: a renncia420Carta das Naes Unidas: a proibio formal e extensiva420Seo III DIREITO SUPERVENIENTE PROSCRIO DA GUERRAO direito de Genebra: o imperativo humanitrio422Desarmamento e outros temas de trato recente424Guerra total: hoje um falso problema425Abreviaturas427Bibliografia431Obras gerais431Normas internacionais435Personalidade internacional440Domnio pblico internacional444Conflitos internacionais445Outras obras446ndice remissivo449DO PREFCIO DE JOS SETTE CAMARA 1 EDIOO direito internacional desenvolveu-se extraordinariamente depois da segunda guerra mundial.O convvio dos Estados em uma comunidade juridicamente organizada e a intensificao das relaes entre os povos produziram uma nova tessitura de normas em grande parte incorporadas em convenes, que deu vida internacional um ordenamento jurdico de que jamais disps no passado.Cada dia mais importante o conhecimento do direito internacional para o profissional das leis, de vez que a repercusso dos problemas internacionais na vida crescente de convenes vigentes, que, por fora da promulgao, passam a fazer parte da ordem jurdica interna dos Estados.A codificao e o desenvolvimento progressivo do direito internacional transformam o velho direito das gentes, outrora uma disciplina vaga, um amontoado frouxo de princpios consuetudinrios e prticas tradicionais, esparsamente incorporados em convenes, num dos mais vivos e florescentes ramos da cincia jurdica.Da a importncia de livros como este curso, que indicam o caminho da volta s nossas melhores tradies de respeito ao primado do direito nas relaes entre os Estados, de devoo da melhor doutrina e dos nossos maiores juristas ao estudo dos problemas do direito internacional.Rio de Janeiro, outubro de 1988. Jos Sette Camara (1920-2002) Embaixador do Brasil, Juiz (1979-1988)e Vice-Presidente (1982-1985) da Corte Internacional de Justia.3029DO PREFCIO DO AUTOR 12 EDIOO livro preserva ainda hoje o que foi seu propsito original: ensinar o direito internacional pblico a quem queira ter uma noo precisa do que este domnio da cincia jurdica, fazendo-o com absoluto rigor cientfico, mas poupando o leitor de tudo quanto seja, para aquele fim, suprfluo, redundante, declamatrio. Como nas edies anteriores, o livro pode ser inteiramente assimilado por quem tenha outra formao queno a jurdica, sob a s condio do bom senso pressupostoindescartvel do direito, se no de todo o conhecimento humano. Uma reviso integral do texto precedeu sua atualizao, com dados contemporneos da ida ao prelo, e houve certo nmero de acrscimos ao texto principal. Numa evocao da obra de Hlio Tornaghi, o grande mestre do processo penal na minha juventude, plantei no texto, de modo esparso e graficamente distinto, certas leituras. So quase sempre votos meus, no necessariamente vitoriosos, no Supremo Tribunal Federal e na Corte Internacional de Justia, que de algum modo favorecem o entendimento damatria ou revelam, aqui e ali, sua dimenso controvertida.No prefcio das edies anteriores mais recentes, lembrei que crescia na conscincia coletiva de nosso tempo um sentimento de saturao com a desordem e o arbtrio no cenrio internacional, um generalizado senso crtico ditado em parte pela tica, em parte pela razo pura; prenncio provvel de uma era onde mal conseguiramos acreditar que de fato aconteceu na virada do sculo, sob nossos olhos, aquela extrema banalizaodo sacrifcio da dignidade humana. Tenho agora a convico de que haver tempo, no espao de nossas vidas, para ver construda uma sociedade internacional em definitivo estado de direito. Compartilho, uma vez mais, essa esperana com o leitor deste livro.INTRODUOOrdem jurdica numa sociedade internacional descentra- lizada. Uma advertncia deve ser feita a todo aquele que se inicia no estudo do direito internacional pblico. A sociedade internacional, ao contrrio do que sucede com as comunidades nacionais organizadas sob a forma de Estados, ainda hoje descentralizada, e o ser provavelmente por muito tempo adian te de nossa poca. Da resulta que o estudo desta disciplina no oferea a comodidade prpria daquelas outras que compem o direito interno, onde se encontra lugar fcil para a objetividade e para os valores absolutos. No plano interno, a autoridade su perior e o brao forte do Estado garantem a vigncia da ordem jurdica, subordinando compulsoriamente as proposies mino ritrias vontade da maioria, e fazendo valer, para todos, tanto o acervo legislativo quanto as situaes e atos jurdicos que, mesmo no mbito privado, se produzem na sua conformidade. No plano internacional no existe autoridade superior nem mi lcia permanente. Os Estados se organizam horizontalmente, e dispemse a proceder de acordo com normas jurdicas na exa ta medida em que estas tenham constitudo objeto de seu con sentimento. A criao das normas , assim, obra direta de seus destinatrios. No h representao, como no caso dos parla mentos nacionais que se propem exprimir a voz dos povos, nem prevalece o princpio majoritrio. A vontade singular de um Estado soberano somente sucumbe para dar lugar ao primado de outras vontades reunidas quando aquele mesmo Estado tenha, antes, abonado a adoo de semelhante regra, qual sucede no quadro das organizaes internacionais, a propsito de questes de importncia secundria.Em direito interno as normas so hierarquizadas como se se inscrevessem, graficamente, numa pirmide encabeada pela lei fundamental. No h hierarquia entre as normas de direito internacional pblico, de sorte que s a anlise poltica de todo independente da lgica jurdica faz ver um princpio geral, qual o da no interveno nos assuntos domsticos de certo Estado, como merecedor de maior zelo que um mero dis positivo contbil inscrito em tratado bilateral de comrcio ou tarifas. As relaes entre o Estado e os indivduos ou empresas fazem com que toda ordem jurdica interna seja marcada pela ideia da subordinao. Esse quadro no encontra paralelo na ordem internacional, onde a coordenao o princpio que preside a convivncia organizada de tantas soberanias.Dentro da ordem jurdica estatal, somos todos jurisdicio nveis, dessa contingncia no escapando nem mesmo as pes soas jurdicas de direito pblico interno. Quando algum se dirige ao foro para demandar contra ns, em matria civil ou criminal, no se nos pergunta vestibularmente se aceitamos ou recusamos a jurisdio local: imperioso aceitla, e a opo pelo silncio s nos poder trazer maior transtorno. J o Estado, no plano internacional, no originalmente jurisdicionvel pe rante corte alguma. Sua aquiescncia, e s ela, convalida a au toridade de um foro judicirio ou arbitral, de modo que a sen tena resulte obrigatria e que seu eventual descumprimento configure um ato ilcito.Frente aos atos ilcitos em que o Estado acaso incorra, no exato supor que inexista no direito internacional um sistema de sanes, em razo da falta de autoridade central provida de fora fsica. Tudo quanto certo que, neste domnio, o siste ma de sanes ainda mais precrio e deficiente que no interior da maioria dos pases. A igualdade soberana entre todos os Estados um postulado jurdico que concorre, segundo notria reflexo de Paul Reuter, com sua desigualdade de fato: dificil mente se poderiam aplicar, hoje, sanes a qualquer daquelescinco Estados que detm o poder de veto no Conselho de Se gurana da ONU.Fundamento do direito internacional pblico. Sistema jurdico autnomo, onde se ordenam as relaes entre Estados soberanos, o direito internacional pblico ou direito das gentes, no sentido de direito das naes ou dos povos repou sa sobre o consentimento. As comunidades nacionais e, acaso, ao sabor da histria, conjuntos ou fraes de tais comunidades propendem, naturalmente, autodeterminao, regncia de seu prprio destino. Organizamse, to cedo quanto podem, sob a forma de Estados independentes, e ingressam numa comunida de internacional carente de estrutura centralizada. Tais as cir cunstncias, compreensvel que os Estados no se subordinem seno ao direito que livremente reconheceram ou construram. O consentimento, com efeito, no necessariamente criativo (como quando se trata de estabelecer uma norma sobre a exata extenso do mar territorial, ou de especificar o aspecto fiscal dos privilgios diplomticos). Ele pode ser apenas perceptivo, qual se d quando os Estados consentem em torno de normas que fluem inevitavelmente da pura razo humana, ou que se apoiam, em maior ou menor medida, num imperativo tico, parecendo imunes prerrogativa estatal de manipulao.Pacta sunt servanda o princpio segundo o qual o que foi pactuado deve ser cumprido um modelo de norma fundada no consentimento perceptivo. Regras resultantes do consentimento criativo so aquelas das quais a comunidade internacional poderia prescindir. So aquelas que evoluram em determinado sen tido, quando perfeitamente poderiam ter assumido sentido diverso, ou mesmo contrrio. E impossvel, em definitivo, conceber que a mais rudimentar das co munidades sobreviva sem que seus integrantes reconheam, quando menos, o dever de honrar as obrigaes livremente assumidas.Modelo de construo costumeira original e discricionria foi aquele pertinente ao objeto da extradio. Esta, com efeito, era compreendida, ao tempo das cidades soberanas da antiguidade grega, como o mecanismo prprio para a recuperao dodissidente poltico exilado, garantindose, desse modo, a tranquilidade do sono do prncipe. Com o tempo, o costume sofre modificao ampliativa: ao Estado se torna lcito querer, tambm, a rendio do criminoso comum refugiado no estrangeiro. Consumase, enfim, a total reviravolta em relao ao objeto primitivo: a extradio serve to s ao regresso forado, e submisso justia ordinria, dos autores de crimes de direito comum, excluda toda perspectiva de turbao do asilo poltico.Caso digno de destaque o de certas regras consolidadas com vigor no scu lo XX, tais a proscrio do uso da fora e os princpios da no interveno e da autodeterminao, ou ainda um pouco antes, qual a condenao da escravatura. Nenhuma dessas normas aparece vestida daquela imperatividade, congnita at mesmo nas sociedades primitivas, do pacta sunt servanda, e melhor prova disso no h que seu advento tardio consagrao geral. Porm, no mbito desses temas, a mobilidade do direito no sinuosa: tem ela um sentido to certo e irreversvel quanto o da evoluo da sociedade internacional. Assim, o trfico de escravos e a guerra de conquista, lcitos outrora, esto hoje condenados, sendo seguro que no voltaro, amanh, condio de licitude. Sem dvida nos encontramos, aqui, em presena de normas internacionais no gravadas, desde o princpio, na conscincia dos povos, mas tampouco mutveis de modo pendular como as que se referem imunidade jurisdicional do Estado estrangeiro ou extenso do mar territorial.Direito internacional e direito interno: teorias em confron- to. Para os autores dualistas dentre os quais se destacaram no sculo passado Carl Heinrich Triepel, na Alemanha, e Dio nisio Anzilotti, na Itlia , o direito internacional e o direito interno de cada Estado so sistemas rigorosamente independen tes e distintos, de tal modo que a validade jurdica de uma norma interna no se condiciona sua sintonia com a ordem inter nacional. Os autores monistas dividiramse em duas correntes. Uma sustenta a unicidade da ordem jurdica sob o primado do direito internacional, a que se ajustariam todas as ordens internas. Outra apregoa o primado do direito nacional de cada Estado soberano, sob cuja tica a adoo dos preceitos do direito inter nacional aparece como uma faculdade discricionria. O monis mo internacionalista teve em Hans Kelsen seu expoente maior, enquanto a vertente nacionalista encontrou adeptos avulsos na Frana e na Alemanha, alm de haver transparecido com bas tante nitidez, entre os anos vinte e os anos oitenta, na obra dos autores soviticos.Nenhuma dessas trs linhas de pensamento invulnervel crtica, e muito j escreveram os partidrios de cada uma delas no sentido de desautorizar as demais. Perceberamos, contudo, que cada uma das trs proposies pode ser valorizada em seu mrito, se admitssemos que procuram descrever o mesmo fe nmeno visto de diferentes ngulos. Os dualistas, com efeito, enfatizam a diversidade das fontes de produo das normas ju rdicas, lembrando sempre os limites de validade de todo direi to nacional, e observando que a norma do direito das gentes no opera no interior de qualquer Estado seno quando este, por tla aceito, promove sua introduo no plano domstico. Os mo nistas kelsenianos voltamse para a perspectiva ideal de que se instaure um dia a ordem nica, e denunciam, desde logo, luz da realidade, o erro da ideia de que o Estado tenha podido ou trora, ou possa hoje, sobreviver numa situao de hostilidade ou indiferena frente ao conjunto de princpios e normas que com pem a generalidade do direito das gentes. Os monistas da linha nacionalista do relevo especial soberania de cada Estado e descentralizao da sociedade internacional. Propendem, desse modo, ao culto da constituio, afirmando que no seu texto, ao qual nenhum outro pode sobreporse na hora presente, h de encontrarse notcia do exato grau de prestgio a ser atribudo s normas internacionais escritas e costumeiras. Se certo que pouqussimos autores, fora do contexto sovitico, compromete ramse doutrinariamente com o monismo nacionalista, no menos certo que essa ideia norteia as convices judicirias em inmeros pases do ocidente includos o Brasil e os Es tados Unidos da Amrica , quando os tribunais enfrentam o problema do conflito entre normas de direito internacional e de direito interno.Roteiro do curso. Em quatro partes distintas este curso pro pe o estudo das normas que regem a sociedade internacional, da personalidade dos Estados e outros componentes desse quadro de atores, dos espaos que integram o domnio pblico internacional, e finalmente dos conflitos internacionais e de seus meios alternativos de soluo.Parte INORMAS INTERNACIONAIS33O rol das fontes no Estatuto da Corte da Haia. Redigiase em 1920 o estatuto do primeiro tribunal vocacionado para resol ver litgios entre Estados sem qualquer limitao de ordem ge ogrfica ou temtica. A certa altura do texto surgia a necessida de de que se dissesse qual o direito aplicvel no mbito da ju risdio nascente, tanto significando a necessidade de fazer um rol das formas de expresso do direito internacional pblico, um roteiro das fontes onde se poderiam buscar, idoneamente, normas internacionais. O estatuto relacionou ento os tratados, os cos tumes e os princpios gerais do direito. Fez referncia juris prudncia e doutrina como meios auxiliares na determinao das regras jurdicas, e facultou, sob certas condies, o emprego da equidade.A primeira parte deste curso versa as fontes e meios auxilia res referidos no art. 38 do Estatuto da Corte da Haia, cuidando tambm de duas outras categorias que, por razes diversas, ali no mereceram referncia: os atos unilaterais e as decises to madas no mbito das organizaes internacionais.5051Captulo IO TRATADO INTERNACIONALPerspectiva histrica. Parte fundamental do direito das gen tes, o direito dos tratados apresentava at o romper do sculo XX uma consistncia costumeira, assentada, entretanto, sobre certos princpios gerais, notadamente o pacta sunt servanda e o da boaf. Como negociam as partes, e atravs de que rgos; que gnero de texto produzem, e como o asseguram autntico; como manifestam, desde logo ou mais tarde, seu consentimento definitivo, e pem o compromisso em vigor; que efeitos produz, ento, o tratado, sobre as partes pactuantes, e acaso sobre ter ceiros; que formas, enfim, de alterao, desgaste ou extino, se podem abater sobre o vnculo convencional: isso tudo constitui, em linhas muito rudes e incompletas, o direito dos tratados, cuja construo consuetudinria teve incio nalgum ponto extrema mente remoto da histria das civilizaes.O primeiro registro seguro da celebrao de um tratado, naturalmente bilate ral, o que se refere paz entre Hatusil III, rei dos hititas, e Ramss II, fara egpcio da XIX dinastia. Esse tratado, pondo fim guerra nas terras srias, num momento situado entre 1280 e 1272 a.C., disps sobre paz perptua entre os dois reinos, aliana contra inimigos comuns, comrcio, migraes e extradio. Releva observar o bom augrio que esse antiqussimo pacto devera, quem sabe, ter proje tado sobre a trilha do direito internacional convencional: as disposies do tratado egiptohitita parecem haverse cumprido risca, marcando seguidas dcadas de paz e efetiva cooperao entre os dois povos; e assinalandose, na histria do Egito, a partir desse ponto da XIX dinastia, certo refinamento de costumes, com projeo no prprio uso do idioma, conta da influncia hitita. As duas grandes civilizaes entrariam, mais tarde, em processo de decadncia, sem que haja notcia de uma quebra perceptvel do compromisso.O que sucede ao cabo de trs milnios de prtica conven cional, no sculo XIX, no uma alterao na contextura do direito dos tratados sempre costumeira , mas uma sensvel ampliao no seu acervo normativo, por fora de quanto o tra tado multilateral desafiava desde a conferncia preparatria at o mecanismo de extino aquelas regras concebidas para reger acordos meramente bilaterais. Outro fato digno de nota, na mesma poca, foi a eroso do protagonismo concentrado na pessoa do chefe de Estado. A multiplicao dos regimes repu blicanos, a progressiva constitucionalizao das monarquias trouxeram ao direito dos tratados esse novo fator de complexi dade: o envolvimento, no processo, de rgos estatais de repre sentao popular, sem comunicao direta com o exterior. Re sultou induvidoso que essa fase interna, a da consulta ao parla mento como preliminar de ratificao, imps ao direito das gentes uma importante remisso ao direito domstico dos Esta dos. As comunidades jurdicas nacionais deramse conta da distino entre esses dois objetos de anlise, nenhum deles ex guo: o direito dos tratados no quadro do direito internacional pblico, e o s vezes mais controvertido direito dos trata dos no contexto do direito constitucional.O sculo XX abriria espao a dois fatos novos: a entrada em cena das organizaes internacionais, no primeiro apsguerra fazendo com que o rol das pessoas jurdicas de direi to das gentes, habilitadas a pactuar no plano exterior, j no se exaurisse nos Estados soberanos; e a codificao do direito dos tratados, tanto significando a transformao de suas regras cos tumeiras em regras convencionais, escritas, expressas, elas mesmas, no texto de tratados.Na Havana, em 1928, celebrouse entre outros compromissos uma Conveno sobre tratados, at hoje vigente entre oito pases1, embora superada, em sua notoCol. MRE, n. 21, II. So partes o Brasil, o Equador, o Haiti, Honduras, a Nicargua, o Panam, o Peru e a Repblica Dominicana.riedade, pelo curso dos acontecimentos. Cuidase de um texto sumrio, objetivo, um tanto menos austero e idealista que o projeto de Epitcio Pessoa que lhe serviu de inspirao. A partir de 1949, no mbito das Naes Unidas, a Comisso do Direito Internacional trabalhou sobre o tema2, at que se reunisse em Viena, nos anos de 1968 e 1969, a conferncia diplomtica programada para negociar uma conveno de alcance universal sobre o direito dos tratados.A Conveno de Viena sobre o direito dos tratados teve seu texto ultimado em 23 de maio de 1969. Sua negociao envol vera cento e dez Estados, dos quais apenas trinta e dois firmaram, naquela data, o documento. Mais de dez anos se passaram at que a Conveno de Viena, o grande tratado que se preparou com pacincia, trabalho tenaz e conjugao de talentos incomuns para reger o destino de todos os demais tratados, entrasse em vigor, para Estados em nmero equivalente, de incio, quarta parte da comunidade internacional3.A Comisso do Direito Internacional, entidade doutrinria e de apoio legislativo no quadro das Naes Unidas, fez figurar o direito dos tratados no seu plano de progressiva codificao da matria, por temas avulsos, traado na etapa inicial de seus trabalhos, em 1949. James Leslie Brierly, jurista britnico, integrante da Comisso, foi por ela designado relator especial para o tema, funo em que lhe sucederam, com o passar do tempo, trs compatriotas: Hersch Lauterpacht em 1952, Gerald Gray Fitzmaurice em 1954, e Humphrey Waldock em 1961. No era despropositado desejar que, dentro da Comisso, o projeto em preparo para a conferncia de Viena tivesse contrabalanadas, de certo modo, as consequncias naturais da formao anglosaxnia dos relatores. Nessa tarefa, propcia maior aceitabili dade do projeto, destacouse o internacionalista italiano Roberto Ago, afinal eleito para presidir a conferncia instalada em Viena, nas sesses de 1968 e 1969.A Conveno de Viena sobre o direito dos tratados somente entrou em vigor em 27 de janeiro de 1980, quando, nos termos de seu art. 84, chegouse ao quorum mnimo de trinta e cinco Estadospartes. No meado de 2010 eram partes na Conveno, por haveremna ratificado ou a ela aderido, ou ainda por sucesso, cento e onze pases no includos, entre outros, os Estados Unidos da Amrica e a Frana. O Brasil ratificou a Conveno em 25 de outubro de 2009, mais de quarenta anos depois de havla assinado. Durante esse tempo nenhum preceito da Conveno deixou de ser aplicado no Brasil sob o pretexto de no sermos ainda comprometidos, visto que tanto no terreno da administrao quanto no da Justia havia perfeita conscincia do preexistente carter costumeiro dessas normas.Na ltima assertiva do prembulo, a Conveno de Viena declara, implicita mente, sua insuficincia para a cobertura de todos os aspectos do direito dos trata dos, ao lembrar que o direito internacional costumeiro prosseguir regendo as questes no versadas no texto. A Conveno de 1969 diz respeito apenas ao vn culo convencional entre Estados. Outra Conveno de igual substncia celebrouse, tambm em Viena, em 1986, sobre tratados entre Estados e organizaes interna cionais, ou somente entre estas ltimas. No incio de 2010 essa conveno, ratifi cada por menos que trinta pases, ainda no havia entrado em vigor.Seo I ENTENDIMENTO DO FENMENO CONVENCIONALConceito. Tratado todo acordo formal concludo entre pes soas jurdicas de direito internacional pblico, e destinado a pro duzir efeitos jurdicos. Na afirmao clssica de Georges Scelle, o tratado internacional em si mesmo um simples instrumento; identificamolo por seu processo de produo e pela forma final, no pelo contedo. Este como o da lei ordinria numa ordem jurdica interna varivel ao extremo. Pelo efeito compromis sivo e cogente que visa a produzir, o tratado d cobertura legal sua prpria substncia. Mas essa substncia tanto pode dizer res peito cincia jurdica quanto produo de cereais ou pesqui sa mineral. Desse modo, a matria versada num tratado pode ela prpria interessar de modo mais ou menos extenso ao direito das gentes: em razo da matria, pontificam em importncia os trata dos constitutivos de organizaes internacionais, os que dispem sobre o servio diplomtico, sobre o mar, sobre a soluo pacfi ca de litgios entre Estados. certo, contudo, que todos os tratados mesmo quando disponham sobre um tema prosaico como a classificao de marcas de origem de vinhos ou queijos inte ressam igualmente, em razo da forma, a esta parte do direito das gentes que ora nos ocupa, o direito dos tratados.Terminologia. O uso constante a que se entregou o legislador brasileiro a comear pelo constituinte da frmula tratadose convenes, induz o leitor ideia de que os dois termos se prestem a designar coisas diversas. Muitas so as dvidas que surgem, a todo momento, na trilha da pesquisa terminolgica. H razo cientfica por que o tratado constitutivo da OIT se chame constituio, enquanto fundao de tantas outras or ganizaes internacionais se deu preferncia ao vocbulo carta? Termos como acordo, ajuste ou convnio designam sempre um tratado de importncia medocre? O protocolo necessariamen te um tratado acessrio? A realidade do direito convencional contemporneo rende algum tributo s velhas tentativas doutrinrias de vincular, a cada termo variante de tratado, cer ta modalidade bem caracterizada de compromisso internacional? A esta ltima questo a resposta firmemente negativa. O que a realidade mostra o uso livre, indiscriminado, e muitas vezes ilgico, dos termos variantes daquele que a comunidade uni versitria, em toda parte no houvesse boas razes histricas para isso , vem utilizando como termopadro. Quantos so esses nomes alternativos? H referncia, na Frana, a contagens que tero detectado nada menos que trinta e oito... Em lngua portuguesa, chegamos seguramente a duas dezenas. Essa esti mativa no inclui os nomes compostos, seja porque, admitida a composio, alargase demais o limite do quadro terminol gico, seja porque a adjetivao serve justamente para especifi car a natureza do texto convencional, quebrando a neutralidade do substantivobase. Assim, as expresses acordo e compro misso so alternativas ou juridicamente sinnimas da expresso tratado, e se prestam, como esta ltima, livre de signao de qualquer avena formal, concluda entre persona lidades de direito das gentes e destinada a produzir efeitos ju rdicos. Se nos referimos, porm, a um acordo de sede4 ou a um4. Isolado, o termo acordo quase nada informa. J a expresso acordo de sede, nas condies presentes, e sem qualquer outro dado, permite saber: (a) que se cuida de um tratado bilateral; (b) que uma das partes uma organizao internacional, e a outra um Estado, provavelmente mas no seguramente membro da primeira; e (c) que o temacompromisso arbitral5, o nome composto estar carregando consigo informaes ainda maiores que aquelas implcitas em tratado de comrcio e navegao, ou em tratado de paz.A anlise da experincia convencional brasileira ilustra, quase que exausto, as variantes terminolgicas de tratado concebveis em portugus: acordo, ajuste, arranjo, ata, ato, carta, cdigo, compromisso, constituio, contrato, conveno, convnio, declarao, estatuto, memorando, pacto, protocolo e regulamento. Esses termos so de uso livre e aleatrio, no obs tante certas preferncias denunciadas pela anlise estatstica: as mais das vezes, por exemplo, carta e constituio vm a ser os nomes preferidos para tratados constitutivos de organizaes internacionais, enquanto ajuste, arranjo e memorando tm largo trnsito na denominao de tratados bilaterais de importncia reduzida. Apenas o termo concordata possui, em direito das gentes, significao singular: esse nome estritamente reserva do ao tratado bilateral em que uma das partes a Santa S, e que tem por objeto a organizao do culto, a disciplina eclesistica, misses apostlicas, relaes entre a Igreja catlica local e o Estado copactuante.Formalidade. O tratado um acordo formal: ele se exprime, com preciso, em determinado momento histrico, e seu teor tem contornos bem definidos. A repousa, por certo, o principalprecpuo desse tratado o regime jurdico da instalao fsica da organizao no territrio do Estado.Compromisso arbitral o tratado pelo qual dois Estados submetem arbitragem certo litgio que os antagoniza. Esse nome indistintamente usado quando, diante da pree xistncia de um tratado geral de arbitragem entre as partes, ou de uma clusula arbitral em tratado sobre tema vrio, o compromisso cuida de pouco mais que a designao do rbitro; e quando, nada preexistindo, o compromisso externa desde a opo das partes pela via ar bitral at os derradeiros detalhes pertinentes tarefa confiada ao rbitro. Em qualquer dessas hipteses, o compromisso arbitral costuma ser bilateral. Uma exceo foi aquela relativa ao caso do Canal de Beagle, firmado no s pelas partes litigantes Argentina e Chile mas tambm pelo rbitro, no caso, o governo do Reino Unido, e datado de 22 de julho de 1971.elemento distintivo entre o tratado e o costume, este ltimo tambm resultante do acordo entre pessoas de direito das gentes, e no menos propenso a produzir efeitos jurdicos, porm for jado por meios bem diversos daqueles que caracterizam a cele brao convencional. Essa formalidade implica, por outro lado, a escritura. O tratado internacional no prescinde da forma es crita, do feitio documental. A oralidade no apenas destoante do modelo fixado em 1928 pela Conveno da Havana, e reto mado em 1969 pela de Viena6; ou desajustada ao sistema de registro e publicidade inaugurado pela Sociedade das Naes, herdado pelas Naes Unidas, e assimilado, ainda, por organi zaes regionais7. A oralidade briga com a prpria noo hist rica de tratado, isso no importando, em absoluto, a negao de sua serventia para exprimir outros atos jurdicos, porventura tambm capazes de criar obrigaes.O conceito proposto se refere a um acordo concludo. Este ltimo termo, quando empregado na definio do tratado inter nacional, tem muito mais do seu significado comum o de coisa efetivamente acabada que daquele sentido tcnico, preservado por alguns internacionalistas, luz do qual a conclu so consiste no trmino das negociaes, ou em algo mais que isso, no compreendendo, porm, a confirmao do compromis so e sua entrada em vigor. A verdade que, antes deste ltimo evento, no existe um tratado internacional, seno um projeto concludo, e sujeito a uma variedade de incidentes que o podero lanar, dentro do arquivo histrico das relaes internacionais, na vasta galeria dos projetos que no vingaram.Conveno da Havana sobre tratados, art. 2: condio essencial nos tratados a forma escrita. A confirmao, prorrogao, renovao ou reconduo sero igualmente feitas por escrito, salvo estipulao em contrrio. Conveno de Viena sobre o direito dos tratados, art. 2, I, a: tratado significa um acordo internacional celebrado por escrito... etc.Pacto da Sociedade das Naes, art. 18; Carta das Naes Unidas, art. 102; Pacto da Liga dos Estados rabes, art. 17.Atores. As partes, em todo tratado, so necessariamente pessoas jurdicas de direito internacional pblico: tanto signifi ca dizer os Estados soberanos aos quais se equipara, como ser visto mais tarde, a Santa S e as organizaes interna cionais. No tm personalidade jurdica de direito das gentes, e carecem, assim, por inteiro, de capacidade para celebrar tratados, as empresas privadas, pouco importando sua dimenso econ mica e sua eventual multinacionalidade.Efeitos jurdicos. Reconhecendo que o acordo, luz do lxico, pode significar mera sintonia entre pontos de vista, per ceberemos que acordos existem, e se renovam, e se perfazem s centenas, a cada dia, entre os membros da comunidade interna cional. No convm negligenciar a possibilidade de se exprimi rem formalmente acordos dessa natureza. A no haveria tratados, em razo da falta do animus contrahendi, ou seja, da vontade de criar autnticos vnculos obrigacionais entre as partes concor dantes. A produo de efeitos de direito essencial ao tratado, que no pode ser visto seno na sua dupla qualidade de ato ju rdico e de norma. O acordo formal entre Estados o ato jur dico que produz a norma, e que, justamente por produzila, desencadeia efeitos de direito, gera obrigaes e prerrogativas, caracteriza enfim, na plenitude de seus dois elementos, o tratado internacional. conhecida em direito das gentes a figura do gentlemens agreement, que a doutrina uniformemente distingue do tratado, sob o argumento de no haver ali um compromisso entre Estados, base do direito, mas um pacto pessoal entre estadistas, funda do sobre a honra, e condicionado, no tempo, permanncia de seus atores no poder.O exemplo mais vulgarizado tem sido a Carta do Atlntico, declarao fir mada pelo presidente americano Franklin Roosevelt e pelo primeiroministro britnico Winston Churchill, a bordo do navio Augusta, em 14 de agosto de 1941. Mencionamse tambm com frequncia dois compromissos do incio do sculo XX, ambos referentes imigrao japonesa nos Estados Unidos: o acordo RootTakahira de 1907 e o acordo LansingIshii de 1917. O clebre acordo de Yalta, de fevereiro de 1945, e a proclamao de Potsdam, de agosto do mesmo ano, peas integrantes do contexto poltico do desfecho da segunda grande guerra, tm sua qualidade de gentlemens agreements assentada em documentos oficiais. OConnell lembra uma nota do Departamento de Estado americano ao governo japons, de 7 de setembro de 1956, em que se aponta ... o chamado acordo de Yalta como uma simples declarao de propsitos comuns por parte dos governantes das potncias envolvidas, sem qualquer efeito legal a respeito de transferncia de territrios8.A distino entre tratado internacional e gentlemens agre ement sugerida pelo prprio nome deste ltimo tem sido feita considerao inicial no do teor do compromisso, mas da qualidade dos atores. Quase tudo quanto se tem escrito a respei to induz ao abandono da pesquisa dos efeitos jurdicos, em favor da apurao, pretensamente mais simples, de quais sejam as partes pactuantes. Assim, afirmase que o gentlemens agreement no um tratado pela razo elementar de que os contratantes no so pessoas jurdicas de direito internacional. No so Es tados. So pessoas humanas, investidas em cargos de mando, e hbeis para assumir externamente sobretudo em matria poltica prospectiva compromissos de pura ndole moral, cuja vitalidade no ultrapassar aquele momento em que uma dessas pessoas deixe a funo governativa. As bases dessa tradicional anlise so inconsistentes. No se conhece um nico exemplo de gentlemens agreement em cujo cabealho os cavalheiros pactuantes tenham declarado agir a ttulo pessoal. E como pre sumilo? Cuidase de chefes de Estado, de chefes de governo, de ministros de relaes exteriores, de estadistas, enfim, plena mente capazes, segundo o direito internacional, para falar pelos respectivos Estados. A realidade que nenhum analista pdeOConnell, p. 200. V. tambm McNair, p. 6.jamais classificar certo acordo como um gentlemens agreement seno depois de haver examinado o teor do compromisso, para, ali, detectar a falta de uma tendncia produo de efeitos jur dicos. E para, consequentemente, evocando a noo do compro metimento honorfico, concluir que no os Estados e sim as pessoas haviam chegado quele acordo.Bem o ilustra a Carta do Atlntico. As palavras iniciais so as de um tratado internacional tpico, na descrio das partes:O Presidente dos Estados Unidos e o PrimeiroMinistro Sr. Churchill, repre sentando o Governo de Sua Majestade do Reino Unido, havendose reunido, no mar, ....De modo que a qualificao da carta como um gentlemens agreement, e, pois, como um no tratado, s possvel depois da leitura integral do texto, ante a per cepo de que aquele acordo formal, lavrado por pessoas indiscutivelmente repre sentativas de duas personalidades de direito internacional pblico, no se destinou a produzir efeitos jurdicos, a estabelecer normas concretas e cogentes para as partes, mas apenas a ... dar a conhecer alguns dos princpios comuns s polticas nacionais de seus pases, nos quais baseiam as suas esperanas de um futuro melhor para o mundo9.Tornouse usual, quase que inevitvel em nosso tempo, a expedio de declaraes ou comunicados comuns sempre que se encontram, ao ensejo de visita oficial ou de outro evento, dois ou mais chefes de Estado ou de governo. Papis dessa natureza vm a pblico, s vezes, por ocasio de um simples encontro de trabalho entre ministros de relaes exteriores. A estamos em presena de uma variante do gentlemens agreement. Frequen temente, contudo, as declaraes ou comunicados comuns no mais contm que um arranjo tedioso de frases feitas, onde a ausncia do que dizer de consistente mal se v compensada porV. a ntegra da Carta do Atlntico em Textos de direito internacional e de histria diplomtica, de Rubens F. de Mello (Rio de Janeiro, A. Coelho Branco Filho Editor, 1950, p. 592593).algum esforo diplomtico de imaginao. Est claro, porm, que nem sempre esse produto documental do encontro entre estadistas carece de substncia. Se o comunicado comum expri me uma opo poltica, uma forma de alinhamento, uma exata postura diante de certa questo tpica, h que ver nele a boa essncia do gentlemens agreement: nenhum vnculo jurdico para os Estados em causa, mas um bem definido compromisso moral, a operar enquanto esses Estados se encontrem sob o go verno dos dignitrios responsveis pela manifestao conjunta.A declarao QuadrosFrondizi, de 21 de abril de 1961, foi uma resposta positiva dos presidentes do Brasil e da Argentina s proposies norteamericanas no quadro da Aliana para o progresso. Em 20 de setembro de 1967, reunidos na fronteira colombianovenezuelana, os presidentes Carlos Lleras Restrepo e Ral de Leoni externavam, numa declarao, o propsito de defender suas instituies contra a sedio castrista. Em 19 de junho de 1979, os presidentes do Iraque, Hassan alBakr, e da Sria, Hafez Assad, publicamente declaravam seu acordo de princpio sobre a convenincia da unificao dos dois pases (o presidente Bakr deixaria o poder em 16 de julho seguinte, sendo substitudo por Sadam Hussein).Por vezes a declarao comum de tal maneira substanciosa que parece ne cessrio enfatizar mais tarde, para prevenir equvocos, sua natureza no convencio nal. A Declarao Universal dos Direitos do Homem, adotada pela Assembleia Geral da ONU em 10 de dezembro de 1948, e a Ata final de Helsinque, de 1 de agosto de 1975, so documentos que exemplificam esse gnero de ambiguidade alm de trazer a oportuna lembrana de que as declaraes comuns, como de resto os gentlemens agreements, no so necessariamente bilaterais. A provvel fora cogente da Declarao de 1948 no deve ser buscada no direito dos tratados, mas naquele setor mais recente do direito internacional pblico, que se ocupa das decises das organizaes internacionais. Quanto Ata de Helsinque, em outubro de 1977 o ministro francs dos negcios estrangeiros esclarecia, na resposta a uma consulta parlamentar, seu ponto de vista a respeito da natureza do compromisso:A Ata final de Helsinque no um acordo dotado de valor jurdico, mas uma declarao de intenes, solenemente expressa. Assinandoa, a exemplo de trinta e quatro outros Estados europeus, a Unio Sovitica se comprometeu moralmente a respeitarlhe os diversos dispositivos, a compreendidos aqueles que visam ao respeito e promoo dos direitos do homem e das liberdades fundamentais10.Notas sobre a prtica francesa do direito internacional, AFDI (1978), v. 24, p. 11641165.Regncia do direito internacional. Para os redatores da Conveno de Viena, o tratado um compromisso ... celebrado por escrito entre Estados e regido pelo direito internacional...11. Essa linguagem sugere que um compromisso entre duas sobe ranias pode, porventura, no ser regido pelo direito das gentes, caso em que lhe faltaria a qualidade de tratado. Na realidade, embora certos autores paream admitir algo diverso12, nenhum acordo entre Estados pode escapar regncia do direito inter nacional, ainda que, no uso do poder soberano que essa ordem jurdica lhes reconhece, os Estados pactuantes entendam de fazer remisso a um sistema de direito interno. absurda, por outro lado, a ideia de que um compromisso entre Estados como, de resto, qualquer espcie de contrato, quaisquer que sejam as partes possa regerse por seus prprios termos, flutuando no espao margem de toda ordem jurdica.A mais notria crtica admisso da possibilidade de produzir um acordo interestatal sob a regncia de uma ordem jurdica interna proveio da pena de Hersch Lauterpacht. Formuloua o notvel jurista em relatrio Comisso do Direito In ternacional das Naes Unidas, na fase inicial dos estudos pertinentes codificao do direito dos tratados. Referindose queles casos em que a remisso a certa ordem jurdica interna aparece no acordo entre sujeitos de direito das gentes, Lauterpacht pondera que a escolha de um direito determinado sempre imputvel vontade das partes. E esclarece que, por fora de uma disposio desse tipo, o direito em questo transformado em direito internacional convencional: exatamente aquilo a que se refere o art. 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justia quando fala em ... regras expressamente reconhecidas pelos Estados em litgio13.11. Art. 2, I, a.Arnold McNair, D. P. OConnell, e mesmo autores da escola francesa, como Paul Reuter, Nguyen Quoc Dinh e Serge Sur, todos em oposio, neste particular, ao ensinamen to preciso e incontornvel de Charles Rousseau (cf. J. F. Rezek, Direito dos tratados, Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 7980).Hersch Lauterpacht, Relatrios sobre o direito dos tratados; Documentos da Comisso do Direito Internacional, A/CN 4/63, p. 39.Base instrumental. O tratado internacional pode materiali zarse em duas ou mais peas documentais distintas. Isto sempre pareceu bvio no caso de documentos diversos, porm produzi dos a um s tempo, e por todas as partes contratantes, tal como sucede sempre que o tratado se faz acompanhar de anexos. Quando os negociadores da Conveno de Viena quiseram dei xar claro que um tratado pode tomar corpo ... num instrumen to nico ou em dois ou mais instrumentos conexos14, no co gitavam dessa hiptese, mas daquela outra em que o acordo internacional se desdobra em textos via de regra, dois textos produzidos em momentos diversos, cada um deles firmado em nome de uma das partes apenas.A troca de notas visada por aquele dispositivo da Conveno de Viena , portanto, um mecanismo convencional idneo. No h a novidade alguma: do uso dessa tcnica se colhem exemplos no fundo dos arquivos diplomticos. A real utilidade dessa abordagem do cdigo de Viena ter consistido em sepultar, de uma vez por todas, a mistificao ora alimentada pela prtica de certas chance larias, ora insinuada em peas doutrinrias obscuras tendente a fazer ver a troca de notas como algo situvel margem do direito dos tratados. Este pargrafo com porta uma anlise sumria da troca de notas, em que primeiro se depura o conceito, reduzindoo ao domnio do direito convencional, para chegarse depois ao que, nesse mbito, a figura representa ou seja, um processo alternativo de negociao e concluso de tratados.Troca de notas: um meio de comunicao. De incio, cumpre limitar o alcance da expresso em exame. A conversao diplomtica, quando no oral, fazse rotineiramente pela via do intercmbio de notas escritas ora assinadas, ora providas apenas do selo ou carimbo prprio , sem que essa constante movimentao, em duplo sentido, caracterize a troca de notas do direito convencional. Esta ltima se d apenas quando pos14. Art. 2, I, a.svel determinar a presena do animus contrahendi; quando vlido dizer que as partes, por esse processo formal embora no solene , entraram efetivamente num acordo destinado a produzir efeitos jurdicos, criando, entre ambas, o vnculo con vencional. Inmeras so, no dia a dia da vida diplomtica, as notas que se trocam entre chancelarias e legaes, sem dar origem a um verdadeiro acordo internacional por troca de notas. E, dentre estas tantas, interessante notar que algumas tm funda mental presena no direito dos tratados, visto que exprimem, por exemplo, a vontade das partes, ou de uma delas, no sentido de ver extinto certo compromisso em vigor.A esse gnero pertencem as notas com que dois governos se entendem para o efeito de abrogar um tratado bilateral vigente; bem assim aquelas que exprimem a denncia do tratado, por uma das partes, e a notcia de recebimento, pela outra. Diverso, porm, o caso da troca de notas com que as partes visam a modificar o teor, ou mesmo a prorrogar a vigncia, de um acordo preexistente. Nestas hipteses, defrontamonos com novo acordo no estilo dos protocolos adicionais, bem ca racterizado na sua vocao para instituir obrigaes mtuas entre as partes.Troca de notas: um mtodo negocial. Interessanos, pois, to s aquela troca de notas em que presente o nimo conven cional, em que apurvel a inteno de celebrar um acordo au tntico, bem que privado de unidade de instrumento. Agora, num segundo passo, observamos que a troca de notas no uma va riante terminolgica para o tratado internacional. , antes, um mtodo negocial, um processo de concluso de tratados bilate rais. A opo das partes por esse mtodo que se contrape negociao com vistas ao preparo de um texto nico, a ser fir mado por ambas nada tem a ver com a opo terminolgica que, em todo caso, se lhes concede. A troca de notas pode, pois, ser o meio escolhido pelas partes para a concluso de um com promisso internacional que resolvam denominar acordo, con veno, ajuste, declarao, ou o que melhor lhes parea.Seo II CLASSIFICAO DOS TRATADOSProposio da matria. Aqui se estudam to s aqueles esquemas classificatrios que, em certa medida, iro contribuir para o melhor e mais rpido entendimento de aspectos da gne se, da vigncia ou da extino dos tratados internacionais. Cui daremos de classificar os tratados luz de dois critrios de n dole formal tendo a ver com o nmero de partes e a extenso do procedimento adotado , e trs outros de ndole material dizendo respeito natureza das normas expressas no tratado, sua execuo no tempo e sua execuo no espao.Nmero de partes. A simplicidade desta primeira chave classificatria contrasta com a dimenso de sua importncia, ao longo de todo o estudo do direito dos tratados. Aqui nada mais se leva em conta que o nmero de partes, o nmero de pessoas jurdicas de direito das gentes envolvidas pelo processo conven cional. Dizse bilateral o tratado se somente duas as partes, e multilateral ou coletivo em todos os outros casos, ou seja, se igual ou superior a trs o nmero de pactuantes. evidente a bilateralidade de todo tratado entre Estado e organizao inter nacional, ou entre duas organizaes, qualquer que seja o nmero de seus membros. A organizao, nessas hipteses, ostenta sua personalidade singular, distinta da quela dos Estados componentes.Procedimento. Aqui distinguiremos os tratados segundo o procedimento adotado para sua concluso. Mais que a medida cronolgica desse processo um dado falacioso , interessanos a questo de saber se, dentro dele, possvel detectar duas fases de expresso do consentimento das partes, este entendido como prenunciativo na primeira, a da assinatura, e como defi nitivo na segunda, a da ratificao, ou se, num quadro unifsico,o consentimento definitivo se exprime na assinatura, desde logo criadas as condies para a vigncia do tratado.Esta , pois, aquela mesma chave classificatria que os publicistas franceses adotam para distinguir os tratados em sentido estrito dos acordos em forma sim plificada15. E nada mais razovel, quanto aos primeiros, que a referncia ao sentido estrito. A histria do direito das gentes demonstra e o veremos na hora oportuna que o processo solene ou formal, com duplo momento de expresso do nimo das partes, aquele que se encontra na origem da experincia convencional entre as naes, sendo o outro o resultado de uma prtica bem mais recente.O mais importante tpico a ser aclarado, neste passo, diz respeito pretensa identidade entre os acordos de procedimento breve hbeis, pois, para viger desde a assinatura, sem neces sidade de ratificao e os acordos executivos, assim chamados sob a inspirao da prtica convencional norteamericana.Acordo executivo expresso criada nos Estados Unidos para designar aquele tratado que se conclui sob a autoridade do chefe do poder Executivo, independentemente do parecer e consentimento do Senado. Ora, o critrio que nos orienta neste tpico de classificao tem a ver com a natureza, mais ou menos complexa, do procedimento convencional ou, caso se prefira, com a necessidade ou desnecessidade de ratificao. No se volta este critrio, absolutamente, para o problema de saber quais os poderes internos envolvidos na formao da vontade dos Estados pactuantes a melhor dizer, de cada um dos Estados pactuantes. Um tratado em forma simples, concludo e posto em imediato vigor pela assinatura das partes no instrumento nico, ou por troca de notas, no se confundir com um acordo execu tivo se os governos pactuantes estiverem agindo com apoio em aprovao parlamentar tpica, expressa pelo Legislativo ao tempo mesmo da negociao ou antes. Ao reverso, desenganaCf. Rousseau, p. 2124.damente executivo o tratado solene, de procedimento longo, em que o intervalo entre a assinatura e a ratificao de cada parte se v preencher no com a consulta ao respectivo parlamento acaso desnecessria, segundo seu sistema constitucional , mas com estudos e reflexes confinados no puro mbito governa mental.Percebese, alm disso, que a extenso do procedimento fator objetivo: cabe a considerar o tratado em si mesmo, e apurar as circunstncias de sua concluso, as condies de sua entrada em vigor. A seu turno, a distino entre o tratado exe cutivo e seu natural modelo contrastante qual seja o tratado abonado pelo par lamento traz a marca da subjetividade: para bem operla, no se levar em conta qualquer caracterstica do prprio tratado, mas a maneira de agir de cada uma das partes pactuantes, em ateno s normas do seu direito interno que distribuem competncia para o comprometimento exterior. Consequncia dessa subjetividade que um mesmo tratado pode ter carter executivo para algumas das partes e no para outras, o que se d com mais assiduidade no plano bilateral. Assim, o Acordo militar BrasilEstados Unidos, de 15 de maro de 195216, foi um acordo executivo apenas do ponto de vista norteamericano, havendo motivado no Brasil a necess ria consulta ao Congresso, preliminar ratificao. O art. XII desse tratado dispu nha sobre sua entrada em vigor, marcandoa para a data em que o governo brasi leiro notificasse ao governo dos Estados Unidos sua ratificao. luz do critrio classificatrio de que ora nos ocupamos, essa desigualdade na postura das partes no perturba a noo de que o tratado assim concludo , objetivamente, um tratado de procedimento longo. A assinatura, no desfecho da negociao, no teve a virtude de fazlo firme em definitivo embora, sob a tica singular de uma das partes, isso fosse juridicamente possvel, e talvez dese jvel. S a ratificao, apesar de unilateral, pde propiciar, nos termos do tratado, sua entrada em vigor. fundamental que jamais se identifique a realidade cient fica com a mera probabilidade estatstica. Feita essa advertncia, cumpre reconhecer que o procedimento breve tem servido, com frequncia infinitamente maior, concluso de tratados bilate rais, e de importncia limitada, que celebrao de pactosCol. MRE, n. 320.17. Rousseau, p. 2425.5253coletivos sobre os interesses mais eminentes da comunidade das naes. A prtica geral e, com particular uniformidade, a prti ca brasileira pem mostra duas outras caractersticas do pro cedimento breve. Ele convive melhor com o sistema da troca de notas que com a lavratura do tratado em instrumento nico. De outro lado, sua simplicidade no costuma oferecer lugar par ticipao do chefe de Estado. Pelo poder Executivo, exprimindo o consentimento nacional, fala e assina, via de regra, o ministro das relaes exteriores. Em sntese, e desde que evitemos o erro de ver na reunio desses elementos autnomos um dogma de f, ser possvel descrever, por oposio ao tratado em sentido es trito, um modelo de tratado em forma simples, da mais alta in cidncia na prtica internacional contempornea: aquele acordo bilateral, sobre matria de importncia limitada, que se conclui mediante procedimento breve, sob a forma da troca de notas, envolvendo apenas o ramo executivo do poder pblico das par tes, e sem interveno formal dos chefes de Estado.Natureza das normas. A distino entre tratados contratu ais e tratados normativos vem padecendo de uma incessante perda de prestgio. Charles Rousseau permaneceu entretanto fiel a essa ideia, desenvolvida em sua obra de 1944 e reafirmada nas seguintes17. ntida, segundo Rousseau, a diferena funcional entre os tratadoscontratos, assim chamados porque atravs deles as partes realizam uma operao jurdica tais os acordos de co mrcio, de aliana, de cesso territorial , e os tratadosleis, por cujo meio as partes editam uma regra de direito objetivamente vlida.A esta ltima classe pertenceriam as grandes convenes coletivas como as da Haia e de Genebra sobre o direito da guerra; e, de resto, todos os tratados emque se percebesse nas partes mesmo quando pouco numerosas o intento de estabelecer certas regras uniformes de conduta. Prpria do tratado contratual, por seu turno, seria a diversidade do objeto visado pelas partes, cada uma delas dese jando justamente aquilo que a outra lhe pode dar. Exemplos muito claros deste quadro so os tratados relativos s diversas formas da compra ou da troca, entre Estados, de bens de qualquer natureza.A crtica de Hans Kelsen a essa distino classificatria fulminante. Parecelhe que, tanto no tratado chamado contratual quanto naquele dito normativo, a vontade convencional das partes tem sempre um mesmssimo objeto, constitudo pela integralidade do teor do tratado18. A abordagem kelseniana induz a ver como superficial ou pelo menos como extrajurdica a tese de que haja diversidade no intento de dois Estados que pactuam, por exemplo, sobre a troca de minrio de ferro por petrleo, pelo s fato de que um deles deseja obter o petrleo do copac tuante, enquanto este tem seu interesse voltado para o minrio. A inteno ltima de ambos, nesse quadro, uma s: criar o mecanismo normativo que permita a satisfao de suas necessidades comerciais, mediante o intercmbio daqueles bens. Assim, Kelsen aponta como pleonasmo a expresso tratados normativos19. Todos o so, dos mais transcendentes pactos universais s avenas de comrcio que os Estados concluem aos pares. O que pode variar, em verdade, o feitio de execuo das normas convencionais menos, porm, luz do direito que sob um enfoque puramente operacional. Acresce que um dos dois polos dessa classificao, o tra tado contratual, algo que talvez nunca se encontre em estado de pureza. Mesmo nas avenas bilaterais voltadas para a simples troca de bens ou de servios, usual que marque presena o elemento normativo consistente, por exemplo, numa clusula de nao mais favorecida ou num dispositivo de salvaguarda. Quando menos, o tratado contratual ter seu texto arrematado pelas indispensveis clusu las finais sobre ratificao, entrada em vigor, perspectiva de denncia , cujo carter normativo os autores dessa proposio classificatria no poderiam negar.Evitese, contudo, o extremo de recusar qualquer valor jurdico a esse ensaio de classificao. Ele abriu caminhos teoria geral do direito internacional pblico. Juan Carlos Puig lembra que a teoria do tratadolei de uma utilidade inestimvel para a devida inteligncia da funo legislativa numa comunidade descentralizada20. Mas possvel afirmar, com segurana, que a distino entre tratados contratuais e tratados normativos pouco prstimo oferece ao estudo do prprio direito dos tratados.Hans Kelsen, La thorie juridique de la convention; Arch. Ph. (l940), v. 10, p. 4043.Hans Kelsen, Principles of international law, Nova York, Rinehart, 1952, p. 320.Juan Carlos Puig, Derecho de la comunidad internacional, Buenos Aires, Depal ma, 1975, v. 1, p. 173.7473Execuo no tempo. Cabe aqui um esclarecimento inciden te: pelos critrios formais, todo tratado se pode ajustar, na sua integralidade, a um dos polos de cada chave classificatria. Se confrontamos, por exemplo, os tratados bilaterais aos multila terais, no h meiotermo, no h hibridismo possvel. J no domnio dos critrios materiais de classificao a realidade outra. No de rigor, no sequer fortemente provvel que, tomando ao acaso um tratado internacional, possamos situlo, por inteiro, em determinada categoria. Foi visto, no pargrafo precedente, que um mesmo tratado pode abrigar elementos normativos e elementos contratuais sob a tica dos par tidrios dessa classificao. Esse fenmeno prprio dos crit rios classificatrios materiais: vloemos presente, por isso, no pargrafo atual e no seguinte. conta da execuo no tempo, importa distinguir o tratado que cria uma situao jurdica esttica, objetiva e definitiva, daquele que estabelece uma relao jurdica obrigacional din mica, a vincular as partes por prazo certo ou indefinido. O exemplo clssico da primeira espcie o tratado de fronteirasou, mais exatamente, o tratado de limites , pelo qual dois Estados acertam a linha divisria entre seus territrios. A se enquadram, por igual, os tratados pertinentes cesso territorialcomo, de resto, todos os tratados que formalizam transfern cia definitiva de bens de qualquer espcie.A cesso territorial onerosa teve grandes exemplos no tratado de 3 de maio de 1803 (FranaEstados Unidos), relativo compra da Louisiana por 60 milhes de francos; no tratado de 30 de maro de 1867 (RssiaEstados Uni dos), sobre a compra do Alasca por 7,2 milhes de dlares; e no tratado de 17 de novembro de 1903 (BolviaBrasil), sobre a compra do Acre por 2 milhes de libras esterlinas21.747321. Oliveira, II, p. 318319.A doutrina tem proposto diversas denominaes para os com promissos internacionais desta espcie: tratados dispositivos, reais, territoriais, executados, e at mesmo o que soa paradoxal transitrios. Este ltimo rtulo se prende ideia da instantanei dade da execuo de tais pactos limitada, muitas vezes, simples publicidade da nova situao jurdica objetiva que as partes estabeleceram , em confronto com a permanncia, a continuidade, a extenso, no tempo, dos atos executrios de um tratado de aliana, de comrcio, de extradio ou de cooperao cientfica. Por isso, os mesmos autores que chamam de transit rios os tratados criadores de situao jurdica objetiva qualificam como permanentes aqueles cuja execuo se prolonga pelo tem po. Clara ironia: permanentes, a rigor, so os primeiros, visto que instituem, embora sem qualquer mecanismo de execuo espraia do ao longo do calendrio, um quadro jurdico que se pretende eterno. Com efeito, s a vontade comum das partes no a denncia unilateral, nem o rompimento diplomtico, nem o fe nmeno sucessrio poderia no futuro desfazer o tratado dis positivo. Esse tratado, assim, no se executa no dia a dia dos pactuantes, como um acordo de intercmbio comercial. Ele ope ra como ttulo jurdico, para fundamentar, a todo tempo, a legi timidade da situao que nele encontra origem.Acadmica, mas nem por isso desinteressante, a questo de saber se o tra tado dispositivo se pode dizer vigente pelo tempo afora. Questo que, de todo modo, no se coloca apenas no plano do direito internacional. Est em vigor, hoje, o tra tado que em 1803 transferiu da Frana para os Estados Unidos o territrio da Louisiana? Isso rigorosamente o mesmo que indagar se permanece em vigor, em certa ordem jurdica interna, a lei que, em 1945, tenha mandado erigir em praa pblica o monumento a um heri nacional. Esses textos no se encontram juridi camente mortos, por fora da alegada exausto das medidas executrias que pro vocaram. Eles vigem, sem dvida, apesar da profunda diversidade reinante entre sua vigncia, que esttica como a da escritura que prova uma transao imo biliria , e a vigncia dinmica dos restantes compromissos internacionais. sempre possvel encontrar combinadas as duas caractersticas num mesmo tratado, como aquele que traa a linha limtrofe entre dois Estados e ao mesmotempo institui comisso mista para preservar os recursos naturais da zona de fron teira. Esse feitio hbrido marca o tratado bolivianobrasileiro de 1903, relativo negociao do Acre. Ali no se cuidou da venda de uma rea j perfeitamente de limitada, por preo uniforme e liquidado no ato. A necessidade de bem determinar os contornos do territrio em causa, e ainda a complexidade da contraprestao, alm do parcelamento da soma expressa em dinheiro, conduziram a que a execuo desse pacto se prolongasse acentuadamente no tempo.Execuo no espao. O entendimento dessa ideia clas sificatria ser facilitado por um exemplo hipottico. Se o Rei no Unido se envolve na celebrao de um tratado relativo padronizao do uso de cheques por particulares, ou proteo de algo como o meio ambiente ou os direitos humanos, vem baila a questo do alcance espacial desse tratado, que, em regra, ser aplicado a todo o territrio sujeito quela soberania pactu ante, mas que tambm poderia, por algum motivo, aplicarse somente s ilhas britnicas, ou, pelo contrrio, somente s terras ultramarinas, ou ainda ao conjunto, mas com a excluso do pas de Gales, ou das ilhas Shetland. Mas quando o Reino Unido trata com o Uruguai sobre a compra de carne, ou ingressa numa organizao internacional mediante adeso a seu tratado cons titutivo, ou se envolve em pactos pertinentes ao alto mar, Lua, Antrtica, tende a ser de total impertinncia o tema do alcance espacial desses compromissos no quadro territorial da potncia contratante. Sua execuo, com efeito, implica uma conduta centralizada, a cargo da administrao do Estado, e voltada para o exterior. A presuno de validade do tratado em todo o terri trio desse Estado faria aqui pouco sentido, porque, pela natu reza do compromisso, ele no poderia, logicamente, viger em parte apenas do dito territrio.Aos tratados da primeira espcie no aos da segunda referese o art. 29 da Conveno de Viena, assim concebido:Aplicao territorial dos tratados.A menos que uma inteno diferente resulte do tratado, ou seja de outro modo es tabelecida, um tratado obriga cada uma das partes em relao a todo o seu territrio.A inteno diferente a que se refere o texto de Viena traduziuse inmeras vezes na chamada clusula colonial, com que potncias do hemisfrio norte deixaram expressa a inaplicabilidade, aos seus territrios de ultramar, de tratados geralmente afetos ao progresso social, a benefcios de ordem econmica, garan tia de direitos individuais. A limitao do alcance territorial de um tratado pode, entretanto, deverse a razes somente tcnicas e no raro bvias , como su cede com o Tratado de Cooperao Amaznica, celebrado entre Bolvia, Brasil, Colmbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela:O presente Tratado se aplicar nos territrios das partes contratantes na Bacia Amaznica, assim como, tambm, em qualquer territrio de uma parte con tratante que, pelas suas caractersticas geogrficas, ecolgicas ou econmicas, se considere estreitamente vinculado mesma22.Seo III PRODUO DO TEXTO CONVENCIONALCompetncia negocial. Todo Estado soberano tem capa cidade para celebrar tratados, e igual capacidade costumam ter as organizaes internacionais. Cuidase agora de deter minar quem est habilitado a agir em nome daquelas persona lidades jurdicas hora do procedimento negocial. Ao contr rio do treatymaking power23, que encontra sua disciplina no direito pblico interno de cada pessoa jurdica de direito dasTratado de Cooperao Amaznica, de 3 de julho de 1978, art. 2.Tanto quanto possvel convm evitar o uso da expresso inglesa treatymaking power, que no oferece segurana conceitual altura de sua popularidade, visto que expe rimentada, s vezes em doutrina, e frequentemente em linguagem diplomtica, para signifi car trs coisas diversas. Num primeiro extremo, cuidase da capacidade que tm os Estados, e outras personalidades jurdicas de direito das gentes, para convencionar sob o plio desse mesmo direito: a repblica do Peru e a UNESCO ostentam o treatymaking power, no possudo pelas unidades federadas do Arizona ou da Bahia, nem pela Ordem de Malta, nem pela United Fruit Corporation; e ficando casos como o de Taiwan, a outra repblica da China, a critrio de cada copactuante potencial. No extremo oposto, tratase da competncia que pode revestir certo servidor do Estado para falar externamente em seu nome, compro metendoo: neste sentido dizse, por exemplo, que o primeiroministro detm o treatymaking power independentemente da apresentao de uma carta de plenos poderes. O emprego correto da expresso h de corresponder, todavia, a um plano intermedirio, primordialmente afeto ordem jurdica interna do Estado. A pesquisa lgica do treatymaking powergentes, a representatividade exterior do Estado matria de direito internacional, sedimentada pela via costumeira, e hoje versada na Conveno de Viena. O ponto de partida para esse exerccio analtico o entendimento da dimenso jurdica do chefe de Estado.Chefes de Estado e de governo. A voz externa do Estado , por excelncia, a voz de seu chefe. Certo que a conduo efetiva da poltica exterior somente lhe incumbe, em regra, nas repblicas presidencialistas, onde a exemplo do modelo mo nrquico clssico a chefia do Estado e a do governo se con fundem na autoridade de uma nica pessoa. No que estritamen te concerne, porm, ao direito dos tratados, a representatividade ilimitada do chefe de Estado no sofre desgaste conta do regi me parlamentarista, em que se lhe preserva de toda responsabi lidade governativa transferida esta ao gabinete e a seu regen te, o primeiroministro, titular da chefia do governo. correta a proverbial assertiva de que os chefes de Estados parlamentares no governam. O que lhes sobra, contudo, costuma ser exata mente a encarnao da soberania estatal, e essa virtude repre sentativa, no que toca celebrao de tratados internacionais, tem irrecusvel importncia.A autoridade do chefe de Estado no domnio da concluso de tratados inter nacionais no conhece limites: ele ostenta, em razo do cargo, idoneidade para negociar e firmar o acordo, e ainda para exprimir desde logo, ou mediante ratino consiste, sob este prisma exato, em saber se o objeto de anlise ou no uma persona lidade jurdica internacional, hbil para concluir tratados; e menos ainda em determinar quais as pessoas que falam em seu nome nos foros exteriores. Consiste, sim, em investigar o processo de formao da vontade do Estado quanto ao comprometimento externo, e tem por domnio, em razo disso, o seu direito constitucional. O treatymaking power , assim, aquela competncia que a ordem jurdica prpria a cada Estado costuma partilhar entre o governo e o parlamento. No uma competncia negocial: o poder de determinar, em definitivo, a disposio do Estado em relao ao compromisso. Este o sentido do treatymaking power nas obras clssicas de Hans Blix e Paul de Vischer, como ainda em OConnell(p. 219220) e Rousseau (p. 33 e s.).ficao ulterior o consentimento estatal definitivo. No vem cena, neste passo, a questo constitucional domstica. notrio que mesmo os chefes de Estados presidencialistas costumam ter partilhada com o poder Legislativo a competncia para resolver sobre tratados; assim como sabido que nas naes parlamentaristas o chefe de Estado presidente ou monarca nem sequer partilha essa compe tncia, visto que mantido, em regra, margem do processo decisrio. Em ambos os casos, a limitao constitucional de poder no prejudica a plenitude da repre sentatividade exterior.Em todos os atos relacionados com o comprometimento internacional, o chefe de Estado dispe da autoridade fluente de seu cargo, nada se lhe exigindo de semelhante apresentao de uma carta de plenos poderes mesmo porque impossvel atinar com quem expediria, em seu favor, semelhante credencial. A prtica internacional, ora espelhada na Conveno de Viena, atribui idntico estatuto de representatividade ao chefe do go verno quando essa funo, qual sucede no parlamentarismo, seja distinta da precedente.Plenipotencirios. Um terceiro dignitrio possui ainda essa qualidade representativa ampla: tratase do ministro de Estado responsvel pelas relaes exteriores, em qualquer sistema de governo. Aqui, porm, importa destacar certa distino entre o ministro especializado e as duas autoridades precedentes. A re presentatividade do chefe de Estado e do chefe do governo pode entenderse originria, o que no sucede no caso do ministro, que a tem derivada. Reina um generalizado sentimento da im propriedade de se ajustar ao chefe de Estado, ou ao chefe do governo, o rtulo de plenipotencirio, visto que esta expresso intuitivamente se assemelha a mandatrio, e s parece adequada a quem se viu conceder os plenos poderes no a quem por natureza detm tais poderes, e a prerrogativa, inerente ao cargo, de outorglos a outrem. O ministro das relaes exteriores se entende um plenipotencirio no quadro internacional des de o momento em que investido pelo chefe de Estado, ou pelo chefe do governo, naquela funo especializada. Ele guardar obenefcio dessa presuno de qualidade, independentemente de qualquer prova documental avulsa, enquanto exercer o cargo.Tambm prescinde da apresentao de carta de plenos po deres o chefe de misso diplomtica isto , o embaixador ou o encarregado de negcios , mas apenas para a negociao de tratados bilaterais entre o Estado acreditante e o Estado acredi tado. O horizonte desta plenipotncia presumida , assim, e numa dupla dimenso, muito estreito se confrontado com o que se abre ao ministro do exterior.A Conveno de Viena diz que esse poder geralmente reconhecido aos chefes de misso diplomtica, para a negociao bilateral, vai at a adoo do texto do compromisso. Este um momento processual que a prpria Conveno, logo adiante, antepe ao da autenticao do texto. No de crer que tenha havido o intento de estabelecer que o embaixador s tem virtude nata para levar a negociao at o consenso em torno do texto convencional, precisando, contudo, de uma carta de plenos poderes para autenticlo mediante assinatura. Isso contradiria a prtica corrente, demonstrativa de que esses diplomatas negociam e assinam tratados bi laterais entre o Estado de origem e o Estado de exerccio funcional, base nica do credenciamento permanente de que gozam. Isto, porm, na exata medida em que a assinatura signifique desfecho do processo negocial e autenticao do texto avanado, sem implicar consentimento definitivo.Ressalvada, assim, a plenipotncia que, de modo amplo ou limitado respectivamente , recai sobre o ministro das rela es exteriores e o chefe de misso diplomtica, certo que os demais plenipotencirios demonstram semelhante qualidade por meio da apresentao da carta de plenos poderes. O destinatrio dessa carta , se bilateral a negociao, o governo copactuante, e sua entrega deve preceder o incio da negociao, ou a prtica do ato ulterior a que se habilita o plenipotencirio. O expedidor formal da carta de plenos poderes o chefe de Estado, no s nas repblicas presidencialistas em que lhe incumbe simul taneamente a chefia do governo , mas tambm, de modo geral, nos sistemas parlamentares de governo.O elemento credenciado pela carta de plenos poderes h de ser, normalmente, um diplomata ou servidor pblico de outra rea. A necessidade da credencial especfica, de todo modo, to certa nesse caso quanto no de um particular recrutado pelo governo para o encargo negocial. Mesmo os ministros de Esta do dela no prescindem exceo do titular das relaes exteriores.Delegaes nacionais. Antes de tudo, a delegao tem a ver com a fase negocial da gnese dos tratados. Pluralizar a representao do Estado algo oneroso, que s em circunstncias raras encontraria justificativa hora dos atos posteriores ao es foro preparatrio do texto convencional. Naquela fase, contudo, a individualidade do plenipotencirio costuma no bastar completa e adequada colocao dos desgnios do Estado. Dselhe apoio mediante a composio do grupo, subordinado sua chefia. A hierarquia parece indissocivel da delegao. Seu chefe e apenas ele detm a carta de plenos poderes. Os demais integrantes do grupo, quer se qualifiquem como delega dos, quer como suplentes, ou como assessores, tm por incum bncia darlhe o suporte que requeira suprindo, por exemplo, sua impossibilidade de presena constante mesa de uma nego ciao ininterrupta, ou de presena simultnea em duas ou mais cmaras a que, por especialidade, os trabalhos preparatrios se hajam distribudo. No se concebem conflitos dentro da delega o: h de prevalecer, em face da eventual variedade de opinies, a voz do chefe24, enquanto autorizada o que se presume at evidncia em sentido contrrio pela origem de seus plenos poderes.Entretanto, isto no se d com as delegaes nacionais conferncia anual da OIT, onde se negociam as convenes internacionais do trabalho: o chefe, neste caso, um dele gado governamental, cuja posio no vincula os delegados classistas, representantes sindi cais dos empregadores e dos trabalhadores.O chefe da delegao no necessariamente um diplomata. Outros servidores do Estado, civis ou militares, podem receber o encargo. Neste caso comum em bora no obrigatria a presena de pelo menos um diplomata no corpo da dele gao.No caso das organizaes internacionais, o secretriogeral ou o funcio nrio que, sob ttulo diverso, encabea o quadro administrativo da organizao, quem, via de regra, e sob a autoridade da assembleia geral, conclui seus tratados. Essa prtica tem sido adotada pela OEA e pelas congneres de alcance regional, seja o copactuante um Estado integrante do respectivo quadro ou estranho a ele, ou ainda uma outra organizao internacional. O Secretriogeral da ONU, por sua vez, esteve incumbido de celebrar tratados afetos competncia decisria da As sembleia Geral como os acordos de sede, em 194647, com a Sua e os Estados Unidos , do Conselho de Segurana e do Conselho Econmico e Social. Houve casos em que o secretriogeral subdelegou esse encargo a diretores execu tivos da organizao.Negociao bilateral: roteiro e circunstncias. Em regra, a negociao bilateral ocorre no territrio de uma das partes contratantes, sendo lgico e econmico que tenha curso na ca pital nacional, entre a chancelaria assim chamado o minist rio, secretaria de Estado ou repartio governamental que res ponde pelas relaes exteriores e a embaixada do Estado copactuante, ou a delegao especialmente enviada por este para discutir o tratado. A falta de relacionamento diplomtico perma nente entre dois Estados no impede que o preparo de um trata do bilateral se faa no territrio de um deles, mediante o envio, pelo outro, de delegao ad hoc. Certos fatores, no entanto, podem apontar como prefervel que se negocie em territrio de terceiro Estado. Destacamse entre esses fatores (a) o clima de animosidade ou desconfiana mtua reinante entre as partes ea vantagem operacional e econmica representada pelo ce nrio neutro, onde se encontrem representaes diplomticas permanentes dos dois pactuantes.O acordo de Paris ps termo a cinco anos de negociao, na capital francesa, entre o Vietn e