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Direitos Reais - Teste 20-07-12

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Faculdade de Direito de Lisboa – Ano lectivo 2011/2012 DIREITOS REAIS (Época de Recurso) - 20 de Julho de 2012 (2 horas)

REGÊNCIA: Professor Doutor José Alberto Vieira

GRUPO I (16 valores)

Em Janeiro de 2000, Adalberto, proprietário e possuidor desde 1990 do prédio X, vendeu-o

a Bertolino, seu amigo de infância, mediante escritura pública outorgada por Cartolino, notário

amigo de ambos. Nem Adalberto, nem Bertolino ou tão-pouco Cartolino cuidaram de inscrever o

negócio no registo, onde constava a aquisição a favor de Adalberto, datada de 1990. As chaves da

moradia foram logo entregues a Bertolino, o qual, como residia em Paris, celebrou com Deolinda

um contrato de arrendamento do prédio X.

Em Janeiro de 2005, Adalberto e Bertolino zangaram-se e, para se vingar, Adalberto doou

o prédio X a Ermelindo, por escritura pública, tendo este cuidado de registar o negócio. Acto

contínuo, em Março de 2005, Ermelindo alienou o prédio X a Felisberta e Guinolindo, emigrantes

na Alemanha, em contrapartida de € 500.000,00, por documento escrito e assinado por todas as

partes, durante as férias que estes passaram em Portugal. O preço foi pago através de um cheque

de Guinolindo de € 400.000,00, tendo Felisberta emitido um cheque no valor remanescente.

Felisberta e Guinolindo apenas solicitaram o registo a seu favor em Março de 2006, para o que

contaram com a ajuda de Hilário, seu amigo e ajudante na Conservatória.

Em Fevereiro de 2008, o Banco Super Juros, credor de Bertolino, inscreveu no registo uma

acção tendente a obter a declaração de nulidade do negócio celebrado entre Adalberto e

Ermelindo. O STJ declarou em definitivo a nulidade deste contrato em Julho de 2012.

Entretanto, em Janeiro de 2012, Felisberta e Guinolindo constataram que as chaves

entregues por Ermelindo não funcionavam. Ao deparar com Deolinda, convictos de que esta

invadira a moradia, expulsaram-na a pontapé e iniciaram obras de melhoramento da mesma.

1. Aprecie a situação jurídico-real do prédio X, identificando os direitos reais constituídos

sobre o mesmo. (7 valores)

2. Aprecie a situação jurídico-possessória do prédio X e determine: (7 valores)

2.1. Como podem Bertolino e/ou Deolinda reagir à expulsão desta última?

2.2. Os efeitos decorrentes da posse para o(s) possuidor(es) do prédio X.

3. Aprecie o negócio jurídico celebrado entre Ermelindo e Felisberta e Guinolindo e

indique qual a posição jurídica destes últimos em relação ao prédio X. (2 valores)

GRUPO II (4 valores)

Em Janeiro de 2010, Idalino, proprietário do prédio Y, acordou com Joaquim a constituição

de um direito de superfície, tendo-se Joaquim obrigado a construir uma moradia com três pisos,

no prazo de cinco anos. Em Janeiro de 2011, por simples documento particular, Joaquim constituiu

a favor de Luís, proprietário de um terreno próximo, uma servidão de passagem sobre o prédio Y,

pelo período de dez anos.

Actualmente, a moradia, com apenas dois pisos, encontra-se finalizada, mas Joaquim

considera que tem direito a nela permanecer, até porque vale mais do dobro do que o terreno onde

foi construída. Já Idalino, cansado de ver Luís a passar pelo seu terreno, pretende pôr termo a esta

situação, além de que exige a Joaquim a construção do terceiro piso. Quid iuris?

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Faculdade de Direito de Lisboa – Ano lectivo 2011/2012 DIREITOS REAIS (Época de Recurso) - 20 de Julho de 2012 (2 horas)

REGÊNCIA: Professor Doutor José Alberto Vieira

I (14 valores)

1. Aprecie a situação jurídico-real do prédio X, identificando os direitos reais que foram

constituídos sobre o mesmo. (7 valores)

i. Caracterização do contrato de compra e venda entre A e B; transmissão do direito real

por mero efeito do contrato (princípios da consensualidade, causalidade e unidade;

explicitação); direito de propriedade como direito real de gozo máximo

ii. Análise registal: artigo 2.º, n.º 1 alínea a), do CRPredial; situação prévia à entrada em

vigor do Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho (obrigatoriedade indirecta / ónus de

registar); Artigos 7.º, 9.º, 36.º e 41.º CRPredial; Registo incompleto (não produção do

efeito consolidativo)

iii. Contrato entre B e D: contrato de arrendamento; caracterização do direito do

arrendatário como direito pessoal de gozo; artigo 2.º, n.º 1 alínea m) (eventual sujeição a

registo)

iv. Caracterização do contrato de doação entre A e E; doação de bens alheios, por falta de

legitimidade do doador (princípio da causalidade; explicitação); efeitos da nulidade

(artigos 956.º, 286.º e 289.º CC)

v. Análise registal: artigo 2.º, n.º 1 alínea a) CRPredial; registo não obrigatório (artigo 36.º

do Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho); artigos 7.º e 9.º CRPredial como base da

legitimidade (registal) de A; artigo 68.º CRPredial; artigo 7.º CRPredial (a favor de E);

apreciação da possibilidade de aplicação do artigo 5.º CRPredial à pseudo-aquisição de

E (enunciação dos requisitos; problematização da exigência de onerosidade do negócio

jurídico; apreciação das divergências doutrinárias e posicionamento: em princípio,

afastamento da aquisição tabular a favor de E)

vi. Caracterização do contrato de compra e venda entre E e F e G; venda de bem alheio, por

falta de legitimidade do vendedor (artigo 892.º; princípio da causalidade);

inobservância da forma exigida pelo artigo 875.º CC (artigo 220.º CC)

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REGÊNCIA: Professor Doutor José Alberto Vieira

vii. Análise registal: artigo 2.º, n.º 1 alínea a) CRPredial; registo não obrigatório;

legitimidade de F e G (artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho)); artigos

7.º, 9.º e 36.º CRPredial; artigos 68.º e 69.º, n.º 1 alínea d) CRPredial (o registo deveria ter

sido recusado; eventual responsabilidade disciplinar); apreciação da eventual aquisição

tabular por parte de F e G (problematização do âmbito de aplicação dos artigos 17.º, n.º

2 CRPredial e 291.º CC; apreciação dos requisitos exigidos no artigo 291.º CC;

impossibilidade de funcionamento da aquisição tabular, devido à circunstância de

acrescer à nulidade por falta de legitimidade de E a invalidade formal do contrato de

compra e venda);

viii. Artigo 3.º, n.º 1 alínea a) CRPredial; artigos 286.º, 289.º e 605.º CC; acção proposta mais

de três anos após a celebração do negócio jurídico nulo (artigo 291.º, n.º 2); artigo 13.º

CRPredial

ix. Em conclusão, o único direito real constituído sobre o prédio X é o direito de

propriedade de B (salvo se se entender que pode funcionar aquisição tabular a favor de

E, não obstante a sua aquisição ter sido a título gratuito; nesse caso, eventual

inoponilidade do arrendamento não registado)

2. Aprecie a situação jurídico-possessória do prédio X e determine:

a. Como podem Bertolino e/ou Deolinda reagir à expulsão desta última?

b. Os efeitos decorrentes da posse para o(s) possuidor(es) do prédio X.

(7 valores)

i. Entrega das chaves pelo vendedor (A) ao comprador (B): significado possessório

(tradição simbólica); conceito e elementos da posse: teorias subjectivista e objectivista à

luz do Código Civil; posse de B nos termos do direito de propriedade (artigo 1251.º,

artigo 1263.º, alínea a)); caracteres da posse (civil, efectiva, causal, titulada, presumida

de boa fé, pública e pacífica); fundamentação

ii. Apreciação dos efeitos do contrato de arrendamento na situação jurídico-possessória:

posse de B, nos termos do direito de propriedade; posse de C, nos termos do direito

pessoal de gozo (posse interdictal); detenção de C, nos termos do artigo 1253.º, alínea c);

artigo 212.º; artigo 1252.º

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REGÊNCIA: Professor Doutor José Alberto Vieira

iii. Inexistência de posse por parte de E, F e G; aparência de traditio, mediante a entrega de

chaves fictícias

iv. Caracterização do esbulho por parte de F e G: apossamento (artigo 1263.º, alínea a);

requisitos); caracteres da posse de F e G: posse nos termos da compropriedade (artigo

1405.º, n.º 2) formal, civil, efectiva, não titulada, violenta, presumida de má fé (apesar de

estarem convictos de serem possuidores; artigo 1260.º, n.º 3) e pública; artigo 1267.º, n.º

1 alínea d) e n.º 2: sobreposição de posses; meios de defesa da posse (artigos 1276.º e

seguintes; artigos 1278.º, 1281.º e 1282.º; referência à providência cautelar de restituição

provisória da posse – artigo 1279.º; possibilidade de o arrendatário lançar mão dos

meios de defesa da posse, nos termos do artigo 1037.º, n.º 2); artigo 1278.º (melhor posse

é a de B, por ser titulada); artigo 1311.º (B)

v. Efeitos decorrentes da posse: artigo 1268.º; B pode juntar à sua a posse do antecessor A

(artigo 1256.º), para efeitos de usucapião (apenas relevante se se entender que há

aquisição tabular a favor de E, não obstante o carácter gratuito da aquisição; usucapio

contra tabulas; referência, nesse caso, aos requisitos da usucapião); F e G têm direito a

indemnização pelas benfeitorias úteis e necessárias, apesar da posse de má fé (artigo

1273.º)

3. Aprecie o negócio jurídico celebrado entre Ermelindo e Felisberta e Guinolindo e

indique qual a posição jurídica destes últimos em relação ao prédio X. (2 valores)

i. Caracterização da compropriedade (artigo 1403.º)

ii. Problematização da presunção de igualdade de quotas prevista no n.º 2 do artigo 1403.º;

ausência de menção no título constitutivo; discussão sobre a possibilidade de

afastamento da presunção através de outros elementos do negócio jurídico,

nomeadamente a forma de pagamento do preço; posicionamento e conclusão (em

princípio, funcionamento da presunção de igualdade)

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REGÊNCIA: Professor Doutor José Alberto Vieira

II (4 valores)

i. Constituição do direito de superfície: artigos 1305.º (elasticidade dos direitos reais;

teoria da oneração); artigos 1524.º e 1528.º; artigo 22.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º

116/2008, de 4 de Julho; artigo 2.º, n.º 1 alínea a) CRPredial;

ii. Caracterização do direito de superfície; identificação da existência de dois momentos e

respectivas posições jurídicas do fundeiro e do superficiário

iii. Inadmissibilidade da assunção, pelo superficiário, da obrigação de construção da obra

(princípio da tipicidade; mera eficácia obrigacional)

iv. Impossibilidade de funcionamento do regime da acessão (subsidiariedade)

v. Constituição de servidão predial voluntária de passagem: poder de disposição do

superficiário (problematização, tendo em consideração a coexistência do direito de

propriedade do fundeiro e o disposto no artigo 1460.º); possibilidade de constituição

por contrato (artigos 1543.º, 1544.º e 1547.º); inobservância da forma exigida pelo artigo

22.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho (artigo 220.º CC); M tem a

posse (formal), nos termos do direito de servidão, a qual é civil, efectiva, não titulada,

presumida de má fé, pública e pacífica

vi. Artigo 1536.º, n.º 1 alínea c): impossibilidade de cessar o contrato antes do decurso do

prazo, excepto com fundamento em incumprimento das obrigações assumidas pelo

superficiário; possibilidade de oposição ao exercício da servidão, dada a nulidade do

contrato, ou de intentar acção negatória; inexistência de usucapião da servidão (não

decurso do prazo)