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Antonio Albuquerque da Costa Paulo Sérgio Cunha Farias Formação Territorial do Brasil DISCIPLINA A Primeira República e a consolidação das fronteiras Autores aula 11 Fo_Te_A11_VMVML_080710.indd Capa1 Fo_Te_A11_VMVML_080710.indd Capa1 08/07/10 11:57 08/07/10 11:57

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Antonio Albuquerque da Costa

Paulo Sérgio Cunha Farias

Formação Territorial do BrasilD I S C I P L I N A

A Primeira República e a consolidação das fronteiras

Autores

aula

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Governo Federal

Presidente da RepúblicaLuiz Inácio Lula da Silva

Ministro da EducaçãoFernando Haddad

Secretário de Educação a Distância – SEEDCarlos Eduardo Bielschowsky

Coordenador de EdiçãoAry Sergio Braga Olinisky(UFRN)

Projeto Gráfi coIvana Lima (UFRN)

Revisoras Tipográfi casAdriana Rodrigues Gomes (UFRN)

Margareth Pereira Dias (UFRN)Nouraide Queiroz (UFRN)

Arte e IlustraçãoAdauto Harley (UFRN)Carolina Costa (UFRN)

Heinkel Hugenin (UFRN)Leonardo Feitoza (UFRN)

DiagramadoresIvana Lima (UFRN)Johann Jean Evangelista de Melo (UFRN)José Antonio Bezerra Junior (UFRN)Mariana Araújo de Brito (UFRN)Vitor Gomes Pimentel (UFRN)

Revisora de Estrutura e LinguagemRossana Delmar de Lima Arcoverde (UFCG)

Revisora de Língua PortuguesaMaria Divanira de Lima Arcoverde (UEPB)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

ReitorJosé Ivonildo do Rêgo

Vice-ReitoraÂngela Maria Paiva Cruz

Secretária de Educação a DistânciaVera Lúcia do Amaral

Universidade Estadual da Paraíba

ReitoraMarlene Alves Sousa Luna

Vice-ReitorAldo Bezerra Maciel

Coordenadora Institucional de Programas Especiais – CIPEEliane de Moura Silva

Ficha catalográfi ca elaborada pela Biblioteca Central - UEPB

910.9

C837f Costa, Antônio Albuquerque da.

Formação Territorial do Brasil/ Antônio Albuquerque da Costa; Paulo Sérgio Cunha

Farias. – Campina Grande: EdUEP, 2009.

385 p.: il.

ISBN: 978-85-7879-050-9

1. Geografi a - Brasil. 2. Geografi a – Estudo e Ensino. I. Farias, Paulo Sérgio Cunha.

II. Titulo.

21. ed. CDD

Secretaria de Educação a Distância (SEDIS) – UFRN

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

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Apresentação

Não se pode deixar de reconhecer o papel preponderante que teve a expansão portuguesa para o interior do subcontinente sul-americano na defi nição da confi guração territorial atual do Brasil. Conforme já falamos para você nas aulas anteriores, durante

especialmente o período da União Ibérica, as entradas, as bandeiras, as missões devassaram o interior da colônia portuguesa muito além dos seus limites não claramente defi nidos pelo Tratado de Tordesilhas.

As entradas foram responsáveis pela ocupação lusitana do interior do Nordeste brasileiro, com a pecuária. As bandeiras paulistas se embrenharam pelo interior do território aprisionando índios para escravizar, fazendo a prospecção mineral, estabelecendo a pecuária (como ocorreu no Sul do Brasil) etc. As missões religiosas foram encarregadas de praticar a coleta das drogas do sertão nos vales dos rios da bacia amazônica.

Além desses e de outros processos que já foram discutidos com você nas aulas passadas, coube ao projeto expansionista geopolítico português interiorizar a fi xação de fortes, visando assegurar a posse e a defesa do território, estratégia essa empreendida durante a União Ibérica, quando dividiu a sua colônia americana em dois Estados – do Maranhão, com sede em São Luis, e do Brasil, com sede em Salvador. O Estado do Maranhão era subordinado diretamente à Coroa e foi criado, inicialmente, para garantir a defesa do litoral setentrional, exposto aos ataques e ocupação dos franceses. Posteriormente, depois de afastadas as ameaças dos franceses, em 1751, esse Estado serviu para consolidar a soberania portuguesa sobre a bacia amazônica, mudando, inclusive, o nome de Estado do Maranhão para Estado do Grão Pará, mudança essa que foi acompanhada da transferência da sua sede de São Luis para Belém (Ver Mapa 01 – Os dois Estados do Brasil Colonial).

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Essas, entre outras estratégias de ocupação, expansão e defesa, serviram para alargar as possessões portuguesas na América do Sul em detrimento das possessões espanholas. Esse modelo de expansão e ocupação rarefeitas (pontual e em manchas) se mostrou exitoso quando da assinatura dos tratados diplomáticos entre Portugal e Espanha, no século XVIII, pois levou ao primeiro país defender, com sucesso, o princípio segundo o qual detém a posse de um território quem o ocupa de fato. A consolidação da posse do território a partir desse princípio – utis possidetis, possibilitou a Portugal ampliar bastante a sua colônia americana, deixando um imenso território como legado para o Brasil após a independência, em 1822.

Contudo, os contornos desse imenso território (limites e fronteiras) não foram gestados no período colonial. Nesse período, apenas uma pequena extensão dos nossos contornos territoriais foram defi nidos e demarcados, nossos limites e fronteiras atuais são produtos, principalmente, do desenrolar de eventos diplomáticos que perpassaram o período Imperial e chegaram até a Primeira República.

Nessa aula, convidamos você a fazer um itinerário sobre a defi nição e demarcação dos limites e das fronteiras do Brasil. Para conhecer esse episódio da nossa formação territorial, convidamos você a estudar atenciosamente o conteúdo dessa aula, realizar as atividades sugeridas, consultar a bibliografi a complementar e, em caso de persistência de dúvidas, buscar esclarecimentos com o tutor ou professora da disciplina.

ObjetivosCom essa aula, esperamos que você:

Compreenda que as fronteiras terrestres do território brasileiro atual são produto de confl itos, disputas, acordos, arbitramento internacional e tratados diplomáticos que perpassaram os períodos colonial, imperial e chegaram até a Primeira República.

Identifi que os segmentos de fronteiras terrestres demarcadas no período colonial bem como os tratados que lhes deram conformação.

Conheça os tratados que estabeleceram as linhas de fronteiras terrestres brasileiras atuais demarcadas no período imperial.

Conheça os tratados que defi niram e deram forma as fronteiras terrestres brasileiras atuais demarcadas na Primeira República.

Vamos começar a nossa conversa?

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As fronteiras políticas:conceito e os critériospara o seu estabelecimento

Antes de entrarmos no papo sobre as fronteiras atuais do Brasil é importante fazer a você os seguintes questionamentos: O que é uma fronteira política? Como ela é estabelecida?

Tomando o conceito de território estudado na nossa primeira aula, podemos afi rmar para você, grosseiramente, que uma fronteira separa poderes, em alguns casos confl itantes. No caso dos Estados-Nações, entidades político-territoriais que nasceram como suporte espacial necessário para a afi rmação e a reprodução do capitalismo na Europa, as fronteiras defi nem os limites jurídicos do território e são abstrações geradas e sustentadas pela ação institucional no sentido do controle efetivo do Estado territorial, portanto, um instrumento de separação entre unidades políticas soberanas. Contudo, é importante lembrar para você que os limites de um “país não são simples pontos, conjuntos de marcos ou contornos fi xos” (PEREGALLI, 1982, p. 16). Conforme observa esse historiador:

[...]. Existem fronteiras em movimento e fronteiras estáveis. Fronteiras que foram demarcadas por “arbítrio internacional”, fronteiras que foram conquistadas pelos exércitos, fronteiras que ainda não foram acertadas.

As fronteiras resultam da lenta evolução histórica e são fi xadas através de choques de interesses, estendidas ou constrangidas por ações diplomáticas ou militares. Existem terras neutralizadas, espaços vazios e imprecisos que não pertencem a alguém determinado. Existem fronteiras econômicas que transcendem fronteiras políticas... (PEREGALLI, 1982, p. 16).

Conforme nos lembra Lia Osório Machado:

[...] a fronteira é [também] lugar de comunicação e de troca. Os povos podem se expandir para além do limite jurídico do Estado, desafi ar a lei territorial de cada Estado limítrofe e às vezes criar uma situação de facto, potencialmente confl ituosa, obrigando a revisão dos acordos diplomáticos (MACHADO, 2002, p. 1).

Mas como é estabelecida uma fronteira política entre Estados territoriais? Que etapas envolvem a sua fi xação?

Sem querer entrar em detalhes, e, portanto, de forma sucinta, podemos dizer para você que a fi xação de uma fronteira política envolve, grosseiramente, três etapas: defi nição, delimitação e demarcação.

A definição corresponde à etapa de elaboração conceitual da fronteira política. Nela, os países que estão envolvidos no estabelecimento das fronteiras entre si, através das discussões dos seus diplomatas, chegam a um acordo sobre os princípios norteadores para a sua elaboração.

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Atividade 1

A delimitação se constitui na etapa de elaboração cartografi a da fronteira política. Nela, traça-se nos mapas a linha divisória acordada com base nos princípios gerais estabelecidos na etapa da defi nição.

A demarcação representa a etapa de concretização física da fronteira política. Nela, implantam-se sobre o território os chamados marcos de fronteira. Esses podem ser os chamados acidentes físicos (linhas de crista, os cursos fl uviais etc.) ou marcos implantados (pedras, madeira, concreto etc.). A utilização dos chamados acidentes físicos como marco de fronteira deu origem ao conceito errônea de fronteira natural. Esse conceito é inverídico porque nenhuma fronteira é natural, mas produto da história, já que o uso de um acidente físico como marco de fronteira é estabelecido através da ação política.

No tocante à política, a linha de fronteira nasce na etapa da delimitação, pois é nela que, mediante acordo detalhado sobre os limites entre dois territórios, produz-se um vasto acúmulo de informações cartográfi cas em grande escala, que trazem representadas, em detalhes, os contornos da linha de fronteira.

Assim, nessa rápida conversa sobre o conceito e as etapas de elaboração da fronteira política deu para você perceber que as fronteiras políticas não são naturais. Elas são produto de embates, confl itos, disputas e acordos que instituíram vários Estados territoriais. No caso do Brasil, nossas fronteiras atuais não são obra da natureza que o colonizador aqui encontrou e depois legou ao povo brasileiro nem tampouco foram defi nidas, delimitadas e demarcadas no período colonial. Nossos contornos atuais são produto de vários momentos da nossa história, sendo que a maior parte desses contornos emergiu depois da nossa independência política – no período Imperial e na Primeira República.

Vamos refl etir um pouco sobre esse nosso começo de conversa.

Observe, em um atlas, o mapa político do mundo e responda:

a) Explique como nasceram essas fronteiras políticas.

b) As fronteiras separam e misturam. As fronteiras, ao mesmo tempo em que são um instrumento de separação entre unidades políticas soberanas, são lugares de comunicação e troca. Explique por quê?

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Retomando a nossa conversa

As fronteiras brasileiras atuais originadas no período colonial

O primeiro esboço do território brasileiro atual foi estabelecido em 1494, portanto, antes da chegada de Cabral, em 1500, quando da assinatura do Tratado de Tordesilhas entre os países ibéricos. A elaboração conceitual da fronteiras desse território, que

pertenceria à Coroa portuguesa, tomou como base o sistema de coordenadas geográfi cas, a linha imaginária divisória (o Meridiano de Tordesilhas) deveria se situar 370 léguas a Oeste das ilhas de Cabo Verde - cabendo a Portugal as terras “descobertas ou a descobrir” situadas antes da linha imaginária e à Espanha as terras que fi cassem além dessa linha (Ver Mapa 02 – Primeiro esboço do território brasileiro defi nido pelo Tratado de Tordesilhas).

Mapa 02 – Primeiro esboço do território brasileiro defi nido pelo Tratado de Tordesilhas

Todavia, o Meridiano de Tordesilhas, que separava as possessões lusitanas das espanholas, foi, na sua época, uma fronteira defi nida conceitualmente, mas não delimitada e demarcada. Nesse sentido, as fronteiras entre a América espanhola e a América portuguesa, no sul do Novo Mundo, eram imprecisas.

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Como bem observa Magnoli (1997, p. 47), o Tratado de Tordesilhas, do ponto de vista histórico, representava uma partilha prévia ao empreendimento colonial; do ponto de vista da sua lógica geográfi ca, representava uma abstração matemática e astronômica, assentada na ignorância do território do Novo Mundo.

Além disso, existe uma justifi cativa plausível para toda a imprecisão dos limites territoriais entre as possessões sul-americana das duas Coras Ibéricas. Conforme nos relata Machado (2002, p. 3), só no século XVIII a relação entre limite e fronteira territorial estava sendo desenvolvida na Europa. Até então, os limites das possessões, fossem reinos ou soberanias, eram, com freqüência, imprecisos. Foi no decorrer daquele século que se difundiu na Europa a noção de muro-fronteira ou de uma razão de Estado linear.

A fronteira imprecisa defi nida pelo Meridiano de Tordesilhas foi, como você já teve oportunidade de perceber nas aulas anteriores, transposta principalmente durante o período da União Ibérica, quando a falta de impedimento legal permitiu que as entradas, as bandeiras, as missões etc. alargassem as possessões portuguesas no sul do Novo Mundo e constrangessem as possessões espanholas.

Esse fato, aliado à necessidade de Portugal em estabelecer os limites da única colônia importante que lhe restara (PRADO JÚNIOR, 1987, p. 94), mais o contexto europeu do século XVIII, no qual os países buscavam estabelecer as suas fronteiras (MACHADO, 2002, p. 3), corroboraram para a revisão dos domínios dos países ibéricos na América do Sul e, conseqüentemente, para as primeiras tentativas de demarcação dos limites do Brasil.

Essas tentativas de demarcação dos limites do Brasil no período colonial foram formalizadas através da assinatura de alguns tratados entre Portugal e Espanha: Madri (1750) e Santo Ildefonso (1777), que praticamente confi rmou o Tratado de Madri.

Não obstante ter sido anulado em 1761, através do Tratado de El Pardo, o Tratado de Madri constitui uma referência válida para o estudo do processo histórico de legitimação dos limites das terras brasileiras, em virtude das inovações introduzidas por quatro anos de negociações diplomáticas, entre as quais: a) o reconhecimento da superação da linha de Tordesilhas; b) a primeira tentativa de estabelecer os limites entre as possessões lusas e castelhanas num sentido continental; c) uma visão ampla da geopolítica mundial, em que se estabelece a separação entre os confl itos que pudessem ocorrer na Europa e os confl itos americanos; entre outros (MACHADO, 2002, p. 2-3). Para Becker e Egler (2003, p. 46), o Tratado de Madri, ao estabelecer pela primeira vez as linhas divisórias entre os domínios de Portugal e da Espanha, adotando como critério o utis possidetis, isto é, o reconhecimento do direito de posse a partir do efetivo povoamento e exploração da terra, legitimou a apropriação portuguesa do território cujos limites permanecem grosseiramente os mesmos de hoje (Ver Mapa 03 - O território do Brasil segundo o Tratado de Madri).

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Mapa 03 - O território do Brasil segundo o Tratado de Madri

Mas quais seriam os marcos dos limites ou como estabelecer a linha de fronteira entre as duas possessões sul-americanas dos países ibéricos defi nidos por esse tratado?

Segundo Machado (2002, p.3), no Tratado de Madri e, posteriormente, no Tratado de Santo Ildefonso, a concepção de fronteira implícita nos textos, ou seja, a escolha dos lugares de referência para o traçado da linha-limite das terras revela a enorme importância atribuída aos lugares de comunicação, usualmente coincidentes com pontos estratégicos de passagem da rede fl uvial e de caminhos. São esses lugares que dão coerência à localização das fortifi cações pombalinas, todas situadas nos lugares-ponto por onde confl uíam circuitos de contrabando. Além desses lugares estratégicos, o traçado da linha-limite adotada no Tratado de Madri tomou como referência os lugares de povoamento, em especial as terras sob domínio das missões religiosas. As missões castelhanas se estendiam pelo centro do continente, desde o Paraguai até Maynas (na Amazônia), formando uma verdadeira faixa fronteiriça no sentido norte-sul, o mesmo papel, aliás, que tiveram as missões religiosas portuguesas na parte oriental da bacia amazônica. Esses segmentos foram essenciais para o traçado de limites e para a aplicação do princípio do utis possidetis. Outra referência para o estabelecimento de marcos dos limites do Tratado de Madri foram os acidentes físicos. Não havendo o reconhecimento do direito indígena ao território, grande parte das terras era tida como espaços vazios. Os limites seguiram, nesse caso, os acidentes físicos, ou seja, a fronteira natural, principalmente, as fronteiras fl uviais (motivo pelo qual as Sete Missões passaram para o domínio português ao se respeitar o traçado do rio Uruguai).

Pombalinas

Referentes ao Período Pombalino (1750 —1777) em que o nobre e estadista

português Sebastião José de Carvalho Melo,

conhecido como Marquês de Pombal tomou posse como primeiro-ministro de Portugal e assumiu a administração do Estado

de português e de suas colônias, incluindo o Brasil.

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Todavia, o Tratado de Madri, efetivamente, delimitou apenas alguns trechos das fronteiras atuais do território brasileiro, tomando como referência os acidentes físicos, mais precisamente os cursos conhecidos de alguns rios: o trecho da nossa fronteira atual com a Argentina correspondente ao curso do rio Uruguai e o trecho da nossa fronteira atual com a Bolívia referente ao curso do rio Guaporé. Afora essas linhas-limites originadas com o Tratado de Madri, no período colonial, outro segmento de linha-limite delimitado foi o estabelecido, através do Tratado de Paz entre os Países Baixos e Portugal, assinado por Portugal e a Holanda, em 1661, que, entre outras resoluções, estabeleceu a fronteira entre o Brasil e a Guina Holandesa, atualmente Suriname. A linha-limite estabelecida como marco divisório entre as possessões lusa e holandesa tomou como referência os acidentes físicos, ou seja, a linha de cristas do divisor de águas da bacia amazônica (Ver Mapa 04 – As fronteiras brasileiras atuais originadas no período colonial).

Mapa 04 – As fronteiras brasileiras atuais originadas no período colonial

Assim, as fronteiras terrestres do atual território brasileiro fi xadas no período colonial correspondem a aproximadamente 17% do seu total atual. A metade delas só foi delimitada e demarcada no período Imperial e o restante durante a vigência da chamada Primeira República. Mas, antes de conversarmos sobre elas, responda a atividade logo a seguir.

Teste a sua aprendizagem

Linha de cristas

segundo o Dicionário Geológico e Geomorfológico de Antônio Teixeira Guerra, são os “pontos altos de um relevo alinhados segundo certas direções. As linhas de cristas, algumas vezes se confundem com a linha de cumeada, isto é, uma linha divisora de águas.” (GUERRA, Antônio Teixeira. Dicionário geológico e geomorfológico. 8ª ed.Rio de Janeiro: IBGE, 1993, p. 265)

Divisor de águas

“Linha separadora das águas pluviais. Geralmente se pensa em uma linha de cumeada, isto é, em divisores formados por altas montanhas. Todavia um divisor de águas não é sempre constituído por elevadas cristas.” (GUERRA, Antônio Teixeira. Dicionário geológico e geomorfológico. 8ª ed.Rio de Janeiro: IBGE, 1993, p. 265)

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Por que, no século XVIII, Portugal resolveu estabelecer os limites da sua colônia no Novo Mundo?

Diferencie a confi guração territorial da colônia americana de Portugal defi nida pelo Tratado de Tordesilhas da estabelecida pelo Tratado de  Madri.

Pode-se afi rmar que as atuais linhas-limites do território brasileiro foram gestadas no período colonial? Explique por quê?

As linhas-limites do território brasileiro estabelecidas no período colonial são fronteiras naturais? Explique por quê?

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Império

Período que se inicia em 7 de abril de 1922 com a

declaração de independência de Portugal e conseqüente

formação do Estado Brasileiro através do

estabelecimento de uma monarquia parlamentar e

termina em 15 de novembro de 1889, quando um golpe

de estado instaurou no Brasil a república presidencialista

como forma de governo

Segundo Reinado

Teve iníco em 7 de abril de 1831, quando dom Pedro I abdicou do trono e dom

Pedro II foi aclamado imperador do Brasil, este

período teve fi m com a proclamação da república

em 1889.

Cabildo

Torganismo eclesiástico diocesano de apoio ao bispo.

A palavra “cabildo” tem na lingua espanhola a mesma

origem e mantém o mesmo signifi cado que a palavra portuguesa “cabido”. O

cabido exercia as funções de colégio de consultores do

bispo para aconselhamento sobre assuntos diversos da

vida diocesana.

Voltando a nossa conversa

As fronteiras brasileiras atuais estabelecidas no período imperial

Como discutimos com você anteriormente, o Império foi responsável pelo estabelecimento de mais da metade da extensão das fronteiras terrestres brasileiras atuais.

No Segundo Reinado, foi assinado o tratado de limites entre o Brasil e o Uruguai (1851), estabelecendo a fronteira entre esses dois países como é até hoje, sendo modifi cadas posteriormente apenas algumas disposições no mesmo. O marco da fronteira entre o Brasil e o Uruguai foi estabelecido no curso do rio Jaguarão. Com a demarcação dessa fronteira, o Brasil acrescentou 48.000 Km2 ao seu território.

O estabelecimento da fronteira entre o Brasil e o Uruguai resolveu uma antiga disputa territorial na Bacia do Prata, que concluiu a Questão Cisplatina. Essa questão houvera surgido ainda no contexto da guerra da Independência, quando o tenente-general Carlos Frederico Lecor (Barão de Laguna), entrou com as suas forças em Montevidéu, em 1824, obtendo do cabildo da cidade o juramento à Constituição do Império e, desse modo, anexando ofi cialmente o atual Uruguai ao Brasil. Contudo, essa ocupação foi efêmera, pois, tendo os seus interesses locais prejudicados, muitos cisplatinos, apoiados pelas Províncias Unidas do Rio da Prata (atual Argentina), que também desejavam incorporar à área, iniciaram os confl itos (a Guerra do Corso) contra as forças brasileiras. Após diversos enfrentamentos, nos quais o Brasil não conseguiu levar vantagem sobre os seus opositores, em 1828, com a intermediação da Inglaterra, foi assinada a Convenção Preliminar de Paz, ratifi cada nos anos seguintes, que tratava do comum acordo da desistência do Brasil e da Argentina em controlar a região, o que resultou na independência e no surgimento da República Oriental do Uruguai.

No tocante à fronteira brasileira com o Paraguai, também foi estabelecida no Império, sendo concebida através da forças das armas. Esse segmento de fronteira foi fi xado após o encerramento da Guerra do Paraguai (1864-70), quando, em 1872, foi fi rmado um Tratado de Paz, no qual constavam os respectivos limites do Paraguai com o Brasil. No estabelecimento dessa fronteira prevaleceu um velho princípio para o direito da posse de um território muito bem utilizado por Portugal no período colonial: o Brasil reivindicou as terras já ocupadas ou exploradas por portugueses e brasileiros. No estabelecimento da fronteira com o Paraguai, o Brasil incorporou 47.000 Km2 ao seu território.

Ainda no período imperial foram estabelecidas parte das fronteiras brasileiras com o Peru, a Bolívia (1867) e a Venezuela (1859). Os tratados com o Peru e a Venezuela foram assinados juntos com os acordos que estabeleceram as normas para a navegação na Amazônia.

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Aula 11 Formação Territorial do Brasil 13

Na ocasião da assinatura dos acordos para a demarcação da fronteiras com a Venezuela e a Bolívia, o Brasil anexou ao seu território 150.000 e 160.000 Km2, respectivamente (Ver Mapa 05 - As fronteiras brasileiras atuais demarcadas no Império).

Mapa 05 - As fronteiras brasileiras atuais demarcadas no Império

O Império Brasileiro, na ocasião da fi xação dessas fronteiras, anexou áreas ao seu território baseado na ocupação e exploração portuguesa ou brasileira anteriores. Dessa forma, usou, de certo modo, o velho princípio do utis possidetis tão bem empregado por Portugal para alargar as suas possessões americanas no período colonial. Com a demarcação de fronteiras no período imperial, o Brasil incorporou ao seu território 405.000 Km2.

Para alguns autores, esse crescimento territorial do Brasil revela a faceta expansionista do seu subimperialismo, exercido sobre os seus vizinhos na América do Sul. Já outros autores consideram que o Brasil não era tão forte assim, muito pelo contrário, era um país fragmentado, dividido, sem a presença de um Estado sufi cientemente forte para solidifi car a união de regiões tão diferentes. E o maior perigo de desintegração, por infl uências indiretas ou ações diretas, provinha do outro lado da fronteira. Assim, como condição de existência, era preciso ao Brasil debilitar ou mesmo destruir os seus vizinhos: crescer territorialmente era uma forma de manter a unidade nacional. Outros estudiosos procuram identifi car os destinos dos povos com certos espíritos criadores de acidentes geográfi cos. Os fecundadores do mundo teriam colocado na terra certas montanhas, certos rios, como limites naturais de um povo, predeterminado a exercer sua infl uência sobre esta área. Nesse sentido, o crescimento territorial do Brasil era uma resposta do seu povo ao chamamento para dominar os territórios compreendidos entre

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o Amazonas e o Prata, limitados pela Cordilheira dos Andes, estendendo ao mesmo tempo sua infl uência sobre o resto da América do Sul (PEREGALLI, 1982, p. 14-16).

Seja qual for a explicação para esse crescimento territorial do Brasil nesse período, a referência para a demarcação dessas fronteiras foram preferencialmente os chamados acidentes físicos, principalmente os cursos fl uviais - o rio Jaguarão (limites com o Uruguai ao Sul), trechos dos rios Paraguai e Paraná (parte dos limites com o Paraguai), rio Javari (parte dos limites com o Peru), (ver mapa 6, As fronteiras do Brasil) e as linhas de crista do divisor de águas entre as bacias do Amazonas e Orinoco (parte dos limites com a Venezuela). Isso, de qualquer modo, refl etia a forte ênfase na idéia de fronteira natural dos territórios da época, também bastante utilizada pelo Império brasileiro para justifi car a sua expansão territorial.

Assim, como você percebeu, boa parte dos nossos contornos territoriais foi elaborada no período imperial. Contudo, a fi xação das fronteiras da confi guração territorial brasileira foi concluída na Primeira República, mas antes de falarmos com você sobre esse assunto, refl ita sobre essa parte da nossa conversa.

Refl ita sobre a conversa que acabamos de ter com você

Observe e analise o mapa 05 mostrado na aula, e responda:

Quais os segmentos de linhas-limites do Brasil com os países vizinhos foram fi xados durante o período imperial?

Quais os marcos de fronteira mais utilizados para fixar essas linhas-limites?

Identifi que e explique o conceito de fronteira que prevaleceu na fi xação dessas linhas-limites.

A demarcação de parte das fronteiras no período imperial permitiu ao Brasil anexar 405.000 Km2 ao seu território. Essa expansão territorial revela o subimperialismo, a fraqueza do Estado ou o destino manifesto do Brasil? Justifi que a sua resposta.

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Retomando a nossa conversa

A consolidação da fronteiras brasileiras atuais na Primeira República

Como já falamos para você, aproximadamente um terço das fronteiras terrestres brasileiras foram fi xadas na República Velha ou Primeira República. Nesse período, os limites territoriais brasileiros se encontravam defi nidos pela Constituição de 1891,

porém, nem todos se encontravam delimitados.

A diplomacia brasileira no começo do período republicano estava centralizada na fi gura de José Maria da Silva Paranhos Filho (Barão de Rio Branco). De acordo com Enrique Peregalli, o contexto da atuação diplomática do Barão de Rio Branco apresentava duas tendências gerais:

a) Internacionalmente o eixo diplomático descolou-se de Londres para Washington. Os norte-americanos emergiram como nossos melhores compradores de café, borracha e cacau;

b) Na América do Sul as fronteiras brasileiras foram demarcadas, concluindo-se longas e vagas controvérsias (PEREGALLI, 182, p. 16).

O restante das fronteiras brasileiras demarcadas na Primeira República foi defi nido através de arbitragens ou de acordos bilaterais.

Entre as questões litigiosas de limites territoriais estavam: Palmas, com a Argentina; Amapá, com a França; Acre, com a Bolívia; e Pirara, com a Inglaterra. Nas três primeiras questões, os interesses do Brasil foram defendidos pelo Barão de Rio Branco.

Como já falamos para você na aula sete, a questão de Palmas envolveu o Brasil em uma disputa territorial com a Argentina, entre 1890 -1895. Nela, a Argentina reivindicava a porção oeste dos atuais Estados do Paraná e de Santa Catarina, pretendendo estabelecer a fronteira nos rios Chapecó e Chopim. Segundo a Argentina, esse traçado da fronteira tinha como base o Tratado de Madri. Por outro lado, o Brasil pretendia fi xar os limites nos rios Pipiri-Guaçu e Santo Antônio. Pouco tempo antes da proclamação da República, os dois países em litígio decidiram que a questão seria resolvida através do arbitramento internacional. Pelo resolvido, Quintino Bocaiúva (Ministro das relações Exteriores do Governo Provisório), assinou, em 1890, o Tratado de Montevidéu, que dividia a área em disputa entre os dois países. Contudo, essa decisão não foi ratifi cada pelo Congresso Nacional Brasileiro. Nesses termos, a questão foi submetida ao arbitramento do presidente dos Estados Unidos Grover Cleveland. Nessa questão, atuou como defensor do Brasil o Barão de Rio Branco, que expôs ao presidente

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Cleveland os argumentos brasileiros fundamentados em vasta e valiosa documentação reunida em seis volumes denominados de “A questão de limite entre o Brasil e a República Argentina”. O resultado do arbitramento foi inteiramente favorável ao Brasil, estabelecendo que a fronteira entre os dois países devesse passar no lugar que o Brasil defendia e declarando pertencer a esse país os 35.431 Km2 em litígio (Ver Mapa 06 - A questão de Palmas).

Mapa 06 - A questão de Palmas

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A questão do Amapá envolveu o Brasil em uma disputa territorial com a França. A área em litígio corresponde atualmente a quase a metade do território do Estado do Amapá. Por decisão entre ambos, França e Brasil decidiram submeter a questão à arbitragem. O Governo brasileiro nomeou para representá-lo frente ao presidente Walter Hauser (o árbitro da questão), da Suíça, o Barão de Rio Branco. Mais uma vez os argumentos brasileiros prevaleceram. A decisão de 1900 confi rmou a fronteira entre o Brasil e a Guina Francesa no rio Oiapoque e acrescentou aproximadamente 261.540 km2 ao Brasil, que, assim expandiu pacifi camente suas fronteiras no norte e assegurou para o Barão de Rio Branco uma posição de destaque na diplomacia internacional (PEREGALLI, 1882, p. 79) (Ver Mapa 07 - A questão do Amapá)

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Mapa 07 - A questão do AmapáFo

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A questão do Acre foi outro capítulo da história da formação territorial do Brasil que se passou durante os primeiros anos da República Velha. O território acreano, que pertencia à Bolívia, foi ocupado por seringueiros oriundos do Nordeste brasileiro, apoiados por seringalistas amazonenses, durante o boom da borracha. As escaramuças entre brasileiros e bolivianos se tornaram então constantes e inevitáveis. No transcurso dos acontecimentos, os brasileiros, liderados por Luis Galvez, chegaram a proclamar uma efêmera independência acreana, em 1899. O Governo boliviano, sem condições econômicas e militares para fazer frente à presença de brasileiros nos seringais do Acre, especialmente nos altamente produtivos localizados na bacia do rio Acre, entregou, em concessão, a exploração do Acre a Bolivian Syndicare, um consórcio estadunidense, que teria amplos poderes para administrar o território em questão. Isso foi o estopim para a revolta militar dos seringueiros brasileiros comandados pelo gaúcho Plácido de Castro, que defendia o direito de posse da terra dos brasileiros por estarem eles há muito tempo na área explorando a borracha. Por outro lado, o Governo boliviano mobilizou suas tropas em virtude do confl ito. Diante da iminência da defl agração

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do confl ito, o Governo brasileiro, representado pelo diplomata Barão de Rio Branco, iniciou difíceis negociações com o Governo boliviano. As negociações levaram alguns meses e o desfecho da questão do Acre aconteceu no dia 17 de novembro de 1903, quando foi assinado o Tratado de Petrópolis estabelecendo os limites entre os dois países. A área contestada terminou fi cando sob a soberania brasileira - aproximadamente 189.000 Km2 - e como recompensa a Bolívia recebeu dois milhões de libras esterlinas, pequenas compensações territoriais que lhe deram acesso ao rio Madeira e a promessa da construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré. O consórcio estadunidense Bolivian Syndicate, que houvera arredado a área junto ao Governo boliviano, recebeu do Governo brasileiro uma indenização de 114.000 libras esterlinas (Ver Mapa 08 – A questão do Acre).

Mapa 08 – A questão do Acre

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A resolução da questão do Acre é reconhecida como a mais importante obra diplomática do Barão de Rio Branco, que, por isso, empresta o seu nome à capital daquele território, hoje Estado do Acre. Contudo, se para o Brasil esse diplomata representou um expoente na condução das suas questões territoriais na América do Sul, para os países que tiveram litígios de fronteiras com o Brasil, o referido diplomata era a mais perfeita encarnação da geopolítica imperialista brasileira.

A questão dos Campos de Pirara envolveu o Brasil e a Inglaterra. No século XIX acentuou-se a presença inglesa na fronteira com Roraima, a pretexto da indefi nição de fronteiras e de proteção aos missionários britânicos envolvidos com a catequese de populações indígenas. A questão do Brasil com a atual Guiana (então uma possessão colonial da Inglaterra) foi solucionada através da arbitragem do rei Vitor Emanuel III da Itália. O laudo arbitral do rei Vitor Emanuel dividiu os 22.000 Km2 da área em litígio entre o Brasil (9.065 Km2) e os ingleses (12.950 Km2). Nessa contenda territorial atuou na defesa do Brasil o pernambucano Joaquim Nabuco (Ver Mapa 09 – A questão do Pirara).

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Mapa 09 – A questão do Pirara

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Essa questão encerrou, praticamente, o uso das arbitragens internacionais para a resolução das questões de fronteiras do Brasil com os seus vizinhos sul-americanos. Conforme observa Peregalli (1982, p. 92), durante o restante do período em que comandou as relações exteriores do Brasil, o Barão de Rio Branco não recorreu mais as arbitragens internacionais.

Os últimos acordos sobre as fronteira do Brasil com os seus vizinhos sul-americanos foram fi rmados entre 1904-1909. Em 1905 foi fi rmado o acordo que demarcou o restante das nossas fronteiras com a Venezuela. Em 1906, o restante das questões fronteiriças com o Suriname foi elucidado. Ainda na Amazônia, Rio Branco defi niu o complexo segmento de limites com a Colômbia, fi rmando um tratado básico me 1907, que seria confi rmado em 1928, e assegurou a soberania brasileira sobre a região da cabeça do cachorro. Em 1909, o Brasil, através de acordo direto, defi niu 1.546 km de linha de fronteira com o Peru, nesse acordo o Brasil teve 163.000 Km2 de terra reconhecidos como seu (Ver Mapa 10 – As fronteiras brasileiras atuas estabelecidas na Primeira República).

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Mapa 10 – As fronteiras brasileiras atuas estabelecidas na Primeira República

O Brasil, para fi xar a maioria dessas fronteiras, como na época do Império, usou o velho princípio português para a apropriação de um território: a terra pertence a quem a coloniza de fato (utis possidetis). Ademais, a mitologia territorial que atribuía um fundamento natural para as fronteiras brasileiras, segundo a qual os cursos dos rios Uruguai, Paraguai e Guaporé e a bacia amazônica confi guravam uma “ilha brasileira”, circunscrita pela natureza, mitologia essa originada desde a transferência da Corte portuguesa para o Rio de Janeiro (1808), transformou-se na diretriz da política de fronteiras do Brasil Imperial e na era Rio Branco. Esse mito territorial exprimia a idéia de uma origem natural do próprio Brasil e acabou por refl etir os contornos das fronteiras brasileiras com razoável precisão (MAGNOLI, 1997). Não obstante, os acidentes físicos, notadamente os cursos dos rios, foram, também, na República Velha, bastante utilizados para estabelecer os marcos das nossas fronteiras. Todavia, como bem nos lembra Magnoli (1997), nossas fronteiras não foram obra na natureza, mas produto da política e da história.

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Como observa Peregalli (1982, p. 17), as negociações para a fi xação das fronteiras durante a Primeira República possibilitou ao Brasil incorporar uma área de 638.036 Km2 ao seu território.

Assim, as últimas linhas-limites do Brasil com os países vizinhos na América do Sul foram estabelecidas na Primeira República, dando os últimos contornos à sua confi guração territorial atual.

Vamos refl etir sobre o que acabamos de conversar?

Observe e analise o mapa 10 mostrado na aula, e responda.

Quais foram as linhas-limites do Brasil com os países vizinhos demarcadas na Primeira República? Quais foram os marcos utilizados preferencialmente e a qual conceito de fronteira eles nos remetem?

Quais foram as grandes questões territoriais do Brasil com os países vizinhos na Primeira República? Explique como essas questões foram  resolvidas.

Quais foram os argumentos usados pela diplomacia brasileira para defender o seu ponto de vista sobre as questões territoriais com os países vizinhos na Primeira República? Explique-os.

O saldo territorial da demarcação das fronteiras com os países vizinhos durante a Primeira República foi favorável ou desfavorável ao Brasil? O que ele revela em termos geopolíticos? Explique suas respostas.

Considerando que o território é um espaço defi nido e delimitado por e a partir de relações de poder, o complemento do estabelecimento das suas fronteiras transformou o espaço brasileiro em território? Justifi que a sua resposta.

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Terminando a nossa conversa

Conforme você pôde perceber, o território brasileiro atual não foi uma dádiva da natureza recebida pelos portugueses e repassada, como herança, para os brasileiros, após a independência. Do seu esboço original precariamente defi nido pelo Tratado

de Tordesilhas, os portugueses trataram, através de diversas estratégias geopolíticas e geoeconômicas, de alargar a extensão desse território, estabelecendo grosseiramente a superfície que o mesmo detém atualmente. Porém, suas fronteiras não foram fi xadas no período colonial, a grande maioria delas foi estabelecida no Império e na Primeira República, através de tratados, acordos e arbitramentos internacionais. A demarcação dessas fronteiras e, conseqüentemente, a anexação de territórios, contribuiu para que o Brasil apresente a confi guração territorial que lhe é peculiar atualmente. Portanto, o território do Brasil não era uma dimensão espacial estabelecida à priori pela natureza e nem suas fronteiras foram todas gestadas no período colonial. Nosso território é produto do desenrolar dos eventos históricos situados entre 1500 e os primeiros anos do período republicano, que envolveu muitas discussões, confl itos, disputas e decisões políticas.

Leituras complementares Sugerimos como leitura importante para o aprofundamento da conversa que tivemos sobre a formação das fronteiras do Brasil:

PEREGALLI, Enrique. Como o Brasil fi cou assim? Formação das fronteiras e tratados de limites. 2 ed. São Paulo: Global Editora, 1982 (História Popular; 9).

Esse livro paradidático aborda a formação das fronteiras brasileiras, destacando a importância que tiveram os acordos diplomáticos, especialmente os tratados assinados entre Portugal e Espanha e, posteriormente, entre o Brasil e os países vizinhos, nessa formação bem como os arbitramentos dos outros países em questões de fronteira do Brasil com seus vizinhos, nos quais nosso país quase sempre levou vantagem.

Vamos aprender nos divertindo?

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Amazônia: de Galvez a Chico Mendes

Minissérie da Rede Globo exibida em 55 capítulos entre os dias 2 de janeiro e 6 de abril de 2007, foi escrita por Glória Perez com pesquisa de Bianca Freire-Medeiros, Giovana Manfredi e Sandra Regina, trilha sonora de Alexandre de Faria, dirigida por Pedro Vasconcelos, Marcelo Travesso, Carlo Milani, Roberto Carminati e Emílio di Biasi com direção geral de Marcos Schechtman.

A minissérie se baseou em dois romances de autores acreanos, O Seringal, de Miguel Ferrante, e Terra Caída, de José Potyaguara, a fi cção começa em 1899 e mostra a vida no seringal sob pontos de vistas diferentes.

A história mostra a conquista do território do Acre no auge da borracha e a decadência dessa atividade com a transformação dos seringais em pastos, e a destruição fl oresta Amazônica. 

A minissérie está disponível em DVD.

ElencoJosé WilkerAlexandre BorgesCássio Gabus MendesChristiane TorloniGiovanna AntonelliVera FischerDébora BlochVanessa Giácomo e grande elenco

Mad Maria

Minissérie de Benedito Ruy Barbosa com direção de Ricardo Waddington, exibida pela Rede Globo entre 25 de janeiro e 25 de março de 2005 com gravações na região amazônica. Foi baseada na obra homônima de Márcio de Souza e retrata a feitura da estrada de ferro Madeira-Mamoré, em 1912.

A história abordas questões como a dura rotina dos operários na frente de trabalho em plena selva amazônica, os bastidores do poder na capital da República, no início do século XX, e o drama das populações indígenas em extermínio.

ElencoFábio AssunçãoAna Paula ArósioFidelis BaniwaJuca de OliveiraAntônio FagundesCássia KissPriscila FantinTony RamosCláudia RaiaWalmor Chagas e grande elenco

A minissérie está disponível em DVD.

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Resumo

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AutoavaliaçãoObserve os mapas 04, 05 e 10 mostrados na aula para responder as questões abaixo.

Explique a seguinte afi rmação: As fronteiras brasileiras não foram obra da natureza como atribuía o mito territorial da “ilha Brasil”, mas produto da política e da história (MAGNOLI, 1997).

Nesta aula, você teve oportunidade de aprender que: a) o primeiro esboço do atual território brasileiro foi defi nido pelo Tratado de Tordesilhas; b) durante o período da União Ibérica, os portugueses trataram de alargar esse território, através das entradas, das bandeiras, das missões religiosas etc.; c) essa expansão, assomada à necessidade portuguesa em estabelecer os limites da sua colônia e ao contexto europeu de discussões sobre as relações entre limites e fronteiras, corroboraram para as primeiras tentativas dos portugueses em estabelecer os limites de suas possessões coloniais na América do Sul; d) as tentativas para estabelecer os limites entre as possessões portuguesas e espanholas na América do Sul foram feitas através de Tratados (Madri e Santo Ildefonso, por exemplo); e) apesar dessas tentativas, apenas 17% das fronteiras brasileiras atuais foram fi xadas no período colonial; f) no período imperial foram fi xados cerca de 50% e na Primeira República cerca de um terço das fronteiras brasileiras atuais; g) o estabelecimento dessas fronteiras foi feito através de tratados, acordos diplomáticos e arbitragens internacionais (Primeira República); h) na Primeira República foram solucionadas questões territoriais como as de Palmas, do Amapá, do Acre, dos Campos de Pirara e da região da cabeça do cachorro; exceto no estabelecimento das fronteiras com o Paraguai e no caso do Acre, i) o processo de fi xação das fronteiras brasileiras atuais foi pacífi co, realizando-se mais no campo da diplomacia, no qual teve destaque a atuação do Barão de Rio Branco, no começo da Primeira República; j) na fi xação das fronteiras atuais do Brasil predominou o princípio do utis possidetis; l) tanto no Império quanto na “era” de Rio Branco a diplomacia brasileira atuou movida pela concepção de fronteira natural do território brasileiro; m) a fi xação das fronteiras no Império e na Primeira República alargou consideravelmente o território e revelou a geopolítica expansionista do Brasil na América do Sul; n) por fi m, nossas fronteiras atuais não são naturas, mas produto da história e da política.

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Analise os seguimentos de fronteiras fi xados nos períodos colonial, imperial e republicano. Explique como agiram as diplomacias portuguesas e brasileiras para fi xarem essas fronteiras.

Analise os efeitos da demarcação das fronteiras para a formação do atual território brasileiro.

Referências BECKER, Bertha; EGLER, Claudio. Brasil: uma potência regional na economia-mundo. 4. Ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003 (Coleção Geografi a).

MACHADO, Lia Osório. Limites e fronteiras: da alta diplomacia aos circuitos da ilegalidade. Disponível em http://acd.ufrj.br/fronteiras/pesquisa/fronteira/p02pub02.htm. Acesso em 12/01/2009.

MAGNOLI, Demétrio. O corpo da pátria: imaginação geográfi ca e política externa no Brasil (1808-1912). São Paulo: Editora da UNESP: Moderna, 1997 (Biblioteca Básica).

PEREGALLI, Enrique. Como o Brasil fi cou assim? Formação das fronteiras e tratados de limites. 2 ed. São Paulo: Global Editora, 1982 (História Popular; 9).

PRADO JÚNIOR, Caio. História econômica do Brasil. 35 ed. São Paulo: Editora Brasiliense,  1987.

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Anotações

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AULAS

01 Sobre o território brasileiro: como teorizar a sua formação à luz dos conceitos da Geografi a

02 A territorialização ibérica do mundo e a expansão do capitalismo na sua fase embrionária

03 A chegada dos portugueses ao continente americano: do “descobrimento” às primeiras formas de territorialização do colonizador português no Brasil (as feitorias)

04 A territorialização de fato do colonizador português: as capitanias hereditárias e a plantation açucareira

05 A penetração da colonização para o interior: entradas e bandeiras alargam o território colonial e transformam o Tratado de Tordesilhas em “letra morta”

06 A ocupação do Sertão nordestino e da Amazônia

07 A mineração e agricultura alimentar na ocupação do Brasil Central

08 A ocupação antiga do Brasil Meridional

09 A ocupação moderna e defi nitiva do Sul

10 O “arquipélago” de “ilhas” econômicas do Império e da Primeira República

11 A Primeira República e a consolidação das fronteiras

12 Do arquipélago de “ilhas” econômicas à integração do território

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EMENTA

> Antonio Albuquerque da Costa

> Paulo Sérgio Cunha Farias

Formação territorial e econômica; federalismo e fragmentação territorial; desenvolvimento das forças produtivas e dinâmica

territorial; o brasil no contexto da economia globalizada e a divisão territorial do trabalho.

Formação Territorial do Brasil – GEOGRAFIA

AUTORES

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