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8/13/2019 Dissertacao a Eficacia e a Efetividade Dos Direitos Sociais de Carater Prestacional Em Busca Da Superacao Dos Ob
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Universidade de Braslia UnB
MARCELO REBELLO PINHEIRO
A EFICCIA E A EFETIVIDADE DOS
DIREITOS SOCIAIS DE CARTER
PRESTACIONAL: em busca da superao
dos obstculos
BRASLIA2008
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MARCELO REBELLO PINHEIRO
A EFICCIA E A EFETIVIDADE DOS
DIREITOS SOCIAIS DE CARTER
PRESTACIONAL: em busca da superao
dos obstculos
Dissertao apresentada noCurso de Ps-Graduao emDireito da Universidade deBraslia UnB, como requisitoparcial obteno do grau deMestre
Prof. Orientador:Gilmar Ferreira Mendes
BRASLIA2008
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MARCELO REBELLO PINHEIRO
A EFICCIA E A EFETIVIDADE DOS
DIREITOS SOCIAIS DE CARTER
PRESTACIONAL: em busca da superao
dos obstculos
Dissertao aprovada comorequisito parcial para obtenodo grau de Mestre no Curso dePs-Graduao em Direito daUniversidade de Braslia UnB,pela Comisso formada pelos
professores:
ORIENTADOR: Prof. Dr. Gilmar Ferreira Mendes
Prof. Dr. Ela Wiecko Wolkmer de Castilho
Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet
Prof. Dr. Marcus Faro de Castro
BRASLIA2008
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Dedico este trabalho minhaesposa Denise, nossa queridafilha Beatriz e aos meus pais,Francisco Renato e TerezaCristina.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo, inicialmente, minha querida esposa Denise pelo auxlio
permanente, pelo carinho, pela pacincia e pelo companheirismo.
Pelo sorriso lindo e cativante, agradeo minha filha Beatriz.
Pelo suporte material e amor incondicional, agradeo aos meus pais
Francisco Renato e Tereza Cristina.
Pelo exemplo profissional a ser seguido, agradeo ao meu irmo
Francisco Renato Filho.
Pela orientao precisa e pelas observaes percucientes, agradeo
ao Professor Doutor Gilmar Ferreira Mendes.
Pelas aulas memorveis e pelos debates enriquecedores, agradeo
aos Professores Doutores Cristiano Paixo, Mrcio Irio, Marcus Faro de
Castro e Menelick de Carvalho Netto.
Pelo incentivo e, principalmente, pela licena a mim concedida,
agradeo ao Tribunal Regional Federal da 1 Regio, na pessoa da
Desembargadora Federal Presidente Assusete Magalhes.
Pelo apoio e cooperao, agradeo aos amigos Bruno, Marana,
Mrcio, Paloma e Paulo Jos.
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RESUMO
O presente trabalho examina os principais obstculos erigidos eficcia e efetividade dos direitos sociais de cunho prestacional, comdestaque especial para os seguintes: o contedo aberto e indeterminado dospreceitos constitucionais que prevem direitos sociais; a clusula da reserva dofinanceiramente possvel e a falta de legitimidade democrtica dos juzes.Defende-se que as normas que consagram os direitos sociais devem sercompreendidas como princpios, os quais devem ser realizados na maiormedida possvel dentro das limitaes jurdicas e fticas do caso concreto.Sustenta-se, ainda, que a alegao estatal de escassez de recursos pblicos
deve ser rigorosamente apurada pelo magistrado, de modo que possadistinguir a natureza da escassez, a qual poder ser absoluta ou relativa. Porderradeiro, admite-se que a interveno do Poder Judicirio deve ser a mnimanecessria e desde que comprovado por dados da realidade (reserva deconsistncia) que os poderes polticos se omitiram ou falharam naimplementao dos direitos sociais.
Palavras-chave: direitos sociais eficcia efetividade princpios reservado possvel legitimao democrtica dos juzes reserva de consistncia.
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ABSTRACT
The present paper examines the main hindrances for the efficacyand effectiveness of social rights, focusing mainly on the following: the openand indeterminate content of constitutional precepts that foresee social rights;the clause related to reservation of what is financially possible and the lack ofdemocratic legimitacy of judges. It is defended that the norms that consecratethe social rights should be understood as principles that should be executedwithin the juridical and factual limits of the concrete case. It is also said that thestate allegation of public resources scarcity should be rigorously checked by the
magistrate, in order to distinguish the nature of such scarcity, which may beabsolute or relative. Lastly, it is admitted that the intervention of the JudiciaryPower should be the minimum necessary, and proved by data from reality(consistency reserve) that the political powers have omitted themselves orhave failed on the implementation of social rights.
Key words: social rights efficacy effectiveness principles reservation ofpossible democratic legimitacy of judges consistency reserve.
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADI Ao Direta de InconstitucionalidadeADPF Argio de Descumprimento de Preceito Fundamental
AJURIS Revista da Associao dos Juzes do Rio Grande do Sul
AMS Apelao em Mandado de Segurana
APC Apelao Cvel
apud citado por
art. artigo
arts. artigos
BNDES Banco Nacional do Desenvolvimento Econmico e Social
BVerfGE Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts, amtliche
Sammlung Decises do Tribunal Constitucional Federal,
Coletnea Oficial
CDESC Comit da ONU sobre Direitos Econmicos, Sociais e
Culturais
CF Constituio Federal
CONASS Conselho Nacional de Secretrios de Sade
Des. Desembargador
DJ Dirio de Justia
DJU Dirio de Justia da Unio
EC Emenda Constitucional
IDH ndice de Desenvolvimento Humano
inc. inciso
INSS Instituto Nacional de Seguridade Social
LOAS Lei Orgnica da Assistncia Social
Min. Ministro
ONU Organizao das Naes Unidas
p. pgina
PCDT Protocolos Clnicos e Diretrizes Teraputicas
PET Petio
PIB Produto Interno Bruto
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PIDESC Pacto Internacional sobre Direitos Econmicos, Sociais e
Culturais
pp. pginas
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
RDH Relatrio de Desenvolvimento Humano
RE Recurso Extraordinrio
Rel. Relator
RESP Recurso Especial
RMS Recurso Ordinrio em Mandado de Segurana
ss. seguintes
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justia
TJDFT Tribunal de Justia do Distrito Federal e Territrios
TJRS Tribunal de Justia do Estado do Rio Grande do Sul
TJSC Tribunal de Justia do Estado de Santa Catarina
TJSP Tribunal de Justia do Estado de So Paulo
TRF Tribunal Regional Federal
UnB Universidade de Braslia
vol. volume
vs. versus
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SUMRIO
INTRODUO ................................................................ .................................... 16
CAPTULO I
ELEMENTOS DA TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ............ 20
1.1 Consideraes Gerais ....................................................................... 20
1.2 Identificao Formal e Material dos Direitos Fundamentais .............. 21
1.3 Classificao dos Direitos Fundamentais .......................................... 23
1.3.1 Direitos de Defesa e Direitos a Prestaes ............................ 23
1.3.1.1 Direitos a Prestaes em Sentido Amplo .................... 26
1.3.1.1.1 Direitos de Proteo ........................................ 26
1.3.1.1.2 Direitos Organizao e ao Procedimento ..... 28
1.3.1.2 Direito Originrios e Derivados a Prestaes .............. 29
1.3.2 Direitos Positivos e Negativos ................................................ 30
1.4 Perspectivas Subjetiva e Objetiva dos Direitos Fundamentais .......... 33
1.5 Regras e Princpios ................................................................ ............ 34
1.6 Princpio da Proporcionalidade .......................................................... 42
1.6.1 Consideraes Preliminares ................................................... 42
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2.2 Influncias do Neoliberalismo e da Globalizao na Realizao dos
Direitos Sociais............ ................................................................ ......................... 65
2.3 Dirigismo Constitucional .................................................................... 72
2.4 Direitos Fundamentais Sociais na Constituio Federal de 1988 ...... 76
2.5 A Fundamentalidade dos Direitos Sociais................................ ........... 79
2.6 Princpio da Dignidade da Pessoa Humana e o Mnimo Existencial .. 81
2.6.1 Consideraes Preliminares ................................................... 81
2.6.2 Tentativa de Delimitao do Contedo do Mnimo
Existencial ................................................................ .......................... 83
2.7 Da Proibio do Retrocesso Social ................................................... 86
2.8 Eficcia e Efetividade dos Direitos Fundamentais Sociais de Carter
Prestacional ................................................................................................ 93
2.8.1 Consideraes Preliminares ................................................... 93
2.8.2 Significado e Alcance do art. 5, 1, da Constituio
Federal .............................................................................................. 96
2.8.3 Identificao dos Principais Obstculos Eficcia e
Efetividade dos Direitos Sociais Prestacionais ................................... 99
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CAPTULO III
NATUREZA ABERTA E INDETERMINADA DAS NORMAS
CONSTITUCIONAIS QUE CONSAGRAM DIREITOS FUNDAMENTAIS
SOCIAIS PRESTACIONAIS ............................................................................... 100
3.1 Consideraes Preliminares .............................................................. 100
3.2 A Problemtica da Caracterizao como Normas Meramente
Programticas ............................................................................................. 101
3.3 Geram Direitos Subjetivos? ............................................................... 107
CAPTULO IV
CLUSULA DA RESERVA DO FINANCEIRAMENTE POSSVEL .................. 114
4.1 Consideraes Preliminares .............................................................. 114
4.2 Conceito ............................................................................................. 117
4.3 Origem ................................................................ ............................... 118
4.4 Anlise Jurdica da Escassez de Recursos ...................................... 121
4.5 Hipteses de Mitigao de Aplicao da Clusula da Reserva do
Financeiramente Possvel ................................................................ ........... 126
4.6 Anlise das Correntes Jurisprudenciais ............................................. 130
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CAPTULO V
DA LEGITIMIDADE DO PODER JUDICIRIO................................................... 135
5.1 Consideraes Preliminares .............................................................. 135
5.2 Corrente Procedimentalista ................................................................ 136
5.3 Corrente Substancialista .................................................................... 140
5.4 Os Limites da Interveno do Poder Judicirio diante do
Negligenciamento dos Direitos Fundamentais Sociais de Carter
Prestacional ................................................................................................ 142
CAPTULO VI
DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS DE CARTER PRESTACIONAL:
ESPCIES ......................................................................................................... 156
6.1 Direito Sade .................................................................................. 156
6.2 Direito Educao ............................................................................. 162
6.3 Direito Assistncia Social ................................................................ 166
6.4 Direito Moradia ................................................................................ 168
CAPTULO VII
EFICCIA E EFETIVIDADE DOS DIREITOS SOCIAIS PRESTACIONAIS NO
DIREITO COMPARADO..................................................................................... 172
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7.1 Consideraes Gerais ....................................................................... 172
7.2 Estados Unidos .................................................................................. 172
7.3 frica do Sul ................................................................ ....................... 177
CONCLUSO..................... ................................................................ ................. 181
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ................................................................ ... 187
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INTRODUO
A presente dissertao tem como foco primordial o estudo a respeito da
eficcia e da efetividade dos direitos fundamentais sociais em sua dimenso
prestacional, com maior nfase nos direitos sade, educao, assistncia social e
moradia. Desse modo, o problema especfico a ser enfrentado no trabalho consiste
em apresentar propostas aptas a superar ou amenizar os empecilhos erigidos em
oposio efetivao desses direitos.
O tema provoca muitas controvrsias na doutrina e tambm najurisprudncia. De fato, o assunto complexo, pois no se exige apenas solues de
natureza jurdica, haja vista que a efetividade (eficcia social) dos direitos fundamentais
sociais acarretar repercusses tambm nas esferas da economia e da poltica.
Podemos antecipar, desde j, que tais conseqncias de origens no-jurdicas que
tornam o objeto da pesquisa ainda mais polmico e rido.
Frise-se, por outro lado, que o estudo realizado no teve a pretenso de
atribuir uma soluo definitiva acerca de tal problema de tamanha magnitude, mas sim
a de trazer uma contribuio a este importante debate que tem sido travado no mbito
dos poderes constitudos do Estado.
Quanto ao aspecto normativo-constitucional, notrio que o Constituinte de
1988 foi generoso ao prever um extenso rol de direitos sociais. Contudo, as normas
constitucionais que consagram tais direitos apresentam, em sua maioria, natureza
aberta e indeterminada, suscitando, na doutrina, dissenso no que diz respeito ao grau
de eficcia de tais preceitos. A partir disso, exsurge o questionamento se as referidas
normas teriam o condo de gerar direitos subjetivos, ou, melhor dizendo, se osindivduos poderiam exigir em juzo a realizao destes direitos sociais quando
negligenciados pelo Estado.
Os pontos acima aludidos iro merecer percuciente reflexo, mormente no
que se refere natureza de tais normas fundamentais. Desse modo, ser
imprescindvel o exame dessas a fim de se apurar se elas revelam a qualidade de
princpios ou de regras. Estas importantes questes sero enfrentadas com o suporte
doutrinrio fornecido por Robert Alexy, sobretudo quanto sua compreenso dos
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princpios como normas jurdicas aplicveis dentro das possibilidades fticas e jurdicas
do caso concreto.No tocante s conseqncias econmicas advindas do cumprimento dos
direitos fundamentais sociais, ser indispensvel uma anlise cuidadosa da to
controvertida clusula da reserva do financeiramente possvel. Pode-se dizer que tal
tpico o mais intrincado, uma vez que trata da escassez dos recursos financeiros em
confronto com a necessidade de se executar polticas sociais eficazes.
Outro ponto que deve ser obrigatoriamente abordado diz respeito ao papel
do Poder Judicirio em tal contexto. Assim, poderia um magistrado, que no tem
legitimidade democrtica conferida pelo voto popular, interferir na formulao e
execuo das polticas pblicas de responsabilidade dos Poderes Executivo e
Legislativo? A indagao exposta, a qual ser amplamente discutida mais frente,
constitui uma celeuma que tem merecido reflexes por vrios pases, tanto os j
desenvolvidos, como aqueles ainda em processo de desenvolvimento, como o Brasil.
Tais temas acima alinhavados iro demandar um exame denso da complexa relao
entre o Direito e a Poltica.
Portanto, em breve sntese, estas so as principais questes que seroexploradas no decorrer da exposio. Vejamos, a seguir, a forma adotada para
estruturar a dissertao.
Para se atingir o objetivo principal do trabalho, indispensvel abordar
preambularmente alguns elementos alusivos teoria geral dos direitos fundamentais,
tais como: a identificao formal e material, a classificao, as perspectivas subjetiva e
objetiva, a distino entre regras e princpios, o princpio da proporcionalidade, as
restries aos direitos fundamentais, o ncleo essencial e outras questes preliminaresrelevantes.
No segundo captulo, sero aprofundados alguns aspectos diretamente
relacionados aos direitos fundamentais sociais, como, por exemplo, a crise do Estado
Social, o mnimo existencial, o significado e alcance da norma inserta no art. 5, 1, da
Constituio Federal, o princpio da proibio do retrocesso social e outros pertinentes.
No transcorrer da dissertao, sero identificados e enfrentados os principais
bices erguidos em face da efetivao dos direitos fundamentais sociais prestacionais.
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No stimo captulo, ser relatado como a questo referente eficcia e
efetividade dos direitos fundamentais sociais prestacionais tem sido abordada nombito do Direito Comparado, com destaque para os Estados Unidos e a frica do Sul.
Por derradeiro, sero apresentadas as principais concluses extradas do
presente trabalho.
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1 ELEMENTOS DA TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
1.1 Consideraes Gerais
Desde o final do sculo XVIII, os direitos fundamentais vm se solidificando
nos regimes democrticos, de modo que, atualmente, alcanamos uma cultura de
respeito a tais direitos, ao menos em relao queles que exigem exclusivamente uma
absteno por parte do Estado. Todavia, no que tange aos direitos fundamentais que
impem um dever positivo ao Estado, pode-se dizer que h ainda uma mirade de
deficincias quanto sua consolidao, sobretudo naqueles pases de baixo nvel de
desenvolvimento econmico1.
Portanto, a partir do reconhecimento dos direitos naturais do homem nas
constituies dos Estados soberanos - processo encetado a partir do sculo XVIII -, os
direitos fundamentais vm atingindo um grau de autoridade cada vez maior, inclusivecom reconhecimento internacional (v.g.: a Declarao da ONU de 1948).
Quanto Constituio Brasileira de 1988, ntida a especial importncia
conferida aos direitos fundamentais, considerando que o catlogo de tais direitos foi
inserido logo no incio do texto, diferentemente das outras constituies brasileiras 2.
relevante observar, ainda, que a Constituio Federal de 1988, erigida sob
uma ordem democrtica, foi o resultado de uma assemblia constituinte de carter
claramente heterogneo, a qual buscou abrigar postulaes de vrias camadas dapopulao, de modo que acolheu de forma ampla, mas no absoluta, a liberdade de
iniciativa dos cidados e empresas e, ao mesmo tempo, consignou uma srie de
direitos sociais, inclusive os direitos a prestaes estatais.
1 Este ponto especfico ser tratado com maior profundidade no prximo captulo.2 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev. e ampl.So Paulo: Saraiva, 2006, p. 01.
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Assim, na viso de Gomes Canotilho e Vital Moreira, a Constituio Federal
de 1988 foi estruturada de forma compreensiva, de modo a conciliar os valores doEstado Liberal e do Estado Social3.
1.2 - Identificao Formal e Material dos Direitos Fundamentais
A identificao dos direitos fundamentais, tanto sob o aspecto formal quanto
material, revela-se indispensvel ao desenvolvimento do trabalho, na medida em que a
caracterizao da fundamentalidade de determinado direito implica importantesconseqncias jurdicas, tais como a aplicabilidade imediata do direito (art. 5, 1, da
CF) e a proteo em face do Poder Constituinte Derivado (art. 60, 4, inc. IV, da CF).
Quanto identificao de um direito como fundamental, sob o ponto de vista
formal, Paulo Bonavides apresentou dois critrios elaborados por Carl Schmitt:
Pelo primeiro, podem ser designados por direitos fundamentais todos os direitosou garantias nomeados e especificados no instrumento constitucional.
Pelo segundo, to formal quanto o primeiro, os direitos fundamentais soaqueles direitos que receberam da Constituio um grau mais elevado degarantia ou de segurana; ou so imutveis (unabaenderliche) ou pelo menosde mudana dificultada (erschwert), a saber, direitos unicamente alterveismediante lei de emenda Constituio4.
Embora seja relevante a identificao dos direitos fundamentais sob o
aspecto formal, vlido lembrar, na esteira de Ingo Sarlet, que tal critrio no permite
uma inteira identificao dos direitos fundamentais previstos na Constituio de 1988,
pois, como cedio, nossa Constituio previu uma srie de direitos fundamentais fora
do catlogo expresso do Ttulo II, como, por exemplo, os direitos fundamentais sociaisdescritos no ttulo da Ordem Social5.
3 CANOTILHO, Jos Joaquim Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituio. Coimbra:Coimbra, 1991, p. 105.4 BONAVIDES, Paulo.Curso de Direito Constitucional. 6. ed. So Paulo: Malheiros, 1996, p. 515.5 SARLET, Ingo Wolfgang, A Eficcia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006, pp. 89-90.
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Por isto, em relao aos direitos no previstos no rol do ttulo II do texto
constitucional, ser indispensvel a utilizao de critrios materiais para identifificar osdispositivos que desnudam a natureza de direito fundamental.
Quando a Constituio Federal de 1988, no 2 do art. 5, admite como
direitos fundamentais outros direitos decorrentes do regime e dos princpios por ela
adotados, podemos inferir que o princpio da dignidade da pessoa humana se
apresenta como um importante parmetro material de identificao de direitos
fundamentais.
Registre-se que boa parte da doutrina reconhece o princpio da dignidade da
pessoa humana como um relevante critrio material para identificao dos direitos
fundamentais. Neste sentido, Paulo Gustavo Gonet Branco sustenta que os direitos e
garantias fundamentais, em sentido material, so, pois, pretenses que, em cada
momento histrico, se descobrem a partir da perspectiva do valor da dignidade da
pessoa humana6.
Na acepo de Jos Carlos Vieira de Andrade, os direitos fundamentais, no
aspecto material, seriam aqueles identificados com o princpio da dignidade da pessoa
humana que atribussem aos indivduos direitos subjetivos e que tivessem a funoprotetora de determinados bens jurdicos individuais ou coletivos7. Assim, o autor
lusitano, malgrado admita o princpio da dignidade da pessoa humana como critrio
material de reconhecimento dos direitos fundamentais, acaba, no entanto, por restringir
demasiadamente o conceito material dos direitos fundamentais, visto que limita a sua
caracterizao concepo de direito subjetivo exigvel.
No que se reporta identificao dos direitos fundamentais sociais tema
sobre o qual incide nosso estudo , relevante notar que a dignidade da pessoahumana tambm considerada como um importante elemento que atribui
fundamentalidade material a tais direitos.
6 BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.Curso de Direito Constitucional. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 336.7 ANDRADE, Jos Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituio Portuguesa de 1976. 3.ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2004, pp. 82-83.
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1.3 - Classificao dos Direitos Fundamentais
1.3.1 Direitos de Defesa e Direitos a Prestaes
Seguindo a orientao de Canotilho e Alexy, podemos classificar os direitos
fundamentais em dois grandes grupos: os que esto na condio de direitos de defesa
e aqueles tidos como direitos a prestaes.
Estes ltimos ainda podem ser desdobrados em dois subgrupos: direitos a
prestaes em sentido amplo, incluindo os direitos proteo e os direitos participao na organizao e procedimento; e os direitos a prestaes em sentido
estrito.
Os direitos fundamentais de defesa, por sua vez, geram uma obrigao para
o Estado de se abster, ou seja, implicam numa postura de natureza negativa do Poder
Pblico. Assim, impe-se ao Estado um dever de absteno em relao liberdade,
intimidade e propriedade do cidado, permitindo-se a interveno estatal apenas em
situaes excepcionais, onde haja, ainda, o pleno atendimento dos requisitos
previamente estabelecidos nas normas. Como exemplo, cite-se a proteo conferida ao
sigilo das comunicaes telefnicas, o qual s poder ser restringido mediante prvia
autorizao judicial e desde que satisfeitas as condies estabelecidas na Lei n
9.296/96.
Dentro da classificao dos quatro status, estabelecida por Jellinek, os
direitos fundamentais de defesa podem ser classificados como status negativus ou
libertatis.
Neste contexto, convm explicitar os principais aspectos da t eoria dos status
formulada por Jellinek. Segundo o autor, deve-se analisar a posio jurdica do
indivduo frente ao Estado. Com isso, Jellinek apresentou quatro statusdo homem na
sua relao com o Estado: passivo,negativo, positivo e o ativo8.
No status passivo, o indivduo encontra-se obrigado ao cumprimento dos
deveres impostos pelo Estado. No statusnegativo ou libertatis, o homem se apresenta
8ApudMENDES, Gilmar Ferreira;COELHO, Inocncio Mrtires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.Curso
de Direito Constitucional. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 245.
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prevem, respectivamente, o direito de associao sindical e o direito greve. Percebe-
se claramente que estes dispositivos constitucionais descrevem direitos sociais que noimplicam em direitos a prestaes, pois, na verdade, se consubstanciam como
verdadeiros direitos de defesa e se qualificam como de natureza negativa, sendo
denominados pela doutrina como liberdades sociais10.
Saliente-se, ainda, que os direitos sociais a prestaes (sade, educao,
assistncia social e moradia) proporcionam aos indivduos o pleno gozo das liberdades,
ou seja, possibilita o que se denomina de liberdade real. Desse modo, vlido
constatar que no adiantaria ter liberdade sem sade para goz-la, ou, ento, sem
alimentao adequada que propicie energia suficiente para usufru-la. A respeito da
liberdade real, Bckenfrde apregoa:
Se a liberdade jurdica deve converter-se em liberdade real, seus titularesnecessitam de uma participao bsica nos bens sociais materiais; e essaparticipao bsica nos bens materiais faz parte da liberdade, dado que umpressuposto necessrio para sua realizao11.
Nesta perspectiva, Cristina Queiroz arremata afirmando que a liberdade no
apenas a ausncia de interferncia ou coaco por parte dos poderes pblicos. tambm a ausncia de dependncia, de tal sorte que um indivduo incapaz de se
auto-governar deve ser considerado um cidado no-livre12.
Fechando este tpico, cumpre-nos deixar claro que no h antagonismo
entre os direitos de defesa e os direitos a prestaes, pois, na verdade, tais direitos se
complementam, visto que os direitos a prestaes propiciam que os cidados desfrutem
a liberdade em sua plenitude. Nesta medida, poder-se-ia dizer que os direitos de defesa
conferem liberdade aos cidados perante o Estado, ao passo que os direitos sociais de
cunho prestacional atribuem liberdade aos cidados atravs do Estado.
10 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficcia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006, p. 229.11 Traduo livre do autor. Texto original: Si la libertad jurdica debe poder convertirse en libertad real,sus titulares precisam de uma participacin bsica em los bienes sociales materiales; incluso estaparticipacin em los bienes materiales es una parte de la libertad, dado que es um presupuesto necesariopara su realizacin. (BCKENFRDE, Ernest-Wolfgang. Escritos sobre Derechos Fundamentales.Traduzido por Juan Luis Requejo Pags e Igncio Villaverde Menndez. Baden-Baden: Nomos Verl.-Ges., 1993, pp. 74-75).12 QUEIROZ, Cristina M. M.Direitos Fundamentais Sociais, Coimbra: Coimbra, 2006, p. 35.
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1.3.1.1 Direitos a Prestaes em Sentido Amplo
Neste subitem, sero abordados de modo superficial os direitos a prestaes
em sentido amplo, apenas no intuito de fornecer uma exata compreenso da
classificao dos direitos fundamentais, pois, na verdade, conforme j dito alhures, o
objeto de estudo especfico est concentrado nos direitos a prestaes em sentido
estrito (prestaes fticas). Quanto a estes direitos, por ser o objeto principal da
presente dissertao, ser dedicada uma anlise percuciente em captulo prprio.
Os direitos a prestaes, consoante j assinalado, no esto limitados s
prestaes sociais (sentido estrito), mas tambm a outras relacionadas aos direitos
proteo e aos direitos participao na organizao e procedimento (direitos a
prestaes em sentido amplo). Nesta perspectiva, Gilmar Ferreira Mendes reala que
as prestaes tanto podem referir-se a prestaes fticas de ndole positiva (faktische
positive Handlungen) quanto a prestaes normativas de ndole positiva (normative
Handlungen)13.
interessante notar que os direitos a prestaes em sentido estrito - que
correspondem s prestaes materiais fticas concedidas aos cidados - so
considerados como verdadeira faceta do Estado Social. J os direitos a prestaes em
sentido amplo, que correspondem ao direito proteo, bem como aos direitos de
participao na organizao e procedimento, so destinados proteo da liberdade e
da igualdade na vertente defensiva, guardando identidade, dessa forma, com o Estado
Liberal.
Veremos, a seguir, os direitos a prestaes em sentido amplo, que so os
direitos de proteo e os direitos de participao na organizao e procedimento.
1.3.1.1.1 Direitos de Proteo
Os direitos de proteo podem ser conceituados como posies jurdicas
fundamentais que atribuem ao cidado o direito de exigir perante o Estado a proteo
de bens jurdicos em face de possveis violaes perpetradas por terceiros.
13 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev. eampl. So Paulo: Saraiva, 2006, pp. 02-03.
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Considerando que o Estado deve zelar pelo resguardo dos direitos
fundamentais dos indivduos, ainda que em carter preventivo, cabe, ento, ao PoderPblico o dever de proteo, que se dar, por exemplo, por meio da aprovao pelo
Parlamento de normas penais incriminadoras14, pela atuao da polcia ostensiva para
coibir crimes, pelo exerccio do poder de polcia estatal com o fim de impedir obras
irregulares que possam prejudicar os demais cidados, alm de vrias outras medidas
protetivas.
Portanto, o direito proteo envolve a atuao positiva do Estado com o fim
especfico de proteger o cidado contra atos de terceiros, incluindo atos de outros
Estados soberanos. Recorde-se, outrossim, que o direito de proteo no abriga
apenas o direito vida e integridade fsica, mas tambm liberdade, propriedade e
honra das pessoas15.
Quanto aos deveres de proteo do Estado, bem observa Gilmar Ferreira
Mendes:
A concepo que identifica os direitos fundamentais como princpios objetivoslegitima a idia de que o Estado se obriga no apenas a observar os direitos de
qualquer indivduo em face das investidas do Poder Pblico (direito fundamentalenquanto direito de proteo ou de defesa Abwehrrecht), mas tambm agarantir os direitos fundamentais contra agresso propiciada por terceiros(Schutzpflicht des Staats).
(...)
A jurisprudncia da Corte Constitucional alem acabou por consolidarentendimento no sentido de que do significado objetivo dos direitosfundamentais resulta o dever do Estado no apenas de se abster de intervir nombito de proteo desses direitos, mas tambm de proteger esses direitoscontra a agresso ensejada por atos de terceiros.
Tal interpretao do Bundesverfassungsgerichtempresta sem dvida uma nova
dimenso aos direitos fundamentais, fazendo com que o Estado evolua daposio de adversrio (Gegner) para uma funo de guardio desses direitos(Grundreschtsfreund oder Grundrechtsgarant)16.
14 QUEIROZ, Cristina M. M.Direitos Fundamentais Sociais, Coimbra: Coimbra Editora, 2006, p. 50.15 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficcia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006, p. 222.16 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev. eampl. So Paulo: Saraiva, 2006, p.11.
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a defesa dos direitos fundamentais, pois o gozo do direito fundamental pode no ser
vivel, ou ento, perder em eficcia, quando no existe ainda a organizao e/ou oprocedimento19.
Em relao aos direitos organizao e ao procedimento, a doutrina tem
elaborado crticas quanto impreciso tcnica de tais termos, no sendo, portanto,
tarefa segura a identificao do objeto dos aludidos direitos, que, como se nota,
apresentam uma notria diversificao20.
Da mesma forma que j discutimos em relao ao dever de proteo do
Estado, aqui se questiona se o particular tem direito subjetivo pblico s prestaes
estatais referentes criao de estruturas administrativas (organizao) e elaborao
de procedimentos. Ou seja, indaga-se se o cidado tem o direito subjetivo de exigir do
Estado a criao ou conformao de determinado rgo pblico ou, ento, o
estabelecimento de normas procedimentais que garantam o acesso justia, com as
devidas garantias processuais-constitucionais.
O tema suscita acirrada controvrsia na doutrina, havendo quem se
manifeste pela possibilidade e tambm outros pela impossibilidade. No entanto, o
Tribunal Federal Constitucional Alemo tem declarado a impossibilidade dereconhecimento de direitos subjetivos a prestaes jurdicas em face do legislador21.
Conforme j mencionado, esta questo especfica no ser objeto de maior
reflexo, uma vez que extrapola o objetivo proposto na dissertao.
1.3.1.2 Direitos Originrios e Derivados a Prestaes
Os direitos a prestaes podem ser classificados tambm em derivados eoriginrios. Estes ltimos decorrem diretamente das normas constitucionais que os
prevem, ou seja, o direito prestao independe de prvia atuao estatal. Sobre o
tema, convm trazer lio de Canotilho, que reconhece a existncia dos direitos
originrios a prestaes quando:
19 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficcia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006, pp. 223-224.20
Idem, ibidem, pp. 224-225.21 Idem, ibidem,p. 228.
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Neste particular, calha citar o entendimento de Stephen Holmes e Cass
Sunstein segundo o qual todos os direitos so positivos. Os autores deixam claro queinclusive os direitos tidos como negativos tambm geram custos ao Estado, conforme j
explicitado acima24.
Os doutrinadores norte-americanos apresentam um exemplo prtico para
corroborar suas afirmaes. Assim, lembram de um grande incndio ocorrido em
Westhampton, em agosto de 1995, em que o direito de propriedade que
reconhecido tradicionalmente como um direito de defesa foi protegido por meio de
prestaes positivas do Estado (Corpo de Bombeiros) que lograram xito em apagar o
fogo e assegurar a integridade do imvel25.
Dentro deste contexto, Flvio Galdino defende que deve ser desconsiderada
a classificao dos direitos fundamentais em positivos e negativos, pois entende que
todos os direitos fundamentais, em ltima anlise, assumem uma dimenso positiva 26.
Pontes de Miranda, por sua vez, afirma que os direitos de liberdade tambm
exigem uma prestao positiva estatal, pois a garantia de efetividade de tais direitos ir
demandar uma tutela jurisdicional27. Neste contexto, no demais lembrar que, para
assegurar o manejo eficaz dos writsconstitucionais, por exemplo, torna-se necessria aalocao especfica de recursos para a manuteno e funcionamento do Poder
Judicirio28. Dessa forma, rompe-se com o tradicional pensamento de que os direitos de
liberdade no geram custos ao Estado.
Deve-se concluir, portanto, que os clssicos direitos de defesa tambm
geram elevados custos ao Estado29, sobretudo se considerarmos, por exemplo, os
gastos com a manuteno e funcionamento do Poder Judicirio, das Polcias em geral,
24 HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. The Cost of Rights: Why Liberty Depends on Taxes. NewYork: Norton & Co., 1999, pp. 35-48.25
Idem, ibidem, pp. 13-14.26 GALDINO, Flvio. O Custo dos Direitos. In: TORRES, Ricardo Lobo (Org.) Legitimao dos DireitosHumanos.Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.182.27 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentrios Constituio de 1967. Tomo IV. SoPaulo: Revista dos Tribunais, 1970, p. 661.28 Segundo estudo realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social - BNDES, ocusto total da funo judiciria no mbito dos Estados representou a cifra de R$ 9,8 bilhes no ano de1999, sendo que, no Judicirio Federal, o valor total foi de R$ 6,5 bilhes. (BNDES. Estados: quantocustam as funes legislativas e judicirias. In: Informe da Secretaria para Assuntos Fiscais do BNDES,Braslia, n 22, 2000, p. 03).29 ABRAMOVICH, Victor; COURTIS, Christian.Los Derechos Sociales como Derechos Exigibles . Madrid:Trotta, 2002, pp. 23-24.
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do Corpo de Bombeiros e outras instituies. Nesta direo, a autora lusitana Cristina
Queiroz afirma que:
Os clssicos direitos de defesa, desde a liberdade de expresso, o direito deacesso ao direito e aos tribunais, at ao direito de voto, requerem, por parte daesfera pblica, no apenas proibies de interferncias dos poderes pblicos,mas ainda obrigaes de prover a numerosas e complexas condiesinstitucionais do respectivo exerccio e garantia30.
Contudo, apesar da pertinente afirmao dos citados autores norte-
americanos, no vislumbramos motivo para desconsiderar por completo tal
classificao. O que realmente parece ser equivocada a compreenso de que os
direitos de defesa no gerariam dispndios ao Poder Pblico.
Embora Ingo Sarlet reconhea a interdependncia entre os direitos
fundamentais de cunho positivo e negativo, continua, por outro lado, defendendo um
dualismo relativo entre os mesmos, considerando a diferena entre o objeto e a funo
de tais direitos e no a sua relevncia econmica. Neste sentido, adverte o autor:
Mesmo assim, se de fato parece inglria a tentativa de advogar uma dicotomia
entre os direitos negativos e positivos (coisa que, alis, nunca fizemos), calcadaestritamente no critrio da sua relevncia econmica (na verdade, critrio darelevncia econmica do objeto da prestao), seguimos convictos de que arelao entre os direitos de cunho negativo e positivo pode, a despeito datambm por ns reconhecida indivisibilidade dos direitos fundamentais, sertraduzida como revelando uma espcie de dualismo relativo, caracterizadoessencialmente por uma diferena de objeto e de funo entre as duasimportantes distines, mas jamais por uma lgica da excluso recproca e doantagonismo31.
Logo, consoante o justificado posicionamento do autor, no h razo para se
ignorar a classificao dos direitos fundamentais em positivos e negativos, desde queno esteja relacionada com os custos para implementao dos direitos.
30 QUEIROZ, Cristina.Direitos Fundamentais Sociais,Coimbra: Coimbra, 2006, p. 07.31 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficcia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006, p. 236.
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1.4 - Perspectivas Subjetiva e Objetiva dos Direitos Fundamentais
Os direitos fundamentais podem ser reconhecidos tanto como direitos
subjetivos dos indivduos quanto como elementos objetivos que devem direcionar as
aes dos poderes pblicos.
Sob a perspectiva subjetiva, os direitos fundamentais outorgam aos
indivduos posies jurdicas exigveis do Estado, ao passo que, na perspectiva
objetiva, os direitos fundamentais representam uma matriz diretiva de todo o
ordenamento jurdico, bem como vinculam atuao do Poder Pblico em todas asesferas. Nesta direo, bem observa Gilmar Ferreira Mendes:
Os direitos fundamentais so, a um s tempo, direitos subjetivos e elementosfundamentais da ordem constitucional objetiva. Enquanto direitos subjetivos, osdireitos fundamentais outorgam aos titulares a possibilidade de impor os seusinteresses em face dos rgos obrigados. Na sua dimenso como elementofundamental da ordem constitucional objetiva, os direitos fundamentais formama base do ordenamento jurdico de um Estado de Direito democrtico32 .
Peres-Lun destaca, com preciso, que os direitos fundamentais passaram a
representar um conjunto de valores objetivos bsicos e fins diretivos da ao positiva
dos Poderes Pblicos, e no somente garantias negativas dos interesses individuais 33.
Na mesma acepo, Ingo Sarlet evoca o importante julgamento do caso
Lth, em que o Tribunal Federal Constitucional Alemo, em 1958, reconheceu que os
direitos fundamentais no se restringem condio de direitos subjetivos dos
indivduos frente ao Estado, mas tambm como decises valorativas que influenciam
todo o ordenamento jurdico e estabelecem diretrizes para a atuao dos Poderes
Pblicos34.
Ao se estabelecer que a dimenso objetiva dos direitos fundamentais se
refere s decises valorativas do Constituinte que vo direcionar o modo de agir de
32 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev. eampl. So Paulo: Saraiva, 2006, p. 02.33 PRES-LUO, Antonio-Enrique. Los Derechos Fundamentales. 6. ed. Madrid: Techos S.A, 1995, pp.20-21, apud SARLET, Ingo Wolfgang. Os Direitos Fundamentais Sociais na Constituio de 1988. In:Revista Dilogo Jurdico, Salvador, CAJ Centro de Atualizao Jurdica, v. 1, n 1, 2001, p. 12.Disponvel em: . Acesso em: 14 de junho de 2007.34 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficcia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006, p. 167.
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toda a comunidade, incluindo os Poderes Pblicos, crvel constatar que tal
perspectiva objetiva constitui elemento de legitimao das restries aos direitosfundamentais na sua dimenso subjetiva, haja vista que o implemento de um direito
fundamental de um indivduo poder afetar direitos e bens jurdicos de toda a
sociedade. Com isso, observa-se que o contedo e o alcance das normas de direitos
fundamentais devero ser considerados no apenas a partir de uma perspectiva
subjetiva do titular do direito, mas tambm em face dos direitos assegurados a todos os
cidados35.
1.5 Regras e Princpios
Passemos, agora, anlise dos aspectos centrais da teoria dos princpios,
os quais sero adotados mais adiante para se enfrentar os problemas alados
discusso pela presente dissertao.
Conforme ressalta Humberto vila, a norma corresponde ao resultado da
interpretao do texto legal, no se igualando ao seu enunciado. Com isso, um
dispositivo legal pode gerar variadas normas em conseqncia da atividade do
exegeta36. Complementa o autor, ainda, que o resultado da interpretao do dispositivo
legal poder apresentar tanto uma regra, quanto um princpio, que so espcies de
normas37.
A respeito da natureza das regras e dos princpios, no podemos olvidar dos
valiosos ensinamentos de Ronald Dworkin. O autor norte-americano, apesar de
sustentar que ambos so modalidades normativas, ressalta, no entanto, a presena de
algumas distines.
Conforme Dworkin, as regras so aplicveis maneira do tudo-ou-nada,
sendo cabvel apenas uma perquirio a respeito da validade ou no da regra. No que
concerne aos princpios, Dworkin enfatiza que estes no funcionam base do tudo-ou-
35 OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficcia dos Direitos Fundamentais Sociais frente Reserva doPossvel. Dissertao de Mestrado. Curitiba: Universidade Federal do Paran, 2006, p. 89.36 VILA, Humberto.Teoria dos Princpios: da definio aplicao dos princpios jurdicos. So Paulo:Malheiros, 2003, p. 22.37 Idem, ibidem, p. 26.
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nada, uma vez que devem ser aplicados conforme uma dimenso de peso ou
importncia38
. Em que pese a diferena acima apontada, o autor deixa claro que tantoas regras quanto os princpios so de aplicao obrigatria e vinculam o juiz39.
Note-se que o carter normativo e vinculativo das regras e dos princpios
tambm foi adotado por Robert Alexy40. Segundo o autor germnico, h uma diferena
de grau e qualidade entre as regras e os princpios. Aquelas s podem ser aplicadas ou
afastadas integralmente (tudo ou nada), ao passo que estes so mandados de
otimizao, ou seja, so normas que devem ser empregadas na maior medida possvel,
dentro das possibilidades jurdicas e fticas do caso concreto41
.Ainda segundo Alexy, algumas regras poderiam deixar de ser aplicadas em
determinados casos concretos em decorrncia de clusulas de exceo, sem, contudo,
deixar de existir no mundo jurdico. A partir desta compreenso, seria possvel,
portanto, estabelecer um conflito entre regras e princpios42.
Para se identificar com clareza a hiptese acima aventada, vejamos o
seguinte exemplo: imaginemos um incndio de grande proporo em uma cidade
pequena, onde existe um efetivo reduzido de bombeiros; neste contexto, consideremos,
ainda, a regra constitucional prevista no art. 7, inc. XIII, da Constituio Federal que
limita a jornada diria de trabalho a oito horas; nesta situao hipottica, seria
plenamente aceitvel estender a jornada de trabalho dos bombeiros alm do limite
previsto na regra constitucional, no intuito de preservar a vida das pessoas daquela
diminuta urbe, bem como os respectivos patrimnios43.
Portanto, tendo em vista o conflito entre a ameaa ao direito vida daquelas
pessoas e o direito limitao da jornada de trabalho, evidente que o primeiro deve
prevalecer nesta situao especfica. Assim, a regra deixar de ser aplicada em face de
38 DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Srio. Traduo de Nelson Boeira. So Paulo: MartinsFontes, 2002, pp. 39-43.39
Idem, ibidem, p. 61.40 ALEXY, Robert. Teoria de Los Derechos Fundamentales. Traduccin de Ernesto Garzn Valds.Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993, p. 83.41
ApudAMORIM, Letcia Balsamo. A distino entre regras e princpios segundo Robert Alexy. Esboose crticas. In: Revista de Informao Legislativa, ano 42, n. 165, Braslia: Subsecretaria de EdiesTcnicas do Senado Federal, jan/mar 2005, pp.125-126.42
Idem, ibidem, pp. 126-127.43 OLSEN, Ana Carolina Lopes, A Eficcia dos Direitos Fundamentais Sociais frente Reserva doPossvel. Dissertao de Mestrado. Curitiba: Universidade Federal do Paran, 2006, p. 60.
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situao peculiar que imponha a preferncia por outro bem ou posio jurdica mais
relevante. importante frisar, todavia, que a regra no perder sua validade, poisapenas deixar de ter aplicao em determinado caso concreto.
Desse modo, vrios autores passaram a ver os direitos fundamentais como
regras e princpios e, a partir da, comea a surgir uma nova escola de direito,
denominada como neoconstitucionalismo ou ps-positivista44.
Na doutrina portuguesa, Canotilho adota as principais idias concebidas por
Alexy no tocante distino entre regras e princpios. Canotilho afirma que os
princpios so normas jurdicas impositivas de uma optimizao, compatveis com
vrios graus de concretizao, consoante os condicionalismos fcticos e jurdicos.
Quanto s regras, ressalta o autor lusitano que no so admitidos graus de efetividade
das mesmas, isto , ou so cumpridas ou violadas45.
Ainda sobre o tema, Ana Paula de Barcellos acrescenta outro critrio
distintivo, o qual tem como parmetro os efeitos engendrados pelas normas. Assim,
segundo a autora, as regras produziriam efeitos determinados, ao passo que os
resultados produzidos pelos princpios teriam um maior grau de indeterminao e
tambm uma variedade de meios para atingir sua concretizao. Contudo, o grau deindeterminao teria um limite, que seria o ncleo duro do princpio, insuscetvel de
ponderao46.
Alexy reconhece, ainda, a possibilidade de coliso entre os princpios, de
modo que um deles dever ceder em favor do outro em face das peculiaridades do
caso concreto.
Note-se que a coliso de princpios deriva justamente da estrutura aberta
que possuem tais normas, sendo que, por conta de tal natureza, podem transmitir umaconsidervel variedade de significados47, que, eventualmente, podem vir a colidir com
44 OLSEN, Ana Carolina Lopes, A Eficcia dos Direitos Fundamentais Sociais frente Reserva doPossvel. Dissertao de Mestrado. Curitiba: Universidade Federal do Paran, 2006, pp. 53-54.45 CANOTILHO, Jos Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituio. 2. ed. Coimbra:Almedina, 1998, p. 1035.46 BARCELLOS, Ana Paula de. A Eficcia Jurdica dos P rincpios Constitucionais. O princpio dadignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, pp. 51-57.47 Cristina Queiroz se refere a uma complexa polivalncia semntica das normas que consagramdireitos fundamentais. (Direitos Fundamentais Sociais,Coimbra: Coimbra, 2006, p. 06).
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os significados trazidos por outros princpios. Nesta perspectiva, Daniel Sarmento
afirma que:
(...) pela prpria estrutura aberta e flexvel dos princpios, que no possuem umcampo de incidncia rigidamente delimitado, torna-se por vezes muito rdua,seno impossvel, a tarefa de estabelecer a priori as fronteiras dos seusmbitos normativos com seus congneres 48.
Portanto, diante de um extenso rol de normas jusfundamentais previstas na
Constituio Federal de 1988, torna-se ineludvel a coliso de princpios que veiculam
direitos fundamentais.
Destarte, considerando a possibilidade de coliso, acolhemos a concepo
de que a restrio efetividade de um princpio s se tornar legtima aps a devida
ponderao com os princpios ou bens jurdicos colidentes, sendo que a
proporcionalidade que poder trazer os contornos seguros da respectiva ponderao.
Ressalte-se que a ponderao guarda relao com o princpio de
hermenutica constitucional da concordncia prtica, que, diante de bens jurdicos em
conflito, procura conciliar os mesmos, com o escopo de evitar o sacrifcio total de uns
em relao aos outros.A tcnica da ponderao ganhou fora no comeo do sculo XX,
constituindo, assim, uma resistncia jurisprudncia dos conceitos. O mtodo foi
desenvolvido a partir de alguns julgamentos proferidos pelo Tribunal Federal
Constitucional da Alemanha, que passou a acolher a idia de ponderao consagrada
pela jurisprudncia dos valores49.
De acordo com Karl Larenz, a ponderao de bens em cada caso um
mtodo de complementao do direito, que visa a solucionar as colises de normas50.
48 SARMENTO, Daniel. Os Princpios Constitucionais e a Ponderao de Bens. In: TORRES, RicardoLobo (Org.) Teoria dos Direitos Fundamentais.2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 39.49 TORRES, Ricardo Lobo. A Legitimao dos Direitos Humanos e os Princpios da Ponderao e daRazoabilidade.In: (Org.). Legitimao dos Direitos Humanos.Rio de Janeiro: Renovar, 2002, pp.421-423.50 LARENZ, Karl. Methodenlehre der Rechtswissenschaft. Berlin: Springer Verlag, 1983, p. 397, apudTORRES, Ricardo Lobo.op. cit., p. 423.
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Neste contexto, Daniel Sarmento deixa assentado que a ponderao de bens
equivale a umatcnica de deciso que, sem perder de vista os aspectos normativos doproblema, atribui especial relevncia s suas dimenses fticas51.
A respeito da ponderao de valores na jurisprudncia do Tribunal Federal
Constitucional Alemo, Gilmar Ferreira Mendes assim leciona:
Ressalte-se, porm, que o Tribunal no se limita a proceder a uma simplificadaponderao entre princpios conflitantes, atribuindo procedncia ao de maiorhierarquia ou significado. At porque, como observado, dificilmente se lograestabelecer uma hierarquia precisa entre direitos individuais e outros valoresconstitucionalmente contemplados. Ao revs, no juzo de ponderao
indispensvel entre os valores em conflito, contempla a Corte as circunstnciaspeculiares de cada caso. Da afirmar-se, correntemente, que a soluo dessesconflitos h de se fazer mediante a utilizao do recurso concordncia prtica(praktische Konkordanz), de modo que cada um dos valores jurdicos emconflito ganhe realidade52.
Em palestra proferida na Fundao Casa Rui Barbosa, no Rio de Janeiro,
Alexy ressaltou que:
As colises dos direitos fundamentais (...) devem ser consideradas segundo ateoria dos princpios, como uma coliso de princpios. O processo para asoluo de colises de princpios a ponderao. Princpios e ponderaes sodois lados do mesmo fenmeno. O primeiro refere-se ao aspecto normativo; ooutro, ao aspecto metodolgico53.
Entre ns, Raquel Denize Stumm reala o carter de princpio das normas de
direito fundamental e admite a possibilidade de coliso entre os mesmos, pois a
proibio prescrita por um princpio pode coincidir com a permisso outorgada por
outro. o caso, por exemplo, da inviolabilidade da honra dos indivduos e o direito de
liberdade de expresso. Revela, ainda, a autora, que a melhor maneira para se resolver
uma coliso de princpios deve ser diante do caso concreto, considerando ser a ocasio
em que os princpios expem seus diferentes pesos54.
51 SARMENTO, Daniel. Os Princpios Constitucionais e a Ponderao de Bens. In: TORRES, RicardoLobo (Org.) Teoria dos Direitos Fundamentais.2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 55.52 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 336.53
ApudMENDES, Gilmar Ferreira.Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev.e ampl. So Paulo: Saraiva, 2006, p. 26.54 STUMM, Raquel Denize. Princpio da Proporcionalidade no Direito Constitucional Brasileiro. PortoAlegre: Livraria do Advogado, 1995, p. 77.
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Desse modo, aps breve exposio do pensamento doutrinrio quanto s
distines entre regras e princpios, pode-se notar que o critrio positivista desubsuno apresenta algumas deficincias para devida aplicao do direito, sobretudo
no que se reporta aos casos concretos, considerando as especificidades que nem
sempre o legislador consegue alcanar. Assim, no crvel e nem esperado que o
legislador possa antever todas as possibilidades de conflitos entre direitos fundamentais
e, a partir da, elaborar leis para qualquer situao imaginvel no campo ftico.
Com efeito, h situaes fticas que a lei no regula e que, por outro lado,
necessitam de respostas, as quais s podero ser fornecidas diante do caso concreto,
com devido sopesamento dos princpios aplicveis. Logo, a distino apresentada entre
regras e princpios oferece uma justificativa racional para devida aplicao das normas
de direitos fundamentais.
imperioso enfatizar a importncia da distino entre regras e princpios
para o presente trabalho, uma vez que os direitos fundamentais sociais de carter
prestacional se apresentam, em sua grande maioria, na qualidade de princpios.
Portanto, a aplicao das normas de direitos fundamentais sociais aos casos
concretos se observa com maior efetividade se emoldurada em uma concepo abertade regras e princpios, pois a natureza dos princpios permitiria a sua aplicao em
diferentes graus, a depender das possibilidades fticas e jurdicas da situao posta. Ao
revs, se fossem consideradas apenas como regras, com o regime de aplicao do
tudo ou nada, as normas de direito fundamental social decerto ficariam desprovidas
de eficcia, haja vista a dificuldade de se conferir uma aplicao absoluta a tais direitos.
Assim, as normas de direitos fundamentais sociais podem albergar tanto
princpios como regras (v.g.: licena-gestante). Na qualidade de princpios, querepresentam a grande maioria, so capazes de configurar direitos subjetivos prima
facie, que, aps a devida ponderao com os princpios contrapostos, podem gerar
direitos subjetivos definitivos55. Neste contexto, frise-se que tais normas no possuem
natureza absoluta, mas relativa, porquanto estaro subordinadas tcnica da
ponderao diante dos casos concretos.
55 OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficcia dos Direitos Fundamentais Sociais frente Reserva doPossvel. Dissertao de Mestrado. Curitiba: Universidade Federal do Paran, 2006, p. 59.
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Considerando a ordem constitucional alem, onde os direitos fundamentais
sociais no se encontram positivados no texto constitucional, Alexy enquadra taisdireitos como princpios56. Nesta perspectiva, Bckefrde tambm assinala que os
direitos fundamentais sociais configuram normas objetivas de princpio
(Grundsatznorme)57.
Portanto, na Alemanha, os direitos fundamentais sociais so extrados do
modelo previsto na Lei Fundamental de Bonn, que consagrou o Estado Social e
tambm o princpio da dignidade da pessoa humana.
Por outro lado, a Constituio Federal de 1988 consagrou expressamente os
direitos fundamentais sociais, de modo que, conforme j dito alhures, as normas
definidoras dos direitos fundamentais sociais assumem ora a estrutura de regras, ora a
de princpios.
Destarte, os direitos fundamentais sociais quando representam princpios
constituem posies jurdicas subjetivas prima facie, que podem se tornar definitivas
aps um processo de ponderao, onde se promove um balanceamento com os outros
princpios contrapostos em face de determinada situao concreta. Nas precisas
palavras de Bckenfrde:
As normas de princpio correspondem a mandatos de optimizao, que podemser cumpridos em diferente medida. A medida do respectivo cumprimentodepende no s de possibilidades fcticas, mas tambm jurdicas. Estasnormas tm tendncia para a optimizao, sem que por isso se encontremsujeitas a um contedo determinado. So necessariamente susceptveis deponderao58.
No podemos olvidar, todavia, que o critrio da ponderao alvo de crticas
cidas provenientes de vrios autores de peso. Desta forma, convm, neste momento,
apresentar tais censuras erigidas em face de tal mtodo.
56 ALEXY, Robert. Teoria de Los Derechos Fundamentales. Traduccin de Ernesto Garzn Valds.Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993, p. 483.57 BCKENFRDE, Ernst-Wolfgang. Grundrechte als Grundstatznormen. Zur gegenwrtige Lage derGrundrechtsdogmatik. In: (ed.).Staat, Verfassung, Demokratie.Studien zur Verfassungstheorie undzum Verfassungsrecht, 2. ed., Francoforte sobre o Meno, 1992, pp. 159 e ss, apudQUEIROZ, Cristina M.M. Direitos Fundamentais Sociais, Coimbra: Coimbra Editora, 2006, p. 125.58
Idem, ibidem, pp. 159 e ss, apudQUEIROZ, Cristina M. M. Direitos Fundamentais Sociais, Coimbra:Coimbra Editora, 2006, pp. 125-126.
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A primeira crtica erigida destaca que a tcnica da ponderao conduz a uma
fragilidade da norma de direito fundamental, pois sempre se estaria merc de umareserva de ponderao, ou seja, apenas aps esse juzo que seria possvel a
identificao do direito fundamental a ser protegido59.
A segunda insurgncia diz respeito possibilidade de o critrio da
ponderao gerar resultados diversos quando aplicados por diferentes pessoas. Assim,
diante de uma mesma situao ftica, seria possvel que duas pessoas, por exemplo,
atingissem resultados bem distantes, at mesmo em sentidos opostos e contraditrios.
Com isso, sustentam alguns autores que o mtodo seria inconsistente para enfrentar a
coliso de princpios.
A terceira censura dirigida ao critrio da ponderao, na verdade, uma
decorrncia da segunda, e se refere extensa margem de discricionariedade conferida
aos juzes por tal mtodo. Desse modo, os magistrados teriam a liberdade para eleger
os princpios que deveriam ser acolhidos no caso concreto.
As crticas apontadas so relevantes, pois inegvel que tal mtodo de
aplicao dos princpios confere aos juzes certa dose de discricionariedade, bem como
torna possvel a existncia de decises diferenciadas em um mesmo caso, acarretando,conseqentemente, uma insegurana jurdica.
Contudo, considerando o contexto do sistema jurdico contemporneo, bem
como a necessidade de se apurar as singularidades de cada situao posta, no
vislumbramos soluo jurdica melhor, como j advertiu Martin Borowski60.
Ademais, a tcnica da ponderao no aplicada com total liberdade pelo
intrprete, uma vez que est sujeita a critrios racionais, de acordo com um juzo de
proporcionalidade, o qual iremos analisar mais detidamente no item seguinte.
59 OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficcia dos Direitos Fundamentais Sociais frente Reserva doPossvel. Dissertao de Mestrado. Curitiba: Universidade Federal do Paran, 2006, p. 7060 BOROWSKI, Martin. La Estructura de los Derechos Fundamentales. Traduccin de Carlos BernalPulido. Bogot: Universidad Externado de Colombia, 2003, p. 57.
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1.6 - Princpio da Proporcionalidade
1.6.1 Consideraes Preliminares
O estudo do princpio da proporcionalidade ser um importante instrumento
jurdico para podermos enfrentar, mais adiante, o problema da reserva do
financeiramente possvel quando colocado em confronto com a busca pela efetividade
dos direitos fundamentais sociais de natureza prestacional.
Note-se, inicialmente, que o aludido princpio no foi previsto expressamentena Constituio Federal de 1988. Contudo, apesar da ausncia de positivao, ele foi
acolhido abertamente pela doutrina e pela jurisprudncia nacional.
Vale observar, por outro lado, que alguns pases, como Portugal e
Alemanha, fizeram constar em seus textos constitucionais o postulado da
proporcionalidade. Quanto Constituio Portuguesa, merece destaque o art. 18, 2,
que assim dispe: A lei s pode restringir direitos, liberdades e garantias nos casos
expressamente previstos na Constituio, devendo as restries limitar-se ao
necessrio para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente
protegidos61.
1.6.2 Proporcionalidade e Razoabilidade
A doutrina tem discutido a respeito da distino entre os institutos da
proporcionalidade e da razoabilidade. Com isso, h autores que compreendem a
proporcionalidade como um instrumento da razoabilidade. Por outro lado, h tambm
outros que identificam a razoabilidade como um aspecto da proporcionalidade. Por fim,
uma terceira vertente defende a equiparao dos termos62.
61 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev. eampl. So Paulo: Saraiva, 2006, p. 49.62 SAMPAIO, Jos Adrcio Leite. O retorno s tradies: a razoabilidade como parmetro constitucional.In: (Coord.) Jurisdio Constitucional e Direitos Fundamentais.Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.63.
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Apoiando esta ltima corrente, Lus Roberto Barroso defende que os termos
razoabilidade e proporcionalidade podem ser empregados como sinnimos. Consoanteobserva o constitucionalista carioca:
De logo conveniente ressaltar que a doutrina e a jurisprudncia, assim naEuropa continental como no Brasil, costumam fazer referncia, igualmente, aoprincpio da proporcionalidade, conceito que em linhas gerais mantm umarelao de fungibilidade com o princpio da razoabilidade63.
Suzana de Toledo Barros tambm iguala os aludidos conceitos, pois afirma
que o princpio da proporcionalidade, de origem alem, corresponde a nada mais do
que o princpio da razoabilidade dos norte-americanos64.
Diferentemente, Lus Virglio Afonso da Silva defende a distino entre os
princpios, sustentando, ainda, que a regra da proporcionalidade muito mais complexa
e precisa do que o princpio da razoabilidade. Nas palavras do autor:
A regra da proporcionalidade no controle das leis restritivas de direitosfundamentais surgiu por desenvolvimento jurisprudencial do TribunalConstitucional alemo e no uma simples pauta que, vagamente, sugere queos atos estatais devem ser razoveis, nem uma simples anlise da relaomeio-fim. Na forma desenvolvida pela jurisprudncia constitucional alem, temela uma estrutura racionalmente definida, com subelementos independentes aanlise da adequao, da necessidade e da proporcionalidade em sentidoestrito que so aplicados em uma ordem pr-definida, e que conferem regrada proporcionalidade a individualidade que a diferencia, claramente, da meraexigncia de razoabilidade65.
Em acepo oposta, Jos Adrcio Leite Sampaio compreende a
razoabilidade num sentido mais amplo do que a proporcionalidade. Segundo o autor, a
razoabilidade se refere ao conceito abstrato de justia e correo da forma de agir
do Poder Pblico, sendo a proporcionalidade apenas um dos aspectos darazoabilidade66.
63 BARROSO, Lus Roberto. Os Princpios da Razoabilidade e da Proporcionalidade no DireitoConstitucional. In: Cadernos de Direito Constitucional e Cincia Poltica, n. 23, So Paulo: Revista dosTribunais, abril/jun. 1998, p. 69.64 BARROS, Suzana de Toledo. O Princpio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidadedas Leis Restritivas de Direitos Fundamentais.Braslia: Braslia Jurdica, 2000, p. 57.65 SILVA, Lus Virglio Afonso da. O Proporcional e o Razovel. In: Revista dos Tribunais, v. 798, abril2002, p. 30.66 SAMPAIO, Jos Adrcio Leite. O retorno s tradies: a razoabilidade como parmetro constitucional.In: (Coord.) Jurisdio Constitucional e Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, pp.64-65.
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Diante da divergncia acima descrita, filiamo-nos corrente que concebe o
princpio da proporcionalidade como um instrumento da razoabilidade, uma vez queesta apresenta um aspecto mais genrico, consoante bem delineado pelo professor
Jos Adrcio Leite Sampaio.
Quanto origem do princpio da razoabilidade, Lus Virglio Afonso da Silva
defende que estaria num julgamento proferido pela Corte Inglesa, em 1948, a qual
decidiu que deveriam ser desacolhidas as medidas consideradas irrazoveis. Conforme
o autor, trata-se da frmula Wednesbury, a qual prescreve que se uma deciso (...)
de tal forma irrazovel, que nenhuma autoridade razovel a tomaria, ento pode a
Corte intervir67.
Ainda no que tange ao princpio da razoabilidade, devemos fazer meno ao
julgamento da Suprema Corte norte-americana proferido no famoso caso Lochner vs.
New York, em 1905. Neste caso, a Suprema Corte reconheceu a inconstitucionalidade
de lei que limitava a jornada de trabalho dos padeiros em 60 (sessenta) horas
semanais, sob o argumento de que a lei violava a liberdade de iniciativa, bem como
seria irrazovel. Com a mesma fundamentao, a Corte Constitucional declarou
tambm a inconstitucionalidade de vrias outras leis, incluindo a que estabelecia umsalrio mnimo para as mulheres68.
Este perodo ficou conhecido como era Lochnere representou uma poca de
expanso do judicial review sobre os atos normativos no razoveis e arbitrrios. A
respeito da era Lochner, David P. Currie assinalou, em tom de crtica, que a Corte
Constitucional se tornou o censor supremo da razoabilidade da ao governamental 69.
Com a posse de Franklin Roosevelt na presidncia dos Estados Unidos
(1932), o mesmo props uma srie de leis que tinham como escopo a recuperao daeconomia, a qual enfrentava srias dificuldades desde a crise de 1929. No entanto, a
Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade de tais leis de cunho econmico.
67 SILVA, Lus Virglio Afonso da. O Proporcional e o Razovel. In: Revista dos Tribunais, v. 798, abril2002, p. 29.68
Adkins vs. Childrens Hospital,261 U.S. 525 (1923).69 CURRIE, David P. Lochner Abroad: Substantive Due Process and Equal Protection in the FederalRepublic of Germany. In: The Supreme Court Review. Chicago: The University of Chicago Press, 1989, p.336.
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Desse modo, se o meio escolhido no for capaz de satisfazer o fim almejado
pela norma, ser prescindvel apurar o segundo critrio, concernente necessidade damedida.
1.6.3.2 Princpio da Necessidade
O princpio da necessidade impe a apurao quanto inexistncia de
outros meios menos gravosos aos direitos fundamentais dos indivduos e que, alm
disso, sejam tambm idneos para alcanar os fins almejados pela norma fundamental.Cristina Queiroz assinala que, diante de dois meios igualmente adequados, deve ser
escolhido o mais benigno face ao direito fundamental afetado72.
No que se refere a este subprincpio, Gilmar Ferreira Mendes elucida:
Em outros termos, o meio no ser necessrio se o objetivo almejado puder seralcanado com a adoo de medida que se revele a um s tempo adequada emenos onerosa. Ressalte-se que, na prtica, adequao e necessidade notm o mesmo peso ou relevncia no juzo de ponderao. Assim, apenas o que adequado pode ser necessrio, mas o que necessrio no pode ser
inadequado. Pieroth e Schlink ressaltam que a prova da necessidade tem maiorrelevncia do que o teste da adequao. Por outro lado, se o teste quanto necessidade revelar-se negativo, o resultado positivo do teste de adequaono mais poder afetar o resultado definitivo ou final 73.
Apenas para melhor compreenso do aludido subprincpio, vejamos um
exemplo prtico: um cidado enfermo exige do Estado que este pague os custos de
uma cirurgia a ser realizada no exterior, em hospital que considerado um dos
melhores do mundo. Por outro lado, sabido que a mesma cirurgia realizada
freqentemente em nosocmio de seu municpio, com o mesmo sucesso e com oscustos bem reduzidos74. Dessa forma, verifica-se que o pleito do paciente no atende
ao subprincpio da necessidade, pois h outro meio bem menos oneroso de se atender
seu direito fundamental sade.
72 QUEIROZ, Cristina. Direitos Fundamentais Sociais,Coimbra: Coimbra, 2006, p. 167.73 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev. eampl. So Paulo: Saraiva, 2006, p. 50.74 LIMA, George Marmelstein. Efetivao Judicial dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais.Dissertao de Mestrado. Fortaleza: Universidade Federal do Cear, 2005, p. 188.
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1.6.3.3 Princpio da Proporcionalidade em Sentido Estrito
E, por ltimo, temos o princpio da proporcionalidade em sentido estrito, o
qual impe um balanceamento dos bens e direitos em conflito, configurando, desse
modo, uma regra de ponderao. De acordo com este subprincpio, quanto mais
atingido for um direito fundamental, maior deve ser a importncia do princpio
contraposto.
Acerca da regra de ponderao, Gilmar Ferreira Mendes faz aluso lcidadefinio trazida por Robert Alexy:
Para Alexy, a ponderao realiza-se em trs planos. No primeiro, h de sedefinir a intensidade da interveno. No segundo, trata-se de saber aimportncia dos fundamentos justificadores da interveno. No terceiro plano,ento se realiza a ponderao em sentido especfico e estrito. Alexy enfatizaque o postulado da proporcionalidade em sentido estrito pode ser formuladocomo uma lei de ponderao segundo a qual, quanto mais intensa se revelara interveno em um dado direito fundamental, mais significativos ou relevantesho de ser os fundamentos justificadores dessa interveno 75.
Ainda segundo Gilmar Ferreira Mendes, a proporcionalidade em sentido
estrito assumiria, assim, o papel de um controle de sintonia fina ( Stimmigkeitskontrolle),
indicando a justeza da soluo encontrada ou a necessidade de sua reviso76.
Em sntese, de acordo com o princpio da proporcionalidade, uma restrio a
um direito fundamental, para ter validade, dever ser adequada, necessria e
estritamente proporcional. relevante ressaltar que estes trs vrtices do princpio da
proporcionalidade conservam uma relao de subsidiariedade entre si. Assim, a medida
restritiva do direito ser submetida inicialmente ao crivo da adequao, para, no
momento seguinte, ser avaliada quanto ao critrio da necessidade e, por fim, ser
examinada em face da proporcionalidade em sentido estrito.
Observe-se que, se o exame da adequao no for atendido, ento, no
haver sequer a necessidade de se apurar os demais critrios. Da mesma forma, se o
75 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. 3. ed., rev. eampl. So Paulo: Saraiva, 2006, p. 94.76 Idem,ibidem, p. 51.
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subprincpio da necessidade no for satisfeito, tambm ser prescindvel aferir se a
medida estritamente proporcional. Logo, s haver proporcionalidade se a medidaatender cumulativamente aos trs requisitos.
1.6.4 Duplo Controle de Proporcionalidade
O exame da proporcionalidade deve incidir no apenas em face das
restries impostas pelo preceito normativo em abstrato, mas tambm diante das
decises do Poder Judicirio ou do Administrador Pblico quando aplicam a norma aocaso concreto. Da se falar em duplo controle de proporcionalidade. Por oportuno, cabe
citar a anlise do professor Gilmar Ferreira Mendes:
A Corte Constitucional alem entende que as decises tomadas pelaAdministrao ou pela Justia com base na lei aprovada pelo Parlamentosubmetem-se ao controle de proporcionalidade. Significa dizer que qualquermedida concreta que afete os direitos fundamentais h de mostrar-secompatvel com o princpio da proporcionalidade.
Essa soluo parece irrepreensvel na maioria dos casos, sobretudo naqueles
que envolvem normas de conformao extremamente abertas (clusulas gerais;frmulas marcadamente abstratas). que a soluo ou frmula legislativa nocontm uma valorao definitiva de todos os aspectos e circunstncias quecompem cada caso ou hiptese de aplicao77.
Desse modo, o juiz, diante do caso concreto, tambm dever se ater ao
princpio da proporcionalidade. Com efeito, ao proferir uma deciso, o magistrado
dever atentar para que sua ordem seja adequada, necessria (no excessiva) e
estritamente proporcional, constituindo, assim, o princpio da proporcionalidade, em
verdadeiro limitador s decises judiciais78
. Esta concluso ser de suma importnciaquando formos enfrentar a questo concernente clusula da reserva do
financeiramente possvel.
77 MENDES, Gilmar Ferreira.Curso de Direito Constitucional.So Paulo: Saraiva, 2007, pp. 326-327.78 LIMA, George Marmelstein. Efetivao Judicial dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais.Dissertao de Mestrado. Fortaleza: Universidade Federal do Cear, 2005, p. 189.
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1.6.5 Proibio do Excesso e Proibio da Insuficincia
Inicialmente, vale ressaltar que o princpio da proporcionalidade pode se
manifestar tanto sob o aspecto da proibio do excesso quanto sob o da proibio da
insuficincia. No presente trabalho, ser dado maior nfase vertente relacionada
proibio da insuficincia (untermaverbot).
Quanto proibio do excesso, o princpio da proporcionalidade revela uma
dimenso negativa, pois trata da proteo dos indivduos em face da interveno
estatal na liberdade, de modo que restariam vedadas ao Estado aes excessivas de
restrio liberdade do indivduo 79.
No que se reporta proibio da insuficincia, necessria uma anlise
prvia concernente ao dever de proteo do Estado(Schutzpflitcht).
Claus-Wilhelm Canaris, em sua obra Direitos Fundamentais e Direito
Privado, abordou a eficcia dos direitos fundamentais nas relaes privadas e tambm
o papel do Estado dentro deste contexto. Segundo o autor alemo, o Estado deve atuar
de modo suficiente no intuito de conferir efetiva proteo aos direitos fundamentais dos
indivduos em face de agresses de terceiros80.
Como exemplo desse dever de proteo do Estado, podemos citar a
obrigao estatal de criar e aparelhar as polcias ostensivas, que devem proteger a vida
e o patrimnio das pessoas contra violaes perpetradas por terceiros.
Desse modo, Canaris reconhece no dever de proteo do Estado uma
prestao positiva para resguardar os indivduos contra agresses praticadas por
terceiros. A partir disso, desenvolve o autor a idia de proibio da proteo estatal
insuficiente, de modo que a prestao estatal deve ser satisfatria para amparar odireito fundamental suscetvel de violao. Portanto, a norma constitucional no
admitiria uma proteo estatal que fosse aqum de um nvel mnimo aceitvel81.
Logo, o princpio da proibio da insuficincia foi desenvolvido para balizar o
dever de proteo do Estado, que, conforme j assinalado, assume uma dimenso de
79 OLSEN, Ana Carolina Lopes. A Eficcia dos Direitos Fundamentais Sociais frente Reserva doPossvel. Dissertao de Mestrado. Curitiba: Universidade Federal do Paran, 2006, p. 77.80 CANARIS, Claus-Wilhelm.Direitos Fundamentais e Direito Privado. Traduo de Ingo Wolfgang Sarlete Paulo Mota Pinto. Coimbra: Almedina, 2003, p. 58.81 Idem ibidem, pp. 59-60.
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natureza prestacional. A partir de tais consideraes, revela-se admissvel, portanto,
que tal vertente do princpio da proporcionalidade tambm seja aplicvel aos direitosfundamentais sociais de natureza prestacional.
Assim, sob o aspecto da proibio da insuficincia, o princpio da
proporcionalidade assume uma feio positiva, pois impe ao Estado um dever de agir
de modo satisfatrio ou suficiente. Por conseguinte, o Estado dever atuar de modo a
conferir efetiva proteo aos indivduos em face de atos de terceiros (Schutzpflitcht).
Sob outro prisma, mas tambm em relao proibio da insuficincia, possvel
estender tal raciocnio aos direitos fundamentais sociais de natureza prestacional, na
medida em que o Poder Pblico tambm deve agir de modo suficiente para garantir aos
indivduos o mnimo de prestaes materiais necessrias para uma existncia digna .
Em suma, quando se trata da proteo dos direitos fundamentais de defesa,
o princpio da proporcionalidade assume a feio de proibio do excesso, ao passo
que, no caso de direitos fundamentais prestacionais, o aludido princpio desnuda a
condio de proibio de insuficincia82.
1.7 - Restries aos Direitos Fundamentais
Ao se identificar os direitos fundamentais dentro de um modelo normativo de
regras e princpios, a concluso que exsurge a da inexistncia de direitos
fundamentais absolutos, ou seja, eles podero ser limitados em face das
impossibilidades jurdicas e fticas.
Desse modo, ante as possveis limitaes aos direitos fundamentais, a
doutrina tem discutido se estas seriam consideradas como restries autnomas ou,ento, apenas uma delimitao do mbito normativo do direito fundamental. Com isso,
a doutrina se divide entre as teorias externa e interna, as quais sero analisadas nos
itens abaixo.
82 QUEIROZ, Cristina M. M.Direitos Fundamentais Sociais, Coimbra: Coimbra, 2006, p. 09.
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1.7.1 - Teoria Interna
Segundo a teoria interna, no seria admissvel uma categoria autnoma de
restrio a direito fundamental. Acolhe-se, apenas, uma demarcao do contedo do
direito (limite imanente), mas no com a natureza de restrio. Nesta medida, rejeita-se
a existncia de duas categorias distintas: uma concernente ao direito fundamental e
outra consistente na restrio a este direito.
Gilmar Ferreira Mendes, ao se referir teoria interna, descreve que no
existem os conceitos de direito individual e de restrio como categorias autnomas,
mas sim a idia de direito individual com determinado contedo. A idia de restrio
(Schranke) substituda pela de limite (Grenze)83.
De acordo com os partidrios da teoria interna, o direito fundamental tem um
contedo jurdico previamente demarcado, de tal sorte que toda posio jurdica que
ultrapasse seu mbito normativo no pode ser considerada como albergada por este
direito. Alm disso, sendo a restrio algo que abrevia o mbito de proteo do direito,
quando incorporada norma, no seria considerada como restrio, mas, sim,
delimitao do campo normativo do direito84.Alexy sustenta que o posicionamento adotado quanto s restries aos
direitos fundamentais est diretamente ligado ao modelo normativo que se acolhe85.
Dessa forma, na teoria interna, pode-se observar uma vinculao com o modelo
normativo das regras (tudo ou nada), pois ela estabelece que no h restries aos
direitos fundamentais que poss